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Exame Físico Geral

ou de Rotina
FRANCISCO LEYDSON F. FEITOSA

"NÃO SE ESPECIALIZE. PEREGRINE PELA GENERALIDADE.


SABENDO MAIS, o ESPECIALISTA SABE MELHOR."
(Silvano Raia)

INTRODUÇÃO
A realização de um exame físico geral ou de rotina é necessária por
inúmeras razões, dentre as quais pode-se destacar:

1. Por serem incapazes de se comunicar verbalmente com os homens,


os animais não dizem qual estrutura ou órgão do corpo está com
prometido, ficando, a história do caso em questão, na dependên
cia do conhecimento do entrevistado e da habilidade c experiên
cia do examinador em obtê-la, o que torna o exame físico geral,
nessa fase, de fundamental importância nos casos em que a his
tória é vaga e inespecífica.
2. Muitas vezes, a queixa principal não apresenta relação direta com
o sistema primariamente comprometido.
3. O exame físico geral permite avaliar, rotineiramente, o estado atual
de saúde do paciente (melhorou/piorou/estagnou).
4. Por permitir reconhecer o comprometimento de outros sistemas ou
estruturas do corpo (ncoplasia mamaria = metástasc pulmonar).
5. Em decorrência da dinâmica que os sintomas apresentam em di
ferentes enfermidades e, às vezes, em uma mesma doença em
um determinado período. As características e a intensidade dos
sinais clínicos apresentam uma variação muito ampla, até mesmo
78 Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico

em uma mesma enfermidade, de modo que NÍVEL DE CONSCIÊNCIA


a multiplicidade dos sintomas clínicos difi-
culta a obtenção do diagnóstico. O comportamento ou o nível de consciência do
animal deve ser avaliado pela inspeção, conside-
O exame físico geral constitui, dessa forma, rando, ainda, a sua reação a estímulos, como pal-
um passo decisivo para a realização do exame físico mas ou estalos de dedos. Deve-se considerar a
específico, já que, sendo generalista, dá ao clíni- excitabilidade do animal como "diminuída" (apá-
co, em um só momento e de uma só vez, uma tico), "ausente" (coma), "normal" e "aumentada"
visão de conjunto (da grande maioria dos siste- (excitado). Há, porém, animais sadios que reagem
mas orgânicos e do corpo como um todo). É bem prontamente aos estímulos, enquanto outros o fazem
verdade que, algumas vezes, as circunstâncias lentamente. Por isso, em algumas ocasiões, este
obrigam o clínico a modificar o cronograma de se torna um parâmetro subjetivo. Cabe, por fim,
exame, fazendo com que o mesmo só venha a ser lembrar que o temperamento típico de cada espécie
realizado em sua totalidade depois de afastadas deve ser considerado. Por exemplo, vacas de leite
algumas condições que possam colocar em risco são animais dóceis e fáceis de manusear. Por outro
a vida do animal. Como exemplo, tem-se os ca- lado, bovinos de origem indiana, por serem mantidos
sos de timpanismo espumoso em ruminantes, exclusivamente no pasto, costumam ser mais
cólicas obstrutivas cm equinos, atropelamentos inquietos, mais ágeis e hostis.
com hemorragias intensas em pequenos animais
ou intoxicações, quando são necessárias medidas
eficazes e imediatas para alterar o quadro crítico POSTURA
em que se encontra o paciente. Outras vezes, torna-
se necessário um exame físico mais rápido ou mais E o posicionamento que o animal adota quando
superficial (animais rebeldes ou agressivos, ani- em posição quadrupedal, quando em decúbito e
mais selvagens, condições ambientais impróprias, durante a locomoção. É necessário avaliar se o
ou exame de um grande número de animais). animal assume algum padrão de postura pouco
A adoção de uma mesma sequência de exa- usual, indicativo, muitas vezes, de anormalidades.
me, se repetida várias vezes, torna-se um hábito, Para isso, é necessário o conhecimento do com-
sendo o melhor modo de reduzir a possibilidade portamento da espécie envolvida. Por exemplo,
de erros diagnósticos, junto à realização de um o cavalo passa a maior parte do dia em posição
exame físico geral. quadrupedal e, quando deita, geralmente posi-
A observação do animal pode fornecer inú- ciona-se em decúbito lateral. O bovino permane-
meras informações úteis para o diagnóstico, tais ce muito mais tempo em decúbito que o cavalo,
como: só que em posicionamento esternal ou lateral
Nível de consciência. Alerta (normal), diminuído incompleto. Em geral, permanece em decúbito
(deprimido, apático), aumentado (excitado). esternal, mantendo a cabeça levantada e a expres-
Postura e locomoção. Normal ou anormal (su- são alerta, durante a ruminação. O cão adota o
gerindo dor localizada, fratura, luxação ou doen- decúbito para descansar ou dormir e o faz em
ças neurológicas); observe o animal em repouso e, diferentes posições, inclusive em decúbito dor -
em seguida, em movimento. sal. Não é infreqúente o cão flexionar os mem-
Condição física ou corporal. Obeso, gordo, bros anteriores e posteriores, apoiando o esterno
normal, magro, caquético. sobre o piso; essa é uma das formas de perder calor.
Pelame. Pêlos limpos, brilhantes ou eriçados, A maioria dos animais pecuários saudáveis,
presença de ectoparasitas (carrapatos, piolhos, quando abordados em decúbito, erguem-se. Ao"sej
pulgas, etc.). conduzido para o local de exame, o animal mani-
Forma abdominal. Normal, anormal (timpa- festa resposta a estímulos externos, por uma sim-
nismo, ascite, etc.). ples alteração nos seus movimentos e/ou por emissão
Características respiratórias. Eupnéia ou disp- de ruídos. As atitudes anormais do corpo ocorrem,
neia (postura ortopnéica), tipo respiratório, secreção quase sempre, como indicação de enfermidade. Os
nasal, etc. animais, quando doentes, ficam com a cabeça baixa,
Outros. Apetite, sede, defecação, vómito, se afastam do rebanho ou se levantam com difi-
secreções (vaginal, nasal, ocular) micção, etc. culdade (grandes animais) e adotam posições ca-
racterísticas como, por exemplo, a postura ortopnéica
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aptidão. Convém descrever a condição corporal ou


física do animal de forma objetiva e sem dúbia
interpretação, tal como "caquético, magro, normal,
gordo e obeso". Deve-se evitar termos como "bom"
e "ruim", uma vez que o estado de magreza e/ou
de obesidade são igualmente ruins, mas de aspec-
tos opostos. Em animais normais, todas as partes
proeminentes do esqueleto estão cobertas por
músculos ou gordura, dando ao corpo um aspecto
arredondado. Nos animais magros, várias partes do
esqueleto são prontamente identificáveis (coste-
las, pelve) (Fig. 4.2). Em animais de pêlos curtos,
esse exame pode ser realizado pela inspeção, en-
quanto, em animais peludos ou lanados (como
observado em algumas raças de ovinos, de cães e
gatos), deve-se fazê-lo pela palpação da região sacra,
avaliando-se o preenchimento da musculatura nessa
região. A caquexia é o grau extremo da perda de
peso. Os animais apresentam-se, ainda, com pêlo
Figura 4.1 - Cão com provável disjunção íleo-sacral.
sem brilho, pele seca e pobre performance. Deve-
mos lembrar que o animal pode estar magro por
que acompanha principalmente as enfermidades não receber alimentação adequada, ou por doen-
do sistema respiratório, caracterizada por disten- ça, mesmo recebendo boa alimentação. Uma per-
são do pescoço, protrusão da língua c abdução dos da de peso de 30 a 50% da massa corporal total é
membros anteriores; a curvatura da coluna verte- usualmente fatal.~ínversamente, a obesidade é vista
bral (cifose) em casos de processos dolorosos em com certa frequência, podendo ter, de forma
simplista, as seguintes causas:
cavidade abdominal, etc. Os pequenos animais,
geralmente, escondem-se, ficam indiferentes ou
• Endógena: distúrbio endócrino. Por exemplo,
apáticos, gemem e, às vezes, irritam-se facilmen-
hipotireoidismo.
te. Nenhum animal adotará uma postura anormal,
• Exógena: superalimentação ou alimentação
seja em posição quadrupedal, em decúbito ou em
mal-orientada. Quando a alimentação é rica
locomoção, sem que haja algum fator determinan-
em carboidratos e gordura a tendência do
te. As posturas anormais sugerem, na grande maio-
ria dos casos, algia localizada e/ou comprometimento
do sistema nervoso.
Algumas atitudes são conhecidas e descritas
amplamente na literatura com nomes que se as-
semelham à postura adotada pelo animal. Alguns
exemplos são:

a) Postura de cachorro sentado: observada, por


exemplo, nos casos de paralisia espástica dos
membros posteriores;
b) Postura de foca: comumente vista nas parali
sias flácidas dos membros posteriores;
c) Postura de cavalete: observa-se rigidez e
abdução dos quatro membros, sendo vista,
mais frequentemente, nos casos de tétano.

ESTADO NUTRICIONAL
Ao examinar o estado nutricional do animal deve-
se levar em conta sua espécie, raça e utilidade ou Figura 4.2 - Equino com emagrecimento acentuado (caquexia).
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aptidão. Convém descrever a condição corporal ou


física do animal de forma objetiva e sem dúbia
interpretação, tal como "caquético, magro, normal,
gordo e obeso". Deve-se evitar termos como "bom"
e "ruim", uma vez que o estado de magreza e/ou
de obesidade são igualmente ruins, mas de aspec-
tos opostos. Em animais normais, todas as partes
proeminentes do esqueleto estão cobertas por
músculos ou gordura, dando ao corpo um aspecto
arredondado. Nos animais magros, várias partes do
esqueleto são prontamente identificáveis (coste-
las, pelve) (Fig. 4.2). Em animais de pêlos curtos,
esse exame pode ser realizado pela inspcção, en-
quanto, em animais peludos ou lanados (como
observado em algumas raças de ovinos, de cães e
gatos), deve-se fazê-lo pela palpação da região sacra,
avaliando-se o preenchimento da musculatura nessa
região. A caquexia é o grau extremo da perda de
Figura 4.1 - Cão com provável disjunção íleo-sacral.
peso. Os animais apresentam-se, ainda, com pêlo
sem brilho, pele seca e pobre performance. Deve-
mos lembrar que o animal pode estar magro por
que acompanha principalmente as enfermidades não receber alimentação adequada, ou por doen-
do sistema respiratório, caracterizada por disten- ça, mesmo recebendo boa alimentação. Uma per-
são do pescoço, protrusão da língua e abdução dos da de peso de 30 a 50% da massa corporal total é
membros anteriores; a curvatura da coluna verte- usualmente fatáT Inversamente, a obesidade é vista
bral (cifose) em casos de processos dolorosos em com certa frequência, podendo ter, de forma
cavidade abdominal, etc. Os pequenos animais, simplista, as seguintes causas:
geralmente, escondem-se, ficam indiferentes ou
apáticos, gemem e, às vezes, irritam-se facilmen- • Endógena: distúrbio endócrino. Por exemplo,
te. Nenhum animal adotará uma postura anormal, hipotireoidismo.
seja em posição quadrupedal, em decúbito ou em • Exógena: superalimentação ou alimentação
locomoção, sem que haja algum fator determinan- mal-orientada. Quando a alimentação é rica
te. As posturas anormais sugerem, na grande maio- em carboidratos e gordura a tendência do
ria dos casos, algia localizada e/ou comprometimento
do sistema nervoso.
Algumas atitudes são conhecidas e descritas
amplamente na literatura com nomes que se as-
semelham à postura adotada pelo animal. Alguns
exemplos são:

a) Postura de cachorro sentado: observada, por


exemplo, nos casos de paralisia espástica dos
membros posteriores;
b) Postura de foca: comumcntc vista nas parali
sias flácidas dos membros posteriores;
c) Postura de cavalete: observa-se rigidez e
abdução dos quatro membros, sendo vista,
mais frequentemente, nos casos de tétano.

ESTADO NUTRICIONAL
Ao examinar o estado nutricional do animal deve-
se levar em conta sua espécie, raça e utilidade ou Figura 4.2 - Equino com emagrecimento acentuado (caquexia).
80 Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico

animal é engordar, principalmente animais em virtude da sua grande importância para se


idosos ou sedentários. determinar o estado de hidratação do paciente.
• Mista: manejo alimentar erróneo associado a O grau de desidratação dos animais é frequen-
distúrbios endócrinos. temente estimado, mas dificilmente quantificado.
A desidratação pode ser medida comparando-se o
A obesidade geralmente é identificada pela peso corporal inicial (antes da desidratação) com o
inspeção do animal. Os animais, de maneira ge- peso do animal desidratado, mas raramente o peso
ral, devem possuir as costelas facilmente palpá- do animal é conhecido antes da ocorrência do pro-
veis e a forma de ampulheta quando vistos de cima. blema. O primeiro e mais importante sinal de
Incapacidade de palpar as costelas, falta de re- desidratação é o ressecamento e o enrugamento
corte caudal à última costela, abdome penduloso, da pele. Uma pele normal é elástica quando pinçada
abdome protruso depois da última costela e de- com os dedos, voltando rapidamente à posição
pósito de gordura facilmente palpáveis em am- normal quando solta (dois segundos, em média).
bos os lados do início da cauda sobre os quadris Em animais desidratados, quanto maior for o grau
ou na área inguinal sugerem obesidade. A obesi- de desidratação, maior será o tempo (em segun-
dade é a desordem nutricional mais comum em dos) que a pele permanecerá deformada. A desi-
pequenos animais, sendo caracterizada pela ele- dratação discreta (até 5%) não promove alterações
vação de 15 a 20% do peso considerado normal clínicas marcantes. No entanto, os animais com
para a raça e a idade do animal. A história nutri- desidratação moderada a grave apresentarão várias
cional deve incluir a quantidade e a qualidade da alterações importantes, incluindo o aprofundamento
dieta, comparando-as com a recomendada para a ou a retração do globo ocular na órbita, em virtude
espécie e raça envolvida. Para cães e gatos é im- da perda de fluido em região periorbital e ocular.
portante questionar o proprietário sobre o forne- Outras alterações observadas em casos de desidra-
cimento de restos de comida caseira ou de gulo- tação encontram-se apresentadas na Tabela 4. l. Em
seimas aos mesmos. A alimentação de animais pe- grandes animais, a pele da pálpebra superior e a
cuários é menos controlada e mais difícil de ser da região cervical (tábua do pescoço) fornecem bons
checada. A ocorrência de deficiências nutricionais, indícios do grau de desidratação que, em termos
de mudanças repentinas de regime alimentar ou clínicos, é avaliado como uma porcentagem do peso
de doenças parasitárias é de grande importância corporal. A avaliação da concentração das proteínas
para as várias espécies envolvidas. totais (somente em animais que não possuem
hipoproteinemia) e do hcmatócrito também pode
ser utilizada. Deve-se ter cuidado na estimativa
AVALIAÇÃO GERAL DA PELE da desidratação em raças que apresentam pele em
excesso (sharpei, por exemplo) e em animais idosos,
Tanto fisiológica como anatomicamente, a pele é cuja elasticidade de pele se encontra fisiologica-
um órgão complexo. Há um ditado que se ajusta mente diminuída. Da mesma forma, deve-se levar
perfeitamente à sua importância para o exame em consideração o estado nutricional do animal para
clínico: "a pele é o espelho da saúde". Nos animais, a estimativa da desidratação pela elasticidade da
o estado do manto piloso é também um bom indi- pele, já que animais gordos ou obesos podem ter
cador da saúde física, tanto em relação ao estado seu grau de desidratação subestimado (em virtude
nutricional, à constituição física do indivíduo, quanto do acúmulo de tecido adiposo em região subcutânea)
ao manejo a que esse animal é submetido (ou seja, ou superestimado em animais magros (pela ausência
é um bom revelador, também, das características de gordura).
de manejo adotado pelo proprietário do animal). Existem duas causas principais de desidrata-
Um animal com pêlos sujos, despenteados, eriça- ção: ingestão inadequada de água (devido à pri-
dos, com ectoparasitas e sem brilho, poderá reve- vação ou à diminuição na ingestão de água em
lar um proprietário pouco cuidadoso ou que não decorrência de algumas enfermidades ou por
mantém um vínculo estreito com o animal. As impedimento à ingestão por paralisia faríngea ou
alterações de pele podem ser localizadas ou gene- obstrução esofágica, por exemplo). No entanto, a
ralizadas, únicas ou múltiplas, simétricas ou assi- perda excessiva de líquido promovida pela ocor-
métricas, etc. Tais considerações serão feitas no rência de diarreia e/ou vómito é a principal causa
capítulo de Semiologia da Pele. No entanto, du- de desidratação observada.
rante essa fase de exame, podemos avaliar a pele
Exame Físico Geral ou de Rotina 81

Tabela 4.1 - Estimativa da desidratação através da avaliação física do animal.

Até 5% (não aparente) •l Elasticidade da pele discreta ou sem alteração


Enoftalmia ausente ou muito discreta Estado geral
sem alteração ou levemente alterado Apetite
preservado/sucção geralmente presente Animal
alerta e em posição quadrupedal
Entre 6 e 8% (Leve) •l Elasticidade da pele (de 2 a 4 segundos)
Enoftalmia leve Animal ainda alerta
•l Elasticidade da pele (6 a 10 segundos)
Entre 8 e 10% (Moderada) Enoftalmia evidente
•l Reflexos palpebrais
•l Temperatura das extremidades dos membros, de orelhas e focinho
Mucosas secas
Mantém-se em posição quadrupedal e/ou em dec úbito esternal
Apatia de intensidade variável
-l Marcante da elasticidade da pele (> 10 segundos)
Entre 10 e 12% (Grave) Enoftalmia intensa
Extremidades, orelhas e focinho frios
Tônus muscular i ou ausente
Mucosas ressecadas
Reflexos muito i ou ausentes
Decúbito lateral
Apatia intensa
Possível óbito
> 12% (Gravíssima)

PC = Peso corporal.

Vale a pena ressaltar que a Tabela 4.1 serve de normalidade e a evolução correspondente (para
apenas como orientação para se estimar o grau de melhor ou pior) daqueles já existentes. A altera-
desidratação nas diferentes espécies, já que exis- ção deve, então, ser adequadamente descrita
te uma ampla variação da intensidade e do nú- (taquipnéia, taquicardia, febre) e os valores
mero de sintomas observados de animal para animal criteriosamente anotados. Após o exame físico
de uma mesma espécie e do quadro mórbido geral, realiza-se uma avaliação pormenorizada do(s)
envolvido. sistema(s) que aprescntou(aram) alteração no
exame físico geral preliminar.

AVALIAÇÃO DOS
PARÂMETROS VITAIS
Tabela 4.2 - Valores norm ais da
O conhecimento dos parâmetros vitais (frequên-
corporal em animai temperatura
cias cardíaca, respiratória, do rúmen e do ceco, s
além da temperatura corporal) é de fundamental Espécie Idade Temperatura retal (
lia -------------------- , ------------
•c.
Cães Jovens
importância na fase que antecede o exame físico Adultos + 38,5 37,5
específico, pois pode sugerir o comprometimen- a 39,2
to de outro sistema que não tenha sido abordado Gatos 37,8 a 39,2
ou mencionado pelo proprietário, como também
Equinos Jovens 37,2 a 38,9
ajuda a determinar, de forma generalista, a situa- Adultos 37,5 a 38,5
ção orgânica do paciente naquele momento. Os
Bovinos Jovens 38,5 a 39,5
parâmetros devem ser aferidos e monitorados ro-
Adultos 37,8 a 39,2
tineiramente, se possível, duas vezes ao dia, uma
pela manhã e outra ao final da tarde. Nessa fase Caprinos Jovens 38,8 a 40,2
Adultos 38,6 a 40
do exame, é importante observar se está havendo
ou não alguma alteração nos valores indicativos Ovinos Jovens 39 a 40
Adultos 38,5 a 40
82 Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico

Tabela 4.3 - Valores normais da frequência indicar o estado de saúde atual do animal. Esse
cardíaca em animais adultos. simples exame revela a presença de enfermidades
próprias (inflamação, tumores, edema), como também
auxilia a inferir conclusões acerca da possibilidade
Cães 60 a 1 60 de alterações que reflitam comprometimento do
Gatos 120 a 240
sistema circulatório ou a existência de doenças em
Equinos 28 a 40
outras partes do corpo (icterícia em virtude de dano
Bovinos 60 a 80
Caprinos 95 a 120
hepático ou da ocorrência de hemólise).
O exame das mucosas deve ser realizado
Ovinos 90 a 1 1 5
sempre em locais bem iluminados, de preferên-
cia sob a luz do sol. Caso isso não seja possível,
utiliza-se luz artificial de coloração branca.
Tabela 4.4 - Valores normais da frequência As mucosas visíveis que costumamos exami-
respiratória em animais adultos. nar são as oculopalpebrais (Fig. 4.3) (conjuntiva
Espécie/Adultos Movimentos respiratonos/mm palpebral superior, conjuntiva palpebral inferior,
Cães 18 a 36 3a pálpebra ou membrana nictitante e conjuntiva
Gatos 20 a 40 bulbar ou esclerótica), mucosas nasal, bucal, vulvar,
Equinos 8 a 16 prepudal e, raramente, anal. Deve-se dar especial
Bovinos 10 a 30 atenção às alterações de coloração, como também
Caprinos 20a 30 à presença de ulcerações, hemorragias e secreções
Ovinos 20 a 30 durante o exame visual.
As mucosas oculopalpebrais possuem a mem-
brana nictitante eu terceira pálpebra, que é uma
Os valores prega da conjuntiva que apresenta, em sua por-
descritos nas Tabelas 4.2,4.3 e 4.4 são válidos ção interna, uma glândula denominada glândula
para animais mantidos em repouso e em da terceira pálpebra (Fig. 4.5) ou de Hardcr, (exceto
temperatura ambiente moderada. nos equinos), que pode facilmente ser confundida
com tecido linfóide, responsável pela produção
de 30% do filme lacrimal. Ela se torna evidente
no tétano, na síndrome de Horner (perda da iner-
EXAME DAS MUCOSAS vação simpática do globo ocular) e em algumas
Inicialmente deve-se proceder ao exame das mucosas intoxicações (nicotina e estricnina). Nos bovinos,
aparentes, que é de real importância em semiologia, os vasos episclerais apresentam-se bem delinea-
pois as mucosas, em virtude da delgada espessura dos e, nos equinos, a coloração da esclerótica
da pele e grande vascularização, podem, muitas vezes,

Figura 4.3 - Técnica de abertura das mu-


cosas oculopalpebrais adotada em cães,
gatos e pequenos ruminantes, através da
utilização dos dedos polegares.
Exame Físico Geral ou de Rotina 83

Figura 4.4 - Técnica de


abertura das mucosas oculo-
Dalpebrais adotada em bo-
\ inos e equinos, através da
utilização dos dedos indi-
cador (conjuntiva palpebral
superior) e polegar (conjun-
: .a palpebral inferior).

tm i • -

Figura 4.5 - Protrusão e con-


gestão da terceira pálpebra em
um equino com tétano.

apresenta-se castanho-amarelada, em virtude de de preenchimento capilar (Fig. 4.8). É interes-


maior pigmentação. Nos gatos, a esclerótica é com- sante, principalmente nos casos de desidratação,
pletamente branca e relativamente avascular. já que, muitas vezes, o animal apresenta a elasti-
A mucosa nasal, por ser pigmentada, na maioria cidade de pele normal e um tempo de refluxo ca-
das espécies é de importância para a observação pilar aumentado, demonstrando, na verdade, que
de possíveis corrimentos e lesões próprias, mas o animal está desidratado. Isso pode ser visto em
insatisfatória para verificar alterações de coloração casos de hidratação subcutânea, quando o líquido
(Figs. 4.6 e 4.7). Uma inspeção adequada da se acumula no tecido subcutâneo, não atingindo,
mucosa nasal é facilmente realizada nos equídeos, ainda, a circulação sistémica.
pois suas narinas são amplas e flexíveis. Nesses Além de apresentar alterações da coloração,
animais, os duetos nasolacrimais, um de cada lado, devemos observar nas cadelas a presença de for-
bastante amplos e visíveis, estão situados na tran- mações vegetantes e hemorrágicas (aspecto de
sição entre a pele e a mucosa. couve-flor) na mucosa vulvar c na vagina, caracte-
Deve-se lembrar que, além da coloração, a rísticas do tumor venéreo transmissível, que é
mucosa bucal fornece informações sobre o tempo transmitido, principalmente, pelo coito.
84 Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico

Figura 4.6 - Mucosa nasal de um equino com crescimento Figura 4.8 - Avaliação do tempo de preenchimento capi-
neoplásico (carcinoma). lar em equinos.

Figura 4.9 - Mucosa bucal congesta em um cão.

Avaliação da Coloração
A coloração das mucosas depende de vários
fatores, dentre os quais: quantidade e qualidade
do sangue circulante, sua qualidade, das trocas
gasosas, da presença ou não de hemoparasitos, da
função hepática adequada, da medula óssea e
outros. As mucosas normalmente se apresentam
Figura 4.7 - Mucosa nasal de um equino com secreção úmidas e brilhantes. A tonalidade, de maneira geral,
purulenta unilateral. é rósea clara com ligeiras variações de matiz, vendo-
Exame Físico Geral ou de Rotina 85

se pequenos vasos com suas ramificações. As Quando se avalia um paciente com palidez
mucosas do animal recém-nascido apresentam co- de mucosa, deve ficar estabelecido se a mudança
loração rósea menos intensa. Em fêmeas no cio, de coloração é causada por hipoperfusão ou por
a mucosa vulvar pode se encontrar avermelhada. anemia. A abordagem mais simples para resolver
Em determinadas raças de algumas espécies do- esse problema é avaliar o volume globular (VG)
mésticas, a coloração das mucosas tende a ser mais ou hematócrito (Ht) e o tempo de preenchimento ou
avermelhada (cães: fila brasileiro, cocker spaniel, perfusão capilar'(TPC), já que a palidez de mucosa
bulldog, boxer; bovinos: Simental; equinos: pode resultar de anemia ou de vasoconstrição
Apaloosa, por exemplo), não devendo ser confun- periférica. O TPC pode ser difícil de avaliar em
dida com processo inflamatório ou irritativo da cães e gatos em virtude da falta de contraste
referida mucosa. (resultante da palidez). Basicamente, o TPG reflete
Não é tão preciso o limite entre a coloração o estado circulatório do animal (volemia) e é
normal e a patológica, e o seu adequado reconhe- medido junto à mucosa bucal, próximo aos dentes
cimento requer experiência profissional e acura- incisivos. Para tanto, faz-se a eversão do lábio
do exame do animal. Quando uma coloração anor- superior ou inferior e compressão digital com o
mal for vista em uma determinada mucosa, as dedo polegar, observando-se, após a retirada do
demais também devem ser observadas para ver dedo, o tempo que leva para que ocorra novamente
se tal alteração está, também, presente. Se uma o preenchimento dos capilares, ou seja, para que
única mucosa estiver alterada, pode ser um pro- a palidez provocada pela impressão digital seja
blema localizado ou uma peculiaridade particu- substituída, novamente, pela cor observada antes
lar do animal, enquanto o envolvimento de vá- da compressão ter sido realizada (Fig. 4.8 e
rias mucosas pode ser um indício de comprome- Quadro 4.1). A coloração normal deve voltar dentro
timento sistémico. Existem várias tonalidades ou de dois segundos. Um maior tempo para que ocorra
gradações de uma mesma cor que, na maioria das o preenchimento desses pequenos vasos indica,
vezes, refletem, proporcionalmente, a intensida- na maioria das vezes, desidratação ou vasocons-
de do processo mórbido em evolução. Por exem- trição periférica, associada a baixo débito cardía-
plo, a palidez pode variar desde branco-rósea até co. Um tempo maior que dez segundos significa,
branco-porcelana ou perlácea (Fig. 4.11)- consi- geralmente, uma falha circulatória potencialmente
derada o grau máximo de palidez; a congestão varia fatal. Contudo, vale a pena ressaltar que este tipo
desde um vermelho discreto (irritação) até ver- de avaliação não é tão sensível, já que um TPC
— elho-tijolo (endotoxemia). normal pode ser observado cm animais com doença

Figura 4.10 - Mucosa bucal amarelada em um c ão Figura 4.11 - Mucosa oculopalpebral pálida (perlácea) em
com TOtospirose. um caprino com verminose.
86 Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico

cardíaca grave. A palidez de mucosa pode ser A cianose é uma coloração azulada da pele e
observada, também, em animais com algia abdo- das mucosas, causada pelo aumento da quantida-
minal grave, em virtude do estímulo do sistema de absoluta de hemoglobina reduzida no sangue.
nervoso simpático e, consequentemente, de alfa- A coloração azulada das mucosas, portanto, indi-
receptores, que induzem a uma diminuição da luz ca um distúrbio da hematose (troca gasosa que
vascular. O tempo de preenchimento é normal ocorre nos alvéolos) e que depende mais dos
em animais com anemia, a menos que esteja pulmões que do coração, porém, este órgão po-
havendo hipoperfusão. Um tempo maior que seis derá levar à cianose caso não consiga proporcio-
segundos indica um comprometimento circula- nar ao organismo circulação sanguínea adequada,
tório grave, levando, pelas alterações isquêmicas, quer seja por problemas cardíacos ou vasculares.
a um comprometimento renal e hepático grave e, Mas não se deve esquecer de averiguar se o ani-
muitas vezes, irreversível. mal apresenta ou não anemia, a qual tornará as
trocas gasosas e o transporte de oxigénio deficiente,
tornando-o hipercapnéico (com excesso de dió-
Quadro 4.1 - Avaliação do tempo de preenchi- xido de carbono) ou, ainda, de se avaliar se o animal
mento capilar. está desidratado ou em choque, o que levará a
Animal sadio: 1-2 segundos uma menor pressão sanguínea, acarretando uma
Animal desidratado: 2-4 segundos diminuição da perfusão tecidual e acúmulo de
Animal gravemente desidratado: > 5 segundos dióxido de carbono nos tecidos periféricos, den-
tre os quais, os das mucosas passíveis de serem
inspecionadas clinicamente. Ou seja, muitas são
As manifestações clínicas de anemia nos ani- as causas de cianose, algumas de origem circula-
mais domésticos incluem palidez das mucosas, tória, outras por processos respiratórios ou sisté-
intolerância ao exercício, aumento da frequência micos. Por isso, deve-se sempre realizar um com-
(taquicardia) e da intensidade (hiperfonese) de pleto exame clínico, não apenas examinar os sis-
bulha cardíaca e apatia. Esses sintomas podem temas que, a princípio, julga-se estarem prima-
ser agudos ou crónicos e de intensidade variável. riamente envolvidos no processo patológico em
Deve ser enfatizado que a anemia não constitui questão. Porém vale uma ressalva: para que a
um diagnóstico primário e que todo o esforço deve alteração na coloração da mucosa seja percebida,
ser feito para identificar a sua causa em um pa- o quadro patológico do animal deverá estar bas-
ciente anêmico. Algumas perguntas são cruciais tante avançado, caso contrário, pouca ou nenhu-
para o esclarecimento da causa da anemia: ma alteração será observada - como em casos de
cianose. Geralmente a cianose não é observada
1. O paciente está sendo medicado? em pacientes com hemorragia, haja vista que há,
2. Qual a medicação e a dose utilizadas? também, perda de hemoglobina.
3. Observou alteração na consistência e na co A icterícia é o resultado da retenção de bilir-
loração das fezes (diarreia, melena, hema- rubina nos tecidos, e ocorre devido ao aumento
toquezia)? da bilirrubina sérica acima dos níveis de referên-
4. Apresentou alteração de coloração na urina cia. É sabido que outras substâncias podem de-
(hematúria, hemoglobinúria)? terminar coloração amarelada semelhante, como
5. Quando e com o quê foi feita a última ver- o fornecimento de uma alimentação rica em caro-
mifugação? teno. Entretanto, nesse caso, não cora a mucosa
e a determinação da bilirrubina sérica esclarece o
A congestão de mucosas ocorre devido a um diagnóstico. Deve-se lembrar que a icterícia é uma
ingurgitamento de vasos sanguíneos, por proces- alteração clínica que aparece com frequência não
so infeccioso ou inflamatório, local ou sistémico só nas doenças hepáticas e do sistema biliar, mas
(congestão pulmonar, conjuntivite, estomatite). também em afecções hemolíticas. Contudo, cons-
É de grande valia como indicador do estado cir- titui um achado importante, pois dificilmente uma
culatório do animal. A hiperemia pode ser, ainda, doença hepática grave apresenta-se sem icterícia,
difusa ou ramiforme. É difusa quando a tonalida- ainda que transitória (Fig. 4.10).
de avermelhada é uniforme (intoxicação) e rami- Cerca de 80% da bilirrubina produzida origi-
forme quando se nota os vasos mais salientes, com na-se da degradação da hemoglobina a partir da
maior volume sanguíneo (dispnéias). remoção dos eritrócitos da circulação e os 20%
Exame Físico Geral ou de Rotina 87

Obstrução do fluxo biliar


- colangite (fasciolose,
fotossensibilização)
- abscesso
- neoplasia

Anemia hemolítica
- anaplasmose
- babesiose
- hemobartonelose

Bl> BD / ÍV G BD > BI/ T CGT, FA*/ T AST, ALT**

Hepática

i r
Hepatite -
bacteriana
- virai
- tóxica

' 1

t ALT, AST*/ t BD, CGT, FA**

* Alteração inicial **
Alteração final

Figura 4.12 - Tipos de icterícia e suas consequências.

restantes são originados na medula pela eritro- no e, no íleo e no cólon, é transformada em uro-
poiese. Uma vez na circulação, a maior parte da bilinogênio. A maior parte do urobilinogênio for-
bilirrubina liga-se à albumina, soltando-se da mada é eliminada pelas fezes e o restante retorna
mesma no sinusóide hepático, sendo transporta- para a circulação sistémica, sendo grande parte
da até o retículo endoplasmático liso, onde é con- eliminada pelos rins. Uma parte do urobilinogê-
jugada ao ácido glicurônico, transformada em nio fecal volta ao fígado pela circulação êntero-
bilirrubina direta, também denominada de con- hepática.
jugada. Esta é eliminada pela bile, vai ao intesti- Em caso de icterícia resultante da hiper-
bilirrubinemia pela forma conjugada ou direta intensa em casos de icterícia obstrutiva e hepato-
(hidrossolúvel), os tecidos mais facilmente impreg- celular que na icterícia hemolítica. A icterícia
nados são os tecidos superficiais, pela maior afi- pode ser causada por:
nidade desta com áreas de alta concentração de
fibras elásticas, como a conjuntiva bulbar. Já a forma • Doenças hemolíticas (aumento da produção
não conjugada apresenta maior afinidade por te- por hemólise): quando o fígado não tem con
cido adiposo, pois, por ser lipossolúvel, penetra dições de excretar e/ou conjugar toda a bilir
mais facilmente. As mucosas oral e bulbar costu- rubina formada (babesiose).
mam ser os primeiros locais em que se detecta • Lesões hepáticas (infecções bacterianas: lep-
icterícia. Da mesma forma, a coloração é mais tospirose; substâncias hepatotóxicas: afla-
toxina, fenol "creolina").
• Obstrução dos duetos biliares, quando a bi
lirrubina, ao invés de ser excretada pela bile,
atinge a circulação sistémica.

É prática comum a utilização de termos "hi-


pocorada" e "hipercorada" para caracterizar a
coloração das mucosas, não devendo, no entan-
to, serem adotados, pois se trata de denomina-
ções imprecisas, já que se poderia considerar as
colorações pálida e cianótica (Fig. 4.13) como
hipocoradas c as colorações hiperêmica e ictérica
como hipcrcoradas, sendo a sua origem e o seu
significado clínico, totalmente distintos. A lei-
tura de uma ficha de exame clínico com tal de-
nominação pode, passado algum tempo, causar
88 Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico

nasal ou vaginal, indicativas de anormalidades


na hemostasia (Tabela 4.5).

PRESENÇA DE CORRIMENTOS
Quando presentes nas respectivas mucosas, de-
vemos, inicialmente, verificar se são uni ou bila-
terais, sua quantidade e aspecto. Os corrimentos,
segundo as características macroscópicas, são clas-
sificados ernr
Fluido. Líquido, aquoso, pouco viscoso e trans-
parente (corrimento nasal normal em bovinos).
Seroso. Mais denso que o fluido, mas ainda
transparente (processos virais, alérgicos e prece-
de a secreção de infecções ou inflamações). -
^— Catarral. Mais viscoso, mais pegajoso, esbran-
quiçado.
- Purulento. Mais denso e com coloração variá-
Figura 4.13 - Mucosa bucal cianótica, com formação de vel (amarelo-esbranquiçado, amarelo-esverdeado).
halos endotoxêmicos marginando os dentes em um equi- É, na verdade, um produto de necrose em um
no com peritonite séptica difusa. exsudato rico em neutrófílos, indicando, por exem-
plo, a ocorrência de processos infecciosos, corpos
estranhos).
dúvidas com relação ao seu verdadeiro signifi- Sanguinolento. Vermclho-vivo ou enegrecido.
cado. É interessante que se observe, além da co- Pode resultar de traumas, distúrbios hemor-
loração, a presença de petéquias e de hemorra- rágicos sistémicos, processos patológicos agres-
gias equimóticas na esclera ou nas mucosas oral, sivos, etc.

Tabela 4.5 - Alterações de coloração das mucosas com seus principais significados e causas.
ímm
" \ ... ! ""
Denominação Coloração Significado Principais causas
Pálida Esbranquiçada Anemia Ecto e endoparasitose
Hemorragias/Choque hipovolêmico
Aplasia medular
Insuficiência renal
Falência circulatória periférica
Congesta ou Avermelhada T Permeabilidade Inflamação e/ou infecção local
Hiperêmica vascular Septicemia/Bacteremia
Febre
Congestão pulmonar
Endocardite
Pericardite traumática
Cianótica Azulada Transtorno na Anafilaxia
hematose Obstrução das vias respiratórias
Edema pulmonar
Insuficiência cardíaca congestiva
Pneumopatias
Exposição ao frio
Ictérica Amarelada Hiperbilirrubinemia Estase biliar (obstrução)
Anemia hemolítica imune
Isoeritrólise neonatal
Anemia hemolítica microangiopática
- Babesiose
- Anaplasmose
- Hemobartonelose
Hepatite tóxica e/ou infecciosa
Exame Físico Geral ou de Rotina 89

AVALIAÇÃO DOS LINFONODOS plasmática, aumento nas proteínas do líquido


intersticial e aumento da permeabilidade dos
O sistema linfático constitui uma via acessória pela capilares.
qual os líquidos podem fluir dos espaços inters- A maior parte da linfa coletada pelos capila-
ticiais para o sangue. E, mais importante de tudo, res linfáticos, antes de ser devolvida à corrente
os vasos linfáticos podem transportar para fora dos sanguínea, passa através de pequenas estruturas
espaços teciduais proteínas e grandes materiais ovóides, chamadas linfonodos. Os linfonodos ou
particulados, já que não podem ser removidos gânglios linfáticos são órgãos encapsulados cons-
diretamente por absorção pelo capilar sanguíneo. tituídos por tecido linfóide e que aparecem espa-
Essa remoção de proteínas dos espaços intersti- lhados pelo corpo, sempre no trajeto de vasos
ciais é uma função absolutamente essencial. linfáticos. Os linfonodos, em geral, têm a forma
Com exceção de alguns tecidos (partes su- de rim e apresentam um lado convexo e outro com
perficiais da pele, sistema nervoso central, partes reentrância, o hilo, pelo qual penetram as arté-
mais profundas dos nervos periféricos e ossos), rias nutridoras e saem as veias. A linfa que atra-
quase todos os tecidos corporais possuem canais vessa os linfonodos penetra pelos vasos linfáticos
linfáticos que drenam o excesso de líquido dire- que desembocam na borda convexa do órgão (va-
tamente dos espaços intersticiais. sos aferentes) e sai pelos linfáticos do hilo (vasos
A maior parte do líquido filtrado dos capila- eferentes). O parênquima é dividido em uma região
res arteriais flui por entre as células e é finalmen- cortical, que se localiza abaixo da cápsula, numa
te reabsorvida pelas extremidades venosas dos região medular que ocupa o centro do órgão e seu
capilares sanguíneos. No entanto, cerca de um hilo. Além dessas regiões, descreve-se também
décimo do líquido passa, em vez disso, para os uma zona paracortical, localizada entre a cortical
capilares linfáticos, retornando ao sangue pelo e a medular. Os linfonodos são filtros da linfa. A
sistema linfático, e não pelos capilares venosos. linfa, antes de atingir o sangue, atravessa ao menos
A linfa deriva do líquido intersticial que flui um linfonodo. A linfa aferente chega aos seios
para os vasos linfáticos. Por essa razão, a linfa, subcapsulares, passa para os seios peritrabeculares
quando começa a sair de cada tecido, tem quase e daí para os seios medulares, saindo pelos linfá-
a mesma composição do líquido intersticial. A
ticos eferente.
concentração de proteínas da linfa da maioria dos
O exame do sistema linfático (vasos linfáti-
tecidos é muito próxima à concentração do líqui-
cos e linfonodos) é importante por várias razões,
do intersticial dos mesmos. Por outro lado, a linfa
formada no fígado e no intestino tem uma con- dentre as quais se destacam:
centração acima desses valores.
O sistema linfático também é uma das prin- 1. Por participar dos processos patológicos que
cipais vias de absorção de nutrientes a partir do ocorrem nas áreas ou regiões por eles drena
sistema gastrointestinal, sendo responsável, prin- das, as alterações que ocorrem no sistema
linfático podem identificar o órgão ou a re
cipalmente, pela absorção dos lipídeos. Finalmen-
gião que está acometida.
te, até mesmo grandes partículas, tais como bacté-
2. Os linfonodos, como os vasos linfáticos, apre
rias, podem abrir seu caminho por entre as célu-
las endoteliais dos capilares linfáticos e, desse sentam alterações características em várias
modo, passar para a linfa. Quando a linfa passa doenças infecciosas como a leucose bovina,
pelos linfonodos, essas partículas são removidas a linfadenite caseosa dos caprinos e ovinos, a
e destruídas. leishmaniose visceral canina, sendo, dessa
forma, um fator fundamental para o estabe
O fluxo linfático é relativamente lento em
lecimento do diagnóstico nosológico.
comparação com a troca total de líquido entre o
plasma e o líquido intersticial. A intensidade do 3. A dilatação ou hipertrofia anormal dos linfono
fluxo de linfa é determinada principalmente por dos, que ocorre na maioria dos processos infec
dois fatores: 1. a pressão do líquido intersticial; e ciosos e inflamatórios, pode comprometer a
função de alguns órgãos vizinhos, agravando ain
2. o grau de atividade da bomba linfática. Qual-
da mais o quadro geral do animal, tais como:
quer fator que aumente a pressão do líquido in-
- Disfagia e timpanismo —> linfonodos me-
tersticial também aumenta, normalmente, o flu-
diastínicos (por compressão de vago, nos
xo linfático. Esses fatores incluem pressão capi-
lar elevada, diminuição da pressão coloidosmótica casos de tuberculose e actinobacilose em
bovinos);
90 Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico

- Dispneia —> linfonodos retrofaríngeos mamários e os inguinais superficiais ou escrotais


(compressão faríngea); (Tabela 4.6 e Quadro 4.2).
- Tosse —> linfonodos mediastínicos (com Os linfonodos mandibulares, na maioria das
pressão de traquéia e árvore brônquica). espécies, são em número de dois e estão localiza-
dos superficialmente entre a veia facial. Nos
Pelo exposto, pode-se presumir que os linfo- equinos estão situados mais profundamente e
nodos raramente são sede de uma patologia pri- ventralmente à língua. Os mesmos drenam a
mária, já que se envolvem de maneira secundária metade ventral da cabeça (cavidade nasal, lábios,
nos mais variados processos infecciosos, inflama- língua glândulas salivares). Podem ser examina-
tórios e neoplásicos. dos em cães, gatos, equídeos e ruminantes. Mui-
O exame do sistema linfático baseia-se em tas vezes, eles não podem ser sentidos em bovi-
nos adultos e sadios, pois são relativamente pe-
inspeção, palpação e, caso necessário, realiza-
quenos e recobertos por tecido adiposo.
ção de biópsia dos linfonodos. Se a pelagem é
Os linfonodos retrofaríngeos laterais e mediais
longa e a pele muito pigmentada, a inspeção localizam-se na região cervical, entre o atlas e a parede
torna-se impossível. A palpação é de melhor valia da faringe. Recebem linfa das partes internas da
para se detectar alterações significativas que cabeça, incluindo o esôfago proximal, palato e a
envolvam direta ou indiretamente o sistema faringe. Normalmente não são palpados, mas podem
linfático. Deve-se avaliar o tamanho, consistên- ser examinados em equinos, cães, gatos e em
cia, sensibilidade, mobilidade e a temperatura ruminantes quando aumentados de volume (reativos).
de todos os linfonodos examináveis e sempre Os linfonodos cervicais (pré-escapulares) su-
bilateralmente, para que se possa determinar se perficiais são palpáveis na face lateral da por-
o processo é localizado (uni ou bilateral) ou ção distai do pescoço e ficam em uma fossa
generalizado. formada pelos músculos trapézio, braquiocefálico
É tão difícil o proprietário perceber altera- e omotransverso. Essa fossa se encontra imedi-
ções no sistema linfático dos animais domésticos atamente adiante da escápula, um pouco acima
que raramente esse sistema é o motivo da queixa da articulação escapuloumeral. Em equinos eles
principal, a não ser que sejam visivelmente ex- repousam abaixo do músculo peitoral cranial pro-
tremas (leucose em bovinos, leishmaniose visce- fundo sendo de difícil palpação. Drenam o pa-
ral em cães). Entretanto, quando possível, deve- vilhão auricular, o pescoço, o ombro, os mem-
mos perguntar a data em que o aumento de vo- bros torácicos e o terço proximal do tórax. Po-
lume foi notado, posto que se terá uma ideia da dem ser examinados, com uma certa facilidade
sua evolução, se foi rápida ou lenta. Procuramos nos ruminantes e cães. Nos animais de grande
destacar o verbo "notar", porque o momento em porte, a sua palpação é facilitada passando-se
que o proprietário notou o aumento de volume do as pontas dos dedos sobre os mesmos. Já, nos
linfonodo raramente coincide com o momento no animais de companhia, os linfonodos devem ser
qual ele surgiu. seguros com as pontas dos dedos, mantidos em
forma de pinça.
Os linfonodos pré-femorais podem ser pal-
pados no terço inferior do abdome, a meia dis-
Localização dos Linfonodos tância da prega do flanco e da tuberosidade
ilíaca. Recebe linfa da região posterior do cor-
Os linfonodos são estruturas muitas vezes po e do segmento craniolateral da coxa. São
palpáveis, de modo que fornecem uma boa orien- mais facilmente examinados em animais rumi-
tação sobre o local onde está ocorrendo um de- nantes, mas podem ser palpados em equinos
terminado processo infeccioso ou inflamatório. magros e/ou enfermos. Não existem nos animais
No entanto, é preciso que se conheça sua loca- de companhia.
lização anatómica para que sua avaliação tam- Os linfonodos mamários são representados, na
bém auxilie nos diagnósticos. Os linfonodos maioria das vezes, por dois nódulos de cada lado,
possíveis de serem examinados na rotina práti- entre o assoalho ósseo da pelve e a parte caudal
ca são: mandibulares ou maxilares; os retrofarín- do úbere (transição da parede abdominal e pa-
geos; os cervicais superficiais ou pré-escapulares; rênquima glandular). Drenam o úbere e as partes
os pré-crurais ou pré-femorais; os poplíteos; os posteriores das coxas. São palpados nas fêmeas
Exame Físico Geral ou de Rotina 91

Figura 4.14 - Linfoadenopatia (linfonodo mandibular) em Figura 4.15- Fistulizaçãode linfonodo mandibular em eqiii-
eqiiino. no com adenite.

Tabela 4.6 - Grau de dificuldade à palpação dos principais linfonodos examináveis nas

diferentes espécies domésticas.


Linfonodos
±
Mandibulares
±
Pré-escapulares
N NE l
Pré-femorais
E
Poplíteos
+
i
±
Mamários
i N
Inguinais i
E
+ = relativamente fácil; ± = não tão fácil; J- = de difícil palpação; NE = nãoi existem.
i

de ruminantes domésticos. Em vacas em lacta- fêmoro-tíbio-patelar. Drenam pele, músculos,


ção, para examinar o linfonodo esquerdo do úbe- tendões e articulações dos membros posteriores.
re, deve-se elevar a parte esquerda do úbere, É palpável em cães e gatos.
posicionando-se, após contenção adequada do ani- Muitos linfonodos, tais como parotídeos, re-
mal, lateralmente ao mesmo, enquanto a mão trofaríngeos e axilares, são palpados somente
direita procura localizar e avaliar o linfonodo. Deve- quando estão hipertrofiados, ou seja, quando
se inverter a posição e as mãos para a palpação do estão reativos a algum processo inflamatório, in-
linfonodo oposto. feccioso ou neoplásico nas respectivas regiões
Os linfonodos inguinais superficiais ou escro- de drenagem. Existem, ainda, os linfonodos
tais apresentam-se medial e lateral ao corpo do internos, que podem ser palpados por via retal
pênis. Serve de centro linfático para os órgãos em grandes animais, que são o ileofemoral (es-
genitais masculinos externos. Normalmente pal- paço retroperitoneal, cranial e medial ao corpo
pados em cães. do íleo) e os linfonodos da bifurcação aórtica
Os linfonodos poplíteos superficiais, ausentes (parte caudal do flanco, medial ao íleo). Esses
nos equinos, estão localizados na origem do gas- linfonodos raramente são examinados na rotina
trocnêmio, entre os músculos bíceps femoral e clínica, mas podem ser avaliados na palpação
semitendíneo, posteriormente a articulação retal. Existem, ainda, os linfonodos ilíacos
92 Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico

que podem ser palpados ocasionalmente em cães Características Examináveis


com distúrbios pontuais como nos casos de carci-
noma prostático. dos Linfonodos
Tamanho
Quadro 4.2 - Linfonodos examináveis na rotina
clínica. O tamanho dos linfonodos varia enormemen-
te, mesmo quando palpados em animais saudáveis
Mandibulares ou maxilares Cervicais superficiais ou
pré-escapulares Pré-femorais ou pré-crurais -
c de uma mesma espécie. Normalmente, os gân-
Poplíteos Mamários Inguinais superficiais ou glios linfáticos apresentam forma de grão de feijão
escrotais e são relativamente maiores em animais jovens, já
que são expostos a uma grande variedade de
estímulos antigênicos, tais como vacinação. Além
da idade, o tamanho do linfonodo depende, também,
em um mesmo animal, da sua localização e do seu
estado nutricional. Animais caquéticos podem in-
duzir a uma falsa impressão de adenopatia. Em outras
situações, o emagrecimento pode tornar possível a
palpação de linfonodos que não são normalmente
palpados em animais sadios, como é o caso dos
linfonodos pré-crurais em equinos magros. De modo
genérico, deve-se interpretar uma tumefação (infarto)
ganglionar como uma reação inflamatória de caráter
defensivo, oriunda de processos inflamatórios,
infecciosos e/ou neoplásicos, localizados ou disse-
minados. Essa hiperplasia é decorrente da absorção
e da fagocitose de bactérias, toxinas e da produção
de linfócitos e anticorpos. Quando relacionadas com
os vasos, as afecções são chamadas de linfangites;
Figura 4.16- Linfonodos: 1 - mandibular; 2 - pré-esca- quando relacionadas com os gânglios, adenite; com
pular; 3 - poplíteo e 4 - inguinal superficial (cão macho).
ambas as estruturas, linfadenite. Deve-se lembrar
de que o aumento exagerado dos linfonodos pode
causar a compressão de estruturas vizinhas, causando
sintomas secundários (disfagia e timpanismo por
compressão esofágica dos linfonodos mediastínicos,
por exemplo). O aumento do tamanho dos linfonodos
deve ser descrito usando-se termos comparativos ti-
rados da vida diária, tais como: "caroço de azeito-
na", "azeitona pequena ou grande", "limão", "ovo
de galinha", "laranja", entre outros. Muitas vezes,
não se consegue sentir um determinado linfonodo
que comumente é palpado, mesmo quando a pal-
pação é realizada no local correto e por um examinador
experiente. No entanto, na maioria dos casos, o
significado clínico da "não palpação" do referido
linfonodo é positivo, já que é um forte indício de
normalidade.

Figura 4.17 - Linfonodos: 1 - mandibular; 2 - retro-farín-


Sensibilidade
geo; 3 - pré-escapular e 4 - pré-crural.
Sempre que possível (quando a hipertrofia
do linfonodo é visível), deve-se palpar primei-
Exame Físico Geral ou de Rotina 93

ro as áreas menos dolorosas para, cm seguida, Mobilidade


atingir a área mais sensível ao toque, na tenta-
tiva de se obter melhor cooperação do pacien- Os linfonodos normalmente apresentam boa
te. Nos processos inflamatórios e/ou infeccio- mobilidade; cies são móveis tanto cm relação à
sos agudos os linfonodos tornam-se sensíveis. pele quanto às estruturas vizinhas quando pal-
Nos animais normais e durante os processos pados. A perda ou a ausência de mobilidade é
crónicos, a sensibilidade é normal ou discreta- um achado comum nos processos inflamatórios
mente aumentada, respectivamente. A pesquisa bacterianos agudos, devido ao desenvolvimen-
de sensibilidade pode ser útil para diferenciar to de celulite localizada, que os fixa nos tecidos
linfoadenopatia rcativa de outra neoplásica, já vizinhos.
que, na primeira, a dor à palpação é um achado
frequente.
Temperatura

Consistência Os linfonodos normalmente apresentam uma


temperatura igual à da pele que os recobre. A
A consistência dos linfonodos nem sempre elevação da temperatura é acompanhada, na grande
é fácil de ser descrita. Normalmente, apresen- maioria das vezes, de dor à palpação.
tam uma consistência firme, ou seja, são mo- Deve-se determinar se o comprometimento dos
deradamente compressíveis, cedendo à pressão, gânglios é localizado, isto é, apenas um determi-
e voltando à forma inicial uma vez cessada a nado conjunto de linfonodos apresenta sinais de
pressão. Nos processos inflamatórios e infeccio- anormalidade ou se o mesmo é generalizado. Um
sos agudos a consistência não se altera, mas po- aumento unilateral indica que há um comprome-
demos denotar o aumento de volume e de sen- timento unilateral da área de drenagem de deter-
sibilidade. Nos processos inflamatórios e infec- minado linfonodo. O aumento generalizado dos
ciosos crónicos e neoplásicos, os linfonodos ficam linfonodos é associado a doenças sistémicas agu-
duros. das ou a determinadas condições neoplásicas. A
A presença de flutuação, com ou sem supu- diferenciação pode ser feita por citologia.
ração, faz com que o linfonodo adquira uma con-
sistência mole, representando, geralmente, o es-
tágio final das infecções. Demonstra a formação Procedimentos Complementares
de uma área liquefeita com pus ou material seroso
no seu interior. Ocorre, na maioria das vezes,
Biópsia dos Linfonodos
quando o linfonodo é sede de um abscesso, ou
em casos de metástases de desenvolvimento rá- Existem várias técnicas de biópsia e, no caso
pido (adenite equina). dos linfonodos, podemos utilizar a biópsia por ex-

Figura 4.18 - Punção de biópsia aspirativa


do linfonodo poplíteo em cão com sus-
peita de leishmaniose visceral.
94 Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico

cisão ou por aspiração. Na biópsia por excisão, faz- os aminoácidos, determina a queima destes, com
se a remoção cirúrgica de uma parte ou de todo o consequente produção de calor. Quando o ani-
linfonodo para futuro exame histopatológico. Na mal está em repouso, os principais órgãos gera-
biópsia por aspiração (Fig. 4.18), faz-se punção dores de calor são o fígado e o coração, mas du-
com uma agulha apropriada e, após ser acoplada rante o exercício, os músculos esqueléticos cons-
em uma seringa, aspira-se o material proveniente tituem o maior local de calor, contribuindo com
do linfonodo, ejetando-o sobre uma lâmina de vidro cerca de 80% do calor total produzido.
para posterior exame. A biópsia é empregada nas
linfoadenopatias localizadas e generalizadas, de
etiologia desconhecida, e em suspeitas de metás- FISIQPATOLOGIA DA
tases tumorais. Antes da realização da biópsia, deve-
se, em ambas as técnicas, fazer tricotomia e as- TERMORREGULACÃO
sepsia do local sobre o nódulo linfático.
A manutenção da temperatura corporal normal
depende do centro termorregulador, que alguns
denominam de "termostato", localizado no hipo-
AVALIAÇÃO DA tálamo, o qual é sensível tanto às variações da tem-
TEMPERATURA CORPORAL peratura corporal interna como da superfície cu-
tânea. Existem receptores térmicos, nas vísceras
O estudo da variação térmica (termometria) é de e na pele, que informam ao centro termorregulador
fundamental importância para se avaliar o estado hipotalâmico as respectivas variações existentes.
geral do paciente e nunca deve ser desprezado O termostato atua tanto na produção de calor quan-
pelo veterinário, pois apresenta algumas caracte- to na perda do mesmo. Assim, quando a tempe-
rísticas desejáveis: ratura ambiente diminui há, além de um incre-
mento do metabolismo para a produção de calor,
1. Pouco invasivo. vasoconstricção periférica e piloereção, para evi-
2. Baixo risco de dano à saúde do animal. tar a perda de calor nos membros periféricos, bem
3. Rápida obtenção do resultado. como diminuição da frequência respiratória. Em
4. Baixíssimo custo financeiro. situação inversa, quando a temperatura ambiente
se eleva, observa-se vasodilatação periférica e
As espécies domésticas (mamíferos e aves) aumento relativo da frequência respiratória, pro-
são classificadas como homeotermas, ou seja, são piciando maior dissipação de calor.
capazes de, em condições de perfeita saúde, manter O exame de um paciente febril deve ser com-
a temperatura corporal dentro de certos limites, pleto, com especial atenção para os órgãos que
independente da variação da temperatura ambien- indicam a localização da doença. Deve-se, para
te. Por esse motivo, são chamados de "animais esse fim, levar em consideração, principalmente,
de sangue quente". Já nos répteis, anfíbios e pei- a idade e a espécie animal. O exame físico deve
xes, os mecanismos de ajuste da temperatura são ser minucioso, principalmente naqueles pacien-
rudimentares e, por isso, essas espécies são cha- tes que apresentam sintomas inespecíficos (per-
madas "animais de sangue frio", ou pecilotérmicos, da parcial de apetite, apatia) e/ou com episódios
tendo em vista que a temperatura interna desses febris prolongados. Como foi descrito anteriormen-
animais apresenta uma grande variação, já que está te, a maioria dos processos febris nas espécies
à mercê da variação ambiental. domésticas é causada por doenças infecciosas, que
A temperatura corporal dos animais é deter- são diagnosticadas com relativa facilidade através
minada pelo balanço entre o ganho de calor e sua da obtenção e avaliação cuidadosa da história clí-
respectiva perda, pelo equilíbrio entre dois meca- nica, juntamente com o exame físico do pacien-
nismos distintos chamados de termogênese (me- te. É importante, no momento da obtenção da
canismo químico que aumenta a produção de ca- anamnese, estar atento à duração e periodicida-
lor) e termólise (mecanismo físico que incrementa de do processo febril (se remitente ou intermi-
a perda de calor). A principal fonte de calor é de- tente, por exemplo); quando começou e, caso
rivada de processos metabólicos oxidativos, ou seja, possível, as variações observadas; a hora do dia
por meio de reações nas quais o oxigénio, utili- em que aparece; se houve contato com animais
zando como substrato os carboidratos, lipídios e doentes; se fez uso de vacinas ou outros produtos
Exame Físico Geral ou de Rotina 95

medicamentosos, entre outros. Em relação ao parado e nem encarado como um diagnóstico ou


exame físico geral, é de grande destaque a ava- mesmo uma doença.
liação dos linfonodos na tentativa de determinar o O exame manual da temperatura externa deve
órgão ou a região comprometida, principalmente ser executado aplicando-se o dorso das mãos so-
nos casos de febre de origem indefinida. bre diferentes áreas da superfície corporal do
animal, dando especial atenção à região abdomi-
nal e às extremidades. O dorso da mão é mais
TÉCNICAS DE AFERIÇÃO DA sensível a variações térmicas que a palma da mão.
Através desse procedimento, pode-se ter ideia da
TEMPERATURA temperatura cutânea do animal e uma estimativa
A temperatura dos animais domésticos pode ser de sua temperatura interna. A palpação da região
obtida tanto por palpação externa como, também, abdominal é importante para a constatação de
pela utilização dos chamados termómetros clíni- hipertermia, enquanto a palpação das extremida-
cos. No passado, a temperatura era avaliada colo- des do animal é mais adequada para a constata-
cando-se a mão em algumas partes do corpo, como ção de hipotermia. Além desse tipo de avaliação
o nariz, orelhas, ou, então, introduzindo-se os dois ser subjetivo, alguns fatores podem prejudicar o
dedos na boca do enfermo, o que expunha o clí- correto julgamento da temperatura real do ani-
nico a alguns riscos. O termómetro foi concebido mal, tais como:
por Santorio no século XVI, mas foi Gabriel
Fahrenheit, em 1717, quem fabricou o primeiro • Temperatura da mão do examinador: em dias
termómetro de mercúrio. O termómetro perma - muito frios, a mão do examinador poderá,
neceu um instrumento desajeitado e volumoso também, estar muito fria e, assim, o animal
até os aperfeiçoamentos introduzidos por Aitkin, parecerá estar mais quente que a realidade.
em 1852, e Thomas Allbutt que, em 1870, de- • Temperatura da pele do animal: a temperatura
senvolveu o termómetro clínico tal como se co- cutânea, ao contrário da temperatura central,
nhece hoje em dia. Mais recentemente, inven- aumenta e diminui, de acordo com a tempe
tou-se os termómetros digitais, já amplamente ratura ambiente. Assim, se o animal em exa
utilizados na rotina clínica. Apesar dos imensos me está ou ficou muito tempo sob a ação dos
avanços tecnológicos ocorridos nas últimas déca- raios solares, em horários quentes, sua pele
das, a leitura desse simples instrumento ainda traz certamente estará com a temperatura bem mais
subsídios importantes para o diagnóstico. Deve- elevada que a real. Por isso, é importante que
se ter em mente que a temperatura corporal é um a aferição da temperatura interna dos animais
dado importante a mais dentro do contexto do domésticos seja feita obedecendo alguns pre
exame clínico, não devendo ser avaliado em se- ceitos, pela utilização dos termómetros clíni
cos (Fig. 4.16).

Figura 4.19-Aferição da temperatura retal em um equino:


não esquecer de abaixar a cauda. Figura 4.20 - Termómetro clínico de mercúrio.
96 Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico

É necessário que alguns procedimentos se- duzir um terço do termómetro, sendo reali-
jam obedecidos para que se tenha uma aferição zada, de preferência, através de movimentos
adequada da temperatura retal: giratórios no esfíncter anal, deslocando-o
depois, lateralmente, para que o mesmo se
• Deve-se realizar a contenção adequada do ani mantenha em contato com a mucosa retal,
mal. É necessária maior atenção para animais caso contrário, o termómetro ficará contido
inquietos e hostis, já que os termómetros de dentro da massa fecal, o que elevará a tem-
mercúrio podem se quebrar dentro da muco peratura, devido à intensa atividade bacte-
sa retal durante um movimento abrupto ou riana. Se .houver um movimento peristáltico
uma tentativa de defesa. expulsivo, deve-se aguardar um pouco após
• Verificar se a coluna de mercúrio está em a defecação ter sido finalizada para nova afe-
seu nível inferior, antes da introdução do rição. O tempo para a medição varia entre
termómetro. Caso contrário, deve-se baixá- um e dois minutos. Para melhor segurança,
la. Os termómetros clínicos de mercúrio (Fig. execute duas medições no mesmo animal e,
4.20) são caracterizados como termómetros quando houver dúvida na temperatura obti-
de máxima, pois possuem, pouco acima do da, verifique a temperatura de outros ani-
bulbo, uma constricção na sua coluna que mais do mesmo porte que se apresentem cli-
impede, a não ser propositadamente, o re nicamente normais, para uma melhor com-
torno do mercúrio ao bulbo. Hoje os ter paração.
mómetros de mercúrio estão pouco a pou • É importante lembrar que a temperatura
co sendo substituídos pelos digitais, mais interna pode ser aferida em várias regiões
sensíveis à aferição, porém, de maior cus do corpo. A temperatura retal é a mais re-
to. Os termómetros digitais, quando intro alizada, mas se o animal apresentar um tumor
duzidos adequadamente no reto, conseguem ou uma inflamação no reto (proctite), por
indicar, em poucos segundos, por meio de exemplo, a vulva pode ser o local preferen-
um aviso sonoro, quando a temperatura cial. Em machos, o prepúcio é uma outra
atingiu o seu ponto máximo. Uma outra van opção para se aferir a temperatura. No en-
tagem é qu e não apresentam r isco d e tanto, deve-se lembrar que em ambos os
quebrarem dentro do reto e causarem da locais os valores serão inferiores àqueles
nos à sua mucosa. No entanto, a preocupa obtidos no reto.
ção que se tem com a utilização dos termó
metros digitais é que alguns, por serem As temperaturas das espécies assim relacio-
muito flexíveis em sua extremidade, impe nadas são válidas apenas para animais cm repou-
dem, eventualmente, um adequado conta- so e mantidos em ambientes com boa ventilação,
to entre o bulbo e a mucosa retal, mesmo temperatura e umidade moderadas (verificar va-
quando corretamente desviados em senti lores no início desse capítulo, em parâmetros vitais).
do lateral, o que leva à obtenção de uma Como regra geral, quanto menor a espécie ani-
temperatura irreal. O termómetro, quando mal, maior será sua temperatura em função da
não estiver sendo utilizado, deve, de pre variação da taxa metabólica. Fêmeas gestantes
ferência, ser conservado em solução anti-sép- também apresentam temperaturas maiores que
tica (álcool absoluto ou álcool iodado) e lim os animais não prenhes.
po, antes de se iniciar a medição. Guarde-
o em ambiente fresco, pois, se mantido em Características de um Bom Termómetro
temperatura ambiental elevada, o bulbo se Sensibilidade. Os de mercúrio apresentam
romperá, eliminando o mercúrio e conta coluna capilar delgada o que, algumas vezes, di-
minando, subsequentemente, o local de
ficulta a leitura. Os termómetros digitais são mais
sensíveis.
exame.
Precisão. Determinar a temperatura real com
• Antes da introdução do termómetro, lubrifi pequena margem de erro.
ca-se a extremidade (bulbo) com vaselina ou Rapidez. Atingir a temperatura real em pou-
similar (óleo mineral, pomadas hidratantes), co tempo (máximo de 2 minutos). Os termóme-
principalmente, quando a aferição vai ser rea tros digitais determinam a temperatura em me-
lizada em pequenos animais. Deve-se intro- nor tempo.
Exame Físico Geral ou de Rotina 97

Causas de Erro Sexo. Fêmeas no cio e em gestação apresen-


tam uma temperatura mais elevada.
Os principais erros de aferição da temperatura Gestação. No terço final da gestação, pode
corporal observados na rotina veterinária são ocorrer diminuição de até 0,5°C nas 24 a 48 horas
causados por: antecedentes ao parto, acompanhada, posterior-
mente, de uma discreta elevação da temperatura
L Defecação e enema recente. 2. Introdução poam durante a parturição, em virtude das contrações
profunda do termómetro no reto. ;. Pouco contato musculares e uterina.
do bulbo com a parede do reto ou contato da Estado nutrícional. Animais desnutridos ten-
mão do examinador com o bulbo. dem a apresentar uma temperatura discretamente
4. Penetração de ar no reto (quando se deixa a menor em virtude da diminuição do metabolismo
cauda erguida, por exemplo). basal. E normalmente observada em animais neo-
5. Processo inflamatório retal (proctitc). natos (particularmente cordeiros), privados da in-
6. Tempo de permanência inadequado do termó gestão de colostro ou leite, nascidos em épocas frias.
metro no reto. Tosquia. Em virtude da irritação, determina
um aumento da temperatura em até dois graus,
Glossário Semiológico que tende a cair ainda no primeiro dia.
Enema (clister). Administração de líquidos pelo i. Temperatura ambiental. Mudanças bruscas e
para fim terapêutico ou diagnóstico. acentuadas da temperatura externa são acompa-
nhadas por alterações na temperatura interna dos
animais. Equinos em ambientes quentes podem
ter variações de até 2°C. Se observado o inverso,
Fatores Fisiológicos versus a temperatura esfria. Os banhos frios fazem a
Temperatura Corporal temperatura interna dos ovinos diminuir ate 1,7"C
nas primeiras 12 horas.
Variação nictemeral(circadiana). Durante 24 ho- Esforços físicos. Fazem elevar a temperatura
ras, observa-se, em todos os animais domésticos, de maneira significativa. O retorno ao normal
variações de temperatura corporal que são deno- poderá ocorrer entre 20 c 120 minutos, depen-
minadas de variações nictemerais (do grego nix: dendo da intensidade do esforço. Quando o exer-
noite; himeral: dia). Verifica-se, em animais que cício físico é realizado no frio ou em condições
se apresentam ativos durante o dia, que a tempe- ambientais brandas, os mecanismos termoregu-
ratura interna decresce a partir da noite até o ama- ladores mantêm a temperatura corporal dentro de
nhecer, atingindo, pela manhã, a temperatura mí- variações satisfatórias. Entretanto, quando o ani-
nima, e alcançando o seu valor máximo à tarde. mal é incentivado a se exercitar em ambientes
Os animais que são ativos durante a noite apre- com temperaturas elevadas, a capacidade para a
sentam uma variação de temperatura inversa. A perda de calor é severamente prejudicada, fazendo
com que a temperatura se eleve em até 2,5°C. O
diferença entre as temperaturas matinais e ves-
exercício prolongado conduz a uma hipertermia
pertinas pode variar entre 0,5 e 1,5°G.
grave e a prejuízos na performance física.
Ingestão de alimentos. Em virtude do aumento
do metabolismo basal dos indivíduos (maior ati-
vidade das glândulas digestivas) e dos movimen-
tos mastigatórios, a temperatura pode encontrar-
GLOSSÁRIO TERMOMÉTRICO
se cerca de l a 9 décimos acima do normal após
a ingestão de alimentos. Normotermia
Ingestão de água fria. Sc ingerida em grandes Ocorre quando os valores da temperatura cor-
quantidades, promove uma redução que varia de poral do animal encontram-se dentro dos limites
.25 até 1°G. Pode ser observada com mais fre- estabelecidos para espécie.
quência em equinos.
Idade. Quanto mais jovem o animal, mais
elevada c a sua temperatura interna, em virtude Hipertermia
do centro termoregulador não estar completamente
desenvolvido e pelo elevado metabolismo que Consiste, basicamente, na^elevação da tem-
esses animais apresentam. peratura corporal, sem que haja, no entanto, uma
98 Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico

: :
:.•. ---- •
alteração no termostato hipotalâmico^) Ocorre um
Quadro 4.3 - Principais causas de hipertermia.
aumento na produção de calor, sem que haja au-
mento correspondente em sua perda (Quadro 4.3). • Temperatura ambiente e umidade do ar elevada
O termo hipertermia é usado com frequência para • Exercício
• Convulsões
caracterizar alterações de origem não inflamató- • Desidratação
ria. Assim, se administrarmos antipirético ao • Pêlos ou lã em excesso
paciente, o mesmo não terá qualquer efeito sobre • Obesidade
a hipertermia, já que o termostato não se encon- • Confinamento e/ou transporte sem ventilação adequada
tra alterado. Devemos ter em mente que a
hipertermia é um sinal de febre, mas não indica,
necessariamente, febre ou algum estado patológico. promove aumento mais acentuado de calor, sem
De todos os animais domésticos, bovinos e ovinos que haja, naquele^ momento, uma perda
parecem ser os que melhor se adaptam às elevadas correspondente. A hipertermia mista é observada
temperaturas ambientais. A abertura da cavidade quando as hipertermias de retenção e de esforço
bucal e a sudorese fazem com que esses animais ocorrem ao mesmo tempo. Se a termogênese
consigam suportar temperaturas de até 43°C. Os
(produção de calor) aumenta e a termólise (perda
cães, em virtude de sua efetiva ofegação, suportam
de calor) permanece normal, haverá hipertermia
melhor as temperaturas elevadas que os gatos, mas
por produção de calor, se a termogênese permanece
correm risco de colapso quando a temperatura retal
constante ou inalterada e a termólise é insuficiente,
alcança 41°C. Vale a pena lembrar que os animais
desidratados são mais propensos à hipertermia, haverá hipertermia por retenção de calor.
porque a perda dos fluidos teciduais por transpi- O corpo utiliza-se de vários mecanismos para
ração ou sudorese, encontrar-se-á reduzida. dissipar o excesso de calor produzido e armaze-
A hipertermia pode ser: a) de retenção de calor; nado. A perda de calor se faz principalmente no
b) de esforço; c) mista. nível dos pulmões e da pele, ambos extremamente
A hipertermia por retenção de calor dá-se quan- irrigados pelo sangue. No sistema respiratório, tem
do a irradiação e a condução de calor estão redu- importância o mecanismo de evaporação, dado que
zidas em relação à sua produção. Verifica-se, ge- o ar expirado, além de aquecido, c eliminado com
ralmente, em ambientes quentes e sem ventila- um alto teor de umidade. Na pele, a perda de calor
ção (transporte de animais em caminhões fecha- é obtida por meio de quatro mecanismos:
dos, animais estabulados). E extremamente difí-
cil para um animal perder calor quando mantido • Irradiação: resulta na transferência direta de
em clima quente e úmido, porque não ocorre res- calor por ondas cletromagnéticas (raios tér
friamento corpóreo por evaporação com eficácia. micos) para o meio ambiente mais frio.
Existem outros efeitos danosos aos animais recém- • Evaporação: consiste na transformação da água
nascidos submetidos a uma temperatura ambien- do estado líquido para o estado gasoso pela
te elevada. Como os animais neonatos produzem, superfície cutânea, vias aéreas superiores e
proporcionalmente, mais suor por quilo de peso mucosas. A importância relativa dos diferen
do que os adultos, isso pode fazer com que fiquem tes modos de perda de calor por evaporação
desidratados, tornando-os apáticos e desinteressa- nos animais domésticos varia. Nos equinos e
dos cm mamar. Um ambiente ventilado e com baixa bovinos, a sudorese é a principal forma de
umidade pode auxiliar a perda de calor corporal; perda de calor por evaporação. Os equinos,
ao passo que um ambiente com pouca ventilação por exemplo, podem perder, quando subme
e com umidade relativa elevada, pode fazer com tidos a um exercício árduo (enduro/corrida),
que a perda de calor pela sudorese se torne mais cerca de 10 a 15 litros de suor por hora. Os
difícil. Exercícios físicos extenuantes realizados ovinos e os cães dependem muito do ofego
nessas condições também podem resultar em para liberarem calor. No animal ofegante, o
aumento perigoso na temperatura corporal. Da ingurgitamento das mucosas respiratória e oral
mesma forma, quando os cães ficam fechados em e o aumento da salivação acentuam a perda
carros mantidos ao sol, sua ofegação satura o de calor pela evaporação. Mesmo nos animais
ambiente com vapor de água, impossibilitando a que não ofegam, como os equinos, a perda
perda adicional de calor. A hipertermia de esforço é de calor evaporativo pelo sistema respirató
gerada por trabalho muscular exaustivo, que rio provavelmente aumenta durante o exer
cício prolongado.
Exame Físico Geral ou de Rotina 99

Condução: a perda de calor se faz por contato liberados pelos leucócitos, macrófagos, monóci-
direto com o ambiente como pisos, paredes tos e células de Kupffer, da medula óssea, pul-
e equipamentos. Como os animais habitual- mão, fígado e baço, os quais alteram o ponto fixo
mente não permanecem em superfícies frias do centro termorregulador no hipotálamo. O
por longos períodos, a condução em geral não pirógeno endógeno parece induzir a liberação de
é uma forma significativa de perda de calor. algumas substâncias intermediárias (prostaglan-
Convecção: c o processo de perda de calor para dina E2 e monoaminas) que, então, agiriam dire-
o ar ou a água junto à superfície cutânea. Os tamente na área pré-óptica do hipotálamo, alte-
animais jovens ou pequenos deixados em um rando o termostato e aumentando seu ponto fixo
lugar frio podem perder calor rapidamente por de temperatura. Duas hipóteses são apontadas para
esse processo e devem ser protegidos de tais o envolvimento da prostaglandina E : 1. o piró-
situações. geno endógeno ^estimula a liberação do ácido
aracdônico com subsequente síntese de prosta-
glandina, alterando o ponto de equilíbrio do centro
Síndrome Febre termorregulador; 2. o efeito da aspirina e a flu-
nixina, por exemplo, que são drogas bloqueado-
\A febre (ou pirexia) é a elevação da tempe- ras da cicloxigenase, é exercido diretamente so-
ratura corporal acima de um ponto críticoí e ocor- bre o hipotálamo, inibindo a liberação de prosta-
re em decorrência do aparecimento de algumas glandina e/ou de seus precursores.
joenças, sendo, talvez, o mais antigo e o mais A febre pode originar-se de várias causas, dentre
universalmente conhecido sinal de doença. Para as quais destacam-se: a) a febre de origem séptica;
js leigos, ela é considerada como uma doença e, b) a febre asséptica; e c) a febre neurogênica.
antigamente, era o principal fator a ser tratado. Febre séptica. Gomo o próprio nome sugere,
Hoje em dia, considera-se a febre como indicati- está relacionada com um processo infeccioso. É
vo de alguma doença subjacente que, por ter várias produzida por substâncias pirogênicas de origem
origens, deve ser interpretada juntamente com microbiana. O processo infeccioso pode ser loca-
outros resultados obtidos no exame do paciente. lizado (abscesso, empiema - pus em uma cavida-
E óbvio que a febre é benéfica na maioria das de, um órgão oco ou em algum espaço do orga-
doenças, visto que a temperatura corporal eleva- nismo), ou generalizado como nos casos de sep-
da estimula a formação de anticorpos e outras ticemia. As doenças infecciosas constituem a causa
reações de defesa e impede, de certa forma, a mais frequente de elevação da temperatura, em
multiplicação excessiva de alguns microor- todas as faixas etárias. Geralmente, pensa-se logo
ganismos. Entretanto, na maioria das vezes, os seus em infecção quando o paciente está febril. Km-
efeitos são mais nocivos que benéficos, já que, bora esse tipo de pensamento seja, até certo pon-
por exemplo, a maior velocidade de todos os pro- to, correto, na grande maioria das vezes, deve-se
cessos metabólicos (em até 50%) causa rápida ter em mente que inúmeras doenças não infeccio-
depleção do glicogênio hepático e um aumento sas também podem produzir febre, ao passo que,
da utilização da proteína endógena como ener- em algumas doenças infecciosas, a febre pode não
gia, acentuando a perda de peso, além da sudore- estar presente ou ser de pouca intensidade (botu-
se agravar a perda de líquidos e de eletrólitos, oca- lismo, tétano).
sionando desidratação e desequilíbrio eletrolítico Febre asséptica. Não está relacionada com a
graves. Quando a temperatura corporal ultrapas- ocorrência de infecções e c causada por agentes
sa 42,5°C, a função celular fica seriamente preju- físicos (queimaduras), mecânicos (traumas) ou
dicada e há perda de consciência. químicos (vacinação, alergia, anafilaxia de origem
medicamentosa). A febre induzida por drogas é
relativamente comum, mas tardiamente pensada,
Patogènese da Febre principalmente nos casos de antibioticoterapia
Vários microorganismos - vírus, bactérias, fun- prolongada (anfotericina B, ampicilina). Entretanto,
gos, protozoários - e antígenos podem produzir antes de se pensar no envolvimento de uma de-
febre, são chamados de pirógenos exógenos. O terminada droga medicamentosa, deve-se pensar
pirógeno exógeno causa febre por precipitar a se está havendo resistência do agente microbiano
liberação de citocinas ou de pirógenos endóge- ao medicamento utilizado ou se o mesmo está sendo
nos (interleucina I e VI) que são armazenados e administrado em sub-dosagem. A febre por drogas
100 Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico

ocorre mais frequentemente por hipersensibilidade te pode ser observada em animais com tem-
mediada por anticorpos. Nesse caso, os leucócitos, peratura variando entre 41,5 e 42,5°C.
após fagocitose do complexo anticorpo-droga, li- • Sistema digestório: defecação reduzida, desde
beram os pirógenos endógenos. A utilização de an- que a causa da febre não tenha origem diges
tibióticos nos processos febris deve ser feita após tiva. Polidipsia compensatória.
um exame detalhado do paciente e a localização • Sistema urinário: oligúria.
do processo patológico ou o reconhecimento do pro- • Sistema nervoso: animal deprimido.
cesso mórbido, para que não venha a interferir no
estabelecimento do diagnóstico. O episódio da febre pode ser dividido em três
Febre neurogênica. Geralmente ocorre como fases:
resultado de convulsões e contrações musculares
(epilepsia, compressão do hipotálamo por neopla- 1. Ascensão ou de aparecimento (stadium incre-
sias). O traumatismo da medula espinhal, espe- menti): a fase inicial do aumento progres
cialmente no nível de região cervical, produz febre sivo da temperatura. Corresponde, na maio
de origem irregular, porafetar, provavelmente, as ria das vezes, ao período de invasão do agen
vias sensitivas e efetoras do hipotálamo. te mórbido. Quando o ponto fixo do centro
termorregulador aumenta e atinge um nível
Por que a Febre é Considerada uma Síndrome? acima do normal, todos os mecanismos para
a elevação da temperatura corporal são ati-
Apresenta, além da elevação da temperatu- vados, incluindo a conservação de calor e
ra, as seguintes alterações: o aumento de sua pr odução. O corpo se
ajusta como se aquela fosse a sua verdadeira
• Mucosas: congestão de mucosas (vasodilatação). temperatura. Com isso, ocorre vasoconstrição
Mucosas secas, sem brilho, em uma tentati periférica e o animal demonstra frio e tre
va de reter água. mores.
• Pele e focinhos: pele seca e sem brilho, foci 2. Acme("fastígio"): quando a temperatura atinge
nho seco. o seu limite máximo, determinando, até cer
• Sistema circulatório: taquicardia; aumento de to ponto, uma estabilização térmica. Os tre
10 a 15 batimentos cardíacos/min, para cada mores desaparecem.
grau elevado. Pode-se ouvir sopros cardíacos 3. Defervescência (stadium decrementi): quando
funcionais em virtude da rápida passagem do ocorre o declínio da temperatura. Pode-se
sangue pelas válvulas. observar um decréscimo por lise (queda len
• Sistema respiratório: taquipnéia. É a resposta ta e progressiva da temperatura/pode demo
do organismo com um duplo objetivo: l. perda rar alguns dias) ou por crise (a temperatura
de calor pela respiração; e 2. oferta de maior retorna ao normal em poucas horas).
volume de oxigénio às células e aos tecidos,
agora mais necessitados, em virtude das com
bustões orgânicas e eliminação de CO 2, pelo Tipos de Febre
aumento do metabolismo. Na maioria das es Existem vários tipos de febre descritos em
pécies, quando a temperatura retal atinge 41°C medicina humana, mas grande parte não se en-
a dispneia é acentuada, acompanhada de caixa nos perfis febris dos animais domésticos. De
convulsões e, posteriormente, coma. A mor- maneira geral, ocorrem os seguintes tipos:

Tabela 4.7 - Classificação da febre segundo o grau de elevação da


temperatura.

Tipo
Febrícula Febre 38 a 39°C 39,5 a 40°C 39,3 a 40°C
mediana Febre 39,1 a 40°C 40,1 a 41 °C 40,1 a 41 °C
alta Febre muito 40,1 a 41°C > 41,1 a 42°C 41 a 41,5°C
alta 41 °C >42°C > 41,5°C
Exame Físico Geral ou de Rotina 101

Simples ou típica. Acompanha os três estágios ou mesmo em casos de rupturas gástricas ou


previamente descritos, com a temperatura perma- entéricas com absorção rápida de toxinas bacte-
necendo elevada, mas flutuando dentro de pe- rianas, pode ocorrer hipotermia e colapso circu-
quenos limites (até 1°C). A temperatura perma- latório. Pode ser vista, ainda, após um período de
nece alta por vários dias, podendo cair em virtude febre muito alta, como consequência de colapso,
da recuperação ou da morte do animal. falha circulatória aguda, hemorragias graves ou,
Remitente. A temperatura permanece elevada simplesmente, devido a um período prolongado
durante grande parte do dia (geralmente maior de inanição. Os animais neonatos são particu-
do que 1°C), caindo em intervalos de tempo curtos larmente suscetíveis às hipotermias ambiental e
e irregulares, sem voltar aos valores normais. nutricional. Isso é mais facilmente observado
Intermitente. Os períodos de pirexia perduram quando os animais nascem em épocas frias e a
por um ou vários dias, sendo intercalados por ingestão de colostro e/ou de leite é demorada ou
períodos normotérmicos ou mesmo hipotérmicos. quando não é realizada. Os bezerros e os potros
Atípica. Apresenta um curso irregular, às ve- suportam melhor a hipotermia causada por inanição
zes com grandes oscilações de temperatura em e/ou ambientes frios que os leitões. A hipotermia
um mesmo dia. Nos casos de adenite equina, por é a maior causa de óbito de ovinos na Inglaterra
exemplo, a febre pode ter um padrão bifásico e, em virtude da hipoglicemia causada pelo não
em outras, pode haver quatro ou cinco picos fe- ingestão de colostro. O risco de morte em animais
bris, com ou sem períodos de apirexia, em um com hipotermia varia de espécie para espécie.
mesmo dia (septicemias, processos supurativos). Finalizado o exame físico geral, deve-se fa-
zer um breve resumo das conclusões relativas às
informações obtidas durante a anamnese, na ava-
Intensidade do Processo Febril liação da postura, do comportamento, do estado
nutricional, da condição física, das frequências
Segundo o grau de elevação da temperatura,
respiratória e cardíaca, das características dos lin-
a febre pode ser classificada em: febrícula, medi-
fonodos e da coloração de mucosas, bem como da
anamente alta, alta e muito alta, como demons-
temperatura retal, respondendo a duas pergun-
trado em algumas espécies (Tabela 4.7).
tas básicas iniciais:
Em todos os casos, o retorno da temperatura
deve ser acompanhado pela normalização do pul- 1. Como está a saúde geral do animal (leve,
so ou da frequência cardíaca, já que é um excelen- moderada ou gravemente alterada)?
te parâmetro para avaliar a evolução do processo 2. O provável local da doença é a pele, o tecido
febril. Se a queda da temperatura for acompanha- subcutâneo, o sistema linfático, o sistema car
- . nela diminuição do pulso e da frequência res- díaco, o sistema respiratório, o sistema diges-
piratória, esse tipo de declínio tem significado tório, o sistema genitourinário, o sistema lo-
favorável, já que conduz à melhora do estado geral comotor ou o sistema nervoso central?
ao animal. Se a diminuição da temperatura para os
limites normais ocorrer, mas o pulso e a frequên-
cia respiratória permanecerem elevadas, isso é in- BIBLIOGRAFIA
dicativo de colapso circulatório, com prognóstico
reservado. Entretanto, nos casos em que a tempe- BRAZ, M.B. Semiologia Médica Animal. 2.ed. v.2., Lisboa:
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