Você está na página 1de 123

O Maranhão Histórico

INSTITUTO GEIA

Empresas Associadas
Agromá Empreendimentos Rurais S.A
José de Jesus Reis Ataíde
Alpha Máquinas e Veículos do Nordeste Ltda.
Manuel Maria Correia de Almeida Plantier
Atlântica Serviços Gerais Ltda.
Luís Carlos Cantanhede Fernandes
Agropecuária e Industrial Serra Grande Ltda.
Pedro Augusto Ticianel
Alumar – Consórcio de Alumínio do Maranhão
José Maurício de Macedo Santos
Bel Sul Administração e Participações Ltda.
Jorge Francisco Murad Júnior
Bunge Alimentos S.A
Haroldo Gianinizi
Companhia Maranhense de Refrigerantes
Eduardo de Carvalho Lago
CIGLA- Cia. Ind. Galletti de Laminados
Raphael Carlos Galletti
Companhia Vale do Rio Doce
Marcos Eduardo Veloso Milo
Ducol Engenharia Ltda.
Henry Dualibe Filho
Haroldo Cavalcanti Cia. Ltda.
Haroldo Corrêa Cavalcanti Júnior
Mardisa Veículos Ltda.
Vicente Ferre
Moinhos Cruzeiro do Sul S.A
Amaro Santana Leite
Oleama - Oleaginosas Maranhenses S.A
Marco Aurélio Nascimento de Souza
Pleno – Planejamento Engenharia e Obras Ltda.
Severino Francisco Cabral
Rápido London S.A
Valdecy Claudino
Servi Porto - Serviços Portuários Ltda.
Nemésio Brandão Neves
Skala Engenharia Ltda.
Adalberto Cordeiro Furtado
Tecitex Ltda.
João Guilherme de Abreu
Telemar – Telecomunicações do Maranhão S.A
Alceu Ventoso Júnior
Televisão Mirante Ltda.
Teresa Murad Sarney
Supermercados Lusitana Ltda.
Manoel Alves Ferreira
VCR Produções e Publicidade Ltda.
Vanda Maria da Silva Torres
UDI Hospital - Empreendimentos Médico Hospitalar do Maranhão
Ltda.
Carlos Alberto Vieira Gama
UNIHOSP – Serviços e Saúde Ltda.
Antônio Gaspar
José Ribeiro do Amaral
(1853 – 1927)
José Ribeiro do Amaral

O Maranhão Histórico

Artigos de Jornal
(1911 - 1912)

reunidos por
Luiz de Mello

Coleção Geia de Temas Maranhenses


São Luís / 2003
 Copyright by
Direitos desta edição reservados em nome de
Instituto Geia

COLEÇÃO GEIA DE TEMAS MARANHENSE


Volume 1

Revisão de Texto
Sebastião Moreira Duarte

Editoração Eletrônica
Fabiano Pestana

Capa
Albani Ramos e Jorge Murad

FICHA CATALOGRÁFICA

Amaral, José Ribeiro do


O Maranhão histórico – Artigos de jornal (1911-1912) /
José Ribeiro do Amaral. São Luís: Instituto Geia, 2003.
128p. (Coleção Geia de Temas Maranhenses, v. 1)

1. História do Maranhão. 2. História de São Luís. 1. Título.

CDU 981.21
SUMÁRIO

Explicação – Luiz de Mello ....................................................... 11

A Título de Prefácio ................................................................... 13

1. Primitivas explorações feitas nas costas do Norte do


Brasil. Primeiras tentativas de colonização para o
Maranhão. João de Barros, Fernão d’Álvares e Aires da
Cunha. Versões diversas sobre a verdadeira origem da
palavra Maranhão. Fundação da povoação Nazaré, na
Ilha da Trindade (Maranhão). Segunda expedição.
Naufrágio de Luís de Melo da Silva. Vestígios da
primeira expedição. .............................................................. 17

2. Bequimão e seus descendentes........................................... 23

3. Os franceses no Maranhão ................................................. 29

4. Caráter, fins, meios e resultados da Ocupação Francesa


em paralelo com a Invasão Holandesa .............................. 33

5. Fundação do Maranhão ....................................................... 39

6. Vestígios da Ocupação Francesa. A igreja de Santo


Antônio .................................................................................. 47

7. Convento de Santo Antônio ............................................... 53

8. Qual será a população atual de São Luís? ......................... 59


9. A cidade de São Luís por ocasião da Invasão
Holandesa .............................................................................. 71

10.Disposições diversas, relativas à cidade de São Luís.


Como eram, primitivamente, conhecidas as suas ruas,
ou, antes, como se diferenciavam umas das outras.
Quando começaram a ter nomes próprios. Ruas,
praças, travessas, praias e fortes de São Luís: origem
dos nomes de algumas delas e mudanças por que têm
passado. Ruas com mais de um nome ao mesmo
tempo...................................................................................... 75

11.[Primitivas denominações de ruas] ..................................... 79

12.O convento de Nossa Senhora do Carmo ......................... 87

13.A imprensa no Maranhão: Jornais, revistas


e outras publicações periódicas de 1821 a 1908 ................ 97

14.A imprensa no interior do Maranhão ............................... 113

15.A Imprensa no Maranhão (Codó) ..................................... 121


Explicação

Pesquisando, durante anos, em velhos periódicos maranhenses, acon-


teceu-me encontrar estes artigos do historiador José Ribeiro do Amaral,
publicados entre 1911 e 1912, no Diário Oficial – Estado do Mara-
nhão, jornal então dirigido por Domingos Barbosa.
Agradou-me a idéia de restituí-los à publicação, certo de estar pres-
tando serviço de geral interesse, seja pelos temas tratados, seja pela autorida-
de de quem o faz, bastando lembrar que algumas partes dos textos aqui
reunidos o próprio autor as ampliou e incluiu em seu livro A fundação
do Maranhão, de 1912.
Em particular, agrada-me ver que estes escritos vêm a público no ano
em que se comemora o sesquicentenário de nascimento de Ribeiro do Amaral,
a quem muito devemos por seu zelo incomparável pelas coisas de nossa
terra, sua competência de mestre e sua liderança intelectual, agitador de
idéias e organizador de instituições que perduram até os nossos dias.
Uma carta do historiador ao diretor do jornal abre a série publicada
e explica o “plano da obra”. Servirá de prefácio do livro, cujo título é o
mesmo que encabeça os diferentes artigos, publicados regularmente às sex-
tas-feiras. Por motivos que os leitores logo perceberão, foi ligeiramente alte-
rada, nesta publicação, a seqüência original de datas em que estes trabalhos
apareceram na imprensa.
Agradecendo ao Instituto Geia ter acolhido a reunião destas páginas
para dar início à Coleção Geia de Temas Maranhenses, registro que
são de Jomar Moraes as notas de pé-de-página que trazem informação
atualizada sobre alguns fatos e figuras mencionados por Ribeiro do Amaral.

Luiz de Mello
O Maranhão Histórico

A Título de Prefácio

São Luís, 12 de outubro de 1911

Meu caro Domingos Barbosa:

A
CUSO recebida sua prezadíssima cartinha de ontem, que
só hoje me foi entregue, na qual teve a gentileza de pedir-
me a minha humilde colaboração para o jornal, hoje confi-
ado à sua superior orientação, designando-me, para esse fim, as sex-
tas-feiras de cada semana, e lembrando-me, como feitio a dar a essa
mesma colaboração, a necessidade de escrever alguma coisa sobre a
nossa São Luís, isto é, sobre a história dos seus mais antigos e notá-
veis edifícios, públicos e particulares, tais como o Palácio do Gover-
no, a Catedral, templos, conventos, quartéis, fortalezas, e dos últi-
mos, para não ir mais longe, essa mesma casa da Rua da Estrela,
onde ainda agora funciona a Imprensa Oficial, e que tão conhecida
se tornou, não só nos tempos coloniais, mas ainda nos que se segui-
ram à Independência.
Satisfazendo os seus desejos, que, bem sabe, para mim são or-
dens, aqui me tem, e aqui me terá sempre: não sei se com isso aprovei-
tarão os leitores do Diário Oficial. Tudo farei para corresponder à sua
confiança. Se tal, porém, não acontecer, absolver-me-á a solicitude com
que, prestes, acudi ao seu chamado.

– 13 –
José Ribeiro do Amaral

E, já agora, se me permitisse, pedir-lhe-ia, ou, antes, lembrar-


lhe-ia a conveniência de fazermos uma ligeira alteração no plano
cuja execução se dignou de confiar-me, alteração que em nada o pre-
judica, tornando, pelo contrário, o trabalho mais metódico, a qual é a
seguinte:
Pareceu-me mais acertado, antes de escrever qualquer coisa
sobre os nossos vetustos edifícios, algo dizer, ainda que em traços
gerais, sobre as primeiras expedições que para aqui se encaminharam
– portugueses, franceses e holandeses; fundação do primeiro estabe-
lecimento colonial que aqui houve, nome que primitivamente tinha
o lugar onde foi ele situado, e que teve com a fundação, e por quê;
diversas fases por que passou; o que era a cidade por ocasião da
Invasão Holandesa, em extensão, população e riqueza; aspecto geral
da pequena cidade por aquele tempo, com inclusão dos edifícios pú-
blicos que já então existiam; progressivo desenvolvimento que daí
em diante foi tendo; fontes públicas existentes na cidade, até 1592, e
seus nomes; como se designavam as ruas até 1733, quando ainda não
tinham nomes; quando começaram a ser mencionadas com nomes
próprios; a mesma rua dividida em três trechos, com três nomes;
primeiro lançamento predial; ruas que então existiam e seus nomes;
quem primeiro deu começo ao calçamento da cidade; São Luís em
1822, primitivos costumes dos seus habitantes; diversos gêneros de
moeda, etc., etc.
Como vê, meu amigo, vasto é o campo e rica é a seara. Para
mim, nada de mais atraente e agradável conheço que conversar com
o passado, onde a gente como que se sente bem, sem correr o risco
de ofender a quem quer que seja, nem despertar suscetibilidades; e
nem só para mim, não só o único a assim pensar, pois lembra-me de
haver lido, não há muito, n’A Notícia, do Rio, talhados em semelhan-
tes moldes, notáveis artigos do Dr. Vieira Fazenda, que tão grande
interesse conseguiram despertar no espírito público e não pequeno
renome deram àquele jornal; e ainda agora n’A Ilustração Brasileira,
outros do mesmo gênero estão a sair, porventura de não menos su-
bido valor, firmados pelo ilustre Dr. Pires de Almeida.

– 14 –
O Maranhão Histórico

É esta a pequena modificação a que me referi no começo. Pro-


pondo-a, julgo que assim melhor servirei ao fim que, ambos, temos
em mira.
Se lhe merecer ele, o plano assim organizado, a sua aprovação,
conquanto em coisas do Maranhão não me sinta eu com aquela com-
petência tão notoriamente conhecida dos dois ilustres brasileiros aci-
ma referidos, sobre coisas fluminenses, tudo farei para ser agradável
aos leitores do Diário Oficial, e assim corresponder à sua expectativa.
E até sexta-feira.
Creia-me sempre

Seu am°. e menor servo


José R. do Amaral

(Diário Oficial, 20.10.1911)

– 15 –
O Maranhão Histórico

1
Primitivas explorações feitas nas costas do Norte do
Brasil. Primeiras tentativas de colonização para o Ma-
ranhão. João de Barros, Fernão d’Álvares e Aires da
Cunha. Versões diversas sobre a verdadeira origem da
palavra Maranhão. Fundação da povoação Nazaré,
na Ilha da Trindade (Maranhão). Segunda expedição.
Naufrágio de Luís de Melo da Silva. Vestígios da
primeira expedição.

S
ÃO DE 1535 as primeiras tentativas de colonização para o
Maranhão. Não quer isto dizer, porém, que, anteriormente,
outras explorações não se houvessem realizado já, para o nor-
te do Cabo de São Roque.
Conquanto vagas e escassas as notícias a semelhante respeito,
sabe-se que, por estas bandas andaram, no primeiro decênio do sé-
culo XVI, navios de Portugal, sendo de um deles, piloto, João de
Lisboa, que deu até seu nome a um dos rios aquém do Maranhão.
Em 1514 (e aqui já se vão tornando mais claras as notícias),
por uma carta de Estêvão de Fróis ao rei Dom Manuel, escrita da
ilha de São Domingos em 30 de julho, sabemos que, algum tempo
antes, percorrera parte da costa um João Coelho, das Portas da Cruz,
em Lisboa, e que os índios haviam morto o arauto Diogo Ribeiro,

– 17 –
José Ribeiro do Amaral

que, com o alvará régio, andavam, um e outro, a fazer descobrimen-


tos. Como, porém, essas explorações não eram completas, isto é,
não se estendiam a toda essa costa, limitando-se os exploradores a
traficar nas imediações das paragens onde aportavam, tanto em Por-
tugal como em Castela estiveram, por algum tempo, na crença de
que não havia, por aí, mais que um único grande rio entrando pela
terra adentro; pois os que conheciam o verdadeiro Maranhão (diz o
Visconde de Porto Seguro) não conheciam o Amazonas atual e vice-
versa; donde se originou confusão acerca destes dois rios, vindo am-
bos a ser designados com o nome de Maranhão; de modo que o
próprio Pinzón, descobridor, não do verdadeiro Maranhão, cuja des-
coberta se deve a Diogo de Lepe, mas sim da boca do grande rio de
Santa Maria do Mar Doce, ou atual Amazonas, não duvidou assegu-
rar a Oviedo haver sido o descobridor do Marañon.
De tudo isto resultou que, tendo, mais tarde, Orellana baixado
o mesmo Amazonas, não pôde fazer acreditar que não era o Marañon
o rio por que baixara, acrescenta Herrera, e, para voltar ao mesmo
rio, chegava a desejar pilotos portugueses, “porque eram os únicos
conhecedores da costa que continuamente navegavam.”
Em 1531, aproando ao Porto de Pernambuco, Martim Afonso
que, já, nas suas imediações, apresara três naus francesas, resolve,
talvez em virtude de ordens que recebera, mandar duas delas para as
bandas do Maranhão, sob o comando de Diogo Leite, a fim de fazer
explorar por aí a costa, e de colocar nela padrões em sinal de posse.
Percorrendo o litoral na direção leste-oeste, em virtude das
ordens que recebera, chegou pelo menos até a baía por algum tem-
po denominada Abra de Diogo Leite, hoje conhecida pelo nome
de Gurupi.
Como rico e precioso vestígio desta expedição, um mapa, em per-
gaminho, existe de toda aquela costa, feito por Gaspar Viegas em 1534,
no qual se lê, já, aquele primitivo nome, vendo-se também, nele, desig-
nada mais a oeste a Baía de São João, parecendo assim, diz o ilustre
Visconde de Porto Seguro, ter Diogo Leite chegado a ela no dia deste
santo (24 de junho), depois de haver entrado a 25 de março na Baía de
– 18 –
O Maranhão Histórico

São José, e, a 19 de abril, na de São Marcos, se é que estes nomes não


haviam sido anteriormente dados por Diogo de Lepe, em 1500.
Não obstante, porém, todas estas expedições e muitas outras,
encaminhadas para o litoral sul do Brasil, as quais, por não ser isso
do nosso programa, aqui não as mencionamos, trinta longos anos
passaram-se sem que a esta parte do Novo Mundo dispensassem os
monarcas lusitanos a atenção e os cuidados que parecia ela natural-
mente solicitar-lhes, organizando um serviço de colonização sério.
A notícia, porém, de que corsários de diversas nações infesta-
vam já a terra descoberta, tentando nela estabelecer-se, despertou
afinal a atenção de Dom João III, até então presa nos esplendores do
Oriente, e fê-lo empreender alguma coisa em favor desta parte dos
seus domínios.
Assim pois, dividiu o Brasil em porções desiguais de território,
a que denominou de capitanias, distribuindo-as em seguida por
vassalos beneméritos, sob condição de as povoarem, cultivarem e
civilizarem, concedendo-lhes, demais, todos os poderes reais, exceto
o de cunhar moeda e o de impor pena de morte.
A que recebeu o nome de Maranhão, constituída por uma do-
ação mista de cerca de duzentas e vinte e cinco léguas de costa, cou-
be, em parte, ao glorioso historiador das Décadas, João de Barros, que
convidou para companheiros na empresa Fernão d’Álvares de
Andrade, tesoureiro-mor do Reino, e Aires da Cunha, formando as-
sim uma associação trina, e alcançando da Coroa, como doação es-
pecial, o ouro e a prata, que na terra descobrissem, no que tiveram
mais favor que todos os demais donatários.
Organizada a expedição sob o mando do terceiro, que consigo
trazia dois filhos de Barros1 e um delegado de confiança do segundo,
1
Essa versão, corrente na época e durantes anos depois, está hoje contestada por diversas
pesquisas que desfizeram equívocos provavelmente provindos de Gândavo. Da primeira
expedição, ao comando de Aires da Cunha, não participaram os filhos de João de Barros.
Vd., de Rafael Moreira e William M. Thomas, Desventuras de João de Barros, primeiro
colonizador do Maranhão; o achado da nau de Aires da Cunha naufragada em 1536.
In Oceanos (Lisboa), p. 101-111. N?. 27, julho/setembro de 1996. JM.

– 19 –
José Ribeiro do Amaral

desferrou a grande armada do porto de Lisboa em novembro de


1535, com novecentos homens, dos quais cento e treze de cavalo,
em dez navios, rumo de Pernambuco, onde aportou com felicidade,
recebendo do donatário dessa capitania, Duarte Coelho Pereira, que
muito pareceu interessar-se pelo bom êxito de tão luzida expedição,
línguas ou intérpretes, e uma fusta de remos para ir adiante, sondando
as paragens menos conhecidas e exploradas.
Com tão bons auspícios, deixou o porto de Pernambuco a expe-
dição, à qual, daí em diante, estava reservada toda a sorte de desditas.
Chegada que foi à barra do Maranhão, depois de haver inutil-
mente tentado Aires da Cunha fundar uma colônia no rio Baquipe,
hoje Ceará-Mirim, devido à oposição dos potiguares aliados aos fran-
ceses, e de ter-se desgarrado a fusta de remos, chegando a andar
perdida e já sem mantimentos, deu a expedição, devido à quase ne-
nhuma prática que ainda tinham os pilotos, daquelas paragens, em
uns baixios que se encontravam à entrada, por espraiar ali muito o
mar, perdendo-se toda a armada e perecendo miseravelmente os que
escaparam, inclusive o próprio chefe da expedição, Aires da Cunha.
E assim malogrou-se a primeira tentativa séria de colonização
que se encaminhou para o Maranhão.
É daí, do malogro desta expedição que, no pensar quase unâ-
nime dos melhores historiadores, vem a origem deste nome, dado à
região que constituía a doação de João de Barros; ou porque ao nau-
fragar supusessem os da expedição se encontrar na embocadura do
imenso rio, quando realmente se encontravam a mais de cem léguas
ao sul, perto da ilha em que se salvaram os sobreviventes, e que ora,
graças a este erro, é conhecida pelo nome de Maranhão; ou porque,
como querem alguns, para enobrecer a sua desgraça, dissessem os
náufragos haver-se dado o desastre na boca do grande rio (Amazo-
nas), também conhecido por Marañon (Maranhão).
Como quer que seja, o certo é que o nome se perpetuou, trans-
mitindo-se, com o correr dos tempos, à região toda.
A esta ilha (do Maranhão), deram os sobreviventes o nome de
– 20 –
O Maranhão Histórico

Trindade, ou porque já se encontrasse ela com tal nome no mapa de


Diogo Ribeiro, em 1529, ou porque melhor devia caber-lhe agora,
pela associação dos três donatários; e procuraram, com as relíquias
do naufrágio, nela estabelecer-se, fundando uma pequena povoação
que recebeu o nome de Nazaré, a qual de efêmera duração foi, pois
os índios, com a sua proverbial volubilidade de amigos, que a princí-
pio se tinham mostrado, pouco tardaram em se levantar, queimando
e destruindo as plantações e sementeiras e chegando a pôr em aper-
tado sítio a povoação e a tomar-lhes a água das fontes de beber, de
sorte que, reduzidos à última penúria e havendo perdido já muita
gente, viram-se os que restavam ainda forçados a abandonar a terra
para onde haviam partido todos, tão cheios de esperanças.
Nada mais se tem podido adiantar até hoje sobre a história desta
pequena colônia, sendo para lamentar, como diz ainda o ilustre Vis-
conde de Porto Seguro, que João de Barros no-la não deixasse escrita,
o que teria feito com tanto vigor, como viva era a lembrança que per-
petuamente conservou desta para ele tão malfadada empresa.
Desacorçoado e profundamente arruinado com o insucesso
desta gigantesca expedição, a maior que os nossos mares tinham vis-
to até então em poder naval, tão grande e que tanto ruído fez que,
pelos seus preparativos, chegou a fazer acreditar ao embaixador es-
panhol, Sarmiento, que era mandada pelo governo português contra
os recentes estabelecimentos castelhanos do Rio da Prata, abriu João
de Barros mão do seu privilégio,2 tendo-se ainda por muito feliz em
poder reaver, à custa de muitos trabalhos e despesas, seus dois filhos,
mandados reter na Ilha de São Domingos.
Em 1554, segunda expedição organizou-se, sob o mando de
Luís de Melo da Silva,3 a quem el-rei transferira, intacto, o privilégio
2
Equívoco a que foi levado o autor, seguindo autores de seu tempo. Em 1561, conf. fonte
retrocitada (p. 111), Jerônimo, filho mais velho de João de Barros, obteve, pelo alvará
régio de 5 de março, a revalidação dos direitos de seu pai. JM.
3
Luís de Melo da Silva, não como donatário, mas na condição de contratado por João de
Barros ou a ele associado, viajou pela primeira vez ao Maranhão em 1554. Em 1573,
provavelmente já na qualidade de titular da capitania do Maranhão, por compra aos filhos
de João de Barros (falecido em 1570), Luís de Melo da Silva fez sua segunda viagem ao

– 21 –
José Ribeiro do Amaral

de João de Barros; mas, tão infeliz como a primeira, naufragou em


uns baixios que se presume serem os dos Atins, salvando-se apenas
uma das caravelas, em que os desventurados náufragos conseguiram
se recolher à Pátria.
Ao malogro destas duas expedições sucede um período de cerca
de quarenta anos de completa inação e abatimento, completamente
perdidos, durante os quais não consta que, por parte da Metrópole
ou de particulares, tivesse havido qualquer outra tentativa de coloni-
zação para o Maranhão.
Não nos deixou (que saibamos) nenhuma destas duas expedi-
ções o mais ligeiro vestígio, sequer, de sua passagem por esta terra,
conquanto frei Marcos de Guadalajara, trasladando a Simão Estácio
da Silveira, se refira à existência de uma fortaleza, levantada no
Boqueirão pelos sobreviventes da expedição de Aires da Cunha, na
qual se conheciam pedras brancas de Alcântara.4
Não nos parece ser isto exato, e já o historiador Berredo, es-
crevendo cerca de duzentos anos atrás e em condições, portanto, de
melhor poder apurar a verdade histórica, dizia nos seus Anais que
nem da fortaleza, nem das pedras de Alcântara com que o capitão
Simão Estácio a dava por fabricada, havia a menor tradição do anti-
go Estado do Maranhão, quando mal pode crer-se que no espaço só
de oitenta anos (que não se contam mais desde o de 1535, em que foi
o naufrágio de Aires da Cunha, até o de 1615, em que Jerônimo de
Albuquerque se estabeleceu na Ilha de São Luís) tivesse já o tempo
consumido uma obra de tanta duração, e com tamanho estrago, que
nem lhe deixasse os fundamentos para memória dela.

(27.10.1911)

Maranhão, na qual pereceu. Entre a primeira e a segunda expedição de Luís de Melo da


Silva, houve a dos filhos de João de Barros, Jerônimo e João, que no Maranhão se demo-
raram de 1556 a 1561, fazendo diversas explorações na região. JM.
4
A Alcântara aí referida é a então vila dos arredores de Lisboa, hoje bairro da capital
portuguesa. A primitiva Tapuitapera, atual cidade maranhense de Alcântara, foi assim
denominada só em meados do século XVII. JM.

– 22 –
O Maranhão Histórico

2
Bequimão e seus descendentes

C
OMEMORANDO a Pátria Maranhense neste dia, de tão tris-
tes e saudosas recordações para todos, o 226° aniversário da
execução deste grande patriota, cujas últimas palavras, ao su-
bir ao patíbulo, foram de afeto, de amor para esta terra, interrompe-
mos, por hoje, o programa que traçamos, para alguma coisa dizer
sobre os descendentes deste grande homem e de seu irmão, Tomás
Bequimão.
Assim procedendo, julgamos prestar ao Grande Supliciado de
1685 a maior e melhor de todas as nossas homenagens, contribuin-
do, de nossa parte, para que de sorte alguma se possa extinguir a
memória de seu nome.
Teve a família Bequimão dois ramos aqui no Maranhão – Ma-
nuel – o grande e glorioso mártir de 1685; e Tomás – seu irmão mais
novo e, como ele, considerado cidadão de São Luís.
Do primeiro ficaram a viúva e duas filhas, não constando das
crônicas do tempo que houvesse deixado filho varão algum, a menos
que alguma das suas filhas, casando-se, não houvesse dado a descen-
dente seu o apelido de seu pai, para assim perpetuar-lhe o nome.
Outro tanto, porém, não se deu com o segundo, cuja descen-
dência, numerosíssima, veio até os nossos dias, com variantes diversas
– 23 –
José Ribeiro do Amaral

nos seus apelidos, tais como: Bequimão, Beckman e até Bequimanz.


Nesta nossa faina de percorrer arquivos e conversar com o
passado, não poucas são as vezes que nos tem sido dado deparar
com autógrafos de diversos membros desta família.
O de todos mais antigo que conhecemos é a sua assinatura em
um acórdão em vereação da Câmara de São Luís, cuja data não te-
mos agora presente.
Nele vê-se, em um tipo de letra bem claro, bem conservado e
perfeitamente legível, o nome do chefe desta família, o malogrado
autor da Revolução de 1685 – Manuel Bequimão.
Trinta e dois anos depois do desfecho deste movimento revo-
lucionário, encontramos pela primeira vez este nome em uma carta
régia de 20 de novembro de 1717, da qual consta haver representado o
governador para a Corte que, fazendo o ouvidor-geral da Capitania do Pará, em
1715, o pelouro dos oficiais que tinham de servir no Senado, mais por indústria
que por conformidade de votos, metera nele o nome de Roque, filho de Tomás e
sobrinho de Manuel Bequimão, cuja turbulência (dizia o governador na sua
representação) lhe passara como herança, pois havia feito na mencionada capi-
tania muitas inquietações escandalosas, a que o dito ouvidor deixara de atender,
escolhendo-o para juiz ordinário.
A estas considerações respondeu el-rei que, se Roque Bequimão,
durante o ano do seu juizado, que já devia estar findo, tivesse dado ocasião a
alguma perturbação, do que os povos recebessem desprazer e escândalo, nunca
mais fosse admitido na Câmara, registrando-se, entretanto, aquela ordem para a
todo o tempo constar.
Oito anos depois, em 1725, encontramos Manuel Inocêncio
de Bequimanz (com o apelido já modificado) que por essa ocasião
alcançou sentença para poder servir de procurador da Câmara de
São Luís, alegando que só poderia ser considerado inábil por infame se seu pai
fosse cristão-novo, ou tivesse sido justiçado, o que não sucedera, pois Manuel
Bequimão, que o fora, era apenas seu tio.
Este, como se vê, era, ao que parece, filho de Tomás Bequimão,
havendo já servido como escrivão do Juízo Eclesiástico na célebre
– 24 –
O Maranhão Histórico

ação cominatória que os frades capuchos intentaram às saúvas para


as fazer despejar da cerca do seu convento, cuja posse mansa e pací-
fica turbavam contra todo o direito.5
Além destes, possuímos autógrafos dos seguintes descenden-
tes desta família:
Inácio de Loyola Beckman – Vivia ainda, nos últimos anos do sécu-
lo XVIII, nesta capital, onde era tabelião e exercia o cargo de síndico
dos religiosos de Santo Antônio, segundo se vê de documentos que
temos à vista, de seu próprio punho, com datas de 1783 e 1789.
Dr. Bernardo Bequimão – Promotor do Juízo Eclesiástico em
1779 e cura da Sé. Existia ainda em 1792.
José João Beckman – Temos, deste, dois documentos, todos do
próprio punho; são duas certidões passadas “como pároco da fre-
guesia de Nossa Senhora da Vitória da Igreja Catedral do Maranhão
por apresentação régia e instituição canônica” – uma de 1790, outra
de 1803. Era também vigário-geral da Diocese.
João Antônio Beckman – Foi administrador das diversas rendas
nacionais e inspetor da Alfândega de Parnaíba, de 1835 a 1841.
Tenente Tomás Raimundo Beckman – Em novembro de 1858, era
presidente da Câmara Municipal e juiz de órfãos por lei, na cidade de
Alcântara e seu termo.
Consta isso de uma guia de recebimento de dinheiro de órfãos
na importância de Rs. 54:631$000.
Miguel Eliseu Beckman – Capelão da catedral em 1859. Encon-
tramos este nome em uma Relação das perdas dos empregados da Catedral
no mês de abril daquele ano. E – coisa singular! – entre os empregados
cujos nomes figuram nessa folha, encontra-se o do então capelão
Luís Raimundo da Silva Brito, atualmente arcebispo de Olinda.6

5
O Processo das Formigas é fato real. Correu no Juízo Eclesiástico do Maranhão em
1712-1714, segundo cópias parciais que dele existem no Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro (Rio de Janeiro), sob código Lata 467, Documento 6. JM.
6
Não se perca de vista a data de publicação deste artigo, que é de fins de 1911. D. Luís
Raimundo da Silva Brito, nascido em 1840, faleceu em 1921. JM.

– 25 –
José Ribeiro do Amaral

Érico Pedro Beckman – Carcereiro da Cadeia Pública da capital,


em 1860, e mais tarde sargento-vago-mestre do Corpo de Polícia,
vivia ainda em 1879; era magro e de estatura bastante elevada.
João Batista da Silva Beckman – Era delegado de Polícia na cidade
de Vigia, província do Pará, em 1868. O documento que com a sua
assinatura possuímos é um atestado em que ele declara que o vapor
Odorico Mendes, da Companhia de Navegação a Vapor do Maranhão,
entrou no porto daquela cidade, procedente dos portos do Sul em
11, seguiu para o Norte na mesma data e voltou em 14, tudo de abril
daquele mesmo ano.
Francisco Xavier Beckman – Faleceu sendo chefe de seção do
Tesouro Público Provincial em 1869. Era um caráter respeitabilíssimo.
Violinista exímio, era tido aqui como o primeiro de seu tempo, ten-
do sido professor de Leocádio Rayol e regente da orquestra do Tea-
tro São Luís durante muitos anos.
Tomás Raimundo Beckman Júnior – Escrivão de órfãos da cidade
de Alcântara e seu termo. O documento que isto nos comprova é
uma guia de recebimento do dinheiro daquele juízo, visada em 7 de
dezembro de 1870 pelo então juiz de órfãos daquela comarca, Dr.
Segismundo Antônio Gonçalves, que mais tarde se retirou para
Pernambuco onde, com o advento da República, foi governador, e
atualmente é senador.
Casemiro Francisco Beckman – Atual escrivão de um dos cartóri-
os da cidade de Alcântara.
Em nossos dias, disse João Lisboa, existiram, e existem ainda no
Maranhão, alguns membros desta antiga família, já com o nome de Beckman
restituído à sua genuína ortografia estrangeira, e temos ouvido que em época não
muito afastada, um deles, que exercia o emprego de escrivão da Câmara, queren-
do, quanto em si estava, delir todas as memórias de um fato, que reputava inju-
rioso, a fim de que ninguém mais o conhecesse por neto ou descendente do enforca-
do, subtraiu do Arquivo e do ventre dos livros todas as folhas que tinham relação
com o mesmo fato.

– 26 –
O Maranhão Histórico

O certo é que daqueles memoráveis acontecimentos não se encontram ali


senão referências casuais muito posteriores, faltando tudo quanto é relativo aos
dois anos em que eles tiveram lugar.
Não sabemos quais as razões e testemunhos em que se baseou
o nosso grande historiador para assim pensar.
Quer-nos parecer, porém, com a devida vênia que a sua auto-
ridade nos inspira, que muito outra é a causa da lacuna por ele apon-
tada nos livros da Câmara.
Quando, em comissão do ministro do Império, Visconde de
Monte Alegre por aqui andou, em julho de 1851, o nosso ilustre
poeta Antônio Gonçalves Dias a proceder a “exames nos arquivos
dos mosteiros e das repartições públicas para a coleção dos docu-
mentos históricos relativos ao Maranhão”, retirou-nos daqui, entre
muitos livros e documentos do Arquivo da Secretaria do Governo,
doze da Câmara Municipal, segundo se vê da nota, apensa ao seu
relatório, que diz: Livros da Câmara Municipal do Maranhão que vão reme-
tidos para o Arquivo do Rio:

1°. Registro de 1639-1664


2°. Registro de 1654-1663
3°. Registro de 1647-1668
4°. Registro de 1668-1669
5°. Registro de 1671-1676
6°. Registro de 1685-1690
7°. Registro de 1702-1710
8°. Registro de 1732-1753
9°. Registro de 1720-1809
10°. Cartas régias 1648-1798

– 27 –
José Ribeiro do Amaral

11°. Acórdãos 1628-1662


12°. Acórdãos 1675-1683

Maranhão, 10 de julho de 1851


(Assinado)
Antônio Gonçalves Dias

Como se vê, os livros que daqui foram retirados, para o Arquivo


do Rio de Janeiro nada valem, estão lá abandonados, se existirem ain-
da, para nós são de um valor inestimável, insubstituível: representam a
história de toda a nossa vida colonial até princípios do século XIX.
Pela simples inspeção das datas, fácil é de ver que neles se deve
encontrar tudo quanto diz respeito à Invasão Holandesa, às lutas
com os jesuítas, à revolução de Bequimão, etc., cuja falta tanto la-
menta Lisboa.
E já que nos ocupamos disto, é ocasião de fazer aqui um apelo
ao honrado Sr. Governador do Estado,7 que tão carinhoso é por
tudo quanto diz respeito a esta terra.
Procure S. Exa. reaver estes livros que daqui nos levaram, que
são nossos, que representam o esforço dos nossos antepassados pelo
Maranhão; não consinta que permaneçam eles por mais tempo fora
do lugar onde estavam e de onde nunca deveriam ter saído.
Queira, como costuma querer, e não pequeno serviço terá pres-
tado a esta terra que tanto lhe deve.

(3.11.1911)

7
Luís Antônio Domingues da Silva, governador do Maranhão no quadriênio 1910-1914. JM.

– 28 –
O Maranhão Histórico

3
Os franceses no Maranhão

Q
UARENTA anos eram já passados do naufrágio de Luís de
Melo e, com ele, do malogro da última tentativa de coloniza-
ção, sem que a Portugal fosse dado, durante todo esse tem-
po, lançar suas vistas para esta parte de seus domínios, preocupado,
como se achava então, a princípio com as guerras da África, que lhe
consumiam o melhor de suas forças, e mais tarde, com a dolorosa
passagem da Coroa ao domínio espanhol, quando, em 1594, um fran-
cês de nome Jacques Rifault, armador de Dieppe, andando a piratear
pelas costas do Brasil, acossado por tremenda tempestade, de que
lhe resultou a perda de seu melhor navio, veio, com os dois que lhe
restavam, ter ao Maranhão.
Aqui, abrindo relações com os selvagens, e ganhando a afei-
ção do principal deles, o cacique Ovirapive, conseguiu fundar um
pequeno estabelecimento, cuja administração confiou a Carlos des
Vaux, que, depois de uma permanência de cerca de dois anos, em
que logrou a posse de toda a Ilha e a amizade dos tupinambás, seus
habitadores, partiu para a França a fim de obter de Henrique IV o
apoio e proteção para fundar aí um estabelecimento permanente.
Tais foram as informações que, dos recursos e riquezas natu-
rais da nova terra, levou ao rei, que este determinou mandar explorá-
la à custa da Coroa, fazendo voltar na mesma ocasião des Vaux,
– 29 –
José Ribeiro do Amaral

acompanhado de Daniel de La Touche, Senhor de La Ravardière,


que vinha desempenhando as funções de comissário régio.
Chegados ao Maranhão, demoraram-se seis meses.
Exatíssimo era quanto des Vaux havia contado ao rei; volta-
ram à França.
Mas, nesse ínterim, Henrique IV acabava de cair sob o punhal
de Ravaillac (1610), e as dissensões intestinas, civis e religiosas, que
então consumiam aquele País, não permitiram a La Ravardière obter,
de pronto, os auxílios que esperava da Coroa, e só depois de alguma
delonga e não pequeno esforço, foi que conseguiu incorporar uma
companhia, de parceria com Nicolau de Harlay, Senhor de Sancy e
Barão de Molle e Gros Bois, e Francisco, Senhor de Rasily e Aumelles,
aos quais, em nome de El-Rei Cristianíssimo, conferiu a Rainha Re-
gente as cartas-patentes de tenentes-generais nas Índias Ocidentais e
territórios do Brasil, fazendo-lhes, também por essa ocasião, doação
de uma riquíssima bandeira com as armas da França em fundo azul
celeste, tendo por divisa um navio no qual se via ela mesma ao leme,
com o filho à proa, empunhando um ramo de oliveira que das mãos
dela recebera, e por lema Tanti dux faemina facti.
Organizada a expedição, composta de três navios – Regente,
Carlota e Sant’Ana – com cerca de quinhentos homens, levantou fer-
ro do porto de Cancale, aos 19 de março de 1612, vindo, depois de
uma viagem das mais tormentosas, lançar âncora no Maranhão, aos
26 de julho, na ilha então conhecida por Upaon-Mirim, à qual, em
memória daquele dia, deram o nome de Santana, que ainda hoje dura.
Aqui demoraram-se os expedicionários alguns dias, que não
foram perdidos para a causa da catequese e civilização dos índios,
chegando à Ilha Grande a 6 de agosto, depois de bem se haver de La
Ravardière certificado, por intermédio de seu emissário Carlos des
Vaux, da boa hospedagem que a todos reservavam os indígenas.
Acompanhavam a expedição, a pedido de Maria de Médicis,
regente da França, os padres capuchinhos Ivo d’Evreux, Cláudio de
Abbeville, Arsênio de Paris e Ambrósio de Amiens, todos, pelas suas
– 30 –
O Maranhão Histórico

virtudes, sendo os dois primeiros, particularmente Ivo d’Evreux, dos


mais insignes religiosos que terras brasileiras têm pisado, acrescendo
ainda a circunstância de haverem sido mais tarde os historiadores da
missão, da qual bem podiam dizer que grande parte foram.
Mas, a esse tempo, já à Metrópole haviam chegado vagos ru-
mores da ocupação francesa, e então, só então, como que tornando a
si do abandono a que havia deixado cair esta tão rica porção das suas
possessões, foi que a corte de Madri se decidiu afinal a empreender a
conquista do Maranhão.
Aparelhada para esse fim a esquadra, que se compunha de dois
navios redondos, uma caravela e cinco caravelões, com uma
equipagem de menos de cem homens de mar e guerra, desferrou do
porto do Recife aos 23 de agosto de 1614, ao mando de Diogo de
Campos Moreno, que deveria em viagem juntar-se a Jerônimo de
Albuquerque, dali saído desde 22 de junho com algumas embarca-
ções, e já então na Fortaleza do Rio Grande.
Reunidas as duas pequenas expedições, fez-se de vela, deste
último porto, a armada, no dia 5 de setembro, sob o mando supremo
do segundo, já investido no cargo de capitão-mor da conquista do
Maranhão; e depois de uma derrota trabalhosa e difícil, deu fundo
no dia 26 de outubro no sítio denominado Guaxenduba, onde, ape-
nas desembarcados, trataram apressadamente todos de levantar for-
tificações, a fim de, assim, melhor resistirem a qualquer ataque por
parte dos dominadores da ilha que lhes ficava fronteira.
E não se iludiram.
Acobertados pelas últimas sombras da madrugada de 19 de
novembro, e cosidos com o mangue quanto lhes permitiam as cano-
as em que iam, começaram os franceses a despejar gente em terra,
ferindo-se dentro em pouco a ação, que é conhecida pelo nome de
Guaxenduba – do sítio em que teve ela lugar, e que é uma das pági-
nas mais brilhantes e mais gloriosas de toda a nossa história colonial.
As minguadas forças portuguesas, tendo à sua frente os dois
velhos guerreiros – Jerônimo de Albuquerque, encanecido nas guerras
– 31 –
José Ribeiro do Amaral

irregulares do Brasil, decidido e arrojado; e Diogo de Campos, o vete-


rano de Flandres, calmo e imperturbável, cobriram-se, nesse dia, de
glória, obrando excessos de energia, praticando gentilezas de valor,
lutando enfim contra um inimigo dez vezes superior em número!
Prolongou-se esta famosa jornada das dez horas da manhã até
quase ao cair da noite, quando, repelidos por toda a parte, entrega-
ram-se os franceses à mais desordenada fuga, abandonando o cam-
po aos vencedores.
No mapa da Provincia del Maragnone que acompanha a obra Istoria
delle guerre del Regno del Brazile accadute tra la Corona di Portogallo, e la
Republica di Olanda, composta, ed offerta alla sagra reale maestà di Pietro Secondo
re di Portogallo, etc., dal P. P. Gio. Giuseppe di Santa Teresa, Carmelitano
Scalzo. Parte Prima Anno MDCXCVIII. In Roma, nella Stamperia degl’Eredi
del Corbelletti, nesse mapa, que se encontra entre as páginas 24 e 25 da
referida obra, vem já assinalado o sítio onde feriu-se tão gloriosa
peleja, a quatro léguas do Rio Munim, representado por um hexágo-
no perfeito com a inscrição – Forte de Santa Maria, assim chamado
(diz Diogo de Campos, Jornada do Maranhão por ordem de Sua Majestade
feita o ano de 1614), por haverem os padres capuchos lançado sortes
ao nome da fortaleza e ter saído o Nascimento de Nossa Senhora.
A este brilhante feito de armas seguiu-se um tratado de tré-
guas, que não foi respeitado por ter sido concluído com piratas, –
disse-o a Corte de Lisboa, sendo então enviado Alexandre de Moura
com uma nova expedição e ordens terminantes para ultimar a con-
quista do Maranhão.
No dia 11 de novembro de 1615, apresentou-se na barra a
armada portuguesa, e, no dia seguinte, intimado a render-se, assinou
Ravardière um auto de entrega da Fortaleza de São Luís, bem como
dos navios, com toda a artilharia, munições e petrechos bélicos, ha-
vendo durado a ocupação francesa, no Maranhão, cerca de três anos
e quatro meses.

(10.11.1911)

– 32 –
O Maranhão Histórico

4
Caráter, fins, meios e resultados
da Ocupação Francesa em paralelo
com a Invasão Holandesa

A
QUEM ESTUDA a História do Maranhão e compara as
duas invasões estrangeiras que logo nos seus começos se
sucederam uma a outra com tão pequeno intervalo, não é
possível (disse o nosso grande historiador)8 que escape o pronunci-
ado antagonismo do caráter, fins, meios e resultados de ambas.
De fato, assim é.
E, se não, vejamos, começando pelo próprio ato, em si, da invasão.
Dos franceses não se pode propriamente dizer que invadiram
– não, eles tomaram posse, ocuparam um território totalmente aban-
donado, cujas primeiras explorações lhes eram devidas, pois haviam
sido feitas por armadores de Dieppe e datavam já de 1524, explora-
ções completadas pelas navegações de Afonso de Chaintongeois até
às bocas do Amazonas, em 1542.
Foi de toda essa imensa extensão de território que, vinte e
cinco anos mais tarde, Henrique IV fez doação a um bravo capitão
da Religião Reformada, doação de que vamos encontrar de posse a
8
Referência a João Francisco Lisboa. JM.

– 33 –
José Ribeiro do Amaral

Daniel de La Touche, pelas cartas-patentes de julho de 1605, e que


este conseguiu que lhe fosse renovada por Luís XIII em 1610, esten-
dendo-se o seu domínio (dizia o texto da concessão renovada) desde o
Rio do Amazonas até a Ilha da Trindade.
Eram, portanto, os franceses portadores de um título, cuja le-
galidade não é aqui ocasião de apurar, que os habilitava a tomar pos-
se de toda esta região.
E ainda assim, como o fizeram?
Procuraram a amizade e as alianças dos naturais do País, e,
uma vez aqui estabelecidos, trataram de catequizá-los e civilizá-los,
levando-os sempre pelos meios brandos, conseguindo, por esta for-
ma, ganhar-lhes confiança tal, que não consta, durante o período de
três anos e quatro meses, que tanto durou a Ocupação Francesa, ter
havido qualquer ato de insurreição por parte dos indígenas.
Era, portanto, a Missão Francesa uma missão toda de paz, toda
no interesse da própria civilização.
Dirigindo-se ao Brasil, procurando terras do Maranhão, certo
não o haviam feito os franceses tão-somente no interesse ou por
amor aos indígenas, não! Mais do que isso, para aqui os atraía e arras-
tava a idéia de arrancar de uma terra virgem tudo quanto ela lhes
pudesse dar, e disso estavam mais que certos pelas afirmações de des
Vaux; mas, enquanto por um lado assim pensavam e assim procedi-
am, por outro, não descuravam um só instante dos índios, ativando
por todos os meios a catequese e provendo ao seu bem-estar, aten-
dendo-lhes assim às necessidades espirituais e temporais.
Era Daniel de La Touche protestante. Não foi, entretanto, aos
partidários de sua religião que se dirigiu ele para ser bem-sucedido
nesta empresa.
Pelo contrário, sem hesitar, entrou em conferência com católi-
cos proeminentes, cuja lealdade perfeitamente conhecia, tais como: o
almirante Francisco de Rasilly, uma das mais antigas glórias da França,
e Nicolau de Harlay, uma de suas sumidades financeiras, conseguin-
– 34 –
O Maranhão Histórico

do deles que se lhe associassem na exploração deste privilégio.


Em todo o século XVII não conhecemos transação outra, en-
tre católicos e protestantes, mais leal e desinteressada: foi, na verda-
de, uma empresa digna de contar em si o padre Ivo d’Evreux, tão
sincero como justo.
E dos holandeses, poderemos nós dizer outro tanto?
Governava o Maranhão Bento Maciel Parente, quando, a 25
de novembro de 1641, apresentou-se inopinadamente na barra po-
derosa esquadra holandesa, forte de dezoito velas, com cerca de dois
mil homens de desembarque, a qual, recebida a princípio com salvas,
como sói acontecer entre nações amigas, e logo em seguida com
artilharia das baterias portuguesas, por mostrar intenções hostis, foi
altaneiramente, transpondo o ancoradouro, dar fundo na Ponta do
Desterro, no rio Bacanga.
Aí, desembarcando metade de suas tropas, dispunha-se
Lichthart a investir contra a fortaleza, quando Maciel por um emis-
sário lhe fez notar a perfídia com que procurava senhorear-se de um
território que só pertencia a El-Rei seu amo.
Iludindo o velho governador com promessas falaces de um ajuste
de tréguas, até que recebesse resposta dos Estados Gerais, a quem ia
consultar nesse sentido, dirigiu-se João Cornelles à testa dos seus sol-
dados para a fortaleza, que encontrou indefesa, e, prendendo a Bento
Maciel, fez abater o pavilhão português e arvorar o holandês.
Dar-se-á caso de maior perfídia?
Colhida esta tão fácil vitória, entregaram-se os holandeses a
toda a sorte de depredações, não respeitando sagrado nem profano.
Pilharam as casas e os templos, levando mão sacrílega às imagens,
que despedaçaram.
Aterrados com este espetáculo, fugiram espavoridos os mora-
dores para os matos, abandonando suas casas, ficando assim em pouco
tempo a pequena cidade quase deserta; e não satisfeito ainda, fez
João Cornelles prender a cento e cinqüenta dos mais importantes,
– 35 –
José Ribeiro do Amaral

entre os quais se contava um sobrinho de Bento Maciel, atirando-os


no porão de um navio, podre e inservível, que mandou sair barra
fora, contando assim entregá-los a uma morte certa.
Ainda mais. Fintou em cinco mil arrobas de açúcar os propri-
etários dos cinco únicos engenhos que havia nas margens do
Itapecuru, reduzindo-os, por escárnio, a administradores ou feitores
dos seus próprios estabelecimentos!
E agora, que contraste entre uns e outros: entre o procedi-
mento indigno de João Cornelles para com os pobres habitantes de
uma pequena cidade, tomada à mão armada, à falsa fé, em plena paz,
e abusando da fraqueza de um povo imbele e desarmado, não menos
que das irresoluções de um velho setuagenário, e o cavalheiresco e
nobre de Daniel de La Touche, logo após a Batalha de Guaxenduba,
o qual, apesar de derrotado por Jerônimo de Albuquerque, não tre-
pidou de mandar ao campo inimigo o seu cirurgião-mor e remédios
para acudir aos feridos que, à míngua deles, faleciam!
Convidado a jantar a bordo de um dos navios franceses pelo
Senhor de La Ravardière, depois de haver sido recebido com termos
muito corteses e de lhe terem sido prestadas todas as honras milita-
res (é o próprio Diogo de Campos quem o diz) – observou que não
faltava de comer, e música naval bem concertada, mostrando Ravardière na auto-
ridade e no trato um vestígio honrado em que se enxergava despesa mais que
ordinária. – Ao retirar-se o sargento-mor, salvaram os navios e fize-
ram-lhe todas as demais honras do estilo.
Do pouco que aqui fica dito, conclui-se que:
Os franceses levantaram, os holandeses derrubaram; os france-
ses deram começo à fundação da cidade e à construção dos primeiros
edifícios que aqui houve, alguns dos quais ainda hoje duram; os holan-
deses incendiaram ou lançaram por terra esses mesmos edifícios; os
franceses trouxeram para aqui não pequenos cabedais, inclusive alfaias
para o convento de São Francisco (Santo Antônio), trabalhadas pelas
próprias mãos da Duquesa de Guise; os holandeses arrebataram-nos
tudo isso, como fintaram o açúcar de todos os engenhos e tudo o
– 36 –
O Maranhão Histórico

mais que seus olhos cobiçosos viram, só não havendo feito o mes-
mo às pedras das casas das nossas fortalezas por lhes ser, de todo,
impossível transportá-las nos seus já arruinados e imprestáveis navi-
os.
Eis por que na sua Introdução aos Anais históricos do Maranhão,
por Berredo, dizia o nosso grande poeta9 que a expulsão dos france-
ses levara consigo tantas esperanças, e a invasão dos holandeses es-
tragara tantas fortunas.

(17.11.1911)

9
Gonçalves Dias. JM.

– 37 –
O Maranhão Histórico

5
Fundação do Maranhão

A
CIDADE de São Luís, capital do Estado do Maranhão, é
uma cidade de origem absolutamente francesa, ocupando,
ainda hoje, o mesmo lugar escolhido por seus fundadores.
Está situada a 2°30’44" de Lat. S. e 1°6’36" de Long., em arco
do meridiano do Rio de Janeiro, em uma pequena península ao sul
do Anil, a E. e N. do Bacanga, ligada à ilha do mesmo nome pela
estrada do Caminho Grande, no lugar conhecido por Alto da Carneira.
Foi na extremidade O. desta península, em um sítio previa-
mente escolhido, a cavaleiro do ponto em que se dá a confluência
dos dois já referidos rios – Anil e Bacanga – que, há 299 anos, lança-
ram os chefes da Missão Francesa os primeiros fundamentos de uma
pequena cidade a que deram o nome de São Luís, em memória eter-
na de Luís XIII, rei da França e de Navarra, e ao fundeadouro que
lhe ficava junto o de Porto de Santa Maria - em homenagem à Vir-
gem Santíssima, cuja natividade se celebrava naquele memorável dia
(8 de setembro), e também a Maria de Médicis, regente da França na
menoridade de Luís XIII, como reconhecimento aos largos favores
por ela dispensados à expedição.
Vejamos agora como tudo isto teve lugar; como foram assen-
tados os primeiros fundamentos da nossa querida São Luís.
– 39 –
José Ribeiro do Amaral

Chegados ao Maranhão a 6 de agosto de 1612, guiados, como


já vimos, por de Rasilly e de La Ravardière, trataram para logo os
franceses de construir um forte que lhes pudesse dar a segurança da
posse e conservação do território que acabavam de ocupar.
Escolheram para esse fim (diz o padre Cláudio de Abbeville) uma
bonita praça muito própria por ser numa alta montanha e na ponta de um
rochedo inacessível, superior a todos os outros, e donde se descobre terreno a
perder de vista, e, embora separada da terra firme, é inconquistável e muito
forte, por estar cercada de dois rios profundos e largos que desembocam no mar
ao pé do dito rochedo, onde é o único porto da Ilha do Maranhão, e nele podem
fundear com toda a segurança navios de mil a mil e duzentas toneladas.
Isto quanto à escolha do local para o forte.
Vejamos agora como se construiu este, e onde e como se le-
vantaram as primeiras habitações que contou a nascente cidade.
Reconhecendo os índios a necessidade desse forte, por seu e nosso interesse
(continua Cláudio d’Abbeville), principiaram a trabalhar logo nele com
muita alegria e sinceridade, construindo muitas casas para os franceses, com
pequenas árvores, que contavam de 12, 15 e 20 pés, conforme a altura que se
desejava.
Enterrando essas árvores no chão uma contra a outra, eles as prendiam
com outros pedaços de paus atravessados com barrotes e cordas.
Por cima de tudo estendiam ripas e cobriam com folhas de palmeira, cha-
madas em sua linguagem – pindoba –, e com tal arte que não deixava penetrar
a chuva, e vista de dentro, notava-se curiosa disposição ou arranjo.
Em pouco tempo edificaram muitas casas dessas, de um e dois andares
com um grande armazém, onde arrumaram todos os gêneros que trouxemos, e
que eles próprios foram buscar a bordo.
Com auxílio dos franceses, montaram no dito forte, embora muito alto,
vinte canhões grandes para sua defesa.
Junto a este forte há uma praça cômoda e bonita: nela se encontram muito
boas fontes e regatos, que são a alma de uma cidade, e aí existem todas as como-
didades desejadas, como sejam paus, pedras, barro e outros materiais para a
edificação sem muito dispêndio.

– 40 –
O Maranhão Histórico

Tal é a singela descrição que nos faz o reverendo padre Cláu-


dio de Abbeville do local preferido pelos chefes da Missão Francesa
para a fundação da pequena cidade, local que, pelos termos claros e
inconfundíveis por que o descreve, outro não é senão o outrora co-
nhecido por Largo de Palácio, atualmente Avenida Maranhense.
Abrangia, portanto, o estabelecimento francês, no seu come-
ço, a área que se estende da Rampa até o lugar ocupado hoje pela
Catedral e Palácio do Bispo, onde então havia, sob a invocação de
São Luís, uma pequena capela provisória, à imitação das igrejas dos
conventos dos capuchinhos de Paris, construída de madeira, cercada
e coberta de ramos fortes, cortados de uma árvore chamada
Acaiucantim.
Era aí que, temporariamente, celebravam os religiosos capuchos
todos os atos divinos, enquanto procediam à construção da capela
de São Francisco do Maranhão (Santo Antônio).
Aí, diz Ivo d’Evreux, celebrei missas, cantei vésperas, preguei e bati-
zei catecúmenos.
À tarde tocava o sino, todos se reuniam nesta capela onde se cantava a
saudação angélica, implorava-se a graça divina, e depois cada um ia para
onde queria.
De um lado e de outro, isto é, ao norte e ao sul, era a praça
ladeada pelas recentes habitações, às quais, com o correr dos tem-
pos, outras melhores se foram naturalmente sucedendo, até o ponto
em que a vemos hoje, tudo isto defendido por altas fortificações nas
quais montaram os franceses vinte canhões grandes.
Fala-nos também Cláudio de Abbeville, num dos tópicos da
sua descrição a que nos referimos há pouco, de uma praça cômoda e
bonita que havia junto ao forte, na qual se encontravam muito boas fontes e
regatos, e existiam todas as comodidades desejadas tais como paus, pedras, barro
e outros materiais para a edificação sem muito dispêndio.
A praça a que alude aqui o ilustre capuchinho, pelas circunstâncias
de que faz ele revestir a sua narração – “estar situada junto ao forte, e

– 41 –
José Ribeiro do Amaral

existirem nela muito boas fontes e regatos”, outra certamente não é


senão a em que, poucos anos depois, foi erigida a igreja de Nossa Se-
nhora do Carmo, outrora Largo deste nome, hoje Praça João Lisboa,
mesmo porque nenhuma outra existe nas condições acima apontadas.
Quanto “às fontes e regatos” a que se refere a descrição, é
tradição velha no Maranhão existirem, por aí assim, os grandes ma-
nanciais que fornecem toda essa água que, ininterruptamente, quer
de verão, quer de inverno, vem ter à Fonte do Ribeirão e abastece, de
há longos anos, a população que demora por aquelas imediações.
E nem só tradição velha, não.
Conhecemos, mesmo, documento positivo a semelhante respei-
to, e que vem em abono do que acabamos de dizer, o qual é o seguinte:
Quando foi da sua construção, o que teve lugar em 1796, no
governo de D. Fernando Antônio de Noronha, o encarregado da
inspeção das obras que ali se praticavam, José Luís da Rocha, em
ofício de 13 de fevereiro daquele ano, dirigido ao referido governa-
dor, com este instava para que mandasse avaliar e comprar um quintal de
uma pequena casa de João Gomes Viana, porque sendo ele muito baixo e não
dando saída por parte alguma às águas que nele se ajuntavam no inverno, fica-
vam encharcadas e iam filtradas pela terra ter à principal mãe-d’água da dita
fonte que fica a mui pequena distância prejudicando-a com as suas impu-
rezas e imundícies e tornando-se assim prejudiciais aos povos desta cidade.
Mas voltemos ao fim principal da nossa conversa de hoje.
Agasalhados nas suas habitações, depois de haverem todos, padres
como soldados, passado as primeiras noites ao relento, sob o frondoso
arvoredo que sombreava a beira-mar, trataram os da expedição francesa
de marcar dia para a instituição solene da pequena cidade, ou antes, a posse
oficial da terra ocupada em nome de El-Rei Cristianíssimo, sendo acordado,
entre franceses e indígenas, que tal solenidade se realizaria a 8 de setembro,
dia da Natividade da Virgem Santíssima.
No dia aprazado estavam todos, logo bem cedo, com os fran-
ceses, e depois de haverem celebrado o santo sacrifício da missa na

– 42 –
O Maranhão Histórico

capela de São Luís, de que já falamos, encaminharam-se todos


processionalmente até o forte.
Cedamos aqui a palavra a um dos historiadores da missão, o
padre Cláudio de Abbeville. É tocante e belíssima a descrição que
nos deixou o ilustre religioso, daquela memorável solenidade, a pri-
meira que terras maranhenses viram, e tão ao sabor daquelas épocas
de piedade, de fervor e de fé viva.
Na frente, diz ele, ia um gentil-homem levando água benta, outro o
incenso, outro o turíbulo.
Atrás destes ia outro fidalgo conduzindo um lindo crucifixo, presente do
Sr. Manoir, indo ao lado dele dois mancebos índios, filhos dos principais, carre-
gando dois castiçais com tochas acesas alumiando a cruz.
Chamava-se um destes moços Louy (depois Carlos, quando se batizou) e
era filho de Japiaçu, principal de toda a Ilha, e o outro era o filho mais novo de
Markoya-Pero, um dos maiores do lugar, chamava-se Patuá e era o mais pequeno
dos seis rapazes que levamos para a França e, pouco antes de morrer, nas águas
do batismo teve o nome de Tiago
Estes dois meninos eram da mesma idade e foram pelo Sr. de Rasilly
vestidos da mesma forma, e a ele entregues desde a nossa chegada ao Maranhão.
Nós quatro religiosos, revestidos de sobrepelizes brancas, acompanhamos
a cruz com ordens.
Seguia-se depois o Sr. de Rasilly, loco-tenente-general de Suas Majestades,
toda a nobreza e afinal os outros franceses, misturados com os índios.
Principiamos a cantar a ladainha da Virgem Maria, como fizemos quando
plantamos a cruz na Ilha de Santana.
Chegando ao forte, no lugar escolhido para plantar-se a cruz, que era
muito grande e aí se achava pronta, cantou um de nós o Te Deum Laudamus,
e seguiram-se outras orações
Em seguida teve lugar uma prática, acabada a qual o Sr. des Vaux fez
compreender aos principais dos ditos índios, e a outros de sua nação, aí presentes,
o motivo e o fim da ereção da cruz, que era como testemunho da aliança entre ele
– 43 –
José Ribeiro do Amaral

e Deus, e solene protesto de abraçarem a nossa religião, desprezando inteiramente


o maldito Jeropari que jamais podia existir diante dessa santa cruz, apenas aben-
çoada, sendo forçado a deixar a terra, quando fosse erguido este símbolo da reli-
gião, pelo qual se obrigavam – em primeiro lugar, a deixar a má vida que ti-
nham, e especialmente a não comer mais carne humana, embora de seus maiores
inimigos; em segundo, a ser obedientes às leis e a tudo quanto lhes ensinassem os
padres; e, finalmente, a combater com valor sob este glorioso estandarte, e mil vezes
morrer antes que consentir fosse dali arrancada aquela cruz.
Causou este discurso a mais funda impressão no ânimo dos índios, que
exteriormente manifestaram a emoção que sentiam, assegurando que voluntária e
satisfatoriamente acolhiam e abraçavam tudo quanto se lhes propunha, visto que,
de há muito, desejavam conhecer o Deus que adoravam os franceses, e aprender
como devia ser obedecido e adorado, protestando nunca faltar à promessa tão
solenemente feita.
Feito isto, de acordo com o cerimonial usado pela Igreja em ocasiões tais,
procedeu-se à benção da cruz, que em seguida foi exposta à adoração de todos, a
começar pelos sacerdotes, e depois por de Rasilly, pelos fidalgos e afinal por todos os
franceses, uns após outros.
A estes seguiram-se os indígenas, vindo, em primeiro lugar, os principais
com particular devoção, como exemplo dado a todos os índios (diz o historiador
da Missão).
Estavam vestidos com bonitos sobretudos de cor azul-celeste, tendo por
cima deles cruzes brancas adiante e atrás, que lhes foram dadas pelos loco-tenen-
tes-generais para servirem nesta e noutras iguais solenidades, seguindo-se depois os
velhos e pessoas antigas, e afinal todos os índios presentes, com ordem, sem confu-
são, uns após outros, os quais todos, assim como tinham visto os franceses faze-
rem, ajoelhavam-se perante a cruz, adoravam-na, beijavam-na com todo o respei-
to, humildade e devoção, como se houvessem, em toda a sua vida, sido educados à
sombra do Cristianismo.
Terminando este cerimonial todo, teve lugar a ereção da cruz (trabalho este
exclusivamente feito pelos indígenas), procedendo-se em seguida à benção da Ilha
ao troar da artilharia do forte e dos navios, em sinal de regozijo, dando, então, de
Rasilly à fortaleza o nome de Forte de São Luís, e ao fundeadouro que lhe fica
junto o de Porto de Santa Maria.

– 44 –
O Maranhão Histórico

São decorridos 299 anos das cenas que, aqui, ligeiramente fi-
cam descritas, mas ao percorrer ainda hoje aquelas páginas de Cláu-
dio de Abbeville na sua História da missão dos padres capuchinhos na Ilha
do Maranhão, como que nos parece vê-las renovarem-se aos nossos
olhos, tão viva é a narração que delas nos deixou o venerável
capuchinho, tão viva e tão verdadeira que pode e deve ser considera-
da como o auto da fundação da cidade
À obra, a que acabamos de nos referir, acompanham sete finíssimas
gravuras, das quais a primeira, na capa, representa o ato da elevação da
cruz, e as outras seis, os retratos de seis indígenas transportados para a
França. É raríssima (de 1614) e de inestimável valor.10
Não se sabe hoje, ao certo, precisamente, o lugar em que na
antiga praça, ora Avenida Maranhense, foi erguido este primeiro
monumento histórico pelos franceses.
A cruz nunca foi renovada, e o tempo, que tudo gasta e conso-
me, não nos deixou dela senão esta tradição.
A julgar, porém, pelo que nos refere o historiador da Missão, pare-
ce-nos não andarmos muito longe da verdade, aventurando que ela deve-
ria naturalmente ter sido hasteada na área que fica entre os edifícios ocupa-
dos hoje pela Capitania e Delegacia Fiscal, de modo que, mesmo ao longe,
pudesse ser vista pelos que demandassem o porto.
O nome de Forte de São Luís estendeu-se depois à nascente
cidade, e, finalmente, a toda a ilha.
E já agora não deixa de ser curioso saber os diversos nomes
por que foi conhecida na História a ilha que habitamos.
Pelos indígenas era chamada Upaon-Açu (Ilha Grande); pelos
europeus Ilha dos Tupinambás, por serem estes os ocupadores de
toda a costa, desde a foz do Jaguaribe até aqui.
10
O autor faz referência à obra original, em francês (Paris: De l’Imprimerie de François
Hvby, 1614. [7]. 394, [28], f. 7 il]. Dela, o historiador César Augusto Marques fez tradução
em 1874 (São Luís: Typ. Do Frias, [6], cii, xvi, 456, [2], iii p.), e Sérgio Milliet em 1945
[inicialmente, São Paulo: Livraria Martins, 196p. (Biblioteca Histórica Brasileira, 15; com
introdução e notas de Rodolfo Garcia), com reedição em 1975 (Belo Horizonte: Itatiaia,
297p.). Segunda edição de César Marques saiu recentemente em São Paulo (Siciliano,
2002, 363p. Coleção Maranhão Sempre). JM.

– 45 –
José Ribeiro do Amaral

Os portugueses denominaram-na Ilha das Vacas, e os sobrevi-


ventes da expedição de João de Barros – Ilha da Trindade.
Os franceses que andavam a corso pelas costas do Brasil, de-
ram-lhe o nome de Maranhão; alguns cosmógrafos o de Ilha de Fer-
ro, pela suposição da existência de minas deste metal; os chefes da
Missão Francesa o de Ilha de São Luís, e finalmente, Alexandre de
Moura, após a capitulação assinada pelos franceses no Forte do Sar-
dinha (São Francisco) o de Ilha de Todos os Santos.
Foram todos estes nomes esquecidos, ficando somente o de
São Luís, como uma compensação aos superiores intuitos da Missão
Francesa.
Completa o Maranhão a 8 de setembro do ano vindouro (1912)
o tricentenário da sua fundação.
Não deve este dia passar aqui despercebido, como a Minas,
Ceará e outros Estados não passou, e, desde já, daqui apelamos para
o honrado Sr. Governador do Estado, sempre pronto a ser o primei-
ro a dar o exemplo nestas comemorações cívicas, a fim de que seja
colocado no local onde foi erigida a cruz, um padrão, uma pedra
qualquer, por mais modesta que seja, rememorativa daquela
imorredoura data.
Bem pode essa pedra ter a forma simbólica de uma cruz em
que sejam gravadas as armas da França naquela época e o escudo de
hoje do Maranhão, com a seguinte inscrição:

8 de setembro de 1612
8 de setembro de 1912

HOMENAGEM DO MARANHÃO
AOS SEUS FUNDADORES
(24.11.1911)

– 46 –
O Maranhão Histórico

6
Vestígios da Ocupação Francesa.
A igreja de Santo Antônio

D
ENTRE OS RAROS e preciosos vestígios dos três anos e
quatro meses, que sob a Ocupação Francesa, tem, sob todos
os títulos, o primeiro lugar, logo após o Forte de São Luís, é
o convento de São Francisco (hoje Santo Antônio).
A primeira notícia que a seu respeito encontramos é a que nos
transmitiu Cláudio de Abbeville em sua obra, tantas vezes já por nós
citada em artigos anteriores.
Em distância de mil ou mil e duzentos passos (do Forte de São Luís)
há um bonito lugar de recreio, diz o notável missionário, onde existe uma
fonte, especial pela limpidez e bom gosto de sua água, viva e clara, que dela jorra
e corre para o mar; é cercado de palmeiras, de guaiaco, de murtas e de outras
árvores corpulentas e grandes, onde se vêem, muitas vezes, monos, macacos que
vão ali beber água.
Neste delicioso lugar os índios tupinambás derrubaram grande número de
árvores e um pouco acima da fonte construíram uma grande e espaçosa casa para
habitarmos, e outra a ela mística, para a celebração do Santo Sacrifício da Missa,
servindo de capela.
Demos a este lugar o nome de Convento de São Francisco.
– 47 –
José Ribeiro do Amaral

É, portanto, o convento de Santo Antônio uma das primeiras


fundações francesas ocupando, segundo se infere dos termos claros
e precisos da descrição acima, o lugar que primitivamente lhe fora
assinalado pelos religiosos capuchinhos.
A fonte a que se refere o historiador da Missão, todos o sa-
bem, é o lugar conhecido por Tanque de Santo Antônio, na cerca do
convento deste nome.
Data a sua fundação de agosto de 1612, isto é, dos primeiros
dias posteriores à chegada, aqui, da expedição francesa, havendo
sido seus fundadores os reverendos padres capuchinhos da pro-
víncia de Paris, Cláudio de Abbeville, Arsênio de Paris e Ambrósio
de Amiens, tendo como superior da Missão o venerável padre Ivo
d’Evreux.
Grandemente auxiliado pelos indígenas, que a trabalho algum
se poupavam, tiveram os padres a rara ventura de ver acabada a sua
capela na véspera de Natal, a 24 de dezembro, portanto, daquele mes-
mo ano, ou cerca de quatro meses, contados do dia em que à mesma
haviam dado começo, e muito a propósito, (acrescenta um deles) pela devo-
ção que sempre teve o seráfico padre São Francisco a quem era dedicada.
Nessa noite, celebraram-se aí, pela primeira vez, atos do cul-
to divino.
Na verdade enchia-me de imenso prazer (diz Ivo d’Evreux in Viagem
ao Norte do Brasil, feita em os anos de 1613 a 1614) vendo nessa capelinha,
feita de madeira coberta de folhas de palmeiras, mais semelhante ao presépio de
Belém do que a esses grandes e preciosos templos da Europa, os nossos compatri-
otas franceses cantarem os salmos e matinas desta noite, e depois, purificados pelo
sacramento da Penitência, receberem o mesmo Filho de Deus no presépio dos seus
corações, envolvido nas faixas do Santíssimo Sacramento do altar.
Festejamos também o dia de Natal, à noite pregamos, o que sempre fize-
mos depois das festas e nos domingos, e com prazer, embora muito sofrêssemos no
princípio; enquanto durou esta devoção corria o tempo tão depressa, que o dia
parecia ter somente duas horas; e assim achando-se o nosso espírito preocupado
com obras piedosas sentia a morte vir tão depressa.
– 48 –
O Maranhão Histórico

Com a capitulação, porém, dos franceses, o que teve lugar no


dia 2 de novembro de 1615, no Forte do Sardinha (São Francisco)
após condições humilhantes, arrogantemente ditadas por Alexandre
de Moura e vergonhosamente aceitas por la Ravardière, retiraram-se
também os capuchos, sendo o modesto hospício, que com tanto
desvelo haviam levantado, entregue aos cuidados de frei Cosme da
Anunciação e frei Daniel da Natividade, ex-guardião do convento da
Paraíba, e frei Manuel da Piedade, afamado teólogo, ambos para aqui
vindos de Pernambuco com Jerônimo de Albuquerque.
E é de notar como se revelaram, ainda uma vez mais, nobres e
elevados os intuitos da Missão Francesa.
Os capuchinhos, muito ao contrário do que seria de esperar,
talvez, em se tratando de vencidos para com vencedores, em vez de
levar consigo quanto da França haviam trazido e o mais que depois
receberam durante a sua estada aqui, deixaram à nascente igreja tudo
quanto a mesma já então possuía, constante de alfaias custosas, tra-
balhadas pelas próprias mãos da Duquesa de Guise, cálices, castiçais
e muitos objetos outros, próprios de templos católicos, no valor de
mais de vinte mil cruzados, o que para o lugar e tempo era uma soma
já bastante avultada.
E não somente isso: tudo o mais que lhes estava a vir de Paris!
Entretanto, Deus sabe quanto não lhes teria isso custado.
Assim procedendo, tornando-se superiores à própria desdita,
engrandeceram-se os missionários franceses perante a História.
A Missão acabou, terminou aqui seus dias, como havia co-
meçado.
Havia então no convento frei Arcângelo de Pembré, comissá-
rio, com dois religiosos capuchos, – tão venerandos e de tais mostras, que
pareciam santos, e como tais foram recebidos pelos religiosos portugueses.
Quando se retiraram para a França, não podendo ser indife-
rentes à sorte da colônia que, durante três anos, lhes tinha sido a
preocupação constante e única de todos os instantes, aqui deixaram
– 49 –
José Ribeiro do Amaral

ainda dois frades e um clérigo de missa, todos franceses, para cuida-


rem dos católicos e de vinte mil índios que tinham cristianizado.
É Diogo de Campos (quem o afirma), sargento-mor e autor
da Jornada do Maranhão, feita por ordem de Sua Majestade o ano de 1614, o
vencedor dos franceses em Guaxenduba, testemunho, portanto, de
um valor único a semelhante respeito.
Retirando-se os capuchinhos franceses, ponderaram os religi-
osos portugueses que tinham vindo substituí-los, que – sendo o sítio do
convento pouco conveniente, e havendo necessidade de outro, em que morou Monsieur
de Pinau, francês, com todas as suas águas vertentes para nele começarem o mos-
teiro da sua ordem, por isso o pediram e terminaram solicitando carta de data do
referido terreno.
A carta foi passada por Alexandre de Moura em 12 de dezem-
bro de 1615, no Forte de São Luís, tendo lugar a demarcação a 15 de
janeiro de 1616, falando-se nela em uma baixa que fazia aí o oiteiro para
o Rio Cutim no teso da baixa da outra banda – parecendo ser o lugar onde
está o Tanque.
Nesse mesmo dia foram os frades empossados das terras, das
águas e das árvores, figurando, entre outros, como testemunhas desta
doação, Jerônimo de Albuquerque e Bento Maciel Parente, depois
tão tristemente célebre, e, como escrivão na posse, Frutuoso Lopes,
tabelião de toda esta conquista.
Com a nomeação do primeiro governador que teve este Esta-
do, Francisco Coelho de Carvalho, em 1624, para aqui veio em sua
companhia o reverendo frei Cristóvão de Lisboa, como comissário,
trazendo consigo um bom socorro de religiosos da província de Santo
Antônio.
Em chegando aqui, em agosto do mesmo ano deu princípio
ao convento no lugar onde ainda hoje existe, tendo o prazer de vê-lo
acabado.
O templo, que, sob a denominação de igreja de Santo Antô-
nio, ora conhecemos situado no Largo do mesmo nome, não é, pre-
cisamente, o mesmo que há uns sessenta anos ali existia.
– 50 –
O Maranhão Histórico

Não era assim o primitivo.


Baixo, acaçapado, de proporções acanhadas, não tinha torre
alguma na frente, existindo uma, pequena e muito baixa, nos fundos,
por detrás do lugar onde se vê hoje o altar de Nossa Senhora da
Conceição.
Acompanhando toda a extensão da parede que olha para o
poente (frontispício) corria em frente e encostado à igreja, um al-
pendre, de regular altura, sobre o qual se via em um nicho, encravado
na mesma parede, uma imagem do padroeiro da igreja, de propor-
ções tais que facilmente era avistada ao longe pelos que do Largo do
Rosário se dirigiam à igreja de Santo Antônio.
Interiormente, mais que pobreza respirava o templo.
Era isto em 1850.
Notável era então a decadência das ordens religiosas. O seu
pessoal, já tão desfalcado no Brasil, e aqui mais que em outra qual-
quer província, ia, dia a dia, desaparecendo, seja pelos incessantes
golpes da morte, seja pelas continuadas secularizações.
Foi nesse momento de desfalecimento e em que o velho e
tradicional templo ameaçava próxima ruína, pois que por toda a par-
te desabava já, que um religioso houve que se encontrou à altura da
situação, merecendo por isso que lhe relembremos aqui o nome.
Esse foi frei Vicente de Jesus.
Natural da província do Pará, para aqui veio em 1849,
ordenando-se no ano seguinte, e sendo nomeado, logo em seguida,
guardião do convento, por haver revelado, desde cedo, não vulgares
qualidades administrativas.
Moço, com vinte e cinco anos apenas, de um gênio ativo e
empreendedor, lutando não só com a falta de meios, como, ainda
mais, com a de um pessoal habilitado e capaz de reforma, não desa-
nimou entretanto.
E assim, confiado em si e na força de sua vontade, dirigiu-se à
Assembléia Provincial, pedindo um auxílio pecuniário para ajudá-lo
– 51 –
José Ribeiro do Amaral

na obra que tinha em plano.


Felizmente todos o compreenderam, e não foi sem assombro
que os incrédulos daquele tempo viram, de velhas e carcomidas pa-
redes, levantar-se, soberba e majestosa, a igreja do convento de San-
to Antônio, no gosto da arquitetura gótica.
Não teve o incansável e saudoso religioso a ventura de ver
realizados os seus tão ardentes desejos, mas, pelo que deixou feito,
bem se pode avaliar de quanto seria ele capaz, se a morte, a terrível
morte, não o houvesse arrebatado tão moço, aos 36 anos de idade,
quando se propunha, após onze anos de um trabalho sem tréguas, a
dar a última demão às obras que com tanto ardor empreendera.
Faleceu o laborioso franciscano a 4 de agosto de 1862.
Era frei Vicente de Jesus um espírito culto, tendo sido, com o
arcediago Dr. Manuel Tavares da Silva, de quem era grande amigo,
fundador e redator d’O Cristianismo, jornal exclusivamente voltado
aos interesses da Igreja Católica e que aqui existiu de 1854 a 1855
Com o desaparecimento de frei Vicente, foi nomeado guardião
do convento frei Ricardo do Sepulcro, que, a muito pedir, obteve da
Assembléia Provincial a consignação anual de 12:000$000 para a
conclusão destas obras, sendo pela Presidência incumbido da dire-
ção delas o engenheiro Francisco César da Silva Amaral.
As obras, porém, pouco andamento tiveram, estacionando, de
vez, e talvez para sempre, com a morte deste que foi o último religi-
oso que teve a Ordem franciscana no Maranhão.

(1°.12.1911)

– 52 –
O Maranhão Histórico

7
Convento de Santo Antônio

É
O CONVENTO de Santo Antônio uma casa tradicional-
mente histórica. Grandes e importantes acontecimentos aí
se passaram desde os primeiros dias da sua fundação.
Vejamos se conseguimos, de alguma forma, reconstituir esse
longo e curioso passado.
Comecemos remontando-nos ao tempo dos seus fundadores.
Aí, nas suas primitivas celas que bem modestas deviam ser
então, foram escritas pelos notáveis capuchinhos Cláudio de Abbeville
e Ivo d’Evreux as duas primeiras obras que do Maranhão se ocupa-
ram, obras de um valor único e tal que, ainda hoje, outras não se
conhecem que possam substituí-las sobre a história naqueles primei-
ros tempos.
Essas obras, a que mais de uma vez nos havemos referido já,
nestes despretensiosos escritos, são:
– Histoire de la Mission des Pères Capucins en l’Isle de Maragnan et terres
circonvoisines (Brésil) où il est traicté des Singularitez admirables & des Meurs
merueilleuses des Indiens habitants de ce pais. Avec les missions et aduis qui ont este
enuoyez de nouveau. Avec titre gravé et 7 planches gravées par L. Gaultier, dont 6
repres. les portraits de six indigenes qui furent transportés en France.
A Paris, François Huby, 1614. Abbeville, Claude de (predicateur capucin).
– 53 –
José Ribeiro do Amaral

– Voyage dans le nord du Brésil faít durant les années 1613 et 1614 par
le père Ives d’Evreux, publié d’après l’exemplair unique conservé a la Biblioteque
Imperiale de Paris, avec une introduction et des notes par M. Ferdinand Denis.
1615.
Para bem se poder ajuizar do valor delas, basta saber que, da
primeira, os raríssimos exemplares que ainda hoje aparecem, são, a
grande esforço, adquiridos a preço de 440 de marcos (cada um), sem
contar outras despesas; e que, da segunda, um único exemplar ape-
nas existe.11
E essas obras, de um valor incomparável hoje, pela verdade e
sinceridade com que foram escritas, e minúcia de que se revestem
em todas as suas descrições, a ponto de se poderem reconhecer ain-
da hoje os mesmos lugares e sítios a que se referiam os piedosos
capuchinhos – aí tiveram origem, aí foram gravadas pelos abnegados
superiores da Missão Francesa nos curtos instantes que lhes sobra-
vam dos seus labores apostólicos.
Sim, é o convento de Santo Antônio uma casa tradicional-
mente histórica.
Foi aí que, sob a presidência de Bequimão, reuniram-se pela
última vez, na noite de 23 de fevereiro, véspera de uma sexta-feira
de Passos, os conjurados de 1684, adversários dos assentistas e das

11
A menção à raridade das obras remete, outra vez, ao original francês. Em nota anterior,
apresentamos o roteiro editorial da obra de Claude d’Abbeville. Quanto à de Yves
d’Evreux, saiu em 1615, com o título de Suíte de l’histoire des choses plus mémorables advunuës en
Maragnan ès annes 1613 & 1614, e foi destruída, ainda na tipografia, por motivos políticos,
salvando-se dois exemplares (e não apenas um, como diz o autor destes artigos) mutilados,
de que Ferdinand Denis se serviu para fazer a edição moderna da obra, alterando-lhe o
título, conforme acima referido. Note-se, no entanto, que sua edição é de 1864 (Leipzig;
Paris: Librairie A. Franck, [10], xlvi, 456p. Bibliothèque Américaine. Collection d’Ouvrages
Inédits ou Rares sur l’Amérique). César Marques também traduziu o livro de d’Evreux
(Maranhão [São Luís]: [Typ. do Frias]. 1874. [6], xlv, [2], 424, iiip.). Sua tradução foi
reeditada em 1929, em coleção dirigida por Humberto de Campos (Rio de Janeiro: Livra-
ria Leite Ribeiro, 1929. 442p. Biblioteca Escritores Maranhenses). Terceira edição foi
publicada em 2002 (São Paulo: Siciliano, 436p. Coleção Maranhão Sempre). É estranho
que Ribeiro do Amaral não faça qualquer referência às traduções de César Marques, tanto
de d’Evreux como de d’Abbeville. JM.

– 54 –
O Maranhão Histórico

leis do estanco, dali saindo a depor o capitão-mor Baltazar


Fernandes.
E como se nos afigura ainda hoje, decorridos 228 anos, ver,
nessa reunião, o vulto de Manuel Serrão de Castro – o ilhéu brutal e de
pouca suposição (no dizer de João Lisboa) arrancando e brandindo a
espada a exclamar furioso que, pois haviam chegado até ali, já agora
não havia recuar do propósito começado com tanto perigo, e que o
traidor que o contrário sustentasse ali mesmo acabaria às suas mãos!
Foi aí nesse convento que houve o singular processo dos seus
religiosos contra as formigas, narrado pelo padre Manuel Bernardo,
no tomo I, tít. 6°. § 50 da Nova floresta.
Serviram de base a este processo os roubos que “as formi-
gas grandes e daninhas faziam na despensa da comunidade,
minando-a e afastando a terra debaixo dos fundamentos, com o
que ameaçava ruína.”
Foi nomeado um curador da res ad litem, teve lugar o autuamento
em 17 de janeiro de 1713, e depois de várias diligências, seguindo-se
seis meses sem falar no feito, requereram os autores a reinstauração
da instância perempta, e deferindo-lhes como pediam o vigário
forâneo, o licenciado Manuel Homem, “foram as formigas citadas
em sua pessoa” pelo escrivão do eclesiástico Joseph Guntardo de
Bequimanz, em 19 de julho de 1714.
Com o termo de vista dada aos autores no dia seguinte,
terminou-se esta ridícula farsa.
Por diversas vezes serviu este convento de abrigo aos perse-
guidos, ou aos que desejavam opor-se às ordens régias, ou às deter-
minações das autoridades legitimamente constituídas.
Nestas condições, aí recolheram-se, entre outros, em julho de
1720, o ouvidor-geral Dr. Vicente Leite Ripado, para subtrair-se a
prepotências do governador Bernardo Pereira de Berredo; e em 1792,
o também ouvidor-geral, Dr. João Francisco Leal, por não se ter
querido submeter à intimação de suspensão que lhe fora mandada
fazer pelo governador Fernando Pereira Leite de Foyos.
– 55 –
José Ribeiro do Amaral

Aí, do púlpito da primitiva igreja, em uma eloqüência inteira-


mente nova, mais de uma vez se fez ouvir o grande padre Antônio
Vieira, da Companhia de Jesus.
Aí, desapontado em suas esperanças e ferido no seu orgulho,
com a notícia da provisão de 17 de outubro de 1653, pela qual eram
consideravelmente modificadas as resoluções favoráveis à liberdade
dos índios, cuja execução havia excitado os tumultos de 1652 – aí,
dizemos, tomada subitamente a resolução de partir, pronunciou o
insigne orador a sua famosa oração conhecida por Sermão aos Pei-
xes, em dia de Santo Antônio, e a propósito da festa que se celebrava
no respectivo convento.
Daí, da parte do antigo convento, desde 1838 ocupado pelo
Seminário Maior, saíram sacerdotes dos mais ilustres de que se pode
honrar o clero de qualquer país católico, bastando citar, entre muitos
cujos nomes não nos ocorrem agora, os do saudoso padre Raimundo
Alves da Fonseca, do erudito monsenhor Dr. João Tolentino
Guedelha Mourão, do grande educador que foi o cônego Raimundo
da Purificação dos Santos Lemos, do Dr. Joaquim de Sampaio Cas-
telo Branco, do padre João Manuel de Carvalho, de D. Luís Raimundo
da Silva Brito e de D. Carlos Luís d’Amour, os dois últimos, arcebis-
pos hoje: o primeiro da Sé de Olinda e o segundo da de Cuiabá.12
Foi o convento de Santo Antônio a residência de dois dos
mais virtuosos antístites que tem contado a Diocese do Maranhão:
Dom frei Joaquim de Nossa Senhora de Nazaré, o último dos bis-
pos nomeados pelo governo português, e que nos últimos dias do
domínio lusitano aqui foi presidente da Junta Governativa; e Dom
Antônio Cândido de Alvarenga, removido mais tarde para São Paulo,
onde faleceu.
Finalmente, para encerrar estas linhas, aí na igreja do conven-
to de Santo Antônio repousam os restos de muitos homens notá-
veis, ocorrendo-nos neste momento os nomes dos seguintes:

12
Hoje: entenda-se, à época em que escrevia o autor. Dom Carlos Luís d’Amour, nascido em
1836, foi o segundo bispo e o primeiro arcebispo de Cuiabá, onde faleceu em 1921. J. M.

– 56 –
O Maranhão Histórico

– Padre Ambrósio de Amiens, um dos quatro membros da


Missão Francesa, falecido a 9 de outubro de 1612;
– Dr. Antônio Corrêa de Lacerda, grande botânico, que fale-
ceu em 21 de julho de 1852, deixando por sua morte uns vinte e dois
volumes manuscritos de diversas obras, algumas das quais apenas
esboçadas, tornando-se sobre todas notável pela sua importância, e
por se julgar completa, a que tem por título Matéria médica das provín-
cias do Pará e Maranhão, acompanhada de mais de duzentas estampas, desenha-
das e coloridas com esmero.
– Dr. José Maria Barreto Júnior, formado pela Faculdade de
Medicina do Rio de Janeiro, deputado à Assembléia Geral Legislativa
pelo Maranhão e um dos vice-presidentes desta província; foi, tam-
bém, por muitos anos, comandante superior da Guarda Nacional da
Capital. Neste caráter, em 1865, espontaneamente ofereceu-se para
marchar para a Guerra do Paraguai, o que teve lugar a 5 de agosto do
mesmo ano, sendo mais tarde, em remuneração de tantos serviços,
distinguido com o posto de brigadeiro honorário do Exército e o
título de Barão de Anajatuba.
E finalmente o padre Raimundo Alves da Fonseca, falecido
em 1885, sacerdote insigne nas letras e virtudes.

(19.1.1912)

– 57 –
O Maranhão Histórico

8
Qual será a população atual de São Luís?

D
ANDO COMEÇO a estas linhas, é com o mais vivo prazer
que fazemos nosso o belíssimo artigo que, a este propósito,
em o Almanack do Maranhão de 1860, segundo se crê, atribuído
à pena de um dos homens de mais talento e gosto que já tivemos, e
também mais cheio de serviços a esta terra, o benemérito Dr. Antô-
nio Henriques Leal.
A população, diz ele, é o centro para o qual convergem todos os materiais
de uma estatística e donde partem os esclarecimentos que iluminam e dão-lhe o
cunho da verdade e exatidão.
Um país cuja população não é conhecida em suas condições sociais, dife-
renças de idade, de sexo, estado civil, classes, profissões, movimento e de desenvol-
vimento, não pode ser bem administrado, porque o governo tem necessidade de
tomar por guia o arbítrio e o acaso.
Nestas condições infelizmente estamos nós: os poderes do Estado, ainda
quando tenham veemente desejo de acertar, erram e vexam a população, princi-
palmente na distribuição dos impostos e nas divisões territorial, judiciária e
eleitoral.
Com empenho e tenacidade da parte das autoridades havia de conseguir-se
muito, embora os obstáculos que lhes oporiam a ignorância, a incúria, as preven-
ções, os preconceitos, as más paixões e os interesses feridos de muitos.
– 59 –
José Ribeiro do Amaral

A falta de instrução é a causa principal de todos os obstáculos de um


registro de censo, por isso que a maior parte da população, não sabendo ler, não
compreende as suas vantagens, evita-o ou falseia-o com números inferiores, por
julgar que é feito para o fim de recrutar, de criar novos impostos, etc.
A estes obstáculos acrescem os erros cometidos pelas autoridades incumbi-
das de sua organização, que para forrarem-se a trabalhos puníveis fazem mapas
de sua imaginação: o cálculo inexato das idades, negando-as ou alterando-as muitos
indivíduos, principalmente do sexo feminino, declarações incertas das profissões, e
mais que tudo o movimento perpétuo das populações. Com tempo, porém, e repe-
tidas e variadas operações, chegar-se-ia ao conhecimento da verdade, havendo boa
vontade e dedicação.
É um dos trabalhos que se procura executar com mais exatidão nos países
civilizados, por ser de seu conhecimento que se pode inferir o crescimento e decrescimento
da população, o seu estado de civilização, prosperidade, salubridade, etc.
Isto que, com tanta ponderação e critério, escrevia o Dr. Antô-
nio Henriques Leal em 1860, reproduz-se infelizmente ainda hoje,
decorridos cinqüenta e dois anos.
E como é triste, no meio de tudo isto, confessar que não co-
nhece o Estado as forças de que dispõe; que não temos um censo,
mesmo imperfeito, da nossa população!
Um dos últimos recenseamentos a que, nos termos do art. 13
do Regulamento de 30 de dezembro de 1871, se procedeu na Pro-
víncia, na administração do Dr. Augusto Olímpio Gomes de Castro,
falecido senador da República, excluídas as paróquias de São Félix
de Balsas, São Pedro de Alcântara da Carolina e Santa Teresa da Im-
peratriz, cujos trabalhos não foram enviados, deu para o Maranhão
uma população de 335.325 almas.
Que este resultado não era a expressão da verdade, disse-o o
próprio presidente no relatório com que a 18 de maio de 1874 pas-
sou a administração da Província ao seu sucessor:
O conhecimento que tenho de grande parte da Província habilita-me a
duvidar da exatidão dos dados colhidos pelas comissões.
– 60 –
O Maranhão Histórico

Estou convencido de que a nossa população é muito mais numerosa. E


nem era de esperar que fosse a expressão da verdade a primeira tentativa de
recenseamento de uma população derramada por um território tão vasto, como é o
nosso, cortado de rios e quase privado de estradas.
Deu este recenseamento à capital da Província 27.817 habitan-
tes, com 4.210 fogos em 3.898 casas habitadas; e à Ilha toda, 34.923
almas, o que era simplesmente irrisório.
Remontemo-nos, agora, um pouco ao passado, e procuremos
estudar desde os seus começos o desenvolvimento gradual e pro-
gressivo que foi tendo a população na Ilha do Maranhão.
Em 1612, por ocasião da ocupação francesa, existiam, segun-
do o padre Cláudio de Abbeville, em toda a Ilha, 27 aldeias com
cerca de 12.000 almas.
Em 1648, era a sua população, exclusive os índios, de 400 co-
lonos portugueses e 80 soldados, não sendo maior, por se ressentir,
ainda, a pequena cidade dos desastrosos efeitos produzidos pela In-
vasão Holandesa.
Em 1683 havia já, só em São Luís, para mais de 1.000 habitantes.
Em carta de 23 de maio de 1661, escrita por D. Pedro de Melo
ao padre Antônio Vieira, na qual lhe referia o levante em que foram
presos os jesuítas pela primeira vez, diz: “O tumulto do povo devi-
am de ser mais de seiscentas almas.” (Berredo, Anais, n.° 1041).
Ora, para que a esse tumulto se pudessem achar presentes 600
pessoas, era preciso que a população da cidade fosse, então, aproxi-
madamente de cinco a seis mil almas.
Manuel Guedes Aranha no seu Papel político sobre o Estado do
Maranhão, apresentado ao Sr. D. Pedro II no ano de 1685, referindo-se à
cidade daquele tempo, diz: Compõe-se a cidade de mil e tantos vizinhos, em
que há muita nobreza e gente boa, mas muita pobreza, uma matriz, quatro conven-
tos, uma Misericórdia, uma igreja de São João e uma ermida de Nossa Senhora do
Desterro em um retiro sobre o mar, todas as tardes freqüentado de devotos. O
Maranhão com Tapuitapera tem hoje o melhor de dois mil homens de armas.
– 61 –
José Ribeiro do Amaral

Ora, não sendo admissível a hipótese de que todos os habitan-


tes de São Luís fossem guerreiros, e dando-se ao Maranhão mil e
quinhentos dos dois mil homens de armas que contava com
Tapuitapera, devia a população da cidade ser, então, pelo menos de
seis mil habitantes.
Descrevendo a cidade do seu tempo, dizia Teixeira de Moraes
(Relação política, parte 1ª., cap. 1°. e 4°., 1692): A cidade de São Luís tem
quinhentas casas e oitocentos homens capazes de tomar armas, cuja maior parte
vive nas suas lavouras e só vem à cidade pela quaresma e festas do ano.
No princípio, as paredes e tetos da cidade, tudo era de pindoba, de que
ainda hoje restam algumas renovadas, mas agora as fabricam de taipa de pilão
com sua telha-vã sobre mal polida madeira.
Frei Domingos Teixeira, na Vida de Gomes Freire de Andrade,
parte 2ª., publicada em 1727, e já depois do falecimento do autor,
tratando da revolta de Bequimão que, como se sabe, teve lugar de
1684 a 1685, dá a cidade de São Luís habitada por quinhentos vizi-
nhos.
Não se pode saber, ao certo, em que acepção tomava o cronista,
aqui, a palavra vizinhos, não sendo de presumir que fosse no sentido de
habitantes, pois é de todo impossível que em princípios do século XVIII
tão reduzido fosse ainda o número de moradores de São Luís.
Continuando a descrever a cidade, fala ainda frei Domingos
Teixeira na sua pobreza, autorizada nas construções dos seus edifícios, alguns
dos quais eram de madeira, cobertos de folhas de palmeiras, e outros de barro de
taipa e adobos, cobertos de telha-vã.
A cidade, estendida por espaçosas ruas, é cercada de espessas matas pela
parte de terra.
Berredo, nos Anais, usa da mesma expressão, quando dá pou-
co mais de mil vizinhos à cidade de São Luís.
O padre João Felipe Bettendorf, na sua História da missão da
Companhia de Jesus no Estado do Maranhão (1699), é mais positivo quan-
do dá à cidade de São Luís uma população de mais de seiscentas
– 62 –
O Maranhão Histórico

famílias, pela maior parte pobres, o que equivale a uma população de


cerca de seis mil almas.
Em 1788, segundo um arrolamento então procedido pelo vi-
gário da única freguesia da cidade (Nossa Senhora da Vitória), era a
população de São Luís bem numerosa já, contando-se 16.580 habi-
tantes e 1.482 fogos.
Em 1819, segundo se lê na Poranduba maranhense, de frei Fran-
cisco de Nossa Senhora dos Prazeres, era a população da cidade 16.000
almas, não entrando nesse número os índios. Só no ano de 1817 –
continua este ilustre religioso – vieram para o Maranhão 8.000 escravos.
Se não morressem tantos como morrem todos os anos (uma grande parte por
causa do mau trato e da triste lembrança de se verem separados para sempre de
sua pátria e parentes) existiria agora na Província extraordinário número deles.

(2.2.1912)

* * *
Prosseguindo nas ligeiras considerações que até aqui havemos
feito, relativamente ao progressivo desenvolvimento que foi tendo a
população em São Luís, daremos começo hoje a estas linhas com o
testemunho de Raimundo José de Sousa Gaioso.
Descrevendo a cidade do seu tempo (1814), dizia o autor do
Compêndio histórico-político dos princípios da lavoura do Maranhão: A cidade de
São Luís do Maranhão se pode dividir em dois bairros, a saber: o da Praia Gran-
de, ou freguesia de Nossa Senhora da Vitória, que é o de maior povoação, ainda que
menos extenso do que o segundo. Tem muitos sofríveis edifícios, e com muita comodi-
dade; mas a desigualdade do terreno lhes tira uma parte de sua formosura, e algu-
mas ruas mal calçadas fazem a sua serventia bastante incômoda.
A liberdade que cada qual tem de edificar como lhe parece faz que tudo é irregular.
A Praça do Comércio nada tem que admire, à exceção da ponte de pedra
e cal que se está fazendo para o desembarque das fazendas. O Palácio do Gover-
no, mandado edificar pelo governador Joaquim de Melo, é uma enfiada de casas
– 63 –
José Ribeiro do Amaral

sem acomodação alguma, apesar de ocupar um terreno suficiente para fazer um


edifício suntuoso. Por baixo fica a Contadoria da Fazenda e a casa em que a
Junta faz as suas sessões. A do bispo, que foi antigo colégio dos jesuítas, e mística
à igreja Catedral, se acha hoje com melhores acomodações, mas sem nobreza
alguma. A Casa da Câmara que também fica no mesmo bairro, e a Cadeia
Pública só têm de particular a nova capela que há poucos anos se edificou e se acha
sem exercício.
O segundo bairro é o da freguesia nova de Nossa Senhora da Conceição, e
se é mais extenso, também é mais miúda e diminuta a sua povoação em geral;
porém, há de pelo tempo adiante ser considerável, por ainda compreender muitos
terrenos por edificar. Neste bairro fica o quartel militar, denominado de Campo
de Ourique. É um edifício na figura de um paralelogramo, edificado no tempo do
governador D. Fernando Antônio de Noronha, com todas as acomodações e ofi-
cinas necessárias, porém muito úmido, apesar das diligências que se têm feito para
igualar o terreno dos lados e fundo com o da frente, que era mais baixo, e suposto
se ache concluído aparentemente, porque nem se formou a casa para os conselhos
de guerra, que devia ser por cima do portão da entrada, nem se guarneceu o
edifício com a custosa cantaria que se mandou vir de Lisboa, por não poderem as
paredes com tanto peso. Toda esta cantaria se acha ainda na praça fronteira ao
dito quartel, e a maior parte já encoberta pela terra que as enxurradas precipitam
sobre ela.
Fora da cidade se acham vários sítios de recreio e frutíferos, sendo o mais
principal de todos, o do comendador José Gonçalves da Silva (atual Quinta das
Laranjeiras ou do Barão) cujas incansáveis e dispendiosas diligências da arte
não têm podido emendar os obstáculos da natureza.
A povoação da cidade, (conclui o historiador Gaioso) conforme as
notícias que tenho dos últimos numeramentos feitos pelos róis da desobriga, não
chegava a trinta mil almas; mas como do ano de 1808 para diante ela tem
acrescido, talvez que hoje complete esse número.
O coronel de engenheiros Antônio Bernardino Pereira do Lago,
que aqui serviu no governo do marechal Bernardo da Silveira Pinto
(1819-1822), e que tanto se notabilizou por serviços de toda a sorte
prestados ao Maranhão, notadamente pelo levantamento da Carta

– 64 –
O Maranhão Histórico

geral da Província, trabalho este que ainda hoje serve de base e de guia
aos que se abalançam a empresas tais, pela segurança e escrúpulo
com que foi feito – o coronel Lago, dizemos, no Mapa geral da popula-
ção da Província do Maranhão do ano de 1821, que acompanha a sua obra
Estatística histórico-geográfica da Província do Maranhão, fazendo a distri-
buição da população da antiga colônia, por freguesias, dava às duas
em que se dividia a cidade a seguinte população: Nossa Senhora da
Vitória – 1.458 fogos, com 11.713 almas; Conceição – 1.256 com
7.808, o que perfazia para a cidade daquele tempo um total de 2.714
fogos, com 19.611 habitantes, o que aproximadamente equivalia a
uma média de 8 para cada fogo.
De 1840 em diante, raro é o relatório de presidente que não se
ocupe deste importantíssimo ramo de serviço público.
No Jornal da Sociedade Filomática Maranhense, junho de 1847, nú-
mero 2, p. 85 e 86, sob a epígrafe Movimento da População da Capi-
tal, 1840-1845, encontra-se o seguinte judiciosíssimo artigo que da
máxima autoridade se reveste, por ser firmado pelo notável médico
maranhense Dr. José da Silva Maia, um dos redatores daquele jornal:
Pelos mapas que ora oferecemos ao público (diz este ilustre clínico), vê-
se que se enterraram no cemitério desta cidade nos anos que decorreram de 1840-
1845 – 7.722 pessoas, o que dá para cada ano, termo médio – 1.287, e que no
mesmo tempo batizaram-se, em ambas as freguesias (Vitória e Conceição) 4.168,
o que dá para cada ano, termo médio – 694, havendo uma diferença dos
enterramentos sobre os batizados de 593 pessoas anualmente.
Ora, se tivéssemos de julgar do movimento da população da nossa cidade
pelo que mostram os mapas, não eram precisos muitos anos para que ela desapa-
recesse completamente; entretanto, é sabido que, se a população não vai em grande
aumento, como nos primeiros anos, pelo menos conserva-se estacionária.
Convém, pois, averiguar a causa de tamanha diferença e mostrar ao mes-
mo tempo que existem erros nos dados estatísticos que apresentamos.
É na Capital que grande parte dos doentes vem procurar os socorros da
medicina que lhes faltam por lá e que infelizmente raras vezes aproveitam, porque

– 65 –
José Ribeiro do Amaral

quando a isso se resolvem é já tarde, e quase sempre sucumbem; ao passo que


ninguém vem aqui batizar seus filhos, e nem dá-los à luz; o número dos óbitos por
conseguinte deve crescer, e muito mais ainda nos seis anos de que tratamos, porque
nesse tempo reuniu-se dentro da capital quase toda a população branca da Pro-
víncia, que fugia da rebelião; e porque de outro lado grassou uma desastrosa
epidemia de sarampo durante os três primeiros anos, que foi causa de não pequena
mortandade, com especialidade nas crianças, no de 1841.
O número dos enterramentos no Cemitério da Misericórdia, sendo aliás o
único que temos, não representa o número exato dos óbitos, porquanto todas as
crianças que nascem mortas, ou que morrem logo depois que nascem, sem o sacra-
mento do batismo, são enterradas nos quintais das casas, o que mostra o grande
atraso das nossas leis policiais, higiênicas e administrativas.
E isto basta para provar igualmente que na nossa cidade não é possível
atualmente conhecer-se o número exato dos nascimentos; além disso muitos batizados
deixam de ser inscritos nos livros das respectivas freguesias, e muitos outros se
fazem em casas particulares de que os párocos não têm notícia, uns por padres, e
outros por qualquer pessoa – em artigo de morte; e finalmente costumam os
vigários a confiar o assento a sacristãos que os fazem com bem pouco cuidado.
Assim, pois, algumas certidões de idade se têm requerido, que não se encontram
nos competentes livros.
O senador Cândido Mendes de Almeida no seu Atlas do Impé-
rio do Brasil, trabalho que, no seu gênero, até hoje ainda não foi igua-
lado, quanto mais excedido, dava, em 1868, à capital da Província,
35.000 almas.
No meio de opiniões tantas, diversas e tão desencontradas al-
gumas, sem documentos nem dados oficiais, nada se pode afirmar,
de certo, sobre a população atual de São Luís. Não obstante,
parece-nos não estar longe da verdade dizer que é ela, presentemen-
te, superior a 50.000 almas.
É o que procuraremos demonstrar em subseqüente artigo.

(9.2.1912)

– 66 –
O Maranhão Histórico

* * *

Ao encerrar o nosso último artigo, dissemos parecer-nos não


estar longe da verdade dar à população atual de São Luís um cômpu-
to superior a 50.000 almas; diremos mais: pode, desassombradamente,
avaliar-se em 60.000 habitantes.
É o que procuraremos demonstrar nas linhas seguintes.
Pelo lançamento de 1836-1837, o mais antigo e um dos mais
regulares dos que se encontram no Tesouro do Estado, do tempo
em que por esta repartição corria semelhante serviço, e que nos de-
mos ao trabalho de minuciosamente examinar, havia na capital da
Província 2.199 casas habitadas, e, com pequena diferença, o mesmo
número de praças, travessas, ruas, etc., das atualmente existentes, sendo
a sua população, segundo os melhores cálculos, avaliada então em
25.000 almas.
Pelo lançamento de 1895-1896, posterior àquele sessenta anos,
trabalho que corre hoje por conta do Município, verificou-se contar
a cidade, na direção E.-O., 2.546 casas, e na N.-S., 2.752, o que perfaz
um total de 5.298 casas habitadas, distribuídas por 74 ruas, 16 praças,
21 travessas e 2 becos, sendo considerados como seus pontos mais
culminantes: o Campo de Ourique, a 32m, 692 acima do nível médio
das marés; Largo de São João, a 29m, 418; e Largo do Carmo, a 22m,
876.
Finalmente, pelo último lançamento, conta a cidade, em nú-
meros redondos, segundo informações colhidas na Intendência, 6.000
casas habitadas, não incluídas nessa cifra cerca de 1.000, derramadas
por diversos lugares nas proximidades da Estação, Cemitério, etc. –
mas compreendidas todas no perímetro da Capital.
Se, em 1814, levado pelos últimos numeramentos feitos pelos
róis da desobriga, dava o historiador Gaioso, segundo já ficou dito no
nosso último artigo, uma população aproximada de 30.000 almas à

– 67 –
José Ribeiro do Amaral

cidade do seu tempo; se, em 1814, quando a cidade para o rumo de


L., pouco além da matriz da Conceição se estendia, e havia muitos
terrenos por edificar ainda, como ele próprio o refere, sendo consi-
derado sítio de recreio, e já fora da cidade, o do comendador José
Gonçalves da Silva (atual Quinta do Barão ou das Laranjeiras); se,
em 1821, davam-lhe o autor da Poranduba e o coronel Lago uma po-
pulação de 20.000 almas; se, pelo lançamento de 1836-1837,
contavam-se-lhe 2.199 casas habitadas, com uma população
presumível de 25.000, não é muito dar-se-lhe, atualmente, uma po-
pulação de 60.000 habitantes, depois das grandes e numerosas
edificações que se vêem por toda a parte, hoje que tem ela mais do
triplo das casas que tinha em 1836.
Àqueles, porém, a quem parecer exagerada esta nossa afirma-
tiva, bastará lembrar que na direção S., para além de São Pantaleão,
encontra-se hoje uma cidade inteiramente nova, composta, é verda-
de, de pequenas e modestas habitações, mas que enchem a grande
área compreendida entre esta igreja, o Largo de Santiago, Hospital
Militar, Cemitério Municipal e Rua Senador João Pedro.
Na época, a que acabamos de nos referir, isto é, em 1836, exis-
tiam já aí os cemitérios dos Ingleses e o da Misericórdia (o cemitério
velho) e o primeiro Hospital dos Lázaros, por detrás deste, ambos
não há muito arrasados, e bem se compreende que edifícios tais não
seriam levantados nos lugares em que, até há pouco, ainda eram vis-
tos, se já então se derramasse a cidade para além deles.
O que parece certo é que, à exceção do Hospital Militar, Quin-
ta da Boa Hora, que primitivamente pertenceu ao cirurgião-mor José
Maria Barreto (atual Fábrica de Tecidos São Luís) e de uma outra que
foi do falecido comendador João Gualberto da Costa (atual Fábrica
Cânhamo), e que são as construções mais antigas do bairro, raríssimas
edificações deveriam então por ali haver.
E tanto isto assim é, que as ruas de São Pantaleão e da Madre
Deus, que por aquele lançamento (1836-1837) tinham 63 casas cada
uma, possuem presentemente, a primeira, 279 prédios, e a segunda,
172, não compreendidos neste número os por concluir.
– 68 –
O Maranhão Histórico

Estudando a cidade na direção E., chegaremos ainda ao mesmo


resultado: veremos toda essa área, hoje, coberta de grandes e pequenas
habitações; destas, numerosíssimas choupanas, sobretudo nos lugares
conhecidos por Baixinha, Vila Timon, João Força, etc, etc.
Da boca do Caminho Grande ao lugar denominado Dois
Leões, que é a continuação ainda da Rua Grande, e onde chega
atualmente o perímetro da cidade, contavam-se, ainda não há mui-
tos anos, apenas as seguintes Quintas: de Carlos Rocha, ocupada
hoje pelo major Francisco da Costa Rodrigues; do Lapenberg (atu-
al Fabril Athletic Club); Educandos (antigo Armazém da Pólvora
até 1818, quando foi incorporado à Fazenda Provincial); do Barão
de Turiaçu (propriedade atual do coronel Manuel Inácio Dias Vieira);
ltamacaca, do Lamarão, (Empresa Ferro-Carril) do major Inácio
José Ferreira, do Dr. Felipe Joaquim Gomes de Macedo, do Dr.
Roberto Frebourg, do desembargador Viriato Bandeira Duarte, do
Monteiro e uma ou outra casinha muito rara. Entretanto, vê-se hoje
inteiramente edificado todo o leito dessa estrada, não só até ao
Dois Leões, mas ainda até o Anil.
O Cemitério dos Passos, hoje fechado, construído por acórdão
tomado em mesa geral da mesma irmandade, de 3 de outubro de
1841, bem mostra que a cidade, por esse lado, até então, quando
muito, até aí se estendia.
A Rua Grande, que pelo lançamento de 1836 tinha 126 prédi-
os, conta hoje 330 habitados, ou o triplo dos que então possuía!
Até 1844, segundo se vê de uma planta da cidade desse tempo,
estava ainda esta cercada de trincheiras no Alto da Carneira, trinchei-
ras cujos flancos se apoiavam nos rios Bacanga e Anil, e que eram os
restos das que, em 1839, foram levantadas por ocasião da Balaiada.
Se lançarmos as vistas para a direção N.E., apresentar-nos-á a
cidade o mesmo espetáculo, chegaremos ainda à mesma conclusão:
ruas que, de vias públicas só tinham o nome, hoje já se acham calça-
das e edificadas, havendo quase que desaparecido esses numerosos
terrenos baldios que até bem pouco tempo por ali se viam.

– 69 –
José Ribeiro do Amaral

Para não ir mais longe, basta citar a Companhia de Fiação e


Tecidos Maranhense (Camboa) com as construções que lhe ficam
adjacentes; a do Chumbo, as edificações feitas na cerca do convento
de Santo Antônio, em frente à Rua do Pespontão, etc.
E se, ao que fica dito, se acrescentar ainda a grande corrente
da imigração síria que para aqui se tem encaminhado nestes últi-
mos anos; que, como hoje, não eram então ocupados os baixos
dos sobrados e que não havia essas construções de nova espécie,
mais vulgarmente conhecidas pelos nomes de cortiços, tão preju-
diciais à saúde e moralidade públicas e em que grande é a aglome-
ração de indivíduos de toda a casta, teremos que é, mais que racio-
nal, o cômputo acima.

(23.2.1912)

– 70 –
O Maranhão Histórico

9
A cidade de São Luís por ocasião
da Invasão Holandesa

C
omeçado em 1615 por Jerônimo de Albuquerque, que, com
rara habilidade, se soubera aproveitar das primitivas constru-
ções francesas, pouco mais de vinte e cinco anos contava, em
1641, por ocasião da Invasão Holandesa, o pequeno estabelecimen-
to português de São Luís, que, então, tinha por governador a Bento
Maciel Parente, o feliz e opulento donatário da Capitania do Cabo
do Norte.
Da narração de Berredo (Anais históricos, Livro XI), claramente
se vê terem os holandeses dado o desembarque no Desterro, onde a
terra faz volta para o Portinho, acrescenta o Visconde de Porto Se-
guro, e daí guiado para a cidade, atacando e tomando, já à entrada
desta, uma de suas portas que, em vão, tentara valorosamente defen-
der o capitão Paulo Soares de Avelar.
Mas, o que era a cidade daquele tempo?
Entre as páginas 44 e 45, parte segunda e livro segundo da
Istoria delle guerre del Regno del Brasile accadute tra la Corona di Portogallo e la
Republica di Olanda dal P. P. Gio. Giuseppe di Santa Teresa, Carmelitano
Scalzo, impressa em Roma no ano de 1698, ornada de numerosas
estampas, cartas geográficas, etc., etc., gravadas em aço, delineadas
– 71 –
José Ribeiro do Amaral

por Andréas Antonius Horatius e esculpidas por Benedictus Fariat,


obra esta raríssima hoje, e por isso mesmo de um valor único,
encontram-se a planta e a perspectiva da cidade de São Luís por
ocasião da Invasão Holandesa.
Comparando a planta e desenhos feitos então (1641) pelos
holandeses com a cidade atual, vê-se, pela planta, que a cidade, na-
quele tempo, estendia-se na direção S., quase sem interrupção até o
Desterro, existindo já, com muitas casas, as ruas que mais tarde vie-
ram a receber os nomes de Formosa (Afonso Pena), da Palma, do
Giz (28 de Julho) e Estrela, cortadas por outras que, pela mesma
planta, evidentemente se vê serem as atuais de Santana, Direita, da
Saúde e Cascata (Jacinto Maia).
Sob os números 6, 7 e 15, respectivamente, assinala ainda a
planta, nos mesmos sítios onde ainda hoje se encontram as igrejas
do Carmo (Chiesa della Madona del Carmine) – que, pela sua configura-
ção, nos pareceu ser o maior edifício da cidade de então; a de São
João (S. Giovanni), a curta distância, por detrás desta, e de Santo An-
tônio (Convento di S. Francesco), que se achava já fora da cidade, no
meio dos matos (boschi), como diz a planta.
Examinando a planta na direção L., vê-se que tinha a cidade
cinco vias principais. A primeira, e mais extensa de todas com algu-
mas casas já, e que corre à esquerda da igreja do Carmo, é aí designa-
da pelo nome de strada maestra (Rua Grande), parecendo-nos, assim,
vir daí este nome que ainda hoje conserva.
Correndo paralelamente a esta, vêem-se perfeitamente as ou-
tras quatro: da Paz, Sol, Afogados, que parte de detrás do Colégio
dos Jesuítas, e uma última que vai ter à igreja de Santo Antônio, e que
outra não é senão a rua deste nome. Em frente e por detrás da igreja
de São João, duas outras correm paralelas, verificando-se pela dispo-
sição atual da cidade serem essas a rua deste nome, e a das Flores,
esta com algumas casas dispersas.
A ermida, ou pequena igreja do Desterro, vem aí menciona-
da sob o n° 5, com o nome de Igreja de São Jorge – Chiesa di S.
– 72 –
O Maranhão Histórico

Giorgio, e parecendo-nos assim ter sido esta a sua primitiva invoca-


ção. Do que não resta a menor dúvida, pois que isto claramente se
vê da planta, é que esse bairro era então, da cidade, a parte mais
populosa, ou a em que a população se achava mais condensada, o
que naturalmente se explica pela maior proximidade em que se en-
contrava do litoral.
A área hoje ocupada pela Avenida Maranhense, antigo Largo
de Palácio, toda coberta de fortificações, formava, então, uma como
cidadela para a qual se entrava por uma porta situada pouco mais ou
menos na altura do prédio onde ora funciona a Administração dos
Correios.
Dentro dessa área, além do convento dos Jesuítas, exatamente
no lugar hoje ocupado pelo Paço Episcopal e de grande número de
habitações, vê-se bem distintamente, no centro, uma figura assina-
lando o sítio onde, pelos capuchinhos franceses, fora, em 1612, ele-
vada a primeira cruz e celebrada, pela vez primeira, o santo sacrifício
da missa nestas terras.
Fora das fortificações, mas bem próximo delas, na esquina da
Rua de Nazaré com a 28 de Julho, vê-se, isolado, um edifício, o qual,
pela vetustez que ainda hoje apresenta, outro certamente não é se-
não o vulgarmente conhecido por Palácio dos Holandeses.
Isto quanto à planta.
Pela perspectiva, vê-se a cidade de São Luís com suas casas,
igrejas, fortes, etc.
No antigo Largo de Palácio descortina-se perfeitamente a re-
sidência dos governadores, circulada de fortificações e diversos edi-
fícios outros, entre os quais, distintamente, a primitiva igreja da Mi-
sericórdia, fronteira ao Palácio, e com a frente voltada para o mar.
Em um plano inferior a este, um pouco abaixo das fortifica-
ções a que nos referimos acima, vê-se uma como linha de trinchei-
ras, apoiada em dois pequenos fortes ou redutos, a qual nada mais é
que o atual Forte de São Luís, com os seus dois baluartes de São
– 73 –
José Ribeiro do Amaral

Cosme e São Damião que, conquanto desmontados hoje, existem


ainda nas duas extremidades desta fortaleza,
Na planta, tem esta fortificação o nome de Castelo de São
Felipe, vendo-se logo em seguida, no lugar hoje ocupado pela guar-
da-moria e diversos outros prédios fronteiros ao Tesouro do Estado,
os armazéns onde eram recolhidos os gêneros vindos da Metrópole
e os de produção da Colônia; e, mais adiante ainda, uma bateria na
saliência que fica entre as extremas das ruas de Santana e Direita.
Traz ainda a planta, sob a denominação de fango (lama), uma
faixa de terreno que, pela posição que se lhe assinala, é precisamente
o atual Apicum, com uma casinha solitária ao lado.
Abrange, também, a planta a margem direita do Rio Anil, fron-
teira a essa parte da cidade, já então habitada.
Aí destacam-se duas pontas.
Em uma delas, a que fica mais próxima, e que, inconfundivel-
mente é a de São Francisco, vê-se, no alto, uma pequena igreja com a
sua cruz, voltada para o mar, e algumas casas derramadas pela encos-
ta; e embaixo, na praia, uma bateria ou fortim.
Na outra, um pouco mais afastada, e que nos pareceu ser a
Ponta d’Areia, mas muito mais alta do que atualmente é, há ainda
uma outra igreja com a frente para o Boqueirão, deixando ver pela
parte posterior do seu lado direito o princípio de um forte.
Será a atual Fortaleza ou Reduto de Santo Antônio da Barra
com a sua capelinha, há pouco incendiada?
Tal era a cidade de São Luís quando, a 25 de novembro de 1641,
insidiosamente, se apresentou a esquadra holandesa diante do porto.

(1°.3.1912)

– 74 –
O Maranhão Histórico

10
Disposições diversas, relativas à cidade de São Luís.
Como eram, primitivamente, conhecidas as suas ruas,
ou, antes, como se diferenciavam umas das outras.
Quando começaram a ter nomes próprios. Ruas, pra-
ças, travessas, praias e fortes de São Luís: origem dos
nomes de algumas delas e mudanças por que têm pas-
sado. Ruas com mais de um nome ao mesmo tempo.

E
M VEREAÇÃO de 6 de outubro de 1646 delibera a Câmara
de São Luís que, visto as casas da cidade ou as mais delas
serem de pindoba, ninguém trouxesse ou desse fogo senão em
panela para se evitarem os incêndios, pena de mil réis pagos na cadeia.
A princípio eram de pindoba as paredes e tetos das casas, mas
com o correr dos tempos, sobretudo de 1692 em diante, foi essa
edificação sendo substituída por outra mais de acordo com o pro-
gressivo desenvolvimento que foi tendo a cidade. Passaram então as
casas a ser construídas de taipa de pilão com telha-vã sobre mal po-
lida madeira. Por aquele tempo tinha São Luís quinhentas casas.
Em 1665, deliberou a Câmara de São Luís mandar fazer cami-
nho de carro da cidade até o Cutim, caminho que, segundo se verifi-
ca de um termo de vereação de 1691, se consertava anualmente, sen-
do os moradores obrigados a concorrer para isso com seus escravos,
– 75 –
José Ribeiro do Amaral

que se reuniam em princípios do mês de julho, atrás da igreja de São


João, onde começava a estrada.
Até 1733 ainda não tinham nomes as ruas. Designavam-se,
geralmente, ou pelos pontos a que iam ter, ou pelas casas por que
passavam, ou, finalmente, pelo nome de uma ou outra pessoa distin-
ta ou mais conhecida que nelas morava. Assim, era muito comum,
por exemplo, o dizer-se rua que vai ter à Olaria, à Fonte da Telha, à
Forca, etc.
Em 1692, além das duas fontes supramencionadas, havia tam-
bém a das Pedras, sendo então a Rua de Amaro Reis a mais freqüen-
tada do povo e procissões.
E nada há de estranho nisso – nesse modo de assim designar
as ruas, pois ainda em nossos dias, muito comum era entre nós o
dizer-se, por exemplo: Canto das Frazoas, querendo indicar a casa
de construção antiqüíssima, habitada por uma das mais importantes
e respeitáveis famílias da Província (a família Frazão), e que há uns
bons vinte anos se via ainda na Rua do Sol, esquina da de São João,
hoje inteiramente reconstruída; Canto do Lambão, Canto dos Qua-
dros, Beco do Papo Roto, etc. etc.
Em 1746, começam já os terrenos a ter valor, vendendo-se
por seis mil réis um de cinco e meia braças de frente, sito na rua que
vai das Mercês para a Olaria.
Em 1756, arremata-se o conserto de quarenta e seis braças de
calçada da Praia Grande por 111$000.
Em vereação de 8 de janeiro de 1757, mencionam-se já as ruas
do Desterro, do Carmo, de Santo Antônio, de São João e da Praça da
Praia Grande, únicos bairros que existiam então, segundo parece.
Continua-se, entretanto, a fazer uso dos nomes ou designações a que
nos referimos há pouco.
É desse tempo, ou antes, de 1758, o prédio sito na Praça João
Lisboa, de propriedade, outrora, do Barão de Coroatá, e onde pre-
sentemente tem as suas oficinas a Pacotilha.
– 76 –
O Maranhão Histórico

De um auto de arrematação de 12 de janeiro de 1772, que


temos à vista, assinado por Joaquim de Mello e Póvoas, consta a
existência de uma morada de casas, confiscada, entre outros bens,
aos jesuítas proscritos, e sita na rua denominada do Quebra-Potes.
O traslado do auto de inventário e avaliação diz: Uma morada de
casas de taipa e pilão com dois quartos assobradados da parte sul e de pedra e cal
até o sobrado, cobertas de telha sitas em doze braças de chão pouco mais ou menos,
as quais por se acharem com todo o emadeiramento do ar e o assoalhado dos
sobrados totalmente arruinados e muita parte deles podres, foram vistos e avalia-
dos pelos ditos louvados em quatrocentos mil réis com que se vai, e se declara que
as ditas casas são situadas na rua chamada Quebra-Potes – místicas pela parte
do Norte com as da viúva Dona Luísa Maria de Assunção com quintais para o
poente.
Não nos foi possível saber a que rua corresponde, atualmente,
essa que então tinha o nome de Quebra-Potes.
De 1762 a 1764, mencionam já os livros do precioso Arquivo
da Intendência Municipal desta Capital, ora confiado aos cuidados
do muito zeloso funcionário o Sr. Francisco Joaquim Pereira Rego, a
existência de mais três ruas: do Giz, Formosa e da Madre de Deus,
segundo se vê dos seguintes termos de arrematação, constantes do
Livro n.° 12 de Acórdãos de 1764-1767:
1°) Termo de arrematação que faz Pedro de Souza Martins, da
calçada da Rua do Giz, em 18 de maio de 1762 pela quantia de 170$000;
2°) Idem, idem, que faz Felício Antônio Cordovil, mercador,
morador na Rua Formosa, do contrato das aguardentes da terra, por
tempo de três anos, que principia a correr a 18 de novembro de
1763, pela quantia de 700$000;
3°) Idem, idem, que faz Francisco Amândio Lansarote, da cal-
çada da Rua da Madre de Deus, em 17 de setembro de 1764, pelo preço
de 70$000.
Até 1790, pouco além da igreja de São João estendia-se a cida-
de por esse lado, contando-se apenas, além do Quartel do Campo de
– 77 –
José Ribeiro do Amaral

Ourique, então em construção, raríssimas e modestas habitações, aqui


e ali dispersas. Vê-se isso de um ofício de 19 de novembro daquele
ano, do ouvidor João Francisco Leal ao ministro do Ultramar.
Finalmente, para se poder avaliar do que era a cidade, até qua-
se meados do século XIX, basta saber que, ainda em 1837, era o
Largo de João do Vale (mais tarde Praça da Assembléia e ora Praça
Benedito Leite) tapado por uma cerca; e que nesse mesmo ano, por
acórdão de 27 de outubro, concedia a Câmara a Antônio José Pereira
Rego e a Francisco Ferreira de Carvalho, licença para tirarem terra
no Largo da Sé por espaço de três meses, tal como se pratica atual-
mente nos barreiros do Caminho Grande.
E isto, por mais que pareça estranho, dava-se ainda em 1837, e
o que é mais, em pleno coração da cidade!

(Vide Livro de acórdãos da Câmara Municipal de 1837-1841).

– 78 –
O Maranhão Histórico

11
[Primitivas denominações de ruas]

É
O LANÇAMENTO de 1837-1838, a que já tivemos ocasião
de nos referir, o mais antigo e o mais seguro dos que se en-
contram no Tesouro do Estado, do tempo em que por esta
repartição corria semelhante serviço.
Por um Índice que lhe vem apenso, vê-se que tinha São Luís,
então, as seguintes ruas, travessas, becos, praias, largos, praças, fren-
tes, barracas, trapiches, etc.
Ruas: de São João, São João da Praia, São João da Divisão, da
Fonte das Pedras, da Cruz, Ferreiros, do Ribeirão, Manga, Egito,
Formosa, do Estaleiro, da Palma, Desterro, Giz, Calçada, Estrela,
Rua Velha, do Machado, do Sá Vedra, Santo Antônio, Alecrim, Bar-
queiros, Barrocas, Violas, do Nazaré, Sol, Barbeiros, Paz,
Quebra-Costas, Grande, Relação, Covoca, Direita, Fundão, Açou-
gue, Cascata, Precipício, Barraquinhas, Poço, Flores, Madre de Deus,
Craveiros, São Pantaleão, Forca Velha, Portão, Pespontão, Deserto,
Santa Rita, Santaninha, Norte, Remédios, Passeio, Hortas, Alegria,
Prazeres, do Moinho do Vento, Retiro, Tapada, da Praia de Santo
Antônio, Viração, Galhofa, Rua Cortada, Campo de Ourique, Afo-
gados, Sant’Ana, Mocambo, Inveja, Cajazeiras e Santiago.
Travessas: da Passagem, do Sineiro, do Pontal, Couto, Barqueiros,
– 79 –
José Ribeiro do Amaral

Escura, da Lapa, Cruz, Rancho, Laranjeiras, Cotovia, Palha e São


Pantaleão.
Becos: do Desterro, da Alfândega, Feliz e do Caela.
Praias: do Prego, Caju, Pequena, da Fonte das Pedras, do Esta-
leiro e de Santo Antônio.
Largos: do Carmo, de João do Vale, de Santo Antônio e de Palácio.
Praças: do Açougue.
Frentes: da Alfândega, da Rua do Giz, e dos Barbeiros.
Barracas.
Trapiches: da Boquinha e do José dos Reis.
Sob todos os aspectos, é a Rua Grande, incontestavelmente, a
primeira de todas as nossas vias públicas.
Situada no centro, no coração da cidade, daí como que se irra-
diam o movimento, a vida para todos os pontos, ainda os mais extre-
mos, de São Luís.
Strada maestra (estrada principal) é assim ela designada na plan-
ta da cidade (1641) que acompanha a obra do notável carmelitano
descalço frei José de Santa Teresa, sobre a Invasão Holandesa, pare-
cendo advir-lhe daí o nome que desde o começo lhe foi dado e que,
inalteravelmente, ainda hoje o guarda, mesmo porque, como ele, ne-
nhum outro tão bem lhe quadra.
Das duas ruas da Paz e Sol, que paralelas lhe correm, não nos
foi dado, até agora, encontrar vestígios dos motivos que presidiram a
imposição destes nomes, parecendo-nos terem-no eles sido aprovei-
tados ou imitados das de outras capitais européias.
Quanto, porém, à Rua de Santana, que corre no mesmo senti-
do, não se dá outro tanto. Teve ela, outrora, três nomes distintos, ao
mesmo tempo, ou antes, estava como que dividida em três trechos,
sendo um continuação do outro. Assim, da esquina da Rua da Estre-
la à da Rua Formosa (Canto Pequeno), teve primitivamente o nome de
– 80 –
O Maranhão Histórico

Rua do Hospital Velho, ou simplesmente Hospital, assim chamada


por ter sido nela instalada, na casa onde ora funciona a Repartição de
Higiene, o primeiro hospital regimental que aqui houve. Esta casa
foi propriedade dos jesuítas, passando, por confiscação dos bens de-
les, ao domínio da Coroa. Com este nome figura, ainda, em um livro
do Lançamento da receita da décima dos prédios urbanos da freguesia da Senho-
ra da Vitória desta cidade, do ano de 1821 que temos à vista.
Com a instalação do Tribunal de Relação neste prédio, em
novembro de 1813, foi esse trecho da rua perdendo pouco a pouco
o seu primeiro nome, passando daí em diante a ser mais conhecido
pelo de Rua da Relação, como se vê do documento que segue, que é
uma guia de recolhimento de dinheiro:

Rs. 13.500 – Com que entra para a Tesouraria de Fazenda o major de


engenheiros José Joaquim Rodrigues Lopes (falecido marechal-de-campo e Barão
de Matoso), por mão do abaixo assinado, importância da décima urbana de sua
casa da Rua do Hospital ou da Relação, que pertenceu aos herdeiros do falecido
José Henriques Cottes, relativa ao ano de 1828.

Maranhão, 16 de outubro de 1850


Luís José Joaquim Rodrigues Lopes

O segundo trecho desta rua, que ia daí, do Canto Pequeno à


esquina da Rua da Cruz, tinha o nome de Rua dos Covões, por causa
dos que ainda hoje existem entre os sobrados que foram outrora dos
falecidos Dr. Frederico José Corrêa e Manuel da Costa Launé.
Assim se lia, ainda, no lançamento de 1838.
O terceiro, finalmente, e último trecho, que ia da esquina da Rua
da Cruz à Praça da Alegria, também chamada de Sotero, era propria-
mente denominado Rua de Santana, da igreja deste orago, nome este
que com o correr dos tempos tornou-se extensivo à rua toda.

– 81 –
José Ribeiro do Amaral

Paralelamente, também, à Rua Grande, corre ainda a rua co-


nhecida hoje em toda a sua extensão pelo nome de Afogados, outro-
ra das Violas.
Teve primitivamente esta rua o nome de Afogabugio. Vê-se
isto de um ato da Câmara Municipal, representada por José da Costa
Reis, como seu vereador mais velho, ato em que, a requerimento do
cônego José Maciel Aranha, cedeu-lhe, a 19 de janeiro de 1784 um
chão, no fim da Rua do Afogabugio, para edificação de uma capela à
Senhora Santana.
É a pequena igreja, conhecida vulgarmente hoje pelo nome de
Santaninha.

(15.3.1912)

* * *
Outra das ruas nas condições da de Santana, isto é, dividida
em três trechos, era a de São João.
No índice que acompanha o Lançamento de décimas urbanas de
1838, apresenta-se-nos ela com três nomes distintos: São João, São
João da Praia e São João da Divisão, compreendendo, o primeiro
trecho, a parte que ia da esquina desta rua com a de Santana até sair
ao Largo de Santiago; o segundo, a que se dirigia da esquina da Rua
Grande ao lugar vulgarmente conhecido por Canto do Manuel do Bico
(Praia de Santo Antônio); e o terceiro e último, a que ficava entre as
ruas Grande e Santana, assim chamado por ser ele o marco divisório
das duas freguesias – da Conceição e Vitória – únicas então existen-
tes nesta cidade.
Das antigas ruas de São Luís, mencionadas neste lançamento,
algumas há que, positivamente, não nos foi dado saber a que outras
correspondem hoje, tal a mudança de nomes por que têm passado.

– 82 –
O Maranhão Histórico

Neste caso encontram-se as então conhecidas pelos nomes de


Rua Velha, dos Ferreiros, Fundão, do Moinho do Vento, da Galhofa,
do Tanguitá, Rua Cortada, do Navio, etc., e bem assim a Travessa do
Pontal e a praia denominada do Estaleiro.
A do Fundão, quase que podemos afirmar ser o trecho da atual Rua
Direita, compreendido entre o Mercado Público e o Passo, vulgarmente
conhecido pelo nome de Passo do Lapenberg, defronte do edifício da
Escola Normal. Atendendo-se à configuração dessa parte da rua, vê-se
que está ela perfeitamente de acordo com o nome que lhe puseram.
Lê-se isto em documento do tempo.
A do Moinho do Vento ficava por detrás da igreja dos Remé-
dios, constando isso de um parecer da Assembléia Provincial, opi-
nando para que se comprassem para o estabelecimento de um horto
botânico, nesta província, “os terrenos do cidadão Manuel José de
Medeiros, compreendidos entre a Rua Liberal, que é a frente da Casa
de Prisão, com trabalhos, e a do Moinho do Vento, que é à baixa-mar
a Rua da Independência, e a da Fonte do Marajá.”
A da Galhofa, era, também, lá para o bairro dos Remédios. De
uma sessão da Câmara Municipal, de 14 de agosto de 1843, vê-se que
tinha ela princípio “da casa do cidadão Manuel Duarte do Vale e que
vinha sair na Rua dos Remédios.”
Ficava ainda para esse bairro a Rua do Navio. Quanto às ruas
Velha, dos Ferreiros, Cortada, nada de positivo sabemos sobre a sua
verdadeira situação, podendo porém afirmar que a Travessa do Pontal
era ali pelas imediações do antigo Açougue Velho, e que a praia de-
nominada do Estaleiro era no Desterro.
Comparando-se os primitivos lançamentos com o atual vê-se que
ainda há ruas cujos nomes se acham hoje de alguma forma alterados.
Assim, diz-se atualmente da Savedra, de Nazaré, etc., quando
os seus primitivos e verdadeiros nomes eram Rua do Sá Vedra, Rua
do Nazaré, oriundos, naturalmente, de moradores mais conhecidos
que nelas foram domiciliados.

– 83 –
José Ribeiro do Amaral

Uma outra rua há, ainda, sobre cuja verdadeira situação mais
de uma pessoa nos tem inquirido. É a conhecida nos documentos e
lançamentos antigos pelo nome de Tanguitá.
Em um edital da Mesa Administrativa da Santa Casa de Mise-
ricórdia desta cidade, de 7 de fevereiro de 1849, assinado pelo secre-
tário Luís Miguel Quadros, em que se fazia público o fornecimento
de diversos terrenos pertencentes a este estabelecimento de carida-
de, lê-se: Um na Rua do Tanguitá, que esteve aforado ao falecido major Joa-
quim Alves de Abreu Guimarães Picaluga, com 40 braças de frente para a rua
que corre por detrás da Quinta do Monteiro.
Ora, sabido que a Quinta do Monteiro, a que se refere o edital
supra, é a chácara onde ora se acha instalado o Hospital Português,
adquirida em 1868 pela Real Sociedade Humanitária 1° de Dezem-
bro, claro está que a Rua do Tanguitá é uma daquelas três ruas ou
travessas compreendidas entre a casa dos herdeiros do saudoso clí-
nico Dr. Afonso Saulnier de Pierrelevée e a Rua Grande.

(22.3.1912)

* * *
Rua do Egito: é conhecida nos primeiros dias de nossa histó-
ria, na história de nossas lutas com os holandeses, pelo nome de Rua
Antônio Vaz, ou rua que ia ter às casas de Antônio Vaz, sendo essas
casas, segundo o erudito senador Cândido Mendes (Memórias para a
história do extinto Estado do Maranhão, tomo II) sitas então no canto
que hoje faz a rua que vai para Santo Antônio.
Teve depois, com o correr dos tempos, o nome de Rua do Egito.
Em 1865, em homenagem ao nosso glorioso historiador, foi,
por acórdão da Câmara Municipal, denominada Rua João Lisboa,
devido à circunstância de haver ele aí morado, em 1838, em um

– 84 –
O Maranhão Histórico

sobradinho de dois andares que nesse tempo tinha o n.° 12 e que


ainda hoje ali se vê, contíguo ao Instituto Rosa Nina.
Pouco durou essa denominação, sendo, como a de tantas ou-
tras, riscadas por deliberação da vereação que sucedeu àquela, vol-
tando a chamar-se de novo Rua do Egito.
Rua da Cruz: assim chamada, de uma cruz de madeira, de um
metro de altura, pintada de preto, que há uns quarenta anos ainda se
via no alto da parede de uma casa onde, em tempo, houve uma pada-
ria, e que faz esquina para a Rua de Santo Antônio sob o n.° 37 –
placa. O trecho desta rua, compreendido entre a Rua de Santana e a
Fonte das Pedras, era mais vulgarmente conhecido pelo nome de
Calçada da Zimbra.
Rua da Mangueira: era primitivamente conhecida pelo nome
de Rua da Forca Velha – e assim é encontrada nos lançamentos de
1837 a 1839. Adveio-lhe este último nome do fato de ter aí sido
levantada a forca no terreno, por muito tempo baldio, modernamente
ocupado por um templo protestante. O trecho desta rua, entre as de
Santana e Grande, é ainda hoje mais conhecido pelo nome de Beco
das Águas Verdes.
Travessa da Passagem: foi este, sempre, o seu verdadeiro nome,
e assim se lê em todos os lançamentos de décimas urbanas desde
1825; mas, pelo vulgo, era mais geralmente conhecida pela denomi-
nação de Beco do Panaca.
Travessa do Teatro: seu primitivo nome era Travessa do Sinei-
ro, oriundo de Manuel de Assunção Sineiro, que por aí morou. Con-
servou este nome até 1866, quando passou a denominar-se Travessa
do Teatro. O trecho desta rua entre a de Santana e o Mercado foi
sempre mais conhecido por Calçada do Açougue.
Praia do Caju: a denominação de Praia do Caju por que é co-
nhecida esta parte do litoral da cidade, adveio-lhe de Matias Correia
Caju, primeiro a quem foi dado alvará de concessão daquela praia, e
que ali habitou e construiu, segundo se vê do Livro Objetos diversos – n.°
22, de 1820-1821, ofício 660, dirigido ao juiz de fora desta cidade.
– 85 –
José Ribeiro do Amaral

Praia da Trindade: seu primitivo nome era Praia do Armazém, as-


sim chamada por se acharem aí situados os grandes armazéns do Estanco.
Era também conhecida pelo nome de Praia Pequena. Com o
estabelecimento, porém, aí, de uma fábrica de arroz, de que ainda
hoje se vêem as ruínas, foi pouco a pouco perdendo o seu primitivo
nome, e sendo mais conhecida pelo da proprietária da referida fábri-
ca, segundo se vê do seguinte aviso, inserto no jornal O Progresso, n.°
2, de 5 de janeiro de 1850:
Os herdeiros de D. Ana Tereza de Souza Trindade fazem público que em
fevereiro de 1852 finda o contrato de arrendamento que a dita Trindade fizera a
Francisco José Rabelo, da sua fábrica de socar arroz, sita na Praia Pequena para
pagamento do mesmo Rabelo, como consta da escritura feita em fevereiro de 1837
pelo tabelião Nunes, cujo débito fica pago e inteiramente extinto na data acima
mencionada.
É esta praia grandemente célebre na História do Maranhão
por haver aí sido suplicado Manuel Bequimão.
Praia do Prego: veio-lhe o nome de Manuel José Prego, ali
morador.
Com a construção do Cais da Sagração, foram pouco a pouco
desaparecendo todas essas praias, restando delas, hoje, apenas a tradição.
Barracas: chamava-se assim a um quarteirão de casebres, de-
nominados das Tulhas, fronteiro à Praça do Comércio e Arsenal de
Marinha (hoje Armazém da Alfândega), situado no mesmo lugar onde
ora existem as atuais barracas construídas pela Companhia Confian-
ça Maranhense, e que, em virtude de contrato celebrado em 1855,
são atualmente de propriedade da Municipalidade.
Para dar uma idéia do que era esta parte da cidade naquele
tempo, basta dizer que, então, aí se viam barracas portáteis de
meaçabas velhas e podres, levantadas por licença da própria Câmara!

(29.3.1912)
– 86 –
O Maranhão Histórico

12
O convento de Nossa Senhora do Carmo

E
M COMPANHIA de Alexandre de Moura, nomeado
capitão-mor com poderes de governador, para restaurar o
Maranhão do poder dos franceses, vieram, por capelães do
presídio, os padres frei Cosme da Anunciação, pregador, e frei Daniel
da Natividade, filhos da vigararia do Brasil, os quais chegando à Ilha
de São Luís, aos cinco de outubro de 1615, foram, aos 2 de novem-
bro seguinte, testemunhas da entrega das chaves do Forte de São
Filipe (única fortaleza que então havia), solenemente feita pelo Se-
nhor de La Ravardière ao referido capitão-mor.
Restaurada a colônia da ocupação francesa, pediram-lhe os dois
carmelitas sítio para fundar um convento, concedendo-lhes Alexandre
de Moura uma pequena ilha defronte da barra, conhecida pelo nome
de Ilha do Medo, com meia légua de terra, fundação que nunca teve
efeito na dita ilha, e mais duas léguas em quadro da ponta da terra
(Bonfim) para o sul. De tudo tomaram posse a 12 de dezembro do
dito ano de 1615, segundo constava dos livros do mesmo convento.
Foi esta a primeira doação de terras que aqui houveram os carmelitas,
ficando livres para Sua Majestade (como rezavam então todas as cartas de
data), todas as madeiras reais que nas ditas terras houvesse e que servir
pudessem para o fabrico de embarcações e de engenhos de fazer açúcar.
– 87 –
José Ribeiro do Amaral

Assumindo o governo da colônia o capitão-mor Jerônimo de


Albuquerque, não só lhes confirmou em nome de Sua Majestade
esta mercê, como lhes deu ainda “sessenta braças de terras para a
fundação, e trinta braças mais para umas casas e quintal para o mes-
mo convento”, o que se vê da respectiva data, passada a 20 de feve-
reiro de 1616.
De posse destas doações, vindos de Pernambuco, aqui
aportaram no ano de 1624, em companhia de frei Cristóvão de Lis-
boa, dois frades da Ordem de Nossa Senhora do Carmo – Frei Fran-
cisco da Purificação, cronista desta província, mestre de cerimônias
do convento de Lisboa, e que foi o primeiro prelado-maior que teve
esta vigararia; e frei Gonçalo da Madre de Deus, natural da cidade do
Porto, os quais em 1627 construíram o atual convento no sítio onde
presentemente se lhe vê ainda, no lugar em que, segundo a tradição,
havia então uma capela sob a invocação de Santa Bárbara, sendo seu
primeiro prior, ou provincial, frei André da Natividade.
Dizemos atual convento, porque o primitivo, o primeiro que
aqui houve, foi levantado em 1615, no lugar então conhecido por
Sítio de Monsieur de Pinau, onde atualmente se vê a igreja de Nos-
sa Senhora do Rosário, que por muito tempo conservou ainda o
nome de Carmo Velho.
De livros de registros, existentes no Arquivo da Câmara Munici-
pal, vê-se que não era pequeno o patrimônio da Ordem Carmelitana
nesta província, o qual sucessivamente foi confirmado: em 1° de agos-
to de 1631, por Francisco Coelho de Carvalho, primeiro governador
que foi do extinto Estado do Maranhão; em 11 de outubro de 1690,
por Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho, que sucessivamen-
te foi governador do Rio de Janeiro, de Minas e de Angola; e finalmen-
te, por Pedro II de Portugal, por carta de 24 de janeiro de 1698.
Abrangia esse patrimônio, aqui na cidade, nada menos que o bair-
ro que se chama hoje Rua do Egito, e até 1818 todo o terreno compre-
endido no quarteirão onde atualmente se acha situado o Teatro São Luís
(outrora União), sendo que até aí se estendia a cerca do convento,

– 88 –
O Maranhão Histórico

terreno este que, depois de grande oposição por parte dos prelados
carmelitanos, por aforamento foi concedido a Eleutério Lopes da
Silva Varela e Estêvão Gonçalves Braga para aquele fim, graças so-
bretudo aos esforços do governador e capitão-general, de então, Paulo
José da Silva Gama, como em ofício de 3 de fevereiro daquele ano
comunicou ele para a Metrópole.
Contemporâneo da Invasão Holandesa, é o convento do Carmo
o testemunho vivo das últimas lutas feridas entre colonos e invasores.
Aí acastelaram-se os nossos antepassados. No adro que lhe
corria em frente, hoje bela e espaçosa praça, deu-se o derradeiro e
mais renhido encontro que decidiu a sorte da nascente colônia,
resgatando-a de vez da dominação batava.
Conquanto guardando as mesmas proporções, não é, todavia,
a igreja do Carmo de hoje, a mesma dos primitivos tempos, sobretu-
do depois das grandes e importantíssimas transformações ali opera-
das, a golpes de trabalho e de coragem, pelos incansáveis e benemé-
ritos capuchinhos lombardos.
Descrevendo o convento e a igreja do seu tempo, dizia um
cronista da Ordem: É o dito primeiro convento no meio da cidade de São Luís
com o frontispício para o poente, tem duas torres, uma de cada banda, as janelas
dos dormitórios são para a parte do mar, tem uma boa cerca povoada de muitas
e várias plantas frutíferas, toda murada de pedra e cal.
A igreja tem cento e sessenta palmos de comprido e cinqüenta de largo. A
capela-mor é muito formosa, o seu comprimento são sessenta palmos, a largura
trinta, a tribuna é de talha coberta de tintas, ouro, e é a melhor que há na cidade.
Tem uma milagrosa imagem de Nossa Mãe Santíssima do Carmo, de seis pal-
mos; da parte do Evangelho está o nosso protopatriarca Elias, e da parte da
Epístola, nosso Padre Santo Eliseu. Nesta capela-mor há coro que tem duas
ordens de cadeiras de pau de cedro curiosamente lavrado. Saindo da capela-mor,
tem duas capelas colaterais: a da parte do Evangelho é de Santa Luzia, a da
parte da Epístola é de Santo Amaro.
Dentro do cruzeiro há duas capelas: a da parte do Evangelho tem a milagrosa
imagem de Cristo Senhor Nosso com a cruz às costas, (hoje do Sagrado Coração
– 89 –
José Ribeiro do Amaral

de Jesus), que está recolhido em uma perfeita tribuna; a principal nobreza desta
terra serve a este Senhor em uma bem governada Irmandade.
A da parte da Epístola é do Santíssimo Sacramento (hoje do Senhor
dos Passos). Em uma tribuna está a Senhora da Piedade, e da parte de fora dela
as imagens da Senhora da Penha de França e da Guia. É a Senhora festejada
nestes títulos com grande solenidade.
Tem o convento sua livraria com bastantes livros, assim de Padres Expo-
sitores, Concio-natórios, de uma e outra Teologia, e alguns de Filosofia. Nossa
Senhora do Carmo é o título deste convento.
(Vide Memórias históricas dos ilustríssimos arcebispos, bispos e escrito-
res portugueses da Ordem de Nossa Senhora do Carmo, reduzidas a catálogo
alfabético que entregou na Academia Real de História Portuguesa, e a seu Pro-
tetor Augustíssimo, el-rei D. João V, Nosso Senhor, oferece e dedica o Acadêmico
Supranumerário Fr. Manuel de Sá, religioso da mesma Ordem da Província de
Portugal – Lisboa Oriental, na Oficina Ferrerigana. – MDCCXXIV).

Tal a descrição que, da primitiva igreja e convento do Carmo


desta cidade, nos legou um dos cronistas da Ordem.
Como se vê, do velho e tradicional templo, internamente, à
exceção dos altares, quase que nada mais resta hoje, tal a transforma-
ção por que ultimamente passou.
A imagem da Virgem do Carmelo foi substituída por uma ou-
tra, mandada vir da Itália pelos capuchinhos lombardos, conjunta-
mente com o belíssimo altar de mármore que no centro da capela-mor
se ostenta.
As duas bancadas da capela-mor, onde diariamente se reunia a
comunidade para a recitação dos ofícios próprios do coro, no alto de
uma das quais se lia a seguinte inscrição: Hinc est chorus – foram dali
retiradas.
Das duas capelas colaterais a que se refere o cronista da Ordem,
e que, segundo as indicações deixadas nas suas Memórias históricas, se

– 90 –
O Maranhão Histórico

encontram ao sair da capela-mor, a de Santa Luzia, que fica à direita


de quem vai para a sacristia, está hoje totalmente desmontada, mal
deixando ver os vestígios do que foi; a de Santo Amaro, que jaz por
debaixo do antigo consistório de Santa Filomena, de há muito que
serve de capela mortuária.
O antigo púlpito, pregado à parede, e as grades de comunhão,
há muito que desapareceram.
Manteve a Ordem Carmelitana, durante os tempos coloniais,
sobretudo de 1814 até muito depois da Independência, cadeiras não
só de Humanidades, mas ainda de todas as ciências morais e teológi-
cas, tornando-se verdadeiramente notáveis pelo seu saber:
– frei Inácio Caetano de Vilhena Ribeiro, latinista, helenista e
hebraizante que teve como discípulos Manuel Odorico Mendes e
Sotero dos Reis;
– doutor frei Custódio Alves Serrão, natural de Alcântara, len-
te da antiga Escola Central, diretor do Jardim Botânico, falecido na
Corte do Império a 10 de março de 1873, e de quem, fazendo o seu
elogio fúnebre, disse o orador do Instituto Histórico, Dr. Joaquim
Manuel de Macedo em admirável síntese: “Sábio, criado no gabinete
de profundos e constantes estudos, eminente nas Ciências Físicas,
na Botânica igual a Freire Alemão, que é um monumento, em políti-
ca sempre liberal por convicção e por amor à Pátria, e nunca, em um
só dia, por amor de si; de caráter independente até a resistência na
guarda de seu direito, no culto da amizade tipo de dedicação e de
fineza, em suas relações particulares angélica amabilidade, como len-
te a eloqüência abraçada com a lógica mais cerrada; como adminis-
trador o zelo mais inteligente fulgurando pelo esplendor de imaculada
probidade; eis aí frei Custódio Alves Serrão.”
– Doutor frei Antônio Bernardo da Encarnação e Silva, na-
tural de Viana, que mais tarde obteve brevê de secularização e foi
deputado-geral por esta Província na legislatura de 1838 a 1841,
bem como cônego mestre-escola da catedral, examinador sinodal,
professor de retórica e poética do Liceu Maranhense, comendador
na Ordem de Cristo e cavaleiro na da Rosa, falecido em 1848;
– 91 –
José Ribeiro do Amaral

– e frei Antônio Julião da Costa Leite, professor de latim em


Alcântara.
Não pequenos foram ainda os serviços de outra ordem, pres-
tados em todos os tempos pela Ordem Carmelitana a esta província.
Por algum tempo esteve aí aquartelado o Corpo de Artilharia,
até que na tarde de 7 de julho de 1829 foi transferido para o Arma-
zém da Pólvora, mais tarde Casa dos Educandos Artífices, e hoje,
Aprendizes Artífices.
Por longos anos cedeu o andar térreo do seu convento para aí
se estabelecer o quartel do Corpo de Polícia e as aulas régias de ensi-
no secundário, até que, criado o Liceu na administração de Vicente
Tomás Pires de Figueiredo Camargo, foi ele aí instalado, aí permane-
cendo durante o não pequeno período de cinqüenta e dois anos,
quando teve lugar a sua trasladação para o prédio na Rua Formosa,
onde presentemente se encontram a Escola Normal e a Escola Mo-
delo Benedito Leite.
No andar superior, e muito mais tarde, no interior do conven-
to, na parte que dá para a Rua da Paz, funcionou a Biblioteca Pública,
aí instalada em 1828.
Em 1873, governando a Província o dr. Silvino Elvídio Car-
neiro da Cunha, cedeu-lhe ainda o convento do Carmo uma parte da
sua cerca para a construção de uma escola, edifício este onde presen-
temente funciona a Biblioteca Pública do Estado.
Com a morte, porém, em 9 de maio de 1891, do último reli-
gioso e provincial que foi frei Caetano de Santa Rita Serejo, alma
boa e generosa, coração extremamente bondoso, e por isso geral-
mente benquisto de todos, foi o convento do Carmo incorporado
aos bens da União, caindo então em abandono, chegando mesmo a
ameaçar quase completa ruína, quando aí se instalou a Missão
Capuchinha, chefiada por frei Carlos de São Martinho, um dos reli-
giosos mais ilustres que aqui têm pisado, a qual não só acudiu ao
convento, prestes a desmoronar-se, mas ainda transformou a velha e

– 92 –
O Maranhão Histórico

arruinada igreja no belo e majestoso templo que todos vemos e ad-


miramos, e isto à custa de muito esforço, de muito trabalho e de uma
abnegação e perseverança sem limites.
E já que falamos nos capuchinhos lombardos, injustiça fora,
sendo eles os legítimos sucessores dos carmelitas na posse do velho
convento, não registrar aqui os grandes e inestimáveis serviços de
toda a sorte, por eles prestados à causa da religião e da civilização.
Achava-se, nos últimos anos, de todo abandonado o serviço
de colonização, catequese e civilização dos índios, quando em prin-
cípios de 1893 aqui chegaram os primeiros religiosos capuchinhos,
tendo por superior ou prefeito o revmo. frei Carlos de São Martinho.
Dominado de ardente zelo apostólico e do desejo de chamar à
fé e à civilização cristãs tantos dos nossos infelizes patrícios que va-
gueiam ainda por essas matas, lançou o ilustrado e virtuoso sacerdo-
te suas vistas para a comarca de Barra do Corda, onde, porventura,
são eles encontrados em maior número, e aí deu começo à sua santa
missão pela fundação de um instituto para educação de meninos in-
dígenas; e, como se tanto não fosse bastante ainda, acabou o infati-
gável e modesto superior dos capuchinhos por prestar mais um assi-
nalado serviço ao Estado, com a aquisição, pela quantia de Rs.
15:000:000, de um importante estabelecimento de lavoura, denomi-
nado de Alto Alegre, com o fim único e altamente humanitário de
chamá-los à vida social.
Não se pode calcular, ao certo, o número de índios ainda hoje
existentes em todo o Estado. Nas diversas aldeias, porém, de Barra
do Corda, na ocasião em que as percorreu frei Carlos, afirmou-nos
ele encontrarem-se para mais de 5.000, já domesticados e com ten-
dências para adquirirem os hábitos de civilização.
E tão relevante, tão humanitária considerou o Governo do
Estado a obra de frei Carlos que, desde logo, lhe fez consignar no
orçamento um subsídio de Rs. 2:000:000, que no ano seguinte ele-
vou a Rs. 4:000:000 e por último a Rs. 12:000:000, sendo 6.000:000
para o colégio de Barra do Corda e 6.000:000 para o de Alto Alegre.
– 93 –
José Ribeiro do Amaral

Neste ínterim, ameaçando ruína iminente o convento, e talvez


mais do que este a igreja do Carmo, requereram os missionários
capuchinhos em 10 de setembro de 1894, ao inspetor da Alfândega
neste Estado, que lhes fossem entregues as chaves de um e outro
edifício, já então de propriedade da União, o que, sendo-lhes favo-
ravelmente deferido, foi nomeado depositário dos mesmos o revmo.
frei Carlos de São Martinho, fundador da Missão dos Capuchinhos
Lombardos do Norte do Brasil e primeiro superior regular da mes-
ma Missão pro tempore, com decretal generalício de 12 de maio de
1894, fixando sua residência nesta capital.
Obtido este primeiro favor, foi, pelos seus superiores de Roma,
constituído chefe da missão o revmo. frei Carlos, que, espírito supe-
rior, antevendo nos seus grandiosos ideais um auspicioso porvir para
o convento do Carmo, e desejando que fosse ele contínua habitação
dos missionários capuchinhos, fez à Senhora do Carmo um voto
que ainda hoje é respeitado pelos seus sucessores, a fim de alcançar,
pelo patrocínio dela, esta pacífica posse.
A frei Carlos sucedeu, no governo da Missão, com decretal de
11 de agosto de 1897, o malogrado frei Reinaldo de Paulo, que foi uma
das vítimas do massacre de Alto Alegre em 13 de março de 1901.
Em 1900, voltou de novo frei Carlos ao governo da Missão,
como superior regular, com decretal de 24 de abril.
Em 1901, ano fatal para os capuchinhos lombardos pela co-
nhecida hecatombe de Alto Alegre, profundamente ferido no seu
coração e no seu espírito altamente criador, não pôde este venerável
missionário resistir ao abalo produzido pelo desmoronamento de
sua obra, tão paciente e sabiamente organizada; e assim, um tanto
enfraquecido em suas faculdades mentais, foi, a conselho médico,
forçado a procurar o doce clima de sua terra para se restabelecer,
sendo substituído no governo da Missão, como vigário, por frei João
Pedro de Sexto, que, nomeado pelo revmo. visitador-geral, frei Ti-
móteo de Brescia, em 28 de junho de 1901, foi, por decretal generalício
de 23 de abril de 1903, confirmado no mesmo governo, como supe-

– 94 –
O Maranhão Histórico

rior regular, por um triênio, e reconfirmado por outro, por decretal


de 3 de maio de 1906.
O Maranhão, isto é, o convento do Carmo – Mater et Caput
Missionís como é conhecido na Ordem – foi, desde o início da Mis-
são, o lugar de residência do superior dos capuchinhos lombardos,
até que sendo pela segunda vez eleito frei Carlos, que se achava então
no Pará, ali determinou este fixar, como superior regular, sua nova
residência, que permaneceu por bem sete anos.
Nomeado superior regular da Missão, por decretal de 10 de
julho de 1909, transferiu o revmo. frei Estevão de Sexto a residência
para o Maranhão.
Amando profundamente esta terra, bem compreendeu o ilus-
tre capuchinho que, tendo aqui sido o primeiro e hospitaleiro asilo
seu e dos seus companheiros, aqui deveria ser também a Casa Mater.
Tornando-se, pelo desaparecimento do último religioso, como
já vimos, propriedade da Fazenda Nacional o convento do Carmo,
foi ele, pela segunda vez, em julho de 1911, posto em hasta pública,
apresentando-se por essa ocasião os seguintes proponentes:
Os Revmos. Padres Capuchinhos, pela quantia de Rs.
16:500:000;
Os Srs. Lisboa Machado & Companhia, pela de Rs. 15:000:000;
E a Liga do Livre Pensamento, pela de 10:000:000, tendo sido
preferida a primeira, por mais vantajosa à Fazenda Pública.
A transmissão de propriedade, feita pelo poder competente ao
superior, frei Estevão de Sexto, que para esse fim fora ao Rio de
Janeiro, teve lugar nessa mesma capital, em 21 de agosto de 1911, na
Procuradoria Geral da Fazenda Pública, sendo registrada aqui no
Maranhão, no livro competente, em 11 de novembro do mesmo ano.
Tem tido o convento do Carmo nesta sua nova fase, isto é,
depois que chegou a Missão Lombarda, os seguintes superiores, aqui
residentes:

– 95 –
José Ribeiro do Amaral

1°) Frei Carlos de São Martinho, 1894-1897. Vice-superior –


frei Mansueto da Perseverança;
2°) Frei Reinaldo de Paulo, 1897-1900. Vice-superior – Frei
João Pedro de Sexto
3°) Frei João Pedro de Sexto, 1900-1901.
4°) Frei Agostinho de Milão, 1901-1903
5°) Frei Estêvão de Sexto, 1903 até o presente, tendo tido,
durante o seu superiorado, sucessivamente, como vice-superiores,
os reverendos frei Roberto de Castelança e frei Miguel de Origgio; o
primeiro, de 1909 a 1910; o segundo, daí até esta data.
Tal é, em traços gerais, a história da Missão Lombarda no
Maranhão durante estes últimos dezoito anos, havendo durante esse
tempo passado por não pequena transformação o convento e a igre-
ja que lhe fica anexa, isto à custa de avultadas despesas de que todo o
povo desta terra é testemunha, e a imprensa por mais de uma vez o
tem registrado.

(16.4.1912)

– 96 –
O Maranhão Histórico

13
A imprensa no Maranhão: Jornais, revistas e outras
publicações periódicas de 1821 a 1908

C
ATÁLOGO organizado por ocasião da celebração do cente-
nário da imprensa no Rio de Janeiro:

1821 – O Conciliador do Maranhão

1822 – A Folha Medicinal do Maranhão


Palmatória Semanal
Gazeta da Verdade

1823 – Gazeta Extraordinária do Governo da Província


Diário Eclesiástico Independente

1824 – O Amigo do Homem

1825 – O Argos da Lei


O Censor, mais tarde, O Censor Maranhense
1826 – O Piparote

1827 – Minerva
O Farol Maranhense
A Bandurra
– 97 –
José Ribeiro do Amaral

1828 – O Despertador Constitucional

1829 – A Estrela do Norte do Brasil


A Cigarra
O Maranhense
O Observador Constitucional
O Poraquê
O Azorrague dos Corcundas

1830 – O Brasileiro
Semanário Oficial
O Almanack Mercantil
O Clarim
A Segunda Estrela do Norte do Brasil

1831 – O Publicador Oficial


O Constitucional
O Jornal dos Anúncios
A Bússola da Liberdade
A Opinião
Foguete da Nova Luz Jurjuba

1832 – O Brasileiro
O Correio do Conselho Provincial
O Mentor Liberal
O Escudo da Verdade
O Rondante Político

1833 – O Publícola Brasileiro


A Sentinela Maranhense
Atalaia dos Caiporas?

1834 – Eco do Norte


O Berro do Norte
O Correio Semanal
– 98 –
O Maranhão Histórico

O Publicador da Relação
Reformatório

1835 – O Investigador Maranhense


O Justiceiro
Correio da Assembléia Provincial

1836 – Cacambo
O Americano

1837 – Sete de Setembro


O Momborré
O Correcionador dos Abusos
O Paraense
A Tábua de Salvação
A Temperança ou O Moralista Maranhense

1838 – O Investigador Constitucional


A Sentinela
Crônica Maranhense
O Bem-te-vi
Crônica dos Cronistas
Caçador de Bem-te-vis
O Amigo do Povo
O Despertador
Correio d’Anúncios
28 de Julho
O Recopilador de Anedotas

1839 – A Revista
O Militar
O Recreio dos Maranhenses
O Amigo do País
Buscapé

– 99 –
José Ribeiro do Amaral

1840 – O Moralista
O Cometa
O Legalista
O Astro Maranhense
O Jornal Maranhense
O Guajajara
O Raio

1841 – O Imperialista
Vinte e Oito de Julho

1842 – Publicador Maranhense


O Correio Maranhense
O Dissidente
A Opinião Maranhense
O Caboclo Maranhense
O Pica-pau
O Museu Maranhense

1843 – O Maranhão
O Diário
Eco da Oposição
Liberal
A Figa

1844 – A Malagueta Maranhense


Tapy Ouaissú
Vigilante da Liberdade
Foguete

1845 – Jornal da Instrução


O Almazém
A Rabeca
O Atleta Piauiense
Tribuna do Povo
– 100 –
O Maranhão Histórico

1846 – O Unitário
O Arquivo
Jornal da Sociedade Filomática Maranhense
A Palmatória
A Matraca
O Arre e Irra
O Patusco
O Azorrague
O Cacete

1847 – O Homem do Povo


O Estudante
O Observador
O Bem-te-vi
O Bem-te-vi Maranhense
Correio Maranhense
O Barrete
O Progresso

1848 – Diário Maranhense


O Tribuno do Norte
O Verdadeiro Patriota
Voz do Bacanga

1849 – A Sentinela da Liberdade


Revista Universal Maranhense
O Porto Franco
O Sulista
A Época
O Vulcão
O Canela
O Bem-te-vi Corcunda
O Mexeriqueiro
O Salvador do Povo
O Salvador da Liberdade
– 101 –
José Ribeiro do Amaral

O Timbira
O Luzia
O Defensor do Povo

1850 – A Marmota Maranhense

1851 – Argos Maranhense


Correio dos Anúncios
O Constitucional
O Infante

1852 – O Novo Farol


O Globo
O Despertador
O Eclesiástico
A Marmotinha
Jornal de Tímon
Argos da Cena Maranhense
O Propugnador Católico
O Universal

1853 – O Estandarte
O Conciliador
O Apreciador Dramático
O Bem-te-vi

1854 – O Cristianismo
O Botão de Ouro

1855 – Diário do Maranhão


A Sentinela
O Suspiro
A Saudade

1856 – A Nova Época


A Conciliação
– 102 –
O Maranhão Histórico

Regeneração Política
A Saudade

1857 – A Moderação
A Imprensa
A Estrela da Tarde
O Espelho
Jornal dos Jovens

1858 – O Iguaçu
O Globo
Jornal do Comércio
Correio Maranhense
O Japi
A Tentativa
A Aurora do Norte
Álbum Maranhense
O Guaraciaba

1859 – Correio da Tarde


O Século
A Estrela Maranhense
O Conservador
Eco da Verdade

1860 – Ordem e Progresso


A Verdadeira Marmota
O Estudante
A Jararaca
A Tulipa

1861 – A Opinião Pública


Clarim da Monarquia
O Jardim dos Maranhenses
O Comércio
– 103 –
José Ribeiro do Amaral

O Porto Livre
Caldo de Boi
O Pirilampo

1862 – Revista Jurídica


O Artista
A Coalição
O Fórum
O Insulano
Heraclia
O Ramalhete

1863 – O País
A Situação
O Constitucional
Ginásio Literário
O Eco da Pátria

1864 – A Aurora Maranhense


O Trevo
O Trovador
A Fé
O Eco da Juventude
A Lanterna de Diógenes
Palestra Militar
A Verdade
Satanás
Boletim Comercial
O Janota

1865 – A Tribuna
A Exposição Evangélica
O Passatempo

1866 – O Futuro
O Apreciável
– 104 –
O Maranhão Histórico

Primavera
Revista Comercial
Tifon

1867 – Semanário Maranhense

1868 – O Artista
O Liberal
A Sensitiva

1869 – Juvenilia
A Atualidade
A Nação
O Fantasma
O Represador

1870 – O Formigão
A Situação
O 14 de Janeiro
A Opinião Pública
Monitor
Vinte e Oito de Julho
O Estudante
A Esperança
O Chicote

1871 – O Telégrafo
O Forte
O Represador

1872 – A Brisa
O Domingo

(15.12.1911)

– 105 –
José Ribeiro do Amaral

1873 – Diário do Maranhão

1874 – A Instrução
O Justo

1875 – Jornal da Lavoura


A Mocidade

1876 – Revista Juvenil


Gazeta do Povo
Jornal para Todos
A Floresta

1877 – Província
Revista de Instrução e Recreio
O Amigo do Povo
O Telégrafo

1878 – O Tempo
Escola
O Timbira
O Democrata
O Progresso

1879 – A Flecha
O Regenerador

1880 – Pacotilha
O Tribuno
Civilização
Cartas aos Maçons do Maranhão
O Pensador
A Lei
O Malho
Idália França
– 106 –
O Maranhão Histórico

1881 – Pacotilha
O Futuro
Antônio Pedro

1882 – Lúcia Avalle

1883 – Gazeta de Notícias


O Domingo
Atualidade
Lidador Maranhense

1884 – O Cruzeiro
O Pigmeu
Aurora
Carapuça
Jornal da Tarde
Tribuno
O Abolicionista

1885 – Gazeta do Povo


A Província
O Repolho
O Sorriso
Voz do Povo
O Estudante
Porvir
A Evolução
O Abolicionista

1886 – O Liberal
O Mensageiro
A Luz
O Eco
O Protesto
O Repórter
– 107 –
José Ribeiro do Amaral

A Federação
O Meteoro
Homenagem do Comércio a Retalho ao Dr. João Henrique

1887 – Revista Maranhense


O Binóculo
O Estudante
Campeão Português
A Semana

1888 – O Novo Brasil


Eco do Norte
Vibração Suave

1889 – O Globo
A República
Correio de Anúncios
Luso-Brasileiro
O Século
A Luz
O Povo
Homenagem ao Presidente da República dos Estados Unidos

1890 – A Aurora Maranhense


O Corisco
O Domingo
O Vulcão
O Ensaio
A Cruzada
O Nacional

1891 – O Estado do Maranhão


A Escola
A Luta

– 108 –
O Maranhão Histórico

O Canudo
O Cruzeiro

1892 – O Federalista
A Cruzada (2ª. fase)
28 de Julho
O Operário
Revista Elegante
O Novidades

1893 – A Idéia
A União Postal
Diário de Notícias
O Estudante
O Bisturi
A Infância
Atenas

1894 – Pierrô
O Mefistófeles

1895 – A Alvorada
O Estudante
O Porvir
Filomatia

1896 – O Membi
A Liberdade
Camélia
O Canudo

1897 – O Argos
O Centro Caixeiral
O Estudante

– 109 –
José Ribeiro do Amaral

1898 – O Atenas
Regeneração
O Piaga
O Ideal
O Papagaio
O Pau
O Abelhudo
O Filomático
A Vassoura

1899 – O Imparcial
A Sogra
A Vassoura

1900 – Jornal da Manhã


Os Novos
O Atleta
A Atualidade
A Tesoura

1901 – O Domingo
A Revista do Norte
A Propagadora
O Anúncio
Avante
A Renascença
Jornal dos Artistas
A Crise
O Carnaval de 1901
La Tourterelle

1902 – O Apito
O Porvir
A Escola
A Campanha

– 110 –
O Maranhão Histórico

1903 – Nova Atenas


O Rouxinol
A Fenda
As Pastorinhas
João Braga
O Domingo

1904 – A Faísca
Corneta de Ouro

1905 – Amor às Letras

1906 – A Notícia
A Imprensa
Diário Oficial
O Combate
O Chicote
Maranhão Moderno
Revista Musical
A Mocidade
Correio da Moda
Verdade e Paz

1907 – Jornal do Comércio


O Maranhão
Mensageiro Diocesano
A Avenida
Revista Tipográfica
O Moleque
O Corsário
O Falador
O Brasil
O Mensageiro
O Progresso

– 111 –
José Ribeiro do Amaral

1908 – A Pátria
Primavera
Jornal dos Artistas
A Via Láctea
A Sentinela
A Boa Nova
O Boré
O Futuro
Revista da Associação Comercial do Maranhão
O Sentinela
A Negrada
O Condor

(22.12.1911)

– 112 –
O Maranhão Histórico

14
A imprensa no interior do Maranhão

CAXIAS

1845 – Brado de Caxias

1846 – Jornal Caxiense


O Tigre de Caxias

1847 – Marimbondo
O Telégrafo
O Povo

1848 – O Pescador
O Correio dos Municípios
O Analítico

1849 – O Lidador
A Água Benta
O Bem-te-vi Caxiense
A Aurora

1850 – O Farol
– 113 –
José Ribeiro do Amaral

1851 – O Eco Caxiense


O Pelourinho

1853 – A Crônica

1854 – O Correio Caxiense

1859 – A Imprensa Caxiense


O Pugnador

1862 – O Álbum Caxiense

1864 – A Rosa

1866 – O Justiceiro

1867 – O Cabo d’Esquadra

1870 – Jornal de Caxias

1871 – Semanário Caxiense

1873 – O Lidador Caxiense

1874 – O Beija-flor
A Cruz
O Comércio de Caxias

1876 – A Luz

1877 – A Situação

1880 – A Tarrafa

1881 – O Observador

– 114 –
O Maranhão Histórico

1883 – O Xixixi
Crisálida

1884 – Eco Liberal

1886 – O Brado

1887 – Gazeta
Artista Caxiense

1891 – O Pirilampo

1893 – Gazeta Caxiense (2ª. fase)

1895 – Jornal de Caxias

1898 – O Timbira
Cidade de Caxias

1899 – O Lábaro

1900 – O Trepa
O Caxiense

1901 – O Zéfiro

1903 – O País
Correio do Sertão
Parnaso

1904 – O Porvir
O Janota

1905 – Jornal do Comércio


Liberdade

– 115 –
José Ribeiro do Amaral

1907 – O Binóculo
A Luz
O Independente
O Maranhão
A Luz

1908 – O Partenon
Gruta de Lourdes

COROATÁ

Em 1867, apareceu nesta vila um pequeno jornal, denomina-


do Coroataense, impresso em Caxias e destinado à defesa dos interes-
ses locais. Efêmera foi a sua duração. Com ele desapareceu, até hoje,
a imprensa naquela localidade.

VIANA

1876 – O Vianense
Alavanca
A Violeta

1878 – O Guanambi

1879 – O Domingo

1880 – Recreio Juvenil


A Reforma

1881 – A Ordem

1884 – Atualidade

– 116 –
O Maranhão Histórico

BREJO

Jornal Imparcial do Brejo – Foi este o primeiro periódico que


teve esta localidade. De cor política, apareceu em agosto de 1865.
Depois de um intervalo de cerca de quarenta anos, apareceu em 1906
O Anapuru.

ALCÂNTARA

1893 – Gazeta Alcantarense

1906 – O Alcantarense

ROSÁRIO

No dia 8 de abril de 1855, circulou pela primeira vez na vila do


Rosário um jornalzinho intitulado O Baluarte do Povo. Era impresso
na Capital, na tipografia do Bem-te-vi, e tinha como redator o falecido
major João da Matta de Moraes Rego, a quem deve a imprensa da
província os mais relevantes serviços. Saíram apenas 18 números.
Após um intervalo de 55 anos, apareceu em

1903 – O Rosariense

1904 – O Ser

PICOS13

1895 – O Município

1896 – O Carapuceiro
13
Atualmente, Colinas. J. M.

– 117 –
José Ribeiro do Amaral

O Republicano

1897 – A Estrela

1898 – A Época
A Imprensa

1899 – O Juvenil

1903 – Gazeta de Picos

1906 – Filolítera

BARRA DO CORDA

1888 – O Norte

Fundado em 1888, pelo inolvidável dr. Isaac Martins dos Reis,


tinha este jornal, principalmente, por fim a propaganda das idéias
republicanas. Com a proclamação da República e desaparecimento
do seu fundador, assumiu a direção desta folha o intemerato jorna-
lista Frederico Figueira, que continua a prestar os mais relevantes
serviços, especialmente à zona sertaneja do Estado.

– O Novo Mundo

1897 – O Porvir

1898 – O Guarani

– 118 –
O Maranhão Histórico

FLORES14

1906 – O Trabalho

LORETO

1904 – O Ideal

SÃO FRANCISCO

1905 – O Lírio

SÃO BENTO

1902 – O São Bento (manuscrito)

(29.12.1911)

14
Atualmente, Timon. J. M.

– 119 –
O Maranhão Histórico

15
A Imprensa no Maranhão
(Codó)

N
O FINAL de 1869, veio à luz o primeiro número do Aristarco,
primeiro jornal que teve Codó, periódico de pequeno forma
to, de quatro páginas de duas colunas, contidas em meia folha
de papel genovês ou almaço.
Foi impresso na primeira tipografia havida naquela localidade,
sendo seu redator o ilustre Dr. Antônio de Aguiar e Silva, pai do
distinto Sr. major Alcebíades de Aguiar, atual congressista do Esta-
do, a quem pertencia a referida tipografia.
Apareceu cerca de um ano, e semanalmente.
Desejando aumentar-lhe o formato, suspendeu o major
Alcebíades a publicação do Aristarco, obteve novo material e em se-
guida (1870) fez circular O Codó, que não logrou ir além de 1871.
Mais tarde, essa tipografia, que ficara guardada em uma casa
próxima à margem do Rio Itapecuru, foi sepultada sob as ruínas da
mesma, em conseqüência do desmoronamento produzido pela grande
enchente de 1875.
Em 1880 ou 1881, reunido a outros companheiros de luta, fez
o major Alcebíades aquisição, no Piauí, de outra tipografia, nela pu-
– 121 –
José Ribeiro do Amaral

blicando A Voz do Povo, de que era redator o coronel Aristides Lobão,


então residente naquela cidade, onde estreou sua vida pública, e que
mais tarde, com rara competência, desempenhou as funções de ins-
petor do Tesouro do Estado.
A tipografia foi montada na própria residência dele, e sob sua
imediata direção corria o jornal, que contava, entre outros, ao major
Alcebíades como dos principais colaboradores.
Essa tipografia passou depois, gratuitamente, às mãos do te-
nente Pedro Marques de Sousa, que fez dela surgir um número único
de um jornal intitulado Codouara, sob os auspícios do finado Dr. Lucas
da Silva Antunes, então juiz municipal naquele termo.
A falta de meios do novo periódico não lhe permitiu ir além,
obrigando-o a vendê-la novamente para o Piauí, onde em 1902 exis-
tia ainda.
Batalhador infatigável, não podendo nem sabendo conservar-se
inativo, montou ainda o major Alcebíades pela quarta vez, em 1890,
nova oficina tipográfica naquela cidade, adquirindo para esse fim o
material do periódico A Luta, que aparecia então na capital do Estado.
Dela fez surgir, enquanto seu proprietário, a Gazeta do Codó,
em 6 de novembro de 1892, a qual teve duas fases, suspendendo em
1894, passando em seguida a novo proprietário, o Sr. Antônio
Rodrigues de Oliveira Sobrinho.
Este fez dela aparecer o Monitor Codoense, em agosto de 1894,
que passou por diversas fases, à proporção que a tipografia mudava
de proprietários, desaparecendo finalmente em 1908.
Por esta ocasião fez dela aquisição o Sr. Ulisses de Jesus, que a
vendeu a uma sociedade de cinco companheiros, entre os quais se
achava ainda o major Alcebíades, vindo, por último, a tipografia che-
gar às mãos de Raimundo Viana, que dela fez sair em 14 de abril de
1901 a Gazeta Codoense.
Em conclusão, depois de tantas mudanças de proprietários,
foi esta tipografia, por derradeiro, adquirida pelo ilustre Sr. coronel

– 122 –
O Maranhão Histórico

Manuel Ferreira Bayma, que fez dela sair, em 9 de fevereiro de 1902,


o primeiro número do Comarca, jornal que ainda circula e que desde
o seu aparecimento grandes e importantes benefícios tem prestado
àquela localidade.
Além destes que acabamos de mencionar, viram mais a luz da
publicidade em Codó, entre outros cuja existência talvez desconhe-
çamos, os seguintes jornaizinhos:

A Lâmpada – em 1°. de março de 1893;


A Primavera – em 10 de dezembro de 1896;
O Martelo – em 10 de dezembro de 1908;
O Marimbondo;
A Gazeta das Moças – em março de 1882, sendo seu principal
redator Alípio de Castro Marques.

(5.12.1912)

– 123 –

Você também pode gostar