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RAMOS, E.M. TRA149 - Tecnologia do Processamento de Carnes & Derivados. Texto didático (apostila reprografada), v.

1
(Fundamentos Teóricos). Itapetinga: Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). 2005.

Teórica 04

Conversão do Músculo
em Carne
E.M. Ramos & L.A.M. Gomide

Introdução importante durante a conversão do músculo em carne


por duas razões principais:
Embora o músculo seja, percentualmente, o
principal componente do que comumente se conhece 1) Muitas das reações e mudanças que ocorrem
como carne, existem diferenças fundamentais entre durante a conversão são resultados diretos da
músculo e carne. A conversão do músculo em carne tentativa de se manter as funções vitais; e,
envolve uma série de alterações post-mortem, 2) As condições do ambiente ante-mortem são
oriundas de transformações bioquímicas e físicas estressantes e podem causar alterações post-mortem
como resultado dos processos de abate animal. Estas que afetam a qualidade da carne. Isto inclui todo o
reações são similares tanto no músculo vivo como manejo pré-abate do animal, desde o embarque na
após o sacrifício, porém, após a morte fisiológica, os fazenda/granja até a hora do abate no abatedouro.
tecidos são incapazes de sintetizar e eliminar
determinados metabólicos como em vivo. A A conversão do músculo em carne começa com a
conversão do músculo em carne resulta numa série sangria, onde o equilíbrio homeostático é quebrado
de reações provocadas pela necessidade de devido à redução da pressão sanguínea. Na tentativa
manutenção da vida a qualquer custo, sendo reguladas de manter o volume adequado de sangue para os
pelo mecanismo homeostático, na tentativa de manter órgãos vitais, os batimentos cardíacos são
o suprimento energético essencial à vida. aumentados, a circulação periférica e a de tecidos
menos essenciais é reduzida (vaso-constrição) e a
O Mecanismo circulação para os órgãos e o cérebro é aumentada
Homeostático (vaso-dilatação). Entretanto, como o funcionamento
do mecanismo homeostático depende da circulação
O mecanismo homeostático é aquele que tenta sangüínea, o seu tempo de atuação é de no máximo
manter a vida em condições adversas, sendo regulado alguns poucos minutos após o abate. Estas respostas
pelo sistema nervoso central (SNC) e pelas glândulas às condições adversas são, no entanto, suficientes para
endócrinas, aproveitando o sistema circulatório para desencadear todo o processo de alterações que levam
que os diversos hormônios atuem nos órgãos e tecidos à transformação do músculo em carne.
em que são necessários. No animal vivo este
mecanismo, por exemplo, regula a temperatura Alterações Musculares
corporal aumentando (no calor) ou diminuindo (no Pós-Abate
inverno) a circulação periférica (aumentando ou
reduzindo a troca de calor com o ambiente, Queda do pH Muscular
respectivamente). Outro exemplo é a remoção do
ácido láctico do músculo e sua condução para o fígado Com a morte do animal, cessam os sistemas
(para a gluconeogênese) ou para o coração (energia), respiratório e circulatório, e o músculo não receberá
evitando que a cãibra se perpetue. mais nutrientes e oxigênio. Para obtenção de energia
O conceito de homostease torna-se muito necessária à manutenção de sua integridade, o

PROCESSAMENTO DE CARNES E DERIVADOS 45


Texto em Revisão
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músculo recorrerá ao mecanismo aeróbio enquanto fibras vermelhas apresentam uma maior concentração
estiverem presentes reservas de oxigênio nas de mioglobina e, consequentemente, conseguem
mioglobinas. O mecanismo imediato de produção de manter o mecanismo oxidativo por mais tempo,
energia é limitado (concentração de fosfocreatina entre apelando para o mecanismo anaeróbio mais
13 e 23 µmol/g, dependendo da espécie animal e do tardiamente. Estima-se que em bovinos 15% do ATP
músculo envolvido, sendo maior em músculos com produzido post-mortem seja oriundo do mecanismo
menor teor de mioglobina) e cessa quando esgotam oxidativo. Em suínos a energia obtida pela via aeróbia
as suas reservas, não renovadas com o término do é estimada em apenas 1% de todo ATP produzido
mecanismo aeróbio. post-mortem. Esta diferença é um dos fatores que
Assim, exauridas as reservas de oxigênio, o influencia a menor taxa de declínio de pH post-
músculo passará então a utilizar o mecanismo mortem observada em bovinos, quando comparado
anaeróbio, com consequente acúmulo de ácido lático, com a queda de pH em músculos de suínos.
uma vez que não há sistema circulatório para removê- De fato, o valor do pH final do músculo e a
lo, e queda de pH muscular. O ácido lático continuará velocidade que este é atingido são influenciados por
sendo produzido e se acumulando no músculo, até vários fatores. Entre eles citam-se: a espécie (a queda
que todo glicogênio estocado seja consumido ou até do pH é mais rápida nos suínos, intermediária nos
que o pH no tecido muscular se torne tão baixo que as ovinos e mais lenta nos bovinos); tipo de músculo
próprias enzimas glicolíticas sejam inativadas. No (maior queda em músculos com maior proporção de
animal vivo, o glicogênio muscular é utilizado como fibras brancas); fator hereditário, responsável pela
material energético para sustentar a contração quando variação entre animais de mesma espécie; e manejo
a demanda energética é maior do que aquela oferecida pré-abate, diretamente relacionado ao estresse animal.
pela quebra da glicose sanguínea. A queda post-mortem do pH muscular é
O abaixamento do pH do músculo devido ao extremamente importante para a qualidade final da
acúmulo de ácido lático é uma das mudanças mais carne. Um dos principais defeitos associados às carnes
significativas que aparecem durante a sua conversão diz respeito à obtenção de carnes que apresentam
em carne. A velocidade do consumo de ATP determina curvas de queda de pH não usuais, uma vez que esta
a velocidade de degradação do glicogênio e, queda de pH influencia nas propriedades de cor,
consequentemente, da produção do ácido lático. textura e retenção de água da carne, com reflexos na
Assim, a forma mais simples e rápida para se observar maciez, sabor, rendimento industrial e comercial,
a velocidade de consumo de ATP é o acompanhamento vida-de-prateleira, valor nutricional, etc.
da queda do pH. Várias curvas de pH foram propostas para
Devido à diferença no conteúdo de mioglobina explicar algumas das transformações musculares
entre as fibras brancas e vermelhas, a concentração post-mortem (Figura 4.1). Entretanto, para
de oxigênio estocado no músculo é variável com a simplicidade de compreensão e análise três tipos de
espécie animal. Músculos com maior proporção de condições são comumente conhecidas: DFD, PSE e

Figura 4.1. Curvas de queda de pH post-


7,0 mortem. Em condições normais (RFN) o pH
DFD
cai de aproximadamente 7,0 no músculo vivo
para ± 5,6 depois de 6 a 8 horas após o abate,
6,5 atingindo um pH final (depois de 24 horas)
Ligeiramente escura entre 5,5 e 5,7. Na condição DFD o pH cai
apenas alguns décimos durante a primeira
5,0
hora após o abate, permanecendo com valores
pH

RFN relativamente altos e dando um pH final entre


RSE
6,5 e 6,8. Na condição PSE o pH cai
5,5
rapidamente na primeira hora (para ± 5,8 em
45 minutos) após a sangria, apresentando um
5,0
pH final entre 5,3 e 5,6. Na condição RSE, a
PSE queda de pH também é relativamente rápida
Carne ácida
(até 5,5 em 3 horas), mas o pH final se
mantém entre 5,3 e 5,6. A curva com queda
1 2 3 4 5 6 24 de pH gradual, porém com valor final
Tempo (horas) post mortem próximo de 5,0, é denominada “carne ácida”.
Fonte: adaptado de Briskey (1964).
Conversão do Músculo em Carne 47

Figura 4.2. Padrões e


características de qualidade
de carne utilizados pelo
Conselho Nacional de
Produtores de Carne Suína
(NPPC). Fonte: National
Pork Producers Council.

Normal (RFN). Atualmente, em termos práticos, tem- abate e que esgota os níveis de glicogênio muscular.
se avaliado a qualidade da carne em função de quatro Uma vez que no momento de abate o animal apresenta
condições de pH, já que se reconheceu que algumas pouca disponibilidade de glicogênio para ser utilizado
carnes apresentam características intermediárias entre pelo mecanismo anaeróbio (quando terminarem as
as curvas Normal (RFN) e PSE. Estas carnes são reservas de oxigênio), a produção de ácido lático é
denominadas RSE, e apresentam coloração típica da baixa e, consequentemente, a carne se apresenta com
carne Normal, enquanto as demais características são alto valor de pH post-mortem (pH 6,5 a 6,8). A
semelhantes à da carne PSE. Os tipos característicos diferenciação da carne DFD da normal somente
de qualidade de carne estão ilustrados na Figura 4.2. poderá ser feita no pH final. Se após 24 horas o pH
da carne se apresentar acima de 6,2, têm-se o indício
Carne RFN da condição DFD.
(queda de pH normal) Como na anomalia DFD o pH post-mortem
permanece próximo ao fisiológico, haverá pouca
O animal normal não se encontra sob excessivo desnaturação protéica e sua carne possuirá alta
estresse e apresenta estoque normal de glicose. Assim, capacidade emulsificante (CE) e alta capacidade de
após certo tempo de queda o pH estabiliza-se devido retenção de água (CRA). Do ponto de vista
ao esgotamento das reservas de glicose e à econômico, a maior CRA mantém o peso da carne
desnaturação das enzimas da via glicolítica pelo baixo quase constante, com pouca perda de suco,
pH muscular. possibilitando a venda de “água por carne”.
As carnes oriundas desta situação apresentam A carne DFD apresenta ainda uma maior maciez
características intermediárias entre os extremos PSE (suculência) e um maior rendimento durante o
e DFD e são preferidas para a comercialização de processamento, especialmente após os processos de
carnes frescas. cocção. Outrossim, a sua maior CRA evita perda de
componentes hidrossolúveis (minerais e vitaminas
Carne DFD hidrossolúveis) e evita a redução do tamanho da carne
pela perda de água quando submetida a temperaturas
A carne de corte escuro (dark cutting), ou ainda elevadas. São carnes ideais para o processamento de
DFD (dark, firm and dry), apresenta características produtos emulsionados, uma vez que as suas
anormais devido ao seu aspecto escuro, firme e seco. proteínas, em especial as miofibrilares, são
Esta anomalia é detectada em ovinos e suínos, mas minimamente desnaturadas, pelo que são altamente
apresenta maior incidência em bovinos (cerca de 3% solúveis, permitindo uma maior extração e capacidade
das carcaças). emulsionante.
A carne DFD é um problema causado pelo Entretanto, carnes DFD apresentam alguns
estresse crônico (cansaço, maus tratos, excitação, etc.) inconvenientes. A sua conservação é problemática por
submetidos a animais resistentes ao estresse antes do apresentar pH próximo ao neutro, ótimo para o
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crescimento de grande parte dos microorganismos e hipertermia.
para reações de deterioração. Além disso, do ponto A disfunção metabólica parece ser causada por
de vista do consumidor, apresenta uma carne de uma mutação no gene responsável pelo controle da
coloração mais escura, o que pode dar a impressão, síntese protéica muscular, que ocasiona alterações na
nem sempre real, de deterioração. Esta forte coloração proteína rianodina (RYR), receptora de cálcio,
é conferida pelo baixo grau de desnaturação dos causando um descontrole na liberação de cálcio do
pigmentos de mioglobina. retículo sarcoplasmático. Assim, nestes animais há
Devido à sua elevada CRA, a carne DFD não é um grande fluxo de cálcio para o sarcoplasma frente
adequada para o processamento de produtos secos a condições adversas (estressantes), o que acelera o
ou semi-secos, como salames. A carne DFD também metabolismo post-mortem, resultando numa
não é propícia para a fabricação de curados, por exacerbada elevação da temperatura muscular e queda
apresentar dificuldades na absorção de sais de cura e de pH muscular.
condimentos, uma vez que a sua capacidade de A PSS é ocasionada por fatores estressantes como
absorver quantidades adicionais de água está limitada ferimentos, doenças, brigas e, especialmente, por
pela manutenção da água naturalmente presente extremos de temperatura e umidade durante o
(ligada às proteínas musculares). Associado a isto a transporte e a espera nas pocilgas de matança.
carne DFD apresenta uma coloração muito intensa Associado a estes fatores, existe animais com maior
que pode descaracterizar o produto frente ao predisposição ao estresse (mais sensíveis), carreadores
consumidor. Quando do seu uso na fabricação de de um gene recessivo semiletal conhecido como gene
presunto cozido, aconselha-se a mistura com 60% de halotano.
carne normal para retenção da cor do produto. O gene halotano foi assim batizado pelo fato dos
Do ponto de vista do sabor, este se apresenta animais carreadores deste gene apresentarem espamos
menos pronunciado na carne DFD, o que se deve à intensos quando submetidos ao teste com o gás
falta de açúcares (carboidratos) para a reação de halotano. O lócus responsável pela sensibilidade ao
Maillard,que fornece o “gosto de carne”, halotano é denominado “Hal” e possui dois alelos: o
independente da espécie. Devido ao seu elevado pH, alelo normal (N) e o responsável pela sensibilidade
a carne DFD também é menos propensa às reações (n). Assim, reconhecem-se três genótipos:
de oxidação de gorduras, responsáveis pelo “gosto
da espécie, e à degradação dos nucleotídeos de ATP a # Halotano-negativos (Hal NN): animais mais
IMP (favorecida em pH ácido), o qual apresenta efeito resistentes ao estresse e menos propensos a gerar a
potencializador de sabor. condição PSE. No entanto, estes animais são menos
eficientes na produção de carne magra;
Carne PSE # Halotano-positivos homozigotos (Halnn): animais
altamente eficientes na produção de carne magra,
A carne PSE (pale, soft and exsudative) apresenta mas também altamente estressáveis e propensos a
características anormais devido ao seu aspecto pálido, desenvolver a condição PSE; e
flácido e exsudativo. Embora a maior parte da # Halotano-positivos heterozigotos (HalNn): animais
literatura diga respeito a suínos (com incidência entre que apresentam susceptibilidade intermediária ao
5 e 20% das carcaças), a condição PSE também está estresse, bem como eficiência intermediária de
presente em outras espécies, especialmente aquelas produção de carne magra e propensão a
em que a musculatura é rica em fibras brancas, como desenvolverem a condição PSE.
aves por exemplo.
A condição PSE é comumente gerada em animais De forma geral, suínos halotanos-positivos (Halnn
altamente susceptíveis ao estresse, principalmente e HalNn) são mais propensos a morrerem durante o
aqueles oriundos de seleção genética para a produção transporte do que os halotanos-negativos (HalNN). Por
de carne magra. Embora este objetivo tenha sido isso, a seleção genética oferece a única ferramenta
alcançado, esta seleção também levou ao possível para redução da incidência de problemas
desenvolvimento de animais que apresentam uma originados pela PSS. Entretanto, embora esteja inter-
disfunção metabólica que leva a uma acidose relacionada com a PSS, compartilhando vários
muscular excessiva e elevado aumento da temperatura caminhos fisiológicos, a condição PSE pode ocorrer
corporal, conhecida como Síndrome do Estresse independentemente do defeito genético (gene
Suíno (PSS, do inglês Porcine Stress Syndrome) ou halotano). Desta forma, a remoção (seleção genética)
Hipertermia Maligna. Em condições de estresse dos animais susceptíveis ao estresse devido ao gene
extremo, a PSS pode acarretar em níveis elevados de halotano pode praticamente eliminar a ocorrência da
potássio no sangue e a morte do animal por PSS, mas grande parte da incidência de PSE não será
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afetada se as condições de estresse pré-abate não de abate, como, por exemplo, a escaldagem.
forem adequadas. Isto reforça a necessidade de se ter A associação de temperatura elevada e baixo pH
um manejo adequado destes animais durante as etapas no músculo promove uma acentuada desnaturação das
que precedem o abate. proteínas miofibrilares e sarcoplasmáticas, e a carne
Suínos que apresentam uma muscularidade se apresenta com baixa capacidade de retenção de
excessiva, fruto da seleção genética para a produção água (CRA) e baixa capacidade emulsionante (CE).
de carne magra, são mais sensíveis ao estresse crônico, Consequentemente, esta anomalia gera carnes de
sendo comum se verificar um avermelhamento do seu aparência ruim (pálida, sem firmeza, com a presença
couro, ansiedade e tremores musculares nos animais de suco sanguinolento na embalagem), baixo
estressados (Figura 4.3). rendimento (redução do peso da carne e seu
Em função de sua susceptibilidade ao estresse, o encolhimento, quando submetida a temperaturas de
animal apresenta condições musculares de anoxia cocção, pela perda de água) e com perda maior de
(ausência de oxigênio) nos momentos que antecedem nutrientes hidrossolúveis, como algumas vitaminas e
ao abate, especialmente em função da atuação dos sais minerais.
hormônios epinefrina e norepinefrina. Assim, por Do ponto de vista tecnológico a carne PSE pode
apresentar baixas reservas musculares de oxigênio, o ser usada em produtos que serão submetidos a
músculo deste animal recorrerá ao mecanismo processos de remoção de água (secos ou semi-secos),
anaeróbio mais rapidamente, ocorrendo, nas três como salames, uma vez que requererão menos energia
primeiras horas após o abate, uma queda drástica de para remoção de água do produto. Sua adição, no
pH a valores inferiores a 5,5, característico de carnes entanto, deve ser de no máximo 70% em mistura com
PSE. Após esse período, ocorre uma gradual elevação carnes normais, para não depreciar a qualidade do
do pH da carne pela liberação de amônia resultante produto, especialmente quanto à cor (menos atrativo,
da degradação de proteínas pelas enzimas pois o produto se apresenta com coloração menos
lisossômicas, que atuam a valores baixos de pH. intensa).
Valores de pH muscular menores que 5,8 após 45 Por apresentarem pouca capacidade ligante,
minutos pós-abate é uma das principais características devido à menor solubilização e extração de proteínas
utilizadas na identificação de carnes PSE. Neste miofibrilares, a carne PSE prejudica a elaboração de
período a temperatura corporal também se encontra produtos que necessitam da ligação entre pedaços de
elevada, devido ao próprio metabolismo energético tecidos musculares para fatiamento homogêneo, como
muscular acelerado e também à processos específicos é o caso do presunto cozido. Entretanto, pode ser

Figura 4.3. Suínos submetidos a estresse crônico. Note-se mnchas na pele avermelhada e a extrema musculosidade.

Tabela 4.1. Mudança relativa no peso de pernil PSE, normal e DFD durante o processamento*
Tipo de Músculo
Item
PSE Normal DFD
Ganho após a injeção, % 8.63a 9.16a 8.60a
Perda durante a cura, % 3.30a 2.36b 1.33c
Perda durante estocagem,% 14.47a 12.91b 10.26c
*Médias, na linha, seguidas por letras iguais não diferem significativamente (P<0,001).
Fonte: Kauffman et al. (1978).
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usada na fabricação do presunto cru, uma vez que se reações exotérmicas para manutenção da integridade
trata de um produto semi-seco, em que o pernil é muscular, o que implica numa elevação localizada
curado inteiro. Ainda assim, o produto pode apresentar da temperatura muscular. Esta elevação de
áreas deficiente em aroma e, no caso de pernis muito temperatura é maior em músculos internos, e naqueles
grande, a diferença de cor dos músculos pode ser recobertos com tecido adiposo, que apresentam maior
acentuada. isolamento térmico, dificultando a dissipação de calor
A Tabela 4.1 ilustra as conseqüências da carne para o ambiente.
PSE para a indústria de carnes e produtos processados. Os fatores externos associados ao processo de
Por outro lado, por apresentar baixos valores de abate (temperatura ambiente da sala de abate, duração
pH, a carne PSE possui uma boa conservação do ponto do processo de abate e obtenção da carcaça,.etc)
de vista microbiano. Entretanto, há que se considerar também podem influenciar na dissipação do calor.
o efeito negativo em função desta acidez elevada sobre Alguns processos pós-abate aos quais as carcaças
a propensão a processos oxidativos. Desta forma, estão sujeitas, como a escaldagem e o
embora a carne se apresente estável do ponto de vista chamuscamento, contribuem para um aumento da
microbiológico, sua vida-útil é restrita devido ao temperatura muscular em torno de 2 a 3°C;
favorecimento de processos oxidativos, especialmente Vale ressaltar que animais PSE apresentam um
em carnes frescas (não-processadas). aumento elevado de temperatura (hipertermia
maligna) na primeira hora após o abate em função do
Condições intermediárias maior metabolismo gerado pelo acúmulo
sarcoplasmático de cálcio.
A carne RSE, conforme já mencionado, se
apresenta vermelha, mas com aspecto flácido e Rigor Mor tis
Mortis
exsudativo. Este tipo de carne, também oriunda de
um estresse crônico pré-abate, não é distinguível da O rigor mortis consiste em uma contração
carne normal pela medida do pH, seja 45 minutos muscular intensa e irreversível que ocorre com a
após o abate ou, mesmo, após 24 horas. exaustão das reservas de energia do músculo, sem
As características de qualidade da “carne ácida” que ocorra a resíntese de ATP, conferindo ao tecido
são semelhantes às das carnes PSE, sendo, porém, muscular a perda de suas propriedades elásticas. De
detectadas somente no final do resfriamento das fato, podemos considerar a contração e o rigor mortis
carcaças, quando apresentam valores de pH final (24 como dois processos distintos.
horas) muito abaixo do normal, igual a 5,4 ou menos. O endurecimento muscular observado no rigor
Esta anomalia esta associada ao Gene RN - ou mortis é devido à formação de ligações permanentes
Rendimento Napole, que induz uma acelerada entre os filamentos de miosina e actina. É a mesma
acidificação da carne após o abate. O efeito do Gene interação química que forma o complexo de
RN- se manifesta pelo aumento da concentração de actomiosina durante a contração muscular no animal
glicogênio muscular, em torno de 70% acima do valor vivo. A diferença entre a contração no animal vivo e
encontrado em suínos normais no estado de rigor é que nesse último o relaxamento
O nome Gene RN - foi atribuído após a é impossível, uma vez que não há energia suficiente
identificação de que animais carreadores deste gene para quebrar as ligações do complexo de actomiosina.
apresentavam baixos valores de rendimento quando Além disto, no rigor mortis, a interação entre os
submetidos ao teste Rendimento Napole (RN), que monômeros de actina e as cabeças de miosina é de
prediz o rendimento durante a cocção (heat loss). Por praticamente 100%; na contração muscular normal é
enquanto, o Gene RN- foi identificado apenas em de cerca de 20%.
linhagens de Hampshire. Animais homozigotos Na ausência da Bomba de Cálcio, devido ao
recessivos são classificados como normais, esgotamento das reservas de energia, o teor de íons
produzindo carne com características de qualidade cálcio no sarcoplasma tende a se igualar com o teor
normais. de cálcio do retículo sarcoplasmático (equilíbrio
osmótico), impossibilitando o relaxamento muscular.
Ele
Elevvação da Além disso, não é mais gerado o ATP-Mg, necessário
Tem per
emper atur
peratur a Muscular
atura para desativar o complexo actomiosina, o que
permitiria o deslizamento dos monômeros de actina
Uma vez sem o sistema respiratório e a circulação e a volta do sarcômero ao tamanho original.
sangüínea, o calor corporal não é mais removido dos A instalação do rigor mortis é gradual, e apresenta
músculos para ser dissipado na superfície. Entretanto, três fases, que pode ser acompanhada pela perda de
o mecanismo homeostático gera calor ao realiza extensibilidade do músculo (Figura 4.4) ou pelo
desenvolvimento de tensão isométrica (Figura 4.5):
Conversão do Músculo em Carne 51
Figura 4.4. Diagrama de mudanças na Fase do atraso Fase do estabelecimento
extensão usada no companhamento do
desenvolvimento do rigor mortis pela
perda de extensibilidade. Tiras musculares
de tamanho definido são submetidas a um
processo cíclico de estiramento. A seta 1 1 1
indica o início do rigor mortis. Fonte: 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
0 1 2
Betchel (1986). Tempo (horas) post mortem

produção de energia está ainda atuando nas fibras


Fase do Fase do
Fase da conclusão musculares.
atraso estabelecimento
# Fase de conclusão: O nível de ATP continua
decrescendo até atingir valores menores que 0,1
µmol/g, quando o rigor se estabelece. O
estabelecimento do rigor mortis ocorre quando
Tensão

cessa a produção de energia, devido ao esgotamento


resolução
das reservas de glicose e, ou, pela desnaturação de
estabelecimento enzimas da via glicolítica em decorrência à queda
de pH e à elevação de temperatura post mortem.
Nesta fase, a perda de extensibilidade é total e o
início
desenvolvimento de tensão sobre a célula de força
é máximo. No entanto, a carne não permanece rígida
indefinidamente, devido sobretudo à degradação da
Tempo post mortem estrutura muscular pela atividade enzimática natural
Figura 4.5. Desenvolvimento de tensão isométrica durante da carne, o que ocasiona na queda da tensão
a instalação do rigor mortis. A tensão isométrica é medida (resolução) após o estabelecimento do rigor.
mantendo-se tiras musculares de tamanhos definidos presas
de forma a manter este tamanho constante. A força do O início do rigor mortis é dependente de vários
músculos se contraindo é medida por uma célula de carga.
fatores, como: espécie animal, tipo de músculo,
Fonte: Aberle et al. (2001).
condições pré-abate e de processamento, etc. A Tabela
4.2 apresenta os tempos médios para o início do rigor
mortis nas diferentes espécies de animais de abate.
# Fase de atraso: Ocorre logo após o abate do animal, A instalação do rigor mortis está intimamente
sendo caracterizada pela extensibilidade e relacionada com os valores de pH, uma vez que ambos
retratibilidade do músculo quando puxado e relacionam-se com o metabolismo energético. Assim,
liberado (teste de extensibilidade) ou enquanto não a velocidade de queda do pH extremamente rápida
há desenvolvimento de tensão. Neste período ainda (PSE) ou extremamente lenta (DFD) conduz ao
há energia (ATP) sendo produzida pelos desenvolvimento rápido do rigor mortis. Em animais
mecanismos imediato, aeróbio e anaeróbio, o que DFD há pouca disponibilidade de substrato
permite a extensibilidade do músculo. A carne nesta (glicogênio), cessando rapidamente a produção de
fase se encontra no estado pré-rigor. energia, e o rigor mortis se instala mais cedo. Em
# Fase de estabelecimento: O início do rigor mortis animais PSE há pouco oxigênio estocado, sendo
(rigor onset) caracteriza-se pela perda gradual de rapidamente acionado o mecanismo anaeróbio, o que
extensibilidade do músculo. Em músculos bovinos provoca uma elevada queda de pH pelo acúmulo de
mantidos a 20ºC, o início do rigor mortis ocorre
quando concentrações de ATP alcançam valores
próximos de 1,0 mmol/g. Nesta concentração, o pH Tabela 4.2. Tempo de atraso para o início do rigor mortis
do músculo geralmente se encontra próximo ao em animais de corte
valor de 5,9, desde que a concentração de glicogênio Animal Tempo para o início do rigor mortis
do músculo na hora da morte esteja em níveis Bovino 6 a 12 horas
normais. No teste de extensibilidade, o músculo se Ovino 6 a 12 horas
distende pouco ao ser esticado e se retrai menos ao
Suíno 15 minutos a 3 horas
ser liberado. No teste de tensão, o músculo começa
Aves 5 minutos a 1 hora
a exercer força sobre a célula de carga.
Provavelmente somente o mecanismo anaeróbio de Peixes 30 minutos a 1 hora
52 E.M. Ramos & L.A.M. Gomide
ácido láctico. O pH baixo, associado à elevação de Perda da Integridade Estrutural
temperatura, desnatura enzimas da via glicolítica, (Resolução do Rigor Mortis)
cessando a produção de energia com instalação do
rigor mortis também mais cedo. Em qual das duas Com a morte do animal e estabelecimento do rigor
curvas o rigor mortis se instalará primeiro dependerá mortis, uma série de reações é desencadeada no
das reservas de glicogênio e do grau de estresse a que músculo. Estas reações alteram as propriedades da
o animal estiver submetido pré-bate. carne, sendo a degradação enzimática da estrutura
Músculos que apresentam maior proporção de muscular a mais notável. Esta degradação,
fibras brancas também apresentam a instalação do denominada resolução do rigor mortis, confere à carne
rigor mais cedo (conforme se pode observar na Tabela refrigerada armazenada por um período razoável uma
4.2). Animais que apresentam maior proporção de maciez característica, num processo que conhecemos
fibras vermelhas podem produzir energia por mais como maturação.
tempo pela via aeróbia que aqueles que apresentam O processo é iniciado pela atividade das enzimas
mais fibras brancas. Uma vez que as fibras vermelhas pertencentes ao sistema denominado calpaínas,
possuem maiores reservas de oxigênio (maior também conhecidas como CAFs (enzimas ativadas
concentração de mioglobina) e podem utilizar lipídeos pelo cálcio). Este complexo enzimático é constituído
como substrato energético, são capazes de sustentar de duas enzimas dependente de cálcio e um inibidor
por mais tempo a via aeróbia, retardando o específico, a calpastatina. As duas enzimas deste
acionamento da via anaeróbia e queda de pH. sistema diferem na quantidade de cálcio requerida
Consequentemente, o rigor mortis se instala mais para ativação: a m-calpaína requer quantidades
lentamente nos músculos/animais em que a relação milimolar de cálcio (proximo de 1 mM); enquanto
fibra vermelha/fibra branca é alta. que a µ-calpaína requer quantidades micromolar (5
a 50 µM). A elevada concentração de cálcio, liberado
Per da dos
erda do retículo sarcoplasmático e das mitocôndrias
Mecanismos Pr
Prootetor es
ores
durante a estocagem post-mortem, é que ativa as
calpaínas.
Perda da Homeostase
Outro grupo de enzimas proteolíticas responsáveis
pela degradação da estrutura muscular são as
Após a sangria do animal, a circulação sangüínea
proteases ácidas (catepsinas) liberadas dos lisossomos
é perdida em, mais ou menos, 3 minutos, não sendo
com a queda do pH post-mortem.
mais possível o transporte de hormônios reguladores
A catepsinas e calpaínas degradam as proteínas
da homeostase. Além disto, a falta de oxigenação do
miofibrilares atuando principalmente ao nível da linha
cérebro também leva à perda da capacidade do SNC
Z, o que resulta em um “afrouxamento” da estrutura
em induzir uma resposta pelas glândulas endócrinas
muscular com o fim de sua rigidez. As catepsinas B e
do animal. Assim, cessa a capacidade de serem
D degradam a actina e miosina nativas, e as catepsinas
efetuados ajustes metabólicos para compensar
B e L degradam o colágeno. Já as calpaínas não atuam
situações adversas no músculo. O mecanismo
diretamente sobre a miosina e actina, porém degradam
homeostático é perdido em cerda de 4 a 6 minutos
a linha Z e as proteínas desmina, titina, nebulina,
após a sangria, quando o sistema nervoso central
tropomiosina, troponina e proteína C (Figura 4.6).
(SNC) não mais funciona.
Vale ressaltar que este “afrouxamento” da
estrutura muscular não implica em relaxamento
Perda da Proteção
Contra a Invasão Microbiana muscular, o qual só ocorre em músculos “vivos”, por
depender de energia (ATP). Trata-se unicamente de
No animal vivo o músculo é estéril, o que se deve uma ação enzimática.
à presença de barreiras físicas (como a pele e
membranas celulares) e do sistema linfático e glóbulos Fatores que Afetam as
Propriedades e Qualidades
brancos, que combatem os microrganismos
Físicas da Carne
infectantes. Com a morte do animal, as membranas
perdem sua seletividade e durante a conversão do
Embora a maioria dos fatores (raça,
músculo em carne os tecidos tornam-se susceptíveis
hereditariedade/genótipo, dieta, uso de hormônios e
à invasão bacteriana. Uma vez que a circulação e o
tranqüilizantes, clima, manejo na criação e transporte,
sistema linfático não mais operam, o organismo (do
etc) que afetam as propriedades e características de
animal) não pode mais evitar a propagação microbiana
qualidade da carne estejam associados a condições
porventura presente.
estressantes (não usuais) que induzem respostas
Conversão do Músculo em Carne 53
Fat or
ator es Pr
ores é-
Pré- Abat
é-Abatee

O Estresse

Estresse pode ser definido como qualquer


condição não usual (temperatura e umidade relativa
diferentes, condições anormais de luz, som e espaço,
etc.) que leva a uma maior demanda de energia e,
portanto, induz a atuação do mecanismo homeostático
de regulação da vida. Quando submetidos a estas
condições, os animais tendem a se estressarem, o que
se evidencia através da excitação, fadiga, elevação
ou queda da temperatura corporal, queda de pH
muscular e sangüíneo, dentre outros.
O estresse provoca um aumento na necessidade
de energia do animal, promovendo um aumento na
circulação sanguínea para fornecer mais oxigênio e
nutrientes aos diversos tecidos do corpo, fazendo
frente a este aumento na demanda energética, e para
remover calor e acidez extra dos músculos e tecidos
internos. Apesar do aumento no fornecimento de
Figura 4.6. Eletromicrografia de seções de músculo Bíceps
oxigênio, o músculo trabalha no mecanismo
femoris após 3 dias de estocagem post-mortem, ilustrando
a ação do sistema enzimático de calpaínas. Pode se
anaeróbio (ação da epinefrina) produzindo ácido
observar a distancia entre miofibrilas adjacentes e a perda láctico, já que a demanda energética é muito grande.
do material que conecta os discos Z (seta). Este material Este ácido láctico produzido é removido pela
provavelmente é constituído principalmente pela proteína circulação sanguínea, e é levado ao fígado, onde é
desmina. Fonte: Taylor et al. (1995). convertido em glicose e glicogênio (gluconeogênese),
ou ao coração, onde é utilizado como fonte de energia.
Quando a produção de ácido láctico é muito grande,
fisiológicas através do mecanismo homeostático, a sua remoção fica ineficiente (incompleta) e pode
alguns destes fatores, bem como alguns outros induzir acidose muscular e, ou sanguínea, o que,
envolvidos na criação e processo de abate (suspensão associado à elevação da temperatura corporal, pode
de carcaças, uso de estimulação elétrica, taxa de promover grande desnaturação protéica (por exemplo,
resfriamento, etc) dos animais também são da mioglobina, diminuindo a capacidade de transporte
determinantes. Assim, as alterações sofridas pelo de oxigênio para os diversos órgãos e tecidos) e levar
músculo imediatamente post-mortem, bem como as à morte do animal (Síndrome do Estresse Suíno).
propriedades finais da carne, são resultantes do De uma maneira geral se um animal consegue se
manejo dos animais e de suas respectivas carcaças recuperar do estresse antes do abate, ele tende a
antes do abate (principalmente nas 48 horas que o apresentar uma curva normal de queda de pH
antecedem) e após o abate. Esses fatores vão muscular post-mortem. Isto é possível desde que
influenciar a qualidade da carne obtida, tanto do ponto condições adequadas lhes sejam oferecidas (repouso,
de vista do consumo direto (maciez, coloração, recuperação energética, etc.) para desfazer as
textura, etc.) quanto do ponto de vista tecnológico conseqüências estressantes.
(propriedades funcionais, etc.). Os principais hormônios envolvidos na resposta
Os fatores podem ser divididos em: fisiológica ao estresse são:

# Fatores pré-abate, relacionados às etapas de abate # Epinefrina e Norepinefrina: Também conhecidos


ante-mortem, podendo ser oriundos, ou não, do como adrenalina e noradrenalina, são hormônios
estresse, manejo (dieta, sexo, utilização de provenientes da medula adrenal e que conferem
estimuladores de crescimento, como hormônios, resistência ao estresse atuando nos seguintes
etc.) e carga genética. processos: (a) regulam a circulação sanguínea,
# Fatores pós-abate, relacionados a práticas post- atuando no coração e vasos sanguíneos; (b) quebram
mortem de manuseio das carcaças. o glicogênio e lipídios para acelerar a produção de
energia.
54 E.M. Ramos & L.A.M. Gomide
# Corticóides: Provenientes do cortéx adrenal, e sangue, associado a uma temperatura elevada, que
também aumentam a resistência ao estresse, acaba por desnaturar sistemas protéicos e enzimáticos
induzindo a síntese de carboidratos essenciais à vida, o que pode causar a morte.
(gluconeogênese) e mantendo o balanço de íons na Animais susceptíveis ao estresse são
célula. particularmente sensíveis a temperaturas altas. Seus
# Hormônios da Tireóide: Provenientes da glândula sistemas respiratório e circulatório são deficientes,
tireóide, atuam aumentando a taxa metabólica, não havendo uma adequada dissipação de calor e a
estimulando o mecanismo oxidativo, para produzir conseqüente queda do pH muscular é maior. Isto
energia mais rapidamente. explica o aumento na incidência da condição PSE em
suínos criados no verão, sendo recomendando que
Elementos do Meio Ambiente estes animais sejam mantidos à sombra e com
aspersão de água fria como forma de amenizar os
A resposta que o animal apresentará frente ao efeitos do calor e a incidência de carnes PSE.
estresse induzido por cada fator ambiental dependerá
da espécie, peso, idade, sexo e resistência do animal, UMIDADE RELATIVA
bem como o seu estado emocional.
A umidade relativa (UR) do ar, especialmente a
TEMPERATURA elevada, aumenta o desconforto causado pela
temperatura, ou seja, aumenta os efeitos do frio e do
A temperatura é um dos estressantes mais calor.
proeminentes em seus efeitos. Um ambiente quente e com alta umidade
relativa, implica num resfriamento por evaporação
Quando a temperatura ambiente é menor que a superficial do suor menos eficiente (ar já saturado)
corporal, o sistema homeostático leva a um aumento com conseqüente perda da eficiência dos mecanismos
da liberação de hormônios (epinefrina, norepenefrina de compensação térmica.
e hormônios da tireóide), que provocam um aumento Um ambiente frio e com alta umidade relativa,
no metabolismo energético (com catabolismo do implica em maior taxa de troca de calor com o
glicogênio) para elevar a temperatura muscular, ambiente o que provoca maior perda de calor corporal
repondo o calor perdido para o ambiente. Isso pode levando a uma maior necessidade energética
ser evidenciado por arrepios (tremores) do animal resultando em maior quebra de ATP e
oriunda de uma contração muscular localizada para conseqüentemente maior consumo de glicogênio.
gerar calor. Ao mesmo tempo, a taxa respiratória e a
circulação sangüínea periférica são diminuídas para LUZ, SOM E ESPAÇO
evitar perda de calor corporal. Este conjunto de
condições leva a uma depleção na reserva muscular Em geral, animais preferem ambientes espaçosos,
de glicogênio. Como, normalmente, há aumento na bem iluminados e sem ruídos não familiares. Na falta
chegada de nutrientes e oxigênio para os músculos e desses pré-requisitos eles se tornam amedrontados e,
uma remoção eficiente de ácido láctico, o frio ou, hostis, gerando um desbalanço hormonal que,
normalmente leva ao surgimento da condição DFD, dependendo da susceptibilidade ou resistência ao
ou pelo menos à diminuição na incidência da condição estresse do animal, gera carnes PSE ou DFD,
PSE. respectivamente. Pequenos espaços (alta densidade
A alta temperatura ambiente já é mais prejudicial na baia ou caminhão de transporte), por exemplo,
ao animal que o frio. Normalmente o animal induzem ao aumento da temperatura localizada pela
compensa este efeito com menor atividade e aumento maior troca de calor entre os animais. Também gera
na circulação sangüínea periférica e na taxa um aumento de agressividade e brigas entre animais,
respiratória para ativar os mecanismos de troca de o que pode levar ao aumento do nível de estresse e à
calor (trocas evaporativas com o ar). Porém, se o calor presença de contusões, depreciando a musculatura
for excessivo estes mecanismos não são suficientes, afetada.
e acaba ocorrendo uma elevação da temperatura
corporal. Esta, por sua vez, acelera as reações Elementos do Manuseio Pré-Abate
metabólicas e fisiológicas do animal, levando a um
aumento na taxa de hidrólise do ATP (consumido mais DIETA
rapidamente), o que leva a um aumento no mecanismo
glicolítico (ativado para repor o ATP). Há, portanto, A dieta é um dos principais fatores a determinar
um acúmulo de ácido láctico generalizado no músculo a expressão do potencial de crescimento e
Conversão do Músculo em Carne 55
desenvolvimento dos tecidos de carcaça, o que pode maciez observada), é altamente influente na maciez
afetar positiva ou negativamente a produção animal observada sensorialmente, por estimular a salivação,
e de carne, além de ter influências diretas e indiretas determinando a suculência e sabor da carne e
sobre a qualidade da carne. conferindo uma sensação aparente de maciez.
De forma geral, a dieta não tem um efeito direto Há de se considerar também o efeito da dieta pré-
de importância mais relevante, desde que não haja abate e seus efeitos nas curvas de queda de pH, e as
deficiências nutricionais sérias. Contudo, as taxas de conseqüências disto. Caso o animal seja abatido sem
crescimento de diferentes tecidos podem ser alteradas que haja um mínimo de reserva de carboidrato
e controladas monitorando-se a dieta do animal. Um muscular, isto levará ao à incidência da anomalia
exemplo disto é fato da expressão do potencial DFD. Por outro lado, a reposição pré-abate dos níveis
genético do desenvolvimento de massa muscular de carboidratos no músculo, implica em maiores
depender de um nível adequado de lisina ou do uso cuidados na minimização de estresse durante o abate,
de uma outra proteína de elevado valor biológico. como forma de se evitar a curva PSE de pH.
Outros efeitos da dieta estão relacionados ao tipo
de gordura depositada e seus efeitos sobre o valor CONFINAMENTO versus CRIAÇÃO EXTENSIVA
nutricional, o desenvolvimento de sabor e odor, a
conservabilidade da carne, etc. Um exemplo que pode Além do efeito sobre a dieta (confinados podem
ser observado é a preocupação na alimentação dos ser alimentados com a energia da dieta regulada),
animais monogástricos com o tipo de gordura da dieta. exerce também efeito sobre a estruturação muscular
Estes animais (aves e suínos), ao contrário dos através do seu tecido conectivo, devido à diferenças
ruminantes (bovinos e ovinos), não possuem em seu relativas à atividade física durante o crescimento
estômago uma flora que modifica a gordura que animal.
consomem e, portanto, a gordura da dieta influencia Animais confinados tendem a serem mais
no tipo de gordura depositada, com conseqüências precoces, atingindo o ponto de terminação mais cedo,
na conservabilidade da carne. Geralmente, quanto ou, em se considerando um mesmo tempo de criação,
maior a concentração de gorduras polinsaturadas na apresentarem carcaças mais gordas. No primeiro caso
dieta, implica em que a gordura depositada (ex.: (mesmo ponto de terminação), os animais confinados
toucinho) é mais insaturada, menos firme e mais são cronologicamente mais novos, o que implica em
propensa a se rancificar, com conseqüências óbvias apresentarem carnes mais macias, já que o seu tecido
na conservabilidade da carne. Ruminantes, em geral, conectivo tende a ser menos estruturado (menores
não sofrem este efeito. Contudo, novas pesquisas têm quantidades de ligações inter e intra-moleculares do
demonstrado que é possível uma certa alteração na colágeno, apresentando estas mais fracas). No
composição da gordura depositada na carcaça bovina segundo caso (mesmo tempo de recria), os animais
através do controle de variáveis da dieta. confinados tendem a apresentar carcaças mais gordas,
O tipo de alimento (mais ou menos energético) com menor propensão aos processos de encolhimento
na alimentação, principalmente nos últimos períodos pelo frio e rigor de descongelamento (efeito isolante
(30 a 90 dias) antes do abate, influencia na deposição da gordura, especialmente a de cobertura), e carnes
e composição de gordura subcutânea e intramuscular. mais suculentas, macias e saborosas, como resultado
Assim, a maturidade dos animais (início do período do maior grau de marmorização.
de deposição de gordura) é acelerada quando são Animais criados livres, principalmente em terreno
criados à base de uma dieta composta principalmente mais acidentado, tendem a se exercitar mais e com
por grãos e, portanto, rica em energia. A gordura isto terem o seu tecido conectivo mais estruturado e
deposita-se mais cedo, resultando em maior teor para desenvolvido, o que resulta numa menor maciez, que
um mesmo período de manutenção de dieta. animais criados confinados. Do mesmo modo eles
Animais que apresentam maior espessura de tendem a apresentar um sabor mais pronunciado
gordura subcutânea (de cobertura) tendem a devido a uma maior concentração de mioglobina e
apresentar carcaças menos susceptíveis, devido a um de ATP e seus derivados, que são sintetizados em
maior isolamento térmico das carcaças, aos maior quantidade afim de suprir as suas necessidades
fenômenos de Encolhimento pelo Frio e Rigor de energéticas. A carne de animais confinados tem menor
Descongelamento (discutidos mais à frente) e seus concentração de mioglobina, se apresentando mais
efeitos sobre a maciez e suculência da carne. Já o clara do que a de animais criado em sistema aberto.
teor de gordura intramuscular (ou de marmoreio,
última gordura a se depositar na carcaça animal), CASTRAÇÃO
embora não se correlacione com a maciez da carne
medida objetivamente (explicaria apenas 4% da Animais castrados são menos hostis e briguentos,
56 E.M. Ramos & L.A.M. Gomide
ou seja, são menos estressáveis que animais inteiros. propensos a gerar carne DFD.
Além disso, os machos inteiros tendem a exprimir,
na sua carne odor mais forte, como resultado da maior TRANSPORTE E ESPERA NOS CURRAIS E POCILGAS
concentração de hormônios sexuais nos seus tecidos
musculares. Isto é especialmente notado em suínos, O transporte pode gerar condições
onde o odor sexual é fortemente expresso em animais extremamente estressantes se cuidados não forem
inteiros de peso vivo superior a 70 kg. Este odor, observados. Morte de animais no processo,
também conhecido como cheiro de cachaço, se deve especialmente suínos, costuma ocorrer. Para se evitar
à concentração, na fração insaponificável do tecido ou minimizar o efeito do transporte sobre os animais
adiposo, de compostos como a androstenona e o itens como densidade, ventilação, condições
escatol (oriundo do metaolismo de triptofano), que climática, tempo de transporte, entre outras, devem
conferem, mesmo em concentrações muito pequenas, ser observados com critério.
um odor e sabor que lembra a dejetos (fezes e urina). O período de espera nos currais/pocilgas também
Muito embora nem todo consumidor seja capaz de deve ser criteriosamente observado, para que o animal
perceber esta alteração no sabor, ainda assim este se recomponha do estresse sofrido nas etapas de
fenômeno é percebido por cerca de 5% da população, embarque/desembarque e transporte. É especialmente
especialmente mulheres. eficaz para se minimizar a condição DFD já que é
Dentre as alternativas para a produção de suínos possível se recuperar, via alimentação, os níveis de
livres deste odor estão: glicogênio muscular, com uma alimentação rica em
carboidratos. Entretanto, deve-se observar o período
# A escolha de raças resistentes, com menor expressão de jejum e dieta hídrica que antecedem ao abate,
hormonal; estipulado pela legislação vigente no país. Este
# A castração, que deve ser conduzida pelo menos 68 período visa minimizar contaminação das carcaças
dias antes do abate; na etapa de evisceração (devido à diminuição do
# O aumento do nível de hormônios de crescimento, volume do trato gastrointestinal).
usado com o intuito de reduzir a quantidade de
gordura depositada, diminuindo a impregnação INSENSIBILIZAÇÃO E SANGRIA
destes compostos na carne; e
# Abate dos animais com peso vivo inferior a 70 kg, A importância dos processos de insensibilização
o que não é economicamente vantajosa para a e sangria no bem-estar animal e na qualidade final da
indústria, principalmente agora que tem passado a carne, bem como sua forma de aplicação e sistemas
abater animais mais pesados (entre 100 e 120 kg). utilizados, foram abordados na Prática 01 (Abate
Humanitário & Bem-Estar Animal).
A alteração dos níveis de hormônios, através da
castração, afeta a composição final da carcaça. Em Elementos Genéticos
animais inteiros, os níveis de hormônios desviam as
reações da síntese de gordura, favorecendo a síntese A hereditariedade tem efeito sobre determinadas
de proteína. Quando o animal é castrado, a alteração características finais da carne, ainda que parcialmente.
dos níveis de hormônios possibilita maior síntese de Isto permite melhoria de qualidade da carne através
gordura em detrimento à síntese protéica, ou seja, a de melhoramentos genéticos.
relação músculo/gordura é maior em machos inteiros Embora a heredidariedade proporcione o
do que em castrados. potencial necessário para o crescimento e
Para animais de mesma idade: o teor de gordura desenvolvimento do animal, o meio ambiente, a dieta
em fêmeas é maior que em machos castrados, que é e o sistema de criação, é que poderão potencializar
maior que em machos inteiros. Neste sentido, animais ou restringir este potencial. A porção hereditária das
castrados são menos propensos aos fenômenos de variações fenótipas (aparência externa) expressa como
Encolhimento pelo Frio e Rigor de Descongelamento, porcentagem é denominada Estimativa Hereditária.
e seus efeitos, que machos inteiros. Por exemplo, da Tabela 4.3 podemos verificar que
Animais inteiros apresentam maior concentração em bovinos, a maciez é bastante influenciada pela
de colágeno intramuscular, o qual pode ser mais carga genética (60%) da raça, o que possibilita o
maduro (maior número de ligações cruzadas) numa melhoramento deste atributo através de cruzamentos
mesma idade cronológica que castrados, o que gera e seleção de raças
uma carne mais dura. Além disso possuem uma cor Este efeito genético permite que se trabalhe o
mais escura quer pela maior concentração de plantel de modos a transferir características
mioglobina (maior atividade) quer por serem mais desejáveis, criando-se um híbrido de características
Conversão do Músculo em Carne 57
Tabela 4.3. Estimativa da hereditariedade sobre algumas propriedades da carne.
Animal Cor e Firmeza Gordura Intramuscular Maciez
Bovinos 30% - 60%
Suínos 30% 25% 30%

intermediárias. Alguns exemplos do efeito da carga produtores brasileiros já estão implantando no seu
genética sobre as características de qualidade da carne plantel este tipo de animal;
podem ser citados: # No caso de suínos, animais foram geneticamente
selecionados para depositar menos gordura de
# Bovino do tipo Angus são reconhecidos pela sua cobertura e mais músculo (suínos tipo carne).
alta propensão a depositar gordura de marmoreio, Entretanto, isto também causou uma seleção de
o que influencia na suculência e sabor da carne, linhagens que apresentam maior suscetibilidade ao
com reflexos indiretos na percepção de maciez; estresse e, portanto, maior predisposição à condição
# Em bovinos, vários autores demonstraram que PSE.
animais do tipo Bos taurus (gado europeu)
apresentam maior atividade de proteases RESISTÊNCIA OU SUSCEPTIBILIDADE AO ESTRESSE
dependentes de cálcio (calpaínas) e menor atividade
de seu inibidor (calpastatina), que animais do tipo De uma maneira geral animais mais susceptíveis
Bos indicus (gado indiano, criado no Brasil). ao estresse tendem a apresentar maior incidência de
Entretanto, estes últimos são animais mais rústicos, carne PSE e os mais resistentes a apresentarem carne
que suportam mais as nossas condições climáticas DFD. A resistência e, ou, susceptibilidade ao estresse
e são mais resistentes a pragas, como, por exemplo, varia dentro de cada espécie animal segundo o tipo.
carrapatos; Por exemplo, suíno tipo banha é mais resistente ao
# Bovinos de musculatura dupla apresentam carcaças estresse que suíno tipo carne.
mais musculosas e magras (Figura 4.7), e com A espécie animal, relacionada à maior proporção
tamanho (diâmetro) de fibra menor. Este menor de fibras musculares vermelhas ou brancas, também
tamanho de fibra tem sido considerado como uma possui efeito sobre a suceptibilidade aos fatores
das razões para a maior maciez de sua carne, apesar estressantes. Assim, suínos, por apresentarem alta
da aparente maior propensão aos fenômenos de relação fibras brancas/fibras vermelhas, possuem
encolhimento pelo frio e rigor de descongelamento, menor capacidade de estocar oxigênio no músculo
que gerariam carnes mais duras. A grande (menor concentração de mioglobina), recorrendo com
desvantagem deste tipo de animal é o seu baixo mais freqüência ao mecanismo anaeróbio para
índice de natalidade, e alta mortandade das matrizes obtenção de energia. A queda de pH resultante do
durante o parto, o que tem inviabilizado a sua acúmulo de ácido láctico, associada à temperatura
utilização em larga escala. Ainda, assim, alguns corpórea, tem ação desnaturante sobre as proteínas,
sendo os suínos mais susceptíveis à condição PSE.
Já os bovinos apresentam alta relação fibras
vermelhas/fibras brancas, possuindo maior
capacidade de estocar oxigênio e utilizando
preferencialmente o mecanismo aeróbio para
obtenção de energia, sem queda de pH muscular,
sendo menos susceptíveis à condição PSE. São,
entretanto, mais propensos à condição DFD devido a
pouca quantidade de reservas de glicogênio em sua
musculatura.

Fat or
ator es P
ores ós-
Pós- A bat
ós-A batee

Temperatura Post-Mortem

A temperatura sob a qual a carne é mantida tem


Figura 4.7. Bovino com musculatura dupla.
influência na qualidade da carne obtida, uma vez que
58 E.M. Ramos & L.A.M. Gomide
os processos deteriorativos (microbiológicos e encurtamentos de 20 a 40%, e a um declínio, tão
químicos) são afetados pela temperatura. De uma acentuado quanto, para valores acima de 60%.
maneira geral, quanto menor a temperatura de Esta redução dramática da dureza em condições
estocagem da carne menor é a deterioração de contração extrema, embora seja inicialmente
microbiana e química. surpreendente, parece ter uma explicação
O valor Q10 para a carne (equação seguinte) é perfeitamente compreensível. Micrografias têm
maior que 3, ou seja, diferenças de 10°C na demonstrado que estas contrações severas não são
temperatura podem acelerar (aumento da temperatura) uniformes, apresentando zonas de contração intensa
ou retardar (redução da temperatura) os processos alternadas com zonas onde as fibras foram esticadas
deteriorativos num fator de 3 (vezes) ou mais. e torcidas. De fato, com o aumento do encurtamento,
o músculo vai, por si mesmo, se tornando mais macio,
velocidade reação à temperatura (T + 10°C ) por “despedaçar” sua própria estrutura.
Q10 = ≥3
velocidade reação à temperatura (T )
ENCOLHIMENTO PELO FRIO
Uma vez que a maioria destas reações é
endotérmica (favorecidas a temperaturas mais Locker e Hagyard, em 1963, foram os primeiros
elevadas) um abaixamento rápido da temperatura a mostrar que músculos removidos da carcaça bovina
muscular post-mortem é aconselhável para se manter imediatamente post-mortem encolheriam até um
qualidade por mais tempo (aumentar o período de máximo entre 50 e 60% quando expostos à
conservação da carne). temperatura de 2°C (Figura 4.9).
Tanto por razões de higiene, quanto por razões Este encolhimento, denominado Encolhimento
econômicas, as carcaças e, ou, cortes cárneos frescos, pelo Frio (EPF), é um tipo severo de rigor mortis
devem ser refrigerados o mais rapidamente e à menor que ocorre quando o músculo pré-rigor é resfriado a
temperatura possível. Uma queda rápida na temperaturas inferiores a 15-16ºC. O encurtamento
temperatura é a melhor maneira de se proteger a carne muscular é resultante do aumento dos níveis
do crescimento de microrganismos contaminantes e intracelulares de cálcio (Ca +2), devido a uma
reduzir as reações químicas e enzimáticas, que incapacidade do retículo sarcoplasmático e das
limitam a vida-útil do produto. Entre os maiores mitocôndrias em seqüestrar e ligar estes íons,
fatores que afetam a taxa de resfriamento pode-se liberados por estas organelas devido à influência de
citar: o tamanho (peso) da carcaça e a sua quantidade baixas temperaturas e baixos valores de pH no
de gordura de cobertura; a temperatura e velocidade músculo pré-rigor.
do ar na câmara; e o número e o espaço entre as O encolhimento muscular pelo fenômeno do EPF
carcaças na câmara. é diferente do encolhimento ocorrido durante o rigor
Teoricamente a temperatura deveria ser abaixada mortis, já que: ocorre mais rapidamente (poucos
rapidamente até 4°C no centro do músculo. Porém, minutos após baixas temperaturas terem sido
na prática, se isso acontecer teremos problemas com alcançadas contra horas no encolhimento pelo rigor);
a maciez da carne obtida. Se o resfriamento do
músculo for rápido demais, a ponto de abaixar a
temperatura muscular além de 15-16°C e antes que o
rigor mortis se ocorra, a carne se apresentará mais
dura após o cozimento. Esta dureza é conferida pelo
encurtamento excessivo da estrutura muscular
(encolhimento) estimulada pelo frio.
Aqui é importante abrirmos parênteses quanto ao
efeito do encolhimento do sarcômero sobre a maciez
da carne. Na verdade, o encurtamento do sarcômero
poder levar tanto ao endurecimento quanto ao
amaciamento da carne, dependendo do nível em que
ocorre. A Figura 4.8 ilustra esta dependência. A dureza
da carne, medida pela força de cisalhamento (força
necessária para se cortar a carne), permanece
constante ou aumenta ligeiramente quando o grau de
encurtamento do sarcômero se encontra entre 0 e 20%. Figura 4.8. Maciez relativa em relação ao encurtamento
Entretanto, a extensão deste encurtamento a níveis muscular (percentagem do comprimento inicial). Fonte:
maiores leva a um aumento acentuado da dureza, em Marsh e Leet (1966).
Conversão do Músculo em Carne 59
bem como os sítios de ligação. Esta perda de água,
que implica numa perda de peso (e de rentabilidade)
e de exsudado (lixiviação dos nutrientes
hidrossolúveis), contribui para o endurecimento da
carne.
A ocorrência do EPF é predominante e bem mais
caracterizada em músculos com uma significativa
proporção de fibras vermelhas, sendo sua extensão
menor na maioria dos músculos suínos e de coelhos.
A ocorrência em menor grau do encolhimento pelo
frio em músculos com predominância de fibras
brancas (suínos, de aves e coelhos), parece se dever à
menor concentração de mitocôndrias (ricas em cálcio)
e a um retículo sarcoplasmático bem mais
desenvolvido nestas fibras.
Figura 4.9. Efeito da temperatura no grau de encurtamento
Com o advento de novas tecnologias, que
em músculos bovinos removidos da carcaça. Fonte: Locker
(1985).
permitem acelerar o início do rigor mortis, é
geralmente aceito que, numa linha de abate, o
encolhimento pelo frio ocorra pronunciadamente em
carnes de bovinos quando esta é resfriada a
em pH elevado (normalmente pH maior que 6,7 contra temperaturas inferiores a 10ºC antes de 10 horas post-
pH próximo de 5,8 no encolhimento pelo rigor); e mortem. Em suínos, o fenômeno de encolhimento pelo
com níveis residuais de ATP mais elevados (5 a 6 frio é bem mais pronunciado quando a carcaça é
µmol/g contra concentrações próximas de 1 µmol/g submetida a temperaturas inferiores a 10ºC enquanto
no encolhimento pelo rigor). Além disso, músculos o pH muscular for superior a 6,2. Os processos de
sujeitos ao encolhimento pelo frio também sofrerão refrigeração das carcaças são, atualmente, projetados
uma segunda contração quando atingirem a fase de em função destes limites.
depleção rápida do ATP (fase do estabelecimento) o Obviamente, os diferentes músculos da carcaça
que se traduzirá em num maior encolhimento. Estima- irão atingir esta temperatura em tempos diferentes e,
se que encurtamento do músculo pré-rigor estimulado conseqüentemente, alguns serão mais propícios ao
pelo frio resulta numa perda de maciez duas a três encolhimento pelo frio do que outros, de acordo com
vezes maior do que no encolhimento pelo rigor. a sua localização (músculos mais externos são mais
Além do problema da perda de maciez e, portanto, propícios) e gordura envoltória. A Figura 4.10 ilustra
menor qualidade sensorial, da carne submetida ao a taxa de queda de temperatura de diferentes músculos
EPF, também ocorre uma redução da CRA, devido a da carcaça de bovinos quando a carcaça é submetida
um efeito estérico: o encurtamento do sarcômero a um resfriamento rápido. Observa-se que a maciez
reduz espaço para acomodação das moléculas de água, da alcatra, um dos principais cortes comerciais, é

Figura 4.10. Taxa de


resfriamento de músculos
bovinos quando a meia-carcaça
(aproximadamente 120 kg) é
submetida a um sistema de
resfriamento ultra-rápido (blast
chilling system). A meia-carcaça
foi mantida por 3 horas em
câmara fria a -15ºC (velocidade
do ar a 3 m/s) e depois transferida
para câmaras com temperatura de
0ºC (velocidade do ar a 0,5 m/s).
A área em destaque representa as
condições em que o fenômeno do
encolhimento pelo frio é
relevante. Fonte: Woltersdorf
(1989).
60 E.M. Ramos & L.A.M. Gomide
negativamente afetada pelo processo de resfriamento de exsudado da carne. A Figura 4.11 ilustra o
ultra-rápido devido à ocorrência do fenômeno do encolhimento muscular severo que ocorre no rigor
encolhimento pelo frio. de descongelamento.
Uma das maneiras de se prevenir o fenômeno de Alguns pesquisadores demonstraram que o efeito
encolhimento pelo frio é a maturação e de rigor de descongelamento sobre a maciez é ainda
acondicionamento das carnes em temperaturas entre mais danoso quando a carne congelada é cozida antes
15 e 20ºC até que o rigor mortis se instale. Neste de ser descongelada, ou seja, quando ela é
caso há um consumo mais rápido de ATP, o que descongelada “na panela”. Assim, aconselha-se que
também acelera a instauração do rigor mortis. Um a carne seja descongelada em temperaturas de
dos problemas desta técnica , entretanto, está no fato refrigeração (4ºC). Nesta situação, o exsudado
de que a manutenção de carnes a estas temperaturas liberado da carne pode ser reabsorvido, minimizando
as torna susceptível à proliferação de a perda excessiva e favorecendo a suculência da carne.
microorganismos (necessidade de maior higiene), Quando a carne é descongelada no microondas ou na
comprometendo a sua qualidade. Além disto isso panela, isto não ocorre.
implica em adicionar mais espaço físico nas plantas Também se verifica que a velocidade de
de abate, onerando o processo. congelamento da carne influi no rigor de
Um outro método muito usado, desenvolvido na descongelamento, uma vez que: no congelamento
Nova Zelândia, se baseia na estimulação elétrica (EE) rápido, a temperatura da carne cai rapidamente abaixo
das carcaças pós abate. Este processo acelera a taxa do ponto de congelamento inicial (entre 1,0 e 2,5ºC),
glicolítica e de consumo de ATP post mortem, o que, formando-se, à mesma velocidade e por toda a sua
além de acelerar a instauração do rigor mortis (e extensão, cristais de gelo menores com aspecto
portanto diminuir as chances de ocorrência do filamentoso. Durante o descongelamento, as perdas
encolhimento pelo frio), também apresenta outras por gotejamento são menores, já que a maioria da
vantagens tecnológicas, que serão abordadas no item água interfibrilar congela-se intracelularmente. Como
seguinte. Também o isolamento térmico das carcaças os cristais formados são pequenos, não ocorre ruptura
por uma espessa camada de gordura, via criação de dos tecidos, especialmente do retículo
animais com mais gordura de cobertura (dieta sarcoplasmático e das mitocôndrias, minimizando o
energética, castração) e a pendura da carcaça pelo movimento do fluxo salino para o sarcoplasma e
Foramem pélvico (discutido nos itens seguintes), ao causando menor encolhimento. Por outro lado, no
invés do método tradicional (tendão de Aquiles), congelamento lento a temperatura da carne
parecem minimizar o encolhimento pelo frio. permanece por muito tempo próxima ao ponto de
Em músculos menores, o efeito de encolhimento congelamento inicial, sendo formado grandes cristais
é mais pronunciado, sendo os cortes desossados mais de gelo. Estes cristais são formados inicialmente na
susceptíveis ao EPF, uma vez que não possuem mais
a resistência ao encolhimento causada pela ligação
(de ambas as extremidades) aos ossos nas carcaças e,
ou, a outros músculos. Obviamente, o processamento
de carnes pré-rigor (abordado mais a frente) também
previne o fenômeno de EPF.
Por fim, carnes DFD e PSE são menos
susceptíveis ao encolhimento pelo frio pela instalação
mais rápida do rigor mortis.

RIGOR DE DESCONGELAMENTO

O Rigor de Descongelamento (RD) é um


processo similar ao Encolhimento pelo Frio, porém
mais severo, que ocorre quando se descongela
músculos congelados pré-rigor. O fenômeno parece
ser devido a um excessivo fluxo salino durante o
Figura 4.11. Fenômeno de Rigor de Descongelamento.
descongelamento, resultando na excessiva liberação Um músculo fresco excisado (abaixo) é comparado com
de cálcio do retículo sarcoplasmático e mitocôndrias um músculo idêntico que foi congelado pré-rigor e
no meio intracelular, levando a um acúmulo deste íon descongelado (acima). O músculo afetado pelo RD
no sarcoplasma e conseqüente encurtamento apresenta apenas 42% de seu comprimento original. Fonte:
muscular, com redução da maciez e perda excessiva Woltersdorf (1989).
Conversão do Músculo em Carne 61
área extracelular e tem seu tamanho aumentado pela # Condições que favoreçam a ação das enzimas
água das fibras que atravessam a membrana por catepsinas (rápida queda de pH) e calpaínas (elevada
osmose. A formação de grandes cristais causa danos concentração de cálcio) sejam alcançadas mais cedo
às fibras, que encolhem, pela perda de água para os e em temperaturas favoráveis, sem o detrimento da
acúmulos extracelulares, resultando em maior qualidade da carne (acelera o processo de
gotejamento durante o descongelamento. maturação); e
A prevenção do rigor de descongelamento pode # Danos estruturais (Figura 4.13) causados à fibra
ser conseguida pelos mesmos processos citados no muscular devido à excessiva contração a que o
EPF. O descongelamento lento antes do processo de músculo é submetido (efeito mecânico). Estas
cocção, também contribui para a qualidade final da rupturas na estrutura fibrilar também contribuem
carne. para uma maior maciez da carne.

Estimulação Elétrica

O processo de estimulação elétrica (EE) foi Aplicação


desenvolvido na Nova Zelândia para solucionar os 7,0 da EE
problemas oriundos dos fenômenos de encolhimento
pelo frio e rigor de descongelamento. Estes
fenômenos geravam problemas de dureza na carne
6,5
ovina exportada para a Europa e os Estados Unidos. pH
Não Estimulado
O processo baseia-se na indução da aceleração
da contração muscular post-mortem, pela aplicação
de um estímulo elétrico externo, o que leva a um 6,0
RM
consumo mais rápido das reservas de ATP musculares, 5,9
acelerando, assim, a glicólise e, conseqüentemente,
Estimulado
o início do rigor mortis. A EE permitiu o aumento na 5,5
taxa de resfriamento das carcaças sem que se 0 1 2 3 6 9 12 15 18
incorresse nos fenômenos previamente citados. Tempo post-mortem (Horas)
Conforme anteriormente mencionado, o
Figura 4.12. Diferenças na taxa de declínio de carnes de
desenvolvimento do rigor mortis pode ser carcaças bovinas estimuladas e não estimuladas. Em
acompanhado indiretamente pela queda do pH bovinos, o início do rigor mortis (RM) ocorre,
muscular. Neste sentido, a Figura 4.12 ilustra o aproximadamente, quando o pH do músculo atinge o valor
aumento na taxa de glicólise post mortem, para de 5,90 (20ºC). Com a aplicação da EE, a glicólise é
carcaças estimuladas e não estimuladas eletricamente. acelerada, causando um substancial aumento na queda do
Além da prevenção dos fenômenos de EPF e RD, pH muscular e conseqüente aceleração do tempo necessário
o favorecimento da maciez pela EE é atribuído a dois para início do rigor mortis. Fonte: Pearson e Dutson
outros fatores: (1985).

Figura 4.13. Eletromicrografia de músculo (longisimus) bovino (A) não estimulado e (B) com estimulação elétrica.
CB = bandas contraídas pelo efeito mecânico da EE. Fonte: Pearson e Dutson (1985).
62 E.M. Ramos & L.A.M. Gomide
Existem várias maneiras de se realizar a EE, # Melhora o sabor e aroma da carne, por acelerar o
variando-se a voltagem e a freqüência da corrente processo de maturação. Assim, potencializadores
elétrica aplicada. Entretanto, pode-se dividir em dois do sabor, como a inosina monofosfato (IMP) e a
tipos básicos: a de baixa e a de alta voltagem. hipoxantina, formadas na quebra do ATP, são
A EE de Baixa Voltagem é mais segura para os liberados mais cedo na carne, favorecendo sua
funcionários (menor risco de acidentes), porém de qualidade sensorial;
eficiência limitada à integridade física do sistema # Extensão da vida-de-prateleira das carnes, devido
nervoso central (SNC) do animal, uma vez que baixas a redução rápida do pH para níveis que inibem o
voltagens apenas estimulam o cérebro a executar a crescimento microbiano.
contração muscular. Desta forma, sua aplicação se
restringe a até10 minutos post-mortem, a partir do Suspensão da Carcaça (Pendura)
qual ocorre a falência completa do SNC.
O seu efeito se deve apenas à aceleração da Nem todos os músculos da carcaça estão livres
glicólise (queda mais rápida do pH muscular), causada para encolherem, mesmo quando expostos a
por um rápido consumo energético, que temperaturas inferiores a 15ºC ainda no estado pré-
consequentemente acelera o início do rigor mortis. rigor. A sua ligação ao esqueleto e a tensão localizada
As voltagens usadas estão na ordem de 30 a 100 V desenvolvida são suficientes para impedir o
por 2 a 4 minutos, sendo geralmente aplicadas durante encolhimento das fibras musculares, evitando a perda
a etapa de sangria (logo após corte da jugular). na maciez. No modo convencional de pendura, a
Já a EE de Alta Voltagem é um processo menos carcaça é suspensa pelo tendão de Aquiles, ficando
seguro para os funcionários, o que exige a construção alguns músculos mais aptos ao encolhimento do que
de instalações restritas a esta operação e sistemas de outros.
segurança eficazes, para evitar riscos de acidentes no A suspensão da carcaça resulta no
abatedouro. Entretanto, a EE por alta voltagem possui desenvolvimento de tensão localizada em
maior eficiência na melhoria da qualidade da carne. determinados músculos, minimizando ou impedindo
Uma vez que não depende do SNC do animal, a sua contração, já que eles ficam como que presos por
EE de alta voltagem pode ser usada num tempo post- suportes numa extremidade enquanto a gravidade atua
mortem maior (até uma hora após a insensibilização), no músculo como um todo, o que não deixa o músculo
sendo efeitva mesmo quando aplicada após a livre para sofrer a contração total do rigor mortis. É
evisceração. Sua aplicação (entre 400 e 1000 V por mais ou menos como se mantivesse o músculo
cerca de 1 a 2 minutos) permite uma estimulação esticado até o rigor mortis ocorrer. Como ele está
direta e uniforme através de toda a carcaça, com seu preso, não há movimentação livre dos filamentos finos
efeito sobre a qualidade da carne oriunda não apenas sobre os grossos. A menor compactação das estruturas
da aceleração da glicólise, mas também devido a celulares resulta em aumento da maciez dos músculos
rupturas nas fibras musculares causadas pelas atingidos.
extensivas distensões e violentas contrações (efeito Assim, mudando-se a forma de pendura, muda-
mecânico). se a susceptibilidade dos músculos ao encolhimento
Além do seu efeito sobre a maciez, também se pelo frio. A pendura pode ser realizada de duas formas
atribui as seguintes vantagens da aplicação da (Figura 4.14): pelo processo tradicional através do
estimulação elétrica nas carcaças: tendão de Aquiles; ou pelo foramem pélvico (pélvis
ou aitch bone).
# Melhora a coloração vermelha brilhante do músculo A pendura pelo Tendão de Aquiles (método
18 a 24 horas post-mortem, que se apresenta mais convencional), comumente utilizado no Brasil,
clara e atrativa. Esta coloração fornece a impressão beneficia os músculos abdominais e torácicos, o que
de se tratar de uma carne de um animal jovem; não tem muita razão de ser já que estes são
# Melhora a visualização da gordura de marmoreio normalmente mais macios, por serem menos exigidos
24 horas post-mortem, devido a um maior contraste fisicamente (menor conteúdo de tecido conectivo).
na sua aparência, permitindo um maior escore Já na pendura pelo Foramen pélvico, também
sensorial; conhecido como Tenderstrech, as patas traseiras ficam
# Previne a formação do “Anel de Aquecimento” numa posição de 90º fazendo com que uma série de
(presença de duas tonalidades de cor, com anel músculos do quarto traseiro permaneçam esticados
escuro na extremidade, geralmente no lombo, e, portanto, impedidos de se contrair. Esta posição de
causado pelo resfriamento muito rápido) no pendura deveria ser a mais utilizada, uma vez que
músculo. O mecanismo de atuação da EE, no beneficia músculos que uma dureza inerente devido
entanto, é ainda desconhecido; à alta atividade e, portanto, elevado teor de tecido
Conversão do Músculo em Carne 63
conectivo. A maciez ocasionada nestes músculos é refrigeração rápida, trata-se de uma operação, no
devido à eliminação/redução de mais um fator (o mínimo, inconveniente na linha de abate. Além disso,
encolhimento) responsável pela dureza, conferindo- deve se levar em consideração o fato de que o espaço
lhes uma maciez somente alcançada após vários dias ocupado pela carcaça suspensa pela pélvis é maior
de maturação. do que o espaço da carcaça suspensa pelo método
Embora a pendura pelo forâmen pélvico permita tradicional, exigindo câmaras frias maiores do que
certo controle sobre os músculos susceptíveis ao no processo convencional (pelo tendão de Aquiles).
encolhimento pelo frio durante o processo de Através da Figura 4.14 e da Tabela 4.4 pode-se
observar os músculos favorecidos pelo tipo de
pendura.

Processamento Pré-Rigor

Como o próprio nome já diz, a carne pré-rigor é


aquela que se encontra na fase de atraso (antes do
início do rigor mortis) e, portanto,apresenta um
elevado nível de ATP (maior que 1 µmol/g). Também
pode ser referida como “carne quente”, por se tratar
da carne antes da sua refrigeração. Assim, o processo
de desossa da carne pré-rigor é comumente
denominado “desossa quente”.
Uma vez que na carne pré-rigor não há formação
do complexo de actomiosina, a quantidade de água
retida no músculo apresenta-se maior, devido à maior
disponibilidade de espaço estérico dentro das
miofibrilas. Além disso, o pH mais elevado desta
carne leva a uma menor desnaturação protéica que,
aliado a um afastamento do ponto isoelétrico das
proteínas miofibrilares, confere uma maior CRA e
(A) (B) CE.
A maior CRA da carne pré-rigor possibilita uma
Figura 4.14. Formas de pendura de carcaças bovinas: (A)
pelo tendão de Aquiles; e (B) pelo forâmen pélvico
maior solubilização das proteínas miofibrilares, e,
(Tenderstrech). As áreas marcadas representam os consequentemente, maior extração destas para
principais músculos afetados (cinza claro = músculos aplicações tecnológicas, como o preparo de emulsões
favorecidos; cinza escuro = músculos negativamente mais estáveis. A maior extração protéica permite
afetados). Fonte: Sørheim e Hildrum (2002). maior encapsulamento dos glóbulos de gordura (maior

Tabela 4.4. Tamanho do sarcômero1 e força de cisalhamento2 em diferentes músculos segundo o tipo de suspensão de
carcaça: Tendão de Aquiles (TA) e Foramen Pélvico (FP)
Tamanho do Sarcômero (µm) Força de Cisalhamento (kg)
Músculo
TA FP TA FP
Longissimo (lombo) 1,9 2,3 6,0 4,9
Semimembranoso (coxão) 1,9 2,6 5,0 4,3
Semitendenoso (coxão) 2,4 2,9 5,3 4,9
Biceps femures (coxão) 1,9 3,2 4,2 5,0
Rectus femures (coxão) 2,2 2,5 4,7 3,8
Adutor (coxão) 2,0 3,4 4,7 4,0
Psoas maior (filé mignon) 3,6 2,4 3,7 4,2
Gluteus medius (alcatra) 2,0 2,8 4,9 3,7
Triceps brachial (paleta) 2,3 2,3 4,7 4,8
Média 2,2 2,7 4,8 4,4
1
Quanto menor o tamanho do sarcômero, mais contraído se apresenta o músculo.
2
Quanto maior a força de cisalhamento, menor a maciez da carne.
64 E.M. Ramos & L.A.M. Gomide
CE) e conseqüente formação de uma “malha protéica” Tabela 4.5. Efeito da utilização da carne pré-rigor no
que impede a livre movimentação dos glóbulos de rendimento de hamburguês
gordura que porventura não tenham sido Carne Carne
Característica
encapsulados, evitando a sua coalescência e a Pré-Rigor Pós-Rigor
formação de grumos. Aumenta-se com isto a Perdas por cocção 33,85% 41,06%
estabilidade da emulsão. A maior solubilização das Rendimento 66,15% 58,94%
proteínas permite, ainda, um aumento da velocidade
da penetração dos sais de cura nos produtos
processados. carne, causada pela moagem, a adição de sal causa
A maior CRA também reduz a perda de água por a competição dos íons sódicos pelos sítios protéicos
evaporação durante o cozimento de embutidos e onde o cálcio se ligaria, disponibilizando mais
reestruturados, resultando no aumento do rendimento proteínas para exercerem propriedades funcionais
econômico, como se pode observar na Tabela 4.5. (CRA e CE). Além disto, o sal passa a inibir a
Como exemplo, o rendimento de salsichas aumenta atuação das enzimas glicolíticas, evitando uma
em cerca de 13 a 14%, com liberação de gordura da queda maior do pH (incremento de 0,2 unidades de
emulsão 83% menor e de gelatina 58% (formulação pH), afastando-o ainda mais do ponto isoelétrico
sem fosfato) a 70% (com fosfato) menor, quando do das proteínas miofibrilares e favorecendo a CRA e
uso de carne pré-rigor na elaboração destes produtos. a CE da carne. Associado ao efeito do pH, a adição
Entretanto, o curto espaço de tempo em que a de sal, em quantidades adequadas, causa uma maior
condição pré-rigor existe, requerer uma alteração no solubilização e extração protéica, devido a uma
fluxuograma de operação dos matadouros frigoríficos estabilização de sua estrutura, num efeito conhecido
e o seu processamento apresenta dificuldades em sua como salting-in, favorecendo também a CRA e CE.
manipulação. Devido à estrutura menos rígida que a # Se o corte desossado pré-rigor for destinado à
carne se apresenta, a faca “dança” durante a desossa comercialização refrigerado, este deve ser contido
a quente, implicando em riscos adicionais aos fisicamente para evitar a sua contração. Uma nova
operadores. Além disso, o processamento pré-rigor técnica de embalagem da carne, denominado
implicar em maior risco de contaminação e sistema Pi-Vac, permite manter tencionado o corte
proliferação microbiológica (devido ao seu pH e desossado pré-rigor enquanto embalado,
temperatura mais elevados) exigindo cuidados favorecendo a maciez da carne, mesmo quando esta
higiênicos maiores com o ambiente, instrumental e é submetida a um resfriamento rápido. O sistema
funcionários. Pi-Vac consiste em se embalar a carne à vácuo em
Por outro lado, a utilização da carne pré-rigor filmes altamente elásticos fazendo-se uso de
implica em menor consumo de energia, espaço, e mão- câmaras de embalagem especialmente
de-obra em frigoríficos, pela diminuição do tamanho desenvolvidas (Figura 4.15). O filme elástico,
das peças de carne a serem resfriadas e estocadas, e, depois de aplicado, automaticamente se retrai,
portanto, do volume e área para penetração de calor, mantendo-se firmemente preso em toda extensão
com redução do tempo de resfriamento. No entanto, da carne, evitando a sua contração. O favorecimento
cuidados com relação ao EPF e RD devem ser das condições higiênicas e um aspecto mais atrativo
observados, uma vez que a carne desossada se que é conferido à carne embalada são benefícios
apresenta mais propícia ao encolhimento. adicionais do sistema.
Para se tirar vantagens das características da carne
pré-rigor, minimizando ou evitando as sua Condicionamento (Maturação)
desvantagens, pode-se adotar um dos seguintes
procedimentos: Consumidores consideram a maciez da carne
como sendo o componente de qualidade mais
# Desossa e congelamento rápido da carne associado importante. Ainda assim, a inconsistência na maciez
à sua utilização ainda congelada no processamento. da carne é identificada como uns dos maiores
Com esta técnica evita-se o efeito do RD, uma vez problemas de processamento da indústria de carne.
que quando o descongelamento ocorrer, a fibra, e Um recente levantamento demonstrou que os
suas estruturas protéicas, já estarão totalmente consumidores estavam insatisfeitos com a qualidade
rompidas, impedindo a formação do complexo de comestível da carne bovina preparada em casa em
actomiosina. mais de 20% das vezes.
# Moagem da carne quente e sua salga imediata antes A maturação tem como objetivo melhorar a
da refrigeração (0ºC por 2 a 3 dias) até o maciez e conferir sabor característico à carne, devido
processamento. Além da destruição da estrutura da a uma ação proteolítica de enzimas (catepsinas e
Conversão do Músculo em Carne 65
(B) ganchos
(A)
Filme plástico

Remoção CARNE
do ar

Tubo de
embalagem

(D) (C)

CARNE

Figura 4.15. Esquematização do sistema Pi-Vac para embalagem de músculos pré-rigor. O corte de carne é inserido
(A) num tubo em que um filme altamente elástico é mantido estirado (B). Um sistema de vácuo suga o corte e o filme
é aplicado (C). Com a aplicação, o filme é liberado da máquina retornando, automaticamente, ao seu estado original
(retrai). A força do filme é aplicada em toda extensão da carne (D) impedindo a expansão de seu diâmetro (causado
pela contração longitudinal do músculo, veja Figura 4.11). Fonte: Meixner e Karnitzschky (2001).

calpaínas) naturalmente presentes na carne. A carne segurança microbiológica. Como o amaciamento


maturada é o resultado do processo que consiste em causado pelo acondicionamento é o resultado da
manter a carne embalada a vácuo (para evitar ativação enzimática, a utilização de temperaturas mais
problemas de ordem microbiológica) sob elevadas acarreta em maior proteólise e conseqüente
temperaturas de refrigeração (0 a 1ºC), por um período amaciamento. Neste sentido, o tempo de
mínimo de 14 dias (geralmente de 14 a 21 dias). A acondicionamento aumenta em 16 vezes entre 0 e 6°C
maturação de cortes comerciais é uma prática bastante e em 4 vezes entre 5 e 20°C, em relação ao
difundida entre os frigoríficos no Brasil, sendo um acondicionamento em temperaturas superiores a
requisito indispensável de muitos importadores. 20°C.
Não há nenhuma dúvida que enzimas proteolíticas Uma outra forma de acelerar o processo de
endógenas são as principais responsáveis pelas maturação, além do aumento de temperatura, é a
mudanças no tecido muscular durante aplicação de cloreto de cálcio (CaCl2) na carne. A
acondicionamento post-mortem. As calpaínas são infusão de cálcio na carne aumenta a concentração
responsáveis pelo amaciamento inicial, quando o pH intracelular deste íon, ativando as proteases
do músculo ainda está elevado (próximo de 6,3). A dependentes de cálcio (calpaínas), acelerando a
partir daí, quando o pH cai, a liberação gradual e maturação e, consequentemente, favorecendo a
ativação de proteases lisossomais (catepsinas) maciez da carne.
contribui para o amaciamento que ocorre na estrutura A redução do tempo de maturação pode ser obtida
contrátil. pela infusão de 10% de CaCl2 0,3 M imediatamente
A taxa de amaciamento varia entre espécie de após o abate. Nestas condições a maciez máxima pode
mamíferos sendo que 80% da maciez é alcançado em ser obtida em apenas um dia de estocagem refrigerada.
aproximadamente 5 dias de estocagem para porco e A injeção destes níveis de cálcio na carne tem efeito
pelo menos duas semanas para carne de boi em positivo na maturação mesmo quando aplicada até 7
temperatura de refrigeração. O amaciamento da carne dias post-mortem.
de galinha é muito rápido, sendo alcançado em Entretanto, alguns autores citaram a necessidade
aproximadamente 48 horas em temperatura de de tempos maiores do que 10 dias de maturação para
refrigeração. O tempo necessário para amaciamento alguns cortes. Além disso, a elevada concentração de
depende de fatores como maturidade fisiológica, sexo, cálcio confere um sabor amargo e metálico à carne.
temperatura da câmara, teor de tecido conjuntivo. Tentando suprir estes problemas várias modificações
O uso de temperaturas de estocagem de 0 a 1ºC é do processo original foram sugeridas. Atualmente, o
recomendado para a maturação, devido a razões de processo recomendado é a infusão de 5% de solução
66 E.M. Ramos & L.A.M. Gomide
CaCl2 0,2 M, 1 a 2 dias post-mortem, seguido de preferência pela segunda. A faixa de preferencial de
maturação refrigerada, embalada a vácuo, por um temperatura para a atividade máxima situa-se entre
período mínimo de 7 dias. 30 e 50ºC, sendo inativada a cerca de 65ºC
A Tabela 4.7 ilustra o efeito da aplicação de CaCl2 (temperatura alcançada em processo normal de
no favorecimento da qualidade da carne. cozimento).
O processo de maturação modifica o sabor da A bromelina atua preferencialmente sobre o
carne, tende a apresentar uma exsudação acentuada, tecido conjuntivo e mais especificamente sobre o
dependendo das condições de manipulação e colágeno e elastina. A faixa de temperatura ótima para
embalagem, e sua cor escura pode constituir um fator sua atividade enzimática situa-se entre 30 e 60oC.
restrito. As carnes maturadas podem se apresentar com
coloração vermelha e enegrecida, devido à formação Referências
da metamioglobina. A cor pode ser reversível,
retornando a vermelho-vivo se a carne maturada for ABERLE, E.D., FORREST, J.C., GERRARD, D.E.,
exposta em ambiente de oxigênio. MILLS, E.W. Principles of Meat Science. 4 ed. New York:
Kendall/Hunt Publishing Company, 2001. 354p.
Uso de Enzimas Exógenas ARAÚJO, J.M. Química de Alimentos: Teoria e Prática.
2 ed. Viçosa: Editora UFV, 1999. 416p.
As enzimas de diferentes origens (vegetal, animal ASGHAR, A., PEARSON, A.M. Influence of Ante- and
ou bacterianas) atuam preferencialmente sobre Postmortem Treatments upon Muscle Composition and
determinados componentes do músculo. A qualidade Meat Quality. Advanced Food Research, v.26, p.53-177,
de uma carne amaciada com esta técnica depende do 1980.
tipo de enzima e sua especificidade. A enzima BECHTEL, P.J. Muscle as Food. Florida: Academic Press,
selecionada deve modificar a textura da carne atuando Inc. 1986. 453p.
preferencialmente sobre o tecido conjuntivo a ponto
de enfraquecê-lo, ou mesmo digeri-lo, e degradar BENDALL, J.R. Post-Mortem Changes in Muscle. In:
BOURNE, G.H. The Structure and Function of Muscle.
minimamente as proteínas miofibrilares. Uma
2 ed. New York: Academic Press, p.243-309, 1973a.
degradação extensiva das proteínas miofibrilares
resultaria em um produto final extremamente macio, BENDALL, J.R. The Biochemistry of Rigor-Mortis and
com textura esponjosa, completamente diferente da Cold Contracture. In: 19th EUROPEAN MEETING
MEAT RESEARCH WORKERS, Proceedings…, Paris,
carne habitualmente consumida.
p.1-27, 1973b.
A papaína tem afinidade tanto pelas proteínas
miofibrilares quanto as do tecido conjuntivo, com BENDALL, J.R., SWATLAND, H.J. A review of the
aparente preferência pela primeira. A sua atividade relationships of pH with physical aspects of pork quality.
enzimática é maior que a bromelina e ficina, o que a Meat Science, 24, p.85-126, 1988.
torna de difícil controle. A faixa de temperatura ideal BERG, R.T. & BUTTERFIELD, R.M. New Concepts of
para desenvolver atividade máxima situa-se entre 60 Cattle Growth. Sydney University Press, 1976. 240p.
e 85ºC. Geralmente, não é inativada em temperaturas BOUTON, P.E. et al. The Effects of Some Post-Mortem
inferiores a 85ºC, acima, portanto, da temperatura de Trataments on the Mechanical Properties of Bovine and
cozimento usualmente alcançada. Se a papaína não Ovine Muscle. Journal of Food Science. v.37, n.539.
for inativada durante o processo de cozimento, e se a 1972.
carne amaciada não for consumida de imediato, a BOUTON, P.E. et al. Changes in Shear Parameters of meat
enzima contínua a ação de degradação proteolítica Associated with Structural Changes Produced by Aging,
resultando em um produto inaceitável. Cooking and Myofibrillar Contraction. Journal of Food
A ficina tem afinidade pelas proteínas Science. v.40, n.1112. 1975.
miofibrilares e do tecido conjuntivo, com aparente

Tabela 4.7. Efeito da injeção de 10% de CaCl2 0,3 M, imediatamente após o abate, na maciez de músculos
semimembranosus de acordo com o tempo de maturação post mortem
Força de cisalhamento (kg) Perda por
Tratamento
1 dia 8 dias 14 dias cozimento (%)
Controle 8,95 8,51 7,30 29,4
CaCl2 3,67 3,20 3,21 32,0
Quanto maior a força de cisalhamento, menor a maciez da carne.
Fonte: Wheller et al. (1991).
Conversão do Músculo em Carne 67
CASSENS, R.G., COOPER, C.C. Red and White Muscle. PUOLANNE, E.J., PÖSÖ, A.R., RUUSUNEN, M.H.,
Advanced Food Research, v.19, p.1-74, 1971. SEPPONEN, K.V., KYLÄ-PUHJU, M. Lactic Acid in
Muscle and its Effects on Meat Quality. In: 55TH ANNUAL
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