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- árabe não se estenderia tanto para o Norte. Mais me parece que <í:hamar meu sogro e sogra Qerido Amor a\enbre~se das falas que Je dei não
essa excitação genésica é devida ao amortecimento do espírito .são intrijisses não dichese de cartas são papeiz.
.que alem de eu istar longe de longe faso perto só se a menina não não amor
religioso, e que o segrêdo da transformação do carácter libidinoso ·.perteito bira amor
desta gente estaria na propaganda religiosa inteligente e aturada, Amor
a qual, pelo correr do tempo, iria modificando a sua índole. Dezejaya mandarlhe o meu retrato odepois de boce me prometese que
Justifica esta afirmação o número diminuto de quadras reli- .Mandam e o seu tambem que eu não sou intrujão. não? alem destar longe ãon
':11lío faso escrobo da minha palabra.
giosas, o que contrasta com o Cancioneiro de S, Simão, onde elas Menina aceite um abraso cheiu de saudades!
se encontram abundantemente. .deste Seu amor que eide amar ate a Morte
:Só se bose não quizer.
Nos costumes e nos hábitos há grande diferença, do baixo não se importe
Minho para Celorico. Por exemplo: o conceito de propriedade é .de eu Ronper Sola;
muito mais respeitado em terras de Basto do que em Famalicão. .que quem anda a gosto não cansa.
.Amor. Amor! Só em me alenbiar Amor já meu Cura cão jel fica milho r.
Outra coisa que me chamou a atenção foi a forma garrida
Amor Qerido
como as raparigas de Celorico, com os seus vestidos claros, com
•responda a estas du linha mal nutada que a vão encontrar de uma perfeita
as faces córadas, respirando saúde por todos os poros, contrasta saude que a minha fica sendo boa graças a Deus.
com as mulheres de S. Simão, que vestem quási sempre de preto, Allior com isto adeuz.
.adeuz-amor adeuz nãote cera macar maiz. espero bolta por correio o quanto
enfezadas e pálidas. Emfim, a obra das fábricas, que mataram a 'mais brebe melhor. Se eu fico anciozo por resposta areceber Sem ter tua carta
alegria e a beleza das mulheres de Famalicão. i Que diferença elas outra não posso escreber.
Baite carta nas azas do
fazem das do tempo em que viviam no campo e só para o campo ·Roissinol bai o meu amor maiz
e nada mais! lindo que ainda debaixo da
Roda do Só!
baite carta feliz carta nas ondaz do J\lar
.semcontrares o meu amor por mim bai falar"·
* *
E
digna de registo a maneira como namoram as raparigas Há nesta carta, escrita num português em que as mais ele-
e os rapazes de Celorico; vou transcrever para aqui uma carta mentares regras de gramática sofrem tratos de polé, qualquer
de amor dum namorado de Fafe para a sua mais que tudo, que <:oisa de curioso que está para além da rigidez gramatical. Quero
vive em Celorico. Conservarei a linguagem tal como está escrita, -referir-me ao muito amor que a distância da sua bem amada
sem lhe alterar uma virgula. ~eza assim: faz sofrer ao pobre coração apaixonado, e ainda à ingenu'idade
<:orno está escrita e que tanto está em contradição com um ror
« Qerido Amor .de cantigas que colhi.
Sempre alenbrado. São raroz muito raroz os momentos em que o meu
Aguêle <Sempre alenbrado' de rapaz em plena crise de
curacão deixa de palpitar parti.
Qerido Amor Qerido Amor xeu de saudades porte não dezer adeuz na amor, que nunca esquece a sua querida namorada distante, tem
festa do Santroquarto procuremos duas vezes vimos pai e mai que lhe eide um sabor bem característico. A tristeza profunda de não ter
112 FERNANDO DE CASTRO PIRES DE LIMA CANCIONEIRO DE CELORICO DE BAS i' O 113
aspectos da filosofia popular. Nesta agora mostra-se a vaidade do cantador e a sua basófia
Encaremos alguns dêsses aspectos, apenas os mais impor- de conquistador:
tantes, para não aumentar em demasia êste estudo, que eu dese- Preguntei ao sol se viu
jaria o mais claro e conciso possível. À lua se percebeu,
Às estrêlas se já viram
O amor é sempre o grande cartaz, a grande preocupaçã<> Coração igual ao meu.
CANCIONEIRO DE CELORICO DE BASTO 115
114 FERNANDO DE CASTRO PIRES DE Ll1\\A
Tenho presentes algumas quadras em que uma ou mais l Não haverá aqui uma referência às antigas navegações dos
·raparigas, feridas no seu amor próprio, respondem altivamente: Portugueses?
Cuidavas que eu te queria? O amor que não é correspondido é recusado na seguinte
Olha o toledo do mundo!
Os meus olhos já navegam
quadra:
Por outro poço mais fundo. O Serpão é miudini10,
Não se pode atar aos molhos;
Julgavas em me deixar Amar a quem me não ama
Qu'eu por ti deitava dô? É grande cegueira de olhos.
Há mais rapazes no mundo,
Não julgues que és tu só .•.
Também chega a sua vez aos amuos dos namorados. Senão
Cuidavas em me deixar leia-se:
Haveria algum desvelo?
Tenho meu brio guardado O meu amor, coitadird10,
Para mais alto castelo. Anda de costas voltadas.
Se tem dor de cotovelo
Nesta vê-se que o poeta anda a ser solicitado pelo amor, Ponha-lhe urtigas pisadas.
o que êle explica duma forma pitoresca: Quando o amor é verdadeiro, a mínima sombra vem per-
Ando rouco do meu peito, turbar o coração dos namorados e, se Deus tiver de levar um
Não é catarro nem tosse:
É o ladrão do amor dêles, que os leve a ambos:
Que de mim quer tomar posse!
Esta noite sonhei eu
A falia de constância do homem é posta à prova nas Tinha morrido meu bem ;
Acordei, pedi a Deus,
seguintes cantigas: Que me levasse também!
C) meu amor, não embarques.
Olha que o me r não tem fundo! E ainda noutras surge o amor, puro e forte que está para
É como o amor dos homens além da própria vida:
Que engana todo o mundo.
Hei-de-te amar 'té ü morte
Os homens são como os lobos
Até depois de morrer:
Só lbes falta ter o rabo:
lv1esmo debaixo da tura,
Aparec' ils raparigas
Meu amor, poJendo ser •• ,
Na íigura do diabo.
FERNANDO DE CASTRO PIRES DE LIMA CANCIONEIRO DE CELORICO DE BASTO 117
116
A alegria das raparigas não é leviandade, antes pelo con- Elevados pensamentos traduzem muitas vezes as composições
trário. Desconfiai sempre das mais caladas, pois são as peores: poéticas de quatro versos:
Ú alta serra da neve
Raparigas, cantai tôdas,
Donde o penedo caiu!
Guardai o que vosso é:
As que não cantam, nem dançam
Ninguém diga o que não sabe,
Também Jh'escorrega o pé ...
Nem afirme o que não viu!
A ironia não é esquecida também. Vejam-se os seguintes É indiscutível que o honrado lavrador se destaca da profissão
cantares: dos outros homens. Ser-se lavrador é por assim dizer um título
Maria, linda Maria,
Tu és o meu ai-Jesus;
de legítimo orgulho, com pergaminhos de muito e honesto labor:
Quem me dera pôr a mão
Sapateiros não são homens,
Onde o lenço faz a cruz I
Alfaiates também não:
Eu sempre gostei de ver Onde chega o lavrador
As pernas às raparigas: Bate o pG e treme o chão!
Se são grossas ou delgadas
Se são curtas ou compridas . ..
Não se diga que o poeta popular, perdido nas musas do
E, por aí fora, onde nós iriamos, se eu não prometesse de amor, se esquece da sua Pátria e dos seus Heróis. Às vezes,
início retirar as cantigas pornográficas ... quantas vezes, com desalento profundo, choram a desgraça do
E, no amor, ponto final. seu País ao desfazer-se em lutas mesquinhas e tristes. Vem a
Passemos agora às quadras religiosas. Algumas há que têm altura em que o poeta chora e descrê da salvação da Pátria
um cunho duma grande beleza e dum perfeito misticismo: e da sua eternidade:
Ou ainda esta, duma suave inspiração: Mas, de repente, como fôsse milagre de Deus, o poeta
Senhora da Conceição, acorda da sua tristeza e vai cantar aquêles que foram grandes
És das Santas mais bemditas,
e que deram honra e glória à Pátria amada.
Por teres altar no peito
Destas môças mais bonitas . .. A ingratidão e o esquecimento ainda não entraram na alma
generosa do povo português:
Uma vez por outra surge-nos uma quadra de sabor erudito:
Ó D. Carlos de Bragança,
Deus fêz de leite e de neve
Filho de Luís Primeiro!
A ondulação do teu seio;
Hás-de vir p'la rua abaixo,
A tua bôca formosa
Para o pé do Paiva Couceiro!
De um rubi partido a meio.
CANCIONEIRO DE CELORICO DE BASTO II~
118 FERNANDO DE CASTRO PIRES DE LI 1\A
Sidónio Pais, essa figura que iluminou urna época, também curiosas devia apresentar. Mas tenho de finalizar e fecharei a
série de Celorico de Basto com urna quadra muito bela:
é focado na trova popular:
Procurei a paz no mundo,
6 grande Sidónio Pais, fui ao cemitério e vi
Director da R.ev'lução: Um letreiro que dizia :
Não nos deixeis sofrer mais, Não há paz senão aqui!
Rende a nossa divisão !
histórica duma lenda atrás citada (pág. 108), que ê corrente em Celorico de
Basto. (LiPrO de Linhagens do Conde D. Pedro, tit. LV, in « Portugaliae Monumenta
Historica,, Scriptores, I, fase. lU, pág. 358).
-entom era e outros homens boas e rricos que em Portugal! auia se quisessem
-dizer que o caualeiro norn fazia dereito, que- elles lhe meteriam as mãaos: e esta
meesmo deziam os caualeiros e filhos d'algo das outras terras aos filhos d'algo
-de Portug-al que lhes meteriam as mãaos se dissessem que o caual!eiro nom
fezera dereito. E todo esta trouxe Martim Vaasquez por escripto e assiir.ado per
mãaos de notairos das terras, e trouxe cartas dos rreis e dos primçipes e dos
-altos homeens sobre esta assiinadas por elles. E este .Martim Vaasques da CuyN
nha leixou o castel!o de Çellorico pella maneira que lhe mandaram os rreys
e outros altos homeens, e fez dous boas feitos que nunca foram feitos em
Espanha pera poderem os fidallgos leixar os caste\los sem vergonha quando
lhos nom quiserem tomar aque!!es de que os teem. Esta boa façanha ficou pera
sempre»,
5
A açucena c' o pé n'.:igua Adeus ó Penafiel,
Dura mais quarenta dias; Adeus 6 pena da pena!
Eu sem ti, nent uma hora Eu também tenho a minha,
-Quanto mais anos e dias •. , Ou maior ou mais pequena.
2 6
Abaixai~yos,serras altas Adeus 6 Penafiel,
Eu quero ver Carvalheira; ó igreja do Calvário !
Quero ver o meu amor Por causa do meu amor
Debaixo duma roseira. Passo aqui um fadário.
3 7
A barra da minha saia Água do rio, clara,
foi você quem m' a queimou Deixa passar a barrenta;
Com a ponta do cigarro, Coração de pedra dura
Quando comigo falou. Cai ao chão, não arrebenta.
4 8
Abre-te, campa adorada! Águas do mar abrandai,
Minha amada quero ver; Que eu quero caçar um peixe;
(?uero~lhe beijar o rosto Eu quero deixar amor
Antes da terra o comer, Antes que o amor me deixe.
(1) Para mais fácil confrvnto com outras colectâneas, foram dispostas
.estas quadras por ordem alfabética.
'
CANCIONEIRO DE CELORICO DE BASTO 123
fERNANDO DE CASTRO PIRES DE LIMA
!22
25 32
17 A salsa do meu quintal, As ondas do mar são brancas
9 Ando rouco do meu peito; No meio são amarelas: '
As pedrinhas do teu muro:
Ai de mim, ai de você, Mal haja a rouquidão, Aqui 'stão as testemunhas Coitadinho de quem ama
Ai de nós ambos e dois! Que me não deixa cantar Das vezes que t'eu procuro. P'm morrer no meio delas.
Ai de mim primeiramente A minha satisfação.
Ai de você ó depois! 26 33
!8 As asas dos passarinhos As ondas do mar são verdes
No meio s~o amarelas.
10 Ando rouco do meu peito; '
foram feitas p'ra voar ;
Ainda depois de morta, Não é catarro, nem tosse: Ai duma mãi, que crio;
Os corações das donzelas
Onde meu corpo repousa, E o ladrão do amor foram feitos pe.ra amar. Um filho p'ra andar nelas!
Acharás teu nome escrito Que de mim quer tomar posse~
Debaixo da fria lousa! 27 34
19 A Senhora da Apar'cida As telhas do teu telhado
II Anel de ouro não é prenda Apar'ceu na Barreirinha. As pedrinhas do teu mu:o
AUádega é o rei dos cheiros, Nem o de prata lembrança~ Ó que milagre tamanho!' Hão-de ser as testemunhas
Segurelha o meu preceito; Anel de contas miUdas Senhora tão pequeninha! Das vezes que te eu procuro (l).
Hei~ de te amar 'tê à morte: R.equer tôda a confifinça.
Essa jura tenho feito. 28 35
20 A Senhora do Sàmeiro As telhas do meu telhado
12 À noite, quando me deito, Tem um manto que reluz, Dei tum água sem chover·
Altas torres têm teu peito, A Deus peço, a chorar, Que lhe deu um brasileiro, O meu triste coracão '
Eu não posso lá entrar: Que me mate num momentO> Que se viu no mar sem luz. AlegraMse em te v~r.
Bem poderas tu, menina, Para te eu poder deixar.
Altas torres abaixar ... 29 36
21 As estréias miudinhas Atiraste ao meu peito,
13 Ao passar do ribeirinho Trazem o Céu bem composto. A parte mais delicada·
Alto pinheiro redondo Quebrei a minha viola; Nunca contigo, menina, Quem ao meu peito aiira
No cimo tens grande c' ruclza; Fui juntar os cacos todos. Pude falai- a meu gôsto! Pouco bem me quer ou nada ..•
'Stou à beira do pomar, Para fazer uma nova.
Não posso comer a fruta. 30 37
22 As lágrimas e as saüdades A viola quer qu'eu cante
14 Ao teu quarto eu trepei São irmtís que nascem juntas: A prima quer qu'eu pade,ça;
Amores, ao longe ao longe, P'ra roubar teu coração;.
Que ao perto quem quer os tem; Sôbre as nossas esperanças O tocador da viola
Quanto mais ao longe ao longe,
Gritaste aqui de!- rei ..•
fiquei prêso por ladrão!
No mundo jazem defuntas. Quer qu'eu por êle endoideca ..
Mais, amor, te eu quero bem. 31 38
23 As ondas do mar dão saltos Bota~medaí os olhos,
!5 A rosa depois de sêca
A mulher enquanto é nova Dão saltos como cabritos. Amor, de quando em quando,
E um braço de loucura;
foi-se queixar ao jardim; Também eu, por tua caos~, De modo que não perceba
O cravo lhe respor.deu:
Depois que vai para velha Saltarei aos infinitos. O povo que está no bando, .•
Tudo o que nasce tem íim ....
Nem o diabo a atura.
24
!6 A rosa depois de sêca
Anda-me ver à janela, Por todos é desprezada;
Da janela tabuleiro; A jelor que cai ao chão
Anda ver a triste vida (1) Cf. N.o 25.
Até aos pés é calcada ..
Que passa um rapaz solteiro.
124 FERNANDO DE CASTRO PIRES DE LIMA
CANCIONEIRO DE CELORICO DE BASTO
I25
39 45
Campa é terra sagrada Chamaste a meu pai teu sogro, 51
Coração por ccração, 59
E de todos triste leito ; À minha irmã, cunhada? Da minha janela à tua,
Já morreu a minha amada, Nem 0 meu pai é teu sogro, Amor, não troques o meu:
Do meu coração ao teu,
Trago luto no meu peito. Nem a minha irmã t'é nada. Sabes que o meu coração
Vai um tiro de espingarda:
Sempre foi leal ao teu.
40 46 Quem o dispara sou eu.
Canário, lindo canário Chamaste à minha bôca 52
60
Canário lindo, meu bem, Gaiola dos passarinhos ; Cravo branco da janela,
Da minha janela à tua
Quem me dera ter as penas Eu também chamo à tua Criado à revelia!
É o salto duma cobra;
Que o lindo canário tem··· Gaiola dos meus beijinhos. Quem quer bem, tmta por tu:
1nda espero de chamar
Amor não tem senhoria.
41 47 À tua mãi minha sogra.
Candeia que não dá luz Chamaste ao meu cabelo 53
61
Não se espete na parede; Canavial de Viana; Cravos brancos à janela,
Das l<igrimas faço contas
O amor, que não é firme, Eu também chamo ao teu Meninas, não os ponhais;
Que eu rezo iis escuras;
Não se faz mais caso dêle. Que é de prender quem ama. Dá-lhes o vento, balançam :
Eu cuido que me acenais.
d, morte, que tanto tardas!
42 48 d, vida, que tanto duras!
Cantigas ao desafio Chamaste ao meu cabelo 54
Cravos roxos à janela
62
Comigo nir1guém as cante; Dobadoira de dobar; De domingo a domingo
Eu tenho quem m'as ensine: Também eu chamo ao teu .i\'leninas, não os ponhais ;
Me parecem três semanas,
O meu amor é 'studante. Sarilho de ensarilhar. Dá-lhes o vento e ê!es bolem:
Que te não vejo, amor;
Dirão que vós me acenais ...
42 49 Ú que satidades tamanhas!
0 teu amor é 'studante Combóio arrasta, arrasta, 55
63
0 meu anda no estudo: Com bóio arrastador: Cuidavas em me deixar
Deixa-me ir dormir contigo,
0 meu 'studa p'ra doutor Levaste e não trouxeste Haveria algum desvelo?
Que uma noite não é nada:
0 teu estuda p'ra burro. Da marinha o meu amor. Tenho meu brio guardado
Eu entro com o escuro
Para mais alto castelo.
43 49 E saio na madrugada ...
Carta vai, carta me leva, Da marinha o meu amor· · · 56
64
Segue lá minha ilusão: Eu também sou marinheiro: Cuidavas que eu te queria,
Deixa-me ir, que levo pressa,
Vai dizer à minha amada Só te peço que me leves Minha pereira abnna da?
Ao freixo tirar o ninho:
Que me encontro na prisão. Para 0 R.io de Janeiro (1). Tôda a vida trouxe e tmgo
EsUt o cano a quebrar
Tôda a mulher enganada ...
44 50 C'o pGso do passarinho.
Carta vai, carta me leva, Com pêna peguei na pêna, 57
65
Segue lá o meu destino: Com pêna, p'ra te escrever: Cuidavas que eu te queria?
Deixa-me ir, que levo pressa,
Vai dizer à minha amada A pêna caíu·me ao chão Olha o to ledo do mundo!
Levo água de regar:
Que me encontro aqui prezinho. Com pêna de te não ver. Os meus olhos já nt~.vegam
Amanhã é dia santo
Por outro pôço mais fundo,
Temos tempo de falar ...
58
66
Da minha janela à tun,
Desgraçado Portugal,
Do meu coração ao teu,
Qu'ainda não ficas assim!
(1) Esta réplica íoi ouvida a uma rapariga de Penafiel. Podia andar um barquinho:
Quem me dera ser eterno,
O navegador sou eu ...
Para ver teu triste fim!
126 FERNANDO DE CASTRO PIRES DE LIMA CANCIONEIRO DE CELORICO DE BASTO I27
67 75 83 90
Deste ao noivo adorado Escrevi na branca areia És te mundo é, donzela, Eu comprei uma sopeira
Três cravos para Jesus; O retrato do meu bem; Todo cheio de ilus[Lo: Por trinta réis de canela;
Com três cravos foi pregado Tornei-o a riscar fora, Por poucos dias de vida Mandei-a aparelhar
Com muito amor na cruz. Porque não estava bem. Não mates teu coraçllo. E pus-me a cavalo nela.
68 76 84 91
Deste-me uma pêra verde, És linda, posso dizer, 'Estes mocinhos d'agora Eu comprei um chapéu branco
Para eu amadurar; És de tôdas mais formosa; Cuidam que são e não são; P'ra aprender a namorar;
O que é verde, verde iica: Os teus cabelos são loiros São como o ouriço chocho : O chapéü branco rompeu-se,
Tu querias-me enganar. Tuas faces côr de rosa. Dá-lhe o vento, cai ao chão. O amor vai-se acabar.
69 77 85 92
Deus fêz de leite e de neve Êsses teus cabelos loiros Estes rapazes d'agora, Eu sou como a borboleta
A ondulaç:ão do teu seio; Pelas costas ao comprido !Franganitos de vintém, Que seguiu a luz tirana:
A tua bôca formosa Parecem fies de oiro Prometem dez rêis às almas, De repente caiu morta.
De um rubi partido a meio. A martelos rebatido. A ver se a barba lhes vem. É infeliz o que ama.
70 78 86 93
De vermelho veste a rosa, Esta noite sonhei eu ~Escreviteu lindo nome, Eu fui dos que disse ao sol
De verde o mangericl'ío, Contigo, minha beleza; Pus-me com êle na mão: Que não tornasse a nascer:
De branco veste a açucena, Acordei, achei-me só: P'ra o não perder, guardei-o Tendo a luz dos teu~ olhos
De luto o meu coração. Em sonhos não há iirmeza I Dentro do meu coração. Mais sol não quero eu ver ...
71 79 87 94
Dizem que não pode ser Esta noite sonhei eu, Escrevi teu lindo nome Eu fui uma das que disse:
Silva verde dar um cravo? Na outra sonhado tinha, Sôbre a areia iugidia; Ou contigo, ou co'a terra!
Aqui o trago ao peito Qu'estava na tua cama: Veio o vento, apagou Ou hei-de casar contigo,
Da mesma silva cortado. Acordei, 'stava na minha! As cinco letras: Maria. Ou hei-de morrer donzela ..•
72 80 88 95
Em Lisboa, no Rossio, Esta noite sonhei eu És uma cruz que ah·eja Eu hei-de ir à romaria,
Pertinho da estação, Tinha morrido meu bem; Em linda noite ao luar: Que me hei-de regalar,
Mataram Sidónio Pais, Acordei, pedi a Deus Quem me dera ser o Cristo, Com cinco réis de tremocos
Director da R.ev'lução. Que me levasse também! P'ra nessa cruz me pregar. , • Que o meu amor me vai 'dar .••
73 8\ 89 96
Ergue o chapéu para cima, Esta palavra saüdadc, Eu atrás das pulgas, Eu hei-de subir ao alto,
Não o tragas derribado; Aquêle que a inventou Elas aos saltinhos; Ao mais alto que eu poder:
Desengana o teu amor, A primeira vez que a disse, Não te posso amar, Ao mais alto ramalhinho
Não o tragas enganado. Com certeza que chorou .•• Sem te dar beijinhos, , , Qu'a oliveira tiver.
74 82 89 97
Escrevia-te uma certa, Estas meninas d'agora Sem te dar beiiinhos, Eu já vi Lisboa a arder,
Se a tu soubesses ler; São poucas, mas são valentes: Não te posso ~mm-; As pedrinhas a estalar;
Mas tu vais dar a outro Pegam nas pias dos porcos fu atrás das pulgas, Eu já vi uma menina
Meus segredos a saber. Atravessadas nos dentes. Elas a saltar. Pelo seu amor chorar.
I28 FERNANDO DE CASTRO PIRES DE LIMA CANCIONEIRO DE CELORICO DE BASTO I29
174 182
158 166 Nossa Senhora da Graça t O anel que tu me deste
Minha sogra morreu ontem, Não posso andar descalça Eu p'ra o ano lá hei-de_ ir, Era de vidro, quebrvu;
Deus a leve ao Paraíso; Que me picam as areias ; Ou casado, ou solteiro, A amizade que me tinhas
Deixou-me uma manta velha: O meu amor 'ioda ganha Ou criado de servir. O anel a demonstrou.
Não posso chorar com riso ... Para sapatos e meias.
175 183
159 167 Nunca vi íigueira preta O anel que tu me deste
Minhas lágrimas são contas Não quero amor bonito Dar os figos bacorínhos ; Era de vidro, quebrou;
Que et: rezo às escuras. Nem de caracóis na testa: Nunca vi mulher donzela Assim dure a tua vida
Ú, morte, que tanto tardas! Eu não quero ser a árvore Dar de mamar aos filhinhos. Como o anel durou.
Ú, vida, que tanto duras! Onde o cuco faz a festa ...
176 184
160 168 Ú acipreste do adro, O anel que tu me deste,
Moro à beim do mar, Não vou falar das mulheres, Não ensombres a Igreja! Eram horas da Trindade,
.Moro mesmo à beirinha: Que a mim não me convém, Bem ensombradinho anda Era-me largo no dedo,
Da janela do meu guaria Porque eu gosto ricamente Quem não logra o que deseja ... Apertado na amizade.
Vejo saltar a sardinha. De uma coisa que elas têm l
177 185
161 169 Ú acziJreste do adro O anel que tu me deste
Morte, se agora viesses, Na Senhora d'Ape.r'cida, Retiro dos passarinhos! Trago-o no dedo mendinho:
Quanto te eu agradecera; Numa pedra me assentei: A quem deste os abraços, Cada vez que tu me lembras,
Que me tirasses do mundo C' o sentido no amor Dá-lhe também os beijinhos .•. Alanuel, dou-lhe um beijinho ...
Antes que o aborrecera. Nem a 'smola à Santa dei ..•
178 186
162 170 Ú alta serra da neve O chapéu que o amor cobre
Muitas mágoas me consomem, Nem meu pai, nem minha mãi Donde o penedo caiu! Tem presilha de metal;
Uma só me faz cismar: Não querem que te eu logre; Ninguém diga o que não sabe, Prometo de te ser firme,
Morrendo o último homem Queira eu e queiras tu, Nem aiirme o que não viu. Se tu me fores leal.
Quem o há-de enterrar? Contra o amor ninguém pode ..•
179 187
163 171 O amor e o dinheiro Ú coração retmído,
Não ames, ou ama sempre, No mar largo anda a guerra; São dois amantes leais; Diz-me com quem te divertes!
·Era melhor nunca amar: Eu bem ouço dar os tiros: Quando o coração tem penas Com quem passas o teu tempo,
O amor começa a rir Eu bem ouço combater Os olhos dão os sinais. Que tanto de mim te esqueces?
Acaba sempre a chorar! Os teus ais c' os meus suspiros.
180 188
164 172 O amor é uma criança O cravo depois de sêco,
Não calculas, meu amor No meio daquêle campo Que r.onnosco vem brincar: Depois de sêco, mirrado,
A dor do meu coração; Lá no meio nada o peixe; Canta, ri, salta e dança, foi-se queixar ao jardim,
Mais me valia morrer Nos dias que te não vejo E por fim faz-nos chorar! Que não qu'ria ser mais,,cravo.
Que sofrer tanta paixão! Não há saüdades que deixe.
181 189
165 173 O anel que tu me deste O cravo, depois de sêco,
Não olhes p'ra mim, não olhes, Nossa Senhora da Graça, Á saída de Amarante, foi-se queixar ao jardim;
Que eu não sou o teu amor: Eu aqui 'stou 8 chegar: Era-me largo no dedo; A rosa lhe respondeu:
Eu não soo como 8 iigueirn Botai-me ns vossas bênçãos DeiMo a outro amante. Tudo por tempo tem fim.
Que dá irutos sem feio r. Lá de cima do altar.
134 FERNANDO DE CASTRO PIRES OE LIMA CANCIONEIRO DE CELORICO DE BASTO 135
O meu amor e o teu 6, minha caninha verde, Ó Senhor dos Ajelitos, Os olhos do meu amor
Andam naquela ribeira: Verde cana ricócó! Bem ajelito 'stou eu! São duas continhas pretas,
O meu anda à erva doce Quem me dera ricOcar .Recebi um telegrama C0lhidinhas ao luar
O teu à erva cidreira. Contigo uma noite só! De amor que me morreu! No jardim das violeias.
O meu amor é um corno Ú, que rua tão escura! Ó Senhora da Saúde, O serpão é miudinho,
Daqueles mnis retorcidos: Não vejo nada por ela: Dai salide ao meu irm[lo! Não se pode atar aos molhos;
Hei-de o pôr à jane!n, Bem podias tu, menina, Eu prometo de lá ir Amar a quem me não ama
P'ra convidar os amigos ... Pôr candeias à janelt:. , . ·C'um ran!o d'oiro na mão. É g1ande cegueira d'olhos.
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l~apurigasde Viade Sapateiros não são homens, 301 308
São duras como o arame: Alfaiates tarr.bém não: Semeei na minha horta S. Gonçalo de Amarante,
Não há machado que as corte Onde chega o lavrador O brio das raparigas: Casamenteiro das velhas!
Nem rapaz que as engane. Bate o pé e treme o chão! Nasceu~ me uma rosa branca Porque não casais as novas?
Cercada de margaridas. Que mal vos fizeram elas?
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Raparigas do meu tempo, S'as lágrimas fôssem pedras, 302 309
Cachopns da minha idade, Que eu por ti tenho chorado, Semeei no meu quintal Se o meu amor me ouvisse,
fazei tôdas como eu: Formariam um castelo, A semente do repolho: Eu cantava todo o dia;
Gozai-Yos da mocidade ... No meio do mar sagrado. Nasceu um velho corcunda O meu t:mor não me ouve.
C'uma batata num olho. A quem fará companhia?
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Raparigas, tomai tento, S'a violeta nascesse 303 310
Cachopas, não vos fiéis.! Em teu qt.:arto períum&do, Semeei no meu quintal Se os beijos espigassem
Cantigas leva-as o vento Também meu amor nascia O brio das raparigas: Como espiga o tdecrim,
Cartas de emcr são papéis. Em teu coração gelado. Nasceu uma rosa branca Na cara das raparigas
Cercada de margaridas (1), Se formava um jr.rdim •..
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Rosa bíanca, gfmha côr, Se as saüdades matassem 304 311
Não sejas tão desmaiada, Muita gente morreria: Semeei os teus carinhos Siga a rusga, siga a rusga,
Para que as mais não digam: As saüdades não matam Ao redor dos pinheirais, Siga a nossa reinação!
Rosa branca, não és nada! Senão no primeiro dia .•• Só p'ra ver se m'e~quecias: O meu pai era da rusga,
Cade, vez me lembras mais! Os filhos p'ra rusga são .•.
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Salsinha, olaré, salsinba, Se Coimbra fõsse minha 305 312
Salsinha, ola ré, meu bem! Como é dos estudantes, Senhora da Conceicão, S'o Padre Santo soubesse
Ainda não sabes, menina, Mandava~ lhe pôr no meio És das Santas mais. beP.ditas, O gôsto que o fado tem,
O gôsto que a salsa tem ... Um ramo de diamantes. Por teres o altar no peito Viria de Roma aqui
Destas môças mais bonitas ..• Cantar o fado também.
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O gôsto que a salsa tem, Se eu fôsse ladrão, roubava, 306 313
O gôsto qu'ela teria; Roubava aquela menina: Senhor mestre serralheiro, Sou alegre e vivo triste,
Salsinha, olarê, meu bem, Roubava tt filha ao pai faça-me uma vara de aço, Morrerei duma paixão:
Tu és a minha alegria! Deixava-a desgraçadinha. P'ra bater nas raparigas, Eu desejo e não posso
Que não têm desembaraço. Lograr o teu coração ..•
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Sant' António dos porquinhos, Seja novo, seja velho, 307 314
S. José dos carpinteiros, Esse teu belo tear Se o mar tivesse varandas Sou filho duma viúva,
Santa Luísa dos trolhas, Leva um fio de saüdade la-te ver ao Brasil; O meu pai morreu no mar ;
O diabo dos pedreiros. Que sobressai a matar. O mer varandas não tem Agora passo a vida
Diz-me, amor, par'onde hei-de ir. No terreiro a dançar.
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Sapateiros, alfaiates Semeei e não colhi,
São um bando de ladrões: Eu bem pudera' colher:
Sapateiros roubam sola Semeei os teus carinhos,·
Alfaiates os botões, Não me quiseram nascer.
(') Ci. N.o 301.
142 FEI~NANDO DE CASTRO PII(ES DE LIMA CA:-<CIONEIRO DE CELORICO DE BASTO 143
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Vai-te, carta venturosa Vós chamais-me trigueirinha? Os cabelos, cujos caracteres têm por vezes uma larga ampli-
Vai ter àquele jardim; Isto ê do pó da eira.
Pede licença, ajoelha, Se vós me vires ao domingo .. _
tude de variação, fornecem, para a classificação das raças huma-
Dá mil abraços por mim. Sou um botão da roseira. nas, valiosíssimos elementos.
A côr, a disposição, o enrolamento, a quantidade, em suma
os seus caracteres macroscópicos, desde há muito já que, nesse
sentido, são utilizados pelos antropologistas.
Todavia, hoje liga-se grande importância, também, aos seus
caracteres microscópicos, não só pelo que diz respeito à histolo-
gia mas, sobretudo pelo modo de distribu"ição do pigmento e
forma da secção transversal.
Foi Pruner Bey quem, pela primeira vez, procurou estudar
os caracteres microscópicos dos cabelos, fazendo observações
sôbre cortes longitudinais e transversais dêstes. Estudando a
forma da secção transversal, aquele investigador, dividiu-os em
três grupos, figurando no primeiro os cabelos de secção elíptica,
no segundo os de secção oval e no último aqueles que tivessem
secção circular.
O Doutor Lateux fêz também observações sôbre os cabelos
e procurou descobrir o processo de os seccionar normalmente~
tendo chegado no seu estudo a conclusões idênticas às de
Pruner Bey.
Nos <Elementos de Antropologia Geral>, Topinard dedica ao
assunto algumas páginas, calculando, pela primeira vez, segundo