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O que você sabe não tem valor algum, o valor está no que faz com o que sabe. Página 1
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 2
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

BUDISMO A
FILOSOFIA DOS
PRATICANTES DE
ARTES MARCIAIS

Uma Pequena Abordagem à Filosofia e


Espiritualidade Marcial

Marco Natali

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 3
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Mensagem

Existem pessoas que ao passarem por este


mundo fazem de seus ideais a tarefa de levar amor e
sensibilidade aos corações que delas se
aproximam.

Da mesma forma que o jardineiro não consegue


tirar das mãos o perfume das flores que colhe, tais
pessoas mantêm no semblante a irradiação do amor
que exprimem.

Que tuas pegadas sobre a Terra sejam marcos


preciosos atestando que por estes caminhos passa
um ser humano que se lembra do exemplo do Buda
e sabe, como ele, num ato de respeito às bênçãos
que recebemos da Mãe Natureza, doar-se com amor
em prol de um ideal construtivo e gratificante, que
contribui para fazer de nosso pequenino planeta um
mundo melhor.

Marco Natali

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 4
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Dedicatória:
Dedico este livro a três benfeitores.

Primeiramente a Nelson Herbst, meu amigo, irmão,


camarada, companheiro de jornada em vários momentos desta
vida que nos ensejaram oportunidades de ajudarmos muitas
pessoas, uma missão de vida excelente para cada um de nós.

Dedico-o também a meus benfeitores intencionais e aos meus


benfeitores não intencionais:

Benfeitores intencionais:

À minha esposa Marli.


A meus filhos Fábio e Cristiano.
Aos meus netos Danilo e Amanda.
À minha nora Patrícia.
Aos meus discípulos fiéis.

Àqueles que me defendem e defendem meu trabalho com


carinho e denodo apesar do pouco que faço por eles.
Aos amigos que têm me apoiado apesar de meus poucos
méritos.
Aos verdadeiros Artistas Marciais, que não se preocupam em
julgar nem em difamar os praticantes de estilos diferentes dos
seus.

Aos verdadeiros Mestres de Artes Marciais que se preocupam


em transmitir valores éticos e morais a seus discípulos e não
apenas as técnicas físicas.

Benfeitores não intencionais:

À fome que me ensinou a trabalhar.


Ao precário resultado de meus esforços que me fez livre.
Às pessoas que (muitas vezes sem nem mesmo me
conhecer) não me apreciam nem a meu trabalho e que, por me
caluniarem, ensinaram-me a lutar, a tornar-me consciente de
minhas habilidades e a permanecer no reto caminho.
O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 5
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Que meu trabalho seja abençoado para que um dia


eu possa realizar algo tão bom que tenha algum valor e
mereça a gratidão daqueles a quem dedico minhas
obras.

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Donnie Yen-甄子丹 Official

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Se você quer saber


como foi o seu
passado, olhe para
quem você é hoje;
se quer saber
como será seu
futuro,
olhe para o que
está fazendo hoje.

Siddhartha Gautama
(o Buda)
O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 17
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Clique nas imagens abaixo (cada uma tem um link diferente):

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As lições do curso a distância da


Fraternidade Kung Fu são ricamente
ilustradas e você também recebe
acesso a vídeos que demonstram as
técnicas apresentadas.

Amostras das ilustrações estão nesta e


na próxima pagina:

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A História do Kung Fu

A palavra "Kung Fu" pode ser traduzida como "Maestria",


"Habilidade e eficiência" e "Domínio alcançado com o tempo".

Os autores mais respeitados a traduzem por "Tempo de


Habilidade" e usam-na para designar as pessoas que tenham
se dedicado por um longo tempo ao domínio técnico de uma
disciplina até ao ponto em que possam expressá-la com o
máximo de habilidade.

Certa feita uma pessoa que nem me conhece me criticou


alegando que a palavra Kung Fu não significa “Tempo de
Habilidade”, mas meses depois o Jet Li publicou um artigo e
nesse artigo disse que a palavra Kung Fu se traduzia
exatamente como eu sempre ensinei, fiquei feliz com isso.

Eu a aprendi com meu professor de chinês na USP e sempre


acreditei que estivesse certo, mas foi muito bom ter isso
confirmado pelo Jet Li(*).

No Oriente a palavra Kung Fu nunca é utilizada para designar


a arte marcial; dá-se preferência ao uso de dois outros termos,
a saber:

Wu Shu - (Wu = Guerra e Shu = Arte).


Kuo Shu - (Kuo = Nacional e Shu = Arte).
(*) Devido a meus problemas de memória eu pensava que havia sido o Jackie
Chan, mas graças a meu amigo Edson Conselheiro descobri que foi o Jet Li e
pude corrigir.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 21
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

O termo Wu Shu possui uma conotação superior àquela que é


atribuída a Kuo Shu.

As palavras Wu Shu servem para designar todas as artes


guerreiras, militares ou marciais.

Em 1928 o governo chinês adotou universalmente a expressão


Kuo Shu para designar as artes marciais de origem chinesa,
dessa forma distinguindo-as de suas sucedâneas coreanas e
japonesas.

Enquanto a expressão Wu Shu é usada genericamente,


englobando todas as artes marciais conhecidas, a expressão
Kuo Shu é usada para designar apenas as artes marciais de
origem comprovadamente chinesas.

Devido à imensa riqueza do idioma chinês é possível o uso de


outros termos para se expressar a arte marcial.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 22
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

É muito comum a designação "Ch‟Uan Shu" para significar um


determinado conhecimento marcial ou mesmo um estilo.

O termo Ch‟Uan designa a arte do uso dos punhos ou mesmo


o boxe chinês - que é o nome usado para designar o Kung Fu
em todo o Oriente.

O próprio Bruce Lee usou o ideograma Ch'Uan no frontispício


de sua obra "Chinese Gung Fu, the Philosophical Art Of Self
Defense".

A palavra Kung Fu (ou Gung Fu em dialeto cantonês) é usada


aqui no Ocidente para nomear todas as artes marciais de
origem chinesa.

O povo chinês sempre foi possuidor de um grande espírito


O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 23
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

guerreiro, que fez de seu país, em épocas passadas (Dinastia


Shang -1.766 a 1.122 a.C), o país mais poderoso da Terra.

Segundo os historiadores, esse poderio militar se desenvolveu


graças às invasões estrangeiras e às revoluções entre os
senhores feudais e os imperadores chineses.

Naquela época, a imensidão do território chinês era disputada


pelos cobiçosos monarcas bárbaros que habitavam as terras
vizinhas.

Como levavam semanas e até meses para deslocar as tropas


imperiais para defender as longínquas fronteiras, a família
imperial usou o recurso desesperado de delegar poderes aos
nobres da corte.

Esses nobres, que passaram a ser conhecidos como senhores


feudais, receberam imensas porções de terras, semelhantes
aos condados outorgados à nobreza na Inglaterra medieval.

Dessa forma passaram a receber grande parte das riquezas


produzidas por seus vassalos e metade das colheitas e das
extrações minerais, mas eram obrigados a defender suas
terras e a vida de seus súditos com seus próprios recursos.

Os senhores feudais se viam obrigados a sustentar imensos


exércitos, que em tempos de paz se dedicavam intensamente
às técnicas marciais.

Por volta dos séculos II e III, aconteceram grandes batalhas


internas entre os senhores feudais que desejavam ampliar
seus domínios.

Essa época, denominada "Época dos Reinos Combatentes",


fez com que milhares de homens se enfrentassem, e as
crônicas da época relatam formidáveis batalhas que
terminavam com a morte de 70, 80, e até 400 mil homens. Os

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 24
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

vencedores não admitiam sobreviventes e aqueles que não


pereciam no ardor da batalha eram sumariamente decapitados.

Antes do advento do Comunismo a China era flagelada pela


opressão da classe dominante sobre o povo.

Depoimentos de correspondentes e missionários ocidentais


atestam que antes da Segunda Guerra Mundial a fome
imperava entre o povo e era comum a presença de cadáveres
flutuando por entre a imensa quantidade de juncos chineses.

O povo com fome não tinha sequer um lugar onde morar e


muitas famílias eram julgadas abençoadas por possuir um
barco onde viviam amontoadas como ratos.

Houve época em que a vida humana não tinha mais valor e


que se matava por um prato de comida.
Esse quadro de horrores fazia com que o povo também se
interessasse pelo aprendizado de técnicas marciais que
fossem úteis para a defesa de si mesmos e de suas famílias.

Para se ter uma vaga ideia do poderio da família imperial sobre


a grande massa do povo, basta mencionar que, em
determinada época, com exceção da família do imperador, o
povo era obrigado a se vestir sempre de preto.

Preservando a memória deste tempo de opressões os


praticantes de Kung Fu do mundo todo ainda usam uniforme
preto, identificando-se com o povo chinês.
Durante bom tempo uma das maneiras mais fáceis de
identificar o falso praticante ocidental de Kung Fu era pela cor
de seu uniforme de treino.

Normalmente os treinamentos do Kung Fu são efetuados de


calça e camiseta e o uniforme cerimonial é preservado para
ocasiões especiais ou para os mestres.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 25
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Quando o uniforme cerimonial (denominado IFU) possui


botões, mangas ou golas de cor branca, indica que o mestre
ou o pai do praticante é falecido.

O branco é o sinal de luto na cultura chinesa e usar uniforme


branco ou com partes brancas estando o mestre ainda vivo é
sinal de grande ignorância e temeridade do praticante.

Outra coisa a se notar é que, no mundo inteiro, o Kung Fu não


usa faixa como sistema de graduação.

O máximo que se admite é o uso de uma faixa de cor única


(geralmente vermelha), que será usada por todos os
participantes, independente de seu estágio ou grande domínio
técnico.

Não tendo faixa e sequer qualquer outro sistema de


graduação, o praticante de Kung Fu é avaliado em primeiro
lugar por suas realizações em prol da preservação e
divulgação de seu estilo, e em segundo lugar pelo número de
anos que se dedica à prática do Kung Fu e pelas distinções
que tenha obtido em campeonatos e apresentações públicas.

A China, mais que qualquer outro país do mundo, situa-se em


uma posição geográfica de isolamento total.

Isolada ao norte pelas amplidões dos desertos da Manchúria e


da Mongólia, e para além deles a imensidão gelada da Sibéria,
a nordeste pelo Himalaia que vai até o sul e sudeste e a leste
pelo oceano Pacífico, os chineses foram forçados a
desenvolver sua própria cultura, sem influências do mundo
exterior.

À semelhança de outros povos da antiguidade, os chineses


possuíam um modo de vida relacionado com a natureza e com
a vida agrícola.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 26
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Quem constata o comportamento mesquinho de certos


“mestres” chineses que ensinam Kung Fu no Ocidente e que
adotam a fofoca e o vilipendio como reação habitual aos outros
mestres, não consegue entender como pessoas tão ignorantes
e primitivas podem ter antepassados tão ilustres.

Os antigos chineses souberam, como nenhum outro povo,


deduzir dos fenômenos da natureza certas leis e princípios que
passaram a fazer parte de uma filosofia de vida e de uma
sabedoria excepcionais.

Através da observação dos animais criaram exercícios


especiais para fortalecimento e agilização do corpo.

Embora na antiguidade (por volta de 4.000 anos antes de


Cristo) esses exercícios fossem usados com o objetivo de
preservar a saúde, com o correr do tempo foram transformados
em estilos de luta e em escolas internas e externas. As
internas dedicam-se aos estilos suaves e as externas aos
estilos duros.

Em recordação a essas origens muitos estilos modernos ainda


mantêm, em seus nomes, referências aos movimentos dos
animais de onde se originaram.

Por exemplo: "Tong Long" (Louva-a-Deus), "Fei Hok Pay" ou


"Bay Hok Pay" (Garça Branca), "Fan Tzi" (Águia), "Fu Jow Pay"
(Tigre) etc.

Das séries animais mais conhecidas na antiguidade, destaca-


se em importância a "Wu Chin Si" atribuída ao grande médico
e anestesista "Hua To", e que incluía o veado, o macaco, a
águia, o urso e o tigre.

É imensa a quantidade de estilos existentes no Kung Fu.


Estima-se que só na cidade de Hong Kong existam cerca de
360 estilos.

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Essa grande variedade de estilos se deve à imensa população


da China (é o país mais populoso do mundo) e à grande
antiguidade do Kung Fu (situado historicamente pela primeira
vez no ano 2674 antes de Cristo).

Os primeiros estilos foram criados pelos clãs (famílias) e


mantidos como segredo através das gerações.

Era muito comum que, ao herdar um determinado estilo um


membro dessa família acrescentasse alguns movimentos por
sua própria conta, e o estilo original sofria diversas alterações
de geração para geração.

Com o passar do tempo o mesmo estilo se desmembrava em


vários estilos menores, que por sua vez iriam se dividir em
outros e assim por diante.

As diferentes escolas de Kung Fu recebem na China uma


divisão empírica, que as denomina como Escolas do Norte e
Escolas do Sul.

Essa denominação surgiu devido ao fator geográfico que


influenciou no desenvolvimento dos estilos básicos.

Graças à grande extensão do continente chinês, suas regiões


do norte e do sul caracterizavam-se por marcantes diferenças
no que tange ao solo e aos acidentes geográficos.

Daí surgir o conceito "Na Kuen Pat Tui", que em chinês


significa: ”Punhos no Sul, pernas no Norte."

Os povos do norte habitavam as montanhas, e, portanto,


tinham pernas fortes e se especializaram no desenvolvimento
de estilos que fossem favoráveis ao uso dessa predisposição
natural.

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Os povos do sul habitavam os pântanos, nas várzeas onde


semeavam o arroz e nas barcas atracadas às margens dos
rios.

Por força dessas circunstâncias precisavam manter o equilíbrio


de forma precária e se tornaram exímios cultores dos estilos
em que predominava o uso dos braços.

Além da influência geográfica que acabamos de examinar, o


Kung Fu se desenvolveu sob as características das religiões e
filosofias mais marcantes de sua cultura.

No início da Era Cristã as escolas budistas originárias da Índia


tiveram grande ascensão dentro da civilização chinesa,
passando a ter certa influência política.

Os líderes do Budismo chinês eram agraciados pelo imperador


com cargos públicos.

Esses fatos perturbaram muito os praticantes da filosofia


taoísta, criada por Lao Tsu, que se viram na contingência de
transformar sua filosofia em religião em busca do prestígio que
tinham perdido.

Essa transformação do Taoísmo em religião foi tão radical que,


para concorrer com as divindades budistas, foram instituídos
os "Imortais", que eram semideuses taoístas.

Desses imortais, os mais famosos foram os "Oito Imortais


Bêbados", que deram origem ao estilo "Chui Pa Hsien", mais
conhecido como "Estilo dos Bêbados".

Para diferenciar as escolas de Kung Fu de origem taoísta das


de origem budista, foram criados os termos "Nei Chia" (escola
interna) e "Wai Chia" (escola externa).

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

As escolas taoístas (internas) caracterizam-se pelos


movimentos lentos, pela respiração profunda e pelo estudo das
energias internas exemplo: o “T‟AI CHI CHUAN”.

As escolas budistas (externas) caracterizam-se pelos


movimentos rápidos e agressivos e pela busca de praticidade
em situações de luta exemplo: o “SHAOLIN”.

Na época da dinastia Chou, os homens estavam cansados das


guerras e revoluções que esfacelavam o império chinês.

Muitos desses homens foram para os bosques e montanhas


buscando refúgio na vida solitária e na convivência com a
natureza.

Esses ermitãos professavam a filosofia do "Tao" (caminho), daí


serem conhecidos como taoístas.

Esse conceito denominado “Tao" não pertence aos taoístas,


tendo surgido no alvorecer da civilização chinesa e sendo
atribuído ao filósofo Fu Hi.

O conceito original foi ampliado através dos ensinamentos de


Lao Tsu (também conhecido por Lao Tse, Lao Zi ou Li Ehr,
segundo diferentes dialetos).

As escolas taoístas passaram no decorrer da história por três


etapas sucessivas e independentes: A fase filosófica (Tao Kia),

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a fase mágica-alquimista (Tao Kiao) e a fase religiosa (Ching


Kia).

A respeito de fase religiosa, já explicamos anteriormente que


ela surgiu como consequência da influência budista sobre a
cultura chinesa.

A fase mágica-alquimista foi a mais pobre e a mais extensa


das fases do taoísmo, fundamentando seus dogmas na crença
da possibilidade de imortalidade e na fábula da existência de
uma erva que a concretizaria.

A erva da imortalidade (Ling Chi Tsao) e a busca dos gênios


imortais (Hsien) foram a preocupação maior e a razão máxima
que motivou grande parte dos filósofos taoístas nessa fase.

Quanto à fase filosófica, sua base apóia-se na obra “Tao Te


Ching”, de Lao Tsu (604-517 a.C).

Nessa obra de grande profundidade e de difícil interpretação,


você tem a oportunidade de encontrar uma das mais sensíveis
contribuições do pensamento chinês.

Já foi traduzida para o português e existem pelo menos 12


traduções diferentes ao alcance do público brasileiro nas boas
livrarias.
O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 31
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Lamentavelmente muito se perde nessas traduções e embora


tenhamos comparado três das melhores versões para
podermos aconselhar sua aquisição ao leitor, nenhuma delas
nos satisfez o suficiente.

Essa obra contém muitos ensinamentos que incentivam a


meditação, a busca interior e as técnicas respiratórias (mais
tarde adotadas no T‟Ai Chi Chuan").

Exemplo de citação:

"O sábio fecha a boca e os olhos, anula os sentidos e se torna


impenetrável ao mundo exterior, abrindo-lhe apenas o
coração."

É lamentável que a maioria dos professores de “T‟Ai Chi


Chuan" não se interessem em (ou não saibam como) transmitir
os conhecimentos da filosofia taoísta a seus alunos.
O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 32
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Ao invés disso, preocupam-se mais com os conceitos taoístas


(da fase mágica-alquimista) sobre os métodos de respiração e
mentalização com objetivos de alcançar a longevidade.

Um dos conceitos mais populares entre os taoístas da


antiguidade, dizia respeito ao retorno ao "Tao" após a morte.

A morte para eles era uma forma de libertação onde iriam


colher os frutos da experiência que acumulavam durante a vida
terrena.

Para se acumular o maior número possível de experiências,


fazia-se necessário ter uma vida o mais longa possível, por
isso cuidavam muito de assuntos relacionados com
alimentação, exercícios, higiene, equilíbrio energético do corpo
e Medicina.

Incentivavam a fluência da energia do Tao (Chi), através de


massagens Tui Ah (ou Do-in), exercícios respiratórios Chi
Kung e da exposição do corpo à luz solar e lunar.

Por volta do ano 120 a.C., surgiu a obra "Huai Nan Tsu", onde
são citadas as técnicas para se obter a vida eterna.

Tais técnicas se baseavam em métodos respiratórios e em


ginásticas especiais, em muito semelhantes aos estilos antigos
de "T'Ai Chi Chuan" e "Pa Kua".

Essa busca da imortalidade contribuiu para o surgimento dos


primeiros conceitos sobre Acupuntura (medicina chinesa com
agulhas), no tempo do imperador Huang Ti.

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Inúmeras lendas relatam a história de Chao Tao Ling (34-156


D.C) que teria sido um grande mago alquimista, especializado
na fabricação de talismãs, tendo criado uma sociedade secreta
onde ensinava Alquimia e a fórmula para a vida eterna.
Segundo se conta, teria ascendido aos céus sobre as costas
de um tigre em plena luz do dia, levando consigo a sua esposa
e dois dos discípulos mais fiéis.

Dentre os termos chineses a expressão "Chi" é utilizada para


designar a energia do Tao, que se manifesta nas múltiplas
formas do Universo, e que é a responsável pela manifestação
da vida nas diferentes espécies existentes sobre a Terra.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 34
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Trata-se de uma energia interna, misteriosa, de natureza


psicofisiológica, responsável pela manutenção da vida de
todos os seres.

Segundo as teorias da Acupuntura e do Do-ln (temas que


serão estudados posteriormente na Fraternidade Kung Fu), a
doença se manifesta quando a energia "Chi" se encontra
bloqueada em um dos meridianos (Ching) do corpo.

A ação terapêutica do Do-ln e da Acupuntura consiste em


pressionar com os dedos ou puncionar com agulhas esses
meridianos, fazendo com que essa energia volte a fluir
novamente.

Segundo os métodos "Noi Kung" e "Chi Kung" das escolas


taoístas, o praticante de Kung Fu aprende a centralizar o "Chi"
no "Tai Tien" (Tanden em japonês), um ponto localizado a
alguns centímetros abaixo do umbigo.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 35
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Conta-se que alguns praticantes mais experimentados eram


capazes de arremessar essa energia a tal ponto que podiam
derrubar um adversário a vários metros de distância.

Uma das técnicas mais famosas que emprega o uso dessa


energia é a “Tie Sa Chang”, mais conhecida como "Palma de
Ferro".

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 36
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Um presente a nossos leitores.


Baixe esta revista de minha autoria:

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FU+Editora+3.rar

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Os Precursores
No início da Era Cristã (141 a 203 d.C.) viveu na China um
grande médico que ficou conhecido como O Pai da Educação
Física.

Esse médico, cujo nome era Hua-To, nasceu no Distrito de Po,


na Província de Anewei e se tornou muito famoso por ser o
primeiro médico cirurgião a usar analgésicos ao realizar suas
operações.

Mas para os praticantes de Kung Fu, ele merece ser lembrado


pela criação de uma série de exercícios que, imitando o
comportamento de cinco animais, teria fundamentado a origem
de alguns dos estilos de Kung Fu que seriam matrizes dos
estilos existentes em nossos dias.

A famosa série dos cinco animais de Hua-To tinha por objetivo


agir como um preventivo contra as enfermidades e constituir-se
em um método de exercício cotidiano.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 38
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Essas séries de movimentos passaram a ser conhecidas sob o


nome "Wu-Chi-Si" e, para motivar melhor seus praticantes,
acabou por se tomar um dos primeiros estilos de luta interna.

Segundo registros históricos dessa época, o método de Hua-


To consistia em exercícios físicos onde se dava grande
importância às práticas respiratórias e que poderiam ter
utilidade como defesa pessoal.

A história registrou também que dois de seus discípulos (Wu-


Pu e Fae-Ya) viveram mais de 90 anos, sem perder um só
dente e mantendo a vista e os ouvidos tão aguçados quanto na
juventude.

Hua-To praticava regularmente esses exercícios e insistia em


divulgá-los ao povo.

Esses exercícios consistiam num Tchia Dsu (também chamado


Kuen), semelhante aos Tchia Dsu de alguns estilos de Kung
Fu dotados de movimentos amplos ainda existentes em nossos
dias.

Tchia Dsu são os movimentos formais de cada estilo.


Em japonês chama-se Kata e por essa razão alguns
praticantes de Kung Fu que tentam “achinezar” termos
japoneses os chamam de Catí.

Esse tipo de movimentação era denominado "Chung Chuan"


ou "Cheong Kuen".

Os movimentos eram suaves, flexíveis e amplos, ao passo que


a respiração era relaxada e natural: o inverso dos estilos
externos onde a respiração era forçada pelos músculos
abdominais.

Esses exercícios também tinham a intenção de manejar a

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 39
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manifestação energética da natureza denominada YING e


YANG, servindo de base, portanto, para o surgimento dos
estilos internos que vieram posteriormente a essa época (T'Ai
Chi Chuan, Pa Kua e Hsing I).

Dentro do folclore do Kung Fu, existe um personagem


marcante cujas lendas ainda são narradas pelos mestres de
Kung Fu no mundo todo.

Esse personagem era conhecido pelo nome de Kwang Kung e


as histórias sobre ele são contadas em uma obra clássica da
literatura chinesa denominada "Os Três Reinos", onde ele é
descrito como um homem de alta estatura e possuidor de
grande força e coragem, o que o tornava um guerreiro temido e
respeitado.

Kwang Kung era o soberano de uma vasta região da China e


era muito habilidoso nas artes estratégicas e no Kung Fu.

Nesta obra existe uma passagem a respeito de uma ocasião


em que Hua-To fez uma operação no braço de Kwang Kung.
O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 40
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Hua-To foi o criador do primeiro medicamento anestésico


conhecido homem. Esse remédio, denominado Ma-Fei-San,
permitia a realização operações mantendo o paciente sob
anestesia geral.
O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 41
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Segundo contam os relatos da época, Kwang Kung teria sido


ferido uma flecha e ao tentar retirá-la quebrou-a dentro do
braço.

Hua-To foi chamado para extrair a ponta da flecha e ofereceu a


aplicação de seu famoso analgésico para que não houvesse
dor durante a cirurgia, mas Kwang Kung o recusou e preferiu
se distrair durante a operação jogando um espécie de xadrez
chinês (como você vê na ilustração da página anterior).

Hua-To abriu o braço de Kwang Kung, extraiu-lhe a ponta da


flecha, limpou a ferida e costurou as carnes no lugar sem que
este pronunciasse uma palavra de dor!

Um dos inimigos de Kwang Kung chamado Chou-Chou e que


também era soberano de um dos reinos em que a China
estava dividida nesse período, ficou espantado com o
restabelecimento rápido de seu inimigo e com a rapidez com
que retornou aos campos de batalha.

Algum tempo depois Chou-Chou foi acometido de violenta dor


de cabeça e chamou Hua-To para que a curasse.

Depois de diagnosticar a origem dessa dor Hua-To informou


que seria necessária uma operação e que teria de abrir-lhe a
cabeça.

Chou-Chou achou que o médico tinha tramado algum método


para assassiná-lo e mandou executar Hua-To.

Tempos depois o próprio Chou-Chou morreria em uma crise


fortíssima de dores de cabeça - provavelmente de algum tipo
de tumor cerebral.

Go-Ko-Hung (mestre que retém a simplicidade) viveu na China


por volta de 254 a 334 d.C, tendo escrito uma obra chamada

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 42
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

"Nuy-Pi-En" (Textos Interiores), que tratava de fórmulas da


Alquimia sobre a transmutação dos metais e fórmulas mágicas
sobre o prolongamento da vida.

Entre os métodos de longevidade citados em sua obra


incluíam-se os exercícios com práticas respiratórias e
mentalizações energéticas que seriam adotadas pelas escolas
de Kung Fu internas.

Li-Chih-Min transformou o Taoísmo em religião imperial por


volta do ano 300 a 600 d.C.

Essa fase religiosa do Taoísmo surgiu, como já dissemos


antes, como uma reação às influências do Budismo.

Constituíram-se ordens monásticas, com extensa liturgia, com


O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 43
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

cânones dogmáticos e grande quantidade de templos e uma


série de divindades.

Em sua origem tanto o Budismo como o Taoísmo eram apenas


filosofias sem pretensões religiosas.

No entanto, as ramificações que ocorreram após a morte de


Buda criaram duas escolas principais - a Mahayana (Grande
Veículo) e a Hinayana (Pequeno Veículo), das quais, a
primeira passou a divinizar a figura de Buda e a admitir
conjeturas sobre a vida após a morte e outros conceitos sobre
a existência de deuses e da reencarnação.

O sucesso da seita Mahayana trouxe aos monges budistas um


vasto poderio político que provocou um certo ciúme por parte
das autoridades taoístas que, por suas origens chinesas (o
Budismo veio da Índia), exigiam igual número de regalias.

Para ascenderem ao mesmo plano de influência política e


social do Budismo, os patriarcas do Taoísmo decidiram
transformá-lo em religião e idealizaram uma série de
divindades, chegando ao ponto de alegar que o Buda era
apenas uma encarnação de Lao-Tse (o criador do Taoísmo).

Dentre a plêiade de divindades taoístas criadas para satisfazer


a curiosidade popular, as que se tomaram mais famosas foram
os "Pa Hsien" ou "Oito Imortais", que dariam origem a um estilo
denominado "Chui-Pa-Hsien" -o estilo dos oito imortais
bêbados.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 44
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Historicamente falando a origem desse Tchia Dsu (que


estudaremos mais tarde no curso à distância da Fraternidade
Kung Fu), nada tem a ver com a religião taoísta originada no
tempo de LiChih-Min.

A origem do estilo dos oito imortais bêbados situa-se em um


Tchia Dsu da escola Ti Tang, método da China do norte, que
se baseava em movimentos que deveriam ser usados caso o
lutador viesse a cair ao solo durante uma luta.

O praticante do "Chui-Pa-Hsien" executa uma série de


movimentos de grande grau de dificuldade técnica, movendo
seu corpo como se estivesse bêbado a ponto de
aparentemente perder o equilíbrio e cair no chão.

O sucesso desse estilo foi imitado por outras escolas de Kung


Fu externo e em nossos dias existem "estilos do bêbado", nas
escolas "Tai Shing" (estilo do macaco), "Fey-Hok-Pay" (estilo
da garça), "Tong-Long" (louva-a-deus) e "Choy Lay Fut".

No estilo Tai Shing esse Tchia Dsu se caracteriza por uma


mescla dos movimentos do macaco no solo - o corpo do

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 45
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

praticante fica quase ajoelhado e algumas vezes com as


costas ou a parte de cima da cabeça no chão.

No Choy-Lay-Fut o Tchia Dsu Chui-Pa-Hsi-En (note a grafia


diferente) é transmitido juntamente com uma série de Tchia
Dsu avançados denominados: "Sup Pat Law Hon Yik Gun
Ching" (sistema interno dos oito budas), "Pa Kua Sum Kuen"
(Tchia Dsu dos oito trigramas), "Fey Hok Da Kuen" (Tchia Dsu
serpente contra o grou).

O "estilo do bêbado" tornou-se muito popular em nossos dias


graças ao desempenho do ator chinês Jackie Chan que
executou em um de seus filme uma estilização coreografada
do Tchia Dsu do bêbado do estilo Tai Shing.

Veja ilustrações desse filme a seguir:

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 46
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O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 47
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O estilo Hsing I (pronuncia-se Chin i) foi criado pelo general


Yueh-Fei (1102-1141), durante a dinastia Sung.

Mais tarde estudaremos no curso a distância da Fraternidade


Kung Fu a vida desse grande praticante de Kung Fu e
entraremos em maiores detalhes sobre o tema.

A peregrinação dos monges budistas e taoístas pelo Tibete


trouxe influências novas para os estilos de Kung Fu chineses.

Essas influências foram mais marcantes nas escolas Fey Hok


Pay e Hop Gar.

O estilo Fey Hok Pay, também conhecido como "Pay-Hao",


"Bai Hok Pay", "Hao Chuan" e "Pae Hok" e o estilo Hop Gar se
desenvolveram sob as influências do Budismo Vajrayana do
Tibete e foram levados pelos monges budistas e tibetanos que
peregrinaram por esse país até Cantão, no sul da China.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 48
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Chang San Feng (ou Chang San Fong) que também viveu na
dinastia Sung, teria, segundo as lendas, dado origem ao TAi
Chi Chuan, o mais famoso estilo interno de Kung Fu.

Segundo se conta, teria sido monge budista (embora outros


autores o citem como tendo sido monge taoísta) do mosteiro
"Shaolin-Chi" e era um grande especialista no método de luta
desse mosteiro -o estilo Shaolin.

Narra a lenda que esse monge estava meditando em um


templo da montanha de Wu-Tang-Shang e se questionava a
respeito das vantagens e desvantagens de se vencer uma luta
e qual o significado da vitória em um combate.

No momento em que meditava sobre esses assuntos ouviu um

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 49
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

barulho no pátio do templo e pôde observar pela janela uma


luta entre um grou e uma serpente.

Observando os movimentos circulares da serpente, que se


esgueirava pelo chão, escapando habilmente aos movimentos
furiosos do grou, percebeu as vantagens da esquiva e dos
movimentos que diluem a força de ataque do adversário e
teria, segundo a lenda, estabelecido as bases para a criação
do T'Ai Chi Chuan.

Outras lendas dessa mesma época dizem que Chang San


Feng teria criado o T'Ai Chi Chuan a partir de um sonho em
que o teria aprendido de certos personagens misteriosos
denominados "Homens do Dragão de Fogo".

Observando-se o uso da energia interna na prática do T'Ai Chi


Chuan e a movimentação tipicamente flexível que o diferencia
dos estilos originários em Shaolin, temos razões para crer que
Chang San Feng era um monge taoísta e não um monge
budista.

Considera-se Chang San Feng como pai do Nei Kung e a


montanha Wu-Tang-Shan é citada como o local de origem dos
estilos "Wu Tang Pai" e "Pa Kua Chuan".

Essas informações fazem parte da obra de Yuan-Ch'U-T'Sai, o "Wu Tang Pa Kua


Chuan", o "Mo-Kik" e o "Lo-Hon-Kuen".

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 50
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

O Templo Shaolin
Ainda nos tempos de hoje existe um templo budista na
montanha de Soong Shan, na província de Honan, que foi
fundado no início da era cristã e cujos feitos relativos ao
desenvolvimento e a preservação do Kung Fu o tornaram
lendário.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 51
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Logo após as escadarias de sua entrada principal ainda existe


uma placa onde se pode ler em chinês arcaico os seguintes
ideogramas: "Shao-Lin-Chi", que podem ler traduzidos por:
"Templo da Jovem Floresta" ou "Monastério do Pequeno
Bosque".

A tradição oral que tem prevalecido na cultura do povo chinês


afirma que as artes marciais duras (escolas externas) "Wai
Chia" se originaram nesse templo.

As artes marciais que ali foram praticadas acabaram por


receber o nome de "Shaolin Chuan" (arte dos punhos da jovem
floresta) tornando-se a base sobre a qual seriam estabelecidos
os mais de trezentos e sessenta estilos de Kung Fu que ainda
existem em nossos dias.

A origem do templo fundamenta-se em causas exclusivamente


religiosas.

O templo Shaolin era um monastério onde o povo chinês se

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 52
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

refugiava em busca da paz e da tranquilidade necessárias à


realização de sua busca espiritual.

O cidadão comum desse período da história da China tinha


sua vida nas mãos do imperador, que era um déspota com
direito absoluto sobre seus súditos.

Mas, devido às crendices da época, quando uma pessoa


dedicava sua vida à busca espiritual deixava de ser um
cidadão do mundo e o imperador perdia os direitos sobre ele.

Durante a dinastia Wei (398 a 534 d.C.) houve uma grande


conversão do povo chinês ao Budismo recém-chegado da
Índia, e o imperador do norte, Shao Wen, mandou construir o
primeiro templo Shaolin por volta de 450 d.C.

Para a construção do templo foi escolhida uma localização


privilegiada na face norte da montanha Soong Shan.

Ao redor da construção do templo os monges plantaram um


pequeno bosque com árvores frutíferas e outras plantas
escolhidas e, com o passar dos anos, acabaram por atribuir-lhe
o nome de Shaolin.

À medida que a ordem monástica dos Shaolin se desenvolveu,


foram criados outros templos.

Depois do templo erigido em Honan, o mais famoso templo


Shaolin foi constituído na província de Fukien por um monge
muito famoso chamado Ta-Shin-Sheng.

Diz-se que embora tenha sido em Honan que se criou o estilo


Shaolin de Kung Fu, foi em Fukien que este se desenvolveu
até atingir os elevadíssimos padrões técnicos que lhe deram
tanta fama.

Existiram cinco templos pertencentes à ordem monástica dos

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Shaolin, mas devido às dificuldades dialéticas do idioma


chinês, existe alguma divergência sobre suas localizações.

Segundo Wang Lai Sheng, praticante de Kung Fu citado na


obra "Asian Fighting Arts", os templos se situavam em Honan,
Fu Kien, Wu Tang, 0-Weí-Shan e Kwantung.

Segundo outros autores os templos se situavam em Honan,


Fukien, Ngor Mee, Wu Tang e Kwang-Tung.

A maior problemática dessas divisões é que aos monastérios


de Wu Tang e de O-Wei-Shan os taoístas também atribuem as
origens de seus estilos internos.

Ambas as alternativas são citadas aqui mais por uma questão


de aprimoramento cultural do leitor, pois esses fatos não
possuem maior relevância e não impedem um estudo
aprimorado do Kung Fu.

Como já disse anteriormente, as técnicas marciais e o Kung Fu


já estavam presentes na cultura chinesa centenas de anos
antes do estabelecimento da comunidade budista de Shaolin.

As teorias de maior relevo têm atribuído ao templo de Honan o


grande mérito de ter preservado muitos dos conhecimentos
marciais originários da China Antiga.

Mas os mesmos historiadores que fazem essas afirmações


também são concordes em afirmar que no templo de Honan se
dava mais importância às práticas da filosofia e da meditação
Ch'An (transmitidas por Bodhidharma), enquanto que no
templo do sul (Fukien) os monges davam grande importância
às técnicas marciais e estavam constantemente envolvidos nas
lutas e nas rebeliões do povo chinês.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 54
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Por falta de registros históricos de reconhecida competência,


pouco se pode deduzir a respeito do grau de aperfeiçoamento
que o Kung Fu já possuía antes de ser introduzido em Shaolin.

Alguns historiadores com mentalidade mais nacionalista


recusam-se a admitir que o Kung Fu de Shaolin tenha sido
criado a partir dos ensinamentos de Bodhidharma, e afirmam
que o estilo Shaolin teria sido gerado durante a dinastia Sung
(420-479 d.C.) pelo imperador Chao-Kan-Ying.

Sabendo-se que Bodhidharma só chegaria ao templo por volta


do ano 525 d.C, tais historiadores têm a intenção de nos fazer
crer que o Kung Fu já fazia parte dos ensinamentos do templo
antes de sua chegada.

Mas tal raciocínio entra em choque com outros fatores que


parecem comprovar que o estilo Shaolin tenha sido realmente
introduzido por Bodhidharma.

Em comprovação à tese que atribuiu tal feito a Bodhidharma


existem as gravuras e ilustrações pintadas em diversas
paredes dos templos Shaolin e que podem ser vistas até hoje.

Nessas ilustrações se podem ver monges indianos (tez mais


escura) ensinando os monges chineses a lutar.

Outro argumento de grande peso é a grande superioridade


técnica do estilo Shaolin sobre os outros estilos existentes fora
do templo, que acabaram por ser dizimados pelos
sobreviventes de Shaolin a ponto de hoje em dia muito poucos
terem sobrevivido.

Bodhidharma é certamente a figura mais controvertida no


panorama das artes marciais do Oriente.

Sua influência na origem das artes marciais da China, da


Coréia e do Japão é insofismável.

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Conhecido por Bodhidharma, Bodai Daruma, Daruma Taishi Ta


Mo, Dart Mor ou Dat Mor, esse monge indiano foi o
responsável pela criação do Budismo Ch‟An, conhecido na
Coréia como Sun e no Japão com Zen.

Na Índia o povo possui uma divisão por castas que tem


prevalecido desde tempos imemoriais até os dias de hoje.

Sendo filho do Rei Sughanda, Bodhidharma pertencia à casta


dos Kshastryias - que era a casta guerreira.

Desejando proporcionar a seu filho a mais esmerada instrução


marcial que lhe fosse possível, o Rei Sughanda contratou o
mais famoso guerreiro da índia para instruí-lo pessoalmente na
arte do Vajramushti.

Esse guerreiro famoso por seus feitos militares e por sua


grande bravura chamava-se Prajnatara e se afeiçoou muito a
seu discípulo, tendo lhe transmitido técnicas marciais de
impressionante eficiência.

Prajnatara

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 56
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Com o decorrer dos treinamentos surgiram fortes laços de


amizade entre mestre e discípulo, e mesmo quando Prajnatara
se converteu ao Budismo, (nesse tempo transformado em
religião e possuindo um conceito filosófico antagônico ao
Hinduísmo tradicional), Bodhidharma não o abandonou e
continuou a praticar o Vajramushti sob sua tutela até sua
morte (por volta de 520 d.C.)

Devido à sua grande fama como guerreiro Prajnatara foi


iniciado nos mais altos mistérios budistas, e acabou por atingir
uma vivência espiritual que o fez receber do Abade Punyamitra
(vigésimo sexto patriarca do Budismo) a incumbência de
continuar a tarefa de divulgação do Budismo.

Punyamitra conhecido por Funyomitta no Japão

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 57
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Com a morte de Punyamitra, Prajnatara veio a se tornar o


vigésimo sétimo patriarca do Budismo.

Nessa época o Budismo estava perdendo seu prestígio na


Índia devido ao surgimento de inúmeras seitas novas que
estavam se afastando dos conceitos filosóficos originais dados
por Buda e se perdendo em questões dogmáticas de natureza
religiosa.

Prajnatara percebeu a necessidade de reconduzir a filosofia


budista à sua simplicidade original, e vendo a tenacidade e
percebendo em Bodhidharma a firmeza de caráter necessária
ao desempenho dessa tarefa, passou a ensinar-lhe o Budismo.

Com a morte de Prajnatara, Bodhidharma assumiu a condição


de vigésimo oitavo patriarca do Budismo e empenhou-se na
tarefa que recebera de seu mestre: - Reconduzir a filosofia
budista à sua simplicidade original.

Com esse objetivo Bodhidharma viajou pelos países onde a


filosofia budista possuía o maior número de adeptos, a saber:
Nepal, Tibete e China.

Nesse período o Budismo estava sendo muito difundido na


China, e suas obras básicas haviam sido traduzidas do
sânscrito e do pali para o idioma chinês.

A convite do Imperador Liang Wu Ti, que governava em um


dos reinados estabelecidos durante o período das seis
dinastias (no início do sexto século D.C.), Bodhidharma foi à
China com a intenção de dar prosseguimento à sua missão.

Porém Wu Ti era seguidor de uma linha inovadora do Budismo,


cujas características salvacionistas e ritualísticas eram
diametralmente opostas ao método de Budismo difundido por
Bodhidharma, que incentivava a busca interior e a meditação.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 58
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Além do que, Wu Ti não era um imperador benéfico para seu


próprio povo, tratando-o com mãos de ferro e com muito pouco
daquela bondade tão inerente aos ensinamentos budistas.

A respeito da convivência de Bodhidharma com esse


imperador pouco se registrou na história, mas houve um
diálogo entre ambos que ficou muito famoso; aconteceu mais
ou menos assim:

O imperador era muito presunçoso e julgava que pelo simples


fato de ter permitido a divulgação do Budismo sob o seu
reinado já se qualificava como um grande benfeitor.

Certa ocasião o imperador contou a Bodhidharma que


construíra grandes templos para o Budismo e que nomeara
inúmeros monges para cargos políticos de relevo, devendo
portanto ter grandes méritos diante de Buda.

Mas Bodhidharma lhe respondeu que não tinha nenhum mérito


por ter feito essas obras.

Surpreso, Wu Ti perguntou o que deveria fazer então para


conseguir méritos dignos do Budismo.

- Vossa alteza terá que dormir até o meio-dia. Respondeu-lhe


Bodhidharma.

Não tendo compreendido nada o imperador aproveitou a


primeira oportunidade para consultar os sábios da corte a
respeito do que Bodhidharma lhe dissera.

Depois de discutirem entre si, os sábios informaram a Wu Ti


que Bodhidharma estava se referindo aos malefícios que o
imperador causava ao povo chinês devido a seus atos
impensados e prepotentes.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 59
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Concluíram que Bodhidharma lhe recomendara dormir até ao


meio-dia para que, dessa forma, reduzisse pela metade os
vandalismos que costumava cometer diariamente.

Furioso com essa crítica o imperador ordenou que


Bodhidharma fosse trazido à sua presença, mas o monge já
havia previsto a cólera de Wu Ti e viajado para o reinado de
Wei.

Essa história vem comprovar a grande coragem de


Bodhidharma, que não se curvava nem mesmo diante de um
tirano que dispunha da vida de seus súditos com a mesma
facilidade com que mudava seu estado de humor.

Os artistas que o retrataram tentaram demonstrar essa


coragem que o caracterizava colocando uma certa fúria em
seu olhar.

Veja por exemplo o olhar desta estátua que o retrata:

A arte praticada por Bodhidharma na Índia era o Vajramushti, a


esse respeito leia Vajramushti - A Arte Marcial dos Monges

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 60
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Budistas - livro de minha autoria que reproduzo nas próximas


páginas:

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 61
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A seguir incluo algumas imagens de Bodhidharma ao analisa-


las é preciso ter em mente que por ser um guerreiro os artistas
o pintavam com expressões muito severas e por ser indiano às
vezes o retratavam muito moreno e sempre lhe davam olhos
imensos, muita barba e muito pelo, pois os chineses, possuem
a tez clara, olhos tipicamente orientais e poucos pelos.

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Escultura de Bodhidharma no Templo Shaolin

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Escultura em um osso.

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Uma das maiores estátuas retratando Bodhidharma.

Nas páginas seguintes, para sua


reflexão e meditação, transcrevo algumas
das frases atribuídas a Bodhidharma –
estão em inglês, mas você pode traduzi-
las com a ajuda do Google Tradutor.

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Como eu estava contando, após a conversa com o Imperador


Wu Ti, Bodhidharma viajou para o reinado de Wei.

No reinado de Wei, Bodhidharma foi acolhido pelos monges


Shaolin que o hospedaram por muitos anos.

Conta-se que nesse local Bodhidharma meditou diante de um


muro por nove anos seguidos.

Nesse templo, localizado na face norte da montanha de Soong


Chan, existe até hoje uma sala em que está escrito em chinês
arcaico: "Este é o local onde Tamo fitou a parede."

De qualquer forma, segundo alguns autores, se ele não tivesse


preservado o Budismo e o ensinado aos chineses, essa
filosofia jamais teria sobrevivido até o nosso tempo.

Bodhidharma não era um homem comum, haja vista que seu


nome ainda é citado com respeito pelos verdadeiros mestres
de Kung Fu e de Karatê do mundo inteiro.

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Dentro dessa dimensão, a luta perdia todo seu significado em


termos de agressividade e mérito pessoal, para transformar-se
em mais um caminho de autoconhecimento que justificava sua
aplicação técnica apenas em situações de defesa pessoal,
para autoproteção ou para amparo de pessoas mais fracas e
desprotegidas.

Lutar sim, mas não para vencer outro ser humano, ou para
provar sua capacidade técnica sobre a capacidade de outrem.

Lutar apenas como uma forma de expressar e preservar a


justiça e a harmonia que dão vida às criaturas e asseguram o
equilíbrio universal.

Milhares de outros lutadores tiveram grandes atuações no


mundo das Artes Marciais, mas ninguém teve seu nome
preservado tanto tempo quanto Bodhidharma.

Dado a sua lucidez e pertinácia Bodhidharma entregou-se de


corpo e alma ao estudo dos ensinamentos budistas que lhe
eram transmitidos por Prajnatara.

Tendo se dedicado muito à prática da meditação, começou a


perceber que o domínio da vivência espiritual era muito mais
importante que o domínio do corpo físico e que, embora as
técnicas marciais lhe agradassem muito, seu conhecimento
não tinha o mesmo valor que o conhecimento e a prática das
verdades espirituais.

Bodhidharma compreendia que as técnicas marciais que


praticava dependiam muito de sua habilidade física e que,
quando atingisse idade mais avançada, veria sua capacidade
técnica diminuir progressivamente.

Qual a finalidade de praticar-se alguma coisa exaustivamente,


se com o passar do tempo vai se diluindo nossa capacidade de
executá-la com perfeição?

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À medida que Bodhidharma evoluía em suas práticas de


meditação, ia superando cada vez mais as manifestações
egoísticas da personalidade, destruindo o próprio ego e
emergindo para uma consciência superior.

Quando sua consciência atingiu um plano mais elevado,


começou a perder o sentimento de individualidade e passou a
identificar-se cada vez mais com a unidade de todos os seres.

A tal ponto evoluiu Bodhidharma através das práticas de


meditação budista, que não mais via a si mesmo existindo
separadamente da existência de todas as demais pessoas.

Passou a compreender que qualquer ação deve ser feita


visando o bem comum e não apenas a individualidade (que por
si mesma é egocêntrica e volta-se apenas para a realização de
aspirações pessoais egoísticas).

Concluiu então que o homem deve executar seu trabalho, dar


sua contribuição e prestar sua ajuda, com vistas a toda a
humanidade e ao bem comum, que favoreça não só ao gênero
humano como também a todas as criaturas vivas (por isso que
os budistas são vegetarianos).

Existe uma lenda na China que conta que quando


Bodhidharma começou sua meditação, caiu em profundo sono
devido ao cansaço da viagem, e que quando acordou ficou tão
aborrecido com isso que, pedindo uma faca, cortou fora as
pálpebras.

Dessa forma nunca mais seria surpreendido pelo sono


enquanto meditasse.

Outra lenda conta que as pálpebras de Bodhidharma foram


enterradas à esquerda e à direita da porta principal do templo,

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aos pés das estátuas guardiãs ferozes que eram comuns


nessa época.

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Com o passar do tempo, no local onde foram enterradas


surgiram plantas cujas folhas possuíam aroma agradável e que
passaram a ser usadas nas infusões do templo e para a
recuperação de inúmeras indisposições.

Essa planta veio a se tomar muito conhecida na China e


recebeu o nome de chá.

Após um longo período de meditação que o conduziu a


estados de consciência cada vez mais sutis, Bodhidharma
chegou à conclusão que de todas as práticas budistas a mais
importante para a preservação dos ensinamentos de Buda era
a meditação.

Embora compreendesse a importância ética e social das


chamadas "Quatro Nobres Verdades" e da "Senda Óctupla do
Reto Caminho" que constituíam o sustentáculo dos dogmas do
Budismo, Bodhidharma percebeu que sem a prática
sistemática da meditação, os dogmas perdiam seu sentido
filosófico e a profunda dimensão que Buda lhes tinha atribuído.

Assim sendo, graças a Bodhidharma a prática do Budismo foi


totalmente modificada e muitos dos rituais foram suprimidos e
substituídos pela prática severa da meditação.

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A essa nova concepção Bodhidharma denominou Dhyanna,


que em sânscrito significa meditação.

Mas, para os chineses a pronúncia do sânscrito era muito


dificultosa e acabou sofrendo modificações fonéticas que
mudaram sua pronúncia para Ch'Anna e finalmente Ch'An.

O pensamento Ch'An influenciou profundamente todas as artes


orientais.

Monges budistas de inúmeros países iam ao templo Shaolin


para receber upadesa (aconselhamento pessoal) de
Bodhidharma e difundiram o pensamento Ch'An para as mais
remotas regiões do Oriente.

O Ch'An é até hoje ensinado no Japão com o nome de Zen e


na Coréia com o nome de Sun.

Praticamente todas as mais representativas manifestações do


folclore e da cultura japonesa fundamentam-se no pensamento
Ch'An (Zen).

Podemos citar a cerimônia do Chá, a arte Ikebana de arranjos


florais, a técnica Bonsai de cultivo de árvores anãs, a arte de
pintura com a pedra nankin denominada Sumi-E, o teatro
Kabuki, o No etc.

As Artes Marciais japonesas são literalmente inseparáveis do


Ch'An (Zen).

Graças aos esforços de Miyamoto Musashi (Shinmen Musashi


No Kami Fujiwara No Genshin) (1584-1645) o maior samurai
da história do Japão, que, fundamentado na prática sistemática
da meditação Ch‟An (Zen), criou o Bushido (Código de Honra
dos Samurais), as Artes Marciais japonesas pautaram seus
mais profundos ensinamentos no pensamento Ch'An.

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As Artes do Kendo, do Aikido, do Kempo, do Kyudo, do Judô e


outras, estão fundamentalmente ligadas ao Ch'An (Zen).

Miyamoto Musashi

Jigoro Kano, criador do Judô, mantinha um monge Zen na


Kodokan (Escola Kodo) para ensinar a seus discípulos o
verdadeiro valor da disciplina nas Artes Marciais.

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Quem examinar as obras de Gishin Funakoshi (o pai do


Karate) vai encontrar inúmeras referências ao Zen.

Quem examinar obras sobre o estilo Goju-Ryu de Karate verá


fotos do célebre mestre Gogen Yamaguchi praticando
meditações Zen sob cachoeiras.

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Quem for à ilha de Shikoku em Tadotsu, na prefeitura de


Kagawa assistir aos treinamentos do templo de Shorinji Kempo
verá que entre as práticas diárias incluem-se sessões de
meditação Zen.

Também na Coréia houve grande influência da escola Sun


(Ch'An) nas Artes Marciais.

Quem examinar as origens de inúmeros Kihons


(movimentos formais) do Taekwondo, do Hapkido e do
Hwarang-do, encontrará neles o nome de monges das seitas
Ch'An coreanas.

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Os ocidentais jamais poderão avaliar a severidade das práticas


impostas por Bodhidharma aos monges de Shaolin.

Para se ter uma vaga idéia, basta examinar os programas dos


templos Zen nos dias de hoje (muito mais suaves que naquele
tempo).

Segundo depoimento publicado na obra "The Empty Mirror",


que narra as experiências de um ocidental em um templo Zen
do Japão, os monges meditavam das quatro horas da
madrugada até as vinte e duas horas, interrompendo sua
meditação apenas para atenderem as suas necessidades
fisiológicas e cumprirem suas pequenas obrigações diárias.

Dada a severidade das meditações, os monges Shaolin não


resistiam e desmaiavam durante sua prática.

Considerando atentamente o estado débil e enfermiço dos


monges que limitavam suas práticas físicas aos asanas
(posições) utilizados na meditação e nos rituais, Bodhidharma
começou a ensinar-lhes o Vajramushti indiano para fortalecê-
los e capacitá-los a suportar com mais eficiência a meditação.

Tratando-se de exercícios com fins espirituais, exigia-se a


prática rigorosamente correta de cada movimento e aos
mínimos gestos atribuía-se uma importância fundamental.

Embora considerada uma Arte Marcial Budista por muitos


pesquisadores, o Vajramushti data de época muito anterior ao
surgimento do Budismo.

As referências históricas não são exatas, visto que o país de


origem do Vajramushti (a Índia), por sua própria filosofia social
de extrema religiosidade nunca deu muita importância aos
registros históricos.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 93
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

É interessante notar que o Vajramushti tem sua origem em


época pré-ariana, quando a Índia ainda era habitada pelos
drávidas.

Os historiadores situam a civilização dos drávidas como


bastante anterior à civilização dos arianos, que teriam invadido
a Índia por volta de 2000 a.C.

Embora menos conhecida que suas congêneres chinesas,


japonesas e coreanas, a Arte Marcial Vajramushti é
mencionada em quase todos os textos heróicos da civilização
dravidiana.

Aliada à técnica física característica de toda Arte Marcial, o


praticante de Vajramushti tem a seu dispor o mais rico cabedal
de conhecimentos filosóficos e espirituais que a Índia propiciou
ao mundo desde tempos imemoriais.

Nenhuma outra Arte Marcial, seja qual for sua origem, possui
um respaldo histórico mais antigo e abalizado.

O leitor deve basear-se em seu próprio critério para julgar os


pontos mais importantes entre as semelhanças e
dessemelhanças entre os diversos estilos de Kung Fu e o
Vajramushti como foi transmitido por Bodhidharma, segundo os
relatos históricos que o tempo conseguiu preservar.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 94
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A EVOLUÇÃO DO KUNG FU ESTILO SHAOLIN

Ao ensinar o Vajramushti aos monges Shaolin Bodhidharma


transmitiu-o mais como uma prática ascética que como uma
Arte Marcial.

O Vajramushti servia para vivenciar certos preceitos budistas


relativos à unidade da mente e do corpo.

Os monges que o aprenderam passaram a apreciá-lo também


por seus recursos defensivos que os protegiam nos longos e
solitários caminhos que percorriam para a divulgação da
doutrina budista.

Alguns historiadores mencionam que para Bodhidharma tanto


a meditação como o Vajramushti tinham igual valor diante dos
objetivos de conhecimento interior.

Tanto isso é verdade que com o tempo a prática do


Vajramushti como meio de desenvolvimento espiritual
substituiu grande parte da meditação sentada, nas atividades
desenvolvidas no templo, fazendo com que o templo Shaolin
se tornasse famoso não como um centro de meditação Ch'An,
mas como uma escola de Arte Marcial sem armas.

O Vajramushti ensinado no templo Shaolin era mantido como


segredo, transmitido apenas a uns poucos iniciados que
haviam recebido suas vestes monásticas e feito os votos mais
elevados.

A razão para esse procedimento é que o Vajramushti era


extraordinariamente eficiente, podendo se tornar perigoso nas
mãos de pessoas menos esclarecidas e que não possuíssem o
conhecimento de seu verdadeiro significado.

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Acredita-se inclusive que tenha permanecido oculto entre


alguns poucos iniciados, mesmo quando o templo abrigou
refugiados políticos por volta da época da dinastia Ming.

Em sânscrito o nome Vajramushti significa:

Vajra = Real, Bastão, Cetro, Vara, Direto, Reto, Correto.


Mushti = Golpe, Golpe de Punho, Soco, Raio, etc.

Atribui-se a criação do Vajramushti ao deus Shiva da Trindade


Hindu.

Essa Trindade é formada por três deuses, a saber: Brahma, o


Criador, Vishnu, o Conservador e Shiva, o Destruidor.

A função destruidora de Shiva não deve ser interpretada no


mau sentido e sim como um processo de transformação.

Shiva age transformando e destruindo o que é inútil para que


se manifeste o que é útil e construtivo.

Como já vimos anteriormente, embora a cultura dravidiana


tenha sido relegada ao esquecimento após a invasão dos
arianos, as técnicas do Vajramushti foram preservadas pela
casta dos guerreiros (Kshastryia).

Budha o aprendeu como parte de sua educação militar por


volta, do ano 500 a.C.

Segundo depoimento de So Doshin, pai do Shorinji Kempo


(Kung Fu Shaolin em japonês), ensinado na ilha de Shikoku no
Japão, mesmo depois de iluminado, Buda ensinava o
Vajramushti como prática ascética.

Dado a dificuldade de pronunciar a palavra Vajramushti os


chineses mudaram o nome dessa arte para Lo-Han e mais

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 96
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tarde ela passou a ser conhecida como Nalo-Jan, Arohan e l-


Jinsin.

Durante a dinastia Ming um monge chamado Kwok Yuen


peregrinou por toda a China pesquisando os estilos antigos de
Kung Fu, tendo introduzido no templo certos conhecimentos
marciais que mais tarde foram ampliados, somados a certos
rudimentos do Vajramushti e classificados em cinco diferentes
estilos: Tigre, Grou, Leopardo, Serpente e Dragão.

Os Manchus invadiram a China e dizimaram a dinastia Ming,


obrigando os oficiais do exército chinês a fugirem ou serem
mortos.

Muitos desses oficiais se ocultaram nos templos budistas, por


serem territórios apolíticos e independentes do Estado chinês.

Os templos Shaolin foram dos mais procurados devido as suas


localizações privilegiadas e devido as suas grandes
dimensões.

Durante esse período os estilos desenvolvidos por Kwok Yuen


passaram a ser ensinados ao povo com o nome de Kung Fu
Shaolin, com o propósito de possibilitar-lhes defenderem-se
dos emissários corruptos do governo invasor Manchu.

A grande eficiência desse estilo tomou-o muito famoso,


passando a ser utilizado nas demonstrações públicas do
templo e nas comemorações do ano novo chinês, juntamente
com a Dança do Leão.

Mas entre os monges mais adiantados permanecia oculto o


verdadeiro Vajramushti, que, como um recurso à meditação e
ao desenvolvimento espiritual passou a ser chamado em
chinês Ch'An Tao Chuan -"A Arte dos Punhos do Caminho da
Meditação".

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A grande dificuldade em se traçar as origens históricas do


Kung Fu está na pronúncia diferente dos nomes chineses,
devido aos dialetos e as modificações pelas quais passou o
idioma chinês arcaico até chegar a seus padrões modernos.

Devido a essas e outras dificuldades não conseguimos


determinar com exatidão a época em que teria vivido Kwok
Yuen mas, pelos referenciais históricos que possuímos,
podemos situá-lo entre a dinastia Yuan (1268-1368) e a
dinastia Ming (1368-1644). |

A respeito dele conta-se a seguinte história:

O jovem Yuen da Província de Yen-Chou, aprendeu os


exercícios de Ta Mo (Bodhidharma) no Mosteiro Shaolin com o
auxílio do monge Hung-Yun.

Depois de aprendê-los converteu-os em setenta e duas séries


de técnicas marciais.

Mas seu desejo de aprender as técnicas marciais do Kung Fu


antigo o levou a viajar por toda a China em uma época de
constantes guerras.

Certa ocasião o jovem Yuen enfrentou um ancião chamado


LiCh'Eng na cidade de Lanchow, de quem se tornou grande
amigo.

Li-Ch'Eng havia sido um grande lutador em seus anos de


juventude e se tomara famoso por ter sido mestre do guerreiro
Pai-Yu-Feng.

Baseado nessa experiência aumentou suas setenta e duas


séries originais em 172 Tchia-Dsu, divididos em cinco grupos
diferentes.

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Cada um desses grupos passou a se identificar com um


animal, a saber: a Serpente, o Tigre, o Dragão, o Leopardo e o
Grou.

Cada grupo de Tchia-Dsu com o nome de um determinado


animal possuía suas características próprias.

Os Tchia-Dsu do Dragão cultivavam o espírito e a capacidade


de estar alerta; executavam-se sem a aplicação de força,
enfatizando-se a respiração e a concentração na parte baixa
do abdômen, em movimentos longos, fluentes e contínuos.

Os movimentos do Tigre serviam para fortalecer o corpo


(ossos, músculos e tendões); seus movimentos eram curtos e
bruscos, dando-se ênfase à força e à tensão dinâmica.

As técnicas do Leopardo desenvolviam a força, com


movimentos rápidos, inteligentes e imprevisíveis.

O estilo da Serpente desenvolvia o Chi (energia interna), era


usado a partir do controle espiritual e cultivava a resistência,
através da respiração lenta, profunda e harmoniosa, dando
prioridade aos golpes desferidos com a ponta dos dedos.

Os movimentos do Grou visavam o desenvolvimento do


autocontrole e do caráter.

Com esses novos conhecimentos Yuen e seu amigo Pai-Yu-


Feng retomaram ao templo Shaolin.

Pai-Yu-Feng já tinha 70 anos e resolveu aderir à vida


monástica, adotando o nome Ch'ln-Yueh (Lua do Outono),
querendo demonstrar que conseguira realizar um antigo sonho
já no outono da vida.

A Kwok Yuen (Chueh Yuan), se atribuem as seguintes


palavras:

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 99
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

"Sem o Chi não existe força. Um lutador que grite e lance sua
mão com ferocidade, não tem verdadeira força em seu golpe.
Um verdadeiro lutador não é espetacular, mas seu punho é
pesado como uma montanha. Isso acontece porque ele possui
Chi. Depois de muita prática o Chi pode ser focalizado sobre
qualquer ponto de ataque que se deseje. A vontade domina o
Chi que pode ser localizado em qualquer ponto
instantaneamente."

Quando os oficiais Ming se ocultaram nos templos Shaolin,


despertaram a ira dos governantes manchus, que se
empenharam arduamente em tentativas para destruir os
templos.

Na época da dinastia Ching foram feitos diversos ataques ao


templo principal, mas sem sucesso, pois suas paredes eram
inexpugnáveis, tendo mesmo diversos metros de espessura
em alguns pontos.

O templo sofreu longos cercos, semelhantes ao que vitimou o


templo de Jerusalém, mas sobreviveu facilmente devido a
auto-suficiência dos monges, que plantavam seus próprios
alimentos e podiam resistir interminavelmente.

Mas, da mesma forma que a Inconfidência Mineira, o templo


Shaolin também teve seu traidor.

Despeitado por não ter acesso aos exercícios originais de


Bodhidharma e motivado por vultosa quantia e pela oferta de
um cargo político de relevo, um monge de categoria inferior
chamado Ma Ning Yee tramou sua traição com o apoio de três
oficiais do governo Manchu, a saber: Chan Man Yu, Cheung
Ching Chow e Wong Chun May.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 100
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Ma Ning Yee envenenou a água do templo e o incendiou no


vigésimo quinto dia do sétimo mês do décimo segundo ano do
reinado de Yung Cheng (1733 d.C).

Enquanto o fogo aumentava Ma Ning Yee abriu as portas para


os soldados manchus que rapidamente dizimaram todos os
sobreviventes que encontraram e destruíram o que ainda
restava.

Conseguiram fugir apenas cinco dos mestres e quinze


discípulos.

Dentre os quinze discípulos apenas seis tiveram seus nomes


guardados pela história, quer por sua fama como possuidores
de grandes habilidades nas Artes Marciais, quer por seus feitos
heróicos nas infrutíferas tentativas de derrubar os invasores
manchus.

Foram eles:

Hung Hee Kung e Luk Ah Choy, que criaram o estilo Hung


Kuen, mais tarde conhecido como Hung Gar.

Fong Sai Yuk, que criou um estilo baseado no movimento dos


cinco animais de Shaolin.

Tse Ah Fook, Fong Weng Chun e Tsung Chin Kun, que foram
grandes lutadores e cujos feitos heróicos são até hoje narrados
em histórias do folclore chinês.

Quanto aos cinco mestres que escaparam, seus nomes eram:


Cheen Sin, Fung To Tak, Mui Hin, Ng'Mui e Pak Mey.

Os exercícios que Bodhidharma ensinou no templo Shaolin


passaram a ser conhecidos como "As Dezoito Mãos de Lo-
Han", (Shih-PaLo-Han-Sho) e foram descritos em uma obra

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 101
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

chamada "O Livro da Transformação Muscular" (I Chin Ching)


em dois volumes, dos quais apenas um sobreviveu.

Baseado no "Shih-Pa-Lo-Han-Sho" o imperador Tai-Tzu da


dinastia Sung criou trinta e duas formas de punho longo e seis
formas de deslocamento.

Infelizmente muitos dados sobre a filosofia budista e as Artes


Marciais chinesas se perderam devido à ausência de
referencial histórico.

Foi o escritor Tao-Yuan quem mencionou o nome de


Bodhidharma pela primeira vez, e isso ocorreu no ano 1004, ou
seja, quase quinhentos anos após sua morte.

As primeiras referências históricas à capacidade marcial dos


monges do templo Shaolin citam o primeiro imperador da
dinastia T'Ang, que venceu a Wang Chin Chung graças à ajuda
de três monges lutadores chamados Chih Tsao, Hui Nang e
Tsan Tsun.

Graças às proezas desses monges o templo Shaolin tornou-se


famoso como um centro de cultura marcial.

Outra referência menciona que o general Yueh Fei criou as


técnicas do Chin-Na (Cento e Oito Técnicas de Apresamento e
Torção) a partir dos ensinamentos que teve do monge Jao
Tung do templo Shaolin.

Tem sido despertada a curiosidade de inúmeros leitores, que


tem nos escrito para saber como eram feitas as iniciações dos
pretendentes a se tornarem discípulos dos templos Shaolin.

A esse respeito têm sido relatadas inúmeras lendas que,


infelizmente, não podem ser comprovadas historicamente.

Mas vamos contar algumas delas apenas para cultura geral de

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 102
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

nossos leitores.

Segundo relatos antigos, os novos discípulos eram admitidos


no templo no início da primavera, que coincidia com o tempo
das grandes chuvas.

Nesses dias os pais que desejavam que seus filhos se


tornassem monges, os levavam ao pátio frontal às escadarias
do templo e lá os deixavam sozinhos aguardando que os
monges os convidassem a entrar.

Essas crianças tinham em média de 7 a 12 anos de idade.

Considerando-se a dispersividade que caracteriza as crianças


dessa idade, imagine como eram rigorosos os testes que
descreverei a seguir.

Os monges não abriam logo as portas do templo (às vezes


demoravam alguns dias) e as crianças eram obrigadas a
suportar ao relento o sol e as chuvas torrenciais que
costumavam cair nesse período.

Muitas das crianças abandonavam a espera e voltavam para


suas casas.

Outras crianças eram conduzidas de volta por seus próprios


pais que não suportavam vê-las sofrer.

Embora não abrissem as portas os monges observavam o


comportamento das crianças e iam selecionando aquelas que
consideravam suficientemente disciplinadas para suportar as
árduas exigências do templo.

Quando as portas se abriam os monges mandavam de volta


para casa as crianças que consideravam que não suportariam
seus ensinamentos.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 103
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

As demais crianças eram admitidas no primeiro pátio interno e


conduzidas a uma grande mesa onde já estava sentado um
velho monge (geralmente o patriarca do templo).

Quando se sentavam à mesa eram observados seus


comportamentos.

Se pediam comida (podiam estar há três dias sem comer)


eram servidas e depois mandadas para suas casas, pois era
considerado indecoroso pedir comida ao invés de aguardar o
momento de serem servidas.

Se corressem para a mesa avidamente ou apressadamente


demais, também eram dispensadas.

Às que passavam por esse teste era dado uma tigela sem
fundo, uma grande bolacha seca achatada (do tamanho do
fundo da tigela) e era servido o chá.

O procedimento correto era forrar o fundo da tigela com a


bolacha para que pudesse ser servido o chá sobre ela.

As crianças que não o faziam eram dispensadas


sumariamente, pois não eram consideradas suficientemente
inteligentes para aprender os ensinamentos do templo.

Se a criança agisse corretamente colocando a bolacha no


fundo da tigela, mas começasse a tomar o chá antes do monge
idoso que estava sentado à mesa, era mandada de volta para
casa, pois o respeito aos idosos era de grande importância na
cultura chinesa.

Supondo que o garoto conseguisse superar esses testes,


ainda enfrentaria outros.

Logo em seguida a essa fase lhe era entregue uma vassoura e


lhe ordenavam que varresse um determinado pátio.

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Mal ele tivesse terminado de varrer surgia algum monge com


os pés enlameados e sujava todo o lugar que havia sido
varrido.

Assim que o monge porcalhão desaparecesse por uma porta


qualquer surgia o monge que lhe havia ordenado que varresse
o lugar e o interpelava mais ou menos assim:

-Eu não mandei que você varresse esta sala? Olhe só que
imundície! Você é um vagabundo que não obedece às ordens
que recebeu!

Se o garoto resmungasse que já tinha varrido ou que depois


que tinha varrido tinha vindo um cara e sujado tudo outra vez,
era mandado embora, pois não tinha suficiente dedicação ao
trabalho para permanecer no templo.

O garoto deveria abaixar a cabeça e continuar a varrer sem


proferir nenhuma palavra.

Este teste da varredura era repetido diversas vezes como


prova da humildade, da paciência e da perseverança do
postulante.

Havia uma variante desse teste em que o monge que mandara


o postulante varrer retornava e afastava um painel que dava
para outra sala tão grande quanto a primeira.

Em seguida interpelava o garoto perguntando por que não


varrera a outra sala também.

e o menino respondesse que não lhe tinham ordenado que


varresse a outra sala era sumariamente dispensado.

Seu procedimento deveria ser de extrema humildade, deveria


abaixar a cabeça e continuar a varrer sem retrucar.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 105
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Pessoalmente não creio que nenhum garoto ocidental


superasse satisfatoriamente esta prova, a menos que tivesse
sido previamente instruído sobre como deveria se comportar.

Depois que superava os testes iniciais o postulante era


submetido a todo tipo de provação, e executava todas as
tarefas menos agradáveis do templo por longo período.

Buscar água era uma tarefa penosa, pois os baldes eram


propositadamente imensos e mesmo quando vazios bastante
pesados.

Havia também as tarefas da cozinha que eram muito


desagradáveis, quando não monótonas e exaustivas.

As tarefas de limpeza incluíam lavar as latrinas, retirar a poeira


dos imensos arabescos e baixos-relevos que existiam por
quase todas as paredes do templo, cuidar das folhas e das
ervas daninhas dos vários jardins, lavar escadarias e
corredores imensos, etc.

Durante esse período inteiro o postulante passava por


periódicas humilhações por parte dos estudantes mais
avançados, todas elas com a intenção de testar-lhe a fibra
moral e a paciência.

E todas essas tarefas e testes que eram impostos aos garotos


não os livravam de cumprirem outras obrigações relacionadas
com as práticas budistas e com o estudo das doutrinas
ensinadas no templo.

Dormia-se poucas horas cada noite e trabalhava-se


arduamente.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 106
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Quando começava a espelhar certa frustração ou cansaço, um


monge se aproximava dele e lhe indagava há quanto tempo
estava no templo.

Geralmente os garotos respondiam que estavam lá há muito


tempo, em parte porque não lhes era dado acesso a nenhum
calendário que lhes permitisse saber há quanto tempo lá
estavam; em parte porque estavam desejosos de iniciar a
prática do Kung Fu que só era permitida a alunos
mais avançados.

Mas se a resposta fosse essa, o aluno era deixado entregue a


seus afazeres por mais alguns meses.

A resposta certa seria: -Há bem pouco tempo estou aqui.


(Mesmo que já fizesse alguns anos que lá estivesse.)

Esta resposta era considerada correta porque diante dos


dogmas do Budismo a manifestação material no mundo que
nos cerca é ilusória (Maya = Ilusão) e também é ilusório o
conceito de tempo e de espaço.

Não era obrigatória a prática do Kung Fu, mas se o jovem


passasse em todos os testes que descrevemos até agora e
manifestasse desejo de aprender o Kung Fu Shaolin, seu
desejo seria escarnecido e ignorado por muitos meses.

Depois desse abandono inicial passavam-se alguns meses e


ele era convidado a participar das aulas de Kung Fu.

Nas primeiras aulas era mais ou menos usado como um saco


de pancadas e as surras eram duríssimas.

Se demonstrasse ter fibra, superando essa fase inicial que


tinha sua duração determinada pelo comportamento do
postulante então seria recebido como um discípulo de Shaolin,

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 107
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

mudando a cor das vestes e o comportamento que recebia dos


demais.

Muitas de suas tarefas diárias eram transferidas aos


postulantes menores e passava a receber incumbências de
maior responsabilidade.

Seus estudos dentro das doutrinas do templo eram mais


profundos, e maior o número de matérias estudadas.

As práticas ritualísticas e o período de meditação eram


ampliados.

Já não tinha que se alimentar na cozinha junto com os


postulantes menos graduados, passava a frequentar as mesas
dos refeitórios.

Era transferido para os dormitórios superiores.

Até que recebesse as vestes amarelas e prestasse os votos


monacais o postulante não cessava de ser submetido a testes
periódicos que, embora menos humilhantes, não deixavam de
ser bastante exigentes.

Além dos testes de habilidade física e marcial havia os testes


de habilidade artística -geralmente caligrafia e composição
poética.

Havia também os testes de doutrina budista e de medicina


oriental (os monges eram excelentes acupuntores e
massagistas).

Quando evoluía em seus estudos aprendia vários idiomas (ou


dialetos chineses) e ajudava na tradução de textos budistas de
origem pali ou sânscrita.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 108
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

O trabalho na lavoura também era obrigatório e todo monge


tinha que fazer seu estágio na cozinha aprendendo auto-
suficiência na arte culinária.

Cada um desses assuntos exigia um teste de avaliação.

Segundo a tradição chinesa o homem Kung Fu teria que se


distinguir em pelo menos cinco áreas do conhecimento
humano.

Ele deveria saber se exprimir no idioma chinês tanto oralmente


como por escrito de maneira impecável.

Ele deveria possuir uma caligrafia de rara beleza que


chamasse a atenção de quantos a vissem.

Ele deveria ser capaz de se exprimir em versos, de conhecer


poesia e os textos clássicos com alguma profundidade.

Ele deveria se exprimir em alguma forma de arte com grande


habilidade -geralmente desenho ou pintura.

Ele deveria conhecer os rudimentos da lavoura e da arte


culinária e ser capaz de transmitir tais conhecimentos às
pessoas do povo que necessitassem deles.

Ele deveria ser hábil no uso das agulhas da Acupuntura, e na


falta delas ter conhecimentos suficientes da Medicina oriental
para poder tratar um paciente aplicando dedos habilidosos
sobre os pontos dos meridianos de energia utilizados na
Acupuntura.

Ele deveria ter uma consciência política e econômica para


poder desempenhar o papel de educador diante do povo,
segundo os melhores procedimentos da tradição de Confúcio.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 109
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Ele deveria possuir sólidos conhecimentos das doutrinas


religiosas, mormente o Budismo e o Taoísmo, para poder
doutrinar e esclarecer dúvidas a respeito de tais assuntos.

Ele deveria ser capaz de defender a si mesmo e aos


desamparados que recorressem ao seu auxílio.

Ele deveria ter noções de sobrevivência em condições


inóspitas, na selva e em terrenos desconhecidos, devendo ser
capaz de localizar ervas medicamentosas, preparar infusões
curativas, colocar no lugar ossos quebrados, preparar
beberagens e poções.

Dentre os atributos que acabo de citar, o homem Kung Fu tinha


que se destacar em pelo menos cinco deles.

A falta de pelo menos cinco dessas qualidades o


desqualificaria como praticante de Kung Fu, mesmo que se
tratasse de um habilidoso lutador.

Há que compreender que para a tradição chinesa, devido às


influências de Confúcio, a cultura geral de um homem era
muito mais respeitada que sua capacidade de lutar.

Recentemente foi mencionado na obra "Chinese Boxing


Masters and Methods", de autoria de Robert Smith, o professor
Cheng Man-Ch'lng, famoso praticante de Tai Chi que tinha a
alcunha de Mestre das Cinco Excelências.

Com isso o povo chinês lhe prestava homenagens tratando-o


como um mestre cujos conhecimentos comparavam-se com os
grandes mestres da antiguidade.

Ingressar no templo Shaolin exigia uma atitude muito séria e


uma forte intenção de vontade que predispusesse o postulante
a todo tipo de provação.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 110
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

As pessoas não entravam no templo meramente na intenção


de aprender o Kung Fu.

O templo Shaolin era, antes de tudo, uma escola de filosofia e


religião e as pessoas que nele ingressavam o faziam com o
objetivo de alcançar a realização espiritual.

Se alguma pessoa lá entrasse apenas com objetivos marciais


acabaria por se lamentar amargamente, pois não poderia mais
sair a menos que atingisse um nível de proficiência espiritual
ou marcial extraordinários.

Aos monges que se dedicavam exclusivamente aos estudos


doutrinários e às práticas espirituais era facultada a saída do
templo desde que em missões administrativas ou de caridade.

Mas aos monges que haviam escolhido o caminho da Arte


Marcial somente era permitida sua saída caso se distinguissem
de maneira incomum na arte de lutar.

Se fosse capaz de vencer os instrutores dos cinco estilos


principais do templo poderia requerer a prova do corredor da
morte.

O corredor da morte era assim chamado porque nele havia


cento e oito bonecos de madeira que eram acionados pelo
peso de quem se atrevesse a penetrá-lo.

Tais bonecos eram confeccionados por artesãos habilidosos


de maneira que, se o praticante escapasse dos golpes
desferidos pelo primeiro, certamente teria que enfrentar o
segundo e assim por diante.

Cada golpe de defesa ou ataque desferido contra um dos


bonecos gerava reações de ataques dos outros.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 111
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Se o monge que os enfrentasse conseguisse sobreviver ao


corredor, deveria levantar urna urna arredondada
incandescente para poder sair.

Essa urna pesava aproximadamente 225 quilos e era colocada


em um pedestal especialmente confeccionado, de maneira que
Ao ser erguida automaticamente abria a imensa porta situada
ao fim do corredor.

Essa porta não podia ser aberta a não ser dessa maneira.

Nas laterais da urna havia em alto-relevo as figuras dos cinco


animais que simbolizavam os cinco principais estilos do
templo.

A cada monge era permitida a prática de, no máximo, dois


desses estilos, dessa forma o desconhecimento dos outros três
estilos (sem falar no Vajramushti), garantiriam a sobrevivência
do templo caso o monge se transformasse num renegado que
traísse seus conhecimentos.

Era mantido fogo acesso no interior da Urna durante todos os


dias do ano e sua superfície externa atingia uma temperatura
tão elevada que onde fosse tocada a carne grudava e ficava
impressa a figura do animal que estivesse gravado naquele
ponto.

Quem quer que tivesse superado os 108 bonecos do corredor


da morte teria que levantar a urna para poder sair, e como a
roupa dos monges era de seda (altamente combustível), o
monge se via obrigado a retirar a parte de cima de suas vestes
e, de torso nu, erguer a pesadíssima urna com os antebraços e
mudá-la de pedestal.

A porta permanecia aberta por uns poucos momentos, e se o


monge desmaiasse no processo ou não se atirasse para fora
com certa rapidez, arriscava-se a perder todos seus esforços.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 112
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Por uma questão de respeito às artes que praticara, o monge


procuraria tocar na urna em pontos que contivessem a figura
dos animais que representavam os estilos que havia praticado,
de maneira a ostentar em seus braços por toda a vida o
desenho deles.

Evidentemente não basta a mera força física para se conseguir


erguer um objeto de tão grande peso, e nem eram suficientes
apenas técnicas marciais aprendidas no templo para se vencer
os 108 bonecos do corredor da morte.

Eram necessárias práticas mentais apuradas para que se


desenvolvessem certos poderes (hoje chamados paranormais),
que permitiriam a realização de tais feitos extraordinários.

Certamente você já ouviu falar a respeito de pessoas,


aparentemente frágeis, que carregam pessoas com o dobro de
seu peso e até pianos imensos por ocasião de grandes
incêndios.

Depois que cessa o fogo essas pessoas percebem que em


condições normais não seriam capazes de realizar tais
esforços.

Experiências têm comprovado que pessoas em condição de


hipnose profunda são capazes de levantar imensos pesos e de
se submeterem a imensas dores sem senti-las.

Os monges Shaolin eram treinados em métodos avançados de


Yoganidra transmitidos por Bodhidharma, que lhes permitiam
realizar essas proezas todas e outras ainda mais
impressionantes.

O Yoganidra é uma técnica transmitida através do Yoga e do


Vajramushti, que permite ao praticante atingir diretamente seu

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 113
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

subconsciente de lá tirando forças para realizar tarefas que,


sob condições comuns, seriam consideradas impossíveis.

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

As Sociedades Secretas
Depois da destruição do templo Shaolin os sobreviventes se
espalharam por toda a China e passaram a incentivar o povo a
criar frentes revolucionárias com o objetivo de expulsar os
Manchus do poder.

Tal meta nunca foi atingida, mas os diversos grupos acabaram


por dar origem a Fraternidades Secretas, Sociedades e
Irmandades que cultivaram o Kung Fu ocultamente durante
muito tempo.

Essas Sociedades Secretas eram conhecidas como Hung


Mun, Hung Tong ou simplesmente Tríades.

Mais popularmente os membros delas eram conhecidos como


Tong.

Convém lembrar que o Kung Fu também era praticado fora do


templo Shaolin e que muitas das Fraternidades Tong eram
fundadas por lutadores de Kung Fu que apesar de não
descenderem da linhagem de Shaolin, também estavam
interessados em tirar os Manchus do poder.

Esses lutadores faziam longas viagens demonstrando suas


habilidades nas localidades onde passavam e arregimentando
adeptos para suas Fraternidades.

Muitos desses lutadores eram hábeis médicos, pois o


conhecimento de Acupuntura e Do-ln eram transmitidos pelos
mestres de Kung Fu.

Ocultos sob a personalidade de médicos, esses lutadores


tinham facilidade para arregimentar elementos para os Tong.

O poderio dos Tong estendeu-se por toda a dinastia Ching,


finalizando apenas com a constituição da República em 1912.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 115
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Por essa época os Tong não estavam mais interessados no


poderio Manchu e sim na invasão dos ocidentais -portugueses,
espanhóis, ingleses e franceses que, aos olhos deles, estavam
dividindo a China e pervertendo suas tradições.

Pelo fim do século XVIII o ópio chinês era muito cobiçado pelos
europeus, e o incentivo brutal que os ocidentais impuseram ao
povo chinês para aumentar a produção desse tóxico acabou
por aumentar o vício e o consumo entre os chineses.

Os Tong, por serem mais politizados que o resto da população,


se revoltaram com esse estado de coisas e iniciaram um
movimento de resistência e guerrilha que acabou resultando na
famosa revolta dos Boxers.

Entre as inúmeras pequenas revoluções geradas pelas


Fraternidades Tong podemos citar a tentativa de assassinato
do Imperador Kia-Ching perpetrada pela Fraternidade da
Razão Celeste, que era uma facção da Sociedade do Lótus
Branco.

Esse imperador era um déspota que se divertia assistindo as


torturas de seus prisioneiros.

Em 1813 a Seita dos Nenúfares Brancos começou um grande


movimento revolucionário contra os Manchus.

Por volta de 1840, como represália ao novo acordo que os


ingleses firmaram com o governo corrupto chinês, referente à
importação de ópio, os Tong destruíram todo o carregamento
dos ingleses.

Por seu turno os ingleses invadiram Nanking tendo


conquistado a cidade em 1842.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 116
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Essa revolta foi conduzida por Hung Siu Chuan (1812-1864),


que pertencia ao grupo étnico dos Hakka, de onde surgiu o
famoso estilo Tong Long.

Hung Siu Chuan converteu-se ao Cristianismo e deu origem à


"Seita dos Adoradores de Deus".

Daí o nome da revolta, pois Hung Siu Chuan tentou


estabelecer uma nova sociedade na China que denominou "O
Reino Celeste da Paz", em chinês "Tai Ping Tien Kuo".

Embora os Tong não se unissem a essa seita devido às


oposições religiosas, apoiavam-se devido as semelhanças de
intenções políticas.

Os Tong eram exímios lutadores treinados nas artes, do Kung


Fu e das armas chinesas, sendo hábeis praticantes das
técnicas da espada, da lança e dos machados gêmeos.

Eram facilmente distinguidos entre o povo, pois em revolta com


a ordem Manchu que obrigou o povo a cortar o rabicho
característico dos Ming, usavam seus cabelos compridos ou
cortados à maneira dos ocidentais.

Apesar de suas inúmeras vitórias, os Tai-Ping (Hung Siu


Chuan e seus seguidores) foram finalmente vencidos pelo
general Tseng Kuo Fan, que uniu suas forças ao exército
inglês estrategicamente dirigido pelo comandante Gordon, que
era apelidado de "Comandante Chinês", por ser um lambe-
botas do governo estabelecido.

Graças ao esforço conjunto desses dois exércitos Nanking foi


reconquistada e 100.000 homens da Seita dos Adoradores de
Deus foram exterminados a golpes de espada.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 117
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

As inúmeras revoltas geradas pelos Tong acabaram por


culminar num dos maiores levantes da história chinesa, a
Revolta dos Boxers.

Esse nome foi dado pelos ingleses, pois na impossibilidade de


verter satisfatoriamente o idioma chinês, chamavam os
praticantes de Kung Fu de Boxers, numa analogia ao esporte
de origem inglesa.

Portanto, para os ingleses o Kung Fu era o Boxe Chinês e o


praticante de Kung Fu era chamado de Boxer.

No final do século XIX a Imperatriz Tseu-Hi (chamada pelos


ingleses de Imperatriz Dowager), fez um acordo com os
estrangeiros e com o auxílio deles dizimou os membros do
Partido Reformista Liberal, conquistando seu lugar no poder e
em pagamento cedendo grandes áreas do território chinês.

Como a imperatriz era da raça Manchu, os Manchus


começaram a insuflar sentimentos patrióticos exacerbados
entre o povo chinês, numa tentativa de lançá-los contra os
estrangeiros, fazendo-os esquecer dos desmandos de sua
governante.

Para se ter uma ideia desses incentivos à revolta,


reproduzimos a seguir o texto de um dos cartazes que foram
afixados em Pequim na noite em que se iniciou a revolta.

"O Santo Imperador Chu Hung Tang avisa a todos os


discípulos de Buda: Morte aos Demônios do Oeste que
oprimem nosso país escarrando sobre nossos deuses e
roubando nossas riquezas. O grande momento já foi escolhido
pelo destino. O céu não permitirá que aqueles que violaram
tantas sepulturas para abrir caminho para suas máquinas de
ferro e que tomaram à força as terras dos filhos do céu,
escapem à condenação de seus crimes. Insolentes como são,
esses bárbaros não recuam diante de nada. É por essa razão

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 118
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

que nós, membros da Sociedade Harmoniosa do Punho


Fechado, membros da Arte Marcial Chinesa, da Justiça e da
Concórdia, o convidamos a massacrá-los sem piedade no cair
desta noite."

A sociedade Tong responsável pela revolução dos Boxers era


a Fraternidade do Punho da Concórdia (Yi Ho Kuen em
chinês), que era filiada à Seita dos Grandes Punhais e à Seita
dos Nenúfares Brancos.

Mas o processo todo teve origem muito antes, com Chu Hung
Tang, líder que reuniu lutadores de diferentes estilos e formou
um formidável exército.

Originário da cidade de Sze Chui na Província de Shantung,


Chu Hung Tang era estudioso de Medicina e Kung Fu, tendo
aberto sua casa a quem quer que desejasse praticar Kung Fu
e reunindo especialistas marciais que deram origem ao estilo
Yi Wu Kuen (Arte dos Punhos da Justiça e da Concórdia).

Em sua seita a ênfase era exclusivamente dedicada ao Kung


Fu, sem que se ensinasse conceitos filosóficos ou políticos,
mas posteriormente Chu Hung Tang adotou alguns princípios
políticos da Seita Pa Kua e da Seita do Lótus Branco.

Com a aceitação dessa conceituação nova os ânimos de seus


alunos se tornaram mais politizados e agressivos, culminando
com a formação da Sociedade da Justiça e da Concórdia, Yu
Wu Mun em chinês.

Essa Sociedade altamente nacionalista e avessa aos


estrangeiros, tinha dois princípios que a norteavam, a saber:

-Ajude o pobre e lute contra os estrangeiros.


-Se encontrar uma desigualdade em seu caminho empreste
sua mão como ajuda.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 119
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Esse ato de emprestar a mão nada tinha a ver com a atitude


cristã de dar a outra face, muitas vezes significava emprestar
um punho irado de um hábil praticante de Kung Fu.

Por sinal, parte de suas vítimas eram os chineses convertidos


ao Cristianismo, que era muito malvisto devido à sua origem
estrangeira.

A guarda imperial não os impedia de atacar as igrejas e aos


chineses cristãos, pois também tinha certo preconceito a
respeito dessa cultura estranha.

Chu Hung Tang tinha apenas 300 homens em sua seita, mas
um golpe hábil do destino aumentou suas fileiras em mais de
mil homens.

Fiéis a seus dois princípios, os homens da Sociedade da


Justiça e da Concórdia ajudaram o povo por ocasião de uma
inundação ocorrida em Sze Shui, o que lhes trouxe centenas
de novos adeptos.

Chu Hung Tang tinha um amigo de infância que se tomou


monge budista e era forte praticante de Kung Fu.

Esse monge, chamado Bun Ming organizou uma filial da


Sociedade na cidade de Cheung Chin.

Com o auxílio desse monge, Chun Hung Tang estabeleceu


uma estratégia de expansão que funcionava mais ou menos
assim:

Enviava 50 homens a uma nova região para fundar uma


espécie de Mosteiro e uma Escola de Kung Fu.

Na continuidade os frequentadores dessa comunidade eram


convidados a participar de uma Sociedade Secreta de

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 120
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

voluntários, que era organizada mais ou menos nos mesmos


padrões das organizações dos Tai Ping.

O objetivo dessas organizações era a derrubada da Imperatriz


Manchu Tseu Hi e a expulsão dos estrangeiros do território
chinês.

Os treinamentos nas escolas de Kung Fu da organização eram


duríssimos, os homens treinavam horas e horas todos os dias
e se especializavam no uso da lança e da espada.

O começo da revolta foi bastante prosaico.

No Condado de Ping Yuen o povo estava passando fome e


mais uma vez, fiéis a seus dois princípios, um grupo de
homens da Sociedade Secreta resolveu assaltar um armazém
dos bárbaros estrangeiros e repartir os alimentos entre o povo.

Mas o grupo era muito pequeno, e seis dos homens foram


presos e condenados à morte.

Os outros elementos do grupo procuraram Chu Hung Tang e


lhe pediram que os salvasse.

Chu Hung Tang uniu-se a Bun Ming e com 200 homens atacou
a guarnição estrangeira vencendo-a e repartindo a comida
entre os pobres.

O Governador do Condado foi avisado e mandou suas tropas


contra os revolucionários, mas elas foram derrotadas.

Os revolucionários haviam se preparado para a batalha através


de banhos especiais que as antigas tradições do Kung Fu
acreditavam produzir invulnerabilidade, e como nenhum dos
homens foi ferido ou morto nas duas escaramuças, passaram
a acreditar que suas fórmulas de invulnerabilidade haviam
funcionado.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 121
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Em agradecimento à vitória, foi realizada uma cerimônia


budista e para obter o favorecimento dos deuses em suas
futuras batalhas, adotaram mais cinco normas morais, a saber:

-Não contar vantagens nem ter presunção.


-Respeitar os pais e anciãos.
-Não cobiçar nem invejar.
-Não roubar.
-Não adulterar.

Nessa altura dos acontecimentos os adeptos da Sociedade


Secreta já eram 20.000 e estavam espalhados por toda a
China.

A tradição diz que mais da metade deles praticava o Kung Fu.

Em maio de 1898 foi realizado um conselho secreto dos


mestres de Kung Fu.

Estavam em assembléia:

Fao Kan Tzi, famoso mestre Shaolin que tinha mais de 2.000
discípulos e que pertencia à Tríade dos Tong.

Che I Chai, mestre de Hsing I que tinha vencido o famoso


mestre da Palma de Ferro.

Li Tsung, o mais famoso mestre de Pa Kua daquela época.

Chen Ting Hua, conhecido pelo apelido de "Cobra Invencível",


feroz lutador de Hsing I.

Mestre Hung, que tinha mais de 5.000 discípulos fanáticos no


estilo Pa Kua.

Feng yu Hsiang, mestre de Hung Gar e dirigente da Sociedade

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 122
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Secreta "União pela Grande Espada".

Tsu Hsin Wu, criador da escola do sul "Tsu Jen Men",


especializada na arte de guerrilha Sun Tzu e no estilo Shuai
Chiao.

Chan Ti San, discípulo do grande mestre Ho Yuen Chia, que


por estar doente não pôde comparecer.

É curioso notar que Bruce Lee interpretou no filme "Fists of


Fury" (Fúria do Dragão, no Brasil), o papel de aluno de Ho
Yuen Chia vingando a morte de seu mestre, que foi
envenenado pelos japoneses.

Essa reunião tinha por objetivo reunir a força desses mestres


para derrubar o poder Manchu representado pela imperatriz e
expulsar os estrangeiros.

Essa reunião dos mestres foi muito importante para o


desenvolvimento do Kung Fu, visto que a união em prol de um
objetivo comum - derrubar os Manchus e expulsar os
estrangeiros - criava união entre mestres e fazia cessar as
guerras entre diferentes estilos.

Como consequência dessa união de forças, nesse mesmo ano


principiou a revolta dos boxers, mas devido a traições internas
(mestres menores invejando e fofocando contra os que se
destacavam já havia naquela época) e outros fatores, esse
início da revolta foi muito conturbado e muita gente foi
capturada e executada.

Os estrangeiros já eram muito influentes politicamente, e se


valiam dessa influência para impor drásticas medidas de
repressão e de controle militar, que acabaram minando a
resistência inicial dos boxers e forçando a captura de milhares
de lutadores.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 123
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Só na cidade de Pequim foram executados 3.000 desses


lutadores.

Conta-se que os carrascos recebiam prêmios em dinheiro caso


vencessem o concurso diário de cortar as cabeças.

Os mais afoitos chegavam a cortar mais de sessenta cabeças


por dia.

Considerando que levasse dez minutos para retirar o


prisioneiro do calabouço, sessenta execuções representava
para o carrasco dez horas de trabalho diário, sem parar sequer
para as refeições.

E havia vários carrascos trabalhando ao mesmo tempo.

Mas a coisa não parou por aí. No ano seguinte (1899), os


boxers se reagruparam e estavam ainda mais motivados
devido às execuções de seus companheiros.

Nessa altura dos acontecimentos, a Sociedade da Justiça e da


Concórdia de Chu Hung Tang já contava com milhares de
adeptos, que eram sistematicamente doutrinados para odiar os
estrangeiros.

A matança inicial dos boxers só serviu para exacerbar ainda


mais os ânimos esquentados e a revolta acabou por escapar
do controle dos mestres.

Embora a maioria dos mestres envolvidos tivesse um


comportamento ético e pautassem suas ações dentro de um
determinado padrão moral, seus subordinados estavam
sedentos de sangue e não queriam mais saber de obedecer
ordens.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 124
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Levados pela avalanche provocada pela sede de vingança e


pelo ódio aos estrangeiros, a tentativa dos mestres em
controlar a turba, falhou.

Contra suas ordens e em oposição aos princípios morais do


Kung Fu, muitos inocentes pagaram pelos pecadores.

Os homens religiosos, mesmo os padres cristãos e os pastores


das missões protestantes da China, jamais haviam sido
molestados pelos praticantes de Kung Fu, pois eram
considerados homens de paz.

Da mesma forma, eram respeitadas as instituições


assistenciais e de caridade que acolhiam idosos e crianças
órfãs.

Mas os boxers desprezaram os conselhos de seus mestres e


criaram uma carnificina sem par na História da China,
destruindo igrejas, escolas e hospitais, matando religiosos,
médicos, mulheres, anciões, crianças e doentes que
estivessem nessas instituições.

Em 1900 -conhecido como o "Ano da Revolta dos Boxers" -os


revolucionários já ocupavam quase toda Pequim.

Embora a revolta de 1900 tenha sido extremamente curta


(durou de junho a agosto apenas), centenas de combates
foram travados e milhares de atrocidades perpetradas.

Mesmo sendo chamada de Revolta dos Boxers, a revolução já


não pertencia aos boxers, pois a população havia se unido e
com a proposição de apoiá-los cometia grandes morticínios,
numa revanche vingativa e cega pelos muitos anos de
opressão e penúria.

O grosso da revolta iniciou no dia 20 de junho de 1900,


forçando o governo a tomar drásticas medidas para sobreviver.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 125
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

No dia seguinte ao início da revolta, (21 de junho) o governo


declarou oficialmente guerra aos estrangeiros.

Com a tomada de Pequim as fraternidades e sociedades


secretas organizaram desfiles para demonstrar suas forças.

Entre outras participaram do desfile as Sociedades Tríades, a


Sociedade do Lótus Branco, os Turbantes Amarelos e a
Unidade da Grande Espada.

Por ocasião dos desfiles das Fraternidades que tomaram


Pequim, os ocidentais haviam se refugiado dentro das
muralhas da cidade velha.

Por trás dessas muralhas havia tropas ocidentais.

Os comandantes ingleses eram muito orgulhosos de seus


feitos militares nas colônias e estavam acostumados a conter
revoltas populares e mesmo rebeliões armadas na Índia.

Suas tropas eram especialistas em lidar com situações


denominadas "Carga de Cavalaria Ligeira".

Faziam parte dos batalhões ingleses sediados em Pequim


várias tropas indianas "Gherkas", compostas por temíveis
lutadores Singhs, especialistas na luta corpo-a-corpo e no
manejo do punhal ondulado (Kriss).

Havia também as tropas de combatentes argelianos, os


Zuavos, ferozes e calejados soldados com muita prática em
guerra de guerrilhas.

Os regimentos ingleses e franceses uniram-se e atacaram os


revoltosos, mas foram derrotados.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 126
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Mesmo seus fuzis e baionetas não eram páreo para as lanças


e espadas dos praticantes de Kung Fu.

Muitos mestres e lutadores famosos se davam ao luxo de


enfrentar os soldados estrangeiros fortemente armados,
usando apenas os seus punhos nus.

As perdas chinesas foram mínimas, ao passo que o exército


estrangeiro foi inteiramente dizimado, sobrando apenas uns
poucos homens.

Embora o povo chinês estivesse orgulhoso da vitória, os


mestres sabiam que o pior ainda estava por vir, e que
dificilmente teriam condições de enfrentar as armas pesadas
dos ocidentais.

No dia 11 de julho os regimentos alemães chefiados pelo


Conde Waldersse entrou em batalha com os boxers.

Esses regimentos alemães eram formados por soldados


prussianos, experientes em inúmeras batalhas, chamados
Bandeburgueses e tendo como emblema a Águia Alemã.

Era uma tropa de elite onde só eram admitidos homens com


mais de um metro e noventa de estatura, que passavam por
testes de admissão que exigiam suprema força e coragem.

Era a Águia contra o Dragão.

Os ocidentais eram homens fortes, enormes, superequipados,


obedecendo a uma formação que os dispunha em falanges de
combate já testadas incontáveis vezes e respaldadas em
técnicas militares cientificamente estudadas.

Os chineses eram miúdos e subnutridos, usando armas


rudimentares: facas, paus, pedras, enxadas, correntes, etc.

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

A batalha durou apenas uma hora e os alemães foram


forçados a recuar com seus poucos sobreviventes.

Até essa batalha com os alemães os ocidentais ainda não


tinham usado suas armas de fogo de maior alcance, porque
achavam que feria sua honra usar armas sofisticadas contra
uma plebe destreinada, desarmada e pertencente a uma raça
inferior.

Mas tendo em vista as derrotas sofridas os ocidentais


perderam seu amor à honra e começaram a usar plenamente
todos os recursos bélicos que dispunham.

Em desespero de causa os chineses invadiram os museus e


se apossaram de todos os tipos de armas de fogo antigas em
que conseguiram pôr a mão.

E armados de umas poucas escopetas, trabucos e pistolas


antigas tentaram atacar as muralhas da cidade antiga onde os
ocidentais se abrigavam.

Graças à ajuda de um velho canhão que disparava bolas de


fogo de mais de 100 quilos conseguiram abrir brechas nas
muralhas e por elas tentaram passar.

Mas as armas mais sofisticadas dos ocidentais os impediram e


foram mortos aproximadamente quinze dos grandes mestres e
mais de 1.000 boxers.

No dia 14 de julho chegaram os reforços pedidos pelos


ocidentais.

Constava de tropas americanas, européias e japonesas, que


logo ao chegar ocuparam a cidade de Tien-Tsin.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 128
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

No dia 14 de agosto o exército ocidental chegou em Pequim,


com 8.000 homens fortemente armados, mais de cem canhões
e 20 metralhadoras de longo alcance.

O cerco dos boxers a Pequim durou cinquenta e dois dias.

Enfrentaram bravamente as tropas aliadas e pereceram


gloriosamente em batalha defendendo o direito à liberdade de
seu povo e a necessidade de preservar seus valores culturais
contra o estrangeiro predador.

Não era a primeira e nem seria a última vez que ocidentais


invadiriam outros países e outros povos, impedindo-os de
exercerem sua liberdade na escolha de seus governantes e na
preservação de sua cultura.

Os boxers conseguiram resistir durante treze dias até serem


dizimados completamente no dia 27 de agosto de 1900.

Pereciam com eles dezenas de estilos de Kung Fu que


desapareceram para sempre por terem sido mortos seus
mestres e praticantes mais destacados.

Jamais saberemos como seria hoje o Kung Fu se alguns


desses mestres tivessem conseguido sobreviver.

Com eles morreram segredos marciais insubstituíveis e


técnicas primorosas, que provavelmente nunca mais serão
reencontradas.

Participaram dessa revolta: de um lado os mestres do Kung


Fu, os membros das Fraternidades, das Tríades e das
Sociedades Secretas e, por outro lado soldados bem nutridos,
fortemente armados e exemplarmente treinados da Alemanha,
Argélia, Áustria, França, Índia, Inglaterra e Japão.

A resistência chinesa era dirigida por homens de ferro como o

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 129
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

General Feng-Yu-Hsiang que comandava o célebre batalhão


Ta-Tao-Tui.

Este e outros generais pereceram lutando ombro a ombro com


seus soldados diante das armas de fogo mais sofisticadas de
outros países.

Durante muitos anos o Kung Fu foi banido da China, tendo sido


preservado por uns poucos aficcionados que o praticaram em
segredo até há poucas décadas, quando novamente foi
liberado e conquistou seu lugar ao sol.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 130
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Na revolução dos Boxers surgiu o lema


que deu origem ao lema de Bruce Lee:
O General Feng-Yu-Hsiang criou um famoso lema para sua
tropa de revolucionários, lema esse que motivaria Bruce Lee a
criar outro lema de grande impacto. Vejamos:

O lema de Feng-Yu-Hsiang:

Quando combatemos
Usamos as balas de nossas armas
Quando acabam as balas
Usamos as baionetas
Quando se quebram as baionetas
Usamos as coronhas dos fuzis
Quando se quebram as coronhas
Usamos nossos punhos
Quando cortam nossos punhos
Nós os mordemos

O lema de Bruce Lee:

Aproxima-te do Jeet Kune Do


Com a ideia de dominar a vontade.
Esquece a vitória ou a derrota;
Esquece o orgulho e a dor.
Deixa teu adversário arranhar tua pele
E esmaga a carne dele;
Deixa-o esmagar tua carne
E fratura-lhe os ossos;
Deixa-o fraturar seus ossos
E toma a vida dele!
Não te preocupes em escapar ileso
Deixa tua vida diante dele.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 131
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Apólogos do Kung Fu
O Kung Fu, a título de propiciar uma formação moral a seus
praticantes, cultiva em sua tradição um sem-número de
apólogos que, tais como as parábolas do Cristianismo
primitivo, transmitem profundos ensinamentos.

A título de ilustrar como são esses apólogos, a seguir narro


alguns deles na esperança de que o leitor saiba apreciá-los e
consiga extrair deles os ensinamentos especiais que ocultam.

A Especialização Marcial

Há muito, muito tempo, quando a ilha de Okinawa pertencia


aos chineses e os okinawenses aprendiam técnicas de Kung
Fu que mais tarde dariam origem ao Karate (se não acredita,
leia os livros de Ginchin Funakoshi), morava nessa ilha um
velho mestre chinês que transmitia sua arte com muito desvelo
e carinho.

Dentre os inúmeros discípulos desse mestre havia três que


eram seus alunos prediletos.

Desses três, um havia se dedicado exclusivamente às técnicas


de luta com as pernas e se tornara muito famoso como "O
Homem da Perna de Ferro".

Outro gostava apenas das técnicas manuais e se tomara


eficientíssimo no uso dos braços e das mãos, granjeando fama
como "O Homem dos Punhos de Aço".

O terceiro não se especializou em técnica alguma, contentava-


se em seguir plenamente os ensinamentos do mestre e
dedicava-se tanto às técnicas de perna, quanto às técnicas de
mão.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 132
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Por não se ter especializado em nada, não era famoso como


os outros dois e embora querido por seu mestre, permanecia
na obscuridade e era pouco conhecido.

Com o passar dos anos, o velho mestre vendo chegar o fim de


seus dias, convocou o povo a ouvir suas últimas palavras.

Como era um homem probo e caridoso as pessoas de sua


aldeia vieram ouvi-lo.

Nessa sua última mensagem conclamou todos à prática da


caridade e da fraternidade, incentivou-os a continuarem
praticando o Kung Fu como forma de cultura física e recurso
para defender a ilha de possíveis invasores.

Em seguida fez vir à sua presença seus três alunos favoritos e


apresentando-os ao povo disse-lhes que se um dia tivessem
problemas com algum mau elemento que ameaçasse suas
vidas ou seus bens, confiassem a defesa da ilha a esses seus
três discípulos. Terminando de dizer estas palavras, expirou.

No banquete que foi realizado após o passamento do mestre


(os chineses comemoram a morte com festas e banquetes),
foram dados lugares de honra aos dois lutadores famosos, pois
seus feitos eram muito conhecidos e as canções e danças da
ilha reproduziam muitas de suas histórias.

O terceiro lutador conseguiu um lugar afastado entre os alunos


menos conhecidos do mestre.

Os anos foram se passando e os dois lutadores famosos cada


vez venciam adversários mais poderosos e mais e mais
aumentavam a fama que possuíam.

As crianças corriam atrás deles nas ruas gritando seus nomes;


quando iam ao mercado os comerciantes lhes ofereciam
presentes e dinheiro.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 133
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Todos se sentiam honrados em hospedá-los e alimentá-los.

O terceiro lutador continuou desconhecido. Todos os dias pela


manhã abria os portões do quintal da casa do mestre, onde
continuou a morar e recebia aqueles que o procuravam para
aprender Kung Fu, ensinando-os com o mesmo carinho que
costumava ter quando o mestre era vivo.

Às vezes um dos dois lutadores famosos, o "Homem dos


Punhos de Aço" ou o "Homem da Perna de Ferro" vinha à
academia e era recebido com muita alegria pelos alunos que
os convidavam a ensinar suas técnicas prodigiosas.

Os anos foram se passando e certo dia a ilha foi invadida por


um bando de salteadores chineses chefiados por um bandido
feroz, exímio praticante de Kung Fu.

Esse bandido atacava as aldeias, matava aqueles que


resistiam, aprisionava os sobreviventes, arrancava-lhes as
roupas, saqueava o que podia e em seguida incendiava as
casas.

Os sobreviventes, nus e humilhados, iam às aldeias próximas


pedir socorro.

De todos os lados chegavam as mesmas notícias -


assassinatos, saques e incêndios destruindo as aldeias por
toda a ilha.

Então o povo se lembrou das recomendações do velho mestre


e saiu à procura dos dois lutadores famosos.

Conseguiram encontrar o "Homem da Perna de Ferro" e


pediram sua proteção.

O "Homem da Perna de Ferro" era muito confiante, pois tinha

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

vencido grandes adversários e tinha uma perna tão rápida que


nenhum outro lutador especialista em pernas conseguia
superá-lo; procurou o bandido e o desafiou para uma luta.

O povo estava com ele e confiantes em sua habilidade


armaram-se de paus e pedras e cercaram o bando.

A luta começou, o bandido enfrentava o "Homem da Perna de


Ferro" e seus asseclas lutavam com o povo.

O bandido lançou alguns golpes com a perna que foram


prontamente defendidos pelas pernas e joelhos de seu
adversário, que prosseguiu arremessando-lhe chutes
tremendamente poderosos e praticamente indefensáveis.

Sua técnica de pernas era tão superior que se dava ao luxo de


florear, dando saltos no ar, giros, chutes repetidos com a
mesma perna, etc.

O bandido era um lutador muito experiente e conhecia


inúmeras técnicas do Kung Fu; adotou a defensiva e passou a
observá-lo.

Notou que seu adversário mantinha os braços quase abertos


para melhorar seu equilíbrio de pernas; notou também que ele
executava até as defesas com os pés, canelas e joelhos.

Lançou-se à frente e encurtou a distância até poder tocá-lo


com os punhos, iniciando um ataque poderoso com golpes
simultâneos de punhos, cotovelos, calcanhar, mãos e pontas
dos dedos.

Atingido por essa saraivada de golpes o "Homem da Perna de


Ferro" tentou se afastar para poder ter espaço para desferir
seus chutes poderosos, mas quanto mais se afastava mais o
bandido se lançava para a frente encurtando a distância e
atingindo-o pesadamente com as mãos.

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Em desespero tentou golpes com joelhos e pisões curtos, mas


os golpes com os punhos eram muito rápidos e atingiam-lhe a
cabeça, esmagando-lhe as orelhas, os lábios, os dentes, o
nariz e os olhos.

Tentou se afastar mais rápido para poder chutar, mas quando


conseguia se afastar o bandido o empurrava desequilibrando-o
e prosseguindo com a saraivada de socos.

Dessa maneira foi acuado contra o canto de uma casa onde,


impedido de usar as pernas, foi surrado até morrer.

Quando o povo viu que o famoso "Homem da Perna de Ferro"


tinha morrido fugiu apavorado, com o bando em seus
calcanhares.

Diversos mensageiros saíram em busca do "Homem dos


Punhos de Aço" e contaram-lhe o que tinha acontecido
suplicando-lhe que os auxiliasse.

O "Homem dos Punhos de Aço" sorriu com superioridade: -


Então o "Homem da Perna de Ferro" havia sido vencido por
um bandido especialista no uso das mãos não é?

Ninguém era suficientemente bom com os punhos para


enfrentá-lo.

Havia vencido dezenas de adversários que eram exímios


lutadores com as mãos, venceria o bandido com facilidade...

Quando acharam os bandidos a luta recomeçou.

O bandido encarou seu adversário e imaginou que como o


anterior este também era especialista no uso das pernas,
resolveu acabar logo com a coisa, encurtando a distância e
partindo para uma série de golpes de punhos.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 136
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

O "Homem dos Punhos de Aço" adorou essa aproximação, o


bandido estava vindo de encontro a seus punhos poderosos,
capazes de varar uma parede de pedras.

Cada soco que o bandido lhe dava era habilmente defendido e


desviado.

Mas o bandido era um lutador experiente e logo percebeu que


jamais venceria aquele oponente apenas desferindo golpes
com seus punhos.

Começou a guardar uma certa distância do adversário,


afastava-se o suficiente para que os punhos do "Homem dos
Punhos de Aço" não pudessem atingi-lo.

Quando o "Homem dos Punhos de Aço" tentava encurtar a


distância, esquivava-se e fugia do ataque linear.

Quando não conseguia evitar o encurtamento da distância


tentava apresar os braços do adversário e aplicar-lhe torções.

Começou a observar atentamente o seu jogo de perna e notou


que nunca desferia golpes com as pernas, nem possuía um
jogo de pernas eficiente.

Começou a usar suas pernas contra ele e em determinado


momento conseguiu derrubá-lo com a rasteira circular
posterior.

Assim que o "Homem dos Punhos de Aço" caiu no chão o


bandido pulou em cima dele e aplicou-lhe uma chave de braço.

O herói nunca tinha lutado no chão, e não sabia o que fazer,


tentou ainda uns socos desesperados mas teve seu braço
direito deslocado à altura do cotovelo, em seguida foi asfixiado
pelo bandido que o matou.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 137
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Ao perceberem que o "Homem dos Punhos de Aço" havia sido


morto o povo debandou apavorado.

O povo da ilha não sabia mais o que fazer, havia ainda o


terceiro aluno do mestre falecido, mas se os outros dois que
eram verdadeiros heróis, famosos por suas lutas, nada haviam
conseguido contra o bandido, o que conseguiria o outro lutador
que era apagado, nunca havia realizado grandes feitos, não
possuía técnicas mirabolantes e nem havia vencido
grandes adversários?

E nem se incomodaram em chamá-lo.

Enquanto isso o bando de facínoras progredia em seu avanço


devastador, arrasando as aldeias por onde passavam.

Mas os rumores das atrocidades cometidas pelos bandidos e a


notícia da morte dos dois heróis do Kung Fu chegaram ao
terceiro lutador.

Certa manhã reuniu os alunos da academia e disse-lhes:

"-Hoje nosso treinamento será diferente. Peguem as armas e


sigam-me."

Não tiveram que andar muito para achar os bandidos. A luta


começou rápida e não tardou para que ambos os chefes se
enfrentassem.

Quando o bandido começou a lutar com ele imaginou qual


seria a especialidade de seu adversário -pernas ou punhos?

Arriscou alguns chutes e estes foram habilmente defendidos e


revidados à altura; resolveu mudar de tática, lançou alguns
socos e estes também foram defendidos e devolvidos.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 138
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Lançou-se à frente tentando encurtar a distância, mas foi


rechaçado por uma saraivada de golpes certeiros que
penetraram em sua guarda pelo centro de seu corpo.

Tentou agarrar as mãos do adversário e ficou surpreso em


descobrir que ele era liso e sabia esquivar-se com admirável
habilidade.

Começou a socar com força, mas o lutador ao invés de


defender formalmente seus golpes desviava-os para fora com
hábeis movimentos com os cotovelos, somados a um sutil giro
de cintura.

O bandido reparou que seu adversário completava seus


ataques com apresamento de seus braços seguidos de revides
formidáveis.

Outro detalhe interessante é que cada braço que executava


uma defesa estava lançando um ataque quase que
simultaneamente.

Tentou dar alguns chutes para aumentar a distância, mas


suas pernas eram bloqueadas antes mesmo que os pés
saíssem do chão.

O lutador bloqueava soltando golpes curtos com o calcanhar


sobre a coxa, joelho e canela do bandido.

Tentou aplicar um golpe de torção, mas o rapaz esquivou-se


num giro completo pelo outro lado e acabou por prender-lhe o
pulso direito com mão de ferro.

Quando puxou o pulso a fim de se livrar, o adversário dobrou o


pulso arremessando o cotovelo da frente e caindo sobre ele
com todo o peso do corpo.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 139
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

O impacto no peito foi enorme e quebrou várias costelas,


fazendo com que sentisse gosto de sangue em sua boca.

Ainda tentou ensaiar vários golpes, mas cada vez que


arremessava um ataque era atingido na área de seu corpo que
estivesse menos defendida, começou a cansar-se, a abaixar a
guarda e a apanhar feio.

Não demorou muito tinha deslocado o ombro e o tornozelo,


logo mais desabou ao chão e não mais conseguiu se levantar.

Quando os outros bandidos viram que o chefe estava fora de


combate, perderam o espírito da batalha e da melhor forma
que puderam trataram de fugir.

A essas alturas o povo começou a se juntar em volta do lutador


e de seus alunos e fizeram uma festa para comemorar a
expulsão dos bandidos e a descoberta de um novo herói do
Kung Fu.

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Influências Taoístas
As influências taoístas se faziam mais marcantes nas Artes
Internas, tais como o TAi i Chi Chuan, o Hsing I e o Pa Kua.

Não havia um código específico para os praticantes das Artes


Marciais, o que se recomendava era a prática do Caminho
(Tao) e os estudos do "Tao Te Ching”.

O Tao Te Ching é a obra fundamental do Taoísmo.

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Influências Budistas
Diante da necessidade de impedir que os aprendizes de
Shaolin usassem seus conhecimentos de Kung Fu com más
intenções, o Monge Kwok Yuen, o grande recodificador de
Shaolin que viveu por volta do século XVI, instituiu as "Dez
Normas Budistas".

A cada uma dessas normas acompanham vários apólogos,


dentre os quais alguns foram selecionados e estão descritos
no curso a distância da Fraternidade Kung Fu.

As Normas Budistas
1 -O praticante de Kung Fu deve treinar sem interrupção.

2 -O praticante de Kung Fu deve usar suas técnicas apenas


para sua defesa pessoal.

3 -O praticante de Kung Fu deve respeito a todos os mestres


de
Kung Fu e a todos os discípulos que praticarem o Kung Fu há
mais tempo que eles.

4 -O praticante de Kung Fu deve ser amigo de seus colegas e


demonstrar em suas atitudes bondade e honestidade.

5 -O praticante de Kung Fu deve evitar demonstrações de


técnicas, mesmo que para isso tenha que recusar um desafio.

6 -O praticante de Kung Fu jamais deve ser agressivo ou ter


maneiras rudes.

7 -O praticante de Kung Fu jamais deve ingerir bebidas


alcoólicas em excesso.

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8 -O praticante de Kung Fu deve conter seus impulsos sexuais.

9 -O praticante de Kung Fu não deve ensinar suas técnicas a


ninguém que não seja budista.

10 -O praticante de Kung Fu tem que se imunizar contra a


cobiça, a agressividade e a fanfarronice.

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

A seguir interpretarei com brevidade


cada uma das Normas Budistas e
incluirei um apólogo que elucide sua
aplicação.
1 - O praticante de Kung Fu deve
treinar sem interrupção.
Praticar a todas as horas do dia é um velho conhecimento,
sempre presente na vida dos grandes ases do Kung Fu ou de
qualquer outro esporte.

Conta-se que Bruce Lee durante suas aulas escolares


colocava as mãos sob a carteira e pressionava com força para
treinar os músculos do antebraço.

Quando assistia televisão à noite Bruce aproveitava os


intervalos comerciais para treinar os braços com halteres.

Linda Lee conta que quando ele tomava banho de chuveiro


ficava na posição Kin Nheung Mah do estilo Wing Chun para
treinar as pernas e os joelhos.

São muito conhecidas as artimanhas utilizadas por esportistas


famosos para incluir técnicas de treinamento nos momentos
mais comuns de seu dia-a-dia.

O famoso homem forte Charles Atlas, costumava carregar


tampinhas de garrafa e pregos em seus bolsos para amassar e
entortar entre os dedos enquanto viajava de ônibus.

Muitos jogadores de beisebol costumam levar uma bolinha de


borracha em seus carros e se dedicam a apertá-las com as

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

mãos enquanto esperam os semáforos abrirem, dessa forma


exercitando os músculos do braço.

O atleta Francisco José D'Urbano, campeão brasileiro de Kung


Fu em seu tempo e em sua categoria, costumava praticar
flexões de calejamento entre uma e outra aula ministrada na
União Nacional de Kung Fu.

A superação é a marca do campeão, se você faz apenas o que


o instrutor manda, você jamais será nada além de um
medíocre lutador.

A História do jovem ambicioso:


Certo jovem chinês, desejoso de aprender as técnicas do Kung
Fu Shaolin, submeteu-se aos testes de admissão do templo e
em seguida foi encaminhado à presença do mestre.

Diante do mestre pôs-se a descrever sua ansiedade em tomar-


se um lutador poderoso, seus desejos com relação à Arte
Marcial, sua admiração pela arte de chutar, socar, saltar, lutar,
etc.

Quando terminou de falar o mestre permaneceu algum tempo


em silêncio e depois lhe explicou que o valor no Kung Fu não
está na força e no poder e sim no conhecimento.

O garoto continuou a insistir em sua admiração pelas técnicas


de luta.

O mestre lhe contou a respeito de um touro que entrou em


uma loja de louça e pisoteou os vasos e as cerâmicas finas,
reduzindo tudo a cacos.

O menino continuou a elogiar as técnicas que havia


presenciado e os lutadores que havia conhecido.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 145
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

O mestre insistiu que as ambições dele eram demasiadas e


que se quisessem aprender tudo aquilo, uma vida só não
bastaria.

Ele respondeu que não tinha muito tempo, que tinha pressa e
que queria aprender mesmo que fosse umas poucas técnicas.

Mais uma vez o mestre o aconselhou a meditar no touro da loja


de louça fazendo-o ver que podia se transformar nesse touro, e
que acabaria por destruir ao mundo a seu redor como o touro
destruiu a loja.

Mais o jovem continuou a insistir mais e mais em aprender as


técnicas que desejava.

O mestre então lhe propôs uma última prova antes de ser


admitido aos ensinamentos marciais do templo.

A prova consistia em amassar uma folha de papel


transformando-a em uma bola e depois alisá-la novamente e
recomeçar outra vez, transformando-a novamente em bola e
alisando e prosseguindo assim até que o papel se reduzisse a
tiras; deveria então pegar outra folha e recomeçar.

Esse exercício deveria ser feito diariamente por doze horas,


durante três anos.

Terminados os três anos o jovem retornou à presença do


mestre e este indagou:

-Praticou continuamente durante doze horas diárias como lhe


foi recomendado?

-Sim; respondeu o jovem.

-Então pode ir embora - respondeu o mestre. - Seu


aprendizado terminou.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 146
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O jovem ficou muito aborrecido e decepcionado, pois tinha


seguido à risca as instruções do mestre.

À custa de muito sacrifício tinha praticado doze horas diárias e


agora o mestre se recusava a lhe ensinar o que tanto queria.

Sentiu-se enganado e culpou o mestre por ter lhe roubado três


anos de sua vida.

Voltou para casa e assim que chegou, seu irmão que estava
no banho pediu-lhe que lhe esfregasse as costas.

Começou a esfregar as costas do irmão, mas teve que parar,


pois descobriu que por onde passava sua mão a carne se abria
e jorrava sangue...

Essa história que acabou de ler provavelmente é apócrifa mas


pertence ao rol das inúmeras lendas chinesas sobre o Kung Fu
e não deve ser interpretada literalmente.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 147
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2 -O praticante de Kung Fu deve usar


suas técnicas apenas para sua defesa
pessoal.
Uma pessoa que sabe Kung Fu tem superioridade física sobre
as pessoas que não aprenderam técnicas de defesa pessoal,
independente de sua estatura e peso.

O que você pensaria se visse um adulto espancando uma


criança?

Nessa mesma proporção, um praticante de Kung Fu que use


sua superioridade técnica para subjugar alguém que
desconheça as técnicas de defesa pessoal, age como um
adulto que espanca uma criança.

Da mesma forma que é de se esperar que um adulto não


abuse de sua estatura para infligir castigos físicos a uma
criança, também é de se esperar que um praticante de Kung
Fu não abuse de seus conhecimentos técnicos para espancar
qualquer pessoa, seja adulta ou não, seja maior em estatura
ou não.

Aliás, o Código Penal Brasileiro condena qualquer pessoa que


mate seu adversário usando golpes desferidos com as mãos
nuas, mesmo que o adversário esteja armado.

Os antigos afirmavam que o Kung Fu tinha por objetivo


transmitir ensinamentos de autodisciplina e autoconhecimento,
não devendo jamais ser usado contra outro ser vivo (seja
homem ou animal).

O Rei Suan e o Mestre Po-Kung-Hi


O Rei Suan da dinastia Chou era um guerreiro valente e muito

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 148
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

poderoso.

Certa vez ouviu falar do grande Mestre Po-Kung-Hi e de sua


grande fama; decidiu-se a procurá-lo e medir suas forças com
ele.

Quando chegou diante de Po-Kung-Hi perguntou-lhe qual era


sua especialidade, em que técnica era mais forte.

Po-Kung-Hi respondeu:

-Posso arrancar a perna do gafanhoto e impedir que a cigarra


abra suas asas.

Espantado, o Rei Suan lhe disse:

-Sou capaz de atravessar o couro de um rinoceronte com um



golpe de meus punhos. Como é que você, capaz de feitos
insignificantes é mais famoso do que eu?!

Po-Kung-Hi respondeu:

-Aprendi com Tze-Shang-Chi, que era tão forte que jamais


houve outro lutador como ele, mas cujas proezas nunca foram
vistas por alguém, pois não gostava de se exibir.

O Karate Do de Gichin Funakoshi


Um dos melhores livros sobre Artes Marciais traduzido para
línguas ocidentais é o "Karate-Do My Way of Life", de Gichin
Funakoshi -o criador da palavra Karate.

Nessa obra o autor relata que quando estava com oitenta anos
foi surpreendido por um assaltante que tentou roubá-lo, em um
dia de chuva em que carregava em sua mão esquerda um

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 149
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

saco contendo uma lancheira vazia e alguns livros, e na mão


direita um guarda-chuva.

Tal fato ocorreu enquanto voltava para casa e caminhava entre


as estações Otsuka e Hikawashita, em Tóquio.

O marginal arrebatou-lhe o guarda-chuva das mãos e tentou


golpeálo com a ponta.

Funakoshi agachou-se e com a mão direita agarrou firmemente


os testículos do adversário.

O guarda-chuva caiu no chão na hora e o rapaz começou a


gemer parecendo que ia morrer.

Funakoshi termina esse relato dizendo:

"... Eu tinha feito o que constantemente tinha dito a meus


jovens discípulos para nunca fazerem... Não me senti muito
orgulhoso de mim mesmo."

Citado do "Karate-Do My Way ofLife", Kodansha International,


First Paperback Edition, 1981 -Página 112

Essa pequena história mostra a grandeza de Funakoshi, que


foi um grande artista marcial e que pregava a seus discípulos a
segunda norma budista.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 150
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

3 -O praticante de Kung Fu deve


respeito a todos os mestres de
Kung Fu e a todos os discípulos que
praticarem o Kung Fu há mais tempo
que eles.
A tradição do Kung Fu relata que as escolas marciais da velha
China eram administradas dentro de um sistema quase
familiar.

O mestre era considerado como um pai e sua esposa como


mãe.

Os alunos mais antigos eram tidos como irmãos mais velhos e


tratados com todo o respeito.

As pessoas que iniciavam o treinamento juntas tratavam-se


umas às outras como irmãs e irmãos.

Os discípulos que entrassem depois delas eram tratados como


irmãos mais novos e mereciam toda a atenção e
prestimosidade.

Dentro desse espírito de fraternidade os outros mestres eram


também respeitados por seus conhecimentos e mesmo que
dois mestres não se dessem entre si, seus discípulos os
respeitariam igualmente e jamais fariam críticas ao outro
mestre.

Foi esse respeito mútuo que garantiu a sobrevivência do Kung


Fu até nossos dias, e quando os mestres de Kung Fu deixarem
de se respeitar dessa maneira, ou se permitirem criticar a
outros mestres diante de seus alunos, estarão contribuindo
para o desaparecimento do Kung Fu.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 151
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

A fofoca contra um mestre:


O discípulo Li certa vez perguntou ao Mestre Shiu se tinha
ouvido falar no Mestre Pu Hao, cuja técnica era inferior e de
origens desconhecidas.

Mestre Shiu respondeu que nunca havia ouvido falar em


Mestre Pu Hao, mas que conhecia Mestre Hao, que era um
mestre respeitável e que, embora seus conhecimentos
técnicos não tivesse mais valor devido à sua avançada idade,
contribuía muito para a preservação dos verdadeiros
conhecimentos do Kung Fu.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 152
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

4 -O praticante de Kung Fu deve ser


amigo de seus colegas e demonstrar
em suas atitudes bondade e
honestidade.
Ser amigo de alguém, principalmente de um colega de treino,
implica em interessar-se genuinamente pela outra pessoa.

Quando somos amigos de alguém, nos interessamos por seu


progresso, nos entristecemos quando percebemos que não
consegue seus objetivos, nos sentimos felizes quando vemos o
sucesso que consegue alcançar.

É muito importante que o praticante de Kung Fu deixe de ser


infantil em seu comportamento com relação aos colegas.

O praticante infantil é aquele que perde um tempo precioso


criticando colegas de treino.

O praticante infantil adora corrigir os outros, sem dar a devida


atenção à correção das próprias falhas.

O praticante infantil quando se torna bom de luta, começa a


esnobar os colegas de treino, não os cumprimenta mais, não
responde a seus cumprimentos, toma atitudes orgulhosas com
relação a todos.

O praticante infantil não sabe substituir as fofocas que ouve


pela realidade que vê.

O praticante infantil não compreende que não é importante ser


o melhor de sua escola.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 153
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

O praticante infantil não compreende que a verdadeira Arte


Marcial não consiste em vencer aos outros e sim em VENCER
A SI MESMO.

Vencer a si mesmo implica em dominar os sentimentos de


superioridade, os comportamentos egoístas e substituir o
desejo de ser melhor que os outros pelo interesse sincero em
ser bondoso, amigo e leal com os companheiros, não só de
sua academia como das academias que ensinam estilos
diferentes do seu.

Esse tipo de batalha é a mais difícil de todas, mas a vitória final


obtida com essa luta é a maior de todas.

A história de Li e Ping:
Nos tempos antigos havia dois praticantes de Kung Fu
chamados Li e Ping, que desde crianças haviam praticado
juntos, tendo se tomado grandes amigos.

Certo dia resolveram tatuar seus braços com a mesma


tatuagem como símbolo da amizade que os unia, dessa forma
se tomaram irmãos e se juraram fraternidade enquanto
vivessem.

Devido a razões de família, separaram-se e não mais se


tornaram a ver.

Com o tempo tomaram-se adultos e seguiram caminhos


diferentes.

Embora ambos continuassem a treinar o Kung Fu com


regularidade e persistência, Li se tomou famoso comissário de
polícia enquanto Ping tomou-se um jogador.

Uma ocasião Li foi enviado a uma cidade distante para deter


uma gangue de traficantes que mantinha um cassino ilegal.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 154
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Li invadiu o cassino e enfrentou a todos os bandidos que lá


estavam, tendo vencido brilhantemente graças a seu domínio
do Kung Fu.

Em seguida teve que enfrentar o chefe da gangue que se


ocultara em uma sala especialmente reforçada.

Com algum esforço Li conseguiu penetrar na sala e enfrentá-


lo.

Quando começou a lutar Li percebeu que se tratava de seu


grande amigo Ping, mas como cada um lutava pelo que julgava
ser seu dever brigaram durante horas.

Finalmente Ping conseguiu vencer a Li e quando o seu amigo


estava caído no chão ensanguentado, abraçou-o fortemente e
chorou muito.

Como todo praticante sério de Kung Fu conhece


profundamente Acupuntura, Ping tratou de seu amigo até que
se recuperasse plenamente.

Quando Li já estava bom, Ping o acompanhou e se entregou à


justiça.

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

5 -O praticante de Kung Fu deve evitar


demonstrar suas técnicas, mesmo que
para isso tenha que recusar um desafio.
Esta regra foi criada para impedir que as técnicas do Templo
Shaolin fossem aprendidas por algum praticante de Kung Fu
de outro estilo que as poderia usar com propósitos menos
elevados.

Como praticante de Kung Fu você se torna responsável pelo


que sabe e não deve transmitir seus conhecimentos
indiscriminadamente.

Se você ensina o que sabe a alguém e esse alguém faz mau


uso do que aprendeu, você é o responsável.

Além do que, muitos praticantes de Kung Fu transmitem seus


conhecimentos não com a intenção de ajudar seus discípulos,
e sim com o desejo de se sentir importante, por orgulho das
técnicas que aprendeu.

O monge do lago Ching-Hai:


Antigamente vivia próximo ao lago Ching-Hai um jovem monge
que possuía grande habilidade em Kung Fu.

Sendo tão hábil na arte de lutar esse monge era mais ou


menos convencido e orgulhoso.

Seus colegas monges gostavam muito dele e por amizade o


advertiam que deveria controlar seu temperamento e que essa
sua habilidade pessoal não deveria tomar conta de sua mente,
havendo coisas muito mais importantes na vida.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 156
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Não sendo burro, o monge compreendeu que seus amigos


tinham razão e dedicou-se a seus estudos, à leitura de livros
de Filosofia e à prática da meditação.

No outono do ano seguinte, realizou-se uma grande


competição de Kung Fu em Sagan-Ushu e o monge obteve
autorização para participar dela.

Chegando ao local das competições enfrentou todas as


classes de lutadores; desde outros monges muito habilidosos
em Kung Fu, a guerreiros de terras distantes exímios
praticantes de outras modalidades marciais.

Devido a sua grande habilidade foi sagrado campeão e iniciou


a viagem de regresso.

Quando já caminhava há algum tempo, encontrou um lutador


que o desafiou a lutar.

Orgulhoso como estava por ter vencido a todos no


campeonato, o jovem monge esqueceu-se da quinta regra e
aceitou o desafio.

Lutaram durante várias horas, até que o monge conseguiu


vencer seu adversário mas, como havia anoitecido e estava
cansado depois de tanta luta, decidiu dormir à margem do
caminho.

Com o raiar do Sol reiniciou sua caminhada de volta ao


monastério.

Em determinado momento foi reconhecido por outros viajantes


que o convidaram a almoçar com eles.

Quando terminou de almoçar um deles o convidou a lutar.

Sem poder recusar teve que enfrentá-lo.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 157
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

A luta tomou-lhe apenas meia hora, mas atraiu espectadores e


assim que terminou de lutar um deles o atacou de surpresa,
fazendo com que tivesse que lutar de novo.

Nem bem liquidou com seu novo oponente, se agachou para


pegar sua bagagem, foi novamente desafiado e nesse
momento se recordou da quinta regra e dos conselhos de seus
colegas monges, percebendo que onde quer que fosse sempre
haveria alguém que o desafiaria.

À medida que lutava com o novo adversário, percebeu que


este não era tão bom quanto os anteriores, o que lhe permitiu
enfrentá-lo enquanto pensava em tudo que estava
acontecendo.,

Foi então que os conhecimentos filosóficos que havia estudado


e as meditações que havia feito vieram a sua mente.

Chegou à conclusão que o EU INTERIOR era muito mais


importante que o EU EXTERIOR.

Compreendeu que as vitórias que tinha obtido agradavam


apenas a seu EU EXTERIOR, a seu EGO, a seu orgulho
infantil.

Compreendeu que o Kung Fu era a arte de vencer aquele


impulso infantil de demonstrar aos outros sua grande
habilidade.

Então passou a abrir a sua guarda, a não defender os golpes


do adversário e a deixar-se vencer.

Quando vencido foi ridicularizado e abandonado por todos, que


passaram a seguir o novo campeão.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 158
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Caído no chão e ensanguentado pelos golpes de seu


adversário, que para ele teria sido tão fácil de vencer, o monge
sorria feliz.

Não queria mais ser um grande campeão de Kung Fu, pois


sabia que o caminho de sua vida estava na meditação e no
estudo.

Com a derrota aprendeu que o Kung Fu era o TEMPO DE


HABILIDADE para converter seu Eu em algo profundo e muito
grande.

Sua habilidade continuava a mesma, continuava apto a


defender-se em alguma ocasião de perigo, mas agora poderia
sentir satisfação com outras coisas além de sua capacidade de
lutar.

Apanhou suas coisas e voltou ao templo.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 159
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

6 -O praticante de Kung Fu jamais deve


ser agressivo ou ter maneiras rudes.
O verdadeiro mestre de Kung Fu deve se esforçar por ter um
controle pleno sobre si mesmo, evitando os comentários
desairosos sobre os outros mestres, evitando os desafios e os
comportamentos rudes e mal educados.

O mestre Chan do Estilo Shaolin

Vivia em uma pequena aldeia chinesa o Mestre Chan, famoso


por seus conhecimentos do estilo Shaolin, do estilo Tong Long,
por sua habilidade nas técnicas dos Oito Deuses Bêbados e
pelo domínio da Palma de Ferro e das dezoito armas chinesas.

Em sua juventude havia sido um invejoso, sempre caluniando


outros mestres que tinham conseguido mais fama que ele.

Apesar de toda a sua habilidade no Kung Fu, sua maior arma


ainda era a fofoca, a maledicência, o desprezo.

Seus alunos, por confiarem nele, acreditavam que tudo que


dizia era verdadeiro e passaram também a desprezar os outros
mestres.

Esses outros mestres sabiam do procedimento do mestre


Chan, mas não lhe queriam mal, simplesmente tinham pena
dele.

Quando os discípulos desses mestres lhes perguntavam a


respeito do Mestre Chan, estes lhes respondiam que se tratava
de um mestre muito valente, pena que fosse tão infantil e não
soubesse respeitar a seus colegas.

Alguns mestres chegavam mesmo a recomendar sua escola a

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 160
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pessoas que moravam próximas à sua região, recomendação


essa que Mestre Chan seria incapaz de fazer a respeito deles.

A valentia de Mestre Chan era muito grande.

Certa vez entrou sozinho na caverna de um grande urso negro


que assustava a população da vila, enfrentando a fera e saindo
de lá com ele morto.

Certo dia estava andando pela rua quando um ancião se


aproximou dele e lhe disse:

-O senhor é um grande mestre e possui habilidades


espantosas, mas por que, ao invés de perder tempo falando
mal de outros mestres, o senhor não enfrenta os três monstros
que estão assustando o povo?

Mestre Chan estranhou a interpelação e perguntou quais eram


os três monstros.

O ancião explicou que havia um grande tigre rondando o


povoado e que já havia comido três homens.

Mestre Chan pegou suas armas e saiu em busca do tigre,


matando-o a golpes de lança e punhal.

Voltou ao povoado, procurou o ancião e lhe disse:

-Já matei o tigre, qual é o próximo monstro?

O ancião lhe contou que havia uma grande serpente que se


ocultava no caminho da aldeia atacando os viajantes.

Mestre Chan pegou sua corrente articulada e foi atrás da


serpente, matando-a.

Quando voltou à aldeia perguntou ao ancião qual era o terceiro

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[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

monstro.

O ancião respondeu:

-Você é o terceiro monstro.

Mestre Chan ficou furioso e ergueu seu poderoso punho para


fulminar o pequeno ancião.

Mas o ancião continuou a falar:

-Você é um grande mestre, para você é muito fácil me tirar a


vida, minha técnica não é suficiente para enfrentá-lo, mas
mesmo que você me mate continuará sendo o terceiro
monstro, pois sua língua é ferina e venenosa e o mal que ela
faz apaga todo bem que sua arte consegue fazer.

Mestre Chan abaixou seu punho e foi-se embora, passou toda


a noite pensando, no dia seguinte juntou algumas roupas e
caminhou até a montanha onde meditou durante três meses.

Enquanto meditava na montanha reparou que o vento forte


derrubava os troncos vigorosos mas só acariciava as folhagens
flexíveis, enquanto a chuva matava a sede dos dois.

Compreendeu que a chuva era mais sábia que o vento, e que


todas as pessoas, boas ou más, com grandes ou com
medíocres conhecimentos, continuavam a merecer a luz do Sol
e a água da chuva.

Retornou à aldeia e o povo de lá ficou surpreso quando viu que


havia se modificado, suas maneiras eram as de um homem
cortês e se comportava com amabilidade em relação a todos
os outros mestres, mesmo com aqueles a que julgava ser
superior.

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7 -O praticante de Kung Fu jamais deve


ingerir bebidas alcoólicas em excesso.
Devemos certo respeito ao nosso corpo e afinal de contas, o
corpo é o instrumento de que nos utilizamos para a prática do
Kung Fu.

Os livros de Medicina informam que a ingestão de qualquer


bebida alcoólica, mesmo em pequenas proporções, destrói os
neurônios, descalcifica os ossos, lesa as fibras nervosas e os
vasos cardíacos, irrita a mucosa gástrica, desarranja os rins,
elimina a vitamina B, diminui o oxigênio do sangue, podendo,
quando em grande dose, provocar a cirrose hepática.

Mas a questão da ingestão de bebidas alcoólicas não é tão


simples assim.

Trata-se de uma doença e deve ser encarada como tal.

Na continuidade de minhas pesquisas assisti algumas reuniões


dos Alcoólicos Anônimos e ouvi depoimentos de rara
intensidade emocional e rico conteúdo humano.

Se você ouvisse falar de uma doença que estivesse atingindo


nosso país e vitimando 4 milhões de pessoas, afetando-as a
ponto de torná-las loucas durante algumas horas todos os dias,
isso lhe causaria um certo espanto, não é?

Pois fique sabendo que o alcoolismo é uma doença que


provoca a loucura em determinados períodos e que as
pessoas vítimas dessa doença prejudicam cerca de 20.000
pessoas no Brasil todos os dias, afetando a vida social e
empresarial desta nação com custos incalculáveis.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 163
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Segundo a A.A.A., a doença do alcoolismo ataca uma a cada


treze pessoas que bebem e é a terceira doença do mundo em
número de mortes.

Somente na cidade do Rio de Janeiro uma estimativa situa a


existência de trezentos mil alcoólatras.

Sabendo-se que cada alcoólatra afeta e prejudica o


comportamento de pelo menos cinco outras pessoas em
média, temos um milhão e quinhentas mil pessoas
prejudicadas diariamente só no Rio de Janeiro.

O alcoolismo é uma doença progressiva e, como tal, é


acionada pelo primeiro gole ingerido.

Estive em reuniões da A.A.A. ministradas em diferentes locais,


mas notei que estava sempre presente um pequeno outdoor
eletrônico que piscava de forma intermitente e onde estava
escrito: "Evite o primeiro gole."

Outro cartaz que está sempre presente diz: "Um é muito e mil
não é suficiente."

Espantei-me da lucidez da sétima regra budista que diz que


não se deve ingeri bebidas alcoólicas em excesso.

Se você provar, já tomou o primeiro gole, não é?

Diz também a A.A.A.: "Não adianta tentar convencer um


alcoólatra a largar a bebida, até que ele mesmo reconheça a
sua incapacidade perante o álcool."

O alcoólatra começa bebendo socialmente, mais tarde passa a


beber habitualmente e depois começa a perder o controle e a
beber sob qualquer pretexto.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 164
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Nenhum esportista que se preza ingere bebidas alcoólicas e


isso inclui os praticantes de artes marciais, mesmo que os
anúncios dos fabricantes de bebidas mostrem o contrário na
televisão.

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8 -O praticante de Kung Fu deve conter


seus impulsos sexuais.
Quando analisamos esta norma temos que compreender que
ela foi estabelecida para ser adotada pelos Artistas Marciais do
Templo Shaolin, que eram Monges e portanto haviam feito
votos de castidade.

É interessante você saber que não são todos os budistas


(monges ou não) que praticam a abstinência sexual.

Alguns monges budistas são casados e têm filhos.

No curso de formação de ascetas do Budismo Niskama Karma,


podem participar pessoas de ambos os sexos e até mesmo
pessoas casadas.

Para informações sobre como obter essa formação clique


neste link:

http://perfeitaoportunidade.com.br/budismo-niskama-karma-2/

Em se tratando de pessoas comuns de nossos dias, seria


exigir demais impor a total abstinência sexual, mesmo porque
seria praticamente impossível cumprir essa regra vivendo
dentro do mundo.

No entanto, podemos observar que é comum a prática de


abstinência sexual entre os esportistas profissionais, haja vista
as famosas "concentrações" dos jogadores da Seleção
Brasileira.

A energia sexual quando contida por um ato da vontade pode


ser sublimada em realizações físicas (e/ou intelectuais) de
excepcional performance.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 166
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Isso não significa que o praticante de Kung Fu não deva


permitir a livre expressão de sua sexualidade, e sim que deve
manter controle sobre ela.

O que se recomenda é que se evitem os exageros que


contribuem mais para tornar o homem escravo de seus
instintos do que senhor de si mesmo.

O relacionamento sexual deve ser encarado com normalidade,


não se deve atribuir-lhe uma importância desproporcional e
nem se deve permitir-lhe que ocupe nossa mente a todos os
momentos.

É fato notório que os grandes gênios de todas as épocas


possuíam intensa sexualidade e muitos autores consideram a
sublimação dessa sexualidade como um dos fatores que
conduziram esses homens a suas grandes realizações.

O monge que carregou uma mulher:


Conta-se que dois monges caminhavam às margens de um rio
discutindo certos pontos da Filosofia Budista, quando deles se
aproximou uma mulher e perguntou-lhes se não podiam
carregá-la até a outra margem do rio, pois não desejava
molhar suas vestes.

Um dos monges, sem titubear, tomou a mulher em seus braços


e a levou até a outra margem, depositando-a no chão,
retomando à margem de onde partira e continuando a
discussão filosófica no ponto em que havia sido interrompida,
como se nada houvesse acontecido.

Diante dessa atitude o outro monge ficou muito espantado e


censurou o companheiro:

-Você não sabe que somos proibidos de nos aproximarmos de


uma mulher e que jamais podemos tocá-las ?!

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O outro respondeu:

-Eu a carreguei para o outro lado mas a larguei lá, você


continua carregando-a.

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9 – O praticante de Kung Fu não deve


ensinar as suas técnicas a ninguém
que não seja Budista.
A transmissão completa dos ensinamentos de um estilo de
Kung Fu é responsabilidade difícil que preocupa os mestres
conscientes de seus deveres.

Evidentemente que esta norma também deve ser interpretada,


levando em conta o sistema de valores vigentes em nossos
dias.

Na antiguidade os mestres não se permitiam sequer fazer


demonstrações públicas.

Deixavam isso a cargo de seus discípulos.

Fazer demonstrações em primeiro lugar era sinal de certo


orgulho pessoal, indigno de um verdadeiro mestre.

Em segundo lugar permitia que o público aprendesse


movimentos mais adiantados que tinham que ser
preservados.

Alguns dos mestres mais qualificados do Kung Fu moderno


ainda atendem a esse dever e raramente fazem
demonstrações públicas.

Embora não se exija que os discípulos sejam budistas, é de


primordial importância que se verifique a lealdade e o caráter
de um praticante antes que se lhes permita o aprendizado de
técnicas mais avançadas.

As pessoas mudam com o tempo e os brasileiros em geral são


multo volúveis e emocionais, julgando seus mestres pela
opinião dos outros mais que por sua própria.

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A violência é um fator marcante entre nosso povo, mormente


se observarmos que temos entre nós um dos maiores índices
de criminalidade registrado em todo o mundo.

Se um professor não for suficientemente responsável na


escolha de seus discípulos, acabará por disseminar sua arte
entre pessoas menos qualificadas que perpetuarão a violência
e a discórdia entre seus alunos.

Recomenda-se especial cuidado com professores que falem


mal de outros professores ou de outros estilos.

Em geral trata-se de pessoas que tentam esconder nas críticas


a própria incompetência.

Essa recomendação é especialmente verdadeira no que se


refere a fofoqueiros de origem chinesa.

O fato de um praticante de Kung Fu ser chinês não o


transforma em um mestre nem traz dignidade a quem não a
possui (mesmo que se auto intitule mestre e alguns vão mais
longe e se apresentam como grão mestre).

Muitos estilos de Kung Fu desapareceram no passado devido


a dificuldade de se selecionar discípulos criteriosos que os
preservassem.

Na intenção de preservar os conhecimentos milenares do Kung


Fu sem permitir que um só elemento se tornasse depositário
de toda a técnica, o Templo Shaolin nunca ensinava todo seu
estilo a um só praticante, preferindo transmitir técnicas parciais
a cada discípulo, dessa forma assegurando a unidade do
Templo.

O mundo se encontra num estado caótico em que imperam a


guerra e a violência.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 170
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Aqueles que moram nas grandes cidades não possuem mais a


liberdade de se moverem em segurança pelas ruas, sem
correrem o risco de um assalto ou de uma atitude mais violenta
por parte das pessoas que lá convivem.

O Kung Fu e as demais Artes Marciais são armas poderosas


que não devem ser colocadas nas mãos de pessoas menos
preparadas.

Aquele que ensina apenas as técnicas físicas do Kung Fu


isoladas do contexto filosófico e espiritual característico dessa
arte está apenas demonstrando ser um medíocre que semeia a
violência no mundo.

Que mundo estamos construindo para nossos filhos se


semeamos indiscriminadamente a violência?

Ê necessário que aprendamos a combater a violência em sua


origem dentro de nós, antes que ela se manifeste através de
nossos atos.

Para isso temos que compreender que o que nos torna


violentos é o orgulho.

Estamos semeando a violência quando nos orgulhamos do


estilo de Kung Fu que praticamos, quando nos orgulhamos do
nosso Mestre, quando nos orgulhamos de nossa técnica,
quando nos orgulhamos de nossa força física, quando nos
orgulhamos de nossa nacionalidade, etc.

E por que isso?

Porque quando achamos que aquilo que sabemos é melhor


que aquilo que os outros sabem, estamos adotando um
comportamento de superioridade que impõe um certo desprezo

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 171
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

para com o conhecimento dos demais, e isso é sinal de uma


grande inferioridade nossa.

Temos que aprender a respeitar as demais pessoas, e isso


inclui aprender a respeitar o estilo e os padrões de
comportamento das demais pessoas.

Esse aprendizado de convívio harmonioso e tolerante é a


marca do praticante de Kung Fu amadurecido e idôneo.

Quando permitimos que a semente do orgulho penetre em


nosso coração, estamos abrigando o ódio e a discriminação
dentro de nós.

Nesse momento o Kung Fu que cultivamos cessa de ser uma


expressão da arte e passa a ser uma expressão da violência.

E seremos piores que aqueles de quem falamos mal, menores


que aqueles que expressam modalidades de Kung Fu distintas
da nossa.

É muito fácil criticar, adotar um comportamento desdenhoso


com relação a outros estilos e comportar-se de maneira
orgulhosa diante dos praticantes de outras modalidades.

Isso é tão fácil que qualquer idiota pode fazê-lo (e geralmente


faz mesmo!).

É de se esperar que um praticante de Kung Fu tenha mais


dignidade e adote um comportamento menos infantil.

O discípulo Fanfarrão:
Certa feita vários Mestres e seus discípulos fizeram uma
demonstração de Kung Fu.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 172
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Como é usual nessas ocasiões, os mestres se colocaram em


fita indiana e ingressaram no pátio onde seria realizada a
demonstração na ordem de sua antiguidade (Kung Fu =
Tempo de Habilidade).

Porém um discípulo fanfarrão e presunçoso adiantou-se e


colocou-se ao lado de seu professor, ou seja, mais â frente que
um mestre de outro estilo que possuía muito mais tempo de
treino que ele.

E passou a olhar o outro mestre com um ar de superioridade


como se possuísse o mesmo nível que ele.

O mestre o interpelou e lhe disse:

-Cheguei onde cheguei porque venci meu orgulho, ao passo


que seu orgulho venceu você.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 173
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

10 -O praticante de Kung Fu tem que


se imunizar contra a cobiça, a
agressividade e a fanfarronice.
Todos os comentários feitos na interpretação da norma anterior
são também válidos para a compreensão desta norma.

Nada mais ridículo que um artista marcial que se preocupe


com faixas, diplomas e carteirinhas de estudante.

Quantos atletas de grande potencial encerram suas


possibilidades por desistirem da oportunidade de estudar com
um verdadeiro mestre, para se prenderem a outros "mestres"
menos sérios apenas por serem chineses ou por venderem
diplomas.

Já dizia Bruce Lee que a faixa serve apenas para segurar as


calças.

Uma pessoa que se dedica às Artes Marciais deve possuir um


desejo sincero de evoluir tanto como lutador quanto como
pessoa.

Antigo provérbio chinês diz que o maior guerreiro é aquele que


vence a si mesmo: só conseguimos vencer a nós mesmos
quando dominamos nossos impulsos de orgulho, de
fanfarronice, de querer ser mais que os outros.

A humildade é a marca do verdadeiro campeão. Um campeão


muito papudo é logo esquecido e seus feitos diminuídos.

Embora muito do desempenho técnico do Artista Marcial


dependa de sua dedicação aos treinos, não devemos nos
esquecer que o destaque na Arte Marcial em geral é reservado

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 174
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

a pessoas cujas condições físicas hereditárias sejam


superiores.

Por si só isso deveria ser motivação suficiente para que o


praticante dessas modalidades cultivasse a humildade, visto
que ninguém é responsável por suas condições hereditárias.

Nada mais honroso que ver o forte protegendo o fraco, o


poderoso socorrendo o oprimido, o virtuoso amparando o débil.

A preocupação do Artista Marcial não deve ser tornar-se mais


forte que os demais nem vencê-los, e sim tornar-se mais forte
diante de si mesmo e vencer-se a si, ao invés de tentar vencer
os outros.

Muitos já ouviram falar da pecadora que foi atirada aos pés de


Jesus para que fosse apedrejada conforme ditava antiga lei
mosaica.

A resposta de Jesus foi:

"-Aquele de vós que não pecou que atire a primeira pedra."

Parafraseando a Jesus pergunto: - Quem possui suficiente


domínio sobre si mesmo para que possa presumir ser melhor
que os outros?

As vitórias do mundo são sem valor, pois tudo fenece diante da


morte; aquele que é forte hoje será fraco amanhã; se os fortes
de hoje não ensinam com seus exemplos a proteção dos
fracos, quem os protegerá amanhã quando se tornarem fracos
eles mesmos?

O Kung Fu de Li-Ne-Jam:
Na Província de Hopei viveu um camponês chamado Li-Ne-
Jam que, apesar de ser pobre e humilde, era um profundo
conhecedor do Kung Fu.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 175
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Um dia foi assistir a demonstração de dois famosos heróis, os


irmãos Tai-Ling-Pang e Tai-Lung-Pai, mas não se
impressionou muito, pois percebeu que sua própria arte era
superior.

Ao invés de fanfarronear-se, guardou para si mesmo esses


sentimentos e não falou a respeito nem se exibiu.

Um dos irmãos percebeu que aquele camponês pobre e


maltrapilho não se impressionara com a exibição e o seguiu.

Quando Li-Nem-Jam estava novamente trabalhando no


campo, aproximou-se por trás e o agarrou fortemente tentando
demonstrar toda sua força.

Li-Ne-Jam o atirou ao ar facilmente, arremessando-o longe.

Surpreso com tamanha habilidade, o homem se ergueu e


perguntou-lhe como o fizera.

-Pura sorte, respondeu Li-Ne-Jam e continuou a trabalhar..."

Excetuando-se os fráteres filiados à Fraternidade Kung Fu,


esta é a primeira vez que o público brasileiro tem a
oportunidade de conhecer as Dez Normas Budistas do Templo
Shaolin.

Você, leitor deste livro, é um privilegiado por ter tido essa


oportunidade.

A questão é: acabamos de estudá-las; o que faremos com


esses conhecimentos?

Como aplicaremos essas normas em nossa vida prática, em


nosso dia-a-dia?

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 176
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Procure estabelecer um plano de trabalho visando a adaptação


destas normas à sua própria realidade.

Repartindo o que Sei


Quando do preparo de meu livro O ESPIRITO MARCIAL, um
instrutor do estilo Wing Chun que vinha me auxiliando por
alguns meses insistiu comigo para que incluísse minha filosofia
pessoal como fechamento desta obra.

Não acredito nem nunca acreditei que alguém seja capaz de


levar outra pessoa ao conhecimento da verdade.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 177
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

O máximo que os grandes avatares, os gurus e os mestres têm


conseguido fazer é apontar o caminho por onde trilharam, sem
que ninguém tenha, até onde eu saiba, conseguido percorrer o
mesmo caminho através de outrem.

Não acredito nessa história de mestres e discípulos.

Não me vejo como mestre de nada sou daqueles que crêem


que o mestre está dentro de cada um.

Tenho tentado fazer ver isso às pessoas que me buscam em


procura do conhecimento.

Mas, toda vez que insisto em que a pessoa deva pensar por si
mesma e preparar-se por seus próprios meios, movido por
suas próprias experiências, as pessoas desanimam.

Toda vez que digo que minha experiência serve apenas a mim
e a ninguém mais, sou interpelado por alguém que não
consegue dar o primeiro passo.

Ao examinar o que sei, verifico que tudo que sei já existe no


mundo, já foi dito por muitos e que não necessito emitir minhas
próprias percepções, visto que são de domínio público e
aqueles que comigo convivem sabem como penso.

Assim sendo, as conjeturas de que trato a seguir descrevem


mal e porcamente a filosofia de vida que adotei para mim
mesmo e que representa o resumo de minhas pesquisas
dentro da sabedoria do Kung Fu, e de meus autores prediletos
(Boécio, Buda, Epicuro, Epiteto, Han Ryner, Marco Aurélio e
Sêneca).

Não sou o melhor nem o mais virtuoso dos homens, portanto


esta não é a melhor nem a mais virtuosa filosofia de vida.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 178
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Se decidir adotá-la, talvez você possa encarar a vida com o


mesmo pragmatismo e objetividade com que a encaro; talvez
não.

O risco é todo seu.

De qualquer modo, será sempre uma escolha sua e, como tal,


sua responsabilidade exclusiva.

Afinal, já dizia La Bruyère: "A vida é uma tragédia para os que


sentem e uma comédia para os que pensam."

Antes de examiná-la, procure se lembrar de que O QUE VOCÊ


SABE NÃO TEM VALOR ALGUM, O VALOR ESTÁ NO QUE
VOCÊ FAZ COM O QUE SABE.

De que lhe aproveita saber discutir estas teorias se não for


capaz de demonstrá-las em suas próprias atitudes e ações?

O exemplo não é a melhor maneira de ensinar, É A ÚNICA


MANEIRA!

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 179
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Uma Filosofia Pessoal


Escolhi "Uma Filosofia Pessoal" como título, por várias razões.

Primeira - Sendo UMA Filosofia Pessoal, significa que existem


outras.

Segunda - Sendo Uma FILOSOFIA Pessoal, significa que não


se trata da verdade absoluta, visto que filosofia é a busca da
verdade, não a verdade em si mesma.

Terceira - Sendo Uma Filosofia PESSOAL, significa que


dificilmente pode atender totalmente às necessidades de mais
alguém.

Isto claro, comecemos:

Seja o que for que faço, faço-o porque é justo diante de meu
entendimento e não porque há alguém que possa premiar-me
ou castigar-me na proporção de minhas ações.

Ao esforço para conformar os atos de minha vida ao meu


pensamento, chamo de virtude.

A única recompensa da virtude é a própria virtude.

Se penso numa recompensa não sou virtuoso, pois a principal


característica da virtude é o desapego.

Creio firmemente que a virtude desapegada cria a felicidade.

Aquele que tenta ser bom porque quer ganhar o céu, não é
bom, é como a prostituta que se vende.

Aquele que evita ser mau porque não quer ser condenado ao
inferno, não deixa de ser mau, é um covarde que se comporta
porque teme.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 180
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

É típico do fraco colocar a responsabilidade de sua própria


felicidade sobre os ombros de alguma coisa externa a si
mesmo.

Os ombros favoritos são os de Deus.

Convido o leitor a considerar atentamente este pensamento de


Epicuro:

"Deus, ou quer impedir os males e não pode, ou pode e não


quer, ou não quer nem pode, ou quer e pode. Se quer e não
pode, é impotente: o que è impossível em Deus. Se pode e
não quer ê pervertido: o que, do mesmo modo, é contrário
a Deus. Se nem quer nem pode, é bisonho e impotente:
portanto nem sequer é Deus. Se pode e quer, o que é a única
coisa compatível com Deus, de onde vêm então os males? Por
que razão não os impede?!"

De qualquer maneira não cabe aos homens julgar a Deus, pois


sequer têm meios de provar sua existência e não se julga algo
que não existe.

Nem perco tempo portanto, e me atenho às coisas que me


pertencem e as ações que posso fazer.

Visto que é impossível ao homem conjeturar sobre a natureza


de Deus, dedico minha atenção à natureza que é a expressão
da inteligência responsável pelas coisas serem como são e
não de outra forma.

Percebo logo de início que meus poderes sobre ela são


limitados e que se não a respeito, por ela mesmo pereço.

Só culpa a natureza pelo que lhe acontece, aquele que baseia


sua opinião num falso sistema de valores que o faz confundir o
que lhe pertence com o que não lhe pertence.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 181
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

A morte nada significa, pois enquanto vivo ela não existe e


quanto ela chega eu cesso de existir.

Para mim, ser feliz é viver o aqui e agora, sem apegos e sem
culpa.

O que me permite ser feliz é minha capacidade de escolher.

Han Ryner diz:

"A felicidade é um estado de espírito em que me sinto


perfeitamente livre de todas as servidões e em perfeito acordo
comigo mesmo."

Sêneca conta:

"O homem feliz é aquele para quem não existe nem outro bem
nem outro mal senão o bem e o mal da alma; que pratica a
honestidade e se satisfaz com a virtude; que não se deixa
exaltar nem abalar pelos acontecimentos fortuitos; que não
conhece maior bem que o que ele próprio se pode
proporcionar, para quem o verdadeiro prazer é o desprezo do
prazer."

Epicuro afirma:

"Nunca é cedo nem tarde demais para cuidar de si mesmo;


aquele que diz que ainda é cedo ou que é tarde demais para
filosofar, está dizendo que ainda não é tempo ou que já não dá
mais tempo de ser feliz. A felicidade consiste em se obter
aquilo que se deseja e em evitar aquilo que não se deseja; as
pessoas infelizes são aquelas que: ou não conseguem aquilo
que desejam ou não conseguem evitar o que desejariam evitar.
Conquiste a felicidade evitando considerar como suas as
coisas que não dependem de você."

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 182
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

O mundo tem apenas duas espécies de coisas: aquelas que


dependem de mim e aquelas que não dependem.

Depende de mim apenas meu pensamento e, através do


pensamento, gero minhas opiniões, minhas atitudes, meus
apegos e minhas ações.

Não dependem de mim meu corpo, meus bens materiais,


minha reputação e tudo que não seja gerado por meu
pensamento.

As coisas que dependem de mim, me pertencem, são livres,


nada as impede.

As coisas que não dependem de mim, não me pertencem e


estão sujeitas às vicissitudes da vida.

Se considero minhas as coisas que não me pertencem, sou um


ladrão e necessariamente serei infeliz, sofrerei, ficarei
perturbado, descontente com o mundo e com os homens.

Se aprendo a considerar minhas apenas as coisas que são


minhas, e a considerar do mundo o que pertence ao mundo,
ninguém jamais será capaz de me aborrecer, não ficarei
descontente com ninguém, não poderei culpar os outros por
minha infelicidade, não farei coisas que sejam contra
minha vontade, não terei nenhum inimigo, nem serei vítima de
nenhum dano ou perda.

Esforço-me para compreender estas coisas com perfeição


pondo-as em prática diante dos fatos da vida, sem me deixar
influenciar pelas aparências.

Pergunto-me sempre: -Isto que está me acontecendo se


relaciona com as coisas que dependem de mim ou com as
coisas que não dependem de mim e, se a resposta determinar

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 183
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

que as coisas que estão me acontecendo não são coisas que


dependem de mim, aceito que nada me significam.

Um antigo diálogo apócrifo que teria, segundo dizem, ocorrido


entre Deus e Epiteto diz o seginte:

"Teu corpo não passa de argila mas também te dei uma porção
de mim mesmo: o poder de pensar e escolher, tomando
decisões sobre as coisas dos sentidos. Se não negligenciares
estes poderes e neles te aplicares, jamais te verás obstado ou
embaraçado, jamais terás de que te lamentar, jamais terás que
censurar ou lisonjear alguém. Contenta-te com estas coisas."

Sêneca, em uma de suas cartas a Lucílio, conta que Demétrio


Poliocerta destruiu a cidade de Estilbao, matou sua esposa e
filhos e depois lhe perguntou se havia sofrido alguma perda.

Estilbao respondeu: "Todos os meus bens estão comigo. Nada


perdi do que era meu."

Possuo as faculdades que me permitem compreender que sou


parte de um todo e que compete a mim, como parte, ceder
lugar ao todo.

Cabe a mim ver que as coisas que me cercam são ou isentas


de impedimento, pertencendo ao domínio de minha vontade,
ou sujeitas ao impedimento e dependente da vontade do
mundo.

Não desperdiço energias me aborrecendo e me preocupando


com as coisas que não dependem de mim; prefiro transferir
minhas energias para evitar crer que dependem de mim as
coisas que dependem do mundo.

Meus desejos são os limites que estabeleço para mim mesmo.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 184
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Quando desejo alguma coisa limito minha capacidade de ser


feliz, a minha chance de conseguir o que desejo.

Minhas aversões também são desejos e limitam minha


capacidade de ser feliz, a minha chance de me livrar daquilo
que não desejo.

Tanto é infeliz aquele que não consegue ter o que deseja,


quanto aquele que não consegue evitar aquilo a que tem
aversão.

É fácil ser feliz, basta que deseje apenas aquilo que dependa
de mim e que tenha aversão apenas às coisas que dependa de
mim evitar.

Se faço com que aquilo que desejo dependa apenas de mim


mesmo, vivo livre e feliz, nada lamentando do que me venha a
ocorrer e contra nada me insurgindo.

Se me deixo prender pelas coisas externas, que não


dependem de mim, vejo-me forçosamente dependente e
sujeito a impedimentos; tomo-me escravo daqueles que têm
poder sobre o que desejo; serei necessariamente injusto por
reclamar mais do que me pertence.

Nada afeta o que me pertence. As únicas perturbações que


podem me atingir são formadas pela minha opinião.

Tudo quanto existe mudará dentro de um instante e não mais


existirá.

O UNIVERSO É MUTAÇÃO, A VIDA OPINIÃO.


A ÚNICA VERDADE IMUTÁVEL É QUE TUDO MUDA.

Por exemplo, se gosto de um vaso, procuro me lembrar que


gosto de uma coisa que se quebra e quando se quebrar, não
sofrerei.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 185
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Quando inicio qualquer ação, examino a que natureza


pertence.

Se vou tomar um ônibus procuro me lembrar do que costuma


acontecer num ônibus: algumas pessoas se acotovelam;
outras falam e riem alto; umas correm na frente e tomam o
lugar de outras; existem cobradores mal-educados; outros que
roubam no troco; motoristas que arrancam antes que eu suba,
ou antes que eu tenha tempo de descer completamente.

Assim, pois, constato que, se minha intenção é tomar o ônibus,


estou sujeito a todas essas coisas (não dependem de mim) e
que, se eventualmente elas me acontecerem, isso não me
impedirá de conservar-me em harmonia com as circunstâncias.

Quando surge algum contratempo recordo imediatamente que


foi minha intenção andar de ônibus conservando meu
pensamento em harmonia, e que não o manterei em harmonia
se me aborrecer com as coisas que acontecem.

A realidade nunca chega a mim como ela é, antes passa pelos


meus sentidos e o que vejo dela é a exata proporção do que
meus sentidos me permitem ver.

Mesmo o que meus sentidos percebem não chega até mim


porque tem antes que passar pela interpretação de minha
mente.

Assim, sendo percebo que o que sei da realidade é minha


interpretação da realidade.

Não são pois os acontecimentos da vida que me perturbam, e


sim as opiniões que formo a respeito desses acontecimentos.

Se me torno infeliz, triste ou perturbado, não culpo a ninguém


por isso, mas somente a mim mesmo e a minhas opiniões.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 186
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Não me orgulho de qualidades que não me pertencem.

Se me orgulho dizendo: "-Tenho um belo carro.", estou me


orgulhando de algo que pertence apenas ao carro.

O que é meu então?

O saber apreciar a beleza que vejo, pois é o que depende de


mim.

Não desejo que as coisas aconteçam segundo minha vontade


(afinal elas não dependem de mim); a não ser na exata
proporção do que depender das coisas que dependem de mim.

Como quero continuar a ser feliz, aprendo a aceitar as coisas


como vierem.

A doença é um impedimento para meu corpo (que não me


pertence), mas não para minha opinião.

Observando a vida percebo que as coisas se impedem umas


as outras, mas não são empecilhos a mim.

Em face de qualquer acontecimento pergunto-me quais as


forças que possuo e que podem ser utilizadas eficientemente
nessas circunstâncias.

Quando me habituo a pensar e agir assim, as aparências das


coisas perdem a capacidade de me conduzirem à infelicidade.

O mundo me empresta certas coisas, mas como não fazem


parte das coisas que me pertencem nunca serão realmente
minhas.

Nunca perco nada, apenas devolvo ao mundo.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 187
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Meu filho morreu?

Ele foi devolvido.

Minha mulher me abandonou?

Ela foi devolvida.

Minha casa foi tomada?

Bem, não é isso o mesmo que devolvido?

"Mas quem a tomou não presta!", você me dirá; mas eu lhe


digo: "a mim, que importa se as mãos pelas quais o mundo que
me deu essas coisas, as retome?"

Quando o mundo me dá alguma coisa eu a uso, mas como


algo que não é meu, como fazem os hóspedes de uma
estalagem.

Se espero que minha mulher, meus filhos e meus amigos


vivam para sempre, estou desejando que me pertençam coisas
que não me pertencem.

Quando encontro alguém chorando porque o filho mudou para


longe ou morreu, cuido para que minha imaginação não faça
com que eu perceba o fato erroneamente.

Percebo imediatamente que não é o que ocorreu que


entristece essa pessoa, porque o que a entristece é a opinião
que ela formou a esse respeito.

Percebo também que essa pessoa não dedicou parte de sua


vida a criar uma filosofia pessoal que a sustentasse, e portanto
não aprendeu a enfrentar essa situação.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 188
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Assim sendo, procuro agir com caridade e concordar com ela e


a consolar, mas mantendo-me atento para não permitir que a
dor dela contamine a ideologia que me dará apoio em
circunstâncias semelhantes.

Quando algo de ruim me acontece, penso desta maneira:

"Nenhuma das coisas que estão me acontecendo podem me


afetar; talvez possam afetar este corpo, as posses materiais
que o mundo me emprestou, minha reputação, a esposa que
me foi dada, os filhos que me foram dados, mas nada me afeta
a menos que eu o permita."

Não tenho a presunção de ser respeitado pelos demais, pois


isso não me pertence.

Não espero receber consideração dos demais, pois isso não


me pertence também.

Sei que não é possível permanecer fiel aos meus princípios e


ao mesmo tempo ter a pretensão de ser amado e estimado
pelo mundo.

Não me aborreço com as pessoas, porque se pretender que


elas não me aborreçam estarei pretendendo que elas não
cometam erros, pensem da forma certa e adotem as atitudes
certas e nada disso me pertence.

Se desejo que meus desejos não sejam desapontados, isso


está em meu poder, pois basta que queira aquilo que possa
ter.

Só é senhor de si aquele que é capaz de dar ou tirar aquilo que


é capaz de dar ou tirar.

Aquele que procura a liberdade perfeita não deve desejar nem

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 189
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

recusar nada que dependa dos outros ou perderá sua


liberdade e se tornará um escravo.

Todo aquele que jamais se envolve numa luta que não possa
vencer, é invencível.

Mesmo que alguém me injurie, me provoque ou me soque,


jamais conseguirá me causar mal, porque o mal está na
maneira com que considero estas coisas.

Se alguém me provoca, sei que é minha opinião a respeito de


mim mesmo que me provoca.

Se alguém me ofende é a opinião que tenho a respeito de mim


mesmo que me ofende.

Não permito que as coisas que vêm de fora (e portanto não


dependem de mim), me entristeçam ou me tomem infeliz.

Mantendo-me dentro destes princípios, controlo a mim mesmo


e me torno capaz de ser feliz.

Ao adotar a busca da sabedoria como minha meta de vida,


sempre soube que seria ridicularizado pelos que são incapazes
de avaliar a profundidade desses conhecimentos.

Mas a opinião dos outros não me pertence, portanto não me


perturbo com esses preconceitos.

Contento-me em buscar a sabedoria, não quero parecer sábio


e nem ser tomado como sábio.

Ninguém consegue me desconsiderar, pois não depende de


mim as opiniões dos outros.

Apenas eu posso me considerar e me honrar, pois apenas a


minha opinião me pertence.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 190
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Não há lugar em mim para a inveja e o ciúme, pois é tolice


pretender ter as coisas que não me pertencem.

Melhor que ser um general ou um presidente, é ser senhor de


mim mesmo, e isso só é possível me desapegando de todas as
coisas que não dependem de mim.

Mesmo que queira ajudar a meu próximo, nada posso fazer


para ajudá-lo, pois nada do que lhe possa dar pertence a mim
ou a ele.

Sabendo o que me pertence e o que pertence ao mundo noto


que jamais poderei dar aos outros alguma coisa que eles já
não possuam.

Visto que depende de mim apenas minha opinião e visto que


minhas atitudes e ações dependem de minha opinião, percebo
que existem ações que dependem de mim e ações que não
dependem de mim.

Depende de mim portanto a decisão de conquistar bens


materiais para mitigar as necessidades das pessoas que amo
e de meu próximo.

Mas o fato dessas ações dependerem de uma decisão minha


não significa que tenha a obrigação de fazê-las, pois não
pertencem nem às pessoas que amo nem ao meu próximo as
ações que me pertencem (que eu posso fazer).

Que procuram as pessoas que amo e meu próximo?

Minhas posses?

Meus esforços?

Ou preferirão eles um amigo modesto, mas sincero?

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 191
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Se me respondem argumentando que só serei um bom pai e


um bom cidadão se produzir riquezas para o engrandecimento
de minha família e de meu país, lhes responderei que o
engrandecimento das famílias e das pátrias se faz
pela soma da integridade de seus membros, e que traz muito
maior proveito à sociedade um só cidadão honrado mesmo
que de posses modestas, que muitos cidadãos cheios de
posse mas corruptos.

Se de alguma forma eu ceder na aplicação destes princípios,


estarei colocando nas mãos dos outros a minha felicidade.

Compreendo que ao utilizar esta filosofia não me permito usar


certos recursos que poderiam me trazer coisas que não me
pertencem e, por agir assim, não serei avaliado pelos demais
em pé de igualdade e portanto não merecerei as honras que
são outorgadas pelo mundo.

Não elogio a ninguém, não cortejo a ninguém, não lambo as


pessoas que estão no poder; assim sendo, não mereço dessas
pessoas a mesma consideração que dedicam aos que agem
dessa maneira.

Não pretendo, pois, conquistar as honras dos que agem dessa


forma.

Afinai, se as honrarias do mundo têm esse preço, serão elas


honradas?

Nunca serei justo se pretender ter as coisas pelas quais não


paguei.

Por quanto se vende um jornal?

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 192
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Se alguém, pagando alguns trocados, recebe um jornal e eu,


nada pagando não recebo jornal algum, não posso considerar
que esse alguém tenha levado alguma vantagem sobre mim.

Da mesma forma que esse alguém tem o jornal, eu terei os


trocados que não gastei.

Da mesma forma, se não recebo honrarias do mundo é porque


não paguei por ela o preço que vale em salamaleques, cortejos
e elogios.

Nada me sobrou em lugar dessa honra?

É claro que sim: a liberdade de não cortejar aqueles a quem


não desejo cortejar e a liberdade de não sofrer a insolência e a
soberba daqueles que outorgam a honraria.

Para que possa manter a coerência para com minha ideologia


é preciso que aprenda a medir os outros da mesma forma que
meço a mim mesmo.

Quando morre o filho de alguém é comum que se diga:

"Essas coisas acontecem."

Mas, quando morre seu próprio filho essa mesma pessoa dirá:

"Ai de mim, aconteceu-me uma desgraça!"

Tenho que ser coerente e evitar agir dessa forma.

Não é possível que eu tenha dois pesos e duas medidas.

Da mesma forma que medir o meu próximo medirei a mim


mesmo.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 193
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Fica fácil distinguir entre as coisas que dependem de mim e as


que não dependem de mim, basta perceber que as coisas que
dependem de mim são todas ações interiores e as que não
dependem de mim são todas ações exteriores.

São ações interiores meus pensamentos, minhas opiniões,


meus desejos, minhas inclinações e minhas aversões.

São ações exteriores meu corpo, meus bens, minha reputação,


as honras e dignidades que recebo do mundo, e todas as
coisas que não são ações interiores.

As ações interiores são livres em sua própria natureza, nada


pode detê-las nem criar obstáculos a elas.

As ações exteriores, por não dependerem de mim são, já por


sua própria natureza, fracas e sujeitas a obstáculos e
inconvenientes que podem impedi-las.

Não tenho o direito de julgar o que ocorre com meu corpo e


com minhas ações exteriores como fatos bons ou maus,
porque não cabe a mim julgar o que ocorre às coisas que não
me pertencem.

Nada do que ocorre ao que me pertence pode ser bom ou


mau.

É simplesmente indiferente.

As pessoas que julgam o que ocorre com as coisas que não


lhes pertencem, vivem aflitas e perturbadas, enfrentam
obstáculos e vivem a se queixar.

Antes de iniciar qualquer ação, examinarei a ação que a


precedeu e a que se seguirá, dessa forma o entusiasmo do
começo não me abandonará quando os obstáculos
aparecerem.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 194
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Quem deseja se tornar um lutador tem que examinar


atentamente as ações que precedem esse objetivo e as ações
que o sucedem e, se ainda assim achar que o objetivo vale o
esforço, lançar-se a ele sem esmorecer.

Quem deseja se tornar um lutador tem que ingerir alimentos


que não lhe agradam, tem que cortar as guloseimas e os
refrigerantes, tem que treinar arduamente, faça frio ou calor,
tem que se sujeitar às exigências de seu técnico, sejam elas
agradáveis ou não.

Quando lutar poderá quebrar as mãos ou as costelas, poderá


beijar a poeira do chão, levará muitas pancadas e nem por isso
terá vitória assegurada.

Se assim mesmo ainda deseja se tornar um lutador, deve


persistir nesse caminho.

Mas se a pessoa tenta esse caminho sem considerar todas


essas coisas, será como um garoto que não sabe o que quer e
nunca chegará a ser nada, porque a nada terá se dedicado
com todo o seu propósito.

As pessoas devem considerar a consistência do assunto a que


pretendem se dedicar e verificar se suas naturezas oferecem
recursos para tanto.

Quem quer ser um lutador tem que considerar a força de seus


braços e de suas pernas, sua agilidade e outras condições
físicas.

Mesmo que você queira se dedicar à busca interior, ao


autodomínio e à espiritualidade, terá que ficar atento e
trabalhar, haverá de vencer certos apetites, abandonar a
companhia de certas pessoas, não mais merecerá a

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 195
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

consideração de uns e certamente ganhará o desprezo de


outros.

Se eu tiver que visitar alguém, previamente considerarei o que


me pode acontecer; talvez essa pessoa não se encontre em
casa, talvez não possa receber-me, talvez bata com a porta em
minha cara, talvez finja não perceber minha presença e, se
mesmo assim tiver o dever de visitá-la, aceitarei o que tiver
que aceitar e não direi:

"Não pensei que isso aconteceria comigo."

Porque só um homem que não busca o autodomínio se queixa


de coisas que não dependem dele.

Todos os meus deveres se prendem à relação de


determinação que se impõe sobre mim.

É meu dever cuidar de meu pai e suportar suas advertências e


reprimendas.

Se alguém disser:

"Mas ele é um mau pai!", responderei: - A natureza por acaso


determina que todos os pais sejam obrigatoriamente bons?

A natureza determina que haja um pai para que possa haver


um filho, mas isso não implica que para que haja um filho o pai
tenha que ser bom.

Tenho que cumprir minha obrigação em relação ao meu pai e


não me cabe a tarefa de julgar as ações dele e sim cumprir
minhas responsabilidades em relação àquele que a natureza
me determinou por pai.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 196
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Mesmo que seja um mau pai, ele não poderá me ferir, pois
serei ferido apenas segundo minha opinião; se eu não quiser,
ninguém me ofenderá.

Dessa forma atendo a minhas obrigações relativas aos


vizinhos, ao meu próximo e a mim mesmo, tratando cada qual
com o respeito que a ele se deve.

Não perco tempo conjeturando sobre o futuro e tentando


adivinhar quais os desígnios que o mundo me reserva nos dias
por vir.

Seja qual for o evento que me suceda, saberei como enfrentá-


lo pois, se não for por uma coisa que dependa de mim, não
será nem bom nem mau.

Procuro, sim, evitar preconceitos, desejos ou aversões, pois


essas coisas me impedirão de chegar à percepção de que
todos os acontecimentos são indiferentes, pois está em meu
poder fazer deles o uso certo, o que ninguém poderá impedir.

Não deixarei a sorte decidir sobre aquilo que é meu dever.

Minha reputação não me pertence, pois depende das opiniões


de outras pessoas.

Ninguém é senhor da própria reputação, e por melhor que seja


um homem, sempre haverá alguém que não o respeita e não o
ama.

O próprio Cristo foi traído por dois de seus apóstolos; um em


cada seis o traiu.

Não devo pretender melhor sorte.

Se alguém me diz que outrem fala mal de mim, dir-lhe-ei:

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 197
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

"A pessoa que fala mal de mim não conhece todos os meus
outros defeitos, senão não teria mencionado somente estes."

Quando alguém me prejudica ou fala mal de mim, procuro me


lembrar que o faz achando que está fazendo o que é certo.

Não devo esperar que as pessoas façam o que me parece


certo e sim que façam o que parece certo a elas.

Se a pessoa que me julga baseia seu julgamento numa má


interpretação a meu respeito, o prejudicado é ela, visto que
está enganando a si mesma.

Se alguém julga erroneamente um fato, não é o fato que se


prejudica e sim a pessoa que a esse respeito engana a si
mesma.

Partindo desse princípio aprendo a suportar a fofoca, que é o


esporte nacional do brasileiro.

Todos os fatos têm dois ângulos, devendo ser manejado


apenas por um desses ângulos.

Se meu irmão age de forma injusta, não manejo a situação


pelo ângulo da injustiça que foi cometida.

Prefiro manejar a situação pelo ângulo que o torna meu irmão


e, lembrando-me que foi criado junto comigo e dos bons
momentos que passamos juntos, saberei suportar a injustiça.

É, preciso que eu aprenda a ver as coisas como elas são,


raciocinando através da noção do que depende de mim e do
que não depende de mim.

Se alguém se lava rapidamente, não devo julgar que se lava


mal e sim que se lava em pouco tempo.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 198
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Se alguém bebe grande quantidade de cerveja, não devo julgar


que age mal e sim que tem a capacidade de beber em grande
quantidade.

Afinal de contas, não dependem de mim as ações das outras


pessoas e também cabem a elas as opiniões que venham a
formar a respeito de suas ações.

Quando procedo dessa forma, baseio-me nos princípios que


conheço plenamente e não nas aparências dos fatos que
presencio.

Quando assumo diante da vida um papel que esteja acima de


minhas forças, não só desempenho indignamente esse papel
como perco a oportunidade de fazer o que posso fazer com
habilidade e mérito.

A proporção dos bens materiais deve ser para cada um como a


medida do sapato em relação ao pé.

Você dificilmente se moveria livremente se seus sapatos


fossem maiores que a necessidade de seus pés.

Quando me contento com pouco, não me excedo, mas se


passo desse ponto, sou arrastado cada vez mais por minhas
ambições até um precipício.

Da mesma forma que os adornos de um sapato podem ser tão


sofisticados que se perca de vista a sua função de proteger o
pé, não há limites para aquilo que excede as medidas.

Quando pediam a Sócrates que indicasse um filósofo, ele, que


era o maior filósofo da Grécia, indicava um outro, sem que por
isso se sentisse diminuído.

Se alguém disser que não sei nada não me perturbarei com


isso, afinal de contas os carneiros não mostram aos pastores

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 199
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

quanto capim comem, mas demonstram o que comeram


através da lã que trazem sobre si.

Não tenho que mostrar teorias às pessoas, prefiro demonstrar,


através de meus atos e realizações, o que estes princípios têm
feito por mim.

Mesmo quando satisfaço às necessidades de meu corpo


apenas através de uma única refeição por dia (O que faço a
maioria das vezes), mantendo uma dieta útil e sadia, não me
vanglorio disso.

Mesmo quando controlo minha vontade de tomar cerveja e


bebo apenas água, não digo aos outros que bebo apenas
água.

Ao invés de adotar um comportamento presunçoso diante dos


pequenos atos de disciplina que imponho a mim mesmo,
procuro me lembrar que os pobres e os miseráveis, diante de
suas aflições são muito mais contidos, pacientes e econômicos
do que eu.

Se me exercito com proveito no cumprimento destas regras, é


para meu proveito e crescimento pessoal e não para mostrar-
me ou vangloriar-me diante dos outros.

Considero as privações que imponho a mim mesmo como


exercícios de autodisciplina e não como alarde diante do
mundo.

A palavra responsabilidade significa a habilidade de dar a


resposta (resposta + habilidade).

Não a resposta no sentido de responder a uma pergunta e sim


a resposta no sentido de reação aos fatos da vida.

A maioria das pessoas acredita que são prejudicadas ou

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 200
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

beneficiadas por causas externas, nunca por si mesmas.

Aquele que procura o caminho da virtude e merece ser


reconhecido como sábio, se caracteriza por esperar todo o
benefício e todo o prejuízo
de si mesmo.

Não cabe a mim censurar ninguém, louvar ninguém, acusar


ninguém, culpar ninguém e nem considerar-me como melhor
que os outros, pensando que sei alguma coisa ou que sou
alguma coisa.

Quando alguma circunstância me impede ou me reprime,


procuro em mim mesmo as razões.

Se alguém me elogia, sei rir de mim mesmo por dentro e se


sou censurado, não me defendo.

Todos meus desejos se voltam para as coisas que dependem


de mim e tenho aversão apenas às coisas que não dependem
de mim.

Minhas emoções se demonstram livremente e não me importo


se me julguem tolo ou ignorante.

Acima de tudo vigio a mim mesmo como a um inimigo, pois o


maior mal que me sobrevém é aquele que é capaz de surgir de
mim mesmo.

Sei que o maior lutador é aquele que vence a si mesmo.

Você só se torna senhor de si quando reconhece, através de


suas ações, que as coisas que não dependem de você são
indiferentes.

Ao fazer isso você se torna livre; ninguém poderá forçá-lo a


fazer o que não quer ou impedi-lo de fazer o que quer.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 201
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Não terá, pois, motivos para se queixar de ninguém.

Procure se lembrar que o oprimido que se queixa, tem a


intenção de se tomar opressor.

A prisão, a pobreza e todas as coisas exteriores, só


conseguem diminuir a liberdade de seu corpo e de suas ações,
não impedem portanto a sua vontade se você não adotar a
loucura de pretender aquilo que não depende de você.

Os tiranos só têm poder sobre aquilo que lhe é supérfluo.

Se esta Filosofia lhe parecer satisfatória, aceite estas regras


para si mesmo como modo de conduta e disciplina de vida,
respeite-as como se fossem leis e não consinta em transgredi-
las.

Não se preocupe com o que dirão a seu respeito; afinal de


contas, o que dizem faz parte das coisas que não dependem
de você.

Por quanto tempo ainda vai deixar para depois a aceitação da


tarefa de cumprir estas regras e viver de acordo com a razão?

Já conhece estes princípios, o que quer mais?

Que outro mestre está esperando para responsabilizá-lo pela


demora em trilhar o caminho do auto-aperfeiçoamento?

Pare de adiar sua decisão a respeito destes princípios, pare de


jogar para o futuro o início de seus esforços ou acabará por
viver e morrer como um homem ignorante.

Faça com que aquilo que sua razão aponta como sendo o
melhor seja para si uma lei inviolável.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 202
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Seja o que for que se apresente em seu caminho, lembre-se


que agora é a hora da luta e que não pode adiar mais o
combate contra si mesmo.

Mesmo que seja derrotado num desses combates, só será um


perdedor ou um vencedor dependendo do que aprendeu dessa
derrota para usar em suas lutas futuras.

Esta é a batalha de sua vida, melhorar-se em cada combate,


não cedendo a nada senão à razão.

Mesmo não sendo ainda senhor de si mesmo, procure viver


como alguém que almeja tornar-se senhor de si mesmo.

Os homens poderão lhe matar, é verdade, mas jamais poderão


lhe ferir.

Agora você não tem nada mais a temer, pois aprendeu uma
FILOSOFIA PESSOAL e sabe que a única coisa que lhe
pertence é a sua vontade que forma sua opinião e atitudes
diante do mundo.

Aprenda a caminhar para onde é o seu lugar e chegue lá com


alegria, porque se você não aprender a fazer isso o destino o
levará lá do mesmo jeito, mas lá você chegará como culpado e
mesmo que não o queira.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 203
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

A Fraternidade Kung Fu
A Fraternidade Kung Fu é uma instituição a serviço dos
praticantes e simpatizantes da arte marcial Kung Fu, cujos
objetivos, em seguida relacionados, visam o desenvolvimento
integral do ser humano.

Nossos associados formam uma sociedade fraternal composta


pela associação de pessoas interessadas no estudo e
preservação dos conhecimentos filosóficos e marciais do Kung
Fu.

Muito mais que uma arte marcial, um esporte ou uma técnica


de defesa pessoal, o Kung Fu é uma maneira de viver e se
fundamenta em métodos e técnicas capazes de influir
positivamente na vida de seus praticantes, enriquecendo-lhes
a existência e contribuindo para o sucesso em todos os
campos do conhecimento humano.

As Vantagens de Sua Filiação


Filiando-se à Fraternidade Kung Fu você tem a oportunidade
de reorganizar a sua vida através de métodos e técnicas
especiais que lhe proporcionarão os elementos necessários
para conseguir o máximo de satisfação e realização pessoal
em todas as áreas de sua existência.

Você receberá uma orientação pessoal que lhe permitirá


transformar todos os setores de sua vida em experiências de
sucesso.

Independente dos estudos que tenha feito e, até mesmo se


não teve oportunidade de estudar, desde que saiba ler, você
está em condições de obter todas as vantagens e privilégios de
sua filiação individual e exclusiva.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 204
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Filiando-se à Fraternidade Kung Fu você recebe apostilas (em


formato e-book que você pode escolher imprimir e encadernar
ou não, segundo sua vontade) que lhe transmitirão de forma
gradual e sistemática, preciosos conhecimentos das técnicas
físicas e mentais do Kung Fu.

Objetivos

1 - O ensino de técnicas marciais do Kung Fu, seu estudo


através de cursos especialmente preparados (cursos livres na
modalidade ensino à distância), de aulas ao vivo e de revisões
para aperfeiçoamento sistemático sob a tutela de professores
credenciados por mim Marco Natali (que sou o criador e o
mentor desta Fraternidade).

2 - A preservação dos conhecimentos ancestrais do Kung Fu,


transmitidos de mestres a discípulos através de inúmeras
gerações.

3 - O auto-aprimoramento moral do praticante de Kung Fu e


das pessoas que, mesmo não sendo praticantes, interessam-
se pelo aperfeiçoamento de si mesmas.

4 - O autoconhecimento, mediante o estudo e a aplicação de


técnicas psicológicas que permitem uma maior integração da
personalidade e consequente melhoria das relações
interpessoais.

5 - A edificação de uma vida melhor, através da prática de


métodos originais centralizados no desenvolvimento dos
potenciais individuais existentes em todo ser humano.

6 - O estudo das leis universais, aplicando esses


conhecimentos no desenvolvimento dos diversos setores da
existência.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 205
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Os estudos da Fraternidade Kung Fu são subdivididos em


graus progressivos.

O primeiro nível de ensinamentos compreende o grau de


postulante.

É o primeiro grau de Estudos Básicos.

Este primeiro nível se desenvolve através de oitenta apostilas


enviadas em vinte remessas que incluem, entre outros, os
seguintes assuntos:

Como obter flexibilidade através dos exercícios especiais do


Kung Fu - Como construir seu próprio Moodjong - O primeiro
movimento do estilo Wing Chun completo, incluindo aplicações
-As 108 técnicas do Moodjong - O primeiro movimento
completo do estilo Ch'An Tao Chuan - Como usar a Espada
Shaolin num Tchia Dsu completo com mais de 100
movimentos - Como fazer você mesmo seu próprio Nunchaku -
Os nomes chineses dos movimentos do Estilo Wing Chun - Os
principais movimentos do Nunchaku - Como criar uma
Associação de Kung Fu em sua própria cidade, etc. A história
do Kung Fu - O templo Shaolin – Como usar o seu tempo para
realizar coisas que deseja -Ensinamentos transcendentais do
Budismo - Técnicas de Disciplina e Meditação do Kung Fu
antigo Segredos de Auto-Aperfeiçoamento e desenvolvimento
pessoal - Como planejar e modificar seus objetivos de vida - A
Espiritualidade Kung Fu Como Meditar - Como estabelecer
metas - Lendas e Apólogos dos antigos Mestres de Kung Fu -
A evolução pessoal através do método de Autoverificação - As
técnicas de Meditação favoritas dos chineses e tibetanos - As
normas budistas dos antigos templos do Kung Fu - A
Sabedoria Milenar e sua aplicação na vida diária - O Dharma,
etc.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 206
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Após concluir este nível, nossos filiados recebem informações


a respeito dos outros níveis.

Para obter maiores informações, você pode entrar em contato


por e-mail e solicitá-las:

fraternidadekungfu@perfeitaoportunidade.com.br

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 207
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Em busca do Sangha em Sorocaba:


Busca do Budismo em Sorocaba
Senti falta do Sangha (comunidade em sânscrito) e resolvi
procurar alguma comunidade budista aqui em Sorocaba, fui ao
irmão Google e digitei Budismo em Sorocaba:
Deparei-me com três citações iniciais as demais citações
eram cópias dessas três ou citavam templos em outras
cidades.
 Meditação e Budismo em Sorocaba - Budismo Kadampa

budismokadampa.org.br/project/budismo-em-sorocaba/

Nessa semana começam novos horários de aulas de meditação em Sorocaba! Oportunidades para
descobrirmos o verdadeiro sentido de nossa vida humana, ...

 Budismo: a crença na lei de causa e efeito - RELIGIÕES ...

www.cruzeirodosul.inf.br/materia/430040/undefined

28/10/2012 - CADERNO DE DOMINGO - RELIGIÕES ORIENTAIS EM SOROCABA - Budismo: a crença na


lei de causa e efeito - A religião tem origem na ...

 SANTUARIO BUDISTA - Jardim Leocádia - Sorocaba - SP

www.guiamais.com.br/.../santuario+budista-igrejas+templos+e+instituico...

Veja o telefone e saiba como chegar em SANTUARIO BUDISTA especializado em Igrejas, Templos e
Instituições Religiosas localizado no endereço R ...

A primeira citação anunciava uma palestra e um retiro


espiritual cujo tema era "Viver significativamente, morrer com
alegria".
Considerando que "alegria" é um atributo da mente, ao
contrário da "felicidade" que é um atributo do Ser, nesse
primeiro instante pulei essa opção e fui para a próxima, pois
morrer com alegria ou com tristeza dá no mesmo, pois ambas
são faces opostas de uma mesma moeda e remetem à mente
e não à transcendência.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 208
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

A mente é sinônima do pequeno eu (ou ego se preferir) e


o Budismo visa transcendê-la em busca da iluminação.
A próxima trazia um artigo sobre Budismo com o subtítulo
CADERNO DE DOMINGO – RELIGIÕES ORIENTAIS EM
SOROCABA e citava apenas o Budismo Nitiren.
Como tive dois contatos insatisfatórios com essa
comunidade resolvi pular essa opção.

Contatos com o Budismo Nitiren:

Esclarecendo os contatos insatisfatórios:

PRIMEIRO: Um aluno de um aluno meu, foi muito gentil e


entrou em contato comigo pelo Facebook e me convidou a
levar-me a conhecer um mestre budista aqui em Sorocaba.
Compareci ao encontro e descobri que se tratava da seita
Nitiren.
Fui apresentado ao "mestre budista" e era um senhor
japonês que me informou que era o dirigente da organização
em várias cidades, listou todas elas e os cargos importantes
que exercia.
Eu lhe informei que pertencia à Ordem Budista Niskama
Karma e ele me perguntou se conhecia o Buda Nitiren
Daishonin e eu lhe disse que tinha assistido a um filme japonês
sobre a vida dele.
Ele me perguntou se já havia lido a obra A REVOLUÇÃO
HUMANA de Daisaku Ikeda.
Eu lhe disse que tinha lido apenas os primeiros cinco
volumes.
Ele me informou que já haviam sido publicados catorze
volumes.
Eu lhe disse que estava interessado em completar minha
coleção e queria comprar os demais volumes, perguntei se
tinham a venda ali.
Ele me disse que estava continuamente em São Paulo e
que encomendaria e que quando chegassem ligaria para mim.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 209
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Dei-lhe meu cartão e nunca mais soube dele, já fazem


uns dois ou três anos, nunca me ligou para falar sobre os
livros, nunca me procurou.

SEGUNDO: Depois desse primeiro contato com a seita


Nitiren compareci a um casamento budista em São Paulo,
realizado por sacerdotes dessa seita.
Depois da entoação de muitos mantras o monge disse no
microfone que ele era representante do Budismo Nitiren o
Budismo criado pelo ÚNICO BUDA VERDADEIRO.
Posso estar errado e se estou me desculpe, mas isso me
pareceu uma tentativa de desrespeito ao Buda Gautama
criador do Budismo, e uma ofensa ao criador da seita dele o
monge Nitiren Daishonin a quem admiro e respeito muito e que
era, ele mesmo, seguidor do Buda Gautama.
Eu disse tentativa porque sentir-se ofendido ou não é um
assunto da mente e não do Ser.
Ninguém consegue ofender a ninguém que não queria se
sentir ofendido, apenas a mente decide se quer se sentir
ofendida ou não.

Ou seja eu não julguei a essas duas pessoas que citei,


apenas descrevi as atitudes que presenciei, eles julgaram-se a
si mesmos ao adotarem esses comportamentos.

Para mim foram apenas contatos insatisfatórios.

Continuando em Busca do Sangha em Sorocaba:

A terceira opção oferecida pelo Google era ainda pior,


com o título de Santuário Budista – considerando que não há
santos no Budismo.
Mesmo assim liguei para eles e atendeu uma senhora,
confirmou que era do tal "Santuário" e perguntou o que eu
desejava.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 210
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Mencionei que buscava uma prática ou convivência em


grupo e ela me disse que lá não havia isso, só davam
"passes".
Nunca ouvi falar sobre "passes" no Budismo, resolvi
descartar essa hipótese.

A experiência do Sangha tibetano:

Retornei então à primeira opção, anotei o horário e o


endereço e compareci alguns minutos antes do início para me
inscrever.
Fui recebido por moças e senhoras muito solícitas que
responderam minhas poucas perguntas paguei o que me
cobraram e também comprei um livro cujo subtítulo dizia
abordar as Quatro Nobres Verdades, um assunto que sempre
me cativou por se tratar do primeiro grupo de ensinamentos do
Buda.
Fui conduzido juntamente com outras pessoas que
chegaram a uma sala agradável e a uma prática de meditação
tendo por foco a respiração.
A palestra inicial ministrada por uma mocinha muito
divertida (ria sempre) que declarou sua idade (29 anos), mas
não se deu a conhecer (até este momento em que escrevo
esse relato ainda não sei o nome dela) começou de maneira
interessante.
Ela disse que nunca sabemos até chegar o momento da
morte qual será a segunda causa da morte, mas que a primeira
causa é o nascimento.
E isso é uma grande verdade que nossa mente prefere
não cogitar.
E por que é verdade?
Porque para que seja possível morrer é preciso primeiro
ter nascido, não é possível morrer sem nascer.
Fiquei feliz com esse novo ângulo de uma velha verdade.
Em seguida ela disse que acabava de chegar de um
curso sobre o tema da palestra (entendi que se tratava de um

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 211
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

curso a que ela tinha comparecido e que a conferencista falava


inglês, não sei se entendi direito).

Não foi meu primeiro contato, mas foi pitoresco:

Não posso dizer a bem da verdade (Satya) que foi meu


primeiro contato com o Budismo tibetano, pois já li alguns livros
de autores de algumas dessas escolas, mas o que ouvi a
seguir achei bastante pitoresco.
Nossa professora parecia maravilhada com a
possibilidade de se cultivar a alegria diante da morte.
Considerando a Impermanência um dos princípios mais
marcantes do Budismo é de se pressupor que tanto a vida
quanto a morte sejam ciclos efêmeros por que passa o ser.
Se tudo é impermanente é óbvio que a vida um dia
cessará e da mesma forma se tudo é impermanente a morte
também um dia terá um fim.
O conceito da impermanência faz surgir também o
conceito da reencarnação e da vida após a morte.
Mas esses dois conceitos embora presentes no Budismo
não são tão relevantes se levarmos em conta que o Buda se
dedicou aos assuntos desta vida e não da próxima.
Mas algumas das pessoas presentes pareceram muito
interessadas nisso e fizeram algumas perguntas a respeito.
Percebi então que aquela escola de Budismo era
salvacionista, pois mencionava uma espécie de céu que
alcunhava de Terra Pura.
A palavra "pura" em sânscrito significa "terra".
Para citar um exemplo, a Índia tem o nome de
"Hastinapura" em sânscrito, onde "Hastina" quer dizer
"elefante" e "pura" quer dizer "terra", portanto "Hastinapura"
significa "Terra do elefante".
Chamar algum lugar de Terra Pura é o mesmo que
chamar esse lugar de Pura Pura ou Terra Terra, bem
pitoresco.

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 212
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

Conceitos sobre Mahayana e Hinayana

Isso nos remete aos conceitos pejorativos que separam


as escolas budistas denominando as que adotam conceitos
posteriores ao Buda de Mahayana e as que seguem os
preceitos ensinados por Buda de Hinayana.
Como mencionei em resposta publicada em nossa
Comunidade no Facebook, perguntar sobre o Mahayana e o
Hinayana é perfeitamente válido, coerente e aceitável.
O que não é aceitável é a utilização desses termos, pois
são pejorativos e sectários.
E por que são pejorativos e sectários?
Porque foram criados unilateralmente sem a participação
de todos os envolvidos.
Isso fere o conceito de compaixão que nos foi ensinado
por Gautama.
Esses termos não foram criados em um consenso entre
as escolas que "representariam" cada uma dessas facções.
Esse termo foi criado pela facção que se auto intitulou
Mahayana no século dois da Era Cristã, e lançou sobre todas
as demais escolas o epiteto pejorativo de Hinayana, sem que
essas tenham participado da criação desses termos.
Os termos Mahayana e Hinayana foram originalmente
mencionados nos Sutras Prajnaparamita e aparentemente a
intenção da criação desses termos foi demonstrar ao mundo
que as escolas Mahayana tinham ampliado os ensinamentos
do Buda e que as demais escolas existentes, por não o terem
feito eram menores que elas.
Tratando-se de um assunto filosófico, é discutível essa
afirmação e o pressuposto lógico é ofensivo ao próprio
conceito do Budismo.
Note que não fere os ensinamentos do Buda a
possibilidade de uma ampliação da conceituação original visto
que um dos princípios mais básicos do Budismo é a Lei da
Impermanência.
Ora sendo essa uma Lei Absoluta, nada é permanente e é

O que você sabe não tem valor algum o valor está no que faz com o que sabe. Página 213
[BUDISMO FILOSOFIA DOS PRATICANTES DE ARTES MARCIAIS] Coach Marco Natali

de se esperar que tudo passe por transformações, inclusive os


ensinamentos do próprio Buda.
No entanto, por uma questão de respeito e até mesmo de
consideração pelos conceitos originais ensinados pelo Buda,
não podemos julgar e condenar as escolas que insistem em
preservar os conceitos originais como principal linha de
ensinamento.
Chamar essas escolas de Caminho Vil ou Caminho
Mesquinho (que seria a tradução de Hinayana, visto que
"Yana" significa "caminho") é pejorativo e inadequado.
Defendo esse ponto de vista porque o Budismo Niskama
Karma é da Escola Hinayana?
Não.
No Budismo Niskama Karma adotamos o caminho do
meio como recomendava Buda, portanto não podemos ser
totalmente Hinayana nem totalmente Mahayana, nossa escola
é Madhyamika, ou seja segue o "caminho do meio".
E o que isso significa?
Significa que em primeiro lugar não aceitemos nenhum
desses termos por considera-los pejorativos e em segundo
lugar buscamos a verdade.
Por buscarmos a verdade os ensinamentos mais
importantes para nós são aqueles que foram transmitidos pelo
próprio Buda, mas não estamos fechados a novos
conhecimentos surgidos após a época do Buda, pois o
conhecimento evolui, nada é imutável, tudo é impermanente.
Mas preferimos tomar decisões a esse respeito de uma
forma mais adulta, sem julgar, condenar, ou discriminar
quaisquer que sejam as escolas, mesmo admitindo que muitas
delas adotem esses termos.
Acho lúcido não aceitar ensinamentos que contrariem
aqueles transmitidos pelo Buda, mas não é útil o destrato de
nenhuma escola, pois ninguém está obrigado a frequentá-las,
quem quer que o faça o faz por escolha própria.
Afinal de contas depois de Buda surgiram muitos outros
mestres que se destacaram por seus ensinamentos e
conduziram muitos à verdade e à iluminação e independente

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de quais escolas eles pertenciam, merecem todo o nosso


respeito.
Devido aos avanços e "ampliações" dos conceitos
budistas originais hoje existem escolas budistas salvacionistas
e até algumas que endeusam o Buda.
No Budismo Niskama Karma preferimos uma postura
mais conservadora e consideramos algumas inovações (não
todas) um desvirtuamento aos ensinamentos originais do Buda
e não concordamos com essas escolas embora
compreendamos que é parte da natureza humana esse tipo de
percepção.
As denominações Mahayana e Hinayana são
inadequadas porque SE esses termos foram criados para
separar as escolas que defendiam os ensinamentos originais
das que ensinam conhecimentos modernizados isso já de
início não é correto.
E por que não é correto?
Porque Buda nada deixou escrito e os mais antigos sutras
foram escritos muito depois de sua morte, portanto podemos
mencionar a tentativa de se preservar os conceitos originais,
mas não podemos afirmar, a bem da verdade, que esses
conceitos tenham sido realmente preservados dada à
possibilidade de que tenham sofrido distorções com o passar
do tempo antes de terem sido transcritos.
Considere também que Buda era um príncipe, portanto
um homem letrado que poderia ter deixado escrito tudo que
quisesse, mas não o fez.
Por que não?
A priori podemos conjeturar que não deixou nada escrito
porque sabia (não apenas acreditava) que tudo é
impermanente.
Note que duas das maiores expressões de sabedoria que
existiram na humanidade: Sócrates e Jesus também nada
deixaram escrito.
Das dezoito escolas budistas classificadas como
Hinayana na época em que esses termos foram criados
acreditava-se que apenas uma subsistia até os dias de hoje –

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a escola Theravada - mas segundo esclarecimento do


Dhammacariya Dhanapala (*) do Budismo Nalanda, isso
também não é verdade pois o Theravada como conhecido hoje
se desenvolveu no Sri Lanka bem distante do local onde essa
disputa espúria ocorreu.
Segundo esse mesmo autor a intenção dessa
classificação era má pois a palavra "Hina" significa "vil" e
"mesquinho" (Embora posteriormente os praticantes das
escolas Mahayana tentassem minimizar esse erro dando novo
significado à palavra "Hina" como significando apenas
"menor").
Entre os muitos problemas gerados por essa classificação
um deles é que ela é inadequada também porque muito depois
do segundo século surgiram outras escolas budistas que
tinham por objetivo preservar os ensinamentos originais.
Ora, se as escolas que preservavam os ensinamentos
originais eram denominadas Hinayana, como ficam então
essas escolas que surgiram posteriormente (e portanto são
escolas "modernas")?
Tornou-se inadequado utilizar o termo Mahayana como
"Budismo Moderno" considerando-se o surgimento dessas
novas escolas.
Em termos de origem é preciso considerar também que
muitas das escolas chinesas consideradas Mahayana seguem
o Dharmagupta (O Dharma Secreto, pois "gupta" em sânscrito
significa "secreto") e a escola Dharmagupta era uma escola
considerada Hinayana.
Alguns autores numa tentativa inútil de preservar esses
termos passaram a utilizá-los como referência ao Budismo
Meridional e Budismo Setentrional.
Mas tais denominações também não procedem, pois
embora tenham existido muitas comunidades budistas ditas
"Mahayana" na Indonésia, não conseguiram sobreviver por lá.
Outra tentativa inútil foi tentar alcunhar os praticantes de
escolas Mahayana de "Bodhisatvayana", pois trilhavam o
caminho dos Bodhisatvas e alcunhar os praticantes das
escolas Hinayana de Shravakayana por acreditar que

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buscassem o ensinamento do Buda apenas para a auto


iluminação.
Isso não tem fundamento, pois se o Buda após sua
própria iluminação se dedicou a transmitir seus ensinamentos
ao mundo ele não pode ser apenas considerado como Buda,
pois ele foi por seus ensinamentos um grande Bodhisatva.
+++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++

(*) Palavras do Dhammacariya Dhanapala: Ao contrario do que muitos


pensam, o Mahayana não é uma escola, da forma como theravada,
sarvastivada, mahasanghika, etc, o eram, mas sim um movimento
filosófico com características específicas que as escolas que surgiram
posteriormente (como o zen, terra pura, etc.) adotaram com maior ou
menor grau e quantidade. Em minha opinião há três características
fundamentais do Mahayana enquanto movimento: a predominância dos
ensinamentos dos mestres em relação ao ensinamento direto do Buda,
a exclusividade do ideal do Bodhisatva e o uso de escrituras claramente
posteriores (pós-canônicas).
Como se vê esses termos carecem de consistência e não
designam absolutamente nada exceto certa presunção espúria
que não cabe a quem pratica o Budismo.

Continuação da palestra sobre a morte:

Aparentemente incentivando pessoas que lhe


perguntaram sobre a vida após a morte a palestrante citou um
caso acontecido com um monge de sua tradição:
Esse monge estava muito entusiasmado com a
proximidade de sua morte e "alegre" afirmava que naquele dia
mesmo chegaria à Terra Pura.
Se fosse um asceta de nossa escola consideraríamos
isso pitoresco.

Por quê?

Porque no Niskama Karma se considerássemos o


Budismo como uma montanha, ao sopé da montanha estariam
as Quatro Nobres Verdades por terem sido o primeiro
ensinamento do Buda – portanto a base da montanha.

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O corpo da montanha seria a Senda Reta dos Oito


Caminhos e consequentemente a Meditação e o Dharma e no
cume da montanha estaria o conceito do Anatman, que
significaria a transcendência da dualidade.
A morte do corpo é denominada no Budismo de
Mahanirvana, ou Mahasamadhi justamente porque a mente é
transcendida e se alcança o Anatman com o consequente
desaparecimento da individualidade.
Consideraríamos pitoresco (para dizer o mínimo) se um
asceta de nossa escola ficasse "alegre" por alcançar um céu
(Terra Pura) após a morte, pois a pretensão de tal coisa seria
justamente a negação do Anatman e a continuação do eu
pequeno, o que significaria um desperdício total da vida em
busca de uma ilusão.

Continuo feliz.

Uma hora e meia depois de iniciada a palestra a


conferencista deu por encerrada a sessão e retirou-se para a
recepção.
Saímos todos da sala e coloquei meus sapatos.
Tirando os fatos pitorescos da palestra eu continuava feliz
pois continuava comigo tudo que me pertencia (Compreensão
Correta) ou seja, meus pensamentos, minha vontade e o que
eu pudesse fazer através de meu pensamento e minha
vontade.
Sendo essas as condições para ser feliz eu realmente
estava feliz e ainda havia sido acrescido da consideração
sobre a primeira causa da morte ser o nascimento.
O conceito não era novo, mas havia sido dito de uma
maneira nova e isso muito me agradou.
Gosto de novas considerações a respeito de antigas
verdades isso me ajuda a compreender as coisas e a ensinar
melhor quando as transmito.

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A pergunta na hora da despedida

Tentei abrir a porta, mas estava trancada.


A palestrante abriu a porta para mim e me perguntou se
gostei.
Isso me surpreendeu, pois é uma pergunta à mente e não
ao ser, em se tratando do Budismo era uma pergunta peculiar.
O gostar ou não gostar é um assunto da mente e exige
uma avaliação da mente, quando a mente cessa não há mais o
gostar ou não gostar.
Para mim isso é o Mahasamadhi ou a morte, com a
benção da realização do Anatman e a conquista da cessação
da dualidade que era o assunto da palestra.
Com certeza eu havia gostado, pois continuava comigo
tudo que já era meu ao chegar (condição única para a
felicidade) e ainda havia aprendido uma nova maneira de me
referir a uma verdade antiga. Retornei ao mundo da mente
rapidinho e disse a ela que havia gostado, mais uma vez ela
demonstrou alegria.

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VAJRAMUSHTI
A seguir se pode ver a capa da primeira edição e a capa que
foi adotada para as edições posteriores deste livro que se
encontra esgotado.
Como se pode ver meu nome está escrito errado em todas as
edições.

A seguir você dispõe de uma recuperação através de imagens


que me foi gentilmente oferecida pelo Daniel Alencar a quem
agradeço publicamente e cujo nome incluo aqui nesta segunda
edição deste livro lançada em 03 de Maio de 2016.
Este livro foi publicado originalmente em 1987, portanto há
quase 30 anos.
Por enquanto fica aqui meu muito obrigado por recuperar essa
obra que está extinta há muitos anos.

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