Você está na página 1de 211

C~IBGE

100 anos de imigração japonesa no Brasil


Instituto Brasileiro de Geografia e Estatrstica

resistência&integração
O IBGE, integrando-se aos festejos pela comemoração dos 100 anos da
imigração japonesa no Brasil, iniciada, oficialmente, com a chegada do
navio Kasato Maru ao porto de Santos, em 1908, oferece, através desta
obra, sua homenagem a esses pioneiros imigrantes e seus descendentes que, ao longo
do tempo, nos legaram sua marca indelével na economia, na cultura e na sociedade
brasileiras. Realizada em esforço conjunto de pesquisadores do IBGE, demógrafos e
estatísticos, e pesquisadores da comunidade acadêmica, a presente publicação reúne
dez textos, elaborados por especialistas de renome nas áreas de História, Demografia,
Estatística, Sociologia, Geografia e Direito, e aborda, sob essas várias perspectivas,
o processo lento e gradual de integração desse grupo étnico ao País que, entretanto,

JtAesistjência&integração
resistência&integração
não transcorreu sem frustrações e resistência.
O livro inicia com a história dos avanços e retrocessos da política de abertura dos
portos ao imigrante japonês, e prossegue com textos de análise da sua distribuição ter-
ritorial e da dinâmica demográfica no Brasil e, em particular, no Estado de São Paulo.
Apresenta, em seguida, textos que, na perspectiva geográfica, ressaltam a importância
das práticas associativas como elementos de aglutinação da comunidade e de conso- a~os de
100 anos d imigração japonesa no Brasil
lidação de um sistema de mobilidade geográfica e social. O tema da ascensão social é
retomado na perspectiva sociológica, sob o foco das mudanças culturais, dos projetos
familiares de mobilidade pela via da educação e do trabalho. Finalmente, a análise
recai sobre o retorno ao Japão de alguns descendentes – o fenômeno dekassegui – e
sobre a complexidade da construção de uma identidade dos nipo-brasileiros.
Como se vê, esta obra trata das múltiplas faces da imigração japonesa no Brasil e,
por isto, sendo uma homenagem, é também a contribuição do IBGE para o acervo de
conhecimento sobre a resistência e a integração desses imigrantes na sociedade brasi-
leira, que os acolheu.
resistência&integração
100 anos de imigração japonesa no Brasil
Presidente da República
Luiz Inácio Lula da Silva

Ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão


Paulo Bernardo Silva

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE

Presidente
Eduardo Pereira Nunes

Diretor-Executivo
Sérgio da Costa Côrtes

ÓRGÃOS ESPECÍFICOS SINGULARES

Diretoria de Pesquisas
Wasmália Socorro Barata Bivar

Diretoria de Geociências
Luiz Paulo Souto Fortes

Diretoria de Informática
Luiz Fernando Pinto Mariano

Centro de Documentação e Disseminação de Informações


David Wu Tai

Escola Nacional de Ciências Estatísticas


Sérgio da Costa Côrtes (interino)

UNIDADE RESPONSÁVEL

Centro de Documentação e Disseminação de Informações


Assistente
Magda Prates Coelho
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE
Centro de Documentação e Disseminação de Informações

resistência&integração
100 anos de imigração japonesa no Brasil

Rio de Janeiro
2008
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE
Av. Franklin Roosevelt, 166 - Centro – 20021-120 - Rio de Janeiro, RJ - Brasil

ISBN 978-85-240-4014-6

© IBGE 2008

Capa
Fernanda Costa e Silva
Gerência de Editoração/Centro de Documentação e Disseminação de Informações - CDDI
Ideograma da capa
Masao Matsumoto

Resistência & integração : 100 anos de imigração japonesa no Brasil /


IBGE, Centro de Documentação e Disseminação de Informações. - Rio
de Janeiro : IBGE, 2008.
210p.

ISBN 978-85-240-4014-6

1. Japoneses – Brasil - História. 2. Brasil – Migração - História.


3. Imigrantes – Brasil - História. 4. Trabalhadores estrangeiros japoneses –
Brasil. I. IBGE. Centro de Documentação e Disseminação de Informações.

Gerência de Biblioteca e Acervos Especiais CDU 314.742(81:520)


RJ/IBGE/2008-09 DEM

Impresso no Brasil/Printed in Brazil


Sumário

Apresentação

Introdução | Célia Sakurai

Parte 1 | História da imigração japonesa no Brasil


16 Episódios da imigração: um balanço de 100 anos
Kaori Kodama e Célia Sakurai

Parte 2 | Distribuição territorial dos japoneses no Brasil


32 Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil: Censo Demográfico
1920/2000
Nilza de Oliveira Martins Pereira e Luiz Antônio Pinto de Oliveira

54 Vivendo no Brasil: características da população de origem japonesa


Kaizô Iwakami Beltrão, Sonoe Sugahara e Ryohei Konta

72 Plantadores do futuro: japoneses em São Paulo na primeira metade do


Século XX
Maria Silvia C. Beozzo Bassanezi e Oswaldo Mário SerraTruzzi

Parte 3 | Dois exemplos de colonização japonesa no Brasil:


Paraná e Rio de Janeiro
90 Da terra do sol nascente às terras férteis do Paraná: territorialização e
organização social de nikkeys
AliceYatiyo Asari e RuthYoukoTsukamoto

102 Resgate de uma história: os japoneses no Estado do Rio de Janeiro


Tomoko Iyda Paganelli
Parte 4 | Tradição e Modernidade

120 Dos passageiros do Kasato Maru aos aviões da Varig: quem eram os
imigrantes?
Célia Sakurai

136 Imigração japonesa no Brasil: riquezas de uma presença secular


Mônica Raisa Schpun

150 O tradicional e o moderno na educação dos filhos de imigrantes japoneses


Masato Ninomiya

166 Família, mulher e cultura: impactos da migração para o Japão


Lili Kawamura

Anexo 1 | Sobre os autores

Anexo 2 | Lista de imagens


Apresentação

O
esforço do homem na luta pela sua sobrevivência e pela garantia de uma
existência digna para si e sua família é, certamente, o estímulo maior para
tomar a decisão extrema de emigrar para terras que sequer conhece.
Esta publicação é uma contribuição singela do IBGE para homenagear homens e
mulheres que, há 100 anos, tomaram essa corajosa decisão de deixar o Japão e atra-
vessar o mundo para buscar dias melhores no Brasil.
O título Resistência & Integração retrata a saga percorrida pelos japoneses numa
corrente migratória em direção ao Brasil, um país com língua e costumes desconheci-
dos para os primeiros imigrantes. Muitos deles não vieram com a idéia de fixar raízes
aqui. Pretendiam enriquecer e voltar, incentivados, ou iludidos, pelas promessas das
companhias de imigração.
Mas, suas marchas e contramarchas, dores e sacrifícios, frustrações e alegrias aca-
baram por produzir a sua lenta e gradual amálgama com a sociedade brasileira.
A publicação sobre o centenário da imigração japonesa no Brasil explora, sob
a ótica multidisciplinar de renomados especialistas, diversos ângulos dessa histó-
ria e ressalta a sua contribuição para a formação social, cultural e econômica da
nossa Nação.

“Uma nação é uma grande fraternidade constituída pelo sentimento


dos sacrifícios que alguns fizeram e que estão dispostos a fazer novamente.”
Ernest Renan: Que’est-ce qu’une Nation? Paris, 1882

Presidente do IBGE
Introdução

Célia Sakurai

Todos os velórios foram budistas. Engraçado, os casamentos, não.


Feijão, bife, batata frita, só que o arroz tem que ser japonês, tem que ter uns ninomo (cozido)

A
spectos sobre o seu modo de viver, observados pelo jovem paulista MH de
38 anos, economista, retratam bem o perfil dos nipo-brasileiros ou, como
outros preferem, dos nikkeis brasileiros. É o ritual budista para os funerais,
e os casamentos na igreja católica; é o feijão comido com o arroz cozido à moda ja-
ponesa. São detalhes que podem parecer estranhos aos que não têm convivência com
os descendentes dos imigrantes japoneses, mas são muito familiares para quem vive a
experiência da fusão das duas culturas.
Há um século chegavam os primeiros imigrantes japoneses ao Brasil envoltos em
mistérios e em dúvidas. Para os brasileiros, os japoneses eram conhecidos ou pela figu-
ra da Madame Butterfly da ópera de Puccini, ou pelas vitórias contra a China e o Im-
pério Russo, pouco antes da chegada em 1908. Sabiam que suas feições eram muito
diferentes, que tinham costumes estranhos, mas não sabiam muito mais que isso. Por
outro lado, havia uma enorme preocupação com os destinos raciais do Brasil com a
vinda de “amarelos”. Como se configuraria a “raça brasileira” com a adição de mais
um grupo racial? Como se comportariam esses japoneses? Seriam bons trabalhadores,
honestos, dedicados? Ninguém sabia responder. Embora houvesse relatos favoráveis
aos japoneses, como os de Oliveira Lima, embaixador brasileiro no Japão, não havia
como prever como se daria a convivência com os brasileiros.
Por parte dos japoneses também, quase nada sabiam sobre o Brasil. Foi ao longo
de 100 anos, num processo contínuo de aprendizados mútuos que se forjaram pes-
soas como MH. Neto de imigrantes, ele relata as dificuldades dos avós desde o mo-
mento de sua chegada ao Brasil na década de 1930, as várias mudanças, de um sítio
10 para outro até terminarem a sua vida na capital de São Paulo.
É um relato que fala do trabalho árduo nos chamados “sítios”,
que na realidade são as pequenas propriedades que puderam
Célia Sakurai

comprar no interior de São Paulo e no norte do Paraná até a


instalação definitiva de toda a família em São Paulo, quando
os pais de MH se dedicam ao pequeno comércio, e amparam
os avós até a sua morte. Na geração de M, a terceira vivendo
no Brasil, todos têm curso superior.
O perfil de MH não estaria completo sem uma referên-
cia às resistências à integração como ocorreu quando, na in-
fância, seus amigos que não eram descendentes de japoneses
eram proibidos de entrar na casa por imposição dos avós e
a comunicação era exclusivamente em Japonês. M diz que
com o falecimento deles, as coisas mudaram, houve um re-
laxamento das regras que nem sempre eram compreensíveis
para ele. Por outro lado, porém, e sempre há o outro lado,
as reuniões familiares – Eu lembro das festas até hoje. Fazia
aquelas mesas compridas, reunia muita gente – foram desa-
parecendo, as comemorações de Ano Novo com o bolinho de
arroz (moti) preparado pela avó deixaram de fazer parte de
suas vidas e são motivo de saudades.
O livro que apresentamos é um retrato das experiências
como as da família de MH. Mostra as experiências que os imi-
grantes japoneses passaram ao longo de 100 anos. Foram ho-
mens, mulheres e crianças que deixaram parte de suas vidas para
trás, para transformar seus descendentes em brasileiros com
passado japonês. A trajetória que os estudiosos em imigração
consideram como de rápida ascensão social – passando de em-
pregados na agricultura para “doutores” – em menos de três
gerações, merece de fato a atenção sobre os caminhos percor-
ridos. Há, no entanto, considerações sobre o contexto que esses
imigrantes encontraram no Brasil. Foi uma época de mudanças
políticas e econômicas muito rápidas, mas profundas. A primei-
ra geração dos japoneses viveu o período das crises da econo-
mia cafeeira que culminaram com a quebra da Bolsa de Nova
Iorque em 1929; o início e todo o primeiro período Vargas; a
Segunda Guerra Mundial; o início do desenvolvimentismo bra-
sileiro, alguns, o período militar. Seus descendentes se beneficia-
ram com as profundas transformações que o mundo começou
a viver com a internacionalização da economia tendo o Japão
como um exemplo de economia a ser seguido. Se no começo do
Século XX ser japonês era sinônimo de Madame Butterfly ou de
samurai, a partir dos anos 1970, ser japo- O objetivo é o de apresentar diversos as- 11
nês significou ser portador da tecnologia pectos do encontro dos japoneses e bra-
de ponta, dos filmes e desenhos que pas- sileiros ao longo de 100 anos.

Introdução
savam na televisão, tornando o Japão e Para apreender a diversidade de abor-
os japoneses cada vez mais familiares aos dagens em torno do tema, a publicação
olhos da sociedade nacional. Os próprios está dividida em quatro partes.
descendentes deixam para trás as reservas Na parte I, o artigo de Kaori Kodama
impostas pelos mais velhos e passam a se e Célia Sakurai (Episódios da imigração:
casar com não-descendentes, quebrando um balanço de 100 anos) traça a histó-
a norma do casamento arranjado (miai) ria dos imigrantes japoneses detalhando
que fez parte da história dos jovens da os caminhos e os contextos em que ela
primeira geração nascida no Brasil; os se desenrolou a fim de localizar o leitor
da segunda geração têm pouco ou ne- nos detalhes que são citados nos artigos
nhum conhecimento da Língua Japonesa, seguintes. Começa com as condições so-
embora conheçam e sigam rituais como o ciais e econômicas do Japão da era Meiji
funeral budista ou as festas de Ano Novo. para a compreensão dos motivos da
É de posse dessas tantas experiências emigração para o Brasil. Em seguida, as
de transformações do modo de vida e de etapas da fixação deste contingente até
pensamento que os descendentes che- o final do fluxo no final dos anos 1970
gam ao Japão para buscar outras pers- e a ida de descendentes para o Japão a
pectivas para o seu futuro. O fenótipo partir de meados dos anos 1980.
é o mesmo, mas no contato com a so- A parte II, elaborada por especialistas
ciedade japonesa percebem o quanto em Demografia, é de um valor inestimá-
os anos vividos no Brasil por mais de vel para todos os interessados no tema da
três gerações mudou a visão de mun- imigração japonesa no Brasil. O trabalho
do dos descendentes dos imigrantes. minucioso de apresentação e análise de
Diferenciam-se dos descendentes perua- dados quantitativos tal como estão ex-
nos ou bolivianos com quem convivem postos nos três artigos serão certamente a
como dekassegui nos locais de trabalho, ferramenta básica de referência a todos os
no Japão, exatamente pela interioriza- trabalhos que serão produzidos de agora
ção dos valores e comportamentos da em diante. Valem pelo ineditismo dos da-
nossa sociedade multiracial e cultural. dos apresentados, preenchendo uma lacu-
As lições duramente aprendidas pelos na que há muito a bibliografia brasileira
imigrantes no primeiro contato com o deixava a dever.
Brasil foram passadas aos descendentes, No trabalho de Nilza de Oliveira
que, depois de 100 anos, são privilegia- Martins Pereira e Luiz Antônio Pinto de
dos brasileiros com raízes japonesas. Oliveira, Trajetória dos imigrantes ja-
A presente publicação é uma iniciativa poneses no Brasil: Censo Demográfico
do Centro de Documentação e Dissemi- 1920/2000 é uma análise detalhada dos
nação de Informações - CDDI, coorde- dados referentes aos japoneses nos cen-
nado por David Wu Tai, e a organização sos de 1920, 1940, 1950, 1960, 1970,
geral foi de Magda Prates e sua equipe. 1980, 1991 e 2000 apontando a sua
12 presença em todos os Estados ao longo como esse ensaio “enraizou-se e vice-
da série. A constatação de que 2/3 vivem jou”, segundo palavras deles próprios.
no interior e não nas capitais é de fun- Ao lado dos dados dos Censos do IBGE
Célia Sakurai

damental importância para a reflexão fazem uso das estatísticas do Serviço de


dos estudiosos sobre a questão da fixa- Imigração e Colonização - SIC, da Secre-
ção atual dos japoneses, os imigrantes taria da Agricultura de São Paulo, apre-
propriamente ditos. Traçam um perfil sentando dados sobre como o trabalho
por sexo e idade e apontam dados para a agrícola molda o tamanho e valor das
análise da longevidade de homens e mu- propriedades, as culturas, a mobilidade
lheres ao longo dos censos analisados. geográfica e as mudanças no perfil de-
Mostram também os dados sobre reli- mográfico das famílias que decorrem da
gião, educação, trabalho, assim como a experiência de imigrante.
autodeclaração de cor e raça. A parte III mostra a colonização nos
Kaizô Iwakami Beltrão, Sonoe Su- Estados do Paraná e Rio de Janeiro. São
gahara e Ryohei Konta escreveram Vi- estudos que tomam especificamente a his-
vendo no Brasil: características da po- tória dos japoneses nesses dois estados.
pulação de origem japonesa com ênfase Da terra do sol nascente às terras férteis
na diferenciação interna do grupo que do Paraná: territorialização e organização
genericamente denominamos de japo- social de nikkeys, de Alice Yatiyo Asari
neses. O artigo apresenta essas nuances e Ruth Youko Tsukamoto, e Resgate de
sempre tendo a população brasileira uma história: os japoneses no Estado do
como parâmetro e analisa os anos de Rio de Janeiro, de Tomoko Iyda Paganelli,
escolaridade de cada um dos segmentos, colocam as peculiaridades que os japo-
além da distribuição espacial dentro do neses que se dirigiram para esses lugares
Território Nacional e o movimento da encontraram: no Paraná, a abundância
concentração inicial em São Paulo e da de terras e as possibilidades de desenvol-
mobilidade contínua desta população ver a agricultura em áreas oferecidas por
com dados dos Censos. A indicação dos companhias de colonização cujo chama-
movimentos internos da população ja- riz era a fertilidade; a situação do Rio de
ponesa em dados quantitativos é uma Janeiro é diferente por ter sido a capital
contribuição das mais relevantes para a do País atraiu japoneses antes mesmo de
bibliografia nacional. 1908 e a colonização agrícola se espalhou
A análise dos japoneses no Estado de em vários núcleos pelo Estado do Rio de
São Paulo ganha uma abordagem demo- Janeiro. Em ambos os casos, as autoras
gráfica inédita no artigo de Maria Silvia salientam o papel das associações como
C. Beozzo Bassanezi e Oswaldo Mário centrais para a compreensão de experiên-
Serra Truzzi, Plantadores do futuro: os cias como as estudadas.
japoneses em São Paulo na primeira me- Na última parte, os três primeiros
tade do Século XX. Diante das outras ex- artigos tomam como eixo a questão de
periências migratórias, a japonesa é vista como ocorreram os processos de fixação
como um ensaio, sobretudo para as pri- e integração. Dos passageiros do Kasato
meiras levas. Os autores vão mostrando Maru aos aviões da Varig: quem eram
os imigrantes?, de Célia Sakurai, aponta, para o Japão. O último texto, de Lili 13
pelo método qualitativo, os diferentes Kawamura, Família, mulher e cultura:
passos dos imigrantes, pessoas com perfis impactos da migração para o Japão, faz

Introdução
diferentes na origem. Em Imigração japo- a ligação entre os dois países mostrando
nesa no Brasil: riquezas de uma presença as mudanças na forma como as famílias,
secular, Mônica Raisa Schpun ressalta as mulheres e a experiência vivida no Bra-
as contribuições destes imigrantes e seus sil impactam a vida dos brasileiros que se
descendentes no decorrer do processo de mudaram para o Japão.
integração, mostrando as dificuldades e Nos diferentes aspectos abordados
as formas como esta ocorreu. O texto O nesta publicação fica a lembrança de tan-
tradicional e o moderno na educação dos tos japoneses que trocaram o seu país de
filhos de imigrantes japoneses, de Masato origem pelo Brasil, e aqui reconstruíram
Ninomiya, trata de uma questão crucial suas vidas. Seus descendentes reconhecem
na vida dos japoneses; os dilemas da edu- e respeitam todo o trabalho e a dedicação
cação mista – brasileira e japonesa – no dos seus pais e avós. MH sintetiza o seu
Brasil, mas também ressalta os mesmos respeito falando sobre o altar onde se faz
problemas na educação das crianças bra- o culto aos antepassados: é ali que você
sileiras que estão vivendo com seus pais acende o incenso e dentro daquela caixa
no Japão. Não poderíamos deixar de fora tem aquele pozinho (do incenso queima-
a saída dos nipo descendentes brasileiros do) desde a época dos meus avós...

Parte 1 |
História da Imigração japonesa no Brasil
Parte 1 |

História da imigração japonesa no Brasil


Episódios da imigração
um balanço de 100 anos

Kaori Kodama
Célia Sakurai

A
história dos japoneses no Brasil teve um longo e tortuoso começo. Ela se
principiou timidamente, e de forma interrompida, na última década do Sé-
culo XIX, quando se travaram as primeiras relações entre os dois países que,
cada qual a seu modo e com suas razões próprias, buscavam resolver suas questões
nacionais. Do lado brasileiro, havia a demanda por novos trabalhadores para as
novas áreas cafeicultoras que cresciam, ao mesmo tempo em que o suprimento de
mão-de-obra com a vinda de imigrantes europeus mostrava-se descontínuo. Do lado
japonês, desde a modernização do país que começara com a chamada Restauração
Meiji (1868), conhecida pela devolução do poder ao imperador retirado do xógum,
o país vinha sofrendo de uma grave crise de abastecimento e de superpopulação no
campo. É que, com a busca do Japão por adquirir o rápido posicionamento entre as
novas potências mundiais, várias transformações foram promovidas, tais como a
inauguração de um governo constitucional, além da implementação de reformas de
base – como no campo da educação, que promoveu a alfabetização em massa, e na
economia, com a tributação monetária no campo, trazendo a monetarização para
regiões que ainda utilizavam o escambo como forma de troca em seu cotidiano. Tais
reformas geraram o endividamento de grande parte dos pequenos proprietários, e
essa população se viu expulsa de suas terras, obrigada a seguir rumo às cidades. Por
outro lado, as reformas também geraram melhores condições sanitárias e de vida.
Com a liberação dos agricultores do controle feudal, permitiu-se àqueles a possessão
de terras, o que ajudou no aumento da taxa de crescimento populacional e provo-
cou, num país com limitações de área de cultivo, a escassez de alimentos. Era preciso,
assim, encontrar uma saída para a pressão gerada pela população rural que, em fins
do Século XIX, já rumava para regiões além-mar, como o Havaí e a costa oeste dos
Estados Unidos.
No Brasil, apesar do amplo debate racial da época no que concernia à chamada de
imigrantes asiáticos, a ponto de ter virado decreto um veto à vinda de chineses e de
18 africanos em 1890, a premência da lavoura obrigava as autori-
dades a prosseguir na busca de formas alternativas para suprir
a falta de trabalhadores. O Tratado de Amizade, Comércio e
Kaori Kodama e Célia Sakurai

Navegação entre Brasil e Japão foi assinado em 1895, em Pa-


ris, pelos representantes diplomáticos dos dois países, ficando
implícito que o objetivo maior era a chamada de braços para
as regiões de agricultura no Brasil. Os debates, no entanto, não
chegavam a um termo. Não foram poucos os representantes
do governo brasileiro francamente contrários à entrada de ja-
poneses. Oliveira Lima, que fora ministro plenipotenciário no
Japão de 1901 a 1903, objetaria a imigração por crer que ela
favorecia “uma maior mistura de raças inferiores na nossa po-
pulação” (LEÃO, 1990, p. 22). A inassimilação dos japoneses
e sua aspiração imperialista eram tidas então como argumen-
tos contra a chamada de braços nipônicos. Em contrapartida,
entre os empresários japoneses havia o temor de um alto inves-
timento em terras cujas impressões não tinham sido tão favo-
ráveis nas primeiras visitas.
Contudo, o contexto mundial e a situação interna dos Uma referência ao preconceito contra a imigra-
dois países facilitariam a chegada a um termo. Desde 1906, ção japonesa, retratada pela expressão secular
“perigo amarelo”. Charge “O Japão chinês”, de
a efetivação da vinda de colonos começava a ser articulada K. Lixto, publicada na revista O Malho
com a visita ao Brasil de Ryu Mizuno, diretor da Kokoku
Shokumin Kaisha (Companhia Imperial de Emigração), a
principal companhia japonesa que administraria a vinda dos
imigrantes até 1917. Diante da revalorização dos preços do
café desde o Convênio de Taubaté, de 1906, e das restrições
impostas à imigração italiana, desde 1902, pelo governo da
Itália, os produtores paulistas mostravam-se mais interessa-
n~ ~
dos na chamada de trabalhadores alternativos. O Japão, por
sua vez, a partir de 1907, com o fechamento das portas para
a entrada de novos emigrantes na Califórnia, procurava rapi-
?
~ f. IV a
/J. .,
~
damente uma solução para a emigração. Assim, começava a ,~ 1~ ~ 1 ~
ser articulado o contrato da vinda dos primeiros trabalhado- ;~ í -Y-1 f •
:1 ~
res japoneses. 1l .
Paralelamente às negociações dos paulistas, era realizado
$IV~ ;: } 1ó
um acordo entre o governo do Estado do Rio de Janeiro e m~ ~1;- t-o >t~
os empresários Ryu Mizuno e Rafael Monteiro para a ins- t.f~at; ')
~
talação de colônias japonesas na região da Baixada Flumi- ~ ~~1 J.
nense. Pretendia-se, então, transformar a região decadente e 1~ ~
• A ~~ ~ 7
empobrecida do estado em uma grande produtora de arroz. ~
Naquela região, em 1907, na fazenda Santo Antônio com- Nt~~9~~ jfL
prada pelo governo do Rio, estabeleceram-se as primeiras t ·~· } {# ~
t~ ·i~ ~~1·~ 4 aB I~
O Tratado de Amizade, Comércio e Na- :~ r
vegação entre Brasil e Japão foi assinado
em 1895, em Paris, pelos representantes ~ ~ ~ ·~ )

diplomáticos dos dois países r~ ~ ' - r.


~" ' tt 1~:. t ~
"~ 9
~ )\.. f~
~ j
MJ
~ +
~p + .
j
duas famílias de japoneses. As histó- No entanto, em muito pouco tempo, 19
rias daquelas famílias parecem ter sido os primeiros imigrantes que chegaram
apagadas pelo tempo, da mesma forma aos cafezais perceberam que o sonho de

Episódios da imigração
como a própria experiência ensaiada voltar enriquecidos estava bem longe da
de colonização no Rio, que não vingou. realidade. Imensos obstáculos e as condi-
Registre-se, aqui, essa primeira histó- ções de trabalho, que davam muito me-
ria de insucesso que, no decorrer de um nos retorno do que o esperado, geraram
século, daria lugar para muitas outras, fugas das fazendas e novos deslocamen-
algumas com resultados bem mais feli- tos. A dispersão correu em várias direções.
zes, e outras, nem tanto. Como reza um Dos 781 trabalhadores que chegaram no
provérbio japonês, que diz que, tal qual Kasato Maru direcionados para o traba-
o Daruma (Dharma), se se cai sete vezes lho em cafezais, somente 191 permane-
deve-se levantar oito (nanakorobi yaoki) ceram nas fazendas ao fim de dois anos.

৾ォ߮౎⿠߈ , o estabelecimento de Dentre os que saíram, encontrava-se um
colonos no Brasil vindos da outra face grupo de 75 okinawanos que se empre-
da Terra persistiria, com a chegada no gou na construção da Estrada de Ferro
porto de Santos de 781 indivíduos, para Noroeste, inaugurando assentamentos
continuar em sucessivas vindas, através nas regiões abertas pelos trilhos, atin-
da busca dos emigrantes por melhores gindo Campo Grande, em Mato Grosso
condições de vida. do Sul, onde hoje há uma grande comu-
Da fase que cobre a primeira leva de nidade de nipo-descendentes. Outros se
imigrantes do Kasato Maru até 1924, dirigiram para o porto de Santos, procu-
podem ser ressaltadas algumas caracte- rando emprego nas docas ou como em-
rísticas. Nessa primeira etapa, a vinda pregados domésticos já em 1914, con-
dos trabalhadores japoneses – que sem-
pre foi assistida oficialmente pelo gover-
forme o jornal A Tribuna, de Santos, em
22 de março de 1914.
-,-
no do Japão em acordos com o Brasil – Aos poucos, no entanto, o quadro
direcionou-se marcadamente para São negativo das primeiras experiências foi
Paulo. Os primeiros imigrantes vinham sendo modificado, e os japoneses, num

--
através do contrato entre as companhias
de imigração japonesas e os cafeicultores
espaço de tempo relativamente curto, fo-
ram se tornando pequenos proprietários.
, l
v

paulistas, os quais pagavam o custeio do É preciso dizer que a própria dinâmica


estabelecimento das famílias nas fazen- da expansão das regiões produtoras pa-
das. O contrato previa, para cada família, rece ter contribuído para essa mudança.
um mínimo de três trabalhadores, em re- Novas fronteiras agrícolas em São Paulo
gime de trabalho assinado por pelo me- foram sendo abertas durante as primei-
nos dois anos. Ainda que incentivados ras décadas do Século XX. Eram estas
pelo Estado japonês, os que tomaram a regiões de terra roxa, que melhor produ-
decisão de emigrar eram motivados pelo ziam os pés de café, e para onde se dirigiu
desejo próprio de mudar sua condição parte dos imigrantes. Foi também decisi-
de vida, para retornarem à terra natal va a participação mais direta das compa-
como pródigos bem-sucedidos. nhias japonesas de emigração, das quais

Passaporte de família
japonesa, ao chegar em
Santos (SP)
20 A mais importante das compa-
nhias japonesas de imigração
foi a Kaigai Kogyo Kabushiki
Kaori Kodama e Célia Sakurai

Kaisha, KKKK, fundada em


1917. Seu objetivo era fixar
colonos proprietários em
terras adquiridas por elas,
em acordos de compras ou
concessão com o governo do
estado. Registro (SP)

a mais importante foi a KKKK (Compa- Neste momento, é interessante saber


nhia Ultramarina de Desenvolvimento que na primeira fase da imigração as asso-
S. A.), a Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha, ciações e realizações coletivas foram muito
fundada em 1917. Seu objetivo era fixar importantes para a manutenção de uma
colonos proprietários em terras adquiri- identidade dos imigrantes visando ao en-
das por elas, em acordos de compras ou frentamento das muitas situações adversas,
concessão com o governo do estado. De bem como ao bom resultado dos seus em-
tais acordos, surgiram colônias como as preendimentos. Organizações, tais como
de Registro, Iguape e Sete Barras no vale jornais em Língua Japonesa, escolas primá-
do Ribeira, que se instalaram a partir rias e cooperativas agrícolas começaram a
de 1913 numa área de 100 000 hectares, se estabelecer no decorrer do primeiro de-
dos quais 50 000 foram cedidos pelo go- cênio da imigração. Jornais como o Nippak
verno de São Paulo. Shinbun (1917), Shukan Nanbei (1916), e
Da primeira fase da imigração, é possí- o Burajiru Jih (1917) mostraram-se veícu-
vel verificar que os primeiros núcleos colo- los de divulgação e de aproximação das co-
niais se irradiavam a partir da Estrada de munidades estabelecidas pelo Brasil.
Ferro Mogiana na zona nova do café de Já a partir deste momento, começava
São Paulo. Há indícios de que o primeiro a ficar evidente a expansão dos núcleos
núcleo espontâneo de pequenos agriculto- formados espontaneamente no interior
res japoneses foi a colônia de Monção, da- do Estado de São Paulo, que se expan-
tada de 1911. Porém, as dificuldades no diam ao longo das áreas abertas pelas
estabelecimento das colônias não foram novas estradas de ferro, na zona noroes-
pequenas. Nas regiões recém-desbravadas, te, nas regiões da Araraquense, Alta So-
a malária vitimou muitos dos colonos, e rocabana e Alta Paulista. Parte do traba-
suas plantações também sofreram com o lho neste momento ocorria sob o regime
enxame de pragas, como ocorreu na colô- de contratista, o que favoreceu a trans-
nia fundada por Unpei Hirano, em 1915, formação dos imigrantes em pequenos
na atual região de Cafelândia. proprietários. Neste regime de trabalho,
os agricultores desbravavam novas re- País e os projetos de estada temporária 21
giões para cultivarem café, comprando tornavam-se cada vez mais evidentes.
ou arrendando como meeiros um lote Ao mesmo tempo, a situação de re-

Episódios da imigração
de terra para sua produção individual. lativo isolamento das comunidades, em
Ao mesmo tempo, a produção se diver- sua busca pela manutenção de seus pa-
sificava. A partir de então, começava o drões culturais, reproduzidos nas asso-
estabelecimento de colônias voltadas ciações, atividades sociais e no ensino
para a produção de café, algodão, arroz, primário em Língua Japonesa, geravam
milho, chá, bicho-da-seda, além da pro- tensões com os arautos do nacionalismo
dução, na região periférica de São Paulo, e com os discursos eugênicos no Brasil.
de hortaliças para o abastecimento da Os debates sobre a “inassimilação” dos
cidade. Pode-se dizer que os pequenos japoneses no seio da sociedade brasileira
núcleos, como os de Iguape, Registro, prosseguiam e se acirrariam conforme o
Promissão, Lins, Suzano entre tantos ou- quadro geral da imigração se modificava,
tros, ajudaram a desenvolver os atuais em meados da década de 1920.
Pequena propriedade de municípios de São Paulo. Criadas tais A partir de 1925, quando o governo
imigrante japonês, onde se condições de fixação dos imigrantes em japonês passou a subsidiar diretamente a
vê plantações de hortaliças
ao lado da plantação de café. terras brasileiras, ocorria que as contra- vinda dos seus súditos em acordos com
Avaí (SP) dições entre a estabilidade alcançada no o Brasil, os números de entrada de japo-
neses saltaram em escala a olhos vistos.
Para se ter uma idéia dessa transforma-
ção de grandezas, basta mencionar que
de 1908 até 1924 registrou-se a entrada
de 32 366 indivíduos, enquanto para o
período de 1924 a 1935 foram 141 732
imigrantes registrados. Esta etapa, que
engloba os anos 1925 a 1941, pode ser
considerada um segundo momento da
imigração japonesa. Alguns fatores são
em geral considerados para explicar
tal crescimento. As relações econômicas
entre Brasil e Japão cresciam fortemen-
te no período entre-guerras envolvendo
diversos produtos de exportação, como
o algodão, este produzido também pelos
colonos japoneses no Brasil, em terras
adquiridas pelas companhias japonesas
ou de forma particular, pelos próprios
imigrantes. O Japão passou a canalizar
sua emigração para o Brasil, uma vez
que o Peru deixava de receber os japo-
neses e os Estados Unidos encerravam
22 definitivamente a sua entrada no país,
com o Quota Immigration Law, de 1924.
Ligados a tal crescimento também estão
Kaori Kodama e Célia Sakurai

mudanças do modelo emigratório no Ja-


pão, cujo Estado passou a assistir direta-
mente a saída de colonos. O surgimento
da Brazil Takushoku Kumiai - BRATAC,
em 1928, também marca este momento.
A BRATAC consistiu na federação de
sociedades de emigração das províncias
do Japão e, com sua atuação, grandes
extensões de terras de São Paulo e Pa-
raná foram adquiridas pelos japoneses,
alojando ali em lotes os novos imigran-
tes proprietários. Foram assentadas pela
empresa as mais importantes colônias
dessa fase, Tietê (Pereira Barreto), Bastos
e Assaí (Paraná).
É nesta segunda fase da imigração que No início da segunda fase da imigração japonesa, a colonização
começa também a ocupação por japone- se estendeu para outras regiões do País, alcançando na região
Norte os estados do Pará e Amazonas. Tomé-Açu (PA)
ses de outras regiões do Brasil. As colô-
nias começavam a alcançar os Estados do
Paraná, de Minas Gerais, do Rio de Janei-
Residência do colono
ro e do Mato Grosso do Sul. Em particu- japonês Kubota. Matapi,
lar, surgia uma nova corrente imigratória Macapá (AP)
para o norte do País. Em 1928, as com-
panhias japonesas adquiriam terras no
Paraná, Pará e Amazonas que somavam,
em cada estado, 1 milhão de hectares. Em
1929, chegavam as primeiras 43 famílias
em Acará, atual Tomé-Açu (Pará), para
o cultivo do cacau, abrindo, assim, uma
corrente de imigração que saía direta-
mente do Japão para a Região Norte do
Brasil. Mais uma vez, as dificuldades fo-
ram enormes, a ponto da colônia quase
desaparecer. A cultura do cacau não vin-
gou, e os colonos foram assolados pela
febre amarela e pela malária, causando
morte e reemigração de agricultores para
o sudeste do País. Na região do médio-
Amazonas, fundou-se uma colônia em
1931, em Maués, que ainda que sofrendo ameaçada, segundo eles, pelas aspirações 23
das mesmas agruras que as do Pará, man- imperialistas japonesas. No clima xenó-
teve-se a duras penas ao longo do tempo fobo propiciado pelo Estado Novo, era

Episódios da imigração
com a cultura da juta. votada a emenda que restringia a 2% a
As entradas de imigrantes em grandes entrada de cada corrente imigratória es-
números bem como a aquisição de gran- trangeira e vedava a concentração de imi-
des áreas de terra pelos japoneses susci- grantes em qualquer território da União.
tariam o temor de muitos representantes Mesmo assim, trocas culturais e inser-
da administração pública, bem como de ção dos imigrantes e descendentes já des-
médicos eugenistas ou até de órgãos da pontavam, através dos nipo-brasileiros
imprensa. O Jornal do Brasil insurgiu- que adotavam a Língua Portuguesa e
se contra a formação de grandes colô- que assumiam uma formação cultural
nias de estrangeiros, quando da compra híbrida, dando mostras de que as rela-
de terras pela BRATAC, no Paraná. As ções mantidas entre a comunidade nipo-
colônias da Amazônia também seriam descendente e a sociedade brasileira mais
alvo de críticas, por se crer que nas re- ampla tornavam-se bem mais complexas.
giões isoladas ocupadas pelos estrangei- Bruno Lobo, médico e diretor do Museu
ros formar-se-iam verdadeiros “quistos” Nacional, defendia a imigração e a capa-
contra a nacionalidade que estariam a cidade de incorporação dos japoneses na
serviço dos projetos expansionistas do nação brasileira, e calcava seus argumen-
governo japonês. tos raciais mostrando as provas “científi-
A polêmica racial ganhara maior im- cas”, em fotos para o público, dos resul-
pulso a partir da década de 1930, num tados de proles formadas por brasileiros
contexto interno de crescimento das des- e japonesas e vice-versa.
confianças em relação aos estrangeiros e
de ascensão dos nacionalismos extremis-
tas. Data desse momento a Campanha
Anti-Nipônica, encabeçada pelo médico
Miguel Couto, que contou com o apoio
de outros cientistas, como Artur Neiva
e Edgar Roquette-Pinto. De certa forma,
as atitudes de preservação da identidade
e da cultura dos imigrantes, muitos deles
quase alheios ao modo de vida brasileiro,
acabavam sendo superpostas pelos anti-
nipônicos à idéia de inassimilação bioló-
gica. Durante os debates para a Consti-
tuição de 1934, Miguel Couto, Xavier de
Oliveira e Artur Neiva liderariam o pro-
jeto de restrição da imigração de japone-
ses, insistindo nos argumentos da insol-
vência étnica e da segurança nacional,

Trecho retirado de A imigração


japoneza - Memória apresentada pela
Directoria Geral de Estatística ao
Congresso do Café, realizado na Ca-
pital de São Paulo, em 7 de setembro
de 1927
24 Porém, no decorrer dos anos 1930 até a Segunda Guerra Mundial, a situação en-
frentada pelos imigrantes tendeu a ser cada vez mais crítica. Em 1939, eram fechadas
todas as associações culturais, escolas e jornais em língua estrangeira no Brasil. Com
Kaori Kodama e Célia Sakurai

a guerra, passou-se à proibição da entrada de livros em Língua Japonesa, do porte


de carteira de motorista para japoneses e, por fim, à suspensão da liberdade de lo-
comoção. Neste ambiente, era interrompida a corrente imigratória japonesa para o
Brasil, que só recomeçaria em 1952. A colônia de Acará, no Pará, assim como outras
colônias em diferentes regiões do Brasil, passaria a ser cercada e vigiada por militares,
sob a alegação de que as autoridades deveriam proteger as comunidades de origem
nacional inimiga. Com a retirada dos representantes diplomáticos japoneses após o
rompimento das relações entre Brasil e Japão, o isolamento foi somado à sensação
de abandono das comunidades pelo seu país de origem. A idéia de retorno ao Japão
e a obsessão pela vitória japonesa passaram a servir de consolo para muitos dos imi-
grantes, mitigando, assim, sua condição de expatriados.
No período que se segue imediatamente após o fim da guerra, as tensões no interior
das comunidades se evidenciaram, marcadas que estavam pelo drama do isolamento
e da discriminação sofrida. Na onda das informações desencontradas, devido à des-
confiança de membros da comunidade frente às notícias veiculadas no Brasil, muitos
sustentavam que o Japão havia ganhado a guerra. Parte dos imigrantes, inconfor-
mados com as retaliações e exclusões, preferiam manter a crença na invencibilidade
do Dai-Nippon Teikoku (Grande Império do Japão) exacerbando o sentimento pa-
triótico, calcado na ancestralidade divina do imperador. Tais tensões dariam lugar à
divisão entre os vitoristas – Kachigumi – e os derrotistas – Makegumi – e à sucessão de

O bombardeio de Hiroshima e
Nagasaki teve efeitos traumá-
ticos na vida dos imigrantes ja-
poneses. Ilustração que mostra
a localização das cidades de
Hiroshima e Nagasaki, Japão

Hiroshima

Nagasaki

Com a guerra, a situação dos japoneses no Brasil ficou cada vez mais crítica.
Ataque japonês a Pearl Harbor na Segunda Guerra Mundial
eventos que contribuíram para aumentar imigração de japoneses, pois as mesmas 25
a hostilidade de policiais e de parte da questões de cunho racial dos anos 1930
população brasileira contra os nikkeys. permaneciam como ponto de polêmica.

Episódios da imigração
A derrota japonesa e o bombardeio O governo brasileiro só permitiu as no-
de Hiroshima e Nagasaki tiveram efei- vas entradas porque estava firmemente
tos traumáticos na já precária situação engajado no programa da Organização
dos japoneses e seus descendentes, o que das Nações Unidas - ONU de acolhimen-
acarretou o surgimento do fanatismo to a refugiados de guerra e no recruta-
manifesto na atuação da Shindo Renmei – mento de mão-de-obra qualificada entre
a Liga do Caminho dos Súditos – susten- as populações afetadas pela guerra. A
tado pelos vitoristas. Produtores de seda reabertura da corrente imigratória japo-
e de menta (produtos primários na fabri- nesa começou em 1952, quando foram
cação de pára-quedas e de explosivos) e reatadas as relações diplomáticas entre o
representantes da comunidade que as- Brasil e o Japão. Os acordos estabeleci-
sumiram a derrota foram assassinados dos a partir de então eram feitos por par-
ou tiveram seus estabelecimentos des- ticulares, os quais foram responsáveis
truídos, por serem considerados traido- pela maior parte das entradas no País
res que serviam às nações inimigas. No nesta terceira fase imigratória. Desde
contexto pós-guerra, quando reinava a
desinformação nas comunidades, vários
japoneses e nipo-brasileiros foram ludi-
briados com a venda de bilhetes falsos de
retorno ao Japão e de ienes supervalori-
zados. Outros incidentes ainda teriam lu-
gar, quase dez anos após o fim da guerra,
em 1954, com golpes para arrecadação
de fundos em virtude da notícia espalha-
da sobre a chegada de um falso príncipe,
Asaki, ao Brasil. Concomitantemente, o
sentimento anti-japonês para fora das co-
munidades crescia. A tal ponto chegara a
repercussão das ações da Shindo Renmei
que, na discussão sobre a entrada de japo-
neses em 1947 na Constituinte, quase foi
passado o veto. O movimento só começa-
ria a arrefecer em 1950, cinco anos após o
fim da guerra, quando também se iniciava
uma nova corrente imigratória.
A imigração do pós-guerra só foi rei-
niciada oficialmente entre os dois gover-
nos em 1963, depois de muitas discus-
sões sobre a viabilidade da reabertura da

Em 1952, foram reatadas as relações diplomá-


ticas entre Brasil e Japão e reiniciada a corrente
migratória japonesa para o Brasil.
Getúlio Vargas entre alguns membros da missão
japonesa
26 a reabertura da imigração japonesa no
Brasil até o início dos anos 1980, entra-
ram no País 46 401 imigrantes, segundo
Kaori Kodama e Célia Sakurai

o Ministério dos Negócios Estrangeiros


do Japão.
Após o fim da guerra, o Japão pre-
cisou reassentar a sua economia e lidar
com a alta taxa de desemprego. Dentro
deste quadro, a emigração foi aventada
como uma saída para a crise. O governo
japonês criou uma infra-estrutura sob
o comando do Ministério das Relações
Exteriores para arregimentar e selecionar
os emigrantes, não só para o Brasil como
para outros países da América Latina.
Procuraram jovens solteiros com escola-
ridade superior ou média, de preferência
os formados em cursos especializados em
agricultura e em técnicas industriais. Em
1954, foi criada a Federação Japonesa das
Associações de Além-Mar, com o obje-
tivo de apoiar os candidatos com cursos
preparatórios e encaminhá-los até o país
de destino, de navio ou de avião, depois
de 1973. A amplitude geográfica coberta Grosso, para o cultivo da seringueira, e no No Governo JK, o
pela corrente imigratória nesta nova fase Amazonas, para o da juta. Incentivada pe- lema de crescer “50
anos em 5” estimulou
pode ser percebida pelo número de portos las perspectivas de novos empreendimen- fluxos de imigração
de desembarque utilizados pelos japone- tos, a Cooperativa Agrícola de Cotia (São japonesa para as
ses, que iam desde o tradicional porto de Paulo) obteve junto ao Governo Federal regiões ainda não
desbravadas do Mato
Santos aos portos de Belém, Recife, Rio de permissão para trazer imigrantes, inician- Grosso e Amazonas.
Janeiro e Rio Grande (Rio Grande do Sul). do um amplo projeto de experiências de Celebração da 1a Mis-
Na década de 1950, com o desenvol- produtos e aproveitando o conhecimento sa de Brasília, 1957
vimentismo e o lema dos “50 anos em 5” técnico dos jovens recém-chegados. Nesse
do governo de Juscelino Kubitschek, o Es- momento, verifica-se que não só o perfil
tado brasileiro se empenhou em colocar o dos imigrantes havia mudado após o fim
País na direção da rápida industrialização da guerra, como também se torna percep-
e da expansão das fronteiras agrícolas. A tível que ocorria uma transformação no
criação de Brasília abriu caminho para a campo de suas produções. A produção
abertura de novos pólos regionais, a co- de pimenta-do-reino, iniciada pelos japo-
meçar pela Região Centro-Oeste. Os pri- neses em Tomé-Açu (Pará), conheceu seu
meiros imigrantes do pós-guerra foram boom nos anos 1950 e 1960, quando o
para regiões não desbravadas de Mato Brasil passou à condição de exportador
do produto. Essa atividade atraiu novos extração de alumínio, através da Albras, 27
imigrantes para a Região Norte, em proje- na região amazônica. Parte da mão-de-
tos dirigidos pelo governo federal no Pará, obra era formada por jovens japoneses

Episódios da imigração
no Maranhão e no Acre. Mas, ainda assim, que emigraram para trabalhar com os
outras correntes imigratórias seguiam seu especialistas nacionais.
curso, como as de japoneses agricultores Ao mesmo tempo, uma nova geração
que vinham individualmente, chamados de filhos e netos dos imigrantes chegados
através de cartas por seus parentes ou co- antes da guerra já despontava, abrin-
nhecidos de São Paulo e do Paraná. do um caminho de integração cada vez
Outro bloco significativo dos imi- mais intensa com os outros segmentos
grantes do pós-guerra é o dos trabalha- da sociedade brasileira. Verifica-se que
dores das indústrias. Estes tinham for- a Língua Japonesa ia sendo substituída
mação especializada: eram engenheiros no dia-a-dia das famílias pelo Português.
e técnicos que vinham trabalhar na A inserção cada vez maior dos descen-
metalurgia, em projetos industriais, de dentes no mercado de trabalho brasilei-
montagem de máquinas e instalações ro, em profissões de todos os graus de
elétricas, nas telecomunicações. Vinham qualificação, e a freqüência mais e mais
A modernização da para as empresas privadas japonesas que corriqueira dos casamentos interétnicos
agricultura, aliada ao
processo de expansão abriram filiais em São Paulo e no ABC davam sinais de que as acusações de en-
agrícola do cerrado, paulista. Dos acordos bilaterais entre o quistamento ou dificuldade de assimila-
teve como um dos Brasil e o Japão, foram criados a side- ção já faziam parte do passado.
principais programas
o Prodecer. rúrgica Usiminas, em Minas Gerais, o A tendência verificada desde o perío-
Presidente Ernesto estaleiro Ishibras, no Rio de Janeiro, a do anterior, de alta mobilidade geográ-
Geisel em visita a Celulose Nipo-brasileira - Cenibra, tam- fica, se repete depois da guerra, tanto
Minas Gerais, onde se
desenvolveu a primei- bém em Minas Gerais, o porto de Tuba- através dos deslocamentos para áreas
ra fase do programa rão, no Espírito Santo, e os projetos de ao redor de centros urbanos com a con-
solidação dos cinturões verdes, como
também pela abertura de novas frentes
agrícolas, como na região do Cerrado.
A expansão desta última região se apro-
veitava do acordo bilateral Brasil-Japão,
conhecido como Prodecer, cujo projeto
piloto foi iniciado por descendentes de
segunda geração, nos anos 1970. No
sul, descendentes também participaram
dos projetos de fruticultura de clima
temperado dos Estados do Rio Grande
do Sul e Santa Catarina desenvolven-
do a cultura das maçãs do tipo fuji, do
kiwi, da nectarina. Nos anos 1970, a
cultura do mamão do tipo papaia, do
sul do Estado da Bahia, inundou os
28 mercados. Uma década depois, os nipo-
descendentes auxiliavam no desenvol-
vimento da fruticultura irrigada na
Kaori Kodama e Célia Sakurai

região do Semi-Árido do Nordeste, no


vale do médio rio São Francisco, plan-
tando uvas e mangas para exportação.
No Pará, na colônia de Tomé-Açu, a
exploração de polpa de frutas tropicais,
como o maracujá e o açaí, criou uma
nova perspectiva aos moradores, fazen-
do a colônia renascer depois que a cul-
tura da pimenta-do-reino foi dizimada
por pragas na década de 1960.
A partir de meados dos anos 1980,
teve início o movimento de saída de imi-
grantes e descendentes para trabalhar no
Japão. É o movimento conhecido como
dekassegui, inserido no processo de
emigração de brasileiros para o exterior.
Um curioso retorno, mas, certamente,
não mais para os primórdios da aventu-
ra da imigração japonesa. Perspectivas
de enriquecimento fazem ainda parte
dos sonhos dos novos emigrantes, mas
um novo elo entre os países de origem
e de destino se estabelece, fazendo com
que a identidade desses trabalhadores
esteja atada a este lado de cá da Terra,
onde seus pais, avós, bisavós ou trisa-
vós construíram suas vidas. A situação
do Japão também se inverte atualmente,
quando o país enfrenta um rápido de-
créscimo populacional, necessitando de
braços para o trabalho em suas cidades,
Os japoneses deram
o que traz uma incógnita sobre o futu- uma importante con-
ro dos dekasseguis lá estabelecidos. O tribuição à fruticultura
“retorno” dos descendentes, assim, não brasileira. Frutas, antes
importadas, passaram
é um ponto de chegada, mas um novo a ser aqui produzidas.
ponto de partida dessa história que, ti- Acima: plantação de
midamente começada enriqueceu o Bra- mamão papaia. Meio:
plantação de uva itália.
sil com trocas culturais sequer sonhadas Abaixo: plantação de
pelos viajantes a bordo do Kasato Maru. maçã tipo Fuji
29
29

Episódios
Ep
E isód
pis da
os d
ódio a iimigração
mi ação
graç
migr ão
Referências
ANDO, Z. Estudos sócio-históricos da imigração japonesa. São Paulo: Centro de Estudos
Nipo-Brasileiros, 1976.
ASCOLI, N. A immigração japoneza na Baixada do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro:
Jornal do Commercio, 1910.
CARDOSO, R. C. L. Estrutura familiar e mobilidade social: estudo dos japoneses no Estado
de São Paulo. São Paulo: Primus Comunicação Integrada, 1995. Edição bilíngüe em Por-
tuguês e Japonês, com organização de Masato Ninomiya. Originalmente apresentada pela
autora como tese de doutorado à Universidade de São Paulo.
DUARTE, A. L. A criação do estranhamento e a construção do espaço público. Acervo, Rio
de Janeiro: Arquivo Nacional, v. 10, n. 2, p.129-146, jul./dez. 1997.
HOTTA-LISTER, A. The Japan-British exhibition of 1910: gateway to the island empire of
the East. Richmond, Surrey: Japan Library, c1999. (Meiji Japan series, n. 8).
LEÃO, V. C. A crise da imigração japonesa no Brasil, 1930-1934: contornos diplomáticos.
Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais,
1990. (Coleção Relações internacionais, 10). Originalmente apresentado pelo autor no Cur-
so de Altos Estudos do Instituto Rio Branco.
LESSER, J. Negotiating national identity: immigrants, minorities, and the struggle for ethnicity
in Brazil. Durham, N.C.: Duke University, 1999.
LOBO, B. Japonezes no Japão, no Brasil. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1926.
SAITO, H. (Org.). A presença japonesa no Brasil. São Paulo: T.A. Queiroz: Edusp, 1980.
(Coleção Coroa vermelha, v. 1).
SAITO, H.; MAEYAMA, H. Assimilação e integração dos japoneses no Brasil. Petrópolis:
Vozes, 1973. (Coleção Estudos brasileiros, 4).
SAKURAI, C. Primeiros pólos da imigração japonesa no Brasil. Revista USP, São Paulo,
n. 27, p. 32-45, set.-nov. 1995. Disponível em: <http://www.usp.br/revistausp/27/revistausp_
27_04.pdf>. Acesso em: mar. 2008.
______. Romanceiro da imigração japonesa. São Paulo: Sumaré, 1993. (Série Imigração).
SHINDO, T. Brasil e Japão: os 100 anos do Tratado de Amizade. Tradução de Julia Hoçoya
Sassaki e Olivia Tamiko Ozaki Makibara. São Paulo: Associação Cultural e Recreativa Akita
Kenjin do Brasil, 1999.
Parte 2 |

Distribuição territorial dos japoneses no Brasil


Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil
Censo Demográfico 1920/20001

Nilza de Oliveira Martins Pereira


Luiz Antônio Pinto de Oliveira

A trajetória da população japonesa no Brasil contada pelos Censos Demográficos

O
s censos demográficos permitem traçar o retrato de vários segmentos popu-
lacionais, desvendando parte de sua história e conhecendo as suas caracte-
rísticas. Nesses 100 anos de chegada ao Brasil dos imigrantes japoneses, os
resultados dos censos contribuem para a reconstituição de sua trajetória demográfica
no Brasil.
Tudo começa quando o navio Kasato Maru, em 1908, atracou no Porto de Santos,
trazendo aproximadamente 781 pessoas e 165 famílias, constituídas de acordo com
as condições recomendadas pelo governo brasileiro. O censo de 1920 foi o primeiro a
contabilizar essa população. Seus resultados mostraram que, 12 anos após a chegada
do primeiro grupo de imigrantes no País, a população japonesa somava aproximada-
mente 28 mil pessoas. Nos 80 anos seguintes, entre drásticos declínios e retomadas do
movimento migratório, o Censo 2000 registrou 71 mil residentes de origem japonesa.
Durante esse longo período, o deslocamento do grupo de imigrantes pelo Terri-
tório Nacional se intensificou, acompanhando a expansão das fronteiras agrícola e
urbana, ao mesmo tempo em que se diversificava, também, sua forma de inserção
na estrutura produtiva: migravam do campo para a cidade, onde exerciam as mais
variadas atividades nos serviços, no comércio, na indústria e na administração.
Os Censos Demográficos registraram a trajetória sinuosa da imigração japonesa
no Brasil, no período 1920/2000 (Gráfico 1).
Em nível local, dos 1 304 municípios existentes e recenseados em 1920, somen-
te em 160 deles (12,3%) foi registrada a presença de imigrantes de nacionalidade
japonesa. A proporção de japoneses na população total (30,1 milhões de pessoas)
era de 0,09%, e na população total estrangeira, de 1,8%. Ao longo dos censos, a

1
Os autores agradecem ao técnico Jorge da Silva e à consultora Valeria Bourguignon Beiriz Monnerat
pela elaboração dos indicadores.
34 proporção de japoneses na população Gráfico 1 - Japoneses residentes no Brasil
total estrangeira oscilou entre 10,3%, 1920/2000
em 1940, e 12,9%, em 1970. 155 982 158 087
Nilza de O. M. Pereira e Luiz Antônio P. de Oliveira

A distribuição espacial desses imi- 144 523


139 480
129 192
grantes, em 1920, era caracterizada pela
forte concentração na Região Sudeste,
85 871
que abrigava cerca de 95,3% dos japo- 70 932
neses presentes, destacando-se o Estado
de São Paulo e, neste, os Municípios de
27 976
Iguape, onde o governo estadual distri-
buiu terras às famílias imigrantes, obe-
decendo a um acordo migratório entre 1920 1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000
empresa japonesa e governo paulista; o Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1920/2000.
de Penápolis, seguido pelos Municípios Notas: 1. Inclusive os naturalizados brasileiros no total de japoneses.
de Ribeirão Preto e Pirajuí; o Município 2. A partir de 1960, foram utilizados os microdados dos respectivos censos.

de São Paulo era o quinto no ranking.


Todos esses municípios possuíam po-
pulação de japoneses acima de mil ha- Gráfico 2 - Proporção de japoneses em relação ao total de estrangeiros
bitantes. residentes no país - Brasil - 1920/2000
%
A estrutura de sexo revelada pelos re-
sultados do Censo 1920 era bastante de- 12,9 12,6
11,1 11,6
sequilibrada, mostrando uma forte predo- 10,3 10,6 10,4
minância masculina: 141,5 homens para
cada 100 mulheres, com um excedente de
4 898 homens. Este mesmo modelo se re-
pete nos municípios, com apenas três ex-
ceções: Avaré, Franca e Pedreira, onde o 1,8
total de mulheres superava o de homens.
Outros estados também receberam
1920 1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000
contingente significativo de imigrantes
japoneses, podendo-se citar Minas Ge- Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1920/2000.
Notas: 1. Inclusive os naturalizados brasileiros no total de japoneses.
rais, principalmente nos Municípios de 2. A partir de 1960, foram utilizados os microdados dos respectivos censos.
Conquista e Uberaba. Existem relatos
que afirmam ter Minas Gerais recebido,
em 1913, 107 imigrantes para trabalhar
nas minas de ouro, sendo os únicos mi-
neiros japoneses na história da imigra-
ção (A LINHA..., 2008). No Estado do
Paraná, o Município de Jacarezinho, no
chamado Norte Velho na divisa com São
Paulo, já possuía uma imigração japone-
sa expressiva para a época.
Cartograma 1 - Japoneses recenseados no Brasil - 1920/2000 35
1920 1940
Número de japoneses recenseados

Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil


Até 1 000

1 001 a 2 500

2 501 a 10 000

10 001 a 30 000

30 001 a 50 000

1960 1970

1980 1991 2000

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1920/2000.


Notas: 1. Inclusive os naturalizados brasileiros no total de japoneses.
2. A partir de 1960, foram utilizados os microdados dos respectivos censos.
36 No período de 1908 a 1920, os japoneses mantiveram seus
costumes, seus hábitos e seus valores culturais, mas procu-
rando sempre maior participação na sociedade brasileira, seja
Nilza de O. M. Pereira e Luiz Antônio P. de Oliveira

através da educação, seja através do trabalho, atentos às novas


oportunidades trazidas pela melhoria das condições de vida no
campo e pelo crescimento urbano acelerado, especialmente a
partir da década de 1950. A adaptação dos primeiros imigran-
tes não foi imediata, muitos buscaram outras opções em diver-
sas regiões e, assim, a permanência nas fazendas foi gradativa-
mente se tornando mais duradoura enquanto a economia do
café não esgotava seu processo de ocupação no Sudeste.
Em 1930, o Censo Demográfico não foi realizado e somente
é possível acompanhar a trajetória demográfica e socioeconô-
mica da população japonesa a partir do Censo 1940, auge da
Segunda Guerra Mundial. De 1940 a 1950, esses imigrantes,
juntamente com imigrantes de outras nacionalidades, viveram
períodos austeros, com restrições que limitavam suas ativida-
des econômicas, culturais e educacionais.
Focalizando retrospectivamente o movimento imigrató-
rio deste grupo populacional, observa-se que no período Família de colono japonês. Castanhal (PA)
1920/1940 o fluxo migratório foi mais intenso, com um ritmo
de crescimento anual da população japonesa de 8,5%, resul-
tado dos projetos (primeiras políticas) de incentivo à imigra-
ção, desde a aquisição dos lotes iniciais, em 1911. A partir de
1940, com a Segunda Guerra Mundial, a imigração japonesa
foi interrompida e, em 1950, o número de japoneses no Brasil
era inferior ao recenseado em 1940, fruto da interrupção do
fluxo combinado com os efeitos da mortalidade e do retorno
populacional (Tabelas 1 e 2).
Durante a década de 1950, o fluxo foi restabelecido e, com
uma taxa de crescimento anual da ordem de 1,9% (Tabela 2),
a população japonesa residente no Brasil no ano de 1960 foi a
mais numerosa (156 mil pessoas) desde 1910, e ligeiramente
inferior à de 1970 (158 mil pessoas). A partir de então, o fluxo
migratório praticamente se encerrou em 1973.
Ao longo dos 100 anos de permanência no País, a distri-
buição dos imigrantes japoneses no território brasileiro foi
muito desigual. Também desigual foram as datas de chegada
nas diversas regiões do País. Na Amazônia, especificamente
o Estado do Pará, os primeiros imigrantes chegaram no fi-
nal da década de 1920, o que justifica a tão elevada taxa de
crescimento regional da população de japoneses no período
Tabela 1 - Japoneses residentes no Brasil e distribuição percentual, 37
segundo algumas Unidades da Federação - 1920/2000

Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil


Algumas Unidades da Japoneses residentes no Brasil
Federação 1920 1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000
Números absolutos
Brasil (1) 27 976 144 523 129 192 155 982 158 087 139 480 85 571 70 932
Pará 3 467 421 1 216 3 597 3 046 1 703 1 790
Minas Gerais 1 923 893 917 2 964 1 353 1 923 1 244 1 088
Rio de Janeiro 313 918 1 478 1 794 2 782 3 949 1 808 1 801
São Paulo 24 435 132 216 108 912 115 752 119 338 105 196 63 865 51 445
Paraná 701 8 064 15 393 28 158 21 528 15 771 9 960 7 994
Mato Grosso (2) 510 1 128 1 172 4 940 4 025 2 975 2 290 1 816
Distribuição percentual (%)
Brasil (1) 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Pará 0,0 0,3 0,3 0,8 2,3 2,2 2,0 2,5
Minas Gerais 6,9 0,6 0,7 1,9 0,9 1,4 1,5 1,5
Rio de Janeiro 1,1 0,6 1,1 1,2 1,8 2,8 2,1 2,5
São Paulo 87,3 91,5 84,3 74,2 75,5 75,4 74,6 72,5
Paraná 2,5 5,6 11,9 18,1 13,6 11,3 11,6 11,3
Mato Grosso (2) 1,8 0,8 0,9 3,2 2,5 2,1 2,7 2,6
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1920/2000.
Notas: 1. Inclusive os naturalizados brasileiros no total de japoneses.
2. A partir de 1960, foram utilizados os microdados dos respectivos censos.
(1) Exclusive os habitantes da região da Serra dos Aimorés, território em litígio entre os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo. (2) Foram
agregadas as informações de Mato Grosso e de Mato Grosso do Sul para os anos de 1970 a 2000.

Tabela 2 - Taxa média geométrica de crescimento anual dos japoneses residentes no Brasil,
segundo algumas Unidades da Federação - 1920/2000
Algumas Unidades da Taxa média geométrica de crescimento anual dos japoneses residentes no Brasil (%)
Federação 1920/1940 1940/1950 1950/1960 1960/1970 1970/1980 1980/1991 1991/2000
Brasil (1) 8,6 (-) 1,1 1,9 0,1 (-) 1,2 (-) 4,3 (-) 2,1
Pará 28,7 (-) 1,0 11,0 11,5 (-) 1,6 (-) 5,1 0,6
Minas Gerais (-) 3,8 0,3 12,2 (-) 7,5 3,6 (-) 3,9 (-) 1,5
Rio de Janeiro 5,5 5,0 1,9 4,5 3,6 (-) 6,9 0,0
São Paulo 8,8 (-) 2,0 0,6 0,3 (-) 1,3 (-) 4,4 (-) 2,4
Paraná 13,0 6,8 6,1 (-) 2,6 (-) 3,1 (-) 4,1 (-) 2,4
Mato Grosso (2) 4,0 0,4 15,2 (-) 2,0 (-) 3,0 (-) 2,4 (-) 2,6
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1920/2000.
Notas: 1. Inclusive os naturalizados brasileiros no total de japoneses.
2. A partir de 1960, foram utilizados os microdados dos respectivos censos.
(1) Exclusive os habitantes da região da Serra dos Aimorés, território em litígio entre os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo. (2) Foram
agregadas as informações de Mato Grosso e de Mato Grosso do Sul para os anos de 1970 a 2000.
38 1920/1940. O pós-guerra, nos períodos Desde 1920, as taxas de crescimento
1950/1960 e 1960/1970, também carac- anual da população japonesa no Estado
teriza-se por altas taxas de crescimento do Rio de Janeiro foram expressivas, com
Nilza de O. M. Pereira e Luiz Antônio P. de Oliveira

desta parcela da população de imigran- exceção do período 1950/1960. Uma cer-


tes, resultado, segundo Homma (1996), ta particularidade quanto ao processo
de um ciclo de prosperidade agrícola imigratório de japoneses para o estado
entre aqueles imigrantes radicados em reside no fato da não possibilidade de se
Municípios como Tomé-Açu, e entre determinar o destino daqueles migrantes
aqueles que se dedicaram ao plantio da que realizavam movimentos de forma es-
pimenta-do-reino, principalmente em pontânea e não declaravam aonde iriam;
Santa Isabel do Pará e Castanhal. Ante- algumas famílias durante a noite abando-
riormente, o Censo 1940 contabilizara navam as fazendas, sem deixar notícias, e
nos Municípios de Acará (entre Belém durante o desembarque muitos imigran-
e Tomé-Açu) e Belém os contingentes tes subsidiados apresentavam cartas de
mais elevados de imigrantes japoneses. parentes ou declaravam não serem lavra-
Os Estados de Minas Gerais e São dores, sendo rejeitados e seguindo então
Paulo foram considerados, pelos emissá- como espontâneos, sem declarar rumo
rios do governo japonês no Brasil, por- ou paradeiro (ARAÚJO, 2008). Os resul-
tadores de terras de boa qualidade e de tados do Censo 1920 mostraram que os
excelente clima para a prática da agricul- Municípios do Rio de Janeiro, Bom Jar-
tura. Dessa forma, muitos japoneses que dim e Cabo Frio foram, em valores abso-
reuniam condições para sair ou evitar as lutos, os de maior destaque em número
fazendas de café deslocavam-se em dire- total de imigrantes japoneses. Já em 1940,
ção ao Estado de Minas Gerais, onde, no os maiores contingentes, além do Municí-
Triângulo Mineiro, se dedicavam, sobre- pio do Rio de Janeiro, encontravam-se em
tudo, ao cultivo do arroz. Foi justamen- Nova Iguaçu, Petrópolis e Resende. Des-
te no Triângulo Mineiro que surgiu, em de 1970, os resultados censitários vêm
1919, nas cidades de Uberaba e Conquis- mostrando um crescimento significativo e
ta, as primeiras cooperativa de imigran- regular de imigrantes japoneses nos mu-
tes japoneses (A IMIGRAÇÃO..., 2005). nicípios do Rio de Janeiro, Itaguaí, Nite-
Em 1920, foram contados quase 2 mil rói, Nova Iguaçu e Cachoeira de Macacu.
japoneses no Estado de Minas Gerais, Em alguns desses municípios, como os da Estação da Estrada de Ferro
cerca de 7% do total residente no Brasil. Região Serrana e Itaguaí, predominaram Bragança. Castanhal (PA)
as atividades agrícolas e as colônias. Nos 39
demais, os imigrantes dirigiram-se para
as atividades urbanas, sobretudo serviços.

Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil


Os imigrantes japoneses, como se
sabe, chegaram em grande maioria ao
Estado de São Paulo. No intervalo en-
tre 1908 até a realização do Censo 1940,
foi intenso o fluxo migratório no estado,
principalmente no período 1914-1918,
da Primeira Guerra Mundial. São Paulo
foi o grande distribuidor de imigrantes
japoneses para o Paraná, mais preci-
samente o norte do estado, bem como
para os Estados de Mato Grosso e Pará
(Tabela 2). Em todo período inicial e até
os anos 1950, foi alta a concentração de
japoneses em São Paulo, oscilando en-
tre 84% e 91% do total de japoneses no
País. A redução dessas proporções para
o patamar de 72% a 75% só ocorreu
a partir de 1960, com os novos fluxos
imigratórios resultantes das iniciativas
de incentivo à imigração por parte do
governo Juscelino Kubitschek e de emi-
Foi justamente nas cidades do Triângulo Mineiro, gração do governo japonês: o primeiro,
Uberaba e Conquista, que surgiram as primeiras coo- interessado na abertura de novos pó-
perativas de imigrantes japoneses. Uberaba (MG)
los regionais de desenvolvimento; o se-
gundo, pressionado pelas altas taxas de
desemprego vigentes no pós-guerra.
No Estado do Paraná, o período
compreendido entre os Censos 1920 e
1940 foi o de maior ritmo de crescimen-
to da imigração japonesa. Isso se deve ao
avanço das frentes pioneiras do sudoeste
paulista em direção às novas terras do
norte e, posteriormente, do noroeste pa-
ranaense. O café, o algodão e o comércio
foram os grandes impulsionadores desse
movimento. Em 1940, 5,6% dos japone-
ses residiam no Paraná, proporção que
nas décadas seguintes foi crescendo para
12%, 18% e, a partir de 1970, situando-
Em 1940, Resende era uma das localidades onde se
encontravam os maiores contingentes de imigrantes
japoneses. Resende (RJ)
40 se entre 11% e 13% do total. Municípios A estrutura por sexo e idade
do chamado Norte Novo, como Assaí e As informações mais recentes sobre a
Uraí, próximos a Londrina, formaram estrutura por sexo e idade de imigrantes
Nilza de O. M. Pereira e Luiz Antônio P. de Oliveira

importantes colônias japonesas. O fluxo japoneses referem-se às gerações sobre-


acompanhou a ocupação dessa frontei- viventes ao longo dos censos e que não
ra demográfica e econômica do Paraná, retornaram ao Japão, permanecendo no
instalando-se nos principais municípios. País. Constituem, portanto, uma pro-
Nos anos de 1940 e 1950, o número de porção de população idosa em declínio,
japoneses aumentou e, a partir da déca- a partir do momento em que os fluxos de
da de 1960, seu volume foi decrescendo, imigrantes japoneses tornou-se residual
passando de 28 mil, em 1960, para 8 mil ou tendente a zero.
japoneses recenseados em 2000. Até 1950, a população brasileira
A passagem dos japoneses pelo Esta- como um todo apresentava predomínio
do do Mato Grosso2, acompanhando as masculino. Entre 1950 e 1980, os dados
frentes pioneiras que se deslocavam pelo revelaram equilíbrio entre os sexos, e
atual Estado de Mato Grosso do Sul, foi nos dois últimos censos do Século XX
marcante, mais precisamente nos anos (1991 e 2000) as mulheres vêm sendo
compreendidos entre 1950/1960, con- maioria. Já para a população de imi-
forme pode ser observado pelo significa- grantes japoneses, desde 1920, o núme-
tivo ritmo de crescimento. Desde o iní- ro de homens excede o de mulheres. No
cio da chegada desses imigrantes ao País, início, em 1920, o número de homens
os mesmos se direcionaram, através de japoneses era bem superior ao de mu-
São Paulo, para o estado, atraídos pelos lheres (41,6%), declinando nas décadas
serviços de obras na construção de ferro- seguintes até atingir um excedente de
vias e atividades básicas nas cidades em 6,0%. Embora fosse uma recomendação
formação, reflexo do avanço da frontei- contratual a migração de famílias com-
ra agrícola e demográfica. pletas, o número de homens sempre foi
A partir de 1980, em todo país, a pre- predominante, estando essa caracterís-
sença dos imigrantes japoneses começou tica associada à predominância das ati-
a declinar, não só pela quase interrupção vidades agrícolas que inicialmente moti-
do fluxo como também pela incidência varam a imigração.
da mortalidade, em função do processo Por se tratar de uma população sobre- Trem que levava imigrantes
recém-chegados dos navios
de envelhecimento das pessoas. Convém, vivente, a atual estrutura etária da popu- para outras localidades do
contudo, registrar que os japoneses, em lação japonesa é fortemente envelhecida. País
particular, fizeram parte de um momento Chama atenção, contudo, em 2000, o li-
de ascensão e contribuíram para o forta- geiro aumento da proporção de crianças
lecimento econômico regional, sendo in- e adolescentes, de 0 a 14 anos de idade,
discutível a importância dessa corrente que atingiu um percentual de 4,0% (con-
imigratória (A LINHA..., 2008). tra 0,6% na década anterior). Tal fato
pode estar relacionado ao deslocamento
2
de brasileiros (dekasseguis) para traba-
Para efeito de análise, os dados de Mato Gros-
so e Mato Grosso do Sul foram agregados. lhar no Japão, a partir de 1988, os quais
Gráfico 3 - Razão de sexo dos japoneses residentes no Brasil - 1920/2000 41
141,6

Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil


122,2 120,5 121,5 118,4 118,4
109,7 106,0

1920 1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000


Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1920/2000.
Notas: 1. Inclusive os naturalizados brasileiros no total de japoneses.
2. A partir de 1960, foram utilizados os microdados dos respectivos censos.

Tabela 3 - Razão de sexo dos japoneses residentes no Brasil, segundo os grupos de idade - 1960/2000

Razão de sexo dos japoneses residentes no Brasil (%)


Grupos de idade
1960 1970 1980 1991 2000
Total 121,5 118,4 118,4 109,7 106,0
0 a 14 anos 107,3 106,8 110,4 81,9 112,2
15 a 64 anos 124,0 123,6 124,6 126,0 135,0
65 anos ou mais 110,3 99,0 104,0 95,9 93,1
65 a 74 anos 101,3 104,8 116,9 95,4 100,1
75 a 84 anos 156,5 89,7 88,0 103,4 91,9
85 anos ou mais 100,0 78,2 69,7 74,0 76,7
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960/2000.
Nota: Inclusive os naturalizados brasileiros no total de japoneses.

posteriormente retornaram ao Brasil com ou mais). Em 1960, os idosos jovens


os filhos nascidos no Japão. (7,4%) correspondiam a quase quatro
O grupo de 15 a 64 anos de idade vezes mais que os idosos adultos (2,0%).
tende a se reduzir progressivamente, em Já em 2000, praticamente estão iguala-
função do processo de envelhecimento dos. Os idosos velhos, nos anos 1960 e
populacional, com a concentração nas 1970, revelaram proporções semelhan-
idades mais avançadas. Para efeito de tes, e observa-se que a partir da década
análise desse contingente, os idosos de de 1980 o incremento na proporção des-
65 anos ou mais de idade foram classi- se grupo vai se duplicando, consonante
ficados em três grupos de idade: idosos com a lógica de envelhecimento de uma
jovens (65 a 74 anos), idosos adultos população, do ponto de vista demográ-
(75 a 84 anos) e idosos velhos (85 anos fico, sobrevivente.
42 Tabela 4 - Distribuição percentual dos japoneses residentes no Brasil,
segundo o sexo e os grupos de idade - 1960/2000
Nilza de O. M. Pereira e Luiz Antônio P. de Oliveira

Sexo Distribuição percentual dos japoneses residentes no Brasil (%)


e grupos de idade 1960 1970 1980 1991 2000
Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
0 a 14 anos 5,8 2,5 1,8 0,6 4,0
15 a 64 anos 84,0 80,0 71,7 49,8 32,9
65 anos ou mais 10,2 17,5 26,6 49,5 63,1
65 a 74 anos 7,4 11,9 17,1 28,3 28,6
75 a 84 anos 2,0 4,9 7,7 16,9 25,6
85 anos ou mais 0,7 0,8 1,8 4,3 8,9
Homens 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
0 a 14 anos 5,5 2,4 1,7 0,5 4,1
15 a 64 anos 84,8 81,5 73,3 53,1 36,7
65 anos ou mais 9,7 16,1 25,0 46,4 59,1
65 a 74 anos 6,8 11,2 17,0 26,4 27,8
75 a 84 anos 2,3 4,3 6,7 16,4 23,8
85 anos ou mais 0,6 0,6 1,3 3,5 7,5
Mulheres 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
0 a 14 anos 6,2 2,7 1,8 0,7 3,9
15 a 64 anos 83,1 78,1 69,7 46,2 28,8
65 anos ou mais 10,7 19,2 28,5 53,0 67,3
65 a 74 anos 8,2 12,6 17,2 30,4 29,4
75 a 84 anos 1,8 5,7 9,0 17,4 27,5
85 anos ou mais 0,8 0,9 2,3 5,2 10,4
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960/2000.
Nota: Inclusive os naturalizados brasileiros no total de japoneses. A população japonesa é uma população envelhecida.
Chama atenção, entretanto, o ligeiro aumento da
proporção de crianças e adolescentes, de 0 a 14 anos
Um recurso demográfico que pode ser utilizado é o índice de idade, observado no Censo 2000. Tapiraí (SP)
de longevidade, que pode ser medido pelo quociente, expresso
em valores percentuais, entre o número de pessoas com idade
de 75 anos ou mais e o número de pessoas com idade de 65 anos
ou mais. A leitura que fazemos é de que, em 1960, existiam 27
idosos japoneses de 75 anos ou mais para cada 100 idosos japo-
neses de 65 anos ou mais; esse índice, para 2000, cresceu signi-
ficativamente, chegando praticamente ao dobro (55) de idosos
japoneses de 75 anos ou mais em relação a 100 idosos japone-
ses de 65 anos ou mais. O índice calculado para os homens, em
1960, era superior ao das mulheres, mas tal comportamento foi
sendo modificado, ao longo dos censos, com as mulheres pas-
sando a ser maioria, dado que a longevidade mais alta das mu-
lheres é função de sua esperança de vida mais elevada.
Gráfico 4 - Índice de longevidade dos japoneses, por sexo 43
% Brasil - 1960/2000
55 53 56

Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil


43 43 43
40
36
30 32 31 34 32
27
24

1960 1970 1980 1991 2000


Total Homens Mulheres
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960/2000.
Nota: Inclusive os naturalizados brasileiros no total de japoneses.

A composição por sexo e idade dos japoneses nascidas no Japão. Muitos brasileiros, no
no período 1940/2000 final da década de 1980, foram para o Ja-
Em conseqüência da diminuição, nas pão na busca por empregos – fenômeno
últimas décadas, da população de imi- dekassegui, com sentido inverso Brasil-
grantes japoneses, atribuída principal- Japão. O auge da ida de milhares de ja-
mente à mortalidade, a representação poneses e descendentes para o Japão foi
gráfica da composição por sexo e idade, no início dos anos 1990 e o objetivo era
revelada pelos censos desde 1940, apre- o mesmo daqueles que chegaram ao País
senta um menor número de nascimentos, no começo do Século XX, ou seja, a bus-
devido ao processo de envelhecimento ca de novas oportunidades.
que se evidencia no alargamento da par-
te superior da pirâmide. Esse compor- Os últimos remanescentes
tamento se caracteriza pela redução da Os Censos Demográficos 1991 e 2000
participação relativa de crianças e jovens, permitem obter informações acerca do
acompanhada do aumento do peso pro- ano em que os japoneses fixaram residên-
porcional dos adultos e, particularmente, cia no País. Esses sobreviventes de várias
dos idosos, e se estende até 1991, marca- gerações que chegaram ao Brasil e que
do pelo aumento da expectativa de vida. foram contados na época de realização
Em 1991, o formato vai se tornando “pi- dos respectivos censos indicam ser as dé-
ramidal invertido”, que é resultado de um cadas de 1930 e de 1960 os períodos em
contingente elevado de idosos e um nú- que mais intensamente chegaram ao País.
mero reduzido de crianças e adolescentes. Fazendo um paralelo com as informações
Já em 2000, esses sobreviventes idosos e o de Sakurai (2007) e Tsuchida (1978 apud
aparecimento de proporções de japoneses SAKURAI, 2007), de que o Brasil recebeu,
nos grupos menores de 15 anos indicam entre 1908 e o final dos anos 1970, cerca
um retorno de brasileiros com crianças de 250 mil japoneses, as “entradas” por
44 Gráfico 5 - Composição da população japonesa residente no Brasil,
por sexo e grupos de idade - 1940/200
1940 1950
Nilza de O. M. Pereira e Luiz Antônio P. de Oliveira

80 ou mais 80 ou mais
70-79 70-79
60-69 60-69
50-59 50-59
40-49 40-49
30-39 30-39
20-29 20-29
10-19 10-19
0-9 0-9
-20 -15 -10 -5 0 5 10 15 20 -20 -15 -10 -5 0 5 10 15 20

1960 1970
80 ou mais 80 ou mais
70-79 70-79
60-69 60-69
50-59 50-59
40-49 40-49
30-39 30-39
20-29 20-29
10-19 10-19
0-9 0-9
-20 -15 -10 -5 0 5 10 15 20 -20 -15 -10 -5 0 5 10 15 20

1980 1991
80 ou mais 80 ou mais
70-79 70-79
60-69 60-69
50-59 50-59
40-49 40-49
30-39 30-39
20-29 20-29
10-19 10-19
0-9 0-9
-20 -15 -10 -5 0 5 10 15 20 -20 -15 -10 -5 0 5 10 15 20

2000
80 ou mais
70-79
60-69
50-59 Homens
40-49 Mulheres
30-39
20-29
10-19
0-9
-20 -15 -10 -5 0 5 10 15 20

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1940/2000.


Notas: 1. Inclusive os naturalizados brasileiros no total de japoneses.
2. A partir de 1960, foram utilizados os microdados dos respectivos censos.
ano de chegada apresentam comportamento semelhante aos dados agregados reve- 45
lados pelos censos, considerando que esses levantamentos apresentam somente os so-
breviventes (vivos e que não regressaram). Existem, inclusive, registros da chegada de

Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil


japoneses antes do Tratado da Amizade, Comércio e Navegação, e esses sobreviventes
somavam 148 pessoas, segundo o Censo 1991.

Gráfico 6 - Japoneses, por período que fixaram residência no País


100 000 Brasil - 1991/2000
90 000
80 000
70 000
60 000
50 000
40 000
30 000
20 000
10 000
0
Até 1911 1921 1931 1941 1951 1961 1971 1981 1991
1910 a a a a a a a a a
1920 1930 1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000
1991 2000 Entradas (1)
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1991/2000.
(1) Ver: TSUCHIDA, N. The japanese in Brazil, 1908-1941. 1978. 398 p. Tese
(Doutorado)-University of California, Califórnia, 1978; HOMMA, A. K. O. (Ed.).
Amazônia: meio ambiente e desenvolvimento agrícola. Brasília, DF: Serviço de
Produção e Informação, 1998.

As informações censitárias permitem traçar um perfil desses últimos remanescen-


tes de imigrantes japoneses ao longo dos censos, conhecendo a sua distribuição em
solo brasileiro, e algumas características como religião; como se autoclassificaram
segundo a investigação da cor ou raça; o nível educacional e o envolvimento nas ati-
vidades econômicas.

No território brasileiro
O interior3 do País concentra praticamente 2/3 dos últimos remanescentes de ja-
poneses que aqui chegaram ao longo desses 100 anos. Do ponto de vista histórico, a
direção era predominantemente esse interior, portanto a chegada à cidade foi se dan-
do de forma gradativa e para se estabelecerem, tanto no trabalho quanto para usu-
fruir dos serviços e lazeres que a cidade proporcionava, foi preciso muita perseveran-
ça, principalmente para aqueles que chegaram durante o período da Segunda Guerra
Mundial. Os imigrantes oriundos de países como Itália, Alemanha e Japão tiveram
suas atividades restringidas pelo governo federal, inclusive sofrendo até confisco de
bens. Os últimos remanescentes chegaram, em sua maioria, nas capitais de estados,
no período de 1951 a 1960, e Macapá e Rio Branco apresentaram ocupação mais
recente. A participação relativa do interior superando a da capital ocorreu, em todas
as regiões, com exceção da Centro-Oeste, em decorrência dos residentes na capital

3
Considera-se “interior” o espaço territorial do estado, exceto o da capital estadual.
46 Brasília. Convém destacar a participação Tabela 5 - Japoneses residentes na capital e no interior, e participação
relativa do interior da Região Sul, signifi- relativa, segundo as Grandes Regiões e Unidades da Federação - 2000
cativamente maior do que a das capitais
Nilza de O. M. Pereira e Luiz Antônio P. de Oliveira

Japoneses residentes Participação relativa (%)


sulistas, o que pode ser explicado, em Grandes Regiões e
parte, pela ocupação do norte e noroeste Unidades da Federação
Total Capital Interior Capital Interior
do Paraná. Em termos estaduais, pode-
Brasil 70 919 28 312 42 607 39,9 60,1
se afirmar que a capital ou o interior de-
Norte 2 612 1 156 1 456 44,3 55,7
têm a maioria dos últimos remanescen-
Rondônia 128 46 82 35,9 64,1
tes japoneses nas seguintes situações: as
capitais dos Estados do Amazonas, Ma- Acre 41 16 25 39,0 61,0
ranhão e Paraíba possuem percentuais Amazonas 562 472 90 84,0 16,0
acima de 80%, enquanto o interior dos Roraima 20 7 13 35,0 65,0
Estados do Tocantins, Minas Gerais, Pará 1 789 579 1 210 32,4 67,6
Paraná, Santa Catarina e Mato Grosso Amapá 36 36 - 100,0 0,0
também atingiram níveis de grande rele- Tocantins 36 - 36 0,0 100,0
vância, expressando uma presença mais Nordeste 1 245 527 718 42,3 57,7
intensa em áreas de concentração no in- Maranhão 57 46 11 80,7 19,3
terior dos respectivos estados. Quanto a Piauí 20 7 13 35,0 65,0
São Paulo, onde, em 2000, residiam cer- Ceará 141 76 65 53,9 46,1
ca de 71% dos japoneses remanescentes, Rio Grande do Norte 62 27 35 43,5 56,5
57,2% situavam-se no interior do estado, Paraíba 20 20 - 100,0 0,0
espalhados por quase todas as sub-regiões,
Pernambuco 243 126 117 51,9 48,1
e 42,8% residiam na capital.
Alagoas - - - - -
Segundo o Censo 2000, os últimos
Sergipe 18 18 - 100,0 0,0
remanescentes estão distribuídos em 803
Bahia 684 207 477 30,3 69,7
municípios – que representavam 14,6%
do total de municípios brasileiros – ten- Sudeste 54 388 23 228 31 160 42,7 57,3
do sua maior incidência no Município Minas Gerais 1 087 119 968 10,9 89,1
de São Paulo. Outros municípios, ainda Espírito Santo 55 22 33 40,0 60,0
que com cifras bem reduzidas, abrigam Rio de Janeiro 1 801 1 082 719 60,1 39,9
os últimos remanescentes daqueles que São Paulo 51 445 22 005 29 440 42,8 57,2
chegaram ao País na busca de um novo Sul 9 553 1 677 7 876 17,6 82,4
horizonte mais promissor. Esses muni- Paraná 7 994 1 314 6 680 16,4 83,6
cípios vão se alternando entre os Esta- Santa Catarina 496 21 475 4,2 95,8
dos de São Paulo e Paraná nas primeiras Rio Grande do Sul 1 063 342 721 32,2 67,8
posições do ranking, porém os Municí- Centro-Oeste 3 121 1 724 1 397 55,2 44,8
pios do Rio de Janeiro (Rio de Janeiro), Mato Grosso do Sul 1 397 566 831 40,5 59,5
Brasília (Distrito Federal), Belém (Pará) Mato Grosso 418 84 334 20,1 79,9
e Campo Grande (Mato Grosso do Sul)
Goiás 467 235 232 50,3 49,7
também pertencem à lista daqueles
Distrito Federal 839 839 - 100,0 -
com população japonesa acima de 500
habitantes. Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000.
Tabela 6 - População residente e japoneses estrangeiros ou 47
naturalizados brasileiros, segundo os municípios com população
japonesa superior a 500 habitantes - 2000

Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil


Japoneses estrangeiros ou
Municípios População residente
naturalizados brasileiros
São Paulo (SP) 10 435 546 22 005
Moji das Cruzes (SP) 330 241 1 968
Londrina (PR) 447 065 1 684
Guarulhos (SP) 1 072 717 1 565
São Bernardo do Campo (SP) 703 177 1 516
Baía de Guanabara e Pão de Curitiba (PR) 1 587 315 1 314
Açúcar. Rio de Janeiro (RJ) Rio de Janeiro (RJ) 5 857 904 1 083
Suzano (SP) 228 690 1 042
Santo André (SP) 649 331 1 021
Campinas (SP) 969 396 897
Maringá (PR) 288 653 856
Brasília (DF) 2 051 146 840
São José dos Campos (SP) 539 313 750
Marília (SP) 197 342 618
Bauru (SP) 316 064 609
Belém (PA) 1 280 614 580
Campo Grande (MS) 663 621 567
Sorocaba (SP) 493 468 531
Presidente Prudente (SP) 189 186 525
Palácio do Planalto.
Brasília (DF) Araçatuba (SP) 169 254 512

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000.

Na religião
O Brasil é conhecido como o País com a maior população
católica do mundo. Segundo os resultados do Censo Demográ-
fico 2000, a população brasileira era 74% Católica Apostólica
Romana, enquanto no Japão as principais religiões são o Xin-
toísmo e o Budismo. A informação proveniente dos imigran-
tes japoneses foi traduzida como uma continuação da religião
trazida com eles e transmitida por gerações, confirmando-se,
no período dos censos analisados, o budismo como a religião
de maior percentual (42,7%), embora declinante. A segunda
leitura é a influência do catolicismo na cultura dos imigrantes,
sendo a religião católica a segunda de maior proporção (31%),
mantendo-se ao longo dos censos em patamares constan-
tes. Em ascendência estão as “outras religiões” (13,3%) que,
48 especificamente para os japoneses, podem ser contabilizadas como novas religiões
orientais surgidas no Século XX, tais como: Seicho-no-Ie e Messiânica. Também em
crescimento estão aqueles que declararam “sem religião”, passando de 3,1%, em
Nilza de O. M. Pereira e Luiz Antônio P. de Oliveira

1960, para 12,8%, em 2000, ou seja, o percentual foi multiplicado por quatro.

Tabela 7 - Distribuição percentual de japoneses residentes no Brasil, segundo o sexo e a religião


1960/2000
Distribuição percentual de japoneses residentes no Brasil (%)
Sexo e religião
1960 1970 1980 1991 2000
Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Católica Apostólica Romana 31,6 37,7 34,3 31,8 31,0
Budismo 58,4 53,2 51,5 46,4 42,7
Outra religião 6,7 2,7 5,3 10,6 13,3
Sem religiao 3,1 6,5 8,6 10,7 12,8
Sem declaração 0,2 0,0 0,4 0,6 0,2
Homens 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Católica Apostólica Romana 32,6 38,3 35,1 32,2 31,1
Budismo 57,6 51,7 49,7 45,1 41,4
Outra religião 6,6 2,5 5,1 9,2 11,5
Sem religiao 3,2 7,4 9,8 12,9 15,8
Sem declaração 0,1 0,0 0,3 0,5 0,2
A religião católica é a segun-
Mulheres 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 da de maior proporção entre
Católica Apostólica Romana 30,3 36,8 33,3 31,3 30,8 os imigrantes japoneses. São
Budismo 59,5 55,0 53,5 47,8 44,0 Paulo (SP)

Outra religião 6,9 2,8 5,7 12,1 15,3


Sem religiao 3,1 5,4 7,1 8,2 9,7
Sem declaração 0,2 0,0 0,4 0,6 0,2
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960/2000.
Nota: Para efeito dessa tabulação, dois procedimentos foram adotados: em 1970, como as categorias eram precodi-
ficadas, assumiu-se “outra religião” como Budismo e as demais religiões (Evangélica e Espírita) foram agregadas e
designadas como a nova categoria “outra religião”; em 1980, assumiu-se para os japoneses as religiões “orientais”
como Budismo, pela sua predominância.

Na declaração da cor ou raça


A miscigenação é uma forte característica na sociedade brasileira, enquanto entre os
imigrantes japoneses não era um fato comum a união de um natural com uma pessoa
que não fosse japonesa, porque, além de razões culturais, isso, em parte, podia ser obs-
táculo à intenção ou a um ideal eventualmente existente de retorno ao Japão. Essa situa-
ção passou a se reverter a partir da década de 1970, em virtude da própria experiência
da segunda e terceira gerações de filhos de imigrantes. As informações do Censo 2000,
último do Século XX, permitiram observar que, para as gerações mais antigas, a auto-
declaração na categoria amarela era fortemente preponderante, porém, entre aqueles
que fixaram residência no período 1971/1980, inicia-se o declínio na intensidade da 49
autodeclaração na categoria amarela, e entre os que chegaram na década de 1990, a
autodeclaração na categoria branca foi significativa em relação às gerações anteriores,

Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil


expressando, talvez, a perspectiva dos dekasseguis, que retornaram do Japão com filhos
lá nascidos.

Tabela 8 - Distribuição percentual dos japoneses no Brasil, por cor ou raça autodeclarada, segundo
o período em que fixaram residência no País - 2000
Período em que Distribuição percentual dos japoneses no Brasil por cor ou raça autodeclarada (%)
fixaram residência Sem
no País Total Branca Preta Amarela Parda Indígena
declaração
Total 100,0 6,2 0,1 92,3 0,9 0,0 0,4
Até 1910 100,0 0,0 0,0 100,0 0,0 0,0 0,0
1911 a 1920 100,0 6,4 0,0 91,4 1,1 0,0 1,1
1921 a 1930 100,0 4,1 0,1 95,5 0,1 0,1 0,2
1931 a 1940 100,0 4,5 0,1 94,8 0,5 0,0 0,2
1941 a 1950 100,0 6,2 0,0 93,1 0,4 0,0 0,3
1951 a 1960 100,0 5,7 0,0 93,4 0,6 0,1 0,3
1961 a 1970 100,0 4,3 0,0 92,8 1,3 0,0 1,6
1971 a 1980 100,0 9,9 0,0 86,9 2,4 0,0 0,7
1981 a 1990 100,0 8,4 1,5 87,7 2,0 0,0 0,5
1991 a 2000 100,0 22,2 0,5 72,4 4,3 0,0 0,6
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000.

Na educação
Dentre as sociedades mais instruídas do mundo estão os japoneses, cabendo res-
saltar que na época da Restauração Meiji, em meados do Século XIX, a população
alfabetizada já atingia 40%. No Brasil, em 2000, a média de anos de estudo para as
pessoas de 15 anos ou mais de idade foi 6,2 anos de estudo para o total; 6,0 para os
homens, e 6,3 para as mulheres. A média de anos de estudo dos japoneses residentes
no Brasil, calculada para esse mesmo grupo etário, em 2000, foi 5,9 para o total; 6,7
para os homens e 5,1 para as mulheres. Diferentemente dos brasileiros, entre os imi-
grantes japoneses as mulheres detêm as menores médias, contudo, não pode se per-
der de vista o fato de que faz parte desse cálculo médio um número ainda razoável de
remanescentes que aqui chegaram até os anos 1940 e que vinham para as atividades
rurais, possuindo níveis educacionais muito baixos. Os últimos remanescentes con-
tabilizados no Censo 2000 revelaram uma média em torno de 4 anos de estudo entre
aqueles que aqui chegaram nas primeiras décadas. Com o passar do tempo, os níveis
educacionais foram crescendo até atingirem, no final da década de 1990, uma média
em torno de 12 anos de estudo.
50 Gráfico 7 - Média de anos de estudo dos japoneses de 15 anos ou mais de idade,
por ano em que fixaram residência no País - 2000
14,0
Nilza de O. M. Pereira e Luiz Antônio P. de Oliveira

12,0

10,0

8,0

6,0

4,0

2,0

0,0

2000
1909

1960

1990
1920

1930

1980
1940

1950

1970
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000.

No trabalho
Tendo em vista a intenção de prosperar e, se possível, enri-
quecer e retornar ao Japão, um dos principais mitos da migração,
chegaram ao Brasil os primeiros imigrantes japoneses, em sua
maioria camponeses, e foram trabalhar, inicialmente, nas plan-
tações de café no interior paulista. Dentre todos os imigrantes
que chegaram ao País, os japoneses foram os que mais se desta-
caram na diversificação da produção dos hortifrutigranjeiros e
ocuparam por mais tempo as atividades rurais (HISTÓRICO...,
2007). A penetração dos imigrantes japoneses em solo brasileiro
não ficou restrita ao Estado de São Paulo, alcançando, como vi-
mos, o norte do Paraná e até a Amazônia, com a exploração da
borracha e, também, com a pimenta-do-reino e a juta, no Estado
do Pará. Desses últimos remanescentes, em 2000, ainda estavam
desenvolvendo uma atividade econômica 31,4% do total, dos
quais 96,2% estavam ocupados na semana de referência da pes-
quisa censitária. Os grupos de atividade que praticamente divi-
diam a atividade econômica desses imigrantes eram a agricultura,
pecuária e silvicultura; nas áreas urbanas, o comércio, reparação
de veículos automotores e de objetos pessoais e domésticos, que Colono japonês e o cultivo da pimenta-do-reino.
agregou a maior proporção de ocupados (25,7%). Tomé-Açu (PA)
Gráfico 8 - Distribuição percentual dos japoneses de 10 anos ou mais de idade ocupados na semana de 51
referência, por grupos de atividade no trabalho principal - Brasil - 2000
%

Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil


Agricultura, pecuária, silvicultura 21,4

Pesca 0,4

Indústria extrativa 0,1

Indústria de transformação 13,1


Produção e distribuição de 0,4
eletricidade, gás e água
Construção 2,6
Comércio, reparação de veículos
automotores e de objetos pessoais 25,7
e domésticos
Alojamento e alimentação 7,5
Transporte, armazenagem 4,8
e comunicação
Intermediação financeira 1,6
Atividades imobiliárias, aluguéis 7,0
e serviços prestados às empresas
Administração pública, 1,0
defesa e seguridade social
Educação 3,2

Saúde e serviços sociais 2,5


Outros serviços coletivos, 5,5
sociais e pessoais
Serviços domésticos 1,0

Organismos internacionais 0,5


Outras atividades ou 1,8
atividades não-classificadas

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000.

A distribuição desses grupos de atividade, sobretudo o


avanço em tipos específicos de serviços urbanos, foi se diversi-
ficando à medida em que o próprio Brasil ia se transformando,
e o que antes era um destino à agricultura passou a ter no-
vas características, como pode ser observado na trajetória dos
imigrantes censitários. Para aqueles que chegaram na década
de 1910, somente as atividades de agricultura, pecuária e sil-
vicultura juntamente com atividades imobiliárias, aluguéis e
serviços prestados às empresas foram informadas. A partir do
pós-guerra, observa-se o acentuado declínio das atividades de
agricultura, pecuária e silvicultura, e o crescimento de ativida-
des ligadas à indústria de transformação e a serviços especifica-
dos, inclusive os de natureza educacional.
52 Tabela 9 - Distribuição percentual dos japoneses de 10 anos ou mais de idade, ocupados na semana de referência, por período
em que fixaram residência no País, segundo os grandes grupos de atividade no trabalho principal - Brasil - 2000
Distribuição percentual dos japoneses de 10 anos ou mais de idade, ocupados na semana
Nilza de O. M. Pereira e Luiz Antônio P. de Oliveira

Grandes grupos de de referência, por período em que fixaram residência no País (%)
atividade no trabalho
principal 1909 e 1911 a 1921 a 1931 a 1941 a 1951 a 1961 a 1971 a 1981 a 1991 a
Total
1910 1920 1930 1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000

Total 100,0 - 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Agricultura, pecuária,
21,4 - 47,5 26,8 30,0 24,6 23,3 18,3 10,9 13,0 5,3
silvicultura
Pesca 0,4 - 0,0 2,5 0,3 1,6 0,2 0,4 0,0 1,1 0,0

Indústria extrativa 0,1 - 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,2 0,0 0,0 1,1

Indústria de transformação 13,1 - 0,0 14,0 10,5 13,8 12,7 14,0 14,7 10,3 18,8
Produção e distribuição de
0,4 - 0,0 0,0 0,0 1,6 0,4 0,7 0,5 0,0 1,0
eletricidade, gás e água
Construção 2,6 - 0,0 3,8 2,1 1,7 2,6 2,5 3,2 2,4 2,7
Comércio, reparação de
veículos automotores e de 25,7 - 0,0 27,7 28,9 25,4 25,7 28,2 18,5 18,1 20,5
objetos pessoais e domésticos
Alojamento e alimentação 7,5 - 0,0 3,8 5,5 3,3 8,8 6,9 8,6 9,1 7,8
Transporte, armazenagem e
4,8 - 0,0 7,7 4,1 2,4 5,5 4,5 2,4 8,8 2,5
comunicação
Intermediação financeira 1,6 - 0,0 0,0 0,0 2,6 1,1 1,6 6,0 1,3 5,2
Atividades imobiliárias,
aluguéis e serviços prestados 7,0 - 52,5 2,9 4,2 11,1 7,0 7,1 7,4 14,5 8,6
às empresas
Administração pública,
1,0 - 0,0 0,0 0,0 1,9 1,2 1,1 2,8 0,0 0,0
defesa e seguridade social
Educação 3,2 - 0,0 2,3 1,5 1,3 2,1 3,6 5,4 5,7 14,5

Saúde e serviços sociais 2,5 - 0,0 0,0 1,4 0,0 2,4 3,9 4,5 1,1 3,2
Outros serviços coletivos,
5,5 - 0,0 8,0 7,0 4,0 4,3 4,6 7,7 9,0 6,6
sociais e pessoais
Serviços domésticos 1,0 - 0,0 0,0 2,8 1,7 0,7 0,3 2,6 0,0 0,0

Organismos internacionais 0,5 - 0,0 0,0 0,0 0,0 0,2 0,2 1,7 2,3 2,4
Outras atividades ou
1,8 - 0,0 0,6 1,8 3,1 1,7 1,8 3,2 3,2 0,0
atividades não classificadas

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000.


Considerações finais assinalado na reconstituição de sua tra- 53
Em suma, a trajetória demográfica jetória através dos censos do IBGE.
dos imigrantes japoneses revelada pelos

Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil


censos, no período de 1920 a 2000, traz Referências:
à luz informações que refletem, em certo ARAÚJO, M. T. de. Migrações na Baixada.
sentido, as várias etapas de assimilação, São João de Meriti: Instituto de Pesquisas e
pontuadas por momentos de grande di- Análises Históricas e de Ciências Sociais da
ficuldade quando aqui chegaram, pela Baixada Fluminense, 2008. Disponível em:
<http://www.ipahb.com.br/genera_migra.
não adaptação em função da língua, dos php>. Acesso em: 28 jan. 2008.
hábitos e costumes que eram bem distin-
HIRATA, R. Y. Tempo e espaço na dinâmi-
tos em relação aos da população brasi-
ca migratória japonesa: o caso de Mogi das
leira. Contudo, a evolução e o espalha- Cruzes. Trabalho apresentado no XV En-
mento dos movimentos evidenciam suas contro Nacional de Estudos Populacionais,
importantes contribuições, tais como Caxambu, Minas Gerais, 2006.
persistência, organização e dedicação, HISTÓRICO da imigração no Brasil. Japo-
que fizeram com que conseguissem culti- neses. Brasília, DF: Advocacia Dias Marques,
var e transmitir seus valores e as opções [2007]. Disponível em: <http://www.dias
de novos contextos para os descenden- marques.adv. br/ pt/historico_imigracao_
brasil.htm#Histórico>. Acesso em: 07 jan.
tes. Nesses 100 anos de imigração ja- 2008.
ponesa para o Brasil, destacam-se dois
HOMMA, A. K. O. A imigração japonesa na
fluxos imigratórios de sentidos opostos:
Amazônia, 1915-1945. In: CONGRESSO
o Japão-Brasil, na primeira metade do BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIO-
Século XX, e o fenômeno dekassegui, os LOGIA RURAL, 34., 1996, Aracajú. Anais...
descendentes dos migrantes originários, Brasília, DF: SOBER, 1996. v.1. p. 115-137.
que foram em busca de trabalho e opor- ______ (Ed.). Amazônia: meio ambiente e de-
tunidades no país de seus pais e avós, em senvolvimento agrícola. Brasília, DF: Serviço
função da crise econômica brasileira, tri- de Produção e Informação, 1998.
lhando o sentido inverso, Brasil-Japão, A IMIGRAÇÃO japonesa em Minas Gerais.
no final do Século XX. A contribuição Uberaba, MG: Arquivo Público de Uberaba,
do contingente imigratório japonês para 2005. Disponível em: <http://www.arquivo-
publicouberaba.com.br/projeto_imigracoes.
a população brasileira foi muito signifi-
htm>. Acesso em: 28 jan. 2008.
cativa na formação econômica e socio-
cultural do País, incorporando-se ao A LINHA do tempo da imigração japone-
sa. Brasília, DF: Grupo Parlamentar Brasil-
avanço das fronteiras agrícolas e moder- Japão, 2008. Disponível em: <http://www.
nização de diversas atividades. Do pon- gpbrasiljapao.com.br/index.php?option=
to de vista demográfico, sua presença ul- com_content&task=view&id=42&Itemid=
trapassa amplamente o contingente que 42>. Acesso em: 28 jan. 2008.
aqui se fixou, desdobrando-se por suas SAKURAI, C. Os japoneses. São Paulo: Con-
gerações de descendentes que represen- texto, 2007.
tam efetivos populacionais social e eco- TSUCHIDA, N. The japanese in Brazil,
nomicamente relevantes em diversas ci- 1908-1941. 1978. 398 p. Tese (Doutorado) -
dades e Unidades Federativas, conforme University of California, Califórnia, 1978.
Vivendo no Brasil
características da população de origem japonesa

Kaizô Iwakami Beltrão


Sonoe Sugahara
Ryohei Konta
Introdução

E
mbora o início das relações oficiais entre o Japão e o Brasil tenha ocorrido
em 1895, com a assinatura do Tratado de Amizade, Comércio e Navega-
ção, e as primeiras representações diplomáticas tenham sido instaladas dois
anos depois, foi somente em 1907 que a Companhia Imperial de Migração e a Secre-
taria de Agricultura de São Paulo assinaram o contrato para o translado de 3 mil mi-
grantes no período de três anos. Assim, a migração dos japoneses para o Brasil teve
início em 1908 com a chegada ao porto de Santos, em 18 de junho daquele ano, da
primeira leva de 158 famílias, num total de 781 japoneses, a bordo do navio Kasato
Maru. Este movimento foi parte de um fluxo migratório maior de japoneses, primei-
ro dentro do próprio Japão e depois para a América, Manchúria e outras regiões do
mundo. Em sua origem, destacam-se vários fatores: econômicos, decorrentes da mo-
dernização introduzida pelo governo Meiji; crises internas geradas pela guerra con-
tra a Rússia; e mudanças introduzidas no Código Civil japonês (sistema de sucessão e
herança) (WOORTMANN, 1995).
No início, esses imigrantes dedicaram-se à agricultura, onde introduziram novas
culturas e novas técnicas. Os primeiros anos foram de imensas dificuldades, pois
muitos fazendeiros tratavam os imigrantes como se fossem escravos (que na verda-
de vieram substituir), além de outros problemas como língua, alimentação, baixos
salários etc. Este período inicial foi, segundo as palavras dos próprios imigrantes, o
“inferno vivo” (SHINDO, 2005).
Estima-se que até 1941, período que Saito (1980) classifica como fase I, tenham
entrado quase 200 mil imigrantes japoneses e, entre 1953 e 1962, que ele classifica
como fase II, cerca de 50 mil. Os imigrantes da fase I de Saito caracterizavam-se por
serem de procedência rural (pequenos proprietários ou proprietários arrendatários
no Japão), direcionados aqui principalmente para a cultura do café, e que vinham
com a intenção de retorno após o sucesso. Os imigrantes da fase II, muitos deles
das antigas possessões e colônias japonesas (Taiwan, Coréia, Manchúria etc.) vieram
56 com o intuito de realocação permanente meio rural ou migraram para outros
e foram dispersos em núcleos coloniais estados. Já em 1926, há registros de ja-
(Amazônia, Nordeste, Sul, São Paulo e poneses no Paraná e Mato Grosso. Em
Kaizô Iwakami Beltrão, Sonoe Sugahara e Ryohei Konta

Paraná). Com o aumento da industriali- 1929, iniciou-se o desbravamento da


zação no Japão e o “milagre brasileiro”, Amazônia com a colônia Acará, atual-
a fase III trouxe um novo tipo de migran- mente Tomé-Açu, e também se instala-
te, caracterizado por capital-tecnologia- ram nessa época em Anápolis (Goiás).
empresário, um contingente bem menos Embora os primeiros migrantes te-
expressivo e com uma permanência limi- nham vindo especificamente para se de-
tada no País. dicar às atividades agrícolas, aos poucos
A partir do final da década de 1980, foram desenvolvendo outras atividades,
o fluxo de migrantes mudou de direção. como comércio e indústria, e mesmo pro-
Esta reversão na tendência histórica se fissões, como professores, médicos, den-
intensificou com a crise econômica bra- tistas etc. Outros se tornaram arrenda-
sileira dos anos 1980 e se tornou parte tários, meeiros, empreiteiros e sitiantes,
do movimento de globalização, com a comprando terras das fazendas de café.
incorporação de fluxos internacionais Não existe ainda uma boa quanti-
de mão-de-obra aos crescentes fluxos de ficação deste processo de migração ur-
bens, serviços e capitais em nível mun- bano-rural e interestadual dos nikkeys.
dial e, no caso do “fenômeno dekassegui”, Os dados dos censos quanto à migração
obviamente fruto da posição do Japão podem elucidar parte da trajetória. A
entre as potências industrializadas. Em inserção dos filhos destes migrantes nos
princípio, couberam aos dekasseguis os diversos setores de atividade econômi-
trabalhos de baixa qualidade, rejeitados ca é também parte do fenômeno a ser
pelos japoneses e por eles denominados investigado. Como esta mobilidade es-
de “3K”: kitanai (sujo), kiken (perigoso) pacial está conectada com a mobilidade
e kitsui (penoso). “Os brasileiros incluem educacional? Trabalhos anteriores dos
ainda outras duas características [a este autores mostram que este subgrupo da
tipo de trabalho]: exigente [kibishii] e de- população brasileira foi o que apresen-
testável [kirai]” (ROSSINI, 2004). tou maiores ganhos de escolaridade en-
Este texto pretende traçar, utilizan- tre 1940 e 2000 (BELTRÃO, 2005). O
do tabulações especiais dos microdados texto pretende, também, mostrar algu-
dos Censos Demográficos entre 1960 e ma conexão entre o aumento de escola-
2000, o perfil da população de origem ridade e a mudança do tipo de ativida-
japonesa no Brasil focalizando, princi- de empreendida pelos japoneses e seus
palmente, a distribuição espacial, edu- descendentes.
cação e tipo de atividade da população Este texto é composto de seis seções.
nikkey (japoneses e descendentes). Os A primeira é esta introdução. A segunda
japoneses vieram originalmente para descreve em linhas gerais a migração in-
trabalhar nas fazendas de café no in- ternacional para o Brasil, em particular
terior de São Paulo. Muitos destes mi- a efetuada pelos migrantes japoneses. A
grantes saíram assim que possível do terceira apresenta a evolução dos níveis
educacionais da população nikkey, evo- 57
lução esta que é apresentada para alguns
recortes: imigrantes, emigrantes e não-

Vivendo no Brasil
migrantes por situação de domicílio.
Para cotejar este valor, apresentamos
também a distribuição de anos de estudo
Gráfico 1 - População residente, de estrangeiros da população do Brasil como um todo,
e de japoneses - Brasil - 1872/2000 desagregada também por situação de
1 000 000 000 domicílio: urbana e rural. A distribuição
espacial e os principais fluxos migrató-
100 000 000 rios da população nikkey no Brasil são
descritos na quarta seção. Na quinta se-
10 000 000
ção, apresentamos a evolução dos seto-
res de atividade nos quais está envolvida
1 000 000
a população nikkey. Na última seção,
100 000 são tecidos comentários.

10 000 A população nikkey


1870 1880 1890 1900 1910 1920 1930 1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000
Como já mencionado na introdução,
População residente Estrangeiros (1) Japoneses (1) a migração japonesa foi intensa nos anos
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1872/2000. 1920 e 1930, o que acarretou um rápido
(1) Inclui os estrangeiros naturalizados brasileiros. crescimento da população japonesa, tanto
em números absolutos (Gráfico 1) quanto
relativos (Gráfico 2). Com o advento da
Gráfico 2 - Representatividade dos diversos grupos Segunda Guerra, houve uma queda no flu-
populacionais - Brasil - 1872/2000 xo migratório, que aumentou novamente
%
100,0 na década de 1950, voltando a cair desde
então, em números absolutos. Em termos
relativos, observamos que tanto a parti-
10,0
cipação dos japoneses como a de todos
os estrangeiros vem experimentando que-
1,0 da contínua (a dos japoneses, a partir de
1940). A participação dos japoneses entre
os estrangeiros tem se mantido constante,
0,1
em torno de 10%, desde 1940.
A distribuição dos japoneses entre os di-
0 ferentes estados mostra uma concentração
1870 1880 1890 1900 1910 1920 1930 1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000
maior em algumas áreas. Para analisar o
Estrangeiros (1)/população residente Japoneses (1)/estrangeiros (1)
processo de migração dos nikkeys entre as
Japoneses (1)/população residente diferentes Unidades da Federação, foram
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1872/2000. consideradas 11 áreas, as quais encon-
(1) Inclui os estrangeiros naturalizados brasileiros. tram-se listadas na Tabela 1, que mostra,
58 também, a população residente, a população nikkey e o percentual da população
nikkey em cada uma das áreas. Como proxy para a população nikkey, consideraram-
se os domicílios nos quais morava pelo menos um indivíduo que se autodeclarou
Kaizô Iwakami Beltrão, Sonoe Sugahara e Ryohei Konta

amarelo, ou que nasceu no Japão, ou, ainda, que declarou um movimento migrató-
rio (o último ou de data fixa – 5 anos) com origem no Japão. Foram retirados deste
grupo os domicílios com indivíduos – ainda que autodeclarados amarelos – que se
declararam nascidos em outros países asiáticos (China, Taiwan e Coréia) ou com um
movimento migratório destes mesmos países. Os nikkeys encontram-se principal-
mente concentrados nos Estados de São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul (Tabela 1).
O Estado de Minas Gerais apresentava mais de 75 mil nikkeys no Censo 2000, mas
uma proporção de 0,4% destes na população do estado.

Tabela 1 – População total e população nikkey, absoluta e percentual, segundo as áreas consideradas
Brasil - 1960/2000 (continua)
1960 1980

Áreas consideradas População nikkey População nikkey


População total População total
Percentual Percentual
Absoluta Absoluta
(%) (%)

Total 69 387 691 439 416 0,6 117 641 283 987 436 0,8

Norte (1) 1 380 091 2 341 0,2 2 477 208 16 883 0,7

Pará 1 526 325 2 592 0,2 3 403 498 21 425 0,6

Nordeste (2) 16 236 378 629 0,0 25 360 047 110 003 0,4

Bahia 5 910 429 582 0,0 9 455 392 35 768 0,4

Sudeste (3) 11 197 675 3 612 0,0 15 403 443 26 970 0,2

Rio deJaneiro 6 601 038 7 274 0,1 11 291 631 22 158 0,2

São Paulo 12 775 121 336 338 2,6 25 042 074 600 657 2,4

Sul (4) 7 479 906 1 261 0,0 11 402 141 16 550 0,1

Paraná 4 259 610 81 205 1,9 7 629 849 106 369 1,4

Centro-Oeste (5) 2 021 118 3 582 0,2 6 176 000 30 653 0,5

Mato Grosso do Sul 568 983 8 896 1,6 1369769 16738 1,2
Tabela 1 – População total e população nikkey, absoluta e percentual, segundo as áreas consideradas 59
Brasil - 1960/2000 (conclusão)
1991 2000

Vivendo no Brasil
População nikkey População nikkey
Áreas consideradas
População total População total
Percentual Percentual
Absoluta Absoluta
(%) (%)

Total 145 035 418 145 035 418 0,7 167 909 995 1 405 685 0,8

Norte (1) 5 078 156 5 078 156 0,5 6 715 207 54 161 0,8

Pará 4 949 207 4 949 207 0,3 6 195 965 39 353 0,6

Nordeste (2) 30 626 761 30 626 761 0,2 34 696 719 147 112 0,4

Bahia 11 867 338 11 867 338 0,3 13 085 769 78 449 0,6

Sudeste (3) 18 344 150 18 344 150 0,2 21 117 838 84 076 0,4

Rio deJaneiro 12 807 195 12 807 195 0,3 14 392 105 63 470 0,4

São Paulo 31 588 825 31 588 825 2,0 37 035 456 693 495 1,9

Sul (4) 13 680 491 13 680 491 0,1 15 545 705 35 862 0,2

Paraná 8 448 623 8 448 623 1,3 9 564 642 143 588 1,5

Centro-Oeste (5)(6)(7) 7 644 672 7 644 672 0,4 9 560 589 66 119 0,7

Mato Grosso do Sul 1780373 1780373 1,3 2078069 29805 1,4

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960/2000.


(1) Considerados os Estados de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Amapá e Tocantins. (2) Considerados os
Estados do Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas e Sergipe. (3) Conside-
radas os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo. (4) Consideradas os Estados de Santa Catarina e Rio Grande
do Sul. (5) Consideradas os Estados de Mato Grosso, Goiás e Distrito Federal. (6) Em 1960, foram realizados os
desmembramentos dos Estados de Mato Grosso e de Goiás, retirando-se os municípios que vieram a compor, res-
pectivamente, os Estados de Mato Grosso do Sul, criado em 1977, e de Tocantins, criado em 1988. (7) Em 1980, foi
realizado o desmembramento do Estado de Goiás.

Para a análise dos grupos populacionais, segundo as características escolhidas


(educação e renda), optou-se por desagregar a população nikkey segundo a situação
de domicílio e naturalidade. Para permitir uma comparação entre a população brasi-
leira como um todo, os japoneses (nascidos no Japão) e os descendentes de japoneses
(nikkeys), dividiu-se a população em grupos. Foram consideradas as seguintes clas-
ses, sumarizadas no Quadro 1.
60 Quadro 1 - Grupos considerados na análise, por descendência, situação do domicílio e
status migratório no Brasil
Kaizô Iwakami Beltrão, Sonoe Sugahara e Ryohei Konta

Grupos Descendência, situação do domicílio e status migratório


Japoneses indivíduos nascidos no Japão (também nikkeys)
nikkeys não-japoneses moradores cuja situação era urbana e
nikkeys imigrantes urbanos que nasceram em Unidade da Federação diferente daquela
na qual foram recenseados por ocasião do censo
nikkeys imigrantes soma dos nikkeys imigrantes urbanos e rurais
nikkeys cuja situação era urbana e que nasceram na mesma Unidade da
nikkeys urbanos não-migrantes
Federação na qual foram recenseados por ocasião do censo
todos os nikkeys soma dos nikkeys imigrantes e nikkeys não-imigrantes
nikkeys não-migrantes soma dos nikkeys urbanos não-migrantes e nikkeys rurais não-migrantes
nikkeys cuja situação era rural e que nasceram em Unidade da Federação
nikkeys imigrantes rurais
diferente daquela na qual foram recenseados por ocasião do censo
nikkeys cuja situação era rural e que nasceram na mesma Unidade da
nikkeys rurais não-migrantes
Federação na qual foram recenseados por ocasião do censo
população brasileira como um todo soma de todos os residentes no Brasil por ocasião do censo
população brasileira urbana soma de todos os residentes urbanos no Brasil por ocasião do censo
população brasileira rural soma de todos os residentes rurais no Brasil por ocasião do censo

Educação
A Tabela 2 apresenta o número médio pulação de nikkeys imigrantes urbanos.
de anos de estudo da população nikkey As populações nikkeys apresentam con-
segundo a situação de domicílio e status sistentemente mais escolaridade do que
migratório para os anos em estudo. O a população brasileira correspondente
Gráfico 3 apresenta as informações cor- na mesma situação de domicílio. Como
respondentes à distribuição dos anos de já mencionado, foi a população asiá-
estudo das populações, segundo a mes- tica que apresentou o maior ganho na
ma desagregação para, respectivamente, escolaridade no período, inclusive au-
os anos 1960, 1980, 1991 e 2000. mentando o hiato com os outros grupos
Para o ano 1960, não existe a opção de cor/raça (BELTRÃO, 2005). Como
de 16 e 17 anos de estudo. Observa-se o a distribuição foi calculada para a po-
padrão usual com respeito à situação de pulação com 5 anos ou mais de idade,
domicílio: as populações urbanas apre- pode existir um viés de composição etá-
sentam, em média, mais anos de estudo ria: nikkeys apresentam uma taxa de fe-
do que as suas contrapartes rurais. Nos cundidade mais baixa do que o resto da
anos 1960, 1991 e 2000, os nikkeys população e uma maior longevidade. A
urbanos não-imigrantes apresentam a população de nativos japoneses residen-
maior escolaridade, mas, no ano 1980, tes no Brasil, em 1960, apresenta uma
este grupo perde a primazia para a po- média de anos de estudo inferior à da
população urbana, revertendo-se a situa- parcialmente devido ao óbito dos mais 61
ção nos demais anos. Deve-se lembrar idosos). Cumpre notar que a população
que esta é, em média, uma população nikkey rural migrante ou não apresen-

Vivendo no Brasil
mais velha que as demais. Considerando- ta a pior situação de escolaridade entre
se o nível baixo da imigração japonesa os nikkeys e nos diversos censos: ora
depois de 1960, depreende-se que hou- se aproxima ora se afasta das caracte-
ve um aumento da escolaridade formal rísticas da população brasileira como
média destes imigrantes (ainda que um todo.

Gráfico 3 - Distribuição cumulativa da população de 5 anos ou mais de idade, por anos de estudo,
segundo a situação do domicílio e condição de migração - Brasil - 1960/2000
% 1960 % 1980
100 100
90 90
80 80
70 70
60 60
50 50
40 40
30 30
20 20
10 10
0 0
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20

%
1991 %
2000
100 100
90 90
80 80
70 70
60 60
50 50
40 40
30 30
20 20
10 10
0 0
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20

Nikkey urbano Nikkey imigrante urbano Nikkey rural Nikkey imigrante rural Nikkey não-migrante

Nikkey imigrante Todos nikkeys Japoneses Todos moradores urbanos Todos moradores rurais Todos moradores

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960/2000.


62 Tabela 2 - Média de anos de estudo dos grupos populacionais de 5 anos ou mais de idade,
segundo o status migratório e situação de domicílio - Brasil - 1960/2000
Média de anos de estudo Média de anos de estudo
Kaizô Iwakami Beltrão, Sonoe Sugahara e Ryohei Konta

Status migratório Status migratório


dos grupos populacionais dos grupos populacionais
e situação do e situação do
de 5 anos ou mais de de 5 anos ou mais de
domicílio domicílio
idade idade
1960 1980
Nikkeys urbanos não-migrantes 3,8 Nikkeys imigrantes urbanos 5,1
Nikkeys imigrantes urbanos 3,4 Japoneses 4,9
Nikkeys não-migrantes 3,2 Nikkeys imigrantes 4,8
Total de nikkeys 3,0 Nikkeys urbanos não-migrantes 4,0
Nikkeys imigrantes 2,8 Total de nikkeys 3,8
População urbana 2,7 Nikkeys não-migrantes 3,3
Japoneses 2,7 Nikkeys imigrantes rurais 3,3
Nikkeys rurais 2,7 População urbana 2,9
Nikkeys imigrantes rurais 2,2 População total 2,3
População total 1,7 Nikkeys rurais não-migrantes 1,4
População rural 0,8 População rural 1,1

Média de anos de estudo Média de anos de estudo


Status migratório Status migratório
dos grupos populacionais dos grupos populacionais
e situação do e situação do
de 5 anos ou mais de de 5 anos ou mais de
domicílio domicílio
idade idade

1991 2000
Nikkeys urbanos não-migrantes 7,0 Nikkeys urbanos não-migrantes 7,7
Nikkeys imigrantes urbanos 6,8 Nikkeys imigrantes urbanos 7,6
Nikkeys imigrantes 6,6 Nikkeys imigrantes 7,4
Total de nikkeys 6,6 Total de nikkeys 7,2
Nikkeys não-migrantes 6,6 Nikkeys não-migrantes 7,1
Japoneses 5,6 Japoneses 5,9
População urbana 4,8 População urbana 5,8
Nikkeys imigrantes rurais 4,2 População total 5,3
População total 4,2 Nikkeys imigrantes rurais 4,6
Nikkeys rurais não-migrantes 3,3 Nikkeys rurais não-migrantes 3,3
População rural 2,1 População rural 2,9
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960/2000.
Nota: Nesta tabulação, os nikkeys não incluem os japoneses natos, que estão listados em separado.
Distribuição Espacial 63
O Cartograma 1 mostra a distribuição dos nikkeys segun-
do dados dos Censos 1960, 1980, 1991 e 2000, com uma re-

Vivendo no Brasil
presentação do seu número através da cor da Unidade da Fe-
deração. São considerados cinco grupos: até 20 000; 20 000
a 50 000; 50 000 a 100 000; 100 000 a 200 000; e mais de
200 000 nikkeys. Observa-se que entre 1960 e 2000 os nikkeys,
antes concentrados em apenas dois estados (Paraná e São Pau-
lo), passam a se espalhar pelas diversas Unidades da Federação
em 2000.
Em 1960, apenas São Paulo e Paraná apresentavam presen-
ça expressiva de nikkeys, com clara predominância de São Pau-
lo, já que Paraná apresentava ainda cerca de 1/4 do número de
nikkeys de São Paulo (Cartograma 1 e Apêndice 2).
Em 1980, observa-se um crescimento da presença nikkey
em outras Unidades da Federação, notadamente, Paraná, Mi-
nas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia, Ceará, Maranhão e Pará.
Em 1991, observa-se o crescimento da presença nikkey em
Mato Grosso do Sul e uma diminuição da presença em algu-
mas Unidades da Federação quando comparadas com o ano
de 1980, embora além de São Paulo e Paraná (os mais repre-
sentativos), Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia permane-
çam com presença de nikkeys semelhante à de 1980. Em 2000,
observa-se que os nikkeys, antes bastante concentrados em al-
gumas poucas Unidades da Federação, espalham-se por diver-
sos estados brasileiros, com poucas exceções (Acre, Rondônia,
Roraima, Amapá, Tocantins, Santa Catarina, Espírito Santo,
Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte
e Maranhão).
O Cartograma 2 apresenta a distribuição da população
nascida no Japão e presente no Brasil por ocasião do Censo
1960. A população de indivíduos nascidos no Japão estava
concentrada quase que única e exclusivamente no Estado de
São Paulo, cujo contingente alcançava 64% desse total. Neste
ano, Paraná apresenta cerca de 4 mil japoneses e dois outros
estados (Pará e a região que viria a constituir o Mato Gros-
so do Sul) apresentavam mais de mil. Nove dos Estados da
Federação não apresentavam nenhum indivíduo nascido no
Japão. São Paulo apresentara uma concentração bem maior
de indivíduos nascidos no Japão nos censos anteriores: 87%,
em 1950, e 92%, em 1940.
64 Cartograma 1 - Distribuição da população nikkey no Brasil - 1960/2000

1960 1980
Kaizô Iwakami Beltrão, Sonoe Sugahara e Ryohei Konta

1 117
335

2 341 10 319

24 0
2 592 20 639 6 865
55 24 439
72

44
57 10 036
6 910 13 772
441 2 700
2 064 4 232 9 577
1 132 582 9 341 35 251 3 274

896 7 483
1 755 8 765
3 612 24 725
1 803
8 896 16 456
336
338 592 521 21 604
Até 20 000
81 205 7 274 104 921
20 000 a 50 000
5 392
1 261 50 000 a 100 000 10 822

100 000 a 200 000


200 000 a 700 000

1991 2000
2 102 1 815
614 3 403

11 618 4 238 26 613

34 2
16 434 39 353 8 408
14 7

13 054 26 998

35
03

5 949 9 046
4 502 18 671
1 021 4 633 30 537
6 620 13 475 8 428 9 269 9 713
3 465 5876
12 372 34 836 21 023 78 449 9 504
3 682
9 494 16 150
12 279 28 946
37 977 75 449
23 587 5 869 29 605 8 627
617 693
614 39 879 495 63 470
113 548 143 588
9 520 13 937
9 542 21 925

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960/2000.


Cartograma 2 - Distribuição da população japonesa no Brasil - 1960/2000 65

1960 1980

Vivendo no Brasil
1 117
36
71

72 815
1 222 3 020 52
51 113
53 50
34 75
10
169 220
700 322
91 13 8
58 353 9474
341 993 8

19 1 216
95 8 681
765
366 1 920
1 498 8 16 456
2 495 380
48 104 959
022 3 913
963 Até 1 000
4 039 15 729
1 000 a 2 000
434
591 2 000 a 5 000 1 297
10 822
5 000 a 50 000
50 000 a 150 000

1991 2000
40 21
41 36

481 550
1 703 1 790 141
170 39 58
85 62
7 20
17 21
10 42 243
154 167 129 37 8
9 6
595 558 418 685 18
23
875 840
318 467
1 225 1 069
250 1 363 56
1 695
63 766 51 372 1 801
1 808
9 960 7 974
386 497
1 062 1 064

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960/2000.


66 Fluxos Migratórios de nikkeys (não-naturais da contingentes de nativos japoneses, acima
Unidade da Federação onde residem) de 2 000 indivíduos. Ocorreram também
Para analisar os movimentos migrató- movimentos notáveis entre São Paulo e
Kaizô Iwakami Beltrão, Sonoe Sugahara e Ryohei Konta

rios da população nikkey, são apresenta- Minas Gerais e de São Paulo para o Rio
dos os fluxos migratórios no Brasil (Car- de Janeiro. No Nordeste, os Estados
tograma 3), com uma indicação na cor do Maranhão e da Bahia apresentaram
das Unidades da Federação com maior maiores contingentes de nikkeys não-
intensidade de imigrantes. Optamos por naturais.
uma estatística para a qual existe infor- O Censo 1991 já apontava para um
mação em todos os Censos de 1960 a maior espalhamento da população de
2000, qual seja, a Unidade da Federação nikkeys não-naturais, acrescentando aos
ou o país de nascimento. Para comple- contingentes anteriores, Mato Grosso e
mentar a informação, são apresentadas Pernambuco.
as direções dos principais fluxos (aque- Já em 2000, todas as Unidades da Fe-
les com mais de 2 mil indivíduos, desta- deração apresentavam contingentes im-
cando-se os com mais de 20 mil em linha portantes de nikkeys não-naturais. As
mais grossa). exceções foram a Paraíba, na Região Nor-
No Censo 1960, os contingentes de deste, e os antigos territórios federais na
não-naturais da Unidade da Federação Região Norte. Em todos os anos, as Uni-
envolvendo mais de 20 mil indivíduos fo- dades da Federação com maior intensida-
ram os de nativos japoneses nos Estados de de migrantes coincidem com aquelas
de São Paulo e Paraná e os de paulistas com maior população nikkey: São Paulo
no Paraná. Abaixo deste valor, mas ain- e Paraná. A Região Nordeste apresenta-
da acima de 2 000, temos contingentes se, com o tempo, com mais Unidades da
de nativos japoneses no Estado do Rio de Federação de origem nas migrações: em
Janeiro, de paulistas na região que cons- 1980, somente Pernambuco; em 1991,
tituiria mais tarde o Mato Grosso do Sul, acresce-se Bahia; e, em 2000, soma-se
e de paranaenses em São Paulo. Nas Re- ainda Ceará, Paraíba e Alagoas. A notar
giões Norte e Nordeste, o contingente de ainda, além da troca entre São Paulo e
nikkeys não-naturais era insignificante. Paraná (com fluxos declarados de mais
No Censo 1980, o Estado do Paraná de 20 mil indivíduos), outra Unidade da
já não apresentava um contingente tão Federação, o Rio de Janeiro, apresenta
importante. Outras duas novas Unida- trocas recíprocas de migrantes com São
des da Federação apresentaram também Paulo, ainda que de menor importância.
Cartograma 3 - Fluxos migratórios no Brasil - 1960/2000 67

Vivendo no Brasil
1960 1980


9 341



16 456 ∧
Até 1 000




∧ ∧
1 000 a 5 000


5 000 a 10 000
10 000 a 50 000
50 000 a 150 000

1991 2000





∧ ∧
∧ ∧∧ ∧∧

∧ ∧ ∧

∧ ∧∧




∧ ∧

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960/2000.


Nota: Não-naturais da Unidade da Federação.
68 Atividade
O Gráfico 4 apresenta, do lado esquerdo, a distribuição de grupos de atividades
econômicas dos brasileiros em geral (ver Apêndice 1 para a descrição dos grupos
Kaizô Iwakami Beltrão, Sonoe Sugahara e Ryohei Konta

agregados) e, do lado direito, a dos nikkeys.


Em 1960, um pouco mais da metade da força de trabalho brasileira e da força de
trabalho nikkey estava alocada na agricultura. O que se nota num primeiro movi-
mento é uma retração das atividades agrícolas e um crescimento das industriais com
uma concomitante expansão dos serviços. Num segundo momento, observa-se que
a atividade agrícola continua decrescendo, a de serviços continua em expansão, mas
a industrial começa a decair. No entanto, entre os nikkeys, a retração é bem menor
para as atividades agrícolas bem como a expansão dos serviços. O comércio, que
apresenta uma expansão para a população como um todo, mostra certa estabilidade
na participação entre os nikkeys. Fica então patente a especialização das atividades
da população nikkey: a agricultura e a indústria são campos privilegiados para os
nikkeys e o comércio e serviços não parecem uma vocação do grupo.

Gráfico 4 - Distribuição da população de brasileiros e de nikkeys no Brasil,


segundo a atividade - 1960/2000

2000 4 4 41 3 19 15 13 18 19 14 1 38 5 5

1991 0 4 39 5 18 19 14 24 22 13 2 35 5 0

1980 02 33 5 19 19 22 31 24 10 2 29 4 0

1960 21 20 1 14 8 54 54 12 7 1 21 32

100 80 60 40 20 0 20 40 60 80 100
Brasileiros Nikkeys

Agricultura Indústria Comércio Crédito, seguros...


Serviços Administração pública Outros

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960/2000.

Comentários e Conclusões
Ao longo destes 100 anos de presença japonesa no Brasil, observou-se que o pro-
cesso de migração foi intenso nos anos 1920 e 1930, acarretando um rápido cresci-
mento desta população. Com o advento da Segunda Guerra, houve uma queda no
fluxo migratório, seguido de um novo aumento na década de 1950, voltando a cair
desde então e, a partir do final da década de 1980, o fluxo de migrantes muda de di-
reção, com o “fenômeno dekassegui”.
Vemos que a população nikkey apre- As atividades a que se dedicam os 69
senta certas particularidades, pelo menos nikkeys parecem ter um perfil diferente
no que tange à educação. Observa-se o da população como um todo: houve uma

Vivendo no Brasil
padrão usual com respeito à situação de menor retração nas atividades agrícolas e
domicílio: as populações urbanas apre- uma maior expansão na área de serviços.
sentam, em média, mais anos de estudo O comércio, que apresenta uma expansão
do que as suas contrapartes rurais. Os para a população como um todo, mostra
imigrantes urbanos apresentaram a maior uma certa estabilidade na participação
escolaridade em 1960 e 2000 sendo que, entre os nikkeys. Observa-se, assim, uma
em 1991, o grupo de maior escolaridade certa especialização nas atividades da po-
foi o de nikkeys urbanos não-migrantes. pulação nikkey: a agricultura e a indús-
As populações nikkeys apresentam con- tria como campos privilegiados para os
sistentemente mais escolaridade do que a nikkeys e o comércio e o serviço não pare-
população brasileira como um todo. En- cem uma vocação do grupo.
tretanto, como a distribuição foi calcula-
da para a população com 5 anos ou mais
Referências
de idade, pode existir um viés de compo-
sição etária já que os nikkeys apresentam AZEVEDO, D. B. Brasileiros no exterior.
Brasília, DF: Câmara dos Deputados, [2005].
uma taxa de fecundidade mais baixa do Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/
que o resto da população. comissoes/credn/publicacao/Notatecnica
Esta população, originalmente con- Brasileiros Exterior.html>. Acesso em: 12 nov.
centrada em duas Unidades da Federação, 2005.
São Paulo e Paraná, está se expandindo BELTRÃO, K. I. Raça e fronteiras sociais:
para outras regiões, principalmente o lendo nas entrelinhas do centenário hiato de
Centro-Oeste. A distribuição dos japo- raças no Brasil. In: SOARES, S. et al (Org.).
Os mecanismos de discriminação racial nas
neses entre os diferentes estados mostra
escolas brasileiras. Brasília: IPEA; Rio de Ja-
uma concentração maior em algumas neiro: Ford Foundation, 2005.
áreas: os nikkeys encontram-se princi-
BELTRÃO, K. I.; NOVELLINO, M. S. F. Al-
palmente concentrados nos Estados de fabetização por raça e sexo no Brasil: evolu-
São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul. ção no período 1940-2000. Rio de Janeiro:
O Estado de Minas Gerais apresentava IBGE, 2002. (Textos para discussão. Escola
mais de 75 mil nikkeys no Censo 2000, Nacional de Ciências Estatísticas, n. 1). Dis-
mas uma proporção de 0,4% destes na ponível em: <http://www.ence.ibge.gov.br/
publicacoes/textos_para_discussao/textos/
população do estado. Entre 1960 e 2000, texto_1.pdf>. Acesso em: mar. 2008.
os nikkeys, antes concentrados em ape-
CENSO demográfico 2000. Rio de Janeiro:
nas dois estados (Paraná e São Paulo),
IBGE, 2003. Microdados. 1 CD-ROM.
passam a se espalhar pelas diversas Uni-
dades da Federação, com poucas exce- DEKASSEGUI: empreendedor e cidadão.
São Paulo: Serviço Brasileiro de Apoio às
ções (Acre, Rondônia, Roraima, Amapá, Micro e Pequenas Empresas em convênio de
Tocantins, Santa Catarina, Espírito San- cooperação com a Associação Brasileira de
to, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraí- Dekasseguis, 2004. 73 p. Pesquisa de cam-
ba, Rio Grande do Norte e Maranhão). po coordenada por Kaizô Iwakami Beltrão e
70 Sonoe Sugahara. Disponível em: <http://www. Apêndice 1 - Códigos das atividades definidas pelas variáveis V532 (fina-
biblioteca.sebrae.com.br/bds/bds.nsf/Dow lidade/ramo do negócio) no Censo 1980, V0347 (código de atividade) no
Contador?OpenAgent&unid=2DC78098A6 Censo 1991, e V4461 (código antigo da atividade) no Censo 2000
Kaizô Iwakami Beltrão, Sonoe Sugahara e Ryohei Konta

89A8CD03256EA9007B5748>. Acesso em:


mar. 2008. 0 – agricultura
agricultura, silvicultura e pecuária (códigos 011 a 029)
JAPAN STATISTICAL YEARBOOK 2005.
extração vegetal (códigos 031 a 037)
Tokyo: Statistical Research and Training
Institute, 2005. Disponível em: <http://www. pesca e piscicultura (códigos 041 e 042)
stat.go.jp/english/data/nenkan/index.htm>. extração mineral (códigos 050 a 059)
Acesso em: nov. 2005. 1 - indústria
KODAMA, K. O sol nascente do Brasil: um indústrias de transformação (códigos 100 a 300)
balanço da imigração japonesa. In: BRASIL: indústrias da construção (código 340)
500 anos de povoamento. Rio de Janeiro: 2 - comércio
IBGE, 2000. p. 197-213. comércio de mercadorias (códigos 410 a 424)
ROSSINI, R. E. O Brasil no Japão: a con- comércio e administração de imóveis e valores mobiliários (códigos 461 a 464)
quista do espaço dos nikkeis do Brasil no 3 - crédito, seguros e capitalização
Japão. In: ENCONTRO NACIONAL DE instituições de crédito, de seguros e de capitalização (códigos 1451 a 453)
ESTUDOS POPULACIONAIS, 14., 2004,
4 - serviços
Caxambu. Anais... Belo Horizonte: Asso-
ciação Brasileira de Estudos Populacionais, transportes (códigos 471 a 477)
2004. Disponível em: <http://www.abep. comunicações (códigos 481 e 482)
nepo.unicamp.br/site_eventos_abep/PDF/ serviços industriais de utilidade pública (códigos 351 a 354)
ABEP2004_279.pdf>. Acesso em: mar. 2008. serviços de alojamento e alimentação (códigos 511 e 512)
SAITO, H. (Org.). A presença japonesa serviços de reparação e conservação (códigos 521 a 525)
no Brasil. São Paulo: T.A. Queiroz: Edusp, serviços pessoais (códigos 531 a 533)
1980. (Coleção coroa vermelha, v. 1). Sim- serviços domiciliares (códigos 541 a 545)
pósio realizado na Casa de Cultura Japonesa,
serviços de diversões, radiodifusão e televisão (códigos 551 e 552)
Universidade de São Paulo.
serviços técnicos-profissionais (códigos 571 a 578)
SENDING money home: remittance to Latin serviços auxiliares das atividades econômicas (códigos 581 a 589)
America and the Caribbean. Washington,
serviços comunitários e sociais (exclusive médicos, odontológicos, veterinários e ensino) (códigos 610
D.C.: Inter-American Development Bank,
a 619)
2004. Disponível em: <http://idbdocs.iadb.org/
wsdocs/getdocument.aspx?docnum=547263>. serviços médicos, veterinários e odontológicos (códigos 621 a 624)
Acesso em: nov. 2005. ensino (códigos 631 e 632)
5 - administração pública
SHINDO, T. Passos da imigração japonesa
no Brasil. São Paulo: Associação Cultural e administração pública (códigos 711 a 717)
Recreativa Akita Kenjin do Brasil, 2005. defesa nacional e segurança pública (códigos 721 a 727)
6 - outros
WOORTMANN, E. F. Japoneses no Brasil/
brasileiros no Japão: tradição e modernida- organizações internacionais e representações estrangeiras (código 800)
de. Brasília, DF: Universidade de Brasília, atividades não compreendidas em outros ramos (código 901)
Departamento de Antropologia: 1995. (Sé- atividades mal-definidas (código 902)
rie Antropologia, n. 183). Disponível em: atividades sem correspondência na classificação Censo 2000 (código 999)
<http://www.unb.br/ics/dan/Serie183empdf. atividade não-declarada (código 903) no Censo 1991
pdf>. Acesso em: mar. 2008.
pessoas com menos de 10 anos ou que não trabalhou nos últimos 12 meses no Censo 1991
Apêndice 2 - População brasileira e nikkey, segundo as Unidades da Federação - 1960/2000 71
População
Unidades da
Brasileira Nikkey Brasileira Nikkey
Federação

Vivendo no Brasil
1960 1980
Brasil 69 957 864 448 312 119 011 052 979 407
Rondônia 69 769 - 491 025 2 064
Acre 158 084 - 301 276 2 700
Amazonas 706 124 2 341 1 430 528 10 319
Roraima 28 297 - 79 121 1 117
Pará 1 526 325 2 592 3 403 498 20 639
Amapá 67 560 - 175 258 335
Tocantins 350 257 - 739 049 4 232
Maranhão 2 466 148 - 3 996 444 24 439
Piauí 1 241 139 - 2 139 196 6 910
Ceará 3 291 004 55 5 288 429 24 044
Rio Grande do Norte 1 144 065 72 1 898 835 6 865
Paraíba 1 998 449 57 2 770 346 10 036
Pernambuco 4 088 773 441 6 143 503 13 772
Alagoas 1 256 338 - 1 982 915 9 577
Sergipe 751 652 4 1 140 379 3 274
Bahia 5 910 429 582 9 455 392 35 251
Minas Gerais 9 899 959 3 612 13 380 105 24 725
Espírito Santo 1 297 716 - 2 023 338 1 803
Rio de Janeiro 6 601 038 7 274 11 291 631 21 604
São Paulo 12 775 121 336 338 25 042 074 592 521
Paraná 4 259 610 81 205 7 629 849 104 921
Santa Catarina 2 116 737 - 3 628 292 5 392
Rio Grande do Sul 5 363 169 1 261 7 773 849 10 822
Mato Grosso do Sul 568 983 8 896 1 369 769 16 456
Mato Grosso 319 296 1 132 1 138 918 9 341
Goiás 1 562 098 1 755 3 121 125 8 765
Distrito Federal 139 724 696 1 176 908 7 483

População
Unidades da
Brasileira Nikkey Brasileira Nikkey
Federação
1991 2000
Brasil 146 815 791 1 033 848 169 988 064 1 435 490
Rondônia 1 133 266 6 620 1 380 952 8 428
Acre 417 098 1 021 557 882 4 633
Amazonas 2 102 776 11 618 2 817 253 26 613
Roraima 217 582 2 102 324 398 1 815
Pará 4 949 207 16 434 6 195 965 39 353
Amapá 289 039 614 477 032 3 403
Tocantins 918 395 3 465 1 157 690 9 269
Maranhão 4 929 681 13 054 5 657 553 26 998
Piauí 2 582 072 4 502 2 843 428 18 671
Ceará 6 366 115 14 703 7 431 597 34 235
Rio Grande do Norte 2 415 077 4 236 2 777 509 8 408
Paraíba 3 201 328 5 949 3 444 793 9 046
Pernambuco 7 127 947 13 475 7 929 154 30 537
Alagoas 2 512 665 5 826 2 827 856 9 713
Sergipe 1 491 876 3 682 1 784 829 9 504
Bahia 11 867 338 34 836 13 085 769 78 449
Minas Gerais 15 743 533 37 977 18 020 341 75 449
Espírito Santo 2 600 617 5 899 3 097 497 8 627
Rio de Janeiro 12 807 195 39 879 14 392 105 63 470
São Paulo 31 588 825 617 614 37 035 456 693 495
Paraná 8 448 623 113 548 9 564 642 143 588
Santa Catarina 4 542 032 9 520 5 357 863 13 937
Rio Grande do Sul 9 138 459 9 542 10 187 842 21 925
Mato Grosso do Sul 1 780 373 23 587 2 078 069 29 805
Mato Grosso 2 026 071 12 372 2 505 245 21 023
Goiás 4 017 507 12 279 5 004 198 28 946
Distrito Federal 1 601 094 9 494 2 051 146 16 150
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960/2000.
Nota: As populações de Mato Grosso do Sul e Tocantins foram reconstituídas a partir das informações dos municípios que, mais tarde, na criação
destas Unidades da Federação, passaram a fazer parte das mesmas.
Plantadores do futuro
japoneses em São Paulo na primeira metade do Século XX

Maria Silvia C. Beozzo Bassanezi


Oswaldo Mário SerraTruzzi

N
o presente ano 2008, quando se comemora o centenário da imigração japo-
nesa no Brasil, é curioso observar que uma saga de gerações, tão importante
na formação do povo paulista, começou com um ensaio, cujos resultados
não deram margens ao otimismo.

A titulo de ensaio, para tentar crear uma nova fonte de suprimento de braços á lavoura
cafeeira, celebrou-se, a 6 de novembro ultimo [1907], com a Companhia Imperial de Emi-
gração, com sede em Tókio, Japão, contracto para a introducção de 3.000 immigrantes
daquella procedência, por levas de 1.000, no máximo, em cada anno, a partir de 1908, e
[...] (SÃO PAULO, 1907, grifo dos autores).

Este trecho, extraído do Relatório da Secretaria dos Negócios da Agricultura, Co-


mércio e Obras Públicas do Estado de São Paulo, do ano 1907, expressa claramente
que o interesse pela imigração japonesa era suprir a lavoura cafeeira de trabalhado-
res, em um período em que os países europeus estavam dificultando a vinda de mão-
de-obra subsidiada para a cafeicultura paulista. O contrato aludido visava, também,
abrir diretamente o mercado japonês para o café brasileiro. Portanto, da perspectiva
do Brasil, as relações do governo paulista com o Japão iniciavam-se estreitamente
atreladas aos interesses da cafeicultura.
Da perspectiva do Japão, as reformas da era Meiji durante o último quartel do
Século XIX haviam impulsionado a abertura ao Ocidente, acompanhada da emi-
gração de japoneses aos Estados Unidos, sobretudo à Califórnia e ao Havaí. Quan-
do o volume crescente desse fluxo alertou as autoridades norte-americanas, estas
convenceram o governo japonês a assinar um “acordo de cavalheiros” que impu-
nha um regime de cotas à emigração, ao final do ano de 1907. A necessidade de
reduzir as tensões sociais geradas pela crise econômica pela qual passava o Japão
(que acabara de sair de uma guerra contra a Rússia), agravadas com o crescimento
74 populacional nas zonas rurais, levou
o governo japonês a se interessar pelo
Brasil como destino.
Maria Silvia C. Beozzo Bassanezi e Oswaldo Mário Serra Truzzi

Segundo aquele contrato de 1907, a


Companhia Imperial de Emigração deve-
ria transportar do Japão ao porto de
Santos, no Brasil, imigrantes japoneses
agricultores, constituídos em famílias,
compostas de três a dez pessoas aptas ao
trabalho. Esses podiam ser homens ou
mulheres e deviam ter entre 12 e 45 anos.
Devido à grande distância entre Brasil
e Japão, o preço das passagens era mais
elevado que aqueles pagos para imigran-
tes europeus. Portanto, ficou consigna-
do que uma parte das passagens dos
imigrantes japoneses (a parte que ultra-
passasse o máximo daquelas pagas aos
imigrantes europeus) ficaria a cargo dos
fazendeiros, com a faculdade de descon-
tar nos salários a importância restituída
ao Governo.
Embora o ensaio tivesse como foco
atender à cafeicultura, o contrato abria
espaço para a vinda de imigrantes estra-
nhos à profissão agrícola – como pedrei-
ros, carpinteiros, ferreiros e outros – des-
de que estes não excedessem 5% do total
de japoneses introduzidos no Estado de controle da adaptação desses imigrantes Casal de japoneses nos
São Paulo. Atendendo, também, à con- na terra receptora. jardins da Hospedaria de
Imigrantes, em São Paulo
veniência de evitar embaraços para a ad- Estabelecidas essas normas, em mea-
ministração, o contrato previa a criação dos de junho de 1908, deu entrada na
de núcleos coloniais destinados aos imi- Hospedaria de Imigrantes da capital
grantes japoneses que lograssem se tor- paulista a primeira leva de imigrantes
nar pequenos proprietários de terra. japoneses para o café, em número de
Para que o ensaio de imigração ja- 781. Destes, 767 foram alocados em seis
ponesa pudesse se fazer em condições grandes fazendas cafeeiras: a Companhia
satisfatórias, as autoridades paulistas Agrícola Fazenda Dumont (204); a São
acharam conveniente que os primei- Paulo Coffee Estates C. Ltda. (155); a
ros imigrantes a chegar se concentras- Companhia Agrícola Fazenda São Marti-
sem em poucas fazendas, a fim de que nho (99); e as propriedades do Dr. Godo-
a administração pública pudesse ter um fredo da Fonseca (170), de D. Albertina
Prado & Filhos (90) e do Dr. Francisco agricultores, mas na realidade muitos não 75
Antonio de Sousa Queiroz (49). exerciam esta atividade, e apenas cinco
Além desses enviados à cafeicultura, desses japoneses eram católicos. Naquele

Plantadores do futuro
cerca de 40 japoneses adentraram no Es- mesmo ano 1908, abandonaram esse es-
tado de São Paulo no ano 1908. O balan- tado, pelo porto de Santos, 30 japoneses
ço da Inspetoria de Imigração do porto (29 destinaram-se à Argentina e ao Uru-
de Santos, para esse ano, aponta a entra- guai e um aos Estados Unidos).
da total de 808 japoneses, dos quais 801 Não se adaptando às condições de vida
haviam embarcado no porto de Kobe; e trabalho encontradas nas fazendas, mui-
13 eram tidos como imigrantes espontâ- tos japoneses revoltaram-se, retirando-se
neos; 60 eram indivíduos sem família; e ou sendo expulsos das mesmas. Do total,
os restantes 748 compunham 169 uni- 282 voltaram à Hospedaria, para em se-
No decorrer do tempo, dades familiares. Essas tinham em média guida serem alocados em outras fazendas
o perfil da família de 4,4 pessoas e muitas delas incluíam pes- (108), na construção de estradas de ferro
imigrantes japoneses soas adultas sem laços de parentesco com (73) e em outras atividades não-agrícolas
mudou, tanto em função
das exigências contratuais, o chefe. Nesse conjunto, predominavam (101).
quanto da percepção de os homens (76,4%); a imensa maioria Esse primeiro ensaio de imigração
que quanto mais se pudes- possuía mais de 12 anos e era alfabeti- japonesa para o Estado de São Paulo,
se contar com a mão-de-
obra familiar, maior seria zada (98%). Pouco menos da metade portanto, frustrou as expectativas devi-
a possibilidade de sucesso eram casados (42,5%), 90,2% diziam-se do a uma série de fatores, vários deles
76 reconhecidos pelas próprias autorida- São Paulo cerca de 230 000 japoneses,
des da época: grande número de indiví- uma cifra correspondente a 8% de to-
duos não-agricultores entre os imigran- dos os imigrantes, entrados no Estado de
Maria Silvia C. Beozzo Bassanezi e Oswaldo Mário Serra Truzzi

tes, dificultando a adaptação; unidades São Paulo, nos anos entre 1878 e 1972
familiares que agregavam pessoas não (Gráfico 1).
aparentadas entre si; impossibilidade Entre 1926 e 1939, o total de passa-
de saldar a dívida relacionada às des- geiros de terceira classe – que de acor-
pesas de transporte em curto espaço de do com a Legislação Estadual, Decreto
tempo; chegada em momento em que a no 2.400, de 09 de julho de 1913, eram
colheita já estava adiantada, o que tor- considerados imigrantes – entrados no
nou o trabalho pouco rentável. Além porto de Santos foi de 400 651, dos
desses, outros obstáculos contribuíram quais 36,3% eram japoneses. Entre os
para o relativo fracasso inicial do pro- estrangeiros saídos pelo mesmo porto
jeto de empregar japoneses na lavoura (182 606), os japoneses representavam
cafeeeira: as diferenças de usos e costu- apenas 6,8% (desses, 9/10 destinaram-se
mes, língua e religião; a desinformação a portos estrangeiros, que incluíam não
sobre a realidade brasileira (que provo- só portos japoneses, mas também por-
cou decepções) e as más condições de tos dos países platinos). Nesse período,
alimentação e moradia encontradas em os japoneses foram os que alcançaram
muitas das fazendas. o maior grau de fixação no Brasil, entre
Embora o ensaio de imigração japo- os imigrantes, segundo as estatísticas do
nesa não tivesse alcançado os resultados Serviço de Imigração e Colonização, vin-
esperados, as negociações entre as autori- culado à Secretaria de Agricultura, In-
dades japonesas e as paulistas prossegui- dústria e Comércio, publicadas em 1941.
ram. O antigo contrato foi modificado
em 14 de novembro de 1908. As altera-
Gráfico 1 - Imigrantes entrados no Estado de São Paulo
ções referem-se à composição da unidade 1878-1972
familiar imigrante: quais parentes especi- 450 000

ficamente podiam fazer parte da mesma, 400 000


350 000
que ela devia ter pelo menos três pessoas
300 000
aptas para o trabalho entre 12 e 45 anos e 250 000
que teria de ser composta exclusivamente 200 000
de agricultores. Também facultava àque- 150 000
les, munidos de pecúlio, adquirir terras 100 000

em núcleos coloniais, sem passar pela fa- 50 000


0
zenda. Além disso, esse novo contrato al-

70 69
4
00 99

19 1909

30 29

19 1939
18 1894

05 04

19 1924

35 34
18 1889

50 49

19 1959
4

19 1944

55 54

2
1

20 9
4

19 196
88
88

97
91

91
9

9
9

9
8

terava, em relação ao anterior, preços de


-1

-1

-1
-1

-1

-1

-1
-1

-1
-1

-1

-1

-
-

-
-

-
-

-
60
90

65
82

95

25

40
85

45
78

10

15
19

19

19

19

19

19

19

19

passagens, fretes e prazos a serem cum- 19


18

18

18

pridos por ambas as partes. Total Japoneses

A partir de então, o fluxo, ano a ano, Fonte: LEVY, M. S. F. O papel da migração internacional na evolução da população brasileira (1872 a
avolumou-se. No período 1908 ao final 1972). Revista de Saúde Pública, São Paulo: Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo,
v. 8, p. 49-90, 1974. Suplemento. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issues&
dos anos 1960, chegaram ao Estado de pid=0034-8910&lng=en&nrm=isso>. Acesso em: mar. 2008.
Com os subsídios do governo japonês, destino inicial, a procuravam vindos da 77
a partir de 1925, e sob os efeitos da crise capital, do interior, ou dos países do Rio
econômica mundial no Japão, a imigra- da Prata, em busca de nova alternativa de

Plantadores do futuro
ção japonesa em direção ao Brasil chegou trabalho ou aguardando a oportunidade
ao seu auge nos anos entre 1929 e 1934. de deixar o País. Em 1918, por exemplo,
A partir de então, a política de cotas ado- desembarcaram, em Santos, 5 601 japo-
tada pelo governo brasileiro para a imi- neses e, na Hospedaria, deram entrada
gração ocasionou uma diminuição signi- 7 300 desses imigrantes. Esta diferença
ficativa na entrada de japoneses no Brasil. deve-se aos chegados anteriormente e que
De fato, a princípio relativamente tí- retornavam à Hospedaria em busca de
mida, a chegada de japoneses se fortaleceu um novo destino. Em 1929, desembarca-
nos dez anos compreendidos entre 1926 ram 11 176, dos quais 316 seguiram seu
e 1935, abrindo uma agenda inflamada destino sem passar pela Hospedaria.
de debates a respeito tanto da capacida- No decorrer do tempo, o perfil da fa-
de do grupo de se assimilar à sociedade mília japonesa imigrante foi mudando,
brasileira quanto ao “perigo amarelo” re- em função das novas exigências con-
presentado pelos súditos de um país cuja tratuais que delimitavam a sua compo-
política exterior tomava tons imperialis- sição e, também, devido à percepção de
tas. As pressões reverberaram na Assem- que quanto mais se pudesse contar com
bléia Constituinte de 1934 que, ao adotar a mão-de-obra familiar, a possibilidade
um regime de cotas, limitou severamente de sucesso seria maior. As famílias torna-
as entradas a 2 850 indivíduos por ano, ram-se maiores, a maioria delas deixou
quando a entrada no ano anterior havia de incluir pessoas sem vínculo de paren-
sido de quase 25 mil. Há um consenso tesco e as crianças menores de 12 anos
na literatura de que os japoneses, mesmo passaram a representar 1/3 da unidade
sendo um grupo de vocação nitidamente familiar. A inclusão de outros parentes
rural (orientação da política migratória ao núcleo casal e filhos, de certa forma,
que permaneceu privilegiada no governo ajudou a ampliar a capacidade de traba-
Vargas), foram os mais penalizados pelas lho e de adaptação à nova terra.
medidas restritivas adotadas pela Consti- Algumas pistas apontam para o fato
tuinte. Além disso, o número de saídas de de as famílias japonesas no Brasil terem
japoneses pelo porto de Santos aumentou passado a ser mais prolíferas que aquelas
entre 1934 e 1939, o mesmo não acon- que permaneceram no Japão. Pesquisas
tecendo com os imigrantes de outras na- realizadas com mulheres de origem ja-
cionalidades nesse período, chegados há ponesa no Brasil, nos anos 1952-1953,
mais tempo que os japoneses. revelaram que estas possuíam em média
Nem todos os imigrantes de terceira mais filhos que aquelas que habitavam
classe desembarcados no porto de Santos o Japão rural no período (SAITO, 1961,
seguiam para a Hospedaria de Imigran- p. 87). Os dados relativos a taxas de fe-
tes na capital paulista, embora a maioria cundidade por cor, obtidos no Censo De-
o fizesse. Além disso, a Hospedaria rece- mográfico 1950, nos levam a crer nesta
bia aqueles que, não se adaptando ao seu afirmação, ao indicarem uma reprodução
78 consideravelmente mais elevada do seg-
mento denominado cor amarela, onde se
inseriam os japoneses. No total da popu-
Maria Silvia C. Beozzo Bassanezi e Oswaldo Mário Serra Truzzi

lação (assim como para os grupos de cor


branca, preta e mulata), tais taxas eram
menores (FUGII; SMITH, 1959, p. 23).
Provavelmente, as mulheres japonesas
no Brasil estariam se casando mais e em
idades mais jovens que no Japão, o que
ampliava a possibilidade de gerar mais
filhos. Este pode ter sido um mecanismo
utilizado pelo grupo no enfrentamento às
condições da nova terra, que por sua vez
não colocava obstáculos às uniões conju-
gais mais precoces. A oferta de trabalho
e o acesso ou posse da terra, gratuita ou
a preços baixos, nas áreas rurais, teriam
facilitado a adoção daquele padrão de
casamento, ampliando as taxas de fecun-
didade nas primeiras décadas de Brasil.
Em relação às principais correntes imi-
gratórias – a italiana, a portuguesa, a es-
panhola e a alemã – a japonesa destacou-
se também por ser a última a chegar, ser a
de mais curta duração e a que apresentou
maior índice de fixação em solo paulista.
Além da longa distância entre Brasil e Ja-
pão, o que dificultava o retorno na época,
o incentivo e o subsídio para emigração,
fornecidos pelo próprio governo japonês,
a partir de 1925, favoreceram enorme-
mente o deslocamento do Japão e a fixa- Possivelmente, para
ção no Brasil. Em 1932, o Estado japo- enfrentar as condi-
nês chegou a conceder, além da passagem ções encontradas na
nova terra, as famí-
marítima, uma ajuda de 50 yens por emi- lias japonesas no
grante (SAITO, 1961, p. 68). O governo Brasil passaram a
japonês procurou igualmente proteger os ser mais prolífe-
ras do que as que
emigrantes na nova terra, dando supor- permaneceram
tes técnico e econômico. Certamente, as no Japão
associações, as escolas e as cooperativas
agrícolas, fundadas pelos japoneses, aju-
daram a estreitar as relações dentro da
colônia, muitas vezes reproduzindo a organização social de suas antigas aldeias, e, des- 79
sa forma, colaborando para essa fixação. Nesta direção, contribuíram também o de-
senrolar da crise de 1929 e da Segunda Guerra Mundial no Japão.

Plantadores do futuro
Entre os principais grupos imigratórios, no período compreendido entre 1908 e
1941, os japoneses sobressaíram-se pela proporção de alfabetizados (72,9%), ape-
nas superada pelos alemães. Isto lhes possibilitou, diferentemente de outros grupos
que possuíam maior índice de analfabetismo, ler mais jornais, ter acesso a manuais
técnicos, freqüentar cursos necessários ao desempenho das cooperativas, estudar e,
provavelmente, ficarem mais coesos.
Desde os primeiros tempos, o Estado de São Paulo abrigou no mínimo 3/4 de to-
dos os japoneses vivendo em Território Nacional, sendo que em 1940 esta concentra-
ção chegou a ultrapassar os 90%. Já no conjunto dos estrangeiros fixados neste es-
tado, os japoneses, que em 1920 representavam apenas cerca de 3% dos imigrantes,
nas décadas seguintes foram ampliando sua participação, não chegando, no entanto,
a ultrapassar os 17,4% do total de estrangeiros vivendo nesse estado.

Tabela 1 - População japonesa no Estado de São Paulo


1920/1950
Total Percentual de japoneses (%)
Ano No conjunto dos estrangeiros No conjunto dos japoneses
Total Homens Mulheres
no Estado no País
1920 24 435 14 167 10 268 2,9 87,3
1934 131 709 - - 14,1 -
Entre os principais gru- 1940 128 957 70 594 58 363 16,9 91,7
pos de imigrantes, os 1950 105 311 57 284 48 027 16,8 84,4
japoneses sobressaíram-
se pela proporção de Fontes: IBGE, Censo Demográfico 1920/1950; São Paulo. Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Indús-
alfabetizados: 72,9% tria e Comércio e Secretaria de Estado dos Negócios da Educação e Saúde Pública, Recenseamento Demográfico,
Escolar e Agrícola-Zootécnico do Estado de São Paulo 1934.
80 Embora homens em idade produti-
va e reprodutiva predominassem entre Entre os imigrantes
os imigrantes japoneses, no decorrer do japoneses, predominavam
Maria Silvia C. Beozzo Bassanezi e Oswaldo Mário Serra Truzzi

homens em idade produ-


tempo a proporção de mulheres em re- tiva e reprodutiva. Mas,
lação aos homens aumentou, em virtude no decorrer do tempo, a
de uma maior entrada de mulheres com- proporção de mulheres em
relação aos homens au-
pondo unidades familiares e, muito pro- mentou, o que ampliou a
vavelmente, de uma mortalidade mascu- possibilidade de casamen-
lina maior (em 1920 havia 138 homens tos endogâmicos
para cada 100 mulheres japonesas; em
1950, 117 homens para cada 100 mu-
lheres). Esta circunstância certamente
ampliou a possibilidade de casamentos
endogâmicos, e, por conseguinte, refor-
çou a manutenção da língua falada, usos,
costumes e tradições próprias ao grupo.

Gráfico 2 - População ja ponesa no Estado


de São Paulo, por grupos de idade,
segundo o sexo - 1940/1950
1940
80 e mais A população de origem japonesa, em
70 a 79 São Paulo, ampliou-se muito no decorrer
60 a 69 Homem Mulher do tempo. Em 1958, já contava com mais
50 a 59
de 400 mil pessoas. No entanto, o segmen-
40 a 49
30 a 39 to dos nascidos no Japão envelheceu, de-
20 a 29 vido ao arrefecimento da imigração, resul-
10 a 19 tado das restrições impostas pelo governo
0a9
brasileiro, como a política de cotas e, tam-
0,25 0,15 0,05 0,00 0,05 0,15 0,25 bém, da Segunda Guerra Mundial. Em
1950, crianças nascidas no Japão já eram
1950 pouco numerosas no Estado de São Paulo;
80 e mais aquelas existentes em 1940 já haviam cres-
70 a 79 cido ou engrossado as estatísticas de óbitos
60 a 69 Homem Mulher
50 a 59
(Gráfico 2).
40 a 49 Como os demais imigrantes e mesmo
30 a 39 brasileiros natos, os japoneses na terra do
20 a 29 café não ficaram imunes às doenças en-
10 a 19
dêmicas e epidêmicas. Mesmo nas fazen-
0a9
das e em alguns núcleos coloniais, onde
0,25 0,15 0,05 0,00 0,05 0,15 0,25
às vezes se podia contar com assistência
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1940/1950. médica, o imigrante não desfrutou de
condições favoráveis de saúde. Nas zo- Instalados inicialmente nas fazendas 81
nas pioneiras, a situação era ainda pior. de café, os japoneses rapidamente tra-
Nos anos 1920, várias regiões foram in- taram de acumular um pecúlio que lhes

Plantadores do futuro
festadas pela malária, fazendo muitas possibilitasse, individualmente ou em as-
vítimas, inclusive fatais. No caso dos ja- sociação com seus conterrâneos, adquirir
poneses, por necessidade ocupacional, o alguma propriedade. Muitos chegaram à
padrão era construir a moradia em locais condição de proprietário fazendo antes
próximos às várzeas ou às correntezas de serviços de empreitada ou trabalhando
água, o que favorecia o contágio (SAITO, como meeiros. Alguns, munidos de recur-
1961, p. 81). Mas, não foi só a malária a sos, o fizeram assim que chegavam do Ja-
ceifar vidas japonesas. A tuberculose foi pão e sem passar pela fazenda de café.
uma das principais causas de morte en- As primeiras iniciativas para a aquisi-
tre os japoneses, chegando a atingir, em ção da pequena propriedade começaram
determinados anos, cerca de 30% dos a ocorrer logo após a chegada dos primei-
óbitos anuais, principalmente nas áreas ros japoneses. Em 08 de março de 1912, a
urbanas, como as cidades de São Paulo e companhia Kagai Kabushiki Kaisha assi-
Santos. Àquelas e à subnutrição, aliada à nou com o governo paulista um contrato
mudança de regime alimentar a que mui- para a colonização japonesa, no litoral sul
tos foram submetidos, somavam-se ou- paulista, na região de Registro. Os lotes de
tras doenças do aparelho respiratório, o terra desse núcleo começaram a ser ocu-
tracoma, a leishmaniose, a verminose e a pados a partir de 1916 por imigrantes que
amebíase, debilitando a saúde de muitos já estavam no Brasil, e já no ano seguinte
imigrantes japoneses. O enfrentamento também por aqueles vindos diretamente
das novas condições de vida e trabalho do Japão para este núcleo. Também, nessa
também conduziu muitos desses imigran- segunda década do Século XX, outros nú-
tes às doenças mentais e ao alcoolismo. cleos coloniais, iniciativas de companhias

Instalados inicialmente nas fazendas de café, os japoneses


rapidamente trataram de adquirir propriedades. Muitos
chegaram à condição de proprietários, trabalhando como
meeiros
82 de colonização ou dos próprios imigrantes Quatá, na Alta Sorocabana; além de São
em torno de um líder, foram sendo criados, Simão, vizinho a Ribeirão Preto, e Mogi
não só no litoral ao longo da linha férrea das Cruzes, próximo a São Paulo. Nos
Maria Silvia C. Beozzo Bassanezi e Oswaldo Mário Serra Truzzi

Santos-Juquiá, mas também no interior: cinco primeiros municípios citados, os ja-


nas chamadas áreas de boca de sertão, no poneses detinham uma hegemonia absolu-
novo Oeste Paulista, na região da Noroes- ta, constituindo mais de 60% dos estran-
te e na Alta Sorocabana e nos arredores geiros presentes e, dessa forma, marcaram
da capital paulista. Nessas áreas, muitos a vida sociocultural, econômica e política
japoneses também compraram terras di- dessas regiões.
retamente de particulares. Eram, em geral, municípios situados
Foi assim que os japoneses adquiriram mais a oeste do estado, pertencentes às
e preservaram por muito tempo um per- regiões que nos anos 1920 foram chama-
fil predominantemente rural. Em 1934, das de novas áreas da expansão cafeeira,
dos mais de 130 mil japoneses presentes em contraste com a região da Mogiana
no estado, mais de 90% habitavam áreas e da Paulista, mais antigas. Nesses anos,
rurais. Entre os municípios que contavam aquelas regiões tenderam a abrigar um
com mais de 5 mil estrangeiros, eles cons- maior número de propriedades rurais
tituíam o grupo predominante em uma nas mãos de estrangeiros, tendência que
dúzia deles: Araçatuba, Marília, Lins, Ca- se acentuaria após a crise da cafeicultura
felândia, Promissão, Birigüi e Bauru, ser- dos anos 1930. Em 1934, por exemplo,
vidos pela Estrada de Ferro Noroeste; Pre- os japoneses, chegados há relativamen-
sidente Prudente, Presidente Wenceslau e te pouco tempo, já detinham 5,1% do

Cartograma 1 - População japonesa no Estado de São Paulo - 1934

População japonesa
0
1 a 391
401 a 981
1 002 a 1 904
2 034 a 4 563
5 262 a 10 418
13 454 a 13 686

N
W E
S

Fonte: São Paulo. Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio e Secretaria de Estado
dos Negócios da Educação e Saúde Pública, Recenseamento Demográfico, Escolar e Agrícola-Zootécnico do
Estado de São Paulo 1934.
número de estabelecimentos agrícolas do valor daquelas pertencentes a estrangei- 83
estado, embora estes representassem, em ros (Gráficos 3, 4 e 5).
termos de área e valor, 2,8% das proprie- As propriedades de terras perten-

Plantadores do futuro
dades. No conjunto dos estrangeiros, os centes aos japoneses não eram grandes,
japoneses detinham 16,8% das proprie- eram inclusive menores que as dos imi-
dades, cuja área e valor representavam, grantes das principais correntes. Em
respectivamente, 8,9% e 8,3%. Quatro 1934, quase 30% das terras de japone-
anos depois, em 1938, estas cifras já es- ses possuíam menos de cinco alqueires1;
tavam ampliadas para: 18,9% das pro- 44% de 5 a 10 alqueires; e 21% entre
priedades, 11,2% da área e 12,1% do 10 a 25 alqueires, ou seja, cerca de 95%

Gráfico 3 - Propriedades agrícolas, área e valor das propriedades agrícolas, segundo


a nacionalidade dos proprietários no Estado de São Paulo - período 1933-1934

Propriedades agrícolas Área das propriedades agrícolas (alqueires)


4,3% 4,7%
1,1% 3,1%
7,0% 11,1%
17,4% 17,6%

14,2%

13,1%

16,8% 40,2%
40,5% 8,9%

Volor das propriedades agrícolas (1 000 réis) Alemães Japoneses

Espanhóis Portugueses
4,0% 2,2%
Italianos Outros
12,2% 13,5%
Nacionalidade não declarada

14,3% Fonte: São Paulo. Secretaria de Estado dos Negócios


da Agricultura, Indústria e Comércio e Secretaria de
Estado dos Negócios da Educação e Saúde Pública,
Recenseamento Demográfico, Escolar e Agrícola-Zoo-
técnico do Estado de São Paulo 1934.
Notas: 1. Ano agrícola de 1933-1934.
8,3% 2. Um alqueire paulista equivale a 24 200 m2.
45,6%

1
Um alqueire paulista equivale a 24 200m2 .
84 das propriedades em mãos japonesas ti- Em 1934, dos quase 11 mil japoneses
nham menos de 25 alqueires. que habitavam áreas urbanas, 4 563 re-
Das 13 945 propriedades de japone- sidiam na capital do estado. Aí se con-
Maria Silvia C. Beozzo Bassanezi e Oswaldo Mário Serra Truzzi

ses naquele ano, apenas 4 602 produziam centraram inicialmente junto à Rua Con-
café, ou seja, aproximadamente 1/3, onde de de Sarzedas, próximo ao centro e ao
estavam plantados 53 308 245 cafeeiros consulado do Japão, numa região de
que produziram 2 746 304 arrobas de café. aluguéis baratos que aos poucos nucleou
Essas propriedades cafeeiras de japoneses o bairro japonês da Liberdade, com seus
representavam 11,8% das propriedades negócios, associações e uma vida cultu-
cafeeiras em mãos estrangeiras. Bem pou- ral própria, centrada na colônia (LONE,
cas dessas fazendas cafeeiras de japoneses 2001, p. 84 e seguintes).
ficavam nas áreas velhas do café, mais de Alguns anos antes, por exemplo em
90% delas concentravam-se nas zonas da 1928, as estatísticas demógrafo-sanitá-
Noroeste e Alta Sorocabana. rias registraram que das 111 mães e
Nas demais propriedades, planta- 115 pais japoneses que geraram filhos na
vam algodão, arroz, feijão, milho, ba- capital, 108 o fizeram entre si, um forte
tata, chá e banana, contribuindo, dessa indicativo da altíssima sociabilidade en-
forma, para alterar o perfil da produção dógena à colônia. Tanto na capital, como
agrícola da época. Nas áreas ao redor da no interior ou no litoral, as uniões conju-
capital e das grandes cidades, conheci- gais davam-se preferencialmente dentro
das por cinturão verde, os japoneses des- do grupo japonês. Os raros casamentos
tacaram-se como hortifrutigranjeiros, interétnicos, na sua maioria, ocorriam
suprindo a demanda crescente por es- entre homens japoneses e mulheres bra-
ses produtos e ampliando a dieta da sileiras. Tal padrão endogâmico prova-
população paulista (SAKURAI, 2007, velmente refletia tanto as preferências
p. 248-250). conjugais do próprio grupo quanto as

Em 1934, cerca de
1/3 das propriedades
japonesas produziam
café. As demais pro-
duziam outros pro-
dutos como algodão,
arroz, milho, batata
e chá, contribuindo
para alterar o perfil
da produção agrícola
da época
85

Plantadores do futuro
Trabalhadores podando restrições da sociedade mais ampla: ao final dos anos 1940,
o chá uma pesquisa levada a cabo entre jovens universitários em São
Paulo revelou que apenas 23% admitiam um japonês como
parente pelo casamento (MARTUSCELLI , 1950).
Ao final dos anos 1930, Milliet (1939, p. 109) notou que
muitas famílias japonesas permaneciam dedicadas a atividades
agrícolas, mas eram atraídas pelo mercado consumidor da ca-
pital: “uma intensa imigração japonesa vem se concentrando
nos municípios vizinhos de São Paulo, imigração de elementos
ativíssimos que não desprezam as terras más da redondeza”.
Ao longo dos anos, o número de pessoas envolvidas em ati-
vidades não-agrícolas aumentou. Em 1920, 96% dos japoneses
estavam na agricultura, em 1940 eles continuavam vivendo nas
áreas rurais, mas numa proporção um pouco menor (87%). No
comércio e serviços, estavam 5,5%, e 3,0% deles eram artesãos.
Na capital paulista, muitos japoneses tornaram-se carpinteiros,
Entre os japoneses, a mobilidade geográfica ferreiros, pintores, serralheiros, jardineiros, sapateiros, criados,
tomou, principalmente, a direção rural-rural. etc. Em Santos, empregavam-se como estivadores e trabalhado-
Outra direção, rural-urbana, em menor escala, res da estrada de ferro, principalmente (SAITO, 1961, p. 109).
privilegiou o Município de São Paulo, diversi-
ficando o leque ocupacional dos japoneses no A intensa mobilidade espacial da população, que caracteri-
estado zou o Estado de São Paulo na primeira metade do Século XX,
86 também atingiu os japoneses. Sempre à origens e tradições étnicas. Na verdade, os
procura de trabalho que lhes proporcio- japoneses, além de constituírem uma imi-
nasse melhor retorno financeiro, os japo- gração mais recente, eram portadores de
Maria Silvia C. Beozzo Bassanezi e Oswaldo Mário Serra Truzzi

neses transferiam-se com freqüência de uma cultura bastante distinta da nacional,


locais e ocupações. Esse movimento, em de uma língua e religião muito diferentes,
um primeiro momento, tomou princi- que inibiram, a princípio, a integração da
palmente a direção rural-rural: partindo primeira geração aqui chegada.
do interior do estado, irradiou-se para No entanto, apesar dos transtornos
as frentes pioneiras não só nesse estado, gerados pelas políticas de nacionalização,
mas também para os estados vizinhos. a entrada do Japão na Segunda Guerra
Em 1950, o Estado de São Paulo respon- Mundial e o desfecho do conflito acaba-
dia por 84,1% dos japoneses no Brasil e ram por refletir fortemente na decisão dos
o Paraná por 11,9%, totalizando ambos japoneses de permanecer no Brasil. Em
96% (FUGII; SMITH, 1959, p. 19). 1953, a imigração japonesa em direção
Outro movimento, em menor esca- ao Brasil, arrefecida durante a Segunda
la, seguiu a direção rural-urbana e, nes- Guerra Mundial, é retomada, mas não
te caso, privilegiou o Município de São mais nos níveis anteriores. A partir da
Paulo, principalmente a partir de 1939, segunda metade dos anos 1960, a imi-
diversificando ainda mais o leque ocupa- gração agrícola reduziu-se rapidamente,
cional dos japoneses no estado. elevando-se a procura de imigrantes para
Em 1940, quando a política de nacio- o setor industrial. Mas essa imigração
nalização do Estado Novo preocupava- para a indústria limitou-se a um pequeno
se em acompanhar de perto e intervir no número de pessoas, especialmente de tra-
processo de assimilação dos diferentes balhadores qualificados.
grupos de estrangeiros no País, os japo- O balanço do primeiro meio século da
neses chamaram a atenção por dois mo- imigração japonesa em São Paulo eviden-
tivos. Em primeiro lugar, no conjunto dos cia a trajetória de um grupo que, embora
estrangeiros, os japoneses eram os que chegando tardiamente em relação a outros
mais ainda praticavam sua língua natal. imigrantes e enfrentando, desde o início,
Em outros termos, 85% dos nascidos no evidentes desconfianças em relação a sua
Japão não falavam a Língua Portuguesa adaptação à nova terra, acabou obtendo,
habitualmente em seus lares. Esta porcen- mesmo assim, um sucesso muito expressi-
tagem decaiu muito pouco, uma década vo como dedicados agricultores. O ensaio
depois, quando o Censo 1950 se realizou. enraizou-se e vicejou. A partir de então, o
Além disso, apesar de as taxas de natura- terreno estava preparado para que muitas
lização entre estrangeiros em São Paulo já famílias japonesas colhessem outro tipo
se mostrarem ínfimas (menos de 7%), os de fruto, o da mobilidade social, quando
japoneses constituíam, em 1940, o grupo nisseis2 e sanseis3 passaram a apinhar os
que menos se naturalizou (2,5% dos ja- bancos das universidades paulistas.
poneses se naturalizaram e estes represen-
tavam 6,3% dos brasileiros naturalizados), 2 Filho de imigrante japonês nascido no Brasil.
provavelmente compromissados com suas 3 Neto de imigrante japonês nascido no Brasil.
Referências 87
FUGII, Y.; SMITH, T. L. The acculturation of the Japanese
immigrants in Brazil. Gainesville: University of Florida, 1959.

Plantadores do futuro
(Latin American monographs, 8).
LEVY, M. S. F. O papel da migração internacional na evolução da
população brasileira (1872 a 1972). Revista de Saúde Pública, São
Paulo: Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, v. 8,
p. 49-90, 1974. Suplemento. Disponível em: <http://www. scielo.br/
scielo.php?script=sci_issues&pid=0034-8910&lng=en&nrm=isso>.
Acesso em: mar. 2008.
LONE, S. The Japanese community in Brazil, 1908-1940: between
samurai and carnival. Houndmills, Basingstoke, Hampshire; New
York: Palgrave, 2001.
MARTUSCELLI, C. Uma pesquisa sobre aceitação de grupos nacio-
nais, grupos ‘raciais’ e grupos regionais em São Paulo. Boletim da Fa-
culdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo.
Psicologia, São Paulo, v. 69, n. 3, p. 55-73, 1950.
MILLIET, S. Roteiro do café e outros ensaios: contribuição para
o estudo da historia econômica e social do Brasil. São Paulo: [De-
partamento de Cultura], 1939. (Coleção Departamento de Cultura,
v. XXV).
SAITO, H. O japonês no Brasil: estudo de mobilidade e fixação. São
Paulo: Sociologia e Política, 1961.
SAKURAI, C. Os japoneses. São Paulo: Contexto, 2007.
SÃO PAULO. Secretaria da Agricultura, Indústria e Comércio. Bo-
letim do Serviço de Imigração e Colonização. São Paulo, n. 3, mar.
1941.
______. Secretaria da Agricultura, Industria e Commércio. Estatistica
agricola e zootechnica organizada pela Directoria de Estatistica,
Industria e Commercio. São Paulo, 1931-1938.
______. Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Indústria
e Comércio, Secretaria de Estado dos Negócios da Educação e Saúde
Pública. Comissão Central do Recenseamento. Recenseamento De-
mográfico, Escolar e Agrícola-Zootécnico do Estado de São Paulo
(20 de setembro de 1934). São Paulo, 1936.
______. Secretaria dos Negocios da Agricultura, Commercio e
Obras Publicas do Estado de São Paulo. Relatório apre-
sentado ao (...) presidente do Estado pelo (...). Secretario
da Agricultura. São Paulo, 1907-1926.
______. Secretaria dos Negócios da Agricultura, In-
dustria e Commercio do Estado de São Paulo. Rela-
tório apresentado ao (...), Presidente do Estado pelo
(...), Secretario da Agricultura, Industria e Commer-
cio. São Paulo, 1927-1930 e 1940 a 1943 e 1946.
Parte 3 |
Dois exemplos de colonização japonesa
no Brasil: Paraná e Rio de Janeiro
Da terra do sol nascente às terras férteis
do Paraná
territorialização e organização social de nikkeys

Alice Yatiyo Asari


Ruth YoukoTsukamoto

U
m olhar atento para as pessoas que circulam pelas principais ruas de ci-
dades norte-paranaenses permite-nos deduzir que esta região foi alvo de
deslocamentos populacionais de diversas etnias. São decorrentes das mi-
grações externas e internas que possibilitaram a convivência de pessoas, de cultu-
ras, costumes heterogêneos que se dedicaram à construção de um novo território,
de um novo mundo.
Dentre os grupos de imigrantes estrangeiros que vieram para o Paraná, os japo-
neses tiveram papel de destaque. Diferentemente dos demais que aqui chegaram em
início e meados do Século XIX (alemães, poloneses, ucranianos, italianos, dentre
outros), eles se estabeleceram no início do Século XX. Fazem parte, pois, da história
recente da colonização do Norte do Paraná, região cujo recorte espacial considera
como limite sul o paralelo 24. A importância desses imigrantes não se restringe aos
pioneiros que aqui chegaram há 100 anos, mas se estende até aos dias de hoje e, por
isto, serão aqui denominados nikkeys, pois trata-se de um termo mais abrangente
para designar tanto os nascidos no Japão quanto os nascidos no Brasil.
A história dos nikkeys abrange um leque amplo de experiências, sejam as referen-
tes à sua trajetória de vida como imigrantes, sejam as relativas às dificuldades viven-
ciadas, ou às atividades exercidas. Abrange, também, a sua experiência em projetos
de colonização e a sua contribuição para a sociedade brasileira em variados aspectos,
em especial para a atividade agrícola, ou para o desenvolvimento de práticas associa-
tivas, que foram estratégicas para a adaptação tanto no trabalho quanto na comuni-
dade que os recebeu.
O Guia da colônia japonesa do sul do Paraná (RIZABURO apud ANDRADE,
1975) informa que alguns japoneses começaram lentamente a se fixar no Paraná des-
de 1909, em locais como Curitiba, Paranaguá e no Norte Novo. Os que se dirigiram
para o Norte Novo tinham como destino as fazendas de café e trabalhavam como
mascates, artesãos, quitandeiros, marceneiros, enquanto os outros implantaram a
92 Colônia Kakatsu, em Guaraqueçaba, dedicando-se à planta-
ção de banana, cana-de-açúcar, verduras e legumes. Na década
de 1930, vários empreendimentos na área rural começaram a
Alice Yatiyo Asari e Ruth Youko Tsukamoto

ser implantados no Paraná, a exemplo da Colônia Nova Tó-


quio, da Colônia Corte Grande, em Ibaiti, e da Colônia Al-
vorada, em Ponta Grossa. Há relatos de empreendimentos na
zona urbana, como a Sociedade Pesqueira Ltda., sediada em
Paranaguá. Em 1915, instalou-se em Cambará a Vila Japonesa
na Fazenda Barbosa. Na década de 1920, os japoneses adqui-
riram fazendas, como a Nomura (Bandeirantes) e a Atomiya
(Cornélio Procópio), e instalaram-se colônias como a Água da
Divisa, Água da Limeira, Colônia Kosei, Colônia Igarapava e
Colônia Japonesa Central.
Nas décadas de 1920 e 1930, o grande fluxo de imigrantes
japoneses para o norte do estado foi decorrente das mudanças
na política de colonização do governo japonês, quando foram
criadas as companhias colonizadoras. No norte do Paraná, ga-
nharam destaque a Brasil Tokushoku Kaisha - BRATAC (Com-
panhia Colonizadora do Brasil), a Nambei Tochi Kabushiki
Kaisha (Companhia América do Sul) e a Companhia de Terras
Norte do Paraná - CTNP.

As companhias colonizadoras
As companhias colonizadoras que vieram para o norte do
Paraná apresentavam semelhanças em vários aspectos: tama-
nho dos lotes, formas de aquisição das propriedades, tipo de
cultura, perfil dos compradores, dificuldades vivenciadas e
organização social. A BRATAC e a Nambei Tochi Kabushiki
Kaisha instalaram as colônias de Três Barras (Assaí) e Pirianito
(Uraí). A Companhia de Terras do Norte do Paraná - CTNP A BRATAC é uma das companhias de imi-
adquiriu, em 1925, cerca de 500 mil alqueires (1 210 000 hec- gração criadas com a mudança da política
de emigração do governo japonês, que
tares) nessa região, tendo fundado o Município de Londrina passou a subsidiar diretamente a vinda dos
que, por vários anos, foi a sede da companhia. imigrantes para o Brasil.
A BRATAC era uma empresa de economia mista, com capi- Acima: sede da BRATAC na década de 1930.
No meio: fachada da sede da BRATAC, na
tal constituído pelas contribuições das províncias japonesas e década de 1940. Abaixo: setor de enrola-
de particulares, e dividido em ações de 50 iens (VIEIRA,1973). mento da fábrica, onde são passados os fios
Tinha como objetivo recrutar e encaminhar os imigrantes de de carretel para serem transformados em
meadas. Bastos (SP)
colonização agrícola, não os deixando isolados, mas organi-
zando-os como colonos-proprietários em núcleos planejados.
Esta organização também atendia aos interesses da companhia
colonizadora que detinha o controle social, econômico e cultu-
ral na região, o que poderia ser mais uma forma de conquistar
alguma segurança nos empreendimen- preferencialmente, para imigrantes japo- 93
tos em realização, tanto por parte dos neses, provenientes do Estado de São
compradores quanto dos vendedores. Paulo (YAMOCHI,1991). Estes se dedi-

Da terra do sol nascente às terras férteis do Paraná


Assim, adquirida a Fazenda Três Barras caram, inicialmente, à extração da ma-
com 18 500 alqueires (44 710 hectares), deira e ao plantio do algodão, justificado
no ano de 1932, foi parcelada em lotes pelos altos preços alcançados no merca-
de dez alqueires (24,2 hectares) e ven- do e por ser uma cultura de rápido re-
dida a compradores, em sua maioria, torno. O café também foi plantado em
da região oeste do Estado de São Paulo. grande escala, mas exigia um mínimo de
Hoje, esta área corresponde ao Municí- três anos para a colheita de modo a tor-
pio de Assaí. É importante lembrar que, nar rentável a atividade.
com o intuito de dotar a colônia de uma A Companhia de Terras Norte do Pa-
infra-estrutura capaz de fazer com que raná - CTNP, criada em 1920 (IGARASHI,
a mesma se auto-sustentasse, a empresa 2005), foi uma empresa de capital inglês,
colonizadora abriu estradas, construiu tendo sido responsável pelo parcelamen-
escolas, deu condições para atendimento to e colonização de uma grande área de
médico, além de executar o saneamento terras férteis do norte do Paraná. São lem-
de áreas insalubres, face à presença de bradas as figuras de Lord Lovat, Simon
malária e leishmaniose. Joseph Fraser e Lord Edwin Montagu,
A Nambei Tochi Kabushiki Kaisha que vieram para o Brasil com o objetivo
(Companhia Colonizadora América do de assessorar o governo brasileiro junto
Sul) fundou, em 1932, a Colônia Piriani- às finanças públicas. Concluída a tarefa
to, hoje ocupada pelo Município de Uraí. original, se interessaram em fazer inves-
Em 1926, adquiriu uma gleba de dez mil timentos no País, principalmente com o
alqueires (24 200 hectares) na margem intuito de introduzir o sistema agrícola
Primeiro grupo de compra- do rio Congonhas, a qual foi parcelada plantation para suprir de matéria-prima a
dores de terras, constituído e os lotes (rurais e urbanos) vendidos, indústria têxtil inglesa. Cumpridos todos
por japoneses, acompanha-
dos por Hikoma Udihara
e George Craig Smith,
dezembro de 1929
94 os trâmites para a legalização da atividade, Mitsuji Ohara é o primeiro a adquirir
foi fundada inicialmente a empresa Para- 15 alqueires (36 hectares) na gleba Ribei-
ná Plantation Company, em 1925, tendo rão Cambé, no dia 27 de março de 1930.
Alice Yatiyo Asari e Ruth Youko Tsukamoto

como subsidiária a CTNP, e com sócios Em 1934, Londrina passou à categoria


brasileiros, vinculados aos capitalistas de município, evidenciando, então, o di-
paulistas, a exemplo dos proprietários do namismo que ocorria tanto na área rural
Banco Mercantil de São Paulo. Entre 1925 como na urbana. Há que se registrar ain-
e 1928, os ingleses adquiriram 500 mil al- da que, tal como em Assaí e Uraí, predo-
queires (1 210 000 hectares), recebendo minavam famílias vindas dos Estados de
títulos definitivos do governo paranaense. São Paulo, Minas Gerais, dos estados do
Entre os responsáveis pelo sucesso da Nordeste e do exterior. Nos anos seguin-
colonização e desenvolvimento regio- tes, foi inaugurado o acesso por ferrovia
nal, figuram Mr. Arthur Thomas e o e implantados equipamentos de infra-
sr. Hikoma Udihara, sendo o primeiro, estrutura. Em 1940, Londrina possuía
gerente-geral da CTNP, que confiou ple- 2 100 habitações e 10 mil moradores. En-
namente na capacidade do segundo para tre esses, estavam os pioneiros de 31 na-
vender terras entre os imigrantes japone- cionalidades. Dos proprietários de lotes,
ses, nomeando-o representante exclusivo. 1 823 eram brasileiros, 611 italianos, 533
Dedicou-se Hikoma Udihara, durante japoneses, 510 alemães, 303 espanhóis,
25 anos, à CTNP, ajudando os japoneses 218 portugueses, 193 poloneses, 172
a se fixarem no Norte Novo do Paraná, ucranianos e 138 húngaros, para citar
que é a região com a maior concentração apenas os mais numerosos.
de nikkeys do estado. Outros locais da área da CTNP foram
Londrina, considerada “boca-de-ser- sendo objeto de ocupação, a exemplo de
tão”, foi sede da companhia inglesa e Cambé, Rolândia, Arapongas e Apuca-
assim permaneceu por vários anos até rana, que vão se emancipando gradativa-
ser transferida para Maringá. A fun- mente. Maringá, por exemplo, tem a sua
dação do Patrimônio Três Bocas – hoje emancipação em 1947.
Londrina – deu-se no dia 21 de agosto
de 1929 e logo, em dezembro, imigran- Os núcleos de colonização e as associações
tes japoneses, conduzidos por George O papel exercido pelo Sr. Hikoma
Craig Smith (funcionário da empresa) e Udihara, corretor encarregado de ven-
Hikoma Udihara, fizeram o reconheci- das pela CTNP, foi de grande importân-
mento dos lotes. Nos registros da CTNP, cia junto aos imigrantes japoneses no

Hikoma Udihara, agencia-


dor de vendas de terras da
Cia. de Terras Norte do
Paraná - CTNP
95

Da terra do sol nascente às terras férteis do Paraná


Muitas das escolas japonesas foram período 1930 a 1955. Fundou 31 núcleos, contribuindo para
mantidas pelas associações, que a implantação de vários centros de cultura e de educação em
designavam professores os imigran-
tes com maior conhecimento da Londrina e nas zonas circunvizinhas a esse município.
cultura de origem. Escola japonesa Os núcleos eram esboços de cooperativas, com a finalidade
em Londrina (PR)
de proteger os associados, racionalizar o manejo da mata vir-
gem, desmatar e semear as primeiras safras. Neles se organiza-
vam mutirões (ajuda mútua) e a educação dos filhos, sendo de-
signados professores os imigrantes com maior conhecimento
da cultura de origem. Pela intermediação, buscava-se a melhor
comercialização das safras e a compra de implementos agrí-
colas. Em cada núcleo ocorriam exibições artísticas e práticas
religiosas, encontros festivos, dando origem às associações cul-
turais, de apoio, aos que estavam se fixando. Eram conhecidos
por Associação Japonesa ou Nihon-jin-kai.
As associações auxiliaram na agregação do grupo étnico e
mantiveram as escolas japonesas em funcionamento (na área
rural, principalmente) assim como foram e ainda são responsá-
veis pela realização das competições poliesportivas (undokai),
as comemorações do bon-odori (homenagem aos mortos), au-
xiliadas pelas Associações de Senhoras e de Jovens. Da mesma
forma que em outras comunidades nipo-brasileiras, à medida
que se fixavam as famílias de imigrantes japoneses, implan-
tavam-se as associações. Em Londrina, a primeira reunião
96 ocorreu em 1933, portanto poucos anos
após a chegada das primeiras famílias.
Exemplo de associações é a de Assaí,
Alice Yatiyo Asari e Ruth Youko Tsukamoto

que se baseou naquela existente no Ja-


pão: área dividida em “seções” (mura)
em que “a pequena produção de mer-
cadorias baseada no trabalho familiar
e a comunidade “mura” eram a forma
tradicionalmente adotada pelos japone-
ses no Japão” (ONO, 1973, p.137). Fo-
ram fundadas as associações de moços
(seinen-kai), de senhores (nihon-jin-kai),
de senhoras (haha-no-kai ou fujin-kai)
em cada seção, promovendo atividades
culturais e esportivas. Hoje, tais asso-
ciações estão vinculadas à Liga das As-
sociações Culturais de Assaí - LACA, a Brasil-Japão do Paraná, que é a entida- As associações auxiliaram
qual é subordinada à Aliança Cultural de que congrega as associações nipo- na agregação do grupo
étnico e mantiveram
e Esportiva do Paraná. À época da pes- brasileiras do estado. A primeira teve sua as escolas japonesas
quisa de Asari (1992), a LACA reunia origem nas associações nipo-brasileiras, em funcionamento. À
cerca de 800 famílias, tendo havido um implantadas à medida que se aglutina- medida que as famílias de
imigrantes japoneses se fi-
decréscimo significativo, pois, na década vam famílias, seja na área urbana ou na xavam, implantavam-se as
de 1950, a entidade contava com 2 500 rural. A segunda, fundada há mais de associações. Fachada da
famílias. Uma outra entidade ainda vi- 30 anos, é de utilidade pública reconhe- Aliança Cultural Brasil-
Japão do Paraná
gente é a Sociedade de Amigos - SAMA, cida pelos governos municipal (Londri-
criada em 1952, vinculada à LACA, que na), estadual e federal e tem sua sede em
reúne as 400 famílias da zona urbana, Londrina. É regida nos moldes de uma
sendo a entidade responsável pelas ati- federação, congregando 78 entidades
vidades culturais, esportivas e sociais da socioculturais e esportivas em cerca de
comunidade nipo-brasileira de Assaí. 75 municípios do Paraná. Tem por fina-
No entanto, em pesquisa realizada lidades promover atividades culturais,
por Asari e Tsukamoto (2008), verificou- beneficentes, intercâmbios, prestar assis-
se que as associações estão perdendo o tência médica e odontológica aos idosos,
dinamismo apresentado em décadas an- promover concursos e cursos diversos,
teriores, o que se evidencia pelo surgi- bem como de Língua Japonesa (Carto-
mento de outros interesses, pela ausência grama 1).
dos jovens ou pelo desinteresse de asso- Mas, ao lado da proliferação de asso-
ciações que privilegiem um grupo étnico. ciações, outro fator foi de fundamental
A continuidade dessas associações tem importância para que os nikkeys se fixas-
sido garantida pelo grupo dos idosos. sem na região norte-paranaense: trata-se
Em 2006, a Liga Desportiva Norte do desenvolvimento da agricultura. Não
Paranaense se fundiu à Aliança Cultural esquecendo que a atuação dos japoneses
Cartograma 1 - Territorialização das associações nipo-brasileiras - 2006 97
Diamante
do Norte

Centenário

Da terra do sol nascente às terras férteis do Paraná


do Sul
Paranacity Colorado Primeiro
de Maio
Sertaneja
Loanda Cruzeiro Bela Vista Itambaracá
Paranavaí Cambará
do Sul do Paraíso
Alto Santa
Santa Paraná Mariana
Isabel Cambé
Bandeirantes
do Ivaí Cornélio
Nova Ibiporã Uraí
Esperança Procópio
Rolândia
Astorga
Douradina
Maringá
Assaí Gu
Arapongas ap

i
nd

i
ar
ira
Londrina Carlópolis

gu
Sara
m
a

da
an
Apucarana

M
Maria

sta
Marialva Jandaia

ra
Helena

re
ssa

Flo
Terra do Sul

Ju
Cianorte Boa
Santana
Umuarama Cruzeiro Engenheiro do
do Oeste Beltrão Marilândia Ibaiti Itararé
do Sul
Wenceslau
Mauá Brás
da Serra
Borrazópolis
ESCALA
Iporã Campo
Mourão
Goioerê
-25 0 25
Guaíra Terra
Roxa Ivaiporã

Quilômetros
Assis
Chateaubriand
Ubiratã

Toledo

Castro

Cascavel

Ponta Grossa

Guarapuava

Curitiba
Morretes
Foz do Iguaçu Paranaguá

Palmas

Municípios com associação japonesa

Fontes: Aliança Cultural Brasil-Japão do Paraná; Base Cartográfica da Secretaria de Estado do Meio
Ambiente e Recursos Hídricos do Paraná. Cartograma elaborado por Kleyton Kamogawa.

no norte do Paraná foi significativa em alqueires (sete hectares) e plantou arroz;


vários setores de atividade, é importan- com Kazahaya, que semeou uma grande
te ressaltar que, historicamente, a maior área de milho e com os Hayassaka, que
contribuição está na agricultura, uma vez semearam feijão. A primeira safra des-
que o processo de territorialização desses pertou a atenção de todos para a quali-
imigrantes se deu por meio dos loteamen- dade da terra. Hara colheu 50 sacos de
tos destinados à produção agrícola. arroz por alqueire, 150 ao todo, no valor
Esta atividade não só possibilitou a de 15 mil réis o saco. Outros consegui-
entrada de 250 mil imigrantes japoneses ram, em média, 800 balaios de milho
no País, visto a necessidade de mão-de- em seis alqueires (14 hectares) e o ren-
obra na cafeicultura, como também con- dimento do feijão foi espetacular. Assim,
tou com a inegável contribuição dos seus a companhia colonizadora começou a
descendentes. propagandear, com alarde, o enorme
potencial do solo; as propriedades pio-
Os nikkeys na agricultura: ontem e hoje neiras tornaram-se modelos, receben-
Na região de Londrina tudo começou do quase diariamente a visita de novos
com Kunijiro Hara, que desmatou três compradores. Um ano após a chegada
98 dos japoneses, 400 famílias já estavam
assentadas, sendo 700 nos próximos
seis meses. Pela primeira vez, a comi-
Alice Yatiyo Asari e Ruth Youko Tsukamoto

da vinha com fartura e qualidade para


os japoneses há duas décadas no Brasil
(IGARASHI, 2005).
Além do café, principal atividade de-
senvolvida para fins comerciais, tiveram
grande expressão no norte do Paraná a
cultura do algodão em Assaí, a cultura
do rami em Uraí e a criação de bicho-da-
seda. Assaí foi considerada a capital do
algodão dando nome a uma divisão regio-
nal do IBGE, a microrregião Algodoeira
de Assaí. Essa cultura teve destaque até o
final da década de 1980 quando, susten-
tada pela pequena propriedade, tornou-
se inviável pelos altos custos de produ-
ção. Em fins de 1940, a cultura do rami
passou a ter grande significado, porém,
com a Segunda Guerra Mundial, houve
uma estagnação, pois tratava-se de um
produto para exportação. Após 1950, a
cultura foi retomada no Município de
Uraí, chegando a ser considerado capital
do rami. Liderado por um nikkey, alcan-
çou o mercado nacional e internacional,
mas perdeu espaço para o Sudeste Asiá- No norte do Paraná, além do café, teve grande
tico no final da década de 1980. Destas expressão a cultura do algodão
três principais atividades mencionadas,
o bicho-da-seda ainda está em destaque,
colocando o norte do Estado do Paraná
como o maior produtor de casulos ver-
des do Brasil.
Os produtores nikkeys também se
destacam no cultivo de grãos, na fruticul-
tura e na olericultura. Para efeito quan-
titativo, apesar da inexistência de uma
pesquisa sistemática sobre os produto-
res nikkeys, procurou-se verificar o per-
centual dos que estivessem vinculados à
hortifruticultura e à produção de cereais.
Segundo a lista de produtores da Associação Norte Paranaense 99
de Horticultores, cerca de 14% destes são de origem japone-
sa e a Cooperativa Integrada, mais voltada aos produtores de

Da terra do sol nascente às terras férteis do Paraná


grãos, conta com 25% de nikkeys dentre seus associados.
Mostra a história dos nikkeys na atividade agrícola do nor-
te do Paraná que a diversificação de atividades no processo de
transição, de substituição de culturas, deveu-se não somente
às diferenças nas características físicas, principalmente de solo
e relevo da região, mas também ao próprio talento agrícola
dos produtores nikkeys, que se revelou não pela ampliação das
áreas de cultura, mas pela diversificação das culturas (SAKATA;
WAKISAKA, 1992). De fato, o tamanho das propriedades era
de até 50 hectares e, pelos estudos de Ono (1973), os japone-
ses agricultores que migraram para o Brasil trouxeram a tradi-
ção do mura, onde se produzia em áreas muito reduzidas. Isso
sempre os levou a procurar novas tecnologias para aumentar a
produtividade. Assim, a base técnica era e é um fator relevante
para o sucesso da sua lavoura.
Ao longo do tempo, a agricultura passou por um processo
de transformação e o pensamento das novas gerações se reflete
na forma de expansão de suas atividades: de colonos de café os
produtores nikkeys passaram a proprietários rurais capitalistas,
sendo várias as evidências desta transformação. Duas merecem
destaque. Primeira, a dos proprietários que residem no Paraná, e

Figueira, árvore
típica do Paraná.
O diâmetro de seu
tronco indica o grau
de fertilidade da terra
100 que possuem terras fora do estado como puderam procurar terras para obter sua
no oeste da Bahia, no Maranhão, em Mi- autonomia. No Cartograma 2, podemos
nas Gerais (Triângulo Mineiro) e no Mato observar a localização desses jovens no
Alice Yatiyo Asari e Ruth Youko Tsukamoto

Grosso do Sul. São aqueles que foram Paraná. Segunda, a dos proprietários que
incentivados pelo acordo bilateral Brasil- arrendam terras próximas às suas para a
Japão, o Prodecer (Programa de Desenvol- expansão da cultura de grãos como soja,
vimento dos Cerrados), no qual teve papel trigo e milho, desenvolvendo uma agricul-
expressivo a Cooperativa Agrícola de tura capitalista, voltada ao agronegócio.
Cotia e a Cotia Seinen. Esses eram jovens
imigrantes, que aqui chegaram entre 1955 Considerações Finais
e 1967, estagiaram nas propriedades ru- À guisa de considerações finais desta-
rais de associados da Cooperativa e após camos que, ao tratar dos nikkeys norte
cumprirem o contrato de quatro anos paranaenses, uma série de fatos vêm à

Cartograma 2 - Localização da Cotia Seinen do Paraná - 2005

Diamante
do Norte

Centenário
do Sul
Colorado Primeiro
Paranacity de Maio

Loanda Cruzeiro Bela Vista Sertaneja Itambaracá


Cambará
do Sul do Paraíso
Santa
Paranavaí Mariana
Santa Alto
Isabel Paraná Cambé Bandeirantes
do Ivaí
Nova Cornélio
Esperança Ibiporã Uraí
Rolândia
Astorga Procópio
Douradina
Maringá
Assaí Gu
Arapongas
i
nd

ap Carlópolis
i

ira
ar

Londrina
Sara

ma
gu
da
an

Maria Marialva
M

Apucarana
sta

Umuarama Helena
Jandaia
ra

re
ssa

Flo

do Sul
Cianorte Terra
Ju

Boa Santana
Cruzeiro do
Engenheiro Marilândia Ibaiti Itararé
do Oeste Beltrão do Sul
Wenceslau
Mauá Brás
da Serra
Borrazópolis

ESCALA
Iporã Campo
Mourão -25 0 25
Guaíra Terra Goioerê
Roxa Ivaiporã
Quilômetros
Assis
Chateaubriand
Ubiratã Piraí do Sul

Toledo
Castro

Cascavel
Ponta Grossa

Guarapuava
Curitiba
Morretes
Foz do Iguaçu
Araucária Paranaguá

Contenda

São Mateus
do Sul

Palmas Número de pessoas


31
11 a 30
1 a 10

Fontes: 50 anos da Cotia Seinen. Edição comemorativa. São Paulo, 2006; Base Cartográfica da Secretaria de Estado do
Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Paraná. Cartograma elaborado por Kleyton Kamogawa.
tona, desde a vinda dos primeiros imi- Referências 101
grantes, os processos de adaptação, a 50 Anos da Cotia Seinen. Edição comemora-
sua organização social, a sua contribui- tiva. São Paulo, 2006.

Da terra do sol nascente às terras férteis do Paraná


ção, principalmente na agricultura, e o ANDRADE, J. C. A colônia esperança: o ja-
fenômeno dekassegui, que expõe facetas ponês na frente pioneira norte-paranaense.
diferenciadas, características do territó- 1975. Dissertação (Mestrado)-Universidade
rio reordenado e de tempos diversos. Federal do Paraná, Curitiba, 1975.
O fato é que o processo migratório, ASARI, A.Y. ... E eu só queria voltar ao Ja-
desde o início da civilização, tem sido pão. Colonos japoneses em Assai (PR). 1992.
Tese (Doutorado) - Faculdade de Filosofia,
analisado sob o ponto de vista do indi- Letras e Ciências Humanas, Universidade de
víduo, em que a decisão de migrar visa à São Paulo, São Paulo, 1992.
melhoria das condições de vida, ou como ASARI, A.Y.; TSUKAMOTO, R.Y. Espaço
um fato social, em que sociedade é a res- e tempo nas migrações internacionais do
ponsável pelos deslocamentos popula- Norte do Paraná. Londrina: Universidade
cionais, pois não deu oportunidades para Estadual de Londrina, 2008. Relatório de
pesquisa.
sobreviverem nos seus locais de origem.
Os imigrantes japoneses, que com- IGARASHI, T. História da imigração japo-
nesa no Paraná: rumo ao centenário da imi-
pletam no ano de 2008 cem anos de vi- gração. Londrina: Aliança Cultural Brasil-
vência em nosso País, Brasil, atravessa- Japão do Paraná, 2005.
ram os mares para construir um novo ONO, M. De colono a pequeno produtor. In:
território, legando-nos seus valores, sua SAITO, H.; MAEYAMA, H. Assimilação e
cultura, os quais vêm sendo, gradativa- integração dos japoneses no Brasil. Petrópo-
mente, incorporados à sociedade brasi- lis: Vozes, 1973. (Coleção Estudos brasilei-
ros, 4).
leira. Esta experiência histórica suscita
reflexões. Suas esperanças, lutas e co- SAKATA, H.;WAKISAKA, K. Papel desem-
penhado na agricultura brasileira. In: UMA
ragem para vencer o desconhecido, por EPOPÉIA moderna: 80 anos da imigração
um lado, e o espírito associativo, a ajuda japonesa no Brasil. São Paulo: HUCITEC:
mútua, a solidariedade, o respeito às tra- Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa,
dições culturais, por outro, foram poten- 1992.
cialidades de grande importância para a VIEIRA, F. I. S. O japonês na frente de ex-
superação das privações e, mais que isto, pansão paulista: o processo de absorção do
japonês em Marília. São Paulo: Pioneira,
para transformar os constrangimentos 1973. (Biblioteca pioneira de ciências sociais.
cotidianos, representados pelas doenças, Antropologia). Originalmente apresentada
pela pobreza, pela diversidade cultural pela autora como tese de doutorado à Uni-
e até, diferenças físicas, em experiências versidade de São Paulo.
bem sucedidas. YAMOCHI, Y. Imigração japonesa: ontem e
A “saga” dos imigrantes japoneses hoje. O exemplo dos japoneses da comuni-
dade nikkey de Urai (PR-Brasil). 1991. Dis-
deve ser resgatada, estudada e inserida no sertação (Mestrado) - Faculdade de Filosofia,
cotidiano de nossas vidas, pois somos par- Letras e Ciências Humanas, Universidade de
te dela na qualidade de seus descendentes. São Paulo, São Paulo, 1991.
. . . ,.
..... ...•.
....·.. ...... . • ••
"
.~
.
Resgate de uma história
os japoneses no Estado do Rio de Janeiro

Tomoko Iyda Paganelli

Introdução

D
uas características comuns destacam-se na formação dos núcleos de imigra-
ção japonesa no Brasil: as Associações culturais e/ou esportivas, onde algu-
mas tradições da cultura japonesa eram reavivadas e as crianças iniciavam
as aulas da língua de seus pais e avós, e as Cooperativas, que reuniam imigrantes
para comercialização dos produtos agrícolas cultivados. A primeira cooperativa foi
fundada em 1919, sob a denominação de Sindicato Agrícola Nipo-Brasileiro, ligada
aos orizicultores de Uberaba, e a mais conhecida, a Cooperativa Agrícola de Cotia,
oficialmente fundada em 1927 (87 sócios), que estende sua atuação do estado de ori-
gem aos outros estados do Brasil, tal como ocorreu no início da formação dos núcleos
coloniais de Santa Cruz (1938) e de Funchal (1960) no Estado do Rio de Janeiro.
No Brasil, as primeiras notícias de navios japoneses são as dos náufragos do
Wakamiya Maru, que aportou em 20 de dezembro de 1803 em Desterro (atual Flo-
rianópolis), permanecendo até 4 de fevereiro de 1804. A narrativa da viagem desses
náufragos, os primeiros japoneses que deram a volta no mundo, foi registrada por
Otsuki Gentaku, por ordem do suserano de Mutsu. Relata a passagem por Santa Ca-
tarina e contém dados sobre o povo e os produtos da terra.
A cidade do Rio de Janeiro, por sua posição político-admistrativa como capital
do Vice Reino (1763), do Império (1822-1889) e da República (1889), atraiu viajan-
tes, imigrantes isolados, casas comerciais e instituições financeiras e industriais. Em
1867, o navio Kaiyo Maru, encomendado pelo shogunato Tokugawa à Holanda em
sua viagem para o Japão, permaneceu 11 dias ancorado no porto do Rio de Janeiro.
Entre os passageiros, faziam parte o barão Takeaki Enomoto e oito jovens estagiários
japoneses que viviam na Holanda. Em visita à cidade e seus arredores, levantaram as
possibilidades de imigração japonesa para o Brasil (OS PRECURSORES..., 2006).
O tratado de Amizade, Comércio e Navegação com o Brasil foi assinado em Paris,
em 1895. A representação diplomática, Legação do Japão no Brasil, se instalou em
104 Petrópolis em 1897, na região serrana no período 1908-1913 (11 402), e com-
do Rio de Janeiro, afastada do perigo de parando-se com o total de asiáticos re-
febre amarela das áreas de baixadas. censeados em 1906 no Rio de Janeiro,
Tomoko Iyda Paganelli

Os dados estatísticos do período conclui-se que entre 1904-1913 viviam


1904-1913 assinalam a presença de no Rio de Janeiro 45 japoneses.
11 869 imigrantes japoneses no Bra- O Censo Demográfico 2000, realiza-
sil, sem a especificação dos estados. A do pelo IBGE, assim registra o total da
comparação destes dados com aqueles população de imigrantes de origem ja-
da lista de entrada dos navios que che- ponesa, por municípios, segundo regiões
garam ao porto de Santos – 11 402, no do Estado do Rio de Janeiro:
período 1908-1913 – indica que antes Área metropolitana do Rio de Janeiro:
mesmo da chegada do Kasato Maru Municípios da Baixada Fluminense: Rio
já moravam no Brasil 467 imigrantes de Janeiro, Itaguaí, Nova Iguaçu, Belford
japoneses. Roxo, Niterói, São Gonçalo, Guapimi-
Tabela 1 - Entrada de imigrantes no Brasil rim e Magé, com 2 097 japoneses;
1908-1913 Região Serrana: Municípios de Friburgo,
Petrópolis, Teresópolis e Cachoeira de
Ano Navio Número de imigrantes Macacu, com 2 291 japoneses;
1908 Kasato Maru 780
Região dos Lagos: Municípios de Cabo
1910 Ryojun Maru 960
Frio e Macaé, com 55 japoneses; e
1912 Itsukushima Maru 1 432
1912 Kanagawa Maru 1 412 Vale do Paraíba: Município de Resende,
1913 Daí-no-unkai Maru 1 506 com 27 japoneses.
1913 Wakasa Maru 1 588
Comparando os dados acima com os
Teikoku Maru 1 946
dados do registro de associações japone-
Wakasa Maru 1 808
sas da RENMEI (Associação Cultural e
Total 11 402
Esportiva Nipo-Brasileira do Estado do
Fonte: O autor, a partir de fontes diversas.
Rio de Janeiro), que reúne 24 associa-
Os dados do recenseamento do Rio ções nikkeys fluminenses, temos no car-
de Janeiro no ano de 1906 contabilizam tograma a seguir a visualização da distri- Praça 15 de Novembro no iní-
459 homens e 53 mulheres, num total de buição das associações de imigração no cio do século. Rio de Janeiro
(RJ), 1907
512 asiáticos. Deduzindo-se do total de Estado do Rio de Janeiro. O quadro que
imigrantes japoneses no Brasil em 1913 o acompanha mostra o ano de fundação
(11 869), o total de japoneses entrados dessas associações.
Cartograma 1 - Associações nikkeys por ano de fundação no Estado do Rio de Janeiro 105
p g g

Espírito Santo

Resgate de uma história


Minas Gerais

15O
7O 13O
12O
16O
6O
5O
9O
São Paulo 2O
3O 4O
1O 11O 14O10O 8O Ordem Ano de fundação Município Associação
1º 1938 Rio de Janeiro Associação Rural Nipo-brasileira de Santa Cruz
Oceano Atlântico 2º 1938 Belford Roxo Associação Nikkei de São Bento
3º 1947 Itaguaí Itaguai Burka Clube
0 10 30 50 Km 4º 1948 Itaguaí Esperança Atlético Clube de Pirarema
5º 1953 Cachoeiras de Macacu Esporte Clube Agrícola de Papucaia
6º 1953 Cachoeiras de Macacu Associação Cultural e Esportiva de Funchal
7º 1953 Teresópolis Teresópolis Nikkei Clube
8º 1954 Niterói Associação Nikkei de Niterói
9º 1970 Nova Iguaçu Clube Nikkei deTinguá
10º 1972 Rio de Janeiro Associação Nikkei do Rio de Janeiro
11º 1982 Rio de Janeiro Associação Nikkei de Campo Grande
12º 1986 Resende Associação Cultural e Esportiva Nipo-brasileira de Resende
13º 1988 Nova Friburgo Associação Cultural e Esportiva Nipo-brasileira de Nova Friburgo
14º 1995 Rio de Janeiro Rio Sports Club
15º 2005 Valença Associação Nipo-brasileira de Valença e Rio das Flores
16º 2008 Petrópolis Associação Nikkei de Petrópolis
- sem atividade Seropédica Santa Alice Nikkei
- sem atividade Japeri Associação Nipo-brasileira de Pedra Lisa
- sem atividade Macaé Associação Nikkei de Magé
- sem informações Magé Piabetá Nikkei Clube
- sem informações Angra dos Reis Clube de Angra dos Reis
- sem informações Volta Redonda Associação Cultural e Esportiva de Volta Redonda
- sem informações Guapimirim Associação Cultural e Esportiva de Guapimirim
- sem informações Rio de Janeiro Grêmio Recreativo Nipo-brasileiro

Fonte: RENMEI (Associação Cultural e Esportiva Nipo-brasileira do Estado do Rio de Janeiro). Cartograma elaborado por Tiago Dionísio da Silva.

Em cada uma dessas associações cru- municípios, ocorrendo ou por indução


zam-se as trajetórias pessoais, familiares das companhias de imigração estatais ou
e dos grupos dos imigrantes japoneses privadas que atuavam na retribuição dos
no Brasil e de seus deslocamentos. Mui- imigrantes, ou por decisão do próprio
tos dos imigrantes que se estabeleceram imigrante e sua família, como foi o caso
no estado aqui chegaram oriundos de dos primeiros imigrantes das fazendas
um processo de reimigração, comum nas de café em São Paulo que se deslocaram
décadas de 1910 e 1930. Esse processo para outros locais e outras atividades. A
consistiu no deslocamento de imigran- reimigração esteve na base da formação
tes com destino a outros estados e/ou dos núcleos das colônias de imigrantes
106 no Estado do Rio de Janeiro. Assim, República, foi destituído de sua função e
através da reconstituição geográfica e fundou o Circulo Imperial Japonês, uma
histórica da presença desses imigrantes academia de ginástica no Rio de Janeiro.
Tomoko Iyda Paganelli

japoneses no Rio de Janeiro, pós Kasato Wasaburro Ohtake a convite do prín-


Maru, é possível traçar suas trajetórias cipe Augusto Leopoldo, neto do impera-
em terras fluminenses: vindos de outras dor Pedro II, integrou-se ao navio-escola
localidades em direção ao Estado do Rio Almirante Barroso, na viagem de circuna-
de Janeiro, foram atraídos, principal- vegação. Retornou ao Brasil em julho de
mente, na década de 1930, pela política 1890, após a proclamação da República.
de implantação de núcleos coloniais do Obteve a nacionalidade brasileira, acon-
governo federal na Baixada Fluminense. selhado pelos oficiais e por interferência
Retomaremos a análise desses núcleos do Almirante Custódio de Melo, e cursou
contextualizando sua formação após a Escola Naval. Após a Revolta da Arma-
identificar algumas iniciativas precurso- da, ocorrida em 5 de setembro de 1893,
ras dos imigrantes isolados e dos inter- comandada pelo almirante, foi preso e
cambistas (Kamajiro Enomoto, Kakijiro exilado em 1894. Retornou ao Japão, sen-
Uchida, Tarozaemon Sawa, Shunpai do considerado desertor da guerra Russo-
Taguchi), os chamados “imigrantes inte- Japonesa. Posteriormente, foi nomeado
lectuais”, que para aqui vieram com a intérprete da Legação Brasileira em Tó-
finalidade de avaliar as possibilidades quio. Em 1925, publicou o primeiro di-
de uma imigração dirigida para o Brasil, cionário Japonês-Português e, em 1937, o
em particular para o Estado do Rio de Português-Japonês. Foi intérprete na rela-
Janeiro. ção Japão-Brasil durante 30 anos.
Em 1906, por iniciativas de Saburo
Precursores da imigração japonesa no Kumabe, Yassaburo Yamagata e Ryu
Estado do Rio de Janeiro Mizuno, foram realizadas, nos Municí-
Algumas iniciativas anteriores ao pios de Macaé e Cabo Frio, as primeiras
Kasato Maru estão presentes no Rio de experiências de implantação de imigran-
Janeiro. Foram iniciativas isoladas e de tes japoneses no Estado do Rio de Janeiro.
grupos que antecederam e/ou participa- Em 1906, Saburo Kumabe, juiz de
ram ativamente da formação da “imigra- Direito em Kagoshima e Kumamoto,
ção tutelada”, promovida pelo governo ja- com respectiva família, Umeki Akiho e
ponês e/ou por companhia particular que Ryochi Yassuda dirigiram-se para a Fa-
considerava a emigração um bom negócio. zenda Santo Antonio, em Macaé, no vale
São precursores da imigração japo- do rio Macaé (Glicério). Abandonaram
nesa no Rio de Janeiro duas pessoas que o local na segunda semana pelas condi-
direta e indiretamente estiveram associa- ções precárias da ligação entre a fazenda
das à Família Imperial brasileira: e a cidade de Macaé, servida pela linha
Manto Takezawa chegou ao Rio de férrea do estado, transferindo-se para a
Janeiro em 1880. Foi professor de gi- cidade do Rio de Janeiro com a família.
nástica e de jiu-jitsu da guarda do Impe- As filhas de Saburo Kumabe naturaliza-
rador Pedro II. Com a proclamação da ram-se brasileiras, sendo as primeiras
japonesas formadas pela Escola Normal processo de imigração para o Estado de 107
do Distrito Federal, em 12 de abril de São Paulo.
1921. Inicialmente, na cidade do Rio de Yassaburo Yamagata (nascido Naka-

Resgate de uma história


Janeiro, Saburo Kumabe trabalhou como mura, adotado pela família Yamagata, sem
vigia em uma companhia fornecedora de descendente masculino), depois de uma
gás e, posteriormente, dedicou-se a for- vasta experiência adquirida em Hokkaido
necer alimentos e legumes para os navios (em transporte marítimo, de concessões
da Nippon Yusen KK e Osaka Shoosen na venda de arenque, principal produto
KK, que aportaram no Rio de Janeiro. da ilha, e um dos fornecedores, em 1904,
Suicidou-se aos 72 anos, atirando-se ao durante a guerra Russo-Japonesa, de car-
mar do navio que se dirigia para o Rio vão e transporte marítimo) em 1905 en-
Grande do Sul, em 1925. viou para o Brasil, Perú e Argentina, au-
Ryu Mizuno, considerado “pai da xiliares para sondar as possibilidades de
imigração japonesa no Brasil”, funda- empreendimentos para sua organização.
dor e presidente da Kokoku Sokumin Em 1908, partiu para o Brasil, via o por-
Kaisha (Companhia Imperial de Emi- to de Vladivostok. Atravessou a Sibéria,
gração) em 1906, tendo visitado o Peru, Moscou, Berlim, Paris e Londres, e desem-
Chile, Argentina, chegou ao Rio de Ja- barcou no Rio de Janeiro, em 18 de maio
neiro em busca de terras para novas co- de 1908. No centenário da Abertura dos
lônias. Negociou contrato em 1o de no- Portos, apresentou-se como representante
vembro de 1907, assinado somente em do Japão. Em 1911, comprou três fazen-
30 de outubro de 1909, entre o Estado das no município de Macaé. Naturalizou-
do Rio de Janeiro e a Fundação dos Nú- se brasileiro, fundou uma Escola de Pes-
cleos Coloniais de Japoneses na Baixada ca em Cabo Frio (Ilha Amorin, hoje Ilha
Fluminense, representado por Mizuno dos Japoneses) e adquiriu salinas em São
e Raphael Monteiro. Uma nova tentati- Pedro da Aldeia. Constam na Diretoria
va foi efetuada mediante entendimento da Agricultura os nomes de Yamagata e
entre o governador do Rio de Janeiro e seus filhos como proprietários em Macaé
Vista da Baía de
Guanabara. Rio de Ryu Mizuno, na Fazenda Santo Antonio, e Cabo Frio (Izaburro Yamagata. Ilha dos
Janeiro (RJ), 1920 em Macaé. Nova desistência. Atuou no Pombos, Primeiro Distrito, cinco alquei-
res de salinas, atual Salinas Mossoró no
bairro do mesmo nome em São Pedro da
Aldeia, Cabo Frio e Macaé, em nome de
Takiô, Fumio, Gugio, Norico Yamagata e,
em Santa Rita, Sexto distrito, a Fazenda
Lavrador, na Estrada de Ferro Leopoldi-
na). Está enterrado em Macaé (Cemitério
Santana). Dois de seus filhos estudaram
Engenharia na Universidade de Keio (Ja-
pão) e um, Economia. Seus descendentes
atuaram, através de empresa de constru-
ção civil, em várias obras no Estado do
108 Rio de Janeiro. Noriko Yamagata, médica, Cartograma 2 - Terras registradas como sendo do patrimônio da
residente na cidade do Rio de Janeiro, dá Fazenda Nacional, de acordo com o mapa da Divisão de Terras
um longo depoimento em pesquisa desen- do Ministério da Fazenda
Tomoko Iyda Paganelli

volvida por Mariléia Inoue, sobre a traje-


tória da família no Brasil.

Os núcleos coloniais de imigração japonesa


no Estado do Rio de Janeiro
No Estado do Rio de Janeiro, a imi-
gração japonesa se concentrou na região
metropolitana do Rio de Janeiro/Baixa-
da Fluminense; na região serrana, nos
Municípios de Petrópolis, Teresópolis,
Nova Friburgo; e no vale médio do rio
Macacú, no Município de Cachoeira
de Macacú. Com exceção da segunda
região, as demais foram instaladas em
áreas públicas do estado.
O Cartograma 2, da década de 1950,
localiza e delimita as respectivas fazen-
das, entre elas: Fazenda Santa Alice (2);
Fazenda de Santa Cruz (6) e no seu inte- Fonte: GEIGER, P. P.; MESQUITA, M. G. C. Estudos rurais da baixada fluminense
rior o Núcleo Colonial de Santa Cruz (5); (1951-1953). Rio de Janeiro: IBGE, 1956. (Biblioteca geográfica brasileira. Série A, n. 12).
Fazenda Tinguá (8); Fazenda São Bento Nota: A Fazenda Nacional de Santa Cruz, como se observa, englobava as terras do atual
Município de Itaguaí, desmembrado do Município de Angra do Reis, em 1818.
(16); e no vale do rio Macacú, a Fazenda
Papucaia (26).

Os núcleos de imigração japonesa na Baixada


Fluminense
Sob a denominação de Baixada Flumi-
nense estão incluídas as terras em redor da
Baia de Guanabara. Os desmembramen-
tos dos municípios mais antigos realiza-
ram-se ao longo dos Séculos XVI e XX.
Nesses municípios, se distribui a
população de origem japonesa: poucos
isseis, muitos nisseis, yonseis descen-
dentes dos primeiros imigrantes (como
a família Arume), procedentes quase
na totalidade do processo de reimigra-
ção durante o Governo Vargas. Muitos
dos núcleos coloniais agrícolas foram
Zona rural, pastagens em Campo Grande. Santa Cruz, antigo Estado da Guanabara
Cartograma 3 - Planta geral do Núcleo Colonial de Santa Cruz criados, incentivados e instalados na 109
década de 1930, através do Ministério
da Agricultura, com objetivo central de

Resgate de uma história


formação de um cinturão verde para
abastecer a capital Federal de produtos
agrícolas e implementar uma política
relacionada às propriedades rurais na
Baixada Fluminense, em geral, grandes
latifúndios subutilizados e apropriações
indevidas de terras públicas.

Núcleo Colonial de Santa Cruz


Este núcleo destaca-se na análise da
imigração japonesa no Estado do Rio
de Janeiro pela importância histórica da
área desde o Brasil Colonial. No início
da Primeira República, essa área foi de-
Bonde, Ilha de Gua- nominada de Fazenda Nacional de Santa
ratuba, zona rural Cruz e o núcleo só foi criado no Gover-
(RJ), 1958.
no Vargas pelo Decreto-lei n. 8.993, de
26 de novembro de 1938, que dispunha
sobre o aproveitamento da Fazenda Na-
cional de Santa Cruz e de outros imóveis
da União. Visou este decreto acabar com
a ocupação indevida de terras pertencen-
tes à União e trazer maiores vantagens ao
Fonte: GEIGER, P. P.; MESQUITA, M. G. C. Estudos rurais da baixada fluminense abastecimento da capital da República. O
(1951-1953). Rio de Janeiro: IBGE, 1956. (Biblioteca geográfica brasileira. Série A,
n. 12). decreto exigia dos ocupantes a exibição
dos títulos sobre o domínio pleno das ter-
ras num prazo de três meses.
Inicialmente, vieram para a Colô-
nia Agrícola de Santa Cruz, em 1938,
13 famílias japonesas e posteriormente,

Fachada da Associação Rural Nipo-brasileira de Santa Cruz


e propriedade do Sr. Miyata, vice-presidente da Associação.
Santa Cruz (RJ), 2000
110 até 1940, mais 18 familias. Entre elas, poneses por reimigração. Através da
as famílias Adachi; Togashi; Fukumati; família Kunisawa pode-se resgatar a
Watanabe; Sudo, de Mogi das Cruzes; trajetória de um morador de Piranema,
Tomoko Iyda Paganelli

Takahashi, do Amazonas; e Hoshina, do cujas informações foram obtidas, atra-


Peru (INOUE, 2002), chegaram por via vés de entrevista em projeto de pesquisa,
do processo de reimigração. Envolvendo por Leonardo Tsukino.
todos os membros da família, o sistema O pai imigrou solteiro com o tio para
de plantio mais utilizado na colônia foi o Brasil. Permaneceu durante quatro
o de rotação de culturas: legumes (es- anos em uma fazenda de café no noroes-
pecialmente tomates), entre julho e ou- te do Estado de São Paulo; retornou ao
tubro, e arroz ou milho, entre outubro Japão, onde casou-se; imigrou com a es-
e abril. Houve tentativa de formação de posa para o Brasil, voltando para mesma
uma cooperativa que, no entanto, malo- região de São Paulo. Migrou para o Es-
grou devido à heterogeneidade da popu- tado do Rio Janeiro e se estabeleceu em
lação da colônia, formada por japoneses Piranema, por volta de 1946-1947.
e brasileiros. A partir da década de 1970, Estudou até o terceiro ano primá-
a Colônia Agrícola de Santa Cruz foi rio na “roça” e completou o primário
fortemente afetada pela urbanização do e o ginásio em Itaguaí, percorrendo
bairro de Santa Cruz. 10 a 12 km diariamente. Fez o científi-
Entre 1938 e até a Segunda Guerra, o co (atual 2o grau) em Escola Técnica,
núcleo se consolidou com os imigrantes na Universidade Federal Rural do Rio
na condição de pequenos proprietários de Janeiro - UFRRJ e o curso de Medici-
da terra. Exerceu papel importante nesta na em Vassouras. Tinha seu consultório
consolidação a fundação da Associação em Nova Iguaçu. Na colônia, plantavam,
Rural Nipo-brasileira de Santa Cruz, que inicialmente, tomate, pimentão e jiló.
manteve sobretudo coesas as tradições Na década de 1950, iniciou o cultivo
culturais e o ensino da Língua Japonesa. de quiabo, tornando-se um dos maiores
Mais tarde, entre 1950 e até o final dos produtores dessa leguminosa no Estado
anos 1970, preocupadas com a educa- do Rio de Janeiro.
ção dos filhos, algumas famílias se trans- Mais adiante do relato do sr. Kunisawa,
feriram para a sede do bairro de Santa foi ressaltado o papel da associação, ou
Cruz, onde se dedicaram às atividades de “clube” da sua infância, onde as ativida-
comércio e serviços. Desde a década de des esportivas (sumô, kendô, atletismo),
1980, foram abandonadas as atividades atividades culturais (comemoração de da-
rurais, permanecendo como atividade tas festivas tradicionais, apresentação de
apenas de alguns descendentes, que man- danças japonesas) e as aulas de Japonês,
têm a propriedade rural e uma moradia obrigatórias, dadas por uma professora
no núcleo mais urbanizado. japonesa de Kumamoto, asseguravam a
coesão do grupo e a manutenção da cul-
Núcleo em Itaguaí: Piranema e Mazomba tura do país de origem. Atualmente, as
Piranema - Núcleo emancipado da Fa- atividades esportivas do clube são mais
zenda Nacional, recebeu imigrantes ja- restritas, onde “se brinca” de baseball e
as aulas de Língua Japonesa são dadas especificamente construir, a cada três se- 111
por professoras nisseis ou sanseis. manas, casa para uma nova família que
ali se refugiasse. Algumas famílias perma-

Resgate de uma história


Mazomba - Núcleo que traduz a tradição neceram neste núcleo após o término da
associativa e de cooperação que marcou Segunda Guerra; outras retornaram aos
a fixação dos imigrantes japoneses nas antigos locais de residência na Baixada.
terras brasileiras. Está situado no vale
dos rios que descem da serra Mazomba Núcleo Colonial de São Bento/ Babi
Esses rios percorrem a Fazenda Nacio- Este núcleo foi criado no Governo
nal e deságuam na baía de Sepetiba. Vargas pelo Ministro da Agricultura Fer-
Na memória dos imigrantes japoneses nando Costa, em 1938, na estrada Rio-
da Baixada Fluminense, está a lembrança Petropólis, no Município de Duque de
de Mazomba como o refúgio que busca- Caxias, tendo por objetivo abastecer a
ram durante a Segunda Guerra. Nesta Capital Federal de produtos agrícolas.
época, foram obrigados a retirar-se das Durante a Segunda guerra, os imigrantes
cidades e dos núcleos coloniais mais vi- de origem japonesa foram obrigados a se
síveis e estratégicos da Rio-Santos e Rio- retirar do local, em 12 de agosto de 1942,
Petrópolis. Os relatos das familias Inoue, refugiando-se em Mazomba. Após o térmi-
Fukamati, Sunada, Shiose e Nakaie per- no da Guerra, retornaram ao denominado
mitem reconstruir essa história, cuja ên- Lote 15, no Município de Belford Roxo
fase é dada no trabalho da comunidade (desmembrado do Município de Caxias) e
em mutirão nos fins de semana, visando refundaram a Colônia de São Bento/Babi.

Duas gerações da
Família Arume.
Nilópolis (RJ), 2008
112 Embora em bairros distintos, pertencem A trajetória dos Arume, imigrantes
a uma única associação – a Associação do Kasato Maru, em sua primeira etapa,
Nikkey de São Bento (1938, refundada) – é comum a todos os imigrantes japone-
Tomoko Iyda Paganelli

tendo uma subadministração por bairro. ses que chegaram no porto de Santos
em 18 de junho de 2006: dirigiram-
Os descendentes dos imigrantes do Kasato Maru em se, primeiro, à fazenda de café em Itú,
Nilópolis São Paulo, abandonaram a fazenda e
Entre os imigrantes do Kasato Maru, retornaram a Santos para trabalhar na
constam os nomes dos irmãos Kenjun, Companhia Docas de Santos. Mais tar-
Kendo e Kentoku Arume. Os desceden- de, reimigraram para o Rio de Janeiro,
tes de Kentoku Arume vivem em Nilópo- trabalhando na Companhia Docas do
lis, no Rio de Janeiro. O relato de Marly Rio de Janeiro. A esposa de Kentoku
Arume nos possibilitou recuperar a traje- Arume, Makata, trabalhou na Fábrica
Família de D. Rosa
tória da família. de Aniagem Silveira Martins, no setor Toguchi Arume, em
1920, já no Brasil
de teares, até o nascimento do primeiro passados 10 anos do inicio da imigração 113
filho, Kanemassa (João). japonesa oficial para o Brasil, foi transfe-
A Baixada Fluminense, principalmente rida para a cidade do Rio de Janeiro.

Resgate de uma história


Nova Iguaçu, era grande produtora de la- O núcleo de imigrantes japoneses em
ranja para exportação. A família mudou- Petrópolis não se destaca e são poucos
se para Nilópolis e adquiriu pequenos os imigrantes ou seus descendentes neste
lotes, iniciando o plantio da fruta. Mais município. Dedicam-se à cultura de hor-
tarde, adquiriu nova propriedade nos li- taliças e flores. A Associação Nikkey de
mites de Nilópolis e São João de Meriti. Petrópolis data de 2008.
Com a decadência da exportação de la-
ranja após a Segunda Guerra, a plantação Nova Friburgo
foi substituída pela produção de horti- As trajetórias dos imigrantes japoneses
granjeiros, comercializados no mercado em Nova Frigurgo representam as duas
atacadista do Rio de Janeiro e vendidos fases da imigração japonesa no Estado
nas feiras livres pelos familiares. do Rio de Janeiro. A primeira, a de Tooru
Os filhos, quando crianças, freqüenta- Kassuga, da década de 1920; e a segunda,
ram as escolas de Nilópolis e Cascadura; de Kenichi Tanizaki e Yoshiyubu Ban, da
jovens, um ingressou na Faculdade de década de 1950.
Agronomia da Universidade Federal Ru-
ral do Rio de Janeiro - UFRRJ, e outro, na Tooru Kassuga - A primeira família japo-
Faculdade de Medicina da Universidade nesa a se instalar em Nova Friburgo foi a
Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. No ma- de Tooru Kassuga, em 1929. Responsável
trimônio, mantiveram a tradição do ca- pela leva de imigrantes do navio Santos
samento endogâmico: João (Kanemassa) Maru, através de conhecimentos sobre
casou-se com Rosa, filha de um imigrante outras possibilidades de estabelecer-se no
do Kasato Maru, Seijin Toguchi. Brasil, além do Estado de São Paulo, op-
tou por fixar-se no Rio de Janeiro, depois
Núcleo da Região Serrana: Petrópolis, Nova de desligar-se de suas tarefas como res-
Friburgo eTeresópolis ponsável pela leva de imigrantes. Através
Por suas características climáticas do antigo secretário da embaixada japo-
amenas em relação às baixadas litorâ- nesa travou relações de amizade com um
neas, a região serrana do Estado do Rio brasileiro (Dr. Júlio Zamith), proprietá-
de Janeiro sempre foi procurada como rio no local, e decidiu estabelecer-se na
refúgio de verão. localidade de nome Tingly, tendo, então,
iniciado a plantação de uma espécie de
Petrópolis caqui em Nova Friburgo (Sítio Japão).
Na história da imigração japonesa Durante cerca de 20 anos, desde a che-
no Brasil, a cidade de Petropólis é a pri- gada em 1929, a familia Kassunga foi a
meira referência pois a representação di- única família nikkey na município.
plomática do Japão, a Legação do Japão
no Brasil, foi instalada em 1897, perma- Kenichi Tanizaki e Yoshiyubu Ban - As
necendo nesta cidade até 1918, quando, duas experiências que se seguem são
114 um dos exemplos da colonização japo-
nesa no Brasil. O que as distingue das
demais, no primeiro caso, é a ênfase no
Tomoko Iyda Paganelli

desenvolvimento da agricultura e, no
segundo caso, a experiência de um dos
primeiros jovens que emigrou para o
Brasil na condição de estagiário de téc-
nicas agrícolas.
A Fazenda de Kenichi Tanizaki (hoje,
Fazenda São João) foi um dos exemplos
de empreendimento agrícola no Brasil
apoiado na concepção que, no Japão do
período Showa (1926-1989), enfatizava
o papel da agricultura como base da na- Família Kenichi Tanizaki em Tere-
ção e da formação de jovens líderes. Nesse sópolis. À esquerda, o casal mais
período, foi fundado o Nippon Senenkai idoso, Sr. e Sra. Tanizaki. Teresó-
polis (RJ)
(Associação de Moços do Japão), um
empreendimento de colaboração entre o
governo japonês, as Forças Armadas e a
iniciativa privada. A influência dessa As- Ocupação do solo nos vales e alvéolos,
sociação repercutiu na formação dos nú- tomate, couve e feijão. Teresópolis (RJ)
cleos agrícolas do pós-guerra através do
Seinen-Cotia (Jovem Cotia).
Kenichi Tanizaki, oriundo de Tóquio,
desenvolveu na fazenda Tanizaki/Fazen-
da São João, de sua propriedade, proje-
tos inspirados na concepção acima men-
cionada. Supervisionada e inspecionada
por seu proprietário duas ou três vezes
por ano, seu planejamento e administra-
ção eram delegados a jovens auxiliares.
Esta fazenda serviu de modelo para uma
geração de jovens imigrantes e estagiá-
rios, tendo sido a maior produtora de to-
mate da região.
Yoshiyubu Ban retrata o perfil dos
imigrantes japoneses do pós guerra que
vieram solteiros para o Brasil. Forma-
do em Agricultura pela Universidade de
Tiba-Ken, foi um dos primeiros imigran-
tes desse período, chegando ao País para
dedicar-se ao estudo de técnicas agrícolas.
Participante da Associação Nippon de das Caixas/Magé), atingia os Municípios 115
Jovens (Nippon Seinem Kuôko) estagiou de Friburgo e Cantagalo. No Município
na propriedade de Tanizaki, e posterior- de Cachoeira de Macacu, cuja origem

Resgate de uma história


mente reencontrou, em Brasília, seu pro- remonta a 1679, na encosta da Serra do
fessor, contratado pela NOVACAP para Mar, cortada pela estrada Rio-Friburgo,
a construção de um jardim japonês, no estão instalados dois núcleos de imigra-
interior de um dos palácios da nova ca- ção: Funchal e Papucaia.
pital do País.
Núcleo Colonial de Funchal
Teresópolis O núcleo de Funchal está localizado
A Associação Japonesa de Teresó- no distrito de Japuíba, em Cachoeira de
polis data de 1953. Atualmente recebe a Macacu. Em 1960, o antigo Instituto Na-
denominação de Teresópolis Nikkey Clu- cional de Imigração e Colonização, hoje
be e congrega 245 famílias, num total de absorvido pelo Instituto Nacional de Co-
641 pessoas descendentes de imigrantes lonização e Reforma Agrária - INCRA,
japoneses da cidade e da zona rural, que autorizou a emigração de quatro famí-
se dedicam à horticultura (plantação de lias japonesas que se estabeleceram, em
repolho, salsa e verduras em geral) e cuja abril de 1961, no que hoje é conhecido
produção é entregue, na própria proprie- como Fazenda Funchal. A primeira leva
dade, aos comerciantes do CEASA do de imigrantes, 10 famílias vindas de
Rio de Janeiro, durante todo o ano. A Hokkaido, chegou em 13 de agosto de
associação atualmente não tem ativida- 1961. No Japão, trabalhavam nas mi-
de esportiva. São ministradas aulas de nas de carvão de Hokkaido e de Kiyshu.
Japonês por uma nissei, esposa do pre- Com o fechamento destas, sem emprego,
sidente da entidade, e entre os alunos há a Companhia deu-lhes a opção de irem
predominância de brasileiros e poucos para o Paraguai ou para a agricultura
descendentes de japoneses. A associação no Estado do Rio de Janeiro. Optaram
se incumbe das festividades culturais do pelo Rio de Janeiro que, apesar do preço
dia 1o de janeiro e do undokai (gincana da terra, possuía as vantagens de proxi-
esportiva familiar) que ocorre em agos- midade da estrada asfaltada e mais fácil
to. O presidente, Massaki Shitomi, res- acesso para a comercialização dos pro-
gatou a história do núcleo. Seu pai che- dutos agrícolas. Além de 10 famílias de
gou ao Brasil, com dois anos, natural de comerciantes, havia 38 famílias consti-
Kumamoto, foi para Pompéia (Norte de tuídas apenas de lavradores.
São Paulo) e reimigrou para Teresópolis, Atualmente, existem 27 famílias em
entre 1934-1935. Funchal. Com a morte dos pais, alguns
descendentes se instalaram em Niterói e
Os núcleos doVale do rio Macacu: Funchal e no Município do Rio de Janeiro; outros
Papucaia foram para São Paulo ou retornaram ao
O vale do rio Macacu foi a via de pe- Japão. Os que ficaram no Rio de Janei-
netração para a interior do estado que, ro investiram na atividade de criação
partindo da baía da Guanabara (Porto de aves por alguns anos, tendo iniciado,
116 Frutas do Núcleo Colonial
de Papucaia. Papucaia (RJ)
Tomoko Iyda Paganelli

posteriormente, experiências com plantação de goiaba. Ainda hoje possuem laços


com a terra natal de seus ancestrais: têm aposentaria paga pelo Japão, mantêm o
recebimento regular de revistas e jornais do Japão e assistem a programas da TV ja-
ponesa. Muitos obtiveram a possibilidade de votar nas eleições do Japão, em 2000.

Núcleo Colonial de Papucaia


Na década de 1950, na Fazenda Papucaia (Cartograma 2), onde hoje vivem 65 fa-
mílias, predominava o cultivo de diferentes produtos hortifrutigranjeiros. A região
era produtora de tomate e, posteriormente, de jiló e quiabo, cuja comercialização foi
difícil por falta de consumo da população. Mais tarde, com a queda do preço do to-
mate, passaram a produzir goiaba, por recomendação de uma associação paulistana.
Com 10 anos dedicados à produção de goiaba, Cachoeira de Macacu se transformou
no maior produtor da fruta no estado e o segundo produtor do Brasil.
A família Namura, residente em Papaucaia, chegou ao Brasil em 1957, sendo
plantadores de maçãs em Hokkaido. A possibilidade de emigrar para o Brasil surgiu
por ocasião de uma forte nevasca em sua região de origem, que dizimou a plantação.
Emigraram e iniciaram, em Papucaia, a cultura da goiaba trazendo uma experiência
do cultivo de maçã. O patriarca introduziu diversas técnicas utilizadas no Japão no
plantio da maçã e desenvolveu novas es- Referências 117
pécies de goiaba, apurando a qualidade GEIGER, P. P.; MESQUITA, M. G. C. Estudos
da fruta, e batizando-as de Namura 1 e rurais da baixada fluminense (1951-1953).

Resgate de uma história


Namura 2. Produzem cerca de 480 tone- Rio de Janeiro: IBGE, 1956. (Biblioteca geo-
ladas por hectare, mediante a utilização gráfica brasileira. Série A, n. 12).
de técnicas irrigadas, aspergindo água HANDA, T. Cronologia da imigração japo-
no final da produção, o que terminou nesa no Brasil. São Paulo: Museu Histórico
por aumentar a produtividade de 30 hec- da Imigração Japonesa, 2006.
tares a 50 hectares por ano. INOUE, M. F. M. Do outro lado nasce o
Concluindo, vê-se que a reimigração sol: o trabalho dos japoneses e seus descen-
dentes no Estado do Rio de Janeiro. 2002.
e as associações foram marcas indeléveis
Tese (Doutorado em Sociologia) - Faculda-
na formação e consolidação dos núcleos de de Filosofia, Letras e Ciências Huma-
no Estado do Rio de Janeiro. De fato, a nas, Universidade de São Paulo, São Paulo,
Cronologia da imigração japonesa no 2002. 2 v.
Brasil (HANDA, 2006) e a história das MARAFON, G. J. et al. Elementos norteado-
famílias que para aqui vieram apontam res da (re) organização espacial fluminense.
para a importância que desempenharam In: ______. Regiões de governo do Estado do
e desempenham as associações (clubes) e Rio de Janeiro: uma contribuição geográfica.
Rio de Janeiro: Gramma, 2005. p. 25-45.
cooperativas agrícolas, na preservação
dos traços culturais e na viabilização da OS PRECURSORES do Kasato Maru. São
Paulo: Museu Histórico da Imigração Japo-
produção agrícola dos primeiros imi-
nesa, 2006.
grantes japoneses e seus descendentes.
SOUZA, S. do N. Educação e mobilidade so-
cial na colônia japonesa de Santa Cruz. 2004.
Dissertação (Mestrado em Educação) - Uni-
Ao meu pai, Massaji Iyda (1903), plantador
versidade Federal Fluminense, Rio de Janei-
de algodão na média Sorocabana, no pe-
ro, 2004.
ríodo 1927-1935. Foi um dos fundadores
da Sociedade Cultural e Esportiva Nipo- VALVERDE, O. et al. Estudos para a recu-
Brasileira de Avaré, em São Paulo, falecido peração econômica da Baixada Fluminense.
aos 98 anos, em 18 de junho de 2001, após Anuário Geográfico do Estado do Rio de Ja-
93 anos do início da imigração japonesa no neiro, Rio de Janeiro: IBGE, n. 5, p. 83-122,
Brasil. 1952.
Parte 4 |

Tradição e Modernidade
Dos passageiros do Kasato Maru
aos aviões da Varig
quem eram os imigrantes?

Célia Sakurai

A
data de 18 de junho de 1908 é emblemática para a história da imigração ja-
ponesa e para o Brasil. Ela marca não só o início da imigração oficial como
também daqueles que vieram por convites de parentes ou conhecidos e de
outros, por iniciativa própria. Os 781 japoneses embarcados no navio Kasato Maru
aportaram em Santos, São Paulo, em 1908, como imigrantes e com o apoio dos go-
vernos dos dois países. Foram seguidos por um fluxo constante que se estendeu até o
início dos anos 1980.
Quem são esses japoneses que em algum momento interromperam suas vidas no
Japão e atravessaram oceanos para apostar o seu futuro num país do outro lado do
mundo?
Já de início, surge a surpresa de constatar que em quase todos os livros de regis-
tros das entradas no Brasil pelo porto de Santos, até o período da II Guerra Mundial,
a ocupação dos chefes de família está preenchida como “agricultor”.
A ocupação apontada nos registros é um indicador que levanta aspectos insti-
gantes na reflexão sobre quem foram os japoneses que vieram para o Brasil: de um
lado, mascara a realidade das origens reais dos que imigraram, considerando-se
como era o Japão do início do Século XX; de outro, esse registro como agricultor
revela que, pelo lado brasileiro, o alvo está bem definido. É sobre esses aspectos
que nos deteremos.

Japão e Brasil
É notoriamente conhecida a dedicação japonesa à agricultura, como também é
amplamente sabido que o território japonês é pequeno e a geografia muito aciden-
tada torna intensivo o cultivo da terra com o aproveitamento máximo de todos
os espaços disponíveis. A história do Japão até o Século XIX pode ser sintetiza-
da como a da luta permanente pelo domínio das terras férteis. As migrações dos
povos asiáticos para o arquipélago japonês formaram reinos que ocuparam as
planícies de terras agriculturáveis, seguindo-se um processo de lutas incessantes
122 entre esses reinos até a consolidação
do reino de Yamato e o longo proces-
so para alcançar estabilidade política
Célia Sakurai

e institucional com a criação da figura


de um imperador. Mas, nem mesmo a
figura de um imperador era suficiente
para conter a necessidade de domínio
sobre as terras mais férteis. Foram as
forças locais que, de fato, predomina-
ram como autoridade para os mora-
dores das regiões que dominavam. O
imperador era apenas a figura simbó-
lica que nominalmente manteve o de-
licado equilíbrio interno por séculos,
até que por 300 anos foi efetuado um manutenção dessa estrutura recaiu so- Ilustração do Imperador Meiji
pacto de paz, conhecido como o xogu- bre a população. Os diversos segmentos
nato Tokugawa (1603-1868). Nesse de trabalhadores do campo se defron-
período de paz interna, ocorreu o de- taram com as dificuldades da economia
senvolvimento de técnicas agrícolas, monetária sendo obrigados a enviar fi-
como adubação, irrigação, enxertos e lhos e filhas para as cidades que, por sua
rodízio de culturas, que aumentaram vez, ficaram inchadas de trabalhadores
a produtividade das terras e continua- sem qualificação, obrigados a aceitar
ram a ser aprimoradas com as lições empregos de baixa remuneração nas
recebidas depois da aproximação com indústrias e serviços. Algumas alterna-
o Ocidente, a partir do período Meiji, tivas para a falta de perspectiva de um
em 1868. Inicia-se uma nova fase na futuro sólido para esses jovens sem ex-
história japonesa quando o Japão co- periência e qualificação eram o servi-
meçou a se industrializar rapidamente, ço militar, ou a colonização nas terras
tornando-se, aos poucos, uma potência recém-conquistadas, ou a emigração.
econômica e militar. Na virada para o É nesse contexto que muitos japoneses
Século XX, o Japão voltou-se para fora encararam a sua viagem.
de seu território, empreendendo guer- O Brasil do início do Século XX, por
ras de conquista para melhor garantir sua vez, recém-saído da escravidão e ini-
o sustento de sua população. Qualquer ciando o período republicano, tinha no
mudança, porém, não ocorre sem dor. café o símbolo de novos tempos. A eco-
A sociedade japonesa teve que se nomia cafeeira deslocara o centro econô-
adaptar aos novos tempos, passando mico e político para o Sudeste, onde
do ceticismo quanto à eficácia dos ru- emergiram novos grupos que passaram
mos que a nação estava tomando para a decidir os destinos do País. Como con-
a euforia da vitória nas guerras contra seqüência, o Estado de São Paulo tor-
a China e a Rússia. O seu território foi nou-se o grande pólo de atração de no-
estendido para dentro da Ásia, mas a vos negócios, de urbanização acelerada
e necessidade de mão-de-obra para as das de colonização, o número de não- 123
novas áreas cultivadas de café, o que se agricultores não diminuiu.
concretiza com a vinda de imigrantes. Em 1958, foi realizado o Censo De-

Dos passageiros do Kasato Maru aos aviões da Varig


Dentre eles, os japoneses. mográfico da Colônia Japonesa, um
extenso trabalho de levantamento de
Quem foram os japoneses que escolheram dados estatísticos para obtenção do
vir para o Brasil? perfil dos japoneses e descendentes no
Não eram todos agricultores e, para Brasil (SUZUKI, 1969). Na seção so-
emigrar, burlaram a burocracia decla- bre a origem socioeconômica dos che-
rando-se agricultores. As companhias fes de família no Japão, desperta muita
de emigração japonesas fizeram “vistas atenção o fato de que mesmo quem es-
grossas” em virtude da dificuldade para tava nas cidades tinha os pais agricul-
arregimentar candidatos dispostos a vir tores, a maior parte trabalhando como
para o Brasil, na época em que os Esta- arrendatários, ou seja, a ligação com o
Os imigrantes que che-
garam ao Porto de San- dos Unidos eram o destino favorito. Elas campo era ainda muito recente para a
tos vinham de todas as tinham contrato com fazendeiros de café maioria daqueles de origem urbana que
regiões do Japão: das
e, para preencher o número requisita- emigraram. Eram filhos de pais que per-
províncias mais pobres
e “atrasadas” às mais do, permitiram a vinda de pessoas que maneciam no campo e migraram para
ricas e “nobres”. Entre não estavam engajadas na agricultura as cidades em virtude de suas famílias
eles, havia diferenças
naquele momento. Mesmo com o maior não terem condições de manter todos
marcadas de língua
e de costumes. Kobe, controle das companhias, unificadas os membros dependendo da produção
Japão, 1953 em 1917, e com as companhias priva- da terra que não era própria, um nítido

D
124 reflexo das profundas mudanças que es- províncias do Japão, do norte ao
tavam ocorrendo no interior da socie- sul, do leste ao oeste, inclusive alguns
dade japonesa. nascidos na Coréia e Taiwan, territórios
Célia Sakurai

Quando as companhias de emigra- ocupados pelo Japão. Havia um contras-


ção fizeram a divulgação sobre o Brasil, te nítido nos dialetos, no comportamen-
pesou muito na decisão para emigrar o to entre os que saíram das províncias
chamariz das terras a perder de vista. A “atrasadas” e “pobres”, de forte tradi-
propaganda acenava para a possibilida- ção rural como Okinawa e
de de lidar com extensões de terras de Kagoshima, e os das provín- mar do Japao

que nunca poderiam usufruir no Japão, cias mais “nobres”, da ilha


mas os 168 986 japoneses, entre homens de Honshu, onde se localizam
e mulheres de todas as faixas etárias que Tóquio, Kyoto, Osaka, cosmopo-
trocaram o seu país natal pelo Brasil, de litas e engajadas no processo de
1908 até 1941 (SUZUKI, 1969, p. 16), modernização industrial. Para
chegaram com poucas informações so- a grande maioria, era a pri-
bre o seu novo lar. Não faziam idéia das meira vez que saíam
reais dimensões do País, da diversidade da terra onde ha-
cultural e muito menos o que significaria viam nascido e,
conviver com pessoas de outras naciona- portanto, o primeiro
lidades e diferentes raízes culturais. Até contato direto com oceano Pacifico

o período em que o Japão começou a sua japoneses de outras KYUSHU


marcha para a modernização, a história partes do país. Para
japonesa era praticamente a do próprio os de status superior, OKINAWA
Japão. Tudo o que não estava ligado ao foram destinadas as acomodações
universo cultural japonês causou um melhor localizadas na terceira classe.
enorme estranhamento e a xenofobia Quando da distribuição para as fazen- O Japão é um arquipé-
expressada no gaijin (estrangeiro) ao se das de café, os agentes das companhias lago que forma um arco
localizado no noroeste
referir a todos os que não eram japone- de emigração procuraram respeitar essa do Oceano Pacífico. As
ses (mesmo estando no Brasil), não foi hierarquia, não misturando famílias de ilhas maiores, conside-
nada mais que a forma de se identifica- províncias muito diferentes. radas as principais, são:
Hokkaido, Honshu,
rem como grupo. Pelo lado dos brasilei- As dificuldades de comunicação, de Shjikoku e Kyushu.
ros, por sua vez, eram todos chamados adaptação ao clima e aos novos ingre- Honshu é a ilha mais
de “japão”. dientes em sua dieta, atingiram a todos populosa e onde se de-
senrola a maior parte da
No momento do desembarque no por- igualmente. De forma diferente, senti- história do país. Sakurai
to de Santos, todos se tornaram iguais: ram que as condições oferecidas pelos (2007, p. 23-25)
eram imigrantes e, de fato, todos eram fazendeiros estavam muito aquém do
“japão”. As diferenças que se manifesta- esperado. A realidade dos primeiros
ram durante a viagem foram se apagando. anos está sintetizada numa canção que
Dentro do navio, os próprios passageiros mostra o desânimo e a frustração do
da terceira classe se estranharam porque, Brasil real: “Mentiu quem disse que o
além da origem ocupacional diversa, os Brasil era bom, mentiu a companhia de
imigrantes eram originários de todas as emigração” (HANDA, 1987).
125

Dos passageiros do Kasato Maru aos aviões da Varig


No momento do de- “O tempo é o melhor dos remédios”, adoção da língua padrão japonesa na
sembarque no Porto diz o ditado popular. A adaptação foi qual tinham sido alfabetizados come-
de Santos todos se
tornaram iguais: eram ocorrendo com o passar de experiências çou a substituir os dialetos, que nos pri-
imigrantes e, de fato, de homens e mulheres que lutaram para meiros tempos eram usados como auto-
todos eram “japão”. construir um lar, manter a família, mes- identificação perante os outros. Com o
Santos (SP), 1950
mo em condições distantes do padrão tempo, os próprios japoneses aprende-
em que foram socializados. Ocorre que ram a se conhecer, experiência que difi-
a experiência migratória inverteu as po- cilmente teriam oportunidade de viven-
sições de status dentro do grupo, pois ciar no Japão nas primeiras décadas do
os imigrantes de origem urbana tiveram Século XX. Se em algumas regiões do
que tomar lições de como lidar com a Japão o inhame era cozido junto com o
terra com aqueles que tinham familia- arroz, em outras, era a batata-doce; uns
ridade com o trabalho do campo, fator usavam mais açúcar para temperar, ou-
que acelerou o processo de diluição das tros usavam ingredientes mais salgados;
diferenças internas dentro do grupo. A havia maneiras diferentes de conservar
126 alimentos entre aqueles que vinham das realização dos eventos – nascimentos,
províncias mais frias do norte e os do casamentos ou mortes – ou nem eram
sul, de clima subtropical. Com a escas- registrados, até por esquecimento. Em-
Célia Sakurai

sez que experimentaram nas fazendas bora as dificuldades iniciais fossem pau-
de café e nas zonas de desbravamento, latinamente superadas, não foram pou-
qualquer ajuda era bem recebida, e as cos os casos de suicídios, de distúrbios
trocas se efetuavam sem conflitos. Até mentais ou de mortes e seqüelas por
no plano religioso havia flexibilidade doenças ou acidentes.
já que sem poder contar com religiosos O maior contato entre os “japão” e
para dirigir os cultos, sobretudo nos fu- os gaijin foi reduzindo as arestas do es-
nerais e matrimônios, alguém da comu- tranhamento mútuo, a xenofobia dimi-
nidade se encarregava da cerimônia sem nuindo à medida que os contatos se es-
a preocupação de seguir rigidamente o treitaram. São pequenas manifestações
ritual das seitas budistas ou das diver- que mostram como os imigrantes e os
sas denominações cristãs. Pelo lado civil, descendentes caminharam para deixar A ajuda mútua foi
os registros eram feitos prioritariamen- para trás o mal-estar do início. Para não traço marcante das
te no consulado japonês e, em segundo serem tratados de “japão”, tornaram-se relações entre os
imigrantes japoneses.
lugar, nos cartórios brasileiros. Muitas Antônio ou Mário de modo a evitar cons- Mutirão para constru-
vezes, porém, ocorriam anos após a trangimentos com os nomes japoneses ção de escola
difíceis de pronunciar; foram ba- que encontraram no momento da chega- 127
tizados na Igreja Católica para ter da ao Brasil.
padrinhos brasileiros, figuras im-
padrin A possibilidade de comprar pequenos

Dos passageiros do Kasato Maru aos aviões da Varig


portantes na convivência com os
portan pedaços de terra abriu caminho para a
nacionais no interior do Brasil.
nacio policultura que, na realidade, era a ver-
Mais tarde, seus filhos e netos dadeira vocação desses imigrantes. Es-
foram registrados com preno- tavam habituados a cultivar diversos
me ocidental e japonês, e até produtos em suas terras no Japão, o que
a ggrafia dos sobrenomes foi era estranho era a monocultura. Deste
simplificada para facilitar a
sim modo, nos sítios, os pequenos agricul-
comunicação – muitos retira-
co tores plantavam tudo aquilo que gerasse
ram o “h” e o “s” dos “sh”,
ra renda. Da mesma forma que mudavam
“ts”, sons comuns na língua
“ts continuamente de lugar, mudavam de
japonesa. Por conseguinte,
ja produtos, sempre de acordo com a de-
mesmo o nome de família,
m manda do mercado. Plantações exten-
um dos elos com os ances- sivas como as do algodão e do amen-
trais e os parentes que per- doim, voltadas para a indústria de óleos
maneceram no Japão, se modificou
manecera comestíveis, eram divididas com as de
V d
Verduras e llegumes d
de com a mudança
d para o Brasil. verduras e legumes para assegurar uma
pequenas proprieda- Os chefes de família vieram mui- renda adicional, caso houvesse algum
des japonesas tinham
escoamento próprio e to jovens – a média de idade era de problema no decorrer da safra. A avicul-
giro rápido de capital. 20 anos – por isso, “não paravam quie- tura de poedeiras nasceu como atividade
Mercado em Monte tos”, sempre à procura de lugar e ativi- complementar à agricultura, tornando-
Alegre (PA)
dade para encontrar estabilidade finan- se depois uma especialização.
ceira. Foram as escolhas calculadas para Os que vieram sem familiaridade com
preencher as expectativas de cada família o trabalho agrícola logo se dirigiram para
Entre os agricultores que resultaram na mobilidade geográfi- as cidades, ou para a capital de São Paulo,
japoneses, a avicultura ca e ocupacional, duas variáveis que se ou, ainda, para as pequenas e médias cida-
de poedeiras nasceu
como complemento agregam à trajetória das famílias como des do interior. Nas zonas recém-abertas
da agricultura reação de desconforto com a situação pelas estradas de ferro, começaram a
128 surgir núcleos urbanos que atraíram comerciantes e prestadores
de serviços. É nessa onda de novas oportunidades que famílias
com pouco capital se dedicaram a atividades em que podiam
Célia Sakurai

aproveitar a mão-de-obra familiar e garantir giro rápido de ca-


pital: o pequeno comércio, como as quitandas, mercearias de se-
cos e molhados, bares, pensões e feiras. Essas atividades serviram
também de apoio aos pequenos sitiantes para a comercialização
de sua produção, por menor que fosse. As verduras e legumes
plantados em propriedades recém-adquiridas tinham forma de
escoamento e, também, de giro rápido de capital.
Esses japoneses foram, aos poucos, mudando os hábitos O pequeno comércio serviu de apoio aos pequenos
alimentares da população, oferecendo alternativas para a sitiantes para a comercialização de seus produtos. As
dieta dos brasileiros. Os chamados cinturões verdes em torno cidades foram, assim, o elo de ligação entre as famílias
que tiravam o sustento das pequenas e médias pro-
das cidades têm sua origem com esses pequenos proprietários, priedades, ou de terras arrendadas. São Paulo, 1940
que contavam com a garantia de venda nos estabelecimentos
dos patrícios. Na própria cidade de São Paulo, havia boxes
no mercado central dirigidos por japoneses que comerciali-
zavam produtos de chácaras de regiões como Morumbi, Ita-
quera e Freguesia do Ó, que até a década de 1950 ainda eram
zonas rurais. Esta mesma experiência se repetiu em cadeia em
outros centros urbanos. Quando a produção de um determi-
nado lugar ultrapassava o potencial de venda dos pequenos
estabelecimentos, a solução era a formação de cooperativas
para organizar a produção e garantir a comercialização. As
cidades eram, assim, o ponto de ligação para as famílias que
tiravam o sustento dos pequenos e médios pedaços de terra, As cidades ofereciam oportunidades para o exercício
de sua propriedade, ou arrendadas. de várias atividades econômicas. Dos trabalhos pro-
fissionais aos não qualificados, todos foram exercidos
As cidades abriram oportunidades também para os que vieram pelos imigrantes que buscavam a estabilidade e a
com qualificação em trabalhos manuais, como os marceneiros e ascenção social. Cafelândia (SP), 1940
carpinteiros que trabalharam na construção civil, por exemplo.
Estes logo alcançaram prestígio pelo esmero com que trabalha-
vam a madeira, herança secular vinda do Japão. Do trato com a
madeira e o bambu, surgiram vários fabricantes de brinquedos e
móveis; o mar atraiu pescadores para a cidade de Santos; e pro-
fissionais como confeiteiros – a fabricação de doces é uma espe-
cialidade respeitada no Japão – e massagistas puderam exercer
a sua profissão nas cidades. A tradição japonesa no tratamento
dos tecidos facilitou o caminho dos tintureiros, que se espalha-
ram por todas as grandes cidades, com destaque para a capital de
São Paulo. Por serem considerados discretos e educados, homens
As cooperativas organizavam a produção e garantiam
e mulheres japoneses eram disputados para trabalhar como em- a comercialização dos produtos agrícolas.
pregados domésticos em famílias moradoras em bairros chiques, Cooperativa Agrícola de Cotia. São Paulo (SP)
como copeiros, governantas e motoristas. para dar uma identidade de grupo aos 129
Outros encontraram ocupação aprenden- próprios imigrantes e uma forma de diá-
do ofícios na prática, como os mecânicos logo com a sociedade abrangente. Des-

Dos passageiros do Kasato Maru aos aviões da Varig


de máquinas e caminhões, os barbeiros e de reuniões informais, sentados nos ba-
os fotógrafos. Outros buscaram nichos res ou conversando em torno das mesas
voltados para outros japoneses, como os de refeição nas pensões (eram muitas
fabricantes de produtos culinários – tofu nas cidades do interior), até as reuniões
(queijo de soja), shoyu (molho de soja) e nas associações, a sociabilidade girava
saquê (bebida fermentada do arroz). em torno da necessidade de se organizar
Os bares e pensões foram espaços para ter um canal de diálogo entre os
importantes de sociabilidade do mesmo membros da comunidade e, deles, com
Desde reuniões informais modo que eram as associações criadas a sociedade local.
nos bares, nas pensões, até as
reuniões nas associações, a na esteira do processo de fixação das A sociabilidade foi facilitada pela
sociabilidade girava em torno da famílias nas cidades. A tão propalada presença de imigrantes cuja qualifica-
necessidade de se organizar para característica de organização dos japo- ção profissional no Japão estava dentre
criar canais de comunicação en-
tre os membros da comunidade, neses, seja nas associações ou nas coo- as ocupações não-manuais, como os
e deles com a sociedade local perativas, foram fórmulas encontradas empregados de escritórios, professores,
profissionais liberais, jornalistas. O pa-
pel desses profissionais foi fundamental
para diminuir o isolamento das pessoas.
O trabalho não se restringia aos empre-
Esquerda: bar do gos nos escritórios das companhias de
Sr. Miyagi. Bastos
(SP). Abaixo: pensão emigração, nos escritórios dos consu-
Yuwhi. Bastos (SP) lados ou nas agências bancárias: esses
130 funcionários se tornaram intermediários vadas a cabo por alguns agrônomos. No
na execução de serviços burocráticos início, os resultados dessas pesquisas eram
junto a cartórios e fóruns judiciais, bem divulgados e distribuídos aos interessados
Célia Sakurai

como na orientação para a compra e ven- sob a forma de panfletos que, mais tarde,
da de propriedades, graças à experiência se transformaram em revistas especializa-
e à comunicação em Português, mesmo das voltadas para assuntos agrícolas, redi-
que precária. Muitos ingressaram em es- gidas em Japonês.
colas brasileiras para se aperfeiçoar em Uma das formas de manutenção da
contabilidade, por exemplo. Estas pes- Língua Japonesa se dava através dos jor-
soas formaram uma elite respeitada den- nais produzidos por jornalistas que per-
tro das comunidades do interior, condu- corriam os núcleos em busca de notícias,
zindo as associações e cooperativas. socializando experiências, divulgando
Uma das implicações da maior convi- eventos esportivos, criando elos: uma das
vência entre os membros das comunida- colunas mais lidas era o obituário ou a
des japonesas no interior foi a formação sessão de pessoas procurando por paren-
de redes de ajuda mútua. Elas se desen- tes e amigos. Outra maneira de manter a
volveram espontaneamente sem cunho ligação com o Japão eram as escolas de
religioso ou político, recriando práticas Língua Japonesa. Os professores forma-
comuns do Japão, como o “envelope”, dos no Japão se desligaram das ativida-
que consistia na contribuição em dinhei- des agrícolas para se dedicar à educação
ro, anônima ou não, para ajudar nos das crianças. Muitos desses professores
momentos de doença e morte. No Japão, estudaram nas escolas normais para en-
é oferecido para uma família enlutada sinar o Português às crianças japonesas.
“comprar incenso”; no Brasil, a prática O mesmo ocorreu no setor da saúde. Vie-
se alargou, usando-se para os momen- ram médicos, dentistas, farmacêuticos
tos de emergência de pessoas ou famílias que visitavam famílias, atendiam em am-
que os recebiam de parentes ou amigos. bulatórios e hospitais pelo interior, e dei- Importante para a ma-
Tratando-se da abertura de algum ne- xaram escritas cartilhas, livros e artigos nutenção da Língua Ja-
gócio ou, ainda, para ocasiões especiais, em jornais sobre os sintomas e tratamen- ponesa eram as diversas
formas de comunicação
como o casamento de algum filho, exis- to das doenças, prevenção, orientações entre os colonos.
tia a prática do tanomoshi, uma espécie de higiene. Para o exercício da Medicina Cinema ambulante
de poupança coletiva feita entre amigos,
em que se fazia o depósito em dinheiro
de uma quantia estipulada pelo grupo e,
quando necessário, efetuavam-se saques.
Era muito comum quando o acesso aos
bancos era restrito.
Se pensada em termos mais gerais, a
ajuda mútua foi responsável também pela
divulgação de técnicas de adaptação de
plantas ao solo e clima do Brasil, de adu-
bação, de experimentos de variedades, le-
131

Dos passageiros do Kasato Maru aos aviões da Varig


A convivência entre no Brasil, os médicos precisavam revalidar seus diplomas japoneses, e para isso ti-
associações fortaleceu veram que se submeter a um exame de qualificação. Muitos freqüentaram o curso
os elos de ligação
entre os imigrantes, inteiro de Medicina no Brasil. Assim como a educação, a saúde dos imigrantes rece-
promovendo festas, beu atenção especial do governo japonês, que criou programas especiais e destacou
gincanas e torneios funcionários para dar orientação e assistência aos profissionais envolvidos.
esportivos regionais.
São Paulo (SP), 1936 A convivência entre as associações promoveu o intercâmbio de esportistas, poe-
tas, cantores que se encontravam nos inúmeros torneios regionais e estaduais que
ocorreram antes da Segunda Guerra Mundial. Os talentos iam afluindo à medida
que a luta pela sobrevivência ficava menos pesada. Foi assim que o beisebol, o judô,
o atletismo propiciaram a confraternização entre os jovens, enquanto os mais velhos
se dedicavam às competições de haikai, tanka (poesias japonesas), aos concursos de
oratória e canto. Havia incentivo dentro das comunidades para que cada um buscas-
se um caminho alternativo ao trabalho, voltado para o lazer e o compartilhamento
de experiências. Dentro desse contexto, surgiram artistas plásticos e artesãos que
passaram a se dedicar exclusivamente ao desenvolvimento de sua arte.
As redes de solidariedade se espalharam em todos os locais onde famílias japone-
sas se concentraram. Havia um pacto silencioso de amparar aqueles mais necessita-
dos, quer por práticas como a do “envelope”, quer pelo trabalho de pessoas voltadas
132 para esse fim, como os religiosos de dife-
rentes crenças, budistas ou cristãos, ou
voluntários que amparavam os órfãos,
Célia Sakurai

as mães solteiras, as pessoas sem família.


No imaginário dos moradores da cidade
de São Paulo ouvia-se muito que “não
existem mendigos japoneses”!
A guerra, declarada pelo Brasil aos paí-
ses do Eixo em 1942 – Alemanha, Itália e
Japão – afetou a rotina das famílias, direta
ou indiretamente. Não era raro que o che-
fe fosse preso e a família desconhecesse seu
paradeiro, ou que os negócios passassem
para o nome de pessoas sem sobrenome
japonês, já que durante a Segunda Guer-
ra era proibido aos cidadãos dos países
do Eixo adquirir ou vender bens. Nesses
momentos, as relações com os padrinhos
e vizinhos brasileiros foram de grande va-
lia. A proibição dos jornais e revistas em seriam aceitos candidatos com formação Quadro de comemo-
Língua Japonesa prejudicou as redes de técnica, e de acordo com a demanda. O ração dos 50 anos de
imigração japonesa
sociabilidade até então estabelecidas, e o embaixador brasileiro no Japão, Rober- no Brasil
fechamento das escolas de Língua Japone- to Mendes Gonçalves, foi claro em 1958
sa interrompeu o estudo das crianças. As quando disse: “[...] deveríamos insistir
crianças que na época foram atingidas por mais na qualidade do imigrante que na
essas medidas (de 1938 a 1945) têm co- quantidade, frisando dois pontos es-
nhecimento da linguagem falada, mas não senciais, dos quais depende o futuro da
da escrita. Formam a geração dos analfa- emigração: seleção e assimilação”(grifo
betos da guerra. nosso)1. Isto é, havia ainda receios em
relação aos japoneses, por isto, para ga-
No pós-guerra: uma outra história? rantir a “qualidade”, os empregadores,
A partir de 1952 (reatamento das rurais ou urbanos, faziam a solicitação
relações diplomáticas) até o final da dé- de mão-de-obra e os funcionários do go-
cada de 1970, chegaram mais 50 000 verno brasileiro passavam o pedido aos
imigrantes japoneses para preencher a japoneses, que por sua vez indicavam o
necessidade de mão-de-obra para os candidato. Saíam do Japão, sabendo de
projetos de desenvolvimento do gover- antemão a função, o nome do emprega-
no brasileiro do pós-guerra: ampliação dor, o endereço e o salário. Os jovens do
das áreas para a agricultura e início do
processo acelerado de industrialização. 1
Foi consultado o Ofício nº 221, da Embaixada
Desta vez, porém, as regras de recruta- do Brasil em Tóquio, no Arquivo Histórico do
mento e seleção foram mais rígidas. Só Itamaraty, em Brasília.
sexo masculino que mal haviam termi- Os jovens agricultores se reuniram 133
nado os cursos de técnicas agrícolas ou aos imigrantes e descendentes do pe-
de especialização industrial formaram a ríodo de antes da guerra que ainda

r s do Kasato Maru aos aviões da Varig


grande maioria deste novo fluxo. A ida- permaneciam na agricultura e, juntos,
de média não ultrapassava os 25 anos e iniciaram a abertura de novos pólos
eram solteiros na quase totalidade. Estes agrícolas2. Com o passar dos anos, os
também eram originários de todas as resultados podem ser observados atra-
regiões do Japão, embora se verifique vés da introdução de mais produtos na
uma nítida mudança em relação ao pe- mesa dos brasileiros, sobretudo as fru-
ríodo anterior. Até a guerra, os maiores tas, como o mamão do tipo papaia, os
contingentes vinham de províncias cuja melões e maçãs, anteriormente impor-
atividade principal era a agricultura. No tados. Locais que não tinham tradição
pós-guerra, há uma inversão: a decla- de agricultura comercial entraram no
ração do último local de residência dos circuito de negócios, como o interior de
jovens imigrantes recai sobre “regiões Santa Catarina e regiões do Nordeste –
nobres”, como Tóquio, Osaka, Hyogo e Rio Grande do Norte, sul do Estado da

passageiros
as províncias ao seu redor. Há uma ex- Bahia, Chapada Diamantina (Bahia),

ageiro
ceção, que é Okinawa. Os agricultores partes do baixo e médio rio São Fran-

ssag
da província foram profundamente pre- cisco (norte de Minas Gerais, Bahia,

ass
Interior da Usiminas judicados pelos bombardeios no final da Pernambuco) – além das extensas áreas

os pa
guerra e, por isto, receberam uma aten- do Cerrado.

Dos
Do
ção especial, participando de projetos de A participação dos técnicos nas in-
colonização não só no Brasil como na dústrias ocorreu principalmente nos car-
Bolívia e Paraguai. Chegaram ao Brasil gos de chefia de sessões, ou na gerência
a partir de 1953 para trabalhar em colô- ou diretoria das empresas, cujas matri-
nias no atual Estado do Mato Grosso do zes eram japonesas, ou em indústrias de
Sul e no norte de Mato Grosso. nipo-brasileiros. Vieram implementar as
Do ponto de vista do planejamen- etapas iniciais dos processos industriais,
to, a vinda dos novos imigrantes pode desenhando, projetando, montando má-
ser considerada bem-sucedida. Sob a quinas e ensinando a operação e a ma-
orientação de empresas como a Japan nutenção aos trabalhadores brasileiros.
Migration and Colonization - JAMIC, Ocorreu o mesmo nas indústrias pesadas
fundada em 1954, ou pela Cooperativa
Agrícola de Cotia, os jovens imigrantes
2
As colônias mais importantes do pós-guerra
se engajaram nos projetos de coloniza-
foram: Várzea Alegre (Mato Grosso do Sul); Pi-
ção ou no quadro de funcionários das nhal (São Paulo); Guatapará (São Paulo); Ou-
indústrias privadas e de base. Para a rinhos (São Paulo); Ramos (Santa Catarina);
Caçador (Santa Catarina); Ivoti (Rio Grande
adaptação se efetuar mais depressa, em
do Sul); Tomé-Açu (Pará); JK (Bahia); Colô-
janeiro de 1964 foram iniciados cursos nia Efigênio Sales (Amazonas); Colônia Kinari
de adaptação com aulas de Português, (Acre); Colônia Sakura (Brasil Gifu-mura em
Guararema, São Paulo); Colônia Federal Gua-
de informações sobre o Brasil, inclusive
má (Pará); Colônia Jacareí (São Paulo); e Três
de culinária para as esposas. Lagoas (Mato Grosso).
134 e de infra-estrutura como na Siderúrgi- tinham vindo antes. Os novos costu-
ca Usiminas ou no Estaleiro Ishibras. A mavam chamar os antigos de burajiru
convivência nos locais de trabalho, po- (Brasil) bokê (gagá, velho) numa alusão
Célia Sakurai

rém, nem sempre foi cordial, pois a ad- ao “atraso” destes, que ainda falavam e
ministração era feita dentro dos métodos escreviam num Japonês antigo, anterior
de trabalho japoneses, aos quais os bra- à reforma efetuada depois da guerra, e
sileiros não estavam acostumados. A in- tinham comportamentos e hábitos anti-
termediação era feita pelos nipo-brasilei- quados, distantes daqueles da geração
ros que, entre outras funções, serviam de pós-guerra japonesa. A tensão chegou
intérpretes “traduzindo” as ordens das a um ponto que, em 1959, houve uma
chefias. Houve até uma tentativa de gre- violenta briga numa das ruas do bair-
ve na Usiminas porque os operários não ro da Liberdade, em São Paulo, entre os
conseguiam se adequar às exigências dos “Japão novo”, como eram chamados, e Porto de Tubarão (ES)
chefes japoneses. nisseis. Alguns pais de famí-
Situação semelhante ocorreu na co- lia chegaram a proibir que
munidade como um todo. Nos primei- suas filhas se casassem com
ros anos da década de 1950, a convi- eles. Foi encontrada uma
vência foi tensa em razão das diferenças solução trazendo-se noivas
inerentes à vivência de ambos os gru- do Japão através da prática
pos: de um lado, os antigos imigrantes da fotografia, como era co-
que tinham vindo trabalhar nas fazen- mum nos Estados Unidos no
das de café; de outro lado, os jovens início do Século XX: muitas
nascidos num Japão mais urbanizado picture brides chegaram ao
e industrializado que o do início do Brasil para casar sem conhe-
século. Chegaram orgulhosos, consi- cer o noivo, que geralmente
derando-se superiores por serem mais era agricultor. Novamente,
estudados, mais cosmopolitas. Por sua o tempo foi diminuindo as
vez, os velhos imigrantes os acusavam arestas e foram realizados
Altos fornos de ingratos, pois entendiam que não muitos casamentos entre
da Usiminas reconheciam as dificuldades passadas membros dos dois grupos.
e apenas usufruíam do espaço social Após terminada a guer-
conquistado a duras penas pelos que ra, os deslocamentos para as
nichos do pequeno comércio, que duran- 135
te a década de 1950 até o final do século
estiveram nas mãos de famílias de japo-

Dos passageiros do Kasato Maru aos aviões da Varig


neses imigrantes, como em São Paulo. A
substituição do slogan “bairro japonês”
para “bairro oriental”, para a Liberdade,
é significativa para entender porque os
produtos japoneses são vendidos em lo-
jas que não pertencem mais a japoneses,
como foi no passado.
A partir de 1973, os imigrantes come-
çaram a chegar de avião, deixando para
trás a longa tradição dos navios. Deste
ano em diante, porém, o número de en-
tradas começou a cair, até praticamente
desaparecer no final da década. Com o
vertiginoso desenvolvimento econômi-
co a partir dos anos 1970, o Japão não
precisava mais exportar mão-de-obra.
Uma década depois, o movimento con-
trário começou a tomar força: desta vez
os descendentes vão para a terra de seus
A compra da casa cidades se acentuam e é o momento em ancestrais à procura de trabalho. É o
própria pelos que os descendentes de primeira gera- começo de uma nova etapa de uma his-
nisseis realiza o
sonho de seus pais ção, os nisseis, podem viver o sonho de tória que começou há 100 anos com a
de uma vida estável, seus pais de uma vida estável, mas sem vinda dos primeiros “japão” a bordo do
permitindo também luxo. Entre as metas na cidade estão a Kasato Maru.
reviver o modelo
de família extensa aquisição de imóvel para residir levan-
japonesa do consigo os pais e eventuais parentes,
quase à semelhança da família extensa Referências
japonesa. Outro objetivo perseguido HANDA, T. O imigrante japonês: história de
quase obsessivamente é a garantia de sua vida no Brasil. São Paulo: T.A. Queiroz:
oferecer estudos para os filhos mesmo Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, 1987.
(Coleção Coroa vermelha. Estudos brasilei-
que em escolas particulares, pagas com ros, v. 15).
horas de trabalho nas feiras, quitandas,
SAKURAI, C. Os japoneses. São Paulo: Con-
tinturarias, salões de beleza, ou diante
texto, 2007.
da máquina de costura. Formados, os
descendentes abandonaram os negócios SUZUKI,T. Narrative part. In: THE
JAPANESE immigrant in Brazil. Tokyo: Uni-
dos pais e partiram para a profissão que versity of Tokyo, 1969. v. 2. Edição em In-
escolheram. A educação dos descenden- glês, com análises dos resultados do censo
tes é um indicador de ascensão social e a demográfico realizado em 1958 pela Comis-
explicação para o desaparecimento dos são de Recenseamento da Colônia Japonesa.
Imigração japonesa no Brasil
riquezas de uma presença secular

Mônica Raisa Schpun

A chegada

N
o dia 18 de junho de 1908, o vapor Kasato Maru, vindo do porto japonês
de Kobe, encostava no porto brasileiro de Santos trazendo os primeiros 781
imigrantes japoneses destinados às fazendas de café do Estado de São Paulo.
Precedida de um longo processo de debates e hesitações entre as duas partes, esta
chegada marcou o início da história agora centenária da presença japonesa no Brasil.
Maior concentração nipônica fora do Japão, com cerca de 1,5 milhão de pessoas, a
comunidade nipo-brasileira apresenta uma história singular em relação às suas equi-
valentes em outros países – sobretudo Estados Unidos e Peru – e às outras comunida-
des étnicas presentes em solo brasileiro.
O acordo de 1908 foi assinado diretamente pelo governo do Estado de São Paulo
com o governo japonês. Não só o sistema federativo do Brasil reservava uma mar-
gem de autonomia bastante grande aos estados, mas o café era um negócio paulista.
O objetivo dos cafeicultores era de enraizar os imigrantes nas fazendas, evitando que
o investimento inicial fosse perdido. Assim, o tratado assinado incluía uma exigência
significativa do lado brasileiro: a imigração deveria ser familiar e não individual, a
família sendo composta de no mínimo três pessoas aptas ao trabalho, ou seja, en-
tre 12 e 45 anos. Tal exigência tocava num problema fundamental, já que poucas
famílias japonesas propunham-se à emigração, até então majoritariamente mascu-
lina. É assim que, recorrendo a uma prática familiar existente no Japão, a adoção
de adultos, muitas famílias compuseram-se no momento de emigrar, encaixando-se,
assim, nos critérios previstos pelo acordo binacional.

No campo
O sistema de trabalho em vigor nas fazendas de café – colonato – baseava-se na par-
ticipação de todos os membros da família: a cada uma cabia um certo número de pés
de café e, quanto mais numerosos seus membros, maior era sua rentabilidade. As pri-
meiras famílias japonesas parecem ter sido pequenas, formadas muitas vezes às pressas,
138
Mônica Raisa Schpun

em torno dos homens candidatos à emi- O tempo médio de permanência no Família japonesa em
gração. Porém, pouco a pouco, essa rea- sistema de colonato foi, para os japone- foto de passaporte.
Japão, 1918
lidade mudou, no sentido de uma maior ses, relativamente curto: metade deixou
adaptação às exigências do trabalho nos as fazendas de café em menos de cinco
cafezais. anos, mas uma boa parte o fez em menos
Em 1924, o governo japonês assumiu de dois anos. Muitos alcançaram rapida-
a responsabilidade pelas subvenções ofe- mente a posição de arrendatários ou de
recidas aos imigrantes, prestando uma pequenos proprietários, seguindo as duas
assistência muito mais significativa do possibilidades que se apresentavam na
que aquela dada, até então, pelas auto- época: em primeiro lugar, o acesso às cha-
ridades brasileiras. A maior parte do madas “terras velhas”, gastas pelo café,
contingente de japoneses entrou efetiva- onde se dedicaram à policultura intensiva
mente no País entre 1924 e 1941 (67,1% de frutas e legumes. Em segundo lugar, a
do total de entradas, contra 13,4% de compra ou arrendamento de terras ainda
1908 a 1923, e 19,5% após a guerra, de virgens, nas zonas pioneiras, optando
1952 a 1963). por uma mobilidade acelerada em que a
revenda era também rápida, seguindo o do noroeste do estado. Estes resultados 139
ritmo do avanço da fronteira do café. não podem ser explicados sem levarmos
A prática da policultura serviu para su- em conta o apoio oferecido aos imigran-

Imigração japonesa no Brasil


prir as necessidades das cidades que, além tes pelo governo japonês, junto com as
de São Paulo, foram implantadas no ca- companhias nipônicas de imigração e
minho da expansão cafeeira, abrindo um colonização. Tal apoio incluía desde
mercado que os japoneses souberam – ou conselhos técnicos necessários para o
puderam – tomar e desenvolver. Essa agri- desenvolvimento agrícola, até o – funda-
cultura voltada aos mercados internos de mental – financiamento para a compra
proximidade também favoreceu a grande de terras, de utensílios e ferramentas, e
propriedade cafeeira, que se tornou assim para o investimento inicial. E os conse-
ainda mais especializada, abandonando lhos iam além das técnicas agronômicas,
antigos costumes de auto-suficiência. fazendo com que a estratégia de mobili-
Fora a agricultura de alimentos, os ja- dade geográfica não fosse aleatória, mas
poneses dedicaram-se, também, a novas bem informada.
culturas. Dentre elas, destaca-se o algo- Assim, a mobilidade social, aliada à
dão, cuja expansão se fez sentir, de modo mobilidade geográfica, indica, por um
agudo, após a crise de 1929, e sobretudo lado, uma integração eficaz ao sistema
a partir de 1932, justamente graças aos agrícola local, do qual os japoneses mos-
agricultores de origem nipônica. Estes traram conhecer as regras e o funciona-
se beneficiaram de mercados extrema- mento e, por outro, a existência de redes
mente favoráveis, em nível nacional e de ajuda eficientes, graças às quais os imi-
internacional. grantes encontraram-se bem informados,
De modo geral, e notadamente nas não se deslocando de modo gratuito, nem
duas frentes rurais ocupadas pelos ja- se intimidando e permanecendo imóveis.
As cooperativas agrícolas poneses, a pequena propriedade parece Este último aspecto mostra, ainda, que
não foram uma invenção ter avançado de modo mais rápido que o o grupo não apresentou uma atitude
japonesa, mas remetem a latifúndio, fato jamais previsto na lógica conservadora do ponto de vista econô-
uma tradição que atraves-
sava toda a vida social no das elites rurais da época. No início dos mico. Ao contrário, demonstrou possuir
Japão. anos 1930, os japoneses detinham 1,8% ao mesmo tempo um forte “espírito de
das terras do Estado de São Paulo e eram aventura” e uma boa dose de pragma-
responsáveis por 29,53% da produção tismo, ambos expressos numa grande dis-
agrícola. Das terras que possuíam, 45% ponibilidade aos deslocamentos espaciais,
estavam localizadas na região pioneira trampolim para a mobilidade social.
140 Os japoneses associaram-se freqüen- administrava de forma centralizada a
temente em cooperativas agrícolas, algu- vida doméstica, encontrou-se assim re-
mas das quais duraram muitas décadas forçada diante das novas necessidades.
Mônica Raisa Schpun

e ficaram conhecidas, como a Coopera- E, aliada à obediência e ao respeito reve-


tiva Agrícola de Cotia - CAC. Esta forma rencial aos mais velhos, elementos pro-
de associação não foi uma invenção dos fundamente inculcados na socialização
imigrantes, mas remete a uma tradição dos japoneses, exerceu uma função cen-
japonesa que atravessava todas as esferas tral após a imigração: garantiu a imposi-
da vida social, e não somente a agricul- ção de um padrão ascético de consumo.
tura ou a atividade econômica. Ainda no Os elementos descritos até aqui re-
Japão, jovens, adultos, idosos, mulheres sultam no que ficou conhecido como a
e homens se encontravam em associações excelência dos japoneses na agricultura,
e cooperativas para reunirem-se entre onde primaram pelo exercício de técnicas
“iguais”, para praticarem atividades pre- intensivas de policultura, que contrasta-
cisas, de lazer ou outras, para contarem vam com tradições agrícolas locais, ex-
com uma mediação organizada entre o tensivas e de baixo teor produtivo. Pe-
vilarejo ao qual pertenciam e os poderes quenos proprietários, destacaram-se na
públicos regionais ou nacionais. Trata-se produção de hortifrutigranjeiros justa-
de uma prática ancestral que se adaptou mente no momento em que a fronteira do
Família de agricultores
bem às novas necessidades enfrentadas café avançava, seguida pela malha ferro- na colheita de legumes.
no país de imigração. Se muitos outros viária paulista, com a abertura de novos Suzano (SP)
elementos culturais, ligados a tradições
e costumes caros aos imigrantes, foram
abandonados, por não contarem com
condições suficientes para sua manuten-
ção e/ou por não responderem às necessi-
dades prementes, a proliferação de asso-
ciações e cooperativas, por seu lado, foi
amplamente adotada e favoreceu coleti-
vamente a vida dos japoneses no Brasil.
Resta dizer que, no processo descrito
de ascensão social, houve uma coinci-
dência paradoxal entre a demanda dos
proprietários brasileiros, que viam na
família imigrante uma unidade econô-
mica, e alguns padrões tradicionais rei-
nantes no seio da família japonesa. Para
deixar o sistema de colonato, era neces-
sário acumular uma pequena poupança,
projeto cuja realização não era nada fá-
cil nas condições de vida das fazendas.
A autoridade do chefe da família, que
núcleos urbanos, de cujo abastecimento 141
puderam cuidar sem grande concorrência.
Sem contar as terras gastas em torno de

Imigração japonesa no Brasil


São Paulo, onde puderam produzir para
suprir as necessidades da nova metró-
pole. E foram ainda os protagonistas da
expansão do algodão no início dos anos
1930, quando o café sofria as drásticas
conseqüências da crise de 1929, que não
os atingiu. Estamos diante de um elemen-
to fundamental da contribuição variada
dos imigrantes japoneses à sociedade
brasileira. Tendo se transformado em ca-
racterística marcante do grupo, o talento
agrícola, se não foi a maior contribuição
que trouxeram, foi sem dúvida a primeira,
se pensarmos na rapidez com que trans-
formaram a seu favor as difíceis condi-
ções de vida e de organização do trabalho
agrícola enfrentadas inicialmente.
Agindo nas brechas deixadas pela
agricultura monoexportadora do café,
criaram e desenvolveram técnicas agrí-
colas e culturas que não haviam sido
previstas, nem desejadas pelos latifun-
diários. No campo, os imigrantes japo-
neses emergiram como novos atores
sociais, num momento de forte urbani-
zação e de formação de novas camadas
urbanas e de novas demandas de consu-
mo. Além de atuarem junto ao mundo
urbano, exerceram papel de destaque na
transformação da estrutura fundiária da
região cafeeira, com o aumento de pe-
quenas e médias propriedades às quais
tiveram acesso.

Na cidade
Entre os japoneses, a passagem do
campo para a cidade fez-se, em média,
O talento agrícola, se não foi a mais importante, foi a primeira contri- dez anos após a chegada da família no
buição dos imigrantes japoneses para a sociedade brasileira País. Em 1958, a população japonesa já
142 contava com 49% de seus membros vivendo em cidades, contra ntraa
menos de 9%, em 1930.
Chegando na cidade, os japoneses dedicaram-se, majorita-rita-
a-
Mônica Raisa Schpun

riamente, ao pequeno comércio, onde a família ainda funciona-


onaa-
va como unidade econômica. Os que dispunham de mais capital itall
abriram negócios de alimentos, quitandas, avícolas, mercearias
riass
de secos e molhados. Os mais humildes tornaram-se tintureirosross
e feirantes, ramos que acabaram tomando colorações étnicas cass
na cidade. Muitas mulheres trabalhavam como costureirass e
cabeleireiras. Se outros grupos étnicos caracterizaram-se pelo
eloo
exercício de um ofício que os identificou no espaço urbano, ano o,
como foi o caso dos mascates sírio-libaneses e judeus, que em m
seguida transformaram-se em comerciantes nos ramos ligados doss
à indústria têxtil (tecidos, armarinho, vestimentas), os japone-
one-e-
ses ocuparam uma gama bem mais variada de atividades.
A explicação tradicionalmente dada ao êxodo rural doss ja ja-
a-
poneses no Brasil elegeu como motor por excelência, que oss te- e-
ria feito deixar o campo, o desejo generalizado de proporcionar
narr
uma melhor educação aos filhos. Um argumento mais recente nte
indica que as razões teriam sido fundamentalmente de mobi- obi-
lidade social, já que a grande maioria dos imigrantes deixa o Loja japonesa. São Paulo (SP)
campo após a guerra, quando a derrota do Japão impossibilita
a manutenção das formas vigentes de apoio aos imigrantes no
campo. Sem tal apoio, e com as cidades crescendo, multipli-
cando e diversificando as oportunidades oferecidas, a escolha
faz-se nesse sentido. O que não anula a importância dada ao
investimento escolar realizado na cidade: as famílias parecem
ter realmente apostado na conquista de diplomas como ele-
mento determinante da ascensão social dos filhos.
A aspiração a maiores oportunidades educacionais nas cida-
des não foi nada ilusória. Os imigrantes japoneses chegaram no Os japoneses exerceram uma gama
variada de atividades na economia
Brasil com índices educacionais mais altos que os demais. Mas urbana
o isolamento provocado pela vida no campo funcionou como
143
14
143

Im
I gra
ig çã japonesa
apo
ção ja
Imigração
raçã one sa nno
nesa
pone Brasil
o Br
B asill
as
um obstáculo de peso à escolarização das Se nos limitarmos aos dados do Cen-
Grupo de alunos na quadra crianças, ainda que os esforços das asso- so Demográfico da Colônia Japonesa,
de tênis da escola de colônia ciações e cooperativas também se concen- realizado em 1958, os resultados deste
japonesa. Registro (SP)
trassem na abertura de escolas japonesas, processo são positivos quanto ao inves-
sempre que possível. timento escolar, mas indicam uma mobi-
Nem todos os filhos puderam ter lidade social urbana muito menos mar-
acesso ao mesmo investimento escolar, cada do que aquela realizada no campo.
ao menos não ao mesmo tempo, pois Se a segunda geração, aproveitando os
contava-se com o trabalho de todos na trunfos da escolarização e da vida ur-
empresa familiar. Os critérios usados, bana, liberou-se do trabalho da enxada
pragmáticos, privilegiaram aqueles que para ocupar posições mais prestigiosas,
apresentavam melhores resultados. Mas seu estatuto social não se tornou maior
a tradição também condicionou tais es- que o dos pais, pequenos comerciantes.
colhas e os primogênitos homens, res- Empregados de escritórios e técnicos, os
ponsáveis pelos pais na velhice e pela jovens não trabalhavam mais por conta
gestão do patrimônio familiar, tinham própria, como seus pais, mas continua-
tratamento diferenciado. De modo geral, vam exercendo profissões de pequena
os critérios empregados foram no sen- classe média.
tido de tentar capitalizar para a família Com um maior recuo temporal, pode-
toda os resultados do investimento esco- mos rever tais conclusões. De fato, se to-
lar feito, visando ao usufruto coletivo do marmos dados mais recentes, o quadro ge-
maior nível escolar atingido pelos filhos, ral é bem mais promissor. Observa-se, em
e das vantagens conquistadas graças a primeiro lugar, que, em 1958, o processo
isso no mercado de trabalho. de urbanização do grupo ainda estava
144 longe de se esgotar e que, no período posterior, a diminuição
brutal daqueles que se dedicavam a atividades rurais é um dos
elementos mais notáveis dos resultados de um estudo, ainda iné-
Mônica Raisa Schpun

dito, elaborado por Sakurai (2006), que compara as ocupações


dos nipo-brasileiros em 1958 e 1988. Esta diminuição impor-
tante dos agricultores foi acompanhada de um aumento signi-
ficativo das categorias mais prestigiosas, que exigem diplomas
elevados e capacidades técnicas, científicas e administrativas. A
diminuição também foi acentuada na categoria de profissionais
ligados ao comércio, que ainda concentravam mais de 1/3 dos
profissionais em 1958 (contra 1/5, após 30 anos). Podemos estar
vendo aí, além de um deslocamento ocupacional, a passagem
das gerações, concomitante com a ascensão social dos jovens em
relação aos pais. Enfim, aqueles trabalhando na indústria tam-
bém diminuíram radicalmente, outro indício de mobilidade.
Podemos dizer, ainda, que a primeira geração viveu uma
melhoria nas condições de vida graças ao crescimento urbano
acelerado, que abriu novas oportunidades. Se a maioria, vinda
do campo, vivia e trabalhava no mesmo local, a compra da
casa própria foi o momento em que os dois espaços se sepa-
raram, marcando um aumento de estatuto social. Além disso,
pouco a pouco, as atividades comerciais também se desenvol-
veram e a contratação de empregados liberou os membros da
família do esquema antigo de empresa familiar. Isto quando o
progresso não foi maior, com a mudança de ramo e a aquisição
de pequenas empresas. Quanto aos filhos, desobrigados do tra-
balho no negócio familiar, puderam conquistar diplomas cada
vez mais altos. Os índices mais importantes de diplomados do
superior também liberaram os pais do sustento dos mais jo-
vens, mais autônomos.
Quanto aos estudantes universitários, dados mais recentes
comprovam a tendência descrita acima: em 1998, a população
de origem japonesa aproximava-se de 1% do total nacional, mas
estava super-representada entre os estudantes do superior, dentre
os quais 25% possuíam tal origem (NINOMIYA, 1998, p. 181).
Temos aqui, a meu ver, a segunda grande contribuição dos
imigrantes japoneses à sociedade brasileira. O investimento
escolar intenso e massivo, cujos resultados aparecem de for-
ma eloqüente nos dados acima, pode ser lido através de outras
fontes. Assim, depoimentos existem onde os descendentes da
segunda geração contam como os bons resultados escolares
dos filhos eram uma retribuição obrigatória aos sacrifícios

Formatura de mulheres descendentes


de japoneses em uma turma de Corte
e Costura. Suzano (SP), 1942
feitos pelos pais para garantir-lhes a pos- a indentificar seus companheiros nipo- 145
sibilidade de uma escolaridade longa e brasileiros sob etiquetas variadas, envol-
de diplomas de alto nível, que foram os vendo a idéia de bons alunos, aplicados

Imigração japonesa no Brasil


primeiros – privilegiados – a alcançar. O e disciplinados. E, sobre-representados
sucesso de tais expectativas dos mais ve- nas universidades, como vimos, fornece-
lhos deve-se a uma combinatória de fato- ram à sociedade inclusiva profissionais
res, dentre os quais as próprias relações cada vez mais qualificados, e em propor-
familiares, marcadas pelo autoritarismo, ções extremamente elevadas, tendo em
pelo respeito aos mais velhos e pela pre- vista o percentual de nipo-brasileiros no
dominância dos interesses coletivos da conjunto da população. Isto se deu num
O sentido de retri- família, em detrimento dos desejos indi- contexto particularmente favorável, já
buição ao sacrifício viduais. O próprio sentido de retribuição que a partir de meados dos anos 1950
dos pais, dado o bom
rendimento escolar dado aos resultados escolares parece in- asssitimos, no Brasil, a uma forte ex-
dos filhos, indica que dicar que os frutos do investimento não pansão do setor industrial e de toda a
os frutos do investi- eram vistos como de cunho individual. gama heterogênea de serviços.
mento não eram vistos
como individuais. A Para além da imagem dos japone-
valorização do ensino ses como bons agricultores, ainda viva Hoje
foi uma das contribui- nos dias de hoje, os escolares dos anos Dados de meados dos anos 1980
ções dos imigrantes
japoneses à sociedade 1960-1970, nas cidades onde a presen- (SAKURAI, 2006) nos permitem situar
brasileira. ça do grupo fez-se sentir, aprenderam socialmente os nipo-brasileiros em rela-
146 ção à população brasileira em geral. Me- nada vantajoso), mas, além disso, gran-
tade das famílias brasileiras encontra-se de parte de seus membros encontra-se
numa faixa que congrega somente 20% numa situação privilegiada em relação à
Mônica Raisa Schpun

das nipo-descendentes (1 a 5 salários sociedade brasileira como um todo, que


mínimos). Nas duas faixas superiores não os acompanhou neste processo. Tal
(10 a 20 e mais de 20 salários mínimos) mobilidade tornou-se possível graças a
encontram-se 16% das famílias brasilei- um conjunto de fatores, a começar pelo
ras, contra 32% das nipo-descendentes, apoio inicial prestado pelo estado japo-
a diferença sendo maior na faixa mais nês e pelas companhias de imigração ni-
rica, onde os nipo-brasileiros não cor- pônicas, com a finalidade de garantir a
respondem mais ao dobro, mas ao tri- instalação durável das famílias na nova
plo das famílias brasileiras (16% contra terra. Mas contaram, também, as estra-
5,7%). No sentido inverso, se tomarmos tégias familiares de poupança, as práti-
a faixa mais desfavorecida (menos de cas de consumo extremamente limitadas,
um salário mínimo), vemos que con- a forte coesão familiar – regida, essen-
grega quase quatro vezes mais famílias cialmente, por uma grande rigidez nas
brasileiras que nipo-descendentes (12% relações pessoais, sobretudo entre pais e
das primeiras e 3,3% das últimas). As- filhos – e, enfim, o investimento escolar
sim, não somente a ascensão social do exigente nas gerações de descendentes.
grupo fica atestada (tendo em vista que Contudo, de modo paradoxal, no mo-
a chegada das famílias fez-se majorita- mento em que tais dados otimistas sobre
riamente dentro do sistema do colonato, a situação social do grupo aparecem, o
ou seja, dentro de um quadro econômico País entra num período de crise aguda,

Formatura de nipo-
descendente na Facul-
dade de Medicina da
Universidade de São
Paulo - USP (SP), 2000
cujo ápice ocorre justamente em meados brasileira, com as perspectivas sociais 147
dos anos 1980. Trata-se de uma crise que promissoras que lhes faltaram quando
atinge frontalmente as camadas médias, optaram pelo projeto migratório. Com

Imigração japonesa no Brasil


com índices nunca vistos de hiperinflação. as condições adequadas, sua contribui-
Assim, assistimos, na época, à partida do ção ao País será, sem sombra de dúvidas,
Brasil de um número crescente de jovens significativa.
das camadas médias urbanas, que deci- Dois pontos principais parecem mar-
dem tentar sua sorte no exterior. Os Esta- car a situação atual da comunidade nipo-
dos Unidos são o primeiro destino destes brasileira. De um lado, destaco este pro-
brasileiros, mas uma emigração específi- cesso migratório em direção ao Japão,
ca se dirige ao Japão, para onde seguem que já dura duas décadas, e que transfor-
descendentes de imigrantes japoneses, os ma as relações do grupo com a sociedade
dekasseguis. Desde então, a presença de inclusiva e com a herança cultural rece-
brasileiros no Japão aumentou de modo bida – e transformada ao longo do sécu-
contínuo, atingindo, em 2005, cerca de lo. De outro lado, pensando justamente
250 mil indivíduos. A contribuição dos nesta herança cultural e na invenção de
dekasseguis ao país de origem é carac- novas formas identitárias pelas sucessivas
terística dos fluxos contemporâneos de gerações de descendentes, devemos nos
imigração: as remessas em dinheiro são interrogar sobre a situação atual dos jo-
significativas e não deixam de atrair a vens nipo-brasileiros, suas relações com a
atenção dos poderes públicos. Além disso, sociedade brasileira e com as origens ni-
a poupança feita durante os anos passa- pônicas de que são depositários. Quanto
dos no Japão, investida no Brasil no mo- a essas duas questões, farei a seguir algu-
mento do retorno, não mereceu durante mas colocações, a título de conclusão.
muito tempo a devida atenção. Novos O processo descrito ao longo do tex-
programas governamentais e internacio- to, de ascensão social, de integração à so-
nais começaram, nos últimos anos, a dar ciedade brasileira, com contribuições de
assistência e informação aos imigrantes peso a esta última, foi marcado por pon-
retornados, para que tais capitais não se tos de encontro singulares – e determinan-
perdessem devido a erros na escolha e na tes – entre a história da presença japonesa
gestão dos investimentos. Em época de no Brasil e as transformações da socieda-
crise e recessão, tais entradas de capitais de brasileira no Século XX. Entretanto, a
podem ser primordiais para os familiares história não é um encadeamento linear
que permaneceram no País. Resta saber e me parece importante registrar aqui a
se seu benefício é duradouro e se, de al- existência de uma barreira, que impõe
guma forma, ultrapassa o âmbito restri- resistências à integração efetiva do grupo
to das famílias, trazendo melhorias mais à sociedade brasileira. Pois o processo é
amplas. Resta saber, também, se a estada bilateral, e o olhar da sociedade inclusiva
destas centenas de milhares de jovens das sobre o grupo migratório reflete elemen-
camadas médias urbanas, que decidiram tos estruturais da primeira que interferem,
tentar a vida no Japão, será seguida por e nem sempre positivamente, na inserção
uma reintegração facilitada à sociedade dos imigrantes em seu seio.
148 Assim, o fenótipo sobre o qual o “racismo de marca” bra-
sileiro incide atinge os nipo-brasileiros de forma particular,
distinguindo sua experiência no Brasil daquela da maior par-
Mônica Raisa Schpun

te dos grupos étnicos presentes. Membros de todas as gerações


do grupo sentem na pele a existência de tal forma de discrimi-
nação, mesmo se os jovens exprimem tal realidade com maior
facilidade que as gerações anteriores. Em depoimentos feitos
por ex-dekasseguis, a questão identitária destes descendentes
de imigrantes que se tornaram emigrantes emerge com força: se,
no Brasil, eram ainda considerados “japoneses”, sendo assim
chamados de modo corrente pelos não-descendentes, imaginam
que no Japão, onde o fenótipo os torna iguais aos demais, tal
diferença intransponível, pois corpórea – e a discriminação que
a acompanha – chegaria ao fim, permitindo-lhes, finalmente,
fundir-se às massas urbanas. Entretanto, sem falar a língua (ou
falando-a mal) e ocupando o lugar mais baixo da escala social,
já que os brasileiros encontram empregos nos setores despreza-
dos pelos japoneses, eles enfrentam, no Japão, uma forte discri-
minação. Esta se alia ao rebaixamento social vivido por estes
membros das camadas médias e leva-os a “descobrirem” sua
brasilidade, expressa de diversos modos, inclusive no gestual,
no modo de se deslocar (com ginga) e de se vestir, em suma, na
corporalidade. Se o fenótipo os identifica aos japoneses, outros
elementos, também presentes na aparência física, referem-se a
esta outra pertença que reclamam, fazendo com que se perce-
bam brasileiros. Contudo, de volta ao país natal, estes migran-
tes decididos descobrem-se uma vez mais “japoneses”. Shinjuku, bairro de Tóquio, Japão
Ao mesmo tempo, e paradoxalmente, o sucesso mundial
do Japão e a crise brasileira colocam alguns trunfos nas mãos
destes descendentes. Ocupando cada vez mais a esfera pública,
com o sucesso profissional que a ascensão social garantiu a boa
parte dos descendentes, eles ganham maior visibilidade e pas-
sam a assumir padrões de beleza próprios. Estes, nipônicos ou,
melhor, nipo-brasileiros, eram, até pouco tempo, impossíveis
de serem reconhecidos enquanto tal: os marcadores de discri-
minação locais colocavam os membros do grupo no espaço da
feiúra. E as gerações anteriores preferiram, por valores ditados
pela tradição herdada, mas também pelas tensões vividas no
confronto com a sociedade local – dentro do projeto coletivo
de mobilidade social – o caminho da discrição.
Esta crescente visibilidade nada envergonhada dos des- Casamento interétnico entre nipo-descendente e brasi-
cendentes de japoneses, que toca diretamente na questão da leiro, filho de alemão. Curitiba (PR), 2008
corporalidade, ponto nodal do racismo à Primus Consultoria Comunicação Integra- 149
brasileira, indica duas características cen- da, 1998. Edição trilíngüe em Português, In-
trais do grupo na atualidade, com as quais glês e Japonês, com organização de Masato

Imigração japonesa no Brasil


Ninomiya. Originalmente apresentada pela
terminarei este texto. Em primeiro lugar, autora como tese de doutorado à Universi-
a plena integração dos valores, normas e dade de São Paulo.
práticas sociais da sociedade local, onde o
NINOMIYA, M. Posfácio. In : CARDOSO,
investimento cotidiano e massivo, de ho- R. C. L. Estrutura familiar e mobilidade so-
mens e mulheres, nas práticas da beleza é cial: estudo dos japoneses no Estado de São
um elemento marcante. Em segundo lu- Paulo. São Paulo: Kaleidos-Primus Consul-
gar, a possibilidade encontrada de exibir- toria Comunicação Integrada, 1998. Edição
trilíngüe em Português, Inglês e Japonês,
se publicamente, graças ao contexto fa-
com organização de Masato Ninomiya.
vorável – nacional e internacional – das
últimas décadas, mas também, sem dú- OLIVEIRA, A. C. de. Japoneses no Brasil
ou brasileiros no Japão: a trajetória de uma
vida, graças a uma história migratória identidade em um contexto migratório. 1997.
que já completa 100 anos, acumula cinco Dissertação (Mestrado) - Universidade Esta-
gerações e conta com o aparecimento de dual de Campinas, Campinas, 1997.
cada vez mais indivíduos mestiços, fruto SAKURAI, C. É uma geração diferente dos
do número cada vez maior dos casamen- pais. 2006. Relatório de pesquisa, manus-
tos mistos. Estes indivíduos parecem ser, crito, inédito.
por inúmeras razões, ainda difíceis de ______. Imigração tutelada – os japoneses no
avaliar, os depositários privilegiados dos Brasil. 2000. Tese (Doutorado) - Universida-
padrões de beleza eleitos pelos membros de Estadual de Campinas, Campinas, 2000.
do grupo em seus diversos e cada vez mais SCHPUN, M. R. Les descendants d’immigrés
numerosos canais de expressão e de visi- japonais au Brésil et les chirurgies
bilidade social: websites, jornais, revistas, d’occidentalisation des yeux. In: LILLO, N.;
RYGIEL, P. (Org.). Images et représentations
Festa com japoneses e brasi- concursos de beleza etc.
du genre en migration: mondes atlantiques
leiros, década de 1950 Assim, podemos dizer, enfim, pensan- XIXe-Xxe siècles. Paris: Publibook, 2007.
do na seqüência desta história, que gra- Número especial do periódico eletrônico:
ças à integração dos nipo-brasileiros, Actes de l’Histoire de l’Immigration, v. 7,
demonstrada também pelo número cres- p. 105-122, 2007.
cente de casamentos exogâmicos e, conse- ______. História de uma invenção identitária:
qüentemente, pelo aumento da presença a estética nipo-brasileira dos descendentes de
de mestiços, que o grupo traz, em suas imigrantes (temporalidade migratória, etnia
e gênero). Nuevo Mundo - Mundos Nuevos,
novas gerações, mais uma contribuição Paris: L’Ecole des Hautes Etudes en Sciences
à sociedade brasileira: a diversidade, que Sociales, n. 7, 2007. Disponível em: <http://
abre caminho para a aceitação de outros nuevomundo.revues.org/document 3685.
padrões de beleza e de corporalidade. html>. Acesso em: mar. 2008.
STATISTICAL tables. In: THE JAPANESE
immigrant in Brasil. Tokyo: University of
Referências Tokyo, 1964. v. 1. Edição em Inglês e Japo-
CARDOSO, R. C. L. Estrutura familiar e nês, com resultados do censo demográfico
mobilidade social: estudo dos japoneses no realizado em 1958 pela Comissão de Recen-
Estado de São Paulo. São Paulo: Kaleidos- seamento da Colônia Japonesa.
O tradicional e o moderno na educação
dos filhos de imigrantes japoneses

Masato Ninomiya

Introdução

A
imigração japonesa no Brasil teve início em 1908 e para aqui vieram
cerca de 250 000 japoneses nestes cem anos – cerca de 190 000 antes da
Segunda Guerra Mundial e 60 000 depois da guerra. Houve uma coinci-
dência de interesses entre os dois países, pois o Brasil buscava mão-de-obra para a
lavoura cafeeira no final do Século XIX e início do Século XX, e o Japão procurava
diversificar os países para onde enviaria os seus emigrantes. Não se pode olvidar
o fato de que havia excesso demográfico no país e apenas 20% do seu território
era arável, o que impossibilitava alimentar a sua população. Ademais, o governo
buscava enriquecer o país juntamente com o fortalecimento do seu poder bélico
e, com isso, os recursos orçamentários eram preferencialmente destinados às for-
ças armadas, pouco restando para o bem-estar social. Assim, apesar das vitórias
sucessivas nas guerras, como se verá adiante, a maioria da população continuava
pobre. E esta foi a razão da adoção da política de emigração, cuja primeira opção
foi o então Reino do Havaí, em 1868, depois a Califórnia, na costa oeste dos Esta-
dos Unidos, em 1888, e mais tarde os países sul-americanos, a começar pelo Peru
e Bolívia, em 1899.
Os primeiros imigrantes japoneses que chegaram ao Brasil eram pessoas que
tinham orgulho do seu país, conscientes de serem súditos de um Estado que saíra
vitorioso da guerra contra a China, em 1895, e muito mais do que isto, contra a
poderosa Rússia, em 1905. E não eram pessoas totalmente pobres, pois traziam
alguns recursos e chegaram ao porto de Santos vestindo trajes ocidentais, tanto os
homens quanto as mulheres, ao invés de vestirem quimonos, como ocorreu com
os que emigraram até o final do Século 19. Achavam que vestir quimono não era
digno de súditos do país que passou a fazer parte de um dos cinco mais fortes do
mundo, mas fica-se a imaginar o quanto aqueles trajes teriam custado aos bolsos
daqueles imigrantes.
152 Além do vestuário, os japoneses re-
cém-chegados impressionaram desde
logo os brasileiros, pela ordem, disci-
Masato Ninomiya

plina e asseio. As informações sobre os


primeiros imigrantes japoneses foram
publicadas no periódico Correio Paulis-
tano, de 25 de junho de 1908, em artigo
assinado por J. Amândio Sobral, inspe-
tor da Secretaria de Agricultura, que elo-
giava a sua forma de vestir, o senso de
higiene e a ordem, em comparação com
os demais imigrantes da Europa e Orien-
te Médio que chegavam à Hospedaria
de Imigrantes. Outro fator que chamou
atenção dos observadores foi o seu alto
índice de alfabetização, pois mais de
80% dos recém-chegados sabiam ler e do ensino compulsório de 4 a 5 anos Os primeiros japoneses
escrever em Japonês. para toda a população. Para que o povo que chegaram ao porto
de Santos achavam que
se sentisse obrigado a enviar os filhos vestir quimono não era
O interesse dos imigrantes japoneses em para as escolas, o governo central re- digno de súditos do
relação à educação de seus filhos solveu recorrer à autoridade divina do país que passou a fazer
parte de um dos cinco
A explicação para o alto índice de Imperador, que baixou o Edito sobre a mais fortes do mundo.
alfabetização dos recém chegados era Educação, em 1890, com força de Lei. Santos (SP), 1932
a existência de uma tradição no Japão, A partir de então, ficou gravada na ca-
que datava do período feudal, de fazer beça de toda população japonesa, por
com que as crianças freqüentassem as es- mais humilde que fosse sua origem, a
colas mantidas por templos budistas. Po- obrigação de enviar os seus filhos para o
demos dizer que era um sistema razoa- ensino fundamental gratuito. Ainda que
velmente democrático para a época, pois fossem trabalhar futuramente na lavou-
apesar de haver diferenças de classes ra, na indústria ou no comércio, os pais
sociais essas escolas eram freqüentadas eram obrigados a mandar os seus filhos
indistintamente por filhos de lavradores, para a escola primária. Para os que de-
artesãos e comerciantes que aprendiam monstrassem aplicação, mas não pudes-
a ler, a escrever e a fazer algumas ope- sem prosseguir nos estudos por falta de
rações básicas de aritmética através do recursos, havia pessoas de posses que se
uso do ábaco. Até mesmo os filhos de sa- tornavam uma espécie de padrinho para
murais de escalão inferior freqüentavam sustentá-los durante o curso ginasial. O
estas escolas. jovem morava, muitas vezes, na casa
Com a Restauração Meiji, em 1868, do padrinho e prestava pequenos servi-
o poder de Estado foi devolvido para o ços domésticos nas horas de folga. Uma
Imperador e uma das primeiras provi- vez concluído o curso ginasial, o gover-
dências do Gabinete foi a implantação no oferecia ensino gratuito, desde que
fossem às escolas normais, destinadas à que de três a cinco anos na lavoura de 153
formação de professores primários, ou café seriam suficientes para retornarem
às academias militares, destinadas às ricos para sua terra natal, levando con-

O tradicional e o moderno na educação


dos filhos de imigrantes japoneses
carreiras das armas. Havia, assim, uma sigo os frutos do seu trabalho, com os
forma de ascensão social para os jovens quais poderiam se tornar donos de suas
de procedência humilde, que demons- próprias terras. Sabe-se, hoje, que tudo
trassem aplicação e vontade de conti- não passava de falácias, mas os imigran-
nuar os seus estudos. tes labutaram do alvorecer ao pôr do sol,
A exemplo de todas as sociedades quase todos os dias do ano, para pode-
com influência confucionista, a profis- rem ganhar o suficiente para a concreti-
são de professor era e continua sendo zação de alguns de seus sonhos. Pouquís-
respeitada até hoje pela população ja- simos, contudo, conseguiram realizar o
ponesa, embora a responsabilidade do do retorno à terra natal.
educador e o sacrifício que lhe é inerente Tinham consciência de que seria ver-
nem sempre sejam compensatórios em gonhoso para com a sociedade japonesa
termos salariais, fenômeno este que tam- se voltassem ricos, mas se seus filhos não
bém ocorre no Ocidente. tivessem sido educados à altura, não
Como vimos, razões econômicas le- conhecendo os usos e os costumes da
varam os japoneses a buscar novos ho- Pátria Mãe. Assim, começaram, desde
rizontes para obter ganhos melhores. logo, a fundar escolas para prepararem
Havia, é claro, quem tivesse o ideal de os seus filhos para o momento do retor-
desbravar terras em países desconheci- no ao Japão. Quem tivesse algum estu-
dos, mas podemos dizer que a maioria do além do primário já era considerado
Uma maneira de manter
a ligação com o Japão foi levada a emigrar com o intuito de apto para lecionar naquelas escolas. E
era através das escolas conseguir uma vida economicamente o ensino era ministrado em Língua Ja-
de Língua Japonesa que mais abastada. Os imigrantes recém- ponesa, utilizando livros didáticos tra-
funcionavam, muitas vezes,
no prédio da própria asso- chegados não pretendiam, contudo, ficar zidos do Japão, destinado assim, a for-
ciação. Onda Verde (SP) muito tempo no Brasil. Haviam lhes dito mar cidadãos do seu país, ainda que se
154
Masato Ninomiya

encontrassem no Brasil. As grandes da- rejeitado pelos pais e familiares. Aliás, As festas nas escolas
tas nacionais eram comemoradas como havia resistência até mesmo entre os ja- dos imigrantes japo-
neses eram ocasiões
se estivessem no Japão. O Ano Novo, o poneses de diferentes províncias, mas solenes e oportunida-
Aniversário do Imperador, e demais fe- que foi vencida, aos poucos, pela carên- des para fixação de
riados japoneses eram ocasiões solenes cia absoluta de mulheres em idade ma- sua cultura de origem.
As grandes datas na-
e oportunidades para realização de fes- trimonial. Havia, contudo, o exemplo cionais, como o Ano
tas e gincanas poliesportivas. As festas mais radical, que era o casamento entre Novo e o aniversário
nas escolas começavam com a leitura os jovens cujos ascendentes eram do ar- do Imperador, eram
comemoradas como se
solene do Edito Imperial sobre a Edu- quipélago principal e os do arquipélago estivessem no Japão.
cação e não faltavam as reverências às de Okinawa, província situada no ex- Suzano (SP)
fotografias do Imperador e da Impera- tremo Sul do Japão. A história registra
triz, bem como três vivas em sua home- muitos casos de ruptura de laços entre
nagem. Não deixavam de cantar o Hino pais e filhos que eventualmente eram
Nacional do Japão, hasteando também recompostos com o nascimento de ne-
a sua bandeira. tos, mas houve muitos casos de fuga ou
Reconheça-se que não havia entre a saída dos filhos das casas paternas, ou
maioria dos imigrantes o animus de se até mesmo casos extremos de suicídio
fixarem na terra e participarem da cons- pela falta de compreensão dos pais de
trução de um país novo, integrando-se ambos os lados.
à sociedade brasileira. Um dos indí- Estes preconceitos em termos matri-
cios de integração seria o casamento moniais duraram até o início da década
interétnico que era peremptoriamente de 1970. Os casamentos interétnicos se
tornaram, contudo, fenômeno absolu- nos últimos 50 anos. O preceito constitu- 155
tamente normal nos dias de hoje, e po- cional não incomodou os imigrantes pro-
demos dizer que é difícil encontrar uma venientes da Europa e do Oriente Médio,

O tradicional e o moderno na educação


dos filhos de imigrantes japoneses
família de nikkeys que não tenha algum que começaram a chegar em meados do
membro casado com um não-nikkey ou Século 19, mas atingiu de forma contun-
gaijin. dente os japoneses que haviam chegado
Naquela época, contudo, a insistência ao País, somente há 25 anos. Assistiu-se,
dos japoneses em querer preservar a sua assim, a uma exacerbação cada vez maior
cultura de forma fechada, sem se integrar do nacionalismo, que culminou com a
com o resto da sociedade, veio a incomo- proibição do ensino de línguas estrangei-
dar a elite nacionalista que passou a go- ras, em 1938, e a proibição de publicação
vernar o País a partir da década de 1930. de periódicos em línguas estrangeiras, a
A idéia de purificação racial na tentativa partir de julho de 1941.
de criar uma raça brasileira fez com que Voltando a descrever o que se pas-
a raça amarela fosse alvo de ataque dos sava nas décadas de 1910 e 1920, os
partidários desta idéia, pois os japone- imigrantes passaram a adquirir suas
ses estavam a criar um quisto ao não se próprias terras com os parcos recur-
integrarem com a população brasileira. sos economizados a partir do trabalho
Houve uma campanha encabeçada pelo nas fazendas de café como colonos. As
Deputado Fidélis Reis e pelo médico Mi- terras por eles adquiridas eram as ter-
guel Couto, entre outros, que teve como ras virgens do interior do Estado de São
resultado a inserção, no corpo da Consti- Paulo e, mais tarde, do Paraná, que pre-
tuição de 1934, de uma cláusula que res- cisavam ser desbravadas. Como pionei-
tringia a entrada anual de novos imigran- ros, começavam por desmatar florestas,
tes em 2% do total ingressado no País queimá-las e, então, plantar para colher

Inúmeras escolas de
Língua Japonesa e
oficiais com currículo
bilíngüe atualizavam o
valor da educação não
apenas como um bem
social, mas também
como um valor de
transmissão cultural e
lingüística. Bastos (SP)
156 os seus frutos. Moravam, no início, em da força de trabalho dos filhos, alguns
choupanas cobertas de folhas de sapé mais aplicados começaram a estudar nas
até que tivessem recursos para construí- grandes cidades onde funcionavam os
Masato Ninomiya

rem moradias melhores. Sabe-se, en- cursos colegiais. Na maioria das vezes,
tretanto, que as escolas para as crianças os escolhidos eram os mais novos, pois
eram construídas de madeira serrada. os primogênitos precisavam permanecer
Os prédios assim construídos eram junto aos pais para ajudá-los na lavoura.
utilizados, inclusive, como ponto de Mais tarde, as próprias famílias se muda-
encontro e de reuniões para adultos. A vam para o subúrbio de grandes cidades,
imagem iconográfica mais antiga destas como São Paulo, para se dedicarem à
escolas se encontra no Museu Históri- cultura hortifrutigranjeira ou ao peque-
co da Imigração Japonesa no Brasil, e é no comércio, como feirante, tintureiro,
a da Escola Japonesa de Birigüi, data- quitandeiro, entre outros, para facilitar a
da de 1919. Birigüi era, na época, uma freqüência dos filhos nos cursos colegiais
colônia recém-desbravada ao longo da e, mais tarde, nas faculdades.
Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, Passados cerca de 25 anos após a che-
apenas 11 anos após a chegada dos pri- gada dos primeiros imigrantes, verifica-
meiros imigrantes. se o ingresso dos primeiros japoneses e
Sabe-se que em alguns casos, ao to- seus descendentes nas escolas superiores.
mar conhecimento da existência de pré- O primeiro caso marcante é o de Yamato
dios escolares nas colônias, o governo Kinjo, que chegou aos 15 anos a bordo
do Estado passou a enviar professores do primeiro vapor e 15 anos depois, em
para instalar o ensino primário naque- 1923, foi o primeiro japonês a diplomar-
les locais. Num dos períodos, funcio- se na então Escola Técnica de Farmácia e
nava o ensino fundamental de acordo Odontologia de Pindamonhangaba. Não
com o programa oficial brasileiro, e no era ainda um curso superior, mas tornou-
outro continuava-se a lecionar a se, assim, o primeiro dentista da colônia
Língua Japonesa. Aqueles que japonesa no Brasil.
concluíam o curso primário e Mais precisamente, os japoneses e
que desejavam prosseguir os seus descendentes começaram a ingres-
estudos precisavam caminhar sar nas escolas superiores propriamente
quilômetros até a ditas, no início da década de 1930. Ha-
cidade mais próxi- via, no Estado de São Paulo, quatro insti-
ma, onde havia o tuições federais de ensino, a saber: Direi-
curso ginasial. Em- to, Engenharia, Medicina e Agronomia.
bora fossem pou- A criação da Universidade de São Paulo
cos os que con- data de 1934, passando estas quatro ins-
cluíam o curso tituições à esfera estadual, acrescida de
ginasial, pois nova faculdade, a de Filosofia, Ciências e
as famílias Letras, destinada à formação de profes-
muitas vezes sores secundários e ao aprofundamento
precisavam de pesquisas científicas nestas áreas.

Os japoneses e seus descendentes


começaram a ingressar nas esco-
las superiores no início da década
de 1930
e seus descendentes no ensino superior 157
do
d País.
Outro caso é o da Faculdade de Medi-

O tradicional e o moderno na educação


dos filhos de imigrantes japoneses
cina,
c onde Massaki Udihara foi o primei-
ro
r nikkey a se formar em 1939, seguido
por
p Shizuo Hosoe, em 1940. Udihara
foi
f o primeiro nissei com esta titulação
e teve uma atuação marcante no Hospi-
tal
t Santa Cruz, inaugurado no mesmo
ano
a de sua formatura. Participou, tam-
bém,
b da campanha da Itália como oficial
de
d infantaria da Força Expedicionária
Brasileira, pois não lhe permitiram atuar
como médico. O caso de Hosoe impres-
siona ainda mais. Médico formado pela
Universidade Keio, no Japão, foi enviado
pelo governo japonês para o Brasil, a fim
de dar assistência médica aos imigrantes.
A lei brasileira não permitia, porém, a
sua atuação como médico. Ao invés de
trabalhar na clandestinidade, resolveu
O fato é que, antes da fundação da obter a qualificação de médico, e para
De 1936 até 2008, Universidade de São Paulo - USP, já ha- isso prestou novamente os exames vesti-
1 500 nikkeys colaram via ingressado na Faculdade de Direi- bulares, mas para tanto precisava do cer-
grau na Faculdade de
Direito da Universidade to de São Paulo, situada no Largo de tificado de conclusão do curso colegial.
de São Paulo - USP (SP) São Francisco, um descendente de imi- Obteve-o, prestando os chamados exa-
grante japonês. Verificando os arquivos, mes de Madureza e ingressou na Facul-
constatou-se que, em dezembro de1936, dade de Medicina, juntamente com um
Kenro Shimomoto colou grau como o seleto grupo de colegas mais jovens, con-
primeiro bacharel nikkey, inaugurando seguindo concluir o curso. Contudo, ain-
Na Faculdade de Me- um rol de cerca de 1 500 bacharéis de da não lhe foi permitido trabalhar como
dicina da Universidade origem japonesa que se formaram na- médico, pois precisava ter nacionalidade
de São Paulo - USP, quela faculdade até os dias de hoje. Este brasileira e estar quite com o serviço mi-
desde 1939, formaram-
se 1 300 médicos nipo- foi o início de um fenômeno ímpar de litar. Naturalizou-se e alistou-se. Com
brasileiros alto índice de freqüência de japoneses mais de 30 anos, serviu juntamente com
158 recrutas de 18 anos, enquanto os seus caso do Estado de São Paulo como exem-
colegas de turma serviram como oficiais plo, de cerca de 40 milhões de habitan-
médicos. Isto porque a Constituição bra- tes, e uma população nikkey de cerca de
Masato Ninomiya

sileira não permitia e não permite até 1 milhão, está-se a falar de apenas 2,5%
hoje que brasileiros naturalizados, en- da população paulista. Se partirmos des-
tre outras restrições, sejam oficiais das tes números, a presença de nikkeys é sem
Forças Armadas. Tendo vencido todos dúvida marcante na comunidade univer-
esses obstáculos, Hosoe teve uma atua- sitária do País.
ção marcante, tanto no Hospital Santa É de se notar que esta façanha se de-
Cruz como no Dojinkai, instituição que veu não só à determinação dos jovens
congregava outros médicos que vieram nikkeys mas também ao sistema escolar
do Japão ou nisseis, para prestar assis- brasileiro, que possibilitou aos estudan-
tência médica aos imigrantes japoneses. tes sem recursos freqüentar as escolas
Udihara e Hosoe encabeçam o rol de cer- públicas que oferecem ensino gratuito,
ca de 1 300 médicos que se formaram na desde o ensino fundamental até o su-
Faculdade de Medicina da Universidade perior. Com exceção de alguns cursos,
de São Paulo - USP, sem mencionar os como Engenharia e Medicina, a maio-
egressos de outras faculdades, com des- ria dos cursos puderam ser freqüenta-
taque a Escola Paulista de Medicina e a dos no período noturno, possibilitando
Santa Casa, na cidade de São Paulo. aos estudantes trabalhar durante o dia
Como se vê, os nikkeys tiveram que para sustentar os seus estudos. O em-
vencer, à época, diversos obstáculos para prego nos bancos, por exemplo, com
concluírem seus diferentes cursos supe- jornada de trabalho reduzida, foi uma
riores. Apenas para ilustrar, na Univer- das opções preferidas para os que estu-
sidade de São Paulo - USP, nos dias de davam à noite.
hoje, cerca de 15% do corpo discente, de Deve-se observar, outrossim, que não
um total de mais de 80 000 alunos dos se tem notícia, no Brasil, de discrimina-
cursos de graduação e pós-graduação, e ção de qualquer espécie contra os que
de 7% do corpo docente, de um total de freqüentam cursos noturnos em relação
mais de 5 200 professores, possuem as- aos seus colegas de cursos diurnos, que
cendência japonesa. Embora não haja es- não sofrem, também, quaisquer desvan-
tatísticas claras sobre outras instituições tagens no mercado de trabalho.
de ensino superior, oficiais e particulares, Ainda que o objetivo inicial dos imi-
é de se supor que o mesmo esteja a ocor- grantes japoneses fosse preparar os filhos
rer nas demais faculdades dos Estados para levá-los de volta para o Japão, aca-
de São Paulo, Paraná e Mato Grosso do baram por fazê-los freqüentar também os
Sul, onde há maior concentração de po- cursos regulares das escolas brasileiras. E
pulação nikkey. a educação dos filhos trouxe frutos posi-
Calcula-se que a participação do con- tivos, pois os diplomas de cursos superio-
tingente nikkey na população brasileira res por eles conquistados serviram para
seja de apenas 0,8%, cerca de 1,5 milhão impulsionar a rápida mobilidade social
num total de 180 milhões. Tomando o de muitos nipo-brasileiros (CARDOSO,
1998, p. 171-178). Podemos obter um brasileiros de continuar a viver no País. 159
vasto apanhado da trajetória de uma par- Já durante a década de 1980, assistiu-se
te de nikkeys em diversas carreiras, no à saída cada vez maior de brasileiros que

O tradicional e o moderno na educação


dos filhos de imigrantes japoneses
recém lançado livro O nikkei no Brasil iam tentar a sorte nos Estados Unidos,
(HARADA, 2008, p. 535-630). onde muitos se encontram na ilegalidade.
Há, ainda, brasileiros a circular na Euro-
A crise econômica enfrentada pelo Brasil e pa de forma ilegal, embora haja muitos
a ida de brasileiros ao exterior com passaportes da União Européia, gra-
O início da década de 1980 marcou, ças à ascendência de seus pais ou avós.
no Brasil, o início de uma crise econômi- Quanto ao Japão, o fenômeno
ca e financeira sem precedentes. O País dekassegui tornou-se amplamente co-
foi assolado pela moratória da dívida ex- nhecido nos últimos 20 anos. Havia
terna, desencadeada pelo México na reu- uma demanda de mão-de-obra no Ja-
nião anual do Fundo Monetário Interna- pão durante o boom denominado “eco-
cional - FMI, em 1982. Levou-se mais de nomia de bolha”, onde todos se sentiam
dez anos para a renegociação da dívida ricos graças à especulação imobiliária
externa brasileira conduzida, na cidade que exerceu influência em todos os
de Nova York, com os bancos estrangei- segmentos da economia. Quem era
ros e, em Paris, com os países credores, proprietário de imóveis passou a ali-
no chamado Clube de Paris. mentar ilusões de que obteria créditos
Antes de ver concluído o reescalona- ilimitados nos bancos. Os jovens passa-
mento da dívida externa, a população ram a evitar os trabalhos denominados
brasileira assistiu ao congelamento de kitsui, kitanai, kiken, ou seja, duros,
sua poupança pelo chamado Plano sujos e perigosos. Surgiram, então, la-
Collor, que tirou a esperança de muitos cunas no mercado de trabalho, que se

O fenômeno dekassegui tornou-se amplamente conhecido nos últimos 20 anos. Dekasseguis no Japão.
À esquerda: fábrica na Província de Yamanashi. À direita: fábrica na Província de Ibaraki
160 buscou preencher inicialmente com o
aliciamento de japoneses residentes no
exterior, principalmente de países sul-
Masato Ninomiya

americanos, para onde haviam emigra-


do desde o período anterior à Segunda
Guerra Mundial.
O contingente de japoneses e de du-
plo-nacionais que regressaram à Pátria
Mãe não foi suficiente para atender à
demanda de mão-de-obra e, assim, os
filhos e sobrinhos sem a nacionalidade
japonesa começaram a entrar aos pou-
cos com visto de turista, o que não lhes
possibilitava trabalhar. Transformavam
esse visto, posteriormente, em visto
especial destinado à visita a parentes, qualifi
lificada
d de
d estrangeiros.
i Acha
h vam, Dekassegui no
com visível conivência das autoridades também, que os descendentes de japo- trabalho na indús-
tria automobilística.
de controle de imigração, pressionadas neses não teriam problemas na assimi- Nagóia, Província de
pelos políticos e empresários que as lação da cultura japonesa e que teriam Aichi, Japão
apoiavam e que necessitavam de mão- facilidades na aprendizagem da língua e
de-obra. Aproveitando que tal visto era dos usos e costumes do Japão.
dado de acordo com o poder discricio- Sabemos, hoje, que foi um ledo en-
nário do Ministro da Justiça, as autori- gano. Já alertávamos à época, que este
dades favoreciam a entrada de nikkeys, tipo de raciocínio era demasiadamente
enquanto todos sabem das dificuldades simplista, pois é sabido que houve to-
de outros estrangeiros a consegui-los. tal integração dos japoneses e seus des-
O número de brasileiros começou a au- cendentes à sociedade brasileira, que os
mentar nos idos de 1988, e finalmente, nikkeys são brasileiros, e a expectativa
em junho de 1990, o governo japonês das autoridades e dos empresários ja-
resolveu alterar a sua lei de imigração poneses de contarem com mão-de-obra
a fim de possibilitar que filhos e netos facilmente adaptável ao modelo japonês
de japoneses outrora emigrados para o não passava de ilusão. Hoje, as autorida-
exterior, bem como seus cônjuges sem des japonesas reconhecem que a mudan-
ascendência, pudessem entrar de forma ça legislativa de 1990 foi feita de forma
legal e privilegiada no país. Isto por- aleatória, diante dos problemas de adap-
que as autoridades do Poder Executivo tação dos nikkeys em todos os níveis.
e Legislativo raciocinaram, de forma Poder-se-ia dizer que o problema é mui-
aleatória, que permitir a entrada de des- to mais das autoridades e da sociedade
cendentes até a terceira geração, bem japonesa – acostumadas à homogeneida-
como os seus cônjuges sem ascendência, de, não estando preparadas para receber
não quebraria a rigidez do princípio um contingente grande de estrangeiros,
de não aceitação de mão-de-obra não- não só de brasileiros como também de
outras nacionalidades, como vem ocor- estrangeiros, o número deverá chegar à 161
rendo nos últimos vinte anos. casa dos 330 000.
Os problemas enfrentados por traba-

O tradicional e o moderno na educação


dos filhos de imigrantes japoneses
lhadores brasileiros no Japão são muitos, A educação das crianças nipo-brasileiras no
a começar pelas condições trabalhistas, Japão
cuja contratação, em 80% dos casos, é Estima-se a presença de cerca de
feita através das agências de recursos hu- 30 000 crianças brasileiras no Japão, na
manos, as chamadas empreiteiras. Em faixa etária de 5 a 14 anos, embora não
outras palavras, os brasileiros traba- se disponha de uma estatística confiável.
lham como mão-de-obra terceirizada e As autoridades japonesas no setor de
não são contratados diretamente pelas educação não contabilizam o número
empresas. Outra questão é a adesão ao de crianças estrangeiras por nacionali-
seguro social, que é uma combinação de dade, mas somente dos que necessitam
seguro-saúde com fundo oficial de pen- de atenção especial por não terem co-
são. Todos reconhecem a necessidade de nhecimento da Língua Japonesa. Se-
aderir ao seguro-saúde, mas não desejam gundo estes dados, de maio de 2006, de
fazer parte da previdência, pois precisa- cerca de 71 000 crianças estrangeiras
riam recolher o pagamento durante 25 que estão matriculadas nas escolas ja-
anos e só depois de completar 65 anos ponesas, 22 000 necessitam de atenção
de idade poderiam receber os benefícios. especial por não terem nenhum conhe-
Há uma negociação governamental em cimento da Língua Japonesa. Destas,
andamento, para tentar chegar a um cerca de 40%, ou 8 600 crianças, são
Acordo de Previdência Nipo-Brasileiro, lusófonas. Como não se tem notícias
mas levará ainda alguns anos para ser de crianças portuguesas ou provenien-
concluído. Dentre os problemas, pode- tes de países lusófonos da África e Ásia,
mos citar, também, a questão da educa- residentes no país, supõe-se que elas se-
ção de crianças nipo-brasileiras no Japão, jam brasileiras. Além deste contingente,
que abordaremos a seguir, e o não me- deve haver muitos que freqüentam as
nos grave problema da criminalidade de escolas japonesas com conhecimento da
brasileiros, que entre os adultos chega a língua. É possível que haja um número
disputar o segundo ou terceiro lugares e, igual ou até mesmo maior de crianças
entre os jovens, o desonroso primeiro lu- com conhecimento da língua, o que faz
gar entre os delinqüentes estrangeiros. supor que talvez haja cerca de 20 000
No ano seguinte à reforma da lei de crianças brasileiras que freqüentam as
imigração japonesa, ingressaram no país escolas japonesas.
84 000 brasileiros. Este número tem au- A Constituição Japonesa obriga os
mentado quase todos os anos desde en- nacionais a receberem a educação fun-
tão, tendo atingido a casa dos 313 000, damental, mas interpreta-se a lei de tal
em dezembro de 2006. Somados ao forma que as crianças estrangeiras serão
contingente de duplo-nacionais que se aceitas nas escolas públicas desde que
encontram no país como nacionais ja- queiram freqüentá-las. Garante-se, neste
poneses, e assim, sem constar do rol de caso, a gratuidade do ensino bem como
162 a distribuição gratuita de livros didáti- por parte dos professores. Costumam
cos e outras assistências eventualmente haver auxiliares de ensino ou de profes-
necessárias, em igualdade de condições sores bilíngües para ajudar as crianças
Masato Ninomiya

com as crianças japonesas. estrangeiras, mas sabe-se que a maioria


Reconheça-se que tem havido esfor- destes professores não tem conhecimen-
ços por parte das autoridades japonesas to de Língua Portuguesa.
no sentido de aumentar o número de Sabe-se de crianças brasileiras que
professores de apoio para as crianças deixam de freqüentar as escolas japone-
estrangeiras com falta de conhecimento sas por não terem se adaptado ou por te-
da Língua Japonesa. O erário público rem sofrido algum tipo de discriminação.
nacional arca com 1/3 do salário destes Elas passaram a procurar escolas brasi-
professores, cujo número total é de 985 leiras que surgiram naturalmente da ne-
para o ano fiscal de 2007. Vale lembrar cessidade destas crianças de buscarem
que, no Japão, o ensino compulsório de uma alternativa, ou porque os pais even-
nove anos é da alçada dos municípios tualmente têm planos de retornar um dia
e os três anos do curso colegial, dos para o Brasil. Estima-se, hoje, a existên-
governos provinciais. Nas escolas pú- cia de 85 escolas brasileiras em todo o
blicas japonesas com maior incidência território japonês, das quais 48 são reco-
de crianças estrangeiras, houve a ins- nhecidas pelo Ministério da Educação do
talação de classes especiais de reforço Brasil e, destas, 33 escolas são reconheci-
para Língua Japonesa ou as chamadas das também pelas autoridades japonesas,
classes internacionais, onde crianças es- o que permite, a seus egressos, acesso a
trangeiras recebem tratamento especial exames vestibulares das universidades

A constituição japonesa
obriga os nacionais a
receberem a educação
fundamental, mas
interpreta-se a lei de tal
forma que as crianças
estrangeiras serão aceitas
nas escolas públicas,
desde que queiram
freqüentá-las. Kamakura,
Japão
163

O tradicional e o moderno na educação


dos filhos de imigrantes japoneses
É provável que
cerca de 20 000
crianças brasilei-
ras freqüentem as
escolas japonesas.
Nagóia, Japão
japonesas. Calcula-se, hoje, que cerca de evasão e, por vezes, um certo descaso
9 000 crianças freqüentem escolas brasi- dos familiares constituem problemas
leiras no Japão. efetivos na educação dessas crianças.
O problema maior das escolas bra- Recentemente, a Rádio e TV do Japão,
sileiras em relação às escolas públicas a emissora oficial japonesa conhecida
japonesas que oferecem ensino gratuito como NHK, denunciou que jovens de
é o valor de suas mensalidades, cuja mé- 14 e 15 anos já estão a trabalhar clan-
dia é de 50 000 ienes ou cerca de 850 destinamente, ao arrepio da legislação
reais. Há ainda outras despesas como o trabalhista japonesa, alicerçada na Con-
transporte e a merenda, bem como a de venção da Organização Internacional
material didático. do Trabalho - OIT. É verdade, também,
Sabe-se que, em 2006, três escolas que muitos que atingem a idade legal,
brasileiras tiveram o reconhecimento de 16 anos, para o trabalho, ingressam
das autoridades como pessoa jurídica no mercado de trabalho a fim de ganhar
escolar. As vantagens deste reconheci- um salário próximo ao de seus pais, em
mento são muitas, na medida em que os atividades braçais. Temos chamado a
alunos podem obter passes escolares e a atenção da comunidade para o perigo
própria escola poderá solicitar às auto- que representa esta visão míope pois, se
ridades a utilização de prédios nacionais, estivessem no Brasil, os jovens estariam
provinciais ou municipais que não este- a trabalhar de dia e a estudar à noite,
jam em uso. Podem, inclusive, solicitar preparando-se para ingressar no curso
o uso de prédios escolares desativados superior. Embora não se possa afirmar
pelas prefeituras. que o ingresso no curso superior seja a
Embora alguns avanços estejam sen- fórmula geral para o sucesso profissio-
do registrados, a inadaptação escolar, a nal, é inegável o papel que um diploma
164 universitário exerce na mobilidade so- Por outro lado, já se tem notícia de
cial das pessoas. brasileiros que estão estudando em uni-
O governo brasileiro vem executan- versidades japonesas. Já há diversos casos
Masato Ninomiya

do, há alguns anos, exames supletivos de bacharéis e licenciados que trabalham


no Japão através dos consulados gerais em empresas ou repartições públicas mu-
de Tóquio e Nagóia. Recentemente, as nicipais e provinciais, e são importantes
provas foram realizadas, inclusive, no elementos de ligação entre as autoridades
Reformatório de Menores de Kurihama, e as comunidades brasileiras locais.
onde se acham recolhidos cerca de 20 jo- Sabendo que os primeiros descen-
vens brasileiros, condenados a ali passa- dentes de japoneses conseguiram ingres-
rem de um ano a um ano e meio devido a sar em cursos superiores do Brasil após
algum tipo de delinqüência. O índice de 25 anos da chegada dos primeiros imi-
aprovação, de cerca de 50%, é alentador grantes e considerando que o fenôme-
e serve de estímulo para os jovens e adul- no dekassegui, com apenas 20 anos, já
tos que desejam retornar para o Brasil e produziu egressos de cursos superiores
prosseguir seus estudos. no Japão, podemos, então, esperar que
haja, no futuro, um contingente cada
vez maior de diplomados em universi-
dades japonesas. Diploma universitário
não é o único instrumento de ascensão
social, mas deve-se reconhecer que no
Japão, país onde se preza a escolaridade,
se o brasileiro quiser competir no mer-
cado de trabalho, na mesma condição
dos jovens japoneses, então, ter o diplo-
ma se torna muito importante, senão
indispensável.

Considerações finais
Embora não havendo, entre a maioria
dos primeiros imigrantes, a intenção de
se fixarem no Brasil, integrando-se cul-
tural e socialmente à sociedade brasileira,
as contingências históricas os levaram a
essa integração. Os frutos daí advindos
foram profícuos em vários aspectos,
principalmente no que diz respeito à va-
loração da educação. Educação não ape-
nas como um bem social, mas também
como um valor de transmissão cultural
e lingüística que se presentifica nas inú-
meras escolas de Língua Japonesa e nas
Se o brasileiro quiser competir no mercado
de trabalho japonês, ter o diploma se torna
indispensável
escolas oficiais com currículo bilíngüe, como as encontradas 165
na cidade de São Paulo.
No movimento inverso, conhecido como fenômeno

O tradicional e o moderno na educação


dos filhos de imigrantes japoneses
dekassegui, podemos observar que, embora a educação não
seja encarada como prioridade, tem rendido alguns frutos e a
esperança de um futuro mais promissor.

Referências
CARDOSO, R. C. L. Estrutura familiar e mobilidade social: estudo
dos japoneses no Estado de São Paulo. São Paulo: Kaleidos-Primus
Consultoria Comunicação Integrada, 1998. Edição trilíngüe em
Português, Inglês e Japonês, com organização de Masato Ninomiya.
Originalmente apresentada pela autora como tese de doutorado à
Universidade de São Paulo.
COSTA, J. P. C. De decasségui a emigrante. Brasília, DF: Fundação
Alexandre Gusmão, 2007.
DAIGO, M. Pequena história da imigração japonesa no Brasil. Tra-
dução de Masato Ninomiya. São Paulo: Associação para Comemo-
ração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil, 2008.
HARADA, K. (Coord.). O nikkei no Brasil. São Paulo: Atlas, 2008.
NINOMIYA, M. The dekasegi ph h
phenomenon and the education of
Japanese Brazilian children in Japa
a
Japanese schools. In: HIRABAYASHI,
L. R.; KIKUMURA-YANO, A.; H HIRABAYASHI, J. A. (Ed.). New
worlds, new lives: globalization ann people of Japanese descent in
and
the Americas and fromm Latin America in Japan. Stanford:
S anford University,
St
Stanford Universityy 2002. (Asian America).
REIS, M. E. F. Brasileiros no Japão: o elo huma-
n das relações
no relaçõ
õ bilaterais. Organização, tradu-
Jaa
ção para o Japonês e apresentação de Masato
Ninomiya. São Paulo: Kaleidos Primus, 2001.
Edição trilíngüe em Japonês, Por-
tuguês e Inglês.
Família, mulher e cultura
impactos da migração para o Japão

Lili Kawamura

Introdução

D
esde fins dos anos 1980, a população nipo-brasileira teve que enfrentar os
desafios postos pela contínua e crescente migração de jovens e adultos econo-
micamente ativos para o Japão1, movimento que se constitui em importante
fator esclarecedor das atuais mudanças ocorridas com os descendentes de japoneses
no Brasil. Esse processo migratório se fez acompanhar de constantes desarticulações
e rearticulações das relações no trabalho, na família, na vizinhança, nos grupos de
amizade e nas associações criadas por descendentes de japoneses no Brasil.
Novas atitudes, novos comportamentos e valores decorrentes da vivência simul-
tânea dos migrantes em dois países culturalmente tão diferentes – para enfrentar os
desafios no trabalho, na vida cotidiana, na organização familiar e educação dos fi-
lhos – influenciaram os grupos relacionados com estes trabalhadores, tanto no Brasil
quanto no Japão.
Na medida em que a busca de trabalhadores estrangeiros por empresários japo-
neses visava a resolver seus problemas de carência de mão-de-obra, em atividades
que não requeriam qualificação, geralmente rejeitadas pelos trabalhadores nipô-
nicos, a maioria dos brasileiros executava tarefas braçais, sujas, perigosas e pesa-
das, sofrendo preconceitos e discriminações. Na vida cotidiana, ao expressarem
comportamentos, atitudes e valores levados do Brasil, os migrantes envolviam-se
em confronto ou se sentiam ignorados por vizinhos nipônicos, em vista de mal-
entendidos culturais.
A expansão de espaços de brasileiros no Japão, com o crescimento de empresas
de produtos e serviços brasileiros em áreas com alta concentração de migrantes,
veio facilitar a vivência desses trabalhadores e seus familiares, na medida em que
podiam se expressar e viver conforme seus próprios padrões culturais. Restaurantes,

1
Os migrantes para o Japão compreendiam cerca de 312 979 mil brasileiros, em 2006; 302 080 mil,
em 2005; e 286 557, em 2004, de acordo com os dados do Ministério da Justiça do Japão.
168 bares, lojas, academias e outros espaços
de lazer, escolas e empresas brasileiras
constituíram-se em pontos de encon-
Lili Kawamura

tro de brasileiros, possibilitando falar


em voz alta, ouvir música em som ele-
vado, manifestar beijos, abraços e bri-
gas, comportamentos antes censurados
pelos nipônicos e que compreendiam
motivos de desentendimentos com a po-
pulação local (KAWAMURA, 2003a).
A expansão desses redutos de brasilei-
ros desenvolveu canais de comunicação
entre os migrantes no Japão e os grupos
(parentes, amigos, sócios, fornecedo-
res e clientes) no Brasil, ao estabelecer
conexões formais entre empresas co-
merciais; serviços técnicos, esportivos
e artísticos; atividades escolares e de
comunicação (jornais, revistas, TV, ví-
deos etc.) instaladas em ambos os paí-
ses. Essas redes formais reforçaram os
vínculos informais familiares e de ami-
zade antes existentes, entre os nipo-
brasileiros de ambos os países, o que
veio facilitar as influências dos valores
e comportamentos dos migrantes sobre
os grupos nikkeys no Brasil.
Os novos comportamentos, valores,
novas condutas e atitudes, trazidos pe-
los migrantes em seu retorno ao Brasil,
vêm também reafirmar as influências
culturais do Japão atual decorrentes
das relações econômicas, tecnológicas e
de comunicação, como equipamentos e
aparelhos hi-tech, filmes de animação,
mangás, brinquedos e programas de TV
(LUYTEN, 2005). Essa especificidade
expressa o lado ambíguo, transnacional
e complexo das manifestações culturais A expansão dos redutos de brasileiros no Japão vem facilitan-
dos migrantes, colocando-os numa po- do a convivência entre eles. Acima: açougue de brasileiros no
Shopping Brazilian Plaza. No meio: mercearia de brasileiros,
sição culturalmente intermediária entre “Quitandinha”. Abaixo: brasileiros se servindo na Churrascaria
ambas as sociedades. “Primavera”. Oizumi, Japão, 1998
Costumes tradicionais e novas formas especificidade em relação aos demais 169
culturais grupos socioculturais do Brasil.
No transcorrer da inserção dos japo- Desde o passado, na árdua luta para

Família, mulher e cultura


neses e seus descendentes na sociedade a inserção na sociedade brasileira, os
brasileira, durante os 100 anos da imi- imigrantes japoneses e seus descendentes
gração, não ocorreram simplesmente um desenvolveram estratégias de organiza-
“branqueamento” físico (mestiçagem) e a ção familiar, de trabalho, de educação
simples ocidentalização dos valores, mo- dos filhos, de comunicação entre si e a
dos de vida, comportamentos e atitudes, sociedade brasileira, procurando preser-
mas, também, a expressão de um reforço var, ao lado das influências ocidentais,
étnico e cultural, não somente através da os valores, princípios, regras e condutas
preservação e recuperação da tradição, de vida privada e social, crenças reli-
mas principalmente mediante as influên- giosas, atividades esportivas e artísticas
cias recebidas do Japão herdadas de seus antepassados. No en-
atual. A ocidentalização tanto, no decorrer da modernização da
das novas gerações sociedade brasileira, as gerações mais
de nipo-brasileiros jovens buscaram a plena integração, na
expressa tanto a medida em que seguiram as instituições
marca cultural her- nacionais para se inserir no mercado
dada dos imigran- de trabalho e ascender socialmente. As
tes japoneses quan- oportunidades que se abriam no merca-
to os traços da atual do local, de um lado e, de outro, a me-
sociedade nipônica, o mória de experiências negativas de seus
que dá aos nikkeys uma ancestrais pelas agressões sofridas no
pós-guerra (DEZEM, 2000; MORAIS,
2000), levavam os jovens a desejar disso-
ciar-se da imagem de “ser japonês”, pre-
servada por seus pais e avós. A elevada
escolaridade de grande contingente de
jovens nipo-brasileiros, pela ênfase dada
à educação pelos ancestrais, levou-os a
ocupar posições de destaque no mercado
de trabalho, especialmente nas grandes
cidades. Por outro lado, o Japão atual
estava muito distante das metas de vida
dos grupos com ascendência japonesa,
apesar da presença daqueles que ainda
mantinham a tradicional cultura nipôni-
ca, especialmente nas áreas rurais e cida-
des interioranas.
Se, no passado, houve uma visão
homogênea da vida e cultura dos nipo-
170 brasileiros, hoje paira a diversidade e a
complexidade cultural, com casamentos
interétnicos, significativa presença de
Lili Kawamura

“mestiços”, participação em uma varie-


dade de religiões e em diversas áreas de
atividades na sociedade. O fato de o Ja-
pão ter se tornado uma das maiores po-
tências tecnológicas do mundo fez uma
grande diferença para os descendentes
de japoneses residentes fora daquele país,
principalmente no Brasil, onde vive a
maior parte deles. Essa condição de po-
tência mundial influiu positivamente na
imagem que os descendentes tinham so-
bre o país do Sol Nascente, bem como
possibilitou mudar a auto-imagem dos
grupos nikkeys, reforçando neles aspec-
tos culturais nipônicos, como o interesse
pelo idioma, pelas artes, pelos esportes
e eventos e, principalmente, o mundo
imaginário transmitido pela atual mídia
e pelos produtos tecnológicos japoneses.
É preciso aqui esclarecer que a va-
lorização da cultura nipônica por des-
cendentes de japoneses, ao adotar es-
tilos e modos de vida transportados da
vivência de jovens da atual sociedade A ocidentalização das novas gerações de nipo-brasileiros
nipônica – também compartilhada por expressa a marca cultural herdada dos imigrantes e da atual
sociedade nipônica. Shinjuku, bairro de Tóquio, Japão
grupos de brasileiros de outra origem –
não significou uma dissociação da forte e levando novas formas culturais criadas
tendência à integração dos nikkeys na para enfrentar os desafios da vida na so-
sociedade brasileira. Ao contrário, com- ciedade japonesa, contribuindo, assim,
preendeu um processo de atração mútua para fortalecer a presença da influência
de grupos específicos que se identificam cultural do Japão atual no Brasil, parti-
entre si por critérios étnicos, de estilos, cularmente nas relações familiares, de
de interesses os mais variados, e que se amizade e de educação dos filhos – por
proliferam na diversidade da sociedade outro, a cultura tradicional dos imigran-
brasileira, favorecida pela globalização. tes japoneses no Brasil ainda permeia, em
Assim, se por um lado, a diversidade e variados graus, a conduta, o comporta-
a complexidade cultural dos nipo-brasi- mento, os valores e sentimentos dos nipo-
leiros é reforçada pelo vai-e-vem dos mi- brasileiros. É significativa nesse sentido a
grantes na rota Brasil-Japão – trazendo influência do espírito associativo, com a
171

Família, mulher e cultura


Dekassegui no trabalho como arubaito (trabalho avulso) em uma lancho-
nete. Província de Yamanashi, Japão

presença de entidades culturais, esportivas, de mulheres e de


jovens voltadas para atividades relativas aos nipo-brasileiros.
Mesmo informalmente, é visível a tendência de jovens descen-
A diversidade e a complexidade cultural dentes andarem em grupos nas escolas, nos shoppings, nos ba-
dos nipo-brasileiros é reforçada pelo vai- res, karaokês e outros eventos, expressando, sob novas formas,
vém dos migrantes na rota Brasil-Japão, o
que contribui para fortalecer a influência
a valorização da tradicional conduta associativa.
cultural do Japão atual no Brasil. Santos Em suma, a situação diferenciada e ambígua dos nipo-
(SP), 2007 brasileiros tem trazido questões de identidade, pois no Brasil,
por uma série de características físicas e culturais, costuma-
vam ser considerados “japoneses” e, quando migrantes no Ja-
pão, passaram a ser denominados “brasileiros” (burajirujin)
e estrangeiros (gaijin), o que levou considerável parcela dos
Alguns números nikkeys a reavaliar sua própria identidade.
Conforme o último levantamento sobre a população de
Influência da migração na concepção e organização familiar nikkey
descendentes de japoneses no Brasil, realizado pelo Centro
de Estudos Nipo-Brasileiros de São Paulo, a unidade do- A primazia do trabalho e da formação profissional torna-
méstica de origem japonesa mais os membros não-descendentes ram flexíveis o conjunto das demais relações sociais, isto é, a
apresentam a média de 3,4 pessoas em 1987/1988, consi- ênfase no trabalho, emprego, negócio e profissão deixaram
derada de tamanho médio, no entanto, 41% das famílias nipo- em segundo plano a família, amigos, parentes, vizinhos, que
brasileiras constituem-se de 5 a 7 membros. A proporção de antes ocupavam o lugar central na vida da população nikkey.
parentes colaterais caiu de 7,7%, em 1958, para 4,1%, em Famílias extensas, com pais, filhos, avós e tias, de caráter
1987/1988. As famílias compostas de duas gerações decres-
patriarcal, onde o pai (ou avô) definia e controlava as regras
ceram de 70,6%, em 1958, para 58%, em 1987/1988, e as
de relacionamento e de conduta dos membros, foram subs-
formadas por três gerações passaram de 25% para 12,9%
(PESQUISA..., 1990). tituídas por famílias nucleares formadas por pais e filhos, de
caráter mais flexível e menos hierarquizado, em diferentes
172 graus. A concepção e as diretrizes que norteavam as famí-
lias dos imigrantes japoneses visavam a preservar a cultura e
os costumes tradicionais com vistas à volta ao Japão, desejo
Lili Kawamura

acalentado desde os primórdios da chegada dos japoneses ao


Brasil, bem como para a autodefesa perante o “desconheci-
do” que representava o “perigo” na sociedade mais ampla.
Casamentos arranjados por conveniência definidos pela fa-
mília (miai) através do intermediário (nakodo), primazia do
primogênito, obrigação de amparo aos idosos pelos filhos,
estudo do idioma japonês por crianças e jovens, atividades
religiosas e esportivas, associações, comemorações de da-
tas festivas do Japão tradicional (CARDOSO, 1995) deram
lugar a práticas ocidentalizadas e integradoras à sociedade
brasileira, apesar da persistência das tradições em áreas ru-
rais e interioranas.
O emprego no Japão veio enfatizar mais ainda a prioridade
ao trabalho, em detrimento das relações familiares, afetivas
e “desinteressadas” dos migrantes. A primazia do trabalho
e as condições desafiantes da vivência no Japão provocaram A ausência dos pais migran-
mudanças nas relações familiares, de vizinhança, de amiza- tes requer dos avós, tios e
amigos, a responsabilidade
de, lazer e educação dos filhos dessa parcela da população pela educação das crianças.
migrante, com implicações na vida dos demais membros das Bastos (SP)
famílias que permaneceram no Brasil. A saída temporária e
intermitente dos migrantes passa a exigir, cada vez mais, uma
reavaliação das funções e dos papéis dos demais membros da
família para atender aos interesses deixados no Brasil, como a
manutenção dos bens e principalmente a educação dos filhos.
A ausência dos pais migrantes passa a requerer dos avós, tios,
amigos ou vizinhos a responsabilidade pela educação das
crianças e dos adolescentes que permanecem no Brasil. Na
perspectiva dos que ficam no Brasil, o esforço é recompensa-
do pela melhoria das condições de vida dos familiares, viabili-
zada pela ajuda dos parentes migrantes. No entanto, pessoas
idosas, que na tradição japonesa deveriam ser amparadas
por seus filhos primogênitos, passam a ter que cuidar dos ne-
tos deixados pelos filhos migrantes. Essa situação, além de
constituir-se em sobrecarga estressante aos responsáveis para
cuidar dos jovens, traz outros desafios relativos à educação e
à saúde emocional destas crianças e adolescentes, decorrentes
da re(des)organização da vida familiar, como a sensação de
abandono pela falta de notícias dos pais migrantes. São signi-
ficativas as notas em jornais brasileiros no Japão, procurando
ou sem-teto. A mobilidade exigida pelo 173
emprego, por exemplo, levando o pai ou
a mãe trabalhadora para cidades diferen-

Família, mulher e cultura


tes, tem provocado dificuldades no rela-
cionamento entre marido, mulher e filhos,
com conseqüências para a organização
familiar e para a educação das crianças
e adolescentes migrantes. Recentemente,
cresce a visibilidade de separações de ca-
sais e formação de novos casais dentre os
grupos migrantes (SASAKI,1998), com
implicações na concepção de casamen-
to, família e educação de filhos. Tam-
bém são encontradas famílias dirigidas
por mulheres, devido às separações de
casais, à presença de mães solteiras e à
maior demanda da mão-de-obra femi-
Moradia de brasilei-
ros em Homi Danchi. migrantes considerados desaparecidos nina, considerada mais adequada para
Toyota, Japão, 1994 pelos familiares do Brasil2. Nem sempre atividades que exigem destreza com as
a (re)(des)construção das famílias ocor- mãos, paciência e delicadeza na fabrica-
re de forma harmoniosa, muitas delas ção dos produtos. Nesta última situação,
permanecem truncadas, aguardando a os maridos desempregados ou subem-
volta dos parentes migrantes para se re- pregados assumem as tarefas domésticas
constituírem e seguirem um novo rumo. e de educação dos filhos.
Ao lado dos que vão e voltam continua- A flexibilização das uniões matri-
mente, há os bem-sucedidos que conse- moniais, da organização das famílias e
guem, na volta ao Brasil, se estabelecer da educação dos filhos baseia-se forte-
economicamente no mercado brasileiro, mente na idéia de transitoriedade que
adotando influências do modelo japo- permeia a vivência dos migrantes no
nês de trabalho. Japão. Os encontros e desencontros fa-
A vida familiar no Japão também miliares conduzem a novas formas de
sofre alterações que desestruturam e uniões e separações, de acordo com in-
reestruturam relações familiares, em teresses imediatos que se estabelecem
decorrência das novas situações sociais, na vivência cotidiana. Por isso, a busca
culturais e psicológicas enfrentadas pe- de soluções aos problemas decorrentes
las famílias brasileiras nesse país, que e a concretização dos sonhos relativos
variam desde a condição de empresário às famílias passam a ser postergadas
para a de desempregado/subempregado para o futuro, no retorno ao Brasil.
Vêm fortalecer a flexibilização familiar
2
Ver coluna “Família Procura”, Jornal Tudo
e sua relação com a transitoriedade da
Bem, no período 2000 a 2005, e Jornal vivência como migrante, o uso de sub-
International Press, 2000 terfúgios ao ingresso de brasileiros não
174
Lili Kawamura

Casamento miai,
uma das formas de
casamento arranja-
do, apenas para fins
pragmáticos

descendentes no mercado japonês, mes- desfeitos, podem colocar em risco a es-


mo que em proporções pequenas, como tadia dos ex-cônjuges não descendente
o casamento “só no papel” e a “adoção de nipônicos, que passam a depender da
filial” apenas para fins pragmáticos, de- “boa vontade” da outra parte para não
corrente da restrição das leis de imigra- ter que retornar ao Brasil ou não ficar
ção japonesa que permite a entrada ape- na clandestinidade no Japão.
nas de descendentes de japoneses para As idéias de “estar de passagem” e
trabalhar no Japão3. Além disso, o rom- “vivência transitória” que permeiam as
pimento desses contratos pode trazer situações das famílias migrantes tendem
conseqüências drásticas pelo menos aos a mudar com o propósito de permanên-
não descendentes de japoneses. Mesmo cia de brasileiros no Japão devido ao su-
casamentos efetivos entre nipo-brasilei- cesso em atividades empresariais, à boa
ros e pessoas de outra origem, quando adaptação no trabalho e valorização
do modo de vida na sociedade japone-
3
Conforme lei de controle de imigração do Ja- sa, bem como à presença de filhos nas-
pão, de junho de 1990. cidos e criados no país (KAWAMURA,
2003b). Essa mudança traz a expectativa da, principalmente na primeira e segunda 175
para a realização dos sonhos e solução gerações, pelos valores, princípios, atitu-
dos problemas para o presente no país de des e costumes trazidos pelos imigrantes

Família, mulher e cultura


residência permanente. O esforço para japoneses ao Brasil. A imagem da “mu-
a consolidação da organização familiar, lher tímida, reservada e submissa” que
do papel de cada um dos seus membros se difundiu na sociedade a respeito da
e da educação dos filhos, tendo em vista nikkey decorreu da herança da tradicio-
os objetivos da permanência no país de nal cultura nipônica dos imigrantes que,
destino, leva o migrante a buscar maior em maior ou menor grau, transparece
familiaridade com o idioma e os costu- nas atitudes e comportamentos da popu-
mes locais, e a participar na comunidade, lação feminina de ascendência nipônica
a despeito das barreiras para sua aceita- (SAKURAI, 1993). As diferentes condi-
ção na sociedade nipônica. Essas práti- ções de vida dessa parcela da população
cas também afetam aos demais familia- indicam variadas posturas, estilos de
res que vivem no Brasil, ao introduzir vida, expectativas, posições sociais e cul-
novos aspectos culturais na vida familiar turais, mostrando a diversidade na situa-
ampla ou reduzir os vínculos com os pa- ção das mulheres, conforme o grau de
rentes distantes. inserção na tradicional cultura nipônica,
na cultura pop japonesa e/ou na cultura
Migração, mulher e mudança cultural ocidental.
De modo geral, a formação da mulher A experiência da migração para o Ja-
nipo-brasileira foi fortemente influencia- pão trouxe novos elementos de diferen-

Dekassegui em
Tóquio, Japão
176 ciação e complexização na posição e
papel da mulher nipo-brasileira. A con-
dição de migrante já traz a priori o desa-
Lili Kawamura

fio da vivência em duas sociedades, em


duas culturas simultaneamente, na medi-
da em que transita entre os grupos fami-
liares, de amizade e de negócios no Brasil
e no mercado de trabalho, consumo, ser-
viços e vizinhança no Japão. Com a mi-
gração, parte da família permanece no
país de origem e parte no país de destino,
mantendo relações internacionalizadas,
com idas e vindas dos seus membros e
trocas de notícias, informações, proble-
mas e perspectivas entre si, mesmo que
de modo truncado e intermitente, na rota
Brasil-Japão. Para enfrentar, então, os
desafios da vivência no Japão, a mulher
teve que reformular o trabalho domés-
tico e a educação dos filhos, conforme
as condições de seu trabalho em tempo
integral fora de casa (TOMA, 2000), au-
sência de empregadas domésticas, expec-
tativas de conduta pela população local,
dificuldades de integração de seus filhos
em escolas japonesas e os elevados pre-
ços das escolas brasileiras no Japão.
A especificidade da mulher migrante
está na inserção no mercado de traba-
lho japonês nas mesmas funções exerci-
das por seus colegas do sexo masculino, Jovens posam para foto numa rua em Osaka, Japão
com a vantagem de o gênero feminino
ser considerado mais adequado para de-
terminadas atividades, por exigirem ca-
pacitação em trabalhos minuciosos, de-
licados e que requerem paciência, além
dos salários mais baixos4. A situação

4
Conforme pesquisa de Elisa Sasaki, o salário do
homem estava entre U$2.800 a U$6.500 men-
sais e o da mulher, entre U$1.200 a U$2.500
(SASAKI, 1998).
vantajosa no acesso ao mercado de tra- filhos (as), pai e filhos (as), avós e netos 177
balho aumentou o poder e a liberdade (as), tios (as) e sobrinhos (as), madras-
da mulher nipo-brasileira migrante nas tas e padrastos de novas uniões, formais

Família, mulher e cultura


relações familiares, na medida em que ou informais.
suas atividades, e até mesmo seus ga- As mulheres solteiras, separadas ou
nhos, passaram a se equiparar ou até divorciadas sem compromissos familia-
superar os rendimentos auferidos pelos res, ao trabalharem no Japão nas mes-
homens, principalmente quando desem- mas condições que os homens, inclusive
pregados ou subempregados. Em alguns cumprindo horas extras noturnas, po-
casos, tornou-se mais vantajosa para dem expressar condutas mais liberadas
a família a inserção das mulheres no em relação aos comportamentos antes
mercado de trabalho e a delegação dos adotados no Brasil. Essa sensação de li-
afazeres domésticos e cuidados com os berdade e a situação temporária e tran-
filhos para os homens. Diferentemente sitória de vida no Japão constituem um
dos padrões seguidos pelas atuais mães forte chamariz para se manter no país,
japonesas, cuja prioridade compreende adiando a solução de problemas e os
a administração da casa e educação dos sonhos para o futuro no Brasil. Se, no
filhos, sem deixar de usufruir do lazer início, a migração feminina estava con-
com as amigas, a mulher migrante tem dicionada às condições conseguidas pe-
como tarefa mais importante atender los migrantes no Japão, que mandavam
às exigências do trabalho no mercado buscar suas famílias, com o passar do
japonês, colocando em segundo plano tempo, as mulheres migram individual-
as demais atividades, como a educação mente por inúmeras razões além da
dos filhos, as atividades domésticas, a financeira, como a busca de parceiros,
formação cultural e o lazer. reconstrução da vida pessoal e a neces-
Essa visão pragmática possibilitou sidade de romper com laços discrimina-
mudanças de valores, princípios e con- tórios e preconceituosos na sociedade
dutas consideradas machistas – idéias de origem.
que ainda persistem fortemente no Bra- As brasileiras no Japão, mesmo com
sil – dentre os migrantes, pelo menos a idéia de maior liberdade em sua vi-
enquanto vivendo no Japão, revertendo, vência descolada de suas famílias, ado-
inclusive, a concepção japonesa tradi- tam padrões de vida bem diferentes da
cional de que ao primogênito compete o população feminina nipônica. A maio-
papel de chefe de família. A recuperação ria das migrantes tem a semana inteira
e o comando de sua própria vida em face ocupada por seu trabalho em fábricas e
da família transmigrante deu à mulher a serviços. Geralmente executam tarefas
sensação de liberdade em relação a ma- domésticas nos finais de semana, quan-
ridos, pais, filhos e amigos instalados no do não fazem zangyo (hora extra) no
Brasil ou no Japão. Essa mudança vem trabalho ou freqüentam os lugares de
repercutindo nas relações familiares, lazer dos brasileiros em espaços pró-
levando à desarticulação e à rearticula- prios, como shopping centers, restau-
ção de novas formas familiares: mãe e rantes, bares e eventos.
178 As idas e vindas das mulheres entre espaços brasileiros na sociedade japone-
o Japão e o Brasil possibilitam uma sa. Assim, as idas e vindas de migrantes
avaliação do que foi deixado para trás, continuarão trazendo e levando as novas
Lili Kawamura

manifestando um sentimento saudosis- formas culturais, em particular, sobre


ta, na medida em que há uma tendên- o modo de (des) reorganização familiar,
cia a idealizar o “outro lugar”. Assim, posição da mulher e de desconstrução e
no Japão, ao supervalorizar o modo de reconstrução da educação das crianças
vida e a cultura do Brasil, a migrante e jovens. A separação dos membros das
põe em prática condutas consideradas famílias não significa apenas a deses-
brasileiras e que nem sempre faziam truturação, mas principalmente a cons-
parte de sua vivência no Brasil, como trução de estratégias de organização de
determinados pratos da culinária e ati- novas formas de família e do papel da
tudes mais liberadas ao cantar, dançar mulher, em face dos desafios de vivência
samba e participar do carnaval, além em duas sociedades diferentes e longín-
dos estilos mais descontraídos nos quas, porém estreitamente conectadas
comportamentos. Ao retornar ao Bra- na globalização.
sil, por outro lado, ocorre a supervalo- Os transmigrantes contribuem no
rização da vivência no Japão, como o fortalecimento da influência nipônica
acesso à alta tecnologia, à segurança e a presença de grupos específicos rela-
na vida cotidiana, à organização e dis- cionados com a atual cultura japonesa,
ciplina. Essa ambigüidade das mulheres bem como com a introdução de aspec-
migrantes influencia parentes, amigos tos da cultura brasileira no Japão. Esse
e outros grupos relacionados no Brasil processo facilitado pelas condições da
e no Japão, com a difusão de condutas, globalização aponta um novo elo entre
comportamentos e estilos miscigenados ambos os países, permitindo a cons-
imbuídos dos aspectos culturais de am- trução de redes, não só subjetivas e in-
bas as sociedades. Nessa perspectiva, o formais (familiares e de amizade), mas
papel da mulher torna-se fundamental também comerciais, de serviços cultu-
na reconstrução e rearticulação das re- rais, educativas, artísticas, esportivas e
lações familiares, de amizade e afetivas de comunicação, que interferem direta-
dos brasileiros que vão e vêm na rota mente na vivência social e cultural dos
entre o Japão e o Brasil, integrando in- descendentes de japoneses situados em
fluências culturais de ambos os países. ambos os países.

Considerações finais Referências


No atual mundo dos nipo-brasileiros, CARDOSO, R. C. L. Estrutura familiar e
como de descendentes de japoneses em mobilidade social: estudo dos japoneses no
outros países latino-americanos, a mi- Estado de São Paulo. São Paulo: Primus Co-
gração para o Japão já se constitui em municação Integrada, 1995. Edição bilíngüe
um processo efetivo e não intermitente em Português e Japonês, com organização de
Masato Ninomiya. Originalmente apresen-
ou esporádico, principalmente conside- tada pela autora como tese de doutorado à
rando-se as raízes já instaladas pelos Universidade de São Paulo.
DEZEM, R.; CARNEIRO, M. L. T. (Org.). 179
Shindô-renmei: terrorismo e repressão. São
Paulo: Arquivo do Estado, 2000. (Inventário

Família, mulher e cultura


DEOPS. Módulo III, japoneses).
KAWAMURA, L. K. Para onde vão os bra-
sileiros?: imigrantes brasileiros no Japão. 2.
ed. rev. Campinas: Unicamp, 2003a.
______. Redes sociales y culturales de mi-
grantes brasileños en la ruta Brasil-Japón:
movimiento y permanencia. In: YAMADA,
M. (Org.). Emigración latinoamericana:
comparación interregional entre América
del Norte, Europa y Japón. Osaka: Natio-
nal Museum of Ethnology, 2003b. (JCAS
Symposium series 19). Disponível em: <http://
www.cias.kyoto-u.ac.jp/alpub/jcas_ss/>.
Acesso em: mar. 2008.
LUYTEN, S. M. B. (Org.). Cultura pop ja-
ponesa: mangá e animê. 22. ed. São Paulo:
Hedra, 2005.
MORAIS, F. Corações sujos: a história da
shindo renmei. [São Paulo]: Companhia das
Letras, 2000.
PESQUISA da população de descendentes de
japoneses residentes no Brasil: 1987-1988.
São Paulo: Centro de Estudos Nipo-Brasilei-
ros, 1990. Mimeo.
SAKURAI, C. Romanceiro da imigração
japonesa. São Paulo: Sumaré, 1993. (Série
imigração).
SASAKI, E. M. O jogo da diferença: a expe-
riência identitária no movimento dekassegui.
1998. 144 f. Dissertação (Mestrado) - Progra-
ma de Pós-Graduação em Sociologia, Institu-
to de Filosofia e Ciências Humanas, Universi-
dade Estadual de Campinas, Campinas, 1998.
Disponível em: <http://www.ifch.unicamp.br/
pos/sociologia/index.php?texto=dissertacoes_
1998&menu=menudissertacoes>. Acesso em:
mar. 2008.
TOMA, C. Y. A experiência feminina
dekassegui: um olhar sobre a subjetivida-
de no processo migratório. Londrina: UEL,
2000. (Atualidade acadêmica).
Anexo 1 | Sobre os autores

Alice Yatiyo Asari


Mestrado e doutorado em Geografia Humana pela Universidade de São Paulo - USP,
tendo realizado trabalhos sobre os “colonos” japoneses de Assai (PR). Professora do
Departamento de Geociências da UEL, leciona a disciplina Geografia da População
e está desenvolvendo pesquisas sobre “Tempo e espaço nas migrações internacionais
no Norte do Paraná”, com ênfase para os estudos de mobilidade espacial dos imi-
grantes japoneses.

Célia Sakurai
Mestrado em Ciência Política pela Universidade de São Paulo - USP e doutorado em
Ciências Sociais pela Unicamp. Especialista em história da imigração japonesa no Bra-
sil, foi pesquisadora do Idesp e em diversas instituições de pesquisa em São Pau-
lo. Autora de diversos livros e artigos sobre imigração japonesa, é colaboradora no
Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil. É autora de diversas publicações
sobre o tema da imigração japonesa, sendo o mais recente Os Japoneses. São Paulo:
Editora Contexto, 2007.

Kaizô Iwakami Beltrão


Mestrado em Matemática Aplicada pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada
(1977) e doutorado em Estatística pela Princeton University (1981). Atualmente é
Pesquisador/Professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas/Instituto Brasi-
leiro de Geografia e Estatística. Tem experiência na área de População e Políticas
Públicas, com ênfase em Previdência Social e Educação, atuando principalmente nos
seguintes temas: demografia, diferenciais por sexo/raça, condições de saúde, demo-
grafia (estatística) e mortalidade.

Kaori Kodama
Doutorado em História Social da Cultura pela PUC-Rio. Atualmente, está no prelo
seu livro O filho das brenhas e o Império do Brasil – A etnografia do Instituto Histó-
rico e Geográfico do Brasil (1840-1860), em co-edição Editora Fiocruz e Edusp. Suas
principais áreas de atuação são em história e historiografia do Brasil-Império, história
das ciências e os debates sobre raça e nação no Brasil no século XIX. Tem capítulos de
livros e artigos publicados recentemente que versam sobre o tema da nação em diferen-
tes perspectivas. É pesquisadora visitante da Casa de Oswaldo Cruz-Fiocruz.

Lili Kawamura
Doutorado em Sociologia (USP), Livre-Docente em Educação (UNICAMP), com Pós-
doutorado na Universidade de Nagoya, Japão (1993-94); Professora e Pesquisadora
da UNICAMP, desde 1987; Professora visitante no Japão, no Programa de Mestra-
do em América Latina da Universidade de Tsukuba (1997-2000) e na Universidade
de Tenri (1994); Professora-Colaboradora na Universidade de Estudos Estrangeiros
de Quioto (1994). Pesquisadora sobre Migração de Brasileiros ao Japão, publicou
Para onde vão os Brasileiros?, Ed. UNICAMP, 2a. edição, 2003 e Nihon Shakai to
Burajirujin Imin (Sociedade Japonesa e Imigrantes Brasileiros), Ed. Akashi Shoten,
Tóquio, 2000, dentre outros livros e artigos sobre o tema, em revistas acadêmicas do
Brasil e Japão.

Luiz Antônio Pinto de Oliveira


Mestrado em Economia com concentração em Demografia Econômica, Centro de De-
senvolvimento e Planejamento Regional - CEDEPLAR/UFMG, graduação em Ciências
Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, com especialização em Demografia, Es-
cola Nacional de Ciências Estatísticas - ENCE/Centro Latinoamericano de Demogra-
fia - CELADE. Atualmente é coordenador de População e Indicadores Sociais - COPIS/
IBGE.

Maria Silvia C. Beozzo Bassanezi


Pesquisadora do Núcleo de Estudos de População (NEPO) da Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP) e bolsista PQ/CNPq. Doutora em Ciências (História) pela
Universidade Estadual Julio de Mesquita Filho (UNESP). Sua área de investigação é
Demografia Histórica, com ênfase em imigração internacional, distribuição espacial
da população e família (São Paulo, séculos XIX e XX). Tem publicado artigos em
periódicos e capítulos de livros sobre essas temáticas. Coordenou a elaboração e é co-
autora do Atlas da Imigração Internacional em São Paulo 1850-1950 (no prelo).

Masato Ninomiya
Mestrado e doutorado em Direito pela Universidade de Tokyo (1976 e 1981). Pro-
fessor Doutor do Departamento de Direito Internacional da Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo, Presidente do CIATE Centro de Informação e Apoio ao
Trabalhador no Exterior, desde 1992. Entre suas principais publicações estão “Igual-
dade entre os gêneros no Direito de Nacionalidade – um estudo de Direito Com-
parado” (em japonês), Yuhikaku, Tokyo, 1983; “Introdução ao Direito brasileiro”
(co-autoria com Michio Yatani), Institute of Developing Economies, Tokyo, 1993
e artigos em revistas especializadas: Brazilian Workers in Japan (co-autoria com
Aurea Christine Tanaka), University of Tokyo Journal of Law and Politics, volume 1,
Spring 2004, pp. 121-143 Remittances of Brazilian workers in Japan, idem, volume 2,
Spring 2005, pp.103-110.

Mônica Raisa Schpun


Doutorado em História pela Universidade Paris 7 (França). Pesquisadora do Centre
de Recherches sur le Brésil Contemporain, da Ecole des Hautes Etudes en Sciences
Sociales (Paris), leciona História das migrações internacionais nesta instituição. De
1997 a 2002, lecionou na Universidade de Milão. Publicou sobretudo Les Années
folles à São Paulo: hommes et femmes au temps de l’explosion urbaine (IHEAL/
l’Harmattan, 1997) e Beleza em jogo: cultura física e comportamento em São Paulo
nos anos vinte (SENAC/Boitempo, 1999). É especialista em história urbana, história
das elites, das relações de gênero e dos processos migratórios, sendo autora de diver-
sos artigos nessas áreas.

Nilza de Oliveira Martins Pereira


Doutoranda em Saúde Pública na Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação
Oswaldo Cruz e graduada em estatística, com pós-graduação em Demografia e Edu-
cação. Exerceu o cargo de Gerente de Análises Estruturais e Espaciais da População
da Coordenação de População e Indicadores Sociais do IBGE até 2007. Atualmente
é Membro do Grupo de Desenho Conceitual dos “Estudos de Modalidades Alter-
nativas de Censos Demográficos”; representante do IBGE no Grupo de Trabalho da
Diversidade Linguística (grupo interministerial), e vice-coordenadora do Grupo de
Trabalho de Demografia dos Povos Indígenas da Associação Brasileira de Estudos de
População - ABEP.

Oswaldo Mário Serra Truzzi


Pós-doutorado na Universidade de Chicago, doutorado em Ciências Sociais (Uni-
camp), mestrado em Administração (EAESP-FGV) e Engenheiro de Produção (EESC-
USP). Professor Associado da UFSCar desde 1980, foi pesquisador do IDESP de 1989
a 2002. Entre seus livros mais recentes constam: Estudos Migratórios – Perspectivas
Metodológicas (co-organizador, EdUFSCar, 2005), Sírios e Libaneses – narrativas de
história e cultura (Cia. Editora Nacional, 2005), Memorial dos Vassimon – Trajetória
familiar de emigrantes da Revolução Francesa a Portugal e ao Brasil (RiMa, 2001),
Café e Indústria, São Carlos, 1850-1950 (IMESP e EdUFSCar, 2007), Patrícios – Sírios
e Libaneses em São Paulo (HUCITEC, 1997).

Ruth Youko Tsukamoto


Mestrado e doutorado em Geografia Humana pela Universidade de São Paulo - USP,
onde desenvolveu pesquisas sobre os imigrantes japoneses na produção e industrializa-
ção do chá no Vale do Ribeira Paulista. Professora do Departamento de Geociências da
Universidade Estadual de Londrina (PR) lecionando a disciplina Geografia Agrária e está
desenvolvendo pesquisa sobre o Papel dos Agricultores Nikkeis no Norte do Paraná.
Ryohey Konta
Mestrado em Sociologia pela Tokyo University of Foreign Studies. Atualmente é
Pesquisador Visitante no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA, Rio de
Janeiro, e membro do Latin American Studies Group, Area Studies Center. Seu prin-
cipal campo de interesse se insere nas áreas de Estudos Brasileiros, Desenvolvimento
Social e Sociologia Urbana. Entre suas publicações mais recentes constam: “Brazil
the presidential election and Lula Government in the 2nd term”, Latin American
Report, v. 24, n. 1, 2007; “São Paulo, the biggest city in South America constructed
by immigrants: the history of social integration of Japonese Hospital Santa Cruz”,
Latin American Report, v. 23, n 2, 2007.

Sonoe Sugahara Pinheiro


Mestrado em Matemática pelo Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada
(1975), mestrado em Operations Research pela Stanford University (1979) e doutora-
do em Economia da Indústria e da Tecnologia pela Universidade Federal do Rio de Ja-
neiro (1996). Atualmente é pesquisador da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística. Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Estatística Sócio-
Econômica, e modelagem estatística atuando principalmente nos seguintes temas: pre-
vidência social, mercado de trabalho, tábuas de mortalidade e modelos matemáticos.

Tomoko Iyda Paganelli


Mestrado em Educação pelo Instituto de Estudos Avançados Em Educação (1982) e
doutorado em Geografia (Geografia Humana) pela Universidade de São Paulo - USP
(1998). Atualmente é professora adjunta IV da Universidade Federal Fluminense.
Tem experiência na área de Geografia, com ênfase em Geografia Urbana, atuando
principalmente nos seguintes temas: mapas, grupo espaço tempo ensino fundamen-
tal, estudos sociais, representação do espaço e espaço de representação Publicou,
dentre outros, O Brasil, Acess Editora, 2000. v. 4. 136 (com Antunes, A. R. ; Trin-
dade, M. L. A. ; Costa, C. F. L.), e Para a Construção do Espaço Geográfico na
Criança. In: Rosangela do Índio Almeida. (Org.). Cartografia Escolar. São Paulo:
Editora Contexto, 2007.
Anexo 2 | Lista de imagens

Introdução
Célia Sakurai

Autor: Katushika Hokusai.


pág. 8

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 10

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág.13

Parte 1 | História da imigração japonesa no Brasil


Episódios da imigração: um balanço de 100 anos
Kaori Kodama e Célia Sakurai

Autor: Katushika Hokusai.


pág. 16

Charge O Malho - Revista O Malho, 1904, In Matizes do Amarelo: a gênese dos


discursos sobre os orientais no Brasil (1878-1908).
pág. 18

Tratado da Amizade, Comércio e Navegação - Arquivo do Itamaraty. Foto cedida por


Tomoko Iyda Paganelli.
pág. 18
Passaporte dos bisavós de Sara Watanabe Amorim. Santos (SP), 1933 - Foto cedida pela
Família Watanabe. Arquivo Pessoal.
pág. 19

Companhia Japoneza de Imigração Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha, KKKK. Registro (SP) -
Acervo da Memória Institucional do IBGE.
pág. 20

Propriedade de colono. Avaí (SP) - Acervo da Memória Institucional do IBGE.


pág. 21

Colono japonês. Tomé-Açu (PA) - Acervo da Memória Institucional do IBGE.


pág. 22

Residência de colono japonês. Matapí, Macapá (PA) - Acervo da Memória Institucional


do IBGE.
pág. 22

Relatório - “A imigração japoneza” In Memória apresentada pela Diretoria Geral de


Estatística ao Congresso do Café, 1927.
pág. 23

Á
Mapa de Hiroshima e Nagasaki - http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://
upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/0/06/Japan_map_hiroshima_nagasaki.
Hiroshima

...... ~ .... png/.


.
Nagasaki

,.
~ ·. pág. 24
i

Segunda Guerra Mundial - commons.wikimedia.org.


pág. 24
Foto 027-1 - Arquivo Getúlio Vargas - CPDOC/FGV.
pág. 25

Juscelino Kubitschek - Acervo da Memória Institucional do IBGE.


pág. 26

Presidente Ernesto Geisel em Minas Gerais - Luís Issamu Sasaki. Arquivo Pessoal.
pág. 27

Plantação de uva - Foto cedida por Célia Sakurai. Arquivo Pessoal.


pág. 28

Plantação de mamão - Foto cedida por Célia Sakurai. Arquivo Pessoal.


pág. 28

Plantação de maçã - Foto cedida por Célia Sakurai. Arquivo Pessoal.


pág. 28

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 29
Parte 2 | Distribuição territorial dos japoneses no Brasil
Trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil: Censo Demográfico 1920/2000
Nilza de Oliveira Martins Pereira e Luiz Antonio Pinto de Oliveira

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 32

Família de colono japonês. Castanhal (PA) - Acervo da Memória


Institucional do IBGE.
pág 36

Estação da Estrada de Ferro Bragança, Castanhal (PA) - Acervo da Memória


Institucional do IBGE.
pág. 38

Cidade de Uberaba. Década de 1940 - Acervo da Memória


Institucional do IBGE.
pág. 39

Cidade de Resende. Década de 1940 - Acervo da Memória


Institucional do IBGE.
pág. 39

Trem que levava imigrantes recém-chegados dos navios para outras localidades do País -
Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil.
pág. 40

A avó com o neto em Tapiraí (SP), 1948 - Foto cedida por Tieko Fujiye.
Arquivo Pessoal.
pág. 42
Baía de Guanabara. Década de 1940 - Acervo da Memória
Institucional do IBGE.
pág. 47

Palácio do Planalto. Brasília (DF) - Acervo da Memória


Institucional do IBGE.
pág. 47

1a Comunhão de nipo-descendente, São Paulo (SP) - Foto cedida pela Família Uesato.
Arquivo Pessoal.
pág. 48

Tomé-Açú (PA) - Acervo da Memória Institucional do IBGE.


pág. 50

Autor: Katushika Hokusai.


pág. 53

Vivendo no Brasil: características da população de origem japonesa


Kaizô Iwakami Beltrão, Sonoe Sugahara e Ryohei Konta

Autor: Katushika Hokusai.


pág. 54

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 66
Plantadores do futuro: japoneses em São Paulo na primeira metade do Século XX
Maria Silvia C. Beozzo Bassanezi e Oswaldo Mário SerraTruzzi

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 72

Casal de japoneses nos jardins da Hospedaria de imigrantes. São Paulo (SP) - Memorial
do Imigrante.
pág. 74

Família japonesa em trabalho no campo, Cafelândia (SP), 1930 - Memorial do Imigrante.


pág. 75

Autor: Daizi Yamamoto.


pág. 77

Família Ouchi, 1930 - Foto cedida pela Família Ouchi. Arquivo Pessoal.
pág. 78

Família Ouchi, 1930 - Foto cedida pela Família Ouchi. Arquivo Pessoal.
pág. 78

Inauguração do novo prédio da escola japonesa do município de Agua Limpa, Araçatuba


(SP), 1931 - Memorial do Imigrante.
pág. 79
Casamento no Japão, 1931 - Foto cedida por Carlos Akira Kato.
Arquivo Pessoal.
pág. 80

Um japonês e um negro em plantação de café - Museu Histórico da


Imigração Japonesa no Brasil.
pág. 81

11 -:-:' Agricultor japonês. Miguelópolis (SP) - Acervo da Memória


-. -- - ~~.\ ~ -- Institucional do IBGE.
pág. 81
,v

Colheita de arroz - Década de 1930 - Museu Histórico da Imigração


Japonesa no Brasil.
pág. 84

Trabalhadores podando o chá. Registro (SP) - Acervo da Memória


Institucional do IBGE.
pág. 85

Comércio japonês. Bairro da Liberdade (SP) - Museu Histórico da


Imigração Japonesa no Brasil.
pág. 85

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 87
Parte 3 | Dois exemplos de colonização japonesa no Brasil: Paraná e Rio de Janeiro
Da terra do sol nascente às terras férteis do Paraná: territorialização e organização social de nikkeys
Alice Yatiyo Asari e Ruth Youko Tsukamoto

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 90

Sede da BRATAC, na década de 1930. Bastos (SP) - Fiação de seda BRATAC S.A.
pág. 92

Fachada da sede da BRATAC, na década de 1940. Bastos (SP) - Fiação de seda


BRATAC S.A.
pág. 92

Setor de enrolamento da fábrica BRATAC na década de 1960 - Fiação de seda


BRATAC S.A.
pág. 92

Primeiro grupo de compradores de terras, constituído por japoneses,


acompanhados por Hikoma Udihara e George Craig Smith, dezembro de 1929 -
Museu Histórico de Londrina “Padre Carlos Weiss”.
pág. 93

,;;,- . ~
~ ...-
,.-_;::::;·· Hikoma Udihara – agenciador de vendas de terras da Cia. de Terras Norte do Paraná -
.... f-
CTNP. Década de 1920 - Museu Histórico de Londrina “Padre Carlos Weiss”.
pág. 94

Escola Japonesa localizada na rua Ceará (atual rua Pref. Hugo Cabral).
Londrina (PR), 1938 - Museu Histórico de Londrina “Padre Carlos Weiss”.
pág. 95
Fachada da Aliança Cultural Brasil-Japão do Paraná - Aliança Cultural
Brasil Japão.
pág. 96

Plantação de café na região de Londrina (PR). Primeira metade do Século XX -


Museu Histórico de Londrina “Padre Carlos Weiss”.
pág. 98

Plantação de algodão na região de Londrina (PR). Primeira metade do Século XX -


Museu Histórico de Londrina “Padre Carlos Weiss”.
pág. 98

Figueira. Árvore típica da região do Paraná - Museu Histórico de Londrina


“Padre Carlos Weiss”.
pág. 99

Resgate de uma história: os japoneses no Estado do Rio de Janeiro


Tomoko Iyda Paganelli

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 102

Praça 15 de Novembro - In “Recenseamento do Rio de Janeiro”, 1907, IBGE.


pág. 104

Baía de Guanabara - commons.wikimedia.org.


pág. 107
Zona Rural - Acervo da Memória Institucional do IBGE.
pág. 108

Propriedade do Sr Miyata, vice-presidente da Associação Rural Nipo-brasiliense de Santa


Cruz (RJ) - Foto cedida por Tomoko Iyda Paganelli. Arquivo Pessoal.
.---~.-
pág. 109
,. -

Associação Nipo-brasileira de Santa Cruz (RJ) - Foto cedida por Tomoko Iyda Paganelli.
Arquivo Pessoal.
pág. 109

Família Arume 1 - Foto cedida pela família Arume.


Arquivo Pessoal.
pág. 111

Família Arume 2 - Foto cedida pela família Arume.


Arquivo Pessoal.
pág. 112

Família Tanizaki, Teresópolis (RJ) - Foto cedida por Tomoko Iyda Paganelli.
Arquivo Pessoal.
pág. 114

Teresópolis (RJ) - Acervo da Memória Institucional do IBGE.


pág. 114

Frutas - Foto cedida por Tomoko Iyda Paganelli. Arquivo Pessoal.


pág. 116

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 117
Parte 4 | Tradição e Modernidade
Dos passageiros do Kasato Maru aos aviões da Varig: quem eram os imigrantes?
Célia Sakurai

Autor: Katushika Hokusai.


pág. 120

Autor desconhecido.
pág. 122

Grupo de japoneses em frente à hospedaria de Kobe às vésperas do


embarque para o Brasil. Kobe (Japão), 1953 - Memorial do Imigrante.
pág. 123

Mapa político do Japão - Extraído do livro Os japoneses, Célia Sakurai, editora


Contexto 2007.
pág. 124

Chegada ao Brasil em 1950 - Foto cedida por Alexandra Takeda.


Arquivo Pessoal.
pág. 125

Intervalo para refeição durante mutirão para a construção de escola em colônia


japonesa. Cafelândia (SP), 1935 - Memorial do Imigrante.
pág. 126

Transporte da colônia para o mercado. Monte Alegre (PA) - Acervo da Memória


Institucional do IBGE.
pág. 127
Colono japonês - Macapá (AP) - Acervo da Memória
Institucional do IBGE.
pág. 127

Granja de frangos, Suzano (SP) - Foto cedida pela família Arume.


Arquivo Pessoal.
pág. 127

Armazém de imigrante japonês interior do Estado de São Paulo, 1940 -


Memorial do Imigrante.
pág. 128

Consultório dentário em colônia japonesa, Cafelândia (SP), c. 1940 -


Memorial do Imigrante.
pág. 128

Cooperativa agrícola de Cotia, São Paulo (SP) - Museu Histórico da Imigração


Japonesa no Brasil.
pág. 128

Bar do sr. Miyagi. Bastos (SP), 1950 - Museu Histórico Regional Saburo Yamanaka
de Bastos.
pág. 129

Aspecto da pensão. Bastos (SP) - Memorial do Imigrante.


pág. 129

Cinema ambulante - Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil.


pág. 130
Grupo de jovens imigrantes japoneses, praticantes de Kendô -
Memorial do Imigrante.
pág. 131

Quadro comemorativo dos 50 anos de imigração - Foto cedida pela família Arume.
Arquivo Pessoal.
pág. 132

Interior da Usiminas - Foto cedida pela Usiminas. Fotógrafo:


Leonardo Horta.
pág. 133

Altos fornos na Usiminas - Foto cedida pela Usiminas. Fotógrafo:


Leonardo Horta.
pág. 134

Porto de Tubarão (ES) - Foto cedida pela Prefeitura de Vitória/fotógrafo Carlos


Antonlini.
pág. 134

Casa própria. Nilópolis (RJ) - Foto cedida pela Família Arume. Arquivo Pessoal.
pág. 135

Imigração japonesa no Brasil: riquezas de uma presença secular


Mônica Raisa Schpun

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 136

Família japonesa em foto de passaporte Japão, 1918 -


Memorial do Imigrante.
pág. 138
Cooperativa Agrícola de Cotia. São Miguel (SP) - Acervo da Memória
Institucional do IBGE.
pág. 139

Carregamento de batatas na propriedade de imigrante japonês na região de Moinho


Velho. Cotia (SP), 1921 - Memorial do Imigrante.
pág. 139

Família de agricultores na colheita de legumes.


Suzano (SP). Foto cedida por Helena Kiyoe Ito. Arquivo pessoal.
pág. 140

Pequeno agricultor. Suzano (SP) - Foto cedida por Helena Kiyoe Ito.
Arquivo Pessoal.
pág. 141

Pequeno agricultor. Suzano (SP) - Foto cedida por Helena Kiyoe Ito.
Arquivo Pessoal.
pág. 141

Loja japonesa. São Paulo (SP) - Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil.
pág. 142

Sapataria da família Yoshihara. Álvares Machado (SP) - Foto cedida por Thomas Suzuki.
Arquivo Pessoal.
pág. 142

Tecelagem Murai. Bastos (SP), 1935 - Museu Histórico Regional


Saburo Yamanaka de Bastos.
pág. 142
Escola de colônia japonesa - Memorial do Imigrante.
pág. 143

Formatura de mulher descendente de japoneses em uma turma de Corte e Costura.


Suzano (SP), 1942 - Foto cedida pela família Arume. Arquivo Pessoal.
pág. 144

Formatura de mulher descendente de japoneses em uma turma de Corte e Costura.


Suzano (SP), 1942 - Foto cedida pela família Arume. Arquivo Pessoal.
pág. 144

Formatura de mulher descendente de japoneses em uma turma de Corte e Costura.


Suzano (SP), 1942 - Foto cedida pela família Arume. Arquivo Pessoal.
pág. 144

Tomoko formatura - Foto cedida por Tomoko Iyda Paganelli.


Arquivo Pessoal.
pág. 145

Formatura de nipo-descendente - Foto cedida por Otávio Omati.


Arquivo Pessoal.
pág. 146

Autor: Daizi Yamamoto


pág. 147

Shinjuku - Foto cedida por Bruna Siqueira Campos.


Arquivo Pessoal.
pág. 148
Casamento interétnico - Foto cedida por Hélio Shimada.
Arquivo Pessoal.
pág. 148

Festa com japoneses e brasileiros. Suzano (SP) - Foto cedida por Helena Kiyoe Ito.
Arquivo Pessoal.
pág. 149

O tradicional e o moderno na educação dos filhos de imigrantes japoneses


Masato Ninomiya

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 150

Japoneses aportando em Santos (SP), 1932 - www.br101.org.


pág. 152

Escola Japonesa em Onda Verde, São Paulo - Foto cedida por Mauro Kyotoku.
Arquivo Pessoal.
pág. 153

Festa na escola da Associação Nipo-Brasileira do bairro Rio Abaixo. Suzano (SP) -


Foto cedida por Helena Kiyoe Ito.
Arquivo Pessoal.
pág. 154
Recreio de Escola Japonesa. Bastos (SP) - Museu Histórico Regional Saburo
Yamanaka de Bastos.
pág. 155

Formando de Medicina, pela Universidade do Brasil, atual UFRJ (RJ), 1955 -


Foto cedida pela Família Arume.
Arquivo Pessoal.
pág. 156

Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo - USP - Acervo da


Memória Institucional do IBGE.
pág. 157

Faculdade de Farmácia e Odontologia de São Paulo (SP) - Acervo da


Memória Institucional do IBGE.
pág. 157

Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, USP - Acervo da


Memória Institucional do IBGE.
pág. 157

Dekassegui no Japão - Foto cedida por Helena Kiyoe Ito. Arquivo Pessoal.
pág. 159

Dekassegui no Japão - Foto cedida por Helena Kiyoe Ito. Arquivo Pessoal.
pág. 159

Dekassegui. Nagóia, Província de Aichi, Japão - Foto cedida por Edmilson


Koji Tanaka.
Arquivo Pessoal.
pág. 160

Crianças em Kamakura, Japão - Foto cedida por Bruna Siqueira Campos.


Arquivo Pessoal.
pág. 162
Escola primária em Nagoya, Japão - Foto cedida por Bruna Siqueira Campos.
Arquivo Pessoal.
pág. 163

Formatura em Geografia pela USP - Foto cedida por Helena Kiyoe Ito.
Arquivo Pessoal.
pág. 164

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 165

Família, mulher e cultura: impactos da migração para o Japão


Lili Kawamura

Autor: Utagawa Kuniyoshi.


pág. 166

Açougue de brasileiros no shopping Brazilian Plaza, Oizumi, Japão, 1998 -


Foto cedida por Lili Kawamura.
Arquivo Pessoal.
pág. 168

Mercearia de brasileiros “Quitandinha”. Oizumi, Japão, 1998 -


Foto cedida por Lili Kawamura.
Arquivo Pessoal.
pág. 168

Brasileiros se servindo na churrascaria “Primavera”.


Oizumi, Japão, 1998 - Foto cedida por Lili Kawamura.
Arquivo Pessoal.
pág. 168
Autor: Tsukioka Yoshitoshi.
pág. 169

Jovens em Shinjuku, bairro de Tóquio, Japão -


Foto cedida por Bruna Siqueira Campos.
Arquivo Pessoal.
pág. 170

Festival de Karaokê. Santos (SP), 2007 -


Foto cedida pela Prefeitura Municipal de Santos.
pág. 171

Kofu, Província de Yamanashi, Japão -


Foto cedida por Edmilson Koji Tanaka.
Arquivo Pessoal.
pág. 171

Bastos (SP) - Acervo da Memória Institucional do IBGE.


pág. 172

Moradia de brasileiros em Homi Danchi. Toyota, Japão, 1994 -


Foto cedida por Lili Kawamura.
Arquivo Pessoal.
pág. 173

Ilustração de Sílvio Sano publicada originalmente no livro “Confrontos e conflitos”


em 2006. Ilustração cedida por Sílvio Sano.
Arquivo Pessoal
pág. 174

Dekassegui em Tóquio (Japão) - Foto cedida por Helena Kiyoe Ito.


Arquivo Pessoal.
pág. 175
Jovens em Osaka (Japão) - Foto cedida por Bruna Siqueira Campos.
Arquivo Pessoal.
pág. 176

Autor: Tavik Frantisek Simon


pág. 179
Agradecimentos

Acervo Tavik Frantisek Simon


Alexandra Takeda
Aliança Cultural Brasil-Japão do Paraná e
Liga Desportiva e Cultural Paranaense
Alice Yatiyo Asari
André Uesato
Associação para Comemoração do
Centenário da Imigração Japonesa no Brasil
Associação Brasileira de Dekasseguis
Blog Espaço Livre
(http://www.br101.org)
Bruna Siqueira Campos
Carlos Akira Kato
Célia Sakurai
Celina Yamamoto Nishimura
CENIBRA
Chiaki Karen Tada
Editora Abril
Edmilson Koji Tanaka
Família Arume
Fiação de seda BRATAC
Helena Kiyoe Ito
Hélio Shimada
Hiroaki Okudai
Ivanete Noriko Suzuki
Kiyoko Kamimura
Lili Kawamura
Magda Prates Coelho
Marina Yumi
Marlene Iumi Ijichi
Massachusetts Institute of
Techonology - MIT
Mauro Kyotoku
Museu Padre Carlos Weiss
Museu Histórico Regional Saburo
Yamanaka de Bastos
Otávio Omati
Prefeitura de Vitória (ES)
Prefeitura de Santos (SP)
Ralph Giesbrecht
Ricardo Hirata
Roberto Meizi Agune
Rogério Dezem
Ruth Youko Tsukamoto
Sara Watanabe Amorim
Sílvio Sano
Teruo Ouchi
Thomas Suzuki
Tieko Fujiye
Tomoko Iyda Paganelli
Toyota do Brasil
USIMINAS
Volkswagen do Brasil
Equipe técnica

Centro de Documentação e
Disseminação de Informações
David Wu Tai

Coordenação de Produção
Marise Maria Ferreira

CRÉDITOS

David Wu Tai
Editor

Magda Prates Coelho


Coordenação

Célia Sakurai
Consultoria especializada

Célia Sakurai
Magda Prates Coelho
Organização

Agláia Pereira Tavares de Almeida


Helena Bezerra Torelly
Pesquisa iconográfica

Fernanda Costa e Silva


Projeto gráfico

Fernanda Jardim
Ubiratã O. dos Santos
Sebastião Monsores
Tratamento de imagens

Katia Vaz Cavalcanti


Carmen Heloisa Pessoa da Costa
Elizabeth Santos Fontoura
Estruturação textual, tabular e de gráficos
Carmen Heloisa Pessoa da Costa
Fernanda Costa e Silva
Fernanda Jardim
Marisa Sigolo Mendonça
Mônica Pimentel Cinelli Ribeiro
Diagramação

Ana Raquel Gomes de Almeida


Aparecida Tereza Rodrigues Regueira
Solange de Oliveira Santos
Normalização textual e bibliográfica

Josianne de Miranda Pangaio


Sergio de Assis Barbosa
Paulo Roberto dos Santos Lindsay
Digitalização das imagens da Memória
Institucional do IBGE

Ednalva Maia do Monte


Maria Alice da Silva Neves Nabuco
Impressão e acabamento

Você também pode gostar