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Vá pra a rua
comprar quadrinhos
Navegar é preciso, sobreviver de quadrinhos não é preciso. É sobretudo sinu-
oso, arriscado e, ao menos no Brasil, sempre... bastante impreciso. Diante de
um mercado que, simultaneamente, consegue publicar obras cada vez mais
requintadas (e caras) enquanto assiste a uma crise editorial que afeta também
o circuito de eventos e lojas que se sustentam dos quadrinhos, é difícil fazer pre-
visões sobre os próximos cinco, dez anos (ou mesmo sobre os próximos cinco
minutos). Mas Ramon Vitral sabe juntar as pessoas certas - e fazer as pergun-
tas que precisam ser feitas - numa conversa sobre o cenário contemporâneo
das HQs no Brasil.
O resultado disso é uma matéria de capa daquelas de dar orgulho sobre o dis-
curso crítico que tentamos exercer com esta revista. Falando em dar orgulho, o
que dizer de uma segunda edição que 1) traz Marcelo D’Salete conversando
sobre um dos maiores (em todos os sentidos) projetos na história dos quadrinhos
brasileiros, o livro Angola Janga, 2) que faz percursos cruciais para a memória
das HQs brasileiras com uma matéria sobre a paraibana Marca de Fantasia
e 3) que traz histórias inéditas, feitas exclusivamente pra gente, de Mascaro,
Brendda Costa Lima, Felipe Portugal, Roberta Cirne e uma inédita de Jô Oliveira?
Isso fora as resenhas, o passeio por algumas cidades icônicas das HQs, pela re-
lação entre quadrinhos e gêneros musicais... Bem, a gente aqui está com sorriso
de canto a canto e se a resposta à primeira edição foi massa, a gente espera que
essa segunda continue a instigar todas, todos e todes vocês!
Equipe editorial
Plaf 3
Nesta Plaf
8 SEÇÕES
Divulgação
Entrevista:
Rafael Roncato/Divulgação
Marcelo D’Salete
Quadrinista conversa sobre a negritude
14 HQPÉDIA
nos quadrinhos brasileiros e fala da
produção de Angola Janga, HQ sobre o
Quilombo dos Palmares. A vida e obra de Jô Oliveira,
quadrinista pernambucano
inspirado pelo imaginário
20
do Nordeste.
Quem lê tanta HQ?
16 INFOQUADRO
26
Uma reportagem sobre a lógica
HQs para ouvir: jazz, hip hop,
de consumo de quadrinhos
rock e samba em quadrinhos.
no Brasil hoje.
18 MAKING OF
HQS
Dandara Palankof / Plaf
Wagner Willian fala
43 Corisco,
30
Mulher-Maravilha, Uma história inédita do
A história da Pantera Negra, Paciência, veterano quadrinista.
8 30
marca de fantasia André Toral e Jason.
Resistência, criatividade e verdadeiro
espírito “faça-você-mesmo” nesta 47 CMYK, de Mascaro
Em cores, o resumo
de um rumo perdido.
editora paraibana.
Paulo Floro / O Grito!
51
Paulo Floro/O Grito!
O Fantasma do Menino
Feliz, por Roberta Cirne
36
Uma história de fantasma
EM ANGOULÊME no Recife de antigamente.
Fomos conhecer o Festival
Internacional de Quadrinhos
de Angoulême, um dos mais 54 Sem Título,
de Brendda Costa Lima
Sobre gostar de seu corpo
importantes do mundo
(e de si mesma).
20 36
ou “Nicolas Cage”,
por Felipe Portugal
Você sabe o que é uma
“correlação espúria”?
4 Plaf Plaf 5
COLABORADORES
Fotos: Divulgação
Wagner Willian é quadrinista e artista gráfico,
>
revistaplaf.com.br
autor de Bulldogma (Veneta) e Lobisomem Sem
Barba (Balão Editorial). Venceu o Troféu HQ Mix
de melhor novo talento roteirista e foi indicado A revista Plaf é uma
ao Prêmio Jabuti na categoria Quadrinhos. Sua iniciativa da Revista
nova obra é O Maestro, O Cuco e a Lenda, pela O Grito! e é editada
Texugo. Wagner nos mostrou seu processo no Recife (PE).
criativo na seção “Making-Of”
Número 2
Julho / Agosto / Setembro
de 2018
Editores
Paulo Floro, Dandara
Palankof e Carol Almeida
Produção editorial
Paulo Floro, Alexandre
Roberta Cirne
Figueirôa e Fernando
é pesquisadora, de Albuquerque
roteirista e desenhista Projeto gráfico
de quadrinhos. Entre
>
e diagramação
suas obras estão Erika Simona
Passos Perdidos, Administração
História Desenhada, Brendda Costa Lima é quadrinista e colorista. Entre e contabilidade
Heróis da Restauração seus trabalhos estão Pombos (Netuno Press), a série Daiane Dultra
Pernambucana, AFRO Mayara & Annabelle (Ficticia), onde assina as cores; e Revisão
HQ e a mais recente, Manual de Sobrevivência à Vida Adulta (Netuno Press), Túlio Vasconcelos
em que assina texto e arte. Neste número, Brendda e Paulo Floro
Sombras do Recife. Ela
criou para a PLAF uma trouxe uma HQ sobre sua relação com o próprio corpo.
> A Plaf tem incentivo
história de fantasma do Funcultura - Fundo
passada no Recife. Mascaro é quadrinista e
>
Pernambucano de Incentivo
designer pernambucano. à Cultura do Governo do
Foi um dos fundadores Estado de Pernambuco.
da revista Ragu, antologia
de quadrinhos brasileiros COMPRE A PLAF
e internacionais, editada loja.revistaplaf.com.br,
com entrega em todo o Brasil
no Recife. Também teve
trabalhos publicados na
Ragu Cordel, Ascenso FALE COM A GENTE
Envie seus comentários, sugestões
Ferreira em Quadrinhos e críticas para nosso e-mail:
e Domínio Público, com leitores@revistaplaf.com.br.
versões de clássicos da Se quiser sugerir pautas, enviar
releases, propor parcerias, distribuir
literatura mundial. Na nossa revista em seu ponto de
Plaf #2 assinou a capa
>
ANÚNCIO (2)
Anne Caroline Quiangala é autora do blog Preta, Nerd & Burning Hell. Endereço para
correspondência
Rua Doutor José Maria,
Erramos: A resenha de Carolina não contou com a ficha da obra, aqui vai: Carolina, de Sirlene Barbosa e João Pinheiro. [Veneta, 128 379. Caixa Postal 6275.
páginas, R$ 39,90]. Nossas desculpas ;). Encruzilhada, Recife – PE
CEP 52041-970
6 Plaf
ISSN: 25270281
balburdia.net Plaf 7
Foto: Rafael Roncato/Divulgação
ENTREVISTA
T
udo que cerca o mais
Uma HQ
recente trabalho de
Marcelo D’Salete, Angola
Janga, vem sublinhado
pela dimensão grandiosa
empreendida por seu artista:
11 anos de pesquisa, dezenas
para repensar de livros lidos, viagens feitas
e entrevistas realizadas que
desembocam em 432 páginas
de histórias em quadrinhos que
se cruzam para, na dimensão
simultaneamente do detalhe
e do panorama, se aproximar
das experiências sensíveis e
simbólicas de um dos maiores
acontecimentos da História do
Brasil: a existência de Palmares.
Nenhum número, no entanto,
consegue dar conta do quão
importante é esse álbum, não
apenas para os quadrinhos
do Brasil, mas sobretudo para
que se revisite as ferramentas
narrativas que constituem o
Com Angola Janga, poderoso relato imaginário de ser brasileiro. Na
entrevista desta edição, D’Salete,
sobre o Quilombo dos Palmares, Marcelo D’Salete
que venceu o Prêmio Eisner em
traz novas perspectivas da história dos negros no Brasil 2018 com seu trabalho anterior,
Cumbe, conversa sobre os
por Carol Almeida
processos que o levaram a Angola
Janga, as não tão sutis operações
do racismo, a necessidade de
se debater HQ e negritude e as
influências e referências que
atravessam não apenas esse, mas
como toda sua obra.
8 Plaf Plaf 9
/ entrevista / Marcelo D’Salete Marcelo D’Salete / entrevista /
Imagens: Divulgação
Plaf / Já são mais de dez anos de
pesquisa pra você chegar a Angola
Internamente, houve o acordo com
Ganga Zumba que resultou nas terras
“Na história do Brasil, personagens negros
Janga. E essa é uma narrativa que, de Cucaú em 1678, criando uma cisão são apresentados como secundários e
com os mocambos de Palmares.
como várias outras narrativas de
Comparando com outros países, na terciários nas narrativas, é difícil ver
resistência negra no Brasil, são
apagadas ou minimizadas em nossos
Jamaica, por exemplo, houve negociações essas pessoas como sujeitos de suas ações.”
com o poder colonial que resultaram
livros de História. Quando apareceu em acordos mais longos. Mesmo com
pra você a urgência de se fazer uma a queda de Macaco, em 1694, e o
HQ sobre Angola Janga e, desde então, assassinato de Zumbi um ano depois,
que tipo de material você foi buscar Palmares ainda continuou por mais
para compor esse trabalho? 20 anos. Existiam outros líderes
quilombolas importantes nesse
Minha trajetória como alguém período, como Mouza e Camuanga. Essa estratégia de apagamento Plaf / A maior parte do que foi criado
interessado em artes visuais começou Esses fatos ainda conhecemos pouco. relaciona-se à história do negro no Brasil, sobre o imaginário do negro no Brasil
cedo. Tive muita influência do grafite Provavelmente não há documentos onde não é permitido que essas pessoas é uma construção de pessoas
e do hip hop na passagem dos anos novos a serem descobertos, mas tenham uma representação complexa brancas. Você sente em algum
1980 para os 1990. Quando já estava precisamos, sim, fazer novas perguntas e muito menos reconhecimento. E qual momento, enquanto artista negro,
um pouco mais velho, fiz um curso sobre e interpretações sobre esse episódio. o resultado disso? Naturalizar a sub- uma sensação de responsabilidade
História do Brasil focado na população cidadania das pessoas negras e pobres
em empoderar outros jovens artistas
negra. Era um curso com o Petrônio Plaf / O quanto da tua própria ainda hoje. Essa naturalização alinha-
Domingues, no Núcleo de Consciência negros a ocuparem os espaços
história é conscientemente se com o encarceramento em massa
de criação de imaginário?
Negra da USP, em 2004. Ali tive
contato com textos sobre Palmares.
em grande parte Bantu, do Congo e
Angola. Fui no Memorial dos Palmares,
“Quis fugir colocada nos teus trabalhos? de uma juventude negra periférica que,
quando não está presa, é tratada como
10 Plaf Plaf 11
/ entrevista / Marcelo D’Salete Marcelo D’Salete / entrevista /
Imagens: Divulgação
Me interessam histórias que sejam
significativas pra pensar nas possibilidades
Plaf / Desde o Noite Luz, passando “Esse imaginário do que é ser Biblioteca básica
pelo Encruzilhada e chegando ao
de um pensamento crítico sobre o que Cumbe, existe uma estrutura negro no Brasil foi elaborado Principais obras de Marcelo D’Salete
é ser negro e ser brasileiro nesse país.
Esse imaginário do que é ser negro foi
episódica nas tuas histórias. Mas quase sempre por e para
mesmo dividindo a narrativa em
elaborado quase sempre por e para
capítulos que são aparentemente pessoas brancas.” Noite Luz
[Via Lettera, 112 pags, 2008]
pessoas brancas. Se a gente for pensar
no público negro lendo literatura, e espe- independentes uns dos outros, há Um dos primeiros trabalhos
cificamente literatura negra, isso é mais também uma energia que todas de D’Salete, Noite Luz discute temas
recente. No entanto, hoje esse público compartilham. Há uma preocupação como violência, urbanidade e a invisi-
pode influir no debate público, como sua em manter essa energia circulando? bilidade de muitas pessoas que vagam
aconteceu com a Flip. Considero impres- E, segundo, Angola Janga mantém pela noite. Já mostrava a sensibilidade
cindível ter autores negros produzindo de um autor comprometido em tratar
essa estrutura?
obras sobre universos negros e sobre de temas sociais com muita verdade.
outros grupos, não negros. Todos os livros que fiz foram um Este tema perpassa minha obra. Porém, é preciso tomar
processo de aprendizado tanto de cuidado pra não cairmos dentro de certas formas e discursos Encruzilhada
Por outro lado, não criamos essas desenho quanto de narrativa. Até hoje em que você somente pode falar a partir daquele local. São [Veneta, 160 pags, 2016]
histórias em um campo neutro. Vamos tenho um interesse muito grande pelo alguns perigos que temos que enfrentar, seja sobre a presença Uma série de histórias urbanas
precisar discutir e dialogar com outras formato Conto na literatura. Gosto de negra nos quadrinhos, quanto com a questão de gênero, desvendam uma São Paulo para
pessoas, autores e leitores, sobre histórias longas também, mas aprecio imagino. Podemos falar sobre isso, mas podemos também além da segurança dos shoppings
essas representações. E é fundamental aquelas na qual cada capítulo funciona falar sobre outras coisas, partindo de diferentes perspectivas. e fachadas luminosas. Lançada
que autores negros também façam quase de maneira independente. No caso O espaço da arte é justamente aquele que permite você se originalmente pela Leya em 2011,
parte desse debate.
“O racismo opera de Angola Janga, trabalhei com uma colocar no lugar do outro. Mas, claro, pra se colocar no lugar a obra ganhou versão revista e
do outro é preciso ter responsabilidade e profundidade.
na lógica de negar
única história, mas dividida em capítulos. ampliada pela Veneta em 2016.
Angola Janga é um pouco diferente
Plaf / Tem muito de montagem de
cinema no teu trabalho. Em Encru- a humanidade dos outros livros, justamente porque se Plaf / Frantz Fanon, em Pele Negra, Máscaras Brancas Cumbe
assemelha mais a um romance. De
zilhada, chegam até a aparecer dos outros.” qualquer forma, me interessam histórias
escreve em certo momento: “O entusiasmo é, por excelência,
a arma dos impotentes. Daqueles que esquentam o ferro
[Veneta, 176 pags, 2014]
Mostra a luta de pessoas negras
aquilo que, imagino, sejam algumas que funcionem mais como um mosaico
para malhá-lo imediatamente. Nós pretendemos aquecer a escravizadas no Brasil a partir do
referências dos tipos de filme que e menos como algo linear, de começo,
carcaça do homem e deixá-lo livre. Talvez assim cheguemos ponto de vista da resistência.
te atraem. De que forma a lingua- meio e fim. Gosto de imaginar que a
O autor pesquisou a língua banto
gem cinematográfica passa pelo leitura e compreensão do todo é a este resultado: o Homem mantendo o fogo por auto-
para criar os diálogos. Saiu em
teu trabalho? feita pelo leitor também. combustão.” Somente com entusiasmo você não consegue 2017 nos EUA pela Fantagraphics
passar mais de dez anos dedicados a fazer uma HQ, como e recebeu em 2018 o prêmio Eisner
Aprendi a contar histórias a partir do Plaf / Com frequência, tanto eu é o caso de Angola Janga. Você acredita nessa ideia de Melhor Edição Americana de
cinema. Primeiro devido a influência do quanto Dandara Palankof (duas das de que é preciso sempre se manter em autocombustão Material Internacional.
amigo Kiko Dinucci. Além de músico, editoras da Plaf) somos chamadas para fazer as coisas acontecerem?
ele é cineasta e me apresentou muitos Plaf / Existe uma visualidade muito Angola Janga -
pra falar sobre a “mulher nos
filmes e escritores. Depois, aprendi a particular do desenho em preto e Uma História de Palmares
quadrinhos”, porque o ambiente Autocombustão... O Fanon é incrível, né? Ele foi uma referência
desenhar luz e sombra vendo obras do branco e queria que você falasse quando comecei a conhecer intelectuais negros. O modo dele
[Veneta, 432 pags, 2017]
é sobretudo masculino e porque,
Cinema Novo e do neorrealismo italiano. mais sobre essa tua opção estética. perceber e desnudar a realidade, tão camuflada por códigos e Produzida ao longo de 11 anos,
sendo mulheres, talvez esse seja o
Eu pausava o filme pra desenhar símbolos, me fascina. Um projeto longo como Angola Janga só Angola Janga mostra a saga do
imagens em preto e branco. Desse modo, Meu desenho talvez não seja algo
tema que “nos cabe”. O quanto você Quilombo dos Palmares, uma das
é possível se você tem muita paixão durante todo esse tempo,
acabei aprendendo a contar histórias próximo daquilo que se costuma é chamado para debater sobre “o maiores resistências ao sistema
talvez seja isso que o Fanon chama de autocombustão. Cada
lendo roteiros de cinema. Sempre tive ver nos quadrinhos. Gosto bastante negro nos quadrinhos”, ou esse é escravagista no período Colonial
vez que lia um pouco mais sobre Palmares, ia entendendo os
um fascínio muito grande pela forma de trabalhos em preto e branco e um debate que ainda passa longe meandros da história e me apaixonava um pouco mais por ela. no Brasil. A HQ traz heróis como
de contar narrativas com imagens. me aproximei de artistas como o das pautas desse universo? O que fiz foi uma ficção com base em fatos históricos. Espero Zumbi, Ganga Zumba, Domingos
Quando elaboro uma história, primeiro (Sergio) Toppi, o (Lorenzo) Mattotti, que ela nos ajude a entender melhor como o Brasil, de séculos Jorge Velho, Ganga Zona e muitos
realizo o roteiro, depois o esboço das o (Alberto) Breccia, Tayio Matsumotu Tem duas coisas que valem ser citadas atrás, ainda está presente hoje, em muitos sentidos. outros nomes importantes .
páginas e finalização. Muito do roteiro etc. Todos eles foram referências aí. Primeiro, acredito existir uma certa
inicial muda nesse processo. Gosto de fortes. Me fascinam as infinitas ausência desse debate (sobre a negri-
prestar atenção no ritmo das imagens, possibilidades do jogo de luz e tude) dentro do universo das histórias Conheça mais de Marcelo D’Salete no site
em como funciona esse encontro sombra. E considero que ainda em quadrinhos. Segundo, não tenho Carol Almeida é mestra em Comunicação e editora da Plaf. dsalete.art.br
de uma cena com outra. estou aprendendo a lidar com isso. problema nenhum em falar sobre isso. Assina o blog foradequadro.com.
12 Plaf Plaf 13
HQPÉDIA Jô Oliveira / HQpédia /
A B C D E F G H I J K L M N O P Q R S T U V W X Y Z
Jô Oliveira
Quadrinista pernambucano iniciou sua formação artística
no Leste Europeu, mas sempre manteve como inspiração as
tradições populares nordestinas, como a xilogravura e o cordel
por fernando de albuquerque IMAGINÁRIO O autor pernambucano sempre se apoiou no imaginário do Nordeste em suas obras. Da esquerda para direita: Lampião
em número da AlterLinus; uma HQ em homenagem a Zumbi dos Palmares; o autor na capa da Corto Maltese e uma edição da Risco
com Superman capturado pelo cangaço.
S
ubdesenvolvimento, fome, polícia secreta, graves violações de Imagens: Divulgação
direitos e enormes filas para comprar pão. Essas são as insígnias muito bem estruturado, uma vez que ele
que rodeiam o imaginário apologético de quem pensa o Leste
Europeu sob a cortina de ferro sem nenhuma pesquisa mais crítica
“História defende a livre utilização de quadrinhos
dentro das escolas. “Toda criança sabe
e aprofundada. Esse pensamento recheava de medo a cabeça dos
brasileiros que viam o recrudescimento da ditadura nos anos 1970,
é aventura. desenhar. De repente, as crianças param
de desenhar, seja pela pressão dos pais ou
mas não amedrontou Josimar Fernandes de Oliveira, o Jô Oliveira.
Pernambucano nascido em 1944 na Ilha de Itamaracá, ele juntou
Nas escolas, por identificar o desenho com uma atividade
demasiada infantil”, lamenta. “Nas escolas
as economias geradas pelo trabalho em uma loja de sapatos no
Centro do Rio e, com uma única mala, partiu para a Escola Superior o ensino de o ensino de história, por exemplo, é muito
chato. História é aventura. Os maiores
de Artes Industriais, em Budapeste, na Hungria.
história é relatos de aventuras da humanidade estão
nos livros de história, que passam a ver os
muito chato,
Com pouca noção do idioma, enfrentou com altivez o frio às margens acontecimentos de maneira muito formal”,
do Danúbio e forjou com cordel, xilogravura e história brasileira a comenta Oliveira que, no primeiro governo
muito formal.”
identidade da sua obra. “A Hungria não era o inferno na Terra, pelo Lula, chegou a agendar reuniões com o então
contrário, era um país bom de se viver. Não havia um clima de medo ministro da Educação, Cristovam Buarque.
e violência nos rodeando. Havia emprego, educação razoável, assis- A ideia era inserir quadrinhos na rotinas
tência médica gratuita e um clima geral de camaradagem”, conta. escolares a partir de incentivos do Minis-
tério da Educação. O projeto acabou
Longe do país que o acolheu na sua formação, seus primeiros quadrinhos sendo engavetado.
foram publicados na Itália, na revista Alter Linus, publicação festejada
e cuja primeira edição circulou em abril de 1965 pela editora Milano Libri. Avesso às histórias de super-heróis
A revista lançou personagens icônicos como Valentina, de Guido Crepax, como Batman e Superman, Jô também
e fez chegar na Europa histórias com o personagem Dick Tracy. A noto- não curte muitos os mangás. “Os super-
riedade trazida pela Linus levou Jô Oliveira à Dinamarca, Espanha e heróis emburrecem seus leitores. Você acaba
Rússia, fazendo com que o seu Lampião em quadrinhos, primeiramente,
falasse grego, para só assim ganhar assinatura brasileira.
Ficha A semelhança com a xilogravura foi alcan-
çada, inicialmente, com o uso do linóleo e,
Outra obra que se destaca é Hans Staden
- Um Aventureiro no Novo Mundo. A HQ
depositando toda a responsabilidade de
uma ação em uma única pessoa. Isso não
em trabalhos mais recentes, com o nanquim. levou seis meses para ficar pronta e nada existe…”, comenta. Entre os trabalhos atuais
menos do que 16 anos para chegar ao Brasil. está o resgate de algumas obras suas que não
La Guerra Del Regno Divino [Guerra do Reino Divino] foi uma das Dentro do universo das HQs, Jô é quase uma Antes de sua impressão e distribuição pela foram publicadas em português, bem como
principais HQs publicadas por Jô Oliveira na Alter Linus. Recheada de Nome: Jô Oliveira a tentativa de dar continuidade à adaptação
unanimidade. Voltando da Europa, ele iniciou editora Conrad, a obra já havia sido publica-
referências nordestinas, ele fez uso da estética do cordel, incorporando Natural da Ilha de Itamaracá, PE. os trabalhos no Brasil elaborando selos postais da em três edições da revista italiana Corto de Grande Sertão: Veredas, interrompida
referências e mitos europeus à cultura popular brasileira, lançando para a Empresa Brasileira de Correios e Telégra- Maltese, casa de artistas como Hugo Pratt devido à questões internas da editora.
mão da cavalhada,caboclinho, bumba-meu-boi, forró, pau de sebo, fos, sendo responsável por mais de 50 peças e Sergio Toppi. “A história de Staden é fan- “Não entendi por que eles não quiseram
além da figura de Lampião como o herói, representado miticamente
Carreira: 1965 - Atualmente
filatélicas, recebendo a medalha “Olho de boi” tástica. Ele só queria conhecer o mundo continuar… o trabalho de construir uma
como Dom Sebastião. Principais trabalhos: Hans pela produção de selos. Na gaveta, traz uma e acabou refém de índios por mais de oito HQ é muito complicado, envolve diversos
Staden - Um Aventureiro no série de prêmios: por duas vezes recebeu o meses, quase foi devorado e saiu ileso processos e custa muito tempo”, concluiu.
Para além da estética do cangaço, as expressões artísticas do Nordeste troféu do melhor selo do mundo, na cidade disso tudo”, comenta empolgado.
Novo Mundo (Conrad), A Guerra
tornaram-se a marca registrada de toda a sua obra. São características de Asiago, Itália. Foi agraciado com o Prêmio
de seu estilo o traço bem marcado, as expressões fortes nos seus perso- do Reino Divino (Pasquim). Tucuxí de Ilustração, o Troféu Carlos Estevão de A escolha de trazer as histórias da formação Fernando de Albuquerque é jornalista,
nagens, a simplicidade das formas e a presença de motivos, paisagens e Humor e o Troféu HQ Mix de Grande Mestre dos do povo brasileiro para dentro da fantasma- educador e um dos editores da Revista
personagens nordestinas, tomando a xilografia popular como inspiração. Quadrinhos, em 2004. Só para citar os principais. goria da sua narratividade tem um porquê O Grito! (revistaogrito.com).
14 Plaf Plaf 15
INFOQUADRO
Imagens: Divulgação
Quadrinhos
contam a história
da música, do jazz
de Billie Holiday ao
rock de Johnny Cash,
passando pelo samba
de Adoniran Barbosa e
o nascimento do hip hop
16 Plaf Plaf 17
MAKING OF O Maestro, o Cuco e a Lenda, por Wagner William / Making of /
O maestro,
o cuco e a lenda,
por wagner willian
Quadrinhos só acontecem na experimentação.
Ao menos os meus. Essa criatura é selvagem
demais para se pressupor algum domínio.
“
Página desenhada não quer dizer Cedi e fiz as 80 páginas porque aqui já
página terminada. A insatisfação havia uma história em torno dessa lenda.
S
Imagens: Divulgação
ão várias tentativas até achar é a regra e acabo achando meios de Uma história que não se conteve e cresceu
a linha que melhor traduz o melhorá-la. Significa que não estava para 140, 160, 208 páginas e basta!
teor de uma história. Uma vez boa o suficiente? Sim, é cruel, mas a
definido o estilo do desenho, o que já é difícil vida é essa aí. Saca só essa página Depois de tudo feito, vem a hora da
de se conseguir para quem não tem um traço como mudou (acima). Mesmo texto, revisão. Por estar imerso no trabalho,
patente, vem toda a parte de layoutagem. mesma cena, três concepções diversas. muita coisa acaba passando, coisas
Tentar condensar o tempo, pensar o ritmo A última está bem mais situada, que alguém de fora não deixaria. Tive
de uma página, buscar o melhor ângulo para tem uma dinâmica que atrai o olhar o privilégio de contar com o homem
e envolve e, por favor, tente não com olhos de águia, Lielson Zeni. Além
sugerir a sensação que você quer passar com
discordar... de corrigir a ortografia, ele apontou
aquela cena, são tantas possibilidades, pensar
para alguns erros da narrativa e
a luz, a textura, meu deus, a fonte que dará
Tanto em Bulldogma quanto no Cuco lá fomos nós outra vez.
voz aos seus personagens, páginas com ou sem
não existia um roteiro todo predefinido.
sarjeta.... seu cérebro já está completamente
Escrever ao mesmo tempo que se Para a próxima HQ, experimentarei
torcido, mas é aí que entra a beleza da coisa.
desenha permite desenvolver caminhos usar nanquim. Fiz tudo digitalmente,
Todo esse esforço é recompensado à la Fran- surpreen-dentes. Por outro lado, pode-se desde o esboço à finalização
kenstein, com vida! Você sente o peso das coisas, acabar perdendo um monte de páginas. no Photoshop com minha mesa
a passagem do tempo, a extensão de um campo, Mesmo assim prefiro arriscar digitalizadora Wacon Bamboo
suas personagens começam a viver dentro e encontrar esse curso mais natural respingada de tinta a óleo.
daquelas páginas. Quando isso acontece, e progressivo no desenvolvimento de
vira um caminho sem volta. uma história. Só foi possível testar todas essas
possibilidades porque resolvi fazer
Fazer o leitor virar a página é que são elas e A lenda do cuco, por exemplo, nasceu tudo digitalmente. Isso me deu uma
nisso vale tudo. Geralmente o último quadro em outra história, chamada “Silvestre”, liberdade para remanejar as figuras,
dará o gancho. Para que isso aconteça costumo onde descrevia várias lendas. Uma mudar sua direção, suprimir ou
jogar o texto dentro da página, imaginando delas era a do cuco. Achei que merecia acrescentar elementos, o diabo. Às
a ação que transcorrerá ali. Assim consigo um livro só para ela. E a princípio, vezes há um quadro muito escuro Wagner Willian é artista plástico, escritor e quadrinista,
calcular melhor o ritmo, pensando nesse tal seria um livro infantil de 32 páginas. na página que eu consigo pesar e autor do livro Lobisomem Sem Barba (Balão Editorial, 2015)
“gancho do pirata”. Muitas vezes ele escapa Transpor as cenas imaginadas. Para isso tenho um acervo imenso de fotografias. Melhorei o estilo do desenho, subindo criar contrapontos, diminuindo a e da premiada graphic novel Bulldogma (Ed. Veneta, 2016).
e te rasga inteiro. Isso resolvido, começa Geralmente, frames de filmes, relacionados por temas como bar, carro, floresta e por aí vai. para 40 páginas. Aquilo foi tomando visualização da página, dosando O Maestro, O Cuco e A Lenda foi lançado pela Texugo.
a hora do pesadelo. Uso e abuso de referências fotográficas, mas sempre como um começo e nunca como um fim. um corpo que exigia virar uma HQ. camadas de branco e preto.
18 Plaf Plaf 19
CAPA Quem lê tanta HQ? / capa /
Quem lê A
decisão do técnico de TI Sandro
Merg Vaz em rever seus gastos
com histórias em quadrinhos é
um alerta para a cena brasileira
de HQs. O colecionador gaúcho de 46 anos,
morador de São Paulo há 28, é uma espécie
Imagens: Divulgação
HQ?
finanças e acredita que a tendência é uma
diminuição drástica na frequência e nos
valores de seus gastos.
Plaf 21
/ capa / Quem lê tanta HQ? Quem lê tanta HQ? / capa /
“Sabe como é, eu Competindo preferiam apoiar os delas”, diz a autora. potência do encontro
Edições milionárias
Os encontros proporcionados pelas que tinha lançado até então. No primeiro de ficção, não apenas quadrinhos,
convenções, feiras e festivais periódicos semestre de 2018 a editora já contava da Amazon no Brasil.
realizados no Brasil acabam aproximando com mais de uma dezena de publicações.
artistas e editoras com modelos de negócios Nascidos como um canal do YouTube, o Já Gerlach brinca em relação ao
e percepções comerciais completamente projeto floresceu por meio de parcerias montante crescente de quadrinhos
distintos. Na Ugra Fest 2017, por exemplo, com a Amazon. “Nosso capital de giro lançados em eventos e nas feiras reali-
poucos metros separavam a mesa dos é baixo, uma HQ financia a próxima zadas mensalmente pelo país: “Sabe
editores do jovem e bem-sucedido selo e, até o momento, não vimos a cor como é, eu faço quadrinhos, então não
Pipoca & Nanquim, parceiros comerciais da do dinheiro”, explica um dos editores ganho dinheiro suficiente pra consumir
transnacional Amazon, e o espaço ocupado do selo, Alexandre Callari. Composta muito quadrinho. Como política editorial
pelo quadrinista gaúcho independente Diego por uma equipe enxuta, com todos seus do meu selo, procuro não fazer edições
Gerlach, autor de trabalhos caracterizados sócios levando outros empregos em caras, porque tento lançar coisas que, hi-
por suas impressões em xerox e acaba- paralelo ao empreendimento editorial, poteticamente, eu mesmo compraria”. Um
mentos caseiros. a Pipoca & Nanquim fez história em dos destaques do selo pessoal de Gerlach,
2017. Seu primeiro lançamento, Espadas a Vibe Tronxa Comix, é a série Know-Haole,
Em julho de 2017, o Pipoca & Nanquim e Bruxas, do espanhol Esteban Maroto, atualmente em seu sétimo número, com
apresentou no Ugra Fest os dois títulos foi um dos destaques de venda de obras tiragens baixas e preços acessíveis.
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/ capa / Quem lê tanta HQ? Quem lê tanta HQ? / capa /
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/ ensaio / Cidades visíveis e invisíveis dos quadrinhos / ensaio /
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Poucos
autores
foram tão
obcecados
pela própria
cidade quanto
Eisner por
Nova York.
Cidades
LAERTE: Na São Paulo de Chiclete com Banana, a paranóia é um estado de espírito que beira o hilário.
visíveis e invisíveis
A relação fictícia entre Kublai Khan e Marco Polo, NOVA YORK, Faz das janelas dos vagões de metrô telas
bem como as descrições poetizadas das cidades de cinema, faz das escadarias que ligam
a partir das memórias, desejos, símbolos e trocas
RECIFE, GOTHAM... os edifícios às calçadas o local onde a
quadrinhos
frequência referenciadas quando queremos nos outro senão pelo autor que foi tão, mas tão
do
aproximar tatilmente das metrópoles que têm obcecado pela cidade onde viveu, que fez dela Viro a esquina, retiro mais um livro
vida própria e que não, não podem ser descritas o tema maior de suas mais celebradas obras. da estante e dou de cara com a São Paulo
apenas por mapas, números e autos oficiais. Will Eisner esmiuçou uma certa vizinhança de Angeli e Laerte dos anos 1980. Primeiro
Toda cidade, como bem escreve Calvino, vem de Nova York, mais particularmente aquela nas páginas da Chiclete com Banana e, depois,
carregada de sensações, texturas e cheiros das cercanias do Bronx dos anos 1930/40. nas filhas e filhos dessa revista. Entre a prole,
que somente os viajantes mais inventivos, como Em trabalhos como Um Contrato com Deus Rê Bordosa e Piratas do Tietê. Com a musa
o Marco Polo fictício, podem dar conta. E na e, particularmente, em O Edifício, Eisner mais famosa de Angeli, conheci uma São
História das histórias em quadrinhos, não foram abriu na nossa frente uma janela que deu a Paulo com cheiro de cigarro e hálito de
poucos os artistas que igualmente conseguiram ver todas as pequenas alegrias e grandes vodca. Uma cidade em que a rua era o bar, e
fazer pular do papel essa tessitura própria das angústias daquela periferia de cidade moderna o bar era um banheiro sujo. Mas a São Paulo
cidades que, ora foram por eles criadas, ora que havia, em tão pouco tempo, superlotado de Rê Bordosa é muito mais uma projeção
C
reinventadas, ora utopicamente imaginadas todos os seus espaços entre a virada do do espaço externo dentro do discurso interno
Um passeio por histórias onta-me as cidades que possuo,
diria Kublai Khan a Marco Polo, exigindo
entre a cabeça, o coração e a ponta do lápis. século 19 para o século 20, sofrendo as
consequências de um urbanismo mais
da própria personagem que a visualização
de suas esquinas. A pessoa que realmente
em que os cenários estão que o viajante por ele contratado desse
conta de descrever todas as aglomerações
Este texto se propõe então a fazer um exercício acelerado que qualquer trem a vapor. conseguiu desenhar a capital paulista com
de flânerie por algumas das cidades que toda a espacialidade de suas ruas, prédios
em primeiro plano na narrativa, urbanas do vasto domínio do imperador terminei descobrindo ao longo de alguns anos Sou capaz de escutar os vizinhos de cima e placas de trânsito foi Laerte.
mongol. Marco Polo, que não sabia falar a (algumas décadas, serei sincera) lendo desde reclamando da água que não aquece e
da São Paulo de Laerte a Chicago língua do soberano, criava gestos, tocava gibis até as elaboradas graphic novels. Flânerie visualizar com o canto do olho, que lá E é nela, a partir de um ponto de vista muito
de Chris Ware, passando pelos em objetos, fazia caretas e movimentos
para tentar de alguma forma representar
no sentido de que a intenção é, sobretudo, tentar
andar pelos espaços dessas cidades e, tal como
embaixo, na rua, um grupo de meninos
planeja alguma trela da qual eles vão se
insólito mesmo para quem nasceu ou já
morou na cidade, que é feito esse passeio
sonhos futuristas de Moebius, a NY (ou apenas apresentar) como cada uma
das cidades que ele descrevia tinha uma
uma viajante a serviço de uma majestade
ansiosa em conhecer os espaços de seu
arrepender daqui a alguns minutos. A Nova
York de cheiros fortes de um esgoto ainda
urbano: de dentro do rio Tietê. Laerte me
trouxe o cheiro de esgoto daquilo que, um
de Eisner e a soturna Gotham City personalidade própria. A cidade que “contém império, convidar a quem estiver lendo de fazer insuficiente para a população, de invernos dia, foi de fato um rio, para tentar sentir na
seu passado como as linhas da mão, escrito também esse caminho comigo. Serão passeios duros e verões insuportáveis, uma cidade pele o que é andar por uma cidade onde a
nos ângulos das ruas, nas grades das janelas, por histórias que, intencionalmente ou não, cheia de pessoas mal-humoradas e ladrões paranoia é um estado de espírito que beira
por CAROL ALMEIDA nos corrimãos das escadas, nas antenas dos jogaram essas cidades para o primeiro plano da de carteira e, ao mesmo tempo, repleta de o hilário. O trânsito parado e os cidadãos
pára-raios, nos mastros das bandeiras, cada narrativa, transformando-as em personagens últimos românticos e sonhadores otimistas. dormentes que moram nessa cidade são
segmento riscado por arranhões, serradelas, tão importantes quanto os heróis, anti-heróis Eisner faz da cidade sua personagem favorita, tão absurdos quanto a imagem de um
entalhes, esfoladuras”. e sujeitos comuns que habitam nela. desenha ruas ora alegres, ora assustadas. navio de piratas navegando e mijando e
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/ ensaio / Cidades visíveis e invisíveis dos quadrinhos Cidades visíveis e invisíveis dos quadrinhos //chapéu
ensaio /
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À DIREITA
Raoni Assis responde
com um traço que faz
fundir o sujeito e a
cidade num só corpo.
ABAIXO
Futurismo de Moebius
influenciou o cinema.
ACIMA
Na dúvida, pego voo. Decido que é momento de sobrevoar ciadas pela concepção visual da Gotham criada por Anton Cidade mais famosa
alguns desses espaços e, lá de cima, visualizo as cidades Furst e Tim Burton, no Batman de 1989. Ou seja, uma cidade dos quadrinhos,
imaginadas por Moebius, particularmente aquela com uma certa energia de Art Deco, mais sombria, onde Gotham City tornou-
desenhada na saga The Long Tomorrow, publicada no todos os prédios e curvas disparavam um éthos da vilania se personagem
Brasil pela Nemo dentro do volume O Homem É Bom?. inerente ao local. Na versão dos quadrinhos, essa direção marcante.
O cenário pós-moderno de prédios que sobrepõe todas de arte se expande para a própria história a ser contada:
as correntes arquitetônicas do mundo num só lugar me em Destroyer, o grande vilão em cena quer implodir os
falam desse ambiente de identidades fugidias, onde posso edifícios retos e modernos de Gotham para revelar que, por À ESQUERDA
ser quem quiser e, no virar da esquina, me transformar debaixo dessas estruturas, existe uma base essencialmente Aparentemente tão
em outra pessoa. Mestre absoluto da representação sinuosa nessas construções, numa arquitetura que, uma higienizada em sua
espacial, com um senso de perspectiva de fazer alguns vez exposta, invocaria forças maléficas de volta à cidade. superfície, a Chicago
dos melhores arquitetos do mundo prestarem muita de Chris Ware esconde
atenção em seu traço, Moebius me apresenta uma cidade Fujo de Gotham para tentar respirar ares menos contamina- detritos de um
futurista tão ou mais cínica do que aquela em que vivo dos e chego à Chicago de Chris Ware, onde a mediocridade desconforto geral.
hoje. O excesso de modernidade e tecnologia que há da classe média me parece, à primeira vista, inofensiva
cuspindo rum no Tietê. Até hoje para mim, e isso se nela traz para o primeiro plano uma beleza, muito bem sem ser, com isso, menos marcada por detalhes bastante eu teria contato – óptico e háptico – não fossem os
deve fundamentalmente aos trabalhos de Angeli e, projetada por seu desenhista, a revestir a sensação de específicos. Ware desenha os espaços, externos e internos, artistas que decidiram desenhá-las. Falo, por exemplo,
particularmente, Laerte, São Paulo é a cidade que vazio existencial que atravessa seus cidadãos. Não é como se fosse ele mesmo um arquiteto apegado à simetria da Sarajevo e da Gaza de Joe Sacco, ou da Pyongyang,
catalisa a essência do absurdo. coincidência que essa mesma HQ tenha se tornado das coisas, às proporções corretas que nos dão uma (propo- de Guy Delisle. As HQs são uma linguagem que já nascem
uma referência de imagem para a construção das Los sitalmente) falsa sensação de harmonia e serenidade. tentando dar conta de dimensionar as cidades tanto
Olho para o chão, vejo uma bituca de cigarro e quando Angeles de Blade Runner, de Ridley Scott. Na ironia melancólica presente em suas histórias e na a partir de suas características físicas visualmente
levanto os olhos estou no Recife, ou melhor, o Recife meticulosa composição dos quadros dentro da página, explícitas (a citar algumas páginas de Little Nemo, no
está no meu corpo. Da minha pele brotam edifícios, Mas se sinto que com Moebius a cidade se adapta aos a cidade reproduzida no papel é fiel à Chicago que existe comecinho do século 20), como por suas qualidades
cada vez mais altos, e sou consumida pelas imagens meus desejos, sejam eles bem intencionados ou perversos, no plano real; mas se passeamos por dentro dos espaços extra-arquitetônicas e é importante reconhecer o status
que fundem o ser humano e a cidade tal como naquela que se tornou a cidade mais famosa dos quadrinhos criados por Chris Ware, vamos perceber que a sua de personagem que essas cidades adquirem em várias
desenhadas por Raoni Assis, quando na compila- não há muitas vias de escape para ser qualquer outra vizinhança é, na verdade, a nossa vizinhança. Há um histórias, e que, como uma Marco Polo contemporânea
ção quadrinizada Tô Miró, ele traz esse Recife de pessoa senão uma sombra que, com sorte, consegue forte sentido de familiaridade na geografia que ele cria, a tentar construir uma moldura sensível do que elas
concreto que está dentro de nós. “Quantos sacos escapar da índole criminosa desse grande centro urbano. nessa cidade aparentemente tão higienizada em sua transbordam para além das páginas, minha sugestão
de cimento há em ti, Recife? Quiçá meu coração Não poderia estar falando de outro lugar senão de Gotham superfície, mas que cavando um pouco dá para encontrar final é mais simples: procurem essas cidades, mas antes
não vire concreto, quiçá meu coração não vire City, particularmente daquela Gotham desenhada na saga detritos de um desconforto geral. de conhecê-las, imaginem apenas como seria senti-las.
cimento”, é o que o poeta Miró pergunta, no que Destroyer, no começo dos anos 1990, quando a cidade
Raoni responde com um traço que faz fundir o finalmente deixou de ser apenas um espectro remodelado Poderia passear por vários outros centros urbanos que
sujeito e a cidade num só corpo. Seriam cumpli- de Nova York para se transformar em uma personagem me marcaram nos quadrinhos, particularmente quando Carol Almeida é doutoranda em Comunicação,
cidades ou infeliz-cidades? de características muito próprias, fortemente influen- eles me revelaram cidades com as quais dificilmente crítica de cinema e editora da Plaf.
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/ perfil / / perfil /
EM CASA
Henrique Magalhães
a a:
das publicações
M
missão
de um
homem A
Comic House, loja
´
de quadrinhos localizada
sO
na cidade de João Pessoa e
comandada pelo descontraído e amável
Manassés Filho, tem na placa de sua
fachada vários personagens dos gibis; COMO
entre eles, Maria, criada pelo quadrinista,
também paraibano, Henrique Magalhães. FUNCIONA A
MARCA DE FANTASIA
“Toda vez que Henrique vem aqui, me diz
que vai desistir desse negócio de quadrinhos, Henrique toma conhecimento dos
que isso não leva a nada”, dizia Manassés, trabalhos que deseja publicar através “Foi minha estratégia
aos risos. “Mas ele não consegue!” do circuito independente, acadêmico e em para que eu pudesse ter dezenas
eventos – mas também recebe trabalhos de títulos ao mesmo tempo, em vez
Henrique é fundador, editor e único de autores que entram em contato com ele. de publicar dois por ano e ter 500 exem-
funcionário da editora Marca de Fantasia Os quadrinhos são sempre impressos; já os plares de cada um. Foi uma visão editorial,
– responsável pela publicação de dezenas livros acadêmicos, caso ultrapassem as 200 para a viabilidade da produção”, conta ele.
de títulos todos os anos, entre quadrinhos, páginas, viram e-books, disponibilizados no
pesquisas acadêmicas sobre a área e outros site da editora (muitas vezes, gratuitamente). Sozinho, costura à mão cada um dos cadernos,
Resistência, criatividade e o verdadeiro espírito estudos sobre Comunicação. Funções que com um método que ele mesmo desenvolveu;
exercia em paralelo à vida de professor Henrique revisa, edita, diagrama e monta depois, dá forma aos livros colando-os com uma
do “faça-você-mesmo” de Henrique Magalhães, universitário – até se aposentar, em cada uma das publicações. Nos primórdios da prensa caseira – também feita por ele mesmo.
meados deste ano. editora, as páginas eram impressas, recortadas,
mente e braços da editora paraibana especializada coladas e xerocadas, como num fanzine – sua
Por fim, junta-os às capas. Quanto aos e-books,
também é Henrique quem os edita, diagrama e
em quadrinhos e livros teóricos sobre o tema Sua persistência se deve principalmente
a dois fatores: o amor pelos quadrinhos e
escola e seu objeto de pesquisa durante quase
toda a vida. Hoje, imprime as páginas em casa,
disponibiliza no site da Marca de Fantasia – tam-
bém totalmente construído e administrado por ele.
publicações independentes; e a necessidade numa impressora à laser. Faz os miolos de dez
por DANDARA PALANKOF de não deixar que passem em branco tantos em dez exemplares, fazendo a reposição à
trabalhos que não encontrariam espaço medida em que se esgotam.
em editoras comerciais.
As capas também eram feitas artesanal- AS primeiras publicações
“Registro” é uma palavra-chave para mente, impressas e coloridas à mão ou com
definir o trabalho desenvolvido pela Marca carimbos de linóleo; hoje, são impressas em Desde cedo, Henrique se interessava não só por
de Fantasia. A editora é uma espécie de guardiã off-set, em gráficas da cidade. Essa é a única desenhar, mas em fazer suas publicações (a
da memória da produção de quadrinhos – parte da produção que ele terceiriza – e, admite, primeira foi uma revista mimeografada, ainda no
e da pesquisa sobre o tema – totalmente muito a contra-gosto. Mas fazê-lo permite colégio). Já na faculdade de Arquitetura, começou
underground, produzida por nomes que que as capas tenham maior qualidade. Ele a publicar as tiras de Maria, sua personagem
correm (ainda mais) por fora de um as imprime às centenas e as armazena, mais icônica, nos jornais da Paraíba. Então,
circuito que, podemos dizer, ainda utilizando-as a medida em que precisa criou uma revista para suas tiras, que tinha
está em processo de formação. confeccionar novos exemplares. ainda artigos e trabalhos de outros artistas.
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/ perfil / Marca de Fantasia: missão de um homem só Marca de Fantasia: missão de um homem só / perfil /
Divulgação
Com tiragem de mil exemplares, a revista Maria O vigor da cena francesa inspirou Henrique a criar
Sozinho, teve dez números, em preto e branco e papel jornal, uma estrutura que viabilizasse uma produção de alta
distribuídos na Paraíba e em Recife. Teve também qualidade no meio independente brasileiro. Sua ideia
costura à mão um álbum: Maria, A Maior das Subversões. era criar um projeto editorial que pudesse oferecer
suporte e divulgação aos trabalhos que conhecia Brasil
as páginas internas, O selo estampado na capa da revista, porém, era afora. Então, em 1995, o nome Marca de Fantasia
outro: Editora Artesanal – referência ao grupo de agora batizava uma editora, destinada a publicação
com um método teatro do qual Henrique fazia parte. Porém, quando de fanzines, revistas, livros e álbuns.
trocou a Arquitetura pelo Jornalismo, ele começou
que ele mesmo a editar uma nova revista no curso. O nome da
publicação, que trazia artigos sobre cultura em
desenvolveu; geral, veio num estalo: Marca de Fantasia.
A marca toma forma
depois, dá forma Ele usou o nome novamente em meados de 1986
para batizar um fanzine de quadrinhos criado com O projeto inicial da Marca de Fantasia consistia
em três linhas: um fanzine, batizado como Top-Top;
aos livros colando- a colega de mestrado Sandra Albuquerque, em São
Paulo; foram oito números. Quando voltou para uma revista em quadrinhos experimental, a Tyli-Tyli
Quem é Maria os com uma prensa João Pessoa, criou mais um fanzine: o Nhô Quim –
dessa vez, um projeto coletivo; e que foi interrom-
(nome da personagem criada por Flávio Calazans),
rebatizada como Mandala quando passou a contar
pido por uma nova mudança: o doutorado na França. com outros colaboradores; e livros de tiras, que inte-
O alter ego de Henrique caseira – também grariam uma série intitulada “Das tiras, coração” –
Nunca houve interesse
Magalhães surgiu em 1975 Henrique já havia aprofundado seu conhecimento esta, junto com o professor e quadrinista mineiro
e estrelava as tiras que o feita por ele mesmo da produção independente de fanzines e quadri- Edgard Guimarães, um dos parceiros mais antigos
em transformar a Marca
nhos em outros estados brasileiros e outros países de Henrique. As publicações se alternavam a cada
quadrinista publicava nos europeus durante o mestrado. Mas na França, ele
descobriu o que descreve como uma “efervescência”
mês. A ideia durou exatamente um ano.
de Fantasia em um negócio
jornais de João Pessoa. Era
uma solteirona em busca de
das publicações independentes, entre as mais Outras publicações foram surgindo, como a série
de álbuns Repertório; a revista de quadrinhos
propriamente dito. A editora
artesanais e aquelas com maior refinamento
um marido; mas logo saiu do editorial. Acompanhou de perto, por exemplo, poético-filosóficos Artlectos e Pós-Humanos, de
Edgar Franco; e o tradicional fanzine QI, de Edgard
é sua paixão e, talvez, sua missão
os primórdios da L’Association – hoje uma das
armário como lésbica e suas editoras mais importantes do mercado francês Guimarães (hoje disponibilizado gratuitamente pela
tiras tornaram-se o veículo de quadrinhos. Em sua tese, acabou discorrendo Marca, em edição eletrônica). Quem também ganhou
sobre as similaridades e diferenças entre os espaço mais uma vez foi o alter-ego de Henrique,
através do qual Henrique em sua Maria Magazine.
fanzines brasileiros, portugueses e franceses.
advogava em prol da liberdade
de expressão e dos direitos das
Fotos: Dandara Palankof / Plaf
minorias. Em 2015, aos 40
anos da personagem, a editora O livro perdido Espaço para a cultura LGBTT
portuguesa Polvo publicou o Divulgação
álbum Seu Nome Próprio... Henrique havia acordado com o A Marca de Fantasia também dá atenção especial aos quadrinhos
cartunista Jaguar a publicação protagonizados por personagens homossexuais. Em seu catálogo, constam
Maria! Seu Apelido, Lisboa, de uma coletânea de seus publicações como a coletânea Autores Plurais; revistas de Katita (personagem
agraciado no ano seguinte com trabalhos, chamada Lugares lésbica criada por Anita Costa Prado); Camila, gibi que aborda a transexualidade,
Incomuns. Porém, o processo de autoria de Julie Albuquerque; um retrato do universo dos “ursos” em Ber
o prêmio de Melhor Álbum de de confecção do livro demorou the Bear, de Rafael Lopes; além de Macambira e Sua Gente, também de
Tiras Humorísticas no Festival um ano. Quando foi lançado, autoria de Henrique Magalhães.
de BD de Amadora. Em 2017, Henrique recebeu uma ligação
nada amistosa de uma editora,
Henrique e Maria ganharam
uma exposição no mesmo
afirmando que haviam assinado
um contrato com Jaguar para relançar toda a sua obra.
Quadrinhos na academia
Henrique conta que, ao contatar Jaguar para resolverem A série Quiosque, de estudos sobre quadrinhos, conta com títulos como Miracleman:
festival, além de uma nova
a questão, o colega quadrinista se mostrou um tanto Um Outro Mito Ariano (Márcio Salerno), O que é História em Quadrinhos Brasileira
edição do álbum Maria: A intransigente. Mesmo com o argumento de que a (Edgard Guimarães), Tiras Livres: Um Novo Gênero dos Quadrinhos (Paulo Ramos),
Maior das Subversões, também Marca de Fantasia, sem fins lucrativos e com tiragem A Linguagem dos Quadrinhos: Definições, Elementos e Gêneros (Alberto Ricardo
pequena, não prejudicaria as vendas da outra editora, Pessoa) e Quadrinhos e Totalitarismo: V de Vingança, Watchmen e El Eternauta
publicado em Portugal pela Jaguar também exigiu que a edição da Marca fosse (Douglas Pigozzi). Além disso, a Marca de Fantasia também publica a revista
Editora Polvo e por aqui (é claro) recolhida. No fim das contas, Henrique teve que lidar acadêmica Imaginário!; ligada ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação
pela Marca de Fantasia. com uma acusação de violação de direitos autorais – da UFPB, abre submissão de artigos sobre quadrinhos, artes visuais, cultura pop
mas a tal editora nunca relançou a obra de Jaguar. e afins a graduandos, mestrandos e doutorandos de qualquer lugar do país.
A Marca tem cerca de 200 títulos publicados, entre HQs, publicações acadêmicas, revistas e antologias.
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/ perfil / Marca de Fantasia: missão de um homem só ESTANTE // CAPITÃO AMÉRICA, de Nick Spencer e Daniel Acuña
Sam Wilson:
“
a Marca foi por ALlan da rosa
a primeira a Além das obras de
publicar no Brasil
Killoffer e Claire Bretécher,
os franceses Killoffer
F
e Claire Bretécher, outras publicações de uçando em uma banca com meu guri de 10 anos, Bem, o novo Capitão América é negro. Sam Wilson, o antigo
além de Thierry autores estrangeiros parceiro de emoções por gibis e livros, me surpre- Falcão, aquele que era braço direito e subalterno, assume
Groensteen, um dos endi com uma capa impensável nos anos 1980 de o posto. Não está mais ali para sugerir a fraternidade e a
também se destacam
maiores teóricos minha infância. Naquela época eu juntava a merreca ganha ven- união entre as raças. Sam chacoalha os pilares do nacio-
das HQs no mundo. no catálogo da Marca. dendo banana na feira ou recolhida em troca de serviços pela nalismo que sustentou a ideologia do Capitão América
Entre elas, o experimental quebrada. Toda minha fortuna era pra gibi de herói e o do Capitão desde a guerra contra Hitler, destrona a propaganda que
América era um dos cinco mensais da Marvel. Sempre achei este regeu globo afora a ideia do espírito de justiça dos EUA
Postais de Viagem, da glorioso paladino o mais chato da trupe e ele ainda aparecia na como terra da liberdade e oportunidade, como movimen-
Além dos autores nacionais, a Marca também Com o tempo, a editora tornou-se um projeto de
portuguesa Teresa Câmara “Heróis da TV”, comandando os Vingadores. tos pretos já demonstram há séculos.
Divulgação
publicou autores estrangeiros com menor pene- extensão quando a Pós-Graduação em Comunicação
tração no mercado brasileiro. A Marca de Fantasia da UFPB foi criada, passando a publicar não apenas Pestana; e a coletânea Mas em seu gibi apareciam vilões malucos, dramá- O loiro Steve Rogers, antigo dono do escudo que manteve
foi a primeira editora do país a publicar um gibi os trabalhos de conclusão da graduação, mas tam- Carne Argentina, do selo ticos ou sedutores e heróis secundários que a juventude por anos na câmara criogênica, torna-se
do renomado autor francês Killoffer – a coletâ- bém do mestrado e do doutorado lá produzidos. mapeavam minha imaginação. Alguns res- um velhinho satirizado por seus inimigos, atuante como
nea de histórias Quando Tem que Ser. Também é coletivo La Produtora. suscitaram, outros nasceram. Ainda inven- agente especial da SHIELD, a força de pensamento militar
motivo de orgulho para Henrique o fato de sua Já entre os artistas taram mais heróis ou novas origens para subordinada aos barões engravatados do burô do país.
editora ter sido a única no país a publicar uma obra bambambãs antigos, bebendo como E Sam Wilson manda em rede nacional um discurso ácido:
nacionais, há veteranos
da também aclamada francesa Claire Bretécher. O CONTRA-CULTURAL sempre em mitologias de muitos “a verdade é que sempre estivemos divididos” é o que diz
álbum Os Frustrados foi lançado primeiro em 2004 de renome, como Shiko, povos ou mesclando tendências enquanto imagens de conflitos raciais pipocam nas telas.
e ganhou uma reedição em 2012. Hoje, a Marca de Fantasia conta com cerca de contemporâneas com o fas- A série veio em plena época de campanhas de Trump e de
Shimamoto, Edgard
duzentos títulos em seu catálogo, entre livros, cínio das tecnologias Hillary para a presidência do país e a história gira no deser-
revistas e álbuns. Tudo o que já foi e ainda é Guimarães e Edgar bélicas e de infor- to do Arizona, onde migrantes mexicanos são sequestra-
publicado pela editora está disponível no site Franco, além de nomes mação. dos por supremacistas brancos que lhes metralham ou lhes
AS PUBLICAÇÕES ACADÊMICAS da editora. Vários e-books são disponibilizados
promissores no circuito
usam em experimentos genéticos. Dos sobreviventes virá
gratuitamente e o restante é vendido a preço de Joaquin Torres, o novo Falcão, que já nas capitais do Norte
Henrique já era professor da Universidade custo, apenas para manutenção dos trabalhos. brasileiro de quadrinhos, vai fortalecer a luta com a Soluções Serpente, vilões ofídicos
Federal da Paraíba, na área de Comunicação, que pregam o neoliberalismo mesclado ao racismo assumido,
como a goiana Cátia Ana
desde a época do mestrado. Alguns trabalhos Henrique sabe que o apelo comercial das publi- entre uma postura bufona e a sofisticação de um discurso
de conclusão de curso começaram a lhe chamar cações da Marca de Fantasia é mínimo – e nunca (When a Man Loves a contemporâneo que toma conta das indústrias farmacêu-
atenção e, assim, a Marca de Fantasia passou a desejou que tivessem. Nunca houve, de sua parte, Woman e O Diário de ticas oferecendo consultoria, às vezes à força. Sam Wilson,
publicar também livros acadêmicos. qualquer interesse em transformar a editora em com sua rala popularidade após mexer nas furadas verda-
um negócio propriamente dito. Para Henrique, seu Virgínia) e a gaúcha des nacionais, tem que lidar com as ferrugens da buro-
Mas a nova linha do projeto editorial tomou trabalho “de verdade” sempre foi a vida acadêmica. Samanta Flôor (Toscomics, cracia e as traições de antigas parcerias, além do dile-
forma após a participação de Henrique na A editora é sua paixão e, talvez, sua missão. mas morais com seu antigo parceiro Steve Rogers.
em parceria com a revista
edição de 2002 do Congresso Brasileiro de
Ciências da Comunicação - Intercom. Na época, Ele sabe das limitações acarretadas por sua maneira Café Espacial).
Histórico Com meu moleque Daruê, em três edições li uma
o evento acadêmico ainda contava com um de trabalhar – principalmente no tocante à distribu- Por aqui, o Capitão América surpreendente mudança, um roteiro bem construído
grupo de trabalho voltado aos quadrinhos, ição. Porém, é o preço da escolha pela liberdade Sam Wilson ganhou título próprio e um bom panorama da atual política, economia
coordenado por Moacy Cirne (considerado o conceitual e temática da qual não abre mão. O que mensal pela Panini, em 2017. e das ideologias coloniais que mordem o globo
maior pesquisador da área no país). Ao ver a lhe move à frente da Marca de Fantasia é a opor- Nos EUA, sua primeira aparição foi em em tempos de Dorias, Trumps e Macris. Com
Captain America 117 (Setembro
ção
quantidade de pesquisas produzidas, Henrique tunidade de dar espaço àquilo que considera impor- o corpo negro protagonista num lugar
ivulga
se propôs a publicar algumas delas; nascia, tante como experimentações gráficas e conceituais de 1969), como Falcão. É tido antes encastelado a um herói branco,
ens: D
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/ festival / Angoulême: cidade dos quadrinhos / festival /
A
ANGOULÊME
casas editoriais como Delcourt, Glénat e Caster-
ideia de um festival como uma man, ainda há bastante espaço para editoras
celebração é algo que remonta pequenas e médias, que nos últimos anos têm
ao sentido mais etimológico contribuído para diversificar ainda mais a produ-
da palavra. Ainda que exista um apelo ção contemporânea de BD. São essas editoras
comercial bastante inerente a qualquer mais independentes as responsáveis por apostar
evento de quadrinhos hoje em dia, o em talentos mais inovadores e experimentais.
Festival Internacional de Quadrinhos de
36 Plaf Plaf 37
/ festival / Angoulême: cidade dos quadrinhos RESENHAS
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Pantera negra
Uma HQ à altura do rei de Wakanda por Anne
Caroline
Quiangala
O arco Uma Nação Sob Nossos Pés, do Pantera Negra, Na segunda parte, a busca de uma terceira via se evidencia:
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BRASILEIROS Três HQs brasileiras concorreram ao prêmio de melhor quadrinho alternativo. Maria Magazine, de Henrique Magalhães, a antologia contou com 12 edições escritas pelo jornalista Ta- o protagonista toma pra si a tarefa de proteger Wakanda
Café Espacial e Amor em Quadrinhos, coletânea organizada por Milena Azevedo. A categoria acabou vencida pela revista francesa Bien, Monsieur #8. Nehisi Coates, em 2016, e foi publicado no Brasil pela de Tetu e Zenzi (líderes dos rebeldes, identificados como
editora Panini, em três encadernados. Este “início de uma Povo), mas também duma forma de governo tradicional
nova era” é uma espécie de resposta à queda nas vendas injusta e ineficaz. Neste meio tempo, o monarca vai
Atravessando a rua do Cité Internacional Um festivalzão desses... de quadrinhos mainstream dos EUA, que encontrou saída perdendo mais força e uma solução para o estrangulamento
encontrei uma ponte em zigue-zague sob no foco às causas sociais da geração millenium. narrativo é a convocação de um time de superamigos
o rio Charante. No meio dela, uma estátua Mais da cobertura Angoulême foi a mais interessante da diáspora: Misty Knight, Tempestade e Luke Cage.
imponente e austera de Corto Maltese parecia experiência que já tive de um festival de Coates, grande admirador de quadrinhos da Marvel T’Challa também busca instrução no plano divino,
vigiar a passagem. O mais famoso personagem Veja mais detalhes do Festival de quadrinhos. Foi incrível vivenciar a forma e filho de um ex-Pantera Negra, adicionou elementos onde repousam os ancestrais e a memória coletiva
de Hugo Pratt é bastante presente em Angoulême, Angoulême no site da Revista O Grito!, como a cidade proporciona uma imersão políticos e estéticos muito pertinentes ao arco. Exemplo de Wakanda, o Djalia.
decorando ônibus públicos e até comerciais com galeria de fotos, reportagens disso é que ele se desenvolve como consequência ideológica
completa ao visitante, algo bem diferente do
de perfume. Aqui ele parecia materializado, e um podcast com participação
distanciamento e isolamento que sinto em de eventos como a maré gigante comandada por Namor Por fim, no terceiro volume, Coates aponta para uma
um anfitrião cortês disponível. Do outro lado de Milena Azevedo (Amor em
eventos fechados dentro de pavilhões como para destruir Wakanda (Vingadores vs X-Men, 2012), nova Wakanda, mais adequada ao tipo de civilização
do rio encontramos o Museu de Quadrinhos Quadrinhos), Henrique Magalhães
as comic-cons. As relações aqui parecem um golpe orquestrado pelo Dr. Destino (Doomwar, 2010), tecnológica que se orgulha de ser. A crise política, o
de Angoulême que trazia a exposição de outro (Maria Magazine) e Maria Clara
não ser tão mediadas pelo consumo quando uma invasão de Thanos (Infinito, 2013), o afastamento esfacelamento das instituições consagradas e uma
grande nome da BD franco-belga, Jacques Carneiro (do blog Balbúrdia). Acessa:
comparados com outro evento de quadri- de T’Challa e, por fim, a morte da princesa Shuri. Para reflexão profunda sobre Poder, justiça social e o real
Martin (1921 - 2009) e seu mais famoso http://bit.ly/ogritoangouleme
nhos. E sim, faz muita diferença um o autor, este tipo de continuidade, tão típica das comics, sentido da democracia são temas urgentes tratados
personagem, Alix. festival todo dedicado exclusivamente nunca havia sido aplicada ao personagem, e isso reduzia com uma seriedade ímpar em Uma Nação Sob Nossos
aos quadrinhos, cuja proposta artística é a importância dele na cosmogonia da Marvel. Pés. Por meio de metáforas potentes, Ta-Nehisi Coates
A série fala de um jovem escravo de origem muito particular e rica. Séries de TV, filmes, demonstra sua “excelência negra” (black exellence),
gaulesa nos tempos de Júlio Cesar. O perso- licenciamentos, enfim, não são a tônica da Assim, em Uma Nação Sob Nossos Pés, temos um atualiza diversas questões a respeito do nacionalismo
nagem completou 70 anos em 2018 e segue Do lado de fora, um grupo de quadrinistas programação, e isso é ótimo. plot completamente novo para Wakanda e seu líder negro, antirracismo e como as instituições capitalistas
até hoje editado na França. A exposição fez protestava por negociações mais justas político e religioso, o Pantera Negra. No primeiro volume, estão acima de qualquer possibilidade de governança
uma tentativa de desconstrução de Alix, de direitos autorais e um piso salarial É por essa atmosfera de intimidade e os
desnudando sua alma juvenil heroica para somos introduzidos à problemática enfrentada pelo rei: realmente alinhada ao interesse, ao objetivo e ao poder
para a categoria. Vários artistas, em seus cenários medievais únicos da cidade que
revelar sua complexidade e contradições. wakandanos opositores ao governo de T’Challa começam negro – tema amplamente discutido em seu belíssimo
agradecimentos no palco, apoiaram a causa Angoulême, acredito, ainda será relevante
a aterrorizar a parcela simpatizante, tanto alimentando Entre o mundo e eu (2015).
dos manifestantes. por muitos anos. O festival cresce a cada
a vergonha e uma “consciência da irresponsabilidade” do
edição e já começa a se adaptar para trazer
Pantera Negra, quanto por meio de “homens-bomba”, Embora eu seja fã do estilo de roteiro mais objetivo
Três brasileiros competiam este ano, na conforto a tantos visitantes, mas saber
com o intuito de desestabilizar ainda mais a realeza. e visual dum Brian M. Bendis, Uma Nação Sob
PRÊMIO E PROTESTO categoria de melhor HQ alternativa: Amor equilibrar seu crescimento com a manutenção
Nossos Pés prima tanto pelas referências filosóficas,
em Quadrinhos, organizado por Milena de sua personalidade será seu maior desafio.
Em 2019, o evento vai celebrar a produção Ainda no Livro Um, conhecemos as guerreiras históricas, étnicas e literárias, quanto por seu roteiro
A premiação é parte importante do Festival de Azevedo; Maria Magazine, de Henrique
Magalhães; e a coletânea Café Espacial. da América e também a música. Espero e amantes Ayo e Aneka, que apresentam uma sem furos. Apesar disso, alerto a respeito do volume
Angoulême e é, em certa medida, o que garante
sua popularidade no mundo, mesmo para quem O prêmio acabou indo para Bien Monsieur voltar para essa celebração de novo. perspectiva alternativa àquela do enfraquecido de recordatórios, subtramas, intrigas e personagens
#8, uma revista de antologia editada por Elsa e instável rei T’Challa. Ao se tornarem os Anjos que se mesclam nos três volumes, conferindo uma
nunca pôs os pés por lá. É que seu poder de Uma Nação Sob
influência atinge diversos mercados editoriais Abderhamani e Juliette Mancini, cujos temas da Meia-Noite, dupla que busca justiça para os sofisticação literária, tão rara nos quadrinhos atuais,
Nossos Pés
e serve como plataforma para novos artistas. eram feminismo, política e sociedade. Ainda * O editor da Plaf viajou em uma parceria segmentos minorizados de Wakanda, vivenciamos subsidiários do cinema. Para os iniciantes, o arco é
assim, é de se comemorar a presença de com o Consulado da França no Recife uma frente de batalha interessada em restabelecer a recomendável porque não exige conhecimento prévio; Ta-Nehisi Coates (roteiro),
Quem levou este ano foi o jovem Jérémie brasileiros em uma seleção tão interessante. e o Institut Français honra do país. Esta representação duma agenda que para os fãs antigos, esta é uma Wakanda nunca Brian Stelfreeze (ilustração
Moreau, de apenas 24 anos, com seu livro se aproxima do Feminismo Negro (conforme a nossa vista antes: vacilante sob os pés do rei! nas edições #1-#4, #9,
La Saga de Grimr. A HQ se passa na Islândia O Grand Prix, entregue para um autor pelo leitura diaspórica), evidencia as leituras de Audre #12), Laura Martin (Cores),
do século 18, quando o país ainda lutava contra conjunto da obra, foi para o norte-americano Lorde e Toni Morrison, além da sensibilidade do olhar Chris Sprouse (ilustração nas
Anne Caroline Quiangala é preta,
a dominação da Dinamarca e vivia na miséria. Richard Corben, autor de Espírito dos Mortos Paulo Floro é mestre em comunicação, de Coates para militância antirracista pra além duma edições #5-#8, #10-#12)
nerd & burning Hell; mestra em literatura,
A premiação aconteceu no Teatro Municipal e também de trabalhos para editoras editor da Plaf e da Revista O Grito!. interpretação dualista (e masculinista) de “Martin [Panini, 3 volumes, capa
apaixonada por bons quadrinhos e séries ruins.
de Angoulême e foi bastante concorrida. mainstream como DC e Marvel. Luther King Jr. versus Malcom X”. dura,148 páginas]
Imagens: Divulgação
tramas românticas cheias de paixão e amor proibido,
Por ALEXANDRE FIGUEIRÔA a Revolução Pernambucana de 1817 é um óbvio
combustível narrativo, prontinho para adaptações na
ficção. E é explorando isso que duas HQs chegam ao A Mulher-Maravilha foi criada pelo psicólogo
William Moulton Marston, em colaboração
com o artista H. G. Peters, em 1941. Ela não foi
poder extremamente elevados e rodeada de um
elenco secundário extremamente cativante e rico
em conflitos e histórias.
Por PAULO FLORO
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/ resenhas /
O mais novo trabalho de Daniel Clowes, bem como frustrado não apenas pela morte de Paciência, mas
Imagens: Divulgação
toda a obra dele, poderia se expandir a partir da particularmente por nunca ter conseguido identificar
frase acima. Artista atento às idiossincrasias de um o assassino de sua mulher.
certo tipo de cidadão norte-americano mais conhe-
cido no dicionário urbano gringo como “loser”, mais A partir de então, visitamos não apenas construções
especificamente o “loser” na pele da pessoa branca espaciais muito bem elaboradas nessa ficção científica
não muito bem-sucedida, Clowes faz um de seus do derrotado, como somos vertiginosamente deslocados
trabalhos mais ousados do ponto de vista narrativo, no tempo seguindo um protagonista que é tudo menos um
com uma história de amor que vai e volta no tempo herói a quem consigamos facilmente nos apegar. Ele
e que se permite delirar junto com o delírio de um de erra, toma decisões equivocadas, é inescrupuloso em várias
seus personagens, sem perder o tom perversamente ocasiões, tudo isso para tentar corrigir, no passado, o even-
realista que atravessa toda sua obra. to que teria ocorrido em 2012. Jack é alguém por quem
temos sentimentos conflitantes e ainda assim torcemos
Com um ritmo cinematográfico de ação que “filma” por ele. Essa ambiguidade sustenta toda a história. Paciência
seus personagens com genuíno interesse em seus Daniel Clowes
dramas pessoais – quase sempre o que eles têm Os aspectos formais da obra, para além do desenho cada
em comum é um histórico de terem sido abusados vez mais elegante, também revelam que Clowes chegou [Nemo, 180 páginas,
ou negligenciados durante boa parte da vida -, o em outro patamar dos quadrinhos. Ele brinca com as R$ 64,90 / 2017]
artista conta aqui a história de Paciência, uma jovem palavras que vão fugindo das páginas, com a sobrepo-
mulher que, no ano de 2012, recebe a notícia de sição de quadros, com o uso dos closes para dar mais
que está grávida de seu também jovem marido Jack. tensão à história e, sobretudo aqui, com um jogo de
Um evento violento acontece, Paciência é assassi- cores que, já na capa, denunciam um tom estridente que
nada e, de repente, somos transportadxs para 2029, está na imagem, bem como na história. Valeu ter espe-
quando Jack já está velho, tendo passado toda sua vida rado cinco anos para ler algo inédito de Daniel Clowes.
Falar é de prata,
C ala r é de o u r o Por DANDARA
PALANKOF
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JÃO
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Jô Oliveira é quadrinista e ilustrador pernambucano,
autor de Hans Staden - Um Aventureiro no Novo Mundo e A Guerra do Reino Divino, entre outros.
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Mascaro é quadrinista e designer pernambucano. Foi um dos fundadores da revista Ragu, antologia de quadrinhos brasileiros e internacionais, editada no Recife.
Também teve trabalhos publicados na Ragu Cordel, Ascenso Ferreira em Quadrinhos e Domínio Público, com versões de clássicos da literatura mundial.
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Roberta Cirne é pesquisadora, roteirista e desenhista de quadrinhos. Ilustrou Passos Perdidos, História Desenhada,
Heróis da Restauração Pernambucana, AFRO HQ e a mais recente, Sombras do Recife, online. / sombrasdorecife.com.br
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Brendda Costa Lima é quadrinista e colorista cearense. Coloriu Pombos (Netuno Press), a série Mayara & Annabelle (Ficticia) e é autora
deManual de Sobrevivência à Vida Adulta (Netuno Press), em que assina texto e arte. / http://vanillatre.tumblr.com/
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SAIDEIRA