Você está na página 1de 346

2010

Sutra Mahayana do
Mahaparinirvana
TOMO I – A Cena do Mahaparinirvana

Tradução srcinal para o Inglês de Kosho Yamamoto.


Editado e revisado por Dr. Tony Page
Tradução para português do Brasil por
Marcos Ubirajara de Carvalho e Camargo

Marcos Ubirajara de Carvalho e Camargo


Cristal Perfeito
08/10/2010
Copyright © 2009 por Marcos Ubirajara de Carvalho e Camargo

Sutra Mahayana do
Mahaparinirvana
TOMO I – A Cena do Mahaparinirvana

Tradução srcinal para o Inglêsde Kosho Yamamoto.


Editado e revisado porDr. Tony Page
Tradução para português do Brasil por
Marcos Ubirajara de Carvalho eCamargo

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 2


Capítulo Um: Introdução
Assim eu ouvi.

Naquele momento, o Buda encontrava-se em Kushinagar (Kushinaga-


ra), na terra dos Mallas, próxima ao rio Ajitavati, onde ficava uma dupla
de árvores sala. Naquela ocasião, Grandes Monges, tão numerosos
quanto 80 centenas de milhares de bilhões deles, estavam com o Hon-
rado pelo Mundo. Eles circundavam-no completamente. No décimo
quinto dia do segundo mês (15 de Fevereiro), como o Buda estava
prestes a entrar no Nirvana, ele, com o seu poder transcendental, emi-
tiu uma poderosa voz que preencheu o mundo e alcançou o mais ele-
vado dos céus. E disse a todos os seres de tal forma que todos pudes-
sem compreender: “Hoje, o Tathagata, Merecedor de Ofertas u- e S
premamente Iluminado, sente piedade, protege e, com um pensamen-
to único, vê a todos os seres como seu próprio filho Rahula. Assim, ele
é o refúgio e o abrigo do mundo. O Supremamente Iluminado Honrado
pelo Mundo está prestes a entrar no Nirvana. Todos aqueles que tive-
rem dúvidas podem agora indagar sobre elas.”

Naquela ocasião, ao alvorecer, o Honrado pelo Mundo emitiu da sua


boca raios de luz de variadas cores, a saber: azul, amarelo, vermelho,
branco, cristal e ágata. Os raios de luz resplandeceram sobre os três mil
grandes sistemas de mil mundos Búdicos. Também, as dez direções
foram igualmente iluminadas. Todas as ofensas e aflições dos seres dos
seis domínios, em razão de terem sido iluminados, foram expiadas. As

pessoas viram choraram


padas. Todos e ouviram eisto, ficando profundamente
lamentaram aflitas
tristemente: “Oh, Paie amado!
preocu-
Oh, que dia! Oh, que tristeza!”. Eles levantaram suas mão
s, entre suas
cabeças e peitos, e choraram copiosamente. Alguns tremiam, chora-
vam e soluçavam. Naquela ocasião, a terra, suas montanhas e grandes
mares tremeram. Então, todos disseram uns aos outros: “Vamos por
agora esconder nossos sentimentos, não vamos enlouquecer de triste-
za! Vamos rapidamente para Kushinagar, na chamada terra dos Mallas,

Capítulo 1: Introdução Página 3


tocar os pés do Tathagata, prestar-lhe homenagem e implorar: “Oh
Tathagata! Por favor não entre no Parinirvana, mas fique aqui por mais
um kalpa ou menos que isso.” es
El juntaram as palmas das suas mãos e
disseram novamente: “O mundo está vazio! A fortuna nos abandonou;
a maldade aumentará no mundo. Hei você! Apresse-se, vamos rapida-
mente! Em breve, o Tathagata certamente entrará no Nirvana.” Eles
também diziam: “O mund o está vazio, vazio! Se nos apartarmos do
Honrado pelo Mundo, e surgirem dúvidas, a quem iremos indagar?”.

Naquela ocasião, lá estavam muitos dos discípulos do Buda, tais como


o Venerável Mahakatyayana, Vakkula, e Upananda. Todos esses gran-
des Monges, quando viram a luz, ficaram muito agitados, a ponto de
não conseguirem conter-se. Seus pensamentos tornaram-se confusos,
e o caos reinou. Choravam em voz alta e demonstravam um variado
grau de tristeza. Estavam presentes, naquela ocasião, oito milhões de
Monges. Todos eram Arhats. Eles eram inabaláveis em seus pensamen-
tos e, possuindo o autocontrole, poderiam agir como desejassem. Eles
haviam se apartado de todas as ilusões e todos os seus órgãos sensori-
ais estavam subjugados. Como Grandes Reis Dragões (naga = é uma
palavra do Sanskrito e do Pāli que designa uma deidade ou classe de
entidades ou seres, que assumem a forma de uma enorme serpente,
mas muitas vezes com os troncos e cabeças humanas, encontrada tan-
to no Budismo como no Hinduísmo), eles eram perfeitos nas grandes
virtudes. Eles eram versados na sabedoria do vazio e perfeitos em sua
autorealização. Eles eram como uma floresta de sândalo cercada por
sândalos, ou como o rei leão cercado por leões. Eles eram completos
em tais virtudes. Eram os verdadeiros filhos do Buda. Ao alvorecer, tão
logo o sol nasceu, eles levantaram-se de suas camas no local onde vivi-
am e estavam para escovar seus dentes quando viram a luz que ema-
nava da pessoa do Buda. Então, disseram uns aos outros:

“Apressem-se com o banho, a higiene bucal, e limpem-


se.” Tão logo
eles disseram, seus pelos arrepiaram por todo o corpo e seu sangue
corria tal que pareciam flores da palasa (também chamada Kanaka -
Butea Frondosa - árvore que dá flores vermelhas que teriam muitas
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 4
propriedades ocultas). Lágrimas encheram seus olhos, os quais expres-
savam grande dor. Para trazer benefícios e paz aos seres viventes, para
estabelecer a Verdade Transcendente do Vazio do Mahayana, para
revelar o que o Tathagata havia ensinado latentemente por conveniên-
cia, tal que todos os seus sermões nunca se perdessem, e para subjugar
os pensamentos de todos os seres, eles correram para onde o Buda
estava. Eles caíram aos pés do Buda, tocaram-lhe com as suas cabeças,
circundaram-no uma centena de milhares de vezes, juntaram as pal-
mas das suas mãos, prestaram-lhe homenagem, recuaram e postaram-
se a um lado.

Naquela ocasião, lá estavam presentes mulheres tais como Kuddara e


Monjas como Subhadra, Upananda, Sagaramati, e seis milhões de
Monjas. Eram todas grandes Arhats. Todas já sem falhas, elas eram
imperturbáveis em seus pensamentos e podiam agir como lhes aprou-
vesse. Elas eram livres de todas as ilusões e todos os seus sentidos
orgânicos (órgãos sensoriais) estavam subjugados. Como Grandes Reis
Dragões, elas eram perfeitas nas virtudes. Elas haviam alcançado a
Sabedoria do vazio. Também, ao alvorecer, tão logo o sol havia nasci-
do, seus pelos arrepiaram por todo o corpo e seu sangue corria em
suas veias tal que pareciam flores palasa. Lágrimas encheram seus
olhos, os quais aparentavam grande tristeza. Elas desejavam beneficiar
os seres, trazer a paz e a felicidade, e estabelecer a Verdade Transcen-
dente do Vazio do Mahayana. Elas pretendiam manifestar o que o Ta-
thagata havia ensinado latentemente por conveniência, tal que todos
os seus sermões não desaparecessem. No sentido de subjugar os pen-
samentos de todos os seres, elas correram para onde o Buda estava,
tocaram seus pés, circundaram-no uma centena de milhares de vezes,
juntaram as palmas das suas mãos, prestaram-lhe homenagem, recua-
ram e postaram-se a um lado.

Dentre as Monjas, havia aquelas que eram nagas de Bodhisattvas e


humanos. Elas haviam atingido os dez estágios (do desenvolvimento do
Bodhisattva), e a condição de não retroação. Elas nasceram como fê-
meas, de modo a ensinarem os seres. Elas sempre praticaram as qua-
Capítulo 1: Introdução Página 5
tro virtudes ilimitadas (da benevolência, compaixão, da intenção amá-
vel (alegria simpática), e equanimidade), atingindo dessa forma um
ilimitado poder para a realização do trabalho do Buda.

Naquela ocasião lá estavam também Bodhisattvas Mahasattvas tão


numerosos quanto às areias do rio Ganges, e que eram todos nagas de
humanos, que haviam atingido os dez estágios (do desenvolvimento do
Bodhisattva), e a condição de não retroação. Como um meio hábil, eles
haviam adquirido a vida como humanos e eram chamados Bodhisatt-
vas Sagaraguna e Aksayamati. Tais Bodhisattvas Mahasattvas eram em
número como dito acima. Todos eles prezavam o Mahayana, residiam
nele, compreendiam-no profundamente, amavam-no e protegiam-no,
e respondiam bem às questões mundanas. Eles fizeram seus votos e
cada um disse: “Aqueles que ainda nãoatingiram a Via, eu conduzirei à
outra margem. Através dos inumeráveis kalpas passados, tenho manti-
do os puros preceitos, e agido em sua observância. Farei com que a-
queles não libertos ainda ganhem a Via, tal que eles possam transpor-
tar a semente dos Três Tesouros. E nos dias que virão, girarei a Roda da
Lei, e adornando-me grandiosamente, completarei todas as inumerá-
veis virtudes, e verei os seres como meus próprios filhos”. Eles, do
mesmo modo, no alvorecer, encontraram a luz do Buda. Todos os seus
pelos arrepiaram por todo o corpo e seu sangue corria tal que pareci-
am flores da palasa. Lágrimas encheram seus olhos, os quais expressa-
vam grande dor. Também, para trazer benefícios e paz aos seres viven-
tes, para manifestar o que o Tathagata havia ensinado latentemente
por conveniência, para evitar que os seus sermões se perdessem, e
para subjugar todos os seres, eles correram para onde o Buda estava,
circundaram-no uma centena de milhares de vezes, juntaram as pal-
mas das suas mãos, prestaram-lhe homenagem, recuaram e postaram-
se a um lado.

Naquela ocasião, lá estavam presentes leigos (seguidores da lei do


Buda) tão numerosos quanto às areias de dois Rios Ganges. Eles man-
tinham em observância os cinco preceitos e a sua conduta era perfeita.
Lá estavam leigos tais como Rei da Virtude Imaculada, Supremamente
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 6
Virtuoso e outros, em número como dito acima. Eles cultivavam pro-
fundamente o pensamento de combater os opostos tais como: tristeza
versus alegria, eterno versus não-eterno, puro versus impuro, eu ver-
sus não-eu, real versus irreal, refugiar-se versus não-refugiar-se, seres
versus não-seres, sempre versus nunca, paz versus não-paz, criado
versus não-criado, rompimento versus não-rompimento, Nirvana ver-
sus não-Nirvana, argumentação versus não-argumentação; e, assim,
sempre pensando em combater tais opostos dos elementos do Dhar-
ma como estabelecido acima.

Eles também sempre louvavam a audição do insuperável Mahayana,


agiam em concordância com o que ouviam e prezavam ensinar os ou-
tros. Eles mantinham em observância os preceitos da moral imaculada
e prezavam o Mahayana. Uma vez que eram auto-realizados, eles fazi-
am com que outros que prezavam o Mahayana assim se sentissem.
Eles absorveram a Sabedoria Insuperável muito bem, amavam e prote-
giam o Mahayana. Eles conheciam bem os caminhos do mundo, con-
duziam aqueles que ainda não haviam alcançado a Via para a outra
margem da vida, emancipavam aqueles ainda não emancipados, e
protegiam a semente dos Três Tesouros de tal forma que ela não mor-
resse, e tal que, nos dias futuros, eles pudessem girar a Roda da Lei,
adornar-se grandiosamente, apreciar profundamente os puros precei-
tos morais, obter a realização de todas essas virtudes, tendo um senti-
mento de grande compaixão para com todos os seres, sendo imparciais
e não-dúbios, e vendo todos os seres como seus próprios filhos.

Capítulo 1: Introdução Página 7


A Cena do Parinirvana do Buda

Também, logo cedo quando o sol acabara de nascer, no sentido de


prover a cremação do corpo do Tathagata, as pessoas carregaram em
suas mãos dezenas de milhares de fardos de madeiras fragrantes tais
como sândalo, aloés, sândalo do goirsa e madeiras celestiais que, com
seus cernes e anéis anuais, fulgurassem nos maravilhosos matizes dos
sete tesouros. Na queima, os vários matizes pareciam cores pintadas,
verdadeiras maravilhas emanadas do poder do Buda, e que eram azul,
amarelo, vermelho e branco. Eram agradáveis aos olhos de todos os
seres. Toda a madeira foi cuidadosamente impregnada com vários
tipos de incenso como açafrão, aloés, sarjarasa, e outros. Flores tais
como utpala (lótus azul), kumuda (noturna, que floresce ao luar), pad-
ma (lótus vermelho) e pundarika (lótus branco) foram espalhadas co-
mo adornos. Acima de todas as madeiras fragrantes estavam pendura-
dos estandartes das cinco cores. Eles eram leves e delicados, como
véus celestiais tecidos em kauseya, ksuma e seda.
As madeiras fragrantes eram carregadas em carruagens decoradas, as
quais fulguravam em cores tais como azul, amarelo, vermelho e bran-
co. Seus varais e raios eram todos incrustados com os sete tesouros.
Cada uma dessas carruagens era puxada por uma junta quádrupla de
cavalos que corriam como o vento. Na frente de cada carruagem esta-
vam 57 estandartes de plantas ornamentais, sobre os quais estavam
espalhados finos véus de ouro verdadeiro. Cada carruagem tinha 50
maravilhosos dosséis finamente decorados com grinaldas de utpala,

kumuda, padma
ouro, e seus e pundarika.
cálices As pétalas
feitos de diamante. dessas
Havia nas flores eram de
flores muitas puro
abelhas
negras, que se juntavam ali, brincavam e se divertiam, emitindo uma
música maravilhosa. Aquela música falava da impermanência, da tris-
teza, da vacuidade e do não-Eu. Aquela música também falava sobre o
que o Bodhisattva srcinalmente faz (o trânsito do Buda neste mundo).
Danças, cânticos, e dança de máscaras se sucediam, tocadas por ins-
trumentos musicais tais como o “cheng”, flauta, harpa, “hsiao” e o

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 8


“shã”. Da música, emergia uma voz que dizia: “Oh, que dia aflito, dia de
aflição! O mundo está vazio”! Na frente de cada carruagem estavam
Monges segurando bandejas decoradas com várias flores tais como
utpala, kumuda, padma, pundarika, vários tipos de incensos como o de
kunkuma e outros, e incensos fumegantes, todos maravilhosos. Eles
carregavam vários utensílios para preparar alimentos para o Buda e a
Sangha.

O cozimento dos alimentos em água das oito virtudes teve como com-
bustível as madeiras de sândalo e aloés. Os pratos eram delicados,
belos e em seis sabores: amargo, azedo, doce, picante, salgado e ads-
tringente. Suas virtudes eram três: 1) leves e suaves, 2) puros, e 3) a
verdadeira culinária. Equipados com tais utensílios, eles correram para
a terra dos Mallas (região no norte da Índia), ruma à floresta de árvores
Sala (Sal, Shorea robusta, uma espécie de árvore da Ásia). Lá, eles for-
raram todo o chão com areia e cobriram-no com tecidos de kalinga,
kambala e seda. Essa cobertura estendia-se por um espaço de 12 yoja-
nas [1 yojana = 15-20 km]. Para o Buda e a Sangha, eles eregiram Tro-
nos de Leão (Simhasana) incrustados com os sete tesouros. Os tronos
eram tão altos e largos quanto o monte Sumeru. Acima desses tronos
estavam içados pálios finamente decorados. Grinaldas de todos os
tipos pendiam-lhes, e de todas as árvores Sala também pendiam mara-
vilhosos estandartes e dosséis. Maravilhosas essências foram arpergi-
das entre as árvores e várias flores maravilhosas colocadas ali. Todos os
Monges então disseram uns aos outros: “Oh, todos os seres! Se sent i-
rem necessidade, comidas, roupas, cabeças, olhos, membros e todas as
coisas vos esperam; tudo será vosso”. Enquanto faziam os oferecime n-
tos, a avareza, a ira, a corrupção e os venenos abandonaram as suas
mentes; nenhum outro desejo, nenhum pensamento de alguma graça
ou prazer lhes distraia. Seus pensamentos estavam voltados unicamen-
te para a insuperável e pura Mente Iluminada (Bodhi). Todos esses
Monges eram bem estabelecidos no estado de Bodhisattva. Eles tam-
bém disseram para eles mesmos: “O Tathagata agora aceitará nossas
comidas e entrará no Nirvana”.

Capítulo 1: Introdução Página 9


Conforme eles disseram isto, todos os pelos através dos seus corpos
arrepiaram e o seu sangue corria tanto que seus corpos pareciam a flor
palasa. Lágrimas encheram os seus olhos, expressando uma grande
dor. Cuidadosamente, cada um carregou os utensílios das comidas nas
carruagens decoradas: incenso de madeira, estandartes, pálios decora-
dos, comidas; e foram todos correndo para onde o Buda se encontrava.
Eles tocaram os pés do Buda, fizeram-lhe oferecimentos, circundando-
o 100 mil vezes. Eles choraram copiosamente. A terra e o céu agitaram-
se em concordância. Eles bateram em seus peitos e choraram. Suas
lágrimas corriam como chuva. Disseram uns aos outros: “Oh que dia
aflito! O mundo está vazio, está vazio!”. Eles se atiraram ao chão diante
do Tathagata e disseram- lhe: “Oh Tathagata! P or favor, tenha piedade
e aceite nossos oferecimentos”!

O Honrado pelo Mundo, ciente da ocasião, permaneceu em silêncio, e


não recebeu (os oferecimentos). Por três vezes eles rogaram, mas suas
súplicas não foram ouvidas. Frustrados em seu objetivo, os Monges
entristecidos sentaram-se em silêncio. Isto foi como no caso do pai
compassivo, mas que tinha apenas um filho. Este filho, de repente,
torna-se doente e morre. Ao cabo da cremação, o pai retorna para casa
mergulhado em grande aflição. O mesmo era o caso de todos os Mon-
ges, que choraram e ficaram profundamente aflitos. Com todos os seus
utensílios colocados num local seguro, os Monges recuaram e senta-
ram silenciosamente a um lado.

Naquela ocasião, lá estavam Monjas, numerosas como as areias de três


Rios Ganges, que eram perfeitas na observância dos cinco preceitos e
na conduta. Dentre elas estavam Monjas tais como Ayusguna, Guna-
malya e Visakha que lideravam 84.000 Monjas e que, assim, poderiam
proteger propriamente o Verdadeiro Dharma. No sentido de prover a
travessia de inumeráveis centenas de milhares de seres para a outra
margem, elas haviam nascido como mulheres. Elas depuraram seve-
ramente seu autocontrole sob a luz das leis monáticas e meditavam
sobre suas próprias pessoas. Como as quatro víboras [os quatro princi-
pais elementos que são a terra, o ar, o fogo e a água], este corpo carnal
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 10
é constantemente atacado e devorado por inumeráveis vermes. Cheira
mal e é corrompido. Esconde a ganância. Este corpo é detestável, como
a carcaça de um cão. Este corpo é impuro, e dele nove furos evacuam
impurezas. É como se fosse um castelo, com o sangue, tecidos, tronco,
ossos e pele formando suas paredes externas, braços e pernas servindo
como baluartes, os olhos como bocas de canhões e a cabeça como
torre principal. O Rei Pensamento está sentado lá dentro. Esse castelo
carnal é aquele que todos os Budas Honrados pelo Mundo abandonam
e que os mortais comuns e ignorantes sempre amam e apegam-se a
ele. Semelhantemente aos rakshasas (demônios devoradores de car-
ne), a avareza, a ira e a estupidez nele se estabelecem. Este corpo é
frágil como uma cana, como a eranda (planta mal-cheirosa), a espuma
e a bananeira. Este corpo é não-eterno e não permanece estável se-
quer por um segundo. Ele é como um relâmpago, água corrente ou
uma miragem. Ou ainda, é como pintar um quadro na água, que desa-
parece tão logo é feito. Este corpo cai tão facilmente quanto uma
grande árvore pendurada na barranca de um rio. Ele não durará muito.
Ele será mordiscado e devorado por raposas, lobos, corujas, águias,
corvos, abutres e cães famintos. Quem em sã consciência se alegraria
em devorar-se. Ainda que pudéssemos preencher a pegada de uma
vaca com água, não teríamos a completa explicação do não-eterno, o
não-puro, o mau-cheiro e a corrupção deste corpo; ainda que pusés-
semos triturar a grande terra e reduzi-la a grãos do tamanho de uma
semente de mostarda ou do tamanho de uma partícula de pó, nunca
poderíamos explicar completamente as falhas e males deste corpo.
Sendo assim, deveríamos descartá-lo como lágrimas ou saliva. Em ra-
zão disto, todas as Monjas exercitavam suas mentes em leis como o
vazio, sem forma e sem desejo. Assim, elas desejavam muito mais in-
dagar e aguardar por um ensinamento dos sutras Mahayana e, tendo
ouvido-o, explicá-lo para outros. Elas guardavam e mantinham os seus
votos e depreciavam a forma feminina. A forma tem mais a ser repug-
nada e é, por natureza, não indestrutível. Assim, os seus pensamentos
sempre viam corretamente as coisas e subjugavam a interminável roda
do nascimento e da morte. Elas mantinham o Mahayana em observân-
cia e, elas próprias, eram bem nutridas por ele. Elas alimentavam os
Capítulo 1: Introdução Página 11
pensamentos daquilo que o comprazia. Prezavam-no enormemente,
defendiam-no e protegiam-no. Embora mulheres na forma, elas eram,
de fato, não mais que Bodhisattvas. Em plena concordância com os
caminhos do mundo, elas os conheciam bem, ajudavam aqueles que
ainda não haviam conquistado a outra margem e emancipavam aque-
les ainda não emancipados. Elas protegiam a herança dos Três Tesou-
ros, tal que eles nunca viessem a desaparecer, e tal que elas pudessem
girar a Roda da Lei nos dias vindouros. Elas adornavam grandiosamente
suas próprias pessoas, mantendo verdadeiramente em observância os
preceitos proibitivos e, assim, acumulando tais virtudes. Seus corações
compassivos abarcavam todos os seres. Eram imparciais e não-dúbias,
como se consideraria um único filho. Elas também, logo cedo quando o
sol acabara de nascer, disseram umas às outras: “Apressemo -nos hoje
à floresta das árvores gêmeas ”! Os utensílios das Monjas eram duas
vezes mais. Elas levaram-nos para onde o Buda se encontrava, tocaram
seus pés, circundaram-no cem mil vezes e disseram: “Oh Honrado pelo
Mundo! Trazemos conosco alimentos para o Buda e a Sangha. Oh Ta-
thagata! Por favortenha piedade e aceite nossos oferecimentos”! O
Tathagata manteve-se em silêncio e não os aceitou. Como sua súplica
não foi atendida, todas as Monjas ficaram tristes. Elas recuaram e sen-
taram silenciosamente a um lado.

Naquela ocasião, os Licchavis (um famoso clã da época) do Castelo de


Vaisali estavam presentes e havia outros tão numerosos quanto às
areias de quatro Rios Ganges, que eram homens, mulheres, grandes e
pequenos, esposas e filhos, parentes e servos dos reis do Jambudvipa.
Seguindo o Caminho, eles mantinham verdadeiramente em observân-
cia os preceitos proibitivos e eram perfeitos em sua conduta. Eles sub-
jugaram as pessoas que seguiam outros ensinamentos e que agiam
contra o Dharma Maravilhoso. Eles sempre diziam uns aos outros: “Nós
teremos depósitos de ouro e prata para defender o doce e infinitamen-
te profundo Dharma Maravilhoso, de tal forma que ele florescerá. Fa-
çamos votos de sempre aprender o Dharma. Arrancaremos a língua
daqueles que difamem o Dharma Maravilhoso do Buda”. Eles também
oraram: “Se houver um monge que transgrida as proibições, nós o
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 12
mandaremos de volta para a vida secular e o tornaremos escravo; se
alguém vier a perseverar no Dharma Maravilhoso, nós o estimaremos e
o serviremos como o faríamos para nossos parentes. Se sacerdotes
praticarem bem o Dharma Maravilhoso, compartilharemos da sua
alegria e o apoiaremos, tal que ele cresça”. Eles sentiam
-se sempre
alegres ao emprestar um ouvido para o sutra Mahayana. Tendo ouvi-
do, eles expunham amplamente para outros aquilo que tinham ouvido.
Todos eram versados em tais virtudes. Estavam ali incluídos Licchavis
como: Repositório-Puro-e-Imaculado, Puro-e-Não-Indulgente, Água-
do-Ganges-da-Pura-e-Imaculada-Virtude.

Todos eles disserama si próprios: “Apressemo-nos para onde o Buda


se encontra”! Muitos eram seus utensílios para oferecimentos. Cada
Licchavi tinha 84.000 elefantes inteiramente decorados, juntamente
com 84.000 carruagens de tesouros puxadas por juntas quádruplas de
cavalos, e 84.000 gemas brilhantes como a lua. Havia também feixes de
madeira combustível como a madeira celestial, sândalo e aloés, todos
em número de 84.000. À frente de cada elefante pendiam emblemas
suspensos finamente decorados, estandartes e dosséis. Mesmo os
menores dosséis mediam cerca de um yojana tanto na largura como no
comprimento. Mesmo os mais curtos estandartes mediam 32 yojanas.
E os mais baixos emblemas suspensos atingiam a altura de 100 yojanas.
Com esses objetos para oferecimento, eles foram para onde o Buda se
encontrava, tocaram seus pés, circundaram-no 100 mil vezes e disse-
ram-lhe: “Oh Honrado pelo Mundo! Aqui estamos com oferecimentos
para vós, o Buda, e para a Sangha. Por favor, tenha piedade e aceite-
os”! O Tathagata permaneceu em silêncio e não os aceitou. Não cons
e-
guindo o que almejavam,todos os Licchavis ficaram tristes. Através do
poder do Buda, eles elevaram-se no céu à altura de sete talas, onde
permaneceram em silêncio.

Além disso, naquela ocasião, lá estavam ministros e leigos ricos tão


numerosos quanto às areias de cinco Rios Ganges. Eles prezavam o
Mahayana. Se houvesse quaisquer seguidores de outros ensinamentos
que caluniassem o Dharma Maravilhoso, eles os subjugariam assim
Capítulo 1: Introdução Página 13
como o granizo e a chuva o fazem com a grama e as plantas. Eles eram
Luz Solar, Protetor-do-Mundo e Protetor-do-Dharma. Estes lideravam
seus séquitos. Seus utensílios eram cinco vezes mais do que aqueles
que lhes precederam. Eles os carregaram para a floresta das árvores
sala gêmeas, tocaram os pés do Buda, circundaram o Buda por 100 mil
vezes, e disseram: “Oh Honrado pelo Mundo! Trouxemos para vós e a
Sangha utensílios para oferecimentos. Por favor, tenha piedade e acei-
te-os”! O Tathagata permaneceu em silêncio e não os aceitou. Como
seu desejo não foi atendido, os longevos ricos ficaram tristes. Através
do divino poder do Buda, eles foram elevados à altura de sete talas do
chão ao céu, onde permaneceram em silêncio.

Naquela ocasião, lá estavam presentes o Rei de Vaisali e sua consorte,


as pessoas do seu harem, e todos os reis do Jambudvipa, exceto Ajata-
satru e aqueles da torre do castelo e vilas do seu reinado. Estavam ali
Reis tais como Imaculado-como-a-Lua e outros. Eles levaram com eles
as quatro forças militares [elefantes, cavalos, infantaria e carruagens] e
desejavam ir para onde o Buda se encontrava. Cada rei tinha pessoas e
parentes tão numerosos quanto 180 milhões de bilhões. As carruagens
e soldados eram puxados por elefantes e cavalos. Os elefantes eram de
seis presas e os cavalos corriam como o vento. Seus adornos e utensí-
lios eram seis vezes mais do que aqueles que lhes precederam. Dentre
todos os dosséis ornamentados, o menor deles cobria um diâmetro de
8 yojanas. O menor dos estandartes media 16 yojanas. Todos aqueles
reis perseveravam pacificamente no Dharma Maravilhoso e detesta-
vam leis distorcidas. Eles estimavam o Mahayana e sentiam profunda
alegria nele. Eles amavam todos os seres como se ama um filho único.
A fragrância dos alimentos e bebidas que eles levavam preenchia o ar
ao redor de quatro yojanas. Eles também, logo cedo quando o sol aca-
bara de nascer, carregaram esses deliciosos pratos e foram para a flo-
resta das árvores sala gêmeas onde o Tathagata se encontrava e disse-
ram: “Oh Honrado pelo Mundo! Desejamos oferecer isto para o Buda e
a Sangha. Por favor, tenha piedade, Oh Tathagata! E aceite nossos úl-
timos oferecimentos!” O Tathagata, ciente da ocasião, não os aceitou.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 14


Com seus desejos não atendidos, todos aqueles reis ficaram tristes.
Eles recuaram e tomaram assento a um lado.

Naquela ocasião, lá estavam as consortes dos reis, tão numerosas


quanto às areias de sete Rios Ganges, exceto a consorte do Rei Ajatasa-
tru. De modo a salvar os seres viventes, elas manifestaram-se como
mulheres. Elas estavam sempre conscientes das suas ações corporais e
perfumavam seus pensamentos com as leis do vazio, sem forma e sem
desejo. Dentre elas estavam as senhoras Maravilhoso-Mundo-Tríplice e
Virtude-Amorosa. Todas essas consortes perseveravam pacificamente
no Dharma Maravilhoso, mantinham em observância as proibições e
eram perfeitas em sua conduta. Elas se comportavam para com todos
os seres como se fossem um filho único. Todas elas disseram: “Vamos
todas rapidamente para onde o Buda se encontra.” Os oferecimentos
daquelas consortes reais eram sete vezes mais do que aqueles que lhes
precederam, e constavam de: incenso, flores, emblemas pingentes,
tecidos de seda, estandartes, dosséis, e as melhores comidas e bebidas.
Mesmo o menor dos dosséis finamente decorados media 16 yojanas. O
mais baixo dos emblemas pingentes media 68 yojanas. A fragrância de
suas comidas e bebidas espalhava-se por uma área de oito yojanas ao
redor. Carregando todos aqueles oferecimentos, elas foram para onde
o Buda se encontrava. Elas tocaram os seus pés, circundaram-no por
100 mil vezes, e disseram ao Buda:Oh“ Honrado pelo Mundo! Viemos
com os nossos oferecimentos para o Buda e a Sangha. Por favor, tenha
piedade e aceite nossos últimos oferecimentos!” O Tathagata, ciente
da ocasião, permaneceu em silêncio e não os aceitou. Com suas súpli-
cas não atendidas, todas as consortes ficaram tristes. Elas puxaram
seus cabelos, bateram em seus seios e choramingaram como a mãe
compassiva que acabara de perder seu único filho. Elas recuaram e
tomaram assento silenciosamente a um lado.”

Naquela ocasião, lá estavam também deusas tão numerosas quanto às


areias de oito Rios Ganges. Virupakasa liderava seu séquito e disse: “Oh
Irmãs! Vejam bem, vejam bem! Os melhores oferecimentos de todos
aqueles seres são para o Tathagata e para os Monges. Deveríamos agir
Capítulo 1: Introdução Página 15
seriamente e fazer oferecimentos ao Tathagata com utensílios tão
maravilhosos quanto aqueles. Ele compartilhará (participará) dos nos-
sos oferecimentos e entrará no Nirvana. Oh Irmãs! É difícil encontrar
um Buda, o Tathagata, neste mundo. É também difícil fazer os últimos
oferecimentos. Uma vez que o Buda entre no Nirvana, o mundo tornar-
se-á vazio.” Todas aquelas mulheres celestiais amavam o Mahayana e
desejavam ouvi-lo. Tendo ouvido-o, elas o exporiam amplamente para
outras pessoas. Prezando muito o Mahayana, elas também satisfaziam
aqueles que estavam morrendo por ele. Elas protegiam o Mahayana
muito bem. Se houvesse qualquer outro ensinamento que se opusesse
ou invejasse o Mahayana, elas subjugavam-nos severamente, assim
como o granizo faz com a grama. Elas mantinham em observância os
preceitos proibitivos e sua conduta era perfeita. Elas conheciam bem
os caminhos do mundo, atravessavam aqueles que ainda não haviam
alcançado a outra margem, e giravam a Roda do Dharma. Elas protegi-
am a herança dos Três Tesouros, tal que eles nunca viessem a desapa-
recer. Elas estudaram o Mahayana e, assim, adornaram-se grandiosa-
mente. Perfeitas em todas aquelas virtudes, elas amavam todos os
seres igualmente, assim como se ama um filho único. Elas também,
logo cedo quando o sol acabara de nascer, pegaram incenso de madei-
ras celestiais em quantidade duas vezes maior que aquela existente no
mundo humano. A fragrância de todo aquele incenso limpou todos os
maus odores humanos. Suas carruagens tinham as coberturas brancas
e eram puxadas por juntas quádruplas de cavalos. Cada carruagem era
acortinada, e em cada um dos quatro cantos estavam pendurados
sinos de ouro. De diversos tipos eram o incenso, as flores, os emblemas
pingentes, estandartes, dosséis, maravilhosas comidas e danças de
máscara. Lá estavam simhasanas [tronos de leão], cujos quatro pés
eram de pura água-marinha (berílio azul). Atrás dos simhasanas esta-
vam divãs incrustrados com os sete tesouros. Na frente de cada divã
havia um encosto para o braço feito de ouro. As luminárias eram feitas
dos sete tesouros, e várias gemas serviam-lhe de lâmpadas. Flores
maravilhosas espalhavam-se pelo chão. Tendo feito seus oferecimen-
tos, todas essas deusas ficaram tristes em seu coração. As lágrimas
verteram-lhes e grande foi a sua tristeza. No sentido de beneficiar os
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 16
seres e torná-los felizes, elas haviam completado a insuperável prática
do Todo-Vazio do Mahayana e propuseram revelar os secretos ensi-
namentos dos meios expedientes do Tathagata. Para evitar que os
vários sermões viessem a se perder, elas foram para onde o Buda se
encontrava, tocaram seus pés, circundaram-no por 100 mil vezes, e
disseram ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Por favor, aceite nossos
últimos oferecimentos.” O Tathagata, ciente da ocasião, permaneceu
em silêncio e não os aceitou. Todas aquelas deusas, com seus desejos
não atendidos, ficaram tristes. Elas recuaram, tomaram assento a um
lado, e permaneceram em silêncio.

Naquela ocasião, lá viviam vários Reis Dragões nos quatro quadrantes,


tão numerosos quanto às areias de nove Rios Ganges. Eles eram Vasu-
ki, Nanda e Upananda, que liderava seu séquito. Também, todos aque-
les Reis Dragões, logo cedo quando o sol acabara de nascer, pegaram
seus utensílios de oferecimentos, tão numerosos quanto aqueles dos
humanos e seres celestiais. Carregando-os para onde o Buda se encon-
trava, eles tocaram seus pés, circundaram-no por 100 mil vezes e disse-
ram-lhe: “Oh Tathagata! Por favor, aceite nossos últimos oferecime
n-
tos.” O Tathagata, ciente da ocasião, permaneceu em silêncionão
e os
aceitou.Todos os Reis Dragões, com seus desejos não atendidos, fica-
ram tristes. Eles recuaram e sentaram-se a um lado.

Naquela ocasião, lá estavam Reis Demônio tão numerosos quanto às


areias de dez Rios Ganges. Vaishravana liderava seu séquito. Eles disse-
ram uns aos outros: “Apressemo -nos para onde o Buda está!” Traze n-
do com eles várias coisas como oferecimentos, duas vezes mais do que
aquelas dos Reis Dragões, eles foram para onde o Buda se encontrava,
tocaram seus pés, circundaram-no por 100 mil vezes, e disseram-lhe:
“Oh Tathagata! Por favor, tenha piedade e aceite os nossos últimos
ofereceimentos!” O Tathagata, ciente da ocasião, permaneceu em
silêncio e não os aceitou. Com seus desejos insatisfeitos, eles sentiram
tristeza, recuaram e sentaram-se a um lado.

Capítulo 1: Introdução Página 17


Naquela ocasião, lá estavam também Reis Garudas [Pássaros Mitológi-
cos], tão numerosos quanto às areias de 20 Rios Ganges. O Rei-Vitória-
Sobre-Ressentimentos liderava seu séquito.

Também, lá estavam Reis Gandharva [músicos semi-deuses], que eram


tão numerosos quanto às areias de 30 Rios Ganges. O Rei Narada lide-
rava seu séquito.

Também, lá estavam Reis Kimnara [cantores e dançarinos celestias],


tão numerosos quanto às areias de 40 Rios Ganges. O Rei Sudarsana
liderava seu séquito.

Também, lá estavam Reis Mahoragas [seres com cabeça de serpente],


tão númerosos quanto às areias de 50 Rios Ganges. O Rei Mahasudar-
sana liderava seu séquito.

Também, lá estavam Reis Asura [demônios titânicose contenciosos],


tão numerosos quanto às areias de 60 Rios Ganges. O rei Campalu
liderava seu séquito.

Também, lá estavam Reis Davanat [abundantes em doações], tão nu-


merosos quanto às areias de 70 Rios Ganges. O Rei Água-Do-Rio-
Imaculado e Bhadradatta lideravam seu séquito.

Também, lá estavam Rakshasa [demônios carnívoros], tão numerosos


quanto às areias de 80 Rios Ganges. O Rei Temível liderava seu séquito.
Abandonando o mal, ele não devorava humanos; mesmo em meio ao
ressentimento, ele mostrava-se compassivo. Sua forma era horrível de
ver, ainda que parecesse correto e austero devido ao poder do Buda.

Também, lá estavam Reis da Floresta, tão numerosos quanto às areias


de 90 Rios Ganges. O Rei Música-e-Odor liderava seu séquito.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 18


Também, lá estavam Reis Possuidores-dos-Dharanis [encantamentos],
tão numerosos quanto às areias de 1.000 Rios Ganges. O Rei-Grande-
Visão-da-Proteção-dos-Dharanis liderava seu séquito.

Também, lá estavam Obcecações Sensuais [espíritos], tão numerosos


quanto às areias de 100 mil Rios Ganges. O Rei Sudarsana liderava seu
séquito.

Também, lá estavam as Deusas Sensuais, tão numerosas quanto às


areias de 10 milhões de Rios Ganges. Secreção
–Azul-Celeste, Secreção-
da-Tristeza-pelo-Cadáver, Secreção-da-Via-Imperial e Visakha lidera-
vam seu séquito.

Também, lá estavam os Reis da Obcecação da Terra, tão numerosos


quanto às areias de um bilhão de Rios Ganges. O Rei Secreção-
Esbranquiçada liderava seu séquito.

Também, lá estavam Príncipes, Guardiões Celestiais, e os quatro Anjos


Guardiões da Terra, tão numerosos quanto às areias de 10 trilhões de
Rios Ganges.

Também, lá estavam os ventos dos quatro quadrantes, tão numerosos


quanto às areias de 10 trilhões de Rios Ganges. Eles trouxeram as flores
sazonais e extemporâneas de todas as árvores e espalharam-nas entre
as árvores sala gêmeas.

Também, lá estavam os principais deuses das nuvens e das chuvas, tão


numerosos quanto às areias de 10 trilhões de Rios Ganges, os quais
disseram a si mesmos: “Quando o Tathagata entrar no Nirvana,e-far
mos chover na ocasião da sua cremação e extinguiremos o fogo. Se lá
houver alguém que sinta calor e murmure, tornaremos o ar frio.”

Também, lá estavam Elefantes Reais Grandiosamente Fragrantes, tão


numerosos quanto às areias de 20 Rios Ganges. Dentre eles estavam
Rahuhastin, Suvarnavarnahastin, Amrtahastin, Elefante-de-Olhos-Azuis
Capítulo 1: Introdução Página 19
e o Elefante Fragrância do Desejo, que liderava seu séquito. Eles respei-
tavam e amavam o Mahayana. Como o Buda estava prestes a entrar no
Nirvana, cada um pegou uma inumerável, incomensurável quantidade
de belíssimas flores de lótus e levaram-nas para onde o Buda se encon-
trava, tocaram seus pés com suas cabeças, recuaram e postaram-se a
um lado.

Também, lá estavam Reis Leões, tão numerosos quanto às areias de 20


Rios Ganges. O Rei Rugido do Leão liderava seu séquito. Eles conferi-
ram o destemor para todos os seres. Ostentando várias flores e frutos,
eles vieram para onde o Buda se encontrava, tocaram seus pés com
suas cabeças, recuaram e postaram-se a um lado.

Também, lá estavam os reis dos pássaros, tão numerosos quanto às


areias de 20 Rios Ganges. Dentre eles estavam plovers, gansos selva-
gens, patos mandarin, pavões, gandharvas,
karandas, mynahs, parrots, kokilas, wagtails, kalavinkas, jivamjivakas e
todos os tipos de pássaros; todos carregando flores e frutos, vieram
para onde o Buda se encontrava, tocaram seus pés com suas cabeças,
recuaram e postaram-se a um lado.

Também, lá estavam búfalas, vacas e ovelhas, tão numerosas quanto


às areias de 20 Rios Ganges, que vieram ao Buda e ofereceram-lhe um
leite maravilhosamente fragrante. Todo aquele leite preencheu as
valas e poços do Castelo de Kushinagar. Sua cor, fragrância e sabor
eram perfeitos. Isto feito, elas recuaram e postaram-se a um lado.

Também, lá estavam sábios dos quatro continentes, tão numerosos


quanto às areias de 20 Rios Ganges. Ksantirsi liderava o seu séquito.
Carregando flores, incenso e frutas, eles vieram para onde o Buda esta-
va, tocaram seus pés com suas cabeças, circundaram-no por três vezes
e disseram-lhe: “Oh Honrado pelo Mundo! Por favor, tenha piedade e
aceite nossos últimos oferecimentos!” O Tathagata, ciente da ocasião,
permaneceu em silêncio e não os aceitou. Diante disto, com seus dese-

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 20


jos não atendidos, todos os sábios ficaram tristes. Eles recuaram e pos-
taram-se a um lado.

Lá estavam presentes todas as abelhas rainhas do Jambudvipa. Som


Maravilhoso, a Rainha das abelhas, liderava seu séquito. Trazendo mui-
tas flores, elas vieram para onde o Buda se encontrava, tocaram seus
pés com suas cabeças, circundaram-no uma vez, recuaram e postaram-
se a um lado.

Naquela ocasião, os Monges e Monjas do Jambudvipa estavam todos


concentrados juntos, exceto os dois veneráveis, Mahakashyapa e A-
nanda.

Também, lá estavam os espaços entre os mundos, tão numerosos


quanto às areias de inumeráveis asamkhyas de Rios Ganges, bem como
todas as montanhas do Jambudvipa, dentre as quais o Rei Monte Su-
meru que liderava seu séquito. Grandiosos eram os adornos das mon-
tanhas. Velhas e exuberantes eram as matas e florestas, os ramos e
folhas encontravam-se em seu clímax, de tal maneira que ocultavam o
sol. Diversas eram as flores maravilhosas que desabrocharam em toda
a volta. As nascentes e córregos eram puros, fragrantes e transparen-
tes. Devas, nagas, gandharvas, asuras, garudas, kimnaras, mahoragas,
sábios, mágicos, atores, dançarinos e músicos lotavam o lugar. Todos
estes seres celestiais das montanhas e outros vieram para onde o Buda
se encontrava, tocaram seus pés com suas cabeças, recuaram e posta-
ram-se a um lado.

Além disso, lá estavam presentes os deuses dos quatro grandes ocea-


nos e dos rios, tão numerosos quanto às areias de asamkhyas de Rios
Ganges, os quais possuíam grandes virtudes e feições celestiais. Seus
oferecimentos eram duas vezes maiores que aqueles que lhes precede-
ram. As luzes que emanavam dos corpos daqueles deuses e daqueles
dançarinos de máscara eclipsaram tanto a luz do sol e da lua, que eles
ficaram ocultos e não mais podiam ser vistos. Flores de Champaka
foram espalhadas sobre as águas do Rio Hiranyavati. Eles vieram para
Capítulo 1: Introdução Página 21
onde o Buda se encontrava, tocaram seus pés com suas cabeças, recu-
aram e postaram-se a um lado.

Naquela ocasião, as árvores sala da floresta de Kushinagar mudaram de


cor e pareciam grus (pássaro da família gruidae) brancos. No céu, um
salão de sete tesouros apareceu espontaneamente. Neles, podia-se ver
uma fina decoração. Havia balaustres em todo seu redor, com gemas
preciosas incrustadas neles. Em meio aos edifícios viam-se córregos e
lagos para banho, onde flores de lótus maravilhosas flutuavam. Era
como se estivéssemos no Uttarakuru, nos jardins do Céu Trayastrimsa.
Isto é como as coisas estavam na floresta de árvores sala, com adornos
esplêndidos e maravilhosos. Os devas (espíritos intimamente ligados e
integrados à natureza, ou seja, aos cinco elementos), asuras e todos os
outros testemunharam a cena da entrada do Tathagata no Nirvana,
ficando todos profundamente entristecidos e inconsoláveis.”

“Então, os quatro Anjos Guardiões da Terra e Sakrodevendra disseram


uns aos outros: “Veja! Todos os devas, seres manos
hu e asuras estão
em preparativos com a intenção de fazer seus últimos oferecimentos
ao Tathagata. Nós, também, faremos o mesmo. Se fizermos nossos
oferecimentos finais, não será difícil tornarmo-nos perfeitos no dana-
paramita.” Naquela ocasião, os oferecimentos dos quatro anjos guar-
diões da terra eram duas vezes maiores que aqueles que lhes precede-
ram. Carregaram em suas mãos todos os tipos de flores como manda-
rava, mahamandarava, kakiruka, mahakakiruka, manjushaka, maha-
manjushaka, santanika, mahasantanika, amorosa, muito amorosa,
samantabhadra, mahasamantabhadra, tempo, grande tempo, castelo
fragrante, castelo muito fragrante, alegria, grande alegria, convite ao
desejo, grande convite ao desejo, fragrância intoxicante, grande fra-
grância intoxicante, toda fragrante, muito grande fragrante, folhas
douradas celestiais, nagapuspa, paricitra, kovidara, e também carre-
gando maravilhosas comidas, eles vieram para onde o Buda se encon-
trava e tocaram seus pés com suas cabeças. A luz de todos aqueles
devas sobrepujou a luz do sol e da lua, tal que eles não podiam ser
vistos. Com esses utensílios, eles intencionavam fazer oferecimentos
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 22
ao Buda. O Tathagata, ciente da ocasião, permaneceu em silêncio e
não os aceitou. Com seus desejos não atendidos, os devas ficaram
tristes e preocupados, recuaram e postaram-se a um lado.

Naquela ocasião, Sakrodevendra e os seres do Céu Trayastrimsa carre-


garam os vasos de seus oferecimentos, os quais eram duas vezes maio-
res do que aqueles que lhes precederam. As flores que eles carregaram
eram igualmente muito numerosas. A fragrância era maravilhosa, mui-
to agradável de sentir. Eles carregaram o salão (hall) da vitória, o Vaija-
yanta [palacio de Sakrodevendra] e muitos outros salões menores e
vieram para onde o Buda se encontrava, tocaram seus pés com suas
cabeças, e disseram-lhe: “Oh Honrado pelo Mundo! Nós amamos o- pr
fundamente e protegemos o Mahayana. Oh Tathagata! Por favor, acei-
te nossas comidas (oferecimentos).” O Tathagata, ciente da ocasião,
permaneceu em silêncio e não as aceitou. Shakra [Indra, líder dos deu-
ses] e todos os devas, com seus desejos não atendidos, ficaram tristes.
Eles recuaram e postaram-se a um lado.
Os oferecimentos daqueles até o sexto céu aumentavam em tamanho
um após o outro. Lá estavam emblemas finamente decorados, estan-
dartes e dosséis. Mesmo os menores dos dosséis cobriam os quatro
continentes; os menores estandartes cobriam os quatro mares; mesmo
os menores emblemas alcançavam o céu Mahesvara. Uma brisa suave
soprava e uma doce música surgiu. Carregando as mais deliciosas co-
midas, eles vieram para onde o Buda se encontrava, tocaram seus pés
com suas cabeças, e disseram- lhe: “Oh Honrado pelo Mundo! Roga-
mos, Oh Tathagata! Tenha piedade e aceite nossos últimos ofereci-
mentos!” O Tathagata, ciente da ocasião, permaneceu em silêncio e
não os aceitou. Com seus desejos não atendidos, todos os devas fica-
ram tristes. Eles recuaram e postaram-se a um lado.

“Todos os devas até o mais elevado dos céus estavam reunidos lá.
a- N
quela ocasião, o Grande Deus Brahma e outros devas emitiram uma luz
que resplandeceu sobre os quatro continentes. Para os humanos e
devas do mundo dos desejos, as luzes do sol e da lua ficaram obscure-
Capítulo 1: Introdução Página 23
cidas. Eles tinham emblemas finamente decorados, estandartes e dos-
séis de seda colorida. Mesmo o menor estandarte que pendia do palá-
cio do Brahma vinha até onde estavam as árvores sala. Eles vieram
para onde o Buda se encontrava, tocaram seus pés com suas cabeças, e
disseram-lhe: “Oh Honrado pelo Mundo! Rogamos, Oh Tathagata!
Tenha piedade e aceitenossos últimos oferecimentos.” O Tathagata,
ciente da ocasião, permaneceu em silêncio e não os aceitou. Diante
disto, os devas, com seus desejos não atendidos, ficaram tristes. Eles
recuaram e postaram-se a um lado.

Naquela ocasião, Vemacitra, o rei dos asuras, estava presente com


inumeráveis grandes aparentados. A luz que resplandeceu (ali) era
mais brilhante que aquela do Brahma. Ele tinha emblemas finamente
decorados, estandartes e dosséis. Mesmo o menor estandarte cobria
mil mundos. Carregando deliciosas comidas, eles vieram para onde o
Buda se encontrava, tocaram seus pés com suas cabeças e disseram-
lhe: “Rogamos, Oh Tathagata! Tenha piedade e aceite nossos últimos
oferecimentos!” O Tathagata, ciente da ocasião, permaneceu emn- silê
cio e não os aceitou. Como seus desejos não foram atendidos, todos os
asuras ficaram tristes. Eles recuaram e postaram-se a um lado.

Naquela ocasião, Marapapiyas (Mara, o Demônio) do mundo dos dese-


jos com todos os seus demônios aparentados e suas fêmeas domesti-
cadas, com seus inumeráveis acompanhantes, abriram os portões do
inferno, aspergiram água pura, e disseram: “Agora vocês nada têm a
fazer. Somente pensem que o Tathagata, o Merecedor de Ofertas e
Todo-Iluminado, participa com alegria, e ofereçam seus últimos ofere-
cimentos. Vocês agora terão uma longa noite de paz.” Então, Marap a-
pivas eliminou todas as grandes e pequenas espadas, venenos e dores
do inferno. Ele fez a chuva cair e extinguir o fogo ardente. Através do
poder do Buda, ele obteve esse estado de espírito. Ele fez todos os seus
demônios aparentados abandonarem suas grandes e pequenas espa-
das, arcos, bestas, armaduras, armas, alabarda (uma combinação de
machado e lança), escudos, ganchos, martelos de metal, machados,
carros de guerra e laços. Os oferecimentos que eles tinham eram duas
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 24
vezes maiores do que aqueles dos humanos e seres celestiais. Mesmo
o menor dos dosséis cobria meio milhar de mundos. Eles vieram para
onde o Buda se encontrava, tocaram seus pés com suas cabeças, e
disseram-lhe: “Nós agora amamos e pro tegemos o Mahayana. Oh Hon-
rado pelo Mundo! Os homens e mulheres no mundo podem, com a
finalidade de fazer oferecimentos, sem medo, seja por motivos de infi-
delidade, por lucro e outros motivos; aceitar este Mahayana, sejam
eles (os motivos) verdadeiros ou não. Então, no sentido de erradicar o
medo de tais pessoas, enunciaremos o seguinte dharani: “Taki, tatar
a-
taki, rokarei, makarokarei, ara, shara, tara, shaka". Nós cantamos esse
dharani para o benefício daqueles que perderam sua coragem, que
possam estar sentindo medo, que pregam para outros, que oram para
que o Dharma não se extingua, que desejam sobrepujar os tirthikas
[seres deludidos, não-Budistas], para a proteção de si próprios, para a
proteção do Dharma Maravilhoso, e para a proteção do Mahayana.
Armados com esse dharani, não temeremos elefantes enfurecidos, ou
quando atravessarmos regiões selvagens, terras pantanosas, ou quais-
quer lugares íngremes; não haverá medo da água, fogo, leões, tigres,
lobos, ladrões ou reis. Oh Honrado pelo Mundo! Armados com este
dharani, ninguém terá medo. Nós protegeremos a pessoa que tenha
este dharani, e ele ou ela será como a tartaruga que guarda seus seis
membros dentro de sua carapaça. Oh Honrado pelo Mundo! Não dis-
semos isto apenas para agradar. Na realidade, nós faremos coisas tais
que aqueles que estiverem armados com este dharani aumentarão o
seu poder. Nós apenas rogamos, Oh Tathagata! Tenha piedade e aceite
nossos últimos oferecimentos.” Então,
o Buda disse à Marapapiyas: “Eu
não aceito o vosso oferecimento; eu já possuo o vosso dharani. Isto é
para fazer com que todos os seres e as quatro classes de pessoas da
Sangha descansem em paz.” Assim dizendo, o Buda caiu em silêncio e
não aceitou os oferecimentos de Marapapiyas. Por três vezes Mahapa-
piyas indagou o Buda para aceitá-los, mas o Buda não o fez. Diante
disto, com suas súplicas não atendidas, Mahapapiyas ficou triste, recu-
ou e postou-se a um lado.

Capítulo 1: Introdução Página 25


Naquela ocasião, lá estava presente Mahesvara Raja com seus inume-
ráveis aparentados e outros devas. Eles carregaram seus vasos de ofe-
reciementos, os quais eram, de longe, maiores que os de Brahma e
Indra, do que aqueles dos anjos guardiões da terra, humanos e devas,
os oito seres e não humanos. Os preparativos que Sakrodevendra fize-
ra pareciam preto contra branco, se tomarmos como comparação o
branco do casco do cavalo, e toda a sua glória (dos preparativos anteri-
ores) desapareceu. Mesmo os menores dos dosséis finamente decora-
dos cobriam 3.000 grandes sistemas de mil mundos. Carregando seus
vasos de oferecimentos, eles vieram para onde o Buda se encontrava,
tocaram seus pés com suas cabeças, circundaram-no incontáveis vezes,
e disseram-lhe: “Oh Honrado pelo Mundo! As coisas desprezíveis que
temos conosco são comparáveis aos oferecimentos nos feitos por
mosquitos e moscas; ou como um homem atirando uma concha de
água no grande oceano; ou como tentar somar uma pequena luz à luz
de 100 mil sóis; ou como tentar, na primavera e verão, quando há mui-
tas flores, adicionar uma única flor à glória de todas as flores; ou tentar
adicionar o esplendor do Monte Sumeru com uma única semente rou-
bada. Como poderia haver qualquer aumento do grande oceano, do
brilho dos sóis, de todas as flores ou do Monte Sumeru? Oh Honrado
pelo Mundo! O pouco que carregamos aqui (para lhe oferecer), bem
pode ser comparado a isto. Realmente, poderíamos oferecer-lhe in-
censo, flores, danças de máscaras, estandartes e dosséis de 3.000
grandes sistemas de mil mundos, mas isto ainda não seria digno de
menção. Por que não? Porque você sempre sofreu as dores nos infeli-
zes domínios do inferno, da fome, da ira e da animalidade. Em razão
disto, Oh Honrado pelo Mundo! Por favor, tenha piedade e, desse mo-
do, aceite nossos oferecimentos.”

Agora, no leste, havia uma terra Búdica, distante tantas terras quanto
às areias de incontáveis, inumeráveis asamkhyas de Rios Ganges, cha-
mada Tranqüila-em-Pensamento-e-Linda-no-Som, e cujo Buda é cha-
mado Igual ao Vazio, Tathagata, Merecedor de Ofertas, de Conheci-
mento Correto e Universal, de Lucidez e Conduta Perfeitas, um Bem-
Aventurado que Compreende o Mundo, um Mestre Insuperável, um
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 26
Herói Justo e Destemido, um Buda, um Honrado pelo Mundo. Naquela
ocasião o Buda falou aos seus principais grandes discípulos: “Vá agora
ao mundo no oeste, chamado Saha. Há um Buda naquele mundo cha-
mado Tathagata Shakyamuni, que é Merecedor de Ofertas, de Conhe-
cimento Correto e Universal, de Lucidez e Conduta Perfeitas, um Bem-
Aventurado que Compreende o Mundo, um Mestre Insuperável, um
Herói Justo e Destemido, um Buda, um Honrado pelo Mundo. Logo ele
entrará no Parinirvana. Bons homens! Levem consigo as comidas fra-
grantes deste mundo, as mais fragrantes e belas, que trazem a paz.
Ofereçam-nas a ele. Tendo feito isto, ele entrará no Parinirvana. Bons
homens! Além disso, curvem-se diante do Buda, façam-lhe perguntas,
e dirimam quaisquer dúvidas que vocês tenham.”

Então, o Bodhisattva Mahasattva do Corpo Incomensurável, dessa


forma, levantou-se do seu lugar, tocou os pés do Buda com sua cabeça,
circundou-o por três vezes, acompanhado de inumeráveis asamkhyas
de Bodhisattvas, deixou aquela terra e veio a este mundo Saha. Nisto,
os três mil grandes sistemas de mil mundos agitaram-se de seis formas,
os cabelos daqueles em assembléia– Brahma, Indra, os quatro anjos
guardiões da terra, Marapapiyas e Mahesvara – arrepiaram diante da
grande agitação da terra, e suas gargantas e lábios ficaram secos de
medo. Eles ficaram tão assustados que tremeram e queriam fugir em
todas as direções. Conforme eles olharam para os seus próprios cor-
pos, a sua luz havia se perdido, e a sua aparência divina desaparecera.
Então, o Dharmarajaputra Manjushri levantou-se e falou àqueles em
assembléia: “Boa gente! Não tenham medo, não fiquem receosos! Por
quê? Ao leste, tão distante quanto às areias de incontáveis, inumerá-
veis asamkhyas de Rios Ganges, há uma terra chamada Tranqüila-em-
Pensamento-e-Linda-no-Som. O nome do Buda naquela terra é Igual ao
Vazio, Merecedor de Ofertas, Samyaksambuddha. Ele possui os dez
atributos do Buda. Existe um Bodhisattva lá, de corpo incomensurável.
Acompanhado de inumeráveis Bodhisattvas, ele deseja vir aqui e fazer
oferecimentos ao Tathagata. Através do poder daquele Buda, seus
corpos agora não brilham mais. Assim, alegrem- se; não temam!” En-
tão, aqueles em assembléia viram um grande número de pessoas da-
Capítulo 1: Introdução Página 27
quele Buda, a quem eles viam como se fossem seus próprios corpos
refletidos num espelho. Então Manjushri disse àqueles em assembléia:
“Agora vocês vêem as pessoas daquele Buda como se vissem o próprio
Buda. Através do poder do Buda, vocês podem ver claramente todos
os inumeráveis Budas das outras nove terras Búdicas.” Diante daquilo,
as pessoas em assembléia disseram umas às outras: “Oh, que dia aflito,
que dia aflito! O mundo está vazio. O Tathagata logo entrará no Pari-
nirvana”.

“Agora, todas as pessoas viram o Bodhisattva do Corpo Incomensurá-


vel e seu séquito. E eles viram que de cada poro da pele daquele Bo-
dhisattva desabrochava uma grande flor de lótus, cada uma delas con-
tendo 78 cidades-castelo. Nos sentidos transversal e longitudinal, cada
castelo correspondia ao Castelo do Vaisali. As paredes e fossos dos
castelos eram forrados com os sete tesouros. Lá havia avenidas orna-
mentadas com sete fileiras de árvores tala. As pessoas eram ativas,
pacíficas, ricas, e era muito confortável viver naquela terra. Cada caste-
lo era de ouro de Jambunada (Jambunadasuvarna). Cada umcontinha
árvores dos sete tesouros. A vegetação era exuberante, e ricas eram as
flores e frutos. Uma brisa suave soprava, emitindo um suave som, co-
mo de uma música celestial. As pessoas do castelo, ouvindo aqueles
sons, sentiam enorme prazer. Os poços eram cheios de uma água ma-
ravilhosa. Ela era pura, fragrante e parecia água-marinha (berílio azul).
Na água, barcos dos sete tesouros podiam ser vistos. As pessoas esta-
vam navegando neles. Eles banhavam-se e divertiam-se. Assim, desfru-
tavam de um prazer sem fim. Além disso, havia flores de lótus de várias
cores tais como a utpala (azul), kumuda(noturna, quefloresce ao lu-
ar), padma (vermelho), pundarika (branco). Elas eram como grandes
rodas vistas no sentido transversal e longitudinal. Acima dos fossos
havia muitos jardins. Em cada um deles havia cinco lagos, nos quais se
via novamente as tais flores de utpala, kumuda, padma e pundarika,
semelhantes a grandes rodas vistas no sentido transversal e longitudi-
nal. Elas eram fragrantes e agradáveis. A água era pura e suave ao to-
que. Nela podiam ser vistos plovers, gansos selvagens e patos manda-
rim nadando. Havia lá caramanchões de pedras preciosas, cada um dos
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 28
quais perfeitamente quadrados, cobrindo uma área de sete yojanas
quadradas. Todas as paredes eram feitas de quatro tesouros: ouro,
prata, água-marinha e cristal. Em toda a volta havia janelas, treliças e
corrimãos de ouro puro. O chão era coberto de kumshuka (rubi - pala-
vra do Sanscrito que significa flores de jóias vermelhas - anãs do tur-
quistão) em meio a ouro em pó. No palácio havia muitos córregos,
nascentes e lagos para banho feitos dos sete tesouros. Cada muralha
lateral tinha 18 degraus de escada de ouro. As plantas (plantain, espé-
cie de bananeira) eram de ouro de Jambunada (Jambunadasuvarna) e
semelhantes aos jardins suspensos do Céu Trayastrimsa. Cada um da-
queles castelos acomodava 80 mil reis e cada rei tinha consigo inume-
ráveis consortes e governantas. Todos estavam divertindo-se, e eram
satisfeitos e felizes. O mesmo aplicava-se às outras pessoas que esta-
vam divertindo-se onde eles viviam. As pessoas não ouviam outro en-
sinamento que não fosse o Insuperável Mahayana. Sobre cada flor
estava um Trono de Leão (simhasana), com cada um dos pés feito de
água-marinha (berílio). Em cada assento estava estendido um tecido
branco de seda leve. O tecido era maravilhoso, insuperável em todos
os três mundos. Em cada assento encontrava-se um rei pregando o
Mahayana para as pessoas. Alguns estavam segurando livros em suas
mãos, recitando, e praticando a Via. Dessa forma, os sutras Mahayana
tornaram-se popularizados. O Bodhisattva do Corpo Incomensurável
permitiu que inumeráveis pessoas caminhassem por lá, se satisfizes-
sem e abandonassem os prazer es mundanos. Todos disseram: “Que
dia aflito, que dia aflito! O mundo está vazio. O Tathagata logo entrará
no Nirvana.”

Então, o Bodhisattva de Corpo Incomensurável, seguido por inumerá-


veis Bodhisattvas e com o seu poder divino e maravilhoso, carregou
inúmeros e diferentes recipientes de oferecimentos, abarrotados com
finas e maravilhosamente fragrantes delícias. Ao sentir a fragrância
daquelas comidas, todas as manchas da ilusão se desfizeram. Em razão
do poder divino do Bodhisattva, as pessoas viram todas aquelas trans-
formações. O tamanho desse Bodhisattva de Corpo Incomensurável
era ilimitado, era como o espaço em si. Com exceção do Buda, nin-
Capítulo 1: Introdução Página 29
guém realmente podia ver o tamanho corporal desse Bodhisattva. Os
oferecimentos desse Bodhisattva de Corpo Incomensurável eram o
dobro daqueles que lhes precederam e, assim, eles vieram para onde o
Buda se encontrava. Eles tocaram os pés do Buda, juntaram suas mãos,
prestaram-lhe homenagem e disseram: Oh Honrado pelo Mundo! Por
favor, tenha piedade e aceite nossos ferecimentos.”
o O Tathagata,
ciente da ocasião, permaneceu em silêncio e não os aceitou. Por três
vezes eles indagaram, mas ele não os aceitou. Dessa forma, o Bodhi-
sattva de Corpo Incomensurável e seu séquito recuaram e postaram-se
a um lado. O mesmo foi o caso do Bodhisattva de Corpo Incomensurá-
vel de todas as Terras Búdicas ao sul, oeste e norte. Eles carregaram
oferecimentos duas vezes maiores que aqueles que lhes precederam.
Vieram para onde o Buda se encontrava, recuaram e postaram-se a um
lado. Todos procederam dessa maneira.

Então, já não restava qualquer espaço na auspiciosa terra da felicidade


entre as árvores sala, dentro de uma área de 32 yojanas quadradas, e
que não estivesse repleto de pessoas. Naquela ocasião, todo o espaço
ao redor do Bodhisattva de Corpo Incomensurável e seu séquito, que
vieram juntos dele dos quatro quadrantes, parecia estar preenchido
com pontos do tamanho de um grão de poeira, ou do furo de uma
agulha. Todos os grandes Bodhisattvas de todas as inumeráveis Terras
Búdicas das dez direções estavam reunidos lá. Além disso, todas as
pessoas do Jambudvipa estavam reunidas lá, com exceção da dupla
Mahakashyapa e Ananda, e também de Ajatasatru e seu séquito, ser-
pentes venenosas que atacam pessoas, besouros de excrementos,
víboras, escorpiões e as dezesseis espécies de depravados do mal. Os
danavats e asuras tinham todos abandonado suas intenções malignas e
tinham tornado-se de pensamentos compassivos. Assim como pais,
mães, velhos e jovens; todas as pessoas dos três mil grandes sistemas
de mil mundos juntaram-se e falaram umas às outras com o mesmo
sentimento compassivo, exceto os icchantikas.

Então, através do poder do Buda, os três mil mundos tornaram-se sua-


ves ao toque. Lá não havia mais montanhas, areia, cascalho, pragas ou
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 30
plantas venenosas; mas tudo estava adornado com vários tesouros
como no caso do Paraíso Ocidental de paz e felicidade do Buda Amita-
yus. Naquela ocasião, todos os que haviam congregado-se lá viram o
incontável número de Terras Búdicas como se vissem suas formas re-
fletidas num espelho. O mesmo foi o caso de quando eles viram as
terras de todos os Budas.

A luz que foi emitida da face do Tathagata era composta de cinco co-
res, e resplandeceu sobre toda a grande congregação, tal que obliterou
a luz que vinha do corpo (da assembléia). Tendo feito isto, ela retornou
para o Buda, penetrando-lhe através da sua boca. Então, os seres ce-
lestiais e todos aqueles na assembléia, asuras e outros, ficaram muito
receosos quando viram a luz do Buda penetrar-lhe através da sua boca.
Seus cabelos arrepiaram. Disseram: “A luz do Tathagata surgiu, voltou e
entrou nele. Isto não é sem razão. Isto indica que o Buda fez o que ele
pretendia fazer nas dez direções e, agora, entraráno Nirvana como
seu último ato. Este deve ser o que ele tenta sinalizar para nós. O mun-
do está aflito, o mundo está aflito! Por que é que o Honrado pelo
Mundo abandonou as quatro intenções ilimitadas e não aceitou os
ofereciementos tanto de humanos como de seres celestiais? Agora a
luz da Sabedoria está indo embora para sempre. Agora, o insuperável
navio do Dharma está naufragando. Ah, que dor! O mundo está aflito!”
Eles levantaram suas mãos, bateram em seus peitos, e tristemente
choraram e gritaram. Seus membros tremiam, e eles não sabiam como
se suportarem. O sangue jorrava de seus corpos e corria sobre o chão.”

Capítulo 1: Introdução Página 31


Capítulo Dois: Sobre Cunda

A Parábola da Terra Fértil

“Naquela ocasião, encontrava


-se presente na assembléia um monge
que
Cundaeraera
filho de nome.
o seu um artesão das fortificações
Ele estava lá com seus da cidade de Kushinagar.
companheiros, quinze ao
todo. No sentido de que o mundo gerasse bons frutos, ele abandonou
todos os adornos do corpo, levantou-se, descobriu o seu ombro direito,
colocou o seu joelho direito no chão, juntou as palmas das mãos e
olhou fixamente para o Buda. Triste e chorosamente, ele tocou os pés
do Buda com sua cabeça e disse: ‘Oh Honrado pelo Mundo! Por favor,
tenha piedade, aceite nossos últimos oferecimentos e acuda inumerá-
veis seres. Oh Honrado pelo Mundo! De agora em diante, não temos
mais um mestre, nem pais, nem salvação, nem proteção, nenhum lugar
para tomar refúgio, e nem um lugar para onde ir; nos tornaremos po-
bres e famintos. Seguindo o Tathagata, desejamos obter comida para
os dias que virão. Por favor, tenha piedade e aceite nossos humildes
oferecimentos e, então, entre no Nirvana. Oh Honrado pelo Mundo! É
como no caso de um Kshatriya, Brahmin, Vaishya ou Sudra que, sendo
pobre, viaja para um país distante. Ele trabalha no campo e ganha uma
vaca amestrada. A terra é boa, plana e extensa. Não há pobreza, nem
solo arenoso, nem ervas daninhas, nem aridez e nenhuma degradação.
É necessário apenas esperar a chuva dos céus. Dizemos ‘vaca amestra-
da’. Isto pode ser compreendido como as sete ações do corpo e da
boca; e a terra boa, plana e extensa pode ser compreendida como
Sabedoria. Acabar com o solo pobre, ervas daninhas, aridez e degrada-
ção refere-se à Ilusão, a qual devemos acabar com ela. Oh Honrado
pelo Mundo! Agora, temos conosco a vaca amestrada e o bom solo,
temos cultivado a terra e acabado com as ervas daninhas. Agora, estou
esperando apenas que a doce chuva do Dharma do Tathagata me visi-
te. As quatro castas da pobreza nada mais são que o corpo carnal que
possuo. Sou pobre, pois não possuo o soberbo tesouro do Dharma.
Rogo que tenha piedade e elimine a nossa pobreza, miséria, e livre-nos,

Capítulo 2: Sobre Cunda Página 33


bem como a inumeráveis seres, das nossas tristezas e preocupações.
Os oferecimentos que faço são insignificantes. Mas, penso que eles
satisfarão ao Tathagata e à Sangha. Agora, não tenho mais mestre,
nem pais, e nem refúgio. Por favor, tenha piedade de nós, assim como
teve de Rahula’.”

Oferecimentos de Alimentos

Então, o Honrado pelo Mundo, o todo Iluminado, o Mestre Insuperá-


vel, disse a Cunda: “Isto é bom, bom de fato! Eu agora arrancarei as
raízes da sua pobreza e farei cair sobre o seu campo da vida carnal a
insuperável chuva do Dharma, e evocarei o broto do Dharma. Seu de-
sejo agora é obter de mim a vida, o corpo, o poder, a paz, e a fala sem
impedimentos (eloqüência). E eu darei a você a imortalidade, o corpo,
o poder, a paz, e a fala sem impedimentos. Por quê? Oh Cunda! Nos
oferecimentos de alimentos há dois frutos que sabemos não ter distin-
ção. Quais são os dois? Primeiramente, atinge-
se o ‘anuttarasamyak-
sambodhi’ quando se os recebe; em segundo lugar, entra-se no Nirva-
na após recebê-los. Eu agora receberei vossos últimos oferecimentos e
vos permitirei completar o danaparamita.”

Nisto, Cunda disse ao Buda: “Você diz que não há diferença entre os
frutos daqueles oferecimentos. Mas, isto não é assim. Por que não?
Porque na primeira instância de recebimento de dana [a doação por
caridade], ainda não se acabou com a ilusão e ele ainda não atingiu o

pleno
frutemconhecimento. E eleQuanto
do danaparamita. ainda não pode
a esta fazer com
segunda que os
e última seres des-
instância do
recebimento, a ilusão já se acabou e ele atingiu o pleno conhecimento,
podendo levar todos os seres a serem abençoados igualmente com o
danaparamita. Aquele que recebe os oferecimentos em primeira ins-
tância ainda é um ser comum, mas o último (em segunda instância) é
um ser celestial. Alguém que receba dana em primeira instância é a-
quele com: 1) um corpo alimentado por vários tipos de comida, 2) um

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 34


corpo de ilusão, 3) um corpo onde ainda há remanescências (como
resultado) da ilusão, e 4) um corpo não-eterno. Uma pessoa que rece-
ba dana em segunda instância possui: 1) o corpo da desilusão, 2) o
Corpo Adamantino (incorruptível), 3) o Corpo do Dharma, 4) o corpo
eterno, e 5) o corpo incomensurável. Como pode alguém dizer que os
resultados (os frutos) do dana recebido nas duas instâncias são unos e
não diferentes? A pessoa que recebe dana em primeira instância é
alguém ainda não realizado desde o danaparamita até o prajnaparami-
ta. Ele possui apenas os olhos físicos (com os quais nasceu), mas não o
olho Búdico, e nem o olho da Sabedoria. O caso da pessoa que recebe
dana na segunda instância é aquele de alguém realizado desde o dana-
paramita até o prajnaparamita, e também desde o olho físico até o
olho da Sabedoria. Como podemos dizer que os resultados dos dois
danas são os mesmos e que não há diferença? Oh Honrado pelo Mun-
do! No caso da primeira instância, aquele que recebe dana toma refei-
ções que vão para o seu abdômen e lá são digeridas, ele ganha a vida, o
corpo carnal, poder, desenvoltura e a fala sem impedimentos. No se-
gundo caso, a pessoa não come, nem digere, e não resulta nas cinco
coisas (citadas acima). Como podemos dizer que os resultados dos dois
danas são o mesmo e não diferentes?

O Buda disse: “Oh bom homem! O Tathagata, desde inumeráveis, n- i


comensuráveis asamkhyas de kalpas atrás, já não tinha o corpo alimen-
tado por comida e ilusão, e nem tinha o corpo onde houvesse rema-
nescência (como resultado) da ilusão. Ele é o Eterno, o Corpo do
Dharma, e o Corpo Adamantino. Oh Bom homem! Aquele que ainda
não viu a ‘Budeidade’ é chamado corpo -de-ilusão, o corpo alimentado
por vários tipos de comida, e o corpo onde ainda há remanescências
como resultado da ilusão. O Bodhisattva, como ele participa da comida
[que lhe é oferecida antes da Iluminação], adentra o Samadhi Adaman-
tino. Quando aquela comida é digerida, ele vê a ‘Budeidade’ e atinge o
insuperável Bodhi (Iluminação). Este é o porque digo que os resultados
dos dois danas são iguais e que eles não são diferentes. O Bodhisattva,

Capítulo 2: Sobre Cunda Página 35


1
naquele momento, subjuga os quatro Maras [ilusão, skandhas , morte
e o demônio celestial]. Então, ao entrar no Nirvana, ele subjuga os
quatro Maras. Este é o porquê digo que os resultados dos dois danas
são iguais e que eles não são diferentes. O Bodhisattva, naquela ocasi-
ão, ainda não discorre fluentemente acerca dos 12 tipos de sutras Bu-
distas, mas ele já é versado neles. Agora, após sua entrada no Nirvana,
ele fala expansivamente deles para benefício de todos os seres. Este é
o porquê digo que os resultados dos dois danas são iguais e que eles
não são diferentes. Oh bom homem! O corpo do Tathagata já não par-
ticipa de comida e bebida há inumeráveis asamkhyas de kalpas. Mas,
para o benefício de todos os Sravakas [Ouvintes dos ensinamentos do
Buda], digo que tomei o mingau de leite cozido oferecido por Nanda e
Nandabala, as duas mulheres-pastoras, e que, em seguida, atingi o
insuperável Bodhi. Mas, na realidade, eu não o tomei. Agora, para o
benefício das pessoas congregadas aqui, eu aceitarei os vossos ofere-
cimentos. Mas, na realidade, não compartilharei deles.”

Então, ouvindo que o Buda, Honrado pelo Mundo, para o benefício das
pessoas congregadas lá, aceitaria os últimos oferecimentos de Cunda,
eles sentiram-se radiantes e cheios de satisfação, e disseram em lou-
vor: “Quão maravilhoso, quão maravilhoso! Isto é raro,h Cunda!
o Você
agora tem um nome; seu nome não servia para nada. Cunda significa
‘compreensão dos maravilhosos significados’! Agora você estabeleceu
tão grande significado. Você revelou que é verdadeiro, você está em
concordância com o significado, e ganhou seu nome. Este é o porquê
de você ser Cunda. Você, agora, nesta vida, ganhará um grande nome,
benefícios, virtudes e votos. É raro, oh Cunda, nascer como um huma-
no e alcançar o insuperável benefício que é o mais difícil de encontrar.

1 Os Cinco Agregados que compõem um ser ou indivíduo são os seguintes:


1. A matéria
(corporalidade); 2. As sensações; 3. Aspercepções; 4. As formações mentais; 5. A
consciência. Estes cinco agregados abrangem dois grupos (nama-rupa) que são: o
agregado da matéria, o corpo físico (rupa), que é objetivo, e os agregados mentais
(nama), que são subjetivos e se compõem das sensações, percepções, formações e
consciência.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 36


Isto é bom, oh Cunda! Você é a Udumbara, sobre a qual se diz florescer
somente em muito raras ocasiões. É muito raro o aparecimento do
Buda no Mundo. É também muito difícil encontrar-se com o Buda,
obter a fé, e ouvir sermões. É mais difícil ainda conseguir fazer os ofe-
recimentos finais a ele por ocasião da sua entrada no Nirvana e ser
bem sucedido nisto. Muito bem, muito bem, oh Cunda! Agora você
completou o danaparamita. Isto é como no décimo-quinto mês do
outono, quando a lua está limpa e cheia, quando não há vestígio de
nuvens no céu, e todos os seres olham para cima em louvor. O mesmo
é o caso com você, para quem olhamos e louvamos. O Buda agora
recebe seus últimos oferecimentos e o faz completar o danaparamita.
Oh, muito bem, oh Cunda! Dizemos que você é como a lua cheia, para
a qual todas as pessoas olham. Muito bem, oh Cunda! Embora huma-
no, a sua mente é do Buda. Oh Cunda! Você é verdadeiramente como
o filho do Buda, Rahula. Não há diferença.”

Então, aqueles que lá estavam congregados disseram em versos:


“Embora nascido como humano, você agora reside acima do sexto céu.
Eu e todos os outros, portanto, o louvamos e oramos.
O mais sagrado dos humanos agora entra no Nirvana. Perdoe-nos e,
rapidamente,
implore ao Buda para permanecer em vida ainda um longo tempo,
para beneficiar inumeráveis seres,
para transmitir-lhes o insuperável maná do Dharma que louva a Sabe-
doria.
Se você não implorar ao Buda, nossa vida não será perfeita.
Em razão disto, curvamo-nos ao chão,
em homenagem ao Mestre Insuperável.”

Em razão disto, Cunda ficou cheio de alegria! Ele ficou como no caso de
um humano cujos pais haviam falecido de repente, e que subitamente
retornam. Assim é como Cunda se sentia. Ele levantou-se novamente,
curvou-se diante do Buda, e disse em versos:

Capítulo 2: Sobre Cunda Página 37


“Sou grato por ter oc nquistado minha Via;
é bom que eu tenha nascido como humano.
Acabei com a ganância e a ira;
estou apartado para sempre dos três maus caminhos.
Sou grato por ter ganhado benefícios
e me encontrado com a bola de ouro do tesouro,
que eu agora me encontre com o Mestre
e que não tenho medo, mesmo que venha a ganhar a vida no reino
animal.
O Buda é uma Udumbara, por assim dizer, difícil de encontrar,
e difícil de ter fé.
Uma vez que o tenhamos encontrado e praticado a Via,
acabamos com as tristezas dos espíritos (pretas) famintos.
Além disso, ele subjuga completamente os asuras e outros.
É mais fácil balançarmos uma semente de mostarda na ponta de uma
agulha
do que encontrar a aparição de um Buda neste mundo.
O Buda não é manchado pelos caminhos mundanos.
Ele é como um lótus (nenúfar, lírio d’água, ninféia) na água.
Estou completamente livre das raízes do mundo secular
e atravessei as águas do nascimento e da morte.

A Erva Daninha

É difícil nascer como humano;

mais difícil
É como no ainda é encontrar
caso de o Buda
uma tartaruga quando
cega que, ele aparece no mundo.
em meio ao oceano, consiga acertar o furo de um tronco de madeira
flutuante.
Eu agora ofereço comida e rogo que alcançarei a insuperável recom-
pensa,
que destruirei as amarras da ilusão,
e que ela (a ilusão) não será mais forte.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 38


Não procuro aqui obter um corpo celestial.
Mesmo que o tivesse ganhado, minha mente não estaria satisfeita.
O Tathagata aceita este meu oferecimento.
Nada poderia me satisfazer mais.
É como no caso de uma erva daninha mal-cheirosa,
mas que exala uma fragrância de madeira de sândalo.
Eu sou aquela erva daninha.

O Tathagata aceita meus oferecimentos.


Isto é como a fragrância que exala de uma madeira de sândalo.
Este é o porquê de estar jubiloso.
Agora, nesta vida, estou agraciado com a mais elevada recompensa.
Shakra, Brahma e todos os outros venham e façam oferecimentos para
mim.

Todos os mundos estão profundamente preocupados,


uma vez que agora sabem que o Buda entrará no Nirvana.
Eles clamam ruidosamente:
“Agora nãohá mais um Mestre no mundo;
não despreze todos os seres;
veja-os como se visse a um filho único!”

O Sol Búdico e as Nuvens de Samsara

O Tathagata, em meio aos Monges, fala do soberbo Dharma.

Isto
que pode ser bem
permanece comparado
não molestadoao Monte
em meio Sumeru,
ao grande oceano.
A Sabedoria do Buda desfaz completamente o desalento dos humanos.

É como quando o sol se levanta, todas as nuvens dispersam,


e a sua luz resplandece sobre tudo.
O Tathagata acaba completamente com todas as ilusões.

Capítulo 2: Sobre Cunda Página 39


Isto (a vida mundana) é como o frescor que reina
quando as nuvens aparecem no céu.
Todos os seres amam e choram.
Todos se debatem nas águas amargas do nascimento e da morte.

Por esta razão, rogo, Oh Honrado pelo Mundo!


Permaneça vivo por mais tempo e aumente a fé de todos os seres,
libertando-os do sofrimento da nascimento e da morte!”

O Buda disse a Cunda: “É assim, é assim! É tudo como você diz. É raro
que o Buda apareça no mundo. É como no caso da Udumbara. É tam-
bém difícil encontrar-se com o Buda e adquirir fé. Estar presente no
momento da entrada do Buda no Nirvana, para oferecer-lhe comida e,
assim, realizar o danaparamita é ainda mais difícil. Oh Cunda! Não fi-
que triste agora. Seja grato por ter feito os oferecimentos finais ao
Tathagata agora, e por ter realizado bem o danaparamita. Não indague
o Buda sobre permanecer mais tempo em vida. Você agora deve medi-
tar sobre o mundo de todos os Budas. Tudo é não-eterno (imperma-
nente). O mesmo ocorre com todas as coisas criadas, suas naturezas e
características.”

Para o benefício de Cunda, ele disse em versos:

“Em todos os mundos,


aquilo que nasce deve morrer.
A vida parece longa, mas, por natureza,
tem de haver um fim.
Tudo o que floresce sempre desvanece;
encontra, deve partir.
O explendor (clímax) do ser humano não é longo;
a exuberância encontra-se com a doença.
A vida é devorada pela morte;
nada existe eternamente.
Todos os Reis são soberanos;
ninguém pode competir (com eles).
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 40
Ainda assim, todos devem perecer;
e assim é com a vida.
O sofrimento não encontra um fim;
e sem um fim a roda gira e gira.
Nenhum dos três mundos
[da matéria, do espírito e do desejo] é eterno;
E tudo o que existe não é feliz.
O que existe possui uma natureza e características.

Tudo é vazio.
Aquilo que é destrutível vem e vai;
Apreensões e doenças se sucedem
(uma segue os passos da outra).
O temor de todos os erros e más ações,
velhice, doença, morte e o declínio causam preocupações.
Todas as coisas não existem para sempre,
e elas facilmente acabam.
Os ressentimentos as atacam;
todos (os ressentimentos) estão cheios de ilusão,
como no caso do bicho-da-seda e do casulo.

Ninguém que tenha sabedoria


encontra prazer num lugar como este.
Este corpo carnal é onde o sofrimento se instala.
Tudo é impuro, como tumores,
carbúnculos, furúnculos e semelhantes.
Nenhuma razão está por baixo.
E o mesmo se aplica àqueles (seres) celestiais sentados acima.
Todos os desejos não terminam.

Assim, eu não me apego.


Descartados os desejos, medite bem,
atinge-se o Dharma Maravilhoso,
e aquele que, definitivamente, eliminou o ‘ser’ (existência samsarica),
pode hoje ganhar o Nirvana.
Capítulo 2: Sobre Cunda Página 41
Eu transpassei para aoutra margem do ‘ser’,
e permaneço acima de todas as tristezas.
Assim, eu colho este soberbo Êxtase”.

Então, Cunda disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! É assim, és- a
sim. É tudo como você, o Sagrado, diz. A sabedoria que possuo é des-
prezível e de baixo grau. Sou como um mosquito ou mosca. Como pos-
so contemplar as profundezas do Nirvana do Tathagata? Oh Honrado
pelo Mundo! Agora sou como qualquer naga ou elefante de um Bodhi-
sattva Mahasattva que cortou os vínculos da ilusão. Sou como o Dhar-
marajaputra Manjushri. Oh Honrado pelo Mundo! É como alguém que
entra para a Ordem (dos Monges) ainda muito jovem. Embora mante-
nha os preceitos, aquela pessoa ainda é apenas da classe ordinária de
Monges. Eu, também, sou como aquela pessoa. Devido ao poder do
Buda e dos Bodhisattvas, sou agora um dos numerosos séquitos de tais
grandes Bodhisattvas. Este é o porquê de ter implorado ao Tathagata
para permanecer por mais longo tempo em vida e não entrar no Nirva-
na. Isto é semelhante a um homem faminto e ferido que nada mais
tem para expelir. Eu somente rogo que esse será o caso com o Honra-
do pelo Mundo, e que ele permanecerá por mais longo tempo em vida
e não entrará no Nirvana.

Então, Dharmarajaputra Manjushri disse a Cunda: “Oh Cunda! Agora,


não fale dessa forma implorando ao Tathagata para permanecer por
mais tempo em vida e não entrar no Parinirvana, como no caso do
faminto que nada mais tem a expelir. Isto não pode ser. Agora você
deveria ver a natureza e características de todas as coisas. Vendo as
coisas assim, você ganhará o Samadhi do Todo-Vazio. Se você deseja
atingir o Dharma Maravilhoso, aja assim!”

Cunda indagou: “Oh Manjush ri! O Tathagata é o Mais Sagrado e o mais


elevado de todos os céus e terra. O Tathagata como tal, poderia ser
alguém que é criado? Se ele é alguém criado, ele não poderia ser dife-
rente da existência samsarica. Espuma, por exemplo, forma-se rapida-
mente e se desfaz rapidamente; as idas e vindas [de todas as coisas]
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 42
são como o giro de uma roda. Tudo o que é criado é assim. Eu ouço
que os devas têm a vida mais longa. O Honrado pelo Mundo é o céu
dos céus. Como ele poderia ter uma vida tão curta a ponto de não atin-
gir os 100 anos? O chefe da aldeia é soberano no poder, e através disso
ele pode atender ao povo. Mas, quando as virtudes o abandonam, ele
torna-se pobre e medíocre. Então, ele será visto de cima para baixo,
será chicoteado e o farão trabalhar para os outros. Por quê? Porque
seu poder acabou. O mesmo é o caso com o Honrado pelo Mundo. Ele
é como todas as coisas compostas. Se ele é igual a todas as coisas com-
postas, ele não pode ser o céu dos céus. Por que não? Porque todas as
coisas são existências que devem sofrer pelo nascimento e pela morte.
Portanto, oh Manjushri! Não coloque o Tathagata no mesmo nível de
todas aquelas coisas que são compostas. E mais, oh Manjushri! Você
pensa isto [de fato] e fala assim? Ou é algo que você conhece, e diz que
o Tathagata está no mesmo nível de todas aquelas coisas compostas.
Se o Tathagata está no mesmo nível de todas as coisas compostas, não
podemos chamá-lo de céu dos céus ou de Soberano Rei do Dharma dos
três mundos. Por exemplo, um rei pode ser um homem de grande
força. Seu poder é igual ao daquele de mil pessoas e ninguém pode
vencê-lo. Assim, esta pessoa é chamada como aquele que possui o
poder de um milhar de pessoas. Por tais qualidades ele é adorado.
Assim, lhe é conferida uma distinção lisonjeira, juntamente com um
feudo. Feudos e recompensas fluem para ele abundantemente. Esta
pessoa é chamada como aquele cujo poder é igual ao de um milhar de
pessoas. Ele não é exatamente igual a mil pessoas. Mas, o que ele faz
vale muito. Por essa razão dizemos que ele é igual a um milhar de pes-
soas. O mesmo é o caso do Tathagata. Ele subjuga as ilusões de Mara, o
Mara dos cinco agregados, o Mara do (sexto) Céu, e o Mara da Morte.
Este é o porquê lhe chamamos de o mais honrado dos três mundos.
Isto é como no caso de um homem cujo poder se iguala ao de mil pes-
soas. Dessa forma, ele é dotado de várias, incontáveis virtudes verda-
deiras. Este é o porquê de lhe chamarmos Tathagata, Merecedor de
Ofertas e Todo Iluminado. Oh Manujushri! Você não deve presumir,
imaginar e falar acerca daquilo que pertence ao mundo do Tathagata
como sendo igual àquilo que é composto. Por exemplo, um homem
Capítulo 2: Sobre Cunda Página 43
muito rico gera um filho; e um áugure (adivinho) vaticina que essa cri-
ança não irá sobreviver. Os pais ouvem isto e sabem que a criança não
será capaz de herdar o patrimônio da família, e olham sobre aquela
criança como se fosse sobre a relva. Ora, uma pessoa que viveu bre-
vemente não é muito respeitada por Sramanas, Brahmins, homens,
mulheres e pessoas em geral, grandes ou pequenas. Se o Tathagata é
colocado no mesmo nível daqueles que são compostos, ele não pode
ser respeitado por todo o mundo, seres humanos ou celestiais. O que o
Tathagata fala acerca disso é quenão muda e não é diferente. Isto é o
verdadeiro Dharma. Não há ninguém que (o) receba. Por isso, oh Man-
jushri! Não diga que o Tathagata é o mesmo que qualquer coisa com-
posta.

E mais, oh Manjushri! É como no caso de uma mulher pobre que não


tem uma casa para morar e ninguém para cuidar dela. Além disso, ela
está muito doente e faminta. Então, ela vagueia, implora por comida,
fica na casa dos outros, e dá à luz uma criança. O dono da casa a põe
para fora. Segurando a sua criança, ela decide ir para o estrangeiro. No
caminho, ela depara com uma grande tempestade; e o frio lhe acome-
te. Mosquitos, moscas, abelhas e insetos venenosos atacam-lhe ruido-
samente. Ela carrega sua criança e deseja atravessar o Ganges. A cor-
renteza é forte, mas ela segura a criança e não a deixa escapar do do-
mínio dela. Ambos, a mãe e a criança morrem. Esta mulher, em razão
da sua ação compassiva, após a sua morte, nasce no céu Brahma. Oh
Manjushri! Qualquer bom homem que deseje guardar o Dharma Ma-
ravilhoso não deve dizer: ‘O Tahtagatha é como todas as coisas’ ou ‘ele
não é assim’. Essa pessoa deveria somente reprovar o seu próprio ego
e pensar: ‘Sou um ignorante; não possuo os olhos da Sabedoria.’ O
Dharma Maravilhoso do Tathagata não pode ser concebido por todos.
Em razão disto, não é adequado para nós dizer que o Tathagata é de
fato uma coisa definitivamente composta, ou uma coisa que não é
composta. O que é correto dizer é: ‘O Tathagata é definitivamente Não
Composto [aquilo que não é criado]. Porque para nós, os seres, o bem
emana e flui a partir de uma mente compassiva. Isto é como no caso da
pobre mulher que, por amor à sua criança, sacrificou a si própria. Oh
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 44
bom homem! Com o Bodhisattva que guarda o Dharma é assim. Po-
demos sacrificar a nós próprios, mas não podemos dizer que o Tatha-
gata é igual ao composto. Podemos dizer que o Tathagata é um Não
Composto. Dizendo que o Tathagata é um Não Composto, ganhamos a
Iluminação insuperável. Isto é como no caso da mulher nascida no Céu
Brahma. Por quê? Através da proteção ao Dharma. O que queremos
dizer com proteção ao Dharma? Ora, dizer que o Tathagata é um Não
Composto. Oh bom homem! Emancipação não é algo que se procure,
contudo ela vem de si mesmo. É como no caso da pobre mulher que
não procurou nascer no céu Brahma, todavia Brahma responde. É as-
sim. Oh Manjushri! Uma pessoa pode estar empreendendo uma longa
viagem. No caminho, ela fica muito cansada e se hospeda na casa de
uma outra pessoa. Enquanto ela está dormindo, um grande incêndio se
irrompe. Rapidamente ela se levanta e pensa: “Agora, certamente
morrerei.” Como ela se arrepende, ela veste
-se rapidamente. Ela morre
e vem a renascer no Céu Trayastrimsa. Então, após 80 renascimentos,
ela torna-se um Grande Brahma. Após 100 mil renascimentos, ela volta
a renascer como um humano e torna-se um Chakravartin [um grande
monarca do mundo]. Esta pessoa não ganha a vida nos três maus do-
mínios da existência. A vida se repete, e ela nasce em lugares onde a
paz sempre reina. Esta é a forma como as coisas acontecem. Em razão
disto, alguém que sinta arrependimento deveria, oh Manjushri, medi-
tar sobre o Buda, mas nunca pensar a seu respeito como sendo o
mesmo que aquilo que é composto. Oh Manjushri! Os tirthikas [seres
deludidos, não-Budistas] e aqueles de mentes distorcidas podem dizer
que o Tathagata é o mesmo que os seres compostos. O Monge que
observa os preceitos não deveria pensar que o Tathagata é uma exis-
tência criada. Caso diga que o Tathagata é algo criado, isto nada mais é
que uma falsa declaração. Após a morte, tal pessoa cairia no inferno,
tão seguramente quanto alguém que está em sua própria casa. Oh
Manjushri! O Tathagata, de fato, é uma Não Criação. Não devemos
dizer que ele é um ser criado. Você deveria, doravante, nesta vida de
nascimento e morte, abandonar a ignorância e dar lugar à correta Sa-
bedoria. Saber bem que o Tathagata é um Não Criado. Aquele que

Capítulo 2: Sobre Cunda Página 45


medita muito sobre o Tathagata estará realizado nos 32 sinais de per-
feição e atingirá Iluminação Insuperável.”

Então, Dharmarajaputra Manjushri elogiou Cunda e disse: “Falaste


bem, falaste bem, Oh bom homem! Você já fez aquilo que lhe propor-
cionará uma vida eterna. Você sabe bem que o Tathagata é Eterno e
Imutável, e é Não Composto (Não Criado). Você agora protegeu bem a
existência de forma-criada do Tathagata. Alguém que se encontre num
incêncio cobre seu corpo com roupas em razão do arrependimento.
Este bom pensamento o faz ganhar o nascimento no Céu Trayastrimsa.
Ele torna-se um Brahma e um Chakravartin, e não renasce nos maus
domínios da existência e, assim, sempre desfrutará de paz. Essa é a
forma como as coisas virão acontecer com você. Como você protegeu
bem a forma-criada do Tathagata, nos dias que virão você obterá os 32
sinais de perfeição (marcas distintivas), as 80 marcas menores de exce-
lência, e as 18 características peculiares somente ao Buda. Sua vida
tornar-se-á eterna, sem mais amarras com o Samsara. Haverá sempre
um eterno fluxo de paz e felicidade, e não tardará o dia em que você
despertará na luz do Merecimento de Ofertas e da Perfeita Iluminação.
Oh Cunda! O Tathagata em si falará mais expansivamente sobre isso
mais tarde. E você e eu protegeremos o corpo-criado do Tathagata.
Deixemos de lado, por ora, questões sobre criado e não-criado.

Você deveria, como você próprio vê, rapidamente oferecer alimentos.


Oferecer assim é o melhor de todos os oferecimentos. Os Monges,
Monjas, Leigos e Leigas podem ter empreendido uma longa viagem;
eles podem estar extremamente cansados. Dê-lhes as coisas mais pu-
ras como exigido. A doação expressa é uma coisa fundamental para se
completar o danaparamita. Oh Cunda! Dê os oferecimentos finais ao
Buda e à Sangha, mais ou menos, cheios ou não, mas rapidamente
como a ocasião requer. O Tathagata logo entrará no Parinirvana”.

Cunda disse: “Oh Manjushri! Porque é que você cuida tão avidamente
da comida e me faz dar mais ou menos, cheio ou não cheio, em respos-
ta às exigências da ocasião? Oh Manjushri! No passado, o Tathagata
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 46
praticou penitências por seis anos e se sustentou. Por que ele não o
faria agora quando se trata apenas de questão de um momento. Oh
Manjushri! Você disse que o Tathagata, o Perfeitamente Iluminado,
verdadeiramente pretende aceitar essa refeição? Mas eu definitiva-
mente sei que o Tathagata é o Corpo de Dharma e que ele não é o
corpo carnal que participa da comida.”

Então o Buda disse a Manjushri: “Assim é, assim é, é como Cunda diz.


Falaste bem, oh Cunda! Você já atingiu o delicado ponto da grande
Sabedoria e você agora domina os sutras Mahayana.”

Manjushri disse a Cunda: “Você diz que o Tathagata é um Não Criado


(Não Composto); e o corpo do Tathagata é de longa vida. Se isto está
dito, o Tathagata ficar
á satisfeito (em participar da refeição).”

Cunda respondeu: “O Tathagata não ficará satisfeito comigo apenas;


ele também ficará satisfeito com todos os seres.”
Manjushri disse: “O Tathagata está satisfeito com você e com todos
nós seres?”

Cundarespondeu: “Eu não disse que o Tathagata está satisfeito. Agora,


obter satisfação é um pensamento invertido. Um pensamento inverti-
do representa nascimento e morte. Nascimento e morte são de uma
existência criada. Assim, oh Manjushri! Não diga que o Tathagata é
uma existência criada. Se você diz que o Tathagata é uma existência
criada, eu e você cometemos uma inversão [da verdade]. Oh Manjus-
hri! O Tathagata não tem qualquer pensamento de amor [apêgo]. Ago-
ra, o amor é como o caso de uma vaca leiteira que, amando sua própria
cria, sente fome e sede, vai e busca grama e água, e quer esteja satis-
feita ou não, de repente retorna. O Buda, Honrado pelo Mundo, não
tem tal pensamento. Ele vê a todos como sendo iguais, assim como vê
a Rahula. Um pensar assim é que condiz com o mundo da Sabedoria do
Todo Iluminado. Oh Manujshri! Por exemplo, uma carruagem puxada
por um burro não resistiria a uma comparação com uma puxada por
Capítulo 2: Sobre Cunda Página 47
uma junta de quatro cavalos treinados de um rei. O caso comigo e você
é também como este. É impossível penetrar as profundezas daquilo
que está oculto com o Tathagata, mesmo que tentássemos.”

Os Olhos dos Mortais Comuns

“Oh Manjushri! O garuda voa incontáveis yojanas no céu. Ele olha para
baixo no grande oceano e vê coisas da água tais como peixes, tartaru-
gas marinhas, tartarugas migrantes, crocodilos, tartarugas comuns,
nagas2, e também sua própria sombra refletida na água. Ele vê todas
essas coisas da mesma forma como se vê todas as formas visíveis num
espelho. A mesquinha sabedoria dos mortais comuns não pode sequer
ponderar bem o que chega aos seus olhos. O mesmo é o caso comigo e
você também. Não podemos ponderar a Sabedoria do Tathagata.”

Manjushri disse a Cunda: “É assim, é assim, é assim como você diz. Não
é que eu não veja isto. Eu apenas quis testar suas relações no que diz
respeito ao mundo de um Bodhisattva.”

Então, o Honrado pelo Mundo emitiu da sua boca uma luz de várias
cores. A luz resplandeceu brilhantemente sobre o corpo de Manjushri.
Iluminado por esta luz, Manjushri interpenetrou-a. Então, ele disse a
Cunda: “O Tathagata mostra agora esta cena maravilhosa. Ele logo
entrará no Nirvana. Os últimos oferecimentos que você carregou há
algum tempo atrás serão primeiro oferecidos ao Buda e, então, dados
a todos aqueles que estão congregados aqui. Oh Cunda! Sabe que não

é sem razão que o Tathagata emitiu esta luz de várias cores.”


Ouvindo isto, Cunda ficou em silêncio e triste.

2 naga é uma palavra do Sanskrito do


e Pāli que designa uma deidade ou classe de
entidades ou seres que assumem a forma de uma enorme serpente, mas muitas vezes
com os troncos e cabeças humanas, encontrada tanto no Budismo como noinduísmo.
H

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 48


O Buda disse a Cunda: “É chegada a hora de você dar os oferecimentos
ao Buda e à congregação. O Tathagata logontrará
e no Parinirvana.”
Ele, então, disse isto uma segunda e uma terceira vez.

Então, ante àquelas palavras do Buda, Cunda chorou e lamuriou, solu-


çou tristemente e disse: “Que dia aflito, que dia aflito! O mundo está
vazio.”

Ele também disse para a gra


nde assembléia: “Levemos nossos corpos
ao chão em súplica e imploremos para que o Buda não entre no Pari-
nirvana.”

Então, o Buda disse a Cunda: “Não chore e não abale a sua mente.
Pense que este corpo é como uma planta, uma miragem no deserto,
uma espuma aquosa, um fantasma, um corpo transformado, o castelo
de um gandharva, um tijolo cru, um lampejo, uma pintura desenhada
sobre a água, um prisioneiro diante da morte, uma fruta madura, um
pedaço de carne, uma malha num tear que está prestes a terminar, e a
ascensão e queda de um morteiro. Você deveria pensar que todas as
coisas criadas são como comida venenosa e que qualquer coisa com-
posta é inerentemente dotada de todas as aflições.”

A isto, Cunda disse novamente ao Buda: “O Tathagata não desejar-pe


manecer longo tempo em vida. Como podemos não chorar? O mundo
está aflito, o mundo está aflito! O mundo está vazio. Eu apenas rogo
que o Tathagata tenha piedade de todos nós seres. Por favor, perma-
neça por mais longo tempo e não entre no Nirvana.”

O Buda disse aCunda: “Não diga coisas tais como ‘ame -nos e perma-
neça por mais longo tempo em vida’. Por piedade a todos vocêso-e t
dos os seres, hoje entrarei no Nirvana. Por quê? Porque esta é a verda-
de de todos os Budas. Isto é assim com tudo aquilo que é criado. Este é
o porquê de todos os Budas dizerem em versos:

“A lei daquilo que é criado


Capítulo 2: Sobre Cunda Página 49
é por natureza não-eterna.
A vida acabou, deixamos o mundo;
extinção é felicidade.”

Oh Cunda! Medite agora sobre tudo que é feito, que é composto. Pen-
se que todas as coisas são não-Eu e não-eternas, e que nada perdura.
Este corpo carnal possui inumeráveis erros. Tudo é como espuma a-
quosa. Sendo assim, não chore.”

Então, Cunda novamente disse ao Buda: “É assim, é assim! Tudoo-é c


mo você amavelmente me ensinou. O Tathagata entra no Nirvana por
uma questão de expediente. Mas, eu não posso ajudar os seres estan-
do triste. Seja como for, devo refletir e sentir-
me satisfeito.”

O Magnífico Campo de Prosperidade

O Buda elogiou Cunda e disse: “Falaste bem, falaste bem! Você bem
sabe que o Tathagata, seguindo a via de todos os seres, entra no Nirva-
na por uma questão de expediente. Ouça-me bem! É como no caso no
qual todos os pássaros sarasa [uma espécie de ganso de tamanho mé-
dio encontrado no norte da Europa e Ásia] se reúnem no Lago Anava-
tapta [Manasarwar] nos meses da primavera. O mesmo é o caso com
todos os Budas. Todos se reúnem aqui. Oh Cunda! Pense, nem muito e
nem pouco, a respeito da vida de todos os Budas. Todas as coisas são
como fantasmas. O Tathagata vive em meio a elas. O que ele tem é

expediente;
de todos os ele não Oh
Budas. se apega.
Cunda!Por
Eu que não?
agora Isto é assim
receberei o quecom
vocêo oferece.
Dharma
Isto é para permitir-lhe atravessar o rio do nascimento e da morte.
(Seres) humanos ou celestiais que façam oferecimentos [ao Buda] pela
última vez, todos ganham uma inabalável recompensa e serão abenço-
ados com felicidade. Por quê? Porque eu sou o melhor campo de pros-
peridade para todos os seres. Se você deseja tornar-se um campo de

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 50


prosperidade para todos os seres, aceite qualquer (coisa) que lhe seja
dada. Não tardará muito.”

Então Cunda, em prol da emancipação de todos os seres, levantou sua


cabeça, suprimiu (enxugou) suas lágrimas, e disse ao Buda: “Muito
bem, oh Honrado pelo Mundo! Quando eu for digno de tornar-me um
campo de prosperidade, serei capaz de sondar o Nirvana ou não-
Nirvana do Tathagata. Neste momento, nós e todos os Sravakas e Prat-
yekabudas somos como mosquitos ou moscas, e não podemos ponde-
rar corretamente sobre o Nirvana ou não-Nirvanao dTathagata”.

Então Cunda e todos os seus parentes (acompanhantes) choraram


tristemente e circundaram o corpo do Tathagata, queimaram incenso,
espalharam flores, e muito sinceramente prestaram homenagem ao
Buda; e então, se levantaram juntamente com Manjushri, e entrega-
ram os utensílios dos oferecimentos.

Capítulo 2: Sobre Cunda Página 51


Capítulo Três: Sobre a Aflição
“Tão logo após Cunda ter deixado aquele lugar, a grande terra tremeu
de seis formas diferentes. Assim se passaram as coisas também no céu
Brahma. Há dois tipos de agitação: uma é uma pequena agitação e a
outra uma grande agitação. A primeira agitação é um tremor e aquela
que agita mais fortemente é um grande abalo. Aquela que gera um
pequeno som é uma agitação, e aquela que gera um estrondo (grande
som) é um grande abalo. A agitação onde somente a terra se agita é
um tremor; e aquela quando montanhas, florestas, rios, mares e todas
as demais coisas se agitam é um grande abalo. Aquela que agita em
uma direção é um tremor e aquela que agita à toda volta é um grande
abalo. O tipo que movimenta (as coisas) é um tremor, e o tipo onde as
mentes dos seres se agita é um grande abalo. A agitação que ocorre
quando o Bodhisattva chega do Céu Tushita ao Jambudvipa é um gran-
de abalo. Os tremores de quando os Bodhisattvas nascem nesta terra,
quando eles deixam o lar, atingem a insuperável Iluminação, giram a
Roda da Lei, e entram no Parinirvana são grandes abalos. Hoje o Tatha-
gata estava prestes a entrar no Nirvana. Este é o porque da terra se
agitar fortemente.

Então, todos os seres celestiais, nagas, gandharvas, asuras, garudas,


kinnaras, mahoragas, humanos e não humanos ouviram isto e seus
cabelos arrepiaram (ficaram de pé) e, em uníssono, eles choraram e
lamentaram. Eles disseram em versos:

“Oh Mestre dos


Curvamo-nos humanos!
agora e suplicamos-lhe!
Estamos nos despedindo do Rishi (Grande Sábio) dos humanos.
Não temos esperança de sermos salvos.
Vemos agora você, o Buda, entrar no Nirvana
e estamos no mar do sofrimento.
Estamos tristes e aflitos,
como um bezerro que se despede de sua mãe vaca.

Capítulo
Sobre
3– a Aflição Página 53
Indigentes e sem ninguém para nos salvar estamos.
Sentimo-nos como alguém arrasado pela doença que, sem um médico,
tem que socorrer a si próprio e alimentar-se de comida não apropriada
para a doença.

Os seres estão presos nas ilusões.


Estão sempre obliterados (impedidos) pelas visões da vida.
Estão separados da cura do Rei do Dharma
e tomam drogas que são venenosas.
Em razão disto, o Honrado pelo Mundo abandonou-nos.
É como quando, sem um rei,
o povo na terra é atacado pela fome.
O mesmo é o caso conosco.
Não temos a sombra de nenhuma árvore,
e nem o sabor do Dahrma.
Agora, ouvindo que o Buda entrará no Nirvana,
nossa mente compreende,
da mesma maneira como um grande abalo destrói todos os lugares.
O Grande Sábio (Rishi) entra no Nirvana
e o sol do Buda afunda-se no chão.
As águas do Dharma estão todas secas.
É certo que morreremos.

Os seres estão extremamente aflitos


porque agora o Tathagata entra no Parinirvana.
Isto é como o filho de um homem rico que acaba de perder seus pais.
O Tathagata entra no Nirvana, e se ele nunca mais retornar,
nós e todos os seres não teremos quem nos proteja.
Como o Tathagata entrará no Nirvana,
os animais e todos os outros (seres) estão tristes e temerosos;
Seus pensamentos ardem em preocupações.
Como não nos preocuparíamos hoje?
O Tathagata abandonou-nos da mesma forma
como derramamos nossas lágrimas e saliva.
Por exemplo, quando o sol acaba de nascer,
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 54
sua luz resplandece brilhantemente.
Por si mesmo ele transita e brilha,
removendo toda a escuridão.
A luz divina do Tathagata afasta para longe nossas preocupações.
Ele está no meio de nós seres como um Monte Sumeru.”

“Oh Honrado pelo Mundo! oPr exemplo, um rei cria muitos filhos. Eles
parecem corretos e justos, ele os ama e os têm sempre em seu cora-
ção. Primeiro ele ensina-lhes arte, os quais se tornam mestres. Então,
ele os coloca nas mãos de candalasCandala
( é uma classe de pessoas
na Índia geralmente consideradas como sem castas). O mesmo é o
caso aqui, oh Honrado pelo Mundo! Hoje nos tornamos os filhos do Rei
do Dharma. Fomos ensinados e perseveraremos na visão correta. Im-
ploramos que não nos abandone. Se nos abandonar, seremos como os
filhos do rei. Por favor, permaneça por mais longo tempo e não entre
no Nirvana. Oh Honrado pelo Mundo! Por exemplo, o mesmo é o caso
com alguém versado em todas as fases do aprendizado. No caso do
Tathagata, ainda que ele seja versado em todas as fases do Dharma, o
medo ainda surge em todos os fenômenos (que são como seus filhos).
Se o Tathagata permanece longo tempo no mundo, concedendo-nos o
maná do Dharma e satisfazendo-nos, não teremos medo de cair no
inferno.

Oh Honrado pelo Mundo! Pode haver um homem que aprenda o seu


primeiro trabalho. Ele é pego pelos oficiais do governo e é preso. As
pessoas vêm e perguntam- lhe: ‘Como você está sendo tratado?’ (Ao
que ele responde): ‘Agora me encontro em profunda tristeza e preoc
u-
pação. Se eu fosse solto da prisão, sentir-me-ia tranqüilo e ficaria em
paz’. Assim é com o Honrado pelo Mundo! Para o nosso benefício, você
sofreu penitência. E ainda (assim) nós não estamos livres do nascimen-
to, da morte e da aflição. Como o Tathagata alcançaria a paz?

Oh Honrado pelo Mundo! É como um grande doutor que é versado na


prescrição (de remédios) e na medicina. Ele ensina a seu filho os segre-
dos da arte medicinal, mas não os ensina para outros estudantes. É
Capítulo
Sobre
3– a Aflição Página 55
assim com o Tathagata. Você compartilha todos esses segredos somen-
te com Manjushri e exclue-nos, sem olhar para trás. Por favor, oh Ta-
thagata! Não seja mesquinho; não nos exclua dos segredos do Dharma,
como no caso do grande doutor que compartilha [seu conhecimento]
somente com o seu filho e exclui os outros estudantes. A razão pela
qual o doutor regateia compartilhar seu conhecimento com os outros
estudantes reside na diferença em seu amor. O coração do Tathagata é
sempre imparcial. Por que é que você não nos ensina? Por favor, per-
maneça por mais longo tempo e não entre no Parinirvana.

Oh Honrado pelo Mundo! É como alguém que é velho ou jovem, doen-


te ou com dor, e não está numa estrada plana, mas num caminho ín-
greme e pode sofrer privações. Uma pessoa vê isto, sente piedade e
aponta o caminho que é plano e bom. O mesmo nos ocorre, Honrado
pelo Mundo! ‘Jovem’ é uma alusão àqueles de estatura ainda não
e-el
vada em relação ao Corpo-de-Dahrma. ‘Velho’ é uma alusão àqueles
altamente sobrecarregados com a ilusão. ‘Doença e dor’ referem -se
àqueles ainda não libertos do ciclo do nascim
ento e da morte. ‘Íngr
e-
me’ é uma alusão às 25 existências [os tipos de existência nas quais
podemos transmigrar]. Oh Tathagata! Mostre-nos o caminho suave e
plano. Por favor, permaneça por mais longo tempo e não entre no
Nirvana.”

Então, o Honrado pelo Mundo disse a todos os Monges: “Oh Todos


vocês Monges! Não fiquem tristes como todos os mortais e devas; não
chorem! Façam um esforço, fiquem atentos, e perseverem no pensa-
mento correto.”

Então, todos os devas e asuras, tendo ouvido o que o Buda disse, para-
ram de chorar como alguém que perdeu um filho e, após o serviço
funeral, suprimiram seu pesar e não mais choraram.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 56


O Maná do Dharma e o Castelo de Tesouros

Então, o Honrado pelo Mundo falou em versos para toda a congrega-


ção:

“Todos vocês! Abram suamente, não se aflijam profundamente.


Os ensinamentos de todos os Budas são assim.
Portanto, façam silêncio. Procurem não ser indolentes,
protejam sua mente, perseverem no pensamento correto,
apartem-se dos atos ilícitos;
consolem-se e sejam felizes.

Além disso, oh Monges! Se vocês têm qualquer dúvida, indaguem ago-


ra. Se vocês têm dúvidas acerca do vazio versus não-vazio, eterno ver-
sus não-eterno, sofrimento versus não-sofrimento, dependente versus
não-dependente, passado (ido/partido) versus não-passado, refúgio
versus não-refúgio, sempre versus não-sempre, impermanência versus
o eterno, seres versus não-seres, ‘é’ versus ‘não
-é’, o real versus não-
real, a verdadeiro versus a não-verdadeiro, extinção versus não-
extinção, esotérico versus não-esotérico, e o dual versus não-dual;
falarei a vocês neste sentido. Para o vosso benefício, também, primeiro
falarei do maná e então entrarei no Nirvana.

Oh Monges! É difícil presenciar o aparecimento de um Buda no Mun-


do. É difícil nascer como humano. É difícil, também, encontrar o Buda e
ganhar a fé. É também difícil ouvir o inaudível. É difícil também manter

em observância
rhatship. e perseverar
Isto é como nas injunções
tentar encontrar proibitivas
ouro na e atingir
areia. É como no ocaso
A-
da udumbara. Oh Monges! É difícil nascer como um humano a partir
do auto-isolamento das oito situações inoportunas [vícios que barram
o caminho para encontrar o Buda e ouvir seus ensinamentos].

Oh vocês! Tendo me encontrado agora, não partam de mãos vazias. Eu


sofri privações no passado, e agora obtive todos aqueles expedientes

Capítulo
Sobre
3– a Aflição Página 57
insuperáveis. Para o vosso benefício, inumeráveis kalpas atrás, oferecí
meu corpo, mãos, pés, cabeça, olhos, tutano, e cérebro. Em vista disso,
não se sujeitem à indolência. Oh Monges! Como podemos adornar o
Castelo de Tesouros do Dharma Maravilhoso? Adornando a nós mes-
mos com várias virtudes e jóias raras, e sendo protegidos pelos baluar-
tes e fossos dos preceitos [shila], meditação [dhyana] e Sabedoria
[prajna]. Agora, vocês se encontraram com este castelo dos ensina-
mentos Budistas. Não o tomem por falso. Por exemplo, um mercador
pode deparar com um castelo de tesouros verdadeiros e, mesmo as-
sim, recolher entulhos como telhas e cascalhos, e voltar para casa. O
mesmo se dá com vocês. Depararam-se com um castelo de tesouros, e
ainda o tomam como sendo falso. Oh todos vocês Monges! Não se
satisfaçam com idéias subalternas. Vocês são ordenados agora, mas
não amam o Mahayana que é superior. Oh vocês Monges! Vocês ves-
tem em seus corpos a kasaya (robes de Monges Budistas) e robes tin-
gidos de um sacerdote, mas vosso pensamento ainda não está tingido
pelo puro Dharma do Mahayana. Oh vocês Monges! Vocês vão a mui-
tos lugares e imploram por oferecimentos, mas não procuram pelos
alimentos do Dharma do Mahayana. Oh Monges! Vocês cortam seus
cabelos, mas não cortam as amarras da ilusão. Oh vocês Monges! Eu
agora ensino-lhes verdadeiramente. Agora eu vejo que tudo está em
harmonia e a natureza do Dharma do Tathagata é verdadeira e inaba-
lável. Assim, esforcem-se, todos vocês! Levantem-se, sejam bravos e
desatem todos os laços da ilusão! Se o sol da Sabedoria dos dez pode-
res se por, a escuridão reinará sobre vocês. Oh vocês Monges! É como
quando a grande terra, todas as montanhas e ervas medicinais tornam-
se úteis para os seres. O mesmo é o caso com o Dharma do qual eu
falo. Ele proclama maravilhosamente o alimento bom e doce do Dhar-
ma e provê a melhor cura para as doenças da ilusão dos seres. Agora,
farei todos os seres meus discípulos e as quatro classes da Sangha Bu-
dista residirem nos secretos ensinamentos do Dharma. Eu, também,
resido nisto e entrarei no Nirvana.”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 58


O Repositório Secreto

“O que é o Repositório Secreto? É como os três pontos [no sânscrito]


da letra ‘i’. Se elesse encontram numa linha transversal, eles não for-
mam o ‘i’. Colocados verticalmente, eles também não têm finalidade.
Mas quando se colocam os três pontos sobre o supercílio do Mahesva-
ra (O Grande Lorde), isto é ‘i’. Se os três pontos são escritos separad
a-
mente, isto novamente não tem finalidade. Assim, também, é comigo.
O Dharma da emancipação é também [por si mesmo] não-Nirvana. O
corpo do Tathagata é também não-Nirvana. A Grande Sabedoria é
também não-Nirvana. As três coisas podem existir separadamente,
mas isto não constitui Nirvana. Agora, eu resido pacificamente nos três
e digo que, para o benefício de todos os seres, entro no Nirvana. Isto é
como no caso da letra ‘i’.”

Então, todos os Monges, ouvindo que o Buda, o Honrado pelo Mundo,


entraria no Nirvana defenitivamente, ficaram tristes. Seus cabelos ar-
repiaram e suas lágrimas rolaram. Eles prostraram-se no chão, tocaram
os pés do Buda, circundaram seu corpo inumeráveis vezes, e disseram
ao Buda:

“Oh Honrado pelo Mundo! Você nos explicou muito bem o Eterno, o
Sofrimento, o Vazio, e o não-Eu. Assim como todos os seres deixam
pegadas e as melhores de todas as pegadas são aquelas do elefante,
assim é com este pensamento do não-Eterno: ele abrange todos os
pensamentos. Alguém que empreenda esforços e boas práticas, erradi-

ca o apego
padhatu e a cobiça
(mundo dos mundos
do espírito), rupadhatu a(mundo
a ignorância, da forma)
arrogância, e aru-
e o pensa-
mento sobre o não-Eterno do kamadhatu (mundo dos desejos). Oh
Honrado pelo Mundo! Se o Tathagata estivesse livre do pensamento
sobre o não-Eterno, ele não entraria no Nirvana agora. Se não, como se
pode dizer: ‘Se praticamos a meditação sobre o não -Eterno, erradica-
mos de nós mesmos o amor (desejo), a ignorância, a arrogância, e a
impermanência do mundo trípli ce?’ Oh Honrado pelo Mundo! Assim

Capítulo
Sobre
3– a Aflição Página 59
como o agricultor, no outono, ara profundamente a terra e assim re-
move todas as ervas daninhas, assim é com esse pensamento do não-
Eterno. Ele rigorosamente nos liberta do apego e da cobiça, do amor às
coisas do mundo da forma, do mundo do espírito, da ignorância, da
arrogância, e dos pensamentos sobre a impermanência (não-Eterno)
do mundo dos desejos. Oh Honrado pelo Mundo! De todos as lavras
dos campos, aquela que é feita no outono é a melhor. De todas as pe-
gadas, aquelas dos elefantes são as melhores. E de todos os pensamen-
tos, aquele sobre o não-Eterno é o melhor. Oh Honrado pelo Mundo!
Analogamente, quando um imperador está para falecer, a anistia é
concedida a todos os prisioneiros. Então, ele falece. O mesmo se dá
agora com o Tathagata. Por favor, liberte todos os seres das amarras
das ilusões, da ignorância e da obscuridade; dê-lhes a emancipação e,
então, entre no Nirvana. Não estamos emancipados ainda. Sendo as-
sim, o Tathagata nos abandonaria e entraria no Nirvana? Oh Honrado
pelo Mundo! Poderíamos ser capturados por um demônio. Mas, como
viemos através de um bom encantador, por força do encantamento,
podemos ganhar a nossa libertação. O mesmo é o caso com o Tathaga-
ta. Para o benefício de todos os Sravakas, ele expulsa o demônio da
ignorância, e permite-lhes residir pacificamente, como no caso da letra
‘i’, em Leis como a Grande Sabedoria, a emancipação e outras Leis. Oh
Honrado pelo Mundo! Por exemplo, as pessoas podem laçar um gan-
dhahastin (elefante almiscarado, perfumado com almíscar), mas mes-
mo um bom treinador não pode mantê-lo sob controle. De repente, ele
se desprende da corda e da rede, e foge como bem entender. O mes-
mo é o caso aqui. Ainda não estamos livres das 57 ilusões. Por que o
Honrado pelo Mundo deseja abandonar-nos e entrar no Nirvana? Oh
Honrado pelo Mundo! Uma pessoa sofrendo de malária obtém uma
cura para sua enfermidade ao encontrar um bom médico. Conosco é
assim. Há muitas enfermidades e tristezas, os caminhos doentios da
vida, febres, etc. Encontramos com o Tathagata, mas as doenças não se
foram, e dessa forma não obtivemos a paz e bem-aventurança celesti-
ais. Como o Tathagata pode desejar abandonar-nos e entrar no Nirva-
na? Uma pessoa intoxicada não sabe quem está próximo ou não, se
sua mãe ou irmã, se perde na rudeza e na luxúria, perde a faculdade da
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 60
fala e dorme em lugares degradados. Pode acontecer de ela encontrar
um bom médico, que lhe dê um remédio. Após tomá-lo, ela vomita e
recupera a sua saúde; recobra a consciência e o arrependimento se
abate sobre ela. Ela se autocensura muito mais e passa a reputar a
bebida como a raiz de todos os atos vis. Se ela pudesse livrar-se da
bebida, seus maus atos cessariam. O mesmo se passa aqui. Oh Honra-
do pelo Mundo! Há longo tempo estamos reciclando entre o nascimen-
to e a morte. Estamos perdidos nos prazeres sensuais e vorazmente
atados aos cinco desejos. Aquela que não é mãe tomamos como mãe,
aquela que não é irmã tomamos como irmã, a que não é fêmea toma-
mos como fêmea, e os não-seres como sendo seres. Em razão disto, a
transmigração continua e sofremos a partir do nascimento e da morte.
É como no caso do intoxicado deitado na sarjeta. Oh Tathagata! Por
favor, dê-nos o remédio do Dharma, e faça-nos vomitar a bebida vil das
ilusões. Nós ainda não despertamos. Por que, oh Tathagata, você pre-
tende abandonar-nos e entrar no Nirvana?

“Oh Honrado pelo Mundo! Pode haver um homem, por exemplo, que
elogie a árvore e diga que ela é constituída de madeira dura. Mas isto
não é bem assim. O mesmo se dá com os seres. Oh Honrado pelo
Mundo! Podemos elogiar e dizer que as pessoas, os seres, a vida, a
caridade, o intelecto, o executor e o receptor são todos verdadeiros.
Mas isto não pode ser. Dessa forma, praticamos o não-eu. Oh Honrado
pelo Mundo! É como no caso da água na qual o arroz foi lavado ou o
caso dos excrementos, os quais não servem para mais nada. O mesmo
ocorre com o corpo também. Ele não tem o Eu ou o Mestre. Por exem-
plo, oh Honrado pelo Mundo! A saptaparna [alstonia scholaris, planta
de “sete folhas”] não opssui fragrância. É assim com este corpo carnal.
Ele não tem o Eu ou o Mestre. Dessa forma, meditamos sobre o altru-
ísmo. Você, o Buda, diz: ‘Todas as coisas são destituídas do Eu e nada
pertence a si. Oh vocês Monges! Aprendam e pratiquem [isto]!’ Uma
vez que isto seja praticado, a vaidade desaparece. (Quando) a vaidade
se vai, entra-se no Nirvana. Oh Honrado pelo Mundo! Não existem
caminhos dos pássaros no céu. Tal coisa nunca poderia haver. Ao prati-

Capítulo
Sobre
3– a Aflição Página 61
car a meditação sobre o altruísmo não podemos ter várias visões da
vida. Isto não é possível.”

Então, o Honrado pelo Mundo elogiou todos os Monges e disse: “É


bom, é bom, que vocês pratiquem a meditação sobre o altruísmo.”

As Quatro Inversões do Dharma

Então, todos os Monges disseram ao Buda: “Não somente praticamos a


meditação sobre o altruísmo, mas ainda outras meditações, a saber:
todas aquelas relativas ao Sofrimento, à Impermanência, e ao Altruís-
mo. Oh Honrado pelo Mundo! Uma pessoa quando embriagada, a
mente gira, e todas as montanhas, rios, castelos, palácios, o sol, a lua e
as estrelas parecem girar também. Oh Honrado pelo Mundo! Qualquer
pessoa que não pratique a meditação sobre a Impermanência e o Al-
truísmo não pode ser chamada de sábia. Devido à indolência, recicla-
mos entre o nascimento e a morte. Oh Honrado pelo Mundo! Em razão
disto, praticamos tais meditações.”

Então o Buda disse a todos os Monges: “Ouçam -me bem, ouçam-me


bem! Agora vocês mencionam o caso de uma pessoa embriagada. Isto
se refere ao conhecimento, mas não à significação. O que eu entendo
por significação? A pessoa embriagada vê o sol e lua, que não se mo-
vem, mas ela pensa que sim. O mesmo é o caso com os seres. Como o
peso de todas as ilusões e da ignorância recai sobre [a mente], a mente

vira
ternodecomo
cabeça para baixo e passa
Impermanente, a entender
a Pureza o Eu como
como Impureza, e não-Eu, o E-
a Felicidade
como Sofrimento. (Com a mente) sobrecarregada pelas ilusões, esses
pensamentos surgem. Embora esses pensamentos surjam, o significa-
do não é compreendido. Isto é como no caso da pessoa embriagada
que vê o que não se move como se estivesse se movendo. O ‘Eu’ sign i-
fica o Buda; ‘Eterno’ significa o Dharmakaya; ‘Felicidade’ significar- Ni
vana, e ‘Puro’ significa Dharma. Monges, por é que se diz que aquele

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 62


que tem a idéia de um Eu é um arrogante e orgulhoso girando no Sam-
sara? Monges, embora vocês digam ‘nós também meditamos (cultiv a-
mos) sobre a impermanência, o sofrimento, e o não- eu’, esses três
tipos de cultivo não possuem um valor ou significado real. Agora eu
explicarei as três formas excelentes de cultivar o Dharma. Pensar no
sofrimento como felicidade e pensar na felicidade como sofrimento é
uma perversão do Dharma; pensar o impermanente como eterno e
pensar o eterno como impermanente é uma perversão do Dharma;
pensar o não-eu [anatman] como eu [atman] e pensar o Eu como não-
eu é uma perversão do Dharma; pensar o impuro como puro e pensar
o puro como impuro é uma perversão do Dharma. Aqueles que têm
esses quatros tipos de perversões são pessoas que não conhecem o
correto cultivar dos dharmas. Monges, vocês dão lugar à idéia de Feli-
cidade referenciada aos fenômenos associados com o sofrimento; à
idéia de Eternidade referenciada aos fenômenos associados com a
impermanência; à idéia do Eu referenciada aos fenômenos destituídos
do Eu; e à idéia da Pureza referenciada aos fenômenos que são impu-
ros. Ambos, o mundano e também o supramundano, têm o Eterno, a
Felicidade, o Eu, e a Pureza. Ensinamentos mundanos [dharmas] têm
letras e são sem significado; os ensinamentos Supramundanos têm
letras e significado. Por quê? Porque as pessoas mundanas têm essas
quatro perversões, elas são inaptas para compreender o verdadeiro
significado. Por quê? Tendo essas idéias perversas, seus pensamentos e
visões são distorcidos. Através dessas quatro perversões, as pessoas
mundanas vêem sofrimento na Felicidade, impermanência no Eterno,
não-Eu no Eu, e impureza na Pureza. Elas são chamadas perver-
sões/inversões. Em razão dessas perversões/inversões, as pessoas
mundanas conhecem as letras, mas não o significado. O que é o signifi-
cado/referente? Não-Eu é Samsara, o Eu é o Tathagata; impermanên-
cia são os Sravakas e Pratyekabudas, o Eterno é o Dharmakaya do Ta-
thagata; sofrimento são todos os tirthikas [seres deludidos, não-
Budistas], Felicidade é Nirvana; o impuro são todos os dharmas com-
postos [samskrta], o Puro é o Dharma Verdadeiro que o Buda e os Bo-
dhisattvas têm. Isto é chamado não-perversão/não-inversão. Não sen-
do invertido, se saberá ambos, a letra e o significado. Se desejamos nos
Capítulo
Sobre
3– a Aflição Página 63
livrar das quatro perversões/inversões, deveremos conhecer o Eterno,
a Felicidade, o Eu, e a Pureza dessa maneira (acima descrita).”

Então, todos os Monges disseram ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Como você disse, se nos apartarmos das quatro inversões, conhecere-
mos o Eterno, a Felicidade, o Eu e a Pureza. Como você eliminou as
quatro inversões eternamente, você conhece bem o Eterno, a Felicida-
de, o Eu e a Pureza. Se você conhece bem o Eterno, a Felicidade, o Eu e
a Pureza; por que não permanece aqui por mais um kalpa, ou meio
kalpa, e nos ensina e nos resgata das inversões? E você ainda nos a-
bandona e deseja entrar no Nirvana. Se você voltar atrás e ensinar-nos,
certamente o ouviremos e praticaremos a Via com toda a atenção. Se o
Tathagata deve a todo custo entrar no Nirvana, como poderíamos
permanecer com este corpo envenenado e levar ao cabo as ações da
Via? Nós também seguiríamos o Honrado pelo Mundo e entraríamos
no Nirvana.”

Então o Buda disse a todos os Monges: “Não digam isto. Eu agorai- de


xarei todo o insuperável Dharma nas mãos de Mahakashyapa. Este
Kashyapa doravante será alguém em quem vocês poderão confiar. Isto
é como no caso onde o Tathagata torna-se alguém a quem todos os
seres podem circundar. O mesmo é o caso com Mahakashyapa. Ele
agora se tornará vosso refúgio. Isto é como no caso de um rei que tem
muitos territórios e que empreende uma viagem de inspeção, deixan-
do todos os assuntos do estado nas mãos do seu ministro. O mesmo se
passa com o Tathagata. Todos os ensinamentos corretos estão sendo
deixados nas mãos de Mahakashyapa.

A Parábola da Água-Marinha

Sei que tudo aquilo que vocês aprenderam até agora sobre não-eterno
e sofrimento não é verdadeiro. Na primavera, por exemplo, as pessoas
vão banhar-se num grande lago. Elas estão se divertindo, velejando

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 64


num barco, quando deixam cair uma gema de água-marinha nas pro-
fundezas da água, após o que ela não pode mais ser vista. Então todos
eles pularam na água à procura desta gema. Eles, competitivamente,
encontraram todo tipo de entulho como telhas, pedras, pedaços de
madeira, cascalhos, e pensaram que tinham a água-marinha. Eles fica-
ram felizes e, levando todas essas coisas para fora (da água), viram que
aquilo que eles detinham em suas mãos não era verdadeiro. A gema
ainda estava na água. Através do poder da gema em si, a água tornou-
se clara e transparente. Como resultado, as pessoas viram que a gema
ainda estava na água, tão claramente como quando se olha para cima e
se vê a forma da lua no céu. Naquela ocasião, lá estava um homem
sábio que, exercitando um poder, mansamente entrou na água e obte-
ve a gema. Oh vocês Monges! Não permaneçam pensando sobre o
não-Eterno, o Sofrimento, o não-Eu, e o não-Puro; ficando na situação
daquelas pessoas que pegaram pedras, pedaços de madeira e casca-
lhos como se fosse a verdadeira gema. Vocês devem estudar profun-
damente a Via, o modo de agir, onde quer que vá, e ‘meditar sobre o
Eu, o Eterno, a Felicidade, e a Pureza’. Sei que os aspectos dos quatro
itens que vocês aprenderam até agora são inversões e que qualquer
pessoa que deseje praticar a Via deve agir como o homem sábio que
espertamente obteve a gema. Isto se refere aos chamados pensamen-
tos do Eu, do Eterno, da Felicidade, e da Pureza.”

Então, todos os Monges disseram ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Você, o Buda, disse antes que todas as coisas eram desprovidas do Eu,
que nós praticássemos isto e que, quando praticássemos, o pensamen-
to do Eu nos deixaria, e que uma vez que o pensamento do Eu fosse
abandonado, eliminaríamos a arrogância e que, uma vez abandonada a
arrogância, ganharíamos o Nirvana. Assim você disse. Como, agora,
poderíamos compreender isto?”.

O Buda disse a todos os Monges: “Bem falado, bem falado! Vocêsn- i


dagam sobre esta questão com a intenção de dissipar suas dúvidas.
Imaginem: existe um rei que é estúpido, que tem pouca sabedoria, e
existe um médico que é obstinado. Mas, o Rei não sabe disso e paga-
Capítulo
Sobre
3– a Aflição Página 65
lhe um salário. O médico usa os produtos do leite para curar todas as
enfermidades. Também, ele não sabe qual é a srcem das doenças. Ele
pode ser versado na medicina do leite, mas para ele não existe diferen-
ça entre um frio e uma febre. Ele prescreve leite para todas as doenças.
Este Rei não tinha conhecimento de que este médico era um ignorante
do que fosse agradável e desagradável, os bons e os maus aspectos do
leite. Mas, havia um Doutor que conhecia oito diferentes tratamentos
para as enfermidades e que era apto a curar todas as doenças. Este
Doutor era versado na prescrição de medicamentos e tinha vindo de
um lugar distante. O médico do Rei não sabia como indagar e apren-
der. Ele era imprudente e arrogante. Assim, o ilustre Doutor convidou
cordialmente o médico do Rei e [como um expediente] tratou-lhe co-
mo seu mestre e perguntou-lhe sobre o segredo do seu tratamento.
Ele disse ao médico do Rei: ‘Ne
ste momento, convido-lhe para que seja
meu professor. Por favor, seja benevolente o bastante para ensinar-
me’. O médico do Rei disse: ‘Se você servir-me por quarenta e oito
anos, lhe ensinarei a arte da medicina’. Então, diante daquelasa-pal
vras, o ilustreDoutor disse: ‘Farei como você me diz. Usarei o melhor
das minhashabilidades’. Então o médicodo Rei, tendo o ilustre Doutor
em sua companhia, veio visitar o Rei. Nisto, o Doutor visitante explicou
ao Rei as várias formas de tratamento bem como outras coisas. Ele
disse: ‘Por favor, oh grande Rei, saiba! Saiba bem! Este Dharma é como
isto (as várias formas de tratamento) e você curará bem as enfermida-
des’. Ouvindo isto, o Rei reconheceu a ignorância e a ausência de o- c
nhecimento do seu próprio médico. Ele imediatamente o expulsou do
país e passou a respeitar o novo Doutor acima de tudo. Então o novo
Doutor disse para si mesmo: ‘Agora é o momento para ensinar o Rei’.
Ele disse para o Rei: ‘Oh grande Rei! Se você realmente me ama, por
favor, faça-me uma prome ssa’! O Rei respondeu: ‘Dar-te-ei tudo que
desejar, ainda que seja minha mão direita ou qualquer parte do meu
corpo’. O novo Doutor disse: ‘Você pode dar -me todo o status, mas eu
não tenho muito a desejar. O que desejo que você faça para mim é
proclamar às pessoas de todos os cantos da sua terra que, doravante,
não devem mais usar o remédio do leite que o médico anterior disse-
lhes para usar. Por que não? Porque muitos males e intoxicações sur-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 66
gem dele. Qualquer pessoa que ainda use essa medicina deve ser de-
capitada. Se a medicina do leite não for utilizada, não haverá mais mor-
tes; e ficaremos em paz. Esta é a razão de pedir-lhe isto’. Então o Rei
disse: ‘O que você me solicita fazer é algo irrelevante. Imediatamente
emitirei uma ordem para que qualquer um que esteja doente não to-
me leite como remédio. E qualquer pessoa que não o faça será decapi-
tada’. Diante disto, oilustre Doutor preparou vários tiposde remédios,
os quais possuíam sabores cáustico, amanteigado, salgado, doce, e
azedo. Com estes, os tratamentos eram administrados, e não houve
mais casos nos quais a doença não tenha sido curada.

Após aquilo, o próprio Rei caiu doente, e o Doutor foi chamado. O Rei
disse: ‘Estou doente agora. O que faço para ser curado’? O Doutorn-pe
sou acerca da doença do Rei e viu que naquele caso o remédio do leite
seria bom. Então ele disse ao Rei: ‘A doença da qual você está sofrendo
agora pode muito bem ser curada com leite. O que eu disse antes so-
bre a medicina do leite não era verdade. Se você tomá-lo agora, você
estará curado. Neste momento, você está sofrendo de uma febre. Por-
tanto, é correto que você tome leite’. Então, o Rei disse ao Doutor:
‘Você está louco? Isso é uma febre? E você diz que se eu tomar leite ele
me curará? Antes, você disse que (o leite) era um veneno. Agora você
diz-me para tomá-lo. Como pode ser isto? Quer me enganar? Aquilo
que o médico anterior disse estava correto, e você o desprezou e disse
que era veneno, e fez-me expulsá-lo. Agora você diz que (aquele remé-
dio) cura bem as doenças. Pelo que você me diz, o antigo médico deve-
ria exceder-lhe’.

Então o ilustre Doutor disse ao Rei: ‘Oh Rei! Não diga isto, por favor.
Um verme corrói a madeira e o resultado [tem a forma de] é uma ins-
crição. Este verme nada sabe sobre escritas. Uma pessoa sábia vê isto.
Mas, não diz que este verme conhece escritas. E, assim, não é tomado
de surpresa. O grande Rei! Saiba, por favor: Assim foi também com o
médico anterior. Para todas as doenças ele dava um remédio feito de
leite. Isto é como no caso do verme que corrói a madeira e, como re-
sultado, emerge algo na forma de uma inscrição. O médico anterior
Capítulo
Sobre
3– a Aflição Página 67
não sabia como distinguir entre os aspectos do agradável e do desa-
gradável, o bom e o mau’.

Então o Rei esperou para dizer: ‘O que quer dizer com ele não sabia?’

O ilustre Doutor respondeu ao Rei: “Este medicamento do leite é i-noc


vo, mas também é um maná.”

‘Como pode você dizer que este leite é um maná?’

‘Se você ao ordenhar vacas não pegar os resíduos, os refugos da grama


e do trigo; e se o bezerro alimentou-se bem; e se a vaca não estava
pastando em terras muito altas ou num lugar baixo e encharcado; se
foi dado à vaca água pura e ela não estava a correr e a viver entre os
touros; e se a alimentação é feita regularmente; e se o lugar que ela
vive é apropriado; o leite de tal vaca elimina todas as doenças. Isto
pode ser chamado de maná da medicina. Qualquer outro leite é vene-
no’.

Ouvindo isto, o Rei elog


iou o grande Doutor: ‘Falou bem, falou bem, oh
grande Doutor! Hoje, pela primeira vez na vida, eu conheci o que é
agradável e não agradável, o que é bom e o que não é bom na medici-
na do leite. Compreendendo isto, agora estou bem. Proclamarei nova-
mente às pessoas que eles podem tomar o remédio do leite.’ Ao ouvir
isto, as pessoas do país, iradas e ressentidas, dirão: ‘O grande Rei está
agora tomado por um demônio. Ele está louco? Ele nos engana e nos
faz tomar leite.’ Todas as pessoas, iradas e ressentidas,
virão ao Rei. O
Rei dirá a elas: ‘Não fiquem irados e não tenham ressentimentos. o- T
mar leite ou não tomá-lo, isto tudo vem do conhecimento da medicina.
Eu não tenho culpa’. Nisto, o grande Rei e todas as pessoas dançaram
de alegria. Passaram a ter mais respeito, honraram o Doutor, e fizeram-
lhe oferecimentos. Isto foi como todas as pessoas tomaram o remédio
do leite e recuperaram sua saúde.”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 68


“Saibam, oh vocês Monges! O mesmo é o caso com o Tathagata, o
Merecedor de Ofertas, Todo-Iluminado, o Grande Mestre Insuperável,
o Mestre dos Céus e da Terra, o Buda, Honrado pelo Mundo. Ele vem
como um grande Doutor (Médico) e subjuga todos os tirthikas [seres
deludidos, não-Budistas] e maus médicos. Na presença do Rei e todas
as pessoas, ele diz: ‘Eu me tornarei Rei
o dos doutores e subjugarei os
tirthikas’. Assim dizemos: ‘Não há eu, nem humano, nem seres, nem
vida, nem criação, nem sabedoria, nem aquele que dá, e nem aquele
que recebe’. Oh Monges! Sei que aquilo que os tirthikas dizem é como
o caso de um verme que corrói a madeira, a partir do que, por acaso, a
madeira se parece com uma inscrição. Em razão disto, o Tathagata
ensina e diz não-eu. Isto é para ajustar os seres e porque ele (o Tatha-
gata) está ciente da ocasião. Conforme a ocasião, não-eu é citado, e
diz-se também que existe o Eu. Isto é como no caso do ilustre Doutor,
que conhece bem as qualidades medicinais e não medicinais do leite.
Ele (o Tathagata) não é como os mortais comuns, que podem medir o
tamanho do seu próprio eu. Os mortais comuns e os ignorantes podem
medir o tamanho do seu próprio eu e dizer: ‘É do tamanho de um o- p
legar, é do tamanho de uma semente de mostarda, ou é do tamanho
de um grão de poeira’. Quando o Tathagata fala do Eu, em nenhum
caso se trata de coisas assim. Este é o porquê ele
diz: ‘Todas as coisas
são destituídas do Eu’. Mesmo que ele tenha dito que todos os ô- fen
menos são desprovidos do Eu, não se trata dos fenômenos serem
completamente / verdadeiramente desprovidos do Eu.

O Eu Búdico
Que Eu é este? Qualquer fenômeno [dharma] que é verdadeiro [satya],
real [tattva], eterno [nitya], soberano / autônomo / autogovernado
[aisvarya], e cuja base / fundamentação é imutável [asraya-
aviparinama], é denominado ‘Eu’ [atman]. Isto é como no caso do
grande Doutor que compreendia bem a medicina do leite. O mesmo é
o caso com o Tathagata. Para o benefício de todos os seres ele dizs-‘exi

Capítulo
Sobre
3– a Aflição Página 69
te o Eu em todas as coisas’. Oh vocês das quatro classes (Monges,
Monjas, Leigos e Leigas)! Aprendam o Dharma assim!”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 70


Capítulo Quatro: Sobre Longa Vida
“O Buda disse a todos os Monges: ‘Se têm qualquer dúvida sobree-pr
ceitos morais, sintam-se livres para formular questões. Eu agora expla-
narei e os satisfarei completamente. Eu já pratiquei a Via e atingi cla-
ramente a verdadeira natureza do Todo-Vazio de todas as coisas. Oh
Monges! Somente o Tathagata praticou a verdadeira natureza do Vazio
de todas as coisas.’ Ele também disse aos Monges: ‘Se têm quaisquer
dúvidas, indaguem-me, todos vocês’!”.

Então, os Monges disseram ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Com a


sabedoria que temos, não podemos formular questões para o Tathaga-
ta, o Merecedor de Ofertas e Todo-Iluminado. Por que não? O mundo
do Tathagata não pode ser compreendido por nós. Todos os Samadhis
não podem sequer serem imaginados. O que quer que seja dito, não
estará ao alcance da nossa compreensão. Oh Honrado pelo Mundo!
Existe um homem, por exemplo, que tem 120 anos de idade. Sofrendo
de uma longa enfermidade, ele está acamado e não pode levantar-se.
Sua vitalidade acabou, tal que ele não pode mais viver. Lá existe um
homem rico que está a caminho de lugares distantes em viagem de
negócios. Ele dá a este (velho) homem cem libras de ouro e diz:e-‘Pr
tendo empreender uma viagem e confio este tesouro a você. Dentro
de 10 ou 20 anos, eu retornarei, quando meus negócios estiverem
concluídos. Quando eu estiver de volta, devolva-
o para mim.’ O velho
homem doente recebe-o, e não tem ninguém para sucedê-lo. Após um
certo tempo, a doença agrava-se, ele morre, e o que lhe foi confiado

não pode
de sua ser encontrado.
viagem, A pessoa
olha ao redor, mas que
não lhe
podeconfiou o tesouro
encontrar retorna
o homem. O
mesmo ocorre conosco, sendo ignorantes, não podemos pensar e
ponderar sobre o bem e mal de confiar uma coisa às mãos de uma
outra pessoa. Assim, quando voltamos, não sabemos onde procurar.
Dessa forma o tesouro se perde. Oh Honrado pelo Mundo! O mesmo
se passa conosco, os Sravakas. Ouvimos todo o tipo de exortação do
Tathagata, mas não podemos mantê-la por muito tempo. É como no

Capítulo
Sobre
4– Longa Vida Página 71
caso do velho homem a quem foi confiado o tesouro. Somos ignoran-
tes agora e não sabemos o que indagar acerca dos preceitos.”

O Buda disse aos Monges: “Se me perguntarem agora, benefi ciarei


todos os seres. Este é o porquê de dizer que vocês devem indagar acer-
ca de quaisquer dúvidas que possam ter.”

Então, todos os Monges disseram ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Imagine, por exemplo: Existe um homem aqui de 25 anos, cheio de
vitalidade, correto e apropriado. Ele tem muitos tesouros, tais como
ouro, prata, gemas, etc. Ele tem seus pais, esposa, filhos, parentes, e
toda sua família. Então um homem chega e entrega um tesouro para
ele, dizendo: ‘Tenho coisas a fazer e estou prestes a empr
eender uma
longa viagem. Assim que conclua meus negócios, eu voltarei. Quando
eu retornar, devolva-me isto.’ Após aquilo, o jovem homem guarda
muito bem o tesouro, agindo como se fosse seu. O jovem homem ado-
ece e diz a alguém que é sábio e sabe como agir e ponderar as coisas:
‘Todo este ouro foi confiado aos meus cuidados. Quando o homem
voltar, entregue-lhe isto.’ Com os seus negócios concluídos, o homem
retorna, e aquilo que ele havia confiado [a um outro] encontra-se em
segurança, sem nada perder. O mesmo se passa com o Honrado pelo
Mundo. Se o tesouro for confiado a Ananda e aos Monges, ele não
perdurará muito tempo. Por que não? Porque todos os Sravakas e
Mahakashyapa devem morrer e a situação será inevitavelmente como
aquela do velho homem que recebe em confiança os bens de uma
outra pessoa. Em razão disto, todos os insuperáveis ensinamentos
Budistas devem ser confiados às mãos de todos os Bodhisattvas. Eles
discorrem bem (sobre os ensinamentos) e o tesouro viverá longamen-
te, florescerá por infinitos milhares de eras e beneficiará todos os seres
enormemente. Isto é como no caso do homem nos primórdios da vida
que recebe em confiança os bens de uma outra pessoa. Em razão disto,
todos os Bodhisattvas podem melhor colocar as questões. A riqueza
que temos pode ser comparada à de um mosquito ou outro inseto.
Como podemos questionar o Tathagata sobre as profundezas dos ensi-
namentos?” Posto isto, todos os Sravakas caíram em silêncio.
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 72
Então, o Buda, elogiou todos os Monges e disse: “Muito bom, muito
bom que todos vocês tenham atingido a incorruptível mente do Arhat.
Eu também pensava isto sobre mim. Em razão daquelas duas circns-
tâncias [isto é, que Sravakas não podem colocar questões e que Bodhi-
sattvas podem], eu confiarei o Mahayana a todos os Bodhisattvas e
permitirei que este Dharma Maravilhoso tenha longa vida”.

Então o Buda disse a todos na congregação: “Oh bons homens e boas


mulheres! Vocês não podem calcular a duração da minha vida. Nem a
fala sem obstruções de um Bodhisattva pode expressá-la plenamente.
Vocês podem, se desejarem, indagar-me sobre os preceitos ou como
tomar refúgio. Vocês podem fazê-
lo por uma segunda ou terceira vez.”

Naquela ocasião, em meio aos congregados, havia um Bodhisattva


Mahasattva do estágio do noviciado [isto é, do nono entre os dez níveis
do Bodhisattva]. Ele havia nascido numa família Brâhmane numa vila
chamada Tara. Seu nome de família era Mahakashyapa. Através do
poder transcendental do Buda, ele levantou-se do seu assento, desco-
briu seu ombro direito, circundou o Buda cem mil vezes, colocou seu
joelho direito no chão e, juntando as palmas das suas mãos, disse ao
Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Eu gostaria de indagar algo ao Buda
agora. Se me permitir, eu desejo falar.”

O Buda disse a Kashyapa: “O Tathagata, o Merecedor de Ofertas e


Todo-Iluminado permiti-lhe dizer o que desejar. Exporei para você,
claramente e sem dúvidas, e o alegrarei.”

Então o Bodhisattva Kashyapa novamente disse ao Buda: “Oh Honrado


pelo Mundo!O Tathagata, por piedade a mim, me dá permissão. Ago-
ra indagarei, mas a sabedoria que possuo é mesquinha, como aquela
de um mosquito ou outro inseto. Você, o Tathagata Honrado pelo
Mundo, é exaltado pelas virtudes pessoais e está rodeado por um sé-
quito tão fragrante quanto a madeira de sândalo, tão difícil de subju-
gar, e tão invencível quanto um leão. A pessoa do Tathagata é como
Capítulo
Sobre
4– Longa Vida Página 73
um verdadeiro diamante. Você brilha como o berilo. Tudo [sobre você]
é verdadeiro e difícil de contestar, e está rodeado por um grande ocea-
no de Sabedoria. Todos os Bodhisattvas Mahasattvas congregados aqui
são perfeitos na infinita e ilimitadas profundezas das virtudes. Eles são
como gandhahastins. Como posso formular questões diante de tal
congregação? Somente agora, protegido pelo poder divino do Buda e
por força da grande dignidade das virtudes morais das pessoas aqui
congregadas, formularei questões para você.”

Ele falou em versos:

“Como obteremos a longa vida,


o corpo adamantino e invencível?
Como ganharemos grande força?
Através deste sutra,
como atingiremos finalmente a outra margem?
Suplicamos-lhe que abra a porta do desconhecido (secreto) e,
para o benefício de todos os seres,
ensine-nos amplamente.

Como podemos nós, para o benefício das multidões,


tornarmo-nos um refúgio expansivo e,
embora não sendo Arhats,
tornarmo-nos iguais a Arhats?
Como podemos nós, em benefício de todos os seres,
antever os distúrbios de Papiyas [isto é, Mara, o demônio]?

Como podemos distinguir claramente


entre o que diz o Tathagata e o que diz Papiyas?
Como faremos para nos tornar um Grande Mestre Insuperável
satisfeito em seu coração
e falar acerca do ‘Paramartha-satya’ [A Verdade da Realidade Tran
s-
cendente],
tornarmo-nos plenos na boa justiça,
e falarmos acerca das quatro inversões?
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 74
Como você faz o bem?
Oh Grande Rishi! Por favor, diga-nos agora.
Como é que Bodhisattvas sondam a natureza insondável?

Como eles compreendem os significados


da palavra completa e da meia palavra [isto é, a palavra composta, feita
da junção do alfabeto do Sanskrito e possuindo significado, e as letras
do alfabeto e símbolos fonéticos no caso do Sanskrito]?
Como poderemos praticar simultâneamente duas ações divinas
tal como sarasa e karanda que andam juntas?

Como poderemos ser como o sol e a lua,


como as estrelas da noite e Júpiter?
Como poderemos, ainda que não aspirando,
ser chamados de Bodhisattvas?
Como todos os seres poderão obter o destemor (audácia),
como o ouro de Jambunada,
no qual nenhuma falha pode jamais ser encontrada?
Como poderemos, embora vivendo num mundo corrompido,
não ser corrompidos como a flor de lótus?

Como vivermos em meio às ilusões e


não sermos manchados e nem atacados pelos desejos,
como no caso de um médico que, curando todas as doenças,
não se contagia pela doença?
Como poderemos ser um capitão-do-mar,
se ainda náufragos em meio ao mar do nascimento e da morte?

Como poderemos abandonar o nascimento e a morte,


como a serpente o faz com sua pele velha?
Como meditarmos acerca dos Três Tesouros
e sermos como a árvore nos céus que responde bem aos nossos dese-
jos?
Como falaremos acerca dos Três Veículos e do Sobrenatural?
Como poderemos falar da Felicidade,
Capítulo
Sobre
4– Longa Vida Página 75
sendo ainda não agraciados com a Felicidade?
Como todos os Bodhisattvas podem ser indestrutíveis?

Como poderemos ser os olhos e um guia para uma pessoa nascida


cega?
Como poderemos ganhar uma mente multifacetada [mente rica em
conhecimento]?
Suplicamos-lhe, oh Grande Rishi!
Por favor, explique-nos!
Como você é capaz de girar a Roda da Lei
expandindo-a como a lua no início do mês?
Como você se manifesta novamente e atinge o Nirvana no final?
Como pode você, o corajoso,
avançar e mostrar a Via para seres humanos, celestiais e para Mara?

Como conhecermos o ‘Dharmata’ [essência da Realidade]


e tornarmo-nos abençoados com o Dharma?
Como todos os Bodhisattvas eliminam todas as enfermidades?
Como eles expõem para todos os seres os ensinamentos secretos?
Como eles expõem o que é final e o que não é final (ultimado)

Se podemos erradicar as dúvidas,


por que não explicar definitivamente?
Como atingiremos a Suprema Via Insuperável?
Suplico ao Tathagata, para o benefício dos Bodhisattvas,
expor os mais profundos e mais maravilhosos ensinamentos.
Todas as coisas possuem a natureza da paz e da felicidade.

Exponha em detalhes para nós, por favor,


oh Grande Rishi Honrado pelo Mundo!
Oh Grande Refúgio! Oh Honrado Duplamente Realizado,
o mais Maravilhoso de Todos os Remédios!
Agora desejo saber tudo sobre as coisas,
mas não tenho Sabedoria;
e mesmo todos os Bodhisattvas
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 76
que fazem um supremo esforço podem não conhecer
tais profundezas do mundo de todos os Budas.”

Então, elogiando o Bodhisattva Kashyapa, o Buda disse: “Bem falado,


bem falado, oh bom homem! Você ainda não alcançou o Pleno-
Conhecimento, mas eu sou alguém que o atingiu. Você agora me inda-
ga acerca das mais recônditas profundezas da doutrina secreta. Veja,
oh bom homem! Eu, sentando sob a Árvore Bodhi, atingi pela primeira
vez a correta iluminação. Naquela ocasião, em todas as terras Búdicas,
tão numerosas quanto às areias de incontáveis asamkhyas de Rios
Ganges, havia Bodhisattvas. Eles também me indagaram sobre o signi-
ficado desta mais profunda doutrina. E a virtude do que eles disseram
era assim, a mesma, não diferente. Indagando-me assim, grandes be-
nefícios advirão para todos os seres.

Então o Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo n-


Mu
do! O poder da minha sabedoria não é longínquo a ponto de colocar
questões de tais profundezas ao Tathagata. Oh Honrado pelo Mundo!
Isto é como um mosquito ou uma mosca que não pode voar sobre o
grande oceano ou voar em torno dos mais altos céus. O mesmo se
passa comigo. Não tenho poder para indagar o Tathagata acerca deste
grande oceano de Sabedoria ou sobre o significado das grandes pro-
fundezas e amplidão do ‘Dharmata’. Oh Honrado pelo Mundo! Isto é
como no caso de um rei que concede ao oficial encarregado dos tesou-
ros uma gema brilhante que estava alojada no nó do seu cabelo, e o
oficial, ao recebê-la, reforça a guarda. O mesmo é o caso comigo. Ten-
do recebido os profundos ensinamentos do Mahayana do Tathagata,
os guardarei a todos o mais cuidadosamente. Por quê? Isto é apenas
para me fazer atingir as grandes profundezas da Sabedoria.”

Capítulo
Sobre
4– Longa Vida Página 77
O Segredo da Longa Vida

Então o Buda disse a Kashyapa: “Oh bom homem! Ouça claramente,


ouça claramente! Eu agora lhe direi a causa da longevidade da vida do
Tathagata. O Bodhisattva, através desta ação, ganha longa vida. Por
esta razão, ouça-a com a sua melhor atenção. Tendo ouvido-a, fale a
respeito dela para outros. Oh bom homem! Praticando assim, eu atingi
o insuperável Bodhi. Eu, para o benefício de todos os seres, agora falo a
respeito disto. Oh bom homem! Como um exemplo: um príncipe
transgride as leis do estado e está encarcerado na prisão. O rei sente
piedade dele e, subindo num palanquim, condena-se à prisão porque
ama o príncipe. O mesmo ocorre com o Bodhisattva. Se ele deseja ter
uma longa vida, ele deveria guardar e proteger os seres, considerá-los
como se fossem seu filho único, e perseverar no grande amor, grande
compaixão, grande alegria, e grande equanimidade. Também, ele de-
veria propagar-lhes o preceito de não-ferir e ensinar-lhes a praticar
todas as boas coisas. Também, ele deveria deixar todos os seres perse-
verarem pacificamente nos cinco preceitos morais e nas dez boas a-
ções. Além disso, ele deveria entrar nos reinos do inferno, fome, ani-
malidade, e ira; e libertar todos os seres de onde quer que estejam
sofrendo, emancipar aqueles ainda não emancipados, atravessar aque-
les que ainda não alcançaram a outra margem, dar o Nirvana àqueles
que ainda não o atingiram, e consolar a todos aqueles que vivem com
medo. Agindo assim, o Bodhisattva ganha a longevidade da vida e uma
imperturbável liberdade no conhecimento. E quando o fim chegar, ele
ganhará vida nos elevados céus.”

Então o Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mun-


do! Você diz que o Bodhisattva-Mahasattva considera todos os seres
como se fossem filhos únicos. Este pensamento é muito profundo e eu
não posso compreendê-lo. Oh Honrado pelo Mundo! Você diz que o
Bodhisattva olha todos os seres com equidade e os olha como olharia
seu único filho. Mas, as coisas não são assim. Por que não? Em meio
aos Budistas, há aqueles que violam os preceitos morais, aqueles que

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 78


cometem pecados mortais, e aqueles que transgridem o Dharma Ma-
ravilhoso. Como é possível que ele [o Buda] tenha o mesmo pensamen-
to tanto em consideração a eles como em consideração ao seu único
filho?”

O Buda disse a Kashyapa: “Isso mesmo, isso mesmo! Eu vejo todos os


seres como vejo o meu próprio Rahula.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Certa vez, no décimo-quinto dia do mês, no dia de posadha (um encon-
tro realizado a cada quinze dias por Shakyamuni e seus seguidores, no
qual eles recitavam os preceitos e seus seguidores confessavam e se
arrependiam de quaisquer faltas), em meio aos congregados que eram
fiéis e puros nos preceitos morais, havia um menino que não observava
seriamente as três ações do corpo, da boca e da mente. Ele escondia-
se num lugar escuro e ouvia secretamente o que era dito. Guhyapada,
recebendo o poder divino do Buda, triturou este menino com um vajra
(cetro). Oh Honrado pelo Mundo! Guhyapara agiu tão maldosamente
que a vida do menino foi tirada. Como você poderia olhar todos os
seres como se fossem o seu própr
io Rahula?”

O Buda disse a Kashyapa: “Não fale assim! Este menino era nada mais
que uma transformação, não uma verdade. Ele era assim apenas para
reprimir a quebra dos preceitos e a transgressão do Buda-Dharma, e
para aperfeiçoar os seres. Mesmo o vajra e também Guhyapada eram
existências transformadas (tranformações). Oh Kashyapa! Há no mun-
do aqueles que caluniam o Dharma Maravilhoso, icchantikas (pessoas
de descrença incorrigível), aqueles que fazem mal aos outros, que per-
sistem em visões distorcidas, que agem propositadamente contrários
aos preceitos morais. Eu tenho piedade de todos e um sentimento de
compaixão, assim como em consideração a um filho único, como é no
caso de Rahula. Oh bom homem! Para ilustrar: quando os oficiais da
corte real violam as leis do estado, o rei os pune de acordo com as
regras relacionadas aos crimes cometidos e não os deixa sem punição.
O Tathagata não age assim. Ele faz com que aqueles que violam os
Capítulo
Sobre
4– Longa Vida Página 79
preceitos sejam submetidos a situações de serem banidos, repreendi-
dos, colocados sob vigilância, acusados ou banidos pela não-confissão
dos pecados cometidos, pelo não-arrependimento, e pelo não-
abandono das visões distorcidas. A razão pela qual, oh bom homem, o
Tathagata impõe preceitos morais proibitivos àqueles que caluniam o
Dharma vem do fato de que ele deseja mostrar aos trangressores que
conseqüências cármicas advirão daquilo que eles fizeram. Oh bom
homem! Saiba que o Tathagata deseja ensinar aos seres maus que eles
não necessitam ter medo. Ele emite um, dois, ou cinco sinais, tal que
aqueles que encontram esta luz se libertarão de todas as más ações.
Agora, o Tathagata possui incontáveis meios para exercer tal poder. Oh
bom homem! Se você deseja ver o Dharma que não pode ser visto, Eu
agora explicarei a você tudo acerca daquilo que você pode ver.

O Verdadeiro Discípulo

Quando eu tiver entrado no Nirvana, um Monge que é perfeito na


conduta de um Monge, e que mantém em observância o Dharma Ma-
ravilhoso, pode deparar com um que o transgride. Se este Monge se
afasta, repreende, censura, ou corrige tal mal-feitor, ele será abençoa-
do com uma riqueza que não podemos medir ou conceber. Oh bom
homem! Para ilustrar: existe um rei tirano que perpetra más ações, e
acontece de ele vir a sofrer muito seriamente de uma enfermidade. O
rei de um país vizinho, ouvindo isto, mobiliza o exército para conquistar
o seu país. Neste momento, o rei, não tendo poder para resistir ao

ataque, arrepende-se,
rei daquele país vizinhotenta fazerincalculável.
torna-se o bem e, dessa forma,
O mesmo se apassa
fortuna
comdoo
Monge observador dos preceitos. Se ele se afasta ou repreende aque-
les que agem contra o Dharma, e faz com que eles façam o bem, uma
riqueza incalculável tornar-se-á sua. Oh bom homem! Como uma ilus-
tração: nos campos e ao redor da casa onde mora um homem rico,
crescem muitas plantas daninhas e venenosas. Vendo isto, ele as ceifa,
não deixando qualquer uma delas. Ou quando cabelos brancos apare-

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 80


cem na cabeça de uma pessoa jovem, ela sente vergonha deles, corta-
os e não permite que seus cabelos cresçam muito. O mesmo é o caso
com o Monge observador dos preceitos. Se ele vê quaisquer pessoas
que violam os preceitos e que transgridem o Dharma Maravilhoso, ele
se afastará, repreenderá ou censurará tais pessoas. Se um bom Monge,
vendo aqueles que transgridem o Dharma, não se afastar, repreender
ou censurar tais pessoas, saiba que este Monge é um inimigo dos ensi-
namentos Budistas. Se ele se afasta, repreende ou censura tais pesso-
as, ele é meu discípulo, um Verdadeiro Discípulo.”

O Bodhisattva Kashyapa disse novamente ao Buda: “Oh Honrado pelo


Mundo! Você pode dizer que considera todos os seres igualmente e
trata-os como trataria seu filho único, Rahula. Isto não é assim. Oh
Honrado pelo Mundo! Uma pessoa pode tentar ferí-lo com uma espa-
da, ou pode haver alguém que tente pintar o corpo do Buda com pasta
de madeira de sândalo. Se for este o caso em que você vê essas duas
pessoas com os mesmos olhos, como poderia remir ofensas morais? Se
for este o caso em que remis ofensas morais, isto não faz
entido.”
s

A Parábola do Pai Rigoroso

O Buda disse a Kashyapa: “Uma ilustração, oh bom homem! O rei, o


ministro e o primeiro-ministro podem desejar promover seus filhos
que são bem aparentados e refinados no intelecto. Um daqueles pais
pega um, dois, três, quatro filhos e encaminha-os para um rigoroso

professor e diz-lhe:
comportamento, ‘Porescrita
artes, favor, eensine aosEstes
cálculo. meus filhos
meus conduta,
quatro filhosbom
estu-
darão sob seus cuidados. Mesmo que três desses meus filhos morram
sob o rigor dos ensinamentos, ensine o último através de quaisquer
meios que você pense ser adequado. Eu posso perder os três, mas não
me envergonharei.’ Oh Kashyapa! O pai e o professor são responsáveis
pelas mortes?”

Capítulo
Sobre
4– Longa Vida Página 81
“Não, Honrado pelo Mundo! Por que não? Por que um sentimento de
amor era a base [das suas ações]. O que existe é um desejo de realiza-
ção, mas não um mau pensamento. Tais ensinamentos serão bem
ministrados, e sua extensão será ilimitada.”

“Oh bom homem! O mesmo é o caso com o Tathagata.eElolha aque-


les que transgridem o Dharma como olha seu filho único. Agora, o Ta-
thagata confia o insuperável Dharma Maravilhoso às mãos de reis,
ministros, altos-ministros, Monges, Monjas, leigos e leigas. Todos esses
reis, ministros, e as quatro classes da Sangha Budista encorajarão aque-
les que praticam os ensinamentos Budistas e permitir-lhes-ão gradati-
vamente manter em observância os preceitos morais, as práticas medi-
tativas e a sabedoria. Se houver alguém que fracasse nesses três aspec-
tos (dos ensinamentos) do Dharma e se houver aqueles que são indo-
lentes e que violem os preceitos morais; os reis, ministros, e as quatro
classes da Sangha Budista trabalharão duro e recuperarão tais pessoas.
Oh bom homem! Poderiam todos esses reis, ministros, e as quatro
classes da Sangha Budista serem culpados ou não?”

“Realmente, não, Honrado pelo Mundo!”

“Oh bom homem! Esses reis, ministros e as quatro classes da Sangha


Budista não podem ser culpados. Como poderia ser culpado o Tathaga-
ta? Oh bom homem! O Tathagata observa a tudo com tal imparcialida-
de, considerando todas as pessoas como se fossem seu filho único.
Chama-se praticante da Via aquele que pratica o pensamento igualitá-
rio de um Bodhisattva e aquele que possui o sentimento de quem ama
seu filho único. Oh bom homem! O Bodhisattva, praticando assim,
obtém uma longa vida e estará apto a ver o que aconteceu no passa-
do.”

O Bodhisattva Kashyapa disse novamente ao Buda: “Oh Honrado pelo


Mundo! Você diz que um Bodhisattva, praticando a imparcialidade,
pode ver a todos os seres exatamente como veria seu filho único, e que
tal pessoa obteria uma longa vida. Mas, você não poderia dizer isto.
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 82
Por que não? Alguém que realmente conheça o Dharma, fala bem das
obrigações filiais. Mas, retornando para casa, ele agride seus pais com
telhas e pedras, [a despeito] do fato de os pais serem o melhor campo
de prosperidade, de onde advém muita felicidade, tal como a mais
difícil (felicidade) dentre as mais difíceis de encontrar. Onde a pessoa
deveria fazer oferecimentos, ela pratica a maldade. Existe uma distin-
ção entre o que esta pessoa sabe e o que ela faz. Aquilo que o Tathaga-
ta diz é semelhante a isto. O Bodhisattva pratica a imparcialidade e vê
todos os seres como se visse seu filho único, ele obtém a longa vida,
pode olhar através do passado, viver eternamente, e não pode haver
qualquer alteração (desta situação). Agora, por que é que o Honrado
pelo Mundo é como qualquer pessoa com vida mais curta no mundo?
Não estariao Tathagata alimentando o ódioentre todosos seres? Oh
Honrado pelo Mundo! Que más ações você praticou no passado?
Quantas más ações você cometeu, tal que obtivesse uma vida mais
curta, que nem mesmo vai além dos 100 anos?”

O Buda disse a Kashyapa: “Oh bom homem! Sob que circunstâncias


você despeja através dos seus lábios tantas palavras grosseiras contra o
Tathagata? A vida do Tathagata é a mais longa e mais elevada das vidas
eternas. O seu Dharma eterno é insuperável dentre todas as coisas
eternas.”

Paramartha-satya

O Bodhisattva
Mundo! Como Kashyapa disse novamente
você, o Tathagata, obteve a ao
vidaBud
a: “Oh Honrado pelo
eterna?”

O Buda disse ao Bodhisattva Kashyapa: “Oh bom homem! Existem oito


grandes rios, quais sejam: 1) Ganges, 2) Yamuna, 3) Sarabhu, 4) Ajitava-
ti, 5) Mahi, 6) Indus, 7) Pasu, e 8) Sita. Todos estes oito grandes rios e
outros rios menores correm para o grande oceano. Oh Kashyapa! To-
dos os grandes rios da vida de todas as pessoas, dos seres celestiais, da

Capítulo
Sobre
4– Longa Vida Página 83
terra e dos céus correm para o oceano da vida do Tathagata. Sendo
assim, a longevidade da vida do Tathagata é incalculável. Além disso,
ainda ocorre o seguinte, oh Kashyapa! Como uma ilustração: é como o
caso do Lago Anavatapta, que abarca (as águas de) quatro rios. O
mesmo se passa com o Tathagata. Ele abarca todas as vidas. Oh Kash-
yapa! Como um exemplo: dentre todas as coisas eternas, a (eternida-
de) do espaço é suprema. O mesmo é o caso com o Tathagata. Ele é
supremo dentre todas as coisas eternas. Oh Kashyapa! Isto é como no
caso do sarpirmanda [o mais delicioso e eficaz remédio], o primeiro
dentre todos os remédios. O mesmo é o caso com o Tathagata. Ele é
dotado da mais longa vida.”

O Bodhisattva Kashyapa disse novamente ao Buda: “Se a vida do a- T


thagata é assim, você deveria viver por mais um kalpa, ou menos que
um kalpa, e proferir serm
ões da forma como a grande chuva cai.”

“Oh Kashyapa! Não distorça a idéia da extinção com respeito ao Tath


a-
gata. Oh Kashyapa! Pode haver em meio aos Monges, Monjas, leigos e
leigas; ou mesmo em meio aos tirthikas [seres deludidos, não-
Budistas], uma pessoa que possua os cinco poderes divinos ou o poder
ilimitado de um Rishi (Grande Sábio). Essa pessoa pode viver um kalpa
ou menos que um kalpa; ela pode ser capaz de voar através do ar, e ser
imperturbável se estiver reclinada ou sentada. Ela pode soltar fogo do
lado esquerdo do seu corpo e água do seu lado direito. Seu corpo pode
soltar fumaça e labaredas como uma bola de fogo. Se ela desejar viver
longamente, ela poderá fazê-lo como desejar. Ela pode prolongar ou
encurtar a sua vida livremente. Com tais poderes divinos, ela possui
liberdade de poder. Como isso não seria possível com o Tathagata, que
possui ilimitado poder sobre todas as coisas? Como não seria possível
que ele pudesse viver a metade de um kalpa, um kalpa, 100 kalpas, 100
mil kalpas, ou inumer
áveis kalpas? Em razão disto, saiba que ‘o Tath
a-
gata é uma existência eterna e imutável’. O corpo do Tathagata é um
corpo transformado (não nascido) e não é nutrido pelos vários tipos de
alimentos. No sentido de conduzir os seres à outra margem, ele mani-
festa-se em meio às árvores venenosas. Dessa forma, ele manifesta-se
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 84
descartando seu corpo carnal e entrando no Nirvana. Saiba, oh Kash-
yapa, que o Buda é uma existência eterna e imutável. Oh todos vocês!
Pratiquem a Via neste Paramartha-satya [Verdade da Realidade Trans-
cendente], façam esforço, e pratiquem a Via com pensamento único;
tendo praticado a Via, exponha-
a amplamente aos outros.”

Então, o Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo n- Mu


do! Que diferença há entre o Dharma supramundano e o mundano?
Você disse que o Buda é uma existência eterna e imutável. Se assim é,
na vida mundana, também, temos Brahma que é eterno, e também
Isvara que é eterno, e não há mudança. A eterna natureza do Eu tam-
bém é eterna; mesmo uma minúscula partícula também é dita ser e-
terna. Se o Tathagata é uma existência eterna, por que o Tathagata não
se mostra sempre dessa forma? Se é que você não existe assim, que
diferença poderíamos ver? Por quê? Porque Brahma, a existência de
uma partícula, e prakriti [matéria primordial] também não se manifes-
tam assim.”
O Buda disse a Kashyapa: “Um homem rico possui muitas cabeças de
gado, cujas cores variam; não obstante, elas são todas de um grupo.
Elas são confiadas às mãos de um vaqueiro, que as conduz para terras
abundantes em água e grama. Somente o sarpirmanda [o mais delicio-
so e eficaz remédio] é desejado, não o leite fresco ou a nata. O pecua-
rista, tendo ordenhado as vacas, obtém o leite em si. Quando o ho-
mem rico morre, as vacas são furtadas por ladrões. Eles pegam as va-
cas, mas não havendo mulheres, eles mesmos ordenham as vacas. Os
ladrões dizem uns aos outros: ‘O homem rico alimentou essas vacas
para produzir sarpirmanda, não para leite fresco ou nata. O que fare-
mos? O sarpirmanda possui o melhor de todos os sabores do mundo.
Não possuímos utensílios e nem um lugar para guardá-lo em seguran-
ça.’ Eles também dizem uns aos outros: ‘Nós temos um capuz. Pod e-
mos guardá-lo nele. Embora tenhamos algo para guardar o leite, não
sabemos como batê-lo. É difícil conseguir algo que pudéssemos beber.
Como poderíamos obter a manteiga fresca?’ Nisto, os ladrões, em r- vi
tude de que o sarpirmanda era o que eles obteriam após, adicionaram
Capítulo
Sobre
4– Longa Vida Página 85
água ao leite. Mas, em razão de terem adicionado muita água, o leite
fresco, a nata e o sarpirmanda foram perdidos. O mesmo se dá com os
mortais comuns. Existem bons ensinamentos. Mas, todos são os resí-
duos do Dharma Maravilhoso do Tathagata. Como? O Tathagata entra
no Nirvana. Mais tarde, nós roubamos o que foi deixado para trás; isto
é, os preceitos, o samadhi, e a Sabedoria. Isto é como os ladrões rou-
bando as vacas. Todos os mortais comuns obtêm preceitos, samadhi, e
Sabedoria; mas, eles não possuem meios para trabalhá-los [aperfeiço-
ando-os, implementando-os]. Dessa forma, eles nunca obtêm os pre-
ceitos eternos, o samadhi eterno, a Sabedoria eterna, e a emancipação.
Isto é como no caso dos ladrões que não possuindo meios para produ-
zir [levando adiante o que eles queriam], perderam, assim, o sarpir-
manda; ou é como os ladrões adicionando água quando eles pretendi-
am obter o sarpirmanda. O mesmo se passa com os mortais comuns.
Referindo-se à emancipação, os seres dizem que o Eu, o ser, a vida,
humano, Brahma, Isvara, prakriti (matéria primordial), os preceitos,
samadhi, Sabedoria, emancipação, ou Estado de nem percepção nem
não- percepção [naivasamjnanasamjnayatana], ou Nirvana é Nirvana.
Isto, todavia, não leva à emancipação ou Nirvana. Isto é como os la-
drões falhando em obter o sarpirmanda. Os mortais comuns fazem
boas e puras ações em pequena escala, e fazem oferecimentos aos
seus pais. Então, eles obtêm o renascimento no céu e atingem uma
felicidade de pequena escala. Isto é como o leite ao qual os ladrões
adicionaram água. E os mortais comuns, em si, não conhecem o fato de
que se nasce no céu em razão de ações puras de pequena escala e por
fazer oferecimentos aos seus pais. Também, eles não conhecem os
preceitos morais, o samadhi, a Sabedoria e buscam refúgio nos Três
Tesouros. Não conhecendo [tudo isto], eles falam sobre Eternidade,
Felicidade, Eu e Pureza. Embora falem, eles não sabem o que é isto.
Dessa forma, após nascer nesta vida, o Tathagata fala acerca da Eterni-
dade, Felicidade, Eu e Pureza. Um Chakravartin [supremo monarca do
mundo] aparece no mundo. Em razão do poder das suas virtudes, to-
dos os ladrões se afastam, e não há perda de nenhuma vaca. Esta pes-
soa utiliza bem os meios e obtém sarpirmanda. Devido ao sarpirmanda,
não há doenças ou dores para os seres. Assim é. Quando o Chakravar-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 86
tin da roda do Dharma aparece no mundo, todos os seres abandonam
isto (isto é, falar acerca da Eternidade, Felicidade, Eu e Pureza), porque
eles não podem falar acerca dos preceitos, samadhi e Sabedoria. Isto é
como a fuga dos ladrões. Então, o Tathagata realmente fala das coisas
seculares e supramundanas. Para o benefício dos seres, ele permite
que o Bodhisattva fale conforme surja a ocasião. O Bodhisattva-
Mahasattva, obtendo o sarpirmanda, permite a todos os inumeráveis
seres obterem o insuperável Maná do Dharma. A Eternidade, a Felici-
dade, o Eu e a Pureza do Tathagata, assim, são alcançadas. O Tathagata
é aquele que é eterno e imutável. Isto não é da maneira como os mor-
tais comuns e os ignorantes do mundo dizem que Brahma é eterno.
Esta eternidade está sempre com o Tathagata e não com qualquer
outro. Oh Kashyapa! Todos os bons homens e boas mulheres deveriam
sempre praticar cuidadosamente a Via do Buda Bi-Silábico, que é eter-
no [isto é, em Chinês ‘Nyo -rai’ – consistindo de duas sílabas ou caracte-
res – significa ‘Tathagata’, ‘Aquele que vem da Realidade Transcende n-
te’]. O Kashyapa! Qualquer bom homem ou boa mulher que pratique a
Via do (Buda) Bí-Silábico estará em concordância com o que eu faço e
nascerá onde eu for. Se qualquer pessoa prática as duas sílabas e as vê
como extinção, saiba que o Tathagata entra no Parinirvana para ela. Oh
bom homem! Nirvana é o ‘Dharmata’ [A Verdadeira Essência] de todos
os Budas.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “O que pode significar o


‘Dharmata’ do Tathagata? Oh Honrado pelo Mundo! Eu, agora, desejo
saber sobre o ‘Dharmata’. Tenha piedad e e exponha isto para mim
extensivamente. Ora, ‘Dharmata’ significa ‘abandono do corpo’. n-
Aba
donar significa ‘não possuir’. Se não é possuído, como pode existir o
corpo? Se o corpo existe, como podemos dizer que há ‘Dharmata’ no
corpo? Se o corpo possui ‘Dharmata’, como pode o corpo existir?o- C
mo posso compreender isto?”

O Buda disse a Kashyapa: “Oh bom homem! Não fale assimque – ex-
tinção é ‘Dharmata’. Ora, o ‘Dharmata’ compreende a não extinção. Oh
bom homem! Isto é como com o céu do Não-Pensamento [o quarto
Capítulo
Sobre
4– Longa Vida Página 87
céu dhyana do rupadhatu– Reino da Forma], onde não há pensamento
de matéria, embora a matéria esteja perfeitamente dotada. Pode-se
perguntar: ‘Como, então, os devas (espíritos intimamente ligados e
integrados à natureza, ou seja, aos cinco elementos) podem viver lá,
satisfazer-se e divertir-se, ter paz, e como eles pensam, vêem e inda-
gam?’ Oh bom homem! O mundo do Tathagata não é aquele quea-Sr
vakas e Pratyekabudas podem compreender. Não explique assim (co-
mo o fez) e diga que o corpo do Tathagata é extinção. Oh bom homem!
O Tathagata e extinção são assuntos para o mundo dos Budas. Não
está ao alcance do conhecimento de Sravakas e Pratyekabudas. Oh
bom homem! Não envide tais pensamentos como sobre onde o Tatha-
gata vive, onde ele trabalha, onde ele está para ser visto, onde ele se
diverte. Oh bom homem! Essas, também, são coisas que não se ajus-
tam ao alcance do vosso conhecimento. Todas as coisas relativas ao
Corpo-do-Dharma de todos os Budas, e todas as coisas relativas aos
vários (meios) expedientes estão além do alcance do conhecimento
mundano”.

O Todo-Maravilhoso dos Três Tesouros

“Também, além disso, oh bom homem! Pratique os ensinamentos do


Buda, do Dharma e da vida da Sangha (que são os Três Tesouros), e
persevere no pensamento sobre o Eterno. Essas três coisas não se con-
tradizem. Não existe forma do não-eterno, nem mudança. Qualquer
pessoa praticando essas três (coisas) como coisas que diferem (entre

si),
Istofalha
quer nos
dizerTrês
queRefúgios que
tal pessoa são puros.
carece de um Isto
lugarnós
paradeveríamos
se abrigar. saber.
(Se) o
preceito não for completamente compreendido; nenhum fruto poderá
advir de Sravakas ou Pratyekabudas. Qualquer um que persevere no
pensamento do Eterno neste Todo-Maravilhoso tem um lugar para se
refugiar. Oh bom homem! É como a sombra acompanhando uma árvo-
re. O mesmo é o caso com o Tathagata. Como existe o Eterno, existe
um refúgio que pode ser buscado. Não é não-eterno. Uma vez que se

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 88


diga que o Tathagata é não-eterno (impermanente), ele não poderá ser
um refúgio para todos os seres celestiais e pessoas do mundo.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Por


exemplo, é como o caso de uma árvore na escuridão, onde não há
sombra.”

“Oh Kashyapa! Não diga que existe uma árvore e que ela não tem
sombra. Isto é meramente porque os olhos carnais não podem vê-la. O
mesmo ocorre com o Tathagata. Sua natureza é eterna, é imutável.
Não podemos vê-la sem os olhos da Sabedoria. Isto é como no caso
onde nenhuma sombra da árvore aparece na escuridão. Os mortais
comuns, após a morte do Buda, poderão dizer: ‘O Tathagata é -não
eterno’. É o mesmo caso. Se dizemos que o Tathagata difere do Dha
r-
ma e da Sangha, não poderá haver os Três Refúgios. Isto é como no
caso em que, seus pais como são diferentes um do outro, existe o não-
eterno.”
O Bodhisattva Kashyapa disse novamente ao Buda: “Oh Honrado pelo
Mundo! Daqui por diante, eu, pela primeira vez, com a Eternidade do
Buda, do Dharma e da Sangha, iluminarei os pais por eras, até a sétima
geração. É realmente maravilhoso! Oh Honrado pelo Mundo! Eu agora
aprenderei o Todo-Maravilhoso do Tathagata, do Dharma e da Sangha.
Tendo me satisfeito, exporei isto amplamente para todos os outros. Se
eles não tiverem fé no ensinamento, saberei que eles têm praticado
extensivamente o não-Eterno. Para pessoas assim, serei como a geada
e o granizo.”

Então o Buda elogiou o Bodhisattva Kashyapa e disse: “Disse bem, disse


bem! Você agora realmente protege e ostenta o Dharma Maravilhoso.
Esta proteção do Dharma não está fraudando as pessoas. Pela boa
ação de não fraudar os outros, obtemos uma longa vida e nos torna-
mos aptos a ler as nossas vidas passadas.”

Capítulo
Sobre
4– Longa Vida Página 89
Capítulo Cinco: Sobre o Corpo Adamantino
“Então o Honrado pelo Mundo disse a Kashyapa: “Oh bom homem! O
corpo do Tathagata é aquele que é eterno, é aquele que é indestrutí-
vel, é aquele que é adamantino, e aquele que não é nutrido pelos vá-
rios tipos de alimentos. É o Corpo-do-
Dharma.”

Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Nós não vemos tal
corpo da forma como você fala. O que vemos é aquele que é não-
eterno, destrutível, de pó, e que é sustentado pelos vários tipos de
alimentos. Como? Em que você, o Tathagata, está agora prestes a en-
trar no Nirvana.”

O Buda disse a Kashyapa: “Não diga que o corpo do Tathagata não é


forte, que pode ser facilmente quebrado, e que é o mesmo que aquele
dos mortais comuns. Oh bom homem! Saiba que o corpo do Tathagata
é tão indestrutível quanto algo que dure por incontáveis bilhões de
kalpas. Ele não é um corpo humano e nem celestial, não é aquele que
teme, e nem é nutrido pelos vários tipos de alimentos. O corpo do
Tathagata é aquele que não é um corpo e ainda o é. É aquele não nas-
cido e aquele que não morre. É aquele que não aprende ou pratica. É
incomensurável, ilimitado, e não deixa qualquer rastro atrás de si. Não
se conhece e não há qualquer forma de representá-lo. É puro em últi-
ma instância. Não se agita. Não recebe, nem age. Não reside, não faz. É
insípido e não misturado. Ele é um ‘é’ e mesmo assim não é algoa-cri
do. Não é ação e nem fruição [isto é, é além do Karma]. Não é aquele

que é feito,
surável; é o eTodo-Maravilhoso,
nem aquele que morre. Não ée pensamento;
é o Eterno, não éNão
o não presumível. men-é
consciência e está para além da mente. E, no entanto, ele não se sepa-
ra da mente. É um pensamento que é um-todo- igual. Não é um ‘é’; no
entanto, ele é o que ‘é’ é. Não existendo
i nem vindo; no entanto, vai e
vem. Não quebra. É indestrutível. Não se apega e não cessa. Ele não
surge, nem se extingue. Não é mestre e, no entanto, um mestre. Não é
algo que existe; nem não existe. Não acorda, nem vê. Não é letra, e não

CapítuloSobre
5– o Corpo Adamantino Página 91
é não-letra. Não é Dhyana e não é não-Dhyana. Não pode ser visto e
pode ser bem visto. Não é um lugar e, no entanto, é um lugar. Não é
uma morada e, no entanto, é uma morada. Não é escuro e nem brilha.
Não há quietude e, no entanto, há quietude. É não-posse, não-
recebimento, e não-doação. É puro e imaculado. Não é desavença e
jamais luta. É o que está vivo e não é o que está vivo. Não é conquista e
nem queda. Não é coisa e não é não-coisa. Não é campo de prosperi-
dade e não é um não-campo de prosperidade. É sem fim e não termi-
na. É distinção e é um todo. É vazio e é distinto do Vazio. Embora não
eterno, não é o caso em que ele morre momento após momento. Não
há corrupção e imundície. Não há letra e é distinto das letras. Não é voz
e nem fala. Não é prática e aprendizado. Não é elogio e nem opressão.
Não é uno e nem distinto. Não tem forma ou características. Tudo é
um grandioso adorno. Não é corajoso e nem medroso. Não é quietude
e não é quieto. É caloroso e não é quente. Não pode ser visto; não há
forma para representá-lo. O Tathagata socorre todos os seres. Embora
não emancipáveis, ele, de fato, ainda emancipa os seres. Não havendo
emancipação, o que existe é o despertar dos seres. Não havendo ilu-
minação, ele realmente oferece sermões. Não havendo dualidade, ele
é imensurável e é incomparavelmente igual. Sendo tão plano quanto o
espaço, não há forma para representá-lo. Sendo igual à natureza de
todos os seres, ele não é o ‘não
-é’, nem é o ‘é’. Ele sempre pratica o
Veículo Único. Ele vê a árvore dos seres e não retrocede, não muda, e
erradica todas as raízes da ilusão. Ele não luta ou toca. Ele é não-
natureza e, no entanto, reside na natureza. Ele não mistura e não dis-
persa. Ele não é longo e nem curto. Ele não é redondo e nem quadra-
do. Ele não é um skandha (agregado), esfera ou mundo e, no entanto,
ele é o skandha, a esfera e o mundo. Ele é não-crescente e não é min-
guante. Ele é não vitorioso e, no entanto, não é vencido. O corpo do
Tathagata é perfeito em tais inumeráveis virtudes. Não há nada que ele
saiba, e nem não saiba. Não há nada que ele veja e nada que ele não
veja. Não é aquilo que há em qualquer criação e nem há na não cria-
ção. É não-mundano e não é não-mundano. Ele não é feito e não é
não-feito. Ele é não-dependente e não é não-dependente. Ele não é os
quatro grandes elementos, nem é não os quatro grandes elementos.
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 92
Ele não é causa e não é não-causa. Ele não é ser e não é não-ser. Ele
não é Sramana, nem Brahman. Ele é o Leão, o Grande Leão. Ele é nin-
guém e não-ninguém. Não podemos expressar. A não ser a partir da
unicidade do Dharma, nenhuma avaliação é possível. Por ocasião do
Parinirvana, ele não entrou no Parinirvana. O Corpo-do-Dharma do
Tathagata é perfeito em todas essas inumeráveis e maravilhosas virtu-
des. Oh Kashyapa! Somente o Tathagata conhece todas essas fases da
existência. Tudo está além do que Sravakas e Pratyekabudas podem
compreender. Oh Kashyapa! O corpo do Tathagata é composto de
todas essas virtudes. Ele não é um corpo mantido ou nutrido pelos
vários gêneros alimentícios. Oh Kashyapa! Tais são as virtudes do ver-
dadeiro corpo do Tathagata. Como ele poderia sofrer de doenças, as
dores das enfermidades, e da insegurança? Como ele poderia ser tão
frágil quanto uma peça de louça não queimada? Oh Kashyapa! A razão
pela qual o Tathagata manifesta a doença e a dor vem do seu desejo de
subjugar os seres. Oh bom homem! Saiba agora que o corpo do Tatha-
gata é aquele que é adamantino. De agora em diante, pense exclusi-
vamente sobre este significado. Nunca pense de um corpo sustentado
por alimentos. Também, diga a todos os seres que o corpo do Tathaga-
ta é o Corpo-do-Dharma.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! O


Tathagata é perfeito em tais virtudes. Como poderia tal corpo sofrer de
doença e dor, impermanência e destruição? Doravante eu considerarei
o corpo do Tathagata como o do eterno Corpo-do-Dharma e o corpo
da paz. Também, falarei dele como tal para todos os outros. Sim, real-
mente, o Corpo-do-Dharma do Tathagata é adamantino e indestrutível.
Embora eu não saiba ainda como ele poderiair va ser assim.”

O Buda disse a Kashyapa: “Pelo fato de manter (em observância) e-


corr
tamente o Dharma Maravilhoso, obtém-se este corpo adamantino. Oh
Kashyapa! Como no passado eu preservei bem o Dharma, sou agora
abençoado com a consecução deste corpo adamantino, que é eterno e
indestrutível. Oh bom homem! Aquele que mantém o Dharma Maravi-
lhoso não recebe os cinco preceitos e práticas de conduta, mas prote-
CapítuloSobre
5– o Corpo Adamantino Página 93
ge-o com a espada, o arco, a flecha e alabarda daqueles Monges que
mantém os preceitos e que são puro
s.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Se


um Monge está desprotegido, vivendo sozinho em campo aberto, em
um cemitério, ou sob uma árvore, eu diria que esse é um verdadeiro
Monge. Qualquer Monge cujos olhos se voltem para a sua proteção,
podemos dizer, é um falso Monge.”

O Buda disse a Kashyapa: “Não diga ‘falso’. Pode haver um Monge que
vá onde ele queira, satisfaça as suas necessidades pessoais, recite su-
tras, sente e medite. Caso alguém venha e indague sobre a Via, ele
proferirá sermões, observando preceitos, ações virtuosas, e dirá àquela
pessoa que caso deseje pouco, será satisfeita. Mas, ele não está apto a
emitir o rugido do leão da doutrina, não está cercado por leões, e não
está apto a subjugar aqueles que praticam o mal. Tal Monge não pode
realizar seu próprio benefício, nem está apto a ajudar os outros. Saiba
que esta pessoa é indolente e preguiçosa. Embora ele possa manter
em observância os preceitos e perpetrar ações puras, tal pessoa, você
deve saber, nada pode fazer.

De outra forma, pode haver um Monge cujos utensílios podem ser


completos e ele mantém em observância os preceitos proibitivos,
sempre emite o rugido do leão, concede sermões maravilhosos como
sutras, geya, vyakarana, gatha, udana, itivrttaka, jatakas, vaipulya, e
adbutadharma. Assim, ele expõe estes nove tipos de sutras Budistas.
Ele confere benefícios e paz para os outros. Assim, ele diz: ‘Proibições
são dadas para Monges no Sutra do Nirvana dizendo que eles não de-
vem possuir empregados, vacas, carneiros ou quaisquer coisas contrá-
rias às proibições. Caso Monges possuam tais coisas degradantes, eles
devem ser instruídos a não tê-las. O Tathagata estabeleceu nos sutras
de várias escolas que qualquer Monge que possua tais coisas deve ser
corrigido, assim como reis corrigem más ações, e devem ser conduzi-
dos de volta à vida secular.’ Quando um Monge emite o rugido do leão,
qualquer um que quebre os preceitos, ouvindo isto (o rugido do leão),
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 94
se encherá de ira e atacará esse Monge. Se esta pessoa morrer como
conseqüência disto, ela deve ser chamada aquela que mantém os pre-
ceitos e que beneficia tanto a si própria como aos outros. Por esta ra-
zão, reis, ministros, altos-ministros e leigos protegem aquele que pro-
fere sermões. Qualquer pessoa que proteja o Dharma Maravilhoso
deve aprender as coisas assim.

Um Rei Chamado Virtuoso

Oh Kashyapa! Qualquer pessoa que quebre os preceitos e que não


proteja o Dharma Maravilhoso deve ser chamada de falso Sacerdote.
Alguém que mantenha estritamente em observância as regras (monás-
ticas), não ganha tal designação (falso). Oh bom homem! No passado,
há inumeráveis, ilimitados asamkhyas de kalpas atrás, apareceu nesta
cidade de Kushinagar um Buda que era Merecedor de Ofertas, Todo-
Iluminado, Plenamente Realizado, Bem Aventurado que Conhece o
Mundo, Grande Mestre Insuperável, Mestre dos Céus e da Terra, Buda,
Honrado pelo Mundo, e cujo nome era ‘Tathagata do Aumento da
Alegria e Benefícios’. Naquela ocasião, o mundo era amplo e glorios
a-
mente puro, rico e pacífico. As pessoas estavam no auge da prosperi-
dade e nenhuma fome era sentida. Elas pareciam Bodhisattvas da Ter-
ra da Paz e da Felicidade. Aquele Buda, Honrado pelo Mundo, perma-
neceu no mundo por uma inumerável extensão de tempo. Tendo ins-
truído as pessoas, ele entrou no Parinirvana entre duas árvores sala.

Após
mundo o Buda ter entradobilhões
por incontáveis no Nirvana, seueensinamento
de anos permaneceu
na última parte no
dos últimos
quarenta anos os ensinamentos Budistas ainda não haviam desapare-
cido. Naquela ocasião, havia um Monge chamado ‘Virtuoso Iluminado’,
que mantinha bem os preceitos e era cercado por muitos dos seus
parentes. Ele emitiu o rugido do leão e pregou todos os nove tipos de
sutras. Ele ensinou dizendo: ‘Não possuam empregados,sejam homens
ou mulheres, vacas, carneiros ou o que quer que possa ir contra os

CapítuloSobre
5– o Corpo Adamantino Página 95
preceitos’. Naquela ocasião havia muitos Monges que estavam agindo
contrariamente aos preceitos. Ouvindo isto, eles conspiraram e vieram
para cima desse Monge brandindo espadas e bastões. Naquela ocasi-
ão, havia um Rei chamado ‘Virtuoso’. Ele ouviu sobre isto. Para prot
e-
ger o Dharma, ele veio para onde o Monge estava proferindo o seu
sermão e lutou contra os malfeitores de tal forma que o Monge não
sofresse. O rei, todavia, foi ferido em todo o seu corpo. Então o Monge
Virtuoso Iluminado elogiou o rei, dizendo: ‘Bem feito, bem feito, oh
Rei! Você é uma pessoa que protege o Dharma Maravilhoso. Nos dias
que virão, você se tornará um insuperável utensílio do Dharma’. O rei
ouviu seu sermão e regozijou-se. Então, ele morreu e nasceu na terra
do Buda Akshobhya e tornou-se seu principal discípulo. Os subalternos
deste rei, seus parentes e soldados ficaram todos felizes e não retroa-
giam no seu Bodhichitta. Quando veio o dia de sua partida do mundo,
eles nasceram na terra do Buda Akshobhya. Na ocasião em que o
Dharma Maravilhoso estava prestes a se extinguir, eles puderam agir e
proteger um Dharma como este. Oh Kashyapa! O rei naquele tempo
era Eu; o monge que proferia o sermão era o Buda Kashyapa. Oh Kash-
yapa! Aquele que protege o Dharma Maravilhoso é recompensado
com tal incalculável fruição. Esse é o porquê de hoje eu adornar meu
corpo de várias formas e de ter alcançado perfeitamente o indestrutí-
vel Corpo-do-Dharma.”

O Bodhisattva Kashyapa ainda disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mu


n-
do! O corpo eterno do Tathagata é aquele esculpido em pedra, tal co-
mo ele era.”

O Buda disse a Kashyapa: “Oh bom homem! Por esta razão, Monges,
Monjas, Leigos e Leigas devem todos se esforçar mais e proteger o
Dharma Maravilhoso. A recompensa pela proteção do Dharma Maravi-
lhoso é extremamente grande e inestimável. Oh bom homem! Em
razão disto, os leigos qu
e protegem o Dharma deveriam pegar espadas
e bastões e proteger um Monge que guarda o Dharma. Muito embora
uma pessoa mantenha em observância os preceitos, não podemos
chamar aquela pessoa de alguém que protege o Mahayana. Muito
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 96
embora uma pessoa ainda não tenha recebido os cinco preceitos, se
ela protege o Dharma Maravilhoso, tal pessoa pode perfeitamente ser
chamada de alguém do (que protege o) Mahayana. Uma pessoa que
protege o Dharma Maravilhoso deveria pegar espadas e bastões e
defender os Monges.”

Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Se todos os n-


Mo
ges fossem acompanhados por leigos com espadas e bastões, poderí-
amos dizer que eles são dignos ou indignos desse nome? Estariam
mantendo em observância os preceitos ou não?

O Buda disse a Kashyapa: “Não diga que tais pessoas são aquelas que
transgridem os preceitos. Oh bom homem! Após a minha entrada no
Nirvana, o mundo será dominado pelo mal e a terra será devastada,
um pilhando ao outro, e as pessoas serão dominadas pela fome. Em tal
época, em razão da fome, as pessoas poderão optar por abandonar o
lar e entrar para a Sangha. Tais pessoas são falsos reverendos. Estes,
vendo aquelas pessoas que são rigorosas na observância dos preceitos,
que são corretas em sua conduta, e que são puras em suas ações, pro-
tegendo o Dharma Maravilhoso; se afastarão ou tentarão matá-las ou
prejudicá-las.”

O Bodhisattva Kashyapa disse novamente ao Buda: “Oh Honrado pelo


Mundo! Como todas essas pessoas poderão observar os preceitos e,
guardando e protegendo o Dharma Maravilhoso, entrar nas vilas, cida-
des e castelos; e ensinar?”

“Oh bom homem! Isto ocorre porque eu perm ito que aqueles que
observam os preceitos sejam acompanhados pelas pessoas vestidas-
de-branco [pessoas leigas, não-Monges] com espadas e bastões. Em-
bora todos os reis, ministros, homens leigos ricos e leigos em geral
possam possuir espadas e bastões para proteção do Dharma, eu cha-
mo isto de observação dos preceitos. Você pode possuir a espada e o
bastão, ‘mas não rouba a vida’. Se as coisas são assim, nós chamamos
isto em primeira mão de observação dos preceitos.”
CapítuloSobre
5– o Corpo Adamantino Página 97
Kashyapa disse: “Qualquer um que proteja o Dharma persevera numa
visão correta e expõe amplamente os sutras Mahayana. Ele não carre-
ga os parasóis cravejados de jóias das pessoas nobres, vasos de óleo,
arroz integral, ou frutas e sementes. Ele não se aproxima de reis, minis-
tros ou dos ricos visando benefícios. Ele não bajula os danapatis [doa-
dores de ofertas], é perfeito na boa conduta, e subjuga aqueles que
transgridem os preceitos e que perpetram o mal. Tal pessoa é chamada
um mestre que ostenta e proteje o Dharma. Ele é um verdadeiro bom
mestreda Via. Seu pensamento é tão expansivo quanto o mar.”

“Oh Kashyapa! Se houver um Monge que fale sobre o Dharma com


fins lucrativos, as pessoas e os seus parentes também seguirão seu
exemplo e avidamente buscarão lucros. Assim, esta pessoa corrompe o
povo. Oh Kashyapa! Há três tipos de reverendos: 1) os violadores dos
preceitos, 2) os ignorantes, 3) os puros. Um reverendo impuro violador
dos preceitos pode facilmente ser subjugado, enquanto um reverendo
observador dos preceitos não pode ser subjugado apenas pelo lucro.
Como é um reverendo impuro violador dos preceitos? Um reverendo
pode estar observando os preceitos, mas por ganhos ele senta, perma-
nece, vai e vem na companhia de pessoas violadoras dos preceitos,
relaciona-se amigavelmente com elas e faz coisas junto com elas. Este
é um violador de preceitos e, portanto, ‘impuro’.

Por que chamamos um reverendo de ignorante? Um Monge pode


estar vivendo num lugar quieto, mas todos os seus órgãos sensoriais
não estão de acordo [sob controle], sua mente é obscura e lenta no
trabalho. Ele deseja pouco e implora por esmolas. No dia da admoesta-
ção e libertação [pravarana], ele não ensina a confissão pura para todas
as pessoas; vendo muitas pessoas quebrando os preceitos, ele não lhes
ensina a confissão pura. Ele ainda senta com outros, fala a respeito dos
preceitos e procura ser livre. Tal pessoa é um reverendo ignorante.

O que é um reverendo puro? Existe um Monge, um reverendo a quem


100 mil bilhões de Maras não podem corromper. Este Bodhisattva é
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 98
puro na sua natureza e pode treinar os dois tipos de reverendos referi-
dos acima e fazê-los viver em meio àqueles que são puros. Ele é um
grande e insuperável mestre, que proteje bem o Dharma, que mantém
em observância os preceitos. Ele conhece bem o que é leve ou grave na
manutenção dos preceitos, corrige e beneficia as pessoas. Ele não sabe
nada que não seja a observância dos preceitos; o que ele sabe é aquilo
que concerne aos preceitos. O que ele faz para corrigir os seres? Por
exemplo, no sentido de corrigir as pessoas, o Bodhisattva sempre entra
num vilarejo a qualquer momento e visita os lugares onde vivem viúvas
e prostitutas. Ele vive lá por muitos anos. Isto é o que Sravakas não
podem fazer. Isto é o que se chama corrigir e beneficiar os seres.

Como ele sabe o que é grave? Se virmos que o Tathagata admoesta e


proíbe algo, não poderíamos fazê-lo posteriormente. Coisas tais como
as quatro ofensas graves [matar, roubar, fornicar e mentir] são aquilo
que um reverendo não deve fazer. Se, contrariamente a isto, ele pro-
positadamente as faz, isto indica que essa pessoa já não é um Monge,
nem filho do Shakya [Buda]. Isto é o que se considera ‘grave’. O que é
‘leve’? Uma pessoa comete maus atos e é severamente admoestada.
Então, ela não os comete novamente. Isto é ‘leve’. Dizemos ‘não
-vinaya
referente àquilo que não está provado’. Uma pessoa preza as coisas
impuras, diz que pode recebê-las e desfrutá-las, e diz que está de acor-
do com a palavra, e não para de fazê-
las. Dizemos ser ‘vinaya correto
aquele que é corretamente resp ondido (observado)’. Isto está ens i-
nando corretamente o vinaya [regras de disciplina monástica], não
tergiversando o que é contrário ao vinaya, e compartilhando prazer
espiritualmente. Assim asseguramos que o vinaya seja observado. As-
sim compreendemos bem o que nos obrigamos fazer como Budistas e
o descrevemos bem. Isto é o que o vinaya se refere como bom enten-
dimento de uma escrita. O mesmo se aplica à proteção dos sutras. Oh
bom homem! O Dharma do Buda é incalculável e difícil de compreen-
der. O mesmo é o caso com o Tathagata. Ele está além do conhecimen-
to.”

CapítuloSobre
5– o Corpo Adamantino Página 99
O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! É
assim, é assim. É como você, o Santo, diz. Inconcebível e incompreensí-
vel é o Dharma do Buda. Assim, também, é o Tathagata. (O Dharma do
Buda) Está além da compreensão; bem como o Tathagata. Assim, eu
sei agora que o Tathagata é eterno e indestrutível, e que não há mu-
dança com ele. Eu agora estudarei bem e o exporei amplamente para
as pessoas.”

Então o Buda elogiou o Bodhisattva Kashyapa disse:


e “Bem falado,
bem falado! O corpo do Tathagata é adamantino e indestrutível. Você,
Bodhisattva, agora tem a visão correta e a compreensão correta. Se
você vê claramente assim, você verá o corpo adamantino e indestrutí-
vel do Tathagata da forma como você vê as coisas refletidas num espe-
lho.”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 100


Capítulo Seis: Sobre a Virtude do Nome
Então o Tathagata novamente falou a Kashyapa: “Oh bom homem!
Agora você deve proteger todas as palavras, capítulos, cláusulas e to-
das as virtudes deste sutra. Qualquer bom homem ou boa mulher que
ouça o nome deste sutra nunca mais nascerá nos quatro reinos [do
inferno, fome, animalidade e ira]. Por que não? Exporei agora para
você todas as virtudes deste sutra e tudo o que é praticado pelos inu-
meráveis, ilimitados Budas.”

A Virtude do Nome

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Como este sutra deverá ser chamado? Como deveriam os Bodhisattvas
Mahasattvas proteger e ostentar este sutra?”

O Buda disse a Kashyapa: “O nome deste sutra deverá ser ‘Mahapar i-


nirvana’. A palavra precedente (maha) significa ‘bom’, a palavra do
meio (pari) também (significa) ‘bom’, e a palavra final (nirvana) ‘bom’
também. O significado [deste sutra] é extremamente profundo, e o que
está escrito [nele] é bom. A pureza da sua organização é perfeita, sua
ação é pura, e é plenamente satisfatório como hospedeiro do Tesouro
Adamantino. Ouça bem, ouça bem! Falarei agora. Oh bom homem! A
palavra ‘maha’ prenuncia ‘eterno’. Isto é como todos os grandes rios
drenando para o grande oceano. O mesmo ocorre com este sutra. Ele
desfaz todos os elos das ilusões, todos os poderes de Mara e, então,
corpo e vida correm para o ‘Mahaparinirvana’. Por isso dizemosa-‘M
haparinirvana’. Oh bom homem! Isto é como o caso de um médico que
tem um tratamento secreto abarcando todos os tratamentos médicos
para doenças. Oh bom homem! O mesmo ocorre com o Tathagata.
Todas as várias doutrinas maravilhosas ensinadas e todos os seus pro-
fundos significados secretos encontram seu caminho neste ‘Mahapar
i-
nirvana’. Este é o porquê de dizermos Mahaparinirvana. Oh bom o- h
mem! É como um agricultor que planta as sementes na primavera. Ele

Capítulo Sobre
6– a Virtude do Nome Página 101
acalenta um raro desejo. Quando ele terminar a colheita, toda a sua
ansiedade terá um fim. Oh bom homem! O mesmo é o caso com todos
os seres. Se estudamos outros sutras, sempre esperamos por belas
apreciações. Quando ouvimos este Mahaparinirvana, [todavia], cessa o
desejo de apreciar os belos sabores mencionados em outros sutras.
Este Grande Nirvana possibilita a todos os seres atravessarem o mar de
todas as existências. Oh bom homem! Dentre todas as pegadas, aquela
do elefante é a melhor. O mesmo ocorre com este sutra. De todos os
samadhis dos sutras, o (samadhi) deste sutra é o melhor. Oh bom ho-
mem! Dentre todos os preparos da terra, aquele feito no outono é
melhor. O mesmo ocorre com este sutra. Ele é o melhor de todos os
sutras. Ele é como o sarpirmanda, que é o melhor de todos os remé-
dios. Ele cura completamente as preocupações febris e os pensamen-
tos frenéticos dos seres. Este Grande Nirvana é o maior de todos. Oh
bom homem! Ele é como a doce manteiga que contém os oito sabores.
O mesmo também se aplica a este sutra. Ele contém os oito sabores.
Quais são os oito? São: 1) é eterno, 2) sempre é, 3) é pacífico, 4) é puro
e sereno, 5) não se torna velho, 6) não morre, 7) é imaculado, e 8) é
agradável e feliz. Esses são os oito sabores. Ele possui esses oito sabo-
res. Este é o porquê de dize rmos ‘Mahaparinirvana’. Agora, todos os
Bodhisattvas Mahasattvas pacificamente residem nisto e manifestam
Nirvana em todos os lugares. Este é o porquê de dizermos ‘Mahapar i-
nirvana’. Oh Kashyapa! Todos os bons homens e boas mulheres que
desejarem entrar noNirvana através deste ‘Mahaparinirvana’ devem
estudar bem o fato de que o Tathagata é eterno e que o Dharma e a
Sangha são eternos.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Tudo é maravilhoso, ohn-Ho


rado pelo Mundo! Não podemos conceber as profundezas das virtudes
do Tathagata. O mesmo é o caso com as virtudes do Dharma e da San-
gha. Este Mahaparinirvana também é inconcebível. Aquele que estuda
este sutra obterá a visão correta do Dharma e tornar-se-á um grande
Doutor. Qualquer um que não tenha estudado este sutra, devemos
saber, é uma pessoa cega, não possuidora dos olhos da sabedoria e
está obscurecida pela ignorância.”
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 102
Capítulo Sete: Sobre os Quatro Aspectos
“O Buda novamente falou à Kashyapa: “Oh bom homem! Há quatro
aspectos sobre os quais um Bodhisattva Mahasattva discrimina e ex-
põe o Mahaparinirvana. Quais são esses quatro? Existe: 1) retidão em
si, 2) corrigir outros, 3) boa concordância [com os ensinamentos] e
discussão, e 4) bom entendimento das relações causais.

Oh Kashyapa! O que é retidão em si? Isto é como quando o Buda, o


Tathagata, expõe o Dharma observando bem as relações causais. Isto é
como um Monge vendo um grande fogo. Ele diz: ‘Eu preferiria me ati-
rar dentro desta bola de fogo ardente do que dizer que todos os doze
tipos de sutras e os ensinamentos secretos são de Mara [o demônio].
Se dissermos que o Tathagata, o Dharma e a Sangha são não-eternos,
isto estará enganando a nós próprios e também aos outros. Eu preferi-
ria cortar minha língua com uma espada afiada do que dizer que o
Tathagata, o Dharma e a Sangha são não-eternos. Eu, de fato, posso
ouvir outros dizendo isto, mas eu nunca acreditaria. Eu sentiria piedade
de uma pessoa que dissesse algo assim. O Tathagata, o Dharma e a
Sangha são inconcebíveis’. Deveríamos proteger a nós mesmos assim.
Olharmos para nós mesmos como se víssemos uma bola de fogo. Esta
é a forma como deveríamos compreender retidão em si.

Oh Kashyapa! Como corrigimos os outros? Certa vez, quando eu estava


falando acerca do Dharma, havia uma mulher alimentando uma crian-
ça com leite. Ela veio para onde o Buda se encontrava. Ela tocou meus

pés
aflita,com
ela sua cabeça
estava e prestou
absorta homenagem
e tomou a mim.
assento a um lado.Como ela estava
Penetrando seu
pensamento, eu disse especialmente a ela: ‘Por amor pela sua criança,
você tem dado-lhe muita nata. Você não pondera entre digestão e
indigestão’. Nisto, a mulher disse-me: ‘Quão maravilhoso que oHonra-
do pelo Mundo leia meu pensamento assim. Por favor, Oh Honrado
pelo Mundo! Ensine-me como fazer. Oh Honrado pelo Mundo! Eu dei
[à minha criança] nata em demasia esta manhã. Possivelmente ele não

CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 103
possa digeri-la bem. Isto não tomará a vida da criança? Oh Tathagata!
Por favor exponha as coisas para mim.’ Eu disse: ‘O que você deu será
digerido pouco a pouco e, então, aumentará a vida.’ A mulher, ouvindo
isto, ficou muito contente. Ela falou novamente, dizendo: ‘Aquilo que o
Tathagata fala é [sempre] verdadeiro. Dessa forma, estou satisfeita. O
Honrado pelo Mundo, no sentido de ensinar todos os seres, faz distin-
ções e expõe sobre digestão e indigestão, sobre o não-Eu e o não-
eterno de todas as existências. Se o Honrado pelo Mundo fosse falar
primeiro sobre o Eterno, uma pessoa ouvindo isto poderia dizer que o
que ele disse é o mesmo que dizem os tirthikas, descartariam o que ele
dissera eiriam embora’. Eu então disse mulher:
à ‘Quando as crianças
crescem e se tornam grandes, e quando elas podem ir e vir por si
mesmas, o que for ingerido será digerido, mesmo quando indigesto. A
nata que foi tomada antes não será suficiente para sustentar [aquela
pessoa]. O mesmo é o caso com todos os meus discípulos Sravaka. É
como no caso da sua criança. Eles não podem digerir este Dharma e-
terno. Este é o porquê de eu falar sobre sofrimento e impermanência.
Quando todos os meus Sravakas já estiverem perfeitos nas virtudes e
puderem permanecer ensinando os sutras Mahayana, eu então, neste
sutra, falarei sobre os seis sabores.

Os Seis Sabores

O que são os seis sabores? O sofrimento é o sabor do vinagre; o não-


Eterno é o salgado; o não-Eu é o amargo; a Alegria tem o sabor da do-

çura; o Eu é há
vida secular de três
saborsabores,
pungente; e osejam:
quais Eterno1)éoleve (suave) no
não-Eterno, 2) sabor. Na
o não-Eu,
e 3) o Sofrimento. A ilusão é o combustível, e a Sabedoria é o fogo.
Através desses meios, obtemos o repasto do Nirvana. Isto é, o Eterno, a
Alegria, e o Eu. Todos os meus discípulos provam-nos como doces.’

Eu também disse para a mulher: ‘Se acontecer de você ir a outrosa-lug


res, afaste os maus meninos de casa e dê tesouros aos bons meninos.’

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 104


A mulher disse-me: ‘De fato, conforme me instruiu, os raros tesouros
que possuo serão mostrados para os bons filhos, eonãpara os maus.’
‘Oh irmã! O mesmo é o caso comigo. Por ocasião da entrada no i-Par
nirvana, o secreto e insuperável repositório do Dharma do Tathagata
não será dado aos discípulos Sravakas [Ouvintes dos ensinamentos do
Buda]. Assim como você não revela seus tesouros para maus filhos, ele
[meu repositório do Dharma] será por todos os meios confiado aos
Bodhisattvas. Isto é como a sua revelação dos seus tesouros para os
bons filhos. Por que é assim? Porque discípulos Sravakas (Ouvintes)
persistem em pensamentos de mudança e dizem que o Tathagata ver-
dadeiramente morre. Mas, de fato, não morro. Isto é como você ir a
lugares distantes e, não tendo ainda retornado para a casa, seus maus
filhos dizerem que você morreu, embora não tenha morrido. Todos os
Bodhisattvas dizem que o Tathagata nunca muda. Isto é semelhante
aos seus bons filhos, que não dizem que você está morta. De fato, eu
confio o insuperável tesouro secreto a todos os Bodhisattvas’. Oh bom
homem! Se alguma pessoa diz que o Buda é Eterno e imutável, saiba
que o Buda está presente naquela casa. Isto é corrigir os outros.

“Oh Kashyapa! O que é ‘boa concordância e discussão’? Por exemplo,


uma pessoa chega e coloca uma questão ao Buda, o Honrado pelo
Mundo: ‘Como eu posso ser um grande danapati [doadore dofertas],
não jogando o meu dinheiro fora’? O Buda diz: Caso haja qualquer
Shramana, Brahman, ou qualquer pessoa que procure possuir pouco,
esteja plenamente satisfeita e que assim não aceitará ou acumulará
quaisquer coisas impuras, dê para tal pessoa um empregado ou um
servente. Para aqueleque pratica açõespuras, dê-lhe a luxúria deuma
mulher, e para aquele que não bebe ou come, dê-lhe bebida e comida;
para aquele que não faz refeições após o meio-dia, dê-lhe uma refeição
após o meio-dia; para aquele que não usa flores e incenso, dê-lhe flores
e incenso. Tais doações darão srcem a rumores e a fama preencherá o
mundo. Nenhum centavo é gasto. Isto é ‘boa concordância e discu s-
são.’

CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 105
Então o Bodisattva Kashyapa disse ao Buda: “Honrado pelo Mundo!
Para aquele que come carne, não devemos dar carne. Por que não? Eu
vejo a emanação de uma grande virtude da abstenção do consumo de
carne.”

O Buda elogiou Kashyapa e disse: “Bem falado, bem falado! Agora você
entendeu bem o meu pensamento. Um Bodhisattva que protege o
Dharma deve ser assim. Oh bom homem! De agora em diante, não
permitirei aos meus discípulos Sravaka (ouvintes) comerem carne.
Quando receberem de um danapati uma doação (de carne) de pura fé,
pensem que (vocês) estão comendo a carne do seu próprio filho.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ainda ao Buda: “Oh Honrado pelo n-


Mu
do! Por que é que o Tathagata não nos permite comer carne?”

“Oh bom homem! Aquele que come carne mata a semente da grande
compaixão.”
Kashyapa disse novamente: “Por que você primeiro permitiu aos n-
Mo
ges comer três tipos de carne pura?”

“Oh Kashyapa! Esses três tipos de carne pura foram instituídos de


acordo comas necessidades da ocasião.”
O Bodhisattva Kashyapa disse novamente ao Buda: “Oh Honrado pelo
Mundo! Em quais circunstâncias você não permite as dez impurezas ou
os nove tipos daquilo que é puro?”

O Buda disse a Kashyapa: “Isto também é permitido em passos gradu-


ais de acordo com as necessidades da ocasião. Isto é o que se aplica na
presente proibição de comer carne.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ainda ao Buda: “Por que é que a carne


do peixe é elogiada e chamada de bela?”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 106


“Oh bom homem! Eu não digo quea carne de peixe é uma bela comi-
da. Eu digo que a cana-de-açúcar, o arroz solto, balas, caramelos, todos
os tipos de trigo, mel, leite, natas e óleo são belas comidas. Diversos
tipos de peças de vestuário podem ser guardadas (estocadas), mas não
aquelas cuja cor pode desbotar (deteriorar). Como poderíamos desejar
avidamente a carne de peixe?”

Kashyapa disse novamente ao Buda: “Se o Tathagata intenta proibir a


ingestão de carne, coisas dos cinco tipos de sabores como leite, nata,
manteiga fresca, manteiga refinada e sarpirmanda, todos os tipos de
roupas, tecido de seda, calçado de casco de cavalo, couro e peles, taças
de ouro e prata não deveriam ser recebidos.”

“Oh bom homem! Não confundamos as coisas com o que os Nirgra n-


thas [Jainistas] dizem. Cada uma das proibições que o Tathagata esta-
belece tem um significado diferente. Por essa razão, três carnes puras
são permitidas com base em três diferentes motivos e os dez tipos de
carne são proibidos por diferentes pontos de vista. Pelos diferentes
pontos de vista, todas são proibidas, até o momento da morte de al-
guém. Oh Kashyapa! Eu, de agora em diante, direi aos meus discípulos
para refrearem o desejo de consumir qualquer tipo de carne. Oh Kash-
yapa! Quando alguém come carne, isto faz exalar o cheiro da carne
enquanto andando, parando, sentando ou reclinando. As pessoas sen-
tem isto e tornam-se receosas. Isto é como quando alguém se aproxi-
ma de um leão. Ele vê, cheira o leão, e surge o medo. Oh bom homem!
Quando alguém come alho, o mau-cheiro é insuportável. As outras
pessoas o notam. Eles sentem o mau-cheiro. Eles se afastam daquela
pessoa e vão embora. Mesmo de longe, as pessoas odeiam ver tal pes-
soa. Eles não se aproximarão dela. O mesmo ocorre com alguém que
come carne. É uma situação semelhante com todas as pessoas que,
sentindo o cheiro da carne, tornam-se temerosas e acalentam um pen-
samento de morte. Todos os seres viventes na água, na terra e no céu
se afastam dessa pessoa e caem fora. Eles dizem que essa pessoa é sua
inimiga. Por essa razão o Bodhisattva não come carne. No sentido de
salvar os seres, ele mostra-se como alguém que come carne. Embora
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 107
ele [pareça] comer carne, de fato ele não o faz. Oh bom homem! Tal
Bodhisattva não come sequer as comidas puras. Como ele poderia
comer carne?

Cem anos após a minha morte, todos os santos sábios das quatro frui-
ções [os quatro estágios que conduzem ao ‘Arhatship’] entrarão no
Nirvana. A era do Dharma Maravilhoso se encerrará, e surgirá a era do
Dharma Adulterado, quando o Monge manterá os preceitos [apenas]
como uma questão de formalidade, recitará [somente] um pouco os
sutras, tomará avidamente comida e bebida, e [excessivamente] nutri-
rá seu corpo. O que ele vestirá em seu corpo será feio e grosseiro. Ele
parecerá fatigado e não mostrará dignidade. Ele alimentará vacas e
ovelhas, e carregará lenha (combustível) e capim. Sua barba, unhas e
cabelos serão longos. Ele não adotará a kasaya [o robe sacerdotal],
mas, antes, parecerá um caçador. Ele aguçará seus olhos, caminhará
lentamente e parecerá um gato que está atrás de um rato. Ele irá sem-
pre murmurar: ‘Eu atingi o arhatship’. Ele sofrerá de todos os tipos de
doenças, deitará e dormirá sobre dejetos. Exteriormente ele parecerá
sábio, mas interiormente ele será ganancioso e invejoso. Ele pratica o
silêncio (mute) como um Brâmane. Para dizer a verdade, ele não é
Shramana [Monge], mas somente tenta se passar por tal. Ele está
queimando com as visões pervertidas, sempre caluniando o Dharma
Maravilhoso. Tal pessoa transgride os preceitos, a ação correta e a
conduta instituída pelo Tathagata. Ele fala acerca do fruto da emanci-
pação, mas suas ações apartam-se daquilo que é puro e, assim, ele
viola o Dharma, que é profundo e recôndito. Tal pessoa, seguindo a sua
própria interpretação, falará contrariamente ao que os sutras e o vina-
ya [regras de disciplina monástica] estabelecem, dizendo: ‘O Tathagata
permite a carne a todos nós’. Eles falarão assim e dirão que o Buda o
disse. Eles disputarão e dirão que são Shramanas e sucessores dos
ensinamentos do Buda. Oh bom homem! Naquela ocasião, haverá
Shramanas que estocarão cereais, receberão peixe e carne, prepararão
as próprias comidas, e manterão vasilhas de óleo. Eles viverão ao redor
de dosséis cravejados de jóias, objetos de couro, calçados, reis, minis-
tros e pessoas ricas. Eles serão condescendentes com as práticas astro-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 108
lógicas e tratamentos médicos; terão serviçais, ouro, prata, berílio (ge-
mas preciosas), madrepérola (musaragalva – coral branco), ágata, cris-
tal, corais, âmbar, jade, casco de cavalo, e muitos tipos de melões [se-
mentes]. Aprenderão todas as artes, pintura, artes plásticas, confecção
de livros, e todos os tipos de ciências, todos os tipos de cultura por
semeadura ou plantação de raízes, colocação de pragas (maldições),
encantamentos, preparação de remédios, arte teatral, música, ador-
nando seu corpo com fragrâncias e flores, jogatina, jogo de “GO”, e
vários tipos de trabalhos manuais. Se um Monge qualquer rejeita tais
maldades, podemos dizer que ele é verdadeiramente meu discípulo.”

Então Kashyapa ainda disse ao uda:


B “Oh Honrado pelo Mundo! Os
Monges, Monjas, Leigos e Leigas podem ter que viver dependendo das
pessoas. Por ocasião do ciclo de doações, pode ser oferecida comida
contendo carne. Como eles poderão aceitá-la e ainda permanecerem
puros?”

O Buda disse: “Use água, lave-a, livrando-a da carne, e então coma-a [o


resto da comida]. O utensílio poderá ser contaminado pela carne. Mas,
se nenhum sabor da carne permanece, ele poderá ser usado. Assim,
não haverá qualquer dano a ser causado. Se vemos que há um bocado
de carne, não deveríamos aceitar tal comida. Nunca devemos comer a
carne em si. Quem a come infringe a regra. Eu agora estabeleço esta
regra de abstenção da ingestão de carne. Se formos entrar em deta-
lhes, não haverá um fim para as explicações. Agora é o tempo em que
entrarei no Nirvana. Sendo assim, devo dispensar maiores explicações.
Isto já está ‘respondendo bem o que foi indagado acima’”.

“Oh Kashyapa! O que significa ‘bom entendimento das relaçõesu-ca


sais’? As quatro classes da Sangha podem vir a mim e dizer: ‘Esta é a
primeira vez, oh Tathagata, que nos disse tais coisas. Por que isto?
Você não falou ao Rei Prasenajit (nome em sâncrito do Rei Pasenadi)
acerca da parte mais profunda dos ensinamentos, e disse, às vezes, que
ele (o ensinamento) era ‘profundo’ e, outras vezes, ‘superficial’; às
vezes, disse que se infringia e, outras vezes, que não se infringia. Por
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 109
que dizemos ‘parajayika’ [parajika significa grave, extremamente sério],
preceitos e ‘pratimoksha’ [regras da vida monástica que ‘libertam’]?”

O Buda disse: “Pratimoksha significa sentimento de satisfação. Existe


então perfeição do comportamento; não há recebimento e contenção
(armazenamento). Isto também é chamado ‘vida pura’.

‘Parajayika’ significa ‘os quarto reinos do sofrimento’. També


m significa
cair no inferno, até o Inferno Avichi [o mais terrível dos oito infernos];
quanto à lentidão ou rapidez, é mais rápido do que uma chuva torren-
cial. Aquele que ouve [isto], teme, observa rigorosamente os preceitos
e nunca age contrariamente à boa conduta. Treinado na auto-
satisfação, ele nunca receberá aquilo que não é puro. Também, o para-
jayika aumenta [os reinos do] inferno, da animalidade e dos espíritos
famintos. Por essas razões, dizemos ‘parajayika’.

‘Pratimoksha’ erradica a maldade e as


ações pervertidas do corpo, da
boca e da mente.

‘Preceitos’ referem-se à conduta moral, o profundo significado dos


sutras, significando o bem, o abster-se de aceitar coisas impuras e to-
das as relações causais com coisas impuras. Também, os preceitos
impedem coisas como as quatro graves ofensas, treze ofensas de sam-
ghavasesas (são violações de regras de conduta que podem causar a
dissolução da Sangha), duas ofensas de aniyatans, trinta ofensas de
naihsargika-prayascittikas, noventa e uma ofensas de payatikas, quatro
ofensas de desaniyas, siksakaraniya, sete maneiras de envidar disputas
(adhikaranasamatha), etc. Ou pode haver uma pessoa que transgrida
todos os preceitos. Quais são todos eles? Isto se refere desde as quatro
graves ofensas até as sete maneiras de envidar disputas (adhikarana-
samatha). Ou pode haver pessoas que caluniem o profundo significado
dos sutras Budistas do Dharma Maravilhoso ou que são como icchanti-
ka, que não têm qualquer possibilidade de encontrar os ensinamentos
Budistas por quaisquer meios. Tais pessoas dizem a respeito de si pró-
prias que elas são esclarecidas e sábias. Elas são iguais a todos os peca-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 110
dos. Elas ocultam todos os males feitos, os quais podem ser leves ou
graves na natureza, assim como uma tartaruga esconde seus seis
membros sob sua carapaça. Elas nunca se arrependem de quaisquer
desses pecados. Em razão deste não-arrependimento, seus pecados
aumentam dia e noite. Tais Monges não confessam todos os seus pe-
cados. E como eles ocultam-nos dentro de si, eles crescem gradual-
mente. O Tathagata, ciente de tudo isto, proíbe através de etapas gra-
duais e não de uma só vez.”

Então, bons homens e boas mulheres diriam ao Buda: “Oh Honrado


pelo mundo! O Tathagata sabia todas essas coisas. Por que você não as
erradicou previamente? Ou, Oh Honrado pelo Mundo! Isto não signifi-
ca que todos os seres estão caindo no Inferno Avichi? Por exemplo,
muitas pessoas, desejando ir a outros lugares, erram o caminho correto
e pegam o errado. Essas pessoas, desconhecendo o que está errado,
dizem que estão pegando o caminho certo. Isto é como no caso de
alguém que não indaga acerca do certo e do errado. Da mesma manei-
ra, as pessoas tomam o caminho errado no que respeita aos ensina-
mentos Budistas. O Tathagata deveria primeiro mostrar o caminho
certo e levar todos os Monges a saber como se viola as injunções e o
que está correto. Assim, você deveria mostrar as proibições. Por quê?
Porque nós dizemos que o Tathagata, o Perfeitamente-Iluminado, é
aquele que é verdadeiro. Ele vê o caminho correto e ele, o Tathagata, é
o deus dos deuses, e ele realmente fala acerca das virtudes supremas
das dez boas ações e o seu significado. Dessa forma, respeitosamente,
rogamos-lhe que primeiro institua os preceitos.”

O Buda disse: “Oh bom homem! Se você diz que o Tathagat a, para o
benefício dos seres, fala acerca das virtudes supremas das dez boas
ações, isto indica que ele vê a todos os seres como vê a seu filho Rahu-
la. Como você pode censurá-lo e indagar se ele não está deixando os
seres caírem no inferno? Se eu visse uma pessoa caindo no Inferno
Avichi, para o benefício daquela pessoa, eu permaneceria no mundo
por um kalpa ou menos que um kalpa. Eu tenho grande compaixão
para com todos os seres. Como eu poderia enganar alguém que consi-
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 111
dero como meu filho e dexá-lo cair no inferno? Oh bom homem! É
como uma pessoa na terra de um rei que veste a kasaya. Existe um
furo nela, ele vê e mais tarde o repara. O mesmo se passa com o Ta-
thagata. Vendo uma pessoa caindo no inferno, ele faz os reparos e
confere os preceitos para as boas ações. Oh bom homem! Isto é como
um Chakravartin [um supremo monarca do mundo] que, para o bene-
fício dos seres, primeiro fala sobre as dez boas ações. Depois, vem o
tempo quando ele ocasionalmente vê as pessoas fazendo maldades.
Então o rei cria uma lei e as erradica. Tendo erradicado todas as mal-
dades, o rei desempenha o papel de um Chakravartin. Oh bom ho-
mem! O mesmo se passa comigo. Eu tenho coisas a dizer, mas eu não
imponho as leis primeiro.

Sempre, primeiro, os Monges cometem erros; então, de acordo com o


erro, uma admoestação é dada. Assim, as pessoas que amam a Via têm
o prazer de praticar [em concordância]. Tais pessoas podem ver bem o
Corpo-do-Dharma do Tathagata. Isto é como o chakraratna [chakra
significa roda e ratna significa jóia preciosa], a qualidade toda-
maravilhosa de um Chakravartin, e que é difícil de conceber. O mesmo
é o caso com o Tathagata. Ele está além do conhecimento. Os dois
tesouros do Dharma e da Sangha também estão além do que se pode
conceber. Aquele que fala e aquele que ouve também estão além do
conhecimento. Isto é como compreender bem as relações causais.
Assim o Bodhisattva discrimina e expõe o significado dos quatro aspec-
tos. Estas são as relações causais referentes ao Grande Nirvana do
Mahayana.

‘Corrigindo-se’ (você) está a ganhar este Mahaparinirvana. ‘Corrigindo


outros’ é o que eu digo aos Monges, dizendo -lhes que o Tathagata é
Eterno e Imutável. ‘Respondendo às questões’, oh Kashyapa, através
da sua questão, eu agora explanarei essa doutrina toda-maravilhosa
para o benefício dos Bodhisattvas, Monges, Monjas, Leigos e Leigas.
Através das ‘relações causais’ eu abro os olhos dos Sravakas (Ouvintes)
e Pratyekabudas, em razão de eles não compreenderem o profundo
significado das coisas ditas acima, e em razão de não terem oportuni-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 112
dade de ouvir sobre o fato de que os três pontos do ‘i’ compreendem
emancipação, Nirvana, Mahaprajna, e também o repositório secreto.
Eu agora o farei no sentido claro, discriminarei e, para o benefício de
todos os Sravakas, abrirei os olhos da Sabedoria. As pessoas podem
dizer: ‘Como podem todas as quatro coisas (quatro aspectos) estar
fundidas em uma? Isto não é um disparate?’ Então podemos dizer:
‘Poderia haver alguma diferença entre os (quatro) aspectos do espaço,
não-possessão, imutabilidade e não-obstrução?’ Poderíamos dizer que
isto é um disparate?”

“Não, oh Honrado pelo Mundo! Todas as quatro expressões apontam


para a mesma coisa. Elas significam não mais que o Vazio. O mesmo é o
caso com ‘corrigir-se’, ‘corrigir outros’, ‘responder às
questões (em boa
concordância [com os ensinamentos])’, e ‘compreender bem asa-rel
ções causais’. Isto está a dizer que o que há aqui é a unidade do Grande
Nirvana e que nada é diferente [isto é, não há dualismo ou diferencia-
ção].”

Compreendendo a Eternidade do Tathagata

O Buda disse a Kashyapa: “Ou pode haver bons homens e boas mulhe-
res que podem dizer: ‘O Tathagata é não
-Eterno. Como podemos saber
que ele é não-Eterno? O Buda diz que quando o fogo da ilusão é extin-
to, há Nirvana. Isto é como quando nada há para ser visto quando o
fogo é extinto. O mesmo é o caso quando todas as ilusões são aniquila-

das. Isto,Eterno
Dharma ele diz,eéImutável?
Nirvana. Como o Tathagata
O Buda pode alegar
diz que quando que ele é ao
abandonamos
existência, há Nirvana. Neste Nirvana, nada pode haver que tenha exis-
tência. Como, então, o Tathagata pode ser Eterno e Imutável? Quando
uma peça da roupa se rasga, não mais a chamamos de roupa. O mes-
mo se passa com o Nirvana. Quando todas as ilusões são extintas, nada
mais pode haver. Como o Tathagata pode ser Eterno e Imutável? O
Buda diz que a separação dos desejos e a chegada da quietude são

CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 113
Nirvana. Se a cabeça de uma pessoa é cortada, não há mais cabeça. O
mesmo se passa com a separação dos desejos e a chegada da quietu-
de. O que existe é Vacuidade. Não há mais nada ali. Portanto, Nirvana.
Como o Tathagata pode ser Eterno e Imutável’?

O Buda diz:

[Isto é como no caso do ferro aquecido.


Quando batido por um martelo, saem faíscas.
Elas reluzem e se esvanecem; nada permanece.
O mesmo se aplica à consecução da emancipação.
Uma vez que a confusão do desejo carnal foi superada,
ganha-se o estado de imobilidade.
Já não existe um lugar para ir].

Como o Tathagata pode ser eterno e imutável?

Oh Kashyapa! Alguém que me censure assim comete uma calúnia que


é grave. O Kashyapa! Você não deve acalentar tal noção e dizer que a
natureza do Tathagata perece. Oh Kashyapa! Nós não colocamos a
aniquilação da ilusão na categoria da matéria [rupa]. Por que não? Em
razão da ulterioridade da Eternidade. Por isso, dizemos Eterno. A quie-
tude [nirvânica] nada tem a sucedê-la. Todos os fenômenos existentes
são extirpados, nada permanecendo. Isto aponta para aquilo que é
inédito, limpo, eterno e irreversível. Este é o porquê de dizermos que o
Nirvana é eterno. O mesmo se passa com o Tathagata. Ele é Eterno,
Imutável. ‘Fazer a Limpeza’. Isto se refere à ilusão. Uma vez varridas (as
ilusões), tudo desaparece, não permanecendo um traço sequer da
existência. Isto indica que todos os Tathagatas são aqueles que bani-
ram as ilusões e não estão mais nos cinco reinos. Isto significa que o
Tathagata é aquele que é Eterno e Imutável. Ademais, oh Kashyapa!
Este é o Dharma que é o Mestre de todos os Budas. Portanto, o Tatha-
gata respeitosamente faz oferecimentos. Como o Dharma é Eterno,
assim também todos os Budas são Eternos.”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 114


O Fogo da Sabedoria

O Bodhisattva Kashyapa disse novamente ao Buda: “Se a chama da


ilusão morre, o Tathagata também deve morrer. Isto indica que não
pode haver uma terra onde o Tathagata seja eterno. Isto é semelhante
à situação na qual a escória do ferro fundido não pode mais ser vista
quando a cor vermelha desaparece. O mesmo se passa com o Tathaga-
ta e a ilusão. Acabou, não há mais outro caminho a seguir. E é como no
caso do ferro. Quando o calor e a cor vermelha se vão, nada permane-
ce lá para ser visto. O mesmo se passa com o Tathagata. Uma vez extin-
to, o que permanece é o não-Eterno. Com o fim do fogo da ilusão, ele
entra no Nirvana. Isto nos diz que o Tathagata é não-
Eterno.”

“Oh bom homem! O errof sobre o qual você fala refere-se aos mortais
comuns. Quando a ilusão acaba, o mortal comum retorna novamente
(ao ciclo do nascimento e da morte). Este é o porquê de dizermos não-
Eterno. Este não é o caso com o Tathagata. Tendo ido, não há retorno.
Portanto, é eterno.”

Kashyapa ainda disse ao Buda: “Se colocarmos o ferro sem cor de volta
no fogo, a cor vermelha retornará. Se assim for com o Tathagata, a
ilusão novamente tomará forma. Se a ilusão tomar forma novamente,
isto nada mais é que o não-Eterno
.”

O Buda disse: “Oh Kashyapa! Não diga que o Tathagata é não


-Eterno.
Por que não? Porque o Tathagata é o Eterno. Oh bom homem! Quando

aasmadeira é queimada,
cinzas. Quando vemcom
se acaba a extinção
a ilusão,e,ocomo remanescentes,
que fica ficam
é Nirvana. Todas as
parábolas como as da roupa rasgada, da decapitação, e da louça que-
brada enunciam a mesma verdade. Todas essas coisas têm nomes
como estes: roupa rasgada, (cabeça) decapitada, e louça quebrada. Oh
Kashyapa! O ferro que tornou-se frio pode ser aquecido novamente.
Mas este não é o caso com o Tathagata. Uma vez que se acaba com a
ilusão, o que fica é a pureza e a serenidade em seu grau extremo. O

CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 115
chama ardente nunca mais volta. Oh Kashyapa! Saiba que a situação de
inumeráveis seres é como aquela do ferro. Com o fogo flamejante da
Sabedoria livre de ‘asvaras’ [impurezas], eu agora queimo os laços da
ilusão de todos os seres.”

Kashyapa disse ainda: “Muito bom, muito bom que eu agora veja a- cl
ramente o que significa quando o Tathagata diz que todos os Budas são
Eternos.”

O Buda disse: “Oh Kashyapa! Imagine, por exemplo, um Chakravartin


[um supremo monarca do mundo] nos fundos do seu palácio. Naquele
momento ele encontra-se nos jardins de trás. Embora este rei não
esteja em meio às suas acompanhantes, não podemos dizer que sua
vida está no fim. Oh bom homem! O mesmo é verdadeiro com o Ta-
thagata. Embora não esteja no Jambudvipa [este mundo], mas sim no
Nirvana, não podemos dizer que ele é não-Eterno. Ele encontra-se
agora fora do mundo das inumeráveis ilusões e está agora num mundo
todo-maravilhoso de paz e felicidade. Ele senta-se em meio às flores da
Iluminação, vê (a si) e recreia-
se.”

O Universo Físico e o do Bodhisattva

Kashyapa novamente indagou o Buda: “O Buda diz que já atravessou o


grande oceano da ilusão. Se você está além do mar da ilusão, por que
se casou com Yashodara e teve Rahula? A respeito disto, podemos

pensar
cruzou oque
mar.o Por
Tathagata ainda
favor, oh não seIlumine-me
Tathagata! desatou dos laços
sobre da ilusão e
stee ponto.”

O Buda disse a Kashyapa: “Não diga que se o Tathagata já há muito


atravessou o grande mar da ilusão, não haveria razão para ele ter Ya-
shodara [como sua esposa], conceber Rahula e que, em conseqüência,
o Tathagata ainda não teria se desatado dos laços da ilusão e atraves-
sado o grande mar da ilusão. Oh, bom homem! Este Grande Nirvana

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 116


evoca uma coisa de grande significância. Ouça-me com a sua melhor
atenção. Falarei para todo o mundo. Não fique surpreso ou alimente
dúvidas. Se o Bodhisattva-Mahasattva alcança o Grande Nirvana, coisas
tão altas e amplas quanto o Monte Sumeru poderiam, de fato, ser co-
locadas dentro de uma semente de mostarda. Se [naquela ocasião] os
seres se encontram no Monte Sumeru, eles não se sentirão reduzidos e
nem oprimidos. Não haverá sensação de vir ou ir a qualquer lugar.
Tudo será exatamente como antes, sem qualquer diferença. Somente
alguém que tenha atravessado o oceano [da ilusão] estará apto a ver
que este Bodhisattva colocou os três mil grandes sistemas de mil mun-
dos dentro de uma semente de mostarda e está de volta à sua própria
residência (morada) novamente. Oh, bom homem! Igualmente, o Bo-
dhisattva-Mahasattva pode entrar no Grande Nirvana e colocar os três
mil grandes sistemas de mil mundos dentro de um poro da sua pele, e
ainda assim o lugar srcinal permanecer como sempre foi [imutável,
inalterado]. Oh, bom homem! Também, o Bodhisattva-Mahasattva
pode entrar no Nirvana, separar as terras Búdicas dos três mil grandes
sistemas de mil mundos, coloca-las na ponta de uma agulha e empur-
rá-las através de outras terras Búdiscas como se as tivesse transpas-
sando através de uma folha de jujuba e, mesmo assim, os seres viven-
tes ali não teriam qualquer sensação de estar indo ou vindo. Somente
alguém emancipado poderia ver isto e também o lugar srcinal. Tal é o
caso.

Oh, bom homem! Também, poderia haver um Bodhisattva-Mahasattva


que, morando no Grande Nirvana, separasse as terras Búdicas dos três
mil grandes sistemas de mil mundos, as colocasse na palma da sua mão
direita e, como no caso da roda do oleiro, as arremessasse para outros
mundos de partículas. E mesmo assim, nenhum simples ser acalentaria
uma idéia de estar indo ou vindo. Somente alguém emancipado estaria
apto a ver isto. E assim seria também com o lugar srcinal. Oh, bom
homem! Também, um Bodhisattva-Mahasattva que tenha atingido o
Grande Nirvana pode separar inumeráveis terras Búdicas de todas as
dez direções e colocá-las dentro do seu próprio corpo. E as pessoas
vivendo ali não se sentiriam apertadas, oprimidas ou tendo qualquer
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 117
sensação de estarem sendo movidas de onde elas estavam. Somente
alguém que tenha sido salvo poderia ver isto. O mesmo se passa com o
lugar srcinal. Oh, bom homem! Pode haver também um Bodhisattva-
Mahasattva que tenha entrado no Nirvana e que tenha colocado as
terras das dez direções numa partícula de pó. Os seres ali dentro tam-
bém não se sentiriam constritos, ou apertados ou teriam alguma sen-
sação de ir e vir. Somente alguém emancipado vê isto bem. O mesmo
se passa com o lugar de srcem.

Oh bom homem! Quando este Bodhisattva reside no Grande Nirvana,


ele manifesta bem as várias inumeráveis transformações. Portanto, diz-
se Mahaparinirvana. Todos os divinos poderes milagrosos que este
Bodhisattva-Mahasattva demonstra nunca podem ser ponderados ou
conhecidos por qualquer dos seres [comuns]. Como poderia você saber
por que o Tathagata se comprometeu numa vida de amor e desejo e
procriou Rahula? Oh, bom homem! Agora, já se vai um longo tempo
desde que eu [primeiramente] experimentei este Grande Nirvana e
manifestei muitos divinos poderes milagrosos. É como aludido nou- ‘S
tra Surangama’, em que eu já me manifestei várias vezes em dezi- m
lhões de sóis e luas, e em dez milhões de Jambudvipas dos três mil
grandes sistemas de mil mundos. E mais, eu atingi o Nirvana nos três
mil grandes sistemas de mil mundos e no Jambudvipa. Eu realmente o
atingi. E mais, Eu encontro a minha Via dentro do útero da mãe e faço
com que os pais pensem que sou seu filho. Mas eu nunca sou aquele
que nasceu através de uma comunhão de amor e desejo; Eu me afastei
do amor [sensual] há inumeráveis kalpas.

Passos para a Paz e Felicidade dos Seres

Este meu corpo é o Corpo do Dharma. Seguindo os caminhos do mun-


do, eu me manifesto num útero materno. Oh, bom homem! Neste
Jambudvipa, nos jardins de Lumbini, eu manifestei como nascido do
útero da Mãe Maya. Após nascer, dei sete passos para o leste e pro-
clamei: ‘Eu sou o mais Honrado e Supremo dentre todos os humanos,

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 118


devas e asuras.’ Meus pais, humanos e devas, testemunhando isto,
ficaram jubilosos para além das palavras e maraviralham-se. Todas
aquelas pessoas disseram que eu era uma criança. Mas, há inumerá-
veis kalpas passados, eu me apartei de quaisquer dessas coisas. Um
corpo tal como este é o Corpo-do-Dharma, e não aquele nascido da
carne, sangue, nervos, ossos e medula. Seguindo os caminhos do mun-
do, eu apareci como uma criança. Dei sete passos para o sul e procla-
mei que me tornaria o Supremo Campo de Prosperidade para o benefí-
cio de inumeráveis seres. Dando sete passos para o oeste, indiquei que
a vida agora estava encerrada (extinta), que eu partiria da velhice e da
morte, e que este era o último dos meus corpos. Dando sete passos
para o norte, eu manifestei que atravessaria todos os mares do nasci-
mento e da morte de todas as existências. Dando sete passos para o
leste, eu revelei que me tornaria o Guia para todos os seres. Dando
sete passos para os quatro cantos, eu revelei que erradicaria as raízes
das várias ilusões e as naturezas das quatro Maras (maldades), tornan-
do-me o Tathagata, Merecedor de Ofertas, o Todo-Iluminado. Dando
sete passos para o céu, eu proclamei que nunca seria manchado pelas
impurezas. Dando sete passos para baixo, eu proclamei que a chuva do
Dharma extinguiria o fogo do inferno, tal que os seres nascidos lá seri-
am abençoados com paz e felicidade.

Para uma pessoa que violou as proibições, eu me manifestei como


geada e granizo. Após sete dias de vida no Jambudvipa, eu me manifes-
tei raspando a minha cabeça. Todos disseram que eu era a primeira
criança a ter sua cabeça raspada. Todos os humanos e devas, o rei dos
Marapapiyas, Shramanas e Brahmanes jamais podem ver a usnisa [pro-
tuberância no topo das cabeças dos Budas] da minha cabeça. Como
possivelmente poderiam eles pegar uma lâmina e raspá-la? Jamais
haverá qualquer pessoa que possa pegar uma lâmina e alcançar a mi-
nha cabeça. Eu raspei a minha cabeça há inumeráveis kalpas no passa-
do. Mas, para seguir os caminhos do mundo secular, eu mostrei que a
raspei [como um jovem Príncipe]. Após o meu nascimento, meus pais
me levaram para o templo das divindades e mostraram-me para Ma-
hesvara que, vendo-me, juntou suas mãos e postou-se a um lado. Des-
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 119
de inumeráveis kalpas passados, eu já acabei com qualquer cerimônia
como, por exemplo, ao entrar no templo de um deva. Mas, apenas
para seguir os caminhos da vida secular, manifestei isto. Na vida do
Jambudvipa, deixei as pessoas fazerem um furo no lóbulo da minha
orelha. Ninguém no mundo pode fazer um furo no lóbulo da minha
orelha. Para seguir o caminho da vida secular, manifestei isto. Além
disso, eles fizeram brincos de todas as gemas e adornaram os lóbulos
da minha orelha. Mas, desde inumeráveis kalpas passados, eu já dis-
pensei os adornos. Apenas para seguir aquilo que se obtém na vida
secular, manifestei isto. Eu fui para a escola e mostrei que aprendera
leitura e escrita. Mas, eu já me formei em todas essas coisas há inume-
ráveis kalpas no passado. Como eu passei meus olhos através de todos
os seres dos três mundos, não vi nenhum que pudesse ser meu profes-
sor. Mas, para cumprir as formalidades da vida secular, eu dispus-me a
ir à escola. Este é o porquê de Eu ser chamado Tathagata, Merecedor
de Ofertas, e Todo-Iluminado. O mesmo se passou com a condução de
um elefante, a equitação num cavalo, quando lutando, e o aprendizado
de várias artes, também. No Jambudvipa, eu me manifestei como um
jovem Príncipe. Todos os seres viram-me como um Príncipe Real diver-
tindo-se e satisfazendo-se em meio aos cinco desejos da vida. Mas, há
inumeráveis kalpas passados, eu já descartei coisas tais como os cinco
desejos. Apenas para estar em concordância com aquilo que se obtém
na vida secular, eu manifestei isto. O vidente viu-me e disse que se eu
não abandonasse o lar e buscasse a Via, eu me tornaria um Chakravar-
tin e rei do Jambudvipa. Todos os seres compreenderam isto. Mas, eu
já descartara o trono de um Chakravartin e era o Rei-do-Dharma. No
Jambudvipa eu renunciei ao harém e aos cinco desejos, vi a velhice, a
doença, a morte, o Shramana, abandonei o lar e busquei a Via.

Todos os seres dizem que o Príncipe Sidharta, então pela primeira vez,
abandonou o lar e tornou-se um Shramana. Mas, já há inumeráveis
kalpas atrás, eu abandonei o lar, tornei-me um Shramana e pratiquei a
Via. Meramente para cumprir com o que obtive na vida secular, eu
manifestei isto. Eu já abandonei o lar no Jambudvipa e recebi a grande
ordenação [upasampada]. Envidei esforços, pratiquei e atingi as frui-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 120
ções da Via tais como Srotapanna [um monge que nascerá apenas
entre duas e sete vezes antes de ganhar a libertação], sakridagamin
[renasce apenas mais uma vez após a morte], anagamin [não mais
retorna a este mundo], e arhat [um santo]. Meramente para cumprir
com o que obtive na vida secular, eu manifestei isto. Todos diziam que
era fácil e não havia dificuldades para atingir o arhatship. Mas já, há
inumeráveis kalpas no passado, atingi o arhatship. No sentido de con-
duzir os seres para a outra margem da Iluminação, eu sentei sob a ár-
vore Bodhi no Bodhimanda [assento da Iluminação] de grama e derro-
tei todos os Maras [demônios]. Mas eu, já há longos e inumeráveis
kalpas no passado, derrotei os Maras. A fim de dominar os seres fortes,
eu manifestei esta cena. Eu também exibi dois tipos de resposta aos
apelos da natureza, inspirando e expirando. Todos os seres dizem que
eu respondi aos chamados da natureza e inspirei e expirei. Mas, com
este meu corpo, não tenho fruição do karma e preocupação. Eu mera-
mente ajo em concordância com a via da vida mundana. Este é o por-
quê de manifestar-me assim. Eu também mostro que recebo ofereci-
mentos feitos a mim através da prática da fé. Mas eu não sinto mais
fome ou sede neste meu corpo, e apenas cumpro com a via mundana
da vida. Eu me exibo assim. Eu também acompanho a via mundana da
vida de todos os outros e durmo. Mas eu atingi a profunda Sabedoria
há inumeráveis kalpas no passado e acabei com ações tais como ir e vir,
dores de cabeça, dos olhos, do estômago, das costas, do resto do meu
corpo, carbúnculos difíceis de curar; todas estas resultantes do karma
passado. Mas, manifestei-me lavando minhas mãos e pés numa bacia,
lavando meu rosto, gargarejando, usando escovas de dente e todas
essas coisas quese aplicam ao mundo. As pessoas dizem que eu faço
todas essas coisas. Mas, não as faço. Minhas mãos e pés são tão puros
quanto uma flor de lótus, minha boca é limpa e cheira à utpala [flor de
lótus]. Toda a gente diz que eu sou um humano. Mas agora sou não-
humano. Eu também me manifesto recebendo pamsukula [roupas
descartadas], lavando, costurando e remendando. Mas há longo tempo
que não uso tais indumentárias. Todos dizem que Rahula é meu filho,
que Suddhodana foi meu pai e Maya minha mãe, que tive uma carreira

CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 121
secular na minha vida, que eu gostava de paz e felicidade [quando um
jovem príncipe], e que abandonei todas essas coisas e busquei a Via.

As pessoas ainda dizem: ‘O príncipe deste reino, do grande Clã de u-


Ga
tama, renunciou aos prazeres mundanos e buscou o supramundano’.
Mas já há longo tempo que me afastei do amor e do desejo mundanos.
Eu meramente exibi todas essas coisas. Todos dizem que sou homem.
Mas, para dizer a verdade, não sou. Oh bom homem! Eu me manifesto
no Jambudvipa e frequentemente entro no Nirvana. Mas, na verdade,
eu não entro no Nirvana a toda a hora. Todas as pessoas ainda dizem
que o Tathagata agora está morrendo. Mas, a natureza do Tathagata,
verdade seja dita, é eternamente imortal. Você deveria saber que eu
sou o Eterno e Imutável. Oh bom homem! O Grande Nirvana nada mais
é que o mundo do Dharma de todos os Budas-Tathagatas. Eu também
me manifesto neste Jambudvipa. As pessoas dizem que [como Sidhar-
ta] atingi o estado de Buda pela primeira vez. Mas, desde há inumerá-
veis kalpas passados, eu fiz o que era necessário ser feito e perfeita-
mente de acordo com o caminho (o hábito) do mundo. Esta é a razão
porque eu, neste Jambudvipa, manifesto a renúncia e a consecução do
Estado de Buda. Eu também [aparentemente] agi em desacordo com
as proibições e cometi as quatro graves ofensas. As pessoas viram-me e
disseram que eu transgredi. Mas, há inumeráveis kalpas passados,
tenho agido em concordância com as proibições, e nada (do que fiz) foi
incorreto. Também, no Jambudvipa, eu fui um icchantika (pessoa de
incorrigível descrença). Todas as pessoas me viram como um icchanti-
ka. Mas, dizendo a verdade, não fui icchantika. Se fui um icchantika,
como poderia ter atingido a Suprema Iluminação? Eu também me
mostrei no Jambudvipa como um perturbador da paz da Sangha Budis-
ta.

As pessoas dizem que eu era um sacerdote Budista que destruía a paz


da Sangha. E também me manifestei no Jambudvipa como protetor do
Dharma Maravilhoso. As pessoas vêem isto e dizem que isto é prote-
ção do Dharma. Todos eles estão surpresos. Todos os Budas fazem isto
e nada há de surpreendente a respeito. Neste Jambudvipa, eu também
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 122
me manifestei como Marapapiyas (Mara, o Demônio). As pessoas dis-
seram que este era Marapapiyas. As pessoas disseram que este era
‘papiyas’ [‘muito mau’]. Mas, eu me apartei da maldade há inumer
á-
veis kalpas no passado; eu sou puro, não sou impuro e sou como o
lótus. Eu também me manifesto no Jambudvipa como um Buda femi-
nino. As pessoas vêem isto e dizem que é estranho que uma mulher
pudesse atingir a Suprema Iluminação. O Tathagata, afinal, nunca foi
uma mulher. Com o objetivo de subjugar as pessoas, eu me manifesto
como uma mulher. Como sinto piedade pelos seres, também me mani-
festo em várias imagens coloridas. Eu também me manifesto em meio
aos quatro reinos do sofrimento do Jambudvipa. Como eu poderia
nascer nos quatro reinos do sofrimento através de más ações? A fim de
conduzir os seres à outra margem, eu nasci assim. Eu também nasci
como Brahma no Jambudvipa e fiz aqueles que servem ao Brahma
residirem no Dharma Maravilhoso. Mas, na verdade, eu não sou um
Brahma. Mas todas as pessoas dizem que eu sou verdadeiramente um
Brahma. Eu também me manifesto como devas (espíritos intimamente
ligados e integrados à natureza, ou seja, aos cinco elementos) e preen-
cho todos os templos de devas. Mas, é o mesmo caso. Eu também me
manifesto como freqüentador de bordéis neste Jambudvipa. Mas a
minha mente não conhece a luxúria; eu sou puro e imaculado como
um lótus. Para ensinar aqueles inebriados no desejo e na luxúria, eu
fico nas encruzilhadas e falo acerca da Doutrina Maravilhosa. Mas, na
verdade, eu não tenho a luxúria ou pensamentos degradantes. As pes-
soas dizem que eu protejo mulheres. Eu também, no Jambudvipa, me
manifesto na casa de serventes e domésticas. Tudo isto é para levá-las
ao caminho do Dharma Maravilhoso. Mas, na verdade, eu nunca me
degradei, perpetrei más ações e me tornei [íntimo de] serventes e do-
mésticas. Ainda, no Jambudvipa, eu me manifestei como um professor
e conduzi crianças pelo Dharma Maravilhoso. No Jambudvipa, eu tam-
bém entrei em vários bares e cassinos. Tudo isto é para participar nos
jogos, nas discussões, e auxiliar os seres. Além do mais, eu não tenho
experiência com essas más relações. E ainda as pessoas dizem que eu
faço tais coisas. Eu também vivi muito tempo em meio às escarpas
como uma grande águia, assim como para auxiliar pássaros voando. E
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 123
ainda as pessoas disseram que fui uma águia de verdade. Mas há muito
que já me apartei de tais modos de vida. Tudo isto foi para auxiliar
pássaros e águias.

A Real e Profunda Intenção do Buda

“Shariputra, todos deveriam compreender que aquilo que o Buda diz


por suas palavras, não é de forma alguma em vão ou falso. Shariputra,
todos os Budas pregam a Lei de acordo com o que é apropriado, mas
sua intenção é difícil de compreender”. Sutra
– de Lótus, Cap. 02: Meios
Hábeis.

“Eu também me manifestei no Jambudvipa como um grande homem


rico. Isto foi para fazer com que inumeráveis pessoas fossem abençoa-
das com a paz e residissem no Dharma Maravilhoso. Além disso, tor-
nei-me um rei, ministro, príncipe ou primeiro ministro. Em meio a tais
cargos, tornei-me o primeiro em todos os casos. No sentido de praticar
o Dharma Maravilhoso, tornei-me um rei. Também, houve um tempo
no Jambudvipa em que numerosas epidemias surgiram e muitas pes-
soas sofreram. Primeiro, dei-lhes a medicina (remédio) e mais tarde
falei-lhes acerca do Dharma Maravilhoso, e fiz-lhes atingir a Suprema
Iluminação. Então, todos disseram que aquele tempo foi uma era de
doenças. Também, houve um tempo no Jambudvipa em que a fome
eclodiu. Dei às pessoas a comida de que necessitavam, falei acerca do
Dharma-Todo-Maravilhoso e as conduzi à Suprema Iluminação. Tam-

bém, para pessoas


o não-eterno; para com pensamentos
aqueles inclinadosinclinados
com pensamentos ao ‘ser’, eu
ao falei sobre
prazer, eu
falei sobre o sofrimento. Para aqueles que se apegam ao eu, o altruís-
mo é exposto. Para aqueles que se apegam à pureza, a impureza é
exposta. Para aqueles que se apegam aos três mundos, o Dharma é
exposto, para fazê-los renunciar ao mundo. Para passar os seres à ou-
tra margem, o maravilhoso remédio do Dharma é prescrito. A fim de
derrubar as árvores da ilusão, aquelas (árvores) da insuperável medici-

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 124


na do Dharma são plantadas. Para salvar todos os tirthikas [seres delu-
didos, não-Budistas], o Dharma Maravilhoso é exposto. Embora eu aja
como um mestre para os seres, nenhum pensamento de (ser) um mes-
tre para todos os seres reside em mim. Uma vez que intento socorrer
todos aqueles das baixas camadas sociais, eu ganho vida em meio a
eles e falo acerca do Dharma. E nenhuma má ação ecoará (na forma-
ção de um mau carma) dentro de mim.”

O Tathagata-Todo-Iluminado está eternamente no Parinirvana. Portan-


to, eu digo ‘Eterno e Imutável’. Tal como no Jambudvipa (ao sul do
Monte Sumeru), assim também se passa no Purvavideha (ao leste do
Monte Sumeru), no Aparagodana (a oeste do Monte Sumeru) e no
Uttarakuru (ao norte do Monte Sumeru). Como nos quatro continen-
tes, assim também se passa nos três mil grandes sistemas de mil mun-
dos. Quanto às 25 existências, as coisas são como estabelecidas expan-
sivamente no ‘Sutra Surangama’. Portanto, ‘Parinirvana’.O Bodhisatt-
va-Mahasattva que reside no Parinirvana pode exibir bem tais poderes
(milagrosos) e transformações, e não tem receio. Oh, Kashyapa! Não
diga, portanto, que Rahula é o filho do Buda. Por que não? Porque há
inumeráveis kalpas atrás eu já erradiquei todos os desejos da existên-
cia. Este é o porquê de dizermos que o Tathagata é Eterno e Imutável.”

Kashyapa ainda disse: “Oh, Tathagata! Por que dizermos eterno? Você,
o Buda, disse que quando a luz de uma lâmpada se extingue, não há
direção ou lugar para ser nomeado [como para onde ir]. O mesmo é o
caso com o Tathagata. Uma vez morto, não pode haver direção ou
lugar que possa ser nomeado.”

O Buda disse: “Oh, Kashyapa! Você não deveria dizer: ‘Quando a luz de
uma lâmpada se extingue, não há direção ou lugar para ser nomeado.
O mesmo é o caso com o Tathagata. Quando há extinção, não pode
haver direção ou lugar para ser nomeado.’ Oh, bom homem! Quando
uma lâmpada é acesa por um homem ou por uma mulher, qualquer
lâmpada, grande ou pequena, [tem que ser] abastecida com óleo.
Quando há óleo, a lâmpada se acende. Quando o óleo é consumido, a
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 125
luz também desaparece, junto com ele. A luz que se vai pode ser com-
parada à extinção da ilusão. Embora a luz tenha se desvanecido, o u-
tensílio permanece. O mesmo é o caso com o Tathagata. Embora a
ilusão tenha partido, o Corpo-do-Dharma permanece para sempre. Oh,
bom homem! O que isto significa? Será que significa que ambos, a luz e
a lâmpada, desaparecem? É assim?”

Kashyapa respondeu: “Não, Honrado pelo Mundo! Ambos não desapa-


recem ao mesmo tempo. E o que fica ainda é não-eterno. Se o Corpo-
do-Dharma é comparado com a lâmpada, a lâmpada é não eterna e,
assim, o Corpo-do-Dharma também é não-
eterno.”

(O Buda disse:) “Oh, bom homem! Você não deveria refutar dessaa-m
neira. Nós falamos de um ‘utensílio’ do
mundo. O Tathagata-Honrado-
pelo-Mundo é o Supremo Utensílio do Dharma. Um utensílio do mun-
do pode ser não-eterno, mas não aquele do Tathagata. Dentre todas as
coisas, o Nirvana é eterno. O Tathagata tem isto (o Nirvana). Assim, ele
é eterno. Ainda mais, bom homem! Você diz que a luz da lâmpada se
extingue. Isto é [como] o Nirvana alcançado por um Arhat. Em razão de
todas as ilusões da cobiça e do desejo se acabarem, podemos compa-
rar isto à extinção da luz da lâmpada. O Anagamin ainda tem a cobiça.
Como ainda há a cobiça, não podemos dizer que isto é o mesmo que a
extinção da luz da lâmpada. Este é o porquê eu disse no passado num
ensino secreto que ele (o Anagamin) era como uma lâmpada morrendo
(se apagando). Não é que o Nirvana deva ser equiparado com a lâmpa-
da se apagando. O Anagamin retorna uma outra vez. Ele não volta para
as 25 existências. Novamente, ele não ganha mais o corpo mal-
cheiroso, o corpo de vermes, o corpo que é alimentado, o corpo vene-
noso. Assim é um ‘Anagamin’ [aquele que não retorna para uma exis-
tência corpórea novamente]. Se um corpo surge novamente, isto é um
‘Agamin’ [aquele que retorna para uma existência corpórea]. Quando o
corpo não surge novamente, isto é um ‘Anagamin’. Aquele que é a- dot
do do ir e vir é o ‘Agamin’. Aquele que nãoem
t o ir e vir [não nasce e
morre] é ‘Anagamin’.”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 126


Então, o Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh, Honrado pelo
Mundo! Você, o Buda, diz que todos os Budas-Honrados-pelo-Mundo
possuem um repositório secreto. Mas isto não é assim. Por que não?
Todos os Budas-Honrados-pelo-Mundo têm palavras faladas reserva-
damente (secretamente), mas não um repositório secreto [um ensino
não tornado conhecido]. Por exemplo, isto é análogo ao caso de um
mágico, seu dispositivo mecânico, e sua imagem de madeira. Pode-se
ver os movimentos de flexão, alongamento, para cima e para baixo;
mas, não sabemos que dentro há um homem que faz as coisas se pro-
cederem assim. Mas com os ensinamentos do Buda, não é daquela
maneira. Seus ensinamentos permitem a todos os seres conhecer e
ver. Como poderíamos dizer que todos os Budas-Honrados-pelo-
Mundo têm qualquer segredo?”

O Buda elogiou Kashyapa e disse: “Falaste bem, falaste bem, oh bom


homem! É como você diz. O Tathagata, para dizer a verdade, não man-
tém qualquer coisa oculta. Como assim? É como no caso de uma lua
cheia no outono, quando ela está aberta, desnuda, clara, pura e sem
nuvens, tal que todas as pessoas possam vê-la. Aquilo que o Tathagata
diz também é assim. É aberto, desnudo, claro, puro e sem nuvens. As
pessoas estúpidas (obtusas) não compreendem e falam de um segredo
em conexão com aquilo (que o Tathagata diz). O sábio, compreenden-
do o assunto, não diz que há alguma coisa secretamente guardada em
outro lugar. Oh, bom homem! Há um homem aqui que guarda ouro e
prata juntando ‘yis’ por ‘yis’ [uma unidade numérica Chinesa]. Sendo
um miserável, ele não dá aos pobres ou ajuda-os. Qualquer coisa guar-
dada dessa maneira pode ser chamada de ‘secretamente guardada’
[secretamente retida]. Não é assim com o Tathagta. Ao curso de inu-
meráveis longos kalpas, ele guarda leis maravilhosas [doutrinas, verda-
des] e tesouros raros. Ele não regateia; ele sempre os dá a todos os
seres. Como podemos dizer que ele guarda secretamente [verdades]?
Oh, bom homem! Há um homem aqui ao qual está faltando uma parte
do corpo, tal como um olho, mão ou perna. Ele se sente tímido e não
permite aos outros ve-lo. Como todas as pessoas não o vêem, diz-se
(que ele está) ‘oculto secretamente’. Não é assim com o Tathagata. Ele
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 127
é perfeito no Dharma Maravilhoso e não é mutilado, permitindo a to-
dos os outros ve-lo.

Como poderíamos dizer que o Tathagata guarda secretamente coisas?


Oh, bom homem! Um homem pobre, por exemplo, tem débitos. Ele
teme o homem a quem ele deve dinheiro. Ele se esconde e não quer se
mostrar. Neste caso podemos falar de ocultação. Não é o mesmo caso
com o Tathagata. Ele não está sujeito às leis mundanas de todos os
seres, mas às suas leis supramundanas. Mas, ele não as esconde. Por
que não? Porque ele sempre considera os seres como seus filhos úni-
cos e lhes expõe o Dharma Insuperável. Oh, bom homem! Por exem-
plo, existe um homem rico que possui muitas riquezas. Ele tem somen-
te um filho. Ele ama demais este filho e não pode esquecê-lo. Ele mos-
tra toda a sua riqueza para o seu filho. Assim é com o Tathagata. Ele vê
todos os seres como seus filhos únicos. Oh, bom homem! Isto é como
no caso das pessoas mundanas. Homens e mulheres ocultam a sua
genitália sob as roupas porque tais coisas não são agradáveis de ver.
Neste caso podemos falar de ‘ocultação’. Nãoassim
é com o Tathagata.
Desde há muito que ele acabou com a genitália. Como ele não possui
tais coisas, não há razão para ocultação. Oh, bom homem! Os Brahma-
nes não gostam que suas palavras e o que eles dizem seja ouvido por
Kshatriyas, Vaishyas e Sudras. Por que não? Porque há muitas coisas
em suas palavras que são erradas e maldosas. Mas o Dharma Maravi-
lhoso do Tathagata é tal que ele é agradável em seu início, agradável
no seu meio e agradável na sua conslusão. Assim sendo, não podemos
falar aqui de algo oculto ou escondido.

A Colheita do Grande Nirvana (Mahaparinirvana)

Oh, bom homem! Por exemplo, aqui existe um homem rico que tem
um único filho. Ele sempre pensa a respeito e ama este menino. Ele
leva o menino para um professor para ser ensinado. Apreensivo de que
as coisas possam não progredir rapidamente (a contento), ele leva o

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 128


menino de volta para casa. Como ele o ama, lhe ensina o alfabeto dia e
noite, muito pacientemente. Mas, ele ainda não lhe ensina o vyakarana
[um trabalho popular para estudo da linguagem, um tipo de gramáti-
ca]. Por que não? Porque a criança é pequena e não está apta a apren-
der tais lições. Oh, bom homem! Todavia, o homem rico terminou o
ensinamento do alfabeto. Estaria o menino pronto para ser ensinado o
vyakarana?”

“Não, oh Honrado pelo Mundo!”

“O Homem rico está ocultando algo da criança?”

“Não, oh Honrado pelo Mundo! Por que não? Porque a criança é muito
jovem. Dessa forma, ele não lhe ensina [as matérias mais avançadas].
Não é que o menino não seja ensinado porque o homem regateie [tais
lições]. Por que não? Porque se houvesse algum ciúme ou inveja, pode-
ríamos dizer que ele ocultou coisas. Com o Tathagata não é assim. Co-
mo poderíamos dizer que ele escondeu e ocultou?”

O Buda disse: “Falaste bem, falaste bem, oh bom homem! É como você
diz. Se houvesse qualquer raiva, ciúme ou inveja (má vontade), poderí-
amos dizer que ele está ocultando coisas. O Tathagata não tem raiva
ou ciúme. Como poderíamos dizer que ele esconde as coisas? Oh, bom
homem! O grande homem rico é o próprio Tathagata. Sua única crian-
ça são [todos] os seres. O Tathagata vê a todos os seres como vê seu
filho único. (O homem rico) Ensinando seu filho único diz respeito aos
discípulos Sravaka [Ouvintes dos ensinamentos do Buda]; o alfabeto diz
respeito aos nove tipos de sutras; o vyakarana diz respeito aos sutras
Vaipulya [extensivo] Mahayana. Uma vez que todos os discípulos Sra-
vaka não possuem o poder da Sabedoria, o Tathagata ensina-lhes o
alfabeto; isto é, os nove tipos de sutras. Mas, ele ainda não fala do
vyakarana; isto é, do Vaipulya Mahayana. Oh, bom homem! Quando o
filho do homem rico crescer e estiver apto a enfrentar as lições, se o
vyakarana não for ensinado, então poderemos dizer que houve ‘ocu l-
tação’. Se todos os Sravakas estão crescidos e podem de
atof enfrentar
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 129
as lições do Vaipulya Mahayana, mas o Tathagata regateia isto e não
lhes ensina, então poderíamos dizer que o Tathagata regateia, esconde
e oculta os ensinamentos. Mas, não é assim com o Tathagata. O Tatha-
gata não oculta [nada]. Isto é como no caso do homem rico que, tendo
ensinado o alfabeto, proximamente ensina o vyakarana. Eu também
faço o mesmo. A todos os meus discípulos eu tenho pregado acerca do
alfabeto e dos nove tipos de sutras. Tendo feito isto, eu agora falo a-
cerca do vyakarana. Isto nada mais é que a natureza eterna e imutável
do Tathagata. Além disso, oh bom homem! Isto é como nos meses de
verão, quando grandes nuvens provocam trovões, grandes chuvas e,
como resultado, todos os agricultores podem plantar as suas sementes
e colher coisas. Aquele que não planta, nada pode esperar colher. Não
é através dos trabalhos dos reis naga (naga = é uma palavra do
Sanskrito and doPāli que designa uma deidade - ou classe de entidades
ou seres que assumem a forma de enormes serpentes, mas muitas
vezes com os troncos e cabeças humanas - encontrada tanto no Bu-
dismo como no Hinduísmo) que ele não pode colher. E estes reis naga
também não armazenam coisas. O mesmo se passa comigo. Eu deixo
cair a grande chuva do Sutra do Grande Nirvana. Aqueles seres que
plantaram boas sementes colhem os brotos (rebentos) e frutos da
Sabedoria. Aqueles que não plantaram, nada podem esperar. O Tatha-
gata não é culpado se eles nada ganharam. O Tathagata não esconde
nada.”

Kashyapa disse novamente: “Agora eu sei definitivamente que a- oT


thagata-Honrado-pelo-Mundo nunca esconde e oculta [qualquer coi-
sa]. Você, o Buda, diz que o vyakarana refere-se à eterna e imutável
natureza do Buda-Tathagata. Mas, este não pode ser o significado. Por
que não? Porque o Buda disse antes em um gatha:

‘Todos os Budas, Pratyekabudas e Sravakas (Ouvintes) abandonam o


corpo não eterno.
Como poderia não ser assim com os mortais comuns?’

Agora você diz ‘eterno’ e ‘imutável’. O que isto significa?”


Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 130
O Buda disse: “Oh, bom homem! Como eu tenho ensinado o alfabeto
aos discípulos Sravakas, então falei assim no gatha. Oh, bom homem!
O Rei Prasenajit perdeu sua mulher. Ele chorou tristemente. Ele amava
sua mulher e não poderia conter a tristeza. Ele veio a mim. Eu indaguei:
‘Oh Rei! Por que você está tão aflito e triste’? O Rei disse: ‘A Rainha
-
Mãe do reinado morreu, oh Honrado pelo Mundo! Se alguém puder
trazer minha (rainha) mãe de volta à vida, darei meu reinado, elefan-
tes, cavalos, os sete tesouros, ou mesmo minha vida; assim lhe retribui-
rei’. Eu disse ao Rei: ‘Oh, Grande Rei! Por favor, não se perca na mágoa
e na tristeza! Não chore! Quando a vida termina para uma pessoa, isto
é morte. Todos os Budas, Sravakas, Pratyekabudas e discípulos têm
que partir com este corpo. Como poderiam os mortais comuns não ter
de fazê-lo?’ Oh, bom homem! Para ensinar o alfabeto ao Rei, falei s- a
sim neste gatha. Agora eu exponho para os meus discípulos Sravakas o
vyakarana e digo que o Tathagata é eterno e que ele é imutável. Se
qualquer pessoa disser que o Tathagata é não-eterno, como poderia a
língua dessa pessoa não ser cortada?”

Kashyapa ainda replicou: “Você disse: ‘Nada é amealhado, e eu estou


satisfeito com a refeição que tomei. É como no caso do pássaro que
voa no céu, cujos caminhos são difíceis de traçar’. O que pode isto
g- si
nificar? Oh, Honrado pelo Mundo! Dentre todos aqueles aqui congre-
gados, quem poderia ser aquele que não amealha? Quem poderia ser
chamado de satisfeito com [sua] comida? Quem são aqueles que voam
através dos céus e cujos caminhos não podem ser traçados? E para
onde vamos quando deixarmos este lugar?”

O Buda disse:“Oh, bom homem! O amealhado nada mais é que riqu e-


za e tesouro. Oh, bom homem! Há dois tipos de amealhados: um da-
quilo que é criado e outro daquilo que é não-criado. O amealhado do
criado é aquele que os Sravakas fazem; o amealhado do não-criado é
aquele que o Tathagata faz. Oh, bom homem! Dentre os sacerdotes, há
dois tipos: um é do tipo criado, e o outro é do tipo não-criado. O sacer-
dote do tipo criado é o Sravaka. O sacerdote Sravaka não amealha.
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 131
Homens ou mulheres humildes estão fora-da-lei; assim, guardam arroz,
pasta de feijão, gergelim, pequenos e grandes feijões num armazém.
Se alguém disser que o Tathagata permite possuir serventes, homens
ou mulheres, e as demais outras coisas, sua língua será cortada. Eu digo
que todos os meus discípulos Sravakasãos ‘não-armazenadores’. Ou
que eles são aqueles satisfeitos com a sua comida. Se uma pessoa pro-
cura avidamente por comida, tal pessoa não está satisfeita. Dizer que ‘é
difícil traçar os caminhos’ significa alguém que está próximo da Ilum
i-
nação Insuperável.Eu disse: ‘A pessoa vai, mas não há lugar para ir’.”

Kashyapa disse ainda: “O sacerdote do tipo criado não amealha. Como


poderia o sacerdote do tipo não-criado assim proceder? O sacerdote
do tipo não-criado é o Tathagata. Como o Tathagata poderia amealhar
coisas? Amealhar significa ‘esconder e ocultar’. Como o Tathagata
x- e
põe [verdades] e não oculta [nada]. Como poderíamos dizer que ele
amealha coisas? Dizer que os caminhos não podem ser traçados refere-
se ao Nirvana. No Nirvana não há traços remanescentes do sol, lua,
estrelas, constelações, frio, calor, vento, chuva, nascimento, velhice,
doença, morte, ou as 25 existências. O Nirvana está isolado da apreen-
são, da tristeza e da ilusão. Assim é a morada do Nirvana e do Tathaga-
ta, que é Eterno e Imutável. Sendo assim, o Tathagata vem para a flo-
resta de árvores sala e entra no Parinirvana através do Grande Nirva-
na.”

O Buda disse à Kashyapa: “ ‘Grande’ significa amplo e extensivo na


natureza. É como quando falamos de um ‘grande homem’, quando a
extensão da vida daquele homem é infinita. Quando este homem resi-
de no Dharma Maravilhoso, chamamos- lhe ‘superior a todos os o-
h
mens’. É como no caso dos ‘oito pensamentos despertos de um grande
homem’ sobre os quais eu falo (este é o chamado Nobre Caminho c- Ó
tuplo: entendimento correto, pensamento correto, linguagem correta,
ação correta, modo de vida correto, esforço correto, atenção plena
correta, concentração correta). Se uma pessoa se tornasse assim, mui-
tas pessoas também se tornariam assim. Se uma pessoa possui as oito
qualidades, ela é a melhor. O Nirvana sobre o qual falamos não tem
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 132
erupções (feridas) ou tumores. Oh, bom homem! Por exemplo, [Imagi-
ne] um homem aqui que tenha sido atingido por uma flecha envene-
nada e que se encontra em grande dor e sofrimento. Um doutor (mé-
dico) instruído vem, extrai a flecha envenenada e aplica-lhe um remé-
dio soberbo. Como resultado, o sofrimento se vai, e o homem obtém a
paz. Este doutor visita castelos, cidades e vilas. Ele vai para onde as
pessoas sofrem a dor de erupções e tumores, aplica a sua arte e remo-
ve a dor. Oh, bom homem! O mesmo é o caso com o Tathagata. Tendo
atingido a Suprema Iluminação, ele se tornou um grande doutor. Ven-
do todos os seres do Jambudvipa atingidos pelas flechas envenenadas
das ilusões da luxúria, da ira e da ignorância; sofrendo ao curso de i-
numeráveis kalpas, ele aplica o doce remédio dos sutras Mahayana. Ao
término do tratamento ele se desloca para outros lugares onde as pes-
soas estão sofrendo pelas flechas envenenadas das ilusões. Lá, ele
[também] manifesta sua consecução da Iluminação e concede o trata-
mento [aos aflitos]. Assim, falamos de ‘Mahaparinirvana’. Mahaparini
r-
vana é o lugar onde todos alcançam a emancipação. Onde quer que
haja pessoas a serem subjugadas [isto é, com impurezas a serem re-
movidas] ele manifesta-se. Em razão deste verdadeiramente grande
significado, nós dizemos Grande Nirvana.”

O Bodhisattva Kashyapa ainda disse ao Buda: “Oh, Honrado pelo n-


Mu
do! Será que todos os chamados médicos curam completamente as
dores das erupções etumores? Ou eles não curam?”

“Oh, bom homem! Há dois tipos de dores relativas a erupções e tum o-


res. Uma é curável e a outra é incurável. O médico cura a que é curável,
mas não a que é incurável.”

Kashyapa disse novamente: “De acordo com o que o Buda diss e, o


Tathagata curou todos os seres do Jambudvipa. Ao término do trata-
mento, como poderia ainda haver lá seres que ainda não atingiram o
Nirvana? Se for o caso, que nem todos atingiram o Nirvana ainda, co-
mo pode o Tathagata dizer: ‘Ao término do tratamento
, eu me desloco
para outros lugares’?”
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 133
“Oh, bom homem! Há dois tipos de seres no Jambudvipa. Há aqueles
que possuem a fé, e os outros que não a possuem. Aqueles com fé
podem ser curados. Por quê? Porque tais pessoas, as quais não têm
erupções ou tumores,podem atingir o Nirvana definitivamente.”

“Oh, Honrado pelo Mundo! O que pode ser o Nirvana?”

“Oh, bom homem! Nirvana é emancipação [‘vimukti’, liberação].”

Kashyapa disse novamente: “A emancipação é uma coisa (algo) ou não


é uma coisa?”

O Buda disse:“O que não é uma coisa é a emancipação dos Sravakas e


Pratyekabudas; o que é uma coisa é a emancipação de Todo-Buda-
Tathagata. Sendo este o caso, oh bom homem, emancipação é uma
coisa e não é uma coisa. O Tathagata fala a todos os Sravakas e apre-
senta-a como não-coisa.”

“Oh, Honrado pelo Mundo! Se não é uma coisa, como podem osa-Sr
vakas e Pratyekabudas viver?”

“Oh, bom homem! Aquilo é tal como o Céu da ‘Irreflexão -não-


Irreflexão’ (Thoughtlessness é consciência sem obstruções, sem disti
n-
ções e sem apegos, que permeia todas as coisas) que, também, é e não
é uma coisa. O Eu, também, não é uma coisa. Podemos argüir, dizendo:
‘Se o Céu da ‘Irreflexão
-não-Irreflexão’ não é uma coisa, como pode
uma pessoa viver, vir e ir, avançar e ainda permanecer’? Tais assun
tos
relacionam-se ao mundo de todos os Budas; eles não são aquilo que
Sravakas e Pratyekabudas possam compreender corretamente. O
mesmo se passa com a Emancipação. Nós também falamos da matéria
[‘rupa’ = matéria, forma, corpo] e não
-matéria [‘arupa’ = não
-matéria,
não-forma, não-corpo], e isto é apresentado como não (sendo) uma
coisa. Também, falamos de pensamento e indolência, e isto é apresen-
tado como indolência. Todas essas coisas pertencem ao mundo de
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 134
todos os Budas e não são aquilo que Sravakas e Pratyekabudas possam
conhecer.”

A Verdadeira Emancipação e o Grande Nirvana

Então o Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh, Honrado pelo n-


Mu
do! Por favor, condescenda em explicar para mim o que concerne ao
Mahaparinirvana e o significado da emancipação.”

O Buda elogiou Kashyapa, dizendo: “Falaste bem, falaste bem, oh bom


homem! A verdadeira emancipação significa a libertação do nosso
próprio eu de todos os laços da ilusão. Se atingirmos verdadeiramente
a emancipação e apartarmos o nosso próprio eu dos laços da ilusão,
não há mais eu, ou nada para associar-se como no caso dos pais, de
cuja união resulta o nascimento de uma criança. A verdadeira emanci-
pação não é como este caso (dos pais). Este é o porquê da emancipa-
ção ser não-nascida, não-criada. Oh, Kashyapa! É como o sarpirmanda
[o mais delicioso e eficaz remédio], que é puro na sua natureza. O
mesmo é o caso com o Tathagata. Ele não é aquele que surge através
da união dos pais, da qual resulta o nascimento de uma criança. Sua
natureza é pura. A apresentação dos pais [do Tathagata] é [um meio
hábil] para atravessar os seres para a outra margem. A verdadeira e-
mancipação é o Tathagata. O Tathagata e a emancipação não são duas
coisas, não são diferentes. Quando plantamos as sementes na prima-
vera e no outono, por exemplo, é quente e úmido e, como resultado

disso, as sementes eclodem seus brotos. A verdadeira emancipação


não é assim.

Também, a emancipação é inexistência. Inexistência é emancipação.


Emancipação é o Tathagata e o Tathagata é inexistência. Não é algo
que surgiu do fazer [da ação]. O ‘fazer’ é como construir um castelo. A
verdadeira emancipação não surge dessa forma [isto é, ela não é com-

CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 135
posta, uma coisa construída]. Por esta razão, a emancipação é simulta-
neamente o Tathagata.

Também, a emancipação é o não-criado. Um oleiro faz um vaso, o qual


se quebra em pedaços novamente. As coisas (criadas) não são como
aquelas na emancipação. A verdadeira emancipação é não-nascimento
e não-extinção. Isto é o porquê emancipação é o Tathagata. Ele é não-
nascimento, não-extinção, não-envelhecimento; e é eterno, inquebrá-
vel e indestrutível. Ele não é algo criado. Por essa razão dizemos que o
Tathagata entra no Grande Nirvana (Mahaparinirna).

O que entendemos por não-envelhecimento e não-extinção? Velhice


refere-se àquilo que se move e se transforma. Nossos cabelos tornam-
se brancos, e rugas aparecem em nossa face. Por morte entende-se a
decomposição [desintegração] do corpo, como resultado da vida que
se vai. Nenhuma coisa deste tipo surge na emancipação. Uma vez que
nada deste tipo surge, então dizemos emancipação. Com o Tathagata,
também, não surgem coisas da existência criada como o embranque-
cimento dos cabelos ou o aparecimento de rugas na face. Assim, ne-
nhum envelhecimento ocorre no caso do Tathagata. Como não há
envelhecimento, não há morte.

Também, emancipação significa não-adoecimento. Entende-se por


doença as 404 enfermidades, e todos os outros agentes que vêm de
fora e espoliam o corpo. Quando tais coisas não vêm a ocorrer, dize-
mos emancipação. Quando nenhuma doença surge, existe a verdadeira
emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata. O Tathagata
não tem doenças. Assim, não incidem doenças sobre o Corpo-do-
Dharma. Este estado de não-adoecimento é o Tathagata. A morte é a
decomposição do corpo e o final da vida. Não há morte aqui [na eman-
cipação]. O que há é a não-extinção [‘amrta’ –o estado de imortalida-
de], o qual é a verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o
Tathagata. O Tathagata é dotado de tais virtudes [bênçãos]. Como
poderíamos dizer que o Tathagata é não-eterno? Algo como o não-
eterno nunca pode existir lá (na emancipação). Ele é um Corpo Ada-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 136
mantino. Como ele poderia ser não-eterno? Como resultado, nunca
dizemos que haja qualquer fim da vida com o Tathagata. Com o Tatha-
gata, o que existe é pureza; não existe impureza. O corpo do Tathagata
não recebe impureza pelo ventre. Ele é como o pundarika-lotus [lótus
branco], cuja natureza é pura. O mesmo se passa com o Tathagata e a
emancipação. Assim, a emancipação é objetivamente o Tathagata. Este
é o porquê do Tathagata ser puro e imaculado. Com a emancipação,
coisas tais como ‘asvaras’ [impurezas, excrementos], erupções e tum
o-
res, e todas as outras coisas, se acabam. O mesmo se passa com o Ta-
thagata. Ele não tem impurezas, erupções ou tumores.

Também, com a emancipação, não pode haver contenda ou refutação.


Por exemplo, os obcecados pela fome nutrem um sentimento de cobi-
ça e de arrebatamento quando vêem outros comendo. Com a emanci-
pação, não é este o caso.

Também, emancipação é paz e quietude. As pessoas comuns dizem


que paz e quietude são do Mahesvara (O Grande Lorde). Mas isso é
uma mentira. A verdadeira quietude significa a emancipação em seu
grau mais extremo. A emancipação em seu grau mais extremo é o Ta-
thagata.

Também, emancipação significa paz e segurança. O lugar onde os la-


drões estão presentes não há paz e segurança. O lugar onde reinam a
pureza e a paz é o lugar da paz e da quietude. Como não há temores
nesta emancipação, então dizemos paz e quietude. Portanto, paz e
quietude são a verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o
Tathagata. O Tathagata é Dharma.

Também, a emancipação é inigualável. Por igual, podemos entender o


caso de um rei que tem iguais nos reinados da vizinhança. O caso da
verdadeira emancipação não é assim. Não ter igual é como no caso do
Chakravartin [um grande monarca do mundo], o qual não tem igual. O
mesmo ocorre com a emancipação. Não há nada igual a ela. Não ter
igual é a verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o Ta-
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 137
thagatachakravartin. Assim, não há quem seja igual. Não se pode falar
de um igual.

Também, emancipação é não-apreensão. Aquele que tem apreensão


pode ser comparado a um rei que teme e calunia o estado vizinho mais
forte, e tem apreensão. Agora, com a emancipação não há nada (típi-
co) deste rei. Isto é como a aniquilação dos inimigos, como uma conse-
qüência de que já não há qualquer apreensão. O mesmo é o caso com
a emancipação. Nela não há apreensão ou medo. Não-apreensão é o
Tathagata.

Também, emancipação é não-apreensão ou não-alegria. Por exemplo,


uma mulher tem somente um filho. Em conseqüência da guerra, ele vai
para um lugar distante. Notícias chegam dizendo que o menino se en-
contra com uma doença afortunada, como uma conseqüência de que a
mãe está preocupada. Mais tarde, ela ouve sobre a sua segurança e em
razão disto está feliz. Agora, com a emancipação não ocorre nada deste
tipo. Quando não há apreensão ou alegria, existe a verdadeira emanci-
pação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, não há pó ou sujeira na emancipação como quando nos me-


ses da primavera, após o por do sol, o vento levanta uma nuvem de pó.
Agora, na emancipação, nada deste tipo advém. Onde não há nuvem
de pó, existe a verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o
Tathagata. Isto é como uma gema brilhante guardada no nó do turban-
te sobre a cabeça de um Chakravartin, onde não há mancha de sujeira.
A natureza da emancipação é assim: ela não tem impurezas. A ausência
de impureza pode ser relacionada à verdadeira emancipação. A verda-
deira emancipação é o Tathagata. O ouro verdadeiro não contém qual-
quer traço de areia ou pedra. Este é o verdadeiro tesouro. Quando
ganhamos isto, sentimos [ter ganhado] a verdadeira riqueza. A nature-
za da emancipação também é tal como a verdadeira emancipação. Este
tesouro verdadeiro pode ser relacionado à verdadeira emancipação. A
verdadeira emancipação é o Tathagata.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 138


Quando um vaso não vitrificado se quebra, um som [estrépito] caracte-
rístico é emitido. Com o vaso do tesouro adamantino, as coisas são de
outra forma. Agora, a emancipação não emite um som [estrépito] ca-
racterístico. O vaso do tesouro adamantino é como a verdadeira eman-
cipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata. Assim sendo, o cor-
po do Tathagata não pode ser destruído. Dizemos que ele (o vaso)
estrepita. Isto é como quando sementes de rícino são colocadas em um
fogo ardente, as chamas se elevam e um som estrepitante é produzido.
É como aquilo. Agora, não há nada deste tipo com a emancipação. O
vaso adamantino do verdadeiro tesouro não emite estrépitos ou som
de quebra. Mesmo que inumeráveis centenas de milhares de pessoas
disparassem flechas sobre ele, nenhuma poderia quebrar este vaso.
Aquela que não emite estrépitos ou som de quebra é a verdadeira
emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata. Um homem
pobre está em débito com outra pessoa. Por essa razão, ele fica preso e
acorrentado em grilhões, é castigado pelo chicote, e tem que sofrer
pelas preocupações e dores. Agora, com a emancipação, não ocorre
nada deste tipo. Não há divida a pagar. Isto é como no caso de uma
pessoa rica que possui inumeráveis ‘yis’ de tesouros, cujo poder éi-ilim
tado, e que nada deve à outra pessoa. O caso da emancipação é assim.
Ela possui um incontável estoque da riqueza do Dharma e raros tesou-
ros, tendo pleno poder e nada devendo aos outros. Nada devendo aos
outros pode ser relacionado com a verdadeira emancipação. A verda-
deira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é ‘não ser oprimido’. Isto pode ser contrastado


com a primavera, quando caminhamos no calor; com o verão, quando
saboreamos o que é doce; e com o inverno, quando encontramos o
frio. Na verdadeira emancipação nada há de qualquer natureza que
não corresponda ao nosso desejo. A ausência de qualquer coisa a nos
oprimir pode ser relacionada à verdadeira emancipação. A verdadeira
emancipação é o Tathagata. Como (exemplo de) não-opressão, pode-
mos tomar o caso de um homem que, tendo compartilhado avidamen-
te um peixe, toma leite novamente. Um homem como este não está
longe da morte. Na verdadeira emancipação, não ocorre nada assim.
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 139
Se ele obtém ambrosia [‘amrta’ –o estado de imortalidade] ou o bom
remédio, as preocupações o deixam. A verdadeira emancipação é co-
mo aquilo. Ambrosia e boa medicina podem ser relacionadas com a
emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata. Como pode-
mos falar de seres oprimidos ou não oprimidos? Por exemplo, um mor-
tal comum é arrogante e prepotente. Ele pensa: ‘Dentre todas asi- co
sas, nada pode me atingir’. Assim, ele segura em suas mãos umar- se
pente, um tigre ou um inseto nocivo. Embora o tempo destinado à sua
morte não tenha chegado, esta pessoa encontra uma morte prematu-
ra. Na verdadeira emancipação, nenhuma coisa deste tipo vem a ocor-
rer. Dizemos ‘não ser oprimido’. Isto pode ser relacionado à gema
vi-di
na de um Chakravartin, que aniquila todos os insetos nocivos, tais co-
mo o besouro do esterco e os 96 insetos nocivos [isto é, o número total
de tirthikas que se pensava existir à época do Buda]. Conforme entra-
mos em contato com o brilho desta gema divina, todos os venenos se
dissipam. As coisas são assim com a verdadeira emancipação. Tudo
morre longe das 25 existências. A aniquilação do veneno é análoga à
verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, ‘não ser oprimido’ é co mo o espaço em si, por exemplo. Isto


é verdadeira emancipação. O espaço é comparável à verdadeira eman-
cipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata. Também, estar sen-
do oprimido é como segurar uma lâmpada junto ao capim seco. Quan-
do ela estiver muito perto, o capim pegará fogo. Este é o caso. Todavia,
não há nada dessa natureza na verdadeira emancipação. Também,
‘não-opressão’ é como o sol e a lua, que não se aproximam muito de
todos os seres. Tal é a situação com a emancipação. A verdadeira e-
mancipação é o Tathagata.

A Emancipação e o Dharma Imutável.

Também, emancipação é o Dharma imutável. Isto está em contraste


com inimizade e amizade, as quais não existem na verdadeira emanci-

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 140


pação. Além disso, imutabilidade pode ser relacionada a um Chakravar-
tin [um grande monarca do mundo]. Ninguém há que possa ampará-lo.
Ninguém se torna seu amigo. O fato de o rei não ter amigos pode ser
relacionado à verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o
Tathagata. O Tathagata é Dharma. Também, o ‘imutável’ pode con- ser
trastado com roupa branca, que pode facilmente ser tingida. Não é
assim com a emancipação. Também, este ‘imutável’ pode ser relaci o-
nado à varsiki [videira sempre-viva do leste da Índia, cultivada pela sua
profusão de flores brancas fragrantes]. Assim, torná-la mal cheirosa e
azul na cor é impossível. O mesmo se passa com a emancipação. O que
quer que façamos, não podemos torná-la mal cheirosa ou mudar a sua
cor. Por esta razão, emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é aquilo que é raro. Por exemplo, não há nada


de raro com relação ao crescimento do lírio d’água na água. Quando
ele cresce no fogo, isto é algo raro. As pessoas, ao verem isto, ficam
encantadas. Aquilo que é raro pode ser relacionado à verdadeira e-
mancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata. Este Tathagata
é o Corpo-do-Dharma. Também, o ‘raro’ poderia ser comparado a um
bebê. Ele não tem dentes, mas conforme cresce, eles aparecem. Toda-
via, não é assim com a emancipação. Não há nascimento e não-
nascimento.

Muito Além do Bem e do Mal

Além disso, emancipação é o que está ‘vazio e quieto’. Não pode haver

indeterminação. Por indeterminada


o icchantika (pessoa descrente) nuncaentende-se a situação
muda e que aquelesdeque
dizer que
come-
teram graves ofensas nunca atingirão o estado de Buda. Nunca se po-
dem aplicar (fazer valer) tais coisas. Por que não? Quando aquela pes-
soa [icchantika] ganha a fé pura e genuína no Dharma Maravilhoso do
Buda, imediatamente a pessoa aniquila o icchantika [dentro de si]. Ao
tornar-se um upasaka (um seguidor leigo), o icchantika [naquela pes-
soa] morre para sempre; a pessoa que cometeu graves ofensas tam-

CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 141
bém atinge o estado de Buda quando seus pecados são expiados. Sen-
do assim, nunca podemos dizer que não haja mudança para todos e
que o estado de Buda não pode ser atingido. Com a verdadeira eman-
cipação, todavia, não pode haver tais casos de aniquilação. Além disso,
‘vacuidade e quietude’ são coisas do mundo do Dharma. A natureza do
mundo do Dharma é a verdadeira emancipação. Verdadeira emancipa-
ção é o Tathagata. Também, uma vez que o icchantika tenha morrido,
não podemos mais falar de icchantika. O que é um icchantika? Um
icchantika corta [dentro de si] todas as raízes da benevolência (boas
ações) e o seu pensamento não evoca qualquer associação com o bem.
Nem mesmo uma ponta de um bom pensamento surge na sua mente.
Nada semelhante a isto ocorre na verdadeira emancipação. Como (na
emancipação) nada há desta natureza, dizemos verdadeira emancipa-
ção. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação é chamada ‘imensurável’. Por exemplo,


o- p
demos medir o volume do cereal. Mas a verdadeira emancipação não é
como isto. Ela é como o grande oceano, cujo volume não pode ser
medido. Emancipação é como aquilo (o grande oceano). Não podemos
medi-lo. A verdadeira emancipação é imensurável. A verdadeira eman-
cipação é o Tathagata.

Além disso, a verdadeira emancipação é chamada ‘inumerável’ [ilim


i-
tada]. É como os muitos e variados resultados do karma que uma pes-
soa tem. O mesmo é o caso com a emancipação. Ela tem inumeráveis
retribuições. Inumeráveis retribuições significam emancipação. A ver-
dadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação é ampla e imensa como o grande oceano, ao


qual nada se iguala. O mesmo se passa com a emancipação. Nada pode
se igualar a ela. Aquilo que não tem igual é a verdadeira emancipação.
A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação é a mais elevada. É como o firmamento, que


é o mais elevado, ao qual nada se iguala. O mesmo é o caso com a e-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 142
mancipação. Aquilo que é o mais elevado e incomparável é a verdadei-
ra emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação é ‘intransponível’. É como o dente de um


leão, diante do qual nenhum animal ousa passar. O mesmo, também, é
o caso com a emancipação. Ninguém há que possa transpô-la. Aquilo
que é intransponível é a verdadeira emancipação. A emancipação é o
Tathagata.

Também, a emancipação é o ‘supremo’. Por exemplo, o norte é a mais


elevada de todas as direções. O mesmo, também, é o caso com a e-
mancipação. Nada a supera. Aquilo que é supremo é a verdadeira e-
mancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação é o topo do supremo. Por exemplo, compa-


rado com o leste, o norte é o supremo. O mesmo se passa com a e-
mancipação. Nada a supera. Aquilo que é supremo é a emancipação. A
verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação é a lei da constância. Por exemplo, quando o


corpo de um humano ou deva se decompõe, a vida parte. Isto é sem-
pre assim. [Esta lei] não é não-constante (como no caso dos corpos e
das vidas que partem). O mesmo é o caso com a emancipação. Ela não
é não-constante. O que não é não-constante é emancipação. A verda-
deira emancipação é Tathagata.

Também, emancipação é o fortemente estabelecido (duradouro). É


como no caso da khadira [acácia catechu, cujo extrato – ‘catechu’ –é
muito usado como um remédio, um adstringente e tônico], madeira de
sândalo e de aloés, cuja qualidade está na força e na fidelidade. O
mesmo se passa com a emancipação. A sua qualidade é a força e a
fidelidade. Aquilo que é forte e fiel é emancipação. A verdadeira eman-
cipação é o Tathagata.

CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 143
Também, emancipação é o não-vazio. Por exemplo, os corpos do bam-
bu e da cana são ocos. Este não é o caso com a emancipação. Saiba que
emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é aquilo que não pode ser corrompido. Por


exemplo, existe uma parede. Enquanto a parte superior do revestimen-
to não estiver acabada, mosquitos e moscas vêm, pousam e brincam
sobre ela. Quando ela está pintada e acabada, e decorada com quadros
e esculturas, os insetos, sentindo o cheiro da tinta, não permanecem
nela. A emancipação pode ser relacionada com tal impermanência (dos
insetos). A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação é ilimitada. Todas as vilas e cidades possuem


limites. Este não é o caso com a emancipação. Ela é como o espaço,
que não tem limites. Este tipo de emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é o que não pode ser visto. Exatamente como


os caminhos dos pássaros que voam através dos céus não podem ser
traçados. Aquilo que é impossível ser visto pode ser bem relacionado à
verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, extremamente profundo é o que os Budas e Bodhisattvas


perscrutam. Um filho obediente serve aos seus pais, e a virtude disso é
extremamente profunda. É assim. Extremamente profunda refere-se à
emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é o que não podemos ver. Por exemplo, um


homem não pode ver o topo da sua própria cabeça. O mesmo é o caso
com a emancipação. Sravakas e Pratyekabudas não podem vê-la. Aqui-
lo que não pode ser visto é a verdadeira emancipação. A verdadeira
emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é o desabrigo. Isto é como no caso do Vazio,


que não tem uma casa. O mesmo se passa com a emancipação. A casa

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 144


refere-se às 25 existências. ‘Desabrigo’ é a verdadeira emancipação. A
verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é o que não pode ser segurado (mantido) em


nossas mãos. A amalaka (fruta indiana da groselha - a cúpula de um
templo) pode certamente ser segurada nas mãos de um humano. Com
a emancipação não é assim. Ela não pode ser segurada em nossas
mãos. Aquilo que não pode ser segurado em nossas mãos é emancipa-
ção. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é o que não podemos agarrar com nossas


mãos. Isto é como no caso de um fantasma, o qual não podemos agar-
rar com nossas mãos. O mesmo é o caso com a emancipação. Aquilo
que não é possível agarrar com as mãos é emancipação. A verdadeira
emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação não possui corpo carnal. Por exemplo, temos


um corpo, sobre o qual e dentro do qual podem entrar a varíola, lepra,
todos os tipos de carbúnculos, loucura e ressecamento. Na verdadeira
emancipação, nenhum tipo de doença e enfermidade acontece. Aquilo
que é imune a tais doenças e enfermidades é a verdadeira emancipa-
ção. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação é única no paladar. É como o leite, que é


único no seu paladar. O mesmo se passa com a emancipação, que é
única no seu paladar. Tal exclusividade no paladar é a verdadeira e-
mancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é pureza. Isto é como no caso da água que não


contém lodo, é clara, imóvel e pura. O mesmo se passa com a emanci-
pação. Ela é limpa, imóvel e pura. Aquilo que é limpo, imóvel e puro é a
verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação é única no sabor. Ela é como a chuva no céu,


que é única no sabor e pureza. Aquilo que é único no sabor e é puro
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 145
pode ser relacionado à verdadeira emancipação. A verdadeira emanci-
pação é o Tathagata.

Também, emancipação é exclusão. É como a lua cheia que não tem


qualquer parte encoberta (por nuvens). Assim se dá com a emancipa-
ção. Ela não tem partes encobertas. Aquilo que não tem partes enco-
bertas é a verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o
Tathagata.

Também, emancipação é quietude. Um homem tem uma febre. Quan-


do curada, ele se sente quieto. Emancipação é assim. Sentimo-nos
quietos. Quando nos sentimos quietos, existe a verdadeira emancipa-
ção. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a verdadeira emancipação é equanimidade [imparcialidade].


Por exemplo, no campo existem serpentes venenosas, ratos e lobos,
todos os quais representam a morte aos outros. Não é assim com a
emancipação. Não há pensamento de morte. Não havendo pensamen-
to de morte, isto é verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação
é o Tathagata. Também, equanimidade pode ser comparada ao pen-
samento dos pais, que vêem suas crianças todas iguais. Assim é a e-
mancipação. O pensamento é todo igual. Este pensamento todo igual é
verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é não ter qualquer outro lugar [para residir].


Por exemplo, existe um homem aqui que somente vive no melhor de
todos os lugares, não tendo outro lugar para viver. O mesmo se passa
com a emancipação. Ela não tem outro lugar para viver. Não ter outro
lugar diferente para viver é verdadeira emancipação. A verdadeira
emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é se sentir satisfeito. Considere o caso de um


homem faminto que, encontrando doces delícias, devora-as, e não há
um fim da comilança. O caso da emancipação não é assim. Se parti-
lhamos de mingau de leite cozido, já não sentimos mais a necessidade
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 146
de comer. Não sentir mais qualquer necessidade de comer pode ser
bem relacionado à emancipação. A verdadeira emancipação é o Tatha-
gata.

Também, emancipação é segregação. É como uma pessoa amarrada


que corta a corda e ganha a sua liberdade. O mesmo é o caso com a
emancipação. Cortamos todas as amarras da dúvida. O corte de todas
as amarras da dúvida é verdadeira emancipação. A verdadeira emanci-
pação é o Tathagata.

Também, emancipação é alcançar a outra margem. Um grande rio, por


exemplo, tem esta margem e a margem distante. Isto não é assim com
a emancipação. Embora ela não tenha este lado, existe o lado distante.
Aquilo que possui esta outra margem (distante) é verdadeira emanci-
pação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é silêncio. A superfície de um grande mar se


eleva, por exemplo, e surgem muitos sons. Com a emancipação as
coisas não são assim. Emancipação como esta (silenciosa) é o Tathaga-
ta.

Também, emancipação é o Todo-Maravilhoso. Se haritaki [um fruto


amargo purgativo] é adicionado a qualquer remédio, o remédio se
tornará de sabor amargo. Mas a emancipação não é como isto. Ela
torna-se doce. O sabor da doçura pode ser relacionado à verdadeira
emancipação.

Também, a emancipação acaba com as ilusões. Isto pode ser compara-


do ao caso de um médico instruído que mistura todas as drogas e cura
todas as doenças. O mesmo é o caso também com a emancipação. Ela
acaba completamente com a ilusão. Aquilo que acaba com a ilusão é a
verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação não tem constrição. Por exemplo, uma peque-


na casa não pode receber muitas pessoas. O caso da emancipação é o
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 147
contrário, a qual pode receber muitos. Aquilo que pode receber muitos
é a verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é análoga à aniquilação de todas as paixões


amorosas e não ter desejos carnais. Uma mulher tem muitas fases da
paixão. Isto não é assim com a emancipação. Emancipação como esta é
o Tathagata. O Tathagata não possui ilusões tais como avareza, ira,
ignorância, arrogância, etc.

Também, emancipação é não ausência de amor [não ausência de dese-


jo]. O amor é de dois tipos: um é o amor do desejo (da fome) e o outro
é o amor do Dharma. O verdadeiro amor não é possuído pelo amor do
desejo (fome). Como existe amor por todos os seres, existe o amor do
Dharma. Tal amor do Dharma é a verdadeira emancipação. A verdadei-
ra emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação não é dotada de atmatmiya [fixação no eu e


no que diz respeito ao eu]. Essa emancipação é o Tathagata. O Tatha-
gata é Dharma.

Também, emancipação é extinção. São removidos todos os tipos de


avareza (cobiça). Tal emancipação é o Tathagata. O Tathagata é Dhar-
ma.

Também, emancipação é assistência. Ela verdadeiramente socorre


todos aqueles que têm medo. Esta emancipação é o Tathagata. O Ta-
thagata é Dharma.

Também, emancipação é o lugar para o qual retornamos. Alguém que


compartilha de tal emancipação não busca qualquer outro lugar para
se refugiar. Por exemplo, um homem que depende do rei não procura
por outros reis para depender. Contudo, mesmo quando alguém de-
pende do rei, pode haver uma situação na qual mudanças acontecem.
Para alguém que depende da emancipação, não há qualquer mudança

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 148


mais. Onde não há mudança, há verdadeira emancipação. A verdadeira
emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é destemor. É como o leão, que não teme


qualquer animal. O mesmo é o caso com a emancipação. Ela não teme
quaisquer Maras. Destemor é verdadeira emancipação. A verdadeira
emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação não conhece estreiteza. Num caminho estrei-


to, duas pessoas não podem caminhar [lado a lado]. Não é assim com a
emancipação. Tal emancipação é o Tathagata. Também, há o caso da
não-estreiteza. Por exemplo, um homem cai num poço em razão do
seu medo de um tigre. A situação da emancipação não é como esta. Tal
emancipação é o Tathagata. Novamente, há outro caso de não-
estreiteza. Num grande mar, abandonamos um pequeno navio naufra-
gado. Navegando num navio forte, atravessamos o mar e chegamos ao
destino, e nosso pensamento é abençoado com a paz. O mesmo é o
caso com a emancipação. A sensação é de felicidade. O alcançar da
felicidade é a verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o
Tathagata.

Também, a emancipação fica acima de todas as causas e condições.


Por exemplo, do leite obtemos o creme, do creme, obtemos a mantei-
ga; e da manteiga, obtemos o sarpirmanda. A verdadeira emancipação
não tem qualquer dessas causas. A ausência de causas é a verdadeira
emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação subjuga a arrogância completamente. [Pense


em] um grande rei que menospreza um pequeno rei. Este não é o caso
com a emancipação. Tal emancipação é o Tathagata. O Tathagata é
Dharma.

Também, a emancipação subjuga todos os tipos de indolência. O indo-


lente é ambicioso. Com a verdadeira emancipação, nada semelhante a

CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 149
isto acontece. Isto é verdadeira emancipação. A verdadeira emancipa-
ção é o Tathagata.

Também, a emancipação acaba com a escuridão. Isto é como com a


manteiga refinada. Quando a escumalha e a sujeira são removidas,
obtemos o sarpirmanda. O mesmo se passa com a emancipação. Como
resultado da exclusão da escumalha da ignorância, um brilho verdadei-
ro resplandece. Essa resplandecência é a verdadeira emancipação. A
verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é quietude, a pura (quietude), a não-dual. Isto


é como o elefante da savana, que não tem comparação. A mesma é a
situação com a emancipação. Ela é única, não-dual, a qual é a verdadei-
ra emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação é forte e cheia de verdade. As hastes das


plantas do bambu, da cana e do óleo de rícino são ocas, mas as semen-
tes são fortes e verdadeiras. Ao contrário do Buda-Tathagata, todos os
seres humanos e celestiais não são fortes e cheios de verdade. A ver-
dadeira emancipação está longe de todas as ilusões. Tal emancipação é
o Tathagata.

Também, a emancipação levanta-se e expande-se. A verdadeira eman-


cipação é como isto. Tal emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação abandona todas as existências. Por exemplo,


um homem, depois de participar da refeição, pode vomitar. A emanci-
pação é também como isto. Ela abandona todas as existências. O a-
bandono de todas as existências é a verdadeira emancipação. A verda-
deira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é uma decisão. Isto é como no caso da fragrân-


cia da varsiki, que não é encontrada na saptapama [alstonia scholaris

árvore sempre-viva da Ásia oriental e Filipinas]. O mesmo é o caso com
a emancipação. Tal emancipação é o Tathagata.
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 150
Também, emancipação é água. Por exemplo, a água cai sobre todos os
outros elementos da terra e umedece completamente todas as árvo-
res, gramas e sementes. O mesmo é o caso com a emancipação. Ela
umedece completamente todos os seres. Tal emancipação é o Tatha-
gata.

Também, emancipação é entrada. Se existe um portal, isto significa que


há uma entrada para um caminho. É como num lugar onde há ouro
que podemos pegar. Emancipação é assim. É como um portal. Aqueles
que praticam altruisticamente certamente podem entrar. Tal emanci-
pação é o Tathagata.

Também, emancipação é aquilo que é bom. Por exemplo, um discípulo


segue corretamente as injunções do seu mestre e chamamos isto de
bom. Assim, também, é com a emancipação. Tal emancipação é o Ta-
thagata.
Também, a emancipação é chamada de Lei Supramundana. Dentre
todas as coisas, esta é a única que supera todas as outras. É como no
caso da manteiga, que é o melhor dentre todos os sabores. Assim é
[também] com a emancipação. Tal emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é o imóvel. Por exemplo, o vento não pode


mover um portal. A verdadeira emancipação é como isto. Tal emanci-
pação é o Tathagata.

Também, emancipação é calmaria. O grande oceano tem ondas. Mas


este não é o caso com a emancipação. Tal emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é como um palácio real. Emancipação é como


aquilo. Saiba que emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é aquilo que é útil. O ouro de Jambunada tem


muitos usos. Ninguém fala mal dele. O mesmo se aplica à emancipa-
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 151
ção. Não há nada de mal com relação à ela. Aquilo que não tem nada
de mal é a verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é Ta-
thagata.

Também, emancipação é renunciar (abandonar) as ações dos nossos


dias de infância. O mesmo é o caso com a emancipação. Ela acaba com
os cinco skandas (cinco agregados). Abandonar os cinco skandas é a
verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é Tathagata.

Também, emancipação é o supremo. Uma pessoa encarcerada obtém


a liberdade e, após lavar-se e limpar-se, retorna para casa. O mesmo é
o caso com a emancipação. Ela é pura ao extremo. Esta pureza extrema
é a verdadeira emancipação. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é a felicidade que não é expelida. (Isto se dá)


Em razão do desejo, da malevolência e da ignorância terem sido expe-
lidas. Como um exemplo: um homem engole uma droga venenosa por
engano. Para expelir o veneno, ele toma um remédio. Uma vez que o
veneno é expelido, ele está curado, sente-se bem e ganha a paz. O
mesmo é o caso com a emancipação. Tendo se libertado de todas as
ilusões e venenos que nos aprisionam, o corpo ganha a paz. Por isso
falamos ‘paz não-expelida’. Paz não-expelida é a verdadeira emancipa-
ção. A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é a nossa libertação das quatro serpentes ve-


nenosas da ilusão [isto é, desejo, ódio, ignorância e arrogância]. A con-
quista da libertação da ilusão é a verdadeira emancipação. A verdadei-
ra emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é apartar-se de todas as existências, extirpando


todo o sofrimento, obtendo todos os aspectos da paz, erradicando
eternamente os desejos, maus-desejos e ignorância, e apartando-se
das raízes de todas as ilusões. Cortar as raízes da ilusão é emancipação.
A verdadeira emancipação é o Tathagata.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 152


O Verdadeiro Eu e a Emancipação

Além disso, denomina-se emancipação a tudo aquilo que se separa de


todos os fenômenos condicionados [samskrtadharmas], dá srcem ao
todo imaculado [anasrava], às qualidades/fenômenos saudáveis e eli-
mina os vários caminhos/abordagens que se referem ao Eu, não-Eu e
não não-Eu. É meramente separar-se dos vínculos (da afeição pelo Eu)
e não separar-se do ponto de vista do Eu / o discernimento do Eu / a
visão do Eu [atma-drsti]. O ponto de vista do Eu é denominado ‘Buda
-
Dhatu’ [Natureza-de-Buda ou Verdadeiro Eu]. O Buda-Dhatu é a verda-
deira emancipação, e a verdadeira emancipação é o Tathagata.

Também, emancipação é o ‘não -vazio-vazio’. ‘Vazio-vazio’ é não-


possessão. Não-possessão é a emancipação que os thirtikas e Nirgran-
tha Jnatiputras [Jainistas] presumem a respeito [deles próprios]. Mas,
na verdade, os Nirgranthas não possuem emancipação. Então se diz
‘vazio-vazio’. Não-vazio-vazio é a verdadeira emancipação. A verdadei-
ra emancipação é o Tathagata.

O Não-Vazio e a Emancipação.

Também, emancipação é o ‘não -vazio’. O vaso no qual colocamos a


água, bebida, leite, creme, manteiga, mel, etc.; pode ser chamado de
vaso de água ou algo assim, mesmo quando não há água, bebida, cre-
me, manteiga, mel ou qualquer coisa dentro dele. Além disso, não
podemos dizer que o vaso está vazio ou não-vazio. Se dizemos vazio,
não pode haver qualquer cor, cheiro, sabor ou tato. Se dizemos não-
vazio, o que vemos é que não há nada dentro dele tal como água, be-
bida ou qualquer outra coisa. Podemos dizer nem matéria [‘rupa’] nem
não-matéria [‘arupa’]; podemos dizer nem vazio e nem não-vazio. Se
dizemos vazio, não pode haver Eternidade, Felicidade, Eu e Pureza. Se
é não-vazio, quem é aquele abençoado com a Eternidade, a Felicidade,
o Eu e a Pureza? Assim, poderíamos dizer nem vazio e nem não-vazio.

CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 153
Vazio intuirá [a noção de] que as 25 existências, todas as ilusões, sofri-
mento, as fases da vida, e todas as ações atuais não existem. Quando
não há creme no vaso, podemos dizer vazio. Não-vazio aponta para a
Verdade, para aquilo que é Bom, Eterno, Feliz, Eu (Auto), Puro, Imóvel
e Imutável. É como no caso do sabor e do tato com relação ao vaso.
Este é o porquê de dizermos não-vazio. Em conseqüência, podemos
dizer que a emancipação é como no caso do vaso. O vaso quebrará em
determinadas circunstâncias. Mas não é assim com a emancipação. Ela
não pode quebrar. Aquilo que é indestrutível é a emancipação. A ver-
dadeira emancipação é o Tathagata.

Também, a emancipação erradica toda a avareza (cobiça), todas as


aparências externas, todas as amarras, todas as ilusões, todos os nas-
cimentos e mortes, todas as causas e condições (relações), todos os
resultados do Karma. Tal emancipação é o Tathagata. O Tathagata é
Nirvana. Quando todos os seres [vierem a] temer o nascimento, a mor-
te e a ilusão, eles se refugiarão nos Três Tesouros. Isto é como um re-
banho de cervos que temem o caçador e fogem. Um salto pode ser
equiparado a um refúgio, e três saltos a três refúgios. De três saltos
vem a paz. O mesmo se passa com todos os seres. Quando tememos
os quatro Maras e o caçador mal-intencionado, buscamos os Três Re-
fúgios [no Buda, na Lei e na Sangha]. Como um resultado dos três Re-
fúgios, obtemos a paz. Obter a paz é verdadeira emancipação. A ver-
dadeira emancipação é o Tathagata. O Tathagata é Nirvana. Nirvana é
o infinito. O infinito é a Natureza-de-Buda. A Natureza-de-Buda é ilimi-
tável. Ilimitável é a Insuperável Iluminação.”

Por Que Fazemos Oferecimentos à Sangha?

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh, Honrado pelo Mundo! Se


é o caso que Nirvana, a Natureza-de-Buda, o Ilimitável, e o Tathagata
são unos e o mesmo, por que dizemos ‘Três Refúgios’?”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 154


O Buda disse a Kashyapa: “Todos os seres temem o nascimento e a
morte. Sendo assim, eles buscam os Três Refúgios. Por Três Refúgios,
entendemos a Natureza-de-Buda, o Ilimitável, e o Nirvana. Oh, bom
homem! Há casos nos quais o nome, Dharma, é um (o mesmo), mas o
significado difere. Há casos nos quais os nomes do Dharma e os signifi-
cados são ambos diferentes. Dizemos que o nome é um (o mesmo),
mas os significados diferem. Isto se refere à situação onde dizemos que
o Buda é eterno, o Dharma é eterno, e o Monge é eterno. Também,
Nirvana e o espaço são eternos. Este é o caso onde o nome é um, mas
a significação é diferente. Dizemos que ambos, a palavra e a significa-
ção diferem. O Buda é chamado ‘Iluminação’, o Dharma é chamado
‘Não-Desperto’, a Sangha é ‘Harmonia’, e Nirvana ‘Emancipação’. O
Espaço é chamado‘não-seguro’ e também ‘não-coberto’. Há casos nos
quais a palavra e a significação, ambas diferem. Oh, bom homem! O
caso dos Três Refúgios é também como isto. A palavra e a significação,
ambas diferem. Como podemos dizer um? Este é o porquê eu disse a
Mahaprajapati [a tia do Buda, que o criou]: ‘Oh, Gautami! Não faça
oferecimentos para mim; faça-os à Sangha! Se os oferecimentos são
feitos para a Sangha, isto equivale a fazer oferecimentos aos Três Refú-
gios’. Mahaprajapati respondeu, dizendo: ‘Em meio aosacerdotes, s
não há Buda e nem Dharma. Como podemos dizer que os oferecimen-
tos feitos à Sangha constituem oferecimentos feitos aos Três Refúgios’?
Eu disse: ‘Se você fizer como eu digo, isto significará que você fez e- of
recimentos ao Buda. Para fins da emancipação, o oferecimento é feito
ao Dharma. Quando todos os sacerdotes recebem isto, é um ofereci-
mento feito à Sangha’. Oh, bom homem! Às vezes o Tathagata fala
sobre uma coisa e a faz referir-se a três; ele fala sobre três e as faz refe-
rirem-se a uma. Todas essas coisas são aquilo que tem a ver com o
mundo de todos os Budas. Elas não são aquilo que Sravakas e Pratye-
kabudas possam compreender.”

Kashyapa disse ainda: “Você, o Buda, diz que a paz insuperável é a-


Nirv
na. Como pode ser isto? Agora, Nirvana significa abandono do corpo e
do intelecto. Se abandonamos o corpo e o intelecto, quem é aquele
que será abençoado com a paz?”
CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 155
O Buda disse: “Oh, bom homem! Como um exemplo: existe umo- h
mem aqui. Ele come alguma comida. Após participar dela, ele se sente
mal, deseja sair e vomitar. Depois de vomitar, ele volta. Uma pessoa
que estava com ele pergunta: ‘Você se livrou do problema que você
tinha? Você voltou aqui novamente.’ Tal pode ser o caso. O mesmo se
aplica ao Tathagata. Ele se apartou completamente das 25 existências e
ganhou o Nirvana eternamente, o qual é paz e felicidade. Não pode
haver mais inversões confusamente, nem fim e nem extinção. Todo o
sentimento é erradicado (com o Nirvana). Esta é a felicidade do não-
sentimento. Este não-sentimento é Felicidade eterna. Nunca podemos
dizer que o Tathagata sente Felicidade. Assim, a Felicidade Suprema é
nada mais que o Nirvana. Nirvana é verdadeira emancipação. A verda-
deira emancipação é o Tathagata.”

Kashyapa ainda disse: “O não


-nascimento e o não-desejo são emanci-
pação?”
“É assim, é assim. Oh, bom homem! Não
-nascimento e não-desejo são
emancipação. Tal emancipação é o Tathagata.”

Kashyapa ainda disse: “Você disse que não


-nascimento e não-desejo
são emancipação. O espaço, também, por sua natureza, é não-
nascimento e não-desejo. Ele deve ser o Tathagata. A natureza do Ta-
thagata deve ser emancipação.”

O Buda disse a Kashyapa: “Oh, bom homem! Não é assim.”

“Por que, oh Honrado pelo Mundo, isto não é assim?”

“Oh, bom homem! A kalavinka e o jiva


-jivaka têm cantos límpidos e
maravilhosos. Como podemos comparar suas vozes às do corvo e da
pega? O que você diz sobre isso?”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 156


“Nós não podemos. Oh Honrado pelo Mundo! As vozes do corvo e da
pega não podem suportar comparação 100 mil ‘wan’ [unidade de
ú- n
mero chinesa] vezes.”

Kashyapa disse ainda: “As vozes da kalavinka e outros (pássaros) são


maravilhosas; e assim é o seu corpo. Oh Tathagata! Como podemos
compará-las àquelas do corvo e da pega. Isto é um pouco diferente da
comparação entre a semente de mostarda e o Monte Sumeru. O mes-
mo é o caso com o Buda e o espaço. A voz da kalavinka pode ser com-
parada àquela do Buda; mas, as vozes do corvo e da pega não podem
suportar comparação com aquela do Buda.

Então o Buda elogou Kashyapa e disse: “Falaste bem, falaste


bem, oh
bom homem! Você agora alcançou o que é mais difícil de compreen-
der. O Tathagata, às vezes, de acordo com o que a situação requer,
pega o caso do espaço e o compara à emancipação. Tal emancipação é
o Tathagata. A verdadeira emancipação, [todavia], não pode suportar
comparação com (seres) humanos e celestias. E o espaço em si, para
dizer a verdade, não é preenchido por [tais] comparações. Para ensinar
os seres, uma comparação é buscada para aquilo que não pode, em
seu verdadeiro sentido, servir ao objetivo (de ensinar). Saiba que e-
mancipação é o Tathagata; a natureza do Tathagata é esta emancipa-
ção. Emancipação e Tathagata não são duas coisas, não são diferentes.
Oh, bom homem! Dizemos ‘não -comparável’. Não podemos tomar
[para fins de analogia] aquilo que não pode ser comparado. Quando
existe uma conexão, então podemos comparar [duas coisas]. É como
quando se diz nos sutras, por exemplo: ‘O rosto é tão perfeito quanto
aquele da lua cheia; o elefante branco é tão afável e límpido quanto a
neve do Himalaya’. Ora, a lua cheia não pode ser o mesmo que uma
face, e o Himalaia e o elefante branco não podem ser iguais. Oh, bom
homem! Não é possível expressar emancipação através de parábolas.
[Mas] no sentido de ensinar os seres, recorre-se às parábolas. Através
de parábolas, adquirimos a consciência da natureza de todas as coisas.
A matéria (o ensino) é colocada assim.”

CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 157
Kashyapa ainda disse: “Por que é que o Tathagata recorre a dois tipos
de parábolas?”

O Buda disse: “Oh, bom homem! Por exemplo, existe umapessoa aqui
que segura uma espada em sua mão e com um pensamento irado in-
tenta ferir o Tathagata. Mas o Tathagata se apresenta (com a feição)
benevolente, e não tem o semblante irado. Pode este homem ferir e
Tathagata e cometer o pecado mortal?”

“Não, Oh Honrado pelo Mundo! Por que não? Porque o corpo do Ta-
thagata não pode ser destruído. Por que não? Porque ele não é algo
como o corpo carnal composto. O que existe é o ‘Dharmata’ [Natureza
-
do-Dharma]. O princípio do ‘Dharmata’ é indestrutível. Como poderi
a
este homem esperar destruir o Corpo-do-Buda (que é intangível)? Em
razão do seu mau pensamento, esta pessoa cairia no Inferno Avichi.
Assim, podemos fazer uso de parábolas e vir a conhecer o Dharma
Maravilhoso (que é intangível pela razão humana).”
Então o Buda elogiou o Bodhisattva Kashyapa: “Falaste bem, falaste
bem! Você já disse o que eu gostaria de dizer. Além disso, oh bom ho-
mem! Por exemplo, uma pessoa má intenta ferir a sua própria mãe. Ele
vive nos campos e esconde-se sob um palheiro. Sua mãe traz comida
para ele. Então o homem acalenta um mau pensamento, avança e
aponta sua espada. Sua mãe, vendo isto, escapa e esconde-se sob o
palheiro. O homem enfia a sua espada no palheiro por todos os lados.
Tendo feito isto, ele está satisfeito e pensa que matou a sua mãe. En-
tão, sua mãe sai do palheiro e retorna para casa. No que isto implica?
Este homem deve sofrer no Inferno Avichi ou não?”

“Oh, Honrado pelo Mundo! Definitivamente, não podemos dizer qual é


o caso. Por que não? Se dissermos que ele destinou-se ao Inferno Avi-
chi, [em tal caso] o corpo da sua mãe teria que estar ferido. Mas, se ele
não está ferido, como podemos dizer que o homem a feriu? Se ele é
inocente, como ele acalentou o pensamento de ter realmente matado
sua mãe e como poderia ter ficado tão satisfeito? Como podemos dizer
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 158
que ele é inocente? Embora ele não tenha realmente cometido este
pecado mortal, isto é nada mais que um pecado mortal. Disto (, em
conclusão), nós podemos conhecer somente através de parábolas a
verdadeira naturezadas coisas.”

Elogiando Kashyapa, o Buda disse: “Falaste bem, falaste bem, oh bom


homem! Por esta razão, eu recorro a muitos expedientes e parábolas, e
explico a emancipação. Poderíamos empregar inumeráveis asamkhyas
de parábolas, e mesmo assim as parábolas não poderiam explicar tudo
completamente. Se a ocasião requer, podemos recorrer às parábolas,
ou a ocasião pode não permitir parábolas. Assim, a emancipação pos-
sui tais virtudes. Se explicamos o Nirvana, o Nirvana e o Tathagata pos-
suem inumeráveis virtu des. Falamos do ‘Grande Nirvana’.

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh, Honrado pelo Mundo!


Agora eu sei que não há um fim para as coisas que se referem à para
onde vai o Tathagata. Se o lugar é interminável (eterno), a vida tam-
bém deve ser eterna.”

O Buda disse: “Falaste bem, falaste bem! Você agora protege o Dharma
Maravilhoso, de fato. Qualquer bom homem ou boa mulher que deseje
cortar as amarras da ilusão e todas as outras amarras deveria proteger
o Dharma Maravilhoso assim.”

CapítuloSobre
7– os Quatro Aspectos Página 159
Capítulo Oito: Sobre os Quatro Fidedignos
O Buda, além do mais, disse a Kashyapa: “Oh, bom homem! Neste
Todo-Maravilhoso ‘Sutra do Mahaparinirvana’, aparecem quatro tipos
de pessoas. Estas pessoas o protegem, o estabelecem (o tornam co-
nhecido, reconhecido e aceito) e pensam bem a respeito do Dharma
Maravilhoso. Eles beneficiam demais os outros e sentem piedade do
mundo. Eles se tornam os refúgios do mundo e concedem a paz e a
felicidade aos seres humanos e celestiais. Quem são os quatro? Uma
pessoa que aparece no mundo envolvida em ilusões. Esta é a primeira
categoria. Aquelas pessoas nos graus (estágios) de Srotapanna e Sakri-
dagamin são a segunda (categoria). Aquelas no grau (estágio) de Ana-
gamin são a terceira. Aquelas no estágio de Arhat são a quarta. Esses
quatro tipos de pessoas aparecem, beneficiam e sentem piedade do
mundo. Eles se tornam os refúgios do mundo e concedem a paz e a
felicidade aos seres humanos e celestiais.

O Mortal Comum

O que entendemos por ‘aqueles trajados em ilusões’? Tais pessoas


suportam as proibições, mantém em observância a (regra de) conduta,
e ostentam o Dharma Maravilhoso. Eles concordam com o que o Buda
diz, compreendem o que é dit o e o expõem aos outros, e dizem: ‘Alm e-
jar pouco é a Via; Desejar muito não é a Via’, e expõem os ‘oito pensa-
mentos despertos de um grande homem’ (este é o chamado Nobre
Caminho Óctuplo: entendimento correto, pensamento correto, lingua-
gem correta, ação correta, modo de vida correto, esforço correto, a-
tenção plena correta, concentração correta). Àquele que transgride, a
Via é mostrada, tal que ele confesse e se arrependa. Estas pessoas
erradicam os pecados e conhecem os expedientes e segredos dos ensi-
namentos dos Bodhisattvas. Tal pessoa [desta primeira categoria] é um
mortal comum, e não uma pessoa do oitavo estágio [alguém que tenha
chegado ao estágio de realização chamado ‘eighth-person stage’]. A

Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 161
pessoa do oitavo estágio não é um mortal comum. Ele é chama
do ‘Bo-
dhisattva’, mas não Buda.

O Srotapanna e o Sakridagamin

As pessoas da segunda categoria são aquelas dos estágios de Srota-


panna e Sakridagamin. Tendo encontrado o Dharma Maravilhoso, elas
ostentam-no. Elas seguem e ouvem as palavras do Buda e agem de
acordo como as ouviram. Tendo ouvido, elas escrevem o que ouviram,
sustentam o que ouviram, recitam-no e expõem os ensinamentos aos
outros. Não pode ocorrer [com estas pessoas] delas não escreverem,
não receberem, ostentarem e exporem os ensinamentos aos outros.
Com elas nunca poderia ocorrer nada como dizer que o Buda lhes
permite ter serviçais (empregados) e aquilo que é impuro. Estas coisas
se referem às pessoas da segunda categoria. Elas ainda não atingiram o
segundo e o terceiro lugares de residênci
a. São chamadas ‘Bodhisat
t-
vas’. Elas já receberam a profecia do Buda de que [um dia] atingirão o
Estado de Buda.

O Anagamin

“As pessoas da terceira categoria são aquelas do estágio do Anagamim.


Com elas nunca pode acontecer coisas que caluniam o Dharma Maravi-
lhoso, possuindo empregados, homens ou mulheres, possuindo coisas
impuras, ou tendo em consideração os livros (escrituras) dos tirthikas
[seres deludidos, não-Budistas], sofrendo impedimentos por ilusões
forasteiras (outras crenças), ou estando atadas por antigas ilusões,
guardando para si a verdadeira shahira [relíquia] do Tathagata, sendo
atacadas pelas doenças eternas (seculares) ou pelas quatro grandes
serpentes venenosas [a ganância, o ódio, a ignorância e a arrogância], e
persistindo no eu. Elas falam sobre altruísmo, mas nunca falam a res-
peito ou se apegam às coisas mundanas. Elas falam a respeito e man-

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 162


têm em observância o Mahayana, mas seus corpos nunca são infecta-
dos pelos 80.000 germes. Elas removem para sempre o apetite sensual
e, mesmo nos sonhos, elas nunca ejaculam coisas impuras. No último
momento das suas vidas, elas nunca sentem medo. O que significa
‘Anagamim’? Significa que essa pessoa nunca volta (a renascer) ou
retrocede. Como já foi dito, nenhuma falha ou doença jamais se apo-
derará dela. Ela vai, volta e circula. Ela é chamada Bodhisattva. Rece-
bendo a sua profecia, ela, não muito depois disso, atinge a Iluminação
Insuperável. Esta é a pessoa da terceira categoria”.

O Arhat

“A quarta (categoria) é o Arhat. Um Arhat é aquele que


ortou
c as amar-
ras da ilusão, que acabou com o peso que recaía sobre os seus ombros
e que alcançou aquilo que ele queria ter. Uma vez que todas as coisas
tenham sido cumpridas, ele vive no décimo nível. Atingindo um estado
imperturbável de Sabedoria, ele realiza aquilo que os outros desejam
ter e manifesta-se em (através de) muitas imagens. Se ele deseja reali-
zar a Via do Buda, do jeito que ela deve ser realizada, ele pode fazê-lo.
Dessa forma, aquele que pode realizar inumeráveis virtudes é um A-
rhat”.

“Estes são os quarto tipos de pessoas que aparecem, beneficiam, e


sentem piedade do mundo. Assim, eles tornam-se refúgios do mundo e
levam a paz e a felicidade aos seres humanos e celestiais. Eles são os

mais
comohonrados
no caso doe mais soberbos
Tathagata, quedentre todos
é o mais os humanos
soberbo e deuses.
dentre os humanosÉ
e deuses, e é o Refúgio do mundo.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh, Honrado pelo Mundo! Eu


não busco refúgio nesses quatro seres. Por que não? É como dito ante-
riormenteno ‘Sutra Goshila’, o qual o Buda endereça à Goshila (um rico
propiretário Kaushambi que construiu o monastério Ghoshilavana para

Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 163
convidar o Buda Shakyamuni a vir e ensinar a sua doutrina). Lá você
disse: ‘Devas, Maras e Brahma podem desejar a destruição, apresen-
tando-se na forma de Budas, adornando-se perfeitamente com as 32
marcas distintivas (do Buda) e as oitenta características menores de
excelência, a luz do halo (auréola sobre sua cabeça) medindo oito pés,
a face perfeitamente redonda como em fase de lua cheia, e o tufo de
cabelos brancos de entre suas sobrancelhas, mais branco que o casco
de um cavalo ou a neve. Caso eles apareçam adornados assim, olhe
cuidadosamente para ver se eles são genuínos. Estando seguro [de que
não são genuínos], subjugue-os ’. Oh, Honrado pelo Mundo! Maras e
outros podem se apresentar como Budas. Por que eles não estariam
aptos a se apresentarem como os quatro sábios (fidedignos), come-
çando pelo Arhat, sentando ou dormindo no ar, soltando água pelo
lado esquerdo do seu corpo e fogo pelo lado direito, soltando chamas
flamejantes do seu corpo como uma bola de fogo? Por estas razões,
não posso ter fé nisto; atrevo-me a não aceitar isto, mesmo quando
ensinado. Não vou buscar refúgio neles.”
O Buda disse: “Oh, bom homem! Se você tem dúvida com relação ao
que eu digo, é para você não aceitá-lo. Ainda mais quando você tem de
lidar com essas pessoas. Sendo assim, pondere bem sobre uma coisa e
descubra se ela é boa ou não, se é para você fazê-la ou não. Agindo
assim, nos tornamos abençoados com a paz e a felicidade na longa
noite [Isto é, nossa vida no Samsara]. Oh, bom homem! Existe aqui um
cão com a sua mente fixada em roubar. À noite ele entra na casa das
pessoas. Quando os empregados vêm a saber disto, eles gritam furio-
samente: ‘Caia fora neste instante, ou o mataremos!’ O cão assaltante
ouve isto, foge da casa e nunca mais retorna. De agora em diante, aja
dessa maneira e expulse os Papiyas [(Mara) Papiyas - Pessoas Más,
Demônios], dizendo: ‘Oh, Papiyas! Não se apresentem de tal ma. for
Caso se atrevam, os amarraremos com cinco cordas’. Ao ouvir isto,
Mara fugirá e se esconderá. Como o cão assaltante, ele nunca mais se
mostrará.”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 164


Kashyapa disse ao Buda: “Oh, Honrado pelo Mundo! É como você, o
Buda, disse ao homem rico, Goshila. Alguém que possa conquistar
Mara dessa maneira, seguramente se aproximará do Parinirvana. Oh,
Tathagata! Como é que você fala particularmente desses quatro tipos
de pessoas e diz que devemos buscar refúgio neles? O que tais pessoas
dizem não pode ser confi
ável.”

O Buda disse a Kashyapa: “Oh, bom homem! Eu me dirigi aos Sravakas


que possuem somente os olhos carnais e disse que eu subjuguei Mara.
Eu não disse isto para aqueles do Mahayana. Aqueles pertencentes à
classe dos Sravakas caem na categoria dos olhos carnais, embora eles
possam adquirir os olhos celestiais. Aqueles que praticam o Mahayana
também podem possuir os olhos carnais, mas eles são aqueles que
possuem o Olho-Búdico. Como assim? Esses sutras Mahayana são
chamados Veículo do Buda. Esse Veículo do Buda é o mais soberbo.
Oh, bom homem! Por exemplo, existem pessoas bravas e corajosas,
mas também aqueles covardes e fracos, e que vêm e aguentam. O
forte sempre ensina o fraco e diz: ‘Pegue o arco com esta (mão),e-a fl
cha com esta, e aprenda [como lidar com] a alabarda, o gancho longo e
o laço do policial’. O homem forte também dirá: ‘Agora, o destino
a- d
queles que lutam é como o caminhar sobre lâminas de espadas. Mas,
não devemos temer. Ao depararmos com humanos ou deuses, pense
que eles são mesquinhos e fracos. Devemos ser bravos no coração.
Pode haver também um homem que, embora não seja um bravo, a-
presente-se como um bravo e, armado com um arco, uma espada e
muitas outras coisas, vá para o campo de batalha. Então aquela pessoa
cairá em prantos. Não tema essas pessoas. Se eles virem que você não
tem medo, eles entenderão e logo se dispersarão como o cão assaltan-
te’. Oh, bom homem! O mesmo é o caso com o Tathagata. Para todos
os Sravakas, ele diz: ‘Não tenham receio de Marapapiyas. Se Marapap
i-
yas, vestidos como um Buda virem a você, faça um esforço e firme seu
pensamento, tal que eles fujam e se afastem.”

“Oh, bom homem! É como no caso de um homem forte que não dá


ouvidos ao que outros dizem. O mesmo se passa com aquele que a-
Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 165
prende o Mahayana. Ele ouve os ensinamentos dos vários sutras, faz
uma profunda reflexão, alegra-se e não sente medo. Por quê? Porque
alguém que reside no Mahayana fez no passado inumeráveis ofereci-
mentos a inumeráveis milhões de bilhões de Budas, adorou-os, e ele
não tem pensamentos de temor a Maras, que podem ser tão inumerá-
veis quanto bilhões de milhares, e que podem vir e atacar aquela pes-
soa. Ele não teme. Oh, bom homem! Por exemplo, um homem possui a
agasti [uma planta medicinal] e não teme qualquer serpente venenosa.
Através desse remédio, o veneno perde toda a sua potência. O mesmo
se passa com esse sutra Mahayana. Exatamente como no caso do re-
médio, nenhuma pessoa temerá quaisquer Maras ou venenos. Ele
subjuga completamente o inimigo, que nunca mais poderá se levantar
novamente. Também, oh bom homem! Por exemplo, existe uma naga
(naga = é uma palavra do Sanskrito do
e Pāli que designa uma deidade
ou classe de entidades ou seres, que assumem a forma de uma enorme
serpente, mas muitas vezes com os troncos e cabeças humanas, en-
contrada tanto no Budismo como no Hinduísmo) que, por natureza, é
muito mal intencionada. Quando ela deseja atacar as pessoas, ele a-
borda hipnotizando com os olhos ou aturdindo com o bafo. Por isso, o
leão, o tigre, o leopardo, o chacal, o lobo e o cão, todos a temem.
Quando todos esses animais maus ouvem sua voz, vêem sua forma ou
tocam o seu corpo, nenhum há que não perca a sua vida. Mas existe
alguém que conhece uma boa mágica, que permite que tais criaturas
más e venenosas, como as nagas, garudas, elefantes, leões, leopardos
e lobos sejam domesticados, tal que possamos andar entre eles. Essas
criaturas, conforme encontram essa mágica maravilhosa, tornam-se
domesticadas. Assim ocorre com Sravakas e Pratyekabudas. Ao verem
Marapapiyas, todos ficam assustados. Dessa forma, os Marapapiyas
não sentem medo e fazem as maldades. O mesmo não é o caso com
aqueles que praticam o Mahayana. Eles vêem que todos os Sravakas
têm medo das más ações e não têm fé neste Mahayana. Em primeiro
lugar, eles recorrem aos meios (expedientes) para, como um resultado
do fato de todos os Maras serem conquistados, que eles tornem-se
domesticados e possam agora servir como veículos para carregar coi-
sas neles. Através disso, eles ensinam diversas doutrinas maravilhosas.
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 166
Vendo que os Maras estão temerosos, os Sravakas e Pratyekabudas
ficam admirados, ganham a fé e divertem-se no Dharma Maravilhoso
do insuperável Mahayana.

Eles dizem: ‘De agora em diante, não devemos mais obstruir o Dharma
Maravilhoso’. Ainda mais, oh bom homem ! Os Saravakas e Pratyeka-
budas alimentam medo com relação a todas as ilusões. Aqueles que
estudam o Mahayana não têm tal temor. Praticando-se o Mahayana,
ganha-se tal poder. Como resultado, tudo aquilo que foi dito acima é
para Sravakas e Pratyekabudas acabarem com Maras, e não para o
Mahayana em si. Este sutra Mahayana Todo-Maravilhoso não pode se
acabar facilmente. Tudo é extremamente maravilhoso. Alguém que o
ouve e sabe que o Tathagata é Eterno é muito raro. Tal pessoa é como
a Udumbara. Podem aparecer pessoas que, após a minha morte, ou-
çam os ensinamentos deste maravilhoso sutra Mahayana e ganhem a
fé. Saiba que tais pessoas nunca cairão nos maus domínios da existên-
cia nas futuras eras, através dos 100 mil bilhões de kalpas que virão.”
Então o Buda disse ao Bodhisattva Kashyapa: “Oh, bom homem! Após
a minha entrada no Nirvana, poderão existir 100 mil inumeráveis pes-
soas que caluniarão e não acreditarão neste Todo-Maravilhoso Sutra
do Grande Nirvana.”

As Raras Delícias do Rei d’Outras Terras

O Bodhisa
Mais cedottva Kashyapa
ou mais tarde,disse ao Buda:
pessoas “Oh, este
caluniarão Honrado
sutra.pelo
Oh, Mundo!
Honrado
pelo Mundo! Quais pessoas boas e puras virão e salvarão aqueles que
cometerem tais calúnias?”.

O Buda disse a Kashyapa: “Oh, bom home m! Durante os 40 anos após


o meu Nirvana, este sutra florescerá no Jambudvipa. Então, ele desa-
parecerá. Oh, bom homem! Por exemplo, na terra onde podemos ob-

Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 167
ter a cana de açúcar, arroz, caramelo, manteiga, nata (creme) e sarpir-
manda, as pessoas dirão: ‘Esteé o melhor de todos os sabores’. Ou
pode haver pessoas que estejam vivendo em meio a uma roça de pain-
ço e capim, e que podem dizer que aquilo que elas comem é a melhor
de todas as comidas. Essas são pessoas de má sorte, devido à sua retri-
buição cármica. Os ouvidos dos afortunados nunca ouvirão falar de
painço ou de capim-arroz. O que eles ouvirão será farelo de arroz, cana
de açúcar, caramelo e sarpirmanda. O mesmo é o caso com esse mara-
vilhoso Sutra do Grande Nirvana. Aqueles nascidos ignorantes e desa-
fortunados não desejarão ouvi-lo, tal como aquelas pessoas, que são
estúpidas e de pouca sorte, odeiam farelo de arroz e caramelo. Isto é
assim com as pessoas dos dois veículos (Sravakas e Pratyekabudas),
que odiarão esse insuperável Sutra do Nirvana.

Mas, há pessoas que se sentem gratificadas ao ouvir este sutra e que,


tendo ouvido-o, sentirão prazer e não o caluniarão. Elas são como a-
quelas pessoas de boa sorte que comem farelo de arroz. Oh, bom ho-
mem! Por exemplo, existe um rei que vive nas profundezas das mon-
tanhas, num lugar localizado num precipício, de difícil acesso. Ele tem
cana de açúcar, farelo de arroz e caramelo, mas uma vez que essas
coisas são difíceis de obter, ele regateia e as esconde, e não as come.
Temendo que elas possam acabar, ele come somente painço e capim.
Então, o Rei de uma terra diferente, ouvindo sobre isto e sentindo pie-
dade, manda farelo de arroz e cana de açúcar para ele. O rei as recebe
e as divide entre as pessoas da sua terra, que as consomem. Após co-
mê-las, estão todos satisfeitos e dizem: ‘Por causa daquele Rei, agora
fomos abençoados com esta comida’. Oh, bom homem! O mesmo se
passa com os quatro tipos de pessoas. Eles tornam-se generais deste
grande ensinamento. Um dos quatro tipos de pessoas vê que incontá-
veis Bodhisattvas de outros países estudam, copiam, ou possuem ou-
tras cópias de sutras Mahayana deste tipo visando ganhos, fama, co-
nhecimento, proficiência ou para transação com outros sutras; mas
que eles não falam deles (dos sutras Mahayana) para os outros. Sendo
assim, ele (um dos quatro tipos de pessoas) pega este sutra Todo-
Maravilhoso e o dá para os Bodhisattvas, tal que eles possam aspirar
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 168
ao Bodhichitta Insuperável e descansar pacificamente na Iluminação.
Um Bodhisattva, ao obter esse sutra, fala dele aos outros que, através
dele, tornam-se abençoados com a amrta [‘amrta’ Ambrosia
– - o esta-
do de imortalidade] do ensinamento Mahayana. Tudo isto é o que tem
sido levado adiante por este único Bodhisattva (um dos quatro tipos de
pessoas). Ele permite aos outros ouvirem o que eles não ouviram an-
tes. Isto é como a pessoa que, através do poder daquele Rei, degusta
raras delícias. O caso é similar.

Também, oh bom homem! Onde quer que esse Todo-Maravilhoso


Sutra do Grande Nirvana vá, aquele lugar
– saiba você– é indestrutível.
As pessoas que vivem lá também são igualmente adamantinas. Qual-
quer pessoa que ouça este sutra atingirá a Iluminação insuperável e
nunca regredirá dela. Tais pessoas obterão o que quer que desejem
ter. Oh, vocês Monges! Guardem bem o que digo para vocês hoje.
Quaisquer pessoas que não ouçam este sutra são, vocês devem saber,
dignas de pena. Por que é assim? Porque tais pessoas não podem
guardar o profundo significado de um sutra Mahayana como este”.

Kashyapa disse ao Buda: “Oh, Honrado pelo Mundo! Este é o caso em


que após a morte do Tathagata este Sutra Mahayana do Grande Nirva-
na florescerá no Jambudvipa por um período de 40 anos e que após
aquilo ele desaparecerá. Quando e como ele ressurgirá novamente?”

O Buda disse: “Oh, bom homem! Por um pe ríodo de 80 anos após o


final da era do Dharma Maravilhoso e durante os 40 anos precedentes
a ela, este sutra florescerá grandemente no Jambudvipa”.

Kashyapa ainda disse ao Buda: “Oh, Honrado pelo Mundo! Quando a


era do Dharma Maravilhoso se acabar e quando a correta observância
dos preceitos não mais prevalecer, quando os ensinamentos heréticos
prevalecerem, quando não mais houver qualquer pessoa que tome o
caminho correto– quem serão aqueles que darão bons ouvidos aos
ensinamentos, que mantenha-os e recite-os, e façam esse sutra circular
no mundo, de tal forma que as pessoas façam oferecimentos, respei-
Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 169
tem, copiem e exponham esse sutra? Por favor, tenha piedade dos
seres, oh Tathagata, e analise e exponha isto amplamente, tal que to-
dos os Bodhisattvas possam ouvir o Dharma, mantê-lo, e nunca retroa-
girem do Bodhichitta insuperável.”

Então o Buda elogiou Kashyapa e disse: “Falaste bem, falaste bem, oh


bom homem! Você agora coloca essa questão. Oh, bom homem! Se os
seres, no rio Hiranyavati, no assento do Tathagata, aspirarem à Ilumi-
nação neste mundo de maldade, eles manterão um sutra como este e
não o caluniarão. Oh, bom homem! Pode haver seres nos assentos de
todos os Tathagatas, tão numerosos como as areias do Rio Ganges, que
aspirem à Iluminação e não caluniem o Dharma no mundo da maldade
e que, embora amem este sutra, [ainda] não estejam aptos a analisá-lo
e expô-lo para os outros. Oh, bom homem! Pode haver seres nos as-
sentos de todos os Budas, tão numerosos quanto às areias de dois Rios
Ganges, que aspirem à Iluminação, não caluniem o Dharma no mundo
da maldade, compreendam-no corretamente, tenham fé, estejam
satisfeitos, o mantenham e o recitem, [mas] não estejam aptos, para o
benefício do mundo, a expô-lo e falar sobre ele para outros. Ou pode
haver seres que, no assento de todos os Tathagatas, tão numerosos
quanto às areias de três Rios Ganges, aspirem à Iluminação, não calu-
niem o Dharma no mundo de maldade, mantenham, recitem e copiem
este sutra e o exponham aos outros, mas que [ainda] não estejam ap-
tos a alcançar as profundezas dos seus ensinamentos. Ou pode haver
seres que, no assento de todos os Tathagatas, tão numerosos quanto
às areias de quatro Rios Ganges, aspirem à Iluminação e, no mundo da
maldade, não caluniem e mantenham, recitem, e copiem este sutra e
exponham uma décima-sexta parte do seu significado, [embora] ainda
não de forma perfeita. Ou pode haver seres que, no assento de todos
os Tathagatas, tão numerosos quanto às areias de cinco Rios Ganges,
aspirem à Iluminação, não caluniem (o Dharma) no mundo da malda-
de, mas o mantenham, o recitem e copiem este sutra e falem sobre
oito décimas-sexta partes dele. Ou pode haver seres que, no assento
de todos os Tathagatas, tão numerosos quanto às areias de seis Rios
Ganges, aspirem à Iluminação e, no mundo da maldade, não caluniem
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 170
esse Dharma, mas o mantenham, recitem, e copiem este sutra e expo-
nham doze décimas-sexta partes dele aos outros. Ou pode haver seres
que, nos assentos de todos os Tathagatas, tão numerosos quanto às
areias de sete Rios Ganges, no mundo da maldade, não caluniem o
Dharma, mas o mantenham, recitem e copiem este sutra e falem acer-
ca de quatorze décimas-sexta partes dele. Ou pode haver seres que,
nos assentos de todos os Tathagatas, tão numerosos quanto às areias
de oito Rios Ganges, aspirem à Iluminação e, no mundo da maldade,
não caluniem, mantenham, recitem e copiem este sutra, e também
levem outros a copiá-lo, eles mesmos ouvindo bem o que é dito neste
sutra, bem como fazendo outros ouvirem-no também, recitando e
protegendo, ostentando-o vigorosamente –e sentindo piedade de
todos os seres– fazendo oferecimentos a este sutra, instando outros a
também fazerem oferecimentos para honrar, respeitar, recitar e adorá-
lo e, dessa forma, compreender perfeitamente e penetrar o seu signifi-
cado.

Isto significa dizer que o Tathagata é Eterno e Imutável, que ele é a


suprema paz em si, e que ‘todos os seres possuem a Natureza -de-
Buda’ [‘Buddhata’]. Eles compreendem (alcançam) bem todos os i-ens
namentos do Tathagata, fazem oferecimentos a todos os Budas e cons-
troem a casa do insuperável Dharma Maravilhoso, ostentam-no e pro-
tegem-no. Se uma pessoa, pela primeira vez, aspira à Iluminação insu-
perável, saiba que tal pessoa seguramente, nos dias que se sucederem,
construirá a casa do Dharma Maravilhoso, o ostentará e o protegerá.
Isto você deve saber a respeito das pessoas que se tornarão guardiãs
do Dharma. Por quê? Porque essas pessoas, nos dias que virão, segu-
ramente protegerão o Dharma Maravilhoso.”

“Oh, bom homem! Pode haver um Monge ma l-intencionado que, ao


ouvir que eu agora estou entrando no Nirvana, possa não sentir qual-
quer apreensão ou tristeza, mas que ao invés disso diga: ‘Agoraa-o T
thagata está entrando no Parinirvana. Quão prazeiroso é que ele o
faça! Quando o Tathagata estava vivo, obstruía o caminho do nosso
lucro. Agora ele está entrando no Nirvana. Quem mais vai ficar no nos-
Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 171
so caminho? Se ninguém impedir-me, voltarei a lucrar como nos tem-
pos antigos. Enquanto vivo, o Tathagata também foi rigoroso quanto às
proibições. Quando ele entrar no Nirvana, nós descartaremos todas
elas. A kasaya [Robe Budista] que me foi dada srcinalmente, o foi sim-
plesmente por uma questão de formalidade. Eu agora a descartarei, da
mesma forma que o faria com um turbante’. Essa pessoa calunia esse
sutra Mahayana e o transgride.

Oh, bom homem! Você, agora, deveria manter [este sutra] e pensar:
‘Se os seres são perfeitos nas inumeráveis virtudes, eles certamente
acreditarão neste sutra Mahayana e, tendo fé nele, o ostentarão. Tam-
bém pode haver outros seres além destes que possam sentir alegria no
Dharma, e se este sutra for amplamente exposto para tais pessoas,
elas, após ouvi-lo, erradicarão todos os pecados acumulados durante
os inumeráveis asamkhyas de kalpas passados. Aqueles que não crêem
neste sutra, nesta vida, serão atacados por inumeráveis doenças e
serão mal-falados por todas as pessoas. Após [a morte], eles serão
desacreditados pelos outros. [Na vida] eles terão má aparência e suas
finanças não irão bem. Ou talvez, eles possam ganhar um pouco, mas
aquilo será grosseiro e de má qualidade. Serão pobres e da baixa ca-
mada social, durante toda sua vida. Eles podem ganhar vida [renascen-
do] em famílias onde advenham calúnias e más relações.

Há tempos em que devemos partir desta vida, podendo ser uma época
de guerras ou quando as pessoas pegam em armas; ou quando impe-
radores e reis estejam praticando a tirania; ou quando inimizade e
vingança possam nos visitar incessantemente. Poderá existir um bom
amigo [um bom mestre Budista], mas eles [isto é, aqueles descrentes
neste sutra] não terão oportunidade de encontrá-lo. Será difícil para
eles ganharem a sua vida. Eles podem ganhar em uma certa medida,
mas a apreensão pela fome se abaterá sobre eles. Eles serão conheci-
dos apenas pelas pessoas da baixa classe, e reis e ministros não olharão
para trás [dando-lhes atenção]. Pode haver ocasiões em que falem com
razão, mas ninguém lhes dará crédito. Essas pessoas não vão para bons
lugares. São como um pássaro cujas asas estão quebradas. O mesmo
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 172
ocorrerá com essas pessoas. Nas vidas que virão, elas não estarão ap-
tas a ganharem um lugar seja no mundo dos seres humanos ou dos
celestiais.

O Sol do Grande Nirvana

Se alguém acredita num sutra Mahayana como este, as formas rudes e


grosseiras que possa ter obtido no nascimento parecerão certas e cor-
retas, em virtude do poder deste sutra; a dignidade e o semblante me-
lhorarão dia a dia, tal que humanos e deuses sentirão prazer em vê-lo.
Eles o respeitarão e o amarão, e em nenhum momento perderão a
consideração por ele. Reis, ministros e familiares ouvirão, respeitarão e
acreditarão nele. Se quaisquer dos meus discípulos Sravaka (Ouvinte)
estiverem desejosos de realizar o primeiro ato raro, eles deveriam pre-
gar esse sutra Mahayana para todo o mundo.

Oh, bom homem! A geada e a névoa podem desejar fortemente per-


manecer como elas são, mas isto somente até a hora do sol nascer.
Uma vez que o sol tenha nascido, tudo se vai e nada permanece como
antes. Oh, bom homem! As más ações cometidas por essas pessoas
também se acumulam da mesma forma (como a neve). O poder [que
podemos ter] na presente vida somente continua ao vermos a ascen-
são do sol do Grande Nirvana. Quando o sol desse Grande Nirvana
surge, todas as maldades que têm sido feitas morrerão. Além disso, oh
bom homem! Por exemplo, podemos abandonar nossas casas, raspar

nossos cabelos,
tos de um vestir a Kasaya,
Shramanera. e ainda
Uma pessoa ricanão recebermos
pode os dez
vir a convidar precei-
todos os
sacerdotes [à sua casa], e aqueles que ainda não receberam os precei-
tos podem ser convidados, juntamente com os outros. Eles podem não
ter recebido os preceitos ainda e, no entanto, poderão ser contados
como sacerdotes.

Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 173
Oh, bom homem! É como acontece com uma pessoa que aspira à Ilu-
minação pela primeira vez, estuda este Sutra Mahayana do Grande
Nirvana, ostenta-o, copia-o e recita-o. Ela pode ainda não ter atingido o
nível dos dez estágios [de um Bodhisattva] e, no entanto, ela será con-
tada como sendo um daqueles dos dez estágios. Se uma pessoa, quer
seja um discípulo ou não, sem ganância ou medo, ou mesmo por lucro,
ouvir apenas um gatha deste sutra e, tendo ouvido-o, não o calunie –
saiba que essa pessoa já está próxima da Iluminação insuperável. Oh,
bom homem! Por esta razão, Eu digo que as quatro pessoas [fidedig-
nas] se tornarão os refúgios do mundo. Assim eu digo, oh bom homem,
que essas pessoas nunca dirão que o que o Buda disse não é o que Ele
disse. Nada deste tipo ocorrerá. Este é o porquê eu digo que esses
quatro tipos de pessoas tornam-se os refúgios do mundo. Oh, bom
homem! Faça oferecimentos a esses quatro tipos de pessoas.”

(Kashyapa ainda disse): “Oh, Honrado pelo Mundo! Como posso saber
quem são, e como posso fazer oferecimentos?”
O Buda disse a Kashyapa: “Quem ostenta e protege o Dharma Marav
i-
lhoso deve ser convidado. Devemos abandonar nossas vidas e fazer
oferecimentos. Isto é como eu digo no meu sutra Mahayana:

À qualquer pessoa versada no Dharma,


não importa se jovem ou velha,
oferecimentos devem ser feitos;
devemos respeitá-la e reverenciá-la,
como o Brahmin reverencia o fogo.

A alguém versado no Dharma, jovem ou velho,


oferecimentos devem ser feitos.
Tal pessoa será respeitada e reverenciada,
assim como todos os devas servem ao Shakra.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “As coisas devem se proceder


como você, o Buda, diz, e nós devemos render respeito aos mestres e
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 174
mais velhos. Eu tenho uma dúvida que você [talvez] gentilmente dissi-
pará para mim. Se há uma pessoa idosa que tenha por muito tempo
mantido os preceitos e que indague uma pessoa jovem para dizer-lhe
aquilo que ela não ouviu antes– deve ser dado respeito a essa pessoa
jovem? Se assim for, isto não pode ser uma defesa dos preceitos? Ou,
pode haver uma pessoa jovem que tenha mantido os preceitos e que
possa indagar acerca daquilo que ela não ouviu de uma pessoa que
tenha quebrado os preceitos. Devemos respeito a tal pessoa (que que-
brou os preceitos)? Ou, uma pessoa que abandonou a vida secular
pode dar ouvidos ao que um leigo diz acerca de coisas que ele não
ouviu antes. Deveríamos dar respeito a tal pessoa? O entendimento
disto seria que a pessoa que abandonou a vida secular não deveria dar
respeito ao leigo, mas que o jovem e pequeno deveria dar respeito ao
idoso, porque essas pessoas idosas receberam o upasampada mais
cedo e sua (prática da) conduta está realizada. Portanto, deveríamos
dar-lhe respeito e fazer-lhe oferecimentos. De acordo com o Buda, a
violação dos preceitos não é permitida na casa do Buda. É como no
caso de um crescimento (avanço) do arrozal sobre o capim. Também,
de acordo com o que o Buda disse, existe aquele que reside no Dhar-
ma, a quem oferecimentos devem ser feitos, não importando se aquela
pessoa é velha ou jovem, da mesma forma como a pessoa serviria ao
Shakra. Como podem esses dois casos ser compreendidos? Ora, não
poderia ser que aquelas fossem falsas palavras do Tathagata que indi-
caram que mesmo pessoas observadoras dos preceitos podem trans-
gredi-los? Por que o Tathagata disse tal coisa? Também, o Honrado
pelo Mundo disse em outros sutras que a violação dos preceitos pode
certamente ser curada. Não é fácil compreender o significado de coisas
desse tipo.”

O Buda disse a Kashyapa: “Bom homem! Eu falo assim no gatha para o


benefício daqueles Bodhisattvas dos dias que virão e que estudarão o
Mahayana. Eu não o faço para o benefício de Sravakas. Como disse
acima, quando os dias do Dharma Maravilhoso terminarem, quando os
preceitos corretos forem violados, quando a violação dos preceitos
crescer em amplitude, quando as más ações proliferarem, quando [os
Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 175
santos] estiverem escondidos e ninguém estiver junto a eles, quando
Monges aceitarem ou possuírem coisas impuras e empregados; apare-
cerá um desses quatro (tipos de pessoas fidedignas) que raspará a sua
cabeça e praticará a Via. Todos os Monges [daquela época] receberão e
possuirão coisas impuras e empregados, não sabendo a diferença entre
o puro e o impuro, o certo e o não certo. Essa pessoa, com a intenção
de ensinar esses Monges, suavizará (a doutrina) e não fará confusão
entre o bem e mal, e saberá o que é necessário ser feito e o que o Buda
faz. Ela verá os outros cometendo graves ofensas, ainda assim ela sen-
tará em silêncio e não tomará parte [de tais ofensas]. Por que não? Por
que eu apareço no mundo para estabelecer e proteger o ensinamento
correto. Este é o porquê eu sento silenciosamente e não reprovo [os
ofensores]. Oh, bom homem! Tal pessoa, embora violando [as regras],
não é classificada como alguém que viola as regras de uma disciplina,
em razão da sua proteção do ensinamento.

Bom Homem! Por exemplo, um rei morre de uma doença e seu filho, o
príncipe da coroa, ainda é jovem e não apto a ascender ao trono. Existe
um candala [uma pessoa mestiça desprezada, nascida de um pai da
casta Sudra e uma mãe Brâmane] que é rico e cuja fortuna é inestimá-
vel. Ele tem muitos parentes. No final, usando a força, ele tira vanta-
gem da condição de fraqueza do estado e usurpa o trono. Muito antes,
o povo, Monges, Brâmanes e outros se revoltam e fogem para países
distantes. Há pessoas que não fogem, mas que não desejam ver o rei,
bem como os ricos e Brâmanes que não deixarão a sua terra nativa, tal
como as árvores que crescem onde se encontram e onde elas morrem.
O rei candala, vendo os subjugados deixando o país, envia homens
candala para bloquear todas as estradas. E também, após sete dias, ele
põe homens a bater tambores e proclama a todos os Brâmanes: ‘A
qualquer pessoa que celebre a cerimônia de abhiseka [uma cerimônia
de consagração, envolvendo aspersão de água sobre a cabeça], metade
da terra lhe será dada!’ Eles ouvem isto, mas nenhum Brâmanea-se
presenta. Todos dizem: ‘Como poderia um Brâmane fazer tal coisa?’

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 176


O rei candala ainda diz: ‘Se nenhum Brâmane vir a ser meu mestre,
certamente farei os Brâmanes viverem, comerem, dormirem e traba-
lharem juntos com os candalas. Se algum Brâmane vir e aspergir água
sobre a minha cabeça, eu lhe darei metade da minha terra. Tal como é
dito, assim se fará. Também, a toda-maravilhosa amrta [ambrosia],
aquela coisa do Céu Trayastrimsa que opera todos os milagres dos
mortais, também será dada a essa pessoa’. Naquela ocasião, havia o
filho de um Brâmane, alguém muito jovem. Ele era perfeito nas ações
puras, usava cabelo longo, e era bem versado em encantamentos. Ele
veio ao rei e disse: ‘Oh, grande Rei! Tudo o que você, o Rei, diz será
feito por mim’. O rei ficou satisfeito e deixou esse menino celebrar a
abhiseka. Todos os Brâmanes ouviram sobre isso e ficaram vexados.
Eles reprovaram o menino, dizendo: ‘Você, o filho de um Brâmane!
Como você poderia celebrar a abhiseka num candala?’

Então o rei deu ao menino a metade do seu reinado. Juntos, eles reina-
ram sobre todo o reino. Um longo tempo se passou. Então o menino
Brâmane disse ao rei: ‘Eu rejeitei a minha tradição familiar, vim você
a
para tornar-me seu mestre e lhe ensinei, Rei, todos os intrincados as-
suntos do encantamento. Ainda assim você não me ajuda’. Então o rei
respondeu: ‘De que forma eu não te ajudo?’. O menino Brâmane disse:
‘Eu ainda não experimentei a amrta que o rei anterior deixou em suas
mãos’. O rei disse: ‘Falaste bem! Oh, meu grande mestre! Eu não sabia.
Se você deseja usá-la, por favor leve isto [amrta] para sua casa’. Então
o menino Brâmane, ouvindo as palavras do rei, levou a amrita para
casa e convidou todos os ministros, e compartilhou (a amrta) com eles.
Todos os ministros, tendo- a, disseram ao rei: ‘é maravilhoso que o
grande mestre tenha a amrta’. Ouvindo isto, o rei disse ao seu mestre:
‘Como é que, oh grande mestre, você experimenta a amrta com todos
os ministros e ainda assim não a mostra para mim?’ Então o menino
Brâmane deu ao rei uma poção venenosa. Tomando a poção, o rei
sentiu-se mal e caiu no chão. E lá ficou inconsciente, como um homem
morto. Então o menino Brâmane chamou de volta o rei anterior, resti-
tuiu-lhe o trono e disse: ‘O trono do leão não pode, por lei, ser ocupado
por um candala. Nunca ouvi desde o passado que um candala alguma
Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 177
vez tenha sentado num trono real. Nunca poderia acontecer de um
candala reinar sobre o estado e governar o povo. Oh, grande rei! Agora
você deve suceder o rei anterior e governar o estado equânime e le-
galmente’. Tendo disposto as coisas assim, ele deu um antídoto para o
candala e deixou-lhe despertar. Após despertar, ele retirou-se do país.
Agora, esse menino, agindo dessa forma, não perdeu o prestígio dos
Brâmanes. E os outros, ouvindo o que aconteceu, elogiaram o seu ato e
disseram que isto era uma coisa inédita. Eles disseram: ‘Bem feito, bem
feito! Você realmente se livrou do rei candala’.

O mesmo se passa comigo. Bom homem! Após a minha entrada no


Nirvana, os Bodhisattvas que protegem o Dharma Maravilhoso tam-
bém agirão assim. Usando meios hábeis, eles se comportarão como
aqueles sacerdotes que transgridem os preceitos, que são sacerdotes
somente no nome e que recebem e guardam coisas impuras. E quando
eles virem uma pessoa que, embora [aparentemente] viole os precei-
tos, no entanto corrige (cura) aqueles maus Monges que são transgres-
sores das proibições, eles irão a ele, o respeitarão, o reverenciarão e
farão de tudo oferecendo as quatro coisas [isto é, roupas, comidas e
bebidas, roupas de cama e remédios], bem como sutras e demais uten-
sílios. Se essas coisas não estiverem à mão, eles deverão buscar os
meios, ir a doadores, mendigar por elas e então dar [os seus ofereci-
mentos]. Para fazer isto, eles podem possuir as oito coisas impuras [isto
é, ouro, prata, empregados, empregadas, vacas, carneiros, cereais e
celeiros]. Por quê? Porque isto pode corrigir [o caminho dos] Monges
mal-feitores. Isto é como no caso do menino que conquistou o candala.
Então, os Bodhisattvas poderão novamente respeitar e reverenciar
essa pessoa. Embora a pessoa também possa receber e guardar as oito
coisas, isto pode ser aceito com impunidade. Por quê? Porque esse
Bodhisattva deseja refutar e curar todos os maus Monges e permitir
que os Monges de coração puro vivam em paz, e permitir que os sutras
Mahayana Vaipulya (Mahayana Extensivo) prevaleçam no mundo e
beneficiem o céu e a terra.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 178


Bom homem! É por isso que eu coloquei os dois gathas (versos) neste
sutra e (dizendo) que todos os Bodhisattvas louvem aquele que prote-
ge o Dharma. Isto é semelhante a todos os Monges e Brâmanes que
louvaram o menino, dizendo: ‘Bem feito, bem feito!’ O mesmom-ta
bém se aplicará aos Bodhisattvas protetores do Dharma. Caso alguém
veja uma pessoa protetora do Dharma trabalhando com pessoas que-
bradoras dos preceitos, e diga que aquela pessoa está cometendo um
pecado, saiba que a pessoa [que diz isso] está convidando o infortúnio
para si, e que a pessoa que protege o Dharma não tem conexões com o
pecado. Bom homem! Se qualquer Monge quebra os preceitos e, além
da arrogância, não se arrepende, essa é realmente uma violação das
proibições. Um Bodhisattva que, enquanto cometendo uma violação,
assim o faz para proteger o Dharma, não é chamado aquele que come-
te uma violação. Por que não? Porque ele não tem arrogância, confes-
sa e se arrepende. Este é o porquê eu repito no sutra e digo num verso:

‘Se há uma pessoa que conheça o Dharma,


seja aquela pessoa velha ou jovem,
tal pessoa deve ser honrada,
respeitada e reverenciada,
tal como no caso dos Brâmanes que fazem culto ao fogo
e servem o Shakra do segundo céu [i.e. Trayastrimsa].’

Devido a isto, não para aqueles que desejam aprender os ensinamen-


tos dos Sravakas (Ouvintes), mas para Bodhisattvas, eu falo assim em
versos”.

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Se


for o caso que o Bodhisattva-Mahasattva pode agir assim sem
restrições com relação aos preceitos, os shila [preceitos] recebidos
srcinalmente podem permanecer intactos e genuínos?”

O Buda disse: “Oh bom homem! Não fale assim. Por que não? Os
preceitos (shila) recebidos srcinalmente permanecem intactos e não
são perdidos. Se transgredimos, nos arrependemos. Tendo
Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 179
arrependido, nos tornamos puros. Oh bom homem! Quando uma
barragem está velha e tem buracos nela, a água inevitavelmente
vazará. Por quê? Porque ninguém a reparou. Quando a reparamos, a
água não poderá vazar. O mesmo se passa com o Bodhisattva. Quando
os preceitos são violados, segue-se a confissão [posadha], recebendo
[novamente] os preceitos, e assim vêm as horas de liberdade. As
obrigações monásticas são cumpridas, mas as regras do vinaya não são
como o caso da barragem com furos através dos quais a água vaza. Por
que não? Se houver alguém que defenda o vinaya (conjunto de regras
monásticas), o tamanho da Sangha diminuirá e advirão a frouxidão
moral e a indolência, que somente crescerão. Se houver aqueles que
sejam puros em seus atos e que mantenham em observância os
preceitos, os preceitos (shila) srcinais permanecerão perfeitos e
válidos. Oh bom homem! Uma pessoa que é relaxada no Veículo [isto
é, com relação às orientações gerais do Buda-Dharma do Mahayana], é
[de fato] relaxada; e uma pessoa que é relaxada com respeito aos
preceitos, não é [de fato] relaxada. O Bodhisattva-Mahasattva não é
relaxado com relação aos ensinamentos disto [isto é, despertar para o
estado real da existência]. Isto é observância dos preceitos. Ele guarda
bem o Dharma-Maravilhoso e banha-se nas águas do Mahayana.
Assim, embora o Bodhisattva viole os preceitos, ele não é [realmente]
relaxado com relação aos preceitos.”

A Maldade e a Pureza (de um Cristal Perfeito)

O Bodhisattva
Sangha. É comoKashyapa
com a disse ao Buda:
manga, que é“Há quatro
difícil tipos de
de saber pessoas
quando na
está
madura. Como podemos saber a diferença entre violação e não-
violação dos preceitos?”

O Buda disse: “Oh bom homem! Baseando -se no Todo-Maravilhoso


Sutra do Grande Nirvana, é fácil saber. Como alguém poderá saber
olhando o Sutra do Grande Nirvana? Por exemplo: um agricultor planta

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 180


arroz, e remove o joio no arrozal. Quando olhamos para o campo com
os olhos carnais dizemos que é um belo campo. Mas quando vem a
colheita, agora vemos que o joio e o arroz são diferentes. Assim, oito
coisas mancham de fato o sacerdote. Se as erradicarmos
completamente, veremos que ele é puro. Quando uma pessoa observa
os preceitos e não os viola, isto é difícil distinguir com os olhos carnais.
Se a maldade surge, isto é fácil ver. É como no caso do joio no arrozal,
que pode facilmente ser visto. O mesmo se passa com o Monge. Se ele
está apto a acabar com as oito impuras serpentes venenosas, o
chamamos de puro e um santo campo de prosperidade. A ele serão
feitos oferecimentos por humanos e deuses. Não é fácil ver claramente
a retribuição cármica das ações puras com os olhos carnais.

Além disso, oh bom homem! [Imagine que] houvesse uma floresta de


kalaka [bambusa vulgaris]. As árvores eram numerosas, em meio às
quais havia uma chamada tinduka [diospyros embryoteris]. Os frutos
da kalaka e da tinduka parecem iguais, e é difícil distingui-los. Quando
os frutos amadureceram, uma mulher os apanhou. Somente uma parte
era tinduka, sendo dez partes de kalaka. A mulher, não sabendo [a
diferença], mandou-os para o mercado, espalhou-os para venda e os
vendeu. Pessoas ignorantes e crianças, não conhecendo bem as coisas,
compraram a kalaka, comeram-na e morreram. Uma pessoa instruída
ouviu acerca disto e indagou a mulher: ‘Oh mulher! De onde ocêv
obteve isto?’ Nisto, a mulher apontou para uma direção. Todo mundo
disse: ‘Naquela direção há inumeráveis árvores de kalaka; somente
uma é tinduka’. Todas as pessoas, aprendendo isto, riram, jogaram as
frutas fora e foram embora. O caso é assim.

Oh bom homem! O mesmo se passa com as oito coisas impuras quanto


aos seres. Em meio às pessoas, há muitas que possuem essas oito coi-
sas. Somente um é puro, aquele que observa os preceitos e não possui
as oito coisas impuras. Ele sabe bem que todas as pessoas recebem e
guardam coisas contrárias aos preceitos, e ainda age junto [com elas] e
não as deixa. Ele é como a tinduka em meio a todas as outras árvores
na floresta. Existe um Leigo que vê todos os Monges transgredindo (os
Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 181
preceitos). Então, ele não presta respeito ou faz oferecimentos em
companhia [de outras pessoas]. Se essa pessoa deseja oferecer algo
[todavia], ela primeiro indaga: ‘Oh prezados! Está certo receber e r-gua
dar essas oito coisas? Essas coisas são aquelas que o Buda permite ou
não?’ Se a resposta for que o Buda permitiu-
lhes, ele indagará: ‘Vocês
podem participar da posadha (um encontro realizado a cada quinze
dias por Shakyamuni e seus seguidores, no qual eles recitavam os pre-
ceitos e seus seguidores confessavam e se arrependiam de quaisquer
faltas) e pravarana (libertação)?’ Assim esse Leigo pergunta. Nisto,
todos responderão: ‘O Tathagata é piedoso e permite -nos essas oito
coisas’. Então, o Leigo diz: ‘No Jetavana, havia muitos Monges que
diziam que o Buda havia permitido a posse de ouro e prata, ou que ele
não havia permitido. Se qualquer Monge dissesse que o Buda havia
permitido [tais coisas], as pessoas no campo do ‘não -permitido’ não
ficavam juntas [com aquelas que diziam que ouro, etc. era permitido],
não falavam [com elas] sobre os preceitos, ou confessavam [a elas], ou
tomavam água no mesmo rio e não compartilhavam com elas daquilo
que viesse do ganho (lucro). Como você pode dizer que o Buda deu
permissão? O Buda, o Senhor de todos os Deuses, pode recebê-las,
mas vocês, a Sangha, não podem ’. Se há aqueles que recebem essas
coisas, não fale sobre os preceitos [com eles], ou confesse ou faça kar-
man [ações ritualísticas de um Monge quando recebe shila (preceitos)
ou faz confissão], mas aja como a Sangha deve agir. Se falamos [com
Monges ímprobos] sobre shila (preceitos), confessamos-lhes, ou faze-
mos karman, e assim participarmos dos trabalhos da Sangha, após a
morte, seguramente cairemos no inferno. Isto é como todos aqueles
que perderam suas vidas em razão de comerem kalaka.

Além do mais, oh bom homem! Por exemplo, existe na cidade um co-


merciante de drogas. Ele tem um remédio maravilhosamente doce que
vem do Himalaia. Ele também vende muitas outras drogas. Todas elas
de sabor doce e muito parecidas entre si. As pessoas desejam muito
comprar [as drogas], mas não podem distinguir [seus diferentes tipos].
Elas vão ao farmacêutico e indagam: ‘Você vende a droga do Himala
i-
a?’ O farmacêutico diz: ‘Sim!’ Um homem pega a droga que nãoa-é
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 182
quela do Himalaia. O mercador trapaceia o freguês e diz-
lhe: ‘Esta é a
droga doce que eu tenho do Himalaia.’ Mas o comprador é incapaz de
dizer a diferença. Ele compra e laeva para casa, pensando: ‘Obtive a
droga do Himalaia.’ A situação é como aquela.

Oh Kashyapa! Em meio aos Sacerdotes Sravakas (Ouvintes), há aqueles


que são Sacerdotes somente no nome, há aqueles que são verdadei-
ros, ou aqueles que se juntam em harmonia; também, há aqueles que
observam os preceitos e aqueles que os violam. Todos farão ofereci-
mentos, serão respeitados e reverenciados. Mas esse Leigo não pode,
apenas por olhar, distinguir qual é qual. Isto é como a situação do ho-
mem que não poderia ver se a droga que ele tinha era do Himalaia.
Quem são aqueles que observam e aqueles que violam os preceitos?
Quem é um verdadeiro Sacerdote , e quem é um Sacerdote somente
no nome? Alguém com os olhos celestiais poderia ver isto bem. Oh,
Kashyapa! Se esse Leigo sabe que [tal e tal] pessoa é alguém que trans-
gride, ele não lhe dará nada, se curvará ou o reverenciará. Se ele sabe
que [tais e tais] pessoas recebem e guardam as oito coisas impuras, ele
não dará aquilo que ele tem, não fará reverência ou oferecimentos.
Qualquer [Monge] que viole os preceitos não deve ser respeitado ou
reverenciado apenas em razão da kasaya que ele veste.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda:”Falaste bem, falaste bem! O


que o Tathagata diz é verdadeiro, não falso. Aceitarei a [sua] palavra
com o maior respeito, por exemplo, como se eu tivesse recebido um
tesouro adamantino. Exatamente como o Buda diz, esses Monges
devem basear-se nas quatro coisas. O que são as quatro coisas? Eles
devem estar baseados no Dharma, não na pessoa; no significado, não
na letra; na Sabedoria, não na consciência; no receber e abraçar os
sutras, não no não receber e abraçar os sutras. Eles devem conhecer
bem essas quatro coisas, mas não essas quatro pessoas.”

O Dharma e a Pessoa

Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 183
O Buda disse: “Estar baseado no Dharma significa nada mais que
basear-se no Mahaparinirvana do Tathagata. Todos os ensinamentos
Budistas nada mais são que o ‘Dharmata’ [essên cia do Dharma,
essência da Realidade]. Esse ‘Dharmata’ é o Tathagata. Portanto, o
Tathagata é Eterno e Imutável. Qualquer pessoa que diga que o
Tathagata é não-Eterno não conhece o ‘Dharmata’. Essa pessoa não é
alguém em quem basear-se. Todos os quatro (tipos) de pessoas
mencionadas acima aparecem no mundo, protegem, agem e se
tornam um refúgio [para todos os seres]. Por quê? Porque eles
realmente compreendem os pontos mais profundos daquilo que o
Tathagata diz e sabem que o Tathagata é Eterno e Imutável. Não é bom
dizer que o Tathagata é não-Eterno e que ele muda.

Os quatro (tipos) de pessoas, quando (aparecem) como tais, são o


Tathagata. Por quê? Porque esses (tipos de pessoas) compreendem
bem e falam acerca das palavras secretas do Tathagata. Alguém que
compreenda bem o que está profundamente oculto e sabe que o
Tathagata é Eterno e Imutável nunca dirá, por lucro, que o Tathagata é
não-Eterno. Essapessoa é alguém em quem basear-se– por que não
nos quatro (tipos) de pessoas?

Basear-se no Dharma significa basear-


se no ‘Dharmata’; não basear-se
em humanos refere-se a Sravakas (mas não aos quatro tipos de
pessoas). ‘Dharmata’ é Tathagata, e o Sravaka é o criado. O Tathagata é
Eterno, mas o Sravaka é não-eterno.

Oh bom homem! Um homem pode violar os preceitos e, por ganhos,


dizer que o Tathagata é não-Eterno e que ele muda. Essa pessoa não é
alguém em quem se possa tomar refúgio. Oh bom homem! Isto é uma
regra definida.

O Significado e as Palavras

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 184


Dizemos que nos baseamos no significado, não nas palavras. O
significado conota seres plenamente iluminados. Plena Iluminação
significa sem-falhas. Sem-falhas significa (plena) satisfação. Satisfação
significa que o Tathagata é Eterno e Imutável. Que o Tathagata é
Eterno e Imutável significa que o Dharma é Eterno. Que o Dharma é
Eterno significa que a Sangha é Eterna. Isto é basear-se no significado.
Não se baseie em palavras. Quais são as palavras nas quais não
devemos nos basear? São as palavras discursivas e decorativas. Elas [as
pessoas que aderem às letras, antes que ao espírito] buscam, também,
ávida e insaciavelmente todos os inumeráveis sutras do Buda.
Maldosamente, habilmente e insinceramente, elas enganam e,
exibindo uma aparência de simpatia e benevolência, elas buscam os
lucros. Trajados de branco, eles galgam postos. Eles também
proclamam em altas vozes: ‘O Buda permite aos Monges receberem
todos os [tipos de] serviços (ajudas nas tarefas) e coisas impuras,
comerciar ouro, prata, gemas raras, estocar arroz, comerciar vacas,
carneiros, elefantes e cavalos; e assim buscar lucros. E também poderá
surgir uma fome, e por piedade das crianças, os Monges podem visar
lucros, armazenar coisas e guardá-las numa casa, preparar comidas
com as suas próprias mãos e para o seu próprio sustento, ao invés de
recebê-las [doações dos outros].’Todas essas palavras não são para ser
seguidas.

Sabedoria e Consciência

Dizemos
Sabedoriaque
é umanos baseamos
alusão ao na SabedoriaSee qualquer
Tathagata. não na consciência.
Sravaka nãoA
compreende bem as virtudes do Tathagata, a consciência (deste) não é
para ser seguida. Se ele sabe que o Tathagata é o Corpo-do-Dharma,
essa verdadeira Sabedoria pode realmente ser seguida. Se uma pessoa
vê o corpo expediente do Tathagata e diz que ele pertence aos cinco
skandhas, aos dezoito reinos [isto é, os seis órgãos dos sentidos (nariz,
ouvido, etc.), os seis campos do sentido (olfato, audição, etc.) e as seis

Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 185
consciências], e às doze esferas [os seis órgãos dos sentidos e os seis
campos dos sentidos], e que ele resulta da alimentação, isso não é para
ser seguido. Isto significa que mesmo a consciência não é para ser se-
guida. Se um sutra diz tal coisa, ele não pode ser seguido.

Receber e Abraçar Sutras

Dizemos que devemos nos basear no receber e abraçar os sutras


[aqueles que sondam as profundezas do verdadeiro espírito do Buda-
Dharma], e não no não receber e abraçar os sutras. O não receber e
abraçar os sutras são o veículo do Sravaka (Ouvinte). Mesmo ouvindo o
profundo e recôndito repositório do Buda-Tathagata, surgem dúvidas
em suas mentes com relação a todas as coisas e a pessoa não percebe
que esse repositório surge do mar da Grande Sabedoria, como no caso
de uma criança que não pode distinguir uma coisa da outra. Isto é a
não-apreensão do significado. A realização (o alcance) do significado
nada mais é que a Verdadeira Sabedoria do Bodhisattva. Ela flui a partir
do desimpedimento da Grande Sabedoria de sua mente, como com um
adulto, para quem não há nada que não seja conhecido. Isto é
realização do significado.

Também, o veículo do Sravaka é a não-apreensão do significado, e o


insuperável Mahayana é a apreensão do significado. Se uma pessoa diz
que o Tathagata é não-Eterno e que ele muda, isso indica que essa
pessoa ainda não chegou ao significado. Se uma pessoa diz que o

Tathagata é Eterno
ao significado. e Imutável,
Se uma issoque
pessoa diz mostra queo aquela
o que Sravakapessoa chegou
diz pode ser
compreendido, isto indica não-apreensão do significado. Se uma
pessoa diz que o Tathagata é um produto da alimentação, isto é não-
apreensão do significado. Se uma pessoa diz que o Tathagata é Eterno
e Imutável, isto é plena apreensão do significado. Se uma pessoa diz
que o Tathagata entra no Nirvana como no caso do combustível que se
exauriu, isto é não-apreensão do significado. Se uma pessoa diz que o

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 186


Tathagata adentra o mundo do ‘Dharmata’, isto é apreensão do
significado.

Não podemos seguir os ensinamentos do Sravaka. Por que não?


Porque o Tathagata, através da conveniência (meios hábeis), articula o
ensinamento do Sravaka apenas para salvar os seres. Isso é como no
caso do homem rico que ensina o alfabeto ao seu filho. Oh bom
homem! O veículo do Sravaka é análogo à situação onde uma pessoa
primeiro cultiva a sua terra, mas ainda não chegou o momento da
colheita. Isso é a não-apreensão do significado. Por esta razão, não
podemos nos submeter ao veículo do Sravaka. Devemos buscar refúgio
nos ensinamentos do Mahayana. Por quê? No sentido de salvar os
seres, através da conveniência (meios hábeis) o Tathagata expõe o
Mahayana. Portanto, não devemos segui-lo (na forma dos meios
expedientes). Isto é apreensão do significado. Devemos conhecer bem
essas quatro coisas às quais devemos seguir.

Também, além disso, dizemos que nos baseamos no significado.


Significado é mente (pensam ento) honesta. ‘Mente Honesta’ significa
‘Luz’. Luz significa ‘Sem
-Falha’. Sem-Falha é o Tathagata. Também, ‘Luz’
é Sabedoria. A mente honesta é Eterna. O Eterno é o Tathagata.
[Saber] que o Eterno é o Tathagata é seguir o Dharma. O Dharma é
eterno. Ele também significa o ilimitado. Ele é difícil de conhecer. Uma
pessoa não pode segurá-lo ou prendê-lo. E ainda podemos vê-lo bem.
Se uma pessoa diz que ela não pode vê-lo, (ela) não poderia seguí-lo
como tal. Este é o porquê dizermos que seguimos o Dharma e não a
pessoa.

Também, se uma pessoa diz que a palavra Toda-Maravilhosa é não-


eterna, então ela não deve ser seguida. Esse é o porquê nos baseamos
no significado e não nas palavras. Dizer que a ‘verdade’ subordina
-se à
Sabedoria significa que a Sangha é eterna, não-criada e imutável, e que
eles (a Sangha) não guardam as oito coisas impuras. Por esta razão,
seguimos a Sabedoria e não a consciência. Se uma pessoa diz que a
consciência faz e a consciência recebe (coisas impuras), não há harmo-
Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 187
nia na Sangha. Por que não? Ora, harmonia significa não-possessão. Se
ela (a consciência) é possessão, como poderíamos dizer ‘eterno’? Em
consideração a isto, a consciência não deve ser seguida.

A Apreensão do Significado

Dizemos ‘significado’. ‘Significado’ significa ‘estar satisfeito’. Isto quer


dizer nunca, até o fim, enganar (fraudar) procurando demonstrar pure-
za de comportamento e com arrogância mostrar-se como sendo de
uma alta posição, e assim buscar avidamente o lucro. Além disso, não
se deve mostrar apego àquilo que o Tathagata diz por razões de con-
veniência. Isto é alcançar o significado. Se uma pessoa reside nisto,
então podemos dizer que essa pessoa reside no ‘Paramartha -Satya’
[Realidade Última]. Esse é o porquê dizermos que nos baseamos no
significado dos sutras e não na não-apreensão do significado.

Não-apreensão do significado relaciona-se àquilo que está estabelecido


nos sutras dizendo que tudo pode ser extinto, tudo é não-eterno, tudo
é sofrimento, tudo é vazio, e tudo é destituído do eu. Isto é não-
apreensão do significado. Como assim? Porque essa pessoa não está
apta a apreender o significado intentado, mas somente a aparência
[literal] do significado. Isto leva todos os seres a cair no inferno Avichi.
Por quê? Em razão do apego, como um resultado de que a pessoa não
apreende o significado. Uma pessoa diz que tudo caminha para a extin-
ção implicando que a entrada do Tathagata no Nirvana constitui extin-

ção. Umaé pessoa


Nirvana diz que
não-eterno, e otudo é não-eterno,
mesmo significando
se passa com que mesmo
o sofrimento, o vazio, oe
o não-eu também. É por isso que dizemos que isso é não-apreensão da
essência dos sutras. Não podemos seguir isso.

Oh bom homem! Pode haver uma pessoa que diga que o Tathagata,
por piedade a todos os seres, olha para aquilo que é mais apropriado
para a ocasião. Como ele (o Tathagata) sabe o que é certo para a ocasi-

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 188


ão, ele fala do que é leve como sendo pesado e do que é pesado como
sendo leve. O Tathagata sabe que todos os seus discípulos são supridos
daquilo que necessitam pelo danapatis [doadores de ofertas]. Dessa
forma, o Buda não permite que tais pessoas recebam (serviços) ou
tenham serviçais, homem ou mulher, ouro, prata e gemas preciosas,
ou comercializem coisas impuras. Quando os discípulos não são supri-
dos pelos danapatis, como quando há fome e escassez de comida, ele
lhes permite, com a finalidade de se sustentarem e protegerem o
Dharma Maravilhoso, receber serviçais, homem ou mulher, ouro, pra-
ta, veículos, campos (terrenos), casas e arroz, e comercializar aquilo
que eles têm. Embora lhes seja permitido receber e ter tais coisas, elas
devem ser doadas pelos fiéis danapatis.

Então, todas essas quatro coisas são aquelas que podemos seguir. Se
os preceitos, o abhidharma e os sutras não diferem daquelas quatro
coisas, devemos segui-los. Se uma pessoa diz que há ocasiões e não-
ocasiões, que o Dharma deve ser protegido e que o Dharma não deve
ser protegido, e que o Tathagata permite a todos os Monges recebe-
rem e terem essas coisas impuras, essa (pessoa) não deve ser seguida.
Se os preceitos, o abhidharma e os sutras concordam com isso, essas
três coisas (os preceitos, o abhidharma e os sutras) não podem ser
seguidos. Eu falo sobre essas quatro coisas para o benefício de todos os
seres com olhos carnais, mas não para aqueles que possuem o olho da
Sabedoria. Esse é o porquê falo sobre essas quatro coisas e digo que
elas são aquilo que deve ser seguido. ‘Dharma’ é ‘Dharmata’; ‘signific
a-
do’ está dizendo que o Tathagata é Eterno e Imutável; ‘Sabedoria’ é
saber que todos os seres possuem a Natureza-de- Buda [‘Buddhata’];
‘apreensão do significado’ significa ser bem versado em todos os sutras
Mahayana.”

Capítulo Sobre
8– os Quatro Fidedignos Página 189
Capítulo Nove: Sobre o Errado e o Certo
Então Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Devemos
seguir os quatro tipos de pessoas acima?”

O Buda disse: “É assim, é assim! Oh bom homem! O que eu disser pode


ser seguido. Por quê? Porque existem quatro Maras. Quais são os qua-
tro? Eles aparecem como pessoas que mantém os sutras e os preceitos
daquilo que Mara disse.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Você, o Buda, diz que existem quatro Maras. Como podemos distinguir
o que Mara diz daquilo que o Buda diz? Há pessoas que se conduzem
de acordo com o que Mara diz e aqueles que seguem o que o Buda diz.
Como poderemos saber?”

O Buda disse a Kashyapa: “Sete séculos após a minha entrada noi-Par


nirvana, esses Marapapiyas corromperão o meu Dharma Maravilhoso.
É como um caçador usando vestimenta sacerdotal. Os Marapapiyas
também agirão assim. Eles se apresentarão na forma de um Monge,
Monja, Leigo ou Leiga. Ou eles poderão mostrar-se como um Srota-
panna ou qualquer outro grau até o Arhat. Ou eles poderão mostrar-se
como um Buda vivo. O corpo criado de um rei Mara se apresentará
como um corpo não-criado, violando dessa forma o Dharma Maravi-
lhoso. Quando estiver violando o Dharma Maravilhoso, esse Marapapi-
yas dirá: ‘O Bodhisattva, certa ve
z, deixou o Céu Tushita e desceu à esta

terra, ao castelo
na. Através de Kapilavastu,
da união dos desejos ecarnais
viveu no palácio
do pai e dado (Rei)
mãe, eleSuddhoda-
ganhou o
nascimento e a espécie humana. Um homem, nascido em meio aos
humanos, nunca pode ser respeitado por todos os seres celestiais e
seres na terra.’ Ele também dirá: ‘No longínquo passado, ele foi subm
e-
tido à penitência, ofereceu sua cabeça, olhos, medula, estado, esposa e
filhos. Em razão disto, ele atingiu a Iluminação. Como resultado, ele
agora é respeitado por humanos e deuses, gandharvas, asuras, kimna-

Capítulo 9Sobre
– o Errado e o Certo Página 191
ras e mahoragas.’ Se quaisquer sutras ou vinayas disserem assim, saiba
que todos eles são nada mais do que aquilo que saiu da boca de Mara.
Oh bom homem! Os sutras e vinayas poderão dizer: ‘Já há um longo,
um longo tempo atrás desde que o Tathagata atingiu a Iluminação. Ele
agora atinge a Iluminação (recente), tudo para salvar os seres. Assim,
ele mostra-se como sendo nascido de uma união de desejos carnais do
pai e da mãe. Ele manifesta-se assim apenas para estar de acordo com
aquilo que se aplica ao mundo.’ Saiba que qualquer sutra ou vinaya
que fale assim é verdadeiramente do Tathagata. Qualquer pessoa que
siga o que Mara diz é o aparentado de Mara; uma pessoa que siga a
palavra do Buda é um Bodhisattva.

Qualquer pessoa que diga que é incompreensível que o Buda tenha


caminhado sete passos nas dez direções quando ele nasceu é alguém
que segue apenas o que Mara diz. Se uma pessoa diz que o Tathagata
caminhou sete passos nas dez direções quando ele nasceu, tudo isto
para manifestar-se expedientemente, essa pessoa repousa sobre [ba-
seia suas palavras] os sutras e vinayas que o Tathagata entregou. Qual-
quer pessoa que siga o que Mara diz é um aparentado de Mara. Qual-
quer um que siga o que o Buda disse é um Bodhisattva.

Ou uma pessoa poderia dizer que quando o Bodhisattva nasceu, seu


pai, o Rei, enviou homens aos santuários celestiais, ao que os deuses,
vendo-os, todos desceram e o adoraram. Por essa razão, ele é o Buda.
Então alguém cometerá calúnia e dirá: ‘Os deuses apareceram primeiro
e o Buda depois. Como poderiam os deuses adorar o Buda?’ Quaisquer
semelhantes coisas que sejam ditas, nada mais são do que palavras de
Marapapiyas. Se qualquer sutra diz que o Buda foi para onde os devas
estavam e que todos os deuses como Mahesvara, o Grande Brahma e
Sakrodevanamindra juntaram suas mãos e tocaram os pés do Buda
com suas cabeças e o reverenciaram; esse sutra ou vinaya é do Buda.
Qualquer pessoa que siga o que Mara diz é um aparentado de Mara.
Qualquer pessoa que siga o que o Buda disse é um Bodhisattva.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 192


Se qualquer sutra ou vinaya diz que o Bodhisattva, quando ainda um
príncipe da coroa, tinha esposas à sua volta em razão dos desejos car-
nais, viveu nas profundezas do palácio [isto é, no harém] e experimen-
tou plenamente os cinco desejos e divertiu-se, esse é um sutra ou vina-
ya de Marapapiyas. Qualquer sutra ou vinaya que diga: ‘O Bodhisattva
já há muito abandonou todos os desejos, esposa e filhos, e não recebe
[ou se apega a] os cinco desejos maravilhosos do Céu Trayastrimsa,
mas os abandonou como se fossem saliva e lágrimas. Como ele poderia
ter desejos humanos? Ele raspou a sua cabeça, tornou-se um sacerdo-
te, e praticou a Via.’ Esses são os sermões do Buda. Qualquer pessoa
que siga os sutras e vinayas de Mara é um aparentado de Mara; qual-
quer pessoa que siga os sutras e vinayas do Buda é um Bodhisattva.

Se uma pessoa diz que o Buda, em Sravasti, no Vihara (Monastério) de


Jetavana, permitiu a todos os Monges o que eles quisessem ter, como
serviçais homens ou mulheres, pajens, vacas, carneiros, elefantes, ca-
valos, asnos, mulas, galinhas, gatos, ouro, prata, berílio, pérolas, cris-
tais, musaragalva, ágata, coral, âmbar, casco de cavalo, jade, cobre, ou
chaleiras de ferro, bacias de cobre grandes ou pequenas; que a eles foi
permitido lavrar a terra, semear e plantar, vender ou permutar coisas;
que a eles foi permitido estocar arroz, que o Buda sentiu piedade dos
Monges e permitiu-lhes todas essas coisas em razão da sua compaixão
– todos esses sutras e vinayas são de Mara.

Ou alguém poderia dizer que o Buda permaneceu em Sravasti, no Mo-


nastério Jetavana, onde o demônio Nirdara viveu, e disse com relação a
um Brâmane chamado Kuteitoku e ao Rei Prasenajit: ‘Oh Monges!
Vocês não deveriam receber ouro, prata, berílio, cristais, pérolas, mu-
saragalva, ágata, coral, âmbar, cascos de cavalo, jade, empregados
homens ou mulheres, pajens, meninos, meninas, vacas, carneiros, ele-
fantes, cavalos, asnos, mulas, galinhas, porcos, gatos, cães, ou outros
animais; chaleiras de ferro ou cobre, bacias grandes ou pequenas, len-
çóis de várias cores, e camas; ou essas coisas necessárias para as ativi-
dades da vida [mundana] como: [construção de] casas, arar a terra,
semear, vender coisas no mercado local, fazer comidas com suas pró-
Capítulo 9Sobre
– o Errado e o Certo Página 193
prias mãos, polir ou forjar com suas próprias mãos, fazer encantamen-
tos para ganhar a vida, treinar falcões, observar as constelações, traba-
lhar com encantamento, adivinhar o crescente (a cheia) e o minguante
da lua, dizer a sorte de um homem ou mulher, dizer boas ou más coisas
sobre os sonhos das pessoas, adivinhar ou fazer premonição e dizer
que isto é um homem ou mulher, ou dizer que isto não é um macho ou
isto não é uma fêmea, falar sobre as 64 marcas de excelência [que se
diz existir nas casas dos tirthikas], ou dizer que existem 18 dharanis
através dos quais as pessoas podem ser desviadas; ou falar sobre qual-
quer das artes, quaisquer coisas mundanas, usar incenso em pó, curna
(pó de açafrão) [para espalhar sobre assentos, torres, etc.], incenso em
pasta [para dar cheiro agradável às mãos e ao corpo], incenso para
queimar, usar vários tipos de leis [jarros de bronze para vinho], [prati-
car] as artes de cabeleleiros, iludir trapaceando e lisonjeando, e dessa
forma visar avidamente o lucro, gostar de lugares estúpidos e baru-
lhentos, brincar e rir, [andar] e pregar. [Esses Monges] comem avida-
mente peixes, fazem poções venenosas, untam-se em óleos fragrantes.
Eles possuem sombrinhas de gemas e calçados de couro. Eles fazem
caixas, arcas, leques e vários tipos de pinturas e estátuas. Eles guardam
cereais e arroz, grandes e pequenas variedades de trigo e feijões, e
vários (tipos de) melões. Eles se aproximam [das consortes de] de reis,
príncipes, ministros e todos os tipos de mulheres, riem alto ou sentam-
se silenciosamente. Eles acalentam dúvidas com relação às coisas, fa-
lam muito e falam descuidadamente; gostam de vestir boas roupas,
que podem ser longas ou curtas, agradáveis ou não, boas ou más. Eles
próprios elogiam todas essas coisas na presença dos doadores. Eles
freqüentam e vagueiam por lugares sujos, lugares onde se encontram
tabernas, prostitutas e jogadores, e todos os lugares onde não permito
que Monges entrem. Eles devem abandonar a busca pela Via; devem
voltar para a vida mundanae serem postos para trabalhar.’ Por exe m-
plo, isto é como o joio no arrozal, que tem que ser erradicado, de tal
forma que não seja mais encontrado. Saiba que aquilo que é proibido
nos sutras e vinayas constituem as injunções do Tathagata. Qualquer
pessoa que siga as palavras de Mara é um aparentado de Mara; qual-
quer um que siga as palavras do Buda é um Bodhisattva.
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 194
Ou uma pessoa poderia dizer: ‘O Bodhisattva foi ao templo dos devas
para fazer oferecimentos a deidades como Brahma, Mahesvara, Skan-
da e Katyayana. Por quê? Ele entrou lá meramente para conquistar os
devas. As coisas nunca podem ser diferentes disto.’ Se for dito: ‘Mesmo
que o Bodhisattva argumente com os tirthikas, ele não pode saber dos
seus comportamentos, provérbios e artes, e ele não pode causar confli-
tos (divergências) entre empregados para chegar aos termos (dos seus
argumentos); ele não pode ser respeitado por machos ou fêmeas, reis
ou ministros; ele não sabe como preparar remédios; este é o porquê
de ser chamado ‘Tathagata’. Tudo qoue ele sabe é o que é perverso;
também, o Tathagata não vê nem inimigo e nem amigo; no seu pen-
samento tudo é igual; podemos pegar uma espada e cortá-lo; ou pode-
ríamos espalhar incenso sobre seu corpo, e ele não teria qualquer sen-
timento de ganho ou perda. Ele senta-se no meio. Esse é o porquê de
ser chamado ‘Tathagata’’. Qualquer sutra que diga isso é de Mara.

Ou uma pessoa poderia dizer: ‘O Bodhisattva comporta -se assim: ele


entra nas casas dos outros ensinamentos, ensina-lhes a abandonar a
vida doméstica e a praticar a Via, para virem a saber sobre comporta-
mento e maneiras; ele ensina-lhes a saber do que está escrito e como
as artes são realizadas, e como fomentar argumentos e disputas. Ele é
o mais elevado de todas as pessoas, meninos e meninas, pessoas do
harém real, as consortes reais, pessoas comuns, pessoas ricas, Brâma-
nes, reis, ministros, ou os pobres. Além disso, ele é respeitado por eles
e também conhece todas essas coisas. Ele pode envolver-se (deparar-
se) com as várias situações da vida, e ainda assim não alimentar qual-
quer sentimento de apego. Isto é como o lótus, que não se torna sujo
pelas impurezas. No sentido de salvar os seres, ele utiliza-se de vários
meios hábeis e vive uma vida mundana.’ Quaisquer sutras e vinayas
que falem assim são os sermões do Tathagata. Alguém que siga o que
Mara diz é um aparentado de Mara; qualquer um que siga o que o
Buda diz é um grande Bodhisattva.

Capítulo 9Sobre
– o Errado e o Certo Página 195
Ou uma pessoa poderia dizer: ‘O Tathagata expôs os sutras e vinayas
para mim. De todos os grandes pecados, aqueles [classificados como]
leves, pesados e sthulatyaya (ofensa grave) são todos graves. No nosso
vinaya não os cometemos, até o fim. Há tempos eu apresentei essa Lei,
mas vocês não a compreenderam. Como eu poderia abandonar meu
próprio vinaya e vir para o vosso vinaya? O vosso vinaya é nada mais do
que aquilo que Mara diz. O nosso é o que o Buda diz. O Tahagata já deu
os nove tipos de formulações do Dharma [isto é, os ensinamentos Hi-
nayana]. Essas nove formulações constituem nossos sutras e vinaya. Eu
nunca ouvi falar de uma sentença ou palavra dos sutras Vaipulya [isto
é, os sutras extensivos do Mahayana]. Onde, em todos os inumeráveis
sutras e vinayas, deparamos com o nome de sutra Vaipulya? Em ne-
nhum deles (sutras) temos ouvido falar alguma vez de dez tipos de
sutras. Se existirem tais coisas, seguramente devem ser trabalho de
Devadatta. Devadatta é uma pessoa má. Com o intuito de destruir os
bons ensinamentos, ele fez o Vaipulya. Não acreditamos em quaisquer
sutras destes. Isto é o que os sutras dizem. Por quê? Porque eles dizem
isto e aquilo que diz respeito à doutrina Budista. Todas essas coisas
(ditas por vocês) estão estabelecidas [somente] nos vossos sutras; os
nossos não contém essas coisas [ensinamentos]. Nos nossos sutras e
vinayas, o Tathagatadiz: ‘Após a minha entrada no Nirvana, na era da
maldade, poderão surgir sutras e vinayas distorcidos. Estes são os cha-
mados sutras Mahayana. Nas eras que virão, existirão esses Monges
maus.’ Eu, então, digo: ‘Há ainda os sutras Vaipulya além dos nove
tipos de sutras.’ Uma pessoa que aceita completamente a significação
diz que ela compreende bem os sutras e vinayas, aparta-se de tudo o
que é impuro e é tão delicada e pura que poderíamos compará-la à lua
cheia.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 196


O Profundo Significado de Salvar os Seres

Se uma pessoa diz: ‘O Tathagata concedeu explanações para cada sutra


e vinaya, tão numerosas quanto às areias do Rio Ganges, mas o nosso
vinaya não contém quaisquer delas. Não há nada sobre elas. Se exis-
tem [tais explanações], como é que o Tathagata não as expôs no meu
vinaya? Sendo assim, eu não posso acreditar nelas’. Se uma pessoa fala
assim, saiba que essa pessoa está cometendo um pecado. Uma pessoa
ainda pode dizer: ‘Esses sutras e vinayas [do Hynayana] eu defenderei
bem. Por quê? Porque eles são a razão da boa doutrina, do ser satisfei-
to, do pouco desejo, da eliminação das ilusões, e assim obtemos Sabe-
doria e Nirvana’. Qualquer pessoa que diga isso não é meu discípulo. Se
uma pessoa diz: ‘O Tathagata deu -nos os sutras (Mahayana) Vaipulya
com a finalidade de salvar os seres’, essa pessoa é meu verdadeiro
discípulo. Qualquer pessoa que não aceite os sutras Vaipulya não é
meu discípulo. Essa pessoa não é aquela que se tornou um sacerdote
em razão dos ensinamentos Budistas. Tal pessoa é mal-intencionada,
ímpia, e nada mais é que um discípulo de tirthikas. Esses sutras e vina-
yas (do Vaipulya), conforme mencionado acima, são aquilo que o Buda
concedeu. Se não fosse assim, eles nada mais seriam do que aquilo que
Mara diz. Qualquer pessoa que siga aquilo que Mara diz é um aparen-
tado de Mara; qualquer um que siga o que o Buda diz é um Bodhisatt-
va.

Além disso, oh bom homem! Se for dito: ‘Uma vez que o Tathagata não
é perfeito nas inumeráveis virtudes, ele é não eterno e deve mudar. Ele

reside
do’; talno Todo-Vazio
sutra ou vinayae éexpõe o não-Eu.
de Mara. Se umIsto nãodiz:
sutra é o‘Acaminho do Ilum
verdadeira mun-
i-
nação do Tathagata está para além do conhecimento e da compreen-
são. E também, ele é perfeito nos inumeráveis asamkhyas de virtudes.
Portanto, ele é Eterno e não pode haver mudança (é imutável)’, tal
sutra ou vinaya é o que o Buda disse. Qualquer pessoa que siga o que
Mara diz é um aparentado de Mara. Qualquer pessoa que siga o que o
Buda diz é um Bodhisattva.

Capítulo 9Sobre
– o Errado e o Certo Página 197
Ou uma pessoa poderá dizer: ‘Há um Monge no mundo que, não co-
metendo quaisquer das parajika [as mais graves ofensas], está preso ao
mundo por ter transgredido, como (por exemplo) cortar a árvore sala’.
Mas em verdade, esse Monge não transgrediu. Por que não? Eu sem-
pre digo: ‘O caso de algué
m que cometa quaisquer das parajikas é se-
melhante a partir uma pedra em dois: ela nunca mais se tornará uma’.

Se uma pessoa diz que obteve aquilo que supera o poder dos homens
[Pali: ‘uttarimanussadhamma’, um estado do Dharma que é superior
ao estado humano, estado superhumano que transcende as limitações
humanas], ela comete parajika (ofensa grave). Por quê? Porque ela de
fato não atingiu nada, e ainda finge tê-lo feito [ou seja, está dizendo
mentiras]. Essa pessoa retrograda do mundo dos humanos e da Dou-
trina. Isso é uma parajika.

Há um Monge que deseja pouco, sente-se satisfeito, observa os precei-


tos, é puro e senta-se num lugar quieto. O rei ou ministro vê esse Mon-
ge e diz que ele atingiu o Arhatship, vai até ele, o louva, o respeita e o
reverencia. Também, ele diz: ‘Esse grande Mestre atingirá a suprema
Iluminação, tendo assim abandonado a vida’. O Monge ouve isto e diz
ao rei: ‘Para dizer a verdade, eu ainda não atingi a fruição de uma-Shr
mana. Oh Rei! Por favor não me fale acerca do Dharma da não-
satisfação. Se aquiescermos quando dissermos que alcançamos a tão
distante quanto insuperável Iluminação, isto nada mais é do que o
desconhecimento da satisfação. Se eu aceitasse suas declarações e
concordasse, certamente eu compraria a repreensão de todos os Bu-
das. Sentir-se satisfeito é uma virtude louvada por todos os Budas. Este
é o porquê eu pretendo prazeirosamente praticar a Via até o final da
minha vida e atingir o estado no qual eu possa sentir-me satisfeito.
Também, sentir-me satisfeito é saber que atingi definitivamente a frui-
ção da Via. Você, Rei, diz que eu a atingi. Eu não aceito suas palavras.
Assim eu fico satisfeito’.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 198


Então o rei disse: ‘Oh grande Mestre! Você verdadeiramente atingiu o
Arhatship e não difere do Buda.’ Então o rei tornou do conhecimento
de todos, dentro e fora, daquelas do harém real e das esposas reais,
que essa pessoa tinha alcançado o Arhatship. Como resultado, todos
que ouviram isto sentiram respeito, fizeram oferecimentos e honra-
ram-no. Essa pessoa (o Rei) é pura em sua intenção. Dessa forma, ela
faz todos os outros obterem grandes benefícios e, verdadeiramente,
esse Monge não comete qualquer parajika. Por que não? Porque ele (o
Rei) foi antes dos outros, acalentou alegria no seu próprio pensamento,
elogiou e fez oferecimentos. Como poderia esse Monge ter cometido
um pecado? Se for dito que essa pessoa pecou, saiba que tal sutra é de
Mara.

Também, há um Monge que fala sobre a imensa profundeza dos sutras


secretos do Buda, dizendo que todos os seres possuem a Natureza-de-
Buda, que através dessa natureza eles eliminam [todos] os inumeráveis
bilhões de ilusões e assim atingem a Iluminação insuperável, exceto os
icchantika. Então, o rei ou ministro ouvem isto e dizem: ‘Oh Monge!
Você atingiu o Estado de Buda ou não? Você possui a Natureza-de-
Buda ou não?’ O Monge responde: ‘Devo possuir a Natureza -de-Buda
dentro de mim. Todavia, não posso ser claro quanto à questão de se
atingirei [a Iluminação] ou não’. O rei diz: ‘Oh Grande homem! Se você
não tornar-se um icchantika, não há dúvida de que você atingirá o Es-
tado de Buda’. O Monge diz: ‘Sim, deve ser verdadeiramente como
você, o Rei, diz’. Essa pessoa diz que ela deve seguramente possuir a
Natureza-de-Buda. E ainda, ela não comete parajika [dizendo isto].

Também, há um Monge que, por ocasião da sua ordenação, pensa


para si: ‘Seguramente atingirei a Iluminação insuperável’. Esse homem
ainda não pode atingir a Iluminação insuperável. Mas, ele ganha uma
incalculável, ilimitada felicidade, sendo difícil avaliá-la. Se alguém diz
que essa pessoa cometeu parajika, então não pode haver qualquer
pessoa que não tenha cometido parajika. Por que não? Porque certa
vez, 80 milhões de kalpas atrás, Eu já me apartei de todas as impurezas.
Eu tenho pouco desejo, sinto-me satisfeito, realizei-me na conduta,
Capítulo 9Sobre
– o Errado e o Certo Página 199
pratiquei o Dharma insuperável do Tathagata, e eu próprio certamente
sabia que eu possuía a Natureza-de-Buda. Portanto, Eu atingi a Ilumi-
nação insuperável e Eu posso ser chamado de ‘Buda’. Eu tenho uma
grande compaixão. Tal sutra ou vinaya é um sermão do Buda. Qualquer
pessoa que não aja de acordo [com tal sutra ou vinaya] é um aparenta-
do de Mara; alguém que aja em concordância é um grande Bodhisatt-
va.

Ou uma pessoa poderia dizer: ‘Não pode haver nada como as quatro
graves ofensas, as treze samghavasesas (são violações de regras de
conduta que podem causar a dissolução da Sangha), as duas aniyatans,
as 30 naihsargika-prayascittikas (lapsos por caducidade), 91 payattikas,
quatro formas de arrependimento, diferentes formas de aprendizado,
sete formas de adhikarana-samatha, e também não pode haver sthu-
latyayas, cinco pecados capitais e icchantikas. Caso um Monge viole
todas essas shilas (regras de conduta de comportamento ético) e caia
no inferno, todos os tirthikas nasceriam no céu. Por quê? Porque eles
não têm quaisquer preceitos para transgredir. Isto mostra que o Tatha-
gata pretende assustar as pessoas. Este é o motivo de ele instituir esses
preceitos. O Buda tem dito que quando os Monges desejam satisfazer
os seus desejos carnais, eles devem largar os seus trajes sacerdotais,
vestir uma roupa mundana e fazê-lo.

Uma pessoa também pode pensar que os desejos carnais e da luxúria


não são pecados, e que mesmo nos dias do Tathagata houve um Mon-
ge que satisfez seus desejos sensuais e ainda atingiu a correta ilumina-
ção; ou que houve alguém que, após a morte, renasceu no céu; que
todas essas coisas têm um precedente e que não é apenas o que eu
estou fazendo sozinho. Podemos cometer as quatro graves ofensas, os
cinco pecados capitais e todos os atos impuros, e mesmo assim pode-
mos [ainda] atingir a verdadeira e correta emancipação. O Tathagata
pode dizer que se cometermos atos de duskrta [ofensas menores, pu-
níveis pela confissão], cairemos no inferno e ficaremos lá por 8 milhões
de anos, que é o número de anos do sol e da lua do Céu Trayastrimsa.
Mas isto é o que o Tathagata diz para assustar as pessoas. Eles dizem
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 200
que não existe diferença entre o grave e o leve [pecado], o parajika
[pecado sério] e o duskrta [pecado venial]. Todos esses mestres do
vinaya dizem falsamente que todas essas [regras] foram instituídas
pelo Buda. Saiba definitivamente que elas não foram instituídas pelo
Buda’. Todos esses sutras e vinayas que falam assim são de Mara.

Ou uma pessoa poderia dizer que se transgredirmos mesmo o menor


ou mínimo de todos os preceitos, maus frutos serão colhidos e que não
há limite para o número de conseqüências cármicas. Percebendo isso,
deveríamos nos guardar em nós mesmos como a tartaruga, que es-
conde os seus seis membros em sua carapaça. Se existe qualquer pes-
soa versada no vinaya que diga: ‘Transgride
-se, mas nenhuma conse-
qüência cármica decorre (disto)’, nós não deveríamos nos aproximar de
tal pessoa, como já indicado pelo Buda:

‘Alguém extrapolou,
isto está dizendo mentiras [mrsavada].
Se não vemos após-a-vida,
não há pecado que não será cometido’.

Por esta razão, não deveríamos nos aproximar de tal pessoa. O que é
puro neste ensinamento Budista é assim. Poderia acontecer de alguém
que tivesse violado o sthulatyaya, o samghavasesa e o parajika; pudes-
se passar como não tendo pecado? Em razão disto, deveríamos nos
colocar em guarda e proteger esse Dharma. Se não o defendermos,
onde poderá haver qualquer proibição? Eu agora digo nos sutras: ‘Por
cometer qualquer uma das graves ofensas ou quaisquer das ofensas
menores (duskrtas), devemos sofrer dor para remediá-
las’. Se não nos
resguardarmos quanto [a transgressão] às proibições, que possibilida-
de poderá haver de vermos a Natureza-de-Buda?

Todos os seres possuem a Natureza-de-Buda. Apenas por observar os


preceitos podemos vê-la. Quando vemos a Natureza-de-Buda, atingi-
mos a Iluminação Insuperável. Nos nove tipos de sutras, não existe o
Sutra Vaipulya (Mahayana extensivo). Isso é porque eles (os nove tipos
Capítulo 9Sobre
– o Errado e o Certo Página 201
de sutra) não falam acerca da Natureza-de-Buda. Embora esses sutras
não se refiram a ela, seguramente existe o Vaipulya neles. Aquele que
fala assim é meu verdadeiro discípulo”.

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Nós


não vemos nos nove tipos de sutras quaisquer referências aos seres
possuindo a Natureza-de-Buda, que você diz que eles possuem. Se
dizemos que eles a possuem, não poderia ser que fôssemos culpados
de infringir o parajika?”.

O Buda disse: “Oh bom homem! Eles [os que assim dizem] não violam
o parajika. Por exemplo, oh bom homem! Se qualquer pessoa diz que
no grande oceano existem apenas as sete gemas, não oito, aquela
pessoa não pecou. Se uma pessoa diz que não há menção da Natureza-
de-Buda nos nove tipos de sutras, não pode haver qualquer cometi-
mento de pecado. Por que não? Eu digo que no oceano do Mahayana
da grande Sabedoria existe a Natureza-de-Buda. Como os dois veículos
não sabem ou vêem [isto], não se pode falar que tenham cometido
qualquer pecado, mesmo que eles digam que ela não existe. Isso é uma
coisa que somente o Buda sabe, e que Sravakas e Pratyekabudas não
podem saber. Oh bom homem! Não tendo nunca ouvido sobre a gran-
de profundeza do Dharma secreto do Tathagata, como poderia uma
pessoa esperar saber da existência da Natureza-de-Buda? O que é o
repositório secreto? Nada mais que os sutras Vaipulya. Oh bom ho-
mem! Pode haver tirthikas que falam sobre o eu eterno ou o ‘não-ser’
do eu. Este não é o caso com o Tathagata. Ele diz que existe o Eu,–ou
em outras ocasiões– que não existe. Esse é o Caminho Médio.

Uma pessoa poderia dizer: ‘O Buda fala sobre o Caminho Médio. Todos
os seres possuem a Natureza-de-Buda. Como a ilusão os ofusca, eles
não sabem ou vêem. Assim, um (meio) expediente é aplicado para
cortar as raízes da ilusão’. Uma pessoa que
fala assim não comete as
quatro graves ofensas. Isto nós deveríamos saber. Qualquer pessoa
que não fale assim infringe o parajika. Ou uma pessoa poderia dizer:
‘Eu já atingi a Iluminação Insuperável! Por quê? Porque eu possuo a
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 202
Natureza-de-Buda. Qualquer pessoa que possua a Natureza-de-Buda
seguramente atingiu a Iluminação Insuperável. Consequentemente, eu
atingi a Iluminação’. Então, deveríamos saber que essa pessoa infringe
o parajika. Por que é assim? Com toda a certeza existe a Natureza-de-
Buda. Mas ainda não tendo praticado o melhor expediente da Via, a
pessoa ainda não a viu. Não a tendo visto, ela não pode ter atingido a
Iluminação Insuperável. Oh bom homem! Com relação a isto, o ensi-
namento do Buda é profundo em seu significado e difícil de entender
”.

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Um


rei indaga: ‘Como um Monge adere ao Dharma Supramundano?”.

O Buda disse a Kashyapa: “Um Monge pode, por lucro ou comida,u-baj


lar, estabelecer coisas erradamente ou enganar, e dizer coisas tais co-
mo: ‘Como todo o mundo poderá acreditar que eu sou verdadeirame n-
te um Monge real, de tal forma que eu possa obter um grande ganho e
fama?’ Esse Monge, em razão da escuridão da sua mente, sempren-pe
sa e reza: ‘Na verdade, eu ainda não cheguei às quatro metas de um
Sravaka. Como posso estar apto a fazer o mundo pensar que eu as
alcancei? Como posso estar apto a fazer com que Leigos e Leigas pen-
sem sobre mim como sendo um sábio que realizou completamente
todas as verdadeiras virtudes?’. Assim ele nsa.
pe Tudo o que é feito
visa o lucro, e não a Via. Em suas idas e vindas, em suas saídas e chega-
das, avançando e descansando, ele parece pacífico. No seu modo de
vestir e de segurar a sua tigela, a conduta não é perdida. Sozinho, ele
senta num lugar solitário e parece um Arhat. Dessa forma as pessoas
pensam: ‘Esse é o maior dos Monges. Exercitando -se totalmente, ele
pratica a Via da extinção’. Ele pensa: ‘Como resultado disto, com e-cert
za ganharei discípulos. As pessoas certamente me oferecerão roupas,
comida, bebida, roupas de cama e remédios. Todas as mulheres me
respeitarão e amarão’. Qualquer pessoa que aja dessa maneira age
contra o Uttarimanussa-Dhamma [estado superhumano que transcen-
de as limitações humanas].

Capítulo 9Sobre
– o Errado e o Certo Página 203
Também, há um Monge que senta num lugar solitário desejando edifi-
car o insuperável Dharma Maravilhoso. Embora não seja um Arhat, sua
intenção é de que outros o chamem de Arhat, um Monge amável, um
bom Monge, um Monge quieto. Ele assim, efetivamente, faz com que
inumeráveis pessoas venham à fé. Por isso, eu permito que todos os
inumeráveis Monges amparem-lhe como um parente. Através disso,
eu posso ensinar e fazer com que os Monges quebradores dos precei-
tos, Leigos e Leigas defendam os preceitos. Em conseqüência, o Dhar-
ma Maravilhoso será estabelecido, o insuperável significado do grande
princípio do Tathagata resplandecerá e o ensinamento do Mahayana
Vaipulya será reverenciado, emancipando todos os inumeráveis seres,
tal que eles venham conhecer os significados leves ou pesados dos
sutras e vinayas que o Tathagata concedeu.

Também, uma pessoa poderia dizer: ‘Agora eu possuo a Natureza


-de-
Buda. Existe um sutra que é chamado o Repositório do Tathagata. Na-
quele sutra, certamente eu obterei o ensinamento Budista e cortarei
inumeráveis bilhões de amarras das ilusões. Eu falarei para inumeráveis
Leigos: ‘Todos vocês possuem a Natureza -de-Buda. Sentemos juntos,
eu e vocês, no Caminho do Tathagata e atingiremos a Iluminação Insu-
perável e acabaremos com todas as inumeráveis amarras das ilusões’.
Alguém assim não viola o uttarimanussa-dhamma; ele é um Bodhisatt-
va.

Alguém que cometa duskrta (ofensas menores) cairá no inferno por um


período de 8 milhões de anos dos dias do Céu Trayastrimsa, e terá de
submeter-se às punições pelos pecados que cometeu. Quanto pior será
quando ele transgride o sthulatyaya (ofensas graves)? Isto faz uma
pessoa dizer: ‘Caso haja qualquer Monge em meio àqueles do Mah a-
yana reunidos aqui, que tenha violado o sthulatyaya, esse (Monge) não
deve ser amparado’.

O que são sthulatyaya (ofensas graves) dos sutras Mahayana? Por e-


xemplo, um homem rico erige um templo Budista e adorna-o com
várias grinaldas, e oferece isso ao Buda. Existe um Monge que, ao ver a
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 204
corda que passa através da grinalda, toma-a sem pedir. Isso é sthulat-
yaya. Seja consciente ou não, ele viola dessa maneira. Se, com um pen-
samento cobiçoso, causamos danos a uma torre Budista, isto é sthulat-
yaya. Não se deve aproximar [ou associar-se] de uma pessoa que aja
dessa maneira. Ou um rei ou um ministro, vendo que a torre está velha
e danificada, e pretendendo repará-la, faz oferecimentos às relíquias e
encontra nelas uma gema rara, que ele deu a um Monge. Ao obter a
gema, o Monge usou-a como ele quis. Esse Monge é alguém que é
impuro e que muito provavelmente provocará discussões. Nenhum
bom Leigo deveria se aproximar desse Monge, lhe fazer oferecimentos
ou respeitar-lhe. Esse Monge é denominado ‘sem -definição’ (‘sem-
raízes’). Esse Monge é também denominado ‘duplamente -definido’
(‘duplamente enraizado’, ‘duas-faces’), ou alguém em quem a raiz é
indefinível. Por ‘indefinidamente
-enraizado’ é denotado o caso de uma
pessoa cujo corpo torna-se o de uma fêmea quando surge o desejo de
ser uma fêmea; e torna-se o de um macho quando surge o desejo de
ser macho. Qualquer Monge assim é‘mal-enraizado’. Ele não é nem
macho e nem fêmea, nem um Monge e nem um Leigo. Não devemos
nos aproximar desse Monge, nem fazer-lhe oferecimentos ou respei-
tar-lhe. Alguém que resida no ensinamento Budista e na lei de um
Monge deve ter um pensamento compassivo, benevolente, proteger e
cuidar dos seres. Mesmo à uma formiga, deve-se inspirar um pensa-
mento de destemor. Esta é uma lei do Shramana. Deve se afastar de
bebidas e fumo (incense). Esta é a lei do Shramana. Não deve dizer
mentiras, nem deve ter um pensamento mentiroso. Esta é a lei do
Shramana. Não deve permitir que surja um sentimento de cobiça [ou
desejo] em sua mente. O mesmo se aplica aos sonhos. Esta é a lei do
Shramana”.

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Se


um Monge se torna cativo da luxúria carnal num sonho, isto viola o
Dharma ou não?”

O Buda disse: “Não! Devemos evocar o pensamento de um mau cheiro


contra o desejo carnal. Se o pensamento não é puro, sempre levante
Capítulo 9Sobre
– o Errado e o Certo Página 205
sua cabeça, afaste o pensamento de preocupação e de amor por uma
mulher. Se nos tornamos cativos da luxúria carnal num sonho, deve-
mos nos arrepender pelo ato quando levantarmos. Deve-se residir no
pensamento de um Monge que, quando vai mendigar em sua ronda
por esmolas, recebe oferecimentos e [com a atitude de desgosto de
alguém que] come a carne do seu próprio filho nos dias de fome. Se o
desejo carnal o assedia, descarte rapidamente tal pensamento. Tudo
isso é o ensinamento dos sutras e vinaya do Buda. Alguém que siga o
que Mara diz é um aparentado de Mara; alguém que siga o que o Buda
diz é um Bodhisattva.

Ou uma pessoa poderia dizer: ‘Apoie-se em uma perna, permaneça em


silêncio, não diga nada e atire-se nas águas profundas ou no fogo, ou
salte de um alto precipício, não temendo a queda; tome veneno, jejue,
deite-se em cinzas, amarre suas pernas, mate os seres, e diga sortes
sobre os destinos e os caminhos que uma pessoa toma’. Ou umas-pe
soa poderia dizer: ‘O Tathagata permite candalas, pessoas sem
-raízes,
hermafroditas, indefiníveis e decrépitos tornarem-se ordenados e rea-
lizar a Via’.Essas são as palavras de Mara.

Ou uma pessoa poderia dizer: ‘O Buda já nos permitiu consumir os


cinco sabores do leite de uma vaca, óleo e mel, exceto roupas de seda
e sapatos de couro, etc.’.

Ou uma pessoa poderia dizer: ‘O Buda já nos permitiu a aplicação do


maharanga (é um gênero de plantas medicinais e aromáticas perten-
cente à família Boraginaceae), e também o armazenamento de todos
os tipos de sementes. Mas todas as gramas e árvores têm uma vida. O
Buda, tendo falado assim, entra no Nirvana’. Caso qualquer sutra e
vinaya diga assim, saiba que isso é o que Mara diz. Eu também não
permito sustentar-se sobre uma perna [à maneira do faquir]. Para o
Dharma, todas as posturas como caminhando, parando, sentando e
reclinando são permitidas. Também, alguém poderia dizer: ‘Tomee- v
neno, jejue, queime o corpo com fogo, amarre suas mãos e pés, mate
pessoas, adivinhe destinos e caminhos, faça sapatos de couro decora-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 206
dos com cascos brancos de cavalos e marfim; o Buda permitiu o arma-
zenamento de sementes. Gramas e plantas possuem vida. Ele permitiu
a aplicação do maharanga’. Se uma pessoa diz que o Honrado pelo
Mundo disse isto, essa pessoa é um aparentado dos tirthikas. Qualquer
pessoa como esta não é meu discípulo. Tenho permitido apenas os
cinco sabores (do leite) da vaca, óleo, mel, e também roupas de seda.
Eu disse que os quatro grandes elementos [terra, ar, fogo e água] não
possuem vida. Caso qualquer sutra ou vinaya diga assim, isso é o que o
Buda disse. Qualquer pessoa que aja em concordância com a palavra
do Buda é, deveríamos saber, um grande Bodhisattva. Oh bom ho-
mem! Para o vosso benefício, Eu agora falei extensivamente sobre as
diferenças entre o que Mara diz e o que o Buda diz”.

Kashyapa disse ao Buda:“Oh Honrado pelo Mundo! Eu agora vim a


conhecer a diferença entre a palavra de Mara e aquela do Buda. Em
conseqüência, estarei apto para sondar as profundezas dos ensina-
mentos Budistas”.
Então o Buda elogiou Kashyapa e disse: “Falaste bem, falaste bem,
oh
bom homem! Você agora obteve claramente o significado. Você é inte-
ligente e sábio”.

Capítulo 9Sobre
– o Errado e o Certo Página 207
Capítulo Dez: Sobre as Quatro Nobres Verdades

A Nobre Verdade do Sofrimento

O Buda também disse a Kashyapa: “Nobre Filho! Não é apropriado


designar
fôssemos odesignar
sofrimento como uma
sofrimento comoNobre Verdade.
‘a Nobre Pordoque
Verdade isso? Se
Sofrimento’,
então bovinos, ovelhas, asnos, cavalos e os habitantes do inferno tam-
bém teriam a Nobre Verdade [do Sofrimento]. Nobre Filho! Quem quer
que pense que o extremamente profundo [gambhira] domínio / esfera
/ reino [visaya] do Tathagata– o eterno, o imutável Dharmakaya [Cor-
po da Verdade]– é um corpo nutrido pela comida, essa pessoa não
conhece as virtudes e poderes que o Tathagata possui. Isto [ou seja, tal
ignorância da verdadeira natureza do Buda] é ‘sofrimento’. Por que é
assim? Devido à ignorância. Uma pessoa vê o Dharma como não-
Dharma, e o não-Dharma como Dharma. Saiba que essa pessoa cairá
nos reinos da infelicidade e reciclará entre nascimentos e mortes. Isso
aumentará os laços da ilusão e a preocupação crescerá. Se ele vem a
saber que o Tathagata é Eterno, aquele com o qual não ocorrem mu-
danças, ouse ele ouve a palavra ‘Eterno’, ele ganhará o nascimento no
céu. E alcançando a emancipação, ele verá no presente que o Tathaga-
ta é Eterno e Imutável. Quando isso for visto claramente, ele dirá: ‘Eu
ouvi sobre isso no passado. Agora que estou emancipado, eu sei isso.
Como eu era ignorante no que diz respeito ao Supremo (o Ultimado),
eu vinha reciclando entre nascimentos e mortes sem um fim. Hoje,
estou esclarecido no que diz respeito ao verdadeiro conhecimento’. Se
o conhecimento atinge esse estágio, essa pessoa é verdadeiramente
um praticante do sofrimento. A partir disto, há muito a lucrar. Deve-se
praticar bem isto, mas se desconhecermos que as coisas sejam assim,
nenhum ganho advirá. Isto é o que é chamado conhecimento do sofri-
mento. Esta é a Nobre Verdade do Sofrimento. Se não se pratica assim,
isso é sofrimento e não a Nobre Verdade do Sofrimento.

Capítulo 10–Sobre as Quatro Nobres Verdades Página 209


A Nobre Verdade da Causa do Sofrimento

Dizemos ‘Verdade da Causa do Sofrimento’. Uma pessoa não conhece


verdadeiramente o Dharma Maravilhoso e recebe o que é impuro. Esse
é o caso dos humildes. Não-Dharma é chamado Dharma-Maravilhoso.
Uma pessoa anula o que está correto e não quer acatá-lo para viver.
Por conta disso, aquela pessoa não conhecerá o ‘Dharmata’ [a Essência
da Realidade]. Não conhecendo isto, ela recicla entre o nascimento e a
morte, e sofre grandemente. Ela não obtém o nascimento no céu ou
ganha a correta emancipação. Se uma pessoa tem uma profunda Sa-
bedoria e não transgride o Dharma Maravilhoso, em conseqüência, ela
nascerá no céu e atingirá a correta emancipação. Se uma pessoa não
sabe de onde surge o sofrimento e diz que não pode haver nenhum
Dharma Maravilhoso ou aquilo que é Eterno, e que todos retornamos
para o nada (ou para a inexistência), aquela pessoa, em conseqüência,
repetirá as transmigrações através dos inumeráveis kalpas que virão,
sofrendo todos os tipos de tristezas. Se uma pessoa diz que o Dharma é
Eterno e que não há mudança, isso é conhecimento da causa, e essa é
a Nobre Verdade da Causa do Sofrimento. Se não se pratica assim, isso
é a causa do sofrimento e não a Nobre Verdade da Causa.

A Nobre Verdade da Extinção do Sofrimento

Dizemos ‘Verdade da Extinção do Sofrimento’. Se uma pessoa pratica


muitos ensinamentos e o caminho da inexistência, isto não é bom. Por
que é assim? Porque isso anula todas as leis e destrói o verdadeiro
Repositório do Tathagata. Qualquer prática dessa categoria é a prática
da inexistência. Alguém que pratique (verdadeiramente) a extinção do
sofrimento age contra o que todos os tirthikas fazem. Se a prática da
inexistência é a verdade da extinção, existem tirthikas que também
praticam o ensinamento da inexistência; então, devemos dizer que eles
também possuem a verdade da extinção. Uma pessoa diz: ‘Existe o
Tathagatagarbha [Buda-Útero– o pensamento prístino sob o manto da

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 210


ilusão]. Não se pode ver isso. Mas se acabamos com todas as ilusões,
poderemos de fatoentrar’. É assim. Através do surgimento desse n-pe
samento [isto é, cultivando essa atitude de pensamento], ganharemos
liberdade em todas as coisas. Se uma pessoa pratica a Via do repositó-
rio secreto, altruísmo e vacuidade, essa pessoa reciclará entre nasci-
mento e morte através das inumeráveis eras que virão e sofrerá de
tristeza. Uma pessoa que não faz tais práticas poderá certamente, em-
bora ela possa ter ilusões, logo acabar com elas. Por que é assim? Por-
que ela conhece bem o Repositório Secreto do Tathagata. Essa é a
Nobre Verdade da Extinção do Sofrimento. Qualquer pessoa que prati-
que a extinção dessa maneira é meu discípulo. Uma pessoa que não
pratica a Via assim é alguém que pratica a vacuidade. Isso não é a No-
bre Verdade da Extinção.

A Nobre Verdade da Via

Dizemos ‘Nobre Verdade da Via’. Isso nada mais é que os tesouros do


Buda, do Dharma, da Sangha e a correta emancipação. Todas as pesso-
as dizem com um pensamento de cabeça-para- baixo: ‘Não existe Buda,
Dharma, Sangha, ou emancipação correta. Nascimento e morte são
como fantasmas’. Eles mantêm essas visões. Como resultado, elesi-rec
clarão entre nascimento e morte através dos três mundos [do desejo,
da matéria e do espírito– Mundo Tríplice], sofrendo grandemente lá
por um longo tempo futuro. Se uma pessoa desperta e vem a enxergar
que o Tathagata é Eterno, que nenhuma mudança lhe acomete, e que

o
semesmo se aplica
pensamento ao Dharma,
a pessoa obteráà liberdade
Sangha e irrestrita
à emancipação;
atravésatravés des-
das inume-
ráveis eras que virão e poderá divertir-se como quiser. Por quê? Por-
que certa vez no passado, devido às quatro inversões, eu tomei o não-
Dharma como Dharma e sofri pelas inumeráveis conseqüências cármi-
cas. Quando eu acabei com essas visões, atingi o verdadeiro despertar
para o Estado de Buda. Essa é a Nobre Verdade da Via. Qualquer pes-
soa que diga que os Três Tesouros são não-eternos e mantenha essa

Capítulo 10–Sobre as Quatro Nobres Verdades Página 211


visão da vida, então isso é uma falsa via da prática e não é a Nobre
Verdade da Via. Se uma pessoa pratica a Via assim, tendo-a como Eter-
na, essa pessoa é meu discípulo. Ela reside na verdadeira visão da vida
e pratica o ensinamento das Quatro Nobres Verdades.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Agora, pela primeira vez, venho a conhecer e praticar as grandes pro-
fundezas das Quatro Nobres Verdades.”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 212


Capítulo Onze: Sobre as Quatro Inversões
O Buda disse a Kashyapa: “Falamos das ‘quatro inversões’. Fala-se ‘In-
versão’ quando nutrimos a idéia de sofrimento onde não há sofrime n-
to. ‘Não-sofrimento’ é o Tathagata. A idéia do sofrimento surge quando
uma pessoa pensa que todos os Tathagatas são não-Eternos e que eles
mudam. Se uma pessoa diz que o Tathagata muda, isso é [o conceito
do] sofrimento e constitui um grande pecado. Se uma pessoa diz que o
Tathagata abandona seu corpo de sofrimento e entra no Nirvana, e
que isso é como um combustível sendo queimado completamente, em
conseqüência do que o fogo se extingüe, isto é ter a idéia de sofrimen-
to vis-à-vis não-sofrimento. Isso é uma inversão [da verdade]. Uma
pessoa poderia dizer: ‘Dizer que o Tathagata é Eterno é uma visão u- A
to-centrada. Dessa visão Auto-centrada surgem inumeráveis pecados.
Assim, deveríamos dizer que o Tathagata é não-Eterno, e por assim
dizer ganharemos a Felicidade’. O ser não-Eterno do Tathagata acarre-
taria sofrimento. Se [há] sofrimento, como poderíamos esperar [en-
contrar] Felicidade nisso? Quando a idéia de Felicidade ocorre [nesse
contexto], dizemos ‘inversão’. Isso é dito porque a idéia de sofrimento
surge na [naquilo que verdadeiramente é] Felicidade. Felicidade é o
Tathagata. Sofrimento é o não-Eterno do Tathagata. Se uma pessoa diz
que o Tathagata é não-Eterno, isso é um pensamento de sofrimento na
Felicidade. O Ser Eterno do Tathagata é Felicidade. Se eu digo que o
Tathagata é Eterno, como eu posso entrar no Nirvana? Se eu digo que
o Tathagata é não-sofrimento, como eu poderia abandonar meu corpo
e entrar no Nirvana? Quando uma pessoa tem o pensamento de sofri-

mento na Felicidade, dizemos que isto é uma inversão. Esta é a primei-


ra inversão.

A idéia do Eterno vis-à-vis o não-Eterno, e a idéia do não-Eterno vis-à-


vis o Eterno, são inversões. O não-Eterno é a não-prática da Vacuidade.
Quando não se pratica a Vacuidade, a vida é abreviada. Se dissermos:
‘Não praticando a Vacuidade e a quietude, atingimos a vida eterna’,
isso é uma inversão. Esta é a segunda inversão.

Capítulo 11
Sobre
– as Quatro Inversões Página 213
O pensamento do Eu em relação ao não-Eu, e o pensamento do não-Eu
em relação ao Eu, são inversões. As pessoas do mundo dizem que exis-
te o Eu, e dentro do Budismo, também, dizemos que existe o Eu. As
pessoas do mundo dizem que existe o Eu, mas não existe a Natureza-
de-Buda. Isto é ter a idéia do Eu no [naquilo que é] não-Eu. Isso é uma
inversão. ‘O Eu do qual se fala no Budismo é a Natureza -de-Buda’. As
pessoas do mundo dizem que não há Eu no Budismo. Isto é uma idéia
do não-Eu no Eu. ‘Está definido que não existe o Eu no ensinamento
Budista. Este é o porquê o Tathagata diz aos seus discípulos para prati-
car o altruísmo’. Se tal coisa é dita, isso é uma inversão. Esta é a terce
i-
ra inversão.

O não-Puro no Puro, e o Puro no não-Puro são inversões. O Puro diz


respeito ao Eterno do Tathagata. Não é um corpo nutrido pela comida,
e nem um corpo de ilusão. Não é um corpo carnal, e nem um corpo
composto por nervos e ossos. Se dissermos que o Tathagata é não-
Eterno, e que um corpo nutrido pela comida, ligado por nervos e ossos,
o Dharma, a Sangha e a emancipação morrem, isto é uma inversão.
Dizemos que a idéia do não-Puro no Puro é uma inversão. Uma pessoa
poderia dizer: ‘Não existe sequer um pouco daquilo que é não-Puro em
seu pensamento, e que como não há uma simples coisa que não seja
Pura, ela fica num lugar que é Puro; e que como a pessoa pratica a
meditação do não-Puro que o Tathagata falou anteriormente, o que foi
dito acima (sobre Puro no não-Puro) deve ser falso’. Se uma pessoa fala
assim, isso é uma inversão. Esta é a quarta inversão.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda:“Oh Honrado pelo Mundo!


Obtive agora, pela primeira vez, a visão correta. Oh Honrado pelo
Mundo! Até agora, todos nós residíamos num pensamento errôneo.”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 214


Capítulo Doze: Sobre a Natureza do Tathagata

O Baú de Ouro Verdadeiro em Nosso Próprio Âmago.

Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Existe o Eu nas 25


existências ou não?”
O Buda disse: “Oh bom homem! ‘Eu’ significa ‘Tathagatagarbha’ [Buda-
Útero, Buda-Embrião, Buda-Natureza]. Todos os seres possuem a Na-
tureza-de-Buda. Isso é o Eu. Esse Eu tem sido, desde os primórdios,
encoberto por inúmeras impurezas. Esse é o porquê os humanos não
podem vê-lo. Oh bom homem! [Imagine que] exista uma mulher pobre
aqui. Ela tem ouro verdadeiro escondido em sua casa. Mas nenhuma
das pessoas em sua casa, sejam elas grandes ou pequenas, sabem dele.
Mas existe um estranho que, através de (meio) expediente, diz à mu-
lher pobre: ‘Eu a empregarei. Você deve agora ir e capinar a terra (re-
mover as ervas daninhas)!’. A mulher responde: ‘Não posso fazer isso
agora. Se você deixar meu filho ver onde o ouro está escondido, possi-
velmente trabalharei para você’. O homem diz: ‘Eu sei o caminho. Eu o
indicarei para o seu filho’. A mulher ainda disse: ‘Ninguém da minha
casa, seja grande ou pequeno, sabe [disto]. Como você pode (saber)’?
O homem diz: ‘Eu agora o esclarecerei’. A mulher diz ainda: ‘Eu desejo
ver. Rogo que me permita’. O homem desenterra ouro o que estava
escondido numa cova. A mulher o vê, fica satisfeita e passa a respeitar
aquela pessoa. Oh bom homem! O caso é o mesmo com a Natureza-
de-Buda que os humanos possuem. Ninguém pode vê-la. Isto é análo-
go ao ouro que a mulher pobre possuía e ainda não podia ver. Oh Bom
homem! Eu agora permitirei às pessoas verem a Natureza-de-Buda que
elas possuem, e que está encoberta pelas impurezas. Isto é análogo à
mulher pobre que não podia ver o ouro, muito embora ela o possuísse.
O Tathagata revela agora a todos os seres o Repositório da Iluminação,
que é a assim chamada Natureza-de-Buda. Se todos os seres verem
isso, ficarão satisfeitos e buscarão refúgio no Tathagata. O bom (meio)

Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 215
expediente é o Tathagata, a mulher pobre são todos os inumeráveis
seres, e o Baú de Ouro Verdadeiro é a Natureza-de-Buda.

Também, oh bom homem! Como um exemplo: uma mulher tem uma


criança que, enquanto ainda muito jovem, é acometida pelas doenças.
Preocupada com isso, a mulher procura um bom médico. O bom médi-
co vem e compõe (manipula) três remédios, os quais são manteiga,
leite e caramelo. Ele os entrega a ela para serem tomados pela criança.
Então ele diz à mulher: ‘Quando a criança tiver tomado o remédio, não
dê mais leite a ela por algum tempo. Quando o remédio tiver feito o
seu efeito, você pode então dar-lhe leite’. Então a mulher aplica uma
substância amarga em seus mamilos e diz à criança: ‘Não os toque.
Meus mamilos são venenosos’. A criança está ansiosa pelo leite e quer
tê-lo. [Mas] ao ouvir sobre o veneno, ela se afasta. Após o remédio ter
feito o seu trabalho, a mãe lava seus mamilos, chama a sua criança e os
dá. Embora faminta, a criança, tendo ouvido sobre o veneno, não virá a
eles. A mãe então diz: ‘Eu somente coloquei veneno em meus mamilos
com a finalidade de lhe dar o remédio. Como você já tomou o remédio,
eu limpei o veneno. Venha! Pegue o meu mamilo. Ele não está mais
amargo’. Ouvindo isto, a criança lentamente retorna e os toma. Oh
bom homem! O caso é o mesmo com o Tathagata. No sentido de salvar
os seres, ele lhes dá o ensinamento do não-Eu. Tendo praticado a Via
assim, os seres acabam com o rol de pensamentos que os prendem ao
eu e obtém o Nirvana. Tudo isso é para acabar com os conceitos errô-
neos das pessoas, para mostrar-lhes a Via e elevar-lhes, para mostrar-
lhes que eles aderem ao eu, que aquilo que se obtêm no mundo é tudo
falso e não verdadeiro, e para fazer-lhes praticar o não-Eu e purifica-
rem-se. Isso é semelhante à aplicação de uma substância amarga pela
mulher em seu mamilo por amor à sua criança. O mesmo se passa com
o Tathagata. Para que pratiquem a Vacuidade, digo que todos não
possuem o Eu. Isso é como a mulher limpando os seus mamilos e cha-
mando a sua criança para tomar o seu leite. O caso é o mesmo comigo
também: Eu falo do Tathagatagarbha. Por essa razão, os Monges não
sentem medo. É análogo à criança que ouve a sua mãe, lentamente

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 216


retorna e toma o leite. A situação é a mesma com os Monges. Eles
devem saber bem que o Tathagata nada esconde.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Realmente, não pode haver qualquer caso no qual exista o Eu. Por que
não? Quando uma criança nasce, ela nada sabe. Se existisse um Eu, a
criança deveria ter conhecimento quando ela nasce no mundo. A partir
disto podemos saber que não existe Eu. Se existisse um Eu definitiva-
mente, não poderia haver qualquer perda de conhecimento. Se fosse
verdade que todos os seres possuíssem eternamente a Natureza-de-
Buda, não poderia haver separação (dessa natureza). Se não há destru-
ição, como pode haver diferenças entre Kshatriya, Brâhmanes, Vaishya,
Sudra, Candala e animais? Ora, os efeitos do carma são diversos, e
existem diferenças na vida. Se existe Eu definitivamente, não pode
haver qualquer vitória ou derrota com os seres. Disto, podemos saber
definitivamente que a Natureza-de-Buda é o Dharma Eterno. Se a Na-
tureza-de-Buda é definitivamente eterna, porque falamos de coisas
como matar, roubar, luxúria, língua bifurcada, mal falar, mentir, lisonja,
ganância, ódio e visões distorcidas? Se realmente existe eternamente a
natureza do Eu, por que é que uma pessoa se torna intoxicada ou lou-
ca? Se a natureza do Eu é eterna, o cego deveria ser capaz de ver, o
surdo de ouvir, o mudo de falar e o coxo de andar. Se o Eu é eterno, o
fogo, as enchentes, os venenos, as espadas, as pessoas más e os ani-
mais não deveriam ser evitados. Se o Eu é eterno, aquilo que foi muda-
do basicamente não poderia ser esquecido ou perdido. Se esquecido,
como pode uma pessoa dizer: ‘Eu vi essa pessoa em algum lugarn-[a
tes]’? Se o Eu é eterno, ão
n poderia haver velho ou jovem, nem para
cima ou para baixo, nem lembrança daquilo que já passou. Se o Eu é
eterno, onde ele reside ou vive? É o caso em que lágrimas, saliva, azul,
amarelo, vermelho e branco devem remanescer em todas as coisas? Se
o Eu é eterno, ele preencherá o corpo como no caso das sementes de
sésamo, nas quais não há espaço entre elas. Quando o corpo é picado
em pequenos pedaços, o Eu, também, deveria ser picado.”

Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 217
A Parábola do Lutador

O Buda disse a Kashyapa: “Oh bom homem! Como uma analogia: exis-
te na prole de um rei um grande lutador. Ele tem uma pérola adaman-
tina na sua testa. Esse homem luta com outros lutadores. Quando [cer-
ta vez] a cabeça de outra pessoa tocou a sua testa, a pérola foi para
dentro da carne do lutador, e não se tinha conhecimento de onde ela
estava. Um furúnculo surgiu ali. Um bom médico foi chamado para
curá-lo. Naquela ocasião, existia um bom médico com uma mente bri-
lhante. Ele sabia muito bem como diagnosticar e prescrever remédios.
Ora, ele vê que esse furúnculo apareceu devido ao fato de a pérola ter
entrado no corpo do lutador. Ele compreende que essa pérola pene-
trou a carne e permanece lá. Então, o bom médico indaga o lutador:
‘Onde está aquela pérola que estava sobre suas sobrancelhas’? Oa-lut
dor fica surpreso e responde: ‘Oh grande mestre e doutor! A pérola na
minha testa não foi perdida? Onde a pérola poderia estar agora? Não é
um milagre [que você saiba sobre ela]’? Ele (o lutador) está preocup
a-
do e chora. Então, o doutor pacifica o lutador: ‘Não fiqu
e sobrecarre-
gado. Quando você lutou, a gema entrou no seu corpo. Ela agora está
sob sua pele e pode ser vista saliente. Conforme você lutou, o veneno
da raiva queimou tanto que a gema penetrou no seu corpo e você não
a sentiu’. Mas o lutador não compreende as palavras do doutor. ‘Se ela
está sob minha pele, como é que ela não sai devido ao sangue impuro
e o pus? Se ela está em meus nervos, não podemos de forma alguma
vê-la. Por que você tenta enganar-
me’? Então, o doutor pega um esp e-
lho e o segura em frente ao rosto do lutador. A gema aparece clara-

mente no espelho.
do. É como O lutador
aquilo. Oh a vê, ficando
bom homem! O casosurpreso e todo
é o mesmo commaravilha-
todos os
seres. Eles não se aproximam de um bom mestre da Via. Assim, eles
não podem ver a Natureza-de-Buda que está dentro deles, muito em-
bora eles a possuam. E eles são regidos pela avareza, a luxúria, a ira e a
ignorância. Dessa forma, eles caem nos domínios do inferno, da anima-
lidade, dos espíritos famintos, Ashuras, Candalas e vêm a nascer em
diversas casas como as de Kshatriya, Brâhmanes, Vaishya e Sudra. O

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 218


carma gerado pelo pensamento leva uma pessoa, embora nascida
como humana, a viver como aleijado, coxo, surdo, cego ou mudo, e (a
leva) às 25 existências, onde a avareza, a luxúria, a ira e a ignorância
reinam sobre o pensamento, e a pessoa torna-se incapaz de saber da
presença da Natureza-de-Buda.

O lutador disse que a gema tinha desaparecido, muito embora ela esti-
vesse no seu corpo. O mesmo também se passa com os seres. Não
tendo entrado em contato com um bom mestre da Via, eles não sabem
do tesouro escondido do Tathagata e não estudam o altruísmo. Por
exemplo, quando uma pessoa é dita ser de má índole, não se pode
conhecer a verdadeira qualidade do Eu. O mesmo é verdadeiro com
relação aos meus discípulos. Como eles não se aproximam de um bom
mestre da Via, eles praticam o não-Eu e não sabem onde ele (o Eu)
está. Eles não conhecem a verdadeira natureza do altruísmo. Como,
então, poderiam saber a verdadeira natureza do Eu em si? Assim, oh
bom homem, o Tathagata diz que todos os seres possuem a Natureza-
de-Buda. Isto é como o bom médico fazendo o lutador ver onde a jóia
adamantina repousava. Todos os seres são regidos por inumeráveis
impurezas e, dessa forma, não sabem o paradeiro da sua Natureza-de-
Buda. Quando a ilusão é dissipada, surge a sabedoria e o brilho. Isto é
como o caso do lutador vendo a gema no espelho. Oh bom homem! É
assim o caso em que aquilo que repousa escondido [latente] no Tatha-
gata é imensurável e é difícil para os seres pensarem a respeito.

O Remédio de um Único Sabor


Também, oh bom homem! Como um exemplo, existe um remédio nos
Himalayas chamado ‘paladar agradável’. Seu sabor é muito doce. Ele
cresce escondido sob o denso crescimento de plantas, e não podemos
vê-lo facilmente. Mas a partir do seu aroma, podemos saber o paradei-
ro desse remédio. Em tempos passados houve um Chakravartin que,
colocando tubos de madeira aqui e ali nos Himalayas, colheu esse re-

Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 219
médio. Quando ele amadureceu, ele vazou e entrou nos tubos. Seu
sabor era perfeito. Quando o rei (o Chakravartin) morreu, esse remédio
tornou-se azedo, salgado, doce, amargo, picante, ou suave. Assim,
aquilo que é único (no sabor), apresenta diferentes paladares de acor-
do com os diferentes lugares. O verdadeiro sabor do remédio perma-
nece nas montanhas; é como a lua cheia. Qualquer mortal comum,
estéril em virtudes, pode trabalhar duro, cavar e tentar, mas não pode
obtê-lo. Somente um Chakravartin, elevado nas virtudes, ao aparecer
no mundo pode chegar ao verdadeiro valor desse remédio devido a
uma feliz concatenação circunstancial. O mesmo é o caso [aqui]. Oh
bom homem! O sabor do Repositório Secreto do Tathagata é também
como isto. Encobertos pelo vicejar das impurezas, vestidos na ignorân-
cia, os seres não podem esperar vê-lo (ou senti-lo). Falamos de um
‘Único Sabor’. Isso se aplica, por exemplo, à Natureza-de-Buda. Em
razão da presença de impurezas, vários sabores aparecem, tais como
os do inferno, da animalidade, dos espíritos famintos, dos devas, dos
seres humanos, homens, mulheres, não-homens, não-mulheres, Ksha-
triya, Brâmanes, Vaishya e Sudra.

A Natureza-de-Buda é forte e vigorosa. Ela é difícil de destruir. Portan-


to, não há nada que possa matá-la. Se houvesse algo que pudesse re-
almente matá-la, a Natureza-de-Buda morreria. [Mas] nada pode de
fato destruir essa Natureza-de-Buda. Nada dessa natureza jamais po-
derá ser cortado. ‘A natureza do Eu nada mais é que o Repositório e- S
creto do Tathagata’. Esse repositório nunca poderá ser esmagado,
atirado ao fogo ou extinto. Embora não seja possível destruir ou vê-lo,
podemos conhecê-lo quando atingimos a Iluminação Insuperável. As-
sim, nada existe de fato que possa matá-
lo.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Se nada pode matá


-lo, ne-
nhuma conseqüência carmic
a decorreria das más ações.”

O Buda disse a Kashyapa: “Verdadeiramente existe [algo como] morte.


Como? Oh bom homem! ‘A Natureza -de-Buda dos seres repousa den-
tro dos cinco skandhas’. Se os cinco skandhas são destruídos, isto é a
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 220
morte [daqueles skandhas]. Se ferimos uma coisa viva, ganhamos o
domínio dos infortúnios. Através do trabalho do carma, transmigramos
através desses domínios como Kshatriya, Brâhmane, Vaishya, Sudra,
Candala, ou homen, mulher, não-homem, não-mulher e as 25 diversas
existências. Uma pessoa que não encontrou o estágio de santidade de
um sábio está obstinadamente presa pelo apego ao eu. Todas essas
fases da existência, sejam grandes ou pequenas, são como celeiros de
capim, arroz ou feijão, ou como o polegar. Assim é que eles [isto é, os
seres ignorantes] vagamente imaginam as coisas. Não pode haver for-
ma verdadeira nas fantasias selvagens. A forma do Eu que busca esca-
par do mundo é a Natureza-de-Buda. Essa é a melhor maneira de con-
ceber o Eu.

Além disso, oh bom homem! Como uma analogia: há um homem aqui


que conhece bem o que está oculto [sob o chão]. Ele pega um enxa-
dão, cava o chão e bate em coisas como pedras e cascalhos. Ele vai
atravessando tudo e nada o detém. Somente quando o diamante apa-
rece no seu caminho, o enxadão não pode atravessá-lo. Ora, nenhuma
espada ou machado pode destruir um diamante. Oh bom homem! A
Natureza-de-Buda dos seres é como isto. É algo que todas aquelas
pessoas que discutem as coisas, Marapapiyas, todos os humanos e
devas não podem destruir. O que caracteriza os cinco skandhas é (tra-
tar-se de) aquilo que ocorre e aquilo que é feito (ou seja, o aspecto
fenomenológico). Tudo aquilo que ocorre e que é feito pode certamen-
te ser destruído, como as pedras e a areia. ‘O verdadeiro Eu da Natur
e-
za-de-Buda é comoo diamente, que não pode ser esmagado’. Dessa
forma, chamamos a destruição dos cinco skandhas de morte da vida.
Oh bom homem! Saiba que definitivamente o ensinamento Budista
não está dentro dos limites da compreensão.

Oh bom homem! Os Sutras Vaipulya são como amrta [ambrósia, néc-


tar] e veneno.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Por que, oh Tathagata, você


diz que os Sutras Vaipulya são [ambos] amrta e veneno?”
Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 221
O Buda disse: “Oh bom homem! Você deseja ser informado acerca do
Repositório Secretodo Tathagata?”

Kashyapa disse ao Buda: “Eu agora realmente tenho desejo de apre


n-
der o significado do Repositório Secreto
do Tathagata.”

O Tathagata disse em versos:

“Existe uma pessoa que toma amrta, fere a vida e morre cedo,
ou uma outra que toma amrta e ganha longa vida,
ou alguém que toma veneno e ganha vida,
ou um outro que toma veneno e morre.
A Sabedoria sem obstruções, que é a amrta,
não é outra senão os sutras Mahayana.
e esses sutras Mahayana são os que também contêm veneno.

É como manteiga, sarpirmanda ou caramelo,


que quando tomados e digeridos, agem como remédios.
Se não digeridos, então nada mais são que venenos.
É o mesmo com os Sutras Vaipulya.
O sábio faz deles amrta,
e o ignorante,
não conhecendo o valor da Natureza-de-Buda,
faz deles veneno.
Sravakas e Pratyekabudas fazem do Mahayana amrta.
Isso é como o leite, que é superior em sabor.
Aqueles que trabalham assim e progridem
viajam no Mahayana, alcançam a margem do Nirvana
e se tornam elefantes reis entre os homens.
Seres como Kashyapa sabem da Natureza-de-Buda.
Este soberbo amrta é não-nascimento e não-extinção.

Oh Kashyapa!

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 222


Agora você vai analisar os Três Refúgios:
assim como é o intrínseco ser [svabhava] dos Três Refúgios,
tão certamente assim é o meu intrínseco ser [svabhava].
Se uma pessoa está verdadeiramente apta a discernir
que seu intrínseco ser possui a Buda-Dhatu [Natureza-de-Buda],
então você deveria saber que essa pessoa
entrará na Matriz Secreta [=Tathagatagarbha].

Aquela pessoa que conhece o Eu [atman]


e que faz parte do Eu [atmiya]
já transcendeu o mundo mundano.
A natureza das Três Jóias, o Buda, o Dharma [e a Sangha]
é suprema e mais digna de respeito;
como no verso que eu proferi,
o significado da sua natureza é assim.”

Então Kashyapa disse em versos:


“Não seicomo tomar refúgio nos Três Tesouros,
como tomar refúgio no destemor insuperável.
Não conhecendo o lugar dos Três Tesouros,
como pode alguém ganhar destemor?
Como pode alguém que toma refúgio no Buda ganhar a paz,
como pode alguém tomar refúgio no Dharma?
Condescenda a falar-me sobre isto!
Como alguém ganha o desimpedimento e não-desimpedimento?
Como alguém toma refúgio na Sangha e, dessa forma,
atinge o benefício insuperável?

Como ganhar sermões verdadeiros,


como (atingir) o Estado de Buda nos dias que virão?
Se alguém não atingi-lo nos dias a vir,
Como alguém poderá tomar refúgio nos Três Tesouros?

Não tenho nada a prever;


Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 223
trabalharei meu caminho passo a passo.

Sem concepção, pode uma pessoa pensar em ter um filho?


Se ele está definitivamente no embrião,
podemos de fato dizer que temos um filho.
Se a criança está no útero, tão logo ela emergirá.
Este é o significado vis-à-vis de uma criança.
A mesma pertence ao carma do homem.

O ignorante não pode entender o que o Buda diz.


Por ignorância, a roda do nascimento e da morte gira.
Aquele que é um Monge somente no nome
não pode compreender o verdadeiro significado.
Condescenda a explicar para mim
e erradique a malha de dúvidas.
Oh, grande Sabedoria do Tathagata!
Tenha piedade e explique!
Eu rogo, abra a porta fechada
da casa do tesouro do Tathagata.”

“Oh Kashyapa!

Para o seu benefício,


abrirei agora a porta fechada do repositório e erradicarei sua dúvida.
Ouça o que eu digo com todo o seu coração!
Você, e todos vocês Bodhiattvas,
e o sétimo Buda [isto é, o Buda Kashyapa]
possuem o mesmo nome.
Alguém que se refugia noBuda
é um verdadeiro Monge.
Ele já não se refugia em todos os outros deuses.
Alguém que se refugia noDharma
evita a si próprio de prejudicar os outros.
Alguém que se refugia naSangha sagrada
não se refugia nos tirthikas.
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 224
Ao se refugiar nosTrês Tesouros,
atinge-se o destemor.”

Kashyapa disse ao Buda:

“Eu me refugio nos Três Tesouros.


Esse é o caminho correto, e isso é o mundo de todos os Budas.
O fato de que os dois Tesouros (o Buda e o Dharma) são iguais
possui sempre a natureza da grande Sabedoria.
A natureza do EU e a Natureza-de-Buda não diferem.
Esse é o caminho louvado pelo Buda;
esse (caminho) é por onde certamente o homem avançará
e por onde residirá na paz.
Isso é verdadeira Iluminação.
Isso é Estado de Buda.
Eu também sou um ‘Sugata’ [=Buda],
e estou no caminho para a Iluminação insuperável louvada por todos.
Esse é o melhor amrta.
Esse é (o lugar) onde não há existência de nome.”

O Sabor Único dos Três Tesouros

Então, o Buda disse a Kashyapa: “Oh bom homem! Não veja os Três
Tesouros como todos os Sravakas e os mortais comuns fazem. Neste
Mahayana, não existe distinção entre os Três Tesouros. Por que não? A

Natureza-de-Buda contém comuns,


ensinar Sravakas e mortais dentro dela o Dharma
recorre-se e a Sangha.
à discriminação e osPara
três
diferentes aspectos são falados a respeito dos Três Tesouros. Seguindo
o caminho (a maneira) do mundo, é pregada a distinção com relação
aos Três Tesouros. Oh bom homem! O Bodhisattva pensa rá: ‘Este ‘Eu’
agora se refugia no Buda. Se este ‘Eu’ atinge a Iluminação e o Estado de
Buda, não respeitarei, reverenciarei ou farei oferecimentos a todos os
Budas. Por que não? Porque todos os Budas são iguais. Eles são toma-

Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 225
dos como refúgio por todos os seres. Se alguém deseja prestar respeito
ao Corpo-do-Dharma e às Shariras [relíquias], deveria também prestar
respeito às torres de todos os Budas. Por quê? Para conduzir todos os
seres. Isto também fará com que os seres concebam um pensamento
da torre em mim, para torná-los reverentes e fazerem oferecimentos.
Esses seres farão do meu Corpo-de-Dharma o lugar onde eles se refu-
giarão. Todos os seres estão enraizados naquilo que não é verdadeiro e
naquilo que é falso. Eu agora revelarei, passo a passo, o verdadeiro
Dharma. Se existem pessoas que se refugiam nos Monges que não são
do calibre certo, eu me tornarei o verdadeiro refúgio para elas. Se exis-
tem aqueles que vêem os Três Refúgios como distintos, eu me tornarei
um lugar único onde eles possam se refugiar. Sendo assim, não pode
haver qualquer distinção entre os Três Refúgios. Para alguém nascido
cego, eu serei os seus olhos, e para os Sravakas e Pratyekabudas eu me
tornarei o verdadeiro refúgio’. Oh bom homem! Tais Bodhisattvas
promulgam os trabalhos do Buda para o benefício de inumeráveis se-
res (agentes) do mal e (também) para todas as pessoas sábias. Oh bom
homem! Existe, como um exemplo, uma pessoa aqui que vai para o
campo de batalha e pensa: ‘Eu sou o primeiro de todos eles. Todos os
soldados dependemde mim’. Também, é como o príncipe que pensa:
‘Eu conquistarei todos os outros príncipes, executarei os trabalhos de
um grande imperador, obterei um poder ilimitado e farei todos os ou-
tros príncipes prestarem homenagem a mim. Portanto, não me permi-
to distrair com um único pensamento de auto-
rendição’.

Tal como acontece com o príncipe do reino, assim também é com o


ministro. Oh bom homem! O caso é o mesmo com o Bodhisattva-
Mahasattva, e ele pensa: ‘Como os três se tornam um comigo’? Oh
bom homem! Eu faço [em meus ensinamentos] com que as três coisas
sejam Nirvana. O Tathagata é o insuperável. Por exemplo, a cabeça é a
parte mais elevada do corpo de um homem, não os outros membros
ou as mãos e pernas. O mesmo é o caso com o Buda. Ele é o mais res-
peitado, não o Dharma ou a Sangha. Com o propósito de ensinar o
mundo, ele manifesta-se diversamente. É como subir uma escada. Esse
sendo o caso, não considere os Três Refúgios como diferentes, como o
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 226
fazem os mortais comuns e os ignorantes. Resida no Mahayana tão
brava e decisivamente quanto uma espada afiada.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Eu indago acerca daquilo que


eu sei, e não daquilo que eu não sei. Eu indago acerca das ações puras
imaculadas para o benefício dos Bodhisattvas altamente corajosos, de
forma que o Tathagata proclame, para o benefício dos Bodhisattvas, o
que é maravilhoso, exponha-o e, assim, [os Bodhisattvas] elogiarão os
Sutras Mahayana Vaipulya. O Tathaghata, que é o Grande Compassivo,
agora fala. Eu também residirei nele pacificamente. As ações puras do
Bodhisattva estão bem proclamadas no Sutra do Grande Nirvana. Oh
Honrado pelo Mundo! Para o benefício de todos os seres, eu agora
disseminarei o Repositório Secreto do Tathagata. Também, eu agora
atesto, e conheço bem, os Três Refúgios. Se qualquer ser acreditar
fortemente no ensino do Sutra do Grande Nirvana, esse ser, natural e
claramente, atingirá os Três Refúgios. Por quê? Porque o Repositório
Secreto do Tathagata possui a Natureza-de-Buda. Qualquer pessoa que
dissemine esse sutra afirmará que possuímos a Natureza-de-Buda den-
tro do nosso própriocorpo. Tal pessoa não buscará refúgiofora, nos
Três [Tesouros]. Por que não? Porque em vida consumamos os Três
Tesouros. Em razão disto, Sravakas, Pratyekabudas e todos os outros
virão, reverenciarão e prestarão homenagem a mim.”

(O Buda disse: ) “Oh bom homem! Em razão disto, aprenda os Sutras


Mahayana.”

O Bodhisattva Kashyapa ainda disse: “Portanto, a Natureza


-de-Buda
não pode ser conhecida. As 32 marcas distintivas da perfeição e as 80
marcas menores de excelência também são místicas.”

O Dilema da Dualidade e Caminho do Meio

Então o Buda elogiou o Bodhisattva Kashyapa: “Bem falado, bema-fal


do, oh bom homem! Você alcançou a mais profunda e aguda das Sa-

Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 227
bedorias. Agora falarei sobre como se entra no Tathagatagarbha. Se o
Eu vive, isso é o ensinamento do ‘ser’. Ele não se aparta do sofrimento.
Se o Eu não existe, não poderá haver benefício, mesmo se praticarmos
ações puras. Se dizemos que todas as coisas não possuem um Eu, isso
nada mais é que a teoria do ‘não -ser’ [‘ucchedika-drsti’, ou seja, a visão
do mundo de total negação de qualquer existência, que é a teoria do
todo-vazio]. Se dizemos que o Eu existe, isso é a teoria do ‘ser -eterno’
[‘sasvata-drsti’ – uma visão errônea da vida que considera a existência
como algo concreto e imutável]. Se dizemos que todas as coisas são
não-eternas, isso é a visão do ‘não -ser’. Se dizemos que todas as coisas
existem, isso é a visão do ‘ser-eterno’. Se dizemos que tudo é sofrime n-
to, isso é o ‘não-ser’. Se dizemos que todas as coisas são felicidade, isso
é o ‘ser eterno’. Se uma pessoa pratica a Via do ‘ser -eterno’ de todas as
coisas, essa pessoa cai na heresia do ‘não -ser’. Uma pessoa que pratica
a Via de acordo com a qual todas as coisas tornam-se extintas cai no
‘ser-eterno’. Isso é como a medida de um verme, que carrega suas
patas traseiras adiante por ação das suas patas dianteiras.
O mesmo se passa com a pessoa que pratica o ‘ser -eterno’ e o ‘não-
ser’. O ‘não-ser’ se apóia [depende do, está baseado] no ‘ser
-eterno’.
Em razão disto, aqueles dos outros ensinamentos que praticam o so-
frimento (prática de austeridades) são chamados ‘não -bons’. Aqueles
dos outros ensinamentos que praticam a felicidade são chamados
‘bons’. Aqueles dos outros ensinamentos que praticam o ‘não -Eu’ são
aqueles da ilusão. Aqueles dos outros ensinamentos que praticam o
‘ser-eterno’ dizem que o Tathagata guarda (esconde) secretamente
[verdades]. O assim chamado Nirvana não tem qualquer gruta ou casa
para viver nela. Aqueles os
d outros ensinamentos que praticam o ‘não -
ser’ referem-se à propriedade; aqueles dos outros ensinamentos que
praticam o ‘ser-eterno’ referem-se ao Buda, Dharma, Sangha e correta
emancipação (ou seja, fazem distinção). Saiba que o Caminho do Meio
do Buda nega os dois planos e fala do Dharma Verdadeiro. Mesmo os
mortais comuns e os desluzidos (ignorantes) residem nele e não têm
dúvidas. É como quando os fracos e os doentes tomam manteiga, e
como resultado disto eles sentem leveza no espírito.
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 228
A Naturezadual do ‘ser’ e ‘não-ser’ é indefinida. Por exemplo, as nat
u-
rezas dos quatro elementos [terra, água, fogo e vento] não são as
mesmas. Uma difere da outra. Um bom médico vê bem que cada uma
se coloca em oposição à outra. Ele o vê mesmo através deuma fase
unilateral (parcial) daquilo que acontece. Oh bom homem! O mesmo
se passa com o Tathagata. Ele age como um bom médico em relação a
todos os seres. Ele conhece a diferença entre a natureza interna e ex-
terna da ilusão, erradica-a, revela o fato que o Repositório Secreto do
Tathagata é puro, que a Natureza-de-Buda é Eterna e imutável. Se uma
pessoa diz ‘é’, ela deve estar atenta para que a sua Sabedoria não fique
manchada; se uma pessoa diz ‘não -é’, isto não passa de uma falsidade.
Se dizemos ‘é’, não podemoscair em contradição. Também, não se
deve jogar com as palavras e disputar; somente buscar conhecer a
verdadeira natureza de todas as coisas. Os mortais comuns jogam com
as palavras e disputam, traindo a sua própria ignorância quanto ao
Repositório Secreto do Tathagata. Quando vem a questão do sofrimen-
to, o ignorante diz que o corpo é não-eterno e tudo é sofrimento. Além
disso, eles não sabem que existe também a natureza da Felicidade no
corpo. Se é feita alusão ao Eterno, os mortais comuns dizem que todos
os corpos são não-eternos, e são como tijolos crus. Aquele com Sabe-
doria discrimina as coisas e não diz que tudo é não-eterno. Por que
não? Porque os humanos possuem a semente da Natureza-de-Buda.
Quando o não-Eu é mencionado, os mortais comuns dizem que não
pode haver Eu no ensinamento Budista. Aquele que é sábio deve saber
que não-Eu é uma existência temporária (um aspecto da dualidade) e
não é verdade. Sabendo isso, não se deve ter qualquer dúvida. Quando
o oculto Tathagatagarbha é estabelecido como sendo vazio e aquieta-
do, os mortais comuns pensarão em cessação e extinção. Aquele que é
sábio sabe que o Tathagata é Eterno e Imutável.”

Se a emancipação é estabelecida como sendo algo como um fantasma,


os mortais comuns dizem que a pessoa que atinge a Emancipação é
alguém que se desgastou até a insignificância; uma pessoa com Sabe-

Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 229
doria pensa que ele é um homem-leão e que, embora ele venha e vá,
ele é Eterno e imutável.

Se é estabelecido que a ignorância reside em todas as coisas, os mor-


tais comuns ouvem isto e pensam em duas existências diferentes, a
‘brilhante’ e a ‘não-brilhante’. O homem sábio vê que a natureza é não
-
dual e que a natureza do não-dual é a natureza real.

Se é estabelecido que as coisas estão na consciência, os mortais co-


muns dizem que são ‘duas’, quais sejam ‘samskara’ [volição, impulso
mental] e ‘vijnana’ [consciência]. Mas o sábio sabe que a sua natureza
é não-dual e que a natureza do não- dual é o ‘svabhavika’[‘natureza
-
própria’, ‘auto-natureza’].

Se falamos das ‘dez boas ações’ ‘dez


e más ações’, sobre o que pode
ser feito e o que não pode ser feito, dos bons reinos e dos maus reinos,
sobre o ensino branco [sukladharma = saddharma = Dharma Maravi-
lhoso] e o ensino negro [krsnadharma =Pali kanhadhamma], os mortais
comuns concebem duas coisas. Mas o sábio sabe que a natureza é não-
dual e que a natureza do não-dual é a natureza real.

Quando é estabelecido que todas as coisas terminam em sofrimento,


os mortais comuns dizem dois. Mas o sábio sabe que a natureza é não-
dual e que a natureza do não-dual é a natureza real. Se estabelecemos
que todas as coisas criadas são não-eternas e que o Repositório Secre-
to do Tathagata, também, é não-eterno, os mortais comuns dizem
dois. Mas o sábio sabe que a natureza é não-dual e que o não-dual é a
natureza real.

Se todas as coisas não possuem o Eu e o Repositório Secreto do Tatha-


gata não possui o Eu, os mortais comuns dizem que a natureza é dual.
Mas o sábio sabe que ela é não-dual e que o não-dual é a natureza real.
Não podem existir as duas coisas do Eu e do não-Eu. É a isto que o Re-
positório Secreto do Tathagata se refere. Isto é o que é elogiado por
incontáveis, inumeráveis, o ilimitado número de todos os Budas. Agora,
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 230
neste sutra todo-perfeito, explicarei tudo. Existe o não-dual na nature-
za e caractrísticas do Eu e do não-Eu. Você deveria entender as coisas
assim. Oh bom homem! Você deveria abraçar fortemente e pensar
sobre esses sutras. Eu já estabeleci no ‘Sutra Mahaprajnaparamita’ que
não existem as duas fases [aspectos, fenômeno] do Eu e não-Eu.

O caso é assim. Do leite fresco obtemos a nata, da nata fresca a man-


teiga, da manteiga fresca a manteiga refinada, e da manteiga refinada
o sarpirmanda. A natureza da nata vem do leite em si, ou vem de fora?
E o mesmo é o caso com o sarpirmanda. Se ele vem de fora, ele seria
algo criado por um outro e não algo que venha do leite em si. Se ele
não vem do leite, o leite nada tem a ver com a sua existência. Se ele
vem do leite em si (deriva-se do leite), ele não poderia vir de uma ma-
neira semelhante e continuamente (como no caso do leite). Se ele
viesse continuamente, ele não poderia vir junto (do leite). Se ele não
vem junto, não podemos ter os cinco sabores de uma só vez, (ao mes-
mo tempo). Embora não ao mesmo tempo, definitivamente ele não
poderia vir de outros lugares.

Saiba que no leite já existe a fase [elemento, aspecto] da nata. Como


ele possui muita doçura, ele não pode mudar. O mesmo se passa com
o sarpirmanda. Quando a vaca pasta nas gramas de lugares banhados
(aquosos), seu sangue se transforma e obtemos o leite. Se a vaca pasta
em gramas doces, o leite torna-se doce, e se o faz em gramas amargas,
o leite torna-se amargo. Nos Himalayas existe um tipo de grama cha-
mada pinodhni. Se a vaca pastar naquela grama, ela produzirá sarpir-
manda puro e não haverá essas cores como azul, amarelo, vermelho,
branco ou preto. As gramas e os cereais afetam a cor e o sabor do leite.
Dois aspectos emanam de todos os seres através das relações cármicas
de brilho e ignorância. Quando a obscuridade muda, o brilho surge. O
caso é o mesmo com o bom e o não-bom de todos os seres. Não pode
haver dois aspectos.”

Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 231
O Brilho e a Ignorância

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Você, o Buda, diz que a nata existe no leite. O que isto significa? Oh
Honrado pelo Mundo! Se definitivamente existe nata no leite e se é
verdade que ela não pode ser vista em razão do seu diminuto tamanho
(concentração), como podemos dizer que a nata vem através das rela-
ções causais do leite? Quando as coisas não possuem o elemento raiz
srcinalmente, podemos dizer que uma coisa seja nascida. Se ela já
existe, como podemos dizer que a vida surge (vem à luz)? Este é o caso
que se definitivamente existe nata no leite, deve haver leite em todas
as gramas. Da mesma maneira, deve haver grama no leite também. Se
a situação for que definitivamente não existe nata no leite, como pode-
ria a nata vir de fora do leite? Se não houver o elemento raiz, mas ele
aparecer mais tarde, como poderia acontecer de a grama não crescer
no leite?”

“Oh bom homem! Não diga que existe definitivamente nata no leite ou
que não existe nata no leite. Também, não diga que ela vem de fora
(do leite). Se definitivamente existe nata no leite, como ela pode ser
uma coisa diferente e ter um sabor diferente? Este é o porquê você
não deve dizer que definitivamente existe nata no leite. Se não existe
definitivamente nata noleite, por que é que algo diferente nãosurge
do leite? Se for colocado veneno no leite, a nata matará uma pessoa.
Este é o porquê você não deve dizer que não existe definitivamente
nata no leite. Além disso, se dissermos que a nata vem de fora, por que

évem
quedea nata
algumnão surge
outro da água?
lugar. Em homem!
Oh bom razão disto,
Comonãoadiga
vacaque a nata
pasta na
grama, seu sangue transforma-se em branco. Grama e sangue morrem
e o poder das virtudes dos seres transforma-os e obtemos o leite. Esse
leite vem da grama e do sangue, mas não podemos dizer que existam
os dois (no leite). Tudo o que podemos dizer é que as condições (rela-
ções) o fazem acontecer. Isso nós podemos dizer. Da nata ao sarpir-
manda, as coisas se passam assim. O caso [aqui] é o mesmo. Em razão

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 232


disto, podemos dizer corretamente que existe o sabor da vaca. Esse
leite acaba e, em conseqüência, surge a nata. Qual é a condição? É
azedo ou morno. Em razão disto, podemos dizer que ela (a nata) vem
das condições. A situação é a mesma com os outros, até o sarpirman-
da. Em razão disto, não podemos dizer que definitivamente não exista
nata no leite. Se ela vem de outro lugar, ela deveria existir separada-
mente do leite. Isto não pode ser. Oh bom homem! O mesmo é o caso
com o brilho e a ignorância. [Sobre o que é] atado pelas ilusões, dize-
mos ignorância. Se estiver ligado a todas as boas coisas, poderá existir
brilho. Este é o porquê dizermos que não pode haver duas coisas. As-
sim, Eu disse: ‘Existe uma grama nos Himalayas chamada pinodhni, a
qual, se comida pela vaca, produz sarpirmanda’. O mesmo é o caso
com a Natureza-de-Buda.

Oh bom homem! Os seres são estéreis na sorte e não se encontram


com essa grama. O mesmo se aplica à Natureza-de-Buda. Como as
impurezas os envolvem, os seres não podem vê-la. Por exemplo, a
água de todo o grande oceano tem o mesmo sabor salgado, mas ela
contém em si a melhor das águas, como no caso do leite. Também, os
Himalayas são perfeitos em várias virtudes e produzem vários remé-
dios, mas também há ervas venenosas. O mesmo se passa com os cor-
pos de todos os seres. Existem as quatro serpentes venenosas, mas
está presente também o grande rei do remédio todo-maravilhoso. A
assim chamada Natureza-de-Buda não é algo que foi criado. Simples-
mente, ela está encoberta pelas impurezas. Somente uma pessoa que
as elimine completamente - seja ela um Kshatriya, Brâmane, Vaishya
ou Sudra - vê a Natureza-de-Buda e atinge a Iluminação Insuperável.
Por exemplo, se o trovão agita o céu, as nuvens dispersam e todas as
presas do elefante se cobrirão de pétalas de flores. Se não houver o
trovão, as flores não surgirão. Também, isso é como no caso onde não
exista nome denotativo (que encerra o significado). O mesmo é o caso
também com a Natureza-de-Buda de [todos] os seres. Ela está sempre
encoberta pelas várias impurezas e não é vista. Este é o porquê digo
que os seres não possuem o Eu. Se formos abençoados com a audição

Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 233
do Todo-Maravilhoso ‘Sutra do Mahaparinirvana’, veremos a Natureza
-
de-Buda.

Isto é como no caso das flores nas presas do elefante. Podemos ouvir
tudo acerca dos samadhis dos sutras. Mas se não ouvirmos este sutra,
não poderemos obter a forma maravilhosa do Tathagata. É como
quando não há trovão, não podemos ver flores nas presas do elefante.
Ao ouvir este sutra, se vem a conhecer a secreta [latente] Natureza-de-
Buda, sobre a qual o Tathagata fala. Isso é como ver flores nas presas
do elefante. Ao ouvir este sutra, todos os inumeráveis seres vêm a
saber que isto é a Natureza-de-Buda. Em razão disto, Eu falo sobre o
Grande Nirvana e digo que Eu expando o Corpo-de-Dharma, o Reposi-
tório Secreto do Tathagata. Isto é como com o trovão, quando as flores
caem sobre as presas do elefante. Como isto detém e nutre o grande
significado, isto é chamado ‘Mahaparinirvana’. Se qualquer bom o- h
mem ou mulher aprender esse Todo-Maravilhoso Sutra do Grande
Nirvana, eles devem saber que estão fazendo um trabalho de ação de
graçase que são verdadeiros discípulos do Buda.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “É excepcionalmente marav i-


lhoso, oh Honrado pelo Mundo! A assim chamada Natureza-de-Buda é
profunda para conhecer; é difícil vê-la e atingi-la. Sravakas e Pratyeka-
budas não podem esperar compartilhar dela.”

O Buda disse: “Oh bom homem! É assim, é assim! É exatamente como


você a elogiou; não difere daquilo que eu digo.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Em


que medida a Natureza-de-Buda é profunda, e quão difícil é percebê-la
e penetrá-la?”

“Oh bom homem! [Como uma analogia]: 100 pessoas cegas consultam
um bom médico à busca de cura. Com isso, o doutor abre a membrana
dos olhos com uma lâmina de ouro e então, levantando um dedo, per-
gunta: ‘Você pode ver isto?’ A pessoa cega diz: ‘Eu não posso-lovê
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 234
ainda’. Então, o doutor levanta dois dedos, e três dedos. Então, as-pe
soa diz que ela pode ver em certa medida. Oh bom homem! Enquanto
este Maravilhoso Sutra do Grande Nirvana ainda não tinha sido delibe-
rado pelo Tathagata, o caso era o mesmo. Embora inumeráveis Bodhi-
sattvas pudessem praticar perfeitamente os paramitas, eles podiam
alcançar apenas os dez estágios de residência (abodes, ‘bhumis’) e
ainda não podiam estar aptos a ver a Natureza-de-Buda. Se o Tathaga-
ta fala, eles podem ver em alguma medida. Quando esses Bodhisattvas
verem tudo, eles dirão: ‘Oh, maravilhoso, oh Honrado pelo Mundo!
Temos reciclado entre nascimentos e mortes, e estivemos preocupa-
dos com o altruísmo’. Oh bom homem! Esses Bodhis attvas podem
alcançar bem os dez estágios [‘bhumis’ estágios
– de desenvolvimento
do Bodhisattva], e ainda não podem ver claramente a Natureza-de-
Buda. Como os Sravakas e Pratyekabudas poderiam vê-la?

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, vemos gansos


voando longe no céu e se pergunta se eles [realmente] são gansos ou o
céu. Olhamos cuidadosamente e vemos isso indistintamente. O caso
dos Bodhisattvas também pode ser como este; eles vêem não mais que
uma pequena parte da natureza do Tathagata. Como poderiam Srava-
kas e Pratyekabudas ver bem essa natureza?

Oh bom homem! O mesmo é o caso com um homem intoxicado que


tem um longo caminho a trilhar, mas pode ver somente o caminho
indistintamente (de uma forma turva). Este é o caso com os Bodhisatt-
vas nos dez estágios de residência, que podem ver somente uma pe-
quena parte da natureza do Tathagata.

Oh bom homem! Existe uma pessoa que tem sede e tem que viajar um
longo caminho através do deserto. A sede o deprime tanto que ele
procura por água em toda parte. Então, ele vê a folhagem de uma ár-
vore com um grou branco nela. Tendo perdido a sua capacidade de
julgar, a pessoa não pode dizer se aquilo é uma árvore ou água. Ele
esforça-se para ver. Então ele vê que é um grou branco e a folhagem
de uma árvore. Algo semelhante ocorre com os Bodhisattvas dos dez
Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 235
estágios de residência, que vêem não mais que uma pequena parte da
natureza do Tathagata.

A Natureza de Buda Dentro de Nós

Oh bom homem! Por exemplo, existe aqui um homem que está no


meio de um grande oceano. Muito longe, inumeráveis centenas de
milhares de yojanas de distância, ele vê um grande galeão, a torre do
leme e o convés. Ele olha e pensa para si: ‘Aquilo é uma torre do leme
ou é o céu?’ Ele olha por um longo tempo, seu pensamento torna -se
fixo e ele vem a concluir que aquilo é uma torre do leme. O mesmo é o
caso com o Bodhisattva dos dez estágios de residência, que vê dentro
de si a natureza do Tathagata.

Por exemplo, há um príncipe aqui que é fisicamente fraco, que passou


a noite jogando e agora está acordando. Ele tenta, mas não consegue
ver claramente. O caso é como este. O Bodhisattva dos dez estágios de
residência vê dessa maneira a natureza do Tathagata dentro de si. E,
semelhantemente, o que ele vê não é claro.

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, um oficial do go-


verno, obrigado pela sua rotina típica de trabalho, chega em casa tarde
da noite. Ocorre um ‘flash’ momentâneo de luz e ele vê um grupo de
vacas. Então ele pensa: ‘Isso é um grupo de vacas, uma nuvem, ou um
cavalo?’ Ele olha por um bom tempo e chega à conclusão de que são

vacas. E ainda
estágios assim elevênão
de residência pode se assegurar.
a natureza O Bodhisattva
do Tathagata dentro de dos
si e,dez
no
entanto, não pode vê-la claramente. A situação é como esta.

Também, além disso, oh bom homem! Um Monge que observa os


preceitos procura alguma água na qual não existam vermes. E, no en-
tanto, ele vê um verme e pensa para si: ‘Essa coisa que se move na
água é um verme ou um grão de pó?’ Ele encara aquilo por um bom

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 236


tempo. Mesmo após ele ter compreendido que era um grão de pó, ele
não está seguro. É assim. O mesmo é o caso com o Bodhisattva dos dez
estágios de residência, que vê assim a natureza do Tathagata dentro de
si. Nada é muito claro.

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, um homem vê


uma criança na escuridão, à distância. Ele pensa: ‘Isso é uma vaca, um
homem, ou um pássaro?’ Ele fica contemplando aquilo por um bom
tempo. Ele agora vê que aquilo é uma criança e, no entanto, ele não
pode vê-la claramente. É assim. O mesmo se aplica ao Bodhisattva que
está nos dez estágios de residência e que vê dentro de si a natureza do
Tathagata. Nada é completamente claro.

Também, além disso, oh bom homem! Existe uma pessoa que, na escu-
ridão da noite, vê a imagem deum Bodhisattva e pensa: ‘Isto pode ser
a imagem de um Bodhisattva, do Mahesvara, do Grande Brahma ou de
alguém num traje monástico?’ A pessoa contempla aquilo por um bom
tempo e conclui que é a forma de um Bodhisattva e, no entanto, ela
não o vê muito claramente. O mesmo é o caso com o Bodhisattva dos
dez estágios de residência que vê dentro de si a natureza do Tathagata.
Nada parece ser muito claro.

Oh bom homem! A Natureza-de-Buda que temos é a mais profunda e a


mais difícil de ver. Somente o Buda pode vê-la bem. Ela não está ao
alcance de Sravakas e Pratyekabudas. Oh bom homem! Assim o sábio
deve ver e compreender a natureza do Tathagata.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! A


Natureza-de-Buda é muito delicada (sutil) e difícil de conhecer. Como
podemos percebê-la bem com os olhos carnais?”

O Buda disse a Kashyapa: “Oh bom homem! Mesmo o Céu da Indif e-


rença-não-Indiferença também não está ao alcance dos dois veículos.
Quando concordamos com os sutras, podemos vê-la bem por força do
poder da fé. Oh bom homem! O mesmo é o caso com Sravakas e Prat-
Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 237
yekabudas que concordam com o Sutra do Nirvana e que vêem em si a
natureza do Tathagata. Oh bom homem! Em razão disto, devemos nos
esforçar e aprender o Sutra do Grande Nirvana. Oh bom homem! A
Natureza-de-Buda como tal, pode ser conhecida somente pelo Buda
sozinho e não está ao alcance de Sravakas e Pratyekabudas.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Os


mortais comuns sem religião possuem a natureza dos mortais comuns
e [ainda] dizem que possuem o Eu.”

O Buda disse: “Como um exemplo disso: duas pessoas são amigas.


Uma é um príncipe e a outra um homem pobre. Eles se associam e
tornam-se amigos. Então o homem pobre, vendo que o Príncipe possui
uma espada muito brilhante, cobiça-a. O Príncipe, mais tarde, foge
para outros países, levando a espada com ele. O homem pobre, mais
tarde, entra na casa de uma outra pessoa e, em seu sono, ele lamenta
e chora: ‘A espada! A espada!’ Uma pessoa próxima ouve isto e vai ao
rei. O rei diz ao homem: ‘Você disse ‘espada’. Diga
-me onde ela está’. A
pessoa fala dela em detalhes: ‘Oh Rei! Você pode cortar meu corpo,
decepar meus pés, e ainda assim não será capaz de obter a espada. Eu
estive uma vez junto com o Príncipe. Antes, quando nós estávamos
juntos, eu a vi. Mas não a toquei. E como poderia pegá-la?’ O Rei inda-
ga novamente: ‘Como era a espada que você disse ter visto?’ O homem
responde: ‘Oh grande Rei! Ela era como um chifre de ovelha’. O Rei,
ouvindo isto, sorriu alegre e di
sse: ‘Não se preocupe. Em todo o meu
arsenal, não temos uma espada assim. Como você poderia tê-la visto
com o Príncipe?’ Então o Rei indaga todos os seus ministros: ‘Alguma
vez vocês viram uma espada desse tipo?’ Assim falando, ele morre.
Então outro príncipe ascende ao trono. Ele também indaga os minis-
tros: ‘Alguma vez vocês viram no armazém governamental alguma
espada deste tipo?’ Todos os ministros dizem: ‘Certa vez a vimos’. n- (I
daga o rei) ‘Com que se parecia a espada?’ Eles responderam: ‘Ela era
como um chifre de ovelha’. (Indaga o rei) ‘Como poderia haver esse
tipo de espada no meu arsenal?’ Quatro reis, um após o outro, indag a-
ram e confirmaram, mas eles não podiam obtê-la. Algum tempo de-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 238
pois, o Príncipe que tinha fugido do país retorna e torna-se Rei. Ascen-
dendo ao trono, ele indaga os ministros: ‘Alguma vez vocês viram a
espada?’ Eles responderam: ‘Oh grande Rei! Sua cor era pura e ela era
como uma lótus-utpala’. Eles também responderam: ‘Ela era como o
chifre de um carneiro’. Eles ainda responderam: ‘Ela era vermelha e
como uma bola de fogo’. Eles responderam também: ‘Ela era como
uma serpente negra’. Então o Rei riu: ‘Todos vocês não viram, nar- ve
dade, a minha espada’.

Nobre Filho! Um Bodhisattva-Mahasattva também é como aquilo – ele


aparece no mundo e expõe a verdadeira natureza do Eu. Após tê-la
exposto, ele parte como, por exemplo, o príncipe que pegou a espada
maravilhosa e fugiu para um outro país. As tolas pessoas comuns dizem
‘Todos possuem o Eu! Todos possuem o Eu!’, como o pobre homem,
hospedando-se na casa de um outro, lamentou: ‘A espada! A espada!’.
Sravakas e Pratyekabudas indagam as pessoas: ‘Quais são os atributos
do Eu?’, ao que eles respondem: ‘Eu vi os atributos do Euele – é do
tamanho de um polegar’ ou eles dizem ‘É como [umão gr de] arroz, ou
como [um grão de] milho’, ou existem alguns que dizem ‘o atributo do
Eu é para residir dentro do coração, queimando como o sol’. Dessa
maneira, as pessoas não conhecem a natureza do Eu, assim como, por
exemplo, os vários ministros não conheciam a natureza da espada.
Enquanto um Bodhisattva discorre acerca da qualidade do Eu, as pes-
soas comuns nada mais fazem que imputar vários conceitos falsos ao
Eu, exatamente como quando indagados sobre ao atributos da espada
os [ministros] responderam que ela era como o chifre de um carneiro.
Essas pessoas comuns geram falsas visões em sucessão de um para
outro. No sentido de eliminar essas falsas visões, o Tathagata revela e
discorre sobre a não-existência do eu, exatamente como quando o
príncipe diz aos seus vários ministros que não existia a tal espada em
seu tesouro. Nobre Filho, o Verdadeiro Eu que o Tathagata expõe hoje
é chamado Buda-Dhatu [Natureza-de-Buda]. Essa forma do Buda-
Dhatu é mostrada no Buda-Dharma com o exemplo da espada real.
Nobre Filho, caso haja alguma pessoa comum que seja apta a expor
bem isto, então ela [fala] em concordância com o insuperável Buda-
Capítulo 12Sobre
– a Natureza do Tathagata Página 239
Dharma. Caso haja alguém que seja apto a distinguir isso em concor-
dância com o que foi exposto a respeito, então você deve saber que ele
tem a natureza de um Bodhisattva.”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 240


Capítulo Treze: Sobre as Letras
O Buda disse ao Bodhisattva Kashyapa: “Todas essas diferentes opin
i-
ões, premonições, linguagem e letras são aquilo que o Buda falou e não
o que foi dito pelos tirthikas.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Como você, o Tathagata, descreve o conceito-
raiz das letras?”

O Buda disse: “Oh bom home m! Primeiro, a meia-letra [isto é, o alfabe-


to fonético do Sânscrito] é ensinada e é criado o conceito-raiz. Isso é
válido para todas as coisas escritas, premonições, sentenças, todos os
elementos e realidades. Os mortais comuns aprendem o fundamento
das letras. Mais tarde, eles vêm saber o que é correto e o que não é.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Qual é o significado de letra?”

“Oh bom homem! Ele (o significado) fica nas quatorze bases fonéticas
que constituem os significados. A assim chamada letra é Nirvana. Sen-
do Eterno, ele (o significado) não flui (não dissipa ou é perdido). Aquilo
que não é fluído (dissipado) não conhece um fim. Aquilo que não co-
nhece um fim é o Corpo Adamantino do Tathagata. Essas quatorze
(bases fonéticas) constituem o fundamento das letras.

‘a’ ( ) é assim chamado porque ele não pode ser destruído. Aquilo
que é indestrutível representa os Três Tesouros. Por exemplo, isto é
como o diamante. Ele também é assim chamado porque ele não flui
(dissipa). Aquilo que não flui (dissipa) é o Tathagata. Nos nove furos
[isto é as saídas do corpo: dois olhos, dois ouvidos, duas narinas, boca e
as duas saídas das excreções] do Tathagata, não há nada que flua (va-
ze) para fora. Assim, ele é estanque [‘anasrava’sem
– impurezas]. E há
nove furos. Todavia, é ‘estanque’ (‘sem fluxos’). Sem
-Fluxos é o Eterno;
o Eterno é o Tathagata. O Tathagata não é aquele que foi criado. Por-

Capítulo
Sobre
13– as Letras Página 241
tanto, ele é Sem-Fluxos. Também, ‘a’ é virtude. Virtude representa os
Três Tesouros. Por ess
a razão dizemos ‘a’.

A seguir, ‘ā’ ( ) simboliza ‘ācārya’. O que ‘ācārya’ significa? Na vida


mundana, podemos chamá- lo de ‘pessoa santa’. Por que dizemos ‘pe
s-

soa santa’?
‘estar ‘Santo’Também,
satisfeito’. significa ‘não
é -apegado’. SignificaEle
chamado ‘puro’. ‘deconduz
pouco desejo’
a- e
complet
mente os seres através do grande mar dos três mundos do nascimento
e da morte. Isto é o que chamamos ‘santo’.

Também, ‘ā’ significa ‘instituição’, a qual deve agir em concordância


com os preceitos de pureza e observar a conduta.

Além disso, ‘ā’ significa depender de uma pessoa santa. Trata -se de
aprender sobre suas idas e vindas e tudo o que ela (essa pessoa santa)
faz. Aos santos devem ser feitos oferecimentos, eles devem ser respei-
tados e reverenciados. Devemos fielmente servir nossos pais e estudar
o Mahayana. Bons homens e boas mulheres mantêm em observância
as proibições. Todos os Bodhisattvas são chamados ‘santos’. Além s- di
so, ‘ā’ também significa ‘ordem’. Ele diz: ‘Venha e faça isto; você não
deve fazê-lo desse jeito’. Então, faça as coisas como condiz. Aquele que
é atento e suprime a má conduta é um santo. Este é o porquê dizemos
‘ā’.

‘i’ ( ) é o ensinamento Budista. A ação pura é extensiva, pura e imacu-


lada. Por exemplo, é como a lua cheia.Faça
‘ assim, não daquele jeito;
isso está correto, aquilo não está correto; isso é um sermão do Buda, e
isso é o que Mara diz’. Assim, dizemos ‘i’. O significado do ensinamento
Budista é maravilhoso e profundo. É como quando evocamos as ilimi-
tadas leis [dharmas] de Mahesvara e Brahma. Se bem acolhido, ele [o
ensinamento Budista] é a proteção do Dharma. Além disso, são cha-
madas imperturbáveis [ilimitadas, irrestritas] as quatro proteções do
mundo. Como essas quatro são imperturbáveis, alguém que as receba

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 242


protege o Sutra do Grande Nirvana e imperturbavelmente o expõe e o
dissemina.

Também, além disso,‘ī’ ( ) simboliza a imperturbada [sem entraves]


disseminação do Dharma aos seres.

Também, ‘ī’ é o imperturbado [irrestrito]. Ele indaga e responde o que


está correto. Isso nada mais é que o aprendizado dos Sutras Vaipulya.

Além disso, a seguir, ‘ī’ simboliza a aniquilação do ciúme (inveja).


Quando o quintal de relva (ervas daninhas) tiver sido completamente
capinado (limpo), tudo se transforma naquilo que é auspicioso. Portan-
to, dizemos ‘ī’.

‘u’ ( ) simboliza Grande Nirvana, o Supremo, o mais soberbo, o piná-

culo dos pináculos de todos os sutras.


Também, a seguir,‘ū’ ( ) simboliza a Natureza-do-Tathagata, sobre a
qual nem Sravakas ou Pratyekabudas ouviram. Isso é como Uttarakuru
que é o melhor de todos os lugares. Se qualquer Bodhisattva de fato
ouve este sutra, ele é o mais elevado e soberbo (Bodhisattva). Portan-
to, dizemos ‘ū’.

‘ṛ’ ( ) é como o leite da vaca, por exemplo, que é o melhor de todos


os sabores. A Natureza-do-Tathagata é também como isto. De todos os
sutras, este é o mais sagrado e melhor. Qualquer um que caluniá-lo é
nada mais que uma vaca.

Também, a seguir,‘ṝ’ ( ) é chamado ‘não-sábio’. Uma pessoa calunia


completamente o delicado e secreto repositório do Tathagata. Saiba
que essa pessoa é mais digna de pena. A partir do Repositório Secreto
Eu. Portanto, dizemosṝ’.‘
do Tathagata, ele fala do não-

Capítulo
Sobre
13– as Letras Página 243
‘e’ ( ) é o ‘Dharmata’ e Nirvana de todos os Budas. Assim, dizemos ‘e’.

‘ai’ ( ) significa ‘Tathagata’. Também, ‘ai’ refere


-se às idas e vindas,
contrações e expansões, e as ações do Tathagata, através das quais,
em meio a todos os seres, nenhum deixa de ser beneficiado. Portanto,
‘ai’.

‘o’ ( ) simboliza a ilusão; ilusão é ‘asrava’ [impureza]. O Tathagata é


eternamente livre de ilusões. Portanto, ‘o’.

‘au’ ( ) significa Mahayana. Ele simboliza o mais supremo de todos


os quatorze sons. O caso dos sutras Mahayana é também assim. Eles
são o extremo máximo de todos os sutras e shastras (escritos sagrados
do hinduísmo). Portanto, ‘au’.

‘aṁ’ ( ) acaba com todas as impurezas. Nos ensinamentos Budistas,


todo o ouro, prata e tesouros são abandonados.ortanto,
P ‘aṁ’.

‘aḥ’ ( ) significa ‘Veículo Soberbo’. Por quê? Esse sutra Mahayana,


este Sutra do Grande Nirvana, é o mais superlativo de todos os sutras.
Portanto, ‘aḥ’.

‘ka’ ( ) evoca grande compaixão para com todos os seres. O senti-


mento de umfilho surge, como com relação a Rahula. Ele significaa-‘m
ravilhosamente bom’. Portanto, ‘ka’.

‘kha’ ( ) simboliza ‘não-bom amigo’. ‘Não-bom amigo’ significa mi


s-
turado e impuro. Ele não acredita no Repositório Secreto do Tathagata.
Portanto, ‘kha’.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 244


‘ga’ ( ) significa ‘repositório’. ‘Repositório’ significa Repositório
o
Secreto do Tathagata. Todos os seres possuem a Natureza-de-Buda.
Portanto, ‘ga’.

‘gha’ ( ) é o som eterno do Tathagata. O que é o som eterno do Ta-


thagata? O chamado ‘Tathagata é ete
rno e não sofre mudanças (Imu-
tável)’. Portanto, ‘gha’.

‘ṅa’ ( ) representa as características destrutíveis [impermanência] de


todos os seres. Portanto,ṅa’.

‘ca’ ( ) significa ‘praticar’. Como ela subjuga todos os seres, dizemos


‘prática’.

‘cha’ ( ) significa ‘Tathagata’, que abriga [sombreia, protege] todos os


seres, como no caso de um grande parasol. Portanto, ‘cha’.

‘ja’ () significa ‘emancipação correta [verdadeira]’. Nela surge o não


-
envelhecimento. Portanto, ‘ja’.

‘jha’ () simboliza a grande proliferação de impurezas, como no caso


de uma grande floresta. Portanto, ‘jha’.

‘ña’ ( ) significa ‘Sabedoria’. Ela significa o verdadeiro ‘Dharmata’.


Portanto, ‘ña’.

‘ṭa’ ( ) significa fala proferida sobre dharmas no Jambudvipa, mos-


trando um meio-corpo (imperfeição), como no caso da meia-lua. Por-
tanto, ‘ṭa’.

Capítulo
Sobre
13– as Letras Página 245
‘ṭha’ ( ) representa a perfeição do Corpo-do-Dharma, como no caso
da lua-cheia. Portanto, ṭha’.

‘ḍa’ ( ) representa um Monge ignorante que não conhece o Eterno e


ḍa’.
o não-Eterno, como no caso de uma criança. Portanto, ‘

‘ḍha’ ( ) representa uma pessoa que se sente desobrigada com rela-


ḍha’.
ção ao seu mestre, como no caso de um carneiro. Portanto, ‘

‘ṇa’ ( ) representa ausência de conhecimento do significado do que é


ṇa’.
sagrado, como no caso de um tirthika. Portanto, ‘

‘ta’ () representa o Tathagata, que diz a todos os Monges: ‘Venham


sem susto ou medo. Eu agora proferirei sermões sobre o Dharma Ma-

ravilhoso’. Portanto, ‘ta’.


‘tha’ ( ) significa ‘ignorância’. Os seres reciclam entre nascimentos e
mortes e amarram-se (apegam-se), como no caso de um bicho-da-seda
ou um besouro-de-extrume. Portanto, ‘tha’.

‘da’ ( ) significa ‘grande dádiva’. Esse é o chama


do Mahayana. Por-
tanto, ‘da’.

‘dha’ ( ) enaltece a ‘virtude’. É como no caso dos Três Tesouros, que


são como o Monte Sumeru, elevado, grande, extensivo e, ainda assim,
não inclina para um lado. Portanto, ‘dha’.

‘na’ ( ) faz alusão aos Três Tesouros, que permanecem pacificamente


enraizados, não inclinando para um lado ou movendo-se, como o limiar
de um Portal. Portanto, ‘na’.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 246


‘pa’ ( ) significa ‘invertido’. Se uma pessoa diz que os Três Tesouros
expiram, isto mostra que aquela pessoa acalenta dúvidas. Portanto,
‘pa’.

‘pha’ ( ) refere-se à má-sorte do mundo. Se uma pessoa diz que


quando a má-sorte surge no mundo, os Três Tesouros também desapa-
recem, isto indica que aquela pessoa é ignorante, que ela não tem
conhecimento, e que ela age contra a vontade sagrada. Portanto, ‘pha’.

‘ba’ ( ) refere-se aos dez poderes do Buda. Portanto, ‘ba’.

‘bha’ ( ) refere-se ao carregamento (nos ombros) daquilo que é pe-


sado. Ele pode permanecer suportanto o peso do Dharma Maravilhoso.
Saiba que essa pessoa é um grande Bodhisattva. Portanto, ‘bha’.

‘ma’ ( ) refere-se a todos os Bodhisattvas que observam estritamen-


te todas as instituições [regras]. Isso é chamado Mahayana Mahapari-
nirvana. Portanto, ‘ma’.

‘ya’ ( ) faz alusão a todos aqueles Bodhisattvas que, para o benefício


dos seres, pregam a doutrina do Mahayana em todos os lugares. Por-
tanto, ‘ya’.

‘ra’ ( ) erradica a ganância, o ódio e a ignorância (a avareza, a ira e a

estupidez), e dissemina o Dharma Maravilhoso. Portanto,


‘ra’.

‘la’ ( ) relaciona-se ao veículo do Sravaka, que se move, transforma-


se e não tem um lugar para viver [isto é, uma residência permanente].
O Mahayana é seguro, firme e não há inclinação ou movimento. Aban-
donando o veículo do Sravaka, fazemos esforços e praticamos o insu-
perável Mahayana. Portanto, ‘la’.

Capítulo
Sobre
13– as Letras Página 247
‘va’ ( ) significa que o Honrado pelo Mundo é quem faz cair sobre
todos os seres a grande chuva do Dharma. Ele é chamado, por assim
dizer, sutra da boa-sorte.Portanto, ‘va’.

‘śa’ ( ) significa livrar-se das três flechas (farpas) [ganância, melovo-


lência e ignorância]. Portanto, ‘śa’.

‘ṣa’ ( ) significa ‘perfeição’. Se verdadeiramente ouvirmos este Sutra


do Grande Nirvana, então já ouvimos e protegemos tudo acerca dos
sutras Mahayana. Porta nto, ‘ṣa’.

‘sa’ ( ) significa que o Dharma Maravilhoso é exposto a todos os se-


res, tal que as pessoas se sintam abençoadas. Portanto, ‘sa’.

‘ha’ ( ) indica (traduz) o estado de alegria da mente. Quão maravilho-


so é que o Honrado pelo Mundo aparte-se de todas as ações; estranho
é que o Tathagata entre no Nirvana. Portanto, ‘há’.

‘ḷa’ ( ) significa ‘Mara’. Inumeráveis Maras são incapazes de destruir


o Repositório Secretodo Tathagata. Portanto, ‘lham’.

As quatro letras:ṛ, ṝ, ḷ, ḹ, têm quatro significados. Estes são: Buda,


Dharma, Sangha e Abhidharma. Abhidharma diz respeito ao que se
observa no mundo. Ele mostra que Devadatta destrói a Sangha. Ele
transmuta-se em várias formas, faces e formas concretas. O caso é
assim. Tudo isto é para estabelecer o vinaya. O sábio deve ver clara-
mente através disto e não ter qualquer receio. Isto é seguir o que se
observa no mundo. Portanto,ṛ, ṝ, ḷ, ḹ.

A inalação do ar é o som que vem quando a língua está em sintonia


com o nariz. Obtemos o significado através do (som) longo, curto, ou
algo que substitua o som. Tudo difere de acordo com as ações da lín-
gua e dos dentes.
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 248
Todos esses significados das letras permitem aos seres purificar as suas
ações verbais. A Natureza-de-Buda dos seres não se torna pura quando
antes for amparada pelas letras. Por que não? Porque aquela natureza
é srcinalmente pura. Também, (essa natureza não se torna pura) en-
quanto co-existindo com os cinco skandas, os 18 reinos e as 12 esferas.
Em razão disto, todos os seres deveriam refugiar-se nos Bodhisattvas e
outros. Em razão da [existência da] Natureza-de-Buda [dentro deles],
os seres são vistos com os mesmos olhos [sem discriminações], e não
há diferença. Portanto, as meias-letras [alfabeto fonético do Sânscrito]
formam a base de todos os sutras, todos os materiais escritos e sen-
tenças.

Também, o significado das meias-letras diz respeito à raiz de todas as


impurezas (por isso o sentido dúbio de muitas delas?). Assim, elas são
chamadas meias-letras. As letras-cheias são a raiz de todos os bons
dharmas e preleções (discursos). Por exemplo, aqueles (seres) do
mundo que praticam o mal são chamados meias-letras, e aqueles que
praticam o bem são letras-cheias. Dessa forma, todos os sutras e os
Abhidharmas estão baseados em meias-letras. As pessoas podem dizer
que o Tathagata e a verdadeira emancipação caem na categoria das
meias-letras. Mas isto não é assim. Por que não? Porque estes (o Ta-
thagata e a emancipação) partem das letras (cheias). Em razão disto, o
Tathagata é imperturbável, inatacável e completamente emancipado
em todas as coisas. Como fazemos para chegar ao significado das le-
tras? Se viermos a pensar que o Tathagata aparece no mundo e acaba
com as meias-letras, isto é compreensão do significado das letras.
Qualquer pessoa que siga o significado das meias-letras é alguém que
não conhece a natureza do Tathagata. Qual é o significado de iletrado
(ignorante)? Aquele que se associa com quem pratica os ensinos do
mal pertence à (classe) dos iletrados. Também, embora uma pessoa
possa associar-se com aqueles que praticam o bem, se ela não sabe a
diferença entre o Eterno e o não-Eterno, entre a constância e a não-
constância do Tathagata e os dois Tesouros do Dharma e da Sangha (se
estes últimos têm permanência e são eternos, então o primeiro, o Ta-
Capítulo
Sobre
13– as Letras Página 249
thagata também é permanente e eterno, pois os Três Tesouros são
unos no Todo-Marvilhoso. Portanto, se o Dharma e a Sangha estão
presentes, o Tathagata também está), entre vinaya e não-vinaya, sutras
e não-sutras, as palavras de Mara e aquelas que são do Buda; essa
pessoa é alguém iletrado. Isto eu estabeleço com relação ao que é
iletrado. Oh bom homem! Por esta razão, você deve partir da meia-
letra e chegar ao significado das letrascheias)”.
(-

O Bodhisattva Kashyapadisse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Agora aprenderei completamente o valor das letras. Eu encontrei o
Mestre Insuperável. Eu agora recebi gentilmente as injunções do Ta-
thagata”.

O Buda elogiou Kashyapa e disse:


“Falaste bem, falaste bem! Uma pes-
soa que almeja o Dharma Maravilhoso deve aprender as coisas assim”.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 250


Capítulo Quatorze: Sobre a Parábola dosPássaros
O Buda ainda disse a Kashyapa: “Oh bom
homem! Há duas espécies de
pássaros: um é o kacalindikaka e o outro é o pato mandarin. Se brin-
cando ou repousando, eles sempre agem juntos; eles não se separam.
O mesmo é o caso com o sofrimento, o não-eterno, e o não-Eu. Eles
não se separam.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! De


quais maneiras são feitas as coisas que terminam no sofrimento, no
não-eterno e no não-Eu, como ocorre com o pato mandarin e o kaca-
lindikaka?”

O Buda disse: “Oh bom homem! O que é contrário ao Dharma é sofri-


mento, e o que não é contrário ao Dharma é felicidade. O que não é
contrário ao Dharma é o Eterno, e o que é contrário ao Dharma é o
não-eterno. O que não é contrário ao Dharma é o Eu, e o que é contrá-
rio ao Dharma é não-Eu. Por exemplo, é como no caso em que o arroz
difere do cânhamo e do trigo, e o cânhamo e o trigo (diferem) do fei-
jão, do milho e da cana de açúcar. Com todos eles, o não-eterno são os
brotos, flores e folhas. Quando a fruta amadurece e quando os huma-
nos as consomem, dizemos eterno. Por quê? Porque a Natureza (de
Buda) é verdadeira.”

Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Se estes são r-ete
nos, eles são iguais ao Tathagata?”

“Oh bom homem! Não fale dessa maneira. Por que não? Se dissermos
que o Tathagata é como o Monte Sumeru, isto implica que ele quebra-
rá assim como o Monte Sumeru deverá quebrar quando chegar o tem-
po para a sua desintegração. Oh bom homem! Não veja as coisas as-
sim. Oh bom homem! ‘Dentre todas as coisas, com exceção do Nirv
a-
na, nenhuma é eterna’. Meramente para conformidade com as formas
da verdade secular, dizemos que a fruta é eterna”.

Capítulo 14Sobre
– a Parábola dos Pássaros Página 251
O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Está
bem,está bem! É como o Buda diz.”

A Consciência de Possuir a Natureza de Buda

O Buda disse a Kashyapa: “É assim, é assim, oh bom homem! Uma


pessoa pode ser fiel e verdadeira com relação ao que os sutras dizem,
ou pode ter praticado todos os Samadhis, mas até que ela tenha a-
prendido o Mahaparinirvana, ela dirá que tudo é não-eterno. Uma vez
que uma pessoa tenha aprendido esse sutra, ela poderá ter ilusões,
mas estará, por assim dizer, sem ilusões. Ele beneficia aos humanos e
celestiais. Por quê? Porque vemos claramente que o nosso próprio
corpo possui a Natureza-de-Buda dentro dele.

Também, oh bom homem! É como no caso da mangueira. Quando


suas flores aparecem pela primeira vez, o que existe [naquele momen-
to] é a fase de transformação. Quando ela dá os frutos e quando con-
cede os maiores benefícios, falamos do eterno. Oh bom homem! Dessa
forma, uma pessoa poderá ser verdadeira e fiel a todos os sutras, ou
poderá ter praticado Samadhis, mas enquanto ela não der ouvido a
este Sutra do Grande Nirvana, tudo estará baseado no não-eterno.
Quando uma pessoa der ouvido a este sutra, embora [ainda] possuindo
ilusões, é como se ela não as tivesse. Este é o porquê digo que ele be-
neficia a ambos, humanos e celestiais. Como? Porque aquela pessoa

sabe claramente que possui a Natureza-de-Buda dentro dela. Isto é o


Eterno.

Também, além disso, oh bom homem! Enquanto um lingote de ouro


funde-se, essa é a fase do não-eterno. Uma vez fundido, ele torna-se
ouro. Quando algo beneficia grandemente uma pessoa, dizemos eter-
no. O caso é este. Assim, oh bom homem, uma pessoa pode ser verda-
deira e fiel a todos os sutras, ou pode ter praticado todos os Samadhis,

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 252


mas se ela ainda não deu ouvidos a este Sutra do Grande Nirvana, tudo
é não-eterno. Quando uma pessoa der ouvidos a esse sutra, ela poderá
ter ilusões, mas é como se ela não as tivesse. Assim, ele beneficia todos
os humanos e deuses. Por quê? Porque a pessoa vem a saber clara-
mente que possui a Natureza-de-Buda dentro dela. Isto é o Eterno.

Também, além disso, oh bom homem! O gergelim (sésamo), por e-


xemplo, quando ainda não prensado, é não eterno. Uma vez que ele
tenha sido prensado e o óleo extraído, o gergelim concede grandes
benefícios. Isto é o Eterno. Oh bom homem! Uma pessoa pode ser
verdadeira e fiel a todos os sutras, ou pode ter praticado Samadhis,
mas se ainda não ouviu o Grande Nirvana, tudo é não-eterno [para
aquela pessoa]. Tendo ouvido este sutra, embora ainda atada pelas
ilusões, é como se a pessoa não possuísse ilusões. Benefícios advêm
para quaisquer humanos ou deuses. Por quê? Porque aquela pessoa
compreende que possui a Natureza-de-Buda dentro dela. Isto é o Eter-
no.
Também, além do mais, oh bom homem! É como no caso em que to-
dos os rios drenam para o oceano. Todos os sutras e Samadhis fluem
para o Sutra Mahayana do Grande Nirvana. Como assim? Porque ele
expõe ultimadamente (conclusivamente, em última instância) a Natu-
reza-de-Buda. Este é o porquê digo: ‘Alguns dharmas são eternos;
l- a
guns dharmas não são eternos. Com o não-Eu, também, as coisas con-
tribuem para o mesmo (não-eterno)’. É assim que eu digo.”

O Bodhisattava Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! O


Tathagata já está apartado das flechas envenenadas da apreensão e do
sofrimento. A apreensão e o sofrimento são divinos [divindades]; o
Tathagata não é uma divindade (celeste). Apreensão e sofrimento são
humanos; o Tathagata não é humano. Apreensão e sofrimento são as
25 existências. Portanto, não pode existir apreensão e sofrimento com
o Tathagata. Como poderíamos dizer que o Tathagata é apreensão e
sofrimento?”

Capítulo 14Sobre
– a Parábola dos Pássaros Página 253
“Oh bom homem! No Céu do Não -Pensamento [‘avrha-samadhi’ –
concentração sem pensamento], o que se alcança é a ausência de pen-
samento (indiferença). Se não há pensamento, não pode haver vida. Se
não há vida, como pode haver os cinco skandas, os 18 reinos e as 12
esferas? Portanto, não podemos dizer que a vida do Céu do Não-
Pensamento tenha algum lugar para existir. Oh bom homem! Por e-
xemplo, o deus de uma árvore vive na árvore. Definitivamente, não
podemos dizer que ele viva no ramo, no nó, no tronco ou na folha.
Embora não possamos dar nome ao lugar, não podemos dizer que ele
não existe. A vida do Céu do Não-Pensamento é também como aquilo.
Oh bom homem! O caso do Buda-Dharma é semelhante a isto. É muito
profundo e insondável. O Tathagata não tem apreensão, sofrimento ou
preocupação. E ainda assim, ele demonstra grande compaixão para
com todos os seres, tem apreensão e tristeza, e os vê como ele vê Ra-
hula.

Também, além disso, a vida do Céu do Não-Pensamento pode ser co-


nhecida somente pelo Buda. Ela está além da percepção dos outros.
Também, o mesmo se aplica ao Céu da Indiferença-não-Indiferença. Oh
Kashyapa! A natureza do Tathagata é pura e imaculada, e é como um
corpo transformado. Como pode haver qualquer apreensão, sofrimen-
to ou preocupação? Se o Tathagata não tem apreensão ou sofrimento,
como ele pode conceder benefícios a todos os seres e disseminar o
ensinamento Budista? Se não, como podemos dizer que ele vê a todos
os seres como vê a Rahula? Se ele não vê os seres como vê Rahula,
quaisquer dessas declarações somente podem ser falsas. Portanto, oh
bom homem, o Buda é inconcebível, o Dharma é inconcebível, a natu-
reza dos seres é inconcebível, e a vida do Céu do Não-Pensamento é
inconcebível. Quer o Tathagata tenha alguma apreensão ou não, isso é
para o mundo do Buda. Não é o que Sravakas ou Pratyekabudas pos-
sam sondar.

Oh bom homem! Por exemplo, uma casa não pode permanecer no ar


como ela é nem por um momento. Se alguém diz que uma casa pode
permanecer no ar, isto é algo que não pode ser dito. Por essa razão,
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 254
não devemos dizer: ‘Uma casa no ar pode ou não permanecer’. Um
mortal comum pode dizer que uma casa permanece no ar. Mas, não há
lugar no ar onde ela possa ficar. Por que não? Porque, por natureza, ela
não tem lugar para ficar (no ar). Oh bom homem! O mesmo é o caso
com o pensamento. Não diga que a sua morada está nos cinco skan-
das, nos 18 reinos ou 12 esferas. O mesmo se passa com a vida do Céu
do Não-Pensamento. Quanto a qualquer apreensão e tristeza do Ta-
thagata também é assim. Se ele não tem apreensão e tristeza, como
podemos dizer que ele vê [todos os seres] com um olhar equânime,
como se visse Rahula? Uma pessoa ainda pode dizer que ele tem [a-
preensão e sofrimento], [então] como podemos dizer que a sua natu-
reza é como o Vazio?

Oh bom homem! Como um exemplo: um mágico pode evocar diversas


coisas como um palácio, morte, longa vida, apego ou desapego, ouro,
prata, berílio, tesouros, florestas e árvores. Mas elas não têm um lugar
onde de fato existam. O mesmo se passa com o Tathagata. Seguindo o
caminho do mundo, ele demonstra apreensão e tristeza. Não pode
haver [de fato] essas formas [no Tahagata]. Oh bom homem! O Tatha-
gata já adentrou o Parinirvana. Como poderia haver qualquer apreen-
são, tristeza ou preocupação? Agora o Tathagata entra no Nirvana. Se
alguém disser que isso é o não-eterno, saiba que essa pessoa tem a-
preensão e tristeza. Ninguém pode verdadeiramente saber se o Tatha-
gata tem apreensão ou não.

Também, além disso, oh bom homem! Como um exemplo: uma pessoa


que vive na baixa esfera social pode certamente saber o que se obtém
na mais baixa esfera da vida. Mas ela não pode saber o que se obtém
nas esferas médias e superiores da vida. Uma pessoa da esfera média
sabe o que se obtém na média esfera, mas não na superior. Uma pes-
soa da esfera superior conhece a esfera superior, mas não a média e a
baixa esfera. O mesmo se passa com Sravakas e Pratyekabudas. Da
mesma forma, uma pessoa somente conhece o que é da sua própria
esfera. Não é assim com o Tathagata. Ele conhece a sua própria esfera,
bem como aquelas dos outros. Este é o porquê dizemos que o Tathaga-
Capítulo 14Sobre
– a Parábola dos Pássaros Página 255
ta é sem-impedimentos. Ele manifesta-se em espírito e segue os cami-
nhos do mundo. Os olhos carnais dos mortais comuns vêem isto. Eles
dizem que ele é verdadeiro. Eles podem desejar conhecer a Sabedoria
sem-impedimentos e insuperável do Tathagata, mas isso nunca acon-
tecerá. Somente o Buda sabe o que é apreensão e o que não é. Portan-
to, diferentes coisas possuem o Eu e diferentes coisas não possuem o
Eu. Isto é o que queremos dizer quando dizemos quais coisas obter,
como no caso do pato mandarin e o kacalindikaka (que andam sempre
juntos).

A Parábola do Pato Mandarin e do Kacalindikaka

Também, a seguir, oh bom homem! O ensinamento Budista é como o


pato mandarin [e o kacalindikaka] que andam sempre juntos (embora
sejam diferentes pássaros). O pato mandarin e o kacalindikaka procu-
ram os planaltos no solstício de verão, quando o nível das águas está
alto, e colocam os seus filhotes lá. Isto é para induzir-lhes o crescimen-
to. Mais tarde, eles agirão como srcinalmente deveriam fazê-lo. O
mesmo acontece com o aparecimento do Tathagata. Ele ensina os
inumeráveis seres e permite-lhes residir no Dharma Maravilhoso. Isto é
como o pato mandarin e o kacalindikaka buscando planaltos e colo-
cando seus filhotes seguramente lá. O mesmo se passa com o Tathaga-
ta. Ele permite aos seres agirem como eles deveriam agir e (mais tarde)
permite-lhes entrar no Mahaparinirvana. Oh bom homem! Isto signifi-
ca dizer que o sofrimento é um ensinamento [dharma] e a felicidade é

outro
Nirvanadiferente (ensinamento).
é Felicidade. Todas
Ele (o Nirvana) é oasmais
coisas criadas são
maravilhoso tristeza;
e destrói as
coisas criadas [isto é, eleva-
nos para além da esfera da criação].”

O Bodhisattva Kashyapa disseao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Como os seres atingem o Nirvana e conquistam a preeminente Felici-
dade?”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 256


O Buda disse: “Oh bom homem! Como já afirmado,

a fusão dos compostos é velhice-e-morte.


Se o nosso modo de vida é restrito e não indolente,
isso é amrta [imortalidade, ambrosia].
Ser indolente e não restrito
no nosso modo de vida é morte.
A não-indolência conquista o lugar da imortalidade;
a indolência sempre leva-
nos à morte.”

A indolência é da criação, o maior dos sofrimentos. Não-indolência é


Nirvana, a suprema amrta e Êxtase. O criado é um lugar da morte, o
maior dos sofrimentos. Nirvana é Imortalidade, o mais maravilhoso
Êxtase. A indolência evoca [isto é, é causadora] o criado. Fala-se tam-
bém de eterno Êxtase, Imortalidade e Corpo Indestrutível. O que é
indolência e o que não é? O ímpio mortal comum [isto é, um tirthika] é
(feito de) indolência e morte eterna; o santo que escapa-do-mundo
[‘Shramana’] pertence à classe da não-indolência, na qual a velhice-e-
morte não têm lugar. Por que não? Ele alcança o supremo Êxtase e
Nirvana eterno. As pessoas santas do estágio supramundano não têm
indolência e [com elas] não existe velhice-e-morte. Por que não? Elas
entram no estágio superior do Nirvana eterno. Portanto, Sofrimento e
Êxtase são duas coisas diferentes; Eu e não-Eu são duas coisas diferen-
tes.

Um homem deita-se no chão e olha para o céu, onde ele não pode ver
os caminhos por onde os pássaros voaram. Aqui é o mesmo caso. Oh
bom homem! O mesmo é o caso com os seres. Eles não possuem os
olhos celestiais. Imersos na ilusão, eles não podem ver a natureza do
Tathagata que eles possuem. Por essa razão, eu agora exponho os
ensinos secretos do altruísmo. Por quê? Uma pessoa que é desprovida
dos olhos celestiais não conhece o Verdadeiro Eu. Porque ela imagina o
Eu de uma maneira errada. Todas as coisas criadas pela ilusão são não-
eternas. Este é o porquê digo que o Eterno e o não-Eterno são duas
coisas diferentes.
Capítulo 14Sobre
– a Parábola dos Pássaros Página 257
Se com esforço e coragem
alcançamos o cume de uma montanha,
vemos as planícies, a vastidão dos campos e todos os seres.
Como alcançamos o grande palácio da Sabedoria
e o assento que é o mais elevado e maravilhoso,
então já acabamos com a apreensão e o sofrimento
e vemos a apreensão dos seres.

O Tathagata cortou as inumeráveis (amarras das) ilusões, vive na mon-


tanha da sabedoria e vê todos os seres que vivem em meio às inume-
ráveis bilhões de ilusões.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! As


coisas não são como afirmadas no gatha (versos). Por que não? Alguém
que entre no Nirvana não tem apreensão ou alegria. Como pode essa
pessoa conquistar o palácio da Sabedoria? Além do mais, vivendo no
cume da montanha, como podemos ver os seres?”

O Buda disse: “Oh bom homem! O palácio da Sabedoria é Nirvana. A


pessoa sem apreensões é o Tathagata; a pessoa que tem apreensões é
o mortal comum. O mortal comum tem apreensões e o Tathagata não
as tem. O cume do Monte Sumeru é a verdadeira emancipação. Al-
guém que faça esforços incessantemente é como o Monte Sumeru, o
qual não se agita. A terra é uma coisa criada. Todos os mortais comuns
vivem pacificamente na terra e fazem todas as coisas. Sabedoria é o
verdadeiro Despertar. Uma pessoa longe da existência é alguém eter-
no. Isto é o Tathagata. O Tathagata tem piedade dos inumeráveis seres
que estão expostos às flechas envenenadas de todas as existências.
Este é o porquê digo que o Tathagata tem apreensão.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Se o


Tathagata tivesse apreensão e tristeza, ele não poderia ser o Todo-
Iluminado.”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 258


O Buda disse a Kashyapa: “Tudo depende das circunstâncias. Quando
ele vê que a sua presença é evocada para salvar os seres, o Tathagata
manifesta-se. Embora se manifestando na vida, não há (neste caso)
verdadeiramente vida. Este é o porquê dizermos que o Tathagata é
aquele que é Eterno. O caso é como aquele do kacalindikaka e do pato
mandarin.”

Capítulo 14Sobre
– a Parábola dos Pássaros Página 259
Capítulo Quinze: Sobre a Parábola da Lua

A Parábola da Lua

O Buda disse a Kashyapa: “Como um exemplo: existe um homem aqui


que,
nutrecomo ele vê que de
o pensamento a lua
queainda
a luanão saiu, diz Mas
sucumbiu. que aessa
lua foi
lua,embora,
pela suae
natureza, jamais sucumbe. Quando ela aparece no outro lado do mun-
do, as pessoas do outro lado dizem que a lua nasceu. Por quê? Uma
vez que o Monte Sumeru obstrui [a visão], a lua não pode revelar-se. A
lua está sempre lá. Ela, por natureza, não nasce ou sucumbe. O mesmo
é o caso com o Tathagata, o Merecedor de Ofertas, o Todo-Iluminado.
Ele manifesta-se nos três mil grandes sistemas de mil mundos, ou dá a
entender que possui pais no Jambudvipa (que nasce) ou que entra no
Nirvana no Jambudvipa (que morre). O Tathagata, por natureza, não
entra no Nirvana. Mas todos os seres dizem que ele verdadeiramente
entra no Parinirvana. O caso é análogo ao da sucumbência da lua. Oh
bom homem! O Tathagata, por natureza, não possui a natureza do
nascimento e da morte. Para socorrer os seres, ele manifesta-se nas-
cendo e morrendo.

A Eterna Lua-Cheia

Oh bom homem! Do outro lado dessa lua-cheia, temos a meia-lua; se


deste lado temos a meia-lua, do outro lado a lua-cheia é vista. As pes-
soas do Jambudvipa, quando vêem a lua-nova, dizem que é o primeiro
dia, e têm no pensamento a idéia de um novo mês. Vendo a lua-cheia,
eles dizem que é o décimo-quinto dia do mês e criam a noção de lua-
cheia. Mas essa lua não tem, para dizer a verdade, nem enchimento e
nem esvaziamento. Somente devido ao Monte Sumeru ela apresenta
um aspecto de crescente e minguante. Oh bom homem! O mesmo é o
caso com o Tathagata. No Jambudvipa, ele manifesta-se nascendo e
entrando no Nirvana. Seu primeiro aparecimento (nascimento) é o

Capítulo 15
Sobre
– a Parábola da Lua Página 261
primeiro dia do mês. Todos dizem que esse menino é recém-nascido.
Ele caminha sete passos. Isso é como a lua no segundo dia. Ou ele mos-
tra-se estudando. Isto é como a lua no terceiro dia. Ele demonstra a
renúncia. Isto é como a lua do oitavo dia. Ele emite a luz toda-
maravilhosa da Sabedoria e subjuga um incontável número de seres e
os exércitos de Mara. Isto pode ser comparado com a lua-cheia do
décimo quinto dia. Ou ele manifesta os 32 sinais de perfeição e as 80
características menores de excelência. Assim ele adorna-se e manifes-
ta-se entrando no Nirvana. Ele (o Nirvana) é como o eclipse da lua.
Assim, o que cada um dos seres vê não é o mesmo. Alguns vêem a
meia-lua, outros a lua-cheia, e ainda outros um eclipse. Mas essa lua,
por sua natureza, não conhece crescimento (enchimento) ou eclipse.
Ela é sempre Lua-Cheia. O corpo do Tathagata é assim. Por essa razão,
dizemos eterno e imutável.

O Verdadeiro Aspecto do Carma Original


Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, através da lua-
cheia, todas as coisas aparecem. Em todos os lugares como nas cida-
des, aldeias, montanhas, pântanos, sob as águas, lagos, poços e recipi-
entes de água, a lua manifesta-se. Os seres podem viajar uma centena
ou uma centena de milhar de yojanas, e a lua sempre os acompanha.
Os mortais comuns e os ignorantes pensam erroneamente e dizem: ‘Eu
vejo tudo isso no castelo da cidade, em casa, e aqui no pântano. É a
verdadeira lua ou não é a verdadeira?’ Cada pessoa pensa acerca do

tamanho da lua
diz: ‘É como umae roda’.
diz: ‘É Ou
como a bocapode
alguém de uma chaleira’.
dizer: Ou uma
‘É algo em tornopessoa
de 45
yojanas’. Todos vêem a luz da lua. Alguns a vêem tão redonda quanto
uma bacia de ouro. A natureza dessa lua é somente uma, mas diferen-
tes seres a vêem de formas diferentes. Oh bom homem! O mesmo é o
caso com relação ao Tathagata. Ele aparece no mundo. Humanos e
deuses podem pensar: ‘O Tathagata está agora diante de nós e vive’. O
surdo e o mudo vêem o Tathagata como alguém surdo e mudo. Diver-

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 262


sas são as linguagens que os seres falam. Cada um pensa que o Tatha-
gata fala como ele ou ela, ou pensa: ‘Na minha casa, o Tathagatae-rec
beu oferecimentos’. Ou uma pessoa pode ver o tamanho do Tathagata
como sendo muito grande e imensurável; ou alguém pode vê-lo como
muito pequeno; ou uma pessoa pode confundi-lo com um Sravaka ou
um Pratyekabuda; ou vários tirthikas podem pensar e dizer: ‘O Tatha-
gata está agora na minha linha de pensamento [seguindo minha linha
de pensamento] e está praticando a Via’. Ou uma pessoa pode pensar :
‘O Tathagata apareceu somente para mim’. A verdadeira natureza do
Tathagata é como aquela da lua. Isto significa dizer que ela é o Corpo-
de-Dharma, o Corpo do não-nascimento, ou aquele do expediente. Ele
responde ao chamado do mundo, sendo inumeráveis as suas manifes-
tações. O Carma Original manifesta-se de acordo com as diferentes
localidades. Isto é como no caso da lua. Por essa razão, o Tathagata é
Eterno e Imutável.

Também, além disso, oh bom homem! Rahu-asura-raja (um dos quatro


reis Asura) encobre a lua com as suas mãos. Todas as pessoas do mun-
do dizem que isto é um eclipse da lua. Mas Rahu-asura-raja não pode
causar qualquer eclipse à lua. Ele meramente obstrui a luz da lua. A lua
é redonda. Não há parte (nela) que sobressaia (quando a obstrução é
parcial). Somente como um resultado da obstrução a plenitude da sua
luz é encoberta. Uma vez que as mãos sejam retiradas, as pessoas do
mundo dizem que a lua recuperou o seu poder. Todos dizem que essa
lua sofre um bocado. Mas mesmo 100 mil reis asuras não poderiam
causar-lhe sofrimento. O caso é semelhante. O mesmo é o caso com o
Tathagata. Os seres concebem maus pensamentos sobre o Tathagata,
causam derramamento de sangue, cometem os cinco pecados mortais
e agem [como] icchantikas. As coisas são mostradas dessa maneira.
Para o benefício dos seres que virão, (as conseqüências cármicas de)
essas coisas são mostradas na forma de ações contra a Sangha, trans-
gressão do Dharma e surgimento de obstáculos. Maras tão inumerá-
veis quanto 100 trilhões não podem esperar causar (o menor) derra-
mamento de sangue do corpo do Buda. Por que não? Porque o corpo
do Tathagata não é constituído de carne, sangue, nervos, tutano ou
Capítulo 15
Sobre
– a Parábola da Lua Página 263
ossos. O Tathagata realmente não tem nenhuma preocupação com a
desintegração. Os seres dizem
: ‘O Dharma e a Sangha desintegraram e
o Tathagata está morto’. Mas o Tathagata, por natureza, é todo verd
a-
deiro e não há mudança ou dissolução. Seguindo o caminho do mundo,
ele manifesta-se assim.

Também, além disso, oh bom homem! Duas pessoas lutam com espa-
das e bastões, causando lesões corporais, derramamento de sangue e
morte. Mas se eles não tivessem intenção de matar, a conseqüência
cármica seria leve, e não pesada. O mesmo é o caso [aqui]. Mesmo em
relação ao Tathagata, se uma pessoa não tem intenção de matá-lo, o
mesmo se aplica à sua ação. Ela é leve e não pesada. O mesmo é o caso
com o Tathagata. Para guiar os seres nos dias que virão, ele mostra as
conseqüências cármicas (leves ou pesadas que os seres carregam).

A Parábola do Bom Filho


Também, além disso, oh bom homem! Isto é como o doutor que envi-
da esforços e compartilha conhecimentos médicos básicos com o seu
filho, dizendo que este é o remédio-raiz, este é para o sabor, aquele é
para a cor etc., assim permitindo que o seu filho se torne familiarizado
com as várias propriedades [dos remédios]. O filho presta atenção
àquilo que o seu pai diz, esforça-se, aprende e vem a compreender
todos os [diferentes] tipos de remédios. Chega o tempo em que seu pai
morre. O filho se enternece, chora e z:di‘o pai ensinou-me dizendo que

este
mesmo é oseremédio-raiz, oeste
passa com é a haste,
Tathagata. No este é a de
sentido florguiar-nos,
e este é ele
a cor’.
impõeO
aos seres muitas restrições. Dessa forma, devemos tentar agir em con-
cordância [com essas restrições] e não contrariá-las. Para aquelas pes-
soas dos cinco pecados mortais, para aqueles caluniadores do Dharma
Maravilhoso, para os icchantikas e para aqueles que podem cometer
tais ações (caluniosas) nos dias que virão, ele manifesta-se de acordo.
Tudo isso é para os dias após a morte do Buda, para os Monges sabe-

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 264


rem que estes são pontos importantes nos sutras, estes são os aspec-
tos pesados e leves dos preceitos, estas são as passagens do Abhi-
dharma que são importantes ou não importantes. Isto é para permitir-
lhes ser como o filho do doutor.

Também, além disso, oh bom homem! Os humanos vêem, uma vez a


cada seis meses, um eclipse lunar. Nos céus superiores, apenas por um
(curto) tempo, nós vemos o eclipse lunar. Por quê? Porque os dias são
mais longos lá nos céus e mais curtos no mundo humano. Oh bom
homem! O mesmo se passa com o Tathagata. Ambos, deuses e huma-
nos dizem: ‘A vida do Tathagata é curta’. Isto é como (ocorre) com os
seres dos céus que vêem o eclipse da lua frequentemente por um cur-
to tempo (ou seja, num dia celeste cabem muitos dias terrestres). O
Tathagata, de forma semelhante, num curto tempo manifesta 100
milhares de milhões de bilhões de Nirvanas, destruindo os Maras das
ilusões, dos skandas e da morte. Portanto, todos os 100 milhares de
milhões de bilhões de Maras celestiais sabem que o Tathagata entra no
Nirvana. Também, eles mostram 100 milhares de inumeráveis (milhões
de bilhões) carmas. Tudo isto advém do fato de que ele segue as várias
naturezas do mundo. Assim, ele segue com as suas manifestações. Elas
são inumeráveis, ilimitadas e inconcebíveis. Por esta razão, o Tahagata
é Eterno e Imutável.

O Brilho da Lua

Também, além
tam ao olhar disso, da
o brilho ohlua.
bomEste
homem! Por exemplo,
é o porquê amos aoslua
cham seres se edelei-
de ‘aqu -
la que é agradável de ver’. Se os seres estiverem possuídos pela cobiça
(avareza), a malevolência e a ignorância, não haverá prazer em vê-la. O
mesmo se passa com o Tathagata. A natureza do Tathagata é pura,
boa, limpa e imaculada. Isto é o que há de mais prazeroso para con-
templar. Os seres que estão em harmonia com o Dharma não hesitarão
(e sentirão prazer) em ver; aqueles com maus pensamentos não senti-

Capítulo 15
Sobre
– a Parábola da Lua Página 265
rão prazer em ver. Por essa razão dizemos que o Tathagata é como o
Brilho da Lua.

Também, além disso, oh bom homem! Com respeito ao nascer do sol,


há três diferenças de tempo, a saber: primavera (e outono – equinó-
cios), verão e inverno (solstícios). No inverno, os dias são mais curtos;
na primavera/outono eles são iguais, e no verão são mais longos. O
mesmo se passa com o Tathagata. Nos 3.000 grandes sistemas de mil
mundos, para todos aqueles (seres) de vida breve e Sravakas, ele mani-
festa uma vida curta. Vendo isto, dizem: ‘A vida do Tathagata é curta’.
Isso é comparável a um dia de inverno. Para Bodhisattvas ele manifesta
uma vida de média-duração. Ela pode durar um kalpa ou menos. Isso é
semelhante aos dias de primavera. Somente o Buda pode conhecer a
vida do Buda. Isto, por exemplo, é como os dias de verão. Oh bom
homem! O ensinamento sutil e secreto do Mahayana Vaipulya do Ta-
thagata é concedido ao mundo como um grande aguaceiro do Dharma.
Nos dias que virão, se qualquer pessoa ostentar, proteger, revelar,
compreender [tais ensinamentos] e beneficiar os seres, saiba que essa
pessoa é um verdadeiro Bodhisattva. Esta é a doce chuva dos céus que
cai no verão. Se Sravakas e Pratyekabudas ouvirem o ensinamento
secreto do Buda-Tathagata, isto é como o encontro com um grande
frio num dia de inverno. Se um Bodhisattva ouve o ensino secreto,

isto é, que o Tathagata é Eterno e Imutável
– isto é como o desabro-
char que vem com a primavera. A natureza do Tathagata não é longa e
nem curta; ele manifesta-se (assim) para o benefício do mundo. Esta é
a verdadeira natureza de todos os Budas.

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, as estrelas não


são vistas durante o dia. Aítodos dizem: ‘As estrelas morrem durante o
dia’. Mas de fato elas não morrem. A razão de elas não serem vistas
vem do fato de que o sol está brilhando resplandecente. O mesmo
ocorre com o Tathagata. Os Sravakas e Pratyekabudas não podem vê-
lo. Isto é como no caso das estrelas que não podem ser vistas durante
o dia.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 266


Também, oh bom homem! Por exemplo, na escuridão da noite, sol e
lua não são vistos. O ignorante diz: ‘O sol e a lua morreram’. Mas, na
verdade, o sol e a lua não se perderam. O caso é assim. Na época em
que o Dharma Maravilhoso do Tathagata morre, os Três Tesouros tam-
bém não são vistos. Esta é uma situação análoga. Não é que eles (os
Três Tesouros) tenham partido eternamente. Assim sendo, deveríamos
saber que realmente o Tathagata é Eterno e que ele é Imutável. Por
quê? Porque a verdadeira natureza dos Três Tesouros não fica man-
chada por quaisquer ilusões.

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, no crepúsculo do


dia, um cometa pode aparecer brilhando intensamente à noite como
uma chama. E logo ele morrerá. Os seres vêem isto e [dizem que ele]
pressagia má sorte. O caso é análogo a todos os Pratyekabudas, tam-
bém. Nascendo nos dias sem um Buda, os sereslham o e dizem: ‘O
Tathagata realmente morreu’. E assim eles nutrem pensamentos de
apreensão e tristeza. Mas, para dizer a verdade, o Tathagata não mor-
reu. Ele é como o sol e a lua, que não conhecem extinção.

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, quando o sol nas-
ce, todo o nevoeiro se dispersa. A situação é a mesma com relação ao
Sutra do Grande Nirvana. Se dermos ouvidos uma única vez a ele, toda
a maldade e o karma do Inferno Avichi morrerão. Ninguém pode pene-
trar o que se conquista neste Grande Nirvana (assim como não vemos
o sol na escuridão da noite), que expõe o repositório secreto da natu-
reza do Tathagata. Por esta razão, bons homens e boas mulheres nutri-
rão um pensamento de que o Tathagata é Eterno, é Imutável, que o
Dharma não cessa de ser, e que o Tesouro da Sangha não morre. As-
sim, deveríamos empregar todos os meios, empreendermos esforços e
aprender esse sutra. Essa pessoa, ao longo do tempo, atingirá a Insupe-
rável Iluminação. Este é o porquê esse sutra é dito conter inumeráveis
virtudes e é também chamado aquele que não conhece (ou concebe) o
fim da iluminação. Em razão desta infinitude, podemos dizer Mahapa-
rinirvana. A luz de Brilho Excelente como nos dias de sol. Como ele é
ilimitado, dizemos Grande Nirvana.”
Capítulo 15
Sobre
– a Parábola da Lua Página 267
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 268
Capítulo Dezesseis: Sobre o Bodhisattva
“Também, além disso, oh bom homem! De todas as luzes, a luz do sol e
da lua é insuperável. Nenhuma outra luz se iguala a ela. O mesmo se
passa com a luz do Grande Nirvana, que é a mais maravilhosa de todas
as luzes dos sutras e Samadhis. É algo que não pode ser alcançado por
qualquer das luzes de qualquer dos sutras e Samadhis. Por que não?
Porque a luz do Grande Nirvana penetra completamente nos poros da
pele. Embora os seres possam não possuir o Bodhichitta (autodetermi-
nação de atingir a iluminação), ela ainda causa o Bodhi (é um termo
Pāli e Sânscrito para o estado ‘desperto’ ou ‘iluminado’). Esse é or-po
quê dizermos ‘Mahaparinirvana’.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Você diz que a luz do Grande Nirvana penetra os poros da pele de to-
dos os seres e que ela evoca a mente do Bodhi, se os seres não a têm.
Isto não é assim. Por que não? Se for assim, que diferença pode haver
entre aqueles que cometeram as quatro graves ofensas, aqueles que
cometeram os cinco pecados mortais, os icchantikas e aqueles que
mantêm em observância os puros preceitos e praticam todas as boas
ações; se for o caso em que a luz penetra os poros da pele e faz o Bodhi
acontecer? Se não existe diferença, como é que o Tathagata fala sobre
os significados das quatro coisas para estabelecê-la? Oh Honrado pelo
Mundo! Em contradição ao fato que, como você o Buda diz, se ouvir-
mos uma vez o Grande Nirvana, todas as impurezas serão aniquiladas,
você, o Tathagata, estabeleceu anteriormente que mesmo em meio às

pessoas
no lugar que concebam
de Budas o Bodhichitta
tão numerosos [decidam
quanto alcançar
às areias a Iluminação]
do Ganges, [ainda]
haverá aqueles que não alcançarão o significado do Grande Nirvana.
Como poderia uma pessoa erradicar a raiz das impurezas sem antes
alcançar o significado?”

O Buda disse: “Oh bom homem! Todas as pessoas, exceto os icchanti-


kas, ganham a causa da Iluminação tão logo elas ouçam este sutra. Se a

CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 269
voz do Dharma e a luz [do Grande Nirvana] penetrarem os poros da sua
pele, elas infalivelmente atingirão a Iluminação Insuperável. Por que é
assim? Se alguém fizer verdadeiramente oferecimentos e prestar ho-
menagem a todos os Budas, essa pessoa seguramente encontrará oca-
sião para ouvir o Sutra do Grande Nirvana. Pessoas não dotadas de boa
sorte não serão abençoadas com a audição deste sutra. Por que não?
Uma pessoa de grande virtude estará realmente apta a dar ouvidos a
algo tão importante como este. Os mortais comuns e aqueles dos graus
inferiores (aos do mortal comum) não podem facilmente dar ouvidos a
ele (este sutra). O que é que é Grande? Nada mais que o Repositório
Secreto de todos os Budas, que é a Natureza do Tathagata. Isto é o
porquê dizemos importante.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Como pode uma pessoa que ainda não concebeu o Bodhichitta esperar
pela causa da Iluminação?”

O Buda disse a Kashyapa: “Se alguém que tenha ouvido este Sutra do
Grande Nirvana disser que ele nunca conceberá o Bodhichitta e [assim]
cometer calúnias, essa pessoa verá um Rakshasa num sonho e sentirá
medo. E o Rakshasa dirá: ‘Hey, bom homem! Se o Bodhichitta nãor-su
gir em você, certamente tomarei a suaida’.
v Sentindo medo e aco r-
dando do seu sonho, a pessoa aspirará o Bodhi. Após a morte, aquela
pessoa nascerá nos três reinos do infortúnio, ou no mundo dos huma-
nos ou seres celestiais, e ela pensará sobre o Bodhichitta. Saiba que
essa pessoa é um grande Bodhisattava. Assim o grande poder divino
desse Sutra do Nirvana possibilita à pessoa que não aspirava a Ilumina-
ção atingir a causa da Iluminação. Oh bom homem! Isto é como um
Bodhisattva aspira o Bodhi. Não é que não haja causa. Assim, os mara-
vilhosos sutras Mahayana são o que o Buda falou.

Também, além disso, oh bom homem! Uma grande nuvem de chuva se


forma no céu, e a chuva cai sobre a terra. A água não permanece nas
árvores mortas, montanhas rochosas, planaltos e elevações. Mas como
ela flui para as pradarias abaixo, todos os lagos se tornam cheios, bene-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 270
ficiando inumeráveis pessoas. O caso é o mesmo com o Sutra do Gran-
de Nirvana. Ele drena a grande chuva do Dharma, beneficiando os se-
res. Somente os icchantikas não aspiram à Iluminação.

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, uma semente


queimada não brotará, mesmo se a chuva cair sobre ela por um perío-
do de 100 bilhões de kalpas. Nunca haverá uma situação em que essa
semente brotará. O mesmo acontece com o icchantika. Nenhum broto
de Iluminação eclodirá, mesmo que o icchantika dê ouvido a este todo-
maravilhoso Sutra do Grande Nirvana. Tal coisa nunca poderá aconte-
cer. Por que não? Porque essa pessoa aniquilou totalmente as raízes da
benevolência. Como com a semente queimada, nenhuma raiz ou broto
do Bodhichitta nascerá.

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, colocamos uma


gema brilhante numa água turva. Mas, pela virtude da gema, a água
por si só tornar-se-á clara. Porém, mesmo essa gema, se colocada na
lama, não poderá fazer a lama clarear. O mesmo se passa com esse
Todo-Maravilhoso Sutra do Grande Nirvana. Se colocado na água im-
pura da pessoa culpada de cometer os cinco pecados mortais e daque-
les que cometeram as quatro graves ofensas também, ele poderá re-
almente ainda evocar o Bodhichitta. Mas na lama do icchantika, mes-
mo após 100 bilhões de anos, a lama não poderá tornar-se clara e ele
não poderá evocar o Bodhichitta. Por que não? Porque esse icchantika
aniquilou totalmente as raízes da benevolência e não tem mais valor. O
homem (o icchantika) pode ouvir esse Sutra do Grande Nirvana duran-
te 100 bilhões de anos e, ainda assim, não poderia acontecer de surgir
o Bodhichitta [dentro dele]. Por que não? Porque ele não tem bons
pensamentos.

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, existe uma árvore
medicinal cujo nome é ‘rei dos remédios’. De todos os remédios, esse é
o melhor. Ele pode ser bem misturado com leite, mel, manteiga, água
ou suco; ou ele pode ser feito na forma de pó ou pílulas, ou podemos
aplicá-lo às feridas, ou cauterizar o corpo com ele, ou aplicá-lo aos o-
CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 271
lhos; ou podemos olhá-lo ou cheirá-lo. Ele cura todas as doenças e
enfermidades dos seres. Essa árvore medicinal não diz para si mesma:
‘Se os seres tomarem a raiz, ele
s não devem tomar as folhas; se eles
tomarem as folhas, eles não devem tomar a raiz; se eles tomarem a
madeira, eles não devem tomar a casca; se eles tomarem a casca, eles
não devem tomar a madeira’. Embora a árvore não pense dessaa-m
neira, no entanto ela pode curar todas as doenças e enfermidades. O
caso é similar. Oh bom homem! O mesmo também é o caso com esse
Sutra do Nirvana. Ele pode acabar totalmente com todas as más ações,
as quatro graves ofensas, os cinco pecados mortais e quaisquer más
ações internas ou externas [do pensamento, das palavras, ou das a-
ções]. Qualquer pessoa que ainda não tenha aspirado ao Bodhichitta
virá de fato a aspirá-lo. Como assim? Porque este todo-maravilhoso
sutra é o Rei de todos os sutras, assim como a árvore medicinal é o rei
de todos os remédios. Podem existir aqueles que tenham aprendido
esse Sutra do Grande Nirvana ou aqueles que não tenham aprendido.
Ou eles podem ter ouvido o nome deste sutra e, ao ouvi-lo, vieram a
respeitá-lo e compreendê-lo. Através disso, todas as grandes doenças
das impurezas serão aniquiladas. Somente o icchantika não pode espe-
rar atingir a Iluminação Insuperável, como no caso do remédio todo-
maravilhoso que, embora ele de fato cure todas as doenças e enfermi-
dades, não pode curar aquelas pessoas que estão à beira da morte.

Também, além disso, oh bom homem! Podemos ter uma ferida em


nossa mão. Se derramarmos veneno nela, esse veneno penetrará; se
não houver ferida, o veneno não penetrará. O mesmo ocorre com o
icchantika. Não existe (nele) causa para o Bodhichitta. Ele é como al-
guém que não tem ferida em sua mão. Assim, não pode haver pene-
tração. A assim chamada ferida é a causa da Iluminação Insuperável; o
veneno é o insuperável remédio maravilhoso. Aquele que não tem
ferida é um icchantika.

Também, além disso, oh bom homem! Um diamante é algo que nin-


guém de fato pode quebrar. Ele verdadeiramente corta todas as coisas,
exceto o casco da tartaruga e o chifre do bode. O mesmo acontece
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 272
com esse sutra. Ele realmente coloca todos os seres seguramente no
caminho da Iluminação. Ele somente não pode fazer a classe de pesso-
as dos icchantikas obter a causa da Iluminação.

Também, além disso, oh bom homem! Podemos cortar os ramos ou os


talos da urslane (beldroega - Erva da família das urticáceas também
conhecida como potulaca ou purslane), da sala ou da niskara, mas os
ramos vão crescer novamente, exatamente como antes; mas com a
árvore tala [palmeira de leque], quando um ramo é cortado, nenhum
outro pode crescer novamente [naquele lugar]. O caso é análogo. Se
ouvirmos esse Sutra do Grande Nirvana, mesmo aquelas pessoas das
quatro graves ofensas e dos cinco pecados mortais podem ainda real-
mente cultivar a causa do Bodhichitta. Com o icchantika, as coisas não
podem ser assim. Mesmo ouvindo esse belo sutra, ele não pode alcan-
çar a causa da Iluminação.

Também, além disso, oh bom homem! O mesmo é o caso com a khadi-


ra [acácia catechu] e a tinduka [diospiros embryoteris], as quais, uma
vez que seus ramos tenham sido cortados, nunca mais soltam brotos
novamente. O mesmo se passa com o icchantika. Ele pode ouvir este
Sutra do Grande Nirvana, mas nenhuma causa do Bodhichitta surgirá.

Também, além disso, oh bom homem! É como no caso da grande chu-


va que nunca permanece no céu. O mesmo acontece com esse todo-
maravilhoso Sutra do Grande Nirvana. Este sutra faz precipitar a chuva
do Dharma. Ele não paira sobre o icchantika. O corpo inteiro do icchan-
tika é tão minuciosamente feito que ele poderia ser bem comparado
ao diamante, o qual nunca permite que outras coisas o penetrem. O
mesmo é o caso [aqui].”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Exatamente como você diz


num verso:

‘Uma pessoa não vê ou faz o bem;


o que ela faz é a maldade.
CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 273
Isto deveria ser muito temido,
como no caso de uma estrada que é íngreme e difíci
l de passar.’

Oh Honrado pelo Mundo! Qual é o significado disto?”

O Buda disse: “Oh bom homem! Dizemos que ‘não vemos’, o que sign i-
fica que nós não vemos a Natureza-de-
Buda. ‘Bem’ refere-se à Ilumina-
ção Insuperável. Dizemos que ‘não fazemos’, o que signi
fica dizer que
nós não nos aproximamos de um bom amigo [bom mestre do Budis-
mo]. Nós ‘apenas vemos’ significa dizer que nós vemos as coisas como
não tendo relações causais. Por maldade entende-se a calúnia aos Su-
tras Mahayana Vaipulya. ‘Fazer’ corresponde fala
à dos icchantikas
dizendo que não pode haver qualquer Vaipulya. Em razão disto, não
existe oportunidade para o icchantika voltar o seu pensamento para
aquilo que é puro e bom. O que é ‘Bom Dharma’? É Nirvana. Aquele
que caminha ao longo da via do Nirvana realmente pratica o que é
sábio e bom. Com o icchantika, não há nada que seja sábio e bom.
Como resultado, não pode haver retorno em direção ao Nirvana. O que
devemos ‘temer’ significa o temor de caluniar o Dharma Maravilhoso.
Quem tem medo? É o sábio. Por quê? Porque uma pessoa que calunia
não tem bons pensamentos e nem bons expedientes. A via (estrada)
que é difícil de passar faz alusão a todas as práticas.”

Kashyapa ainda disse: “Você, o Tathagata, diz:

‘Como vemos o que é feito?


Como obtemos o Bom Dharma (a Boa Lei),
e onde está o lugar do destemor?
É como com a plana estrada real.’

O que isto significa?”

O Buda disse: “Oh bom homem! ‘Ver o que é feito’ é simplesmente


desnudar todos os males feitos. Quando todos os males feitos desde o
início do nascimento e da morte tiverem sido postos a nu, chegamos a
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 274
um lugar onde não há mais para onde ir. Como resultado, o que existe
aqui (neste lugar) é destemor. Por exemplo, é como no caso de uma
estrada real na qual todos os ladrões se escondem. Uma vez desnuda-
das, todas as maldades tornam-se aniquiladas, e nada fica para trás.

Também, além disso, ‘não ver o que fazemos’ significa que o icchantika
não vê tudo o que ele faz. Esse icchantika, com base na arrogância,
perpetra muitas más ações. Agindo assim, ele não tem medo. Como
resultado, ele não pode atingir o Nirvana. Por exemplo, isto é como no
caso de um macaco que tenta agarrar a lua refletida na superfície de
um lago. Oh bom homem! Mesmo que todos os inumeráveis seres
atingissem a Iluminação Insuperável em um momento, nenhum dos
Tathagatas veria o icchantika atingindo a Iluminação. Por essa razão,
dizemos que ‘o que é feito não é visto’. Além disso, qual ação que não
é vista? Aquela do Tathagata. O Buda, para o benefício dos seres, diz
que existe a Natureza-de-Buda. O icchantika, ainda que repetindo vi-
das, não pode conhecer ou ver [a Natureza-de-Buda]. Este é o porquê
dizemos que não vemos o que o Tathagata faz. Também, o icchantika
pensa que o Tathagata entra no Nirvana por razões óbvias, dizendo
que tudo é transitório, exatamente como quando a chama se apaga, é
porque o óleo acabou. Por quê? Porque as más ações dessa pessoa
nunca chegam a um fim. Se houver um Bodhisattva aqui que transfira
[os méritos de] todas as boas ações que ele tem feito com vistas à Ilu-
minação Insuperável àqueles da classe dos icchantikas, eles cometerão
a calúnia e não compreenderão. A despeito disto, todos os Bodhisatt-
vas perseveram como sempre na doação e no desejo de atingir a Ilu-
minação. Por quê? Isto é como as coisas se procedem com as leis
[dharmas] de todos os Budas.

‘A maldade é feita,
mas o resultado não aparece de uma só vez.
Ele aparece como a nata que vem do leite.
Isso é como quando a cinza é colocada sobre um fogo
e o ignorante descuidadamente pisa nele’.

CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 275
O icchantika é o cego. Ele não vê o caminho do Arhatship, o caminho
ao longo do qual o Arhat não toma o íngrime e árduo rumo da vida-e-
da-morte. Sendo cego, ele calunia o Vaipulya e não deseja praticar a
Via, como o Arhat que procura aprender a compaixão. Dessa maneira,
o icchantika não pratica o Vaipulya. Pode haver uma pessoa que diga:
‘Eu não acredito nos sutras do Sra
vaka. Eu acredito no Mahayana, reci-
to os sutras e os exponho. Assim, agora sou um Bodhisattva. Todos os
seres possuem a Natureza-de-Buda. Em razão da Natureza-de-Buda, os
seres possuem dentro de si os 10 poderes, os 32 sinais de perfeição e
as 80 características menores de excelência. O que eu digo não difere
daquilo que o Buda diz. Você agora destrói, junto comigo, um incontá-
vel número de impurezas, agora posso ver a Iluminação Insuperável’. A
pessoa pode dizer isto. Embora ela fale dessa maneira, ela não acredita
que as pessoas têm dentro delas o Natureza-do-Tathagata. Apenas em
prol do lucro, essa pessoa fala dessa maneira, seguindo o que está
escrito. Aquele que assim fala é mau. Essa má pessoa não obterá resul-
tado, como o do leite tornando-se nata. Por exemplo, um emissário de
um rei fala bem e habilmente desenvolve os expedientes e as tarefas
nos países estrangeiros. Mesmo ao custo de sua vida, ele não deixa de
dizer, até o final, o que ele tem que dizer em nome do rei. O mesmo se
passa com um homem sábio, também. Ele não se importa muito com a
sua própria segurança, mas sempre fala a respeito da doutrina secreta
do Mahayana Vaipulya e diz que todos os seres possuem a Natureza-
de-Buda.

Oh bom homem! Existe um icchantika que personifica um Arhat e vive


num lugar quieto caluniando os sutras Mahayana Vaipulya. Todo mun-
do, vendo-o, diz que ele é um verdadeiro Arhat, um grande Bodhisatt-
va. Esse icchantika, um Monge mau, vive num lugar quieto e quebra a
lei de um lugar quieto. Vendo outros obterem benefícios, ele sente
ciúmes e diz: ‘Todos os sutras Mahayana Vaipulya são aquilo que os
Marapapiyas falam’. Ou ele pode dizer: ‘O Tathagata é não
-eterno’. Ele
transgride contra o Dharma Maravilhoso e causa desavença na Sangha.
Palavras como estas (ditas por este mau Monge) são de Mara e não
uma doutrina que é boa e mansa. Isso é o que é mau. Essa pessoa faz o
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 276
mal, mas as conseqüências daquelas más ações não se manifestam
imediatamente, como a nata não surge [imediatamente] do leite; ou
como quando as cinzas são colocadas sobre o fogo, o ignorante desde-
nha delas e pisa nele. O icchantika é essa pessoa. Portanto, devemos
saber que os Todo-Maravilhosos Sutras Vaipulya do Mahayna são defi-
nitivamente puros. Isso é como no caso da mani [jóia, gema] que,
quando colocada numa água turva, torna a água clara e transparente.
O mesmo ocorre com os Sutras Mahayana também.

A Maravilhosa Causa da Iluminação

Além do mais, oh bom homem! Por exemplo, é como no caso do lótus


em botão, o qual, quando o sol o ilumina, ele nunca falha em abrir. O
mesmo é o caso com os seres. Uma vez encontrado o sol do Grande
Nirvana, alguém não familiarizado com a Iluminação irá aspirá-la e
plantará a semente da Iluminação. Este é o porquê eu digo: ‘Quando a
luz do Grande Nirvana penetra os poros da pele, isto provoca imedia-
tamente a Maravilhosa Causa da Iluminação’. O icchantika possui a
Natureza-de-Buda, mas encoberta por inumeráveis impurezas, ele não
pode esperar escapar, à semelhança do bicho-da-seda. Por esta razão,
ele não pode ganhar a Toda-Maravilhosa Causa da Iluminação, mas
recicla entre nascimentos e mortes interminavelmente.

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, é como o que


acontece com a utpala, a padma, a kumuda ou o pundarika [diversos

tipos do lótus],
culados os quais
pela lama. Commuito emborapessoa
qualquer nascidosque
na lama, nãoo são
estude ma-
Todo-
Maravilhoso Sutra do Grande Nirvana, acontece o mesmo. Embora a
pessoa tenha impurezas, mesmo assim ela não é manchada por elas.
Por que não? Em razão do poder (de alguém) que conhece a Natureza-
do-Tathagata. Por exemplo, oh bom homem! Existe uma terra onde há
uma grande corrente de vento frio. Se ele entra em contato com o
corpo e os poros da pele dos seres, ele acaba com toda a preocupação

CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 277
(mal estar) da falta de umidade. O mesmo acontece com este Sutra
Mahayana do Grande Nirvana. Ele penetra os poros da pele dos seres e
engendra as delicadas relações [causais] da Iluminação. Todavia, a situ-
ação é diferente com o icchantika. Por quê? Porque ele não é um re-
ceptáculo do Dharma.

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, um bom médico


conhece oito tipos de remédios e cura as doenças, exceto a asadhya
[doença incurável]. A mesma situação ocorre com os sutras, dhyanas e
samadhis. Eles curam todas as impurezas da cobiça, indolência e igno-
rância, e de fato extraem as flechas envenenadas, mas não podem
curar as quatro graves ofensas e os cinco pecados mortais.

Oh bom homem! Também, existe um bom médico que conhece para


além dos oito tratamentos, através dos quais ele efetivamente cura
todas as doenças dos seres. Somente a asadhya ele é incapaz de curar.
O mesmo é o caso com esse Sutra Mahayana do Grande Nirvana. Ele
verdadeiramente cura as preocupações dos seres e lhes permite des-
cansar em paz na causa toda-maravilhosa do Tathagata [a causa que os
faz tornarem-se Tathagatas], e faz com que aqueles que ainda não
aspiraram à Iluminação venham a aspirá-la, exceto o icchantika, que
tem a certeza de morrer.

Também, além disso, oh bom homem! Um bom médico pode realmen-


te curar o cego com remédios maravilhosos, e o cego passará a ver
todas as formas do sol, da lua e das constelações. Somente aqueles
congenitamente cegos ele não pode curar. O caso é como este. Seme-
lhante ao que ocorre com o Sutra Mahayana do Grande Nirvana. Ele
abre os olhos dos Sravakas e Pratyekabudas, concede-lhes os olhos da
Sabedoria e permite-lhes descansar em paz no inumerável grande nú-
mero de sutras Mahayana. Mesmo aqueles que não aspiravam à Ilumi-
nação, bem como aqueles que cometeram as quatro graves ofensas e
os cinco pecados mortais, podem também aspirar à Iluminação, exceto
os congenitamente cegos icchantikas.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 278


Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, um bom médico
conhece oito tipos de tratamentos e cura todas as doenças e dores dos
seres. Vários tipos de tratamentos e remédios são prescritos de acordo
com a doença. No caso de vômitos e intestino solto, o remédio pode
ser espalhado sobre o corpo e aspergido no nariz, ou se usa a cauteri-
zação ou um remédio para assepsia, ou o remédio é administrado na
forma de pílulas ou pó. O remédio pode ser dado de todas essas ma-
neiras. Ainda assim, o pobre e ignorante não deseja tomá-lo. Sentindo
piedade deles, o bom médico os leva para a sua própria casa e obriga-
os a tomar o remédio. Devido ao poder do remédio, a doença desapa-
rece. Existe uma paciente mulher, cujo cordão umbilical não saiu. Após
o remédio ter sido tomado, o cordão sai imediatamente e faz com que
a criança se sinta tranqüila. O mesmo acontece com esse Sutra Maha-
yana do Grande Nirvana. Onde quer que ele vá, seja na casa de qual-
quer ser, todas as preocupações são erradicadas, tais como aquelas das
quatro graves ofensas e dos cinco pecados mortais, e aqueles que ain-
da não aspiram à Iluminação despertam para ela, exceto o icchantika.”
O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! As
quatro graves ofensas e os cinco pecados mortais são, de fato, a mais
grave de todas as doenças. É como cortar o caule da árvore, que tem
como resultado o não aparecimento de novos ramos. Como pode uma
mente sem aspiração à Iluminação abrigar a causa da Iluminação?”

O Buda disse: “Oh bom homem! Por exemplo, essas pessoas têm o- s
nhos nos quais elas caem no inferno, sofrem dores lá e se arrependem
dizendo: ‘Oh, essa dor! Nós as provocamos e as atraímos para nós
mesmos. Se pudermos sair disto, certamente cuidaremos da Ilumina-
ção. O que temos (aqui) é o pior [dos sofrimentos]’. Despertando do
seu sonho, eles vêm a enxergar a grande recompensa do Dharma Ma-
ravilhoso aguardando-lhes. É como no caso da criança que gradual-
mente cresce e pensa: ‘Esse é o médico que melhor entende de s-pre
crições e medicamentos. Quando eu ainda estava no útero, ele medi-
cou a minha mãe. Como conseqüência disso, ela ficou em paz e, em
razão desses fatores circunstanciais, fiquei fora de perigo. Oh, quão
CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 279
terrível que minha mãe tenha sofrido grandes dores. Por dez meses ela
protegeu-me e carregou-me. Após o meu nascimento, ela cuidou para
que eu não ficasse muito seco ou muito molhado, vendo através das
minhas excreções; ela deu-me leite e alimentou-me. Por tudo isto,
devo lhe retribuir o meu débito, ver os seus sentimentos, ser obediente
e servir-lhe’.

Uma pessoa pode ter cometido as quatro graves ofensas e os cinco


pecados capitais. Mas se no momento da sua passagem deste mundo
(na morte) ela pensa neste Sutra Mahayana do Grande Nirvana, isto irá
gerar a causa da iluminação, mesmo que a pessoa possa estar no infer-
no, ou nasça como um animal, espírito faminto, ou nasça nos céus ou
como um humano, exceto o icchantika.

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, um bom médico e


o seu filho sabem muito e superam de longe os outros. Eles conhecem
encantos maravilhosos e antídotos para venenos. O caso pode ser a-
quele das serpentes de veneno mortal, a naga ou a víbora, mas o efeito
dos seus encantos medicinais salva. Esse bom remédio é espalhado
numa bota de couro e, se a bota tocar o veneno, este perderá a sua
virulência, exceto para aquele (veneno) da ‘mahanaga’. O mesmo a-
contece com o Sutra Mahayana do Grande Nirvana. Aqueles seres que
cometeram as quatro graves ofensas ou os cinco pecados mortais,
todos são desintoxicados e atingem a Iluminação. Isto é análogo ao
couro desentoxicado da bota. Uma pessoa que não tem o Bodhichitta
adquire-o e desperta para a insuperável Iluminação. Tudo isto vem a
ocorrer através do efeito do remédio divino do Sutra Mahayana do
Grande Nirvana. Todos os seres são colocados em paz, exceto a maha-
naga e o icchantika.

Também, além disso, oh bom homem! Um homem pode ter inventado


uma nova poção e espalhado-a sobre um tambor que, quando é batido
em meio à multidão, faz com que o som os arrebate. Ninguém deseja
ouvi-lo. Mas qualquer um que não o ouça morre, exceto ele (o icchan-
tika) que é imune à morte. O mesmo é o caso com este Sutra Mahaya-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 280
na do Grande Nirvana. Qualquer pessoa, de qualquer lugar ou profis-
são, ao ouvir este som, acaba com todas as impurezas como a cobiça, a
indolência e a ignorância. Pode haver aqueles que não pensam a res-
peito dele, mas em razão do grande poder gerado pelo Sutra do Gran-
de Nirvana, as impurezas desaparecem e as amarras se rompem.
Mesmo aqueles das quatro graves ofensas e dos cinco pecados mor-
tais, quando ouvem este sutra, geram a causa da Iluminação Insuperá-
vel e, gradativamente, cortam as amarras das impurezas, exceto o ic-
chantika que é imune à morte.

O Alvorecer do Grande Nirvana

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, conforme o cre-


púsculo cai, todos param de trabalhar. Uma pessoa cujo trabalho não
terminou sempre espera pelo alvorecer. Aqueles que praticam o Ma-
hayana praticam todos os tipos de sutras e samadhis, mas eles sempre
esperam o alvorecer do Sutra Mahayana do Grande Nirvana. Ouvindo
este ensinamento secreto do Tathagata, eles dão srcem às ações para
a Iluminação, e então vêm a residir no Dharma Maravilhoso. Isso é
como no caso da chuva que cai do céu sobre todas as coisas, umedece-
as, beneficia e desenvolve-as, e uma rica colheita resultará de tal ma-
neira que acabe com a fome. O mesmo é o caso com a incrível abun-
dância da chuva secreta do Dharma do Tathagata. Ela realmente acaba
com as febres. O aparecimento deste sutra no mundo é como a fruta
que beneficia e torna todos felizes, permitindo aos seres ver a Nature-

za-do-Tathagata.
abençoados com aDesua
todas as flores
profecia [parado Dharma,
o Estado de 8.000
Buda] Sravakas forama
e alcançaram
grande fruição. No outono é feita a colheita, no inverno o armazena-
mento, e nada mais há a fazer. O mesmo acontece com o icchantika.
Com todas as boas leis [dharmas], nada mais há a fazer.

Também, além disso, oh bom homem! Existe um médico que ouve que
o filho de certa pessoa está possuído por um demônio. Assim, ele envia

CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 281
um mensageiro com um remédio maravilhoso, dizendo- lhe: ‘Pegue
este medicamento e dê à pessoa. Se a pessoa estiver com vários de-
mônios das más concepções (visões distorcidas), a virtude desse remé-
dio irá afastá-los. Se você se demorar a ir, irei eu mesmo. Não quero
que esse menino morra. Se a pessoa que está doente vir o mensageiro
e esta minha virtude, todas as preocupações desaparecerão e haverá
paz’. O mesmo é o caso com esse Sutra Mahayana do Grande Nirvana.
Se todos os Monges, Monjas, Leigos, Leigas, e mesmo os Tirthikas,
mantiverem esse sutra, lerem-no, compreenderem-no e o expuserem
para as outras pessoas, copiarem ou pedirem para outros copiarem-no,
todas essas ações se tornarão a causa para a Iluminação. Mesmo aque-
les que cometeram as quatro graves ofensas e os cinco pecados mor-
tais, ou aqueles que são capturados pelos ímpios demônios, ou vene-
nos, ou maldades, tão logo ouçam este sutra, acabarão com todas as
maldades. Isto é exatamente como no caso daquele médico, ao ver
todos aqueles demônios fugirem. Saiba que essa pessoa é um grande
Bodhisattva. Por quê? Porque ele está apto a ouvir o Sutra do Grande
Nirvana mesmo que por um instante; também, porque ele pensa sobre
a eternidade da Natureza-do-Tathagata. Qualquer um que o tenha [isto
é, este sutra], mesmo que por um instante, ganha esses benefícios.
Quanto mais não seria o caso quando copiamos, ostentamos, prote-
gemos e o lemos? Com exceção dos icchantikas, todos [acima] são
Bodhisattvas.

Também, além disso, oh bom homem! É como no caso de uma pessoa


surda, que não pode ouvir. O mesmo ocorre com o icchantika. Tam-
bém, mesmo que ele deseje ouvir o ensinamento deste sutra maravi-
lhoso, ele não pode. Por que não? Porque ele não plantou a semente
para ele (o ensinamento).

O Grande Médico Habilidoso

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 282


Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, um bom médico
conhece tudo sobre remédios e prescrições. Além do mais, ele possui
um extensivo conhecimento de inumeráveis encantamentos. Esse mé-
dico, recebido em audiência pelo rei, disse: ‘Oh Rei! Você tem uma
doença que levará a sua vida’. O rei respondeu: ‘Você não olhou dentro
de mim. Como você pode dizer que eu tenho uma doença que certa-
mente levará a minha vida?’ O médico ainda disse: ‘Se você não acred
i-
ta em mim, por favor, tome esse purgativo. Uma vez que o tenha to-
mado, você, Rei, poderá olhar dentro de si mesmo’. O rei, deliberad
a-
mente, não tomou o purgativo. O bom médico, através de encanta-
mento, utilizou-se de meios [para mostrar] que, nas partes escondidas
do corpo do rei, erupções e abscessos surgiram, e também pus mistu-
rado com vermes e sangue. Vendo isto, o rei ficou muito assustado e
elogiou a habilidade do médico: ‘Bem feito, bem feit
o! Eu não aceitei o
que dissera antes. Agora sei que você faz grandes coisas para mim’. Ele
então passou a respeitar o médico como seu próprio pai. O mesmo
acontece com este Sutra Mahayana do Grande Nirvana. De todos os
seres, se ambiciosos ou não, este sutra extrai as impurezas. Todos es-
ses seres vêem este sutra mesmo nos seus sonhos, o respeitam e fa-
zem oferecimentos a ele. Isto é semelhante ao rei que respeita o médi-
co habilidoso. Esse grande médico habilidoso não diagnostica uma
pessoa que certamente está para morrer. O mesmo é o caso com este
Sutra Mahayana do Grande Nirvana. A exceção é o icchantika: ele não
tem meios de ser curado.

Também, além disso, oh bom homem! Um bom médico conhece oito


formas de tratamento e cura todas as doenças. Mas ele não pode curar
uma pessoa que esteja à beira da morte. O mesmo se passa com todos
os Budas e Bodhisattvas. Eles curam todas as pessoas pecadoras. So-
mente uma pessoa à beira da morte, isto é, o icchantika, não pode ser
curada.

O Mestre da Arte Suprema

CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 283
Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, um bom médico é
versado em todos os sutras e artes. Seu conhecimento é tão extensivo
que ele vai além dos oito [tipos de métodos de tratamento]. Ele ensina
o que sabe para o seu filho. Ele faz o seu filho tornar-se familiarizado
com todas as ervas medicinais dos lugares alagados, terras, montanhas
e vales. Ele ensina-lhe por etapas, expõe-lhe os oito tipos; e então, ele
finalmente o torna familiarizado com a Arte Suprema. O mesmo é o
caso com o Tathagata, o Merecedor de Ofertas e Todo-Iluminado. Pri-
meiro, ele recorre a um expediente e faz com que seus filhos, isto é
seus Monges, aniquilem todas as impurezas e aprendam a residir num
pensamento da impureza do corpo e também num pensamento da
instabilidade (impermanência) [de todos os dharmas/leis]. Falamos de
‘lugares alagados’ e ‘vales da montanha’. Por ‘água’ deve
-se entender
que o sofrimento do corpo é como espuma aquosa, e por ‘terra’ deve -
se entender a instabilidade do corpo, como aquela (instabilidade) da
bananeira. Por ‘vale da montanha’ deve-se entender a prática do altru-
ísmo, vivendo como alguém completamente vestido (encoberto) pelas
impurezas. Por essa razão, o corpo é chamado ‘destituído do eu’. Assim
o Tathagata, passo a passo, ensina aos seus discípulos os nove tipos de
sutras e os faz compreender-lhes completamente, e após isso ele ensi-
na o Dharma Secreto do Tathagata. Para o benefício dos seus filhos, ele
fala sobre a Eternidade do Tathagata. O Tathagata assim expõe o Sutra
Mahayana do Grande Nirvana. Para o benefício de ambos, aspirantes e
não-aspirantes, ele provoca-lhes a causa da Iluminação, exceto para o
icchantika. Dessa forma, oh bom homem, esse Sutra Mahayana do
Grande Nirvana é uma coisa indescritivelmente, ilimitadamente e toda-
maravilhosamente rara. Saiba que este (sutra) é o insuperável médico,
o mais honrado, o mais supremo Rei de todos os sutras.

Também, além disso, oh bom homem! Uma ilustração! É como o caso


de um grande navio que navega desta margem para a outra e da outra
margem para esta. A verdadeira Iluminação do Tathagata é também
assim. Viajando no navio-do-tesouro do Mahayana do Grande Nirvana,
ele (o Tathagata) navega vindo e indo, salvando todos os seres. Em
todos os lugares, se houver pessoas qualificadas para serem salvas, ele
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 284
permite-lhes ver o corpo do Tathagata. Assim, chamamos o Tathagata
de Insuperável Mestre Marinheiro. Por exemplo, um navio tem um
Mestre Marinheiro. Se existir um Mestre Marinheiro, haverá seres que
[poderão] atravessar o grande oceano. O Tathagata é Eterno, aquele
que salva os seres.

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, existe um homem


que pode desejar viajar no grande mar em um grande navio, e atraves-
sar aquele mar. Se o vento for favorável, ele poderá navegar uma dis-
tância de imensuráveis yojanas num curto período de tempo. Se não,
ele terá que ficar e esperar por um longo tempo, não se movendo o
mínimo que seja do seu local de srcem. Ou então, o navio pode que-
brar e uma pessoa pode afogar-se nas águas e morrer. Assim os seres
flutuam no grande oceano da vida e morrem de ignorância. Mas se o
navio daquilo que é criado encontra-se com o vento favorável do Ma-
haparinirvana, uma pessoa pode alcançar a outra margem da Insupe-
rável Iluminação. Se não, ela terá que repetir inumeráveis nascimentos
e mortes e, às vezes, o navio poderá quebrar e ela terá que cair em
reinos como os do inferno, animalidade e dos espíritos famintos.

O Rei do Vento

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, existe um homem


que, não encontrando o rei do vento, permanece por longo tempo no
mar. Ele pensa: ‘Encontrarei minha morte aqui’. Conforme ele pensa

isso, ele ele


mar. Ou encontra um vento
pode pensar: benevolente
‘Esse e, Ele
vento é bom. através
é umadele, atravessa
coisa rara.o-Ag o
ra podemos atravessar o mar seguramente, despreocupados com
quaisquer dificuldades’. Assim, todos os seres, por longo tempo, vivem
sobre o mar do nascimento, da morte e da ignorância; lutando contra a
pobreza e as privações, não encontrando ainda um grande vento do
Nirvana como este,e pensam: ‘Certamente cairemos nos reinos do
inferno, da animalidade e dos espíritos famintos’. Conforme esses seres

CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 285
pensam isso, eles encontram o vento do Sutra Mahayana do Grande
Nirvana e, no transcorrer do tempo, alcançam a Iluminação Insuperável
e, encontrando a Verdade, concebem um pensamento raro e expres-
sam elogios: ‘Isso é felicidade! Desde há muito eu ainda não havia
n- e
contrado ou ouvido sobre esse Repositório Secreto
do Tathagata’. Des-
sa forma, eles adquirem uma fé pura neste Sutra do Grande Nirvana.

A Pele da Serpente

Também, além disso, oh bom homem! Você acha que a morte vem ou
não para a serpente conforme ela troca a sua pele?”

“Não, oh Honrado pelo Mundo!”

“Oh bom homem! O mesmo é o caso com o Tathagata. Ele utiliza


-se de
um expediente, manifesta-se e descarta o não-eterno, o corpo enve-
nenado. Você acha que o Tathagata é não-
eterno e morre?”

“Não é a palavra, oh Honrado pelo Mundo! O Tathagata abandona seu


corpo neste Jambudvipa como um expediente. O caso é como o de
uma serpente que troca (e abandona) a sua pele velha. Este é o porquê
dizermos que o Tathagata é Eterno.”

Também, além disso, oh bom homem! Um ourives pega em suas mãos


um peça de ouro de boa qualidade e faz várias coisas conforme deseja.

O mesmo
cias, é o caso
em várias come oassim
formas, Tathagata.
ensinaEle manifesta-se
os seres nas 25
e os conduz existên-
através do
mar do nascimento e da morte. Esta é a razão de dizermos que o Ta-
thagata tem um corpo ilimitado. Assim, ele manifesta-se de várias for-
mas. Mas ele é eterno; ele é imutável.

Também, além disso, oh bom homem! As árvores da manga e do jam-


bo mudam três vezes num ano. Num tempo, as flores nascem e bri-

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 286


lham gloriosamente; num outro tempo, as folhas nascem exuberante-
mente; e ainda num outro tempo, as folhas caem e tudo parece morto.
Oh bom homem! O que isto significa? Essa árvore morre?”

“Não, oh Honrado pelo Mundo.”

“O mesmo é o caso com o Tathagata. Ele manifesta


-se nos três mun-
dos nos três tipos [estágios] de corpos. Num tempo, ele nasce; num
outro tempo, ele cresce; num outro tempo ainda, ele manifesta a mor-
te. Mesmo assim, o corpo do Tathagata é não não-eterno (ou seja,
eterno).”

O Bodhisattva Kashyapa elogiou [o Buda] e disse: “Bem falado! Tudo é


como você, o Sagrado, diz. O Tathagata é eterno; nenhuma mudança
advém.”

O Ministro Sábio

“Oh bom homem! Aquilo que o Tathagata diz em termos secretos é


profundo, não é fácil compreender. É como no caso de um grande rei
que ordena aos seus ministros trazerem- lhe ‘saindhava’. A palavra
‘saindhava’ possui quatro significados. Primeiro, ela significa ‘sal’;
e- s
gundo, ‘utensílio’; terceiro, ‘água’; e quarto, ‘cavalo’. Dessa maneira,
quatro coisas possuem o mesmo nome. Um ministro sábio conhece o
conteúdo dessa palavra. Quando o rei está banhando- se e pede ‘sain-

dhava’,
va’, ele ele
lhe lhe dá água.
dá sal. Quando
Quando o rei está
ele acabou comendo
de comer e pedetomar
e deseja ‘saindh
a- um
suco e pede ‘saindhava’, ele lhe dá um utensílio. Quando ele deseja sair
em recreação, ele lhe dá um cavalo. Assim, o ministro sábio compreen-
de bem o significado das palavras do grande rei.

A situação é a mesma com este Sutra Mahayana do Grande Nirvana.


Existem quatro não-eternos. O ministro sábio do Mahayana deve co-

CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 287
nhecê-los bem. Se o Buda aparece no mundo e diz que ele está a entrar
no Nirvana, o ministro sábio deve saber que o Tathagata está falando
do não-eterno para aqueles que aderem ao ‘ser’ e deseja ensinar os
Monges a praticar o não- eterno. Ou ele pode dizer: ‘O Dharma Marav
i-
lhoso está para expirar’. O ministro sábio dev
e saber que o Tathagata
está falando do sofrimento para aqueles cujo pensamento adere à (o
conceito de) ‘felicidade’, e faz com que os Monges residam numn-pe
samento de sofrimento. Ou ele pode dizer: ‘Estou doente agora e com
dor; todos os Monges expiram’.O ministro sábio deve saber que o
Tathagata está se dirigindo àqueles apegados ao ‘eu’ sobre a questão
do altruísmo e deseja fazer com que os Monges pratiquem a idéia de
altruísmo. Ou ele pode dizer também: ‘O assim chamado Vazio é a
verdadeira emancipação ’. O ministro sábio deve saber que o Tathagata
pretende ensinar que não existe verdadeira emancipação e as 25 exis-
tências (ao mesmo tempo). Isto é para os Monges praticarem a Vacui-
dade. Dessa forma, a correta emancipação é a Vacuidade e, portanto, é
imóvel. ‘Imóvel’ significa que na emancipação não existe sofrimento.
Portanto, imóvel. Essa verdadeira emancipação é chamada ‘sem -
forma’. Sem-forma significa que não há cor, voz, odor, sabor ou tato.
Assim, não há características. Portanto, a verdadeira emancipação é
eterna e imutável. Com essa emancipação, não há não-eterno, nada
quente, nem preocupações e nem mudanças. Por isso, essa emancipa-
ção é chamada eterna, imutável, pura e fria. Ou ele pode dizer: ‘Todos
os seres possuem a Natureza-de- Buda’. O ministro ásbio deve saber
que o Tathagata está falando do Dharma Eterno e deseja que os Mon-
ges pratiquem o aspecto correto do Dharma Eterno. Saiba que qual-
quer Monge que pratique assim a Via é verdadeiramente meu discípu-
lo. Ele de fato penetra o Repositório Secreto do Tathagata, exatamente
como o ministro compreende bem o pensamento do rei. Oh bom ho-
mem! Assim, o grande rei também tem a sua lei secreta. Oh bom ho-
mem! Como poderia ser que o Tathagata não a possuísse? Por essa
razão, é difícil conhecer o ensinamento secreto (oculto) do Tathagata.
Somente um homem sábio pode alcançar as grandes profundezas da-
quilo que eu ensino. Isto é o que os mortais comuns podem bem acre-
ditar.
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 288
Também, além disso, oh bom homem! Numa grande seca, as flores da
palasa [butea frondosa], da kanika [premna spinosa] e da asoka [saraca
índica] não dão frutos; também, todas as plantas dos alagados e da
terra morrem ou crescem fracas. Sem umidade, nada pode crescer.
Mesmo os remédios podem tornar-se inúteis. Oh bom homem! O
mesmo é o caso com Sutra Mahayana do Grande Nirvana. Após a mi-
nha morte, as pessoas não mostrarão respeito (a ele) e não haverá
dignidade ou virtude. Por que não? Aquelas pessoas não conhecem o
Repositório Secreto do Tathagata. Por que não? Porque aquelas pesso-
as nasceram com pouca sorte.

Também, além disso, oh bom homem! Quando o Dharma Maravilhoso


do Tathagata está para desaparecer, pode haver muitos Monges que
façam o mal. Eles nada sabem do Repositório Secreto do Tathagata;
são indolentes, preguiçosos e não sabem como ler os sutras do Dharma
Maravilhoso, como disseminá-los e compreendê-los. Isso é como um
ladrão ignorante abandonando o tesouro verdadeiro e carregando
capim e mato sobre seus ombros. Isto vem do fato de que eles não
compreendem o Repositório Secreto do Tathagata. São preguiçosos e
não fazem esforços nos (na compreensão dos) sutras. Quão lamentável
é que exista esse grande perigo com o qual o mundo se defrontará.
Isso deve ser muito temido. Quão triste é que os seres não dêem ouvi-
dos a este Sutra Mahayana do Grande Nirvana. Somente todos os Bo-
dhisattvas vêem o verdadeiro significado daquilo que este sutra esta-
belece (determina) e não ficam preocupados com as letras [palavras].
Eles seguem obedientemente e não transgridem. E falam para o bene-
fício dos seres.

O Grande Nirvana na Era da Maldade

Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, uma ordenhadei-


ra, com a intenção de obter um lucro exorbitante, adiciona 20% de

CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 289
água ao leite e o vende para outra mulher que, novamente, adiciona
20% de água e o vende para uma mulher que vive próximo à cidade-
castelo. Essa mulher adiciona mais 20% de água e o vende para uma
mulher que vive no castelo. Essa mulher compra o leite e leva-o para o
mercado e o vende. Naquela ocasião, havia uma pessoa que receberia
uma mulher para o bem do seu filho. Ele queria usar um bom leite para
servi-lo à sua hóspede. Ele foi ao mercado e queria comprar algum
(leite). A vendedora do leite pediu o preço normal. O homem disse:
‘Esse leite contém um bocado de água. Então, ele não vale o preço
normal. Hoje eu tenho que receber uma visita. Então vou comprá-lo’.
Chegando com esse leite em casa, ele cozinhou um mingau de cereais,
mas o mesmo não tinha o sabor do leite. Embora ele não tivesse qual-
quer sabor do leite, ele era de longe melhor que qualquer coisa amar-
ga; era mil vezes melhor. Por quê? Porque dentre todos os sabores, o
do leite é o melhor.

Oh bom homem! Quando eu morrer, durante os 80 anos quando o


Dharma Maravilhoso ainda não tiver expirado, este sutra será ampla-
mente propagado no Jambudvipa. Naquela ocasião, haverá muitos
Monges mal intencionados que dividirão esse sutra em partes e o sim-
plificarão de tal maneira que a cor, o sabor, a beleza e o paladar do
Dharma Maravilhoso serão perdidos. Todas essas más pessoas lerão
este sutra, espoliarão o profundo e essencial significado do Tathagata,
introduzirão palavras meramente pretensiosas, decorativas e sem sen-
tido que dizem respeito ao mundo. Eles arrancarão a parte da frente e
a adicionarão à parte de trás do sutra, ou pegarão a parte de trás e a
adicionarão à da frente, ou colocarão as partes da frente e de trás no
meio e o meio na frente e atrás. Saiba que tais Monges são amigos de
Mara. Eles receberão e guardarão todas as coisas impuras e dirão que
o Tathagata deu-lhes permissão para agirem assim. Isto é como a or-
denhadeira que adicionou água ao leite. Ocorrerá o mesmo com esses
Monges maldosos. Eles adicionarão palavras da vida mundana, espolia-
rão as palavras estabelecidas e corretas dos sutras, e obstruirão o aces-
so dos seres aos sermões corretos, às cópias corretas, à compreensão

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 290


correta, honrando, reverenciando, fazendo oferecimentos e respeitan-
do [os sutras].

Em razão da busca pelo ganho, esses Monges mal intencionados não


disseminarão esse sutra. O mundo em que os seus benefícios serão
obtidos será tão limitado que não merece ser mencionado. Isto é como
no caso da pobre ordenhadeira que adiciona água ao leite e o vende de
tal maneira que o mingau que será feito mais tarde não terá o sabor do
leite. O mesmo é o caso com esse Sutra Mahayana do Grande Nirvana.
O seu paladar será gradualmente diminuído e [eventualmente] ne-
nhum sabor restará. O espírito partirá; e ainda assim ele será 1.000
vezes melhor que os outros sutras. É como com o leite diluído, que
ainda é 1.000 vezes melhor do que qualquer coisa amarga. Por que é
assim? Porque esse Sutra Mahayana do Grande Nirvana é o melhor
dentre todos os sutras da classe dos Sravakas. É como com o leite, que
é o melhor de todos os sabores. Por essa razão, dizemos Grande Nirva-
na.
Também, além disso, oh bom homem! Todos os bons homens e boas
mulheres desejam nascer como um homem. Por que é assim? Porque
as fêmeas são os ninhos da maldade. Também, é como no caso da
água de mosquitos e moscas, a qual não pode umedecer essa grande
terra. Além disso, o apetite sensual das fêmeas nunca pode ser satisfei-
to. Isto é como se transformássemos a grande terra numa bola e então
a comprimíssemos num pequeno comprimido. Ainda que esse grande
número de pessoas pudessem se divertir sensualmente com uma fê-
mea, ela nunca ficaria saciada. Mesmo se pessoas tão numerosas
quanto às areias do Rio Ganges se divertissem com uma mulher, não
haveria satisfação [da parte da mulher]. Oh bom homem! Como um
exemplo, é como o que ocorre com o grande mar, para o qual fluem as
gotas da chuva dos céus e as águas dos rios, e ainda assim as águas do
mar nunca indicam que o mesmo está cheio. O mesmo é o caso com
uma mulher. Por exemplo, mesmo que todas as pessoas fossem trans-
formadas em machos e tivessem relações carnais com uma mulher,
ainda não haveria suficiência [da parte da mulher]. Também, além
CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 291
disso, oh bom homem! A asoka, a patala e a kanika dão suas flores na
primavera, quando as abelhas se juntam em torno das suas cores, chei-
ro e delicado sabor, e não há satisfação da parte delas. O mesmo se
passa com uma fêmea que deseja ter um macho. Oh bom homem! Por
esta razão, todos os homens e mulheres que ouvem os ensinamentos
desse Sutra Mahayana do Grande Nirvana devem sempre evitar a for-
ma feminina e buscar a masculina. Por que é assim? Este sutra Maha-
yana pode ser comparado a um macho. O ponto é que ele tem a Natu-
reza-de-Buda. Se não conhecemos a Natureza-de-Buda, não podemos
ser chamados de homens. Por que não? Porque não temos a consciên-
cia de que possuímos a Natureza-de-Buda dentro de nós. Qualquer
pessoa que não tenha a consciência de que ela possui a Natureza-de-
Buda é uma mulher. Se ela se conscientiza, ela é um homem. Se qual-
quer mulher sabe que ela possui a Natureza- de-Buda, ela é um ho-
mem. Oh bom homem! Este Sutra Mahayana do Grande Nirvana é
repleto de inumeráveis e ilimitadas virtudes maravilhosas. Como as-
sim? Porque ele revela o Repositório Secreto do Tathagata. Por esta
razão, oh bons homens e boas mulheres, se desejam conhecer rapida-
mente o Repositório Secreto do Tathagata, devem encontrar os meios
e estudar esse sutra.”

Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! É assim, é assim! É


como você, o Buda, disse. Eu agora tenho as características de um ho-
mem, porque agora adentrei o Repositório Secreto do Tathagata. O
Tathagata despertou-me. Em conseqüência, agora certamente entra-
rei.”

O Buda disse: “Bem falado, bem falado, oh bom homem! O que você
conhece do insuperável sabor do Dharma é profundo e difícil de pene-
trar. Mesmo assim, você conhece bem. Você age como a abelha. Tam-
bém, além disso, oh bom homem! É como no caso da água do pântano
na qual os mosquitos vivem e que não serve para molhar essa terra. O
mesmo será o caso no futuro com a propagação deste sutra no mundo.
É exatamente como o terreno pantanoso onde os mosquitos vivem.
Quando o Dharma Maravilhoso tornar-se extinto, este sutra tornar-se-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 292
á extinto nesta terra (Índia). Saiba que isto é o declínio da fortuna deste
sutra. Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, após o ve-
rão vem o outono, quando as chuvas outonais caem uma após a outra.
O mesmo é o caso com esse Sutra Mahayana do Grande Nirvana. Para
o benefício dos Bodhisattvas do sul, a disseminação se procederá am-
plamente, e haverá a chuva do Dharma, a qual umedecerá completa-
mente a terra. Quando o Dharma Maravilhoso estiver para tornar-se
extinto (naquela terra– Índia), ele irá para a Kashemira e nada restará.
Ele entrará na terra e tornar-se-á extinto. Pode haver uma pessoa que
seja fiel ou uma pessoa que não seja. O doce sabor de todos esses su-
tras Mahayana Vaipulya então afundará no chão. Quando o sutra [Ma-
haparinirvana] morrer, todos os outros sutras Mahayana morrerão
também. Se este sutra é perfeito, ele é nada mais que o elefante rei
dos homens. Todos os Bodhisattvas devem saber que o insuperável
Dharma Maravilhoso do Tathagata está prestes a extinguir-se em bre-
ve.”

Então Manjushri disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Agora,


Cunda tem alguma dúvida. Por favor, oh Tathagata, explique uma vez
mais e acabe com [essa] dúvida.”

O Buda disse: “Ohbom homem! O que você quer dizer com ‘uma me
n-
te que duvida’? Fale! Eu explicarei [o assunto].”

Manjushri disse: “Cunda tem uma dúvida em seu pensamento com


relação à natureza eterna do Tathagata, devida ao poder de ser capaz
de ver a Natureza-de-Buda. Se é o caso que existe o eterno quando a
Natureza-de-Buda é vista, deve existir o não-eterno quando ela não é
vista. Se a base é o não-eterno, esse não-eterno persistirá. Por quê? A
lei do mundo é que uma coisa vem a existir sobre aquilo que não exis-
tia antes. O que existiu antes não é mais agora [não mais existe]. Todas
as coisas que se procedem assim são não-eternas. Portanto, não pode
haver diferença entre o Buda, o Bodhisattva, o Sravaka e o Pratyeka-
buda.”

CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 293
Então o Buda disse em versos (gatha):

“O que originalmente foi, agora não é mais;


o que srcinalmente não foi, agora é;
Nada pode existir como ‘é’
sucedendo-se nos Três Tempos [do passado, do presente, e do futu-
ro].”

“Oh bom homem! Por esta razão, pode haver diferença entre o Buda,
o Bodhisattva, o Sravaka e o Pratyekabuda; e não pode haver diferen-
ça.”

Manjushri elogiou [o Buda] e disse: “Isso é bom, é exatamente como


você, o Sagrado, diz. Eu agora, pela primeira vez, venho saber que há
casos de diferença entre os Budas, Bodhisattvas, Sravakas e Pratyeka-
budas.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Você, o Buda, diz que por natureza não existe diferença entre as natu-
rezas do Buda, Bodhisattva, Sravaka e Pratyekabuda. Por favor, oh
Tathagata! Condescenda a falar [disto] em detalhes, explique-o am-
plamente, e conceda benefícios e paz para todos os seres.”

O Buda disse: “Oh bom homem! Ouça atentamente, ouça atentame n-


te! Eu agora o explanarei para você. Como um exemplo: existe aqui um
homem rico. Ele tem muitas vacas, que são de várias cores. Ele sempre
tem um homem cuidando e conduzindo-as. Este homem, certa vez por
ocasião de um serviço religioso, ordenhou todas as vacas e derramou o
leite num recipiente. O leite de todas essas vacas é branco. Ele vê isso e
fica surpreso. ‘A cor dessas vacas varia. Como é que a cor do leite é
branca, tudo igual’? O homem pensa e vem a compreender que em
razão do carma passado e das relações causais dos seres, a cor do leite
torna-se uma só. Oh bom homem! O mesmo se passa com todos os
Sravakas, Pratyekabudas e Bodhisattvas. O fato de todos eles possuí-
rem a mesma Natureza-de-Buda é como com o leite. Por que é assim?
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 294
A razão é que todas as ‘asravas’ [impurezas, manchas, ‘afluxo’ den-pe
samentos e emoções insalubres] são eliminadas. E, no entanto, existem
diferenças entre o Buda, Sravaka, Pratyekabuda e Bodhisattva. Mas
todos os Sravakas e mortais comuns duvidam e dizem: ‘Como poderia
ser de não haver diferença entre osrês
t veículos’?

Todos os seres, após um longo tempo, vêm a compreender que todos


os três veículos possuem igualmente a Natureza-de-Buda. O caso é
semelhante àquele do leite, que aparece como ele é devido ao carma
passado. Também, além disso, oh bom homem! Por exemplo, quando
o ouro é tratado [fundido] num forno, a escória é descartada. Quando
fundido novamente, o ouro depura e o seu preço torna-se inestimável.
Oh bom homem! O mesmo se passa com Sravakas, Pratyekabudas e
Bodhisattvas. Todos podem chegar à mesma Natureza-de-Buda. Por
quê? Porque se acabou com as impurezas. É como acabar com a escó-
ria do lingote de ouro. Assim, todos os seres possuem a mesma Natu-
reza-de-Buda. Quando ouvimos pela primeira vez sobre o Repositório
Secreto do Tathagata, e quando mais tarde atingirmos o Estado de
Buda, nós, ao longo do tempo, viremos a conhecer este fato. Isto é
como no caso do leite do homem rico, no qual a unicidade da qualida-
de do leite torna-se aparente. Por quê? Porque se acabou com os inu-
meráveis bilhões dempurezas.”
i

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Se


todos os seres possuem a Natureza-de-Buda, que diferença existe en-
tre o Buda e os [outros] seres? Se as coisas são explicadas dessa manei-
ra, dúvidas podem surgir. Se todos os seres possuem a Natureza-de-
Buda, então Shariputra (que era um Sravaka/Ouvinte) adentra o Pari-
nirvana com um Nirvana [apenas] de pequeno porte, o Pratyekabuda
com um Nirvana de médio porte, e o Bodhisattva adentra o grande
Nirvana? Se eles possuem a mesma Natureza-de-Buda, como poderia
ser que eles não adentrassem [o Nirvana] como no caso do Tathaga-
ta?”

CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 295
“Oh bom homem! O Nirvana atingido por todos os Budas -Honrados-
pelo-Mundo não é aquele que Sravakas e Pratyekabudas atingem. Este
é o porquê dizermos que ‘Mahaparinirvana’ é a ‘boa existência’. s-Me
mo se não houver Buda no mundo, não é o caso em que os dois veícu-
los não ganham dois Nirvanas.”

Kashyapa ainda disse: “O que isto pode significar?”

O Buda disse: “Há inumeráveis, ilimitados asamkhyas de kalpasás, atr


existiu um Buda que apareceu no mundo e apresentou os três ensina-
mentos dos três veículos. Oh bom homem! Como não existe diferença
entre os Bodhisattvas e os dois veículos, acerca do que você indaga?
Devo dizer que já expliquei [isto] quando falei do Grande Nirvana do
Repositório Secreto do Tathagata. Todos os Arhats não têm elementos
de bondade. Por quê? Porque eles são aqueles que ganham o grande
Nirvana (residual). Por essa razão, existe a benção ulterior no Mahapa-
rinirvana. Este é o porquê dizemos ‘Mahaparinirvana’.”
Kashyapa disse: “Como você, o Buda, ensinou
-me, agora eu, pela pri-
meira vez, compreendi os pontos de diferenaça e não-diferença. Co-
mo? Porque todos os Bodhisattvas, Sravakas e Pratyekabudas atingirão
o Mahaparinirvana no futuro. Isto é como acontece com todos os rios
correndo para o oceano. Este é o porquê dizemos que os Sravakas e
Pratyekabudas são eternos e não não-eternos. Em razão disto, há dife-
rença e não há diferença.”

Kashyapa disse: “Como é que existe uma diferença na natureza


[do
Nirvana]?”

O Buda disse: “Oh bom homem! O Sravaka é como o leite, o Pratyek


a-
buda é como a nata, o Bodhisattva é como a manteiga, e o Buda-
Honrado-pelo-Mundo é como a sarpirmanda. Este é o porquê dizemos
que há quatro tipos de diferentes naturezas norande
G Nirvana.”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 296


Kashyapa falou novamente: “Quais são as características da natureza
de todos os seres?”

O Buda disse: “Oh bom homem! É como no caso de uma vaca que é
recém-nascida e não há diferença entre leite e sangue. O mesmo é o
caso com a naturezados seres, a qual contém todas as impurezas.”

Kashyapa ainda disse: “No Castelo de Kushinagar havia um candala


chamado ‘Joy’. Quando essa pessoa aspirou à Iluminação, o Budao-pr
fetizou que ele atingiria a Iluminação Insuperável durante a sua vida
neste aeon de 1.000 Budas. Por que é que o Buda não fez uma profecia
e disse de uma vez que o venerável Shariputra e Maudgalyayana atingi-
riam a Iluminação?”

O Buda disse: “Oh bom homem! Sravakas, Pratyekabudas e Bodhisat


t-
vas podem fazer votos: ‘Por toda a eternid
ade, defenderei o Dharma
Maravilhoso e atingirei o Estado de Buda’. Quando eles fizerem os seus
votos, Eu lhes darei a sua profecia instantaneamente. Também, além
disso, oh bom homem! Como um exemplo: um mercador possui um
tesouro inestimável. Ele o leva para o mercado e o vende. Os ignoran-
tes, não sabendo o que era, riam para ele. O proprietário do tesouro
diz: ‘Esse tesouro é inestimável’. Ouvindo isto, riram novamente. As
pessoas, não sabendo o valor desse tesouro, dizem que ele é mera-
mente uma peça de cristal. O mesmo se passa com Sravakas e Pratye-
kabudas. Se eles recebem uma profecia (da iluminação) imediata, eles
se tornarão indolentes, rirão e considerarão as coisas levianamente.
Isto é análogo à pessoa ignorante que não conhece o [valor do] verda-
deiro tesouro. Nos dias que virão, certamente haverá muitos Monges
que não farão esforços ou praticarão a Via. Serão pobres e viverão em
circunstâncias difíceis, e sofrerão de fome. Em conseqüência, eles re-
ceberão a ordenação e viverão. Seus pensamentos serão apressados e
eles serão impudentes; viverão da maneira errada, bajularão e dirão
mentiras. Quando eles ouvirem que o Tathagata concedeu profecias da
consecução da iluminação imediata aos Sravakas, eles vão rir com isso,
se comportarão arrogantemente, e até mesmo cometerão calúnia. Isso
CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 297
nada mais é do que uma transgressão dos preceitos. Eles dirão que
atingiram o que os outros não podem. Por essa razão, a Iluminação é
profetizada tão logo o voto é feito, para dizer que haverá a realização
instantânea da Iluminação. E para aqueles que protegem o Dharma
Maravilhoso, uma profecia é concedida para os dias que virão.”

O Bodhisattva Kashyapa ainda disse ao Buda: “Oh Honrado pelo n-


Mu
do! Como pode um Bodhisattva evitar romper as relações com os seus
parentes?”

O Buda disse a Kashyapa: “Todos os Bodhisattvas tentam fazer esforços


e proteger o Dharma Maravilhoso. Como resultado, não pode haver a
quebra de relações com aqueles que são seus parentes.”

O Bodhisattva Kashyapa ainda disse ao Buda: “Oh Honrado pelo n- Mu


do! Em quais circunstâncias os seres terão a sua boca secada (calada)?”

O Buda disse a Kashyapa: “Se uma pessoa não sabe que os Três Teso
u-
ros sempre existem, em conseqüência a sua boca será secada e quei-
mará. Em razão disto, a boca humana toma o caminho errado e aquela
pessoa torna-se inapta a distinguir os seis sabores que são o doce, a-
margo, pungente, ácido, salgado e suave. Todos os seres são ignoran-
tes, não possuem intelecto e não sabem que existem os Três Tesouros.
Portanto, dizemos: ‘Lábios e boca secaram e queimaram’. Também,
além disso, oh bom homem! Qualquer pessoa que não saiba que o
Tathagata é eterno, tal pessoa é congenitamente cega. Qualquer pes-
soa que saiba que o Tathagata é eterno, embora dotado com olhos
carnais, é alguém que possui os Olhos Celestiais. Também, além disso,
oh bom homem! Qualquer pessoa que saiba que o Tathagata é eterno,
de há muito estudou sutras deste tipo. Eu também digo que essa pes-
soa pertence à classe das pessoas possuidoras dos Olhos Celestiais. Se
uma pessoa não sabe que o Tathagata é eterno, essa pessoa cai na
classe daqueles que possuem meramente os olhos carnais. Esse tipo de
pessoa não conhece as suas próprias mãos e membros, e nem a forma

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 298


de permitir aos outros conhecer. Por esta razão, ele é (dotado apenas)
dos olhos carnais.

Também, além disso, oh bom homem! O Tathagata torna-se o pai para


todos os seres. Como? Todos os seres e várias coisas vivas possuem
dois pés, quatro pés, múltiplos pés ou são sem pés. O Buda fala sobre o
Dharma em uma voz, e todos eles compreendem, exprimem louvores e
dizem: ‘O Tahagata falou somente a mim (sobre) o Dharma’. Por essa
razão, dizemos pai.

Também, além disso, oh bom homem! Uma pessoa dá à luz uma crian-
ça. Após seis meses, ela fala, mas as palavras que ela fala não podem
ser compreendidas. Os pais ensinam-lhe as palavras, primeiro repetin-
do o mesmo som. Passo a passo, as coisas evoluem. É assim. É o caso
que as palavras dos pais possam ser incorretas?”

“Não, Honrado pelo Mundo!”


“O mesmo é o caso com o Buda -Tathagata. Ele ensina o Dharma de
acordo com os vários sons dos seres. No sentido de fazê-los descansar
pacificamente no Dharma Maravilhoso do Buda, ele manifesta-se em
várias formas. O Tathagata fala com a mesma língua. Poderia isso pos-
sivelmente se proceder de uma forma incorreta?”

“Não Honrado pelo Mundo! Por que não? Porque a fala do Tathagata
é como o rugido de um leão. Seguindo os sons do mundo, ele fala so-
bre o Dharma para o benefício dos seres.”

CapítuloSobre
16– o Bodhisattva Página 299
Capítulo Dezessete: Sobre Questões Suscitadas pela
Multidão
Então, o Honrado pelo Mundo emitiu luzes de diversas cores como o
azul, vermelho, branco, escarlate e púrpura, as quais resplandeceram
sobre Cunda. Cunda,
seus parentes, pegoutendo
todassido banhado em
as delicadas luz, juntamente
delícias compara
e as carregou os
onde o Buda estava e ofereceu-as ao Tathagata e aos Monges, dese-
jando fazer os últimos oferecimentos. Pegando-as em vários recipien-
tes abarrotados, eles as trouxeram para onde o Buda se encontrava.

Naquela ocasião, existia um deva de grande virtude que chegou lá,


obstruiu o caminho e, permanecendo no local, disse: “Oh Cunda!e-
Esp
re por um momento, não faça os oferecimentosinda]!”
[a

Então o Tathagata novamente irradiou inumeráveis e ilimitadas luzes.


Todos os devas, vendo essas luzes, permitiram a Cunda seguir adiante,
oferecer as coisas ao Buda e, prostrando-
se no chão, disse: “O
h Tatha-
gata! Permita a todos os Monges aceitar
em os nossos oferecimentos.”

Os Monges, sabendo que aquele era o momento, pegaram seus robes


e tigelas e, segurando-as, mantiveram-se em pensamento único. Então
Cunda assentou vários tipos de tronos de leão cravejados de jóias para
o Buda e para os Monges, içou estandartes e parassóis de seda e, junto
com essas coisas, levou incenso, flores e grinaldas. Naquela ocasião, os
três mil grandes sistemas de mil mundos tornaram-se semelhantes ao
Paraíso [Búdico] Ocidental da paz e felicidade.
Então Cunda, que se encontrava diante do Buda, triste e preocupado,
disse novamente ao Buda: “Oh Tathagata! Por favor, tenha piedade,
permaneça e viva conosco por mais um kalpa ou mesmo menos que
isso.”

Capítulo 17–Sobre Questões Suscitadaspela Multidão Página 301


O Buda disse a Cunda: “Se você deseja ter
-me por longo tempo neste
mundo, faça os perfeitos oferecimentos finais.”

Então, todos os Bodhisattvas-Mahasattvas, devas e todos os outros


disseram em uníssono: “Oh, é maravilhoso Cunda, que você tenha
realizado a maior das virtudes. Você a fez tão bem que o Tathagata
aceitou [de você] os oferecimentos finais. Faltou-nos virtude, uma vez
que aquilo que nós fizemos no fim não satisfazia.”

Então o Honrado pelo Mundo, no sentido de satisfazer as pessoas,


expeliu de cada poro da sua pele um Buda. Cada Buda tinha um séqui-
to (acompanhamento) de inumeráveis Monges. Todos esses Budas e
Monges compartilharam de todos os oferecimentos que haviam sido
feitos. O Tathagata Shakya em si tomou aquilo que Cunda lhe presen-
teou. Naquela ocasião, todo o farelo de arroz, todas as comidas bem
cozidas, os oito koku [unidade de medida para cereais e líquidos] de
cereais que eram suficientes para satisfazer bem todo o povo do esta-
do de Magadha foram, devido ao poder divino do Buda, servidos a
todos aqueles que lá estavam congregados. Vendo isto, Cunda ficou
cheio de satisfação; sua alegria era inexprimível. Os corações de todos
aqueles lá congregados sentiram o mesmo.

Estou Sempre Aqui

Então todos aqueles congregados lá, de acordo com o desejo do Buda,

pensaram dessa
cimentos. Tão maneira:
logo, “O Tathagata
ele entrará agora aceita os nos
no Nirvana.” sos ofere-

Pensando assim, eles ficaram tanto alegres como tristes. Através do


poder divino do Buda, num espaço do tamanho da ponta de uma agu-
lha, estavam congregados inumeráveis Budas e seus séquitos, todos os
quais sentaram e comeram. O que eles comeram era tudo igual [a
mesma comida], sem diferença.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 302


Então os devas, asuras e todos os outros choraram e ficaram tristes.
Eles disseram: “O Tat
hagata recebeu os nossos oferecimentos finais.
Tendo recebido-os, ele entrará no Nirvana. A quem faremos ofereci-
mentos agora? Agora, com o insuperável Mestre (Treinador) tendo
partido de nós, somos todos como homens cegos.”

Então o Honrado pelo Mundo, com o propósito de consolar todos a-


queles lá congregados, falou em versos (gatha):

“Não chorem! O Dharma de todos os Budas é assim.


Já há inumeráveis kalpas desde que eu entrei no Nirvana.
Eu já alcancei o melhor dos Êxtases
e me repousei para sempre na paz.

Agora, ouçam com todo seu coração!


Falarei agora sobre o Nirvana.
Eu agora estou apartado do sentido da [degustação da] comida;
eu agora não sinto sede.
Eu agora, para o vosso benefício,
falarei sobre os votos passo a passo
e farei com que todos sejam abençoados com a paz.

Ouçam bem e pratiquem o Dharma eterno de todos os Budas.


Se corvos e corujas viverem numa árvore
e tornarem-se amigos um do outro como irmãos,
eu atingirei o Nirvana para a eternidade.
O Tathagata vê a todos os seres como ele vê Rahula.
Eu sempre serei o mais honrado para todos os seres.
Como eu poderia entrar no Nirvana para toda a eternidade?

Se cobras, ratos e lobos viverem num buraco


e tornarem-se amigos um do outro como irmãos,
eu entrarei no Nirvana para a eternidade.
O Tathagata vê a todos os seres como ele vê Rahula.
Capítulo 17–Sobre Questões Suscitadaspela Multidão Página 303
Ele torna-se sempre o mais honrado pelos seres.
Como ele pode permanecer por longo tempo no Nirvana?

Se a saptaparna [uma planta amarga] se transmutasse em varsika [jas-


mim],
se karu [genciana] se transmutasse em tinduka [diospyros embryote-
ris],
então, eu poderia perfeitamente entrar no Nirvana.
O Tathagata vê a todos como ele vê Rahula.
Como ele poderia abandonar a compaixão
e entrar no Nirvana por um longo tempo?

Se um icchantika pudesse, em seu corpo presente,


atingir a Iluminação e o Êxtase em primeiro-grau,
então certamente eu entraria no Nirvana.
O Tathagata vê a todos como ele vê Rahula.
Como ele poderia abandonar a compaixão
e entrar no Nirvana por um longo tempo?

Se todas as pessoas atingissem a Iluminação ao mesmo tempo


e abandonassem todas as maldades,
eu certamente atingiria o Nirvana.
O Tathagata vê a todos como vê Rahula.
Como ele poderia abandonar a compaixão
e entrar no Nirvana por um longo tempo?

Se a água (impura) dos mosquitos e moscas


pudesse de fato molhar toda a terra
e encher os rios, vales e mares,
eu entraria no Nirvana.
Meu coração compassivo vê a todos como eu vejo Rahula.
Eu sempre sou o honrado de todos os seres,
como eu poderia permanecer longo tempo no Nirvana?

Por esta razão, procurem profundamente pelo Dharma Maravilhoso.


Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 304
Não sejam ansiosos (preocupados) em demasia, não lamentem, não
chorem.
Se você deseja agir corretamente,
pratique a eternidade do Tathagata;
guarde o pensamento de que esse Dharma vive longamente
e que não há mudança.

Também, esteja consciente do fato de que os Três Tesouros são todos


eternos.
Isto srcinará uma grande proteção.
É como no caso de uma árvore morta que,
como resultado de encantos mágicos, vem a frutificar.
Esses são os Três Tesouros.

Todos vocês, as quatro classes de pessoas! Ouçam bem!


Ao ouvir bem, a alegria nascerá e o Bodhichitta surgirá.
Se os Três Tesouros surgem como (sendo) eternos
e são como ‘Paramartha -satya’ [Realidade Última],
este é o mais supremo dos votos de todos os Budas.”

O Mais Elevado Voto do Tathagata

“Se qualquer Monge, Monja, Leigo ou Leiga aspirar ao mais elevado


voto do Tathagata, saiba que tal pessoa não terá ignorância e será dig-
na de receber oferecimentos. Por força do poder do voto, as virtudes e

frutos
Arhat. das açõesque
Alguém daquela pessoameditar
não possa no mundo serão
sobre como aquelas
a eternidade dosdeTrês
um
Tesouros é um candala. Se uma pessoa puder de fato conceber a eter-
nidade dos Três Tesouros, essa pessoa deixará para trás o sofrimento
que surge da causalidade da existência, atingirá a paz, e não haverá
tentação, dificuldades ou problemas de preocupações, os quais ficarão
para trás.”

Capítulo 17–Sobre Questões Suscitadaspela Multidão Página 305


Então, humanos, devas, a grande multidão e os asuras, tendo ouvido
este sermão, ficaram alegres, satisfeitos e inexprimivelmente jubilosos.
Suas mentes ficaram aliviadas com todos os obstáculos removidos, e
nenhum alto ou baixo (sobressalto) era sentido em suas mentes. Suas
grandes virtudes eram puras. Seus semblantes pareciam esplêndidos e
eles conheciam a natureza eterna do Buda. Em razão disto, os devas
fizeram oferecimentos celestiais e espalharam flores de vários tipos;
com incenso em pó, incenso em pasta e com músicas celestiais, eles
fizeram oferecimentos ao Buda.

Então o Buda disse aoBodhisattva Kashyapa: “Você vê as raras coisas


feitas por essas pessoas?”

Kashyapa respondeu: “Já as vi, oh Honrado pelo Mundo! Eu vi que o


número de Tathagatas é inumerável, ilimitado e incontável; eu vi que
eles receberam os oferecimentos de todas as pessoas, humanos e de-
vas. Também, eles (a multidão) vêem os adornos dos grandes corpos
de todos os Budas, e vêem que, embora o lugar onde eles sentam seja
apenas do tamanho da ponta de uma agulha, um grande número de
pessoas permanecem ao redor e não empurram um ao outro, que
todas as pessoas que estão reunidas recebem votos, sermões proferi-
dos em treze versos (gathas), eque a grandemultidão está orando em
suas mentes e estão dizendo: ‘O Tathagata agora aceita os meus e-ofer
cimentos’. Mesmo se a comida ofer ecida por Cunda fosse transforma-
da em partículas de pó e uma partícula fosse oferecida para cada Buda,
ela não seria, de forma alguma, suficiente. Mas o poder divino do Buda
engendrou as coisas de tal modo a permitir que todas as pessoas reu-
nidas aqui recebessem sua parcela.”

Somente os Bodhisattvas Mahasattvas, o Príncipe do Dharma, Manjus-


hri, e outros sabiam que esta coisa rara era [devida a ação] do Tathaga-
ta. Eram expedientes do Tathagata que assim se manifestavam. A
grande multidão de Sravakas e Asuras agora também sabia que o Ta-
thagata era eterno.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 306


A Árvore Medicinal

Então o Honrado pelo Mundo disse a Cunda: “As coisas que você vê
não são raras?”

“Sim, realmente, oh Honrado pelo Mundo! Os inumeráveis Budas que


eu vi, todos possuíam as 32 marcas (sinais) da perfeição e as 80 carac-
terísticas menores de excelência. Eles eram assim adornados. Todos os
Bodhisattvas são grandes no tamanho, todos maravilhosos e seus
semblantes são incomparáveis. Assim eu vi. Somente o corpo do Buda
é como o de uma Árvore Medicinal, circundada por todos os Bodhisatt-
vas.”

O Buda disse a Cunda: “Todos os Budas que você viu diante de você
eram Budas da minha própria transformação [isto é, projeções]. Era
para beneficiar todos os seres e torná-los felizes. Todos esses Bodhi-
sattvas Mahasattvas aqui têm inumeráveis coisas a praticar (fazer).
Todos eles fazem o que os inumeráveis Budas fazem. Oh Cunda! Agora
você realizou (abarcou) o que os Bodhisattvas fazem e está completo
(perfeito) naquilo que o Bodhisattva dos dez ‘bhumis’ (estágios) faz.”

O Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo!


Tudo é como você diz. Tudo é como o Buda diz. Os trabalhos de um
Bodhisattva que Cunda realizou alegram-me. Agora o Tathagata, para o
benefício dos inumeráveis seres do futuro, deseja empreender um
grande trabalho e proferiu esse sermão do Sutra Mahayana do Grande

Nirvana. Ohque
que aquilo Honrado pelo Mundo! Será que os sutras contém mais do
está estabelecido?”

“Oh bom homem! O que estabeleci tem e não tem mais (significado
ou conteúdo) do que estabeleci.”

Cunda disse ao Buda: “Como você, o Buda, diz:

Capítulo 17–Sobre Questões Suscitadaspela Multidão Página 307


‘O que possuo eu dou a todos;
somente reverenciem, mas não espoliem (roubem).’

Oh Honrado pelo Mundo! O que isto significa? Que diferença existe


entre o observador (protetor
) e o quebrador dos preceitos?”

O Buda disse: “Exceto para alguns, dê a todas as outras pessoas. e-


Rev
renciem a todos.”

Cunda indagou: “Quem é aquela pessoa que deve ser excetuada?”

“Por exemplo, a pessoa que quebra os preceitos estabelecidos neste


sutra.”

Cunda ainda disse: “Não compreendi completamente. Por favor, seja


bondoso o bastante para explicar.”

O Buda disse a Cunda: “Quebrar os preceitos refere


-se ao icchantika.
Dar coisas a todos os outros deve ser altamente levado em considera-
ção. Isto resultará numa grande fruição.”

Cunda ainda indagou: “O que significa icchantika?”

O Buda disse a Cunda: “Caso algum Monge, Monja, Leigo ou Leiga fale
mal do Dharma Maravilhoso, e cometa graves ofensas, não se arre-
penda, e em sua mente não pense que ele foi mau, essa pessoa inevi-
tavelmente será alguém que estará trilhando o caminho de um icchan-
tika. Qualquer pessoa que tenha cometido pecados graves tais como as
quatro graves ofensas e os cinco pecados mortais, e que, sabendo que
ela transgrediu, nunca tema ou se arrependa e não confesse, que não
está intencionada em proteger, sentir amor e edificar o Dharma Mara-
vilhoso do Buda, mas fale mal dele, menospreze-o e aponte para coisas
[supostamente] erradas, é uma pessoa que está trilhando o caminho
de um icchantika. Também, uma pessoa que diz que não existem coisas
como os Três Tesouros é uma pessoa que está trilhando o caminho de
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 308
um icchantika. Exceto para esses, você deve realmente dar (doar). E
isso é louvável.”

Então Cunda ainda disse ao Buda: “O que aé transgressão dos precei-


tos?”

O Buda disse a Cunda: “Uma pessoa que comete as quatro graves o-


fensas, os cinco pecados mortais e que calunia o Dharma Maravilhoso,
é um transgressor dos preceitos.”

Cunda indagou ainda: “Pode essa pessoa, que transgrediu


s preceitos,
o
ser salva absolutamente?”

O Buda disse a Cunda: “Se fatores circunstanciais se combinarem, essa


pessoa pode de fato ser salva. Se uma pessoa que assumindo o Robe
Budista, não o descarte e seu pensamento sempre se arrependa, tema
e não se afaste, ela vai censurar-
se, dizendo: ‘Que bobo fui de cometer
esses graves pecados! Quão estranho que eu deva gerar esse carma!’
Ela se arrepende grandemente. Ela se torna intencionada a proteger o
Dharma Maravilhoso e edificá- lo. ‘Certamente farei oferecimentos a
quem quer que proteja o Dharma. Para qualquer um que recite os
sutras Mahayana, formularei questões, ostentarei e recitarei [aqueles
sutras]. Se compreendê-los bem, falarei deles amplamente para ou-
tros’. Eu digo que essa pessoa não é alguém que tenha quebrado os
preceitos. Por que não?

Oh bom homem! Por exemplo, quando o sol nasce, a escuridão desa-


parece. O mesmo se aplica ao aparecimento no mundo deste todo-
maravilhoso Sutra do Grande Nirvana. Isto aniquila todos os pecados
cometidos através dos inúmeros kalpas passados. Este é o porquê esse
sutra diz que se o Dharma Maravilhoso é obtido, segue-se a grande
fruição e isso salva a pessoa que quebrou os preceitos. Uma pessoa
pode transgredir, mas se ela se arrepende e retorna ao Dharma, ela
pensará: ‘Todas as maldades que perpetramos são como se fizéssemos
maldades a nós próprios’. O medo surge e ela se arrepende: ‘Não pode
Capítulo 17–Sobre Questões Suscitadaspela Multidão Página 309
haver outra salvação senão este Dharma Maravilhoso. Por essa razão,
retornarei e me refugiarei no Dharma Maravilhoso’. Se as coisas se
procedem assim na tomada de refúgio, uma pessoa pode fazer ofere-
cimentos a outro alguém e não haverá fim da boa fruição que surgirá
disto. Também, poderemos dizer que essa pessoa é merecedora de
oferecimentos de todo o mundo. Pode haver uma pessoa que faça
maldade, como estabelecido acima, e após um mês ou quinze dias, não
busque refúgio ou confesse. Se alguém faz oferecimentos a essa pes-
soa, haverá muito pouco mérito decorrente deles. O mesmo acontece
com alguém que cometeu os cinco pecados mortais. Se ele se arrepen-
de, sente-se envergonhado no seu pensamento e diz para si mesmo
que aquilo que ele fez até agora eram todas más ações e causa de
grande sofrimento, e que doravante ele fará tudo o que for possível
para proteger o Dharma Maravilhoso, essa pessoa não cairá dentro da
categoria daqueles que cometeram os cinco pecados mortais. Caso
sejam feitos oferecimentos a essa pessoa, isso acarretará uma inexpri-
mível quantidade de bênçãos. Quando se faz oferecimentos a uma
pessoa que cometeu os pecados mortais e em cuja mente não surge
um único pensamento de proteção ao Dharma e de busca de refúgio,
as bênçãos que podem decorrer não merecem ser comentadas.

Também, oh bom homem! Qualquer pessoa que tenha cometido más


ações deve agora ouvir-me claramente. Agora exporei extensivamente.
Pense dessa maneira: ‘O Dharma Maravilhoso é o Repositório Secreto
do Tathagata. Portanto, o protegerei e o elevarei’. Qualquer um que
faça oferecimentos a essa pessoa será abençoado com suprema virtu-
de. Oh bom homem! Uma mulher concebe uma criança. Quando ela
está para dar à luz, surge uma turbulência na terra e ela foge para o
estrangeiro. Existe um relicário, onde ela dá à luz a sua criança. Mais
tarde, ela ouve sobre o retorno da paz ao seu país e de uma abundante
colheita. Ela pega a sua criança e deseja retornar à sua terra natal. Em
seu caminho está o Ganges, onde o nível da água está alto e há uma
forte correnteza. Tendo a criança [com ela], ela não pode atravessar o
rio. Ela roga em seu pensamento: ‘Não atravessarei oo risozinha;
mesmo que eu morra, não me separarei da minha criança’. Dizendo
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 310
isto, ela se atira na água. Ela morre e mais tarde nasce no céu, por con-
ta do seu coração compassivo em querer proteger a criança. Mesmo
assim, essa mulher foi má de coração. Mas em razão do seu amor ao
filho, ela nasceu no céu. O mesmo se passa com aqueles que comete-
ram as quatro graves ofensas e os cinco pecados mortais. Embora te-
nham feito maldades antes, em razão da proteção ao Dharma, a pes-
soa se torna o melhor campo de méritos para o mundo [isto é, o bem
feito a essa pessoa produzirá felizes resultados cármicos]. Uma pessoa
que protege o Dharma será contemplada com tal inexprimível recom-
pensa.”

Cunda ainda disse: “Oh Honrado pelo Mundo! Um icchantika pode


arrepender-se, respeitar e fazer oferecimentos aos Três Tesouros. Se
fizermos oferecimentos a essa pessoa, aquilo irá gerar um grande re-
torno?”

O Buda disse: “Oh bom homem! Não indague tais coisas. Por exemplo,
existe um homem aqui que comeu uma manga. Mais tarde, ele pega o
caroço e pensa: ‘Pode haver algo de doce neste caroço’. Então ele o
pega, quebra-o e mastiga-o. O sabor é extremamente amargo e ele
lamenta [sua ação]. Pensando que ele pode perder a semente, ele
volta atrás e planta-o. Ele nutre-o cuidadosamente às vezes com man-
teiga, óleo e leite. O que isto significa? Você pensa que a planta nasce-
rá?”

“Não, oh Honrado pelo Mundo! Ainda que os céus precipitassem a


doce chuva, não haveria nenhuma chance de uma planta nascer.”

“O mesmo é o caso com esse icchantika. A raiz do bem foi queimada.


Como ele pode expiar seu pecado? Oh bom homem! Se um bom pen-
samento surge, não falamos de um ‘icchantika’. Oh bom homem! Por
essa razão, não é verdade que em tudo o que é dado (em oferecimen-
to) não há diferença em seu resultado. Por que não? A coisa dada a um
Sravaka é diferente; assim como o que é dado a um Pratyekabuda.
Somente o que é dado a um Tathagata causa a fruição insuperável.
Capítulo 17–Sobre Questões Suscitadaspela Multidão Página 311
Esse é o porquê digo que não é verdade que não há diferença no resul-
tado dos oferecimentos feitos.”

Cunda ainda disse: “Por que é que o Tathagata pronunciou esses versos
(gatha)?”

O Buda disse a Cunda: “Quando existe razão para tal, eu pronuncio um


sermão. Em Rajagriha, havia certa vez um Monge que não tinha fé e
serviu a um Nirgrantha [Jainista]. E mesmo assim, ele veio a mim e
indagou sobre o significado dos oferecimentos. Esse é o porquê eu
pronunciei esse sermão. Também, para o benefício dos Bodhisattvas-
Mahasattvas, eu falo da doutrina secreta. Qual é o significado desses
versos (gatha)? Eu digo ‘todo’. Mas esse ‘todo’ refere
-se a tudo que é
pequeno apenas no tamanho. Saiba que o Bodhisattva-Mahasattva é o
homem dos homens. Ele defende os preceitos e dá o que resulta disto.
Ele abandona a transgressão dos preceitos e erradica as ervas daninhas
[isto é, as impurezas]. Também, além disso, oh bom homem! Isto é
como com o gatha no qual eu disse em tempos passados:

‘Todos os rios têm curvas;


todas as florestas têm árvores;
todas as mulheres (são) lisonjeiras;
toda a liberdade evoca a paz’.”

Então o Bodhisattva Manjushri levantou-se do seu assento, descobriu o


seu ombro direito, ajoelhou-se com seu joelho direito, reclinou-se para
frente, tocou os pés do Buda e disse um gatha:

“Não é o caso que todos osrios têm curvas,


e que todas as madeiras são árvores,
todas as mulheres são lisonjeiras,
e toda a liberdade é paz.”

“O que o Buda diz neste gatha tem mais significado. Por favor, conde
s-
cenda em dizer-nos os detalhes. Por quê? Oh Honrado pelo Mundo!
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 312
Nos 3.000 grandes sistemas de mil mundos, existe um país chamado
Godaniya (um dos quatro continentes, a oeste, que se diz cercar o
Monte Sumeru). Naquela terra existe um rio que é reto. Esse rio é
chamado ‘Shabaya’. Ele é como uma linha reta e corre para o mar no
oeste. O Buda ainda não falou disto em outros sutras. Por favor, oh
Tathagata, condescenda em expor no âmbito dos agama-sutras Vaipul-
ya aquilo que foi deixado de lado nas explanações, para permitir aos
Bodhisattvas terem uma profunda fé e compreensão. Oh Honrado pelo
Mundo! Por exemplo, existe um homem aqui que pode saber primeiro
sobre um lingote de ouro, mas não do ouro. O mesmo ocorre com o
Tathagata. Ele conhece todas as leis (dharmas) e, todavia, ainda há
partes deixadas de lado em sua fala [isto é, ele não disse tudo que sa-
be]. O Tathagata nos concede esses sermões e, todavia, ainda pode-
mos não compreender bem qual o significado intencionado. Todas as
florestas seguramente têm árvores e há também outras coisas [nelas].
Por quê? Diversas coisas como ouro, prata e berílio estão lá; veios de
gemas são também chamados árvores. Dizemos que todas as mulheres
são lisonjeiras; no entanto, elas são mais do que isso. Por quê? Por que
existem mulheres que observam (e mantém) os preceitos e são perfei-
tas nas virtudes, tendo um grande e compassivo coração. Toda a liber-
dade é certamente paz (boa-aventurança), mas existe ainda algo mais.
Por quê? Alguém que tenha liberdade é um Chakravartin. O Dharmara-
ja [Rei-do-Dharma] Tathagata não pertence ao Yama [o governador dos
infernos]. Ele não pode morrer. Bhrama e Shakra são sem impedimen-
tos [sem restrições] e, mesmo assim, eles são não-eternos. O que é
eterno e imutável é chamado sem impedimentos. Isto é o Sutra Maha-
yana do Grande Nirvana.”

O Buda disse: “Oh bom homem!Você agora fala bem. Pare e ouça-me
por um momento. Oh Manjushri! Como um exemplo: um homem rico
adoece e sofre. Um bom médico vê [isso] e prepara algum remédio. O
homem doente é guloso e toma muito. O doutor diz: ‘Se o seu corpo
pode sustentar-se, você deve realmente tomar tanto quanto lhe a-
prouver. Mas o seu corpo está fraco agora. Não tome muito. Saiba bem
que isto é amrta [ambrósia, néctar], mas ao mesmo tempo um veneno.
Capítulo 17–Sobre Questões Suscitadaspela Multidão Página 313
Se tomado em excesso e não digerido, torna- se venenoso’. Oh bom
homem! O mesmo é o caso com o Tathagata. Tudo foi feito para o rei,
a rainha, o príncipe herdeiro, o príncipe e o ministro. O príncipe e a
rainha do Rei Prasenajit eram arrogantes. Para ensiná-los, o medo era
apropriado. Especialmente para (pessoas como) o médico um gatha
(versos) como este é proferido:

‘Todos os rios têm curvas;


todas as florestas têm árvores;
todas as mulheres são lisonjeiras;
toda a liberdade certamente conquista a paz.’

Oh Manjushri! Saiba que naquilo que o Tathagata diz não há equívocos.


A terra pode virar de cabeça-para-baixo, mas aquilo que o Tathagata
diz não tem equívocos. Em razão disto, aquilo que o Tathagata diz tem
por trás de si o não-
dito.”

Então o Buda elogiou Manjushri e disse: “Bem falado, bem falado, oh


bom homem! Você já possui um vasto conhecimento sobre todas essas
coisas. Por sentir piedade pelos seres e para permitir-lhes alcançar a
Sabedoria, você coloca amplamente tais questões para o Tathagata
referindo-se ao gatha.”

Então, o Dharmarajaputra Manjushri disse versos (gatha) diante do


Buda:

“Eu acompanho o que outros dizem


e não falo contra [eles].
E não olho para outros [para ver]
se eles fazem ou não fazem [de acordo com o Dharma];
eu somente examino o bem
ou o mal daquilo que faço.

Oh Honrado pelo Mundo! Eu falo sobre o remédio do Dharma assim.


Eu não digo que aquilo que eu digo está correto. Eu digo o que outros
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 314
dizem e não transgrido. Condescenda, oh Tathagata, a falar-me disto. O
Honrado pelo Mundo sempre diz: ‘Todos os tirthikas dos 95 tipos vão
para os reinos do infortúnio e todos os Sravakas perseveram no cami-
nho correto. Eles observam os preceitos, a conduta e guardam seus
sentidos orgânicos. Todas essas pessoas têm carinho pelo grande
Dharma e seguem o caminho que é bom’. Oh Tathagata! Por que é que
nos nove tipos de sutras você reprova quando há uma pessoa que in-
terrompe outras? Qual poderia ser o significado desse gatha?”

O Pecado do Rei Ajatasatru

O Buda disse a Manjushri: “Oh bom homem! Eu concedi esse gatha.


Não é para os seres [em geral]. Foi para ninguém mais senão o Rei
Ajatasatru. O Buda-Honrado-pelo-Mundo não contradiz o que foi dito
se não há razão para assim fazê-lo. Quando existe uma razão, ele então
fala. Oh bom homem! O Rei Ajatasatru, após ter assassinado o seu pai,
veio a mim e, para prevalecer sobre mim, colocou-me esta questão:
‘Oh Honrado pelo Mundo, você é Pleno -Conhecedor, ou você não é?
Devadatta através de inumeráveis eras passadas teve uma má intenção
e um pensamento de perseguir e prejudicar o Tathagata. Por que é que
você permitiu-lhe tornar-se ordenado?’ Oh bom homem! Em razão
disto, eu concedi esse gatha para aquele rei:

Eu acompanho o que outros dizem


e não falo contra [eles].

Esenão
elesolho para
fazem ououtros [para[de
não fazem ver]acordo com o Dharma];
eu somente examino o bem
ou o mal daquilo que faço.

Eu, o Buda, disse ao grande rei: ‘Agora você matou o seu pai. O pecado
mortal já foi cometido. É o maior dos pecados, cuja consequência é a
vida no Inferno Avichi. Confesse e purifique-se. Por que você olha para

Capítulo 17–Sobre Questões Suscitadaspela Multidão Página 315


a maldade dos outros (no caso de Devadatta)?’ Oh bom homem! Por
esta razão, eu concedi esse sermão em um gatha apenas para o seu
benefício. Também, além disso, oh bom homem! Eu também concedo
esse sermão para aqueles que observam estritamente os preceitos,
que não os transgridem, que são perfeitos na conduta e que vêem bem
quais más ações os outros cometem. Qualquer pessoa que seja [corre-
tamente] guiada por outros, que se afaste de todas as más ações, que
ensine outros e lhes faça afastar do mal, não é outro senão um discípu-
lo meu.”

Então, o Honrado pelo Mundo, para o benefício de Manjushri, falou


um gatha:

“Todos temem a espada e o bastão;


não há ninguém que não ame a vida.
Coloque-se dentro da parábola.
Não mate, não use o bastão.”
Então, Manjushri falou este gatha diante do Buda:

“Não é que todos temam o bastão;


Coloque-se dentro da parábola.
Tente o melhor para conceber os melhores expedientes.”

O Tathagata falou este gatha, o qual não está completo. Por que não?
O Arhat, o Chakravartin, mulheres bonitas, elefantes, cavalos, tesourei-
ros e ministros não podem ser feridos por devas e asuras com espadas
afiadas em suas mãos. Soldados valentes, mulheres corajosas, os reis
dos cavalos, os reis das bestas e Monges que observam os preceitos
não sentem medo, mesmo quando atacados. Por esta razão, podemos
dizer que o gatha do Tathagata também contém elementos não expli-
cados. Você pode dizer: ‘Coloque
-se dentro da parábola’. Massto
i con-
tém mais do que está dito. Por quê? Se um Arhat é feito objeto da pa-
rábola, não pode haver pensamento do eu e vida. Se existe o pensa-
mento do eu e vida, necessitamos de proteção. Os mortais comuns
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 316
também pensarão que o Arhat é uma pessoa que pratica a Via. Essa é
uma visão pervertida. Se mantivermos uma visão pervertida, após a
nossa morte, cairemos no Inferno Avichi. E pensar que um Arhat tem
um pensamento de ferir um mortal comum não é possível. E nenhum
dos inumeráveis seres, qualquer que seja, de
po ferir um Arhat.”

O Buda disse: “Oh bom homem! O pensamento do eu refere -se a um


pensamento que é muito compassivo com os seres e que nem mesmo
pensa em feri-los. Este é o pensamento todo-igual do Arhat. Não diga
irracionalmente algo que o contradiga. Em tempos passados, existiu
nesta (cidade de) Rajagriha um grande caçador. Ele matou um grande
número de veados e convidou-me para comer. Eu então aceitei o seu
convite. Mas eu tenho um sentimento compassivo para com todos os
seres, tal como tenho com relação ao meu próprio Rahula. Eu disse
num verso (gatha):

‘Permita-se ser abençoado com longa vida,


e viva longamente; defenda o não-ferir
e a vida será como aquela de todos os Budas.’

Por esta razão, Eu disse neste verso:

‘Todos temem a espada e o bastã


o;
não há ninguém que não ame a vida.
Coloque-se dentro da parábola.
Não mate, não use o bastão’.”

O Buda disse: “Bem falado, bem falado, oh Manjushri! Para o benefício


de todos os Bodhisattvas-Mahasattvas, você coloca essas questões
com relação aoensinamento secreto do Tathagata.”

Então Manjushri falou num verso:

“Como respeitarmos pai e mãe,


como sermos obedientes, e como rendermos homenagem?
Capítulo 17–Sobre Questões Suscitadaspela Multidão Página 317
Como praticararmos o Dharma
e (mesmo assim) ganhar o Inferno Avichi?

Então o Tathagata respondeu num verso:

“Caso alguém faça amor insaciável com a mãe de outrem,


(com) ignorância do pai de outrem,
e segui-los e respeitá-los,
ele ganha o Inferno Avichi.”

Então o Tathagata disse novamente a Manjushri num verso:

“Tudo o que pertence aos outros é sofrimen


to;
tudo o que estiver ao nosso próprio lado
é o que é tranqüilo e paz;
a força da arrogância é extremamente tormentosa e demoníaca;
alguém que seja sábio e bom é amado por todos.”
Então o Bodhisattva-Mahasattva Manjushri disse ao Buda: “Oh Honra-
do pelo Mundo! O que o Tathagata diz não é conclusivo. Condescenda,
oh Tathagata, em dizer-me a razão. Por quê? O filho de um homem
rico estuda, seguindo um professor. Ele pertence ao professor ou não?
Se ele pertence ao professor, o significado não se ajusta bem. Se não
(pertence), não se ajusta bem da mesma forma. Mesmo que alcance-
mos o desimpedimento (não-obstrução), ele (o significado) também
não se ajusta. Portanto, o que o Tathagata diz ainda tem mais a dizer.
Também, além disso, oh Honrado pelo Mundo! O príncipe não apren-
de; as coisas não ocorrem quando nada acontece. Isto é desimpedi-
mento, e ainda ele tem ignorância, escuridão e sofrimento sempre. Se
um príncipe é considerado como desimpedido (imperturbável), o signi-
ficado também não se ajusta bem. Se dizemos que pertencemos aos
outros, o significado falha novamente. Em razão disto, dizemos que o
que o Buda diz ainda tem mais a dizer. Por essa razão, mesmo quando
dependemos de outros, isso não resulta necessariamente em sofri-
mento. Nem todo o desimpedimento necessariamente termina em
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 318
felicidade. Dizemos que o poder da arrogância é demoníaco. Isto, no-
vamente, ainda tem mais a dizer. Oh Honrado pelo Mundo! Todas as
mulheres valentes, sem arrogância, tornam-se ordenadas e aprendem
coisas; elas observam os preceitos e são perfeitas na conduta. Todos os
seus sentidos orgânicos são bem guardados, e nenhuma falha pode ser
vista. Em conseqüência disto, dizemos que todas as impurezas da arro-
gância não são necessariamente demoníacas. Os sábios e os bons não
são amados por todos. Mesmo neste caso, ainda há mais a dizer. Uma
pessoa comete as quatro graves ofensas em seu pensamento, não joga
fora o robe sacerdotal e mantém a conduta rigidamente em observân-
cia. O caso é como este. Alguém que preza o Dharma vê e não gosta.
Essa pessoa, após a morte, infalivelmente cairá no inferno. Uma boa
pessoa comete as ofensas graves e aqueles que protegem o Dharma
vêem [isto], expulsam esse homem, excomungam-no e o devolvem
para a vida mundana. Em conseqüência disto, podemos bem dizer que
nem mesmo todos os sábios são necessariamente amados.”

Então o Buda disse a Manjushri: “Quando existe razão, o Tathagata diz


o que ainda tem mais a ser dito. E em certas circunstâncias, o Buda-
Tathagata fala sobre este Dharma. Certa vez, existiu em Rajagriha uma
mulher chamada Sobhadra. Ela retornou para a casa dos seus pais, veio
a mim e tomou refúgio em mim, no Dharma e na Sangha. Ela disse:
‘Todas as mulheres não têm espaço livre de poder; todos os homens
são não-molestados e sem- impedimentos’. Então, anquela ocasião, eu
penetrei o pensamento da mulher e disse esses versos. Oh Manjushri!
É bom, é bom! Você agora coloca tais questões ao Tathagata com rela-
ção às palavras secretas para o benefício de todos os seres.”

Então Manjushri disse num verso:

“Todos os seres vivem de alimentos;


todas as pessoas com poder não têm ciúme [inveja];
de todas as coisas comidas ganhamos a causa da doença;
das boas ações ganhamos a paz e a felicidade.

Capítulo 17–Sobre Questões Suscitadaspela Multidão Página 319


Oh Honrado pelo Mundo! Você agora recebe a comida oferecida por
Cunda.Você, oh Tathagata, não sente receio em você ou não?”

Então o Honrado pelo Mundo disse num verso a Manjushri:

“Não é que todos os seres vivem de comida apenas;


não é que todos aqueles que têm poder não têm ciúmes [inveja] em
seus corações;
não é que toda a comida (ingerida) causa doença;
não é que todas as ações puras necessariamente dê-nos a paz e a feli-
cidade.

Oh Manjushri! Se você ficar doente, eu também ficarei doente. Por


quê? Todos os Arhats, Pratyekabudas, Bodhisattvas e Tathagata não
ingerem comida. No sentido de guiar as pessoas, eles aceitam e co-
mem. Inumeráveis pessoas trazem coisas. Eles [os santos] lhes permi-
tem realizar o danaparamita e evitar que vivam no inferno, no reino
animal e dos espíritos famintos. O Tathagata gastou seis anos em peni-
tência, e seu corpo tornou-se emaciado e arqueado, mas [atualmente]
nada do gênero acontece. O Buda-Honrado-pelo-Mundo é indepen-
dente de todas as coisas e não é o mesmo como um mortal comum.
Como poderia ser possível para [seu corpo] crescer fraco? O Buda-
Honrado-pelo-Mundo fez esforços, praticou a Via e atingiu a Mente
Adamantina. Ele não é o corpo fracamente constituído do mortal co-
mum. O mesmo acontece com meus discípulos. Tudo [isto do corpo do
mortal comum] não pode ser pensado deles. Eles não permanecem na
[dependência de] comida. Dizemos que aqueles que têm grande poder
não têm ciúmes [inveja]. Isto ainda tem mais a dizer. [Algumas] pessoas
do mundo não têm, ao longo de toda a sua vida, qualquer ciúme. Elas
parecem carecer de grande poder, também. Dizemos que todas as
doenças surgem da comida. Isto também necessita de qualificação.
Existem doenças que se srcinam de causas externas tais como dardos,
espadas e alabardas. Dizemos que todas as ações puras trazem a paz.
Isto, também, tem algo mais que necessita ser dito. Vemos no mundo
thirtikas praticando ações puras e sujeitos a dor e preocupações. Em
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 320
razão disto, tudo o que o Tathagata diz ainda tem mais a dizer. Por isso,
não é o caso que o Tathagata fala neste gatha (versos) sem razão. Ele
diz conforme haja razão para assim dizer. Em tempos passados, nesta
Ujjayini (cidade da Índia antiga que foi capital do reinado de Avanti),
existiu um Brâmane chamado Kuteitoku. Ele veio a mim e quis receber,
de imediato, os preceitos sobre as oito ações puras ["astangasamanva-
gatopavasa"]. Eu, naquela ocasião, falei esse gatha.”

Então o Bodhisattva Kashyapa disse ao Buda: “O que poderia ser uma


coisa que não tem mais partes? O que ‘todo’ significa?”

“Oh bom homem! ‘Todo’ denota o Dharma Maravilhoso da Felicidade


eterna, exceto aquilo que auxilia a realização da Iluminação. Isto pode
ser chamado ‘todo’, ou aquilo que não tem mais partes remanesce n-
tes. Pode ser que todas as outras coisas, também, tenham partes a
dizer ou não tenham mais partes a dizer. Isto é para permitir que todos
aqueles que se comprazem no Dharma saibam o significado daquilo
que ainda tem partes a serem ditas e aquilo que não tem mais partes a
dizer.”

O Bodhisattva Kashyapa sentiu-se extrema e inexprimivelmente satis-


feito. Ele avançou em direçãoao Buda e disse: “Isto é Todo -
Maravilhoso. O Tathagata vê a todos como se estivesse vendo Rahula.”

Então o Buda elogiou Kashyapa e disse: “Bem falado, bem falado! O


que você vê é Todo-Maravilhoso.”

Últimas Palavras do Tathagata

O Bodhisattva Kashyapa dis


se ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! Por
favor, condescenda em expor para mim a virtude que este Sutra Ma-
hayana do Grande Nirvana possui.”

Capítulo 17–Sobre Questões Suscitadaspela Multidão Página 321


O Buda disse a Kashyapa: “Oh bom homem! Qualquer um que ouça o
nome deste sutra obtém virtude, a qual é tão grande que Sravakas e
Pratyekabudas não podem falar bem [sobre ela]. Somente o Buda a
conhece bem. Por quê? Porque o mundo do Buda é inconcebível. Quão
maior não será [essa virtude] se alguém possuí-lo, recitá-lo, compreen-
dê-lo e copiá-lo?”

Então todos os devas, pessoas do mundo e asuras disseram num verso:

“O mundo do Buda é inconcebível.


Assim também são aqueles (mundos) do Dharma e da Sangha.
Sendo este o caso, imploramos que fique um pouco mais.
O venerável Mahakashyapa e Ananda,
os dois da Sangha, logo estarão aqui.
Também, o grande rei Ajatasatru, rei de Magadha,
que respeita demais o Buda, o Honrado pelo Mundo, não está aqui.
Tenha um pouco de piedade e permaneça por algum tempo,
esteja conosco, a grande congregação, e elimine nossas dúvidas.”

Então, o Tathagata, para o benefício da grande multidão, falou em


versos:

“O mais velho dos meus filhos é Mahakashyapa.


Ananda esforçou-se bastante e pode bem eliminar vossas dúvidas.
Estejam satisfeitos com isto. Ananda é alguém que tem ouvido muito.
Ele compreenderá de uma forma natural
o eterno e o não-eterno.
Em razão disto, não fiquem mais magoados.”

Então a grande multidão ofereceu muitas coisas ao Buda. Feitos os


seus oferecimentos, todos eles aspiraram à Iluminação Insuperável.
Todos os Bodhisattvas, que eram tão numerosos quanto os grãos de
areia de inumeráveis Rios Ganges, atingiram o primeiro ‘bhumi’ á-
[est
gio do desenvolvimento do Bodhisattva].

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 322


Então o Honrado pelo Mundo concedeu profecias a Manjushri, ao Bo-
dhisattva Kashyapa e a Cunda. Feitas as pro
fecias, ele disse: ‘Todos os
bons homens! Corrijam (endireitem) seus pensamentos. Sejam cuida-
dosos e não indolentes. Eu agora sinto dores em minhas costas e em
todo o meu corpo. Agora desejo deitar-
me.”

[E assim] ele o fez como qualquer criança ou alguém que está doente.

“Oh Manjushri! Todos vocês! Disseminem o Grande Dharma em meio


às quatro classes de pessoas. Eu agora confio este sutra a vocês. Igual-
mente, quando Mahakashyapa e Ananda chegarem, confiem-lhes o
Dharma Maravilhoso também.”

Então, o Tathagata, tendo falado assim, deitou-se sobre seu lado direi-
to, como qualquer criança doente na cama, tudo para disseminar o
Dharma para todos os seres.

Capítulo 17–Sobre Questões Suscitadaspela Multidão Página 323


Capítulo Dezoito: Sobre Doenças Reais
Então, Kashyapa disse ao Buda: “Oh Honrado pelo Mundo! O Tathag a-
ta há muito já removeu todas as doenças. Já erradicou as impurezas e a
dor, nenhum temor restou. Oh Honrado pelo Mundo! Todos os seres
têm quatro flechas envenenadas, que se tornam as causas da doença.
Quais são as quatro? Elas são a avareza, a má-vontade, a ignorância e a
arrogância. Quando a causa está dentro, doenças surgem como frio,
febre, tuberculose, tontura, vomito, paralisia do corpo, alucinações,
intestino solto, convulsões, incontinência urinária, dor nos olhos e ou-
vidos, inchaço do abdômen e das costas, loucura, ressecamento ou ser
atormentado por maus espíritos. Todas essas doenças corporais não
podem surgir num Buda-Honrado-pelo-Mundo. Por que é que o Tatha-
gata olha para trás e diz a Manjushri: ‘Sinto dores em minhas costas.
Todos vocês deveriam ensinar a grande congregação’? Doençasr-su
gem por duas razões. Quais são as duas? Primeira, é sentir piedade de
todos os seres; segunda, édar remédio àqueles queestão doentes. O
Tathagata, já há inumeráveis milhões de bilhões de kalpas atrás, quan-
do estava praticando a Via do Bodhisattva, sempre teve palavras de
amor. Ele beneficiou os seres e extraiu as raízes das aflições. Ele deu
vários remédios a todos que estavam doentes. Por que é que hoje,
agora, ele deveria adoecer? Oh Honrado pelo Mundo! No que concer-
ne ao mundo, uma pessoa enferma senta-se ou reclina-se e não tem
tempo para descansar. Ela clama por comida, faz injunções para a sua
família, ou diz-lhes para trabalhar. Por que é que o Tathagata senta
silenciosamente? Por que é que você não ensina aos seus discípulos e

Sravakas
Por que éasque
práticas corretas
você não dosutras
profere shilaparamita
Mahayanae do
quedhyanaparamita?
tenham profun-
do significado? Por que é que, usando inumeráveis (meios) expedien-
tes, você não ensina Mahakashyapa, o grande elefante dentre os hu-
manos, e as grandes pessoas, tal que eles não retroajam da Iluminação
Insuperável? Por que é que você não ensina todos os Monges maldo-
sos que recebem e guardam coisas impuras?

CapítuloSobre
18– Doenças Reais Página 325
Os Três Grandes Obstáculos

Oh Honrado pelo Mundo! Você não tem doenças. Por que você se
reclina sobre o lado da sua mão direita? Todos os Bodhisattvas dão
remédios aos pacientes e quaisquer méritos que surjam da doação são
todos oferecidos a todos os seres e transferidos para a Grande Sabedo-
ria. Isto é para remover os obstáculos das impurezas, os obstáculos do
carma, e aqueles das retribuições cármicas. Os obstáculos das impure-
zas são a avareza, o ódio, a ignorância e a ira diante do que é desagra-
dável, a ilusão que obscurece o pensamento, dificultando dessa manei-
ra o bem de produzir seus brotos; [os obstáculos também são] a preo-
cupação ardente, inveja, mesquinhez, mentira, lisonja, não sentir ver-
gonha de si mesmo, não sentir vergonha dos outros, orgulho, orgulho-
desmedido, orgulho simulado (fingido), orgulho da auto-estima, orgu-
lho de si, orgulho distorcido, arrogância, indolência, presunção (auto-
importância), ressentimento mútuo, arguição (disputa, contenda), vida
errada, lisonjear, enganar usando diferentes aparências, perseguir o
lucro pelo lucro, buscar coisas através das vias erradas, buscar a fortu-
na, faltar com respeito, não observar as injunções, e associar-se com
maus amigos.

Não há um fim para a busca do lucro, para enlaçar e amarrar a si pró-


prio de tal forma que tudo se torna difícil de compreender. Uma pes-
soa se baseia em maus desejos e na ganância. Uma pessoa é avida-
mente intencionada com base em visões heréticas da vida com relação
à sua existência carnal, as visões do ‘ser’ e do ‘não
-ser’ da vida; uma

pessoa solta umougemido


está satisfeita, ou está satisfeita
come vorazmente; de cochilar,
sua mente é fracaboceja
e elaou não
pensa
sobre coisas estranhas, faz maldades com o corpo e se compraz em
falar muito; todos os seus sentidos orgânicos são obscuros; ela fala
excessivamente e é sempre ofuscada pelos sentidos como a avareza, a
ira e a maldade. Esses são os obstáculos das impurezas.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 326


Os obstáculos [que surgem] das ações [carma] são os cinco pecados
mortais e as doenças graves.

Os obstáculos das retribuições cármicas resultam em uma vida nos


reinos do inferno, da animalidade e dos espíritos famintos, e também
na calúnia do Dharma Maravilhoso e no icchantika. Esses são os obstá-
culos da retribuição.

Esses três obstáculos (das impurezas, das ações (carma) e das retribui-
ções) são as maldades. Todavia, o Bodhisattva, quando praticando a
Via através de inumeráveis kalpas, dispôs remédios para todas as do-
enças e sempre fez votos de libertar os seres eternamente das doenças
graves dos três obstáculos.

Também, além disso, oh Honrado pelo Mundo! Quando o Bodhisattva-


Mahasattva praticou a Via, ele deu remédio a todos aqueles que esta-
vam doentes e sempre ez f os votos: ‘Farei com que os seres se apa
r-
tem eternamente de todos os males e lhes permitirei atingir o Corpo
Adamantino do Tathagata. Também, farei com que todos os inumerá-
veis seres tornem-se remédios todo-maravilhosos e sejam aptos a er-
radicar as doenças más; permitirei a todos os seres obter o agada (me-
lhor antídoto para venenos e tóxicos) e, através do poder desse remé-
dio, acabar com todos os inumeráveis males dos venenos; não permiti-
rei que todos os seres retroajam da Iluminação Insuperável, mas lhes
permitirei rapidamente realizar a insuperável Medicina-do-Buda e ex-
trair (dos seres) todas as flechas envenenadas; permitirei a todos os
seres fazerem esforços, gerarem e realizarem a Mente Adamantina do
Tathagata, tornando-se este todo-maravilhoso remédio, curando todas
as doenças, tal que nenhuma idéia de disputa (contenda) possa surgir;
permitirei aos seres tornarem-se uma grande árvore medicinal e cura-
rem todas as doenças graves de todos os seres; lhes permitirei extrair
completamente as flechas envenenadas dos seres e realizar a insupe-
rável luz do Tathagata; permitirei aos seres entrarem no repositório
secreto do Dharma da Grande Medicina da Sabedoria do Tathagata e
no repositório hermeticamente guardado do Dharma’.
CapítuloSobre
18– Doenças Reais Página 327
Oh Honrado pelo Mundo! O Bodhisattava, já há inumeráveis centenas
de milhares de nayutas de kalpas atrás, fez esses votos e extraiu todos
os males de todos os seres. Por que é que o Tathagata hoje diz que ele
tem doença?

Também, além disso, oh Honrado pelo Mundo! Existe no mundo uma


pessoa que está doente na cama, que não pode se sentar, erguer-se,
levantar, caminhar ou ficar de pé, e não é capaz de engolir qualquer
alimento ou fazer passar um líquido através da sua garganta; ela não
pode ensinar e repreender seus filhos de tal maneira que eles possam
aprender as tarefas de casa. Seus pais, esposa, filhos, irmãos, parentes
e amigos estão ansiosos, e pensam que ela certamente morrerá. Oh
Honrado pelo Mundo! O mesmo é o caso com o Tathagata hoje. Você
reclina sobre o lado da sua mão direita e nada diz. Todos os ignorantes
deste Jambudvipa pensarão: ‘O Tathagata, o Todo -Iluminado está en-
trando no Nirvana’. Por quê? Eles podem pensar que você cessará de
existir. Mas a natureza do Tathagata, até o fim, não entra no Nirvana.
Por que não? O Tathagata é eterno e imutável. Por esta razão, ele não
pode dizer: ‘Eu tenho dores nas minhas costas’.

Também, além disso, oh Honrado pelo Mundo! Existe uma pessoa que
está doente na cama e cujo físico está alquebrado; ela fica com o seu
rosto para baixo ou de lado, ou sobre a cama. Então, as pessoas negati-
vamente pensam que a morte não está longe. O mesmo é o caso com
o Tathagata. Os 95 (tipos de) tirthikas observam e acalentam o pensa-
mento do não-eterno. Eles certamente dirão: ‘As coisas [no Budismo]
não são como com a nossa própria doutrina, na qual nos baseamos no
eu, natureza, homem, tranqüilidade, tempo, mote [‘prakrti’matéria

primordial], e pensamos que essas (coisas) são eternas e não sofrem
mudança. O Shramana Gautama está agora sujeito a mudança. Isto
meramente revela a lei da mudança’. Por esta razão, oh Honrado pelo
Mundo, você não deveria silenciar e reclinar sobre o lado da sua mão
direita.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 328


Também, além disso, oh Honrado pelo Mundo! Existe no mundo um
homem doente na cama. Os quatro grandes elementos aumentam ou
diminuem de tal forma que não funcionam ou combinam bem; seu
corpo está extremamente enfraquecido ou emaciado. Em razão disto,
ele não pode sentar ou erguer-se como deseja. Assim, ele permanece
na cama. Com o Tathagata, nenhum dos quatro elementos está fora de
harmonia. Você está perfeito na sua capacidade física; nada está fraco
ou debilitado. Oh Honrado pelo Mundo! A força de dez vacas pequenas
não se iguala àquela de uma vaca grande; a força de dez vacas grandes
não se iguala àquela de uma vaca azul; a força de dez vacas azuis não
se iguala àquela de um elefante comum; a força de dez elefantes co-
muns não se iguala àquela de um elefante selvagem; a força de dez
elefantes selvagens não se iguala àquela de um elefante de duas-
presas; a força de dez elefantes de duas-presas não se iguala àquela de
um elefante de quatro-presas; a força de dez elefantes de quatro-
presas não se iguala àquela de um elefante branco dos Himalayas; a
força de dez elefantes brancos (dos Himalayas) não se iguala àquela de
um elefante fragrante; a força de dez elefantes fragrantes não se iguala
àquela de um elefante azul; a força de dez elefantes azuis não se iguala
àquela de um elefante amarelo; a força de dez elefantes amarelos não
se iguala àquela de um elefante vermelho; a força de dez elefantes
vermelhos não se iguala àquela de um elefante branco; a força de dez
elefantes brancos não se iguala àquela de um elefante da montanha; a
força de dez elefantes da montanha não se iguala àquela de um elefan-
te utpala; a força de dez elefantes utpala não se iguala àquela de um
elefante kumuda; a força de dez elefantes kumuda não se iguala àquela
de um elefante pundarika; a força de dez elefantes pundarika não se
iguala àquela de um Malla [lutador de força descomunal]; a força de
dez Mallas não se iguala àquela de um Pakkhandin; a força de dez Pak-
khandins não se iguala àquela de um Narayana de oito-membros (Vi-
shnu); a força de dez Narayanas de oito-membros não se iguala àquela
de um membro de um Bodhisattva dos dez ‘bhumis’ (estágios). Com os
mortais comuns, as partes-médias (articulações) do corpo não se jun-
tam; com os Mallas, as partes-médias e a cabeça se juntam; com os
Pakkhandins, todas as juntas do corpo se juntam; com Narayanas, as
CapítuloSobre
18– Doenças Reais Página 329
juntas e a cabeça podem se entrelaçar bem; com os Bodhisattvas dos
dez ‘bhumis’, os ossos de todas as juntas se separam ou juntam -se
como no caso de uma naga [serpente] enrolada. Assim, a força de um
Bodhisattva é a maior. Quando o mundo veio a existir, o Vajrasana
[trono de diamante] surgiu do mundo Vajra [diamante] e então surgiu
o Bodhimanda [lugar da Iluminação], que apareceu sob a Árvore Bodhi.
Tendo sentado ali, a mente do Bodhisattva atingiu os dez poderes. Oh
Tathagata! Você não deveria ser como qualquer pequena criança. Ne-
nhuma pessoa infantil, criança, ignorante ou desajuizada pode expor
bem as coisas. Por esta razão, embora você deite com sua face para
baixo e de um lado, ninguém repreende você. Você, Tathagata, o Hon-
rado pelo Mundo, possui grande Sabedoria e brilha (resplandece) so-
bre tudo. Você é a naga entre os humanos; você possui grande virtude
e poderes divinos; você é o Rishi (Grande Sábio) insuperável; você
rompeu a malha de dúvidas e extraiu as flechas envenenadas. Em paz
você vai e vem, perfeito na conduta e armado com o destemor. Por
que você deveria reclinar sobre o lado da sua mão direita e fazer com
que todos os celestiais e humanos mergulhem na tristeza e preocupa-
ção?”

O Sol Nascente do Dharma Maravilhoso

Então Kashyapa disse num verso diante do Buda:

“Oh Grande Deus(Sagrado) do clã Gautama!

Erga-se, rogo-lhe,
Não recline sobre ea cama
fale-nos acerca
como umado Dharma Todo-Maravilhoso!
criança,
ou alguém que está doente.
O Treinador, o Mestre de deuses e humanos,
jaz entre as árvores sala.
Os humildes e os ignorantes
podem dizer que ele certamente entrará no Nirvana.

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 330


Eles nada sabem sobre o Vaipulya,
ou o que o Buda faz.
Como cegos, eles não vêem
o Repositório Secreto do Tathagata.
Somente todos os Bodhisattvas e Manjushri
conhecem bem as suas profundezas,
como um bom arqueiro.

Todos os Budas das Três Existências [passado, presente e futuro]


basearam-se na Grande Compaixão.
Qual é o valor agora dessa Grande Compaixão?
Sem compaixão, não se chama Buda.
Se o Buda definitivamente entra no Nirvana,
isto não é o eterno, oh Insuperável!
Tenha piedade de nós, responda às nossas orações,
conceda benefícios a todos os seres,
e subjugue todos os tirthikas!”
Então, o Honrado pelo Mundo, sua mente de grande compaixão acen-
deu (fulgurou), realizou todas as coisas que cada ser queria, de acordo
[com os seus desejos], para responder às suas súplicas (orações) e con-
ceder-lhes benefícios; levantou-se do seu leito e sentou-se de pernas
cruzadas. Sua fisionomia era brilhante e suave como uma bola de ouro
fundido. Sua face serena e os olhos brilhavam como a lua cheia. Sua
forma era pura, sem qualquer imperfeição. Uma grande luz preencheu
o firmamento. A luz era tão brilhante quanto àquela de mais de 100 mil
sóis. Ela resplandeceu no leste, sul, oeste, norte, nas quatro direções
intermediárias, nos mundos acima e abaixo, e sobre todas as Terras
Búdicas. Ela deu aos seres a tocha da Sabedoria, iluminou a escuridão e
permitiu aos 100 mil bilhões de nayutas de seres viverem na irreversí-
vel mente do Bodhi [Iluminação].

Naquela ocasião, a mente do Buda tinha plena consciência (hipercons-


ciência), e ele parecia um rei leão. Ele estava adornado com as 32 mar-
cas distintivas de um grande homem e as 80 características menores de
CapítuloSobre
18– Doenças Reais Página 331
excelência. De cada poro da sua pele surgiu uma flor de lótus. As flores
eram maravilhosas, tendo cada uma mil pétalas. A cor era como a do
ouro puro. As hastes eram de berílio, os estames de diamante e o cáli-
ce de kumshuka (rubi - palavra do Sanscrito que significa flores de jóias
vermelhas - anãs do turquistão). Elas eram tão grandes e redondas que
pareciam grandes rodas. Todas aquelas flores de lótus emitiam luzes
de várias cores tais como azul, amarelo, vermelho, branco, púrpura
(vermelho-violeta) e cristal.

E essas luzes preencheram todos os infernos como o Avichi, Samjna,


Kalasutra, Sanghata, Raurava, Maharaurava, Tapana, e Mahatapana.
Naqueles oito infernos, todas as aflições como as de ser queimado,
cozido, assado, cortado e espetado, tendo a pele arrancada, se foram.
Quando uma pessoa é abrilhantada por esta luz, todas essas aflições
desaparecem. Quando há paz, existe a frieza e uma interminável (sen-
sação de) alegria. Nesta luz, o Repositório Secreto do Tathagata é pro-
clamado: ‘Todos os seres possuem a Natureza
-de-Buda’. Os seres ou-
vem isto, suas vidas terminam lá (nos infernos) e eles nascem nos
mundos dos humanos e seres celestiais.

Além do mais, há oito tipos de infernos do frio, que são: Apapa, Atata,
Arbuda, Ababa, Utpala, Kumuda, e Pundarika. Os seres nascidos lá são
sempre oprimidos pelo frio. O que acontece lá é a contração e tração
(esticamento) do corpo, despedaçamento e quebra, ferimentos mú-
tuos, todos os quais, encontrando essa luz, acabam; surgindo então a
harmonia e o calor que confortam e satisfazem o corpo. Esta luz, tam-
bém, proclama o Repositório Secreto do Tathagata, dizendo: ‘Todos os
seres possuem a Natureza-de- Buda’. Os seres ouvem isto, sua vida
termina e eles nascem nos mundos dos humanos e seres celestiais.
Quando isto acontece, aqui no Jambudvipa e em todos os outros mun-
dos, os infernos tornam-se vazios e nenhum de nós verá (seres) sendo
punidos, exceto os icchantika.

Aqueles do reino dos espíritos famintos são oprimidos pela fome. O


que eles possuem para cobrir os seus corpos é cabelo, e por um perío-
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 332
do de 100 mil anos eles nunca mais ouvem (falar) de líquido. Mas
quando eles encontram essa luz, sua fome desaparece imediatamente.
Essa luz proclama o Repositório Secreto do Tathagata e diz: ‘Todos os
seres possuem a Natureza-de- Buda’. Quando todos eles ouvem isto,
sua vida termina e eles nascem nos mundos dos humanos e seres ce-
lestiais. Todo o reino dos espíritos famintos torna-se vazio, exceto para
aqueles que caluniaram os Sutras Mahayana Vaipulya.

Os seres nascidos no reino dos animais ferem e devoram uns aos ou-
tros. Encontrando essa luz, todo o ódio se afasta. A luz também pro-
clama o Repositório Secretodo Tathagata e diz: ‘Todos os seres poss
u-
em a Natureza-de-Buda’. Os seres ouvem isto, suas vidas terminam e
eles nascem nos mundos dos humanos e seres celestiais. Então não há
mais (seres) no reino dos animais, exceto para aqueles que caluniam o
Dharma Maravilhoso.

Em cada flor, senta-se um Buda. Seu halo tem seis pés de diâmetro e
uma luz dourada brilha resplandecente. É maravilhoso e austero. É
insuperável e incomparável. As 32 marcas distintivas da perfeição e as
80 características menores de excelência adornam o corpo [de cada
Buda]. Entre aqueles Honrados pelo Mundo, alguns estão sentados,
alguns caminhando, alguns deitados, alguns de pé e alguns estão emi-
tindo o som do trovão; alguns estão fazendo precipitar uma chuva
torrencial, alguns estão lampejando relâmpagos, alguns soprando um
grande vento e outros estão expelindo fumaça e chamas. Seus corpos
parecem uma bola de fogo. Alguns mostram montanhas, lagoas, lagos,
rios, florestas e árvores, todas de gemas (preciosas). Também, eles
mostram terras, cidades (no entorno) de castelos, vilas, palácios e ca-
sas, todas de gemas (preciosas). Ou eles mostram elefantes, cavalos,
leões, tigres, lobos, pavões, fênix chinesas e todos esses pássaros. Ou a
todas as pessoas do Jambudvipa é permitido ver os reinos do inferno,
da animalidade e dos espíritos famintos. Ou os seis céus do mundo do
desejo são mostrados. Ou pode haver um Honrado pelo Mundo que
fale sobre todas as maldades e aflições de todas as coisas que perten-
cem aos cinco skandhas (agregados), aos 18 reinos e às 12 esferas. Ou
CapítuloSobre
18– Doenças Reais Página 333
o Dharma das Quatro Nobres Verdades é exposto, ou algum [Buda]
pode falar sobre relações causais. Algum outro pode falar sobre o Eu e
o não-Eu, ou algum pode estar falando sobre o par [de opostos], sofri-
mento e felicidade; ou algum pode estar falando sobre o Eterno e o
não-Eterno. Ou algum outro pode estar falando sobre o Puro e o não-
Puro. Ou poderá haver um Honrado pelo Mundo que fale para o bene-
fício dos Bodhisattvas sobre as virtudes que todos os Bodhisattvas ad-
quirem. Ou algum outro poderá estar falando sobre as virtudes dos
Sravakas. Ou outro poderá estar falando sobre o ensinamento do Veí-
culo Único [‘ekayana’ –o ensinamento no qual todos os seres igual-
mente atingem a mesma Iluminação]. Ou algum outro pode ser um
Honrado pelo Mundo que jorra água pelo lado da mão direita do seu
corpo e fogo pelo lado da sua mão esquerda. Ou um outro pode mos-
trar [seu] nascimento, renúncia, (seu) sentar no Bodhimanda [lugar da
Iluminação] sob a árvore Bodhi, seu maravilhoso Girar da Roda (da Lei)
[isto é, o ensino do Dharma do Buda], e sua entrada no Nirvana. Ou
pode haver um Honrado pelo Mundo que emita o rugido do leão, per-
mitindo a qualquer um que o ouça atingir os estágios desde o primeiro,
segundo, terceiro até o quarto [isto é, o ‘arya
-marga’ (nobres cami-
nhos) do srotapanna (um monge que nascerá apenas entre duas e sete
vezes antes de ganhar a libertação), sakridagamin (renasce apenas
mais uma vez após a morte), anagamin (não mais retorna a este mun-
do), e arhat (um santo)]. Ou pode haver um outro que fale sobre as
inumeráveis relações causais [por meio] das quais podemos escapar do
ciclo do nascimento e da morte. Naquela ocasião, neste Jambudvipa,
todos os seres encontraram essa luz; o cego viu as cores, o surdo tor-
nou-se apto a ouvir, o mudo falou, o aleijado andou, o ganancioso ob-
teve a fortuna, o avarento deu, o irado sentiu compaixão e o descrente
acreditou.

Então, todos os devas, nagas, pishacas, gandharvas, ashuras, garudas,


kimnaras, mahoragas, rakshasas, skandas, umadas (umarakas), apas-
mara (apasmarakas), humanos e não-humanos disseram com suas
vozes em uníssono: “Bem dito, bem dito, oh Insuperável Honrado -
Celestial! Grande é o benefício que você concede.”
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 334
Dizendo isto, eles regozijaram e saltaram [de alegria]; alguns cantaram
e alguns dançaram, e outros se atiraram e rolaram no chão. Eles espa-
lharam todos os tipos de flores celestiais sobre o Buda e a Sangha, flo-
res como a utpala, kumuda, padma, pundarika, mandarava, maha-
mandarava, manjushaka, mahamanjushaka, santanika, mahasantanika,
rocana, maharocana, gandha, mahagandha, chakui, mahachakui, ka-
madrsti, mahakamadrsti, vira e prathamavira. Também, todas as espé-
cies de incenso foram espalhadas sobre eles, incensos como o agaru,
tagara, madeira de sândalo, açafrão, vários tipos de incensos mistos e
do litoral. Também, foram feitos oferecimentos ao Buda de estandar-
tes, bandeiras bordadas com gemas celestiais, dosséis, todos os tipos
de músicas (tocadas) pelos (seres) celestiais com cheng (dung-cheng:
instrumento musical como uma grande concha), flauta, órgão (de
bambú), she e harpa. E eles também disseram versos:

“Curvamo-nos para vós, Grande Esforço, Isuperável,


Corretamente-Iluminado, Honrado entre os bípedes!
Devas e humanos não sabem, mas Gautama conhece bem.
O Honrado pelo Mundo praticou penitências por nós
em tempos passados, inumeráveis kalpas atrás.
Como podeis abandonar o que certa vez jurastes
e agora desejar entrar no Nirvana?

Todos os seres não podem ver agora o repositório secreto


do Buda-Honrado-pelo-Mundo.
Em razão disto, será difícil escapar deste mundo,
reciclaremos entre nascimento e morte,
e cairemos nos maus domínios.

Como o Buda disse, todos os Arhats entram no Nirvana.


Mas como fazer com que os mortais comuns nascidos humildes
saibam bem o que o Buda faz com o seu mais profundo pensamento?
Ele faz chover a amrta [ambrosia] sobre todos os seres,
para erradicar todas as impurezas.
CapítuloSobre
18– Doenças Reais Página 335
Se esse amrta for compartilhado (tomado),
nunca mais repetiremos o nascimento, a velhice, a doença e a morte.

O Tathagata-Honrado-pelo-Mundo cura as enfermidades


dos 100 mil inumeráveis seres
e erradica as doenças graves
e assim garante que nenhuma mais permaneça.
Muito se passou desde que o Honrado-pelo-Mundo
deixou para trás todas as dores das doenças.
Este é o porquê de ele poder ser chamado o Sétimo Buda.
Rogamos que o Buda faça chover
a chuva do Dharma e dê-nos a umidade
para as nossas sementes de virtudes.
Toda a grande congregação,
humanos e deuses, sentasilenciosamente, como vedes.”

Quando esses versos foram ditos, todo os Budas sentados nas flores de
lótus moveram-se desde o Jambudvipa até o Céu Suddhavasa [o mais
elevado dos céus do quarto céu dhyana do ‘rapadhatu’], e todos i-ouv
ram isto.

Então o Budadisse ao Bodhisattva Kashyapa: “Bem falado, bem falado!


Você agora possui a extremamente profunda e sutil Sabedoria. Você
não será destruído por nenhum dos Maras ou tirthikas. Oh bom ho-
mem! Você agora reside na paz e nunca mais será abalado por qual-
quer mal. Oh bom homem! Agora você aperfeiçoou a coragem da ora-
tória, e já fez oferecimentos a todos os inumeráveis Budas do passado,
tão incontáveis quanto as areias do Ganges. Em razão disto, agora você
coloca essa questão para o Tathagata, o Corretamente-Iluminado. Oh
bom homem! Certa vez, há inumeráveis, ilimitados nayutas de uma
centena de milhar de milhões de kalpas atrás, eu já erradiquei as raízes
das doenças e deixei de reclinar-me numa cama. Oh Kashyapa! Há
inumeráveis asamkhyas no passado, apareceu um Buda que era Taha-
gata-Supremo, Merecedor-de-Ofertas, Todo-Iluminado, Melhor Trei-
nador, Mestre dos Céus e da Terra, Buda, Honrado-pelo-Mundo. Para o
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 336
benefício de todos os Sravakas, ele proferiu sermões deste Sutra Ma-
hayana do Grande Nirvana, desdobrou a doutrina, discriminou e a ex-
pôs. Eu, então, agi como um Sravaka, protegi o Sutra Mahayana do
Grande Nirvana, recitei, compreendi e o copiei; e desdobrei, discriminei
e expliquei seus conteúdos. Eu transferi os méritos disto para a Ilumi-
nação Insuperável.

Oh bom homem! Desde então, nunca mais aconteceu de comprome-


ter-me com as más ações das impurezas e das más relações cármicas,
ou caluniar o Dharma Maravilhoso, tornar-me um icchantika, nascer
com órgãos genitais imperfeitos, ou sem órgãos genitais, ou com ór-
gãos genitais duplos, agir contra meus pais, matar um Arhat, destruir
uma Torre (Votiva) ou a lei da Sangha, causar o derramamento de san-
gue do corpo de um Buda, ou cometer as quatro graves ofensas. Desde
então, meu corpo e mente permanecem em paz, e não sinto sofrimen-
to ou preocupação. Oh Kashyapa! Eu agora, na verdade, não tenho
doenças de quaisquer espécies. Por que não? Porque o Buda-Honrado-
pelo-Mundo está longe das doenças.

Oh Kashyapa! O Tathagata é chamado ‘homem -leão’. E, no entanto, o


Tathagata não é realmente um leão. Tudo isso é o ensinamento secre-
to do Tathagata. Por exemplo, é como quando dizemos que o Tathaga-
ta é uma grande naga (naga = é uma palavra do Sanskritodoe Pāli que
designa uma deidade ou classe de entidades ou seres, que assumem a
forma de uma enorme serpente, mas muitas vezes com os troncos e
cabeças humanas, encontrada tanto no Budismo como no Hinduísmo)
entre os humanos. E, no entanto, já há incontáveis kalpas passados,
acabei com a ação [carma]. Oh Kashyapa! É como quando dizemos que
o Tathagata é tanto um humano quanto um deva. Não sou nem pisha-
ca, gandharva, ashura, garuda, kimnara e nem mahoraga. Sou não-eu,
não-vida, e nada que possa ser nutrido [com comida]; não sou alguém
que sinta, e nem que não sinta. Não sou Honrado-pelo-Mundo, nem
algum Sravaka. Não sou alguém que profere sermões, nem alguém que
não o faça. Todas essas expressões são as palavras secretas do Tatha-
gata. Oh Kashyapa! É como quando dizemos que o Tathagata é o Gran-
CapítuloSobre
18– Doenças Reais Página 337
de-Rei-do-Mar-do-Monte- Sumeru [‘mahasamudra-sumeru-parvata-
raja’]. E, no entanto, o Tathagata não está no mesmo nível que l-qua
quer montanha de pedra salgada. Saiba que isto, também, é o ensina-
mento secreto do Tathagata. Oh Kashyapa! É como quando dizemos
que o Tathagata é como o pundarika [lótus branco]. E, no entanto, para
dizer a verdade, eu não sou um pundarika. Tudo isso é o ensinamento
secreto do Tathagata. Oh Kashyapa! É como quando dizemos que o
Tathagata é como um pai. E, no entanto, para dizer a verdade, o Tatha-
gata não é um pai. Tudo isso é também o ensinamento secreto do Ta-
thagata. Oh Kashyapa! É como quando dizemos que o Tathagata é
como um grande mestre marinheiro. E, no entanto, para dizer a verda-
de, o Tathagata não é um mestre marinheiro. E isto é também o ensi-
namento secreto do Tathagata. Oh Kashyapa! É como quando dizemos
que o Tathagata é como um grande mercador. E, no entanto, para
dizer a verdade, o Tathagata não é um mercador. Isso é também o
ensinamento secreto do Tathagata. Oh Kashyapa! É como quando di-
zemos que o Tathagata realmente subjuga Mara. E, no entanto, o Ta-
thagata não é, para dizer a verdade, alguém que subjugue outros com
um mau pensamento. Isso é também o ensinamento secreto do Tatha-
gata. Oh Kashyapa! É como quando dizemos que o Tathagata cura
completamente carbúnculos e erupções. Mas eu não sou alguém que
cura carbúnculos e erupções. Isso também é o ensinamento secreto do
Tathagata. Oh Kashyapa! É como dissemos até agora. Existem bons
homens e mulheres que protegem bem o seu corpo, boca e mente
(pensamento). Quando suas vidas chegarem ao fim, virão seus paren-
tes, pegarão o cadáver e o queimarão no fogo, ou podem jogá-lo no
mar, entre túmulos, e raposas, lobos e pássaros podem vir e devorá-lo
avidamente. Ainda assim, a mente (desse bom homem ou boa mulher)
encontrará nascimento num bom domínio (da existência). E a mente
não tem idas e vindas, e nem um lugar para onde ir. A frente e o verso
se assemelham e continuam, sem diferença na aparência exterior. Isso
é um ensinamento secreto do Tathagata.

Oh Kashyapa! Eu disse que estou doente. Mas o caso é diferente disto.


Isto também é o ensinamento secreto do Tathagata. Este é o porquê
Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 338
eu disse a Manjushri: ‘Tenho dores em minhas costas. Você deve i-ens
nar bem as quatro classes de seres’. Oh Kashyapa! O Tathagata, or-Co
retamente-Iluminado, não se deita doente numa cama sobre o seu
lado direito. E nem, ao fim, entra no Nirvana. Oh Kashyapa! Este Gran-
de Nirvana é o mais profundo dhyana [estado de meditação] de todos
os Budas. Esse dhyana não é aquele que Sravakas e Pratyekabudas
podem praticar. Oh Kashyapa! Você indagou por que o Tathagata deve
deitar numa cama e não sentar-se, por que ele não deve pedir comida,
ensinar e fazer injunções para os familiares ganharem a vida. Mas, oh
Kashyapa! O Vazio não faz tais coisas como sentar, pedir comida, fazer
injunções para os familiares ganharem a vida. Não há nada do tipo
como ir ou vir, nascimento ou morte, envelhecer ou ser de meia-idade,
aparecer ou desaparecer, ser ferido ou destruído, ser emancipado ou
ser atado. Também, não há uma fala em concordância conosco ou com
os outros. Também, não há compreensão em concordância conosco ou
com os outros; não há paz, nem doença. Oh bom homem! O mesmo é
o caso com o Buda-Honrado-pelo-Mundo. Este é como o Vazio. Como
poderia haver qualquer doença?

As Mais Graves Doenças Reais

Oh Kashyapa! Existem três tipos de pessoas doentes que são difíceis de


curar. São elas: 1) uma pessoa que calunia o Mahayana, 2) uma pessoa
que cometeu os cinco pecados mortais, e 3) o icchantika. Os três cita-
dos acima são os mais graves de todos os pecados no mundo. Não são

aqueles
bom homem!que Sravakas e Pratyekabudas
Por exemplo, existe umapossam
doençacurar
que facilmente. Oh
infalivelmente
acaba em morte e é difícil de curar. Pode haver atendimento, uma
atitude em conformidade [com o tratamento médico], e remédio para
aplicar; ou pode não haver atendimento, nem atitude em conformida-
de, e nem remédio para aplicar. Essa doença significa morte certa e
não pode ser curada. Deve-se saber que essa pessoa certamente mor-
rerá. O mesmo é o caso com os três tipos de pessoas (doentes). Pode

CapítuloSobre
18– Doenças Reais Página 339
haver Sravakas, Pratyekabudas e Bodhisattvas que sejam capazes de
pregar a doutrina ou pode não haver. Não existe maneira de fazê-las
[aqueles três tipos de pessoas] aspirar à Iluminação Insuperável.

Oh Kashyapa! Existe uma pessoa que está doente (e que não é dos três
tipos acima). Se for feito o atendimento dela, se há uma atitude em
conformidade e remédios, a doença pode ser curada. Se não há essas
três coisas, não existe maneira de curar [a doença]. O mesmo é o caso
com Sravakas e Pratyekabudas. Eles ouvem o que o Buda e os Bodhi-
sattvas dizem, e eles realmente aspiram à Iluminação Insuperável. Não
é que eles não ouçam o ensinamento (ou seja, não sejam atendidos) e
aspiram à Iluminação. Oh Kashyapa! As pessoas doentes (comuns e
não dos três tipos) são aquelas com relação às quais pode haver aten-
dimento, uma atitude em conformidade e remédios – ou pode não
haver essas coisas. Todas são curadas. Esse é o caso de alguém do tipo
comum. Uma pessoa pode cruzar com um Sravaka ou não; uma pessoa
pode cruzar com um Pratyekabuda ou não; uma pessoa pode cruzar
com um Bodhisattva ou não; uma pessoa pode cruzar com um Tatha-
gata ou não; uma pessoa pode ter a oportunidade de ouvir o ensina-
mento ou não. Uma pessoa pode atingir naturalmente a Iluminação
Insuperável. Alguns, para o seu próprio benefício, ou para o benefício
dos outros, sem medo, ou por lucro, ou pela lisonja, ou para enganar os
outros, ostentarão ou recitarão, farão oferecimentos, respeitarão ou
concederão sermões aos outros sobre o Sutra do Grande Nirvana.

Cinco Caminhos para a Cura


Oh Kashyapa! Existem cinco (tipos) de pessoas neste Sutra Mahayana
do Grande Nirvana– exceto o Tathagata– que estão doentes, mas têm
lugares para onde ir. Quem são esses cinco?

Um é aquele que corta os três grilhões [‘trinisamyojanani’, isto é, o


‘srotapanna’], que acaba com os primeiros três dos dez grilhõesn-
me

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 340


tais e atinge o estágio de Srotapanna, não caindo desse modo nos três
domínios do infortúnio do inferno, da animalidade e dos espíritos fa-
mintos. Essa pessoa ganha mais sete (re)nascimentos e mortes nos
mundos dos humanos e celestiais, erradica eternamente todos os tipos
de sofrimento e entra no Nirvana. Oh Kashyapa! Este é o primeiro caso
de alguém que tem uma doença e ainda tem um lugar para chegar lá.
Essa pessoa, nos dias que virão, após 80.000 kalpas, atingirá a ilumina-
ção insuperável.

O Segundo tipo é aquele que corta os três grilhões, aliviando o peso da


cobiça, da ira e da ignorância, atingindo o nível de Sakridagamin e, após
um ciclo de ida e vinda [nascimento e morte], corta eternamente as
amarras de todos os sofrimentos e atinge o Nirvana. Oh Kashyapa! Este
é o segundo caso de alguém que tem doença e ainda tem um lugar
onde ele nascerá. Essa pessoa, nos dias que virão, após 60.000 kalpas,
atingirá a Iluminação Insuperável.

O terceiro tipo de pessoa é aquela que corta os cinco grilhões das ilu-
sões [‘pancavarabhagiyasamyojanani’] que a prendem ao kamadhatu
[mundo do desejo] e atinge a luz do Anagamin. Essa pessoa nunca mais
renascerá aqui neste mundo, cortará eternamente as amarras de todos
os sofrimentos e atingirá o Nirvana. Este é o terceiro caso daquele que,
tendo uma doença, ganha um lugar para nascer nele. Essa pessoa, após
40.000 kalpas, atingirá a Iluminação Insuperável.

Oh Kashyapa! A quarta pessoa é aquela que corta eternamente as im-


purezas da cobiça, da ira e da ignorância, alcança o Arhatship e, não
tendo mais nenhuma mácula das impurezas, entra no Nirvana. Tam-
bém, esta não é uma prática monopolizada pelo Pratyekabuda. Este é
o caso da quarta pessoa doente que ganha um lugar para nascer. Essa
pessoa, após 20.000 kalpas, atingirá a Iluminação Insuperável.

Oh Kashyapa! A quinta pessoa é aquela que corta eternamente as im-


purezas da cobiça, da ira e da ignorância e, tendo obtido a luz de um
Pratyekabuda, não tem mais ilusões a cortar e entra no Nirvana. Este é
CapítuloSobre
18– Doenças Reais Página 341
realmente o único caso de um kirin [nome de um animal fabuloso].
Este é o caso da quinta pessoa que, tendo uma doença, ganha um lugar
para nascer. Essa pessoa, após 10.000 kalpas, atingirá a Iluminação
Insuperável. Oh Kashyapa! Este é o caso quinta pessoa que, tendo do-
ença, ganha um lugar para nascer. Essa pessoa não é um Tathagata.”

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 342


Índice do Tomo I

CAPÍTULO UM: INTRODUÇÃO ........................................................................... 3


A CENA DO PARINIRVANA DOBUDA ............................................................................8

CAPÍTULO DOIS: SOBRE CUNDA ...................................................................... 33


A PARÁBOLA DATERRA FÉRTIL ................................................................................. 33
OFERECIMENTOS DEALIMENTOS .............................................................................. 34
A ERVA DANINHA ..................................................................................................38
O SOL BÚDICO E ASNUVENS DESAMSARA ................................................................ 39
OS OLHOS DOSMORTAIS COMUNS ..........................................................................48
O MAGNÍFICOCAMPO DEPROSPERIDADE ................................................................. 50
CAPÍTULO TRÊS: SOBRE A AFLIÇÃO ................................................................. 53
O MANÁ DO DHARMA E OCASTELO DETESOUROS .................................................... 57
O REPOSITÓRIOSECRETO ........................................................................................ 59

A
ASPQ
ARÁBOLAI DAÁGUA-MARINHA
UATRO NVERSÕES DODHARMA .......................................................................62
...........................................................................64
O EU BÚDICO ........................................................................................................ 69
CAPÍTULO QUATRO: SOBRE LONGA VIDA ...................................................... 71
O SEGREDO DALONGA VIDA ................................................................................... 78
O VERDADEIRODISCÍPULO ......................................................................................80
A PARÁBOLA DOPAI RIGOROSO............................................................................... 81
PARAMARTHA-SATYA ............................................................................................. 83
O TODO-MARAVILHOSO DOSTRÊS TESOUROS .......................................................... 88
CAPÍTULO CINCO: SOBRE O CORPO ADAMANTINO ....................................... 91

UM REI CHAMADO VIRTUOSO ................................................................................. 95


CAPÍTULO SEIS: SOBRE A VIRTUDE DO NOME .............................................. 101
A VIRTUDE DONOME ........................................................................................... 101
CAPÍTULO SETE: SOBRE OS QUATRO ASPECTOS .......................................... 103
OS SEIS SABORES .................................................................................................104
COMPREENDENDO AETERNIDADE DOTATHAGATA ................................................... 113
O FOGO DASABEDORIA ........................................................................................ 115

Índice Página 343


O UNIVERSOFÍSICO E O DOBODHISATTVA ............................................................... 116
PASSOS PARA APAZ E FELICIDADE DOSSERES ...........................................................118
A REAL E PROFUNDAINTENÇÃO DOBUDA ............................................................... 124
A COLHEITA DOGRANDE NIRVANA(MAHAPARINIRVANA) .........................................128
A VERDADEIRAEMANCIPAÇÃO E OGRANDE NIRVANA .............................................. 135
A EMANCIPAÇÃO E ODHARMA IMUTÁVEL. .............................................................. 140

M
OVUITO ALÉM DO BEM E DO MAL ...........................................................................141
ERDADEIROEU E A EMANCIPAÇÃO ....................................................................153
O NÃO-VAZIO E AEMANCIPAÇÃO. .........................................................................153
POR QUE FAZEMOS OFERECIMENTOS ÀSANGHA? ....................................................154
CAPÍTULO OITO: SOBRE OS QUATRO FIDEDIGNOS .......................................161
O MORTAL COMUM .............................................................................................161
O SROTAPANNA E OSAKRIDAGAMIN .......................................................................162
O ANAGAMIN ...................................................................................................... 162
O ARHAT.............................................................................................................163
AS RARAS DELÍCIAS DOREI D’OUTRAS TERRAS ......................................................... 167
O SOL DO GRANDE NIRVANA .................................................................................173
A MALDADE E APUREZA (DE UM CRISTALPERFEITO) ................................................180
O DHARMA E APESSOA ........................................................................................183
O SIGNIFICADO E ASPALAVRAS ..............................................................................184
SABEDORIA ECONSCIÊNCIA ....................................................................................185
RECEBER EABRAÇAR SUTRAS .................................................................................186
A APREENSÃO DOSIGNIFICADO ..............................................................................188
CAPÍTULO NOVE: SOBRE O ERRADO E O CERTO ...........................................191
O PROFUNDOSIGNIFICADO DESALVAR OSSERES ..................................................... 197
CAPÍTULO DEZ: SOBRE AS QUATRO NOBRES VERDADES .............................209

AN
A NOBRE VERDADE
OBRE V
DOSOFRIMENTO ......................................................................209
ERDADE DACAUSA DO SOFRIMENTO ...................................................... 210
A NOBRE VERDADE DAEXTINÇÃO DOSOFRIMENTO ..................................................210
A NOBRE VERDADE DAVIA ....................................................................................211
CAPÍTULO ONZE: SOBRE AS QUATRO INVERSÕES ........................................213
CAPÍTULO DOZE: SOBRE A NATUREZA DO TATHAGATA ...............................215
O BAÚ DE OURO VERDADEIRO EMNOSSO PRÓPRIO ÂMAGO. ....................................215
A PARÁBOLA DOLUTADOR ....................................................................................218

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 344


O REMÉDIO DE UMÚNICO SABOR .........................................................................219
O SABOR ÚNICO DOSTRÊS TESOUROS .................................................................... 225
O DILEMA DADUALIDADE ECAMINHO DOMEIO ..................................................... 227
O BRILHO E AIGNORÂNCIA ....................................................................................232
A NATUREZA DEBUDA DENTRO DENÓS ................................................................. 236
CAPÍTULO TREZE: SOBRE AS LETRAS ............................................................. 241
CAPÍTULO QUATORZE: SOBRE A PARÁBOLA DOS PÁSSAROS ...................... 251
A CONSCIÊNCIA DEPOSSUIR ANATUREZA DEBUDA.................................................. 252
A PARÁBOLA DOPATO MANDARIN E DOKACALINDIKAKA..........................................256
CAPÍTULO QUINZE: SOBRE A PARÁBOLA DA LUA ........................................ 261
A PARÁBOLA DALUA ............................................................................................ 261
A ETERNA LUA-CHEIA ........................................................................................... 261
O VERDADEIROASPECTO DOCARMA ORIGINAL ....................................................... 262
A PARÁBOLA DOBOM FILHO ................................................................................. 264
O BRILHO DALUA ................................................................................................265

CAPÍTULO DEZESSEIS: SOBRE O BODHISATTVA ............................................ 269


A MARAVILHOSACAUSA DAILUMINAÇÃO ............................................................... 277
O ALVORECER DOGRANDE NIRVANA .....................................................................281
O GRANDE MÉDICO HABILIDOSO ...........................................................................282
O MESTRE DAARTE SUPREMA .............................................................................. 283
O REI DO VENTO ..................................................................................................285
A PELE DA SERPENTE ............................................................................................ 286
O MINISTROSÁBIO ..............................................................................................287
O GRANDE NIRVANA NAERA DA MALDADE ............................................................289
CAPÍTULO DEZESSETE: SOBRE QUESTÕES SUSCITADAS PELA MULTIDÃO .. 301

ESTOU SEMPRE AQUI ........................................................................................... 302


O MAIS ELEVADO VOTO DOTATHAGATA ................................................................ 305
A ÁRVORE MEDICINAL .......................................................................................... 307
O PECADO DOREI AJATASATRU ............................................................................. 315
ÚLTIMAS PALAVRAS DOTATHAGATA ......................................................................321
CAPÍTULO DEZOITO: SOBRE DOENÇAS REAIS ............................................... 325
OS TRÊS GRANDESOBSTÁCULOS ...........................................................................326
O SOL NASCENTE DODHARMA MARAVILHOSO ....................................................... 330

Índice Página 345


AS MAIS GRAVES DOENÇAS REAIS ..........................................................................339
CINCO CAMINHOS PARA ACURA ............................................................................ 340
ÍNDICE DO TOMO I............................
................................
..............................343

Sutra Mahayana do Mahaparinirvana Página 346

Você também pode gostar