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Cruzamento
[...] Meu carro corta com esforo a geleia modorrenta em que o ar se transformou
nesse vero. Um casal de adolescentes comea a atravessar a rua, de mos dadas,
minha frente. Fora da faixa. Eles do uma olhada para o meu carro, de leve, calculando.
A garota faz meno de apressar o passo, o garoto a dissuade com um olhar de esguelha
e, talvez, um sutil aperto na mo. Eles seguem seu ritmo, lento, rumo outra calada.
[...]
Percebo ento que quem atravessou a rua minha frente no foi um casal de
adolescentes, foi a adolescncia. E quem freou o carro no fui eu, mas a idade adulta.
Pois assim que a adolescncia lida com o mundo. No capitula, arrisca, peita.
"Imagina se eu mudo meu ritmo, o mundo que se acostume a ele!", e porque os
adolescentes tm um anjo protetor dos mais poderosos ou, pelo menos, uma sorte do
tamanho de um bonde, acontece de chegarem, quase sempre, sos e salvos do outro lado
da rua.
J a idade adulta pondera, pe o p no freio quando convm, faz concesses,
dirige afinada com a sinfonia dos outros, dentro dessa outra geleia modorrenta cujo
nome, hoje, soa to adolescente: sistema. E por isso me irrito, porque ali, naquela rua,
diminuindo meu ritmo, me percebo velho, adequado, apascentado. Eles vo no ritmo
deles, a realidade que se vire, e assim, distrados, que mudam o mundo.
3. O narrador apresenta suas ideias com ponderao, sem ser taxativo. Assinale a
nica passagem em que isso no acontece:
a) despreocupados.
b) enganados.
c) esquecidos.
d) iludidos.
Gabarito:
1A | 2B | 3C | 4D | 5A