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Luzes apagadas
De Manjula Padmanabhan
Tradução de Manoela Wolff
Personagens:
Frieda
Bhasker
Leela
Mohan
Naina
Surinder
Uma nota para a personagem de FRIEDA: ela permanece constantemente à vista, fazendo
seus deveres de uma maneira muda e sem exigências. Os outros personagens não prestam
atenção nela exceto para lhe dar ordens. Quando ela está fazendo nenhuma tarefa específica,
ela pode ser vista se movendo pela cozinha. Ao público deve ser permitido imaginar o que ela
pensa.
CENA UM
BHASKER: Frieda? (uma vez acomodado) Frieda! (não espera uma resposta). Onde está meu chá?
Ela aparece da cozinha, já carregando a bandeja, completa com o abafador de chá e uma xícara, caminhando
lentamente. Leela aparece na porta do quarto à direita do palco. Ela parece não ter trocado o seu cafetã desde a
manhã. Ela fica parada encarando Bhasker, tensa de ansiedade. Mas ele está imerso em seu jornal e não a
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percebe.
Frieda acomoda a bandeja de chá em uma mesa baixa ao lado do sofá. Ela se curva, servindo o chá, já
misturado com leite, nas xícaras. Adiciona açúcar e mexe. Quando acaba, volta para a cozinha. Suas
atividades passam despercebidas pelos outros dois.
LEELA (encara-o e então enterra a cabeça nas mãos): Não! Você não fez!
BHASKER: O quê?
LEELA: De novo?
LEELA: Esquecer?
BHASKER (faz uma careta): Ah, pelo amor de deus! (voltando ao jornal). Você ainda está
preocupada com aquilo?
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LEELA: Você não se importa com o que eu sinto, com o que eu passo todo dia!
BHASKER: Mas não há nada do que se ter medo! Eles não podem te machucar-
LEELA (ignorando-o): Primeiro era só na hora em que estava acontecendo. Depois, assim que
escurecia. Depois, na hora do chá, quando as crianças chegavam em casa da escola. Depois no
meio do dia, quando quer que a campainha tocasse. Depois, de manhã, quando eu mandava as
crianças para a escola. E agora - do momento em que eu acordo…
LEELA: Não estou! É como uma bola dura, apertada, bem… aqui (ela segura a garganta)
BHASKER (parecendo preocupado): Dor? Você está com dor?
LEELA: Eu carrego essa coisa comigo o dia todo. Às vezes é como um xale que se enrola em
meus ombros e eu começo a tremer.
LEELA: Eu sei, eu sei - você me disse que eles não estão interessados em casos como esses,
eles não se importam com pequenos delitos menores - mas – mas – eu estou com medo! Você
não consegue ver? Isso não é suficiente?
BHASKER: Vá dizer à polícia que você está com medo de barulhos no prédio ao lado! Eles
vão rir na sua cara!
LEELA: Quando você estava fora viajando, eu não conseguia dormir à noite! E com todas as
janelas fechadas, todas as cortinas puxadas, com algodão nos meus ouvidos - o som ainda
passava! Mesmo no quarto das crianças, do outro lado da casa, eu conseguia ouvir!
LEELA (apertando os braços em volta de si mesma): E eu estou com medo, eu estou com medo!
BHASKER (tentando segurá-la outra vez) Acalme-se, agora, acalme-se. Realmente não vale tudo
isso.
BHASKER: Nenhuma ideia (claramente perdendo o interesse. Procura ao redor pelo jornal.)
LEELA: Que nós somos parte do… do que acontece lá fora. Que por assistir, nós estamos
nos tornando responsáveis-
LEELA: Nós nem mesmo realmente assistimos, assistimos? Eu quero dizer, eu não. Pausa.
Mas… você assiste! Você assiste!
BHASKER (distraído, não olhando para ela): Sim. Quero dizer, eu assisti. Uma ou duas vezes.
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LEELA: E é… terrível?
LEELA (tocando as orelhas pateticamente): Eu não preciso nem assistir! Os sons são ruins o
suficiente! (pausa) E… você tem certeza que nós não podemos chamar a polícia? Agora mesmo,
só uma vez?
BHASKER (exasperado, baixando novamente o jornal): Leela, se nós ligássemos agora, o que
diríamos?
LEELA (animada): Nós podíamos contar pra eles tudo! Que tem um prédio em construção ao
lado e que toda noite no complexo…
BHASKER: Espere! Primeiro eles nos perguntariam, ‘Qual é a reclamação?’ e nós teríamos
que dizer -
LEELA: Que nós estamos com medo! Que nós estamos gravemente perturbados!
BHASKER: Não, isso não é suficiente, você não vê? Se a polícia tivesse que se preocupar com
coisas como essa eles seriam psiquiatras, não policiais.
BHASKER: Mas aí eles nos perguntariam, ‘Por que vocês não nos ligaram ontem à noite?’
LEELA: Nós podíamos dizer que… que nós só agora conseguimos nossa conexão
telefônica...
BHASKER: E eles diriam, ‘Senhora, seu bairro tem telefones desde 1968!’ E em todo caso - e
os vizinhos?
BHASKER: Huh! Neste caso, a polícia obviamente ignorou as reclamações! Então por que nós
deveríamos gastar um telefonema?
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LEELA: Porque… porque eu estou com medo! Eu não posso mais suportar isso!
BHASKER (como para uma criança): Mas sons não podem te machucar…
BHASKER: Então feche os ouvidos, vê? Assim - (coloca as mãos sobre as orelhas dela). Aí está!
Assim está melhor?
LEELA (debatendo-se dentro do seu meio-abraço): Mas os sons deles vêm pra dentro, pra dentro da
minha casa agradável e limpa, e eu não posso empurrá-los para fora! (para de se debater.) Se ao
menos eles não fizessem tanta algazarra, eu não me importaria tanto! (Pausa durante a qual
Bhasker a embala gentilmente) Por que eles têm que fazer isso aqui? Por que não podem ir para
qualquer outro lugar?
BHASKER (inspirando profundamente): Leela, a coisa a se fazer é não deixar que eles te
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LEELA: Mas como? Eu não posso evitar ouvi-los! Eles são tão - tão barulhentos! E rudes! Como
eu posso me fazer de surda apenas para eles!
BHASKER (soltando-a): Mas veja - Eu não sou surdo e eu não sou perturbado por eles!
BHASKER: Eu não sei, realmente. Eu não os permito, eu suponho. É o que eles querem,
você vê, eles querem te aborrecer, eles querem te amedrontar, e - você não vê?- quando você
fica com medo você está jogando o jogo deles, fazendo o que eles querem…
LEELA: Mas como eu posso apenas parar! Eu não quero me sentir desse jeito! Quem
gostaria?
LEELA: Bem, eu não. Eu me sinto horrível, eu me sinto enjoada. Eu mal consigo comer, eu
me sinto tão enjoada.
BHASKER: Você precisa aprender a relaxar. A coisa mais importante é não ceder a eles.
LEELA: Eu não consigo relaxar. Não enquanto isso estiver acontecendo toda noite!
BHASKER: Farei o seguinte - Eu ligarei pra eles hoje à noite, enquanto está acontecendo.
Afinal, não é como filme ou algo do gênero, não há garantia de que acontecerá hoje à noite!
LEELA: Eu tenho certeza que vai - é claro! Por que pararia hoje à noite? (pausa) E - e eles vão
vir, não vão?
BHASKER: Quem?
LEELA: Não, nem mesmo diga, eu não vou aguentar se eles não vierem!
BHASKER: Você nunca sabe com a polícia nos dias de hoje. Eles podem dizer que não tem
nada a ver conosco, o que acontece no complexo vizinho. Afinal, tem o vigia…
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LEELA: Mas os donos não estão lá. O prédio recém foi construído - certamente qualquer um
pode ver isso? Tem todos os quartos e janelas e luzes, mas não há ninguém vivendo lá ainda,
então não há ninguém para assistir o que acontece ali. Exceto nós.
BHASKER: E o vigia.
LEELA: Quando a polícia vier eles poderão ver o quão terrível é tudo isso, como isso tem
invadido as nossas vidas, nossos lares, como nós não podemos receber convidados para jantar
-
LEELA: Mas nós não temos recebido, não por duas semanas -
LEELA: Não! É isso. Eu não consigo imaginar deixar mais alguém ver tudo isso.
BHASKER (respira profundamente e precipita-se adiante): Bem - de qualquer maneira. Tem alguém
vindo hoje à noite.
LEELA: Quem? Ah… Seu amigo de Delhi! (pausa, então pânico repentino). Mas - o que faremos
em relação a...?
LEELA (agarrando-o) Não! Não! O som vai me deixar tensa, eu não consigo suportar nenhum
som mais!
BHASKER: Leela, Leela - você não deve reagir assim, você não vê?
LEELA: Ah, mas por quê? Por que fariam isso? Eles não me conhecem! O que eu fiz pra eles?
BHASKER: Meu bem, você deve aprender a ignorar isso agora, eu insisto.
LEELA: Eu estou. Eu estou me concentrando com toda a minha força - mas não funciona -
BHASKER: Por que você não vai ver seu professor de yoga novamente?
LEELA: Se demanda tanto esforço ignorar alguma coisa, não é a mesma coisa que não a
ignorar?
BHASKER: Não, porque no seu caso, ao não ignorá-la, você está sendo perturbada, e isso é
errado. Você não deve deixar coisas te perturbarem. O que o seu professor de yoga disse? Que
a sua mente deve ser como uma-?
LEELA: Como uma fresca, limpa poça d’água, através da qual meus pensamentos conseguem
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LEELA: Eu estava, eu realmente estava. Eu fiz exatamente o que o meu guruji me disse. Eu
sentei em uma almofada, ali junto à janela e eu tornei minha mente um espaço em branco. Eu
pensei em uma parede branca, com nada escrito nela. E eu pensei no cosmos, e na minha
respiração, entrando (ela inspira bruscamente)... e saindo (ela expira)... entrando… e saindo…
entrando… e saindo. E em minha mente eu disse… Om… de novo e de novo… Om…
Om… até que a minha mente se tornou absolutamente quieta, absolutamente calma… Om…
Om… Om… (Assim que ela começa a entrar em um estado calmo tipo-transe, Bhasker, com óbvio alívio,
silenciosamente volta para o seu jornal. Por alguns segundos tudo que se ouve é o som da meditação de Leela e o
ocasional farfalhar do jornal. De repente a campainha toca estridentemente) Ahhh! (saindo do transe em um
tranco violento) Qu-quem é! O que - o que está acontecendo? Frieda? Oh!
Frieda aparece da cozinha caminhando em direção à porta com um balde para leite, contando trocados na mão.
Frieda acerta as contas na porta e retorna para a cozinha, ainda contando os trocados.
LEELA (meio-soluçando): Você vê? Você vê? É isso que acontece, é por isso que eu não consigo
meditar! Tem sempre alguma coisa vindo e me perturbando!
BHASKER: Shhh, shhh, agora! Nós teremos que tentar de novo hoje à noite, enquanto a
coisa está de fato acontecendo.
BHASKER: Mas esse é o momento, não é? Você deve ter a habilidade de barrar qualquer tipo
de distração, especialmente enquanto está acontecendo. Caso contrário - qual o objetivo?
LEELA: Eu… Eu suponho que você esteja certo. Eu só terei que tentar mais arduamente
(mudando de rumo). Seu amigo, Mohan, ele ficará para o jantar?
BHASKER: O que for - eu quero dizer, ele não é exigente (alonga-se, bocejando). Mmhh! O que
você acha de … parathas?
A luz diminui.
CENA DOIS
Leela, vestida para a noite, segurando um drink, senta no sofá. Ela olha o relógio com ansiedade. Bhasker está
perdendo tempo com o sistema de som no divisor-de-salas-com-bar. A campainha toca, sobressaltando Leela,
fazendo-a derramar a bebida. Bhasker vai até a porta, abre-a.
Mohan acena uma saudação, e assim que Leela o reconhece, força-se a sorrir.
MOHAN: Sim -
MOHAN: E como você está? (parado formalmente enquanto Bhasker hesita atrás dele).
LEELA: (com um sorriso afetado): Ah… bem! (com um gesto, convida-o a sentar.) E você?
MOHAN: Obrigado, sim (se encosta na poltrona mais próxima, mas olha para onde Bhasker está)
LEELA: De manhã?
BHASKER: Soda?
MOHAN (para Bhasker):... obrigado - e gelo… obrigado (Bhasker acena, preparando também o seu
drink. Mohan dá a volta na cadeira e senta, sorrindo brilhante para Leela) Então? Estou tentando me
lembrar qual a última vez que nos encontramos -
LEELA (empurrando uma tigela de amendoins para Mohan): Por favor! Sirva-se -
MOHAN: Saúde!
Eles tomam um gole dos seus drinks. Leela se recosta, tensa, olha o relógio. Mohan a vê. Há um silêncio após
o qual cada um deles abre a boca para dizer algo, causando a irrupção de envergonhados risos abafados. Leela
transforma o dela em uma tosse. Bhasker olha para Mohan no lado oposto, Leela olha novamente o relógio, de
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relance.
LEELA (com os olhos saltando do rosto): Você - você contou pra ele?
BHASKER (suavemente): Querida, eu tive que - afinal, ele está fadado a perceber, quando
começar -
LEELA: Mas então - por que ele veio! (virando-se para Mohan) Por que você veio, sabendo que
algo horrível aconteceria?
LEELA (ela não está se divertindo): Mas por quê! Por que ver essas coisas terríveis a não ser que
você seja obrigado!
MOHAN (mais seriamente): Eu quero dizer, com que frequência você pode parar e assistir a
(rápida olhadela para Bhasker) um crime sendo cometido bem na sua frente?
MOHAN: Ou está acontecendo com alguém que você conhece e você precisa se envolver…
MOHAN: Mas isso! Longe o suficiente para não se envolver, e perto o suficiente para ver
tudo claramente. Ou é o que Bhasker me diz.
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LEELA: Mas é tão amedrontador - você não vai ficar com medo?
LEELA: Deles! Eles são tão terríveis, as coisas que eles fazem.
MOHAN: Mas eles estão tão distantes, como eles podem me machucar?
MOHAN: Oh, eu entendo - afinal, não é exatamente algo para uma mulher.
LEELA (consternada): Vocês também não deveriam assistir, vocês sabem! Vocês realmente não
deviam!
BHASKER (com um sorriso irônico): Alguém disse a Leela que assistir a um crime e não fazer
nada é estar - o quê? Envolvido nele você mesmo?
BHASKER: Exatamente o que eu disse. Eles estão lá e você está aqui. Qual é a conexão?
LEELA: Sushila disse - se você pode parar um crime, você deve - caso contrário você está
ajudando ele a acontecer…
BHASKER: E ela é!
MOHAN: Esses intelectuais sempre reagem desse jeito, sempre confundem problemas
simples. Afinal, qual é o mal em simplesmente assistir alguma coisa? Mesmo quando há um
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acidente na rua, todos nós não viramos nossas cabeças para olhar?
BHASKER: Mas Leela, supondo que você sofreu um acidente na estrada e ninguém olhou, e
daí? O que aconteceria a você? Como você conseguiria ajuda?
MOHAN: Sim - você vê? É antinatural não olhar. É antinatural não se envolver -
LEELA (gesticulando em direção à janela): Mas eu ficaria com medo demais para ir em auxílio
deles!
BHASKER: Além do mais - você é quem quer que essa coisa pare…
LEELA (bastante firme sobre seu posicionamento): Eu quero que a polícia venha e tire eles daqui. Eu
não quero ir lá eu mesma!
MOHAN: Ou são só generalizados? Isso importa, você sabe. Afinal - isso poderia ser só, você
sabe, drama -
BHASKER: Quem pode dizer! Com essas pessoas lá fora, ninguém pode dizer por que elas
fazem o que fazem!
BHASKER: Você ouvirá você mesmo em um minuto. Por que perder tempo falando sobre
isso?
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MOHAN: Isso nos dá uma oportunidade de comparar a versão de Leela com a coisa real.
BHASKER: Mas é uma pessoa diferente toda noite, então como você pode fazer uma
comparação?
BHASKER (dá de ombros): Você sabe como é isso - todos eles lá fora parecem exatamente os
mesmos.
MOHAN: Então como você pode dizer que é uma pessoa diferente?
MOHAN: De qualquer forma, voltando à questão. Vamos nos restringir ao caso da noite
passada… era uma voz aguda?
MOHAN: Ou pra colocar de forma diferente, havia nela uma ponta de histeria?
BHASKER: Leela viveu uma vida muito calma até agora - tudo isso é muito novo para ela!
MOHAN: ...Como eu devo descrever o que quero dizer? Havia… Okay! Era, por exemplo,
como a voz de uma cantora, aguda e doce? Era musical?
MOHAN: Sim?
MOHAN: Gorgolejante?
LEELA: Sim, e rouca, como se… quem quer que fosse estivesse com um resfriado ou algo
assim.
MOHAN: Essa é uma pista importante. Talvez a vítima esteja sempre um pouco doente?
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BHASKER: Bem, você sabe, depois que você está gritando por um tempo, eu acho… eu
quero dizer, talvez… uh… a garganta fique dolorida? É claro - eu não saberia realmente, eu
mesmo.
MOHAN: É claro.... mas, o que você sugere é, talvez o catarro se forme e então -
BHASKER: E tem uma razoável quantidade de choro, você sabe, então lágrimas também,
além do catarro.
BHASKER: Bem, sim, eu acho que sim. Soa como choro pelo menos.
MOHAN: Bem, bem, rouquidão, gorgolejo, choro - nós estamos conseguindo uma imagem
mais clara das coisas agora.
LEELA (com medo): E se eles estão realmente gritando por socorro, se é mesmo autêntico,
então… isso significa que nós mesmos devemos ir salvá-los?
MOHAN: Não, é claro que não. Nada está provado ainda, exceto que os gritos são, bem
possivelmente, autênticos. Ou ao menos soam autênticos…
MOHAN: B-e-m… (ainda não bem convencido do que está dizendo) não realmente - afinal, supondo
que os gritos são genuínos, mas eles não querem ajuda?
LEELA (de forma infeliz): Eu acho que sempre que alguém realmente grita, deve ser por ajuda.
Do contrário - por que gritar?
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MOHAN: Oh, bem! Quanta ingenuidade! Pessoas gritam pelas mais variadas razões!
BHASKER (mudando de terreno): Porque elas estão com medo de pesadelos, por exemplo…
LEELA (afobada): Porque… é tão… eu quero dizer… o choro, o gorgolejo - tudo soa tão
amedrontador, simplesmente não pode ser por prazer -
MOHAN: Bem, tudo certo, nós vamos descartar o prazer no momento. Entretanto… (pausa
para refletir);
LEELA: O que?
MOHAN: A menos que eles efetivamente chamem por ajuda, é nossa obrigação ir? Essa é a
questão!
BHASKER: Essas pessoas não dizem exatamente muitas palavras - é tudo bastante
inarticulado.
MOHAN: Afinal, pode ser algo privado, uma briga doméstica; como podemos intervir?
BHASKER: Não é provável que seja algo doméstico. Eu quero dizer… Eles têm todos
aproximadamente a mesma idade, eu diria, não são pais, nem jovens - e dificilmente há
qualquer conversa no todo -
MOHAN: Pessoalmente, eu sou contra me enredar na vida privada das outras pessoas.
Estranhos nunca podem realmente ser o juiz de quem está certo e quem está errado.
MOHAN: Bem… eu não sei - quero dizer, eu não gosto de me envolver. A menos, é claro…
BHASKER: Não, não! Digo, a vítima está se contorcendo e se movendo mesmo no final.
MOHAN: Bem, então, a menos que seja assassinato, eu não acho que ninguém deva ficar
entre os membros de uma família.
MOHAN: Mmmm… bem, isso é muito mais difícil… afinal, o que vamos descrever como
tortura? É um termo muito vago, eu sempre senti.
LEELA (estranhamente confiante): Bem, sempre há um propósito por trás da tortura, não é? Eu
quero dizer, a polícia ou alguma coisa, tentando conseguir informação de alguém… Eu digo,
não é apenas aleatório e repugnante, não é?
BHASKER: Geralmente… Mas aí eu me lembro de ter lido na revista Time muitos anos atrás,
sobre uma família que torturou alguém apenas pela diversão. Uma simples e simpática família
de classe-média Americana.
MOHAN: Imagine!
BHASKER: Mas Leela está certa - eu também não acho que seja tortura.
BHASKER: Eu não sei, afinal, tortura, mesmo quando agrada aos torturadores, é
normalmente… de alguma forma… mais… qual é a palavra?
MOHAN: Digna?
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BHASKER: É isso, eu acho, controlada! Enquanto que, aqui, se sente que não há controle ou
decência em absoluto. Abandono selvagem é mais próximo.
BHASKER: Exatamente - mas nestes dias você não consegue imaginar sair a céu aberto e
torturar alguém, consegue?
LEELA: … na frente de decentes pessoas comuns como nós! Realmente, é terrível que tais
coisas sejam permitidas.
MOHAN: Vocês supõem que eles saibam que vocês podem ver?
LEELA: Eles não teriam feito isso a não ser que quisessem que assistíssemos!
MOHAN: Pediram que desligassem as luzes? Tem alguém em contato com o porta-voz deles
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então?
LEELA (fazendo uma careta): Não, não! Quem falaria com essas criaturas?
LEELA: Todos os que deixaram as luzes acesas têm tido suas janelas quebradas.
MOHAN: Quebradas! Mas isso é terrível! Eles podem ser processados por isso!
MOHAN: Apenas uma? Mas mesmo assim! Vocês devem reclamar sobre isso! É um ultraje!
Vocês devem chamar a polícia!
BHASKER: Você sabe como é nesses bairros - não dá pra manter segredo de ninguém -
MOHAN: Eu digo, se eles vão ser agressivos, então onde fica a questão de ir em seu auxílio?
MOHAN: Elas podem pensar que vão conseguir ajuda mais rápido desse jeito.
MOHAN: Seguradas?
BHASKER: Eu quero dizer, você sabe, os agressores. Normalmente há uns quatro deles.
LEELA: Oh não! Eu não gosto mesmo que vocês falem sobre isso!
MOHAN (virando-se para Leela com interesse): Você realmente nunca viu?
LEELA: Eu? Não! Nunca! Como eu poderia? Isso me deixaria doente por semanas!
MOHAN: A imagem está se tornando mais clara - então há vítimas diferentes todos os dias -
BHASKER: Você que o diga, nós não podemos ter certeza disso!
MOHAN: O quê?
MOHAN: Ah sim, eu acho que você mencionou isso pra mim mais cedo - mas então, no que
a questão das roupas importa?
LEELA: Oh, mas por que, por que estamos falando de tais coisas!
MOHAN: Mas Leela - nós devemos, do contrário como podemos saber se ajudamos ou não a
vítima?
MOHAN: Então você diria que as vítimas são, em geral, pessoas pobres?
BHASKER: Definitivamente!
BHASKER: Eu quero dizer, eles não são ricos. As roupas deles são, você sabe, calças
rasgadas, camisetas, esse tipo de coisa -
MOHAN: Bem, enquanto forem pobres atacando pobres (ele se perde significantemente)... vocês
sabem como é… eles vivem a vida deles e nós a nossa.
BHASKER (incerto): Ainda há o problema, vocês sabem, do porquê eles fazem isso dessa
forma, regularmente, sob as luzes e tudo.
MOHAN: Sim, essa é uma característica estranha. Mas - você sabe – acabo de me dar conta de
uma coisa (ele parece repentinamente animado).
BHASKER: O quê?
MOHAN: Eu quero dizer, algum tipo de, vocês sabem, pedras esculpidas, ou estatuetas, ou -
ou - qualquer coisa?
MOHAN: Mas - vocês não vêem? Isso explicaria por que ninguém sai em auxílio das vítimas -
porque, é claro, se é algo religioso, ninguém pode interferir, nem mesmo a polícia.
BHASKER (considerando a questão): Isso é verdade, é claro. Se é religioso, então não há como
parar a coisa. Condição de liberdade religiosa e tudo isso.
BHASKER: Ninguém mais pode dizer o que é ou não é bom. A religião dos outros é assunto
dos outros.
MOHAN: Você vê, Leela, o que quero dizer é que se trata de uma questão de gosto. O que
soa celestial para uma pessoa pode soar infernal para outra!
MOHAN: Talvez para eles é isso que soa celestial! Quem pode dizer, hoje em dia? Tem de
todos os tipos.
BHASKER (dando a volta): Sim, realmente. Quem pode dizer? Esse é um ponto muito bom,
Mohan, muito bom. Ele explica muito!
MOHAN: Especialmente por que a polícia não foi chamada. Ou se foi, por que ela não fez
nada. Você pode imaginar o tumulto se eles tivessem tentado parar um rito religioso?
LEELA: Mas mesmo que seja algo religioso, não pode ser parado? Se eles estão fazendo algo
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realmente horrível?
MOHAN: Esse é todo o objetivo de ser uma nação secular! Ninguém tem o direito de decidir
que isso é horrível e aquilo não é!
MOHAN: Ah, mas isso é porque até agora você não tinha se dado conta da natureza sagrada
do espetáculo!
LEELA: Mas e quanto às vítimas? Certamente as suas sensibilidades estão sendo ofendidas?
BHASKER: Eu não tenho mais nem certeza se ainda as podemos chamar de vítimas! No
máximo elas sentem dor. Isso não é o mesmo que ser uma vítima.
MOHAN: Não se é em nome da religião. Veja os sadhus? Eles sentam voluntariamente sobre
pregos ou atravessam carvões em chamas. Veja os dias de jejum? A flagelação com facas?
LEELA: Mas essas são pessoas fazendo coisas em si mesmas, enquanto que aqui… são quatro
pessoas se unindo contra uma vítima, a qual, nós concordamos, está genuinamente gritando…
LEELA (sem convicção): Mas isso é diferente… isso é, você sabe, pais tem alguns direitos sobre
os seus filhos -
LEELA: Qual?
MOHAN: Você tem certeza que não há nenhum objeto incomum ao redor?
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BHASKER: Espere um minuto - eu entendo seu objetivo! Você quer dizer… objetos
ritualísticos - relíquias, estátuas, ídolos - esse tipo de coisa?
MOHAN: Exato! É justamente sobre isso que eu estava me perguntando. Parece estranho
pensar em uma cerimônia religiosa sem nenhum desses elementos -
BHASKER (confiante): Não, por quê? As religiões que nos são familiares têm esse tipo de
coisas, mas talvez esse seja um tipo completamente novo de fé? O Culto dos Fisiculturistas -
LEELA (incerta): Isso explicaria por que eles estão pelados, então?
MOHAN: Sim - e talvez o barbarismo também. Novos cultos podem ser bem violentos de
início - especialmente nos ritos de iniciação.
BHASKER: Sim! E isso explicaria porque tem uma nova vít - uh, iniciante - toda vez.
BHASKER: Provavelmente leva algum tempo até que uma religião alcance a fase dos hinos e
cantos -
MOHAN: Afinal, se nós criticarmos os outros, eles podem nos criticar - e então onde
estaríamos?
LEELA: Mas nós todos somos boas pessoas, o que nós fizemos de errado? Nós não corremos
por aí, gritando nus, no meio da noite -
BHASKER: Leela, Leela! Nós não devemos julgar os outros, nós não devemos mostrar
preconceito -
LEELA: Onde está o preconceito? Eu estava apenas descrevendo o que acontece do lado de
fora da nossa casa todas as noites - é isso que temos feito pela última meia hora, todos nós!
BHASKER: Mas até agora nós não tínhamos entendido o que estávamos descrevendo. Agora
que nós adivinhamos, nós não podemos mais usar palavras como ‘correndo por aí nus no
meio da noite’. Isso soa tão crítico e julgador!
Enquanto Bhasker fala, um som fraco é ouvido do lado de fora. Deve ser indistinto o suficiente para que o
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BHASKER: Supondo que eu descreva a Santa Missa dos católicos como ‘comer hóstias’ ou
um Abhishekam como ‘jogando líquidos sobre um pedaço de pedra’?... As pessoas não se
sentiriam insultadas?
MOHAN (cortando-o) Shh! Espere um minuto! O que é isso que eu ouço? (os outros fazem silêncio)
Isso não são eles? Não é hora de começar?
LEELA (escutando) Sim. É sim. (ficando em pé, chamando pela Frieda) Frieda? Traga umas velas!
Desligue as luzes! Puxe as cortinas! (virando-se para os outros dois) Venham! O jantar está na mesa.
Vamos comer.
Durante os últimos dez minutos Frieda esteve preparando a mesa de jantar, lenta e metodicamente. Na hora
em que Leela anuncia que a refeição está pronta, a mesa está posta. Enquanto Leela, Bhasker e Mohan se
movimentam para os fundos, a luz diminui, e fecha a cortina.
CENA TRÊS
A cena reabre em uma sala de jantar escurecida. A mesa de jantar está em primeiro plano. Todas as luzes
elétricas estão desligadas. Bhasker, Leela e Mohan estão comendo na mesa, sobre a qual algumas velas estão
acesas. Há uma vela na cozinha. As cortinas da janela foram fechadas, mas a luz do lado de fora da janela é
potente o suficiente para iluminar o espaço. Vindo de fora da janela também podem ser ouvidos os
inconfundíveis sons de uma mulher gritando por ajuda. Assim como no relato feito, o som é realmente rasgado e
desagradável. Inicialmente, devem ser vigorosos e determinados - com palavras distintas como - ‘me soltem’,
‘socorro!’, entre outros - mas à medida que a noite avança eles se degeneram em gritos generalizados, soluços,
com uma irregularidade beirando o cansaço. A mulher que grita vai ficando exausta, soluçando até parar, e
então começa novamente com vigor renovado, como em resposta a uma nova agressão. Os gritos devem ser
cuidadosamente regulados para se encaixar dentro do ritmo do diálogo na sala, mas não devem parecer
controlados por ele. A conversa responde aos gritos, e não o contrário. A intensidade dos gritos deve ser mantida
com precisão, não tão alta a ponto de parecer logo fora da janela, nem tão suave que possa ser ignorada.
Ambos olham para Leela, que não comeu nada e tem os olhos pesados de tensão.
LEELA (abruptamente): Vocês sabem - eu não me importo sobre o que é isso! Religião ou não -
eu odeio esse som! Eu odeio!
MOHAN: Não, eu entendo o que ela quer dizer, Bhasker. O som real disso é desagradável. Me
deixa com os dentes trincando.
BHASKER: Isso continuará agora por pelo menos mais uma meia hora…
LEELA: Vocês que sabem. (ela procura por Frieda) Frieda, as crianças jantaram?
MOHAN: Eu achei que você tinha dito que elas estavam dormindo.
LEELA: Eu as mantenho trancadas no quarto de hóspedes, para que elas não consigam ver
essa coisa. Normalmente, elas caem no sono antes de comer o jantar-
LEELA: Não! Isso eu absolutamente não vou permitir - quaisquer que sejam as leis seculares
desse país, eu não permitirei que meus filhos sejam prejudicados com essas visões
repugnantes!
LEELA: Eu não me importo com o que seja, cerimônia religiosa ou não! Tudo que eu sei é
que isso é chocante e deveria ser impedido!
MOHAN: Além do mais, e o mal que elas sofrem por estarem aprisionadas em um quartinho
a noite toda?
LEELA: Eu não me importo com o que seja. Enquanto isso estiver acontecendo, elas vão ficar
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BHASKER: Você preferiria que as crianças se tornassem vegetais estúpidos do que que eles -
LEELA: Não - ninguém! Pode ser alguma coisa horrível! A Frieda deveria abrir a porta ou
não?
BHASKER: Diga-lhe que coloque a corrente, e então veja quem é - não há razão em correr
riscos!
LEELA: Frieda? Coloque a corrente! Não deixe ninguém entrar (a campainha toca novamente)
Ooh!
Frieda, tendo aberto a porta cautelosamente, vê a visitante, então fica de lado para deixá-la entrar. Entra
Naina. Sua aparição coincide com uma relativa calmaria nos gritos.
LEELA: É Naina!
Frieda já está perto da cozinha. Olha de lado para a mesa, aguardando instruções.
LEELA: Por favor, sente-se Naina… Eu pedirei a Frieda que traga pratos. Mas onde está
Surinder?
NAINA: Não - mesmo, Leela! Não se incomode, nós pensamos em aproveitar a oportunidade
-
NAINA: Faz tanto tempo desde que demos uma passada! Lembra? A última vez foi quando
(ela olha em volta, percebendo as luzes pela primeira vez) que engraçado! Havia uma queda de energia
também!
LEELA (sem pensar): Não é uma queda de energia! (ela para repentinamente)
NAINA (risonha): Então por que as velas? Aniversário de alguém? (olha claramente para Mohan, a
quem ela não foi apresentada.)
MOHAN: Olá.
BHASKER: Ele terá que andar uma boa distância. Não há nenhum lugar perto daqui.
LEELA (tentando desesperadamente disfarçar o som): Então - então - como estão as coisas, Naina?
NAINA: Oh, bem! Eu queria trazer Shashi, você sabe, mas eu pensei que as crianças deveriam
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LEELA (rapidamente): Sim, elas estão indo pra cama cedo nesses dias.
NAINA (surpresa): Ele não falou com você ontem? Ele está se demitindo -
BHASKER: Oh - uh - sim… mas ele… uh, ele mencionou - alguma coisa sobre - planos de
expansão -
BHASKER (levantando a voz): Talvez eu esteja confundindo ele com outra pessoa - oh! Eu sei
quem! É o -
NAINA: Esse… (vira-se para a janela, então de volta para os outros) Vocês não ouviram? Soava
como alguém pedindo ajuda!
Outro grito.
NAINA: Não… Vêem? Vocês não ouviram? Está vindo de lá, lá de fora… (começa a se
levantar).
MOHAN: É algum tipo de cerimônia religiosa, você vê, os moradores das favelas fazendo um
programa.
NAINA: Uma cerimônia religiosa? Que estranho - quero dizer, que festival é esse? (olhando em
direção à janela) Eu quero dizer, vocês tem certeza? Soa mais como alguém chamando por
ajuda…
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LEELA (para Bhasker): Por que você simplesmente não explica? Vai parecer tão ruim do
contrário.
MOHAN: Todos nós concordamos que soa bizarro, nem um pouco religioso. Mas aí eu
penso que tambores também soam horríveis - vocês sabem, durante aqueles festivais em que
eles saem por aí batendo seus tambores a noite toda…
LEELA (tentando agitar o tópico): Ah, sim, eu odeio os tambores também - tão insensível!
NAINA (não querendo trocar o foco): Eu quero dizer - isso não - eu não sei, mas não soa como se
alguém estivesse realmente pedindo ajuda?
NAINA: Mas - que ritual? Eu posso apenas dar uma olhada? Quero dizer, eu gostaria de ver
por mim mesma o que eles estão fazendo -
BHASKER (de forma grave): Eu não olharia, Naina, mesmo - Eu quero dizer, seriamente, é
melhor não olhar -
NAINA (divertindo-se com a seriedade): Por que? Não me diga que vai dar má sorte?
BHASKER (ainda de forma grave): Sim - é exatamente isso que quero dizer: dá má sorte ver
essas coisas.
LEELA: Má sorte?
MOHAN (seguindo o fio): Sim! Com certos ritos religiosos - não crentes não tem permissão de
assistir -
LEELA (perplexa, para Bhasker e Mohan): Mas - mas - então, e as luzes, por que eles fazem isso a
céu aberto, por que eles quebram nossas janelas se eles não querem que assistamos (pára,
percebendo que havia dito demais)
NAINA: Janelas?
BHASKER: Francamente, Naina, isso é realmente uma coisa sobre a qual não queremos falar
-
NAINA: Mas eu devo, eu não posso suportar ouvir esse som e não ver. Mesmo que seja algo
religioso, isso soa como se devesse ser parado!
BHASKER: Naina -
Mas ela o empurra para o lado e vai para a janela. Ela abre as cortinas. Há um silêncio sem respiração na
sala, os gritos do lado de fora sendo o único som. Naina se aproxima da janela, protegendo seus olhos do brilho
das luzes. Sua atenção é captada. Ela arfa, sua mão na boca. Então um som estrangulado sai dela, à meio
caminho entre um vomitar-em-seco e um grito. Mohan e Bhasker já tinham levantado. Eles vão em sua ajuda.
NAINA: Auugh! (ela se empurra para longe da janela. Bhasker a pega pelos ombros, a conduz para
longe)... Auugh!
NAINA: Tem alguém sendo… (ela luta pela sua voz) Eles estão - eles estão (ela vomita-em-seco).
BHASKER: Não diga nada em voz alta - Leela vai ficar chateada!
NAINA: Tem alguém sendo (ela ainda não consegue completar sua afirmação. Ela vomita em seco
novamente)Tem uma mulher sendo -
Leela, que estava sentada imóvel, agora segura a cabeça com as duas mãos, cobrindo os ouvidos.
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BHASKER (vivamente): Você acha que isso pode ser parte do ritual, Mohan?
BHASKER (cobrindo a boca de Naina): Não… Não, não diga. Você vê, a Leela está
extremamente sensível nesses dias. E eu não quero que ela saiba…
NAINA (empurrando a mão dele): Mas o que você pode querer exprimir, dizendo que é um ritual!
Nós temos que fazer alguma coisa, fazer com que isso pare, chamar a polícia!
NAINA (ela o encara, quase esperançosa): Você quer dizer - quer dizer – que é algum tipo de show?
Não é real, é só um tipo de - não! Deve ser real! Eles estavam realmente nus! (virando-se para
Bhasker) O que você está dizendo?
BHASKER: Não há nada que possamos fazer a respeito. Nós só temos que ignorar.
LEELA (mesmo que suas orelhas estivessem cobertas, ela ouve o último comentário): Não, nós não temos!
Nós podemos chamar a polícia!
Um espasmo de gritos agonizantes entram na sala e Naina cambaleia, seus olhos bem fechados. Ela começa a
vomitar-em-seco novamente. Leela se levanta e a conduz para o quarto.
MOHAN (moderadamente exaltado, vira da janela para falar com Bhasker, que havia vindo parar ao seu
lado): Bem, bem, bem!
MOHAN: Sim.
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BHASKER: Você acha, então, que isso pode não ser um festival religioso afinal?
BHASKER: Realmente?
MOHAN: Na verdade - não apenas qualquer ritual religioso, mas - você sabe o que isso me
lembra?
MOHAN: Um exorcismo!
MOHAN: Mais cedo eu vi eles na verdade meio que socando e chutando - em ritmo, quase -
Ambos assistem em silêncio, por alguns momentos, quando um novo ataque de gritos começa.
BHASKER: Hmmm. Bem, você sabe, pessoas iletradas acreditam que quando um demônio
possui uma mulher, é sempre via o - uh - orifício mais baixo -
MOHAN: Sim, certamente, e é por isso que, mais cedo, eles a estavam arrastando naquela
desagradável posição, como que para persuadir o demônio a sair -
BHASKER: Não é espantoso que alguém em tal condição tenha energia sobrando para gritar?
MOHAN: Dizem que as pessoas sob o poder de um demônio, mesmo uma mulher, tem a
força de três homens grandes…
NAINA: De que prova vocês precisam? Só olhem pela janela e vocês os verão sobre ela!
LEELA: Então. Nós estamos ouvindo os sons de uma mulher sendo estuprada. Do lado de
fora da nossa janela, sob as luzes.
MOHAN: Você não vê, essa é a única situação que explica o porquê disso estar sendo
repetido noite após noite - eu li em algum lugar que há um padrão em possessões demoníacas,
que as crises vem em horários regulares, todo dia -
BHASKER: Apesar de que - você sabe - como é uma mulher diferente toda noite é bastante
improvável que cada uma delas tenha sido possuída pelo mesmo, pontualíssimo, demônio!
NAINA: Vocês estão… vocês estão loucos! Vocês dois - vocês estão falando absurdos!
Apenas um olhar para fora da janela e você sabe que é estupro!
MOHAN: Minha nossa! Você deve ter visto muitos estupros, Naina, para reconhecê-los com
um olhar!
NAINA: Três homens, segurando à força uma mulher, com as pernas separadas, enquanto o
quarto enfia seu - órgão - dentro dela! Como você chamaria isso - uma leitura de poesia?
BHASKER: Mas e o espancamento? A brutalidade? Se tudo que eles queriam era um pouco
de sexo, por que eles se dariam o trabalho de tanta violência?
NAINA: A maior parte dos estupros, especialmente estupros coletivos, são acompanhados de
violência física extrema!
MOHAN: Mas todos os estupradores estão normalmente nus, como essas pessoas lá fora?
Naina está em silêncio, enquanto tenta encontrar uma resposta para isso.
LEELA (repentina, mas silenciosamente): Eu não me importo com o que seja. Eu quero chamar a
polícia e ter esse horrível transtorno terminado.
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BHASKER: E escutem: há mais uma consideração extremamente importante para ser levada
em conta… (há uma nota de triunfo na sua voz)
LEELA: Ugh!
NAINA (incerta): Isso é suficiente para provar que ela é uma puta?
BHASKER: Uma mulher decente nunca estaria com quatro homens de uma vez.
NAINA: Mas ela pode ter sido raptada de algum lugar, sido trazida para cá e…
LEELA (insensivelmente): Se ela é uma puta, isso significa que vocês não vão chamar a polícia?
BHASKER: Se ela é uma puta, Leela, então, isso não é estupro… assim baseados em que
motivos poderíamos chamar a polícia?
NAINA: Por quê? Uma puta não pode ser estuprada? É essa a lei?
BHASKER (triunfante): Uma puta é uma mulher cujo meio de vida é sexo!
NAINA: Mas - isso significa que apenas mulheres decentes podem ser estupradas?
MOHAN: É claro!
MOHAN: Convenhamos! Uma puta não é decente, então uma puta não pode ser estuprada!
NAINA (com teimosia): Mas então - se apenas mulheres decentes podem ser estupradas, qual a
razão pra ser decente?
BHASKER: Escutem… (reprimindo os outros) escutem… vocês veem aquilo lá fora? (ele gesticula).
Agora… aquela (com uma certa satisfação diabólica) aquela é a razão para ser uma mulher decente!
(pausa dramática) Vocês veem, se ela fosse uma mulher decente, nós iríamos resgatá-la! (pausa)
Ela não é, e então ela está sendo deixada ao seu destino!
NAINA (pouco convencida): Certamente - eu quero dizer - mesmo uma puta tem o direito de
escolher seus clientes?
BHASKER: Quaisquer direitos que uma mulher tenha, eles são perdidos no momento em que
ela se torna uma puta.
NAINA: Você quer dizer, se ela é uma puta, não há nada que possamos fazer?
MOHAN: O que há pra se fazer? Nós podemos ou assistir ou não assistir - isso é tudo.
BHASKER: Por que deveríamos nos envolver com uma mulher imoral e seus amantes?
LEELA (insensivelmente): Por que nós estamos aqui sentados falando sobre isso? Por que não
podemos chamar a polícia?
NAINA: Mas escutem! A mulher não está só sendo estuprada, ela também está sendo
brutalizada!
BHASKER: Veja. Essas coisas acontecem o tempo todo, por toda a cidade - quem somos nós
para interferir?
MOHAN: É só que, dessa vez, você pode ver acontecer na sua frente. É só isso.
NAINA (sem mais certeza de nada): Você acha que essas coisas acontecem o tempo todo?
MOHAN: A todo nosso redor, está acontecendo - putas, cafetões, prostitutas, violência…
BHASKER: É um mundo difícil lá fora, Naina, um mundo difícil. Pessoas como nós -
simplesmente não há contato de forma alguma.
NAINA: Mesmo tudo isso… quatro homens de uma vez… batendo… ferindo… chutando…
MOHAN: Quero dizer, quem sabe? Quem sabe como essas pessoas vivem?
BHASKER: Elas são como animais, na verdade. Pessoas decentes como nós, nós não
podemos entender suas vidas de forma alguma.
NAINA: Escutem - mas supondo que ela não seja uma puta?
NAINA: Certamente deve haver alguma forma de diferenciar uma mulher decente de uma
puta!
BHASKER: Se torna difícil uma vez que elas estão sem roupas e estão cobertas em sangue e
sujeira…
NAINA: Que tipo de roupas essas mulheres lá fora vestem? Isso deveria nos dizer alguma
coisa…
LEELA: Nós-devemos-chamar-a-polícia.
NAINA: Bem, isso não parece muito com uma puta, não é? Quero dizer, eu achava que putas
eram espalhafatosas e vulgares -
MOHAN: E elas devem ser pobres, do contrário - por que elas se submeteriam a isso?
NAINA: Leela está certa. Deve ser terrível ser uma puta.
NAINA: Ao perder a vulnerabilidade delas para o estupro, putas perdem seu direito de ser
mulheres? É isso que você quer dizer?
MOHAN: Isso. Afinal, finalmente, a diferença entre homens e mulheres é que mulheres são
vulneráveis ao estupro…
BHASKER: Afinal de contas… o que é uma mulher senão alguém decente o suficiente para
ser estuprada?
MOHAN: E o que é um homem senão alguém indecente demais para ser estuprado?
NAINA: Mas se homens são indecentes demais para serem estuprados isso significa que
homens são putas?
LEELA: AAAAAAAH!
NAINA: Rápido! Ela está histérica! (tenta segurar a cabeça de Leela firmemente)
LEELA: AAAAAAAHH!
LEELA: AAAAAAAHHHHH!
NAINA: Não leve isso tão a sério, Leela, ninguém vai te machucar.
LEELA: Não! Eu não quero água nenhuma! Eu quero a polícia! Eu quero a polícia!
BHASKER: Certo, Leela, certo! Nós vamos ligar para eles agora mesmo.
NAINA: Afinal, qualquer que seja a verdade por trás disso (ele gesticula em direção à janela), é um
transtorno e deve ser parado.
MOHAN: Pense nos efeitos que isso está tendo nos mais jovens!
MOHAN: Mas esse é só o número geral - nós devíamos chamar a polícia do bairro.
LEELA: Diga a eles que estamos sendo torturados por uns goondas!
BHASKER: Isso dificilmente é verdade, Leela, não é? Quero dizer, quem acreditaria em tal
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reclamação?
LEELA: Eu não me importo no que eles acreditarem. Os sons me torturam. Diga à polícia
que eu não consigo dormir a noite… diga à polícia que os goondas devem ir embora e que
levem suas putas sujas pra algum outro lugar! (ela está novamente perdendo o controle.) Eu não me
importo com o que eles fazem, ou com quem eles são, ou o que eles são - eu só os quero bem
longe, fora da minha escuta… fora da minha vida…
NAINA: Ela está certa. É uma agressão em todos nós, conseguir vê-los e ouvi-los desse jeito -
BHASKER: Sim, sim! Veja! Eu estou no telefone! Eu estou discando o número… um…
zero… zero… oh-droga! Desconectou! Eu vou tentar de novo -
De repente a campainha toca. Todos eles congelam. Leela, sendo confortada por Naina choraminga. Frieda, na
porta, aguarda instruções.
NAINA: Oh - deve ser o Surinder, é claro. Há quanto tempo ele está fora!
Frieda abre a porta. Surinder entra, amigável e inconsciente do que está acontecendo.
NAINA: É a Leela!
SURINDER: O quê?
SURINDER: Polícia?
SURINDER: Mas -
Surinder vai até a janela. Há um silêncio na sala enquanto ele assiste. Ele agarra a grade ferozmente,
parecendo puxá-la. No momento em que ele se vira, ele está mudo de raiva. Bhasker, vai até o bar, planejando
preparar para Surinder um drink. Surinder volta à mesa, incapaz de falar. Finalmente ele se apoia na mesa
cravando nela os nós dos dedos.
SURINDER (controlando a voz com esforço): Vamos lá aniquilá-los! (em sua paixão ele varre um copo da
mesa).
Frieda imediatamente se apresenta para limpar o copo quebrado. Os outros não prestam atenção nem a ela
nem ao copo. Bhasker deixa o bar, perturbado.
MOHAN: Matá-los?
MOHAN: Todos vão nos ver, nós não podemos assumir um risco como esse.
SURINER (silenciando os outros com a sua voz): Estou dizendo a vocês - esses bastardos entendem
apenas uma coisa: violência!
NAINA: Surinder -
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MOHAN: Mas quem somos nós pra decidir que eles deveriam morrer?
SURINDER: A polícia não levantará um dedo - o que importa a eles se uma pobre mulher
está sendo estuprada?
BHASKER: Eu concordo que eles devam ser parado, mas nós não podemos simplesmente -
SURINDER: E por que não? Do jeito que está, a vida daquela mulher está acabada. Ela vai
cometer suicídio, se ela conseguir sobreviver!
LEELA: Shiii!
BHASKER (sentindo-se confrontado): O que você quer dizer, ‘mijando nas nossas caras’?
MOHAN: Por que nós deveríamos nos envolver no que essas pessoas fazem?
BHASKER: Afinal de contas, eles não fizeram, na verdade, nenhum mal a nós -
SURINDER: Escutem. Escutem. O que vocês acham que esses merdas estão fazendo? Só
fodendo uma mulher, é isso? E eles não têm nenhum outro lugar pra ir então eles vêm e
fazem isso aqui, é isso? Depois de colocar refletores, pra que então todos vocês, pessoas boas
possam assistir? (ele pausa dramaticamente.) Eles estão fodendo todo esse maldito bairro, droga!
Eles sabem que nós todos estamos aqui parados! Cagando em nossas calças, com medo
demais pra fazer qualquer coisa a não ser assistir! Eles estão nos fazendo de idiotas! (apelando
para Bhasker) Você! Você não vê isso?
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BHASKER: Bem, eu -
MOHAN: Espere um momento, Bhasker, eu acho que eu consigo ver - uh, Surinder? – o que
o Surinder quer dizer...
SURINDER: Alô, sim - mas você entende o que quero dizer? Nós devemos agir
imediatamente!
MOHAN: Você realmente sente que isso será melhor que ir na polícia?
SURINDER: Veja. Se nós chamarmos a polícia, eles virão duas semanas depois, haverá um
inquérito, pessoas serão questionadas, um pouco de barulho vai ser feito e então nós vamos
todos dormir de novo. Se nós formos nós mesmos - chega! O problema está resolvido de uma
vez.
MOHAN: Mesmo que nós o façamos, como nós faremos? Com nossas próprias mãos?
LEELA: Facas!
BHASKER: Eu não sei. Eu não acho que essa seja a melhor maneira.
BHASKER: Eu quero dizer, afinal, eles também são seres humanos. Nós temos que entender
os seus problemas, seus -
Frieda pode ser vista acatando a ordem, abrindo gavetas, tirando os talheres.
NAINA: Isso é insano! Vocês não podem sair por aí matando pessoas!
SURINDER: Nós três teremos cada um uma faca. Eles não estarão esperando por nada. Nós
vamos atacar um por vez-
BHASKER: E o vigia?
LEELA: Há seis!
SURINDER (vira para ela de repente e diz com silenciosa malevolência): Cale a boca - ou eu vou te
acertar os dentes! (virando de volta) Nós vamos levar essas!
Naina afasta-se, embaraçada. Nem ela nem os outros percebem que os sons lá fora cessaram.
BHASKER: Escutem, facas não são o caminho. Elas são muito diretas.
BHASKER: Com facas, nós teremos que dominar eles, lutar, pegá-los de surpresa - e supondo
que eles se virem contra a gente, por acaso?
SURINDER: Então nos diga - o que infernos você quer que nós façamos?
SURINDER: Ácido… bem, nós precisaríamos de algo para colocá-lo dentro… vocês sabem,
tipo bulbos…
SURINDER: Seis-sete -
MOHAN: Talvez nós devêssemos esperar eles saírem do complexo? E daí jogar?
BHASKER: Eu ainda acho que gasolina será muito arriscado. E fará um barulho muito
grande. E se mais alguma coisa pega fogo? Nós seremos culpados.
BHASKER: Não… Nós nunca pegaríamos os quatro juntos, um deles pode pegar o número e
- além do mais, uma vez que eles saírem daqui, que prova nós teremos de que eles estavam
fazendo alguma coisa pela qual eles mereciam morrer?
BHASKER: Não -
MOHAN: Armas são muito barulhentas e além do mais - quem consegue atirar?
SURINDER: Não… veja, nós jogamos água neles e então nós trazemos alguns fios e -
MOHAN: Por que nós não vamos lá embaixo de uma vez e tiramos fotos deles como eles
estão, nus e tudo, e então as publicamos nos jornais?
MOHAN: É claro! Vocês não vêem? Quando todos souberem que isso está acontecendo, nós
seremos capazes de - eu não sei! - organizar um linchamento público, ou alguma coisa -
SURINDER: Bem, eu não sei… Eu ainda acho que devíamos dar uma surra neles…
BHASKER: Supondo que nós descubramos onde eles moram e coloquemos fogo em seus
barracos?
BHASKER: Por quê? Veja o que eles estão fazendo conosco! Nos ameaçando, quebrando
nossas janelas, aterrorizando nossas mulheres…
NAINA: Vocês são todos velhos demais pra ficar correndo por aí fazendo coisas desse tipo!
BHASKER (para Leela): Você está certa - nossas prioridades andam todas erradas nesses dias -
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se nós formos pegos, o pessoal dos direitos civis protestaria, defendendo essa escória de
sarjeta!
MOHAN: Ei, convenhamos! Qualquer jornal! Imagens como essas, mesmo a imprensa
estrangeira as abocanharia - estou te dizendo, nós faríamos muito dinheiro - afinal, com que
frequência alguém vê imagens autênticas de um estupro coletivo em ação?
BHASKER: Você tem razão - tais imagens devem ser muito raras…
NAINA: A maioria das pessoas simplesmente não fica parada por aí tirando fotos!
BHASKER: Bem, se nós vamos bater neles, então eu acho que tenho a coisa exata - umas
barras de aço. Vocês acham que elas podem ser de algum uso?
Naina parece de repente alerta. Ela se levanta e vai até a janela. Ela olha para fora por um momento, então
de volta pro grupo, com uma expressão curiosa em seu rosto. Ela fecha as cortinas e retorna para onde o
restante ainda está conversando.
BHASKER: O quê?
NAINA: Vocês estão atrasados - os gritos pararam (ela fica metade voltada para a janela). Não há
mais ninguém lá fora -
As luzes são cortadas rapidamente. O elenco se move para o lado para proporcionar uma visão sem
desimpedida da cortina sobre a janela. Na cortina a seguinte mensagem é brevemente projetada:
‘Esta peça é baseada no relato de uma testemunha. O incidente aconteceu em Santa Cruz,
Bombay, 1982.’
‘Na vida real, como na peça, um grupo de pessoas comuns de classe média escolheram parar e
assistir enquanto uma mulher estava sendo brutalizada em um complexo vizinho.’
‘Na vida real, como na peça, o incidente aconteceu durante um período de semanas.’
Cada slide aparece por aproximadamente cinco segundos. No momento em que o quinto aparece, o elenco já
saiu. Há silêncio. O último slide é mantido na cortina. Lentamente ele se enche de vermelho, até que as letras
estejam praticamente obliteradas.
A luz do teatro acende abruptamente. Não há fechamento de cortina.
Nota:
No caso de ser difícil conseguir um projetor, a alternativa é:
A luz do teatro diminui e o elenco começa a sair. De fora da janela, a luz ofuscante permanece.
O texto dos slides é ouvido em off, lido em um tom calmo e sem emoção, com pausas distintas entre as
mensagens.
A luz por trás da janela se torna gradualmente vermelha até que quando a última mensagem é ouvida, o palco
está lívido.
Há uma pausa de silêncio.
Então as luzes do teatro acendem abruptamente. Não há fechamento de cortina.