Você está na página 1de 15

25

Capítulo 2

Conceitos Básicos de Jogos

Neste capítulo serão apresentados, de maneira resumida, alguns tópicos importantes antes de
iniciar-se no desenvolvimento de jogos eletrônicos. Esses tópicos tratam da parte anterior à
programação de um jogo, que merecem ser pensadas e descritas antes de iniciar-se qualquer
desenvolvimento.

Primeiramente, será apresentada uma visão geral das empresas de jogos, abordando
processos e ciclo de desenvolvimento. Em seguida, será discutido um pouco sobre a espe-
cificação de jogo, que é mais conhecida como game design.

2.1 Visão Geral das Empresas de Jogos


Quando se fala em empresas de desenvolvimento de jogos, logo se pensa em um ambiente de
trabalho desorganizado, em que cada um trabalha da maneira que bem entende. Geralmente,
o negócio de desenvolvimento de jogos não é levado a sério pelas pessoas em geral e, muitas
vezes, nem mesmo pelos próprios desenvolvedores. Normalmente, a imagem que se tem é
de um grupo de programadores enfurnados em um ambiente por horas a fio programando
enlouquecidamente “a última tecnologia” sem planejamento ou objetivos claros, apenas com
a idéia de que “quando estiver pronto será um sucesso”.

Este modelo foi verdadeiro e funcionou bem por algum tempo para algumas empresas,
mas à medida que a indústria começou a se profissionalizar, esse paradigma teve que ser
quebrado. Os publicadores (conhecidos em inglês como publishers) de jogos, que normal-
mente são os financiadores dos projetos, começaram a exigir prazos rigorosos e orçamentos
limitados. A competitividade aumentou e os times mais organizados e competentes come-
çaram a se destacar.

2.1.1 Dicas para Iniciantes


Diante disso, caso deseje montar uma empresa de desenvolvimento de jogos, recomendamos
que antes de pensar em qual jogo criar, pense em termos de negócio. Reflita que pode estar
montando um empreendimento que irá prover seu sustento. Se possuir uma formação muito
técnica (como informática ou engenharia), procure cursos rápidos de empreendedorismo,
26 Desenvolvimento de Jogos Eletrônicos

de gerência de equipes, de marketing ou de vendas. Diversas universidades ou escolas de


negócio oferecem-nos pelo Brasil inteiro. Ou, o que pode ser melhor ainda, junte-se com
algum profissional que venha dessas áreas. Essa escolha ajudará cada um a manter o seu foco
e fazer o que melhor sabe. Por exemplo, caso tenha que se preocupar com linhas de código
e vendas ao mesmo tempo, passará por alguns apuros.

Lembre-se de que uma empresa de jogos é como qualquer outra: tem área de planejamento,
gerenciamento de projetos, produção, marketing, vendas, financeiro etc. É claro que, como
sua empresa começará pequena, algumas pessoas terão responsabilidades acumuladas, o
que já ajudará a manter a empresa organizada, até mesmo para cobrar tarefas. Quem será
o responsável financeiro? Sim, empresas de jogos também pagam impostos, funcionários,
aluguel e telefone!

A empresa deve ter uma forma organizada de produção dos jogos. Defina postos de tra-
balho específicos para cada pessoa, em cada projeto. Lembre-se de que o material humano é
o conhecimento de sua empresa, ou seja, é essencial. Trate as pessoas como o seu principal
recurso.

Outra dica importantíssima é planejamento. Se tem uma idéia de jogo, coloque-a no papel.
Discuta com seus colaboradores. Pense nos mínimos detalhes. Essa é a pedra fundamental do
Game Design (veja mais sobre esse assunto na seção 2.3). Depois de ter essa etapa pronta,
poderá organizar o projeto para a produção. Um gerente de projetos deve ser capaz de definir
metas específicas e mensuráveis que devem ser monitoradas ao longo do desenvolvimento
para que o projeto termine no prazo estipulado.

As empresas de desenvolvimento de jogos são empresas como outras quaisquer. Precisam


ter uma estrutura de trabalho que permita o cumprimento de metas e um trabalho em equipe
que aumente tanto a produtividade como a eficácia e que reduza custos.

2.1.2 Organização da Equipe


Atualmente, os jogos computadorizados são criados como grandes produções de cinema,
com orçamentos que facilmente chegam a milhões de dólares. Para criar e desenvolver um
jogo de última geração que faça sucesso no mercado atual, levam-se, em média, três anos
com uma equipe que pode variar de 20 a 50 pessoas, ou mais. No caso da Nology, que de-
senvolve jogos casuais, o ciclo de produção leva em torno de dois a quatro meses, com uma
equipe de seis a sete pessoas.

Para produzir um jogo, é necessária uma equipe qualificada e multidisciplinar. Na maio-


ria das empresas, incluindo a Nology, podemos encontrar pessoas com os perfis descritos
a seguir:

• Programadores: encarregados de desenvolver o software do jogo. Geralmente oriundos


da Informática ou Ciência da Computação, os programadores implementam técnicas
de computação gráfica, inteligência artificial, interação, efeitos sonoros etc. para im-
plementar o jogo.

• Artistas: responsáveis pelo layout do jogo, criam os objetos, personagens, texturas,


ilustrações, animações etc.
Capítulo 2 • Conceitos Básicos de Jogos 27

• Projetistas de níveis/fases: oriundos das mais variadas áreas, os projetistas de níveis


são aqueles que elaboram as fases dos jogos estruturando seus desafios e surpresas.
Dependendo do tamanho da empresa, um projetista de níveis pode ser responsável
apenas pela fase de design ou atuar em todas as etapas, desde a concepção até a im-
plementação.

• Projetistas de jogos: mais conhecidos como Game Designers, os projetistas são funda-
mentais durante a construção dos projetos, por terem envolvimento em quase todas as
áreas da produção de jogos computadorizados. São eles os responsáveis pela criação
das idéias para a concepção do jogo e pela elaboração do design document, um do-
cumento detalhado contendo as características e especificações do jogo. Tendo uma
visão ampla de todo o jogo, os projetistas precisam manter comunicação constante
com todos os membros da equipe de produção para garantir que o jogo desenvolvido
esteja alinhado com a proposta do design document.

• Planejador de software (Software Planner): a tarefa do planejador de software é dividir


o projeto do jogo (elaborado pelo game designer) em um conjunto de requisitos téc-
nicos e estimar o tempo e esforço necessário para implementar tais características.

• Arquiteto-chefe (Lead Architect): a tarefa do Lead Architect é trabalhar em conjunto


com o Software Planner para produzir um conjunto de especificações de módulos,
baseados nos requisitos técnicos identificados pelo Software Planner. O Lead Architect
é o responsável pela arquitetura geral do projeto. Na Nology, não dispomos desse
profissional, pois os programadores reúnem-se para definir a arquitetura e o modelo
de objetos do jogo a ser desenvolvido.

• Gerente de projeto (Project Manager): a tarefa do Project Manager é balancear a carga


de trabalho gerada pelo Software Planner e pelo Lead Architect produzindo um pla-
nejamento eficiente e organizado. Ele deve ser responsável por criar um cronograma
de desenvolvimento, monitorando, cobrando e adaptando as tarefas de cada membro
da equipe ao longo do desenvolvimento. O gerente de projetos, se possível, não deve
estar envolvido na parte operacional do desenvolvimento, para que tenha uma visão
ampla e global da situação. Podemos ilustrar os problemas decorrentes do acúmulo
dessas duas funções da seguinte forma: imagine um homem que tem de gerenciar a
obra de uma casa e, ao mesmo tempo, tem de levantar os pilares mais importantes
dela... Qual tarefa ele irá priorizar?

• Músicos e sonoplastas: geralmente vindos de áreas relacionadas à arte e à música, são


os responsáveis por compor trilhas sonoras, vozes e efeitos especiais para os jogos.

• Testadores: geralmente surgindo nas fases finais do projeto, os testadores, como o


próprio nome diz, são incumbidos de testar o jogo, procurando falhas e possíveis
erros (bugs). Normalmente, os testadores entram no processo de desenvolvimento
quando o jogo está quase em sua versão final (fase da produção conhecida na indús-
tria como Beta Testing). Sugerimos que utilize como testadores pessoas que nunca
jogaram o jogo. A equipe que está desenvolvendo o jogo normalmente está “viciada”
nos procedimentos do jogo e não percebe erros importantes.
28 Desenvolvimento de Jogos Eletrônicos

2.2 Ciclo de Desenvolvimento


Neste tópico, iremos discutir um formato de ciclo de desenvolvimento de um jogo. Esse não
é o único meio de realizar essa tarefa, mas é a forma que vem sendo utilizada e aprimorada
pela Nology ao longo dos diversos projetos desenvolvidos.

Tudo começa com uma reunião criativa em que as idéias de jogos são expostas e discu-
tidas por todos. Cada idéia é discutida abrangendo originalidade, inovação, público-alvo,
plataforma e possibilidades de mercado. Este último é o mais importante, a não ser que esteja
pensando em distribuir seu jogo gratuitamente. Essa fase raramente é resolvida em apenas
uma reunião. Às vezes, são necessárias diversas reuniões para se estabelecer um projeto em
que realmente seja interessante investir. Após os processos de reunião criativa, já se tem o
projeto que deve ser desenvolvido. Inicia-se, então, o processo de game design.

O game design é o processo onde são descritas as características principais do jogo como
jogabilidade (palavra que vem da expressão inglesa gameplay), controles, interfaces, per-
sonagens, armas, golpes, inimigos, fases e todos os aspectos gerais do projeto. Durante essa
fase, é elaborado o design document, um documento que descreve as características citadas
anteriormente em detalhes. O design document funciona como um roteiro de cinema. Com
base nessas informações, os artistas irão criar o visual e os programadores desenvolver a
interatividade do produto.

Durante a fase de game design, os artistas começam a trabalhar na concepção de per-


sonagens e na identidade visual do jogo. Também nessa fase, os programadores fazem a
modelagem do software e implementam a estrutura básica de classes do produto (caso
utilizem orientação a objetos, que recomendamos por ser mais simples e organizado de
implementar e manter).

Com o design document pronto, o gerente de projeto já pode ter noção do tamanho
do produto e de quanto tempo será necessário para concluí-lo. Então os diretores de arte
e programação definem as metas para suas equipes e passam os cronogramas específicos
para o gerente de projeto, que organizará o cronograma geral com as metas específicas para
a equipe e para cada indivíduo. É importante que toda a equipe esteja comprometida com
o cumprimento dos cronogramas e que o gerente de projeto tenha autonomia para cobrar
as metas de cada um.

Em projetos pequenos (como jogos de puzzle, por exemplo), apenas o design document
é suficiente para que programadores e artistas comecem a trabalhar no desenvolvimento do
projeto. Em projetos maiores com muitas fases e missões, é necessário que cada fase possua
um planejamento específico para que programadores e artistas tenham a clara noção de como
irão trabalhar para a realização do que foi planejado.

O level design é um mapa geral com os desafios e missões que o jogador deve cumprir
para vencer a fase. Este documento serve como referência para que os artistas trabalhem na
criação dos cenários e do visual de cada fase. Enquanto o level design está sendo desenvol-
vido, os artistas e programadores trabalham em características mais gerais do projeto que não
são específicas a cada fase. Com o level design concluído, já podem dedicar-se à produção
das fases.
Capítulo 2 • Conceitos Básicos de Jogos 29

Cada empresa, de acordo com o tamanho do projeto e suas próprias preferências, define
metas para versões intermediárias do produto. As versões intermediárias podem ser gera-
das a cada semana ou mês e permitem que o gerente de projeto acompanhe a evolução do
produto em termos gerais e possa cobrar as metas de cada um. Essas versões intermediárias
também possibilitam detectar bugs que surgem durante o desenvolvimento. Esses bugs são
corrigidos para a próxima versão, o que acaba por aumentar a estabilidade do produto até
a versão final.

Assim, o produto evolui de versão em versão até atingir a versão Beta. A versão Beta já
contém todas as fases do jogo e toda a interatividade. Quando essa versão é concluída, inicia-se
o ciclo de testes para detecção de bugs e coleta de sugestões que podem melhorar o produto
(Beta Testing). O ciclo de testes gera refinamentos tanto na programação quanto na arte do
jogo para que este se torne um produto mais atrativo ao consumidor. Esses refinamentos
continuam a conclusão da versão Gold, que é o produto final.

2.3 Projeto do Jogo ou Game Design


Antes de iniciar o desenvolvimento de um jogo, é necessário que o projeto dele esteja muito
bem definido. Mas afinal, o que é game design? Existem várias definições, mas, em geral, é
o que determina a jogabilidade, as escolhas que o jogador terá dentro do mundo do jogo e
as ramificações que suas escolhas vão ter no resto do jogo. Inclui o que faz o jogador vencer
ou perder, como ele vai controlar o jogo, as informações que o jogador deverá receber. Em
resumo, o game design descreve cada detalhe de como funcionará a jogabilidade.

Os próximos tópicos que se estendem até o final desta parte do livro tratarão essencial-
mente de conceitos de game design. Lembre-se de que este conteúdo é apenas um resumo
desta área de conhecimento que é extremamente importante no mundo atual dos jogos.
Caso deseje aprofundar-se nesse assunto, não hesite em procurar outras bibliografias. Há
verdadeiras enciclopédias tratando desse tema de forma mais aprofundada.

2.3.1 Idéia
O desenvolvimento de uma idéia de jogo geralmente surge de um pequeno conceito, que
deve ser expandido com técnicas de brainstorm. Muitas vezes bons conceitos de jogos sur-
gem de pensamentos que em um primeiro momento pareceriam ridículos. Por esse motivo,
deve-se cuidar para não eliminar a idéia enquanto estiver pouco madura. Afinal, como um
bombeiro poderia tornar-se herói em um mundo com tartarugas e cogumelos que andam?
Se observar o bem-sucedido Mario, poderá obter algumas respostas.

Questões do tipo “Qual o objetivo do jogo?”, “O que o jogador terá de fazer?”, “Como ele
vai fazer?”, “O que tornará este jogo divertido?” etc. podem facilitar o processo de desenvol-
vimento de idéias para o seu jogo.
30 Desenvolvimento de Jogos Eletrônicos

2.3.2 Rascunhos do Jogo


Criar desenhos (rascunhos) que mostrem algumas fases, personagens e itens com pequenas
descrições para cada um. Faça alguns rascunhos das telas do jogo, menus, fluxo de telas etc.
Nesta fase é interessante realizar alguns testes de jogabilidade (gameplay), o que pode ser feito
sem escrever uma única linha de código, dependendo do jogo, é claro. Um jogo de puzzle
(ex.: Tetris) é possível ser jogado apenas com alguns pedaços de papel que representam as
peças do jogo.

A figura 2.1 demonstra o projeto de uma fase de um jogo com alguns itens de interface. O
processo de rascunhos do projeto em papel é muito vantajoso, pois por meio deles pode-se
visualizar melhor como será o produto final. E essa visualização permite fazer alterações sem
gandes impactos no desenvolvimento.

Figura 2.1 – Rascunho de fase e interface.

As figuras 2.2 e 2.3 reforçam a importância dessa etapa do projeto do jogo, visto que ilus-
tram um cenário do jogo Koko Arena, desenvolvido pela Nology, na sua fase de concepção
e, depois, finalizado. Torna-se bem mais fácil projetar o jogo tendo os esboços feitos antes
de inicir realmente o desenvolvimento del.
Capítulo 2 • Conceitos Básicos de Jogos 31

Figura 2.2 – Esboço de cenário.

Figura 2.3 – Cenário colorizado e finalizado.


32 Desenvolvimento de Jogos Eletrônicos

2.3.3 Detalhamento do Jogo


Neste momento o jogo torna-se mais detalhado e complexo. É necessário pensar em cada
detalhe importante e escrever algo a esse respeito. Lembre-se de que ao fazer um jogo, você
é “soberano”, ou seja, se não programar para que um detalhe aconteça, ele simplesmente
não acontecerá. E vice-versa.

A seguir, algumas perguntas fundamentais para detalhar o seu jogo:

• O que o jogador fará no jogo? Ele anda, voa ou nada? Como e quando ele realiza cada
uma dessas ações? Qual a personalidade do personagem principal (jogador)?

• Quantos inimigos o herói vai enfrentar? Como eles são?

• Quais as armas disponíveis que o jogador terá para enfrentá-los?

• Como será o sistema de vida do jogador? Começará com quantas vidas? Terá energia?
Terá como recuperar energia ou ganhar novas vidas?

• Qual o objetivo do jogo? Quantas fases o jogador terá que passar para alcançar o ob-
jetivo final? Como será cada uma das fases (cenário, inimigos, dificuldade, objetivo
etc.)?

• Quantos jogadores poderão jogar o jogo? Um único jogador (singleplayer), dois ou


mais jogadores em turnos (turnbased) ou vários jogadores (multiplayer)?

• Qual o tipo de visualização gráfica? Será 2D (Sonic), 3D (Mario Sunshine ou Grand Thief
Auto 3), isométrico (Diablo), primeira pessoa (Doom III), terceira pessoa (Mario)?

• Qual o tipo de trilha sonora do jogo (rock, clássico etc.)?

Pode-se observar que as perguntas anteriores se aplicam a um jogo de ação ou aventura.


Mas, se for um jogo de puzzle? Neste caso, somente algumas dessas perguntas se aplicam.
Será necessário abordar detalhes que não foram previstos nos itens anteriores, como, por
exemplo: como será o tabuleiro do jogo? Como serão as peças? Como elas aparecerão no
jogo? Como será a interação do jogador para vencer os desafios do jogo?

2.3.4 Game Design Document


O próximo passo é juntar todos os conceitos citados anteriormente em um grande documento,
conhecido na indústria como design document (DD), ou documento de projeto do jogo. O
DD é como um script de um filme, que informa todos os detalhes do jogo.

Escrever um DD é extremamente trabalhoso e exaustivo, pois se deve detalhar tudo que


ocorrerá no jogo. Todavia, é muito útil para repensar decisões já tomadas, validar alguns
conceitos, suprimir algumas regras e adicionar outras. Você poderá até mesmo testar algumas
idéias economizando tempo precioso para o projeto. Durante a escrita do DD, poderá visua-
lizar com antecedência o jogo. O universo deve ser coerente, para que o jogador realmente
entre no mundo que você estará propondo.
Capítulo 2 • Conceitos Básicos de Jogos 33

A figura 2.4 mostra um exemplo de projeto do jogo JoKenPo, que foi desenvolvido pela
Nology e trata-se de uma brincadeira com a trinca pedra-tesoura-papel. A figura ilustra um
efeito de transformação dos personagens do jogo. A parte superior da figura exibe o storyboard
– seqüência narrativa feita por meio de desenhos –da situação e a inferior, o efeito final.

Figura 2.4 – Transformação no jogo JoKenPo.

Esse documento é muitas vezes requerido pelos publicadores de jogos para analisar um
jogo demonstrativo (mais conhecido como “jogo demo”). Assim, eles podem ter uma visão
mais precisa de como será o produto final. Geralmente também constam nesse documento
o cronograma, as metas e o orçamento para o desenvolvimento do produto.

A seguir, alguns itens que podem ser abordados e detalhados em um documento de


descrição, ou game design document, de seu jogo:

• Conceito: nome do jogo; apresentação resumida do jogo; público-alvo; estilo de jogo;


história; principais regras do jogo.

• Especificações técnicas: hardware; sistema operacional; hardware mínimo; requeri-


mentos de software; gráficos.

• Especificações do jogo: número de fases; níveis de dificuldade; vidas; descrição dos


tipos ou modos de jogo; sistema de pontuação; sistema de ranking (ou high scores);
opções de configuração; número de jogadores; recursos de carga e gravação (load e
save); sistema de câmera; personagens; itens de jogo; itens de cenário; tabela de itens;
evolução de fases; tabela de mensagens.

• Dispositivos de entrada: suporte para mouse; dispositivos de entrada para os menus;


dispositivos de entrada de jogo; definição de teclas e botões.

• Design gráfico e arte: abertura; descrição de layout de menus e telas; descrição de


layout do jogo na fase; definição de fases; definição do final do jogo.
34 Desenvolvimento de Jogos Eletrônicos

• Sonorização: definição das músicas nos menus; definição das músicas nas fases; de-
finição dos efeitos sonoros de menu e outros; definição dos efeitos sonoros de jogo
(nas fases).

• Desenvolvimento: tempo de desenvolvimento; alocação de pessoal; metas.

2.4 Regras Básicas para um Bom Jogo


Não pense que bons gráficos e sons são o suficiente para um jogo. Muitos deles têm esses
recursos e não vendem bem.

“Nós precisamos de gráficos. Nós precisamos de uma boa interface, limpeza visual para as
informações que constarão no jogo, e de gráficos que façam isso. Mas, quando um projetista
de jogo (game designer) é questionado como o jogo dele fará a diferença, espero que ele
fale de jogabilidade (gameplay), diversão e criatividade – em oposição a uma idéia de que
simplesmente foca em como ele é bom visualmente”. Sid Meyer, criador do Civilization (Edge
Magazine, setembro de 1997)

Outros jogos não vendem bem por falta de marketing do produto (um jogo não se vende
sozinho) ou simplesmente porque não agradaram ao público. Conhecer o perfil do jogador é
muito importante. Por exemplo, jogos para jogadores menos adictos (como jogos de cartas)
oferecem diversão com complexidade diferente daqueles destinados ao público aficionado
(como jogadores de videogame).

O segredo é um bom game design e, acima de tudo, o jogo tem de ser consistente e di-
vertido. A seguir há algumas regras básicas para criar um bom jogo:

• Comece com uma boa idéia e uma boa história: pense no jogo, faça brainstorms com
base nele, crie-o com coerência e lógica, seja criativo. Mostre sua idéia a alguns joga-
dores e veja o que pensam a respeito dela. Não desanime com as críticas feitas ao seu
jogo: lembre-se de que todo mundo é crítico. O objetivo é coletar novas idéias e visões
de jogadores, que você poderá aplicar ao seu jogo, caso considere necessário. O best
seller The Sims (Figura 2.5) foi duramente criticado nos testes de grupo focal – técnica
de avaliação que oferece informações qualitativas sobre uma idéia ou produto, aos
quais foi submetido em 1996 (quando o jogo era apenas uma idéia). Posteriormente,
seu criador Will Wright não conseguiu fazer com que sua empresa acreditasse no pro-
duto. Porém, com muito esforço, convenceu um programador da empresa a trabalhar
com ele, em segundo plano, para criar toda a simulação de comportamento humano
utilizada hoje no jogo. A partir daí, a Maxis e a Eletronic Arts (EA) passaram a acreditar
no produto, e Wright conseguiu montar sua equipe para o desenvolvimento. The Sims
foi um jogo que marcu época e bateu recordes de vendas para o PC.
Capítulo 2 • Conceitos Básicos de Jogos 35

Figura 2.5 – The Sims quebrou recordes de vendas.

• Escreva o design no papel: ponha no papel a idéia, elementos, regras, alguns desenhos,
fluxos do jogo, storyboards etc. Depois disso, você perceberá se o jogo é bom, ruim,
se pode ser melhorado, se é viável ou não. Muitos dos jogos simplesmente não saem
do papel. Por isso, planeje o seu jogo. O Zelda, The Wind Waker, para o videogame
GameCube, ficou três anos sendo planejado e oito meses sendo desenvolvido(Figura
2.6). O resultado é um jogo fantástico.

Figura 2.6 – Zelda, the Wind Waker.


36 Desenvolvimento de Jogos Eletrônicos

• Comece pequeno: não tente criar o que você não conhece, ou nem sabe se é capaz
de fazer. Como planejar o que você nunca fez antes? Opte sempre pelo simples, do
contrário você nunca acabará o trabalho. Muitas empresas entram em falência no meio
de projetos que apresentaram muitos problemas de concepção e desenvolvimento,
por serem muito audaciosos. Este livro baseia-se neste conselho, visto que você terá
que construir um jogo que, se bem seguido, será finalizado.

• Cuidar do público: desenhe seu jogo para entreter as pessoas que você sabe que irão
jogá-lo. Faça o seu jogo encantá-las, invocar as emoções delas. Só não tente agradar
a todos (você não vai conseguir), e, sim, o seu público.

• Use uma nova idéia: tente desenvolver uma idéia única e criativa. Inspire-se em outros
jogos, mas não os copie por inteiro. Adicione seus ingredientes pessoais. Acostume-se
a ter idéias, mesmo que em um primeiro momento pareçam ridículas: delas podem
surgir grandes jogos.

• Seja flexível: quando você está concebendo um jogo, pode se dar conta de que ele
não funcionará da maneira que deseja. Seu sistema gráfico atual não o suporta ou você
não terá tempo ou dinheiro suficiente para implementá-lo. Seja flexível para adaptar
seu jogo à sua realidade. Ou não o faça, deixe-o para mais tarde.

• Projete seu jogo para o futuro: pense em que tipos de tecnologia estarão disponíveis
quando finalizar seu jogo. Não adianta inserir nele recursos que ninguém terá acesso
(por exemplo, uma placa de vídeo YKW2400 com um preço elevadíssimo). Faça seu
jogo funcionar nas plataformas que serão padrão de mercado quando o jogo for lan-
çado.

• Pense em séries, seqüências e expansões: guarde algumas boas idéias para seqüên-
cias. Pense em outras versões de seu jogo. Você poderá reutilizar muito código e arte
se fizer isso. Arquitete o jogo, se o projeto permitir, para suportar expansões futuras.
The Sims (Figura 2.5) utilizou esse modelo de negócios muito bem, incrementando
as vendas por mais de três anos.

• Conteúdo é tudo: ofereça bons gráficos, sons, jogabilidade, ou seja, conteúdo! Tenha
certeza de que seu jogo é divertido. Duke Nukem, que pode ser visto na figura 2.7, é
puro conteúdo. Os designers deixaram o jogo simplesmente muito divertido. Foi o
primeiro jogo em que se podia vivenciar situações inusitadas, como ir ao banheiro e
matar um inimigo que ali estivesse. Sem falar nas falas do Duke, que deixavam o jogo
realmente engraçado.

• Dê objetivo ao jogador: jogos sem objetivos são odiáveis. Dê sentido ao jogo, para
que o jogador sinta que está indo para algum lugar. Se ele não está progredindo, qual
o sentido? E sempre premie o jogador por algum objetivo cumprido. Uma novafase,
um efeito gráfico ou um pedaço de história.
Capítulo 2 • Conceitos Básicos de Jogos 37

Figura 2.7 – Duke Nukem é pura diversão!

2.5 O que os Jogadores Querem


“... A idéia é não fazer algo somente porque vende, mas por amar isso, e fazer algo que nós,
criadores, possamos amar. Esse é o principal sentimento que temos de ter para criar jogos”.
Shigeru Miyamoto, Game designer da Nintendo, criador de Mario, Donkey Kong, Zelda e outros
sucessos da empresa.

Confira, a seguir, uma lista com o que os jogadores realmente querem e de que gostam
em um jogo:

• Desafio: é a verdadeira motivação de um jogo. Os desafios sempre servem como


experiência de aprendizado e geram emoção ao serem superados.

• Socializar: jogos em geral (não só videogames, mas jogos de tabuleiros ou cartas)


provocam uma experiência social com amigos ou família. Videogames oferecem
singleplayer e multiplayer e ambos são sociáveis. Quantos já não se reuniram em casa
de amigos ou familiares para passar horas se divertindo com jogos?

• Experiência solitária: embora se oponha ao item anterior, jogadores também gostam


de jogar sozinhos ou quando estão desacompanhados, apenas para passar o tempo.
É como ler um bom livro.

• Respeito: jogadores gostam de ganhar e obter, com isso, respeito. Quando estão entre
os melhores do ranking de um jogo, sentem-se orgulhosos. Esses fatores criam disputas
acirradas em torno dos jogos.
38 Desenvolvimento de Jogos Eletrônicos

• Experiência emocional: todos procuram sempre um tipo de emoção. Adrenalina e


tensão no Quake. Suspense e medo no 7th Guest. Heroísmo em um jogo de aventura
como Mario ou Sonic, que tem de salvar o mundo dos vilões.

• Fantasia: jogadores querem escapar para uma realidade ou mundo diferente do nosso.
O jogador poderá voar, atirar, mergulhar, salvar pessoas, matar alienígenas. Poderá
praticar ações proibidas em nosso mundo, como no Grand Theft Auto, em que se pode
ser um ladrão de carro e assassino. Quem não gostaria de ser um Homem-Aranha ou
Batman e combater o crime? Ou comandar a melhor seleção de futebol do mundo ou
seu time do coração em um campeonato?

2.6 O que os Jogadores Esperam


• Mundo consistente: o mundo do jogo deve ser consistente o bastante para que o
jogador entenda os resultados de suas ações. Em um jogo de luta, quando o jogador
erra um golpe, deve ser porque o inimigo bloqueou, pulou ou estava muito longe ou
por algum outro motivo que o jogador entenda.

• Entender os limites do mundo: o que o jogador pode e não pode fazer. Exemplo: no
Doom, o jogador deve perceber que não irá bater-papo com os monstros: “Por favor,
você pode se render?”. Não insira mecanismos novos no jogo que quebrem as regras
desse mundo em questão.

• Direção: sempre mostre direção ao jogador. Dê-lhe dicas para que ele saiba aonde
deve chegar. Dê objetivos, mas não o caminho: isso é tarefa do jogador. Só não o deixe
perdido, fazendo perguntas do tipo: “O que tenho de fazer agora?”. O SimCity, por
exemplo, não é classificado como um jogo, e, sim, como um software de brinquedo.
O jogador coloca seus objetivos e corre atrás deles: “Eu quero a maior cidade” ou “Eu
quero a menor criminalidade e a menor poluição”.

• Cumprir tarefas progressivamente: faz-se isso dando subobjetivos ao jogador. Gratifique


o jogador enquanto ele caminha para um objetivo maior.

• Imersão: faça o jogador entrar em seu mundo, em todos os sentidos. Quem não é
capaz de lembrar-se do Super Mario Bros (Figura 2.8) apenas escutando sua música
ou vendo aqueles canos verdes?

• Falha: faça o jogador fracassar algumas vezes. Usualmente, eles não jogam quando o
jogo é fácil demais. Faça-o falhar, mas não exagere, pois pode tornar o jogo tão difícil
a ponto de ele abandoná-lo. O jogo deve começar fácil, para que o jogador sinta-se
confiante e à vontade. Depois, aumente a dificuldade aos poucos.

• Não gostam de repetição: não ofereça desafios iguais ao jogador. A repetição torna o
jogo desagradável e cansativo. Não o faça voltar ao início do jogo só porque ele falhou
em um ponto muito adiante. Ou ofereça opção de salvar o jogo.

• Não o deixe trancado: não coloque um buraco em uma fase que impeça o jogador
de sair. Não tranque o jogo na fase 35 porque ele nãopegou uma chave na fase 8. É
extremamente frustrante.
Capítulo 2 • Conceitos Básicos de Jogos 39

Figura 2.8 – Super Mario Bros.

• Querem fazer e não ver: não insira cutscenes (técnica utilizada para contar a história
do jogo, como, por exemplo, um filme) longos, visto que tal ação tira a interatividade
do jogo e irrita o jogador. Se jogo fosse só para ver, seria melhor ver um filme. Se os
cutscenes forem muito necessários, pelo menos permita que o jogador cancele sua
execução. Deixe sempre o jogador no controle de seu jogo. Deixe-o interagir o máximo
possível, pois a interatividade e a jogabilidade são o coração e a alma de um software
de entretenimento.

2.7 Puzzles
O uso de puzzles é uma técnica quase que obrigatória nos jogos. Porém, seu uso deve ser
balanceado, para não torná-lo entediante. Deve-se colocá-los quando forem necessários e
tiverem sentido dentro do jogo. Não há coerência em o jogador resolver uma equação ma-
temática em um jogo de ação.

Myst é um grande puzzle, bem como Indiana Jones and the Fate of Atlantis. Já em jogos
como Duke Nukem, Doom e Quake, os puzzles estão presentes na forma de interruptores
que abrem portas, caminhos ou seqüências escondidas, ou certos equipamentos que só
podem ser usados em determinadas situações. O bom desses puzzles é que estão inseridos
tão claramente que o jogador não percebe que está resolvendo-os.

Quando conceber seu jogo, crie puzzles nos quais o jogador tenha que pensar um pou-
co, que não são óbvios. Um bom exemplo é o jogo Doom III, onde existem portas de cores
determinadas trancadas e o jogador deve encontrar a chave correspondente para abri-la.

Você também pode gostar