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CONTROLANDO O

AQUECIMENTO GLOBAL
COMO REDUZIR EM 30% AS EMISSÕES DE
GASES ESTUFA ATÉ 2030

SAMUEL VIDAL
Índice
Capítulo 1: O aquecimento global
Capítulo 2: A origem das emissões de gases estufa

Capítulo 3: As dificuldades para substituir a matriz


energética fóssil

Capítulo 4: As previsões internacionais acerca das


emissões mundiais de CO2 e do aumento da temperatura
da Terra nos próximos anos

Capítulo 5: Como reduzir em 30% as emissões mundiais


de gases estufa até 2030

Capítulo 6: A viabilidade política da proposta da


Mckinsey

Capítulo 7: O setor de carbono terrestre: silvicultura e


agricultura

Capítulo 8: A redução de emissões na Amazônia

Capítulo 9: O sequestro geológico de CO2

Capítulo 10: Fontes energéticas limpas

Capítulo 11: Eficiência Energética


Capítulo 12: Conclusão
Capítulo 1: O aquecimento global

O planeta Terra corre sério risco de sofrer nas próximas décadas


um aumento de temperatura que provocará mudanças climáticas
expressivas e que ameaçará a existência humana. O fenômeno é
conhecido como aquecimento global. O livro busca definir o que é esse
fenômeno e apontar soluções com viabilidade temporal e econômica
para o problema. O título “Controlando o Aquecimento Global” se
refere à tentativa de se limitar o aquecimento global em 2°C, valor
considerado seguro pelos cientistas para que as mudanças climáticas
sejam brandas. Uma redução de 30% das emissões de gases estufa até
2030, e a continuação desse ritmo de redução nas décadas seguintes,
permitirá que os níveis de gases estufa se estabilizem num patamar que
possa garantir o controle do aquecimento global dentro dos 2°C de
aumento. Essa curva de redução foi defendida pelos cientistas do quarto
Painel Internacional de Mudanças Climáticas de 2007, o IPCC1.
Inicialmente precisamos entender o aumento do efeito estufa, o
causador do aquecimento global. O efeito estufa é um fenômeno natural
do planeta Terra, que consiste na retenção pela atmosfera de uma parte
do calor gerado pela radiação solar. Essa retenção de calor é feita pelos
gases do efeito estufa (GEE). Entre eles se destacam o vapor d'água
(H2O), o dióxido de carbono (CO2) e o metano (CH4). O termo estufa se
refere à retenção de calor do sol similar a retenção provocada pelo vidro
numa estufa de plantas. O efeito estufa é responsável pelo aquecimento
natural do planeta. Esse fenômeno climático é provavelmente o mais
importante para a manutenção da vida na Terra. Sem ele a temperatura
média do globo seria de -18°C, contra os 15°C atuais. O grande
problema que estamos enfrentando é o aumento artificial desse
fenômeno devido à influência do homem. O crescimento econômico nos
últimos dois séculos da nossa sociedade foi incentivado pela Revolução
Industrial com a queima intensiva de combustíveis fósseis e com o uso
do solo em larga escala (agropecuária e desmatamento). O elemento
químico carbono presente no petróleo, gás natural e carvão, na queima

1 O IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change) foi estabelecido em


1988 pela organização Metereológica Mundial e o Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) para fornecer informações científicas,
técnicas e sócio-econômicas relevantes para o entendimento das mudanças
climáticas.
desses combustíveis, passou a ser lançado na atmosfera na forma de
dióxido de carbono (CO2), um dos gases que provocam o efeito estufa.
As concentrações de CO2 passaram de 280ppm (partes por milhão) para
377ppm ao longo do século XX. Esse aumento de concentração já
causou uma elevação média de 0,8°C na temperatura da Terra e já está
provocando mudanças climáticas sérias. O aumento da quantidade de
CO2 também aumenta o efeito estufa provocado pelo vapor d’água. Se
você esquenta um pouco que seja o ar, ao adicionar a ele uma
quantidade extra de dióxido de carbono, esse ar então reterá muito mais
vapor d'água. Esta quantidade extra de vapor d'água age como um gás
do efeito estufa e aquece o ar ainda mais, quase dobrando o efeito que
esses gases produziriam se agissem sozinhos2. Se as emissões de gases
do efeito estufa se mantiverem nos níveis atuais, calcula-se que haverá
um aumento mínimo de 5°C na temperatura média da Terra, variação
similar à ocorrida desde a última era glacial até os dias de hoje.
O aumento da temperatura do globo pode provocar alterações
climáticas drásticas que ameaçarão a nossa qualidade de vida, o nosso
padrão sócio-econômico e até mesmo a nossa existência. As principais
conseqüências serão:
1- Aumento do nível dos oceanos. Com o aumento da temperatura no
mundo, está em curso o derretimento das calotas polares. Ao aumentar o
nível da águas dos oceanos, pode ocorrer, futuramente, a submersão de
muitas cidades litorâneas. A subida do mar deverá inclusive inundar
países inteiros. Tuvalu, com apenas 9 mil habitantes, é atualmente um
dos menores dos cinco países localizados em atóis, e que em breve
deixarão de existir. Os outros são: Kiribati, irmã de Tuvalu no mesmo
grupo de atóis, com uma população de 78 mil habitantes; as ilhas
Marshal, com 58 mil; a pequena Tokelau (2 mil habitantes, um território
dependente da Nova Zelândia); e as Maldivas, o maior e mais
densamente povoado de todos os grupos insulares com 268 mil
habitantes. Somado à população deslocada das áreas litorâneas de outras
ilhas, que não constituem atóis, isso já totaliza cerca de meio milhão de
pessoas que repentinamente divorciadas da sua cultura e de suas
origens, terão de procurar novos lares3;

2 Gabrielle Walker e Sir David King. Como combater o aquecimento global e


manter as luzes acesas. Página 24, 2008.
3 Mark Lynas. Seis graus: o aquecimento global e o que você pode fazer para
evitar uma catástrofe. Página 60, 2008.
2- Crescimento e surgimento de desertos. O aumento da temperatura
provoca a morte de várias espécies animais e vegetais, desequilibrando
vários ecossistemas. As florestas de países tropicais como Brasil, Congo
e Indonésia, podem se "savanizar" e savanas podem se tornar áreas
desérticas. Isso afetará a produção de alimentos prejudicando
principalmente as populações mais pobres que não poderão pagar por
alimentos mais caros e escassos. Os conflitos por água e alimentos
aumentarão;

3- O desequilíbrio nos ecossistemas trará novas pragas e doenças para o


convívio humano. Um exemplo é a malaria. Ela é transmitida por
mosquitos, que em temperatura quentes toleráveis amadurecem mais
rápido e se multiplicam. A umidade também ajuda a espalhar a doença.
As mudanças climáticas levarão a malária para o norte e para as regiões
montanhosas se outros fatores ecológicos não impedirem4. Situações
como essa podem se multiplicar;

4- Aumento de furacões, tufões e ciclones. O aumento da temperatura


faz com que ocorra maior evaporação das águas dos oceanos,
potencializando estes tipos de catástrofes climáticas. Os furacões tipo 4
e 5(os furacões de maior intensidade) só se formam quando a água do
mar atinge determinada temperatura elevada;

5- Ondas de calor. As regiões de temperaturas amenas têm sofrido com


as ondas de calor. No verão europeu, tradicionalmente, muitas famílias
saem para viajar de férias e deixam os parentes idosos sozinhos em casa.
Muitos idosos acabaram morrendo devido aos picos de temperatura
nunca vistos em algumas cidades européias, como ocorreu em 2003. O
forte calor na Espanha, França, Holanda, Itália, Portugal e Reino Unido
em 2003 provocou 35 mil mortes5. Esse fenômeno tende a se intensificar
cada vez mais;

6- Degelo do permafrost, os solos permanentemente congelados da


Região Ártica. Estima-se que cerca de 500 bilhões de toneladas de

4 Kirstin Dow e Thomas E. Downing. O Altas da Mudança Climática – O


Mapeamento Completo do Maior Desafio do Planeta. Página 61, 2006.
5 Kirstin Dow e Thomas E. Downing. O Altas da Mudança Climática – O
Mapeamento Completo do Maior Desafio do Planeta. Página 21, 2006.
carbono estejam encerradas nesses solos6. Esse processo expõe ao ar
várias camadas de dejetos animais e outros tipos de matéria orgânica
deixados pelas criaturas que habitavam a tundra no passado. Isso
propicia a decomposição por bactérias dessa matéria orgânica, que
acabam "arrotando" dióxido de carbono e metano para atmosfera, dois
gases causadores do efeito estufa. O efeito estufa inicial causado pelas
emissões dos combustíveis fósseis e do desmatamento gerará, portanto
uma reação em cadeia. Então poderemos assistir a formação de uma
bomba de calor que aquecerá o planeta de uma forma incontrolável no
longo prazo.
Todas essas previsões têm feito a comunidade internacional se
movimentar. Nos anos 70 e 80 as primeiras reuniões e conferências
governamentais sobre mudanças climáticas ocorreram. Mas o tema só se
tornou central na agenda dos países na década de 90. Em 1990, o
primeiro informe com base na colaboração científica de nível
internacional foi o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança
Climática, em inglês), onde os cientistas advertiram que para estabilizar
os crescentes níveis de dióxido de carbono (CO2) – o principal gás-
estufa – na atmosfera, seria necessário reduzir as emissões de 1990 em
60%. Dois anos depois, mais de 160 governos assinam a Convenção
Marco sobre Mudança Climática na ECO-92, na cidade do Rio de
Janeiro. O objetivo era evitar interferências antropogênicas perigosas no
sistema climático. Isso deveria ser feito rapidamente para poder proteger
as fontes alimentares, os ecossistemas e o desenvolvimento social.
Também foi incluída uma meta para que os países industrializados
mantivessem suas emissões de gases estufa, em 2000, nos níveis de
1990. Em 1997 é assinado no Japão o Protocolo de Kyoto, um novo
componente da Convenção ocorrida na ECO-92. O acordo internacional
foi assinado por representantes de mais de 160 países. O objetivo do
Protocolo é reduzir a concentração dos gases causadores do efeito estufa
(GEE) na atmosfera. Por isso, os países industrializados se
comprometeram a reduzir as emissões de GEE a media combinada de
5,2% em relação aos níveis de 1990, durante o período a partir do ano
de 2008 até 2012. Para os países em desenvolvimento, como o Brasil, o
protocolo não previu compromissos de reduções de GEE.

6 Mark Lynas. Seis graus: o aquecimento global e o que você pode fazer para
evitar uma catástrofe. Página 182, 2008.
Dentro do Protocolo surgiu um dispositivo chamado de
mecanismo de desenvolvimento limpo, ou simplesmente MDL, que
permite aos países desenvolvidos compensarem suas emissões de gases
causadores do efeito estufa por meio de projetos que diminuam as
emissões de países em desenvolvimento. Essencialmente, para ser
aprovado, o projeto precisa efetuar mudanças reais, mensuráveis e de
longo prazo para a mitigação da mudança do clima. O exigente processo
de aprovação inclui dois critérios fundamentais: adicionalidade e
sustentabilidade. O primeiro requer que o proponente comprove que seu
projeto é realmente importante para desacelerar o aquecimento global,
demonstrando como era a situação sem o MDL e como passa a ser com
ele. Para ser elegível, é preciso ainda que haja contribuição efetiva para
o desenvolvimento sustentável local, promovendo benefícios sócio-
econômicos. O poluidor compra créditos de carbono das empresas que
fazem o projeto de MDL. Exemplos de MDL são projetos de
reflorestamento, de geração de biogás em aterros sanitários e de energia
eólica. Uma empresa poluidora da Alemanha que teria um custo muito
elevado para diminuir a sua poluição no seu próprio país compra
créditos de carbono de um projeto de reflorestamento no Brasil, capaz
de absolver CO2 da atmosfera por um custo muito menor.

O Protocolo de Kyoto tem sua importância histórica, apesar das


críticas. Os governos do mundo ratificaram uma legislação que criava
metas de redução para os gases do efeito estufa. No entanto, o maior
poluidor do planeta, os Estados Unidos, não ratificou o Protocolo. Esse
veto limitou bastante a abrangência, juntamente com a não inclusão de
metas para os países emergentes como Brasil, China e Índia. Os países
em desenvolvimento crescem economicamente num ritmo mais
acelerado do que os países ricos e nos próximos 20 anos se tornarão o
grande grupo poluidor do planeta. No cumprimento das metas, os países
do Leste Europeu estão atingindo as metas com folga, já que em 1990
eles ainda eram países socialistas com uma indústria muito poluente, e
durante a transição para o capitalismo nos anos 90 tiveram quedas
severas nas suas economias. A maioria dos demais países está tendo
dificuldades para cumprir as metas. Entre esses países que apresentam
dificuldades, alguns como a Alemanha e o Reino Unido estão próximos
da meta devido a soluções interessantes. A Alemanha investiu pesado
em energia eólica, e o Reino Unido vem aumentando a participação das
usinas a gás natural menos poluentes. Alguns grupos ambientalistas
criticam os projetos de MDL, afirmando que se trata de uma forma de os
ricos pagarem para poluir. Discordo dessa idéia, pois se há um resultado
concreto (diminuição de emissão ou absolvição de carbono), ele deve
ser incentivado. É claro que os projetos de MDL são paliativos, não são
a solução final, mas são uma parcela da solução.

A maioria absoluta da comunidade científica concorda que o


aquecimento global é causado pelo homem. No total, o relatório IPCC
afirma que mais de 29 mil dados de observação espalhados em 75
estudos mostram mudanças significativas em sistemas físicos e
biológicos em todo o mundo. E 90% desses dados são exatamente o que
se esperaria de um cenário de aquecimento. E mais: as regiões em que
as alterações estão acontecendo coincidem com as regiões em que um
maior aquecimento foi registrado7. Com isso, a discussão central hoje é
a viabilidade econômica ou não da diminuição de emissões dos gases do
efeito estufa (GEE). O ex-presidente americano Bush não ratificou o
Protocolo de Kyoto afirmando que ele diminuiria a lucratividade das
empresas americanas. Alguns países em desenvolvimento não aceitam
metas de redução dos GEE, por afirmarem que o aquecimento global
vem sendo intensificado pelas emissões lançadas desde a Revolução
Industrial no século XVIII pelos países que atualmente são ricos. Então
argumentam que se os países ricos poluíram para se desenvolver, os
países emergentes também tem esse direito, devendo haver metas de
redução de poluição apenas para os países ricos. De fato, estima-se que
cerca de 1/3 do CO2 emitido ao longo dos últimos 200 anos ainda está
concentrado na atmosfera, sendo responsável por boa parte do efeito
estufa atual. No entanto, a responsabilidade é de todos nós, pois com o
aumento da participação na poluição global por parte dos países em
desenvolvimento, qualquer acordo de criação de metas de poluição sem
a presença desses países, não conterá o aquecimento planetário. A
maioria dos governantes do mundo discursa a favor do meio-ambiente e
defendem verbalmente metas de redução de emissões no longo prazo.
No entanto, são árduos inimigos do planeta na prática, defendendo um
suposto pragmatismo econômico e não aceitando metas de redução no
curto prazo. Contra essa posição estão a comunidade científica, os
ambientalistas e uma classe emergente de novos políticos, que defendem
uma transição rápida da nossa matriz energética viciada em carbono
para uma matriz limpa e renovável. A pergunta principal é: Quanto

7 Gabrielle Walker e Sir David King. Como combater o aquecimento global e


manter as luzes acesas. Página 50, 2008
dinheiro temos que gastar para estabilizar a temperatura do planeta ou
mantê-la num patamar aceitável (até 2°C de aumento)? A resposta é
controversa, pois cada especialista defende uma forma diferente de
conter o aquecimento global. Mas todos convergem para a necessidade
de investirmos entre 1 e 2% do PIB Mundial para evitar uma
hecatombe climática e econômica no longo prazo. Parte do valor
investido trará retorno econômico na forma de economia no consumo de
energia. Esse investimento é viável tecnicamente, mas evidentemente
gerará uma pequena diminuição na taxa de crescimento econômico
mundial no curto prazo, que os defensores do aumento de riqueza a
qualquer custo não querem abrir mão.
Capítulo 2: A origem das emissões de gases estufa

O Quarto Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima


(IPCC), de 2007, congregou os maiores especialistas do tema
aquecimento global. Segundo o painel, precisamos diminuir entre 50% e
85% as nossas emissões de gases do efeito estufa até 2050, em relação
às emissões de 2000. Dessa forma poderemos limitar o aumento de
temperatura do planeta em 2°C, limite considerado seguro pelos
cientistas para que as conseqüências ambientais sejam brandas. Uma
redução de 30% das emissões de gases estufa até 2030, e a continuação
desse ritmo de redução até 2050, é necessária para se atingir o objetivo.

O primeiro passo é quantificar as emissões planetárias. Para isso


usaremos os dados do IPCC de 2007. No ano de 2004 o mundo emitiu
49 bilhões de toneladas equivalentes de CO2. O leitor pode perguntar: o
que isso significa? Isso significa que o aquecimento provocado pela
soma de todos os tipos de gases estufa emitidos no ano de 2004 equivale
ao aquecimento provocado por 49 bilhões de toneladas de CO2, levando-
se em conta o tempo que os diferentes gases permanecem na atmosfera.
No gráfico seguinte temos a distribuição das emissões de GEE
mundiais8:

8 Fonte do gráfico: IPCC 2007, grupo de trabalho 3, capítulo I. O gráfico pode


ser encontrado no site em inglês: http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-
report/ar4/wg3/ar4-wg3-chapter1.pdf
O gás metano (CH4) é o segundo gás estufa com maior
quantidade de emissões em toneladas equivalentes de CO2,
representando 14,3% das emissões totais. Elas estão concentradas no
setor de agricultura e no setor de resíduos. No setor agrícola as
principais fontes emissoras são o arroto dos animais (ex. vacas, porcos)
e o cultivo de arroz. No setor de resíduos os grandes lançadores são os
lixões das grandes cidades. Uma tonelada de metano emitida equivale a
21 toneladas de dióxido de carbono, quanto ao nível de aquecimento da
atmosfera. Muitos projetos de MDL de redução de emissões do gás
metano queimam o gás e geram energia elétrica através do calor obtido
da reação. A reação também gera dióxido de carbono, diminuindo o
nível de poluição, já que como foi citado acima o aquecimento da
atmosfera provocado pelo dióxido de carbono é menor do que o
aquecimento provocado pelo metano. O óxido nitroso (N2O) é o terceiro
gás estufa com maior quantidade de emissões em toneladas equivalentes
de CO2, representando 7,9% das emissões totais. Elas estão
concentradas em sua maioria no setor agrícola, sendo lançadas
principalmente pelos solos agrícolas, após o uso indiscriminado de
fertilizantes nitrogenados.
Os gases-F representam apenas 1,1% das emissões totais em
toneladas equivalentes de CO2. Elas estão concentradas principalmente
no setor industrial. Em geral 1 tonelada desses gases apresenta um
potencial de aquecimento centenas de vezes ou até milhares de vezes
maior do que 1 tonelada de dióxido de carbono. Como exemplo pode-se
citar o SF6 (Hexafluoreto de enxofre), que tem uma capacidade de
aquecimento do planeta 22200 vezes maior que o CO2 e é usado como
isolante térmico, condutor de calor e agente refrigerante. No mercado de
crédito de carbono, um MDL que evita o lançamento do SF6, pode
vender para uma empresa poluidora 1 tonelada de SF6 evitada por
2200009 dólares. Isso torna a transição para uma indústria limpa nesses
setores altamente lucrativa. Não por acaso, 25% dos projetos redutores
de emissões no período 2004-2005 foram de eliminação de HFCs10.

9 Se evitarmos o lançamento de 1 tonelada de SF6, estaremos anulando 22200


toneladas de CO2 emitidas ( 22200 x 10 dólares). Os 10 dólares se referem ao
preço médio de 1 tonelada de CO2 evitada no mercado de créditos de carbono.
10 Kirstin Dow e Thomas E. Downing. O Altas da Mudança Climática – O
Mapeamento Completo do Maior Desafio do Planeta. Página 75, 2006.
As emissões mundiais de dióxido de carbono (CO2) são
compostas basicamente da queima de combustíveis fósseis e do
desmatamento. Temos 4 "torneiras" de carbono que precisam ser
fechadas: gás natural, petróleo, carvão e desmatamento. As emissões de
CO2 foram responsáveis por 76,7% do aquecimento provocado pelos
gases estufa lançados artificialmente em 2004. Isso evidencia que o
nível de emissões de CO2 em quantidade de toneladas emitidas em
relação aos outros gases estufa é muito superior, já que mesmo sendo
menos poluente por tonelada emitida, o CO2 é o gás estufa que mais
influencia no aquecimento planetário. O desmatamento, concentrado nas
florestas tropicais remanescentes, é incentivado pela expansão da
agricultura e da pecuária em busca de novas terras baratas e pela
exploração predatória de madeira. Os combustíveis fósseis lançadores
de CO2 respondem por 56,6% das emissões totais de gases estufa e por
81% da matriz energética mundial, sustentando a produção econômica
mundial. Essa dependência energética é incentivada pelos custos
elevados das outras fontes de energia. O gráfico11 abaixo nos mostra a
participação de cada fonte primária na matriz energética mundial:

Apesar da liderança do petróleo, em relação aos outros dois


combustíveis fósseis, não podemos esquecer que o carvão mineral é
mais poluente que o petróleo por unidade de energia, sendo as emissões

11 Os dados estão na edição 2007 do “World Energy Outlook” da Agência


Internacional de Energia. O relatório está no site em inglês:
http://www.iea.org/textbase/nppdf/free/2007/weo_2007.pdf
totais dos 2 combustíveis muito próximas. O gás natural é o que
apresenta menor quantidade de emissões por unidade de energia e
menor participação na matriz energética entre os três fósseis. Também é
importante especificar quais tipos de atividades econômicas mais
contribuem para o aquecimento global. O gráfico abaixo nos mostra a
participação dos principais setores da economia mundial nas emissões
globais de gases de efeito estufa em 200412:

Esse gráfico não se refere apenas as emissões de CO2. As


emissões da agricultura são compostas basicamente dos gases metano
(CH4) e óxido nitroso (N2O). Na indústria uma parcela pequena das
emissões é de óxido nitroso, gases-F e metano. As emissões dos setores
de edifícios, de produção de energia elétrica, de produção industrial e de
transportes são compostas na maioria de CO2 produzido pelos
combustíveis fósseis. As emissões dos edifícios são lideradas pelo
petróleo. Exemplos do uso do petróleo nesse setor são o cozimento de
alimentos e o aquecimento de água com o gás liqüefeito de petróleo
(GLP). Os 7,9% de participação das emissões dos edifícios não
computam as emissões provenientes do consumo de energia elétrica dos
edifícios. Se adicionarmos as emissões provenientes do consumo de
energia elétrica nos edifícios (que estão incluídas na categoria
“produção de energia“), as emissões dos edifícios chegam
aproximadamente a 18% do total. O gás natural e o carvão mineral

12 Fonte do gráfico: IPCC 2007, grupo de trabalho 3, capítulo I. O gráfico


pode ser encontrado no site em inglês:
http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar4/wg3/ar4-wg3-chapter1.pdf
lideram as emissões de CO2 e a quantidade de energia produzida na
geração de energia elétrica e de energia primária na indústria, os setores
com as maiores emissões. Abaixo temos um gráfico com a participação
de cada fonte na geração de energia elétrica mundial13:

Origem da energia elétrica consumida pela economia mundial em 2005.


(Agência Internacional de Energia, WEO-2007)

A geração de eletricidade através das fontes hidráulica e nuclear


não libera gases estufa em quantidade significativa. Os líderes carvão e
gás são muito baratos e o carvão especificamente é abundante. O
petróleo em contrapartida é caro e apresenta uma participação pequena
de 6,6% do total e de 9,9% se contarmos apenas a geração com
combustíveis fósseis. Sempre que se fala em fim do petróleo, se associa
a sua substituição às fontes de energias renováveis como energia eólica
e solar, mas essas fontes limpas estacionárias deverão substituir na
maioria dos casos o carvão mineral e o gás natural. Quanto ao custo do
petróleo, uma termelétrica a diesel por exemplo, gera energia muito
mais cara do que uma similar a gás ou carvão. Então porque sendo tão
caro, o petróleo é tão importante e valioso para o setor energético?
Porque ele é o combustível portátil que sustenta o setor de transportes
no mundo. Todos os processos econômicos atuais dependem de uma
rede de transportes terrestres, marítimos e aéreos. O abastecimento do
setor de transportes pelo carvão mineral, que é sólido, não é viável

13 Os dados estão na edição 2007 do “World Energy Outlook” da Agência


Internacional de Energia. O relatório está no site em inglês:
http://www.iea.org/textbase/nppdf/free/2007/weo_2007.pdf
econômicamente na maioria dos casos, apesar de o carvão poder
tecnicamente ser transformado em combustível líquido. O combustível
sintético do carvão atende metade da demanda por gasolina e diesel da
África do Sul, e com os altos preços do petróleo mundial, os
combustíveis sintéticos de carvão estão se tornando competitivos em
outras partes do mundo. A liquefação do carvão produz muito mais CO2
do que o refinamento convencional do petróleo14. O gás natural
necessita de uma gigantesca rede de abastecimento para ser implantado,
sendo mais viável para geração de energia próximo a reserva num lugar
fixo. Temos abaixo um gráfico com a parcela de cada matriz no setor de
transportes15:

Origem da energia consumida pelo setor de transportes da economia


mundial em 2005. (AIE, WEO-2007)

A liderança do petróleo é avassaladora. O alto valor do petróleo


acaba tornando o mercado de energia do petróleo superior
economicamente ao mercado de energia do gás natural e do carvão
mineral. Uma alternativa ao uso do petróleo no setor de transportes,
seria usar um carro elétrico abastecido na rede de energia elétrica com
energia proveniente de uma termelétrica a carvão ou mesmo de uma
usina hidrelétrica que é limpa. Um carro elétrico gasta em dinheiro até 3
vezes menos para rodar do que um carro a gasolina, apresentando uma
eficiência de 65% na conversão de energia contra 20% do carro a
gasolina, que desperdiça a maior parte da energia gerando calor. O
problema é que as baterias tem uma densidade energética muito inferior

14 Mark Lynas. Seis graus: o aquecimento global e o que você pode fazer para
evitar uma catástrofe. Página 251, 2008.
15 Os dados estão na edição 2007 do “World Energy Outlook” da Agência
Internacional de Energia. O relatório está no site em inglês:
http://www.iea.org/textbase/nppdf/free/2007/weo_2007.pdf
a densidade de um tanque de gasolina, o que diminui drasticamente a
autonomia do carro elétrico, além do abastecimento que demora
algumas horas.

O petróleo e o gás natural tem reservas comprovadas para


aproximadamente mais 50 anos de consumo atual, enquanto o carvão
mineral tem reservas para sustentar o consumo mundial atual por mais
de 200 anos. O carvão mineral pode sustentar a matriz energética
mundial no futuro, abastecendo os carros elétricos(com as limitações já
citadas) através da energia proveniente das termelétricas, ou através do
caro carvão líquido. No entanto ele é o combustível fóssil mais
poluente, emitindo até 150% mais CO2 que o gás natural e 50% mais
CO2 que o diesel, com a mesma energia gerada. O uso intensivo do
carvão mineral acelerará mais ainda o aquecimento global. Temos
portanto, duas crises no setor de energia. Uma crise ambiental, pois
todos os setores dependem da geração de energia fóssil, que aumenta o
aquecimento global, e uma crise econômica restrita ao setor de
transportes dependente do petróleo e que enfrenta a sua escassez.
Capítulo 3: As dificuldades para substituir a matriz
energética fóssil

Vimos no capítulo passado que os combustíveis fósseis


representam a expressiva participação de 56,6% nas emissões mundiais
de gases estufa. Temos de lado um combustível caro e portátil, que
representa a maior fatia do mercado de energia no mundo entre os
fósseis, como o petróleo, e do outro lado o carvão mineral e o gás
natural mais baratos e predominantemente não portáteis. Uma menor
participação dessa matriz energética fóssil é essencial para alcançarmos
a meta de 30% de diminuição de gases estufa até 2030. No entanto,
existem muitas problemas que dificultam esse processo. O principal
chama-se tempo. As termelétricas fósseis, por exemplo, possuem uma
vida útil de até 40 anos, sendo portanto a substituição por novas usinas
lenta. Além disso, as empresas do setor planejam investimentos com
anos de antecedência, principalmente em pesquisa. No caso do
transporte rodoviário, que representa a maioria das emissões do setor de
transportes, ocorre um cenário parecido. Os carros e caminhões novos
têm uma vida útil de 20 anos. Temos uma infra-estrutura de
fornecimento (ex. postos de gasolina) de derivados de petróleo (diesel,
querosene, gasolina) com vida útil longa. No parque industrial, o
problema também se repete quanto ao tempo de vida útil. Um país que
decretasse o fechamento de todas termelétricas nos próximos 20 anos
teria que arcar com os custos de implantação de novas usinas de geração
de energia limpa, mais caras do que as usinas fósseis, e com os custos de
indenização das empresas proprietárias das usinas e de seus respectivos
acionistas. Uma proibição de construção de novas usinas termelétricas
também pode esbarrar nos lobbys políticos das empresas donas das
grandes jazidas de carvão, gás e petróleo, que não aceitam perder
bilhões de dólares em patrimônio na forma de reservas sem uma justa
indenização. Uma ponto dramático que piora a situação é o crescimento
econômico acelerado acima de 7% ao ano da India e da China, com
populações somadas de quase 2,5 bilhões de habitantes e que tem o
carvão barato, o combustível mais poluente do mundo, como a principal
fonte energética. Uma solução plausível seria os governos agirem nos
mercados com incentivos para as empresas renováveis ou com a
taxação de impostos sobre as termelétricas poluidoras, a fim de diminuir
gradativamente no decorrer dos próximos anos a participação das
termelétricas nas novas plantas de geração de energia elétrica. No
entanto não podemos esquecer de um detalhe: a elasticidade dos preços
dos combustíveis fósseis, tanto no mercado de geração de energia
elétrica, quanto no mercado de transportes. Se as energias renováveis se
tornarem mais baratas do que os combustíveis sujos através dos
incentivos dos governos ou de avanços tecnológicos restará ainda aos
fornecedores de combustíveis baixarem os preços para se manterem
dominantes do mercado. Não se deve subestimar a capacidade da
indústria fóssil de reduzir os preços numa concorrência direta com as
energias renováveis. Com a queda drástica do preço do petróleo na crise
financeira de 2008, por exemplo, se reduziu o interesse do consumidor
americano por carros híbridos. Essa redução não foi intencional, mas
pode se tornar no futuro para manter a soberania do petróleo, por
exemplo. O custo de exploração da maioria das jazidas de petróleo no
mundo é muito inferior as valores de mercado do líquido. O valor de
mercado elevado só se justifica pela escassez de jazidas e pelo
monopólio das jazidas em poucas mãos. Os preços são controlados pela
OPEP, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo. Uma
fornecedora de petróleo por exemplo que lucra com um barril a 80
dólares nos dias atuais, pode continuar lucrando com um barril a 40
dólares e sofrendo expressivas taxações de impostos. Empresas extraem
petróleo com sucesso econômico no longícuo Alasca americano com
pesadas taxações de impostos.

Apenas as leis do mercado não resolverão o problema. A solução


passa inicialmente pelo incentivo governamental ao aumento da
eficiência energética na indústria e na produção de energia elétrica,
possibilitando uma diminuição na demanda de combustíveis fósseis e
consequentemente uma redução no aumento de emissões. Na produção
de energia o incentivo às fontes limpas através de subsídios deve ser
acompanhada de uma forte regulação que possa impedir que os cartéis
dos combustíveis fósseis imponham temporariamente preços
artificialmente baixos para manter o domínio do mercado. Também se
faz importante o incentivo a um mix de fontes limpas (eólica, solar,
biomassa, nuclear, hidrelétrica), para que cada uma contribua no limite
do seu potencial. Uma alternativa seria os governos criarem cotas
estabelecendo que uma parcela considerável das novas plantas de
energia sejam obrigatoriamente de fontes energéticas limpas.
No setor de transportes é importante inicialmente a expansão de
tecnologias que já são viáveis economicamente hoje como o carro
híbrido e o carro a álcool. O álcool é limpo e renovável porque o CO2
emitido na combustão do carro é anulado pelo CO2 foi absolvido no
crescimento da plantação de cana ou milho. Ele pode ser usado
individualmente ou misturado numa proporção de até 24%16 na
gasolina. A melhor alternativa são os carros flex que podem rodar com
álcool e gasolina com um aumento mínimo dos custos de produção.
Esses carros rodam com um combustível renovável e limpo e protegem
o consumidor de um possível desabastecimento do álcool, com a opção
da gasolina. Os carros flex são sucesso no Brasil, constituindo a maioria
absoluta da frota de carros novos. O álcool pode substituir
adequadamente até 20% da demanda mundial de gasolina. As limitações
se referem a falta de terras para plantar cana-de-açúcar ou milho e
abastecer a população mundial de alimentos simultaneamente. Além
disso, o álcool não substitui o diesel usado nos caminhões, ônibus, trens
e navios que tem motores com uma vida útil muito superior. O
biodiesel, o substituto biológico do diesel, ainda tem um custo muito
elevado. O carro híbrido tem um motor a gasolina e outro elétrico. O
motor elétrico aproveita parte da energia desperdiçada pelo motor a
gasolina que é armazenada numa bateria (ex: energia dos freios).
Quando o carro está parado num sinal ele funciona exclusivamente
como o motor elétrico e quando se movimenta os dois motores podem
funcionar simultaneamente. Um carro híbrido tem uma diminuição de
consumo de gasolina entre 25% e 50%. Por outro lado ele é mais caro
de se produzir que um carro exclusivamente a gasolina. Se estima que
em até 8 anos esse custo extra se paga. Além da expansão das
tecnologias viáveis, um caminho vigoroso de substituição gradual do
petróleo no setor de transportes precisa incentivar melhorias de
eficiência energética e incentivar tecnologias que hoje ainda não são
viáveis como os biocombustíveis de 2ª geração.

Nesse contexto de dificuldade de substituição da matriz fóssil,


um ângulo interessante a ser avaliado é a posição dos países produtores
de petróleo. O seleto grupo de países produtores de petróleo não quer
abrir mão da prosperidade em nome do meio-ambiente. No caso do
Brasil, um novo integrante do grupo, a sociedade comemorou as

16 Proporção de álcool presente na gasolina brasileira.


descobertas de petróleo na camada do pré-sal17, que tornaram o país
dono de mais de 80 bilhões de barris de reservas estimadas. A
descoberta acelerará o crescimento econômico do Brasil nas próximas
décadas através da exportação do petróleo. A Petrobrás, a estatal de
petroleo do Brasil, projeta investimentos em gigantescas refinarias de
petroleo em estados pobres como Ceará, Pernambuco e Maranhão. Os
governadores e as populações desses estados vêem o refino do petróleo
do pré-sal como a chegada definitiva da prosperidade econômica. Se
comemora o crescimento econômico mas se esquece dos bilhões de
toneladas de CO2 que os bilhões de barris de petróleo poderão lançar
nos próximos 40 anos. A paixão brasileira pelo petróleo também ocorre
em outros países produtores. Por outro lado a questão das emissões
passadas de gases estufa volta à tona. Os Estados Unidos cresceram
economicamente com a ajuda do petróleo. A Noruega é atualmente o
país mais rico da Europa devido principalmente a exportação de
petróleo. Então por que a pobre Angola na África deveria parar de
exportar petróleo ou o Brasil não deveria explorar o pré-sal para
melhorar os indicadores sociais de suas regiões pobres? A melhor
opção é que os países produtores tenham liberdade de produção e
exportação, desde que cada um assuma metas internas de redução de
emissões de gases estufa. O controle do volume de exportações e
conseqüentemente de consumo dos países importadores ficaria a cargo
dos países consumidores. Felizmente os países que representam a maior
fatia da economia mundial (Estados Unidos, China, Japão, grande parte
da Europa Ocidental) são importadores de petróleo e por isso tem
grande interesse na redução do consumo. Um acordo de redução de
emissões de gases estufa ratificado por todos os países geraria uma
redução no consumo do petróleo e uma redução natural e gradual no
volume das exportações dos países produtores de petróleo sem severas
imposições.

As variáveis do problema da substituição da matriz fóssil citadas


nesse capítulo apontam para a viabilidade de uma transição possível
para uma matriz limpa, mas que precisa ser custeada por incentivos
estatais e que precisa ser gradual para evitar custos econômicos
excessivos. Os incentivos governamentais precisam de apoio político

17 Camada que fica a até 7000 metros de profundidade na plataforma


marítima brasileira abaixo da camada de sal, onde foram encontradas
recentemente vultuosas reservas de pétroleo e gás natural.
para sair do papel. No entanto, em geral os governos não estão dispostos
a colaborar, trocando uma parte do crescimento econômico no curto
prazo por sustentabilidade ambiental no longo prazo. Um presidente de
um país, com uma reeleição complicada, acredita que a troca
investimentos na construção de estradas e geração de empregos por
investimentos que evitem emissões de CO2, lhe tirará votos. Mudanças
tecnológicas em direção a tecnologias mais limpas na maioria dos casos
só são implementadas quando os custos são mínimos. Um exemplo
disso é a tecnologia dos catalisadores em automóveis. Quando um carro
realiza combustão ele lança basicamente CO2 e uma pequena fração de
monóxido de carbono (CO), enxofre e outros poluentes, frutos da
combustão incompleta da gasolina. Essa pequena fração de gases são
altamente venenosos e provocam todos anos milhares de mortes por
doenças respiratórias no mundo. O catalisador evita a emissão desses
poluentes, tornando os carros até 40 vezes menos poluentes que nos
anos 70. No entanto essa poluição se refere apenas aos gases que fazem
mal diretamente a saúde do homem. O CO2, que é a maioria absoluta
das emissões, não faz mal a saúde quando é lançado na atmosfera mas é
responsável pelo aquecimento global. Ele só representa um perigo a
saúde em níveis altíssimos, geralmente só encontrados em ambientes
fechados. Então é sempre importante discernir os gases venenosos
(monóxido de carbono, enxofre e outros) causadores das doenças
respiratórias, do CO2 que não faz mal à saúde mas interfere no clima.
Os gases venenosos estão diminuindo gradativamente nas grandes
cidades por conta da frota com catalisadores, mas o CO2 está crescendo
devido ao aumento do número de veículos, sendo a emissão
proporcional ao consumo de gasolina.

Por último uma alternativa que poderia inesperadamente mudar a


rota provável de transição energética lenta seria um choque tecnológico
que reduzisse drasticamente os custos da energia, que os tornasse mais
baratos do que os custos de produção dos combustíveis fósseis. Quanto
a esse choque, a fonte revolucionária mais promissora é a fusão nuclear,
a energia das estrelas. A energia gerada pelo Sol, por exemplo, provém
da fusão nuclear. A fusão nuclear é diferente da fissão nuclear, usada
nas usinas atômicas convencionais. Tanto a fusão quanto a fissão
baseiam-se em reações nucleares, não em reações químicas como a
combustão. Uma reação química envolve apenas a eletrosfera dos
átomos: os núcleos atômicos permanecem intocados. Já em uma reação
nuclear, como a própria expressão indica, os núcleos atômicos
interagem e são transformados, em processos físicos que envolvem
muito mais energia do que nas reações químicas. A diferença entre as
duas formas básicas de liberação de energia nuclear é que, na fissão,
núcleos pesados (como o dos átomos de urânio) são divididos em
núcleos menores, enquanto na fusão núcleos leves (como o dos átomos
de deutério) são soldados e formam um único núcleo mais pesado. A
fusão nuclear tem vantagens importantes sobre a fissão, pois emite baixa
poluição radioativa e possui baixo risco de acidentes. O problema é que
um gerador de energia com fusão nuclear ainda não foi viabilizado
tecnicamente e os especialistas acreditam que dificilmente isso será
possível nas próximas décadas. A fusão nuclear ocorre apenas a
temperaturas muito altas, nas quais a matéria se encontra em um estado
conhecido como plasma (que não é líquido, sólido, nem gasoso). O
controle da reação de fusão depende do confinamento desse plasma no
interior de um reator, que possa transformar a energia gerada em alguma
forma aproveitável economicamente. Este confinamento do plasma tem
sido a principal dificuldade no desenvolvimento dos reatores de fusão.
Capítulo 4: As previsões internacionais acerca das
emissões mundiais de CO2 e do aumento da temperatura
da Terra nos próximos anos

A Agência Internacional de Energia prevê em seus relatórios um


aumento das emissões ligadas aos combustíveis fósseis até 2030. Eles
são baseados no seu "World Energy Model" (Modelo da Energia
Mundial), um sofisticado modelo matemático de simulação do
comportamento dos mercados mundiais de energia, com cerca de 16.000
equações, que incorpora a extensiva base de dados da AIE sobre a
produção, comércio e consumo mundiais de energia, além de estudos
sobre o crescimento econômico mundial, investimentos no setor
energético, novas tecnologias e políticas energéticas. A AIE projeta dois
tipos de cenários: o cenário de referência e o cenário de políticas
alternativas18. O primeiro é considerado o cenário mais provável. Nele a
agência assume que haverá avanços tecnológicos tanto no consumo
como na produção de energia e que estas mudanças serão incrementais,
por conta das longas vidas úteis dos equipamentos de conversão
envolvidos. Algumas tecnologias que hoje estão ainda em fase
experimental deverão se difundir nas próximas três décadas. Assim
como foi defendido no capítulo anterior deste livro, a AIE acredita que
existe uma grande dificuldade para substituir a matriz energética fóssil.
A Agência adota como premissa em seu cenário de referência que a
quantidade de energia necessária para prover uma dada quantidade de
serviço de energia, deverá continuar evoluindo no mesmo ritmo das
últimas três décadas. No cenário de referência, entre 2004 e 2030,
prevê-se um crescimento de 55% das emissões de dióxido de carbono
(CO2) relacionadas com a energia, isto é, uma taxa de crescimento de
1,7% por ano. No cenário de políticas alternativas, a AIE simula o
impacto de políticas que já estão sendo analisadas pelos governos,
sobretudo dos países da OCDE, mas que ainda não tinham sido
implementadas até 2004. As tendências no cenário de referência não são
imutáveis. Os governos podem tomar medidas mais vigorosas para
alterar o curso do sistema energético, o desviando para um caminho

18 Os dois cenários estão na edição 2006 do “World Energy Outlook” da


Agência Internacional de Energia. O relatório está no site em inglês:
http://www.iea.org/textbase/nppdf/free/2006/weo2006.pdf
mais sustentável. No cenário de políticas alternativas, presume-se que os
governos implementarão as políticas e medidas para melhorar a
segurança energética e reduzir as emissões de CO2. Nele se prevê um
crescimento de 29% nas emissões de CO2 em 2030, em relação a 2004.
No Cenário de Políticas Alternativas os investimentos adicionais na
geração de energia limpa e no aumento da eficiência energética são
pagos com sobra pela economia de energia gerada. Usaremos como
bússola o Cenário de Referência da AIE, onde as emissões aumentarão
55% até 2030.

Enquanto a AIE fez projeções do crescimento das emissões de


CO2 provenientes dos combustíveis fósseis se baseando em projeções
econômicas, o IPCC fez projeções científicas sobre o impacto do
crescimento das emissões de todos os gases estufa no clima. O 4°
Relatório do IPCC de 2007 (o já citado Painel Intergovernamental de
Mudanças Climáticas) avaliou 177 cenários de estabilização das
concentrações de gases do efeito estufa, e conseqüentemente da
temperatura. Eles foram agrupados em 6 categorias, de acordo com os
valores finais das concentrações de gases estufa e com os valores da
temperatura após a estabilização. As 6 categorias19 de estabilização são:

19 Fonte da tabela: IPCC 2007, grupo de trabalho 3, capítulo III. A tabela


pode ser encontrada no site em inglês:
http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar4/wg3/ar4-wg3-chapter3.pdf
Aumento da Mudança nas
temperatura emissões
Ano de pico Número
global média globais de
Categoria das de
acima dos gases estufa
emissões de cenários
níveis pré- em 2050 em %
CO2 avaliados
industriais das emissões
(°C) de 2000

I 2,0 - 2,4 2000 - 2015 -85 a -50 6


II 2,4 - 2,8 2000 - 2020 -60 a -30 18
III 2,8 - 3,2 2010 - 2030 -30 a +5 21
IV 3,2 - 4,0 2020 - 2060 +10 a +60 118
V 4,0 - 4,9 2050 - 2080 +25 a +85 9
VI 4,9 - 6,1 2060 - 2090 +90 a +140 5

Segundo a comunidade científica, aumentos da temperatura


acima de 2,4°C são reconhecidamente perigosos. A categoria I, que
corresponde à faixa "prudente" de perturbação do sistema climático,
exige que as emissões parem de crescer até 2015, e que em 2050 elas
sejam entre 50% e 85% daquelas do ano 2000. Esqueceremos as outras
categorias de estabilização e tomaremos como cenário de referência a
categoria I. Nosso objetivo é reduzir em 30% as emissões anuais de
gases estufa em 2030, em relação aos níveis de 2005, começando a
redução em 2010. Esse nível de redução até 2030 e a continuação desse
ritmo de redução até 2050 tem grande potencial para atingir o objetivo
final de estabilização climática prudente. Assim temos:
Mudança nas
Aumento da
emissões
temperatura
Ano de pico globais de
global média Número de
Categoria das gases estufa
acima dos cenários
emissões de em 2050 em
níveis pré- avaliados
CO2 % das
industriais
emissões de
(°C)
2000

I 2,0 - 2,4 2000 - 2015 -85 a -50 6


Capítulo 5: Como reduzir em 30% as emissões mundiais
de gases estufa até 2030

Diante das dificuldades apresentadas pelas previsões dos órgãos


internacionais pode-se pensar que o aquecimento global dificilmente
será controlado. No entanto existem várias alternativas para mudar o
curso das emissões. A diminuição das emissões mundiais de gases
estufa começará a ser explicada neste capítulo. A situação é:

-Temos um cenário provável de crescimento de emissões de CO2 no


setor de energia da ordem de 55% até 2030, em relação ao ano de 2004,
segundo a AIE;
- Mesmo no cenário de políticas alternativas, teremos um crescimento
de emissões de CO2 da ordem de 29% até 2030, em relação ao ano de
2004, segundo a AIE;
- Precisamos que as emissões parem de crescer até 2015, segundo o
IPCC;
- Em 2050 as emissões precisam ser entre 50% e 85% menores do que
as emissões do ano 2000, segundo o IPCC;
- Segundo as duas grandes referências climáticas e energéticas do
planeta (IPCC e AIE), estamos caminhando para não alcançar a
estabilização do aumento de temperatura do planeta dentro dos 2°C
considerados seguros e brandos para o clima;
-Esse cenário levará a humanidade a sofrer graves conseqüências
ambientais e econômicas.

A consultoria McKinsey e Company, referência mundial em


consultoria empresarial, empreendeu um esforço global num estudo
sobre as soluções técnicas existentes para controlar o aquecimento
global e o respectivo custo dessas soluções. O estudo lançado no
começo de 2009 se chama “Caminhos para uma economia de baixo
carbono – versão 2”20. No estudo a consultoria estimou em 45,9 bihões
de toneladas de CO2 equivalente emitidas pelo mundo em 2005. O valor
é um pouco inferior aos 49 bilhões estimados pelo IPCC 2007 emitidos

20
O estudo pode ser encontrado no site:
http://www.mckinsey.com/clientservice/ccsi/pathways_low_carbon_econo
my.asp
pelo mundo em 2004. A pequena diferença é justificada no estudo pelo
uso de instituições distintas do IPCC como referência no cálculo das
emissões. No entanto o importante é que os valores são bem próximos
dos valores do IPCC 2007.

A consultoria Mckinsey desenvolveu uma projeção de evolução


de emissões entre 2005 e 2030 se baseando em previsões de instituições
como a AIE. Nesse cenário, chamado de caso base, as emissões
passarão de 46 bilhões de toneladas de CO2 equivalente emitidas em
2005 para 70 bilhões de toneladas de CO2 equivalente em 2030, um
crescimento de 52% nas emissões. Essa curva de crescimento de
emissões é considerada pelo estudo a mais provável projeção de
crescimento de emissões. Evidentemente, externalidades não previstas
pelo modelo da consultoria poderão alterar a projeção de crescimento. O
estudo abrangeu todas as emissões mundiais de gases estufa e não
somente as emissões lançadas pelos combustíveis fósseis como foi feito
pelos relatórios da AIE. O gráfico a seguir mostra a distribuição das
emissões por setores econômicos em 2005 e a estimativa de emissões
desses setores segundo o caso base em 2030:
Além de projetar o caso base, a consultoria mapeou 200
iniciativas, em 10 grandes atividades econômicas, com potencial de
reduzir as emissões de 70 bilhões de toneladas de CO2 equivalente para
32 bilhões de toneladas em 2030. Todas as iniciativas apresentam um
custo inferior a 60 euros por tonelada de CO2 equivalente evitada. A
diminuição de 38 bilhões de toneladas emitidas representa uma redução
de 55% em relação ao caso base. Se compararmos com as emissões de
2005 teremos uma redução de 30%, passando de 46 bilhões para 32
bilhões em 2030. Essa redução é tomada como referência no subtítulo
do livro: “Como reduzir em 30% as emissões mundiais de gases estufa
até 2030”. A proposta de redução ( linha marrom contínua) é explicitada
no gráfico a seguir:
A Mckinsey também avaliou oportunidades com custo entre 60 e
100 euros, com potencial de abatimento de 9 bilhões de toneladas de
CO2 equivalente. No entanto o foco do estudo foram as oportunidades
com custo inferior a 60 euros por tonelada de CO2 equivalente. No
cenário onde essas iniciativas com custo inferior a 60 euros serão
implementadas as emissões atingirão 32 bilhões de toneladas de CO2
equivalente em 2030. Nele o pico da concentração de gases estufa na
atmosfera será de 510ppm e a estabilização dos gases estufa atingirá
450ppm de concentração de CO2 equivalente. Nesse cenário a
expectativa de aumento médio da temperatura do planeta segundo o
IPCC é de 2°C. Esse valor é suficiente para evitar mudanças climáticas
bruscas. No gráfico abaixo temos o potencial de abatimento de 38
bilhões de toneladas emitidas em 2030 em relação ao caso base dividido
por setor econômico:

Na proposta de diminuição de emissões, as iniciativas devem ser


implementadas entre 2010 e 2030. Os investimentos incrementais
necessários nas iniciativas crescerão gradualmente passando de 317
bilhões de euros anuais no período 2011-2015 para 811 bilhões de
dólares anuais no período 2026-2030. Esses valores representariam um
acréscimo aos valores de investimentos normais estimados no caso base.
O custo de investimento para construir uma usina solar, por exemplo, é
mais elevado do que o custo de investimento para construir uma
termelétrica a carvão. Esse investimento adicional, acima do valor de
construção da termelétrica é considerado como o investimento
incremental na iniciativa citada. No entanto parte dos investimentos se
pagará, pois iniciativas de incentivo à eficiência energética
economizarão energia. O custo líquido médio das iniciativas durante o
período 2011-2030 será aproximadamente 4 euros por tonelada de CO2
equivalente evitada. O custo líquido anual atingirá 150 bilhões de euros
anuais em 2030. A consultoria também avaliou outros custos adicionais,
como os custos transacionais e os custos dos programas de
implementação de redução de emissões. Os programas de
implementação podem ser caros ou não dependendo da forma escolhida
pelos agentes. Um programa de incentivo à eficiência energética, por
exemplo, pode ser implantado através de uma campanha educativa
(forma cara e pouco intrusiva) ou através da imposição de uma
legislação obrigatória (forma barata e muito intrusiva). Os custos
adicionais foram avaliados entre 40 bilhões e 200 bilhões de euros em
2030. Somando o custo líquido das iniciativas (150 bilhões de euros)
com os custos adicionais (entre 40 bilhões e 200 bilhões de euros), o
custo total é estimado entre 200 bilhões e 350 bilhões de euros anuais
em 2030. A McKinsey estimou o PIB mundial em 60 trilhões de euros
anuais em 203021. Então o custo líquido total pode representar menos de
0,4% do PIB global em 2030, um valor muito baixo se compararmos
com os prejuízos que o aquecimento global pode causar.

O estudo da Consultoria McKinsey não é contraditório com os


relátorios da AIE, que prevêem mesmo no cenário de políticas
alternativas um aumento de 29% nas emissões de CO2 dos combustíveis
fósseis. Além de o estudo da consultoria ser mais completo englobando
oportunidades de abatimento baratas nas emissões de CO2 provenientes
da silvicultura e nas emissões de outros gases estufa, ele assume que
haverá um custo líquido para reduzir as emissões, enquanto no Cenário
de Políticas Alternativas da AIE, os investimentos se pagarão tornando
o custo líquido negativo. Outro ponto para se salientar é o fato que as

21
No estudo da Mckinsey se utilizou uma taxa de câmbio de 1,5 dólar por
euro. Além disso, todos os custos estão expressos em euros reais corrigidos
pela inflação de 2005.
emissões de CO2 lançadas pelos combustíveis fósseis representaram
56,6% do total de emissões de gases estufa lançadas em 2004, segundo
o IPCC 2007. Os outros 43,6% não foram objeto de estudo da AIE.
Capítulo 6: A viabilidade política da proposta da
Mckinsey

No capítulo 4 se comentou sobre as previsões científicas do


IPCC 2007 quanto ao impacto das emissões de gases estufa no clima
global. A conclusão do Painel Intergovernamental é que as emissões
precisam parar de crescer ate 2015 e a partir daí declinar linearmente até
serem entre 50% e 85% menores no ano 2050 em relação às emissões
do ano 2000, para que se evitem mudanças climáticas perigosas. Por
outro lado, a Agência Internacional de Energia e a Consultoria
McKinsey, baseando-se em previsões populacionais e econômicas,
afirmam que se nada for feito, a tendência é que as emissões de gases
estufa cresçam enormemente entre 2005 e 2030. A Consultoria
McKinsey propõe o investimento em 200 iniciativas para mudar essa
situação, gerando um cenário de emissões de gases estufa capaz de
limitar o aquecimento global dentro dos 2°C seguros para o planeta.
Temos então previsões científicas e econômicas sobre o aquecimento
global. Temos também uma proposta de controle do aquecimento global
nos próximos 20 anos com um determinado custo econômico. Agora a
questão principal é responder a seguinte pergunta: Existe viabilidade
política para se implementar a proposta da Consultoria McKinsey que
busca diminuir as emissões de gases estufa?

A existência de viabilidade política passa pelos custos


econômicos de implementação. O custo líquido anual deve representar
menos de 0,4% do PIB global em 2030, um valor muito atrativo. No
entanto a implementação das iniciativas de redução de gases estufa
demandará grandes investimentos no período 2011-2030 que
aumentarão gradativamente e atingirão 811 bilhões de euros em 2030, o
que representa aproximadamente 1,35% do PIB global estimado em
2030. Existem grandes problemas à vista. Os políticos dos países em
desenvolvimento podem preferir colocar a culpa do aquecimento global
nos países desenvolvidos e não assumirem nenhum tipo de meta de
redução de emissões, defendendo demagogicamente que precisam
combater a pobreza nos seus países. Os países desenvolvidos têm
condições de custearem os investimentos nos seus próprios países, mas
o custeio completo dos países em desenvolvimento por parte dos países
desenvolvidos nas iniciativas será muito difícil. Os países em
desenvolvimento deverão ter crescimento econômico mais rápido do
que os países desenvolvidos nas próximas décadas e em 2030 poderão
representar mais de 50% da economia mundial. Dessa forma o
financiamento das iniciativas feito exclusivamente pelos países
desenvolvidos está condenado ao fracasso, já que um grupo de países
com menor fatia da economia global teria que financiar a si e a outro
grupo de países com a maior fatia da economia global. Os países
desenvolvidos já terão dificuldades políticas para obter recursos a fim de
financiar as iniciativas de redução de emissões dentro dos seus próprios
territórios, imagine financiar iniciativas mais dispendiosas em outros
países. A solução desse problema passa por uma responsabilidade
compartilhada quanto ao financiamento das iniciativas de redução de
emissões nos países em desenvolvimento. Os países desenvolvidos
financiariam as iniciativas no seu próprio território e financiariam
metade dos recursos necessários nas iniciativas localizadas nos países
em desenvolvimento. Os países em desenvolvimento financiariam a
outra metade de recursos necessários nas iniciativas dentro dos seus
próprios territórios. Com a economia de dinheiro através dos ganhos de
eficiência energética e com o financiamento de apenas 50% dos recursos
necessários nas iniciativas, o custo líquido total de se combater o
aquecimento global seria negativo para os países em desenvolvimento,
ou seja, haveria ganhos econômicos reais ao invés de custos. Isso
dissiparia a tese que afirma que os países em desenvolvimento ao
combaterem o aquecimento global, estão deixando de combater a
pobreza.

Todas as 200 iniciativas distribuídas em 10 setores que visam


reduzir as emissões de gases estufa são fundamentais para controlar o
aquecimento global dentro do limite de 2°C considerados seguros para o
planeta. Entre elas podemos apontar algumas “barganhas” no relatório
da McKinsey, aquelas iniciativas e aqueles setores que apresentam
maior potencial econômico de implementação e conseqüentemente de
apoio político. As 200 iniciativas podem ser divididas 3 grandes
categorias: carbono terrestre, eficiência energética e suprimento de
energia de baixo carbono. As grandes barganhas são o grupo de
iniciativas associadas ao carbono terrestre e o grupo de iniciativas
associadas à eficiência energética. O carbono terrestre engloba os
setores de agricultura e de silvicultura que apresentam baixo custo
líquido total e que necessitam de baixo investimento. Exemplos de
iniciativas nesses setores são a recuperação de solos degradados e o
combate ao desmatamento tropical. Mais de 90% das oportunidades de
abatimento estão localizadas nos países em desenvolvimento. Os
investimentos necessários do setor de silvicultura e de agricultura
representarão apenas 5% dos investimentos totais durante o período
2011-2030 e serão responsáveis aproximadamente por 31,5% da
redução total anual (12 bilhões de toneladas de CO2 equivalente) de
emissões em 2030. O grupo de iniciativas associadas à eficiência
energética está distribuído em sua maioria nos setores de edificações e
de transporte. Exemplos de iniciativas nesses setores são a construção
de edifícios que exigem menos climatização e o incentivo ao uso de
carros híbridos. As iniciativas de eficiência energética são aquelas que
precisam dos maiores investimentos iniciais, mas no longo prazo esses
investimentos são pagos pela economia de energia, apresentando custo
líquido negativo. Elas têm potencial de abatimento de 14 bilhões de
toneladas de CO2 equivalente anual em 2030, aproximadamente 37% do
potencial total de 38 bilhões de toneladas. O terceiro grupo, associado
ao suprimento de energia de baixo carbono, engloba iniciativas que
requerem em sua maioria alto nível de investimento e um alto custo
líquido total. Exemplos dessas iniciativas são as energias renováveis
como a energia solar e a energia eólica e o seqüestro geológico de
carbono. Apesar do custo líquido alto, todas as iniciativas apresentam
custo inferior a 60 euros por tonelada de CO2 equivalente evitada. As
iniciativas estão concentradas principalmente nos setores energético e
industrial e tem potencial de abatimento de 12 bilhões de toneladas de
CO2 equivalente anual em 2030, 31,5% do potencial total. Então temos
praticamente 70% da redução de emissões concentradas em iniciativas
(carbono terrestre e eficiência energética) que possuem um potencial
econômico extraordinário de implementação. A falta de vontade política
de implementação dessas iniciativas baratas representará uma falta de
conhecimento técnico dos governantes do mundo.

O custo das iniciativas de redução de emissões também pode ser


avaliado por setor econômico. No gráfico a seguir temos a quantidade
de investimento necessário nas iniciativas com potencial de abatimento
dividido por setores econômicos em dois períodos diferentes, segundo o
estudo da Mckinsey:
Nesse gráfico podem-se evidenciar em números alguns dados
citados anteriormente como a baixa necessidade de investimentos nos
setores de agricultura e silvicultura e a necessidade de grandes
investimentos nos setores de edificação e transporte, onde a maioria das
oportunidades de eficiência energética está concentrada. Evidentemente
que os investimentos em eficiência energética serão pagos pela
economia de energia.

Mesmo com o custo líquido total de menos de 0,4% do PIB global


para se controlar o aquecimento global, o senso comum de uma grande
parcela dos políticos do mundo difere da avaliação que evitar o
aquecimento global descontrolado é viável. Sem os conhecimentos
técnicos adequados, muitos acreditam que controlar o aquecimento
exigirá vultosos investimentos que diminuirão fortemente o crescimento
econômico e que estipular metas de redução de emissões
individualmente é uma atitude típica de falta de pragmatismo e visão
realista do cenário econômico. Para eles, o mais inteligente é colocar a
culpa nos outros países, afirmar verbalmente que combatem o
aquecimento global (sem combater de fato) e estipular metas de redução
de emissões de longo prazo que serão pagas por outros governantes. A
mudança dessas opiniões só ocorrerá se uma nova forma de “vender a
idéia” do combate ao aquecimento global for gerada. O estudo da
Consultoria McKinsey tem grande importância nessa mudança. Ele não
representa um relatório conclusivo, já que trabalha com cenários que
podem não se confirmar, mas representa uma referência robusta
importante a ser seguida, além de defender posicionamentos que
coincidem com outros estudos anteriores de combate ao aquecimento
planetário. Posicionamentos como a defesa do incentivo às iniciativas de
eficiência energética, que por economizarem energia futuramente,
geram ganhos econômicos líquidos ou como o discernimento que evitar
o lançamento de CO2 provocado pelo desmatamento é mais barato do
que investir em energias alternativas. Essas direções ajudam no
momento de decidir a forma de convencer os políticos e os governos a
combaterem o aquecimento global. Alguns argumentos, não
necessariamente ligadas ao estudo da McKinsey, são fundamentais para
“vender a idéia” aos governantes mundiais:

1- O custo líquido anual de menos de 0,4% do PIB global para


combater o aquecimento global representará um peso econômico baixo
nas economias nacionais em relação aos benefícios climáticos de longo
prazo ocasionados pelas iniciativas;

2- O custo das iniciativas pode ser encarado como um seguro contra


catástrofes naturais financiado pelos governos. A indústria de seguros
movimenta cifra bilionárias no mundo, sendo que grande parte dos
prêmios pagos se referem a eventos naturais como enchentes, furacões,
incêndios e terremotos. Se os governos não combaterem o aquecimento
global, as companhias de seguros aumentarão os seus valores cobrados
no longo prazo, tendo em vista que as catástrofes naturais terão maior
probabilidade de acontecer. Isso significará um custo extra para a
sociedade que poderá ser maior do que o custo das iniciativas;

3- A quantidade de investimentos necessários para custear as iniciativas


representará um valor próximo de 1% do PIB global estimado no
período 2011-2015 e aproximadamente 1,35% do PIB global no período
2026-2030, um nível relativamente elevado. No entanto, as iniciativas
de incentivo a eficiência energética, aquelas que precisam do maior
volume de investimentos, garantem benefícios imediatos a sociedade,
proporcionais aos benefícios ocasionados por investimentos em
iniciativas não ambientais. Os governos podem subsidiar na forma de
redução de impostos a fabricação de carros híbridos, tornando os seus
preços iguais aos carros comuns. Com esse incentivo, os proprietários
dos carros terão durante toda a vida útil do veículo a condição de andar
gastando até metade do combustível consumido por um carro comum.
Esse benefício econômico é proporcional ao obtido caso o dinheiro
fosse aplicado na construção de uma nova estrada, por exemplo. Assim
como as iniciativas comuns, as iniciativas de redução de emissões
podem gerar benefícios a sociedade e conseqüentemente benefícios
eleitorais para os políticos;

4- Com a responsabilidade compartilhada dos investimentos localizados


nos países em desenvolvimento22, esses países menos ricos só
financiarão 50% dos investimentos feitos no seu território, fazendo com
que as iniciativas tenham um custo líquido negativo. Então ao invés de
representar um peso econômico, as iniciativas gerarão um pequeno
aumento das taxas de crescimento econômico dos países em
desenvolvimento;

5- As iniciativas de redução de emissões podem significar um seguro


energético contra os altos preços dos combustíveis fósseis no futuro. O
estudo da McKinsey assume um preço médio de 60 dólares o barril de
petróleo no período de redução, seguindo projeções da AIE. No entanto
também foi avaliado o impacto do preço médio de 120 dólares o barril
no custo das iniciativas. Nesse cenário haveria uma economia adicional
de 700 bilhões de euros em 2030 (19 euros por tonelada de CO2
equivalente), tornando o custo total líquido das iniciativas negativo.
Antes da crise mundial de 2008, houve uma grande especulação no
mercado internacional de petróleo, com os preços variando entre 50
dólares e 150 dólares o barril num período inferior a um ano. O preço do
petróleo é definido pelo cartel da OPEP e não segue regras de mercado
na fixação de preços. A concentração da maioria das reservas em poucos
países e a esgotabilidade do combustível em poucas décadas favorecem
essa definição. Quando um país decide continuar dependendo
fortemente do petróleo no setor de energia, ele se sujeita ao humor da
especulação de lideres políticos instaurados em regimes instáveis como

22
Proposta defendida neste capítulo do livro
Arábia Saudita, Irã, Iraque, Venezuela, Nigéria e Líbia. No momento
em que o petróleo sobe demais, corre-se o risco de se sofrer choques
econômicos que só poderão ser aliviados em alguns anos através da
introdução de programas de eficiência energética, pois a infra-estrutura
energética não consegue sobreviver no curto prazo sem petróleo, ou
mesmo com menos petróleo. A primeira crise mundial do petróleo nos
anos 70, por exemplo, incentivou os Estados Unidos a fabricarem carros
mais econômicos. A prevenção de uma crise energética através da
diminuição da dependência dos combustíveis fósseis é a melhor
alternativa para evitar choques econômicos. O investimento nas
iniciativas de diminuição de emissões pode cumprir esse papel. No
entanto também há o outro lado da moeda. Se todas as iniciativas de
redução de emissões forem implementadas, isso pode provocar um
choque de excesso de oferta, reduzindo os preços do barril do petróleo.
Há a possibilidade de nesse cenário o cartel da OPEP tornar os preços
do petróleo artificialmente baixos temporariamente, no momento em
que se sentir ameaçado na posição de líder do mercado energético
mundial. As empresas tomam decisões econômicas com anos de
antecedência e num cenário de preço do petróleo muito baixo, podem
preferir continuar investindo em infra-estruturas que dependem do
combustível fóssil, temendo perder vantagens competitivas contra outras
empresas do seu setor econômico no futuro. Nesse momento entra uma
importante palavra para evitar esse processo: regulação. Quando um
país tem uma infra-estrutura dependente do petróleo e acontece um
choque de preços elevados, não há alternativa, senão suportar o choque
econômico. Mas quando o preço baixa muito a melhor alternativa é
evitar que as empresas do país tomem como referência esse valor que é
temporariamente ilusório. Essa é uma decisão de estratégia que evita a
sedução por preços de petróleo baratos e o poder dessa decisão está
inteiramente nas mãos dos países consumidores. A regulação através da
fixação de preços mínimos garante a implantação da infra-estrutura
energética de baixo carbono sem que as empresas temam uma
concorrência desleal contra a infra-estrutura dependente do carbono. A
consultoria McKinsey avaliou a influência do preço médio do petróleo a
40 dólares o barril, no custo líquido das iniciativas de redução de
emissões. Em 2030 esse valor baixo do petróleo representaria um
aumento de 4,5 euros por tonelada de CO2 equivalente no custo médio
das iniciativas, pois apesar de o custo das iniciativas de redução de
emissões continuar o mesmo, ele ficaria mais caro quando comparado
com a infra-estrutura dependente de carbono. Praticamente se dobraria o
preço da tonelada de CO2 equivalente evitada. Mas como sabemos o
valor médio do petróleo a 40 dólares o barril é ilusório. Alguns analistas
acreditam que o petróleo pode atingir mais de 200 dólares o barril nas
próximas 2 décadas, se mantido o ritmo atual de crescimento do
consumo. Portanto implementar as iniciativas de redução de emissões
representará um escudo contra ataques especulativos nos preços do
petróleo, garantindo a estabilidade econômica dos países;

6- O mesmo princípio que se aplica ao petróleo (citado no item anterior)


se aplica ao gás natural. Os dois combustíveis fósseis têm reservas
suficientes para suportar o consumo mundial atual por mais 50 anos
aproximadamente. No entanto se o consumo continuar subindo esse
tempo pode diminuir. A maioria das reservas mundiais está concentrada
em poucos países. No caso do gás natural a Rússia, o Irã e o Qatar
possuem mais de 50% das reservas mundiais. A forte dependência do
gás natural pode provocar no futuro um choque econômico causado pelo
aumento do preço do combustível. A Europa depende fortemente do gás
natural russo. Se a Rússia resolver, por exemplo, aumentar o preço do
gás natural no inverno (época em que a demanda energética aumenta),
restará a Europa escolher entre pagar mais caro pelo gás ou literalmente
congelar. A “Rússia sul-americana” é a Bolívia, o país mais pobre do
continente e que possui as maiores reservas de gás natural. O Brasil
sofreu no passado recente uma grave crise energética provocada por
problemas de suprimento do gás natural boliviano. As iniciativas de
redução de emissões também têm o potencial de reduzir o risco de crises
econômicas provocadas pelo mercado do gás natural;

7- Cada vez mais políticos perderão eleições se não investirem em


iniciativas de combate ao aquecimento global. Em 2005 o furacão
Katrina devastou a cidade de New Orleans nos Estados Unidos. Esse
evento prejudicou a popularidade do ex-presidente Bush, pois o furacão
foi associado ao aquecimento global, e o ex-presidente era um árduo
inimigo de iniciativas de redução de emissões. Nas eleições de 2008, o
candidato republicano John Maccain perdeu a eleição presidencial
devido principalmente a impopularidade do presidente Bush, do seu
partido. Grande parte dessa impopularidade veio da sua posição
ambiental e o furacão Katrina se tornou um símbolo dessa posição. Na
realidade provar que o furacão Katrina foi provocado pelo aquecimento
global é cientificamente difícil. O cientificamente mais correto é
associar uma série de mudanças climáticas distintas, que são explicadas
pelo aquecimento global e não associar somente um evento climático.
No entanto a opinião pública reage a cada catástrofe natural histórica
como um efeito do aquecimento global, e para azar dos políticos essas
catástrofes se tornarão cada vez mais freqüentes justamente por causa
das mudanças climáticas. Por esse motivo os eventos naturais
influenciaram as eleições da maior economia do mundo. Esse fenômeno
eleitoral já aconteceu recentemente e vai acontecer novamente com mais
força no futuro. O furacão Katrina acabou se tornando “o furacão
Bush”. Os políticos que não aceitarem as iniciativas de redução de
emissões terão que conviver com o ônus de terem sua popularidade
ameaçada por eventos naturais que não podem ser controlados,
configurando um verdadeiro “terrorismo climático”.

As iniciativas de redução de emissões deverão ser custeadas


pelos governos na forma de subsídios ou obtidas através de taxações de
empresas emissoras de gases estufa. Os incentivos governamentais
precisam ser amparados por regulações de longo prazo que garantam
segurança jurídica para os investidores. Outro ponto importante é a
implementação de normas e padrões mínimos de eficiência energética
em equipamentos. As iniciativas localizadas nos setores de silvicultura e
agricultura, fortemente concentradas em países em desenvolvimento,
devem proporcionar desenvolvimento econômico, desincentivando
práticas ambientalmente insustentáveis.

O estudo da Consultoria McKinsey avaliou individualmente com


aprofundamento as iniciativas de redução de emissões dividindo-as em
10 setores econômicos. No entanto nos capítulos seguintes utilizaremos
a divisão explicitada no capítulo anterior: carbono terrestre,
suprimento de energia de baixo carbono e eficiência energética. Essa
divisão também é abordada no estudo, mas sem aprofundamento. No
capítulo 7 se abordará o setor de carbono terrestre. No capítulo 8 se
comentará especificamente sobre a região amazônica, importante fonte
de emissões do setor de carbono terrestre. As iniciativas de suprimento
de energia de baixo carbono serão explicadas em 2 capítulos: os
capítulos 9 e 10. No capítulo 9 se falará sobre o seqüestro geológico de
carbono, que torna as fontes emissoras de CO2 em fontes limpas através
do envio do CO2 para o subsolo. No capítulo 10 se comentará sobre as
principais fontes de energia limpas, distintas das fontes do capítulo 9, já
que não há lançamentos de CO2 efetivos, nem mesmo para o subsolo.
No capítulo 11 se comentará sobre um grupo de soluções de eficiência
energética. Esses 5 capítulos farão uma abordagem geral das principais
formas de redução de emissões (energia eólica, energia solar, energia
nuclear, carros híbridos, combate ao desmatamento tropical, etc)
focando nas potencialidades e gargalos de cada tecnologia ou solução.
Os dados do estudo da McKinsey ajudarão na abordagem, mas não
serão a principal fonte de informação.
Capítulo 7: O setor de carbono terrestre: silvicultura e
agricultura

O setor de carbono terrestre engloba as emissões de gases estufa


não ligadas ao consumo de combustíveis fósseis. Ele é composto de dois
setores econômicos: a silvicultura e a agricultura. As emissões da
silvicultura são compostas basicamente do desmatamento tropical, da
degradação da biomassa após o desmatamento, da drenagem de áreas de
turfa e da queima de solos turfosos. As emissões da agricultura são
compostas da atividade agrícola propriamente dita (exemplo: emissões
provenientes dos solos agrícolas) e também da pecuária (exemplo:
fermentação entérica dos animais). O setor de carbono terrestre é o que
provavelmente apresenta maior viabilidade de mitigação de emissões,
pois tanto o custo líquido das iniciativas é baixo, quanto à necessidade
de investimentos. No entanto também existem dificuldades como a
fragmentação dos emissores e a concentração da maioria absoluta das
emissões nos países em desenvolvimento. Enquanto poucas empresas
são responsáveis pelas emissões das termelétricas no mundo, milhões de
proprietários rurais são responsáveis pelas emissões do setor de carbono
terrestre. Essa fragmentação demanda uma forte fiscalização
acompanhada de incentivos de práticas sustentáveis, para que as
iniciativas de redução de emissões tenham êxito. A redução das
emissões nos países em desenvolvimento precisa ser financiada em
parte pelos países desenvolvidos. Países como Brasil e Indonésia que
lideram as emissões do setor de silvicultura no mundo, não possuem
apoio político interno para financiarem sozinhos as iniciativas. No caso
brasileiro a consultoria McKinsey estimou em 17 bilhões de reais23
anuais o custo para zerar o desmatamento na Amazônia. Esses
problemas não inviabilizam a redução de emissões no setor de carbono
terrestre. Na maioria dos casos reduzir as emissões tem uma viabilidade
econômica muito alta, pois as práticas agrícolas e florestais predatórias
geram um baixo ganho econômico em relação a quantidade de gases
estufa gerado, se comparadas as atividades do setor de energia. A
Consultoria McKinsey estima em 15 bilhões de euros anuais em 2015 e
em 43 bilhões de euros anuais em 2030 a quantidade de investimentos
necessários para tornar o setor de silvicultura neutro em carbono em

23
A quantia equivale a 5,5 bilhões de euros em valores de 2005
2030. Quanto ao setor agrícola a quantidade de investimentos é
considerada insignificante, já que a maioria das iniciativas é constituída
de mudanças de práticas agrícolas, que podem se tornar sustentáveis
sem investimentos adicionais. Ao total com apenas 5% dos
investimentos necessários em todas as iniciativas durante o período de
redução 2011-2030, o setor de carbono terrestre pode ser responsável
por 31,5% das reduções totais em 2030, uma relação custo-benefício
muito alta.

O setor agrícola foi responsável por 14% das emissões mundiais


de gases estufa em 2005, ou 6,2 bilhões de toneladas de CO2
equivalente. Os principais responsáveis são as emissões de metano
provenientes da fermentação entérica por parte do animais (38% do
total), a emissão de metano proveniente do cultivo de arroz (13% do
total) e a emissão de óxido nitroso (N2O) dos solos agrícolas (37% do
total). Temos, portanto três grupos bem definidos que necessitam ter
suas emissões reduzidas.

As emissões de metano (CH4) através da fermentação entérica são


oriundas de animais como vacas, ovelhas e cabras, que pertencem à
classe dos ruminantes. Os ruminantes têm quatro estômagos e digerem
seu alimento em seus estômagos ao invés de seus intestinos, como
fazem os humanos. Os ruminantes comem o alimento, expelem-no
como bolo alimentar para a boca e tornam a comê-lo.No rúmen, o
primeiro estômago dos animais, ocorre a fermentação entérica do
alimento ingerido através de um processo anaeróbico (sem a presença de
ar) realizado por bactérias. Nesse processo há a produção de metano. O
metano produzido é posteriormente arrotado pelas narinas e pela boca
dos animais. Também há produção de metano através da flatulência dos
animais, mas em menor quantidade que o arroto. A redução das
emissões lançadas pela fermentação entérica tem sido tentada através do
uso de aditivos alimentares, pílulas e vacinas. Pesquisas com aditivos
alimentares como gordura de coco, linhaça, sementes de girassol, alho e
óleo de peixe tem obtido reduções entre 20% e 50% na geração de
metano através da inibição da proliferação de bactérias responsáveis
pela produção do gás. Outra opção é o uso de pílulas. Cientistas na
Alemanha desenvolveram uma pílula que acompanhada de uma dieta
especial com algumas restrições alimentares é capaz de reduzir a
emissão de metano através da conversão do gás em glicose. Por último,
vacinas contra bactérias metanogênicas estão sendo desenvolvidas, mas
ainda não estão disponíveis comercialmente.

As plantações de arroz também são ambientes propícios para a


liberação de metano na atmosfera. O arroz é cultivado em áreas alagadas
e com grande presença de matéria orgânica. Esse ambiente pobre em
oxigênio favorece a decomposição da matéria orgânica por bactérias
anaeróbicas produtoras de metano. O gás pode ser liberado através de
bolhas dentro da água até a atmosfera quando se encontra em altas
concentrações, mas o principal responsável pelas emissões é o
transporte difuso pelo aerênquima, um tecido vascular presente nas
plantas de arroz. O aerênquima permite a circulação de ar no interior da
planta, levando o oxigênio da atmosfera até as raízes. Essa circulação de
ar facilita a liberação do metano. As plantas de arroz facilitam até 10
vezes mais o escape de metano para a atmosfera24 em comparação com
solos inundados sem cultivo de arroz. Fatores como a temperatura, a
radiação solar, o tipo de adubação, a espécie de arroz e o nível de
inundação influenciam na produção de metano. O metano resultante do
cultivo de arroz irrigado pode reduzir-se significativamente
introduzindo alterações nos sistemas de irrigação e drenagem ou através
do uso de fertilizantes. Cerca de 50% do total das terras dedicadas no
mundo aos arrozais é irrigada. O arroz irrigado libera mais metano do
que o arroz de sequeiro. A drenagem de um campo de arroz irrigado em
momentos específicos durante o ciclo de cultivo pode reduzir
drasticamente as emissões de metano sem diminuir os rendimentos da
colheita. Outras opções técnicas para reduzir as emissões de metano
consistem em agregar sulfato de sódio ou carboneto de cálcio aos
fertilizantes com base em uréia, ou substituir a uréia por sulfato de
amônio como fonte de nitrogênio para os cultivos de arroz.

A principal origem das emissões de óxido nitroso (N2O)


advindas dos solos agrícolas é a aplicação indiscriminada de
fertilizantes nitrogenados sintéticos nos cultivos. As emissões ocorrem
devido à desnitrificação a partir do nitrogênio mineral. A desnitrificação
consiste na redução microbiana dos nitratos (N3O) às formas
intermediárias de nitrogênio e então às formas gasosas (NO, N2O e N2)
que são perdidas para a atmosfera. As emissões de óxido nitroso
24

http://w3.ufsm.br/ppgcs/congressos/CBCS_Gramado/Arquivos%20trabalho
s/Efluxo%20de%20metano_Fabio%20G..pdf
originadas do setor agrícola podem minimizar-se com novos
fertilizantes e práticas de fertilização. Aumentando-se a eficiência com a
qual os cultivos utilizam o nitrogênio, é possível reduzir a quantidade de
fertilizantes necessária para produzir uma determinada quantidade de
alimento ou reduzir as emissões de N2O lançada por uma determinada
quantidade de fertilizante. As principais práticas que aumentam a
eficiência no uso do nitrogênio são: ajuste de taxas de aplicação com
base em estimativas precisas das necessidades da cultura (ou seja,
agricultura de precisão); uso de fertilizantes de liberação lenta ou
controlada ou inibidores de nitrificação (que desaceleram processos
microbianos que levam à formação de N2O); aplicação de nitrogênio
quando a perda for menos provável, geralmente logo antes do consumo
(melhor programação); ou aplicação do nitrogênio de forma mais
precisa no solo, para torná-lo mais acessível às raízes.

O setor agrícola também pode ajudar a mitigar as emissões de


CO2 através do seqüestro de carbono pelos solos. Os solos são um
importante reservatório de carbono e desempenham um importante
papel no ciclo do carbono global. Historicamente, os solos perderam
muito carbono devido à intervenção do homem, mas uma parte desse
carbono pode ser readquirido através de manejo aprimorado, retirando
assim CO2 da atmosfera. A quantidade de carbono orgânico no solo é o
resultado do balanço entre dois processos: a) deposição de resíduos
(serapilheira e raízes) de plantas que originalmente obtiveram seu
carbono do CO2 atmosférico através da fotossíntese; b) decomposição
dos resíduos depositados, resultando no lançamento de CO225. O
primeiro processo aumenta o carbono no solo enquanto o segundo
diminui. Práticas agrícolas de baixa sustentabilidade ambiental como a
aração excessiva, a gradeação e os desmatamentos, aumentam a
decomposição do carbono orgânico, lançando CO2 para a atmosfera e
diminuindo a fertilidade dos solos. Além disso, fatores como a
fertilização inadequada, a queima de restos culturais e o cultivo
intensivo das terras, contribuem para o aumento dessa degradação dos
solos. Práticas sustentáveis podem restaurar tanto áreas de cultivos
agrícolas quanto pastos de criação de gado, reduzindo essas perdas e
fixando carbono no solo. Os solos podem ter sua fertilidade restaurada

25

http://www.cnpab.embrapa.br/pesquisas/folders/folder_sequestro_carbono.p
df
através da correção de nutrientes com fertilizantes, da aplicação de
adubos orgânicos, do cultivo com plantio direto e da retenção de
resíduos agrícolas. Solos mais férteis aumentam a produção agrícola e
conseqüentemente aumentam a quantidade de restos culturais que
acabam ficando no solo após a colheita. Para garantir que esse carbono
dos restos culturais seja fixado no solo é preciso evitar a aração das
terras. A terra arada por tratores no cultivo tradicional acelera a
decomposição da matéria orgânica porque destrói os agregados do solo
que protegem a matéria orgânica da ação microbiana, gerando
significativas emissões de CO2 para a atmosfera, que são ignoradas por
não serem visíveis a olho nu como as queimadas. No plantio direto há o
cultivo sobre a palha deixada pela cultura anterior, sem a necessidade da
remoção do solo através da aração. No plantio direto esse carbono que
seria liberado para atmosfera pela aração da terra é fixado no solo.

A expansão do setor agrícola também influencia as emissões do


outro grande setor econômico associado ao carbono terrestre: o setor de
silvicultura. O setor de silvicultura emitiu em 2005, segundo a
consultoria McKinsey, 7,4 bilhões de toneladas de CO2 equivalente,
sendo 5,4 bilhões provenientes do desmatamento e 2 bilhões
provenientes da drenagem de áreas de turfa e da queima de áreas de
turfa. Acredito que a melhor estimativa das emissões das áreas de turfa
(drenagem e queima de solos) seja superior à apontada pela consultoria.
Num estudo mais recente26 e mais abrangente, realizado pelos mesmos
pesquisadores que são citados na bibliografia do relatório da McKinsey,
as emissões das áreas de turfa são estimadas em 3 bilhões de toneladas
anuais.

O desmatamento tropical é o grande emissor do setor de


silvicultura, já que 88% das emissões do desmatamento são oriundas das
florestas tropicais localizadas em países em desenvolvimento. No
mundo todo o processo de desmatamento de florestas tropicais ocorre
basicamente por três razões: a alta lucratividade da atividade madeireira,
a expansão irracional da agropecuária e a ausência do Estado. O Brasil,
26
A publicação “Fact book for UN-FCCC policies on peat carbon emissions”
com os dados pode ser encontrada no site www.wetlands.org, no link
específico:
http://global.wetlands.org/LinkClick.aspx?fileticket=mGqAyxnvFJw%3d&tabi
d=56
o país com maior índice mundial de desmatamento anual, é uma
referência para a questão. O desmatamento de uma determinada área em
poucos meses oferece uma lucratividade que só será obtida através da
agropecuária num prazo de muitos anos. Com pouca fiscalização
ambiental, esse filão é bem aproveitado pelas madeireiras ilegais.
Depois vem a agropecuária. A agricultura de alta produtividade está
localizada nas terras mais caras e próximas das grandes cidades. A
necessidade de aumentar a produção impulsiona a compra de terras mais
distantes, onde se pratica uma agricultura menos intensiva, que devido a
isso se transfere para áreas ocupadas pela pecuária extensiva. A pecuária
extensiva por sua vez invade a floresta. O aumento da produção em
áreas que praticam uma agricultura menos intensiva e o aumento da
criação de gado extensiva também acelera essa invasão da floresta. O
problema é que essa invasão é desnecessária. Existem terras já
desmatadas suficientes pra multiplicar a criação de gado. Na Amazônia
brasileira, se cria 0,7 bois por hectare em terras desmatadas, onde se
poderia criar 3 cabeças por hectare, sem uso de ração externa. No
entanto isso não acontece. Grande parte das áreas em processo de
desmatamento são terras públicas sem ocupação e controle onde quem
desmata de forma predatória e ocupa a terra com gado bovino se torna
dono. Conquistar uma terra de graça se torna um grande estímulo para
se derrubar a floresta. Sai mais barato desmatar, do que investir na
criação intensiva em terras já desmatadas. No entanto não é apenas a
pecuária que é responsável pelo processo de desmatamento. Alguns
cultivos agrícolas como a soja no Brasil e a palma na Indonésia também
são responsáveis, com o agravante de serem atividades com maior
lucratividade por área do que a pecuária, dificultando a substituição por
uma atividade sustentável que precisa ter no mínimo o mesmo nível de
lucratividade. A união do lucro da atividade predatória com a falta de
intervenção estatal justifica plenamente o desmatamento tropical no
mundo.

O outro forte emissor de CO2 na atmosfera no setor de


silvicultura são as turfeiras. A turfa é um material orgânico de coloração
preto-amarronzada composto por restos parcialmente decompostos de
vegetais, encontrado geralmente em pântanos e em áreas frias como as
tundras. Em todos os ecossistemas terrestres, as plantas convertem CO2
atmosférico em biomassa vegetal que após a morte se decompõem
rapidamente sob a influência de oxigênio. Nas turfeiras, a planta morta
fica molhada, num ambiente de baixo oxigênio onde a decomposição é
muito mais lenta. Há um equilíbrio entre o CO2 lentamente absolvido
pela biomassa vegetal e o CO2 lentamente lançado pelas turfeiras. Se a
turfeira entra em contato com o ar pela ação humana, esse equilíbrio é
perdido e a turfeira acaba sendo decomposta e lançada rapidamente para
atmosfera na forma de CO2. Os solos turfosos representam 3% da
superfície da Terra. Um estudo recente conduzido pela ONG Wetlands
juntamente com a Universidade de Greifswald, concluiu que as
emissões provenientes da turfa chegam a 3 bilhões de toneladas de CO2
anuais sendo que 2/3 estão concentradas em 4 países do Sudeste
Asiático: Brunei, Indonésia, Malásia e Papua Nova Guiné. Entre as
emissões do Sudeste Asiático, cerca de 600 milhões de toneladas são
lançadas pela decomposição dos solos de turfa drenados e outras 1,4
bilhão de toneladas provém da queima de áreas de turfa27. A diminuição
das emissões advindas do desmatamento tropical no Sudeste Asiático e
das emissões advindas dos solos turfosos constituem um objetivo
comum, pois a maioria das emissões dos solos turfosos na região são
causados pelos incêndios florestais, com o objetivo de plantar palma e
outros produtos agrícolas. Esses incêndios acabam se alastrando e
queimando as camadas de solos turfosos riquíssimas em matéria
orgânica. O cultivo de palma, um dos grandes causadores dos incêndios,
tem o objetivo de produzir biodiesel, que é vendido como um
combustível limpo no mercado internacional, pois o CO2 lançado pelo
combustível na queima foi absolvido pela planta no momento do
cultivo. No entanto, está se cometendo um grande crime ambiental na
prática. Vão ser necessários dezenas ou até centenas de anos para que o
CO2 absolvido pelo cultivo de palma compense o CO2 emitido pela
queima dos solos turfosos e pela queima da floresta tropical.

O ciclo de crimes ambientais e falta de presença do Estado, que


causam as emissões do setor de silvicultura, pode ser revertido através
de investimentos em práticas sustentáveis e atuação governamental em
fiscalização. O problema é que as florestas tropicais remanescentes
estão em áreas de países em desenvolvimento (Brasil, Indonésia e
Congo são exemplos de grandes desmatadores) onde a preocupação

27 A publicação “Fact book for UN-FCCC policies on peat carbon emissions”


com os dados pode ser encontrada no site www.wetlands.org, no link
específico:
http://global.wetlands.org/LinkClick.aspx?fileticket=mGqAyxnvFJw%3d&tabi
d=56
principal dos governos é o crescimento econômico e a redução da
pobreza, ficando o meio-ambiente num plano secundário. Não se
controla o desmatamento porque não há ganho econômica imediato com
isso, existindo áreas fora do controle estatal. Esses países alegam que os
países ricos desmataram suas florestas para se desenvolverem e não
podem exigir moralmente metas de redução dos países em
desenvolvimento, e que só devem existir metas de redução para o
consumo de combustíveis fósseis dos países ricos. Alguns países ricos
defendem que os governos dos países desmatadores precisam cumprir
metas de redução. Nessa disputa todos estão errados, porque devemos
pensar como "nós" e não como "eu". Um país como o Brasil, que possui
a 8ª economia do mundo, por exemplo, pode diminuir fortemente o
desmatamento na Amazônia sem recursos externos. Por outro lado os
países ricos também podem contribuir com uma fração ínfima das suas
riquezas. Essa disputa não pode impedir que o mundo aproveite uma das
formas de diminuição de emissões de gases estufa com melhor custo-
benefício. A solução passa pela já citada responsabilidade
compartilhada, onde os países desenvolvidos contribuem com 50% dos
recursos financeiros necessários para financiar as iniciativas do setor de
silvicultura e os países em desenvolvimento contribuem com os outros
50% necessários para financiar as iniciativas dentro dos seus territórios.
Iniciativas como o incentivo a práticas sustentáveis (exemplo: extração
sustentável da madeira da floresta), gerarão ganhos econômicos que
compensarão os investimentos feitos pelos países em desenvolvimento.

O fim do desmatamento tropical depende de uma grande mudança


de mentalidade na exploração das florestas. Até hoje o desmatamento
das florestas foi visto como fonte de progresso econômico inesgotável
através da exploração da madeira e da conquista de novas terras para o
cultivo agrícola. Diante do aquecimento global, onde as emissões do
setor de silvicultura são responsáveis por quase 20% do efeito estufa, da
esgotabilidade das florestas e de outros papéis ambientais como a
responsabilidade pela formação de chuvas, as florestas tropicais
apresentarão um melhor custo-benefício no longo prazo para a
sociedade se forem mantidas em pé. No curto prazo são necessárias
alternativas para manutenção dos benefícios econômicos trazidos pela
exploração predatória. Ao invés de se desmatar novas terras para
expandir a pecuária extensiva, a melhor alternativa é aumentar a criação
de gado nas mesmas terras. A exploração sustentável da madeira da
floresta, onde é desmatada apenas a parcela da floresta que possui valor
comercial, pode substituir com sucesso o desmatamento predatório. A
palavra chave desse processo é COMPATIBILIZAÇÃO. Precisamos
compatibilizar a preservação da floresta com a manutenção de
atividades econômicas lucrativas. Mesmo que essa compatibilização
consiga ser implementada com sucesso na maioria dos países, parece
pouco razoável que o mundo acabe completamente com o
desmatamento, pois mesmo que os grandes focos acabem o
desmatamento ocorrerá difusamente com baixa intensidade em qualquer
parte do globo. No entanto há um grande aliado para zerar e até mesmo
tornar negativa as emissões do setor de silvicultura: o reflorestamento.
O reflorestamento em áreas degradadas já vem sendo feito como forma
de neutralizar as emissões de CO2. Enquanto uma floresta adulta e
madura consome e emite uma quantidade similar de CO2, uma floresta
jovem e em crescimento consome muito mais CO2 do que emite. Ela
fixa carbono na forma de tronco, galhos, folhas e emite oxigênio para a
atmosfera. Essa capacidade de consumir CO2 pode anular a emissão de
uma usina ou de um carro que lança CO2 em qualquer parte do mundo.
No caso do setor de silvicultura, o reflorestamento pode neutralizar as
pequenas emissões difusas por desmatamento ao redor do planeta.
tropical.

Para se reduzir as emissões do setor de silvicultura até se atingir


emissões neutras ou negativas em 2030 basicamente 4 soluções
precisam ser implementadas:

1)Reflorestamento de matas tropicais

O reflorestamento em áreas degradadas já vem sendo feito como


forma de neutralizar as emissões de CO2 como instrumento de
conscientização ambiental, Exemplos dese processo são as
neutralizações de eventos, produtos e programas de televisão.
Precisamos aumentar exponencialmente o tamanho das áreas de
reflorestamento de matas nativas. No mundo já existem áreas
significativas de reflorestamento para fins comerciais como produção de
carvão vegetal, papel e madeira. No entanto essas áreas não devem ser
usadas como neutralizadores de outras emissões externas, pois o
carbono sequestrado pode ser lançado posteriormente na atmosfera na
queima de carvão vegetal por exemplo. O reflorestamento com espécies
nativas além de neutralizar outras emissões reecria a biodiversidade que
foi perdida no momento do desmatamento da área. O estudo da
McKinsey estima em 2,4 bilhões de toneladas de CO2 equivalente o
potencial de sequestro de carbono em 2030 através do reflorestamento
de áreas degradadas e de áreas marginais de pastos e terras agrícolas.
Para isso será necessário o plantio nos próximos 20 anos de uma área de
3,3 milhões de km², configurando um sequestro aproximado médio por
hectare de 7,2 toneladas anuais de CO2, o que equivale a um sequestro
de 2 toneladas de carbono anuais. Existem regiões como a floresta
amazônica que apresentam um potencial muito maior de sequestro de
CO2 por hectare. Um hectare reflorestado na Amazônia pode fixar entre
6 e 9 toneladas de carbono por ano28. Outro ponto é que quando se
refloresta uma determinada área, esse seqüestro anual de carbono se
mantém por 20, 30 anos, ou seja, enquanto a mata vai crescendo. Então
o seqüestro de CO2 através do reflorestamento continuará por mais
alguns anos após 2030.

Alguns ambientalistas questionam se há terra suficiente para


fazer reflorestamentos tão extensos e ao mesmo tempo aumentar a
produção agrícola sem desmatar novas áreas. No mundo existem 25
milhões de km² de área agricultáveis sem a necessidade de novos
desmatamentos. Essa área deve aumentar um pouco mais nas próximas
2 décadas, mesmo no cenário de controle do desmatamento, já que a
diminuição ocorrerá gradativamente ao longo dos anos. O
desmatamento tropical, mesmo que num ritmo menor, gerará novas
áreas para a produção agrícola. Dos 25 milhões de km², 14 milhões de
km² (56% do total) estão sendo usados para agricultura ou para pecuária
e 11 milhões ainda podem ser aproveitadas. Em 1960, a humanidade
usava uma quantidade de terra similar a atual para alimentar 3 bilhões
de pessoas, com uma dieta de 2400 calorias diárias. Hoje essa
quantidade terra é capaz de alimentar 6 bilhões de pessoas com uma
dieta de 3000 calorias diárias. Uma grande parte da população
abandonou o campo e foi para a cidade nesse período, mas o aumento
explosivo da produtividade agrícola conseguiu quase que triplicar a
produção, com menos trabalhadores e a mesma quantidade de terra. Nas
próximas 4 décadas a taxa de crescimento populacional e a taxa de
crescimento da ingestão calórica serão menores. Por isso o aumento da

28 Revista Scientific American Brasil, edição 6, novembro de 2002, versão


eletrônica, reportagem “a Amazônia e o carbono Atmosférico”. A reportagem
na íntegra está no site:
http://www2.uol.com.br/sciam/reportagens/a_amazonia_e_o_carbono_atmosfer
ico_imprimir.html
produção agrícola não será tão grande quanto foi no período 1960-2008.
Através da continuação do aumento da produtividade agrícola e de uma
boa utilização dos 11 milhões de km² restantes de terras agricultáveis,
poderemos entre 2011 e 2030 aumentar a produção agrícola, diminuir
fortemente o desmatamento tropical e reflorestar grandes áreas com
espécies nativas.

O reflorestamento de matas nativas tem potencial de neutralizar


qualquer emissão em qualquer setor econômico, não somente as
emissões residuais do desmatamento tropical. Uma excelente alternativa
é a neutralização de combustível nos postos de gasolina. Sabe-se que 1
litro de gasolina emite 2,3 kg de CO2 na atmosfera. A quantificação de
emissões de um consumidor de gasolina ou de um posto é muito mais
fácil e precisa do que a quantificação de emissões de uma empresa que
necessita de cálculos complexos e muitas vezes imprecisos. Existe uma
empresa de distribuição de combustível no Brasil que está realizando a
neutralização do combustível consumido no posto de gasolina. Os
postos Ipiranga, uma rede que é responsável pela distribuição de 14
bilhões de litros de combustível no Brasil, criou um cartão de fidelidade
chamado cartão Ipiranga Carbono Zero29. O consumidor que abastece o
carro com o cartão tem o seu combustível neutralizado, através do
reflorestamento de matas nativas em 3 estados brasileiros (São Paulo,
Rio de Janeiro, Paraná) . Inicialmente a distribuidora financiou o plantio
de uma área suficiente para neutralizar 5 mil toneladas de CO2. Apenas
uma pequena parcela de combustível da distribuidora está sendo
neutralizada, referente exclusivamente ao combustível pago com o
Ipiranga Carbono Zero, mas a idéia tem um grande potencial de
ampliação. Fazendo uma comparação, os cartões de Fidelidade
tradicionais da rede Ipiranga oferecem um desconto de 4 centavos de
real por litro de combustível consumido, enquanto o Cartão Carbono
Zero não oferece descontos no combustível, somente o ganho ambiental.
Isso evidencia que os consumidores podem estar dispostos a trocar um
pequeno ganho econômico pela possibilidade de melhorar o clima do
planeta. O programa de neutralização está sendo validado pela Bureau
Veritas Certification, uma empresa certificadora presente em mais de
140 países. Veja a foto do cartão:

29 O site do cartão é: http://www.cartaoipirangacarbonozero.com.br/


O custo de 4 centavos por litro que o consumidor paga é muito
baixo, além de ser um valor próximo das estimativas do relatório da
McKinsey. O estudo afirma que o custo médio para se evitar a emissões
no período 2011-2030 no setor de silvicultura é de 9 euros por tonelada
de CO2, o que equivale a um custo de 27 reais. São necessários a queima
de 434 litros de gasolina para se emitir 1 tonelada de CO2. Aplicando-se
o custo de 27 reais por tonelada evitada, o custo para se neutralizar 1
litro de gasolina é de 6,2 centavos de real (27 : 434). No caso da
gasolina brasileira o custo ainda é menor porque há uma adição de 24%
de álcool, que tem suas emissões neutralizadas pelo crescimento da
cana-de-açúcar. Um custo entre 4 e 6 centavos de real diante de um
preço final da gasolina que ultrapassa 2 reais por litro no caso brasileiro
é plenamente viável de ser pago pelo consumidor final até mesmo de
forma voluntária.

2) Fortalecimento das instituições

Combater o desmatamento tropical no mundo exige um


aumento da participação estatal no controle do uso da terra. Sem
presença dos governos, as áreas de desmatamento se tornam terras sem
lei, onde quem desmata predatoriamente e posteriormente a ocupa se
torna dono. Na Amazônia brasileira, por exemplo, menos de 10% das
terras têm títulos de propriedade claros. O primeiro passo é fazer a
regularização fundiária, dando títulos de terra para os posseiros que já se
estabeleceram a um determinado tempo em regiões que foram
desmatadas no passado e que hoje desenvolvem atividades
agropecuárias. O segundo passo é a ocupação efetiva das grandes áreas
de florestas preservadas por parte dos governos e a posterior concessão
dessas terras para empresas que realizem a extração sustentável da
madeira. Outra opção é a transformação dessas áreas de florestas
preservadas em parques nacionais com grande presença de guardas
florestais na fiscalização. O importante é separar as áreas desmatadas
das áreas preservadas, garantindo segurança jurídica para as terras e
atraindo empresas formais e sérias para o campo. Impor que áreas
desmatadas no passado sejam reflorestadas pelos posseiros com recursos
próprios, como alguns ambientalistas defendem, geraria um impacto
econômico tão negativo que inviabilizaria no campo político a
implementação das ações. Após o estabelecimento da regularização
fundiária se faz necessário o investimento em recursos policiais e
judiciários que garantirão a manutenção da segurança jurídica no
campo.

3)Monitoramento e fiscalização

Um grande aliado no combate do desmatamento tropical é o


monitoramento via satélite das áreas efetivamente desmatadas. No
entanto é preciso que agentes ambientais de campo efetivem na floresta
a fiscalização. Os moradores das comunidades locais também podem
ajudar no trabalho de fiscalização através de incentivos financeiros.
Além dos agentes que combatem o desmatamento, se faz necessário o
aumento de fiscais que controlem as atividades predatórias que se
sustentam do desmatamento. Nesse processo é muito importante a
rastreabilidade dos rebanhos e dos produtos agrícolas, garantindo a
obrigatoriedade que a produção não provenha de áreas desmatadas. A
participação do consumidor nacional e internacional, exigindo a origem
ambiental do produto, completa o monitoramento.

4)Incentivos econômicos para atividades sustentáveis

Simplesmente apertar as causas do desmatamento não resolve o


problema. As atividades associadas ao desmatamento são fundamentais
para o funcionamento das economias locais. Se faz necessário criar
incentivos para que novas cadeias produtivas sejam criadas e que as
cadeias tradicionais sejam aperfeiçoadas. O desmatamento predatório
pode ser substituído pelo manejo sustentável da floresta através da
concessão de uso para empresas privadas certificadas. Enquanto no
desmatamento convencional se tira a madeira que a indústria precisa e
se queima o resto da floresta, no desmatamento com manejo se retira
apenas a madeira com valor comercial e se deixa o resto da floresta
quase intacta. Depois de alguns anos as árvores com valor comercial
crescem e podem ser extraídas novamente. Essa alternativa resolve com
sucesso a extração da madeira, mas as atividades agropecuárias almejam
aumentar sua produção através do aumento das áreas de plantio. Para
aumentar a produção sem precisar aumentar a área de produção é
necessário principalmente tornar a pecuária mais intensiva (a atividade
que mais ocupa terras) e reaproveitar áreas degradadas. Um exemplo de
sucesso é o sistema de criação desenvolvido na Embrapa (Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária) onde há uma integração entre
lavoura e pecuária30. O produtor cria 3 bois por hectare ao invés da
criação de 0,7 bois por hectare extensiva. A técnica consiste em plantar
milho e outros grãos em uma área separada, para alimentar o rebanho. O
gado ocupa menos pasto e as terras são adubadas pela alternância entre
bois e lavoura. Além de reduzir os custos com a recuperação das áreas
degradadas, essa técnica aumenta os ganhos do produtor. A produção da
pecuária poderá crescer por décadas sem desmatamento ao mesmo
tempo em que parte das áreas de pecuária é substituída pela produção
agrícola de grãos como a soja. Outra forma de manter a floresta em pé é
pagar uma espécie de bolsa-floresta para que proprietários de terra e
ribeirinhos moradores da floresta conservem as matas. Por último é
importante desincentivar atividades predatórias através da proibição de
créditos governamentais e da maior taxação de impostos sobre essas
atividades.

Diante do custo mais baixo para efetivar as soluções de mitigação


de emissões no setor de Silvicultura em comparação com os setores
econômicos dependentes dos combustíveis fósseis, a ONU estuda uma
forma de incluir a preservação de florestas entre as categorias de
projetos de MDL em 2013, na próxima fase do Protocolo de Kyoto.
Esse tipo de crédito de carbono será chamado de Redd (Emissões
Reduzidas do Desmatamento e da Degradação). As nações ricas
comprariam créditos de carbono das comunidades e regiões que
evitassem o desmatamento ilegal a fim de cumprir suas metas
obrigatórias de emissão. Um grande risco é que se pague para preservar

30
Um estudo interessante sobre o Sistema integrado lavoura-pecuária pode ser
encontrado no link:
http://www.cpatu.embrapa.br/publicacoes_online/documentos-
1/2008/diagnostico-e-modelagem-da-integracao-lavoura-pecuaria-na-
regiao-de-paragominas-pa/at_download/PublicacaoArquivo
uma determinada área e que isso empurre o desmatamento para outras
regiões, os chamados “vazamentos”. O importante é que não apenas se
exija o cumprimento das iniciativas nos moldes dos projetos de MDL
tradicionais, mas que se exijam também metas nacionais de redução de
desmatamento dos países recebedores dos créditos.

Além de conter as emissões de CO2, a diminuição do


desmatamento tropical pode evitar outro tipo de mudança climática.
Graças a capacidade de evaporar enormes volumes de água, as florestas
servem para manter fria e úmida a região que as abriga, revestindo-a
com nuvens que refletem calor e trazem a chuva que as sustenta. Mais
do que isso as grandes florestas tropicais são parte do resfriamento do ar
da Terra. O desmatamento já causou o desaparecimento de 65% das
florestas naturais. Modelos de computador prevêem que se 70% das
árvores do planeta forem derrubadas, o sistema regulador de
temperatura que elas proporcionam perderá a sua eficiência31. Sem isso
o aquecimento é inevitável. Outro serviço ambiental importante são os
chamados “Rios Voadores” 32, onde regiões que estão longe da floresta
tropical, são beneficiadas com chuvas que se formam nas regiões
florestais. No Brasil, as regiões Centro-Oeste e Sudeste, celeiros
agrícolas do Brasil e do Mundo dependem fortemente da Floresta
Amazônica para formação de chuvas. Então o combate ao
desmatamento também proporciona essa estabilização climática como
bônus, aumentando ainda mais a sua importância.

A sociedade global deve decidir como usar o espaço terrestre


racionalmente. Se nós precisamos de um modelo de desenvolvimento
diferente (sustentável nas florestas tropicais restantes e nas áreas
agrícolas) do modelo tradicional até hoje realizado, se os países
desmatadores estão dispostos a receber dinheiro em troca desse modelo
e se é mais fácil e barato mudar as atividades econômicas marginais que
destroem a floresta do que mudar as atividades econômicas principais
do mundo para conter o aquecimento global, se faz necessário que os
países desenvolvidos e os países em desenvolvimento em conjunto
paguem por essa preservação.

31 Revista Aquecimento Global, Ano 1, nº 2, Editora Online, página 22.


32 O termo se refere as correntes de ar que carregam umidade e vapor d'água
Capítulo 8: A redução de emissões na Amazônia

Neste capítulo venho ressaltar a importância da Amazônia no


cenário de reduções de gases estufa. As emissões da Amazônia
obviamente estão incluídas no setor de silvicultura, abordado no
capítulo anterior, mas a dimensão da floresta e das suas respectivas
emissões merece uma análise mais específica. O Brasil detém mais da
metade da área de florestas tropicais remanescentes do mundo, num
total de 4,6 milhões de km², sendo que a maioria absoluta dessas áreas
está na Amazônia. Isso representa um patrimônio colossal de
biodiversidade, de estabilidade climática e de recursos naturais não só
para o Brasil, mas para o mundo inteiro. No entanto esse patrimônio
vem sendo ameaçado nas últimas décadas. A taxa de desmatamento
brasileira atingiu uma média de 19 mil km² entre 1996 e 2005. O
desmatamento brasileiro emitiu na média dos últimos anos 1,2 bilhão de
toneladas de CO2 anualmente, sendo 0,8 bilhão somente no bioma
amazônico. O Brasil sozinho é responsável por 22% das emissões
advindas do desmatamento no mundo.

A destruição da floresta amazônica é realizada através de uma


simbiose entre as madereiras e os pecuaristas. O processo começa com a
extração da madeira. As madeireiras retiram apenas as árvores de valor
comercial que estão dispersas na mata. Mas, para cada árvore retirada,
outras 27 são danificadas. Com as estradas, uma madeireira predatória
degrada 60% da floresta. Os pecuaristas, geralmente associados às
madeireiras, derrubam o que sobrou da mata e plantam capim para o
gado. Criados livres no campo, sem ração, os bois precisam todo ano de
novas áreas derrubadas para a formação de pasto. O pasto é abandonado
em pouco tempo. Cerca de 30% das pastagens duram menos que cinco
anos. Nas terras abandonadas, a floresta não se recupera porque o solo
foi compactado pelos bois e empobrecido pelo fogo. Resta uma
vegetação rala, com arbustos. Dos 72 milhões de hectares já devastados
na Amazônia, cerca de 56 milhões de hectares são ocupados por uma
pecuária de baixa produtividade e outros 16,5 milhões de hectares de
áreas foram abandonados pelo empobrecimento do solo.

Felizmente, a taxa de desmatamento caiu fortemente na


Amazônia Legal nos ano de 2008 e 2009. Em 2008 foram desmatados
12,9 mil km² enquanto que em 2009 foram desmatados 7 mil km².No
entanto o desmatamento no ano de 2009 não pode ser utilizado como
referência definitiva. Ao contrário da indústria dos combustíveis fósseis,
que apresenta pequenas variações de emissões de um ano para outro, o
desmatamento tropical apresenta grandes variações. Num ano de crise
econômica como 2009 onde a economia mundial esteve em recessão, há
pouca demanda por novas áreas para a agropecuária, enquanto num ano
de vigoroso crescimento econômico há um grande aumento na demanda
por terras. Por isso os esforços precisam aumentar para que a redução
continue. O Fundo Amazônia33 pode ser um grande aliado nessa tarefa
de redução permanente. Ele é um fundo criado pelo governo brasileiro
que tem a finalidade de captar doações para investimentos não-
reembolsáveis em ações de prevenção, monitoramento e combate ao
desmatamento, e de promoção da conservação e do uso sustentável das
florestas no bioma amazônico. Essas doações podem vir de governos,
instituições multilaterais, organizações não governamentais e empresas.
O primeiro contrato do Fundo Amazônia foi celebrado em 2009 com o
Governo da Noruega, onde foram doados US$ 100 milhões.

A consultoria McKinsey, ciente da importância da Amazônia,


realizou o mais abrangente estudo já feito para quantificar o custo de se
zerar o desmatamento na região. No estudo “Caminhos para uma
economia de baixa emissão de carbono no Brasil”34 houve uma atenção
especial para quantificar esse desafio. O custo total foi estimado em 17
bilhões de reais (5,5 bilhões de euros) anuais nos próximos 20 anos.
Desse valor 7,2 bilhões de reais se referem ao combate do
desmatamento propriamente dito, investindo em iniciativas de
fortalecimento das instituições, de fiscalização, de monitoramento e de
incentivos econômicos a atividades sustentáveis. Outros 10 bilhões de
reais anuais foram estimados como necessários para criar empregos
urbanos com maior valor agregado nas pequenas cidades e aumentar o
investimento em dimensões básicas como saúde e educação na região
Amazônica e dessa forma melhorar os índices de desempenho humano
da população, trazendo esses índices para o patamar nacional. A
McKinsey salientou que esse custo adicional pode ser considerado como
um gasto do País necessário para trazer os Estados do bioma Amazônia
ao patamar da média nacional, ou incluído no balanço geral do custo de

33
http://www.fundoamazonia.gov.br/
34
O estudo pode ser acessado no link:
http://www.mckinsey.com.br/sao_paulo/carbono.pdf
redução do desmatamento. Acredito que os financiadores (governos,
empresas) nacionais e internacionais do combate ao desmatamento na
Amazônia devem custear apenas os 7,2 bilhões de reais anuais iniciais.
O investimento adicional de 10 bilhões de reais por ano para melhorar
os indicadores sociais e econômicos da região não é imprescindível para
se zerar o desmatamento. No custo inicial estimado de 7,2 bilhões de
reais anuais já estão incluídos investimentos em atividades sustentáveis
no campo como a exploração sustentável da floresta, a pecuária
intensiva sem ração externa e a concessão de bolsa-floresta para manter
a floresta em pé, que poderão substituir com sucesso a agropecuária e o
desmatamento predatórios. Quanto aos empregos urbanos e a melhoria
da saúde e da educação na região, eles de fato aceleram a redução do
desmatamento porque absolvem mão-de-obra dependente de atividades
predatórias, mas podem ser fomentados por investimentos na construção
de hidrelétricas na região que não precisam de incentivos econômicos
para se concretizarem.

O Brasil precisa aumentar a sua capacidade de geração de energia


elétrica para suprir o crescimento econômico das próximas décadas. A
produção através das usinas hidrelétricas surge como a melhor
alternativa, já que apresenta o menor custo econômico de produção,
inferior ao custo dos combustíveis fósseis e das fontes alternativas.
Além disso, a energia hidrelétrica elétrica representa uma forma de
obtenção de energia limpa. Apenas 25% do potencial hidrelétrico
brasileiro está sendo aproveitado. A grande maioria do potencial não
aproveitado está localizado na Amazônia. O governo brasileiro tem
dezenas de projetos de construção de grandes hidrelétricas na região,
mas tem sofrido grandes pressões ambientais que têm dificultado a
implementação dos projetos, principalmente através de embargos
judiciais. Os grupos ambientalistas afirmam que as hidrelétricas
destruirão a biodiversidade das áreas alagadas e mudarão o curso natural
dos rios. Por outro lado o Brasil quer a energia barata da Amazônia e os
moradores da região querem os vultosos investimentos na construção
das usinas. O investimento de 20 bilhões de reais nas usinas
hidrelétricas de Jirau e Santo Antonio, por exemplo, mudarão o perfil
econômico do estado de Rondônia localizado na Amazônia brasileira.
Apesar dos possíveis impactos ambientais, temos que analisar
prioritariamente a proporcionalidade entre os benefícios econômicos e
os impactos ambientais. As hidrelétricas projetadas são usinas fios
d'água, que apresentam lagos artificiais pequenos. Enquanto a usina de
Jirau, que será construída no rio Madeira, alagará 0,08 km² por cada
MW gerado, a média nacional das usinas existentes é de 0,57 km²
alagado por cada MW gerado. Mesmo esse pequeno alagamento
proporcional gerará pesadas compensações ambientais (exemplo:
reflorestamentos) que serão custeadas pelos construtores das
hidrelétricas. Se compararmos o impacto ambiental das hidrelétricas
com o impacto ambiental da pecuária extensiva na Amazônia, os valores
chegam a ser ridículos. Enquanto 1 MW de energia pode abastecer uma
cidade de 50 mil pessoas, inundando uma área de 8 hectares, nessa
mesma área se cria apenas 5 cabeças de gado através da pecuária
extensiva. Uma área centenas de vezes maior é necessária para que a
pecuária forneça o mesmo resultado econômico das hidrelétricas. Torna-
se uma grande ilusão acreditar que a humanidade pode viver com
impacto ambiental zero, que a Amazônia precisa virar um santuário
virgem intocado. O que precisamos é desenvolver atividades
econômicas com BAIXO impacto ambiental. As hidrelétricas podem se
tornar na realidade protetoras da floresta amazônica gerando
desenvolvimento econômico nas zonas urbanas através dos
investimentos de construção num momento inicial e posteriormente
através dos ganhos dos estados amazônicos com os royalties e os
impostos arrecadados no momento de funcionamento. O
desenvolvimento econômico poderá absolver mão-de-obra que
atualmente se encontra dependente de atividades de alto impacto
ambiental como o desmatamento predatório e a pecuária extensiva,
enquanto a arrecadação de impostos e de royalties poderá financiar a
melhoria dos indicadores de saúde e educação da população que reside
na Amazônia.

Com o investimento de 7,2 bilhões de reais anuais, o equivalente


a 2,4 bilhões de euros, o desmatamento da Amazônia brasileira cessará e
a floresta será preservada para as futuras gerações. Temos nas próximas
2 páginas um resumo das iniciativas propostas35 pela McKinsey para a
Amazônia com os respectivos custos de cada uma em euros, inclusive
com as iniciativas de desenvolvimento econômico e social que foram
consideradas dispensáveis. Veja as iniciativas na próxima página:

35
Essas iniciativas propostas estão no estudo “ Caminhos para uma economia
de baixa emissão de carbono no Brasil”
Capítulo 9: O sequestro geológico de CO2

O sequestro geológico de CO2 transforma as fontes fósseis em


fontes de suprimento de energia de baixo carbono. Ele consiste no
princípio de devolver ao subsolo o carbono retirado, que antes estava
presente na forma de petróleo, carvão mineral e gás natural. O CO2
emitido por termelétricas, refinarias e indústrias é capturado,
transportado e armazenado em campos de petróleo antigos, camadas de
carvão, ou aquíferos salinos. As fontes fósseis que sequestram
geologicamente o CO2 diferem das fontes limpas não emissoras de gases
estufa porque produzem um passivo ambiental. O CO2 estocado precisa
ser monitorado para se evitar possíveis vazamentos. A diminuição de
emissões via armazenamento geológico possibilitará uma transição
ambientalmente segura no processo de substituição das fontes fosseis
por fontes renováveis limpas.

Com a temática do aquecimento global cada vez mais presente


na sociedade, as indústrias sujas estão como "a fera acuada". Enquanto
parte da opinião pública defende o fechamento delas, essas empresas
procuram uma forma de se tornarem ambientalmente sustentáveis e bem
vistas pela sociedade. O sequestro geológico é avaliado como única
forma de sobrevivência no longo prazo. O armazenamento de líquidos e
gases em reservatórios geológicos é uma atividade exercida a décadas
pela indústria do petróleo36. A injeção de CO2 em campos petrolíferos
tem a função de extrair o petróleo de difícil extração. O CO2 injetado se
dissolve no petróleo, diminuindo a sua viscosidade e aumentando a sua
mobilidade, propiciando a extração de até 40% do petróleo não extraído
de forma convencional. Essa tecnologia já é empregada desde a década
de 60 nos Estados Unidos e desde a década de 80 no Brasil. Então a
tecnologia de armazenamento geológico de CO2 não foi inventada
recentemente, apenas adaptada para a mitigação de emissões
atmosféricas. O sequestro geológico de CO2 para essa finalidade, já foi
demonstrado em projetos de pequena escala, que injetam menos de 10
milhões de toneladas de CO2 por ano. O principal projeto de
demonstração no mundo é o Sleipner, operado desde 1996 pela

36 Fonte: http://www.pucrs.br/cepac/download/CEPAC_FOLHETO.pdf
O CEPAC é o Centro de Excelência em Pesquisa sobre Armazenamento de
Carbono, localizada na PUCRS, estado do Rio Grande do Sul, Brasil.
petrolífera norueguesa StatoilHydro, que injeta CO2 separado de gás
natural na formação Utsira, um aquífero salino situado a 900m abaixo
do leito do Mar do Norte. O projeto In Salah, na Argélia, desde 2004
injeta CO2 em um aquífero salino a 2km de profundidade abaixo da
superfície do deserto do Saara. O que ainda falta é o uso comercial em
massa do armazenamento geológico de CO2, mas a tecnologia já existe.
Nos próximos anos haverá o amadurecimento comercial do processo.
Veja a imagem37 com a injeção de CO2 no subsolo:

Fgfffg
dgfgjfgjf

O processo de sequestro geológico de CO2 começa com a


captura do gás nas fontes estacionárias como indústrias e termelétricas.
A captura é feita basicamente por 4 tipos de tecnologia: pós-combustão,
pré-combustão, oxi-combustão e processos industriais. Na pós-

37 A imagem está no site:


http://www.pucrs.br/cepac/download/SemanaAcademicaQuimica_RSI.pps
combustão e nos processos industriais o CO2 é extraído dos gases de
exaustão. No processo de pré-combustão, o carbono é extraído da sua
combustão antes da sua queima, sendo produzido o gás de síntese,
composto por hidrogênio e monóxido de carbono. Depois o gás de
síntese reage com água para a transformação de CO (monóxido de
carbono) em CO2. No processo de oxi-combustão, o combustível é
queimado com alto teor de oxigênio ao invés de ar, obtendo CO2
praticamente puro como gás de exaustão38.

Após a captura, o CO2 precisa ser comprimido e transportado


até o seu local de injeção em formações geológicas apropriadas. O
transporte de CO2 pode ser realizado através de carbodutos ou através de
navios tanques.

O armazenamento geológico do CO2 pode ser feito de forma


segura em três tipos de reservatórios: campos de petróleo, aqüíferos
salinos e camadas de carvão. Os campos de petróleo são reservatórios
geológicos, que abrigam petróleo e gás, que ficaram aprisionados
naturalmente por milhões de anos. Muitos desses reservatórios foram
exauridos pelo consumo humano, e o espaço pode ser aproveitado para
armazenamento de CO2. Segundo a Agência Internacional de Energia,
os campos de petróleo do mundo podem armazenar 1 trilhão de
toneladas de CO2. Os aqüíferos salinos consistem em reservatórios de
água subterrânea com alta salinidade, por vezes similar ou maior que a
água do mar, e que não podem ser usadas para consumo humano. A
injeção de CO2 em aqüíferos salinos deve ocorrer em profundidades
superiores a 800m, para que o CO2 esteja em estado supercrítico, isto é,
um gás com densidade similar a de líquidos. Esses reservatórios
possuem a capacidade de armazenar 10 trilhões de toneladas de CO2 no
mundo. As camadas de carvão podem aprisionar CO2 em seus espaços
porosos, sendo o armazenamento preferencialmente realizado em
camadas profundas, isto é, camadas cuja exploração convencional não é
economicamente viável. Estima-se que 200 bilhões de toneladas de CO2
podem ser armazenados em camadas de carvão no mundo inteiro. Veja a
foto39 de um aqüífero salino:

38 Fonte: http://www.pucrs.br/cepac/download/CEPAC_FOLHETO.pdf
39 Fonte: http://www.pucrs.br/cepac/download/CEPAC_FOLHETO.pdf
Fotomicrografia de uma rocha reservatório

Após o armazenamento, vem a fase de monitoramento da


eficiência com que a formação geológica é capaz de reter o CO2 e,
portanto, evitar vazamentos para a superfície ou outras unidades
geológicas. Estima-se que o risco de operação de injeção de CO2 seja
similar ao risco de outras atividades da indústria do petróleo. Do ponto
de vista geológico, a eficiência das formações para o aprisionamento de
fluidos pode ser atestada pela ocorrência natural de campos de dióxido
de carbono. O CO2 injetado em formações geológicas pode ser
precisamente monitorado, medido e verificado periodicamente através
de tecnologias já maduras e disponíveis comercialmente. Dentre as
técnicas mais avançadas encontra-se a sísmica 4D, que permite a
obtenção de uma imagem do sub-solo, onde é possível verificar
diretamente a presença do CO2, acompanhar o eventual deslocamento
do CO2 injetado através da rocha, bem como medir o volume
armazenado. A prática de monitoramento constante do armazenamento
permite antecipar o comportamento do CO2 em sub-superfície e
eventualmente promover ações de remediação.

Mesmo com todas as medidas preventivas, alguns críticos


questionam a segurança do processo de armazenamento geológico,
quanto à possibilidade de vazamento. Eles afirmam que em 1986, 1700
camaroneses morreram asfixiados devido a uma erupção natural de CO2
no lago Nyos. No entanto não se pode comparar as emissões naturais de
um lago dentro de uma cratera de um vulcão, que se encontra na
superfície, com o CO2 armazenado a quilômetros de profundidade em
áreas propícias para o armazenamento. O incidente no Lago Nyos é na
verdade mais parecido com a erupção de um vulcão, um fenômeno
natural que não pode ser evitado pelo homem. O que mais garante
segurança para o processo de armazenamento geológico de CO2 é a
reatividade do gás no subsolo. Quando ele é lançado num aqüífero
salino ou num campo de petróleo, começam a ocorrer reações químicas
com as rochas porosas desses locais. O reservatório passa a sofrer uma
acidificação. O gás carbônico reage com os minerais presentes no
aqüífero salino, formando carbonatos. Então o dióxido de carbono acaba
se transformando em substâncias inofensivas e sólidas. Enquanto o lixo
atômico pode levar dezenas de milhares de anos para se tornar
inofensivo, o CO2 vai reagindo nas décadas seguintes ao
armazenamento e se tornando inofensivo. Isso é um diferencial a favor
do armazenamento geológico de CO2. A seguir temos a reação química
que forma a calcita e alguns exemplos40 de outros carbonatos que o CO2
forma no subsolo:

calcita magnesita dolomita


CaCO3 MgCO3 (Ca,Mg)CO3

dawsonita siderita ankerita


NaAl(CO3)(OH)2 FeCO3 Ca(Fe,Mg,Mn)(CO3)2

40 A imagem está no site:


http://www.pucrs.br/cepac/download/SemanaAcademicaQuimica_RSI.pps
A consultoria McKinsey estima que em 2030 o uso do seqüestro
geológico de carbono nos setores energético e industrial tem o potencial
de abater entre 3,3 e 4,1 bilhões de toneladas anuais de CO2 equivalente
a um custo entre 30 e 45 euros por tonelada de CO2 equivalente evitada.
O custo líquido estimado em 2030 é ligeiramente superior ao custo de
fontes limpas como a energia solar e a energia eólica. O seqüestro
geológico pode ser muito útil para neutralizar emissões de usinas
termelétricas já em funcionamento onde a opção de fechá-las
significaria um grande prejuízo financeiro, já que a vida útil da infra-
estrutura é longa. Apesar de adaptar uma usina em funcionamento para
o seqüestro ser mais caro do que construir uma infra-estrutura de
seqüestro numa usina nova, esse custo não é o mais relevante. O custo
de implementação do seqüestro geológico tanto em usinas novas quanto
em usinas velhas é inferior a 10 euros por tonelada de CO2 equivalente
evitada. A maior parte dos custos se refere ao consumo de energia
necessária para separação do dióxido de carbono dos demais gases de
exaustão, podendo se requerer até 25% da eficiência final das plantas,
um custo de manutenção do sistema. Outra boa opção é a associação
entre fontes renováveis e fontes fósseis novas com seqüestro geológico
de carbono. Fontes renováveis como o a energia solar e a energia eólica
dependem de fatores naturais, por isso não funcionam com a mesma
intensidade 24 horas por dia. Nos horários de menor vento incidindo nos
aerogeradores, por exemplo, podem-se ligar usinas termelétricas com
seqüestro geológico de carbono, principalmente termelétricas a gás
natural que podem funcionar de forma flexível durante o dia com alta
eficiência. Por fim termelétricas novas movidas a carvão com seqüestro
geológico de carbono podem ser uma boa opção para fornecer energia
24 horas por dia com um baixo índice de emissões.

O seqüestro geológico tem potencial para se tornar um


importante passo na transição das fontes fósseis para as fontes
renováveis limpas. Os combustíveis fósseis estão se esgotando,
principalmente o petróleo e o gás natural. O estabelecimento da
obrigatoriedade do seqüestro geológico nas próximas décadas em
grandes fontes fósseis garantirá que uma parcela considerável desses
combustíveis não lance CO2 na atmosfera. A solução ideal para
controlar o aquecimento global até 2030 e também nas décadas
posteriores é aproveitar um mix de oportunidades que inclui as fontes
renováveis limpas e o seqüestro geológico de carbono.
Capítulo 10: Fontes energéticas limpas

As energias limpas constituirão o futuro energético do planeta.


Isso se deve ao crescente aumento da demanda energética humana
impulsionada pelo crescimento econômico, a esgotabilidade das fontes
fósseis e a crise climática ocasionada pelas emissões humanas de gases
estufa. A grande dúvida se refere a velocidade de transição da matriz
fóssil para a matriz limpa. O estudo da Consultoria McKinsey estimou o
potencial de redução de emissões através do suprimento de energia de
baixo carbono em 12 bilhões de toneladas de CO2 equivalente anual em
2030, implementando apenas iniciativas com custo inferior a 60 euros
por tonelada de CO2 equivalente. Desse valor entre 3,3 e 4,1 bilhões de
toneladas poderão vir de fontes fósseis com seqüestro geológico e
aproximadamente 8 bilhões através de fontes limpas, que são o assunto
deste capítulo. A principal contribuição através das fontes limpas é o
uso de energias renováveis (energia solar, eólica, geotérmica, biomassa)
no setor de energia elétrica com um potencial de abatimento de 4
bilhões de toneladas anuais em 2030. Em segundo plano está o uso da
energia nuclear no setor de energia elétrica com potencial de abatimento
de 2 bilhões de toneladas anuais e o uso de biocombustíveis no setor de
transportes com potencial de abatimento de 500 milhões de toneladas
anuais. Salienta-se novamente que todas as contribuições são sempre um
acréscimo ao caso base, ou seja, estima-se, por exemplo, um certo nível
de consumo de biocombustíveis em 2030 sem incentivos e poderemos
aumentar esse nível de consumo esperado através de incentivos
financeiros. Esse acréscimo no caso dos biocombustíveis no setor de
transporte tem potencial de abatimento de 500 milhões de toneladas
anuais em 2030.

As iniciativas de redução através das fontes energéticas limpas


necessitam de maiores investimentos e apresentam maior custo líquido
do que as iniciativas do setor de carbono terrestre (silvicultura e
agricultura). Na comparação com as iniciativas de eficiência energética
o investimento é menor, mas o custo líquido no longo prazo é maior, já
que as iniciativas de eficiência energética economizam dinheiro através
da economia de energia. Mesmo com custos maiores, as fontes
energéticas limpas constituem um pilar fundamental no combate ao
aquecimento global, pois além de um importante potencial de
abatimento de emissões entre 2011 e 2030, se olharmos no horizonte
além de 2030, os setores de carbono terrestre e de eficiência energética
apresentam um potencial que atingirá um certo limite. A humanidade
continuará crescendo economicamente e consumindo energia e quando
ela se tornar em algumas décadas muito eficiente no consumo de
energia, a única solução plausível será investir em fontes energéticas
limpas para aumenta a geração de energia. A seguir temos as fontes
energéticas limpas mais promissoras:

10.1 Energia Eólica

A energia eólica é a energia que provém do vento. Ela tem sido


aproveitada desde a antigüidade para mover os barcos impulsionados
Parque Eólico,
por velas na cidade
ou para de Fortaleza,
fazer funcionar Brasil.
a engrenagem de moinhos, ao mover
as suas pás. Na atualidade utiliza-se a energia eólica para mover
aerogeradores - grandes turbinas colocadas em lugares de muito vento.
Essas turbinas têm a forma de um cata-vento ou um moinho. Esse
movimento através de um gerador produz energia elétrica. A energia
eólica é renovável, limpa e amplamente distribuída globalmente. Em
alguns países, a energia elétrica gerada a partir do vento representa
significativa parcela da demanda. Na Dinamarca ela já representa 25%
da produção e aproximadamente 10% na Alemanha. Os avanços nos
desenhos das turbinas reduziram os custos da eletricidade. No início dos
anos 80, a energia eólica custava cerca de US$ 0,30 por kWh. Já em
2006, a energia eólica custava em média de US$ 0,04 a 0,10. Essa
redução de custos propiciou o crescimento de 25% ao ano do mercado
de energia eólica, tornando-a a energia renovável mais barata e a com
maior participação na matriz energética mundial. No entanto a energia
eólica ainda é mais cara que a energia fóssil, principalmente se
comparada com o carvão. Os aerogeradores não consomem
combustíveis, mas apresentam um custo de instalação inicial alto. Em
2030 eles estarão mais baratos devido aos ganhos aerodinâmicos e a
redução de custos nos materiais através da nanotecnologia41. As usinas
eólicas não produzem energia durante todo tempo nem com a mesma
intensidade porque dependem da velocidade dos ventos. Cientistas e
empresários americanos encontraram uma solução criativa para superar
esse gargalo. O excesso de energia obtido nos momentos de vento mais
forte, alimenta enormes compressores de ar, que enviam ar comprimido
para camadas de arenito a 1000 metros de profundidade. Quando falta
vento ou o consumo de energia aumenta muito (horário de pico), o ar-
comprimido armazenado é usado para gerar energia juntamente com
uma fonte extra de gás natural. O ar-comprimido consegue elevar o
rendimento da turbina movida a gás natural em até 60%, em relação a
uma turbina que não usa o ar-comprimido. Outra adequação inteligente
da energia eólica está sendo projetada no Brasil. A maior parte da
energia elétrica brasileira é gerada por usinas hidrelétricas, que barram
rios muito volumosos como o São Francisco e o Paraná. Esses rios
diminuem a vazão nos anos de baixa precipitação de chuvas, afetando a
segurança energética do sistema. Justamente nesses anos se registra as
maiores intensidades dos ventos. Então haverá uma complementaridade
entre as duas fontes. Parques eólicos construídos nas regiões Nordeste e
Sul do Brasil evitarão que os lagos artificiais das hidrelétricas lancem
muita água nas turbinas das usinas na estação seca, economizando água
para geração de energia futura e água para consumo humano.

41 A nanotecnologia é a aplicação da ciência em sistemas que tratam de


objetos mensurados em nanômetros. Um nanômetro (nm) é um bilionésimo
de metro, ou um milionésimo de milímetro.
10.2 Energia solar

A energia produzida pelo do Sol é lançada na Terra e pode ser


captada e transformada em alguma forma utilizável pelo homem, seja
diretamente para aquecimento de água ou ainda como energia elétrica
ou mecânica. A energia solar é abundante e permanente, renovável a
cada dia, não polui e nem prejudica o ecossistema. Ela soma
características vantajosamente positivas para o sistema ambiental, pois o
Sol, trabalhando como um imenso reator à fusão irradia na terra todos os
dias um potencial energético extremamente elevado e incomparável a
qualquer outro sistema de energia, sendo a fonte básica e indispensável
para praticamente todas as fontes energéticas utilizadas pelo homem.

A transformação da luz solar em energia elétrica, através do


efeito fotovoltaico, é considerada a aplicação mais promissora da
energia solar. Placa formadas de materiais semicondutores (como na
foto acima) produzem eletricidade após a absorção da luz. Como o sol
não brilha 24 horas por dia, para se ter abastecimento o dia inteiro, é
preciso uma forma de armazenar o excesso de energia durante o dia em
baterias. A energia solar tem potencial ilimitado de aproveitamento, é
silenciosa e tem baixo custo de manutenção. No entanto, os custos para
armazenar a energia na forma de baterias e os custos elevados para
produzir placas solares tornam o custo de instalação muito elevado,
mesmo tendo havido reduções importantes nas últimas décadas. A
energia solar custa em média entre US$ 0,17 e US$0,32 por kWh de
energia gerado, um valor mais elevado que a energia eólica. A energia
solar é a solução ideal para áreas afastadas e ainda não eletrificadas, que
estão longe da rede de energia. Em 2030 a energia solar fotovoltáica
deve baratear consideravelmente, fruto do surgimento de novos
materiais com maior eficiência na conversão da luz solar em energia
elétrica. Quanto ao armazenamento para uso noturno, a solução passa
pela construção de usinas que armazenem durante o dia o excesso de
energia na forma de ar-comprimido em cavernas42, de forma similar ao
armazenamento do excesso de energia produzido por aerogeradores nos
momentos de muito vento. A redução de custos aumentará imensamente
a participação da energia solar nas próximas décadas.

Outra forma de aproveitamento da energia solar muito difundida


é o aquecimento de fluídos (líquidos ou gasosos) através do calor do sol.
Coletores concentradores ou planos absolvem o calor do sol e o
transmitem para reservatórios termicamente fechados. O calor é
aproveitado para aplicações como água quente para banho, ar quente
para secagem de grãos, ou aquecimentos de piscinas. Essa aplicação da
fonte solar proporciona redução de gastos com energia elétrica e isso
tem impulsionado o uso comercial da tecnologia. Geralmente os
sistemas se pagam entre 2 e 5 anos após a implantação. O calor do sol
também é utilizado para gerar energia elétrica. Coletores concentram o
calor do sol, que aquece um fluído. O vapor do fluído move uma turbina
gerando energia de forma similar a uma termelétrica convencional,
apenas não usando combustíveis fósseis. Nessas usinas solares térmicas
uma forma de armazenamento de energia, distinta do armazenamento de
ar-comprimido em cavernas, está sendo tentada. A usina PS10, próxima
a Sevilla na Espanha, funciona com uma tecnologia engenhosa. Ela
utiliza o calor dos raios solares, refletidos por espelhos e captados por
uma torre receptora. Esse calor é usado para aquecer um fluido,
geralmente sal liquefeito, que permanece estocado em um reservatório
com alta temperatura, como café quente numa garrafa térmica43. Quando
há demanda por eletricidade, o fluido é conduzido até um gerador, e o
vapor que ele desprende move uma turbina, produzindo eletricidade. Por

42 Revista Scientific American Brasil, edição 69, fevereiro de 2008,


reportagem “Perspectivas para a energia solar”.
43 Mais informações podem ser encontradas no site da empresa detentora da
usina:
http://www.abengoasolar.com/corp/web/es/nuestros_proyectos/plataforma_solu
car/ps10/index.html
enquanto, ela consegue armazenar o calor produzido durante meia hora.
Quando novas tecnologias já em desenvolvimento forem utilizadas, a
nova geração de usinas térmicas como a PS10 será capaz de estocar o
calor por até vinte horas. Veja a usina44:

Usina PS10, em Sevilla na Espanha.

44
A imagem está no link:
http://www.abengoasolar.com/corp/export/sites/solar/resources/pdf/PS10.pdf
10.3 Biocombustíveis de 1ª geração e de 2° geração
Os biocombustíveis são os combustíveis biológicos derivados
de produtos agrícolas e matéria orgânica, que não tem origem fóssil.
Exemplos de biocombustíveis são o biodiesel, o álcool (já comentado
anteriormente) e o biogás. Assim como os combustíveis fósseis, os
biocombustíveis produzem CO2 quando geram energia. O diferencial é
que o CO2 lançado foi seqüestrado no momento em que as plantas
cultivadas estavam crescendo. A produção é praticamente neutra em
carbono e renovável. Os principais biocombustíveis são o substituto
biológico do diesel (biodiesel) e o substituto biológico da gasolina
(álcool). O biodiesel, produzido através de plantas como soja, mamona,
dendê e pinhão manso, ainda é no mínimo 30% caro que o diesel fóssil.
Quanto ao álcool, produzido com plantas como a beterraba, o milho e o
trigo, a produção comercial só se sustenta através de fortes subsídios
governamentais. O único biocombustível viável na atualidade
ambientalmente e economicamente é o álcool brasileiro proveniente da
cana-de-açúcar, com um custo de produção de US$ 0,22 por litro. Um
hectare de cana produz 7500 litros de álcool e necessita apenas de 1
unidade de energia fóssil para produzir 8,3 unidades de energia
renovável. A maioria da frota brasileira de carros pode funcionar tanto
com gasolina quanto com álcool. O baixo preço do álcool chega a
pressionar os preços da gasolina para níveis mais baixos. Em países
como os Estados Unidos e em alguns países europeus a taxa de
importação imposta ao etanol brasileiro evita que o consumo de álcool
barato proveniente do Brasil se expanda.

Todos os biocombustíveis citados até agora são conhecidos


como biocombustíveis de 1ª geração. O principal problema desses
biocombustíveis é a falta de terras disponíveis para substituir todo o
consumo de combustíveis fósseis do mundo. Teríamos que usar grande
parte dos 25 milhões de km² de terras agricultáveis para produção de
biocombustíveis, gerando um grande aumento do preço das terras e
inflacionando o preço dos alimentos. Uma alternativa seria desmatar
florestas para produzir biocombustíveis, mas o resultado ambiental seria
decepcionante. Se lançaria até 700 toneladas de CO2 na atmosfera ao se
desmatar 1 hectare de floresta tropical e se evitaria apenas a emissão de
10,8 toneladas de CO2 por hectare/ano, ao se substituir a gasolina pelo
álcool. No entanto, a limitação de terras não inviabiliza que os
biocombustíveis de 1ª geração possam substituir adequadamente até
20% do consumo mundial de combustíveis fósseis no setor de
transportes, sem grandes pressões inflacionárias nos alimentos, e
possam ter relevância na matriz energética futura.

Os biocombustíveis de 2ª geração não competem fortemente por


terras com a produção agrícola. Alguns apresentam uma altíssima
produtividade por hectare plantado, não necessitando de grandes áreas
de cultivo, enquanto outros utilizam restos agrícolas como matéria-
prima. Eles não apresentam os gargalos dos biocombustíveis de 1ª
geração. Quando forem viabilizados comercialmente poderão substituir
todo o consumo mundial de combustíveis fósseis sem grandes impactos
ambientais, representando uma revolução energética. Os dois
biocombustíveis de 2ª geração mais promissores são o biodiesel
produzido a partir de algas e o etanol produzido a partir da celulose.

O biodiesel das algas é produzido em tanques de água abertos


ou fechados. Um hectare de produção de algas pode produzir 90 mil
litros de biodiesel por ano contra os 3 mil litros de biodiesel produzido
através do pinhão manso, uma das plantas mais eficientes do mundo na
produção de biodiesel convencional. O biodiesel a partir de algas não
necessita de safras, podendo ser produzido todo dia, além de a produção
poder utilizar áreas de solos pobres e o consumo de água não potável. O
fator terra afeta muito pouco o custo de produção.

O etanol celulósico é produzido de uma forma diferente do


etanol de 1ª geração. O etanol de 1ª geração da cana-de-açúcar é
produzido a partir da sacarose. A cana é exprimida para tirar o caldo e
esse caldo é levado para a fermentação. Nesse processo, um grupo de
microorganismos transforma o açúcar (sacarose) em etanol. No caso do
etanol celulósico, se utiliza a celulose encontrada nas plantas para
produzir álcool. A celulose é o recurso renovável mais abundante da
terra. A celulose pode ser extraída de restos agrícolas como lascas de
madeira, grama, palha, folhas, caules e bagaços de frutas. Dessa forma
não há competição entre a produção de alimentos e a produção de
combustível, pois numa mesma área que se produz laranja, por exemplo,
pode-se extrair etanol celulósico proveniente das cascas e do bagaço das
frutas no momento em que a fruta é processada para produção de suco
engarrafado. O etanol celulósico pode ser extraído dos cultivos que já
estão produzindo etanol de 1° geração como a cana-de-açúcar e o milho.
Se aproveitando a celulose encontrada na palha, nas folhas e no bagaço
da cana-de-açúcar e a sacarose do caldo da cana, pode-se obter uma
produção de 28 mil litros de etanol por hectare ao ano. Essa
produtividade, quase 4 vezes maior do que a obtida utilizando apenas o
etanol da sacarose, diminui fortemente a competição por terras com o
setor de produção de alimentos. O processo de produção do etanol
celulósico já foi viabilizado tecnicamente, mas o custo ainda é muito
alto. Enquanto o etanol da sacarose custa US$ 0,22 por litro para ser
produzido, o etanol da celulose, custa entre US$ 0,40 e US$ 0,60 por
litro para ser produzido. Estima-se que quando o custo atingir US$ 0,30
por litro, o álcool celulósico será viável comercialmente. Os custos mais
altos se devem ao alto custo das enzimas que são usadas no processo de
transformação da celulose em glicose. No momento está ocorrendo uma
corrida tecnológica para baratear os custos dessas enzimas, pois esse
fator é chave para viabilizar o etanol celulósico. Após a transformação
da celulose em glicose, outro açúcar, o processo é o mesmo do etanol da
sacarose. A glicose é fermentada, obtendo-se álcool.

Os especialistas afirmam que dentro de 10 anos os


biocombustíveis de 2ª geração se tornarão viáveis economicamente
podendo ser adicionados gradativamente ao diesel ou a gasolina
proveniente do petróleo, sem grandes preocupações ambientais ou
alimentares. Se essa previsão se confirmar, teremos nas próximas
décadas uma redução significativa consumo de petróleo no setor de
transportes mundial e conseqüentemente de emissões líquidas de CO2.
Poderemos ter em 2030, por exemplo, um típico carro global sendo flex
e híbrido e fazendo 30 km/l. No setor de veículos pesados poderemos ter
caminhões rodando com 50% de diesel fóssil e 50% de biodiesel. No
entanto todas essas previsões precisam de inovações tecnológicas
importantes para se concretizarem. Por esse motivo ainda é impreciso
afirmar que os biocombustíveis de 2ª geração tomarão a dianteira no
abastecimento mundial do setor de transportes.

10.4 Energia proveniente do mar


Os oceanos podem fornecer milhares de vezes a quantidade de
energia que a humanidade consome. Uma abundância de energia
renovável e limpa só comparável com a energia do sol e a energia dos
ventos. O grande problema é encontrar uma forma viável de aproveitar
esse potencial comercialmente. Apesar de centenas de inventos
desenvolvidos, as formas de obtenção de energia dos oceanos têm se
mostrado ineficientes em relação ao rendimento e aos custos. As
principais formas de obtenção de energia dos oceanos são as ondas, as
marés, as correntes marítimas e o calor dos oceanos.

O calor do sol aquece os oceanos, principalmente nas zonas


tropicais, criando uma diferença significativa de temperatura entre a
superfície quente e o fundo do mar escuro e gelado. Essa diferença é
capaz de gerar energia. O principal sistema de aproveitamento desse
gradiente de temperatura utiliza a amônia, uma substância que evapora
com facilidade. As águas mornas da superfície do mar transformam a
amônia em vapor, que movimenta uma turbina acoplada a um dínamo,
gerando energia elétrica. Posteriormente o vapor da amônia é
condensado pelo frio proveniente da água fria do fundo do mar, e em
seguida a amônia líquida volta para o evaporador para começar um novo
ciclo.

As marés são criadas pelas forças gravitacionais que interagem


entre a Terra, a Lua e o Sol, gerando variações dos níveis do mar no
litoral durante o dia. Elas são mais previsíveis do que os ventos, o que
representa uma grande vantagem no aproveitamento energético. A
forma de aproveitamento da energia das marés mais utilizada até hoje é
através de barragens semelhantes às hidrelétricas. A barragem
construída separa geralmente uma baia do restante do mar. Na maré alta,
a água passa pela barragem através de uma turbina, gerando energia
elétrica e enchendo o reservatório (a baia). Na maré baixa a baia, que se
encontra cheia e num nível mais elevado que o mar é esvaziada e a água
passa em sentido contrário ao do enchimento pela turbina gerando
energia. Existem várias dessas usinas no mundo, mas a única de grande
porte e viável economicamente é a usina construída no estuário do rio
Rance, no norte da França, com capacidade de produzir 240 MW de
energia. As dificuldades se referem à escassez de locais propícios para a
construção, pois é preciso uma grande amplitude de maré e uma
topografia adequada para se obter energia com um custo
comercialmente viável.

As ondas oceânicas podem ser criadas por uma série de fatores


como a atração gravitacional, a atividade submarina e a pressão
atmosférica, mas sua origem mais comum é o vento. Apesar de existir
inúmeras variantes de aproveitamento da energia das ondas, a maioria
usa o mesmo princípio onde a onda pressiona um corpo oco,
comprimindo o ar ou um líquido que move uma turbina ligada a um
gerador. A desvantagem de se utilizar este processo na obtenção de
energia é que o fornecimento não é contínuo e apresenta baixo
rendimento.

As correntes marítimas são deslocamentos de massas de água


oceânicas geradas pela inércia de rotação do planeta e pelos ventos, que
se movimentam por todos os oceanos do mundo. As correntes são como
rios oceânicos que transportam grande quantidade de água. O
aproveitamento é feito com turbinas semelhantes às turbinas eólicas. A
utilização de turbinas para aproveitar tanto o deslocamento das correntes
marítimas quanto o fluxo das marés (sem a necessidade de construir
barragens) está sendo considerado pelos especialistas como a fonte mais
promissora de energia proveniente do mar O custo da geração de
energia através de turbinas em locais propícios (Escócia, por exemplo) é
próximo do custo de geração da energia eólica, com a vantagem de os
fluxos oceânicos serem mais constantes e previsíveis que os ventos.
Veja a figura da turbina marinha45:

45
Fonte: www.marineturbines.com
10.5 Carro a Hidrogênio
O uso do hidrogênio como combustível em carros apresenta
teoricamente vantagens interessantes em relação aos combustíveis
fósseis. O hidrogênio é o mais simples e mais comum elemento do
Universo, sendo ilimitado e renovável. A queima de hidrogênio gera
energia mecânica para movimentar os carros sem emitir poluentes e um
determinado volume de hidrogênio líquido pesa menos do que um
volume semelhante de gasolina e produz quase três vezes mais potência.
Um combustível limpo, ilimitado, leve e eficiente energeticamente
poderia ser considerado perfeito. No entanto, o hidrogênio não é uma
fonte de energia como os combustíveis fósseis. O hidrogênio gasoso
puro raramente ocorre na natureza, pois ele é um elemento químico
muito reativo e está sempre procurando outro elemento para se
combinar. Como não existe nenhuma reserva de hidrogênio puro no
planeta, ele deve ser extraído de outros compostos se tiver o propósito
de ser usado como uma fonte de combustível. Nesse processo de
extração há um consumo considerável de energia. Então é necessária
uma fonte de energia primária que pode ser limpa (eólica, solar, etc) ou
emissora de CO2. Já os combustíveis fósseis, são encontrados na
natureza prontos para serem queimados no caso do gás natural ou
necessitando apenas de refino no caso dos derivados de petróleo. Na
prática, o hidrogênio combustível exerce um papel semelhante às
baterias nos carros elétricos, acumulando energia proveniente de uma
fonte primária de energia.

As duas principais formas de obtenção de hidrogênio


combustível são a eletrólise da água e o uso de combustíveis fósseis. Na
eletrólise a corrente elétrica é passada através da água para quebrá-la em
hidrogênio e oxigênio. A reação é a seguinte:

2H2O + eletricidade --> 2H2 + O2.

O hidrogênio produzido na reação é usado como combustível.


Na queima do hidrogênio para movimentar o carro, ocorre a reação
reversa. O hidrogênio reage com o oxigênio, gerando energia elétrica,
energia térmica (calor) e água. A energia elétrica move o carro e o único
subproduto do motor é vapor de água, configurando uma queima limpa.
Veja a reação química:

2H2 + O2 --> 2 H2O + energia


Também é possível obter hidrogênio através do uso de
combustíveis fósseis. O petróleo e o gás natural contêm
hidrocarbonetos, moléculas formadas por hidrogênio e carbono.
Utilizando-se um dispositivo chamado reformador, ocorre-se a
separação do hidrogênio do carbono de um hidrocarboneto. O carbono
que sobra do reformador é lançado na atmosfera como dióxido de
carbono e o hidrogênio é posteriormente utilizado como combustível
gerando vapor de água como subproduto. Essa forma de obtenção de
hidrogênio não é considerada ambientalmente correta devido a emissão
de CO2.

A produção de hidrogênio via eletrólise é a única considerada


viável ambientalmente, mas assim como os carros elétricos se faz
necessário que a fonte primária que gerou a energia elétrica seja uma
fonte não poluente. Precisa-se gerar energia elétrica através de usinas
solares ou eólicas, por exemplo. Outros problemas são as dificuldades
de transporte e armazenamento do hidrogênio. A construção de postos
de abastecimento de hidrogênio é extremamente cara, assim como o
custo dos tanques de combustível nos carros. Isso se deve as
características do hidrogênio. Além de inflamável, o hidrogênio gasoso
e mais leve e mais volumoso que o ar atmosférico, sendo que 1 grama
de hidrogênio ocupa 10 vezes o espaço de 1 grama de ar atmosférico.
Para não se construir um reservatório de abastecimento muito grande se
faz necessário armazenar o hidrogênio gasoso a uma altíssima pressão.
Por isso o reservatório de combustível tem que ser muito resistente,
tornando-se conseqüentemente caro. Uma alternativa é armazenar o
hidrogênio no estado líquido, que ocupa 700 vezes menos espaço do que
o hidrogênio gasoso, mas ele tem que ser armazenado numa temperatura
de -253 graus centígrados para conservar o estado líquido. Essas
temperaturas criogênicas também exigem tanques de combustível caros.
A solução mais promissora é o armazenamento sólido, no qual o
hidrogênio passa a fazer parte da estrutura atômica de um material,
sendo liberado aos poucos, na medida necessária para alimentar o
veículo. Já existem materiais especiais construídos que chegam a reter
10% do seu peso em hidrogênio.

O hidrogênio tem sido apresentado na mídia para o grande


público como o combustível do futuro, que abastece foguetes espaciais e
lança apenas água para a atmosfera. No entanto, ainda há a necessidade
de avanços tecnológicos imensos para que a produção do hidrogênio se
torne barata e possa ser usada em massa no setor de transportes. Os
carros elétricos e suas baterias são uma opção muito mais barata que o
carro a hidrogênio na atualidade e provavelmente continuarão sendo
também nas próximas décadas.

10.6 Carro elétrico


O carro elétrico é movido por um motor elétrico abastecido por
baterias. Como foi citado no capítulo 2, o carro elétrico tem uma
eficiência de 65% na conversão de energia contra 20% do carro a
gasolina, pois o motor a gasolina desperdiça mais energia na forma de
calor. Por esse motivo se gasta menos dinheiro com energia elétrica num
carro elétrico do que com combustível num carro a gasolina. No
entanto, 50 quilos de gasolina têm muito mais densidade energética do
que 50 quilos de bateria, ou seja, armazena muito mais energia com o
mesmo peso. Então a autonomia do carro elétrico, a quantidade de
quilômetros que o carro anda com tanque cheio, é bem menor do que a
do carro a gasolina. Outro problema é a recarga demorada do carro
elétrico. Enquanto um carro a gasolina é reabastecido em 3 minutos, um
carro elétrico demora horas para recarregar as baterias. Temos portanto
dois gargalos na tecnologia do carro elétrico: a baixa autonomia e a
recarga demorada.

Nos últimos anos tem ocorrido uma corrida tecnológica para se


obter baterias mais leves e baratas, que aumentariam a autonomia dos
carros elétricos e diminuiriam os custos. Os aperfeiçoamentos
tecnológicos obtidos na diminuição do peso das baterias dos carros
híbridos, que já são produzidos comercialmente, estão sendo
transferidos para a tecnologia do carro elétrico. Eles têm tornado o carro
elétrico próximo da viabilidade comercial. A autonomia dos novos
carros elétricos já aumentou bastante, mas ainda persiste o problema da
recarga demorada. O engenheiro Shai Agassi, em parceria com o
governo de Israel, tem desenvolvido um projeto revolucionário para
resolver o problema da recarga demorada. A idéia é criar 500 mil postos
de recargas convencionais de baterias no país, em lugares públicos
como estacionamentos, e criar 200 pontos onde se poderão trocar as
baterias descarregadas por outras previamente carregadas nos postos46.

46 O site do projeto é: http://www.betterplace.com/


Ao invés de horas de recarga convencional, a troca de baterias demorará
poucos minutos. O governo de Israel pretende implantar o sistema em
2011. Críticos afirmam que o projeto é viável em Israel, por se tratar de
um país pequeno com pouco mais de 20 mil km² de extensão e muito
povoado, mas num país com baixa densidade populacional, é inviável
manter economicamente uma rede tão grande de abastecimento com
uma distância pequena de um ponto de abastecimento para outro. Outra
forma de resolver o problema da autonomia seria o abastecimento de
energia sem fio, chamado de witrycity. A tecnologia ainda está em fase
de desenvolvimento, mas no futuro poderemos ter carros elétricos com
pequenas baterias, que são abastecidos por pontos nas ruas e rodovias,
que enviariam energia sem necessidade de fios para uma antena do carro
enquanto ele está em movimento.

Provavelmente nas próximas décadas, com a escassez do


petróleo e com novas tecnologias, o carro elétrico se tornará viável e
terá participação importante no fornecimento energético do setor de
transportes. Mas para que o carro elétrico seja limpo ambientalmente, é
necessário saber se a fonte primária que produz energia para abastecer a
rede elétrica emite CO2 ou não. A geração de energia elétrica precisa vir
de fontes renováveis e limpas como a energia solar ou eólica, ou de
usinas com fontes fósseis que tenham o CO2 emitido seqüestrado
geologicamente.

10.7 Energia nuclear e energia hidrelétrica


Além das 6 tecnologias alternativas mais promissoras citadas
acima, ainda temos as tradicionais energia nuclear e energia hidrelétrica,
que representam 15,2% e 16% respectivamente da geração de energia
elétrica mundial, segundo a Agência Mundial de Energia (AIE). Essas
duas fontes praticamente não emitem CO2, mais pairam sobre elas
outros problemas ambientais. As usinas hidrelétricas barram rios e criam
grandes lagos artificiais que inundam imensas áreas de florestas e
obrigam milhares de famílias a desocuparem as suas moradias. As
usinas que usam a fissão nuclear apresentam riscos relacionados aos
vazamentos de radioatividade nas usinas ou ao armazenamento dos
rejeitos nucleares, que podem provocar danos à saúde humana. Diante
dos riscos a sobrevivência humana que o aquecimento global pode
representar, parece razoável continuar aumentando a participação dessas
duas fontes de energia, desde que precauções necessárias sejam
tomadas.

As usinas hidrelétricas devem ser construídas com lagos


artificiais menores e também se deve incentivar a construção de
pequenas centrais hidrelétricas, que provocam menos danos ambientais
que as grandes usinas e produzem energia com um preço competitivo.
Como foi citado no capítulo 8, o Brasil (terceiro maior potencial
hidrelétrico do mundo) apresenta a maior parte do potencial não
explorado na Amazônia. A construção de usinas hidrelétricas tem sido
muito criticada na região devido a morte de espécies de plantas e
animais pelos lagos artificiais numa região com uma biodiversidade tão
rica. No entanto, as novas hidrelétricas construídas na região são usinas
fios d'água, que apresentam lagos artificiais pequenos. Enquanto a usina
de Jirau, que será construída no rio Madeira, alagará 0,08 km² alagado
por cada MW gerado, a média nacional das usinas existentes é de 0,57
km² alagado por cada MW gerado. No caso brasileiro, apenas 25% do
potencial hidrelétrico de 260 gigawatts está sendo aproveitado, enquanto
no mundo o aproveitamento é de 33% do potencial hidrelétrico. Uma
parte do potencial hidrelétrico mundial esbarra nos altos custos e nos
danos ambientais, mas tanto o Brasil quanto o mundo podem no mínimo
dobrar a geração de energia elétrica proveniente das hidrelétricas com
viabilidade econômica e com danos ambientais moderados, como o
exemplo da usina de Jirau.

A geração de energia nuclear tradicional a partir da fissão dos


átomos, explicada no capítulo 3 deste livro, deve ser incentivada nos
países que já dominam a tecnologia nuclear para fins pacíficos, que
representam a maioria absoluta da economia mundial. Uma expansão de
geração de energia elétrica através da fonte nuclear em novos países
poderia incentivar o aumento do número de países que dominam a
tecnologia da bomba atômica e criar perigos desnecessários a segurança
global. Apesar das críticas, a energia nuclear tem gerado uma fatia
significativa da energia elétrica mundial a um custo competitivo, com
poucos acidentes com morte nos últimos 50 anos. A França, país com a
6º economia do mundo, gera 75% da sua energia elétrica através da
fonte nuclear, com danos ambientais mínimos. Evidentemente que o
passivo ambiental dos rejeitos nucleares, que poderão representar um
risco ambiental por milhares de anos, deve ser considerado, mas isso
não torna a energia nuclear inviável ambientalmente.

A energia hidrelétrica e a energia nuclear podem ser importantes


na transição da matriz energética fóssil para as fontes alternativas
renováveis. As usinas das duas fontes energéticas, quando bem
planejadas, geram danos ambientais moderados muito menores do que
os causados pelos combustíveis fósseis. Os danos provocados a saúde
humana pelos fósseis diminuirão nas próximas décadas com a
massificação dos catalisadores e com os testes para detectar a emissão
de gases venenosos nos automóveis e nas indústrias cada vez mais
freqüentes, mas o problema do aquecimento global provocado pelo CO2
persiste. O ideal é que uma parte das usinas de carvão e gás natural
geradoras de energia elétrica seja substituída por usinas com seqüestro
geológico de carbono, e que outra parte seja gradativamente substituída
tanto pelas usinas nucleares e usinas hidrelétricas, com danos ambientais
moderados e custos baixos, quanto por fontes alternativas renováveis,
100% limpas e com um custo um pouco mais alto. A participação da
energia hidrelétrica e da energia nuclear, que representam juntas 31,2%
da geração de energia elétrica atual, poderá aumentar ainda mais nas
próximas décadas.
Capítulo 11: Eficiência Energética

O aumento da eficiência energética busca diminuir o gasto de


energia na produção de bens e serviços. No cenário atual de
aquecimento global, a lógica é que se mantivermos o nosso padrão de
vida consumindo menos energia, estaremos conseqüentemente emitindo
menos CO2. O IPCC de 2007 estimou que a eficiência energética seja o
setor com maior potencial de redução de emissões de CO2 até 2050. Há
100 atrás a humanidade tinha poucos recursos tecnológicos e recursos
naturais abundantes, o que tornava a lógica da eficiência energética
inviável. Na atualidade, diante do consumo desenfreado de recursos,
temos um mundo com recursos naturais limitados como alimentos, água
e energia, e por outro lado tecnologia capaz de gerar conforto com a
utilização de poucos recursos naturais. Esse cenário estimula a busca
por soluções que economizem energia, pois se os recursos energéticos
naturais são escassos, ou no mínimo de difícil extração, eles
conseqüentemente são caros. O aquecimento global provocado pelas
emissões de CO2 da matriz energética torna o aumento da eficiência
energética mais importante ainda.

O maior símbolo da defesa da eficiência energética contra as


emissões de CO2 é o cientista americano Amory Lovins. Ele faz da sua
casa, localizada a 2000 metros de altitude nos vales rochosos no estado
do Colorado, um exemplo de como é possível viver com conforto,
mesmo com pouco gasto energético. Em pleno inverno, onde a
temperatura da região cai para 40 graus negativos, a sua casa consome o
mínimo possível de energia. Ele utiliza arquitetura bioclimática para
isolar termicamente a residência do ambiente externo e cultiva plantas
tropicais em estufas, além de fazer uso de energias alternativas. Lovins é
presidente e fundador do Rocky Mountain Institute47, uma fundação que
defende o uso da eficiência energética como solução para o aquecimento
global.

Os ganhos de eficiência energética são possíveis em todos os


tipos de produtos e construções. A grande questão é saber se os preços
mais altos de instalação inicial dos produtos eficientes serão
compensados por ganhos maiores na redução de gastos com energia no
futuro. Também é importante que o conforto obtido com o produto

47 Site: www.rmi.org
tradicional seja igual ao obtido com o produto eficiente
energeticamente. O consumidor quer saber se o ar-condicionado de
baixo consumo gela tão bem quanto o de alto consumo, por exemplo.
Existem inúmeros setores produtivos que poderiam se tornar mais
eficientes com incentivos governamentais. Muitas vezes os
consumidores preferem produtos mais baratos e ineficientes
energeticamente devido ao investimento inicial menor, mas acabam
pagando 3, 4 vezes mais energia durante a vida útil do produto e acabam
perdendo dinheiro devido ao imediatismo. Se os governos diminuírem
os impostos sobre os produtos eficientes e os tornarem tão baratos
quanto os tradicionais, o consumidor escolherá sempre o produto mais
eficiente. O valor perdido com os impostos será varias vezes
compensado pelos ganhos obtidos com a redução de gastos com energia
para a população. Além do benefício econômico para a sociedade,
teremos o benefício ambiental de emitir menos gases estufa. Outra
forma de incentivo governamental é a implantação legal de um nível
máximo de consumo de energia para os produtos fabricados no país.

A Consultoria McKinsey estima em 14 bilhões de toneladas de


CO2 equivalente o potencial de redução das emissões através das
iniciativas de aumento da eficiência energética em 2030. Sempre se
salienta que esse potencial é um acréscimo ao caso base. Mesmo no
cenário onde não haja incentivos econômicos para combater o
aquecimento global (caso base) haverá ganhos de eficiência energética
entre 2011 e 2030. O potencial da eficiência energética é maior do que o
setor de carbono terrestre e do que o potencial do setor de fontes
energéticas limpas. Ele corresponde a aproximadamente 37% do
potencial de abatimento de 38 bilhões de toneladas previsto pela
consultoria. A maioria absoluta das iniciativas tem custo líquido
negativo. Podemos afirmar que a implementação das iniciativas de
eficiência energética aumentará o crescimento econômico dos países no
longo prazo. No entanto as iniciativas necessitam de grandes
investimentos iniciais. Esses altos investimentos são plenamente viáveis
diante dos benefícios econômicos que a economia de energia gerará.

A fim de facilitar a análise sobre as principais oportunidades de


aumento da eficiência energética haverá uma divisão em quatro
categorias: construção de edificações sustentáveis, uso de aparelhos
elétricos e luminárias de baixo consumo, produção de veículos de
baixo consumo de combustível e fabricação de produtos industriais
com diminuição do consumo de energia. A seguir temos as categorias
a serem analisadas:

11.1 Construções de edificações sustentáveis

As construções sustentáveis buscam reduzir os impactos


ambientais tanto no momento de construção dos edifícios residenciais e
comerciais, quanto no momento de uso deles (vida útil). O maior
impacto ambiental são as emissões de CO2 provocadas pelo consumo de
energia nesses dois momentos, que podem ser reduzidas principalmente
pelo aumento da eficiência energética. Se considerarmos as emissões de
gases estufa nos 2 momentos(construção e utilização dos edifícios), elas
chegam a 40% das emissões mundiais totais de 49 bilhões de toneladas
de CO2 equivalente48.

No momento da construção, o cimento é o principal responsável


pelas emissões de CO2. Cada 1 tonelada de cimento gera
aproximadamente 1 tonelada de CO2. O cimento é constituído de 95%
de clínquer e 5% de gipsita. A produção do clínquer é a grande fonte
emissora da produção. O calcário é a matéria-prima principal do
clínquer, representando aproximadamente 80% da mistura rochosa que é
complementada com argila e ferro. Na produção do clínquer ocorre a
calcinação do calcário (carbonato de cálcio). O processo de aquecimento
do calcário demanda a queima de combustíveis, o que gera CO2.
Quando o calcário (CaCO3) é calcinado e se transforma em óxido de
cálcio (OCa) a reação química também produz CO2. Então temos a
produção de CO2 através dessas duas formas. Muitas pesquisas têm sido
desenvolvidas com o objetivo de reduzir a participação do clínquer no
cimento, produzindo a mesma quantidade de cimento demandando
menos energia, um típico aumento de eficiência energética. Materiais
como cinzas das centrais termelétricas, cinzas do bagaço da cana-de-
açúcar, casca de arroz e resíduos da indústria de cerâmicas, podem
substituir até 40% do clínquer usado no cimento. O cimento é o
elemento ligante do concreto, a substância mais usada pela sociedade
global nas construções. Uma forma de diminuir a demanda por cimento

48 Tanto no IPCC 2007 quanto no relatório da McKinsey, as emissões das


edificações lançadas pela fabricação dos materiais utilizados nas
construções foram classificadas como emissões do setor industrial.
nas construções é reciclar o concreto presente em demolições ou restos
de obras.

Outro importante emissor de CO2 é o tijolo tradicional de argila,


que é queimado para ser produzido. Uma alternativa é o tijolo de solo-
cimento que é produzido sem queima. Se mistura 1 parte de cimento
com 12 partes de solo, composto de areia e argila, e posteriormente a
mistura é prensada. Quando se faz o assentamento do tijolo de solo-
cimento, ao invés de usar a argamassa tradicional com cimento na
composição, se utiliza uma cola especial. A utilização de madeira
proveniente de extração de baixo impacto ou de reflorestamento
também constitui uma alternativa interessante nas construções
sustentáveis, pois quando as árvores cortadas crescem novamente,
voltando a seqüestrar CO2.

No momento da construção também se planeja formas de se


diminuir a necessidade de iluminação ou climatização durante a via útil
da edificação, a fim de se economizar energia. O planejamento inclui a
escolha dos materiais e da arquitetura do edifício. Os principais
responsáveis pelo consumo de energia e pelas emissões de gases estufa
nas edificações no momento de uso estão no gráfico49:

49
O gráfico pode ser encontrado no link:
http://www.mckinsey.com/clientservice/ccsi/pathways_low_carbon_econo
my.asp
Nesse gráfico a McKinsey incluiu as emissões indiretas das edificações (ex.
consumo de energia elétrica).
A climatização e a iluminação são as utilidades que apresentam o
maior potencial de redução de consumo através de uma construção
planejada para se tornar eficiente energeticamente. O aquecimento de
água tem como melhor opção o uso de uma fonte de energia renovável,
o aquecedor solar, e os aparelhos elétricos (televisão, computadores)
não dependem diretamente da construção para serem eficientes, por isso
os aparelhos serão comentados no ítem 11.2 .

A iluminação responde por importantes 15% de emissões de


gases estufa nas edificações. Elementos como paredes internas claras e
uma arquitetura que facilite a entrada da luz solar, aumentam a
quantidade de horas sem necessidade de luz artificial em residências e
diminuem a necessidade de luz artificial durante o dia nos escritórios
comerciais. Numa região fria, onde se precisa de iluminação e calor ao
mesmo tempo, janelas transparentes no teto das residências permitem a
entrada de luz e criam um efeito estufa interno, apresentando duas
utilidades. Em regiões quentes, a solução não é recomendada, pois
enquanto se aumenta a luminosidade, aumenta-se mais ainda o
indesejável calor. Uma solução para as regiões quentes são os Domus
Prismáticos. Eles são compostos de milhares de micro prismas,
localizados nos tetos das construções, que fragmentam a luz em micro
raios, direcionando-os em todo ambiente interno e gerando um leve e
agradável brilho natural de luz. Além disso, cerca de 75% do calor
transmitido pelos raios infravermelhos, o espectro de luz responsável
pela transmissão do calor, volta para atmosfera, mantendo-se o ambiente
interno com uma temperatura agradável. O aumento da iluminação
natural estimula favoravelmente o relógio biológico humano,
aumentando a produtividade no trabalho.

A manutenção da temperatura interna (climatização) nas


edificações constitui a principal forma de reduzir gastos com energia. A
busca principal é o isolamento térmico da construção, evitando a
transmissão do calor em locais quentes e a transmissão do frio em locais
gelados. Dessa forma evitam-se gastos de energia com a calefação ou
com a refrigeração do ambiente. Projetos de isolamento térmico podem
reduzir drasticamente a perda de calor e ajudar a deter as mudanças
climáticas. A demanda de energia para aquecimento nos prédios
existentes pode ser reduzida de 30% a 50%, em média. Em prédios
novos, a demanda de energia para aquecimento pode ser reduzida de
90% a 95%, usando-se tecnologia e projetos amplamente disponíveis e
competitivos50. Nas regiões frias as casas devem ser construídas sobre
pedras para se proteger do frio que vem do solo e precisam de paredes
grossas para isolar termicamente do frio externo do ar. Nas regiões
quentes as construções devem facilitar a entrada de ventilação, ser
pintadas externamente com cores claras para refletir a luz solar e
principalmente apresentarem um telhado que impeça a passagem do
calor para o interior da residência ou edifício comercial. O alumínio é
um excelente refletor da luz solar e conseqüentemente um excelente
isolador térmico. Ele é usado em forma de telhas de alumínio ou em
forma de folhas finas que cobrem as telhas convencionais. Outra
maneira de combater o calor nos telhados é o resfriamento evaporativo,
onde se utiliza uma irrigação periódica com água fria no telhado. A água
fria retira o calor do telhado, evaporando em seguida. O telhado diminui
de temperatura e transfere menos calor para o interior da edificação. Os

50 Fonte: www.greenpeace.org.br/energia/pdf/cenario_brasileiro.pdf
telhados verdes também representam uma alternativa interessante de
climatização de casas ou edifícios. Eles constituídos de uma cobertura
de grama ou de um jardim e são usados a milhares de anos, tornando a
temperatura amena em locais quentes. Veja a imagem51:

A vegetação absolve menos calor do que os telhados


convencionais, e parte da pequena energia absolvida é perdida através
do processo de evaporação da água da planta. O uso coletivo de telhados
verdes pode potencializar economia de energia e bem-estar climático
numa cidade inteira. Em cidades como Teresina, na região Nordeste do
Brasil, onde a qualidade de vida é muito prejudicada pelo calor, o
incentivo governamental ao uso de telhados verdes teria grande sucesso.
Um exemplo prático da importância dos vegetais são as diferenças de
temperatura de até 6,0 C° entre áreas distintas das grandes cidades
tropicais. Enquanto regiões ricas, cheias de jardins, apresentam
temperaturas mais amenas, as regiões mais pobres, sem áreas verdes,
apresentam temperaturas mais altas.

51
A imagem está no site: www.ecotelhado.com.br
11.2 Fabricação de aparelhos elétricos e luminárias de baixo
consumo
Os aparelhos elétricos e a iluminação são responsáveis juntos por
35% das emissões de gases estufa nas edificações. No caso da
iluminação uma construção bem planejada diminui a sua demanda,
como vimos no ítem 11.1, mas não exclui a necessidade de iluminação
mesmo que em menor intensidade. Nesse caso a alternativa para
diminuir mais ainda o gasto de energia com iluminação é o uso de
luminárias de baixo consumo.

A forma mais simples de aumentar a eficiência energética em


aparelhos elétricos e eletrônicos é a imposição de marcos regulatórios
fortes pelos governos. Os padrões de eficiência energética que são
classificados como "A" pelas agências reguladoras devem mudar
freqüentemente. Como em quase todas as iniciativas de aumento de
eficiência energética, um aumento no custo de aparelhos elétricos
através da imposição de exigentes padrões de eficiência gerará uma
economia de dinheiro várias vezes maior durante a vida útil do
equipamento através da economia de energia. Essas exigências corrigem
as compras inadequadas dos consumidores, que muitas vezes escolhem
aparelhos elétricos ineficientes mirando de forma míope apenas o preço
de venda do produto. O uso da energia por utensílios domésticos como
máquinas de lavar roupas, lava-louças, TVs e refrigeradores pode ser
reduzido em 30% usando as melhores opções disponíveis no mercado, e
em 80% com tecnologias avançadas. O uso da energia por aparelhos
elétricos de escritório pode ser reduzido entre 50% a 75% através de
uma combinação de gestão energética e sistemas de computação
eficientes52.

O aumento de funcionalidades desnecessárias nos aparelhos


elétricos também tem incentivado o consumo ineficiente de energia nos
últimos anos. As indústrias têm aumentado a fabricação dos aparelhos
elétricos que consomem energia mesmo quando estão desligados, no
modo conhecido como standby. O modo standby mantém recursos
desnecessários nos aparelhos eletrônicos como a marcação da hora. O
consumo de energia no modo standby é baixo, mas como ocorre 24
horas por dia pode representar um consumo total de energia maior do

52
Fonte: www.greenpeace.org.br/energia/pdf/cenario_brasileiro.pdf
que o consumo ocorrido pelo uso do aparelho. A Agência Internacional
de Energia estima que o modo standby pode ser responsável por 1% das
emissões mundiais de gases estufa, o que eqüivale as emissões de toda a
indústria da aviação53. Em 1999, a AIE lançou a “iniciativa do watt
único”, a fim de incentivar fabricantes a limitar o modo standby a um
watt ou menos.

Na iluminação os ganhos de eficiência energética passam pela


substituição das lâmpadas incandescentes e fluorescentes por LEDs. Os
LEDS são materiais semicondutores semelhantes aos usados nos chips
de computador, que emitem luz quando percorridos por uma corrente
elétrica. As lâmpadas incandescentes apresentam a pior eficiência
energética, mas ainda representam uma fatia importante no uso de
luminárias. No Brasil, por exemplo, 50% das lâmpadas utilizadas ainda
são incandescentes. As lâmpadas incandescentes apresentam uma
capacidade luminosa de apenas 12 lumens por watt. As lâmpadas
fluorescentes fluorescentes são 5 vezes mais econômicas do que as
lâmpadas incandescentes, apresentando uma capacidade luminosa de 60
lumens por watt. Substituir todas as lâmpadas incandescentes do mundo
por lâmpadas fluorescentes reduziria o consumo mundial de eletricidade
em 12%. As lâmpadas fluorescentes têm uma vida útil 10 vezes superior
às incandescentes. No entanto a melhor solução é a substituição de todas
as lâmpadas incandescentes e fluorescentes pelos LEDs. As lâmpadas
com LED são mais econômicas do que as fluorescentes e apresentam
maior vida útil, possuindo uma extraordinária capacidade de 150 lumens
por watt. Elas são mais caras do que as fluorescentes, mais vêm
diminuindo de preço nos últimos anos e vem sendo utilizadas de modo
crescente nas residências. No longo prazo as lâmpadas com LED
possuem um custo líquido muito menor do que as lâmpadas
fluorescentes. Por ultimo ainda há o potencial de diminuição da energia
gasta com iluminação através do uso em massa de sistemas inteligentes
como o sensor de presença. A iluminação de um corredor num prédio
comercial, por exemplo, só é acionada quando o sensor detecta a
presença de uma pessoa.

53 Fonte: www.iea.org/textbase/papers/2005/standby_fact.pdf
11.3 Fabricação de veículos com baixo consumo de
combustível
No capítulo 10 foram citadas formas importantes de diminuição
de emissões nos veículos como o uso de carros movidos a
biocombustíveis e como o uso de carros elétricos que utilizam energias
limpas como fontes primárias. Quanto ao aumento da eficiência
energética em veículos, o assunto a ser tratado neste item, as
oportunidades se referem às tecnologias que tornam os carros mais
econômicos. A fabricação de veículos mais eficientes diminuirá as
emissões de CO2 para a atmosfera através do menor consumo de
combustível fóssil. O transporte rodoviário é responsável por 71% das
emissões de gases estufa no setor de transportes, contribuindo com 5
bilhões de toneladas de CO2 equivalente emitidas anualmente. Os
automóveis atuais consomem a metade do que os automóveis similares
de 30 anos atrás consumiam. O problema é que o mundo está mais rico
e comprando automóveis muito maiores e confortáveis. Isso anulou os
ganhos de diminuição de consumo, fazendo com que os carros atuais
tenham um consumo médio similar aos de 30 anos atrás. De olho nisso
os governos do mundo estão criando metas de consumo médio de
combustível para a frota inteira das montadoras.

As tecnologias de redução de consumo nos veículos se aplicam


tanto ao trem de força dos veículos quanto à estrutura física. O trem de
força dos veículos pode ser mais eficiente através de ganhos técnicos
nos motores e nas caixas de transmissão dos veículos. No entanto a
forma de se conseguir os maiores ganhos de economia de combustível é
a implantação de uma propulsão adicional elétrica ao trem de força
movido a gasolina ou a diesel. O carro híbrido tem um motor a gasolina
e outro elétrico. O motor elétrico aproveita parte da energia
desperdiçada pelo motor a gasolina (ex: energia dos freios) e armazena
essa energia numa bateria. Quando o carro está parado num sinal ele
funciona exclusivamente como o motor elétrico, o que evita consumo de
combustível, e quando se movimenta os dois motores podem funcionar
simultaneamente. O carro híbrido básico tem uma redução de consumo
apenas com a ajuda da eficiência energética. Não se utiliza energia
elétrica externa, não precisando portanto de uma estrutura de
abastecimento de energia elétrica complementar. Qualquer local do
mundo está preparado para receber os carros híbridos. Um carro híbrido
é entre 25% e 50% mais econômico que um carro comum. Um Toyota
Prius, por exemplo, é capaz de fazer 25 km/l na cidade, enquanto um
carro do mesmo padrão faz 12km/l. Os avanços tecnológicos devem
tornar a diferença de custos em relação aos carros comuns bem menor e
tornar a obrigatoriedade de fabricação dos carros híbridos menos
onerosa para o consumidor. Evidentemente que os custos adicionais na
aquisição dos carros híbridos serão compensados com gastos menores
com combustível.

Com a massificação dos carros híbridos, os automóveis


fabricados em 2030 poderão ter um consumo médio de 25 km/l. Com a
inclusão de melhoras na estrutura física dos veículos que aumentam a
eficiência energética, como a diminuição do peso e a melhora
aerodinâmica dos veículos, os carros poderão fazer 30 km/l.
Basicamente, os carros gastam energia através das perdas por atrito,
influenciadas pelo peso, e através da resistência do ar. O peso do veículo
pode ser diminuído com o uso de materiais mais leves. Uma diminuição
de peso dos veículos gera uma grande economia de combustível. O uso
do aluminío na carroceria e nas peças torna os carros mais leves e
resistentes. Enquanto o típico carro americano tinha 40 quilos de
alumínio em 1974, em 2006, ele tinha em média 160 quilos. O alumínio
é muito caro, principalmente por exigir muita energia na fabricação.
Esse gasto energético inicial, gerará uma redução de consumo de
energia muito maior durante a vida útil do veículo. Uma alternativa é
reciclar o aluminío, que gasta apenas 10% da energia usada na
fabricação para ser reciclado porque envolve o derretimento do metal ao
invés do processo tradicional de redução eletroquímica. Não é por acaso
que em todo mundo as latinhas de refrigerante e cerveja compostas de
alumínio lideram os índices de reciclagem. O incentivo governamental a
um forte aumento do uso de alumínio nos carros ajudará o atendimento
da meta de se fabricar carros que façam 30 km/l em 2030. Com o passar
dos anos, os carros feitos de alumínio que acabarem a vida útil, terão o
seu alumínio reciclado, diminuindo os custos de fabricação dos carros
novos e gerando um ciclo virtuoso. Algumas empresas estão mirando
mais a frente, adaptando materiais da era espacial super leves ao invés
de focarem em materiais leves convencionais como o alumínio. Entre
esses materiais super leves se destaca o produzido pela empresa
Fiberforge54. Ela fabrica compostos de termoplástico avançado
reforçado com fibra de vidro ou carbono. Outra forma de diminuição de

54
http://www.fiberforge.com/
consumo é a fabricação de carros com melhor coeficiente aerodinâmico,
afim de que se diminua a resistência do ar. Os governos devem exigir
níveis mínimos de coeficientes aerodinâmicos para cada categoria de
carros novos. Um exemplo de veículo super eficiente eficiente é o
Loremo, carro fabricado pela empresa do mesmo nome. Ele faz 67
quilômetros com 1 litro de combustível e é um carro tão funcional
quanto um automóvel comum do seu porte, transportando 4 pessoas55. O
carro é feito com materiais leves e pesa apenas 450 kilos, além de
apresentar um excelente coeficiente aerodinâmico de 0,20. O motor é
movido a diesel e o carro chega a 160km/h de velocidade máxima. Veja
a foto do Loremo:

Nos próximos 20 anos se prevê um aumento proporcionalmente


maior nas emissões do setor de transportes em relação aos outros setores
econômicos devido a previsão de aumento de quase 100% na quantidade
de veículos no mundo. Construir veículos mais eficientes juntamente
com o aumento da participação de fontes limpas como os
biocombustíveis evitará que essa explosão de emissões ocorra.

55 O site da empresa é: www.loremo.com


11.4 Fabricação dos produtos industriais com diminuição do
consumo de energia

Os processos industriais geram emissões diretas e indiretas. As


emissões diretas ocorrem na própria planta industrial (ex. produção de
ferro gusa com a queima de carvão) e as emissões indiretas ocorrem
essencialmente através do consumo de energia elétrica na indústria,
sendo a produção da energia numa usina termelétrica externa. Nas
emissões indiretas através do consumo de energia elétrica, inúmeros
ganhos de eficiência energética têm ocorrido, principalmente com a
ajuda da informatização das fábricas. Um exemplo desse aumento de
eficiência é o uso de motores de alto rendimento com controle
eletrônico de partida, velocidade e freqüência. Aproximadamente 65%
do consumo de eletricidade industrial destina-se a impulsionar sistemas
de motores elétricos56 em máquinas como bombas, compressores e
ventiladores. Um motor que opera de modo contínuo e flexível em
velocidades relativamente baixas usa muito menos energia do que um
motor que liga e desliga em uma velocidade muito alta57. No entanto,
esses ganhos não avançam mais rapidamente devido a grande vida útil
(superior a 30 anos) de aparelhos obsoletos energeticamente, mas que a
substituição custa caro. Existem caldeiras funcionando há mais de 50
anos e motores há mais de 30 anos. Substituir equipamentos significa, às
vezes, alterar todo o projeto de um processo ou de uma planta industrial.
Isso implica em investimentos com um tempo de retorno financeiro
longo. As grandes indústrias normalmente apresentam capital aberto e
alegam que os investimentos dependem dos acionistas. A melhor forma
de se obter ganhos cada vez maiores de eficiência energética na
indústria é a imposição de marcos regulatórios pelos governos que
estabeleçam consumos de energia cada vez menores na fabricação dos
produtos juntamente com incentivos financeiros governamentais para
mudanças estruturais nas indústrias.

A diminuição das emissões diretas dos processos industriais


através do aumento da eficiência energética tem grande potencial de
implementação. Os setores industriais que apresentam as maiores

56
Fonte: www.greenpeace.org.br/energia/pdf/cenario_brasileiro.pdf
57 Gabrielle Walker e Sir David King.Como combater o aquecimento global e
manter as luzes acesas. Página 110, 2008
emissões são os setores químico, siderúrgico e petrolífero. O setor
cimenteiro também poderia ser incluído grupo, mas resolvi explicá-lo no
ítem 11.1 (Construções de edificações sustentáveis), por estar
intimamente associado às edificações. A maioria das iniciativas se refere
a processos técnicos específicos de cada indústria, mas existem
alternativas que se aplicam as 3 principais indústrias como a
manutenção preventiva de equipamentos, a otimização de processos de
gestão e logística e a co-geração. Na co-geração o calor gerado pelos
gases de um forno siderúrgico, por exemplo, é reaproveitado para gerar
energia elétrica. Essa energia elétrica pode abastecer a própria indústria
ou pode ser vendida para um consumidor externo. Uma fonte de calor é
usada eficientemente para duas funções ao invés de uma só. Quanto à
diminuição de emissões diretas através da melhoria dos processos
específicos de cada indústria podemos citar:

a) Indústria química – Otimização de catalisadores. Os catalisadores são


aquelas substâncias que aceleram a velocidade das reações químicas. O
aumento da velocidade das reações diminui a necessidade da queima de
combustíveis fósseis;

b) Indústria petrolífera – redução do “flaring”. O “flaring” é a queima


de gás natural em poços de petróleo. Quando o petróleo bruto é trazido à
superfície, vem com ele também o gás natural. Este gás pode ser
transportado por gasodutos e vendido, ou pode ser reinjetado no próprio
campo. Entretanto, em áreas que não dispõem de infra-estrutura ou
mercados, este gás associado é usualmente liberado na atmosfera,
queimado ou não. Embora a queima de gás natural seja um método
seguro e efetivo de eliminar o excesso de gás associado à produção de
petróleo (a liberação deste gás, em grande parte metano, sem queimá-lo,
é muito mais nociva do ponto de vista ambiental), o "flaring" desperdiça
uma valiosa fonte de energia e emite dióxido de carbono. A construção
de infra-estrutura para o uso do gás, o acesso a novos mercados
consumidores e o estabelecimento de marcos regulatórios que
estimulem o uso racional do combustível são fundamentais para a
redução do “flaring”.
Capítulo 12: Conclusão

Nós faremos inicialmente uma recapitulação. Ao longo do livro


foram avaliadas as possibilidades de mitigação do aquecimento global
sob os ângulos científico, econômico e político, apresentando dados de
estudos realizados por instituições que são referências mundiais no
tema. Essa avaliação começou com as previsões científicas do IPCC
2007 sobre o impacto que as nossas emissões futuras de gases estufa
trarão ao clima da Terra. Posteriormente mostramos estudos importantes
da Agência Internacional de Energia e da Consultoria McKinsey sobre
as estimativas de emissões de gases estufa até 2030. Também foi
apresentada a proposta de mitigação de emissões da consultoria
McKinsey que tem o objetivo de reduzir em 30% as emissões de gases
estufa lançadas em 2005 até o ano de 2030. A proposta a ser
implementada no período 2011-2030 pode controlar o aquecimento
global, limitando o aumento da temperatura da Terra em 2°C. O nível de
viabilidade política da proposta foi avaliado. Posteriormente os três
principais grupos de mitigação de emissões foram abordados focando
nos potenciais e gargalos de cada iniciativa. Os capítulos explicaram
com aprofundamento o título do livro: “Controlando o aquecimento
global - como reduzir em 30% as emissões de gases estufa até 2030”.
No entanto essa proposta se refere apenas a um caminho técnico que a
humanidade pode seguir ou pode não seguir. Não adianta provar que o
custo líquido para controlar o aquecimento global é baixo e viável de ser
implementado, se a sociedade e os governantes não se convencerem
disso. Por isso é tão importante que as informações corretas sejam
disseminadas e que se procurem formas adequadas de financiamento das
iniciativas.

Quanto à disseminação correta da informação é fundamental que


as pessoas saibam que as florestas tropicais, por exemplo, podem ser
salvas com uma quantidade muito pequena de investimento em relação
as suas rendas. Com um volume de investimento que cresce
gradativamente e atinge 0,07% do PIB global estimado em 2030 esse
objetivo pode ser alcançado. Também é importante que as pessoas
saibam que a implementação de iniciativas de aumento da eficiência
energética as tornará mais ricas ao invés de diminuírem as suas rendas
como muitos pensam. Os sete argumentos apresentados no capítulo 6
deste livro para se “vender a idéia” do combate ao aquecimento global
aos governantes mundiais representam informações de grande valia. A
sociedade na forma de ONGs, associações de classe, cidadãos, políticos
e partidos políticos tem grande potencial de realizar a missão de
informar.

Quanto ao financiamento das iniciativas é preciso que os


governos cumpram essa missão com a contribuição dos cidadãos na
forma de impostos. A contribuição espontânea e direta dos
consumidores para financiar as iniciativas é muito difícil. Se um
consumidor tiver que escolher entre um carro híbrido, 20% mais caro,
mas que economizará combustível, e um carro comum ele
provavelmente escolherá um carro comum vislumbrando a economia no
curto prazo. Apesar de existirem pessoas engajadas com a causa
ambiental, que trocam um ganho econômico por um ganho ambiental
difuso para sociedade, a maioria das pessoas só responde as causas
ambientais se tiverem estímulos econômicos. Isso se agrava pelo fato de
a maioria dos impactos ambientais negativos do aquecimento global
ainda não estarem acontecendo. Por outro lado uma grande parte dos
cidadãos do mundo está disposta a contribuir através de impostos com
1% das suas rendas para financiar iniciativas que combaterão o
aquecimento global e que trarão benefícios econômicos futuros como a
economia de energia que compensarão a maioria dos impostos pagos. A
disposição de contribuir dos cidadãos, mesmo que com uma pequena
fatia das suas rendas, precisa ser aproveitada pelos governos. Essa é a
forma mais adequada de se obter recursos para financiar as iniciativas.
A nossa sociedade apresenta cada vez mais uma economia de serviços
baseada em setores como saúde, educação e tecnologia da informação,
setores que não dependem de muitos recursos físicos e
conseqüentemente não lançam muito gases estufa. Então é mais fácil
diluir o custo de investimento das iniciativas entre os setores de alta
emissão (minoria da economia) e os setores de baixa emissão (maioria
da economia) do que esperar que os consumidores troquem produtos
mais baratos por produtos mais caros em nome da consciência
ambiental. Os custos são os mesmos, mas as abordagens são diferentes.
Uma isenção de impostos para carros híbridos para que tenham o
mesmo preço de carros convencionais pode ser compensada com um
pequeno aumento de impostos em todos os setores econômicos. Como
complemento podemos ter aumentos de impostos para setores
poluidores a fim de incentivar o uso de tecnologias limpas, assim como
uma boa regulação estatal para incentivar o aumento da eficiência
energética. Por fim os consumidores conscientes têm muita importância,
pois aquilo que faltar em termos de implementação de políticas pelos
governos pode ser complementado pelas iniciativas individuais
espontâneas como trocar o carro por transporte coletivo, fazer coleta
seletiva de lixo e comprar apenas produtos ambientalmente sustentáveis.

Grande parte da escolha do clima que teremos nas próximas


décadas dependerá de decisões políticas. No final do ano de 2009
tivemos a COP 1558, uma reunião entre governantes do mundo em
Copenhague na Dinamarca onde se discutiu o que faremos para
combater as mudanças climáticas nas próximas décadas. Na conferência
poucos resultados concretos foram alcançados. Essa conferência e
outras conferências posteriores nos próximos anos serão fundamentais
para decidir o rumo que a sociedade e os governos tomarão. Muitos
analistas acreditam que o ponto de controlar o aquecimento global,
diante dos relatórios científicos mais recentes, já passou. Outros acham
que não conseguiremos nos desviciar da nossa matriz energética suja.
Esse pessimismo não é compartilhado por mim. Acredito que diante do
bombardeio de informações na mídia sobre o tema aquecimento global
nos últimos anos e diante dos estudos técnicos que os tomadores de
decisões políticas têm nas mãos, alertando sobre os perigos das
catástrofes climáticas futuras, ocorrerá uma MUDANÇA. A pressão
ambiental será muito mais forte nas próximas duas décadas por parte da
sociedade organizada do que foi nas duas décadas anteriores, e isso
provavelmente modificará a estimativa de crescimento de emissões de
gases estufa. No entanto é uma grande incógnita saber se essa mudança
será suficiente para controlar o aquecimento global. Nesse processo de
mudança qualquer atitude favorável conta, mesmo que o objetivo final
de aumento de temperatura global dentro do limite de 2°C não seja
alcançado. Quanto menos gases estufa lançarmos, independente do
aumento final da temperatura do planeta, menos mudanças climáticas
teremos. Os três conselhos básicos que eu sugiro ao leitor para ajudar
nesse esforço coletivo são: consumir produtos com o maior nível de
sustentabilidade ambiental possível, disseminar informar corretas sobre
o aquecimento global às pessoas do seu convívio social e votar em
políticos que tenham compromisso com a diminuição das mudanças
climáticas.

58
O endereço eletrônico oficial da Conferência é: www.en.cop15.dk
A Terra, o mundo azul onde vivemos, é o único lugar do universo
que propicia a sobrevivência da humanidade. Nós precisamos agir agora
para que ela continue nos fornecendo o clima estável dos últimos
milhares de anos que garantiu o florescimento da nossa civilização. Essa
decisão provará que somos verdadeiramente racionais.
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