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e a Rebelião dos Titãs

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e a Rebelião dos Titãs

Livro 5 da série Olimpo em Guerra

Tradução
Michele A. Vartuli

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Título original: Pegasus and the Rise of the Titans
Copyright © 2015 by Kate O’Hearn
Todos os direitos reservados.
Tradução para a Língua Portuguesa © 2017 Casa da Palavra/LeYa, Michele A.
Vartuli.

Esta edição foi publicada originalmente na Inglaterra pela Hodder Children’s


Books. O direito de Kate O’Hearn de ser identificada como Autora desta Obra
foi conferido por ela de acordo com a Lei de Direitos Autorais.

Preparação de texto: Thaíssa Tavares


Revisão: Amanda Meirinho
Diagramação: Leandro Collares | Selênia Serviços
Produção editorial: Anna Beatriz Seilhe | Oliveira Editorial
Adaptação de capa: Leandro Dittz

Poema “As baleias não choram” (p. 300-301), de D.H. Lawrence, traduzido por
Fernando Guimarães e Maria de Lourdes Guimarães.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Angélica Ilacqua CRB-8/7057

O’Hearn, Kate
Pegasus e a rebelião dos titãs / Kate O’Hearn ; tradução de Michele A.
Vartuli – Rio de Janeiro : LeYa, 2017.
304 p. - (Olimpo em Guerra, v. 5)

ISBN 978-85-441-0543-6

Título original: Pegasus and the rise of the titans

1. Ficção canadense 2. Ficção fantástica 3. Literatura infantojuvenil I. Título


Índices para catálogo sistemático:
II. Vartuli, Michele A. III. Série
1. Ficção canadense
17-0639 CDD C813

Todos os direitos reservados à


Editora Casa da Palavra
Avenida Calógeras, 6 | 701
20030-070 – Rio de Janeiro – RJ
www.leya.com.br

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Você já se perguntou o que acontece depois de ler “e eles
viveram felizes para sempre”? Eu já.

Adoro os mitos da antiguidade, mas sempre me perguntei o que


acontecia no dia, na semana ou no ano seguinte. O que os
olímpicos faziam quando as histórias acabavam? Suas vidas
devem ter continuado por muito tempo depois que seu último
relato foi contado. Mas o que aconteceu de fato?

O que narro a seguir é o que acredito que houve depois que


Belerofonte cavalgou Pegasus pela primeira vez para destruir a
Quimera. E também sobre o que aconteceu muito tempo
depois que Perseu matou a Medusa, provocando o nascimento
de nosso amado garanhão, Pegasus.

Minhas histórias não são adaptações dos mitos da antiguidade,


pois esses já são perfeitos. São novas histórias sobre o que
aconteceu muito depois dos mitos terminarem...

- Kate O’Hearn

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Em um passado
muito distante

A guerra entre os olímpicos e os Titãs havia sido combatida e


ganha. Júpiter, líder do Olimpo, seus dois irmãos, Netuno
e Plutão, além de Chiron, o centauro, e os três gigantes Hecta-
rônquiros estavam reunidos nas ruínas da sala do trono, encaran-
do os mais perversos guerreiros Titãs.
A batalha final aconteceu no Olimpo. A paisagem ao redor
estava queimada e destruída. A beleza do mundo, manchada. Mas
das cinzas da batalha, o Olimpo voltaria a se erguer. Seria maior
e mais arrebatador do que se poderia imaginar.
Diante de Júpiter, Netuno e Plutão, também conhecidos
como os Três Grandes, estava Saturno, pai deles e líder dos Titãs.
Suas mãos algemadas tremiam de raiva ao encarar os filhos. Acor-
rentados ao seu lado estavam seus irmãos e seguidores mais pode-
rosos; derrotados, mas ainda assim assustadores.
– Esperam que eu me ajoelhe diante de vocês? – desdenhou
Saturno. – Que implore perdão aos meus filhos por desafiarem o
meu poder?
Júpiter olhou para seus irmãos e balançou a cabeça, triste.
– Não, pai, não queremos suas desculpas. E não acreditaría-
mos em sua sinceridade se você as pedisse. Suas palavras nada
significam para nós.

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– Então, o que querem? – exigiu Saturno. – O que vocês
poderiam fazer comigo? Não podem me destruir, nem a nenhum
outro Titã. Somos poderosos demais.
– Você está certo, pai. Não podemos destruí-lo e é horrível
que você seja capaz até de sugerir uma coisa dessas. Ainda somos
seus filhos.
– Meus filhos? – questionou Saturno, cuspindo no chão. –
Vocês nunca deveriam ter fugido do Tártaro. Órfãos ingratos. É
isso o que vocês são. Não são meus filhos!
Netuno suspirou.
– Suas palavras e ações revelam a profundidade do ódio que
sente por nós. Você só conhece a sede de poder. Você é uma
doença que precisa ser extirpada das nossas vidas antes que possa
espalhar ainda mais sua infecção.
Saturno riu com desprezo.
– Vou perguntar novamente: o que podem fazer comigo?
Vocês não passam de sombras da minha grandeza!
– Não, pai, não somos sombras – declarou Netuno. – Era
você que lutava com as sombras.
– Você torturou inocentes para criar seu exército de Titãs das
Sombras – prosseguiu Plutão. – Mas mesmo eles não conseguiram
nos derrotar. Foram destruídos, e nós ainda estamos aqui.
– Foi sua arma secreta que destruiu meus Titãs das Sombras,
não vocês. Vocês esconderam a garota de mim, mas isso é só um
inconveniente temporário. Eu a encontrarei e, quando isso acon-
tecer, meus Titãs das Sombras vão se reerguer e eu dominarei
esses mundos. Esse é meu destino.
– Emily está fora do seu alcance! – gritou Júpiter. – A guerra
acabou. Você foi derrotado!
– Jupe, calma – avisou Netuno. – Ele está tentando provocar
você.
Júpiter respirou fundo para se acalmar.

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– A paz voltou aos mundos. Com o tempo, o Olimpo, Titus
e a Terra vão se recuperar. Sua presença sombria será apagada e
você será esquecido. – Júpiter ficou de pé para pronunciar sua
sentença. – Saturno de Titus, você foi declarado culpado de crimes
contra o Olimpo. Nós o condenamos ao mesmo fim que nos
destinou. Você será levado daqui e aprisionado nas profundezas
do Tártaro para nunca mais experimentar a liberdade.
– O Tártaro jamais vai me deter! – gritou Saturno. – Rendam-
-se agora e terei misericórdia.
Júpiter balançou a cabeça.
– Você não sabe o significado da palavra misericórdia. Não,
pai, isso acaba agora. Você e seu povo serão levados ao Tártaro e
trancafiados nas entranhas da prisão. Nunca mais verão a luz do
dia.
– Você vai desejar a morte, pai – garantiu Plutão com voz
sombria. – Mas eu não a concederei. Você viverá e sofrerá como
nós sofremos por tanto tempo.
Saturno ergueu as mãos. As pesadas algemas de metal come-
çaram a tilintar. Sua fúria explodiu em chamas e raios que irrom-
piam de suas mãos na direção dos filhos.
Instintivamente, Júpiter, Netuno e Plutão ergueram as mãos
para criar um escudo e desviar o ataque. As chamas ricochetearam
ferozmente pela sala do trono, derretendo escombros e transfor-
mando rochas em vidro. Os olímpicos correram para se abrigar e
se agacharam atrás das colunas, mas felizmente as defesas dos Três
Grandes os protegeram.
– Pai, pare! – urrou Júpiter. – Você não vencerá!
– Então destruirei todos nós!
As chamas e os raios de Saturno aumentaram mais ainda, até
que ele começou a se cansar e as explosões enfraqueceram e desa-
pareceram. Saturno estava diante dos filhos, suado e ofegante,
tentando recuperar o fôlego.
– Isso não muda nada.

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Júpiter balançou a cabeça, enojado.
– Isso muda tudo. – afirmou ele. E fez um sinal para os
Hectarônquiros. – Levem-nos embora daqui.
Cada um dos três gigantes leais balançou suas cinquenta cabe-
ças e fez uma reverência desajeitada. Usando seus cem braços, se-
guraram os prisioneiros que protestavam e os arrastaram para fora.

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O Olimpo à noite era tão lindo quanto de dia. O ar era puro


e fresco, e uma sensação de paz prevalecia. A temperatura
caía, mas somente um pouco. Flores que só se abriam ao anoite-
cer desdobravam suas pétalas delicadas e liberavam seu intenso
perfume no ar.
Era nesse horário que os habitantes noturnos saíam de suas
casas. Sua pele pálida e fina quase brilhava à luz das estrelas, e suas
vozes eram tão baixas quanto sussurros. As crianças noturnas nun-
ca erguiam a voz, nem mesmo quando brincavam. E, como todos
os olímpicos, os habitantes noturnos se curvavam com respeito
quando Emily, a Chama do Olimpo, passava por eles.
Emily andava pelos jardins nos fundos do palácio de Júpiter
com seu cão, Mike, saltitando alegremente ao seu lado. Mike era
o mais novo membro da família. Ela o trouxera de Atenas em sua
última viagem ao mundo dos humanos, que parecia ter aconteci-
do em uma vida passada, embora nem fizesse tanto tempo.
Ao se aproximar do rio, Emily viu o brilho de tochas e ouviu
risadas. Ela sorriu ao reconhecer os gritos dos seus amigos Joel e
Paelen, e apertou o passo para poder entrar na brincadeira.
Logo à frente, ela viu Pegasus. O garanhão alado mantinha a
cabeça majestosamente erguida, com as asas imaculadas e bem-
-cuidadas, brilhando de saúde e alegria. Só de vê-lo, Emily ficava
sem fôlego.
Ela parou para apreciar a beleza do garanhão e o quanto ele
significava para ela. Toda a sua vida mudara no momento em que
se encontraram, e os dois já haviam passado por tanta coisa juntos.

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Ele era tão parte dela, agora, que Emily não conseguia se ver um
só dia longe dele.
Pegasus estava com seu irmão gêmeo, o javali alado Crisaor,
que parecia muito mais desleixado. Suas penas marrons e ásperas
estavam todas espetadas, e ele parecia ter acabado de rolar na lama.
Três jovens habitantes noturnos estavam com eles. Uma ga-
rota no início da adolescência, com longo cabelo branco e uma
voz suave como uma brisa mansa, virou-se e cumprimentou Emily
com uma reverência formal quando ela se aproximou.
– Chama, é uma honra vê-la essa noite.
– Olá – respondeu Emily. – Por favor, não precisa se curvar.
Só me chame de Emily.
A habitante noturna fez cara de susto.
– Mas você é a Chama do Olimpo! Não posso chamá-la por
outro nome. Dizem que você tem poderes maiores que os do
próprio Júpiter! Deve ser sempre respeitada.
Emily deu uma risadinha. Ela ainda não estava acostumada
com aquele status tão elevado. Era verdade que ela alimentava a
Chama do Olimpo: a fonte de poder dos olímpicos. E havia até
um templo dedicado a ela. Mas, na maior parte do tempo, ela se
sentia apenas Emily Jacobs, uma garota de Nova York que calhou
de ter um garanhão alado como melhor amigo.
Ela sorriu para a habitante noturna.
– Posso ser a Chama e tenho poderes sim, mas mesmo assim
sou uma garota como você. Você poderia me chamar de Emily,
então?
Uma cor estranha apareceu no rosto fantasmagoricamente
branco da garota ao assentir.
– Sou Fawn. Estes são o meu irmão Dax e nossa irmãzinha,
Sapphire. – Fawn abriu um sorriso imenso, exibindo seus dentes
pequenos de pontas afiadas.
O garoto era um pouco mais velho que a irmã e ainda mais
tímido. Havia uma beleza tranquila neles, ali parados perto de

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Pegasus. Emily tinha certeza de que, se olhasse as mãos deles
contra a luz, veria a aura da luminosidade através delas.
A irmãzinha menor parecia ter 5 ou 6 anos. Era alegre, agi-
tada, e parecia mais interessada em fazer carinhos nas asas de
Crisaor enquanto tagarelava sem parar com o javali alado.
– Vejo que conheceram Pegasus – comentou Emily, tentando
tirar algumas palavras de Dax. Ela se aproximou do garanhão
alado. – Olá, Pegs. A noite não está linda?
Pegasus relinchou e encostou a cabeça nela.
– Você é magnífico – disse Fawn a Pegasus, acariciando seu
focinho. – Vi você pelo Olimpo durante toda minha vida, mas é
a primeira vez que temos a oportunidade de nos conhecer. – Ela
o encarou, ansiosa. – Deve ser maravilhoso ter asas e poder voar.
– Fawn se virou novamente para Emily. – Vocês têm muita sorte
de serem amigos.
– Eu sei – concordou Emily. – Eu estaria perdida sem ele.
Emily viu Pegasus corar com o elogio. Ele relinchou e bateu
os cascos de leve no chão.
Os olhos escuros de Fawn reluziram.
– Podemos mesmo?
– O que ele disse? – perguntou Emily. Apesar de morar no
Olimpo há muito tempo, ela ainda não era capaz de entender as
palavras do garanhão.
Fawn estava praticamente dando pulos de alegria.
– Ele disse que qualquer noite dessas podemos sair todos
juntos para voar. Ele vai me deixar montá-lo.
– É uma ótima ideia – comentou Emily. – Não existe nada
melhor do que voar com ele, especialmente à noite.
A cabeça do garanhão balançou para baixo e para cima, e ele
relinchou baixinho para Fawn, que baixou a cabeça, tímida.
– Obrigada, Pegasus.
Emily não fazia ideia do que ele havia dito, mas, pela expres-
são no rosto de Fawn, aquilo a deixara muito feliz.

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Mike estava latindo, desesperado para que alguém brincasse
com ele. Dax se curvou para afagá-lo e, quando deu por si, o
grande cão havia saltado em cima dele, derrubando-o no chão. O
riso suave do habitante noturno ecoava, enquanto os dois rolavam
na grama, abraçados.
– Nós vamos nadar – convidou Emily. – Querem ir com a
gente?
– Obrigada, Chama... quero dizer, Emily – agradeceu Fawn.
– Mas precisamos ir trabalhar.
– O que vocês fazem?
– Trabalhamos nos canteiros de néctar – explicou Dax, ainda
brincando com Mike. – Nossa função é extrair o néctar das flores.
Isso só pode ser feito noite. As flores desabrocham com o brilho
das estrelas.
– Eu carrego água – contou Sapphire. – É um trabalho im-
portante.
– Com certeza! – concordou Emily, encantada com a peque-
na habitante noturna.
Dax soltou Mike e ficou de pé. Ele pegou a irmãzinha pelo
braço.
– Sinto muito, mas precisamos ir. – Ele sorriu, tímido, para
Emily, que notou como ele era estranhamente atraente. Seus
olhos eram elípticos como os de uma cobra e, embora fossem
negros como a noite, faiscavam e brilhavam. Seus traços eram
angulosos, mas não desagradáveis. Foi então que Emily notou
que suas orelhas eram pontudas como as dos elfos. As orelhas de
Fawn e Sapphire estavam quase totalmente escondidas pelos lon-
gos cabelos brancos, mas agora Emily conseguia distinguir suas
pontas também.
– Claro – disse Emily, dirigindo-se para Fawn. – É só me
avisarem quando tiverem uma noite livre, aí faremos aquele voo.
Os olhos de Fawn brilhavam de empolgação enquanto o ir-
mão as levava embora.

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– Pegs – perguntou Emily, olhando-os irem embora –, quan-
do Júpiter permitia visitas à Terra, algum habitante noturno ia
para lá?
O garanhão relinchou e assentiu.
– Ouvi dizer que eles nunca saem à luz dia porque machuca
os olhos deles e queima suas peles finas. É verdade?
Mais uma vez, Pegasus assentiu.
– Hmmm – ponderou Emily, estudando os outros habitan-
tes noturnos na área. – Será que eles são a origem do mito dos
vampiros na Terra? Eles têm grandes olhos negros, além da pele
pálida que queima sob a luz do sol, como os vampiros. Sei que
os habitantes noturnos não bebem sangue, mas seus dentes são
pontudos, e o néctar que eles colhem é vermelho. Talvez seja
por isso.
Pegasus e Crisaor responderam com relinchos e grunhidos,
mas o significado das palavras deles continuava um mistério para
Emily. À medida que se aproximavam do rio, os sons dos gritos
e das risadas ficavam mais altos. Mike correu na frente e, quando
viu Joel na água, saltou no rio.
Joel riu ao ver o cão nadando na sua direção. Ele olhou para
Paelen, que estava de pé no trampolim.
– Vai, Paelen, faça como mostrei. Pule!
Fora preciso certo esforço de Joel para convencer Júpiter de
que eles precisavam de um trampolim, mas, depois que ele foi
construído, muitos olímpicos gostaram de usá-lo, e já falavam em
fazer outro, mais alto, para quando o rio estivesse mais cheio.
Emily olhou Paelen se balançar na ponta do trampolim, usan-
do seu calção de banho olímpico de seda. Não era muito diferen-
te de uma bermuda, mas era branco e tinha pequenas pregas
benfeitas. Seu corpo era liso e magro, e não revelava a sua grande
força ou a capacidade única de se alongar e manipular sua forma
para entrar em qualquer espaço ou chegar a quase qualquer dis-
tância. Emily conheceu Paelen na época em que ele usava essas

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habilidades para ser um grande ladrão, mas, com esses dias no
passado, agora ele era um dos melhores amigos de Emily.
O pai de Emily, Steve, estava na margem do rio dando ins-
truções de mergulho a Paelen, que se provaram inúteis. Ao saltar
do trampolim, Paelen subiu muito acima da água e, em vez de
estender os braços e dobrar o corpo para mergulhar, bateu na
superfície de barriga.
– Ui! – exclamou o pai dela.
Paelen voltou à tona, tossindo e cuspindo água.
– Nunca vou aprender.
– Claro que vai – riu Joel. – Só precisa praticar.
A risada de Joel fez o coração de Emily balançar e um sorri-
so aflorar em seus lábios. Como ela, ele também viera para o
Olimpo de Nova York. E, embora fosse humano, Joel parecia
estar em casa. Seu peitoral largo e forte e seus lindos traços italia-
nos faziam com que ele fosse facilmente confundido com um
olímpico. A única coisa que o diferenciava eram seu ombro e
braço prateados. Ele perdera o braço de carne e osso durante a
batalha com as górgonas, e Vulcano fizera aquele poderoso mem-
bro artificial.
Três ninfas aquáticas vieram à tona atrás de Joel. Seus olhos
claros brilhavam enquanto acariciavam o ombro prateado dele,
no ponto onde o braço artificial se unia ao corpo. À luz das tochas,
o metal parecia ouro derretido.
Tanto Joel quanto Paelen coraram quando as lindas ninfas
começaram a cantar.
Paelen nadou para mais perto delas.
– É, Joel tem um braço de prata, mas vejam o que consigo
fazer. – Tirou o braço da água e usou seus poderes para estender
ossos e músculos. – Não é tão sensacional quanto um braço de
prata? – perguntou ao mexer os dedos da mão.
As três ninfas aquáticas não ficaram impressionadas. Volta-
ram-se para Joel e, dando risadinhas, submergiram no rio.

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– Esperem, não vão embora – gritou Paelen, decepcionado.
– Voltem!
– Deixe elas irem – disse Joel. – Você ainda precisa aprender
a mergulhar. – Quando seus olhos pousaram em Emily, na mar-
gem, ele sorriu. – Ei, Em, você poderia mostrar a Paelen como se
mergulha?
Qualquer resquício de ciúme que Emily poderia ter sentido
das lindas ninfas aquáticas desapareceu quando se tornou o mo-
tivo do sorriso iluminado de Joel. Ela deixou sua toalha com o
pai, subiu até o trampolim, balançou-se duas vezes e lançou-se
graciosamente no ar, mergulhando de modo perfeito no rio.
Joel espirrou água em Paelen.
– Viu? É assim que se faz!
– Foi exatamente o que eu fiz – contestou Paelen. – Só ficou
um pouco diferente.
Joel caiu na risada.
– Que história é essa? Você caiu de barriga!
– Dá no mesmo – concluiu Paelen, enquanto Pegasus entra-
va na água seguido por Crisaor.
Emily nadou até o garanhão e notou que Paelen e Joel olha-
vam fixamente para o mesmo ponto. Ela seguiu seus olhares até
encontrar Diana, a grande caçadora, aproximando-se do rio.
Ela usava um maiô dourado, e seu longo cabelo negro
estava livre de suas costumeiras tranças apertadas, caindo em
seus ombros e pelas costas. Diana estava sempre linda, mas
eles raramente a viam tão relaxada. O rosto dela se iluminou
com um sorriso quando o pai de Emily se virou para cumpri-
mentá-la.
Emily riu de seus amigos com os olhos vidrados em Diana e
jogou água em seus rostos.
– Ei, por que fez isso? – perguntou Joel.
– Parece que vocês dois precisam esfriar a cabeça – provocou
Emily.

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O pai de Emily beijou Diana no rosto. Depois, eles entraram
na água e começaram a nadar juntos rio abaixo.
– Você está feliz com isso? – perguntou Joel. – Quero dizer,
com sua mãe, e tal...
Ela fez que sim com a cabeça.
– Sei que meu pai amava minha mãe de verdade, mas ela
morreu há muito tempo e ele ainda é jovem. Não gostaria que
ele ficasse sozinho. E sei que Diana gosta muito dele.
Pegasus nadou por trás dela e a empurrou de leve, relinchan-
do baixinho.
– Diana está sozinha há tempo demais – comentou Paelen.
– Pegasus disse que está feliz por vê-la com seu pai. Eles combi-
nam, porque seu pai não tem medo do temperamento dela.
Emily afagou o focinho branco do garanhão.
– Achei que seria estranho ver meu pai com outra pessoa, mas
Diana é diferente. Ela já faz parte da família para mim.
Emily nadou até a margem e subiu de novo no trampolim
para tentar ensinar Paelen a mergulhar.

Mais tarde, naquela noite, Pegasus acompanhou Emily de volta


ao apartamento que os dois dividiam com o pai dela, Joel e Pae-
len. Embora o garanhão tivesse seu próprio quarto, na maioria
das noites ele montava guarda no de Emily. Ela insistia que não
precisava de proteção, mas gostava da presença do seu amigo mais
querido.
Pegasus dormiu perto da porta enquanto Emily relaxava em
sua cama e folheava um velho diário. Ele fora escrito pelo Agente
B, da Unidade Central de Pesquisas. Ele havia lutado ao seu lado
quando ela viajara de volta no tempo para a guerra contra os
Titãs. Inimigo no começo, no fim da guerra o Agente B havia se
tornado um amigo muito próximo.

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Ainda era difícil acreditar que ela um dia tinha chamado um
agente da UCP de outra coisa que não de inimigo. Quase desde
o primeiro dia em que ela encontrara Pegasus, a UCP agiu como
uma sombra escura que os encobria. Eles caçaram os olímpicos e
criaram clones usando o sangue deles. Torturaram ela e seus ami-
gos em busca de informações. A UCP era a causa da maioria dos
seus problemas, mas, de alguma forma, o Agente B se provara um
amigo leal e confiável.
Ela já havia lido as páginas amareladas daquele diário tan-
tas vezes que praticamente decorara cada parágrafo. Mesmo
assim, continuava a relê-lo, pois aquele livro, seu próprio diário
e o pingente prateado em forma de Pegasus que ela sempre
usava eram as únicas provas remanescentes da sua jornada ao
passado distante.
Claro, Mike ainda estava com ela. O cão abandonado que
eles adotaram em Atenas roncava baixinho ao seu lado. Ocasio-
nalmente, ele rosnava e movia as patas como se estivesse correndo.
Emily se perguntava se ele sonhava estar lutando contra os Titãs
das Sombras.
Mas, tirando o cachorro e alguns dos olímpicos originais que
haviam vivido aquilo tudo com ela, ninguém se lembrava dos
acontecimentos do passado. Todas as aflições que eles vivencia-
ram, todas as perdas e, finalmente, o triunfo, foram apagados das
memórias daqueles que viajaram no tempo ao seu lado.
Foi exatamente como o Agente B disse que seria. Depois que
Emily usara seus poderes para destruir a arma dos Titãs, um
botão cósmico de reiniciar havia sido ativado. Tudo voltara ao
normal, como se a descoberta da arma na Grécia contemporânea
nunca tivesse acontecido.
Nem mesmo Pegasus se lembrava da jornada. Essa era a par-
te mais difícil: não poder falar com o garanhão alado sobre aqui-
lo, porque para ele fazia parte de uma linha do tempo diferente,
que ele não havia vivido. Muitas vezes ela olhava para o saudável

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e jovem garanhão alado e, de repente, se lembrava do Pegasus
velho que morrera em seus braços.
Porque Pegasus morrera em seus braços, quer ele se lembras-
se disso, quer não.
Emily parou em uma parte do diário que já lera tantas vezes
a ponto de conseguir recitá-la de memória.

Emily e Joel se aproximaram tanto. Depois da morte de Paelen e de


Pegasus, algo mudou entre os dois. Eles estão inseparáveis, e isso me
preocupa. Se alguma coisa acontecesse com Joel, acho que ninguém
conseguiria conter a fúria de Emily. Estou convencido de que ela
perderia o controle de seus poderes. Eles a dominariam e nenhum de
nós sobreviveria a isso.
Conheço Emily – falar com ela não adianta. Tudo o que posso fazer
é estar ao lado dela e oferecer a orientação ou o apoio que puder.
Também vou manter uma vigilância particularmente protetora sobre
Joel. Já falei com Júpiter e os outros sobre isso, e todos concordamos.
Nada deve acontecer com Joel. Pelo bem de Emily. E pelo nosso.

– Ele tinha medo de mim – ponderou Emily em voz alta,


olhando para Mike. – Temia que eu surtasse, perdesse o controle
dos meus poderes e destruísse tudo. – Emily falou em voz alta,
mesmo sabendo que isso não teria acontecido.
Mas então o belo rosto de Joel, com seus olhos negros e
ardentes, suas maçãs do rosto pronunciadas e lábios cheios e
bem moldados, apareceu em sua mente e ela refletiu mais um
pouco sobre o assunto. Talvez o Agente B tivesse razão. E se
algo tivesse acontecido com Joel, o que ela teria feito? Poderia
mesmo ter perdido o controle.
Emily folheou o diário e encontrou um esboço que o Agen-
te B desenhava, que mostrava Emily e Joel sentados juntos, assan-
do maçãs do Olimpo em uma fogueira. Estavam rindo enquanto
o velho Pegasus descansava ao lado dela.

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Emily se lembrava de muitas noites assim. Momentos passa-
dos com Joel, nem sempre conversando, mas dizendo tudo com
o olhar. Saber que cada dia poderia ser o último tornava cada
momento juntos muito mais precioso.
Emily inclinou a cabeça para o lado. O esboço era bom: o
Agente B havia retratado Joel com perfeição. Olhar para o dese-
nho fez seu coração bater mais rápido. Ela sentiu seu rosto se
aquecer ao lembrar do beijo que os dois deram.
– Ele ama você – comentou Riza baixinho em sua mente.
Emily sorriu. A voz da ancestral Xan que vivia dentro dela a
assustara no início, mas agora Riza era como uma irmã gêmea, e
Emily não conseguia imaginar sua vida sem ela.
– Sim, eu sei – respondeu Emily.
– E você o ama.
Emily ficou ainda mais vermelha.
– Sim.
– Então, o que vai fazer a respeito? – provocou Riza.
Emily deu de ombros.
– Não sei. Joel não se lembra de ter me contado isso.
– Você não pode me enganar, Emily – gracejou Riza. – O pro-
blema não é Joel não se lembrar; é você. Você tem medo de contar a
ele tudo o que aconteceu naquele passado. Deveria deixar que ele
lesse o diário do Agente B.
– Não estou com medo – disse Emily com uma voz que não
convencia nem a ela mesma. – É só que... – fez uma pausa.
– Sim...?
Um barulho estranho vindo de fora da janela a poupou de
ter que responder. Olhando lá fora, Emily percebeu um movi-
mento rápido demais para ser seguido. Alerta, chamou o garanhão
alado até a janela.
– Pegs, tem algo estranho acontecendo lá fora.
Emily apontou para a janela quando ele chegou ao seu lado.

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– Eu ouvi primeiro e, quando cheguei perto, vi alguma coisa
se mexendo bem rápido em direção aos fundos do palácio.
Pegasus relinchou baixinho, depois farejou o ar. Sua cabeça
balançou para cima e para baixo. Ele olhou para Emily e abaixou
uma asa, convidando-a a montá-lo. Sem hesitação, Emily subiu
nele e segurou sua crina. Pegasus saltou graciosamente para fora
da janela e começou a voar.
A viagem foi curta. O garanhão bateu as grandes asas e os
levou para os jardins aos fundos do palácio de Júpiter. À luz das
estrelas, Emily viu que eles estavam indo para o grande labirinto
de arbustos.
Pegasus pousou na entrada do labirinto e balançou a cabeça
mais uma vez.
– Lá dentro? – perguntou Emily. Desmontou dele e, com
Pegasus ao seu lado, entrou no labirinto. Não tinha sensação algu-
ma de perigo, apenas uma curiosidade que não podia ser ignorada.
Pegasus farejou o ar de novo e começou a trotar. Ao se apro-
ximarem do centro do labirinto, Emily ouviu alguém soluçando
baixo.
Dobrando uma última esquina, ela viu o que parecia ser uma
leoa, mas com a parte superior do tronco humana e grandes asas
como as de uma águia. A criatura estava agachada no canto da
trilha, chorando em silêncio.
– Alexis? – sussurrou Emily.
A Esfinge do Olimpo tinha a cabeça apoiada nas patas e suas
grandes asas de águia pendiam ao chão. Quando Alexis levantou
a cabeça, Emily viu que seus adoráveis olhos verdes estavam in-
chados e vermelhos.
– O que houve? – perguntou Emily, correndo para o lado
da Esfinge.
Alexis se sentou e tentou secar as lágrimas com suas grandes
patas, enquanto continha os soluços.
– Não... não é nada.

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– Isso não é “nada”. – Emily estendeu a mão e enxugou de-
licadamente as lágrimas da Esfinge. – Por favor, conte para gente
qual é o problema.
Alexis fungou de novo.
– É Juno. Ela ordenou que eu volte para o palácio. Sente que
estou negligenciando minhas obrigações aqui. Ela não entende
como é para mim, e a vida que escolhi levar.
– A vida com Tom, você quer dizer – esclareceu Emily. – Você
não quer deixá-lo. – Alexis fez que sim com a cabeça, enquanto
suas lágrimas continuavam a correr.
Emily se sentou sobre os calcanhares. Tom, anteriormente
conhecido como Agente T, fora um perigoso membro da super-
secreta Unidade Central de Pesquisas. Seu trabalho era caçar e
capturar os olímpicos para explorar seus poderes. Então, Cupido
o encantou, e o letal agente mudou. Mas essa mudança comple-
ta só ocorreu depois que Tom conheceu Alexis e foi para Las
Vegas ajudá-los.
Quando o Agente T se deparou com a letal Alexis, foi amor
à primeira vista. Mas em seguida Tom foi gravemente ferido e
ficou paralisado. A única maneira de Júpiter salvá-lo foi transfor-
má-lo em um salgueiro. Desde o momento em que ele chegou ao
Olimpo, Tom e a Esfinge se tornaram inseparáveis.
Alexis fungou.
– Tom é a minha vida. Não suporto ficar um momento sequer
longe dele. Mas, quando pedi a Júpiter que o transportasse para
cá, soube que Tom não sobreviveria à mudança. Por ordem de
Juno, vamos nos separar.
Emily sabia o quanto a Esfinge gostava do Agente T, e o
quanto seu amor era correspondido.
– Ela não entende! – reclamou Alexis. – Deixar Tom é como
arrancar minhas garras uma a uma. Mesmo assim, Juno insiste
que eu volte para o palácio.
Alexis estava arrasada ao se virar para Emily.

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– Por favor, me diga o que fazer... Como fazê-la entender?
Não posso desafiar Juno, mas não posso ficar aqui.
– Posso conversar com ela se você quiser...
Alexis fez que não com a cabeça.
– Não vai dar certo. Ela está irredutível. A menos que encon-
tremos uma maneira segura de transportar Tom para cá, vou
perdê-lo. – Alexis baixou a cabeça sobre as patas novamente. –
Não há esperança... – lamentou ela. – Não há mesmo...
– Emily, existe uma maneira – falou Riza suavemente em sua
cabeça. – Eu já deveria ter pensado nisso. Deixe Alexis aqui. Tive
uma ideia. Mas vamos precisar de Pegasus.
Emily afagou o ombro da Esfinge.
– Não desanime, Alexis, vamos encontrar um jeito de você e
Tom ficarem juntos. Prometo. Fique aqui um momento. Eu já
volto.
Levantando-se, Emily levou Pegasus para fora do labirinto.
– Então, o que vamos fazer? – perguntou a Riza.
– Vamos ver Tom. Acho que vai funcionar.
– Pegs, você leva a gente até Tom? Riza teve uma ideia.
O garanhão baixou sua asa, e Emily montou em seu dorso.
Em poucos momentos, eles estavam no ar, se afastando do labi-
rinto. Com a luz das estrelas para guiá-los, deixaram o verde vi-
cejante da área ao redor do palácio e atravessaram um estéril de-
serto arenoso até o lar da Esfinge.
Pegasus pousou diante de um salgueiro alto, verde e cheio de
folhas. Emily olhou para cima e viu o que parecia ser uma grande
casa na árvore, construída em seus galhos com uma grande plata-
forma plana e uma parede. O resto era aberto para facilitar os
pousos e as decolagens na árvore.
– Tom? – chamou Emily.
– Emily! – respondeu a árvore com sua voz aguda e folhosa.
– E Pegasus. Que maravilha a visita de vocês. Mas, se vieram ver
Alexis, infelizmente ela não está.

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– Eu sei – afirmou Emily. Ela se aproximou da árvore e afagou
o grosso tronco para cumprimentá-la. – Acabamos de deixá-la no
labirinto de Júpiter. Ela estava chorando.
As folhas da árvore começaram a se agitar.
– Ela está bem? Aconteceu alguma coisa?
Emily balançou a cabeça.
– Não, ela está bem. Mas sente sua falta. Juno ordenou que
ela voltasse para o palácio, mas ela não quer ir.
– Também não quero que ela vá – confessou Tom com tristeza.
– Os dias e as noites vão ser intermináveis para mim. Mas é o dever
dela. Se tem uma coisa que Alexis entende são suas obrigações.
– Tom, você se lembra de Riza?
– Claro que sim. Olá, Riza.
– Olá, Tom – saudou-o Riza pela boca de Emily. – Tive uma
ideia que pode ajudá-los a ficarem juntos. Mas precisamos do seu
consentimento.
– Mesmo? – perguntou Tom, um pouco mais esperançoso.
– Por favor, conte-me.
– Bem – começou Riza –, por muitos milênios, meu povo soube
como manipular a matéria, de forma parecida com o que Júpiter fez
com você. Mas ele não podia reparar seu corpo humano, por isso fez o
melhor que pôde e o transformou no que você é hoje.
– E sou muito grato a ele – admitiu Tom. – Eu não era gran-
de coisa como ser humano, para ser sincero.
– Você era ótimo – contestou Emily, voltando à conversa.
– E você mente muito mal, Emily Jacobs – declarou Tom
rindo. Quando ria, suas longas folhas farfalhavam de leve, produ-
zindo um sussurro agradável. – Emily, você sabe tão bem quanto
eu que sou melhor agora, como árvore, do que quando homem.
– Mas você mudou – argumentou Emily.
– Gosto de pensar que sim.
– Tom – Riza voltou a falar em tom sério –, Júpiter não tinha o
poder para restaurar seu corpo destruído. Nós temos. Mas só se você quiser.

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– Vocês podem mesmo fazer o que Júpiter não conseguiu?
– Sim – afirmou Riza.
– Está falando sério?
– Sim.
Houve uma longa pausa. Finalmente, o salgueiro perguntou,
hesitante:
– Se vocês têm o poder de me restaurar, poderiam me trans-
formar em algo diferente?
– Depende do que você quer – respondeu Riza.
– Você quer ser uma Esfinge – adivinhou Emily.
– Sim – concordou Tom. – Para ser exatamente como a mi-
nha Alexis.
– Sem problemas – disse Riza. – Assim será.

– Você tem certeza de que a gente consegue fazer isso? – pergun-


tou Emily.
– Sim – garantiu Riza em voz alta. – Mas precisamos de algo
de Alexis. Algo que nos ajude a reproduzir seu padrão em Tom.
– Quer dizer, como o DNA dela?
– Exatamente – respondeu Riza.
– Cabelos, por exemplo? – propôs Tom. – A escova dela está
aqui na plataforma.
– Perfeito!
Emily subiu a pequena escada que levava até a plataforma
que Alexis chamava de lar. Travesseiros fofos de cetim estavam
jogados no canto onde Alexis ficava. Do outro lado da plataforma,
havia o que parecia uma penteadeira com espelho. Alinhados em
uma fileira organizada, estavam os pentes e as escovas de diferen-
tes tamanhos que Alexis usava em sua toalete.
Emily franziu a testa.
– Como ela usa tudo isso com aquelas patonas?

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– Não é fácil – respondeu Tom. – Demora muito, mas Alexis
é muito determinada.
Emily pegou uma das escovas e puxou alguns fios de cabelo
longos e escuros.
– Isso basta?
– Com certeza – disse Riza. – Também vamos precisar de um
punhado de folhas novas de Tom.
Emily olhou para cima e viu alguns brotos se abrindo.
– Tudo bem se eu pegar algumas dessas folhas? – perguntou
ela a Tom.
– Pegue quantas precisar. – Ele parecia empolgado. – Não
estou acreditando. Têm certeza de que vão conseguir?
– Temos – declarou Riza.
– Você tem, quer dizer – corrigiu Emily. – Eu nem tinha
pensado em tentar.
Riza riu baixinho.
– Porque você ainda não entende a dimensão dos nossos poderes.
Emily desceu a escada e se afastou da árvore. Com Pegasus ao
seu lado, olhou inquisitivamente para o grande salgueiro.
– E agora, o que a gente faz?
– Emily – começou Riza com voz séria –, você tem que me
deixar assumir o controle. Preciso me concentrar muito. Não podemos
errar. Você vai cooperar comigo?
Emily não hesitou.
– Claro. O que devo fazer?
– Quando eu vier à tona, quero que você relaxe. Não fale e
tente não pensar. Apenas se imagine boiando em um lago tranquilo...
Emily sentiu Riza mais forte dentro dela. A presença serena
da Xan a estava embalando em um estado de espírito suave e
tranquilo. Emily não sentiu medo algum quando Riza assumiu o
controle do seu corpo e da sua mente.
Através de olhos enevoados, como em um sonho, Emily viu
Riza erguer as mãos “dela”. Sentia que poderes imensos a percorriam,

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quase como a eletricidade estática ao esfregar os pés em um tapete.
Ela sentia que, se tocasse em alguma coisa, uma grande faísca surgiria.
Riza fundiu os poderes das duas e os usou para entrelaçar os
fios de cabelo e as folhas de salgueiro.
– Lá vamos nós! – exclamou Riza para Tom. – Não tenha medo.
Você estará seguro.
A energia percorria Emily de um jeito que ela jamais havia
sentido. Cada nervo estava eletrizado enquanto Riza usava os pode-
res combinados para comandar a mudança da matéria da árvore.
À medida que Riza puxava mais e mais energia, Emily come-
çou a sentir algo peculiar. A princípio, era apenas uma sensação
estranha de formigamento. Não dolorosa, mas estranha. Sua cal-
ma estava se esvaindo...
– Riza...? – Emily sabia que não deveria falar, mas precisava
avisar a Xan. Algo estava errado. A dor começou, no fundo de sua
mente. Era forte, muito, muito forte. – Riza, pare!
A voz exígua de Emily se perdeu nos sons crepitantes da
energia que saía de seu núcleo. A Chama estava lá, bem como
todos os seus outros poderes. Mas, à medida que os segundos
passavam, algo começou a rachar e se partir. O centro das duas
não aguentaria por muito mais tempo.
– Você está usando energia demais. Pare, por favor!
Emily tentou de tudo para ser ouvida por Riza enquanto
esmurrava as paredes de sua mente. Gritava mais alto do que ja-
mais gritara, mas nada alcançava a Xan.
Mais energia foi liberada.
Emily estava girando fora de controle nos estreitos confins de
sua mente. Não conseguia mais ver nem ouvir nada e continuava
percebendo a drenagem de energia aumentar. Quando começou
a ser engolida pela escuridão, sentiu, mais do que ouviu, algo se
rasgando bem no seu âmago. Incapaz de gritar, Emily desmaiou.

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