Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Coimbra 2014
ii
Aos meus pais, Vasco e Elisabete,
Aos meus verdadeiros amigos
ao Miguel,
DEDICO
iii
iv
Agradecimentos
À minha orientadora, a Doutora Cidália Maria da Mota Lopes, sincero agradecimento
pela disponibilidade, apoio, paciência e por todas as críticas e sugestões efectuadas no
decorrer da realização desta dissertação, que se demonstraram cruciais para a concretização
deste estudo.
A toda a minha família, principalmente aos meus pais,Vasco e Elisabete, por todo o
amor, incentivo, confiança e apoio incondicional que se revelaram a base da minha motivação
e tiveram um impacto decisivo na minha evolução ao longo deste percurso académico.
Ao Miguel pela companhia nas intermináveis horas de trabalho, pela paciência, força e
conforto que foram essenciais na realização desta dissertação e, sem dúvida, tornaram este
percurso muito mais fácil.
Aos meus amigos que desde sempre estiveram presentes quando mais precisei e me
proporcionaram momentos inesquecíveis.
Um enorme obrigada!
v
vi
Resumo
Por via de maior mobilidade existente a fiscalidade tem vindo a desempenhar um papel
cada vez mais relevante no processo de captação de investimento externo. Por sua vez este
assume-se como um fator crítico para o desenvolvimento das economias, bem como para a sua
competitividade em termos nacionais e internacionais. Com efeito tem-se acentuado a
importância da concorrência fiscal entre Estados.
Na atual conjuntura insta aumentar essa concorrência em Portugal principalmente a
nível de atração de investimento externo, sendo que o CINM representa o único instrumento
utilizado para este fim.
Neste sentido, a presente dissertação tem como intuito expor e analisar de forma crítica
o regime fiscal do CINM, mais precisamente o impato das sucessivas alterações ao benefícios
fiscais do Centro sobre o desenvolvimento económico e regional da ilha, bem como sobre a
capacidade do CINM fazer face ao seu propósito de captar investimento externo e criar
emprego.
Assim que, primeiro faz-se uma análise ao contributo do CINM para a região e qual o
impato das alterações aos benefícios fiscais numa perspetiva macroeconómica, mais
precisamente sobre o CINM e sobre as receitas fiscais para a ilha. Numa segunda parte tenta-
se aferir acerca do impato das mudanças ocorridas sobre o investimento no caso particular das
empresas da Zona Franca Industrial. Para este efeito, optou-se por uma metodologia
qualitativa na qual se insere uma entrevista como objectivo de recolha de dados das empresas
em questão.
No que diz respeito aos resultados do estudo, podemos concluir que, não obstante o
fator fiscal não ser um fator decisivo para o licenciamento das empresas na região, é,
indiscutivelmente considerado pelas empresas como um fator importante e muito importante,
para a sua atividade.
vii
viii
Abstract
Due to the growing mobility, taxation has been playing an increasingly important role
in the process of attracting foreign investment. This is perceived as a critical factor for the
development of economies, as well as their competitiveness in national and international
terms. This has emphasized the importance of tax competition between states.
At the present juncture it urges to increase competition in Portugal mainly at the level
of attraction of foreign investment and the CINM is the main tool used for this purpose.
In this sense, this thesis has the intention to expose and critically analyze the tax
regime of the CINM, more precisely the impact of successive changes to the tax benefits of
the center on economic and regional development of the island, as well as on the capacity of
the CINM to face its own purpose of raising foreign investment and to create jobs.
Initially we make an analysis of the contribution to the CINM for the region and the
impact of changes to tax benefits from a macroeconomic perspective, more precisely on the
CINM and on tax revenues for the island. The second part is an attempt to assess the impact
on these changes on investment of companies in the Zona Franca Industrial. For this purpose,
we chose a qualitative methodology in which an interview was conducted with the purpose to
collect data from the companies concerned.
The results have demonstrated that, despite the fact that the fiscal factor is not a
decisive factor when it comes to licensing of company in the Island, it is,without any doubt of
major importance and it’s considered by the companies as a relevant factor for its activity.
ix
x
Lista de siglas
xi
RUP´s – Regiões Ultraperiféricas
SDM – Sociedade de Desenvolvimento da Madeira
SF – Sistema Fiscal
SGPS – Sociedades Gestoras de Participações Sociais
SI – Serviços Internacionais
TFUE – Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia
TJCE – Tribunal de Justiça da Comissão Europeia
EU – União Europeia
VAB – Valor Acrescentado Bruto
ZEC – Zona Especial Canaria
ZFI – Zona Franca Industrial
ZFM – Zona Franca da Madeira
xii
Lista de Quadros
natureza fiscal…………………………………………………………………………….. 25
xiii
Lista de Gráficos
no período 1998-2003………………………………………………………………….. 62
xiv
xv
Indíce
Introdução Geral…………………………………………………………………….. 1
18
Capítulo 2 - Formas de regulação da Concorrência Fiscal………………………
1 O Combate à Concorrência Fiscal Internacional……………………………… 18
1.1 A Posição da União Europeia ……………………………………………… 20
1.1.1 O Código de Conduta …………………………………………………… 20
1.1.1.1 Natureza Jurídica e Âmbito de aplicação…………………………... 20
1.1.1.2 Critérios para a qualificação das medidas fiscais prejudiciais……...22
1.1.1.3 Congelamento e desmantelamento das medidas fiscais
prejudiciais………………………………………………………………….. 22
1.2 A Posição da OCDE ………………………………………………………... 23
1.2.1 Natureza e âmbito de aplicação …………………………….................. 24
1.2.2 Recomendações ……………………………………………………….. 24
1.2.3 Critérios de Identificação………………………………………………. 28
xvi
1.2.4 O Forúm……………………………………………………………….. 30
2. Análise comparativa entre as posições do Código de Conduta
da União Europeia e as recomendações da OCDE…………………………….. 30
xvii
Capítulo 1 – Metodologia de Investigação ……………………………………….. 69
1 Metodologia da investigação: considerações prévias………………………….69
1.1 A técnica de recolha de informação: entrevista……………………………...71
1.2 Objetivos gerais do estudo………………………………………………….. 72
1.3 Questões de investigação e apresentação da entrevista……………………. 73
1.4 Caraterização da população-alvo e participantes do estudo: a amostra………73
Capítulo 2 - Apresentação e discussão dos resultados…………………………… 76
2.1 Motivos para licenciamento na Zona Franca Industrial (ZFI)……………… 76
2.2 Importância atribuída por partes das empresas aos benefícios
fiscais concedidos……………………………………………………………… 78
2.3 A imposição da criação de postos de trabalho através de plafonds máximos
à matéria coletável e final da isenção dos dividendos: o impacto destas alterações
nos resultados e capacidade de investimento da empresa…………………………… 79
2.4 O regime fiscal do CINM: a perceção das empresas sediadas na ZFI……… 80
Capítulo 3 – Considerações finais…………………………………………………. 86
3.1. Conclusão …………………………………………………………….……. 86
3.2 Limitações ao Estudo ………………………………………………………. 88
3.3 Referências Bibliográficas …………………………………………………. 89
xviii
xix
Introdução Geral
1
A atual mundialização da economia e a concorrência fiscal que dela deriva não
podem deixar de suscitar a reflexão sobre as consequências em termos de política fiscal,
importando analisar os seus possíveis efeitos sobre as receitas fiscais para o Estado, a
repartição da carga fiscal, bem como sobre o investimento e a empregabilidade (Pereira,2008).
Na economia portuguesa um instrumento fiscal característico de um particular efeito
da globalização, que é passível de exemplificar os efeitos de competitividade, é o Centro
Internacional de Negócios da Madeira (CINM). Este representa um regime de baixa tributação
concedido através de um auxílio de Estado – medida destinada a isentar, total ou parcialmente
as empresas de um determinado sector, sob uma carga fiscal, com o intuito de atrair
investimento externo de forma a diversificar e desenvolver a pequena e unisetorial economia
da região ultraperiférica da Madeira. Note-se que para este propósito o Centro necessita de
uma elevada capacidade concorrencial, isto é, capacidade competitiva do sistema fiscal que o
abrange.
O Centro usufrui de um regime de incentivos fiscais controlados e aprovados pela
Comissão Europeia. Contudo, ao longo dos últimos anos, tem sofrido várias alterações ao seu
regime em termos de tipos de atividades aprovadas e benefícios fiscais concedidos.
Neste sentido, a presente dissertação tem como objetivo expor e analisar de forma
crítica, os regimes fiscais do CINM. Para o efeito, elabora-se uma análise simples, mas sem
descurar o rigor do regime fiscal da Madeira, onde irá tentar-se aferir acerca do impacto das
alterações sucessivas dos regimes fiscais no desenvolvimento económico e regional da ilha,
bem como na capacidade do CINM, em específico, o caso particular da Zona Franca Industrial
para captar investimento e emprego.
Como tal surgem as seguintes questões de investigação:
A que nível a concorrência fiscal pode ser considerada benéfica e um instrumento
para o desenvolvimento económico?
O que se entende por concorrência fiscal prejudicial, critérios de qualificação e quais
as medidas de combate?
O CINM representa um instrumento de competitividade fiscal e desenvolvimento
económico compatível com as normas do direito comunitário e concorrência fiscal legal?
2
Qual o impacto das consequências das alterações ao regime fiscal preferencial do
CINM?
3
característica geral de incompatibilidade com o mercado comum, bem como as derrogações
existentes a este princípio de incompatibilidade, onde salienta-se o caso particular das regiões
ultraperiféricas, e por último os fundamentos existentes para o controlo deste tipo de auxílios.
O quarto capítulo centra-se na análise do Centro Internacional de Negócios da
Madeira no qual é abordado a caraterização do Centro bem como o intuito da sua criação
como instrumento para a diversificação e desenvolvimento da Região Autónoma da Madeira.
Refere-se o tipo de regime vigente - regime fiscal preferencial - e a evolução deste ao longo
dos últimos anos que resultou em três regimes distintos. Neste ponto é também abordado o
CINM em relação às normas do direito comunitário e aos auxílios de Estado, evidenciando a
sua compatibilidade com o mercado comum e a não prejudicialidade para a concorrência
fiscal.
O quinto e último capítulo desta primeira parte da dissertação destina-se à análise do
contributo do CINM para o desenvolvimento da ilha da Madeira, quer a nível de impacto no
Produto Interno Bruto (PIB) e Valor Atualizado Bruto (VAB) da região, quer sobre o número
de empregos e mais importante sobre a diminuição das receitas fiscais. É também objetivo
deste estudo analisar o impacto das sucessivas alterações ao regime fiscal para a atração de
investimento externo e competitividade do Centro como também desenvolvimento da ilha da
Madeira, evidenciando as melhorias e perdas no investimento, no número de empregos e das
receitas fiscais para o Estado.
A segunda parte da presente dissertação intitula-se o “O Centro Internacional de
Negócios da Madeira (CINM) – evidência empírica” no qual é realizada uma investigação
acerca da importância e impacto das alterações aos benefícios fiscais sobre o investimento das
empresas da Zona Franca Industrial do CINM.
No primeiro capítulo, faz-se uma breve apresentação da metodologia de investigação
seguida, explicando o tipo de entrevista utilizada (semiestruturada), a definição da amostra e a
exposição das questões de investigação.
No segundo capítulo é realizado uma apresentação e análise dos resultados obtidos
com a metodologia utilizada.
Por fim, segue as conclusões retiradas e as limitações ao estudo.
4
Parte I: O Centro Internacional de Negócios da Madeira: Enquadramento
Normativo
5
Basto (2004) afirma que as realidades modernas vieram impor alguns objetivos,
designadamente, o de manter o mais simples possível o sistema tributário, de forma que seja
possível administrá-lo bem, o de o conservar estável durante períodos suficientemente
dilatados, em ordem a facilitar o cálculo a mais longo prazo dos agentes económicos, e o de
concorrer com outras jurisdições, na economia aberta e globalizada que é da realidade
contemporânea.
Neste sentido, de acordo com a literatura disponível, podemos incluir nos objetivos
de um bom sistema fiscal, os seguintes:
Equidade;
Neutralidade;
Eficiência Económica;
Simplicidade;
Capacidade Concorrencial.
Segundo Lopes (2008) estes princípios, embora sejam atendidos de uma aceitação
generalizada, são frequentemente passíveis de entrar em conflitos, sendo que diversos
economistas declaram diferentes perspetivas sobre o equilíbrio adequado que deverá existir
entre eles.
Vejamos separadamente cada um destes objetivos ou princípios a que um bom
sistema fiscal deve obedecer.
6
que dois contribuintes são rigorosamente iguais. Estes até podem possuir idêntica matéria de
incidência de imposto, mas podem experimentar níveis de bem-estar e de capacidade
contributivas distintas conforme características, como sejam o estado civil, a idade e a
condição física.
Contudo, Pereira (2011) afirma que os principais problemas de equidade se colocam
atualmente e estão distantes de estar resolvidos, uma vez que, por exemplo, um mesmo
montante de rendimento é objetivo de tributação muito diferenciada conforme a sua origem ou
natureza.
Quanto à equidade vertical, esta assenta no pressuposto que contribuintes com
capacidades de contribuição diferentes devem ser tributados de modo desigual. Desta forma, a
autoridade tributária quer que independentemente do grau de contribuição, o sacrifício seja o
idêntico para ambos. Segundo o autor, a capacidade contributiva aumenta mais rápido do que
o rendimento, o que implica que os impostos devam ser progressivos.
“A justificação económica para a progressividade tem sido feita com base no
argumento de que só ela permitiria, ainda que tendencialmente, uma igualdade de sacrifícios”
Pereira (2011).
Em suma, o autor afirma que: “O princípio da equidade tem sido considerado como
prioritário na hierarquia dos requisitos a satisfazer pelos impostos. Daí que num grande
número de países mereça consagração constitucional.”
7
do contribuinte português ainda se encontra sujeito a elevadas taxas marginais de imposto e à
existência de inúmeras isenções ou benefícios fiscais.1
Segundo Teixeira (2012) “o princípio da eficiência está intimamente relacionado com
o princípio da neutralidade” pois a eficiência só ocorrerá se o sistema for neutro, impondo que
todo rendimento seja sujeito à mesma taxa de imposto.
“Um imposto pode influenciar de vários modos a eficiência económica,
nomeadamente quanto à oferta e procura de trabalho, à poupança e a sua utilização produtiva,
à afetação de recursos em geral. É que o imposto é algo que se impõe aos agentes económicos
e pode, por isso, modificar preços relativos das variáveis económicas diretas ou indiretamente
relacionadas com a sua incidência. Dessa modificação dos preços pode resultar a ineficiência
económica (…) O objetivo é, assim, minimizar esta, ou seja, assegurar que os impostos sejam
o menos distorcionários possível” (Pereira, 2011).
Essas alterações poderão provocar um efeito de rendimento, que resulta da criação ou
subida do imposto, diminuir o rendimento do indivíduo e, por consequência, o seu poder de
compra, ou, um efeito de substituição, na qual a alteração poderá levar o contribuinte a
substituir uma atividade/bem por outra(o). Por outro lado, é sabido que os mercados têm
falhas, deste modo, os impostos podem ser usados para compensar algumas dessas falhas e,
em vez de ser em fonte de ineficiência económica, são um instrumento que contribui para
aumentar essa eficiência.
1
Num contexto de circulação internacional de capital, os fiscalistas prestam especial atenção a este
princípio. Este subdivide-se em neutralidade na exportação de capitais (NEC) e neutralidade de importação de
capitais (NIC).
Segundo Pereira (2011) de acordo com a neutralidade exportação de capitais (NEC) o investidor deve
pagar o mesmo imposto, quer invista no país de residência, quer no estrangeiro. Deste modo, é favorecida a
tributação no país de residência do rendimento mundial. Já segundo a neutralidade na importação de capitais
(NIC) o que importa é assegurar que todos os rendimentos investidos num determinado país são tratados da
mesma forma independentemente da sua origem. Esta neutralidade é assegurada quando todos os rendimentos
são tributados exclusivamente no país de origem (princípio da fonte).
Presentemente, tomando em consideração que a maioria dos países desenvolvidos são
simultaneamente importadores e exportadores, os dois objetivos acima mencionados deverão ser prosseguidos
simultaneamente.
8
1.3. Princípio da Simplicidade
A gestão dos impostos deve ser simples e clara, garantindo os menores custos
administrativos para os sujeitos passivos no âmbito do cumprimento das obrigações acessórias
(custos de cumprimento), bem como a redução dos custos de transação (custos originados
pelas divergências e litígios no âmbito da aplicação da lei fiscal) e dos custos de contexto
(custos decorrentes da “má qualidade” das leis fiscais, que torna difícil e onerosa a sua
consulta e aplicação e facilita a fraude e a evasão fiscais, uma vez que, existe evidência
demonstrativa de que esta aumenta na razão direta do acréscimo de complexidade do Sistema.
Segundo Nabais (2012) é necessária uma luta adequada, eficaz e corajosa contra a
evasão fiscal que campeia um pouco por toda a parte, particularmente facilitada com a
moderna hipertrofia e complexidade técnica da generalidade da legislação fiscal e da crescente
desmaterialização dos pressupostos de facto dos impostos. O autor apela mesmo à necessidade
de reduzir significativamente, o número de leis fiscais que nos regem, bem como simplificar
as restantes, de modo a que tenhamos uma legislação fiscal que não só seja suscetível de ser
aplicada, mas sobretudo possa ser aplicada com custos bem menores do que aqueles que se
verificam atualmente. A melhor solução, seria, todavia, redesenhar o sistema fiscal para que
muitas das oportunidades de fuga, arbitragem e evasão fossem eliminadas e, simultaneamente,
incentivar os contribuintes ao cumprimento voluntário da lei.
De acordo com Lopes (2003) na verdade o sistema fiscal ganha, e muito, se for visto
pela generalidade do público como justo. Isso contribui para não tornar a evasão socialmente
aceitável e aumentará o grau de cumprimento espontâneo da lei.
A simplicidade do sistema fiscal faz com que este seja compreendido pelos
contribuintes facilitando a relação contribuinte - fisco e evitando custos desnecessários,
revelando-se uma característica fundamental de um sistema fiscal justo e competitivo (Pereira,
2011).
Neste sentido Basto (2004) explica que a constituição de um sistema fiscal mais
simples seria mais facilmente entendido pelo público, sendo que a nível de evitar custos
desnecessários, inclui-se menores perdas de tempo no cumprimento das obrigações fiscais e
menores custos de angústia associados à probabilidade de falhar no preenchimento de
declarações.
9
Os custos inerentes a alguma complexidade do sistema fiscal podem recair sobre o
setor público através de custos de administração ou sobre o setor privado através de custos de
cumprimento.2
10
transfronteiriços, não era até então encarada como um fenómeno prejudicial, muito menos,
objeto de uma preocupação específica. Sendo que, até relativamente pouco tempo, era
considerada por vários autores, um fenómeno natural decorrente da soberania fiscal.
11
Assim que, é certo que existe concorrência fiscal entre empresas, em particular entre
empresas transnacionais, as quais desenvolvem as suas atividades em diversas jurisdições
fiscais. Contudo, como refere Santos (2003a) quando se fala de concorrência fiscal é no
sentido de concorrência entre jurisdições fiscais, da concorrência entre Estados, entre sistemas
ou políticas fiscais.
Segundo Wilson (1999) a influência da tributação definida por cada Estado Membro
nas bases tributárias disponíveis para outros governos está na génese do conceito de
concorrência fiscal internacional.
A concorrência entre Estados não visa a obtenção de maior quota de mercado, mas
direta ou indiretamente de uma maior quota de receita fiscal procedente da divisão
internacional da base tributária global.
Deste modo, a definição de concorrência fiscal dá-se quando o sistema de uma
entidade governamental afeta o sistema de outra entidade governamental, usualmente através
de um efeito nas receitas fiscais deste última. Ela resulta do fato dos Estados passarem a
considerar nas suas decisões a necessidade de adequar os impostos ao bem-estar social, ao
investimento e ao progresso científico, visando atrair investimentos ou não deslocá-los.
Neste sentido, é possível dizer que a concorrência revela-se em alguns casos como
prejudicial, mas em outros origina uma racionalização dos sistemas fiscais criando resultados
benéficos.
Por norma, a concorrência fiscal, através das zonas de baixa tributação são, na maior
parte das vezes, associados a um planeamento fiscal ilegal. Todavia, nas últimas duas décadas,
o aumento da mobilidade do capital a nível mundial, assumiu para dar grande importância à
necessidade de uma estrutura fiscal de elevada competitividade entre Estados.
A diversidade dos sistemas fiscais dos Estados, a sua estrutura, composição e
articulação entre os impostos, diferentes níveis de fiscalidade e de esforço fiscal, a ação
administrativa e da justiça tributárias estão na base das políticas ativas e dos fatores
incontornáveis da concorrência fiscal.
12
Como referido anteriormente a concorrência tributária ocorre quando os Estados
alteram as respetivas normas tributárias a fim de atrair atividades empresariais, fluxos de
investimentos ou recursos humanos (Field, 2003). Deste modo, esta revela-se um motor de
competitividade, que por sua vez, tem como objetivo criar um enquadramento mais favorável
à captação de investimento (Keuschnigg, 2008).
É neste contexto, que o sistema fiscal revela-se um exemplo essencial para a
competitividade (Brás e Santana, 2013; Santos 2003a, Tanzi, 2003), mas não apenas no seu
desenho normativo, mais ou menos estático - isto é a nível da estrutura jurídica dos impostos,
as regras de incidência ou não incidência, as normas de isenção e outro benefícios entre outros
– mas também nos seus aspetos dinâmicos – existência de acordos ou não dos contribuintes
com a administração fiscal, a maior ou menor eficácia do sistema de informações fiscais, da
fiscalização e da ação administrativa (Santos, 2003a).
Através de um estudo do National Bureau for Economic Research (NBER)3
concluiu-se que a concorrência fiscal pode trazer mais vantagens que desvantagens. Isto
porque ao aumentá-la, a tendência é de melhorar o bem-estar dos contribuintes, uma vez que,
os gastos governamentais improdutivos, incluídos benefícios e pagamentos a políticos,
diminuem.
Neste contexto, existe um culminar de autores que defendem a concorrência fiscal
internacional, descrevendo diversos benefícios económicos e sociais, possíveis de ser
repercutidos da utilização de uma baixa tributação fiscal.
O investimento assume-se como um fator crítico para o desenvolvimento das
economias, bem como para a sua competitividade em nacionais e internacionais.
Segundo Mitchell (2009) a rivalidade entre os governos produz um impacto
incrivelmente desejável sobre a política fiscal. A concorrência fiscal resultante ajudou a
reduzir os impostos empresariais nos Estados da Europa Ocidental, verificando-se que a média
de imposto empresarial no mundo desenvolvido, foi afetada, passando de cerca de 48 por
cento em 1980, para menos de 27 por cento nos dias de hoje.
3 Janeba, E. e Schjelderup, G. (2002) “Why Europe should love tax competition – and the U.S. even more so”,
NBER Working Paper 9334
13
Conforme o mesmo autor a concorrência fiscal é sinónimo de aumento de qualidade.
Mais importante, aumento do desempenho e promoção do desenvolvimento económico.
Portanto, proteger e preservar o direito de exercer concorrência fiscal deve ser um objetivo
fundamental.
Com a melhoria do sistema jurídico de um Estado origina-se um quadro mais
adequado para o investimento, para o desenvolvimento económico e social, que traz grandes
vantagens competitivas em relação a outros Estados.
A concorrência fiscal internacional apresenta várias vantagens económicas, pelo que,
dentro de certos limites, pressiona os Estados a agir de forma mais rigorosa e eficiente na
cobrança dos seus impostos o que leva a um aumento da competitividade. Em muitos casos,
permite a sobrevivência económica dos Estados de periferia e regiões ultraperiféricas, uma vez
que, compensa o esvaziamento da periferia a favor do centro, das regiões mais pobres a favor
das regiões mais ricas - fenómeno que se verifica muito claramente dentro de Portugal –
criando maior riqueza e entidades mais sustentáveis.
Conforme explica, a pressão da concorrência surge de forma a incentivar uma melhor
alocação de recursos e aumentar a eficiência económica, melhorando a qualidade dos serviços
e, simultaneamente, evitar monopólios de mercado. Se se continuar a destruir ou limitar o
sucesso da concorrência fiscal, tantos as empresas, como os governos terão menos incentivos
para se comportar de forma mais responsável, melhorada e eficiente para continuar a atrair o
interesse (Mitchell, 2009).
No caso de Portugal, Abreu (2008) menciona que na corrida ao investimento
estrangeiro, este parte em desvantagem, designadamente face aos novos Estados Membros
(EM) da União Europeia (UE)4.
Frasquilho (2007) defende que Portugal encontra-se nesta situação - mal posicionado
ao nível da fiscalidade como fator de competitividade - devido à elevada carga fiscal suportada
pela economia nacional e pela reconhecida grande complexidade do SF português. A
4
Conforme dados mais recentes do Fórum Económico Mundial, Portugal, em matéria de competitividade, num
total de 142 países, ocupa a 45ª posição do ranking. No entanto, a prestação nacional é ainda mais modesta se nos
cingirmos ao espaço europeu, sendo que na União Europeia (UE) a 27 ficamos pelo 18º posto. Em relação ao
impacto dos impostos no incentivo para trabalhar ou investir no país, Portugal ocupa a 123ª posição de entre um
leque de 139 países, significando que revela-se num dos países em que os impostos mais desincentivam. (Barros,
2011).
14
diminuição da complexidade e aumento de estabilidade deste, é fundamental no planeamento
dos investimentos, pois os investidores procuram segurança, previsibilidade, consistência e
rapidez na aplicação das regras fiscais, sendo que em muitos casos estas condições são tão
importantes como a taxa efetiva de imposto.
Nesse sentido, a capacidade de Portugal absorver no futuro investimento direto
estrangeiro (IDE) será um fator chave na competitividade económica e na capacidade de
inovação da economia portuguesa (Neto, 2003).
“Para Portugal é crítico, a todo o momento, ter um sistema fiscal mais amigo do
investimento e da atividade empresarial que a vizinha Espanha” (Catroga, 2001). Esta
necessidade surge, porque a concorrência fiscal é uma componente do fenómeno da
globalização, onde a competição é mais evidente nos países com maior proximidade.
É neste sentido que Carrapatoso (2003) e Ludgero Marques (2009) realçam que é
necessária a redução dos impostos para obter um resultado económico positivo, defendendo
que os resultados do combate à fraude e evasão fiscal devem reverter a favor da redução da
carga fiscal suportada pelos contribuintes cumpridores.
O presidente da AEP refere que é inevitável que as disparidades fiscais gerem
distorções na economia que, para além de prejudiciais às empresas e à atratividade da
economia, acabam por se revelar pouco eficazes em termos de cobrança de receita. A política
fiscal portuguesa deveria favorecer a atratividade e a competitividade da economia, “adotando
o fortalecimento concorrencial das nossas empresas e do nosso território para a captação de
investimento direto externo”.
15
com a deslocação de atividades para jurisdições onde a respetiva tributação seja mais
favorável. (Zodrow, 2003)
Tratando-se a concorrência fiscal da concessão de regimes especiais, isto é, regimes
mais favoráveis, com níveis de tributação mais reduzidos, ou mesmo, de ausência de
tributação, a residentes de outro Estado, com o intuito de atrair investimento ou receitas para
esse Estado, passou a ser encarado como um fenómeno predominantemente político, como um
elemento de concorrência institucional, na medida em que interfere com as condições que, em
cada Estado, permitem escolher o nível de receitas fiscais e, consequentemente, a forma de
Estado e o próprio tipo de civilização.
Na atualidade, não obstante à política fiscal dos Estados continuar a ser moldada por
objetivos tradicionais, a crescente mobilidade de pessoas e capitais oriunda da globalização da
economia implica que a política fiscal de um país tenha repercussões inevitáveis nos demais
parceiros. Deste modo, qualquer medida tomada por uma jurisdição fiscal no sentido de
diminuir a tributação traduz a uma ausência de harmonização que pode levar a
comportamentos de evasão fiscal, na obtenção de mais vantagem competitiva em relação às já
existentes, induzindo uma deficiente afetação dos recursos. (Azevedo, 2013)
Este fato pode conduzir assim à degradação fiscal, isto é, à erosão sucessiva das
receitas fiscais de Estados, que levará a uma não tributação pura e simples. (Brás, 2011; Tanzi,
2000; Zodrow, 2003)
Leitão (2003) refere que o conhecido fenómeno da globalização provocou grandes
intercâmbios de fluxos financeiros a nível internacional, uma vez que o capital não tem pátria
e desloca-se a grande velocidade para onde lhe são oferecidas mais vantagens. Isto coloca
especiais dificuldades às administrações fiscais, não apenas porque a mobilidade de capitais
implica a erosão de receitas, mas também porque certos países tendem a adotar medidas de
concorrência fiscal prejudicial, atraindo fluxos financeiros deslealmente com a promessa de
garantir ausência de tributação.
Ocorrendo esta situação de concorrência fiscal prejudicial há naturalmente danos
causados aos Estados vítimas dessa subtração, na medida em que se opera uma distorção dos
verdadeiros fluxos financeiros que corrói a integridade e a equidade dos sistemas fiscais,
desencorajando o cumprimento por parte de todos os contribuintes. Tal aumenta os custos
16
administrativos de fiscalização da máquina fiscal e, obriga o Estado a dirigir a carga fiscal
para fatores menos móveis, como o trabalho, a propriedade e o consumo, sob pena de não
conseguir uma adequada cobertura dos gastos públicos através das receitas fiscais.
A concorrência fiscal nociva apresenta uma dimensão realmente mundial e, assim
sendo, a luta contra tais práticas não pode deixar de corresponder a um dos principais desafios
internacionais dos nossos dias, que legitima e justifica a particular atenção e o forte
empenhamento manifestado pela regulação a tal propósito (Azevedo, 2013).
A justificação dessa regulação prende-se com a necessidade de impedir que se
restrinja ou falseie a concorrência interempresarial no mercado interno, quando tal resulte de
um planeamento fiscal dos agentes económicos induzido pela política fiscal dos EM.
Podemos então afirmar que, de fato, existe verdade em ambas as vertentes referidas,
sendo possível aludir que a concorrência fiscal apresenta duas faces. Por um lado, revela-se
benéfica, funcionando, no interior da União, como fator de dinamização das economias, e por
outro, ao ultrapassar certos limites, pode ter efeitos perversos, com caráter prejudicial, e
portanto, deve ser objeto de medidas de regularização fiscal.
No capítulo seguinte procedemos à análise das instituições e medidas utilizadas no
combate à concorrência fiscal internacional.
17
Capítulo 2 – Formas de regulação da Concorrência Fiscal
18
Ocorreu o segundo encontro de ministros da
OCDE, a nível regional, do qual resultou a
publicação do Relatório Ruding, onde pela
primeira vez o fenómeno de concorrência fiscal
1992 Relatório Ruding
foi alvo de uma análise oficial e específica.
Exprimindo ainda que de uma forma contida,
uma natural preocupação com o incremento das
práticas de concorrência fiscal entre os EM da
EU.
19
mais inovador por ser específico e globalmente destinado à regulação da concorrência fiscal e
por passar a privilegiar a utilização de formas soft law em detrimento dos tradicionais
regulamentos e diretivas.
De forma a procurar dar eficácia a este combate no plano internacional, onde
também a concorrência fiscal não era objeto de regulação específica, surgiu o relatório com as
recomendações da OCDE.
20
O seu âmbito de aplicação deve ser analisado em duas vertentes – quanto aos
impostos e medidas fiscais incluídos e quanto às áreas geográficas abrangidas.
Na primeira, o Código restringe-se à fiscalidade das empresas, mas sem um definição
do que se deve entender como tal, dando a impressão que apenas estão em causa impostos
diretos que incidem sobre essas unidades económicas.
Quanto às medidas fiscais abrangidas poder-se-á dizer que se visam quaisquer tipos
de vantagens fiscais cujo afetem a localização das atividades económicas, qualquer que seja a
sua base jurídica ou forma de concretização (incluem-se disposições legislativas, disposições
regulamentares e simples práticas administrativas), que possam ser consideradas como
potencialmente prejudiciais. Nestas se integram, nomeadamente, as que traduzem um nível de
tributação efetivo, incluindo a taxa zero, significativamente inferior ao normalmente aplicado
pelo Estado-membro em causa (Nabais, 2012).
Relativamente ao âmbito de aplicação territorial, o Código cinge-se, em princípio, ao
espaço comunitário, ao território a que se aplique o TCE, compreendendo as regiões
ultraperiféricas. No entanto, revela-se mais ambicioso e consagra expressamente a pretensão
de que os princípios sobre as medidas fiscais sejam adotados num perímetro tão amplo quanto
possível5.
Neste contexto os EM comprometem-se a promover a adoção dos princípios
destinados à eliminação das medidas fiscais prejudiciais quer nos países terceiros, através
duma ação concertada na OCDE ou em certas instituições, quer nos territórios associados e
dependentes dos EM da União que estão fora do âmbito de aplicação do respetivo Tratado. Os
EM que têm territórios dependentes ou associados ou que têm responsabilidades especiais ou
prerrogativas fiscais sobre outros territórios, comprometem-se, assim a assegurar a aplicação
de tais princípios naqueles territórios, no respeito das obrigações constitucionais6. (Santos,
2003a)
5
Ponto M do Anexo 1 às conclusões do ECOFIN de 1 de dezembro de 1997, publicado no JOCE n.º C 002, de 6
de janeiro de 1998
6
A não inclusão no código dos territórios dependentes ou associados poderia provocar a deslocalização de
atividades para esses territórios. Essa a razão pela qual, Portugal, aquando das negociações do texto do código,
defendeu sempre a inclusão de tais territórios. (Santos, 2003b)
21
1.1.1.2 Critérios para a qualificação das medidas fiscais prejudiciais
No ponto B o Código fornece, a título exemplificativo, alguns critérios a ter em conta
aquando aferir acerca da qualificação de uma dada medida como sendo de caráter prejudicial,
sendo eles:
a) Se o regime é aplicável apenas a não residentes ou a transações realizadas com
não residentes (“ring fencing”);
b) se as vantagens concedidas são totalmente isoladas da economia interna, sem
incidência na base fiscal nacional;
c) se as vantagens são concedidas mesmo que não exista qualquer atividade
económica real, nem qualquer presença económica substancial, no EM que as proporciona;
d) se o método de determinação dos lucros resultantes das atividades interna de
um grupo multinacional se afasta dos princípios geralmente aceites a nível internacional,
nomeadamente, das regras aprovadas pela OCDE, como, por exemplo, as relativas a preços de
transferência, ou, dos princípios consagrados na Convenção Modelo da OCDE em termos de
determinação dos lucros de estabelecimentos estáveis; e
e) se as medidas fiscais e as disposições legais carecem de transparência e são
aplicadas de forma menos rigorosa a nível administrativo.
É de relevar que por sugestão das delegações portuguesa e espanhola, no ponto G do
Código é estabelecido uma disposição, na qual refere que deve ser prestada uma especial
atenção às características e condicionalismos particulares das regiões ultraperiféricas e das
pequenas ilhas, salvaguardando a integridade e coerência da ordem jurídica comunitária
incluindo o mercado interno e as políticas comuns.
Note-se que na avaliação de uma medida qualificada como potencialmente
prejudicial, a abordagem deve ser globalizada, tendo em conta, a interligação existente entre
alguns critérios.
22
a) de informação recíproca das medidas vigentes ou futuras potencialmente
subsumíveis no âmbito da aplicação do Código, podendo qualquer EM ou a Comissão solicitar
informações;
b) de adoção de dois tipos de intervenção relativamente aos regimes fiscais
prejudiciais: de um lado, o congelamento e, de outro, o desmantelamento das medidas fiscais
prejudicais existentes.
Neste sentido, os países membros assumem o compromisso de, no tocante ao
congelamento, no âmbito da elaboração da respetiva política tributária, não introduzirem
novas medidas fiscais passíveis de qualificação como prejudiciais face aos princípios do
Código, tendo em conta o processo de avaliação. E uma vez efetuada a avaliação do caráter
prejudicial das medidas, devem também promover o desmantelamento das existentes,
alterando-as o mais rapidamente possível.
Para Palma (2010) a decisão de manutenção do Grupo do Código de Conduta afigura-
se adequada, particularmente tendo em consideração a realidade atual em que a crise agudizou
as preocupações sobre a sustentabilidade dos sistemas fiscais em ambiente de globalização.
Neste contexto, a promoção da boa governança na área fiscal numa base geográfica tão ampla
quanto possível tem um relevante papel a cumprir.
23
Para o efeito, o Comité dos Assuntos Fiscais OCDE publicou, em 1998, o
Relatório «Harmful Tax Competition: An Emerging Global Issue», o qual define um
conjunto de princípios diretores para a identificação das práticas fiscais prejudiciais
dos países membros. Neste são apresentadas dezanove recomendações, sendo sete
relativas às legislações e práticas dos EM, sete respeitantes a tratados de natureza
fiscal e as restantes referentes à cooperação internacional.
1.2.2 Recomendações
As dezanove recomendações constituintes do Relatório da OCDE
encontram-se resumidas no seguinte quadro:
Recomendação n.º 1 – empresas Os países que não tenham este tipo de medidas
estrangeiras controladas (Controlled deverão ponderar a respetiva adoção. Por outro
Foreign Corporations) ou medidas lado, os países que as tenham adotado devem
equivalentes assegurar-se que a respetiva aplicação se encontra
em conformidade com as medidas de combate às
práticas fiscais prejudiciais.
Recomendação n.º 2 – fundos de Os países que não tenham este tipo de medida
investimento estrangeiro ou medidas deverão adotá-las e aqueles que as tenham adotado
equivalentes deverão ponderar a respetiva aplicação aos
rendimentos e às entidades abrangidas pelas
24
práticas qualificadas como concorrência fiscal
prejudicial.
Recomendação n.º 4 – troca de Os países que não possuam regras relativas à troca
informação com outros países de informações sobre as transações internacionais
e as operações estrangeiras, realizadas por
contribuintes residentes, deverão adotá-las, bem
como, proceder à troca de informações obtidas por
essa via.
25
qualifiquem como concorrência fiscal prejudicial.
Recomendação n.º 11 – lista de regras O comité deverá elaborar uma lista das regras
de exclusão constantes dos tratados utilizadas pelos países no sentido de excluir dos
benefícios das convenções fiscais determinadas
entidades ou tipos de rendimentos, devendo tal lista
ser utilizada como ponto de referência aquando da
negociação de convenções fiscais e servir de base
para as discussões no Fórum.
26
disposições que, atendendo àquele objetivo, possam
vir a ser incluídas nos tratados.
27
as linhas diretrizes.
28
b) regimes ring fencing, ou seja, parcial ou totalmente isolados dos mercados
domésticos do país em causa. O ring fencing pode assumir diversas formas, como por
exemplo, o facto do regime, implícita ou explicitamente, excluir os residentes dos benefícios
concedidos ou proibir as empresas que beneficiem do regime, de operar no mercado nacional;
c) falta de transparência - quer ao nível da conceção do regime (relativa às
disposições legais), quer ao nível da respetiva aplicação prática (disposições administrativas),
e;
d) falta de uma troca efetiva de informações relativamente aos contribuintes que
beneficiem do regime.
Os dois regimes são alvo de atenção neste relatório. A grande diferença entre eles
recai sobre o fato que um regime fiscal preferencial é um regime excecional no quadro de uma
tributação-regra normal vigente num determinado Estado, uma espécie de zona de tributação
nula ou baixa, num território caracterizado pela existência de altas ou medias taxas, isolada da
produção de efeitos negativos nesse Estado, por só se aplicar a não residentes ou por se aplicar
mesmo na ausência de uma atividade económica substancial.
Por outro lado, os paraísos fiscais pressupõem uma zona de exclusão de tributação ou
de baixa tributação extensiva a todo o território. Contudo, segundo Santos (2003b), isto não
basta para que um determinado território seja considerado paraíso fiscal. Para tal, é necessário
também que ele recuse a troca de informações com outros Estados, que os benefícios
decorrentes da nula ou reduzida tributação sejam usufruídos mesmo que não exista atividade
económica substancial no país, ou que se verifiquem outras características que, não sendo
especificamente fiscais, podem ser fatores adicionais de atração, como a existência de regido
sigilo bancário, de um bom sistema de comunicações, de telecomunicações eficientes, etc.
Os critérios que relevam na qualificação de uma jurisdição como paraíso fiscal são,
fundamentalmente, o da ausência de uma troca efetiva de informações e da falta de
transparência. Relativamente aos critérios de identificação dos regimes fiscais preferenciais
continua a prevalecer o critério do ring fencing (Palma, 2003). Cria-se assim um desequilíbrio
de tratamento entre paraísos fiscais e regimes fiscais preferenciais, sendo que, os que
correspondem a situações mais gravosas passaram a ser tratados de forma mais benévola
(Santos, 2002).
29
1.2.4 O Fórum
Como anteriormente referido, a Recomendação abrange todos os países da OCDE
(nos quais se incluem os países da UE), pretendendo-se alargar a sua ação igualmente aos
países não membros e países terceiros.
Neste sentido o Conselho de Ministros da OCDE aprova, a 9 de Abril de 1998, o
referido Relatório, adotando uma Recomendação aos governos dos países membros que,
demandam os EM a consagrarem as recomendações expressas neste e, como tal, encarrega o
Comité dos Assuntos Fiscais a prosseguir os trabalhos sobre a matéria, utilizando para esse
propósito, a criação do Fórum para dinamizar a implementação das recomendações, consagrar
as medidas aventadas, realizar relatórios periódicos sobre os resultados dos trabalhos e
apresentar propostas de novas medidas e a desenvolver o diálogo com países não membros
encorajando-os a associarem-se às recomendações do Relatório.
A este propósito Palma (2003), refere que trata-se de um projeto ambicioso que
suscita muitas dúvidas quanto à legitimidade de atuação da OCDE, ou não pretendesse esta,
através de um texto não jurídico, impor obrigações aos seus países membros. Legitimidade
esta, ainda mais questionável quando a OCDE pretende estender os seus princípios aos países
não membros, situação que originou fortes oposições por parte dos países das Caraíbas
aquando da sua qualificação de paraísos fiscais.
30
Desde o início dos trabalhos têm existido uma cooperação entre a U.E e a OCDE
relativamente às tarefas de aprovação e implantação do Código de Conduta da U.E e da
Recomendação do Conselho da OCDE que adota o Relatório.
O seguinte quadro comparativo aborda os pontos fulcrais do Código de Conduta e a
Recomendação e Relatório da OCDE:
31
Outros fatores a Níveis de tributação efetiva Base tributável definida
ter em das atividades da artificialmente;
consideração na comunidade – efeitos das Determinação dos lucros com base
avaliação medidas nos outros EM; nos critérios da OCDE;
Proporcionalidade das Existência de provisões
medidas e direcionamento confidenciais;
para os objetivos Relação entre atividades
pretendidos caso se desenvolvidas e o volume do
destinem a apoiar o investimento e do rendimento
desenvolvimento obtido;
económico de regiões
específicas;
Especial atenção às
especificidades das regiões
ultraperiféricas e das
pequenas ilhas
32
Uma outra problemática inserida nas preocupações das instituições em matéria de
combate a práticas prejudicais são os auxílios de Estado. Sendo o CINM, considerado pela
Comissão um auxílio de Estado, importa desenvolver, no próximo capítulo um breve
enquadramento teórico sobre o tema.
33
Capítulo 3 – Auxílios de Estado: breve enquadramento normativo e teórico
34
Europeia, com os artigos 87.º a 89.º, e atualmente com a sua numeração 107.º e 109.º, após
adoção do Tratado de Funcionamento da União Europeia. Estas normas, no que concerne ao
princípio da aplicação universal, aplicam-se a todo o território comunitário.
7
Cf. COMISSÃO, primeiro relatório sobre os Auxílios Estatais na Comunidade Europeia, ponto 3.
35
De acordo com Santos (2003a), o fenómeno da intervenção estatal tem repercussões
particularmente visíveis nos mercados e na forma natural da concorrência. Assim que sempre
que em sede constitucional se consagre direta ou indiretamente, um princípio da concorrência
surge uma certa tenção, mormente entre o poder de atribuir auxílios de Estado e a criação de
condições de funcionamento da concorrência e dos mercados.
36
O mercado é imperfeito e por si só é incapaz de resolver este tipo de problemas.
Segundo o autor, nestes casos, a intervenção do Estado é essencial e justificada. O mesmo
refere que a política de redistribuição é necessária, sendo que a distribuição do rendimento
operada no mercado não é a melhor do ponto de vista da justiça social. Outro argumento a
favor da intervenção Estatal está relacionado com o medo de que o particular não atue no seu
próprio interesse. Desta forma, o Estado precisa e irá impor aos particulares o consumo de
certos bens ou proibir-lhe o consumo de outros.
Santos (2003a) defende também que a atribuição de incentivos no quadro de políticas
regionais e de ordenamento do território justifica-se, neste contexto, como o meio de
realização do desenvolvimento sustentado das regiões mais desfavorecidas como forma de
promoção de qualidade de vida e instrumento de distribuição mais eficiente dos recursos,
contribuindo, deste modo, para o melhor funcionamento do mercado.
O fato é que não existe verdadeiramente nenhum mercado que possua todos os seus
elementos constitutivos de uma concorrência perfeita, assim que, os auxílios de Estado surgem
na medida de corrigir certas deficiências de mercado e, em consequência promover a
eficiência económica e aumentar o bem-estar da comunidade.
Deste modo, ao lado dos aspetos negativos, os auxílios de Estado comportam
múltiplos aspetos positivos. A própria Comissão reconhece que:
Os auxílios de Estado podem contribuir para o crescimento económico e adaptação das estruturas
industriais às alterações das condições do mercado, bem como para o desenvolvimento regional,
para a melhoria das condições sociais resultantes de modificações económicas e para a situação do
emprego num país determinado. (XII Relatório sobre a Política de Concorrência, 1983)
37
como auxílio de Estado, em condições excecionais permitindo uma maior flexibilização na
aplicação da lei ao tomar em consideração circunstâncias especiais, designadamente, quanto
aos objetivos pretendidos.
Como anteriormente referido, os mercados têm falhas, daí que os auxílios de Estado
sejam, no quadro atual, indispensáveis ao funcionamento do sistema de economia mista
existente nos Estados comunitários e na própria Comunidade.
As finalidades dos auxílios cuja incompatibilidade com o Tratado pode ser levantada
por decisão da Comissão após apreciação casuística em que detém amplos poderes regem-se
pelas derrogações previstas nas alíneas a) a d) do n.º3 do artigo 107º do Tratado.
A derrogação da alínea a) do n.º 3 do artigo 107.º do TFUE permite conceder uma
isenção aos auxílios de natureza regional dirigidos às regiões menos favorecidas na
Comunidade. Estes visam “promover o desenvolvimento económico das regiões em que o
nível de vida seja anormalmente baixo ou em que exista grave situação de subemprego”.
Segundo a comissão caem na previsão desta norma os auxílios destinados a regiões
ultraperiféricas e, por conseguinte a Região Autónoma da Madeira. Vide o artigo 349º :
Tendo em conta a situação social e económica estrutural da Guadalupe, da Guiana Francesa, da
Martinica, da Reunião, de Saint-Barthélemy, de Saint-Martin, dos Açores, da Madeira e das ilhas
Canárias, agravada pelo grande afastamento, pela insularidade, pela pequena superfície, pelo relevo
e clima difíceis e pela sua dependência económica em relação a um pequeno número de produtos,
fatores estes cuja persistência e conjugação prejudicam gravemente o seu desenvolvimento (…).
38
desfavorecidas no plano nacional, ou seja, a auxílios de natureza regional em prol da coesão
interna dos Estados membros. O quadro adequado para avaliar estas dificuldades pode ser
constituído não só pela UE no seu conjunto, mas também, em especial, pelo Estado-Membro
em questão.
Por fim, a alínea d) e e) do mesmo artigo consagram os auxílios destinados a
“promover a cultura e a conservação do património, quando não alterem as condições das
trocas comerciais e da concorrência na União num sentido contrário ao interesse comum” e
“as outras categorias de auxílios determinadas por decisão do Conselho, sob proposta da
Comissão”.
É importante referir que os auxílios de Estado aprovados a título das situações
excecionais expostos acima serão objeto de exame permanente por parte da Comissão, no
sentido de averiguar a respetiva compatibilidade com o mercado comum. Para o efeito, os EM
deverão apresentar anualmente à Comissão relatórios sobre os regimes existentes (Palma,
2008).
No que concerne à derrogação relativa às ilhas periféricas a Comissão faz pender a
sua autorização dos auxílios de Estado destinados a favorecer o desenvolvimento económico
das RUP´s da verificação da regra destes serem «proporcionais e orientados para os objetivos
pretendidos» e da verificação das seguintes exigências:
Contribuam para o desenvolvimento regional de atividades que operem e que
tenham um impacto local. São excluídas perentoriamente as atividades «offshore», na medida
em que a sua contribuição para o desenvolvimento da economia local é reduzida;
Correspondam a desvantagens regionais reais para as atividades, para as quais
os custos adicionais implicados têm peso. Exemplifica a inexistência desse nexo de
casualidade: O caso dos custos adicionais de transporte, fruto do isolamento duma região que
são, no entanto, irrelevantes para as atividades ligadas às finanças;
Sejam examinadas num contexto comunitário, ou seja, deve tomar em
consideração os efeitos negativos que tais medidas podem ter noutros Estados-Membros, ou
seja, os efeitos sobre a concorrência.
No Relatório de 2004, a Comissão fez questão de realçar que não reúne quaisquer
preconceitos, entenda-se negativos ou positivos, quanto aos auxílios concedidos sob a forma
39
fiscal. A forma (neste caso fiscal) dos auxílios de Estado é igualmente indiferente quando a
Comissão desempenha a sua função de verificar a compatibilidade com o mercado comum.
Como exemplos de regiões consideradas elegíveis, aponta os regimes fiscais especiais das
Canárias e da zona franca da Madeira, que viram os seus projetos de implementação de
auxílios de Estado sob a forma fiscal, autorizados por reunirem as condições previstas no n.º 3
da alínea a) do art.º 107.º do Tratado, ou seja, ao abrigo da derrogação prevista para as RUP´s.
É de salientar que para a Comissão as atividades como os serviços financeiros, os
serviços «intragrupo» e os centros de coordenação representam um risco de concessão de
montantes elevados de auxílios com um impacto modesto sobre o desenvolvimento regional.
Entende ainda a Comissão que a derrogação concedida a alguns regimes fiscais não pode estar
associada às atividades móveis, tendo em conta o elevado risco da sua deslocalização para
efeitos de obtenção de vantagens fiscais, sendo frequente no caso das atividades referidas no
parágrafo anterior, designadamente nas atividades de seguros e nas atividades bancárias.
Esta condição de exclusão face a este conjunto de atividades teve origem nos
trabalhos preparatórios à aprovação do Código de Conduta, onde se estabeleceu “(…) a
prejudicialidade dos regimes que beneficiam as atividades mais móveis, tais como as
atividades de natureza financeira, facto que determinou a consideração como “prejudicais” das
atividades financeiras”( Palma, 2008).
Tal posição, considera a autora, conduziu a que as atividades financeiras fossem
retiradas do regime do Centro Internacional de Negócios da Madeira (a vigorar a partir de
Janeiro de 2003), para permitir que o regime deixasse de ter aspetos prejudicais em sede do
Código de Conduta.
A Comissão reconhece que os «serviços intragrupo» não existem na ordem jurídica
portuguesa, mas opta por incluí-las na qualificação de prejudicialidade, por razões de
transparência e de segurança jurídica futuras, caso viessem a ser adotadas.
40
política de controlo dos auxílios de Estado. Cada vez mais as autoridades Comunitárias
utilizam o instituto dos auxílios de Estado como instrumento para contenção, em níveis
aceitáveis das distorções provocadas pela concorrência fiscal.
Até ao aparecimento do Código de Conduta, exceção feita aos instrumentos de
harmonização, muitas vezes de difícil recurso político, os restantes não se mostravam
adequados para combater a concorrência fiscal prejudicial.
Como já referido, existe realmente, uma conexão evidente entre as medidas fiscais
suscetíveis de ser qualificadas como prejudiciais e os auxílios de Estado, a que é aplicável o
disposto nos artigos 107º e 109º do Tratado. Note-se também, que caso os auxílios de Estado
se generalizem e se tornem a regra deixariam de ter qualquer caráter de incentivo e os seus
efeitos económicos seriam anulados. Simultaneamente, falseariam as regras do mercado e
afetariam a eficácia da economia comunitária no seu conjunto.
Contudo, se um auxílio de Estado for reconhecido pela Comissão como compatível
com o mercado comum não se afigura lógico que venha a ser qualificado como constituindo
veículo de concorrência fiscal prejudicial para efeitos de Código de Conduta, e desta forma,
uma aplicação mais rigorosa das regras de auxílio de Estado, será suficiente, em muitas
situações, para combater de forma juridicamente vinculante as práticas de concorrência fiscal
prejudicial. (Pereira, 1998)
Conforme o Código, para os auxílios de Estado é contemplada a cláusula de exclusão
da prejudicialidade, que isenta desta qualificação as medidas cuja análise casuística permita
determinar que os efeitos prejudiciais em causa são proporcionais aos objetivos pretendidos
com a sua implementação.
Ainda, o Código prevê a salvaguarda do regime das RUP´s, considerando não
prejudicais as medidas fiscais utilizadas para apoiar o desenvolvimento económico destas
regiões específicas. O Conselho pondera as características e condicionalismos particulares das
regiões ultraperiféricas, desde que não comprometam a integridade e coerência jurídica
comunitária, incluindo o mercado interno e as políticas comuns.
Um outro meio de controlo destinado a garantir a vigência equilibrada e eficaz do
Código decorre da obrigação da Comissão apresentar ao Conselho um relatório anual sobre a
respetiva aplicação, acompanhado de um outro sobre os auxílios estatais de natureza fiscal.
41
Mas, nomeadamente em relação às medidas que também recaem sobre o instituto dos Auxílios
de Estado, deriva do poder da Comissão neste âmbito.
As disposições do Código serão revistas pelo Conselho e pelos Estados membros no
prazo de dois anos a contar da sua adoção e, da experiência da sua aplicação, poderá resultar o
alargamento do seu âmbito e a previsão de outras medidas destinadas a garantir
vinculatividade.
Na seção seguinte procedemos então à análise do regime fiscal do CINM, após uma
breve caracterização deste.
42
Capítulo 4 – O Regime Fiscal do CINM
8
Dados do Instituto Nacional de Estatísticas – Censos 2011
9
Nº 2, do artigo 6º, da Constituição da Republica Portuguesa
43
com o objetivo de desenvolver a economia regional pela diversificação e modernização da
respetiva estrutura produtiva de bens.
Em 1986, a adesão de Portugal à Comunidade Europeia originou uma nova e
importante dimensão no processo do CINM. Sendo a Madeira parte integrante de Portugal e
dadas as suas condições e limitações, considerou-se desejável a sua integração nas
Comunidades Europeia tal que todo o quadro legal do CINM foi apresentado às autoridades
competentes em Bruxelas.
Em 1984, constitui-se a Sociedade Económica de Desenvolvimento da Madeira
(SDM), sociedade anónima da qual, desde o início da sua atividade, colabora com Governo
Regional e Nacional, na qualidade de concessionária, pela gestão, administração e promoção
do Centro Internacional de Negócios da Madeira.
A criação do CINM teve na sua origem a Zona Franca Industrial, sendo que o
Decreto Regulamentar n.º 53/82, de 23 de Agosto veio a autorizar que a Zona Franca deixe de
ter natureza exclusivamente industrial e passe, nos termos do seu artigo 4º, a exercer outros
tipos de atividades, sendo eles de natureza comercial e financeira.
Inicialmente, o CINM era constituído por quatro grandes áreas de atividade: a Zona
Franca Industrial, os Serviços Financeiros, os Serviços Internacionais e o MAR – Registo
Internacional de Navios da Madeira. Os Serviços Financeiros e “intra-grupos”, classificado
como prejudicial, é excluído do regime de benefícios fiscais aplicável às entidades licenciadas
no CINM a partir de 2003, tendo sido descontinuado a partir de 2011.
Assim que, atualmente, o centro abrange apenas três setores, mantendo-se a ZFI, os
Serviços Internacionais e o MAR.
Deste modo, as entidades licenciadas no CINM a partir de 1 de Janeiro de 2007 e até
31 de Dezembro de 201410 podem, designadamente, exercer as seguintes atividades
económicas:
10
Lei nº 83-C/2013 de 31 de Dezembro
44
Quadro 6: Atividades exercidas no CINM
Atividade NACE
Agricultura e com a produção animal Rev.1.1, secção A, códigos 01.4 e 02.02
Pesca, aquicultura e serviços relacionados Rev.1.1, secção B, código 05
Indústrias transformadoras Rev.1.1, secção D
Produção e distribuição de eletricidade,
Rev.1.1, secção E, código 40
gás e água
Comércio por grosso Rev.1.1, secção G, códigos 50 e 51
Transportes e comunicações Rev.1.1, secção I, códigos 60, 61, 62, 63 e 64
Atividades imobiliárias, alugueres e
Rev.1.1, secção K, códigos 70, 71, 72, 73 e 74
serviços prestados às empresas
Ensino superior, ensino para adultos e
Rev.1.1, secção M, códigos 80.3 e 80.4
outras atividades educativas
Outras atividades de serviços coletivos Rev.1.1, secção O, códigos 90, 92 e 93.01
50
ZFI
263
MAR
1590
SI
1903
Total
45
A Madeira acolhe empresas de serviços e trading, gestão de ativos, propriedade
intelectual, telecomunicações e e-business. Já a Zona Franca tem instaladas empresas ligadas à
indústria alimentar, bebidas e tabacos, biotecnologias e produção de energia, entre outras.
Das 263 embarcações registadas no MAR a 31 de Dezembro de 2013, 166 são navios
de comércio, 57 embarcações de recreio e 40 iates comerciais. São maioritariamente alemães,
italianos e espanhóis os armadores que registam os seus navios no MAR.
Assim que, no final do ano passado 616 trabalhadores desenvolviam a sua atividade
na Zona Franca e 2.313 em empresas que desenvolvem a sua atividade em serviços
internacionais e outros 3.387 profissionais são tripulantes dos navios e embarcações registados
no MAR.
46
Portugal sempre defendeu que não fazia sentido qualificar com caráter prejudicial,
medidas autorizadas ao abrigo do regime dos auxílios de Estado, como é o caso do regime da
ZFM, estando em causa direitos adquiridos. Por outro lado, não concordava com o fato da
avaliação da ZFM ser efetuada por categorias, propiciando uma avaliação distinta dos diversos
elementos, uma vez que, o regime foi autorizado como auxílio de Estado nas suas várias
componentes, logo, o mais lógico seria uma avaliação em bloco (Santos, 2002).
Todavia, a avaliação foi prosseguida e das 14 medidas portuguesas avaliadas, sendo,
nove por autoconfissão e cinco por denúncia de outros países, apenas uma, a relativa aos
serviços financeiros, foi qualificada como prejudicial, no Relatório Primarolo de 1999, uma
vez que Portugal conseguiu fazer prova da não prejudicialidade das restantes medidas, pelo
que, foram excluídas da lista final.
Esta qualificação negativa do setor financeiro foi contestada por Portugal, uma vez
que não foi passível de ser analisado e discutido, um relatório apresentado onde se
fundamentava o acionamento da cláusula de exclusão do caráter prejudicial prevista no ponto
G do Código. Sendo que, ao contrário do que ocorreu com os relatórios de outros EM, esta
decisão não foi devidamente avaliada no âmbito deste ponto, nem foi sequer objeto de
qualquer votação, apenas se tendo feito ouvir, a Comissão, em favor da qualificação de
medida com caráter prejudicial (Santos, 2002).
No contexto da OCDE, as atividades financeiras realizadas no CINM voltaram a ser
novamente qualificadas como potencialmente prejudiciais no Relatório de Progressos dos
Trabalhos do Fórum de 2000.
Após várias negociações ao mais alto nível para conseguir novamente a integração
das atividades financeiras na praça da Zona Franca, que foram todas recusadas pela Comissão
Europeia, as autoridades portuguesas acabaram por retirar este setor no novo regime.
47
Assim que, em Março de 2002, Portugal apresentou um novo pedido de auxílios de
Estado para a ZFM que não abrangia os serviços financeiros. Após os trabalhos ocorridos no
grupo do Código de Conduta e da revisão das regras sob aos auxílios com finalidades de
desenvolvimento regional, o regime voltou a ser aprovado a 11 de Dezembro de 2002 e 22 de
Janeiro de 2003, por um período de 4 anos e com produção de efeitos até 31 de Dezembro de
2011 (regime revogado com o OE/2012).
Seguidamente o terceiro e atual regime, constante do artigo 36º do EBF, foi aprovado
a 27 de Junho de 2007 por um período de 6 anos e com produção de efeitos até 31 de
Dezembro 2020. Face ao prazo de admissão de novas empresas, a Comissão, prorrogou o seu
alargamento por duas vezes, em 2013 e 2014, sendo que, atualmente este encontra-se alongado
até 31 de Dezembro de 2014.
Tendo em consideração as alterações introduzidas no regime de auxílios de Estado do
CINM, conclui-se, quer no contexto do Código de Conduta quer na OCDE, que as medidas
prejudiciais tinham sido abolidas, sendo que em ambas as instâncias ficou salvaguardada a
concessão de benefícios do regime.
O regime fiscal do CINM tem sido, na sua envolvente, um tema discutido por vários
autores ao longo dos últimos anos. Contudo, relativamente ao facto deste ser considerado um
paraíso fiscal ou um regime preferencial gera ainda alguma confusão, e leva a que muitas
vezes seja incorretamente qualificado.
Assim que, contrariamente ao que é por vezes referido, o CINM desde sempre
encontra-se inserido na categoria de regime fiscal privilegiado pelo que não existe
fundamentos técnicos suficientes que o permita classificar como um regime offshore (Palma,
2012).
48
Em 1993, a própria Comissão em resposta ao Parlamento Europeu reconhece que não
é correto descrever como extraterritoriais ou offshore os centros financeiros a que, por força
do artigo 227º do Tratado CEE, são aplicáveis o próprio Tratado e a legislação derivada deste.
Palma (2008,2012) salienta que o regime da CINM não se configura como paraíso
fiscal, mas como um regime fiscal preferencial ou privilegiado, uma vez que as entidades
licenciadas para o exercício de qualquer atividade encontram-se sujeitas às mesmas regras de
troca de informações e supervisionamento das entidades oficiais exercidas no resto do
território português, pelo que, não existe impedimentos de natureza legal à existência de
controlos pois a credibilidade do funcionamento de um regime como o do CINM passa por
uma correta inspeção e transparência do seu funcionamento.
Existem vários documentos que reafirmam este fato. Um exemplo é o estudo11 de
Hager e Levin (2002) referido por Palma (2012), nos termos do qual se conclui que “O regime
da Madeira não é um offshore no sentido normal do termo. As licenças são sujeitas a regras
muito rígidas, as companhias a operar na Madeira têm de ser residentes em Portugal e por isso
sujeitas a supervisão de entidades oficiais portuguesas”.
Ao contrário do que ocorre com as praças offshore, os residentes em Portugal podem
operar no CINM através de estruturas empresariais, contrariando a total exclusão de relações
com a realidade económica circundante.
Por conseguinte, deverá denotar-se que a Madeira nunca figurou em nenhuma lista
oficial de territórios ou regiões qualificadas como paraísos fiscais, quer da OCDE, quer do
Grupo de Ação Financeira (GAFI).
O regime fiscal do Centro Internacional de Negócios da Madeira constitui um
programa de auxílios de Estado, totalmente aprovado e apoiado por Portugal e a UE,
proporcionando um ambiente de negócios devidamente regulamentado e supervisionado.
Desde a sua criação, o intuito principal rege-se pelo desenvolvimento e diversificação de uma
região ultraperiférica, expressa e especialmente protegida nos termos do disposto no artigo
11
Estudo de Hager, W. & Levin, M. (2002), The Madeira International Business Centre : The Economic Context
and European Interests do Centre for European Policy Studies, Bruxelas.
49
349º do TFUE, portanto não se prende apenas a atrair investimento ou transações induzidas
por razões estritamente fiscais.
Acolhido pelos artigos 33º, 35º e 36º do EBF, o CINM concerne num regime unitário
que regula três sectores de atividades: a Zona franca Industrial, Serviços Internacionais e o
Registo Internacional de Navios (MAR).
De acordo com o resultado das negociações com a Comissão, é possível, atualmente,
distinguir três regimes de incentivos fiscais.
Os incentivos fiscais resultam de um ganho para o contribuinte sob a forma de
isenções, de reduções de taxa, de deduções à base tributável ou de deduções à coleta
(Guimarães, 2005), através da adoção de um determinado comportamento empresarial que,
supostamente, proporcionará ganhos ao Estado (Lopes, 1999).
Pelos ganhos que proporcionam ao tecido empresarial, os incentivos fiscais funcionam
como um forte elemento de atração ao investimento cada vez mais utilizado pelas jurisdições
económicas à escala global (Davies & Ellis, 2007; Easson, 2001).
Segundo Cunha (2006), podemos identificar alguns tipos de incentivo ou benefício
fiscal: (a) benefícios fiscais de natureza contratual, (b) incentivos fiscais à interioridade, (c)
incentivos fiscais às atividades de I&D e (d) outros tipos de incentivo.
Os benefícios fiscais de natureza contratual são afetos em função da área de atividade
de negócio e em função do montante a investir. Os incentivos fiscais à interioridade estimulam
a captação de investimento para zonas ou regiões periféricas mais desfavorecidas. Os
incentivos fiscais de I&D têm como objetivo a emergência de novas tecnologias, de forma a
garantir a competitividade e a sustentabilidade da economia.
2.2 Regime I
50
Dezembro de 2011, sendo que a admissão de entidades no regime ocorreu até 31 de Dezembro
de 2000.
Neste primeiro regime, constante do artigo 33º do EBF, (antigo artigo 41º do mesmo
Estatuto) foi permitido que se constituísse quatro áreas de investimento: um centro de Serviços
Financeiros, uma Zona Franca Industrial, um Centro de Serviços Internacionais e um Registo
Internacional de Navios.
Em linhas gerais, os principais benefícios fiscais vigentes deste regime recaíam sobre
a isenção do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) e de Imposto sobre o
Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) que se licenciassem no regime até 31 de Dezembro
de 2000.
2.3 Regime II
O Regime II é constante do artigo 35º do EBF e foi aprovado pela Comissão através
do auxílio estatal N222/A/2002 e N222/B/20002 e a nível interno pelo Decreto-Lei nº
163/2003, de 24 de Julho. A data de vidência do regime, em termos de admissão de
licenciamento das entidades, iniciou a 1 de Janeiro de 2003 com termo a 31 de Dezembro de
2006, e produção de efeitos até 31 de Dezembro de 2011.
No que concerne à delimitação das atividades a exercer, este regime passa a abranger
apenas três setores, os quais mantêm a Zona Franca Industrial, os Serviços Internacionais, o
Registo Internacional de Navios (MAR) e excluem-se os Serviços Financeiros e “intra-
grupos”.
Para requisito de licenciamento de entidades, surge pela primeira vez, como condição
para efeitos de aplicação do regime, a imposição de plafonds limitativos dos benefícios, em
função dos postos de trabalho:
51
12 milhões de euros de 6 até 30
20 milhões de euros de 31 até 50
30 milhões de euros de 51 até 100
125 milhões de euros mais de 100
Contudo, para Palma (2003) a imposição destes requisitos para a criação de trabalho,
eram, à data, algo paradoxais, uma vez que a Região Autónoma da Madeira vivia numa
situação próxima de pleno emprego.
Outra particularidade importante deste segundo regime recai sobre o fato de se passar
a tributar as novas sociedades autorizadas a operar na ZFI e Centro de Serviços Internacionais,
em sede de IRC. Assim que passou-se a tributar as empresas em:
1% 2003 a 2004
2% 2005 a 2006
3% 2007 a 2011
52
2.4 Regime III
3% 2007 a 2009
4% 2010 a 2012
5% 2013 a 2020
Assim que, às entidades referidas, que prossigam atividades industriais, são ainda,
passíveis de uma dedução de 50% à coleta de IRC desde que, segundo o n.º 5, do artigo 36º
EBF, preencham, pelo menos, duas das seguintes condições:
12
Nova prorrogação da Comissão sobre o prazo para a admissão de novas empresas no (CINM), por mais seis
meses, no âmbito do atual Regime III.
53
a) Contribuam para a modernização da economia regional, nomeadamente através da
inovação tecnológica de produtos e de processos de fabrico ou de modelos de negócio;
e) Criem, pelo menos, 15 postos de trabalho, que devem ser mantidos durante um
período mínimo de cinco anos.
De acordo com o disposto do n.º 2 do mesmo artigo as entidades que pretendem
beneficiar do presente regime devem: (1) iniciar as suas atividades no prazo de seis meses, no
caso dos serviços internacionais, e de um ano, no caso de atividades industriais ou serviço
marítimo contando da data de licenciamento; (2) observar ainda um dos seguintes requisitos
de elegibilidade:
Criação de seis ou mais postos de trabalho nos seis primeiros meses de atividade.
13
Artigo aditado pelo DL n.º 13/2008, de 18 de Janeiro e alterado pelo DL n.º 108/2008, de 26 de
Junho, pela Lei n.º 83/2013, de 9 de Dezembro (com entrada em vigor a partir de 10 de Dezembro de 2013 e com
produção de efeitos a 1 de Janeiro de 2013) e pela Lei n.º 83-C/2013 de 31 de Dezembro.
54
Quadro 10: Plafonds máximos aplicados à matéria coletável – Regime III
55
2.5. Análise comparativa dos três regimes fiscais do CINM
- Serviços
financeiros
56
Tributação dos
juros Isenção Tributados
Isenção
e dividendos
repartidos
57
Capítulo 5 – O impacto económico e regional do CINM
14
Hager W. and Levin M. (2002), The Madeira Internacional Business Centre: the Economic Context and
European Interests.
58
Gráfico 2: Contributo do CINM em termos de VAB
Em 2000 e 2001, 17% e, em 2002, 20% do VAB total de tais atividades da RAM.
Assim que, as empresas do CINM significavam, em termos de VAB, 23%, 22% e 27%,
respetivamente, do VAB total das empresas não financeiras da Madeira.
Aquando do conjunto das atividades financeiras exercidas na madeira a contribuição
do CINM era de 70%, 48% e 49%, respetivamente em 2000, 2001 e 2002.
30%
25% 21% 21%
20% 18%
15% PIB
10%
5%
0%
2000 2001 2002
Nestes mesmos anos, o seu contributo para o PIB regional da Madeira e para o VAB
a preços de base atingiu percentagens idênticas, respetivamente de 21%, 18% e 21%. Em geral
e segundo estes indicadores, a ZFM representava nos mencionados anos cerca de um quinto da
economia da Madeira, com forte prevalência das atividades dos sectores não financeiros.
59
O mérito do regime de auxílios de Estado – no qual não existia qualquer
obrigatoriedade administrativa de criar empregos ou de investimento – levou a Comissão a
considerar que o regime constituía “um dos instrumentos mais dinâmicos da economia
regional”.
Recentemente, a 31 de Dezembro de 2013:
50
ZFI
263
MAR
1590
SI
1903
Total
Isto resulta num espetro empresarial que representa 12% do investimento estrangeiro
em Portugal em 2013.
No mesmo ano, o CINM foi responsável por 14,5% de receitas fiscais da Região
Autónoma da Madeira, totalizando cerca de 123 milhões de euros. A SDM e as empresas
sediadas na Zona Franca Industrial e no CINM pagaram aproximadamente 73,6 milhões de
euros de imposto sobre o rendimento coletivo, o que representou 41% da receita gerada pelo
imposto cobrado aos lucros de todas as empresas madeirenses.
A atividade foi igualmente responsável por outros 39 milhões de euros de IVA, com
os cerca de três mil trabalhadores que desenvolvem a sua atividade na região a pagarem cerca
de 10 milhões de euros de imposto sobre o rendimento singular.
As empresas que desenvolvem a sua atividade na Zona Franca e no CINM investiram
200 milhões de euros só no ano 2012.
Em relação ao emprego em 2013, 616 trabalhadores desenvolvem a sua atividade na
Zona Franca e 2.313 em empresas que desenvolvem a sua atividade em serviços
internacionais, os outros 3.387 profissionais são tripulantes dos navios e embarcações
registados no MAR, resultando num total de 6.316 postos de trabalho diretos, e de emprego
indireto, que a EU estima ser de 80% do emprego direto.
60
O fato de que o CINM nunca constou da lista de paraísos fiscais da OCDE, tal que as
suas práticas, “se encontram sujeitas às mesmas regras, condições e requisitos que as
atividades exercidas no resto do território nacional, sem exceções” e que existe uma “total
transparência do regime (…), traduzida no facto de se aplicarem as mesmas regras relativas à
fiscalização, controlo e supervisão aplicáveis no demais território nacional, não existindo
quaisquer peculiaridades em matéria de sigilo”, juntamente aos resultados económicos já
alcançados, torna evidente a necessidade de manutenção do regime, como um veículo
imprescindível para o desenvolvimento económico e social da Madeira, através da
diversificação e modernização da respetiva estrutura produtiva de bens e serviços. E neste
sentido, deve ser apoiado e continuado (Palma, 2003; 2006).
Sendo a Madeira uma ilha ultraperiférica e insular, com uma economia uni-setorial e
pouco diversificada, devido às dificuldades e condições que lhe são associadas, o Centro
Internacional de Negócios da Madeira representa um instrumento crucial para o seu
desenvolvimento económico, através da captação de investimento externo, aumento de receita
fiscal e da empregabilidade, ajudando a criar uma autossuficiência e autonomia de que a
região necessita.
A questão pertinente que agora se coloca é, terá o CINM a competitividade fiscal que
é necessária para alcançar os seus objetivos?
No próximo ponto deste trabalho, temos como intuito a análise e comparação dos
regimes fiscais do CINM de forma detalhada, no que diz respeito às consequências das
mudanças introduzidas (ganhos ou perdas) para a competitividade fiscal do Centro e para o
desenvolvimento regional da ilha.
De acordo com o disposto no artigo 7º, n.º2 da LGT, “ a Tributação deverá ter em
consideração a competitividade e internacionalização da economia portuguesa, no quadro de
uma sã concorrência”.
61
De fato muito se fala da competitividade do nosso sistema fiscal, no entanto,
geralmente de forma negativa, salientando-se a falta dessa competitividade principalmente
quando comparado com outros sistemas fiscais.
Neste sentido, Palma (2006) faz a seguinte questão: “Será que na prática, no que
reporta ao CINM, as alterações sucessivamente introduzidas no regime têm vindo a considerar
a competitividade e a internacionalização da economia Portuguesa no quadro de uma sã
concorrência?”
É certo que, no decorrer da sua existência, esta praça cativou investimento externo e
desenvolveu a economia Madeirense porém, devido à ausência de uma estratégia nacional
coerente, que origina numa instabilidade legislativa, tem vindo a perder competitividade ao
longo dos seus três regimes. De forma a constatar tal fato, iremos analisar os impactos das
constantes alterações ao regime do CINM.
No gráfico 4 é possível verificar a evolução do CINM relativamente ao número de
empresas licenciadas desde o seu ano de criação até 2013.
5978
5610
5272
4886
4281 4473
4195
3871
3611
3392
3231
2981
2572 2686
2138 2281
1845
1674
1477 1860
1131
817
7 57 209439
2007
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2008
2009
2010
2011
2012
2013
62
O CINM começou em 1988 com apenas 7 empresas licenciadas, e durante 12 anos,
mais propriamente até ao ano 2000, o seu nível de captação de empresas foi crescente, tendo
atingido o seu pico, com aproximadamente 6000 empresas licenciadas no ano 2000.
O primeiro regime permaneceu em vigor desde 1988 a 2000, os seus benefícios
incluíam, a área financeira, para além das três atividades já mencionadas, a isenção de
tributação de IRC e ausência de plafons. Este regime demonstra resultados positivos e
crescente capacidade de captação de investimento externo, e elevado nível de competitividade
fiscal face aos benefícios e condições atribuídas.
A entrada do Regime II deu-se em 2001, acarretando um conjunto de mudanças nos
benefícios fiscais anteriormente atribuídos.
Tais alterações incluem a amputação do setor dos serviços financeiros e «intra-
grupo», bem como a diminuição dos benefícios fiscais em sede de IRC, ao caducar a isenção
de tributação do imposto, passando a ser tributado a uma taxa de 1% entre 2003 e 2004, de 2%
entre 2005 e 2006 e, de 3% entre 2007 até 2011.
Como requisito principal surge, pela primeira vez, a criação de postos de trabalho
como condição sine qua non para a concessão do regime, através da aplicação de plafonds
máximos à matéria coletável.
O terceiro regime revela uma estrutura semelhante ao anterior, continuando a incluir a
aplicação de plafonds máximos à matéria coletável, a ausência de atividades financeiras e
«intra-grupo» e a tributação a taxas reduzidas de IRC. Todavia, as taxas de tributação deste
último aumentam ligeiramente.
Contudo, o problema não está ligado ao aumento da tributação em sede de IRC, uma
vez que, a taxa de tributação continua a ser uma taxa reduzida e favorável. A grande
preocupação prende-se com o fato da eliminação da praça financeira e da imposição criação de
postos de trabalho através de plafonds máximos à matéria coletável.
No seguinte gráfico é possível ver de forma mais detalhada a decrescente evolução do
CINM ao longo dos três regimes existentes.
63
Gráfico 5: O número de empresas do CINM e os três regimes fiscais
7000
6000
5000
4000 Regime I
3000 Regime II
Regime III
2000
1000
0
1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014
Como podemos averiguar a partir dos regimes II e regime III é notável a absoluta
inversão na tendência de evolução do Centro.
É importante realçar que os limites máximos aplicados à matéria coletável, aquando
aprovados para o terceiro regime, apresentavam valores menores que os atuais. Em Maio de
2009 foi apresentada uma notificação à Comissão visando a revisão dos mencionados plafonds
com base nos efeitos negativos destes para a competitividade do Centro e da região. A
negociação decorreu de forma normal com as três rondas de pedidos de esclarecimentos pela
Comissão e inclusive com a concessão de um período adicional, para além do prazo normal,
de apresentação dos esclarecimentos finais por parte do Governo da República contudo, o
Governo optou pelo cancelamento do processo de negociação em 2010.
Para agravamento da conjuntura, a 17 de Outubro de 2011 aquando da Proposta de
Lei do Orçamento de Estado para 2012 surge uma nova medida que reduz os benefícios fiscais
do CINM, através da caducidade da isenção dos dividendos distribuídos aos sócios das
empresas e sobre os juros de suprimentos.
A constatação destes fatos transmitiu uma imagem extremamente negativa sobre a
efetiva intenção política por parte do Governo Português em assegurar as condições de
competitividade do CINM em comparação com outras praças europeias. Criou-se assim uma
instabilidade legislativa que trouxe falta de confiança no Centro por parte das sociedades lá
64
sediadas e, consequentemente o início da retirada de muitas empresas cujo volume de
negócios eram elevadíssimos e com forte aptidão de geração de receitas fiscais.
Entidade País
Sousa Cruz Suíça
Chevron-Texaco Califórnia
Swatch Suíça
Yahoo Califórnia
Caixa Geral de Depósitos Cayman
Livermore Malta
Um dos exemplos das milhares de empresas que deixaram a praça da Madeira, devido
a tais restrições, foi a tabaqueira brasileira «Sousa Cruz», uma dos maiores da América Latina,
com lucros na ordem dos 100 milhões de euros. Esta empresa transferiu a sua atividade para a
Suíça na qual paga um imposto de 8% mas, em contrapartida não está condicionada aos
plafonds atribuídos como condição para usufruir de tributação reduzida.
A esta lista junta-se a grande petrolífera norte-americana, Chevron-Texaco, a Swatch,
a Yahoo, e até mesmo a Caixa Geral de Depósitos, que passou a sua sucursal financeira para
Cayman.
A sociedade Livermore pertencente ao Grupo Chevron-Texaco apresentou, em 2010,
um lucro tributável de 1.084 milhões de euros, pelo que a sua deslocalização para Malta
representou uma perda de mais de 40 milhões de euros de impostos para a região.
Desde a apresentação do OE em 17 de Outubro em 2011 até a sua aprovação, 30 de
Novembro, 44 empresas cancelaram a sua licença no CINM. Após 4 dias apenas saíram mais
85 empresas, gerando um total de 129 empresas que representavam um lucro tributável em
2010 superior a 1.347 milhões de euros, o qual significa uma perda de receita fiscal de 54
milhões de euros.
65
Nos primeiros 11 meses deste ano abandonaram o Centro 318 empresas, as quais
representavam 1700 milhões de euros e, em perda de receita de receitas fiscais 140 milhões de
euros.
As praças europeias concorrentes para onde estão ser transferidas as empresas do
CINM são, essencialmente, a Suíça, Áustria, Holanda, Luxemburgo, Malta e Chipre.
Em suma, desde 2011 até Abril de 2012 saíram 790 empresas, o que diz respeito a
uma perda fiscal em sede de IRC de 160 milhões de euros (à taxa de 4%) que deixaram de
pagar nesse ano, e em 2013 (à taxa de 5%) que pagariam 200 milhões. Para além disso,
registou-se uma perda de 10 mil milhões de euros relativamente ao volume de depósitos que
terão saído após os benefícios fiscais.
Os números de baixas não pararam de aumentar, assim que até ao final do ano de
2012 saíram do centro cerca de 1000 empresas, 200 das quais no primeiro trimestre que
equivale a uma perda de receita de 60 milhões de euros.
Em 2012 a receita foi de 128.9 milhões (IVA, IRS e Impostos especais de consumo),
o que constitui números muito inferiores aos números perdidos só em IRC devido à saída das
empresas.
No que respeita ao PIB regional em 2011, a Madeira revela sofrer uma diminuição de
2,2%.
O VAB das atividades de comércio por grosso e a retalho, reparação de veículos
automóveis e motociclos, transportes e armazenagem, atividades de alojamento e restauração e
das atividades financeiras e de seguros na Região Autónoma da Madeira também foi
negativamente influenciado pelo comportamento das empresas localizadas no Centro
Internacional de Negócios da Madeira, sendo ainda de destacar o decréscimo do VAB do ramo
da construção que registou uma variação de (–)8,2%.
Em 2012 o PIB nacional assinalou um decréscimo nominal de 3,5% e de 3,2% em
termos reais. A Região Autónoma da Madeira apresenta-se como a que registou o maior
decréscimo em volume, sendo este de 7,1%. Segundo o INE, mais uma vez, este resultado tal
como já tinha ocorrido no ano anterior mas de forma menos acentuada está fortemente
influenciado pela saída de diversas empresas de dimensão relevante que anteriormente
66
operavam a partir do CINM, levando a que o VAB das atividades aí desenvolvidas tivesse
sofrido uma assinalável redução.
Contudo, é de salientar que em 2013 ocorre uma ligeira subida do número de
empresas licenciadas no CINM. Francisco Costa, o presidente da SDM, relacionou esta
“ligeira melhoria” com uma decisão comunitária de Julho que melhorou as condições de
competitividade do CINM, permitindo que “novos investidores externos voltassem a escolher
o CINM como base para as suas operações de vocação internacional”.
O acontecimento, é explicado pelo fato de que atual governo retomou o processo e
voltou as negociações com a Comissão, sendo que a Lei nº 83/2013, de 9 de Dezembro veio
alterar o artigo 36.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais aumentando em 36,7% os limites dos
plafonds a que está sujeito o lucro tributável das empresas do Centro Internacional de
Negócios da Madeira (CINM), com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2013.
Esta decisão representou um passo importante para melhorar a competitividade fiscal
e desenvolvimento do CINM.
Não há retorno das empresas que abandonaram o Centro, contudo em 2013 é
comprovada a entrada de 100 novas entidades ao Centro Internacional de Negócios da
Madeira. No final do ano, a ZFM era constituída por cerca de 1640 empresas licenciadas,
registando-se durante o ano 146 novos licenciamentos, crescimento de mais de 70% em
relação a 2012.
Nos primeiros três meses de 2014, o Centro Internacional de Negócios da Madeira
(CINM) registou a adesão de 42 novas empresas. Um crescimento de mais do dobro de novas
empresas em relação ao período homólogo de 2013 que confirma a tendência de recuperação
do CINM na captação de novos investimentos, iniciada no ano passado.
67
Gráfico 6: Variação do número de postos de trabalho no CINM
Isto deve-se ao fato de que 80% do emprego criado no CINM resultou das empresas
do Regime I (não sujeitas aos plafonds), enquanto os Regime I e III (sujeitos a plafonds) são
responsáveis apenas por, 16% e 4%, respetivamente, do emprego total.
É possível afirmar que a alteração com base nos limites máximos à matéria coletável
origina vários efeitos negativos que traduzem-se numa redução da competitividade fiscal do
CINM, a qual resulta em menor capacidade de atração de novas empresas e investimentos e
induz a um grande número de saída de empresas que por consequência leva a menor
competência de criar emprego.
Resta saber o impacto dos regimes fiscais, em especial dos benefícios fiscais nas
empresas da Zona Franca Industrial, isto é numa perspetiva microeconómica.
68
Parte II – O Centro Internacional de Negócios da Madeira: estudo empírico
à Zona Franca Industrial
69
compreender as perceções individuais do mundo. Procuram compreensão, em vez de análise
estatística. Os dados qualitativos podem também ser usados para suplementar, validar,
explicar, iluminar ou reinterpretar dados quantitativos obtidos dos mesmos sujeitos.
Os estudos qualitativos possuem nas suas características essenciais os quatro pontos
cardeais levantados por Flick (2007), em torno dos quais analisamos, de um modo geral, os
estudos desta natureza.
O primeiro ponto refere-se à concordância entre teorias e métodos. Assim, nos
estudos qualitativos, devem ser privilegiados métodos e teorias abertas e flexíveis,
compatíveis entre si, capazes de fazer frente à tarefa de lidar com a complexidade inerente aos
objetivos e aos problemas a contemplar.
O segundo ponto refere-se ao emprego das diferentes perspetivas dos sujeitos. O
contributo da investigação qualitativa nota-se pela sua capacidade de oferecer respostas que se
apoiam nas perspetivas das diferentes pessoas envolvidas e de criar, deste modo, uma rede de
ações e de significações entre as mesmas.
O terceiro ponto refere-se ao emprego da autorreflexão, como sendo a atitude que
leva o/a investigador/a a atuar como um crítico/a de si mesmo/a, da sua própria investigação e
das pessoas nela envolvidas. Esta atitude implica o alinhamento com uma posição construtiva
e interventiva.
O quarto ponto refere-se à variedade de enfoques e de métodos. As investigações
qualitativas são reconhecidas pelo facto de possuírem diversos esquemas de confronto com a
realidade, tendo em vista a sua compreensão holística (Flick, 2007).
As próprias linhas evolutivas da investigação qualitativa atestam esta tentativa
constante de inovação e de reflexão.
Por último, ainda na linha dos enfoques, as investigações qualitativas são
consideradas humanistas, naturalistas e flexíveis, em função: da sua necessidade de
compreender as pessoas nos seus ambientes naturais; da sua recusa em submeter-se a uma
estandardização de métodos; da sua liberdade em se deixar conduzir, tanto pelas atitudes
criativas como pelo improviso (Taylor, & Bogdan, 1987).
70
Postas estas primeiras considerações iniciais acerca dos métodos de investigação
adotados, passamos, na secção seguinte, à apresentação da metodologia seguida nesta
dissertação, desde a técnica de recolha de informação, ao tratamento e discussão dos dados.
71
fenómeno em estudo; (b) a estrutural, que analisa dados com a finalidade de se encontrar
padrões que possam clarificar e/ou explicar a situação em estudo; e (c) a reflexiva que visa, na
sua essência, interpretar ou avaliar o fenómeno a ser estudado, quase sempre por julgamento
ou intuição do investigador.
Na análise estrutural, os dados são analisados de modo a se identificarem padrões
inerentes ao discurso, texto, acontecimentos ou outros fenómenos. Este tipo de análise é
utilizada quando se tem por objetivo, por exemplo, fazer a análise de uma conversa.
A análise reflexiva difere da interpretativa e da estrutural porque o investigador não
se limita a descrever o fenómeno tal como ele surge, mas inclui também as suas intuições e
juízos de valor quando o retrata ou avalia. Na presente investigação recorremos, sempre que
oportuno, a esta técnica de análise de dados.
72
1.3 Questões de investigação e apresentação da entrevista
ENTREVISTA
O IMPACTO DO FACTOR FISCAL NO INVESTIMENTO: A PERCEPÇÃO DAS
EMPRESAS SEDIADAS NO CINM
5 – Qual a atual importância que dá aos benefícios fiscais concedidos à atividade da sua
empresa?
73
Segundo a lista disponibilizada pela SDM, o universo de entidades licenciadas na ZFI
é de trinta e sete (37) empresas. Contudo, dentro destas, apenas foi possível obter colaboração
de treze (13) empresas.
De forma a enriquecer o presente estudo, é de sublinhar que, durante a investigação,
foi possível ter uma breve reunião com o sénior management da SDM, Doutor Nuno Teixeira,
o qual se disponibilizou para colaborar nesta investigação.
Conforme já referido anteriormente o universo da amostra totalizou, então, treze (13)
empresas. Pode revelar-se um número exíguo, todavia, note-se que a pesquisa qualitativa não
leva em consideração o critério numérico para assegurar a sua representatividade pois em
igual razão a amostragem de qualidade é aquela que possibilita abranger todo o problema
investigado em suas múltiplas dimensões. (Minayo, 2002)
Para preservar a identidade das empresas, optou-se por usar codinomes. Assim, no
seguinte quadro segue-se a identificação das entidades da pesquisa:
Ano de Usufrui do
Empresa CAE Setor de atividade licenciamento benefício
na ZFI fiscal
Produção de eletricidade de
1 A 35112 1998 Sim
origem térmica
Importação e
2 B 23510 1996 Sim
Comercialização
3 C 52102 Armazenagem 1981 Não
4 D 52102 Armazenagem não frigorífica 1999 Sim
Preparação de produtos da
5 E 10201 2006 Sim
pesca e da aquicultura
6 F 10611 Moagem de cereais 2012 Sim
Lavagem e Limpeza a Seco
7 G 96010 2003 Sim
de Têxteis e Peles
Fabricação de estruturas de
8 H 25110 2002 Sim
construções metálicas
Fabricação de sabões,
9 I 20411 1993 Sim
detergentes e glicerina
Fabricação de produtos de
10822 confeitaria;
10 J 1994 Sim
46361 Comércio por grosso de
açúcar
74
Fabricação de fermentos,
11 K 10891 leveduras e adjuvantes para 2014 Sim
panificação e pastelaria
Fabricação de estruturas de
12 L 25110 2010 Sim
construções metálicas
Valorização de resíduos de
13 M 38321 2002 Sim
metálicos
Como podemos observar, através do Quadro 11, o CAE e por consequência o setor de
atividade, das empresas entrevistadas, são diversos, bem como o ano de licenciamento na ZFI,
o que constituí uma amostra diferenciada, a qual possibilita uma análise de estudo ampla e
discernida.
Outro aspeto a observar é que, das treze empresas entrevistadas apenas uma delas
(Empresa C) não usufrui do benefício fiscal, isto é, não desfruta de uma tributação em sede de
IRC de 5%, sendo tributado à taxa normal da região. É necessário não esquecer este dado na
análise dos nossos resultados.
75
Capítulo 2 – Apresentação e discussão dos resultados
76
garantir a receção, armazenagem e expedição de combustíveis na RAM no novo local.”
Acrescenta ainda que “os benefícios fiscais não foram em nada importantes para esta decisão.”
Esta conclusão deixa, porém, de revelar-se curiosa.
No caso da empresa A, relativamente às razões iniciais para o licenciamento em
1998 na zona franca industrial, o sujeito entrevistado admitiu não possuir o conhecimento de
todas as razões existentes na altura, ainda assim, refere que umas das principais foram os
benéficos fiscais concedidos, bem como as relações com as outras empresas.
No que diz respeito a estas relações, consideramos oportuno salientar que as
entidades mencionadas referiram, a este propósito, o seguinte:
77
2.2 - Importância atribuída por parte das empresas aos benefícios fiscais concedidos
“ esse fator tem uma certa importância, no entanto se fosse só por ele não estávamos cá. Outras
vantagens como a proximidade à matéria-prima fornecida pela empresa A, a mão-de-obra, junto a
menores custos de transporte são aspetos que se revelam muito mais importantes do que o IRC.”
(empresa G)
“esses benefícios são mais importantes para empresas com lucros, e para aumentar a
competitividade centro, porque atrai mais empresas estrangeiras.” (empresa E)
78
tanto aquando do seu licenciamento como para a atual realidade da empresa. As empresas F e
J essencialmente porque exportam um elevado número de produtos e a K porque tem como
objetivo a sua “internacionalização”.
Como conclusão geral podemos aferir que, não obstante o fator fiscal não ser um
fator decisivo para o licenciamento das empresas na região, é, indiscutivelmente, para uma
parte das empresas entrevistadas, considerado como importante e muito importante, em
especial, à medida que a empresa vai crescendo e desenvolvendo a sua atividade.
Empresa F: “a imposição dos postos de trabalho através dos plafonds não tem
impacto material na realidade da empresa. E o final da isenção dos dividendos será mais um
fator inibidor à instalação de investidores no CINM.”. De forma explicitar esta situação a
empresa disponibilizou alguns dados do balanço mais propriamente das contas de
investimento realizado com o intuito a comprovar a sua resposta.
79
Depois da Conta 41 ativos fixos tangíveis 5 332 175 €
aplicação dos Conta 42 ativos intangíveis 45 342 €
plafonds Conta 43 ativos financeiros 11 500 €
As pequenas variações verificadas nas contas dos ativos são resultados de outras
razões contabilísticas que não as alterações ao regime fiscal.
“ esta questão não se aplica à empresa. Esta empresa é de pequena dimensão e se por acaso
tivéssemos eventualmente que cumprir esses limites, não haveria nenhum problema, porque somos
uma empresa física, com 20 postos de trabalho diretos e 40 indiretos e com tudo” (empresa H).
“ a imposição dos plafonds não afetou em nada a empresa pois já tinha 30 funcionários. Para as
empresas de serviços internacionais foi prejudicial e também para a zona franca da madeira pois
perdeu força e competitividade em comparação com outras zonas francas” (empresa E).
“as alterações não tiveram qualquer impacto na nossa empresa, no entanto não pretendemos fazer
mais investimentos nas nossas instalações, sendo que todo o investimento de construção/edificação
de armazéns é deixado à SDM no ato da nossa saída. Estas imposições só afastam as empresas da
zona franca deslocando as empresas para outros territórios. ” (Empresa M)
Para finalizar, a entrevista terminou com a seguinte questão: “Qual a sua opinião
acerca do regime fiscal do CINM?”
Vejamos, pois, de seguida, quais as respostas obtidas.
A empresa A: não revelou ter uma conceção relevante acerca deste na perspetiva da
sua empresa, mas sim na perspetiva do CINM, no qual referiu o seguinte: “Realmente
antigamente entraram muitas empresas para apenas usufruir do subsídio, mas sempre
deixavam algum dinheiro cá, e tinham empregados, mesmo sendo poucos poderiam vir a ter
mais. O CINM é que ficou a perder com as alterações feitas.”
A empresa E: sua resposta vai de encontro com a resposta dada pela empresa A,
salientando que considera que deveria voltar ao regime I, uma vez que era o que “deixava
mais impostos para a região (…) que eram pagos direta ou indiretamente pelas empresas.”
Acrescenta que no passado houve “uma má vontade política do governo português” mas
80
espera “que atualmente voltem atrás para criar competitividade para o CINM. As empresas
que saíram já não voltam, mas poderiam atrair mais investimento”.
A empresa H: também admite que não tem um conhecimento pormenorizado acerca
deste, possuindo um conhecimento macro com o qual baseia a sua opinião em que o âmbito
dos benefícios deveria ser alargado. Reconhece que no passado houve oportunidade para o
fazer mas “não houve vontade” e agora compreende que é mais difícil. “Acho que com as
condições que este parque tem, que são melhores do que qualquer parque industrial poderia ter
seguramente o dobro das empresas que já cá estão e ser muito mais competitivo”.
No que diz respeito aos fatores fiscais, as opiniões foram muito semelhantes, sendo
que a maioria das empresas inquiridas considerou ser um regime adequado às empresas da ZFI
81
(A, B, E, F, G, H, J e K), uma vez que o benefício fiscal em sede de IRC, isto é, a tributação
do rendimento em 5% é um aspeto positivo em comparação com o imposto cobrado às
empresas fora da zona franca. Sublinham, todavia, que para as empresas dos serviços
internacionais, as novas alterações fiscais são prejudicais, pois consideram que o regime do
CINM não se revela um regime fiscal muito competitivo na atracão de empresas estrangeiras
e, por consequência, no aumento das receitas fiscais da região. Três das empresas (D, J e L)
referiram que o benefício fiscal não é adequado, devendo existir mais benefícios fiscais. As
empresas C e M recusaram-se a responder a esta questão.
Verifica-se, assim, claramente, que as principais queixas das empresas da ZFI recaem
sobre os fatores não fiscais. O fato das rendas serem elevadas foi um dos aspetos mais
mencionados. A este respeito, algumas empresas explicaram que várias entidades, que
poderiam criar um número significativo de postos de trabalho e investimento na região, viram-
se obrigadas fechar e sair da zona franca industrial, uma vez que não acharam compensatório
os custos de instalação e as rendas, quando comparados com os benefícios obtidos
fiscalmente.
Outro aspeto é o fato de sentirem pouca flexibilidade da concessionária em negociar
estes custos fixos de acordo com a conjuntura económica atual e evolução do volume de
negócios de cada empresa.
A reduzida disponibilidade do porto e da alfândega foi também referido como um
ponto negativo uma vez que na opinião de algumas empresas entrevistadas diminui a
capacidade de importação e exportação.
Assim sendo, após a análise integral dos resultados às questões de investigação, é
possível observar que, apesar do fator fiscal ser um aspeto importante para a decisão de
licenciamento das empresas na zona franca industrial, numa perspetiva de longo prazo, notou-
se que a importância deste diminui, em consequência do surgimento de outros fatores, não
fiscais, os quais passaram a ser condicionantes mais constrangedores do exercício da sua
atividade.
Ao contrário do que foi analisado na revisão da literatura e do que sucedeu com as
empresas licenciadas na parte dos serviços internacionais (empresas de investimento
estrangeiro), nas entidades da zona franca industrial não observaram grandes impactos nos
82
resultados da empresa, nem na sua capacidade de investimento, devido às recentes alterações
aos benefícios fiscais concedidos (à imposição da criação de postos de trabalho através dos
plafonds máximos à matéria coletável nem do final da isenção dos dividendos).
Esta situação é passível de ser justificada pelo fato de que as empresas da ZFI além
de oferecerem um número considerável de postos de trabalho, quando possuem lucros, estes
não são muito elevados e como tal são abrangidos pelos limites/plafonds impostos.
Infelizmente o encerramento de algumas empresas na ZFI também é uma realidade,
contudo deve-se a fatores não fiscais (custos fixos de estar licenciado) que pelas conclusões
retiradas, podemos averiguar que representam as verdadeiras preocupações das empresas
industriais.
Para finalizar, não podemos deixar de referir, como muito oportuna, a posição do
Sénior Management da SDM, Doutor. Nuno Teixeira, acerca das questões de investigação
formuladas.
No que diz respeito ao impacto da imposição dos plafonds nas empresas da ZFI, o
Doutor Nuno Teixeira menciona que é normal que não se verifiquem grandes influências ou
alterações na realidade destas empresas, explicando que em termos de lucros, são poucas as
que conseguem atingir mais de dois milhões de euros (limite mínimo imposto pelos plafonds
até 2 postos de trabalho), portanto estas não sofreram qualquer alteração a este nível uma vez
em que não é aplicável a restrição à material coletável. As suas principais preocupações estão
viradas para os custos de elaboração, transportes, instalação entre outros. A grande
preocupação destas empresas passa por fatores não fiscais. Segundo o mesmo, existem
grandes empresas na ZFI que fazem a diferença na economia da nossa região, que é por
exemplo o caso da Insular, contudo o verdadeiro impacto dos plafonds afetou imenso o CINM
mas na parte das empresas de prestação de serviços internacionais, nas multinacionais e
estrangeiras que usufruem de uma faturação muito elevada, na casa dos mil milhões de euros.
Note-se que não compensa uma empresa com lucros deste montante ter um teto tão
insignificativo para dedução de matéria coletável e ainda ter de criar 100 postos de trabalho
que é um requisito muito difícil para uma empresa deste setor adquirir. Como explica, estas
constituem as empresas que realmente foram embora para outras praças mais competitivas,
83
que já não deixam milhões de receitas fiscais na região e que já não voltam mais, pois
perderam a confiança no regime e na sua regulamentação.
Em relação aos regimes existentes no CINM, o Doutor Nuno Teixeira deu a sua
opinião, afirmando que o melhor e mais competitivo foi sem dúvida o regime I, uma vez que
não existia imposto gerando grande atividade a nível de investimento estrangeiro. Refere que
apesar de que no início estas empresas não criassem muitos postos de trabalho, estas ainda
estariam em fase experimental e à medida que fossem confiando poderiam criar mais postos
de trabalho, mesmo que assim não fosse, existiriam mais empresas licenciadas e por
consequência mais criação de postos de trabalho. Para finalizar, o mesmo afirma que houve
uma melhoria com o alargamento dos plafonds mas ainda assim foi muito pequeno, na ordem
dos 3%, e o ideal era que estes não existissem.
84
Quadro 16: Síntese dos resultados obtidos
85
Capítulo 3 – Considerações finais
3.1 Conclusão
A crescente interdepêndencia económica, em resultado da integração europeia e
globalização, já não permite entender a fiscalidade como mera questão interna. Atualmente
nenhuma nação, nem mesmo as mais poderosas, podem fixar as suas opções em materia fiscal
sem ponderar e analisar devidamente as opções dos seus parceiros ou concorrentes. Em causa
estará direta ou indiretamente a sua competitividade.
A concorrência fiscal é sinónimo de aumento de qualidade. Mais importante,
aumento do desempenho e promoção do desenvolvimento económico. Portanto, proteger e
preservar o direito de exercer concorrência fiscal deve ser um objetivo fundamental.
No entanto, concorrência fiscal deve realizar-se de forma transparente e honesta. A
concorrência tributária passa a ser prejudicial ou desleal quando não observa tais requisitos e,
especialmente, quando são tomadas medidas a fim de encorajar o não cumprimento das leis
tributárias de outros Estados.
No que concerne à concorrência fiscal prejudicial a Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Económico (OCDE) bem como a União Europeia (EU) encarregam-se da
regulação e seu combate, nomeadamente, através do Código de Conduta da fiscalidade das
empresas, o Relatório do Comité dos Assuntos Fiscais sobre a concorrência fiscal.
O Centro Internacional de Negócios da Madeira está, na sua totalidade, sujeito às
regras comunitárias, sendo, pelo artigo n.º 1 do artigo 87 º do Tratado da CE (atual artigo 107º
da TFUE), configurado como regime de auxílios de Estado sob a forma fiscal, necessitando
para tal ser devidamente notificado e aprovado pela Comissão Europeia.
O regime da CINM não se configura como paraíso fiscal, mas como um regime fiscal
preferencial ou privilegiado, uma vez que as entidades licenciadas para o exercício de
qualquer atividade encontram-se sujeitas às mesmas regras de troca de informações e
supervisionamento das entidades oficiais exercidas no resto do território português, pelo que,
não existe impedimentos de natureza legal uma vez que o funcionamento de um regime como
o do CINM passa por uma correta inspeção e transparência do seu funcionamento.
86
Sendo a Madeira uma ilha insular e ultraperiférica, com uma economia uni-setorial e
pouco diversificada, devido às dificuldades e condições que lhe são associadas, o Centro
Internacional de Negócios da Madeira representa um instrumento crucial para o seu
desenvolvimento económico, através da captação de investimento externo, aumento de receita
fiscal e da empregabilidade, ajudando a criar uma autossuficiência e autonomia de que a
região necessita.
No que concerne aos resultados do estudo que recai sobre as empresas da zona franca
industrial, podemos aferir que, não obstante o fator fiscal não ser um fator decisivo para o
licenciamento das empresas na região, é, indiscutivelmente considerado pelas empresas como
um fator “importante” e “muito importante”, para a sua atividade.
87
Apesar das questões de investigação recaírem sobre o regime fiscal, a maioria das
empresas mostrou tendência para expor o seu juízo com os fatores não fiscais do CINM.
Demonstrando que estes talvez possam ter um papel mais significativo e preocupante para a
atividade das empresas da zona industrial.
Todavia, é de realçar que a maioria dos entrevistados sublinharam que para as
empresas dos serviços internacionais, as novas alterações fiscais foram muito prejudicais.
Devido às tais, o regime do CINM não se revela um regime fiscal muito competitivo na
atração de empresas estrangeiras e, por consequência, não manifesta um aumento das receitas
fiscais da região.
O estudo empírico tinha como objetivo aferir acerca da influência da fiscalidade, mais
precisamente do impacto das alterações aos benefícios fiscais do regime do CINM no
investimento das entidades na região Autónoma da Madeira.
Dada a metodologia de investigação escolhida, a entrevista por aplicação de
questionário, é possível a investigação realizada ter sofrido influências da investigadora desde
a recolha de dados até à sua interpretação. É inevitável à própria natureza do ser humano.
Na concretização deste estudo surgiram vários obstáculos, sendo o primeiro a
dificuldade em obter resposta e colaboração por parte das empresas da região. O número de
empresas inquiridas é muito baixo e as respostas são díspares. Não podemos, assim,
generalizar resultados para toda a população de empresas sediadas na região. Porém, as
respostas obtidas não deixaram de suscitar curiosidades e mais investigação no futuro, em
particular, analisar o impacto dos benefícios fiscais no caso particular das empresas de
Serviços Internacionais.
88
3.3 Referências bibliográficas
Azevedo, M.E. (2013), A concorrência fiscal prejudicial, Ciência e Técnica Fiscal, 431.
Bairrada, C. & Martins, A. (2008), Uma nota sobre a justiça fiscal em Portugal, Consultado
Março 11, 2014 de http://www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/egg/v13n3/v13n3a03
Basto, J.G. X. (2004), Tópicos para a Reforma Fiscal Impossível, Notas Económicas, 19, 20-
34.
Competitividade – que papel para a zona franca da Madeira?, Paper presented Conferência
Portugal Competitivo.
Egger, P., Loretz, S., Pfaffermayr, M., & Winner, H. (2009). Bilateral effective tax rates and
foreign direct investment. International Tax and Public Finance, 16(6), 822.
Ernst & Young (2009), Foreign Direct Investment in Portugal. What does the Future hold?.
Lisbon, Ernst & Young Portuguese Attractiveness Survey
89
Field, T. F. (2003), Tax Competition in Europe and America. Tax Notes International
Magazine, 98(14)
Flick, U. (2007). Introducción a la investigación cualitativa (2ª ed.). (T. del Almo, Trad.).
Madrid, A Coruña: Ediciones Morata, Fundación Paideia Galiza.
Ghiglione, R., & Matalon, B. (2001). O Inquérito (4ª ed.). (C. L. Pires, Trad.) Lisboa: Celta.
Janeba, E. e Schjelderup, G. (2002), Why Europe should love tax competition – and the U.S.
even more so, NBER Working Paper 9334
Keuschnigg, C. (2008), Exports, foreign direct investment, and the costs of corporate taxation.
International Tax and Public Finance, 15, 460-477
Lopes, C.M. d. M. (2008), Quanto custa pagar Impostos em Portugal?, Coimbra: Almedina;
90
Palma, C. C. & Lobo, C. (2006). Limitações Internacionais à definição da política fiscal
nacional. Paper presented at the Competitividade e Concorrência Fiscal.
Palma, C.C. (2010), O Código de Conduta da fiscalidade das empresas e a boa governança
fiscal – O futuro do Grupo de trabalho, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, 3.
91
Santos, A. C. d., & Palma, C. C. (1999). A Regulação Internacional da Concorrência Fiscal
Prejudicial, Ciência e Técnica Fiscal, 395.
Silva, S.T. da (2013), Direito Fiscal – Teoria Geral, Coimbra: Imprensa da Universidade de
Coimbra
Teixeira, S., & Diz, H. (2005). Estratégias de internacionalização. Lisboa: Publisher Team.
Tesch, R. (1990). Qualitative Research: Analysis Types & Software Tools. Bristol, PA: Falmer
Press.
Yin, R. (1994). Case study research – Design and methods (2ª ed.). London: Sage
Publications.
Zodrow, G. R. (2003), Tax Competition and Tax Coordination in the European Union.
International Tax and Public Finance, 10(6), 651
92