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Sendo a única composição de Mendinho que nos chegou, esta é seguramente uma das mais
célebres cantigas de amigo de toda a lírica galego-portuguesa. Construída com base na estrutura
tradicional do paralelismo com leixa-pren, o seu resumo também parece simples: na ermida de S.
Simion, a moça esperava o seu amigo, que tardava a chegar; subindo entretanto a maré, ela vê-se
cercada pelas ondas e teme morrer, pois não tem barqueiro para a socorrer, nem saber remar.
A força poética desta cantiga reside em grande parte no modo como Mendinho nos consegue
transmitir, a partir desta estrutura tão simples, o desamparo e a inquietação da moça, sozinha na
pequena ilha, e tão receosa com a subida das ondas como com a possibilidade de o seu amigo
faltar ao encontro - o que ela, note-se, nunca diz explicitamente. Neste sentido, a maré que sobe
identifica-se, simbolicamente, com o seu estado anímico: de paixão, de desejo e de frustração. As
grandes ondas onde receia morrer.
De resto, este clima emocional é ainda potenciado pela ambiguidade dos tempos verbais utilizados
ao longo das estrofes (do imperfeito para o presente e futuro), e que deixam a cena suspensa num
tempo de enunciação indeterminado: estará a moça a recordar-se de um episódio passado (como
poderíamos inferir do uso do passado nas duas primeiras estrofes)? Nesse caso, como entender a
mudança para o presente (nom hei) e para o futuro (morrerei) nas restantes estrofes?