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Contabilidade Criativa e a Ética Profissional no

Contexto das Informações aos


Usuários Externos1
Fabiana Maria de Oliveira da Silva 2

Marcos Antônio da Cunha 3

Resumo

A contabilidade criativa é a manipulação de valores que refletem nas


contas e demonstrações contábeis de uma empresa, ou seja, o manuseio dos
resultados, com a finalidade de mostrar uma imagem melhorada da situação
econômico-financeira da entidade. Este artigo tem como objetivo principal
demonstrar os efeitos causados aos usuários externos, no que se refere à
utilização da contabilidade criativa nas empresas, bem como a participação do
contador nestas situações e a sua conduta ética.

Palavras-chave

Contabilidade Criativa, Usuários Externos, Informação Contábil, Ética Profissional.

Creative accounting and the Professional Ethics in the


Context of the Information to the External Users

Abstract

A creative accounting is the manipulation of values that reflect in the


accounts and countable demonstrations of a company, or either, the manuscript of
the results, with the purpose to show to an improved image of the situation
economic-financier of the entity. This article has as objective main to
demonstrate the caused effect to the external users, in whom if it relates to the
use of the creative accounting in the companies, as well as the participation of the
accountant in these situations and its ethical behavior.
Keywords
Creative Accounting, External Users, Countable Information, Ethical Professional.

1
Trabalho desenvolvido na graduação de Ciências Contábeis da Universidade Católica de Brasília
2
Bacharelando em Ciências Contábeis do 2º semestre de 2004 da UCB
3
Professor Orientador do Trabalho
1. INTRODUÇÃO

Segundo Amat apud Costa et al. (2001, p. 01), o termo contabilidade


Criativa é o “processo mediante o qual os contadores utilizam seus conhecimentos
sobre as normas e procedimentos contábeis para manipular valores refletidos nas
contas e demonstrações contábeis de uma empresa”.
Ainda de acordo com o que preceitua Amat apud Costa et al. (2001, p.
03) “os procedimentos da contabilidade criativa têm como resultado uma variação
dos valores dos elementos patrimoniais e de resultado, além do próprio valor
econômico da entidade como um todo”. Essas variações influem de forma
relevante na interpretação da situação econômica e financeira da empresa, onde o
usuário da informação terá à sua disposição dados irreais, comprometendo o
processo decisório relativamente à situação financeira e ao valor econômico da
empresa.
Para os usuários externos das informações contábeis (investidores,
bancos, fornecedores, governo e interessados), é de extrema importância à
fidedignidade dos dados apresentados nos demonstrativos contábeis para a sua
correta e oportuna interpretação.
Franco (1977, p. 17) afirma que:

Contabilidade é a ciência que estuda, controla e interpreta os fatos


ocorridos no patrimônio das entidades, mediante o registro, a
demonstração expositiva e a revelação desses fatos, com o fim de
oferecer informações sobre a composição do patrimônio, suas
variações e o resultado econômico decorrente da gestão da riqueza
patrimonial.

Diante do exposto, é grande a responsabilidade dos contadores que


preparam as informações contábeis, pois a fidedignidade destas está diretamente
ligada à ética profissional do contador.
Os princípios éticos aplicáveis à profissão de contador representam a
essência das intenções da profissão para viver e atuar dentro da ética. Uma das
condições essenciais para o sucesso profissional do contador é sua aderência a um
conjunto de princípios éticos que sirvam de premissas a suas ações. (MORAIS,
2004).
O presente artigo tem como objetivo principal demonstrar os efeitos nos
usuários externos da utilização da contabilidade criativa nas empresas, bem como
a participação do contador nestas situações e a sua conduta ética.
Não se pretende efetuar pesquisas de campo ou estudo de caso neste
trabalho, sendo a pesquisa bibliográfica o principal instrumento utilizado para
levantamento dos dados e conclusão deste artigo.

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2. PROBLEMA, OBJETIVOS E METODOLOGIA

Nesta seção será feita uma explanação geral do trabalho,


contextualizando o problema, abordando os objetivos gerais e específicos,
apresentando também a metodologia utilizada para a realização do trabalho.

2.1. Problema e Objetivos

Este trabalho tem como foco principal demonstrar qual a


responsabilidade do Contador perante as informações disponibilizadas aos
usuários externos no que tange à contabilidade criativa, e quais as implicações
éticas.
Sendo assim, visando explicar tais indagações foram elaborados os
seguintes objetivos:
a) Objetivo principal:
Elucidar as implicações do uso da contabilidade criativa para
o usuário externo e suas ligações éticas para o profissional da
contabilidade.
b) Objetivos específicos:
Demonstrar elementos positivos da contabilidade criativa;
Demonstrar elementos negativos da contabilidade criativa;
Caracterizar os valores éticos da questão contábil na
contabilidade criativa.

2.2. Metodologia

De acordo com os critérios propostos por Silva e Menezes (2001), do


ponto de vista de sua natureza será uma pesquisa básica, pois objetiva gerar novos
conhecimentos sem aplicação prática prevista. Em relação à abordagem do
problema, considerar-se-á como sendo qualitativa, uma vez que não requer o uso
de métodos e técnicas estatísticas para coleta de dados. Com relação aos meios e
aos procedimentos técnicos considera-se uma pesquisa bibliográfica.

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3. CONTABILIDADE CRIATIVA

O termo “contabilidade criativa” vem do inglês “earnings management”,


que em outra versão poderia ser administração ou negócio vantajoso, ou seja,
pode ser entendida como gerenciamento ou manuseio dos resultados, com a
intenção de mostrar uma imagem diferente (estável no tempo, melhor ou pior) da
entidade.(SANTOS ; GUEVARA, 2003).
Ainda segundo Santos e Guevara (2003, p 8) a visão geral é a de que “as
práticas de contabilidade criativa estão muito próximas à fraude contábil, ficando
em uma linha tênue entre a norma e a fraude”. O termo contabilidade criativa
envolve a seleção de alternativas possíveis, válidas segundo os princípios e as
normas contábeis, realizadas para se conseguir a apresentação mais favorável da
informação contábil de uma empresa, em um momento determinado.
Alguns autores colocam suas definições como:

É o resultado da transformação das cifras contábeis de aquilo que


realmente são para aquilo que aqueles que a elaboram desejam que
sejam, aproveitando-se das facilidades que as normas existentes
proporcionam, ou mesmo ignorando-as (Naser, Kamal, 1993, apud
Cosenza).

É o processo mediante o qual os contadores utilizam seus


conhecimentos sobre as normas contábeis para manipular os valores
incluídos nas demonstrações contábeis que divulgam (Amat, Oriol e
Blake, Jonh, 1999, apud Consenza).

A Contabilidade Criativa é essencialmente um processo de uso das


normas contábeis, que consiste em dar voltas às legislações para
buscar uma escapatória baseada na flexibilidade e nas omissões
existentes dentro delas para fazer com que as demonstrações
contábeis pareçam algo diferente ao que estava estabelecido em
ditas normas (Jameson, Michael, 1988, apud Consenza).

Diante dos conceitos citados, pode-se afirmar que a contabilidade


criativa é o conjunto de práticas ilícitas que tendem a modificar a apresentação da
situação econômico-financeira de uma entidade, evidenciada em suas
demonstrações contábeis, ou seja, a não fidedignidade das informações contábeis.
(GOMES, 2003).

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4. INFORMAÇÃO CONTÁBIL

A contabilidade tem por objetivo suprir a necessidade de informações de


diversos usuários frente a relevantes processos decisórios. De acordo com o
Conselho Federal de Contabilidade (2001, p. 110) “a Contabilidade é uma
ciência social, cujo objeto é o Patrimônio das entidades”.
O Conselho Federal de Contabilidade (CFC, 2001, p 110) na NBC T - 1
estabelece que:

As informações geradas pela Contabilidade devem propiciar aos


seus usuários base segura às suas decisões pela compreensão do
estado em que se encontra a entidade ou a empresa, seu
desempenho, sua evolução, riscos e oportunidades que oferecem.

Segundo esta norma, os usuários da contabilidade são todas as pessoas


(físicas ou jurídicas, públicas ou privadas, internas ou externas) com interesse na
entidade, sejam: administradores, sócios ou acionistas, empregados, fornecedores,
financiadores e demais credores, clientes, governos nos diversos níveis,
integrantes do mercado financeiro e de capitais, além dos meios de comunicação e
do público em geral, ressaltando que:

A informação contábil deve ser, em geral e antes de tudo, veraz e


eqüitativa de forma a satisfazer às necessidades comuns a um
grande número de diferentes usuários, não podendo privilegiar
deliberadamente nenhum deles, pelo fato desses interesses não
serem sempre coincidentes .

As informações contábeis são subordinadas aos princípios ou normas


contábeis, cuja observância, ou não, delas devem revelar, pois se não o fizerem
não estarão alcançando seu objetivo principal, que é o de transmitir informações
confiáveis e úteis para os usuários das informações. (AGUIAR, 2000).
Essas informações devem estar de acordo com os Princípios
Fundamentais de Contabilidade que devem permitir que as informações possuam
as características necessárias para torná-las úteis. Os usuários da informação
contábil necessitam de informações capazes de reduzir os riscos em seus
processos de tomada de decisão através de dados que lhes permitam melhor
interpretar e compreender a situação econômica e financeira das empresas.
(AGUIAR, 2000).
A geração das informações contábeis e sua aplicação real nas decisões
das empresas pressupõem que a atuação do contador seja pautada por princípios
éticos.

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5. ÉTICA PROFISSIONAL

Não se confunde ética e moral como sinônimos. A moral é a regulação


dos valores e comportamentos considerados legítimos por uma determinada
sociedade, um povo, uma religião, certa cultura ou tradição. Há morais
específicas, em grupos sociais mais restritos como uma instituição, um partido
político. Há, muitas e diversas morais. Isso significa dizer que moral é um
fenômeno social e particular, que não tem compromisso com a universalidade,
isto é, com o que é válido e de direito para todos os homens. A ética é a teoria da
moral. (MORAIS, 2004).
Entre a moral e a ética há uma tensão permanente: a ação moral busca
compreensão e uma justificativa crítica universal, e a ética por sua vez, exerce
permanente vigilância crítica sobre a moral, para reforçá-la ou transformá-la.
(MORAIS, 2004).
A ética é um conjunto de princípios e disposições voltados para a ação,
com o objetivo de balizar o comportamento humano. A ética faz uma reflexão
crítica sobre a moralidade e existe como referência para que a vida em sociedade
possa se tornar cada vez mais humanitária. (MORAIS, 2004).
Diante disso o profissional da Contabilidade enfrenta inúmeros dilemas
éticos no cotidiano do exercício de sua profissão. O objetivo do código de ética
para o contador é habilitar esse profissional a adotar uma atitude pessoal, de
acordo com os princípios éticos conhecidos e aceitos pela sociedade.
Sá (1998, p. 102) afirma que:

Cada conjunto de profissionais deve seguir uma ordem que permita


a evolução harmônica do trabalho de todos, a partir da conduta de
cada um, através de uma tutela no trabalho que conduza a regulação
do individualismo perante o coletivo.

Em razão dos inúmeros problemas e situações dúbias, houve a


necessidade da criação de um Código de Ética para regulamentação da profissão
contábil que, no caso do Código de Ética Profissional dos Contabilistas
(Resolução CFC 803/96), foi além dos princípios básicos trazendo orientações
sobre os deveres e proibições, valores dos serviços profissionais, deveres em
relação aos colegas e à classe e, por último, as penalidades por infrações éticas.
O contador deve defender abertamente os princípios e valores éticos
aplicáveis à sua profissão, para produzir imagem verdadeira do que ela se
constitui para as novas gerações de profissionais. (MORAIS, 2004).
O código de ética profissional, além de servir de guia à ação moral,
também possibilita que a profissão de contador declare seu propósito de cumprir
as regras da sociedade, servir com lealdade e diligência e respeitar a si mesma.
Tem o objetivo de habilitar o profissional a adotar atitude pessoal, de acordo com
os princípios éticos conhecidos e aceitos pela sociedade. Não basta preparação
técnica. É preciso encontrar uma finalidade social superior nos serviços que
executa. (MORAIS, 2004)

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O código de ética profissional contém os princípios éticos aplicáveis à
sua profissão. Em síntese, os princípios dizem respeito à:
Responsabilidade, perante a sociedade, de atuar com esmero e
qualidade, adotando critério livre e imparcial;
Lealdade, perante o contratante de seus serviços, guardando sigilo
profissional e recusando tarefas que contrariem a moral;
Responsabilidade para com os deveres da profissão (aprimoramento
técnico, inscrição nos órgãos de classe);
Preservação da imagem profissional, mantendo-se atualizado em
relação às novas técnicas de trabalho, adotando altas normas
profissionais de conduta. O contador deve contribuir para o
desenvolvimento e difusão dos conhecimentos próprios da profissão.
O respeito aos colegas deve ser sempre observado.
A essência principal das responsabilidades descritas anteriormente é de
que o contador deve manter um comportamento social esperado pela sociedade.
Não bastando apenas o conhecimento técnico para o exercício da atividade
profissional. É indispensável o conhecimento do código de ética profissional do
contabilista em todo seu teor, instituído pelo Conselho Federal de Contabilidade
por intermédio da Resolução CFC nº 803/96, de 10-10-1996.

6. FACILITADORES PARA A OCORRÊNCIA DA


CONTABILIDADE CRIATIVA

Nem sempre o contador desempenha as suas funções seguindo


rigorosamente o código de ética. Muitos são os fatores que favorecem o exercício
da criatividade contábil, mas talvez o maior dos incentivos seja a impunidade, em
todos os sentidos (jurídico, social, mercantil, etc.) do manipulador da informação.
Os auditores citam as seguintes causas como origem da contabilidade criativa:
(SANTOS; GUEVARA, 2003).
a) Características dos princípios e normas contábeis:
Existência de múltiplas estimativas;
Flexibilidade, arbitrariedade e subjetividade na aplicação;
Diferentes, porém válidas, interpretações dos princípios e
normas contábeis;
Conceito base de Imagem Fidedigna pouco claro ou
indeterminado; e
Cuidados da administração na aplicação de princípios como
prudência, confrontação de receitas e despesas e uniformidade.
b) Características sociais e de comportamento humano:
Valores éticos e culturais; e
Atitude do administrador diante da fraude.

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Como se pode observar, para a prática da contabilidade criativa utiliza-
se, principalmente, a flexibilidade dos princípios e normas contábeis a que a
empresa se obriga. (SANTOS; GUEVARA, 2003).
A contabilidade criativa tem se desenvolvido em todas as áreas, sendo
cada vez mais comum, com práticas que têm sido cada vez mais complexas,
demandando de seus criadores profundos e detalhados conhecimentos técnicos e
tornando mais difícil sua identificação. (SANTOS; GUEVARA, 2003).
De um lado, parte dos administradores e gerentes da empresa utiliza a
informação contábil para mostrar a cara que desejam que seus usuários conheçam,
mesmo que esta não seja a mais fidedigna. Por outro lado, diversos usuários se
valem da informação contábil e financeira produzida e divulgada pela empresa,
mesmo que alguns dados nem sempre estejam presentes, ou até estejam
apresentados de maneira confusa para dificultar sua compreensão. (SANTOS;
GUEVARA, 2003).
As prováveis razões que fundamentam a utilização da chamada
Contabilidade Criativa são muitas. Tais fundamentos estão focados
principalmente no possível impacto de tais procedimentos nas decisões dos
investidores do mercado financeiro. (COSTA, 2001).
Dessa forma, algumas dessas razões são apresentadas, segundo Costa et
al. (2001, p. 04):
Manutenção de um fluxo constante de receitas: as empresas gostam
de demonstrar uma tendência estável de crescimento do faturamento
e não de evidenciar oscilações bruscas, o que poderia ser
interpretado como risco pelo mercado.
A Contabilidade Criativa também pode ser utilizada para manter em
alta o preço das ações, por meio de mecanismos que reduzam
aparentemente o endividamento, ou aumentem as receitas e os
resultados.
A Contabilidade Criativa pode ser utilizada também para atrasar a
chegada de informações ao mercado financeiro, beneficiando alguns
investidores que tenham acesso privilegiado a tais informações. Um
exemplo configura-se nas remunerações em ações aos próprios
diretores das empresas. Estes (diretores) podem atrasar as
divulgações de resultados alcançados e outros dados financeiros
para que possam operar nas bolsas em benefício próprio.
A Contabilidade Criativa pode ser utilizada para mascarar o
desempenho Governamental. Neste caso o governo pode fazer a sua
divulgação em regime de caixa, dificultando a apuração de custos de
programas e projetos. Além disso, a mudança da base de
contabilização e as entidades que são inseridas na consolidação do
setor governamental podem colaborar para formar uma melhor
imagem dos índices dívida/ PIB e déficit/ PIB.

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Essas razões não são as únicas. Há uma gama de outros fundamentos
apresentados, como a manipulação de prazos, direitos e obrigações contidos em
contratos, chamados de “contratos de gaveta”. Assim, é possível manipular
índices financeiros de acordo com os objetivos que são almejados (melhora de
resultado, melhoria de índices etc.). (COSTA, 2001).

7. CASOS DE CONTABILIDADE CRIATIVA: TEORIA E PRÁTICA

7.1 Casos Teóricos

De acordo com Amat et al apud Costa et al (2001, p 02) as técnicas de


contabilização criativa podem ser sistematizadas nas seguintes transações:
• Aumento ou redução das despesas:
As normas contábeis podem facilitar manobras, tais como distorções nos
prazos para amortização do goodwill, nas provisões para depreciação, nas
provisões para contingências etc. Por exemplo, se a empresa deseja apresentar um
lucro maior, esta pode fazê-lo por meio do aumento do prazo de depreciação de
um ativo. Dessa maneira, a despesa de depreciação diminuirá, contribuindo para o
aumento do resultado.
• Aumento ou redução das receitas:
É possível que em algumas situações seja possível antecipar ou diferir o
reconhecimento de receitas, utilizando-se como argumento, a convenção do
conservadorismo ou o princípio da confrontação das receitas com as despesas.
• Aumento ou redução de ativos:
A manipulação nas provisões e prazos de amortização, descrita acima,
tem impacto sobre o valor dos ativos. Outro exemplo é a mudança no método de
avaliação de estoques. Por exemplo, se a empresa utiliza o método da média
ponderada móvel para a mensuração de seus estoques e deseja apresentar um
valor mais alto para os mesmos, pode mudar seu método para o PEPS (Primeiro
que Entra é o Primeiro que Sai), considerando que geralmente os preços sobem
conforme a passagem do tempo.
• Aumento ou redução do patrimônio líquido:
Os exemplos descritos anteriormente têm um impacto direto ou indireto
no patrimônio líquido da entidade, afetando os índices de endividamento e a
estrutura patrimonial, podendo levar os usuários da informação a tirarem
conclusões erradas, não somente sobre o capital próprio, mas também em relação
a todo o balanço patrimonial da empresa.
• Aumento ou redução do passivo:
As empresas podem utilizar artifícios para diminuir, aparentemente, seu
endividamento. A própria legislação abre brechas sobre tal mecanismo. Um
exemplo clássico, no Brasil, é o tratamento contábil do leasing financeiro. Apesar
de ser, em essência, um empréstimo para aquisição de um ativo, o bem adquirido

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não é ativado e a dívida não é contabilizada, o que pode levar a conclusões
erradas dos investidores acerca da liquidez da empresa e de outros indicadores.
• Reclassificação de ativos ou passivos:
Em alguns casos pode haver dúvida de onde classificar certos itens. Por
exemplo, peças de reposição do ativo imobilizado podem ser classificadas como
imobilizado também ou, se recorrer à convenção da materialidade, como
circulante ou, até mesmo, como despesa diretamente.
• Informação contida no relatório da administração ou no parecer da
auditoria:
A inclusão de mais ou menos informação no relatório da administração
pode conduzir a conclusões erradas, tanto sobre o passado quanto sobre as
perspectivas para o futuro da empresa.
A seguir, é apresentada uma figura que resume o impacto dos
procedimentos contábeis criativos:

Aumento ou Aumento ou Reclassifica- Manipulação do


redução de redução de ção de Ativos Relatório da
Receitas ou Ativos ou ou Passivos Administração
Despesas Passivos ou do Parecer
dos Auditores

Variação no Variação de
Resultado Ativos e
Passivos

Variação na interpretação da situação econômico-financeira da


empresa

Variação no valor da empresa

FIGURA 1 – Práticas contábeis criativas e seus efeitos.


Fonte: Costa, (2001).

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Como podem ser notadas na figura 1, as transações que podem ser
classificadas como contabilidade criativa resultam na variação dos valores dos
ativos, passivos e também do resultado. Conseqüentemente, estas variações
acabam por influírem de maneira relevante na interpretação da situação
econômico-financeira da empresa, pois o usuário da informação disporá de dados
não condizentes com a realidade. (COSTA, 2001).
A conseqüência final de todo o processo de contabilidade criativa,
levando a interpretações equivocadas é a manipulação do valor econômico da
empresa, já que as demonstrações contábeis constituem peça fundamental no
processo subjetivo e individual de avaliação da empresa por parte dos usuários.
Assim, é importante ressaltar as principais razões que fundamentam a utilização
de procedimentos de contabilidade criativa. (COSTA, 2001).

7.2 Casos Práticos

Desde a série de escândalos desencadeada pelas fraudes contábeis,


intitulada de Contabilidade Criativa, que abalou a economia americana no ano
passado, um clamor moralizante atingiu os negócios, a ética nas informações
prestadas aos diversos usuários da informação. Nesse contexto, a ética – definida
como transparência nas relações e preocupação com o impacto de suas atividades
na sociedade – vem sendo vista como uma espécie de requisito para a
sobrevivência das empresas, e para a fuga de casos da então chamada
Contabilidade Criativa. (COSIF, 2004).
Diante do exposto, será demonstrado um quadro resumo de alguns
casos reais, obtidos por meio de pesquisa, resultando nos seguintes dados:

IMPACTOS CAUSADOS AOS


EMPRESA PROCEDIMENTOS
USUÁRIOS / ACIONISTAS
Reduziu do saldo da conta de clientes Perda do Capital Aplicado, em função
os valores de financiamento do não recebimento do bem contratado
vinculados à produção dos imóveis, (imóvel).
que mais tarde seriam transferidos aos
compradores dos imóveis e ainda
reduziu da mesma conta os
compromisso para a conclusão das
obras, que vem a ser os custos
orçados.
ENCOL S/A Fonte: Gomes (2003).
ENG. E
COMÉRCIO PRINCIPIO ÉTICO: PRINCÍPIO CONTÁBIL:

- Art. 2°, Inciso I e VIII (zelo, - Principio da Prudência;


honestidade; impedimento para
- Principio da Oportunidade
exercício da profissão);
- Art. 3°, Inciso VIII e XX (fraude;
não observância dos princípios
contábeis).
Fonte: Resolução CFC nº 803/96, de Fonte: Guia IOB de Contabilidade
10-10-1996 (2002)

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IMPACTOS CAUSADOS AOS
EMPRESA PROCEDIMENTOS
USUÁRIOS / ACIONISTAS
Em 1986, o Banco Nacional
apresentou um rombo de US$ 600
milhões em suas contas, superior ao Desvalorização das Ações;
patrimônio líquido, de US$ 250 Perda do Capital Investido.
milhões, à época.
Para encobrir o rombo, o banco forjou
empréstimos fictícios, abrindo mais de
600 contas fantasmas. Os empréstimos
falsos foram contabilizados como
ativos bons, equilibrando o balanço.
As operações foram sendo renovadas e
ampliadas, o que resultou num rombo
de US$ 9,2 bilhões em 18 de
BANCO novembro de 1995, quando o Banco
NACIONAL Central interveio no Nacional.
Fonte: Carvalho; Oliveira (2002).

PRINCÍPIO ÉTICO: PRINCÍPIO CONTÁBIL:


- Art. 2°, Inciso I e VIII (zelo, - Principio da Prudência;
honestidade; impedimento para
- Principio da Oportunidade
exercício da profissão);
- Art. 3°, Inciso VIII e XX (fraude;
não observância dos princípios
contábeis).
Fonte: Resolução CFC nº 803/96, de Fonte: Guia IOB de Contabilidade
10-10-1996 (2002)

IMPACTOS CAUSADOS AOS


EMPRESA PROCEDIMENTOS
USUÁRIOS / ACIONISTAS
Aquisições feitas pela Parmalat, com A Parmalat foi acusada de fraude, pois
preços inflacionados com o objetivo enganou investidores ao vender
de gerar caixa, ou seja, multiplicação debêntures (títulos privados para captar
de dívidas impagáveis e ativos dinheiro). A empresa italiana ofereceu
imaginários (valorização dos ativos US$ 100 milhões em debêntures aos
financeiros). A empresa fazia investidores americanos enquanto
freqüentes emissões de títulos de disfarçava sua verdadeira situação
dívida, depois declarava ter financeira.
recomprado.
Fonte: BBC BRASIL.COM (2004)
Fonte: BBC BRASIL.COM (2004)
PARMALAT
PRINCÍPIO ÉTICO: PRINCÍPIO CONTÁBIL:
- Art. 2°, Inciso I e VIII (zelo, - Princípio da Entidade;
honestidade; impedimento para
- Principio da Prudência;
exercício da profissão);
- Princípio do registro pelo valor
- Art. 3°, Inciso VIII e XX (fraude;
original;
não observância dos princípios
contábeis). - Principio da Oportunidade.
Fonte: Resolução CFC nº 803/96, de Fonte: Guia IOB de Contabilidade
10-10-1996 (2002)

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8. Considerações Finais:

A contabilidade, como uma ciência social, deve preocupar-se com os


princípios de justiça e decência, procurando sempre uma finalidade social
superior nos serviços que executa: logo, o contador deve ter a consciência de seu
papel, o qual não se restringe exclusivamente ao registro de fatos contábeis e
documentos que atendam a exigências fiscais e legais. Para que isso aconteça é
necessário que o contabilista desempenhe suas funções com atitudes que
valorizem a classe, ou seja, com ética.
O progresso e a valorização social do profissional da Contabilidade só
acontecerá quando estes assumirem com competência a capacidade técnica e o
comportamento ético. O profissional contábil deve tratar com dignidade e zelo os
colegas, clientes e todos os interessados nos resultados da contabilidade,
demonstrando, assim, que de acordo com seus princípios e valores éticos, as
informações por eles prestadas podem ser consideradas fidedignas, transparentes
e confiáveis.
A Contabilidade Criativa é utilizada para descrever uma metodologia
mediante a qual a figura do Contador é profundamente alterada, na medida em
que, utilizando a sua formação de base e o domínio detalhado dos demonstrativos
e dados contábeis, procura “manipular” a imagem destes, transmitindo uma
imagem deturpada da verdadeira situação econômico-financeira da empresa.
Sendo assim, este artigo apresentou os resultados obtidos com a pesquisa,
alertando para a necessidade de reforço nas regras de conduta do profissional de
Contabilidade, bem como na correta interpretação dos princípios e normas da
contabilidade, já que ela dirige-se para uma flexibilização cada vez maior,
alegando-se causas ou motivos de questionável aceitação do ponto de vista da
ético-profissional, e da fidedigna apresentação das informações contábeis aos
usuários externos.

9. REFERÊNCIAS

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