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Aplicação de Programação Dinâmica: Modelo de

Crescimento Neoclássico

Eduardo Zilberman
PUC-Rio

Macroeconomia I - 2017.1 - Aula 6

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Considere uma função de produção: Yt = F (Kt , Lt , At ), onde
Kt é o capital agregado
Lt é o trabalho agregado
At é um choque tecnológico

Hipóteses: para todo K , L e A,


F : R3+ → R é de classe C2 em K e L
Retornos marginais positivos: FK (K , L, A) > 0; FL (K , L, A) > 0
Retornos marginais decrescentes: FKK (K , L, A) < 0;
FLL (K , L, A) < 0
Retornos constantes de escala em K e L: para todo λ ∈ R+

F (λK , λL, A) = λF (K , L, A)

Sem capital, não há produção: F (0, L, A) = 0


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Modelo de Crescimento Neoclássico
Teorema de Euler: para todo K , L e A,
F (K , L, A) = FK (K , L, A)K + FL (K , L, A)L.

Prova: para todo K , L, A e λ ≥ 0,


F (λK , λL, A) = λF (K , L, A)
[ diferencie ambos os lado em relação a λ]
FK (λK , λL, A)K + FL (λK , λL, A)L = F (K , L, A)
[ avalie em λ = 1]
FK (K , L, A)K + FL (K , L, A)L = F (K , L, A).

Hipóteses (condições de Inada): para todo K , L e A,


limK →0 FK (K , L, A) = ∞ e limK →∞ FK (K , L, A) = 0
limL→0 FL (K , L, A) = ∞ e limL→∞ FL (K , L, A) = 0
Estas hipóteses garantem solução interior (K > 0 e L > 0).

Exemplo (Cobb-Douglas): F (A, K , L) = AK α L1−α , α ∈ (0, 1)


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Modelo de Crescimento Neoclássico

Defina kt = Kt /Lt , e suponha At = A (constante).

Yt = F (Kt , Lt , At ) = Lt F (Kt /Lt , 1, A) = Lt f (kt )

Exemplo (Cobb-Douglas): Yt = Lt Aktα .

Note que:
FK (K , L, A) = Lf 0 (K /L)(1/L) = f 0 (k) > 0
FL (K , L, A) = f (k) + Lf 0 (k)(−K /L2 ) = f (k) − f 0 (k)k > 0
FKK (K , L, A) = f 00 (k)(1/L) < 0 ⇒ f 00 (k) < 0
F (0, L, A) = Lf (0) = 0 ⇒ f (0) = 0
limk→0 f 0 (k) = limK →0 FK (K , L, A) = ∞
limk→∞ f 0 (k) = limK →∞ FK (K , L, A) = 0

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Modelo de Crescimento Neoclássico

Resumo: Yt = Lt f (kt ), com f 0 > 0, f 00 < 0, f (0) = 0,


limk→0 f 0 (k) = ∞, limk→∞ f 0 (k) = 0.

Agente representativo: utilidade dada por



X
β t u(ct ), β ∈ (0, 1)
t=0

Não há desutilidade de trabalho: oferta inelástica, sem perda de


generalidade Lt = 1 para todo t.

Hipóteses: u é de classe C2 , com u 0 > 0 e u 00 < 0.


Acemoglu: u : [ε, ∞) → R, para ε > 0 suficientemente pequeno.
Em geral: limc→0 u 0 (c) = ∞ (condição de Inada).

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Restrição de recursos:
ct + kt+1 = f (kt ) + (1 − δ)kt
Hipótese implı́cita: reversibilidade do capital (capital pode virar bem de
consumo, e vice-versa, sem custo adicional).

Problema de crescimento ótimo (centralizado, Pareto): dado k0 ,



X
max ∞ β t u(ct )
{ct ,kt+1 }t=0
t=0
s.a. ct + kt+1 = f (kt ) + (1 − δ)kt
ct ≥ 0, kt+1 ≥ 0, t = 0, 1, 2, ...

Equação de Bellman:
V (k) = max {u(f (k) + (1 − δ)k − s) + βV (s)}
s∈[0,f (k)+(1−δ)k]

Notação: s ∈ G (k) = [0, f (k) + (1 − δ)k] é o capital amanhã.


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Modelo de Crescimento Neoclássico
Não é óbvio que esta formulação satisfaz a hipótese de que k toma
valores em um conjunto compacto. Entretanto, se ct = 0 para todo t,
kt+1 = f (kt ) + (1 − δ)kt .
| {z }
=h(kt )

Note que: h (kt ) = f (kt ) + (1 − δ) > 0 e h00 (kt ) = f 00 (kt ) < 0.


0 0

Portanto, limkt →0 h0 (kt ) = ∞ e limkt →∞ h0 (kt ) = 1 − δ < 1

Como a dinâmica se estabilizará em k̄ = h(k̄), kt ∈ [0, max{k̄, k0 }].


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Modelo de Crescimento Neoclássico

Equação de Bellman:

V (k) = max {u(f (k) + (1 − δ)k − s) + βV (s)}


s∈[0,f (k)+(1−δ)k]

Programação dinâmica: existe uma única função valor V (k) e uma única
função polı́tica s(k) que soluciona a equação funcional acima. V é
estritamente crescente, estritamente côncava e diferenciável (no interior
de seu domı́nio).

Defina c(k) = f (k) + (1 − δ)k − s(k) [consumo].

Proposição: s(k) e c(k) são não-decrescentes.

A prova explora u 0 > 0, u 00 < 0, V 0 > 0 e concavidade estrita de V (veja


Acemoglu).

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Equação de Bellman:

V (k) = max {u(f (k) + (1 − δ)k − s) + βV (s)}


s∈[0,f (k)+(1−δ)k]

CPO : u 0 (c) = βV 0 (s)


TE : V 0 (k) = [f 0 (k) + (1 − δ)]u 0 (c)

Equação de Euler:

u 0 (ct ) = β[f 0 (kt+1 ) + (1 − δ)]u 0 (ct+1 )

Intuição: ganhos marginais de investir e consumir tem que ser iguais.


Note que o agente gosta de suavizar consumo ao longo do tempo.

Condição de transversalidade:

lim [β t (f 0 (kt ) + (1 − δ))u 0 (ct )kt ] = 0


t→∞

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Modelo de Crescimento Neoclássico

Estado estacionário: kt e ct não dependem do tempo t.

Da equação de Euler: u 0 (ct ) = u 0 (ct+1 ) = u 0 (c ∗ ) implica que

1 = β[f 0 (k ∗ ) + (1 − δ)]

Como f 00 < 0, k ∗ é único. Note que k ∗ não depende das preferências u a


não ser via o fator de desconto β.

Se kt → k ∗ e ct → c ∗ = f (k ∗ ) − δk ∗ , como f 0 > 0 e u 0 > 0, a condição


de transversalidade

lim [β t (f 0 (kt ) + (1 − δ))u 0 (ct )kt ] = 0


t→∞

é satisfeita.

Proposição: (1) se k0 < k ∗ , então kt ↑ k ∗ e ct ↑ c ∗ ; (2) se k0 > k ∗ ,


então k0 ↓ k ∗ e ct ↓ c ∗ .

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Proposição: (1) se k0 < k ∗ , então kt ↑ k ∗ e ct ↑ c ∗ ; (2) se k0 > k ∗ ,
então k0 ↓ k ∗ e ct ↓ c ∗ .

Prova (capital): ou (1) k1 = s(k0 ) ≥ k0 ; ou (2) k1 = s(k0 ) < k0 .

Caso 1: k1 = s(k0 ) ≥ k0 . Como s é não-decrescente,


k2 = s(k1 ) ≥ s(k0 ) = k1 . Por indução: kt+1 = s(kt ) ≥ s(kt−1 ) = kt .
Lembre que kt ∈ [0, max{k0 , k̄}]. Logo, {kt }∞ t=0 é um sequência
não-decrescente em um conjunto compacto e, portanto, converge para
k∞ = s(k∞ ). Como k ∗ é o único estado estacionário, kt ↑ k ∗ = k∞ .

Caso 2: k1 = s(k0 ) < k0 . Argumento similar estabelece que {kt }∞


t=0 é um
sequência não-crescente em um conjunto compacto e portanto converge.
Duas possibilidades: k∞ = 0 (se k = 0, então s(k) = c(k) = 0) ou
k∞ = k ∗ . Se s(ε) > ε para ε suficientemente pequeno (próximo slide),
então k∞ = 0 não é uma possibilidade, logo kt ↓ k ∗ .

A prova para o consumo é similar.

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Modelo de Crescimento Neoclássico

Proposição: (1) se k0 < k ∗ , então kt ↑ k ∗ e ct ↑ c ∗ ; (2) se k0 > k ∗ ,


então k0 ↓ k ∗ e ct ↓ c ∗ .

Falta provar que s(ε) > ε para ε suficientemente pequeno.

Teorema do envelope avaliado em k = ε,

V 0 (ε) = [f 0 (ε) + (1 − δ)]u 0 (f (ε) + (1 − δ)ε − s(ε))

Como u 00 < 0,

V 0 (ε) ≥ [f 0 (ε) + (1 − δ)]u 0 (f (ε) + (1 − δ)ε)

Como limε→0 f 0 (ε) = ∞, logo limε→0 V 0 (ε) = ∞.

Os ganhos marginais de fazer s(ε) > ε são muito altos quando ε é


suficientemente pequeno.

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Comentários:
No modelo de Solow (1956): ct = (1 − φ)yt . Poupa-se uma fração
φ constante (e exógena) da renda.
No modelo de crescimento neoclássico (Ramsey (1928), Cass
(1965), Koopmans (1965)): a fração poupada da renda é endógena
e varia no tempo.
Dinâmica é similar ao modelo de Solow (convergência monotônica
para um único estado estacionário, independente da condição
inicial).
Debate: Acemoglu (2009, caps. 1-4) e Romer (2011, caps. 1-4).
Este modelo não explica crescimento de longo-prazo.

Extensão: crescimento balanceado (“balanced growth path”). Pergunta:


que modificação nas preferências e tecnologia são necessárias para que
este modelo gere crescimento de longo prazo?

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Modelo de Crescimento Neoclássico

Definição: no estado estacionário, o consumo cresce a uma taxa


constante µ, ou seja, ct+1 = (1 + µ)ct (“balanced growh path”). Caso
anterior: µ = 0.

Equação de Euler:

u 0 (ct )
= β[f 0 (kt+1 ) + (1 − δ)]
u 0 (ct+1 )

c 1−σ −1
Se u(c) = 1−σ ⇒ u 0 (c) = c −σ , σ ∈ (0, ∞), então:
 σ
ct+1 σ
= β[f 0 (kt+1 ) + (1 − δ)] ⇒ (1 + µ) = β[f 0 (kt+1 ) + (1 − δ)]
ct

Como Lt = 1 (constante), então µ = 0 e kt+1 → k ∗ .

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Suponha um processo tecnológico (exógeno) que aumente a
produtividade do trabalho.

Hipótese: Yt = F (Kt , Lt , At ) = F (Kt , At Lt ) e At+1 = (1 + µ)At , com


µ > 0 e A0 > 0 dado.

Conjectura (a ser verificada): se At+1 = (1 + µ)At , então


ct+1 = (1 + µ)ct no estado estacionário.

Defina k̃t = Kt /Lt At (oferta inelástica: Lt = 1). Logo:


At f (k̃t ) = At F (kt /At , 1).

Problema:

X
max β t u(ct )
{ct ,k̃t+1 }∞
t=0 t=0

s.a. ct + At+1 k̃t+1 = At f (k̃t ) + (1 − δ)At k̃t


ct ≥ 0, k̃t+1 ≥ 0, t = 0, 1, 2, ...

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Modelo de Crescimento Neoclássico

Note que o problema



X
max β t u(ct )
{ct ,k̃t+1 }∞
t=0 t=0

s.a. ct + At+1 k̃t+1 = At f (k̃t ) + (1 − δ)At k̃t


ct ≥ 0, k̃t+1 ≥ 0, t = 0, 1, 2, ...

implica em U(t, xt , xt+1 ) (na notação do Acemoglu).

Duas opções:

Opção 1: aplicar os teoremas da seção 6.7 (Acemoglu). Tudo continua


válido sob hipóteses adicionais. A mais importante, existe M < ∞, tal
que β t U(t, xt , xt+1 ) < M para todo t = 0, 1, ..., x ∈ X e y ∈ G (t, x).

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Note que o problema

X
max β t u(ct )
{ct ,k̃t+1 }∞
t=0 t=0

s.a. ct + At+1 k̃t+1 = At f (k̃t ) + (1 − δ)At k̃t


ct ≥ 0, k̃t+1 ≥ 0, t = 0, 1, 2, ...

implica em U(t, xt , xt+1 ) (na notação do Acemoglu).

Opção 2: transformar o problema: defina c̃t = ct /At . Logo:


∞ ∞
X X A1−σ c̃t1−σ
max β t u(At ct /At ) = (β(1 + µ)1−σ )t 0 − constante
{c̃t ,k̃t+1 }∞
t=0 t=0 t=0
1−σ
s.a. c̃t + (1 + µ)k̃t+1 = f (k̃t ) + (1 − δ)k̃t
c̃t ≥ 0, k̃t+1 ≥ 0, t = 0, 1, 2, ...

Hipótese adicional: β(1 + µ)1−σ < 1


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Modelo de Crescimento Neoclássico
Refazendo a álgebra ...

Equação de Euler no steady state:


σ
(1 + µ) = β[f 0 (k̃ ∗ ) + (1 − δ)]

Assintoticamente: kt = k̃ ∗ At ⇒ kt+1 = (1 + µ)kt .

Consumo assintotico:

ct = At f (k̃ ∗ ) + (1 − δ)At k̃ ∗ − At+1 k̃ ∗


= At (f (k̃ ∗ ) + (1 − δ)k̃ ∗ − (1 + µ)k̃ ∗ )
| {z }
c̃ ∗
⇒ ct+1 = (1 + µ)ct

Produto assintotico: At f (k̃ ∗ ), logo também cresce a taxa µ.

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Modelo de Crescimento Neoclássico

Falta verificar a condição de transversalidade: como At = (1 + µ)t A0

lim [(β(1 + µ)1−σ )t A1−σ


0 (f 0 (k̃t ) + (1 − δ))(c̃t )−σ k̃t ] = 0
t→∞

Basta que β(1 + µ)1−σ < 1 (vale por hipótese) para a condição de
transversalidade ser satisfeita.

Proposição: suponha “constant relative risk aversion preferences”


1−σ
u(c) = c 1−σ−1 e “labor-augmenting technological change” F (K , AL),
com At+1 = (1 + µ)At , µ > 0 e A0 > 0 dado.

Se β(1 + µ)1−σ < 1, há crescimento balanceado (“balanced growh


path”) exógeno no estado estacionário. Em particular, consumo, capital e
produto crescem a mesma taxa µ.

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Modelo de Crescimento Neoclássico

Equação de Euler no steady state:


σ
(1 + µ) = β[f 0 (k̃ ∗ ) + (1 − δ)]

Quanto maior β, maior a razão k/A de steady-state.


Quanto maior µ, menor a razão k/A de steady-state.
Quanto maior δ, menor a razão k/A de steady-state.
Quanto maior σ, menor a razão k/A de steady-state.

Como intepretar σ? Grau de aversão ao risco e/ou elasticidade


intertemporal de substituição?

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Modelo de Crescimento Neoclássico

Digressão sobre CRRA (constant relative risk aversion):

c 1−σ − 1
u(c) = , σ ∈ (0, ∞).
1−σ

Proposição: se σ → 1, então u(c) → ln c.

Prova: aplique L’Hopital, e tire o limite σ → 1

c 1−σ − 1 d (1−σ) ln c
lim = − lim e = − lim e (1−σ) ln c (− ln c) = ln c
σ→1 1 − σ σ→1 dσ σ→1

Proposição: o coef. relativo de aversão ao risco é constante e igual a σ.


00 −σ−1
Prova: − cuu0 (c)
(c)
= − c(−σ)c
c −σ = σ.

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Digressão sobre CRRA (constant relative risk aversion):
c 1−σ − 1
u(c) = , σ ∈ (0, ∞).
1−σ

Definição: a elasticidade intertemporal de substituição é dada por


d ln(ct+1 /ct )

d ln(u 0 (ct+1 )/u 0 (ct ))
Intuição: regula a propensão do consumidor em substituir consumo ao
longo do tempo.

1
Proposição: a elast. intertemp. de substituição é constante e igual a σ.

Prova: note que


 0   
u (ct+1 ) ct+1 d ln(ct+1 /ct ) 1
ln 0
= −σ ln ⇒− 0 0
=
u (ct ) ct d ln(u (ct+1 )/u (ct )) σ

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Digressão sobre CRRA (constant relative risk aversion):
c 1−σ − 1
u(c) = , σ ∈ (0, ∞).
1−σ

Eq. de Euler: ln(u 0 (ct+1 )/u 0 (ct )) = − ln β − ln(f 0 (kt+1 ) + (1 − δ)). Logo:
d ln(ct+1 /ct ) d ln(ct+1 /ct ) 1
− = =
d ln(u 0 (ct+1 )/u 0 (ct )) d ln(f 0 (kt+1 ) + (1 − δ)) σ
Intuição alternativa: elasticidade do crescimento do consumo em relação
a taxa de juros (ou seja, o retorno do investimento).

Quando a taxa de juros aumenta:


se σ > 1, elast. < 1, ct+1 /ct aumenta proporcionalmente menos
que os juros (efeito renda domina)
se σ < 1, elast. > 1, ct+1 /ct aumenta proporcionalmente mais que
os juros (efeito substituição domina)
se σ = 1, elast. = 1, ct+1 /ct aumenta na mesma proporção que os
juros (efeitos cancelam)
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Modelo de Crescimento Neoclássico
Equação de Euler no steady state:
σ
(1 + µ) = β[f 0 (k̃ ∗ ) + (1 − δ)]

Quanto maior β, maior a razão k/A de steady-state.


Quanto maior µ, menor a razão k/A de steady-state.
Quanto maior δ, menor a razão k/A de steady-state.
Quanto maior σ, menor a razão k/A de steady-state.

Interpretação correta: Quanto menor a elasticidade intertemporal de


substituição 1/σ, menor a razão K /A no estado-estacionário.

Interpretação errada: Quanto maior a aversão ao risco σ, menor a razão


K /A no estado-estacionário.

Não faz sentido falar de risco em um modelo sem incerteza.


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Modelo de Crescimento Neoclássico

Até então: problema de crescimento ótimo (centralizado, Pareto), sob a


ótica de um planejador. Dado k0 ,

X
max β t u(ct )
{ct ,kt+1 }∞
t=0
t=0
s.a. ct + kt+1 = f (kt ) + (1 − δ)kt
ct ≥ 0, kt+1 ≥ 0, t = 0, 1, 2, ...

Como descentralizar essa economia planejada? Resposta: impor o


conceito de equilı́brio competitivo.

A economia descentralizada (competitiva) gera a mesma trajetória de


crescimento que a economia planejada? Resposta: sim.

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Modelo de Crescimento Neoclássico

Ao escrever um modelo ...


1 Tempo: finito ou infinito, discreto ou contı́nuo
2 População: geração imbricadas, vida infinita, ...
3 Bens: durável, perecı́vel, ...
4 Dotação: unidades de trabalho, capital, ...
5 Tecnologia: função de produção, ...
6 Preferências: fator de desconto, utilidade instantânea
7 Estrutura informacional: incerteza, informação privada, ...
8 Estrutura do mercado: completos, incompletos, ...
9 Conceito de equilı́brio: competitivo, ...

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Descentralizando o modelo de crescimento neoclássico ...
1 Tempo: infinito, discreto, t = 0, 1, 2, ...
2 População: agente representativo com vida infinita
3 Bens: um bem que pode ser usado para investir ou consumir
Hipótese: reversibilidade do capital (capital pode ser de
consumido sem custo adicional)
4 Dotação: k̂0 unidades deste bem, uma unidade de trabalho
5 Tecnologia: firma representativa, função de produção F (K , L)
neoclássica (mesmas proriedades acima)
P∞
6 Preferências: t=0 β t u(ct ) (mesmas propriedades acima)
7 Estrutura informacional: não há incerteza
8 Estrutura do mercado: completos
9 Conceito de equilı́brio: competitivo

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Problema da firma representativa: toma os preços como dados, e
emprega os fatores (aluga capital e contrata trabalho) de forma a
maximizar seus lucros
max{F (Kt , Lt , At ) − rt Kt − wt Lt }
Kt ,Lt

CPO: FK (Kt∗ , L∗t , At ) = rt e FL (Kt∗ , L∗t , At ) = wt .

Note que o teorema de Euler implica em lucro zero:


F (Kt∗ , L∗t , At ) − rKt∗ − wL∗t =
= F (Kt∗ , L∗t , At ) − FK (Kt∗ , L∗t , At )Kt∗ − FL (Kt∗ , L∗t , At )L∗t = 0.

Rearranjando os termos:
L∗t [F (Kt∗ /L∗t , 1, At ) − rt Kt∗ /L∗t − wt ] = 0,
ou seja, do ponto de vista da firma, o que é relevante é a razão Kt /Lt .

Desde que Kt∗ /L∗t mantenha-se constante, a firma absorve qualquer


quantidade de trabalhadores L∗t .
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Modelo de Crescimento Neoclássico

Se F (K , L, A) = AK α L1−α (Cobb-Douglas),

rK FK (K , L, A)K αAK α−1 L1−α K


= = =α
Y F (K , L, A) AK α L1−α

wL FL (K , L, A)K (1 − α)AK α L−α L


= = =1−α
Y F (K , L, A) AK α L1−α

Ou seja, α é a fração da produção que remunera o capital, e 1 − α é a


fração da produção que remunera o trabalho.

Hipótese: At = A (constante). Logo: Yt = F (Kt , Lt )

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Modelo de Crescimento Neoclássico

Consumidor representativo: dotado de uma unidade trabalho e k̂0 > 0


unidades de capital.

Problema: dado {wt }∞ ∞


t=0 e {rt }t=0 e k̂0 > 0,


X
max β t u(ct )
{ct ,k̂t }∞
t=0 t=0

s.a. k̂t+1 = (1 + rt − δ)k̂t − ct + wt , t = 0, 1, ...


k̂t+1 ≥ 0, ct ≥ 0, t = 0, 1, ...

Ou seja: ele aluga capital para firma, oferta uma unidade de trabalho, e
escolhe consumo.

Necessário e suficiente para o ótimo: transversalidade (omitida) + Euler:

u 0 (ct ) = β(1 + rt+1 − δ)u 0 (ct+1 )

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Equilı́brio competitivo: consiste de uma trajetória para o consumo,
estoque de capital, trabalho, salário e juros, {ct , Kt , Lt , wt , rt }∞
t=0 , tal que

1 Dado os preços {wt , rt }∞


t=0 e k̂0 , o agente representativo soluciona o
seu problema.
Euler: u 0 (ct ) = β(1+rt+1 −δ)u 0 (ct+1 ) [mais transversalidade (omitida)]

2 Dado os preços {wt , rt }∞


t=0 , a firma soluciona o seu problema.

CPOs: rt = FK (Kt , Lt ) = f 0 (kt ) e wt = FL (Kt , Lt )

3 Os mercados “clear” (oferta = demanda):


oferta de capital ≡ k̂t = kt ≡ demanda por capital, ∀t
oferta de trabalho ≡ 1 = Lt ≡ demanda por trabalho, ∀t
oferta de bens ≡ Yt = Ct + Kt+1 − (1 − δ)Kt ≡ demanda por
| {z }
=It
bens, ∀t
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Modelo de Crescimento Neoclássico
Note que substituindo a CPO da firma na eq. de Euler do consumidor:

u 0 (ct ) = β(1 + f 0 (kt+1 ) − δ)u 0 (ct+1 )

Mesma equação que resultou do problema centralizado.

Solução competitiva (descentralizada) idêntica a solução do planejador


(centralizada).

Curso de Micro I:
Primeiro teorema do bem-estar: numa economia sem externalidades,
se u é crescente então a solução competitiva (descentralizada) é
Pareto ótimo (soluciona algum problema centralizado).
Segundo teorema do bem-estar: sob hipóteses adicionais (mais
fortes), toda a solução Pareto ótimo (centralizada) pode ser
descentralizada através de uma economia competitiva.

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Modelo de Crescimento Neoclássico
Digressão sobre a abstração de um agente (ou firma) representativa:
Escreva uma economia com múltiplos agentes e/ou firmas
heterogêneos em algumas dimensões.
Solucione a economia e agregue as variáveis de interesse (capital,
consumo, trabalho, ...)
Justificativa 1: no agregado, a economia admite uma solução
equivalente a de uma economia com agente e firma representativos?
Justificativa 2: no agregado, a economia admite uma solução
suficientemente próxima a de uma economia com agente e firma
representativos?
Resposta: em ambos os casos, depende das especificações da
utilidade, heterogeneidade, ....
Conclusão: agente e firma representativos podem ser uma boa
aproximação (ou não) dependendo do fenômeno que se deseja
estudar.
Área de intensa pesquisa em macroeconomia.
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Modelo de Crescimento Neoclássico
O modelo crescimento neoclássico explica algumas caracterı́sticas de
crescimento de longo-prazo (no estado estacionário) da economia
americana. Engenharia reversa:
Consumo, produto e capital crescem a uma taxa (aprox.) constante
enquanto horas permanecem (aprox.) constantes.
Crescimento balanceado: F (K , AL), com At = (1 + µ)At−1 .
Frações do produto que remuneram os fatores (aprox.) constantes.
Cobb-Douglas: F (K , AL) = K α (AL)1−α .
“Lazer” (1 − h) per capita (aprox.) constante; salários reais
cresceram regularmente.
1−θ θ 1−σ
−1
Preferências: u(c, 1 − h) = (c (1−h)
1−σ
)
.
Note que a oferta de trabalho h é endógena. O agente
representativo também escolhe {ht }∞
t=0 .
Em equilı́brio, demanda ≡ Lt = ht ≡ oferta.
Referência: Cooley e Prescott (1995).
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Modelo de Crescimento Neoclássico

O que a versão apresentada do modelo de crescimento neoclássico não


explica?

Questões ligadas a desenvolvimento: divergência da renda per capita,


milagres e desastres de crescimento, ...

Outros possı́veis determinantes: instituições, geografia, capital humano,


....

Acemoglu (2009, caps. 1-4) e Romer (2011, caps. 1-4) resumem o


debate atual.

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Modelo de Crescimento Neoclássico: Exercı́cios
Exercı́cio 1. Para os probelmas abaixo, escreva a equação de Bellman,
explicitando as variáveis de estado, e derive a equação de Euler. Suponha
as hipóteses usuais do modelo de crescimento neoclássico.

(a) Risco de expropriação. Considere o modelo de crescimento


neoclássico com risco de expropriação da seguinte forma:

f (kt ) com prob. 1 − p
yt =
0 com prob. p

O planejador soluciona: dado k0 ,



X
max ∞ E0 β t u(ct )
{ct ,kt+1 }t=0
t=0
s.a. ct + kt+1 = yt + (1 − δ)kt
ct ≥ 0, kt+1 ≥ 0, t = 0, 1, 2, ...

Extra: suponha que f (kt ) = ktα , u(ct ) = ln ct , δ = 1 e p = 1/2.


Caracterize analiticamente a trajetória ótima para o capital e consumo.
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Modelo de Crescimento Neoclássico: Exercı́cios

Exercı́cio 1. (continuação)

(b) Crescimento populacional. Considere um modelo com um contı́nuo


de agentes idênticos com medida inicial L0 = 1. Suponha que a
população cresca a uma taxa n, ou seja Lt+1 = Lt (1 + n). Como os
agentes são idênticos, esta economia admite um agente representativo. O
planejador soluciona: dado K0 ,

X
max ∞ β t Lt u(Ct /Lt )
{Ct ,Kt+1 }t=0
t=0
s.a. Ct + Kt+1 = F (Kt , Lt ) + (1 − δ)Kt
Ct ≥ 0, Kt+1 ≥ 0, t = 0, 1, 2, ...

Perguntas: Esta economia apresenta crescimento do consumo agregado


no estado estacionário? E crescimento do consumo per capita no estado
estacionário?

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Modelo de Crescimento Neoclássico: Exercı́cios

Exercı́cio 1. (continuação)

(c) Formação de hábitos. Suponha que a utilidade instantânea é


u(ct − γct−1 ), com u 0 > 0, u 00 < 0 e γ ≥ 0. O planejador central
soluciona: dado k0 ,

X
max ∞ β t u(ct − γct−1 )
{ct ,kt+1 }t=0
t=0
s.a. ct + kt+1 = f (kt ) + (1 − δ)kt
ct ≥ 0, kt+1 ≥ 0, t = 0, 1, 2, ...

Extra: interprete a utilidade instantânea (formação de hábitos), e dê uma


intuição para equação de Euler.

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Modelo de Crescimento Neoclássico: Exercı́cios

Exercı́cio 2 (Prova 2012). Considere o seguinte problema do planejador


com bens duráveis: dado k0 e s−1 ,

X
max ∞ β t u(st )
{ct ,kt+1 }t=0
t=0
s.a.
ct + kt+1 = f (kt ) + (1 − δ)kt
st = (1 − φ)st−1 + ct
ct ≥ 0, kt+1 ≥ 0, t = 0, 1, 2, ...

onde st é o estoque de bens duráveis, que deprecia a uma taxa φ ∈ (0, 1).
Note que ct é a quantidade deste bem produzida no inı́cio do perı́odo t.
Suponha as hipóteses usuais do modelo de crescimento neoclássico.

a) Escreva a equação de Bellman deste problema.

b) Derive a equação de Euler.

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Modelo de Crescimento Neoclássico: Exercı́cios

Exercı́cio 2 (Prova 2012). (continuação)

c) Suponha que ao produzir uma quantidade positiva do bem durável, o


planejador tenha que pagar um custo fixo b > 0. Ou seja, o custo total
de ct unidades do bem durável é

ct + b se ct > 0
.
0 se ct = 0

Formule a equação de Bellman deste problema.

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Modelo de Crescimento Neoclássico: Exercı́cios

Exercı́cio 3. Oferta de trabalho endógena.

Considere o modelo de crescimento neoclássico, em que um agente


representativo possui uma unidade de tempo, que pode ser usada para
lazer ou trabalho L. Sua utilidade é dada por

(C 1−θ (1 − L)θ )1−σ − 1


u(C , 1 − L) = , σ ∈ (0, ∞), θ ∈ (0, 1)
1−σ
ou seja, o agente deriva utilidade de consumo C e lazer 1 − L. Este
agente vive infinitamente e desconta o futuro de acordo com β ∈ (0, 1).

Suponha ainda um processo tecnológico At+1 = (1 + µ)At , com A0 = 1 e


µ > 0, que aumente a produtividade do trabalho. A função de produção
é F (A, K , L) = K α (AL)1−α , α ∈ (0, 1).

Finalmente, a restrição de recursos é dada por:


Ct + Kt+1 = Ktα (At Lt )1−α + (1 − δ)Kt , t = 0, 1, 2, ...

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Modelo de Crescimento Neoclássico: Exercı́cios

Exercı́cio 3. (continuação)

(a) Formule o problema do plajenador central. Lembre que, além de


capital e consumo, o planejador também escolhe uma sequência de horas
trabalhadas {Lt }∞
t=0 visando maximizar a utilidade do agente
representativo.

(b) Mostre que no estado estacionário, o consumo, o capital e o produto


crescem a uma taxa constante, enquanto horas trabalhadas (e, portanto,
lazer) permanecem constantes.

(c) Mostre, utilizando a solução competitiva, que no estado estacionário,


o salário cresce a uma taxa constante.

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