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Como Eles Chegaram Lá - José Roberto Whitaker
Como Eles Chegaram Lá - José Roberto Whitaker
1
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Editora Campus.
3
© 1999, Editora Campus Ltda.
Capa
Visiva Comunicação e Design
Editoração Eletrônica
Futura
Copidesque
Paulo Guanaes
Revisão Gráfica
Ana Paula Lessa
Edite Rocha
Projeto Gráfico
Editora Campus Ltda.
A Qualidade da Informação
Rua Sete de Setembro, 111 16o andar
20050-002 Rio de Janeiro RJ Brasil
Telefone: (021) 509-5340 FAX (021) 507-1991
E-mail: info@campus.com.br
ISBN 85-352-0522-5
CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte.
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ
ISBN 85-352-0522-5
99 00 01 02 5 4 3 2 1
4
Aos dez co-autores deste livro.
Pelo que me ensinaram.
5
6
Sumário
Apresentação 9
As receitas de sucesso 15
O marketing pessoal 19
Aquele momento 23
As entrevistas 27
João De Simoni
Do interior para a metrópole 29
Armando Ferrentini
O realizador 63
Carlos Salles
Funcionário público numa multinacional 76
Roberto Duailibi
Antes de se tornar o D da DPZ 92
Marcos Magalhães
Um engenheiro no topo 111
Nizan Guanaes
Publicitário com jeito de padeiro 128
7
Francisco Gracioso
Da empresa à escola 144
8
Apresentação
JRWP
Rio, novembro de 1999
13
AS RECEITAS DE SUCESSO
26
AS ENTREVISTAS
Adoro as pessoas.
Mas não pelas suas semelhanças, e sim pelas diferenças.
Apollinaire
27
28
João De Simoni
Do interior para a metrópole
36
De Simoni: Na empresa de promoção, 70% do nosso custo é
gente. Na empresa de feiras e exposições, os custos maiores são
de materiais, você trabalha com muita madeira, iluminação.
JR: Seus clientes são exclusivos, como nas agências de propaganda?
JR: E os números?
39
Tem que ser valorizada a empresa
voltada mais para o mercado
do que para o seu próprio umbigo.
JR: Por quê?
JR: Você acha que existe algum lugar para os nossos alunos na
administração pública?
44
A primeira coisa é não procurar
estágio, e sim emprego.
45
De Simoni: Sempre foi o meu produto a ser vendido. Acho, até,
que exagerei.
46
Christina Carvalho Pinto
Estrela da propaganda
JR: Que bom saber que você também é uma filha de Lobato.
CCP: Não, só eu. Dos meus quatro irmãos o mais velho é fale-
cido todos foram advogados. Um deles é juiz de direito, outro
é um dos grandes criminalistas do país. Minha irmã é cientista
pura, doutora em estatística por Oxford. A única que abraçou
uma carreira um pouco mais lúdica fui eu. Dos quatro advoga-
dos, tem um que também fez filosofia pura, mas depois acabou
indo para a advocacia.
JR: Publicou?
CCP: Todas as fases da minha vida têm servido como uma impres-
sionante escola, inclusive a deste momento. A CBBA era, sim, uma 51
grande escola. Foi lá que eu vi, pela primeira vez, uma mulher pre-
sidente de agência. Porque o Renato passou a presidente do conse-
lho, e a presidente executiva era a Hilda Schutz, uma mulher bri-
lhante e determinada. O Geri Garcia era grande diretor de arte.
Foi, sim, uma grande escola a CBBA. Fiquei quatro anos e meio e
de lá assumi a direção de criação da McCann-Erickson, a convite
do Marcio Moreira, que se preparava para deixar o país, tinha pla-
nos internacionais. Eu fui trabalhar com o Marcio, fiquei dois anos
com ele na McCann. Foi então que, um belo dia, me deu uma
grande crise existencial. Afinal, eu nasci artista, não nasci publicitá-
ria. Nasci escritora, não nasci redatora. Entrei numa crise comple-
ta. Eu queria ficar mais tempo com o meu filho, que tinha dois
anos. Então larguei tudo, no momento em que estava vivendo o
ápice da carreira. Tinha vinte e poucos anos, já tinha uma atuação
ativa no Clube de Criação de São Paulo fui a presidente interina
do clube durante muito tempo. Mas, aí, eu parei tudo e disse:
Não quero mais. Quero completar minha faculdade de música
porque eu tinha deixado uma série de matérias pendentes por falta
de tempo. Quero voltar a estudar piano, quero fazer uma coisa
mais produtiva e desandei a escrever contos de novo. É dessa
época que eu tenho os contos premiados. Fiquei um ano só cui-
dando do meu filho mais velho, João Francisco, escrevendo con-
tos, estudando piano loucamente, completei a faculdade de músi-
ca, fiz todas as matérias pendentes. Um ano depois, não resisti a
um convite e voltei à propaganda, feliz da vida, através da FCB
Siboney. Assumi a direção de criação, naquela época em parceria
com Oscar Coré, diretor de arte, e fiquei quatro anos na FCB.
Foram anos interessantíssimos. A gente era uma agência low profi-
le, recém-formada no Brasil, e nós ganhamos clientes novos,
ganhamos muitos prêmios. Diverti-me muito lá. Aí a CBBA me fez
uma nova proposta, eu voltei à CBBA, fiquei mais dois anos, aí já
como vice-presidente nacional de criação. Em 1986 foi a festa dos
40 anos da Norton e, lendo no jornal sobre a festa, eu li sobre a
história daquela revolução, feita por Neil Ferreira Fontoura, o
Jarbas, o Joaquim Gustavo, se não me engano, a Helga Miethke
grandes profissionais, os subversivos, eu vi a memória dessa fase
52 extremamente agressiva da criatividade, no Brasil...
JR: Mas isso tinha sido nos anos 70...
CCP: Sim, foi muito antes, mas eu li sobre isso e pensei: Que
coisa, a Norton precisava reviver essa audácia criativa. Aí eu
liguei para o José Francisco Queiroz e disse para ele que já fazia
tempo que a Norton não dava um grande escândalo criativo...
Ele falou, é verdade, vou te apresentar ao Geraldo Alonso
Filho. Conversamos meia hora, a empatia foi total e fiquei dois
anos lá como vice-presidente de criação. Foi genial, a Norton foi
a Agência do Ano, ganhamos um monte de prêmios. Mas aí eu
recebi o convite irrecusável para assumir a presidência da buti-
que criativa do Grupo Young & Rubicam no país, a Impact. A
Young no Brasil se chamava Fischer, Justus, Young & Rubicam e a
Impact era uma outra agência. Seis meses depois houve a ruptura
entre a Fischer e a Young, e então eu assumi a presidência da
Young, incorporei a Impact à casa-mãe, e lá fiquei sete anos e
meio pelos quais eu tenho um respeito indescritível. Foi uma
experiência extraordinária. Quando nós chegamos à Young, a
equipe tinha de enfrentar uma agência desfigurada, carente de
clientes, carente de imagem. A imagem da agência era mais de
uma ameba do que de uma empresa. Ao longo desses sete anos,
com uma equipe fabulosa de profissionais, a gente reconstruiu
tudo imagem, faturamento, lucratividade, e isso deu-me a expe-
riência necessária e levou-me à reflexão de criar um novo concei-
to de agência, que eu corporifiquei, aqui, agora, na Full Jazz.
JR: Mas como é que você relaciona tudo isso com as mudanças
drásticas na mídia? Por exemplo, a televisão está se trivializando,
tornando-se menos importante. O cidadão não fica mais horas
diante da telinha, ou então fica, mas com teclado, está interativo.
Ele não vê mais a propaganda como uma coisa mágica, pois vai
ao shopping, que é lindo, e vê os produtos lá. A propaganda dei-
xou de ser uma coisa mágica para ser mais uma das fontes de
informações que a pessoa tem. Diante do que você disse sobre o
publicitário que ele é responsável por prestar um serviço como
é que vê isso diante dessa mídia que está mudando?
CCP: É tão difícil! Tenho três filhos, e não sei quais as profissões
que vão escolher. O mais velho estuda Administração, que é um
tema muito amplo e ele pode querer fazer uma série de coisas
que eu não sei quais serão. Primeiro, eu acredito que o ser huma-
no está se revolucionando e revolucionando o planeta Terra
numa velocidade de tirar o fôlego. O sonho do publicitário não
vai mais ser trabalhar numa famosa agência de propaganda. O
sonho dessa geração vai ter que servir, estimular a iniciativa,
inclusive, empresarial. O número de anunciantes se multiplicou
número, tamanho, características, lugares no país, tudo está se
ampliando de maneira geométrica. É o erro de todos nós, publi-
citário, universidade, ainda não começamos a estimular concreta-
mente o jovem a usar o seu Pó de Pirlimpimpim retornando a
Monteiro Lobato a sua crença, o seu preparo, a sua capacidade
mobilizadora, pessoal, individual e melhor ainda somada
quando se junta com dois ou três colegas, para montar novos
núcleos na área de comunicação, na área de marketing, novas
formas, não sei se serão estudos criativos, propaganda, agências
pela Internet, planejamento, em todas as áreas. Acho que somos
responsáveis, em grande parte, por essa frustração, porque conti-
nuamos sinalizando que o grande sonho é fazer um estágio na
agência A, B ou C. Mas essa é apenas uma das mil hipóteses para
o ano 2000. Por exemplo, eu tive um estagiário na Young que
era talentoso para redação, o Alessandro. Ganhou o prêmio
Caça-Talentos do Clube de Criação. Por alguma razão, ele não
decolou. Isso me angustiava. Pois um belo dia, ele telefonou e
disse: Você sabe que eu estou feliz da vida? Estou morando em
São Sebastião. Montei uma empresa que faz adesivos e eu crio
adesivos que vão desde colagem em prancha de surfe, vitrines...
Ele montou uma empresa, ele cria, ele gerencia, faz atendimen-
to... e está ganhando dinheiro. Fiquei emocionada. Há tantas
maneiras de começar. É preciso ter coragem de acreditar que não
precisa ter um titio ou uma titia para abrir a porta. Muitas vezes
60 eles nem têm mais porta para abrir...
JR: Há menos empregos, mas há muito mais trabalho....
CCP: Eu acredito que a criatividade vai ter que ser usada não só
para fazer anúncio, mas para criar novas oportunidades, e com
isso eles vão pôr todos nós no chinelo, porque vão fazer o novo.
JR: Como é que a gente junta essas duas Christinas: a que ficou
impaciente com o Instituto Superior de Criação Publicitária, que
foi estudar piano, e hoje aparece nos comerciais da escola, dizen-
do façam o Pós-Graduação da ESPM?
63
Armando Ferrentini
O realizador
AF: Sou uma pessoa que nunca está satisfeita com o que acabou
de fazer. Quero sempre realizar, fazer mais e melhor. Tenho uma
grande satisfação em fazer coisas. Por exemplo, hoje, aqui no
Maksoud Plaza onde gravamos esta entrevista, estamos encerran-
do a décima segunda Semana Internacional da Criação
Publicitária. Sinto uma satisfação muito grande ao ver 500 pes-
soas, à noite, ouvindo as palestras. E, de tarde, são também 500
estudantes vendo coisas que nunca imaginaram ver. Sou do tipo
que não fica na teoria, vou em frente, quero fazer e acho que só
tem valor se você fizer. Nenhuma idéia vale nada se não for rea-
lizada.
AF: Somos três: eu, o Nelo, mais velho, e a Silvia. Sou o caçula.
O Nelo é meu sócio na Editora Referência, a Silvia é de prendas
domésticas, casada, já tem netos e bisnetos. À custa de muito
trabalho, nós conseguimos crescer, mas, na nossa concepção, éra-
mos pessoas pobres que moravam num bairro pobre. O Brás era
um bairro em efervescência, era ainda o bairro dos italianos, mas
de lá surgiam grandes nomes para a literatura, para as artes, para
a indústria, muita gente saiu de lá e abriu negócios, enfim, era
um bairro de pessoas inquietas...
JR: O Cícero devia ser importante, pois escrevia nos jornais dos
Diários Associados.
AF: Sim, era a Globo da época. A Globo surgiu em 1965. Ele era
o colunista mais importante desse grupo inicial. O Cícero, depois
eu, depois o Eloy Simões, o Fernando Reis, mas o Cícero era,
sem dúvida, o mais importante.
AF: Criei a coluna, que logo virou uma página. Mas eu queria
uma seção polêmica, não queria uma coluna oba-oba, de agrado,
de release, simplesmente. Eu queria uma coluna polêmica, para
atrair a atenção. Mas esse comportamento tem de ser sempre
dentro de uma linha de raciocínio coerente. Você não pode pro-
vocar polêmica e ao mesmo tempo escrever bobagem. Pois con-
70 segui sucesso, felizmente, e em menos de um ano eu já me torna-
va conhecido. A primeira coluna saiu no dia 21 de maio de
1965. E, na primeira, saiu como Asterístico, assim, errado, e
ninguém corrigiu. Passou por todo mundo. Eu fiquei extrema-
mente abatido com esse erro. Pensei: Puxa, de cara uma coluna
que sai com o nome errado..., mas aí eu me animei. Lembrei
aquele provérbio o que começa errado termina certo. A coluna
logo virou página e, depois, transformou-se num caderno.
Propaganda & Marketing é um veículo vitorioso na classe publi-
citária.
AF: Até hoje a gente discute isso. Eu achava que tinha sido o
Cícero e ele dizia que a idéia foi minha. Mas aí fizemos uma
exposição na Terrazza Martini, cedida pelo Murilo Antunes
Alves, fizemos a premiação e a entrega dos prêmios e abrimos a
exposição. Isso foi em 1965. Mas o que eu queria ressaltar, nessa 71
história, foi a minha preocupação de trazer colaboradores para a
página e depois para o Caderno. Fazer com que a nossa publica-
ção fosse uma coisa plural, que não tivesse apenas uma opinião,
e isso felizmente se mantém até hoje. São opiniões, às vezes,
completamente contrárias às da gente. Houve até colaborações
que nos criticavam, e a gente deixava sair...
76
Carlos Salles
Funcionário público numa multinacional
CS: Devo ser o lado pobre, pois não tenho nenhuma ligação
com eles.
CS: No Rio, fui para o Colégio Santo Inácio, que era uma orga-
nização bio-militar, mas dava aos seus alunos uma formação
muito sólida. Mas o colégio refletia os preconceitos da época e
um deles era que o Santo Inácio só se sentia realizado se seus alu-
nos fossem ser médicos ou engenheiros. Qualquer outra profis-
78 são era um ultraje às tradições do colégio...
JR: E aí você foi ser médico, ou engenheiro?
JR: Nessa questão que você abordou, das relações das empresas
com a imprensa, muitas multinacionais adotam uma postura low
profile.
A microempresa é extremamente
importante no Brasil. Acho que
o país está assimilando isso.
JR: Por que que você acha que a imprensa está defasada?
CS: Pois é, acho que boa parte da mídia ainda tem essa opinião anti-
quada. Se você conversar com as pessoas, vai ver que é outra coisa,
diferente. Outro detalhe é que isso varia de região para região. O
estado do Rio de Janeiro é profundamente comprometido com o
serviço público a maior concentração de funcionários públicos do
país está no Rio e não em Brasília. As grandes estatais estão todas
sediadas no Rio de Janeiro, então esse é um estado que pensa meio
repartição pública. Se você for a São Paulo, Paraná, ou mesmo, hoje
em dia, Minas Gerais, já não se pensa assim. Agora, em Rondônia,
onde mais da metade da população adulta é funcionária pública, aí
todo mundo só vive em termos de repartição.
JR: Vamos falar sobre carreira, ensino. O que você acha do merca-
do de trabalho para quem está estudando administração e comu-
nicação?
Esta lista poderia ser bem mais longa, mas vamos dar um basta
por aqui e partir para a relação dos do nots.
1. Não imagine que você será capaz de projetar por muito tempo uma
imagem diferente daquilo que você realmente é. Seja autêntico.
92
Roberto Duailibi
Antes de se tornar o D da DPZ
RD: Tive a sorte de trabalhar com gente que ajudou a criar o sis-
tema publicitário no Brasil, todos de outras áreas e profissões. Já
existia a Escola de Propaganda, recém-fundada, mas a profissão
não era reconhecida. Trabalhei na McCann, na Thompson, na
CIN e na Standard. Naquele tempo, carregávamos clichês pelas
ruas, atravessávamos a Praça da Sé e começávamos a ter aceita-
ção e compreensão dos anunciantes e dos veículos. Era uma pro- 93
fissão independente, já liberta da sua semente que foram os veí-
culos. Como você sabe, a profissão começou com os corretores
de anúncios de jornais.
JR: E a sociologia?
RD: Fui pela primeira vez ao exterior premiado pela IAA (Inter-
national Advertising Association).
JR: Como é que foi a sua saída de Campo Grande para o primeiro
emprego em propaganda?
RD: É. Nessa época apareceu a revista PN, que teve uma influên-
cia muito grande também na definição da minha profissão. Eu
comprava a revista nas bancas e lia com muito interesse sobre as
pessoas, as agências, os anúncios etc. Depois surgiu a revista
Propaganda em São Paulo, eu estava me preparando para estudar
medicina. Meu pai foi farmacêutico, meu irmão mais velho ia ser
médico e acabou químico, no Rio. Mas era uma época muito
difícil e me angustiava essa perspectiva de viver seis anos depen-
dendo da minha família. Em Campo Grande, tínhamos sido
quase ricos, mas em São Paulo, embora não nos faltasse nada, o
orçamento era apertado. Vivíamos perto da pobreza uma coisa
muito paranóica. Acho que, até hoje, uma das motivações de eu
trabalhar muito é fugir da ameaça da pobreza. Pois um dia abro
o jornal e tinha um anúncio classificado, da Colgate Palmolive, 97
pertinho da nossa casa, pedindo alguém para o departamento de
propaganda e eu fui lá me candidatar. Aí, fui aceito e foi uma
alegria. Primeiro, porque era perto de casa, dava para ir a pé e,
depois, porque foi a grande escola para mim. Eu substituí o
Dirceu Borges, que foi trabalhar na Thompson. Na Colgate, eu
fazia o levantamento das verbas dos concorrentes, pegava revis-
tas, relatórios de rádio e calculava, com a tabela. Foi assim que
eu aprendi mídia. Eu era também encarregado de traduzir os
anúncios americanos e tinha uma redatora que me prestigiava
muito, a Silvia Jatobá, que mora no Rio, uma pessoa maravilho-
sa. Eu fazia essa análise da concorrência e tinha de escrever um
relatório o que fazia com facilidade. O pessoal gostava dos
meus textos, que eram cheios de humor, muito divertidos. Aí fui
fazer o vestibular da Escola de Propaganda. Embora já tivesse
passado no de Medicina, fiquei muito nervoso com o vestibular
da Escola e, quando cheguei lá e vi a lista de nomes, eu era o
número dois. O primeiro colocado tinha sido o Evaldo Dantas
Ferreira. Voltei para casa numa alegria imensa. Lembro-me per-
feitamente de ter pegado o bonde, na Praça João Mendes, e de
descer a Eça de Queiroz em direção à minha casa. Fui dançando.
E pensava: Agora eu estou fazendo uma coisa de que eu gosto.
E já era uma revolução no ensino, a escola dava um curso de um
ano e você saía com uma profissão. Eu devia ter uns 18, 19 anos
e a perspectiva de só começar a trabalhar com 26 ou 27, se tives-
se sido médico, era apavorante. O curso foi muito legal, eu era
um dos melhores alunos.
JR: Professores?
JR: Você não acha que ainda faz falta uma crônica sobre essa
geração, um livro?
RD: Isso foi naquele terrível ano de 1968. Para quem fala em
recessão, em aperto financeiro, tudo o que aconteceu depois de
68 foi pinto. O ministro do Planejamento era o Roberto
Campos e o da Fazenda, o Bulhões. Eu era o gerente do escritó-
rio da Standard em São Paulo. No Rio, o diretor-geral da
Standard era o Alberto Moraes e Barros, com o Edeson Coelho.
Eu, que estava voltado para a criação, pegava o telefone para
ligar para os veículos e pedir pelo amor de Deus para não man-
dar a fatura para o protesto, ligando desesperado para os clien-
tes, pedindo pelo amor de Deus para pagarem, porque havia
uma moratória geral. Ninguém pagava ninguém, ninguém com-
prava coisa nenhuma. Aquilo não foi só recessão, foi uma
depressão da pior espécie. Foi a era pós-Jango e nunca saiu tanto
dinheiro do Brasil. Todo mundo mandava dinheiro para fora,
porque ninguém confiava no que ia acontecer. 101
JR: Voltando ao lançamento da Veja...
RD: Veja vendeu muito nos primeiros meses, mas, de fato, logo
em seguida, a queda foi brutal. Mas isso também acontece com a
Época, agora. Revista é uma coisa a que a pessoa precisa se habi-
tuar, ela é meio orgânica para o seu leitor. Ele contribui para
ela e ela contribuiu para o leitor. Nessa simbiose é que se vai for-
mando o hábito de ler aquelas páginas, aqueles capítulos com
aquela forma. Eu costumo dizer que uma revista é a extensão das
próprias pessoas, uma coisa meio biológica. Mas Veja acabou
sendo vitoriosa, porque é uma revista corajosa este é um ingre-
diente fundamental de Veja, a sua coragem de denunciar o
roubo, a fraude, o desfalque, a corrupção. O Roberto Civita deve
ficar muitas noites sem dormir, e até ter a necessidade de prote-
ger-se fisicamente, com guarda-costas, porque deve ter muita
gente querendo se vingar de coisas que Veja denunciou.
JR: Conte-me como é que, na JWT, uma vez você fez cem anún-
cios num só dia?
JR: Como é?
RD: Acho que sim. Porque se cada vez mais a gente voltar à
essência da nossa profissão, que é fazer um bom texto, um bom
desenho, se você trabalhar com pessoas éticas, com industriais e
comerciantes éticos, pode ser. Muita gente está sentindo o hor-
ror de conviver com o free-willing, o vale-tudo da remuneração.
Cada um por si, praticar o comércio meio sem regras. Eu acho
que vamos revalorizar a profissão, os veículos vão continuar pre-
cisando dos publicitários. Isso é fundamental.
JR: E o que é que você diz para os jovens, para os nossos alunos,
que querem ingressar na profissão?
RD: É isso mesmo, acho muito estranho a falta disso num publi-
citário. Ontem, entrei no departamento de criação e, do pessoal,
só um se levantou para me cumprimentar, abraçar, o resto ficou
inibido. As pessoas têm de aprender a se relacionar, a criar um
círculo de amizades, de apoio. Outro conselho que eu daria é o
seguinte: Faça de cada trabalho uma missão de Deus, quer
dizer, as coisas têm que ser tão importantes para você, em rela-
ção ao seu trabalho ou à sua profissão, que, se tiver descrença, o
melhor é abandonar a profissão e procurar outra coisa.
108
JR: Mas a nossa tradição religiosa não é de que Deus condenou o
homem ao trabalho, de que aquilo foi um castigo?
RD: Ainda quando trabalhava com meus pais, na loja. Aos dez,
11 anos, eu já acompanhava tudo, principalmente em promoção
no ponto de venda.
111
Marcos Magalhães
Um engenheiro no topo
MM: Não resta a menor dúvida. Hoje tenho, sob minha respon-
sabilidade, não só o Brasil, mas toda a América do Sul. Quando
assumi, encontrei cenários muito semelhantes na Argentina, no
Chile, na Venezuela e na Colômbia. Os presidentes da Philips
desses vários países eram também holandeses ou europeus. Parti
do princípio de que já existem executivos locais com competên-
cia e conhecimentos acumulados para assumir funções de ponta.
No período de pouco mais de um ano com uma única exceção
eu substituí todos os estrangeiros. O resultado tem sido excep-
cional e a motivação aumentou enormemente. Acho que isso
representou um sinal extremamente positivo, principalmente
para os jovens. Hoje não há limites porque a Philips opera em
cem regiões e não mais país-por-país. Um jovem executivo do
Chile, do Brasil ou da Argentina sabe que suas ambições não se
limitam mais às fronteiras de sua nação.
JR: A estabilidade?
JR: E qual tem sido a sua impressão dos jovens formados pelas
escolas de administração, no Brasil?
JR: E você acha que o governo brasileiro está em sintonia com isso?
JR: Você não acha que existe uma certa cultura antibusiness, no
Brasil?
JR: Por que você acha que a Philips teve sucesso com a política de
manter a marca numa grande variedade de produtos?
MM: É muito difícil alguém ser tão eclético que consiga enten-
der a diversidade das populações da América do Sul. Há territó-
rios e ambientes diferentes, um coração brasileiro, um coração
argentino etc. Chegamos a pensar: As pessoas locais entendem
muito mais a forma de linguagem, a forma de estabelecer conta-
to com o consumidor do país A, B ou C. O fato de ser difícil
alguém entender totalmente os anseios das pessoas da América
Latina foi uma desvantagem, inicialmente. Para superar esta difi-
culdade, decidimos pela proliferação de filiais das agências nos
respectivos países. Procuramos, ainda, ter um sabor local, mas
dentro de um contexto mais amplo. A campanha dos startronics,
por exemplo. Cada região tem o que chamamos de um brand-
champion e, junto com o pessoal de criação, foram criando uma
campanha onde o sabor local era trazido por pessoas das respec-
tivas regiões, que participaram do processo inteiro. Procuramos
minimizar a desvantagem de não ter sabor local, através do pro-
cesso participativo.
JR: No Brasil existe uma Phillips, com dois ll. Tem havido
algum problema de convivência com essa outra marca, além de
os jornalistas grafarem o nome de vocês com dois ll?
JR: E os filhos?
JR: E se tiver de dar conselhos aos jovens, o que você diria para eles?
NG: Tanto é que me dedico a ela há vinte anos e é uma das pou-
cas indústrias em que o Brasil tem excelência mundial. Por exem-
plo, eu estou justificadamente contente porque o cinema brasilei- 129
ro teve duas indicações para o Oscar, o que é uma maravilha.
Mas isso é uma coisa que a propaganda brasileira faz todo ano:
competir e ganhar muitas vezes. Acho que é preciso fazer essa
análise para ver a excelência da nossa publicidade.
NG: Nasci na Bahia, meus pais eram de classe média baixa, meu
pai chegou a ser médico, mas até os 17 anos mal sabia escrever.
Depois fez madureza e formou-se com 33 ou 34 anos, tanto
que eu fui na formatura dele. Aí foi para Londres, e todos fomos
juntos. Fiquei dois anos na Inglaterra e um ano na Escócia, uma
coisa que me ajudou muito na vida, pela fluência no inglês e para
ver o exterior como uma coisa normal. São duas características
do meu trabalho e da DM9. Aí voltei para Salvador, estudei no
Colégio Marista, fiz o colegial e a faculdade de administração,
que é outra coisa importante da minha vida, porque me deu
objetividades, uma visão de negócios. Recentemente, um sujeito
de quem até gosto muito mas um pouco ranheta fez um arti-
go, achando que estaria ou me ofendendo, ou gozando, ao me
chamar de negociante. Mas eu sou um negociante primeiro
por raiz, porque minha mãe é libanesa, eles são negociantes há
quatro mil anos...
JR: E o Guanaes?
NG: Até ter paridade, mas eu acho que temos aí um século para
acontecer isso novamente. Mas, retomando, a faculdade de
administração deu-me essa visão de gestão, de gerência, de prio-
ridade, o olho para o negócio. Eu saí da faculdade de administra-
ção e fui trabalhar com Duda Mendonça, na DM9 que era dele.
JR: Foi quando começou em propaganda. Por que você foi traba-
lhar lá?
NG: Porque ele realmente brilhava como hoje ele brilha na área
de marketing. Naquele momento ele brilhava, com aquela agên-
cia fora do eixo Rio/São Paulo, muito criativa, muito instigante...
JR: Irmãos?
JR: Vendo você aqui sentado, olhando para toda a agência, parece
que hoje administra mais do que cria.
JR: Continua?
JR: Foi nessa época que você e o Duda saíram na capa de Veja,
chamados de marqueteiros. Você gostou de ser chamado de
marqueteiro?
NG: Aquela DDB era uma só, a DDB do Bill Bernbach. Hoje, esta-
mos falando de uma média DDB. De uma DDB que é uma federa-
ção, a DDB de Nova York, a DDB de Chicago, que é a DDB da Palmer
Javis, que é a melhor agência do Canadá, que é a DDB da BMT, que
é a melhor agência da Inglaterra, que é a DM9, que é a DDNB da
Paradise da Suécia, quer dizer, é uma federação de grandes agên-
cias, unidas por um background criativo.
JR: E a DM9?
NG: A DM9 fez nove anos em 1999 e dez anos no próximo ano.
Nós tínhamos uma série de coisas previstas mas, em função de
toda essa crise, vamos adiar a festa. Como disse, estamos focados
em dar atenção aos nossos clientes e cuidar do nosso negócio. 135
Quando as coisas se estabilizarem, vamos pensar na comemora-
ção dos nossos dez anos.
JR: Será que propaganda é uma coisa que vai existir ainda, daqui
a cinco anos?
NG: Acho que, no Brasil, foi para pior. Há uma nova geração
muito deslumbrada com títulos, com pastinhas, com anunciozi-
nhos dos próprios publicitários. Acho que está faltando um
pouco dos ingredientes da rapaziada da antiga. A mescla de
gerações seria benéfica.
JR: Você está falando da geração que hoje tem trinta anos?
136 NG: Que tem 25. Acho que eles precisam tomar cuidado.
JR: Você não está sendo muito crítico?
NG: Estou sendo crítico, não estou sendo pessimista. Acho que a
nova geração tem que ter um pouco mais de base mercadológica,
de preocupação de vender, a publicidade não é uma piada, ela é
feita para vender. Se esquecermos disso, nós não teremos produ-
to a vender. Num mercado de comissão aberta, se você não tem
valor, está perdido. Você é uma commodity.
NG: Fazem, mas não tenho visto essa melhoria. O que tenho
visto é uma preocupação muito grande com a marca artística e
uma certa despreocupação com a área mercadológica.
JR: Qual foi o anúncio mais importante que você já fez até
agora?
JR: Só criadores?
JR: Você curte o Dilbert, como todo mundo, e existe uma crítica
feroz, na historinha do Dilbert, às grandes empresas. Essas empre-
sas que você está citando são mega-agências. Como é que você
acha que uma pessoa que trabalha numa agência que congrega
mil, duas, três mil pessoas pode sobreviver naquele clima surreal
em que a gente vê o Dilbert? 139
NG: Nem todas são mega-empresas. Essas empresas são uniões
de muitas empresas de duzentas pessoas, como é a DM9. Tiran-
do a nossa agência americana, onde realmente você tem megas,
em Chicago e Nova York, o resto é uma união de agências relati-
vamente pequenas, trabalhando dentro de padrões saudáveis.
Esse princípio federativo da DDB é a chave do sucesso da DDB,
ou seja, a DDB deixa você ser o que você é.
NG: Eu acho que a gente tem que ler o Ogilvy, como a gente lê
São Paulo Apóstolo, que é uma das partes mais bonitas da Bíblia,
e tem algumas das coisas mais sábias... mas ele diz, também, que
as mulheres devem ficar em casa, que o homem é o chefe absolu-
to da casa, que as mulheres só devem entrar na igreja com a
cabeça coberta, então tem uma série de coisas que você tem que
entender que são o retrato da época em que aquilo foi escrito. A
mesma coisa é David Ogilvy; ele diz, num determinado momen-
to, que você não deve começar afirmações com não. Mas,
depois, sua própria agência ficou famosíssima com uma campa-
nha para o cartão American Express, que era o não saia de casa
sem ele. Então, essas regras têm que ser entendidas nessa pers-
140 pectiva. É importante entender o conteúdo: por exemplo, o
humor: não que não se deva usar o humor, mas se for a gaiatice
pela gaiatice não vai levar a lugar nenhum. Essa é uma das mais
freqüentes armadilhas, quando a piada é mais lembrada do que o
produto.
JR: Você não acha que, às vezes, o governo põe a culpa no cida-
dão? Por exemplo, campanha de segurança no trânsito. O gover-
no devia fazer estradas melhores, controlar melhor a segurança
dos automóveis.
NG: É uma das coisas mais cafonas que existem. Acho que é pre-
ciso tomar muito cuidado com propaganda sexista: primeiro,
porque o avanço das mulheres, a forma como as mulheres vêem
sexo hoje é completamente diferente, elas se sentem ofendidas e
isso é um ruído de comunicação. Depois, para as novas gerações,
o apelo sexual não tem o mesmo peso das gerações de 60, 70.
Eles não estão nem aí, porque todo mundo transa, nós estamos
falando de uma coisa que todo mundo pratica, é como comer,
respirar... então tem que tomar muito cuidado para você não
ficar com uma coisa cafajeste ou uma coisa antiquada.
NG: Eu acho que poderia dizer que, para mim, o grande centro
de preocupação é o publicitário trabalhando. No momento em
que o mercado se abre, em que as comissões são livres, vão
sobreviver e vão brilhar os eficazes. E aí, eu acho que, além do
talento, da boa mão, do ritmo, do texto, vai sobreviver o indiví-
duo que tiver a compreensão madura do que é essa atividade.
Seja como professor, seja como escola, seja como aluno, eu poria
nos alicerces da formação desses meninos um profundo choque
de marketing e de visão administrativa sobre o trabalho que eles
vão fazer. Acho que, nos primeiros dois anos, eles deviam ficar
longe de texto, de caneta, de computador, porque acho que eles
precisam sair da escola metade gerentes de marketing, metade
redatores; porque se eles não tiverem essa compreensão, não sei
quem vai estar fazendo a publicidade do próximo milênio, talvez
já não sejam as agências... 143
JR: Vai ser 80% marketing e 20% o resto?
NG: Eu acho.
JR: E onde é que entra a cultura nisso, Nizan? Onde é que entra,
por exemplo, o conhecimento da cultura do Brasil, o conhecimen-
to da cultura do México?
NG: Mas isso é essencial. Isso, inclusive, é também marketing.
Por que um redator é melhor do que o outro? Por que de cem
redatores dez meninos despontam? Por que dentro do corredor
culto dele, ele ouviu mais bobagens, no rádio, ele decorou mais
músicas, ele foi a mais carnavais, ele sentiu mais o povo dele e
consegue transmitir aquilo. Isso você não consegue dar a nin-
guém, isso vem isso é que faz a diferença entre os indivíduos.
Por que um cavalo anda mais que o outro? Isso nem a escola dá.
A escola pode chamar a atenção para o dar, mas o fato de um ser
mais sensível que o outro, aí entra a genética...
JR: Mas o cavalo bem alimentado, bem tratado, é o que vai correr
no hipódromo e ganhar.
NG: Claro, mas se ele não tem genética de campeão, não adian-
ta. Acho que tem muita gente talentosa desperdiçada, porque
não treinou, porque não estudou. Se um sujeito que já é bom,
que já tem predisposição e tem talento, entra numa escola de
propaganda a escola vai fazer a diferença quisera eu ter me
preparado numa escola. Acho que hoje, se pudesse, eu faria o
curso de administração de empresas, aí eu acho que o cara está
pronto para o que der e vier.
144
Francisco Gracioso
Da empresa à escola
FG: Não, meu pai nasceu na Itália, mas veio para cá criança.
Minha mãe, também de origem italiana, nasceu aqui. Enfim, sou
de família de imigrantes italianos tanto pelo lado materno quan-
to pelo paterno, que vieram para cá e se estabeleceram em São
Paulo, no bairro da Mooca. Cresci nesse bairro. A Mooca desse
tempo era uma região cosmopolita. Não havia apenas italianos,
mas imigrantes do mundo inteiro: da Europa Central, que nós
chamávamos de bichos dágua, não sei por quê. Havia também
muitos espanhóis.
FG: Meu pai era mestre numa fábrica de sapatos chamada Pisar-
Firme e dirigia a área industrial.
JR: Era o ano do quarto centenário de São Paulo. Quer dizer que
quando São Paulo comemorar seu quinto centenário, você estará
comemorando 100 anos de propaganda.
FG: Foi isso que aconteceu. Claro que, depois, as empresas trei-
navam seu pessoal, vieram grandes profissionais de marketing
para cá e formou-se uma geração de anunciantes brasileiros que
passaram a ensinar suas agências a fazer marketing. Mas em sã
150 consciência foram as agências que primeiro ensinaram.
JR: Chico, como personagem da nossa propaganda, você é mais
associado à McCann-Erickson. Como foi a sua passagem da
Thompson para a McCann?
FG: Por muitos anos foi assim. Eu era chefe da redação e tinha
meus redatores, como foi o caso na Thompson. Nós dialogáva-
mos com o chefe de grupo e nos relacionávamos com os direto-
res de arte.
JR: Como você explica o sucesso que o Emil teve junto aos ameri-
canos, tão pragmáticos?
FG: Não, nunca mais. Lembre-se, nós aqui não precisamos ter
bola de cristal para adivinhar essas coisas. Basta olhar para os
mercados que estão à nossa frente em estágio de desenvolvimen-
to social e profissional. Nos Estados Unidos, a propaganda repre-
sentou, o ano passado, 33% das verbas de comunicação com o
mercado. É uma queda que vem de longe.
FG: Até agora, sim. Porém, o que eu quero dizer é que com a
abertura do mercado, com a necessidade de competir e aí a
propaganda se revelou realmente como arma de competição as
empresas voltaram a fazer mais propaganda, em termos de por-
centagens sobre as vendas. É claro que vão fazer cada vez mais
promoção, merchandising e tudo mais, mas a propaganda conti-
nua dominando.
JR: Quais são seus conselhos aos jovens, que estão iniciando car-
reira, começando pelos que você deu aos seus próprios filhos?
FG: Os meus filhos homens cursaram administração quando
aqui ainda não tínhamos o curso. Hoje, eu diria que viessem
fazer administração ou comunicação social na ESPM, porque
continuamos a ter os melhores cursos do Brasil, e formamos
jovens preparados para enfrentar a dureza do mercado de hoje.
O mercado é cada vez mais competitivo e, com uma ajudazinha
da Escola, os jovens vão conseguir enfrentá-lo. Nossa Escola está
pronta para isso. Acho que teremos anos de ouro para o marke-
ting e a propaganda. Serão anos de competição dura, anos de
reestruturação, anos de aglutinação de empresas com a venda de
grandes grupos estrangeiros. Serão anos que vão privilegiar os
jovens bem preparados, dispostos a trabalhar duro e ter a forma-
164 ção de que precisam.
JR: Você falou de seus dois filhos homens e não falou de sua filha
mulher.
FG: Não, ela ajuda o marido a dirigir uma fazenda de café. Ela
voltou à minha vocação original agrícola.
FG: Primeiro, pelo que aconteceu com a minha filha. Elas não
continuam na profissão a não ser, claro, as exceções de praxe.
Elas um dia casam e a maioria resolve se dedicar à família, aos
filhos e ao marido. Segundo, vou dizer com toda a franqueza. Os
homens e as mulheres são diferentes. Cada um tem as suas vanta-
gens e desvantagens. O homem é capaz de raciocinar mais con-
ceitualmente, mais subjetivamente do que a mulher. E estas são
características preciosas para o criador.
FG: Não, não creio. Eu acho que a diferença está aí. O homem é
mais capaz de criar do que a mulher; a mulher é mais capaz de
segurar as pontas, enfrentar uma situação e administrá-la.
Agora, aquele fluido mágico do qual depende o avanço do
mundo, claro que Deus distribuiu por todos nós, mas ele, por
alguma razão, privilegiou os homens. 165
JR: O Brasil tem remédio?
FG: Lógico que tem. Eu nunca concordei com os que dizem que
o Brasil perdeu dez anos a tal década perdida. Mas nos últimos
vinte anos houve uma grande revolução social no Brasil. O Brasil
de hoje nada tem a ver com o de vinte anos atrás. Em termos de
saúde, de longevidade, de conforto na moradia, de nível de edu-
cação, de consumo, de cidadania, de comunicação e informação,
o Brasil evoluiu de uma forma que seria inimaginável. Tudo isso
no meio da dureza. E como você pode ver, é a tal década perdida
de 80. Foi a década em que esta Escola realmente se transfor-
mou, de 120 mil dólares para milhões de dólares e mudou de
um galpão alugado na Bela Vista para uma sede própria de gran-
de valor na Vila Mariana. Se aconteceram essas coisas, é porque
realmente o Brasil tem conserto.
FG: Valores. Isto não está sendo dito apenas por mim. Já houve
estudiosos que definiram as alavancas do progresso como sendo
basicamente três: a primeira são os valores culturais, crenças, coi-
sas enfim às quais a sociedade dá valor. A segunda é o nível edu-
cacional propriamente dito, o que não tem nada a ver com valo-
res. E a terceira é a habilidade para aplicar imediatamente os
novos avanços tecnológicos. Curiosamente, nos três aspectos, os
orientais, e principalmente os japoneses, dão lições ao resto do
mundo. O Japão tem valores morais e sociais que hoje chamaría-
mos de puritanos, protestantes. As tais sociedades protestantes
da Europa, do norte dos Estados Unidos não são mais protestan-
tes coisa alguma. Eles perderam os valores que tinham e que per-
manecem lá no Japão. O Japão tem também o nível educacional
altíssimo e eles são mestres. Criticando os japoneses dizíamos:
Ah! Eles não são capazes de fazer fundamental research. Eles são
bons em adaptar rapidamente o que os outros descobrem. Pois
é aí que está a grande habilidade deles e que nós deveríamos
copiar. Eu acho que a transformação, portanto, não é nem rápi-
da e nem fácil. Dizem que transformar valores leva 25 anos, no
mínimo, uma vez iniciada e nós nem a iniciamos ainda.
168
JR: Importância do marketing pessoal.
169
Carlos Arthur Nuzman
Último representante de uma espécie em extinção
JR: O Melo e Souza era um excelente colégio, seu pai era uma
pessoa como se dizia antigamente de posses ?
JR: O que você responde quando lhe perguntam qual a sua profis-
são?
CN: Advogado.
CN: Até o momento, não. Aliás, isso é uma questão que vem
sendo discutida no mundo inteiro e a tendência é que brevemen-
te o dirigente seja remunerado. Acho que isso vai acontecer até o
ano 2000. Não acredito que o próximo século comece sem que
isso seja colocado oficialmente em prática.
176
JR: O que você diria a um jovem, na adolescência, que demons-
trasse amor, interesse, competência em tênis, em vôlei, em bas-
quete ou em natação, e quisesse fazer disso uma profissão?
JR: Por que será que o brasileiro decora a sua casa toda de verde e
amarelo quando o Brasil é campeão mundial de futebol e, no dia
7 de setembro, nem sabe o que está acontecendo? Você tem algu-
ma teoria para isso?
CN: Está certo. Mas o que nós precisamos fazer no Brasil, para
aproveitar melhor esse grande negócio que é o esporte, é mais
profissionalização, conhecimento de como se organizar um gran-
de evento, entregá-lo pronto e bem-feito, com padrão de quali-
dade, seriedade...
CN: Acho que têm de estudar, acho que todos têm que ter um
conhecimento abrangente de cada segmento dessa fabulosa
indústria do esporte, do que ela solicita, do que ela requer, para
se tornar um verdadeiro especialista nesse assunto.
CN: Como atleta, foi a primeira vez que fui à seleção brasileira,
ia ao campeonato mundial na ex-União Soviética em 1962 e,
naquele mesmo mês, a minha única irmã ia casar... Eu não sabia
se ficava, pedia dispensa da seleção para assistir ao casamento
dela, ou iria ao campeonato mundial. Essa data foi 27 de outu-
bro de 1962, a data da quase-invasão da Baía dos Porcos, em
Cuba, e eu estava em Moscou. Minha decisão foi de ir ao cam-
peonato mundial. Ali eu assumi que era um atleta do Brasil.
Como dirigente, foi quando resolvi parar de jogar tinha trinta
anos, em 1972, ou seja, dez anos depois desse outro fato. Vieram
oferecer-me a presidência da Federação de Voleibol do Rio. Eu
disse: O que eu quero é ser presidente da Confederação Brasileira
de Voleibol. Quero trabalhar pelo voleibol do meu país, retribuir
o que ele fez por mim. Aceitaram-me e ali foi o grande desafio.
Dali em diante, eu queria transformar o voleibol do Brasil numa
potência. Foram momentos cruciais, que se tivesse dito não, a
vida tomaria outro rumo.
CN: Ah, sim... Tenho na vida isso muito claro: vive-se de vitórias
e derrotas. Que saibamos tirar lições das derrotas, transformar
uma derrota numa grande vitória, posteriormente.
184
Joaquim Francisco de Castro Neto
Prefiro ser dono de restaurante
JR: E os modelos familiares? Seu pai, por exemplo, qual era sua
profissão?
CN: O que está por trás dessa afirmativa é que banco, para
ganhar dinheiro, num ambiente não-inflacionário, só tem uma
maneira: emprestando dinheiro, correndo risco de crédito. E
emprestar dinheiro é uma técnica, uma arte, que pressupõe a
absorção de doses cavalares de tecnologia, principalmente quan-
do se fala de crédito para massa e em banco de varejo. Esse é um
dos principais desafios que o setor bancário brasileiro começa a
enfrentar, de maneira tardia, por causa da deformação que a
inflação introduziu no processo. Muitos bancos, até hoje,
cobram através das agências o que é uma loucura. Nenhum
banco europeu ou americano, que tenha volumes expressivos de
ativos, faz cobranças através de suas agências; eles ainda conce-
dem créditos com analistas de crédito, quando as decisões de
créditos devem ser feitas com apoio de modelos matemáticos
atuariais de concessões de crédito... Quer dizer, é uma outra rea-
lidade e quem não se preparar para isso vai ter que enfrentar
taxas de risco até insuportáveis.
JR: Não se pode dizer que o sistema bancário tenha sido tomado
de surpresa pela estabilização da moeda, mas alguns grandes ban-
cos brasileiros fecharam suas portas, ou foram absorvidos por
outros. Por que aconteceu isso?
CN: Diria que ainda não ganhou nada. É possível que ganhe
alguma coisa, no futuro, quem sabe? Talvez você, como cliente
desse banco onde tem a sua segunda conta, no futuro, possa
fazer o que você imaginou fazer: entrar numa agência desse
banco na Europa e sacar seu dinheiro, usar uma máquina auto-
mática etc. Mas isso só vai acontecer bem mais para frente. E tal-
vez isso nem seja relevante, para fazer com que um cliente brasi-
leiro tome a decisão de transferir a sua conta para um banco
estrangeiro.
CN: Claro que vale. Aqui, no Unibanco, acho que uma das capa-
cidades estratégicas que mais temos desenvolvido está relaciona-
da ao conhecimento do cliente aquele negócio que todo
mundo diz que tem, mas que poucos operacionalizam e que é o
domínio das técnicas do marketing database. Hoje, avançamos
muito nisso, não só no entendimento das necessidades dos clien-
tes, mas usamos, diariamente, ferramentas estatísticas de pros-
pecção da propensão a consumir produtos financeiros. E esta- 191
mos utilizando essa técnica para operacionalizar o desenvolvi-
mento de canais alternativos, que antes eram meramente canais
de atendimento a clientes, para prestação de informações e que
passam a partir de agora com o apoio desse marketing database
a ser canais de venda. Por exemplo, eu tenho hoje, um call-cen-
ter, que recebe seis milhões e quinhentas mil ligações por mês. E
somos capazes de, através de um modelo matemático behavior
score olhando para o portfólio de clientes, sem perguntar nada,
a nenhum deles, definir-lhes linhas de crédito.
CN: Não acho que seja a única maneira de tratar a questão. Tenho
um pouco de medo de afunilar. Numa organização como a
nossa, são possíveis algumas dezenas de agentes de solução. Eu
vendo 35 produtos, não sei quantos serviços, e fico com um pouco
de medo de afunilar. Mas não tenho preconceitos contra a idéia...
Já pensei nisso e provavelmente continuarei pensando.
CN: Não sei se receitas completas, mas acho que existem alguns
ingredientes: em primeiro lugar, ter capacidade de trabalhar
muito. Trabalhar muitas horas por dia, sim, mas, segundo, é ter a
capacidade de trabalhar em cima de problemas que nos desagra-
dam, além dos que nos agradam. Existem sempre áreas que rejei-
tamos, que não queremos nem ver, mas para quem tem a capaci-
dade de se expor a todos os desafios, em áreas variadas, serão
adquiridos alguns ativos valiosos para seguir uma carreira ascen-
dente, que demanda, a cada momento, uma visão cada vez mais
generalista. Principalmente nos níveis mais altos da hierarquia,
essas coisas são determinantes para a escolha dos indivíduos.
CN: Acho que sim. Esse marketing pessoal passa até por concei-
tos clássicos: a embalagem é a maneira de a pessoa se apresentar,
vestir, falar, pentear-se, barbear-se... Realmente, cada um de nós
produz uma impressão e essa impressão está permanentemente
sob julgamento, 24 horas por dia, a cada segundo. O marketing
pessoal é algo que deveria começar logo no início da carreira do
indivíduo. O indivíduo como produto, ele deve encarar a ques-
tão de estar atendendo às necessidades de seu mercado. No caso,
o seu mercado é o seu empregador atual e potencial. Na verda-
de, chamamos de marketing pessoal aquilo que sempre existiu,
que antigamente se chamava charme, personalidade e coisas
196 desse tipo.
JR: Qual foi o momento decisivo na sua carreira?
JR: Suponha que você seja convidado para falar a alunos em iní-
cio de carreira. O que diria?
JR: Isso não é triste, numa cultura como a nossa, que, fora das
escolas de administração, é pouco competitiva?
JR: Mas você não acha que um dos problemas do Brasil é de que
nós precisamos de mais gente competindo?