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EXPEDIENTE
_
conselho editorial Ana de Fátima Sousa, Andreia Schinasi, Edson Natale, Elaine Lino,
Glaucy Tudda, Letícia Santos, Moisés Mendoza Baião, Tânia Rodrigues e Vinícius Murilo
Ç AG EM ,
Inezita Barroso
nunca deixou de
lado sua paixão
pela música e
pelo povo
CA IP I-
do Brasil
R IC ES ,
T RA JE - inezita em quadro do programa vamos falar de brasil, comandado por
ela e transmitido pela tv record entre 1954 e 1962
TÓ RI AS por
Aloisio Milani
e Alexandre Pavan
Ignez era o nome da mãe e da filha. Ignez Magdalena Aranha de Lima – a A menina fez aulas de violão e piano com a afamada professora Mary
filha, que acabou ganhando o apelido Inezita – nasceu no dia 4 de março Buarque e recebeu ensinamentos do folclorista e professor de edu-
de 1925, num sobrado da Rua Lopes de Oliveira, na Barra Funda, em São cação física Alceu Maynard de Araújo. Aprendeu a tocar viola de
Paulo, a poucos metros da casa do escritor Mário de Andrade. Por parte ouvido nas fazendas. Jovem, passou a cantar frequentemente entre
de mãe, descendia de uma família de ricos cafeicultores paulistas, os Sousa amigos, ao mesmo tempo que se dedicava aos estudos de bibliote-
Aranha, cuja árvore genealógica tem raízes em Cunha Gago e no cacique conomia, novo curso da Universidade de São Paulo (USP).
Piquerobi. Por parte de pai, dava continuidade a um clã que se espalhara
entre Belém e Ubatuba, os Ayres de Lima. Dizia Inezita que guardava na Praticante de natação, foi nas piscinas do Club Athletico Paulistano
alma um pouco de “terra e mar”. que ela conheceu Adolfo Barroso, estudante de direito da Faculda-
de do Largo São Francisco, com quem se casaria em 1947 e teria
Ela adorava uma história da sua avó paterna, que, como a neta, tinha voz sua única filha, Marta. A família cearense do marido contribuiu para
contralto e tocava piano. O avô, professor de grego e latim, ciumento e aproximá-la ainda mais das artes. Foi por intermédio do irmão de
impositivo, certa vez proibiu a esposa de cantar num recital para um or- Adolfo, Maurício Barroso – integrante do Teatro Brasileiro de Co-
fanato. O motivo: ela estaria muito bonita para se apresentar. A avó então média (TBC) e locutor de rádio –, que ela se tornou amiga dos ato-
trancou o piano, jogou a chave fora e calou seu canto enquanto viveu o res Paulo Autran e Renato Consorte, do radialista Vicente Leporace,
marido. Se ela não poderia se apresentar, ele também nunca mais a ouvi- do pianista Tullio Tavares, do escritor José Mauro Vasconcelos e do
ria. “Foi a vingança dela”, dizia Inezita. “Uma história da família muito forte compositor e zoólogo Paulo Vanzolini.
e que eu adorava.”
–
Aloisio Milani é jornalista e produtor cultural. Atuou na TV Cultura como roteirista
de 2015, que homenageou Inezita Barroso. Em parceria com a filha de Inezita, Marta,
Alexandre Pavan é jornalista e autor dos livros Timoneiro – Perfil Biográfico de Her-
mínio Bello de Carvalho (2006) e, em parceria com Irineu Franco Perpetuo, Popu-
lares & Eruditos (2001). Foi roteirista da TV Cultura e atualmente integra a equipe
Í ZE S
comenta algumas das canções
que marcaram sua vida
DE INE
ZI TA Na abertura do texto – e em várias outras
ocasiões –, Inezita diz ter nascido num
domingo de Carnaval. O dia 4 de março de
1925, no entanto, caiu numa quarta-feira.
ao lado inezita aos ainda criança, inezita fez uma série de
2 anos de idade, em apresentações com outras alunas da professora
1927 abaixo inezita mary buarque; a foto abaixo é de 1933
(indicada pela seta),
em 1933, com sua turma
do 2o ano primário da
tradicional escola
caetano de campos –
inaugurada em 1894, na
praça da república,
em são paulo
boletim escolar de
inezita – então com 16
anos de idade
acima inezita em 1950, em teste de fotografia para o filme angela (1951),
da companhia cinematográfica vera cruz
ao lado revista do rádio, 1956
revista intervalo, 1963
O CARIS- inezita no comando do programa viola, minha viola, da tv cultura
foto: cleones ribeiro de novais | cedoc tv cultura
MA DA
S U Ç U - Ao longo dos quase
35 anos em que
comandou o Viola,
Minha Viola, Inezita
Barroso fez a tela da
AR AN A
TV brilhar como o
luar do sertão
para modernismos, modismos, guitarras ou teclados. Os que lá se produtoras e emissoras como Abril Vídeo, TV Bandeirantes e TV Cultura. Para essa
apresentavam faziam uma música simples, genuinamente caipira – última, criou e dirigiu os programas Micro Macro, Mosaicos e Manos e Minas, entre
como a direção do programa, sem grandes invenções. outros. Foi o último diretor do Viola, Minha Viola.
UMA PIO- Ao mesmo tempo que
N E I R A
defendia os valores
ligados à música de
raiz, Inezita Barroso
viveu como uma
mulher à frente do
seu tempo
APAIXO-
N A D A
PELA TRA-
D I Ç Ã O por Badi Assad
É graças a Inezita Barroso que os valores da música de raiz ainda se aulas de música e de folclore... E, em álbuns como Inezita Apresenta,
mantêm preservados. Sem ela, talvez o novo sertanejo e suas ramifi- fez questão de interpretar e promover o trabalho de outros talentos
cações que invadiram rádios e rodeios brasileiros com temas roman- femininos – lançada em 1958, a coletânea reúne composições de Babi
tizados e guitarras elétricas tivessem nos feito perder boa parte do de Oliveira, Edvina de Andrade, Juraci Silveira, Leyde Olivé e Zica
nosso rico folclore. Inezita lutou para – e conseguiu – resguardar a Bergami, nomes que não estavam inseridos no mercado fonográfico.
música simples, feita pelas autênticas duplas de violeiros, pelos can-
tores e compositores do amor puro e da prosa interiorana. Inezita era uma mulher que não se deixava conduzir. Ela conduzia. Em
1956, rodou com um jipe por diversas regiões do país, coletando can-
Isso não é pouco. No entanto, Inezita é tão mais do que isso... ções e outras manifestações da cultura popular brasileira. Com a via-
gem, ou pesquisa de campo, Inezita também tinha o objetivo de se pre-
Em 2012 a revista Rolling Stone Brasil publicou uma lista com os 70 parar para as filmagens de um longa-metragem sobre Jovita Feitosa,
maiores mestres do violão no país. Entre eles, somente três mulhe- uma moça cearense que, na década de 1860, se disfarçou de homem
res: Inezita Barroso, a eterna Rosinha de Valença e esta que vos es- para tentar lutar na Guerra do Paraguai. O jipe, por sinal, foi apelidado
creve. Eu só conhecia o lado caipira de Inezita. Fiquei curiosíssima e com o nome da heroína do filme – que acabou não sendo produzido.
fui ler a biografia que Arley Pereira fez da artista, Inezita Barroso – a
História de uma Brasileira (2013). E me deparei com o exemplo de Inezita gravou todos os estilos que a interessaram. Do cancioneiro
uma pioneira. Não imaginava, por exemplo, que ela tinha sido uma caipira aos sambas de Noel Rosa, de canções de Ary Barroso a músi-
das primeiras mulheres a subir ao palco com um violão. cas afro-brasileiras... Seria ela a precursora do ecletismo?
Obrigada, Inezita. Certo é que, quando cantava, sua voz altiva e seu sorriso largo – de
sábias profundezas e de uma alegria contagiante – sempre nos ins-
Quando menina, embora tenha nascido em berço de ouro, a pequena piravam a reverência.
Ignez preferia ficar em meio aos peões e suas violas a assistir em si-
lêncio aos concertos promovidos pelos donos dos casarões que sua Aos 90 anos de idade, em 8 de março de 2015 – Dia Internacional da
família frequentava. Em vez de usar saias comportadas, optava por li- Mulher –, Inezita faleceu. E aqui ficamos.
derar a turma de moleques da rua. Imagine uma garota naquela épo-
ca – os anos 1920, 1930 – subindo em árvores, caçando passarinhos Quanta saudade você nos traz... •
com estilingue e jogando futebol. Pois foi com esse espírito livre que
ela resolveu viver não somente sua infância, mas toda a sua vida. _
Badi Assad é cantautora, violonista e escritora. Lançou, entre outros, os CDs Rhy-
Inezita nunca se deixou domar pela sociedade, sempre se recusou a thms (1995) – eleito o melhor álbum do ano na categoria Violão Acústico pela revista
seguir os padrões de comportamento impostos às mulheres de sua norte-americana Guitar Player –, Wonderland (2006) – um dos cem melhores discos
época. Dessa forma, ela talvez possa ser considerada também uma do ano de acordo com a BBC de Londres – e Amor e Outras Manias Crônicas (2012)
das nossas primeiras feministas. Gravou mais de 80 discos, atuou no – pelo qual ganhou o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Artes (APCA) de
ITAÚ CULTURAL
NÚCLEO DE MÚSICA
NÚCLEO DE ENCICLOPÉDIA
e Sacisamba (terceirizada)
foto: josé luis da conceição | estadão conteúdo som direto Rafael Bonifácio (terceirizado) e Tomás Franco (terceirizado)
NÚCLEO DE COMUNICAÇÃO E RELACIONAMENTO educadores Carla Léllis, Claudia Malaco, Edinho Santos, Josiane Cavalcanti, Lucas
gerência Ana de Fátima Sousa Takahaschi, Luisa Saavedra, Malu Ramirez, Raphael Giannini, Thiago Borazanian e
revisão Rachel Reis (terceirizada) produção Carmen Fajardo, Érica Pedrosa, Isabela Bevilacqua (terceirizada), Wanderley
Alexandre Pavan, Aloisio Milani, As Galvão, Fábio Maleronka (projeto Produção Cul-
CENTRO DE MEMÓRIA, DOCUMENTAÇÃO E REFERÊNCIA tural no Brasil), Hernani Aparecido Matias, Jornal do Brasil, Marcel Fracassi, Marta
gerência Fernando Araujo Barroso Macedo Leme, Renato Teixeira e Roberto Corrêa
equipe Amanda Freitas, Caroline Faro, Sidnei Santos, Thays Heleno, Victor Soriano
e Vinicius Magnun
estagiários Alexandre Santos, Aline Rocha, Bianca Melo, Bruna Caroline Ferreira,
Bruna Matsuoka, Caique Soares, Danielle de Oliveira, Edson Bismark, Elissa Sanitá,
to, Juliana Ozeranski, Juliane Lima, Kaliane Miranda, Kim Mansano, Lívia Moraes, O Itaú Cultural realizou todos os esforços para encontrar os detentores dos direitos
Lucas Rosalin, Luene Mantovani, Mariane Souza, Mario Rezende, Pamela Camargo, autorais incidentes sobre as imagens/obras fotográficas aqui publicadas, além das
Pamela Mezadi, Patricya Maciel, Rayssa Muniz, Renan Jordan dos Santos, Thiago pessoas fotografadas. Caso alguém se reconheça ou identifique algum registro de sua
Rodrigues, Vinicius Escócia, Vitor Augusto da Cruz e Walquíria Amancio autoria, solicitamos o contato pelo e-mail atendimento@itaucultural.org.br. As ima-
coordenação de programas de formação Samara Ferreira gens não creditadas pertencem ao acervo pessoal de Inezita Barroso.
Centro de Memória, Documentação e Referência Itaú Cultural
ISBN 978-85-7979-098-0
CDD 780.981
entrada gratuita
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