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CURSO CAPACITAÇÃO TEOLÓGICA

NOVO TESTAMENTO II
(Atos e Epístolas Paulinas)

O LIVRO DE ATOS

1. Título
Desde o começo este livro foi conhecido com o nome de Os Atos dos Apóstolos,
embora o título não aparece no livro. Na verdade, o melhor título poderia ser “Os Atos
do Espírito Santo através dos Apóstolos”. A cópia mais antiga que temos (embora
incompleta) deste livro, conhecida como Papiro 45, e o Códice Sinaítico, lhe dá
simplesmente o título de “Atos”, sem mencionar aos apóstolos. Isto é razoável, pois o
livro não é uma história completa de todos esses homens. Uns poucos capítulos
descrevem a obra do Pedro e João, enquanto que o resto do livro registra a conversão e o
ministério de Paulo até o momento de seu primeiro encarceramento em Roma. Portanto,
o livro não abrange a obra completa de nenhum dos apóstolos. Pelo contrário, guarda
silêncio em quanto a quase todos eles. Dos doze, só Pedro, Tiago e João têm papéis
“importantes” no livro; mas grande parte da narração está dedicada a Paulo, que embora
foi apóstolo, não pertenceu aos discípulos originais. Por isso o título “Atos” seria mais
que suficiente.
A partir do século II começaram a aparecer muitas lendas afirmando que
relatavam a vida e as vicissitudes dos apóstolos (os Atos de Paulo, o chamado Pastor, o
Apocalipse de Pedro, os Ensinamentos dos Apóstolos, os Atos de André, de João, etc.,
estão entre os mais importantes; cf. Eusébio, História Eclesiástica, pág. 99-100). Estes
escritos também levavam o nome de “Atos”, e possivelmente para distinguir ao livro
canônico de Atos destes apócrifos (de autoria não reconhecidamente inspirada),
adicionou-se ao título a palavra “apóstolos”, ficando como “Atos de todos os Apóstolos”
ou “Atos dos Apóstolos”.

2. Autor
A introdução do livro de Atos (cap.1:1-14) deixa claro que o Evangelho de Lucas
e o livro de Atos foram escritos pelo mesmo autor, ou seja, Lucas, como vimos
anteriormente na matéria de NT I.
A Igreja primitiva nunca pôs em dúvida a canonicidade do livro, e rapidamente
assegurou-se a ele um lugar entre os escritos do NT.

3. Marco Histórico
O Império Romano estava em seu apogeu. Augusto tinha colocado um firme
fundamento administrativo sobre o qual seus melhores sucessores puderam construir, e
os piores não puderam demolir. Continuavam os benefícios que a civilização romana
proporcionava aos habitantes do império, mesmo que o governante fosse débil ou tirânico,
ou ambas as coisas. Os imperadores, durante o período abrangido pelo livro de Atos (c.
31-63 d.C.), foram: Tibério (14-37 d.C.), Calígula (37-41 d.C.), Cláudio (41-54 d.C.) e
Nero (54-68 d.C.). Tibério e Cláudio esforçaram-se pelo bem de seus vastos territórios;
em troca, Calígula e Nero, o pouco que fizeram, foi para o mal. Mas, apesar destas
variações no governo, se mantiveram no império as condições favoráveis para a
propagação do Evangelho.

Os fatores que ajudaram na tarefa dos apóstolos foram:



• Um governo relativamente estável,
• Um sistema administrativo comum,
• A justiça romana,
• Uma cidadania que cada vez se outorgava com mais facilidade,
• A paz preservada por legiões bem disciplinadas de soldados,
• Os caminhos que chegavam até cada rincão do mundo então conhecido,
• E seu idioma (o grego) que se entendia quase em todas as partes.

A princípio, a nova religião aproveitou sua vinculação com o judaísmo. A raça


judaica tinha sido dispersada em muitos lugares do império, e suas crenças básicas com
o tempo foram toleradas pelos romanos. O cristianismo, como um desprendimento da fé
mais antiga, compartilhou esta tolerância; mas depois o judaísmo caiu em desgraça. Os
judeus foram expulsos de Roma durante o reinado do Cláudio (Atos 18:2), e as veementes
aspirações nacionais ocasionaram a rebelião na Palestina e as desastrosas guerras dos anos
66-70 d.C., que culminaram com a destruição de Jerusalém no ano 70 d.C. (cf. Mat.
24:20). Quando piorou a situação do judaísmo, a posição do cristianismo se fez mais
perigosa. Era uma religião não reconhecida legalmente, e seus membros não estavam
amparados pela lei. Quando surgiam dificuldades, como quando Roma foi incendiada no
ano 64 d.C., foi fácil jogar a culpa sobre a comunidade cristã; e a perseguição que
sobreveio estabeleceu um terrível precedente que se seguiu fielmente nos anos sucessivos
(veja a apostila de História Eclesiástica, primeira parte).
Esta situação serve como pano de fundo para Lucas ao preparar sua história da
Igreja primitiva, e ao escrever os Atos dos Apóstolos.

4. Tema
Lucas declara (cf. Atos 1:1) que no “primeiro tratado” tinha relatado todas as
coisas que Jesus começou a fazer e a ensinar. Com clara visão histórica, reconheceu que
a obra de Jesus na Terra era só um começo, o qual havia relatado em seu Evangelho. Mas
sabia que Sua história estaria incompleta se se omitida a narração do que Jesus fez por
meio de Sua Igreja nascente depois de Sua ascensão. Portanto, Lucas se propôs descrever
a continuação da obra de Cristo mediante o ministério de Seus discípulos. A partir da
ordem registrada em Atos 1:8, ele descreve em forma ordenada os feitos dos apóstolos.
Em obediência ao mandato de seu Professor, os discípulos deram testemunho em
Jerusalém (1º), em toda Judéia (2º), na Samaria (3º), e até os confins da Terra (4º). Na
descrição das atividades dos apóstolos feita por Lucas, em forma natural surgem estas
divisões, e dessa maneira o livro registra o crescimento geográfico da Igreja primitiva.
Também registra outro elemento de importância. Em seu começo a Igreja era
judia, mas nunca teria podido cumprir sua missão mundial se houvesse permanecido
dentro dos limites de uma religião exclusivista como o judaísmo (pois os judeus não se
esforçavam por evangelizar a outros povos, por acreditarem que eles eram os únicos
escolhidos, e quem quisesse a salvação deveria vir buscá-la em Jerusalém). a Igreja
precisava liberar-se desse exclusivismo. Lucas esboça os passos que levaram a essa
liberação.
Sua narração descreve o crescimento do cristianismo que começou sendo uma
seita (“dissidência”) judaica, e se converteu em uma religião internacional, até que Paulo
pôde dizer que o Evangelho se pregava “em toda a criação que está debaixo do céu”
(Colos. 1:23).
Lucas relata que milhares de judeus, até entre os sacerdotes, muito logo aceitaram
o Evangelho (Atos 6:7), e que as perseguições logo induziram a Felipe a evangelizar aos
samaritanos e ao africano que conhecia algo do judaísmo (cap. 8). Ele narra como Pedro
chegou até Cornélio, o centurião romano (cap. 10). Destaca como uns homens de Cirene
e Chipre pregaram pela primeira vez aos que não eram judeus (cap. 11); como, uma vez
abertas as portas, Paulo e seus colaboradores evangelizaram a grande número de pagãos
(cap. 13- 14); e como, com a ajuda de Pedro e Tiago, foi possível conseguir que os
conversos gentis fossem liberados da sujeição ao ritual judeu (cap. 15). Seu relato termina
com um vívido quadro da propagação do Evangelho por todo mundo romano oriental
(cap. 16 a 28).
Lucas vê como o cristianismo chega a ser, em grande medida, uma religião de
gentios (não judeus). Lucas estava muito bem capacitado para ser o historiador desse
movimento, pois se acredita que ele mesmo era gentio, e demonstrou um profundo
interesse pelo ministério aos que não eram judeus. Resultou, pois, muito apropriado que
Lucas fora o escolhido para relatar a proclamação do Evangelho ao mundo gentio.
O autor de Atos reconhece plenamente o lugar do Espírito Santo no crescimento
da nascente igreja. Desde o dia em que Jesus deu “mandamentos pelo Espírito Santo aos
apóstolos” (cap. 1:2), o Espírito aparece como o Conselheiro dos dirigentes e de seus
colaboradores. Por meio do milagre do Pentecostes “foram todos cheios do Espírito
Santo, e começaram a falar em outras línguas, segundo o Espírito lhes dava que
falassem” (cap. 2:4). À medida que o relato prossegue, o Espírito continua guiando em
situações tais como a ordenação de Saulo (cap. 9:17), na aceitação dos gentios na igreja
(cap. 10:44-47), na consagração de Barnabé e Saulo para a obra missionária (cap. 13:2-
4), no concílio de Jerusalém (cap. 15:28), e nas viagens missionárias de Paulo (cap. 16:6-
7).
Por isso pode dizer-se que o livro de Atos é o relato de uma parte do que fazia o
Espírito por meio dos apóstolos e seus seguidores.
EPÍSTOLAS PAULINAS
Quem Foi Paulo (ou Saulo)?
Apesar de ter nascido em Tarso, principal cidade da Cicília e capital da província
romana local (Gal. 1:21), Paulo era “cidadão romano”. Os romanos não concediam a
cidadania a qualquer pessoa, mas apenas uma pequena parcela dos que viviam no Império
tinham esse privilégio. F. F. Bruce sugere que talvez Paulo tenha adquirido a cidadania
romana devido a algum serviço importante prestado aos romanos por seu pai ou avô (cf.
Morris, Introdução ao Novo Testamento, p. 242). Na condição de cidadão romano, Paulo
possuía 3 nomes: um prenome (praenomem), um nome de família (nomem) e um
sobrenome (cognomem). Destes nós só temos conhecimento do seu cognome, Paulus. A
cidade natal de Paulo pode também tê-lo conduzido na escolha da profissão, pois um
produto local, o cilicium, era empregado na fabricação de tendas, e o registro bíblico
afirma que esta era a profissão do apóstolo (Atos 18:1-4), trabalho este desenvolvido para
poder manter-se sem o auxílio das igrejas (1Tess. 2:9).
Paulo se dizia “hebreu de hebreus”, e alguém que seguia os ditames do judaísmo
com toda seriedade, sendo um membro de uma das mais conservadoras seitas – a dos
fariseus (Atos 26:5). Os fariseus davam grande atenção à lei oral, ou seja, as tradições dos
anciãos (cf. Marcos 7:3), que eram um conjunto de regras que pretendiam interpretar e
complementar a lei escrita por Moisés. Os fariseus eram grandemente respeitados pelo
povo em geral, devido ao seu zelo e certeza de crenças, e seu aparente desejo de buscar a
santidade em todos os pormenores da vida diária.
Paulo fora ensinado por um brilhante rabino chamado Gamaliel (cf. Atos 26:3),
membro da escola de Hillel (que era o chefe da academia teológica mais liberal, oposta à
de outro rabino, Shamai, tido por mais conservador). Paulo parecia não concordar com
alguns pensamentos “liberais” de seu professor (cf. Atos 5:34-39), e o zelo do discípulo
acabou por levá-lo a perseguir os “dissidentes” - membros do movimento cristão (cf. Atos
24:4; 26:9-11).

A Autoridade de Paulo

Para um ministério eficiente, era necessário que Paulo tivesse certeza de sua
autoridade apostólica. Por ser um apóstolo chamado por Deus (Gál. 1:1), ele podia se
equiparar em autoridade a Pedro, Tiago, João e os demais (que eram chamados de “super
apóstolos” pelos adversários de Paulo – 2Cor. 11:5). Embora, aparentemente, não tenha
consciência de estar escrevendo uma “Escritura” inspirada, a sua condição como apóstolo
permite a Paulo interpretar a Bíblia do Antigo Testamento com soberania, e fazer ao povo
os apelos que ele considerava essenciais à vida do crente em Jesus.
Divisão das Epístolas Paulinas
Elas podem ser divididas em 7 grupos distintos, conforme o tema por elas
abordado.

• 1 e 2Tessalonicenses – O tema principal é a escatologia (estudo de eventos do
tempo do fim). Paulo procura corrigir conceitos errôneos sobre a brevidade da Segunda
Vinda. Estas cartas foram escritas aproximadamente em 50 a 51 d.C.
• 1 e 2Coríntios – O tema principal é o combate à crise eclesiástica: diversos
aspectos doutrinários, desrespeito à autoridade apostólica. Foram escritas na primavera e
outono respectivamente do ano 54 ou 55 d.C.
• Romanos e Gálatas – Tema principal: justificação pela fé. Paulo nestas duas
cartas defende a Igreja contra os judaizantes (que pensavam que a observância das
cerimônias rituais do judaísmo contribuíam para a salvação). Estas duas cartas devem ter
sido escritas em torno dos anos 56 e 57 d.C.
• Filipenses, Colossenses e Efésios – O tema principal é a Cristologia (estudo da
Pessoa de Jesus). Há uma defesa contra a perversão gnóstica (corrente filosófica que
baseava a salvação na busca do conhecimento meramente teórico) da Pessoa de Cristo.
Estas cartas podem ter sido escritas entre os anos 61 a 63 d.C.
• 1Timóteo, Tito e 2Timóteo – Estas cartas tratam de problemas eclesiásticos do
dia-a-dia da Igreja. Elas foram possivelmente escritas entre 65 a 68 d.C.
• Hebreus – A autoria de Paulo para o livro de Hebreus tem sido questionada em
função do seu estilo literário e de seu conteúdo teológico que não se relacionam com o
estilo e o enfoque teológico do apóstolo nas outras cartas atribuídas a ele. Há, contudo,
evidências, que Paulo é o autor também desta epístola, como evidenciam P46 (Papiro
Chester Beatty II) e D2 (Códice Claromontano) escritos no final do II século AD e do VI
século AD respectivamente. Pode-se acrescer a isto o testemunho de Ellen White,
confirmando a autoria da paulina da carta aos Hebreus. É muito difícil determinar uma
data precisa para a redação de Hebreus, porém, as evidências favorecem uma data anterior
a 70 d.C. (Leon Morris).
• Filemon – Analisa a questão da escravatura. A data de sua redação apresenta
duas teorias: início da década de 60, se escrita em Roma; ou fim da década de 50, se
escrita em Éfeso.

A EPÍSTOLA AOS ROMANOS


1. Título
Quando Paulo escreveu esta epístola provavelmente não lhe pôs nenhum título.
Simplesmente era uma carta que escrevia aos crentes de Roma; mas posteriormente a
epístola chegou a ser conhecida como “Aos Romanos”, do grego prós romáious, que é o
título que se lhe dá nos manuscritos mais antigos. Em manuscritos posteriores, este título
foi ampliado para “A Epístola de Paulo o Apóstolo aos Romanos", título que com algumas
ligeiras diferenças é o que se usa nas versões portuguesas.
2. Autor
Nunca se pôs seriamente em dúvida que o apóstolo Paulo seja o autor desta
epístola. Alguns eruditos sugeriram que o cap. 16 possivelmente não formava parte da
epístola original enviada a Roma, mas sim foi uma carta separada enviada a Éfeso, onde
Paulo tinha trabalhado durante algum tempo (Atos 19). Esta teoria se apóia
principalmente na extensa lista de nomes que há neste capítulo, e na hipótese de que
dificilmente Paulo poderia ter conhecido a tantos amigos em uma cidade que ainda não
tinha visitado. Entretanto, como o povo afluía a Roma desde todas partes do império, é
muito possível que o apóstolo tivesse tido muitos amigos na capital. Além disso, todos os
manuscritos mais antigos incluem o cap. 16 como uma parte da epístola. Portanto, os
eruditos conservadores modernos deixam a epístola tal como se encontra agora.

3. Marco Histórico
Parece evidente que a Epístola aos Romanos foi escrita quando Paulo esteve em
Corinto, em sua terceira viagem missionária, durante a permanência de três meses nesta
cidade (Atos 20:1-3). Muitos eruditos localizam esta visita em fins do ano 57 e começos
de 58 d.C.; mas alguns preferem uma data mais antiga.
Que a epístola foi escrita desde Corinto é claro por suas referências a Gaio (Rom.
16:23; cf. 1Cor. 1:14) e a Erasto (Rom. 16:23; cf. 2Tim. 4:20), e por seu elogio a Febe, a
quem Paulo descreve como uma crente que havia emprestado serviços especiais à igreja
da Cencréia, o porto marítimo oriental de Corinto (Rom. 16:1). Quando Paulo escreveu a
epístola estava por retornar à Palestina, pois levava uma contribuição das igrejas da
Macedônia e Acaya para os pobres que haviam entre os cristãos de Jerusalém (Rom.
15:25-26; cf. Atos 19:21; 20:3; 24:17; 1Cor. 16:1-5; 2Cor. 8:1-4; 9:1-2).
Depois de terminar essa missão, propunha-se ele a visitar Roma, e de lá continuar
com sua viagem à Espanha (Atos 19:21; Rom. 15:24, 28). Até esse momento não tinha
podido visitar a igreja cristã da cidade capital do Império Romano, embora com
freqüência tenha desejado fazê-lo (Rom. 1:13; 15:22). Mas agora acreditava que tinha
completado seus trabalhos missionários na Ásia e Grécia (cap. 15:19, 23), e desejava
prosseguir rumo ao oeste para fortalecer a obra na Itália e introduzir o cristianismo na
Espanha.
Para poder levar a cabo este último propósito, Paulo desejava estar seguro do
apoio e da cooperação dos crentes de Roma; portanto, antes de sua visita, lhes escreveu
esta epístola em que esboça com termos vigorosos e claros os grandes princípios de seu
Evangelho (cap. 1:15; 2:16).

4. Tema
O tema da epístola é a pecaminosidade universal dos homens e a graça universal
de Deus, a qual proporciona um caminho pelo qual os pecadores podem ser perdoados e
também restaurados à perfeição e a santidade. Este “caminho” é a fé em Jesus Cristo, o
Filho de Deus, que morreu, ressuscitou e vive eternamente para nos reconciliar e nos
restaurar.
Quando Paulo escreve esta epístola, sua mente está cheia dos problemas que
surgiram em seus conflitos com os judaizantes. Ocupa-se das questões básicas, e lhes dá
resposta mediante uma apresentação ampla de todo o problema do pecado e do plano de
Deus para fazer frente a essa emergência. Paulo mostra em primeiro lugar que todos os
homens – judeus e gentios – têm pecado e continuam afastados do glorioso ideal de Deus
(cap. 3:23). Não há desculpa para este afastamento, pois todos, sem exceção, têm recebido
algum grau de revelação da vontade de Deus (cap. 1:20). Portanto, todos estão, com
justiça, sob condenação.
Além disso, os pecadores são completamente impotentes para liberar-se por si
mesmos dessa situação, pois em sua condição depravada lhes é absolutamente impossível
obedecer a vontade de Deus (cap. 8:7). Os intentos legalistas (salvação pelas obras
próprias) de obedecer à lei divina não só estão condenados ao fracasso, mas sim também
podem ser evidência externa de um arrogante estado de rebeldia, gerado por justiça
própria de não reconhecer a debilidade do homem e sua necessidade de um Salvador. Só
Deus mesmo pode proporcionar remédio, e isto o tem feito mediante o sacrifício de Seu
Filho. Tudo o que se pede do homem cansado é que exerça fé: fé para aceitar as condições
necessárias para perdoar seu passado pecaminoso, e fé para aceitar o poder que se oferece
para levá-lo a uma vida de retidão.
Este é o Evangelho de Paulo tal como se desenvolve na primeira parte da epístola.
Os capítulos restantes (cap. 9-16) se ocupam da aplicação prática do evangelho diante de
certos problemas que têm que ver com o povo escolhido e com os membros da igreja
cristã.

A PRIMEIRA EPÍSTOLA AOS CORÍNTIOS

1. Título
No grego, o título desta epístola é simplesmente “Para os Coríntios A”, quer dizer,
“um”. Portanto, no título não figura nada a respeito de Paulo, o apóstolo, como autor da
carta.
No manuscrito de 1Coríntios dos papiros bíblicos de Chester Beatty, o manuscrito
desta epístola mais antigo que existe, copiado ao redor do século III d.C., aparece o título
em sua forma mais singela. Supõe-se que no autógrafo (texto original escrito por Paulo)
não havia nenhum título.

2. Autor
Com a exceção de alguns críticos radicais que chegam a duvidar se Paulo existiu
mesmo, geralmente foi aceita a paternidade literária paulina desta epístola. Acredita-se
em realidade que junto com 2Coríntios, Romanos e Gálatas, esta é a melhor de todas as
cartas de Paulo. O nome do autor aparece tanto ao começo como ao fim desta epístola
(1Cor. 1:1-2; 16:21). A carta foi ditada a um “amanuense” (ou secretário), exceto o texto
final do livro, onde Paulo declara que o escreveu com sua “própria mão” (cap. 16:21).
Não se conhece a razão exata para que o apóstolo utilizasse secretários, mas
indubitavelmente esse era seu costume (Rom. 16:22; Colos. 4:18; 2Tess. 3:17). Uma
possível razão é que Paulo tinha uma visão deficiente (cf. Gál. 6:11; 2Cor. 12:7).

3. Marco histórico
A Primeira Epístola aos Coríntios foi escrita em Éfeso (1Cor. 16: 8). Esta cidade
foi o cenário da atividade missionária de Paulo durante “três anos” (Atos 20:31), e o
centro principal de sua obra durante sua terceira viagem missionária (Atos 19; 20:1). A
carta foi escrita quando ele estava por partir para a Grécia e Macedônia, mas esperava
permanecer em Éfeso “até o Pentecostes” (1Cor. 16:5-8); entretanto, as circunstâncias
apressaram sua partida (Atos 19:21 a 20:3). As evidências permitem que situemos a carta
na primeira parte do ano 57 d.C.
A igreja de Corinto foi estabelecida durante a segunda viagem missionária de
Paulo. O apóstolo tinha passado pelo menos 18 meses nesse lugar. Sua obra tinha sido
árdua e bem-sucedida, e se estabeleceu uma próspera igreja (Atos 18:1-11). A antiga
cidade de Corinto estava situada no istmo que une o Peloponeso com a Grécia continental.
Estava situada no extremo sul do istmo, em uma planície entre o istmo e uma colina
conhecida como Acrocorinto, no topo da qual havia uma cidadela e um templo. A cidade
estava, pois, estrategicamente localizada. O tráfego terrestre entre o Peloponeso e o Ática
passava por Corinto. Sua estratégica localização entre o golfo Sarónico, com Atenas e o
Pireo ao leste, e o golfo de Corinto ao oeste do istmo, converteram-na em um centro
mercantil de uma grande parte do comércio que fluía da Ásia para a Europa e vice-versa.
Alguns fenícios se estabeleceram na cidade e prosseguiram com seu oficio de fazer tintura
de púrpura. Também introduziram outras artes, e estabeleceram o culto imoral das
deidades fenícias.
Portanto, Corinto era uma importante cidade comercial, situada em uma
encruzilhada de rotas marítimas. Floresceu nela o flagelo da libertinagem, até o ponto que
o próprio nome da cidade se converteu em um sinônimo de sensualidade (como aconteceu
com Sodoma e Gomorra). O verbo “corintianizar” significava “libertinagem
desenfreada”. Quando se compreende como era a religião de Corinto, é evidente a
maravilhosa graça de Deus que venceu as forças do mal e estabeleceu uma igreja de santos
regenerados nessa cidade de tão má fama. Por sua riqueza, luxo, comércio e população
cosmopolita, Corinto bem mereceu o título que lhe deu Barnes: “Paris da Antigüidade”.
A deidade principal era Afrodite, a deusa do amor em sua forma mais imoral e da pessoa
desenfreada, por isso não é difícil imaginar o efeito desta deificação da sensualidade. O
templo de Apolo estava construído na ladeira norte da Acrocorinto. Mil belas jovens
atuavam como prostitutas públicas ante o altar da deusa do amor. Eram sustentadas
principalmente por estrangeiros, e a cidade, como produto de sua imoralidade, obtinha
uma renda segura. A tarefa a que fez frente o mensageiro do Evangelho na antiga cidade
de Corinto, apresenta-se muito bem nestas palavras: “Se o Evangelho pôde triunfar em
Corinto, pode vencer quaisquer que sejam as circunstâncias” (W. D. Chamberlain).
Três anos depois da fundação da igreja e durante a ausência de Paulo, surgiram
numerosos problemas que demandavam a atenção do apóstolo; e isto sabemos pela
própria epístola. Em primeiro lugar, algumas facções tinham debilitado a igreja. Devido
à eloqüência e conhecimento de Apolo, muitos da igreja o tinham elogiado acima de Paulo
(1Cor. 1:12; 3:4; cf. Atos 18:24 a 19:1). Outros se gabavam de que não eram seguidores
nem de Paulo nem de Apolo, mas sim de Pedro, um dos apóstolos originais (1Cor. 1:12).
Outros afirmavam não estarem unidos a nenhum dirigente humano, e professavam ser
seguidores de Cristo (cap. 1:12). Além disso, como os membros dessa igreja viviam em
meio da dissoluta população de Corinto, muitos que tinham renunciado a seus caminhos
de impiedade recaíram em seus antigos hábitos de vida (cap. 5). A igreja também se havia
desacreditado devido a que os cristãos levavam seus pleitos aos tribunais seculares. Até
mesmo a Ceia do Senhor havia se convertido em uma ocasião de glutonaria (cap. 11:17-
34). Deste modo surgiram perguntas quanto ao matrimônio e problemas sociais
relacionados com ele (cap. 7), quanto ao consumo de mantimentos sacrificados aos ídolos
(cap. 8) e a respeito da devida conduta das mulheres no culto público (cap. 11:2-16).
Também se entendia mal a função adequada dos dons espirituais (cap. 12-14). E outros
eram céticos quanto à realidade e a forma da ressurreição (cap. 15).
Paulo recebeu de Apolo informações quanto ao estado da igreja de Corinto, e
quando surgiram divisões na igreja, Apolo se retirou. Quando este esteve com o Paulo em
Éfeso, o apóstolo o insistiu a que retornasse a Corinto; mas não teve êxito. Outros que
informaram a Paulo foram “os de Cloé” (cap. 1:11) e também alguns que provavelmente
formaram uma delegação: Estéfanas, Fortunato e Acaico (cap. 16:17). A situação era tal
que causou sérios temores a Paulo. Ele já tinha escrito uma carta à igreja (chamada de
“carta prévia”, cap. 5:9), e há a possibilidade de que tivesse visitado brevemente a Corinto
durante sua permanência em Éfeso (cf. 2Cor. 13:1). Também tinha enviado a Timóteo
(1Cor. 4:17; cf. cap. 16:10) e Tito a Corinto (ver 2Cor. 2:13). Além disso, redigiu a carta
que agora conhecemos como 1Corintios, em que tratava os diversos problemas que
haviam aparecido.

4. Tema
O propósito da carta é duplo: em primeiro lugar, reprovar a apostasia que tinha
provocado na igreja a introdução de práticas que corrompiam os ensinos do Evangelho;
e em segundo lugar, ensinar ou explicar pontos de crença e de prática a respeito dos quais
os crentes haviam pedido elucidações.
Paulo não encobriu o pecado nem o tratou com indulgência. Foi imparcial em sua
condenação, e não procurou lisonjear nenhuma das transgressões. Com firmeza e
severidade ele condenou as separações do caminho da retidão. Junto com a apresentação
das irregularidades e a recriminação pelos crescentes males da igreja, se vê a piedade
compassiva e a terna misericórdia que sempre se acham no coração dos verdadeiros
colaboradores de Cristo, um amor que sempre procura levantar o cansado, restaurar ao
extraviado e curar à alma ferida.
Paulo sabia que o amor, e não a força nem a aspereza, é o poder que converte e
conquista o coração. Portanto, a intervenção cirúrgica espiritual a que submeteu a igreja
de Corinto foi seguida pelo bálsamo consolador do amor aprazível. Isto se vê
especialmente na exposição magistral do amor cristão que se encontra no cap. 13. Com
relação a ensinos, a epístola caminha por vários assuntos práticos, como o matrimônio, a
participação em mantimentos oferecidos aos ídolos, o comportamento nos serviços da
igreja, a Ceia do Senhor e o devido emprego dos dons espirituais.

A SEGUNDA EPÍSTOLA AOS CORÍNTIOS

1. Título
A evidência textual confirma que o texto original grego levava o título breve Prós
Korinthíous B, literalmente: “Aos Coríntios 2”. Este é o título da epístola, que aparece
nos manuscritos mais antigos que existem, que datam aproximadamente do século III d.C.
O título mais extenso, “Segunda epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios”, não
aparece a não ser até muito depois. Quanto a que esta é a "segunda" epístola enviada aos
Coríntios parece que não está correto, pois Paulo havia enviado uma carta antes de
“1Coríntios”, conhecida como “carta prévia” (1Cor. 5:9).

2. Autor
Tanto a evidência externa como a interna, afirmam conclusivamente a paternidade
literária paulina da epístola. A evidência externa se remonta até a geração que seguiu
imediatamente a dos apóstolos. Citações tiradas desta epístola por muitos dos antigos pais
da igreja e por escritores da época, assim como referências a ela, proporcionam um
abundante testemunho quanto a que é fidedigna sua autoria. Em sua carta aos Coríntios
(c. 95 d.C.), cerca de 35 anos depois da de Paulo, Clemente de Roma se ocupa das mesmas
condições que havia em Corinto nos dias de Paulo (Primeira epístola de Clemente aos
Coríntios, 46).
A evidência interna assinala inconfundivelmente a Paulo como seu autor. O estilo
é de Paulo. Na epístola se fazem muitas referências a Paulo, a seus contra-tempos em
Corinto e a sua primeira epístola à igreja dessa cidade. Muitos eruditos bíblicos
consideram que esta epístola apresenta o quadro mais claro e mais completo da natureza
de Paulo, de sua personalidade e caráter.

3. Marco Histórico
Paulo visitou pelo menos três vezes à igreja de Corinto e lhe escreveu três
epístolas; possivelmente quatro. A primeira visita que fez foi durante sua segunda viagem
missionária, ao redor do ano 51 d.C., e durou um ano e meio (Atos 18:11). Nesse tempo
fundou e organizou a igreja, e continuou relacionando-se com ela de vez em quando
mediante mensageiros (2Cor. 12:17). Seu primeiro contato escrito com ela se menciona
em 1Cor. 5:9. Atualmente se considera que esse documento se perdeu. Ao final de sua
permanência de mais de dois anos em Éfeso, em sua terceira viagem, escreveu o que agora
se conhece como a Primeira Epístola aos Coríntios (cap. 16:8).
Em geral se aceita que possivelmente transcorreu um período de várias semanas
entre a redação das duas epístolas aos Coríntios. A primeira foi escrita em Éfeso; a
segunda, na Macedônia. Paulo tinha tido o propósito de permanecer em Éfeso até o
Pentecostes, e ir depois a Corinto passando pela Macedônia (Atos 19:21); mas saiu de
Éfeso antes do que se havia proposto. Isto pode haver-se devido, pelo menos em parte, ao
levante popular que quase lhe custou a vida (Atos 19:24-41). A oposição que sofreu
enquanto estava em Éfeso lhe ocasionou uma grande tensão. Referiu-se aos adversários
da verdade como “bestas” (1Cor. 15:32), e observou que havia sido afligido
“sobremaneira além de” sua força e que tinha perdido “a esperança de conservar a vida”
(2Cor. 1:8). Nesta condição Paulo saiu de Éfeso para a Macedônia.
Alguns pensam que antes de escrever esta carta, e depois de sua primeira visita a
Corinto, Paulo tinha retornado ali para uma segunda visita. Ele fala de uma visita prévia
que lhe causou tristeza e desânimo (ver 2Cor. 2:1; 12:14; 13:1-2). Depois dessa visita e
de ter recebido mais notícias desconcertantes de Corinto (1Cor. 1:11), possivelmente ele
mandou uma carta de recriminações e conselhos (1Corintios – chamada de “carta dura”),
e enviou Tito para que preparasse o caminho para uma nova visita que pensava efetuar
(2Cor. 8:6; 13:1-2). Paulo se refere (cap. 2:4) a uma carta anterior que tinha escrito aos
Coríntios com “muita tribulação e angústia do coração”, e com a qual os tinha entristecido
(cap. 7:8). O Comentário Adventista aceita que 1Coríntios é a carta a que Paulo se refere
em 2Corintios. Acredita-se que Paulo escreveu esta segunda epístola enquanto estava na
Macedônia (cf. cap. 2:13; 7:5; 8:1; 9:2, 4), aproximadamente em 57 d.C.
Depois desta segunda epístola e da seguinte visita de Paulo, só aparecem
referências isoladas à igreja de Corinto. Entretanto, a Epístola aos Coríntios, escrita por
Clemente de Roma ao redor do ano 95 d.C., mencionada anteriormente, revela que tinham
reaparecido pelo menos alguns dos antigos males. Clemente elogia à igreja por sua
conduta exemplar em muitos sentidos, mas também a repreende por suas lutas e espírito
divisionista. Esta é a última informação que temos a respeito da igreja de Corinto durante
a era apostólica.
4. Tema
O motivo imediato da epístola foi o relatório que Tito havia trazido de Corinto. A
primeira parte da carta falou da recepção que tinham dado os coríntios à epístola anterior
de Paulo, e repassa alguns dos problemas que se tratam nela. Seguindo as instruções de
Paulo, a igreja tinha eliminado de seu seio o ofensor imoral (1 Cor. 5:1-5; cf. 2Cor. 2:6);
Paulo agora aconselha como resgatar ao que tinha sido pecador. Dá-se ênfase especial às
contribuições recolhidas nas Igrejas da Macedônia e Grécia para os pobres. Paulo tomou
muito a sério esta missão, pois uniria os corações dos cristãos de origem judia e dos de
origem gentílica com um vínculo de irmandade e unidade. Os crentes gentios seriam
induzidos a apreciar os sacrifícios dos cristãos de origem judia para lhes levar o
conhecimento do Evangelho, e os judeus seriam induzidos a apreciar o espírito de
irmandade do qual as dádivas davam um testemunho mudo, mas eloqüente. Mas a igreja
de Corinto tinha sido descuidada em reunir sua contribuição e tinha ficado muito atrás
das igrejas da Macedônia, possivelmente como resultado das lutas e a imoralidade que
haviam absorvido sua atenção.
Nesta carta Paulo lhes faz uma exortação final para atuarem com rapidez e
diligência. Os primeiros nove capítulos de 2Coríntios se caracterizam por expressar
gratidão e avaliação; os últimos quatro por uma acentuada severidade e autodefesa.
Sugeriu-se que os primeiros capítulos estavam destinados para a maioria, que tinha aceito
o conselho e a recriminação de Paulo; e os últimos, a uma minoria que persistia em opor-
se aos esforços do apóstolo para restaurar na igreja um espírito de harmonia.
Extensamente e de diversas maneiras, Paulo tenta demonstrar sua autoridade e justificar
a forma em que tinha atuado entre eles. Para provar seu apostolado recorre a suas visões
e revelações recebidas do Senhor, a seus incomparáveis sofrimentos pelo Senhor Jesus e
ao selo evidente de aprovação divina pelo êxito de seus trabalhos. Nas epístolas de Paulo
a outras Igrejas não tem paralelo a severidade de suas palavras ao dirigir-se à igreja de
Corinto a respeito de certos “falsos apóstolos”, e possivelmente a uma memória de seus
membros que ainda estavam sob a influência deles.
A segunda epístola é bem diferente de 1Coríntios. A primeira é objetiva e prática;
a segunda é principalmente subjetiva e pessoal. A primeira tem um tom mais tranqüilo e
moderado; a segunda reflete a ansiedade de Paulo por receber notícias de Corinto, seu
alívio e gozo quando finalmente chegou Tito, e sua decisão de tratar com firmeza aos que
ainda perturbavam a igreja. A primeira reflete as condições em que se achava a igreja de
Corinto; a segunda, a paixão do apóstolo pela igreja.
Embora o principal propósito desta epístola não seja “doutrinal” – como no caso
de Gálatas e Romanos – ela destaca importantes verdades doutrinais.

A EPÍSTOLA AOS GÁLATAS

1. Título
Esta carta foi dirigida às igrejas da Galácia. Não se sabe se estas igrejas estavam
no norte da Galácia, em cidades como Tavion, Pesino e Ancira (Angorá), ou no sul, na
Antioquía, Icônio, Listra, Derbe e outras cidades. O nome “Galácia” se deve às tribos que
invadiram a Ásia Menor ao redor do ano 278 a.C. e se estabeleceram na parte norte, e que
em 25 a.C. se transformou na província romana da Galácia.
2. Autor
A paternidade literária paulina desta epístola não foi posta em dúvida seriamente.
A evidência interna da epístola é convincente, e concorda em forma completa com o
caráter de Paulo como é descrito em Atos e em outras cartas atribuídas a ele. Os escritores
cristãos posteriores aos apóstolos conheciam a epístola, e consideravam que provinha da
mão de Paulo. Aparece nas listas mais antigas de livros do NT.

3. Marco Histórico
Paulo e Barnabé fundaram (em sua primeira viagem) as igrejas de Antioquía da
Psidia, Icônio, Listra e Derbe (ver Atos 13:14 a 14:23), ao redor dos anos 45-47 d.C.
Depois de voltar para a Antioquía, foram enviados a Jerusalém com a pergunta de se se
devia impor aos gentios, convertidos ao cristianismo, a prática dos ritos e as cerimônias
do judaísmo (ver Atos 15). O Concílio de Jerusalém, celebrado ao redor do ano 49 d.C.,
pronunciou-se contra a imposição de ritos e cerimônias aos que não eram judeus. Paulo
começou sua segunda viagem missionária pouco depois desse concílio, acompanhado por
Silas. Primeiro visitaram de novo as igrejas do sul da Galácia, as quais Paulo tinha
organizado em sua primeira viagem, três das quatro se mencionam especificamente:
Derbe, Listra e Icônio (ver Atos 16:15). Depois, levaram o Evangelho à Frigia e Galácia
(v. 6).
A Epístola aos Gálatas teve que ter sido escrita depois dos eventos registrados em
Gál. 2:1-14. Se aqui se fizer alusão ao concílio de Jerusalém descrito em Atos 15, a carta
deve ter sido escrita depois da terminação da primeira viagem, pois esse concílio se
celebrou entre a primeira e a segunda viagens missionárias (ver Atos 15:36-41). Além
disso, de acordo com Gál. 4:13, parece que Paulo já tinha visitado as igrejas da Galácia
duas vezes, e se for assim, a carta teve que ter sido escrita depois que terminasse sua
segunda viagem.

4. Tema
O tema da Epístola aos Gálatas é a justificação por meio da fé em Jesus Cristo, o
qual apresenta um contraste com o conceito judaico da justificação por meio do
cumprimento das "obras" prescritas no sistema legal judeu. Esta carta elogia o que Deus
tem feito mediante Cristo para a salvação do homem, e rechaça categoricamente a idéia
de que uma pessoa pode ser justificada por seus próprios méritos. Paulo elogia a dádiva
gratuita de Deus, em contraste com os esforços do homem de salvar-se por si mesmo. A
pergunta surgida na disputa entre Paulo e alguns professores na Galácia era: “o
cumprimento das cerimônias e requisitos prescritos no judaísmo dá direito a uma pessoa
ao favor divino, sendo assim aceita por Deus?” A resposta de Paulo foi um evidente
“não”, pois o homem não é justificado pelas obras da lei, mas sim unicamente pela fé em
Jesus Cristo (cf. 2: 16). O cristão que pretende ganhar a salvação mediante as "obras da
lei", está renunciando completamente à graça de Cristo (cap. 2:21; 5:4).
Os cristãos, como "filhos da promessa" (cap. 4:28), são “herdeiros” (cap. 3:6-7,
14, 29). Já não eram meninos imaturos na fé para necessitar um "tutor" que os guiasse
(Gál. 3:23-26; 4:1-7), pois se haviam convertido em novas criaturas em Cristo (cap. 4:7;
6:15), "guiados pelo Espírito" (cap. 5:18), e Cristo vivia pela fé em seus corações, onde
tinham a lei moral escrita (Gál. 2:20; Heb. 8:10). Mas, enquanto isso, os judeus se
gabavam de uma justificação que pretendiam adquirir mediante os próprios esforços,
observando as leis de Deus (Rom. 2:17; 9:4). Os cristãos, entretanto, reconheciam - e
ainda reconhecem - que não tinham nada do que gloriar-se, exceto no poder salvador da
cruz de nosso Senhor Jesus Cristo (ver Gál. 6:14).
"Lei" na epístola aos Gálatas equivale a toda a revelação recebida no Sinai, as
regras de Deus para seus filhos: leis morais, estatutos civis e ritos cerimoniosos; embora
posteriormente os judeus lhes acrescentaram, por sua conta, um amontoado de leis.
Pensavam equivocadamente que por seus próprios esforços podiam obedecer
perfeitamente essas leis, e que com semelhante obediência podiam ganhar sua salvação.
A Epístola aos Gálatas não se ocupa virtualmente de nenhuma dessas leis em particular,
mas sim da falsa idéia de que alguém possa ganhar sua própria salvação mediante o
cumprimento rigoroso dos diversos requerimentos legais. O dilema é: ou a salvação pela
fé, ou a salvação pelas obras; ambas se excluem entre si, ou seja, ninguém pode ser salvo
pela fé se acreditar que suas obras o habilitam à salvação.
Paulo explica que as promessas do Evangelho foram confirmadas a Abraão no
pacto, e que a revelação da lei de Deus 430 anos depois não alterou as condições desse
pacto (cap. 3:6-9, 14-18). A “lei” não tinha o propósito de substituir o pacto ou de
proporcionar outro meio de salvação, mas sim de ajudar aos homens a que entendessem
as condições do pacto da graça divina e se apropriassem dela. A lei não tinha o propósito
de ser um fim em si mesmo, como supunham os judeus, a não ser um meio - um “tutor”,
um “aio” – para guiar aos homens à salvação em Cristo de acordo com as promessas do
pacto. O propósito da “lei”, seu "fim", ou meta, é conduzir os homens a Cristo (cf. Rom.
10:4), e não lhes abrir outro caminho de salvação. Entretanto, a maioria dos judeus
voluntariamente permaneceu na ignorância do plano de Deus de justificar aos homens
pela fé em Cristo, e continuaram tratando de estabelecer sua própria justiça "pelas obras
da lei" (Gál. 2:16; ver Rom. 10:3).
Como já foi mencionado, a palavra “lei” em Gálatas inclui dentro de seus alcances
tanto a lei moral como a cerimonial. Em realidade, a lei cerimoniosa não teria tido sentido
sem a lei moral (ver 2:16). A lei cerimoniosa terminou na cruz devido à sua limitação (cf.
Colos. 2:14-17); mas a lei moral - o Decálogo - permanece em plena vigência (cf. Mat.
5:17-18). Existe ainda o perigo de aferrar-se à "letra" da lei sem penetrar ou compreender
seu “espírito” (Mat. 19:16-22; cf. Gál. 5:17-22), como aconteceu nos dias de Paulo: o
perigo de participar do sistema de sacrifícios sem compreender que seus símbolos
assinalavam a Cristo. Portanto, se os cristãos modernos aceitarem o engano - não importa
em que grau seja - de tratar de salvar-se por seus esforços guardando a lei (mesmo que o
Decálogo), caem da graça e ficam “sujeitos” ao“jugo de escravidão” (Gál. 5:1, 4). Para
eles Cristo terá morrido em vão (cap. 2:21). Esta é a advertência de Gálatas. O cristão
guarda o Decálogo não para ganhar a salvação, a não ser porque já foi salvo. Não há
dúvida de que só uma pessoa que é salva porque Cristo mora nela, pode guardar realmente
a Lei (cf. João 14:15).
Esta advertência se aplica também aos que pensam alcançar um nível mais alto de
justiça diante de Deus porque praticam minuciosamente algumas regras humanas sobre
normas de vida cristã, como o vestuário e o regime alimentar. Ao fazê-lo (tentarem se
justificar através de obras) cometem o mesmo engano que os judeus dos dias de Cristo
(ver Rom. 14:17; Mar. 7:1-14). Outros devolvem seus dízimos, assistem à igreja e até
observam o sábado, apenas porque acreditam equivocadamente que dessa maneira
“ganham” méritos diante de Deus. É certo que o cristão desejará cumprir fielmente com
todos esses mandatos divinos, mas o fará não com a esperança de “bajular” a Deus, mas
sim porque como filho de Deus pela fé na graça salvadora de Jesus, sente supremo gozo
e felicidade de viver em harmonia com a vontade expressa por Deus (cf. Mat. 7:21-27;
Gál. 3:24).
A lição que se destaca em Gálatas para a igreja atual é a mesma dos dias de Paulo:
que a salvação só se pode obter por meio de uma fé singela nos méritos de Cristo (cap.
2:16; 3:2; 5: l), e que nada do que o homem possa fazer melhora, nem mesmo no mínimo,
sua condição diante de Deus, nem incrementa suas possibilidades de obter o perdão e a
redenção. A lei, quer seja moral ou cerimoniosa, não tem poder para liberar os homens
da condição de pecado em que se encontram (Rom. 3:20; 7:7). Este é o "Evangelho" de
Paulo em contraste com o "evangelho" pervertido dos judaizantes (Gál. 1:6-12; 2:2, 5, 7,
14).
A carta conclui com uma exortação para que não abusassem da liberdade que
pouco antes tinham encontrado no Evangelho, mas sim para que vivessem uma vida santa
(cap. 6). O amor cristão devia induzir aos gálatas a estarem em guarda contra um espírito
de santidade fingida e a tratar bondosamente aos que caíssem em engano. A igreja devia
ser conhecida por suas boas obras no fruto do Espírito, e não devia tratar de substituir a
fé nos méritos salvadores de Cristo pelas “boas” obras humanas.

A EPÍSTOLA AOS EFÉSIOS

1. Título
Quase toda a igreja cristã primitiva considerava que esta epístola foi dirigida à
igreja de Éfeso. Todos os manuscritos conhecidos, sem exceção, levam o título "aos
efésios". A ausência de saudações pessoais na epístola é um fato significativo, e mais
ainda quando se recorda que sem dúvida Paulo deve ter ganho muitos amigos durante
seus três anos de frutífero ministério na cidade de Éfeso. Além disso, a epístola apresenta
doutrinas aplicáveis à igreja mundial. Há três soluções que usualmente se sugerem para
resolver este problema:

1. A epístola em realidade foi dirigida à igreja da Laodicéia (cf. Colos. 4:16).


2. Esta epístola originalmente foi uma carta circular dirigida às igrejas da Ásia.
3. A epístola foi realmente dirigida aos efésios.

Uma resposta satisfatória parece surgir da combinação das explicações 2 e 3. Bem


poderia ser que esta carta fora enviada à igreja de Éfeso, metrópole do proconsulado da
Ásia, com a intenção de que depois fosse enviada a outras igrejas dessa zona. Isto
explicaria a tradição que inclui à igreja de Éfeso como a destinatária da epístola e também
explica por que existiram cópias muito antigas do livro que não incluíam as palavras “aos
efésios”, as quais puderam ter sido cópias do manuscrito original que circularam entre as
igrejas vizinhas. De todas as maneiras, esta epístola indubitavelmente foi lida pelos
crentes de Éfeso e possivelmente também por outros na província da Ásia.

2. Autor
A paternidade literária paulina da epístola não foi posta em duvida durante
séculos; mas a partir do século passado, muitos eruditos modernos chegaram à conclusão
de que a epístola não era paulina, ou seja, de Paulo, ou que, quando muito, o era só
parcialmente. Sugeria-se que se tratava nada mais que de uma paráfrase da Epístola aos
Colossenses, e que certas expressões indicavam que o autor nunca tinha estado em Éfeso.
Destacava-se o fato da ausência de saudações pessoais para os membros da igreja de
Éfeso, onde Paulo tinha trabalhado durante uns três anos (Atos 20:31). Afirmava-se,
ainda, que o estilo, sentido e propósito da epístola não eram paulinos, e até se sugeria que
nenhum homem encarcerado poderia ter escrito uma carta tão animadora.
Porém, Paulo é mencionado por nome como o autor da epístola no Fragmento
Muratoriano, e mais tarde por Irineu (c. 185 d.C.), Clemente da Alexandria (c. 190 -195
d.C.), Tertuliano (c. 207 d.C.), e muitos outros escritores antigos.

3. Marco Histórico
Depois de apelar a César, fazendo uso de seus direitos como cidadão romano,
Paulo foi enviado a Roma, onde provavelmente chegou durante a primavera do ano 61
d.C. Ali esteve preso dois anos; portanto, é provável que esta epístola foi escrita por volta
do ano 62 d.C.
Enquanto estava preso, aparentemente Paulo desfrutou de certas liberdades (cf.
Efés. 6:19; Colos. 4:3- 11), as quais lhe deram a oportunidade de refletir e escrever. O
apóstolo aproveitou esta situação e enviou muitas instruções doutrinais e práticas às
igrejas da Ásia. Parece que as epístolas aos Efésios, aos Colossenses e a Filemon foram
escritas mais ou menos nesse mesmo tempo, porque Tíquico foi não só o portador das
cartas aos Efésios e Colossenses, mas também companheiro de viagem de Onésimo, que
levou a carta a Filemon (Efés. 6:21; Colos. 4:7-9; File. 12). Portanto, Efésios seria uma
das quatro cartas que Paulo escreveu durante seu primeiro encarceramento. Filipenses,
escrita também durante esse mesmo período, possivelmente foi a quarta epístola. As
outras, como citadas cima, foram: Colossenses e Filemon.
Paulo escreveu esta epístola em tempos e circunstâncias que prepararam um
ambiente especial para sua mensagem. O sanguinário Nero era o imperador; abundavam
a libertinagem, a vida faustosa e os assassinatos. Por exemplo, se registra que quando o
senador romano L. Pedanio Secundo foi assassinado por um escravo, aproximadamente
400 escravos de sua propriedade foram condenados à morte como castigo, segundo o
procedimento legal da época. Ao redor do ano quando se escreveu a epístola (62 d.C.),
teve lugar nas ilhas britânicas o levantamento da Boadicea (ou Baodicea), onde, conforme
se afirma, "mais de 70.000" romanos pereceram junto com muitos milhares de rebeldes.
Em ambiente semelhante e como resultado de uma profunda reflexão e inspiração, o
apóstolo produziu uma de suas mais nobres declarações em relação à fé como o único
meio para que o homem recupere a paz e se reencontre consigo mesmo.
A Epístola aos Efésios foi chamada “os Alpes do Novo Testamento”, e destaca-
se em meio às 9 epístolas paulinas escritas a sete Igrejas (de Romanos a
2Tessalonicenses).

4. Tema
O tema de Efésios é a unidade em Cristo. Paulo escreve a uma igreja (ou igrejas)
formada por judeus e gentios; asiáticos e europeus; escravos e livres; representantes todos
de um mundo dividido que devia ser restaurado à unidade em Cristo. Isto implicava
unidade de pessoa, família, igreja e raça. A restauração da unidade individual na vida de
cada crente assegura a unidade do universo de Deus. O tema da unidade se apresenta
explícita e implicitamente através de toda a epístola.
O apóstolo anuncia seu tema em um tom de exaltação espiritual e mandamento a
todos a alcançarem a mais alta norma de caráter e conduta para obter a unidade não só
em doutrina e organização, mas em Cristo (a Cabeça), e na igreja (Seu corpo místico).
Embora "em Cristo" é a frase chave, é difícil escolher um versículo específico, porque
quase não há passagem que não apresente de uma ou outra maneira este tema básico.
Eleição, perdão, predestinação, relacionamento no lar: tudo é "em Cristo".
Paulo não desenvolve seu tema como um argumento ou proposição formal. Trata
simplesmente do que foi dado a ele em revelação, não por causa de possuir um intelecto
superior ou perspicácia maior, mas sim porque era um instrumento da graça de Deus a
quem foi conferida uma visão da unidade essencialmente espiritual do Reino. Pode-se
afirmar que o que Romanos e Gálatas foram para o século XVI e a Reforma Protestante,
Efésios o é para a igreja de hoje. A epístola nos mostra o que pode dizer o cristianismo
em relação às relações do indivíduo com a família, da família com a nação, da nação com
a raça, e de todos com a igreja e com Deus. Paulo responde apresentando a Cristo como
o centro e o fim de todas as coisas, como quem cumpre seus propósitos mediante a igreja,
como quem reúne "todas as coisas em Cristo" (cap. 1:10).
A aquisição de uma unidade que conserve a liberdade do indivíduo, de unidade
sem rígida uniformidade, é nossa mais urgente necessidade agora. Ao apóstolo foi dada
uma revelação que oferece a única solução a um problema de grande importância para
todo homem de bem.

A EPÍSTOLA AOS FILIPENSES


O título desta carta se deve a que ela foi dirigida aos cristãos de Filipos, cidade da
Macedônia. Os manuscritos mais antigos, que se remontam ao século III, levam o singelo
título de Prós filipp'síous ("A [os] Filipenses").

2. Autor

Na carta se menciona ao apóstolo Paulo como seu autor (cap. 1:1). O apóstolo
apresenta a Timóteo como a um de seus colaboradores (cap. 1:1; 2:19), e se refere a seu
encarceramento (cap. 1:7) e a sua anterior pregação na Macedônia (cap. 4:15) de uma
maneira completamente natural e em harmonia com o que se sabe da vida de Paulo. A
igreja primitiva unanimemente reconheceu que esta carta era de Paulo. O primeiro
testemunho extrabíblico quanto à paternidade literária paulina desta epístola, provém de
Policarpo, líder e mártir cristão de meados do século II.
A evidência quanto à paternidade literária de Paulo é tão forte, que há poucos
motivos para pô-la em dúvida.

3. Marco Histórico
A Epístola aos Filipenses foi escrita em Roma durante o primeiro encarceramento
de Paulo nessa cidade. Tinha se passado mais de dez anos desde que Paulo pregou pela
primeira vez o Evangelho em Filipos. Lucas descreve as circunstâncias da primeira visita
do apóstolo a Filipos em Atos 16. Paulo e seus companheiros, Silas, Timóteo e Lucas,
responderam ao chamado (Atos 16:8-9), viajando a Filipos pela via de Neápolis. Filipos
foi o primeiro lugar da Europa onde se pregou o Evangelho (cf. Atos 16:11-12). Os
missionários se uniram ali com um reduzido grupo de crentes para celebrar um culto de
sábado fora da cidade, à beira de um rio (Atos 16:13). Entre os que estavam na ocasião
se destacava a presença de Lídia, vendedora de púrpura, da cidade da Tiatira. Ela e os
seus companheiros receberam com alegria a mensagem do apóstolo, converteram-se e
foram batizados.
Vários anos mais tarde, quando retornava a Jerusalém depois de terminar sua
terceira viagem missionária, Paulo se deteve outra vez em Filipos. Era o tempo da páscoa,
e o apóstolo a observou com os crentes. Deve ter desfrutado de uns dias de pacífica e feliz
comunhão que foi concedida junto com aqueles que se encontravam entre os mais amados
e leais de todos seus conversos (Atos 20:6).
Na carta se pode apreciar muito bem a situação de Filipos, a condição de Paulo e
a relação do apóstolo com os crentes filipenses. A igreja de Filipos era presidida por
bispos e diáconos (cap. 1:1); seus membros estavam sofrendo perseguição (v. 29), e
indubitavelmente se havia produzido alguma tendência à discórdia, especialmente entre
duas das irmãs da igreja (cap. 4:2); mas não há nenhuma indicação de que houvesse
corrupção moral ou falsas doutrinas. Havia pouco que perturbasse o gozo e a gratidão
com que o apóstolo contemplava o crescimento dos filipenses na graça. Seu amor por
Paulo era imutável. Tinham-lhe enviado a Epafrodito, um de seus dirigentes, para que lhe
levasse suas dádivas e o ajudasse em sua aflição (cap. 2:25).
Paulo pensava que seria liberado logo, e expressava sua confiança de que em breve
os veria outra vez (cap. 1:26; 2:24). Mais tarde foi liberado e durante um tempo trabalhou
entre as igrejas que tinha ajudado a estabelecer, o que talvez incluiu à igreja de Filipos.

4. Tema

A Epístola aos Filipenses é uma carta de um amigo a seus amigos; uma carta de
conselho espiritual, escrita para reconhecer uma ajuda dada com amor. Paulo fala com os
crentes de Filipos de suas prisões, do progresso do Evangelho em Roma, dos esforços de
certos adversários para afligi-lo mediante uma oposição sectária, pois pregavam a Cristo
movidos pela inveja e o espírito de divisão (cap. 1:12-17). Conta-lhes da paz interior e do
gozo que o sustentaram em todas suas aflições. Sente-se seguro da simpatia deles;
escreve-lhes tendo a confiança plena da amizade cristã. Seu gozo é o gozo deles. Fala-
lhes da incerteza de seu futuro, pois não sabe como terminará seu julgamento, se em morte
ou em vida. Mas está preparado para ambas: uma vida santa é uma bênção, e também o é
uma morte santa (vv. 19-24). Fala-lhes de que aceita seus presentes com gratidão. Não
tinha estado disposto a receber ajuda de outras igrejas, mas com eles compartilhava uma
estreita intimidade, e essa amizade afetuosa e confiada fazia que estivesse preparado para
aceitar a ajuda deles (cap. 4:14-17).
Apreciava-a não tanto como um alívio para suas próprias necessidades, mas sim
mais como uma evidência adicional do amor deles por ele e de seu crescimento nesse
amor, que é a primeira das virtudes cristãs. Ele sentia-se contente, pois tinha aprendido a
bastar-se a si mesmo no sentido cristão. Ninguém sentia como ele suas próprias
debilidades, mas podia fazer todas as coisas com a fortaleza de Cristo (vv. 10-13).
Portanto, o tema da epístola é “o gozo”, “a alegria em Cristo”. Paulo escreveu esta
carta enquanto estava preso e sem saber o que lhe aconteceria; entretanto, utiliza repetidas
vezes as palavras “gozo” e “regozijo”.
A expressão “em Cristo” aparece com freqüência, e quando está unida com o
pensamento de gozo, expressa adequadamente o tema da epístola.

A EPÍSTOLA AOS COLOSSENSES


1. Título
É provável que esta epístola, como outras de Paulo, originalmente não levasse
nenhum título, pois é uma carta. Os manuscritos existentes mais antigos têm o singelo
título Prós kolossáeis ("A [os] Colossenses"), o que sem dúvida foi acrescentado por
algum antigo escriba quando se recolheram as cartas de Paulo e se publicaram em
conjunto. Mas é evidente que este título é correto (cap. 1:2).

2. Autor
Esta epístola leva os nomes de Paulo e Timóteo como seus autores (cap. 1:1);
entretanto, repetidas referências que há na carta demonstram que em realidade foi Paulo
quem a escreveu (cap. 2:1; 4:3-4, 7-8, 13, 18) em seu nome como no de seu colaborador
mais jovem.

A igreja primitiva unanimemente atribuiu a carta a Paulo, embora os críticos mais


extremistas dos séculos XIX e XX sustentam que esta epístola não foi escrita pelo Paulo.

3. Marco Histórico
Não se sabe com exatidão como, quando ou quem fundou a igreja de Colossos.
Paulo utilizou Éfeso como o centro de suas atividades missionárias durante uns três anos
(Atos 20:31). A energia com que levou a cabo sua evangelização durante esse tempo,
induziu Lucas a declarar que todos os que habitavam na Ásia, judeus e gregos, ouviram
a palavra do Senhor Jesus (Atos 19:10).
Escrevendo aos coríntios perto do fim de sua permanência em Éfeso e seus
arredores, o apóstolo lhes enviou saudações das igrejas da Ásia (1Cor. 16:19). Isto
significa que a província romana da Ásia era nesse tempo o campo missionário do
apóstolo (cf. 2Cor. 1:8; Rom. 16:5, onde a evidência textual estabelece o texto "Ásia" e
não "Acaya"). Visitantes de toda a Ásia iam ao grande porto marítimo de Éfeso, e as
mensagens de Paulo foram amplamente difundidas, quando os viajantes retornavam a
seus lugares de origem (Atos 19:10). Dessa maneira, dois cidadãos de Colossos - Epafras
(Colos. 4:12) e Filemon (File. 1; cf. File. 10-11; Colos. 4:9) - possivelmente ouviram as
boas novas da salvação; e junto com outros puderam ter levado o Evangelho a seus
concidadãos (cf. cap. 1:7).
Esta epístola foi redigida, sem dúvida, em Roma ao redor do ano 62 d.C., durante
o primeiro encarceramento de Paulo.

4. Tema
Na Epístola aos Colossenses Paulo se expressa enfaticamente contra a heresia
prevalecente nessa igreja. Em Gálatas e em outros escritos ele refuta unicamente aos
judaizantes, mas aqui seu propósito é misto: não só se preocupa com refutar o legalismo
judaizante, mas sim também se opõe a certos elementos pagãos que procuravam degradar
ou eclipsar o ministério de Cristo. Portanto, ataca a idéia de intermediários angélicos
como agentes de criação e mediação, e declara que unicamente Cristo é Criador e
Mediador (cap. 1:16, 20). Cristo é a “cabeça” tanto das coisas materiais como das
espirituais (cap. 1:18; 2:19). Nele não há nenhum dualismo. Jesus está por cima de tudo
(cap. 1:18). Por ele subsistem todas as coisas (v. 17). Ele é Deus (v. 15). NEle mora a
"plenitude" (v. 19). Não necessita de subordinados ou emanações. Paulo assegura que em
Cristo estão "todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento (cap. 2:3). O mistério
consumado e salvador não é um conhecimento esotérico referente a diferentes ordens de
anjos (cf. 1: 6), a não ser "Cristo em vós, a esperança de glória" (v. 27). Por isso a
condenação ao culto aos anjos, que os falsos professores propiciavam como uma negação
da perfeição de Cristo como Sustentador e Mediador (cap. 2:18-19).
O apóstolo também comenta os resultados morais dessas heresias. Proíbe por igual
os extremos de um ascetismo muito rígido (isolamento do mundo) e da licença
desenfreada (cap. 2:16, 20-21; 3:5, 8-9). Ambas as heresias sustentavam que a vontade
humana é soberana. Este "culto à vontade" é uma humildade falsa ou fingida, e portanto
imperdoável. Todas as complacências carnais (e a lista do apóstolo é quase exaustiva) são
rigorosamente condenadas. Paulo apresenta a Cristo como o Criador e o Sustentador do
universo; Cabeça, Mediador e Emancipador da Igreja. Em Cristo os princípios substituem
as cerimônias.
O apóstolo escreve clara, lógica e vigorosamente a seus amigos de Colossos,
persuadindo-os a que se voltem das vãs e inúteis especulações à realidade do Evangelho
de Cristo.

A PRIMEIRA EPÍSTOLA AOS TESSALONICENSES

1. Título
Nos manuscritos gregos mais antigos o título desta epístola é simplesmente, Prós
Thessalonikéis A (“A [os] Tessalonicenses I”). O título mais longo, “Primeira Epístola
do apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses”, é um desenvolvimento posterior.

2. Autor
A epístola dá a entender que provém de Paulo, Silvano (Silas) e Timóteo (cap.
1:1); entretanto, basicamente é obra de Paulo (cap. 3:1-2, 6-7; 5:27). Está incluída entre
as cartas de Paulo na lista mais antiga de livros do NT: o Cânon de Muratori (170 d.C.).
Os antigos escritores eclesiásticos - Irineu (c. 130-202), Clemente da Alexandría († c.
220) e Tertuliano (c. 160-240) - consideravam que Paulo era seu autor.
A personalidade e o estilo do apóstolo Paulo saturam toda a epístola, pois através
dela se manifestam o amor por seus conversos e a preocupação do apóstolo por seu bem-
estar espiritual. A ênfase que fica nas grandes virtudes espirituais da fé, o amor e a
esperança é claramente paulina (cf. 1Cor. 13:13).
Os eruditos em geral concordam em que Paulo foi o autor da epístola.

3. Marco Histórico
Tessalônica era uma cidade importante, e capital da segunda divisão da
Macedônia (Atos 17:1). Estava situada no extremo norte do golfo Termaico. Por essa
cidade passava a “Via Ignaciana”, que unia o Oriente com Roma. A situação geográfica
favorável e o excelente porto de Tessalônica se combinavam para fazer dela um centro
comercial de grande importância. Possivelmente por esta razão ali vivia uma grande
coletividade judia e havia uma sinagoga (Atos 17:1). A cidade, que agora se denomina
Salônica, é um dos centros comerciais mais importantes do norte da Grécia. Além disso,
é de interesse arqueológico, pois o arco triunfal sob o qual passava a antiga Via Egnatia
ainda se encontra em pé como um recordativo da glória e do poder da antiga Roma.
Paulo esteve em Tessalônica pela primeira vez durante sua segunda viagem,
imediatamente depois de ter saído de Filipos (Atos 16:40; 17:1). Como o método de
evangelismo do apóstolo era pregar primeiro nas cidades importantes, e as converter
depois em centros para a propagação do Evangelho nos povos e aldeias circundantes, ele
e seus colaboradores foram diretamente desde Filipos a Tessalônica, sem deter-se para
pregar em Anfípolis nem na Apolônia. Paulo sabia que primeiro devia ganhar a simpatia
dos judeus de Tessalônica, e por isso foi à sinagoga por três sábados sucessivos e
apresentou as grandes verdades do Evangelho a seus compatriotas. Os maus tratos que
acabava de sofrer em Filipos não o haviam amedrontado, e com o poder do Espírito Santo
apresentava as profecias messiânicas do AT e mostrava seu cumprimento em Jesus.
Alguns dos judeus e dos gregos acreditaram na pregação (Atos 17:4), e entre os
crentes de Tessalônica também haviam muitas “mulheres nobres”.

4. Tema
Esta epístola está iluminada por um radiante resplendor de amor intenso (cf cap.
1:2-4; 2:7-8; 3:6-7). O apóstolo estava muito agradecido pelo relatório de Timóteo quanto
à fidelidade dos tessalonicenses e sua tenra consideração por ele; então se apressou a
elogiá-los por suas nobres virtudes de fé, amor e esperança. Sentia o veemente desejo de
visitá-los, pois enquanto esteve com eles não tinha tido suficiente tempo para instruí-los
plenamente nas verdades do Evangelho.
Timóteo também deve ter informado ao apóstolo a respeito de certos problemas.
Alguns tessalonicenses estavam afligidos por seus seres amados que haviam morrido
desde que tinham recebido a mensagem evangélica, pois temiam que esses defuntos não
pudessem ter parte na gloriosa ressurreição quando voltasse o Senhor. Outros se tinham
fanatizado com o segundo advento, sustentando que não deviam trabalhar mais, e apenas
esperar a vinda do Senhor em ociosa expectativa.
Havia quem estava voltando para mundo, e se achavam em perigo de afundar-se
na imoralidade. Outros se sentiam inclinados a proceder por sua conta e não desejavam
reconhecer aos legítimos dirigentes da igreja. Necessitavam ajuda "os ociosos, os de
pouco ânimo, os fracos" (cap. 5:14). Tanto quanto possível, o apóstolo se apressou para
dar instruções pessoais a esses amados crentes. Mais de uma vez procurou voltar, mas
Satanás o "estorvou" (cap. 2:18), e por isso teve que contentar-se escrevendo uma carta a
essa igreja.
O tema da epístola é a piedade prática em vista da volta de Cristo. O glorioso
advento do Senhor é a doutrina que mais se destaca (cap. 1:10; 2:19; 3:13; 4:13-18; 5:23).
Outras doutrinas mencionadas são a morte e a ressurreição de Cristo (cap. 4:14), a
ressurreição dos justos (vv. 13-16), as recompensas e os castigos futuros (cap. 4:17; 5:3),
a existência pessoal e a obra ativa de Satanás (cap. 2:18), e a doutrina da redenção, que
inclui eleição e santificação (cap. 1:4; 4:3-7).

A SEGUNDA EPÍSTOLA AOS TESSALONICENSES


1. Título
Nos manuscritos gregos mais antigos que conhecemos, o título desta epístola
simplesmente é Prós Thessalonikéis B ("A [os] Tessalonicenses II"). O título mais
extenso, Segunda Epístola do Apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses, é de uma redação
posterior.

2. Autor
Tradicionalmente não se duvidou seriamente da paternidade paulina desta
epístola. O caráter de Paulo se reflete em toda ela. A tenra consideração do apóstolo por
seus conversos (cap. 2:13-11), seu elogio das virtudes deles (cap. 1:3-5; 3:4), o extremo
cuidado com que assinala as debilidades e, entretanto, a enérgica natureza de suas ordens
cheias de autoridade (cap. 3:6, 12), demonstram que o autor foi Paulo. Não foi a não ser
até começos do século XIX que se colocou em dúvida a paternidade literária paulina da
seção que trata do "homem de pecado". Argumentou-se que em nenhuma das outras
epístolas de Paulo há nada de natureza apocalíptica; entretanto, este pensamento não abala
a aceitação mais antiga de que Paulo é o autor da epístola. É certo que em nenhuma outra
parte ele trata tão diretamente de um tema apocalíptico, mas o fato de que tivesse visões
(Atos 22:17-21; 2Cor. 12:2-4) faz compreensível que Paulo pudesse ter escrito uma
passagem de estilo apocalíptico. A forma em que o autor se ocupou desta profecia é
claramente paulina, pois expressa o mais fervente desejo de que o povo de Deus não seja
enganado quanto ao tempo da vinda do Senhor, mas sim esteja preparado para esse grande
acontecimento.

3. Marco Histórico
É evidente que o tempo e o lugar da redação da segunda epístola são os mesmos
da primeira, pelo fato de que se apresentam juntos os mesmos três apóstolos (1Tess. 1:1;
2Tess. 1:1). Durante sua segunda viagem missionária Paulo ficou em Corinto um ano e
meio (Atos 18:11), e não há nenhuma evidência de que Silas o acompanhasse
posteriormente. A segunda carta teve que ter sido escrita uns poucos meses depois da
primeira; portanto, o marco histórico de ambas é, em temos gerais, o mesmo.
O portador da primeira epístola possivelmente voltou e levou a Paulo a informação
de que havia um espírito de agitação frenética e fanática, que se propagava entre os
membros de Tessalônica devido à crença de que a vinda do Senhor estava a ponto de
chegar.
Esta situação demandava atenção imediata. Qualquer demora poderia ser fatal para o
bem-estar da igreja, pois entre esses humildes cristãos havia alguns rebeldes que estavam
em grave perigo de cair nas redes dos enganos dos perturbadores.

4. Tema
Tendo em conta os problemas de Tessalônica que motivaram a escritura desta
carta, um de seus primeiros propósitos era assegurar aos humildes cristãos dessa igreja
que eles tinham sido aceitos pelo Senhor. O apóstolo destaca o progresso deles nas
virtudes cristãs da fé (2Tess. 1:3), do amor fraternal (2Tess. 1:3; cf. 1Tess. 4:9-10) e de
sua firmeza em meio às perseguições (2Tess. 1:4).
A segunda carta não acrescenta nada quanto à forma da vinda de Cristo e a
ressurreição dos justos, portanto a primeira carta deve ter instruído à igreja quanto a esses
temas; entretanto, junto com esse ensino o apóstolo tinha destacado a necessidade de
estarem preparados para o grande Dia da volta do Senhor e de viver diariamente tendo
sempre em conta a segunda vinda de Cristo (1Tess. 5:1-11; cf. Tito 2:11-13). Esta ênfase
no segundo advento parece que foi entendido por muitos como uma indicação de que
Paulo esperava que o retorno do Senhor fosse quase “imediato” (cf. 2Tess. 2:2). Por isso
ele se apressou a explicar que não quis dizer tal coisa, e recordou a seus leitores que
primeiro devia vir a apostasia, como pessoalmente lhes tinha ensinado, seguida pela
aparição do anticristo (vv. 2-3, 5). Paulo adverte diretamente aos indóceis ociosos, que
sem dúvida diziam que era desnecessário trabalhar devido ao iminente advento. Já tinha-
os admoestado em sua primeira epístola (1Tess. 4:11; 5:14), e agora lhes dá ordens e os
admoesta no Senhor (2Tess. 3:12). Insiste à igreja a tomar medidas disciplinadoras contra
eles com o propósito de reformá-los (vv. 14-15).
O tema da segunda epístola, como o da primeira, é a piedade prática (cap. 1:11-
12). Os fracos devem ser consolados e confirmados (cap. 2:17); deve fazer-se calar aos
perturbadores (cap. 3:12). A igreja deve conhecer a obra enganosa do grande adversário
em causar a apostasia e o reinado do anticristo, e também a destruição final de todo o
poder de Satanás (cap. 2:3-12). Paulo, tendo diante de si a gloriosa esperança do triunfo
da causa de Deus, insiste à igreja da Tessalônica a viver de modo que possa ser tida por
digna do chamado do Senhor (cap. 1:11-12).

EPÍSTOLAS PASTORAIS

As duas epístolas a Timóteo e a designada para Tito são geralmente classificadas


juntas, sob o título de “epístolas pastorais”. Porém, as cartas não estão repletas de
“deveres pastorais”. Mas são enviadas a pessoas que tinham responsabilidades pastorais
na época do apóstolo, portanto, o título é adequado.

PRIMEIRA EPÍSTOLA DE PAULO A TIMÓTEO

1. Título
Nos manuscritos gregos mais antigos o título desta epístola é simplesmente Prós
Timótheon A ("A Timóteo I"). Uma evolução posterior ampliou o título para o que
conhecemos hoje.

2. Autor
Todas as outras epístolas que levam o nome do apóstolo são geralmente aceitas
pelos críticos como de origem paulina (com a possível exceção de Efésios); entretanto,
não acontece assim com as chamadas epístolas pastorais: 1 e 2 Timóteo e Tito. Os
principais argumentos que se apresentam contra a idéia de que Paulo seja o autor destas
três epístolas, são os seguintes:
1. Quando se comparam as alusões históricas que há nas epístolas pastorais (1Tim.
1:3; 2Tim. 4:20; Tito 3:12, etc.) com a história da vida de Paulo como se relata em Atos,
não concordam com o esquema de sua carreira que ali se apresenta.
2. As epístolas pastorais revelam uma organização eclesiástica mais desenvolvida
que em qualquer outra parte do NT. Por exemplo, dão-se as características específicas
que devem ter os anciões e os bispos (1Tim. 3:1-7; Tito 1:5-9) e os diáconos (1Tim. 3: 8-
13), e as regulamentações que se estabelecem para a conduta de homens e mulheres na
igreja (1Tim. 2:8-15), e as estipulações que se dão para o cuidado das viúvas e sua conduta
(1Tim. 5:3-16). Os críticos asseguram que tudo isto equivale a um desenvolvimento na
organização eclesiástica tão superior ao que se encontra em todo o NT, que a escritura
das epístolas pastorais tem necessariamente que se situar em meados do século II d.C., ou
seja, bem depois da morte de Paulo.
Esta teoria também ganhou força devido à admoestação contra as "contradições
da falsamente chamada ciência [conhecimento]" (1Tim. 6:20). Um professor herético
chamado Marción escreveu em meados do século II um livro que intitulou de As
antíteses. Muitas das opiniões de Marción eram similares às dos gnósticos, que
destacavam a importância da gnose (ou “conhecimento”); portanto alguns eruditos viram
no versículo citado uma advertência contra Marción, e por isso afirmam que 1Timóteo foi
escrita nessa época. Sugeriram que se acrescentou o nome de Paulo para lhe dar prestigio
na luta contra Marción e o gnosticismo.

3. Há outro argumento para negar a paternidade das epístolas pastorais: que seu
vocabulário é bastante diferente ao das outras epístolas de Paulo, e que contêm um
número maior de palavras que não se encontram nas outras epístolas do apóstolo.
Estes argumentos induziram a muitos eruditos a negar que Paulo escreveu as
epístolas pastorais. Mas os Adventistas apóiam aos que acreditam que há uma forte
evidência de que as epístolas “pastorais” são autenticamente paulinas. Vejamos...

1. Se as referências históricas das epístolas pastorais não encaixam dentro do


tempo abrangido pelo livro de Atos, isso quer dizer que foram escritas em um período da
vida de Paulo posterior a seu primeiro encarceramento em Roma (Atos 28). Pelas
epístolas pastorais se deduz que Paulo foi libertado, que logo viajou extensamente (Ásia
Menor e Grécia), e depois foi detido e encarcerado pela segunda vez em Roma. E o fato
de que se mencionem pessoas cujos nomes não aparecem nas cartas paulinas (Crescente
- 2Tim. 4:10; Carpo - cap. 4:13; Onesíforo - cap. 1:16; 4:19; Êubulo, Pudente, Linho,
Claudia - cap. 4:21; Artemas e Zenas
- Tito 3:12-13), é uma evidência a mais de que estas epístolas foram escritas por
Paulo em um período posterior de sua vida, e que não são uma fraude. É muito difícil
explicar como um falsário poderia ter introduzido na vida do apóstolo acontecimentos e
pessoas que não concordavam com o que se conhecia bem por outras fontes da vida de
Paulo. Um falsário inteligente evidentemente teria feito que seus escritos concordassem
com as autênticas epístolas de Paulo. Portanto, estes aspectos históricos das epístolas
pastorais podem considerar-se como evidências de sua autenticidade.
2. Quanto ao argumento sobre a organização eclesiástica que se apresenta nas
epístolas pastorais, pode dizer-se que embora nelas se tratam problemas da administração
da igreja com maiores detalhes que em outras partes do NT, entretanto não há nada que
não esteja em harmonia com as evidências a respeito da organização da igreja nos dias de
Paulo. Assim como se destacam em outros escritos de Paulo alguns aspectos da vida
cristã, da mesma maneira nas epístolas pastorais se examina em detalhe a forma de
governo da Igreja Primitiva.
O texto sobre "os argumentos da falsamente chamada ciência" (1Tim. 6:20) não
tem necessariamente que referir-se à obra de Marción. Gnoses ou "conhecimento" é uma
palavra conhecida no vocabulário de Paulo, e pode entender-se bem sem necessidade de
referir-se a nenhuma obra herética; embora gnoses como termo técnico possivelmente já
circulava entre os gnósticos da época de Paulo. E “antíteses” (“contradições”) tampouco
tem necessariamente que referir-se ao livro de Marción, pois entra facilmente no contexto
com seu significado comum de "oposição", "argumentos contrários". Por estas razões
pode entender-se que Paulo advertiu a Timóteo contra os "argumentos do falsamente
chamado conhecimento" em contraste com o Evangelho.
3. O vocabulário diferente nas epístolas pastorais possivelmente se explique
melhor se considerar-se que Paulo as escreveu na etapa final de sua vida, depois de ter
viajado mais e ter mais experiência.

3. Marco Histórico
Só pode se deduzir o marco histórico dos detalhes que se dão na epístola. É
evidente que Paulo estava encarcerado em Roma pela segunda vez quando escreveu esta
epístola..

4. Tema
A epístola foi escrita a Timóteo enquanto este era pastor da igreja de Éfeso, e está
composta principalmente por ensinos dirigidos a ele como dirigente da igreja. Por isso
ela se classifica como uma epístola pastoral. Paulo admoesta a Timóteo a que se conduza
de uma maneira agradável diante de Deus e útil para o rebanho sobre o qual Deus o
colocou, e lhe dá a solene comissão de pregar a Palavra e de defender seus ensinos. Esta
epístola reflete um plano bastante completo de organização e administração da igreja. A
ênfase sobre a doutrina nesta e nas outras epístolas pastorais (1Tim. 4:6, 13, 16; 2Tim.
3:14-17; 4:1-4; Tito 1:9; 2:1, 7) é evidente, porque das 21 vezes que aparece no NT a
palavra grega didaskalía ("doutrina"), 15 se acham em 1 e 2 Timóteo e em Tito.
Embora Paulo parece ter tido mais afinidade com Timóteo que com seus outros
colaboradores (ver Filip. 2:19-20), por esta epístola se pode deduzir que Timóteo era de
temperamento suave e não tão dinâmico como o tivesse preferido Paulo. Por isso o
apóstolo anima a seu companheiro mais jovem no ministério a exercer uma liderança mais
enérgica. A estreita relação entre Paulo e Timóteo explica a forma direta e franca em que
o apóstolo expressa seus desejos, admoestações e propósitos ao pastor de Éfeso, e sem
dúvida explica a conseguinte falta de uma ordem sistemática. A epístola indubitavelmente
foi escrita item após item, à medida que os sucessivos aspectos da atividade ministerial
vinham à mente do apóstolo.

SEGUNDA EPÍSTOLA DE PAULO A TIMÓTEO


1. Título
Nos manuscritos gregos mais antigos, o título deste livro simplesmente é Prós
Timotheon B ("Ao Timóteo II"). Uma evolução posterior deu ao título a forma que tem
agora.

2. Autor
Como o indicam as primeiras linhas de 2 Timóteo, esta epístola foi escrita pelo
apóstolo Paulo, que então estava encarcerado em Roma pela segunda vez (por volta do
ano 67 d.C.).

3. Marco Histórico
Esta é a última epístola que Paulo escreveu da prisão (c. 67 d.C.), quando esperava
a decisão de Nero sobre sua morte (cap. 4:6). Ao comparar esta carta com as outras
epístolas pastorais e com o relato de Atos se chega à conclusão de que depois de um
período de atividade missionária posterior a seu primeiro encarceramento em Roma,
Paulo foi outra vez encarcerado e enviado a Roma. Sabe-se que depois do grande incêndio
de Roma em 64 d. C., Nero perseguiu aos cristãos para dissipar as acusações populares
de que ele tinha feito incendiar a cidade. É razoável pensar que Paulo talvez foi
encarcerado uns dois anos depois, como resultado desta perseguição. Pedro também foi
detido nesse tempo e possivelmente esteve em Roma pelo menos durante uma parte do
tempo quando Paulo estava encarcerado (cf. Atos dos Apóstolos, p. 428-429). O nome da
prisão na qual acredita-se que Paulo ficou preso é Marmetina.
Quando Paulo escreveu 2 Timóteo, já tinha sido julgado (cap. 4:17), mas ainda
não tinha sido condenado à morte, embora imaginava que esse seria o resultado. Estava
sozinho, pois unicamente Lucas o acompanhava, "o médico amado" (Col. 4:14; 2Tim. 4:l
l). Ao escrever a Timóteo, pediu que fosse vê-lo "antes do inverno" (cap. 4:2l), e que lhe
trouxesse sua capa e seus livros (cap. 4:13). Não se sabe se a Timóteo, em resposta ao
urgente pedido de Paulo, foi possível ir a Roma antes da morte do apóstolo.
Quanto a Timóteo, pouco se sabe de sua vida, exceto sua relação direta com Paulo.
Segundo Heb. 13:23, Timóteo foi posto "em liberdade", mas não se sabe quando nem
onde esteve preso. De acordo com a tradição, Timóteo morreu martirizado no tempo do
imperador Domiciano (81-96 d. C.) ou de Trajano (98- 117 d. C.).

4. Tema
Esta epístola foi chamada "o testamento do grande apóstolo dos gentios". Paulo
escreveu pessoalmente esta carta a Timóteo, seu filho espiritual, e em termos gerais, à
igreja. Como sabia que seu fim estava perto, sentiu a necessidade de fortalecer a fé de seu
jovem colaborador mediante seu próprio exemplo. Advertiu a Timóteo e a todos os outros
crentes cristãos contra as heresias que entrariam na igreja depois de sua morte, para que
todos se apegassem com firmeza na Palavra inspirada e permanecessem fiéis até o
segundo advento.

EPÍSTOLA DE PAULO A TITO


1. Título
Nos manuscritos gregos mais antigos que se conhecem, o título desta epístola é
simplesmente Prós Títon ("A Tito"). Como o texto autógrafo era uma carta pessoal de
Paulo, sem dúvida não tinha título.

2. Autor
Como acontece com as outras epístolas pastorais, os eruditos modernos com
freqüência põem em dúvida que Paulo fora seu autor (cap. l:l), objeção que em geral não
se compartilha.

3. Marco Histórico
Esta epístola foi dirigida a Tito quando como ministro atendia aos cristãos de
Creta. Esta grande ilha do Mediterrâneo tem 260 km de comprimento e entre 10 e 57 km.
de largura. Ela foi o centro de uma civilização - a minóica - que rivalizou com as da
Mesopotâmia e Egito. Dizia-se que o lendário rei Minos guardava em um intrincado
labirinto a um touro monstro (minotauro) que devorava aos jovens gregos cativos. Creta
foi finalmente colonizada pelos gregos e teve um papel importante durante algumas das
épocas mais gloriosas da história helenística. Nos primeiros anos do cristianismo os
cretenses eram famosos por sua desonestidade e por não ser dignos de confiança (cf. Tito
1:12 – expressão formulada por um poeta grego, chamado Epimênides).
De Tito se sabe pouco. As referências pessoais na epístola são fragmentárias e não
é mencionado em Atos. A primeira alusão aparece em Gál. 2:1-3, onde Paulo diz que Tito
foi com ele desde a Antioquía ao Concílio de Jerusalém. Como era um converso
incircunciso procedente do paganismo, Tito se converteu em um caso problemático
devido à polêmica sobre a circuncisão dos gentios. Depois de certo tempo representou a
Paulo em Corinto (2Cor. 8:16-17; 12:17-18). Também organizou coletas para os santos
de Jerusalém (2Cor. 8:6-10). Paulo o considerava como um colaborador leal e um soldado
da cruz digno de confiança (2Cor. 12:18), e refere-se a ele como "irmão", "companheiro
e colaborador" (2Cor. 2:13; 8:23). Nesta epístola, Paulo chama a Tito de "verdadeiro filho
na fé" (cap. 1:4).
Na última menção que se faz de Tito se diz que foi a Dalmácia, parte da moderna
Iugoslávia (2Tim. 4:10). Eusébio, o historiador eclesiástico do século I, refere-se a Tito
como bispo da ilha de Creta (História eclesiástica, III. 4). Acredita-se que a Epístola a
Tito foi escrita entre o primeiro encarceramento de Paulo em Roma e o segundo, ao redor
do ano 65 d.C.

4. Tema
Fora do fato de que Paulo tinha deixado Tito na ilha de Creta (1:5), não se podem
reconstruir as circunstâncias exatas em que foi escrita esta epístola. Parece que Paulo
tinha estado viajando de companhia de Zenas, Apolo, Artemas e Tíquico (cap. 3:12-15).
Zenas e Apolo evidentemente estavam por começar uma viagem que os faria passar por
Creta, e por isso Paulo lhes pediu que levassem esta epístola a Tito, o qual devia reunir-
se com Paulo em Nicópolis durante o inverno.
Segundo a epístola, parece que haviam grupos de cristãos em vários lugares de
Creta; entretanto, a organização geral da igreja era incompleta, e se estavam fomentando
dificuldades devido aos falsos professores, que talvez eram judeus semi-convertidos.
Esses falsos professores punham grande ênfase nos mitos, nas genealogias e na lei.
Ocupavam-se de argumentos inúteis e esbanjavam muito tempo e muita energia, tanto
deles como de outros membros de igreja.
Tito deveria arrumar esses assuntos, e Paulo lhe enviou conselhos e o infundiu
ânimo. Paulo se ocupa nesta carta especialmente em dar conselhos a Tito para ajudá-lo a
encaminhar os recém convertidos cristãos de Creta pelo caminho da verdadeira fé e a
devida conduta. Por esta razão a epístola é extremamente prática. Paulo dá conselhos
quanto a uma organização eclesiástica mais cabal e completa, e aconselha Tito quanto às
qualidades que devem ter os Anciões (os pastores locais, também chamados em outros
momentos de “presbíteros”) da igreja. Recorda-lhe a reputação que tinham os cretenses
de ser mentirosos e ociosos, e parece indicar que os cristãos de Creta tinham sido
perturbados por legalistas judaicos.
Paulo destaca especialmente que a ênfase na impureza cerimoniosa, com o tempo,
tende a fazer que a consciência se torne impura. Quando a mente se acha absorta em
detalhes religiosos, com muita frequência as questões verdadeiramente importantes de
moralidade e integridade são postas de lado e a religião se deteriora, convertendo-se em
pura forma e teoria. Veja que grande advertência para nossos dias também!
A grande ênfase de Paulo consiste em que os cristãos cretenses deviam ser sóbrios,
castos e plenamente corretos em toda sua maneira de viver. Os escravos - como sem
dúvida muitos deles o eram - deviam ser obedientes e honrados. Qualquer que fora a
posição social de uma pessoa, sua vida devia ser exemplar, a partir da conversão ao
Senhor Jesus.
Como conclusão de sua carta, Paulo recorda a Tito e, mediante ele, aos cretenses,
que a bondade de Deus para o homem não se ganha mediante boas obras, mas sim é a
dádiva da misericórdia divina por meio de Jesus Cristo. Paulo conhecia bem a herança
pagã desses irmãos cretenses e a confusão mental produzida pelos professores
judaizantes; por isso pôde tratar especificamente seus problemas. Seu conselho é claro e
direto.
Em sua carta, Paulo é preciso e incisivo, qualidades que os pregadores de hoje
também devem imitar.

EPÍSTOLA DE PAULO A FILEMOM

1. Título
Este livro é uma carta pessoal, e por isso mesmo é provável que originalmente não
tivesse título. Os manuscritos gregos mais antigos que se conservam dizem simplesmente
Prós Filemoma ("A Filemom"), título que possivelmente foi agregado por um cristão
desconhecido que juntou pela primeira vez as epístolas de Paulo e as fez circular como
uma coleção.

2. Autor
A epístola diz especificamente que Paulo foi seu autor (v. l). O fato de que seja
para resolver uma circunstância pessoal e que não reflete o propósito de promover algum
novo ensino, é um bom indício de que é genuína. Os eruditos virtualmente aceitam por
unanimidade que esta breve epístola é paulina.

3. Marco Histórico
A Epístola a Filemom é uma carta pessoal que o apóstolo Paulo escreveu enquanto
estava encarcerado em Roma, e a dirigiu a um cristão chamado - Filemom, que vivia em
Colossos. Quanto à data da escritura desta epístola, acredita-se que tenha sido por volta
do ano 60 d.C.
Ela foi enviada junto com a Epístola aos Colossenses por meio de Tíquico, amigo
de Paulo, e foi escrita devido a uma crise de um dos conversos de Paulo. Onésimo,
escravo do cristão Filemom, desconforme por sua condição de servo, tinha fugido de seu
amo, roubando algum dinheiro ou outros bens. Chegou a Roma esperando, como o faziam
muitos escravos, passar inadvertido entre as grandes multidões dessa cidade. E foi ali
onde Onésimo se encontrou com Paulo.
A necessidade possivelmente o impulsionou a procurar os cristãos devido à
caridade destes, da qual sem dúvida tinha sido testemunha com freqüência na casa de seu
amo. Possivelmente, enquanto estava em Roma, assimilou o suficiente dos ensinos
cristãos e sua consciência foi comovida, e logo procurou Paulo, a quem antes pode ter
sido hóspede de Filemom, para receber condução espiritual.
Qualquer que tenha sido o motivo, Onésimo foi bem recebido e se sentiu inspirado
a ajudar com toda dedicação ao idoso apóstolo. Sua consciência e sua vontade
prepararam-no para seguir o caminho do dever e emendar seus enganos do passado,
retornando à casa de seu antigo amo. Onésimo não esperou para ver como Filemom
responderia à carta de Paulo, mas viajou logo com Tíquico, o mensageiro do apóstolo.
Ninguém sabe como foi recebido, mas é difícil imaginar que Filemom, um seguidor de
Cristo e amigo de Paulo, não se comovesse ante uma súplica tão terna. O nobre tom da
carta reflete a confiança do apóstolo de que Filemom receberia a Onésimo como a um
"irmão amado" (vers. 16). Podemos supor que a confiança de Paulo foi assim
recompensada.
Não se pode apreciar plenamente a Epístola a Filemom sem compreender bem o
problema dos escravos no Império Romano nos dias do Paulo. Os escravos eram
reconhecidos como parte da estrutura social, e eram considerados membros da casa de
seu dono. Acredita-se que entre os anos 146 a.C. e 235 d.C. a proporção era de três
escravos para cada cidadão livre. Plínio afirma que no tempo de Augusto, um cidadão
chamado Cecílio tinha mais de 4000 escravos. Como havia uma proporção tão elevada
de escravos, a classe governante se sentia obrigada a promulgar severas leis para evitar
fugas ou revoluções. De acordo com a lei romana, o amo tinha poder absoluto sobre a
vida de seus escravos. O escravo não podia ter nenhuma propriedade. Tudo o que tinha
pertencia a seu amo, embora às vezes este lhe permitia acumular certos lucros.
Os escravos não podiam casar-se legalmente, entretanto eram animados a que o
fizessem porque sua descendência aumentava a riqueza do amo. O escravo sabia que
podia ser separado de sua companheira e filhos, se assim agradasse a seu amo. Os
escravos não podiam ir aos magistrados civis em busca de justiça, e não havia um lugar
onde um escravo fugitivo pudesse encontrar asilo. Não podia acusar a seu amo de nenhum
crime, exceto de alta traição, adultério, incesto ou a violação das coisas sagradas. Se um
amo era acusado de um crime, podia oferecer a seu escravo para que, submetido a tortura,
fora interrogado em seu lugar. O castigo pela fuga era com freqüência a pena de morte,
às vezes mediante a crucificação ou sendo jogado a vorazes peixes, chamados lampréas.
Alguns donos de escravos eram mais considerados que outros, e haviam escravos que
demonstravam grande afeto por seus amos. Certas tarefas confiadas aos escravos eram
relativamente prazenteiras, e o cumprimento de uma quantidade delas exigia muita
inteligência. Professores, médicos e até filósofos com freqüência foram tomados como
escravos devido a vitórias militares. Muitos escravos dirigiam negócios ou fábricas, ou
administravam propriedades para seus amos. Mas a instituição da escravidão era uma
escola de covardia, adulação, improbidade, latrocínio, imoralidade e outros defeitos
morais, pois o escravo tinha que, sobretudo, agradar os desejos de seu amo, não importa
quão perversos fossem.
Os romanos não negavam a seus escravos toda esperança de liberdade. A lei
permitia em diferentes maneiras sua liberação. O mais comum era que o amo levasse seu
escravo ante um magistrado, em cuja presença o fazia dar meia volta e pronunciava as
desejadas palavras: isto liber, "sei livre", e lhe dava um golpe com uma vara. Ao escravo
também podia conceder-lhe a liberdade de outras maneiras: por exemplo, lhe entregando
uma carta onde constava que era livre, ou fazendo que o escravo fora guardião dos filhos
de seu amo, ou colocando sobre sua cabeça o pileus ou “gorro da liberdade”. Mas para
que o escravo ficasse completamente livre de todas suas obrigações com seu amo, a
liberdade que lhe concedia tinha que ser decretada pela lei. No Império Romano era
possível que os libertos com o tempo alcançassem níveis de influência e até de autoridade
cívica; mas quando morriam sem deixar herdeiros, suas propriedades voltavam para seus
amos anteriores. Este foi, por exemplo, o caso de Félix, procurador da Judéia.

4. Tema
Esta pequena jóia de amor cristão e de tato é única no cânon das Escrituras, porque
se trata de uma carta pessoal que se refere a um problema doméstico desses dias: a relação
entre um amo cristão e um escravo fugitivo que se arrependeu. Não apresenta nenhuma
doutrina nem exortação específica para a igreja em geral; mas sua inclusão no cânon da
Bíblia se compreenderá bem estudando a carta como também sua relação com as outras
epístolas paulinas. É o único fragmento que existe do que deve ter sido uma abundante
correspondência epistolar entre Paulo e alguns membros de seu rebanho. Nesta breve
epístola se aplicam vários princípios do cristianismo à vida diária.

EPÍSTOLA AOS HEBREUS

1. Título
O título deste livro nos manuscritos gregos mais antigos é simplesmente Prós
Hebráious ("Aos hebreus"). Este título é particularmente apropriado, já que o livro trata
principalmente do significado do santuário e seus serviços, temas que sem dúvida devem
ter sido de especial significado para os primitivos cristãos de origem hebréia ou judia.

2. Autor

A paternidade literária do livro aos Hebreus foi motivo de debates desde os


primeiros tempos. Muitos atribuíam o livro ao Paulo, mas outros se opunham
intensamente a esta opinião. Orígenes, pai da igreja que escreveu a começos do século
III, concluía seu exame do livro com esta declaração: "Quem a tenha escrito é só
conhecido por Deus" (História Eclesiástica, vi, 25, 14). Outros pais pensavam que o autor
pôde ter sido Barnabé, Apolo, Clemente ou Lucas.
Esta incerteza quanto à paternidade literária da Epístola aos Hebreus foi um fator
importante na relutância de muitos antigos cristãos do ocidente do Império Romano para
aceitá-la como canônica. Não foi aceita no Ocidente a não ser até a segunda metade do
século IV. Nos séculos seguintes cessou a discussão sobre a paternidade literária de
Hebreus, e a maioria dos cristãos a aceitou como obra de Paulo, opinião que foi apoiada
em forma geral até os tempos modernos; então se agitou de novo a polêmica, debatida
especialmente pelos eruditos.
Quando o livro de Hebreus se compara com as epístolas geralmente aceitas de
Paulo, é notavelmente distinto, especialmente nas palavras comuns e nos enlaces
sintáticos com que o autor une as orações e os raciocínios na epístola. Outra clara
diferença está no emprego de citações do AT. Nas epístolas aceitas usualmente como
paulinas, emprega-se um grupo de frases mais ou menos estereotipadas para começar as
citações do AT, enquanto que em Hebreus se usa outro tipo. As epístolas mostram que o
apóstolo também usava com relativa liberdade as passagens do AT. Suas citações seguem
com freqüência a LXX (Septuaginta), mas às vezes apresenta o que evidentemente é sua
própria tradução do hebraico. E em outras ocasiões se satisfaz dando uma citação
aproximada ou paráfrase. Por contraste, as citações do AT que há em Hebreus estão
tomadas quase textualmente da LXX.
Por meio do descobrimento dos papiros bíblicos de Chester Beatty, do século III,
ficou de manifesto alguma provável evidência em favor da paternidade literária paulina
da Epístola aos Hebreus. No códice que contém as epístolas paulinas, Hebreus se acha
entre Romanos e 1Corintios. Embora este fato não demonstra a paternidade literária
paulina de Hebreus, é um significativo indício de que desde muito tempo na história da
igreja havia quem acreditavam que Hebreus devia ser incluída como parte dos escritos de
Paulo.
Acreditamos que, embora se apresentaram sólidos argumentos contra a
paternidade paulina de Hebreus, essas razões não são suficientes para neutralizar a crença
tradicional de que Paulo é o autor. Uma grande parte da diferença de tom e estilo de
Hebreus, em comparação com as demais epístolas paulinas conhecidas, pode ser
explicada razoavelmente pelo fato de que essas outras epístolas foram dirigidas a grupos
de igrejas ou a indivíduos para fazer frente a problemas particulares. Embora se reconhece
que há certas diferenças de estilo literário que não podem ser explicadas com esse
argumento, essas diferenças podem ser razoavelmente explicadas, pois Paulo pregou
certos sermões sobre o tema do ministério sacerdotal de Cristo, os quais foram escritos.
Como acontece às vezes quando se utiliza um sistema tal, a forma literária final do
exemplar transcrito pode ter uma marcada influência de quem fez a transcrição. É fácil
compreender que Paulo não poderia ter tido a oportunidade de redigir esses sermões, pois
viajava incessantemente, e não passou muito tempo antes que suas viagens terminassem
com o martírio.
Aceita-se geralmente que Hebreus foi escrito antes da queda de Jerusalém. O
número de dirigentes da igreja era muito reduzido nos anos anteriores a 70 d.C. Qual
desses dirigentes poderia ter exposto um tema tão profundo como o que se apresenta no
livro de Hebreus? A pessoa mais possível é, sem dúvida alguma, Paulo. Dizer que o autor
foi um cristão desconhecido desse cedo período, só levanta um novo problema: como é
possível que um cristão que possuísse o discernimento teológico necessário e a
capacidade lógica suficiente para produzir uma obra como Hebreus, pudesse ter ficado
no anonimato em um tempo quando os dirigentes cristãos eram tão poucos, mas era tão
completo o registro que se tinha dos mesmos?
3. Marco Histórico
A questão que possivelmente produziu o debate mais profundo na igreja
apostólica foi, sem dúvida alguma, o tema da lei cerimoniosa e sua observância pelos
cristãos. O concílio de Jerusalém tinha liberado os cristãos de origem gentílica das
obrigações próprias dessa lei, mas psicologicamente a grande comunidade cristã de
origem judia, da Palestina, não estava preparada para participar dessa “liberdade”. Esses
cristãos pensavam que porque eram judeus deviam praticar esses ritos. Não se davam
conta de que para todos, sem exceção, os ritos cerimoniosos tinham encontrado seu
cumprimento em Jesus Cristo. Esta situação fez surgir uma insalubre tensão na igreja, já
que um amplo setor seguia um complicado sistema de vida religiosa ignorado por outro
setor.
Paulo, e quem o acompanhava, compreendiam suficientemente bem os ritos
mosaicos e as cerimônias para avaliá-los corretamente e lhes dar seu devido lugar no
plano de salvação. Paulo conhecia a natureza transitiva desse sistema e sabia que já se
cumprira o período para sua “abolição”. A igreja cristã de origem judia, cujo centro estava
em Jerusalém, parecia desconhecer as calamidades que logo sobreviriam a essa cidade.
Os cristãos de origem judia ainda guardavam as festas, seguiam sacrificando como em
anos anteriores e continuavam em seu zelo pela lei cerimoniosa (ver Atos 15). Tinham só
um vago conceito da obra de Cristo no santuário celestial; sabiam pouco de Seu
ministério; não compreendiam que seus sacrifícios eram inúteis devido ao grande
sacrifício do Calvário. Esses milhares de cristãos judaicos "todos... ciumentos pela lei"
(Atos 21:20), teriam que enfrentar-se a uma crise quando fossem destruídos a cidade e o
templo. Isto evidentemente ocorreu só um curto tempo depois de que se escreveu a
Epístola aos Hebreus.
Acredita-se que nessa hora de crise apareceu o livro de Hebreus. Continha
precisamente a ajuda necessária: luz sobre o tema do santuário, de Cristo como Supremo
Sacerdote, do sangue "que fala melhor que o de Abel" (cap. 12:24); do repouso que fica
para os filhos de Deus (cap. 4:9); da bendita esperança que é "segura e firme âncora da
alma, e que penetra até dentro do véu" (cap. 6:19).

4. Tema
O livro de Hebreus consiste essencialmente de uma comparação e um contraste
entre os símbolos mediante os quais Deus apresentou o plano de salvação a Seu povo
escolhido nos dias do NT, e a realidade do ministério de Cristo em favor dos pecadores à
luz da cruz. As experiências do antigo Israel sob o sistema simbólico são apresentadas
como uma lição e uma advertência para os cristãos. Mediante o sistema simbólico e as
experiências de Israel que viveu sob esse sistema, Paulo procura desenvolver uma
compreensão e uma avaliação mais completas pelo ministério de Cristo nas moradas
celestiais.
Ao final, o autor aconselha-nos para que “despojemos de todo o peso e do pecado
que nos assedia, e corramos com paciência a carreira que temos por diante, postos os
olhos em Jesus. Portanto, tendo um grande supremo sacerdote que transpassou os céus,
Jesus o Filho de Deus, retenhamos nossa profissão, e nos aproximemos, pois,
confiantemente ao trono da graça, para alcançar misericórdia e achar graça para o
oportuno socorro" (12:1-2; 4:14, 16).

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