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SUSSEKIND, Flora. Rodapés, tratados e ensaios: a formação da crítica brasileira moderna.

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SUSSEKIND, Flora. Papéis colados. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1993. pp. 14-33.

A autora afirma buscar determinar em que período se crê ter início a “crítica moderna”
no Brasil. Em meados da década de 1940 se verifica uma tensão cada vez mais evidente entre
o modelo de crítico referenciado na imagem do “homem de letras”, bacharel, cuja reflexão
tinha como veículo o jornal e outro modelo vinculado à ‘especialização acadêmica’, o do crítico
universitário, cujas formas de expressão dominantes seriam o livro e a cátedra.

A autora afirma que não é apenas uma tensão metodológica que marca os anos 1960 e
1970, mas a hesitação da crítica universitária entre o texto próximo ao tratado e o ensaísmo.
Sem acesso aos jornais, a uma veiculação maior, e com um público reduzido, a crítica
universitária muitas vezes encaminhou-se para uma linguagem de tratado, exclusivamente
acadêmica. Em fins de 1970, a escrita ensaística parece ter recuperado o seu vigor. Assim
também se abriu a possibilidade de discutir a imagem que uma crítica universitária muitas
vezes auto-centrada criou de si mesma.

A passagem do crítico-cronista ao crítico-scholar inclui um elemento institucional: a


universidade. Segundo Carlos Guilherme Mota , em Ideologia da Cultura Brasileira, “foi no final
dos anos 40 que os resultados do labor universitário se fizeram sentir”. (p. 16)

A luta pelo ensino laico e pela criação de universidades fora feita pelas classes médias
nos anos 20 e 30. Assim, nessas décadas os institutos isolados passaram a se organizar em
universidades, centradas nas recém-criadas faculdades de Filosofia, Ciências e Letras,
quebrando, de certa forma, a antiga hierarquia ligada ao prestígio das “profissões liberais”. A
geração de críticos chamados scholars passa a olhar com desconfiança para o tradicional
modelo do “homem de letras” e para o tratamento anedótico-biográfico em geral concedido à
literatura na imprensa. (p. 17)

Especialização implicaria restrições tanto nos assuntos abordados pelos críticos, qando
nos critérios mesmos de reconhecimento de sua qualificação. Parecia indicar eminente perda
de poder, no que diz respeito ao crítico, e necessária delimitação do campo. (p. 19)

Atingir Álvaro Lins, um dos críticos mais poderosos da época era acertar em cheio nos
próprios mecanismos de qualificação intelectual vigentes. (p. 19-20) Assim, se abriria espaço
para outro tipo de critério de qualificação profissional. Tratava-se de substituir o jornal pela
universidade como ‘templo da cultura literária’ e o crítico enciclopédico e impressionista pelo
professor universitário com seu jargão próprio e uma crença inabalável no papel
‘modernizador’ que poderia exercer no campo dos estudos literários. “Tratava-se, em suma,
de substituir o rodapé pela cátedra. E conquistar o poder das mãos dos não-especialistas.

A questão seria como trabalhar com um paradoxo: “o externo se torna interno e deixa
de ser sociológica, para ser apenas crítica”. (p. 24)

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