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CHRISTIAN MACIEL DE BRITTO

CIDADANIA E IDENTIDADE RELIGIOSA


Uma reflexão preliminar.

Trabalho apresentado ao Programa de


Educação Tutorial, PET, do Curso de
Ciências Sociais, Setor de Ciências
Humanas, Letras e Artes, UFPR, sob
Tutoria da professora Dra. Liliana Porto.

CURITIBA
1o. Semestre de 2009
2

É suficiente dizer que uma das características


do projeto totalitário é sempre a insistência em
tornar clandestina a propensão metafísica do
homem, em banir a transcendência do âmbito
público (exceto na forma domesticada da
religião civil estabelecida) e tornar toda a vida
social sujeita à mundividência trivial da
racionalidade funcional.
Peter L. Berger
3

Sumário
1 INTRODUÇÃO...........................................................................................................4
2 CIDADANIA, SUBJETIVIDADE E CRISE PARADIGMÁTICA...................................6
2.1 Cidadania e a Teoria Política Liberal ......................................................................7
2.2 O primeiro Período do Capitalismo.........................................................................9
2.3 Segundo Período do Capitalismo..........................................................................11
3 RELIGIÃO E SOCIEDADE MODERNA...................................................................15
4 HOMO RELIGIOSUS...............................................................................................18
5 IDENTIDADE RELIGIOSA: INDIVIDUALISMO OU COLETIVISMO?.....................21
6 CIDADANIA E IDENTIDADE RELIGIOSA NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO
PÚBLICA.....................................................................................................................23
6.1 INGLATERRA: O PLURALISMO RELIGIOSO......................................................24
6.2 BRASIL: UM SINCRETISMO SILENCIOSO?.......................................................25
7 TÓPICO METODOLÓGICO: CRENÇAS RELIGIOSAS..........................................28
8 CONCLUSÃO...........................................................................................................32
REFERÊNCIAS BILBIOGRÁFICAS...........................................................................33
4

1 INTRODUÇÃO

A questão da cidadania além de ser tema recorrente de estudos sociológicos


é interessante porque envolve a relação entre a idéia de indivíduo, dotado de
subjetividade, identidade e potencialidades diversas, com a noção de regras de
cunho universal pautadas em grande parte por padrões socialmente desejáveis. Tal
relação, portanto, pode ser útil a análise de relações entre público e privado ou, mais
filosoficamente, entre universais e particulares, diversidade e coerência, ou ainda
sociologicamente - e é isto que nos interessa aqui- entre uma variável sociológica
que iguala - a cidadania - e outra que diferencia - a subjetividade.

Para o sociólogo português Boaventura de Souza Santos, muitas questões


perpassam a história da modernidade sendo uma delas, certamente, a relação entre
cidadania e subjetividade. Para Santos, se for correto se falar em "patologias da
modernidade" poderia se dizer que muitas são fruto de subsínteses entre
subjetividade, cidadania e a relação de ambas com a emancipação - cujo alvo, para
o indivíduo moderno, é o pleno exercício de suas potencialidades sob o crivo da
instrumentalidade da razão - uma relação que muitas vezes tentou ser equacionada
em projetos emancipatórios, explica o autor, que no final das contas sempre resultou
em excessos de regulação (SANTOS, 2005, p.269). Uma relação que segundo
Santos é complexa.
Outro fator que faz parte do projeto da modernidade é o fenômeno da
secularização da sociedade (WEBER, 1974, p.182-3), assim o secularismo se
apresenta como uma cultura pública específica cujo objetivo é o de tornar obsoleto
não somente simbolismos religiosos, como também a identidade religiosa e
principalmente sua manifestação pública. Neste sentido, não somente igreja e
estado se separam mas a religião tende a se tornar irrelevante ou, quando muito,
assunto pessoal e privado em contraposição ao papel público da ciência (TRIGG,
2007) com sua função emancipadora.
Contudo, o fenômeno da secularização analisado por Weber é confrontado
com a questão do fundamentalismo religioso presente no mundo contemporâneo,
com a democracia de cunho liberal que muitas vezes apresenta discursos e práticas
5

muito próximos desta atitude (SANTOS, 2005, p.148) - vide, por exemplo, a
referência a Deus em discursos de posse de presidentes norte americanos1 e
brasileiros, outrossim no caso do Brasil é importante se considerar o fenômeno do
crescimento das religiões midiáticas de massa.
A questão portanto da relação entre cidadania e identidade religiosa -
presente também na subjetividade dos cidadãos - se mostra não somente relevante
como desafiadora, principalmente em um país como o Brasil onde a distinção entre
as esferas do público e do privado é na maioria das vezes difusa, onde acima de
tudo as relações pessoais parecem desempenhar "um papel crítico na concepção e
na dinâmica da ordem social" (DaMATTA, 1987, p.71), caracterizando assim conflitos
de perspectivas e atitudes pessoais em detrimento de normatizações coletivas.
Neste caso, propomos a seguinte pergunta: como se dá então a relação entre
cidadania e identidade religiosa no Brasil? Considerando-se por um lado o caráter
universalizador daquela, face a idéia de indivíduo, sua identidade, e sua
subjetividade, por outro.
Na tentativa de empreender uma reflexão sociológica que possa lançar luz
sobre a questão: a) consideramos relevante a análise da relação entre cidadania e
subjetividade realizada por Boaventura de Sousa Santos, cujos pontos principais
apresentaremos sucintamente com vistas a um panorama geral sobre o tema; b) no
entanto, uma vez que a análise de Santos é pautada fortemente pela relação entre
cidadania subjetividade em sua ligação com o capitalismo, carecendo portanto, para
nossos propósitos, de uma abordagem mais ampla da variável identidade religiosa e
a questão do secularismo e do pluralismo, elencaremos alguns elementos da
sociologia da religião elaborados por Peter Berger; c) em seguida tentaremos
apresentar algumas especificidades da relação entre cidadania e identidade
religiosa a partir da observação de algumas especificidades da formação cidadã no
contexto da escola pública, tomando comparativamente o caso do Brasil e da
Inglaterra; d) analisaremos a definição de crença religiosa, elaborada pelo filósofo

1 Por exemplo o estudioso norte americano Robert N. Bellah, em um artigo sobre a religião civil na
América, aponta o discurso inaugural do mandato de John F. Kennedy, de 20 de janeiro de 1961,
que argumenta em certa altura a crença de que os direitos do homem não se originam na
generosidade do Estado, mas da mão de Deus. No mesmo artigo aponta também que o termo
Religião Civil se origina da obra Contrato Social de Rousseau e aponta também para o
reconhecimento deste conceito na obra de Alexis de Tocqueville, que observa que a religião da
maioria dos cidadãos americanos é republicana (BELLAH, 1991).
6

americano Roy Clouser, pesando a possibilidade de considerá-la útil a futuras


pesquisas empíricas, com o intuito de verificar a possível relação entre Cidadania e
Identidade Religiosa.
Finalmente, para a conclusão de tal desafio nos propomos a realizar tal
empreendimento com base em pesquisa bibliográfica que possa nos apoiar em
problematizações e pesquisas empíricas futuras com o intuito de buscar uma
percepção sociológica mais acurada acerca da relação entre as variáveis
contempladas.

2 CIDADANIA, SUBJETIVIDADE E CRISE PARADIGMÁTICA

Para Santos, o projeto da modernidade, lançado a cabo a partir do século


XVI, teve por objetivo a racionalização global da vida coletiva e individual, tal
empreitada - marcada por déficits e excessos – se fundamentou em dois pilares, o
da Regulação e o da Emancipação2. O primeiro constituído por três princípios: o do
Estado, segundo a articulação de Thomas Hobbes; o do Mercado, cujo principal
proponente foi John Locke; e o da Comunidade, aos moldes de Jean-Jacques
Rousseau. Para nosso propósito aqui vale observarmos, brevemente, que Rousseau
reconhece que o Estado deve garantir que "cada cidadão tenha uma religião que o
faça amar seus deveres" (ROUSSEAU, 1981, p.143), e embora ao Estado em si não
deva a questão dos dogmas religiosos interessar deve apenas intervir quando um
princípio religioso venha promover a intolerância civil, outrossim reconhece como
parte dos dogmas positivos da religião civil a "existência da Divindade, poderosa,
inteligente, benfazeja, previdente e provedora, a vida futura, a felicidade dos justos,
o castigo dos maus, a santidade do contrato social e das leis: eis os dogmas
positivos" (ROUSSEAU, 1981, p.143-4, grifo nosso). Ainda que Santos contemple a
relevância do princípio da comunidade rousseauniana sem abordar o aspecto da
religião civil não obstante é interessante observarmos que Rousseau concede ao
contrato social o mesmo status que a questão da existência da Divindade, ou seja
tanto Divindade como a Comunidade são observados pelo cidadão como princípios

2 Para uma melhor explanação acerca do conceito de paradigma da modernidade, juntamente com
uma crítica nossa conferir Britto (2008b).
7

sacralizados, onde este último requer inclusive uma "profissão de fé puramente civil"
ainda que observada "como sentimentos de sociabilidade sem os quais é impossível
ser bom cidadão, ou súdito fiel" (ROUSSEAU, 1981, p.143).
O outro pilar apontado por Santos, o da Emancipação, é marcado em
contrapartida, por três lógicas de racionalidade, cuja base é caracterizada por
processos de especialização e diferenciação funcional, como apontado por Max
Weber. Neste sentido, a lógica Moral-Prática, estabelecida pela ética e pelo direito
moderno; juntamente com a lógica cognitivo instrumental, que se expressa na
ciência e em sua aplicação pragmático-produtiva, a tecnologia; e finalmente pela
racionalidade estético-expressiva, que encontra como proponentes principais as
artes e a literatura. Estes pólos distintos, Regulação e Emancipação, exercem entre
si tensões, ou cálculos de correspondência tendo como objetivo compromissos
pragmáticos, cujo motivo básico é o anseio pela liberdade, como bem explica Weber:
“O destino de nossos tempos é caracterizado pela racionalização e intelectualização
e, acima de tudo, ‘pelo desencantamento do mundo3’” (WEBER, 1974, p.182). É
importante citar que nesta busca, a racionalidade cognitivo-instrumental da ciência e
da técnica acabou por desenvolver-se em detrimento das demais racionalidades,
colonizando-as, explica Santos. No que tange a formação da cidadania, por
exemplo, pode-se facilmente observar esta colonização através da promoção de um
currículo escolar, salvaguardado pelo Estado, cujo objetivo principal é a preparação
cidadã pelo domínio da ciência, ideal observado por exemplo nos dizeres da
Declaração de Budapeste: “Para que um país esteja em condições de atender às
necessidades fundamentais de sua população, o ensino das ciências e da tecnologia
é um imperativo estratégico [...] a fim de melhorar a participação dos cidadãos na
adoção de decisões relativas à aplicação de novos conhecimentos.” (BUDAPESTE,
1999)

2.1 CIDADANIA E A TEORIA POLÍTICA LIBERAL

3 O sentido deste “desencantamento” é melhor captado pela expressão “desmagificação do


mundo” (Entzauberung der Welt), ou seja, uma supressão, repressão, da magia como meio
de salvação.
8

A modernidade, atrelada ao próprio desenvolvimento do capitalismo, ou nas


tentativas de reação contrária, encontra no advento da teoria política liberal a
conversão da função do Estado à promoção do crescimento do Mercado. Neste
contexto, duas subjetividades tentam se compatibilizar, explica Santos, a
subjetividade atomizada dos cidadãos livres de um lado, via contrato social, e a
monumental subjetividade coletiva do Estado por outro. Neste paradigma, o princípio
da subjetividade é reconhecidamente mais amplo que o da cidadania, que por sua
vez abrange exclusivamente a cidadania civil e política, cujo exercício se manifesta
pelo voto (SANTOS, 2005, p.238). Contudo esta idéia de cidadania traz em seu
âmago o problema da representação democrática, onde paradoxalmente a
representatividade dos representantes é maior quanto menor for o número de
representantes e menor for o número de representados por estes. Destarte, o
interesse geral não pode coincidir com o de todos, ou seja, dentro deste paradigma
o Brasil, por exemplo, nunca será um país de todos, como intenciona o slogan do
atual governo. Outrossim, este modelo de cidadania acaba por absolutizar os
valores “desejáveis pela sociedade” limitando assim a expressão da subjetividade
dos cidadãos a parâmetros abstratos e globalizantes, onde a sociedade civil é
marcada por uma concepção monolítica. Santos ainda aponta outro problema, que
surge uma vez que a conversão da sociedade civil em domínio privado acaba por
ocultar as relações familiares do domínio doméstico, no que as desigualdades
encontradas aqui passam a não ser contempladas pela relação Estado-Cidadão
constituindo especialmente no caso brasileiro um comprometimento à compreensão
acurada da relação entre cidadania e subjetividade, uma vez que aqui as relações
domésticas parecem exercer determinante influência na sociedade desde os tempos
da colonização portuguesa (FREYRE, 1989, 2004; HOLANDA, 1963; PRADO JR, VIANA,
2005)4.

Esta ocultação ainda se associa a uma outra que ocorre na associação


especial da “Empresa”, a unidade básica de organização econômica da produção
capitalista, vista pelo Estado como Pessoa Jurídica, que embora esteja
salvaguardada pelo Estado se foge ao político. Santos exemplifica esta relação de
ocultação apontando que a formação de vontade no lugar de trabalho não se faz
4 para uma discussão sobre algumas especifidades desta relação como abordada pela sociologia
clássica, conferir crítica nossa em Britto (2009).
9

pelo voto, como na sociedade civil, neste sentido tal relação parece legitimar
freqüentes abusos aos trabalhadores submetendo-os não muito raramente a
situações de trabalho desumanizadoras, que por sua vez os submete a uma
cidadania desprivilegiada, com relação a seus empregadores, sem falar no
embotamento de suas potencialidades individuais.

Em suma, a tensão entre Estado e sociedade liberal é regulada pelo por um


princípio de cidadania que objetiva regular os poderes do Estado uma vez que
universaliza e igualiza as particularidades dos sujeitos, de modo a facilitar o controle
social de suas atividades (SANTOS, 2005, p. 240).

2.2 O PRIMEIRO PERÍODO DO CAPITALISMO

Segundo Santos, no primeiro período do capitalismo, que abrange todo o


século XIX, o conteúdo da cidadania é marcado pelo princípio do mercado que
governa a sociedade civil. Dentro deste quadro, então, temos de um lado a
subjetividade cujas características são a autonomia; liberdade; auto-reflexividade;
auto-responsabilidade; materialidade corporal5; particularidades únicas e infinitas,
potencialmente, da personalidade (SANTOS, 2005, p. 240). De outro a cidadania,
que através de direitos e deveres gerais acaba por enriquecer a subjetividade
abrindo-lhe novos horizontes de realização, mas que pela generalização acaba por
reduzir a individualidade ao que nela há de universal. Além disso, ao ser colonizado
pelo princípio do Mercado os cidadãos se tornam unidades iguais e intercambiáveis
no interior de administrações públicas e privadas, receptáculos passivos de
estratégias de produção, como força de trabalho; de consumo, como consumidores;
de dominação, como cidadãos da democracia de massas; e fiéis, vitimizados pela
colonização da Igreja pelo princípio do Mercado – no caso da Igreja Cristã, por
exemplo, como ilustram análises realizadas por Peter Berger (BERGER, 1985).
Como marca de um problema que percorre toda a modernidade, explica Santos, a
igualdade da cidadania colide, assim, com a diferença da subjetividade, tensão esta

5 Seja esta materialidade corporal real ou fictícia, como no caso da subjetividade jurídica – pessoa
Jurídica, cuja idéia é a abstração monolítica de pessoas coletivas, explica Santos.
10

que para este sociólogo só pode ser superada caso ocorra no pilar da Emancipação
e não da Regulação.

Já no marxismo, Santos explica que a crítica a democracia liberal se dá na


contraposição entre dois sujeitos monumentais, Estado liberal e Classe operária,
este último cujo objetivo é a luta contra a homogeneização reguladora do
capitalismo, um conceito onde a subjetividade coletiva se torna capaz de auto-
consciência, num processo em que engloba as subjetividades individuais (SANTOS,
2005, p.241). A emancipação liderada pelos movimentos socialistas, anarquistas,
mutualistas, e do cooperativismo operário, fomentados de uma forma ou de outra em
meio ao paradigma marxista, aborda Santos, acabou por defender um discurso de
emancipação às custas da universalização dos sujeitos, no que “a tensão [...] entre
subjectividade individual e cidadania foi falsamente resolvida pela destruição de
ambas” (SANTOS, 2005, p. 242), uma vez que a chamada Classe operária, ou a
monolítica subjetividade coletiva contaminada pelas ilusões necessárias à
reprodução do sistema capitalista, rejeita as diferenças de personalidade, autonomia
e liberdade individuais. No que tange a identidade religiosa será que poderíamos
considerar a hipótese de que na perspectiva marxista esta seria suplantada por uma
cidadania anti-religiosa? Vejamos, talvez sim se tomarmos como orientação a
definição de Marx de que é o homem que faz a religião, e não o contrário, sendo
esta uma espécie de “consciência invertida do mundo” (MARX, 2004, p.45), ou seja
a religião seria apenas um fenômeno histórico, algo portanto que deveria ser banido
da sociedade, como explica em suas próprias palavras: “O banimento da religião
como felicidade ilusória dos homens é a exigência da sua felicidade real. […] A
religião é apenas o sol ilusório que gira em volta do homem enquanto ele não circula
em torno de si mesmo.” (MARX, 2004, p.46). Segundo Marx, uma vez que a religião
é uma ilusão a verdade acerca do mundo seria encontrada na história, como diz: “A
tarefa da história, desta forma, depois que o mundo da verdade se apagou, é
constituir a verdade deste mundo”.

Contudo, em suma, o que Marx faz, seguindo o filósofo Ludwig Feuerbach, é


transformar a teologia em antropologia, onde a crítica da religião seria na verdade a
crítica do homem, que por sua vez é um produto do seu contexto histórico, assim
poderíamos dizer que a Divindade seria na verdade o próprio homem, mas ao
11

compararmos o comunismo de Marx ao comunitarismo de Rousseau, a existência


da Divindade parece ser substituída pelo determinismo histórico que partilha do
mesmo status do contrato social comunista. Neste sentido, poderíamos considerar a
hipótese de que na verdade a identidade religiosa permanece no comunismo de
Marx apresentado uma fé que deposita nos caprichos do desenvolvimento histórico,
e sua mão invisível cuja manifestação se dá nos modos de produção, a vida futura ,
a felicidade dos justos e o castigo dos maus, parafraseando Rousseau.

2.3 SEGUNDO PERÍODO DO CAPITALISMO

Todavia, no que Santos chama de segundo período do capitalismo, o


capitalismo organizado, observou-se também a passagem da cidadania cívica e
política da tradição liberal, cuja característica é o “conteúdo de pertença igualitária a
uma dada comunidade política e afere-se pelos direitos e deveres que o constituem
e pelas instituições a que dá ázo para ser social e politicamente eficaz” (SANTOS,
2005, p. 243-4), passa a dar lugar a concepção de cidadania social, cuja marca é a
conquista de direitos sociais trabalhistas, de segurança social, da saúde, do acesso
a educação, da habitação – na conquista da casa própria, e na possibilidade de
programação da trajetória familiar viabilizada pela aposentadoria. Este novo
paradigma da cidadania foi reforçado pelo princípio da Comunidade, no pilar da
Regulação, onde a obrigação entre indivíduos e grupos sociais estabeleceu diálogos
com os interesses das classes trabalhadoras. Por um lado, positivamente, abriu
novos horizontes para o desenvolvimento da subjetividade conferindo-lhe maior
autonomia e liberdade (SANTOS, 2005, p. 245), gerando entretanto o aumento do
controle sobre os indivíduos juntamente com a promoção da legitimação do Estado
capitalista – hoje mais hegemônico do que antes. Este controle se deu pela sujeição
dos indivíduos às rotinas de produção e consumo, que é agravada pela
generalização do crédito para consumo presa pelo ciclo vicioso dos empréstimos,
explica Santos, mas também pela criação de espaços urbanos desagregadores e
atomizantes; pela destruição das solidariedades entre redes sociais e de entre
ajuda; e pela promoção de uma cultura midiática massificada, absorvida pela
12

indústria do lazer – onde o tempo livre é negociado e programado para ser


desfrutado passiva e heteronomamente, da mesma forma como no trabalho.

Em resposta a esta cidadania estatizada e consumista, que acaba por


definhar a subjetividade, Marcuse propõem a emancipação do indivíduo e da sua
subjetividade por meio do eros, através de uma “regressão naturalista ao pré-social”
(SANTOS, 2005, p.246). Neste sentido o capitalismo se desenvolveria em
detrimento da subjetividade individual, uma vez que não a desenvolve em suas
necessidades psíquicas, somáticas e emocionais, ou seja, como um todo. Já para
Foucault, segundo Santos, a cidadania sem subjetividade conduz à normatização,
onde os sujeitos são identificados com os poderes-saberes que exercem na
sociedade, um mecanismo que resume a entrada de um novo indivíduo em um meio
social à pergunta: qual a sua profissão? Destarte, a cidadania se dá como fruto do
poder disciplinar que é institucionalizado pelas diferentes disciplinas, que criam os
sujeitos à sua imagem e semelhança que poderíamos chamar de idolatria moderna,
uma vez que a subjetividade encontra espaço para existir apenas dentro do
processo de normatização. Contudo, Santos critica ambas as abordagens
argumentando que cidadania e subjetividade são processos autônomos, embora
intimamente ligados, num mecanismo em que a esfera política do pessoal deve se
expressar em estratégias de cidadania (SANTOS, 2005, p. 246).

Continuando sua análise Santos aponta como consequência de movimentos


estudantis, embasados pela filosofia de Marcuse e em prol de uma oposição ao
produtivismo capitalista e o consumismo, juntamente com a crise do Estado-
Providência, com sua lógica de acumulação, explicitaram diversas opressões sociais
como: a questão do trabalho alienado; da família burguesa; do autoritarismo na
educação; da monotonia do lazer; e da dependência burocrática da sociedade.
Segundo o autor, estes e outros elementos culminaram numa crise do conceito de
cidadania social, o que argumenta ser um "triunfo ideológico da subjetividade sobre
a cidadania" (SANTOS, 2005, p.249), ou seja a sociedade passa a buscar uma
cidadania não hostil à subjetividade, e isto em detrimento da única forma de
cidadania constituída historicamente, a saber, a de cunho liberal. Contudo, esta
busca pelo reconhecimento da subjetividade teve como pano de fundo a colonização
do Estado e da sociedade pela idéia de Mercado, promotora dos ideais de
13

autonomia, liberdade, iniciativa privada, concorrência, mérito, lucro, uma fórmula


cuja resultante é o privatismo, a dessocialização e o narcisismo, no que a sociedade
é cada vez mais marcada pela compulsão consumista de seus indivíduos. No que
tange a questão religiosa, vale dizer que a lógica do mercado também tem
colonizada esta esfera, mais uma vez, no caso do cristianismo brasileiro produtos de
fé são comercializados pelas religiões midiáticas de massa, onde cura, bem estar e
ascensão social e conquistas no próprio mercado se tornam bens de grande
interesse. Em suma, esta hipertrofia do princípio do Mercado promove segundo
Santos um novo desequilíbrio entre os pilares da emancipação e da regulação cujas
conseqüências na década de 90 é um excesso promotor de uma subjetividade sem
cidadania, onde a conduta visa ao "narcisismo e ao autismo" (SANTOS, 2005,
p.256).
Esta hegemonia do princípio do Mercado chega recentemente a atingir um
nível de naturalização social e sua marca passa a ser percebida nos novos
movimentos sociais onde, por exemplo, observa-se o anseio de viver no mercado ao
mesmo tempo lutando contra ele, em outras palavras o Mercado passa a ser
cotidiano ainda que não requeira uma lealdade cultural específica, explica Santos.
No caso do Brasil um dos movimentos que surge, com estas características, são as
Comunidades Eclesiais de Base, por exemplo.
Para nosso tema é importante observarmos que estes novos movimentos
sociais passam a preencher a pauta de requisitos a serem incluídos no conceito de
cidadania. Tais movimentos podem ser encabeçados por grupos sociais específicos
como mulheres, jovens, minorias étnicas, favelados, ou ainda por grupos de
interesse coletivo como movimentos ambientais e pacifistas. Portanto, estes novos
movimentos não mais são formados por classes sociais, mas por grupos, não
buscando também simplesmente a concessão de direitos, o que é típico da
cidadania, mas acabam por exigir uma reconversão global dos processos de
socialização e inculcação cultural ou ainda transformações concretas, imediatas e
locais, como por exemplo a proibição de uma propaganda televisiva violenta
(SANTOS, 2005, p.261). De fato o que estes novos movimentos defendem, e este
ponto e importante para o propósito deste trabalho, é um alargamento da política
14

para além do marco liberal da distinção entre Estado e sociedade civil, nas palavras
de santos:
A politização do social, do cultural e, mesmo, do pessoal abre um campo
imenso para o exercício da cidadania e revela, no mesmo passo, as
limitações da cidadania de extração liberal, inclusive da cidadania social,
circunscrita ao marco do Estado e do político por ele constituído. (SANTOS,
2005, p. 263).

Esta percepção dá luz a uma nova forma de cidadania, que não meramente
individuais são coletivas, assentes em formas político-jurídicas - não mais em
direitos gerais e abstratos - que incentivam a autonomia, que personaliza as
competências interpessoais e coletivas ao invés de uma sujeição a padrões
abstratos. Outrossim, esta nova cidadania está atenta às novas formas de exclusão
social baseadas no sexo, na raça, na perda da qualidade de vida, no consumo, na
guerra e também, em a questão da identidade religiosa - embora esta não seja
citada por Santos. Em suma:
uma cidadania de nível superior capaz de compatibilizar o desenvolvimento
pessoal com o coletivo e fazer da "sociedade civil" uma sociedade política
onde o Estado seja um autor privilegiado mas não o único. (SANTOS, 2005,
p. 268)

Mas para que esta novo ideal de cidadania seja viabilizado Santos explicita
duas questões importantes: a) uma nova teoria de subjetividade, que possa
reconstruir o conceito de sujeito, e; b) uma nova teoria da democracia, que permita
reconstruir o conceito de cidadania e que atenda as novas demandas da ampliação
do campo político.
Em suma, partindo da análise de Santos, observamos três tipos distintos de
cidadania, a saber: 1) a cidadania política e civil, que dota os indivíduos de direitos
e deveres perante o Estado; 2) a cidadania social, que confere aos cidadãos
direitos e uso frutos na sociedade civil; 3) cidadania de nível superior, ou nova,
onde a sociedade civil é transformada em sociedade política, empreendimento que
conclama uma nova democracia e atualizada concepção de sujeito.
Com a ampliação do campo político às demais relações sociais, como as
econômicas, sociais, familiares, profissionais, culturais e religiosas, uma exigência
da cidadania de nível superior torna-se importante a observação da identidade
religiosa. Mas, por que esta questão realmente é importante? Ao se acrescentar a
variável identidade religiosa na complexa relação entre cidadania e subjetividade
15

podem ser elucidados comportamentos sociais dos indivíduos na esfera pública? É o


que nos propomos averiguar a seguir contemplando primeiramente a relevância da
religião na sociedade moderna.

3 RELIGIÃO E SOCIEDADE MODERNA

O fenômeno da secularização gera o que Berger chama de "crise de


credibilidade" da religião (BERGER, 1984, p.139) gerada por um colapso da
plausibilidade das definições religiosas tradicionais da realidade, pensamento que
segue o conceito weberiano de desmagificação do mundo. Esta secularização,
portanto, exerce sua influência tanto em nível subjetivo como objetivo, que por sua
vez promove tanto insegurança no homem contemporâneo quanto a exposição
deste a um assédio de definições da realidade, sejam estas religiosas ou não,
segundo o autor. Neste sentido, o pluralismo se configura como um correlato
socioestrutural de secularização da consciência, em outras palavras, pluralidade e
secularização são fenômenos gêmeos (BERGER, 1996, p.41). Outrossim, uma vez
que a secularização teve como palco os processos capitalistas e industriais a
variável econômica apresenta grande relevância para a análise da sociedade
contemporânea, tendo sido em muitos vezes apontada até mesmo como variável
independente, como no caso do marxismo, contudo dada a complexidade da malha
de relações presentes no fenômeno social da modernidade parece prudente
considerar-se as variáveis economia, religião e, claro, política, como dependentes.
Assim a reflexão sobre cidadania, e impacto da variável econômica sobre esta, pode
ser enriquecida com a sociologia da religião de Berger.
Neste sentido, a sociedade industrial, como berço da secularização, procura
se apresentar como um território livre da influência religiosa, um movimento que se
efetiva na observação da polarização da religião que passa a buscar, então,
acomodação perante a dicotomia do público e do privado, do Estado e da família.
Contudo, no caso da Inglaterra por exemplo observa-se um alto grau de
industrialização juntamente com a presença de um Estado que ainda se apóia em
legitimações religiosas tradicionais. Já no caso dos Estados Unidos a separação
entre estado e igreja é bem delimitada, mas tal separação é desvinculada da
16

ideologia anti-clerical (BERGER, 1984, p.142) no que o estado se mostra inclusive


condescendente com a religião. No caso de países como a França, cujo período de
industrialização se mostrou tardio, observa-se a militância de forças políticas
secularizantes juntamente com a defesa de um laicismo anti-clerical, anti-religioso,
uma postura que nos parece estar estreitamente relacionada com o posicionamento
adotado pelo Brasil. Neste sentido é relevante contabilizar a presença do positivismo
no país e sua relação com o projeto de sociedade republicana juntamente com o
surgimento de um movimento anti-clerical e anti-religioso semelhante ao francês,
numa disputa que marca inclusive o contexto do surgimento das universidades
brasileiras e conseqüentemente a formação da elite intelectual, ou classe de
conhecimento como chamaria Berger; no caso do Paraná tal confronto deixa suas
impressões na constituição da Universidade Federal - UFPR (BEGA, 2006 e
TOMAZI, 2006). Sendo assim tal pano de fundo deve ser analisado como elemento
componente da formação da noção de cidadania no Brasil, uma vez que esta é um
fato objetivo de uma biografia humana, que se forma dentro das estruturas sociais
vigentes onde a religião é fundamentalmente presente, e que é validada como
interpretação oficial da existência individual, objetivamente válida por força de lei e
pela potência fundamental da sociedade de conferir realidade (BERGER, 1984,
p.26).
Contudo, ainda no que tange a religião, o senso comum pode argumentar em
favor de sua irrelevância na contemporaneidade, mas Berger aponta a presença
mundial do fundamentalismo religioso6 como contradição a este pensamento, no
caso do Brasil é fato observar o crescimento das religiões midiáticas de massa e o
fenômeno do evangelicalismo, sem contar a presença das religiões de matriz
africana que parece exercer papel fundamental na esfera privada de nossa
sociedade (DaMatta, 1984; 1986). No entanto é preciso considerar que embora a
tarefa clássica da religião seja a "construir um mundo comum no âmbito do qual toda
a vida social [e isso inclui a cidadania] recebe um significado último que obriga a
todos" (BERGER, 1984, p.145, grifo nosso) os valores na esfera privada da
religiosidade são irrelevantes nas instituições de esfera pública, ou seja, a religião é
aceita na esfera privada sem o status de fundamento ontológico e ainda que possa

6 É interessante observar que Berger considerar a atitude fundamentalista religiosa semelhança às


práticas do Estado totalitarista (BERGER, 1996).
17

se manifestar como retórica pública e virtude privada, como no caso da religião civil
americana ou na referência a Deus por políticos brasileiros, assim, nas palavras do
próprio Berger:
Um homem de negócios ou um político podem aderir fielmente às normas
da vida familiar legitimadas pela religião, ao mesmo tempo em que
conduzem suas atividades na esfera pública sem qualquer referência a
valores religiosos de qualquer tipo (BERGER, 1985, p.145).

Segundo Berger, a busca religiosa do Homem por envolver uma experiência


de transcendência, ou seja, um encontro com uma realidade totalmente outra, acaba
por relativizar o comum pela distinção deste com o sagrado. Com relação a esfera
da ação politica o sociólogo explica que o Estado moderno é totalitário, descansa na
espada, e a instituição política é imponente e opressiva, contudo quando "a política
reconhece a liberdade religiosa como um direito humano fundamental ipso facto
reconhece (sabendo ou não) os limites do poder político" (BERGER, 1996, p.212).
Destarte, a importância da religião se mostra como portadora de uma qualidade
relativizadora e desencantadora das pretensões do poder humano, explica. Assim o
autor defende a primazia da liberdade religiosa, e explica que tanto para um cristão
quanto para um agnóstico a existência humana não pode ser confinada na prisão da
realidade comum.
Com relação a democracia, esta deveria ser uma melhor proteção contra o
governo totalitário, cujo Estado seria "a apoteóse de uma estrutura que em sua
essência contém o impulso para expandir-se por toda a sociedade" (BERGER, 1996,
p.218). Esta asserção de Berger se pauta na premissa de que a liberdade religiosa
não é dos muitos benefícios que o Estado pode conceder a seus cidadãos, ou
súditos, mas encontra sua raiz na própria natureza do homem, lembrando-nos, claro,
de que o fenômeno religioso é encontrado em todas as sociedades. Contudo a
liberdade religiosa não deve se deixar prender pelas jaulas do fundamentalismo,
cujo sistema de fé que tudo abarca e mantendo unido a uma segurança moral que
se acha no direito de se impor a qualquer um (BERGER, 1996, p.220), outrossim
uma fuga da realidade para uma certeza ilusória e necessariamente intolerante, por
isso inadmissível. Esta consideração é importante porque revela não somente o
perigo do fundamentalismo religioso mas também o secular, que é uma forma
generalizada daquele, que pode ser tanto de direita quanto de esquerda, e que
18

manifesta um desrespeito confuso acerca das "superstições" do fundamentalismo


religioso.
Dentro deste contexto, Berger aponta o que chama de classe de
conhecimento (New Class), que diferentemente da velha classe burguesa histórica,
cuja concentração se dá na comunidade empresarial, deriva seus meios de vida e
seu status da produção e distribuição de conhecimento, este simbólico e não
relacionado com bens materiais e serviços, e possui características específicas de
visão de mundo e estilo de vida. Esta classe, segundo Berger, é dotada de valores e
preconceitos que formam importantes políticas, que adquirem força de lei e definem
o que é culturalmente aceitável, e é exatamente esta classe de conhecimento que
hoje procura uma "religião institucionalizada", que nada mais é que a "imposição
estatal de sua mundividência particular e sua moral, e que interfere com o 'livre
exercício da religião' dos que discordam dessa ideologia" (BERGER, 1996, p.222).
Em suma, a análise de Berger não só aponta a importância e presença da
religião na sociedades contemporâneas, com a especificidade de estar em grande
parte, e mais fortemente no ocidente, polarizada entre as esferas do público e do
privado (mostrando uma ruptura com a função tradicional da religião por aqui), como
sua relevância na tarefa de construção do mundo infundindo-lhe significado. Mas, se
a tarefa da construção da sociedade passa pela cosmificação (ato de dar sentido a
realidade) do sagrado a religião não desempenharia ainda papel crucial também na
construção de sentido da esfera pública, ainda que não explicitamente referenciada?
na busca por resposta para tal questão a variável identidade religiosa se torna
relevante.

4 HOMO RELIGIOSUS

Para que possamos avaliar a relevância da variável identidade religiosa é


mister considerarmos uma definição de religião, ainda que a tarefa seja penosa dada
sua complexidade e a brevidade do nosso presente artigo. Grosso modo, a palavra
deriva do latim "Re-Ligare" que significa "religação" com o divino, termo que nos diz
pouca coisa uma vez que pode abarcar diversas concepções, além de não se
adequar a todas as concepções de prática religiosa, como por exemplo se tomarmos
19

o caso do Judaísmo no período hebreu pré-moderno e antigo, este que é uma das
mais antigas tradições religiosas do mundo e ainda em continuidade, cuja
fundamentação é bases tanto para o cristianismo quanto para o islamismo (WEBER,
1974, p.309). Precisamos, portanto, de um conceito mais elaborado. Segundo Peter
Berger, diversos estudiosos abordaram o termo de maneira distinta, por exemplo,
Max Weber ao tratar do assunto argumentou que uma definição de religião deveria
vir ao final de uma pesquisa profunda e detalhada de todas as formas encontradas
desta manifestação nas sociedades (BERGER, 1985, p.182). Contudo, este
posicionamento traz em si uma curiosidade, afinal, como poderíamos empreender
uma pesquisa sobre qualquer coisa sem antes sabermos o que estamos
procurando? Ainda assim é certo que Weber tinha algo em mente, ainda que não o
torne patente, por isto tomou o termo como dado, ou seja, como se o fenômeno
religioso pudesse ser distinguindo intuitivamente por qualquer pessoa, em outras
palavras reconhecido tacitamente7. Para Marx, como já vimos, a religião seria
apenas um espelho da sociedade como produto exclusivamente humano, um reflexo
das mais altas aspirações humanas presentes na ideologia das classes. Já para
Emile Durkheim, aponta Berger, a religião seria importante na sua funcionalidade
social geral, no que ordena a dá sentido às sociedades realizando uma distinção
entre o que é sagrado e profano. Em Thomas Luckman, outro sociólogo, e parceiro
de Berger, a religião “é a capacidade de o organismo humano transcender sua
natureza biológica através da construção de universos de significado objetivos, que
obrigam moralmente e que tudo abarcam” (BERGER, 1985, p.183). Finalmente, para
Berger:
A existência humana é essencial e inevitavelmente uma atividade
exteriorizante. No decorrer da exteriorização os homens conferem
significado à realidade. Toda sociedade humana é um edifício de
significados exteriorizados e objetivados, que tendem sempre a uma
totalidade inteligível. [...] Historicamente considerados, os mundos do
homem têm sido, na sua maioria, mundos sagrados. [...] Pode-se dizer
portanto, que a religião desempenhou uma parte estratégica no
empreendimento humano da construção do mundo. A religião representa o
ponto máximo da auto-exteriorização do homem pela infusão, dos
seus próprios sentidos sobre a realidade. A religião supõe que a ordem
humana é projetada na totalidade do ser. Ou por outra, a religião é a
ousada tentativa de conceber o universo inteiro como humanamente
significativo. (BERGER, 1985, P.40-1, grifo nosso)

7 Para uma abordagem didática a respeito conhecimento tácito, como elaborada por Michael
Polanyi, consultar Cláudio Saiani (2004).
20

Nesta concepção de religião, pode se dizer a Origem de sentido para os


significados da realidade é encontrada tanto nas estruturas fundamentais da
sociedade quanto na efusão dos indivíduos nesta. Mas o que está por detrás desta
necessidade de se construir universos simbólicos ou de classificar a realidade, ou
ainda, que motiva as mais altas aspirações do ser humano? Ora, nos parece que no
âmago desta questão há algo mais fundamental.
Segundo o sociólogo Thomas F. O'Dea uma das definições possíveis de
religião é proposta pelo teólogo Paul Tilich, que a compreende como "uma resposta
ao princípio fundamental, e se torna institucionalizada em pensamento, prática e
organização” (O'DEA, 1969, p. 43), em outras palavras o papel central na
experiência religiosa, partindo desta perspectiva, está no encontro com princípios
fundamentais, um “poder fundamental entendido como base da existência” (O'DEA,
1969, p. 43-44). Um melhor compreensão acerca deste princípio fundamental nos
parece ter sido elaborada pelo filósofo holandês Herman Dooyeweerd, cuja proposta
pode estar no âmago - explicitamente ou não e em maior ou menor grau - nas
definições anteriores e em quem as definiu; em suas próprias palavras:

A Religião é um impulso inato da individualidade humana que a aponta em


direção a verdadeira ou a aspirada Origem absoluta de toda a diversidade
temporal de significados (DOOYEWEERD, 2003, p.230, tradução nossa).

Neste sentido, uma vez que a busca pela significação da realidade é um


fenômeno antropológico, a definição apresentada por Dooyeweerd é relevante
porque revela a necessidade de uma Origem que dá base para esta significação,
assim conscientemente ou não todo ser humano, em qualquer sociedade, tem para
si a crença de algo como sendo a Origem de tudo. Destarte, como revelam estudos
de religião e cosmovisão comparada (CLOUSER, 2005; SIRE, 1997), esta crença
pode ser em um Deus pessoal que criou todas as coisas, uma grande explosão, um
conflito entre os deuses ou ainda uma energia, ou forças, fundamentais, amorfas e
impessoais. Quanto ao fato de esta Origem ser verdadeira ou aspirada é importante
nos atentarmos a uma questão simples de lógica, a saber, que uma mesma coisa
não pode sair de dois lugares diferentes ao mesmo tempo, daí a assertiva de que tal
Origem pode ser verdadeira ou aspirada. Se estamos aqui, viemos de algum lugar!
21

Acreditamos, vale dizer, que enfatizar esta proposição parece não ter sentido útil
frente a cultura do relativismo contemporâneo, que tende a negar sua possibilidade
objetiva, mas tal afirmação relativista para ser logicamente válida parte de si como
sendo absoluta, o que invalida tal proposição8. Assim, mesmo para um ateu que não
crê em um Deus como sendo esta Origem, acaba crendo, como para muitos, que
aqui estamos pelo resultado da combinação entre tempo, acaso e matéria,
mostrando portanto que para ele algo, a matéria, estava lá.
Em suma, se o fenômeno religioso abarca todas as sociedades se
caracterizando como fenômeno antropológico e é fonte de crenças fundamentais
que compõem uma cosmovisão (weltanshauung) e valores que permeiam as
atitudes individuais - além de estar atrelada a questões profundas da humanidade,
que a ciência encontrando seus limites não consegue tratar - provavelmente pode
exercer estreita influência na prática cidadã, cuja perspectiva faz parte da tarefa de
construção do mundo, em outras palavras diferentes ethos religiosos poderiam gerar
práticas diferenciadas na esfera pública?

5 IDENTIDADE RELIGIOSA: INDIVIDUALISMO OU COLETIVISMO?

Como definiríamos então o conceito de Identidade Religiosa? Observamos


anteriormente, que a sociedade é um empreendimento de construção do mundo no
qual a religião ocupa lugar fundamental, contudo para compreendê-la é preciso
considerá-la como fenômeno dialético, ou seja, tanto a sociedade é produto do
homem quanto este daquela (BERGER, 1985, 15-6). Nesta asserção Peter Berger
acredita que uma síntese teórica entre Weber e Durkheim é possível uma vez que
para aquele a realidade social se constitui pela significação da ação social humana
enquanto que para este a sociedade além de estar acima dos indivíduos se lhes
impõem coercitivamente, claro que tal síntese não vai de encontro às intenções
históricas destes sociólogos, reconhece. Esta consideração é importante porque a

8 Neste sentido, aprece ser importante se considerar o Teorema da Incompletude, elaborada pelo
matemático Kurt Gödel, cuja asserção básica é a de que todo sistema axiomático necessita de um
fator externo que o valide, uma ilustração para isto pode ser o Paradoxo do Mentiroso onde a
afirmação, feita por um cretense, de que todos os cretenses são mentirosos, somente pode ser
verdadeira se for falsa. Para uma introdução informal e didática ao assunto consultar Angelini
(2009).
22

ênfase nestas perspectivas isoladas podem levar a uma distorção idealista da


compreensão social, no caso de Weber, ou uma reificação da sociedade, no caso de
Durkheim9.
Para o filósofo americano Roy Clouser as teorias sociais, assim
dicotomizadas, podem ser categorizadas em abordagens coletivistas ou
individualistas de sociedade10. Segundo ele tais representações são errôneas, uma
vez que reducionistas, porque indivíduo e comunidades existem em regime de co-
relação mútua, não podendo um existir sem o outro, no sentido em que um não é
origem nem causa do outro, sendo ambos criados simultaneamente por Deus11. Esta
perspectiva permite uma crítica a teorias que conceituam, explicitamente ou não, a
noção de indivíduo ou sujeito como sendo apenas parte de uma engrenagem, ou
células de um organismo, concebendo-o como sendo nada mais que parte de um
todo (CLOUSER, 2005, p.282), que por sua vez negaria sua subjetividade. Dentro
da nossa temática preocupa-nos uma definição conceitual de identidade religiosa
que não caia no extremo do individualismo, confundindo-se assim com a noção de
subjetividade, nem do coletivismo, no qual desconsideraríamos o caráter dialético da
sociedade.
Em busca de nosso objetivo é imprescindível laborarmos na questão da
identidade religiosa, especificamente no que tange sua definição e sua viabilidade
como variável de análise sociológica. Propomos então uma definição de identidade
religiosa como um conjunto de características pessoais, compostas por crenças
religiosas, que possibilitam uma identificação de ações (físicas e mentais) comuns
entre um grupo de pessoas, gerando senso de pertença e solidariedade. A
formação desta identidade, portanto, passaria pelo que Berger chama de processo
dialético fundamental da sociedade, onde os momentos interiorização, exteriorização
e objetivação estão presentes (BERGER, 1985, p.16). No processo de

9 Nas palavras do próprio Durkheim: "Entre Deus e a sociedade, é preciso escolher. Não examinarei
aqui as razões que podem militar em favor de uma ou de outra das soluções, uma vez que são
ambas coerentes. Acrescento que, do meu ponto de vista, essa escolha deixa-me bastante
indiferente, pois não vejo na divindade mais que a sociedade transfigurada e simbolicamente
imaginada" (DURKHEIM, 1906, p.68).
10 Para uma discussão mais elaborada das idéias de Clouser conferir nosso artigo Roy Clouser e "O
mito da neutralidade religiosa" (BRITTO, 2008).
11 Esta asserção do autor se baseia na crítica transcendental da Filosofia Reformacional, elaborada
por Herman Dooyeweerd e aprimorada por Clouser, e outros. Além disso, no que tange a questão
da necessidade de causas externas para a validação axiomática pode ser interessante averiguar a
relevância do Teorema da Incompletude de Gödel.
23

exteriorização os indivíduos realizam uma contínua efusão de si pautando-se


fundamentalmente por suas crenças, conscientes ou não, mas com base em sua
orientação religiosa, acerca do caráter da realidade (orientação aqui no sentido
utilizado por Dooyeweerd, ou seja, que aponta para a Origem de sentidos da
realidade). Na objetivação a sociedade é identificada como um artefato humano e
na interiorização a realidade é rê-apropriada pelo indivíduo de maneira reflexiva12.
Quanto a relevância sociológica desta variável, para a análise que propomos, esta
foi identificada por Weber ao perceber diferentes éticas (ethos) atreladas às diversas
religiões, reconhecendo no entanto ser esta útil como variável dependente (WEBER,
1974, p.310), que pode trazer a tona elementos importantes para a compreensão da
cidadania.

6 CIDADANIA E IDENTIDADE RELIGIOSA NO CONTEXTO DA


EDUCAÇÃO PÚBLICA

É consenso na perspectiva sociológica que a educação representa importante


papel na reprodução da sociedade através da socialização dos indivíduos que
ocorre também no contexto escolar. Neste sentido, a formação de uma perspectiva
de cidadania certamente se constitui como objeto da atividade educacional, no caso
do Brasil tal papel pode ser explicitado nas diretrizes básicas do Ministério da
Educação, nas recomendações:
A educação formal, na sociedade contemporânea, não é condição
suficiente, mas é necessária para o desenvolvimento da cidadania plena e
para a consolidação da igualdade de oportunidades para todas as pessoas.
(MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2007)

Outro exemplo pode ser observado nas orientações acerca da inclusão da

12 Berger não utiliza o termo reflexividade, que apropriamos aqui num sentido próximo ao utilizado
por Blaise Pascal, que diz: "Em vez de recebermos a idéia pura das coisas, tingimo-la com nossas
qualidades e impregnamos de nosso ser composto todas as coisas simples que contemplamos"
(PASCAL, 1979, p.56). Destarte, uma ação individual que ,exteriorizada, se objetiva pode então
ser interiorizada por outros indivíduos com significação simbólica diferenciada devido a seus
quadros de referência internos, em "estruturas da consciência subjetiva" (BERGER, 1985, p.16).
Contudo, é importante reconhecermos o caráter dinâmico, e dialético, de tal processo, que nos
aproxima do conceito como aplicado por Giddens, que propõe que a "reflexividade da vida social
moderna consiste no fato de que as práticas sociais são constantemente examinadas e
reformadas à luz de informação renovada sobre estas próprias práticas, alterando assim
constitutivamente seu caráter" (GIDDENS, 1993, p.45).
24

disciplina de sociologia como parte obrigatória da grade curricular no Ensino Médio,


tendo como premissa básica, ou expectativa primeira, de preparar os discentes para
o "exercício da cidadania", ou ainda "formar o cidadão crítico" (ORIENTAÇÕES,
2006, p.104-5). Sendo assim, elencando o contexto da educação escolar como base
legítima para investigações acerca do tema que propomos, passamos a avaliar
algumas especifidades da educação para a cidadania comparando alguns dados do
caso brasileiro e inglês. Como nossa análise se restringe, para o momento, a alguns
documentos específicos temos consciência de que o levantamento realizada, além
de ser breve, é de natureza apenas normativa, não contemplando a realidade
empírica de tais contextos.

6.1 INGLATERRA: O PLURALISMO RELIGIOSO

A Inglaterra é um caso interessante para análise porque possui diversas


cidades onde as relações sociais são marcadas tanto pelo pluralismo religioso
quanto cultural. Analisamos brevemente alguns documentos elaborados pela
Citizenship Foundation, ou Fundação para a Cidadania, cujo papel é o realizar
análises sobre a questão da cidadania e da educação no país. Em um documento
encaminhado para um comitê do governo responsável pela questão da cidadania
encontramos logo de início uma definição de cidadania, a saber:
Por cidadania compreendemos o efetivo e informado engajamento de
indivíduos em suas comunidades e na ampla sociedade a respeito de
questões relativas ao domínio público. […] Por esta razão, falamos de
cidadania tanto como um novo sujeito quanto um novo tipo de sujeito.
(BRESLIN; ROWE; THORNTON, 2006, p.2)

Com base nesta definição algumas indicações são propostas, como o


estabelecimento de fundos específicos para a preparação de professores aptos para
a docência de um currículo específico sobre o tema, no caso de escolas
confessionais é recomendada a lidar com questões controversas, especialmente
aquelas relativas a um contexto de fé, com vistas a preparar indivíduos para a vida
numa sociedade pluralista e democrática. Recomenda-se também o investimento
em pesquisas que possam fornecer dados sobres relações inter-religiosas no
contexto escolar. Quanto a questão da identidade religiosa o documento aponta que
25

os estudantes devem estar aptos a lidar com a presença de múltiplos tipos de


identidades, devendo saber portanto como se engajar em tais. Outrossim, é
incentivado um modelo de cidadania que seja pleno e ativo, enfatizando atividades
extra-curriculares na comunidade dos alunos como prática do que é ensinado em
sala de aula. Finalmente, o documento reconhece que diferentes abordagens
acerca da construção da cidadania são utilizados em diferentes países, variando de
acordo com a concepção de democracia, ou falta desta, e com o nível de conflitos
étnicos e religiosos no contexto da pluralização de cada sociedade, concluindo que
pesquisas acerca do ensino de complexas questões que envolvem múltiplas
identidades e como os jovens estudantes se relacionam com elas deve ser
encorajado. Em outro documento analisado a abordagem da prática da cidadania
em contextos religiosas pluralistas é fortemente encorajado (CPD, 2004;
INTERFAITH, 2006).

6.2 BRASIL: UM SINCRETISMO SILENCIOSO?

No caso do Brasil um breve estudo das orientações do Ministério da


Educação para o ensino de cidadania não apresentam uma definição clara
restringindo em alguns casos a usar termos como cidadania plena, ativa, ou
definindo simplesmente como tendo por objetivo “a busca por condições que
garantam uma vida digna às pessoas”. Contudo o termo é utilizado de diversas
maneiras não podendo a ele ser concedido uma definição objetiva e bem definida,
mas aponta para a necessidade de desenvolvimento de “condições físicas,
psíquicas, cognitivas, ideológicas, científicas e culturais” (MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO, 2007, p.11). Outro ponto percebido é o estabelecimento da relação
entre cidadania e ética, onde esta última, compondo a primeira, seria responsável
por instruir o cidadão a valores socialmente desejáveis, que inclui também a
dimensão comunitária dos cidadãos. No que tange a identidade religiosa,
encontramos apenas alguns indícios apontados em princípios como o combate a
exclusões de qualquer tipo, sejam raciais, culturais ou religiosas, o que apontaria
para uma cidadania efetiva. Em suma, a proposta do Ministério da Educação
recomenda uma educação ética voltada para a cidadania, mas tal conteúdo ético
26

deve ser melhor analisado. No site do MEC não encontramos nenhum documento
específico acerca da relação entre religião e cidadania, ou entre identidade religiosa
e esta.
Outro esforço laborado pelo Governo Federal é a criação de um programa
chamado Fórum Escolar de Ética e de Cidadania, cuja base é a discussão dentro
das escolas de temas relacionados a prática cidadã e os problemas da comunidade
(MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2007), cuja análise pode se constituir em
interessante campo para pesquisa empírica. Outro esforço que marca a
preocupação brasileira com a cidadania é a inclusão da disciplina de sociologia no
Ensino Médio como conhecimento necessário ao exercício da cidadania (BRASIL,
2006). Neste sentido, nas Orientações Curriculares Nacionais o papel da sociologia
como ciência é o de grosso modo desnaturalizar e estranhar os fenômenos sociais
levando, como já referido, o aluno a uma postura crítica sobre o tema abordado
capacitando-o a posicionar-se perante a sociedade e sua comunidade local.
No que tange a aplicação destas Orientações ao caso do estado do Paraná,
podemos lançar mão da análise do Livro Didático Público de Sociologia, que por sua
vez atende a recomendação de incluir, em meio aos diversos temas abordados, a
questão da religião e das crenças religiosas.

6.2.1 Potencial de Criticidade do Livro Didático Público

O Livro Didático público de Sociologia aborda o tema da religião no tópico


Instituições Religiosas, para tanto o texto apresenta ao aluno uma definição de
religião como uma mera produção humana, obra da "nossa imaginação e
inteligência, movidas pela curiosidade" (SOCIOLOGIA, 2006, p. 84), uma história
criada para aquietar as angústias humanas. A autora do texto Marilda Iwaya, utiliza
uma definição de religião elaborada por Peter Berger, onde esta é produto do
empreendimento humano da construção de um cosmo sagrado, mas para por ai,
desconsiderando todo a significativa análise daquele sociólogo. Ao nosso ver a
articulação da autora não apresenta aos discentes elementos para uma análise
crítica do fenômeno religioso, em suas próprias palavras, por se tratar de um tema
complexo, "escolhemos para este texto uma pequena definição" (SOCIOLOGIA,
27

2006, p. 84) e em outra parte do texto acrescenta: "não importam suas crenças
religiosas, não importa se você é ateu" (SOCIOLOGIA, 2006, p. 84). Ora, dada a
importância de tal instituição, sem falar no papel da religião no projeto de construção
do mundo, tanto uma pequena definição quanto um descaso para com o conteúdo
das crenças religiosas e seus reflexos na estrutura social são descabidos, além do
que não geram a esperada postura crítica de um cidadão.
Em nossa análise do texto encontramos duas informações erradas, a
primeira, se apoiando no conceito de alienação de Marx, está no seguinte dizer:
Essa é mais uma forma de compreendermos a religião. Que nos leva à
acomodação, à submissão, à aceitação de nosso lugar na sociedade sem
questionamentos como nos sugere o ensinamento "é mais fácil um camelo
passar num buraco da agulha que um rico entrar no reino dos céus"
(SOCIOLOGIA, 2006, p.84)

Nossa crítica quanto a utilização do ensinamento acima é a sua


descontextualização, a referência é feita a uma passagem bíblica do evangelho de
Lucas 18:18-30, que mostra um jovem cujo coração está muito mas ancorado nas
suas riquezas que no desejo de seguir a Jesus para herdar a vida eterna, como
explicado no evangelho de João 17:3: "Esta é a vida eterna: que te conheçam, o
único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste.", e em outra passagem
no livro de Mateus 6:21: "Pois onde estiver o seu tesouro, aí também estará o seu
coração.". Enfim, bastaria uma leitura mais atenciosa do texto citado, uma vez que
no final do relato, localizado em Lucas 18:29-30, Jesus explica que aqueles que
deixaram tudo para segui-lo receberiam "na presente era, muitas vezes mais, e, na
era futura, a vida eterna", assim o ensinamento apresentado não lida com a questão
do dinheiro em si, nem com votos de pobreza, mas sábia exposição do jovem rico à
sua própria ganância. Neste evento Jesus mostra ao jovem que seu desejo pela vida
eterna é na verdade menos importante do que ele próprio pensava. Fazemos esta
crítica aqui porque acreditamos ser importante ressaltar que utilizar um texto bíblico
de maneira descontextualizada em uma disciplina que se propõem a estudar
cientificamente instituições religiosas não é um bom começo.
Outro ponto é relativo a definição dada pela autora para o ateísmo como
sendo uma postura filosófica fundamentada na "total ausência de explicação divina
para a vida" (SOCIOLOGIA, 2006, p.92), proposição que não parece acertada
devido as reflexões que já realizamos e que apontam para a não neutralidade
28

religiosa da atividade humana, neste sentido o ateísmo também encontra em seu


âmago crenças que qualitativamente são indistinguíveis de crenças religiosas.
Ainda, no decorrer do texto são encontrados diversos elementos históricos de
várias crenças religiosas juntamente com alguns poucos posicionamentos teóricos
de Marx, Durkheim e Weber. Um ponto positivo do texto é o alerta para a
colonização da esfera religiosa pela lógica de mercado, que termina por gerar
espertalhões na sociedade ávidos pelo lucro obtido com o sofrimento alheio, sem
dúvida este é um fator presente e importante.
Em suma, o viés utilizado pela autora do Livro Didático Público de Sociologia
parece ser marxista, no que se posiciona em um lugar de neutralidade para tecer
uma postura crítica a respeito da religião. No que tange nosso tema, a questão da
identidade religiosa não é abordada e parece não ser relevante, afinal segundo o
Livro Didático: as crenças dos cidadãos não importam.

7 TÓPICO METODOLÓGICO: CRENÇAS RELIGIOSAS

Uma vez definidos nossos conceitos (cidadania, subjetividade, religião,


identidade religiosa, classe de conhecimento), falta-nos, por uma questão de
viabilidade metodológica para futuras pesquisas empíricas, uma definição de crença
religiosa, passível de verificação, dado que as consideramos parte componente da
formação da identidade religiosa. Uma contribuição do pensamento de Clouser será
útil a nossa investigação, a saber seu conceito de crença religiosa. Em sua definição
utiliza a variável status da divindade cujo papel é o de identificar o que significa ser
divino para as diversas perspectivas religiosas. Sendo assim, algo que constitua
uma realidade não-dependente, a saber, o que simplesmente está lá, é considerado
divino em contraposição ao que é não-divino, ou seja, que depende do divino para a
sua existência. Em outras palavras, o divino é o que existe por si só (per se), é auto-
existente, não dependente de nada a não ser a si mesmo para sua existência e o
não-divino o que depende do divino para sua existência. Com base neste
entendimento Clouser apresenta a seguinte definição:

Uma crença é religiosa desde que:


29

(1) seja uma crença em algo como sendo divino per se não
importando como isso será finalmente descrito, ou
(2) seja uma crença sobre como o não-divino depende do divino per
se, ou
(3) seja uma crença sobre como os humanos vêm a estar em uma
relação apropriada com o divino per se,
(4) o núcleo essencial da divindade per se é ter o status de realidade
incondicionalmente não-dependente (CLOUSER, 2005, p.24,
tradução nossa).

Com base nesta definição, crenças religiosas nem sempre dizem respeito a
um ser supremo, nem sempre envolvem algum tipo de culto o códigos de ética ; ou
seja, qualquer crença em algo não-dependente é uma crença religiosa não
importando como esse algo é concebido. É importante pontuarmos que Clouser
explica que a elaboração de tal conceito se deu como fruto de mais de 40 anos de
estudos em religião comparada, sua área de expertise, sendo portanto conclusão de
análise e não simples ponto de partida teórico, contudo deixa claro que o tal
abordagem semelhante pode ser encontrada em diversos outros autores, a saber:

Virtualmente todos os pensadores pré-socráticos, Platão, Aristóteles,


virtualmente todos os pensadores medievais, João Calvino, e Friedrich
Schleiermacher - para nomear apenas alguns anteriores ao século 20. No
século 20 apenas, também é reconhecida por: W. James, Norman Kemp
Smith, Paul Tillich, Hans Kung, C.S. Lewis, Herman Dooyeweerd, Paul
Chenau, A.C. Bouquet, Mercea Eliade, Joachim Wach, Robert Neville, e Will
Herberg - mais uma vez, para nomear apenas alguns. (CLOUSER, 2004,
p.2, tradução nossa)

Analisando diversas religiões influentes com base no tipo (2), a saber, de


acordo com a forma como vêem a relação de dependência entre o não-divino e
o divino per se, Clouser chegou a identificar 14 tipos de agrupamento; contudo,
elenca três tipos principais, a saber:
(1) Pagão13: Tipo cuja característica essencial é a identificação do divino per
se com alguma parte, aspecto, força, ou princípio do universo aberto à nossa
experiência ou pensamento (CLOUSER, 2005, p.44). Como exemplo, cita a
adoração a Ba'al no oriente, Zeus na Grécia e Júpiter em Roma, deuses adorados

13 Segundo Clouser, a tipologia "pagão" não é empregada aqui da mesma forma como utilizada pela
igreja cristã no período da idade média, cujo sentido seria antagônico ao de "alcançado" pela
igreja, no que distinguia seus membros de seus inimigos.
30

no mundo antigo como controladores das tempestades. Outrossim, podem ser


citados exemplos como a crença no Mana, Numem e Kami como divindades per se.
O tipo pagão também pode ser encontrado sob a forma dualista configurando
o dualismo como um sub-tipo:
a) Dualismo: Sub-tipo pagão cuja característica é a divisão da realidade
entre duas divindades que por sua vez produzem a realidade não-divina. Como
exemplo, Clouser cita o dualismo grego Matéria/Forma, que entre outras coisas
explicava a vida humana como uma constante batalha entre natureza humana
emocional e racional, ou seja marcada pela dicotomia corpo/mente.
Outra questão importante é que a crença religiosa pagã pode resultar ou não
em expressões ritualísticas de adoração, ou seja, pode ser cúltica ou não. Esta
diferença nos remete a dois outros sub-tipos:
(a) Cúltico: O paganismo cúltico, como diz o nome, envolve algum tipo
de adoração, ou rito, à divindade.
(b) Não cúltico: O tipo não cúltico diz respeito a crenças como o
materialismo ou demais teorias que elencam algum aspecto do universo como não-
dependente e portanto divino per se. Um exemplo proposto é a crença dos antigos
pitagóricos de que os números ou outros elementos da matemática são partes de
uma realidade auto-existente da qual tudo, ou pelo menos parte, depende
(CLOUSER, 2005, p.45); segundo Clouser, embora a adoração aos números não
mais exista este tipo de pensamento ainda continua presente em alguns domínios
da ciência. O materialismo dialético proposto por Karl Marx pode ser aqui incluído,
uma vez que se apoia na ideia de auto-existência da matéria física, que por sua vez
é movida pela lei inata do desenvolvimento dialético. Em outras palavras, as teorias
de Marx pressupõem a não-dependência, ou seja, a auto-suficiência da matéria
física (do qual tudo o mais depende) onde cuja lei do desenvolvimento dialético está
simplesmente presente, movendo a história como uma "mão invisível" (CLOUSER,
2005, p.46).

(2) Panteísta: Tipo cuja característica básica é a crença de que tudo o que é
experimentado como realidade, ou seja o não-divino, é de fato uma sub-divisão da
realidade divina, o divino per se, que por sua vez é infinita e a tudo engloba
31

(CLOUSER, 2005, p.48). De maneira geral esta realidade não-divina só pode ser
experimentada misticamente onde uma pessoa por exemplo, pode chegar a romper
com um mundo de meras aparências chegando a ter acesso a uma realidade divina
escondida por esta. Exemplos de realidade divina, ou divino per se nesta
perspectiva seriam o Brahman-Atman no Hinduísmo, Dharmakaya - ou Vazio, Nada,
Nirvana - no Budismo e o Tao no Taoísmo (CLOUSER, 2005, p.49).

(3) Bíblico: Tipo cuja característica principal é a crença teísta em um Criador


transcendente, com isso negando a existência de uma realidade contínua. Neste
sentido, o divino per se não é parte do universo, nem este é parte do divino,
caracterizando uma descontinuidade fundamental entre o criador e sua criação
(CLOUSER, 2005, p.50). No entanto, isto não significa que o Criador não possa se
relacionar com sua Criação (princípio da emanação), como no caso da revelação
cristã de Deus, que cria o universo e os seres vivos a partir do nada, ex nihilo, mas
por ser um Deus pessoal chama homens e mulheres, suas criaturas, a se
relacionarem pessoalmente com ele através de Cristo Jesus. Como exemplo, dentro
deste tipo, podem ser citados além do Cristianismo, o Judaísmo e o Islamismo.
Na ilustração abaixo os principais tipos de crença religiosa são demonstrados
graficamente através de linhas sólidas, que representam o Divino, e por linhas
pontilhadas, que representam o não-divino:

Ilustração 1: Principais Tipos de crença Religiosa

A partir do conceito de crença religiosa, explica Clouser, pode-se realizar uma


tipificação das religiões existentes. No entanto para o que nos interessa no momento
32

as nuanças (1), (2), (3) e (4) do conceito de crença religiosa passam a compor
características fundamentais que formam a identidade religiosa permitindo-nos
tipificá-las de acordo com o tipo (2). Assim, partindo desta reflexão, torna-se
relevante a aplicação de pesquisa empírica que possa comprovar a viabilidade da
identificação de identidades religiosas verificando se estas poderiam ser
categorizadas entre os tipos pagão, panteísta e bíblico, propostos por Clouser,
observando também a existência de sub-tipos, como bíblico cristão evangélico, ou
católico, por exemplo, e hibridações que possam adequar o conceito ao caso
brasileiro.

8 CONCLUSÃO

Como vimos até aqui, a relação entre cidadania e identidade religiosa é


relevante e carece de análises sociológicas, especialmente no contexto da Escola
Pública, em um contexto e re-introdução da disciplina de sociologia com fins a
promoção da cidadania. Acreditamos que o levantamento bibliográfico aqui realizado
pode servir de ponto de partida para investigações futuras que possam contrapor os
tipos de cidadania propostos por Santos, a saber, a cidadania política e civil, social e
de nível superior em sua relação com tipos de identidade religiosa com base na
tipologia proposta por Roy Clouser, cujos tipos básicos se dividem entre panteísta,
pagão e bíblico. Mas que a viabilidade de tal proposta seja verificada faz-se
necessária uma análise empírica para a contraposição de dados coletados com a
base teórica aqui proposta, tal empreendimento parece ser válido e objeto para novo
artigo. Por enquanto, resta-nos a pergunta: a questão da identidade religiosa e sua
atividade na esfera pública, através de práticas de cidadania, é negligenciada por
uma questão de sincretismo religioso, oficialmente não explicitado, ou parte de um
projeto de governo totalitário?

Sola Deo Gloria


33

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