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Felipe Petri Correa da Silva 16.

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Pedro Henrique de Castro Falci 19.1 3972

As declarações dadas pelo atual presidente da república e por seus familiares,


também participantes do governo, muitas vezes acabam soando a ouvidos mais atentos
como antiquadas e retrógradas, mas sob uma olhar mais profundo pode se compreender
que a formação democrática do Brasil proporciona que esse tipo de conduta passe diante
do povo sem muitos empecilhos. Refletir sobre certas questões da trajetória democrática
brasileira tem a chance de promover algum entendimento em relação à obscuridade de
um deputado propor a volta da ditadura. Interessante ainda notar na fala de Eduardo
Bolsonaro uma relação temporal complexa, uma vez que sua aceitação política depende
de uma ideia de futuro e progresso, mas paradoxalmente a nostalgia de um sucesso
através da repressão e do “milagre econômico” testemunhada nos anos 1960-70 também
se faz presente, trazendo à população um sentimento de retorno e ao mesmo tempo de
“nova politica”.

Nesse sentido, o projeto modernizante proposto pela ditadura militar, e não só


por ela, acredito ser um ponto fundamental para tratarmos a experiência brasileira,
principalmente por tocar no âmbito econômico do país. Sua desenvoltura e sucesso
amplo podem ser questionados, principalmente se duvidarmos se o bolo cresceu mesmo,
e que foi repartido, como propôs Antônio Delfim Neto, ministro da fazenda durante a
ditadura. É inegável que algumas classes da população puderam prosperar
economicamente e edificar suas vidas, levando uma doce memória desse tempo, o
assimilando com uma época em que o país funcionava como se devia. Modernização
conservadora/autoritário é um termo que se encaixa bem aqui, delineado a forma em
que o governo militar propunha o crescimento do Brasil, reprimindo manifestações
operárias e de cunho social, visto como aqueles que impediam o desenvolvimento do
país. É no mínimo interessante ver como essa visão reflete ainda nos pronunciamentos
da família Bolsonaro, colocando uma parte da população contra outra, a custo do
avanço do país, ficando clara essa situação em um post de Carlos Bolsonaro no Twitter:
“Só vejo todo dia a roda girando em torno do próprio eixo e os que sempre nos
dominaram continuam nos dominando de jeitos diferentes”. Como se depois da abertura
democrática e o fim do período militar, o Brasil saísse do caminho e ficasse dando
voltas redundantemente.
As fala de Eduardo Bolsonaro, por sua vez, partem para uma linha mais dura,
reavivando traços repressivos que já tivemos em nosso governo, se referenciado com
frequência aos Atos Institucionais, e até mesmo a tortura. Aqui, podemos refletir sobre
o “ pacto de sociedade” exposto por Arão Reis, em que a sociedade se propôs para
seguir um horizonte democrático possível. É uma postura até então sustentada, que se
reflete, por exemplo, na lei de anistia. Atua assim, um entendimento de que o
esquecimento e o silêncio seriam a melhor receita para que haja a mais palpável e viável
possibilidade de país melhor, ao menos, algo que a esquerda, deixando de ser
revolucionária, passa a almejar. Diante disso, pessoas que não faziam parte da parcela
da sociedade que sofria com a politica de tortura por parte do estado, conseguem se
pronunciar sem que haja maiores consequências.

Além dessa questão, outras contribuem para esse panorama geral que esses tipos
de pronunciamentos são possíveis e se assentam. A classe política e mesmo a intelectual
vê o brasileiro como o bestializado de José Murilo de Carvalho, sem autonomia para
fazer escolhas e sem planejamento econômico, sem “civilidade” perante o resto do
mundo. Isto reforça a ideia de uma politica repressiva, capaz de conter os ânimos da
população, tirando sua responsabilidade e guiando-a para o progresso. Por sua vez, a
própria população busca em terceiros o investimento de suas responsabilidades,
distorcendo o republicanismo, que exige uma maioridade moral e uma maturidade de
assumir seus erros e arcar com suas escolhas. A falta dessa responsabilidade republicana
se reflete no populismo e no messianismo político, principalmente em relação ao cargo
da presidência, também no arrependimento e desejo de renuncias e impeachments
constantes.

A fala do deputado é um reflexo das eleições de 2018, estas eleições foram a


exacerbação de algo que é comum nas eleições presidenciais: um maniqueísmo na
liderança do executivo, baixando o nível do debate, e a negligência nos cargos do
legislativo. Logo em seguida, vemos uma revolta com o legislativo e o judiciário.
Demonstração de total ignorância no processo democrático, na divisão e nas funções do
poderes.

Os pedidos populares, nas redes sociais e nas ruas, pelo fechamento do


congresso e afastamento dos ministros do STF por suposta sabotagem ao executivo é o
sintoma do populismo herdado dos governos totalitários tão recorrentes na história do
Brasil republicano. Crises econômicas trazem a tona as velhas discussões dos métodos
de regência e administração. O desejo de mão firme nas finanças evoca no eleitorado a
busca por um salvador, como efeito colateral o poder executivo, tomado como
verdadeiro responsável pelo bem e mal, é lançado contra as instituições democráticas
como ponta de lança. As tradições sebastianistas que perpassam a história da república
tratam a constituição como um documento problemático e as instituições democráticas
como um empecilho para um governo forte. No imaginário popular um bom governo
deve garantir um futuro próspero e para isso tem o dever de romper com os mecanismo
de freios e contrapesos de uma república democrática moderna em um eterno retorno ao
imperialismo e autoritarismo.

As curvas que o estado brasileiro percorre em seu caminho de construção da


democracia nem sempre o aproximam efetivamente de seu objetivo, levando em
consideração, principalmente, que nossa história vem de edificações coloniais e
imperiais. O monumento democrático brasileiro então possui torturas em um sentido de
estar torto e bases erradas em um sentido de estar desigual, proporcionando posturas
que muitas vezes não condizem com que se almeja, ao pensar em democracia, mas que
estão fundamentadas na história brasileira. Como se diz no popular, pra se tudo tem um
jeito, menos pra morte, e nada melhor do que mãos operárias para se mexer em
construções. Apesar de termos tido alguns problemas na construção de nossa
democracia, não a nada que indique o fim do processo, há sim, sem dúvida,
reconfigurações de forças atuantes, mas a partir delas também se pode reconfigurar o
país.

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