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LITORAL DO PARANÁ :

TERRITÓRIO E PERSPECTIVAS
Volume III: Dimensões de desenvolvimento

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Conselho Editorial Autografia

Adriene Baron Tacla


Doutora em Arqueologia pela Universidade de Oxford;
Professora do Departamento de História da Universidade Federal Fluminense.

Ana Paula Barcelos Ribeiro da Silva


Doutora em História Social pela UFF;
Professora Adjunta de História do Brasil do DCH e do PPGHS da UERJ/FFP.

Daniel Chaves
Pesquisador do Círculo de Pesquisas do Tempo Presente/CPTP;
Pesquisador do Observatório das Fronteiras do Platô das Guianas/OBFRON;
Professor do Mestrado em Desenvolvimento Regional - PPGMDR/Unifap.

Deivy Ferreira Carneiro


Professor do Instituto de História e do PPGHI da UFU;
Pós-doutor pela Université Paris I - Panthéon Sorbonne.

Elione Guimarães
Professora e pesquisadora do Arquivo Histórico de Juiz de Fora.

Karl Schurster
PhD em História, Coordenador do curso de história e coordenador geral de graduação da UPE.

Rivail Rolim
Professor do Departamento de História e do Programa de Pós-Graduação em História-UEM-PR.

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organização

Mayra Taiza Sulzbach, Daniela Resende


Archanjo e Juliana Quadros

LITORAL DO PARANÁ :
TERRITÓRIO E PERSPECTIVAS
Volume III: Dimensões de desenvolvimento

Rio de Janeiro, 2018

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Litoral do Paraná : território e perspectivas. (Volume III: dimensões de desenvolvimento)

organizadoras:
sulzbach, Mayra Taiza
archanjo, Daniela Resende
quadros, Juliana

isbn: 978-85-518-1223-5
1ª edição, julho de 2018.

capa: Luciana Ferreira


fotografias: Marcelo Chemin
revisão gramatical e ortográfica: Camila Marcelino Pasqual

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ

L755 Litoral do Paraná : território e perspectivas, volume 3 : dimensões de desenvolvimento


/ organização Mayra Taiza Sulzbach , Daniela Resende Archanjo , Juliana Quadros. - 1. ed.
- Rio de Janeiro : Autografia, 2018.
462 p. ; 20 cm

ISBN: 978-85-518-1223-5

1. Costa - Aspectos ambientais - Paraná. 2. Desenvolvimento sustentável - Paraná.


3. Ciências ambientais. I. Sulzbach, Mayra Taiza. II. Archanjo, Daniela Resende. III.
Quadros, Juliana.

18-50968 CDD: 363.70098162


CDU: 502.51(26)(816.2)

Editora Autografia Edição e Comunicação Ltda.


Rua Buenos Aires, 168 – 4º andar, Centro
rio de janeiro, rj – cep: 20070-022
www.autografia.com.br

Todos os direitos reservados.


É proibida a reprodução deste livro com fins comerciais sem
prévia autorização do autor e da Editora Autografia.

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Autores

Adilson Anacleto
Allan Paul Krelling
Andreia Cristina Silva
Antonio Marcio Haliski
Ariane Maria Basilio Pigosso
Bruna Letícia dos Santos
Carlos Alberto Cioce Sampaio
Carlos Augusto Wroblewski
Dailey Fischer
Diego Costa Nogues
Eduardo Vedor de Paula
Emerson Luis Tonetti
Eva Blaszczyk Gaweleta
Evandro dos Santos
Ezequiel Antonio de Moura
Isabel Jurema Grimm
Izabel Carolina Raittz Cavallet

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Jean Jesus Ilsuk da Silva


Joana Rupprecht Zabhonsky
José Carlos Muniz
Junior Ruiz Garcia
Leandro Ângelo Pereira
Liliani Marilia Tiepolo
Luciana Galvão Martins
Luciana Vieira Castilho Weinert
Márcia Regina Ferreira
Marisete T. Hoffmann-Horochovski
Mayra Taiza Sulzbach
Natali Calderari
Patrícia Bilotta
Priscila Cristina dos Santos
Priscila Tomie Leme Ike
Shalom Moreira Baltazar
Silvana de Andrade
Sony Cortese Caneparo
Tainara Piontkoski Maldaner
Tarcimeri dos Santos Serpa
Wagner Rodrigo Weinert

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Comitê Editorial do Programa de Pós-


Graduação em Desenvolvimento
Territorial Sustentável da UFPR

Liliani Marilia Tiepolo


Luciana Vieira Castilho Weinert
Marcos Cláudio Signorelli
Rodrigo Arantes Reis
Valdir Frigo Denardin

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Comissão de Avaliação e Pareceres

Adriana Lucinda de Oliveira (UFPR)


Beatriz Leite Ferreira Cabral (UFPR)
Cinthia Maria de Sena Abrahão (UFPR)
Diomar Augusto de Quadros (UFPR)
Eduardo Harder (UFPR)
Elaine Cristina de Oliveira Menezes (UFPR)
Ivan Jairo Junckes (UFPR)
Liliani Marilia Tiepolo (UFPR)
Juliana Quadros (UFPR)
Marcos Luiz Fillippim (UFPR)
Marília P.F. Murata (UFPR)
Marisete Teresinha Hoffmann-Horochowski (UFPR)
Mayra Taiza Sulzbach (UFPR)
Sandra Simm Rohrich (UFPR)
Valdir Frigo Denardin (UFPR)

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Sumário

APRESENTAÇÃO 13

O ZONEAMENTO ECOLÓGICO-ECONÔMICO DO LITORAL PA-


RANAENSE (ZEE PR – LITORAL) COMO INSTRUMENTO DE
JUSTIÇA AMBIENTAL: POTENCIAIS CONFLITOS E EFETIVIDA-
DE PELO LICENCIAMENTO 
Shalom Moreira Baltazar 17

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO NO LITORAL DO PARANÁ :


EVOLUÇÃO TERRITORIAL E GRAU DE IMPLEMENTAÇÃO
Eduardo Vedor de Paula
Ariane Maria Basilio Pigosso
Carlos Augusto Wroblewski 41

A FORMAÇÃO E ORGANIZAÇÃO DE UM GRUPO DE TRABALHO


NO IFPR PARANAGUÁ PARA A PROMOÇÃO DO DESENVOLVI-
MENTO SOCIOAMBIENTAL DA REGIÃO COSTEIRA DO PARANÁ
Allan Paul Krelling
Emerson Luis Tonetti
Everaldo dos Santos
Leandro Ângelo Pereira
Izabel Carolina Raittz Cavallet
Joana Rupprecht Zablonsky
Priscila Tomie Leme Ike
Ezequiel Antonio de Moura 93

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

O TURISMO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DO LITORAL


DO PARANÁ E AS PERSPECTIVAS DE DESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL SUSTENTÁVEL
Eva Blaszczyk Gaweleta
Isabel Jurema Grimm
Patrícia Bilotta
Carlos Alberto Cioce Sampaio  119

DO CAULE AOS FRUTOS: O USO DA POLPA DE JUÇARA (Euter-


pe edulis Martius), NA PERSPECTIVA DO DESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL SUSTENTÁVEL DO LITORAL DO PARANÁ
Andreia Cristina Silva
Luciana Galvão Martins
Márcia Regina Ferreira  144

CADEIA PRODUTIVA DA PESCA DE SIRI COM GAIOLAS NO LI-


TORAL PARANAENSE: CARACTERÍSTICAS, IMPLICAÇÕES SO-
CIAIS, ECOLÓGICAS E PERSPECTIVAS ECONÔMICAS
Adilson Anacleto 178

TRANSFORMAÇÕES ESPACIAS EM PONTAL DO PARANÁ – PA-


RANÁ – BRASIL, DIANTE DA INSTALAÇÃO DO COMPLEXO
PORTUÁRIO
Jean Jesus Ilsuk da Silva
Sony Cortese Caneparo  208

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

O PAPEL DOS BENEFÍCIOS ECONÔMICOS E SOCIAIS PRO-


VIDOS PELOS ECOSSISTEMAS NO BEM-ESTAR HUMANO: O
CASO DE PONTAL DO PARANÁ
Junior Ruiz Garcia
Silvana de Andrade
Dailey Fischer 246

AS POLÍTICAS PÚBLICAS E O SERVIÇO DE MONITORAMENTO


DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA
EM SAÚDE EM PONTAL DO PARANÁ , PARANÁ
Bruna Letícia dos Santos
Tainara Piontkoski Maldaner
Luciana Vieira Castilho Weinert
Wagner Rodrigo Weinert 279

QUALIDADE DE VIDA , ENVELHECIMENTO E POLÍTICAS PÚ-


BLICAS: RELATO SOBRE O SERVIÇO DE CONVIVÊNCIA E FOR-
TALECIMENTO DE VÍNCULOS EM PONTAL DO PARANÁ (PR)
Tarcimeri dos Santos Serpa
Marisete T. Hoffmann-Horochovski
Luciana Vieira Castilho-Weinert 312

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

A ARTE DO CARACOL: UMA BREVE HISTÓRIA DE UMA TÉCNI-


CA DE PESCA ARTESANAL PRATICADA NA COMUNIDADE DE
BARRANCOS, LITORAL SUL DO PARANÁ
Diego Costa Nogues
Liliani Marilia Tiepolo 339

RURALIDADE NO LITORAL DO PARANÁ : UM ESTUDO DE


CASO DA COLÔNIA PEREIRA- PONTAL DO PARANÁ E PA-
RANAGUÁ
Priscila Cristina dos Santos
Antonio Marcio Haliski  373

LIGAÇÕES ECONÔMICAS, POLÍTICAS E CULTURAIS DO RIO


BRANCO SPORT CLUB AO MUNICÍPIO DE PARANAGUÁ
Natali Calderari
Mayra Taiza Sulzbach  389

“NO DIA DE SÃO JOÃO O FOGO NÃO QUEIMA”: TRADIÇÃO E FÉ


NA COMUNIDADE DE UTINGA , EM GUARAQUEÇABA/PR
José Carlos Muniz
Andreia Cristina Silva
Márcia Regina Ferreira  408

AUTORES 445

ÍNDICE REMISSIVO 458

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Apresentação

A terceira coletânea do Litoral do Paraná , chamada pelo Progra-


ma de Pós-Graduação em Desenvolvimento Territorial Sus-
tentável da Universidade Federal do Paraná (PPGDTS/UFPR), é de
uma riqueza transformadora ao Litoral do Paraná . O volume apre-
senta novos conhecimentos em temáticas pouco abordadas pela
ciência: críticas, modelos, estudos de caso. O volume apresenta o
Litoral: na complexidade das ciências ambientais; nos desenvolvi-
mentos: territorial sustentável, socioambiental, infantil, social, eco-
nômico, ambiental, cultural e humano; nas ações concretas; nos
arranjos sociais e econômicos; nos elementos da natureza, nos es-
paços físicos e também abstratos, entre outros.
As diferentes contribuições de 38 autores que pensam o Litoral
do Paraná foram organizadas de maneira a apresentar a comple-
xidade ambiental do Litoral do Paraná pela delimitação do uso do
território decorrente do Zoneamento Ecológico-Econômico, ob-
servado por Shalom Moreira Baltazar e por uma análise das uni-
dades de conservação de Eduardo Vedor de Paula; Ariane Maria

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Basilio Pigosso e Carlos Augusto Wroblewski. A complexidade am-


biental do litoral parananese não é somente objeto de estudo, mas
exige a formação e organização de grupos de trabalho para a pro-
moção do desenvolvimento socioambiental, como proposto por
Allan Paul Krelling e colaboradores, do Instituto Federal do Paraná.
De um grupo que relata sua trajetória de formação, aos estu-
dos do desenvolvimento socioambiental da região costeira do Pa-
raná, pode se ler o relato do grupo de Eva Blaszczyk, Isabel Jurema
Grimm, Patrícia Bilotta e Carlos Alberto Cioce Sampaio que apre-
sentam dois estudos de caso de turismo em unidades de conserva-
ção nesse espaço geográfico, visando o desenvolvimento territorial
sustentável do Litoral.
Na mesma perspectiva de desenvolvimento, Andreia Cristina
Silva, Luciana Galvão Martins e Márcia Regina Ferreira discutem o
potencial socioambiental de fomento à produção da polpa do fru-
to da palmeira juçara, uma espécie ameaçada de extinção nas Mata
Atlântica do Litoral do Paraná .
Seguindo a corrente das perspectivas econômicas, a pesca de
siri com gaiolas, “recurso e tecnologia” territorializados no Litoral
do Paraná , tal como os da palmeira juçara, é caracterizada como
cadeia produtiva e observada através das implicações sociais e eco-
lógicas por Adilson Anacleto.
A natureza desse espaço, objeto de investigações, propicia ideais
e uso espacial que vão além do desenvolvimento territorial. O uso
da terra e a cobertura vegetal de Pontal do Paraná , um dos sete mu-
nicípios que compõem a microrregião do IBGE, são analisados por

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Jean Jesus Ilsuk da Silva e Sony Cortese Caneparo, que demonstram


preocupação com o potencial de uma área ambientalmente frágil
composta por praias, manguezais, restingas e porções de floresta
ombrófila densa diante da instalação de um complexo portuário.
Neste volume, Pontal do Paraná registra diferentes olhares, pois
Junior Ruiz Garcia, Silvana de Andrade e Dailey Fischer também ob-
servam o município a partir do ambiente natural, produzindo Servi-
ços Ecossistêmicos, ou seja, valoração dos recursos naturais em ter-
mos monetários. Propõem compreender o papel dos benefícios
econômicos e sociais (bem-estar humano) promovidos pelos ecos-
sistemas.
Três outras contribuições relativas a Pontal do Paraná , seguem.
As duas primeiras contextualizam políticas públicas e a terceira,
lança uma cultura de pesca específica do local. A primeira, apre-
senta as políticas públicas e o serviço de monitoramento do desen-
volvimento infantil na atenção primária em saúde no Município,
de Bruna Letícia dos Santos, Tainara Piontkoski Maldaner, Luciana
Vieira Castilho Weinert e Wagner Rodrigo Weinert, e a segunda, de-
dicadas a entender sobre a qualidade de vida , Tarcimeri dos Santos
Serpa, Marisete T. Hoffmann-Horochovski e Luciana Vieira Casti-
lho-Weinert demonstram que a velhice é (ou deve ser) uma preo-
cupação de toda a sociedade. A terceira contribuição é de Diego
Costa Nogues e Liliani Marilia Tiepolo, denominada “A arte do ca-
racol: uma breve história de uma técnica de pesca artesanal prati-
cada na comunidade de barrancos, litoral sul do paraná”, que abre,
na coletânea, o debate da cultura, já que a arte do caracol é uma

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cultura de pesca artesanal . De Pontal do Paraná a viagem segue


para Paranaguá ao longo da rodovia PR508, com Priscila Cristina
dos Santos e Antonio Marcio Haliski que desenvolvem um traba-
lho sociológico sobre a “Ruralidade no Litoral do Paraná : um estu-
do de caso da Colônia Pereira”. Em Paranaguá , somos convidados
a ir para o campo de futebol do Rio Branco Sport Club, no qual nos
são apresentadas ligações econômicas, políticas e culturais com o
Município, convite esse de Natali Calderari e Mayra Taiza Sulzba-
ch. Para finalizar a viagem, no litoral Norte do Paraná. José Carlos
Muniz, Andreia Cristina Silva e Márcia Regina Ferreira, nos convi-
dam para refletir sobre a cultura como diferenças de um lugar, sen-
do esta decorrente da natureza do lugar. Uma leitura crítica do uso
da natureza a elementos simbólicos: “No dia de São João o fogo
não queima”: Tradição e fé na comunidade de Utinga, em Guara-
queçaba: PR.

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

O ZONE AMENTO ECOLÓGICO-ECONÔMICO


DO LITORAL PARANAENSE (ZEE PR –
LITORAL) COMO INSTRUMENTO DE JUSTIÇA
AMBIENTAL : POTENCIAIS CONFLITOS
E EFETIVIDADE PELO LICENCIAMENTO

Shalom Moreira Baltazar

INTRODUÇÃO: O ZEE PR – LITORAL COMO INSTRUMENTO DE


JUSTIÇA AMBIENTAL
O litoral paranaense se refere ao espaço geográfico que congre-
ga os municípios de Antonina, Guaratuba, Guaraqueçaba, Mati-
nhos, Morretes, Pontal do Paraná e Paranaguá , com uma área total
de 6.333,233 km2 e uma população estimada de 291.158 habitantes
(IPARDES, 2017). Trata-se de região pujante em virtude não apenas
de seus aspectos culturais (p. ex.: populações, música e dança tra-
cionais) e de sua economia (p. ex.: pesca, turismo , agricultura, pe-
cuária, comércio e atividade portuária), mas também de seu patri-
mônio natural, em especial suas formações vegetais, cujas áreas de
conservação chegam a 62,5% do total1.

1.  Conforme BRITEZ, Ricardo Miranda de; PRESTES, Marlon. & MACHADO. Mariana Augusto.
Resultado do Mapeamento da Vegetação do Litoral do Paraná . In Anais do VIII CBUC - Traba-
lhos Técnicos 2015. Disponível em https://docs.ufpr.br/~edugeo/Bibliografia/Artigos/Artigo_Ri-
cardoBritez_VIIICBUC.pdf acesso em 16/10/2017): “A área total de abrangência do mapeamento é

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Essa relevância socioeconômica e ambiental vem pautando inicia-


tivas estatais e da sociedade em direção a uma convivência humana
mais racional e à melhoria da qualidade de vida na região litorânea.
Dentre elas, no âmbito do macroplanejamento normativo, destaca-se
o Decreto Estadual nº 4.996, de 05/09/2016, que aprovou “o Regula-
mento que define o documento técnico científico Zoneamento Eco-
lógico-Econômico do Litoral Paranaense, ZEE PR – Litoral”.
Produto de ações interinstitucionais, pesquisas acadêmicas, oi-
tivas da sociedade e iniciativa do governo estadual2, o ZEE PR-Li-
toral, enquanto instrumento voltado a “organizar, de forma vincu-
lada, as decisões dos agentes públicos e privados quanto a planos,
programas, projetos e atividades que, direta ou indiretamente, utili-
zem recursos naturais, assegurando a plena manutenção do capital
e dos serviços ambientais dos ecossistemas”3, apresenta “diretrizes
e recomendações de ordenamento territorial de forma estratégica”4

de 656.124 ha, retirando os corpos d´água, que na sua maior parte são áreas de baía temos 578.331
ha. Considerando esta última área como a área total, as formações vegetais bem conservadas do li-
toral somam 62,5 % da área total, as formações florestais em estágio médio correspondem a 19,7 %
e as formações florestais em estágio inicial 7,7 %, o restante, 10,1 % são áreas antropizadas” (p. 6).
2.  A priori vinculada a um complexo sistema nacional regulado pela Lei Federal nº 6.938, de
31/08/1981 (Política Nacional de Meio Ambiente), pelo Decreto Federal nº 4.297, de 10/07/2002 (es-
tabelece critérios para o Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil – ZEE), pela Lei Federal nº
7.661 de 16/05/1998 (Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro) e pelo Decreto Federal nº 5.300,
de 07/12/2004 (dispõe sobre regras de uso e ocupação da zona costeira e estabelece critérios de
gestão da orla marítima).
3.  Decreto Federal nº 4.297, de 10/07/2002, art. 3º, e Regulamento a que se refere o Decreto Esta-
dual nº 4.996/2016, art. 2º.
4.  Decreto Estadual nº 4.996/2016, art. 1º.

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que se voltariam, finalmente, a orientar o uso, a ocupação do solo e


o desenvolvimento regional.
A ideia de se tomarem decisões governamentais de planejamen-
to macrorregional para ordenação da ocupação e utilização do ter-
ritório, dos recursos naturais, de direcionamento geográfico da ex-
pansão urbana, voltadas ao aumento ou diminuição de pressão
antrópica em áreas ambientalmente sensíveis, dentre outras variá-
veis no âmbito das quais se possa admitir uma regulação estadual-
-local harmonizada a preceitos nacionais gerais, surgiu nos Estados
Unidos como parte das atribuições de uma agência5que, conse-
quentemente, assumiu substancial poder normativo e regulador6: a
EPA – Environmental Protection Agency7 (Agência de Proteção Am-

5.  “Agência reguladora independente é uma autarquia especial, sujeita a regime jurídico que as-
segure a sua autonomia em face da Administração direta e investida de competência para a regu-
lação setorial” (JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 4. ed. rev. atual., São Pau-
lo: Saraiva, 2009, p. 584).
6.  Ou, como prefere a contemporânea doutrina administrativista alemã, um papel de direção, a
partir do qual a Administração Pública, fundada não mais na ideia de ato, mas de ação adminis-
trativa, passa a propiciar “um aberto diálogo entre os políticos e os especialistas, como se eviden-
cia nas reformas que tem experimentado o Direito Orçamentário, com o objeto de fazer viável a
transferência da festão dos recursos a unidades descentralizadas: ou as reformas que versão so-
bre a formulação de acordos para a realização de diversas prestações; etc” (SCHMIDT-ASSMANN,
Eberhard. Cuestiones fundamentales sobre la reforma de la Teoría General del Derecho Administra-
tivo, in J. BARNES ed., Innovación y reforma en el Derecho Administrativo. Sevilla: Instituto Nacio-
nal de Administración Pública, 2012. p. 33 – tradução livre).
7.  “Nascida na aurora de elevada preocupação com a poluição ambiental, a EPA foi estabelecida
em 2 de Dezembro de 1970 para consolidar em única agência uma variedade de pesquisas, monito-
ramentos, padrões e atividades de polícia para assegurar a proteção ambiental. Desde sua criação,
EPA tem trabalhado para um ambiente mais limpo e saudável para o povo americano” (EPA – Uni-
ted States Environmental Protection Agency. EPA History. Disponível em: https://www.epa.gov/
history, acesso em 16/10/2017 - tradução livre).

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biental). Foi a partir de suas práticas, fundadas em prévio e contínuo


monitoramento, que se consolidou o conceito de planejamento ra-
cional dentre os princípios da Declaração da Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (Estocolmo, 16/05/1972)8,
do qual o zoneamento - expressamente enunciado no Brasil como
princípio da Política Nacional do Meio Ambiente - deriva9.
Foi nesse contexto, portanto, que o zoneamento surgiu como
instrumento de gestão ambiental (land planning or zoning for en-
vironmental managemant)10, passando a integrar o ferramental re-
gulatório estatal com vistas à realização daquilo que Bullard (2005)
denominou - ao analisar os problemas que se verificaram quando

8.  “Princípio 13 - Com o fim de se conseguir um ordenamento mais racional dos recursos e me-
lhorar assim as condições ambientais, os Estados deveriam adotar um enfoque integrado e coorde-
nado de planejamento de seu desenvolvimento, de modo a que fique assegurada a compatibilida-
de entre o desenvolvimento e a necessidade de proteger e melhorar o meio ambiente humano em
benefício de sua população. Princípio 14 - O planejamento racional constitui um instrumento in-
dispensável para conciliar às diferenças que possam surgir entre as exigências do desenvolvimen-
to e a necessidade de proteger y melhorar o meio ambiente. Princípio 15 - Deve-se aplicar o plane-
jamento aos assentamentos humanos e à urbanização com vistas a evitar repercussões prejudiciais
sobre o meio ambiente e a obter os máximos benefícios sociais, econômicos e ambientais para to-
dos. A este respeito devem-se abandonar os projetos destinados à dominação colonialista e racista”.
9.  Lei Federal nº 6.938, de 31/08/1981. “Art . 2º - A Política Nacional do Meio Ambiente tem por ob-
jetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando asse-
gurar, no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacio-
nal e à proteção da dignidade da vida humana, atendidos os seguintes princípios: (...)V - controle e
zoneamento das atividades potencial ou efetivamente poluidoras”.
10.  “O uso do solo é talvez a força dirigente mais significativa do impacto humano no ambien-
te natural. O desenvolvimento do solo para estabelecimento e recursos humanos coloca impac-
tos críticos sobre si mesmo, assim como cobre a água, ar, uso de energia e de materiais” (RANDOL-
PH, John. Enviromental land use planning and management. Washington: Island Press, 2004, p. 36
– tradução livre).

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

do surgimento da ideia de zoneamento ambiental nos Estados Uni-


dos na década de 1980 - de justiça ambiental.
O conceito de justiça ambiental remente à identificação e dis-
ciplina, de modo proporcional e equitativo, dos efeitos adversos à
saúde humana e ao meio ambiente como resultados de programas,
políticas e atividades, principalmente no que se refere a popula-
ções minoritárias e de baixa renda:

As pessoas mais vulneráveis dos efeitos negati-


vos da degradação ambiental são aquelas mais
pobres, as quais possuem uma condição de
vida precária em termos de bem-estar, despro-
vidas do acesso aos seus direitos sociais bási-
cos (moradia adequada e segura, saúde básica,
saneamento básico e água potável, educação,
alimentação adequada etc. Ignorar a feição
socioambiental que se incorpora hoje aos pro-
blemas ecológicos potencializa ainda mais a ex-
clusão e marginalização social (tão alarman-
te no contexto brasileiro), já que o desfrute de
uma vida saudável e ecologicamente equilibra-
da constitui premissa ao exercício dos demais
direitos fundamentais, sejam eles de matriz li-
beral, sejam eles de natureza social. É com tal
cenário socioambiental preocupante, já apon-
tado por Ulrick Beck no tocante à distribuição
desigual dos riscos ambientais, conforme abor-
damos no tópico antecedente, que buscamos
alinhavar algumas questões que permeiam tal
discussão, a qual se coloca como um desafio
para a concepção de justiça ambiental (SAR-
LET; FENSTERSEIFER, 2014, p. 104).

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A pesquisa de BULLARD (2005) revelou que, nos Estados Uni-


dos, ao longo da década de 1980, decisões acerca de onde seriam
destinados, por exemplo, resíduos (waste) de indústrias químicas,
bem como instaladas plantas industriais de alto impacto ambien-
tal, foram tomadas levando-se em consideração a concentração
predominante de populações negras e de pequeno poder aquisiti-
vo nos locais escolhidos. Tamanha a polêmica advinda desse apar-
theid ambiental11 e do movimento que a ele se opôs, que:

Em Fevereiro, 1994, sete agências federais, (…)


patrocinaram um simpósio nacional de saúde ,
‘Necessidades de Saúde e Pesquisa para Asse-
gurar Justiça Ambiental”. O comitê de planeja-
mento da conferência foi único, nisso incluídos
líderes de base do movimento de justiça am-
biental, residentes de comunidades impacta-
das, acadêmicos e representantes de agências
federais. O simpósio de saúde de 1994 reuniu
1,100 stakeholders diversos e aqueles mais afe-
tados por poluição na mesa de tomada de deci-
são sobre questões de saúde em comunidades
de cor. (…) Em 11 de Fevereiro, 1994, o Presiden-
te Clinton assinou a Ordem Executiva 12898, que
previu ações federais voltadas à justiça ambien-
tal em populações minoritárias e de baixa ren-
da. (…) A ordem executiva reforçou duas leis

11.  A expressão foi empregada por Bullard (2005, p. 102-103) como título de capítulo em seu traba-
lho, no qual apresenta a seguinte afirmação: “Alguns residentes da região suspeitam que suas co-
munidades estão rapidamente se tornando ‘zonas de sacrifício’ devido à localização ali de depósi-
tos de lixo, aterros, incineradores, e plantas petroquímicas. Em lugar nenhum isso é mais aparente
do que no sudeste da Louisiana, onde comunidades afro-americanas não incorporadas estão espe-
cialmente vulneráveis à poluição industrial”.

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existentes: a Lei de Direitos Civis de 1964 – que


proíbe práticas discriminatórias em programa
de recebimento de fundos federais – e a Lei Na-
cional de Política Ambiental de 1969, que esta-
belece metas para assegurar a todos os america-
nos um ambiente seguro, saudável, produtivo,
cultural e esteticamente prazeroso (BULLARD,
2005, p. 148-149).

Para BULLARD (2005), a materialização da ideia de justiça am-


biental por meio de instrumentos como o zoneamento ambiental
(inserido no conceito mais abrangente de land-use zoning) cai por
terra se não for reconhecida a importância de se adotarem meca-
nismos protecionistas, especialmente em favor dos interesses eco-
nômicos, sociais e ambientais de comunidades menos favorecidas
e de locais com maior sensibilidade e deficiência de equipamentos
públicos:

O Zoneamento de uso do solo, então, é dese-


nhado como um ‘instrumento de proteção’ para
assegurar um ‘lugar para cada coisa e cada coi-
sa em seu lugar’. O Zoneamento intenciona, em
última análise, influenciar e moldar o uso do
solo de acordo com necessidades locais de lon-
go alcance. O Zoneamento , restrições e outros
mecanismos protecionistas de uso do solo fa-
lharam em efetivamente proteger comunida-
des minoritárias, especialmente aquelas de bai-
xa renda. Logan e Molotch, em seu livro Urban
Fortunes: The Political Economy of Place, con-
tendem que várias classes sociais, com ou sem
controles sobre o uso do solo, são desigualmen-

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te capazes de proteger seus interesses ambien-


tais. Em suas buscas por bairros de qualidade,
os indivíduos geralmente se encontram com-
petindo por equipamentos públicos desejáveis
(i.e., boas escolas, polícia e proteção, serviço de
saúde de qualidade, parques e estruturas de re-
creação) e resistindo características negativas
(i.e., aterros, indústrias poluentes, estradas, pro-
jetos de habitação popular, estrutura para trata-
mento de dependentes químicos, abrigos, etc.),
(BULLARD, 2005, p. 8).
A lição preliminar que se tira do exemplo norte-americano estu-
dado criticamente por Boullard (2005) é no sentido de que iniciati-
vas de zoneamento que se pretendam justas devem ser capazes de
dotar cada indivíduo, independentemente de sua raça ou posição
social, de acesso aos canais de participação para tomada de deci-
sões sustentáveis quanto ao estabelecimento de regras de restrição
ao uso e ocupação do solo12, sob pena de proporcionarem uma pro-
teção desigual, não-isonômica e não-integral.
À luz desse prisma, passa-se a analisar concretamente o ZEE PR
– Litoral, de modo a se verificar se houve observância às diretrizes
concebidas justamente para assegurarem efetividade técnica, par-
ticipação popular e controle social em seus regramentos.

12.  “Tomadas de decisão e políticas ambientais geralmente espelham os arranjos de poder da


sociedade dominante e de suas instituições. (…). A questão de quem paga e quem se beneficia
das atuais políticas industriais e ambientais é central para essa análise de racismo ambiental e
outros sistemas de dominação e exploração”. (BULLARD, Robert D. Dumping in Dixie… Op. cit.,
p. 98 – tradução livre).

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

MECANISMOS DE TECNICIDADE, PARTICIPAÇÃO POPULAR E


CONTROLE SOCIAL NO REGRAMENTO NACIONAL E NO ZEE
PR - LITORAL
No regramento nacional, os arts. 4º, 8º e 9º do Decreto Federal nº
4.297/2002 elencam a sustentabilidade, participação democrática,
a valorização do conhecimento científico multidisciplinar, projetos
específicos de mobilização social, envolvimento de grupos sociais
interessados e coordenações estaduais com caráter deliberativo e
participativo como princípios e pressupostos a serem observados
no processo de elaboração e implementação do ZEE - precisamen-
te para se evitarem direcionamentos descompassados frente aos
interesses das comunidades efetivamente impactadas, tendencio-
sos ou discriminatórios. No mesmo sentido, os arts. 16 e 17 dispõem
sobre a constituição de rede integrada voltada ao compartilhamen-
to de dados e informações, bem como sobre a obrigatoriedade de
divulgação do conteúdo do ZEE com textos, ilustrações explicativas
e em linguagem acessível à população em geral.
Já no âmbito do Decreto Estadual paranaense nº 4.996/2016, não fo-
ram previstos mecanismos específicos de controle popular ou controle
social, presumindo-se, por força do art. 3º13, a ratificação do disposto em
âmbito federal, relegando-se aos planos diretores municipais a discipli-
na de eventuais particularidades locais (Regulamento, art. 3314).

13.  “Art. 3.º As diretrizes e recomendações estabelecidas no Regulamento aprovado não substi-
tuem as exigências previstas na legislação ambiental federal e estadual vigente quanto às normas,
diretrizes e critérios de licenciamento e fiscalização ambiental de empreendimentos”.
14.  “Art. 33. A consolidação do ZEE PR - Litoral e aplicações das diretrizes e recomendações apre-
sentadas devem estar contempladas nos Planos Diretores Municipais, instrumento este que permi-

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Esses mecanismos, ferramentas ou, ainda, canais são voltados à


preservação da boa técnica (científica e administrativa), à partici-
pação dos efetivos e reais interessados nas medidas de zoneamento
/planejamento a serem adotadas, ao controle social e, finalmente,
à tomada de decisão pelo ente público competente. Seus objetivos
são a construção da norma de conduta em alinhamento com seus
destinatários finais (diretos ou indiretos), evitando-se decisões uni-
laterais, eventualmente comprometidas com interesses escusos e,
dessa forma, distantes da tutela adequada dos interesses difusos
em jogo.

POTENCIAIS CONFLITOS DE COMPETÊNCIA A PARTIR DAS


ZONAS DE PROGNÓSTICO DEFINIDAS NO ZEE PR – LITORAL:
HARMONIZAÇÃO PELA VIA DO LICENCIAMENTO
O Prognóstico do ZEE PR – Litoral dividiu a região em seis zo-
nas distintas, cujas regras de uso e ocupação foram definidas no
respectivo Regulamento, a saber: ZPM - Zona de Proteção dos Ma-
nanciais; ZPL - Zona Protegida por Legislação Ambiental Específi-
ca (Mata Atlântica, Restinga, Manguezais, APAs, Parques e Estações
Ecológicas); ZEPI - Zona de Expansão para UCs de Proteção Inte-
gral; ZU – Zona Urbana; ZDTO – Zona de Desenvolvimento das Ter-
ras Ocupadas. ZDD – Zona de Desenvolvimento Diferenciado (Fi-
gura 1). À exceção da ZU, da ZDTO e da ZDD, percebe-se que o tom
dado pelo Regulamento aprovado pelo Decreto Estadual paranaen-
se nº 4.996/2016 foi no sentido de se consolidarem, visualmente in-

te maior especificação de normas de uso e ocupação do território municipal”.

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clusive, substanciais restrições ao uso e à ocupação do solo em pra-


ticamente todo o litoral.
Seja em razão das características topográficas e de relevo, seja
em função do tipo de formação vegetal, seja devido à presença de
recursos hídricos ou outros de maior sensibilidade, apenas as áreas
circundantes aos núcleos urbanos já consolidados foram reconhe-
cidas e indicadas como ainda sendo de potencial uso, mas sem pre-
juízo de análise concreta e detalhada pelo órgão ambiental com-
petente. É o que dispõe a regra dos arts. 3º e 4º15, a qual deve ser
aplicada à luz do mosaico de características socioambientais retra-
tado no mapa de zoneamento que acompanhou o Regulamento
trazido pelo Decreto Estadual nº 4.996/2016.

15.  “Art. 3º As diretrizes e recomendações estabelecidas no Regulamento aprovado não substituem


as exigências previstas na legislação ambiental federal e estadual vigente quanto às normas, dire-
trizes e critérios de licenciamento e fiscalização ambiental de empreendimentos.
Art. 4º São exceções as proibições estabelecidas às UANs pelo Decreto Estadual nº 5.040/1989, as
obras e instalações de utilidade pública e interesse social a serem desenvolvidas na Zona de De-
senvolvimento Diferenciado (ZDD), desde que previamente licenciadas pelo órgão ambiental
competente”.

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Figura 1 Zonas de Prognóstico do Zoneamento Ecológico Econômico do


Litoral do Paraná de acordo com o Decreto Estadual nº 4.996/2016

Fonte: mapa contido no anexo do Decreto Estadual nº 4.996/2016.

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A despeito dessa macro-diretiva, a sobreposição de interesses


locais, estaduais e federais em toda a região litorânea torna a mis-
são do licenciamento complexa. Devido ao grande número de uni-
dades de conservação e patrimônio cultural sob gestão dos mais
diversos níveis de governo, às populações tradicionais (ex: pesca-
dores artesanais, indígenas, quilombolas) e ao ambiente marinho
presentes, a própria definição do ente público competente para o
licenciamento, a emissão do termo de referência ou mesmo o es-
tabelecimento de rito adequado para condução do respectivo pro-
cesso administrativo, em articulação com todos os eventuais inter-
venientes e interessados, se afiguram atividades administrativas
de elevado nível de especialização e imbricação burocrática para
sua realização. A fim de que não haja conflitos de atribuições, ou
ao menos para que sejam minimizados, as disposições normativas
afetas ao ZEE PR – Litoral têm de se articular e compatibilizar às
regras estabelecidas na Lei Complementar nº 140, de 08/12/2011, a
qual, regulamentando os incisos III, VI e VII do caput e o parágra-
fo único do art. 23 da Constituição da República16, fixou normas de
cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Muni-
cípios nas ações administrativas decorrentes do exercício da com-
petência comum relativas à proteção das paisagens naturais no-

16.  “Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
(...)III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os
monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; (...)VI - proteger o meio am-
biente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII - preservar as florestas, a fauna e a
flora; (...)Parágrafo único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do
bem-estar em âmbito nacional”.

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táveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em


qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da fauna e
da flora. Em especial, devem ser observadas as disposições dos arts.
7º, XIV e parágrafo único17, quanto à competência da União, art. 8º,
XIV18 no que se refere à competência dos Estados, e 9º, XIII19, no que
toca aos Municípios.

17.  “XIV - promover o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades: a) localizados


ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; b) localizados ou desenvolvidos no
mar territorial, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva; c) localizados ou de-
senvolvidos em terras indígenas; d) localizados ou desenvolvidos em unidades de conservação ins-
tituídas pela União, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs); e) localizados ou desenvolvi-
dos em 2 (dois) ou mais Estados; f ) de caráter militar, excetuando-se do licenciamento ambiental,
nos termos de ato do Poder Executivo, aqueles previstos no preparo e emprego das Forças Arma-
das, conforme disposto na Lei Complementar no 97, de 9 de junho de 1999; g) destinados a pesqui-
sar, lavrar, produzir, beneficiar, transportar, armazenar e dispor material radioativo, em qualquer
estágio, ou que utilizem energia nuclear em qualquer de suas formas e aplicações, mediante pa-
recer da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen); ou h) que atendam tipologia estabelecida
por ato do Poder Executivo, a partir de proposição da Comissão Tripartite Nacional, assegurada a
participação de um membro do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), e considerados
os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da atividade ou empreendimento; (...) Parágra-
fo único. O licenciamento dos empreendimentos cuja localização compreenda concomitantemen-
te áreas das faixas terrestre e marítima da zona costeira será de atribuição da União exclusivamen-
te nos casos previstos em tipologia estabelecida por ato do Poder Executivo, a partir de proposição
da Comissão Tripartite Nacional, assegurada a participação de um membro do Conselho Nacional
do Meio Ambiente (Conama) e considerados os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da
atividade ou empreendimento”.
18.  “Art. 8º São ações administrativas dos Estados: (...) XIV - promover o licenciamento ambiental
de atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmen-
te poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, ressalvado o dis-
posto nos arts. 7º e 9º”.
19.  “Art. 9º São ações administrativas dos Municípios: (...) XIII - exercer o controle e fiscalizar as
atividades e empreendimentos cuja atribuição para licenciar ou autorizar, ambientalmente, for co-
metida ao Município”.

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Acerca da importância do sistema de cooperação estabelecido


na Lei Complementar nº 140/2011 e do licenciamento ambiental no
bojo dos instrumentos necessários à implementação do manda-
mento constitucional de promoção do desenvolvimento sustentá-
vel20, Curt TRENNEPOHL, que presidiu o IBAMA entre os anos de
2011 e 2012, anota o seguinte:

Ao tempo que representa um dos mais impor-


tantes instrumentos para a garantia da quali-
dade de vida das presentes e futuras gerações,
o licenciamento ambiental introduzido no ce-
nário jurídico nacional desde a Lei 6.938/1981
era, também, um dos maiores pontos de discor-
dância e polêmica, em função da falta de regu-
lamentação do art. 23 da Constituição Federal,
para definir as competências comuns dos entes
federados, dentre as quais se destaca a proteção
do meio ambiente, o combate à poluição, a pre-
servação das florestas, da fauna e da flora, dis-
pôs que uma Lei Complementar deveria fixar as
normas para a cooperação entre a União, os Es-
tados, o Distrito Federal e os Municípios.

20.  Assim interpretado pela Suprema Corte brasileira: “O princípio do desenvolvimento susten-
tável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte legitima-
dor em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator de obten-
ção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto,
a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais
relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteú-
do essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio
ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor
das presentes e futuras gerações”. (ADI 3540 MC. Relator Min. CELSO DE MELLO. Tribunal Pleno.
Julgado em 01/09/2005, DJ 03-02-2006 PP-00014 EMENT VOL-02219-03 PP-00528).

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Somente em dezembro de 2011 foi editada a Lei


Complementar e, até então, tentou-se preen-
cher a lacuna com leis ordinárias, decretos, re-
soluções e até portarias. Se, por um lado, estes
atos eram incapazes de estabelecer quais as ati-
vidades sujeitas ao licenciamento, os tipos de li-
cenças ou autorizações e as exigências para sua
concessão, eram totalmente ineficazes para de-
finir inquestionavelmente quem era a autorida-
de competente para emiti-las (TRENNEPOHL:
TRENNEPOHL, 2016, p. 51-52).

Tendo-se em vista o poder de agenda institucional inerente


a cada um desses atores, será à luz de cada caso concreto que as
eventuais sobreposições e conflitos de atribuições eclodirão e de-
mandarão entendimento recíproco entre os envolvidos, os quais,
antes de adotarem espírito beligerante (e agravador do impasse),
devem reconhecer o cenário de elevada complexidade diante do
qual se está e, preferencialmente em consenso, reunir esforços para
materializarem, no microcosmo, a direção dada em abstrato pela
Administração Pública.

POTENCIAL CONFLITO ENTRE O ZEE PR – LITORAL E O


DECRETO ESTADUAL Nº 1.562, DE 31/05/2011: NOVAMENTE A
SOLUÇÃO PELO LICENCIAMENTO
O Decreto Estadual nº 1.562, de 31/05/2011, declarou como de
utilidade pública as áreas do Macrozoneamento da Área do Por-
to Organizado de Paranaguá que foram indicadas no mapa ane-
xo à normativa com a legenda áreas de expansão. Esse ato executi-

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vo foi praticado, sob o prisma das normativas ambientais federais


de regência, com base nas disposições do art. 4º21 do Código Flores-
tal então vigente (Lei Federal nº 4.771, de 15/09/1965) e art. 1º da Re-
solução CONAMA nº 369, de 28/03/200622, para fins de intervenção
em áreas de preservação permanente onde serão instalados inves-
timentos e obras portuárias, ditas de interesse público.
Numa primeira análise comparativa a olho nu, a recomendar
ulterior sobreposição dos mapas utilizados em escala compatível
mediante técnica computacional própria, vislumbra-se conflito es-
pacial parcial entre os locais indicados como Área de Expansão 1
(Figura 2) e Área de Expansão 3 (Figura 3) e as Zonas ZEPI e ZEPL
do Regulamento aprovado pelo Decreto Estadual paranaense nº
4.996/2016, em Paranaguá e Pontal do Paraná , respectivamente.

21.  “Art. 4º A supressão de vegetação em área de preservação permanente somente poderá ser au-
torizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente caracterizados e motiva-
dos em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao
empreendimento proposto”.
22.  “Art. 1º Esta Resolução define os casos excepcionais em que o órgão ambiental competente
pode autorizar a intervenção ou supressão de vegetação em Área de Preservação Permanente-APP
para a implantação de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse so-
cial, ou para a realização de ações consideradas eventuais e de baixo impacto ambiental”.

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Figura 2 Polígono de área de expansão portuária (área de expansão 1) em Paranaguá e Pontal
do Paraná , Paraná, segundo o Decreto Estadual nº 1.562, de 31/05/2011
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Fonte: PDZPO, mapa contido no anexo do Decreto Estadual nº 1.562/2011.
Figura 3 Polígono de área de expansão portuária (área de expansão 3) em Paranaguá
, Paraná, segundo o Decreto Estadual nº 1.562, de 31/05/2011

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Fonte: PDZPO, mapa contido no anexo do Decreto Estadual nº 1.562/2011.

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Considerando-se a anterioridade do Decreto Estadual nº


1.562/2011 em relação ao Decreto Estadual nº 4.996/2016, bem como
a especialidade do primeiro no que se refere à delimitação concreta
de locais prioritários a atividades portuárias de interesse macrorre-
gional, novamente há que se socorrer do licenciamento ambiental,
conforme surjam impasses em empreendimentos ou iniciativas de
uso e ocupação nas áreas que regulamentam. Nessa empreitada, é
mais uma vez útil a experiência registrada por Curt TRENNEPOHL,
enquanto esteve à frente do licenciamento federal a cargo do IBA-
MA, no que se refere a conflitos de competência comumente viven-
ciados em âmbito administrativo:

Na verdade, era possível observar dois tipos de


conflito de competência entre os órgãos dos di-
ferentes níveis da Federação, no exercício da
competência comum, que podemos definir
como conflito de competência negativo e confli-
to de competência positivo.
Tratando-se de atuação que pudesse gerar des-
gaste político, como autuações, embargos de
obras ou interdições de atividades, era comum
que se invocasse a falta de definição explícita da
competência no sistema jurídico para afastar uma
eventual responsabilização por omissão ou co-
nivência.
Por outro lado, tratando-se de atuação da qual
pudessem resultar ganhos de imagem junto à
opinião pública ou mesmo econômicos, órgãos
de diferentes níveis buscavam avocar a compe-
tência. Nesse último caso, inseria-se, normal-
mente, o licenciamento ambiental, porque o
Município e o Estado estão sempre dispostos a

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trazer em suas searas investimentos e empreen-


dimentos que resultem em geração de empre-
gos e renda, e, também, pela previsão das com-
pensações resultantes do licenciamento dos
empreendimentos de maior porte23.

Na medida em que as diretrizes em tese permissivas das Áreas


de Expansão 1 e 3 aparentemente passem a conflitar, num dado li-
cenciamento concreto, com as restrições das Zonas ZEPI e ZEPL
do Regulamento aprovado pelo Decreto Estadual paranaense nº
4.996/2016, caberá à autoridade pública ambiental a cargo de quem
esteja na presidência do respectivo processo administrativo dirimir
o impasse, utilizando-se para tanto de canais de interlocução que
prestigiem todos os interessados, intervenientes e efetivamente im-
pactados, sempre com primazia da técnica e a juridicidade em de-
trimento da conveniência política de momento.

CONCLUSÃO
É pertinente a denúncia feita por Robert D. BULLARD acerca
dos perigos decorrentes da desfaçatez de se utilizarem o planeja-
mento racional e instrumentos como o zoneamento para legitima-
ção de decisões classistas, ineficientes e ambientalmente injustas.
O exemplo norte-americano, o zoneamento também pode ser
aproveitado sob a perspectiva de mecanismos para a Administra-
ção Pública e a sociedade utilizar e assegurar a primazia técnica,
participação popular e controle social no processo decisório ine-
rente à ideia de uma direção administrativa planejada.

23.  TRENNEPOHL, Curt. & TRENNEPOHL, Terence. Licenciamento . Op. cit., p. 92.

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O ZEE-PR é um marco normativo importante no âmbito do ma-


croplanejamento estatal regional para a materialização das premis-
sas e diretivas nacionais pertinentes tanto ao zoneamento ecológi-
co-econômico propriamente dito quanto ao planejamento costeiro.
A compatibilização dos multidimensionais interesses que convi-
vem na região litorânea paranaense com vistas à realização do de-
siderato constitucional do desenvolvimento sustentável, median-
te participação harmônica dos plurais atores que os representam,
é missão do processo administrativo de licenciamento ambiental,
desde que regido pelos preceitos de prevalência da técnica, partici-
pação dos interessados e juridicidade.

REFERÊNCIAS
BRASIL. CONGRESSO NACIONAL, Lei Complementar nº 140, de
08/12/2011.
______. CONGRESSO NACIONAL. Constituição da República Fede-
rativa do Brasil de 05/10/1988.
______. CONGRESSO NACIONAL. Lei Federal nº 4.771, de
15/09/1965.
______. CONGRESSO NACIONAL. Lei Federal nº 6.938, de
31/08/1981.
______. CONGRESSO NACIONAL. Lei Federal nº 6.938, de
31/08/1981.
______. CONGRESSO NACIONAL. Lei Federal nº 7.661 de
16/05/1998.

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______. CONSELHO NACIONAL DE MEIO AMBIENTE. Resolução


nº 369, de 28/03/2006.
______. GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁ. Decreto Estadual nº
4.996/2016.
______. GOVERNO FEDERAL. Decreto Federal nº 4.297, de
10/07/2002.
______. GOVERNO FEDERAL. Decreto Federal nº 4.297, de
10/07/2002.
______. GOVERNO FEDERAL. Decreto Federal nº 5.300, de
07/12/2004.
______. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADI 3540 MC. Relator
Min. CELSO DE MELLO. Tribunal Pleno. Julgado em 01/09/2005,
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BRITEZ, Ricardo Miranda de; PRESTES, Marlon. & MACHADO.
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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO NO LITORAL DO


PARANÁ : EVOLUÇÃO TERRITORIAL E GRAU DE
IMPLEMENTAÇÃO

Eduardo Vedor de Paula


Ariane Maria Basilio Pigosso
Carlos Augusto Wroblewski

INTRODUÇÃO
O litoral do Paraná soma aproximadamente 90 km de extensão
(Figura 1), o que representa menos de 2% do litoral brasileiro. Con-
tudo, apresenta em seu território uma vasta riqueza natural e cul-
tural. Inserido no bioma Mata Atlântica, sua diversidade de am-
bientes vai desde a Serra do Mar, às praias arenosas, abrangendo
florestas, campos alto-montanos, manguezais e estuários, compon-
do um cenário de expressiva diversidade de flora e fauna, e tam-
bém de modos de vida.
Juntamente com o litoral sul do Estado de São Paulo, o litoral do
Paraná abriga o maior remanescente contínuo de Mata Atlântica em
toda a costa brasileira, dando suporte, por meio da grande diversi-
dade biológica e dos serviços ecossistêmicos, a quase uma centena
de comunidades de culturas e práticas distintas. Além disso, também
suporta atividades de turismo , de recreação, de serviços, de produ-
ção e de transformação (SCHEFFER DA SILVA et al., 2016).

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

A relevância da combinação de patrimônio natural e cultural


existente no litoral do Paraná pode ser justificada pelo elevado nú-
mero de atos declaratórios internacionais estabelecidos para a re-
gião. Dentre os principais deve-se citar:

• Hotspot de biodiversidade: a Mata Atlântica figura entre os


cinco primeiros biomas na lista de hotspots de biodiversi-
dade (MITTERMEIER et al., 2005). Estas regiões caracteri-
zam-se pela grande diversidade de espécies, alto grau de en-
demismo e elevadas perdas de hábitat (BALMFORD et al.,
2000). A situação da Mata Atlântica deve ser considerada de
altíssima criticidade, considerando estar reduzida a cerca
de 12% de sua cobertura original, conforme Fundação SOS
Mata Atlântica e INPE (2017);

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Figura 1 Cartograma de localização do litoral do estado do Paraná

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• Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, reconhecida pela


UNESCO em 1993, tendo toda a Serra do Mar paranaense e
algumas ilhas como zonas núcleo, e as demais paisagens fi-
gurando as zonas de amortecimento e transição desta reser-
va, de modo a recobrir todo o território litorâneo (CORRÊA,
1995; RBMA, 2004);
• Sítios do Patrimônio Mundial Natural, em 1999 recebe esta
outra titulação da UNESCO, cujo objetivo é proteger áreas
consideradas excepcionais do ponto de vista da diversida-
de biológica e da paisagem. Neles, a proteção ao ambiente,
ao patrimônio arqueológico, o respeito à diversidade cultu-
ral e às populações tradicionais são objeto de atenção espe-
cial. Cabe destacar que em território do litoral paranaense
estão abrangidas por este título nove unidades de conserva-
ção, além de manguezais e ilhas oceânicas (UNESCO, 1999);
• Sítios Ramsar, em 2017 a Estação Ecológica de Guaraqueça-
ba e cerca de 40 mil hectares da Área de Proteção Ambiental
de Guaratuba receberam este título. A Lista de Zonas Úmidas
de Importância Internacional é o instrumento adotado pela
Convenção Ramsar para atingir o objetivo de promover a coo-
peração entre países na conservação e no uso racional das zo-
nas úmidas no mundo, de acordo com o reconhecimento da
sua importância ecológica e dos seus valores social, econômi-
co, cultural, científico e recreativo (ICMBio, 2017).

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No âmbito regional já em 1986 a Serra do Mar foi objeto de tom-


bamento (PARANÁ, 1986), convertendo-se em uma área delimitada
com restrições quanto ao uso e ocupação da terra. No ano de 2006
foi reconhecido por meio de portaria o Mosaico Lagamar (MMA,
2006), que abrange o território do litoral do Paraná e litoral sul de
São Paulo, onde cerca de 50 unidades de conservação devem traba-
lhar de forma integrada e participativa na gestão do território.
Quando analisado o contexto legal da conservação da biodiver-
sidade deve-se enfatizar a lei 9.985, que institui o Sistema Nacio-
nal de Unidades de Conservação (SNUC). O SNUC apresenta como
conceito para áreas protegidas brasileiras as unidades de conserva-
ção (UC), definidas como espaços territoriais e seus recursos am-
bientais com características naturais relevantes com objetivos de
conservação (BRASIL, 2000).
Na atualidade, o litoral dispõe de um significativo número de
UC, em todas as esferas de gestão. Estas recobrem 82,6% dos mu-
nicípios litorâneos, condição muito questionada por setores da
sociedade interessados na expansão do modelo convencional de
desenvolvimento econômico, já que a existência de unidades de
conservação restringe determinados usos do território. Outros gru-
pos também questionam a presença destas unidades, diante de
conflituosos processos de criação, que em determinadas situações
careceram de análises acuradas quanto ao estabelecimento de seus
limites. Todavia, deve-se questionar também qual o grau de imple-
mentação das UC, avaliando em que medida cumprem suas finali-
dades de conservação da natureza.

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Nesse contexto, pretende-se no presente capítulo, no seio de


uma abordagem geográfica, descrever a evolução territorial e ana-
lisar o grau de implementação das 44 UC delimitadas no litoral do
estado do Paraná.

EVOLUÇÃO TERRITORIAL DAS UC NO LITORAL DO PARANÁ


As primeiras unidades de conservação criadas no mundo tinham,
sobretudo, o propósito de manter as paisagens originais e reservas de
caça e turismo . Nos Estados Unidos surge a preocupação com a per-
da de terras públicas e bosques, fato que inspirou o processo de cria-
ção de parques nacionais. O Parque Nacional de Yellowstone, criado
em 1872 foi o primeiro do mundo nesse perfil, constituindo-se, con-
forme MILANO (2001), no marco moderno da proteção de áreas natu-
rais contra os processos destrutivos da ação humana.
Inspirado na criação do Parque Nacional de Yellowstone, o bra-
sileiro André Rebouças chegou a propor a criação dos Parques Na-
cionais das Sete Quedas e da Ilha do Bananal, já em 1876 (BRITO,
2003). Porém, somente em 1937 foi criado o primeiro Parque Nacio-
nal Brasileiro, o de Itatiaia/RJ.
Com o fortalecimento da necessidade da conservação da natu-
reza surgiram as entidades ambientalistas, e na década de 1940 veio
a se formalizar a International Union for Conservation of Nature
(IUCN), importante organização até o presente.
Com o aprofundamento das preocupações com o meio ambien-
te, conferências para o amplo debate dos temas passaram a ser
necessárias. Foi então que ocorreram importantes marcos como

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a primeira assembleia geral da IUCN e a Conferência das Nações


Unidas sobre Meio Ambiente Humano, dada pela UNESCO, em ju-
nho de 1972, em Estocolmo (MCCORMICK, 1991), que passaram a
influenciar as políticas nacionais.
O Brasil vivenciava nesse período a expansão de sua fronteira
agrícola, bem como a realização de grandes obras de infraestrutura
e altíssimo impacto ambiental, tais como a Transamazônica e Itai-
pu. No Paraná em apenas um século (1890 a 1990) a cobertura flo-
restal que somava 83,4% de seu território foi reduzida para apenas
5,2% (GUBERT-FILHO, 1988). Os principais remanescentes flores-
tais estavam situados na porção litorânea do estado, que não ficou
livre das grandes obras, dentre as quais destacam-se a rodovia BR-
277 e a usina hidrelétrica Parigot de Souza, que segundo estudos
desenvolvidos por BIGARELLA et al. (1978), resultaram na alteração
do balanço sedimentar da baía de Paranaguá . Esses estudos sub-
sidiaram importantes discussões relacionadas a relevância da pre-
servação integral da Serra do Mar, como condição para a manuten-
ção da viabilidade da atividade portuária no litoral.
Nesse cenário inicia-se o processo de criação de unidades de
conservação na região, tendo sido o Parque Florestal Rio da Onça a
primeira, criado no ano de 1981 no município de Matinhos. No ano
seguinte, foram criadas duas Estações Ecológicas (ESEC): a da Ilha
do Mel e a de Guaraqueçaba, tendo esta última sido ampliada em
1986 (Quadro 1).

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Na década de 1980 foram criadas nove UC (Quadro 1), das


quais sete eram de proteção integral24, somando quase 41 mil ha,
enquanto as duas de uso sustentável25 somavam mais de 310 mil
ha (Figura 2).

Quadro 1 Criação de Unidades de Conservação no Litoral do Paraná : 1981 - 1990 e 1991 – 2000

Unidade de Conservação Ano Instrumento Legal de Criação Área (ha)*


ou Ampliação

Período 1981 – 1990


1981
Parque Estadual do Rio da Dec. nº 3.825 (05/06/1981) 118,5
Onça
1982/1986
Estação Ecológica de Guara- Dec. nº 87.222 (31/05/1982); 13.653,6
queçaba {Dec. nº 93.053 (31/07/1986)
1982
Estação Ecológica Ilha do Mel Dec. nº 5.454 (21/09/1982) 2.240,7

24.  Em conformidade ao SNUC (2000) as UC são agrupadas em proteção integral e uso sustentá-
vel. No primeiro grupo prima-se pela manutenção dos ecossistemas livres de alterações causadas
por interferência humana, admitido apenas o uso indireto dos seus atributos naturais. Enquanto
que nas UC de uso sustentável se permite a exploração do ambiente de maneira a garantir a pereni-
dade dos recursos ambientais renováveis e dos processos ecológicos, mantendo a biodiversidade e
os demais atributos ecológicos, de forma socialmente justa e economicamente viável.
25.  No presente estudo para os somatórios das áreas das UC de uso sustentável serão desconside-
radas as áreas superpostas das unidades de proteção integral, com o intuito de se eliminar a dupla
contabilização de territórios protegidos por UC.

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Unidade de Conservação Ano Instrumento Legal de Criação Área (ha)*


ou Ampliação
1984
Área Especial de Interesse Tu- Lei nº 7.919 (22/10/1984) 67.091,7
rístico (AEIT) do Marumbi
1985
APA (Área de Proteção Ambien- Dec. nº 90.883 (31/01/1985) 283.014,0
tal) Federal de Guaraqueçaba

ARIE (Área de Relevante Inte- 1985 Dec. nº 91.888 (05/11/1985) 109,0


resse Ecológico) Pinheiro e Pi-
nheirinho

Parque Nacional do Superagui 1989 Dec. nº 97.688 (25/04/1989) ≅


21.400,0
Parque Estadual Pico do Ma- 1990 Dec. nº 7.300 (24/09/1990) 2.342,41
rumbi

Parque Estadual da Graciosa 1990 Dec. nº 7.302 (24/09/1990) 1.189,6

Período 1991 – 2000

APA Estadual de Guaraqueçaba 1992 Dec. nº 1.228 (27/03/1992) 191.595,5

APA Estadual de Guaratuba 1992 Dec. nº 1.234 (27/03/1992) 199.596,5

Parque Estadual do Pau Oco 1994 Dec. nº 4.266 (21/11/1994) 905,7

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Unidade de Conservação Ano Instrumento Legal de Criação Área (ha)*


ou Ampliação

Parque Estadual Roberto Ri- 1994 Dec. nº 4.267 (21/11/1994) 2.698,7


bas Lange

Reserva Natural Salto Morato 1994 Portaria IBAMA n° 132 (7/12/1994) 2.253,0

Reserva Natural da Águas 1995 Portaria IAP nº 046 (2003); Porta- 3.426,6
** ria IAP nº 058 (2011)

Parque Municipal da Cotinga 1996 Lei nº 1.959 (07/11/1996 ≅ 854,8

Estação Ecológica do Guara- 1997 Dec. nº 1.230 (27/03/1997) 1.150,0


guaçu

Parque Nacional do Superagui 1997 Lei nº 9.513 (20/11/ 1997) 33.860,4


- Ampliação

Parque Estadual do Boguaçu 1998 Dec. nº 4.056 (26/02/1998) 6.052,0

Floresta Estadual do Palmito 1998 Dec. nº 4.493 (17/06/1998) 530,0

RPPN (Reserva Particular do 1999 Portaria IBAMA nº 99 400,8


Patrimônio Natural) Reserva (25/11/1999); Portaria IBAMA nº
Ecológica Sebuí 03 (03/02/2000)

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Unidade de Conservação Ano Instrumento Legal de Criação Área (ha)*


ou Ampliação

Reserva Natural Papagaio-de- 1999 Portaria IAP nº 157 e 160 6.702,1


-cara-roxa ** (30/08/2007); Portaria IAP nº 059
(30/03/2011)

Reserva Natural Guaricica 2000 Portaria IAP nº 184 (2/09/2004), 8.847,8


** Portaria IAP nº 159 (30/08/2007)
* Área apresentada no instrumento legal de criação ou de ampliação da UC
** A regularização fundiária e criação das RPPN ocorre posteriormente
Fonte: ICMBio (2017), IAP (2017), SPVS (2017), OC2 (2017).

Figura 2 Gráfico representativo da evolução decenal da cobertura


territorial por grupo de UC no litoral do Paraná

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Em 1984 foi criada a Área de Especial Interesse Turístico (AEIT)


do Marumbi, visando a conservação da Serra do Mar, sendo esta
a única UC estadual que até o presente não está adequada ao sis-
tema de categorização estabelecido no âmbito do SNUC. Com a
função de zona de amortecimento da ESEC de Guaraqueçaba foi
criada em 1985 a Área de Proteção Ambiental (APA) de Guaraque-
çaba, valorizando a conservação da Floresta Atlântica, do patrimô-
nio arqueológico (sambaquis) e do modo de vida caiçara. No mes-
mo ano, cria-se a Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) de
Pinheiro e Pinheirinho, que contemplava importantes sítios de re-
produção de aves, tal como o papagaio-de-cara-roxa, espécie endê-
mica da região. O Parque Nacional (PARNA) de Superagui teve sua
primeira delimitação estabelecida no ano de 1989, constituindo-se
na quarta UC do litoral norte paranaense, evidenciando a relevân-
cia ecológica da região.
No decênio seguinte (1991 a 2000) sob influência de eventos in-
ternacionais atrelados à temática ambiental26 foram criadas 13 UC
(Quadro 1), além da ampliação da extensão do PARNA de Supera-
gui, que ocorrera em função da presença de aves marinhas na Praia
Deserta e da ampliação da área de ocorrência do mico-leão-da-
-cara-preta, primata descoberto em 1990 e endêmico da área. Com
essa ampliação algumas comunidades foram incluídas dentro dos

26.  Deve-se destacar a realização do 4º Congresso Mundial de Parques, realizado em Caracas (Ve-
nezuela) em 1992, onde se estabelece o conjunto de categorias de áreas protegidas, adotadas pela
IUCN ainda válidas no presente. Outro evento de extrema relevância foi a Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, também conhecida como Eco-92, realizada
na cidade do Rio de Janeiro em 1992, cujo objetivo foi debater os problemas ambientais mundiais.

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limites do parque, gerando importantes conflitos entre a conserva-


ção da natureza e comunidades tradicionais. O decreto federal que
amplia os limites do PARNA, também extingue a ARIE Pinheiro e
Pinheirinho e altera os limites da APA e da ESEC de Guaraqueçaba,
excluindo das mesmas as áreas sobrepostas ao parque.
Nesse período são criados outros dois parques estaduais (PE) na
Serra do Mar: PE do Pau Oco e PE Roberto Ribas Lange, em 1994.
Duas APA estaduais foram criadas em 1992: APA de Guaratuba e
APA de Guaraqueçaba, sendo que esta última contempla integral-
mente os limites do município homônimo, incluindo, portanto, as
porções do mesmo não abrangidas pela APA Federal27.
Iniciativas privadas inovadoras voltadas à conservação da natu-
reza ocorreram na região nesse período, com a criação de Reservas
Particulares28. A Fundação Grupo Boticário criou em 1994 a Reser-
va Natural Salto Morato, enquanto que a SPVS (Sociedade de Pro-
teção à Vida Selvagem e Educação Ambiental), sob influência do
protocolo de Kyoto29 obtém financiamento para a instalação de três
Reservas Particulares, visando o desenvolvido de projetos voltados

27.  Além do PARNA de Superagui, não estão incluídas na APA Federal de Guaraqueçaba a sede ur-
bana do município de Guaraqueçaba; as porções das ilhas do Superagui a das Peças não integran-
tes do PARNA de Superagui; e a porção norte do município correspondente ao território em litígio
com o estado de São Paulo, a qual soma pouco mais de 30 mil ha.
28.  No âmbito do presente estudo considera-se Reserva Particular todo o território gerido pelo
proprietário, conforme descrito no plano de manejo da unidade. Isto ocorre porque até o pre-
sente momento somente algumas propriedades que compõem estas reservas foram convertidas
em RPPN.
29.  O Protocolo de Kyoto constitui um tratado complementar à Convenção-Quadro das Nações
Unidas sobre Mudança do Clima, definindo metas de redução de emissões para os países desen-
volvidos e os que, à época, apresentavam economia em transição para o capitalismo, considerados

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ao sequestro de carbono. No município de Guaraqueçaba foi cria-


da em 1999 a RPPN (Reserva Particular do Patrimônio Natural) Re-
serva Ecológica Sebuí.
Outra inovação que ocorreu nesse período foi a criação da pri-
meira UC municipal, correspondente ao Parque Municipal da Cotin-
ga, situado no município de Paranaguá . Ao findar dos anos de 1990,
três unidades de proteção integral foram criadas na esfera estadual,
todas situadas na planície litorânea: ESEC do Guaraguaçu (1997), PE
do Boguaçu e Floresta Estadual do Palmito (ambas em 1998).
Dessa forma, o segundo decênio analisado foi marcado pela
criação de seis unidades de proteção integral, que somam 15.263,2
ha de novas porções de territórios protegidos com maior grau de
restrição. Nesse período, também foram criadas sete unidades de
uso sustentável que juntas totalizam mais de 400 mil ha. Ao se ex-
cluir as sobreposições com as unidades de proteção integral, bem
como entre as próprias unidades do grupo de uso sustentável, veri-
fica-se ainda assim um importante acréscimo às áreas deste grupo
de unidades, referente ao valor de 73,5%.
No que corresponde ao decênio de 2001 a 2010 notou-se o maior
número de novas unidades, ou seja, foram criadas 17 UC, além da
significativa ampliação do PE do Marumbi (Quadro 2). Entretanto,
onze destas unidades denotaram áreas inferiores a 30 ha. Nesse pe-
ríodo, de análise merece destaque a promulgação de importantes
leis atreladas à conservação da natureza e de ordenamento terri-

os responsáveis históricos pela mudança atual do clima. Criado em 1997, o Protocolo entrou em vi-
gor no ano 2005 (MMA, 2017).

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torial30, assim como a elaboração de estudos ambientais e abertura


de processos de licenciamento ambiental de grandes empreendi-
mentos portuário-industriais e de infraestrutura na região, motiva-
dos pelo positivo momento econômico que o Brasil vivia, sobretu-
do no final desse decênio.

Quadro 2 Criação de Unidades de Conservação no Litoral do Paraná : 2001- 2010 e 2011 – 2017

Instrumento Legal de
Unidade de Conservação Ano Área (ha)*
Criação ou Ampliação
Período 2001 – 2010
Parque Nacional Saint Hilaire-Lange 2001 Lei nº 10.227 (23/05/2001) 25.118,9
Parque Natural Municipal do Manguezal do 2001 Dec. nº 706 (10/09/2001) 24,9
Rio Perequê
Parque Natural Municipal da Restinga 2001 Dec. nº 706 (10/09/2001) 407,5
Parque Estadual da Ilha do Mel 2002 Dec. nº 5.506 (21/03/2002) 337,8
RPPN Sítio do Bananal 2002 Portaria IBAMA nº 49 28,8
(19/04/2002)
Parque Estadual da Serra da Baitaca 2002 Dec. nº 5.765 3.053,2
(05/06/2002)
Parque Estadual Pico do Paraná 2002 Dec. nº 5.769 4.333,8
(05/06/2002)
Parque Natural Municipal Lagoa do Parado 2004 Dec. nº 5756 (16/11/2004) 3.600,0
Parque Municipal Morro do Boi 2006 Lei nº 1.067 (05/12/2006) ≅ 13,7
Parque Municipal Morro do Sambaqui 2006 Lei nº 1.067 (05/12/2006) ≅ 6,3
Parque Municipal Praia Grande 2006 Lei nº 1.067 (05/12/2006) ≅ 17,3

30.  Dentre as leis promulgadas neste período deve-se enfatizar: a Lei nº 9.985/2000, referente ao
SNUC; Estatuto das Cidades (Lei nº 10.257/2001), já que neste período foram criados 10 parques
municipais, muitos dos quais atrelados ao processo de elaboração dos Planos Diretores Munici-
pais; e a Lei da Mata Atlântica (Lei nº 11.428/2006).

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Instrumento Legal de
Unidade de Conservação Ano Área (ha)*
Criação ou Ampliação
Parque Municipal do Sertãozinho 2006 Lei nº 1.067 (05/12/2006) ≅ 20,3
Parque Municipal do Tabuleiro 2006 Lei nº 1.067 (05/12/2006) ≅ 3,6
RPPN Vô Borges 2007 Portaria IAP nº 161 12,5
(30/08/2007)
Parque Estadual Pico do Marumbi - Am- 2007 Dec. nº 1.531 (02/10/2007) 8.745,5
pliação
Parque Municipal do Guará 2008 Dec. nº 2.375 (19/03/2008) ≅ 6,6
Parque Municipal Ambiental Linear do Em- 2010 Dec. nº 1.324 (01/06/2010) 27,26
boguaçu
RPPN Perna do Pirata 2010 Portaria ICMBio nº 53 18,55
(13/06/2010)
Período 2011 – 2017
RPPN Reserva da Pousada Graciosa 2011 Portaria ICMBio nº 89 17,3
(11/11/2011)
Reserva Biológica Bom Jesus 2012 Dec. s/nº (05/06/2012) 34.179,7
Parque Nacional Marinho das Ilhas dos Cur- 2013 Lei nº 12.829 (20/06/2013) 1.359,7
rais
RPPN Encantadas 2014 Portaria IAP nº 190 18,3
(02/07/2014)
Parque Nacional Guaricana 2014 Dec. s/nº (13/10/2014) 49.286,9
Parque Municipal Ilha dos Valadares 2016 Dec. nº 3768 (23/05/2016) 41,0
Estação Ecológica do Guaraguaçu – Am- 2017 Dec. nº 7097 (06/06/2017) 4.736,41
pliação
Parque Estadual do Palmito – Ampliação 2017 Dec. nº 7094 (06/06/2017) 1.782,44
* Área apresentada no instrumento legal de criação ou de ampliação da UC
Fonte: ICMBio (2017), IAP (2017), SPVS (2017), OC2 (2017).

Dentre as UC criadas, 14 corresponderam à categoria parque, so-


mando 45.716,7 ha. Destaque deve ser dado: ao PARNA Saint-Hilai-

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re/Lange (criado em 2001), por apresentar mais de 25 mil hectares;


aos parques estaduais da Ilha do Mel, da Serra da Baitaca e Pico Pa-
raná, criados no ano de 2002 e que juntos somam 7.724,8 ha; e aos
parques naturais municipais Lagoa do Parado e da Restinga, sen-
do que o primeiro totaliza 3.600 ha, estando situado no município
de Guaratuba e conectado ao PARNA Saint-Hilaire/Lange, enquan-
to que o segundo soma pouco mais de 400 ha, localizado no muni-
cípio de Pontal do Paraná .
Os outros oito parques municipais além de apresentarem pe-
quenas extensões territoriais, estão situados em porções com ele-
vado grau de antropização, sobretudo urbanas. Dessa forma, seus
objetivos estão predominantemente associados à qualidade am-
biental nas cidades nos quais estão inseridos. Por fim, as três RPPN
criadas nesse período estão situadas no município de Morretes e
somam juntas 59,9 ha.
Ao se observar a Figura 2, nota-se que nesse terceiro decênio
houve a estagnação no processo de delimitação de áreas protegidas
em novas porções do território litorâneo, diante de um acréscimo
de apenas 0,7%. Entretanto, percebe-se um importante acréscimo
em territórios do grupo de proteção integral, correspondente a 77%.
Isto se deveu ao fato de que as UC de maior extensão territorial fo-
ram criadas sobre UC de uso sustentável pré-existentes, o que jus-
tifica a queda de 7,4% nas áreas protegidas exclusivamente por uni-
dades deste grupo.
No último período analisado, referente aos anos de 2011 a 2017
(Quadro 2), foram criadas apenas seis UC, das quais três federais

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de proteção integral: Reserva Biológica (REBIO) Bom Jesus (2012),


PARNA Marinho das Ilhas dos Currais (2013) e PARNA de Guari-
cana (2014), que juntas somam 84.851 hectares. Ainda, no tocante
às UC de proteção integral deve-se valorizar a ampliação da ESEC
do Guaraguaçu e do PE do Palmito31, que juntos passaram a somar
6.475,36 ha.
No ano de 2016 iniciou-se o processo de criação do Parque Mu-
nicipal Ilha dos Valadares, o qual se encontra conectado com o PE
do Palmito, no município de Paranaguá . Nesse período, ainda, fo-
ram criadas duas RPPN, uma em Morretes e outra em Antonina,
cujas áreas somadas correspondem a 35,6 ha.
Quando se observa o gráfico representando na Figura 2 é possí-
vel perceber que esse último decênio demonstrou dinâmica similar
ao anterior, quando ocorre um aumento de apenas 1,8% na delimi-
tação de novas áreas protegidas por UC. Porém, também se obser-
va um importante acréscimo na criação de UC de proteção integral,
correspondente ao valor de 90%, tendo sido estas criadas predomi-
nantemente sobre UC de uso sustentável, justificando a redução de
16,1% das áreas cobertas exclusivamente por este grupo. Represen-
tada na Figura 3 tem-se a evolução espaço-temporal das UC no lito-
ral do Paraná , referente ao período de 1981 a 2017.

31.  O documento que amplia a extensão desta UC também a recategoriza, com o intuito de ade-
quá-la ao SNUC.

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Figura 3 Cartograma com a evolução territorial de 1981 a 2017 das UC no litoral do Paraná , com a
indicação das unidades criadas ou ampliadas em cada decênio

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O CENÁRIO ATUAL DAS ÁREAS PROTEGIDAS POR UCS NO


LITORAL
No Quadro 3 tem-se a relação das 44 unidades de conservação
existentes no litoral do Paraná , estando as mesmas representadas
espacialmente na Figura 4, conforme grupos definidos no SNUC,
ou seja, proteção integral e uso sustentável.

Quadro 3 Unidades de Conservação no Litoral do Paraná

Número* Nome da Unidade de Conservação Esfera de Gestão Área (ha)**


1 Estação Ecológica de Guaraqueçaba Federal 4.374,2
2 Estação Ecológica Ilha do Mel Estadual 2.191,7
3 Estação Ecológica do Guaraguaçu Estadual 4.686,4
4 Reserva Biológica Bom Jesus Federal 34.201,7
5 Parque Nacional do Superagui Federal 34.113,7
6 Parque Nacional Saint Hilaire-Lange Federal 24.366,5
7 Parque Nacional Marinho das Ilhas dos Currais Federal 1.350,3
8 Parque Nacional Guaricana Federal 49.300,0
9 Parque Estadual do Rio da Onça Estadual 119,2
10 Parque Estadual Pico do Marumbi Estadual 8.794,6
11 Parque Estadual da Graciosa Estadual 1.147,6
12 Parque Estadual do Pau Oco Estadual 880,8
13 Parque Estadual Roberto Ribas Lange Estadual 2.801,9
14 Parque Estadual do Boguaçu Estadual 6.660,6
15 Parque Estadual do Palmito Estadual 1.788,9
16 Parque Estadual da Ilha do Mel Estadual 363,3
17 Parque Estadual da Serra da Baitaca Estadual 3.008,8
18 Parque Estadual Pico do Paraná Estadual 4.332,9
19 Parque Municipal da Cotinga Municipal 854,8
20 Parque Municipal Rio Perequê (Manguezal) Municipal 28,0

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Número* Nome da Unidade de Conservação Esfera de Gestão Área (ha)**


21 Parque Municipal da Restinga Municipal 398,0
22 Parque Municipal Natural Lagoa do Parado Municipal 3.509,6
23 Parque Municipal Morro do Boi Municipal 13,7
24 Parque Municipal Morro do Sambaqui Municipal 6,3
25 Parque Municipal Praia Grande Municipal 17,3
26 Parque Municipal do Sertãozinho Municipal 20,3
27 Parque Municipal do Tabuleiro Municipal 3,6
28 Parque Municipal do Guará Municipal 6,6
29 Parque Municipal Linear do Emboguaçu Municipal 27,3
30 Parque Municipal Ilha dos Valadares Municipal 41,0
31 Reserva Natural Salto Morato/Fazenda Figueira Particular / FGB 2.252,8
32 RPPN Reserva Ecológica Sebuí Particular 425,7
33 RPPN Sítio do Bananal Particular 31,5
34 Reserva Natural Papagaio-de-cara-roxa Particular / SPVS 6.702,1
35 Reserva Natural Guaricica Particular / SPVS 8.847,8
36 Reserva Natural das Águas Particular / SPVS 3.426,6
37 RPPN Vô Borges Particular 12,5
38 RPPN Perna do Pirata Particular 18,6
39 RPPN Reserva da Pousada Graciosa Particular 23,4
40 RPPN Encantadas Particular 19,4
41 APA Federal de Guaraqueçaba Federal 245.839,5
42 APA Estadual de Guaraqueçaba Estadual 231.799,4
43 Área Especial de Interesse Turístico do Marumbi Estadual 67.091,8
44 APA Estadual de Guaratuba Estadual 199.447,0
* Numeração apresentada nos cartogramas deste capítulo
** Áreas calculadas em ambiente SIG, a partir da delimitação dos memoriais descritivos das UC
Fonte: ICMBio (2017), IAP (2017), SPVS (2017), OC2 (2017).

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Figura 4 Cartograma com as unidades de conservação de proteção integral e de uso sustentável no


litoral do Paraná

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Dentre as dez categorias de unidades de conservação estabe-


lecidas pelo SNUC, no litoral do Paraná ocorrem cinco, conforme
se pode observar na Figura 5. As categorias mais restritivas são as
ESEC e REBIO, que têm por objetivo a preservação da natureza e
na realização de pesquisas científicas. Correspondem à categoria
Ia: Strict Nature Reserve, da IUCN, que enfatiza a importância des-
sas áreas como de referência para pesquisas científicas e monitora-
mento. As três ESEC existentes no litoral recobrem apenas 1,9% do
território, enquanto que a REBIO Bom Jesus recobre 5,6%.

Figura 5 Percentuais abrangidos por UC segundo categorias do SNUC no litoral do Paraná

A terceira categoria de proteção integral existente refere-se aos


parques, sendo a mais representativa, tanto em número de unida-

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des (26 no total) quanto em extensão territorial (143.866,4 ha), re-


cobrindo 55,5% dos municípios litorâneos. Os parques têm como
finalidade a preservação de ecossistemas naturais de grande rele-
vância ecológica e beleza cênica, permitindo a realização de pes-
quisas científicas, o desenvolvimento de atividades de educação e
interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e
de turismo ecológico. Essa categoria encontra-se em consonância
com a II – National Parks da IUCN.
As unidades de uso sustentável perfazem um total de 411.686,94
ha, do qual 95% referem-se às APA32 e 5% às reservas particulares.
Estas abarcam as RPPN, que apesar de representarem um reduzido
percentual, são, para Pinto et al. (2006), importantes para o fortale-
cimento do SNUC, especialmente no que tange a promoção da co-
nectividade da paisagem e a pesquisa sobre biodiversidade.
As APA correspondem à categoria V- Protected Landscapes Seas-
capes da IUCN, que tem por objetivo proteger importantes paisa-
gens e a conservação associada às interações com os seres huma-
nos através de práticas tradicionais. De acordo com o SNUC, as APA
têm por propósito o ordenamento territorial e a conservação de re-
levância regional. Apesar de recorrentemente criticadas pela bai-
xa efetividade, Pádua (2011) aponta a APA Federal de Guaraqueçaba
como um caso positivo, que vem sendo bem manejada.

32.  A AIET do Marumbi no presente capítulo foi analisada como pertencente à categoria APA,
diante de seu modelo de gestão que se demonstra similar ao das APA da região. Cabe mencionar
que o processo para esta recategorização se encontra em curso pelo órgão gestor.

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Quando se analisa o recobrimento por UC apresentado pe-


los municípios litorâneos (Figura 6) verifica-se que os municípios
de Guaraqueçaba e Guaratuba têm 100% e 98,3% de seus territó-
rios abrangidos por unidades de conservação, devendo-se desta-
car as APA homônimas como responsáveis por isto. Guaraqueçaba
tem pouco mais de 55 mil hectares de unidades de proteção inte-
gral em seu território, onde predominantemente o PARNA de Supe-
ragui recobre manguezais e planícies marinhas, a REBIO, escarpas
e morros da Serra do Mar e a ESEC, os manguezais. Em Guaratuba
os PARNA Saint Hilaire-Lange e Guaricana protegem as escarpas e
morros da Serra do Mar. Morros baixos e litorâneos adjacentes ao
Saint-Hilaire são cobertos pelo parque municipal Lagoa do Para-
do. Já, o PE do Boguaçu contempla trechos de manguezal e planície
costeira recobertos por restingas.

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Figura 6 Percentual de cada município do litoral do Paraná , inserido em unidades de conservação de


proteção integral e uso sustentável

O município de Antonina apresenta o substancial percentual de


84,6% de áreas protegidas por UC, o que inclui integralmente três
unidades e partes de outras cinco. No total são pouco mais de 14 mil
ha de UC de proteção integral e outros 60 mil de uso sustentável. A
porção estuarina do município está integralmente inserida na APA
de Guaraqueçaba.
Morretes e Paranaguá apresentam cerca de 60% de seus terri-
tórios cobertos por unidades, praticamente metade de cada cate-
goria. O primeiro município soma mais de 41 mil ha, enquanto o

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

segundo 47 mil ha de áreas protegidas. Em Morretes as unidades


recobrem praticamente toda a porção serrana do município, já em
Paranaguá nota-se uma significativa diversidade de ambientes in-
seridos nas UC, desde a porção aquática do município, ilhas, man-
guezais, extensas porções de planície de restinga e a Serra do Mar.
Por sua vez, os municípios que apresentam os menores percen-
tuais de seus territórios protegidos são justamente os que detém
as menores superfícies. Em Matinhos a Serra do Mar está recober-
ta pelo PARNA Saint-Hilaire/Lange e pela APA de Guaratuba, além
da existência de parques de pequena extensão na planície costeira.
Pontal do Paraná destoa dos demais municípios litorâneos. Embo-
ra seja a porta de entrada para o PE da Ilha do Mel (principal atra-
tivo turístico da região), apresenta somente 2,4% de seu território
protegido por UC, o qual recobrem porções de manguezais e restin-
gas pressionadas pelo intenso processo de urbanização.

A GESTÃO DAS UCS NO LITORAL DO PARANÁ


As Unidades de Conservação têm a gestão relacionada à esfera
as quais foram criadas. No litoral do Paraná são 14 unidades fede-
rais, 20 estaduais e 10 municipais33. Dentre as unidades analisadas,
em geral, as federais e estaduais apresentam objetivos atrelados
à conservação da natureza, com foco na biodiversidade, serviços
ecossistêmicos e manutenção do modo de vida tradicional. As uni-

33.  As RPPN, ainda que particulares, são criadas por meio de portarias junto ao ICMBio (federal),
ao IAP (estadual), ou ao município onde se localizam, remetendo-se a estas esferas de gestão para
o manejo de suas áreas. No litoral do Paraná dentre as 10 Reservas Particulares existentes cinco fo-
ram criadas na esfera federal e outras cinco na esfera estadual.

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dades federais são geridas pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de


Conservação da Biodiversidade), à medida que as estaduais estão
sob responsabilidade do IAP (Instituto Ambiental do Paraná).
O cartograma representado na Figura 7 evidencia a espacialidade
das esferas de gestão das UC no litoral do Paraná , devendo-se salien-
tar a sobreposição entre as esferas estadual e federal, cuja área soma
quase 260 mil ha. Esta situação revela a necessidade de integração
entre os gestores dessas duas instituições. Ainda, ao se analisar a Fi-
gura 7 merecem destaque os territórios de gestão exclusiva do órgão
ambiental estadual, os quais somam mais de 237 mil hectares. Es-
tas áreas estão situadas principalmente: 1) na porção central da Serra
do Mar, onde localiza-se um mosaico de unidades estaduais, com a
existência de seis parques, circundados pela AIET do Marumbi; 2) na
Ilha do Mel; 3) na planície de restinga entre o rio Guaraguaçu e a por-
ção urbanizada de Paranaguá ; e 4) no sul da APA de Guaraqueçaba.
Os territórios de gestão exclusiva do ICMBio superam os 77 mil ha,
referindo-se ao Parque Nacional Marinho das Ilhas dos Currais, por-
ções oeste e sudoeste da APA de Guaraqueçaba e noroeste do Parque
Nacional de Guaricana.
Por sua vez, as unidades municipais, predominantemente, têm
a função de potencializar a qualidade de vida urbana. Estas uni-
dades somam 4.926,3 ha, sendo todas correspondentes à categoria
parque. O Parque Municipal Lagoa do Parado é uma exceção haja
vista sua extensão, superior a 3,5 mil ha, e sua localização adjacente
ao PARNA Saint Hilaire-Lange/Lange.

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As Reservas Particulares somam o expressivo valor de 21.760,5 ha,


estando 86% destas áreas sobrepostas a outras unidades de conser-
vação. Por exemplo, cerca 1.600 ha da Reserva Natural do Papagaio-
-de-cara-roxa apresentam superposição com outras três UC: ESEC,
APA Federal e APA Estadual de Guaraqueçaba, evidenciando a rele-
vância de que estratégias integradas de planejamento e gestão destas
áreas sejam estabelecidas. Cabe ainda salientar o importante papel
prestado pelas unidades particulares no litoral norte, já que embora
sejam pertencentes ao grupo de unidades de uso sustentável, confor-
me o SNUC, na prática são geridas como sendo de proteção integral.
A gestão das áreas deve se dar através de suas equipes formadas
por técnicos e analistas dos órgãos ambientais, ou contratados pelo
proprietário no caso das Reservas Particulares, subsidiadas pelos
conselhos gestores34, orientadas pelos planos de manejo35. Na Figu-
ra 8 estão indicadas quais UC apresentam conselho gestor criado,
bem como aquelas que apresentam plano de manejo elaborado.

34.  Os conselhos deverão promover a integração e conciliação da unidade com outros espaços ter-
ritoriais e segmentos da sociedade em seu entorno. Entre outras coisas, deverão opinar sobre ativi-
dades potencialmente poluidoras causadoras de impacto na UC e o acompanhar os processos de
elaboração, implementação e revisão plano de manejo. Segundo o SNUC (BRASIL, 2000), os con-
selhos gestores podem ser consultivos ou deliberativos. Os das unidades de proteção integral deve-
rão ser consultivos, enquanto que os de uso sustentável poderão ser consultivos ou deliberativos, de
acordo com a categoria. No caso das APA não há especificação pela lei, cabendo à gestão a decisão.
35.  “Documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma unidade
de conservação , se estabelece o seu zoneamento e as normas que devem presidir o uso da área e
o manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à gestão
da unidade” (BRASIL, 2000).

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Figura 7 Cartograma com a representação das esferas de gestão das UC no litoral do Paraná

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Figura 8 Cartograma com as UC do litoral do Paraná e seus instrumentos de gestão

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As unidades de conservação federais não possuem plano de ma-


nejo, sendo que os Parques Nacionais Marinho das Ilhas dos Cur-
rais e de Guaricana, datam dos anos de 2013 e 2014, o que justifica,
relativamente, essa lacuna. A REBIO Bom Jesus, a APA e a ESEC de
Guaraqueçaba estão em processo de elaboração conjunta de seu
plano de manejo. Já o PARNA de Superagui teve avanços conside-
ráveis na construção de um plano de manejo, entretanto o proces-
so de sua aprovação foi judicializado por ação motivada pelo Movi-
mento dos Pescadores Artesanais do Litoral do Paraná (MOPEAR).
Embora não tenham plano de manejo, todas as unidades fede-
rais anteriores a 2012 apresentam conselhos consultivos formaliza-
dos e vigentes, cujas reuniões ocorrem ao menos, uma vez ao ano.
Iniciativa que deve ser valorizada refere-se à dinâmica realizada
pela APA e pela ESEC de Guaraqueçaba, uma vez que as reuniões
de conselho vêm sendo realizadas de forma integrada, otimizando
tempo e recursos financeiros. Todavia, os seguidos cortes de orça-
mento que tem sofrido o ICMBio, nos últimos anos, tem compro-
metido a dinâmica e frequência das reuniões destes conselhos.
Todas as unidades possuem equipe composta por analistas e
técnicos e apenas o PARNA das Ilhas dos Currais conta com somen-
te um analista. As demais equipes variam entre dois e cinco analis-
tas e técnicos, dos quais um cumpre a função de chefe, com exce-
ção de Guaricana e Currais, que não possuem chefe nomeado.
Das 15 unidades sob gestão estadual, sete não possuem plano
de manejo, quais sejam: PE da Graciosa, PE do Pau Oco, PE Rober-
to Ribas Lange, PE do Boguaçu, PE do Palmito, PE Pico do Paraná

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e APA Estadual de Guaraqueçaba. Sendo que essa última unidade


não apresenta qualquer estrutura de subsídio à gestão, não há che-
fe/gestor e equipe, nem houve qualquer processo de formação de
conselho gestor, ou seja, uma unidade de conservação que existe
apenas no papel.
Dentre as UC que possuem plano de manejo estão a ESEC Ilha
do Mel, o PE Ilha do Mel, o PE Rio da Onça e o PE Serra da Baita-
ca, sendo que os mesmos foram elaborados há menos de dez anos.
Já o do PE do Marumbi e da APA de Guaratuba necessitam de revi-
são, pois seus documentos datam de 1996 e 2009, respectivamente.
Para a ESEC do Guaraguaçu a revisão se faz necessária tanto por já
apresentar mais dez anos (o documento data de 2006), quanto em
decorrência de sua expressiva ampliação territorial. Já no caso da
AEIT do Marumbi, há um plano elaborado em 1987 que chegou a
ser revisado no ano de 2004, mas não foi homologado diante da ne-
cessidade de recategorização da área de acordo com o SNUC.
Na esfera Estadual é interessante notar que todas as unidades já
tiveram algum processo de formação dos conselhos, com exceção
do PE do Boguaçu e a APA Estadual de Guaraqueçaba. De todas as
iniciativas, a da APA Estadual de Guaratuba se consolidou, em 2006
e o PE Serra da Baitaca, em 2009, sendo que esse se encontra inati-
vo no momento. Os PE do Palmito e da Ilha do Mel são, hoje, as uni-
dades cujos processos de formação dos conselhos estão ativos.
Os gestores responsáveis pelas unidades estaduais não possuem
equipe de analistas de suporte, sendo que apenas uma das unida-
des, o PE Pico Paraná, possui gestor exclusivo. As demais não pos-

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suem analista ambiental responsável ou um analista é responsável


por mais de uma unidade. A divisão segue uma lógica espacial, as-
sim, o PE do Palmito, a ESEC do Guaraguaçu e o PE Rio da Onça são
geridos pelo mesmo analista; assim como: o PE do Boguaçu e APA
de Guaratuba; a ESEC Ilha do Mel e o PE Ilha do Mel; e a AEIT do
Marumbi e o PE do Marumbi.
As unidades municipais não possuem plano de manejo, conse-
lho, chefe/gestor ou equipe. Dessas, compete mencionar que o Par-
que Municipal do Guará e dos Valadares ainda não apresentam em
seus processos criação integralmente concluídos.
As Reservas Particulares que possuem plano de manejo e equi-
pe de gestão são aquelas geridas pela SPVS ou pela FGB, institui-
ções do terceiro setor que atuam na área ambiental. As demais não
possuem plano ou qualquer outro instrumento de gestão.
As zonas de amortecimento (ZA)36 consistem em importantes
instrumentos para a gestão das unidades, também influenciando
no ordenamento do território. Ao delinear uma faixa de transição
entre a unidade e áreas não protegidas no seu entorno, limitam-se
os tipos de uso. Apenas quatro unidades a possuem, conforme re-
presentado na Figura 8. A ESEC do Guaraguaçu, é uma delas, sobre
a qual foi delimitada (arbitrariamente) a Zona Especial Portuária,
recém aprovada Plano Diretor de Pontal do Paraná , como apontou

36.  Zona de amortecimento, segundo o SNUC, é o entorno de uma unidade de conservação , onde
as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições específicas, com o propósito de minimi-
zar os impactos negativos sobre a unidade.

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o Parecer Técnico da UFPR37, o que poderá gerar conflitos futuros,


já que de acordo com o Art. 49 do SNUC: “a zona de amortecimento
das unidades de conservação, uma vez definida formalmente, não
pode ser transformada em zona urbana”. Não obstante, o PARNA
Saint Hilaire-Lange que não dispõe de uma ZA definida, sofre com
a expansão urbana irregular em direção aos seus limites no municí-
pio de Matinhos (VIKOU et al., 2017), destacando a necessidade de
delimitação dessas porções.
Outro aspecto preponderante no âmbito da efetiva implemen-
tação das UC, no caso daquelas pertencentes ao grupo de prote-
ção integral, consiste na sua regularização fundiária. Conforme se
pode observar na Figura 9, 17 unidades apresentam-se regulariza-
das, outras sete apresentam mais de 50% de seu território regulari-
zado. Entretanto, sete UC têm percentuais inferiores a 50%, figuran-
do nesse grupo as quatro maiores unidades de proteção integral da
região, que juntas somam mais de 140 mil ha, ou seja, 75% do terri-
tório litorâneo coberto por UC de proteção integral. O PARNA Saint
Hilaire-Lange, por exemplo, apresenta regularização fundiária infe-
rior a 1%, a REBIO Bom Jesus e o PARNA de Guaricana têm somente
9% e 16% de seus territórios regularizados.
Perante a amplitude espacial das UC do litoral do Paraná , con-
forme exaustivamente se discorre no presente capítulo, o Mosai-
co Lagamar38, por meio de seu conselho gestor visa a integração do

37.  Parecer da UFPR enquanto instituição conselheira do COLIT (Conselho do Litoral), na data de
04 de dezembro de 2015 (UFPR, 2015).
38.  Reconhecido por meio da Portaria MMA nº 150, de 8 de maio de 2006.

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processo de gestão dessas unidades, otimizando recursos e ações


desenvolvidas em cada uma delas. Todavia, percebe-se que na
atualidade esta importante instância de articulação institucional
não se encontra mobilizada, e consequentemente não vem cum-
prindo com seu papel.

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Figura 9 Cartograma com percentual de regularização fundiária para as UC de proteção integral e


Reservas Particulares no litoral do Paraná

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GRAU DE IMPLEMENTAÇÃO DAS UCS NO LITORAL DO


PARANÁ
Diante do cenário exposto no que se refere à evolução espaço-
-temporal do processo de criação das UC no litoral do Paraná , so-
mado às análises das categorias, esferas e instrumentos de gestão
existentes para estas UC, propõe-se preliminarmente, no âmbito
deste capítulo, um índice para a avaliação do grau de implementa-
ção das 44 unidades de conservação em estudo.
No Quadro 4 estão representados os oito indicadores conside-
rados na avaliação do grau de implementação, bem como seus res-
pectivos atributos. Os três primeiros indicadores (processo de cria-
ção, definição dos limites e adequação à categorização do SNUC)
receberam peso um, por serem considerados básicos para a im-
plantação de uma UC. Aos demais indicadores foi atribuído peso
dois, por serem considerados atrelados ao processo de planeja-
mento e gestão da unidade.

Quadro 4 Indicadores e atributos considerados para a análise do grau de implementação das UC


do Litoral do Paraná

Indicador de
Atributos
Implementação da UC
1- Processo de criação da UC 0- Não está concluído
1- Está concluído
Indicadores Básicos

2- Definição dos limites da UC 0- Existem dúvidas e incertezas sobre os limites da


UC
1- Processo de demarcação concluído
3- Categorização da UC em con- 0- Não está em conformidade
formidade com o SNUC 1- Está em conformidade

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Indicador de
Atributos
Implementação da UC
4- Plano de Manejo 0- Não apresenta
1- Não apresenta, porém dispõe de outro instrumen-
to de gestão elaborado há menos de 10 anos
1,5- Apresenta. Porém, elaborado há mais de 10 anos
2- Apresenta, tendo sido elaborada há menos de 10
anos
5- Equipe Gestora 0- Não apresenta
0,5- Apresenta apenas um analista (chefe ou não)
Indicadores de Planejamento e Gestão

1,5- Apresenta chefe, além de pelo menos um analis-


ta e um técnico
2- Apresenta chefe e equipe superior a três analis-
tas/técnicos
6- Conselho Gestor 0- Não apresenta
1- Apresenta. Todavia, foram realizadas menos de
uma reunião por ano (últimos cinco anos)
2- Apresenta e se reúne mais de uma vez ao ano (úl-
timos cinco anos)
7- Regularização Fundiária 0- Nada regularizado
0,2- 10% Regularizado
(...)
2- 100% Regularizado
8- Zona de Amortecimento 0- Não apresenta
2- Encontra-se delimitada e oficializada

No caso das UC de proteção integral efetuou-se o somatório li-


near ponderado dos atributos estabelecidos para os oito indicado-
res. Entretanto, para o grupo de UC de uso sustentável foram con-

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siderados os seis primeiros indicadores, à exceção das reservas


particulares, para as quais foram considerados os seguintes indi-
cadores: 1, 2, 3, 4, 5 e 7. Depois de somados os atributos, com o in-
tuito de se viabilizar a comparação entre as UC de diferentes gru-
pos, efetuou-se a relativização pela pontuação máxima possível,
ou seja, para as UC de proteção integral o valor máximo possível
foi 13, enquanto que para as UC de uso sustentável o valor máximo
foi nove. No Quadro 5 tem-se representadas as equações utilizadas
para o cálculo do grau de implementação das UC, bem como exem-
plos ilustrando as aplicações respectivas. De acordo com seu grau
de implementação as UC foram agrupadas em cinco classes, con-
forme demonstrado no Quadro 6.

Quadro 5 Equações utilizadas para o cálculo do grau de implementação das UC e exemplos ilustrativos

Grau de Implementação das UC de Proteção In-


( ∑ indicadores 1 a 8 ) * 100 / ∑ máx
tegral (Parques, ESEC, REBIO)
Exemplo de aplicação: (1 + 1 + 1 + 0 + 1,5 + 2 + 2 + 0) * 100 / 13 =
ESEC de Guaraqueçaba 65,4%
Grau de Implementação das UC de Uso Sustentá-
vel (APA e AIET) ( ∑ indicadores 1, 2, 3, 4, 5 e 6 ) * 100 / ∑ máx

Exemplo de aplicação:
(1 + 1 + 1 + 0 + 1,5 + 2) * 100 / 9 = 72,2%
APA Federal de Guaraqueçaba
Grau de Implementação das Reservas Particulares ( ∑ indicadores 1, 2, 3, 4, 5 e 7 ) * 100 / ∑ máx
Exemplo de aplicação:
(1 + 1 + 1 + 2 + 2 + 0,7) * 100 / 9 = 85,9%
Reserva Natural Salto Morato

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Quadro 6 – Classificação atribuída ao percentual do grau de implementação das UC

% do Grau de Implementação Classificação Atribuída


> 85% Muito Alto
Entre 85 e 70% Alto
Entre 70 e 50% Moderado
Entre 50 e 30% Baixo
< 30% Muito Baixo

Os resultados da aplicação desta metodologia estão apresenta-


dos no Quadro 7 e também na Figura 10. Somente quatro UC apre-
sentaram grau de implementação muito alto, sendo todas Reser-
vas Particulares instaladas no litoral norte. Estas unidades somam
21.229,4 ha, sendo três geridas pela SPVS e uma pela FGB. O único
aspecto pendente para a integral implementação destas UC se refe-
re à conclusão do processo de regularização fundiária, dado o po-
tencial que essa medida tem em ampliar a arrecadação municipal,
por meio do ICMS-Ecológico39.

39.  O ICMS Ecológico é uma categoria de pagamentos por serviços ambientais, que surgiu em 1991
no Paraná, com o intuito de compensar os municípios pela restrição de uso do solo em locais pro-
tegidos. Os critérios variam de acordo com as leis de cada Estado, sendo no caso do Paraná con-
sideradas as unidades de conservação, as terras indígenas e os mananciais de abastecimento. O
cálculo é feito com base nos indicadores: coeficiente de conservação da biodiversidade, área de
unidade de conservação , área do município e fator de conservação. Parâmetros para o cálculo do
coeficiente de conservação são encontrados na Portaria IAP nº134/1997.

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Quadro 7 Grau de Implementação das UC do Litoral do Paraná

Grau de Implemen-
Número Unidade de Conservação
tação
34 Reserva Natural Papagaio-de-cara-roxa 97,0
36 Reserva Natural das Águas 93,3
35 Reserva Natural Guaricica 91,6
31 Reserva Natural Salto Morato/Fazenda Figueira 85,9
44 APA Estadual de Guaratuba 83,3
2 Estação Ecológica Ilha do Mel 73,1
9 Parque Estadual do Rio da Onça 73,1
41 APA Federal de Guaraqueçaba 72,2
3 Estação Ecológica do Guaraguaçu 69,2
5 Parque Nacional do Superagui 66,2
16 Parque Estadual da Ilha do Mel 65,4
1 Estação Ecológica de Guaraqueçaba 65,4
40 RPPN Encantadas 61,1
17 Parque Estadual da Serra da Baitaca 57,7
37 RPPN Vô Borges 55,6
38 RPPN Perna do Pirata 55,6
39 RPPN Reserva da Pousada Graciosa 55,6
32 RPPN Reserva Ecológica Sebuí 50,0
6 Parque Nacional Saint Hilaire-Lange 46,2
43 Área Especial de Interesse Turístico do Marumbi 44,4
10 Parque Estadual Pico do Marumbi 43,1
7 Parque Nacional Marinho das Ilhas dos Currais 42,3
12 Parque Estadual do Pau Oco 42,3
15 Parque Estadual do Palmito 42,3
18 Parque Estadual Pico do Paraná 42,3
11 Parque Estadual da Graciosa 38,5
13 Parque Estadual Roberto Ribas Lange 38,5
8 Parque Nacional Guaricana 37,1

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Grau de Implemen-
Número Unidade de Conservação
tação
4 Reserva Biológica Bom Jesus 36,0
33 RPPN Sítio do Bananal 33,3
14 Parque Estadual do Boguaçu 26,9
20 Parque Natural Municipal do Manguezal do Rio Perequê 23,1
21 Parque Natural Municipal da Restinga 23,1
42 APA Estadual de Guaraqueçaba 22,2
19 Parque Municipal da Cotinga 15,4
22 Parque Natural Municipal Lagoa do Parado 15,4
23 Parque Municipal Morro do Boi 15,4
24 Parque Municipal Morro do Sambaqui 15,4
25 Parque Municipal Praia Grande 15,4
26 Parque Municipal do Sertãozinho 15,4
27 Parque Municipal do Tabuleiro 15,4
29 Parque Municipal Ambiental Linear do Emboguaçu 15,4
30 Parque Municipal Ilha dos Valadares 7,7
28 Parque Municipal do Guará 0,0

Com grau elevado de implementação também figuraram apenas


quatro UC, sendo três de gestão estadual e uma de gestão federal.
As APA de Guaratuba e Federal de Guaraqueçaba estão neste gru-
po, que juntas somam pouco mais de 310 mil ha40. Também se des-
tacaram perante aos indicadores selecionados a ESEC da Ilha do
Mel e o Parque Estadual Rio da Onça. Dez UC demonstraram mo-
derado grau de implementação, sendo três parques e duas estações
ecológicas que juntos somam 46 mil ha. As outras cinco unidades
deste grupo são RPPN, cuja área somada não atinge 500 ha.

40.  Este valor contempla somente as áreas de gestão exclusiva destas duas APA, ou seja, as áreas
de UC de proteção integral e reservas naturais internas às APA foram desconsideradas.

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Quando se observa as unidades que denotaram baixo grau de


implementação o cenário é preocupante, já que estão neste grupo
dez unidades de proteção integral: seis parques estaduais, três par-
ques nacionais e a REBIO Bom Jesus, que juntas totalizam quase
130 mil ha. Cabe salientar que praticamente todo o mosaico de UC
estaduais que visam a proteção da porção central da Serra do Mar,
encontra-se neste grupo de baixo grau de implementação, já que a
AEIT do Marumbi também se insere no mesmo.

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Figura 10 Cartograma com o grau de implementação das UC do Litoral do Paraná

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O maior número de unidades apresentou grau muito baixo de


implementação, sendo 13 de proteção integral, além da APA Esta-
dual de Guaraqueçaba. Todos os parques municipais (total de 12)
revelaram que existem apenas legalmente, já que efetivamente não
foram implementados. Muito embora acredita-se que estas unida-
des municipais, quando adequadamente implementadas, exercerão
importante papel no contexto de mosaico em que estão inseridas.
O outro parque que está neste grupo refere-se ao PE do Boguaçu, já
que sua regularização fundiária ainda não foi iniciada, além de não
apresentar plano de manejo, conselho e equipe gestora.
A proposta de utilização de indicadores para compor o grau de
implementação das UC no litoral do Paraná , deve ser aprimora-
da em trabalhos futuros, considerando outros elementos, como
por exemplo: 1) infraestrutura da sede da unidade; 2) infraestrutu-
ra para ações de fiscalização; 3) monitoramento e análise da efetivi-
dade da implementação do plano de manejo; 4) número médio de
ações de fiscalização realizadas na UC; 5) número de processos de
licenciamento ambiental analisados pela equipe gestora; 6) quan-
tidade de pesquisas apoiadas pela UC, entre outros.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O processo de evolução territorial voltado à criação de áreas
protegidas por unidades de conservação no litoral do Paraná evi-
denciou três períodos principais: 1) de 1981 a 1993 ocorreu um ace-
lerado processo de criação de unidades estatais e, sobretudo, vol-
tadas ao uso sustentável do território (as duas APA e a AEIT foram

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criadas neste período); 2) o período de 1994 a 2000 é marcado pela


criação das grandes reservas privadas, justamente as que hoje apre-
sentam maior grau de implementação; 3) de 2001 a 2017 caracteriza-se
pelo importante acréscimo de áreas de proteção integral, majorita-
riamente sobrepostas as unidades de uso sustentável existentes, bem
como pela criação de mais de uma dezena de parques municipais,
certamente motivados pelo Estatuto das Cidades. Porém, unidades
que não apresentam integração ao mosaico de territórios protegidos
no litoral do Paraná e revelam baixíssimo grau de implementação.
Esse estudo evidencia que embora o litoral do Paraná apresente
29% de seu território coberto por UC de proteção integral e 53% por
UC de uso sustentável, o grau de implementação de suas unidades
revela-se predominantemente entre baixo e muito baixo, o que cor-
responde a 55% das UC analisadas.
Farinos e Romero (2007), Massaris-Cabeza (2008) e Gudiño
(2015) discutem que as experiências bem-sucedidas de ordena-
mento territorial na América Latina primam pela participação so-
cial, desenvolvimento local e valorização do patrimônio natural e
cultural da região. Assim, para a modificação do cenário apresenta-
do seguem recomendações:
• Ampliação significativa, nas três esferas de gestão pública,
dos quadros de técnicos e analistas dedicados às UC;
• Reativação de instâncias de integração entre diferentes esfe-
ras de gestão, tal como o Mosaico Lagamar, com o substan-
cial incentivo à participação de gestores municipais;

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• Elaboração (ou atualização) dos planos de manejo com a


clara definição de indicadores de gestão, de modo a permi-
tir avaliação constante da efetividade da gestão, assim como
permitam a adaptação de processos que denotem desempe-
nho insatisfatório;
• Incentivos ao funcionamento dos conselhos gestores das
UC, viabilizando a realização de pelo menos duas reuniões
anuais, além da formação de grupos de trabalho para a dis-
cussão de temas específicos e relevantes para a unidade, as
câmaras técnicas.
• Fomento à viabilização de núcleos de gestão integrada, tal
como o ICMBio vem desenvolvendo no litoral norte. Por
exemplo, a AEIT do Marumbi e os seis parques estaduais si-
tuados na mesma região, podem perfeitamente ser geridos
por um único corpo técnico e plano de gestão;
• Permanente envolvimento dos gestores e posicionamen-
to do conselho gestor da unidade, frente aos inúmeros ins-
trumentos de ordenamento territorial existentes no litoral
do Paraná . Dentre os quais deve-se citar: Zoneamento Eco-
lógico-Econômico (ZEE), Planos Diretores Municipais, Pla-
no de Desenvolvimento e Zoneamento Portuário (PDZPO),
Plano de Gerenciamento Costeiro (GERCO), Plano da Bacia
Litorânea. Já que a ausência de integração entre estes instru-
mentos pode gerar importantes conflitos territoriais, e con-
sequentemente ameaças à gestão da unidade.

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A FORMAÇÃO E ORGANIZ AÇÃO DE UM GRUPO


DE TRABALHO NO IFPR PARANAGUÁ PARA
A PROMOÇÃO DO DESENVOLVIMENTO
SOCIOAMBIENTAL DA REGIÃO COSTEIRA DO
PARANÁ

Allan Paul Krelling


Emerson Luis Tonetti
Everaldo dos Santos
Leandro Ângelo Pereira
Izabel Carolina Raittz Cavallet
Joana Rupprecht Zablonsky
Priscila Tomie Leme Ike
Ezequiel Antonio de Moura

INTRODUÇÃO
A formação de recursos humanos voltados para a gestão da
zona costeira brasileira é, ainda, um desafio. Essa demanda é rei-
terada pelo Plano Setorial para os Recursos do Mar, da Comissão
Interministerial para os Recursos do Mar (CIRM), o qual apon-
ta para a necessidade de formação docente, além do desenvolvi-
mento de cursos em nível de graduação e pós-graduação. Soma-
-se a isso, de acordo com o Comitê Executivo para a formação de
Recursos Humanos em Ciências do Mar (PPG-Mar), o grande in-

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teresse pela inclusão de formações técnica e profissional no esco-


po do PPG-Mar (KRUG, 2016).
Essa lacuna para a gestão costeira faz com que as instituições
de ensino da rede federal – i. e. Institutos Federais (IFs) – tenham
um papel fundamental para a mudança da realidade dos territórios
costeiros, buscando uma perspectiva de melhor governança, pro-
movendo a integração entre crescimento econômico, qualidade de
vida e qualidade ambiental.
Ainda, a formação de grupos de pessoas pensando e atuando
com ações em ciência e tecnológica tem papel central no desenvol-
vimento dos arranjos produtivos locais na região costeira do Bra-
sil. Há um pequeno número desses grupos voltados para a conser-
vação costeira e sua gestão. De acordo, com o Diretório dos Grupos
de Pesquisa do Brasil, em 2017, existem 32 grupos trabalhando com
a gestão e conservação da região costeira, sendo que apenas um é
coordenado por uma instituição paranaense. Sendo assim, a for-
mação de um novo grupo, com a consequente promoção da pes-
quisa, da extensão e da inovação – pelo ensino técnico, superior e
pós-graduação – torna-se fundamental para a gestão socioambien-
tal do litoral paranaense. Consequentemente, o campus Parana-
guá do Instituto Federal tem grandes possibilidades de contribui-
ção científica para a região costeira paranaense.
Os Institutos Federais são especializados na oferta de educação
profissional e tecnológica nas diferentes modalidades de ensino. As
normativas que regem os IFs orientam as ações, priorizando a atua-

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ção em nível local e regional, com foco social e ambiental, promo-


vendo a economia por meio do empreendedorismo e da inovação.
Com a instalação dos novos campi dos IFs em municípios de
médio e pequeno porte, atrelados a Lei n. 11.892, de 29 de dezembro
de 2008 (BRASIL, 2008), cria-se a possibilidade da formação de no-
vos grupos de trabalho com potencialidade para contribuir com o
desenvolvimento social, econômico e ambiental dos locais em que
então instalados, por meio de ações conjuntas no ensino, na pes-
quisa e na extensão.
No Instituto Federal do Paraná (IFPR) as regulamentações inter-
nas demonstram uma instituição voltada para as pessoas, para a in-
clusão e transformações sociais. Isso se dá por meio da educação
profissional e tecnológica, a qual está pautada na indissociabilida-
de entre o ensino, a pesquisa e a extensão.
Diante do exposto, o presente texto se propõe a (i) apresentar a
formação e consolidação de um grupo de trabalho no IFPR, cam-
pus Paranaguá , o qual contribui para o desenvolvimento socioam-
biental na região costeira do Paraná, bem como (ii) avaliar a uti-
lidade de ferramentas de gestão para organização de grupos de
trabalho multidisciplinares. Por meio da convergência das ações no
ensino, na pesquisa e extensão e na inovação, o grupo se alinha às
normativas institucionais e é direcionado por um projeto agrega-
dor e catalizador de ações voltadas para o território litorâneo do es-
tado. Afinal, o Litoral do Estado do Paraná necessita de produção e
divulgação de conhecimentos voltados às necessidades locais, bem
como de geração de capital humano, para que seja possível con-

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ciliar a manutenção da sua diversidade ambiental com sua rique-


za cultural e estas, por sua vez, com o desenvolvimento econômico.

ASPECTOS HISTÓRICOS DA FORMAÇÃO DO GRUPO DE


TRABALHO SOCIOAMBIENTAL NO IFPR PARANAGUÁ
Histórico
A constituição do grupo de trabalho voltado para o desenvolvi-
mento da região costeira do Paraná é resultante de um processo da
integração entre docentes, do campus Paranaguá do IFPR, do eixo
tecnológico de recursos naturais e do núcleo comum de biologia e
química, em um contexto de demanda regional.
O campus Paranaguá do IFPR iniciou suas atividades em mea-
dos de 2008 com a oferta de três cursos técnicos integrados ao en-
sino médio, dentre eles o curso de aquicultura. Ao longo das ati-
vidades do curso e periódica avaliação do perfil dos estudantes
ingressantes e das demandas do mundo do trabalho na região, o
corpo docente do eixo de recursos naturais percebeu a necessidade
de mudar o curso técnico em aquicultura para o curso técnico em
meio ambiente. Com esta mudança, se ampliou o atendimento da
demanda local e otimizou os recursos materiais e de pessoal, pre-
sentes no campus, com a participação de servidores de outras áreas
e eixos tecnológicos.
Durante o desenvolvimento dos trâmites e atividades requeridas
para essa mudança, entre os anos de 2011 e 2012, houve a manifesta-
ção de interesses comuns na realização de projetos de ensino, pes-
quisa e extensão entre os docentes do eixo de recursos naturais e do

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núcleo comum de biologia. Alguns desses projetos foram executa-


dos, o que permitiu que o grupo passasse a se reunir regularmente
e registrasse os interesses em novos projetos. Esses docentes passa-
ram a ocupar o mesmo espaço de trabalho na sala do eixo de recur-
sos naturais com o objetivo de integrar ainda mais as atividades.
Nas reuniões finais do ano de 2013 e início de 2014, o grupo ma-
nifestou o interesse e a necessidade de direcionar, ainda mais, as
atividades do grupo com a elaboração de um projeto agregador/
projeto guarda-chuva das necessidades e problemáticas da região
costeira do Paraná.
Ao longo desse processo, observou-se que existiam diversas ati-
vidades sendo realizadas focadas no território litorâneo do estado.
Entretanto, havia a necessidade de sistematizar e integrar as ações
para que os projetos constituíssem um programa de desenvolvi-
mento – através do ensino, pesquisa e extensão – para a região.
Durante o ano de 2015 o grupo elaborou um projeto de organi-
zação das atividades para a convergência das ações de ensino, pes-
quisa, extensão e inovação. Posto em documento junto às direções
geral e sistêmicas do campus Paranaguá em processo administra-
tivo, o projeto apresentou o planejamento integrado do grupo e os
projetos realizados e planejados em curto, médio e longo prazos
pelos servidores envolvidos.
Com as devidas modificações o documento foi, também, proto-
colado junto ao Comitê de Pesquisa e Extensão (COPE) do campus,
como projeto guarda-chuva, sob o título de “Desenvolvimento So-
cioambiental da Região Costeira do Paraná”. Neste projeto constam

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objetivos a serem atingidos pelo grupo e uma metodologia de mo-


nitoramento das ações do grupo para (re) planejamento das ativi-
dades em curto, médio e longo prazo. Dessa forma, o projeto agre-
gador (guarda-chuva) deve atuar como catalisador das ações de
ensino, pesquisa e extensão no eixo tecnológico Recursos Naturais/
Meio Ambiente, campus Paranaguá . Além da tríade ensino, pes-
quisa e extensão, foram considerados os processos de inovação em
propostas direcionadas de trabalho e de formação integral dos es-
tudantes dos cursos relacionados ao eixo.
Dentre as ações de médio e longo prazo presentes no documen-
to descrito acima constava a proposta de criação de um curso su-
perior na área ambiental, com o objetivo de verticalizar a oferta
de ensino, já que o eixo já contava com os cursos Técnico em Meio
Ambiente e uma Especialização lato sensu em Gestão Ambiental.
Durante as atividades de coleta de informações e dados para de-
finição do curso, percebeu-se a necessidade da presença dos do-
centes de química para a composição do grupo. O convite foi for-
malizado durante o ano de 2015. No início de 2016 essa integração
foi efetivada e desde então tem-se a presença do núcleo comum de
química no grupo de trabalho socioambiental do referido campus.
Considerando essa data como um marco da organização, o gru-
po em ações socioambientais na região costeira do Paraná tem a
presença de onze docentes com dedicação exclusiva. Sendo oito
doutores e três mestres, dos eixos tecnológicos de recursos naturais
e meio ambiente e saúde e também da área de conhecimento de
ciências da natureza e suas tecnologias. Desde então, os integran-

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tes passaram a trabalhar em função de objetivos comuns, presentes


em no projeto agregador de ações que teve um processo de elabo-
ração que será descrito na sequência.
Depreende-se com esse breve histórico que a presente propos-
ta possui um histórico e um contexto estruturado ao longo de nove
anos para os arranjos produtivos locais. Esse período demonstra
que a maturidade de uma proposta de desenvolvimento para a re-
gião costeira, dentro de uma instituição de ensino federal, depende
de estruturação física e de pessoal, além de interesses individuais e
coletivos dos docentes envolvidos.

Processo de elaboração do projeto integrador para o litoral do


Paraná e priorização de ações
Para a formação do grupo, realizou-se um processo de exposi-
ção das ações executadas e dos projetos em andamento sob a coor-
denação dos docentes. Com base nessas informações, foram deli-
mitados os objetivos do projeto guarda-chuva. O referido projeto
encontra-se protocolado institucionalmente no órgão competente
do IFPR e é periodicamente atualizado de acordo com a necessida-
de de apresentação de relatórios técnicos que servem de base para
a reflexão e o planejamento do grupo.
O objetivo geral do projeto elaborado é colaborar com a promo-
ção do desenvolvimento socioambiental na região costeira do Pa-
raná, por meio da convergência das seguintes linhas de ação, ca-
talisadas pelo eixo de Recursos Naturais/Meio Ambiente, Campus
Paranaguá : gestão ambiental, educação ambiental, educação cien-

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tífica e tecnológica, ações de conservação, agroecologia e monito-


ramento. Especificamente, o grupo é orientado para:
Objetivo 1 – diagnosticar e/ou atender as demandas socioam-
bientais locais por meio de ações e projetos;
Objetivo 2 – estimular a mobilização e o empoderamento com
foco socioambiental;
Objetivo 3 – promover a formação e o aperfeiçoamento do capi-
tal humano local\regional;
Objetivo 4 – realizar o monitoramento socioambiental;
Objetivo 5 – elaborar e/ou contribuir para formação de um ban-
co de dados da região costeira do litoral do PR;
Objetivo 6 – facilitar e promover a articulação institucional para
o desenvolvimento de ações, projetos e captação de recursos.
A proposta é, portanto, promover a convergência das atividades
do grupo, norteados por objetivos comuns, orientados pela mis-
são, visão, finalidades e objetivos do IFPR, pelas demandas locais e
da região e pelas potencialidades individuais dos componentes do
grupo de pesquisa. Nesse sentido, os objetivos do projeto guarda-
-chuva, atuam agregando ferramentas para a formação integral dos
estudantes no IFPR em todos os níveis.
Considerando esses aspectos, a seguir são apresentadas as norma-
tivas que orientam os objetivos propostos no projeto guarda-chuva do
grupo de trabalho socioambiental do IFPR do campus Paranaguá .

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DIRETRIZES INSTITUCIONAIS QUE FUNDAMENTAM OS


OBJETIVOS DO PROJETO GUARDA-CHUVA DO GRUPO DE
TRABALHO SOCIOAMBIENTAL NA REGIÃO COSTEIRA DO
PARANÁ
Desde sua origem, os Institutos Federais têm por finalidade, de-
senvolver a educação profissional e tecnológica como processo
educativo e investigativo de geração e adaptação de soluções técni-
cas e tecnológicas às demandas sociais e peculiaridades regionais;
além de orientar sua oferta formativa em benefício da consolidação
e fortalecimento dos arranjos produtivos, sociais e culturais locais,
identificados com base no mapeamento das potencialidades de de-
senvolvimento socioeconômico e cultural no âmbito de atuação do
Instituto Federal (BRASIL, 2008, art. 6°, § II e IV).
Portanto, quando se objetiva diagnosticar e/ou atender as de-
mandas socioambientais locais, o primeiro passo é identificar as
demandas sociais, peculiaridades regionais, os arranjos produti-
vos, sociais e culturais locais. Posteriormente, por meio de ações e
projetos, buscar a geração e adaptação de soluções técnicas e tec-
nológicas às demandas identificadas com base no mapeamento
das potencialidades de desenvolvimento socioeconômico e cultu-
ral do litoral paranaense.
O compromisso com o desenvolvimento regional sustentável, o
estudo dos arranjos produtivos sociais e culturais locais, são par-
te das premissas do Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI)
do IFPR. Isso significa que a instituição se preocupa com a inclu-
são, tendo em vista o enfrentamento dos problemas sociais, econô-

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micos e culturais que decorrem da dinâmica regional, sempre com-


preendida em suas relações com a dinâmica mundial com foco no
mundo do trabalho (IFPR, 2014, p. 30 e 63). Assim, o objetivo de es-
timular a mobilização visa promover o enfrentamento dos proble-
mas sociais, econômicos e culturais decorrentes da dinâmica regio-
nal/global que geram a exclusão social e os problemas ambientais.
Sendo a mobilização apenas uma etapa do processo, há ainda o
objetivo de empoderamento com foco socioambiental, o qual in-
clui estimular e apoiar processos educativos que levem à geração
de trabalho e renda e à emancipação do cidadão na perspectiva do
desenvolvimento socioeconômico local e regional (BRASIL, 2008,
art. 7o). Assim sendo, realizar diagnósticos da realidade, aten-
der demandas, estimular a mobilização, gerar empoderamento do
ponto de vista socioambiental implica um compromisso de realizar
pesquisas aplicadas, estimulando o desenvolvimento de soluções
técnicas e tecnológicas, estendendo seus benefícios à comunidade
(BRASIL, 2008, art. 7o,§ III).
O IFPR em sua dimensão político-pedagógica, ao afirmar a for-
mação integral do estudante, se compromete também com outro
objetivo proposto, o da formação e o aperfeiçoamento do capital
humano. Dessa forma, a formação do egresso não pode ficar restri-
ta à dimensão lógico-formal ou às funções ocupacionais do traba-
lho. Para avançar na constituição de uma instituição comprometida
com a emancipação humana nos espaços de contradição da socie-
dade contemporânea, o IFPR insere-se como um lugar de aprender
a interpretar o mundo para, então, poder transformá-lo a partir do

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domínio dos conhecimentos científico-tecnológicos, sócio-históri-


cos e culturais, bem como dos seus processos de construção, ne-
cessários à superação dos conflitos sociais (IFPR, 2014, p. 31 - 33).
Conforme o PDI do IFPR, o que se pretende é que a educação
e, por sua vez, a escola, estejam relacionadas ao mundo do traba-
lho como a garantia à existência humana (IFPR, 2014, p. 31). Assim,
o trabalho com os conflitos sociais exige um aporte de conhecimen-
tos científico-tecnológicos, sócio-históricos e culturais, que a insti-
tuição pode promover por meio de formação e o aperfeiçoamento
do capital humano local\regional. O PDI também trata da garantia à
existência humana em um mundo do trabalho complexo diante das
contradições da sociedade contemporânea. Tratando-se das con-
tradições e dos conflitos da região costeira paranaense, um proces-
so de formação e aperfeiçoamento referenciado no capital humano
local\regional implica garantir aos sujeitos envolvidos as condições
de interpretar o mundo para, então, poder transformá-lo.
Além do PDI, também o estatuto do IFPR (IFPR, 2011, p. 5 e 6) e o
Projeto Político Pedagógico do campus Paranaguá do IFPR (IFPR,
2012, p. 73) enfatizam a necessidade de formar recursos humanos
para a investigação, a produção, o empreendedorismo e a difusão
de conhecimentos culturais, artísticos, científicos e tecnológicos,
sendo desenvolvidas em articulação com o ensino e a extensão, ao
longo de toda a formação profissional. A formação e aperfeiçoa-
mento inclui, além da oferta direta de cursos de ensino e ações, a
formação de educadores.

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Desde a lei da criação dos Institutos Federais, o IFPR já tem por


finalidade se qualificar como centro de referência no apoio à oferta
do ensino de ciências nas instituições públicas de ensino, oferecen-
do capacitação técnica e atualização pedagógica de seus docentes;
e por objetivo ministrar cursos de formação inicial e continuada
de trabalhadores, objetivando a capacitação, o aperfeiçoamento, a
especialização e a atualização de profissionais, em todos os níveis
de escolaridade, nas áreas da educação profissional e tecnológica
(BRASIL, 2008, art. 7o,§ II e VI).
O objetivo de realização do monitoramento socioambiental, por
sua vez, está de acordo com a lei de criação dos IFs, na medida em
que se busca promover a produção, o desenvolvimento e a transfe-
rência de tecnologias sociais, notadamente as voltadas à conserva-
ção ambiental (BRASIL, 2008, art. 6o,§ IX).
As ações de pesquisa constituem um processo educativo para a
investigação e o empreendedorismo, visando à inovação e à solu-
ção de problemas científicos e tecnológicos, envolvendo todos os
níveis e modalidades de ensino, com vistas ao desenvolvimento so-
cial (IFPR, 2011, p. 5 e 6). Nesse sentido, a pesquisa, articulada ao
ensino, pode fornecer conhecimentos, problemas de investigação
e espaços para programas, projetos e cursos, incluindo também a
perspectiva da formação política (IFPR, 2014, p. 63). A reunião das
informações levantadas, portanto, caminha para o objetivo seguin-
te de elaborar e/ou contribuir para a formação de um banco de da-
dos do litoral paranaense.

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De acordo com o PDI, ainda, a extensão social e tecnológica no


IFPR está alicerçada no desenvolvimento de ações internas e alinha-
mento com políticas nacionais e estaduais, constituindo-se como
processo voltado à emancipação humana, a partir de relações insti-
tucionais formais ou não formais entre o instituto e a sociedade. Tais
ações são desenvolvidas em articulação com o ensino e com a pes-
quisa, interligando o IFPR às demandas sociais e ao desenvolvimen-
to de arranjos produtivos e culturais locais (IFPR, 2014, p. 57).
Da mesma forma, os projetos e cursos de extensão contribuem
para a identificação de novas linhas de pesquisa e para a propo-
sição de projetos que possam – de modo interdisciplinar – articu-
lar: investigação, apropriação do conhecimento e intervenção so-
cial (IFPR, 2014, p. 63). As ações de extensão e de interação com a
sociedade constituem um processo educativo, cultural e científico
que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável, para via-
bilizar uma relação transformadora entre o Instituto Federal do Pa-
raná e a sociedade (IFPR, 2011, p. 5 e 6). Esta ação transformadora
do IFPR não se realiza sem articulações institucionais nos diversos
âmbitos da sociedade, assim como necessita de recursos, os quais
podem ser adquiridos justamente por meio destas parcerias. Desse
modo, facilita-se o desenvolvimento de programas de extensão e de
divulgação científica e tecnológica, bem como a realização e o estí-
mulo à pesquisa aplicada, à produção cultural, o empreendedoris-
mo, o cooperativismo e o desenvolvimento científico e tecnológico
(BRASIL, 2008, art. 6o, § VII e VIII).

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Contudo, se não houver monitoramento e (re) planejamento


das atividades desenvolvidas, mesmo com a presença dos objetivos
e do respectivo alicerce institucional, podem prevalecer ações indi-
viduais desconectadas da proposta agregadora. Para tanto, segue a
ferramenta de monitoramento das ações do grupo de trabalho so-
cioambiental do IFPR do campus Paranaguá .

PROPOSTA DE MONITORAMENTO DAS ATIVIDADES


DO GRUPO DE TRABALHO SOCIOAMBIENTAL DO IFPR
PARANAGUÁ
Para avaliar o andamento e estado de realização dos objetivos
propostos no projeto guarda-chuva do grupo, adotou-se a metodo-
logia de Relatório de Monitoramento proposto por Souza (2005),
considerando adaptações para o Eixo de Recursos Naturais/Meio
Ambiente. A proposta do Relatório de Monitoramento considera
apresentar sistematicamente os dados e os resultados obtidos nas
ações trabalhadas, medindo a eficácia, eficiência e efetividade dos
resultados do projeto.
Portanto, o processo de monitoramento é ponto central nessa
proposta, devendo ser trabalhado não apenas pelos docentes ci-
tados nesse documento, mas também por outros professores inte-
ressados. O conteúdo mínimo ou padrão do Relatório de Monitora-
mento será construído a partir de indicadores já utilizados no eixo,
tendo como base quadros resumo das ações de ensino, pesquisa,
extensão e inovação.

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Esses quadros deverão trazer os principais resultados das ações


desenvolvidas pelos professores, dividida em três escalas temporais
de avaliação: curto período de avaliação (resultados até um ano);
médio período (resultados entre um e quatro anos); e longo período
(resultados esperados acima de quatro anos). Os quadros deverão,
portanto, acompanhar o desenvolvimento dos projetos específicos.
Esta avaliação temporal dos resultados dos projetos individuais
e coletivos dos professores do eixo deverá sempre estar associada
aos objetivos maiores do Projeto Guarda-Chuva.
Os relatórios de monitoramento deverão ser apresentados se-
mestralmente pelo eixo, e o acompanhamento dos indicadores
será feito nas reuniões periódicas do grupo. A avaliação do projeto
Guarda-Chuva deverá envolver três etapas principais, em sequên-
cia: (i) medir continuadamente; (ii) comparar entre o obtido e o
previsto; e (iii) tomar decisão sobre medidas corretivas que redu-
zam falhas e elevem a eficiência, ou seja, um procedimento contí-
nuo, integrado ao sistema de gestão.
A proposta inovadora desse método é inserir, na rotina dos pro-
jetos, um monitoramento continuado. Dessa forma, por meio de
reuniões periódicas dos componentes do eixo, será possível desen-
volver e testar procedimentos e atividades que possam auxiliar o
andamento de ações inter e multidisciplinares, com potencialida-
de, inclusive, de ampliação institucional. A metodologia pode ser,
portanto, utilizada como parte de um processo de aprendizado or-
ganizacional, no que se refere à escolha e uso dos instrumentos
adequados às diferentes situações; nos desafios de gestão política

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e pública e também no que se refere à tomada de decisão e imple-


mentação das deliberações.
Nesse sentido, a referida proposta metodológica pode ser vis-
ta como ultrapassando a condição de ferramenta de comparação
para subsidiar a gerência de projetos, pois poderá constituir na prá-
tica fundamental do processo de aprendizado organizacional. De-
saa forma, o Projeto deverá abranger a dimensão técnica, no que se
refere à escolha e uso dos instrumentos adequados; e outra de ges-
tão política , quanto à tomada de decisão e o poder para implemen-
tar as deliberações.
A metodologia (Figura 1) deverá, portanto, ser orientada para ve-
rificar três pontos principais:
1. Onde estamos – a identificação dos avanços e os limites das
ações do grupo de trabalho;
2. Como estamos – constitui a leitura dos resultados alcançados
pelo grupo nos diferentes momentos de avaliação;
3. O que fazer para avançar – quais seriam os encaminhamentos ne-
cessários para potencializar os avanços e superar os limites encontrados.

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Figura 1 Instrumento de dinâmica do sistema proposto por Brose (2004)

Fonte: Brose (2004), adaptado pelos autores.

A partir do uso, da incorporação e da institucionalização da me-


todologia será possível avaliar os resultados esperados do Projeto,
sejam diretos ou indiretos, previstos ou até mesmo aqueles não pla-
nejados. Este conjunto de aferição deverá ser apresentado resumi-
damente no formato de planilhas, sendo possível definir uma hie-
rarquia de indicadores. Dessa forma, a avaliação de desempenho
medirá essencialmente a avaliação de impacto e se há capacidade
em adequação das novas propostas de pesquisa, ensino ou exten-
são a uma realidade em constante mudança (BROSE, 2004).

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ATIVIDADES DESENVOLVIDAS PELO GRUPO DE TRABALHO


DO IFPR CAMPUS PARANAGUA ORIENTADAS PELO PROJETO
GUARDA-CHUVA
O histórico da organização e a clareza das normativas indutoras
das ações descritas demonstraram um perfil na formação e um viés
do processo de consolidação do grupo de trabalho. Outro modo de
perceber a consolidação do grupo é pela convergência das ações
no ensino, pesquisa, extensão e inovação – direcionadas pelo pro-
jeto guarda-chuva – demonstradas pelos números expressivos ob-
tidos (Quadro 1). Mesmo considerando o curto período de vigência
do monitoramento interno do grupo, entre janeiro de 2016 e julho
de 2017, já foram realizadas 83 ações no total, as quais atingiram e/
ou envolveram 1460 pessoas em todos os municípios da região cos-
teira do Paraná.

Quadro 1 Resumo das ações do grupo de trabalho nos municípios do Litoral do Paraná

Pessoas
Ob. Ob. Ob. Ob. Muni-
Ações nº Ob. 2 Ob. 6 C M L atingidas/
1 3 4 5 cípios
envolvidas
Ensino 11 11 9 11 0 10 11 11 6 6 470 7
Pesqui-
46 45 17 46 21 33 35 46 18 8 120 4
sa
Exten-
25 25 23 24 5 11 15 25 23 9 835 7
são
Inova-
4 4 2 2 2 3 4 3 3 3 35 7
ção
83 85 51 83 28 57 65 83 49 26 1.460 7
Fonte: os autores. Dados referentes ao período de janeiro de 2016 a julho de 2017.
C = ações de curto prazo; M = ações de médio prazo; L = ações de longo prazo.

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No ensino, as ações envolvem principalmente os cursos de


Técnico em Meio Ambiente, de Tecnologia em Gestão Ambien-
tal, Especialização lato sensu em Gestão Ambiental e o Mestrado
stricto sensu interdisciplinar em Ciência Tecnologia e Sociedade.
Todos com abrangência temporal de curto, médio e longo prazo
(Quadro 1).
Esse itinerário de cursos permite ao estudante, desta área de in-
teresse, verticalizar sua formação do ensino médio ao mestrado.
Atendendo, desta forma, objetivos expostos na lei de criação dos
IFs e das normativas institucionais relacionados à verticalização do
ensino com foco nas questões regionais. Essa estratégia contribui
significativamente para o desenvolvimento socioambiental da re-
gião costeira do Paraná, principalmente, com a formação, empode-
ramento e o aperfeiçoamento do capital humano local.
Além dos cursos regulares citados acima, cabe destaque para a
produção de um curso de Adaptações Baseadas em Ecossistemas,
na modalidade de Ensino a Distância (EaD), que ficará disponível
ao público nacional na plataforma EaD do Ministério do Meio Am-
biente (MMA) a partir do ano de 2018. Este curso está sendo execu-
tado em parceria com outras instituições, como a Universidade do
Estado do Paraná (UNESPAR) campus Paranaguá , com recurso do
Ministério do Meio Ambiente e da instituição alemã de cooperação
internacional, Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusamme-
narbeit (GIZ).
Na pesquisa, para o mesmo período, são 46 ações concluídas ou
em andamento (Tabela 1). As quais envolvem, principalmente, os

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docentes e os estudantes dos diferentes níveis de formação. Este


fato, ou seja, envolver os estudantes na pesquisa desde o ensino
médio, é considerado importante para o desenvolvimento do pen-
samento científico, ao longo do processo formativo, como disposto
nas normativas internas descritas anteriormente.
Todas as ações de pesquisa envolvem o contexto do litoral pa-
ranaense, o que permite, entre outros, diagnosticar e ou atender as
demandas socioambientais locais, realizar o monitoramento so-
cioambiental e elaborar e/ou contribuir para formação de um ban-
co de dados da região costeira do Paraná.
Temporalmente, as ações de curto prazo são mais numero-
sas (53,2% das ações). Esse resultado é, primeiramente, um refle-
xo do prazo de criação do grupo (menor que dois anos). Contudo,
ao considerarmos que essas ações envolvem as especificidades da
formação dos docentes, elas se conectam, caracterizando o acúmu-
lo de conhecimento de cada docente, ao longo do tempo, sobre o
mesmo tema e local. Por exemplo, temos as ações de pesquisa re-
lacionadas às questões de diagnóstico e monitoramento dos solos
para fins de biorremediação, da fauna com o desenvolvimento de
protótipos infointerativos, dos resíduos e seu tratamento com o uso
de filtro físico-biológico, da paisagem urbana com vistas ao plane-
jamento que salvaguarda os processos ecológicos, e das adaptações
baseadas nos ecossistemas frente às mudanças do clima, entre ou-
tros. Estas ações são exemplos de que os resultados de curto prazo
aqui apresentados estão pautados em acúmulos individuais de co-

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nhecimento de longo prazo e, de certa forma, fomentam a geração


de novas iniciativas integradas de médio e longo prazo.
De forma similar, os objetivos do grupo e a especificidade apon-
tada acima, também direcionam as ações de extensão na região. No
geral, o grupo apresenta uma tendência de criar ações de extensão,
associadas a ações de pesquisa. Dessa forma, o número de ações de
extensão é menor que o de pesquisas, entretanto, o número de pes-
soas envolvidas e/ou atingidas por esse tipo de atividade é expressi-
vamente maior (Quadro 1).
As ações de extensão permitem estimular, principalmente, a
mobilização e o empoderamento com foco socioambiental, pro-
movendo tanto a formação e o aperfeiçoamento do capital humano
local quanto a articulação institucional para o desenvolvimento de
ações, projetos e captação de recursos.
Algumas destas ações fazem parte do calendário anual dos cursos
listados acima, como os projetos de extensão e das semanas acadê-
micas que oferecem oficinas e palestras para a comunidade interna
e externa ao campus do IFPR Paranaguá . Por exemplo, a oficina de
química experimental que oferece cursos e minicursos com tópicos
da química, abordados através de aulas práticas de laboratório aos
estudantes do IFPR e da rede estadual de ensino. Outro exemplo, é a
execução das oficinas de ensino de ciências e biologia, ofertadas aos
docentes da área, da rede pública estadual e municipal.
Também, cabe destacar que as ações estão em processo de
maior envolvimento com os cursos do eixo tecnológico de comuni-
cação e informação do campus Paranaguá do IFPR. O processo de

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integração inclui também outras instituições, como a Universidade


Federal do Paraná (UFPR), campus Matinhos e Pontal do Paraná e
a Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR), campus Paranaguá
, em diferentes ações de extensão já realizadas e programadas. Um
exemplo é a realização da Semana Nacional de Divulgação da Ciên-
cia e Tecnologia, a qual foi contemplada em edital de seleção, no
ano de 2017, com recursos financeiros do CNPq para sua realização.
Na inovação os números não são tão expressivos (4,8%) como no
ensino, pesquisa e extensão (Quadro 1). Contudo, se considerarmos
a particularidade inerente ao processo de inovação, quatro produ-
tos em um prazo menor que dois anos, pode ser considerado um
destaque. Principalmente se for levado em consideração que todos
eles estão sendo desenvolvidos em parceria entre cursos do IFPR
ou da UFPR.
Essas ações de inovação atendem demandas socioambientais
como a necessidade de monitoramento remoto da fauna regional em
Unidades de Conservação da região ou do monitoramento do enca-
lhe da fauna nas praias dos balneários locais. Também, o desenvolvi-
mento de um produto da aquicultura local, o “siri mole”, apoia a pro-
dução da espécie nas comunidades tradicionais de pescadores e a
sua comercialização como forma de fomentar a economia e a culiná-
ria regional. Na mesma linha, o produto de inovação “coleção didá-
tica do lixo marinho” tem o potencial de estimular a mobilização e o
empoderamento com foco socioambiental em processos de educa-
ção em diferentes iniciativas de curto, médio e longo prazo.

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Dessa forma, a avaliação geral do quadro de ações do grupo de


trabalho indica que há uma tendência maior para a realização de
atividades na pesquisa e menor na extensão e inovação. Tal resul-
tado indica que o replanejamento deverá considerar um equilíbrio
entre as atividades, conforme exposto na metodologia de monito-
ramento do projeto guarda chuva. Vale destacar, que a detecção
desse desequilíbrio apenas pode ser realizada, pela existência da
organização realizada pelo grupo, o que aponta para a importância
da utilização da ferramenta de planejamento adotada. Infere-se as-
sim que para manter um equilíbrio de ações entre o ensino, a pes-
quisa, a extensão e a inovação, a adoção de ferramentas estratégi-
cas por grupos de docentes é fundamental.
Por fim, percebe-se que o resultado obtido pelo conjunto de
onze docentes, no tempo de 18 meses de monitoramento das ati-
vidades desenvolvidas (Quadro 1) constitui um grande volume de
ações no ensino, na pesquisa, na extensão e na inovação e que sua
organização por objetivos comuns norteadores pode facilitar a pro-
moção de melhorias socioambientais na região costeira do Paraná.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do histórico de formação, da organização do projeto
agregador/guarda-chuva com seus objetivos alinhados com as
normativas institucionais e dos resultados apresentados ao lon-
go do presente capítulo, pode-se concluir que há um grupo de
trabalho constituído, organizado e consolidado, no IFPR campus

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Paranaguá , focado em ações socioambientais para o território


costeiro do Paraná.
Esse grupo desenvolve ações no ensino, na pesquisa, na exten-
são e inovação monitoradas por uma ferramenta de autogestão,
neste caso o projeto guarda-chuva, que catalisa e organiza as pro-
postas, otimizando, ao longo do tempo, os recursos de pessoal e
materiais disponíveis e detecta distorções no volume de ações rea-
lizadas para planejar as futuras ações.
Com base nos resultados do monitoramento de atividades, o
grupo de trabalho pretende, entre outras questões: aumentar o im-
bricamento nas ações de ensino, pesquisa, extensão e inovação; au-
mentar o volume de ações na extensão e na inovação; incrementar
os projetos atuais e desenvolver novos; manter a capacitação con-
tínua dos integrantes; ampliar a articulação inter e intra institucio-
nal; e manter o compromisso com o ensino atrelado à pesquisa, à
extensão e à inovação.
Conclui-se, finalmente, que as ferramentas de autogestão e de
planejamento são úteis para a organização de grupos de trabalho
multidisciplinares, especialmente grupos de docentes de institui-
ções de ensino, como é o caso dos Institutos Federais.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei n. 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Institui a Rede
Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, cria os
Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, e dá outras
providências. DOU 30 dez. 2008. Disponível em: http://www.pla-

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

nalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11892.htm Acesso
em: 10 mai. 2015.
__________. Resolução nº 6, de 20 de dezembro de 2012. Define di-
retrizes curriculares nacionais para a Educação Profissional Técni-
ca de Nível Médio. DOU 04 set 2012. Disponível em: http://www.
portal.mec.gov.br/...2012-pdf/10941-rceb004-12 Acesso em: 10
mai. 2015.
BROSE, M. 2004. Aprendizado prático com monitoramento e ava-
liação Estímulo à reflexão in: Monitoramento e avaliação de pro-
jetos: métodos e experiências. Disponível em: http://www.mma.
gov.br/estruturas/168/_publicacao/168_publicacao30012009115158.
pdf. Acesso em 05/10/2015
IFPR. Resolução n. 13, de 01 de setembro de 2011. Aprova a Mudança
e Consolida o Estatuto do IFPR. Disponível em: http://reitoria.ifpr.
edu.br/resolucao-132011/ Acesso em: 15 mai. 2015.
_______. Projeto Político Pedagógico, de novembro de 2012, do
campus Paranaguá . Disponível em: http://paranagua.ifpr.edu.br/
wp-content/uploads/2013/12/Projeto-Pol%C3%ADtico_Pedag%-
C3%B3gico_21_jan_2013_final_com-numero-pag.pdf Acesso em: 15
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_______. Resolução n. 34, de 01 de dezembro de 2014. Aprova o Pla-
no de Desenvolvimento Institucional (PDI) 2014/2018. Disponível
em: http://reitoria.ifpr.edu.br/?p=87271 Acesso em: 15 mai. 2015.
KRUG, L. C. Relatório de Atividades 2015 Plano de Trabalho e Or-
çamento 2016 PPG-Mar. Brasília, 2016. Disponível em: http://cien-
ciasdomarbrasil.com.br/list.php?id=30 Acesso em: 10 set. 2017.

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

SOUZA, P. F. M. 2005. Metodologias de monitoramento de proje-


tos de mdl: uma análise estrutural e funcional. Dissertação (Mes-
trado) – Programa de Pós-Graduação em Engenharia. Universidade
Federal do Rio de Janeiro.

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

O TURISMO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO


DO LITORAL DO PARANÁ E AS PERSPECTIVAS
DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL
SUSTENTÁVEL

Eva Blaszczyk Gaweleta


Isabel Jurema Grimm
Patrícia Bilotta
Carlos Alberto Cioce Sampaio

INTRODUÇÃO
A problemática ambiental se converteu, no século XX, numa cri-
se civilizatória, colocando em questão a racionalidade econômi-
ca e tecnológica dominante. Esta realidade, a partir da década de
1980/1990 abriu espaço para o debate sobre o desenvolvimento sus-
tentável, onde as questões ambientais ganham força e os setores
econômicos passam a ser pressionados a desenvolver suas ativida-
des produtivas de forma sustentável.
Nesse cenário, o turismo , como importante estratégia de desen-
volvimento territorial sustentável, tem sido qualificado como de
grande importância na geração de trabalho e renda, além de con-
tribuir na preservação do patrimônio natural e cultural das comu-
nidades receptoras. Entretanto, sua exploração tem ocasionado

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impactos ambientais, levando o setor a pensar alternativas susten-


táveis da atividade.
Pressionados pela opinião pública e a mídia, o setor de turismo
e governos passam a considerar alternativas ao modelo de mas-
sa, e também o planejamento em longo prazo (ARCHER; COO-
PER, 2001), onde políticas públicas passam a levar em conta as con-
sequências que a repetição de métodos de expansão quantitativa
pode causar em destinos turísticos com uma estrutura socioeco-
nômica e ambiental frágil. Surgem novas formas de pensar e fazer
turismo , como pode ser o turismo comunitário, turismo rural e
o ecoturismo, que levam em conta o tripé da sustentabilidade e a
tomada de consciência do turista para os impactos da sua pegada
ecológica ou de carbono.
Diante disso, governos, por meio de políticas públicas tem bus-
cado promover o turismo como uma importante estratégia de
prosperidade para as comunidades de acolhimento. Entretanto,
estas ações exigem esforços no sentido de construir um futuro in-
clusivo, sustentável e resiliente para pessoas e o planeta. Para que
o desenvolvimento territorial sustentável e inclusivo seja alcança-
do por meio do turismo , é fundamental harmonizar três elementos
principais: crescimento econômico com justa distribuição de seus
benefícios; inclusão das comunidades, que assim desejarem, no
processo de exploração da atividade e a proteção ambiental. Esses
elementos estão interligados e todos são essenciais para promover
a diminuição das desigualdades, redução da pobreza e ao mesmo

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tempo promover o bem viver na comunidade receptora (IRVING,


2009; SAMPAIO et al., 2014; GRIMM,2016).
Neste cenário, as reflexões contidas neste capítulo emergem a
partir de uma perspectiva que levam a analisar o turismo em Uni-
dades de Conservação e as estratégias de desenvolvimento territo-
rial sustentável, com base em dois estudos de caso. O primeiro, no
Parque Nacional do Superagui em Guaraqueçaba (PR) e o segundo,
no Parque Estadual da Ilha do Mel em Paranaguá (PR).
Para alcançar tal propósito foram realizadas pesquisa bibliográ-
fica e documental e entrevistas com gestores e moradores do Par-
que Nacional do Superagui e com especialistas em unidades de
conservação. O capítulo se estrutura em três tópicos. No primei-
ro, busca-se a compreensão do desenvolvimento territorial susten-
tável por meio da exploração do turismo e da implementação de
políticas públicas; o segundo, trata do turismo no Paraná, desta-
cando as áreas de conservação; e o terceiro, finaliza-se com dois es-
tudos de caso realizados na ilha do Mel, município de Paranaguá e
no Parque Nacional do Superagui no município de Guaraqueçaba,
ambos no litoral do Paraná .

DESENVOVIMENTO TERRITORIAL SUSTENTÁVEL - TURISMO


E POLÍTICAS PÚBLICAS
A noção da formação de territórios como espaço de articula-
ção entre atores locais, com a finalidade de “promover estratégias
de desenvolvimento articuladas a políticas públicas definidas pelos
Estados nacionais”, de acordo com Corrêa (2009, p.24), não é recen-

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te. Essas estratégias, anteriores ao processo de industrialização, fo-


ram adotadas em países europeus em que se foi “gerando um tipo
de institucionalidade que estabeleceu relações entre os atores lo-
cais; entre eles e os representantes dos territórios; e entre estes últi-
mos e os Estados nacionais” (CORRÊA, 2009, p.24).
O território oferece chances de inclusão do particular no global,
pelas oportunidades de desenvolvimento de potencialidades locais
e regionais que as valorizam e lhes dão visibilidade. O território é
fundamentalmente um espaço definido e limitado por, e a partir,
das relações de poder (SOUZA, 2002). O poder corresponde à ha-
bilidade humana de não apenas agir, mas agir em uníssono, em co-
mum acordo. O poder jamais é propriedade de um indivíduo; per-
tence ao grupo e existe apenas enquanto o grupo se mantiver unido
(ARENDT, 1985).
Nesse contexto, o turismo , importante atividade econômica,
destaca-se como alternativa de desenvolvimento territorial susten-
tável, sendo responsável por 9% do PIB mundial (MINISTÉRIO DO
TURISMO , 2015). Seu crescimento mundial, comparada à indústria
do período fordista, criou produtos turísticos padronizados, con-
quistou mercados e estimulou a necessidade de viajar. As destina-
ções nas quais o turismo se instala notabilizam o crescimento da
oferta de trabalho e renda, com consequente dinamização da eco-
nomia (FERREIRA & CARNEIRO, 2005).
O impacto do turismo é particularmente forte onde ocorre e re-
presenta oportunidade de negócio para a iniciativa privada, servin-
do como ponto de apoio à economia, para que pequenas e médias

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empresas encontrem possibilidades de expansão de suas ativida-


des. Nas áreas rurais, ou em comunidades tradicionais, constitui-se
muitas, vezes como alternativa, para contrapor o declínio da agri-
cultura de subsistência (GRIMM, 2016).
No litoral, o principal segmento41do turismo está ligado ao sol,
mar e praia “sun, sea, sand” (MORENO, 2010), cuja modalidade tem
na qualidade ambiental a principal fonte de atratividade turística.
Recebendo outras denominações tais como turismo de sol e
mar, turismo litorâneo, turismo de praia, turismo de balneário,
turismo costeiro entre outros, o segmento sol e praia predomi-
nou quase absoluto nos anos de 1970/80. Atualmente os interesses
e motivações dos turistas estão, ao mesmo tempo, se multiplican-
do e mudando e, com isso, surgem novas motivações de viagens e
expectativas que precisam ser atendidas. Diante disso, observa-se
que o elemento cultural, passou a se complementar ao segmento
sol e praia. Este caso é observado no litoral paranaense, onde as co-
munidades tradicionais do Parque Nacional do Superagui e do Par-
que Estadual da Ilha do Mel passaram a receber visitantes motiva-
dos a conhecer também a cultura destas comunidades litorâneas.
Sob a ótica do desenvolvimento territorial, o turismo é muitas
vezes o principal elemento de geração de trabalho e renda, entre-
tanto, sua exploração sempre acarretará impacto, seja positivo ou
negativo para regiões e as comunidades de acolhimento.

41.  De acordo com Ministério do Turismo , a segmentação é entendida como uma forma de orga-
nizar o turismo para fins de planejamento, gestão e mercado. Os segmentos turísticos podem ser
estabelecidos a partir dos elementos de identidade da oferta e também das características e variá-
veis da demanda.

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Nesse contexto, observa-se que a ocupação desordenada em


áreas litorâneas, onde não houve zoneamento , implica em proble-
mas para o destino turístico, uma vez que o aumento do número de
habitantes, em períodos de alta temporada turística, nem sempre
é acompanhada de infraestrutura urbana necessária. Outra situa-
ção comum em destinos turísticos de sol e praia são as deficiências
em saneamento básico, com possível contaminação do solo e das
águas, acarretando danos à saúde humana e interferindo na quali-
dade ambiental (MINISTÉRIO DO TURISMO , 2010).
Em áreas litorâneas, cujo território se constitui em uma unida-
de de conservação , o plano de manejo é o principal instrumento
norteador das políticas de desenvolvimento territorial e de prote-
ção da natureza e das comunidades nela inseridas. O plano de ma-
nejo é um documento técnico, fundamentado nos objetivos gerais
da unidade de conservação , que estabelece o seu zoneamento e
as normas que devem presidir o uso e o manejo dos recursos natu-
rais (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2011). No plano de mane-
jo são destacadas as formas de uso e ocupação das unidades, esta-
belecendo que toda atividade desenvolvida, incluindo o turismo ,
precisa seguir princípios sustentáveis.
Para a execução do turismo sustentável, é fundamental criar
uma consciência coletiva e manter um diálogo constante entre os
atores envolvidos no processo (setor público, privado, ONG’s e co-
munidade local) para que as ações conjuntas ocorram (SOUZA,
2000; SWARBROOKE, 2000).

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Frente à necessidade de estabelecer o controle de visitação nas


unidades de conservação, o setor do turismo faz uso do estudo da
capacidade de carga do lugar. A capacidade de carga considera em
sua definição aspectos: biofísicos, relacionados aos componentes
histórico-culturais; socioculturais, que reconheçam o limite dos
impactos negativos da atividade na comunidade local; psicológi-
cos, que observam a quantidade máxima de pessoas em um deter-
minado espaço em relação à satisfação do cliente; e, o manejo da
capacidade de carga, que se refere à administração adequada do
espaço por parte dos gestores (PIRES, 2005).
Apesar de considerar diversos componentes em sua definição,
a capacidade de carga é mais utilizada para estimar o número má-
ximo de pessoas presentes em um mesmo espaço, dentro de um
determinado período de tempo, minimizando os impactos am-
bientais. Prática comumente utilizada em áreas protegidas, como
ocorre na Ilha do Mel, que abriga duas unidades de conservação:
Estação Ecológica e Parque Estadual da Ilha do Mel, e delimita o
acesso de 5 mil pessoas por dia na ilha (LIMBERGER; PIRES, 2014).
No caso do Parque Nacional do Superagui, que ainda não possui
plano de manejo, ainda não há definição da capacidade de carga
para a unidade de conservação .
Em relação as política públicas que visam colaborar para o de-
senvolvimento do turismo sustentável, observa-se que o setor pú-
blico tomou as primeiras iniciativas relacionadas ao tema no final
da década de 1980 com o objetivo de planejar, desenvolver e esti-

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mular o turismo de forma sustentável (SWARBROOKE, 2000; PIN-


TO, 2007;CASTRO; PINTO, 2013).
Goeldner, Ritchie e McIntosh (2002, p. 294) conceituam a políti-
ca de turismo como um conjunto de regulamentações, regras, di-
retrizes, diretivas, objetivos e estratégias de desenvolvimento e pro-
moção, que fornece uma estrutura na qual são tomadas as decisões
coletivas e individuais que afetam diretamente o desenvolvimento
turístico e as atividades diárias dentro de uma destinação.
Nesta definição, Grimm et al. (2012) observam a complexidade
e necessidade de direção na política pública e relevam sua impor-
tância nas esferas, local, estadual e nacional, para que ela promova
a exploração do setor turístico de forma equilibrada e sustentável.
Observa-se também o importante papel de orientação que é estabe-
lecido a partir da política de turismo , para que, com o planejamento
da atividade turística, os recursos sejam utilizados de forma coerente
e eficaz no desenvolvimento territorial sustentável (BEZERRA, 2003).
Ao abordar o conceito de política pública, reportamo-nos a San-
solo e Cruz (2003), para os quais as políticas públicas são parte de
um processo de planejamento governamental que envolve todas as
ações referentes a um determinado setor. Procopiuck (2013) desta-
ca que, as políticas públicas também ajustam as ações de atores in-
dividuais e coletivos, promovendo, dessa maneira, resultados con-
cretos destinados a solucionar problemas diversos da sociedade.
De acordo com Grimm et al. (2012), alguns elementos são a base
para a construção de políticas voltadas ao turismo sustentável. Os
autores destacam a otimização da economia na atividade turística; a

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garantia de que seja socialmente inclusivo e que a gestão seja volta-


da a preservação da natureza garantindo-a para as gerações futuras.
Portanto, o turismo sustentável deve envolver a tomada de medidas
políticas vigorosas em níveis social, econômico e ambiental. Ou-
tro importante elemento, a ser destacado na elaboração das políti-
cas públicas do turismo , configura-se na formação de capital social
(mão de obra especializada) voltado para as atividades de turismo .

TURISMO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO: O LITORAL DO


PARANÁ
No Paraná, que possui litoral pequeno onde mais de 80% de sua
costa apresenta elevada sensibilidade ambiental, 82% da área cos-
teira está voltada para a preservação, cuja criação se deu por consti-
tuírem-se espaços marginalizados, de difícil acesso ou sem interesse
econômico-produtivo. Esta circunstância inviabilizou a sustenta-
bilidade econômica e social da população que mora dentro ou no
entorno das unidades de conservação tornando estas áreas muitas
vezes responsáveis pela pobreza e falta de oportunidade para popu-
lações que ali se encontram (PIERRI et al., 2006), como é o caso das
comunidades tradicionais inseridas no interior do Parque Nacional
de Superagui e mesmo do Parque Estadual da Ilha do Mel.
Entretanto, a procura de destinos turísticos que reúnam carac-
terísticas climáticas e paisagísticas favoráveis estimulou o floresci-
mento de atividades associadas ao turismo de sol e praia no litoral
paranaense, com destaque para o Parque Estadual da Ilha do Mel e
do Parque Nacional do Superagui.
Assim, a fim de promover a exploração do turismo no Para-
ná de forma organizada e planejada, foi criada em 2008, a Políti-
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ca de Turismo do Paraná, instituída a partir da Lei Nº 15.973 (PA-


RANÁ, 2016).
A Política de Turismo do Paraná reúne um conjunto de estraté-
gias e prioridades orientadas pelos seguintes princípios: sustenta-
bilidade; mobilização; visão sistêmica; parcerias; descentralização;
regionalização; inclusão social; competitividade; conhecimento;
e, qualidade. Com relação à execução da Política , foi estabelecido
que a Secretaria de Estado do Turismo (SETU), atual Secretaria do
Esporte e do Turismo (SEET), define as diretrizes e executa a Polí-
tica Estadual de Turismo , por meio de ações previstas no Plano de
Desenvolvimento do Turismo do Paraná, com base nos objetivos
estabelecidos (Quadro 1) (PARANÁ, 2016a).

Quadro 1 Objetivos da Política Estadual de Turismo do Paraná

CARACTERÍSTICAS
• Acompanhamento de planos, programas e projetos, garantindo o seu desenvolvimento; 
• Promoção do desenvolvimento sustentável do turismo ; 
• Gestão pública do turismo estadual; 
• Articulação institucional entre as atividades vinculadas à Secretaria de Estado do Turismo e os ato-
res da atividade turística, no âmbito municipal, estadual, nacional e internacional; 
• Promoção e divulgação do produto turístico paranaense; 
• Celebração de contratos, convênios e outros instrumentos legais, com entidades públicas e priva-
das, objetivando a perfeita execução dos programas e projetos que decorram do Plano de Desenvol-
vimento do Turismo do Paraná; 
• Representação e atuação como órgão oficial de turismo do Estado, nas diferentes instâncias do setor. 
Fonte: PARANÁ (2016a).

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

O Plano de Desenvolvimento do Turismo do Paraná constitui-


-se em um documento que busca definir os objetivos e as metas
para a atividade no estado. Tem como “princípios orientadores as-
pectos como sustentabilidade, visão sistêmica, mobilização, parce-
rias, descentralização, regionalização, inclusão social, qualidade,
competitividade e conhecimento” (PARANÁ, 2016b).
Nesse contexto, a exploração do turismo e a implantação dos
devidos planos de manejo em unidades de conservação atendem
também as ações previstas em políticas públicas de desenvolvi-
mento territorial sustentável, seja em âmbito municipal, estadual
ou federal, como instrumento de construção de soluções adequa-
das para problemas de uso e ocupação do solo e dos recursos natu-
rais. Com base no exposto, a seguir são apresentados dois estudos
de caso do litoral do Paraná .

CASO 1: ILHA DO MEL


A Ilha do Mel está localizada no litoral sul do Estado do Paraná
e pertence ao município de Paranaguá . Ela foi tombada pelo Patri-
mônio Histórico, Artístico e Natural do Estado do Paraná por meio
da Lei Nº 1.211/53 e possui uma área aproximada de 2.760 hecta-
res, dos quais, cerca de 95% são de áreas de preservação ambiental
(SPERB & TEIXEIRA, 2014).
As áreas de preservação ambiental da Ilha do Mel reúnem a Esta-
ção Ecológica da Ilha do Mel, criada em 1982, com cerca de 2.241 hec-
tares, e o Parque Estadual da Ilha do Mel, criado em 2002, com cerca
de 338 hectares (IAP, 2012). Essas áreas foram delimitadas legalmente

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

na Ilha do Mel por conta da ocupação desordenada e da especulação


imobiliária que teve início na década de 1980 e 1990, com a constru-
ção de casas de veraneio e a instalação de estabelecimentos comer-
ciais destinados ao turismo (SPERB & TEIXEIRA, 2014).
Com vistas a estabelecer um zoneamento ecológico-econômico
e definir as normas de uso de área e manejo dos recursos naturais,
em 2012, o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) em parceria com
outros órgãos estaduais, divulgaram dois Planos de Manejo para a
Ilha: a) Plano para a Estação Ecológica da Ilha do Mel, e b) para o
Parque Estadual da Ilha do Mel; documentos que se tornaram refe-
rência para a gestão adequada das duas áreas de proteção ambien-
tal (IAP, 2012a; IAP, 2012b).
O órgão responsável por controlar o uso e a ocupação do solo
em toda a ilha é o IAP, no entanto, há outros órgãos com atuação
direta no Sistema Estadual de Unidade de conservação : Secreta-
ria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (SEMA); Ins-
tituto das Águas do Paraná; Conselho Estadual de Meio Ambien-
te (CEMA); Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH/PR);
Batalhão da Polícia Ambiental; Corpo de Bombeiros; Secretaria
do Esporte e do Turismo ; Secretaria de Estado da Cultura (SEEC);
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN);
Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER); Servi-
ço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE); e,
Agência de Desenvolvimento do Turismo Sustentável do Litoral do
Paraná (IAP, 2012a).

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Como a ilha pertence ao município de Paranaguá , a prefeitu-


ra gerencia o fornecimento de serviços básicos para a população
ali residente, como saneamento básico, coleta e gerenciamento do
lixo, saúde e educação. O Conselho Gestor da Ilha do Mel reúne ór-
gãos governamentais e não-governamentais, cuja finalidade é re-
presentar as reivindicações dos moradores da ilha por meio de uma
gestão participativa (TELLES & GANDARA, 2009).
O acesso à Ilha do Mel ocorre por barco, via terminais de embar-
que localizados nos municípios de Pontal do Paraná e Paranaguá ,
e de desembarque localizados em Encantadas e Nova Brasília (IAP,
2012a).
Por meio de estudos de capacidade de carga, o IAP permite que
5 mil pessoas permaneçam na ilha diariamente. Para gerir tal limi-
te, desde 2008 o IAP adotou um sistema de passaporte (pulseiras
com código de barras) que, além de controlar a quantidade máxi-
ma de visitantes na ilha ainda permite: diagnosticar o perfil do visi-
tante; controlar o período de permanência do visitante; e, controlar
o número de vagas disponíveis na ilha. O uso desse sistema permite
ao IAP desenvolver ações de melhorias na ilha por conta da análi-
se dos dados coletados. No entanto, esse procedimento não permi-
te monitorar o comportamento dos visitantes na ilha e seus impac-
tos sobre os recursos naturais locais (IAP, 2012a).
A Ilha do Mel possui seis localidades, ou setores de ocupação,
que se limitam a apenas 5% da área de toda a ilha: Fortaleza, Nova
Brasília, Vila do Farol, Encantadas, Praia Grande e Ponta Oeste (IAP,
2012a). Do ponto de vista turístico, a Vila de Encantadas é a localida-

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

de que contempla grande parte dos equipamentos e atrativos turís-


ticos, o que faz com que ela apresente os maiores problemas sociais
e ambientais, por conta do adensamento populacional e do fluxo de
turistas que visitam a localidade (TELLES & GANDARA, 2009).
Esteves (2004) comenta que a exploração do turismo na ilha
ocorreu de forma desordenada, consequentemente a paisagem e as
comunidades tradicionais sofreram alterações. Os hábitos culturais
antigos dos moradores, como a dança do Fandango e os Forrós, fo-
ram se perdendo por conta da vivência com novos costumes trazi-
dos pelos turistas. Além disso, com a venda das áreas, a população
local passou a prestar serviços para empresários que construíram
empreendimentos turísticos de alto padrão.
Com relação aos impactos ambientais, Sperb e Teixeira (2015),
em estudo realizado para identificar a gestão dos resíduos sólidos
nos meios de hospedagem nas áreas de Encantadas, Farol, Nova
Brasília e Fortaleza, constataram que 90% dos estabelecimentos
pesquisados (30 em um total de 107), dizem separar resíduos orgâ-
nicos de resíduos inorgânicos. No entanto, apenas 6% dos estabe-
lecimentos informaram ter muito rigor na hora da separação. Com
relação a destinação final dos resíduos, 64% dos estabelecimentos
informaram destinar para coleta seletiva apenas resíduos reciclá-
veis, e 23% informaram destinar resíduos orgânicos e inorgânicos.
Esses números demonstram que a quantidade de pousadas que
não destinam o lixo inorgânico à coleta seletiva é alta e que, segun-
do Sperb e Teixeira, ela não é correta por apresentar resíduos inor-

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gânicos agregados, o que acaba por contaminar os ambientes natu-


rais da ilha.

CASO 2: PARQUE NACIONAL DE SUPERAGUI


O Parque Nacional de Superagui, localizado no município de
Guaraqueçaba, litoral do Estado do Paraná, está inserido na Área
de Proteção Ambiental de Guaraqueçaba. O parque foi declarado
pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e
a Cultura- UNESCO, em 1991, como Reserva da Biosfera e, em 1999,
como Patrimônio Natural, por ser considerado um dos ecossiste-
mas costeiros mais notáveis do planeta, e por deter uma das maio-
res áreas de florestas cobertas do Paraná (ICMBIO, 2012).
A população residente no Parque Nacional de Superagui é for-
mada por comunidades tradicionais, e depende da extração dos re-
cursos naturais para sua sobrevivência. Historicamente, essas po-
pulações foram excluídas dos ciclos econômicos e também da sua
área, devido à criação de diversas áreas protegidas que restringiram
o seu acesso e determinaram novos modos de uso - o decreto de
criação da unidade de proteção não incluía em seus limites nenhu-
ma comunidade local, no entanto, com a ampliação do parque, em
1997, sete vilas tiveram suas áreas tradicionais inseridas no interior
da unidade (VIVEKANANDA, 2013).
Essas populações dedicam-se quase que exclusivamente à pes-
ca, sendo que apenas uns poucos continuam plantando mandio-
ca, banana e milho. A organização econômica dessas comunidades
é desenvolvida nos moldes tradicionais, alternando-se conforme a

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época, exploradas a partir das disponibilidades do ambiente, me-


diante tecnologia rústica ou artesanal. O produto obtido da pesca
depende muito da localização geográfica da comunidade, que não
costuma se afastar de onde as famílias vivem (CUNHA e ROUGEL-
LE, 1989; FARACO, 2012; ICMBio, 2012).
Entretanto, de acordo com moradores locais, as regras impos-
tas a partir da criação da unidade de preservação geraram confli-
tos, pois limitam o uso do solo e inviabilizam o sustento de mui-
tas famílias que dependem da extração de matéria prima do parque
(GRIMM, 2016).
Esse fato tem levado muitos moradores a se transferirem para
centros urbanos próximos, tornando-se, muitas vezes, desempre-
gados ou vivendo de subempregos, e aqueles moradores, que per-
manecem no parque, encontram no turismo , no cultivo de ostra,
marisco e camarão uma alternativa de diversificação econômica
viável, cujo êxito só é possível com a cooperação, a articulação e o
incentivo de órgãos governamentais e ONGs (PEDROSO, 2002).
O desenvolvimento do turismo sustentável tem trazido novas
possibilidades econômicas para as comunidades tradicionais, con-
tudo, alguns desafios são impostos em sua implementação, como,
por exemplo, a necessidade de unir esforços na elaboração de po-
líticas públicas em todos os níveis de governo para que se tenham
políticas de estado com orçamento vinculado, além da assessoria
técnica interdisciplinar, com inclusão obrigatória do especialista
em turismo (GRIMM, 2016).

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Especificamente em Superagui, o turismo é considerado por boa


parte dos moradores, como uma solução aos problemas econômi-
cos e a falta de trabalho. Muitos (donos de pousadas, restaurantes,
barqueiros,) esperam que a atividade se desenvolva e traga cada vez
mais visitantes. Contudo, é perceptível certa resistência à presença
de turistas, por serem vistos como fator exógeno, cujos costumes mo-
dificam o modo de vida local. Destacam também os impactos am-
bientais oriundos da atividade turística. Porém, estes impactos não
desestimulam os autóctones a receberem os visitantes.
É importante também levar em conta as desigualdades existen-
tes nas vilas da região. Em geral, são poucos os que conseguem acu-
mular capital para investir em infraestrutura para o turismo . Isso é
bastante variável entre comunidades, e mesmo dentro de uma co-
munidade. Qualquer projeto de apoio técnico ou financeiro deve
levar isso em conta e ter o cuidado de não contribuir para aumen-
tar ainda mais essas desigualdades (FARACO, 2014; GRIMM, 2016).
De toda maneira, a narrativa comunitária demonstra que o tu-
rista é preterido como aquele que vem visitar, se hospeda na casa
do morador, consome o alimento alí produzido e compra o peixe,
marisco ou camarão por ele capturado. Neste ponto o turista con-
tribui para que modos de vida tradicionalmente desenvolvidos na
comunidade continuem a existir e fortaleça a permanência dos
moradores em Superagui. Pode ainda ser uma opção para aque-
les que não desejam mais trabalhar com a pesca, assim como pode
ser uma opção de diversificação econômica complementar à pesca,

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uma vez que a maioria das pescarias é sazonal, assim como o turis-
mo na região (FARACO, 2014; VIVEKANANDA,2015; GRIMM, 2016).
Frente a realidade apresentada, o turismo pode ser uma estra-
tégia de desenvolvimento territorial sustentável, para a região do
Parque Nacional do Superagui, mas, destaca-se que a unidade ain-
da não possui plano de manejo, que de acordo com Vivekananda
(2015), gestora da unidade, se encontra em fase de estruturação e
quando implantado deverá atender os seguintes propósitos:

Ordenar atividades de uso público, de forma que


fiquem garantidos: a) conservação dos recursos
naturais da UC, a sensibilização dos visitantes
com a natureza e o retorno de benefícios para as
populações locais; b) determinar a capacidade
de suporte e seus indicadores de qualidade am-
biental e; c) implementar um sistema de monito-
ramento no Parque (ICMBio, 2012, p. 3).

O plano de manejo do Parque Nacional do Superagui relata Vi-


vekananda (2015), se trata de um documento arrojado se compara-
do com outros em nível nacional, pois além das oficinas previstas
no roteiro metodológico, foram realizadas visitas a todas as comu-
nidades para divulgar e informar sobre as ações que iriam aconte-
cer em torno da estruturação do plano. Foi realizado também um
curso de capacitação para os comunitários. Em todas as comuni-
dades, houve o reconhecimento de campo, onde além das comuni-
dades foram visitadas todas as instituições parceiras ou que atuam
na área do parque e região. Foi feito o diagnóstico, planejamento

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

e zoneamento da unidade levando-se em consideração as suges-


tões dos moradores locais e instituições que participaram das ofi-
cinas ou reuniões. Toda fase de estruturação é acompanhada pelo
Conselho Consultivo do Parque, onde foram escolhidos três comu-
nitários e uma instituição para acompanhar o processo do plano de
manejo fora das reuniões do conselho. De acordo com a gestora da
unidade até o momento foram elencadas mais de trezentas ações,
sendo a maioria de cunho socioambiental. Paralelamente foi feito
um pedido ao ICMBio Sede para que seja oficializada a permanên-
cia das comunidades que se encontram no interior do parque, vis-
to que são pequenas, causam pouco impacto e suas atividades são
mais ligadas à pesca tradicional (VIVEKANANDA, 2015).
Sendo assim, Grimm (2016) elenca alguns princípios orientado-
res para que o turismo no Parque Nacional do Superagui se tor-
ne uma estratégia de diversificação econômica e desenvolvimento
territorial sustentável especificamente adequada para a região: (i)
as comunidades têm uma vantagem comparativa, elas têm ativos
de enorme valor: cultura, arte, música, paisagens naturais, fauna e
clima e o turismo pode ajudar na conservação deste patrimônio
cultural e natural; (ii) o turismo tem potencial para apoiar outros
setores econômicos complementando atividades de subsistência,
por meio da criação de renda em toda complexa cadeia de forneci-
mento de mercadorias e serviços (alojamento, transporte, alimen-
tação e recreação); sem, contudo, substituir as atividades tradicio-
nais (pesca, cultivo de ostras etc.) salvo pela decisão individual de
trabalhar exclusivamente com o turismo (GRIMM, 2016).

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

As medidas protetivas tomadas para as áreas de preservação am-


biental encontram no plano de manejo o estabelecimento de dire-
trizes de uso e ocupação do solo. Nos casos observados a Ilha do
Mel, possui este instrumento que orienta a capacidade de carga da
ilha, disciplinando as atividades a serem desenvolvidas e asseguran-
do a sustentabilidade dos recursos. Entretanto, no Parque Nacional
do Superagui este documento ainda não foi instituído, o que pode
pôr em risco o uso e ocupação do espaço pela atividade turística.

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DO CAULE AOS FRUTOS: O USO DA POLPA


DE JUÇARA (Euterpe edulis Martius), NA
PERSPECTIVA DO DESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL SUSTENTÁVEL DO LITORAL DO
PARANÁ

Andreia Cristina Silva


Luciana Galvão Martins
Márcia Regina Ferreira

INTRODUÇÃO
O litoral do Paraná é a região que contém a maior área de flores-
ta nativa do estado, assim como uma forte presença de unidades de
conservação (UCs) com diferentes níveis de restrição quanto ao uso
da terra (BIASSIO, 2011). Apesar de diversos dispositivos legais que
visa proteger os remanescentes naturais, a região apresenta níveis
crescentes de degradação ambiental e parte expressiva da população
vive sob condições de pobreza, sendo alvos de diferentes interesses
que alteram suas práticas adensando a extinção de espécies e culturas
locais (ESTADES, 2003; FERREIRA, 2010; TIEPOLO, 2015).
O estabelecimento das políticas de proteção ambiental, sem o
reconhecimento dos territórios e povos locais, impôs restrições às
suas práticas tradicionais, que culminaram em sua marginalização,
como aponta Ferreira (2010) e Ferreira, Negrelle e Zanatta, (2011).

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Os dispositivos de controle, centrado na fiscalização e na força po-


licial e, somados a escassez de recursos humanos e materiais para
estabelecer os instrumentos mínimos necessários para que se efe-
tivasse as disposições de conservação do território, culminaram no
que Tiepolo (2015) vem a chamar de: política do abandono, da ex-
clusão e da invisibilidade social.
A atividade comercial do palmito que é retirado da parte supe-
rior do caule, composto por folhas indiferenciadas em desenvolvi-
mento (meristema apical), e cuja exploração culmina na morte da
planta (REIS et al., 2000), se intensificou substancialmente a par-
tir da década de 50. Nesse período, se instalaram várias indústrias
de conserva, estimulando o corte e a comercialização deste produ-
to para polos centralizadores principalmente para os centros urba-
nos das capitais (CORSO, 2003). Este fator atrelado a fragmentação
de habitats foram os principais responsáveis para o risco de extin-
ção da espécie (MOURÃO, 1971).
Historicamente a palmeira juçara teve um papel importante para
os habitantes da Mata Atlântica, representando simbologia sagra-
da na cosmovisão Guarani, constituindo fonte de alimento, matéria
para construção de habitação e confecção de remédios (LADEIRA,
2007). Muitos destes usos permanecem nas comunidades tradicio-
nais, dentre as quais o uso alimentar do palmito (BARROSO, 2009).
Em 2008, a palmeira juçara entrou na lista de espécies amea-
çadas de extinção e ficou proibida qualquer exploração que colo-
que em risco a vida da planta (BRASIL. Ministério do Meio Am-
biente, 2008). O extrativismo clandestino do palmito juçara figura

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como “um dos principais motivos de conflito na gestão das áreas


naturais, não sendo raros os confrontos armados entre extrativis-
tas, agentes de vigilância e seguranças de propriedades” (FANELLI
et al., 2012, p. 52). A exemplo do Parque Nacional de Sanit-Hilaire/
Lange onde a ocorrência de retirada ilegal do palmito reforça a ne-
cessidade de inserção de projetos que difundam e valorizem o re-
florestamento da palmeira juçara “para que os palmiteiros possam
sair da clandestinidade e se firmem de forma responsável dentro da
cadeia produtiva” (DENES, 2006, p.103).
Refletir acerca do tema “palmeira juçara e desenvolvimento ter-
ritorial sustentável” provoca inquietações. É sabido que esta espé-
cie, nos últimos anos, obteve um estigma acerca de seu produto e
suas práticas no litoral paranaense, assim, a partir da problemática
da ilegalidade do uso do meristema ou de seu caule por meio do ex-
trativismo, para uma transição para o uso do fruto, suscita o ques-
tionamento: é viável pensar em novas práticas com a espécie?
A partir do exposto busca-se discutir o potencial socioambiental
de fomento à produção da polpa do fruto da palmeira juçara (Euterpe
edulis Martius), que é uma das espécies chaves para conservação da
Mata Atlântica (BARROSO et al., 2010) e que teve participação impor-
tante para as economias de comunidades rurais neste bioma.
Dessa maneira, a palmeira juçara se configura como eixo central
nessa discussão dentro de uma perspectiva que busca uma identi-
ficação territorial, um elemento de inovação que leva em conta as-
pectos culturais e ambientais, objetivando difundir novas possibi-
lidades e relações mais sustentáveis. Verifica-se que o manejo dos

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frutos da juçara surge como uma alternativa mais sustentável, do


ponto de vista ambiental, e mais rentável, do ponto de vista econô-
mico, que a exploração do palmito (MAC FADDEN, 2005).
O percurso metodológico para este ensaio baseia-se em uma re-
visão da literatura em torno de três temas: fruto da palmeira juça-
ra; patrimônio imaterial e desenvolvimento territorial sustentável.
Sendo eles os eixos de discussão de dois projetos de mestrado do
programa de pós-graduação em Desenvolvimento Territorial Sus-
tentável da Universidade Federal do Paraná, em Matinhos. A sín-
tese proposta é resultado das análises e concepções epistemológi-
cas acerca destes temas, além das discussões do grupo de pesquisa
formado pelas autoras na linha de socioeconomia e saberes locais.

DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL SUSTENTÁVEL


A partir de meados da década de 1970, a preocupação ambiental
emergiu na sociedade de forma ampliada, em resposta à recorrência
de grandes impactos ambientais relacionados, na maioria das vezes,
a problemas advindos do crescimento industrial desenfreado (DAL-
LAZEN & SANTOS, 2007; BARBOSA; DRUMMOND, 1994). A pressão
sobre os recursos naturais afetou a dinâmica natural dos ambientes
e estas alterações culminaram em impactos ambientais significativos
nas mais diversas escalas. Além da compreensão da crise socioam-
biental persistem as assimetrias Norte-Sul, “a agudização dos confli-
tos inter-étnicos, a explosão demográfica, os altos índices de exclusão
social, miséria e criminalidade” (VIERA, 2009, p.28).

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O desafio do desenvolvimento cunhado com o adjetivo “susten-


tável” é conciliar interesses sociais, ambientais e econômicos (SA-
CHS, 2004). O modelo de desenvolvimento pautado na ideia de
progresso econômico gerou uma grande quantidade de impactos
ambientais negativos, afetando e fragmentando em várias escalas
todo o ecossistema, não se mostrando um modelo durável e muito
menos capaz de garantir o bem estar das populações (CAVALVAN-
TI, 2012). Por outro lado, iniciativas conservacionistas como a cria-
ção de unidades de conservação de proteção integral, que privile-
gia aspectos ambientais, contribuíram para o aumento da pobreza
no seu entorno (SCHERL et al., 2006).
Abramovay (2012) argumenta que três fatores são importantes
no processo de desenvolvimento: relação sociedade natureza, ino-
vação e biodiversidade. A relação sociedade-natureza constitui-se
a base das demais e a concepção não pode ser a ideia de cresci-
mento, sendo necessário reconhecer o limite dos ecossistemas e,
assim, promover a inovação de forma a “melhorar como se obtém e
transforma energia, os materiais e a própria biodiversidade em pro-
dutos mais úteis para a sociedade” (p.18).
Dentro desse contexto surgem diferentes práticas que buscam
resgatar e\ou promover técnicas que estejam pautadas em um real
processo de desenvolvimento. Para Amartya Sen (2008), o desen-
volvimento deve contribuir para a expansão da liberdade dos indi-
víduos, liberdade de caráter multidimencional e que envolve tanto
o acesso a oportunidades como a recursos naturais (SEN, 2008), ou
seja, envolve práticas que conciliem processos e produtos saudá-

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veis, de forma a não comprometer o acesso às futuras gerações, que


devem acontecer dentro de um processo engajado que envolve to-
dos os envolvidos no processo.
Haesbaert (2007) salienta que o território “assim como em qual-
quer acepção tem a ver com poder, mas não apenas o tradicional
“poder político”. Ele diz respeito tanto ao poder no sentido mais con-
creto, de dominação, quanto ao poder no sentido mais simbólico, de
apropriação” (HAESBAERT, 2007, p. 20), carregado das marcas do
vivido, do valor de uso e de maneira funcional vinculado ao valor de
troca. Segundo Haesbaert (2007), o território é funcional e simbó-
lico em diferentes combinações, exercemos domínio sobre o espa-
ço tanto para realizar “funções” quanto para produzir “significados”.
Buscando superar a visão fragmentada do território e na tentati-
va de não perpetuar a visão hegemônica da economia sobre as ou-
tras dimensões, Haesbaert (2007) ressalta que, além do território
não ser neutro, ele se posiciona, sendo o resultado da arte de pro-
cessos de interação entre seres bióticos e abióticos, em constante
reordenamento territorial onde as questões ambientais, o papel do
estado e as demandas emergentes da sociedade se conectam por
um complexo continuum de ideias entre funcionalidades e simbo-
lismo de relações físico-materiais e sócio- históricas em um cons-
tante processo de territorialização e desterritorialização de jogos de
poder (HAESBAERT, 2007).
Enfim, é preciso pensar o desenvolvimento considerando o que
Escobar (2014) destaca acerca desse rompimento de uma visão
fragmentada, ou pensamento único do território. No livro Sentir-

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pensar com a Terra, este autor discute a forma em que as comuni-


dades territorializadas têm criado na arte de viver, ou seja, entender
o território é conhecer a cultura e os saberes de seus povos. É en-
tender a cultura como diferença radical, as qual se relaciona com
termos como “civilização”, “cosmovisão”, “diferença epistêmica” e
“lógicas comunitárias” (ESCOBAR, 2014, p.17).
Nesse contexto, o território é um espaço coletivo onde as intera-
ções criam e recriam suas vidas. O território como projeto de vida
envolve as dimensões da sustentabilidade do ambiente; o conheci-
mento/saberes dos povos; multiatividades; organização; solidarie-
dade; auto sustento e, bem estar como constituintes do Bem Viver
(ESCOBAR, 2014).
Dentro dessa perspectiva de reconhecimento dos saberes dos
povos, o desenvolvimento territorial deve ser realizado com um pro-
cesso efetivo de participação política : o poder precisa ser redimen-
sionado para a construção da autonomia decisória com responsabi-
lidade social e ambiental, configurando os territórios de existência,
vida, luta e resistência, conforme as necessidades e anseios dos gru-
pos e classes sociais através de práticas de territorialização.
Esta transformação deve acontecer de maneira dialógica e con-
tinuada por meio da participação e cooperação efetiva, “lutan-
do para preservar e valorizar culturalmente o patrimônio históri-
co vinculado ao desenvolvimento territorial” (SAQUET, 2013, p. 62).
O homem como um ser histórico-social, criador e transformador
que “ao refletir sobre sua prática, pode filosofar crítica e conscien-
temente (...) transformação que depende de uma formação política

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contínua. Para o homem mudar o mundo é preciso transformar-se


na praxis, portanto precisa ser criativa, consciente e reflexiva” (SA-
QUET, 2013, p. 50).
O termo desenvolvimento territorial se dá pela necessidade de
pensar o desenvolvimento local de uma forma mais ampla, por se
tratar de uma configuração espacial a partir de uma identificação
coletiva com uma cultura e um território realizada por meio de mo-
bilização dos atores para criar estratégias de adaptação aos limites
externos (PECQUEUR, 2005). Dessa maneira, o desenvolvimento
territorial sustentável, a partir da perspectiva crítica do ecodesen-
vovimento, busca:

Oferecer respostas aos problemas mais pun-


gentes e às aspirações de cada comunidade, su-
perando os gargalos que obstruem a utilização
de recursos potenciais e ociosos e liberando as
energias sociais e a imaginação. Para tanto, de-
vem garantir a participação de todos os atores
envolvidos (os trabalhadores, os empregado-
res, os agentes governamentais e a sociedade ci-
vil organizada) no processo de desenvolvimento
(SACHS, 2004, p.61).

O ecodesenvolvimento se fortalece a partir da adaptação às


características das regiões, na preferência e fortalecimento de
iniciativas locais. São conceituadas como ecorregiões e usam as
ecotécnicas “levando em conta os dados ecológicos da mesma
forma que os culturais, as necessidades imediatas como também

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aquelas a longo prazo” (SACHS, 1986, p. 18), sem negar a impor-


tância dos intercâmbios.
Se as noções de território se propagam no discurso social, am-
biental e econômico, o ator social ocupa lugar e um espaço que de-
termina a própria existência do território. Os territórios são “assim,
entidades socioespaciais, ou relacionadas às atividades humanas
conduzidas num dado espaço; elas refletem, portanto, um proce-
dimento de construção política ” (JEAN, 2010, p. 51). Dessa forma,
a comida pode marcar um território, um lugar, servido como mar-
cador de identidade ligado a uma rede de significados, construídos
em torno de preferências, gostos e costumes.
A comida caracterizada pelos produtos de uma dada região,
uma aliança entre o saber-fazer das pessoas envolvidas no proces-
so, os modos de preparação, os utensílios utilizados e as condições
físicas, exprimem tipicidades e um retorno ao passado. Ao se ali-
mentar de produtos que estão ao seu redor, praticamente no quin-
tal de casa (MACIEL, 2001), as pessoas se incorporam cada vez mais
ao território e ao espaço físico o que é característico de cada região.
Nesse sentido, ao discutir desenvolvimento territorial em uma
perspectiva humanística, é preciso valorizar o saber local conside-
rando a sustentabilidade espacial, cultural, política , social e ecoló-
gica; em especial neste trabalho, destaca-se o que tange os saberes
das comunidades tradicionais e a valorização de práticas que en-
volvem ganhos socioambientais.

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PALMEIRA JUÇARA (EUTERPE EDULIS MARTIUS)


A palmeira juçara é uma palmeira nativa amplamente distribuída,
ocorrendo de forma contínua ao longo de toda a Mata Atlântica e tam-
bém em parte do Cerrado (CNCFLORA, 2012). Embora tenha ampla
distribuição ao longo do bioma a maior parte dos estudos sobre pal-
meira juçara refere-se às áreas de sua maior concentração, que são os
estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo.
Segundo Silva (2011) a palmeira Euterpe edulis “é uma espécie que
se destaca entre as demais por apresentar muitas relações interespe-
cíficas (...) principalmente pelo uso de seus frutos pela fauna, inclu-
sive, destacando-se como item de grande importância na dieta de
animais que correm risco de extinção” (SILVA, 2011, p. 257). A espé-
cie Euterpe edulis pertencente à família Arecaceae (Palmae), é uma
palmeira não estolonífera, de estipe único e suas folhas são pinadas,
com cerca de 2 a 2,5 metros de comprimento (REIS, 2012), caule com
altura média de 10 a 20 61 metros e meristema apical de 8 a 20 cm de
diâmetro, regularmente anelado, localizado na ponta ou extremida-
de do caule, destacando-se por ser lisa e apresentar coloração verde
escura, na qual encontra-se o palmito (REIS et al., 2000).
Apresenta raízes superficiais de coloração vermelha. Os frutos
são arredondados e apresentam cor arroxeada quando maduros e
estão inseridos em cachos. Normalmente apresentam, em média, 3
a 4 cachos por palmeira (SÃO PAULO, 2008).
Os cachos são formados por milhares de frutos que medem de
10 a 15 milímetros de diâmetro (SAAVEDRA, 2008). Os frutos apre-
sentam uma “drupa esférica com casca pouco espessa, lisa na par-

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te externa. O mesocarpo é apreciadíssimo pelos pássaros e quando


ainda imatura apresenta endosperma mole e comestível” (MOSI-
MANN; REIS, 1975, p.40).
A coloração roxa ou violácea dos frutos quando maduro se deve
a presença de antocianinas, que são poderosos antioxidantes que
atuam no organismo inibindo ou diminuindo os efeitos desenca-
deados pelos radicais livres (SILVA, 2013), e representam uma das
principais características nutricionais dos frutos da juçara (SAAVE-
DRA, 2008; FERREIRA, 2013, SILVA, 2013). Sendo expressivamente
superior à quantidade presente nos frutos da palmeira E. oleracea
Mart, o açaizeiro, (FERREIRA, 2013).
As antocianinas, segundo Rogez (2000), protegem o organismo
contra o acúmulo de placas de depósitos de lipídios, tem potencial
de bloquear uma enzima ligada ao desenvolvimento de determina-
das células cancerígenas, retardam o envelhecimento, prolongam
a vida das células, aumentam as defesas imunitárias, propiciam
uma melhor circulação sanguínea e protegem o organismo contra
o acúmulo de lipídeos nas artérias. Possuem a capacidade de adiar
as perdas de visão, memória e coordenação motora, diminuindo os
efeitos da doença de Alzheimer.
Saavedra (2008) encontrou treze tipos antocianinas e doze ou-
tros compostos, entre ácidos fenólicos e outros flavonoides nos fru-
tos da juçara. A polpa integral do fruto da juçara mostrou ser uma
rica fonte de substâncias polifenólicas, apresentando maior poder
antioxidante que o já conhecido para o açaí. Ressalta-se também a
característica dos frutos estar entre os 10 mais ricos em energia, en-

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tre 50 tipos de frutos pesquisados na Mata Atlântica segundo estu-


do realizado por Galetti & Aleixo (1998).
Atualmente, uma expressiva parte dos indivíduos de palmeira
juçara se encontra em quintais agroflorestais (REIS, 2012; FILHO,
2005). Biassio (2011) mostra que a planta é uma das seis espécies
mais comuns nos quintais de Antonina e Morretes (PR), com ocor-
rência de mais de 45 mil indivíduos, representando 46% do total de
indivíduos identificados na área da pesquisa.
Embora alguns autores (CARVALHO & FAGUNDES, 2013; CORSO,
2003; COATI, 2013; MAC FADDEN, 2005; BARROSO et al., 2010) desta-
quem a importância social da juçara para as populações rurais e iden-
tifiquem uma relação de apego e conservação através do replantio da
planta em suas propriedades. Destaca-se que em virtude da crimina-
lização e restrição de uso os produtores familiares também se sentem
desmotivados com a exploração do fruto (BIASSIO, 2011).
A longo do último século, tanto a palmeira Euterpe Oleracea
Mart como a Euterpe edulis Mart tiveram usos alimentares diferen-
tes. A primeira, com participação especial para o uso do fruto e a
segunda do palmito. Os cachos da palmeira juçara ao serem cole-
tados não causam danos à saúde da planta, garantindo assim, sua
preservação.
O fruto do açaízeiro tem a mesma estrutura física do fruto da ju-
çara, sendo o fruto da juçara com cinco vezes mais antocianinas
que o fruto do açaízeiro, tornando-o mais desejável no mercado de
corantes alimentícios (GUIMARÃES, 2009). No entanto, a partici-
pação no mercado é expressivamente maior na região amazônica,

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devido os ribeirinhos do estuário amazônico terem, há vários sé-


culos, o conhecimento de como preparar o fruto para alimentação.
No estado do Paraná, diferentes organizações e coletivos têm
buscado promover a produção e uso da polpa de juçara como: o
Instituto Agrônomico do Paraná (IAPAR); Associação dos Peque-
nos Produtores Rurais e Artesanais de Antonina (ASPRAN); depar-
tamento de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de
Ponta Grossa (UEPG); Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuá-
ria (EMBRAPA FLORESTA); Reserva da Biosfera da Mata Atlântica
(RBMA), Coletivo Juçara, realizando reuniões, eventos, festas, feiras
promovendo a divulgação e compartilhamento de conhecimento
sobre o uso da polpa de juçara. No entanto, conforme aponta Silva
(2017), a maioria dessas práticas são pontuais, carecendo de incen-
tivo e dialogo continuado entre os atores.
A ampliação dos mercados proporcionou que um alimento típi-
co do norte do país como o açaí ganhasse mercado nacional e in-
ternacionalmente, considerando a importância de fortalecimento
dos potenciais locais o fruto da palmeira juçara surge como uma
possibilidade de promover o desenvolvimento territorial susten-
tável. Enfim, as práticas do cotidiano (chão vivido) precisam estar
permeadas pela relação sociedade e natureza, por isso a relevância
do entendimento da importância desta planta nativa, do reconhe-
cimento do seu potencial socioambiental e o resgate ou construção
de novas práticas em relação ao seu fruto.

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PALMEIRA JUÇARA: RELAÇÕES ENTRE IDENTIDADE E


TERRITÓRIO
A identidade envolve símbolos e significados das populações
ocupam o território, que se constroem como continuidades históri-
co-culturais inerentes de um grupo social. Segundo Saquet (2007),
“através de seus gestos, necessidades e aprendizagens produzem
e renovam territorialidades, identidades” (SAQUET, 2007, p. 147).
Para o autor são “ações sociais históricas que são reproduzidas por
cada geração”. Desta forma:

As identidades são produtos dos processos his-


tóricos e relacionais, ou seja, da formação de
cada território num contexto de relações sociais
com o ambiente externo à vida em sociedade.
A identidade, desta maneira, configura-se num
patrimônio territorial a ser preservado e valo-
rizado pelos atores envolvidos diretamente na
sua constituição histórica e por outras pessoas
que podem ‘viver’ esse patrimônio. O territó-
rio, então, envolve esse patrimônio identitário: o
saber-fazer, as edificações, os monumentos, os
museus, os dialetos, as crenças, os arquivos his-
tóricos, as relações sociais das famílias, as em-
presas, as organizações políticas (...) que pode
ser potencializado em projetos e programas de-
senvolvimento que visem sua preservação e va-
lorização (SAQUET, 2009, p. 14).

Segundo Saquet (2007), a “natureza está presente na construção


histórica do território e da identidade, como patrimônio de cada lu-

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gar e que, por isso, precisa ser gerida com vistas ao desenvolvimen-
to territorial sustentável” (SAQUET, 2007, p. 148).
O território que hoje chamamos de Brasil originalmente foi
identificado pela etnia tupi-guarani por Pindorama, que significa a
terra das palmeiras (MOONEN, 1983; CASCUDO, 2012). A ocupação
indígena do litoral do Paraná é associada à etnia Guarani Mbya,
que corresponde ao território entre os países Paraguai, Argentina,
Uruguai e Brasil, mais especificamente entre a região de aldeias do
leste do Paraguai, norte da Argentina e Uruguai até o interior dos
estados do sul e sudeste do Brasil (Rio grande do Sul, Santa Catari-
na e Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo), com agru-
pamentos notados também em outros estados do nordeste junto a
Mata Atlântica (LADEIRA, 2007).
Vários registros apontam para a forte relação entre esta famí-
lia de plantas e os povos originários, das quais os índios utilizavam
toda a planta: a madeira para construir as ocas; as folhas para co-
bertura de habitação e outras construções; alimento através dos
frutos e palmito; fabricavam sal através da cinza das palmeiras42; re-
médio (para dor de cabeça, estomago e cicatrizante); extraiam óleo
para cozinhar; e o espinho de algumas espécies era utilizado como
agulha para costurar (LADEIRA, 2007, STADEN, 2011).
Para o povo Mbya, “além de vinculada à subsistência, esta pal-
meira, cuja espécie é encontrada em todas as regiões do território

42.  Através da queima obtinham cloreto de potássio que não é um substituto adequado para clo-
reto de sódio, indicando que esta ingestão poderia ser retirada de outras fontes (MELATTI, 2007).
Este processo também é descrito nos relatos históricos da viagem de Hans Staden ao Brasil (STA-
DEN, 2011).

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Guarani, tem sua importância também na configuração espacial do


“mundo Mbya” (LADEIRA, 1997, p.17). O prefixo “pindo” se refere
à palmeira sagrada, a origem do mundo quando Nhanderu Guaxu
“trouxe a terra e a colocou em cima e no meio do oceano (yy ee).
Em seguida gerou as árvores entre elas a primeira, a palmeira eter-
na (pindovy ou pindo etei)” (LADEIRA, 2007, p. 105). As áreas com
abundância de palmeiras eram indicativo de lugares propícios para
formação de aldeias.
O município de Paranaguá , denominado Iparavãpy “origem do
mundo”, é considerado o território de onde se originaram os pri-
meiros filhos concebidos pelas divindades. Esta etnia identificava
como pindovy ou pindo etei, uma palmeira que tem um “palmito
doce bom para se comer e de suas folhas são feitas as coberturas
das casas. Seus frutos quando maduros são alimento e seu óleo é
usado como alimento e para cozinhar. Das suas fibras são feitas
cordas e cordões para adornos” (LADEIRA, 2007, p. 82).
Após a invasão dos colonizadores ocorreram processos de mis-
cigenação, que no litoral sul e sudeste do Brasil, entre o Rio de Ja-
neiro até Santa Catarina se deu principalmente entre europeus e ín-
dios (em menor grau com africanos), processo que contribuiu para
a formação de uma morfologia social com um modo de vida ligado
às atividades de pesca, coleta em ambientes aquáticos e agricultura
de subsistência baseada na mandioca (DIEGUES, 1999).

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A população originada a partir desta mescla etno-cultural pas-


sou a ser identificada pelos cientistas43 como caiçara, termo que
vem do vocábulo tupi-guarani caá-içara que se refere “as esta-
cas colocadas em torno das tabas ou aldeias, e o curral feito de ga-
lhos de árvores fincados na água para cercar o peixe. Com o passar
do tempo, passou a ser o nome dado às palhoças construídas nas
praias para abrigar as canoas e os apetrechos dos pescadores” (SOS
MATA ATLÂNTICA, 199244 apud ADAMS, 2000, p. 146).
Vários itens da cultura indígena foram incorporados ao dia a
dia caiçara, como o tipiti (cesto flexível de cipó timbopeva, utiliza-
do para espremer a mandioca ralada), ervas entorpecentes usadas
para atordoar os peixes (timbó), o moquém (processo de conserva-
ção do peixe através do fogo), a canoa escavada no tronco, entre ou-
tras contribuições, entre elas os usos alimentares e construtivos da
palmeira juçara (ADAMS, 2000).
É, principalmente, durante o interstício dos ciclos econômicos
do período colonial, principalmente quando as atividades ligadas
a exportação entraram em declínio, e as opções se voltaram para as
atividades ligadas à terra e ao mar, que a cultura caiçara se fortale-
ce (DIEGUES, 1999).
Diegues (1988) considera que as comunidades tradicionais man-
têm um relacionamento complexo com o ambiente natural e pre-

43.  Conforme aponta Adams (2002) desde 1960 os pesquisadores que estudavam esta popula-
ção não fazem referência a como eles se autoidentificavam. O estudo de Setti (1985, apud ADAMS,
2002) traz elementos que eles se autodenominavam como: praianos, ubatubanos ou barrigas ver-
des pela importância da banana verde em sua dieta.
44.  FUNDAÇÃO SOS MATA ATLÂNTICA, Dossiê Mata Atlântica 1992, São Paulo.

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servação da diversidade biológica, que não é marcada somente por


instâncias econômicas, embora também vincule uso dos recursos
à geração de renda. Os valores, tradições, crenças religiosas e per-
cepções, exercem um papel fundamental na definição das relações
com o ambiente e seus recursos.
A partir dos estudos de antropólogos como Ladeira (2007), que
menciona vários usos das palmeiras entre os Guarani-Mbya que
habitam a costa brasileira, incluindo o uso do fruto na alimenta-
ção, constata-se que este hábito foi perdido ao longo de vários pro-
cessos históricos seculares, se mantendo neste bioma o uso do pal-
mito. Destaca-se que o primeiro registro de resgate da despolpa
de frutos de palmeira nessa região data de 1870 (FERREIRA, 2001),
época em que a família do engenheiro paraense Joaquim Vieira
Ferreira se estabeleceu no sul de Santa Catarina com a missão de
fundar as colônias italiana de Azambuja e Urussanga e nesta terra
se estabeleceu por um período de dois anos. Segundo registros his-
tóricos, tem-se o relato que:

(...) mais agradável era a juçara preparada pela


parda maranhense Luiza Amália, com a cas-
ca do côco do palmito doce. Era uma emulsão
que se tomava como refresco, diluída conve-
nientemente, e não como o assai paraense, que
engrossam a maneira de um chocolate oleoso,
anunciado nas ruas de Belém com uma bandei-
rinha vermelha, a porta da casa em que se ven-
dia. Bebida análoga se faz com outros côcos no
Amazonas, como o patuá, o buriti e a bacaba,
para só citar os que conheço. Mas o refresco fei-

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to com esses não é tinto como o assai, ou a juça-


ra, mas amarelo ou cor de café com leite (FER-
REIRA, 2001, p.72).

Nota-se através dos registros da literatura que este hábito apa-


rece como um processo de reapropriação cultural inicialmente de
pessoas vindas da região norte do país (FARIAS, 2009, MAC FAD-
DEN, 2005), e posteriormente fomentadas por variadas organiza-
ções e coletivos, principalmente a partir dos anos 2000.
Nesse período surgem diversos estudos sobre o assunto em ins-
tituições do Sul e Sudeste do país (MAC FADDEN, 2005; FARIAS,
2009; BARROSO; HANAZAKI, 20xx; COATI, 2013), e é a partir do sé-
culo XXI que o uso alimentar do fruto da palmeira juçara é reco-
nhecido e começa a ganhar destaque como alternativa de renda e
uso na alimentação.
De acordo com Da Matta (1986), comida e alimento são defini-
dos distintamente pelos atributos que cada um carrega. Nem tudo
que alimenta é socialmente aceitável para todas as sociedades,
nem tudo o que é comestível em uma cultura é em outra. Os aces-
sos conduzem a um movimento no qual cada cultura possui um
sistema classificatório que aponta o que é comestível ou não, em
que circunstancias irão comê-los. As características dos alimentos
são apreciadas pelo comedor, simplesmente por ser agradável ou
por ser desagradável, contribuindo assim para ser escolhido, sele-
cionado ou descartado. Para Da Mata (1986):

Alimento é tudo aquilo que pode ser ingerido


para manter uma pessoa viva, comida é tudo

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que se come com prazer, de acordo com as re-


gras sagradas de comunhão e comensalida-
de [...] em outras palavras, o alimento é como
uma grande moldura; mas a comida é o quadro,
aquilo que foi valorizado e escolhido entre os
alimentos; aquilo que deve ser visto e saboreado
com os olhos e depois com a boca, o nariz, a boa
companhia e, finalmente, a barriga (DA MATTA,
1986, p.32-33).

Assim, é possível distinguir comida de alimento, apesar de seus


significados serem facilmente confundidos. Woortmann (2013)
considera um processo de vir a ser, uma passagem no plano da na-
tureza para o da cultura sendo mediado pela via culinária conside-
rando que o trajeto do “alimento passa da roça, da dispensa ou do
supermercado, para a casa onde será processada na cozinha para
depois, na forma de comida, ser consumida pela família” (WOORT-
MANN, 2013, p.15).
Além disso, há de se considerar que dentre os alimentos dispo-
níveis para o consumo humano e considerados comestíveis, nem
sempre todos poderão ser selecionados ou aceitos por uma deter-
minada cultura. Selecionam-se os alimentos. Para Santos I OU H
(2006) a cultura engloba fatores que nos fazem considerar certos
alimentos, “determina o que comer, que nos integra ao grupo, aos
sabores, às vezes exóticos, aos olhos de quem a ela não pertence,
mas é ela que transforma o alimento em comida” (SANTOS, I OU H
2006, p.25). A cultura alimentar se relaciona com algumas dimen-
sões, tais como o econômico, o social e o cultural adaptados ao seu
habitat (CONTRERAS, 1992).

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A escolha da comida, o que se come, quando se come, onde se


come, como se come, com quem se come e por que se come, é re-
lacionada, como afirma Maciel (2001), ao “arbitrário cultural e com
uma classificação estabelecida culturalmente (...) a cultura não
apenas indica o que é e o que não é comida, mas estabelece pres-
crições e proibições” (MACIEL, 2001, p. 28). A comida, para a auto-
ra, pode marcar um território, um lugar, servido como marcador de
identidade ligado a uma rede de significados, construídos em torno
de preferências, gostos e costumes de determinada cultura.
Pensar saberes e fazeres alimentares e suas transformações pas-
sam por reconhecer a diversidade sua cultural e ambiental dos ter-
ritórios, ou seja, o reconhecimento e o fortalecimento de opções
pautados numa valorização socioambiental e visibilizar riquezas
locais que antes não eram conhecidas e tem o potencial de recons-
truir identidades coletivas.
No caso do uso do fruto da palmeira juçara, se destaca que o fo-
mento a incorporação deste alimento para os povos da Mata Atlânti-
ca tem o potencial de contribuir em várias dimensões do desenvol-
vimento territorial. O resgate do uso do fruto da juçara se configura
em uma adaptação aos limites externos, conforme abordado por Pe-
cqueur (2005), uma vez que a espécie foi intensamente explorada e
se encontra em risco de extinção na natureza. Destaca-se que o pro-
cesso de despolpa promove o aumento significativo da capacidade
germinativa da semente quebrando a dormência da planta que pas-
sa de 44 a 69% em germinação de sementes inteiras em estufas para
72 a 97% de germinação em sementes despolpadas (BOVI, 1990).

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Da mesma maneira esta exploração representa uma oportuni-


dade de inovação territorial, conforme discutido por Abramovay
(2012), através do resgate de um alimento que pode vir a ser incor-
porado na cultura dos habitantes da Mata Atlântica como comida,
incluindo na sua cultura novas formas de relação com o meio, na
medida em que este alimento gera benefícios: ambientais (na re-
composição da espécie nativa e no aumento da oferta de alimen-
to para os pássaros); econômicos, pois a partir do manejo susten-
tável da cadeia da juçara é possível utilizar sua polpa (na forma de
sucos), desenvolver outros produtos agregando valor à produção
(como bolos, pães, geleias, sequilhos, entre outros) e também na
venda das sementes despolpadas e; sociais, na melhoria da quali-
dade de vida e segurança alimentar com o aumento da ingestão de
um alimento rico em diversos nutrientes e antocianinas.
No litoral do Paraná , segundo Silva (2017) o diagnóstico da pro-
dução da polpa de juçara foram identificadas dez experiências de
produção com foco na geração de renda e a maioria dos produto-
res (90%), tiveram conhecimento desta possibilidade de produção
a partir da divulgação de coletivos e instituições que atuam no li-
toral ou em outros estados do Sul e Sudeste do Brasil. Esta consta-
tação demonstra a importância das instituições como espaços de
fomentos para novas formas de produção mais sustentáveis. No en-
tanto, destaca-se que as instituições precisam ter contato constante
com os produtores no intuito de auxiliá-los a diminuir os desafios
da cadeia produtiva.

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Nesse território, as atividades de produção são recentes, sen-


do que o início desse processo aconteceu em 2002 por iniciativa
de uma migrante paraense que ensinou o processo de despolpa ar-
tesanal para a Associação de Produtores Artesanais (ASPRAN), no
bairro Cachoeira, no município de Antonina. Posteriormente, em
2008 e 2009, surgiram outras três inciativas no município de Morre-
tes, Guaraqueçaba e Paranaguá , e, por fim, as outras seis iniciativas
que iniciaram entre os anos de 2013 e 2016 (SILVA, 2017).
Entre os principais desafios para a venda da produção está a fal-
ta de conhecimento dos consumidores sobre o produto. Segundo
os produtores quem experimenta compra, no entanto, pelo fato da
polpa estar relacionada a cadeia do frio, dispor de degustação para
os clientes é algo custoso para o pequeno produtor (SILVA 2017). O
território do litoral do Paraná desde os povos originários até os dias
atuais tem forte relação com o uso da palmeira juçara, no entanto,
em virtude do impacto ambiental da exploração do palmito, o res-
gate do uso alimentar do seu fruto precisa ser incentivado, para que
a população deste território resgate o valor deste alimento e o in-
corpore na cultura transformando em comida.
Martins, Tozetti, Ferreira (2017), alertam para o cenário da ne-
cessidade de considerar as particularidades do local na orientação
para uma alimentação saudável, como elementos importantes para
o desenvolvimento territorial, segundo as autoras “quando pen-
samos na alimentação saudável precisamos refletir sobre a ques-
tão imposta pelo processo de globalização bem como implementar
ações na localidade” (MARTINS, TOZETTI, FERREIRA, 2016, p.43).

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Martins (2017) ressalta que, ao longo do tempo houve proces-


sos seculares de colonização que afetaram a dinâmica alimentar e a
partir deste ensaio, se pode observar estas influências na relação en-
tre o homem e a palmeira juçara em que o privilégio de apenas um
aspecto de uso da planta se popularizou ao longo do tempo e poste-
riormente o processo de colonialidade que envolve a importação de
diversas formas de relações subjetivas promoveu o adensamento da
pressão sobre o recurso natural em virtude da especulação do mer-
cado. Além disso, os processos de colonialidade segundo a autora,
impactam inclusive na mudança de hábitos alimentares em várias
escalas (nos fast-foods, comidas prontas e padronizadas).
Nesse contexto perde espaço o saber-fazer tradicional de ali-
mentos, os ingredientes da terra e a retomada desses processos
bem como da conscientização de novas opções locais de alimen-
tação, que pode contribuir para reconstruir a identidade coletiva, a
autoestima e a valorização da cultura local. Silva (2017) destaca que
a fabricação da polpa de juçara, no litoral do Paraná tem gerado
uma série de experimentações culinárias que acabam sendo pouco
conhecidas no território em virtude de vários desafios dos peque-
nos produtores em ampliar suas possibilidades de produção e es-
coamento da produção.
A concepção de comida como elemento gerador de identida-
des faz referência a alimentos definidos como identificadores de
uma região ou, no caso, de um bioma. A culinária se refere ao pas-
sado e também a antepassados, nesse caso tem-se um resgate do
uso alimentar dos povos originários. A culinária regional não se re-

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duz somente a receitas diferentes, mas envolvem ingredientes, pre-


parações, a modos de fazer, de usar os utensílios domésticos, são
sistemas de aprendizado que se baseiam na experiência vivida. A
compreensão e o fortalecimento de opções alimentares que geram
benefícios sociais, econômicos e ambientais deve ser alvo de inves-
timentos públicos com vistas a oportunizar o desenvolvimento ter-
ritorial sustentável.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este ensaio buscou apresentar algumas possibilidades de de-
senvolvimento endógeno a partir de riquezas regionais brasileiras
com resgate e valorização do fruto da palmeira juçara, que teve um
processo de uso tradicional indígena como fonte de alimento e ma-
téria para construção, onde se aproveitava os frutos, caule, fibras e
folhas, posteriormente foi utilizado principalmente para a alimen-
tação (palmito). A alteração da relação onde um elemento natural,
que virou um produto com alta demanda comercial, promoveu a
intensificação do extrativismo, sendo este um dos principais fatores
pelo seu risco de extinção.
No entanto, para além desta problemática, o resgate histórico
evidenciou que as tribos indígenas que ocuparam o território do li-
toral do Paraná apresentavam em seus hábitos alimentares o uso
fruto da palmeira juçara e esta planta representava papel de desta-
que na cosmovisão Mbya. Essa perspectiva temporal, de olhar a es-
pécie e seu uso dentro de um período maior de tempo, proporciona

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uma visão mais real acerca do conhecimento das práticas em rela-


ção a espécie e seu uso.
O processamento da polpa do fruto da juçara se configura dessa
maneira, como um caminho entre preservação e conservação, sendo
possível, a partir de um conjunto de políticas públicas e articulação
de atores, dar ênfase na extração e comercialização da polpa de ju-
çara, como alternativa de renda para a comunidade rural , inclusive
com potencialidade de contribuir para a segurança alimentar, dada
sua capacidade nutricional e recomposição da espécie no ambiente
em virtude do significativo aumento do potencial germinativo.
É fundamental, no entanto, envolver no processo o reconheci-
mento, das iniciativas em curso, o apoio aos seus desafios de pro-
dução e também os anseios e respeito às comunidades rurais apre-
sentando e trabalhando em conjunto esta alternativa, a partir do
resgate e valorização a uma prática ancestral, entendida aqui como
a proteção e valorização de um patrimônio imaterial no que tange a
sustentabilidade socioambiental.
Neste sentido, considera-se viável pensar o fruto da palmeira ju-
çara como elemento de resgate e potencialização de novas identi-
dades a partir de planejamento e envolvimento de atores na gestão
e implementação de políticas que tenham como escopo a identifi-
cação de uma multiplicidade de estratégias e que busquem o de-
senvolvimento de sociedades sustentáveis, em oposição ao padrão
de crescimento que é apresentado e que se mostra insustentável.

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CADEIA PRODUTIVA DA PESCA DE SIRI


COM GAIOL AS NO LITORAL PARANAENSE:
CARACTERÍSTICAS, IMPLICAÇÕES SOCIAIS,
ECOLÓGICAS E PERSPECTIVAS ECONÔMICAS

Adilson Anacleto

INTRODUÇÃO
A colonização do litoral paranaense teve o início por volta do
ano de 1675, quando foi fundada pela coroa portuguesa a cidade
de Paranaguá . A pesca nesse período já era praticada pelos nati-
vos no Brasil. Os frutos do mar já eram coletados pelos índios que
faziam deles parte significativa de sua alimentação (ANACLETO et
al., 2010). A baía de Paranaguá foi cuidadosamente escolhida pela
coroa portuguesa não somente pelas águas calmas que permitiam
atracar seus navios mercantes apesar do baixo calado, mas também
pela abundância de pescados que favorecia a colonização da costa
(LIMA; MESQUITA, 2015).
Desde o período de colonização, o uso dos recursos pesqueiros
esteve presente no cotidiano dos residentes na costa paranaense,
atingindo seu ápice no início da década de 1990, quando então en-
volvia aproximadamente 10 mil pessoas, que residiam em mais de
60 ilhas e vilas nos municípios de Guaraqueçaba, Antonina, Gua-
ratuba, Matinhos, Pontal do Paraná e Paranaguá (SIMON; SILVA,

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2006; ANACLETO et al., 2010). A partir do início do século XXI, a


pesca marítima passou a representar relevante contexto social e
econômico no litoral do Paraná . Esta região é composta por grande
diversidade de ambientes aquáticos, variedade de pescados e di-
versas práticas de captura. Porém, esse setor tem passado por pro-
fundas transformações socioeconômicas (ANDRIGUETTO FILHO,
2003; SERAFINI et al., 2016).
Andriguetto Filho (2003) e Simon e Silva (2006) relatam que sig-
nificativa parte dos envolvidos com a pesca era de pequenos pes-
cadores classificados como artesanais, os quais tinham na captura
de pescados como peixes e camarões, a única alternativa de renda.
Anacleto et al. (2015) descrevem que esse grupo de pescadores
eram remanescentes de comunidades tradicionais ou de comuni-
dades caiçaras, cuja pesca, além de ser a principal fonte de renda,
era complemento importante da alimentação familiar.
A pesca nessas comunidades remanescentes, segundo Diegues
(1983) e Andriguetto Filho (2003), era multicomplexa e variava de acor-
do com as origens culturais e o local onde o pescador estava inserido,
bem como de pequenas tarrafas nas ilhas até embarcações que trans-
portavam duas toneladas de pescados no município de Guaratuba.
As comunidades tradicionais pesqueiras no litoral do Paraná
nas últimas décadas têm sofrido profundas alterações. A pesca in-
dustrial praticada com recursos tecnológicos para identificação dos
cardumes por grandes embarcações oriundas dos estados de São
Paulo e Santa Catarina promoveram o declínio da produção de pes-
cados na região em função do elevado esforço de captura de peixes

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e camarões na costa paranaense. O decréscimo dos estoques natu-


rais de peixes e camarões fez com que esse grupo de pescadores ar-
tesanais e tradicionais do litoral paranaense tivessem que perma-
necer mais tempo no mar para a captura da mesma quantidade de
pescados, o que, conforme Anacleto et al., (2015), elevou os custos
de produção, ampliou a necessidade de mão de obra e, portanto,
reduziu a renda familiar.
Como consequência do declínio dos estoques naturais, segundo
Anacleto et al. (2010), na década de 1980 iniciou-se o êxodo da ati-
vidade pesqueira de centenas de famílias. Diante disso, atualmen-
te apenas 4.000 pessoas, de 600 famílias em 35 comunidades, ain-
da sobrevivem da atividade pesqueira, que continua dando sinais
de esgotamento.
A dificuldade de sobrevivência na pesca de peixes e camarões
provocou, além do êxodo da atividade pesqueira, a migração para
outras atividades que se mostravam mais promissoras sob a obten-
ção e renda, como no caso da maricultura e ostreicultura, que ti-
veram maior aderência nas baias de Paranaguá e Guaratuba por
estarem mais próximos ao continente, sendo que nas ilhas mais
distantes surgiu a pesca do siri com gaiolas (SIMON; SILVA, 2006;
MELLO, 2013).
Os siris são caranguejos da família Portunidae representados no
Brasil por um único gênero, o Callinectes. No litoral do Paraná , lo-
cal de tradicional pesca e comércio de crustáceos, as espécies C. sa-
pidus (siri guaçú) e C. danae (siri mirim) são usadas como alterna-
tivas de renda em diversas comunidades, e, assim como em outras

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regiões da costa marítima brasileira, apresentam relevância ecoló-


gica, econômica e social (METRI et al., 2005).
A carne do siri sob o enfoque nutricional é classificada como um
alimento benéfico ao consumo humano e apresenta em sua com-
posição sódio, cálcio, fósforo e vitaminas B1 e B2. Além disso, é bas-
tante apreciada como iguaria (PEREIRA; FONSECA, 2011). Devido à
procura durante o ano todo, a comercialização da carne de siri nor-
malmente apresenta maior valor agregado que o de espécies simi-
lares. Por esse motivo, tem forte aceitação como alternativa de ge-
ração de renda (BARRETO et al., 2013).
A pesca do siri com o uso de gaiolas submersas, de acordo com
Anacleto et al. (2015), surgiu na Ilha do Tibicanga no início da déca-
da de 1990, e posteriormente esse método de pesca se disseminou
para as demais lhas vizinhas do município de Paranaguá , sendo,
atualmente, praticada na maioria dos municípios do litoral do Pa-
raná e em outros estados brasileiros.
Conforme Anacleto et al. (2017), a pesca do siri com gaiolas é
uma atividade econômica recente, que pode ser um dos elementos
de base ao desenvolvimento sustentável das famílias residentes nas
comunidades caiçaras do litoral paranaense, especialmente devi-
do ao seu caráter plural e da facilidade da associação dessa a outras
atividades potenciais de renda.
Apesar de ser a costa e as ilhas do Paraná um relevante espaço de
trabalho às famílias de pescadores, são esparsos os estudos relacio-
nados à pesca, e em especial, à cadeia produtiva do siri pescado com
gaiolas. Assim, com vistas a subsidiar uma melhor compreensão do

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cenário atual dos aspectos sociais, ecológicos e econômicos dessa


cadeia produtiva, apresenta-se resultado de pesquisa que buscou:
a)identificar os segmentos da cadeia produtiva e como eram es-
tabelecidos os processos de captura, beneficiamento e comércio
da cadeia produtiva da pesca de siri com gaiolas no litoral do es-
tado do Paraná até o consumidor final;
b)promover uma análise de cenário sobre a pesca do siri com gaio-
las e analisar as margens de lucro e “markups” de comercialização;
c)discutir o contexto econômico e socioambiental da cadeia
produtiva de siri com gaiolas no litoral Paranaense.

MATERIAL E MÉTODO
Foi realizada pesquisa exploratória descritiva, conforme pro-
posto por Negrelle et al. (2014), sendo que o levantamento de dados
ocorreu de setembro de 2016 a março de 2017.
Inicialmente, de acordo com o proposto por Anacleto et al.
(2015), para obter informações sobre os locais de onde ocorria a
pesca e captura de siri com gaiolas foi realizada visita ao Departa-
mento Regional da SEAB (Secretaria de Estado da Agricultura do
Governo do Estado do Paraná), em Paranaguá , nos escritórios mu-
nicipais da Emater-Paraná, nas colônias de pescadores e secreta-
rias municipais de meio ambiente ou de pesca dos municípios es-
tuarinos que compõem o litoral do Paraná , a saber: Paranaguá ,
Antonina, Pontal do Paraná , Guaraqueçaba e Guaratuba.
A coleta de dados para o diagnóstico socioeconômico dos pes-
cadores e a caracterização das metodologias de produção e co-

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mercialização foram feitas com visitas às comunidades pesqueiras,


quando se realizaram entrevistas semiestruturadas individuais, co-
letando informações acerca do sistema de captura, despesca, be-
neficiamento da produção, sistemas de vendas, custo de produção,
preços de vendas e destino da produção de acordo com o proposto
por Castro et al. (2002) e Santos (2005).
Para melhor compreensão do cenário da atividade, de acordo
com o proposto por Ilbery e Maye (2005) e Santos (2005), proce-
deu-se a técnica de observação participante com o acompanha-
mento dos pesquisadores ao mar juntamente com os pescadores,
quando foram observadas as distintas fases da captura e despesca
do siri com gaiolas.
A identificação dos principais segmentos da cadeia produtiva
em um processo de “bola de neve” foi obtida a partir das lideran-
ças comunitárias, às quais foi solicitada a indicação de empresários
formais e informais, bem como de organizações que atuavam dire-
ta ou indiretamente na cadeia produtiva do siri com gaiolas.
Após a identificação dos outros atores que também atuavam na
cadeia produtiva, realizaram-se entrevistas presenciais semiestru-
turadas em cada segmento da cadeia produtiva. Nessa fase, foram
entrevistados 52 pescadores, três comerciantes atacadistas, e no
segmento varejista foram entrevistados 22 proprietários de restau-
rantes, 19 proprietários de peixarias e 177 consumidores.
O cálculo do custo de produção da captura do siri com gaiolas
considerou os custos de investimentos diluídos ao longo do tempo
(gaiolas, freezers, panelas, fogões), a mão de obra de descarne, ma-

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teriais (colheres, facas, peneiras, embalagens plásticas, entre ou-


tros), água, energia elétrica e combustível, assim como o sistema
de produção e beneficiamento adotado em cada unidade. De acor-
do com o proposto por Santos (2005), para varejistas e atacadistas,
soma-se a margem de lucro do produtor, o custo de transporte, em-
balagem e tributos.
O cálculo da distribuição de lucratividade entre os segmen-
tos comerciais na cadeia produtiva foi feito com base no markup,
que é um percentual aplicado sobre o custo final de um produto
para estabelecer o preço de venda. O markup foi obtido pela divi-
são do lucro, sobre os custos, incluso neste os tributos, com base na
a fórmula:

Mark-up = (PV - PC) / PC * 100


PV= Preço de Venda Unitário
PC = custo total unitário

CARACTERÍSTICAS DA ATIVIDADE E IMPLICAÇÕES SOCIAIS


O extrativismo de siri com gaiolas é mais fortemente praticado
por comunidades socialmente vulneráveis, e, muito embora a ati-
vidade possa ser considerada como alternativa de melhoria de ren-
da para essas populações, a atividade apresenta limitações no que
se refere à sustentabilidade e capacidade de promover o sustento
das famílias.
A pesca de siri com gaiolas era praticada por duas categorias de
trabalhadores distintas denominadas de coletores e pescadores ar-

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tesanais, que foram identificados em quatro municípios, somando


175 famílias (Quadro1).

Quadro 1 Famílias envolvidas na pesca de siri com gaiolas no litoral do Paraná

Município Número de famílias


Antonina 51
Paranaguá 104
Pontal do Paraná 4
Guaratuba 4
Guaraqueçaba 12
Fonte: pesquisa de campo (autor).

A primeira classe diagnosticada no segmento de captura era de-


nominada de coletores. Foram identificados como pessoas residen-
tes em áreas urbanas que não possuem a pesca artesanal marítima
como fonte de sustento e que praticavam a pesca do siri com gaio-
las como complemento de renda. Esse grupo foi encontrado nos
municípios de Paranaguá , Guaratuba e Antonina.
Os coletores em sua totalidade possuíam carteira de pescadores
amadores, que permitia a captura pelos órgãos de licenciamento
ambiental e pesca, e a pesca era feita com barcos a remo nas ime-
diações de suas residências. A cada incursão ao mar, os coletores
retornavam com média de 100 siris, que eram limpos e preparados
para a venda, incrementando renda e também serviam para a ali-
mentação familiar.

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O segundo grupo na atividade de captura era o de pescadores


artesanais profissionais, vinculados a uma colônia de pesca (asso-
ciação oficial de representação da classe), utilizavam a pesca do siri
com gaiolas como principal alternativa econômica de sustento à fa-
mília. Nesses casos, desenvolviam a atividade durante o ano todo.
A pesca do siri exigia que os pescadores se deslocassem para lo-
cais distantes de suas residências (1,2 milha marítima em média), e,
para tal, usavam canoas e botes com motores de baixa potência (Fi-
gura 1), sendo também comum o deslocamento com uso da força
braçal em embarcações à vela ou remo.
A pesca, na maioria dos casos, (87% dos entrevistados) ocorria
diariamente, ou entre duas a três vezes por semana (23%), depen-
dendo das condições de tempo e, pescadores ocorria em todos os
meses do ano, porém com maior incidência devido à procura dos
consumidores no período de veraneio entre novembro e março.
As gaiolas utilizadas na pesca de siris, conforme Anacleto et al.
(2015), eram confeccionadas basicamente com o uso de materiais
de baixo custo oriundos de reciclagem como “rodado de bicicleta”
e redes de pesca de cação descartadas.
O processo de manufatura das gaiolas era completado com
o uso de arame de cobre, alumínio ou aço. Eram utilizadas ferra-
mentas manuais como: alicate, serra de ferro, agulha e rede de pes-
ca, sendo que em média o custo de fabricação era de R$ 11,40 onze
reais e quarenta centavos por gaiola. As dimensões das gaiolas
eram de aproximadamente 12,5 cm de altura, e 48 cm de diâmetro
(Figura 2), sendo confeccionadas pelos próprios pescadores com

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um tempo médio de três horas por fabricação de cada gaiola. A ca-


pacidade de captura de cada gaiola era de aproximadamente 50 in-
divíduos e a vida útil era de até três anos, dependendo da forma de
conservação e da limpeza após a despesca para minimizar os im-
pactos decorrentes da exposição à salinidade do mar.
A pesca do siri com gaiolas promovia uma divisão do trabalho
dentro do arranjo familiar dos pescadores. A construção das gaio-
las e a pesca em mar eram feitas, na maioria das vezes, pelos ho-
mens que também preparavam as iscas nas gaiolas. Os pescadores
se deslocavam até os locais de pesca quando então as gaiolas eram
lançadas ao mar, onde permaneciam por um período aproximado
de 24 horas A identificação dos locais de pesca era realizada com
boias de sinalização improvisadas, que, na maioria das vezes, eram
feitas com pedaços de isopor ou garrafas plásticas tipo pet de 2 li-
tros. Após esse período, ocorria a retirada dos siris de dentro das
gaiolas que durava em média 4 minutos por gaiola. Os siris captu-
rados eram dispostos vivos em um compartimento composto por
lona ou isopor (Figura 3), e transportados para os locais de benefi-
ciamento no continente ou nas ilhas.
O siri era processado, geralmente em locais simples nas pró-
prias residências dos pescadores ou edículas próximas as residên-
cias e nessa fase eram responsabilidade das mulheres e filhos dos
pescadores. Esses locais, na maioria das vezes, eram de cimento
bruto, sem o revestimento de cerâmicas ou azulejos, e nenhum dos
locais visitados possuía autorização do sistema de vigilância sanitá-
ria dos seus respectivos municípios para beneficiamento da produ-

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ção, situação que é exigida pela legislação brasileira para comercia-


lização deste tipo de produto.
Observou-se nas comunidades localizadas nas ilhas e mais dis-
tantes do continente o beneficiamento dos siris no sistema de “gua-
ju” (mutirão), que é um processo que envolve a troca de dias de tra-
balho entre famílias que residiam próximo umas das outras. O maior
número de pessoas trabalhando simultaneamente nas várias fases
do processo conferia maior produtividade. Nesse sistema, o bene-
ficiamento do siri é realizado de forma coletiva de três até sete pes-
soas, na maioria das vezes, realizado pelas esposas dos pescadores
e seus familiares que atuavam como marisqueiras/descarnadeiras.
O processo de beneficiamento inicia com a pré-lavagem dos
crustáceos, que posteriormente são levados ao cozimento por cer-
ca de 30 minutos. Após essa fase, com o auxílio de colheres e facas,
ocorre o descarne do siri, quando ocorre a separação das carapaças
do abdômen e posterior retirada da carne.
O beneficiamento da produção nas comunidades localizadas na
costa ou próximas desta obedece, muitas vezes, a uma dinâmica di-
ferente da anteriormente descrita, especialmente no que se refere à
contratação de mão de obra para auxiliar o processamento da pro-
dução. Nesse caso, a contratação era exclusivamente de mulheres,
que recebem por kg de carne processada. As “marisqueiras”, como
eram denominadas, recebiam os siris já cozidos, sendo essa a única
atividade por elas desenvolvida, as atividades de preparo e limpe-
za eram desenvolvidas pelas pessoas da família do pescador. Nesse
caso, o rendimento de carne de siri obtida era de 7,2 kg por mulher

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contratada. Esse tipo de beneficiamento era mais direcionado aos


varejistas de restaurantes.

CARACTERÍSTICAS DA ATIVIDADE E IMPLICAÇÕES


ECOLÓGICAS
As gaiolas funcionam como uma espécie de armadilha, em que o
pescador coloca dentro iscas de restos de peixe que atraí os siris em
busca de alimentos, e, uma vez que entram na “armadilha”, os crus-
táceos não conseguem sair do interior dela. Esse processo, segundo
significativa parte dos entrevistados (73%), apresentava três vanta-
gens: a primeira é que o siri permanece vivo dentro da gaiola por até
três dias, assim, mesmo em condições climáticas adversas, o pesca-
dor não perdia os crustáceos capturados. A segunda vantagem da
pesca com gaiolas é que, diferentemente da pesca de siris com ar-
rasto de camarões, os siris capturados que não apresentam tama-
nho ideal ao “consumo humano”, por serem pequenos ou fêmeas,
são devolvidos ao mar para manutenção dos estoques naturais da
espécie. A terceira vantagem é que, por se manterem vivos nas gaio-
las, o abate é feito com os crustáceos ainda frescos, o que, segundo
os entrevistados, confere ao produto final uma qualidade superior.
Apesar da consciência de preservação dos envolvidos com a
pesca de siri com gaiolas, urge que novos e mais aprofundados es-
tudos sejam realizados acerca dos impactos nas populações no am-
biente natural das espécies capturadas, para que estabeleça um
plano de extrativismo sustentável, bem como a possibilidade da in-

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trodução de cultivos, desejo relatado pela totalidade dos pescado-


res entrevistados.

CARACTERÍSTICAS DA ATIVIDADE E IMPLICAÇÕES


ECONÔMICAS
Segmento da produção
A pesca do siri com gaiola era a principal atividade entre a maio-
ria dos entrevistados (87%) que obtinha uma renda média mensal
aproximada de R$ 920,00 reais e envolvia entre três e quatro pes-
soas da família.
O rendimento médio para a obtenção de um kg de carne de siri
variava de 35 a 45 crustáceos que ao final do dia, gerava em rendi-
mento médio 6 kg de carne por pessoa que trabalhava no proces-
samento. A carne do siri era então acondicionada em embalagens
plásticas de 500 gramas ou 1000 gramas e levada à refrigeração ou
congelamento.
O processo de beneficiamento incluía também a limpeza das ca-
rapaças dos crustáceos para secagem, dado que uma das iguarias
de siri mais comercializadas é a casquinha de siri, preparada com a
carne misturada com outros temperos e condimentos, depois frita
dentro da carapaça.
Observou-se que nas comunidades mais próximas da costa, que
a carapaça era vendida, enquanto que nas comunidades mais dis-
tantes os atravessadores exigiam como complemento à carne, sem
custos, as carapaças ou não adquiriam produção dos pescadores.

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O preço de venda da carne de siri pelos produtores era em mé-


dia de R$ 10,00/kg no atacado e de R$ 16,00 no varejo. A venda di-
reta ao consumidor ocorria mais pelos pescadores residentes na
costa ou próximos desta, e representava 20% do volume da comer-
cialização. Nesse caso, o preço médio era de R$16,00 o kg.

Segmento varejista
Os varejistas identificados nesse segmento da cadeia produtiva
do siri com gaiolas eram todos formalmente estabelecidos e com
empresas legalmente constituídas.
Foram identificados dois tipos de varejistas: àqueles cujos esta-
belecimentos tinham como atuação principal a finalidade do co-
mércio de pescados, como as peixarias e bancas de venda de peixes
nos mercados municipais de pescados das cidades visitadas.
Esse tipo de varejista comprava a carne do siri diretamente dos
pescadores no sistema de “trato”, que é um tipo de acordo tácito em
que o varejista se compromete na aquisição de toda produção do
pescador e o pescador entrega toda sua produção a um único com-
prador, no caso, os varejistas que atuavam nos locais adquiriam de
quatro até oito pescadores.
Outro tipo de varejista eram os proprietários de estabeleci-
mentos vinculados à rede gastronômica, formalmente estabele-
cida, e com a finalidade de prestar serviço direto ao consumidor,
como bares, restaurantes e quiosques na beira mar. Os gestores
desses estabelecimentos compravam a carne de siri direto dos

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produtores, e também compravam a carne de siri dos atravessa-


dores e em peixarias.
A carne de siri era comprada pura, e nos estabelecimentos va-
rejistas ocorria o processamento quando a carne de siri se trans-
formava em recheio de pastel, coxinhas, lasanhas e especialmente
na iguaria servida na carapaça do próprio crustáceo e denominada
de “casquinha de siri”, que representava aproximadamente 97% das
vendas. O preço por unidade dessa iguaria variava de R$ 6,00 até R$
12,00 a unidade, contendo 30 gramas de carne de siri.
A carne de siri após a transformação em iguaria pronta a servir ao
consumidor final valorizava o produto. Nessa fase, foi possível apu-
rar o que preço médio do quilograma chegava a atingir até R$ 180,00.

Segmento atacadista
Os atacadistas atuavam no comércio da carne de siri na compra
e venda em maior escala. A maioria era residente na cidade de An-
tonina (n=5) e abastecia toda a rede conforme a demanda. Nesse
segmento, foi possível identificar dois tipos de atacadistas:
O tipo formado por pescadores residentes e inseridos nas pró-
prias comunidades pesqueiras no continente ou nas ilhas. Esse tipo
de comerciante também pescava e produzia a carne de siri, toda-
via, por possuir melhor estrutura, especialmente de transporte ou
de conservação do produto, comprava a carne de siri dos pescado-
res no seu entorno e em bairros próximos e revendia, especialmen-
te para peixarias e restaurantes.

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O segundo tipo, de comerciante, não era composto por pesca-


dores, mas por pessoas que compravam a carne de siri de dezenas
de pescadores, e posteriormente revendia em outras cidades, es-
pecialmente em Curitiba, que apresentava elevada demanda des-
se produto.

Organização de classe e Assistência técnica


A cadeia produtiva da pesca do siri com gaiola no litoral do Pa-
raná se apresenta desorganizada. Essa afirmação é baseada no fato
de que a única entidade formal vinculada à pesca do siri com gaio-
las é a Colônia de Pescadores, presente em todos os municípios,
porém com enfoque maior de defesa dos interesses dos pescadores
artesanais de camarão e peixes e que não possuem ações específi-
cas no sentido de organização da atividade da pesca do siri.
Assim como no caso das organizações de representação de clas-
se, relativo à assistência técnica na captura e processamento, as
empresas de fomento e assistência técnica atuantes no litoral do
Paraná como Emater, IAP, SEBRAE, e BNDES, informaram que re-
conhecem a relevância da atividade, porém, devido às outras de-
mandas mais relevantes como a pesca do camarão e de peixes, não
promovem assistência sistemática na orientação da cadeia produ-
tiva da pesca do siri com gaiolas e atuam apenas quando demanda-
das pelas comunidades pesqueiras em questões específicas.
As outras instituições envolvidas com a questão pesqueira, como
o Instituto Ambiental do Paraná - IAP e Instituto Brasileiro de Meio
Ambiente, IBAMA, atuavam de forma mais punitiva, no processo de

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fiscalização e na garantia do cumprimento da legislação pesqueira


ou seja, à medida que ocorria ou eram identificados danos no setor,
ocorriam as fiscalizações desses órgãos junto aos pescadores.

PERSPECTIVAS ECONÔMICAS DA PESCA DE SIRI COM


GAIOLA
A cadeia produtiva da pesca do siri com gaiolas é classificada
como cadeia produtiva incompleta. Segundo Castro et al. (2002),
são aquelas nas quais estão ausentes um ou mais segmentos. Espe-
cificamente no caso da cadeia produtiva da pesca do siri com gaio-
las, não foi identificada a presença da produção, muito embora já
tenham sido observadas tentativas no cultivo de siri em cativeiro.
Na prática, Igarashi (2009) descreve que essa tecnologia ainda não
possibilita a inserção do produto final ao consumidor em quantida-
de e periodicidade, predominando, portanto, a pesca do siri com o
auxílio de gaiolas no regime de extrativismo.
O comércio da carne de siri de gaiola é praticado o ano todo. To-
davia, no período de veraneio, que dura em média 90 dias, a venda
do produto se intensifica.
O estudo revela que o maior preço pago pelo consumidor está
no segmento varejista associado à gastronomia, onde, justamen-
te, se obtém os melhores índices de lucratividade, e, na distribui-
ção em relação ao total gerado na cadeia produtiva, o pescador fica
com a mínima parte, recebendo o equivalente a 2,7% dos lucros lí-
quidos obtidos em toda cadeia produtiva (Quadro 2).

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Quadro 2 Distribuição do índice de lucratividade (%) entre os segmentos comerciais


da cadeia produtiva do siri pescado com gaiolas no litoral do Paraná

Classe Pescador Varejo Varejo Rede Atacadistas


Peixarias gastronômica

Custo médio do produto por seg- 5,20 14,00 14,00 10,00


mento (R$)
Preço médio de venda pelo seg- 12,00 40,00 180,00 40,00
mento (R$)
Margem de lucro obtida com a 6,80 26,00 166,00 30,00
venda por segmento (R$)
Distribuição do índice de lucrativi- 2,97 11,36 72,56 13,11
dade na totalidade da cadeia pro-
dutiva (%)

Fonte: Pesquisa de campo (autor).

A elevada lucratividade dos outros atores sociais na cadeia pro-


dutiva da pesca do siri com gaiolas (Quadro 2), especialmente os
varejistas da rede gastronômica, evidencia um processo de desi-
gualdade entre os outros segmentos e as comunidades tradicionais
já percebidas e relatadas de forma mais explícita em outras explo-
rações agropecuárias, como o caso das bromélias, cipó preto, or-
quídeas, musgo, entre outras (NEGRELLE et al., 2014).
Similarmente a outras explorações extrativistas no litoral do
Paraná , os pescadores possuem baixa capacidade de organiza-
ção, influenciados pelo isolamento geográfico e também pela
forma de atuação dos atravessadores e varejistas mais capitali-
zados e organizados.

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A mudança desse cenário passa pela capacidade de armazena-


mento e redução da assimetria comercial por parte dos pescadores,
fatores que exigem dedicação e investimento por parte dos pesca-
dores. Contudo, esses tradicionalmente são descapitalizados e, por
isso, necessitariam de auxílio técnico e financeiro.
Existem muitas alternativas de financiamento da produção para
promover melhorias que tornem as instalações mais apropriadas à
produção, porém as empresas de fomento, que em sua maioria são
instituições públicas como o Banco do Brasil, Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social e Programa de Geração de
Renda do Governo Federal (PROGER), apresentam elevados níveis
de exigência para acesso ao financiamento de novas produções ou
melhorias no processo de beneficiamento (ANACLETO et al., 2015;
MURARO et al., 2015).
As comunidades extratoras localizadas no litoral do Paraná , via
de regra, têm precário acesso ao mercado devido à falta de estru-
turas comerciais, insuficiente capital humano, insuficiente capital
produtivo, instituições fracas e, geralmente, fraco poder de barga-
nha junto aos outros atores sociais da cadeia produtiva. Assim, as
famílias, em sua maioria, são socialmente vulneráveis, e têm difi-
culdades de acessar os programas de financiamento que exigem
pareceres técnicos, projetos de viabilidade, avalistas e garantias de
pagamento da dívida. Cria-se, assim, um ciclo de dificuldades em
que as comunidades produtoras são empobrecidas e não conse-
guem acessar os recursos de fomento para a melhoria da produção,
e, por não acessar os recursos de fomento para a melhoria da pro-

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dução, continuam empobrecidas conforme também descrito por


Belcher (2005), Sachs (2004) e Negrelle et al. (2014).
O desenvolvimento de uma cadeia produtiva exige a interlocu-
ção entre os vários atores envolvidos. O diálogo de saberes é pre-
missa para que resulte em ações cuidadosamente articuladas de
forma colaborativa, caso contrário, o elo mais frágil tende a aban-
donar a atividade produtiva. Entretanto, Muraro et al. (2015), nem
sempre as pessoas envolvidas no segmento de produção, espe-
cialmente as famílias socialmente vulneráveis, conseguem se au-
to-organizar para obter melhores preços e atingir mercados mais
especializados sem a ajuda externa, bem como nem sempre têm
consciência de suas limitações tecnológicas no que tange à quali-
dade da produção.
Conforme Ferreira et al. (2011), as comunidades extrativistas do
litoral paranaense em função do enfraquecido tecido social perma-
necem “invisíveis” para o Poder Público, que não fomenta as mu-
danças necessárias nas atividades empreendedoras a partir de po-
líticas de desenvolvimento das comunidades tradicionais de forma
interdisciplinar, abrangendo as dimensões ecológica e social, que
visem o fortalecimento da cadeia produtiva em todos os segmen-
tos, mas em especial os pequenos produtores.
Nesse contexto, Bebbington (1999) e Ferreira et al. (2011), ava-
liando comunidades rurais similares às observadas na pesca de siri
com gaiolas no litoral do Paraná , destacam que as instituições pú-
blicas têm uma grande responsabilidade para romper com a racio-
nalidade posta, propondo, por meio da dialética, caminhos alterna-

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tivos e que sejam construídos coletivamente, reduzindo as tensões


existentes na relação dos pescadores nas comunidades com os ato-
res externos.
Assim, a interlocução entre os atores é condição essencial na
construção de novas abordagens que visem o desenvolvimento re-
gional de forma sustentável, dado que pode apontar as necessida-
des dos ajustamentos, correções de logísticas e mudanças tecnoló-
gicas que possam gerar aos pescadores informações privilegiadas
sobre os desejos dos consumidores, autonomia no processo produ-
tivo e redução da dependência das outras esferas comerciais, resul-
tando no fortalecimento das famílias e na permanência dessas fa-
mílias no meio de origem.
A falta de aproximação entre poder público e os pescadores com
os setores comerciais tem se revelado um entrave para o desenvol-
vimento da atividade, especialmente no que se concerne aos pro-
cessos de beneficiamento, conservação e comercio justo da produ-
ção. A ação conjunta organizada pelo poder público por técnicos
especializados, que considerem a participação efetiva dos pesca-
dores, pode gerar um conjunto de ações que podem promover me-
lhoria, e atuem como facilitadores no desenvolvimento e melhoria
da cadeia produtiva, conforme também descrito por Ferreira et al.
(2011), que revelam que tão importante como crédito, terras, traba-
lho, acesso a novos mercados e processos tecnológicos.
Ferreira et al. (2011) e Negrelle et al. (2014), ao discutirem os de-
safios existentes no litoral do Paraná , compreendidos como dile-
ma territorial, apresentam como desafio, mais importante de qual-

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quer política de desenvolvimento territorial, a organização dos


que se encontram em situação de pobreza, ou dos que têm meno-
res chances de aproveitar oportunidades econômicas, e, nesse sen-
tido, a participação das comunidades envolvidas na pesca do siri
com gaiolas na discussão desses processos socioeconômicos torna-
-se fundamental no âmbito das políticas do desenvolvimento e da
proposição de novas estruturas sociais organizadas de forma cola-
borativa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS E APONTAMENTOS PARA O


DESENVOLVIMENTO DA CADEIA PRODUTIVA DA PESCA DE
SIRI DE GAIOLAS NO LITORAL DO PARANÁ
Quando um setor não possui organização formal, há de serem
consideradas formas de interferência do Poder Público para pro-
mover melhoria na efetivação do diálogo entre os vários segmen-
tos, que possam resultar em ações organizadas nos aspectos so-
ciais, ambientais, econômicos e tecnológicos, especialmente aos
segmentos em condições mais vulneráveis, como é o caso dos ex-
tratores de siri com gaiolas.
O Poder Público tem as prerrogativas para a atuação na orga-
nização da atividade pesqueira, promovendo um novo e inclusi-
vo cenário, atuando no sentido de tornar mais facilitado o acesso
aos pescadores às condições já disponíveis, e que possam promo-
ver mais o desenvolvimento do que no investimento financeiro
propriamente, porém essas comunidades ainda permanecem in-
visíveis ao Poder Público, que até o momento esparsas ações de-

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senvolvem no sentido de transformar essa realidade, porém não


apresenta justificativas para tal inoperância.
O Poder Público tem capacidade mais facilitada de reunir gru-
pos que possam promover o rompimento dos paradigmas tradicio-
nais, em ações sinérgicas resultantes da atuação de empresas, com
o auxílio das agências de pesquisas regionais, das universidades e
do sistema governamental de extensão rural , que promovam em
conjunto com os pescadores ações de desenvolvimento sustentá-
vel que sejam efetivas na busca pela redução da assimetria da lu-
cratividade vivenciada pelos pequenos pescadores, assim urge que
o Poder Público assuma suas prerrogativas de agente de desenvol-
vimento e da melhoria da qualidade de vida dessas comunidades
em condições de vulnerabilidade social.
No entanto, aparentemente o desenvolvimento dessas comuni-
dades, apesar de possível, ainda está longe de ser alcançado, e, em
razão desse contexto, um conjunto de propostas que respeite os sa-
beres e principalmente os anseios das comunidades locais devem
ser considerados para fomentar o desenvolvimento da atividade
nos processos de desenvolvimento rural sustentável.
Diante desses fatores, considera-se que a principal ação que os
pescadores de siri com gaiolas no litoral do Paraná devem conce-
ber é a organização da classe para o fortalecimento do tecido social
e a elevação do poder de barganha junto aos outros atores envolvi-
dos na cadeia produtiva.
Assim, atendendo ao objetivo central deste estudo, apresentam-
-se recomendações aos atores envolvidos na cadeia produtiva, no

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sentido do desenvolvimento da cadeia produtiva que beneficie em


primeira instância as comunidades socialmente vulneráveis.
Neste contexto, deve ser considerado a conjunção de esfor-
ços na busca pelo desenvolvimento sustentável destas comunida-
des em ações articuladas de forma multidimensional, envolvendo
os elementos econômicos, sociais, culturais, políticos, psicológicos,
ecológicos, físicos e especialmente os conhecimentos históricos. É
necessário visualizar alternativas que respeitem a tradição e os co-
nhecimentos das comunidades locais, adaptando de forma em-
preendedora às potencialidades dos recursos naturais disponíveis e,
que busquem corrigir estas distorções, quebrando o paradigma vin-
culado à produção e produtividade das sociedades econômicas con-
forme também descrito por Anacleto et al. (2015) de que explorações
não devem estar associadas apenas a lucros elevados e ao desenvol-
vimento incessante pautados na lógica capitalista, mas no diálogo de
saberes e no respeito aos anseios das comunidades envolvidas.

Contribuições possíveis pelo poder público


Organizar pela Secretaria de Estado e Agricultura do Paraná o
cadastro de pescadores de siri com o uso de gaiolas, coletando in-
formações para poder realizar o diagnóstico das fortalezas e debi-
lidades como forma de orientar políticas públicas à atividade, bem
como promover a interlocução das instituições, setor comercial e
pescadores sobre o debate de planejamento estratégico para a pes-
ca de siri com gaiolas no litoral do Paraná .

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Criar por intermédio da Secretaria de Estado e Agricultura do


Paraná um selo que promova a carne de siri pescado com gaiolas
no litoral do Paraná no conceito de socialmente justo.
Promover por intermédio da Empresa Estadual de Extensão Ru-
ral e do Serviço Brasileiro de empresas capacitação visando à me-
lhoria tecnológica da captura e beneficiamento da produção, bem
como incentivo ao associativismo.
Criar processos facilitados de acesso dos pescadores de siri com
gaiolas às agências de fomento como Banco Nacional de Desen-
volvimento Econômico Social e Banco do Brasil, nos Programas de
Geração e Renda e o Fundo de Amparo ao Trabalhador brasileiro
com sistemas de aval solidário, que possam vir de encontro aos an-
seios das comunidades.
Criar linhas de crédito com baixas taxas de juros ou promover
financiamento a fundo perdido nas agências de fomento para in-
vestimentos comunitários como galpões, laboratórios, entre outros
que possam incentivar a organização de grupos formais ou infor-
mais com o acompanhamento pela Secretaria de Estado e Agricul-
tura do Paraná.

Contribuições possíveis pelas universidades


Inserir questões relativas a pesca do siri com o uso de gaiolas
no ambiente universitário, como semanas científicas e de exten-
são em que possa o assunto ser amplamente debatido entre cien-
tistas, instituições públicas e privadas e em especial as comuni-
dades envolvidas.

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Desenvolver pesquisas que visem ampliar os estudos sobre as


espécies endêmicas de siris da região e relativos aos impactos pro-
vocados pelo extrativismo.
Desenvolver pesquisas sobre a melhoria da qualidade da pesca
e do beneficiamento da produção.
Implantar unidades de observação experimental relativo a via-
bilidade de cultivos de siri, bem como sobre cultivos que envolvam
tecnologias de baixo custo na produção.
Promover projetos de extensão e pesquisa envolvendo volunta-
riamente os residentes dessas comunidades, que podem disponibi-
lizar relevantes informações à ciência, que resultem na construção
de novos diálogos entre os conhecimentos antigos que são de gran-
de importância a sociedade onde estão inseridos, e no desenvolvi-
mento adaptado a cultura e tradições dessas regiões. O resultado
da sinergia entre ciência e comunidade pode facilitar o desenvolvi-
mento, através de amplos debates relacionados aos fatores de pro-
dução disponíveis, os problemas existentes, propondo com base
nos anseios das comunidades envolvidas sugestões para a altera-
ção da situação vivida por estas famílias, criando um novo conceito
de desenvolvimento sustentável e de oportunidade.

Contribuições possíveis pelo comércio


A criação de um canal de comercialização direto entre produtor
e varejista, aproveitando a oportunidade da proximidade geográfi-
ca e repassando o menor custo ao consumidor no sentido de am-

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

pliar as vendas da produção regional, reduzindo a disparidade na


distribuição dos lucros entre os segmentos comerciais.
Criar um canal de relacionamento no sentido de orientar o be-
neficiamento da produção em relação à qualidade do produto final,
e no atendimento às diversas formas de beneficiamento da produ-
ção mais desejadas pelos consumidores.
Criar espaço especial nas gôndolas de vendas onde seja eviden-
ciado o produto final oriundo da pesca de siri com o uso de gaiolas
produzidas no litoral do Paraná , deixando clara a sua importância
no envolvimento da região.

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

TRANSFORMAÇÕES ESPACIAS EM PONTAL


DO PARANÁ – PARANÁ – BRASIL , DIANTE DA
INSTAL AÇÃO DO COMPLEXO PORTUÁRIO

Jean Jesus Ilsuk da Silva


Sony Cortese Caneparo

INTRODUÇÃO
O município de Pontal do Paraná (estado do Paraná – Brasil)
está localizado no litoral do estado do Paraná, na região sul do Bra-
sil, distante 115 km da capital do estado Curitiba. Situa-se em uma
área ambientalmente frágil, composta por praias, manguezais, res-
tingas e porções de floresta ombrófila densa. Trata-se de um mu-
nicípio litorâneo com função, predominantemente, turística no ve-
rão, com uma população de 20.920 habitantes.
Em 1995 foi aí instalada a Porto de Pontal Importação e Exporta-
ção LTDA, em 2013, foi aprovada a licença ambiental para a insta-
lação de um complexo portuário neste município, com a implanta-
ção do Terminal de Contêineres de Pontal do Paraná (TCPP), cuja
finalidade foi o de promover a melhoria dos serviços portuários e
a concorrência com os terminais já instalados, elevar os índices de
produtividade e qualidade e reduzir os custos de operação para os
usuários desses serviços. Tal obra é um desafio, devido ao potencial

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que o mesmo apresenta em produzir impactos ambientais e mu-


danças nos padrões de uso da terra.
Essa pesquisa objetiva analisar as mudanças espaciais que po-
dem ocorrer no uso da terra e na cobertura vegetal em Pontal do
Paraná , em virtude da instalação desse complexo. Para atingir o
objetivo proposto foram realizados os levantamentos do meio físi-
co e socioeconômico, e a elaboração de uma base de dados geo-
gráfica, que permitiram construir um modelo digital do ambiente
para contextualizar a área de estudo. Foram utilizados produtos de
sensoriamento remoto, fotografias aéreas dos anos de 1980 e 1996 e,
para 2012, imagens de satélite. As rotinas de sistemas de informa-
ções geográficas empregadas foram as do IDRISI TAIGA, da Clark
University, dentre elas se destacam a Cadeia de Markov e os Autô-
matos Celulares para a geração do cenário futuro (2032). Estas ro-
tinas preveem as mudanças do uso e cobertura da terra, gerados
digitalmente por duas técnicas contíguas de modelagem temporo-
-espacial: a modelagem temporal dos algoritmos da cadeia de Mar-
kov de segunda ordem, complementados com a aplicação da mo-
delagem espacial dos Autômatos Celulares.
Para elaboração da modelagem preditiva foram elaborados três
planos de informação a partir das fotografias aéreas e imagens de
satélite: uso da terra e cobertura vegetal para os anos de 1980, 1996
e 2012, com as áreas portuárias (10 classes). Como classes de uso
da terra e cobertura vegetal foram definidas: 1-áreas urbanas; 2-co-
pos d’água, 3-manguezais, 4-floresta ombrófila densa, 5-restin-
ga, 6-agricultura/pecuária, 7-sucessão inicial, 8-reflorestamento,

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9-solo exposto e 10-áreas portuárias. Foram então realizadas as si-


mulações, ou seja, as modelagens preditivas, geradas com a aplica-
ção destas rotinas, a partir de dois planos de informações, de duas
datas contíguas, do uso da terra e cobertura da vegetação.
Essa pesquisa tem como resultado a tendência de como ficará a
organização espacial da área de estudo. O mapeamento preditivo foi
para 2032, ou seja, 20 anos à frente do mapa de 2012. A escolha des-
se intervalo temporal reside no fato de que, segundo o manual do
software IDRISI TAIGA, simulações com intervalos temporais muito
extensos tendem a apresentar um exagero em seus resultados, por
outro lado, como o complexo portuário ainda se encontra em im-
plantação descartou-se realizar simulações a curto prazo. No total
foram gerados dois mapas preditivos, um resultante das interações
dos planos de informações de 1980 e 2012, e o outro de 1996 e 2012.
Apesar de cada mapa preditivo apresentar um resultado específico,
a análise espacial dos mesmos permitiu encontrar alguns compor-
tamentos e tendências semelhantes nas mudanças de uso da terra e
cobertura vegetal, as quais serão descritas nos resultados desse.

LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO GERAL DA ÁREA DE


ESTUDO
A área de estudo é o município Pontal do Paraná , que está loca-
lizado no litoral do Paraná , na região sul do Brasil, entre os parale-
los 25°32’42’’ e 25°45’02’’ de latitude sul e os meridianos 48°20’52’’a
48°35’12’’ de longitude oeste de Greenwich. Ocupa uma área de
202,03 km², e limita-se ao norte com a baía de Paranaguá , ao sul

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com o município de Matinhos, a leste com o Oceano Atlântico e a


oeste com a Serra do Mar em sua porção denominada de Serra da
Prata (município de Paranaguá ) (Figura 1).

Figura 1: Cartograma de localização de Pontal do Paraná .

Conforme classificação elaborada pela Mineropar (2006) e


Maack (1968), a área do município de Pontal do Paraná se encontra

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na subunidade morfo-escultural denominada Planície Litorânea e


Planícies Flúvio – Marinhas. Essa subunidade ocupa uma área total
de 2038,70 km², apresentando um baixo índice de dissecação, com
declividade predominante menor do que 6 %. O relevo apresenta
altitudes variando entre 0 m (mínimo) e 200 m (máximo) de altitu-
de. As formas predominantes são as planícies de restingas e flúvio-
-marinhas, terraços arenosos e praias, modeladas em sedimentos
de origem marinhas e flúvio-marinhas (MINEROPAR, 2006).
A área de estudo se localiza na Bacia Hidrográfica da Baía de Pa-
ranaguá , a qual possui 607 km². Trata-se de uma bacia composta
por rios de menor porte, com força de erosão insignificante. Cor-
rem do sul para o norte e apresentam-se fortemente influencia-
dos pelas marés (MAACK, 1968). Os principais rios encontrados em
Pontal do Paraná são os rios Guaraguaçu, Maciel, Biguaçu, Pene-
do, Perequê, Perequê Mirim, Barrancos, Olho d´Água, Pai Antônio,
Peri, Caruçu e Rio das Pombas. Complementa também o desenho
hidrográfico do município uma série de intervenções antrópicas
para fins de saneamento e para a navegação, como por exemplo a
abertura de canais realizada pelo Departamento Nacional de Obras
de Saneamento – DNOS (COLIT, 2004).
Tendo por referência o sistema de classificação climática pro-
posto por Köppen, o município de Pontal possui um clima Subtro-
pical (Cfa). Esse Clima Subtropical (Cfa) apresenta entre as suas
principais características, segundo o Instituto Agronômico do Pa-
raná (IAPAR) (1994): temperatura média no mês mais frio inferior a
18°C (mesotérmico) e temperatura média no mês mais quente aci-

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ma de 22°C, com verões quentes, geadas pouco frequentes e ten-


dência de concentração das chuvas nos meses de verão, contudo
sem estação seca definida.
Segundo Veloso et al45 (1991 citado por COLIT, 2004) em Pontal do
Paraná a vegetação se divide em dois grandes grupos: o Sistema de
Vegetação Primária e o Sistema de Vegetação Secundária. O primei-
ro é composto por formações pioneiras de influência flúvio – mari-
nha (manguezais e os campos salinos), de influência marinha (res-
tingas), e de influência fluvial (caxetais, maricais, taboais e várzeas).
Ainda nesse grupo se encontra a floresta ombrófila densa fluvial e a
floresta ombrófila densa de terras baixas. O segundo grupo é com-
posto por áreas que sofreram algum tipo de intervenção humana.
Para entender a ocupação e delimitação do território de Pontal
do Paraná , é preciso retomar a ocupação do litoral paranaense que
iniciou a partir do final do século XVI e início do século XVII, quan-
do povos vindos da Europa e de outras capitanias brasileiras se di-
rigiram as ditas “Minas de Paranaguá ”, buscando a exploração do
ouro. Durante esse período a região de Pontal do Paraná foi pro-
vavelmente utilizada como base de acampamento para imigrantes
europeus e escravos negros (COLIT, 2004).
A maior ocupação do município ocorreu a partir da década de
1950, onde foi realizada a abertura dos primeiros loteamentos da
região. A especulação imobiliária fez com que os pequenos núcleos

45.  VELOSO, H.; RANGEL FILHO, Al; LIMA, J. Classificação da vegetação brasileira adaptada a um
sistema universal. IBGE/ Departamentos de Recursos Naturais e estudos Ambientais, v.1, Curitiba-
-PR, p.123, 1991.

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de moradores locais migrassem para áreas mais distantes da praia,


à medida que o núcleo urbano formado por casas de veraneio foi
se consolidando e as propriedades valorizando. Nos anos 1980, fo-
ram instalados na região um canteiro industrial e também estru-
turas universitárias, como o Centro de Biologia Marinha (CBM) e
o Centro de Estudos do Mar (CEM), ambos ligados à Universidade
Federal do Paraná (UFPR) (COLIT, 2004).
Ainda na década supracitada começaram as primeiras tentati-
vas por parte dos moradores da região de desmembrar Pontal do
Paraná do município de Paranaguá . A primeira vitória veio com
a Lei Estadual nº 8.915, de 15 de dezembro de 1988, a qual transfor-
mou Pontal do Paraná em um distrito subordinado ao município
de Paranaguá . Por fim, o município de Pontal do Paraná foi criado
em outubro de 1996, após aprovação na Assembleia Legislativa do
Estado do Paraná, e a consequente realização de eleições para os
cargos do Legislativo e do Executivo (IBGE, 2014).
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE,
2014), o município de Pontal do Paraná tinha em 2010 uma po-
pulação de 20.920 habitantes, o que o coloca como o quarto mu-
nicípio mais populoso do litoral paranaense, atrás de Paranaguá ,
Matinhos e Guaratuba. O município apresenta praticamente a to-
talidade de sua população vivendo no perímetro urbano, com ín-
dice de urbanização de 99,15%, e densidade demográfica de 115,06
hab/km².
O município de Pontal do Paraná possui um Índice de Desen-
volvimento Humano Municipal (IDH-M) de 0,738, sendo classifi-

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cado como alto, segundo a metodologia estabelecida pelo Atlas de


Desenvolvimento Humano do Brasil de 2010, elaborado pelo Pro-
grama das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
O município de Pontal do Paraná gerou em 2010 um Produto In-
terno Bruto (PIB) total de R$ 220,164 milhões, desse total, R$ 7.868
milhões foram gerados por atividades agropecuárias, R$30,799 mi-
lhões por atividades industriais e R$ 181,497 milhões por atividades
comerciais e de prestação de serviços (IBGE, 2014).
Conforme IPARDES (2015) o número de pessoas envolvidas por
setor da economia, totaliza 509 indivíduos nas atividades primá-
rias (agrícolas e extrativistas), 525 em atividades secundárias (in-
dústrias) e 8.511 em atividades terciárias (comércio e prestação de
serviços). As atividades comerciais e de prestação de serviços com-
põem 82,44 % e são dessa forma as principais responsáveis pela di-
nâmica econômica do município (IPARDES, 2015). O turismo se
constitui em importante atividade econômica para o município
sendo, porém, uma atividade de caráter sazonal. Durante o verão,
época denominada de alta temporada (entre os meses de dezem-
bro e fevereiro e no Carnaval) o principal atrativo aos turistas são as
praias, com destaque para os Balneários de Praia de Leste, Pontal
do Sul, Barrancos, Ipanema, Santa Terezinha e Shangri-Lá.
No presente momento, algumas obras de maior porte estão sen-
do realizadas no Município, entre elas, a construção de uma unida-
de offshore46 da companhia italiana Techint Engenharia de Cons-

46.  Offshore: Unidade Offshore Techint: Trata-se de uma unidade voltada a construção de duas
plataformas fixas de petróleo WHP-1 e WHP-2. Disponível em: http://ingenieria.techint.com/html/

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trução S/A que terá como função a construção de plataformas


petrolíferas para a extração de petróleo do pré-sal.
O Complexo Portuário de Pontal do Paraná constitui-se em um
conjunto de estruturas físicas a serem aí instaladas, com poten-
cial para gerar mudanças na sua dinâmica ambiental e socioeco-
nômica. O processo para a construção do Terminal de Contêine-
res de Pontal do Paraná (TCPP) começou em 1995 com a fundação
da empresa “Porto Pontal Paraná Importação e Exportação LTDA”
(IBAMA, 2008). O TCPP visa promover a melhoria dos serviços por-
tuários e a concorrência com os terminais já instalados, elevar os
índices de produtividade e qualidade e reduzir os custos de opera-
ção para os usuários desses serviços (ABM, 2008, p.2-3). Nesse ce-
nário o TCPP seria uma alternativa ao Porto de Paranaguá , o qual,
sem concorrência apresenta hoje um dos maiores custos de opera-
ção de contêineres do país, com o valor de R$ 514,34 (ANTAQ, 2008).
A área total do empreendimento é de cerca de 450 000 m², os
quais incluem armazéns cobertos e descobertos, prédios adminis-
trativos e vias internas (ABM, 2008). Entre as principais cargas que
serão movimentadas estão incluídas: madeira, papel, couro, cris-
tais, cerâmica, móveis, subprodutos florestais, produtos eletrôni-
cos, peças em geral, carnes congeladas, objetos componentes para
usinas hidrelétricas e indústrias pesadas (ABM, 2008).
De acordo com o Estudo de Impacto ambiental e o Relatório de
Impacto Ambiental (2012), os aspectos físicos da região, somados a
localização privilegiada e estratégica, na costa Atlântica da Améri-

pt/news/ShowContents_det.asp?NewId=1013_1&LANG=PT. Acessado em 02 de fevereiro de 2014.

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ca do Sul, e a proximidade com grandes centros produtores indus-


trializados, conferem um alto potencial de desenvolvimento às ati-
vidades portuárias na região (ABM, 2008, p. 2-2). Nesse contexto,
segundo o projeto do complexo portuário de Pontal do Paraná , o
mesmo resultará em mudanças expressivas para o meio físico uma
vez que estão previstas operações de dragagem e aterramento, os
quais modificarão o desenho da linha de costa, somando-se ain-
da o fato de que o cais do porto será uma estrutura rígida construí-
da em concreto. Tais elementos, segundo Souza (2009), podem al-
terar drasticamente os processos de erosão e assoreamento na área
em questão, aumentando consideravelmente os impactos ambien-
tais causados pela instalação dessa estrutura.
A área proposta para a instalação do Terminal de Contêineres
de Pontal do Paraná no litoral do estado do Paraná se enquadra
em um local de alta fragilidade natural, circundada por mangue-
zais, restingas e floresta ombrófila densa aluvial e de terras baixas,
além da questão do acesso viário, uma vez que o único acesso exis-
tente tem baixa capacidade de tráfego de veículos, e é utilizada pela
população local e por turistas na temporada de verão. Tal cenário
colaborou para que nos casos específicos dos terminais portuários
do litoral do estado do Paraná, uma série de entraves ambientais
dificultasse o processo de licenciamento desses empreendimentos.
Outros empreendimentos serão instalados e operados parale-
lamente ao Terminal de Contêineres de Pontal do Paraná , en-
tre os quais ganham destaque pelo seu maior porte as estruturas
planejadas pelas Companhias Subsea 7 do Brasil, Melport Termi-

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nais Marítimos, Construtora Norberto Odebrecht S/A e Techint


Engenharia e Construção S/A.

MATERIAIS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS


Para a realização dessa pesquisa foram utilizados os seguintes
materiais cartográficos: - Folhas Topográficas do Instituto Brasilei-
ro de Geografia e Estatística (IBGE), SG.22-X-D-VI-1 e SG.22-X-D-
-VI-2, ambas de 1992, escala 1:50.000 e Datum Palimétrico SAD-69;
-Fotografias Aéreas do Instituto de Terras, Cartografia e Geociên-
cias do Paraná, escala 1:25.000, ano 1980 e escala 1:50.000, ano 1996;
e -Imagens de Satélite, obtidas através do Google Earth Versão Pró –
Digital Globe, Resolução: 2 m, Ano 2012.
Os softwares utilizados foram IDRISI TAIGA e o CARTALINX de-
senvolvido pela Clark Labs e Global Mapper 11 e o ARCGIS 9.3 de-
senvolvido pela Environmental Systems Research Institute - ESRI -
Califórnia - Estados Unidos.
Para atingir os objetivos propostos dessa pesquisa, a mesma foi
dividida em três etapas. Na primeira etapa, foi realizado levanta-
mento do referencial teórico, a delimitação e caracterização da área
de estudo. Na segunda etapa, foi realizada à criação de uma base de
dados geográfica e as operações de geoprocessamento. Na terceira,
foram realizadas as manipulações, as simulações e as análises para
gerar a modelagem preditiva.
Na primeira etapa também foi pesquisada a teorização acerca
da metodologia a ser adotada para a modelagem preditiva: a Ca-

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deia de Markov e os Autômatos Celulares. Cabe aqui se fazer enten-


der cada um desses dois elementos da modelagem preditiva.
Segundo Garcia (2005, p. 20), a Cadeia de Markov é um processo
estocástico que é definido por um modelo matemático que descre-
ve a estrutura de probabilidades de uma série de observações, dis-
tribuídas no tempo ou no espaço.
A Cadeia de Markov se baseia na utilização dos processos esto-
cásticos. Segundo Ricobom (2012), os processos estocásticos utili-
zados no modelo (Cadeia de Markov) são interessantes para des-
crever a dinâmica de um sistema, operando sobre algum período
de tempo, com isso em termos formais, a variável aleatória X (t) re-
presenta o estado do sistema no parâmetro t (geralmente o tempo).
Portanto, pode-se afirmar que a variável X (t) é definida em um es-
paço denominado espaço de estados.
Nesse contexto, segundo o mesmo autor, a cadeia de Markov
passa a ser uma sequência X1, X2, X3 .... Xn de variáveis aleató-
rias, onde o conjunto de valores que elas podem assumir passa a
ser chamada de espaço de estados, sendo que X (t) denota o espa-
ço de tempo do processo (t). Dessa forma, a identidade que defi-
ne a Cadeia de Markov é a distribuição da probabilidade condicio-
nal de X (t+1) do estado passado, sendo essa uma função apenas de
X (t), então:

Pr [X (t+1) = x (X0, X1, X2, ....Xn)]


Pr [X (t+1) = xIX1,],i = 1,2,3....,n.

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Segundo RUHOFF et al47 (2010 citado por BARROS, 2012), a Ca-


deia de Markov pode apresentar vantagens quando da sua utili-
zação, como: o método de predição de mudanças na paisagem, a
simplicidade operacional e matemática deste modelo, a aplicação
direta de dados oriundos de sensoriamento remoto e a implemen-
tação dos em SIG, assim como, o volume reduzido de dados geral-
mente necessários à sua execução são alguns dos pontos positi-
vos de sua utilização. Porém, a Cadeia de Markov não explica o que
está se alterando, tampouco espacializa onde estão ocorrendo as
mudanças, apenas informa as probabilidades de transição entre as
classes envolvidas. Outro ponto negativo deste método está relacio-
nado à limitação de se incluírem variáveis exógenas à análise. Para
suprir tal desvantagem, após sua aplicação devem ser aplicados os
autômatos celulares.
Os estudos a respeito dos Autômatos Celulares, iniciados na dé-
cada de 1950 pelo matemático americano John Von Neumann, ga-
nharam importância científica em diversas áreas do conhecimento,
entre eles: a matemática (análise funcional, teoria ergódica), a físi-
ca (mecânica quântica, hidrodinâmica), economia (teoria dos jo-
gos), a computação (Arquitetura Von Neumann) entre outras.
Segundo Wolfram48 (1983 apud BASTOS, 2011), os autômatos ce-
lulares podem ser considerados como idealizações discretas das
equações diferenciais parciais que podem ser utilizadas para des-

47.  RUHOFF et al. Modelos de simulação dinâmica do desmatamento da Amazônia. Caminhos de


Geografia, Vol.11, Uberlândia-MG, p. 258-268, 2010.
48.  WOLFRAM, S. Cellular Automata. Los Alamos Science, Vol. 9, New México-EUA, p.21, 1983.

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crever sistemas naturais, consistindo de uma rede de células idên-


ticas onde cada célula assume um conjunto finito de valores que
evoluem em períodos discretos conforme regras determinísticas, as
quais determinam o valor de cada célula de acordo com as células
vizinhas. Devido a esta natureza discreta, é possível fazer uma ana-
logia com os computadores digitais, relacionando os autômatos ce-
lulares com computadores de processamento paralelos.
Os sistemas com autômatos celulares se constituem em entida-
des complexas que possuem uma série de propriedades que os de-
finem, nesse contexto para Weimar49 (1998 apud RICOBOM, 2012):
a) o sistema deve apresentar-se em forma de uma matriz ou gra-
de regular de células n dimensionais; b) o sistema deve apresentar
uma evolução em passos discretos de tempo; c) cada célula perten-
cente à grade regular é caracterizada por um estado pertencente a
um conjunto finito de estados; d) cada célula da grade de um autô-
mato celular evolui de acordo com as mesmas regras, as quais de-
pendem somente do estado em que a célula se encontra e de um
número finito de vizinhos; e) a relação de uma célula com a sua vi-
zinhança é local e uniforme.
A primeira propriedade diz respeito à questão da geometria es-
pacial dos autômatos celulares. Para a existência de um sistema
com os mesmos é necessária a existência de uma rede na qual to-
das as células devem possuir o mesmo tamanho.

49.  WEIMAR, J.R. Simulation with Cellular Automata. Berlin: Verlag Berlin, Vol.1, Berlin-ALE,
199p, 1998.

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Quanto à segunda propriedade segundo Weimar50 (1998 apud


RICOBOM, 2012): expressa que a evolução deve se dar em espaços
discretos de tempo. Assim, a interação entre as células de um autô-
mato celular ocorre quando a célula ativa faz uma leitura dos esta-
dos atuais de suas vizinhas do tempo (t). Após essa leitura a célula
executa as instruções características que lhe foram conferidas pelas
vizinhas em seu tempo (t+1).
A terceira propriedade define que os autômatos celulares devem
pertencer a um conjunto definido de estados iniciais. O estado inicial
de um autômato está intimamente ligado ao conteúdo inicial de suas
células, normalmente qualquer valor (entre 0 e 1) pode ser atribuído
às mesmas, e é a partir desses valores que se desencadeia o processo
de evolução dos autômatos. A variação do estado inicial de um autô-
mato possui um impacto direto nos seus estados subsequentes.
A quarta propriedade está relacionada à evolução dos autôma-
tos celulares, a qual depende de um conjunto de regras pré-deter-
minado. Entre os estudos realizados nessa temática se destaca a
Classificação de Wolfram, elaborada pelo matemático inglês Ste-
phen Wolfram, e que se constitui em uma das variações dos autô-
matos celulares de Von Neumman. Assim, segundo Sousa (2002,
p.10): com um anel distribuído por n células com k estados, possí-
veis, existem no máximo nk configurações para cada linha de célu-
las. Na maior parte dos casos o número de possibilidades é grande
– mas é finito. Portanto, esta característica implica que um autôma-
to celular unidimensional com k estados possíveis evoluindo du-
rante um tempo suficientemente grande irá acabar por se repetir.

50.  ibidem

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Segundo Ricobom (2012, p.84), a quinta propriedade, diz res-


peito à relação apresentada por uma célula, em um autômato ce-
lular, com a sua vizinhança. Esta relação pode variar de diferentes
formas, principalmente em relação ao formato da malha que con-
tém as células, (unidimensional, bidimensional, tridimensional, ou
apresentar uma dimensão ND).
Nesse contexto, no caso de um sistema de autômatos celulares
1D, cada célula possui duas células vizinhas, em um sistema de au-
tômatos 2D cada célula possui quatro outras vizinhas, e, por fim,
em um sistema de autômatos 3D, teria para uma célula outras seis
como suas vizinhas. Esse estudo foi baseado no uso dos autôma-
tos celulares em 2D, uma vez que esse é o padrão utilizado para a
composição das imagens matriciais que serão então operadas pelo
IDRISI TAIGA. As relações de vizinhança desse tipo podem ser clas-
sificadas em quatro grupos diferentes (PASCOAL, 2005):

- Vizinhança de Von Neumman: ocorre quando uma célula


apresenta quatro outras células ortogonais como vizinhança, estan-
do elas acima, abaixo, na esquerda e na direita da mesma. Seu raio é
r=1, pois nela se considera a relação apenas com a primeira camada.

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Exemplo de vizinhança em Von Neumman

Fonte: Pascoal (2005).

- Vizinhança de Moore: constitui-se em uma ampliação da de


Von Neumann, no entanto, as células diagonais também são consi-
deradas, dessa forma as células com vizinhança passam de quatro
para oito, sendo assim seu raio e r=1.

Exemplo de vizinhança em Moore

Fonte: Pascoal (2005).

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- Vizinhança Estendida: trata-se da mesma vizinhança de Moo-


re, porém com seu alcance expandido para dezesseis células da se-
gunda camada, sendo seu raio r =2.

Exemplo de vizinhança estendida

Fonte: Pascoal (2005).

- Vizinhança Aleatória: como o próprio nome diz, nelas as células


com vizinhança ficam espalhadas, não tendo assim um raio (r) definido.

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Exemplo de vizinhança aleatória

Fonte: Pascoal (2005).

Na segunda etapa, foram levantadas informações para a elabo-


ração da base cartográfica que servisse de suporte para a manipu-
lação e análise de dados, em ambiente de SIG. O georreferencia-
mento, padronização dos produtos cartográficos, e a mosaicagem
foram realizados, com vistas à elaboração dos planos de informa-
ções. Aferições de campo se fizeram necessárias.
Foi estabelecido o recorte temporal para a elaboração dos pla-
nos de informações da Cobertura Vegetal e Uso da Terra, tal recor-
te contemplou um intervalo de 16 anos (1980, 1996 e 2012). Para a
geração de tais planos foram realizados os processos clássicos de
fotointerpretação. Nesta etapa, também, foi definida uma legen-
da para os planos de informações definidos. Foram identificadas 10
classes, para cada uma dessas foi atribuído um identificador de po-
lígono (ID): 1- Áreas Urbanas; 2 - Corpos D’Água; 3- Manguezais;
4- Floresta Ombrófila Densa; 5- Restinga; 6- Agricultura/Pecuária;

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7- Sucessão Inicial (Capoeiras/Capoeirões); 8- Reflorestamento; 9-


Solo Exposto; 10- Áreas Portuárias.
De posse dos planos de informações supracitados, pode-se rea-
lizar a terceira etapa, onde foram realizadas as manipulações, as
simulações e as análises acerca das mudanças na cobertura vegetal
e no uso da terra, ou seja, a geração de novos planos, os quais con-
templaram a modelagem preditiva para o ano de 2032. A escolha
desse intervalo temporal de 20 anos (partir de 2012) reside no fato
de que, segundo o manual do software IDRISI TAIGA, simulações
com intervalos temporais muito extensos tendem a apresentar um
exagero em seus resultados, por outro lado, como o complexo por-
tuário ainda se encontra em implantação, descartou-se realizar si-
mulações a curto prazo.
O primeiro processo consistiu na aplicação da rotina MARKOV –
Markov Transition Estimator, através do qual, dois mapas são cru-
zados, resultando na geração dos seguintes arquivos: - Uma Matriz
de Probabilidades de Transição: ou seja, um arquivo que identifi-
ca a probabilidade de cada classe de uso da terra e cobertura vege-
tal sofrer modificações ao longo do tempo; - Uma Matriz de Tran-
sição de Áreas: ou seja, um arquivo que mostra a relação de pixels
dentro de cada classe de uso da terra e cobertura vegetal que po-
dem sofrer modificações para outras classes; - Um conjunto de
Mapas de Probabilidades Condicionais: ou seja planos de infor-
mações que através da alocação de valores booleanos (em uma es-
cala de 0 a 1, sendo 1 para a mudança e 0 para a permanência no es-
tado atual), revelam a probabilidade de cada pixel ser mudado ou

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não em um tempo futuro. Observa-se que cada classe de cobertura


vegetal e uso da terra utilizada nesse estudo possui seu respectivo
mapa de probabilidades condicionais.
Nesse processo foram realizados cruzamentos envolvendo dois
pares de mapas: (1) 1996/2012 com 10 classes de uso da terra e co-
bertura vegetal; (2) 1980/2012 com 10 classes de uso da terra e co-
bertura vegetal.
O segundo processo consiste na aplicação da rotina CA_MAR-
KOV – Cellular Automata/Markov Changes, o qual a partir do plano
de informações mais recente, utilizado no processo anterior, acres-
centado da matriz de probabilidades de transição, da matriz de tran-
sição de áreas e do conjunto de planos de informações de probabi-
lidades condicionais gerados no mesmo, foram obtidos os mapas
preditivos contendo os cenários futuros, ou seja, a espacialização das
10 classes de uso da terra e cobertura vegetal para tal cenário.
O layout final dos mapas foi realizado com o auxílio do software
ARCGIS 9.3, através do conjunto ARCMAP & ARCInfo, o qual per-
mitiu adicionar as convenções cartográficas necessárias para a pro-
dução dos mapas finais.

RESULTADOS
Os mapas representados pelas Figuras 2, 3 e 4, representam
o uso da terra e cobertura vegetal em Pontal do Paraná nos anos
de 1980, 1996 e 2012. Foram adotadas 10 classes, tratando-se nesse
caso, de um mapeamento real, onde a classe de uso da área por-
tuária foi incluída, permitindo não só compreender a evolução dos
projetos portuários na área de estudo durante o período analisa-

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do, como também proceder a simulação de cenários futuros (2032)


que contemplem a instalação efetiva do complexo portuário. A par-
tir desses mapeamentos foi elaborada a Tabela 1, a qual compara
quantitativamente as mudanças de uso da terra e cobertura vegetal
em Pontal do Paraná ao longo dos anos de 1980, 1996 e 2012.

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Figura 2 Mapa de uso da terra e cobertura vegetal de Pontal do Paraná em 1980

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Figura 3 apa de uso da terra e cobertura vegetal de Pontal do Paraná em 1996

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Figura 4 Mapa de uso da terra e cobertura vegetal de Pontal do Paraná em 2012

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Tabela 1 Comparação das áreas (ha) e porcentagem (%) de ocupação referentes às 10 classes de
uso da terra e cobertura vegetal do Município de Pontal do Paraná dos anos de 1980, 1996 e 2012

Área Real (ha) Área Real (%)


Classes de Uso da 1980 1996 2012 1980 1996 2012
Terra e Cobertura
Vegetal
1 Áreas urbanas 617,22 1344,13 1711,22 3,06 6,65 8,47

2 Corpos d’água 457,79 466,19 473,44 2,27 2,31 2,34

3 Manguezais 869,54 865,78 860,07 4,30 4,29 4,26

4 Floresta Ombrófi- 16361,14 15768,62 15604,63 80,99 78,06 77,24


la Densa
5 Restinga 511,95 473,23 470,78 2,53 2,34 2,33

6 Agricultura/ pe- 38,32 45,16 123,20 0,19 0,22 0,61


cuária
7 Sucessão Inicial (ca- 1169,28 1053,59 730,75 5,79 5,22 3,62
poeira/ capoeirões)
8 Reflorestamento 4,53 4,53 4,43 0,02 0,02 0,02

9 Solo exposto 81,98 49,19 42,26 0,41 0,24 0,21

10 Áreas portuárias 89,65 130,98 182,76 0,44 0,65 0,90

Total 20201,38 20201,38 20203,53 100 100 100

Fonte: Cálculo realizado no software IDRISI por meio da função GIS ANALYSIS >
Database Query > AREA, aplicada sobre os respectivos mapas de uso da terra
e cobertura vegetal referentes aos anos de 1980, 1996 e 2012.

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A aplicação das rotinas MARKOV – Markov Transition Estimator,


e CA_MARKOV - Cellular Automata/Markov Changes, conforme
descrito no item anterior, foi realizada em duas etapas: a primeira
nos planos de informações do uso da terra e cobertura vegetal para
anos de 1996 e 2012 (FIGURAS 3 e 4), e a segunda nos planos de 1980
e 2012 (FIGURAS 2 e 4), resultando em dois planos preditivos para o
ano 2032, os quais contemplam um cenário futuro da efetivação do
complexo portuário. Os resultados obtidos podem ser visualizados
nas Figuras 5 e 6 e na Tabela 2.

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Figura 5 Mapa preditivo de uso da terra e cobertura vegetal em Pontal do


Paraná em 2032, referente ao cruzamento dos mapas de 1996 e 2012

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Figura 6 Mapa preditivo de uso da terra e cobertura vegetal em Pontal do


Paraná em 2032, referente ao cruzamento dos mapas de 1980 e 2012

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Tabela 2 Áreas (ha) e porcentagem (%) de ocupação para as 10 classes de uso da terra e cobertura
vegetal do Município de Pontal do Paraná , resultantes do mapeamento preditivo para 2032

Área em 2032
Resultante de 1996 Resultante de 1980 -
-2012 2012
Classes de Uso da Terra e ha % ha %
Cobertura Vegetal
1 Áreas urbanas 2077,43 10,28 2265,30 11,21
2 Corpos d’água 472,44 2,34 471,66 2,33
3 Manguezais 860,71 4,26 860,94 4,26
4 Floresta Ombrófila Densa 15344,44 75,91 15171,65 75,07
5 Restinga 470,95 2,33 457,00 2,26
6 Agricultura/pecuária 129,98 0,64 130,48 0,65
7 Sucessão Inicial (capoeira/ 623,65 3,09 621,09 3,07
capoeirões)
8 Reflorestamento 4,35 0,02 4,33 0,02
9 Solo exposto 45,44 0,22 44,55 0,22
10 Áreas portuárias 183,48 0,91 183,99 0,91
Total 20212,84 100 20210,98 100

Fonte: Cálculo realizado no software IDRISI por meio da função GIS ANALYSIS > Database
Query > AREA aplicada sobre o mapa preditivo (2032) de uso da terra e cobertura vegetal.

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

A partir dos dados apresentados foi possível realizar a análise


das mudanças de uso da terra assumidas pelos dois mapeamentos
preditivos:

Áreas Urbanas - nos mapeamentos preditivos realizados, as


áreas urbanas apresentam um crescimento bastante expressivo. Os
valores apresentados são 2077,43 ha ou 10,28% do total da área de
estudo (1996-2012>2032), 2265,30 há ou 11,21% (1980-2012>2032). O
complexo portuário de Pontal do Paraná é um fator que pode fun-
cionar como atrativo populacional, aumentando ainda mais a já
elevada taxa de expansão populacional desse município.

Corpos D’Água - nestes mapeamentos preditivos a área ocu-


pada pelos corpos d’água atingem 472,44 ha ou 2,34% (1996-
2012>2032) e, 471,61 ha ou 2,33% (1980-2012>2032) do total da área
de estudo. Essa classe apresentou um avanço leve entre os dados,
em razão da criação de uma série de pequenos tanques artificiais.
A localização aleatória dessas mudanças (em contraponto as mu-
danças graduais ocorridas na classe de áreas urbana, por exemplo),
fez com que nos mapas preditivos gerados não fossem encontradas
mudanças expressivas na estrutura dessa classe.

Manguezais - os manguezais ocupam nesses cenários 860,71 ha


ou 4,26% (1996-2012>2032) e, 860,94 ha ou 4,26% (1980-2012>2032)
do total da área de estudo, permanecendo praticamente intactos
em sua distribuição espacial em ambas as modelagens. Dois fato-

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

res colaboram para a ocorrência desse quadro nos respectivos ma-


pas, o primeiro como mencionado, anteriormente, reside no fato
dos manguezais serem considerados Áreas de Preservação Perma-
nente, e o segundo, por estarem em sua maior parte relativamente
distantes tanto da mancha urbana de Pontal, como os locais desti-
nados aos empreendimentos portuários.

Floresta Ombrófila Densa - as áreas ocupadas pela Floresta


Ombrófila Densa ocupam nestes mapas preditivos 15344,44 ha ou
75,91% (1996-2012>2032) e, 15171,65 ha ou 75,07% (1980-2012>2032)
do total da área de estudo. A redução das florestas é resultado da
expansão da classe de áreas urbanas.

Restinga - os espaços ocupados por restingas somaram


470,95 ha ou 2,33% (1996-2012>2032) e, 457,00 ha ou 2,26% (1980-
2012>2032) do total da área de estudo. A razão pela qual as áreas
ocupadas pelas restingas tendem a se manter semelhantes pode ser
atribuída ao fato de as mesmas serem consideradas Áreas de Pre-
servação Permanente conforme a legislação nacional (notadamen-
te por meio da Lei Nº 12.651 de 25/05/2012).

Agricultura/Pecuária - as áreas ocupadas pelas atividades agrí-


colas ocuparam nesse mapa preditivo 129,98 ha ou 0,64% (1996-
2012>2032) e, 130,48 ha ou 0,65% (1980-2012>2032) do total da área
de estudo. Elementos físicos (notadamente os solos) se constituem
em fatores limitantes para a expansão de atividades dessa natureza.

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Sucessão Inicial (Capoeira/Capoeirões) - as áreas ocupadas


por Sucessão Inicial ocupam neste mapa preditivo 623,65 ha ou
3,09% (1996-2012>2032) e, 621,09 ha e 3,07% (1980-2012>2032) do to-
tal da área de estudo. A redução dessa classe se deve ao fato de que
as áreas ocupadas pela mesma serão, conforme a simulação reali-
zada, gradualmente convertida em outras classes (notadamente as
áreas urbanas).

Reflorestamento - as áreas ocupadas pela classe de refloresta-


mento assumiram a extensão de 4,35 ha, ou 0,02% (1996-2012>2032)
e, 4,33 ha e 0,02% (1980-2012>2032) do total da área de estudo. Nos
mapeamentos de 1980, 1996 e 2012 as áreas de reflorestamento se li-
mitaram a uma única propriedade, e como os processos utilizados
para a simulações dos mapas preditivos se baseiam em cenários
passados, foi mantida uma tendência de estagnação nessa classe
como resultado.

Solo Exposto - o espaço ocupado por solo exposto apresen-


tou praticamente não apresentou variação em ambas as projeções,
apresentando o valor de 45,44 ha ou 0,22% (1996-2012>2032) e, 44,55
ha ou 0,22% (1980-2012>2032) da área total.

Áreas Portuárias - as áreas portuárias ocupam nesta projeção


183,48 ha ou 0,91% (1996-2012>2032) e, 183,99 ha ou, 0,91% (1980-
2012>2032) do total da área de estudo, constituindo-se basicamen-
te dos projetos a serem operados pelas empresas Porto de Pon-

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tal, Melport Terminal Marítimos, Odebrecht, Techint e Subsea 7.


Os empreendimentos se localizam, sobretudo, na área conhecida
como Ponta do Poço.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nos mapas notou-se uma expansão consideravelmente maior
das áreas urbanas, fator que impactou diretamente nas classes de
Restingas, Sucessão Inicial e Floresta Ombrófila Densa (ambos com
perdas territoriais), esse resultado vai ao encontro a outros estudos
(entre os quais alguns EIA-RIMAs mencionados nesse trabalho)
que apontam que a instalação de um complexo portuário em Pon-
tal do Paraná , irá gerar impactos no incremento da população des-
se município, resultando assim na expansão das classes de uso da
terra ligadas as atividades antrópicas.
Também foi observada a capacidade dos módulos MARKOV e
CA_MARKOV presentes no software IDRISI TAIGA na geração de
uma dinâmica temporo-espacial, e na realização de uma modela-
gem de caráter preditivo.
O presente trabalho revelou que o uso de modelagem preditiva
pode ser uma ferramenta bastante útil para a avaliação e interpre-
tação de cenários futuros, gerando dessa forma subsídios que po-
dem ser utilizados por atores públicos e privados na otimização da
gestão territorial.
Por fim, sugere-se que os resultados de tal trabalho possam
ser utilizados pelos poderes públicos atuantes na área de estudo,
como um subsídio para o planejamento e gestão dessas áreas, con-

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

tribuindo assim tanto para a redução de impactos socioeconômi-


cos advindos das mudanças de uso da terra previstas, como para a
consolidação de um desenvolvimento sustentável para sociedade e
meio ambiente.

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

O PAPEL DOS BENEFÍCIOS ECONÔMICOS E


SOCIAIS PROVIDOS PELOS ECOSSISTEMAS NO
BEM-ESTAR HUMANO: O CASO DE PONTAL
DO PARANÁ

Junior Ruiz Garcia


Silvana de Andrade
Dailey Fischer

INTRODUÇÃO
A principal fonte dos benefícios naturais à sociedade é o capital
natural, entendido como o estoque de recursos naturais que pode
contribuir direta e indiretamente para o bem-estar (Costanza et al.,
1997; De Groot et al., 2002; MEA, 2005). Cabe destacar que a socie-
dade não conhece todos os componentes do capital natural, nem
a inter-relação entre seus componentes e destes com o subsistema
socioeconômico. Desse modo, a contribuição plena do capital na-
tural para o bem-estar não pode ser definida e nem medida, o que
por si só, já justificaria que a sociedade preservasse o capital natu-
ral (Garcia, 2012).
Contudo, a expansão urbano-industrial e da atividade agrope-
cuária implica em um trade-off para a sociedade, que compreen-
de a conversão de áreas naturais em áreas para uso econômico nos
padrões tradicionais. Acontece que estas mudanças no uso e ocu-

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pação das terras resulta em sérios impactos em todo ecossistema


natural, logo, afeta sua capacidade de contribuição para o bem-
-estar. A urbanização, por um lado, inicia-se com os desmatamen-
tos e arruamentos não-pavimentados, cujo resultado é um aumen-
to significativo da erosão e do transporte de sedimentos pela rede
de drenagem natural, sobretudo, o aumento das superfícies imper-
meáveis ou quase impermeáveis tais como telhados, solos expos-
tos, calçamentos e ruas pavimentadas.
Por um lado, este processo contribui para o aumento do volume
e do pico das cheias que são escoadas pelo sistema de drenagem
artificial e natural para córregos, rios, lagoas e nascentes. Por outro,
a urbanização também gera o lançamento de resíduos – sólidos, lí-
quidos e gasosos – no meio ambiente, especialmente em áreas de
mananciais e no próprio leito dos rios. O resultado desse processo
tem sido a crescente deterioração da qualidade dos ecossistemas,
em especial dos recursos hídricos. E conjuntamente com as ações
já mencionadas, comprometem a provisão de bens e serviços ecos-
sistêmicos (SE’s), afetando até mesmo a própria manutenção eco-
lógica dos ecossistemas.
Nesse contexto, a disponibilidade de recursos naturais e de SE’s
em termos de quantidade e qualidade, temporal e espacial, tem
sido objeto constante de preocupação por parte de diversos agen-
tes públicos e privados da sociedade humana em todo o mundo
(MEA, 2005). Esse comportamento pode ser constatado, a partir do
momento em que o componente ambiental dos projetos de investi-
mentos (de qualquer natureza – agrícola, industrial ou prestação de

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

serviços e da própria urbanização) passou a ser considerado como


um dos principais requisitos para sua aprovação, seja para fins de
financiamento, seja para sua implementação (Singulane, 2011). Sig-
nifica que a questão ambiental assume uma nova “posição” na es-
trutura de tomada de decisões de investimentos dos agentes, que
em alguns casos pode superar em importância o componente eco-
nômico (viabilidade econômico-financeira) (Sousa Júnior, 2014), e,
mesmo, em termos do desenvolvimento econômico de determina-
da região (Brasil, 2000).
Neste contexto, a valoração dos recursos naturais pode auxiliar
na tomada de decisão a partir do reconhecimento da importância,
pela sociedade, do capital natural e dos SE’s no bem-estar. Em fun-
ção do dilema – trade-off – que a sociedade vivencia entre aumen-
tar a produção e a renda econômica e preservar o capital natural,
este capítulo tem por objetivo identificar e valorar alguns SE’s pro-
vidos pelos ecossistemas de Pontal do Paraná , localizado no litoral
do estado do Paraná. O estudo se justifica porque existe um conjun-
to de empreendimentos econômicos previstos para serem instala-
dos em Pontal do Paraná , tais como um complexo portuário, par-
que industrial e a construção de uma Faixa de Infraestrutura. Cabe
destacar que os estudos de impactos ambientais (EIA) não contem-
plam a avaliação do custo de oportunidade com a perda de impor-
tantes SE’s em função da realização desses empreendimentos, que
certamente reduzirão de maneira significativa o grau de bem-estar
da comunidade local.

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O capítulo está organizado em três seções além desta introdu-


ção e das conclusões. Na primeira seção são apresentados os ma-
teriais e métodos usados no desenvolvimento do estudo, inclusive
a revisão de literatura sobre valoração dos recursos naturais. Na se-
ção seguinte são apresentados os principais resultados. Por fim, na
última seção é a realizada a discussão dos resultados.

MATERIAL E MÉTODOS
Área de estudo: Pontal do Paraná 51
A criação do município de Pontal do Paraná resulta do des-
membramento do município de Paranaguá , Lei Estadual n. 11.252,
de 20 de dezembro de 1995, localizado no litoral do Paraná (Fi-
gura 1).

51.  As informações desta seção foram retiradas do Portal do Município de Pontal do Paraná (2018),
Ipardes (2018) (Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social), da base de dados
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Sidra – Sistema IBGE de Recuperação Automática)
(2018), do Atlas Brasil (Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil) e do IpeaData (Base de dados
do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

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Figura 1 Localização de Pontal do Paraná

Fonte: preparado pelo autor com base em IBGE (2018).

A região é caracterizada por um relevo suave e de baixa altitu-


de, encontrado nas áreas de restinga. Pontal do Paraná possui área
territorial de 202,16 km² e a orla marítima alcança 23 km distribuí-
dos em 48 balneários. Em 2010, a sua população foi estimada em
20.920 pessoas, densidade demográfica de 104,7 hab./km², superior
à nacional (22 hab./km²) e do Paraná (55 hab./km²) (IBGE, 2018)52.
A taxa de urbanização era de 99% (população urbana 20.743 pes-
soas), apenas 177 pessoas residiam na área rural em 2010 (IBGE,
2018). Entre 2000 e 2010 a população residente em Pontal do Paraná
aumentou 46%, embora a paranaense e brasileira tenham aumen-

52.  Os dados demográficos são do Censo Demográfico realizado pelo IBGE em 2010.

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tado 9% e 12%, respectivamente (IBGE, 2018). A ativação do esta-


leiro da empresa Techint, entre os anos de 2005 e 2006, contribuiu
com este aumento, uma vez que foram empregadas em torno de 1, 5
mil de trabalhadores (GUIMARÃES FILHO, 2011).
Em 2015, o Produto Interno Bruto a preços correntes (PIBpm)
de Pontal do Paraná foi estimado pelo IBGE (2018) em R$ 425 mi-
lhões, PIBpm per capita de R$ 17,5 mil. O PIBpm pela ótica do Valor
Adicionado Bruto (VAB) em 2015 estava distribuído em: R$ 228 mi-
lhões no setor de serviços e comércio (57,5%); R$ 100 milhões o setor
da administração pública (25,3%); R$ 66 milhões no setor industrial
(16,7%); R$ 1,8 milhões no setor agropecuário (0,5%). O IPARDES
(2018) também divulga o Valor Adicionado Fiscal (VAF)53 para as ati-
vidades de turismo , indicando em 2015 um valor de R$ 3,6 milhões.
Essa informação aponta a relevância do turismo para o município.
De acordo com a Lei estadual nº. 12.243, de 31 de julho de 1998,
Pontal do Paraná é considerada como sendo “Área Especial de In-
teresse Turístico” e “Local de Interesse Turístico”, juntamente com
Antonina, Guaraqueçaba, Guaratuba, Matinhos, Morretes e Para-
naguá (Paraná, 1998). Este interesse decorre da presença de uma
ampla variedade de ecossistemas, tais como manguezais, costões
rochosos, marismas, planícies de maré, restingas, praias arenosas,
além dos últimos remanescentes de Floresta Atlântica (Krelling,

53.  O valor adicionado fiscal (VAF) representa à diferença entre as saídas de mercadorias, acresci-
do das prestações de serviços tributáveis pelo ICMS (Imposto de Circulação de Mercadorias e Ser-
viços) e das entradas de mercadorias e serviços recebidos em uma empresa a cada ano civil (Ipar-
des, 2018).

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2004), que representam importantes habitats naturais para espé-


cies locais e migratórias.
Em síntese, Pontal do Paraná apresenta um panorama socioeco-
nômico que poderia indicar que a sua população desfruta de uma
condição de vida relativamente boa (Tabela 1), embora sejam reco-
nhecidas as carências e precariedades não reveladas pelas estatísti-
cas oficiais. No entanto, qual a contribuição dos ecossistemas para o
bem-estar da população local? Quais SE’s são providos pelo ambien-
te natural à população local? Qual o valor econômico desses serviços?

Tabela 1 Indicadores Socioeconômicos de Pontal do Paraná e do estado do Paraná: 2000-2010

Paraná Pontal do Paraná


Variáveis
2000 2010 2000 2010
IDHM – Índice de Desenvolvimento Hu-
mano 0,65 0,75 0,62 0,74
IDHM Renda 0,70 0,76 0,68 0,74
IDHM Longevidade 0,75 0,83 0,79 0,83
IDHM Educação 0,52 0,67 0,45 0,66
Taxa de analfabetismo - 15 anos ou mais 9,53 6,28 7,10 4,83
Taxa de analfabetismo - 18 anos ou mais 10,25 6,69 7,62 5,12
Taxa de analfabetismo - 25 anos ou mais 12,28 7,86 8,61 5,74
Expectativa de anos de estudo 10,11 10,43 9,82 10,64
% de extremamente pobres 6,08 1,96 4,53 1,46
% de pobres 18,90 6,46 17,41 5,98
% de vulneráveis à pobreza 41,24 19,70 40,56 22,49
Índice de Gini 0,60 0,53 0,54 0,51
Fonte: preparado pelo autor com base em Atlas Brasil (2018).

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Avaliação e Valoração dos Recursos Naturais54


O ambiente natural contribui direta e indiretamente para a qua-
lidade de vida das pessoas seja como fonte de alimentos, água pura,
ar limpo e paisagens naturais seja para a geração de emprego e ren-
da econômica (Costanza et al., 1997; De Groot et al., 2002; MEA, 2005).
Todavia, para que o ambiente natural possa manter sua contribuição
para o bem-estar, é preciso que seus componentes estejam “saudá-
veis”, principalmente com a preservação da cobertura vegetação nati-
va, água e biodiversidade (Andrade, 2010; Garcia, 2012).
As intervenções realizadas na dinâmica dos ecossistemas po-
dem alterar negativa ou positivamente o fluxo de benefícios natu-
rais para a sociedade, denominados bens e serviços ecossistêmicos
(SE’s). Os SE’s correspondem aos benefícios resultantes da dinâmi-
ca ecossistêmica natural que contribuem direta ou indiretamente
para o bem-estar humano, classificados em: serviços de provisão;
serviços de regulação; serviços culturais; serviços de suporte (MEA,
2005). Apesar da importância do ambiente natural para o bem-es-
tar humano, a maioria dos SE’s aportados à sociedade não tem pre-
ço ou valor econômico, porque são bens públicos, levando a sobre-
-utilização, tal como ilustrado na Tragédia dos Comuns (Hardin,
1968). Desse modo, a identificação dos SE’s e, quando possível, sua
tradução em valores biofísicos e/ou monetários, podem auxiliar na
adequada gestão ambiental, de forma a gerar impactos positivos
em toda a sociedade.

54.  Para mais informações sobre a valoração econômica dos recursos naturais ou SE’s ver Maia et
al. (2004), Garcia (2012, 2013) e Garcia et al. (2015).

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A Economia do Meio Ambiente (EMA) apresenta um conjunto


de métodos que podem auxiliar na valoração econômica ou mone-
tária dos SE’s (Figura 2). Os métodos dispostos pela EMA buscam
valorar os recursos naturais (precificar), os quais apoiam-se nos
fundamentos da microeconomia neoclássica. A valoração procura
atribuir valores aos SE’s associados à utilidade derivada direta ou
indiretamente, da sua utilização atual e futura ou potencial.

Figura 2 Métodos de Valoração Monetária dos SE’s

Fonte: preparado pelo autor com base em Garcia et al. (2015).


1 Disposição a Pagar (DAP) ou Disposição a Receber (DAR).

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Nesta perspectiva da EMA, o valor econômico dos recursos am-


bientais (VERA) seria composto pelo: valor de uso direto (VUD), in-
direto (VUI), pelo valor de opção (VO) e pelo valor de não uso ou de
existência (VE) (Figura 3).

Figura 3 Decomposição do Valor Econômico de um Recurso ou Serviço Ambiental

Fonte: Modificado pelo autor com base em Maia et al. (2004, p. 4).

Este estudo realizou a valoração monetária de parcela dos bene-


fícios providos pelos ecossistemas de Pontal do Paraná com base
nos métodos indiretos e preços de mercado (Figura 2). O valor mo-

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netário dos recursos naturais pode ser estimado pelo produto entre
o SE avaliado e o preço correspondente, ou seja:

VMRN = PRN x QRN


Onde:
VMRN = Valor monetário do recurso natural;
PRN = preço de mercado ou estimado do recurso natural;
QRN = Quantidade do recurso natural, representada por valores
biofísicos, por exemplo, toneladas, metros cúbicos (m³) etc.

A valoração compreende a realização de uma Avaliação Ecossis-


têmica, a qual permite a identificação e mensuração biofísica (Q)
– quando possível – dos SE’s providos pelo ecossistema (Bingham
et al., 1995; Romeiro; Maia, 2010; Garcia, 2012). Por sua vez, a iden-
tificação dos SE’s e a mensuração biofísica permitem que se possa
tentar traduzir a importância dos serviços para o bem-estar huma-
no na métrica monetária (P) – quando possível –, ou seja, a valora-
ção monetária dos recursos naturais. Isso é possível porque os SE’s
têm valor positivo para a sociedade. Entretanto, nem todos os SE’s
são comercializados no mercado, porque a maioria apresenta as
características de bem público.
A valoração monetária para os SE’s que não são comercializa-
dos no mercado, para os quais não existe sistema de preço, tem
sido realizada com base em valores de referência apresentados na

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literatura (TEEB, 2010) ou pelo emprego de “preços sombra”55, com


base nos métodos indiretos de valoração (De Groot et al., 2002; Ho-
warth; Farber, 2002). Para os SE’s que são comercializados no mer-
cado, como os serviços de provisão, para os quais existe preço de
mercado, foram usados os métodos de valoração de mercado direto
(De Groot et al., 2002; Howarth; Farber, 2002).

RESULTADOS
Bens e Serviços Ecossistêmicos em Pontal do Paraná
Os resultados da Avaliação Ecossistêmica indicam que Em Pon-
tal do Paraná é possível encontrar os quatro grupos de SE’s indi-
cados pela MEA (2005). O conjunto de quadros a seguir apre-
senta uma síntese dos SE’s que podem ser identificados nos
ecossistemas de Pontal do Paraná , e seus possíveis indicadores ou
parâmetros que podem auxiliar na avaliação biofísica, sociocultu-
ral e econômica.

55.  “preços sombras” correspondem aos preços de bens e serviços econômicos comercializados
nos mercados que serão utilizados para a valoração dos recursos naturais. Em outras palavras, o
“preço sombra” poderia ser considerado o custo de oportunidade da perda de determinado recur-
so natural (SEROA DA MOTTA, R. Manual para valoração econômica de recursos ambientais. Rio
de Janeiro: IPEA/MMA/PNUD/ CNPq, 1997. Disponível em: <https://goo.gl/EjDEf1>. Acesso em:
23/05/2018).

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Quadro 1 Serviços de Suporte em Pontal do Paraná e Indicadores/Parâmetros para sua Mensuração

Serviços de Suporte Indicadores e/ou parâmetros


1. Habitat Área de habitat; número/densidade de espécies e indi-
víduos.
2. Diversidade genética Riqueza de espécies, índice de biodiversidade.
3. Produção primária Quantidade bruta ou líquida.
4. Ciclagem de nutrientes Fluxo de nutrientes.
5. Ciclo hidrológico Dados pluviométricos e fluviométricos.

Fonte: preparado pelo Autor.

Quadro 2 Serviços de Regulação em Pontal do Paraná e Indicadores/Parâmetros para sua Mensuração

Serviços de Regulação Indicadores e/ou parâmetros


1. Qualidade do ar Cobertura vegetal.
2. Qualidade da água Coliformes fecais; retenção de nutrientes; contaminan-
tes.
3. Regulação do clima Cobertura vegetal; estoque de carbono.
4. Prevenção de eventos extremos Cobertura vegetal.
5. Regulação do fluxo d’água Escoamento superficial; infiltração; cobertura vegetal.
6. Prevenção contra erosão do solo Cobertura vegetal.
7. Prevenção contra erosão costeira Cobertura vegetal.
8. Qualidade do solo Fertilidade ou aptidão agrícola.
9. Manutenção dos nutrientes no mar Exportação de nutrientes do mangue (área costeira).

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Serviços de Regulação Indicadores e/ou parâmetros


10. Polinização Número/densidade de espécies e/ou indivíduos.
11. Controle de pragas e doenças Número/intensidade de ocorrências.

Fonte: preparado pelo Autor.

Quadro 3 Serviços de Provisão em Pontal do Paraná e Indicadores/Parâmetros para sua Mensuração

Serviços de Regulação Indicadores e/ou parâmetros


1. Pescado Volume de produção.
2. Frutos do mar Volume de produção.
3. Extrativo vegetal Volume de extração.
4. Agrícola Volume de produção.
5. Pecuário Volume de produção.
6. Madeira Volume de produção.
7. Recursos hídricos Disponibilidade hídrica.
8. Recursos genéticos Índice de biodiversidade.
9. Recursos medicinais Informações sobre usos medicinais.
10. Modelos e organismos de ensaio Informações sobre pesquisas realizadas.
11. Recursos ornamentais Volume de produção.
12. Energia Potencial energético.
Fonte: preparado pelo Autor.

Quadro 4 Serviços Socioculturais em Pontal do Paraná e Indicadores/Parâmetros para sua Mensuração

Serviços de Regulação Indicadores e/ou parâmetros


1. Beleza cênica Número de paisagens conhecidas; fluxo de turistas.
2. Apreciação estética Número de paisagens conhecidas; fluxo de turistas.
3. Tranquilidade Turismo de casais ou individual.

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Serviços de Regulação Indicadores e/ou parâmetros


4. Recreação e turismo Fluxo de turistas; gastos com turismo .
5. Patrimônio cultural Revisão da literatura e informações locais.
6. Inspiração artística Obras artísticas.
7. Inspiração religiosa e espiritual Uso religioso; informações locais.
8. Desenvolvimento cognitivo Excursões de educação ambiental.
9. Uso científico Pesquisa realizadas na região.
Fonte: preparado pelo Autor.

As informações apresentadas nos Quadros de 1 a 4 revelam que


o ambiente natural de Pontal do Paraná é responsável pelo provi-
mento de mais de duas dezenas de SE’s, que ultrapassam a fron-
teira local, alcançando a escala regional, nacional e mesmo global.
Agora, qual a sua contribuição econômica para a sociedade?

Valoração Econômica dos Serviços Ecossistêmicos


Os resultados da valoração econômica dos benefícios providos
pelos ecossistemas de Pontal do Paraná foram organizados em gru-
pos, na tentativa de facilitar a sua leitura conforme segue abaixo.
a)Serviços de provisão agropecuária: inclui os serviços de pro-
visão agropecuária (agrícola e pecuária), silvícola e aquícola. A va-
loração foi realizada com base nos dados do valor bruto da produ-
ção publicados pelo IBGE (2018) em 2016. Os resultados indicam
um provimento de R$ 9,3 milhões em 2016, distribuídos em: pecuá-
ria R$ 8,6 milhões; florestal R$ 45 mil; agrícola R$ 633 mil.

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b)Exploração mineral: a região é fonte para extração de recur-


sos minerais, em especial areia, responsável pela geração de uma
compensação financeira de R$ 18.871 em 2016. A extração de mine-
rais não-metálicos gerou um valor de R$ 89 mil em 2015 (Ipardes,
2018). No entanto, esse benefício é resultado da depleção do esto-
que mineral, portanto, a atividade não é sustentável. Desse modo,
esses resultados devem ser avaliados com prudência. O interessan-
te seria avaliar os custos sociais e ecológicos vinculados à obtenção
deste benefício. Apesar disso, representa um benefício econômico
obtido do ecossistema de Pontal do Paraná .
c)Recursos hídricos (água): os ecossistemas contribuem para
o provimento de água potável, distribuída pela Companhia Para-
naense de Saneamento (Sanepar) para mais de 27,7 mil unidades
consumidoras, totalizando 2.344.462 m³ em 2016, apesar de o volu-
me faturado pela Sanepar ter sido de 4.036.804 m³ (Ipardes, 2018).
A diferença entre o volume de água medido e faturado decorre das
perdas do sistema e da taxa mínima de consumo fixada em 10 m³/
mês56. O Índice de Perdas do Sistema foi estimado em 33,4% (per-
das na distribuição e lineares) em 2015 (SNIS, 2018). A receita ope-
racional direta referente apenas aos serviços prestados de captação,
tratamento e distribuição foi estimada em R$ 15.135.284 em 2015
(SNIS, 2018)57. A captação da água no ecossistema não é remunera-
da em Pontal do Paraná , portanto, a água para consumo humano é

56.  Em 2017, a taxa mínima de consumo foi alterada para 5 m³/mês.


57.  Não inclui os custos dos investimentos na construção das Estações de Tratamento de Água
– ETA’s.

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

um bem gratuito entregue pelo ecossistema à população. Supondo


ausência de provimento local de água, a população teria que bus-
car um substituto, que poderia ser a “produção artificial” de água
potável a partir da dessalinização água do mar (Ambiente Brasil,
2015). Essa alternativa tem sido considerada no Brasil como substi-
tuta da água natural em função da recente crise hídrica (Venceslau;
Chapola, 2015; Rodrigues; Brenha, 2014), e usada em muitos países
como substituta à agua natural (Revista em Discussão, 2014). O Pro-
fessor Kepler Borges França, coordenador do Laboratório de Refe-
rência em Dessalinização (Labdes), estima que o custo para dessa-
linizar a água do mar esteja entre R$ 1,50 e R$ 2,00 no Brasil (Revista
em Discussão, 2014). Desse modo, considerando o custo médio de
R$ 1,75 (média entre R$ 1,50 e R$ 2,00), sem os custos de distribui-
ção e de implantação das unidades de produção de água, porque
poderia ser usado o sistema já existente, o valor total da água po-
tável natural provida pelo ecossistema seria de R$ 7.064.407 para o
volume faturado e para o medido e de R$ 4.102.808.
d)Esgotamento sanitário: a capacidade de assimilação de re-
jeitos ou resíduos é outro serviço provido gratuitamente pelo ecos-
sistema. É preciso considerar que o lançamento de rejeitos acima
da capacidade natural de assimilação – capacidade de suporte dos
ecossistemas – pode resultar na degradação do ecossistema recep-
tor. Em função das dificuldades metodológicas, ausências de dados
e do objetivo deste estudo, a análise da capacidade natural de assi-
milação do ecossistema não foi realizada. A população de Pontal do
Paraná tem se beneficiado desse serviço ao lançar esgotamento sa-

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nitário direto no ambiente natural ainda sem grandes repercussões


sobre a qualidade ambiental. Embora 27.661 unidades sejam aten-
didas pelo abastecimento de água da Sanepar, apenas 8.728 eram
atendidas pelo sistema de esgotamento sanitário em 2016, déficit
de 18.933 (Ipardes, 2018), representa um Índice de Coleta de Esgo-
to de 32%. Isto significa que o ambiente natural estaria recebendo
o esgoto de quase 19 mil unidades. Os dados SNIS (2018) informam
que a população atendida é da ordem de 19.530 pessoas, gerando
um volume coletado e tratado médio de 513.560 m³/ano, mas o fa-
turado é de 1.007.780 m³/ano, ao custo médio58 de R$ 2,52/m³. Com
base no volume médio anual de esgoto sanitário coletado estima-
do em 72,95 m³ e o número de unidades não atendidas pelo siste-
ma, estimou-se o volume de esgoto lançado diretamente no ecos-
sistema em 1.381.140 m³/ano. Como o custo médio é R$ 2,52/m³, o
serviço de assimilação seria de R$ 3.480.474. Considerando o volu-
me faturado, ou seja, o valor cobrado do cliente, esse montante al-
cança R$ 6.829.879. Cabe destacar que esse valor não inclui o custo
de implantação de novas ETE’s. Este valor representa um benefí-
cio para a sociedade, porque a população não usa o sistema da Sa-
nepar para disposição do esgoto, mas usa o serviço de assimilação
provido pelo ecossistema. Em outras palavras, a população subs-
titui o sistema artificial de coleta e tratamento do esgoto sanitário
oferecido pela Sanepar, pelo sistema natural.

58.  Não inclui os custos dos investimentos na construção das Estações de Tratamento de Esgo-
tos – ETE’s.

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e)Resíduos Sólidos Urbanos: o ecossistema também forne-


ce o serviço de assimilação para os resíduos sólidos59. Estima-se que
7.075 domicílios tenham acesso ao serviço de coleta dos resíduos sóli-
dos, déficit de 20.261 (Ipardes, 2018). O volume coletado é de 10.536 t/
ano, média de 1,49 t/domicílio/ano (SNIS, 2018; Ipardes, 2018). O cus-
to anual total de coleta é estimado em R$ 2.379.000, representa a des-
pesa total com serviços de manejo de resíduos sólidos urbanos (RSU)
referente à população urbana (SNIS, 2018), um custo médio anual por
domicílio de R$ 336, que não inclui o custo de implantação do aterro
sanitário. Assim, considerando o custo médio anual por domicílio e o
déficit de domicílios não atendidos tem-se o valor do serviço de assi-
milação natural estimado em R$ 6.812.851 por ano, não inclusos os cus-
tos de implantação de novos aterros sanitários. Novamente, este va-
lor representa um benefício, porque a população não usa o sistema de
aterro sanitário, mas usa o de assimilação provido pelo ecossistema.
f)Estoque de carbono na biomassa: o ecossistema também
provê o serviço de captura e armazenagem (sequestro) de carbo-
no na biomassa vegetal e no solo. Com auxílio do Carbon Model do
InVEST (Natural Capital Project, 2018), do mapa de uso e ocupa-
ção das terras (ITCG, 2015; SOS Mata Atlântica, 2015) (Figura 4) e
das estimativas do estoque de carbono por tipo de uso das terras60
foi possível estimar o estoque de carbono na biomassa e no solo em
4.699.612 toneladas de carbono.

59.  É preciso considerar as mesmas observações apresentadas na valoração dos serviços de assi-
milação do esgoto sanitário em termos da capacidade de suporte dos ecossistemas.
60.  Socher et al. (2008), Damasceno (2012); Britez et al. (2006), Dias et al. (2006), Pires et al.
(2006), Sharp et al. (2015).

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Figura 4 Uso e ocupação das terras em Pontal do Paraná : 2002¹

Fonte: Preparado pelo autor com base em ITCG (2015) e SOS Mata Atlântica (2015).
1 informação mais atualizada.

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Ao considerar uma taxa líquida média anual de captura e arma-


zenagem de carbono de 1% ao ano (Britez et al., 2006; Cardoso et al.,
2015; Brevilieri; Dieckow, 2015) sob manejo sustentável da cobertu-
ra vegetal, tem-se que o volume capturado e armazenado de carbo-
no é da ordem de 46.996 t/ano. Com base no preço médio de 2016 da
tonelada de carbono equivalente (tCO2e) no mercado voluntário de
US$ 3,8 na América Latina e Caribe (Ecosystem Marketplace, 2017)
têm-se um valor de US$ 17.858.525 (estoque) e US$ 178.584 (captura
anual). Este representa um importante benefício, porque ultrapassa
as fronteiras locais, uma vez que contribui para a mitigação das emis-
sões de gases de efeito estufa em escala global (IPCC, 2014).
g)Turismo : o ecossistema também é fonte de lazer, recreação e
turismo , que compreende o grupo de serviços culturais ou infor-
macionais (MEA, 2005). O setor de turismo em Pontal do Paraná é
composto por 131 estabelecimentos, empregando 483 pessoas, ren-
dimento mensal médio de R$ 1.428,29 (Ipardes, 2018). O rendimen-
to nominal total (massa salarial) do setor de turismo (RAIS) – total61
foi estimado em R$ 689.865 por mês em 2016, ou R$ 8.278.380 por
ano (Ipardes, 2018), não inclui os efeitos multiplicadores da renda
na economia local.
h)ICMS Ecológico: outro benefício econômico” obtido dos ecos-
sistemas é o ICMS (Imposto sobre Circulação de Bens e Serviços) Eco-
lógico 62, que em 2016, o montante de R$ 218,9 mil (IPARDES, 2018).

61.  Resultado do produto entre a remuneração média dos empregados em dezembro e o número
de empregos existentes no dia 31 do mesmo mês (Ipardes, 2018).
62.  A Lei do ICMS Ecológico ou Lei dos Royalties Ecológicos, Lei Complementar do estado do Pa-
raná nº 59, de 1º de outubro de 1991, dispõe sobre a repartição de 5% do ICMS aos municípios com

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Em síntese, os resultados mostram que apenas os SE’s identificados e


valorados, aportam à população de Pontal do Paraná ” o montante de R$
21,16 milhões/ano e um estoque de carbono de R$ 49,51 milhões (Tabela 2).

Tabela 2 Síntese dos Resultados da Valoração dos SE’s em Pontal


do Paraná (estimativa para 2016), em mil R$

Serviços Ecossistêmicos – SE’s Valor em mil R$


Pecuária 8.624
Agricultura 632
Florestal 45
Exploração mineral 89
Recursos hídricos 7.064
Esgotamento sanitário 6.829
Resíduos sólidos urbanos 6.812
Estoque de carbono¹ 62.326
Captura de carbono¹ 623
Turismo 8.278
ICMS Ecológico 219
Total do fluxo anual 39.215
Total do estoque 62.326
Total geral (estoque + fluxo anual) 101.541
Fonte: preparado pelo autor com base nos resultados.
1
convertido em R$ com base na taxa de câmbio comercial para compra Real (R$) /
Dólar Americano (US$) – média 2016 - estimada em R$ 3,49 (IpeaData, 2018).

Ressalta-se que a parcela dos SE’s providos pelo ambiente na-


tural – benefícios – de Pontal do Paraná , representava, em 2016, o

mananciais de abastecimento e unidades de conservação ambiental (Paraná, 1991).

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equivalente a 24% do seu Produto Interno Bruto (PIB). Cabe desta-


car que existem os valores não-monetários (sociais, culturais e eco-
lógicos), o que elevaria a importância do ambiente natural para o
bem-estar humano em todas as escalas espaciais, local, regional,
nacional e internacional. Contudo, essa avaliação foge ao escopo
deste trabalho.

DISCUSSÃO
A valoração dos benefícios aportados pela natureza à sociedade
pode subsidiar a tomada de decisão ao revelar a importância ecoló-
gica, social e econômica dos ecossistemas para o bem-estar huma-
no, em termos monetários ou não. Como o fluxo de SE’s depende
de ecossistemas saudáveis (Garcia, 2012), mudanças no uso e co-
bertura das terras podem afetar positiva e negativamente esse flu-
xo (Howarth; Farber, 2002). Nesse sentido, a valoração pode forne-
cer um indicativo do ganho ou da perda, em valores monetários ou
não, por exemplo, biofísicos, resultantes das mudanças ambientais
induzidas pela decisão dos agentes econômicos. Estes valores repre-
sentariam o custo de oportunidade de mudanças no uso e cobertura
das terras – tomada de decisão dos agentes econômicos –, elevando
assim o grau de prudência nas decisões dos agentes, revelando tam-
bém informação que tem amplamente negligenciada pela socieda-
de, como o custo do crescimento econômico (Andrade, 2010; Garcia,
2012). Desse modo, a valoração permite incluir na tomada de decisão
custos antes ignorados, tais como os sociais e ecológicos, que afetam
de maneira significativa o bem-estar da sociedade.

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Para Pontal do Paraná está previsto um amplo conjunto de em-


preendimentos portuários (Góes, 2014), os quais podem afetar de
maneira significativa e de forma irreversível a dinâmica socioe-
conômica e ambiental da região. Contudo, ainda não houve uma
mensuração dos impactos sinérgicos desses empreendimentos e
das suas consequências sociais e em termos do provimento de SE’s
para a população local, nem mesmo em outras escalas espaciais.
O que, em princípio, seria considerado como um ganho econômi-
co de curto prazo pode resultar, no longo prazo, em perdas irrever-
síveis dos serviços providos pelos ecossistemas existentes nesta re-
gião, caso o conjunto de empreendimentos previsto seja instalado.
Isto posto, sabe-se que o estabelecimento dos empreendimentos
impõe um custo social e ecológico à população do município, as-
sim, a questão que se coloca é: para a comunidade de Pontal do Pa-
raná , esse custo é maior que o potencial benefício econômico gera-
do pelos empreendimentos econômicos?
Além disso, existe um elevado número de domicílios residen-
ciais em Pontal do Paraná destinados ao uso ocasional, provavel-
mente para atividades de lazer e recreativas relacionadas com as
características naturais da região. Em 2010, existiam 27.336 domi-
cílios (IBGE, 2018), mas apenas 7.099 estavam ocupados, significa
que 20.237 estavam desocupados, deste total, 17.695 eram destina-
dos ao uso ocasional. Dessa maneira, a degradação do ambiente
natural não afetaria essa característica de local de veraneio da re-
gião? Como a degradação ambiental afetaria a qualidade de vida
da população? Contudo, a preservação dos remanescentes naturais

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pelo poder público e pela população local não representaria a pres-


tação de serviços ambientais à sociedade como um todo? O que
aconteceria com o potencial turístico do município, oferecido pe-
los seus 23 km de atributos naturais em bom estado de conserva-
ção e boa qualidade da água para o banho, pouco aproveitado até
o momento? Além disso, Pontal do Paraná é circundado por uni-
dades de conservação (UC’s) estaduais, o Parque e a Estação Eco-
lógica da Ilha do Mel e a Estação Ecológica do Guaraguaçu, e por
uma UC federal, o Parque Nacional Marinho de Currais, que, à ex-
ceção da Ilha do Mel, não são promovidos como destinos turísticos
e/ou educacionais, contribuindo também para o desenvolvimen-
to da região.
Nesse sentido, os resultados deste estudo podem revelar à popu-
lação de Pontal do Paraná , e a toda a sociedade, parcela do papel
dos ecossistemas para seu bem-estar na forma de benefícios eco-
nômicos. Além disso, as informações podem ser usadas para ava-
liar os potenciais efeitos das decisões econômicas que afetem o flu-
xo de SE’s a partir da criação de cenários – simulação para fins de
mediação de conflitos socioambientais, para educação ambiental,
entre outros. Por fim, estes resultados podem subsidiar a formu-
lação de políticas de desenvolvimento regional ou mesmo nacio-
nal, e ambientais mais adequadas à realidade da população local,
por considerar, na devida medida, as dimensões sociais, ecológi-
cas e econômicas envolvidas nas decisões dos agentes econômicos
e seus respectivos custos e benefícios. Esta mudança é necessária,

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porque os benefícios de grandes empreendimentos econômicos


podem ser nacionais, mas custos da instalação são locais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O reconhecimento da importância do ecossistema na qualida-
de de vida das pessoas tem aumentado no período recente, espe-
cialmente em função dos conceitos de SE’s e ambientais e do ca-
pital natural. Esses conceitos podem auxiliar em revelar o grau de
interdependência entre o subsistema socioeconômico e o sistema
natural. Sob essas bases, o presente estudo empreendeu uma va-
loração econômica de alguns SE’s providos pelos ecossistemas em
Pontal do Paraná à sociedade. Acontece que diante da realização
de alguns empreendimentos logísticos e industriais previstos para
a região de Pontal do Paraná , essas informações podem auxiliar na
tomada de decisão. Isto porque o debate a respeito da realização
desses empreendimentos tem ignorado o papel do ecossistema no
provimento de bem-estar humano, e mesmo econômico.
Nesse sentido, a valoração dos recursos naturais poderia prover
informações mais adequadas sobre o custo de oportunidade da de-
gradação ambiental associado às mudanças no uso e ocupação das
terras na região. A realização dos empreendimentos acarretará na
supressão da cobertura vegetal e no aumento da geração de resí-
duos em Pontal do Paraná , os quais podem comprometer a capa-
cidade de provimento local dos SE’s essenciais para a comunida-
de local. Assim, as estimativas do valor monetário dos SE’s providos
em escala local e regional, como o realizado nesse estudo, podem

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contribuir para elevar o grau de informação dos agentes econômi-


cos e da sociedade em geral, especialmente da comunidade local,
em termos da contribuição do ecossistema local para seu bem-es-
tar. Este estudo estimou que parcela dos SE’s providos localmente
podem representar 24% do PIB de Pontal do Paraná , em 2016. Des-
se modo, qualquer alteração na dinâmica ecológica dos ecossiste-
mas pode afetar negativamente o grau de bem-estar da comunida-
de, fortemente dependente dos recursos naturais.
Entretanto, outros estudos relacionados à valoração devem ser
realizados com objetivo de agregar informações mais completas e
contribuir para responder as seguintes questões: Quais os impactos
no bem-estar humano causados pela degradação de áreas naturais
no fluxo dos SE’s com a realização dos empreendimentos previs-
tos? Os benefícios econômicos de um empreendimento econômi-
co são superiores aos seus custos ecológicos e sociais? São questões
complexas e que devem ser avaliadas levando em conta as riquezas
do patrimônio natural da região, seus aspectos culturais e a manu-
tenção dos SE’s. Para isso, seria necessário empreender um estudo
de valoração não-econômica, que contemple os valores sociocultu-
rais e ecológicos dos ecossistemas.

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AS POLÍTICAS PÚBLICAS E O SERVIÇO DE


MONITORAMENTO DO DESENVOLVIMENTO
INFANTIL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA EM SAÚDE EM
PONTAL DO PARANÁ , PARANÁ

Bruna Letícia dos Santos


Tainara Piontkoski Maldaner
Luciana Vieira Castilho Weinert
Wagner Rodrigo Weinert

INTRODUÇÃO
O campo de Desenvolvimento Humano (DH) atém-se ao estudo
das mudanças e transformações que ocorrem ao longo do ciclo vi-
tal, de forma contínua e sequencial. Estas mudanças são mais evi-
dentes na infância, porém ocorrem durante toda a vida. Trata-se de
uma construção em que cada indivíduo se desenvolve a partir de
inúmeros fatores que se vinculam ao tempo, ao contexto e ao pro-
cesso vivenciado (PAPALIA, OLDS E FELDMAN, 2013).
Pondera-se que pessoas com plenas capacidades e potencia-
lidades são também agentes promotores do desenvolvimento do
ambiente e da sociedade que compõem (GADELHA et al., 2011), o
que os tornam agentes de mudanças e transformação de sua pró-
pria história. A necessidade de se compreender as questões de de-
senvolvimento desde a infância atém-se ao fato de que este é um

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período crucial para o projeto de desenvolvimento de uma nação,


haja vista sua peculiaridade de representação do futuro e de cons-
trução de sociedades saudáveis e autônomas.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) enfatiza a importância
do DH durante a primeira infância, pois esta etapa determina de
forma decisiva as oportunidades na vida, as boas condições de saú-
de e sua interferência direta na aquisição de competências, educa-
ção e oportunidades de trabalho. Estima-se que aproximadamente
200 milhões de crianças menores de cinco anos em todo o mundo
não conseguem atingir seu potencial de desenvolvimento. Acredi-
ta-se que programas de avaliação e estimulação infantil são basi-
lares no processo de mitigação das desigualdades socioeconômi-
cas, pois a saúde de um indivíduo em cada fase de sua vida afetará
a saúde nas fases seguintes, com efeitos cumulativos para as ge-
rações seguintes (ENGLE et al., 2007; GRANTHAM-MCGREGOR et
al., 2007; WALKER et al., 2015; HARTINGER et al., 2017; LU, BLACK
e RICHTER, 2016). Crianças menores de cinco anos também se en-
contram no topo da lista dos principais usuários dos serviços de
saúde nos países em desenvolvimento. Atribui-se esta caracterís-
tica ao fato de que este grupo populacional é o primeiro a sofrer
o impacto de qualquer mudança na comunidade. Assim, seus pa-
drões de adoecimento e morte são amplamente utilizados como re-
ferência da qualidade de vida de toda a população (KERR-PONTES
e ROUQUAYROL, 2003; CESAR et al., 2006).
A avaliação do neurodesenvolvimento durante a primeira infân-
cia permite identificar aquelas crianças com maior risco de altera-

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ções em seu desenvolvimento, e é, portanto, vital para intervenção


precoce e orientação aos pais, para evitar que prejuízos se esten-
dam até a fase adulta (SPITTLE et al. 2016; WILLRICH, AZEVEDO
e FERNANDES, 2009). Atualmente, vislumbra-se um mundo onde
crianças possam prosperar em todos os domínios do desenvolvi-
mento, através de diversas estratégias, o que evidencia que a saúde
se insere no contexto das políticas de desenvolvimento. No entan-
to, as políticas de atenção à saúde de crianças devem considerar as
mais diferentes esferas da vida humana, e não aquela que diz res-
peito somente ao ponto de vista da saúde . A atual realidade sani-
tária brasileira é composta por progressos consideráveis nas con-
dições de saúde infantil. Todavia, ainda existem desafios no que
tange às condições de pré-natal, perinatal e pós-natal, bem como
na atenção à primeira infância (OLIVEIRA et al., 2008; PAIM et al.,
2011; VICTORA et al., 2011).
A atenção e cuidado integrais à saúde na infância pressupõem
um efeito benéfico e exponencial a longo prazo. O conhecimento
da realidade e das peculiaridades de um território torna-se essen-
cial para fundamentar estratégias de ação e a implantação de Polí-
ticas Públicas (PPs) conexas à sua realidade, especialmente aquelas
relacionadas à realidade da saúde e desenvolvimento infantil e seus
condicionantes. Diante do exposto, explana-se sobre as principais
PPs relacionadas à infância e, em seguida, apresenta-se a descrição
do processo de implantação de um Serviço de Monitoramento do
Desenvolvimento Infantil na Atenção Primária em Saúde (APS) no
território de Pontal do Paraná , município do litoral paranaense.

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POLÍTICAS PÚBLICAS E INFÂNCIA


O desenvolvimento pleno da criança requer ideais condições de
saúde , nutrição, segurança, amor e aprendizado (PERSSON, 2017).
Ao longo da última década, a prioridade global para o desenvolvi-
mento das crianças elevou-se. Atualmente, o governo, a população
e profissionais de várias áreas observam a importância de progra-
mas, projetos, pesquisas - em especial PPs - que favoreçam a me-
lhora da qualidade de vida e que defendam a dignidade do ser,
principalmente em relação à educação e à saúde (STEDILE et al.,
2015). Portanto, este campo torna-se holístico, onde o todo é muito
mais importante que a soma das partes, indivíduos, instituições e
interesses (SOUZA, 2006). Nesse sentido, pesquisadores da área da
saúde se preocupam com questões inerentes ás políticas que cer-
cam a saúde das populações.
A conceituação do termo PPs é ao mesmo tempo simples e com-
plexa, e sofre variações a partir da ótica dos diferentes autores (HO-
WLETT e RAMESH, 2013). Dentre as múltiplas definições existentes
na literatura destaca-se a de Laswell (1936), ao afirmar que decisões
sobre PPs implicam em responder às questões: quem ganha o que,
por quê e que diferença faz (SOUZA, 2006). As políticas de saúde
são estratégias oficiais organizadas em ações setoriais desempe-
nhadas de acordo com normas legalmente construídas, com foco
na qualidade de vida da população. A OMS afirma que: “a política
de saúde é frequentemente estabelecida por meio de leis e outras
formas de normatização que definem as regras e incentivos que

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orientam a provisão de serviços e programas de saúde , assim como


o acesso a esses” (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1998, p.10).
É necessário entender que, para além dos processos políticos e
institucionais da arena da saúde , há questões maiores relacionadas
a qualquer política , seja ela social, econômica ou ambiental. As po-
líticas de saúde interferem não apenas em questões de saúde (or-
ganização, gestão, relações institucionais e políticas), mas existem
outros impactos sociais implícitos.
Por isso, no âmbito das políticas de saúde , considera-se saú-
de como um dos direitos inerentes à condição de cidadania, pois
a plena participação dos indivíduos na sociedade política se reali-
za a partir de sua inserção como cidadãos. Nesse cenário, trata-se a
política de saúde como uma política social, ou seja, que está vol-
tada para a reprodução dos indivíduos e das coletividades; para o
bem-estar e a proteção social dos cidadãos. Esta abordagem expli-
cita que a política de saúde está sujeita a múltiplos determinan-
tes. Neste caso, como política social, envolve aspectos políticos,
sociais, econômicos, institucionais, estratégicos, ideológicos, teóri-
cos, técnicos, culturais, dentre outros (FLEURY e OUVERNEY, 2012).
Paim e Teixeira (2006) também conceituam as políticas de saúde :

“entende-se como política de saúde a respos-


ta social de uma organização diante das condi-
ções de saúde dos indivíduos e das populações
e seus determinantes, bem como em relação à
produção, distribuição, gestão e regulação dos
bens e serviços que afetam a saúde humana e o
ambiente” (PAIM e TEIXEIRA, 2006, p.74).

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

A saúde da criança é um tema especial para as PPs, uma vez que


estas não possuem capacidade de representação própria. Assim, não
formam movimentos sociais em busca de políticas ou reagem às su-
gestões do poder público, pois constituem um grupo que depende da
atuação de outros para a busca de seus direitos (OLIVEIRA, 2015).
No entanto, as crianças receberam a atenção dos governantes ao
longo da história do Brasil, e a quantidade de iniciativas aumenta
com o passar dos anos. O Quadro 1 sintetiza os principais progra-
mas, políticas e estratégias adotadas no Brasil com relação à Saúde
da Criança a partir da década de 40, com a criação do Departamen-
to Nacional da Criança (ARAÚJO et al., 2014; BRASIL, 2011; WIEC-
ZORKIEVICZ e MILANI, 2013).
Em um passado mais recente, as iniciativas visavam a redução
da mortalidade infantil. No entanto, a preocupação com a criança
se ampliou, pois não basta reduzir a mortalidade infantil, é preci-
so efetivar ações em prol do seu desenvolvimento com qualidade
de vida (ERDMAN e SOUZA, 2009; FROTA et al., 2010). No entanto,
entende-se que enquanto se trata a criança de forma fragmentada,
sem articulação entre as esferas que a acompanham, o seu amadu-
recimento será dificultado. Portanto, para um efetivo acompanha-
mento deste período, houve a necessidade de integrar os três níveis
de atenção e as diversas redes de atenção à saúde , além de siste-
matizar e articular as diferentes ações, programas e políticas exis-
tentes no campo de saúde da criança no país. Isto fez com que em
5 de agosto de 2015, através da Portaria GM 1.130, surgisse a Política
Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (PNAISC).

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Quadro 1 Principais Programas, Políticas e Estratégias brasileiras com vistas à saúde da criança

Ano Sigla Programa/Política /Estratégia


1940 DNRC Departamento Nacional da Criança
1942 SAM Serviço de Assistência ao menor
1970 CPMI Coordenação de Proteção Materno-Infantil
1974 - Programa Nacional de Saúde Materno-Infantil
1975 - Plano de Nutrição e Saúde
1976 DINSAMI Divisão Nacional de Saúde Materno-Infantil
1979 PRONAM Programa Nacional de Alimentação
1981 PNIAM Programa Nacional de Incentivo ao Aleitamento Materno
1983 PAISMC Programa de Assistência Integral à Saúde a Mulher e da Criança
1990 CORSAMI Coordenação de Saúde Materno-Infantil
1990 ECA Estatuto da Criança e do Adolescente
1991 PROASP Programa de Assistência à Saúde Perinatal
1996 AIDPI Atenção Integrada ás Doenças Prevalentes da Infância
1998 ATSCAL Área Técnica de Saúde da Criança e Aleitamento Materno
2000 - Norma de Atenção Humanizada ao Recém-nascido de Baixo
Peso – O Método Canguru
2000 PHPN Programa Nacional de Atenção Humanizada do pré-natal e nas-
cimento
2004 - Agenda de Compromissos para a Saúde Integral da Criança e
Redução da Mortalidade Infantil
2008 - Rede Amamenta Brasil
2008 - Pacto pela Vida
2009 EBBS Estratégia Brasileirinhos e Brasileirinhas Saudáveis
2011 - Rede Cegonha
2013 AAB / EAAB Estratégia Amamenta e Alimenta Brasil
2015 PNAISC Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança
Fonte: Os autores (2017).

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A PNAISC reúne um conjunto de ações programáticas e estraté-


gias para o desenvolvimento da criança em todas as etapas do ciclo
de vida, somando-se às iniciativas e diretrizes das PPs universais
desenvolvidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Sua organiza-
ção ocorre a partir das Redes de Atenção à Saúde (RAS) e de seus
eixos estratégicos, na qual a Atenção Primária à Saúde (APS) con-
figura-se como coordenadora do cuidado à criança e ponto central
desse processo (BRASIL, 2015).
Enfatiza-se que a atenção integral à saúde da criança é resul-
tante da articulação da PNAISC com as demais políticas de saú-
de , sociais e de educação, da assistência social e de investimentos
econômicos e sociais. Além disso, conta com a contribuição e o en-
volvimento de trabalhadores, famílias, cuidadores, gestores, das re-
des sociais, conselhos de direitos e de proteção, ratificando assim a
importância da participação da sociedade, em instâncias delibera-
tivas, nas três esferas de governo (BRASIL, 2015).

DESENVOLVIMENTO, SUSTENTABILIDADE E INFÂNCIA


O termo desenvolvimento se refere ao processo de ampliação
das liberdades das pessoas, com relação às suas capacidades e às
oportunidades a seu dispor, para que elas escolham a vida que de-
sejam ter (MALIK, 2014; SEN, 2010). Isto inclui as dinâmicas sociais,
econômicas, políticas e ambientais necessárias para garantir uma
variedade de oportunidades, bem como o ambiente propício para
que cada uma exerça, na plenitude, seu potencial.

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Nas últimas décadas ampliou-se os debates acerca do sentido


atribuído ao conceito do Desenvolvimento Territorial Sustentável
(DTS), que assumiu múltiplos significados ao longo do tempo. Sua
emergência, mais do que trazer à tona um “novo sentido” ao termo,
exprime a complexificação do debate epistemológico no campo de
estudos sobre desenvolvimento. Com o Relatório de Brundtland de
1987 se consagrou a definição de Desenvolvimento Sustentável que
pode se resumir na seguinte sentença: atender às necessidades do
presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de
satisfazer suas próprias necessidades (WCED, 1987).
A infância faz parte do projeto de desenvolvimento de uma na-
ção por sua capacidade de influenciar em seu futuro. Dessa forma,
o conjunto de ações, programas e políticas nas mais diversas instân-
cias, que compõe as necessidades humanas básicas, como a educa-
ção, o lazer, a segurança alimentar e a saúde garante o crescimento
das crianças, e as forma como cidadãos plenos de potencialidades.
Nesse sentido, pensa-se que o desenvolvimento adequado das
capacidades na infância propicia benefícios ao longo da vida do in-
divíduo (BRITTO et al., 2017; MARTORELL et al., 2010). As habili-
dades que se adquire nos primeiros anos de vida são a base para a
interação com o ambiente e resultarão em um aprendizado esco-
lar e um desenvolvimento cognitivo eficiente (BLACK et al., 2016;
WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2008). Sabe se que a capacida-
de individual para lidar com as questões de vida e de autonomia se
vincula às experiências obtidas neste período. Por isso, os cuida-
dos com a criança são fundamentais, e além disto, do ponto de vista

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do DH, esta é uma das fases de maior vulnerabilidade (PENELLO,


2016; DIAMENT, CYPEL e REED, 2010).
O setor da saúde apoia a infância de maneira mais imediata, pelo
extenso contato com gestantes, famílias e crianças (RICHTER et al.,
2016). Entretanto, entende-se que a saúde é um objeto complexo,
e por isso requer um instrumental teórico não mais referenciado à
epistemologia positivista e analítica. Ela deve partir de uma perspec-
tiva totalizante, e, portanto, transdisciplinar (BATISTELLA, 2007).
Sob esta mesma ótica, a OMS apresentou em 2017 dois novos rela-
tórios intitulados “Herdando um mundo sustentável: Atlas da saúde
e do ambiente da criança” e “Não poluir o meu futuro! O impacto do
ambiente na saúde das crianças”. Estes documentos comprovam que
mais de 1 em cada 4 mortes de crianças menores de 5 anos de idade
são atribuíveis a ambientes insalubres, o que corresponde a 1,7 mi-
lhão de crianças por ano. Boa parte das causas mais comuns de mor-
tes entre crianças nesta faixa etária são evitáveis, com a articulação
de diversos setores não governamentais. A saúde , por exemplo, pode
monitorar seus resultados e realizar educação e prevenção ambien-
tal (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2017a, 2017b).
Considera-se que investimentos substanciais no desenvolvi-
mento das crianças são a base para o desenvolvimento sustentável
nos próximos anos (RICHTER et al., 2016; PERSSON, 2017). Entre-
tanto, apesar do progresso, o desenvolvimento na infância continua
a ser uma questão negligenciada, particularmente em países de
baixa renda. Por ser uma questão intersetorial – que inclui saúde ,

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educação, nutrição, bem-estar social e proteção – fato que torna es-


ses desafios particularmente difíceis (SHAWAR e SHIFFMAN, 2017).
Em suma, parte-se do pressuposto que, para que uma popula-
ção tenha atores sociais engajados na causa do desenvolvimento
infantil, humano e sustentável, estes indivíduos necessitam estar
saudáveis, e este processo se inicia e tem grande intensidade na in-
fância. Portanto, cabem estudos que discutam as relações entre as
diversas facetas que abordam esta questão.

DESENVOLVIMENTO DA MOTRICIDADE NA CRIANÇA


A infância corresponde ao período que se inicia com nascimento
e se encerra na puberdade (PAPALIA, OLDS e FELDMAN, 2006; AN-
DRADE, 2010). Este período é crucial para o desenvolvimento saudá-
vel, do ponto de vista físico, emocional ou mental, pois nele apren-
dem-se muitas habilidades sociais e humanas necessárias, além do
intenso desenvolvimento do sistema nervoso (SACHS, 2015).
Os seres humanos possuem a capacidade de interagir com o
ambiente por meio dos movimentos. Assim, o Desenvolvimento
Motor (DM) refere-se ao movimento como um processo contínuo
e sequencial, associado à idade e que possibilita a interação com o
meio que nos cerca. Assim, o DH sofre influência de fatores intrín-
secos ao indivíduo (maturação biológica, capacidade física, cresci-
mento), fatores relacionados ao ambiente (sociocultural, espacial)
e também as tarefas (objetivos, regras, material disponível) (GAL-
LAHUE, OZMUN 2005; NEWELL, 1991).

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Na infância, o DM se caracteriza pela infinita gama de habilida-


des motoras que possibilitam a criança um domínio do seu corpo
em diferentes posturas e as mais variadas formas de locomoção e
manipulação de objetos. Estas habilidades compõem a motricidade
ampla e são essenciais para que a criança evolua e adquira habilida-
des mais especializadas, ou seja, para que desenvolva a motricidade
fina, a fala, e a escrita (HAYWOOD e GETCHELL, 2016; CORDAZZO
e VIEIRA, 2007). Este período é importante para o desenvolvimen-
to integral, tendo em vista que nele a criança adquire grandes sal-
tos evolutivos em um curto período de tempo, e define seus padrões
pessoais de vivência e convívio social (MANCINI et al., 2004).
O acompanhamento do crescimento e desenvolvimento infantil
consiste em uma das mais importantes estratégias básicas de saúde
no Brasil, que deve ocorrer desde a concepção e prosseguir, ao me-
nos, durante o primeiro ano de vida da criança (SILVA et al., 2013).
Neste primeiro ano, ocorrem os maiores as mais importantes mo-
dificações no que diz respeito ao desenvolvimento da criança. Es-
tes progressos obedecem a uma sequência ordenada, contudo, existe
uma considerável variabilidade individual, pois cada um apresenta
seu padrão característico de desenvolvimento e que sofre influência
de inúmeros fatores (RATLIFFE e GHERPELLI, 2012). Este padrão de
Desenvolvimento Motor Típico (DMT) serve como guia e parâmetro
para identificação de instabilidades que possam acarretar distúrbios
permanentes no desenvolvimento ao longo da vida (CASTILHO-
-WEINERT e LOPES, 2010). O Quadro 2 fornece as principais aquisi-
ções motoras evolutivas do DMT ao longo do primeiro ano de vida.

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Quadro 2 Habilidades motoras do DMT de 1 a 12 meses

Mês Habilidades Motoras


Reflexos primitivos, sem movimentação voluntária; postura em flexão fisiológi-
1 Mês
ca; cabeça lateralizada
Diminuição da flexão e aumento da extensão; Início da movimentação voluntá-
2 meses
ria e reação contra gravidade
Controle cervical; maior coordenação de movimentos; simetria corporal; dimi-
3 Meses
nuição dos reflexos primitivos; início das reações de retificação corporal
Preensão coordenada e controle viso-ocular; incremento de outras reações de
4 Meses
retificação; controle cervical sobre o tronco
Rolamento de decúbito ventral para lateral; maior controle cervical e de tronco;
5 Meses
suporte do peso corporal sobre os pés; início das reações de equilíbrio
Posição sentado com apoio (instabilidade de tronco); reação de proteção para
6 Meses
frente
Posição sentado sem apoio e com manipulação de objetos; apresenta menos re-
7 Meses
flexos e reações; realização de impulsos para frente
Passa da posição sentada para a posição quadrúpede; reação de proteção para
8 Meses
os lados; ajoelhado ou semi-ajoelhado com apoio
9 Meses Engatinha
Desaparecimento do reflexo de preensão plantar; reação de proteção para trás;
10 Meses
desenvolvimento da marcha lateral

Em pé sem apoio; coloca-se e retira-se da posição quadrúpede; inicia os primei-


11 Meses
ros passos
Marcha independe com braços levantados e base larga; equilíbrio precário; iní-
12 Meses
cio da motricidade fina

Fonte: Adaptado de Castilho-Weinert e Forti-Bellani (2011).

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As habilidades adquiridas no primeiro ano de vida serão as ba-


ses para a interação com o ambiente e resultarão em um aprendiza-
do escolar e um desenvolvimento cognitivo eficiente. Especialmen-
te nos primeiros 12 meses de vida, o sistema nervoso se desenvolve
mais rapidamente do que em qualquer outra fase do ciclo vital.
(SILVEIRA, 2012). Os eventos que acontecem neste nível são in-
terdependentes, e pequenas perturbações nestes processos cau-
sam consequências a longo prazo sobre as capacidades da criança
(THOMPSON e NELSON, 2001). Ou seja, dificuldades na aquisição
das habilidades motoras voluntárias básicas no primeiro ano de
vida podem produzir efeitos negativos nos demais domínios do de-
senvolvimento global infantil, como aprendizagem escolar e inte-
ração social (FORMIGA, CEZAR E LINHARES, 2010; SPITTLE et al.,
2009; VALENTINI, 2002).
Um déficit cognitivo ou mesmo um distúrbio psicoafetivo po-
dem repercutir no comportamento motor da criança, causando
atraso no alcance dos marcos motores ou comprometimento da
qualidade dos movimentos. Assim, nas avaliações do desenvolvi-
mento, os comportamentos das crianças revelam não somente a
função motora pura e simples, mas sim simultaneamente as mani-
festações das áreas cognitivas, psicoafetiva, visual, auditiva e de lin-
guagem (HASSANO, 2011), as quais influenciam na saúde global e
na capacidade individual de gerar desenvolvimento.
Além disso, a identificação de instabilidades no comportamen-
to motor, oriundas da infância, após a idade adulta torna-se difí-

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cil, visto que longos períodos podem se passar entre a ocorrência


de um comportamento e outro. Este fato reitera que momentos crí-
ticos durante o processo de desenvolvimento são detectados com
mais facilidade na infância (SANTOS, DANTAS e OLIVEIRA, 2004).

SERVIÇO DE MONITORAMENTO DO DESENVOLVIMENTO


INFANTIL
Um serviço de puericultura tem como prioridade oferecer pro-
moção de saúde a crianças de 0 a 5 anos de idade (BONILHA e
RIVOREDO, 2005). A qualidade deste serviço está diretamente
relacionada com a participação de uma equipe de trabalho inter-
disciplinar e da implementação das PPs pertinentes.
Através do Programa de Puericultura do município de Pontal do
Paraná , investigam-se crianças de ambos os sexos, residentes nes-
te município, na faixa etária entre 1 e 12 meses de vida, atendidas na
Unidade de Saúde da Mulher e da Criança, cujo protocolo de pes-
quisa possui apreciação e aprovação ética para sua execução (Co-
mitê de Ética do Setor de Ciências da Saúde da Universidade Fede-
ral do Paraná - CAAE n.º 21001613.9.0000.0102).
Os bebês nascidos neste município passam por uma rede de cui-
dados que se estende durante o primeiro ano de vida e que incluem
os serviços de enfermagem, odontologia, fisioterapia e medicina
pediátrica. Durante a consulta de enfermagem, coletam-se medi-
das antropométricas como peso, comprimento e perímetro cefálico
do bebê, referentes a data da avaliação. Posteriormente, realiza-se
a consulta com o médico pediatra para análise do estado de saú-

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de geral e do crescimento e desenvolvimento no último período.


Segue-se então com a avaliação ondontológica em que se realiza
orientações sobre higiene oral. Por fim, realiza-se a avaliação fisio-
terapêutica, que se inicia com a obtenção de dados de anamne-
se, perfil socioeconômico e da gestação, através de um questioná-
rio aplicado aos pais e/ou responsáveis pelas crianças. E finaliza-se
com a avaliação da condição motora da criança naquele momento.
O questionário realizado durante a avaliação fisioterapêutica
contém diversas informações importantes para traçar o perfil das
condições sociais, ambientais, econômicas e, consequentemente,
de saúde da população deste território (Quadro 3).

Quadro 3 Informações contidas no questionário

Sexo; Peso; comprimento; perímetro cefálico; idade ges-


Dados do Nascimento
tacional; tipo de parto; parto hospitalar; notas de Apgar
Dados de Saúde do Bebê Internamentos (UTI); icterícia; amamentação; intercorrências
Peso atual; comprimento atual; perímetro cefálico atual; ama-
Dados Atuais do Bebê
mentação; calendário de vacinas
Idade materna; número de gestações; intercorrências gesta-
Dados Maternos e Gestacionais cionais; hábitos alimentares; número de consulta no pré-na-
tal; escolaridade
Renda familiar; nº residentes no domicílio; utilização de auxí-
Dados Socioeconômicos
lios sociais
Dados Ambientais Acesso a água encanada e esgoto

Fonte: Os autores (2017).

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Durante a avaliação motora se utiliza um instrumento para ava-


liação psicomotora que analisa cinco grupos de características ou
dimensões relativas ao DM: reflexos, reações, planos de movimen-
to, padrões de movimento e habilidades motoras voluntárias (Qua-
dro 4). A partir deste instrumento, elaborou-se fichas de avaliação
com os itens pertinentes a cada mês, no intervalo entre 1 e 12 meses.
A presença ou ausência de cada característica mencionada no
Quadro 4 varia de acordo com a faixa etária da criança, ou seja,
mensalmente. Tais ocorrências permitem um parecer final sobre se
este desenvolvimento está adequado (típico) ou com algum nível
de atraso. Logo após a avaliação do bebê, seus pais ou responsáveis
recebem este parecer, bem como são orientados sobre condutas de
estimulação precoce que devem ser realizadas em domicílio afim
de contribuir com o adequado de desenvolvimento do bebê, e que
também se modificam de acordo com o nível de desenvolvimen-
to do mesmo e com a sua faixa etária. Nos casos de identificação de
atrasos, são realizados os encaminhamentos, orientações e acom-
panhamento pertinentes a cada caso.
Após o processo de avaliação, os dados de todas as avaliações
motoras e questionários são tabulados em um banco de dados de-
senvolvido especificamente para este propósito e que permite a ca-
racterização da população segundo os dados da anamnese, de saú-
de gestacional e socioeconômicos e verifica-se a presença ou não
presença de atraso no DM. Tal processo permite o estabelecimento
do perfil de desenvolvimento da população pesquisada.

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Quadro 4 Características avaliadas em cada dimensão do DM

DIMENSÃO DO DM CARACTERÍSTICA AVALIADA


Colocação do membro inferior
Galant
Liberação das vias aéreas
Marcha automática
Moro
Reflexos Preensão tônica palmar
Preensão tônica plantar
Sucção
Sustentação de peso
Tônico cervical assimétrico
Quatro pontos cardeais
Cervical de retificação
Corporal de retificação
De anfíbio
Reações De landau
De proteção para frente
De proteção para os lados
De proteção para trás
Óptica de retificação
Labiríntica de retificação
Sagital
Planos de Movimentação Frontal
Transverso

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DIMENSÃO DO DM CARACTERÍSTICA AVALIADA


Cabeça lateralizada
Posição flexão fisiológica
Decúbito dorsal
Decúbito lateral
Padrões de Movimentação Decúbito ventral
Posição em pé
Posição gatas
Posição semi-ajoelhado e ajoelhado
Sentado com apoio
Sentado em long-sitting
Controle de cabeça
Simetria
Controle de tronco superior
Controle de tronco inferior
Habilidades Motoras Voluntárias Puppy
Preensão
Ponte
Pivotear
Rolar em bloco
Rolar dissociado
Colocar pé na boca
Engatinhar
Kiking
Marcha lateral e independente

Salienta-se que todas as crianças usuárias do Sistema Único


de Saúde , possuem acesso a este acompanhamento, cuja agenda

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ocorre segundo a recomendação da PNAISC (2015) que durante o


primeiro ano de vida prevê consultas de puericultura no primeiro,
segundo, quarto, sexto, nono e décimo segundo mês. Ainda, cabe
ressaltar que na maioria das unidades de saúde em todo o Brasil,
as crianças são acompanhadas somente do ponto de vista do seu
crescimento (peso, comprimento e perímetro cefálico) e da ama-
mentação. E, portanto, esta inciativa agrega a avaliação odontológi-
ca e fisioterapêutica, além de considerar as dimensões socioeconô-
micas e ambientais na análise do desenvolvimento infantil.

RESULTADOS
O presente projeto avaliou 1747 crianças situadas na faixa-etária
entre 1 e 12 meses no período de outubro de 2013 a agosto de 2017.
Verifica-se que 52,1% das avaliações eram do sexo masculino e 47,8
% do sexo feminino.
A média de peso ao nascimento foi de 3278,8 gramas (±544,86)
e o comprimento ao nascimento teve valor médio de 48,6 centíme-
tros (±3,1). O perímetro cefálico ao nascimento foi, em média, de
34,4 centímetros (±1,8). A Idade Gestacional teve média de 38,7 se-
manas (±3,2). As notas do boletim de Apgar no 1º minuto de vida ti-
veram média de 8,7 (±1,2) e, no 5º minuto, 9,7 (±0,7). Em relação a
via de parto, 63,3% das crianças nasceram de parto vaginal e 36,6%
de cesáreo.
Com relação aos dados de saúde do bebê, 3,95% necessitaram
internamento em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal após o
nascimento e 20% tiveram hiperbilirrubinemia (icterícia neonatal).

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No tocante à amamentação realizada de forma exclusiva, ou seja,


como único alimento fornecido à criança, verifica-se que apenas
29,5% a realizou até o 6º mês. Em relação ao tempo de amamenta-
ção parcial, ou seja, com a introdução de outros alimentos ou lei-
te materno, somente 9,71% realizou esta modalidade de aleitamen-
to até o 12º mês.
No que diz respeito aos dados maternos e gestacionais, as mães
possuíam em média, têm 25,6 (±6,7) anos de idade, com uma mé-
dia de gestações de 2,1 (±1,4) filhos e 0,2 (±0,8) abortos. Quanto às
intercorrências gestacionais, a Tabela 1 apresenta as doenças ma-
ternas, com maior incidência de hipertensão, seguida de diabetes.
Em relação às substâncias utilizadas durante a gestação, 6,7% re-
latou o uso de cigarro; 2,6% de álcool e 1,1% de drogas ilícitas. Ain-
da, quando questionado o hábito alimentar das mães, verificou-se
que 70,1% consomem carne semanalmente; 68,5% frutas e verdu-
ras; 65,8% leite e derivados; e 20,9% peixe.

Tabela 1 Doenças gestacionais

Doença %
Hipertensão 43,3
Diabetes 11,7
Toxoplasmose 4,8
Sífilis 3,2
Citomegalovíros 1
H1N1 1
Dengue 0,5
Herpes 0,5
HIV 0,5

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Doença %
Rubéola 0,5
Outra 32,6
Fonte: Os autores (2017).

O percentual de mães que realizou 7 consultas de pré-natal ou


mais no período gestacional foi de 86,12%. Ainda, as mães destas
crianças estudaram, em média, 10,3 (± 2,9) anos, conforme detalha-
mento na Tabela 2.

Tabela 2 Escolaridade materna

Categoria %
Analfabeto 0,2
Ensino Fundamental Incompleto 15,5
Ensino Fundamental 25,8
Ensino Médio 39,5
Graduação 13,2
Ensino Técnico 3,4
Pós-Graduação 2
Fonte: Os autores (2017).

A Tabela 3 apresenta os resultados de renda familiar da popula-


ção estudada. Destas famílias, 11,8% recebem algum tipo de benefício
social do governo. Em média, o número de residentes em cada famí-
lia é de 4,1 pessoas. 100% dos domicílios possuem água encanada e,
em relação ao destino do esgoto, 33,3% destina-se a fossas; 65,2% es-
tão conectados às redes de esgoto e 1,4% destinam aos rios da região.

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Tabela 3 Renda familiar

Categoria %
Até 1 salário mínimo 26,8%
De 1 a 3 salários mínimos 55,7%
De 3 a 5 salários mínimos 13,5%
Mais que 5 salários mínimos 3,9%
Fonte: Os autores (2017).

O Gráfico 1 apresenta o percentual de presença de atraso no desen-


volvimento da população estudada. Cada criança recebeu uma das clas-
sificações entre: sem atraso, atraso leve, atraso moderado e atraso grave.

Gráfico 1 Presença de atraso no desenvolvimento

Fonte: Os autores (2017).

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CONSIDERAÇÕES
Os dados sobre o período gestacional e as condições de nas-
cimento de uma população são importantes informações para a
compreensão do desenvolvimento global infantil e, portanto, para
o DM. Quanto à gestação e às condições de nascimento, as crian-
ças avaliadas por este serviço, até o presente momento, apresen-
taram em média peso, comprimento e perímetro cefálico adequa-
dos ao nascimento, segundo os critérios da OMS. A média de idade
gestacional do presente estudo situa as crianças na categoria termo
precoce, nascimento entre a 37ª e a 39ª semana gestacional. As no-
tas obtidas no Boletim de Apgar deste estudo indicam boas condi-
ções de nascimento, uma vez que escores de 8 a 10 indicam que o
bebê não precisa de extensiva ressuscitação e provavelmente não
terá problemas futuros.
Enquanto as condições de nascimento destas crianças estão em
sua maioria adequada, ainda preocupa visualizar os dados de esco-
laridade materna com pouco acesso à graduação, a taxa de fecun-
didade superior à tendência nacional de primíparas (1,8 filhos por
família), bem como a presença frequente de intercorrências que
podem causar graves danos à saúde do bebê, como o diabetes e a
hipertensão arterial sistêmica. Porém, os dados de renda, acesso à
água encanada e à rede de esgoto situam-se dentro do que se visua-
liza em vários municípios brasileiros.
Quanto à presença de atraso motor, no presente estudo, veri-
ficou-se a presença de atraso leve em 21,6% das avaliações. Neste
caso, as orientações e a estimulação precoce do DM torna-se fun-

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damental para que os atrasos não tomem caráter definitivo e atra-


palhem outros domínios de desenvolvimento da criança e até mes-
mo suas habilidades cognitivas e a capacidade de aprendizagem
escolar da criança.
Nesse sentido, a implantação do serviço de monitoramento do
desenvolvimento infantil realizado por meio da puericultura, no
primeiro ano de vida, como parte do atendimento às recomenda-
ções da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Crian-
ça (2015) trouxe grandes benefícios à população de Pontal do Para-
ná . Uma vez que este, além do acompanhamento do crescimento
e da amamentação, habitualmente realizado pelos serviços de saú-
de pública, agrega a avaliação motora e a caracterização do perfil
socioeconômico e ambiental do desenvolvimento destas crianças.
Como continuidade deste trabalho, os próximos passos serão o esta-
belecimento de correlações entre os atrasos motores e os fatores so-
ciais, econômicos e ambientais que influenciam o desenvolvimen-
to infantil.

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

QUALIDADE DE VIDA , ENVELHECIMENTO


E POLÍTICAS PÚBLICAS: REL ATO SOBRE O
SERVIÇO DE CONVIVÊNCIA E FORTALECIMENTO
DE VÍNCULOS EM PONTAL DO PARANÁ (PR)

Tarcimeri dos Santos Serpa


Marisete T. Hoffmann-Horochovski
Luciana Vieira Castilho-Weinert

INTRODUÇÃO
O aumento da população idosa no Brasil e no mundo é um dos
temas mais debatidos na atualidade. Esse crescimento é decorren-
te de vários fatores, entre os quais: aumento da expectativa de vida,
queda da fecundidade, avanço da medicina, entre outros. No que
se refere à expectativa de vida, houve um acréscimo significativo na
sociedade brasileira das últimas décadas: “De 1940 a 2015, a espe-
rança de vida no Brasil para ambos os sexos passou de 45,5 anos
para 75,5 anos, um aumento de 30 anos” (BRASIL, 2016).
O envelhecimento populacional tem gerado diversas ações da
sociedade e das esferas governamentais em relação à oferta de ser-
viços e regulamentações destinadas a atender as demandas prove-
nientes do processo. “Num país que até muito recentemente preo-
cupava-se basicamente com os jovens, há esforços significativos
de entender o fenômeno do envelhecimento” (HOFFMANN-HO-

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ROCHOVSKI, 2010, p. 38). De entender e acolher, por assim dizer,


no sentido de possibilitar aos idosos o exercício da cidadania. Para
isso, as demandas relacionadas ao envelhecimento devem estar vi-
síveis nos serviços ofertados, estruturas municipais, defesa dos di-
reitos, bem como em programas e projetos nas mais diversas áreas.
Esse artigo se dedica a entender mais sobre a temática e procu-
ra mostrar que a velhice é (ou deve ser) uma preocupação de toda a
sociedade. Por isso, é importante conhecer mais sobre o envelhecer
e planejar políticas públicas e programas eficazes, para que a popu-
lação com sessenta anos ou mais tenha atendimentos adequados e
acesso aos serviços, visando um envelhecimento com qualidade de
vida . Nesse sentido, diante da constatação que se vive mais, busca-
-se saber se se vive necessariamente melhor. A maior longevidade é
acompanhada de qualidade?
Destaca-se que em tempos atuais é praticamente um consenso
que a boa velhice é sinônimo de estar inserido socialmente, pra-
ticar atividades, participar de grupos, entre outras possibilidades.
Muitas políticas voltadas a essa faixa etária visam isso. Na área da
assistência social, por exemplo, foram pensadas várias ações espe-
cíficas, entre as quais o Serviço de Convivência e Fortalecimento de
Vínculos da Pessoa Idosa (SCFVI) que visa promover apoio social.
O Serviço faz parte de uma política federal que é executada em to-
dos os municípios brasileiros.
Foi o SCFVI do Centro de Referência de Assistência Social
(CRAS) Canoas, localizado no município de Pontal do Paraná (PR),
que possibilitou as reflexões aqui apresentadas. Seu objetivo con-

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sistiu em analisar a qualidade de vida e o processo de envelheci-


mento dos 16 idosos que participaram regularmente do Serviço,
no período de maio a dezembro de 2016. Interessava medir a qua-
lidade de vida , por meio de instrumento específico denominado
WHOQOL-Bref, assim como entender como os idosos participan-
tes do SCFVI vivenciam a velhice, refletindo sobre sua autonomia,
apoio social, relações familiares, entre outras questões. Ressalta-se
que esses idosos, usuários do CRAS Canoas, se encontram em si-
tuação de vulnerabilidade social (socioeconômica, perda de víncu-
los familiares, vítimas de violência, etc.). Por isso, partiu-se da hi-
pótese que o SCFVI é importante para os idosos, na medida em que
possibilita apoio social, troca de experiências e fortalecimento de
vínculo, influenciando na melhoria da qualidade de vida .

QUALIDADE DE VIDA E ENVELHECIMENTO


Gadelha et al. (2011), trazem uma importante reflexão sobre a re-
lação entre saúde e desenvolvimento. Para os autores, a promoção
de saúde e a prevenção estão ligadas ao crescimento econômico e
ao desenvolvimento territorial como um todo e dizem muito sobre
a qualidade de vida . Para eles, tanto a saúde está para o desenvol-
vimento, como o desenvolvimento está para a saúde . Os indivíduos
dependem das políticas públicas de saúde , que devem estar arti-
culadas com demais ações, para diminuir as vulnerabilidades que
comprometem a vida das pessoas para a promoção do bem-estar.
Nesse sentido, a mensuração da qualidade de vida no idoso contri-

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bui para reflexões sobre sua situação de saúde , bem como sobre o
desenvolvimento do território em que o mesmo está situado.
O desenvolvimento, para Amartya Sen (2000), é definido como a
capacidade de exercer a liberdade. Para isso é necessário que sejam
oferecidas condições básicas de sobrevivência, como saúde e educa-
ção. Mas os direitos civis básicos nem sempre são oferecidos pelas po-
líticas públicas, assim prejudicando a qualidade de vida da população.
Neste contexto de saúde e desenvolvimento, a Organização
Mundial da Saúde (OMS) também considera a questão socioam-
biental ao conceituar a qualidade de vida como “a percepção do
indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema
de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expec-
tativas, padrões e preocupações” (THE WHOQOL GROUP, 1994).
Conceituação presente na elaboração do instrumento utilizado
nesta pesquisa, o WHOQOL-Bref, que permite mensurar qualida-
de de vida e está detalhado na metodologia do presente trabalho.
A definição de qualidade de vida é uma questão ampla e multiface-
tada, muitas vezes utilizada como sinônimo para bem-estar e felicida-
de (ALBUQUERQUE, 2003). Esses aspectos multifatoriais são relevan-
tes a serem investigados para que se consiga obter uma aproximação
máxima de como estão os idosos no processo de envelhecimento.

Avaliar a qualidade de vida na velhice impli-


ca na adoção de múltiplos critérios de natu-
reza biológica, psicológica e socioestrutural.
Vários elementos são apontados como determi-
nantes ou indicadores de bem-estar na velhice:
longevidade; saúde biológica; saúde mental;

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satisfação; controle cognitivo; competência so-


cial; produtividade; atividade; eficácia cogniti-
va; status social; renda; continuidade de papéis
familiares e ocupacionais, e continuidade de
relações informais em grupos primários (prin-
cipalmente rede de amigos). (NERI, 1993, p. 10).

A partir da Constituição de 1988 e, fundamentalmente, a partir do


Estatuto do Idoso, Lei n. 10.741 de 01/10/2003, é dever do Poder Pú-
blico, juntamente com a família e a sociedade, conforme o artigo 3º,
“assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito
à vida, à saúde , à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao
lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e
à convivência familiar e comunitária” (BRASIL, 2003). Ou seja, asse-
gurar ao idoso um envelhecimento com qualidade de vida .

METODOLOGIA
A pesquisa possui um caráter essencialmente qualitativo, embo-
ra trabalhe com dados quali-quantitativos, na medida em que pro-
cura não apenas medir a qualidade de vida , mas entender como
esses idosos pensam e vivem a velhice dentro de um determinado
contexto social. A pesquisa qualitativa, de acordo com Richardson
(2010, p. 79), “justifica-se, sobretudo, por ser uma forma adequa-
da para entender a natureza de um fenômeno social”. Neste caso,
a natureza do envelhecimento, aprofundando-se o conhecimento
nesse universo para compreensão das transformações sociais. En-
tende-se aqui, seguindo Minayo (1994, p.22), que os dados quali-
-quantitativos “não se opõem. Ao contrário, se complementam,

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pois, a realidade abrangida por eles interage dinamicamente, ex-


cluindo qualquer dicotomia”.
Nesta pesquisa investigou-se a qualidade de vida dos idosos
que frequentam o SCFVI, do CRAS Canoas, bem como “como os
idosos vivenciam a velhice” e “porque” são necessárias políticas
públicas para essa população, em especial a Política de Assistên-
cia Social através do SCFVI. Buscou-se descrever e compreender a
rotina desses idosos no município de Pontal do Paraná e as trans-
formações ocorridas pela participação no Serviço. Ao todo foram
pesquisados dezesseis idosos que participaram regularmente do
SCFVI no período de maio a dezembro de 2016. Todos foram infor-
mados dos objetivos, métodos e instrumentos, que seriam utiliza-
dos e concordaram em participar da pesquisa mediante a assinatu-
ra do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Os dados e informações foram coletados com diferentes ins-
trumentos que permitiram alcançar o objetivo proposto de enten-
der o processo de envelhecimento e medir a qualidade de vida dos
idosos que participam do SCFVI do CRAS – Canoas: questionário
WHOQOL-Bref; observação participante, com registro em diário de
campo; entrevista semiestruturada e pesquisa bibliográfica. Obser-
va-se que o questionário WHOQOL-Bref, elaborado pela Organiza-
ção Mundial de Saúde (OMS) para medir qualidade de vida , foi
aplicado em dois momentos diferenciados: no início e no término
das atividades realizadas no ano de 2016. O intuito era verificar se
houve uma melhora na qualidade de vida dos participantes, du-
rante os meses em que frequentaram o grupo.

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O WHOQOL-Bref é uma versão abreviada do WHOQOL–100,


com 26 questões, traduzido e validado no Brasil (FLECK et al.,
2008) como um importante instrumento para avaliar a qualidade
de vida . Nesta versão abreviada, constam 02 questões gerais a res-
peito de qualidade de vida geral, sendo elas sobre saúde e qualida-
de de vida . As outras 24 questões (facetas) são divididas em quatro
domínios: físico (dor física, tratamento, energia, mobilidade sono,
atividades diárias, capacidade de trabalho); psicológico (aproveita
a vida, sentido da vida, concentração, aparência física, autossatisfa-
ção, sentimentos negativos); relações sociais (relações pessoais, su-
porte/apoio social, atividade sexual); meio ambiente (segurança na
vida diária, ambiente saudável, recursos financeiros, informações
disponíveis, atividades de lazer, moradia, acesso a serviços de saú-
de , meios de transporte).
O WHOQOL-Bref utiliza a escala de Likert, com a utilização de
escores de 1 a 5, sendo que quanto maior a pontuação melhor a
qualidade de vida , considerando respostas que estão relacionadas
às duas últimas semanas da vida do pesquisado. De forma geral,
os resultados indicam que a qualidade de vida necessita melho-
rar (1 até 2,9), é considerada regular (3 até 3,9), boa (4 até 4,9) e, por
fim, muito boa (5). É importante registrar que para trabalhar os re-
sultados, os dados dos dois questionários foram lançados em uma
planilha do Microsoft Excel, organizando-se cada escore das duas
perguntas iniciais, dos domínios e suas facetas. Como disse Albu-
querque (2003, p.86) é fundamental tratar os dados “em função de
cada domínio, pois nesse instrumento não se pode utilizar um “es-

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core total” de qualidade de vida , já que ele foi desenvolvido a par-


tir da premissa de que qualidade de vida é um constructo multi-
dimensional, não cabendo a soma de itens referentes a diferentes
domínios”. Foi também calculado o desvio padrão de todas as face-
tas para verificar as maiores variações.
A observação participante, com os devidos registros em diário
de campo, conseguiu-se acrescentar informações relevantes à con-
vivência dos participantes no grupo, como o entendimento sobre
certas situações relatadas nas entrevistas. Richardson (2010) consi-
dera que o observador passa a ser um dos integrantes, igualando-
-se ao mesmo nível dos outros participantes da pesquisa, inserin-
do-se totalmente nas atividades realizadas e compartilhando todos
os momentos. Com essa integração, o pesquisador “tem mais con-
dições de compreender os hábitos, atitudes, interesses, relações
pessoais e características da vida diária da comunidade do que o
observador não participante” (RICHARDSON, 2010, p. 261). Salien-
ta-se que a observação participante foi realizada ao longo de 27 en-
contros do SCFVI no CRAS Canoas.
A terceira técnica utilizada para a coleta de dados foi a entrevis-
ta semiestruturada com o objetivo de compreender o processo de
envelhecimento dos participantes e complementar os dados obti-
dos com as outras fontes. A entrevista possibilitou certa organiza-
ção das informações que “tratam da reflexão do próprio sujeito so-
bre a realidade que vivencia e a que os cientistas sociais costumam
denominar ‘subjetivos’ e só podem ser conseguidos com a contri-
buição da pessoa” (MINAYO, 2010, p. 262). Dessa forma, a entrevis-

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ta possibilitou uma aproximação maior com os participantes, ex-


pandindo o conhecimento em seus relatos de vida, e uma maior
compreensão das respostas obtidas no questionário WHOQOL-
-Bref, para medir qualidade de vida .

RESULTADOS
Do universo total dos 16 pesquisados, nove idosos possuem ida-
des que variam de 60 a 70 anos, seis entre 71 a 80 anos e um está
com 82 anos. Com relação ao gênero, nove são homens e sete são
mulheres. Quanto ao estado civil, oito são separados, quatro são
viúvos, três casados e apenas um, o participante mais velho (82
anos), é solteiro. No tocante a naturalidade, chamou a atenção o
fato de nenhum ser oriundo do litoral. A maioria é do interior, tanto
paranaense como de outros estados como Santa Catarina, São Pau-
lo, Rio Grande do Sul, Pernambuco e Piauí. Apenas um é natural da
capital paranaense. Registrou-se que, na composição familiar por
domicílio, dez idosos residem sós e seis idosos vivem com algum
familiar. Sendo um dos índices que merece atenção pelas conse-
quências que podem estar ocasionando, esses idosos são priorida-
de na participação do grupo de SCFV. Nesse sentido, conforme Ra-
mos, Meira e Menezes (2013, p. 12): “A condição de morar sozinho
pode levar o idoso a vivenciar inúmeros sentimentos e a enfrentar
diversas situações, sobretudo quando há ausência de contato fa-
miliar e isolamento social”. Constatam-se vários problemas que os
idosos enfrentam no seu dia a dia conforme os relatos nas entrevis-
tas. Os idosos que vivem só possuem idade entre 64 anos a 82 anos.

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No que tange ao tempo de residência no município, quatro dos


idosos relataram morar a menos de 10 anos e outros quatro entre 31
a 40 anos. Apenas o participante mais velho afirmou estar a mais
de 40 anos no local. Logo, a maioria dos pesquisados está entre 11 a
30 anos residindo no município de Pontal do Paraná . Com relação
à religião, há predomínio da evangélica com oito idosos, seguida
da católica com seis e da espírita, com dois idosos. Sobre o vínculo
previdenciário, seis são aposentados e seis beneficiários do Benefí-
cio de Prestação Continuada (BPC) e um é pensionista. Três idosos
não têm nenhum vínculo previdenciário e realizam atividades la-
borais como diaristas, babás, jardinagens, entre outros.
No que diz respeito à escolaridade o Ensino Fundamental in-
completo é predominante entre os pesquisados, sendo treze ido-
sos no total, seguidos de três na condição de não alfabetizado. Com
relação a renda, onze idosos recebem um salário mínimo, dois re-
cebem entre um a dois salários mínimos e três idosos realizam tra-
balho informal (os chamados “bicos”) e sua renda não chega nem
a um salário mínimo mensal. Entre os princípios da vulnerabilida-
de dos idosos estão a renda e a escolaridade, que podem refletir em
exclusão social, baixa qualidade de vida entre outros fatores, resul-
tando em dificuldades de prover suas necessidades básicas. Dian-
te desse quadro, constata-se que as limitações que os participan-
tes declaram ter, registradas nas entrevistas como nas observações
realizadas no período da pesquisa, vão ao encontro do apresentado
em literatura sobre a temática.

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Neste cenário foi avaliada a qualidade de vida por meio da apli-


cação do questionário WHOQOL-Bref. As duas primeiras, como já
dito, se referem a qualidade de vida geral (Figura 1).

Figura 1 Qualidade de vida geral

3,20
Qualidade de vida geral
3,28

3,27
Qualidade de vida 2º Quest
3,44
1º Quest

3,13
Saúde
3,13

2,9 3 3,1 3,2 3,3 3,4 3,5

Fonte: Pesquisa de campo (2016).

A comparação entre os dois questionários demonstrou que hou-


ve pouca alteração nas médias das duas primeiras questões: quali-
dade de vida e saúde . A média sobre qualidade de vida geral (qua-
lidade de vida + saúde ) no primeiro questionário foi de 3,20 e no
segundo de 3,28. Na questão específica sobre qualidade de vida
houve uma alteração significativa, pois passou de 3,27 para 3,44. Já
a questão sobre saúde apresentou a mesma média, 3,13, nos dois
questionários. No geral, não houve alteração significativa e os re-

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sultados dos dois questionários podem ser considerados regulares,


de acordo com a escala de Likert. A variação no desvio padrão foi
maior na pergunta referente à saúde , sendo 1,06 no primeiro e 1,09
no segundo questionário. Já o desvio padrão da qualidade de vida
foi de 0,80 e 0,96 respectivamente.

Figura 2 Domínio físico

Fonte: Pesquisa de campo (2016).

O domínio físico apresentou uma diminuição na média geral do


primeiro (3,20) para o segundo (3,07) questionário. Com relação
as facetas, os resultados foram variados. A dor física apontou um
aumento insignificante, de 2,87 para 2,88, indicando que é neces-
sário melhorar. Tratamento também expôs a necessidade de me-
lhorar, porém apresentou um aumento nos questionários, de 2,40

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para 2,50. A faceta mobilidade teve uma melhora na qualidade de


vida de 3,47 para 3,63. Já energia apresentou uma leve diminui-
ção na média, de 3,33 para 3,19. Em relação ao sono também hou-
ve uma queda na média: 3,27 no primeiro questionário para 3,13 no
segundo. As atividades diárias apontaram uma piora na qualidade
de vida , 3,53 no primeiro para 3,19 no segundo questionário, assim
como a capacidade de trabalho, de 3,53 para 3,00. De acordo com a
escala de Likert, as médias das facetas dor física e tratamento preci-
sam melhorar e as outras estão regulares. Neste domínio, a dor físi-
ca, especificamente no segundo questionário, foi a faceta que apre-
sentou o maior desvio padrão do domínio, 1,36. Já o menor desvio
padrão do domínio físico, 0,64, foi encontrado em atividades diá-
rias e capacidade de trabalho.

Figura 3 Domínio psicológico

Fonte: Pesquisa de campo (2016).


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No domínio psicológico houve um aumento da média geral


do primeiro (3,64) para o segundo questionário (3,73). As ques-
tões que tiveram as médias aumentadas foram: aproveita a vida
(passou de 3,20 para 3,50); sentido da vida (aumentou de 3,53
para 4,00); concentração (subiu de 3,33 para 3,69). As questões
que apresentaram uma piora na qualidade de vida foram: apa-
rência física (baixou de 4,07 para 3,88); autossatisfação (dimi-
nuiu de 4,07 para 3,81); sentimentos negativos (foi de 3,67 para
3,50). De maneira geral, as médias de qualidade de vida deste
domínio ficaram entre regular e boa. Em relação ao desvio pa-
drão, o segundo questionário apresentou a maior variação em
sentimentos negativos com 1,32 e o menor foi em autossatisfação
com 0,91, a faceta com menor variação das médias.
A figura 4 apresenta os resultados do domínio das relações so-
ciais. Este domínio apresentou uma queda na média geral de 3,87
para 3,54 do primeiro para o segundo questionário. Entre todos os
domínios, esse foi o que demonstrou a média mais alta no primeiro
questionário em todas as facetas.

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Figura 4 Domínio relações sociais

Fonte: Pesquisa de campo (2016).

Neste domínio não houve nenhuma faceta com aumento no se-


gundo questionário: relações pessoais baixaram de 4,13 para 4,00;
vida sexual de 3,33 para 3,06; apoio dos amigos de 4,13 para 3,56.
É este domínio também que exibiu a maior média entre todas as
apresentadas nos diferentes domínios e facetas do WHOQOL-Bref:
4,13 em relações sociais. Outro dado relevante foi o desvio padrão
de 0,25 na faceta vida sexual no segundo questionário, foi o menor
em relação aos outros domínios e facetas. O maior desvio padrão
encontrado foi 1,09 em apoio dos amigos no segundo questionário.

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Figura 5 Domínio Meio Ambiente

3,25
Domínio meio ambiente 3,23
3,20
Segurança na vida diária 3,38
Ambiente saudável 3,40
3,88
2,80
Recursos financeiros 2,63
2,87
Informações disponíveis 2,75
Atividades de Lazer 2,33
2,56
4,00
Moradia 3,94
Acesso serviços desaúde 3,67
3,25
3,73
Meios de transporte
3,44
0,00 1,00 2,00 3,00 4,00 5,00
2º Quest 1º Quest

Fonte: Pesquisa de campo (2016).

Em relação ao meio ambiente, a média do domínio sofreu pouca


alteração do primeiro (3,25) para o segundo (3,23) questionário. As
facetas deste domínio que tiveram as médias acrescidas na segun-
da aplicação do questionário foram: segurança na vida diária, de
3,20 para 3,38; ambiente saudável, de 3,40 para 3,88; e atividade de
lazer, de 2,33 para 2,56. Nota-se que esta faceta apresentou a média
mais baixa (2,33) entre as facetas de todos os domínios e que, con-
forme a escala de Likert, necessita melhorar a qualidade de vida .
As facetas que apresentaram uma piora nos resultados do segundo
questionário foram: recursos financeiros (de 2,80 para 2,63); infor-
mações disponíveis (de 2,87 para 2,75); moradia (de 4,00 para 3,94);
acesso a serviços de saúde (de 3,67 para 3,25); e meios de transpor-

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te (de 3,73 para 3,44). As médias apontaram que é preciso melhorar


a qualidade de vida , menos de 3,0, e que ela está regular. Somen-
te a média 4,0 está boa, mas ao mesmo tempo na aplicação do se-
gundo questionário ela teve queda voltando para regular. O desvio
padrão de menor variação foi obtido na faceta de atividade de lazer
com 0,49 e a maior variação foi em segurança na vida diária com
1,21, ambos no primeiro questionário.
A partir dos dados obtidos com a aplicação do WHOQOL-Bref,
verificou-se que no primeiro questionário cinco facetas precisam
melhorar, dezesseis são regulares, cinco são boas e nenhuma mui-
to boa. No segundo questionário houve uma mudança considerá-
vel, levando em conta que houve muitas médias com queda, cinco
facetas precisam melhorar a qualidade de vida , dezenove são regu-
lares, duas são boas e nenhuma muito boa.
Foi possível constatar, genericamente, que os meses entre uma
aplicação e outra do questionário, com a participação no SCFVI e
acompanhamento, não foi fator para acréscimo da média. O fato
de não haver alteração significativa do primeiro questionário para
o segundo pode, num primeiro momento, indicar que o SCFVI não
está contribuindo para uma melhora na qualidade de vida dos par-
ticipantes. Não obstante, é necessário levar em consideração que
os encontros acontecem apenas uma vez na semana e que as res-
postas obtidas nos questionários são sempre referentes às últimas
duas semanas, como explicitado nas orientações da OMS.
Por fim, é preciso considerar que outros aspectos da vida coti-
diana dos idosos, tendem a incidir sobre a qualidade de vida . Es-

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ses aspectos foram identificados na observação realizada ao longo


dos 27 encontros do SCFVI e nas entrevistas efetuadas com os 16
idosos participantes da pesquisa. A partir dessas duas técnicas de
coletas de dados, obteve-se como resultado que o serviço é impor-
tante no processo de envelhecimento dos participantes, pois propi-
cia apoio social e fortalecimento de vínculos, que pode resultar em
maior qualidade de vida , conforme será apresentado na discussão.

DISCUSSÃO
Albuquerque (2003, p. 48) aponta que “‘Qualidade de vida ’ for-
ma parte de uma família de conceitos que se aproximam ao bem-
-estar humano, como ‘modo de vida’, ‘nível de vida’, ‘condições de
vida’, ‘satisfação’”. Conhecer um pouco mais sobre esses aspectos,
por meio da observação e das entrevistas semiestruturadas, per-
mitiu compreender os resultados do questionário WHOQOL-Bref
e entender se estão envelhecendo com qualidade de vida ou não.
A velhice é um processo heterogêneo, vivenciado por cada um
singularmente, e isso ficou claro nas falas dos idosos durante a
pesquisa. Embora, evidentemente, tenham situações comuns,
inerentes ao envelhecimento. A entrevista abordou assuntos di-
versos, entre os quais: satisfação com a residência em Pontal do
Paraná ; vínculos familiares e de amigos; solidão; saúde ; preo-
cupação; como se sentem na velhice; realização pessoal; sonhos;
medo; morte; como ocupa o tempo e o que mudaria na sua vida.
A partir dessas questões, foi possível entender melhor como vi-
vem nesta etapa de vida.

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A maioria dos entrevistados gosta de residir no município litorâ-


neo, sendo que apenas dois participantes declararam não gostar e
afirmaram que gostariam de viver em outro local, no interior onde
tem irmãos e outros familiares e em Curitiba respectivamente.
A respeito dos vínculos familiares, onze participantes residem
sozinhos e disseram-se sentir-se só, mas houve idosos que mesmo
morando com familiares relataram solidão. Para Debert (1999, p.
55), as relações familiares estão em evidência, na condição de tra-
zer benefícios emocionais, estruturais aos idosos. O afastamento
da família traz consigo muito sofrimento, a solidão é mais nebulo-
sa com familiares ausentes e as lembranças do passado podem ser
muito doloridas, como afirma Araújo e colaboradores (2012, p. 101).
Além dos vínculos familiares, há também valorização das relações
sociais, dos vínculos de amizade. Há uma correlação positiva entre
vínculos fortalecidos e qualidade de vida . A ausência ou vínculos
enfraquecidos resultam em pior qualidade de vida .
No que tange a saúde , seis participantes declararam estar com a
saúde ruim, sendo que dois afirmaram ser a doença a maior preo-
cupação no momento. Outros três declararam que sua grande preo-
cupação é com a saúde , embora no momento não tenham proble-
mas de saúde . Todos os idosos afirmaram que realizam tratamento
médico, em certas situações com especialistas fora do município.
Os problemas são diversos – coração (2 idosos), pressão alta (5), dia-
betes (4), câncer (1), catarata (1), entre outros – e demonstram que
a qualidade de vida no que se refere a saúde dos idosos, tal como
identificado no WHOQOL-Bref, é regular. Além disso, a doença e a

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dependência do outro são as maiores preocupações dos partici-


pantes.
Conforme definido por Neri (2001, p. 43), como as pessoas sen-
tem-se, idosos ou não, cabe conceito de idade psicológica, onde cada
pessoa avalia-se, com “a presença ou a ausência de marcadores bio-
lógicos, sociais e psicológicos da idade, com base em mecanismos de
comparação social mediados por normas etárias”. Percebe-se nas fa-
las dos idosos, que muitos admitem cronologicamente estarem ve-
lhos, mas deixam entender que não se sentem idosos. Para muitos
deles, o envelhecimento não está acarretando baixa no bem-estar,
tampouco na autossatisfação e na satisfação com a aparência física.
A heterogeneidade também é sublinhada na realização pessoal.
Somente dois participantes declararam que não tiveram nenhuma
realização pessoal, os outros participantes citaram como realiza-
ção: os filhos, netos, companheiros (as), à aquisição da casa pró-
pria, aspectos relacionados ao trabalho, aposentadoria, BPC, pa-
trimônio (estrutura de trabalho) para os filhos e mudança para a
cidade de Pontal do Paraná .
Em relação ao sonho, os participantes também mencionaram
melhoras na moradia e renda, saúde para si e familiares e visitar
parentes que moram distantes. Um idoso referiu-se a morte como
um sonho, este já havia declarado que por conta da solidão está em
estado depressivo realizando tratamento médico. Outro relatou
que seu sonho seria voltar no tempo relacionado com o envelhe-
cimento, demonstrando não ter expectativas futuras. Para Rudin-
ger e Thomae (apud NERI, 1993, p. 15): “A avaliação que o idoso faz

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de sua atuação atual é outro mediador importante de sua satisfação


na vida”. Mais um aspecto que altera a qualidade de vida dos parti-
cipantes e consequentemente confirma alguns resultados obtidos
nos questionários.
Os pesquisados ocupam seu tempo de variadas formas. Foram
citados os afazeres da casa, cuidado com hortas e limpeza de jar-
dins (terrenos), artesanatos, trabalhos voluntários com a religião
(evangelizar), consertos de objetos em casa para passar o tempo.
Constatou-se que todos os idosos são ativos (dentro das suas limi-
tações) e estão sempre realizando algumas atividades. As ativida-
des citadas variaram entre lazer, trabalho doméstico, trabalho in-
formal e outros (DEPS, 1993). De forma geral, consideram suas
atividades uma escolha pessoal que acrescenta qualidade de vida
nesta época da vida.
O medo está presente na vida cotidiana por diversas razões, en-
tre as quais, a violência, a doença e a morte. O medo da morte está
relacionado a vários aspectos, é um futuro incerto ligado ao sofri-
mento, ao desconhecido. Segundo Elias (2001, p. 16) algumas pes-
soas “podem olhar para sua morte com serenidade, outras com
um medo intenso e constante, muitas vezes sem expressá-lo e até
mesmo sem capacidade de expressá-lo”. Uma das razões para isso,
é que os idosos sabem que a morte está próxima, que o passado é
muito mais longo que o futuro (BEAUVOIR, 1990).
Quando perguntados sobre o significado da morte, alguns par-
ticipantes responderam em relação a acreditarem em “reencar-
nação” ou na existência de “outra vida”. Destacaram a fé presente

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nesse tema e os mais religiosos se mostraram preparados para mo-


mento da morte, pois os estudos religiosos ou leituras estão pre-
sentes no cotidiano de alguns. Cada indivíduo configura de uma
maneira a morte, dependendo da cultura, da fé religiosa e outros
aspectos (SANTOS; ABDALA, 2014, p. 796).
O que você mudaria na sua vida se pudesse? As respostas foram
diversas como na maioria das questões. Os idosos melhorariam
renda, moradia, saúde , idade cronológica, entre outros. Alguns não
responderam, o que pode indicar que não mudariam nada especí-
fico ou que estão satisfeitos com suas vidas.
De forma geral, apurou-se com as observações e com as entre-
vistas que muitos aspectos vivenciados por esses idosos em sua
vida cotidiana interferem na qualidade de vida que é bastante re-
gular, tal como verificado com o instrumento WHOQOL-Bref. Nes-
se sentido, é preciso pensar em políticas públicas específicas para a
população idosa que promovam o envelhecimento saudável, com
qualidade. Ouvir suas histórias, suas demandas, registrar suas ex-
pectativas são fundamentais nesse sentido. Além disso, como disse
D’Aquino (2004, p.182), o “velho é sim, uma âncora, um lastro que
sustenta que as palavras ainda têm poder (...) essas narrativas têm
direção própria, mas também muitas outras, porque a beleza que
as envolve emana do que eles rememoram e no mais além, que eles
rememoram. Um país que ouve seus velhos tem memória!”

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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa procurou entender melhor o processo de envelhe-
cimento e a qualidade de vida da população idosa, a partir de um
estudo com idosos que participam do SCFVI do CRAS Canoas, em
Pontal do Paraná (PR). Idosos que, assim como muitos outros, en-
frentam diferentes desafios, como dificuldades nas relações fami-
liares e sociais, acessos a serviços, incertezas provenientes da crise
econômica e política atual, negação da velhice, medo da doença,
dependência e solidão. Dificuldades que influenciam na qualida-
de de vida e que demonstram a situação de vulnerabilidade social
desses idosos que, contudo, vivenciam a velhice de diferentes ma-
neiras, posto que ela não é um processo homogêneo.
No decorrer da análise, que partiu da hipótese que o SCFVI é
importante para os idosos, uma surpresa. A aplicação de dois ques-
tionários WHOQOL-Bref, no início e no final dos encontros reali-
zados em 2016, não comprovou melhoria na qualidade de vida dos
pesquisados no período citado. Alguns acontecimentos podem ter
influenciado nos resultados obtidos nos questionários. O fato do
primeiro questionário ter sido aplicado no início dos encontros,
quando os idosos poderiam estar com expectativas altas em rela-
ção ao SCFVI. Já o segundo questionário foi respondido nas últi-
mas semanas dos encontros do grupo, próximo do Natal, que pode
aumentar a sensação de vulnerabilidade e solidão para os que es-
tão longe da família. Além disso, por conta das características do
município que recebe turistas para o veraneio, parte das ativida-
des, cessa no município neste período e só retorna após o carnaval.

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Defende-se que os diversos programas e serviços que atendem a


população idosa neste período devem ser mantidos no período da
temporada de verão, sem nenhum prejuízo aos usuários.
Questionamos, por fim, se somente o instrumento WHOQOL-
-Bref consegue medir a qualidade de vida . Ele alcança de fato to-
das as dimensões? Neste estudo, que trabalha um pequeno grupo
em situação de vulnerabilidade social, o questionário foi sem dú-
vida muito importante, mas a observação participante, com regis-
tro em diário de campo, e a entrevista foram fundamentais para en-
tender melhor a qualidade de vida na velhice e a própria atuação
do SCFVI. Este serviço procura amenizar a solidão, com o fortale-
cimento de vínculos, com as ações desenvolvidas em que orienta e
demonstra a necessidade de intermediar os conflitos familiares e a
importância do convívio comunitário por eles. A partir da partici-
pação nos encontros do grupo, observou-se que os idosos começa-
ram a frequentar reuniões de conselhos municipais, Conferências
Municipais, audiências públicas, palestras e outros eventos desti-
nados à população. Verificou-se que os idosos estão interagindo so-
cialmente, buscando participar de decisões relevantes que dizem
respeito à população idosa, como toda sociedade. O SCFVI tem re-
levância na vivência dos participantes, o serviço está atuando posi-
tivamente em qualidade de vida , influenciando na participação so-
cial e cultural entre outros.
Conclui-se comprovando a hipótese que o SCFVI do CRAS Ca-
noas influencia de maneira positiva na qualidade de vida dos ido-
sos atendidos de maneira geral, possibilitando apoio social, troca

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de experiências e fortalecimento de vínculo, mesmo isso não ten-


do aparecido no questionário WHOQOL-Bref. Todavia, reforça-
-se igualmente os resultados obtidos com o WHOQOL-Bref na me-
dida em que indica que a qualidade de vida desses idosos precisa
melhorar ou é regular. Para garantir uma boa qualidade de vida , ou
muito boa, outras políticas, a exemplo dessa, deveriam ser concebi-
das para atender as demandas do envelhecimento populacional no
Brasil.

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A ARTE DO CARACOL : UMA BREVE HISTÓRIA


DE UMA TÉCNICA DE PESCA ARTESANAL
PRATICADA NA COMUNIDADE DE BARRANCOS,
LITORAL SUL DO PARANÁ

Diego Costa Nogues


Liliani Marilia Tiepolo

INTRODUÇÃO
Pesca artesanal não é um conceito preciso, a complexidade as-
sociada à variedade de formas de sua execução, torna a aplicação
de uma definição generalista inviável (OLIVEIRA; SILVA, 2012).
Segundo Diegues (1973), o que é chamado de pesca artesanal no
Brasil, surge em meados do século XX a partir de um momento de
falência econômica dos ciclos cafeeiro e açucareiro, associado à ne-
cessidade de exploração de outros meios além da flora e fauna lito-
râneas (palmito/caxeta/caça).
No Brasil, a Lei nº 11.959 de 29 de junho de 2009 foi estabeleci-
da para dar diretrizes sobre a pesca com o objetivo de aliar desen-
volvimento sustentável; ordenamento; preservação e conservação;
e desenvolvimento socioeconômico. Na referida lei a pesca artesa-
nal é reconhecida como pesca comercial, praticada por pescador
profissional, de forma autônoma ou em regime de economia fami-
liar, onde os meios de produção são ou a partir de parcerias, poden-

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do ocorrer sem o auxílio de embarcações ou a partir daquelas refe-


ridas de pequeno porte (BRASIL, 2009).
Resistência e incalculável importância socioeconômica são ali-
cerces da pesca artesanal , soma-se ainda a esse modo de vida um
imenso significado cultural e de identidade, além de papel de des-
taque no combate à fome e escassez de alimento. Não só o espa-
ço, mas todo o contexto em que a pesca artesanal se insere contri-
bui para transmissão de valores, sendo que o mar (pesca artesanal
marítima) e a terra complementam formas de relação e reprodu-
ção através de convivência social, cultural e afetiva. Possui grande
aporte na produção pesqueira brasileira, estando no Brasil, intima-
mente vinculada ao mercado e à pesca empresarial capitalista, en-
tretanto, encontra-se pressionada, com profissionais explorados e
carentes do apoio que foi dado à pesca empresarial-capitalista (SIL-
VA, 2010; FREITAS NETTO; NUNES; ALBINO, 2002).
No caso do litoral paranaense, a pesca artesanal é praticada em
uma grande diversidade de ambientes com o uso de diversas técnicas,
em sua maior parte em regime de livre acesso, com diferentes origens
culturais dos pescadores, movimentos migratórios, níveis de inserção
no mercado e usos de outros recursos naturais. Não só as mudanças
sociais, mas também absorção ou abandono de técnicas estão sujei-
tas a diversos fatores de pressão, como, mudanças de mercado, evolu-
ção do turismo e da ocupação do solo e o endurecimento e complexi-
ficação da legislação ambiental (ANDRIGUETTO-FILHO, 2003).
No município de Pontal do Paraná de acordo com Caldeira e
Pierri (2014) a pesca artesanal não só se sustenta como vem passan-

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do por um intenso processo de mudança. Os autores consideram a


presença de duas tipologias da pesca artesanal para o município,
sendo uma “mais diversificada” no quesito de tipo de petrechos63 e
organismos alvo, e uma segunda “menos diversificada” com menos
equipamentos, e que, muitas vezes, foca em um único alvo, através
de uma única técnica, e por este motivo possuem menor padrão de
vida e estão em maior situação de vulnerabilidade.
O território garante ao ser humano identidade em relação ao seu
lugar. Espaço, organização social e territorialidade são as bases a
partir da qual derivam comportamentos de movimentação e arti-
culação. Movimentações que permite nos aproximarmos, distan-
ciarmos, pertencer ou excluir-se de determinado grupo. Os pesca-
dores se identificam pelo mar não somente por obter sua renda de
trabalho, mas também pelo domínio do mesmo, pelo prazer do sa-
ber-fazer e pelo reconhecimento da comunidade (MALDONADO,
1993; SILVA, 2010).
Estão presentes na comunidade de Barrancos em 2017, 9 embar-
cações, todas canoas de fibra com motor de centro, que absorvem
algo em torno de 14 pescadores diariamente, sendo que todas pra-
ticam o Caceio redondo/Caracol64, algumas exclusivamente, ou-
tras associadas aos demais petrechos. A atividade na comunidade
possui características assim como as descritas por Oliveira e Silva
(2012), para a pesca artesanal , onde além de fonte de subsistência

63.  Petrecho ou Apetrecho é o equipamento usado em pesca ou caça.


64.  Tipo de emalhe de fundo tracionado que tem como alvo o camarão-branco e algumas espé-
cies de peixes.

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colabora com a manutenção de vínculos humanos. O conhecimen-


to que é passado através das gerações reforça identidade e afinida-
de entre os grupos familiares.
A motivação para esse trabalho surge da lacuna de conheci-
mentos sobre a técnica do Caceio Redondo, também conhecida
como Caracol, praticada por pescadores artesanais da localidade
de Barrancos. Também versa sobre a incidência de normativas so-
bre a pesca artesanal que carecem de maiores aprofundamentos
no campo técnico e científico, e justamente por este motivo aca-
bam afetando o modo de vida de inúmeras famílias que buscam na
pesca seu modo de sustento básico. Para efeito desse estudo a prá-
tica do Caceio Redondo/Caracol será citada apenas como Caracol,
nome que os pescadores se referem à mesma.
A pesquisa se baseia em pesquisa de campo do tipo descritivo-
-exploratório, na qual foram utilizadas como apoio técnicas como
anotações em caderno de campo, observação participante, vivên-
cias do autor na localidade e entrevistas semiestruturada, realiza-
das entre os anos de 2015 e 2017. Sua importância se dá pela ne-
cessidade de informações que permitam entendimentos sobre as
atividades pesqueiras em zonas costeiras; o uso dos organismos
naturais; a conservação de espécies de interesse e também sobre
a manutenção das comunidades humanas que se baseiam nas ati-
vidades de exploração dos bens comuns a partir de artes e técni-
cas singulares, mal compreendidas tanto pelos órgãos ambientais
quanto pela comunidade científica.

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A COMUNIDADE DE BARRANCOS
O litoral paranaense localiza-se entre os paralelos 25º e 26º de la-
titude Sul e 48º e 49º de longitude Oeste, no setor sudeste da cos-
ta brasileira, com uma superfície total de 6.055,9 km², que repre-
senta apenas 3% da superfície do Paraná e engloba sete municípios:
Guaraqueçaba, Antonina, Morretes, Paranaguá , Pontal do Paraná
, Matinhos e Guaratuba. É uma região diversa e contrastante, onde
áreas de conservação escassamente povoadas coexistem com uma
grande cidade portuária, e balneários urbanos com crescimento
acelerado. As atividades econômicas mais presentes, ligadas às ati-
vidades portuárias e ao turismo praiano não revertem benefícios
para a população permanente (ESTADES, 2003).
O município de Pontal do Paraná foi criado em 1995, possui re-
cente história geopolítica, mas assim como os demais municípios
do litoral é considerado o berço da civilização paranaense. Encon-
tra-se no município sítios históricos e sambaquis que remontam a
milhares de anos. Segundo o Plano Diretor de Desenvolvimento In-
tegrado de Pontal do Paraná (PONTAL DO PARANÁ , 2007) ocor-
rem no município três tipos de costa: oceânica; de desembocadura;
e estuarina. A comunidade de Barrancos encontra-se na transição
entre costa oceânica e de desembocadura.
A comunidade de Barrancos localiza-se no quilômetro 75 da
rodovia PR – 412 a 13 km de Praia de Leste, entrada do município
de Pontal do Paraná via rodovia BR - 277, sob as coordenadas 25º
36,498` latitude Sul e 48º 23.865` longitude Oeste. Nas lembranças
vivas nos moradores mais antigos da comunidade em 2017 resga-

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tam-se informações de até cinco gerações. Os antigos habitantes do


local são frequentemente citados como “índios” sendo enfatizadas
as dificuldades presentes no modo de vida passado, como falta de
acesso à energia elétrica e água tratada.
Em 2017, a comunidade de Barrancos possui aproximadamen-
te 80 casas, cerca de 60 pessoas têm ligações com as atividades pes-
queiras em maior ou menor intensidade, considerando pescadores
e pescadoras com registro, sem registro e participantes em ativi-
dades auxiliares. Daquelas que se envolvem na atividade de pesca
com maior frequência, pode-se estimar 30 pessoas, e assim como
encontrado por Capelesso e Cazella (2011) avaliam a pesca não só
pelo rendimento monetário que a mesma gera, mas pelo sentido
que confere as suas vidas.
A pesca profissional de Pontal do Paraná desenvolve-se como
atividade mercantil, tendo a melhoria de produtividade baseada
em inovações técnicas. Associa-se para o município o melhor de-
sempenho econômico na atividade pesqueira com melhores con-
dições de diversificação de práticas (CALDEIRA; PIERRI, 2014).
Para Diegues e Nogara (1999) um maior conhecimento acerca das
técnicas praticadas pelos pescadores caiçaras é o que possibilita
um manejo condizente com a realidade de cada comunidade.
A atividade pesqueira teve seu surgimento na comunidade de
Barrancos a princípio como algo pontual, sem a ocorrência de co-
mercialização, associada apenas à necessidade de alimentação e a

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partir de uma arte de pesca especifica o lanço de praia65, com redes


de cerca de 100 metros de comprimento que tinham sua produção
combinada com aquela obtida nas roças. Em lembranças um pou-
co mais recentes pescava-se de linha corvinas (Micropogonias fur-
nieri) e pescadas (Cynoscion sp.), quando se ia a remo até a Ponta
do Poço66, local onde o camarão-branco Litopenaeus schmitti (Bur-
kenroad, 1936) era tarrafeado67 e capturado para ser usado como
isca para os espinhéis68.
No ano de 2017 em Barrancos ocorrem núcleos de produção ex-
clusivamente familiares, característica afirmada como rara, mas
existente para o município por Caldeira e Pierri (2014). Ocorrem
ainda, como observado pelos autores, proprietários dos meios de
produção (canoas e redes) atuando como pequenos armadores. A
relação dos pescadores com as embarcações ocorre basicamente
de duas maneiras: proprietários acompanhados de tripulante; pro-
prietários que arrendam as embarcações para pessoas da família,
sendo que o obtido com a captura é sempre dividido em terços (Ca-
noa/Mestre/Tripulante), essa é apenas uma generalização do que

65.  A rede é lançada ao mar a partir da praia por meio de uma embarcação e então é puxada da
praia por ambas as extremidades.
66.  Localidade na entrada da Baía de Paranaguá , aproximadamente 10 km de distância da comu-
nidade de Barrancos.
67.  Tarrafa é uma rede circular com pequenos pesos em toda circunferência, arremessada com as
mãos por apenas um pescador, podendo esse estar embarcado ou não.
68.  Tipo de arte de pesca à linha constituída por uma linha principal, a partir da qual pendem li-
nhas secundárias mais curtas e em grande número, a intervalos regulares cada uma terminando
em um anzol.

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ocorre, a ligação de todos os envolvidos é quase sempre familiar, e


existem casos onde essa relação é muito mais complexa.
Todos os pescadores têm na pesca sua fonte de renda principal,
mas praticam outras atividades como complemento de renda, po-
dendo ser citadas: o aluguel de casas, o serviço de jardinagem e ser-
viços vinculados à pesca amadora, quando a embarcação é fretada
para pescadores esportivos que praticam a atividade em áreas de
pesca conhecidas pelos pescadores, geralmente recifes artificiais69.
Todos os pescadores de Barrancos se reconhecem como pescado-
res de pequena escala ou artesanais. É frequente nos discursos dos
pescadores o orgulho quanto à atividade, entretanto, todos afirmam
serem pescadores por falta de alternativas, pela influência do pai,
ou que absorveram o dom da pesca dos avós. A transmissão desse
conhecimento acontece de geração em geração e mais do que um
dom, é fruto da oralidade, tornando o manejo da natureza coleti-
vo, construído ao longo do tempo, e baseado num entendimento in-
tegral dos fenômenos considerando naturalmente a complexidade
presente na natureza, corroborando as afirmativas de Toledo (2001).
Em relação às pescarias que praticam, ocorrem diversas artes.
Cabe lembrar que alguns pescadores diversificam mais, ou seja,
possuem mais petrechos, enquanto outros chegam até mesmo a tra-
balhar exclusivamente com uma arte, sendo essa o Caracol. Caldei-
ra e Pierri (2014), afirmam para o município que entre os pescadores

69.  Recifes artificiais implementados pela Organização-Não-Governamental Associação MarBra-


sil através do programa denominado REBIMAR – Recuperação da biodiversidade marinha no lito-
ral do Paraná .

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menos capitalizados, concentram-se aqueles dedicados, muitas ve-


zes, exclusivamente ao arrasto de portas e/ou o caracol, petrechos
que além de demandar baixo investimento, podem ser utilizados
em boa parte do ano considerando as safras, e são práticas que de-
mandam menor força, podendo ser feitas por um único pescador.
O conhecimento, assim como as técnicas utilizadas pelos pes-
cadores são elementos importantes na demarcação de territórios,
a aceitação de novas técnicas não acarreta o abandono das antigas.
É a partir da disponibilidade das espécies e petrechos associada a
variações ambientais que se formam as bases do conhecimento fa-
zendo com que o funcional e cultural se mesclem (SILVA, 2006).
Para Diegues (1999), adaptações que surgem nessas comunida-
des são frutos da relação intensa com a natureza, onde a alta flui-
dez dos organismos marinhos dificulta um maior controle antró-
pico. Na comunidade de Barrancos podem ser apontadas como
pescarias que foram observadas no ano de 2017: Caracol; Arrasto de
Portas70; Rede Alta71; Fundeio72; Linha de mão73; Cambal74; Caceio75

70.  A embarcação lança cabos presos a “portas” (que tem a finalidade de manter a rede aberta e
revolver o fundo) enquanto a embarcação traciona todo aparelho.
71.  Panos emendados verticalmente alcançando até 30 metros de altura. Utilizadas em mar aberto
nas modalidades de caceio, fundeio e cerco.
72.  Redes fixadas no substrato podendo permanecer até dois dias na água.
73.  Pescaria efetuada com o auxílio de uma vara contendo molinete ou não, geralmente com um
anzol, mas podendo conter mais, podendo ser utilizada na modalidade “corrico” (com a embarca-
ção em movimento).
74.  Realizada na praia, sem auxílio de embarcação. Os cabos das extremidades são amarrados em
uma vara. Um pescador opera a rede da praia, enquanto outro puxa a outra vara dentro d’água.
75.  A rede permanece à deriva por algumas horas (caçando). Pode ser de fundo ou de superfície.

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e Feiticeira76. Autores como Soares et al. (2009); Begossi (2011), en-


tre outros afirmam a absorção de novas técnicas e a diversidade de
petrechos como características inerentes à pesca artesanal , sendo
estas responsáveis pelo alto grau de resiliência presente na cultu-
ra caiçara. Na comunidade de Barrancos podemos perceber esta ri-
queza a partir da dinâmica histórica das práticas.

A ARTE DO CARACOL

“Nós no Caracol somos bom nisso! Cada um en-


tralha suas redes, cada um tem seu jeitinho, ge-
ralmente muda pouca coisa!”
(Pescador de Barrancos)

Para Afonso (2013), a escolha por determinada arte se insere nos


processos de formação da cultura imaterial, ancestral e atual, tais
técnicas são flexíveis e acabam por moldarem-se conforme fato-
res internos e externos de cada grupo e suas relações com o tem-
po e o espaço. Não só os próprios pescadores de Barrancos têm no-
ção e se orgulham de serem pescadores característicos do Caracol
como, também, pescadores das demais comunidades reconhecem
o maior sucesso e presença da prática na comunidade devido aos
pescadores serem bons entralhadores e a comunidade estar próxi-
ma à “boca da barra”, onde o camarão-branco está mais disponível.

76.  Feiticeira ou Tresmalho é uma rede composta por três panos sobrepostos. É bastante eficien-
te, capturando peixes de todos os tamanhos, uma vez que existem malhas de medidas diferentes
e três panagens, o que dificulta a presa a se desvencilhar do petrecho. Sua prática é proibida (IN
166/2007-IBAMA).

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Para Cunha (2009), a absorção de experiências modernas pode ser


capaz de potencializar a própria tradição, em ato de entrega ou tro-
ca de conhecimentos e tecnologias.
Compreendem-se ainda na territorialidade os significados atri-
buídos pelos praticantes da atividade à sua vivência e reprodução
social. Soma-se ainda as relações sociais estabelecidas, o que per-
mite distinguir à qual comunidade se identifica qualidade que o
torna diferente, diferença essa que o aproxima do seu grupo (SIL-
VA, 2010). Tal perspectiva associada à transmissão do conhecimen-
to que envolve o Caracol na comunidade é uma forma de coopera-
ção importante que reforça a noção de território.
A introdução da prática do Caracol no município se deu atra-
vés de “Catarinas”, pescadores do estado de Santa Catarina (fron-
teira ao sul com o estado do Paraná, no município de Guaratuba).
Como localidades exatas de onde vieram tais pescadores, surgiram
informações de serem do Balneário Barra do Sul e Praia Barra do
Saí (Município de Itapoá). Caldeira (2009) já apontava que diver-
sas técnicas, entre elas o Caracol, foram difundidas no litoral pa-
ranaense por pescadores de Santa Catarina e que uma vez intro-
duzidas, tiveram sua transmissão realizada por meio da troca de
informações e experiências entre os próprios pescadores locais,
sendo que tal conhecimento compartilhado envolve tanto aspectos
da confecção dos petrechos quanto da sua operação.
Catarinenses como disseminadores de tecnologias de pesca é
algo comum no conhecimento tradicional presente nas comuni-
dades do sul do Brasil, quando se questiona não só o Caracol, mas

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diversas outras artes. De antemão, pode-se facilmente compreen-


der estas interações a partir da relevância que o trabalho pesquei-
ro possui na região costeira do estado de Santa Catarina em relação
ao cenário nacional, existem ainda relatos de que a sobrepesca em
águas catarinenses seja um motivo dos deslocamentos de pescado-
res catarinenses para águas mais distantes.
A primeira localidade onde surge a técnica em Pontal do Paraná
é a comunidade de Atami, durante a “safra77” do camarão-branco,
aproximadamente de março a maio. Nessa ocasião, pescadores ca-
tarinenses alugaram uma casa nas proximidades e passaram o tem-
po que lhes foi financeiramente viável pescando. Esse deslocamen-
to dos pescadores indo buscar capturas em lugares diferentes de
sua origem pode ser observado durante todo desenvolvimento da
pesquisa no município.
Os elementos que formam as técnicas de pesca podem ser divi-
didos basicamente em três grupos: Os petrechos, que são as ferra-
mentas de pesca e os acessórios; os materiais do que são feitos os
petrechos; e o método sobre como são usados os petrechos (AFON-
SO, 2013). No caso do Caracol, com relação ao petrecho, ocorre um
misto entre captura de emalhe e captura de arrasto sem a utilização
de portas. É um método de pesca ativo já que além de ir à busca de
áreas onde se concentra o organismo alvo (“vieiros”) a rede não é
deixada de “espera”, mas sim, tracionada através de um cabo man-

77.  Melhores épocas para captura de determinado organismo marinho, geralmente associado a
migrações e/ou agrupamentos com finalidade reprodutiva.

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tido preso na extremidade da rede e à lateral da embarcação sendo


executados movimentos próximos a circulares.
Segundo o Dias Neto (2011), o Caracol é classificado como um
tipo de caceio de fundo. Na técnica, uma rede retangular é lança-
da na água em linha reta, com uma de suas extremidades presa por
um cabo na lateral da embarcação. Em seguida, a embarcação exe-
cuta um movimento circular fazendo com que a rede, em contato
com o sedimento78, realize um movimento semelhante ao dos pon-
teiros de um relógio. Algum tempo depois, a rede é recolhida e rea-
liza-se a despesca79.
Durante o ano de 2017, na comunidade de Barrancos, o petre-
cho para o Caracol possui geralmente quatro panos de comprimen-
to, aproximadamente 320 metros, as malhas variam entre 5 e 6 cm
e altura de uma braça (próximo à 1,5 metros). É utilizado principal-
mente para o camarão-branco, entretanto, captura também algu-
mas espécies de peixes (pescadas principalmente), sendo observa-
do que quando o foco é a captura de peixes existe a preferência pelo
uso da malha 6 cm e um maior número de panos de comprimento,
não ultrapassando cerca de 6 a 7 panos.
O caracol enquanto método é operado geralmente por dois pes-
cadores, entretanto, foi observada em Barrancos a realização por
pescadores “sozinhos”, o que apesar de ter maior de dificuldade
permite um maior rendimento. Ocorrem, durante um dia de pesca-

78.  Material sólido acumulado no leito marinho.


79.  Ato de retirada dos organismos capturados da rede.

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ria, diversos “lanços”80, com duração de 20 minutos, até uma hora.


Um tempo médio de lanço é citado como sendo de 30 minutos.
O entralhe da rede é diretamente responsável tanto pela dinâmi-
ca da pescaria, como pela funcionalidade do petrecho acarretan-
do boas ou más capturas. Para que se esclareça sobre o entralhe da
rede de Caracol, inicialmente, esclarece-se que a rede basicamente
é composta por quatro partes: a boia; o chumbo; a “encala” ou “ar-
cala” e o pano. A parte superior da rede é composta por um cabo
multifilamento, do comprimento da rede, com boias de isopor es-
paçadas entre si. Já o cabo inferior é composto por um cabo multi-
filamento no qual se insere o chumbo. O pano é o “corpo” da rede
e é unido aos cabos superiores pela “encala”, ou “arcala” (Figura 1).

80.  Processo completo de colocação da rede na água até o momento de retorno da mesma para
a embarcação.

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Figura 1 Rede de caracol (A) em destaque o cabo superior com a arcala e boia
(B), e o cabo inferior com o chumbo inserido no cabo multifilamento (C)

Fonte: Autores (2017)

Na tática de entralhe da rede do Caracol ocorre a seguinte pecu-


liaridade: no cabo superior, ou seja, na boia, ou “cortiça”, o tamanho
da “arcala” é menor em relação ao chumbo, o que no fim do entra-

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lhe deixa a rede com uma diferença de cerca de três braças entre o
chumbo e a “cortiça”. Portanto, ficando ligeiramente mais curta na
“cortiça”. De acordo com os pescadores esse é um fator que interfe-
re totalmente na operação da rede, tal característica não é observa-
da em nenhuma outra forma de emalhe.
Para Cunha (2009), a territorialidade compreendida pelo uni-
verso do pescador é carregada de significações, dessa complexida-
de deriva o conhecimento acerca das melhores formas de colocar
as redes, e dos movimentos dos organismos marinhos. A adapta-
ção quanto ao entralhe faz com que a rede em operação, quando
tracionada num movimento próximo ao circular, além de trabalhar
“deitada” ganhe uma forma ligeiramente cônica.
Intrigados com as altas capturas, os pescadores de Barrancos as-
sumiram-se dispostos a praticar uma nova técnica, cabe lembrar que
na época, por volta da década de 1980, os pescadores da comunida-
de pescavam o camarão-branco através do caceio, utilizando um nú-
mero muito maior de panos no comprimento, geralmente 20, sendo
a rede completa de preço muito superior à do Caracol. Em termos de
preços para o ano de 2017 o petrecho completo do Caracol custa algo
em torno de trezentos reais (R$300,00), enquanto o petrecho com-
pleto de caceio ultrapassa seiscentos reais (R$600,00).
O Caracol é o petrecho de emalhe mais barato entre os utiliza-
dos pela comunidade de Barrancos. O consumo de óleo necessário
para a prática também é reconhecidamente menor quando com-
parada ao Arrasto de Porta, outra técnica utilizada para a captura
de camarões. A média diária de consumo de óleo para o arrasto de

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portas chega a ser de cinquenta reais (R$50,00) por dia, enquanto


no Caracol esse consumo chega a ser semanal. Estas observações
corroboram com as de Caldeira (2009), que aponta relatos de que
o Caracol é mais acessível financeiramente, e proporciona rendi-
mentos mais satisfatórios. O Caracol possui ainda como vantagem
ter como alvo de captura o camarão-branco, considerado “nobre”,
não sofrendo quedas expressivas no valor durante o ano (CALDEI-
RA; PIERRI, 2014).
Outro ponto vantajoso sobre o Caracol em relação ao arrasto de
portas, segundo os pescadores, é que o Caracol “judia menos do mo-
tor”, “trabalha com o motor na lenta”, ou seja, apesar de a rede tam-
bém ser tracionada, a força necessária a ser empregada com o motor
no Caracol é muito menor, poupando o motor, combustível e au-
mentando a sua durabilidade. É considerado um dia de boa captura
para o Caracol, tendo como alvo o camarão-branco, um rendimento
financeiro em torno de oitocentos reais (R$ 800,00) por canoa.
Autores como Silva (2006) e Afonso (2013) afirmam serem diver-
sas as mudanças que ocorrem nos petrechos, algumas mais signi-
ficativas que outras, tais transformações podem se dar devido aos
processos naturais como as diferenças geográficas, as condições do
mar, temperatura, maré e ventos, a ocorrência de espécies em cer-
tas regiões, acesso aos materiais para a confecção das ferramentas
de pesca, ou humanos como o turismo , a proximidade de cidades,
estradas, ferrovias e portos, o acesso à energia elétrica, à infraestru-
tura urbana e à informação, às políticas públicas e à legislação de

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pesca, o acesso aos diferentes materiais industrializados, a interfe-


rência das empresas pesqueiras, entre outras.

PRINCIPAIS RECURSOS PESQUEIROS DA ARTE DO CARACOL


No Caracol da comunidade de Barrancos tem-se predominan-
temente como alvo o camarão-branco, entretanto, observou-se que
capturas de pescadas também ocorrem, sendo que em determina-
da época do ano (agosto a fevereiro) são significativas as capturas
de pescada, havendo durante esses meses a preferência pela substi-
tuição da malha 5 pela 6 cm; além do uso de mais panos.
Quando considerado o caracol, as espécies a que os pescado-
res associam são sempre o camarão-branco e pescadas. Para o ca-
marão-branco foi informado que a “safra” ocorre de março a junho,
já para a pescada a “safra” vai de agosto a fevereiro. Acerca do ca-
marão-branco foi informado pelos pescadores que 2017 foi um ano
que “surpreendeu” ocorrendo boas capturas até próximo a agosto,
e que apesar de “fracassar” em certas épocas, o mesmo está presen-
te o ano inteiro. Ficou evidente também uma constatação a partir
dos pescadores de uma melhoria na quantidade de camarão a cer-
ca de três anos atrás até 2017.
Considerando as demais artes de pesca, surgem como espécies
presentes no cotidiano das capturas dos pescadores de Barrancos:
Camarão-sete-barbas (Xiphopenaeus kroyeri); Camarão-maruí (“fi-
lhote do rosa”) (Farfantepenaeus sp.); Cavala (Scomberemorus sp.);
Peixe-porco (Balistidae sp.); Robalo (Centropomus sp.); e Tainha
(Mugil sp). Muitos dos organismos capturados pela pesca em Pon-

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tal do Paraná fazem parte de listas nacionais de espécies sobre-


-exploradas ou ameaçadas de sobre-exploração como a pescada-
-membeca (Macrodon ancylodon); camarão-branco (Litopenaeus
schmitti); camarão-sete-barbas (Xiphopenaeus kroyeri) e Tainha
(Mugil sp) (CALDEIRA; PIERRE, 2014).

AS NORMAS E CONFLITOS PARA A PESCA DO CARACOL


O uso ou não das diferentes práticas de pesca é regulamentado
por leis, portarias e instruções normativas dos diversos setores do
poder público que teoricamente, executam e fiscalizam seu cum-
primento. Para Nunes (2010), um dos problemas para a conservação
dos recursos está nas regras de ordenamento de pesca, que na maio-
ria das vezes, não consideram as diferenças nos aspectos socioeco-
nômicos e ecológicos de cada localidade, o que explica não só a não
aceitação das mesmas como o surgimento de novos conflitos.
Caldeira et al. (2016) descrevem 30 instrumentos normativos
presentes no litoral paranaense, que em conjunto são responsáveis
por setenta e uma normas para práticas de pesca e extração de re-
cursos. Observa-se em Barrancos a condição afirmada por Andri-
guetto-Filho (1999) onde a presença de complexos instrumentos ju-
rídicos faz com que pescadores acabem transgredindo a legislação
ambiental, pois do contrário seria impossível manterem seus mo-
dos de vida e mesmo sua sobrevivência.
Uma grande dificuldade da pesca em Pontal do Paraná está no
conflito entre restrições de uso de um lado e sobrevivência e satis-
fação de necessidades básicas do outro. A sustentabilidade ecoló-

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gica é imprescindível e existem evidências cientificas e percepções


dos pescadores sobre práticas potencialmente destrutivas, sendo
de grande importância estudos das diferentes modalidades e in-
tensidade de seus usos. Entretanto, caso seja aplicada com rigor, a
legislação existente em 2017 inviabiliza quase todas as práticas de
pesca do município (CALDEIRA; PIERRI, 2014).
Sobre o Caracol já é sabido que sua prática é proibida na maior
parte das situações, essencialmente por dois motivos: Primeira-
mente o tamanho da malha geralmente utilizado (5 cm entre nós
opostos), medida essa que segundo a Portaria do IBAMA Nº 12 de
2003 “visa à proteção de vasta gama de organismos principalmente
peixes jovens” (BRASIL, 2003). Em segundo lugar, pela prática ser
executada com a rede sendo tracionada a partir da embarcação, re-
forçando a proibição durante três meses do ano, considerados de-
feso (março/abril/maio), conforme a Instrução Normativa Nº 189
de 2008 (BRASIL, 2008).
Não há consenso entre os saberes técnicos, jurídicos e os tradi-
cionais que fundamentam as normativas, assim como não há con-
senso entre os próprios pescadores acerca das normas que inci-
dem na prática. Houve relatos de pescadores de que o Caracol “não
é proibido” e de que “é proibido na época do defeso, pois não pode
puxar a rede motorizado”. Não cabe aqui discutir se os pescadores
têm conhecimento da portaria do IBAMA Nº 12 de 2003 (BRASIL,
2003), responsável pela normatização da malha cinco, entretanto, a
mesma se relaciona com a prática mais do que simplesmente com
a permissão ou não.

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É no artigo 5º da portaria do IBAMA Nº 12 de 2003 (BRASIL,


2003) que fica determinada a proibição da utilização de malhas in-
feriores a 60,0mm (6 cm entre nós):

Durante o período do defeso estabelecido para


a pesca de arrasto de camarões, em mar aber-
to, fica permitida a utilização de redes de caceio
ou de emalhar, com malha igual ou superior a
50,0mm (5 cm entre nós) (...) sem tração mo-
torizada.

Sendo assim, é permitido o caceio de malha 5 cm sem tração


mecânica no período entre 1 de março e 31 de maio (época do de-
feso para camarões). Essa exceção que a portaria faz para o caceio
é de conhecimento de todos os pescadores e surgem expressões
como: “Caracol é proibido porque a rede é puxada a motor, por isso
caceio é permitido, a rede anda com a maré!”.

MUDANÇAS NO PETRECHO DE CARACOL NA COMUNIDADE


DE BARRANCOS
A evolução do Caracol não se limitou apenas a sua introdução a
partir dos pescadores de Santa Catarina. De acordo com os pesca-
dores locais, mesmo depois de absorverem a prática, eles ainda “fo-
ram inventando”, sendo que em 2017 apesar de semelhante, alguns
detalhes diferenciam o petrecho. Tal evolução no Caracol se deu no
petrecho em relação à sua estrutura, podendo ser citados, a exclu-
são da estrutura denominada cachimbo; o uso de uma nova ban-

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deira; a diminuição da espessura do fio, e a diminuição do compri-


mento da rede.
A estrutura denominada cachimbo (Figura 2) inicialmente fazia
parte do petrecho e era composto geralmente de canos de PVC re-
cheados de concreto, podendo ter formato de “J” ou “T” invertido e
chegando a pesar 13 quilogramas. Sua funcionalidade: manter o cabo
inferior da rede não só próximo, mas com algum nível de tração no
sedimento. Quando abordados pela fiscalização, geralmente mais
frequente na época do defeso do camarão, a simples presença da es-
trutura na embarcação, ou constatação da mesma junto à rede pode
ser usada como uma prova flagrante da prática do Caracol.

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Figura 2 Estrutura denominada Cachimbo

Fonte: Autores (2017).

O desaparecimento do cachimbo dificultou a constatação de es-


tarem na prática proibida e a funcionalidade da estrutura (manter a
tração da rede com o sedimento) foi mantida com uma adaptação
a qual chamam de “tesoura” ou “chicote”, constituído de um acrés-
cimo de chumbo no cabo inferior da rede, no trecho próximo à em-

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barcação. A partir de então o petrecho ficou mais semelhante com


aquele em que a legislação abre uma exceção, o caceio. Sem o ca-
chimbo o trabalho foi facilitado e diminuíram acidentes que eram
recorrentes com a estrutura. Acrescenta-se ainda, a percepção de
que com a maior quantidade de chumbo, e o mesmo estando dis-
perso por toda a rede melhoraram as capturas. Nenhuma das em-
barcações de Barrancos em 2017 utiliza o cachimbo.
Uma das características da pesca de emalhe é a utilização de
bandeiras que sinalizam a presença das redes, facilitando com
que outras embarcações a visualizem, como também que o pró-
prio pescador as encontre no caso de a mesma ser deixada à deri-
va. No Caracol como um extremo da rede continua preso à embar-
cação, inicialmente sinalizava-se apenas um dos extremos, ou seja,
de todo o petrecho, a bandeira é a primeira que vai à água, o que
demonstra para outros usuários da área toda a região ocupada pela
rede da embarcação que faz a prática.
Recentemente, ainda que não tenha sido adotado por todas as
embarcações, porém já evidenciado pelos pescadores, é frequen-
te o uso de mais uma bandeira, esta segunda, mais próxima à em-
barcação. Duas bandeiras sinalizando os extremos da rede são
também uma característica da pesca de caceio. Assim, como na re-
tirada do cachimbo, soma-se a possibilidade de se passar por ca-
ceio, uma maior segurança quanto à garantia de que outra embar-
cação avalie corretamente a área ocupada pela rede e não “passe
por cima” da mesma, algo que foi observado acontecer.

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Ocorreram ainda duas mudanças significativas no petrecho fo-


ram elas: a redução da espessura do fio e a utilização de um me-
nor número de panos (menor comprimento da rede), sendo essas
duas, com a finalidade de deixar a pescaria mais seletiva, conside-
rando o camarão-branco como alvo.
A espessura do fio (0,20) é muito menor do que quando introdu-
zida na região, inicialmente o fio utilizado era mais espesso (0,30);
depois migraram (0,25) sendo que atualmente trabalham com o fio
de menor espessura disponível no mercado (0,20). A mudança com
relação ao fio está diretamente ligada às maiores capturas de cama-
rão, relata-se que a menor espessura do fio segundo os pescadores
“pega o camarão até pelo bigode”.
Em 2017, a quantidade de panos de comprimento utilizada na
comunidade para a pesca do Caracol são quatro. De acordo com
os pescadores, inicialmente se faziam com mais panos, porém, ob-
servaram que quanto maior a quantidade de panos maior a captu-
ra de peixes. Quando se intenciona a captura de peixes geralmen-
te pescadas (Cynoscion sp.), utiliza-se um maior número de panos,
não ultrapassando sete. Associa-se também o maior número de pa-
nos com um maior espaço ocupado na água, o que de alguma ma-
neira não é interessante, pois acaba por acirrar a disputa no aces-
so à pescaria.
As mudanças com o intuito de tornar a pescaria mais seleti-
va evidenciam a comunidade de Barrancos como um lugar onde

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não só a biodiversidade81, mas sua conservação são elementos im-


portantes na configuração social, através das formas de apropria-
ção e uso dos organismos marinhos. É nesse sentido que a susten-
tabilidade na pesca surge como um conceito multidimensional a
ser considerado, em que as considerações ecológicas, sociais, eco-
nômicas e culturais têm o mesmo peso. Entende-se aqui como sus-
tentabilidade na pesca a associação entre a conservação das espé-
cies e a manutenção das atividades, o que só ocorrerá mediante a
melhor compreensão das relações das populações humanas com
os organismos marinhos (NUNES, 2010).

ÁREAS DE PESCA DO CARACOL PARA A COMUNIDADE DE


BARRANCOS
O mar além de local de trabalho é onde ocorrem encontros e se
constroem relações cotidianas. Adrião e Nascimento (2006) se re-
ferem ao mar como um deserto com alguns locais específicos onde
há vida. O conhecimento sobre a localização desses lugares foi ad-
quirido pelos pescadores no dia a dia e passado entre as gerações.
Esses pontos são chamados de “marcas”, reconhecidas também
como “visadas”. São feitas a partir de características da área, e/ou de
acordo com pontos fixos na terra vistos do mar.

81.  Conceito que incorpora desde paisagens, ecossistemas e genes, estando inclusos diferen-
tes processos e funções, sua manutenção exige esforços em vários níveis como: a preservação do
conjunto de ecossistemas; a interação entre humano e ambiente; o conhecimento a nível de espé-
cies; e a conservação da variedade genética de espécies cultivadas e animais domesticados (TO-
LEDO, 2001).

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Quanto às marcas informadas pelos pescadores que têm relação


com o Caracol foi possível perceber pelo menos 10 pontos com es-
treita relação com a prática, sendo: Rebentação/Bolacha; Ponta com
Ponta; Serrasilhas; Um Morro; Dois Morros; Três Morros; Encanta-
da; Encantada Grande, e Cano do Farol. Cada uma dessas marcações
possui características próprias, quanto às questões oceanográficas,
com conhecimento associado em relação às principais espécies que
podem ser encontradas e a melhor prática a ser utilizada.
O ponto mais próximo é a referência Rebentação ou Bolacha, a
pesca nessa área depende de um mar calmo, e de acordo com os pes-
cadores fica facilitado com o vento “terral” (vindo de terra/nordeste
para a região). Já o mais longe é considerado como “Encantada” para
fora, com quase 20 metros de profundidade, e de maior ocorrência
de peixes como na afirmação: “quanto mais pra fora, mais peixe”.
Para o camarão a área característica de melhores capturas é de “Três
Morros para terra”. Deslocamentos no sentido norte não são obser-
vados, ou pelo menos não ultrapassam Pontal do Sul, já em sentido
sul existem relatos de que se pode chegar até Matinhos.
Uma característica do ponto de pesca utilizado pelo Caracol de
maior proximidade com a praia (Rebentação/Bolacha) que cabe
ser lembrado, é que o mesmo surge como sendo restrito. Tal restri-
ção se dá por duas normas, primeiramente e mais antiga, a Por-
taria IAP nº 85, de 19 de junho de 2009 (PARANÁ, 2009) que proí-
be a colocação de redes até a distância de meia milha náutica
(926 metros); reforçada em 2012 pela Instrução Normativa MPA/
MMA 12, que no Art. 6º determina proibida a pesca de emalhe

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por embarcações motorizadas até a distância de 1 milha náutica


a partir da linha de costa.
A restrição da atividade na área é de conhecimento de todos os
pescadores, porém, observa-se grande frequência da prática do Ca-
racol “dentro” da primeira milha. Argumenta-se que em determi-
nadas épocas é ali que se concentra o camarão, segundo alguns
pescadores, apesar de afirmarem atuarem na área, consideram
que a proibição tem algum sentido já que tal trecho teria importân-
cia biológica para diversas espécies. Surgem, portanto, expressões
como, “infelizmente o camarão dá na milha”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Caracol e algumas de suas peculiaridades apresentadas trazem
à tona a dimensão cultural, espacial e ambiental presente em Barran-
cos, obtendo assim, a partir da descrição da arte, maior clareza sobre
os recursos naturais, sociais e econômicos presentes no território.
A partir do resgate da dimensão histórica da prática constatou-
-se que os pescadores se reconhecem através do compartilhamento
de técnicas de uso comum, e que é no processo que tem como base
o conhecimento local e aprendizagem coletiva que se reforçam as
noções de identidade “Pescadores artesanais de Barrancos”.
As normas presentes na pesca que influem diretamente na vida
da comunidade de Barrancos não representam a mesma, somente
expressam a dimensão de aprisionamento a que vive uma cultura,
colocando-a diariamente em condições de ilegalidade, o que pode
comprometer severamente seus modos de vida. Os excessos de

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normativas colaboram para a desarticulação de um modo de vida


comunitário, tradicionalmente elaborado e ricamente expresso por
meio da apropriação de técnicas e conhecimento sobre o meio na-
tural, cujas atividades de labor ainda mantêm diversas característi-
cas de um sistema socioeconômico à margem do hegemônico.
Todos os pescadores da comunidade de Barrancos reconhecem-
-se como pescadores artesanais, praticam o Caracol, e são cons-
cientes acerca de suas maiores habilidades e relação com a práti-
ca. A utilização da arte do Caracol não se manteve estática desde
sua inserção na comunidade, sendo que vem diariamente se reno-
vando, em pequenos detalhes que muitas vezes, passam desperce-
bidos aos olhos de leigos.
A prática do Caracol apresenta-se segundo os pescadores como
de menor impacto ambiental quando comparada a outras com o
mesmo alvo, em relação ao Arrasto de Portas o argumento é de que
tal arte “mata muito filhote de peixe”, o caracol no conhecimento
tradicional é interpretado como uma arte mais sustentável até mes-
mo do que aquela permita por lei durante o defeso (Caceio de ma-
lha 5), a malha 5 é vista como um impacto no sentido em que cap-
tura peixes sem valor comercial devido ao pequeno tamanho, e a
quantidade de panos utilizada no Caceio chega a ser cinco vezes
maior que o Caracol.
O conhecimento sobre o universo da técnica e do modo de vida
amplia as possibilidades de se pensar em formas alternativas de de-
senvolvimento. Estudos sobre o qual esse se propôs, irão se benefi-
ciar a partir do momento que surjam investigadores da própria co-

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munidade, que compartilhem a mesma cultura. O ato de pesquisar


não é isento de implicações culturais, éticas e políticas, com pes-
quisadores que compartilhem a mesma cultura aumentam as pos-
sibilidades de controle de seu território pela comunidade.

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ca de arrasto com tração motorizada para a captura de camarão
rosa (Farfantepenaeus paulensis, F. brasiliensis e F. subtilis), cama-
rão sete barbas (Xiphopenaeus kroyeri), camarão branco (Litope-
naeus schmitti), santana ou vermelho (Pleoticus muelleri) e barba
ruça (Artemesia longinaris), anualmente, nas áreas e períodos que
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RURALIDADE NO LITORAL DO PARANÁ : UM


ESTUDO DE CASO DA COLÔNIA PEREIRA-
PONTAL DO PARANÁ E PARANAGUÁ

Priscila Cristina dos Santos


Antonio Marcio Haliski

RURALIDADE: UM CONCEITO SOCIOLOGICO


O ambiente rural sempre se mostrou complexo e historicamen-
te essencial na construção do Brasil, por isso Sérgio Buarque de
Holanda (2014) demonstra as bases da nossa colonização e como
Portugal desempenhou um papel aventureiro e predatório, esta-
belecendo aqui o que ele chama de uma sociedade de base rural
e não de base agrícola, formada a partir de uma herança escravis-
ta e do latifúndio. Wanderley analisando também as raízes históri-
cas do rural brasileiro afirma que “a grande propriedade utilizou, e
ainda utiliza em boa parte, uma força de trabalho não proletariza-
da, isto é, que mantém uma base familiar de produção de sua sub-
sistência [...] fora da grande propriedade a mão de obra familiar
se reproduz quer através da propriedade jurídica da terra, quer da
ocupação sem título legal” (2009, p.114).
Sendo assim, Carneiro (2012, p.31) afirma que toda essa base his-
tórica de formação do Brasil servia de “sustentáculo do universo
social desse Brasil escravocrata, em que não há lugar para o traba-

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lhador livre, a não ser as margens dessa sociedade”. Segundo a au-


tora o “agricultor brasileiro é, desde sua origem, um lavrador sem-
-terra, sem casa, enfim, sem cidadania. Nessa condição, ele já nasce
dependente e em dívida numa sociedade em que a lógica do favor e
o recurso à força física se complementam” (2012, p.31).
Esta estrutura agrária, do latifúndio, ainda se mantém no Bra-
sil e passou por vários projetos de modernização ao longo dos anos
(maquinários, transgênicos, agrotóxicos, entre outros), culminan-
do em um aumento das desigualdades e na consolidação do agro-
negócio. Porém, o campesinato não desapareceu e o rural tradi-
cional não necessariamente teve seu fim.
Atualmente, o que se têm é um rural diverso, que dificilmen-
te se enquadra em uma categoria única de rural e urbano. Portan-
to, é necessário que se pense um conceito mais adequado para a di-
versidade de rurais existentes no Brasil, como o de ruralidade, que
pode ser entendida como:

[...] um processo dinâmico em constante rees-


truturação dos elementos da cultura local, me-
diante a incorporação de novos valores, hábitos
e técnicas. Tal processo implica um movimento
em duas direções, nas quais se identificam, de
um lado, a reapropriação dos elementos da cul-
tura local a partir de uma releitura possibilita-
da pela emergência de novos códigos e, de ou-
tro lado, a apropriação pela cultura urbana de
bens culturais e naturais do mundo rural , pro-
duzindo, assim, uma situação que pode contri-
buir para alimentar a sociabilidade e reforçar os
laços com a localidade (CARNEIRO, 2012, p.50).

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É, portanto, sobre essa perspectiva de um rural não homogêneo,


não estático, não descolado da estrutura urbana e não romantizado que
autores como Wanderley (2009), Carneiro (2012), Schneider (2003),
Brandenburg (2010), entre outros, têm produzido seus trabalhos.
Neste sentido, o objetivo do presente texto é demonstrar elementos de
uma ruralidade presente no litoral do Paraná , através de um estudo de
caso na colônia Pereira, pertencente aos municípios de Pontal do Para-
ná e Paranaguá (Figura 1). Para tanto, nos utilizaremos de uma pesquisa
bibliográfica com autores regionais e também de outros que se destacam
em pesquisas sobre o mundo rural , além de entrevistas com moradores.

Figura 1 Localização e limites da Colônia Pereira

Fonte: Instituto Chico Mendes de Biodiversidade, Parque Nacional Saint-Hilaire Lange, 2012.

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LITORAL PARANAENSE E SUA RURALIDADE


O litoral paranaense é composto por sete municípios, o que cor-
responde apenas a 3% da superfície do estado do Paraná, estes mu-
nicípios estão imersos em Unidades de Conservação ambiental,
que podem ser de proteção integral ou de uso sustentável. Estan-
do somente Matinhos (31,56%) e Pontal do Paraná (0,04%), abaixo
da metade de sua área total do município ocupada pelas mesmas,
ou seja, 81,38% do litoral Paranaense são Unidades de Conservação
(Paraná, 2016, p. 161). As Unidades de Conservação aliadas a ativi-
dades econômicas, como: turismo , agricultura e atividades por-
tuárias geram no litoral um ambiente de diversidade e também de
conflitos na medida em que se tem diversos objetivos e usos sobre
o mesmo território.
O Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura
(IICA) realizou um estudo das diferentes ruralidades presentes no
Brasil, olhando as experiências internacionais e as definições apon-
tadas pela academia. O litoral paranaense foi enquadrado no tipo
19, tendo a mesma ruralidade de locais como Entornos do Rio, Juiz
de Fora, Viçosa, Belo Horizonte, São Paulo; Leste Catarinense; Ve-
lhas Colônias Gaúchas. Este tipo, segundo Bitoun, et al. (201-, p.
51) se caracteriza principalmente por uma forte predominância da
agricultura de base familiar (superior a 45% da área total dos esta-
belecimentos) e pela forte pluriatividade, propiciada pela proximi-
dade de grandes centros urbanos (201-, p. 53).
Este estudo aponta que a ruralidade do tipo 19 tem como carac-
terísticas: menos da metade da população do rural trabalhando em

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atividades agropecuárias, taxas de renda domiciliar per capita de 1


a 3 salários mínimos, taxa geométrica de crescimento populacio-
nal de 1,85, que segundo esse estudo provavelmente estaria associa-
do ao transbordamento de populações urbanas que passam a resi-
dir em zonas rurais, onde residentes não se ocupam em atividades
agropecuárias, padrões observados na Europa e na América do Nor-
te (BITOUN, et al., 201-, p.76). Este estudo tem como pano de fundo
a discussão sobre o rural brasileiro e a reflexão sobre os espaços ru-
rais em sua dinâmica e diversidade. Segundo o IICA (2013, p.81):

Em razão da diversificação observada nos es-


paços rurais nos últimos anos, alguns autores
(por exemplo, Wanderley, 2009; Veiga, 2006;
Graziano da Silva e Del Grossi, 2000; Carneiro,
1998) destacaram que, mais do que um renasci-
mento, vivenciamos atualmente o surgimento
de uma nova ruralidade, que seria resultado da
convergência de alguns fatores, como: o aumen-
to da preocupação com a conservação do patri-
mônio natural; a intensificação de outras ativi-
dades econômicas e de outros interesses sociais
no meio rural , para além da prática agrícola; a
atribuição de novas funções para o meio rural
ademais da produção de alimentos; o aprovei-
tamento das distintas amenidades propiciadas
pelos centros urbanos próximos; e a exploração
de novas fontes de energia. Como consequên-
cia, as áreas rurais passaram a ser consideradas
atualmente como construções sociais específi-
cas e diversificadas.

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COLÔNIA PEREIRA: ELEMENTOS DA RURALIDADE NO


LITORAL
A Colônia Pereira se localiza nas divisas dos municípios de Pa-
ranaguá e Pontal do Paraná . Esta Colônia foi fundada em 1875 e
pertencia, segundo o relatório de presidente de província do esta-
do do Paraná (1876, p. 91), a empresa “Pereira Alves, Bendaszeski &
C”. A maior parte das colônias particulares do estado do Paraná não
prosperou e foi considerada, pelo governo, um fracasso para a in-
trodução de imigrantes (CAVANHA, 2012). Dessa época resta, ainda
hoje, na comunidade uma família, cuja história está intrinsicamen-
te ligada à da região.
Atualmente, boa parte da Colônia Pereira está dentro dos limites
do Parque Nacional de Saint-Hilare/Lange, o que gera, segundo os
moradores, diversas modificações nos usos e práticas dos recursos
naturais na região, como é possível observar na fala da entrevistada
1, moradora da comunidade:

“[...] tinha muita produção de mandioca, banana,


tinha de tudo, agora eles tão jovens (se referin-
do aos filhos) e tão todos empregados, então aca-
bou, e agora tem lugar que é parque, mais difí-
cil para trabalhar, mas tudo tinha documento, eu
acho que quem vive da agricultura tem que tra-
balhar porque vive dela, se eu vivo da agricultura
não era para eu estar buscando patrimônio, an-
tes nós vivíamos da agricultura e hoje temos que
viver de comercio [...]. Sendo que a nossa colônia
produz, produzia antes né porque ninguém bus-
cava lá na cidade, tinha que trabalhar mais o go-
verno não deixa o povo trabalhar, o agricultor do
litoral é prejudicado nessa parte [...].”

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Ao contar sua história de vida, a entrevistada 1 faz referência à


alimentação, que antes era quase que integralmente oriunda do
próprio sítio e da comunidade e hoje exclusivamente do mercado.
Na Colônia há duas grandes empresas, uma pedreira e um hotel e
nas proximidades um parque aquático, estes absorvem uma parte
dos moradores da comunidade como mão de obra temporária ou
permanente. Estas empresas são também um dos elementos cons-
titutivos da ruralidade da Colônia (ou do litoral, a exemplo do estu-
do do IICA), tendo em vista serem fontes de dinamismo na comu-
nidade, seja atraindo novos moradores, seja empregando aqueles
que já moravam e trabalhavam na agricultura.
A Colônia Pereira reflete o rural como um espaço diversificado
de uso, caracterizado pela agricultura, pluriatividade e local de mo-
radia. Isto, segundo Carneiro (1997, p.56), pode ser entendido como
“uma alternativa ao êxodo rural , ao desemprego urbano, e ao pa-
drão de desenvolvimento agrícola dominante.”
A fala dos moradores demonstra o quanto as ocupações são di-
versificadas na Colônia Pereira. Um exemplo disso é a fala da entre-
vistada 2 “Mais aqui é até bom de morar aqui a gente cria galinha e
tem a plantação da gente, tem uma mercearia que é nossa, eu ven-
do roupa, vou em São Paulo buscar.”
Esse fenômeno conhecido como pluriatividade é um processo
de adaptação dos atores do mundo rural , em que o espaço rural
deixa de ter a agricultura como único e exclusivo meio de sobre-
vivência e passa a utilizá-lo como novas possibilidades de traba-
lho. Entendemos isso como uma forma do agricultor permanecer

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no campo, ou seja, o fato de realizar atividades não-agrícolas jun-


tamente com estas, é uma possibilidade a mais de permanência e
não de saída do mundo rural .
Morar no rural e trabalhar no urbano é outro fenômeno rela-
tado por moradores do local, como afirmam as entrevistadas 3 e
4, respectivamente:
“O meu irmão que trabalha em Matinhos [...]
trabalha com sistema de esgoto [...] A mãe tra-
balha aqui para uma mulher de empregada [...]
e vendemos as coisas da roça para os vizinhos”.

“a [...] trabalha aqui no posto de saúde , e a [...]


trabalha na escola e a outra menina mais velha
[...] ela é casada mais mora aqui atrás também,
mora comigo [...] meu filho montou a padaria
aqui e só trabalho um pouco na roça”.

Para Schneider (2003, p.21) esta pluriatividade é “a combinação


de ocupações em atividades agrícolas e não-agrícolas por parte dos
membros de uma mesma família rural ”. Portanto, verifica-se que
a Colônia Pereira se caracteriza como pluriativa, e que dentro de
uma residência podemos ter, por exemplo: aposentados, pessoas
que trabalham na roça, na panificadora, como funcionários pú-
blicos e como empregados assalariados, convivendo sob a mesma
propriedade e colaborando para o sustento do grupo familiar.
Outro processo observado na Colônia e que chama a atenção,
são as trocas entre rural e o urbano num fluxo crescente, o que se-
gundo Wanderley (2000) pode ser fonte de dinamismo ou de con-
flito. Os moradores da área urbana se interessam pela comunidade

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na procura de produtos do sítio (galinha caipira, ovos, verduras, fa-


rinha etc.), pelas belezas naturais (cachoeiras, matas etc.), pelo “re-
torno as origens”, ou simplesmente, pelo investimento econômico
(construção de pousadas, pesque e pague etc.), um interesse cada
vez mais frequente, como mostram os relatos das entrevistadas 2
e 5 respectivamente “Aqui a maioria está comprando, tem muitos
que vem porque está aposentando, porque gosta de criar galinha ...
aqui dá por causa da cachoeira, aí as vezes a gente faz lanche para
o povo, aí agora tem a panificadora ali” ou “Aqui só não tem mais
gente por causa do pernilongo [...]”
Carneiro (1997) afirma que a procura pela área rural como meio de
lazer e como forma alternativa de vida é um movimento que se inicia:

[...] de forma tímida no Brasil na década de 70,


expande-se e encontra a sua legitimidade na di-
vulgação do pensamento ecológico nos anos 90.
Entre os seus efeitos destacam- se a ampliação
das possibilidades de trabalho para a população
rural , até então dedicada quase exclusivamen-
te à agricultura, e a maior aproximação e inte-
gração de sistemas culturais distintos. Novos va-
lores sustentam a procura da proximidade com
a natureza e com a vida no campo. A sociedade
fundada na aceleração do ritmo da industrializa-
ção passa a ser questionada pela degradação das
condições de vida dos grandes centros. O conta-
to com a natureza é, então, realçado por um sis-
tema de valores alternativos, neoruralista e anti-
produtivista. O ar puro, a simplicidade da vida e
a natureza são vistos como elementos ‘purifica-
dores’ do corpo e do espírito poluídos pela socie-

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dade industrial. O campo passa a ser reconheci-


do como espaço de lazer ou mesmo como opção
de residência (CARNEIRO, 1997, p.57).
Este processo complementa-se com o da pluriatividade à me-
dida que a população do campo passa a ocupar-se para atender a
população urbana, seja como empregados (caseiros, empregados
domésticos, diaristas), seja como comerciantes (mercearias, pani-
ficadoras, bares), entre outros serviços. Porém, essa procura pelo
rural nem sempre é positiva, pois há moradores que demonstram
sentimento de invasão e desrespeito quando suas propriedades são
utilizadas pela população urbana, como se a natureza fosse um es-
paço “sem proprietário”, entrando em propriedades para acessar
o rio, deixando sujeira, fazendo bagunça e não respeitando quem
vive na região.
Outro processo de troca registrado nas entrevistas, que demons-
tra a procura pelo rural , foi às idas e vindas dos moradores do ur-
bano ao rural , ou seja, pessoas que nascem na comunidade e vive-
ram nela até certa idade, após migrarem para o urbano retornaram
para o rural :

“Ele trabalhava lá em Matinhos (referindo-se ao


seu filho), em Caiobá, ele trabalhou 13 anos, de-
pois ele não quis mais lá e veio para cá e disse
que ia montar uma padaria e a turma gostou, e
ele está tocando a vida [...]” (entrevistada 3).

“Falta de emprego, já tem bastante tempo que


ele está desempregado, achou melhor se aven-
turar na lavoura, porque lavoura é uma aventura
[...]” (entrevistada 1).

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Esses processos constituem a ruralidade da Colônia Perei-


ra, cujo espaço é caracterizado por diversos usos e ocupações, de-
monstrando aquilo que Carneiro afirmou como sendo um:

[...] processo dinâmico de constante reestrutu-


ração dos elementos da cultura local com base
na incorporação de novos valores, hábitos e
técnicas. Tal processo implica um movimen-
to em dupla direção no qual identificamos, de
um lado, a reapropriação de elementos da cul-
tura local a partir de uma releitura possibilita-
da pela emergência de novos códigos e, no sen-
tido inverso, a apropriação pela cultura urbana
de bens culturais e naturais do mundo rural ,
produzindo uma situação que não se traduz ne-
cessariamente pela destruição da cultura local,
mas que, ao contrário, pode vir a contribuir para
alimentar a sociabilidade e reforçar os vínculos
com a localidade (CARNEIRO, 1997, p.61).

A agricultura ainda é praticada na comunidade, feita de forma


bastante familiar e não como atividade única. Nela utiliza-se de
equipamentos de pequeno porte como micro tratores e de insumos
químicos. Com relação aos insumos químicos, alguns agricultores
parecem demonstrar preocupações:

“Infelizmente sim (se referindo ao uso de in-


sumos químicos), mas hoje usamos o mínimo
possível, por isso temos o projeto piloto da agro-
floresta” (entrevistado 6).

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Há também agricultores que mantém uma prática agrícola livre


de agrotóxicos “Nunca utilizamos nenhum tipo de veneno na nossa
propriedade” (entrevistada 1).
Entre os produtos mais produzidos na comunidade estão: a
mandioca, as hortaliças, a banana e a pupunha e em menor escala:
a cana- de açúcar, o milho, o mel, o café, as frutas, e criação de ani-
mais (peixes e galinhas). Soma-se a isso duas farinheiras de man-
dioca e uma fabricação de pães, bolachas, bolos e doces.
A produção da Colônia é destinada principalmente a compra di-
reta de alimentos por parte dos governos estadual e municipal atra-
vés do Programa de aquisição de alimentos (PAA) e Programa na-
cional de alimentação escolar (PNAE), há também a venda direta
para vizinhos e visitantes na comunidade, além da venda nas feiras
em Paranaguá .
A agricultura, de acordo com o entrevistado 6, é uma atividade
derivada de conhecimentos adquiridos ao longo da vida, pela expe-
riência desde a infância, vivência do dia a dia, troca de informações
com outros e através de cursos. A entrevistada 1, fala que sempre vi-
veu da agricultura, seus pais eram agricultores, seu marido é agri-
cultor e que também participou de muitos cursos oferecidos pela
Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER) que
ajudaram no trabalho do sítio.
Assim, o uso da terra na Colônia Pereira permite caracterizá-la
em quatro modalidades:
1) residências - propriedades com moradores mais antigos e
seus descendentes, cuja lembranças das farinheiras e equipamen-

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tos estão vivas na memória (é muito comum encontrarmos fari-


nheiras desativadas nestas propriedades);
2) roças - propriedades menores com moradores que vieram de
fora, produzindo para o consumo familiar, que trabalham em sua
maioria como empregados dentro e fora da comunidade;
3) sítio - propriedades de uso ocasional aos finais de semana
como espaço de lazer e descanso;
4) agricultura- propriedades cuja a agricultura se dá de forma
intensa, porém não sendo única atividade dos membros da família.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Colônia Pereira representa um rural abrigando diferentes ob-
jetivos, histórias, modos de lidar com a agricultura e com intensa li-
gação com o urbano ou o modo de vida urbano.
O rural não é estático ou não está sendo desertificado frente a
superpopulação do urbano. Ele é dinâmico, em constante transfor-
mação, cujos moradores vivem e participam dos processos de mu-
danças, mas guarda na tradição aquilo que lhes é essencial e im-
portante para viver.
Assim, os resultados desse estudo vão ao encontro do que o IICA
já havia constatado sobre o litoral paranaense, na caracterização de
sua ruralidade, ou seja, é constituído de pequenas propriedades,
cuja ocupação se deu no passado pela imigração e no presente pe-
las aquisições de novos moradores; servem de residência para fa-
mílias que se dedicam a atividades diversificadas que vão além da
agricultura, além de servirem de pouso ou lazer para trabalhadores

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urbanos. A Colônia Pereira revela sua pluriatividade integrando um


rural que não é antagônico ao urbano e sim complementar.
A ruralidade desta colônia é marcada por (re)ocupações na me-
dida em que empreendimentos econômicos se instalam na região
criando empregos, como é o caso da pedreira, do hotel e do parque
aquático, ou ofertando produtos, como do armazém e da agroin-
dústria, estes proporcionando novas dinâmicas que atraem antigos
moradores para o local. Em síntese, temos um rural de base fami-
liar, com dinamismo, conectado com o urbano, que apresenta plu-
riatividade e intensa relação de seus atores com a natureza, enfim,
um rural que é espaço de residência, roça, sítio e agricultura.

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LIGAÇÕES ECONÔMICAS, POLÍTICAS E


CULTURAIS DO RIO BRANCO SPORT CLUB AO
MUNICÍPIO DE PARANAGUÁ

Natali Calderari
Mayra Taiza Sulzbach

INTRODUÇÃO
O futebol, além de sua prática esportiva, está imerso em aspec-
tos sociais do cotidiano das pessoas e do lugar. Sua existência en-
volve pessoas, rituais, instituições, emoções e outros que lhe con-
ferem uma característica ampla em relação à realização de estudos
dentro do campo social. Para Mascarenhas (2005, p. 68), “a história
social do futebol se inscreve na história do lugar e com ele dialoga
intensamente. Sua espacialidade mutante se insere e participa da
lógica mais geral que anima e organiza o lugar”.
Arlei Damo (2007), que aborda a atividade futebolística na versão
espetacularizada, divide o futebol em quatro categorias, com base
nas características de sua prática: futebol bricolado, que se refere
ao praticado no improviso e adaptação das regras por aqueles que
o praticam como forma de divertimento; futebol espetacularizado,
praticado por profissionais; futebol comunitário, marcado pela exis-
tência de condições e estrutura mínimas necessárias para um cam-
peonato, como o futebol de várzea; e o futebol escolar, praticado nas

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escolas. Todas as categorias citadas são potenciais para a realização


de estudos no campo social. A profissionalização do futebol, por sua
vez, contribui para a participação em maiores proporções de dife-
rentes atores no ambiente futebolístico, com possibilidades de inte-
ração de diferentes setores num município, região ou país.
No Litoral do Paraná , o único representante do futebol profis-
sional é o Rio Branco Sport Club, objeto de pesquisa de uma dis-
sertação de mestrado que objetivou identificar laços de identidade
e pertencimento promovidos por este na população de Parana-
guá (CALDERARI, 2017). Para a construção da pesquisa exigiu-se
uma revisão histórica de Paranaguá , município mais antigo do es-
tado do Paraná (1648), local onde foi realizada a pesquisa de cam-
po e sede do Rio Branco Sport Club, e também da história do Clube,
uma organização centenária (1912), que apresentaram fortes liga-
ções econômicas, políticas e culturais, as quais se propõe abordar
neste capítulo, e se fundamentam em referências bibliográficas.

PARANAGUÁ
O município de Paranaguá , situado na região litorânea do esta-
do do Paraná, com uma população estimada para o ano de 2016 de
151.829 habitantes, em uma área de 826,674 km2 de extensão (IBGE,
2016), possui como elemento geográfico notável a Baía de Parana-
guá , a qual propiciou a construção de portos que influenciaram na
economia do Município e do Estado (ABRAHÃO, 2011). A importân-
cia da Baía de Paranaguá e da navegação para o Município se faz
representar no Brasão deste, cercada pelo café e pela cana de açú-

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car, produzidos no Estado, bem como pelos muros da fortaleza da


Ilha do Mel, que protege a terra de invasões e pela data de sua cria-
ção: 29 de julho de 1648 (Figura 1).

Figura 1 Brasão do município de Paranaguá

Fonte: Prefeitura de Paranaguá (www.paranagua.pr.gov.br, 2016).

O povoamento do Paraná (que teve início na região de Parana-


guá ), segundo Freitas (1999), começou na Ilha da Cotinga por volta
de 1550, com a busca de ouro, e, duas décadas depois, se estendeu à
margem esquerda do Rio Taguaré, hoje Rio Itiberê, sob a liderança

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de Domingos Peneda, fundador do povoado. As condições do ter-


reno e a segurança oferecida pelo Rio como fundeadouro teriam
sido determinantes para essa movimentação. De acordo com Bou-
tin (1993), o primeiro documento histórico que apresenta o Litoral
do Paraná foi a “Crônica do Náufrago” do alemão Hans Staden, de
1549, que conta com um mapa da Baía de Paranaguá e da Ilha de
Superagui (denominada por ele de Supraway), mencionando que
lá havia indícios da presença de portugueses.
Segundo Boutin (1993), antes dos europeus a área havia sido
ocupada pelo “homem do sambaqui”, no período pré-histórico,
e posteriormente pelos índios carijós. Freitas (1999) explica que a
presença dos sambaquis, “resultados da abundante coleta dos re-
cursos malacológicos utilizados na alimentação” (p. 34), é prova da
ocupação pré-histórica das terras onde hoje é Paranaguá e que, os
índios carijós, por sua vez, foram exterminados ou capturados por
bandeirantes do final do Século XVI ao início do Século XVII.
Os caiçaras do litoral paranaense ou “caboclos”, como denominou
o viajante francês Auguste de Saint-Hilaire a população local em sua
passagem pela região no Século XIX, preservavam traços da misci-
genação de portugueses, carijós e negros africanos (BOUTIN, 1993).
Em 29 de julho de 1648, o Capitão-Mor Gabriel de Lara obteve o
foral do povoado, passando a chamar-se Vila de Nossa Senhora do
Rosário de Paranaguá , e comemorando o aniversário do Município
(BOUTIN, 1993; FREITAS, 1999). Para Gabriel de Lara, a Vila tinha im-
portância estratégica ao avanço dos portugueses na costa brasileira
(FREITAS, 1999). Segundo Boutin (1993) e Freitas (1999), foi a desco-

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berta das minas de ouro na região, em 1649, que impulsionou a imi-


gração e contribuiu significativamente para o aumento populacional
na Vila. Em 1722, a extração de ouro foi abandonada e a Vila entra em
“fase de profunda decadência e penúria” (BOUTIN, 1993, p. 7).
O Município de Paranaguá conta em sua paisagem com diver-
sas construções representativas historicamente, dentre elas: a Igreja
Matriz Nossa Senhora do Rosário; o Colégio dos Jesuítas; e a Fortale-
za Nossa Senhora dos Prazeres. A Igreja de Nossa Senhora do Rosá-
rio, fundada em 1578, tendo suas características originais modifica-
das ao longo das reformas, está localizada na área em que se inicia
a povoação, crescendo a Vila em seu entorno (VIANA, 1976). O Co-
légio dos Jesuítas teve sua autorização para a construção em 1740,
e por problemas de financeiros levou dez anos para sua utilização,
esta, segundo Freitas (1999, p. 163), graças ao “esforço da comuni-
dade”. De acordo com Boutin (1933) e Freitas (1999), os moradores
também tiveram importante contribuição financeira na construção
da Fortaleza Nossa Senhora dos Prazeres, localizada na Ilha do Mel,
concluída em 1769, que tinha como objetivo a defesa militar contra
investidas espanholas (BOUTIN, 1993; FREITAS, 1999).
Em 5 de fevereiro de 1842 a Vila de Nossa Senhora do Rosário de
Paranaguá foi elevada à categoria de cidade, e em 19 de dezembro
de 1853 Paraná se torna uma Província, tendo como Curitiba sua
capital. Para Boutin (1993), apesar da importância de Paranaguá a
Província do Paraná, Curitiba foi escolhida capital devido “a gran-
de potencialidade econômica do planalto e a necessária interiori-
zação” (p. 12), causando ressentimento dos parnanguaras.

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O sistema portuário de Paranaguá tem sua história iniciada


juntamente com seu povoamento, uma vez que o rio e a baía ofere-
ciam condições favoráveis. Inicialmente localizado próximo à Igre-
ja Matriz, o então Porto de Nossa Senhora do Rosário avançou em
direção à foz do rio na medida em que surgia a necessidade de sua
ampliação (FREITAS, 1999). Segundo Freitas (1999), a necessidade
de maior profundidade para navegação na baía, em 1872, levou à
autorização da construção de um porto na Enseada do Gato, que
em 1874 passa a se chamar Porto Dom Pedro II, inaugurado em 28
de outubro de 1911. Em 1927 iniciaram-se obras de melhoria que ter-
minaram em 17 de março de 1935.
Como forma de ligação do litoral ao planalto, foi inaugurada em
2 de fevereiro de 1885 a estrada de ferro Paranaguá -Curitiba, uma
das maiores obras do Paraná, que contou com a participação dos
engenheiros André Rebouças e Teixeira Soares (FREITAS, 1999). A
viagem inaugural teve a presença da Princesa Izabel e sua famí-
lia, sendo o trem recebido com festividades em Curitiba (BOUTIN,
1993; FREITAS, 1999). Desta época datam as manifestações aboli-
cionistas no Brasil e, segundo esses autores, Paranaguá despendeu
valioso empenho para evitar o tráfico de negros e a libertação dos
escravos, tanto que, quando assinada a Lei Áurea em 1888, poucos
restavam no Município. Para Freitas (1999, p. 348), “o abolicionismo
em Paranaguá contou com os mais devotados apóstolos e servido-
res em todos os segmentos da sociedade”.
Com a construção da estrada de ferro elevaram-se as movimen-
tações de produtos no Porto, apoiando o crescimento da região. Se-

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gundo Freitas (1999), a erva mate teve um ciclo que perdurou mais
de um século. Boutin (1993) relata que, anterior ao ciclo da erva-
-mate ocorreu o da farinha de mandioca, importante produto do
litoral do Paraná , que continuou a ser produzido e exportado du-
rante o ciclo seguinte. A partir de 1920 iniciou-se o ciclo da madei-
ra que perdurou até 1955, dando lugar ao ciclo do café que, após a
segunda guerra mundial, contribuiu para mudanças na estrutura
de Paranaguá e do Porto (FREITAS, 1999). Segundo Freitas (1999),
além de absorver mão de obra trabalhadora, no Município, nes-
te ciclo:

Empresas de grande porte, armazenadoras e ex-


portadoras, instalaram-se, construíram e orga-
nizaram grandes companhias de armazéns ge-
rais, para guarda, conservação e ensaque do
café procedente do norte do Paraná, transporta-
dos por caminhões e vagões (p. 414).

A comercialização e exportação do café em Paranaguá já fazia


parte da rotina portuária desde 1933, quando foi criado o Centro do
Comércio do Café. Dada a importância econômica deste produto
para o Município, foi inaugurado em 29 de julho de 1961 o Palácio
do Café. Em 1965 o Porto Dom Pedro II recebeu o título de maior
porto exportador de café do mundo e, em 1982, com a duplicação
da BR-277, houve a diversificação dos produtos movimentados pelo
Porto de Paranaguá (FREITAS, 1999).

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Segundo o mesmo autor, ainda durante o ciclo da madeira, em


1921, com o estímulo à formação de professores no Brasil, foi cria-
da, em Paranaguá , a Escola Normal Primária pelo então Presiden-
te da Província do Paraná82 Caetano Munhoz da Rocha. O prédio
onde funcionava a Escola foi inaugurado em 29 de julho de 1927 e
em 1952, em homenagem ao seu fundador, recebeu seu nome. Em
1967 a Escola foi elevada a Instituto: atual Instituto de Educação Dr.
Caetano Munhoz da Rocha. Em 1956, Paranaguá é contemplado
com uma instituição de ensino superior: a Faculdade Estadual de
Filosofia, Ciências e Letras.
Outra instituição importante na história do município de Para-
naguá , segundo Freitas (1999), é o Clube Literário (Club Litterario,
na época), pois vem “acompanhando o progresso e a evolução so-
cial de Paranaguá , através do tempo” (p. 500), sendo “valioso patri-
mônio material e cultural da cidade” (p. 501), a “mais alta expressão
social e a mais legítima e honrosa tradição de Paranaguá ” (p. 501).
Segundo o autor, sua fundação estaria ligada a fins culturais, ten-
dendo à recreação, posteriormente.

O RIO BRANCO SPORT CLUB


O Rio Branco Sport Club faz parte da história econômica, so-
cial e cultural de Paranaguá . O Clube foi fundado em 13 de ou-
tubro de 1913 por um grupo de amigos motivados pela crescente

82.  “Criado em 1823 para substituir as Juntas Provisórias de Governo, o cargo de Presidente de Pro-
víncia, nomeado pelo Imperador e com a indicação do Conselho de Ministros, representava o Po-
der central como executor de sua política e administração” (CORRÊA, 2003, p. 1).

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prática do futebol no estado e, principalmente, na capital Curiti-


ba (MACHADO, 2003). De acordo com o autor, o nome do Clube
foi uma escolha de Jarbas Nery Chichorro para homenagear o Ba-
rão do Rio Branco, diplomata brasileiro que atuou no Ministério
de Relações Exteriores.
De acordo com Machado (2003), parte da história do Rio Bran-
co foi perdida, em decorrência do incêndio em sua primeira sede, o
qual destruiu toda a documentação até então, resultando em algu-
mas lacunas da história do Clube.
O primeiro campo do Rio Branco se localizava onde hoje é a
Praça João Gualberto, uma área gramada, outorgada pelo prefeito
Caetano Munhoz da Rocha, e preparada pelos próprios associados.
Segundo Machado (2003), na reunião de fundação do Clube ficou
acordado que o jogo de apresentação seria contra um time de Curi-
tiba. Antes desse confronto, o Rio Branco jogou contra o Brasil, um
time também de Paranaguá , no campo da Praça Pires Pardinho. O
América, time da Capital, foi o escolhido para enfrentar o Rio Bran-
co em sua apresentação oficial, sendo derrotado por 2x1.
Posteriormente à construção das arquibancadas, com madeiras
vindas em vagões e doadas por José Fonseca Lobo (Zezito) (MA-
CHADO, 2003), o campo foi reinaugurado num confronto com uma
equipe de Curitiba, desta vez formada por um misto de jogadores
dos Clubes da Capital, com vitória riobranquista.

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Em 1915 o Rio Branco participou da Liga Sportiva Paranaense83 e


a partir de 1916 da Associação Paranaense de Sports Athleticos84, jo-
gando contra times da Capital e interior do Estado. Uma pecu-
liaridade dos jogos realizados em Paranaguá era o horário dife-
renciado, estavam baseados nos horários do trem “de” e “para”
Curitiba. Os jogos começavam às 11h30min e terminavam antes das
15h30min para que as delegações dos clubes adversários pudessem
se deslocar para suas cidades. O mesmo ocorria em Curitiba, com
participação do Rio Branco (MACHADO & CHRESTENZEN, s/d;
MACHADO, 2003). Desses confrontos surgiu o apelido e mascote
do Rio Branco que, segundo Machado (2003), recebeu o apelido de
“Leão do Litoral” pela imprensa curitibana, que assim o denomi-
nava pelo seu bom desempenho em Paranaguá , frente os grandes
clubes da capital, fazendo parte inclusive do hino do Clube (RIO
BRANCO SPORT CLUB, 2017):

Leão da Estradinha
Me querido esquadrão
Leão da Estradinha
Serás eterno em meu coração

Torcer por suas cores é sensacional


Rio Branco querido não existe outro igual

83.  Primeira Liga de clubes de futebol organizada no estado do Paraná, que possibilitou a reali-
zação do primeiro campeonato oficial do estado, no mesmo ano (MACHADO & CHRESTENZEN,
s/d).
84.  Associação organizada por clubes que se desmembraram da Liga Sportiva Paranaense (MA-
CHADO, 2003).

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A bandeira alvi-rubra, a mais linda que há


Orgulho maior de Paranaguá

Com a construção da Escola Normal Primária de Paranaguá


no terreno aos fundos das arquibancadas, a administração muni-
cipal doou um terreno no bairro da estradinha, antiga estrada das
colônias, para a construção do estádio localizado, inaugurado em 12
de junho de 1927, o qual recebeu o nome de Nelson Medrado Dias,
Presidente do Clube que, através de seus esforços, tornou possível
a construção do mesmo (MACHADO, 2003). Segundo Machado
(2003), o dia da inauguração contou com a Banda Musical da Força
Militar do Estado, passeata pelas ruas, disparos de morteiro, hastea-
mento das bandeiras dos clubes da cidade, benção do campo, en-
trega de uma placa de bronze ao presidente do Clube e recepção e
jogo contra o Atlético Paranaense (naquela data chamado de Athle-
tico). Na cerimônia o time adversário cantou em homenagem ao Rio
Branco e a Paranaguá a seguinte canção (MACHADO, 2003, p. 48):

Rio Branco Esporte Clube – Alleguá!


Hurra! Hurra! Rio Branco valoroso!
E mais outro Hurra, estrepitoso,
Para saudar também Paranaguá .

Irmão, vós os de cá, nós os de lá.


Cultuando o mesmo ideal grande e formoso
Devemos ser o forte e generoso
E o digno filho deste Paraná.

As bandeiras do Athletico e Rio Branco


Devem se entrelaçar de modo franco,

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Cavalheiresco e leal em toda a linha,


Para que possa echoar em serra arriba
Pelos pontos cardeais de Curityba,
A grandeza do esporte da marinha!

O jogo terminou em 1x5 para o time visitante, que foi convidado


pelo Rio Branco para um baile no Club Literário (MACHADO, 2003).
Segundo Machado (2003), em 1943 foram realizadas melhorias
no estádio e novamente, para a inauguração, foi chamado um clube
curitibano para o jogo, o Bloco Esportivo Morgenau, hoje não mais
atuante no futebol. Em 1948 e 1954 o Rio Branco foi Campeão do
Interior85 (MACHADO & CHRESTENZEN, s/d; MACHADO, 2003),
sendo o último título comemorado com estádio lotado e carreata
pela cidade, no dia do trabalho (MACHADO, 2003).
Segundo Machado (2003), nos anos de 1954 e 1955 o Rio Bran-
co comemorou seu aniversário disputando jogos contra Coriti-
ba e Atlético Paranaense, dois times da Capital, com uma vitória e
um empate, respectivamente. A partir de 1956, durante aproxima-
damente dez anos, o Rio Branco passou a disputar o Campeona-
to Paranaense de Futebol86, sendo que em 1962, 1963 e 1964 foi tri-
campeão do Torneio Início87 (MACHADO & CHRESTENZEN, s/d),
o que transformou Paranaguá em um território de vitórias do Leão

85.  Campeonato organizado pela Federação Paranaense de Futebol com clubes de fora da capital
Curitiba (MACHADO, 2003).
86.  Campeonato realizado já nos moldes do atual Campeonato Paranaense, organizado pela Fe-
deração Paranaense de Futebol.
87.  Torneio realizado, na época, antes de cada Campeonato Paranaense, pelos clubes participan-
tes (MACHADO & CHRESTENZEN, s/d).

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e estádio Nelson Medrado Dias lotado de entusiastas torcidas Ma-


chado (2003).
O período de “boa campanha” foi o mesmo no qual o Clube re-
cebia doações de sacas de café, de empresas exportadoras, para
vender e manter-se nas disputas dos campeonatos. Porém, com a
baixa nas exportações de café, o Clube foi atingido (MACHADO,
2003). O ciclo do café também beneficiava seu principal rival na
época, o Seleto, outro time do município de Paranaguá que não
atua mais no futebol profissional. Ambos formavam o clássico Sele-
-Rio, movimentando a cidade:

A cidade litorânea ficava em polvorosa quan-


do as duas tradicionais equipes tinham que se
defrontar. A velha rivalidade, construída e ali-
mentada ao longo dos campeonatos amado-
res da cidade, agora estava em alta. Um queria
desbancar o outro. Foram extraordinárias es-
sas partidas. Estádios completamente lotados –
seja no Nelson Medrado Dias, seja no Orlando
Matos. A cidade só falava no jogo – antes e de-
pois. Ora um carnaval vermelho e branco, ora
um carnaval rubro-negro fora de hora. Carrea-
ta e foguetório até longas horas da noite. Come-
morações e mais comemorações. Sempre foi as-
sim. Quem ganhava era o futebol. A rivalidade
era benéfica para o engrandecimento do futebol
parnanguara (MACHADO, 2003, p. 124-125).

Na década de 1980, com base em Machado (2003), o Clube en-


trou em má fase, caindo para a segunda divisão do Campeonato Es-

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tadual, o que resultou na diminuição do número de torcedores e do


público que comparecia ao Estádio. O retorno à “elite” do futebol
estadual ocorreu somente em 1993 e em 1996, quando o Rio Branco
passou a fazer parte do grupo especial do futebol brasileiro, partici-
pando da terceira divisão.
De acordo com Machado (2003), o desempenho do Clube, histo-
ricamente, esteve relacionado a sua articulação com pessoas “ilus-
tres representantes das mais diversas atividades sociais, econômicas,
culturais e políticas que movimentam a cidade portuária” (p. 218).
Em 2000, o Rio Branco foi novamente Campeão do Interior, ga-
nhando o direito de disputar uma vaga na Copa João Havelange
(Terceira Divisão do Campeonato Brasileiro) (MACHADO, 2003).
Entre 2007 e 2017, o Clube passou a disputar os Campeonatos
no Estádio Municipal Fernando Charbub Farah, o Gigante do Itibe-
rê, com capacidade de 12.218 lugares (CAPETTA, 2010), utilizando o
Estádio da Estradinha como Centro de Treinamento nesse período,
retornando em 2017.

LIGAÇÕES HISTÓRICAS
A história do Rio Branco Sport Club, um clube de futebol pro-
fissional, desde sua fundação no início dos anos 1900, se entrelaça
com a história de Paranaguá e também do Paraná, esta marcada na
rivalidade do RBSC e os clubes da Capital.
O RBSC teve seus primeiros anos durante o Ciclo da Madeira
(1920-1955) de Paranaguá , recebendo do setor produtivo doações
de madeiras para a construção das arquibancadas no seu primeiro

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campo, na Praça João Gualberto, uma área administrada pelo setor


público. Ainda sob a influência das atividades portuárias, no Ciclo
do Café, o mais duradouro e importante ao Porto D. Pedro II de Pa-
ranaguá (da década de 1950 a década de 1980) o Rio Branco encon-
tra apoio do setor produtivo e com ele da população local. As inten-
sas exportações de café levaram para Paranaguá grandes empresas
que faziam doação de sacas de café ao Clube para que este fizes-
se fundos à participação em campeonatos. Para Machado (2003,
p. 97), “enquanto o café esteve em alta, o Rio Branco sobreviveu.
Quando o café sofreu um debacle, o Leão sucumbiu”.
Não só as atividades produtivas dominantes no Município agiam
sobre o Clube, a Estrada de Ferro, que proporcionou a ligação entre
Paranaguá (litoral) com o planalto, favorecendo a economia do Es-
tado, permitiu os deslocamentos das delegações de times aos con-
frontos, influenciando até nos horários de realização dos confrontos.
O centenário Rio Branco Sport Club faz parte da história de pa-
trimônios materiais e imateriais de Paranaguá . A Escola Normal
Primária de Paranaguá , atual Instituto de Educação Dr. Caetano
Munhoz da Rocha, que teve sua construção ao lado das arquiban-
cadas do campo onde o RBSC treinava e jogava, foi motivo da mu-
dança do campo para a Estradinha, é hoje um dos principais edi-
fícios históricos tombados pelo patrimônio histórico do Estado do
Paraná e um dos principais estabelecimentos de educação de Para-
naguá . O Club Litterario, por sua vez, presente na vida dos parnan-
guaras desde 1872, foi local de eventos festivos do RBSC, mantendo,

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em parceria com o Clube, o tradicional baile carnavalesco “Verme-


lho e Branco”, cores do Leão (Figura 2).

Figura 2 Evolução dos emblemas do Rio Branco

Fonte: Rio Branco Sport Club (riobrancosportclub.net.br, 2016).

As mudanças na realização dos jogos e treinos do RBSC ligaram


este à administração pública do município de Paranaguá : da Pra-
ça João Gualberto ao Estádio da Estradinha, e deste, ao Gigante Iti-
berê, o poder público foi determinante. Segundo Machado (2003,
p. 96), a ligação entre o Clube e a Administração Municipal não se
restringe à arena dos jogos, ela é marcada pelo fato de que “mui-
tos presidentes e diretores do Rio Branco SC – ao longo da história –
sempre estiveram ligados ao esquema político-econômico”. Na dé-
cada de 1990, o então vereador Mário Roque foi eleito Presidente do
Leão, e posteriormente, com o apoio da torcida foi eleito Prefeito de
Paranaguá em 1996.

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Alguns breves relatos da história econômica e política de Pa-
ranaguá e do Rio Branco Sport Club permitem observar ligações
entre estes. O Rio Branco Sport Club pode ser observado no lo-
cal como um espaço de construções culturais dinâmicas e rela-
cionadas.
De um lado, o setor produtivo dominante de momentos econô-
micos no Estado e Município influenciava o desempenho do Clu-
be, e de outro, as representações políticas influenciavam na trajetó-
ria dos confrontos do Rio Branco e, de certa forma, atuavam como
atores do Clube, um espaço da e para a vida política do Município.
Por fim, o espaço de lazer, e de representação do local, que se
faz através do futebol, no caso específico do centenário Rio Bran-
co Sport Club, apresenta relação com outros patrimônios históricos
culturais da história de Paranaguá .
Essas ligações históricas, que entrelaçam o futebol profissional e
o Município, pelas condicionalidades econômicas, políticas e cul-
turais, decorrem do compartilhamento da sociedade ao longo do
tempo no mesmo espaço, em comum, aspectos sem os quais estes
resultados não seriam observados.

REFERÊNCIA
ABRAHÃO, Cinthia Maria de Sena. Porto de Paranaguá : transfor-
mações espaciais decorrentes do processo de modernização ca-
pitalista e integração territorial entre os anos 1970 e 2010. 295p.

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

2011. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Geogra-


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Prefeitura Municipal de Paranaguá /Fundação da Cultura e Turis-
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CALDERARI, Natali. Futebol além das quatro linhas: identidade e
pertencimento no Rio Branco Sport Club – Paranaguá /PR. 2017.
129 p. Dissertação (Metrado) – Programa de Pós-Graduação em De-
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CORRÊA, C. H. P. A presidência da província no império In:
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Pessoa. Anais Anpuh.
DAMO, Arlei Sander. Do dom à profissão: a formação de futebo-
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MACHADO, Heriberto Ivan; CHRESTENZEN, Levi Mulford. Fute-
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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

“NO DIA DE SÃO JOÃO O FOG O NÃO QUEIMA”:


TRADIÇÃO E FÉ NA COMUNIDADE DE UTINGA ,
EM GUARAQUEÇABA/PR

José Carlos Muniz


Andreia Cristina Silva
Márcia Regina Ferreira

CULTURA COMO DIFERENÇA RADICAL, O LUGAR DA


NATUREZA E A NATUREZA DO LUGAR
A cultura foi resumidamente definida pela Organização das Na-
ções Unidas para a Educação, Ciência e Cultura em 1996, como
“formas de viver juntos” (UNESCO, 1996, p.14). Conforme a Unes-
co, Cultura é o que dá sentido a nossa existência. Etimologicamen-
te a palavra vem do latim colere, sendo utilizada inicialmente para
designar o cultivo da terra, aplicados ao sentido de cuidar da plan-
tação, plantar, colher, ou seja, um conjunto de ações e práticas que
remetem a relação entre homem e natureza, bem como o mesmo
termo se referia a ligação entre o homem e o divino, pois a palavra
também era designada para a ação de cultuar os deuses (PELEGRI-
NI; FUNARI, 2017).
Escobar (2005) ao discutir o lugar da natureza e a natureza do
lugar nesse momento de globalização e manutenção dos saberes

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culturais do lugar, aborda as possibilidades de desfazer finalmente


a relação binária entre a natureza e a cultura. Para o autor, cada co-
munidade desenvolve seu conhecimento local relacionados a sua
interação com a natureza. Observa-se que essas comunidades uti-
lizam os ambientes naturais de maneira muito particular em que o
mundo biofisico, o humano e o supranatural não são vistos como
esferas opostas da natureza e da cultura.
Na perspectiva do lugar da natureza e a natureza do lugar, perce-
be-se uma imagem complexa da vida social que não está necessa-
riamente oposta a natureza, ou seja, aborda-se que o mundo natu-
ral está integrado ao mundo social, assim como, os modelos locais
que evidenciam um arraigamento especial a um território conce-
bido como uma entidade multidimensional que resulta em muitos
tipos de práticas e relacões. Assim, ao pesarmos no território e sua
cultura, deveríamos pensar o uso, renovar nossa consciência dos
vínculos entre o lugar, a experiência e a produção do conhecimento
para a defesa do lugar, pois precisamos entender o lugar como es-
paço vivido, como espaço da manifestação da cultura. Dessa forma,
emergem várias reflexões acerca do território, “em que medida po-
demos reinventar tanto o pensamento como o mundo, de acordo
com a lógica de culturas baseadas no lugar? É possivel lançar uma
defesa do lugar? Quem defende? É possivel encontrar nas práticas
baseadas no lugar um espaço de resitencia diante da modernida-
de?” (ESCOBAR, 2005, p. 3).
Dentro desse contexto a manutenção das festas religiosas, pode
ser considerada uma das formas de materialização da cultura de

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um grupo, sendo de extrema importancia que se valorize e apoie


sua construção, pois a partir de sua constituição a comunidade re-
vive suas sociabilidades e crenças, une diferentes gerações, reforça
suas identidades culturais e fortalece suas relações. As manifesta-
ções culturais e a mobilização em torno dela, segundo Sen e Kliks-
berg (2010), tem potencial de valorizar as pessoas e grupos, onde
“a cultura pode desempenhar um papel-chave na reconstituição de
laços de associatividade. A mera ideia de cultura já implica em uma
ação coletiva” (SEN; KLIKSBERG, 2010, p. 329).
Segundo Pecqueur (2005) a cultura de um lugar faz parte dos seus
recursos específicos e a partir dela os atores reforçam seus elos e pra-
ticam as relações de reciprocidade, fatores que são fundamentais
para a constituição de capital social que se relacionam a um conjun-
to de relações sócio-culturais ligadas a tradição. Para Escobar (2010)
quando se pensa em território, é preciso pensar em diferença. Ou
seja, configurações territoriais, para compreender as configurações
particulares de natureza e cultura, sociedade e natureza, paisagem e
lugar, como entidades vivenciadas e profundamente históricas.
Sobre o sentipensar com a Terra, Escobar (2016) apresenta que
as lutas territoriais acerca da defesa do lugar, está pautada em uma
dimensão ontológica das epistemologias do Sul. Para o autor, den-
tro de um mundo relacional, a defesa do Território, da vida e da ter-
ra comunitária é uma mesma causa. As lutas e resistências possuem
uma cosmologia, são essas muitas cosmologias que tem mantido os
povos através da história. Para o autor, “dentro destas outras histó-

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rias, o universo é uma vasta manifestação do sagrado, e o sagrado


está repleto de vida e espiritualidade” (ESCOBAR, 2016, p. 28).
A discussão proposta busca refletir sobre o sentir pensar com o
território, o qual implica pensar desde o coração e desde a mente
para se conhecer o lugar, a cultura e o conhecimento tradicional.
Para tanto, buscamos realizar um histórico em torno da construção
da fogueira de São João na comunidade de Utinga município de
Guaraqueçaba, litoral norte do Paraná. Apresentar sua origem his-
tórica e como os elementos naturais, como as condições climáticas e
fatores da contemporaneidade como o trabalho dos moradores em
fazendas tem afetado a manutenção desta prática tradicional.
A fogueira de São João é fortemente ligada a simbologia sagrada
pois “na noite de São João o fogo não queima”, os participantes des-
ta fé e detentores desta cultura, passam descalços sobre as brasas ar-
dentes e os seus pés não são queimados. Para tanto, a metodologia
utilizada no presente estudo, foi baseada na observação participan-
te ou observação ativa, caracterizada conforme Marconi e Lakatos
(2007) e Gil (2008), caracterizada como observação participante do
tipo natural, ou seja, aquela em que o observador pertence a mesma
comunidade do grupo que investiga (MARCONI; LAKATOS, 2007;
GIL, 2008). Este tipo de abordagem metodológica permite um apro-
fundamento de compreensão acerca da importância dos símbolos e
significados dos eventos para a comunidade estudada.
A observação participante do tipo natural apresenta a percep-
ção científica a partir de um ponto de vista endógeno, sendo nes-
ta construção, discutidos dialogicamente com pesquisadores ex-

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ternos que apoiam a elaboração deste trabalho. Cabe destacar que


este tipo de observação apresenta entre outros potenciais a dimi-
nuição ou inexistência de desconfiança por parte do grupo por co-
nhecerem o pesquisador, além da amplitude de experiência já que
os acontecimentos que se relacionam a outras dimensões da comu-
nidade são mais facilmente compreendidos pelo observador natu-
ral do que o observador do tipo artificial (externo a comunidade).
As observações foram realizadas no ambiente real “registrando-se
os dados à medida que forem ocorrendo, espontaneamente” (MAR-
CONI; LAKATOS, 2007, p. 92), segundo Marconi e Lakatos (2007) a
melhor ocasião para o registro é o ambiente onde o evento ocorre.
A presente pesquisa apresenta os nomes reais dos participantes
e, considerando os termos éticos descritos na resolução n° 510, de
07 de Abril de 2016 (BRASIL, 2016) do Conselho Nacional de Saúde
CNS, que dispõe sobre as normas aplicáveis a pesquisas em Ciên-
cias Humanas e Sociais, especificamente o Capitulo 1, artigo 2, inci-
so IV, destaca-se que para esta pesquisa a utilização de nomes reais
foram autorizadas ao pesquisador principal e sua utilização serve
como reconhecimento da simbologia e saberes dos participantes,
sendo seus relatos e olhares incluídos e nominados na pesquisa.
A pesquisa bibliográfica fundamenta o histórico sobre a festa,
além de subsidiar a caracterização do território e a compreensão
sobre as dinâmicas contemporâneas que afetam a construção da
fogueira de São João .
Como elemento de análise, utiliza-se Escobar (2014) que abor-
da a importância da cultura como diferença radical. O autor reali-

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za uma diferença quanto a cultura como estrutura simbólica (Mun-


do único, no qual subjuga a realidade vivida das comunidades) e
como diferença radical para o sentipensar com a Terra. Na cultura
como diferença radical (concepção emergente), se relaciona com
conceitos como: civilização, cosmovisão, diferença epistêmica e ló-
gicas comunitárias. Estes conceitos, oportunizam a espaços para
pensar transições, reconhecimento de muitos mundos e ampliação
de espaços de re-existência (ESCOBAR, 2014, p.21).

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA REGIÃO: FLORESTA


ATLÂNTICA, COMUNIDADES E PRÁTICAS CULTURAIS COMO
FANDANGO E FESTAS TRADICIONAIS
Histórica cidade do litoral paranaense, Guaraqueçaba, confor-
me dados do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômi-
co e Social (IPARDES, 2016), ocupa uma área de 2.315.733 km², apre-
sentando, porém, baixa densidade demográfica, 3,44 hab./km²,
com população estimada para 2015, de acordo com IBGE (2014), em
7.966 habitantes, divididos em 793 domicílios urbanos e 1.507 do-
micílios rurais.
Há registro da presença colonizadora na região já no século XVI,
ao longo dos rios navegáveis, formando núcleos e povoados, com
primitivo ciclo econômico na mineração e, mais tarde com a agri-
cultura, nas tentativas de colonização europeia, alemães em Serra
Negra em 1829 e suíços no Superagui em 1852, além da já praticada
pelos povos tradicionais (MUNIZ; DENARDIN, 2016).

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Povos e comunidades tradicionais são definidos, de acordo com


a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e
Comunidades Tradicionais (BRASIL, 2007), como “grupos cultural-
mente diferenciados”, com formas próprias de organização social,
ocupando territórios e utilizando recursos naturais como condição
para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econô-
mica. Atualmente, na região de Guaraqueçaba, encontram-se duas
Comunidades Remanescente Quilombola (CRQ Rio Verde e CRQ
Batuva), dois grupos indígenas da etnia M’byá Guarani (Kuaray
Haxa e Kuaray Guata Porã), além das diversas comunidades caiça-
ras espalhadas pelo território.
Esse mosaico territorial faz parte do maior remanescente con-
tínuo de Floresta Atlântica, sendo reconhecida em 1999, como Pa-
trimônio Natural da Humanidade, além de ser incluída em 1993 na
Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, ambas pela UNESCO. Qua-
se a totalidade do município integra um mosaico de Unidades de
Conservação (UCs), de proteção integral e de uso sustentável, pú-
blicas e privadas, que totalizam 98% desse território.
Conforme Ferreira (2010) e Muniz e Denardin (2016) as UCs in-
discutivelmente, têm papel relevante à proteção da biodiversida-
de. No entanto, apresentam implicações socioeconômicas, com a
aplicação da legislação ambiental diretamente afetando o modo de
vida das populações tradicionais, resultando em ações conflituo-
sas. Algumas destas ações são descritas e analisadas por Diegues
(2004), o qual destaca que as UCs implementadas agem de forma a
alterar o modo de vida das populações locais, criminalizando suas

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práticas tradicionais. As populações tradicionais por sua forte liga-


ção com a terra e o mar, têm historicamente papel importante em
sua conservação que são negligenciadas pela legislação.
Essas populações tradicionais Caiçaras, conforme Grabner (2016):

foram e, em larga medida, ainda têm sua his-


tória e modo de vida ignorados por historiado-
res e também por gestores públicos e sua cultu-
ra oral, próprias das comunidades tradicionais
não-urbanas, por não deixar marcas escritas,
frequentemente foi menosprezada ou mesmo
“esquecida” pela sociedade envolvente, o que
levou à exclusão e invisibilidade dessas popula-
ções (GRABNER, 2016, p. 78).

Em relação aos aspectos culturais, as CRQ de Rio Verde e Batuva,


ambas certificadas pela Fundação Cultural Palmares (2006), ainda
aguardam titulação definitiva da terra. O Fandango Caiçara, reco-
nhecido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(IPHAN) como Patrimônio Imaterial do Brasil em 2012, aguarda a
construção do seu Plano de Salvaguarda.
Conforme o IPHAN (2011) o Fandango Caiçara é uma expres-
são musical-coreográfica-poética e festiva, cuja área de ocorrência
abrange o litoral sul do estado de São Paulo e o litoral norte do es-
tado do Paraná. Essa forma de expressão possui uma estrutura bas-
tante complexa e se define em um conjunto de práticas que perpas-
sam o trabalho, o divertimento, a religiosidade, a música e a dança,
prestígios e rivalidades, saberes e fazeres. O Fandango Caiçara se
classifica em batido e bailado ou valsado, cujas diferenças se de-

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finem pelos instrumentos utilizados, pela estrutura musical, pe-


los versos e toques. Nos bailes, como são conhecidos os encontros
onde há Fandango Caiçara, se estabelecem redes de trocas e diá-
logos entre gerações, intercâmbio de instrumentos, afinações, mo-
das e passos viabilizando a manutenção da memória e da prática
das diferentes músicas e danças. O Fandango Caiçara se caracte-
riza como “uma forma de expressão profundamente enraizada no
cotidiano das comunidades caiçaras, um espaço de reiteração de
sua identidade e determinante dos padrões de sociabilidade local”
(IPHAN, 2012 n. p.).
O território também tem a presença de aldeias da etnia M’byá
Guaranis que tiveram sua língua reconhecida como Referência
Cultural Brasileira em 2014 e ocupam duas áreas na região, ambas
sem demarcação, sendo uma a Kuaray Hacha, em vias de desinte-
gração, pois localiza-se no interior de uma UC de proteção integral.
É nesse contexto que está localizada a comunidade de Utinga ,
onde residem 14 famílias, somando aproximadamente 40 pessoas,
distante cerca 20 km da sede, com acesso através da PR-405, sem
pavimentação e considerada em péssimas condições de tráfego.
Suas habitações se dividem em dois núcleos: O primeiro e mais
recentemente formado, segue o traçado da estrada vicinal, aberta
na década de 1980, que liga a PR-405 com as comunidades de Batu-
va, Rio Verde e Utinga ; Já o segundo núcleo continua, mesmo após
a abertura da estrada, pouco mais isolado mata adentro, manten-
do-se às margens do Rio Guaraqueçaba, pelo qual outrora navega-
vam a remos quando da inexistência da estrada.

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Apesar de desconhecerem a toponímia local, porém, ao que pa-


rece, conforme Oliveira (2010) deriva do próprio rio, pois em guara-
ni, a palavra Utinga tem significado equivalente a água clara, lím-
pida, transparente (u = rio / tinga = branco). Há quem acredite, no
entanto, fazer referência a uma árvore da Mata Atlântica, que popu-
larmente chamam de “Nhutinga” (indeterminado).
Seus moradores tradicionalmente plantavam milho, banana, ar-
roz, com mercado certo em Guaraqueçaba e Paranaguá . A agricul-
tura hoje, porém, não representa sequer sua subsistência, sendo
mantida ainda pelos mais idosos e abandonada pelos mais jovens
devido, principalmente, ao fato das proibições ambientais que res-
tringiram tais práticas, caindo em desuso, entre elas, por exemplo,
o fabrico88 da farinha de mandioca, o qual, nas palavras de Clotil-
de Célio dos Anjos “neste ano fui obrigada a comprar farinha, coisa
que nunca pensei na vida” (MUNIZ, 2009, p. 06).
Antes das restrições em função da legislação ambiental, confor-
me lembra, Clotilde Célio dos Anjos “era liberto pra trabalhar, sem
perseguição. Hoje em dia é escondido. Os netos têm que trabalhar
na firma”, denunciando a ‘perseguição’ que sofrem, bem como a
nova geração e os informais trabalhos em fazendas vizinhas (MU-
NIZ, 2009, p. 3).
Conforme aponta Pecqueur (2005) o sistema capitalista em
muitos casos entra em confronto com o ciclo longo das tradições,

88.  Fabrico é uma forma de falar local, antiga em que se utiliza termos como fabrico, fabriquei-
ro, para designar quem faz canoa, instrumentos, logo, fabriqueiro utilizado também para quem faz
com a farinha de mandioca.

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sendo um sistema avesso a dinâmica comunitária e sua lógica aca-


ba por gerar rupturas em suas manifestações.
Também o Fandango Caiçara deixou de ser praticado, com a ex-
tinção da prática do mutirão, quando, coletivamente plantavam e
colhiam da terra e ao final era oferecido a ‘brincadeira’ como forma
de pagamento. Da mesma forma, a Dança de São Gonçalo, na qual
agradeciam pelo bom tempo e pela colheita.
Ainda nesse sentido, conforme Bento Gonçalves (OLIVEIRA,
2010), a restrição ao plantio e consequente colheita, fez com que as
caças (animais) desaparecessem, pois muitas destas também de-
pendiam de encontrar seus alimentos próximos a estas plantações
(MUNIZ, 2009).
Ainda se pratica na comunidade algumas tradições como o fei-
tio do Amargo89, beberagem preparada na Sexta-Feira-Santa, usada
contra picada de cobra e também para afastar os males, bem como
ainda existem outras práticas de cura como o benzimento. Outro
saber que corre risco de desaparecimento é o fabrico da Canoa Cai-
çara, mesmo que tenha sido recebido (2013) como pertinente o pe-
dido de seu reconhecimento enquanto Patrimônio Imaterial do
Brasil (NÉMETH, 2011).
Uma das lideranças na comunidade, reconhecida por manter
aspectos da sua cultura, como o benzimento e o Fandango é Alzi-
ro Pedro90 que, mesmo tendo nascido na comunidade paulista de

89.  Para saber mais sobre o Amargoso, bem como as tradições acerca de benzimentos e parteira-
gens caiçaras, ver Muniz; Silva (2016).
90.  Inscrito e pré-selecionado no Prêmio de Culturas Populares Mestre Leandro Gomes de Barros
(MINC/Secretaria da Diversidade Cultural), edição 2017.

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Taquari, ainda jovem casou-se com Irani Célio, da comunidade de


Utinga , mudando-se para o local.
Músico autodidata, Seu Alziro domina alguns instrumentos
como a viola de dez cordas, o cavaquinho e o violão, além da viola
fandangueira, que aprendeu a tocar aos 13 anos de idade. Seu Alziro
utiliza alguns destes instrumentos liturgicamente em celebrações
religiosas na capela da comunidade dedicada a São Vicente, princi-
palmente em sua festa no mês de setembro.
Apesar de não acontecer com frequência o Fandango Caiçara,
ainda mantêm alguns costumes relacionados a esta tradição, como,
por exemplo, em época da Quaresma, “de muito respeito”, confor-
me Irani Célio (MUNIZ, 2009, p. 10) quando penduravam a viola,
desafinada e colocada dentro de um saco, de boca para a parede e
ali ficava por cerca de 40 dias, até passar este período que o catoli-
cismo pede silêncio e reflexão. A esta informação Alziro acrescen-
ta que nem o rádio podia ser ligado nesse tempo de Quaresma, pois
“era o luto de Cristo”, como crê (MUNIZ, 2009, p.10).

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ORIGEM HISTÓRICA DO CULTO A SÃO JOÃO : DO CULTO


PAGÃO À FESTA RELIGIOSA, DA VIVÊNCIA DA PRÁTICA
TRADICIONAL E CULTURAL À DIFICULDADE DA
MANUTENÇÃO DESSAS PRÁTICAS COMUNITÁRIAS NA
CONTEMPORANEIDADE
Privilegiado no calendário litúrgico católico, São João é celebra-
do não apenas no dia de sua morte91, como todos os outros santos,
mas também no dia do seu nascimento, assim como acontece com
Jesus de Nazaré e sua Mãe Maria, pois conforme a tradição católi-
ca, João Batista fora ainda santificado no ventre de sua mãe Isabel
quando esta recebe a visita da Maria e tão logo “ouviu a saudação
de Maria, o menino saltou em seu seio [...]” (Lc 1, 41-56).
Conforme a Bíblia (1982) Zacarias e Isabel já estavam em idade
avançada, ainda Izabel era considerada estéril e Zacarias acabara
ficando mudo ao duvidar da mensagem que recebera do anjo, de
que teriam um filho, ao qual dariam o nome de João (Lc, 1 5-25).
Como as primas Izabel e Maria residiam distantes, combinaram
que, assim que o menino nascesse, Isabel acenderia uma foguei-
ra nas montanhas da Judéia para que a prima, mesmo a distância,
viesse ajudá-la.

91.  João Batista, conforme as Escrituras Sagradas, presente em Mt 14, 1-12; Mc 6, 17-29, era conside-
rado justo e santo por Herodes, mas o repreendia ao dizer: “não te é lícito ter contigo a mulher do
teu irmão”, ao fato deste ter desposado Herodíades, mulher de seu próprio irmão Filipe, atraindo a
raiva daquela mulher que, no dia do seu aniversário, na ocasião do banquete em que Herodes lhe
ofereceu e tendo sua filha Salomé agradado a todos com sua dança e recebido de Herodes a pro-
messa de ter tudo o que desejares, influenciado pela mãe, a jovem lhe responde: “quero que me dê,
num prato, a cabeça de João Batista”. Assim foi feito em 31 d.C, na Palestina.

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De acordo com a Bíblia (1982), após o nascimento, ao trazerem


o filho para que Zacarias escrevesse o nome que desejava numa
tabuinha, este pronuncia João, pois “na mesma hora sua boca se
abriu, a língua se soltou e ele se pôs a falar, bendizendo a Deus” (Lc
1, 57-66) e em sinal de alegria, há louvor em torno da fogueira com
danças e cânticos – nascendo assim a tradição dos festejos home-
nageando São João .
João Batista, o Precursor, nasceu, de acordo com a tradição reli-
giosa, para cumprir sua missão de “preparar o caminho do Senhor”,
assim, realizava pregações, batismos (por isso Batista) de penitên-
cia no Rio Jordão e remissão dos pecados, tendo inclusive batizado
o próprio Jesus Cristo (Lc 3, 5-22) e, dessa forma, sua festa foi fixada
no calendário litúrgico da Igreja Católica no dia 24 de junho, por-
tanto, seis meses antes da véspera do Natal, nascimento de Jesus
Cristo – tendo forte simbologia tais fatos que marcam as duas par-
tes do ano, como a representar a possibilidade do ‘renascimento’.
Quanto a abordagem religiosa, há também outra perspecti-
va para pensar a Festa de São João . Observa-se que embora a ori-
gem da festa dedicada a este santo apresenta-se pelo catolicismo,
pode-se verificar, que esta, remonta a cultos pagãos, baseados em
eventos astronômicos, quando celebrados no hemisfério norte em
homenagem ao sol, uma vez que, entre os dias 22 e 23 de junho,
acontece a chegada ou Solstícios92 de Verão (solstícios de inverno

92.  Na Astronomia, Solstício, que significa “sol que não se mexe, parado”, acontece duas vezes ao
ano – dezembro e junho – quando o sol em seu movimento atinge elevada inclinação em latitude
em relação a Linha do Equador, intensamente atingindo a superfície terrestre, em um dos Hemis-
férios; Quando no verão, significa o dia mais longo do ano e quando no inverno, a noite mais longa

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no Hemisfério Sul) – com maior duração da luminosidade do Sol


- sendo recebido por povos antigos com rituais, incluindo foguei-
ras, danças e cantorias, conforme Rangel (2008), tanto para a ferti-
lidade do solo e, além das chuvas, visando sucesso nas plantações
e fartura nas colheitas, também celebrando a vitória da luz sobre a
escuridão e, em alguns casos específicos, o andar sobre as brasas
destas fogueiras, serviam como purificação de males.
De acordo com Sky (1989) e Danforth (1989 apud MEDEIROS;
MOURA, 2009), na Grécia e na Roma antiga “os deuses da colhei-
ta eram reverenciados com enormes fogueiras, cantorias e danças”
e estas [fogueiras] eram acesas para que a plantação ficasse livre de
maus espíritos que impedisse sua prosperidade. Assim, as celebra-
ções homenageando São João estão, conforme Rangel (2008), rela-
cionadas aos antigos cultos a Adônis e Tamuz, conforme literatura
babilônia e grega respectivamente.
É no século IV, a partir de Constantino que o Cristianismo pas-
sa a ter liberdade no Império Romano, sendo legalizado pelo Édito
de Milão em 313, e com a conversão desse Imperador, além de ser
autorizada a construção de templos, é decretada em 380, pelo Édito
de Tessalônica, o Catolicismo como religião oficial do Império Ro-
mano pelo Imperador Teodósio I, O Grande.

do ano. Em relação ao dia e horário exatos, há variações de acordo com cálculos astronômicos; No
Hemisfério Norte o solstício de verão acontece por volta de 21 de junho e o solstícios de inverno por
volta de 21 de dezembro, quando marcam o início das respectivas estações de ano; Já no Hemisfério
Sul, o solstício de verão ocorre em dezembro e o solstícios de inverno em junho.

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Os cultos pagãos, então, passam a ser perseguidos, tendo, num


primeiro momento, suas festas substituídas por ritos litúrgicos da
religião que se disseminava pelo Império, conforme Rangel (2008).
O Cristianismo adotou então as datas de seus dois principais
cultos no hemisfério norte – solstícios de verão e solsticios de in-
verno – aos nascimentos de João Batista e de Jesus de Nazaré, res-
pectivamente. Da mesma forma, em seu calendário litúrgico, du-
rante os séculos outros ritos pagãos foram substituídos por festas
cristãs, como por exemplo, o mito pagão do Rei do Inverno, equiva-
lente ao Papai Noel cristão, a Páscoa, celebrada no primeiro domin-
go de lua cheia após o equinócio de Primavera no Hemisfério Norte
e até mesmo o próprio Natal, nascimento de Jesus Cristo, na mes-
ma data em que os pagãos do Hemisfério Norte celebravam a che-
gada do Solstícios de Inverno – com menos visibilidade do Sol, po-
rém, neste caso, simbolicamente, o cristianismo incorpora a ideia
do culto pagão da vitória da luz sobre a escuridão (Sol Vencedor/Je-
sus a Luz do Mundo).
De acordo com afirmação de Chianca (2007. p. 59), desde o século
XIV, “algumas práticas tradicionais da festa (como banhos, danças e
cantos) foram perseguidas localmente por monges e bispos obstina-
dos em erradicar todos os ritos associados à religiosidade pagã”.
Após o Concílio de Trento (1545-1563) período em que a Igreja
emite seu maior número de decretos dogmáticos e, passa também
a admitir o fogo, que antes era tido como uma simbologia do peca-
do, carnal e sensual. Após a incorporação pela igreja passa a ser vis-
to como sinônimo de purificação enquanto “fogo eclesiástico”.

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O fogo passa então a ser utilizado nos rituais da Igreja, como na


Inquisição, pois, conforme Chianca (2007; 2009), o fogo “que aque-
ce, civiliza e anima o homem é, para a Igreja, o fogo da perdição que
enquanto se espalha destrói tudo que o Criador construiu”, mas, em
“contrapartida, dominado e produzido pelo homem segundo suas
conveniências, o fogo nos aproxima da condição divina” (CHIAN-
CA, 2007, p. 60).
Com a conquista do Brasil, os portugueses trazem em suas ba-
gagens culturais, diversas manifestações, entre elas então as cele-
brações joaninas, incluindo homenagens aos santos mais popu-
lares daquele país: Santo Antônio (13 de junho), São João (24 de
junho) e São Pedro (29 de junho), ganhando apreciação em dife-
rentes regiões e misturando-se com as próprias festividades locais,
inclusive os costumes indígenas de andar sobre as brasas e ou pular
a fogueira, conforme Cascudo (1985).
Tais festejos, principalmente a partir da chegada da Família
Real, em 1808, acrescentam refinados estilos europeus trazidos da
Coorte, como a quadrilha e outras danças de salão, além dos fogos
de artifício que se tornam “acontecimentos de sucesso, ligando os
dois principais eixos da vida social: as ruas e as igrejas” (CHIANCA,
2009, não paginado).
Porém, na medida em que passaram a ser adotados por todas
as camadas sociais “caindo na graça do povão”, desagradaram à eli-
te colonial, temerosa que ocorresse desordens e excessos, ajun-
tamentos que ocasionassem revoltas, como foi com o Fandango,
Batuques e a Capoeira, proibidos a partir das mudanças de com-

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portamentos sociais na “virada do século XVIII para o XIX” (PEREI-


RA, 1996). Portanto, a Igreja também passa a vê-los, principalmen-
te as comemorações juninas, com precaução, haja vista “perder” o
controle sobre a manifestação que incorporava, no seio popular, di-
versos outros ritos e cultos, sendo assim, era “estritamente vigiada
de modo a não permitir excessos” contrários às práticas litúrgicas
(CHIANCA, 2009, não paginado).
Proibidas no meio urbano, e perseguidas pela Igreja, algumas
manifestações culturais populares encontraram no sincretismo
uma forma de resistência, assim, por exemplo, nos cultos afro-bra-
sileiros, os adeptos do Candomblé, no dia 23 de junho homena-
geiam Xangô, a entidade do elemento fogo, equivalente ao santo
católico São João , conforme Aldé (2009).
Esses cultos e festas tiveram “um pouco mais de liberdade” nas
áreas rurais, onde era difícil a fiscalização, passando, como o Fan-
dango Caiçara e a própria Festa Junina, de acordo com Chianca
(2007) realizado na coletividade, portanto “na qual a comunida-
de estreita sua identidade através de símbolos e práticas que reafir-
mam este pertencimento” (CHIANCA, 2007, p.51).
É a partir da industrialização e consequente migração do cam-
po para as cidades, principalmente após as décadas de 1950/60 que
manifestações rurais ganham destaque nos centros urbanos, confi-
gurando um retorno dos festejos juninos às cidades e aliado à pro-
paganda folclórica, tais manifestações ganham espaço também nas
escolas, porém, em muitos casos, estigmatizados, caracterizando o
“rural ” como caipira ou “não-civilizado”.

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Nesse sentido, conforme Inami Custódio Pinto (In Memoriam),


renomado folclorista paranaense, conforme reportagem ao jornal
O Diário do Paraná (edição de 02.7.78), critica as festas juninas ur-
banas que simbolizam “a ridicularização que é feita com o homem
do campo”, por exemplo, apenas com chapéu de palha, blusa tipo
xadrez e dentes pintados como que podres, ainda dizendo que o
autêntico seria o Fandango, pois a Quadrilha, representa a aristo-
cracia e “quando a aristocracia enjoa de alguma coisa, esta é adota-
da pelos populares”.
De acordo com Chianca (2009, não paginado) o “matuto” é

dotado de traços positivos como a ingenuidade


e o bom coração, o homem do interior é consi-
derado “mais puro” que o da capital. Ele repre-
senta a nostalgia e a idealização do passado dos
migrantes que hoje vivem nas cidades. Mas a
homenagem não chega a alterar sua posição na
estrutura social: depois da festa, ninguém dese-
ja assumir aquela caricatura. O matuto é apenas
o “bufão” da cidade.
Contemporaneamente, os festejos juninos desgarram-se dos
sentidos dogmáticos impostos pela Igreja e caíram na graça do
povo dos sítios e vilarejos do Brasil, preservando, ainda hoje, tradi-
ções seculares numa demonstração popular de devoção em torno
dos santos juninos, mas remetendo às práticas milenares dos anti-
gos cultos pagãos nas lógicas comunitárias.
Conforme Cascudo (1985), no Brasil encontram-se muitas su-
perstições relacionadas à fogueira de São João , algumas com práti-

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cas de ofertas de alimentos, originadas nos antigos cultos e oferen-


das aos deuses, outras, porém, pedindo a São João que, atue como
intercessor em assuntos de relacionamento (namoro e/ou casa-
mento), assim também remetem aos antiquíssimos cultos pagãos
de consultas aos oráculos, bem como com outras adivinhações.
Chianca (2007) lembra que “em 1769, o Santo Ofício condenou
uma mulher à morte por predizer casamentos, em noite de São
João , só por olhar contornos do desenho feito pela clara de um ovo
quebrado, dentro do copo” (CHIANCA, 2007, p.62).
Ainda assim, mantiveram-se alguns outros costumes, como o de
atravessar a fogueira levando uma faca virgem na mão e, de imedia-
to, enfiá-la num tronco de bananeira, quando, pela manhã, ao reti-
rar a faca, deve-se interpretar o desenho feito pela seiva que escor-
rerá do corte, relacionando-o às iniciais do alfabeto, possivelmente
do nome da pessoa com quem irá se casar.
A festa de São João , com a tradição de atravessar a fogueira com
os pés descalços em brasas incandescentes permanecem na tradi-
ção caiçara ainda, também encontrado em outros lugares do Brasil,
tão logo atravesse a fogueira de São João , deve-se ir até a beira de
um rio e olhar sua própria sombra; se acaso esta aparecer significa
vitalidade até o próximo São João , caso contrário, não verá mais os
festejos joaninos.
Outros costumes, conforme lembra Antônio Alves Pires93:

93.  Depoimento recolhido em 2014, publicado em MUNIZ, 2017, p. 76

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dançavam, pulavam a fogueira de um lado pra


outro. Tinha Quentão, Pinhão, Cará com Mela-
do. Fosse São João , os rapazes passavam tição
do carvão da fogueira na cara, pra dizê que tinha
barba, era a simpatia né. Também as moças, iam
lá no cafezal e colhiam um cafézinho e se fosse
verde, ela casava com um homem novo e se fos-
se maduro ela ia casá com um viúvo (MUNIZ,
2017, p. 76).

Já José Hipólito Muniz94 recorda ainda uma simpatia para a pes-


soa saber o nome da outra com quem se casaria

a pessoa pegava três pedaços de papel e escrevia


em cada um, o nome de alguém que ela queria
casar. Passava a fogueira do santo com os papéis
no bolso e depois punha em cima da casa, no te-
lhado. Pela manhã, qual papel estivesse aberto,
seria este o seu futuro marido ou mulher (MU-
NIZ, 2017, p. 75).

Em Campina Grande/PB, por exemplo, de acordo com Martins


(2004), para a Fogueira de São João são utilizas madeiras de espé-
cies florestais nativas, configurando problemas ambientais na re-
gião. Há ainda, tanto no condizente do formato da fogueira, dife-
rente para cada um dos três santos homenageados nas festanças
juninas: Santo Antônio (fogueira com base quadrada), São João
(fogueira com base cônica, piramidal) e São Pedro (fogueira com
base triangular), a preferência em algumas espécies, obedecendo
algumas crenças, bem como de madeiras que não estejam úmidas.

94.  Depoimento recolhido no ano de 2008, publicado em: MUNIZ, 2017, p. 75.

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Embora a Festa de São João , com a prática cultural de atravessar


a fogueira seja uma tradição nas comunidades caiçaras, observa-
-se que em Utinga , fica a cada ano mais difícil a extração da madei-
ra, devido a fatores que vão desde a recente ocupação remunera-
da dos homens da comunidade em uma fábrica, o que faz diminuir
seu tempo e disponibilidade para esta atividade. Outro fator está li-
gado à disponibilidade de madeiras encontradas cada vez mais dis-
tantes da comunidade demandando além de mão-de-obra para o
corte, dispendiosa estrutura para transporte, além da autorização
para entrada e retirada em terrenos de terceiros. Ainda o fato da re-
gião integrar um mosaico de UCs, resultando em proibições acerca
do corte de árvores ou a burocracia que acompanha o processo de
utilização de madeira de árvores já caídas.
Vale dizer ainda que as cinzas do fogo, conforme Aldé (2009) são
“vistas como fonte de fertilidade”, exemplificando agricultores que
guardavam sementes juntamente com as cinzas da fogueira de São
João para a plantação no ano seguinte como que a rememorar os
cultos em agradecimentos ao plantio e a colheita. Na comunidade
de Utinga , conforme lembra Irani Célio, sua avó plantava um den-
te de alho, na noite de São João , abaixo das brasas ardentes da fo-
gueira e pela manhã já se via o broto nascendo; utilizava ainda, a
própria cinza da fogueira como adubo em suas plantações; Outra
árvore que floreia apenas na noite de São João é a Figueira (Ficus
carica), além do Xaxim (Dicksonia sellowiana), como acreditam
“plantas que não se vê florir durante o ano” (MUNIZ, 2009, p. 14).

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Outra crença acerca desta data condiz com a mudança na tem-


porada de caça, pois como acreditam, é nas brasas da Fogueira de
São João que o Gambá (Didelphis), popularmente chamado de ra-
posa “queima a bunda na fogueira e vai molhar no rio; depois fica
magra, com a banha amarelada, não presta mais caçar”; a essa his-
tória Irani Célio lembra ainda que na meia noite de São João “até a
corredeira do rio para”.

COMUNIDADE DE UTINGA : HISTÓRICO VIVIDO E A


CONSTRUÇÃO DA RE-EXISTÊNCIA (RESISTÊNCIA) DO
FESTEJO DO FOGO QUE NÃO QUEIMA EM SEU SENTIPENSAR
É na noite de 23 de junho, portanto véspera de São João , em
que, na comunidade de Utinga , a fé, em forma de tradição é visível
num ritual em torno do fogo dedicado a este santo do catolicismo
que, além de renovar as sociabilidades entre os parentes e amigos,
potencializa o reviver de sua cultura no contexto rural .
Nessa data, com madeiras e lenhas cortadas e ou previamente
recolhidas pela região, a comunidade monta a fogueira que, nas pa-
lavras de Alziro “basta fazer um brazido de, 4, 5 metros de altura”,
abanar a fogueira “que acende aquela luzerna”. Após o acender da
fogueira nos primeiros minutos do dia 24 de junho, dedicado a São
João , se espalha como um tapete as brasas ardentes e atravessam,
com os pés descalços, de um lado para outro, seguindo o ritual que
fizera Alziro Pedro, de benzer o fogo e as brasas com galhos de ár-
vores, como que fazendo o sinal cristão da cruz sobre as brasas.

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A simbologia que nesse dia o fogo não queima, está fortemente


ligada a manifestação da fé. O Sr. Alziro Pedro relata casos como as
pessoas que chegaram a cair sobre as brasas e nada aconteceu. Ao
mesmo tempo aquele visitante que, não acreditando, resolveu atra-
vessar as brasas da Fogueira de São João com os pés calçados, aca-
bou queimando completamente o solado deste.
Oliveira, Romera e Marcelino (2011), ao realizar um resgate so-
bre a festa de São João no distrito de Tupi, município de Piracicaba
(SP), destacam que os braseiros fazem a passagem pelo fogo como
um sinal de fé e ao longo do tempo estes significados sofreram mu-
danças, incluindo a participação daqueles que não são ligados a
comunidade. Segundo relato de um dos organizadores da festa:

No início da tradição em Tupi, as pessoas que


passavam o faziam pela fé e para cumprirem
promessas feitas ao santo no ano anterior. Hoje,
no entanto, a passagem pelo braseiro é uma for-
ma de demonstrar coragem perante os obser-
vadores. Muitos sequer são participantes da
comunidade religiosa, como antigamente, ou
devotos do santo (OLIVEIRA; ROMERA; MAR-
CELINO, 2011, p. 308).
É importante observar que, em Utinga há casos de queimadu-
ras, principalmente par os que desrespeitaram o Fogo dizendo tra-
tar-se de “bobagem” ou que “não tinha segredo”, ainda alguns que
por puro exibicionismo não cumpriram o ritual de atravessar e re-
tornar ou mesmo visitantes que nunca tendo visto ou participando,

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portanto, não pertencendo a esta tradição, ousaram atravessar as


brasas e por mais que seja específico de cada caso.
Há também relatos, que a comunidade destaca sobre a história
da Fogueira e sua força, pela seguinte afirmação: “diziam os anti-
gos, que a queimadura do fogo de São João dura um ano pra sarar”.
Os segredos e rezas que envolve a Fogueira de São João Seu Al-
ziro guarda, devendo, no entanto, repassar apenas a um que dará
continuidade, porém, quando o fizer, não mais poderá benzer ou
mesmo atravessar a brasa, ficando a encargo daquele próximo que
possuir tal conhecimento.
Histórias da Fogueira de São João e o pular, ou também, cami-
nhar descalço sobre suas brasas pertencem a oralidade local, pre-
sentes em depoimentos daqueles que viram ou ouviram em tem-
pos de outrora; em Barra de Ararapira, por exemplo, como lembra
em depoimento José Hipólito Muniz (2017), costumava-se “pular a
Fogueira de São João em cruz”, não passando sobre as brasas, mas
sim pulando, primeiro na horizontal e depois na vertical, fazendo
o desenho de uma cruz; já na comunidade de Rio Verde, no ano de
2004, pela última vez inclusive, os moradores atravessaram as bra-
sas ardentes da Fogueira com os pés descalços, alvos do olhar aten-
to de amigos95 que além de participarem do ritual, foram alguns dos
responsáveis pela repercussão da afirmativa: “na noite de São João
o fogo não queima”.

95.  Entre eles Cristiano Tobias Viana e Raumil Gonçalves, da comunidade de Rio Verde, além de
Aurélio Duarte Gasparini Jr, então membro do Grupo Fâmulos de Bonifrates - que desde 1999 pes-
quisa a tradição caiçara, transfromando-as em espetáculos teatrais.

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Em épocas juninas, especialmente no Dia de São João , o avô de


Irani Célio, de nome João Célio (In Memoriam) realizava o ritual
da Fogueira em homenagem ao seu santo padroeiro, costume esse
que caiu em desuso após seu falecimento, quando então, Alziro Pe-
dro, rememorando o rito que vira quando ainda criança em Taqua-
ri (comunidade paulista) e uma vez tendo aprendido os “segredos e
rezas” com Agostinho Pereira, morador do Rio dos Patos96, tornou-
-se o responsável pela continuidade da Fogueira de São João na
comunidade de Utinga , criando, como diz: “coragem para passar
descalço por cima das brasas ardentes” (MUNIZ, 2009, p. 14).
Nos anos de 2009 e 2010, o projeto “Traços culturais das comu-
nidades do litoral do Paraná ” (UFPR Litoral, 2010) recolheu relatos
acerca da fogueira de São João em Utinga , realizado pelos alunos Dé-
bora Pontes da Silva e Émerson do Rosário (ambos então no ensino
fundamental do Colégio Estadual “Marcílio Dias”) da própria comu-
nidade.
É possivel encontrar, uma valorização da prática cultural da Fes-
ta de São João em Utinga , ou seja, há uma re-exitência de saberes
e uma necessidade dos moradores locais de resistir com essas prá-
ticas. Percebe-se, principalmente de jovens integrantes do Grupo
Fâmulos de Bonifrates, em apoiar a realização da Fogueira de São
João na comunidade de Utinga , que aconteceu já em 201197, atrain-

96.  Comunidade de Guaraqueçaba, já extinta, pois a área virou o Parque Nacional de Superagui.
97.  É possível ver imagens da Fogueira de São João na comunidade de Utinga , em 2011, através
do link: <http://informativo-nossopixirum.blogspot.com.br/2011/06/fogueira-de-sao-joao-na-co-
mun-idade-de.html>.

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do diversos curiosos expectadores a presenciarem o “passar descal-


ços sobre as brasas ardentes da Fogueira de São João ”.
Para o vindouro ano, devido as fortes chuvas, foi impossível cortar
as lenhas para a fogueira e como não se pode adiar devido ao fato de
acontecer exatamente no dia dedicado àquele santo, porém, em 201398,
o ritual em torno da Fogueira de São João voltou a reunir a comuni-
dade de Utinga , comunidades vizinhas, além de amigos visitantes e,
ainda que sem o apoio pretendido com a gestão municipal, integran-
tes dos grupos Fâmulos de Bonifrates e Fandanguará voluntariamente
se fizeram presentes fazendo Fandango Caiçara, manifestação cultural
que há muito tempo que não acontecia na comunidade.
Nos dois anos seguintes, a forte chuva e o falecimento de um ente
querido na comunidade, respectivamente, foram motivos da não
realização da Fogueira de São João , no entanto, por mais que acon-
teçam as dificuldades na manutenção dessas práticas culturais, ve-
rifica-se um empenho para a valorização e resgate da mesma.
Em 2016, novamente aconteceu e, além de reunir considerável
número de visitantes cerca de 200 pessoas aproximadamente, tan-
to da sede quanto de comunidades vizinhas, contou com apoio ins-
titucional da gestão municipal, além de diversos outros amigos.
Na atração, além do auge em torno da Fogueira de São João , tam-
bém Fandango Caiçara com violeiros da comunidade e dos grupos
“Fandanguará” de Guaraqueçaba e “Raízes Fandangueias” de Su-

98.  É possível visualizar momentos da Fogueira de São João no ano de 2013 através do endereço
<https://www.youtube.com/watch?v=vIjDA6oABt4>.

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peragui, além de exibição de vídeo-documentário produzido pelos


moradores sobre a fogueira em anos anteriores.
No ano de 2017 a organização da festa aconteceu de forma mais
intensa uma semana antes da véspera de São João , ficando com-
binado o esforço coletivo da comunidade para o corte da lenha,
o preparo de salgados na expectativa de visitantes ser boa e mes-
mo assim, após confirmação e ampla divulgação nas redes sociais,
do apoio inclusive da gestão municipal (Secretaria de Educação e
Secretaria de Administração) que cedeu transporte aos apoiado-
res, ao Grupo da Melhor Idade da Pastoral de Idosos e outros par-
ticipantes, era incerto o evento devido ao mau tempo previsto para
aquela semana. A trégua da chuva aconteceu apenas um dia an-
tes, tempo necessário para reforçar e confirmar o evento, atraindo
para Utinga centenas de pessoas, inclusive familiares da comuni-
dade vindos de outras cidades e novamente, além de vídeo-docu-
mentário, desta vez retratando o “Amargoso”, tradicional bebida da
cultura local que também fora servido naquele momento. Além do
propósito da elaboração da Festa de São João (A fogueria que não
queima), ocorreu também a união desta com o Fandango Caiçara,
com violeiros de Guaraquelaba, Utinga e Superagui, além da par-
ticipação de músicos presentes (Felipe Santos & Dereck Miranda,
Aníba da Gaita, Dj Erisson) e convidados que animaram o festejo
até o nascer do sol.
Constata-se, que, nesses últimos anos na Comunidade de Utin-
ga , há um processo de resistência e vem se fortalecendo a cada ano
a retomada da tradição da Fogueira de São João . Não há o silencia-

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mento dos saberes e experiências populares, há na Comunidade de


Utinga saberes de um sentipensar de um mundo espiritual/supra-
mundo, entre estes mundos se produz um ir e vir que se conectam,
apresentando práticas e ritos que mostram uma forma sensível e es-
pecifica do lugar. Segundo Escobar (2016), as coisas e seres só existem
em relação com os outros, considerando a ancestralidade existente.
Nesse sentido, a história do surgimento do festejo joanino até
a apropriação da comunidade caiçara na festa de São João , rela-
ciona-se a partir da cultura como diferença radical de resistência,
pois, por mais que houvesse uma intenção, ou seja, uma lógica “ci-
vilizatória a partir do urbano” para que essas práticas desapareces-
sem pela chegada de novas práticas sociais impostas pelo modelo
de desenvolvimento moderno, constara-se que a comunidade de
Utinga manteve seus saberes acerca da tradição.
Segundo Escobar (2014) em seus estudos críticos do desenvol-
vimento, a noção de cultura precisa estar contextualizada a partir
do pensamento decolonial (que faz uma análise da modernidade,
da colonialidade para analisar os saberes do Sul), em que a cultu-
ra diferença radical, questiona o dualismo constitutivo das formas
dominantes da modernidade e a ideia de um mundo feito de um
só mundo. Por isso, recorre à noção de pluriverso, que envolve a
necessidade de enfatizar as ontologias não dualistas ou relacionais
que mantêm muitas comunidades.
Dessa forma, a partir da noção do pluriverso (aceitação de mui-
tos mundos e outras lógicas) percebe-se que as comunidades, não
seguem uma lógica ocidental de narrativas universalistas, mas sim,

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buscam existir da forma que lhe é mais adequada pela sua visão
de mundo, e por sua cosmovisão. Esses elementos que podem até
ser conflitivos (discurso de mundo único moderno e universalistas
X diferença epistêmica e pluriverso), na realidade, criam espaços
para ativação política da relacionalidade na comunidade e geram
resistência pela busca do bem viver e do re-existir entre os huma-
nos e não-humanos por meio de um sentirpensar a vida.

CONSIDERAÇÕES FINAIS: A FESTA DE SÃO JOÃO COMO


ELEMENTO DE CULTURA DO LUGAR, IDENTIDADE,
PERTENCIMENTO E FORTALECIMENTO COMUNITÁRIO
Desde as origens católicas da fogueira de São João sua constitui-
ção foi marcada pelos elementos sagrados e profanos, bem como
na relação do homem com o meio. O fogo marca simbolicamente
um elemento ligado a fé pagã, praticada por povos tradicionais e foi
incorporado pela fé católica.
Destaca-se na presente discussão a importância de fortaleci-
mento dessas iniciativas como elemento que reforça a identidade,
a reciprocidade e a ligação do homem com a terra valorizando o
sentir e o pensar. Se o evento é marcado pelo fogo, sua constituição
tem forte ligação em relação à água e durante este momento, outros
elementos muito importantes para a cultura caiçara como o Fan-
dango Caiçara se fortalecem também.
Foi possível observar a importância que o poder municipal tem
em apoiar esse evento, que sofre com vários conflitos de rupturas de
manutenção, em virtude de mudanças nas relações sociais, oriun-

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das de restrições ambientais e das pressões que o sistema capitalista


impõe a essas comunidades. Conforme comentado anteriormente,
as sociedades capitalistas modernas muitas vezes, impõem um mo-
delo único a ser perseguido por todas as nações, afetando substan-
cialmente as formas de vida dos povos (ESCOBAR, 2014).
Dessa forma, as práticas culturais da manutenção dos ritos
como caminhar sobre a brasa na Festa de São João se apresentam
como elementos de resistências nas comunidades caiçaras que até
recentemente tiveram boa parte dos seus sistemas ligados a modos
tradicionais de subsistência. O olhar acerca dessa prática por meio
da cultura como diferença radical, mostrou que há muitos mundos
fundados em sentidos e construções culturais, os quais garantem
as condições para o exercício da identidade e das práticas culturais,
como esse sentipensar o lugar praticado na Comunidade de Utinga.
A promoção da fogueira de São João , manifestação cultural de
uma comunidade tradicional, se mostra um evento inerente em
suas relações sociais, bem como extremamente ligada ao meio em
que vivem.
Cabe destacar a importância do respeito à crença e valores con-
tidos neste momento, uma vez que a observação participante cons-
tatou casos em que pessoas que não eram ligadas a crença ou a
comunidade quiseram participar desse momento de forte simbo-
lismo cultural. A participação de pessoas que não são ligadas a fé,
também foram observados por Oliveira, Romera e Marcelino (2011)
no distrito de Tupi na cidade de Piracicaba (SP).

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Na comunidade de Utinga a fogueira de São João e sua moti-


vação remete a tradição daquele povo e suas dimensões vão mui-
to além da crença de que “na noite de São João o fogo não queima”,
une diferentes gerações, reforça suas identidades culturais, revivem
suas sociabilidades, fortalecem suas relações na natureza.

AGRADECIMENTOS
A José Hipólito Muniz e aos moradores da comunidade de Utin-
ga , principalmente a Bento Galdino Gonçalves e família, Izidoro
Gonçalves e Clotilde Célio dos Anjos, Dona Escolástica “Corá”, Seu
Alziro Pedro e Irani Célio, Tito Gonçalves; À equipe de professores,
alunos e bolsistas do projeto “Traços culturais das comunidades
tradicionais do litoral do Paraná e resistência frente ao avanço da
modernização expropriatória impulsionada pelo capital”, além dos
amigos e apoiadores nas diversas vezes em que contribuímos com
a Fogueira de São João .

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

IPHAN Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Fan-


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IPHAN Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Fan-
dango Caiçara: Formas de expressão. 2012. Disponível no site
http://portal.iphan.gov.br/bcrE/pages/folBemCulturalRegistra-
doE.jsf%3Bjsessionid=02F8E4D4948853407D23D02544751CE7?i-
dBemCultural=z%40s1%5Bv8%3Ax3331n%5D8%3Am2070_%5B-
d36_%4018c5551n%5D8%3Am208%2F-nop.-wx y.%3B52g-
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IPARDES. Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e
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Disponível em: <http://www.ipardes.gov.br/cadernos/MontaCa-
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18 a 20 de junho de 2009. Modalidade do trabalho: Comunicação
Científica.
MUNIZ, J. C. Fogueira de São João na comunidade de Utinga . Blog
Nosso Pixirum. Publicado em 24.jun.2011. Disponível no endere-
ço <http://informativo-nossopixirum.blogspot.com.br/2011/06/

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

fogueira-de-sao-joao-na-comunidade-de.html>. Acesso em
09.nov.2016.
MUNIZ, J. C. Utinga . Relatório do projeto “Traços culturais das
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da pelo capital”. Guaraqueçaba, 2009. 17p.
MUNIZ, J. C; DENARDIN, V. F. Perspectivas de ecodesenvolvimen-
to: o caso de Guaraqueçaba-PR. In: Revista Brasileira de Desen-
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MUNIZ, J. C. “O meu pai não me deu mestre minha mãe não me
ensinô. Não sei por quem eu puxei violeiro e cantado”: narrati-
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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

RANGEL, L. H. V. Festas juninas, festas de São João : origens, tra-


dições e história. São Paulo: Publishing Solutions, 2008.
SeN; klilsberg 2010
SKY 1989
OLIVEIRA, L. R. Guaraqueçaba: Algumas de nossas escolas e co-
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OLIVEIRA, M.; ROMERA, L.; MARCELLINO, N. Festa, lazer e reli-
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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

AUTORES
Adilson Anacleto é Bacharel em Administração de Empresas pela
Universidade Estadual do Paraná - Unespar Campus de Paranaguá
. Mestre em Ciências (Produção Vegetal) pela Universidade Federal
do Paraná (2005). Doutor em Agronomia pela Universidade Fede-
ral do Paraná (2011). Pós-doutor em Agronomia pela Universidade
Federal do Paraná (2012). Atualmente é Professor do Departamento
de Administração de Empresas e do Programa de Pós-graduação em
Administração de Empresas e Sustentabilidade da Universidade Es-
tadual do Paraná. adilson.anacleto@unespar.edu.br

Allan Paul Krelling possui graduação em Oceanografia pela Uni-


versidade Federal do Paraná (2004) e mestrado em Gestão Costeira
e de Águas (Water and Coastal Management), pelo Programa Eras-
mus Mundus, Universidad de Cádiz (2007) e Doutorado em Siste-
mas Costeiros e Oceânicos pela Universidade Federal do Paraná
(2017). Atualmente é professor do Instituto Federal do Paraná –
campus Paranaguá . Tem experiência na área de Oceanografia, com
ênfase em gestão costeira integrada, atuando principalmente nos
seguintes temas: gestão costeira integrada, lixo marinho, desenvol-
vimento sustentável, impactos ambientais sobre ambientes costei-
ros. allan.krelling@ifpr.edu.br

Andreia Cristina Silva é Graduanda  em  Pedagogia  pela UNI-


VESP. Possui mestrado em Desenvolvimento Territorial Sustentá-
vel, pela UFPR-Setor Litoral (2017). É bacharel em Gestão Ambiental

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

pela USP (2012). Desenvolve pesquisas na linha de socioeconomia


e saberes locais; práticas educativas democráticas e sustentabilida-
de. Profissionalmente atua no planejamento e implementação de
projetos socioambientais, pautados por metodologias e orienta-
ções de educação ambiental crítica. andreiacn@usp.br

Antonio Marcio Haliski é Doutor e pós-doutor em Sociologia pela


Universidade Federal do Paraná. Possui experiência em projetos
com povos e comunidades tradicionais, atuando junto a centros e
grupos de pesquisa. Atualmente é um dos coordenadores da Rede
Internacional Casla/Cepial e professor do Curso de Ciências So-
ciais e do Mestrado em Ciência, Tecnologia e Sociedade do Institu-
to federal do Paraná. antonio.haliski@ifpr.edu.br

Ariane Maria Basilio Pigosso é bacharela em Gestão Ambiental


(UFPR - 2012). Especialista em Análise Ambiental (UFPR - 2014) e Mes-
tre em Geografia (UFPR - 2018). Doutoranda em Geografia pela UFPR,
atua na área de planejamento ambiental. ariane.pigosso@gmail.com

Bruna Letícia dos Santos é graduada em Fisioterapia (UFPR, 2015).


Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento
Territorial Sustentável (PPGDTS) do Setor Litoral da Universida-
de Federal do Paraná (UFPR), na Linha de Pesquisa Redes Sociais e
Políticas Públicas. Bls.fisio@gmail.com

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Carlos Alberto Cioce Sampaio é Administrador, mestre e doutor


em planejamento e gestão organizacional para o desenvolvimen-
to sustentável, pós-doutor em ecossocioeconomia, cooperativismo
corporativo e ciências ambientais. Atualmente é professor dos Pro-
gramas de Pós-Graduação (PPG) em Desenvolvimento Regional/
Universidade Regional de Blumenau (FURB), Gestão Ambiental/
Universidade Positivo (UP) e Meio Ambiente e Desenvolvimento/
UFPR, e colabora no PPG em Gestão Urbana/PUC-PR. Coordena o
Núcleo de Ecossocioeconomia (UFPR/UP/PUCPR). Temas de inte-
resse: desenvolvimento e bem viver. carlos.cioce@gmail.com

Carlos Augusto Wroblewski é Bacharel em Geografia (UFPR –


2017). Atualmente é Analista de Projetos Ambientais na Funda-
ção Grupo Boticário de Proteção à Natureza. carloswroblewski@
gmail.com

Dailey Fischer é Bióloga, mestra em Tecnologia e Sociedade (UT-


FPR) e doutora em Meio Ambiente e Desenvolvimento (UFPR). 
Trabalha no Terceiro Setor desde 2001 e é consultora ambiental au-
tônoma. Tem experiência nas áreas de Conservação da Natureza,
Planejamento Ambiental, Políticas Públicas, Governança, Educa-
ção Ambiental, Ecologia e Ciências Ambientais.

Diego Costa Nogues é graduado em Oceanografia (UFPR - 2012),


Mestre em Desenvolvimento Territorial Sustentável (UFPR - 2017).

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L it oral do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Atua com monitoramento pesqueiro, gerenciamento costeiro, con-


servação dos oceanos e pesca artesanal . d.c.nogues@gmail.com

Eduardo Vedor de Paula é bacharel e licenciado em Geografia


(UFPR – 2002). Mestre e Doutor e Geografia (UFPR – 2005 e 2010).
Pós-Doutor em Ordenamento Territorial (UNCuyo, Mendoza/ARG
– 2018). Docente do Departamento de Geografia e do Programa de
Pós-Graduação em Geografia da UFPR. edugeo@ufpr.br.

Emerson Luis Tonetti possui graduação em Ciências Biológicas


pela Universidade Federal do Paraná (1995), mestrado em Botânica
pela Universidade Federal do Paraná (1997) e doutorado em Geo-
grafia pela Universidade Federal do Paraná (2011). Atualmente é
professor do Instituto Federal do Paraná – campus Paranaguá . Tem
experiência na área de ecologia e planejamento da paisagem e qua-
lidade ambiental urbana. emerson.tonetti@ifpr.edu.br

Eva Blaszczyk Gaweleta é Mestre em Gestão Ambiental (UP) e gra-


duada em Turismo (UP). Atualmente é professora da Universida-
de Positivo nos cursos de Gastronomia e Eventos. Temas de inte-
resse: gestão ambiental, planejamento, organização e execução de
eventos, eventos sustentáveis, turismo rural sustentável. eva.blas-
zczyk@gmail.com

Everaldo dos Santos possui graduação em Ciências Biológicas pela


Universidade Estadual de Ponta Grossa, especialização em Geren-

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

ciamento Ambiental pela Universidade Federal do Paraná (2003),


Mestrado em Ciências do Solo (2007) e Doutorado em Engenharia
Florestal na linha de Conservação da Natureza também pela UFPR.
Atualmente é professor do Instituto Federal do Paraná (IFPR) -
Campus Paranaguá com atuação na educação tecnológica onde
coordena o Lab. de Biologia e Ambiente e desenvolve pesquisas em
ecologia de ecossistemas terrestres com ênfase em biologia do solo
e ciclagem biogeoquímica e também em projetos de ciências am-
bientais. everaldo.santos@ifpr.edu.br

Ezequiel Antonio de Moura é professor do Instituto Federal do Pa-


raná (IFPR) - Campus Paranaguá . Formação em Ciências Biológicas
(bacharel e licenciatura) na Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC) e com Especialização em Ensino de Ciências Humanas e So-
ciais em Escolas do Campo (UFSC/ITERRA). Mestre em Desenvol-
vimento Territorial Sustentável pela Universidade Federal do Para-
ná. Atua com Educação Profissional e Tecnológica, principalmente
na área Ambiental e de Agroecologia, com experiência também em
Educação de Jovens e Adultos. ezequiel.moura@ifpr.edu.br

Isabel Jurema Grimm é Doutora em Meio Ambiente e Desenvolvi-


mento (UFPR), mestre em Desenvolvimento Regional (FURB/Blu-
menau), graduada em Turismo (FACISA/Foz do Iguaçu) e especia-
lista em Administração do Desenvolvimento da Atividade Turística
em Núcleos Receptores (USP). Atualmente é pesquisadora do Nú-
cleo de pesquisa (NECOS) da UFPR (Ecossocioeconomia Urbana:

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

arranjos socioprodutivos e autogestão comunitárias. Temas de inte-


resse: desenvolvimento territorial sustentável, indicadores socioam-
bientais, educação para o ecodesenvolvimento, turismo comuni-
tário solidário e sustentável, mudanças climáticas. isabelgrimm@
gmail.com

Izabel Carolina Raittz Cavallet possui graduação em Medicina


Veterinária pela Universidade Federal do Paraná (2003) e mestra-
do em Ciências Veterinárias pela Universidade Federal do Paraná
(2008). Atualmente é professora das disciplinas de Educação Am-
biental, Zoologia e Conservação e Manejo de Fauna do Instituto Fe-
deral do Paraná (IFPR) – campus Paranaguá . Tem experiência nas
áreas de Educação Ambiental, Zoologia e Conservação e Manejo de
Fauna. izabel.cavallet@ifpr.edu.br

Jean Jesus Ilsuk da Silva é graduado em Geografia pela Universi-


dade Federal do Paraná (Bacharelado e Licenciatura -2009), du-
rante a vida universitária participou do Programa de Monitoria e
do estagio no Projeto de Eutrofização das Águas do Reservatório
do Rio Verde. Mestre em Geografia – área de concentração Análi-
se Ambiental, pela Universidade Federal do Paraná (2015). Como
profissional atuou na educação publica e privada, nos Ensinos Fun-
damental, Médio, Técnico. Atua no momento como Docente de
Geografia na modalidade bilingue (Português e Inglês), no progra-
ma para Educação de Jovens e Adultos do Colégio SESI.

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Joana Rupprecht Zablonsky é Tecnóloga em Química Ambiental


(UTFPR). Licenciada em Química (UTFPR). Mestre em Engenha-
ria Civil (UTFPR). Docente do IFPR Campus Paranaguá , desde 2013
nos curso técnico em Aquicultura e Meio Ambiente, Tecnologia em
Manutenção Industrial, e na especialização em Gestão Ambiental.
Possue expereiência na área de Engenharia sanitária: tratamento
de água, gestão de resíduos sólidos e tratamento de efluentes. joa-
na.zablonsky@ifpr.edu.br

José Carlos Muniz é Mestre em Desenvolvimento Territorial Sus-


tentável pela UFPR (2017); Especializado em História, Arte e Cultu-
ra pela UEPG (2012) e História e Cultura Indígena e Afro-brasileira
pela ULBRA (2014), é licenciado em História pela FAFIPAR (2008).
muniznativofilho@yahoo.com.br

Junior Ruiz Garcia é professor Adjunto III. Departamento de Eco-


nomia. Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Econô-
mico (PPGDE). jrgarcia1989@gmail.com

Leandro Ângelo Pereira possui graduação em Biologia pela Ponti-


fícia Universidade Católica do Paraná (2002), mestrado em Ciências
Veterinárias na área de Meio Ambiente e Desenvolvimento (2004),
especialização em Educação, Meio Ambiente e Desenvolvimento
(2005) e é doutor na área de Ecologia e Conservação pela Universida-
de Federal do Paraná com bolsa sanduíche na University of Victoria,
Canadá (2012). Atualmente é Professor do Instituto Federal do Para-

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

ná (IFPR) – campus Paranaguá . Tem experiência em Conservação


da Natureza e Aquicultura. leandro.pereira@ifpr.edu.br

Liliani Marilia Tiepolo é Bacharela e Licenciada em Ciências Bioló-


gicas (PUC-PR - 1995). Especialista em Metodologia Científica, Mes-
tre em Ciências Florestais (UFPR - 2001), Doutora em Zoologia (UFRJ
- 2007). Docente do curso de bacharelado em Gestão Ambiental da
UFPR, atual Coordenadora do programa de Pós-graduação em De-
senvolvimento Territorial Sustentável da UFPR. liliani@ufpr.br

Luciana Galvão Martins possui Mestrado em Desenvolvimento


Territorial Sustentável pela UFPR Litoral (2017). É graduada em Fi-
losofia e Licenciatura pela USP (2002), especialização MBA em Es-
tratégia Empresarial pela Uninove (2009) e Técnica em Nutrição e
Dietética pela ETEC (2013). Desenvolve pesquisas na área acadê-
mica relacionada as temáticas: segurança e soberania alimentar,
gênero e diversidade e elaborações epistemológicas acerca do ter-
ritório, cultura e saberes locais. Compõe atualmente o grupo de
pesquisa (TeDis/CNPQ) - Território, Diversidade e Saúde da UFPR
Litoral. lucianagmartins@gmail.com

Luciana Vieira Castilho Weinert é graduada em Fisioterapia (PU-


C-PR, 2003). Especialista em Fisiologia Humana e da Nutrição (PU-
C-PR, 2006). Mestre e Doutora em Ciências - Engenharia Biomé-
dica (2005, 2010) pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná
(UTPR). Docente do Curso de Licenciatura em Educação Física e

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Territorial


Sustentável (PPGDTS) do Setor Litoral da Universidade Federal do
Paraná (UFPR). lucianaweinert@gmail.com

Márcia Regina Ferreira é Doutora em Ciências (2010) pela Uni-


versidade Federal do Paraná. Mestre e graduada em Administra-
ção, ambos pela Universidade Estadual de Maringá. Atualmente é
professora do Setor de Educação Profissional e Tecnológica e tam-
bém professora e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Territorial Sustentável da UFPR atuando na Li-
nha de Socioeconomia e saberes locais. É articuladora da Rede de
Economia Social do Brasil onde aborda os temas: Educação, cultu-
ra, economia plural, economia politica e inovação social a partir do
empreendedorismo. marciaregina@ufpr.br

Marisete T. Hoffmann-Horochovski é graduada em Ciências So-


ciais pela Universidade Federal do Paraná (1995), Mestre (2003) e
Doutora em Sociologia pela UFPR (2008). É professora do curso de
graduação em Administração Pública e do Programa de Pós-Gra-
duação em Desenvolvimento Territorial Sustentável (PPGDTS) do
Setor Litoral da Universidade Federal do Paraná. É integrante dos
grupos de pesquisa em Sociologia da Saúde e Desenvolvimento
Territorial Sustentável (UFPR/CNPQ). marisethh@gmail.com

Mayra Taiza Sulzbach é graduada em Economia pela UFSC. Mes-


tre e doutora em Desenvolvimento Econômico pela UFPR. Realizou

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

bolsa Sanduiche no Centre d’analyse théorique des organisations et


des marchés (ATOM) junto a Université Paris I (Panthéon-Sorbon-
ne) e pós-doutorado no Laboratoire Interdisciplinaire de Sociolo-
gie Économique (LISE) junto ao Conservatoire National des Arts et
Métiers (CNAM/Paris III). Docente do Setor Litoral da UFPR e dos
Programas de Pós-Graduação em Desenvolvimento Territorial Sus-
tentável (PPGDTS) e em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PPG-
MADE). mayrasulzbach@yahoo.com.br

Natali Calderari é graduada em Gestão Ambiental. Mestre em De-


senvolvimento Territorial Sustentável pela UFPR. Tem experiência
na área de Ciências Ambientais, com ênfase em Gestão Ambien-
tal, atuando principalmente nos seguintes temas: litoral paranaen-
se, turismo , agricultura familiar, patrimônio natural e patrimônio
cultural. natali_calderari@hotmail.com

Patrícia Bilotta é Mestre e doutora em Engenharia Hidráulica e Sa-


neamento pela Universidade de São Paulo (EESC-USP), especialis-
ta em Projetos Sustentáveis e de Mitigação das Mudanças Climáti-
cas pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Professora Titular
do Programa de Mestrado e Doutorado em Gestão Ambiental
(PGAMB) da Universidade Positivo (UP) - Curitiba/PR. Titular do
Fórum Paraná e Curitiba de Mudanças Climáticas. Temas de inte-
resse: aproveitamento de subprodutos do tratamento de efluentes
(energia do lodo e do biogás, água para reuso), economia de baixa
emissão de carbono. pb.bilotta@gmail.com

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Priscila Cristina dos Santos é Mestranda do Programa de Pós-Gra-


duação em Sociologia da Universidade Federal do Paraná, espe-
cialista em Questão Social e Tecnóloga em Gestão Imobiliária pela
mesma universidade, licenciada em Ciências Sociais pelo Institu-
to Federal do Paraná- campus Paranaguá . Atuou como bolsista em
programas de apoio e fomento de pequenos agricultores produto-
res de farinha em Guaraqueçaba, como gestora de projetos na Mo-
tiro, Sociedade Cooperativa no Projeto Sal da Terra (Sistema Agroa-
limentar Localizado) no município de Paranaguá , como bolsista
PIBID em escolas da Ilha do mel (educação do campo) e Pontal do
Paraná . priscilacristina.santos@hotmail.com

Priscila Tomie Leme Ike é professora do Ensino Básico Técnico e


Tecnológico no Instituto Federal do Paraná (IFPR - Campus Parana-
guá ). Possui Licenciatura em Química, Mestrado em Química Or-
gânica e Doutorado em Química pela Universidade Federal de São
Carlos (UFSCar). Possui experiência em produção, purificação e ca-
racterização de proteínas, biocatálise, síntese e caracterização de
complexos de coordenação. Também possui experiência em ensino
de química e matemática, nos níveis médio e fundamental. priscila.
ike@ifpr.edu.br

Shalom Moreira Baltazar é advogado, Especialista em Direito


Ambiental pela Universidade Positivo, Mestrando em Direito pela
UFPR e Membro da Comissão de Direito Ambiental da OAB/PR.
shalom.baltazar@gmail.com

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Silvana de Andrade é Bióloga, graduada pela PUC-PR.  Trabalha


no Terceiro Setor desde 1996. Carreira desenvolvida na área da edu-
cação formal, da educação ambiental e áreas de elaboração e ges-
tão de projetos, com o acompanhamento orçamentário e criação
de materiais para as atividades de educação ambiental, didáticos e
de divulgação. Foi Secretária executiva no Programa “Incrementos
a Investimentos Conservacionistas no Litoral do Paraná ”, no perío-
do de 2013 a 2016. 

Sony Cortese Caneparo possui Graduação em Geografia (1979),


Mestrado em Ciências Geodésicas (1983), Especialização em Geo-
processamento (1993) e Doutorado em Meio Ambiente e Desenvol-
vimento (1999), todos obtidos na Universidade Federal do Paraná.
Atuou como professora Departamento de Geografia da UFPR de
1984 a 2015 quando se aposentou como professora na classe de Ti-
tular. Atualmente ministra a disciplina de sistemas de informações
geoambientais no Programa de Pós-graduação em Geografia da
UFPR, atuando como orientadora em dissertações e teses do mes-
mo. sonycc.scc@gmail.com

Tainara Piontkoski Maldaner é graduada em Fisioterapia (UFPR,


2015). Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvi-
mento Territorial Sustentável (PPGDTS) do Setor Litoral da Univer-
sidade Federal do Paraná (UFPR), na Linha de Pesquisa Redes So-
ciais e Políticas Públicas. tainara.fisioufpr@gmail.com

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Tarcimeri dos Santos Serpa Bacharel em Serviço Social (UNILA-


GOS, 2008). Especialista em Questão Social pela Perspectiva Inter-
disciplinar (UFPR, 2013). Mestre em Desenvolvimento Territorial
Sustentável (PPGDTS) pela Universidade Federal do Paraná - Setor
Litoral (2017). Atua como Assistente Social no Centro de Referência
da Assistência Social (CRAS) Canoas no município de Pontal do Pa-
raná (PR). tarci.serpa@gmail.com

Wagner Rodrigo Weinert Graduado em Bacharelado em Infor-


mática (UEPG, 2002). Mestre e Doutor em Ciências – Informáti-
ca Industrial (2004, 2010) pela Universidade Tecnológica Federal
do Paraná (UTPR). Docente do Curso Superior em Tecnologia em
Análise e Desenvolvimento de Sistemas e do Programa de Pós-Gra-
duação em Ciência, Tecnologia e Sociedade (PPGCTS) do Campus
Paranaguá do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
do Paraná (IFPR). wrwinert@gmail.com

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Índice remissivo
A
antonina 17, 58, 66, 155, 156, 166, 178, 182, 185, 192, 251, 343

B
barrancos 11, 212, 215, 339, 341, 342, 343, 344, 345, 346, 347, 348, 351, 354,
356, 357, 359, 362, 363, 364, 366, 367

C
complexo portuário 11, 208, 210, 216, 217, 227, 229, 234, 238, 241, 248
comunidade 11, 12, 22, 23, 25, 41, 52, 53, 102, 113, 114, 119, 120, 121, 123, 124,
125, 127, 132, 133, 134, 135, 136, 137, 145, 146, 150, 151, 152, 160, 169,
179, 180, 181, 183, 184, 188, 190, 192, 193, 195, 196, 197, 198, 199, 200,
201, 202, 203, 248, 269, 271, 272, 280, 319, 339, 341, 342, 343, 344, 345,
347, 348, 349, 350, 351, 354, 356, 359, 363, 364, 366, 367, 368, 378, 379,
380, 382, 383, 384, 385, 393, 408, 409, 410, 411, 412, 413, 414, 415, 416,
418, 419, 425, 429, 430, 431, 432, 433, 434, 435, 436, 437, 438, 439, 446
costeiro 18, 38, 88, 94, 116, 123, 133, 445, 448

D
desenvolvimento infantil 11, 279, 281, 289, 290, 293, 298, 303
desenvolvimento socioambiental 10, 93, 95, 97, 99, 111
desenvolvimento territorial sustentável 9, 10, 119, 120, 121, 122, 126, 129, 136,
137, 144, 146, 147, 151, 156, 158, 168, 287, 445, 446, 447, 449, 450, 451,
452, 453, 454, 456, 457

E
econômico 9, 17, 18, 28, 38, 40, 44, 45, 55, 88, 94, 95, 96, 120, 127, 130, 147, 148,
152, 163, 179, 182, 196, 202, 246, 248, 249, 252, 253, 255, 261, 266, 268,
269, 271, 272, 314, 344, 381, 404, 413, 451, 453
ecossistema 148, 247, 256, 261, 262, 263, 264, 266, 271, 272

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

G
guaraqueçaba 12, 17, 44, 47, 48, 49, 52, 53, 54, 60, 61, 64, 65, 66, 68, 69, 72, 73,
80, 82, 83, 86, 121, 133, 166, 178, 182, 185, 251, 343, 408, 411, 413, 414,
416, 417, 433, 434, 455

J
juçara 10, 144, 145, 146, 147, 153, 154, 155, 156, 157, 160, 161, 162, 164, 165,
166, 167, 168, 169

L
litoral do paraná 9, 10, 12, 17, 28, 39, 41, 42, 45, 46, 48, 51, 55, 58, 59, 60, 62,
63, 66, 67, 68, 70, 71, 72, 75, 77, 78, 82, 85, 86, 87, 88, 99, 110, 119, 121,
127, 129, 130, 144, 158, 165, 166, 167, 168, 179, 180, 181, 182, 185, 193,
195, 196, 197, 198, 199, 200, 201, 202, 204, 210, 249, 346, 373, 375, 390,
392, 395, 433, 439, 456

P
paranaguá 12, 17, 32, 33, 34, 35, 47, 54, 58, 66, 67, 68, 93, 94, 95, 96, 97,
98, 99, 100, 103, 106, 111, 113, 114, 116, 121, 129, 131, 159, 166,
178, 180, 181, 182, 185, 210, 211, 212, 213, 214, 216, 249, 251, 343,
345, 373, 375, 378, 384, 389, 390, 391, 392, 393, 394, 395, 396, 397,
398, 399, 400, 401, 402, 403, 404, 405, 417, 445, 448, 449, 450, 451,
452, 455, 457
pesca artesanal 11, 12, 185, 339, 340, 341, 342, 348, 448
pesca de siri 10, 178, 182, 184, 185, 189, 194, 197, 199, 201, 204
política 18, 20, 23, 37, 104, 107, 108, 125, 126, 127, 128, 145, 150, 152, 199, 282,
283, 284, 285, 303, 313, 317, 334, 396, 405, 414, 437
pontal do paraná 10, 11, 12, 17, 33, 34, 57, 67, 74, 114, 131, 178, 182, 185,
208, 209, 210, 211, 212, 213, 214, 215, 216, 217, 228, 229, 230, 231, 232,
233, 235, 236, 237, 238, 241, 248, 249, 250, 251, 252, 255, 257, 258, 259,
260, 261, 262, 265, 266, 267, 269, 270, 271, 272, 279, 281, 293, 303, 312,
313, 317, 321, 329, 331, 334, 340, 343, 344, 350, 356, 357, 373, 375, 376,
378, 455, 457

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L it or al do par an á : t e rrit ório e pe r spe c t iva s

Q
qualidade de vida 11, 18, 31, 68, 94, 165, 200, 253, 269, 271, 280, 282, 284, 312,
313, 314, 315, 316, 317, 318, 319, 320, 321, 322, 323, 324, 325, 327, 328,
329, 330, 332, 333, 334, 335, 336

R
rural 120, 130, 169, 200, 202, 250, 373, 374, 375, 376, 377, 379, 380, 381, 382,
383, 384, 385, 386, 425, 430, 448

S
são joão 12, 408, 411, 412, 420, 421, 422, 424, 425, 426, 427, 428, 429, 430, 431,
432, 433, 434, 435, 436, 437, 438, 439
saúde 11, 21, 22, 24, 98, 124, 131, 155, 279, 280, 281, 282, 283, 284, 285, 286,
287, 288, 290, 292, 293, 294, 295, 297, 298, 302, 303, 314, 315, 316, 317,
318, 322, 323, 327, 329, 330, 331, 333, 380, 412, 452, 453
social 9, 21, 24, 25, 26, 27, 33, 37, 40, 44, 87, 95, 102, 104, 105, 127, 128, 129,
145, 147, 150, 152, 155, 157, 159, 163, 171, 172, 179, 181, 196, 197, 200,
202, 206, 249, 268, 269, 276, 283, 286, 289, 290, 292, 300, 305, 307, 311,
313, 314, 316, 317, 318, 320, 321, 329, 331, 334, 335, 337, 338, 340, 341,
349, 364, 371, 373, 387, 389, 390, 396, 409, 410, 413, 414, 424, 426, 441,
442, 453, 455, 457, 460

T
turismo 10, 17, 41, 46, 64, 119, 120, 121, 122, 123, 124, 125, 126, 127, 128, 129,
130, 132, 134, 135, 136, 137, 215, 251, 259, 260, 266, 267, 340, 343, 355,
376, 448, 449, 450, 454

U
unidade de conservação 48, 55, 60, 69, 73, 74, 81, 82, 124, 125, 130
utinga 12, 408, 411, 416, 417, 419, 429, 430, 431, 433, 434, 435, 436, 438, 439

Z
zoneamento 9, 17, 18, 20, 21, 23, 24, 26, 27, 28, 37, 38, 69, 88, 124, 130, 137

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Este livro foi composto em Utopia
Std pela Editora Autografia e
impresso em papel offset 75 g/m².

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