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Capítulo 1

A relevância clínica das funções da


fáscia: traduzindo a ciência
Leon Chaitow
Este capítulo explora as funções notáveis da fáscia a partir da perspectiva do terapeuta manual,
salientando as conexões clínicas relevantes entre função e disfunção fascial e características anatômicas e
fisiológicas da fáscia.
Conforme descrito neste capítulo, a fáscia tem muitas funções, e mantê-las e restaurá-las quando
estiverem lesionadas – por razões que vão desde o envelhecimento até o traumatismo – deve ser o foco
principal dos profissionais/terapeutas.

Definições – o que é fáscia e o 


Estar ciente de como a fáscia pode se tornar dis-
funcional – e quais sintomas têm, então, proba-
que ela faz bilidade de ocorrer (ver Cap. 2).
No momento não há uma maneira geralmente aceita 
Ter a capacidade de avaliar, observar, palpar
de classificar a fáscia. Schleip (2012a) observou que e avaliar a função e disfunção fasciais, que é o
atualmente há pelo menos três maneiras comuns de tema dos Capítulos 3 e 4 (por Tom Myers e este
codificar a fáscia: autor).

Estar ciente dos métodos que podem prevenir

O Federative International Committee on Ana-
disfunção, bem como ser capaz de restaurar e/
tomical Terminology (1998) descreve fáscia
ou aumentar efetivamente sua funcionalidade.
como “bainhas, folhas ou outros agregados de tecido
conectivo dissecável”, incluindo “revestimentos de São oferecidas avaliações detalhadas de 15 mo-
vísceras e estruturas dissecáveis relacionadas a elas” delos separados de cuidado e tratamento fasciais
(Terminologia Anatômica, 1998). no Capítulo 5 e na Seção 2 (que compreende os

Standring et al. (2008) descrevem fáscia como Cap. 6 a 20). Esses capítulos examinam o que se
“massas de tecido conectivo grandes o suficiente para sabe sobre os métodos terapêuticos mais usados
serem visíveis a olho nu”, observando que “as fi- na fáscia – suas metodologias, seus mecanismos
bras na fáscia tendem a ficar entrelaçadas” e que ela (até onde eles são atualmente compreendidos),
inclui “tecido conectivo areolar frouxo”, tal como a bem como a evidência de efeitos terapêuticos (à
“fáscia superficial” subcutânea. medida que estiver disponível).

Schleip et al. (2012b) caracterizam a fáscia como Deveria surgir um quadro baseado nas evidências
“tecidos colagenosos fibrosos que fazem parte de um sis- que possa ser usado no raciocínio clínico no momen-
tema de transmissão de força tensional amplo do corpo”. to da decisão sobre escolhas terapêuticas, bem como
que possa fornecer a base para explicar um possível
A fim de aumentar a função fascial quando ela envolvimento fascial aos pacientes/clientes. Portan-
for perdida ou estiver sob tensão, é necessário: to, devem resultar escolhas clínicas efetivas no tra-

Entender os papéis da fáscia – o que é e o que ela tamento de problemas já existentes relacionados à
faz (Cap. 1). fáscia.

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4 Seção I • Bases fasciais

Terminologia deste livro as ferramentas que farão com que os julgamentos


corretos sejam exercidos.
Levando em conta as várias definições listadas ante-
riormente, e onde for apropriado, este livro descreve Prática clínica informada por evidência em
tecidos fasciais individuais e estruturas conside- pesquisa
rando:
Além de um resumo das características anatômi-

O papel funcional de tecidos particulares, como, cas e fisiológicas da fáscia, este capítulo descreve os
por exemplo, fáscia separada. principais aspectos de pesquisas fasciais recentes,

As estruturas anatômicas relacionadas aos te- enquanto oferece também a tradução de novas in-
cidos sob discussão, como, por exemplo, fáscia formações onde pode haver relevância clínica.
cervical. Para atingir com sucesso a prevenção e a avalia-

Descritores adicionais podem ser fornecidos, ção e realizar um tratamento bem-sucedido, depen-
como, por exemplo, tecido conectivo frouxo ou demos de interpretação precisa de achados da ciên-
denso. cia básica. Quanto mais claramente entendermos a

A posição hierárquica relativa pode ser descrita, anatomia e fisiologia fasciais e quanto mais cientes
como, por exemplo, fáscia superficial ou profunda. estivermos das implicações dos achados de pesqui-
sa, mais capazes seremos de reconhecer os papéis
Observação: Neste livro, devido à escassez atual de
que a fáscia pode desempenhar em uma variedade
uma concordância universal quanto à terminologia,
de condições dolorosas e disfuncionais.
os seguintes descritores podem ser encontrados em
diferentes capítulos ou citações, todos se referindo à 
O que os estudos sobre células e tecidos em um
mesma camada de tecido conectivo: superficial, sub- laboratório realmente significam quando se refe-
cutânea, frouxa, não densa, areolar, panicular. rem ao tratamento da dor e à disfunção relacio-
nada à fáscia?
A importância da tradução de pesquisa 
O que podemos aprender a partir de avaliações
clinicamente relevante (e precisa) de modelos matemáticos da função fascial (ver
O crescente interesse na fáscia, resultante de con- Cap. 5)?
gressos e simpósios de pesquisa recentes e da ex- 
Como tais estudos informam os métodos de tra-
plosão de publicações baseadas em pesquisa sobre tamento (ver Caps. 2 e 4)?
o assunto, tem levado ao desenvolvimento e à pro- 
Como a pesquisa anatômica, por exemplo, que
moção de uma variedade de “novos” métodos de surge de achados de dissecção, traduz-se em ra-
tratamento. Muitos deles tentam se autovalidar via ciocínio clínico (ver Caps. 3 e 4)?
referência para estudos de pesquisa, com um núme- 
Como a informação que deriva de estudos de
ro significativo sendo marca registrada (R) ou, ten- imagem pode oferecer a informação clínica ma-
tando proteger sua singularidade, adicionando um nual que é clinicamente útil (ver Caps. 3 e 4)?
símbolo de registro (®).
Algumas dessas modalidades registradas e pu- (Bio)Tensegridade definida
blicadas são incluídas como capítulos individuais na
Seção 2. Os autores desses capítulos explicaram os 
“Tensegridade” é uma palavra inventada que
métodos e os fundamentos sobre os quais a moda- combina elementos de “integridade tensional”.
lidade foi construída – isto é, a maneira como a pes- Ela descreve uma forma estrutural que é deter-
quisa científica foi traduzida em uma abordagem minada pelos comportamentos tensionais, con-
clínica. tínuos e fechados dos componentes do sistema
Essa tendência para métodos de publicação – suportes rígidos e elementos de conexão flexí-
enfatiza a necessidade de profissionais, médicos e veis, que respondem complacentemente à tensão
terapeutas terem a capacidade de exercer uma ava- e à compressão (Fig. 1.1).
liação crítica da evidência apresentada a eles e se- 
Levin e Martin (2012) observam que a bioten-
rem capazes de, então, tomar decisões informadas. segridade: “reverte o conceito de séculos de que o
Um dos principais objetivos deste livro é fornecer esqueleto é a estrutura sobre a qual o tecido mole é

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Capítulo 1 • A relevância clínica das funções da fáscia: traduzindo a ciência 5

Ponto-chave
O modelo de (bio)tensegridade deve nos lembrar
de que a carga compressiva ou tensional tem efeitos
de mecanotransdução mecânicos (e químicos) – e de
que a forma da arquitetura importância é relevante
– e de que, à medida que ela muda, também mu-
dam suas funções (ver Fig. 1.1). (Mecanotransdução
é descrita mais adiante neste capítulo. Ela se refere
à maneira como as células convertem estímulos me-
cânicos em atividade química.)

Fáscia: resiliência como um


descritor
FIGURA 1.1 Modelo de biotensegridade. Um modelo de tensegri- Schleip e colaboradores (2012a) descrevem fáscias
dade pré-estressada representando arquitetura de biotensegridade
como: ...“O componente de tecido mole do sistema de
em todas as escalas de tamanho por todo o corpo – nos níveis mo-
lecular, de tecidos, de órgãos e de sistemas orgânicos –, todos com tecido conectivo que permeia o corpo humano. Pode-se
elementos de compressão e de tensão. A = características de ten- também descrevê-las como tecidos colagenosos fibrosos
são: células de microfilamentos, músculo, tendão, ligamento, fáscia. que fazem parte de um sistema de transmissão de força
B = compressão: hélice de DNA, microtúbulos, matriz extracelular,
costelas, ossos, fáscia. AF = aderência focal: pontos de integração en- tensional amplo do corpo. A rede fascial completa, por-
tre elementos tensionais e compressivos em um nível celular. Adap- tanto, inclui não apenas bainhas de tecido planar denso
tada de Swanson 2013. (como septos, envelopes musculares, cápsulas articula-
res, cápsulas dos órgãos e retináculos), que também pode
ser chamada de ‘fáscia própria’, mas ela também abrange
coberto e o substitui por um tecido fascial integrado
densificações locais desta rede na forma de ligamentos e
com elementos de compressão “flutuantes” (ossos em
tendões. Adicionalmente, ela inclui tecidos conectivos
vertebrados), emaranhados dentro de interstícios dos
colagenosos mais moles como a fáscia superficial ou a
elementos tensionados”.
camada intramuscular íntima do endomísio... O termo

Ingber (1993) demonstrou que as células fun-
fáscia agora inclui a dura-máter, o periósteo, o perineuro,
cionam como estruturas de tensegridade pré-
a camada capsular fibrosa dos discos vertebrais e as cáp-
-estressadas independentes e que moléculas,
sulas dos órgãos, bem como tecido conectivo brônquico e o
tecidos e órgãos podem, todos, ser visualizados
mesentério do abdome”.
como complexos de tensegridade.

Dentro desses sistemas de tensegridade bioló- A fáscia faz parte de todos os tecidos moles do
gica hierárquicos (biotensegridade), as células corpo:
pré-estressadas individuais estão estabiliza- 
A fáscia une, comprime, protege, envolve e se-
das e prontas para receber sinais mecânicos e para tecidos;
convertê-los em mudanças bioquímicas, um 
A fáscia reveste e conecta estruturas, fornecendo
processo chamado de mecanotransdução (ver o sistema de andaimes que permite e aumenta a
adiante). transmissão de forças;
O conceito de cadeias contínuas fascialmente liga- 
A fáscia tem funções sensoriais, a partir do nível
das, cabos, trilhos e alças de estruturas miofasciais microscópico (p. ex., comunicação célula-a-cé-
é discutido mais adiante neste capítulo. Ver o Qua- lula individual) até o envolvimento de grandes
dro 1.1 para um resumo de algumas das principais lâminas fasciais, tal como a fáscia toracolombar
características funcionais da fáscia. (FTL);

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Quadro 1.1
Exemplos de caracterizações funcionais de fáscia (Kumka & Bonar, 2012)

Fáscia de ligação: Compreende tecido conecti-  Por exemplo, a fáscia crural do membro inferior
vo denso que pode ser classificado como ativo ou existe como coberturas tipo meias que variavel-
passivo e que “inclui fáscias de músculos, fáscia de mente oferecem compressão e tensão, enquanto
regiões (cabeça e pescoço, tronco, membros), apo- afetam fortemente a eficiência muscular e o re-
neuroses, arcos tendinosos e bainhas neurovascula- torno venoso. As camadas densas são separadas
res” (Terminologia Anatômica, 1998). por tecido conectivo frouxo que facilita os movi-
Fáscia de ligação ativa: contém inúmeros recep- mentos de deslizamento entre elas, permitindo
tores de dor e mecanorreceptores; é ativa durante ações diferenciais de camadas individuais.
o movimento e na estabilização das articulações  Fáscia de separação: Compreendendo principal-
e crucial para a transmissão de força (ver mais mente tecido conectivo frouxo, este material fino
adiante neste capítulo). Ela pode ter a capacidade como uma teia de aranha cria envelopes, bolsas,
de contrair para oferecer pré-tensão aos múscu- compartimentos, túneis, bainhas e revestimentos
los. Exemplos: fáscia toracolombar; trato IT. que separam órgãos e regiões do corpo, reduzindo
Fáscia de ligação passiva: mantém continuida- a fricção enquanto oferecem potenciais de absorção
de entre as estruturas; tem funções propriocep- de choque e de deslizamento, em resposta ao movi-
tivas; é passivamente envolvida na transmissão mento, à tensão e à distensão.
de força via colocação de carga a partir dos mús- Exemplos incluem pericárdio, peritônio e bai-

culos. Exemplos: ligamento da nuca, aponeurose nhas sinoviais.


plantar. Kumka e Bonar (2012) enfatizam a natureza ambígua da

Fáscia fascicular: Compreende uma mistura de te- fáscia quando oferecem um exemplo de todas as quatro
cidos conectivos frouxos e densos que fornecem a dessas categorias sugeridas – na coxa:
forma arquitetônica dos músculos:  “Trato iliotibial (de ligação);
Ela circunda os músculos (epimísio), bem como
 Perimísio do músculo quadríceps femoral (fascicular);
separa as fibras musculares (perimísio), enquanto  Fáscia lata (de compressão);
cobre cada fibra muscular (endomísio).  Tecido subcutâneo (de separação)”.
A fáscia fascicular se funde para formar estru-

turas miotendinosas densas. Esta rede fascial


fascicular intramuscular age para espalhar e con- Ponto-chave
centrar forças dentro dos músculos, bem como
A relevância clínica das observações no Quadro 1.1
entre músculos sinergistas – e via fáscia de liga-
se relaciona aos conceitos de continuidade – de
ção – para os músculos antagonistas. Além disso,
cadeias, cordões e cabos, envolvendo conexões
ela fornece uma variação de túneis protetores e
fasciais. As implicações clínicas específicas para te-
trajetos para nervos, vasos sanguíneos e estrutu-
rapias manuais são discutidas neste capítulo sob
ras linfáticas.
subtítulos como Transmissão de força e Mecanotrans-

Fáscia de compressão: Essa estrutura de tecido co-
dução.
nectivo denso encobre e separa os membros envol-
vendo camadas tipo lâminas.


A fáscia facilita o deslizamento dos tecidos uns rante o ciclo da marcha, por exemplo. Pense em
sobre os outros; cangurus ou gatos!

A fáscia também oferece um meio de armazena- 
As múltiplas funções da matriz de tecido conec-
mento de energia – agindo como uma espiral via tivo, com suas qualidades combinadas de força
estruturas fasciais pré-estressadas, tais como os e elasticidade – de biotensegridade – podem ser
grandes tendões e as aponeuroses da perna, du- descritas pela única palavra resiliência. Isso pode

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Capítulo 1 • A relevância clínica das funções da fáscia: traduzindo a ciência 7

ser definido como a capacidade de se adaptar às do corpo (Langevin e colaboradores, 2011a; Swan-
forças distorcidas e, onde apropriado, a capacida- son, 2013). O que surge é que:
de de retornar à forma e posição originais, que é a

A fáscia é conectada a todos os outros tecidos
qualidade da rede fascial. Resiliência também des-
do corpo, microscópica e macroscopicamente
creve a capacidade de se recuperar rapidamente a
– de modo que suas matrizes de colágeno tridi-
partir da doença ou lesão (ver Quadro 1.2).
mensionais são arquitetonicamente contínuas –
desde a cabeça até o dedo do pé, desde células
Características funcionais da individuais até órgãos principais.

A fáscia tem propriedades elásticas, plásticas e
fáscia viscoelásticas coloidais (ver Quadro 1.2).
As definições e os conceitos em relação à fáscia (aci- 
A fáscia é bastante inervada – participando
ma) oferecem ideias úteis sobre como podemos com- na propriocepção e na sensação de dor (ver
preender de modo clínico os componentes fasciais Quadro 1.3).

Quadro 1.2
Propriedades fasciais – tixotropia, plasticidade, elasticidade, viscoelasticidade e os processos de
arrasto (drag), histerese e deformação
A fáscia tem um conjunto notavelmente diverso de pro-  O colágeno é a proteína mais amplamente distri-
priedades – e elas têm implicações para os terapeutas buída no corpo e é responsável pelas propriedades
manuais. Deve-se ter em mente dois princípios essen- coloidais da fáscia.
ciais ao considerar as características fasciais:  A propriedade tixotrópica dos coloides significa
Lei de Hooke: Estresse imposto sobre os tecidos (i.e., que, quanto mais rapidamente a força é aplicada
o grau de força que está sendo aplicado) é diretamen- (carga), mais rigidamente o tecido responderá – por
te proporcional à tensão produzida (p. ex., mudança no isso a probabilidade de fratura quando a força rápi-
comprimento) dentro dos limites elásticos dos tecidos. da encontra a resistência de osso. Se a força for apli-
Ver discussão de elasticidade e plasticidade abaixo. cada gradualmente, a “energia” é absorvida pelos
Lei de Wolffe: Tecidos (p. ex., osso, fáscia) se remode- tecidos e armazenada neles, com implicações tera-
lam em resposta às forças ou demandas colocadas so- pêuticas potenciais (Binkley & Peat, 1986).
bre eles. Chen e Ingber (2007) descrevem como as forças  O armazenamento de energia também é uma ca-
mecânicas são transmitidas dentro do citoesqueleto e racterística de preparação para movimento – con-
da matriz nuclear das células, onde mudanças bioquími- forme explicado abaixo (Schleip e colaboradores,
cas e de transcrição ocorrem por meio do processo de 2012a).
mecanotransdução. Uma carga manual, sustentada e suave é um requisito se
 A fáscia é um coloide, que compreende partículas o arrasto (drag) e a resistência forem reduzidos quando
de material sólido, suspenso em líquido. A quan- são induzidas mudanças naquelas estruturas de tecidos
tidade de resistência que os coloides oferecem à moles fasciais mais sujeitas à mudança, isto é, as cama-
carga aplicada aumenta proporcionalmente à ve- das fasciais frouxas, mais superficiais, em vez das fáscias
locidade de aplicação de força. Para um exemplo mais profundas, densas.
simples de comportamento coloidal, considere uma  Os tecidos moles mostram graus variados de elasti-
mistura espessa de farinha e água. Se o coloide re- cidade (viscosidade, resiliência ou “cedência”) a fim
sultante for lentamente agitado com um palito ou de resistir à deformação quando a carga é aplicada.
uma colher, o movimento será suave, mas qualquer A propriedade elástica da fáscia é possível porque
tentativa de movê-lo rapidamente encontrará uma esses tecidos têm a capacidade de armazenar um
resistência semirrígida (conhecida como “arrasto pouco da energia mecânica que é aplicada a eles.
[drag]”). Essa qualidade dos coloides é conhecida Eles são, então, capazes de utilizar isso quando re-
como tixotropia – mais evidente na matriz extrace- tornam a seu formato e tamanho originais quando
lular (descrita mais adiante neste capítulo). a carga é removida.

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
Esse processo de armazenamento de energia, e de 
Greenman (1996) descreveu como a fáscia trata as
perda de energia, é conhecido como histerese (Co- cargas e tensões, tanto de forma plástica quanto
meaux, 2002). As propriedades de histerese (e creep, elástica, com suas respostas dependendo – varia-
descritas abaixo) oferecem explicações possíveis velmente – do tipo, da velocidade, da duração e da
para a metodologia de liberação miofascial (ou in- quantidade da carga. Quando a carga é gradual-
dução, ver o Cap. 14), bem como aspectos de terapia mente aplicada à fáscia, seguem-se reações elás-
neuromuscular (Cap. 15). Essas qualidades devem ticas nas quais a folga é reduzida à medida que os
ser levadas em conta durante a aplicação da técnica. tecidos respondem. Uma carga persistente leva ao

Se a carga for repetida de maneira excessiva ou fre- que é coloquialmente chamado de “creep”, em que
quente, ela pode superar o potencial elástico dos o formato do tecido alonga e distorce lentamente
tecidos, levando à deformação plástica. Uma mu- devido à propriedade viscoelástica do tecido conec-
dança permanente, ou uma distorção plástica se- tivo. Um exemplo de deformação é o processo de
mipermanente, da matriz de tecido conectivo pode compressão gradual que afeta os discos interverte-
ocorrer, e o retorno ao normal apenas será possível brais quando ficam na posição vertical.
com a introdução de energia suficiente para permi- 
A rigidez de qualquer tecido se relaciona a suas pro-
tir uma reversão do processo de deformação, ideal- priedades viscoelásticas e, portanto, à natureza co-
mente por meio de terapias manuais aplicadas len- loidal tixotrópica do(a) colágeno/fáscia.
tamente (Doubal & Klemera, 2002). 
Cantu e Grodin (2001) utilizam o termo “caracte-

Olson e Solomonow (2009) oferecem um forte rísticas de deformação” para descrever o que eles
exemplo dos efeitos da elasticidade exaustiva que veem como a característica “exclusiva” de tecido
resulta de carga repetitiva: “as propriedades do tecido conectivo. Esse termo incorpora a característica de
viscoelástico tornam-se comprometidas pela repetição deformação viscosa (permanente, plástica), bem
clínica de flexão – extensão do tronco que consequen- como os potenciais de deformação tipo espiral
temente influencia a ativação muscular. A redução da (temporária, elástica), conforme resumido ante-
tensão nos tecidos viscoelásticos dos humanos ocorre riormente.
durante flexão-extensão cíclicas e é compensada por
atividade aumentada da musculatura a fim de manter
a estabilidade. O reflexo ligamento-muscular é inibido Ponto-chave
durante as atividades passivas, mas torna-se hiperati- A percepção dessas múltiplas qualidades fasciais
vo após flexão cíclica ativa, indicando que os requisitos oferece insights aos fisioterapeutas em relação às
de momento são as variáveis de controle. Imagina-se diversas maneiras como a carga mecânica pode in-
que a exposição de rotina prolongada à flexão cíclica fluenciar o que eles estão tocando. Outro aspecto
minimiza a função dos tecidos viscoelásticos e coloca desse contato é como o sistema nervoso é influen-
demandas crescentes sobre o sistema neuromuscular, ciado, e também por dinâmica de líquido – ambos
o que, com o passar do tempo, pode levar a um distúr- são discutidos mais adiante neste capítulo.
bio e uma possível exposição à lesão”.


A fáscia é funcional, não passiva. Ela é dinâmica Inervação da fáscia
e ativa – participando no movimento e na esta-
bilidade. 
Deixando de lado os processos de mecanotrans-
dução (conforme mencionado anteriormente e
descrito em mais detalhes adiante), como o corpo
Ponto-chave se regula e se adapta ao seu ambiente depende, em
grande parte, do registro neural que oferece a in-
Kumka (comunicação pessoal, 2013) oferece uma
formação cerebral quanto aos requisitos internos e
perspectiva médica: “características morfológicas da
externos. A interpretação de tais informações, re-
fáscia – sua localização, relações, inervações, etc. – são
cebidas de receptores da dor e de mecanorrecep-
as ‘rodovias’ por meio das quais a fáscia deve ser abor-
dada pelos médicos”.
tores de vários tipos, determina a maneira como o
corpo responde às demandas da vida.

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Capítulo 1 • A relevância clínica das funções da fáscia: traduzindo a ciência 9

Quadro 1.3
Principais estações de geração de respostas fasciais

Receptores de Golgi: Estes são abundantes em te- bem mais abundantes em – por exemplo – feixes
cido conectivo denso. Nas junções miotendinosas e musculares e fáscia – do que as estações de relato
nos ligamentos de articulações periféricas, eles são de Pacini e de Ruffini. A densidade mais alta está lo-
conhecidos como órgãos tendinosos de Golgi, calizada no periósteo. 10% são mielinizados (Tipo 3),
onde eles respondem à contração muscular. Outros e o restante é não mielinizado (Tipo 4). Alguns são
receptores de Golgi respondem aos movimentos responsivos à pressão rápida, outros, ao alonga-
de alongamento ativos (mas provavelmente não mento fascial (e cutâneo). Outros são de limiar lento
aos passivos) – com diminuição imediata do tônus – respondendo a um toque que é ‘tão leve quanto o
em fibras motoras relacionadas. Permanece incerto pincel de um pintor’ (Mitchell & Schmidt, 1977). Eles
até que ponto a carga manualmente aplicada pode também são conhecidos como receptores de tecido
evocar respostas de Golgi (Schleip, 2003). miofascial intersticial (interoceptores). Schleip (2011)

Mecanorreceptores de Pacini e paciniformes: sugere que esses interoceptores têm influências au-
Estes receptores intrafasciais são encontrados no tônomas – sobre a pressão arterial, por exemplo.
tecido conectivo denso. Os corpúsculos de Pacini 
O emprego clínico de estratégias manuais apropria-
na fáscia muscular, junções miotendinosas, cama- das a fim de influenciar receptores neurais diferen-
das capsulares profundas e ligamentos espinais são tes é explorado com mais detalhes no Capítulo 5.
relatados por responderem a mudanças na pressão
e na vibração – mas não na compressão sustentada
– com efeitos que levam a feedback proprioceptivo Ponto-chave
aumentado e controle motor. A percepção das maneiras como graus, durações e

Mecanorreceptores de Ruffini: Estes estão loca- direções diferentes de carga podem influenciar as
lizados no tecido conectivo denso, nos ligamentos estruturas neurais dentro da fáscia oferece opções
das articulações periféricas, na dura-máter e nas terapêuticas relevantes para a clínica, por exemplo,
camadas capsulares externas. Alguns respondem a uma carga leve, reduzida e tangencial (que afeta
mudanças rápidas de pressão, mas a maioria é afe- os mecanorreceptores de Pacini), em comparação
tada por pressão sustentada, ou golpes – profundos com um alongamento moderado, sustentado (que
– rítmicos lentos, bem como por forças de alonga- afeta os órgãos tendinosos de Golgi). Uma sensação
mento lateral (tangencial). Os efeitos incluem ativi- de “corte/picada” agudo(a) é comumente relatada
dade simpática reduzida. quando a fáscia disfuncional está sendo alongada

Mecanorreceptores intersticiais (p. ex., Tipos ou comprimida.
3 e 4): Estes oferecem informação sensorial, e são


Os proprioceptores são mecanorreceptores que ceptores nos músculos se conectam às camadas
monitoram constantemente a posição articular, fasciais às quais os fascículos musculares se in-
a carga do tendão, a tensão do ligamento e o es- serem como parte do processo de transmissão
tado do tônus e da contração muscular. Os ór- de força (discutido mais adiante neste capítulo).
gãos tendinosos de Golgi (ver Quadro 1.3) são 
Stecco e colaboradores (2007) demonstraram a
exemplos de proprioceptores especializados presença de uma variedade de estruturas neu-
que são envolvidos na preservação da integri- rais na fáscia profunda – incluindo corpúsculos
dade articular. A propriocepção da fáscia é for- de Ruffini e de Pacini. Isso sugere fortemente
necida principalmente pelos mecanorreceptores que a fáscia participa da percepção de postura,
localizados dentro das estruturas fasciais, bem bem como de movimento, tensão e posição (ver
como do que foi chamado de “ectoesqueleto” Quadro 1.3).
(Benjamin, 2009). Isso descreve um “esqueleto 
Além disso, a fáscia toracolombar (FTL) é den-
de tecido mole” virtual no qual os mecanorre- samente inervada com diferenças acentuadas

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10 Seção I • Bases fasciais

na distribuição das terminações nervosas sobre Mecanotransdução


várias camadas fasciais: o tecido subcutâneo
(fáscia superficial) contém uma presença den- A mecanotransdução descreve as inúmeras manei-
sa de mecanorreceptores sensoriais, tais como ras pelas quais as células respondem aos diferentes
receptores de Pacini e terminações de Ruffini graus de carga: torsão, tensão, cisalhamento, alívio,
compressão, alongamento, inclinação e fricção – re-
(ver Quadro 1.3). Terminações nervosas livres
sultando em modificação rápida do comportamento
positivas para substância P – imaginadas como
celular e adaptações fisiológicas –, incluindo expres-
nociceptivas – são encontradas exclusivamente
são genética e respostas inflamatórias. A mecano-
nessas camadas: “O achado de que a maioria das fi-
transdução nos tecidos conectivos envolve processos
bras sensoriais está localizada na camada externa da
de comunicação físicos e químicos que ocorrem en-
fáscia e no tecido subcutâneo pode explicar por que
tre células especializadas, tais como miofibroblastos
algumas terapias manuais que são direcionadas na
e seu ambiente imediato, incluindo a rede de matriz
fáscia e no tecido subcutâneo (p. ex., liberação fascial)
extracelular (MEC) tipo sopa na qual eles funcio-
são muitas vezes dolorosas” (Tesarz e colaborado-
nam. Os processos de mecanotransdução que envol-
res, 2011). vem colagenase e TGF-β1 (fator de crescimento de
Observação: A FTL é descrita com mais detalhes e transformação beta-1) são de particular importância
com particular atenção no Capítulo 9, “O método de e são explicados abaixo.
Manipulação Fascial® aplicado à dor lombar”.

Ponto-chave
Principais características fasciais Até que ponto os efeitos de mecanotransdução (de-
clinicamente relevantes vido às diferentes formas e graus de carga sobre as
células) podem ser influenciados por terapia manual
Como observado, a fáscia fornece continuidade es- ainda é objeto de estudo. Contudo, há evidências de
trutural e funcional entre os tecidos moles e duros que a alteração de tensão de tecido local pode in-
do corpo como um componente sensorial, elástico- fluenciar a cura pós-traumática, via mecanotransdu-
-plástico e onipresente que reveste, sustenta, separa, ção, como, por exemplo, por meio de mudanças na
conecta, divide, envolve e dá coesão ao restante do colagenase e/ou produção de TGF-β1. Essas carac-
corpo – enquanto às vezes permite movimentos de terísticas fasciais são discutidas adiante e em mais
desvio, deslizamento –, bem como desempenha um detalhes no Capítulo 5.
papel importante na transmissão de forças mecâni-
cas entre as estruturas (Huijing, 2007).
Os elementos individuais contidos naquele resu-
mo (“elástico”, “plástico”, “sensorial”, “de separação”,
Matriz extracelular (MEC)
“de deslizamento”, etc.) precisam ser esclarecidos e A MEC é o microambiente físico no qual as células
individualmente discutidos – como o são nos capítu- operam. A MEC também fornece a oportunidade
los de abertura do livro e em muitas das discussões para as células se ancorarem (usando complexos de
dos métodos clínicos na Seção 2. aderência descritos adiante).
Todas essas funções e atributos da fáscia são O espaço ao redor e entre as células compreende
interessantes; contudo, alguns têm maior relevân- uma malha elástica intricadamente organizada de
cia clínica do que outros. Potenciais características proteína localmente secretada, fibras de colágeno e
fasciais clinicamente relevantes que merecem aten- moléculas de polissacarídeos, bem como água rica
ção incluem as maneiras como as células fasciais em íons e glicosaminoglicanos (GAGs) – tais como
respondem às diferentes formas e graus de carga ácido hialurônico – que formam a MEC. As células
mecânica (mecanotransdução), bem como o aspecto principais da fáscia, os fibroblastos, sintetizam a
MEC e o colágeno em resposta à carga.
múltiplo de conexão, envolvimento e ligação da fás-
cia e como estes influenciam a avaliação terapêutica 
As superfícies das células que produzem os ma-
e o tratamento. teriais constituintes da MEC – fibroblastos – são

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Capítulo 1 • A relevância clínica das funções da fáscia: traduzindo a ciência 11

diretamente conectadas a ela por GAGs e fibras esses papéis de forma mais eficiente quando os
de colágeno. tecidos em que eles estão operando são firmes/

Fibras de colágeno extracelulares na matriz gi- tensos, em vez de flácidos/relaxados – com essas
ram rapidamente, até 50% em apenas 24 horas, características (firme/mole) sendo reconhecidas
demonstrando uma natureza ativa em constante por seus receptores de superfície, as característi-
mudança (Hocking e colaboradores, 2009). cas de aderência.

Dois fatores principais orientam o desenvolvi- 
Wipff e Hinz (2009) observaram que, quando
mento de miofibroblastos: estresse mecânico e colocados em plástico rígido, os miofibroblastos
fator de crescimento de transformação beta-1 respondem aumentando e desenvolvendo feixes
(TGF-β1): de fibras de tensão espessos – mas, quando colo-
Os miofibroblastos sentem estresse usan- cados em uma superfície mole, suas aderências
do aderências de matriz especializada (ver focais não se desenvolvem, permanecendo rela-
adiante). tivamente pequenas (ver Fig. 1.2 e Lâmina 1).
A relevância terapêutica da dinâmica de líquidos e a
Complexos de aderência de matriz MEC são descritas abaixo.
celular (CAMEs)
As células se ancoram ao andaime da MEC usando
Ponto-chave
substâncias aderentes solúveis. Estas prendem os
proteoglicanos e as fibras de colágeno aos recep- A relevância clínica de uma compreensão da nature-
tores na superfície celular. Usando essa estrutura za e das funções da MEC inclui a percepção de que,
arquitetônica (ver observações sobre tensegridade, por exemplo, várias formas de carga modificam seu
anteriormente neste capítulo), as células percebem e comportamento com efeitos profundos sobre estru-
tura e função. A influência da terapia manual sobre
convertem sinais mecânicos em respostas químicas,
tais processos é discutida no Capítulo 5, enquanto
permitindo que elas reajam à carga externa de ma-
os capítulos na Seção 2 descrevem modelos de tera-
neira instantânea. Portanto – além de suas funções
pias individuais.
aderentes –, as moléculas de adesão celular ajudam
a modular a transdução de sinal:

“CAMEs são complexos excepcionalmente flexíveis e
dinâmicos e seus componentes sofrem rotações rápidas Células especializadas, estruturas e
e reguladas para manter as correntes de informações funções da fáscia (Benjamin, 2009)
mecânicas e químicas delicadamente equilibradas.
Apesar do papel crucial de CAMEs na migração ce- A fáscia mantém o corpo integrado, envolvendo
lular, a sinalização por meio desses complexos fornece uma rede tensional ampla do corpo de tecidos mo-
influência sobre quase toda função celular principal, les, colagenosos, às vezes densos e fibrosos e às ve-
incluindo, por exemplo, a sobrevivência, a diferencia- zes elásticos e frágeis (teia fina).
ção e a proliferação das células” (Lock e colaborado- Observação: Esta lista não é abrangente, mas salien-
res, 2008). ta os principais elementos envolvidos na estrutura e

Literalmente, as células informam células adja- na função fasciais:
centes de suas respostas físicas e químicas à car- 
Colágeno: Derivado da palavra grega clássica
ga alterada. Nesse processo, a carga física tam- para cola, kola, o colágeno é formado por diferen-
bém é transferida para complexos de aderência tes combinações e concentrações de proteínas,
– os “membros” virtuais das células que “se an- amarradas juntas em uma variedade de fibras.
coram” à MEC. A arquitetura do colágeno é às vezes descrita

Isso é particularmente relevante durante a cica- quanto às direções dessas fibras, bem como à
trização de feridas. Descobriu-se que, quando os espessura e à densidade da estrutura resultante.
miofibroblastos são ativados para exercer a fun- O colágeno fornece suporte, formato e estabili-
ção de estabilizadores estruturais/arquitetôni- dade, enquanto a razão pela qual ele se funde
cos da ferida em reparação, eles desempenham com elastina (ver abaixo) determina seu grau

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12 Seção I • Bases fasciais

de flexibilidade (Langevin & Huijing, 2009). As quebram as ligações de peptídeos em colágeno,


características dos tecidos, tais como as direções prevenindo formação de tecido conectivo em
das fibras, são basicamente dependentes das de- excesso, por exemplo, durante a cicatrização de
mandas tensionais e compressivas às quais eles feridas (Tortora e colaboradores, 2007).
estão sendo adaptados. A maior parte do colá- 
O alongamento cíclico (ou compressão) dos
geno (cerca de 90%) no corpo é do Tipo 1 – por fibroblastos – envolvendo aproximadamente
exemplo, encontrado na pele; contudo, existem 10% da elasticidade disponível – dobra a produ-
muitos outros tipos de colágeno (Ross & Pawli- ção de colagenase.
na, 2011). Purslow e Delage (2012) relatam que 
Em contrapartida, o alongamento contínuo é
as ligações cruzadas estabilizam as moléculas apenas 50% efetivo (Langevin, 2010; Carano &
de colágeno na fáscia muscular, mas que esses Siciliani, 1996). Além disso, Bouffard e colabo-
elos cruzados podem se tornar excessivos devi- radores (2009) relatam que o alongamento leve
do ao envelhecimento – bem como por serem in- e breve dos tecidos que alojam os fibroblastos
fluenciados pela dieta e pelos efeitos tóxicos do promove produção de colagenase, diminuindo
tabaco, por exemplo. As influências nutricionais a formação de novas estruturas de colágeno, re-
e de estilo de vida sobre a função fascial – e o duzindo, dessa forma, a probabilidade de fibrose.
surgimento de disfunção por meio de envelheci- Existem vários outros processos de mecanotrans-
mento ou trauma – são discutidos no Capítulo 2. dução; contudo, o exemplo fornecido aqui oferece
As influências principais sobre a produção de uma percepção dos potenciais para influências
colágeno envolvem substâncias discutidas mais mecânicas (via exercício e/ou terapia manual e/ou
adiante nesta seção – ver informações sob o sub- acupuntura) sobre o comportamento celular.
título Colagenase e Fator de crescimento de transfor-
mação beta-1 (TGF-β1).

Fibroblastos: Estes são os tipos de célula mais Ponto-chave
comuns no tecido conectivo. Eles secretam as De possível relevância clínica é a observação de que
proteínas de colágeno que mantêm a estrutura células levemente carregadas perdem sua sensibili-
da matriz extracelular – aquela malha acentua- dade à deformação mecânica após 10 a 15 minutos,
damente diversa que circunda as células e que requerendo um período de repouso ou um estímulo
fornece andaime, bem como que é uma rede de diferente para recomeçar a secreção de colagenase.
comunicação. Os fibroblastos alteram sua fun- A observação de que a carga intermitente tem
ção em resposta à atividade e à carga que mo- uma influência maior sobre a produção de colage-
difica seu formato (ver discussão sobre mecano- nase do que a carga sustentada também é clinica-
transdução). Kumka e Bonar (2012) observaram mente relevante.
que: “Os fibroblastos são altamente adaptáveis a seu Em geral, graus e formas variados de carga – in-
ambiente e mostram uma capacidade de se remodelar cluindo exercício, estímulo mecânico cíclico, susten-
em resposta à direção de vários estímulos mecânicos, tado, pesado, leve – modificam o comportamento
celular e a expressão genética, influenciando a re-
produzindo respostas bioquímicas. Se a função muda,
modelagem do tecido – envolvendo enzimas e vá-
como na tensão mecânica aumentada ou imobilização
rios fatores de crescimento como TGF-β1.
prolongada, a transcrição de ácido desoxirribonuclei-
Não é surpreendente, portanto, que o exercício
co (DNA) de procolágeno nos fibroblastos mudará os
aumenta a formação de colágeno, enquanto a ina-
tipos (p. ex., colágeno do tipo I em colágeno do tipo
tividade a diminui dramaticamente – nos músculos,
III), ou os tipos de células não diferenciadas podem se mas não nos tendões.
adaptar a uma linhagem mais funcionalmente apro-
priada”.

Colagenase: Quando os fibroblastos são sub- 
Miofibroblastos: Eles se originam dos fibroblas-
metidos a uma carga contínua ou cíclica (alon- tos que foram estimulados para mudar sua forma
gamento, forças de cisalhamento ou compres- e função como um resultado da carga mecânica e
são – mecânica – ou, por exemplo, envolvendo da consequente deformação. Os miofibroblastos
edema), eles secretam colagenases, enzimas que possuem algumas das características de células

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Capítulo 1 • A relevância clínica das funções da fáscia: traduzindo a ciência 13

de músculo liso, contendo actina e miosina, de 


Células de músculo liso: Como esperado, elas
modo que eles têm a capacidade de se contrair. estão localizadas no tecido muscular liso, con-
Os miofibroblastos ajudam no reparo, na recons- forme encontrado nas paredes das vísceras e nos
trução e na remodelagem do tecido lesionado vasos sanguíneos. Elas também são embutidas
secretando nova MEC (ver acima) e exercitando nos tecidos conectivos. Essas células não estria-
alta força contrátil. Se esses processos se torna- das e em forma de fuso são capazes de contra-
rem não regulados, a contratura do tecido (como ções involuntárias rítmicas lentas. Schleip e co-
na doença de Dupuytren) e o desenvolvimento laboradores (2006) sugerem que sua presença
de fibrose podem ocorrer. A fibrose é discutida na fáscia pode estar relacionada aotônus fascial,
com mais detalhes no Capítulo 2. As duas ca- influenciando a dinâmica musculoesquelética.
racterísticas principais que estão envolvidas na
transformação de fibroblastos para miofibroblas-
tos são a carga mecânica e o TGF-β1 químico. São Ponto-chave
necessários níveis particulares de estresse para
No Capítulo 2, existe uma breve discussão sobre
induzir o desenvolvimento de miofibroblastos,
os efeitos do pH alterado sobre a fáscia – às vezes
tal como ocorre no traumatismo. Os miofibro-
resultante de padrões de respiração excessiva (tal
blastos percebem mudanças na carga/tensão
como hiperventilação). Isso causa a contração dos
usando aderências de matriz especializadas – as músculos lisos, com potencial relevância para o tô-
estruturas que permitem que eles se fixem às su- nus fascial.
perfícies (ver Fig. 1.2 e Lâmina 1).


Integrinas: Projeções de proteína do tipo aérea,
Ponto-chave vitais para comunicação célula-para-célula e
Diferentes formas de aplicação de carga terão efei- célula-para-MEC. Myers (2012) explicou isso de
tos de mecanotransdução sobre os miofibroblastos, forma esplêndida: “A MEC é conectada às mem-
com influência significativa sobre a remodelagem e branas celulares e, por meio delas, ao citoesqueleto
a reabilitação. via centenas ou milhares de integrinas de ligação
na superfície celular. As forças de fora da célula são
transmitidas por meio dessas conexões aderentes para
os trabalhadores internos da célula. Assim, nós po-
demos agora entender que cada célula, assim como
‘experimentando’ seu ambiente químico, está ‘sentin-
do’ e respondendo a seu ambiente mecânico... Forças
também se movem na outra direção – da célula para
a MEC – no caso de contração muscular ou de (mio)
fibroblasto que é transmitido por meio da membrana
até a MEC adjacente”.

Fibronectina: Consiste em uma substância do
tipo cola que, por exemplo, liga-se às integrinas,
as proteínas receptoras abrangentes de células.

Elastina: Elas permitem que os tecidos no cor-
po recuperem seu formato após alongamento ou
contração; por exemplo, onde a fáscia superficial
precisa permitir movimento de deslizamento
significativo, como no dorso da mão, os níveis de
elastina são aumentados para permitir a restau-
ração da posição e do formato após o movimento.
FIGURA 1.2 Miofibroblasto na superfície sólida (esquerda) e su- 
Fibrilina: Este constituinte da MEC é essencial
perfície mole (direita). Ver também Lâmina 1 (Wipff & Hinz 2009). para a formação de fibras elásticas que fornecem

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14 Seção I • Bases fasciais

força e flexibilidade ao tecido conectivo. Quando mento constante, vibração perpendicular e osci-
ela sofre uma mutação genética, resulta em sín- lação tangencial. O grau de eficácia foi julgado
drome de Marfan. por pressão de líquido aumentada de AH, visto

Gordura (tecido adiposo): A fáscia superficial que “a pressão gerada no líquido entre o músculo e a
(ver adiante mais informações sobre este tópico) fáscia... [durante o tratamento]... faz com que a dife-
contém, em diferentes áreas do corpo, camadas rença de fluido aumente”. Os achados foram que
distintas de gordura que fornecem isolamento e “vibração perpendicular e oscilação tangencial podem
amortecimento na forma de tecido fibroadiposo. aumentar a ação do tratamento na matriz extrace-

Fator de crescimento de transformação beta- lular, fornecendo benefícios adicionais nas terapias
1 (TGF-β1): Esta é uma proteína secretada que manuais que atualmente usam apenas movimentos de
realiza muitas funções celulares, incluindo o deslizamento constantes”.
controle de crescimento celular, proliferação e 
Langevin e colaboradores (2011b) mostraram que
diferenciação de células. Um novo colágeno é a redução do potencial de deslizamento da fás-
formado em resposta à carga mecânica (como cia na área toracolombar (descrita tecnicamente
no exercício ou na terapia manual) e ele estimu- como “força de cisalhamento toracolombar re-
la, entre outras substâncias, o TGF-β1. De acor- duzida”) correlaciona-se com espessura aumen-
do com Langevin (2006), o alongamento breve tada da FTL, e, nos homens, parece predispor à
diminui os efeitos de TGF-β1 na produção de dor lombar. Esse elo específico de gênero entre
colágeno adicional – que pode ser relevante um movimento de deslizamento livre da fáscia
para as técnicas de terapia manual que visam na FTL, a espessura das camadas de tecido co-
reduzir o risco de formação de cicatriz/fibrose. nectivo e dor lombar permanece inexplicado.
A inatividade reduz a função de proliferação de
colágeno nos tecidos musculares – mas não nos Modelo de deslizamento alternativo de
tendões – de maneira drástica (Kjaer e colabora- Guimberteau
dores, 2009). Um modelo diferente é sugerido (Guimberteau &
Bakhach, 2006; Guimberteau, 2012), no qual é obser-
Lubrificantes fasciais vado que:

Proteoglicanos (PG), glicosaminoglicanos “A noção tradicional de diferentes fáscias ou do sis-
(GAG): Estas substâncias do tipo muco e que tema de deslizamento, de escorregamento do sistema co-
adoram água, compostas de proteína e molécu- lagenoso... concentra-se na separação dessas estruturas.
las de açúcar em várias combinações, formam A microscopia de mapeamento eletrônico sugere que esse
a substância fundamental – uma característica sistema não consiste em camadas sobrepostas, diferentes.
frouxamente condensada da MEC. Essas subs- Na realidade, há uma única arquitetura tissular com espe-
tâncias têm papéis importantes em auxiliar a cializações diferentes. Para enfatizar suas implicações fun-
difusão de nutrientes e de resíduos, bem como cionais, nós chamamos esse tecido de sistema de absorção
oferecer uma casa para condroitina e outros sul- colagenoso (dinâmico) multimicrovacuolar (SACMVC).”
fatos e várias fibras de colágeno com funções de As observações detalhadas de Guimberteau e
estabilização, compressão ou tensão. colegas sugerem que:

Ácido hialurônico (AH): Este componente de 
Esse ambiente intercelular contém um gel de
PG e GAG tem funções lubrificantes e ajuda a proteoglicano altamente hidratado, com alto
manter a viscosidade da MEC. Uma camada de conteúdo lipídico. Suas laterais compreendem
ácido hialurônico lubrificante fica entre a fáscia vacúolos entrelaçados compostos por colágeno
profunda e o músculo (Langevin, 2009). e elastinas.

Efeitos de carga sobre o AH: Usando métodos 
O SACMVC é visto como o bloco de construção
de modelagem matemáticos sofisticados, Roman de: “uma rede interorgânica, que funciona em níveis
e colaboradores (2013) compararam os efeitos de diferentes e que realiza três papéis mecânicos princi-
lubrificação de AH quando três formas diferen- pais: (i) responde a qualquer tipo de estímulo mecâ-
tes de carga manual foram aplicadas: desliza- nico de uma maneira altamente adaptável e de eco-

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Capítulo 1 • A relevância clínica das funções da fáscia: traduzindo a ciência 15

nomia de energia; (ii) preserva as estruturas, fornece capacidades de ligação à água da substância
informação durante a ação e volta para seu formato fundamental do tecido conectivo do porco, eles
original; (iii) assegura a independência e a autonomia descobriram que o conteúdo de água tinha re-
das várias unidades funcionais”. duzido – como quando se espreme uma esponja.
Isso efetivamente facilitou a rigidez dos tecidos.
Eles também observam que:
Após cerca de 30 minutos, o conteúdo de água

“...a função do sistema microvacuolar é manter as aumentou novamente, de modo que, várias ho-
estruturas periféricas próximas, mas não mecanica- ras após o alongamento, houve um aumento na
mente afetadas pela ação do corpo em progresso. In- rigidez elástica do tecido. Eles concluíram que
versamente, ele também oferece resistência, primeiro a fáscia parece se adaptar hidrodinamicamente
minimamente depois aumentando à medida que a em resposta aos estímulos mecânicos, tais como
carga aumenta”. compressão e alongamento, basicamente devido

É oferecido um exemplo prático no qual a flexão a um efeito de preenchimento e de compressão
do dedo é observada, durante a qual: “o movi- mecânica do tipo esponja na bioarquitetura dos
mento do tendão flexor raramente é perceptível na GAGs e proteoglicanos que têm afinidade com
palma da mão. Acontece o mesmo sob o tecido areolar a água. Isso sugere que pelo menos alguns dos
cutâneo, que é o elo de conexão entre o músculo, o ten- efeitos da terapia manual e do exercício – relati-
dão, a gordura, a aponeurose e as áreas subdérmicas. vos à facilidade de movimento, rigidez, etc. – re-
O sistema SACMVC situado entre o tendão e seu te- lacionam-se às mudanças no conteúdo de água
cido adjacente parece favorecer o deslizamento ideal. dos tecidos conectivos. Isso tem uma possível
A excursão do tendão pode ser grande e rápida sem relevância para reduzir edema, bem como para
resistência e sem provocar qualquer movimento no aumentar o suporte de água para proteínas sub-
tecido adjacente, sendo responsável pela ausência de -hidratadas, permitindo extensibilidade aumen-
quaisquer repercussões dinâmicas de tal movimento tada dos tecidos.
sobre a superfície da pele”. 
Reed e colaboradores (2010) estudaram de que

A capacidade do SACMVC de responder de for- maneiras o líquido se move entre os vasos lin-
ma flexível é alterada quando influências negati- fáticos e sanguíneos periféricos e os tecidos
vas tais como edema, traumatismo, inflamação, intersticiais. Eles descobriram que, durante a
obesidade e/ou envelhecimento ocorrem, crian- inflamação, por exemplo, as propriedades físi-
do mudanças no formato microvacuolar. cas dos tecidos conectivos frouxos (envolvendo
GAGs e ácido hialurônico, conforme descrito an-
teriormente) podem mudar em uma questão de
Ponto-chave minutos, resultando em um aumento de até cem
A relevância clínica do conhecimento sobre MEC e vezes no fluxo de líquido. Eles propõem que:
GAGs (tal como ácido hialurônico) salienta a impor- “células de tecido conectivo aplicam forças de tensão
tância de funções de deslizamento/desvio – seja sobre as fibras da MEC que sucessivamente impedem
entre as camadas fasciais ou envolvendo um me- a substância fundamental sub-hidratada de absorver
canismo diferente. Em essência, a capacidade de líquido e inchar”. O tecido conectivo é visto como
atividade muscular sem atrito é a ideal. Há alguma um aspecto ativo do equilíbrio hídrico e da fi-
evidência de que diferentes formas de carga tera- siologia.
pêutica podem ajudar a criar potencial de desliza- 
Meert (2012) observa que o líquido na MEC: “cria
mento aumentado. Ver o Capítulo 5 para mais deta- um espaço de transporte para nutrientes, resíduos
lhes sobre as formas específicas de carga. e substâncias mensageiras e realmente facilita a ho-
meostase entre a região extracelular e a intracelular.
Além disso, o sistema linfático filtra esse suprimento
para fora do oceano de líquidos intersticiais e o drena
Dinâmica de líquido e fáscia
para o sistema venoso”.

Quando Klinger e colaboradores (2004) exa- 
“Os fibroblastos respondem à tensão do tecido co-
minaram os efeitos do alongamento sobre as nectivo por ajuste homeostático da pressão de líquido

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16 Seção I • Bases fasciais

intersticial e fluxo de líquido transcapilar. A trans- úteis da evidência de pesquisa atual – transferên-
missão de forças dos fibroblastos para a matriz ex- cia de carga.
tracelular... causa mudanças na pressão hidrostática
intersticial... influenciando a resposta à lesão e à in- Camadas e bolsas fasciais
flamação” (Langevin e colaboradores, 2005). (Willard, 2012a)

Fryer e Fossum (2009) sugerem que as contra-
ções isométricas usadas nas técnicas de energia Forças de tensão que resultam de contrações muscu-
muscular (TEM; ver Cap. 13) “aumentam a drena- lares e demandas de carga são espalhadas para teci-
gem dos espaços intersticiais reduzindo as concentra- dos adjacentes – e distantes – via folhas fasciais, bem
ções de citocinas pró-inflamatórias”. como por meio de filamentos densificados, cordões,

A dinâmica de líquido fascial e as mudanças tiras, invólucros e conexões tipo corda (tendões, liga-
fasciais intramusculares ajudam a explicar os mentos, retináculos, etc.).
efeitos das modalidades envolvendo contrações A fáscia também compreende uma variedade
isométricas (tais como TEM e facilitação neu- complexa de bolsas, septos, bolsos e envelopes que
romuscular proprioceptiva). contêm, separam e dividem tecidos e estruturas –
enquanto, em muitos casos, permitem uma facilida-
de de deslizamento, desvio que fornece a base para
Ponto-chave o movimento sem atrito entre as camadas de tecidos
moles. Isso pode ser perdido ou reduzido por ade-
A relevância clínica da dinâmica de líquido e da rências e densidade aumentada.
fáscia indica uma maior influência de líquido/água
A geografia da fáscia pode ser dividida em cate-
sobre a flexibilidade e a rigidez, bem como sobre
gorias funcionais amplas:
a distribuição de substâncias, tais como nutrientes,
produtos pró-inflamatórios e anti-inflamatórios e a 1. Fáscia (frouxa) superficial, ou areolar ou pani-
drenagem de resíduos durante processos como in- cular;
flamação e reparo de tecido – com influências sobre 2. Fáscia axial profunda (ou de revestimento);
a função homeostática. 3. Fáscia meníngea (circunda o sistema nervoso);
4. Fáscia visceral (circunda e sustenta os órgãos).

1. Fáscia superficial (frouxa ou areolar


O panorama geral: características ou panicular)
Uma camada superficial de tecido conectivo frouxo
estruturais da fáscia e gordura circunda o tronco e as extremidades, mas
Descrever as diferentes estruturas fasciais indepen- não os orifícios externos. Isso permite deslizamento
dentemente, como abaixo, pode distrair da realidade entre eles mesmos e a fáscia mais densa e mais pro-
de que a rede fascial é contínua; cada parte dela é funda que envolve e reveste o músculo.
unida a outra parte, estrutural e funcionalmente. Vasos sanguíneos e nervos passam de e para es-
Isso foi sucintamente expresso por Schleip e truturas mais profundas por meio da camada adipo-
colaboradores (2012, Introdução), conforme segue: sa superficial.
“O corpo fascial é um grande órgão em rede, com Essa fáscia subcutânea frouxamente envolvida
muitas bolsas e centenas de densificações locais tipo corda – superficial – é o tecido conectivo que é mais aces-
e milhares de bolsos dentro de bolsos, todos interconecta- sível (e tratável) à intervenção de terapia manual
dos por septos firmes, bem como por camadas de tecido (ver Quadro 1.4 sobre alongamento e fáscia super-
conectivo mais frouxo.” ficial).
O texto abaixo descreve algumas das dife-
Principais características da fáscia superficial
rentes formas, tipos e localizações da fáscia e sua
geografia (ver também Quadro 1.1 para “funções 
Contém canais linfáticos;
da fáscia”), seguido por um resumo de como isso 
Tem uma função de absorção de choque – por
se traduz em um dos aspectos mais clinicamente exemplo, no calcanhar;

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Capítulo 1 • A relevância clínica das funções da fáscia: traduzindo a ciência 17

Quadro 1.4
Tecido conectivo frouxo e alongamento

Langevin e colaboradores (2005) relataram que o libera ATP no espaço extracelular encorajando uma
alongamento sustentado e leve (abaixo de 20% da mudança no formato da célula, possivelmente envol-
elasticidade disponível) produzia um aumento de- vendo produtos de ruptura com efeitos analgésicos.
pendente do tempo significativo no perímetro do Além disso, o trajeto da proteína Rho instiga remode-
corpo de células de fibroblastos e área transversal: lagem das aderências focais da célula, que servem de
“esse estudo [tem] implicações importantes para nosso mediadores de quando e como a célula se liga à matriz
entendimento de movimento normal e postura, bem extracelular, levando ao relaxamento do tecido conec-
como para terapias usando estimulação mecânica de tivo” (Langevin, 2013).
tecido conectivo, incluindo fisioterapia, massagem e

Ver o subtítulo, “Complexos de aderência de matriz
acupuntura”.
celular (CAMCs)”, para uma explicação sobre “ade-

Fourie (2009) observa que estudos em animais e em rências focais”.
humanos indicam que o grau ideal de alongamen-
to, requerido para alongar o tecido conectivo frouxo, 
Quando submetidos a esforços mecânicos (tal como
não deve exceder 20% da elasticidade disponível, alongamento sustentado leve), os fibroblastos den-
com 5 a 6% geralmente sendo adequados. tro da fáscia muscular secretam interleucina-6, que
mostrou influenciar significativamente a diferencia-

“Quando o tecido conectivo se alonga (p. ex., via ex-
ção que é essencial para o reparo muscular e que
tensão física ou estimulação mecânica com uma
agulha de acupuntura), as células de fibroblastos que influencia fortemente os processos inflamatórios
ajudam a produzir e manter a matriz de tecido co- (i.e., tem o potencial de desencadear efeitos pró-
nectivo aumentam e se achatam. Nós sugerimos que -inflamatórios ou anti-inflamatórios dependendo
os complexos de aderência focal sobre as superfícies de outros fatores) (Hicks, 2012).
dos fibroblastos detectam alongamento e iniciam a 
Os fibroblastos sintetizam a MEC e o colágeno em
sinalização mediada pela proteína Rho. A célula então resposta à carga tal como o alongamento.


Age como um isolante do calor e regulador tér- orientação de fibrilas de colágeno, bem como
mico; vários líquidos que permitem movimentos

Armazena energia na forma de triglicerídeos; como as funções de deslizamento e desvio des-

Fornece canais para veias e, em algumas áreas, ses tecidos (ver observações sobre MEC ante-
fibras nervosas grandes e bem protegidas, bem riormente neste capítulo e observações sobre
como contendo inúmeros mecanorreceptores GAGs);
(Schleip e colaboradores, 2012b); 
Reed e colaboradores (2010) resumiram as prin-

Às vezes aloja estruturas musculares vestigiais – cipais características da substância fundamental
por exemplo, o platisma no pescoço; da fáscia superficial, como segue:

Contém fibras elásticas que permitem que a pele
se alongue (derme, epiderme) e que também “A MEC do tecido conectivo frouxo, constituindo a matriz
criam propriedades elásticas e de tensão que intersticial, tem três componentes principais:
facilitam um grau de alongamento seguido por a. colágenos constituindo o andaime rígido para órgãos
um retorno ao estado original; e organismos;

Conecta a fáscia mais profunda com a superfície b. fibras e microfibrilas elásticas;
do corpo; alojando lóbulos adiposos (subdivi-
c. a substância fundamental composta por proteoglica-
sões pequenas;
nos e ácido hialurônico, bem como glicoproteínas.

Contém substância fundamental – a MEC –
que enche os espaços entre as células e que Essa matriz intersticial fornece a rota de transporte para
tem múltiplas propriedades que determinam a nutrientes e materiais residuais entre o lado abluminal da

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18 Seção I • Bases fasciais

barreira endotelial para as células parenquimais de qual- como os mesentérios. Essa fáscia também funciona como
quer tecido. um conduto para os feixes neurovasculares e linfáticos,
visto que eles irradiam para fora do mediastino torácico,

A fáscia superficial também contém vários tipos
abdominal e pélvico até alcançar os órgãos específicos”.
de células importantes, incluindo:
adipócitos para armazenagem de gordura;
A fáscia visceral circunda e sustenta os órgãos
fibroblastos (ver observações anteriormente
e fornece o “tecido de invólucro” para as estruturas
da linha média do corpo (Drake e colaboradores,
no capítulo);
várias células sanguíneas protetoras, tais
2010) – ela é contínua a partir da região nasofaríngea
e cervical, por meio do tórax (mediastino), passando
como neutrófilos e macrófagos;
mastócitos e células plasmáticas;
pelo diafragma, por meio do abdome, até o soalho
glândulas sudoríparas.
pélvico. Na linha média, além do plexo abdominal
e dos nervos autônomos, ela aloja vasos principais,
tais como a aorta e os sistemas da veia cava, bem
Ponto-chave como o ducto torácico. A fáscia visceral envolve efe-
tivamente todos os órgãos principais, cobre os reves-
Aspectos significativos de tecidos conectivos frou-
timentos pleurais e peritoneais e forma as bainhas
xos superficiais encontram-se em sua relativa aces-
neurovasculares. A fáscia mediastinal, que basica-
sibilidade para compressão, alongamento e/ou
mente compreende o tecido conectivo frouxo, por-
agulhamento – como exemplos. Uma carga com o
tanto, forma a cavidade compartimental central do
objetivo de aumentar o comprimento foi sugerida
por requerer pressão de alongamento leve (bem
tórax, alojando órgãos principais, bem como estru-
abaixo de 20%) – sustentada por minutos, não se- turas neurais e vasculares.
gundos. Existem métodos de terapia manual que têm in-
fluências terapêuticas potenciais para o mediastino
(Barral & Mercier, 2004).

2. Fáscia profunda (axial ou de revestimento)


A fáscia axial estende-se profundamente no corpo, Ponto-chave
circundando os músculos principais, tendões, liga- As formas e localizações das várias características
mentos e aponeuroses (folhas do tipo tendão amplas fasciais são relevantes para a clínica devido aos po-
e planas que unem os músculos e as partes do corpo tenciais oferecidos ao terapeuta manual pela con-
sobre as quais os músculos agem) do tronco, esten- tinuidade que existe entre a maioria das estruturas
dendo-se para os membros e fornecendo proteção e que ficam entre a base do crânio e o assoalho pél-
lubrificação. A transferência de força durante a con- vico.
tração muscular é uma característica importante da
fáscia profunda.

3. Fáscia meníngea (circunda o sistema nervoso) Diferenças das extremidades e


Ela está encaixada dentro da fáscia axial, circundan-
do e protegendo as estruturas do sistema nervoso.
do tronco na fáscia profunda
As fáscias mais profundas das extremidades dife-
4. Fáscia visceral e mediastinal rem significativamente daquelas do tronco. A fáscia
Willard (2012b) resumiu a fáscia visceral desse profunda associada com músculos nos membros
modo: “A fáscia visceral pode ser traçada desde a base do desliza livremente, ao passo que, no tronco, os mús-
crânio até a cavidade pélvica. Ela forma o invólucro que culos são mais aderentes à fáscia mais profunda.
circunda as cavidades corporais onde ela é comprimida As fáscias profundas dos membros não apenas
contra a parede corporal somática. Ela também forma o in- envolvem os músculos. Evidências mostram que
vólucro ao redor dos órgãos viscerais, muitos dos quais ela elas compreendem duas ou três camadas densas
alcança passando ao longo dos ligamentos suspensores tais ou lâminas com arranjos ondulados de feixes de

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Capítulo 1 • A relevância clínica das funções da fáscia: traduzindo a ciência 19

colágeno paralelos que podem incluir algumas fi-


bras elásticas. Camadas fasciais densas profundas Ponto-chave
são, em geral, separadas por camadas finas de tecido A relevância clínica das diferentes orientações dos
conectivo frouxo que protegem e permitem que as planos fasciais deve ser levada em conta – por exem-
camadas mais profundas deslizem umas sobre as plo – para atingir aplicações ideais de direções de
outras, fornecendo, assim, adaptabilidade mecânica carga durante métodos de tratamento manual que
sem atrito. visam a barreiras de restrição percebidas.
Existem – onde tecidos duros e moles se encon-
tram, onde a fáscia conecta-se ao osso – áreas locais
de fibras de estresse tensionais concentradas, nas
quais o colágeno liga-se a, e ancora, camadas de teci- Fáscia muscular (Fig. 1.4)
do conectivo profundo umas às outras, ou as conso-

Cada músculo é envolvido por uma camada de
lida dentro de um retináculo (estabilizando bandas
tecido conectivo – o epimísio –, que se liga ao
ao redor de tendões) ou fibrocartilagem (particular-
osso por meio dos tendões.
mente cartilagem em cordão, como o menisco do

O próprio músculo é separado em unidades me-
joelho). As camadas finas, do tipo lâminas, de fáscia
nores de feixes musculares, ou fascículos, por
densa e profunda, são orientadas, umas em relação
meio de uma rede fascial – o perimísio.
às outras, em aproximadamente 78º. Essa orientação

Os fascículos são separados ainda em fibras
aparentemente permite uma fricção reduzida, uma
musculares pelo endomísio.
vez que as lâminas fasciais deslizam sobre as cama-

Septos intramusculares são, então, lâminas fas-
das subjacentes, melhorando a capacidade da fáscia
ciais que separam compartimentos das extremi-
de diminuir o esforço.
dades e músculos – por exemplo, septos crurais
Se uma carga miofascial for exercida sobre o
anteriores e posteriores; septos femorais laterais
músculo, a força é automaticamente transmitida
e mediais; e os septos umerais laterais e mediais.
para o tecido conectivo intramuscular por meio da
camada de fáscia que envolve o músculo (epimísio). Essas estruturas facilitam a divisão de carga e a trans-
Para essa força ser transmitida adequadamente, as ferência de carga, de modo que uma rede contínua
conexões precisam ser firmes, não frouxas. Huijing tridimensional, mecânica e funcional pode operar.
e Langevin (2009) argumentam que, visto que algu-
mas estruturas fasciais não densas são capazes de Transmissão de força,
transmitir alguma força muscular, “o termo ‘tecido
conectivo frouxo’ para tais estruturas é inadequado, e o transferência de carga e fáscia
termo ‘areolar’ é preferido” (ver Fig. 1.3). Schleip (2003a, 2003b) descreveu a fáscia como: “...o
tecido conectivo irregular denso que circunda e conecta
cada músculo, mesmo a miofibrila mais fina, e cada órgão
do corpo formando continuidade por todo o corpo”.
Como esse resumo preciso de presença onipre-
sente da fáscia muda a maneira como entendemos o
movimento e a locomoção? Um elemento principal
envolve reaprender a maneira como a força é trans-
mitida. Aprendemos a pensar nos músculos espe-
cíficos se contraindo com força e depois ela sendo
transferida de forma linear por meio de, por exem-
FIGURA 1.3 Imagem esquemática das fáscias profundas dos mem- plo, aponeuroses e tendões, produzindo, dessa for-
bros, mostrando a composição e a direção das fibras em três dife- ma, o movimento articular.
rentes camadas. Adaptada da Figura 1.5.2 de Stecco C, Stecco A 2012 As ilustrações da atividade muscular nos atlas
Deep fascia of the lower limbs. In: Schleip R e colaboradores. (eds): Fascia:
the tensional network of the human body. Churchill Livingstone Elsevier, anatômicos padronizados, em geral, envolvem re-
Edinburgh, Ch. 1, p. 34. moção de elementos fasciais para revelar o que é

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20 Seção I • Bases fasciais

Periósteo Septos Aréola/adiposa Pele Endomísio (circunda miofibras individuais)


intermusculares
Epimísio (enrola-se ao redor de todo o músculo)

a Epimísio Epiderme e derme Fáscia profunda Miofibrilas (contêm filamentos de


actina, miosina, bem como componentes
elásticos paralelos e em série)
Perimísio (enrola-se ao redor dos fascículos e feixes de fascículos)
b

FIGURA 1.4 (a) Camadas de fáscia muscular. (b) Camadas de fáscia muscular esquelética.

apresentado comumente e de forma imprecisa como so e do serrátil posterior inferior, enquanto na


o aspecto mecânico primário do movimento – mús- camada profunda está a bainha retinacular que
culos específicos –, ignorando, portanto, as continui- encapsula os músculos paraespinais que susten-
dades conectivas fasciais vitais pelas quais a força é tam a espinha lombossacra.
transmitida em múltiplas direções de forma simul- 
Onde essa bainha encontra a aponeurose do
tânea: às vezes lateralmente, às vezes obliquamente transverso do abdome, ela forma uma rafe (uma
e às vezes linearmente. Por exemplo, as estruturas borda tipo sutura) – um septo denso. Essa é a
normalmente descritas como os músculos do qua- junção dos compartimentos fasciais hipaxial
dril, da pelve e da perna interagem com os músculos (anterior à coluna) e epiaxial (posterior à coluna)
do braço e da coluna por meio da fáscia toracolom- – onde ela forma o triângulo interfascial lombar
bar, que permite transferência de carga efetiva entre (TIFL).
a coluna, a pelve, as pernas e os braços em um siste- 
Essa estrutura notável (uma “rotunda” na termi-
ma integrado (ver Fig. 1.5). nologia de Myers – ver Cap. 3) ajuda a distribuir
a carga dos músculos abdominais e das extremi-
O triângulo interfascial lombar (TIFL) dades para, e da, FTL.
(Willard e colaboradores, 2012) 
Todas as camadas de FTL se fundem para se
unir com a espinha ilíaca posterossuperior e o
Como observado anteriormente, a FTL integra for-
ligamento sacrotuberoso, ajudando no suporte
ças que se originam de tecidos conectivos passivos,
da espinha lombar inferior e da articulação sa-
bem como inúmeras estruturas musculares ativas,
croilíaca.
incluindo camadas aponeuróticas e fasciais que se-

A carga que alcança a FTL desde os músculos
param os músculos paraespinais dos músculos da
abdominais, latíssimo do dorso, da extremidade
parede abdominal posterior.
inferior e músculos pélvicos é, portanto, apro-

A camada posterior superficial da FTL é princi- priadamente distribuída a fim de auxiliar a esta-
palmente uma aponeurose do latíssimo do dor- bilizar a coluna, o tronco e a pelve.

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Capítulo 1 • A relevância clínica das funções da fáscia: traduzindo a ciência 21

Latíssimo do dorso (insere-se na fáscia


toracolombar superficial)

Inserção do serrátil
posteroinferior

Fáscia toracolombar

Inserção do
oblíquo interno

Inserção do Rafe lateral


eretor da
espinha

EIPS

Inserção do
glúteo médio

Sacro
FIGURA 1.5 Camada profunda
da fáscia toracolombar, inserções
ao glúteo médio e inserções entre
Inserção do ligamento sacrotuberoso
a camada profunda e o músculo
eretor da espinha.

Escalenos e o tórax
Como as lâminas e membranas fasciais que as en-
volvem e as conectam, os músculos escalenos são
contínuos com estruturas torácicas – variando des-
de os músculos peitorais até o pericárdio. Portanto,
é insensato conceber a disfunção dos escalenos sem
levar em consideração a que eles estão conectados –
via fáscia – de maneira anatômica e funcional.
Stecco e Stecco (2012) observaram que: “as fáscias
intermusculares e do epimísio servem como áreas de inser-
ção para fibras musculares que [...] podem mecanicamente
alcançar um elemento esquelético sem necessariamente
ser diretamente inserido ao osso”. Isso é aparentemente
verdadeiro para conexões às fáscias superficiais (tais
como a fáscia crural e a fáscia antebraquial), que for- FIGURA 1.6 Fáscia do epimísio dos músculos peitoral maior e ser-
rátil anterior – observe a continuidade da fáscia superficial entre es-
necem áreas de inserção amplas para fibras muscu- tes e a fáscia cervical. Ver também a Lâmina 2.
lares (ver Fig. 1.6 e Lâmina 2). Foto: cortesia de Carla Stecco.

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22 Seção I • Bases fasciais

Continuidade fascial da cervical, do podem de fato ser de origem fascial e que a fonte
dessa disfunção pode estar distante de onde ela é
tronco e do ombro percebida.
Stecco e Stecco (2012) relataram sobre os resultados
de suas inúmeras dissecções. Por exemplo: “As fás- A conexão latíssimo do dorso e
cias profundas do ombro apresentam características que
quadril-glúteo máximo
são similares às fáscias do tronco e das extremidades. Em
particular, as fáscias dos músculos peitoral maior, del- Com voluntários, Carvalhais e colaboradores (2013)
toide, trapézio e latíssimo do dorso formam uma camada foram capazes de mostrar que a tensão ativa do la-
única, envolvendo todos esses músculos e passando tíssimo do dorso – por exemplo, quando o ombro
sobre o serrátil anterior, onde elas formam uma forte era ativamente aduzido e a escápula deprimida,
lâmina fascial”. usando força equivalente a 25% de uma contração
Eles continuam: “Todas essas fáscias aderem-se voluntária máxima – produzia rotação lateral do
firmemente aos seus respectivos músculos devido a uma quadril contralateral, junto com rigidez de glúteo
série de septos intramusculares que se estendem desde a máximo (GM) passiva (também contralateral) au-
superfície interna dessas fáscias, dividindo o próprio mús- mentada.
culo em muitos feixes”. É inimaginável que a carga so-
bre qualquer um desses músculos não afetasse dire- Dor no glúteo máximo e no joelho
tamente todos os outros mencionados (ver Fig. 1.5).
Stecco e colaboradores (2013) também identifica-
Esse padrão de músculos “separados” sendo unidos
ram um elo de transmissão de força desde a fáscia
por estruturas fasciais é repetido nos membros, nas
toracolombar, via GM, até o trato IT e para a fren-
costas, na região cervical, etc.
te até o joelho, sugerindo que: “a hipertonicidade do
glúteo máximo poderia explicar a tensão aumentada na
Como a carga dos isquiotibiais é região lombar, causando dor lombar e na região lateral
distribuída do joelho.
Franklyn-Miller e colaboradores (2009) demonstra- Em todos os (12) pacientes, o glúteo máximo apresen-
ram – usando microcalibradores de esforço – que o tou uma inserção principal na fáscia lata tão grande, que
grau de força usado em um alongamento dos isquio- o trato iliotibial poderia ser considerado um tendão de in-
tibiais resulta em uma variedade de transferências serção do glúteo máximo ... [explicando] ... a transmissão
de carga inesperadas: das forças desde a fáscia toracolombar até o joelho [e] pos-
sivelmente explicando por que a hipertonicidade do GM

240% do esforço imposto é transferido para o poderia causar uma síndrome de fricção do trato IT (SFTI)
trato iliotibial (IT). ou, de modo geral, dor no joelho.

145% da carga dos isquiotibiais é transferida A resolução de SFTI só pode ser atingida quando a
para a fáscia lombar ipsilateral via ligamento sa- biomecânica do quadril é abordada de forma apropriada”.
crotuberoso.

103%, para o compartimento crural lateral.

45%, para a fáscia lombar contralateral.
Conexões da linha superficial

26%, para a fáscia plantar. posterior validadas por
A transmissão de tensão via continuidades fasciais
eletromiografia
durante o alongamento pode, portanto, afetar mui- As associações musculares conectadas à cadeia ci-
tos tecidos, exceto o músculo ao qual a carga está nemática miofascial, conhecida como a linha su-
sendo aplicada. perficial posterior (Myers, 2009; ver detalhes mais
Os pesquisadores relatam que “a tensão é adiante neste capítulo e em mais detalhes no Cap. 3,
distribuída por meio de um padrão consistente – particularmente na Fig. 3.2b), foram testadas usando
[que] – correlaciona-se intimamente com a orien- eletromiografia (Weisman e colaboradores, 2014).
tação das fibras de colágeno”. Isso sugere a pos- Os achados desse estudo, que tinha o objetivo
sibilidade de que restrições musculares aparentes de “mapear a associação de ativações musculares ao longo

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Capítulo 1 • A relevância clínica das funções da fáscia: traduzindo a ciência 23

da linha superficial posterior (LSP) usando condições se-


paradas de amplitude ativa de movimento com e sem re- Ponto-chave
sistência e amplitude passiva de movimento”, foram de A relevância clínica que está se tornando aparente a
relevância clínica: partir desses estudos relaciona-se à necessidade de

Durante a contração isométrica máxima do gas- que os terapeutas se tornem cientes – à medida que
trocnêmio direito, houve fortes sinais de ativa- evidências surgem – dos trajetos de transmissão de
ção registrados nos eletrodos colocados sobre: os força em diferentes áreas do corpo.
O exemplo descrito anteriormente das conexões
isquiotibiais direitos, a espinha ilíaca posteros-
do joelho– isquiotibiais–GM–quadril–FTL–latíssimo
superior (EIPS), o 12o segmento torácico esquer-
do dorso, etc. sugere que influências em uma dis-
do e direito (T12) e o trapézio superior direito.
tância precisam ser consideradas quando se busca

Durante a extensão cervical isométrica máxima
as características etiológicas e de manutenção da
(em prono), houve fortes sinais de ativação regis- dor e da restrição.
trados nos eletrodos colocados sobre o trapézio
superior, T6, T12, EIPS, com ativação moderada,
mas significativa, nos isquiotibiais.
Cadeias musculares
Implicações e considerações clínicas
Esta seção não tem o objetivo de fornecer uma lista
Nós podemos ver, por exemplo, que a dor no joelho
abrangente das muitas tentativas feitas para catalo-
pode surgir de disfunção do GM, e que o GM (e o
gar as conexões que formam a distribuição de carga
quadril) pode ser fortemente influenciado por ativi-
miofascial.
dade do latíssimo do dorso contralateral por meio da
fáscia toracolombar. 
Richter (2012) descreve vários modelos diferentes
Dados dos estudos de Stecco – descritos ante- em que elos cordas miofasciais, etc. formam a base
riormente – mostraram a conexão direta entre os para compreender a função biomecânica. Ele ex-
músculos latíssimo do dorso, trapézio superior, es- plica: “Mesmo que esses modelos sejam às vezes muito
calenos e peitorais. Será que a dor no joelho pode- diferentes, todos eles têm algo em comum: eles mostram
ria refletir restrições fasciais, ou outras, envolvendo o sistema locomotor e os tecidos miofasciais como uma
quaisquer desses músculos... ou será que a disfun- unidade que sempre funciona como um todo”.
ção em qualquer um deles poderia se relacionar com 
Provavelmente o modelo mais empregado é dos
as influências a partir do joelho? “Trilhos anatômicos de Myers” (2009), em que
Nós também podemos ver elos entre função do linhas, trilhas e junções, etc. são usados metafo-
gastrocnêmio e, por exemplo, o músculo trapézio ricamente para descrever as múltiplas conexões
superior ipsilateral; e os músculos cervicais e os is- que formam os “complexos de tensão geodésicos,
quiotibiais. globais” do sistema locomotor, “que simultanea-
Esses exemplos salientam a necessidade de re- mente estabilizam e permitem ajustes dentro da es-
visar previamente ideias defendidas sobre como o trutura esquelética”. Uma separação funcional de
corpo trabalha biomecanicamente. Essa revisão de estruturas dentro dessa rede pode ser descrita
conceitos previamente defendidos é um processo como envolvendo os mais de 600 músculos do
necessário a fim de apreciar avanços no entendi- corpo, e os múltiplos, mais profundamente situ-
mento da função fascial – assim como é necessário ados, sistemas de transmissão de força, incluin-
aprender a topografia, a geografia, as conexões e a do ligamentos, tendões, cápsulas, etc. Myers ad-
arquitetura dos tecidos moles, incluindo a fáscia – não mite que o modelo dos “Trilhos anatômicos” é o
a excluindo, como acontece em muitos textos de ana- que irá se desenvolver, mas que fornece um “ar-
tomia. Nós precisamos saber onde e como a fáscia gumento de design” que combina tensegridade e
influencia a função. pesquisa de transferência de carga e, portanto,
Dito de forma simples, a fáscia integra e organi- tem relevância clínica – como ele descreve no
za a postura e o movimento. contexto de avaliação no Capítulo 3.

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24 Seção I • Bases fasciais

Os trilhos que Myers (2009) descreveu são listados 12. Linha anterior profunda: tibial posterior, flexo-
abaixo (e em mais detalhes no Cap. 3). Quando se res longos dos artelhos, compartimento posterior
reflete sobre essas conexões catalogadas por Myers, profundo, poplíteo, cápsula posterior do joelho,
deve-se manter em mente a observação de van der grupo adutor, pélvico, ligamento longitudinal an-
Wal (2009) de que nenhum músculo se insere ao terior, psoas, ilíaco, quadrado do lombo, diafrag-
osso em qualquer lugar no corpo e que as conexões ma, mediastino, músculos longos, complexo hio-
ósseas são sempre feitas via estruturas de tecido co- ideo, assoalho da boca, músculos da mandíbula.
nectivo intervenientes:
Essas “linhas de trilhos anatômicos” são discutidas
1. Linha anterior superficial: extensores dos arte- com mais detalhes no Capítulo 3.
lhos, compartimento crural anterior, quadríceps, Como mencionado, existem muitos modelos di-
reto abdominal e fáscias abdominais, esternal e ferentes que interpretam as cadeias e conexões que a
fáscia esternal, esternocleidomastóideo. fáscia fornece. Como um exemplo, ver as discussões
2. Linha posterior superficial: flexores curtos dos no Capítulo 9 sobre Manipulação Fascial®, em que
artelhos e aponeurose plantar, tríceps sural, is- áreas locais de coordenação – e percepção – são iden-
quiotibiais, ligamento sacrotuberoso, fáscia sa- tificadas em relação às sequências miofasciais.
crolombar, eretor da espinha, fáscia epicraniana.
3. Linha lateral: músculos fibulares, comparti-
mento crural lateral, trato IT, abdutores do qua- Ponto-chave
dril, oblíquos abdominais laterais, intercostais
Não é possível exagerar a relevância clínica de uma
internos e externos, esternocleidomastóideo e percepção de cadeias e elos musculares (seja do mo-
esplênios. delo Trilhos Anatômicos ou de um dos muitos outros
4. Linha espiral: esplênios, romboides (contralate- que foram descritos). Entender a distribuição de car-
rais), serrátil anterior, oblíquo externo, oblíquo ga e a função recíproca das continuidades miofas-
interno (contralateral), tensor da fáscia lata, tra- ciais amplia as escolhas clínicas em relação à terapia
to IT anterior, tibial anterior, fibular longo, bí- manual e exercícios e abordagens de tratamento e
ceps femoral, ligamento sacrotuberoso, eretor da reabilitação.
espinha.
5. Linha do braço posterior superficial: trapézio,
deltoide, septo intermuscular lateral, grupo
extensor.
Como os problemas fasciais
6. Linha do braço posterior profunda: romboi-
des, levantador da escápula, manguito rotador, iniciam
tríceps, fáscia ao longo da ulna, ligamentos cola-
As múltiplas formas pelas quais a disfunção fascial
terais ulnares, músculos hipotenares.
pode se manifestar são exploradas no Capítulo 2.
7. Linha do braço anterior superficial: peitoral
Como na maioria da disfunção musculoesquelética,
maior, latíssimo do dorso, septo intermuscular
as “causas” tendem a ser facilmente resumidas como
medial, grupo flexor, túnel do carpo.
uso excessivo, uso errado, desuso e abuso.
8. Linha do braço anterior profunda: peitoral me-
A disfunção fascial pode resultar de traumatismo
nor, fáscia clavipeitoral, bíceps, fáscia radial, liga-
de desenvolvimento lento (desuso, uso excessivo e
mentos colaterais radiais, músculos tenares.
uso indevido) ou de lesão repentina (abuso) que leva
9. Linha funcional anterior: peitoral maior (borda
à inflamação e remodelagem inadequada (tal como
inferior), linha semilunar, piramidal, adutores
formação de cicatriz excessiva ou desenvolvimento
anteriores (longo, curto e pectíneo).
de fibrose):
10. Linha funcional posterior: latíssimo do dor-
so, fáscia lombossacral, GM, vasto lateral (ver 
A “densificação” pode ocorrer envolvendo distor-
Fig. 1.5). ção de relações miofasciais, reduzindo as facilida-
11. Linha funcional ipsilateral: latíssimo do dor- des de deslizamento e alterando a propriocepção
so (borda externa), oblíquo abdominal externo, e o equilíbrio musculares (Stecco & Stecco, 2009).
sartório. Como um resultado dessas mudanças, a carga

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Capítulo 1 • A relevância clínica das funções da fáscia: traduzindo a ciência 25

crônica de tecido forma “padrões de restrição de te- As opções terapêuticas relativas a tais mudanças são
cido mole globais” (Myers, 2009). exploradas no Capítulo 5 e no decorrer da Seção 2,

“Quando a fáscia é estressada mecanicamente em ex- na qual há capítulos separados sobre 15 modalidades
cesso, inflamada ou imóvel, a deposição de colágeno e diferentes que visam a disfunção fascial.
de matriz torna-se desorganizada, resultando em fibro-
se e aderências” (Langevin, 2008). Referências

A densificação e a perda de função de desliza-
Barral J-P, Mercier P 2004 Lehrbuch der Visceralen Osteopathie; Band 1, 2.
mento fascial foram claramente demonstradas
Auflage. Urban and Fischer, Munich
por Langevin e colaboradores (2011b). Os indiví- Benjamin M 2009 The fascia of the limbs and back – a review. J Anat 214:1–18
duos com dor lombar crônica mostraram uma es- Binkley JM, Peat M 1986 The effects of immobilization on the ultrastructure
pessura 25% maior da FTL do que os indivíduos and mechanical properties of the medial collateral ligament of rats.
Clin Orthop Relat Res 203:301–308
sem dor lombar. O deslizamento potencial entre
Bouffard N et al 2009 Tissue stretch decreases procollagen-1 and TGF-β1 in
camadas fasciais também mostrou ser significati- mouse subcutaneous fascia. Abstract. 2nd Fascia Research Congress.
vamente reduzido nesses indivíduos. Free University of Amsterdam, Amsterdam

Stecco e colaboradores (2013) sugerem que uma Cantu R, Grodin A 2001 Myofascial manipulation, 2nd edn. Aspen
Publishing, Gaithersburg, MD
combinação de irritação, inflamação, acidificação
Carano A, Siciliani G 1996 Effects of continuous and intermittent forces on
e densificação de tecido conectivo frouxo pode human fibroblasts in vitro. Eur J Orthod 18(1):19–26
levar à dor miofascial como um resultado de “ter- Carvalhais V et al 2013 Myofascial force transmission between the latissimus
minações nervosas livres tornando-se hiperativadas”, dorsi and gluteus maximus muscles: an in vivo experiment. J Biomech
46:1003–1007
ocasionando inflamação local, dor e sensibiliza- Chen C, Ingber D 2007 Tensegrity and mechanoregulation: from skeleton
ção. Essas mudanças podem ser revertidas por to cytoskeleton. In: Findley T, Schleip R (eds) Fascia research. Elsevier,
intervenções de terapia manual que reduzem a ri- Oxford, pp 20–32
gidez, a densidade e a viscosidade – e melhoram Comeaux Z 2002 Robert Fulford DO and the philosopher physician. Eastland
Press, Seattle
o pH; todas possíveis via terapias manuais. Doubal S, Klemera P 2002 Visco-elastic response of human skin and aging. J
Amer Aging Assoc 3:115–117
A fáscia também é muito afetada pelo processo de en-
Drake RL, Vogl AW, Mitchell, AWM 2010 Gray’s anatomy for students, 2nd
velhecimento (e inatividade que está possivelmente edn. Churchill Livingstone Elsevier, Philadelphia
relacionada a doença ou dor concomitante): Fourie W 2009 The fascia lata of the thigh – more than a stocking. In: Huijing
PA et al (eds) Fascial research II: basic science and implications for

À medida que envelhecemos, a pele muda, o que conventional and complementary health care. Elsevier GmbH, Munich
é caracterizado pela evolução de rugas, que refle- Franklyn-Miller A et al 2009 The strain patterns of the deep fascia of the
te a redução nas células de colágeno e fibroblastos lower limb. In: Huijing PA et al (eds) Fascial research II: basic science
and implications for conventional and complementary health care.
superficiais. Elsevier GmbH, Munich

As fibras de colágeno tornam-se gradualmente Fryer G, Fossum C 2009 Therapeutic mechanisms underlying muscle energy
menos organizadas, mais entrelaçadas e os teci- approaches. In: Physical therapy for tension type and cervicogenic
headache. Fernandez-de-las-Peñas C et al (eds) Jones & Bartlett,
dos perdem sua forma definida (i.e., eles cedem) e Boston
o potencial e retração elástica. Greenman P 1996 Principles of manual medicine. Williams and Wilkins,

Uma parte desse processo inevitável – porém va- Baltimore
Guimberteau JC, Bakhach J 2006 Subcutaneous tissue function: the
riável – envolve perda de elastina, de modo que, a
multimicrovacuolar absorbing sliding system in hand and plastic
partir da terceira década de vida, esse processo é surgery. In: Siemionow MZ (ed) Tissue surgery. New techniques in
mensurável (Kirk & Chieffi, 1962). surgery. Springer, London, Ch 4, pp 41–54
Guimberteau JC 2012 The subcutaneous and epitendinous tissue behavior

Ao mesmo tempo, há uma atrofia de células adi- of the multimicrovacuolar sliding system. In: Schleip R, Findley T,
posas, de modo que “características quantitativas e Chaitow L, Huijing P (eds) Fascia: the tensional network of the human
qualitativas do sistema conectivo fibroadiposo são al- body. Churchill Livingstone Elsevier, Edinburgh, pp143–146
teradas e suas propriedades viscoelásticas tornam-se Hicks MR et al 2012 Mechanical strain applied to human fibroblasts
differentially regulates skeletal myoblast differentiation. J Appl Physiol
reduzidas”. Além disso, a pele e a fáscia superficial 113(3):465–472
subjacente alongam e relaxam, levando à ptose Hocking D et al 2009 Extracellular matrix fibronectin mechanically couples
dos tecidos moles, bem como a uma forma alte- skeletal muscle contraction with local vasodilation. In: Huijing PA et al
(eds) Fascia research II: basic science and implications for conventional
rada envolvendo deposição de gordura e celulite and complementary health care. Elsevier Urban and Fischer, Munich,
(Macchi e colaboradores, 2010). pp 129–137

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26 Seção I • Bases fasciais

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