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REDAÇÃO

PUBLICITÁRIA

Luciana Pletsch Galhardi


A relação entre o verbal
e o não verbal
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Conceituar comunicação verbal e não verbal.


 Explorar conexões possíveis entre o verbal e o não verbal na
propaganda.
 Analisar textos verbais e não verbais na propaganda.

Introdução
Neste capítulo, você vai conhecer as diferenças entre a comunicação verbal e
a não verbal. Mais especificamente, você vai estudar o elemento textual. Você
vai ver o que é um texto verbal e um texto não verbal e verificar como eles
podem ser analisados pelo olhar semiótico, que trabalha com a interpretação
dos signos. O conhecimento sobre semiótica permite ao redator perceber
como um argumento pode transmitir significado e como tal significado pode
ser interpretado pelo espectador, principalmente com o uso das técnicas de
indução e dedução do pensamento por meio da gramática.
Você vai conhecer as conexões possíveis entre o verbal e o não verbal
por meio de quatro indicativos: a significação ou representação, a referên-
cia, a interpretação da mensagem e a relação de complementariedade
imagem–texto. Por fim, você vai ver como a teoria se aplica a análises
semióticas de peças publicitárias.

Comunicação verbal e não verbal


O estudo da linguagem é muito antigo; ele se iniciou na Grécia (ARISTÓ-
TELES, 1979). A comunicação em si é uma troca de informação entre dois
indivíduos, sendo constituída pela linguagem verbal e pela linguagem não
verbal. Apesar de a diferenciação entre as duas ser bastante simples, quando
2 A relação entre o verbal e o não verbal

aparecem em conjunto, elas precisam usar códigos fáceis de se compreender,


em uma argumentação ou conceito claro e objetivo.
A comunicação verbal é a linguagem falada ou oralizada. Ela inclui todas
as formas de comunicação oral, como fala, sons, música, ruídos e expressões
sonoras. Na peça publicitária, é importante dedicar uma atenção especial ao
que se diz e também ao modo como se diz. O tom de voz, o volume e a empatia
são transmitidos pela fala e interferem na mensagem final.
Já a comunicação não verbal é definida por tudo aquilo que não faz uso
de palavras. São as imagens, fotografias, ilustrações, códigos e signos visuais,
símbolos e ícones que possuem um significado na cultura. Aqui, também está
inclusa a expressão e os gestos corporais, elementos de linguagem que possuem
significado na forma de agir e que precisam ser levados em consideração em
comerciais quando há presença de atores. Afinal, a forma como os atores se
movimentam, se olham e se tocam passa informações para o espectador. É por
meio da comunicação não verbal que você percebe se alguém está triste ou feliz,
por exemplo. Portanto, grande parte da comunicação não verbal faz parte de um
código universal.
A semiótica é um método que pesquisa a linguagem verbal e não verbal
representada pela interpretação dos signos. Ela ficou conhecida pela interpre-
tação dos signos, da significação e da cultura no século XX e é bastante útil
nas investigações sobre a comunicação, incluindo a comunicação publicitária.
A seguir, você vai conhecer os princípios básicos da teoria semiótica desen-
volvida por Charles Pierce, matemático, cientista e filósofo norte-americano.
A autora Lucia Santaella (2007; 2009), nas obras O que é semiótica e Semi-
ótica Aplicada, utiliza os conceitos de Pierce e tece considerações sobre como
ver a comunicação. A seguir, além de conhecer algumas das ideias de Pierce
e Santaella, você vai ver exemplos de peças publicitárias para compreender a
relação entre a comunicação verbal e a não verbal e, mais especificamente, a
relação imagem–texto na publicidade.
A semiótica é uma teoria desenvolvida por Pierce durante toda a sua vida.
Ela não se limita à compreensão da classificação dos signos; é bem mais
ampla, pertencendo a uma lógica entendida como uma teoria geral, formal e
abstrata dos métodos de investigação que podem ser utilizados em diversas
ciências (SANTAELLA, 2007).
Dessa forma, você deve considerar a semiótica uma aliada no seu estudo
das linguagens verbal e não verbal. Santaella (2009, p. 13) justifica que “A
semiótica é a ciência que tem por objeto de investigação todas as linguagens
A relação entre o verbal e o não verbal 3

possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de
todo e qualquer fenômeno”. A seguir, você vai conhecer algumas categorias que
vão auxiliá-lo a decodificar os signos presentes na mensagem publicitária, ou
seja, que vão criar condições de você prever situações comunicativas na hora
de criar uma mensagem persuasiva. Nesse contexto, a semiótica é importante
porque ela ajuda a perceber como ocorre a transmissão de significado de uma
mente para outra e de um estado mental para outro — por meio da gramática,
da lógica (abdução, indução e dedução) e da retórica especulativa.

O método de Pierce é complexo. Aqui, você vai acompanhar uma síntese das categorias
criadas por ele. A ideia é que você, como redator, tenha melhores condições de aplicar
as ideias de Pierce na prática, vendo um panorama sobre como são criados os signos
e sobre os efeitos que são capazes de provocar no receptor.

O signo
O signo tem uma natureza triádica, isto é, ele se realiza a partir de três pontos
de vista (SANTAELLA, 2007):

 em si mesmo, nas suas propriedades internas, ou seja, no seu poder


para significar;
 na sua referência àquilo que ele indica, refere ou representa;
 nos tipos de efeitos que está apto a produzir nos seus receptores, isto
é, nos tipos de interpretação que ele tem o potencial de despertar nos
seus usuários.

Dessa forma, a semiótica permite adentrar no próprio movimento das


mensagens, no modo como são engendradas, nos procedimentos e nos recur-
sos utilizados nelas. Ela pode ser vista como uma metodologia analítica que
percebe significados na comunicação verbal (é oral: fala, som, ruído) e na
comunicação não verbal (é impressa: texto, imagem, ilustração, fotografia).
Como redator, você deve ter cuidado na hora de analisar os signos:
4 A relação entre o verbal e o não verbal

Sem conhecer a história de um sistema de signos e do contexto sociocultural


em que ele se situa, não se pode detectar as marcas que o contexto deixa
na mensagem. Se o repertório de informações do receptor é muito baixo, a
semiótica não pode realizar para esse receptor o milagre de fazê-lo produzir
interpretantes que vão além do senso comum (SANTAELLA, 2007, p. 6).

É por isso que a maior parte da comunicação publicitária trabalha com men-
sagens fáceis de entender, de senso comum. Isso implica criar uma mensagem
clara, que seja compreendida independentemente do grau de escolaridade e
do contexto sociocultural do receptor. Criar uma mensagem que apenas um
seleto grupo de pessoas vai entender não é eficaz. Este é um sinal de alerta:
a mensagem clara geralmente é aquela mais genérica, mas nem por isso deve
deixar de ser autêntica.
Mas, afinal, o que é o signo? O signo é qualquer coisa de qualquer espécie
(uma frase, uma imagem, um som, um anúncio, uma pessoa, um vídeo) que
representa uma outra coisa, que produz um efeito interpretativo na mente do
receptor. Veja o exemplo apresentado por Santaella (2007): um grito representa
algo que não é o próprio grito, isto é, ele indica que aquele que grita está em
apuros e precisa de ajuda. O que é representado pelo signo — ou seja, aquilo
a que ele se refere — é chamado de objeto do signo, e o efeito que o signo
produz (grito) é chamado interpretante do signo.
Agora considere um exemplo na área da publicidade: um anúncio fala bem
de determinado tênis, apresentando benefícios e diferenciais do produto. O
signo (anúncio) vai provocar no receptor um efeito interpretativo: gostar do
tênis, comprar o tênis, não se interessar pelo tênis. Esses efeitos são o inter-
pretante. Os leitores só têm acesso ao objeto do signo, àquilo que o anúncio
representa, pela mediação do signo.
Agora considere mais um exemplo: suponha que um redator precisa criar
um comercial para a televisão. O comercial é um signo daquilo que se deseja
transmitir (objeto do signo). O efeito que a mensagem produz no espectador é
o interpretante do comercial (interpretante do signo), que, no final no vídeo,
é um mediador entre aquilo que o comercial deseja transmitir e o efeito que
o redator deseja produzir por meio da mensagem.
Quando a lógica triádica do signo fica clara, é mais fácil entender por que a
lógica peirciana do signo inclui três teorias: a da significação, a da objetivação
e da interpretação (Quadro 1).
A relação entre o verbal e o não verbal 5

Quadro 1. Lógica triádica da teoria do signo de Peirce

Da relação do signo consigo mesmo, da natureza do


Signo seu fundamento. Vem da teoria das potencialidades
e limites da significação: a sua qualidade.

Da relação do fundamento com o objeto, aquilo que o


signo representa. Vem da teoria da objetivação: estuda
Objeto
problemas relacionados à denotação, à realidade e à
referência, ao documento e à ficção, à mentira e à decepção.

Da relação do fundamento com o interpretante, deriva-se


Efeito
uma teoria da interpretação, com as implicações quanto
interpretativo
aos seus efeitos sobre o intérprete, individual ou coletivo.

Fonte: Adaptado de Santaella (2007).

Qualquer coisa pode ser analisada semioticamente. O signo é aquilo que


dá corpo ao pensamento, às emoções e reações que podem ser externalizadas.
Essas externalizações são traduções dos signos internos e externos. A publici-
dade impressa, sonora e televisiva, incluindo a percepção que o receptor tem
dela, pode ser vista pela luz da semiótica, inclusive na mistura de naturezas de
signos, o verbal e o não verbal. É o que ocorre, por exemplo, em um comercial,
em que o receptor interpreta a mistura verbal acrescida da imagem.

Há também uma parte mais subjetiva do estudo de Peirce: ele classificou as inter-
pretações. As interpretações de primeira categoria são os meros sentimentos e
emoções; as de segunda categoria são as percepções, ações e reações; e as de
terceira categoria são os discursos e pensamentos abstratos. Essas interpretações
tornam muito próximos o sentir, o reagir, o experimentar e o pensar. São essas misturas
que Peirce fundamentou em diferentes classes de signos.
6 A relação entre o verbal e o não verbal

Verbal e não verbal: ícone, índice e símbolo


A comunicação verbal é qualquer forma de expressão falada ou escrita.
Já a comunicação não verbal são movimentos corporais e gestuais, posturas,
expressões faciais e contatos visuais. Contudo, na publicidade, a comunicação
não verbal é mais complexa. Isso significa que o não verbal da comunicação
pode ser encontrado na imagem, na ilustração, na fotografia e também dentro
da semiologia: o ícone, o índice e o símbolo são, muitas vezes, interpretados
de forma inconsciente pelo receptor.
O livro O corpo fala, de Pierre Weil e Roland Tompakow (2015), faz um
apanhado de imagens para ilustrar a comunicação não verbal do corpo humano.
Para isso, analisa os princípios inconscientes que regem e conduzem o corpo,
as expressões, os gestos e os atos corporais, que expressam sentimentos,
concepções ou posicionamentos internos.
A comunicação não verbal é mediada por tudo o que não faz uso das
palavras. Você pode tomar como exemplo as placas de sinalização de trânsito.
Outra forma de comunicação não verbal é o significado das cores. No trânsito,
o vermelho indica perigo, e o verde é associado à tranquilidade, ao caminho
livre. Já no setor alimentício, o vermelho desperta a sensação de sede, de
agitação corporal, e o amarelo, a sensação de fome (pense, por exemplo, nas
cores do McDonald’s). Por sua vez, o verde indica alimentação saudável. Na
área do meio ambiente, a cor mais usada para indicar sustentabilidade também
é o verde. O preto, na cultura ocidental, significa luto; já no Oriente, a cor
que representa o luto é o branco. A comunicação não verbal transmite infor-
mação sociocultural, valores, ideias e conceitos. Nesse sentido, é necessária
a compreensão do ícone, do índice e do símbolo.
O signo possui três tipos de propriedades categorizadas por Peirce (SANTA-
ELLA, 2007). Considere que o signo sempre deve estar em relação ao objeto.
O ícone é uma qualidade relacionada ao objeto. Por exemplo, a modelo Gisele
Bündchen é um ícone da beleza (nesse caso, a beleza é vista como uma qualidade).
O índice é a indicação de uma existência concreta relacionada ao objeto. Por
exemplo, encontrar pegadas no chão é um indício de que alguém passou por
ali. Já o símbolo é uma lei relacionada ao objeto. Por exemplo, a pomba branca
é o símbolo da paz, é uma lei universal. Outro exemplo de símbolo é o logotipo
desenvolvido para as Olimpíadas de Paris de 2014; o logo reúne a medalha de
ouro, a chama olímpica e paraolímpica e a imagem de Marianne, símbolo da
Revolução Francesa. O rosto de Marianne foi escolhido pois a sua figura “[...]
revela a ambição de ser igualitária, partilhadora e generosa” (GEEKPUBLI-
CITARIO, 2019), sendo um “[...] rosto que coloca humanidade no coração dos
A relação entre o verbal e o não verbal 7

jogos” (GEEKPUBLICITARIO, 2019). A publicidade utiliza o ícone, o índice e


o símbolo, como você vai ver mais adiante com exemplos de peças publicitárias.
Uma frase dita em voz alta é uma comunicação verbal. Uma fotografia é
uma comunicação não verbal. Em qualquer um dos casos, os signos se reportam
a algo porque esse algo que eles denotam está representado dentro do próprio
signo. Ou seja, o modo como o signo representa, indica, assemelha-se, sugere
e evoca aquilo a que ele se refere é o objeto. O papel do signo é colocar o
receptor em contato com tudo aquilo que se costuma chamar de “realidade”.
Por exemplo, quando você sente o aroma de um perfume e lembra da sua avó,
o signo é o perfume que está no mundo real e que representa uma lembrança
da avó. O signo é uma coisa que denota outra coisa. A seguir, veja uma síntese
das propriedades do signo (SANTAELLA, 2007).

 Ícone: qualidade.
 Índice: existência concreta.
 Símbolo: lei.

Conexões possíveis entre o verbal


e o não verbal na propaganda
O redator cria campanhas compostas por elementos verbais e não verbais, e
o receptor, por meio de uma associação de ideias, interpreta a conexão entre
o signo e o seu objeto. A ideia criativa da campanha, portanto, precisa ser
coerente com a realidade. Desse modo, quando o redator utiliza um ícone,
índice ou símbolo, deve trabalhar para que o receptor consiga interpretá-lo de
maneira adequada, com base no seu conhecimento de mundo internalizado.
Por exemplo, o hino nacional só simboliza o Brasil para quem internalizou
essa convenção. Lembre-se de que o receptor (interpretante) da mensagem
incorpora não só os elementos lógicos, racionais, como também os emotivos,
sensórios, ativos e reativos como parte do processo interpretativo.
Há uma sinestesia na comunicação não verbal. Segundo Santaella (2007, p.
53), “[...] as imagens visam produzir sensações não só visuais, como também
sensações táteis e, principalmente, sensações de cheiro”. Está em jogo um
conjunto de habilidades mentais e sensórias que o receptor carrega e que não
pode ser desconsiderado na hora de criar a mensagem publicitária.
A linguagem não verbal na publicidade pode transmitir emoções confusas,
de acordo com Pires e Oliveira Júnior (2011). Os autores alertam as agências
de comunicação em relação ao uso de personagens nos enunciados. As ex-
8 A relação entre o verbal e o não verbal

pressões faciais, os movimentos e os gestos precisam transmitir os conceitos


e sentimentos adequados à mensagem que se deseja passar. Imagine que
contraditório seria a expressão de desconforto em um anúncio que deseja
vender absorvente íntimo, ou ainda um bebê chorando ao tomar banho todo
ensaboado em um anúncio de xampu infantil.
Os autores defendem que a expressão facial do ator influencia a opinião do
consumidor sobre o assunto. A linguagem não verbal na publicidade, quando
utilizada de forma correta, evita rejeições do público e torna as campanhas
mais atrativas e sinceras. Os autores sugerem ainda que seja feita uma análise
prévia da campanha antes de veiculá-la na rua, para testar se o conceito ade-
quado está sendo transmitido com clareza a partir da observação da linguagem
não verbal dos personagens. Além disso, o uso adequado da linguagem não
verbal na publicidade, além de evitar rejeições, pode tornar as campanhas
mais agradáveis, atrativas e sinceras (PIRES; OLIVEIRA JÚNIOR, 2011).
O processo comunicativo também pode ser observado a partir de quatro
pontos de vista: a significação ou representação, a referência, a interpretação
da mensagem e a relação de complementariedade imagem–texto. A seguir,
você vai conhecer melhor essas quatro ideias que conectam elementos verbais
e não verbais na propaganda.

A significação ou representação
Na significação ou representação, a semiótica permite observar a mensagem
a partir de três aspectos. O primeiro deles enfatiza as qualidades e a senso-
rialidade das propriedades internas que são mais subjetivas, como linguagem
visual, cores, movimento, formas, linhas, volume e luz. O segundo aspecto se
refere à mensagem no seu aqui e agora, ou seja, deve-se observar a mensagem
no seu contexto. E o terceiro aspecto se refere àquilo que a mensagem tem de
geral, convencional, cultural.

A referência
Na referência, a semiótica permite observar aquilo que a mensagem indica,
aquilo a que se refere ou aplica. Aqui, também há três aspectos. O primeiro é
perceber a sugestão sensorial ou metafórica da mensagem. O segundo é per-
A relação entre o verbal e o não verbal 9

ceber a denotação da mensagem, ou seja, sua capacidade de indicar algo que


está fora dela. E o terceiro aspecto é perceber ideias abstratas e convencionais
que são culturalmente compartilhadas.

A interpretação da mensagem
Na interpretação, a semiótica permite observar os efeitos que a mensagem
pode causar no receptor. Esses efeitos são de três tipos. O primeiro é o efeito
emocional, quando é despertado um sentimento no receptor, como alegria,
tristeza, raiva e comoção. O segundo é o efeito reativo, quando o receptor é
levado a agir diante da mensagem. E o terceiro é o efeito mental, quando o
receptor é levado a refletir sobre a mensagem.
É importante você entender que nem sempre é possível encontrar esses três
aspectos nas mensagens; pode-se encontrar somente um ou dois. Contudo,
lembre-se sempre de que o importante é perceber o que a mensagem representa,
a que ela se refere na cultura e que efeitos provoca.

A relação de complementariedade imagem–texto


A relação de complementariedade imagem–texto se dá quando imagem e texto
precisam estar juntos para significar. Sem um deles, não é possível compreender
o sentido da mensagem, ou seja, ambos se complementam. As palavras são orga-
nizadas de modo que o visual seja capaz de transmitir tanta informação quanto
lhe é possível, cabendo ao verbal confirmar informações específicas que o visual
já não é capaz de transmitir. Essa relação é perceptível em peças publicitárias que
trabalham com a metáfora, uma figura de retórica em que ocorre um processo de
associação subjetiva entre a significação própria e o efeito figurativo.
Os quatro pontos de vista apresentados — significação ou representação,
referência, interpretação da mensagem e relação de complementariedade
imagem-texto — permitem fazer uma análise semiótica detalhada da peça
publicitária, percebendo os elementos verbais e não verbais e explorando os
seus efeitos no receptor. Essa análise será apresentada na próxima seção,
com exemplos.
Para compreender a relação de complementariedade imagem–texto, analise
a Figura 1, a seguir.
10 A relação entre o verbal e o não verbal

Figura 1. Anúncio Axe Excite.


Fonte: Trindade (2012, documento on-line).

Na Figura 1, é possível identificar alguns signos a partir da linguagem não


verbal: as cores escuras lembram as trevas; as asas de anjo e o anel luminoso
(auréola) lembram o divino. Esses elementos articulados produzem um sig-
nificado. A linguagem verbal, presente na palavra “cairão”, está vinculada
à ideia de movimento, já que as letras “a” e “i” estão mais alongadas, como
se estivessem caindo, descendo. Esse recurso que permite inferir a ideia de
movimento também é um signo identificado na imagem.
A metáfora é composta pela relação imagem–texto, expressa pela frase
“Até os anjos cairão”. Essa linguagem metafórica é uma forma de dizer que
até as mulheres mais recatadas cairão aos pés de quem usar o desodorante.
A palavra “anjo” funciona como uma metáfora. A imagem mostra que o
desodorante possui um aroma que conquista todas as mulheres, até mesmo
as que são inacessíveis, como anjos.
A relação entre o verbal e o não verbal 11

Textos verbais e não verbais na propaganda


A semiótica é uma teoria que ajuda a entender todos os tipos de signos, sinais,
códigos e linguagens. Ela permite compreender imagens, palavras e sons em
diversas manifestações, como no design, na publicidade, na arte, na mídia, na
literatura, nas instituições e em vídeos. Dessa forma, os processos perceptivos
também fazem parte dos estudos semióticos. Santaella (2007, p. 59) diz que
“[...] a semiótica estuda os processos de comunicação, pois não há comunicação
sem mensagem”. Agora que você já compreendeu o potencial comunicativo das
mensagens e os efeitos que elas podem gerar no receptor, como o emocional,
o sensório, o metafórico e o simbólico, vai acompanhar a análise de alguns
anúncios e textos verbais e não verbais na propaganda.

Texto verbal
O texto verbal é sonoro. Você pode tomar como exemplos o som, o ruído, a
música, a voz. A seguir, você vai ver a análise semiótica do texto verbal de duas
peças publicitárias ( jingle e spot). Nessa análise, são observados os seguintes
elementos: objeto do signo, interpretante do signo, presença de ícone, índice
ou símbolo, representação, referência e interpretação. Para começar, considere
o jingle Pipoca com Guaraná Antarctica, cuja letra é apresentada a seguir.

Pipoca na panela começa a arrebentar


Pipoca com sal
Que sede que dá (som: tampa da garrafa de guaraná é aberta)
Pipoca e guaraná, que programa legal
Só eu e você, e sem piruá
Quero ver pipoca pular (pipoca com guaraná) (3x)
Soy loca por pipoca e guaraná

Para ouvir o jingle Pipoca com Guaraná Antarctica, acesse o link a seguir.

https://qrgo.page.link/ZLDwQ
12 A relação entre o verbal e o não verbal

O jingle sugere que o ouvinte memorize a marca guaraná Antarctica, que


é repetida diversas vezes (objeto do signo). O efeito que a mensagem produz
no ouvinte é despertar a vontade de consumir pipoca e guaraná (interpretante
do signo). Os efeitos sonoros da pipoca estourando e do guaraná sendo aberto
são percepções que fazem o ouvinte imaginar o produto real (representa-
ção), instigando o sentir. Esses sons produzem sensações visuais, táteis e
até olfativas. No jingle, é possível encontrar principalmente o índice. O som
do estouro que ocorre de forma rápida e contínua é um indício de pipoca, e
a tampa sendo aberta com um som gaseificado é um indício de refrigerante
(referência culturalmente compartilhada).
Percebe-se, também, o desejo da marca de transformar o guaraná Antarctica
em um ícone, pois sugere a combinação com a pipoca — como uma qualidade
—, como se pipoca e guaraná fossem perfeitos juntos. Outra percepção é que
o jingle cria o benefício (qualidade) da refrescância com a frase “A pipoca
com sal, que sede que dá”. O ouvinte pode ter sido persuadido a consumir o
produto, já que o seu desejo foi instigado com diversas referências que ficam
na imaginação (interpretação que gera ação).
Agora, veja o texto do spot Nestlé Purina:

— Ô bem, que tal a gente dar um passeio aqui na pracinha ao lado?


— Na pracinha aqui do lado? Aquela pracinha pequenininha?
— Isso, aquela lá!
— Noooooossa, eu adooooooro aquela pracinha, tem árvore, tem gra-
mado, tem bebedouro! Eu não acredito, não acredito, não acreditoooo!!!
Mas vamos agora, vamos agora né, ai muito obrigada, obrigada, eu te
amo querido, eu te amo muito muito muito muito muito!
Ninguém gosta tanto assim de você, só o cachorro (som: au au a au au)
Retribua com Purina, a marca preferida dos cães.
A relação entre o verbal e o não verbal 13

Para ouvir o spot Nestlé Purina, acesse o link a seguir.

https://qrgo.page.link/DnyaC

O spot deseja transmitir a mensagem de que a marca Purina é a preferida dos


cães (objeto do signo). O efeito que a mensagem produz no ouvinte é lembrar que
o cachorro merece a melhor ração por amar o dono (interpretante do signo). A
argumentação trabalha com o humor, gerando empatia no ouvinte por meio da
mensagem (interpretação emocional). Percebe-se que se trata de um cachorro
pela euforia com que a personagem reage à proposta de passeio na pracinha; logo,
nota-se a representação no contexto, no seu aqui e agora. A referência também é
percebida na sugestão metafórica da mensagem (o “bem” parece ser uma mulher,
mas na verdade é um cão). Pode-se perceber o ícone no momento em que a marca
deseja ser vista como uma marca de qualidade, “a preferida dos cães”. Já o som
de latidos deixa clara a mensagem de que o personagem é um cachorro (índice).

Texto não verbal


O texto não verbal é escrito. Você pode tomar como exemplos as palavras,
frases, títulos, slogans e logotipos. A seguir, você vai ver a análise semiótica
dos textos verbais e não verbais de um anúncio publicitário impresso (Figura 2)
e de um outdoor (Figura 3). Na análise, são observados os seguintes elementos:
objeto do signo, interpretante do signo, presença de ícone, índice ou símbolo,
representação, referência e interpretação.
14 A relação entre o verbal e o não verbal

Figura 2. Anúncio da agência Ogilvy.


Fonte: Revista Galileu (2004, documento on-line).

O anúncio deseja chamar a atenção para problemas relacionados à má


alimentação (objeto do signo). O efeito que a mensagem produz no espectador
é estimular a cultura alimentar saudável mediante a metáfora visual (interpre-
tante do signo). A relação entre o tema do anúncio (“Alimente o Brasil com
novas ideias”) e a metáfora visual (imagem-texto) indica que a alimentação
saudável é necessária para combater os problemas de sobrepeso. Por isso, a
imagem de uma fruta é o recurso visual utilizado para demonstrar um abdômen
saliente (interpretação de efeito mental, que faz refletir). O limão trabalha
metaforicamente com a representação da obesidade, assim como a palavra
“alimente” é uma referência que denota algo fora da mensagem, referindo-se
A relação entre o verbal e o não verbal 15

à alimentação adequada. A barriga saliente ilustrada pelo limão é tomada


como um símbolo da obesidade e relacionada com a saúde. A frase “Alimente
o Brasil com novas ideias” sugere que a alimentação saudável não deve ser
uma meta individual, mas de toda a sociedade. Agora, observe a Figura 3.

Figura 3. Anúncio da escola Cultural.


Fonte: Baldi ([20--], documento on-line).

O outdoor deseja comunicar o serviço de uma escola de idiomas (objeto do


signo). O efeito que a mensagem produz no espectador é informar a qualidade
do ensino por meio do adjetivo “mais força” (interpretante do signo). O tema
do anúncio (“Mais força no inglês”) e a metáfora visual do Super-Homem
(imagem-texto) relacionam o conceito de força a um serviço de qualidade.
A imagem da camisa aberta e a bandeira embaixo dela são recursos visuais
utilizados para representar a língua estrangeira (interpretação de efeito
mental, que faz refletir). O Super-Homem é um ícone da força, considerado
um herói. O gesto de abrir a camisa com as mãos (referência), aliado à frase,
comunica o serviço e a marca.
16 A relação entre o verbal e o não verbal

ALEXANDRO, V. Logo da Olimpiada 2024 é anunciado. Geek publicitário. 2019 Disponível


em: https://geekpublicitario.com.br/41579/logo-da-olimpiada-de-2024-e-anunciado/.
Acesso em: 8 jan. 2020.
ARISTÓTELES. Arte retórica e arte poética. Rio de Janeiro: Ediouro, 1979.
BALDI, M. Uma super campanha para escola de Inglês Blog Marcelo Baldi, [20--]. Dis-
ponível em: https://marcelobaldi.com.br/anuncio/127/uma-super-campanha-para-
-escola-de-ingles. Acesso em: 2 jan. 2019.
PIRES, S. F. S.; OLIVEIRA JUNIOR, E. A publicidade transmite emoções confusas? Instituto
Brasileiro de Linguagem Corporal, 2011. Disponível em: https://ibralc.com.br/a-publici-
dade-transmite-emocoes-confusas/. Acesso em: 2 jan. 2019.
REVISTA GALILEU. Rio de Janeiro: Globo, 2004. 1 imagem. Disponível em: https://
pt-static.z-dn.net/files/d90/94692ea2d1ce70b6579335daa6195fe9.png. Acesso em: 2
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SANTAELLA, L. O que é semiótica. São Paulo: Editora Brasiliense, 2009.
SANTAELLA, L. Semiótica aplicada. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2007.
TRINDADE, J. Análise semiótica da propaganda do desodorante Axe. Blog Sobre o
Português, 2012. Disponível em: sobreasletras.blogspot.com/2012/10/analise-semiotica-
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WEIL, P.; TOMPAKOW, R. O corpo fala: a linguagem silenciosa da comunicação não
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