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Essa observação se torna importante diante da forte relação que o jogo em nossa língua possui com os
termos brincar, brincadeira e brinquedo, onde muitas vezes são empregados como sinônimos.
No primeiro capitulo, do livro em estudo, intitulado Natureza e
Significado do Jogo como Fenômeno Cultural, Huizinga (2008) começa com a
seguinte afirmação: “o jogo é fato mais antigo do que a cultura” (p.3). Pois
homens e animais jogam o mesmo jogo, sendo que apresentam os mesmos
elementos básicos: o convite ao outro; o respeito as regras; o fingimento; a
experimentação do prazer e do divertimento.
Esses elementos são tidos como as características mais simples de
jogo, o que basta para o autor considerar o jogo como uma atividade que
supera os aspectos físicos e biológicos do homem. Para ele o jogo é uma
função significante e encerra um determinado sentido em si. Durante o jogo há
algo em jogo que transcende as necessidades imediatas humanas, o que
confere sentido a ação.
Ao atribuir uma função significativa para o jogo, o autor apresenta
contrapontos da qual forma concebe o jogo em relação às teorias fisiológicas e
biológicas. Para ele essas ciências conservam a hipótese do jogo ser um
instrumento, um meio para alcançar um objetivo que não é o jogo. Não
existiriam motivos para não aceitar e se bastar com concepções naturais de
jogo, desde que, elas não fossem concepções parciais para resolver os
problemas.
Além disso, o jogo em sua natureza provoca uma intensidade, um poder
de fascinação, dando elementos como a alegria, a tensão e divertimento, que
estão à cima da capacidade de analise dessas ciências. As teorias formuladas
por elas não são decisivas, se assim fossem, se eliminariam ou se englobariam
em uma só.
O jogo encerra em si também uma realidade que ultrapassa a esfera da
vida humana, o que venha a impedir sua fundamentação racional. A existência
do jogo não está ligada a uma civilização, religião ou concepção de universo,
ele possui uma realidade autônoma que não pode ser negada. Para Huizinga,
reconhecer o jogo é reconhecer o espírito, que independente de sua essência
torna o jogo imaterial.
“A própria existência do jogo é uma confirmação permanente da sua
natureza supralógica” (p.XX). A imaterialidade do jogo leva o autor a constatar
de que o jogo é algo irracional. Se o homem joga e tem consciência disso, é
pelo fato de ser mais do que simples racional. Tratar o jogo como função
cultural, é desconsiderar que ele existe nas crianças e animais, o que faria
partir do mesmo ponto das ciências naturais.
O que diferencia o seu estudo dos estudos das ciências biológicas é
objetivar o jogo como “forma especifica de atividade, como “forma significante”,
como função social” (p.6). A importância dada ao seu estudo em questão, tem
como pivô a qualidade que é característica daquilo que chamamos de jogo,
procurando considerar-lo na sua significação primaria, para chegar a uma
compreensão dessa atividade como fator cultural da vida.
Assim todo fenômeno cultural tem de pano de fundo, de forma oculta e
marcante o jogo. O mito, a linguagem, o culto, o jurídico e tantas outras formas
de atividades humanas possuem sua origem enraizada no solo fértil do jogo.
Com isso Huizinga afunila a aproximação do jogo e da cultura, não expressada
e nem observada pelas ciências até então.
A falta de interesse pelo tema é dada pela noção de oposição do jogo a
seriedade. Huizinga expressa que esse contraste analisado de perto não é
fator decisivo nem imutável, assim como o jogo não atende uma seriedade,
existem formas extremante sérias de jogo. Ao comparar outros conceitos que
se opõem a seriedade, e formas aparentemente relacionadas ao jogo, é
observada a independência que o conceito possui.
Na elaboração do conceito jogo e na não afirmação de sua relação com
a estética2, Huizinga limita-se a conceituar o jogo sendo
uma função da vida, mas não passível de definição exata, em termos
lógicos, biológicos ou estéticos. O conceito de jogo deve permanecer
distinto de todas as outras formas de pensamento através das quais
exprimimos a estrutura da vida espiritual e social (p. 10).
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Essa relação ou não-relação com estética será aportada posteriormente.
por uma necessidade ou instinto – pois se assim fosse, o jogo se
caracterizado por necessário e utilitário. O jogo se dá diante do convite e da
aceitação livre. “O jogo é livre e ele próprio é liberdade” (p. XX)
c) O jogo não é vida “corrente”, nem “vida real”: ao jogar toda criança e adulto
entram em uma esfera que possui características próprias. Por mais
profundo que seja esse momento, todo o ser sabe que está nessa evasão da
vida real. O “faz de conta” ou o “só jogando” contrasta com a seriedade
fazendo com que não haja uma definição entre o jogo e seriedade. O jogo
por ser uma quebra do cotidiano, adota um papel importante para o ser
humano, reduzindo a inferioridade do jogo em relação a seriedade,
tornando-o seriedade, e fazendo que com que a seriedade ser torne jogo.
Essa quebra de cotidiano não faz com que o jogo se transforme em um
mecanismo de necessidade e desejos primários do homem, mas sim, faz
com que esse seja observado com ênfase no fato de ser desinteressado.
d) O jogo ocorre dentro de um tempo: o jogo como atividade ocorre em um
tempo determinado, dado previamente pelos seus agentes. Chega-se ao fim
do jogo a partir do alcance de um objetivo, do apito final do arbitro, de várias
formas, conforme a regra de cada jogo. Porém o jogo encerra em si uma
característica que mesmo ao fim da atividade ele permanece como criador
de espírito, um tesouro que passa a ser conservado pela memória. É esse
fato que permite o jogo ser transmitido e repetido3, não apenas como jogo
geral, mas também com sua lógica interna.
e) O jogo ocorre em um espaço delimitado: o espaço determinado para ocorrer
o jogo é mais flagrante do que o tempo. Ele pode ser um espaço delimitado
de forma abstrata ou material. Independente da forma da forma qe é
delimitado, é nesse espaço que as regras do jogo serão respeitadas pelos
seus jogadores.
f) O jogo é criador de ordem e ordem: o jogo cria ordem ao mesmo tempo que
é ordem. Essa característica introduz na imperfeição e confusão da vida,
uma perfeição temporária e limitada, por exigir ordem absoluta e suprema.
As regras – importante para discutir o conceito de jogo – ditam o vale no
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Achar um momento para falar da lógica da repetição – qualidade fundamental do jogo.
mundo criado pelo jogo, o não cumprimento delas leva a uma quadra de
magia4.
g) O jogo é integração: a associação entre os jogadores faz com que o jogo se
torne permanente mesmo depois de seus términos. Isso desperta um
sentimento de estar “separadamente junto”, em uma situação excepcional,
compartilhando algo importante, afastando-se do mundo recusando as
normas habituais, conservando a magia do jogo.
Após expor estas características, Huizinga aponta que o jogo possui funções
na vida do homem. Uma delas é a luta por alguma coisa, e a outra é a
representação de alguma coisa. Essas funções se tornam fundamentais para
traçar paralelos entre formas de manifestações sociais e suas relações com o
jogo, ou seja, a relação que existe entre jogo e cultura.
A representação para o autor possui o significado de mostrar, podendo
ser simplesmente uma exibição. Nessa representação o homem pode ser o
que deseja, ser o que habitualmente não é. Ao exemplificar uma criança
jogando, o autor coloca que há no momento da representação um
“transbordamento” de prazer, onde
superando-se a si mesmo a tal ponto que quase chega a acreditar
que realmente é esta ou aquela coisa, sem contudo perder
inteiramente o sentido da “realidade habitual”. Mais do que uma
realidade falsa, sua representação é a realização de uma aparência:
é “imaginação”, no sentido original do termo. (p.17)
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Também leva a uma taxonomia dos jogadores, onde são divididos em bons jogadores – aqueles que
respeitam as regras – e os desmancha prazeres – aquele que não respeitam as regras fazendo que se
quebre a magia do jogo ou com que o jogo termine antes do fim.
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Qual o significado essa palavra e qual a língua (N. Minha)
mudança, solenidade, ritmo e entusiasmo –, sendo também a forma mais alta e
sagrada da seriedade.
Essa questão recai na discussão do jogo e da seriedade serem antítese.
Na busca de solucionar esse problema e continuar a estabelecer similaridades
entre o culto e o jogo, o autor se apega na seriedade pela qual crianças,
jogadores, dançarinos e músicos realizam suas atividades, como também,
ambas as atividades possuem todas as características formais e essenciais6.
O culto também é apresentado pelo autor como uma forma de
celebração, o que leva a uma festividade. As festas tal como o jogo possuem
uma autonomia, ambas ignoradas pela antropologia e a religião comparada.
Huizinga se mostra incrédulo ao relatar a não percepção dos cientistas ao não
enxergarem que as festas e os cultos se realizam dentro do quadro formal do
jogo.
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Falar quais são essas