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RESENHA

CAIO PRADO JUNIOR. “FORMAÇÃO DO BRASIL CONTEMPORÂNEO: Colônia”

Valéria Ferreira Santos de Almada Lima


Universidade Federal do Maranhão (UFMA)

DADOS BIOGRÁFICOS, FONTES DE inteiramente diverso daquele em que atuaram, no


INSPIRAÇÃO E CONTEXTO INTELECTUAL final dos anos 50 e início dos 60, os chamados
marxistas uspianos e teóricos da dependência, os
Caio da Silva Prado Junior nasceu em São quais, nutrindo-se de uma rica vida acadêmica,
Paulo, em 11 de fevereiro de 1907. Filho de família contaram com as condições mínimas necessárias
aristocrática, graduou-se em Direito pela para fundar, em torno de si, uma tradição marxista
Universidade de São Paulo em 1928, já genuinamente brasileira.
despontando como intelectual em 1933, com a Além do referencial teórico marxista, o autor em
publicação de “Evolução Política do Brasil”, o seu análise utilizou fortemente os conhecimentos
primeiro livro. adquiridos no curso de Geografia e História da
Militante do Partido Comunista Brasileiro, Caio Faculdade de Filosofia da USP. Embora não
Prado Junior exerceu mandato eletivo e alguns concluído, esse curso lhe forneceu valiosos
cargos de direção partidária, tendo se caracterizado, subsídios para o conhecimento mais profundo da
nesse campo, assim como em todas as demais realidade brasileira, enriquecendo-o ainda com o
frentes em que atuou, pela coerência e recurso da observação direta, do qual lançou mão,
independência de suas posições. Foram nas freqüentes viagens realizadas pelo país. (LAPA,
exatamente esses atributos que possibilitaram ao 2001, p. 260)
autor desenvolver uma penetrante e devastadora O objeto central de preocupação de Caio Prado
crítica às concepções teóricas dominante,s no Junior era a formação da sociedade brasileira e,
âmbito de seu próprio partido e da esquerda particularmente, os condicionantes do processo de
brasileira em geral, bem como à prática política transição entre a Colônia e a Nação. Instigava-o a
delas decorrentes. Tal crítica, embora perpasse toda percepção da necessidade de empreender uma
a sua trajetória política e intelectual, culmina com a nova forma de interpretação do Brasil que refletisse
publicação de “A Revolução Brasileira”, em 1966, a sua real identidade, em contraposição à
considerado seu livro o mais controvertido e de perspectiva até então dominante, de cunho idealista,
maior repercussão. obcecada com a dicotomia entre o país ideal e o
Quanto às fontes teórico-metodológicas nas país real.
quais Caio Prado buscou inspiração, destaca-se Nesse sentido, nosso autor se aproxima de outros
Karl Marx, fundador do materialismo histórico, de dois intelectuais não-marxistas que, juntamente com
quem incorporou, muito mais do que conceitos e ele, formam o trio conhecido, no campo da teoria
esquemas interpretativos abstratos, o método de literária e das ciências sociais, como “a geração de
investigação, sendo a sua obra, por isso mesmo, 30”, cujas obras clássicas que lhe valeram esse título
considerada “um caso bem sucedido de foram “Casa Grande e Senzala”, de Gilberto Freire,
nacionalização do marxismo”. (RICUPERO, 2000) publicado em 1933, e “Raízes do Brasil”, de Sérgio
A postura não-dogmática que caracteriza o autor, Buarque de Holanda, publicado em 1936. “Formação
distinguindo-o de seus contemporâneos marxistas do Brasil Contemporâneo”, de Caio Prado Junior,
do Brasil e da América Latina, lhe valeu o mérito de publicado em 1942, completa este importante elenco
ser considerado o pioneiro na utilização do de “livros que inventaram o Brasil”, na concepção de
marxismo como ferramenta para a apreensão das Fernando Henrique Cardoso e que conferiram aos
especificidades da formação econômico-social seus autores a láurea de “demiurgos do Brasil”,
brasileira. (COUTINHO, 2000, p. 223). atribuída por Antônio Cândido.
Tal mérito é tanto maior, quando se observa o Segundo Francisco de Oliveira, o que há de novo
meio intelectual em que vivia Caio Prado Junior, nas na maneira de compreender a formação da
décadas de 30 e 40: marcado pela ausência de um sociedade brasileira, moldada pela geração de 30
ambiente universitário consolidado e pelo relativo (e posteriormente compartilhada por outros
isolamento em que produziu as suas principais pensadores da década de 50, também relevantes
obras. Tratava-se, com efeito, de um ambiente para a sedimentação da intelligentzia nacional),

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[...] é a construção de uma complexa ser a “Formação do Brasil Contemporâneo” o


relação entre teoria e história. Assim, resultado de ampla e profunda pesquisa acerca do
não há uma teoria que se aplique à período colonial.
história, nem o contrário, uma história O conteúdo da exposição contempla, na
que seja explicada pela teoria [...]. Introdução, a indicação do tema, a formulação dos
Distanciam-se assim, [os referidos
problemas e a delimitação do objeto de estudo. É
autores] da tradição que ficou
conhecida no Brasil como
aqui também que o autor justifica, logo nas primeiras
bacharelesca, que buscava enquadrar linhas, o corte cronológico que decide privilegiar: o
a realidade, a história, em pré- início do século XIX.
conceitos, em modelos abstratos, para Não se trata de uma escolha aleatória. Tendo
fazer a crítica da história real. como tema central a transição entre a Colônia e a
(OLIVEIRA, 2001, p. 318). Nação, bem como a imbricada relação existente
entre esses dois momentos da evolução histórica
O contexto sócio-histórico em que se inspiravam brasileira, Caio Prado identifica o período em foco
os nossos intérpretes da geração de 30 era marcado como “um ponto morto”, “uma etapa decisiva”, por
pela crise da economia cafeeira e da República se constituir, ao mesmo tempo, “uma síntese” dos
Velha, cujos desdobramentos foram o avanço da três séculos de colonização e a “chave preciosa e
industrialização e a Revolução de 30. Em estreita insubstituível para se acompanhar e interpretar o
consonância com esses processos de processo histórico posterior e a resultante dele que
transformação pelos quais passava o país, ganhava é o Brasil de hoje”. (PRADO JÚNIOR, 1972, p.9)
corpo, no plano cultural, o movimento modernista Na ótica do autor, portanto, nesse período, havia
brasileiro, demarcando uma mudança de postura se completado a obra de colonização portuguesa,
dos intelectuais, expressa no maior compromisso no Brasil, cujos elementos constitutivos se
com a tarefa de compreender a realidade sócio- esgotavam, sinalizando para o “início de um longo
política brasileira em que viviam, com vistas a processo histórico que se prolonga até os nossos
transformá-la. dias e que ainda não está terminado”. (PRADO
Assim sendo, Gilberto Freire, Sérgio Buarque de JÚNIOR, 1972, p. 10).
Holanda e Caio Prado Junior, como frutos de tal Eis aí a grande questão com que se preocupa
tendência, desenvolveram, embora sob Caio Prado Junior, a partir da qual ele delimita seu
perspectivas metodológicas distintas, interpretações objeto de estudo: a presença marcante do passado
globais do Brasil. Ao captarem os traços essenciais colonial em todas as dimensões (geográfica,
de nossa formação, contribuíram, no plano do econômica, social e política) do Brasil-nação de
pensamento, para a reconstrução da sociabilidade 1942, visto como “um organismo em franca e ativa
e da identidade nacionais, fornecendo, dessa forma, transformação e que não se sedimentou ainda em
os fundamentos teóricos indispensáveis à linhas definidas, que não tomou forma” (PRADO
orientação da ação política. JÚNIOR, 1972, p. 11). Daí a necessidade
As vantagens de Caio Prado Junior, em relação identificada pelo autor de mergulhar nos três
aos seus contemporâneos da geração de 30, séculos de colonização em que se constituíram os
decorrem de sua extraordinária acumulação fundamentos de nossa nacionalidade, para colher
historiográfica e da tomada da totalidade como dados indispensáveis à compreensão do Brasil
pressuposto, o que se explica pelo próprio método contemporâneo.
marxista de análise no qual se fundamenta. Uma vez delimitado o objeto de estudo, qual
seja, uma síntese do Brasil após três séculos
ESTRUTURA E CONTEÚDO DO LIVRO de evolução colonial, Caio explicita, no Capítulo
I, o que denominou de “sentido da colonização”:
Três grandes partes compõem a estrutura da “um episódio, um pequeno detalhe daquele
obra aqui em estudo: “Povoamento”, “Vida Material” quadro imenso” que é a historia do
e “Vida Social”, as quais se subdividem, desenvolvimento do comércio e da expansão
respectivamente, em quatro, nove e três capítulos. ultramarina européia, iniciada no século XV.
Estas são antecedidas por uma Introdução e por (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 20).
um capítulo inicial intitulado “Sentido da É a partir da compreensão desse fenômeno
Colonização” que contém a síntese e ao mesmo maior que podemos identificar as particularidades
tempo o pressuposto de toda a argumentação das colônias de exploração, prevalecentes na região
desenvolvida pelo autor, ao longo dos demais tropical e subtropical do continente americano (entre
capítulos. as quais se inclui o Brasil), em relação às colônias
Merece ainda destaque especial a “Bibliografia de povoamento que se estabeleceram na zona
e Referências” em que se baseou o autor, cuja temperada. Enquanto estas últimas se constituíram
particularidade é conter um grande volume de fontes movidas, sobretudo, por razões de ordem
primárias, expressas em documentos oficiais, econômica e político-religiosas, tais como o
correspondências de autoridades e de viajantes, cercamento de terras, na Inglaterra, e a perseguição
memórias, etc., as quais se sobressaem em relação aos puritanos, as primeiras derivaram de um
às obras da literatura historiográfica, demonstrando empreendimento essencialmente comercial.

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Daí o autor definir a colonização nos trópicos irradiador”. (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 55 e 56).
como “uma vasta empresa comercial”, cujo único É a partir da análise das três grandes fases em
objetivo é fornecer produtos primários de alto valor que se processa a evolução do povoamento no
para o mercado externo. Tendo como base a Brasil, com seus fluxos e refluxos entre o litoral e o
produção agrícola e mineradora realizada em interior, ao sabor do desenvolvimento de cada ciclo
grande escala, ela se organiza em torno de “grandes econômico, que o autor constata a grande
unidades produtoras que reúnem um número mobilidade da população, refletindo, mais uma vez,
relativamente avultado de trabalhadores”, o caráter da colonização: aproveitamento aleatório
recrutados “de outras raças, indígenas do continente de conjunturas passageiramente favoráveis, com
ou negros africanos importados” e dirigidos pelo vistas a um mercado exterior e longínquo. De fato,
colono branco. (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 29 e 31). Caio Prado adverte que “[...] a colonização não se
Sobre tal estrutura, conclui Caio, ergueu-se orienta no sentido de constituir uma base econômica
nos trópicos “uma sociedade inteiramente sólida e orgânica, isto é, a exploração racional e
original”, diferentemente do que ocorreu na zona coerente dos recursos do território para a satisfação
temperada, onde se formou uma sociedade que, das necessidades materiais da população que nele
embora com caracteres próprios, guardou habita”. (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 73).
semelhanças em relação à do continente europeu Essa primeira parte do livro que trata do
donde se originou, revelando-se mesmo “pouco “Povoamento” se encerra com o capítulo dedicado
mais do que simples prolongamento dele”. ao exame das raças que contribuíram para a
(PRADO JÚNIOR, 1972, p.27 e 31). formação de nossa nacionalidade. Nele o autor,
Essas observações acerca do Sentido da seguindo a linha de Gilberto Freire, ressalta a
Colonização, por serem consideradas a chave para mestiçagem como a solução mais eficiente
a compreensão do conjunto, são recorrentes, sendo encontrada pelos portugueses para a incorporação
retomadas pelo autor ao término do exame de cada das populações indígena e negra aos objetivos
setor da realidade histórica brasileira que constitui colonizadores. Vista como “o signo sob o qual se
o objeto dos demais capítulos. formou a etnia brasileira” a mestiçagem teria
Segundo Fernando Novais, é exatamente esse resultado “da excepcional capacidade do português
movimento do discurso que revela o caráter dialético em se cruzar com outras raças”, fruto de sua antiga
do pensamento de Caio Prado: “o sentido, isto é, a convivência com os mouros e com as populações
essência do fenômeno explica as suas negras da África, favorecida, por seu turno, pela
manifestações e ao mesmo tempo explica-se por própria posição geográfica de Portugal e
elas [...]. Recortado o objeto, a análise desdobra- intensificada pela invasão árabe, bem como pelo
se, portanto, em dois movimentos: da aparência processo de expansão colonial iniciado no século
para a essência e da essência para a realidade” XV. (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 107 e 108).
(NOVAIS, 1986, p. 16) Além dessa “predisposição do português em
A primeira manifestação do sentido da cruzar com raças exóticas”, são ainda
colonização, analisada pelo autor, em seu considerados fatores determinantes da
movimento de aproximação da realidade concreta, miscigenação: o caráter individual e aventureiro
refere-se à forma particular assumida pelo que assumiu a emigração do colono português
povoamento do território brasileiro. Este teria se para o Brasil e a ausência de freios morais por
caracterizado por um flagrante desequilíbrio inicial parte das outras raças, sobretudo dos índios.
entre o litoral e o interior, em favor do primeiro, Nesse contexto, as uniões mistas envolvendo
exprimindo o caráter predominantemente agrícola a raça dominadora e raças dominadas tornar-se-
da colonização e a decorrente “preferência pelas iam a regra, predominando, dentre estas, a do
férteis, úmidas e quentes baixadas da marinha”. A branco com o negro, mais do que do branco com
penetração para o interior só se adensaria na o índio, devido ao maior peso relativo da população
primeira metade do século XVIII, quando da africana, à sua maior resistência física e ao seu
descoberta do ouro em Minas Gerais, Cuiabá e contato mais íntimo com o colono português.
Goiás. (PRADO JR., 1972, p. 39) (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 110).
Um destaque especial é dado à pecuária como Traçado o quadro étnico geral da sociedade
importante fator de ocupação e integração do brasileira e realçadas algumas diferenças regionais,
território, sendo ainda destacadas as decorrentes do tipo de atividade econômica
especificidades da penetração ocasionada pelas predominante e das especificidades assumidas pela
fazendas de gado em relação àquela decorrente colonização em cada parte do país, o autor dedica-
da mineração. Enquanto esta última se se, então, à análise da “Vida Material” da Colônia, a
caracterizaria pelo deslocamento brusco e pelo qual mereceu a sua maior atenção.
desligamento dos núcleos mineradores entre si e Destaca, nesta dimensão, o lugar central
em relação ao litoral, a primeira ter-se-ia ocupado pela grande exploração, voltada para
desenvolvido de forma paulatina e por contigüidade, produzir e exportar gêneros tropicais ou minerais
conservando os núcleos do interior “contato íntimo de alto valor no mercado internacional, afirmando
e geograficamente contínuo com o seu centro mesmo que “tudo mais [...] será subsidiário e

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destinado unicamente a amparar e tornar possível específicos. Trata-se das produções extrativas
a realização daquele fim essencial”. (PRADO desenvolvidas no vale amazônico, a maioria delas
JÚNIOR, 1972, p. 119). inexpressivas em termos de quantidade e de valor
Assim sendo, o elemento fundamental e comercial, bem como das atividades de
característico da organização econômica da transformação, organizadas em corporações, nos
Colônia, presente tanto na agricultura como na centros urbanos, onde as profissões mecânicas
mineração, seria a grande unidade produtora, são mais numerosas e autônomas, porém,
reunindo numerosos contingentes de reduzidas a simples acessórios dos
trabalhadores escravos e dirigida pelo colono estabelecimentos agrícolas e de mineração, fora
branco, que personifica a figura do “empresário daqueles centros. Neste capítulo, que trata das
explorador de grande negócio”. artes e indústrias, são destacados como ramos
Para Caio Prado, “[...] é neste sistema de mais importantes o das manufaturas têxteis e o
organização do trabalho e da propriedade que se da metalurgia, dada a abundância das matérias-
origina a concentração extrema de riqueza que primas por eles utilizadas e a existência de um
caracteriza a economia colonial” (Idem, p. 124). mercado interno de relativa importância. Não
E, mais adiante, dando ênfase especial à grande obstante, conforme atesta Caio Prado, nem
lavoura da cana-de-açúcar, mas estendendo mesmo esses ramos alcançaram grande vulto,
também suas observações às demais atividades devido às fortes restrições legais impostas pela
fundadas na exploração em larga escala, coroa portuguesa e ao peso da concorrência
complementa: inglesa, especialmente no caso da indústria têxtil.
O exame da estrutura econômica colonial
É deste tipo de organização [...] que encerra-se com os capítulos dedicados ao comércio
derivou toda a estrutura do país: a e às vias de comunicação e transportes. Visto como
disposição das classes e categorias de
o setor capaz de revelar, melhor que qualquer um
sua população, o estatuto particular de
cada uma e dos indivíduos que a
dos outros pertencente à área de produção, o
compõem. O que quer dizer, o conjunto caráter de uma economia, o comércio colonial
das relações sociais no que têm de expressaria, para o nosso autor, o coroamento, a
mais profundo e essencial. (PRADO síntese da vida material da Colônia.
JÚNIOR, 1972, p. 143). Assim sendo, o seu eixo fundamental não
poderia ser outro que não o da exportação, pela via
Um outro elemento fundamental que particulariza marítima, dos produtos tropicais, do ouro e do
a economia colonial, sobressaindo-se na análise diamante para o mercado internacional, sob o
que faz o autor de cada atividade em que se monopólio da metrópole. “Em função dele, dispor-
concentra a grande exploração, é o seu baixo nível se-ão os outros setores acessórios do comércio da
de desenvolvimento tecnológico, configurando, por Colônia e que não têm outro fim que alimentar e
conseguinte, um padrão de “exploração extensiva amparar aquela corrente fundamental”. (PRADO
e especuladora, instável no tempo e no espaço, dos JÚNIOR, 1972, p. 135).
recursos naturais do país”. (Idem, p. 129) Nesta última classificação, incluem-se, em
Nesse ponto do livro intitulado “Vida Material”, ordem de importância, a importação de escravos
são também abordados os setores que não provenientes da Costa da África, o comércio interno
pertencem à grande exploração, ou que nela têm de produtos de subsistência que abastecem as
um papel subalterno, constituindo o que Caio Prado populações dos centros urbanos (visto que os
considera o segmento inorgânico da economia, cuja estabelecimentos rurais são, em regra, autônomos)
lógica de funcionamento não é presidida e, em proporções menores, a importação de
diretamente pelos fins últimos que dão sentido à gêneros alimentícios de luxo e manufaturados,
colonização. Incluem-se aí as atividades consumidos pelos dirigentes da grande exploração
econômicas voltadas para o mercado interno, como agrícola ou mineradora.
a agricultura de subsistência, de baixa A prioridade atribuída à esfera da circulação, em
produtividade, localizada preferencialmente nas detrimento da esfera da produção, revelada
proximidades dos grandes centros urbanos a que explicitamente neste capítulo, mereceu a crítica de
se destina, e a pecuária, praticada de forma alguns autores, sendo entendida como resultante
bastante rudimentar, sobretudo nos sertões da não apropriação, por parte de Caio Prado, de
nordestinos, mas de reconhecida importância, algumas categorias marxistas fundamentais. Dentre
devido aos já mencionados benefícios por ela estas, destaca-se, por exemplo, o conceito de modo
prestados à ocupação e integração do território, de produção que tem pouco peso nas suas obras
como também à função que desempenhou, no historiográficas, inclusive no livro aqui em análise.
abastecimento da população. Segundo Coutinho (2000, p. 223), embora tal
Além dessas atividades, são ainda limitação tenha levado o autor a cometer alguns
contempladas pelo autor outras, também de papel equívocos (como confundir o predomínio de
secundário na economia colonial, mas que relações mercantis no período colonial com a
merecem uma atenção detalhada em capítulos existência de um sistema capitalista no Brasil), ao

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contrário de negar, ela reafirma “a sua criatividade advertindo que, enquanto estas últimas haviam
e os seus extraordinários méritos pioneiros brotado de todo o conjunto da vida social, material
enquanto intérprete marxista da história brasileira”. e moral de sua época, a primeira, como parte
Além disso, não o teria impedido de desenvolver inerente da era dos grandes descobrimentos
uma análise fecunda e adequada da formação ultramarinos, será
econômico-social brasileira da época colonial,
definida como “um escravismo mercantil fundado um recurso de oportunidade de que
na grande exploração rural, produtora de valores- lançarão mão os países da Europa, a
de-troca para o mercado internacional”. fim de explorar comercialmente os
(COUTINHO, 2000, p. 224) vastos territórios e riquezas do Novo
Mundo”, insinuando-se como um
Por último, para complementar o quadro da vida
“corpo estranho na estrutura da
material no Brasil-Colônia, Caio Prado ressalta o civilização ocidental em que já não
caráter difícil e moroso das vias de comunicação e cabia [e contrariando-lhe] todos os
transportes “que imprimem às relações da Colônia padrões morais e materiais
um ritmo lento e retardado”, responsáveis, em boa estabelecidos. (PRADO JÚNIOR,
dose, “pelo tom geral de vida frouxa que caracteriza 1972, p. 270)
o país”. (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 237).
Assim, a situação da economia brasileira no final Aqui é evidente o tom de indignação e de
do período colonial, retratada nesta parte do livro, condenação moral impresso nessa severa crítica
caracteriza-se, em síntese, pela precariedade das que faz Caio Prado à capacidade que teve a Europa
bases em que se assenta, pela falta de dinamismo de fazer renascer das cinzas uma instituição que
e de autonomia, bem como pela subordinação a parecia definitivamente abolida, sem qualquer
objetivos completamente estranhos, condicionados escrúpulo de ter que despojar-se, para tanto, de
pela conjuntura internacional. O autor atribui tal todos os valores éticos sobre os quais se erigia a
estado de coisas ao “trabalho ineficiente e quase civilização ocidental moderna.
sempre semibárbaro do escravo africano” Outra especificidade do instituto escravista
(momento, como outros, em que deixa escapar moderno, que teria pesado desfavoravelmente na
certa dose de preconceito) e ao regime político e civilização ibérica e, particularmente, na constituição
administrativo imposto pela metrópole, refletido, das colônias americanas, estaria relacionada aos
dentre outras coisas, no completo isolamento a que componentes étnicos de que teve de lançar mão,
foi submetido o país; na política fiscal que, representados pelos indígenas americanos e negros
particularmente no ciclo da mineração, foi africanos. De fato, em alguns de seus deslizes
considerada “o capítulo mais negro talvez da preconceituosos, o nosso autor afirma que se trata
administração colonial portuguesa”; no rudimentar de “povos de nível cultural ínfimo, comparado ao
sistema de educação, responsável pelo baixo nível de seus dominadores, [...] simples máquina de
cultural e intelectual da Colônia. Porém, para Caio, trabalho bruto e inconsciente [...] povos bárbaros e
esses seriam apenas aspectos, dos menos semibárbaros [...] pretos boçais e índios apáticos”.
profundos, do sistema geral que presidiu a (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 272 e 277).
colonização do Brasil. Destacar-se-ia, sobretudo, o É verdade que Caio, de certa forma, se redime
regime econômico que tinha como estreito horizonte de tais expressões de cunho racista, quando
a produção de gêneros tropicais, sobressaindo mais distingue o negro e o índio do escravo e atribui o
ainda diante do acelerado desenvolvimento caráter estreito, passivo e unilateral da contribuição
industrial e tecnológico já experimentado no mundo, desses elementos à nossa cultura ao próprio sentido
no início do século XIX. da colonização, que os teria reduzido à condição
Estaria aí, portanto, o cerne da explicação para de mera força física. Nesse sentido, ressalta que
o fato de que o Brasil, mesmo após abolido o regime “nada mais se queria [deles] e nada mais se pediu
colonial, com a Independência, mantinha o estatuto e obteve que a sua força bruta, material. Da mulher,
de produtor e exportador de gêneros para abastecer mais a passividade da fêmea na cópula. Num e
o comércio internacional, perpetuando-se como noutro caso, o ato físico apenas, com exclusão de
“uma feitoria da Europa”. (PRADO JÚNIOR, 1972, qualquer outro elemento ou concurso moral. A
p. 127). animalidade do Homem, não a sua humanidade”.
A análise da “Vida Social” da Colônia, que ocupa Dessa forma, todo o arsenal de cultura trazido pelo
a última parte do livro, aborda a “organização social”, escravo africano ou indígena teria sido abafado e
a “administração” e a “vida social e política”. Uma deturpado pelo estatuto social, material e moral que
ênfase especial é dada à escravidão e à sua a obra da colonização lhes havia reservado.
“influência deletéria” na nossa formação, sendo (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 272)
mesmo entendida como o traço mais marcante que Uma das conseqüências mais nefastas da ampla
caracteriza a sociedade brasileira, no princípio do disseminação do trabalho escravo, em vários
século XIX. setores da vida econômica e social do Brasil
O autor distingue, logo de início, a escravidão Colônia, foi a cristalização de uma ética de
americana das formas servis do mundo antigo, desvalorização do trabalho, transformado em

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ocupação pejorativa e desabonadora, pelo lugar que confecção de leis [...]; o excesso de
ele ocupa na sociedade, restando apenas pequena burocracia dos órgãos centrais [...];
margem de atividades laborais dignas destinadas centralização administrativa que faz de
ao homem livre. Lisboa a cabeça pensante única
[...].(PRADO JÚNIOR, 1972, p. 333).
Com efeito, o que distingue a estrutura social
brasileira, no período em estudo, é o imenso vácuo
Acrescente-se ainda a tudo isso uma justiça
que se abre entre os dois extremos da escala,
cara, morosa e inacessível à grande massa da
representados, no topo, pela pequena minoria de
população, a insegurança generalizada, o
senhores, dirigentes da colonização nos seus vários
orçamento deficitário, o descaso geral para com os
setores e, na base, pela grande quantidade de
serviços públicos de educação, saúde pública,
escravos, que constituem a massa trabalhadora.
saneamento e infra-estrutura, bem como a
Entre esses dois extremos, afirma Caio, “[...] imoralidade e a corrupção, na administração
comprime-se o número que vai avultando com o pública.
tempo, dos desclassificados, dos inúteis e Todo esse caos é atribuído ao espírito particular
inadaptados; indivíduos de ocupações mais ou que anima o governo metropolitano, cujos objetivos,
menos incertas e aleatórias ou sem ocupação ao gerir a sua Colônia, raramente foram além dos
alguma”. (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 281). proveitos imediatos que podia auferir sob a forma
Há que se destacar ainda o lugar central que o de tributos. “Um objetivo fiscal, nada mais que isto,
autor atribui ao clã patriarcal, na organização social é o que anima a metrópole na colonização do Brasil”
brasileira, no que, aliás, sua análise não diverge (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 337).
das de outros autores, destacando-se dentre eles Neste capítulo que trata da administração
Gilberto Freire. Tendo como berço o grande domínio colonial, uma ênfase especial é conferida à Igreja
rural, o clã patriarcal é “a unidade econômica, social, como esfera de grande importância, não só pelo
administrativa e até de certa forma religiosa” em respeito e deferência que merece, mas pelo
torno da qual se agrupa grande parte da população reconhecido poder que desfruta de imiscuir-se nos
do país. (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 286). É o palco mais diversos assuntos, seja de natureza pública,
de um conjunto de relações que vão além das seja privada.
derivadas da propriedade escravista e da Assim sendo, longe de se constituir em
exploração econômica, envolvendo “toda sorte de instituição autônoma e independente, a Igreja “se
sentimentos afetivos” que abrandam o poder tornara um simples departamento da administração
absoluto e o rigor da autoridade do proprietário, ao portuguesa e o clero secular e regular seu
mesmo tempo em que os reforçam, ao torná-los funcionalismo”, dada a colaboração e a identidade
mais consentidos (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 289). de propósitos que marcam a relação entre as
Dada a importância do grande domínio patriarcal, autoridades civis e eclesiásticas da Colônia.
em termos de poder, riqueza e autonomia, os (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 331 – 333)
centros urbanos são vistos pelo autor como “um Finalmente, no último capítulo do livro, intitulado
reflexo das condições dominantes no campo”, “Vida Social e Política”, Caio Prado Junior apresenta,
donde resulta que os senhores rurais também com aguda clareza e capacidade de síntese, uma
constituem aí a classe superior, acompanhados, “visão do conjunto da obra da colonização
porém, das altas autoridades da administração portuguesa no Brasil”.
militar, civil e eclesiástica, as quais “gozam mesmo Nessa perspectiva, destaca, como primeiro
de preeminência social e protocolar” (PRADO grande traço que caracteriza o Brasil do início do
JÚNIOR, 1972, p. 294). Destacam-se, além destas, século XIX, a ausência de nexo moral, sendo os
os comerciantes como uma classe diferenciada e mais fortes laços que mantêm a integridade social
definida que, embora não desfrute de tanto respeito derivados das relações de trabalho e de produção,
e prestígio, tem sua importância na vida colonial, particularmente, da subordinação do escravo ao seu
por representarem a classe credora que financia a senhor. Além desses laços primários, acrescenta
grande exploração, podendo, assim, fazer frente aos outros elementos secundários de integração,
proprietários, enquanto classe possuidora. expressos na pressão exterior exercida pelo poder
No que se refere à administração portuguesa soberano da metrópole e em “uma certa
na Colônia, cuja análise merece um capítulo uniformidade de atitudes, [...] de sentimentos, de
específico do livro, Caio Prado sintetiza a sua feição usos, de crenças, de línguas. De cultura, numa
geral no esboço que se segue: palavra”. (PRADO JÚNIOR, 1972, p. 346).
De fato, a sociedade colonial é vista como sendo
[...] falta de organização, eficiência e constituída de um núcleo central organizado, cujo
presteza do seu funcionamento [...]; elemento principal é a escravidão, e de um setor
processos brutais empregados, de que
periférico, caracterizado por uma tal inorganicidade
o recrutamento e a cobrança de
tributos são o exemplo máximo [...]; a e incoerência que nele não se pode vislumbrar
complexidade dos órgãos, a confusão sequer uma estrutura social.
de funções e competências; a Para complementar a caracterização da vida
ausência de métodos e clareza na colonial e das suas relações, são evidenciados os

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Caio Prado Junior “Formação do Brasil Contemporâneo: Colônia 123

traços mais profundos da psicologia e do caráter Porém, em conformidade com a sua


brasileiros, os quais podem assim ser resumidos: perspectiva dialética de análise, é no interior
atitude relativa ao trabalho marcada pela indolência dessas formas inorgânicas da sociedade brasileira
e pelo ócio; desregramento e promiscuidade no que o autor vislumbra o sujeito da transformação
plano das relações sexuais; exacerbação do estatuto colonial para o nacional, visto estarem
sentimental e afetiva, no que diz respeito às relações tais setores voltados para um mercado interno
entre homem – mulher e pais – filhos; ainda em formação.
superficialidade e mecanização do culto religioso; Assim, mantendo a coerência que é peculiar
infinita tolerância no campo da moral e dos ao autor, bem como a unidade entre teoria e
costumes. prática que permeia a sua trajetória intelectual e
Isso posto, Caio Prado Junior, em uma só política, o fio condutor de toda a obra de Caio
frase, sintetiza o balanço geral dos três séculos Prado, até a publicação de “A Revolução
de colonização que constitui o objeto central deste Brasileira”, é a tentativa de compreender, para
seu livro: superar, os elementos do passado colonial que
persistem incrustados na sociedade brasileira,
[...] incoerência e instabilidade no obstaculizando a concretização do almejado
povoamento, pobreza e miséria na projeto de formação da nação.
economia, dissolução nos costumes, Um traço que marca fortemente as suas obras
inércia e corrupção nos dirigentes subseqüentes é exatamente a sua insistência em
leigos e eclesiásticos. (PRADO denunciar a conservação do velho, do arcaico
JÚNIOR, 1972, p. 356). (relacionado à propriedade latifundiária, aos
resquícios de relações escravistas no campo e à
Tal sistema, segundo o autor, já traz consigo, subordinação da economia aos imperativos do
desde o início, os germes de sua autodestruição, capital internacional), na estrutura da sociedade
os quais, vistos de outro ângulo, são, ao mesmo
brasileira, mesmo depois da abolição da
tempo, forças que se insinuam com nitidez
escravatura, da constituição da República e do
crescente, pressionado por um processo de
avanço do processo de industrialização. Isto lhe
transformação que tem na independência política
valeu severas críticas como, por exemplo, a de ter
da Colônia apenas o seu marco inicial e cujo sentido
subestimado as transformações ocorridas no país,
e duração ainda não se mostram inteiramente claros
advindas do acelerado crescimento industrial,
para o autor, no momento em que escreveu esta
experimentado a partir de 1930 e, sobretudo, na
obra, apontando apenas para o esgotamento das
década de 50.
possibilidades do sistema colonial e para a
Contudo é exatamente na sua percepção da
necessidade de substituição por outro.
De fato, no início do século XIX, quando da articulação entre o velho e o novo, entre o arcaico
transferência da Coroa Portuguesa para o Brasil e o moderno na formação econômica e social
(que marca o início do processo que levaria brasileira que Caio Prado Junior traz uma
inevitavelmente à nossa independência política e à importante inovação na representação que faz do
formação de um Estado Nacional), a sociedade Brasil, como uma “via não clássica” de transição
brasileira encontra-se em plena ebulição, para o capitalismo, assim entendida pela ausência
evidenciada pela explosão de conflitos de toda de processos de rupturas com as formas
ordem, envolvendo o grande proprietário rural e o econômicas e sociais básicas. Ele também inova
comerciante português, o lavrador ou o escravo e o em sua interpretação acerca do
senhor de engenho, o branco e o mulato, o vendeiro subdesenvolvimento, ao romper com as visões
e o pé-descalço. dualistas, até então dominantes no pensamento
Tais conflitos, adverte o autor, são meras social e político brasileiro, centradas na idéia de
manifestações multifacetadas de contradições cuja oposição entre as velhas e as novas estruturas,
origem se encontra na estreita base econômica em entre os setores atrasados e modernos, entre o
que se assenta o sistema colonial, incapaz de centro e a periferia do sistema capitalista.
incorporar e sustentar o crescente contingente de Diferentemente de tal perspectiva, Caio vê entre
população que vive à sua margem, constituindo os esses pólos uma relação de complementaridade,
chamados segmentos inorgânicos. subordinação e dependência, no sentido de que o
Na compreensão de Caio Prado Junior, é a lado moderno se alimenta do atrasado, ao invés
presença marcante desses segmentos excluídos e de encontrar neste um empecilho ao seu
inorgânicos, frutos do regime colonial, que mina o desenvolvimento.
projeto de formação de uma verdadeira nação que, Assim sendo, podemos dizer que Caio Prado
em sua concepção, pressupõe “a configuração de Junior funda uma nova linha de análise para se
um país e sua população voltados essencialmente pensar o Brasil contemporâneo, antecipando
para si mesmos e organizados econômica, social e posições que são posteriormente retomadas e
politicamente, em função de suas próprias aprofundadas por outros importantes pensadores
necessidades, interesses e aspirações”. (PRADO e intérpretes da sociedade brasileira, destacando-
JÚNIOR apud RICUPERO, 2000, p. 219). se, dentre estes, Francisco de Oliveira.

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Tais posições têm se revelado pertinentes e LAPA, José Roberto do Amaral. Caio Prado Junior:
fecundas para elucidar alguns de nossos principais Formação do Brasil contemporâneo. In: MOTA,
problemas do presente e para iluminar a ação Lourenço Dantas (org.). Introdução ao Brasil: um
política, com vistas a superá-los, demonstrando, banquete no trópico. V.1. 3. ed. São Paulo: Editora
dessa forma, o caráter seminal de “Formação do Senac, 2001.
Brasil Contemporâneo” enquanto livro que contém
a sede de todo o pensamento do autor. NOVAIS, Fernando A. Caio Prado Jr. na
De fato “Formação do Brasil Contemporâneo: historiografia brasileira. In: ANTUNES, Ricardo et
Colônia”, além de conter o núcleo teórico em torno al. (orgs.). Inteligência brasileira. São Paulo:
do qual se desenvolve toda a produção intelectual Brasiliense, 1986.
do autor, é reconhecidamente a expressão de um
raro rigor metodológico na aplicação do OLIVEIRA, Francisco de. Celso Furtado. Formação
materialismo histórico, demonstrando a econômica do Brasil. In: MOTA, Lourenço Dantas
fecundidade dessa forma de abordagem para a (org.). Introdução ao Brasil: um banquete no
apreensão das particularidades da formação trópico. V.1. 3. ed. São Paulo: Editora Senac, 2001.
econômica e social brasileira, em sua articulação
com a totalidade mais ampla em que se insere, ou _______. A Economia Brasileira: crítica à razão
seja, o sistema capitalista mundial. Assim sendo, dialética. Petrópolis: Vozes, 1988.
revela-se, a nosso ver, extremamente útil para a
compreensão do Brasil de hoje e não somente o PRADO JUNIOR, Caio. Formação do Brasil
do final do século XVIII e início do século XIX, corte Contemporâneo: colônia. 12. ed. São Paulo:
temporal privilegiado como o marco a partir do qual Brasiliense, 1972.
se inicia o longo e, na ótica do autor, inconcluso
processo histórico de transição entre a colônia e a _______. História Econômica do Brasil. 28 ed.
nação, sob os pesados condicionantes do passado São Paulo: Brasiliense, 1983.
colonial.
A tese central desenvolvida por Caio Prado
_______. Adendo à Revolução Brasileira. Revista
Junior, acerca do “Sentido da Colonização”, pode
Civilização Brasileira. Rio de Janeiro, n. 14, [19?].
contribuir para elucidar, dentre outras coisas, o
caráter excludente de nosso processo de
RICUPERO, Bernardo. Caio Prado Jr. e a
industrialização, desenvolvido sob a égide do
nacionalização do marxismo no Brasil. São
modelo de substituição de importações, do qual
Paulo: Departamento de Ciências Políticas da USP;
resultou uma estrutura produtiva heterogênea
Fapesp. Ed. 34, 2000.
(marcada pela convivência e articulação orgânica
entre o arcaico e o moderno), como também um
mercado de trabalho segmentado, com significativa
Valéria Ferreira Santos de Almada Lima
participação do setor informal. Doutora em Políticas Públicas; professora do Departa-
Da mesma forma, a referida tese pode fornecer mento de Economia e do Programa de Pós-Graduação
subsídios para entendermos a fragilidade daquele em Políticas Públicas da UFMA
modelo de industrialização, revelada pelos E-mail:neval@elo.com.br
movimentos em curso de globalização da
economia, de reestruturação produtiva e de
reordenamento das relações internacionais, Universidade Federal do Maranhão - UFMA
cabendo ao Brasil, neste contexto, uma inserção Av. dos Portugueses, s/n
subordinada, cujos reflexos mais flagrantes são a Campus Universitário do Bacanga
desestruturação de alguns ramos industriais e a São Luis-MA, Cep: 65.080-040
acentuação daqueles traços perversos herdados
de nosso passado mais recente.

REFERÊNCIAS

COUTINHO, Carlos Nelson. A “imagem do Brasil”


na obra de Caio Prado Junior. In ______. Cultura e
Sociedade no Brasil: ensaios sobre idéias e
formas. 2. ed. revista e ampliada. Rio de Janeiro:
DP&A, 2000.

FREIRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala. São


Paulo: Círculo do Livro S.A, sd.

HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. 26.


ed. São Paulo: Companhia do Livro, sd.

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