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Nancy Laura Gouveia Baptista

O Regime Fiscal do Centro Internacional de


Negócios da Madeira (CINM) - Impacto dos
benefícios fiscais ao investimento

Dissertação de Mestrado em Contabilidade e Finanças, apresentada à Faculdade de

Economia da Universidade de Coimbra para obtenção do grau de Mestre

Orientador: Professora Doutora Cidália Maria da Mota Lopes

Coimbra 2014
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Aos meus pais, Vasco e Elisabete,
Aos meus verdadeiros amigos
ao Miguel,
DEDICO

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Agradecimentos
À minha orientadora, a Doutora Cidália Maria da Mota Lopes, sincero agradecimento
pela disponibilidade, apoio, paciência e por todas as críticas e sugestões efectuadas no
decorrer da realização desta dissertação, que se demonstraram cruciais para a concretização
deste estudo.

À Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e todos os seus cooperantes.

Ao Doutor Nuno Teixeira e a todas as entidades que se mostraram interessadas e


colaboraram para a realização do presente estudo.

A toda a minha família, principalmente aos meus pais,Vasco e Elisabete, por todo o
amor, incentivo, confiança e apoio incondicional que se revelaram a base da minha motivação
e tiveram um impacto decisivo na minha evolução ao longo deste percurso académico.

Ao Miguel pela companhia nas intermináveis horas de trabalho, pela paciência, força e
conforto que foram essenciais na realização desta dissertação e, sem dúvida, tornaram este
percurso muito mais fácil.

Aos meus amigos que desde sempre estiveram presentes quando mais precisei e me
proporcionaram momentos inesquecíveis.

Um enorme obrigada!

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vi
Resumo
Por via de maior mobilidade existente a fiscalidade tem vindo a desempenhar um papel
cada vez mais relevante no processo de captação de investimento externo. Por sua vez este
assume-se como um fator crítico para o desenvolvimento das economias, bem como para a sua
competitividade em termos nacionais e internacionais. Com efeito tem-se acentuado a
importância da concorrência fiscal entre Estados.
Na atual conjuntura insta aumentar essa concorrência em Portugal principalmente a
nível de atração de investimento externo, sendo que o CINM representa o único instrumento
utilizado para este fim.
Neste sentido, a presente dissertação tem como intuito expor e analisar de forma crítica
o regime fiscal do CINM, mais precisamente o impato das sucessivas alterações ao benefícios
fiscais do Centro sobre o desenvolvimento económico e regional da ilha, bem como sobre a
capacidade do CINM fazer face ao seu propósito de captar investimento externo e criar
emprego.
Assim que, primeiro faz-se uma análise ao contributo do CINM para a região e qual o
impato das alterações aos benefícios fiscais numa perspetiva macroeconómica, mais
precisamente sobre o CINM e sobre as receitas fiscais para a ilha. Numa segunda parte tenta-
se aferir acerca do impato das mudanças ocorridas sobre o investimento no caso particular das
empresas da Zona Franca Industrial. Para este efeito, optou-se por uma metodologia
qualitativa na qual se insere uma entrevista como objectivo de recolha de dados das empresas
em questão.
No que diz respeito aos resultados do estudo, podemos concluir que, não obstante o
fator fiscal não ser um fator decisivo para o licenciamento das empresas na região, é,
indiscutivelmente considerado pelas empresas como um fator importante e muito importante,
para a sua atividade.

Palavras chave: Concorrência Fiscal, Competitividade, Centro Internacional de


Negócios da Madeira (CINM), Benefícios Fiscais.

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Abstract
Due to the growing mobility, taxation has been playing an increasingly important role
in the process of attracting foreign investment. This is perceived as a critical factor for the
development of economies, as well as their competitiveness in national and international
terms. This has emphasized the importance of tax competition between states.
At the present juncture it urges to increase competition in Portugal mainly at the level
of attraction of foreign investment and the CINM is the main tool used for this purpose.
In this sense, this thesis has the intention to expose and critically analyze the tax
regime of the CINM, more precisely the impact of successive changes to the tax benefits of
the center on economic and regional development of the island, as well as on the capacity of
the CINM to face its own purpose of raising foreign investment and to create jobs.
Initially we make an analysis of the contribution to the CINM for the region and the
impact of changes to tax benefits from a macroeconomic perspective, more precisely on the
CINM and on tax revenues for the island. The second part is an attempt to assess the impact
on these changes on investment of companies in the Zona Franca Industrial. For this purpose,
we chose a qualitative methodology in which an interview was conducted with the purpose to
collect data from the companies concerned.
The results have demonstrated that, despite the fact that the fiscal factor is not a
decisive factor when it comes to licensing of company in the Island, it is,without any doubt of
major importance and it’s considered by the companies as a relevant factor for its activity.

Keywords: Fiscal Competition, Competitiveness, Centro Internacional de Negócios da


Madeira (CINM), Tax Benefits.

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Lista de siglas

AEP- Associação Empresarial de Portugal


CE- Comissão Europeia
CEE- Comunidade Económica Europeia
CINM- Centro Internacional de Negócios da Madeira
CIRC - Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas
EBF- Estatuto dos Benefícios Fiscais
ECOFIN- Economic and Financial Committee
EM- Estados Membros
FMI- Fundo Monetário Internacional
G7- Grupo dos Sete
G8- Grupo dos Oito
GAFI- Grupo de Ação Financeira Internacional
IDE – Investimento Direto Interno
IRC- Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas
IRS- Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares
IVA- Imposto sobre o Valor Acrescentado
LGT- Lei Geral Tributária
MAR- Registo Internacional de Navios
NACE- Nomenclatura estatística das atividades económicas na Comunidade Europeia
NEC- Neutralidade na Exportação de Capitais
NIC- Neutralidade de Importação de Capitais
OCDE- Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
OE- Orçamento de Estado
OMC- Organização Mundial do Comércio
ONU- Organização das Nações Unidas
PIB- Produto Interno Bruto
RAM- Região Autónoma da Madeira

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RUP´s – Regiões Ultraperiféricas
SDM – Sociedade de Desenvolvimento da Madeira
SF – Sistema Fiscal
SGPS – Sociedades Gestoras de Participações Sociais
SI – Serviços Internacionais
TFUE – Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia
TJCE – Tribunal de Justiça da Comissão Europeia
EU – União Europeia
VAB – Valor Acrescentado Bruto
ZEC – Zona Especial Canaria
ZFI – Zona Franca Industrial
ZFM – Zona Franca da Madeira

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Lista de Quadros

Quadro 1: O combate à concorrência fiscal prejudicial: revisão de estudo…………….. 18

Quadro 2: Recomendações do Relatório da OCDE – Legislação de práticas internas…..24

Quadro 3: Recomendações do Relatório da OCDE - Tratados de

natureza fiscal…………………………………………………………………………….. 25

Quadro 4: Recomendações do Relatório da OCDE - Intensificação da

cooperação internacional ………………………………………………………………………… 27

Quadro 5: Código de Conduta vs Relatório OCDE …………………………………….. 31

Quadro 6: Atividades exercidas no CINM ……………………………………………... 45

Quadro 7: Plafonds máximos aplicados à matéria coletável – Regime II…………….… 51

Quadro 8: Taxa de IRC – Regime II………………………………………………….….52

Quadro 9: Taxa de IRC – Regime III……………………………………………….……53

Quadro 10: Plafonds máximos aplicados à matéria coletável – Regime III……….…….55

Quadro 11: Os regimes fiscais do CINM: síntese comparativa…………………………. 56

Quadro 12: Local de destino de entidades que saíram do CINM……………………….. 65

Quadro 13: Identificação das empresas entrevistadas……………………………………74

Quadro 14: Motivos para o licenciamento na ZFI………………………………………. 76

Quadro 15: Fatores fiscais e não fiscais…………………………………………….……81

Quadro 16: Síntese dos resultados obtidos..…………………………………………..… 85

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Lista de Gráficos

Gráfico 1: Número de empresas licenciadas no CINM………………………….……..45

Gráfico 2: Contributo do CINM em termos de VAB…………………………………. 59

Gráfico 3: Contributo do CINM para o PIB regional da Madeira……………………. 59

Gráfico 4: Número de empresas constituídas, por ano, no CINM

no período 1998-2003………………………………………………………………….. 62

Gráfico 5: O número de empresas do CINM e os três regimes fiscais………………... 64

Gráfico 6: Variação do número de postos de trabalho no CINM ……………………. 68

xiv
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Indíce
Introdução Geral…………………………………………………………………….. 1

Parte I: O Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM):


Enquadramento Normativo....................................................................................... 5

Capítulo 1 - Os objetivos do Sistema Fiscal e a Concorrência Fiscal………….. 5


1 Os Objetivos do Sistema Fiscal ……………………………………………… 5
1.1 Princípio de Equidade………………………………………………………. 6
1.2 Princípio da Neutralidade e Eficiência Económica …………………………..7
1.3 Princípio da Simplicidade…………………………………………………… 9
1.4 Capacidade concorrencial…………………………………………………… 10
2 Concorrência Fiscal e Internacional…………………………………………… 10
2.1 Noção de Concorrência Fiscal………………………………………………. 11
2.2 O papel da Concorrência Fiscal Internacional para a atração de
IDE e motor de desenvolvimento…………………………………………….. 12
3 A Concorrência Fiscal como Prejudicial ……………………………………… 15

18
Capítulo 2 - Formas de regulação da Concorrência Fiscal………………………
1 O Combate à Concorrência Fiscal Internacional……………………………… 18
1.1 A Posição da União Europeia ……………………………………………… 20
1.1.1 O Código de Conduta …………………………………………………… 20
1.1.1.1 Natureza Jurídica e Âmbito de aplicação…………………………... 20
1.1.1.2 Critérios para a qualificação das medidas fiscais prejudiciais……...22
1.1.1.3 Congelamento e desmantelamento das medidas fiscais
prejudiciais………………………………………………………………….. 22
1.2 A Posição da OCDE ………………………………………………………... 23
1.2.1 Natureza e âmbito de aplicação …………………………….................. 24
1.2.2 Recomendações ……………………………………………………….. 24
1.2.3 Critérios de Identificação………………………………………………. 28

xvi
1.2.4 O Forúm……………………………………………………………….. 30
2. Análise comparativa entre as posições do Código de Conduta
da União Europeia e as recomendações da OCDE…………………………….. 30

Capítulo 3 – Auxílio de Estado: breve enquadramento


normativo e teórico……………………………………………………………….. 34
1 Noção de Auxílios de Estado…………………………………………………. 34
1.1 Princípio da incompatibilidade dos Auxílios de Estado……………………. 35
1.2 Fundamentos para a atribuição de Auxílios de Estado………………………36
1.3 Derrogações ao Princípio da incompatibilidade……………………………. 37
1.4 Fundamentos de Controlo dos Auxílios de Estado ………………………… 40

Capítulo 4 - O Regime Fiscal do CINM ………………………………………… 43


1 O Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM)…………………… 43
1.1 Caracterização do CINM…………………………………………………… 43
1.2 As Normas do Direito Comunitário e os Auxílios de Estado………………. 46
2 O Regime Fiscal do CINM………………………………………………….. 48
2.1 Regime Fiscal Preferencial…………………………………………………. 48
2.2 Regime I…………………………………………………..………………… 50
2.3 Regime II…………………………………………………………………… 51
2.4 Regime III………………………………………………………………….. 53
2.5 Análise comparativa dos três Regimes Fiscais do CINM……………………55

Capítulo 5 - Impacto económico e regional do CINM …………………………. 58


1 O contributo do CINM para o desenvolvimento da Madeira………………… 58
2 Consequências das alterações ao regime fiscal do CINM…………………… 61
2.1 O número de empresas licenciadas…………………………………………. 63
2.2 O emprego na Madeira………………………………………………………67

Parte II – O Centro Internacional de Negócios da Madeira:


Evidência Empírica………………………………………………………………… 69

xvii
Capítulo 1 – Metodologia de Investigação ……………………………………….. 69
1 Metodologia da investigação: considerações prévias………………………….69
1.1 A técnica de recolha de informação: entrevista……………………………...71
1.2 Objetivos gerais do estudo………………………………………………….. 72
1.3 Questões de investigação e apresentação da entrevista……………………. 73
1.4 Caraterização da população-alvo e participantes do estudo: a amostra………73
Capítulo 2 - Apresentação e discussão dos resultados…………………………… 76
2.1 Motivos para licenciamento na Zona Franca Industrial (ZFI)……………… 76
2.2 Importância atribuída por partes das empresas aos benefícios
fiscais concedidos……………………………………………………………… 78
2.3 A imposição da criação de postos de trabalho através de plafonds máximos
à matéria coletável e final da isenção dos dividendos: o impacto destas alterações
nos resultados e capacidade de investimento da empresa…………………………… 79
2.4 O regime fiscal do CINM: a perceção das empresas sediadas na ZFI……… 80
Capítulo 3 – Considerações finais…………………………………………………. 86
3.1. Conclusão …………………………………………………………….……. 86
3.2 Limitações ao Estudo ………………………………………………………. 88
3.3 Referências Bibliográficas …………………………………………………. 89

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xix
Introdução Geral

Nos últimos anos, a integração e a globalização das economias e dos mercados


aceleraram. Hoje, a crescente multiplicidade de desenvolvimentos verificados num sistema
económico internacional, caraterizado pela abertura de economias nacionais ao exterior e o
incremento do comércio mundial, acompanhado por um aumento extraordinário dos
movimentos de capitais, bens e serviços, veio alterar de forma significativa a análise clássica
dos efeitos das políticas fiscais na perspetiva de uma economia fechada. (Egger, Loretz,
Pfaffermayr & Winner, 2009; Tanzi 2000;)
A relevância da temática abordada, é consequência da estrutura atual da economia
global, que assenta na diluição das fronteiras das nações, sobretudo em termos políticos,
económicos e socio-culturais. Esta revela-se numa caraterística incontornável da economia dos
nossos dias. (Teixeira & Diz, 2005)
Neste contexto urge estudar a relação do tecido empresarial com os mercados
externos dada a complexidade dessa opção como também o crescente peso do fator fiscal no
processo de internacionalização (Brás e Santana, 2013) e a forma como as empresas encaram a
fiscalidade internacional aquando da abordagem aos mercados externos.
Atualmente, os indivíduos, dentro de certos limites regulamentados, podem ser capazes
de escolher, entre muitos países, onde trabalhar, fazer compras, investir o capital, alocar as
atividades de produção das empresas que controlam, e assim por diante. Estas decisões levam
em conta o impacto dos impostos, especialmente devido à divergência dos sistemas fiscais dos
diferentes países.
Os resultados destes desenvolvimentos nos sistemas fiscais foram e são muito fortes,
pelo que, neste contexto assume grande importância várias temáticas, essencialmente a
concorrência fiscal dos Estados e a capacidade de competição fiscal entre eles.
No caso de Portugal, o seu nível de tributação do rendimento empresarial foi um fator
pouco atrativo em 2009 no planeamento dos investimentos de um leque de empresas
internacionais (Ernst & Young, 2009), sendo esta uma variável fiscal crítica para o
crescimento económico e produtividade dos países (OCDE, 2007).

1
A atual mundialização da economia e a concorrência fiscal que dela deriva não
podem deixar de suscitar a reflexão sobre as consequências em termos de política fiscal,
importando analisar os seus possíveis efeitos sobre as receitas fiscais para o Estado, a
repartição da carga fiscal, bem como sobre o investimento e a empregabilidade (Pereira,2008).
Na economia portuguesa um instrumento fiscal característico de um particular efeito
da globalização, que é passível de exemplificar os efeitos de competitividade, é o Centro
Internacional de Negócios da Madeira (CINM). Este representa um regime de baixa tributação
concedido através de um auxílio de Estado – medida destinada a isentar, total ou parcialmente
as empresas de um determinado sector, sob uma carga fiscal, com o intuito de atrair
investimento externo de forma a diversificar e desenvolver a pequena e unisetorial economia
da região ultraperiférica da Madeira. Note-se que para este propósito o Centro necessita de
uma elevada capacidade concorrencial, isto é, capacidade competitiva do sistema fiscal que o
abrange.
O Centro usufrui de um regime de incentivos fiscais controlados e aprovados pela
Comissão Europeia. Contudo, ao longo dos últimos anos, tem sofrido várias alterações ao seu
regime em termos de tipos de atividades aprovadas e benefícios fiscais concedidos.
Neste sentido, a presente dissertação tem como objetivo expor e analisar de forma
crítica, os regimes fiscais do CINM. Para o efeito, elabora-se uma análise simples, mas sem
descurar o rigor do regime fiscal da Madeira, onde irá tentar-se aferir acerca do impacto das
alterações sucessivas dos regimes fiscais no desenvolvimento económico e regional da ilha,
bem como na capacidade do CINM, em específico, o caso particular da Zona Franca Industrial
para captar investimento e emprego.
Como tal surgem as seguintes questões de investigação:
A que nível a concorrência fiscal pode ser considerada benéfica e um instrumento
para o desenvolvimento económico?
O que se entende por concorrência fiscal prejudicial, critérios de qualificação e quais
as medidas de combate?
O CINM representa um instrumento de competitividade fiscal e desenvolvimento
económico compatível com as normas do direito comunitário e concorrência fiscal legal?

2
Qual o impacto das consequências das alterações ao regime fiscal preferencial do
CINM?

De forma a responder tais questões, o presente trabalho divide-se da seguinte forma:


A primeira parte intitula-se “O Centro Internacional de Negócios da Madeira -
enquadramento normativo”, a qual procede-se à revisão da literatura sobre o tema.
No primeiro capítulo são analisados alguns dos objetivos de que o Sistema Fiscal é
instituído, a saber, os objetivos financeiros, a equidade, a neutralidade, a simplicidade e por
fim a capacidade concorrencial, desenvolvendo e explicando cada um deles individualmente.
Assim este ponto destina-se a compreender o que se entende por concorrência fiscal, uma vez
que se trata de um elemento fundamental na inclusão do estudo em questão. A este fim é
abordado a sua crescente importância, a sua definição, bem como as suas vantagens e
desvantagens.
Na primeira é exposto a perspetiva de vários autores acerca de cada uma das
vantagens económicas, políticas e sociais originárias da concorrência fiscal, realçando o seu
papel como motor essencial para a criação de competitividade fiscal e incremento do
desenvolvimento.
Na segunda vertente pretende-se apresentar em que medida a concorrência fiscal é
passível de causar distorções, podendo gerar aspetos negativos que possam criar ou agravar
problemas potenciais, resultando numa concorrência fiscal prejudicial.
Neste sentido, o segundo capítulo desta dissertação destina-se a desenvolver o tema
que recai sobre o combate à concorrência fiscal prejudicial fazendo um levantamento dos
critérios de qualificação utilizados para tal propósito e conhecer as principais medidas levadas
a cabo pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), e pela
União Europeia (EU), em matéria de regulação e combate aos paraísos fiscais e a regimes
fiscais preferenciais, nomeadamente, o Código de Conduta da fiscalidade das empresas, o
Relatório do Comité dos Assuntos Fiscais sobre a concorrência fiscal. Por fim, é feita uma
análise comparativa entre os dois trabalhos realizados.
Sendo o CINM um regime concedido através de um auxílio de Estado, no terceiro
capítulo torna-se importante a compreensão do que se entende por auxílio de Estado, a sua

3
característica geral de incompatibilidade com o mercado comum, bem como as derrogações
existentes a este princípio de incompatibilidade, onde salienta-se o caso particular das regiões
ultraperiféricas, e por último os fundamentos existentes para o controlo deste tipo de auxílios.
O quarto capítulo centra-se na análise do Centro Internacional de Negócios da
Madeira no qual é abordado a caraterização do Centro bem como o intuito da sua criação
como instrumento para a diversificação e desenvolvimento da Região Autónoma da Madeira.
Refere-se o tipo de regime vigente - regime fiscal preferencial - e a evolução deste ao longo
dos últimos anos que resultou em três regimes distintos. Neste ponto é também abordado o
CINM em relação às normas do direito comunitário e aos auxílios de Estado, evidenciando a
sua compatibilidade com o mercado comum e a não prejudicialidade para a concorrência
fiscal.
O quinto e último capítulo desta primeira parte da dissertação destina-se à análise do
contributo do CINM para o desenvolvimento da ilha da Madeira, quer a nível de impacto no
Produto Interno Bruto (PIB) e Valor Atualizado Bruto (VAB) da região, quer sobre o número
de empregos e mais importante sobre a diminuição das receitas fiscais. É também objetivo
deste estudo analisar o impacto das sucessivas alterações ao regime fiscal para a atração de
investimento externo e competitividade do Centro como também desenvolvimento da ilha da
Madeira, evidenciando as melhorias e perdas no investimento, no número de empregos e das
receitas fiscais para o Estado.
A segunda parte da presente dissertação intitula-se o “O Centro Internacional de
Negócios da Madeira (CINM) – evidência empírica” no qual é realizada uma investigação
acerca da importância e impacto das alterações aos benefícios fiscais sobre o investimento das
empresas da Zona Franca Industrial do CINM.
No primeiro capítulo, faz-se uma breve apresentação da metodologia de investigação
seguida, explicando o tipo de entrevista utilizada (semiestruturada), a definição da amostra e a
exposição das questões de investigação.
No segundo capítulo é realizado uma apresentação e análise dos resultados obtidos
com a metodologia utilizada.
Por fim, segue as conclusões retiradas e as limitações ao estudo.

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Parte I: O Centro Internacional de Negócios da Madeira: Enquadramento
Normativo

Capítulo 1 - Os objetivos do Sistema Fiscal e a Concorrência Fiscal

1. Os Objetivos do Sistema Fiscal

“O conceito de sistema fiscal é tradicionalmente usado para designar o conjunto de


impostos existentes num certo espaço, reportando-se, sobretudo, ao domínio normativo, ou à
legislação fiscal existente” (Pereira, 2011).
A sua definição e intuito está presente no artigo 103º da Constituição da República
Portuguesa, na qual poderemos aferir que: “O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades
financeiras do Estado e outras entidades públicas e uma repartição justa dos rendimentos e da
riqueza.”
Nabais (2011) define sistema fiscal como “ o sistema dos impostos ou dos tributos que

sejam de considerar impostos de um ponto de vista jurídico-constitucional”.


Segundo Pereira (2011), um sistema fiscal deve obedecer a um conjunto de objetivos,
sendo que, a este respeito, o autor menciona que a constituição reconhece a necessidade de os
impostos se articularem entre si de modo ordenado, de que resulte um conjunto global e
coerente em face dos objetivos visados e em interação com estes.
Assim que, o sistema fiscal português tem por objetivo cumprir os princípios de
Direito Fiscal, esses princípios intitulados de musgravianos devido à intervenção de
Musgrave, sem descurar a influência de Adam Smith e posteriormente de Stiglitz, de modo
que estes sejam um conjunto de particularidades positivas para um bom sistema fiscal (Silva,
2013).
O principal objetivo recai sobre a obtenção de receitas necessárias ao financiamento
das despesas do setor público e representa, deste modo, uma transferência dos contribuintes,
individuais e coletivos, para o Estado (Lopes, 2008).

5
Basto (2004) afirma que as realidades modernas vieram impor alguns objetivos,
designadamente, o de manter o mais simples possível o sistema tributário, de forma que seja
possível administrá-lo bem, o de o conservar estável durante períodos suficientemente
dilatados, em ordem a facilitar o cálculo a mais longo prazo dos agentes económicos, e o de
concorrer com outras jurisdições, na economia aberta e globalizada que é da realidade
contemporânea.
Neste sentido, de acordo com a literatura disponível, podemos incluir nos objetivos
de um bom sistema fiscal, os seguintes:
 Equidade;
 Neutralidade;
 Eficiência Económica;
 Simplicidade;
 Capacidade Concorrencial.
Segundo Lopes (2008) estes princípios, embora sejam atendidos de uma aceitação
generalizada, são frequentemente passíveis de entrar em conflitos, sendo que diversos
economistas declaram diferentes perspetivas sobre o equilíbrio adequado que deverá existir
entre eles.
Vejamos separadamente cada um destes objetivos ou princípios a que um bom
sistema fiscal deve obedecer.

1.1. Princípio de Equidade


O princípio de equidade impõe que a distribuição de impostos seja justa entre os
cidadãos, pois indivíduos com capacidade contributiva idêntica deverão ser tributados de
forma análoga. Para Adam Smith e muitos dos autores do século XVII, este conceito
implicava que “os impostos devem incidir sobre as pessoas em proporção dos benefícios ou
vantagens que estas retiram das despesas públicas”. (Pereira, 2011)
Bairrada & Martins (2008) defendem que o princípio da equidade pressupõe duas
dimensões, a equidade horizontal e a equidade vertical.
A equidade horizontal conjetura que indivíduos na mesma situação ou em situação
semelhante deverão ser tributados de igual forma. Na realidade dificilmente pode-se afirmar

6
que dois contribuintes são rigorosamente iguais. Estes até podem possuir idêntica matéria de
incidência de imposto, mas podem experimentar níveis de bem-estar e de capacidade
contributivas distintas conforme características, como sejam o estado civil, a idade e a
condição física.
Contudo, Pereira (2011) afirma que os principais problemas de equidade se colocam
atualmente e estão distantes de estar resolvidos, uma vez que, por exemplo, um mesmo
montante de rendimento é objetivo de tributação muito diferenciada conforme a sua origem ou
natureza.
Quanto à equidade vertical, esta assenta no pressuposto que contribuintes com
capacidades de contribuição diferentes devem ser tributados de modo desigual. Desta forma, a
autoridade tributária quer que independentemente do grau de contribuição, o sacrifício seja o
idêntico para ambos. Segundo o autor, a capacidade contributiva aumenta mais rápido do que
o rendimento, o que implica que os impostos devam ser progressivos.
“A justificação económica para a progressividade tem sido feita com base no
argumento de que só ela permitiria, ainda que tendencialmente, uma igualdade de sacrifícios”
Pereira (2011).
Em suma, o autor afirma que: “O princípio da equidade tem sido considerado como
prioritário na hierarquia dos requisitos a satisfazer pelos impostos. Daí que num grande
número de países mereça consagração constitucional.”

1.2. Princípio da Neutralidade e Eficiência Económica


Atualmente, o principal foco dos sistemas fiscais é ser ‘neutral’, isto é, tender para a
eliminação dos impostos que penalizem de forma desigual, ou seja, prejudiquem mais uma
pessoa em relação a outra.
O imposto ideal será aquele que retira do contribuinte em proporção da sua riqueza
ou despesa, de modo a que altere ao mínimo o seu padrão de comportamento.
As exigências deste princípio resumem-se à redução das taxas marginais do imposto e
adoção de bases tributárias gerais com um reduzido apelo a isenções ou benefícios fiscais.
Note-se que estas exigências não se observam no sistema legal português, pois o rendimento

7
do contribuinte português ainda se encontra sujeito a elevadas taxas marginais de imposto e à
existência de inúmeras isenções ou benefícios fiscais.1
Segundo Teixeira (2012) “o princípio da eficiência está intimamente relacionado com
o princípio da neutralidade” pois a eficiência só ocorrerá se o sistema for neutro, impondo que
todo rendimento seja sujeito à mesma taxa de imposto.
“Um imposto pode influenciar de vários modos a eficiência económica,
nomeadamente quanto à oferta e procura de trabalho, à poupança e a sua utilização produtiva,
à afetação de recursos em geral. É que o imposto é algo que se impõe aos agentes económicos
e pode, por isso, modificar preços relativos das variáveis económicas diretas ou indiretamente
relacionadas com a sua incidência. Dessa modificação dos preços pode resultar a ineficiência
económica (…) O objetivo é, assim, minimizar esta, ou seja, assegurar que os impostos sejam
o menos distorcionários possível” (Pereira, 2011).
Essas alterações poderão provocar um efeito de rendimento, que resulta da criação ou
subida do imposto, diminuir o rendimento do indivíduo e, por consequência, o seu poder de
compra, ou, um efeito de substituição, na qual a alteração poderá levar o contribuinte a
substituir uma atividade/bem por outra(o). Por outro lado, é sabido que os mercados têm
falhas, deste modo, os impostos podem ser usados para compensar algumas dessas falhas e,
em vez de ser em fonte de ineficiência económica, são um instrumento que contribui para
aumentar essa eficiência.

1
Num contexto de circulação internacional de capital, os fiscalistas prestam especial atenção a este
princípio. Este subdivide-se em neutralidade na exportação de capitais (NEC) e neutralidade de importação de
capitais (NIC).
Segundo Pereira (2011) de acordo com a neutralidade exportação de capitais (NEC) o investidor deve
pagar o mesmo imposto, quer invista no país de residência, quer no estrangeiro. Deste modo, é favorecida a
tributação no país de residência do rendimento mundial. Já segundo a neutralidade na importação de capitais
(NIC) o que importa é assegurar que todos os rendimentos investidos num determinado país são tratados da
mesma forma independentemente da sua origem. Esta neutralidade é assegurada quando todos os rendimentos
são tributados exclusivamente no país de origem (princípio da fonte).
Presentemente, tomando em consideração que a maioria dos países desenvolvidos são
simultaneamente importadores e exportadores, os dois objetivos acima mencionados deverão ser prosseguidos
simultaneamente.

8
1.3. Princípio da Simplicidade
A gestão dos impostos deve ser simples e clara, garantindo os menores custos
administrativos para os sujeitos passivos no âmbito do cumprimento das obrigações acessórias
(custos de cumprimento), bem como a redução dos custos de transação (custos originados
pelas divergências e litígios no âmbito da aplicação da lei fiscal) e dos custos de contexto
(custos decorrentes da “má qualidade” das leis fiscais, que torna difícil e onerosa a sua
consulta e aplicação e facilita a fraude e a evasão fiscais, uma vez que, existe evidência
demonstrativa de que esta aumenta na razão direta do acréscimo de complexidade do Sistema.
Segundo Nabais (2012) é necessária uma luta adequada, eficaz e corajosa contra a
evasão fiscal que campeia um pouco por toda a parte, particularmente facilitada com a
moderna hipertrofia e complexidade técnica da generalidade da legislação fiscal e da crescente
desmaterialização dos pressupostos de facto dos impostos. O autor apela mesmo à necessidade
de reduzir significativamente, o número de leis fiscais que nos regem, bem como simplificar
as restantes, de modo a que tenhamos uma legislação fiscal que não só seja suscetível de ser
aplicada, mas sobretudo possa ser aplicada com custos bem menores do que aqueles que se
verificam atualmente. A melhor solução, seria, todavia, redesenhar o sistema fiscal para que
muitas das oportunidades de fuga, arbitragem e evasão fossem eliminadas e, simultaneamente,
incentivar os contribuintes ao cumprimento voluntário da lei.
De acordo com Lopes (2003) na verdade o sistema fiscal ganha, e muito, se for visto
pela generalidade do público como justo. Isso contribui para não tornar a evasão socialmente
aceitável e aumentará o grau de cumprimento espontâneo da lei.
A simplicidade do sistema fiscal faz com que este seja compreendido pelos
contribuintes facilitando a relação contribuinte - fisco e evitando custos desnecessários,
revelando-se uma característica fundamental de um sistema fiscal justo e competitivo (Pereira,
2011).
Neste sentido Basto (2004) explica que a constituição de um sistema fiscal mais
simples seria mais facilmente entendido pelo público, sendo que a nível de evitar custos
desnecessários, inclui-se menores perdas de tempo no cumprimento das obrigações fiscais e
menores custos de angústia associados à probabilidade de falhar no preenchimento de
declarações.

9
Os custos inerentes a alguma complexidade do sistema fiscal podem recair sobre o
setor público através de custos de administração ou sobre o setor privado através de custos de
cumprimento.2

1.4. Princípio da capacidade concorrencial


O fenómeno da globalização e a livre mobilidade do fator capital tem consequências
prementes nas receitas fiscais e fomenta a competitividade fiscal entre Estados. (Brás e
Santana, 2013; Field, 2003; Tanzi, 2000 )
A influência da tributação definida por cada Estado-membro nas bases tributárias
disponíveis para outros governos, como seria de esperar, envolve tanto beneficiários como
prejudicados. Assim sendo, na atualidade, os diversos regimes económicos e políticos, o peso
político, económico e financeiro dos Estados, leva a que, cada vez mais, os governos sejam
confrontados com a necessidade de estabelecer sistemas fiscais mais competitivos (Tanzi,
2000; Brás e Santana, 2013).
Neste contexto, Basto (2004) afirma que a capacidade concorrencial constitui hoje
um dos principais objetivos a que um bom sistema fiscal deve obedecer. Este princípio
analisaremos com mais detalhe na secção seguinte.

2. Concorrência Fiscal e Internacional


O mercado evoca concorrência e, por sua vez, este termo conduz quase sempre à
ideia de rivalidade, competição, luta ou porfia comercial.
Em face do crescente papel da fiscalidade no processo de captação e atração de
investimento direto estrangeiro e à incipiente (tributação indireta) ou inexistente (tributação
direta) harmonização fiscal na UE, tem-se acentuado a concorrência fiscal entre Estados
Membros. (Egger, Loretz , Pfaffermayr & Winner, 2009)
Até aos anos noventa, a concorrência fiscal, como instrumento de política fiscal para
atrair investimentos, bem como empresas, serviços, mercadorias, tecnologias e consumidores
2
Para mais informações acerca do princípio da simplicidade veja-se: Lopes, C. M (2003), Simplicidade e
Complexidade do Sistema Fiscal: algumas reflexões, in Fiscalidade, 13/14 , Lisboa, como também, Grupo de
Trabalho para a Simplificação do Sistema Fiscal (2007), Relatório da Simplificação, Caderno Ciência e Técnica
Fiscal, 205 ,Ministério das Finanças, Lisboa.

10
transfronteiriços, não era até então encarada como um fenómeno prejudicial, muito menos,
objeto de uma preocupação específica. Sendo que, até relativamente pouco tempo, era
considerada por vários autores, um fenómeno natural decorrente da soberania fiscal.

2.1 Noção de concorrência fiscal


Não é fácil definir ‘concorrência’. Como explica Santos (2003a) esta tem graus e
formas distintas. Em si mesma é uma noção abstrata que apenas ganha pleno sentido no modo
como se estrutura em cada mercado concreto.
Ao contrário da linguagem corrente, a concorrência não constitui um fenómeno
exclusivamente económico, sendo que revela-se também um princípio cívico e político. Assim
que é possível falar na concorrência interempresarial e concorrência institucional (Santos,
2003a).
Dentro da concorrência interempresarial, existem duas vertentes: a concorrência entre
e a concorrência para.
No primeiro sentido, a concorrência é por definição, em economia de mercado, a
forma normal de coordenação económica, na qual as empresas concorrem entre si por
mercados e clientes através de várias formas, por exemplo, preços, serviços, markting etc..
No segundo sentido, as empresas concorrem para atingir um determinado objetivo em
comum. A expressão representa cooperação e esta pode assumir formas contrárias ao primeiro
sentido, sendo que a cooperação entre empresas revela-se numa forma de suspensão de
competição entre elas.
Stiglitz (2000) refere que a concorrência perfeita dá-se quando um mercado
apresenta-se como um processo de interação entre sujeitos económicos (privados) e a
concorrência tem por função não apenas a obtenção de resultados ótimos na esfera de
produção e distribuição, mas também ao evitar que tais sujeitos disponham de um poder sobre
o mercado, evitando assim a situação de monopólio ou oligopólio.
No entanto, este cenário encontra-se muito longe da realidade. A internacionalização
e concentração deram origem a mercados de bens, de capitais ou de trabalho, cujos sujeitos
são grandes organizações, dotadas de efetivo e assimétrico poder ou influência e, por isso,
regulados pelo Estado ou por instituições internacionais (Santos, 2003a).

11
Assim que, é certo que existe concorrência fiscal entre empresas, em particular entre
empresas transnacionais, as quais desenvolvem as suas atividades em diversas jurisdições
fiscais. Contudo, como refere Santos (2003a) quando se fala de concorrência fiscal é no
sentido de concorrência entre jurisdições fiscais, da concorrência entre Estados, entre sistemas
ou políticas fiscais.
Segundo Wilson (1999) a influência da tributação definida por cada Estado Membro
nas bases tributárias disponíveis para outros governos está na génese do conceito de
concorrência fiscal internacional.
A concorrência entre Estados não visa a obtenção de maior quota de mercado, mas
direta ou indiretamente de uma maior quota de receita fiscal procedente da divisão
internacional da base tributária global.
Deste modo, a definição de concorrência fiscal dá-se quando o sistema de uma
entidade governamental afeta o sistema de outra entidade governamental, usualmente através
de um efeito nas receitas fiscais deste última. Ela resulta do fato dos Estados passarem a
considerar nas suas decisões a necessidade de adequar os impostos ao bem-estar social, ao
investimento e ao progresso científico, visando atrair investimentos ou não deslocá-los.
Neste sentido, é possível dizer que a concorrência revela-se em alguns casos como
prejudicial, mas em outros origina uma racionalização dos sistemas fiscais criando resultados
benéficos.

2.2. O papel da Concorrência Fiscal Internacional para atração IDE e


motor de desenvolvimento

Por norma, a concorrência fiscal, através das zonas de baixa tributação são, na maior
parte das vezes, associados a um planeamento fiscal ilegal. Todavia, nas últimas duas décadas,
o aumento da mobilidade do capital a nível mundial, assumiu para dar grande importância à
necessidade de uma estrutura fiscal de elevada competitividade entre Estados.
A diversidade dos sistemas fiscais dos Estados, a sua estrutura, composição e
articulação entre os impostos, diferentes níveis de fiscalidade e de esforço fiscal, a ação
administrativa e da justiça tributárias estão na base das políticas ativas e dos fatores
incontornáveis da concorrência fiscal.

12
Como referido anteriormente a concorrência tributária ocorre quando os Estados
alteram as respetivas normas tributárias a fim de atrair atividades empresariais, fluxos de
investimentos ou recursos humanos (Field, 2003). Deste modo, esta revela-se um motor de
competitividade, que por sua vez, tem como objetivo criar um enquadramento mais favorável
à captação de investimento (Keuschnigg, 2008).
É neste contexto, que o sistema fiscal revela-se um exemplo essencial para a
competitividade (Brás e Santana, 2013; Santos 2003a, Tanzi, 2003), mas não apenas no seu
desenho normativo, mais ou menos estático - isto é a nível da estrutura jurídica dos impostos,
as regras de incidência ou não incidência, as normas de isenção e outro benefícios entre outros
– mas também nos seus aspetos dinâmicos – existência de acordos ou não dos contribuintes
com a administração fiscal, a maior ou menor eficácia do sistema de informações fiscais, da
fiscalização e da ação administrativa (Santos, 2003a).
Através de um estudo do National Bureau for Economic Research (NBER)3
concluiu-se que a concorrência fiscal pode trazer mais vantagens que desvantagens. Isto
porque ao aumentá-la, a tendência é de melhorar o bem-estar dos contribuintes, uma vez que,
os gastos governamentais improdutivos, incluídos benefícios e pagamentos a políticos,
diminuem.
Neste contexto, existe um culminar de autores que defendem a concorrência fiscal
internacional, descrevendo diversos benefícios económicos e sociais, possíveis de ser
repercutidos da utilização de uma baixa tributação fiscal.
O investimento assume-se como um fator crítico para o desenvolvimento das
economias, bem como para a sua competitividade em nacionais e internacionais.
Segundo Mitchell (2009) a rivalidade entre os governos produz um impacto
incrivelmente desejável sobre a política fiscal. A concorrência fiscal resultante ajudou a
reduzir os impostos empresariais nos Estados da Europa Ocidental, verificando-se que a média
de imposto empresarial no mundo desenvolvido, foi afetada, passando de cerca de 48 por
cento em 1980, para menos de 27 por cento nos dias de hoje.

3 Janeba, E. e Schjelderup, G. (2002) “Why Europe should love tax competition – and the U.S. even more so”,
NBER Working Paper 9334

13
Conforme o mesmo autor a concorrência fiscal é sinónimo de aumento de qualidade.
Mais importante, aumento do desempenho e promoção do desenvolvimento económico.
Portanto, proteger e preservar o direito de exercer concorrência fiscal deve ser um objetivo
fundamental.
Com a melhoria do sistema jurídico de um Estado origina-se um quadro mais
adequado para o investimento, para o desenvolvimento económico e social, que traz grandes
vantagens competitivas em relação a outros Estados.
A concorrência fiscal internacional apresenta várias vantagens económicas, pelo que,
dentro de certos limites, pressiona os Estados a agir de forma mais rigorosa e eficiente na
cobrança dos seus impostos o que leva a um aumento da competitividade. Em muitos casos,
permite a sobrevivência económica dos Estados de periferia e regiões ultraperiféricas, uma vez
que, compensa o esvaziamento da periferia a favor do centro, das regiões mais pobres a favor
das regiões mais ricas - fenómeno que se verifica muito claramente dentro de Portugal –
criando maior riqueza e entidades mais sustentáveis.
Conforme explica, a pressão da concorrência surge de forma a incentivar uma melhor
alocação de recursos e aumentar a eficiência económica, melhorando a qualidade dos serviços
e, simultaneamente, evitar monopólios de mercado. Se se continuar a destruir ou limitar o
sucesso da concorrência fiscal, tantos as empresas, como os governos terão menos incentivos
para se comportar de forma mais responsável, melhorada e eficiente para continuar a atrair o
interesse (Mitchell, 2009).
No caso de Portugal, Abreu (2008) menciona que na corrida ao investimento
estrangeiro, este parte em desvantagem, designadamente face aos novos Estados Membros
(EM) da União Europeia (UE)4.
Frasquilho (2007) defende que Portugal encontra-se nesta situação - mal posicionado
ao nível da fiscalidade como fator de competitividade - devido à elevada carga fiscal suportada
pela economia nacional e pela reconhecida grande complexidade do SF português. A

4
Conforme dados mais recentes do Fórum Económico Mundial, Portugal, em matéria de competitividade, num
total de 142 países, ocupa a 45ª posição do ranking. No entanto, a prestação nacional é ainda mais modesta se nos
cingirmos ao espaço europeu, sendo que na União Europeia (UE) a 27 ficamos pelo 18º posto. Em relação ao
impacto dos impostos no incentivo para trabalhar ou investir no país, Portugal ocupa a 123ª posição de entre um
leque de 139 países, significando que revela-se num dos países em que os impostos mais desincentivam. (Barros,
2011).

14
diminuição da complexidade e aumento de estabilidade deste, é fundamental no planeamento
dos investimentos, pois os investidores procuram segurança, previsibilidade, consistência e
rapidez na aplicação das regras fiscais, sendo que em muitos casos estas condições são tão
importantes como a taxa efetiva de imposto.
Nesse sentido, a capacidade de Portugal absorver no futuro investimento direto
estrangeiro (IDE) será um fator chave na competitividade económica e na capacidade de
inovação da economia portuguesa (Neto, 2003).
“Para Portugal é crítico, a todo o momento, ter um sistema fiscal mais amigo do
investimento e da atividade empresarial que a vizinha Espanha” (Catroga, 2001). Esta
necessidade surge, porque a concorrência fiscal é uma componente do fenómeno da
globalização, onde a competição é mais evidente nos países com maior proximidade.
É neste sentido que Carrapatoso (2003) e Ludgero Marques (2009) realçam que é
necessária a redução dos impostos para obter um resultado económico positivo, defendendo
que os resultados do combate à fraude e evasão fiscal devem reverter a favor da redução da
carga fiscal suportada pelos contribuintes cumpridores.
O presidente da AEP refere que é inevitável que as disparidades fiscais gerem
distorções na economia que, para além de prejudiciais às empresas e à atratividade da
economia, acabam por se revelar pouco eficazes em termos de cobrança de receita. A política
fiscal portuguesa deveria favorecer a atratividade e a competitividade da economia, “adotando
o fortalecimento concorrencial das nossas empresas e do nosso território para a captação de
investimento direto externo”.

3. A Concorrência Fiscal como prejudicial


Não obstante à índole anterior e os benefícios fiscais resultantes do fenómeno da
concorrência fiscal internacional, note-se que como em qualquer competição, a concorrência
tributária deve realizar-se de forma transparente e honesta. Sendo que esta pode ser prejudicial
ou desleal quando não observa tais requisitos e, especialmente, quando são tomadas medidas a
fim de encorajar o não cumprimento das leis tributárias de outros Estados, nomeadamente,

15
com a deslocação de atividades para jurisdições onde a respetiva tributação seja mais
favorável. (Zodrow, 2003)
Tratando-se a concorrência fiscal da concessão de regimes especiais, isto é, regimes
mais favoráveis, com níveis de tributação mais reduzidos, ou mesmo, de ausência de
tributação, a residentes de outro Estado, com o intuito de atrair investimento ou receitas para
esse Estado, passou a ser encarado como um fenómeno predominantemente político, como um
elemento de concorrência institucional, na medida em que interfere com as condições que, em
cada Estado, permitem escolher o nível de receitas fiscais e, consequentemente, a forma de
Estado e o próprio tipo de civilização.
Na atualidade, não obstante à política fiscal dos Estados continuar a ser moldada por
objetivos tradicionais, a crescente mobilidade de pessoas e capitais oriunda da globalização da
economia implica que a política fiscal de um país tenha repercussões inevitáveis nos demais
parceiros. Deste modo, qualquer medida tomada por uma jurisdição fiscal no sentido de
diminuir a tributação traduz a uma ausência de harmonização que pode levar a
comportamentos de evasão fiscal, na obtenção de mais vantagem competitiva em relação às já
existentes, induzindo uma deficiente afetação dos recursos. (Azevedo, 2013)
Este fato pode conduzir assim à degradação fiscal, isto é, à erosão sucessiva das
receitas fiscais de Estados, que levará a uma não tributação pura e simples. (Brás, 2011; Tanzi,
2000; Zodrow, 2003)
Leitão (2003) refere que o conhecido fenómeno da globalização provocou grandes
intercâmbios de fluxos financeiros a nível internacional, uma vez que o capital não tem pátria
e desloca-se a grande velocidade para onde lhe são oferecidas mais vantagens. Isto coloca
especiais dificuldades às administrações fiscais, não apenas porque a mobilidade de capitais
implica a erosão de receitas, mas também porque certos países tendem a adotar medidas de
concorrência fiscal prejudicial, atraindo fluxos financeiros deslealmente com a promessa de
garantir ausência de tributação.
Ocorrendo esta situação de concorrência fiscal prejudicial há naturalmente danos
causados aos Estados vítimas dessa subtração, na medida em que se opera uma distorção dos
verdadeiros fluxos financeiros que corrói a integridade e a equidade dos sistemas fiscais,
desencorajando o cumprimento por parte de todos os contribuintes. Tal aumenta os custos

16
administrativos de fiscalização da máquina fiscal e, obriga o Estado a dirigir a carga fiscal
para fatores menos móveis, como o trabalho, a propriedade e o consumo, sob pena de não
conseguir uma adequada cobertura dos gastos públicos através das receitas fiscais.
A concorrência fiscal nociva apresenta uma dimensão realmente mundial e, assim
sendo, a luta contra tais práticas não pode deixar de corresponder a um dos principais desafios
internacionais dos nossos dias, que legitima e justifica a particular atenção e o forte
empenhamento manifestado pela regulação a tal propósito (Azevedo, 2013).
A justificação dessa regulação prende-se com a necessidade de impedir que se
restrinja ou falseie a concorrência interempresarial no mercado interno, quando tal resulte de
um planeamento fiscal dos agentes económicos induzido pela política fiscal dos EM.
Podemos então afirmar que, de fato, existe verdade em ambas as vertentes referidas,
sendo possível aludir que a concorrência fiscal apresenta duas faces. Por um lado, revela-se
benéfica, funcionando, no interior da União, como fator de dinamização das economias, e por
outro, ao ultrapassar certos limites, pode ter efeitos perversos, com caráter prejudicial, e
portanto, deve ser objeto de medidas de regularização fiscal.
No capítulo seguinte procedemos à análise das instituições e medidas utilizadas no
combate à concorrência fiscal internacional.

17
Capítulo 2 – Formas de regulação da Concorrência Fiscal

1. O Combate à Concorrência Fiscal Internacional

O fenómeno da concorrência fiscal ganha, como é natural, maior relevo em espaços


económicos integrados, tanto maior quanto mais aprofundado seja o processo de integração. É
o caso da União Europeia, mormente no mercado interno, o espaço financeiro europeu e mais
recentemente a União Económica e Monetária, bem como em termos políticos, a abertura dos
países da europa central e oriental, foram os quais trouxeram a verdadeira política comunitária
de combate à concorrência fiscal internacional para o centro das medidas comunitárias a
prosseguir pela União Europeia, de forma a evitar os efeitos negativos da concorrência fiscal.
(Azevedo, 2013).

No quadro mundial apenas a ONU estaria em condições para legitimamente efetuar


tal tarefa. Porém, entidades como a OCDE, a UE, o Fundo Monetário Internacional (FMI), a
Organização Mundial do Comércio (OMC) e G8 têm-se debruçado sobre a regulação e o
combate às práticas prejudiciais do fenómeno da concorrência fiscal.
No seguinte quadro é possível verificar a evolução cronológica dos trabalhos
desenvolvidos a favor da regulação da concorrência fiscal prejudicial.

Quadro 1: O combate à concorrência fiscal prejudicial: revisão de estudos

Ano Relatório Descrição

Relatório de Neumark, trata-se de um


1962 Relatório de Neumark documento pioneiro que recomenda a adoção de
normas que visem a harmonização direta das
sociedades e das pessoas singulares

18
Ocorreu o segundo encontro de ministros da
OCDE, a nível regional, do qual resultou a
publicação do Relatório Ruding, onde pela
primeira vez o fenómeno de concorrência fiscal
1992 Relatório Ruding
foi alvo de uma análise oficial e específica.
Exprimindo ainda que de uma forma contida,
uma natural preocupação com o incremento das
práticas de concorrência fiscal entre os EM da
EU.

Esboçou-se duas formas de regulação da


competição tributária internacional:
 OCDE
 EU
de 27 a 29 de Lyon Cimeira G7 &
Junho de 1996 ECOFIN Verona São adotados três documentos: uma declaração
sobre o terrorismo, um comunicado de natureza
económica intitulado "A mundialização em
benefício de todos" e uma declaração do
Presidente intitulada "Mais segurança e
estabilidade num mundo mais solidário".

Aprovação do código de Conduta por uma


1 Dezembro
Código de Conduta Resolução do Conselho e dos Representantes
1997 dos Estados Membros.

Primeiro conselho de ministros da OCDE


Harmful Tax com objetivo de combate às práticas
9 de Abril de Competition: An prejudiciais que afetem a localização das
1998 Emerging Global atividades financeiras e outras prestações de
Issue serviços, em virtude da existência de
paraísos fiscais.

É de salientar que antes do aparecimento do Código de Conduta, exceção feita aos


instrumentos de harmonização, os restantes não se afiguravam adequados para o combate
contra as várias práticas de concorrência fiscal prejudicial, sendo que o instrumento mais
utilizado, embora pouco apropriado, era o recurso ao controlo, por via administrativa e
judicial, dos auxílios de Estado no domínio tributário. Assim que, o Código revelou-se o pilar

19
mais inovador por ser específico e globalmente destinado à regulação da concorrência fiscal e
por passar a privilegiar a utilização de formas soft law em detrimento dos tradicionais
regulamentos e diretivas.
De forma a procurar dar eficácia a este combate no plano internacional, onde
também a concorrência fiscal não era objeto de regulação específica, surgiu o relatório com as
recomendações da OCDE.

1.1 A posição da União Europeia

1.1.1 O Código de Conduta da fiscalidade das empresas

O Código de Conduta foi aprovado pela resolução de 1 de Dezembro de 1997


resultando num elemento-chave do pacote fiscal aprovado no conselho ECOFIN do mesmo
ano.
Como objetivo, o Código visa combater a concorrência fiscal prejudicial através de
medidas que sejam suscetíveis de ter incidência sensível na localização das atividades
económicas na União, sejam levadas a cabo por empresas diferentes, sejam exercidas dentro
de um mesmo grupo de sociedades.

1.1.1.1 Natureza Jurídica e Âmbito de aplicação


Em relação à natureza do Código, devemos dizer que o mesmo se trata de um
compromisso político, um género de “gentlemen’s agreement”, o qual não afeta os direitos
nem obrigações dos EM nem as respetivas competências e as da Comunidade, tal como
decorrem no Tratado CE. O fato de ser um instrumento político e não jurídico, a sua
interpretação e aplicação não está sujeita à jurisdição do TJCE, o que seria preferível, mas sim,
a um mero controlo político. Contudo, embora o seu carácter não configure uma fonte de
direito comunitário, nem seja suscetível de invocação perante o Tribunal de Justiça, não expõe
quaisquer dúvidas em relação à sua eficácia, pelo contrário, é característico de uma inegável
relevância a que não deve ser menos respeitado. (Nabais 2012; Santos, 2003a)

20
O seu âmbito de aplicação deve ser analisado em duas vertentes – quanto aos
impostos e medidas fiscais incluídos e quanto às áreas geográficas abrangidas.
Na primeira, o Código restringe-se à fiscalidade das empresas, mas sem um definição
do que se deve entender como tal, dando a impressão que apenas estão em causa impostos
diretos que incidem sobre essas unidades económicas.
Quanto às medidas fiscais abrangidas poder-se-á dizer que se visam quaisquer tipos
de vantagens fiscais cujo afetem a localização das atividades económicas, qualquer que seja a
sua base jurídica ou forma de concretização (incluem-se disposições legislativas, disposições
regulamentares e simples práticas administrativas), que possam ser consideradas como
potencialmente prejudiciais. Nestas se integram, nomeadamente, as que traduzem um nível de
tributação efetivo, incluindo a taxa zero, significativamente inferior ao normalmente aplicado
pelo Estado-membro em causa (Nabais, 2012).
Relativamente ao âmbito de aplicação territorial, o Código cinge-se, em princípio, ao
espaço comunitário, ao território a que se aplique o TCE, compreendendo as regiões
ultraperiféricas. No entanto, revela-se mais ambicioso e consagra expressamente a pretensão
de que os princípios sobre as medidas fiscais sejam adotados num perímetro tão amplo quanto
possível5.
Neste contexto os EM comprometem-se a promover a adoção dos princípios
destinados à eliminação das medidas fiscais prejudiciais quer nos países terceiros, através
duma ação concertada na OCDE ou em certas instituições, quer nos territórios associados e
dependentes dos EM da União que estão fora do âmbito de aplicação do respetivo Tratado. Os
EM que têm territórios dependentes ou associados ou que têm responsabilidades especiais ou
prerrogativas fiscais sobre outros territórios, comprometem-se, assim a assegurar a aplicação
de tais princípios naqueles territórios, no respeito das obrigações constitucionais6. (Santos,
2003a)

5
Ponto M do Anexo 1 às conclusões do ECOFIN de 1 de dezembro de 1997, publicado no JOCE n.º C 002, de 6
de janeiro de 1998
6
A não inclusão no código dos territórios dependentes ou associados poderia provocar a deslocalização de
atividades para esses territórios. Essa a razão pela qual, Portugal, aquando das negociações do texto do código,
defendeu sempre a inclusão de tais territórios. (Santos, 2003b)

21
1.1.1.2 Critérios para a qualificação das medidas fiscais prejudiciais
No ponto B o Código fornece, a título exemplificativo, alguns critérios a ter em conta
aquando aferir acerca da qualificação de uma dada medida como sendo de caráter prejudicial,
sendo eles:
a) Se o regime é aplicável apenas a não residentes ou a transações realizadas com
não residentes (“ring fencing”);
b) se as vantagens concedidas são totalmente isoladas da economia interna, sem
incidência na base fiscal nacional;
c) se as vantagens são concedidas mesmo que não exista qualquer atividade
económica real, nem qualquer presença económica substancial, no EM que as proporciona;
d) se o método de determinação dos lucros resultantes das atividades interna de
um grupo multinacional se afasta dos princípios geralmente aceites a nível internacional,
nomeadamente, das regras aprovadas pela OCDE, como, por exemplo, as relativas a preços de
transferência, ou, dos princípios consagrados na Convenção Modelo da OCDE em termos de
determinação dos lucros de estabelecimentos estáveis; e
e) se as medidas fiscais e as disposições legais carecem de transparência e são
aplicadas de forma menos rigorosa a nível administrativo.
É de relevar que por sugestão das delegações portuguesa e espanhola, no ponto G do
Código é estabelecido uma disposição, na qual refere que deve ser prestada uma especial
atenção às características e condicionalismos particulares das regiões ultraperiféricas e das
pequenas ilhas, salvaguardando a integridade e coerência da ordem jurídica comunitária
incluindo o mercado interno e as políticas comuns.
Note-se que na avaliação de uma medida qualificada como potencialmente
prejudicial, a abordagem deve ser globalizada, tendo em conta, a interligação existente entre
alguns critérios.

1.1.1.3 Congelamento e desmantelamento das medidas fiscais prejudiciais


Finalmente, no que toca ao seu conteúdo, o Código de Conduta estabelece para os
EM os seguintes compromissos (Nabais, 2012):

22
a) de informação recíproca das medidas vigentes ou futuras potencialmente
subsumíveis no âmbito da aplicação do Código, podendo qualquer EM ou a Comissão solicitar
informações;
b) de adoção de dois tipos de intervenção relativamente aos regimes fiscais
prejudiciais: de um lado, o congelamento e, de outro, o desmantelamento das medidas fiscais
prejudicais existentes.
Neste sentido, os países membros assumem o compromisso de, no tocante ao
congelamento, no âmbito da elaboração da respetiva política tributária, não introduzirem
novas medidas fiscais passíveis de qualificação como prejudiciais face aos princípios do
Código, tendo em conta o processo de avaliação. E uma vez efetuada a avaliação do caráter
prejudicial das medidas, devem também promover o desmantelamento das existentes,
alterando-as o mais rapidamente possível.
Para Palma (2010) a decisão de manutenção do Grupo do Código de Conduta afigura-
se adequada, particularmente tendo em consideração a realidade atual em que a crise agudizou
as preocupações sobre a sustentabilidade dos sistemas fiscais em ambiente de globalização.
Neste contexto, a promoção da boa governança na área fiscal numa base geográfica tão ampla
quanto possível tem um relevante papel a cumprir.

1.2. A posição da OCDE

De modo a dar eficácia ao combate das práticas identificadas e qualificadas de


concorrência fiscal prejudicial a nível internacional, em Maio de 1996, os ministros dos países
da OCDE, apelaram a que esta fosse incentivada a prosseguir trabalhos com o propósito de por
em prática um quadro multilateral, em cujo âmbito, os países (individual ou coletivamente)
pudessem combater o alcance de tais práticas prejudiciais, abrigo do qual os EM se
comprometem a não adotar novas medidas que sejam abrangidas pelo respetivo âmbito de
aplicação ou a não reforçar e a rever as já existentes, bem como, a remover as práticas
prejudiciais e os regimes preferenciais em vigor, denominada regra dos três R: refrear, rever e
remover as práticas prejudiciais.

23
Para o efeito, o Comité dos Assuntos Fiscais OCDE publicou, em 1998, o
Relatório «Harmful Tax Competition: An Emerging Global Issue», o qual define um
conjunto de princípios diretores para a identificação das práticas fiscais prejudiciais
dos países membros. Neste são apresentadas dezanove recomendações, sendo sete
relativas às legislações e práticas dos EM, sete respeitantes a tratados de natureza
fiscal e as restantes referentes à cooperação internacional.

1.2.1 Natureza e âmbito de aplicação


No tocante ao campo de aplicação, a Recomendação da OCDE, recai sobre as
atividades de maior mobilidade geográfica, mormente as atividades financeiras e outras
atividades de prestação de serviços.
Quanto ao âmbito territorial, a Recomendação abrange todos os países da OCDE
(nos quais se incluem os países da UE), pretendendo-se alargar a sua ação igualmente aos
países não membros e países terceiros.

1.2.2 Recomendações
As dezanove recomendações constituintes do Relatório da OCDE
encontram-se resumidas no seguinte quadro:

Quadro 2: Recomendações do Relatório da OCDE – Legislação de práticas internas

Recomendação n.º 1 – empresas Os países que não tenham este tipo de medidas
estrangeiras controladas (Controlled deverão ponderar a respetiva adoção. Por outro
Foreign Corporations) ou medidas lado, os países que as tenham adotado devem
equivalentes assegurar-se que a respetiva aplicação se encontra
em conformidade com as medidas de combate às
práticas fiscais prejudiciais.

Recomendação n.º 2 – fundos de Os países que não tenham este tipo de medida
investimento estrangeiro ou medidas deverão adotá-las e aqueles que as tenham adotado
equivalentes deverão ponderar a respetiva aplicação aos
rendimentos e às entidades abrangidas pelas

24
práticas qualificadas como concorrência fiscal
prejudicial.

Recomendação n.º 3 – restrições Os países que recorram ao método da isenção para


inerentes à concessão de isenções ao eliminar a dupla tributação do rendimento
rendimento estrangeiro no contexto da estrangeiro, deverão certificar-se da respetiva
concorrência fiscal prejudicial aplicação apenas às atividades que não se
qualifiquem como concorrência fiscal prejudicial.

Recomendação n.º 4 – troca de Os países que não possuam regras relativas à troca
informação com outros países de informações sobre as transações internacionais
e as operações estrangeiras, realizadas por
contribuintes residentes, deverão adotá-las, bem
como, proceder à troca de informações obtidas por
essa via.

Recomendação n.º 5 – procedimentos Os países que tenham um sistema de informações


administrativos administrativas prévias, deverão tornar públicas as
condições de concessão de tais informações.

Recomendação n.º 6 – preços de Os países que seguem os princípios consignados


transferência no documento da OCDE, de 1995, relativo aos
preços de transferência, deverão ter em
consideração a respetiva aplicação apenas às
situações que não se qualifiquem como
concorrência fiscal prejudicial.

Recomendação n.º 7 – acesso às No contexto da concorrência fiscal prejudicial, os


informações bancárias pela países deverão rever a sua legislação e práticas
Administração Fiscal relativas ao acesso da informação bancária, tendo
em vista a remoção dos impedimentos ao acesso a
este tipo de informação.

Quadro 3: Recomendações do Relatório da OCDE - Tratados de natureza fiscal

Recomendação n.º 8 – intensificação e Os países deverão adotar programas de


maior eficiência da troca de informação intensificação de troca de informações relevantes
respeitantes às transações efetuadas nos paraísos
fiscais e nos regimes fiscais preferenciais que se

25
qualifiquem como concorrência fiscal prejudicial.

Recomendação n.º 9 – concessão dos Os países devem ponderar a inclusão, nas


benefícios previstos nos tratados convenções de natureza fiscal, de disposições que
restrinjam a concessão de benefícios a entidades e
rendimentos abrangidos pelas medidas que
constituam práticas fiscais concorrenciais
prejudiciais e ponderar em que medida as
disposições já existentes poderão ser utilizadas da
mesma forma. Deverá igualmente ser ponderado em
que medida o modelo de convenção da OCDE
deverá ser alterado de forma a incluir este tipo de
medidas ou clarificações.

Recomendação n.º 10 – classificação O comentário ao modelo de convenção da OCDE


do papel das medidas internas antiabuso deverá ser clarificado atendendo à compatibilidade
nos tratados das medidas antiabuso com o modelo de convenção.

Recomendação n.º 11 – lista de regras O comité deverá elaborar uma lista das regras
de exclusão constantes dos tratados utilizadas pelos países no sentido de excluir dos
benefícios das convenções fiscais determinadas
entidades ou tipos de rendimentos, devendo tal lista
ser utilizada como ponto de referência aquando da
negociação de convenções fiscais e servir de base
para as discussões no Fórum.

Recomendação n.º 12 – celebração de Os países devem comunicar os tratados celebrados


tratados com paraísos fiscais com paraísos fiscais e não celebrar mais tratados
com tais territórios.

Recomendação n.º 13 – programas de Os países devem efetuar este tipo de ações


ação coordenados relativamente aos contribuintes que beneficiem de
práticas qualificadas como concorrência fiscal
prejudicial.

Recomendação n.º 14 – reclamações Os países devem ser incentivados a rever as regras


fiscais aplicadas ao reforço das reclamações em matéria
fiscal adotadas pelos outros países e o Comité deverá
prosseguir o seu trabalho nesta área tendo em vista

26
disposições que, atendendo àquele objetivo, possam
vir a ser incluídas nos tratados.

Quadro 4: Recomendações do Relatório da OCDE - Intensificação da cooperação internacional

Recomendação n.º 15 – princípios Os países membros devem seguir os princípios


diretores e fórum para as práticas diretores sobre os regimes fiscais preferenciais
prejudiciais prejudiciais e constituir um Fórum para os
implementar, bem como, as demais
recomendações constantes do Relatório.

Recomendação n.º 16 – elaboração de O Fórum deverá ser mandatado para elaborar, no


uma lista paraísos fiscais prazo de um ano, após a respetiva primeira
reunião e com base nos critérios de identificação
constantes no Relatório, uma lista de paraísos
fiscais.

Recomendação n.º 17 – relações com Os países que tenham relações especiais, de


os paraísos fiscais natureza económica ou outra, com paraísos fiscais,
devem certificar-se que tais ligações não
contribuem para a concorrência fiscal prejudicial
e, em particular, os países que tenham territórios
dependentes que tenham paraísos fiscais deverão
certificar-se que as relações que mantêm com tais
territórios não contribuem para a promoção ou
para o incremento da concorrência fiscal
prejudicial.

Recomendação n.º 18 – O Fórum deve ser responsável pelo


desenvolvimento e promoção ativa dos desenvolvimento e pela promoção ativa de
princípios para uma boa Administração princípios que deverão nortear as administrações
Fiscal fiscais, no reforço das recomendações constantes
do Relatório.

Recomendação n.º 19 – associação de O Fórum deverá empreender um diálogo com os


países não membros à recomendação países não membros, utilizando, quando
apropriado, os fora de outras organizações
internacionais, com o objetivo de promover as
recomendações constantes no Relatório, incluindo

27
as linhas diretrizes.

(fonte: Santos e Palma, 1999)

1.2.3 Critérios para a qualificação das medidas fiscais prejudiciais


A OCDE reconhece que uma certa concorrência entre Estados é salutar, mas que
partir de certos limites tal concorrência poderia resultar em prejudicial. A grande dificuldade é
saber quais são esses limites. Neste sentido, à semelhança do Código de Conduta, a OCDE
apresenta critérios para identificação de práticas prejudiciais apontadas no Relatório como
quatro fatores chave de identificação dos paraísos fiscais, sendo eles:
a) tributação inexistente ou insignificante dos rendimentos: revela-se o ponto de
partida para a identificação de um paraíso fiscal, contudo, por si só é insuficiente para tal
qualificação, uma vez que depende da verificação cumulativa de outros fatores, exceto nas
situações em que a jurisdição em apreço se apresente, ou seja reconhecida, como um local em
que os contribuintes se podem evadir à tributação nos respetivos países de residência;
b) ausência de uma troca efetiva de informações: verificação da existência de
práticas proibitivas de uma troca efetiva de informações com os outros países, devidas,
nomeadamente, ao sigilo bancário ou à diminuição dos encargos administrativos;
c) falta de transparência relativamente às disposições legais ou administrativas:
derivada, nomeadamente, da não publicação dos requisitos de aplicabilidade do regime aos
contribuintes, ou da falta de acesso em condições de igualdade por parte destes ao regime; e
d) ausência de atividades económicas substanciais: verificação de que a atividade
económica desenvolvida é relevante, ou seja, que os investimentos não são motivados por
razões estritamente fiscais.
No que concerne aos fatores chave de identificação dos regimes fiscais preferenciais
o Relatório aponta quatro fatores muito idênticos aos já enumerados para os paraísos fiscais, a
saber:
a) taxas de tributação efetivas nulas ou mínimas: à semelhança do já referido para
os paraísos fiscais, trata-se de um fator necessário mas não suficiente para efeitos de
qualificação de um regime como preferencial. Esta qualificação depende, da verificação
simultânea deste e de, pelo menos, outro fator chave;

28
b) regimes ring fencing, ou seja, parcial ou totalmente isolados dos mercados
domésticos do país em causa. O ring fencing pode assumir diversas formas, como por
exemplo, o facto do regime, implícita ou explicitamente, excluir os residentes dos benefícios
concedidos ou proibir as empresas que beneficiem do regime, de operar no mercado nacional;
c) falta de transparência - quer ao nível da conceção do regime (relativa às
disposições legais), quer ao nível da respetiva aplicação prática (disposições administrativas),
e;
d) falta de uma troca efetiva de informações relativamente aos contribuintes que
beneficiem do regime.
Os dois regimes são alvo de atenção neste relatório. A grande diferença entre eles
recai sobre o fato que um regime fiscal preferencial é um regime excecional no quadro de uma
tributação-regra normal vigente num determinado Estado, uma espécie de zona de tributação
nula ou baixa, num território caracterizado pela existência de altas ou medias taxas, isolada da
produção de efeitos negativos nesse Estado, por só se aplicar a não residentes ou por se aplicar
mesmo na ausência de uma atividade económica substancial.
Por outro lado, os paraísos fiscais pressupõem uma zona de exclusão de tributação ou
de baixa tributação extensiva a todo o território. Contudo, segundo Santos (2003b), isto não
basta para que um determinado território seja considerado paraíso fiscal. Para tal, é necessário
também que ele recuse a troca de informações com outros Estados, que os benefícios
decorrentes da nula ou reduzida tributação sejam usufruídos mesmo que não exista atividade
económica substancial no país, ou que se verifiquem outras características que, não sendo
especificamente fiscais, podem ser fatores adicionais de atração, como a existência de regido
sigilo bancário, de um bom sistema de comunicações, de telecomunicações eficientes, etc.
Os critérios que relevam na qualificação de uma jurisdição como paraíso fiscal são,
fundamentalmente, o da ausência de uma troca efetiva de informações e da falta de
transparência. Relativamente aos critérios de identificação dos regimes fiscais preferenciais
continua a prevalecer o critério do ring fencing (Palma, 2003). Cria-se assim um desequilíbrio
de tratamento entre paraísos fiscais e regimes fiscais preferenciais, sendo que, os que
correspondem a situações mais gravosas passaram a ser tratados de forma mais benévola
(Santos, 2002).

29
1.2.4 O Fórum
Como anteriormente referido, a Recomendação abrange todos os países da OCDE
(nos quais se incluem os países da UE), pretendendo-se alargar a sua ação igualmente aos
países não membros e países terceiros.
Neste sentido o Conselho de Ministros da OCDE aprova, a 9 de Abril de 1998, o
referido Relatório, adotando uma Recomendação aos governos dos países membros que,
demandam os EM a consagrarem as recomendações expressas neste e, como tal, encarrega o
Comité dos Assuntos Fiscais a prosseguir os trabalhos sobre a matéria, utilizando para esse
propósito, a criação do Fórum para dinamizar a implementação das recomendações, consagrar
as medidas aventadas, realizar relatórios periódicos sobre os resultados dos trabalhos e
apresentar propostas de novas medidas e a desenvolver o diálogo com países não membros
encorajando-os a associarem-se às recomendações do Relatório.
A este propósito Palma (2003), refere que trata-se de um projeto ambicioso que
suscita muitas dúvidas quanto à legitimidade de atuação da OCDE, ou não pretendesse esta,
através de um texto não jurídico, impor obrigações aos seus países membros. Legitimidade
esta, ainda mais questionável quando a OCDE pretende estender os seus princípios aos países
não membros, situação que originou fortes oposições por parte dos países das Caraíbas
aquando da sua qualificação de paraísos fiscais.

2. Análise comparativa entre as posições do Código de Conduta da União


Europeia e as recomendações da OCDE

Tanto o Código de Conduta como o Relatório da OCDE contêm um objetivo em


comum, o de regulamentar e supervisionar a concorrência fiscal, quer no âmbito da OCDE,
quer na União Europeia. Ao equipará-los observa-se que são compatíveis e complementares,
nos quais se reforçam mutuamente no seu propósito, a utilização de critérios para a
identificação de regimes prejudiciais à concorrência fiscal.

30
Desde o início dos trabalhos têm existido uma cooperação entre a U.E e a OCDE
relativamente às tarefas de aprovação e implantação do Código de Conduta da U.E e da
Recomendação do Conselho da OCDE que adota o Relatório.
O seguinte quadro comparativo aborda os pontos fulcrais do Código de Conduta e a
Recomendação e Relatório da OCDE:

Quadro 5: Código de Conduta vs Relatório OCDE

Código de Conduta Relatório da OCDE


Natureza jurídica Compromisso político. Recomendação.

Âmbito material Fiscalidade das empresas. Serviços financeiros e outras


prestações de serviços com grande
mobilidade geográfica.

Âmbito EM da UE, territórios Países da OCDE e cláusula de


geográfico dependentes e associados e compromisso de incentivar países não
cláusula de compromisso de membros a se associarem aos
adoção dos princípios do princípios do Relatório.
Código a nível internacional.

Medidas Leis, regulamentos e práticas Leis, regulamentos e práticas


abrangidas administrativas. administrativas, não necessariamente
de natureza fiscal.

Fatores  Nível de tributação efetiva,  Nível de tributação baixa, incluindo


identificativos das incluindo a taxa zero, a taxa zero, nos rendimentos
medidas significativamente inferior relevantes;
prejudiciais a ter ao aplicável no regime  Ring fencing;
em consideração geral;  Falta de transparência;
na avaliação  Ring fencing;  Falta de uma troca efetiva de
 Falta de transparência; informações;
 Falta de atividades
económicas reais;
 Determinação dos lucros
segundo os critérios da
OCDE.

31
Outros fatores a  Níveis de tributação efetiva  Base tributável definida
ter em das atividades da artificialmente;
consideração na comunidade – efeitos das  Determinação dos lucros com base
avaliação medidas nos outros EM; nos critérios da OCDE;
 Proporcionalidade das  Existência de provisões
medidas e direcionamento confidenciais;
para os objetivos  Relação entre atividades
pretendidos caso se desenvolvidas e o volume do
destinem a apoiar o investimento e do rendimento
desenvolvimento obtido;
económico de regiões
específicas;
 Especial atenção às
especificidades das regiões
ultraperiféricas e das
pequenas ilhas

Formas de Standstill e eliminação das Standstill e eliminação das medidas


atuação medidas prejudiciais prejudiciais.

Regra dos três R – Refrear, Rever e


Remover.
(Fonte: Santos e Palma, 1999)

O código de Conduta tem um âmbito material de aplicação mais amplo, do que o


Relatório da OCDE o qual é mais restrito, mas que no entanto revela-se mais elaborado.
Ambos os trabalhos recaem sobre a fiscalidade direta, contudo o Recomendação da
OCDE cinge-se às atividades financeiras e outras prestações de serviços caraterizadas por
atividades móveis, já o Código de Conduta, não se limita apenas aos serviços financeiros,
sendo que abrange as atividades industriais e comerciais.
A compatibilidade do Código e do Relatório respeita sobretudo aos objetivos e
critérios utilizados para a identificação dos regimes prejudiciais, embora o relatório seja muito
mais detalhado, bem como as formas de atuação e compromissos dos Estados, ao enfatizar os
métodos utilizados e acentuar o reforço da troca de informação e à adoção de dezanove
recomendações concretas.
Em suma, existe uma concorrência não prejudicial entre os princípios e as práticas
consignadas no Código da Conduta e na Recomendação da OCDE.

32
Uma outra problemática inserida nas preocupações das instituições em matéria de
combate a práticas prejudicais são os auxílios de Estado. Sendo o CINM, considerado pela
Comissão um auxílio de Estado, importa desenvolver, no próximo capítulo um breve
enquadramento teórico sobre o tema.

33
Capítulo 3 – Auxílios de Estado: breve enquadramento normativo e teórico

1. Noção de auxílios de Estado


A intervenção estadual na vida económica é uma realidade incontornável. As suas
fundamentações são díspares, os seus objetivos múltiplos, as suas formas variadas e mesmo
imprevisíveis. De entre as várias formas de intervenção cada vez é maior a relevância que se
prende com a fiscalidade e com as políticas e regimes tributários. O recurso a estes
instrumentos pode, conforme satisfaçam certas condições, configurar um auxílio de Estado.
De acordo com a jurisprudência do TFUE um auxílio de Estado configura-se como
toda a medida destinada a isentar, total ou parcialmente, as empresas de um determinado
sector, sob uma carga fiscal ou imposto, sem que tal isenção se justifique pela natureza ou
economia do sistema. (Palma, 2012)
Contudo, o conceito de auxílio de Estado é de natureza funcional, podendo assumir
diversos conteúdos.
Segundo Santos (2003a) esta falta de definição prende-se com o facto de que a
interpretação dos elementos que o compõem ser evolutiva, adequando-se às mudanças dos
objetivos da Comunidade e do papel da política de concorrência, definida em articulação com
as outras políticas da Comunidade para a satisfação daqueles objetivos.
A intervenção do Estado na economia mesmo que se exerce sob forma tributária, está
sujeita aos princípios e normas da “constituição económica” comunitária e, por conseguinte,
ao controlo das instituições comunitárias.
Conforme o mesmo autor, Santos (2003a), o núcleo essencial da “constituição
económica” comunitária assenta no princípio da economia de mercado aberto e de livre
concorrência, na construção de um mercado interno – um espaço sem fronteiras internas
caracterizado pela livre circulação de mercadorias, de pessoas, de serviços e de capitais – na
institucionalização de uma união monetária, na criação de formas de coordenação das políticas
económicas dos Estados membros e na realização de certas políticas comuns e comunitárias.
Os artigos 92.º a 94.º do Tratado que institui a Comunidade Europeia correspondem
ao primeiro articulado do regime dos auxílios de Estado, e não foram afetados no essencial
com as revisões dos Tratados: primeiro com a numeração adotado pelo Tratado da União

34
Europeia, com os artigos 87.º a 89.º, e atualmente com a sua numeração 107.º e 109.º, após
adoção do Tratado de Funcionamento da União Europeia. Estas normas, no que concerne ao
princípio da aplicação universal, aplicam-se a todo o território comunitário.

1.1 Princípio da incompatibilidade dos Auxílios de Estado

Os auxílios de Estado originam pelos efeitos que provocam distorções de


concorrência entre as empresas7. Os beneficiários destes auxílios são passíveis de diminuir os
seus preços e/ou aumentar a sua parte de mercado, melhorar a sua estrutura financeira e,
consequentemente, atingir fortes vantagens competitivas, violando deste modo, o princípio da
igualdade de oportunidades ou, restringindo de alguma forma, a livre circulação dos fatores e
impedir a afetação otimizada dos recursos. Assim que, são globalmente contrários aos
objetivos da União de estabelecer um regime que não falseie a concorrência.
No n.º 1 do artigo 107º do TFUE encontra-se estabelecido o princípio da
incompatibilidade dos auxílios de Estado com o mercado comum, nos seguintes termos:
Salvo disposição em contrário dos Tratados, são incompatíveis com o mercado comum, na medida
em que afetem as trocas comerciais entre os Estados membros, os auxílios concedidos pelos
Estados ou provenientes de recursos Estatais, independentemente da forma que assumam, que
falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções.

Não obstante, o Tratado exceciona deste princípio geral de incompatibilidade alguns


auxílios que são “compatíveis com o mercado comum” ou que “podem ser compatíveis com o
mercado comum”.
É à Comissão que, fundamentalmente, compete apreciar a compatibilidade ou não
dos auxílios de Estado com o mercado comum, tendo, para o efeitos os poderes de apreciação,
que lhes tão competidos no artigo 108º do mesmo Tratado.
Contudo, os auxílios cuja incompatibilidade podem ser objeto de derrogações por
decisão do Conselho são situações atípicas. Estas dependem da avaliação casuística em que
são ponderados, designadamente, os critérios difundidos para a sua concessão, o respeito por
princípios consignados no Tratado e no Direito Comunitário e a proporcionalidade dos
objetivos face aos efeitos sobre a concorrência. (Palma e Lobo, 2007)

7
Cf. COMISSÃO, primeiro relatório sobre os Auxílios Estatais na Comunidade Europeia, ponto 3.

35
De acordo com Santos (2003a), o fenómeno da intervenção estatal tem repercussões
particularmente visíveis nos mercados e na forma natural da concorrência. Assim que sempre
que em sede constitucional se consagre direta ou indiretamente, um princípio da concorrência
surge uma certa tenção, mormente entre o poder de atribuir auxílios de Estado e a criação de
condições de funcionamento da concorrência e dos mercados.

1.2. Fundamentos económicos para a atribuição de Auxílios de Estado

A fundamentação económica da atribuição dos auxílios públicos depende, em geral,


da perspetiva teórica assumida e, em particular, da visão mais ou menos favorável, que se
tenha acerca do intervencionismo estadual na economia. As regras dos auxílios de Estado
aparentemente foram determinadas por um imperativo de racionalidade económica e de
viabilidade do próprio mercado único.
Como já referido anteriormente, os auxílios alteram, na sua generalidade, as
condições de concorrência existentes no mercado podendo, desta forma, serem considerados
como um agravamento da concorrência fiscal ilegal.
Contudo, é importante realçar que existem determinadas circunstâncias em que não é
possível negar a importância da intervenção de poderes públicos. Neste sentido, a concessão
de auxílios não constituirá uma ameaça à concorrência, desde que se destine a suprir a falta de
algum dos elementos constitutivos de um mercado.
Assim que, o critério de base para a autorização de atribuição de auxílios de Estado
por parte da Comissão consagra-se na existência de imperfeições ou falhas de mercado.
De acordo com os princípios da economia neoclássica as falhas de mercado
consistem em situações nas quais o funcionamento do mercado não produz os resultados que
seria suposto produzir, quer em termos de produção de bens e de serviços, quer em termos de
distribuição dos rendimentos resultantes da produção desses bens e serviços.
Para Stiglitz (2000) existem seis principais categorias económicas que traduzem-se
em falhas de mercado, sendo elas: concorrência imperfeita, bens públicos, as externalidades,
os mercados incompletos, o caráter imperfeito da informação, a inflação e o desemprego.

36
O mercado é imperfeito e por si só é incapaz de resolver este tipo de problemas.
Segundo o autor, nestes casos, a intervenção do Estado é essencial e justificada. O mesmo
refere que a política de redistribuição é necessária, sendo que a distribuição do rendimento
operada no mercado não é a melhor do ponto de vista da justiça social. Outro argumento a
favor da intervenção Estatal está relacionado com o medo de que o particular não atue no seu
próprio interesse. Desta forma, o Estado precisa e irá impor aos particulares o consumo de
certos bens ou proibir-lhe o consumo de outros.
Santos (2003a) defende também que a atribuição de incentivos no quadro de políticas
regionais e de ordenamento do território justifica-se, neste contexto, como o meio de
realização do desenvolvimento sustentado das regiões mais desfavorecidas como forma de
promoção de qualidade de vida e instrumento de distribuição mais eficiente dos recursos,
contribuindo, deste modo, para o melhor funcionamento do mercado.
O fato é que não existe verdadeiramente nenhum mercado que possua todos os seus
elementos constitutivos de uma concorrência perfeita, assim que, os auxílios de Estado surgem
na medida de corrigir certas deficiências de mercado e, em consequência promover a
eficiência económica e aumentar o bem-estar da comunidade.
Deste modo, ao lado dos aspetos negativos, os auxílios de Estado comportam
múltiplos aspetos positivos. A própria Comissão reconhece que:
Os auxílios de Estado podem contribuir para o crescimento económico e adaptação das estruturas
industriais às alterações das condições do mercado, bem como para o desenvolvimento regional,
para a melhoria das condições sociais resultantes de modificações económicas e para a situação do
emprego num país determinado. (XII Relatório sobre a Política de Concorrência, 1983)

Porém, por se recear que os Estados-Membros sucumbam à tentação de socorrer de


forma arbitrária aos auxílios de Estado, vocacionados a atenuar as disparidades e
especificidades de determinadas regiões, cabe à Comissão o exame da compatibilidade das
ajudas em função dos seus efeitos, independentemente da forma ou objetivos prosseguidos.

1.3. Derrogações ao princípio da Incompatibilidade dos Auxílios de Estado

Não obstante ao n.º1 do artigo 107º do TFUE a derrogação ao princípio da


incompatibilidade dos auxílios prevê que a Comissão autorize medidas, ainda que qualificadas

37
como auxílio de Estado, em condições excecionais permitindo uma maior flexibilização na
aplicação da lei ao tomar em consideração circunstâncias especiais, designadamente, quanto
aos objetivos pretendidos.
Como anteriormente referido, os mercados têm falhas, daí que os auxílios de Estado
sejam, no quadro atual, indispensáveis ao funcionamento do sistema de economia mista
existente nos Estados comunitários e na própria Comunidade.
As finalidades dos auxílios cuja incompatibilidade com o Tratado pode ser levantada
por decisão da Comissão após apreciação casuística em que detém amplos poderes regem-se
pelas derrogações previstas nas alíneas a) a d) do n.º3 do artigo 107º do Tratado.
A derrogação da alínea a) do n.º 3 do artigo 107.º do TFUE permite conceder uma
isenção aos auxílios de natureza regional dirigidos às regiões menos favorecidas na
Comunidade. Estes visam “promover o desenvolvimento económico das regiões em que o
nível de vida seja anormalmente baixo ou em que exista grave situação de subemprego”.
Segundo a comissão caem na previsão desta norma os auxílios destinados a regiões
ultraperiféricas e, por conseguinte a Região Autónoma da Madeira. Vide o artigo 349º :
Tendo em conta a situação social e económica estrutural da Guadalupe, da Guiana Francesa, da
Martinica, da Reunião, de Saint-Barthélemy, de Saint-Martin, dos Açores, da Madeira e das ilhas
Canárias, agravada pelo grande afastamento, pela insularidade, pela pequena superfície, pelo relevo
e clima difíceis e pela sua dependência económica em relação a um pequeno número de produtos,
fatores estes cuja persistência e conjugação prejudicam gravemente o seu desenvolvimento (…).

A derrogação inscrita na alínea b) do n.º 3 do artigo 107º do TFUE permite declarar


uma compatibilidade dos auxílios destinados a “fomentar a realização de um projeto
importante de interesse europeu comum, ou a sanar uma perturbação grave da economia de
um Estado-Membro”. É ao abrigo desta disposição, tanto, os projetos de investigação e
desenvolvimento que tenham um interesse europeu (como os sistemas de comunicações, a
construção de auto-estradas ou do canal da Mancha), bem como, as perturbações conjunturais
da economia ou de sectores importantes da economia dos Estados membros, permitindo que
possam ser objeto de auxílios destinados a salvar empresas e evitar despedimentos.
A terceira derrogação rege-se pela alínea c) do n.º 3 do artigo 107.º do TFUE que
recaí sobre “os auxílios destinados a facilitar o desenvolvimento de certas atividades ou
regiões económicas, quando não alterem as condições das trocas comerciais de maneira que
contrariem o interesse comum”. Destina-se assim às regiões economicamente mais

38
desfavorecidas no plano nacional, ou seja, a auxílios de natureza regional em prol da coesão
interna dos Estados membros. O quadro adequado para avaliar estas dificuldades pode ser
constituído não só pela UE no seu conjunto, mas também, em especial, pelo Estado-Membro
em questão.
Por fim, a alínea d) e e) do mesmo artigo consagram os auxílios destinados a
“promover a cultura e a conservação do património, quando não alterem as condições das
trocas comerciais e da concorrência na União num sentido contrário ao interesse comum” e
“as outras categorias de auxílios determinadas por decisão do Conselho, sob proposta da
Comissão”.
É importante referir que os auxílios de Estado aprovados a título das situações
excecionais expostos acima serão objeto de exame permanente por parte da Comissão, no
sentido de averiguar a respetiva compatibilidade com o mercado comum. Para o efeito, os EM
deverão apresentar anualmente à Comissão relatórios sobre os regimes existentes (Palma,
2008).
No que concerne à derrogação relativa às ilhas periféricas a Comissão faz pender a
sua autorização dos auxílios de Estado destinados a favorecer o desenvolvimento económico
das RUP´s da verificação da regra destes serem «proporcionais e orientados para os objetivos
pretendidos» e da verificação das seguintes exigências:
 Contribuam para o desenvolvimento regional de atividades que operem e que
tenham um impacto local. São excluídas perentoriamente as atividades «offshore», na medida
em que a sua contribuição para o desenvolvimento da economia local é reduzida;
 Correspondam a desvantagens regionais reais para as atividades, para as quais
os custos adicionais implicados têm peso. Exemplifica a inexistência desse nexo de
casualidade: O caso dos custos adicionais de transporte, fruto do isolamento duma região que
são, no entanto, irrelevantes para as atividades ligadas às finanças;
 Sejam examinadas num contexto comunitário, ou seja, deve tomar em
consideração os efeitos negativos que tais medidas podem ter noutros Estados-Membros, ou
seja, os efeitos sobre a concorrência.
No Relatório de 2004, a Comissão fez questão de realçar que não reúne quaisquer
preconceitos, entenda-se negativos ou positivos, quanto aos auxílios concedidos sob a forma

39
fiscal. A forma (neste caso fiscal) dos auxílios de Estado é igualmente indiferente quando a
Comissão desempenha a sua função de verificar a compatibilidade com o mercado comum.
Como exemplos de regiões consideradas elegíveis, aponta os regimes fiscais especiais das
Canárias e da zona franca da Madeira, que viram os seus projetos de implementação de
auxílios de Estado sob a forma fiscal, autorizados por reunirem as condições previstas no n.º 3
da alínea a) do art.º 107.º do Tratado, ou seja, ao abrigo da derrogação prevista para as RUP´s.
É de salientar que para a Comissão as atividades como os serviços financeiros, os
serviços «intragrupo» e os centros de coordenação representam um risco de concessão de
montantes elevados de auxílios com um impacto modesto sobre o desenvolvimento regional.
Entende ainda a Comissão que a derrogação concedida a alguns regimes fiscais não pode estar
associada às atividades móveis, tendo em conta o elevado risco da sua deslocalização para
efeitos de obtenção de vantagens fiscais, sendo frequente no caso das atividades referidas no
parágrafo anterior, designadamente nas atividades de seguros e nas atividades bancárias.
Esta condição de exclusão face a este conjunto de atividades teve origem nos
trabalhos preparatórios à aprovação do Código de Conduta, onde se estabeleceu “(…) a
prejudicialidade dos regimes que beneficiam as atividades mais móveis, tais como as
atividades de natureza financeira, facto que determinou a consideração como “prejudicais” das
atividades financeiras”( Palma, 2008).
Tal posição, considera a autora, conduziu a que as atividades financeiras fossem
retiradas do regime do Centro Internacional de Negócios da Madeira (a vigorar a partir de
Janeiro de 2003), para permitir que o regime deixasse de ter aspetos prejudicais em sede do
Código de Conduta.
A Comissão reconhece que os «serviços intragrupo» não existem na ordem jurídica
portuguesa, mas opta por incluí-las na qualificação de prejudicialidade, por razões de
transparência e de segurança jurídica futuras, caso viessem a ser adotadas.

1.4. Fundamentos de Controlo dos Auxílios de Estado

A comunidade tem instituído a coexistência de várias políticas de combate às


distorções fiscais. Uma delas, em franco desenvolvimento nos últimos anos, tem a ver com a

40
política de controlo dos auxílios de Estado. Cada vez mais as autoridades Comunitárias
utilizam o instituto dos auxílios de Estado como instrumento para contenção, em níveis
aceitáveis das distorções provocadas pela concorrência fiscal.
Até ao aparecimento do Código de Conduta, exceção feita aos instrumentos de
harmonização, muitas vezes de difícil recurso político, os restantes não se mostravam
adequados para combater a concorrência fiscal prejudicial.
Como já referido, existe realmente, uma conexão evidente entre as medidas fiscais
suscetíveis de ser qualificadas como prejudiciais e os auxílios de Estado, a que é aplicável o
disposto nos artigos 107º e 109º do Tratado. Note-se também, que caso os auxílios de Estado
se generalizem e se tornem a regra deixariam de ter qualquer caráter de incentivo e os seus
efeitos económicos seriam anulados. Simultaneamente, falseariam as regras do mercado e
afetariam a eficácia da economia comunitária no seu conjunto.
Contudo, se um auxílio de Estado for reconhecido pela Comissão como compatível
com o mercado comum não se afigura lógico que venha a ser qualificado como constituindo
veículo de concorrência fiscal prejudicial para efeitos de Código de Conduta, e desta forma,
uma aplicação mais rigorosa das regras de auxílio de Estado, será suficiente, em muitas
situações, para combater de forma juridicamente vinculante as práticas de concorrência fiscal
prejudicial. (Pereira, 1998)
Conforme o Código, para os auxílios de Estado é contemplada a cláusula de exclusão
da prejudicialidade, que isenta desta qualificação as medidas cuja análise casuística permita
determinar que os efeitos prejudiciais em causa são proporcionais aos objetivos pretendidos
com a sua implementação.
Ainda, o Código prevê a salvaguarda do regime das RUP´s, considerando não
prejudicais as medidas fiscais utilizadas para apoiar o desenvolvimento económico destas
regiões específicas. O Conselho pondera as características e condicionalismos particulares das
regiões ultraperiféricas, desde que não comprometam a integridade e coerência jurídica
comunitária, incluindo o mercado interno e as políticas comuns.
Um outro meio de controlo destinado a garantir a vigência equilibrada e eficaz do
Código decorre da obrigação da Comissão apresentar ao Conselho um relatório anual sobre a
respetiva aplicação, acompanhado de um outro sobre os auxílios estatais de natureza fiscal.

41
Mas, nomeadamente em relação às medidas que também recaem sobre o instituto dos Auxílios
de Estado, deriva do poder da Comissão neste âmbito.
As disposições do Código serão revistas pelo Conselho e pelos Estados membros no
prazo de dois anos a contar da sua adoção e, da experiência da sua aplicação, poderá resultar o
alargamento do seu âmbito e a previsão de outras medidas destinadas a garantir
vinculatividade.
Na seção seguinte procedemos então à análise do regime fiscal do CINM, após uma
breve caracterização deste.

42
Capítulo 4 – O Regime Fiscal do CINM

1 – O Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM)

O arquipélago da Madeira é um território português situado no oceano Atlântico, a


cerca de 980km de Lisboa e 700km da costa africana. É constituído por duas ilhas principais, a
Madeira e o Porto Santo e dois grupos de ilhas desabitadas, as Selvagens e as Desertas.
Atualmente a ilha consta de cerca 263 600 habitantes8 e tem como capital a cidade do Funchal.
Caraterístico de uma grande estabilidade político-social a região é, nos termos da
Constituição da República Portuguesa9, uma região autónoma, dotada de um estatuto político-
administrativo e de órgãos de governo próprio, democraticamente eleitos pela Assembleia
Regional.
As atividades económicas regionais assentam essencialmente na indústria turística, na
produção de flores, bordados, frutos tropicais e vinho Madeira (Silva, 2007).
A ilha da Madeira é uma região ultraperiférica de pequeno tamanho e profundamente
afetada por diversas dificuldades de isolamento, agravadas pelos problemas de relevo, clima e
dependência de uma economia quase uni setorial.
O nível de desenvolvimento e diversificação regional pouco competitivo à escala
internacional levou a que, no final dos anos setenta, o governo português preocupa-se em criar
um mecanismo de desenvolvimento eficiente, isto é, o Centro Internacional de Negócios da
Madeira (CINM), de forma a fazer face às dificuldades e limitações de recursos endógenos da
ilha.

1.1 – Caracterização do CINM

O Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM) também conhecido por


Zona Franca da Madeira (ZFM) foi criado formalmente em 1980 através do DL nº 500/80 de
20 de Outubro. Surgiu como um instrumento importante para o desenvolvimento económico
de forma a concessionar incentivos para a atração de investimento estrangeiro para a Madeira,

8
Dados do Instituto Nacional de Estatísticas – Censos 2011
9
Nº 2, do artigo 6º, da Constituição da Republica Portuguesa

43
com o objetivo de desenvolver a economia regional pela diversificação e modernização da
respetiva estrutura produtiva de bens.
Em 1986, a adesão de Portugal à Comunidade Europeia originou uma nova e
importante dimensão no processo do CINM. Sendo a Madeira parte integrante de Portugal e
dadas as suas condições e limitações, considerou-se desejável a sua integração nas
Comunidades Europeia tal que todo o quadro legal do CINM foi apresentado às autoridades
competentes em Bruxelas.
Em 1984, constitui-se a Sociedade Económica de Desenvolvimento da Madeira
(SDM), sociedade anónima da qual, desde o início da sua atividade, colabora com Governo
Regional e Nacional, na qualidade de concessionária, pela gestão, administração e promoção
do Centro Internacional de Negócios da Madeira.
A criação do CINM teve na sua origem a Zona Franca Industrial, sendo que o
Decreto Regulamentar n.º 53/82, de 23 de Agosto veio a autorizar que a Zona Franca deixe de
ter natureza exclusivamente industrial e passe, nos termos do seu artigo 4º, a exercer outros
tipos de atividades, sendo eles de natureza comercial e financeira.
Inicialmente, o CINM era constituído por quatro grandes áreas de atividade: a Zona
Franca Industrial, os Serviços Financeiros, os Serviços Internacionais e o MAR – Registo
Internacional de Navios da Madeira. Os Serviços Financeiros e “intra-grupos”, classificado
como prejudicial, é excluído do regime de benefícios fiscais aplicável às entidades licenciadas
no CINM a partir de 2003, tendo sido descontinuado a partir de 2011.
Assim que, atualmente, o centro abrange apenas três setores, mantendo-se a ZFI, os
Serviços Internacionais e o MAR.
Deste modo, as entidades licenciadas no CINM a partir de 1 de Janeiro de 2007 e até
31 de Dezembro de 201410 podem, designadamente, exercer as seguintes atividades
económicas:

10
Lei nº 83-C/2013 de 31 de Dezembro

44
Quadro 6: Atividades exercidas no CINM

Atividade NACE
Agricultura e com a produção animal Rev.1.1, secção A, códigos 01.4 e 02.02
Pesca, aquicultura e serviços relacionados Rev.1.1, secção B, código 05
Indústrias transformadoras Rev.1.1, secção D
Produção e distribuição de eletricidade,
Rev.1.1, secção E, código 40
gás e água
Comércio por grosso Rev.1.1, secção G, códigos 50 e 51
Transportes e comunicações Rev.1.1, secção I, códigos 60, 61, 62, 63 e 64
Atividades imobiliárias, alugueres e
Rev.1.1, secção K, códigos 70, 71, 72, 73 e 74
serviços prestados às empresas
Ensino superior, ensino para adultos e
Rev.1.1, secção M, códigos 80.3 e 80.4
outras atividades educativas
Outras atividades de serviços coletivos Rev.1.1, secção O, códigos 90, 92 e 93.01

A 31 de Dezembro de 2013 estavam licenciadas no CINM:

Gráfico 1: Número de empresas licenciadas no CINM

50
ZFI
263
MAR
1590
SI
1903
Total

0 500 1000 1500 2000

1.903 empresas, 50 das quais estavam fisicamente instaladas na Zona Franca


Industrial, outras 1.590 empresas desenvolviam a sua atividade ao nível dos serviços
internacionais e as restantes 263 estavam ligadas ao Registo de Navios da Madeira (MAR).

45
A Madeira acolhe empresas de serviços e trading, gestão de ativos, propriedade
intelectual, telecomunicações e e-business. Já a Zona Franca tem instaladas empresas ligadas à
indústria alimentar, bebidas e tabacos, biotecnologias e produção de energia, entre outras.
Das 263 embarcações registadas no MAR a 31 de Dezembro de 2013, 166 são navios
de comércio, 57 embarcações de recreio e 40 iates comerciais. São maioritariamente alemães,
italianos e espanhóis os armadores que registam os seus navios no MAR.
Assim que, no final do ano passado 616 trabalhadores desenvolviam a sua atividade
na Zona Franca e 2.313 em empresas que desenvolvem a sua atividade em serviços
internacionais e outros 3.387 profissionais são tripulantes dos navios e embarcações registados
no MAR.

1.2. Normas do Direito Comunitário e Auxílios de Estado


O Centro Internacional de Negócios da Madeira está, na sua totalidade, sujeito às
regras comunitárias, sendo, pelo n.º 1 do artigo 87 º do Tratado da CE (atual artigo 107º da
TFUE), configurado como regime de auxílios de Estado sob a forma fiscal, necessitando para
tal ser devidamente notificado e aprovado pela Comissão Europeia.
Em sede de auxílios de Estado o regime foi aprovado pela primeira vez pela
Comissão a 26 de Maio de 1987, por um período de três anos com inicio em 1989 e produção
de efeitos até 31 de Dezembro de 2011, como um regime de auxílios fiscais composto por um
Registo Internacional de Navios, uma Zona Franca Industrial, um centro de Serviços
Financeiros e um centro de Serviços Internacionais. Mais tarde, a 18 de Dezembro de 1991,
este regime voltou a ser aprovado, por um período de três anos e produção de efeitos até 31 de
Dezembro de 2011, e posteriormente em Fevereiro de 1995, por um período de 6 anos com
produção de efeitos até 31 de Dezembro de 2011.
Nos finais dos anos noventa, o primeiro regime foi alvo de análise no contexto de
trabalhos sobre a concorrência fiscal prejudicial, quer à luz dos princípios decorrentes do
Código de Conduta sobre a Fiscalidade das Empresas, quer da OCDE. Contudo, a este
propósito, a posição Portuguesa divergia da posição da Comissão Europeia.

46
Portugal sempre defendeu que não fazia sentido qualificar com caráter prejudicial,
medidas autorizadas ao abrigo do regime dos auxílios de Estado, como é o caso do regime da
ZFM, estando em causa direitos adquiridos. Por outro lado, não concordava com o fato da
avaliação da ZFM ser efetuada por categorias, propiciando uma avaliação distinta dos diversos
elementos, uma vez que, o regime foi autorizado como auxílio de Estado nas suas várias
componentes, logo, o mais lógico seria uma avaliação em bloco (Santos, 2002).
Todavia, a avaliação foi prosseguida e das 14 medidas portuguesas avaliadas, sendo,
nove por autoconfissão e cinco por denúncia de outros países, apenas uma, a relativa aos
serviços financeiros, foi qualificada como prejudicial, no Relatório Primarolo de 1999, uma
vez que Portugal conseguiu fazer prova da não prejudicialidade das restantes medidas, pelo
que, foram excluídas da lista final.
Esta qualificação negativa do setor financeiro foi contestada por Portugal, uma vez
que não foi passível de ser analisado e discutido, um relatório apresentado onde se
fundamentava o acionamento da cláusula de exclusão do caráter prejudicial prevista no ponto
G do Código. Sendo que, ao contrário do que ocorreu com os relatórios de outros EM, esta
decisão não foi devidamente avaliada no âmbito deste ponto, nem foi sequer objeto de
qualquer votação, apenas se tendo feito ouvir, a Comissão, em favor da qualificação de
medida com caráter prejudicial (Santos, 2002).
No contexto da OCDE, as atividades financeiras realizadas no CINM voltaram a ser
novamente qualificadas como potencialmente prejudiciais no Relatório de Progressos dos
Trabalhos do Fórum de 2000.

No Ecofin de 20 e 21 de Janeiro de 2003, em sede do código de Conduta sobre a


Fiscalidade das Empresas, foi salvaguardada a data de produção de efeitos do regime das
atividades financeiras do CINM, até 31 de Dezembro de 2011, decisão que foi respeitada a
nível da OCDE.

Após várias negociações ao mais alto nível para conseguir novamente a integração
das atividades financeiras na praça da Zona Franca, que foram todas recusadas pela Comissão
Europeia, as autoridades portuguesas acabaram por retirar este setor no novo regime.

47
Assim que, em Março de 2002, Portugal apresentou um novo pedido de auxílios de
Estado para a ZFM que não abrangia os serviços financeiros. Após os trabalhos ocorridos no
grupo do Código de Conduta e da revisão das regras sob aos auxílios com finalidades de
desenvolvimento regional, o regime voltou a ser aprovado a 11 de Dezembro de 2002 e 22 de
Janeiro de 2003, por um período de 4 anos e com produção de efeitos até 31 de Dezembro de
2011 (regime revogado com o OE/2012).
Seguidamente o terceiro e atual regime, constante do artigo 36º do EBF, foi aprovado
a 27 de Junho de 2007 por um período de 6 anos e com produção de efeitos até 31 de
Dezembro 2020. Face ao prazo de admissão de novas empresas, a Comissão, prorrogou o seu
alargamento por duas vezes, em 2013 e 2014, sendo que, atualmente este encontra-se alongado
até 31 de Dezembro de 2014.
Tendo em consideração as alterações introduzidas no regime de auxílios de Estado do
CINM, conclui-se, quer no contexto do Código de Conduta quer na OCDE, que as medidas
prejudiciais tinham sido abolidas, sendo que em ambas as instâncias ficou salvaguardada a
concessão de benefícios do regime.

2. Regime fiscal do CINM

2.1. Regime Fiscal Preferencial

O regime fiscal do CINM tem sido, na sua envolvente, um tema discutido por vários
autores ao longo dos últimos anos. Contudo, relativamente ao facto deste ser considerado um
paraíso fiscal ou um regime preferencial gera ainda alguma confusão, e leva a que muitas
vezes seja incorretamente qualificado.
Assim que, contrariamente ao que é por vezes referido, o CINM desde sempre
encontra-se inserido na categoria de regime fiscal privilegiado pelo que não existe
fundamentos técnicos suficientes que o permita classificar como um regime offshore (Palma,
2012).

48
Em 1993, a própria Comissão em resposta ao Parlamento Europeu reconhece que não
é correto descrever como extraterritoriais ou offshore os centros financeiros a que, por força
do artigo 227º do Tratado CEE, são aplicáveis o próprio Tratado e a legislação derivada deste.
Palma (2008,2012) salienta que o regime da CINM não se configura como paraíso
fiscal, mas como um regime fiscal preferencial ou privilegiado, uma vez que as entidades
licenciadas para o exercício de qualquer atividade encontram-se sujeitas às mesmas regras de
troca de informações e supervisionamento das entidades oficiais exercidas no resto do
território português, pelo que, não existe impedimentos de natureza legal à existência de
controlos pois a credibilidade do funcionamento de um regime como o do CINM passa por
uma correta inspeção e transparência do seu funcionamento.
Existem vários documentos que reafirmam este fato. Um exemplo é o estudo11 de
Hager e Levin (2002) referido por Palma (2012), nos termos do qual se conclui que “O regime
da Madeira não é um offshore no sentido normal do termo. As licenças são sujeitas a regras
muito rígidas, as companhias a operar na Madeira têm de ser residentes em Portugal e por isso
sujeitas a supervisão de entidades oficiais portuguesas”.
Ao contrário do que ocorre com as praças offshore, os residentes em Portugal podem
operar no CINM através de estruturas empresariais, contrariando a total exclusão de relações
com a realidade económica circundante.
Por conseguinte, deverá denotar-se que a Madeira nunca figurou em nenhuma lista
oficial de territórios ou regiões qualificadas como paraísos fiscais, quer da OCDE, quer do
Grupo de Ação Financeira (GAFI).
O regime fiscal do Centro Internacional de Negócios da Madeira constitui um
programa de auxílios de Estado, totalmente aprovado e apoiado por Portugal e a UE,
proporcionando um ambiente de negócios devidamente regulamentado e supervisionado.
Desde a sua criação, o intuito principal rege-se pelo desenvolvimento e diversificação de uma
região ultraperiférica, expressa e especialmente protegida nos termos do disposto no artigo

11
Estudo de Hager, W. & Levin, M. (2002), The Madeira International Business Centre : The Economic Context
and European Interests do Centre for European Policy Studies, Bruxelas.

49
349º do TFUE, portanto não se prende apenas a atrair investimento ou transações induzidas
por razões estritamente fiscais.
Acolhido pelos artigos 33º, 35º e 36º do EBF, o CINM concerne num regime unitário
que regula três sectores de atividades: a Zona franca Industrial, Serviços Internacionais e o
Registo Internacional de Navios (MAR).
De acordo com o resultado das negociações com a Comissão, é possível, atualmente,
distinguir três regimes de incentivos fiscais.
Os incentivos fiscais resultam de um ganho para o contribuinte sob a forma de
isenções, de reduções de taxa, de deduções à base tributável ou de deduções à coleta
(Guimarães, 2005), através da adoção de um determinado comportamento empresarial que,
supostamente, proporcionará ganhos ao Estado (Lopes, 1999).
Pelos ganhos que proporcionam ao tecido empresarial, os incentivos fiscais funcionam
como um forte elemento de atração ao investimento cada vez mais utilizado pelas jurisdições
económicas à escala global (Davies & Ellis, 2007; Easson, 2001).
Segundo Cunha (2006), podemos identificar alguns tipos de incentivo ou benefício
fiscal: (a) benefícios fiscais de natureza contratual, (b) incentivos fiscais à interioridade, (c)
incentivos fiscais às atividades de I&D e (d) outros tipos de incentivo.
Os benefícios fiscais de natureza contratual são afetos em função da área de atividade
de negócio e em função do montante a investir. Os incentivos fiscais à interioridade estimulam
a captação de investimento para zonas ou regiões periféricas mais desfavorecidas. Os
incentivos fiscais de I&D têm como objetivo a emergência de novas tecnologias, de forma a
garantir a competitividade e a sustentabilidade da economia.

2.2 Regime I

O regime I resultou da primeira aprovação da Comissão em 26 de Maio de 1987, por


um período de três anos com início em 1989 e produção de efeitos até 31 de Dezembro de
2011. Com características idênticas, este regime veio a ser novamente aprovado a 18 de
Dezembro de 1991, por um período de três anos e com efeitos até 31 de Dezembro de 2011, e
a Fevereiro de 1995, por um período de seis anos e com produção de efeitos até 31 de

50
Dezembro de 2011, sendo que a admissão de entidades no regime ocorreu até 31 de Dezembro
de 2000.
Neste primeiro regime, constante do artigo 33º do EBF, (antigo artigo 41º do mesmo
Estatuto) foi permitido que se constituísse quatro áreas de investimento: um centro de Serviços
Financeiros, uma Zona Franca Industrial, um Centro de Serviços Internacionais e um Registo
Internacional de Navios.
Em linhas gerais, os principais benefícios fiscais vigentes deste regime recaíam sobre
a isenção do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) e de Imposto sobre o
Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) que se licenciassem no regime até 31 de Dezembro
de 2000.

2.3 Regime II

O Regime II é constante do artigo 35º do EBF e foi aprovado pela Comissão através
do auxílio estatal N222/A/2002 e N222/B/20002 e a nível interno pelo Decreto-Lei nº
163/2003, de 24 de Julho. A data de vidência do regime, em termos de admissão de
licenciamento das entidades, iniciou a 1 de Janeiro de 2003 com termo a 31 de Dezembro de
2006, e produção de efeitos até 31 de Dezembro de 2011.
No que concerne à delimitação das atividades a exercer, este regime passa a abranger
apenas três setores, os quais mantêm a Zona Franca Industrial, os Serviços Internacionais, o
Registo Internacional de Navios (MAR) e excluem-se os Serviços Financeiros e “intra-
grupos”.
Para requisito de licenciamento de entidades, surge pela primeira vez, como condição
para efeitos de aplicação do regime, a imposição de plafonds limitativos dos benefícios, em
função dos postos de trabalho:

Quadro 7: Plafonds máximos aplicados à matéria coletável

Matéria Coletável Postos de trabalho criados


1,5 milhões de euros de 1 até 2
2 milhões de euros de 3 até 5

51
12 milhões de euros de 6 até 30
20 milhões de euros de 31 até 50
30 milhões de euros de 51 até 100
125 milhões de euros mais de 100

Contudo, para Palma (2003) a imposição destes requisitos para a criação de trabalho,
eram, à data, algo paradoxais, uma vez que a Região Autónoma da Madeira vivia numa
situação próxima de pleno emprego.

Outra particularidade importante deste segundo regime recai sobre o fato de se passar
a tributar as novas sociedades autorizadas a operar na ZFI e Centro de Serviços Internacionais,
em sede de IRC. Assim que passou-se a tributar as empresas em:

Quadro 8: Taxa de IRC – Regime II

1% 2003 a 2004
2% 2005 a 2006
3% 2007 a 2011

Os rendimentos das Sociedades Gestoras de Participações Sociais (SGPS) licenciadas


a partir de 1 de Janeiro de 2003 até 31 de Dezembro de 2006 são igualmente tributadas nos
termos referidos anteriormente, salvo os casos em que são obtidos em território português,
com exceção das zonas francas ou em outros Estados membros da União Europeia, que são
tributados nos termos gerais.
O objetivo de contribuir para o desenvolvimento económico e regional de uma ilha
periférica, através da modernização e diversificação da economia mantém-se. Todavia,
segundo Palma (2003,2012) este regime possui características próprias impostas pela
Comissão, que o distanciam do regime anterior e por outro lado, aproximam do caso do
regime de ZEC de Canárias, caraterísticas essas, que se unem numa natural perda de
competitividade do mesmo.

52
2.4 Regime III

Em Junho de 2006, foi apresentada à Comissão a proposta de um novo regime, o


regime atual do CINM constante do artigo 36º do EBF. Este Regime III, foi aprovado a 27 de
Junho de 2007 e executado pelo Decreto-Lei 13/2008 de 26 de Junho.
O novo conjunto de benefícios fiscais, é aplicável às entidades devidamente
licenciadas a partir de 1 de Janeiro 2007 até 31 de Dezembro de 201412, para os três setores de
atividade da Zona Franca Industrial, Serviços Internacionais e Registo Internacional de Navios
(MAR), com efeitos de produção até 31 de dezembro de 2020.
Em geral, o regime segue as linhas que estruturam o anterior regime II, isto é, a
exclusão das atividades financeiras, a tributação de taxas reduzidas de IRC e a limitação da
concessão do benefício através da aplicação de plafonds máximos à matéria coletável do
benefício fiscal em sede de IRC.
No entanto, ocorre uma redução dos benefícios fiscais atribuídos, sendo que
rendimentos de IRC passam a ser tributados às taxas de:

Quadro 9: Taxa de IRC - Regime III

3% 2007 a 2009
4% 2010 a 2012
5% 2013 a 2020

Segundo Palma (2012) tendo em consideração a experiência adquirida com o regime


anterior, desta vez condiciona-se a admissão ao regime, com maior adequação às realidades
económicas e dos mercados, em função do contributo das mesmas entidades para a criação de
postos de trabalho.

Assim que, às entidades referidas, que prossigam atividades industriais, são ainda,
passíveis de uma dedução de 50% à coleta de IRC desde que, segundo o n.º 5, do artigo 36º
EBF, preencham, pelo menos, duas das seguintes condições:

12
Nova prorrogação da Comissão sobre o prazo para a admissão de novas empresas no (CINM), por mais seis
meses, no âmbito do atual Regime III.

53
a) Contribuam para a modernização da economia regional, nomeadamente através da
inovação tecnológica de produtos e de processos de fabrico ou de modelos de negócio;

b) Contribuam para a diversificação da economia regional, nomeadamente através do


exercício de novas atividades de elevado valor acrescentado;

c) Promovam a contratação de recursos humanos altamente qualificados;

d) Contribuam para a melhoria das condições ambientais;

e) Criem, pelo menos, 15 postos de trabalho, que devem ser mantidos durante um
período mínimo de cinco anos.
De acordo com o disposto do n.º 2 do mesmo artigo as entidades que pretendem
beneficiar do presente regime devem: (1) iniciar as suas atividades no prazo de seis meses, no
caso dos serviços internacionais, e de um ano, no caso de atividades industriais ou serviço
marítimo contando da data de licenciamento; (2) observar ainda um dos seguintes requisitos
de elegibilidade:

 Criação de um a cinco postos de trabalho nos seis primeiros meses de atividade e a


realização de um investimento mínimo de €75 000 na aquisição de ativos fixos corpóreos ou
incorpóreos, nos dois primeiros anos de atividade;

 Criação de seis ou mais postos de trabalho nos seis primeiros meses de atividade.

Como anteriormente referido, no Regime III os benefícios fiscais atribuídos às


entidades estão também limitados pela fixação de um valor máximo da matéria coletável, a
que é aplicável a taxa reduzida prevista, dependendo do número de postos de trabalho criados,
conforme a seguinte escala (n.º 3 do artigo 36º EBF)13:

13
Artigo aditado pelo DL n.º 13/2008, de 18 de Janeiro e alterado pelo DL n.º 108/2008, de 26 de
Junho, pela Lei n.º 83/2013, de 9 de Dezembro (com entrada em vigor a partir de 10 de Dezembro de 2013 e com
produção de efeitos a 1 de Janeiro de 2013) e pela Lei n.º 83-C/2013 de 31 de Dezembro.

54
Quadro 10: Plafonds máximos aplicados à matéria coletável – Regime III

Matéria Coletável Postos de trabalho criados


2,73 milhões de euros de 1 até 2
3,55 milhões de euros de 3 até 5
21,87 milhões de euros de 6 até 30
35,54 milhões de euros de 31 até 50
54,68 milhões de euros de 51 até 100
205,5 milhões de euros mais de 100

Quanto ao rendimento das Sociedades Gestoras de Participações Sociais (SGPS),


licenciadas a partir de 1 de Janeiro de 2007 até 31 de Dezembro de 2013, o regime aplicado
substancia-se pelas mesmas regras face ao anterior.
Em relação a outros benefícios fiscais, as empresas licenciadas no CINM encontram-
se isentas de imposto do selo nos documentos, contratos e outros atos realizados que
requeiram registo público, desde que realizados com entidades não residentes em Portugal ou
licenciadas no CINM.
As sociedades licenciadas no CINM beneficiam igualmente de isenção de IMT e
imposto sobre as sucessões e doações devidos pelas aquisições de bens imóveis destinados à
sua instalação, assim como de outras taxas e impostos locais.
Às restantes situações não referidas nos números anteriores são aplicáveis, nos termos
da legislação respetiva e relativamente às atividades industriais, comerciais, de transporte
marítimo e de outros serviços não excluídos do presente regime, os demais benefícios fiscais e
condicionalismos atualmente vigentes na Zona Franca da Madeira.

55
2.5. Análise comparativa dos três regimes fiscais do CINM

Quadro 11: Os regimes fiscais do CINM: síntese comparativa

Regime I Regime II Regime III

Período de 1987 - 2011 2003-2006 2007-2013


Vigência

Data limite de 31/12/2011 31/12/2011 31/12/2020


produção de efeitos

- Zona Franca - Zona Franca Industrial - Zona Franca


Industrial Industrial
Áreas de - Serviços Internacional
Investimento - Serviços de Navios - Serviços
Internacional de Internacional de
Navios - Serviços Navios
Internacionais
- Serviços - Serviços
Internacionais Internacionais

- Serviços
financeiros

Benefícios fiscais Taxa de IRC de 2003 – 2004 de 1% 2007 – 2009 de 3%


em sede de IRC 0% 2005 – 2006 de 2% 2010 – 2012 de 4%
2007 – 2011 de 3% 2013 – 2020 de 5%

Postos de Matéria Postos de Matéria


trabalho coletável trabalho coletável
1– 2 1,5M€ 1–2 2,73M€
3–5 2M€ 3–5 3,55M€
6 – 30 12M€ 6 – 30 21,87M€
Plafonds Não existem 31 – 50 20M€ 31 – 50 35,54M€
limitativos
51 – 100 30M€ 51 – 100 54,68M€
+ 100 125M€ + 100 205,5M€

56
Tributação dos
juros Isenção Tributados
Isenção
e dividendos
repartidos

Todas estas alterações causaram um grande impacto no CINM nomeadamente sobre a


sua competitividade, capacidade de atração de investimento financeiro como também no
próprio contributo deste para o desenvolvimento da ilha. Esta problemática é analisada de
forma mais detalhada no próximo capítulo.

57
Capítulo 5 – O impacto económico e regional do CINM

1. O contributo do CINM para o desenvolvimento da Madeira

A Região Autónoma da Madeira possui, como já foi referido, características de


ultraperiferia que condicionam o desenvolvimento e diversificação da sua economia. Neste
sentido, o CINM surge com o intuito para colmatar essas restrições, desenvolver e promover a
competitividade fiscal da região.
O CINM usufrui de benefícios fiscais de forma a cativar o investimento externo para
as suas áreas de investimento, os quais são devidamente aprovados pelo governo português e a
Comissão Europeia em sede de auxílios de Estado.
A atração de investimento externo permite a dinamização dos setores de forma mais
rápida e eficaz estimulando a produtividade e o crescimento económico. Para tal, é importante
que a economia interna seja competitiva e reúna as condições necessárias para dar resposta aos
pressupostos a que se destina.
Note-se que foram efetuados vários estudos sobre o contributo deste regime para o
desenvolvimento regional, na procura de apurar a proporcionalidade dos benefícios
concedidos face aos resultados económicos atingidos.
De entre os existentes, Palma (2011) realça o estudo elaborado pelo Centre European
Policy Studies14, de Bruxelas, que após uma análise substancial e aprofundada, confirma as
conclusões de um relatório entregue por Portugal junto da União Europeia em relação ao
mérito e indispensabilidade da execução do programa consubstanciado no CINM.
Segundo a autora não existem dúvidas quanto ao contributo do Regime I para o
desenvolvimento regional, aos mais variados níveis, nomeadamente, em relação ao contributo
para o PIB regional, ao VAB, à diversificação e modernização do tecido empresarial, à
resposta à globalização, ao emprego (direto ou indireto) qualificado, ou ainda quanto ao
aumento do “turismo de negócios”.
No que concerne às atividades não financeiras o CINM representou:

14
Hager W. and Levin M. (2002), The Madeira Internacional Business Centre: the Economic Context and
European Interests.

58
Gráfico 2: Contributo do CINM em termos de VAB

80% 70% % de contributo no VAB


total das atividades da
60% 48% 49% RAM
% de VAB das atividade
40% 27% não financeiras
23% 22% 20%
17% 17%
20%
% de VAB das Actividades
financeiras
0%
2000 2001 2002

Em 2000 e 2001, 17% e, em 2002, 20% do VAB total de tais atividades da RAM.
Assim que, as empresas do CINM significavam, em termos de VAB, 23%, 22% e 27%,
respetivamente, do VAB total das empresas não financeiras da Madeira.
Aquando do conjunto das atividades financeiras exercidas na madeira a contribuição
do CINM era de 70%, 48% e 49%, respetivamente em 2000, 2001 e 2002.

Gráfico 3: Contributo do CINM para o PIB regional da Madeira

30%
25% 21% 21%
20% 18%

15% PIB

10%
5%
0%
2000 2001 2002

Nestes mesmos anos, o seu contributo para o PIB regional da Madeira e para o VAB
a preços de base atingiu percentagens idênticas, respetivamente de 21%, 18% e 21%. Em geral
e segundo estes indicadores, a ZFM representava nos mencionados anos cerca de um quinto da
economia da Madeira, com forte prevalência das atividades dos sectores não financeiros.

59
O mérito do regime de auxílios de Estado – no qual não existia qualquer
obrigatoriedade administrativa de criar empregos ou de investimento – levou a Comissão a
considerar que o regime constituía “um dos instrumentos mais dinâmicos da economia
regional”.
Recentemente, a 31 de Dezembro de 2013:

50
ZFI
263
MAR
1590
SI
1903
Total

0 500 1000 1500 2000

Isto resulta num espetro empresarial que representa 12% do investimento estrangeiro
em Portugal em 2013.
No mesmo ano, o CINM foi responsável por 14,5% de receitas fiscais da Região
Autónoma da Madeira, totalizando cerca de 123 milhões de euros. A SDM e as empresas
sediadas na Zona Franca Industrial e no CINM pagaram aproximadamente 73,6 milhões de
euros de imposto sobre o rendimento coletivo, o que representou 41% da receita gerada pelo
imposto cobrado aos lucros de todas as empresas madeirenses.
A atividade foi igualmente responsável por outros 39 milhões de euros de IVA, com
os cerca de três mil trabalhadores que desenvolvem a sua atividade na região a pagarem cerca
de 10 milhões de euros de imposto sobre o rendimento singular.
As empresas que desenvolvem a sua atividade na Zona Franca e no CINM investiram
200 milhões de euros só no ano 2012.
Em relação ao emprego em 2013, 616 trabalhadores desenvolvem a sua atividade na
Zona Franca e 2.313 em empresas que desenvolvem a sua atividade em serviços
internacionais, os outros 3.387 profissionais são tripulantes dos navios e embarcações
registados no MAR, resultando num total de 6.316 postos de trabalho diretos, e de emprego
indireto, que a EU estima ser de 80% do emprego direto.

60
O fato de que o CINM nunca constou da lista de paraísos fiscais da OCDE, tal que as
suas práticas, “se encontram sujeitas às mesmas regras, condições e requisitos que as
atividades exercidas no resto do território nacional, sem exceções” e que existe uma “total
transparência do regime (…), traduzida no facto de se aplicarem as mesmas regras relativas à
fiscalização, controlo e supervisão aplicáveis no demais território nacional, não existindo
quaisquer peculiaridades em matéria de sigilo”, juntamente aos resultados económicos já
alcançados, torna evidente a necessidade de manutenção do regime, como um veículo
imprescindível para o desenvolvimento económico e social da Madeira, através da
diversificação e modernização da respetiva estrutura produtiva de bens e serviços. E neste
sentido, deve ser apoiado e continuado (Palma, 2003; 2006).
Sendo a Madeira uma ilha ultraperiférica e insular, com uma economia uni-setorial e
pouco diversificada, devido às dificuldades e condições que lhe são associadas, o Centro
Internacional de Negócios da Madeira representa um instrumento crucial para o seu
desenvolvimento económico, através da captação de investimento externo, aumento de receita
fiscal e da empregabilidade, ajudando a criar uma autossuficiência e autonomia de que a
região necessita.
A questão pertinente que agora se coloca é, terá o CINM a competitividade fiscal que
é necessária para alcançar os seus objetivos?
No próximo ponto deste trabalho, temos como intuito a análise e comparação dos
regimes fiscais do CINM de forma detalhada, no que diz respeito às consequências das
mudanças introduzidas (ganhos ou perdas) para a competitividade fiscal do Centro e para o
desenvolvimento regional da ilha.

2. Consequências das alterações ao regime fiscal do CINM

De acordo com o disposto no artigo 7º, n.º2 da LGT, “ a Tributação deverá ter em
consideração a competitividade e internacionalização da economia portuguesa, no quadro de
uma sã concorrência”.

61
De fato muito se fala da competitividade do nosso sistema fiscal, no entanto,
geralmente de forma negativa, salientando-se a falta dessa competitividade principalmente
quando comparado com outros sistemas fiscais.
Neste sentido, Palma (2006) faz a seguinte questão: “Será que na prática, no que
reporta ao CINM, as alterações sucessivamente introduzidas no regime têm vindo a considerar
a competitividade e a internacionalização da economia Portuguesa no quadro de uma sã
concorrência?”
É certo que, no decorrer da sua existência, esta praça cativou investimento externo e
desenvolveu a economia Madeirense porém, devido à ausência de uma estratégia nacional
coerente, que origina numa instabilidade legislativa, tem vindo a perder competitividade ao
longo dos seus três regimes. De forma a constatar tal fato, iremos analisar os impactos das
constantes alterações ao regime do CINM.
No gráfico 4 é possível verificar a evolução do CINM relativamente ao número de
empresas licenciadas desde o seu ano de criação até 2013.

Gráfico 4: Número de empresas constituídas, por ano, no CINM no período 1998-2013

número de sociedades licenciadas (31 de Dezembro)

5978
5610
5272
4886
4281 4473
4195
3871
3611
3392
3231
2981
2572 2686
2138 2281
1845
1674
1477 1860
1131
817
7 57 209439
2007
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006

2008
2009
2010
2011
2012
2013

62
O CINM começou em 1988 com apenas 7 empresas licenciadas, e durante 12 anos,
mais propriamente até ao ano 2000, o seu nível de captação de empresas foi crescente, tendo
atingido o seu pico, com aproximadamente 6000 empresas licenciadas no ano 2000.
O primeiro regime permaneceu em vigor desde 1988 a 2000, os seus benefícios
incluíam, a área financeira, para além das três atividades já mencionadas, a isenção de
tributação de IRC e ausência de plafons. Este regime demonstra resultados positivos e
crescente capacidade de captação de investimento externo, e elevado nível de competitividade
fiscal face aos benefícios e condições atribuídas.
A entrada do Regime II deu-se em 2001, acarretando um conjunto de mudanças nos
benefícios fiscais anteriormente atribuídos.
Tais alterações incluem a amputação do setor dos serviços financeiros e «intra-
grupo», bem como a diminuição dos benefícios fiscais em sede de IRC, ao caducar a isenção
de tributação do imposto, passando a ser tributado a uma taxa de 1% entre 2003 e 2004, de 2%
entre 2005 e 2006 e, de 3% entre 2007 até 2011.
Como requisito principal surge, pela primeira vez, a criação de postos de trabalho
como condição sine qua non para a concessão do regime, através da aplicação de plafonds
máximos à matéria coletável.
O terceiro regime revela uma estrutura semelhante ao anterior, continuando a incluir a
aplicação de plafonds máximos à matéria coletável, a ausência de atividades financeiras e
«intra-grupo» e a tributação a taxas reduzidas de IRC. Todavia, as taxas de tributação deste
último aumentam ligeiramente.
Contudo, o problema não está ligado ao aumento da tributação em sede de IRC, uma
vez que, a taxa de tributação continua a ser uma taxa reduzida e favorável. A grande
preocupação prende-se com o fato da eliminação da praça financeira e da imposição criação de
postos de trabalho através de plafonds máximos à matéria coletável.
No seguinte gráfico é possível ver de forma mais detalhada a decrescente evolução do
CINM ao longo dos três regimes existentes.

63
Gráfico 5: O número de empresas do CINM e os três regimes fiscais

7000

6000

5000

4000 Regime I

3000 Regime II
Regime III
2000

1000

0
1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014

Como podemos averiguar a partir dos regimes II e regime III é notável a absoluta
inversão na tendência de evolução do Centro.
É importante realçar que os limites máximos aplicados à matéria coletável, aquando
aprovados para o terceiro regime, apresentavam valores menores que os atuais. Em Maio de
2009 foi apresentada uma notificação à Comissão visando a revisão dos mencionados plafonds
com base nos efeitos negativos destes para a competitividade do Centro e da região. A
negociação decorreu de forma normal com as três rondas de pedidos de esclarecimentos pela
Comissão e inclusive com a concessão de um período adicional, para além do prazo normal,
de apresentação dos esclarecimentos finais por parte do Governo da República contudo, o
Governo optou pelo cancelamento do processo de negociação em 2010.
Para agravamento da conjuntura, a 17 de Outubro de 2011 aquando da Proposta de
Lei do Orçamento de Estado para 2012 surge uma nova medida que reduz os benefícios fiscais
do CINM, através da caducidade da isenção dos dividendos distribuídos aos sócios das
empresas e sobre os juros de suprimentos.
A constatação destes fatos transmitiu uma imagem extremamente negativa sobre a
efetiva intenção política por parte do Governo Português em assegurar as condições de
competitividade do CINM em comparação com outras praças europeias. Criou-se assim uma
instabilidade legislativa que trouxe falta de confiança no Centro por parte das sociedades lá

64
sediadas e, consequentemente o início da retirada de muitas empresas cujo volume de
negócios eram elevadíssimos e com forte aptidão de geração de receitas fiscais.

Quadro 12: Local de destino de entidades que saíram do CINM

Entidade País
Sousa Cruz Suíça
Chevron-Texaco Califórnia
Swatch Suíça
Yahoo Califórnia
Caixa Geral de Depósitos Cayman
Livermore Malta

Um dos exemplos das milhares de empresas que deixaram a praça da Madeira, devido
a tais restrições, foi a tabaqueira brasileira «Sousa Cruz», uma dos maiores da América Latina,
com lucros na ordem dos 100 milhões de euros. Esta empresa transferiu a sua atividade para a
Suíça na qual paga um imposto de 8% mas, em contrapartida não está condicionada aos
plafonds atribuídos como condição para usufruir de tributação reduzida.
A esta lista junta-se a grande petrolífera norte-americana, Chevron-Texaco, a Swatch,
a Yahoo, e até mesmo a Caixa Geral de Depósitos, que passou a sua sucursal financeira para
Cayman.
A sociedade Livermore pertencente ao Grupo Chevron-Texaco apresentou, em 2010,
um lucro tributável de 1.084 milhões de euros, pelo que a sua deslocalização para Malta
representou uma perda de mais de 40 milhões de euros de impostos para a região.
Desde a apresentação do OE em 17 de Outubro em 2011 até a sua aprovação, 30 de
Novembro, 44 empresas cancelaram a sua licença no CINM. Após 4 dias apenas saíram mais
85 empresas, gerando um total de 129 empresas que representavam um lucro tributável em
2010 superior a 1.347 milhões de euros, o qual significa uma perda de receita fiscal de 54
milhões de euros.

65
Nos primeiros 11 meses deste ano abandonaram o Centro 318 empresas, as quais
representavam 1700 milhões de euros e, em perda de receita de receitas fiscais 140 milhões de
euros.
As praças europeias concorrentes para onde estão ser transferidas as empresas do
CINM são, essencialmente, a Suíça, Áustria, Holanda, Luxemburgo, Malta e Chipre.
Em suma, desde 2011 até Abril de 2012 saíram 790 empresas, o que diz respeito a
uma perda fiscal em sede de IRC de 160 milhões de euros (à taxa de 4%) que deixaram de
pagar nesse ano, e em 2013 (à taxa de 5%) que pagariam 200 milhões. Para além disso,
registou-se uma perda de 10 mil milhões de euros relativamente ao volume de depósitos que
terão saído após os benefícios fiscais.
Os números de baixas não pararam de aumentar, assim que até ao final do ano de
2012 saíram do centro cerca de 1000 empresas, 200 das quais no primeiro trimestre que
equivale a uma perda de receita de 60 milhões de euros.
Em 2012 a receita foi de 128.9 milhões (IVA, IRS e Impostos especais de consumo),
o que constitui números muito inferiores aos números perdidos só em IRC devido à saída das
empresas.
No que respeita ao PIB regional em 2011, a Madeira revela sofrer uma diminuição de
2,2%.
O VAB das atividades de comércio por grosso e a retalho, reparação de veículos
automóveis e motociclos, transportes e armazenagem, atividades de alojamento e restauração e
das atividades financeiras e de seguros na Região Autónoma da Madeira também foi
negativamente influenciado pelo comportamento das empresas localizadas no Centro
Internacional de Negócios da Madeira, sendo ainda de destacar o decréscimo do VAB do ramo
da construção que registou uma variação de (–)8,2%.
Em 2012 o PIB nacional assinalou um decréscimo nominal de 3,5% e de 3,2% em
termos reais. A Região Autónoma da Madeira apresenta-se como a que registou o maior
decréscimo em volume, sendo este de 7,1%. Segundo o INE, mais uma vez, este resultado tal
como já tinha ocorrido no ano anterior mas de forma menos acentuada está fortemente
influenciado pela saída de diversas empresas de dimensão relevante que anteriormente

66
operavam a partir do CINM, levando a que o VAB das atividades aí desenvolvidas tivesse
sofrido uma assinalável redução.
Contudo, é de salientar que em 2013 ocorre uma ligeira subida do número de
empresas licenciadas no CINM. Francisco Costa, o presidente da SDM, relacionou esta
“ligeira melhoria” com uma decisão comunitária de Julho que melhorou as condições de
competitividade do CINM, permitindo que “novos investidores externos voltassem a escolher
o CINM como base para as suas operações de vocação internacional”.
O acontecimento, é explicado pelo fato de que atual governo retomou o processo e
voltou as negociações com a Comissão, sendo que a Lei nº 83/2013, de 9 de Dezembro veio
alterar o artigo 36.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais aumentando em 36,7% os limites dos
plafonds a que está sujeito o lucro tributável das empresas do Centro Internacional de
Negócios da Madeira (CINM), com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2013.
Esta decisão representou um passo importante para melhorar a competitividade fiscal
e desenvolvimento do CINM.
Não há retorno das empresas que abandonaram o Centro, contudo em 2013 é
comprovada a entrada de 100 novas entidades ao Centro Internacional de Negócios da
Madeira. No final do ano, a ZFM era constituída por cerca de 1640 empresas licenciadas,
registando-se durante o ano 146 novos licenciamentos, crescimento de mais de 70% em
relação a 2012.
Nos primeiros três meses de 2014, o Centro Internacional de Negócios da Madeira
(CINM) registou a adesão de 42 novas empresas. Um crescimento de mais do dobro de novas
empresas em relação ao período homólogo de 2013 que confirma a tendência de recuperação
do CINM na captação de novos investimentos, iniciada no ano passado.

2.2. O emprego na Madeira

Em relação ao número de postos de trabalho, como podemos verificar pelo gráfico 6


a evolução ao longo dos três regimes não se revela tão nítida quanto a evolução do número de
empresas licenciadas na ZFM.

67
Gráfico 6: Variação do número de postos de trabalho no CINM

Isto deve-se ao fato de que 80% do emprego criado no CINM resultou das empresas
do Regime I (não sujeitas aos plafonds), enquanto os Regime I e III (sujeitos a plafonds) são
responsáveis apenas por, 16% e 4%, respetivamente, do emprego total.

É possível afirmar que a alteração com base nos limites máximos à matéria coletável
origina vários efeitos negativos que traduzem-se numa redução da competitividade fiscal do
CINM, a qual resulta em menor capacidade de atração de novas empresas e investimentos e
induz a um grande número de saída de empresas que por consequência leva a menor
competência de criar emprego.

Resta saber o impacto dos regimes fiscais, em especial dos benefícios fiscais nas
empresas da Zona Franca Industrial, isto é numa perspetiva microeconómica.

Para o efeito recorremos como metodologia de investigação ao estudo a entrevista, a


qual será tratada toda a informação no próximo capítulo.

68
Parte II – O Centro Internacional de Negócios da Madeira: estudo empírico
à Zona Franca Industrial

Capítulo 1 – Metodologia de Investigação

1 - Metodologia de investigação: considerações prévias

Para a realização deste estudo adotamos, como metodologia de investigação, uma


abordagem qualitativa, para a qual recorremos aos dados fornecidos por treze (13) empresas as
quais se mostraram proactivas em colaborar na presente investigação. Esta metodologia
enquadra-se com o propósito do estudo que é aferir acerca do impacto do fator fiscal no
investimento das empresas da Zona Franca Industrial da Madeira, em especial, das recentes
alterações ao sistema de benefícios fiscais.
A investigação qualitativa foca um modelo fenomenológico no qual a realidade é
enraizada nas perceções dos sujeitos; o objetivo é compreender e encontrar significados
através de narrativas verbais e de observações, ao invés da investigação quantitativa, cujo
objetivo é quantificar efeitos através de números. A investigação qualitativa normalmente
ocorre em situações naturais em contraste com a investigação quantitativa que exige controlo e
manipulação de comportamentos e lugares.
A investigação qualitativa tem, na sua essência, segundo Bogdan e Biklen (1994),
cinco características:
(1) a fonte direta dos dados é o ambiente natural e o investigador é o principal agente
na recolha desses mesmos dados;
(2) os dados que o investigador recolhe são essencialmente de carácter descritivo;
(3) os investigadores que utilizam metodologias investigação qualitativas interessam-
se mais pelo processo em si do que propriamente pelos resultados;
(4) a análise dos dados é feita de forma indutiva; e
(5) o investigador interessa-se, acima de tudo, por tentar compreender o significado
que os participantes atribuem às suas experiências.
Segundo Bell (2004) os “investigadores quantitativos recolhem os factos e estudam a
relação entre eles” enquanto os investigadores qualitativos “estão mais interessados em

69
compreender as perceções individuais do mundo. Procuram compreensão, em vez de análise
estatística. Os dados qualitativos podem também ser usados para suplementar, validar,
explicar, iluminar ou reinterpretar dados quantitativos obtidos dos mesmos sujeitos.
Os estudos qualitativos possuem nas suas características essenciais os quatro pontos
cardeais levantados por Flick (2007), em torno dos quais analisamos, de um modo geral, os
estudos desta natureza.
O primeiro ponto refere-se à concordância entre teorias e métodos. Assim, nos
estudos qualitativos, devem ser privilegiados métodos e teorias abertas e flexíveis,
compatíveis entre si, capazes de fazer frente à tarefa de lidar com a complexidade inerente aos
objetivos e aos problemas a contemplar.
O segundo ponto refere-se ao emprego das diferentes perspetivas dos sujeitos. O
contributo da investigação qualitativa nota-se pela sua capacidade de oferecer respostas que se
apoiam nas perspetivas das diferentes pessoas envolvidas e de criar, deste modo, uma rede de
ações e de significações entre as mesmas.
O terceiro ponto refere-se ao emprego da autorreflexão, como sendo a atitude que
leva o/a investigador/a a atuar como um crítico/a de si mesmo/a, da sua própria investigação e
das pessoas nela envolvidas. Esta atitude implica o alinhamento com uma posição construtiva
e interventiva.
O quarto ponto refere-se à variedade de enfoques e de métodos. As investigações
qualitativas são reconhecidas pelo facto de possuírem diversos esquemas de confronto com a
realidade, tendo em vista a sua compreensão holística (Flick, 2007).
As próprias linhas evolutivas da investigação qualitativa atestam esta tentativa
constante de inovação e de reflexão.
Por último, ainda na linha dos enfoques, as investigações qualitativas são
consideradas humanistas, naturalistas e flexíveis, em função: da sua necessidade de
compreender as pessoas nos seus ambientes naturais; da sua recusa em submeter-se a uma
estandardização de métodos; da sua liberdade em se deixar conduzir, tanto pelas atitudes
criativas como pelo improviso (Taylor, & Bogdan, 1987).

70
Postas estas primeiras considerações iniciais acerca dos métodos de investigação
adotados, passamos, na secção seguinte, à apresentação da metodologia seguida nesta
dissertação, desde a técnica de recolha de informação, ao tratamento e discussão dos dados.

1.1 A técnica de recolha de informação: Entrevista

Na presente dissertação, a escolha da técnica de recolha de informação versou sobre a


entrevista semiestruturada e a sua aplicação. A realização da entrevista teve como ponto de
partida a realização de um inquérito e, seguidamente, a sua aplicação. Temos, assim, como
técnica de recolha de informação a realização de entrevistas por aplicação de questionário.
Segundo Ghiglione e Matalon (1990) a entrevista poderá ser útil para a recolha de
informação relacionada com a investigação com o intuito de controlo, verificação,
aprofundamento ou exploração.
Bogdan e Biklen (2000) afirmam que as entrevistas variam quanto ao grau de
estruturação, desde as entrevistas estruturadas até às entrevistas não estruturadas. No entanto,
este autor refere ainda que as entrevistas semiestruturadas têm a vantagem de se ficar com a
certeza de obter dados comparáveis entre os vários sujeitos. Neste estudo, optou-se pelas
entrevistas semi-estruturadas por parecem mais adequadas neste contexto e por permitirem
maior segurança ao investigador. Estas foram então conduzidas através de um guião onde se
encontravam algumas questões gerais que foram sendo exploradas mediante as respostas
dadas pelos inquiridos.
Na entrevista semiestruturada ou guiada, como considera Patton (1990), o
entrevistador tem uma lista de questões que explora ao longo da entrevista. Os tópicos da
entrevista são dados a conhecer antes desta se iniciar, mas o entrevistador decide a sua
sequência de acordo com as respostas do entrevistado. Este tipo de entrevista permite recolher
de uma forma sistemática e compreensível as perspetivas de cada um dos participantes, dado
que delimita os assuntos abordados.
Em relação à análise dos dados recolhidos, Tesch (1990) refere que esta pode ser de
três tipos: (a) a interpretativa que visa analisar ao pormenor todos os dados recolhidos com a
finalidade de organizá-los e classificá-los em categorias que possam explorar e explicar o

71
fenómeno em estudo; (b) a estrutural, que analisa dados com a finalidade de se encontrar
padrões que possam clarificar e/ou explicar a situação em estudo; e (c) a reflexiva que visa, na
sua essência, interpretar ou avaliar o fenómeno a ser estudado, quase sempre por julgamento
ou intuição do investigador.
Na análise estrutural, os dados são analisados de modo a se identificarem padrões
inerentes ao discurso, texto, acontecimentos ou outros fenómenos. Este tipo de análise é
utilizada quando se tem por objetivo, por exemplo, fazer a análise de uma conversa.
A análise reflexiva difere da interpretativa e da estrutural porque o investigador não
se limita a descrever o fenómeno tal como ele surge, mas inclui também as suas intuições e
juízos de valor quando o retrata ou avalia. Na presente investigação recorremos, sempre que
oportuno, a esta técnica de análise de dados.

1.2 Objetivos gerais do estudo


Como referido anteriormente a presente dissertação tem como objetivo aferir acerca
do impacto que as sucessivas alterações aos benefícios fiscais do CINM têm na capacidade de
captar investimento e emprego, bem como no desenvolvimento económico e regional da ilha
da Madeira.
Após o desenvolver da revisão da literatura e uma análise macroeconómica acerca
desse impacto, foi possível verificar que houve uma grande influência, provocando um
elevado número de saídas de empresas, bem como uma eminente perda de competitividade
fiscal do Centro e das receitas fiscais da região. Este prejuízo foi elevado, todavia pôde-se
constatar que a maioria das empresas que saíram pertencia aos serviços internacionais da
CINM.
Assim sendo, o presente estudo empírico surge com o intuito de aferir qual a
importância do fator fiscal, na perspetiva das empresas sediadas na Zona Franca Industrial do
CINM, e das recentes alterações aos benefícios fiscais, no investimento destas na ilha e na
captação de investimento estrangeiro para a região.

72
1.3 Questões de investigação e apresentação da entrevista

É necessário ter presente que a nossa pergunta de investigação versa sobre a


importância do regime fiscal do CINM para as empresas, bem como aferir acerca do impacto
das recentes alterações deste regime fiscal no investimento das empresas. Pretende-se, acima
de tudo, analisar a perceção dos gestores das empresas sediadas nesta região.
De forma a concretizar o objetivo desta investigação elaboraram-se as seguintes
questões com o objetivo de criar um guião condutor da entrevista.

ENTREVISTA
O IMPACTO DO FACTOR FISCAL NO INVESTIMENTO: A PERCEPÇÃO DAS
EMPRESAS SEDIADAS NO CINM

1 – Qual o setor de atividade da empresa?

2 – Qual o ano de licenciamento na Zona Franca Industrial?

3 – Porque razões está licenciada a entidade na Zona Franca Industrial?

4 – A empresa usufrui do benefício fiscal ao investimento?

5 – Qual a atual importância que dá aos benefícios fiscais concedidos à atividade da sua
empresa?

6 – Qual a sua opinião acerca da imposição da criação de postos de trabalho através de


plafonds máximos à matéria coletável? E acerca do final da isenção dos dividendos?

7 – Estas alterações tiveram algum impacto na capacidade de investimento da sua


empresa? Se sim, qual a amplitude desse impacto?

8 – Qual a sua opinião acerca do regime fiscal do CINM?

1.4 Caracterização da População - alvo e participantes do estudo: a amostra


Para efeitos de concretização dos objetivos e das questões de investigação, o atual
estudo recaiu sobre as empresas da Zona Franca Industrial do CINM.

73
Segundo a lista disponibilizada pela SDM, o universo de entidades licenciadas na ZFI
é de trinta e sete (37) empresas. Contudo, dentro destas, apenas foi possível obter colaboração
de treze (13) empresas.
De forma a enriquecer o presente estudo, é de sublinhar que, durante a investigação,
foi possível ter uma breve reunião com o sénior management da SDM, Doutor Nuno Teixeira,
o qual se disponibilizou para colaborar nesta investigação.
Conforme já referido anteriormente o universo da amostra totalizou, então, treze (13)
empresas. Pode revelar-se um número exíguo, todavia, note-se que a pesquisa qualitativa não
leva em consideração o critério numérico para assegurar a sua representatividade pois em
igual razão a amostragem de qualidade é aquela que possibilita abranger todo o problema
investigado em suas múltiplas dimensões. (Minayo, 2002)
Para preservar a identidade das empresas, optou-se por usar codinomes. Assim, no
seguinte quadro segue-se a identificação das entidades da pesquisa:

Quadro 13: Identificação das empresas entrevistadas

Ano de Usufrui do
Empresa CAE Setor de atividade licenciamento benefício
na ZFI fiscal
Produção de eletricidade de
1 A 35112 1998 Sim
origem térmica

Importação e
2 B 23510 1996 Sim
Comercialização
3 C 52102 Armazenagem 1981 Não
4 D 52102 Armazenagem não frigorífica 1999 Sim
Preparação de produtos da
5 E 10201 2006 Sim
pesca e da aquicultura
6 F 10611 Moagem de cereais 2012 Sim
Lavagem e Limpeza a Seco
7 G 96010 2003 Sim
de Têxteis e Peles
Fabricação de estruturas de
8 H 25110 2002 Sim
construções metálicas
Fabricação de sabões,
9 I 20411 1993 Sim
detergentes e glicerina
Fabricação de produtos de
10822 confeitaria;
10 J 1994 Sim
46361 Comércio por grosso de
açúcar

74
Fabricação de fermentos,
11 K 10891 leveduras e adjuvantes para 2014 Sim
panificação e pastelaria
Fabricação de estruturas de
12 L 25110 2010 Sim
construções metálicas
Valorização de resíduos de
13 M 38321 2002 Sim
metálicos

Como podemos observar, através do Quadro 11, o CAE e por consequência o setor de
atividade, das empresas entrevistadas, são diversos, bem como o ano de licenciamento na ZFI,
o que constituí uma amostra diferenciada, a qual possibilita uma análise de estudo ampla e
discernida.

Outro aspeto a observar é que, das treze empresas entrevistadas apenas uma delas
(Empresa C) não usufrui do benefício fiscal, isto é, não desfruta de uma tributação em sede de
IRC de 5%, sendo tributado à taxa normal da região. É necessário não esquecer este dado na
análise dos nossos resultados.

75
Capítulo 2 – Apresentação e discussão dos resultados

Após a identificação das empresas que constituem a amostra e que usufruem do


benefício fiscal, neste ponto do trabalho pretende-se analisar e discutir a informação recolhida,
por forma a dar resposta às questões de investigação.
Esta informação será primeiramente apresentada de forma detalhada, expondo as mais
relevantes opiniões individuais de cada um dos entrevistados acerca dos assuntos inquiridos
consoante a sua perspetiva e conjuntura da empresa analisada.
Numa segunda parte será realizada uma análise geral das respostas das empresas e
principais conclusões retiradas do estudo.

2.1 - Motivos para o licenciamento na Zona Franca Industrial (ZFI)

Relativamente às principais razões para as entidades se licenciarem na ZFI, as


respostas obtidas, apesar das diferentes características das empresas, não diferem muito umas
das outras.
Na realidade, os principais fatores influenciadores desta decisão foram, por ordem de
importância, os benefícios fiscais concedidos, a proximidade ao porto, as instalações e as
relações com outras empresas dentro da zona franca, conforme podemos ver na figura abaixo
apresentada.

Quadro 14: Motivos para o licenciamento na ZFI


Razões Empresa Número
Benefícios fiscais A, F, H, I, J, K, L 7
Proximidade ao porto B, H, J, K, M 5
Relações com outras A, G, L 3
empresas
Instalações C, E, I 3

É de salientar que, ao contrário das demais empresas entrevistadas, a empresa D


refere como principal e única razão de licenciamento na ZFI o fato do “desmantelamento da
empresa SHELL da praia formosa, o que resultou necessário a criação da atual empresa para

76
garantir a receção, armazenagem e expedição de combustíveis na RAM no novo local.”
Acrescenta ainda que “os benefícios fiscais não foram em nada importantes para esta decisão.”
Esta conclusão deixa, porém, de revelar-se curiosa.
No caso da empresa A, relativamente às razões iniciais para o licenciamento em
1998 na zona franca industrial, o sujeito entrevistado admitiu não possuir o conhecimento de
todas as razões existentes na altura, ainda assim, refere que umas das principais foram os
benéficos fiscais concedidos, bem como as relações com as outras empresas.
No que diz respeito a estas relações, consideramos oportuno salientar que as
entidades mencionadas referiram, a este propósito, o seguinte:

Empresa A: “ (…) inicialmente foi o fato de existir a possibilidade de uma empresa,


fornecedora de combustível instalar-se aqui ZFI.” Contudo na atualidade, o entrevistado
salienta que existem algumas relações também consideradas importantes com outras empresas
dentro da zona franca industrial que “permitiram aumentar a carteira de clientes” uma vez que
estas, usufruem de alguns produtos e subprodutos da empresa, para embalamento ou matéria-
prima da sua produção.
Empresa G: “nos estamos cá essencialmente devido à proximidade com a empresa A
que nos fornece a nossa matéria-prima que para eles é um subproduto da sua atividade.”
Empresa I: “à proximidade aos clientes dentro da zona franca”.
Para além destes, é possível observar com o estudo que a adjacência ao porto revela-
se também um fator de extrema importância para algumas das empresas, uma vez que estas
dependem imenso da exportação dos seus produtos (ex: empresa M e empresa J - exporta 90%
da sua produção) ou da importação das matérias-primas (empresa B e H - importam 100% de
matéria-prima).
Por sua vez, as empresas C, E e I justificaram ser relevante a questão do espaço e
instalações já existentes, mais propriamente a empresa E mencionando que: “não estávamos
aqui desde a constituição da empresa. Nos adquirimos esta empresa em 2006 devido às
condições das instalações” e a empresa C uma vez que esta não usufrui do benefício fiscal
concedido, e a principal razão deveu-se ao “espaço existente na ZFI para a armazenagem”.
Relativamente a esta empresa as restantes questões de investigação ficaram sem efeito.

77
2.2 - Importância atribuída por parte das empresas aos benefícios fiscais concedidos

Nesta parte da nossa investigação procuramos, pois, aferir acerca da importância


atribuída ao regime fiscal da ZFI por parte das empresas sediadas nesta região.
Vejamos, então, algumas das respostas obtidas por parte das empresas inquiridas:

Empresa A: o entrevistado não desenvolveu muito a sua resposta, afirmando apenas


ser um fator importante “para qualquer uma das empresas”.
Empresa B: o entrevistado referiu ser um fator “bom e importante, principalmente
comparado com outras empresas fora ZFI”, contudo, notou-se de forma significativa, que
existiam outros fatores não fiscais que desempenhavam um papel substancial para si e para a
sua empresa, sendo eles “as rendas muito altas” e a situação do porto, que “além de ter custos
muito elevados” revela-se bastante “concorrido”, o que resulta numa reduzida disponibilidade
para o carregamento/descarregamento dos barcos necessários à atividade da empresa.
Empresa D: apesar de afirmar que o benefício fiscal foi uma variável em nada
influenciável para o licenciamento da empresa, o entrevistado neste campo ser um fator
“importante”, explicando que este garante a viabilidade dos projetos na ZFI.
Empresas E G e H: Relativamente à importância concedida ao benefício fiscal, os
entrevistados destas duas empresas referem a mesma conclusão de que este fato só é
considerado importante para a empresa quando possui rendimento, caso contrário não revela
grande importância. Passemos a citar:
“se nos cingirmos aos últimos 3 anos essa importância é zero, porque como sabe para usufruir do
benefício fiscal é necessário a empresa ter lucros, se esses lucros não existirem no final do
exercício, esse fator deixa de fazer sentido. Essa questão é mais importante para as empresas da
zona financeira, não tanto para as empresas cá. Acredito que nenhuma empresa esteja aqui pela
questão fiscal. Poderá haver uma ou outra, por exemplo, talvez para quem exporta essa questão
poderá interessar, mas à maioria não.” (empresa H)

“ esse fator tem uma certa importância, no entanto se fosse só por ele não estávamos cá. Outras
vantagens como a proximidade à matéria-prima fornecida pela empresa A, a mão-de-obra, junto a
menores custos de transporte são aspetos que se revelam muito mais importantes do que o IRC.”
(empresa G)

“esses benefícios são mais importantes para empresas com lucros, e para aumentar a
competitividade centro, porque atrai mais empresas estrangeiras.” (empresa E)

Empresas F, J e K: de entre as empresas entrevistadas estas três, foram as que mais


demonstraram dar importância ao fator fiscal, mencionando ser um fator “muito importante”

78
tanto aquando do seu licenciamento como para a atual realidade da empresa. As empresas F e
J essencialmente porque exportam um elevado número de produtos e a K porque tem como
objetivo a sua “internacionalização”.

Como conclusão geral podemos aferir que, não obstante o fator fiscal não ser um
fator decisivo para o licenciamento das empresas na região, é, indiscutivelmente, para uma
parte das empresas entrevistadas, considerado como importante e muito importante, em
especial, à medida que a empresa vai crescendo e desenvolvendo a sua atividade.

2.3- A imposição da criação de postos de trabalho através de plafonds máximos à matéria


coletável e final da isenção dos dividendos: O impacto destas alterações nos resultados e
capacidade de investimento da empresa.

No momento da entrevista, para constatar o parecer das empresas sobre a imposição


dos plafonds e final da isenção dos dividendos, foram realizadas duas questões separadamente.
As respostas das empresas inquiridas, acerca desta problemática, foi quase unanime,
mostrando que estas imposições não revelam grande importância, uma vez que não se aplicam
à sua realidade, tendo revelado dois dos entrevistados que não tinha sequer conhecimento
acerca destas imposições e limites, uma vez que estes não produziram qualquer efeito nos
resultados das suas empresas, nem na sua capacidade de investimento.
Das respostas obtidas, destacam-se as seguintes:

Empresa F: “a imposição dos postos de trabalho através dos plafonds não tem
impacto material na realidade da empresa. E o final da isenção dos dividendos será mais um
fator inibidor à instalação de investidores no CINM.”. De forma explicitar esta situação a
empresa disponibilizou alguns dados do balanço mais propriamente das contas de
investimento realizado com o intuito a comprovar a sua resposta.

Conta 41 ativos fixos tangíveis 5 936 244 €


Antes da aplicação Conta 42 ativos intangíveis 61 479 €
dos plafonds Conta 43 ativos financeiros 11 500 €

79
Depois da Conta 41 ativos fixos tangíveis 5 332 175 €
aplicação dos Conta 42 ativos intangíveis 45 342 €
plafonds Conta 43 ativos financeiros 11 500 €

As pequenas variações verificadas nas contas dos ativos são resultados de outras
razões contabilísticas que não as alterações ao regime fiscal.

“ esta questão não se aplica à empresa. Esta empresa é de pequena dimensão e se por acaso
tivéssemos eventualmente que cumprir esses limites, não haveria nenhum problema, porque somos
uma empresa física, com 20 postos de trabalho diretos e 40 indiretos e com tudo” (empresa H).

“ a imposição dos plafonds não afetou em nada a empresa pois já tinha 30 funcionários. Para as
empresas de serviços internacionais foi prejudicial e também para a zona franca da madeira pois
perdeu força e competitividade em comparação com outras zonas francas” (empresa E).

Contudo, a empresa M revela a postura mais descontente a esta situação:

“as alterações não tiveram qualquer impacto na nossa empresa, no entanto não pretendemos fazer
mais investimentos nas nossas instalações, sendo que todo o investimento de construção/edificação
de armazéns é deixado à SDM no ato da nossa saída. Estas imposições só afastam as empresas da
zona franca deslocando as empresas para outros territórios. ” (Empresa M)

2.4 O regime fiscal do CINM: a perceção das empresas sediadas na ZFI

Para finalizar, a entrevista terminou com a seguinte questão: “Qual a sua opinião
acerca do regime fiscal do CINM?”
Vejamos, pois, de seguida, quais as respostas obtidas.
A empresa A: não revelou ter uma conceção relevante acerca deste na perspetiva da
sua empresa, mas sim na perspetiva do CINM, no qual referiu o seguinte: “Realmente
antigamente entraram muitas empresas para apenas usufruir do subsídio, mas sempre
deixavam algum dinheiro cá, e tinham empregados, mesmo sendo poucos poderiam vir a ter
mais. O CINM é que ficou a perder com as alterações feitas.”
A empresa E: sua resposta vai de encontro com a resposta dada pela empresa A,
salientando que considera que deveria voltar ao regime I, uma vez que era o que “deixava
mais impostos para a região (…) que eram pagos direta ou indiretamente pelas empresas.”
Acrescenta que no passado houve “uma má vontade política do governo português” mas

80
espera “que atualmente voltem atrás para criar competitividade para o CINM. As empresas
que saíram já não voltam, mas poderiam atrair mais investimento”.
A empresa H: também admite que não tem um conhecimento pormenorizado acerca
deste, possuindo um conhecimento macro com o qual baseia a sua opinião em que o âmbito
dos benefícios deveria ser alargado. Reconhece que no passado houve oportunidade para o
fazer mas “não houve vontade” e agora compreende que é mais difícil. “Acho que com as
condições que este parque tem, que são melhores do que qualquer parque industrial poderia ter
seguramente o dobro das empresas que já cá estão e ser muito mais competitivo”.

Apesar destas considerações, as empresas consideraram, como conclusão geral, que o


regime fiscal do CINM era adequado para as entidades da ZFI. Das empresas inquiridas, cinco
referiram que o regime é adequado para a ZFI, não desenvolvendo muito mais a sua resposta,
É de salientar que, neste momento, apesar da nossa questão de investigação recair
sobre o regime fiscal, a maioria das empresas mostrou tendência para expor o seu juízo não só
acerca dos fatores fiscais mas também acerca dos fatores não fiscais: O quadro seguinte
apresenta, pois, alguns dos fatores, fiscais e não fiscais, mencionados.

Quadro 15: Fatores fiscais e não fiscais

Fatores fiscais Fatores não fiscais


Regime fiscal mais ou menos adequado
para a realidade das empresas da ZFI,
Rendas demasiado elevadas
mas não para as empresas dos serviços
internacionais;
Disponibilidade de acesso ao porto
Poderia ser mais competitivo para a
limitada devido à não exclusividade
atração de investimento externo;
para ZFI
Custos de transportes marítimos muito
elevados
Pouca flexibilidade negocial da SDM
O horário restrito da alfândega

No que diz respeito aos fatores fiscais, as opiniões foram muito semelhantes, sendo
que a maioria das empresas inquiridas considerou ser um regime adequado às empresas da ZFI

81
(A, B, E, F, G, H, J e K), uma vez que o benefício fiscal em sede de IRC, isto é, a tributação
do rendimento em 5% é um aspeto positivo em comparação com o imposto cobrado às
empresas fora da zona franca. Sublinham, todavia, que para as empresas dos serviços
internacionais, as novas alterações fiscais são prejudicais, pois consideram que o regime do
CINM não se revela um regime fiscal muito competitivo na atracão de empresas estrangeiras
e, por consequência, no aumento das receitas fiscais da região. Três das empresas (D, J e L)
referiram que o benefício fiscal não é adequado, devendo existir mais benefícios fiscais. As
empresas C e M recusaram-se a responder a esta questão.
Verifica-se, assim, claramente, que as principais queixas das empresas da ZFI recaem
sobre os fatores não fiscais. O fato das rendas serem elevadas foi um dos aspetos mais
mencionados. A este respeito, algumas empresas explicaram que várias entidades, que
poderiam criar um número significativo de postos de trabalho e investimento na região, viram-
se obrigadas fechar e sair da zona franca industrial, uma vez que não acharam compensatório
os custos de instalação e as rendas, quando comparados com os benefícios obtidos
fiscalmente.
Outro aspeto é o fato de sentirem pouca flexibilidade da concessionária em negociar
estes custos fixos de acordo com a conjuntura económica atual e evolução do volume de
negócios de cada empresa.
A reduzida disponibilidade do porto e da alfândega foi também referido como um
ponto negativo uma vez que na opinião de algumas empresas entrevistadas diminui a
capacidade de importação e exportação.
Assim sendo, após a análise integral dos resultados às questões de investigação, é
possível observar que, apesar do fator fiscal ser um aspeto importante para a decisão de
licenciamento das empresas na zona franca industrial, numa perspetiva de longo prazo, notou-
se que a importância deste diminui, em consequência do surgimento de outros fatores, não
fiscais, os quais passaram a ser condicionantes mais constrangedores do exercício da sua
atividade.
Ao contrário do que foi analisado na revisão da literatura e do que sucedeu com as
empresas licenciadas na parte dos serviços internacionais (empresas de investimento
estrangeiro), nas entidades da zona franca industrial não observaram grandes impactos nos

82
resultados da empresa, nem na sua capacidade de investimento, devido às recentes alterações
aos benefícios fiscais concedidos (à imposição da criação de postos de trabalho através dos
plafonds máximos à matéria coletável nem do final da isenção dos dividendos).
Esta situação é passível de ser justificada pelo fato de que as empresas da ZFI além
de oferecerem um número considerável de postos de trabalho, quando possuem lucros, estes
não são muito elevados e como tal são abrangidos pelos limites/plafonds impostos.
Infelizmente o encerramento de algumas empresas na ZFI também é uma realidade,
contudo deve-se a fatores não fiscais (custos fixos de estar licenciado) que pelas conclusões
retiradas, podemos averiguar que representam as verdadeiras preocupações das empresas
industriais.
Para finalizar, não podemos deixar de referir, como muito oportuna, a posição do
Sénior Management da SDM, Doutor. Nuno Teixeira, acerca das questões de investigação
formuladas.
No que diz respeito ao impacto da imposição dos plafonds nas empresas da ZFI, o
Doutor Nuno Teixeira menciona que é normal que não se verifiquem grandes influências ou
alterações na realidade destas empresas, explicando que em termos de lucros, são poucas as
que conseguem atingir mais de dois milhões de euros (limite mínimo imposto pelos plafonds
até 2 postos de trabalho), portanto estas não sofreram qualquer alteração a este nível uma vez
em que não é aplicável a restrição à material coletável. As suas principais preocupações estão
viradas para os custos de elaboração, transportes, instalação entre outros. A grande
preocupação destas empresas passa por fatores não fiscais. Segundo o mesmo, existem
grandes empresas na ZFI que fazem a diferença na economia da nossa região, que é por
exemplo o caso da Insular, contudo o verdadeiro impacto dos plafonds afetou imenso o CINM
mas na parte das empresas de prestação de serviços internacionais, nas multinacionais e
estrangeiras que usufruem de uma faturação muito elevada, na casa dos mil milhões de euros.
Note-se que não compensa uma empresa com lucros deste montante ter um teto tão
insignificativo para dedução de matéria coletável e ainda ter de criar 100 postos de trabalho
que é um requisito muito difícil para uma empresa deste setor adquirir. Como explica, estas
constituem as empresas que realmente foram embora para outras praças mais competitivas,

83
que já não deixam milhões de receitas fiscais na região e que já não voltam mais, pois
perderam a confiança no regime e na sua regulamentação.
Em relação aos regimes existentes no CINM, o Doutor Nuno Teixeira deu a sua
opinião, afirmando que o melhor e mais competitivo foi sem dúvida o regime I, uma vez que
não existia imposto gerando grande atividade a nível de investimento estrangeiro. Refere que
apesar de que no início estas empresas não criassem muitos postos de trabalho, estas ainda
estariam em fase experimental e à medida que fossem confiando poderiam criar mais postos
de trabalho, mesmo que assim não fosse, existiriam mais empresas licenciadas e por
consequência mais criação de postos de trabalho. Para finalizar, o mesmo afirma que houve
uma melhoria com o alargamento dos plafonds mas ainda assim foi muito pequeno, na ordem
dos 3%, e o ideal era que estes não existissem.

84
Quadro 16: Síntese dos resultados obtidos

85
Capítulo 3 – Considerações finais

3.1 Conclusão
A crescente interdepêndencia económica, em resultado da integração europeia e
globalização, já não permite entender a fiscalidade como mera questão interna. Atualmente
nenhuma nação, nem mesmo as mais poderosas, podem fixar as suas opções em materia fiscal
sem ponderar e analisar devidamente as opções dos seus parceiros ou concorrentes. Em causa
estará direta ou indiretamente a sua competitividade.
A concorrência fiscal é sinónimo de aumento de qualidade. Mais importante,
aumento do desempenho e promoção do desenvolvimento económico. Portanto, proteger e
preservar o direito de exercer concorrência fiscal deve ser um objetivo fundamental.
No entanto, concorrência fiscal deve realizar-se de forma transparente e honesta. A
concorrência tributária passa a ser prejudicial ou desleal quando não observa tais requisitos e,
especialmente, quando são tomadas medidas a fim de encorajar o não cumprimento das leis
tributárias de outros Estados.
No que concerne à concorrência fiscal prejudicial a Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Económico (OCDE) bem como a União Europeia (EU) encarregam-se da
regulação e seu combate, nomeadamente, através do Código de Conduta da fiscalidade das
empresas, o Relatório do Comité dos Assuntos Fiscais sobre a concorrência fiscal.
O Centro Internacional de Negócios da Madeira está, na sua totalidade, sujeito às
regras comunitárias, sendo, pelo artigo n.º 1 do artigo 87 º do Tratado da CE (atual artigo 107º
da TFUE), configurado como regime de auxílios de Estado sob a forma fiscal, necessitando
para tal ser devidamente notificado e aprovado pela Comissão Europeia.
O regime da CINM não se configura como paraíso fiscal, mas como um regime fiscal
preferencial ou privilegiado, uma vez que as entidades licenciadas para o exercício de
qualquer atividade encontram-se sujeitas às mesmas regras de troca de informações e
supervisionamento das entidades oficiais exercidas no resto do território português, pelo que,
não existe impedimentos de natureza legal uma vez que o funcionamento de um regime como
o do CINM passa por uma correta inspeção e transparência do seu funcionamento.

86
Sendo a Madeira uma ilha insular e ultraperiférica, com uma economia uni-setorial e
pouco diversificada, devido às dificuldades e condições que lhe são associadas, o Centro
Internacional de Negócios da Madeira representa um instrumento crucial para o seu
desenvolvimento económico, através da captação de investimento externo, aumento de receita
fiscal e da empregabilidade, ajudando a criar uma autossuficiência e autonomia de que a
região necessita.

Devido às sucessivas alterações ocorridas no regime fiscal do Centro, precisamente


sobre os benefícios fiscais concedidos, o CINM foi alvo de vários prejuízos que traduzem-se
numa redução da competitividade fiscal, a qual resulta em menor capacidade de atração de
novas empresas e investimentos e induz a um colossal número de saída de grandes empresas
estrangeiras pertencentes aos serviços internacionais, que por consequência origina menor
competência de criar emprego e reduz na ordem dos centenas de milhões as receitas fiscais da
região da Madeira.

No que concerne aos resultados do estudo que recai sobre as empresas da zona franca
industrial, podemos aferir que, não obstante o fator fiscal não ser um fator decisivo para o
licenciamento das empresas na região, é, indiscutivelmente considerado pelas empresas como
um fator “importante” e “muito importante”, para a sua atividade.

Contudo é de salientar que devido às recentes alterações aos benefícios fiscais


concedidos (à imposição da criação de postos de trabalho através dos plafonds máximos à
matéria coletável e o final da isenção dos dividendos) nas entidades da Zona Franca Industrial
não se observaram grandes impactos nos resultados da empresa, nem na sua capacidade de
investimento, ao contrário do acorrido com as empresas de serviços internacionais. Esta
situação pode ser justificada pelo fato de que as empresas da ZFI além de oferecerem um
número considerável de postos de trabalho, quando possuem lucros, estes não são muito
elevados e como tal são abrangidos pelos plafonds impostos.
No que diz respeito aos fatores fiscais, as opiniões foram muito semelhantes, sendo
que a maioria das empresas inquiridas considerou ser um regime adequado às empresas da
ZFI, uma vez que o benefício fiscal em sede de IRC, isto é, a tributação do rendimento em 5%
é um aspeto positivo em comparação com o imposto cobrado às empresas fora da zona franca.

87
Apesar das questões de investigação recaírem sobre o regime fiscal, a maioria das
empresas mostrou tendência para expor o seu juízo com os fatores não fiscais do CINM.
Demonstrando que estes talvez possam ter um papel mais significativo e preocupante para a
atividade das empresas da zona industrial.
Todavia, é de realçar que a maioria dos entrevistados sublinharam que para as
empresas dos serviços internacionais, as novas alterações fiscais foram muito prejudicais.
Devido às tais, o regime do CINM não se revela um regime fiscal muito competitivo na
atração de empresas estrangeiras e, por consequência, não manifesta um aumento das receitas
fiscais da região.

3.2 Limitações ao estudo

O estudo empírico tinha como objetivo aferir acerca da influência da fiscalidade, mais
precisamente do impacto das alterações aos benefícios fiscais do regime do CINM no
investimento das entidades na região Autónoma da Madeira.
Dada a metodologia de investigação escolhida, a entrevista por aplicação de
questionário, é possível a investigação realizada ter sofrido influências da investigadora desde
a recolha de dados até à sua interpretação. É inevitável à própria natureza do ser humano.
Na concretização deste estudo surgiram vários obstáculos, sendo o primeiro a
dificuldade em obter resposta e colaboração por parte das empresas da região. O número de
empresas inquiridas é muito baixo e as respostas são díspares. Não podemos, assim,
generalizar resultados para toda a população de empresas sediadas na região. Porém, as
respostas obtidas não deixaram de suscitar curiosidades e mais investigação no futuro, em
particular, analisar o impacto dos benefícios fiscais no caso particular das empresas de
Serviços Internacionais.

88
3.3 Referências bibliográficas

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