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Bloco Saúde Mental na APS

 Tabagismo
 Somatização
 Abordagem em Saúde Mental pelo MFC
 Depressão
 Transtorno de pânico
 Transtorno de Ansiedade Generalizada
 Álcool e outras drogas

TABAGISMO  Principal causa prevenível de morte e de doenças no mundo.


O QUE FAZER DIANTE DE UMA PESSOA TABAGISTA INICIALMENTE NA APS? (5 itens)
Entrevista com foco na história tabagista.
Tentar estabelecer a maior empatia possível com a pessoa, deixá-la confortável, aumentando seu
envolvimento.

Informações devem ser avaliadas:


1. Níveis de escolaridade e socioeconômico  menor grau de instrução e menor nível socioeconômico
apresentam menores taxas de sucesso de cessação do tabagismo, além de naturalmente terem menos acesso
às medicações antitabagismo.

2. Antecedente atual ou prévio de transtorno de ansiedade, depressão ou história de abuso de drogas 


maior prevalência de tabagismo, consumindo maior quantidade de cigarros. evidências controversas quanto
à relação entre transtornos psiquiátricos e a maior dificuldade para cessação do tabagismo.

3. Histórico de saúde  é recomendado que se faça uma análise detalhada do histórico de saúde e uso de
medicações. Isso se faz muito importante na prevenção de efeitos colaterais e interações medicamentosas.
(p.ex. epilepsia e bupropiona), bem como na prevenção de possíveis interações medicamentosas prejudiciais
ao paciente quando prescritas medicações antitabagismo (bupropiona + amitriptilina).

Ex: Por exemplo, a bupropiona é contraindicada em pessoas com antecedentes de crises convulsivas. Esse
mesmo medicamento, por também ser um antidepressivo, pode resultar em interações medicamentosas em
pessoas em uso de outros antidepressivos ou benzodiazepínicos.

4. Avaliação do grau de dependência à nicotina  ação da nicotina no SNC no núcleo accumbens, levando
a um aumento dos níveis de dopamina.

 O DIAGNÓSTICO DE DEPENDÊNCIA À NICOTINA SE FAZ POR CRITÉRIOS SUGERIDOS


PELO DSM-4 (4 ITENS)
 A AVALIAÇÃO DO GRAU OU GRAVIDADE DA DEPENDÊNCIA À NICOTINA, PELA
APLICAÇÃO DO TESTE DE FAGERSTRÕM ( 6 PERGUNTAS LISTADAS ABAIXO COM A
PONTUAÇÃO VARIANDO DE 0 A 10)
DIAGNÓSTICO DE DEPENDÊNCIA À NICOTINA.

1. Consumo diário de nicotina por semana.


2. Sintomas com a súbita interrupção ou acentuada redução do consumo de nicotina por 24 horas ou mais:
 Estado depressivo ou humor disfórico
 Insônia
 Irritabilidade, Ansiedade
 Dificuldade de concentração, Inquietude
 Queda Fc
 Aumento apetite e ou peso
3.Sintomas descritos no critério 2 produzem mal-estar clinicamente significativo, com deterioração social,
laboral ou em áreas importantes da atividade do indivíduo.
4. Os sintomas não se originam de uma doença clínica, nem se explicam pela presença de outro transtorno
mental.
5. O último item inicial na avaliação da pessoa tabagista refere-se ao grau de motivação da pessoa  para
cessar o tabagismo e obter sucesso durante e após o tratamento é necessário que a pessoa esteja disposta e
motivada a isso. A prescrição de medicações antitabagismo em pessoas pouco ou não motivadas
dificilmente resultará em sucesso, evoluindo mais provavelmente com redução, às vezes, pouco expressiva,
do número de cigarros fumados por dia. Além disso, logo após a cessação da medicação antitabagismo,
frequentemente essas pessoas tender a retomar a quantidade que fumava previamente. Para avaliar esse grau
motivacional do paciente existe uma escala comportamental que classifica as pessoas em 5 estágios de
mudança, sendo:

1. Pré-contemplação: não se cogita a possibilidade de parar de fumar, mesmo sendo aconselhada


sobre os benefícios de cessação do tabagismo. O profissional deve procurar realizar, sempre que
possível, pelo menos uma abordagem mínima, frisando com a pessoa a importância da cessação do
tabagismo e os benefícios associados, de modo que ela possa passar a contemplar a ideia de parar de
fumar e, assim, evoluir para os estágios a seguir.
2. Contemplação: a pessoa começa a admitir que fumar é um problema, no entanto tem medo de dar
os primeiros passos no sentido de parar de fumar. Nesse momento, a pessoa encontra-se mais
suscetível a essa mudança, uma vez que já está consciente da importância de parar de fumar,
precisando de apoio, estímulo e orientação para passar para os estágios seguintes. Identificar barreiras
para a realização de urna tentativa e esclarecer dúvidas é fundamental.
3. Preparação: a pessoa passa a dar os primeiros passos para a cessação do tabagismo, começando a
controlar o número de cigarros fumados por dia, estabelecendo horários para fumar ou mesmo
procurando ajuda profissional.
4. Ação: a pessoa adota atitudes específicas, conseguindo efetivamente parar de fumar. O estímulo à
mudança, o entendimento desse processo e a atenção aos riscos de recaída devem ser abordados pelo
profissional nessa fase. O indivíduo deve estar orientado a identificar e evitar as situações relacionadas
ao consumo de cigarros e a usar estratégias para lidar com os momentos de forte vontade de fumar.
5. Manutenção: nessa fase, a pessoa deve estar consciente da necessidade de prevenir a ocorrência de
lapsos/recaídas, devendo usar as estratégias aprendidas. Mais uma vez, é importante destacar os
benefícios da cessação do tabagismo. Em outras palavras, esse estágio configura a finalização do
processo de mudança ou se encerra no caso de ocorrência de recaídas.

TESTE DE FAGESTRÕM (AVALIAÇÃO DA GRAVIDADE DA DEPENDÊNCIA À NICOTINA)


1. Quanto tempo após acordar você fuma o seu - o primeiro da manhã (1 ponto) - Outros (O
primeiro cigarro? ponto)
- Dentro de 5 min (3 pontos) 4. Quantos cigarros você fuma por dia?
- Entre 6 e 30 min (2 pontos) - Menos de 10 (O ponto)
- Entre 31 e 60 min (1 ponto) - De 11 a 20 (1 ponto)
- Após 60 min (O ponto) - De 21 a 30 (2 pontos)
2. Você acha difícil não fumar em lugares - Mais de 31 (3 pontos)
proibidos, como igrejas, bibliotecas, cinemas, 5. Você fuma mais frequentemente pela
ônibus? manhã?
- Sim (1 ponto) - Não (O ponto) - Sim (1 ponto) - Não (O ponto)
3. Qual o cigarro do dia que lhe traz mais 6. Você fuma mesmo doente, quando precisa
satisfação? ficar de cama a maior parte do tempo?
- Sim (1 ponto) - Não (O ponto)

Interpretação do grau de dependência:


 Muito Baixo (0 A 2 Pontos),
 Baixo (3 Ou 4 Pontos),
 Médio (5 Pontos),
 Elevado (6 Ou 7 Pontos),
 Muito Elevado (8 A 10 Pontos).

+6 pontos  Desconforto significativo ao deixar de fumar - síndrome da abstinência

CONDUTA PROPOSTA

Tratamento não farmacológico


Primeiro passo
 Explicar o planejamento do tratamento, expondo as opções de tratamento medicamentoso e as modalidades
de aconselhamento disponíveis (consultas individuais ou em grupos).

Abordagem em grupo: cada sessão possui duração, em média, de 60 minutos;


Vantagem: a troca de experiências entre os fumantes  empatia e troca de experiências, dificuldades em comum.
Permite abordar simultaneamente vários indivíduos
(até 12 por grupo  número maior de pessoas pode reduzir a eficácia do tratamento supervisionado em AG)
De acordo com o Consenso Abordagem e Tratamento do Fumante, elaborado pelo INCA  recomendam-se 6
sessões (4 primeiras semanais, e as 2 últimas quinzenais).

Rotina das reuniões em grupo

Primeiro encontro, após a entrevista inicial  recomendado ter em mãos as informações de cada pessoa.
Objetivo: preparar as pessoas para parar de fumar.
Perguntar a razão principal que cada indivíduo deseja parar de fumar
 pode ajudar a elevar a motivação.
Deve-se explicar ao grupo o porquê fumam:
 Destacando o papel da nicotina como substancia psicoativa, que pode levar a dependência física,
psicológica e comportamental. Ao ser inalada ela atinge o SNC em aproximadamente 10 segundos. Sua
ação nos receptores nicotínicos-colinérgicos leva à liberação de neurotransmissores, como a dopamina, a
serotonina, a noradrenalina e a acetilcolina, relacionados à sensação de prazer, à diminuição da ansiedade e
ao aumento da atenção e da memória.

Ao parar de fumar ou reduzir para menos da metade o consumo, existe um desequilíbrio na quantidade desses
neurotransmissores, o que dá início à síndrome de abstinência.
 Inicia aproximadamente 8 horas após o último cigarro, pico com 72 horas de abstinência.
 Duração 3 a 4 semanas.
 Ela é marcada por um forte e persistente desejo de fumar, humor deprimido, insônia ou sonolência
diurna, irritabilidade, frustração ou raiva, ansiedade, dificuldade de concentrar-se, inquietação,
diminuição da frequência cardíaca e da pressão arterial e aumento do apetite ou ganho de peso.
 Todo paciente deve ser alertado sobre a abstinência;
 Intensa vontade de fumar em situações associadas ao consumo - festa, álcool, café
 Evitar gatinhos.
 Orientar sobre atividades distrativas, pois episódios tem cerca de 5 minutos e tornam-se mais fracos com o
tempo.
 É interessante explicar mecanismo de ação e efeitos colaterais dos medicamentos antitabágicos.
 Cada participante deve ser estimulado a marcar uma data para parar de fumar.
 Recomenda-se a parada abrupta. (orientações para interrupção de uso de acordo com o tratamento
farmacológico escolhido).

Terapia cognitivo-comportamental (TCC): após a primeira reunião, está preconizada para que haja mudanças
na vida diária dos fumantes.
Entre as principais características da TCC destacam-se as seguintes:
1. Oferecer orientação contínua, independentemente do progresso ou do insucesso da pessoa;
2. Remover barreiras que possam interferir no tratamento, como ansiedade, estresse, falta de motivação, etc;
3. Remover situações gatilhos sempre que possível o que varia de pessoa a pessoa;
4. Estabelecer metas alcançáveis e realistas e ajudar ativamente na tomada de decisões;
5. Parabenizar progressos à medida que vão ocorrendo, o que ajuda no aumento da autoestima;
6. Proporcionar liberdade de escolha nos caminhos do tratamento, seja na modificação da medicação, seja na
recusa em usar novas medicações, ou mesmo na escolha das estratégias a serem utilizadas para a cessação do
tabagismo;
7. Questionar e enfatizar sobre a ocorrência de benefícios relacionados à redução ou à interrupção do tabagismo.
Investigar o impacto da redução/interrupção do tabagismo na dinâmica das relações familiares: eles perceberam,
estão felizes com a atitude da pessoa?
8. Praticar sempre a empatia.
Obs: A cada encontro, também é importante avaliar o progresso dos indivíduos (questionar sobre o número de
cigarros fumados por dia) e se houve lapsos ou recaídas, bem como a ocorrência de efeitos colaterais associados às
medicações prescritas e monitorar periodicamente o peso.
Ganho de peso
De forma geral, 1 em cada 10 fumantes pode ganhar mais de 10 kg após parar de fumar, com a média de ganho de
peso situando-se entre 2 a 4 kg. Vale ressaltar que nem todos os indivíduos ganham peso, com alguns podendo até
emagrecer.

Fase de manutenção: Ao término do programa, os indivíduos que se encontrarem abstinentes do fumo podem ser
encaminhados para a fase de manutenção, que consiste, em encontros mensais até se completar 12 meses de
acompanhamento.
Com as pessoas que fizeram o tratamento descrito e que evoluíram com recaídas durante o acompanhamento,
discutir a programação de uma nova tentativa, de modo semelhante a todo o processo descrito anteriormente,
como se fosse iniciar o tratamento pela primeira vez.

Abordagem individual: é aplicada na forma de uma consulta e deve englobar o mesmo conteúdo descrito na
abordagem em grupo. Nessa modalidade, a entrevista inicial pode conter o processo de preparação para parar de
fumar, sendo o primeiro retorno após a data de parada.

TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
De acordo com o Consenso Abordagem e Tratamento do Fumante, criado pelo INCA o uso de medicações
antitabagismo está indicado nas seguintes situações:
1. Fumantes moderados  fumam 20 ou mais cigarros por dia;
2. Fumantes que fumam o primeiro cigarro até 30 minutos após acordar e fumam 10 ou mais cigarros por dia;
3. Fumantes com escore do teste de Fargerstrõm ≥5, ou avaliação individual, a critério do profissional;
4. Fumantes que já tentaram parar de fumar anteriormente apenas com a abordagem tcc;
5. Fumantes que não possuem contraindicações clínicas;
6. A critério profissional;

De um modo geral, deve-se recorrer inicialmente à monoterapia.


A terapia combinada geralmente é indicada em uma das seguintes situações:
 pessoas com elevado grau de dependência nicotínica,
 pessoas em uso de monoterapia com evolução insatisfatória durante o tratamento,
 pessoas que fizeram uso prévio de várias medicações antitabagismo com sucesso parcial.

A escolha entre medicações de primeira ou segunda linha vai depender de vários fatores: condições financeiras
do indivíduo, disponibilidade das medicações, grau de dependência nicotínica, uso prévio de medicações, presença
ou não de contraindicações às medicações, etc.
Existem atualmente, duas classes de medicamentos com eficácia comprovada para cessar o tabagismo 
medicamentos nicotínicos e não nicotínicos.
Os medicamentos nicotínicos, também denominados terapia de reposição de nicotina (TRN), englobam
medicações de primeira linha para cessação do tabagismo e podem ser adesivos transdérmicos, gomas de mascar,
pastilhas, spray nasal ou para inalação (esses dois não disponíveis ainda no Brasil). O mecanismo de ação desses
medicamentos está relacionado com a ligação aos receptores nicotínicos no SNC, impedindo a ligação da nicotina
liberada pelo cigarro.

GOMA DE MASCAR (primeira linha)


-Deve ser mascada até surgimento de gosto característico na boca, o que indica a liberação de nicotina, devendo
em seguida ser posicionada no sulco gengival por alguns minutos até adquirir consistência mais firme; em seguida,
mascar novamente e reiniciar o processo acima até em média 30 minutos, quando a goma deve ser descartada;
-Age em média por 20 a 30 minutos, com seu pico de concentração em torno de 20 minutos;
Efeitos colaterais: problemas dentais, dor na articulação temporomandibular, dentes amolecidos, soluços, adesão
à dentadura, irritação da boca ou da garganta, úlceras orais, hipersalivação e dispepsia;
Posologia: pode ser usado como monoterapia, o que requer, em média, 8 a 12 gomas/dia, não devendo ser
utilizadas mais que 24 unidades/dia; além de essa abordagem mostrar-se pouco prática e onerosa, também pode se
associar a efeitos colaterais como fadiga muscular no maxilar;
-Outra possibilidade da goma consiste no uso combinado com outras medicações, em especial com os adesivos de
nicotina; nessa situação, a goma é mais utilizada como medicação "emergencial'', para alívio do desejo intenso de
fumar ("fissura") em determinados momentos do dia.

PASTILHAS (primeira linha)


- São mais rapidamente absorvidas pela mucosa oral do que as gomas de mascar, sendo mais práticas de usar, uma
vez que não costumam se associar com dor na articulação temporomandibular.
- São disponíveis na dose de 2 ou 4 mg;
- De modo semelhante à goma, podem ser usadas como monoterapia (mínimo de 9 e máximo 15 pastilhas/dia) ou
para alívio “emergencial” para alívio do desejo intenso de fumar, em combinação com outras medicações, como os
adesivos.

ADESIVOS transdérmicos (primeira linha)


Estão disponíveis em dosagens de 7, 14 e 21 mg de nicotina ativa;
Mecanismo de ação: Promovem liberação contínua de nicotina, promovendo absorção correspondente a 75% da
dosagem total dos adesivos;
Efeitos adversos: irritação cutânea (eritema, prurido, edema e bolhas  o que responde ao uso de corticoide
tópico), além de insônia, hipersalivação, náuseas e vômitos;
Como usar: aplicados pela manhã, ao acordar, em área coberta sem pelos (entre o pescoço e a cintura), sendo
trocados a cada 24 horas, com a orientação de se alternar os locais de aplicação.
Posologia: utilizam-se doses decrescentes de nicotina,
Dose inicial: 21 mg e finalizando com o de 7 mg. Costumam-se usar de 2 a 4 caixas de 21 mg e, em sequência, 2-4
caixas de 14 mg e 1-2 caixas de 7 mg. Dependendo do grau de dependência e do progresso da pessoa, pode-se
prolongar ou abreviar o uso dessas medicações. A dose máxima é de 42 mg/dia (2 adesivos de 21 mg), e a data
para parar de fumar deve coincidir com o início do tratamento.
Observações
Gomas e pastilhas  usar até 12 semanas
Adesivos  usar até 8 a 10 semanas.
 O uso dessas medicações pode ser prolongado conforme critério médico;
 Evitar o consumo de cigarro com concomitância aos medicamentos de TRN, já que pode ter efeito
sinérgico e aumentar a concentração de nicotina, maior do que o indivíduo estava acostumado antes de
iniciar o tratamento, podendo levar a efeitos colaterais prolongados e dificultar o resultado adequado;
A TRN deve ser utilizada com cautela em pessoas coronariopatas (especialmente nos primeiros 14 dias após
infarto agudo do miocárdio) ou em portadores de arritmias graves. No entanto, estudos prévios já indicaram que
a TRN pode ser, de fato, utilizada com segurança em indivíduos cardiopatas crônica, não aumentando a
gravidade da doença cardiovascular.

MEDICAMENTOS NÃO NICOTÍNICOS PARA CESSAÇÃO DO TABAGISMO

VARENICLINA (Champix®, medicação de primeira linha)


Mecanismo de ação:
 agonista parcial dos receptores nicotínicos a4b2
 impede a ligação da nicotina aos receptores nicotínicos;
 agonista parcial  liberação de dopamina ao se ligar ao receptor, em quantidades menores que a nicotina.
É também considerada terapia de primeira linha para cessação do tabagismo.
A pessoa deve estabelecer uma data para parar de fumar, o que ocorre uma semana após o início da vareniclina e
recomenda-se o uso por 12 semanas.
O prolongamento do uso por mais 12 semanas (totalizando 24 semanas) pode reduzir o risco de recaídas.
Posologia:
 1ª ao 3° dia: 1 cp (0,5 mg), 1 vez ao dia;
 4° ao 7° dia: 1 cp (0,5 mg) de 12/12 h;
 8° dia até o final do tratamento: 1 cp (1 mg) de 12/12 h.
Contraindicações: hipersensibilidade à vareniclina e insuficiência renal grave.
Efeitos colaterais:
 náusea  mais frequente (em até um terço das pessoas)
 Intensa no início do tratamento  tende a diminuir
 Pode resultar em interrupção do tratamento em 3% dos casos
 Outros efeitos colaterais (> 10%): aumento do apetite, sonolência, tontura, mudança no paladar, vômitos,
constipação, diarreia, distensão abdominal, desconforto estomacal, flatulência, boca seca, fadiga, dispneia e
rinorreia. Há relatos de ocorrência de sonhos vívidos, humor depressivo, agitação, ideação e
comportamento suicida, sobretudo em pessoas com antecedentes psiquiátricos. Caso isso ocorra, suspender
a medicação imediatamente.

BUPROPIONA (Zyban®, Zetron®, Wellbutrim®, Bup®, é uma medicação de primeira linha)


 Antidepressivo atípico que inibe a recaptação da dopamina e da noradrenalina no cérebro.
 É rapidamente absorvida após a ingestão, atingindo pico plasmático em 3 horas, com meia-vida de 19
horas.
 A metabolização é principalmente hepática, com excreção renal.
Posologia:
 Dose inicial de 150 mg/dia durante os 3 primeiros dias;
 4° dia até o final do tratamento  300 mg/dia, divididos em duas tomadas diárias, e intervalo mínimo de 8
horas.
 Não ingerir a segunda dose após as 19 horas  ao risco de insônia.
 Em pessoas idosas com insuficiência renal ou hepática, a dose plena pode ser reduzida para 150 mg/dia.
Recomenda-se o uso por até 12 semanas
Efeitos colaterais: os mais comuns incluem sensação de boca seca e insônia, cefaleia, tontura e aumento da
pressão arterial; outros menos frequentes são convulsões, náuseas, vômitos, enxaqueca, dor abdominal e
constipação.
Contraindicações
Absolutas: epilepsia ou história de convulsões prévias (inclusive, convulsão febril na infância) ou anormalidades
reconhecidas no EEG, tumores do SNC, traumatismo craniano e uso de inibidor da MAO nos últimos 15 dias;
Relativas: evitar uso concomitante com carbamazepina, cimetidina, barbitúricos, fenitoína, antipsicóticos,
teofilina, corticosteroides sistêmicos, hipoglicemiantes orais/insulina; pessoas em uso de outros antidepressivos ou
benzodiazepínicos ou com hipertensão arterial não controlada.
Deve-se marcar uma data para interromper o consumo de cigarros, o que ocorre geralmente entre o 10° e o 14° dia
após o início da bupropiona.

NORTRIPTILINA (medicação de segunda linha)


Mecanismo de ação: é um antidepressivo tricíclico que promove o bloqueio da recaptação de noradrenalina no
SNC, aumentando seus níveis na fenda sináptica. Em relação ao efeito antitabagismo ainda não está totalmente
esclarecido, mas as evidências sugerem que esse efeito é independente da sua ação antidepressiva.
Posologia: dose recomendada  75 a 100 mg/dia, por 8 a 12 semanas.
A dose deve ser iniciada com 25 a 50 mg/ dia, de preferência à noite, e aumentada, gradualmente, se necessário e
tolerada.
Efeitos adversos: boca seca, sonolência e, retenção urinária.
Exige cautela ao ser prescrita para cardiopatas e portadores de arritmias, uma vez que pode promover
taquicardia sinusal e prolongamento do intervalo QT.
Obs: Pode ser usado combinado ao adesivo  ação antitabagismo combinada com redução dos níveis de
ansiedade**

CLONIDINA (Atensina®, medicação de segunda linha)


Mecanismo de ação:
acredita-se que seu efeito antitabagismo esteja relacionado ao alívio dos sintomas da síndrome de abstinência.
Posologia: a dose recomendada é de 0,1 mg/dia, com incremento gradual até 0,4 mg/dia.
Efeitos colaterais: sedação e hipotensão arterial;
suspensão abrupta  efeito rebote com crises hipertensivas.
A pessoa deve ser orientada a parar de fumar 2 a 3 dias após o início da medicação, que deve ser prescrita por até 3
a 4 semanas.

Outros métodos
 hipnose, acupuntura, cigarros artificiais sem droga, aromaterapia, entre outros.
 Não existem evidências científicas suficientes para comprovar a eficácia desses métodos.
 Nenhum desses métodos é recomendado para a cessação do tabagismo.
IMPORTANTE (considerações finais)
 Tratamento farmacológico  iniciado com monoterapia, não se deve iniciar com combinação de
medicamentos;
 Antes da prescrição, deve-se obrigatoriamente avaliar a existência de contraindicações para as medicações
antitabagismo (avaliar condições clínicas prévias, comorbidades ou os medicamentos já em uso pela
pessoa), para evitar o aparecimento de efeitos colaterais indesejados e iatrogenias.
 Tabagismo é uma doença crônica, prevalente, com tratamento eficaz disponível.
ABORDAGEM EM SAÚDE MENTAL PELO MFC
A abordagem emocional requer que o médico não só compreenda os critérios de diagnóstico, mas que seja capaz
de acolher com sensibilidade sinais e sintomas das pessoas. A abordagem emocional se traduz pela descrição dos
sentimentos associados aos fatos, já que o afeto é um facilitador para a compreensão e a elaboração do que está
ocorrendo. A forma mais simples de abordagem emocional em uma consulta é:
- Perceber as emoções que estão em jogo.
- Reconhecer na emoção uma oportunidade de compreensão do que está ocorrendo no íntimo da pessoa,
para estabelecimento de uma relação de confiança com o profissional.
- Ouvir com empatia, legitimando os sentimentos.
- Ajudar a pessoa a encontrar as palavras e a identificar a emoção que está sentindo.
- Explorar estratégias para solução do problema em questão.

Vantagens na integração do cuidado à saúde mental na APS:


 Diminuição dos custos no tratamento
 Diminuição do estigma ligado à doenças mentais  evita idas à especialistas
 Cuidado de saúde mental pode ser manejado no local aonde recebe os demais cuidados em saúde

Sobre a abordagem em saúde mental:


 Profissional precisa compreender os critérios diagnósticos
 Compreender com sensibilidade os sinais e sintomas das pessoas
 Como fazer a abordagem emocional:
o Perceber as emoções que estão em jogo.
o Reconhecer na emoção uma oportunidade de compreensão do que está ocorrendo no íntimo da
pessoa, para estabelecimento de uma relação de confiança com o profissional.
o Ouvir com empatia, legitimando os sentimentos.
o Ajudar a pessoa a encontrar as palavras e a identificar a emoção que está sentindo.
o Explorar estratégias para solução do problema em questão

Abordagem emocional: Descrição dos sentimentos associados aos fatos, já que o afeto é um facilitador para a
compreensão e elaboração do que está ocorrendo.

COLETANDO A HISTÓRIA E EXAMINANDO O ESTADO MENTAL


Cabe ao médico definir em que momento emocional a pessoa se encontra e avaliar se ela sabe ou não
definir qual é o problema. O médico precisa tornar o problema, caso ele não seja reconhecido pela pessoa, mais
acessível e orientá-las sobre as consequências negativas se eles não forem abordados. Deve-se ter uma abordagem
similar à abordagem centrada na pessoa: escuta feita na anamnese, avaliando e compreendendo a dimensão dos
problemas e quais as expectativas e sentimentos da pessoa sobre eles.
É necessário ter um tempo mínimo adequado, variável para cada situação e pessoa, a fim de entender tanto
a doença quanto a pessoa, com escuta interessada (verbal e não verbal, termos, pausas e silêncios), empatia, etc. É
fundamental um exame aprofundado do motivo da busca ao atendimento, pois dá pistas importantes sobre o fator
desencadeante.
A repercussão emocional de uma doença nunca deve ser menosprezada, necessitando ser levada em conta como
fator desencadeante de quadros emocionais diversos, seja ela uma simples gripe ou alguma doença orgânica mais
grave, pois pode levar a uma situação regressiva ou à vivência de algum tipo de perda. Deve-se investigar modos
anteriores de adoecer - como a pessoa adoeceu anteriormente, que sintomas teve, como lidou com eles, como saiu
ou não da situação, qual foi a medida que mais ajudou na ocasião.

EXAME DO ESTADO MENTAL


Deve-se avaliar a atenção, sensopercepção, representações, memória, orientação, consciência, pensamento (juízo,
raciocínio), linguagem, afetividade, inteligência e atividade voluntária (conduta).
Atenção: sofre alteração em quase todos transtornos mentais, havendo a aprosexia (ausência total de atenção), a
distração (dificuldades na fixação da atenção), a hipoprosexia (enfraquecimento acentuado da atenção, como nos
quadros depressivos) e a hiperprosexia (aumento quantitativo da atenção, como nos quadros paranoicos).
Sensopercepção: sensações e percepções. Sobre as sensações (efeito dos estímulos sobre os órgãos) temos
aumento de sensibilidade (hiperestesia), sua diminuição (hipoestesia), sua supressão completa (anestesia) ou a
redução da sensibilidade especificamente quanto à dor (analgesia). Já sobre a percepção (conhecimento consciente
de objetos exteriores) ilusões e aberrações perceptivas sensoriais.
Reapresentações: Reapresentações de percepções passadas através de produção de alucinações e
pseudoalucinações, em que o estímulo sensorial é percebido sem que tenha sido verdadeiramente produzido no
meio externo.
Memória: As alterações qualitativas ou quantitativas, entre as quantitativas se encontram a hipermnesia (sua
acentuação) e a hipomnesia ou amnesia (graus diferentes de perda da memória, por sua diminuição). A amnesia
pode ser anterógrada, para fatos recentes, ou retrógrada, aquela que acontece para fatos passados, anteriores ao
surgimento de um transtorno.
Orientação: noções de espaço e tempo. A desorientação pode ser autopsíquica (em relação a si próprio) ou
alopsíquica (em relação aos demais e ao ambiente).
Consciência: é um processo de coordenação e de síntese da atividade psíquica. A pessoa pode estar lúcida,
obnubilada (diminuição do grau de clareza do sensório, com lentidão da compreensão, dificuldades de percepção e
elaboração dos estímulos sensoriais) ou mesmo comatosa, geralmente acompanhada de manifestações
neurológicas. Podem ocorrer alterações na consciência do eu.
Pensamento ou Raciocínio: Pode ter pensar elementar (ideias vagas, casuais e irregulares, sem lógica ou
utilidade, como em alguns devaneios) a uma forma superior de pensar (como um ato reflexivo, uma sucessão
lógica de ideias, encadeadas coerentemente). O Juízo pode ter alterações resultantes em diversos tipos de delírio. O
pensamento tem diversas alterações:
Inibição do pensamento (geralmente associada à lentidão de todos os processos psíquicos e do curso do
pensamento) pode ser acompanhada de um sentimento subjetivo de incapacidade, com dificuldades na
compreensão e lentidão na articulação das respostas.
Fuga de ideias: uma perturbação da expressão do pensamento, sem que se consiga chegar a uma conclusão
do raciocínio.
Pensamento vago: um sintoma de difícil conceituação, mas que tem como características um pensamento
ambíguo, equívoco, obscuro.
Interceptação do pensamento, compulsão a pensar: “pensamentos que se atropelam dentro da cabeça”,
pressa de pensar.
Concretismo do pensamento: o pensamento incapaz de produzir conteúdo simbólico, pouco capaz ou até
mesmo incapaz de subjetivação.
Pensamento derreísta ou mágico: o oposto do pensamento realista, aquele baseado em dados da realidade.
Pensamento obsessivo: intromissão indesejável de um pensamento no campo da consciência de maneira
insistente e repetitiva, percebido pela pessoa como um incómodo ou mesmo como irreal.
Perseveração: repetição automática e frequente de representações verbais e motoras.
Pensamento prolixo: aquele tipo de pensamento que produz um excesso de conteúdos para uma ideia
relativamente simples, que poderia ser expressa com bem menos termos sem prejuízo do significado.
Pensamento oligofrênico: pensamento típico de quem apresenta dificuldades cognitivas, como aquelas
presentes no retardo mental (ver "Concretismo do pensamento").
Pensamento demencial: pensamento presente nos quadros demenciais, que se mostra desorganizado em
maior ou menor grau, incoerente, concreto, pouco ou nada realista.
Incoerência do pensamento.
Linguagem: é a forma de expressão do pensamento. Por essa razão, quando existem perturbações do pensamento,
elas se expressam na linguagem. As alterações orgânicas são a disartria (dificuldade de articular as palavras por
problemas nos músculos que intervêm na articulação da fala), a dislalia (que pode ser tanto orgânica quanto
funcional) e as afasias (incapacidade de expressar o pensamento por meio das palavras orais ou escritas). Entre as
principais alterações funcionais, encontra-se a logorreia/ taquilalia, que representa uma forma de incontinência
verbal, comum nos quadros de agitação psicomotora ou de hipomaníacos e maníacos, a bradilalia, que é a
diminuição da velocidade de expressão (como resultado de lentificação dos processos psíquicos). O mutismo
(ausência de linguagem oral).
Inteligência: avaliar o nível de escolaridade alcançado, a dificuldade ou a facilidade para alcançá-lo, as
habilidades laborais adquiridas apenas para tarefas mais simples ou atividades profissionais mais elaboradas e
complexas.
Afetividade: a capacidade de expressar sentimentos e emoções. As principais alterações poderão ser a hipertimia,
a hipotimia, a apatia ou indiferença afetiva, sentimentos de insuficiência (como na depressão, em que a pessoa se
desvaloriza), sentimentos de irritabilidade patológica, de instabilidade afetiva, de incontinência emocional ou
ambivalência. Os mais encontrados são a angustia ou a ansiedade.
Comportamento: Suas alterações poderão variar de estados de excitação motora, de ausência ou diminuição da
atividade motora.

Em resumo, ao realizar a abordagem da pessoa, o médico deve:


 Perceber a comunicação verbal e não verbal da pessoa que busca ajuda.
 Perceber a própria reação emocional imediata às comunicações da pessoa.
 Aprofundar o motivo do atendimento.
 Verificar a existência de conflitos/perdas.
 Questionar/relacionar com problemas orgânicos.
 Avaliar a situação de vida antes do conflito.
 Avaliar e descrever os achados do exame do estado mental.

LISTA DE PROBLEMAS DE SAÚDE MENTAL: Elaborar após a coleta da história, de modo a impedir que
problemas passem despercebidos.

CONSTRUINDO A HIPÓTESE DIAGNÓSTICA: fazer um estudo inicial, buscando ajuda nos livros, no CID e
CIAP e na troca de ideias com colegas, em vez de ceder à tentação fácil do encaminhamento. A forma mais fácil e
objetiva para o MFC é, inicialmente, fazer um diagnóstico sindrômico inicial, podendo-se e devendo-se ir um
pouco além para se obter uma compreensão mais ampla da pessoa em sofrimento. Essa compreensão é chamada
psicodinâmica, referindo-se à dinâmica psíquica em seu sentido mais amplo, ou seja, às formas habituais ou
principais de funcionamento daquela pessoa em várias áreas de sua vida, sejam elas pessoais (tanto objetivas,
quanto subjetivas), sociais ou profissionais.
Em resumo, para o estabelecimento de um plano inicial de abordagem, é preciso:
- Construir uma lista de problemas.
- Conhecer a história dos problemas e o tratamento prévio e corrente.
- Conceitualizar o caso/buscar classificar as queixas/diagnosticar.
- Estabelecer objetivos de curto e longo prazo.
- Selecionar a modalidade de tratamento, os objetivos e as intervenções.
- Estimar o tempo e a frequência do tratamento.
- Considerar necessidades de referenciamento e os recursos externos disponíveis.

PASSOS A SEGUIR NO MANEJO DA PESSOA COM TRANSTORNO MENTAL:


O plano de abordagem deve ser objetivo e adequado às hipóteses construídas e às circunstâncias presentes no
contexto do atendimento (nível intelectual, insight, motivação para o tratamento, recursos financeiros e de tempo,
etc.).

Plano diagnóstico: obter mais informações sobre a época e o contexto pessoal e profissional da pessoa no início de
sua doença. Entender a história da pessoa e como ela contribui para o quadro.

Plano terapêutico: entender a pessoa como um todo e verificar qual a melhor terapêutica para cada caso específico,
se a terapia deve ser individual, de grupo ou familiar, cognitivo-comportamental ou de orientação psicanalítica, se
deve utilizar medicamentos e qual o mais adequado, etc

Plano educacional: fornecer à pessoa e aos familiares a compreensão da doença e de seu prognóstico e quais
medidas podem ser tomadas em conjunto para melhorar e facilitar o manejo.

RESUMO DO PROCESSO DE AVALIAÇÃO:


 Conhecimentos básicos de psiquiatria e de temas de saúde mental.
 Motivação para o atendimento de problemas emocionais (atitude empática e compreensiva ao escutar).
 Coleta criteriosa de dados relevantes, iniciando pelo motivo da busca de tratamento atual (geralmente algum
tipo de perda ou ameaça de perda, real ou imaginada).
 Investigação do fator desencadeante da crise (início, contexto, evolução, significados para a pessoa).
 Listar sinais e sintomas presentes no momento e no passado.
 Faça mais perguntas abertas do que fechadas e específicas.
 Procure compreender e reconhecer as respostas da pessoa. Seja sensível às emoções da pessoa. Preste atenção
à linguagem corporal e ao tom de voz. Permita à pessoa expressar livremente suas emoções. Garanta a
confidencialidade das informações. Evite ser preconceituoso. Quando não souber o que dizer, aguarde em
silêncio, escutando ativamente. Pergunte mais do que dê respostas ou explicações, pelo menos no início da
entrevista. Esmiúce cada informação que pareça relevante, e as irrelevantes também. Coloque as informações
coletadas dentro de um contexto mais amplo, que envolva os sintomas, o tempo, as relações entre as pessoas,
etc. Quando quiser dizer algo, como um entendimento ou uma interpretação, e não tiver certeza de sua
correção ou momento (timing), faça-o na forma de pergunta. Ao dizer algo, faça-o como quem oferece, não
como quem impõe.
 - Uma vez de posse dos dados relevantes, pode-se fazer um diagnóstico inicial no mínimo sindrômico, com
base nos sintomas e no funcionamento mental predominante encontrado.
 Existem 4 padrões de manejo do MFC:
 O médico de família maneja sozinho a situação;
 Dá o atendimento continuado com o auxílio e apoio de um profissional de saúde mental;
 Encaminha a pessoa a um psiquiatra ou serviço psiquiátrico para consulta;
 Encaminha a pessoa a um psiquiatra para que este faça o seguimento ambulatorial ou hospitalar, se esse for o
caso.
 Sempre ter em mente que quem procura o entendimento, não procura um psiquiatra, e sim o terapeuta que
deveria existir dentro do MFC.

TRISTEZA, SENSAÇÃO DE DEPRESSÃO E PERTUBAÇÕES


Pessoas com tristeza e sintomas depressivos são muito comuns na APS, mas a forma de apresentação mais
frequente é uma mescla de sintomas: dor crônica vaga, sintomas ansiosos e depressivos.
Nas últimas décadas, é por meio do termo depressão que uma grande variedade de sintomas e situações de
sofrimento vem sendo definida. O MFC, na sua prática centrada na pessoa, precisa relativizar o diagnóstico de
depressão, assim corno faz com a maioria dos outros diagnósticos.
Para algumas pessoas e situações, sabe-se que pode ajudar o fato de haver um nome que defina um
problema. Por outro lado, a ideia de uma entidade bem delimitada chamada depressão, que existe em seu corpo
graças a um desequilíbrio neuroquímico, pode ser extremamente imobilizadora naqueles casos em que os sintomas
pedem mudanças na vida (na família, no trabalho, nas relações ou no comportamento). O uso excessivo do
diagnóstico de depressão também pode precipitar a utilização de medicamentos, que é a única opção terapêutica
denominada como antidepressiva.
O que pode ocasionar? A noção de causalidade ou etiologia pode não ser muito útil no caso das pessoas que
sofrem. O profissional da APS precisa levar em consideração todos esses aspectos e auxiliar cada pessoa a refletir
sobre sua própria condição e a encontrar suas próprias perguntas e respostas.
Apesar da heterogeneidade das narrativas de dor ou de sofrimento presentes na APS, há determinadas condições
que podem precipitar crises mais frequentemente.
Pessoas que expressam sofrimento na APS Quadros clínicos que podem apresentar sintomas
podem remeter a dificuldades muito comuns depressivos
da vida moderna
Desigualdades sociais - Falta de acesso a Hipotireoidismo - pedir tsh se houver aumento de peso em 30
condições mínimas de alimentação, moradia, dias, letargia, ressecamento da pele, constipação
saneamento e higiene, vestuário e transporte.
Violência - exposição indesejada a situações de Transtorno bipolar ou psicose afetiva - Alternância de 2 ou
coerção física ou psicológica mais episódios depressivos. O tratamento com antidepressivos
pode precipitar uma crise maníaca e aumentar a suspeita.
Luto - perdas ou doenças graves de familiares, Esquizofrenia - quadro inicial pode ser de embotamento,
pessoas próximas ou animais de estimação isolamento social e sonolência. Sintomas positivos como
delírios, alucinações e surtos psicóticos, ajudam no
diagnóstico diferencial.
Família - situações desconfortáveis no Demência - prejuízo na memória, orientação espacial e
relacionamento com parceiros, filhos, pais, cognitiva se destacam em relação aos sintomas depressivos,
irmãos ou outros mas um teste terapêutico pode ajudar.
Trabalho - condições laborais difíceis, Condições clinicas debilitantes - situações clinicas que cursam
relacionamento ruim com superior ou colegas, com fadiga e astenia podem ser confundidas ou mesmo
iminência de demissão ou fechamento da provocar perturbações depressivas. Anemias, neoplasias,
empresa, sensação de injustiça no doenças crônico degenerativas, insuficiência renal e cardíaca.
reconhecimento de seu desempenho
Serviços de saúde - dificuldade de acesso, mau -
entendimento, resposta inadequada às demandas
do usuário
Gravidez e puerpério - as complexas -
modificações provocadas na vida e no corpo da
mulher durante e após a gravidez estão
relacionadas com maior possibilidade de
sintomas depressivos, quadro que também tem
sido chamado de depressão pós parto.

O que fazer? A simples abordagem inicial, ao se fazer uma boa escuta e permitir que a pessoa exponha suas
inquietações, é suficiente para lidar com a maioria dos casos.
Talvez o maior desafio para as equipes de APS seja separar, já no primeiro atendimento, os casos muito graves
(apresentam sinais vermelhos apresentados no fluxograma abaixo), aqueles que precisarão de intervenções mais
precoces, daqueles que podem ser acompanhados com mais calma na sequência.
Suicídio: se há percepção de sofrimento intenso, mas a pessoa não verbaliza ter pensamentos suicidas, vale a pena
conversar sobre esse tema, explicar que são pensamentos recorrentes para a maioria das pessoas e mais ainda para
aqueles que passam por dificuldades, podendo ser bastante terapêutico.
O seguimento continuado é fundamental, especialmente para as pessoas com sintomas moderados e graves. E essa
é mais uma vantagem da APS em relação aos serviços especializados, porque os encontros entre os profissionais e
as pessoas que ele acompanha não são motivados apenas por um problema e ocorrem inúmeras vezes ao longo do
tempo por queixas diversas.
O acesso fácil a um profissional de atenção integral faz as queixas surgirem sem muita elaboração. A escuta e a
postura de interesse inicial contribuirão para que a pessoa já se sinta melhor naquele momento por dizer coisas
que, por alguma razão, estavam bloqueadas. Deverá privilegiar o "exame pelo paciente", ou seja, a própria pessoa
é quem deve chegar às conclusões, fazer as escolhas e tomar as decisões. Cabe ao médico ajudar a conduzir esse
momento, lançando mão das suas próprias habilidades e do que dispõe em sua rede de atenção.
A escolha do medicamento deve ser feita respeitando as necessidades do consultante e como parte de uma aliança
terapêutica em que o contexto de vida e do sofrimento sempre seja abordado. Na APS, é importante pensar o
medicamento para além do efeito químico e do efeito placebo; ele costuma fazer parte da comunicação com o
consultante no momento de encontrar um terreno comum para o manejo dos problemas ou sintomas.
Quando encaminhar? Naqueles casos em que há sinais de gravidade, os alertas vermelhos, ou quando há dúvidas
sobre o quadro clínico, como com a suspeita de psicose afetiva (transtorno bipolar) ou quando há sintomas
psicóticos, pode ser interessante contatar precocemente a equipe de saúde mental. Assim como quando há pessoas
que não melhoram após alguns meses de seguimento ou cujo estado se agrave muito.
PRINCIPAIS ERROS COMETIDOS:
-Rotular ou aceitar precocemente o rótulo de depressão sem explorar o contexto de sofrimento.
-Manter e renovar continuadamente prescrições de ansiolíticos e de antidepressivos sem aproveitar para rever a
indicação, os sintomas iniciais, os benefícios e malefícios do uso desses medicamentos.
-Atender repetidas vezes pessoas com dores crônicas vagas e mal-estar sem usar o tempo para aprofundar esse
sofrimento.
-Iniciar antidepressivos sem haver aprofundado minimamente os sintomas e o contexto de sofrimento;
-Evitar oferecer o antidepressivo como uma das opções terapêuticas.
-Naqueles casos em que o antidepressivo foi introduzido como opção terapêutica, utilizar uma dose inadequada ou
insuficiente para a melhora dos sintomas.
-Não solicitar apoio de outros profissionais da APS ou do NASF para situações graves ou que não apresentaram a
melhora esperada.
-Não conversar sobre o suicídio nos casos moderados e graves.
PROGNÓSTICOS E COMPLICAÇÕES:
O que se vê na prática da APS é uma heterogeneidade na forma de sofrer e nas implicações desse sofrimento para
a vida de cada um. Parece haver mudanças positivas na situação de vida daquela pessoa, que, de algum modo,
foram promovidas porque o mal-estar e a tristeza empurraram-na nesse sentido. Mas há também aqueles casos em
que esse sofrimento socialmente aceito, que tem sido geralmente sintetizado na ideia de depressão, pode
imobilizar as pessoas, mantê-las no mesmo lugar por muitos anos.
Vários estudos epidemiológicos têm encontrado uma maior morbidade e mortalidade por doenças crônicas e
agudas entre as pessoas com os chamados transtornos mentais do que em outros grupos.
O suicídio tem sido apontado como o desfecho indesejado de transtornos psiquiátricos (até 90% das pessoas que se
suicidam teriam algum diagnóstico psiquiátrico, e as perturbações depressivas representariam a maioria desses
casos).
ATIVIDADES PREVENTIVAS E DE EDUCAÇÃO:
Não há e nem nunca houve corno fugir do sofrimento e da frustração. Reconhecer a sua necessidade de prazer e as
limitações que se impõem a si mesmas e as impostas pela vida pode ajudar as pessoas.
TRANSTORNO DE ANSIEDADE
Ansiedade generalizada (AG) (CID10 F41.1, CIAP2 P74) é um distúrbio comum, cuja característica central é a
excessiva preocupação/ apreensão com diferentes eventos, associada a aumento da tensão. Pode acontecer de
forma isolada, mas geralmente ocorre com outros tipos de ansiedade e transtornos depressivos.
Princípios do cuidado para pessoas com AG
Informação e apoio para pessoas portadoras de AG:
• Construa uma relação terapêutica aberta, engajada e sem julgamento.
• Explore com a pessoa sob cuidado: - Suas preocupações, de forma a entender o impacto da AG, como um
todo. - Opções de tratamento, mostrando que a tomada de decisão é um processo compartilhado.
• Assegure que toda discussão ocorre em um contexto de respeito à confidencialidade, à privacidade e à
dignidade.
• Disponibilize informação adequada no nível adequado de entendimento para cada pessoa, sobre a
natureza da AG e o leque de tratamentos disponíveis.
• Promova e organize grupos de apoio na unidade de saúde e informe às pessoas a respeito.
Apoiando famílias e cuidadores:
• Quando familiares e cuidadores estão envolvidos no apoio a pessoas com AG, considere:
- Oferecer uma avaliação dos cuidados oferecidos pelos cuidadores e das eventuais necessidades de saúde física e
emocional.
- Negociar entre portador de AG e seus familiares e cuidadores sobre confidencialidade e o compartilhamento de
informações sobre sua saúde.
- Explicar como será feito o manejo e como familiares e cuidadores podem apoiar a pessoa com AG.
- Orientar o que fazer em situações de crise, e que nessas situações o paciente pode procurar a Clínica da Família
sem agendamento prévio.
MODELO ESCALONADO PARA O CUIDADO DA AG
PASSO 1: Todas apresentações reconhecidas e suspeitas de AG
Identificação: Identifique e comunique o diagnóstico de AG o mais rápido possível para a pessoa entender
o agravo e iniciar o tratamento efetivo prontamente. • Considere o diagnóstico de AG em pessoas que apresentem
ansiedade ou preocupação excessiva e naqueles que buscam frequentemente atendimento na atenção primária com:
- Problema crônico de saúde física, ou - Sem problema crônico de saúde física, mas preocupadas com a presença
de sintomas somáticos (particularmente em idosos e pessoas com cultura diferente da hegemônica), ou -
Persistente preocupação com uma ampla gama de diferentes questões.
Critérios diagnósticos para TAG:
Ansiedade e preocupações excessivas (expectativa apreensiva), ocorrendo na maioria dos dias pelo período
mínimo de 6 meses.
O indivíduo considera difícil controlar a preocupação.
A ansiedade e a preocupação estão associadas a três ou mais dos seguintes seis sintomas: - inquietação -
fatigabilidade - dificuldade em concentrar-se ou sensações de branco na mente - irritabilidade - tensão muscular -
alteração no sono.
O foco da ansiedade ou preocupação não está restrito a aspectos específicos de outro transtorno mental.
Avaliação: Fazer uma avaliação abrangente que não se baseie apenas no número, gravidade e duração dos
sintomas, mas, também, considere o grau de sofrimento e prejuízo funcional. Para pessoas com maior grau de
sofrimento ou prejuízo funcional, considere implementar intervenções do passo 3 de imediato. Abordagem dos
sintomas de AG em 4 passos:
1. Diferenciar ansiedade de inquietação/euforia/irritabilidade.
2. Avaliar a repercussão da AG na vida da pessoa: causa transtorno?
3. Esclarecer se a AG é o problema principal ou parte de problema adjacente (depressão, drogas).
4. Caracterizar o transtorno de ansiedade.
*Pessoas com AG e concomitante transtorno depressivo ou algum outro tipo de ansiedade: Tentar tratamento que
seja efetivo para ambas as condições. Se isso não for possível, tratar primeiro o transtorno que causa mais prejuízo
e sofrimento e que, tratado, muito provavelmente melhore o funcionamento global. • Em caso de dúvida, solicitar
apoio para equipe de matriciamento.
*Pessoas com AG com abuso de substâncias químicas: Estar consciente de que: - Abuso de substância pode ser
uma complicação de AG. - Uso não nocivo de substância não deveria ser contraindicação para o tratamento de
AG. - Uso nocivo ou abuso de substância sempre deve ser tratado ANTES, já que isso pode levar a uma
significativa melhora dos sintomas de AG. Em caso de dificuldade no manejo, solicitar apoio para equipe de
matriciamento.
Educação e monitoramento ativo: Disponibilizar medidas educativas para o paciente sobre a natureza da
AG e as opções de tratamento. Monitorar ativamente os sintomas e grau de funcionalidade da pessoa. Discutir o
risco do uso de medicações e preparações que não tenham segurança cientificamente estabelecida e explique o
potencial de interações com medicamentos prescritos.
PASSO 2: AG diagnosticada que não melhorou após passo 1
Intervenção psicológica de baixa intensidade
Às pessoas com AG cujos sintomas não tiveram melhora com orientações e monitoramento ativo do passo 1,
oferecer um ou mais dos seguintes como uma primeira linha de intervenção, de acordo a preferência das pessoas:
- Consultas frequentes focadas em acolhimento, escuta, auxílio na resolução de problemas e em superar
pensamentos catastróficos. Podem ter curta duração.
- Participação em grupos de convivência (socialização, troca de experiências, aumenta autoestima), Academia
Carioca, ou atividade física não supervisionada.
- Grupos de saúde mental (podem ter profissional do matriciamento, baseado em terapia cc).
PASSO 3: AG com prejuízo funcional, ou que não tenha melhorado com passo 2:
Opções de tratamento
Para pessoas com pronunciado prejuízo funcional ou para aqueles cujos sintomas não responderam
adequadamente às intervenções do passo 2, oferecer:
- Psicoterapia realizada por profissional de saúde mental: A terapia cognitivo-comportamental tem maior
evidência de benefício. Se a Clínica da Família tiver rodas de Terapia Comunitária ou grupos terapêuticos para
transtornos mentais, podem ser oferecidos como alternativa. Ou discutir o caso no matriciamento e oferecer
sessões de psicoterapia breve com o profissional matriciador em atendimento conjunto.
- Tratamento farmacológico: Oferecer ISRS, de preferência a fluoxetina, por estar disponível na REMUME.
Com os ISRS, especialmente com a fluoxetina, pode haver piora inicial dos sintomas. Nesse caso, um curso breve
de benzodiazepínico para alívio dos sintomas (2-4 semanas, apenas) pode ser útil. Monitorar cuidadosamente os
efeitos adversos. Não oferecer antipsicóticos para tratamento de AG na APS
Orientar sobre os potenciais benefícios e desvantagens de cada forma de tratamento, incluindo a tendência de o
tratamento farmacológico estar associado com efeitos adversos e síndromes de abstinência.
Basear escolha do tratamento nas preferências pessoais do paciente, já que não há provas de que uma forma
(psicoterapia ou tratamento farmacológico) seja melhor do que a outra.
*Antes de prescrever qualquer medicação, discuta sobre as opções de tratamento e preocupações eventuais sobre a
pessoa tomar medicamentos. Explicitar completamente as razões para a prescrição e disponibilizar informações
sobre: - Probabilidade de benefícios dos diferentes tratamentos. - As diferentes propensões a efeitos adversos,
síndrome de abstinência e interação farmacológica de cada droga. - O risco de excitação com ISRS e IRSN, com
sintomas, como aumento da ansiedade, agitação e problemas com o sono. - O desenvolvimento gradual, após uma
semana ou mais, do completo efeito ansiolítico. - A importância de tomar o medicamento exatamente conforme
prescrito e a necessidade de continuar o tratamento farmacológico após a remissão para evitar recaída.

Manejando riscos e efeitos adversos:


-Levar em conta o risco aumentado de sangramento associado com ISRS, particularmente em idosos ou pessoas
que estejam tomando outros fármacos que causem irritação na mucosa gastrointestinal ou interfiram na
coagulação. Nessas circunstâncias, considere prescrever um protetor gástrico.
-Para pessoas com idade < 30 anos para as quais tenha sido prescrito um ISRS ou IRSN: - Alertá-los de que esses
fármacos são associados com um aumento do risco de ideação suicida e automutilação em uma pequena minoria
de pessoas < 30 anos, e - vê-los dentro de uma semana após a primeira prescrição, e - Monitorar o risco de ideação
suicida e automutilação semanalmente, durante o primeiro mês.
-Para pessoas que desenvolverem efeitos adversos logo após iniciar o tratamento farmacológico, prestar
informações e considerar uma das seguintes estratégias: - Monitorar de perto os sintomas (se os efeitos adversos
são leves e aceitáveis para a pessoa), ou - Reduzir a dose do fármaco, ou - Suspender o fármaco e, de acordo a
preferência pessoal, oferecer: • Fármaco alternativo, ou • Encaminhamento para psicoterapia. -Rever a efetividade
e efeitos adversos do fármaco a cada 2 – 4 semanas, durante os primeiros 3 meses de tratamento e, depois disso, a
cada 3 meses.
- Se um medicamento é efetivo, oriente para continuar tomando-o por ao menos um ano, pois a possibilidade de
recaída é alta.
Manejando uma resposta inadequada às intervenções do passo 3
Se a pessoa com AG não respondeu à psicoterapia, oferecer um tratamento farmacológico.
Se a pessoa com AG não respondeu satisfatoriamente ao tratamento farmacológico, oferecer psicoterapia ou um
fármaco alternativo ainda não utilizado.
Se a pessoa com AG teve resposta parcial ao tratamento farmacológico, considerar oferecer psicoterapia em
conjunto com o tratamento farmacológico.
Discutir outras alternativas com a equipe de matriciamento.
Quando encaminhar para o nível secundário de atenção
-Considerar encaminhamento para o passo 4 se a pessoa tiver ansiedade severa com acentuado prejuízo funcional
em conjunto com: - Risco de suicídio ou de automutilação, ou - Comorbidade importante, tais como abuso de
substâncias, transtorno de personalidade ou problema complexo de saúde física, ou - Autonegligência, ou -
Inadequada resposta às intervenções do passo 3.
-Em casos selecionados, o encaminhamento para o nível secundário pode ser substituído pelo atendimento e
acompanhamento conjunto com a equipe de matriciamento.
PASSO 4: AG complexa, refratária ao tratamento e pronunciando prejuízo funcional ou alto risco de
automutilação.
Avaliação: Oferecer uma avaliação especializada de necessidades e riscos, incluindo:
- Duração e gravidade dos sintomas, prejuízo funcional, comorbidades, risco para si e de autonegligência.
- Uma revisão dos tratamentos anteriores e os atuais, incluindo adesão a medicamentos previamente prescritos e a
psicoterapia, bem como seu impacto sobre sintomas e prejuízo funcional.
- Ambiente doméstico.
- Apoio na comunidade.
- Relacionamento e impacto sobre a família e cuidadores.
Rever as necessidades das famílias e cuidadores e oferecer avaliação dos seus cuidados, necessidades de
saúde física e mental se algo assim não foi oferecido previamente.
Desenvolver um plano de cuidado abrangente em colaboração com o paciente com AG, que atenda
necessidades, riscos e prejuízo funcional e tenha um projeto terapêutico claramente definido.
Tratamento: Informe às pessoas com AG para as quais não foram oferecidas as intervenções dos passos 1 a 3 ou
que as tenham recusado, sobre o potencial benefício dessas intervenções e ofereça alguma que não tenha sido
tentada (combinações de psicoterapia e tratamento farmacológico, combinação de antidepressivos ou aumento da
dose de antidepressivos – mesmo que não tenha efetividade comprovada).
*Tratamentos combinados deveriam ser prescritos apenas por especialistas em prescrição de psicotrópicos para
AG complexa e refratária ao tratamento, sempre após uma discussão com a pessoa sobre vantagens e desvantagens
do tratamento sugerido. Exceção é feita ao uso combinado de antidepressivo e benzos no início do tratamento e em
situações de crises, ressaltando que o uso de benzodiazepínicos deve ocorrer apenas por curtas durações e em
pacientes sem risco elevado para dependência química.
TRANSTORNO DE PÂNICO (TP)
Princípios para o atendimento a pessoas com TP:
Tomada de decisão compartilhada e prestação de informações:
A tomada de decisão compartilhada entre paciente e equipe de saúde deverá estar presente durante o diagnóstico e
durante todas as fases do cuidado.
Para facilitar a tomada de decisão:
- Disponibilizar informações embasadas cientificamente sobre o tratamento.
- Fornecer informação sobre a natureza, curso e tratamento do TP, incluindo o uso de fármacos e a respectiva
probabilidade de efeitos adversos.
- Discutir eventuais preocupações sobre tomar medicamentos, tais como medo de dependência.
- Considerar a preferência e experiência pessoal e resultados de tratamentos anteriores.
- Encorajar a participação em grupos de apoio e de autoajuda.
Linguagem: Utilize linguagem cotidiana, sem jargões. Explicite os termos técnicos. Quando apropriado,
disponibilize material escrito em linguagem adequada ao nível de compreensão da pessoa.
Papel do matriciamento: Em qualquer momento do acompanhamento pode ser solicitado apoio da equipe de
matriciamento para auxílio no diagnóstico ou na implementação das intervenções terapêuticas.
PASSO 1: Reconhecimento e diagnóstico do TP:
Habilidades de consulta: Um alto padrão de habilidade na técnica de consulta é necessário, de tal forma que uma
abordagem estruturada pode ser utilizada para o plano de diagnóstico e de manejo.
Diagnóstico: Deve-se interrogar sobre informações relevantes, tais como contexto familiar, história pessoal,
automedicação, outras características individuais que possam ser importantes em cuidados subsequentes.
-Ataques de pânico ou crises de pânico são o aparecimento de sintomas, como palpitações, sudorese de
extremidades e palidez, associados à ansiedade intensa, de causa psicológica. São extremamente comuns, podendo
ocorrer em qualquer transtorno de ansiedade ou mesmo em pessoas sem história de transtornos de ansiedade.
-Só passam a caracterizar um transtorno do pânico quando aparecem de forma espontânea, sem um claro
desencadeante, ao menos uma vez. O ataque de pânico é muito mais frequente que o TP.
-No TP, pelo menos um ataque deve ter sido acompanhado das seguintes características: preocupação persistente
com ataques adicionais, preocupação com as implicações do ataque ou com suas consequências (perder o controle,
ter um ataque cardíaco etc.), e alteração significativa do comportamento relacionada com as crises.
-Pode ser diagnosticado com ou sem agorafobia, que é a ansiedade de estar em locais ou situações de onde possa
ser difícil ou embaraçoso escapar ou onde o auxílio possa não estar disponível, na presença de sintomas de pânico.
Comorbidades: Estar alerta a comorbidades. São muito comuns em tais quadros. Identificar os principais
problemas, por meio de diálogo com a pessoa. Deixar clara a sequência cronológica dos problemas para
determinar as prioridades entre as comorbidades – desenhando uma linha do tempo para mostrar quando os
diferentes problemas foram sendo desenvolvidos.
Quando pessoas consultam em serviços de emergência com ataques de pânico: Se uma pessoa apresenta-se
com ataque de pânico, essa pessoa deve: - Ser interrogada se já recebeu tratamento para TP. - Fazer investigação
mínima necessária para excluir problema físico agudo. - Em geral, não ser internada em leito clínico ou
psiquiátrico. - Ser encaminhada para a APS para o acompanhamento subsequente, mesmo se o contato inicial foi
no serviço de emergência. - Receber informações apropriadas, por escrito, sobre ataques de pânico e por que tais
pacientes estão sendo encaminhados para a atenção primária.
PASSO 2-4: Manejo do TP na Unidade de Saúde:
Passo 2: Oferecer tratamento na Unidade de Saúde
As intervenções que podem ser oferecidas incluem:
- Psicoeducação (explicar o que é o ataque e o transtorno do pânico, explicar que é um transtorno muito comum e
que provoca muito desconforto, mas que tem tratamento eficaz);
- Estímulo à atividade física (reduz sintomas de ansiedade e melhoram qualidade de vida, assim como alimentação
saudável, cessação do tabagismo e diminuição do consumo de cafeína);
- Orientações para o automanejo no ataque de pânico (Ensinar ao paciente a questionar a fundamentação lógica
dos pensamentos que surgem durante o ataque, reforçar o caráter passageiro da crise (10-30 minutos), técnicas de
relaxamento podem ser úteis e devem ser ensinadas ao paciente);
- tratamento farmacológico (As melhores evidências são para tratamento farmacológico com inibidores seletivos
da recaptação da serotonina (ISRS) e antidepressivos tricíclicos)
Oferecer ISRS, caso não haja melhora em 12 semanas, considerar imipramina ou clomipramina
Informar paciente sobre: efeitos adversos (podem ser evitados começando com doses mínimas e aumentando
gradualmente) e sintomas de retirada/abstinência, atraso no tempo da ação, tempo de tratamento, seguir
exatamente a prescrição;
- encaminhamento para psicoterapia (cognitivo comportamental, preferencialmente).

Monitorar:

Sintomas de retirada/interrupção de antidepressivos:


-Apesar de antidepressivos não estarem associados com tolerância e dependência, sintomas de abstinência podem
ocorrer em caso de falta de uma dose, suspensão ou mesmo redução de dose do fármaco. Esses sintomas
geralmente são leves e autolimitados, mas, ocasionalmente, severos, particularmente se o fármaco for
interrompido abruptamente.
-Os sintomas mais comumente experimentados são: tontura, parestesias (dormência e formigamento), problemas
gastrointestinais, cefaleia, sudorese, ansiedade e distúrbios do sono.
-Devem procurar aconselhamento com seu MFC se os sintomas de retirada forem significativos.
-Suspensão abrupta de antidepressivo pode causar sintomas de retirada. Por isso, a dose deverá ser reduzida
gradualmente num período estendido de tempo.
-Sintomas leves de interrupção/retirada: reassegurar ao paciente e monitorar os sintomas.
-Sintomas severos de descontinuação/retirada: considerar reintroduzir o antidepressivo (ou prescrever outro da
mesma classe com meia vida mais longa, em especial a fluoxetina) e reduzir gradualmente a dose enquanto
monitora os sintomas.
PASSO 5: Cuidado para pessoas com transtorno de pânico em serviços de saúde mental
Reavaliar o portador de TP, seu ambiente e seu contexto social, considerando: - Tratamentos anteriores, incluindo
aceitação e efetividade. - Uso de qualquer substância, por exemplo, nicotina, álcool, cafeína e droga de recreação. -
Comorbidades. - Funções do cotidiano. - Rede de relacionamentos. - Fatores contínuos de estresse crônico. - Papel
de sintomas agorafóbicos e de evitação (esquivamento).
Realizar uma avaliação de risco global.
Desenvolver um plano apropriado de manejo de risco (necessário mais de 1 contato para isso).
Considerar: - Tratamento das comorbidades. - Resolução estruturada de problemas. - Exploração completa da
farmacoterapia. - Suporte-dia, para aliviar cuidadores e membros da família. - Referenciamento para atenção
secundária ou terciária para avaliação, aconselhamento ou manejo.
* Assegurar comunicação acurada e efetiva entre os profissionais de saúde de atenção primária e secundária
envolvidos, particularmente MFC e equipe e serviços de saúde mental, se há alguma condição crônica de saúde
que também requeira um manejo ativo.
DEPENDÊNCIA DE ÁLCOOL
No mundo, cerca de 4% das mortes (6,2% para homens e 1,1 % para mulheres) são atribuídas ao álcool, mais do
que HIV/ Aids ou tuberculose.
Estudos demonstram que aproximadamente 20% das pessoas que buscam um serviço de saúde primário bebem em
um nível considerado de alto risco, pelo menos em uso abusivo. E o principal transtorno mental nos diversos
níveis assistenciais, devendo estar em igual prioridade ao problema da hipertensão na atenção primária. Está,
principalmente, relacionado ao sexo masculino, em especial, a adultos jovens, porém, em crescente escala no sexo
feminino. Entre os jovens, o álcool está envolvido com absenteísmo (se ausentam com frequência) escolar,
vandalismo, problemas com a polícia, traumas e com atividade sexual de risco. Caso o foco do cuidador esteja
voltado apenas para as doenças clínicas decorrentes do uso danoso, muitos não terão o problema identificado.

Principais teorias para compreensão do uso prejudicial do álcool entre as pessoas


Teorias psicológicas: estão relacionadas aos efeitos prazerosos do álcool como relaxamento, aumento da
autoestima, diminuição da dor psicológica relacionadas a baixas doses.
Teorias psicodinâmicas: associam a alguns usuários de álcool uma fixação na fase oral do desenvolvimento
psicossexual.
Teorias comportamentais: consideram a importância das recompensas relacionadas à utilização do álcool e a suas
contribuições na decisão em beber novamente.
Teorias socioculturais: baseiam-se na observação de grupos sociais e a influência de seus costumes sobre o uso do
álcool.
Teorias antropológicas: sugerem a modificação do papel da bebida alcoólica nos ritos grupais, transitando de uma
função periférica no encontro social à função central do ritual. A transição é bastante clara nas falas entre homens:
"Vamos tomar uma?"
Teorias genéticas: são apoiadas por estudos que demonstram maiores riscos de problemas com o álcool entre
familiares próximos de pessoas dependentes, entre irmãos gêmeos de dependentes e entre crianças adotadas
advindas de pais dependentes.
Teorias biológicas: têm demonstrado que a baixa resposta aos efeitos do álcool encontrada em algumas pessoas,
independentemente de parentesco, seria um fator preditivo de futuros problemas com o álcool.
O que fazer?
Os profissionais de saúde, em sua maioria, não estão preparados para a identificação e o manejo dos problemas
relacionados ao consumo de álcool. O problema costuma ser identificado em estágios avançados, quando já
diminuíram as chances de recuperação do usuário e sua reinserção na vida social. Na maioria dos casos, a ação se
restringe ao tratamento das complicações sem intervir na causa base, desperdiçando a oportunidade de abordar o
uso abusivo do álcool.
ANAMNESE
O consumo do álcool deve ser abordado na consulta de forma respeitosa, tentando estabelecer vínculo e uma
relação de confiança com o usuário. A investigação tem que ser aprofundada o suficiente para se determinar o
padrão atual do consumo (quantidade, frequência e repercussões na vida da pessoa), além de investigar história
pregressa e familiar. Para isso, questionários foram criados para orientar as perguntas e são capazes de detectar o
uso abusivo e estabelecer critérios para o padrão do consumo, sendo assim, mais efetivos que os exames
laboratoriais. O CAGE é um questionário curto e, por isso, pode ser utilizado largamente como triagem. Sua sigla
é composta por palavras-chave de cada pergunta do teste e duas ou mais respostas positivas indicam uso abusivo
do álcool.
Questionário CAGE – rastreamento do abuso de álcool!
C: Alguma vez você sentiu que deveria diminuir (cut down) a quantidade de bebida ou parar de beber?
A: As pessoas o(a) aborrecem (annoyed) ao criticar o seu modo de beber?
G: Você sente-se culpado(a)/chateado(a) (guílty) pela maneira como costuma beber?
E: Você costuma beber pela manhã (eye-opener) para diminuir o nervosismo ou a ressaca.
*Duas ou mais respostas positivas indicam abuso do álcool.
EXAME FÍSICO
O exame físico deve ser completo assim como é realizado em pessoas que não fazem uso abusivo do álcool.
Alguns achados (como tremores, telangiectasias e elevação da pressão) reforçam a hipótese de uso excessivo
crônico de álcool, incluindo sintomas da síndrome de abstinência.
EXAMES COMPLEMENTARES
Em geral, a utilidade dos testes laboratoriais para o diagnóstico do abuso de álcool é limitada. Porém, tem um
importante papel para a vigilância de complicações orgânicas decorrente do álcool e para o usuário se perceber em
acompanhamento, o que lhe dá segurança e estímulo para as metas a serem alcançadas. Assim como o exame
físico, nenhuma alteração precisa estar presente para confirmar o diagnóstico. As alterações comumente esperadas
são a macrocitose, elevação das transaminases e da gama-GT.
Cerca de 90% dos alcoolistas têm macrocitose (VCM entre 100 e 110 fL) antes mesmo da anemia aparecer.
(geralmente induzida pela ingestão regular de 80 g/dia de álcool).
A doença hepática alcoólica pode estar associada a uma série de alterações laboratoriais. O padrão mais comum de
alterações hepáticas em pessoas com hepatite alcoólica é a elevação desproporcional da AST (TGO) comparada
com a ALT (TGP). Esta razão é geralmente superior a 2,0, valor raramente visto em outras formas de doença
hepática.
A elevação do gama-glutamil-transferase (gama-GT) é um indicador precoce da disfunção hepática. Pode ser
evidenciada mesmo antes das alterações clínicas. O gama-GT também é usado como marcador de abstinência em
pessoas em tratamento.
Outra ferramenta para identificar possível ingesta crônica de grande quantidade de álcool é a aferição dos níveis
séricos da transferrina deficiente de carboidrato (CDT). Com alta especificidade (até 90%), possui um desempenho
melhor que outros marcadores para o álcool, como gama-GT e VCM. Porém, esse teste é menos disponível devido
a sua relação custo-benefício.
CONDUTA PROPOSTA
O cuidado oferecido às pessoas que consomem álcool pode ser organizado por etapas. A prevenção será a primeira
linha de cuidado e consiste nas diversas ações políticos-legais e educativas.
Os indivíduos em situações de urgência e emergência relacionadas a episódios de intoxicação e abstinência devem
ser cuidados segundo o exposto abaixo.
QUADRO CLÍNICO (intoxicação alcoólica) CONDUTA PROPOSTA
Euforia, excitação e alterações leves da atenção. Manter o ind. em ambiente calmo e monitorar sinais vitais
Incoordenação motora leve e alteração do humor, Manter o ind. em ambiente calmo e monitorar sinais vitais
da personalidade e do comportamento.
Incoordenação motora pronunciada com ataxia, Monitoramento dos sinais vitais, cuidados intensivos à
diminuição da concentração, piora dos reflexos manutenção das vias aéreas livres, observação do risco de
sensitivos e piora do humor. aspiração do vômito
Piora da ataxia, náuseas e vômitos. Internação, cuidado à manutenção das vias aéreas livres,
observação do risco de aspiração do vomito e administração
IM de tiamina
Disartria (dificuldade de articular as palavras de Internação, cuidados gerais para manutenção da vida e adm de
maneira correta), amnésia, hipotermia e analgesia tiamina IM.
(estágio I)
Coma, morte (bloqueio respiratório central) Emergência médica, cuidados intensivos para manutenção da
vida, seguir diretrizes apropriadas para abordagem do coma.

TRATAMENTO DA SÍNDROME DE ABSTINÊNCIA ALCOOLICA (SAA)


SAA nível I (ttt ambulatorial e internação hospitalar) 1ª semana do TTT.
Trata-se da SAA leve e moderada. Ela aparece nas primeiras 24 horas após a última dose. Instala-se em 90% dos
pacientes e cursa com agitação, ansiedade, tremores finos de extremidades, alteração do sono, da senso percepção,
do humor, do relacionamento interpessoal, do apetite, sudorese em surtos, aumento da frequência cardíaca, pulso e
temperatura. Alucinações são raras.
Cuidados gerais
-Esclarecimento adequado sobre SAA para a pessoa e familiares.
- Retornos frequentes ou visitas da equipe no domicílio por 3 a 4 semanas.
-Contraindicação da condução de veículos durante o uso de benzodiazepínicos.
- Dieta leve ou restrita e hidratação adequada.
- Repouso relativo em ambiente calmo desprovido de estimulação audiovisual.
- Supervisão de familiar.
- Encaminhamento para emergência se observar alteração da orientação temporoespacial e/ou do nível de
consciência.
FARMACOTERAPIA
-Tiamina/dia: 300 mg intramuscular;
- Sedativos: depende do caso  Diazepam: 20-40 mg/dia ou clordiazepóxido: 100-200 mg/dia, VO ou Lorazepam
(hepatopatia associada): 4-8 mg/dia, VO.
2ª e 3ª semana
-Redução gradual dos cuidados gerais
-FARMACOTERAPIA - Tiamina: 300 mg/dia, VO;
-Sedativos: redução gradual
SAA nível II (ttt com internação hospitalar) 1ª semana do ttt
É a SAA grave. Cerca de 5% dos pacientes evoluem do estado I para o II. Isso se da cerca de 48 horas após a
ultima dose. Os sinais autonômicos são mais intensos, os tremores generalizados, apresentam alucinações
auditivas e visuais e desorientação temporo-espacial.
Cuidados gerais
-Repouso absoluto;
- Redução do estímulo audiovisual - Monitoração da glicemia, dos eletrólitos e da hidratação;
- Dieta leve ou jejum;
- Monitoração da evolução sintomatológica pela CIWA-Ar (Quando o indivíduo apresenta a SAA é aconselhável
aplicar a Clinical Withdrawal Assessment Revised (CIWA-Ar). Trata-se de uma escala com 10 itens, cujo escore
final classifica a gravidade da SAA e fornece subsídios para o planejamento da intervenção imediata).
FARMACOTERAPIA
-Tiamina/dia: 300 mg, intramuscular aumentar a dose em caso de confusão mental, ataxia, nistagmo (síndrome
de Wernicke).
-Sedativos: Diazepam: 10·20 mg, VO, a cada 1h ou clordiazepóxido: 50-100 mg, VO, a cada 1h ou Lorazepam:
2-4 mg, VO, a cada 1 h.
Obs: Se necessário, administrar diazepam intravenoso, 1 O mg, em 4 min, com retaguarda para o manejo de
parada respiratória.
2ª e 3ª semana
-Redução gradual dos cuidados gerais
-FARMACOTERAPIA - Tiamina: 300 mg/dia, VO
-Sedativos: redução gradual.

ABORDAGEM PARA USUÁRIOS CRÔNICOS DE ÁLCOOL


Excetuando-se situações de urgência e emergência como abuso agudo de álcool (intoxicação) e a síndrome da
abstinência, já explicados acima, para os indivíduos que desenvolvem problemas crônicos, o tratamento deve ser
ofertado com níveis crescentes de intensidade, restrições e custos. O indivíduo cujos problemas demonstrarem
melhora junto à atenção primária, por meio das diversas abordagens que serão detalhadas a seguir, não necessita
de outros níveis assistenciais. Caso o problema se perpetue ou progrida, é necessária uma nova pactuação entre o
usuário, a equipe de atenção primária e outros níveis assistenciais.
TTT não farmacológico
Existe uma variedade enorme de "ferramentas" à disposição dos profissionais de saúde da atenção primária para o
cuidado de usuários de álcool. Entre estas, as não medicamentosas são as mais acessíveis e de menor custo. Deve-
se enfatizar a melhor efetividade de estratégias múltiplas que combinem os interesses da pessoa e as competências
dos cuidadores.
Exemplos de TTTs não farmacológicos:
1. Família, amigos e redes sociais;
2. Espiritualidade, religiosidade e religião Os aspectos-chave relacionados a esse tipo de cuidado são: apoio
social, tratamento igualitário e aceitação livre de julgamentos. O envolvimento espiritual da pessoa auxilia a
pessoa a se interessar a participar de grupos de apoio (como AA);
3. Redução de danos  A abordagem de redução de danos envolve, entre outros, intervenções breves e entrevistas
motivacionais. Estudos empíricos têm demonstrado que as ações de redução de danos são tão efetivas quanto às
orientadas por abstinência;
4. Intervenção breve (IB) é um atendimento com tempo restrito, cujo foco é a mudança de hábito. O passo a
passo da intervenção breve será descrito abaixo por meio da abreviação FRAMES, que significa "enquadramento"
da pessoa à metodologia. O benefício da IB para consumidores de risco já está bem definido, sendo recomendado
para a atenção primária. A IB é a estratégia com melhor custo-benefício para reduzir o consumo e os
problemas relacionados ao álcool. Nível de evidencia A;
5. Programas de recuperação em 12 passo Entre os diversos programas está o Alcoólatras Anônimos (AA)
(nível de evidência A);
6. Plantas ansiolíticas e sedativas Chás de camomila e de folha do maracujá, entre outros, podem aliviar os
sintomas ansiosos relacionados à abstinência. (nível de evidencia D)
7. Acupuntura  Não há estudos com qualidade para recomendação com base científica para (A) acupuntura;
8.Nutrição  Intervenções precoces sobre o estado nutricional do usuário com danos hepáticos pode melhorar
resposta ao tratamento, aliviar sintomas e promover qualidade de vida;
9.Outras  Meditação, biofeedback, HyPNOSIS, guided imagery, ioga (D)
Passo a passo da intervenção breve (IB)
F: Feedback (devolutiva) Comunicar os resultados da avaliação clínica e de instrumentos como o AUDIT (teste
diagnóstico), com esclarecimento sobre o seu nível de risco para problemas de saúde física, mental, familiares e
sociais.
R: Responsibility (responsabilidade) Pode-se apresentar o contexto complexo de corresponsabilidade nos
problemas relativos ao consumo do álcool na sociedade. É importante estabelecer o estágio de mudança em que a
pessoa se encontra, responsabilizando-a de suas decisões. Nesse momento, podem-se definir metas coerentes com
o desejo do indivíduo, enfatizando o autocuidado.
A: Advice (aconselhamento) Corresponde às orientações e às recomendações que o profissional deve oferecer à
pessoa, fundamentadas no conhecimento empírico atual, sendo estas claras, diretas e desvinculadas de juízo de
valor moral ou social, que preserve a autonomia de decisão da pessoa.
M: Menu (menu de opções)  Fornecer à pessoa um "cardápio" de alternativas de ações que possam ser
implementadas por ela e pela equipe de saúde.
E: Empathy (empatia)  O profissional deve comunicar-se com o usuário de forma empática, solidária e
compreensiva.
S: Self-efficacy (autoeficácia) Reforçar o otimismo e a autoconfiança da pessoa, enfatizando seus avanços nas
metas estabelecidas.

TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
O tratamento farmacológico apresenta papel coadjuvante na abordagem terapêutica do uso abusivo do álcool. O
seu principal efeito não é alcançar a abstinência e sim ajudar na sua manutenção e na prevenção de recaídas. A
pessoa deve ser orientada sobre o uso devido das medicações e seus efeitos e receber apoio da família e da equipe
de saúde para a adesão ao tratamento. Naltrexone, dissulfiram e acamprosato são as principais medicações para o
tratamento farmacológico do uso abusivo do álcool (ABEAD). Esses fármacos não constam na Relação Nacional
de Medicamentos Essenciais fornecidos pelo Sistema Único de Saúde (RENAME), dificultando o acesso dos
usuários a esse tipo tratamento na APS.
Dissulfiram
É indicado para os usuários que necessitam alcançar a abstinência, porém, não é recomendado para aqueles que
desejam o consumo moderado na estratégia de redução de danos. É o primeiro medicamento aprovado pela FDA
para tratamento do alcoolismo. O dissulfiram inibe o aldeído-desidrogenase e, quando usado associado ao álcool,
aumenta os níveis de acetaldeído, provocando reações desagradáveis como palpitações, rubor, náuseas e vômitos
(efeito antabuse). A dose habitual é de 250 mg/dia.
Naltrexona
É indicada quando se deseja alcançar o consumo moderado, e a abstinência não é necessária. A naltrexona é um
antagonista opióide utilizado na dose habitual de 50-100 mg/dia com duração de 3 a 4 meses e pode estender-se de
acordo com cada caso. É necessário o acompanhamento de função hepática.
Acamprosato
É indicado para reduzir os sintomas da abstinência. O acamprosato é um coagonista de receptores de glutamato,
não apresenta efeitos no humor, na concentração, na atenção e no desempenho psicomotor. A dose habitual varia
entre 1.300-2.000 mg/dia, divididos em 3 tomadas, por um período de 3 a 12 meses.
Considerações
É importante analisar a necessidade do uso de antidepressivos e ansiolíticos para a redução de sintomas psíquicos,
pois podem contribuir para a diminuição do desejo do consumo. Isso reforça a estratégia de redução de danos que
considera o uso do álcool dentro do contexto maior dos problemas da vida.
Atualmente, há fármacos, como o topiramato, o ondansetron e o baclofen, que estão em estudo e se mostram
promissores no tratamento do uso abusivo do álcool.
Quando encaminhar??
Detectado o problema com o uso do álcool e estando a pessoa disposta a parar de beber, o profissional de saúde
deve considerar:
-Necessidade de desintoxicação e suas opções na rede: centros de desintoxicação, tratamento ambulatorial,
acompanhamento residencial;
-Avaliação de transtornos psiquiátricos associados;
-Farmacoterapia para ajudar a abstinência e a prevenção de recaídas;
-Consulta de programas que contribuem para manutenção da abstinência: CAPS, AA, entre outros.
Uma vez a pactuação estabelecida e a pessoa mantém ou agrava o problema, esta deve ser encaminhado para uma
avaliação especializada. Essa atitude poderá auxiliar na adesão ao tratamento e manutenção do vínculo, tendo em
vista o papel relevante da equipe multiprofissional em saúde mental. É importante ressaltar que após a referência, a
equipe de saúde da família permanece responsável pelo acompanhamento do tratamento deste usuário.
São indicações de tratamento hospitalar
Depressão com ideação suicida, comorbidades clínicas ou psiquiátricas não controladas, situação do lar
extremamente instável, falta de resposta ao tratamento ambulatorial.
Pessoas que durante o tratamento apresentam sintomas leves a moderados de abstinência podem ser acompanhadas
de forma segura e eficaz na atenção primária. Porém, se for desejo do usuário, pode ser encaminhado a algum
centro de referência para estar em ambiente livre de estímulos e evitar a recaída.
Serviços de referência
A expansão da rede segue os desígnios da reforma psiquiátrica brasileira. Como referência na rede há os centros de
apoio psicossocial - álcool e drogas (CAPS-AD), um serviço que trabalha com uma equipe multiprofissional
(médico clínico, psiquiatra, terapeuta ocupacional, psicólogo e assistente social) e atende pessoas com transtornos
decorrentes do uso e da dependência de álcool e de outras drogas. Atua sob a lógica do território, realiza atenção
matricial oferecendo suporte à equipe de saúde da família na elaboração do projeto terapêutico dentro da própria
comunidade, além de utilizar a estratégia de redução de danos. Funciona diariamente com atendimento individual
(medicamentoso e psicoterápico), atendimento em grupos (como oficinas terapêuticas de trabalho, cultura e lazer),
visitas domiciliares, condições para repouso e desintoxicação ambulatorial, buscando, dessa maneira, a
reintegração social, familiar e comunitária.
PROGNÓSTICO E COMPLICAÇÕES POSSÍVEIS
Os problemas relacionados ao uso abusivo do álcool trazem graves consequências físicas e psíquicas ao indivíduo,
interferindo nas suas relações sociais e familiares. Dentre as causas sociais de morbimortalidade associadas ao
álcool, destacam-se acidentes de trânsito, violência/homicídios inter e intragênero, que estão diretamente
relacionados à dose ingerida. As principais complicações físicas que acarretam maior morbimortalidade são as
doenças hepáticas como a cirrose e as psiquiátricas como os transtornos de humor, que podem levar ao suicídio.
Além disso, são também complicações do álcool:
-Cardiovasculares: hipertensão, cardiopatia isquêmica, arritmias e miocardiopatias;
-Gastrintestinais: diarreia crônica, pancreatite, hepatite alcoólica, cirrose, insuficiência hepática, gastrite aguda,
cânceres gástrico, esofágico e hepático, refluxo esofágico, esôfago de Barrete lacerações de Mallory-Weiss;
-Neuropsiquiátricas: demência de Korsakoff, delirium tremens, convulsões, cefaleia, distúrbios do sono, déficit de
memória, neuropatia periférica e transtornos psiquiátricos;
-Outras complicações: desnutrição, disfunção sexual, síndrome alcoólica fetal, desemprego, violência e disfunção
imunológica que pode acarretar tuberculose.

IMPORTANTE
Pessoas que fazem uso abusivo do álcool, ao se abster ou diminuir a quantidade habitual ingerida, podem
apresentar sinais e sintomas como agitação, tremores, vômitos e alterações do humor, caracterizando a síndrome
de abstinência do álcool (SAA). Essa síndrome pode ter intensidade influenciada por fatores genéticos, pelo
padrão de consumo, pelo gênero, por características individuais e por fatores socioculturais. Por isso, é importante
estabelecer o diagnóstico e definir a gravidade para oferecer os devidos cuidados.

CUIDADOS NECESSÁRIOS NA SAA


Não deve ser feito  Hidratar indiscriminadamente; Administrar glicose; Administrar clorpromazina ou fenil-
hidantoína. Aplicar diazepam intravenoso, sem recursos para reverter uma possível parada respiratória.
MANEJO DAS COMPLICAÇÕES
Convulsões  Diazepam: 10-30 mg/dia, VO, ou 10mg/IV na crise;
Delirium tremens  Diazepam: 60 mg/dia, VO, ou lorazepam: 12 mg/dia, VO. Associar, se necessário,
haloperidol: 5 mg/dia, VO, ou clonidina: 0,1-0,2 mg/dia, VO.
Alucinose alcoólica  Haloperidol: 5 mg/dia
Estágios motivacionais do paciente para cessar o consumo do álcool
Pré-contemplação, contemplação, preparação, ação, manutenção e recaídas.
Critérios diagnósticos para SAA segundo a OMS
1.Deve haver evidência clara de interrupção ou redução do uso de álcool, após uso repetido, geralmente
prolongado e/ou em altas doses.
2.Três dos sinais a seguir devem estar presentes:
-Tremores da língua, pálpebras ou das mãos quando estendidas; -Sudorese; -Náusea, ânsia de vômitos ou vômitos;
-Taquicardia ou hipertensão; -Agitação psicomotora; -Cefaleia; -Mal-estar ou fraqueza; -Alucinações visuais,
táteis ou auditivas transitórias; -Convulsões tipo grande mal.
Obs: Se o delirium está presente, o diagnóstico deve ser estado de abstinência alcoólica com delirium (delirium
tremens) (CID 10 F10.4), sem ou com convulsões (F10.40 e 41).
CIAP 2
P 15 ABUSO CRÔNICO DO ÁLCOOL
P 16  ABUSO AGUDO DO ÁLCOOL

SOMATIZAÇÃO E SINTOMAS SEM EXPLICAÇÃO MÉDICA


Sensações somáticas anormais são comuns na vida das pessoas. Estudos apontam que a maioria das pessoas tem
uma sensação somática anormal a cada sete dias.
Sensações físicas anormais, além de serem causadas por alterações somáticas normais ou por doenças somáticas,
também podem estar associadas a diferentes tipos de sofrimento emocional. E um fato bem conhecido que tristeza
ou angústia, sentimentos frequentes na vida humana, têm um componente físico: um aperto no peito, o corpo
dolorido, dificuldade de respirar ou um grande cansaço. Também, os transtornos mentais mais frequentes (as
síndromes ansiosas e depressivas) são acompanhados de diversos sintomas físicos, tais como cansaço, astenia,
fadiga, palpitações, dores, dispneia, sudorese de extremidades, entre outros.

Somatização
Pode ser descrita como sintomas físicos difusos, pouco definidos, para os quais não se verificam alterações
anatomopatológicas que os justifiquem, frequentemente rejeitados pelos profissionais e cujos portadores são
denominados pejorativamente de "poliqueixosos" e são importante causa de busca de atendimento em pessoas com
sofrimento emocional. Ou, em outras palavras, são sintomas físicos os quais não se encontram explicações
médicas que os justifiquem e nem constituem um quadro clínico específico, mas seriam de origem emocional.
Estes sintomas podem ter sua origem nos pensamentos disfuncionais e emoções fortes que abalam o sistema
psíquico.
A prevalência de sofrimento emocional dentre os usuários atendidos em unidades gerais de saúde é muito alta.
Diversos estudos no Brasil apontam que cerca de 50% dos usuários atendidos por equipes da atenção primária e da
estratégia de saúde da família (ESF) apresentam esse tipo de sofrimento, sendo que, em média, 35% deles têm
alterações de intensidade grave, preenchendo critérios para transtornos mentais diversos.
Ao se estudar a demanda de saúde mental na atenção primária, podem-se perceber dois subgrupos de
somatizadores:
1) Aqueles em que a somatização é um fenômeno de características agudas, associadas a sofrimento emocional
inespecífico, e transtornos mentais comuns (TMC) como ansiedade e depressão;
2)Aqueles em que a somatização é um processo psicopatológico estruturado, de curso crônico, com evolução e
prognóstico frequentemente negativos.

Somatizadores agudos
São pessoas que, em situações de sofrimento emocional, procuram seus médicos ou outros profissionais da
atenção primária como fonte de apoio e cuidado. Geralmente uma parcela grande desses quadros remite
espontaneamente. A consulta é um espaço de apoio e esclarecimento, e as queixas físicas são parte do sofrimento
emocional da pessoa que está sob cuidados. Mesmo que nenhum transtorno físico ou mental esteja presente, essas
queixas podem surgir e necessitam ser acolhidas. A abordagem centrada na pessoa permite que os médicos de
família acolham os sofrimentos e problemas dos usuários e ajudem na busca de soluções.
Outro tipo de indivíduos desse subgrupo são os portadores de transtornos mentais comuns. Diversos estudos
demonstram que, na atenção primária, as queixas somáticas são os principais sintomas trazidos ao médico pelos
portadores dos TMC. É uma importante parcela dos usuários atendidos em unidades gerais, com uma prevalência
mundial média em torno de 23%. São pessoas com transtornos ansiosos e depressivos, com queixas físicas
associadas, em que se verifica a presença de eventos estressantes associados. Esses pacientes tendem a ser mais
recentes e a reagirem positivamente à abordagem de seus problemas pessoais, apesar de suas queixas físicas
múltiplas. Nesses casos, além do acolhimento e da escuta, é necessário diagnosticar corretamente e tratar os
transtornos mentais associados, geralmente transtornos ansiosos e depressivos. Os sintomas costumam ser físicos,
associados à ansiedade ou à depressão, como taquicardia, dispneia suspirosa, dores originárias de contratura
muscular tensional, tais como cefaleia, dor lombar ou cervical, astenia, dores nas pernas, aperto no peito e
alterações de sono e apetite. O uso de medicação adequada, quando indicado, geralmente remite a sintomatologia
física e psicológica e permite a retomada das rotinas de vida. A associação dos sintomas com o sofrimento
emocional e os eventos estressores a eles relacionados pode ser abordada por meio de técnicas terapêuticas
específicas da atenção primária, como terapia de reatribuição e de resolução de problemas.
Somatizadores crônicos
São os que apresentam transtornos mais graves, que incluem os portadores de transtornos somatoformes e
dissociativos, segundo a CID-10 ou o DSM-IV e aqueles com as chamadas síndromes funcionais, como
fibromialgia, colón irritável, dores pélvicas e torácicas atípicas e fadiga crônica, entre outras, cuja interação entre o
sofrimento mental e as alterações orgânicas permanecem bem pouco compreendidas. Esses usuários diferenciam-
se dos que apresentam queixas mais passageiras por um maior risco de se tornarem crônicos, por desenvolverem
grave comprometimento de suas atividades sociais e profissionais, frequentemente recusando associação entre
suas queixas e seus problemas psicossociais e não aceitando as explicações de seus médicos e por evoluírem
aderidos ao papel de doentes com importante ganho secundário. Também nesses casos, é alta a comorbidade com
transtornos depressivos e ansiosos, muitos de intensidade grave, complicando a evolução e o tratamento.
É frequente a comorbidade entre diversas síndromes funcionais, como fibromialgia, fadiga crônica e síndrome do
colo irritável, o que aumenta os questionamentos sobre serem estas diferentes manifestações de um único processo
patológico em que a somatização desempenhe importante papel. Em geral, seus portadores apresentam uma série
de queixas somáticas em comum, que incluem fadiga, dor no corpo todo, cefaleia, alterações gastrintestinais,
alterações de memória e de sono, ansiedade e depressão.

TRANSTORNOS SOMATOFORMES  SINTOMAS FÍSICOS PARA OS QUAIS NÃO SE ENCONTRA


EXPLICAÇÃO MÉDICA ADEQUADA (O PACIENTE REALMENTE ESTÁ SENTINDO)

Transtorno dissociativo\conversivo  presença de 1 ou mais sintomas neurológicos não explicados por


transtorno médico conhecido e as apresentações clínicas podem ser:
sensoriais (ex. ficou cego após ver sua namorada o traindo; queixas de parestesias);
motores, convulsivos, mistos/ miscelânea.
Há duas características que são marcantes na maioria desses casos: representam simbolicamente o conflito
inconsciente envolvido no surgimento do sintoma e, para que tal processo seja possível, necessita envolver
funções corticais superiores, abrangendo apenas sintomas conversivos (motores voluntários, alterações de pares
cranianos e de sensibilidade) e/ou dissociativos (afetam nível e conteúdo da consciência, incluindo pseudocrises
epiléticas). Assim sendo, geralmente envolvem quadros de surdez, cegueira, afasia, paralisias, paresias, anestesias,
parestesias, desmaios.

Transtorno de somatização Diferentemente de somatização e os somatizadores (agudos e crônicos), para dizer


que uma pessoa apresenta transtorno de somatização deve haver (Kaplan psiquiatria)  sintomas múltiplos que
não podem ser adequadamente explicados com base em exames físicos e laboratoriais, podem ser encontrados em
consultórios de cardiologistas, gastroenterologistas, etc, e tem apresentação clínica (necessidade da presença dos 4
sintomas) definida por:
1. Sintomas dolorosos múltiplos;
2. Sintomas GI (não dolorosos);
3. Sintomas sexuais (não dolorosos);
4. Sintomas pseudoneurológicos (vertigem, etc).

Hipocondria  Preocupação ou crença de alguma doença grave, com base na interpretação errônea de sinais ou
sensações físicas, essa interpretação errônea é uma sensação supervalorizada -> hipervigilância -> grande
preocupação. Essas pessoas reinterpretam, com características de pensamento prevalente ou, raramente, delirante,
sensações somáticas normais como indicadoras de uma patologia grave, geralmente única, bem definida e letal,
tais como Aids ou câncer.
O que pode ocasionar esses sintomas ?
Como o tema deste capítulo são os sintomas sem explicação médica, fica difícil definir, com clareza, o que os
"ocasiona". Há evidente contribuição de fatores emocionais, mas há outros fatores de risco que se sabe estar
associados a esses diversos quadros. No grupo dos somatizadores agudos, dois principais padrões se associam à
presença de queixas médicas inexplicáveis: o cultural e o de atribuição.
-Padrão de atribuição  Quando as pessoas apresentam qualquer queixa ou sintoma somática ou mesmo
sintomas psíquicos anormais, costumam construir explicações para essas sensações, o que é definido como
"modelo explicativo". Esses "modelos explicativos" são parte fundamental da maneira e das atitudes tomadas
pelos usuários, podendo, por exemplo, motivar a busca de um médico para sua solução, quando compreendidos
como indicativos da presença de patologia somática. Essa decisão vai depender desses modelos explicativos e são
denominados padrões de atribuição. Assim, dependendo da atribuição feita a esse sintoma, o indivíduo vai, ou não,
buscar atendimento médico para essa queixa, que então se tornará um sintoma, parte inicial do processo de
atendimento médico.
-Fatores genéticos;
-Fatores culturais ambientes onde há pouca expressão de sentimentos; Diversos estudos demonstraram que a
expressão dos transtornos psíquicos varia de cultura para cultura, e que esse fato deve ser considerado na sua
análise;
-Fatores psicodinâmicos  forte componente emocional e individual;
-Baixo apoio social Apresentar uma doença pode ser uma forma bastante eficiente, em especial na ausência de
outras formas de se conseguir apoio social, de se ter atenção e ajuda Rede de apoio pessoal insuficiente, com
isolamento social, tem sido relacionada ao aumento da procura de serviços médicos como forma de apoio, à piora
da evolução de patologias mentais em geral e à diminuição da capacidade das pessoas de resistir a problemas na
esfera psicossocial;
-História de doença na infância A somatização crônica também tem sido associada à história de adoecimento
frequente (ou ter parentes com doenças incapacitantes) na infância, com um reforço ao papel de doente causado
pelo aumento da atenção que ocorre quando há doença física e pela identificação com figuras doentes.
-Trauma e abuso físico e sexual  Verifica-se, em um subgrupo dos somatizadores crônicos, uma alta
frequência de relatos de traumas físico ou psicológico e de abusos sexuais, em especial, relacionados a queixas de
dor, que se destacam nesses casos. As queixas somáticas inespecíficas têm sido associadas a distúrbio do estresse
pós-traumático. A adaptação ao trauma envolve diversos mecanismos aos quais se incluem processos como
somatização, dissociação e desregulação dos afetos, que devem ser diagnosticados para a melhor elaboração de
soluções terapêuticas. A relação existente entre ter um evento estressante e o surgimento de transtornos mentais é
conhecida. Os somatizadores têm uma capacidade de estruturação de "respostas neutralizadoras" diminuída, ou
seja, sua capacidade de "fazer algo" contra o evento lesivo, conduta que normalmente diminui o impacto de
eventos estressantes, apresenta-se restrita.

O PAPEL DO PROFISSIONAL NA APS E DO SISTEMA DE SAÚDE


As queixas somáticas inespecíficas representam uma demanda complexa, pois, na maioria das vezes, os
profissionais não conseguem diagnosticar uma patologia que as justifique, o que leva a inúmeras investigações
clínicas e encaminhamentos a diversos especialistas. Essa conduta traz, além do alto custo associado a esses
usuários, maiores riscos de iatrogenia e uma insatisfação de ambos os protagonistas da relação médico-pessoa,
terminando por tornar o tratamento um campo de batalha fadado ao insucesso.
Reilly e colaboradores no Reino Unido demonstraram que os problemas estão mais nos profissionais que nos
usuários. Os indivíduos apresentam queixas psicológicas, falam de seus problemas, entremeados com as queixas
físicas sem explicação médica. Mas os médicos só valorizam as queixas físicas, e esse processo de cuidado reforça
a apresentação de somatizações. Goldberg e Huxley e Brasil já destacaram como as queixas somáticas funcionam
como um passaporte para o atendimento médico, pois queixas psíquicas normalmente provocam reações de
afastamento e abandono por parte dos profissionais.
É sempre importante, no caso de qualquer indivíduo somatizador, proceder a uma cuidadosa anamnese e a um
exame físico de rotina. A anamnese deve sempre procurar compreender o universo psicossocial da pessoa. O
exame físico (e também a anamnese) serve para descartar causas médicas pouco evidentes e também doenças
físicas que possam estar presentes, já que o status de somatizador não isenta alguém de também apresentar
doenças com explicação médica. Quanto aos exames complementares, esses devem ser parcimoniosos e
cuidadosos. Exames negativos em geral não servem para convencer somatizadores crônicos, e os agudos, em
geral, já se sentem assegurados com um bom diálogo e um atento exame físico.
 O MFC não deve pedir mais exames do que os faria para qualquer pessoa, somatizadora ou não.

CONDUTA PROPOSTA
A correta detecção dos transtornos mentais comuns, principalmente depressão e ansiedade, é fundamental para o
correto manejo dos somatizadores. A grande maioria dos portadores de queixas médicas inexplicáveis na atenção
primária à saúde (APS) do Brasil são portadores desses quadros, que apresentam seu sofrimento sob a forma de
queixas físicas. Nesses casos, quando indicada e apropriada, a medicação antidepressiva e ansiolítica é
fundamental.
Cuidar adequadamente de pessoas com queixas somáticas sem explicação médica só é possível a partir da
superação do modelo biomédico, cartesiano, tradicional, de cuidado, com a construção de uma abordagem
centrada na pessoa, de cunho integral, que permita que espaços para falar e lidar com o sofrimento emocional
estejam presentes na consulta. Para que isso seja possível, é necessário trabalhar com a narrativa do indivíduo e
utilizar técnicas terapêuticas adaptadas para o ambiente da atenção primária.
Nesse contexto, destaca-se especialmente a técnica de reatribuição delineada por Goldberg e Gask. A reatribuição
refere-se a um processo de abordagem de pessoas com sofrimento emocional/ transtorno psíquico que buscam
cuidados na atenção primária, geralmente com sintomas físicos sem explicação médica. Essas queixas,
apresentadas muito frequentemente, acabam por representar uma barreira para o cuidado adequado ao sofrimento
emocional. Elas desviam o foco das consultas para exames e possíveis doenças físicas a serem detectadas quando,
na verdade, representam uma forma de apresentar o sofrimento emocional difuso, geralmente com sintomas mistos
de ansiedade e depressão, associados a problemas psicossociais importantes, típicos da atenção primária, distintos
da forma como as síndromes psiquiátricas se apresentam em unidades especializadas.

ETAPAS DA TERAPIA DA RETRIBUIÇÃO


1.Sentindo-se compreendido  fazer anamnese ampliada e exame físico focado na queixa, com valorização das
crenças da pessoa;
2.Ampliando a agenda  dar feedback à pessoa, com recodificação dos sintomas e vinculação destes com eventos
vitais e/ou psicológicos.
3.Fazendo o vinculo  construir modelos explicativos que façam sentido para a pessoa.
4.Negociando o tratamento  construir, em conjunto com a pessoa, um projeto terapêutico ampliado.

Trabalhar com terapias alternativas e complementares e grupos


Essas técnicas permitem que espaços de acolhimento e elaboração do sofrimento psíquico sejam organizados em
moldes coletivos, que têm se revelado bastante efetivos no cuidado a essas pessoas. Elas incluem
relaxamento/exercício físico, estratégias de grupo e terapia comunitária.

Condutas para somatizadores crônicos


São frequentes fontes de estresse e frustração para o MFC. Geralmente apresentam síndromes funcionais
associadas e têm prognóstico reservado por serem aderidos ao papel de doente. Isso acarreta um sentimento de
frustração nos cuidadores, que, na maior parte das vezes, é causado pela recusa do usuário em aceitar a ausência de
causa orgânica, questionando a origem psicológica dos sintomas.
Fica implícito para eles que sempre há algo que o médico não consegue descobrir. Dessa forma, o que compete no
manejo dessas pessoas à Medicina de Família e Comunidade?
Como as mudanças nessas pessoas são lentas, a resistência para abordar seus problemas emocionais é grande, e a
contratransferência que costumam suscitar em seus cuidadores é bastante negativa, trazendo sentimentos
desagradáveis de rejeição e irritação. O compartilhamento do cuidado com profissionais especialistas em saúde
mental, portanto, faz-se necessário. No entanto, é importante ressaltar que essas pessoas não devem perder o
vínculo com seus médicos de família, os quais devem ser capazes de identificar situações de agudização e ter
mecanismos de coordenação do cuidado, administrando as referências, em especial, para os especialistas em saúde
mental, mantendo urna comunicação com esses profissionais.
Ao identificar um somatizador crônico, o MFC deve considerar o encaminhamento, mas deve fazê-lo no momento
correto, para evitar prejuízo do vínculo terapêutico. O encaminhamento deve ser cuidadosamente preparado, por
meio da reatribuição das queixas para que o tratamento pela equipe de saúde mental faça sentido para a pessoa.

Quando e como encaminhar


As principais características que indicam a necessidade de encaminhamento são a presença de quadros de
depressão e ansiedade que superem o escopo da Medicina de Família e Comunidade, de sintomas obsessivo-
compulsivos e de sintomas psicóticos. Deve-se sempre utilizar, quando disponível, o recurso do apoio matricial em
saúde mental (matriciamento), em especial a consulta conjunta, já que, por meio dela, uma conduta compartilhada
e dialogada pode ser particularmente benéfica para a pessoa com sintomas sem explicação médica.

QUESTÕES
1- Melhor opção para tratamento medicamentoso de quadros de ansiedade: Sertralina
2- Sobre medidas para cessar o tabagismo: Bupropiona (segundo Fagerstrom da paciente já pode entrar com
medicamento).
3- Tratamento de depressão: Sertralina
4- Método diagnóstico para alcoolismo: AUDIT (CAGE é rastreio e Audit diagnóstico)
5- 6- Questões sobre como lidar com pacientes somatizadores (muito óbvias)

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