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ESTUDOS DA LITERATURA

PORTUGUESA
ESTUDO DA
LITERATURA
PORTUGUESA

1
SOMESB
Sociedade Mantenedora de Educação Superior da Bahia S/C Ltda.

Estudo
daLiteratura Presidente ♦ Gervásio Meneses de Oliveira
Portuguesa Vice-Presidente ♦ William Oliveira
Superintendente Administrativo e
Financeiro ♦ Samuel Soares
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Faculdade de Tecnologia e Ciências - Ensino a Distância
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EQUIPE DE ELABORAÇÃO/PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO:

♦ PRODUÇÃO ACADÊMICA ♦
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2
Sumário

A LITERATURA PORTUGUESA DA
IDADE MÉDIA AO ARCADISMO ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 07

AS PRIMEIRAS MANIFESTAÇÕES LITERÁRIAS EM PORTUGAL 07

A Formação de um Estado Independente: Portugal ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 07


1ª Época Medieval ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 10
A Novela de Cavalaria ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 14
2ª Época Medieval ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 17
Atividades Complementares ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
23

DO TEATRO PORTUGUÊS AO ARCADISMO ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 25

O Teatro Gil Vincente ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○


25
Classicismo ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 27
Barroco○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
29
Arcadismo ou Neoclassicismo ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
33
Atividade Complementar ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
37

DO ROMANTISMO À LITERATURA
CONTEMPORÂNEA ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 39

DO ROMANTISMO AO SIMBOLISMO: PERÍODO


DE GRANDES TRANSFORMAÇÕES LITERÁRIAS ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 39

Romantismo: Contexto Histórico e 1ª Geração ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○


39
Romantismo: 2ª e 3ª Gerações ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 43
Realismo ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
47
Simbolismo ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
54
Atividade Complementar ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
59

3
Estudo
daLiteratura
Portuguesa
O MODERNISMO PORTUGUÊS E A
LITERATURA CONTEMPORÂNEA ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 61

Modernismo: Contexto Geral e a Geração Orfeu ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 61


Fernando Pessoa e os Heterônimos ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 62
A Geração de Presença ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
66
José Saramago: O Nobel da Literatura ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 67
Atividade Complementar ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 71

Atividade Orientada ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 73

Glossário ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 80

Referências Bibliográficas ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 83

4
Apresentação da Disciplina
Apresentamos, neste Módulo, uma visão geral da Literatura Portuguesa.
O espírito que norteou nosso trabalho foi o de elaborar um material sério,
consistente e agradável, que servirá como ponto de partida para o estudo da
Historiografia Literária de Portugal.
Quanto à apresentação dos assuntos, partimos do conceito de Estilo de
Época para estudar cada momento literário, no contexto em que foi produzido e
difundido, visando que vocês, alunos, possam desenvolver, através desse
aprendizado, um espírito crítico em relação à literatura em questão. A opção por
esta divisão tem um cunho didático e funciona como uma síntese. É impossível
abarcarmos todo o conhecimento acerca de tudo o que chamamos de Literatura
Portuguesa, porém, esperamos que o conteúdo disponibilizado aqui funcione
como o início de uma longa e apaixonante viagem literária.
Longe de ser a única possibilidade de trabalho, este Módulo é um
instrumento que, utilizado como base de estudo, certamente contribuirá para
promover a reflexão e a autonomia do seu aprendizado. Como o ensino de literatura
deve estar sempre intimamente articulado com a leitura e a escrita, sugerimos
que vocês, educandos, promovam momentos de leitura dos livros mencionados
e elaborem resenhas dos capítulos estudados, procurando relacionar o conteúdo
dos textos a outras fontes de pesquisas, como a Internet, filmes, etc. E, se possível,
socializando essa reflexão com alguns de seus colegas através de e-mails e
chats.
O material está organizado em 2 Blocos temáticos, subdividido em 4 Temas
e estes apresentados em 16 Conteúdos, nomeados de acordo com os assuntos
e objetivos abordados. No Bloco 01, estudaremos desde a origem da Literatura
em Língua Portuguesa ao Arcadismo. No Bloco 02, veremos o período que
chamamos de “Romântico” até o que denominamos “Tendências
contemporâneas”. No final de cada Tema acrescentamos questões para fixação
dos assuntos estudados. Todas as atividades didático-pedagógicas deste Módulo
partem da leitura do material impresso e da sua complementação virtual,
disponível na home-page.
Esperamos que este material vá ao encontro das atuais necessidades do
curso e do aprendizado sobre a literatura lusa.

Seja bem-vindo (a)!


Roselana Trindade

5
Estudo
daLiteratura
Portuguesa

6
A LITERATURA PORTUGUESA DA IDADE
MÉDIA AO ARCADISMO

AS PRIMEIRAS MANIFESTAÇÕES LITERÁRIAS EM PORTUGAL

A Formatação de um Estado Independente: Portugal


Neste primeiro bloco, estudaremos as principais manifestações da Literatura
Portuguesa, desde o Trovadorismo, na Idade Média, ao período denominado de Arcadismo,
também conhecido como Neoclássico.

Veremos que os primeiros textos literários portugueses remontam ao século XII, ou


seja, muitos séculos antes da chegada da frota comandada por Pedro Álvares de Cabral
ao território brasileiro. Veremos, portanto, que a Literatura Brasileira trás, em si, uma herança
do período que estudaremos a seguir.

Contextualizando o Medievo Literário Português

O CONDADO PORTUCALENSE

A independência de Portugal foi conseguida de forma


gradativa, contra os reinos cristãos da Península Ibérica. A
tranqüilidade conseguida com os casamentos reais1 (Reino de Leão
e Reino de Borgonha) foi abalada com a morte do Imperador Afonso
VI (final do Séc. XI) e a tênue unidade política se desfaz, ocorrendo
as lutas entre os reinos cristãos.

Abdala Junior e Paschoalin2 assinalam que “apesar do processo de independência


de Portugal está ligado à diferenciação das atividades econômicas da região e às rivalidades
entre os grupos feudais. Foi, entretanto, o povo quem participou ativamente desse processo,
através de organizações municipais, os Concelhos populares”. Os Concelhos (dentro do
sistema feudal) propiciaram a D. Afonso Henriques (reconhecido Rei, pelo papa, em 1179),
filho de Tareja, as forças militares necessárias para a independência.

O sistema vigente na Europa, o feudalismo, por predominar


grupos sociais fechados, impossibilita a mobilidade de classes. Neste
sistema social, competia aos servos trabalhar para, seus senhores; à
nobreza feudal competia defender a sociedade; e à igreja, orar por
toda a sociedade. Lembremos que em Portugal dentro dos “coutos”
(propriedade da Igreja) ou da “honras” (propriedade da nobreza) os
senhores eram autoridade absoluta e só prestava obediência ao rei –
que detinha os direitos de justiça suprema.

¹
Casamentos Reais:
URRACA – Filha legítima e herdeira do trono casa-se com o conde Raimundo de Borgonha e recebe a região da Galícia.
D. TAREJA – Filha ilegítima, casa-se com D. Henrique de Borgonha (primo do conde Raimundo de Borgonha) e recebe a região
denominada de Condado Portucalense, que abrange a área entre o Minho e o Tejo.
²
História Social da Literatura Portuguesa

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Temos, portanto, uma organização social fechada, que é reiterada pelo
espírito teocêntrico. A Igreja, rica senhora feudal, além de ensinar os mistérios
da fé nas freqüentes missas e/ou em outras cerimônias religiosas, como as
Estudo
peregrinações ou romarias, era também responsável pela difusão da educação
da Literatura – o centro da instituição pública se localizava nas catedrais ou nas escolas
Portuguesa episcopais, nos conventos e mosteiros. Mediante a esse contexto, as grandes
massas adquiriam conhecimentos teóricos e práticos transmitidos por via oral.
Tradições populares, romances, sermões e provérbios tinham papel importante na formação
dos indivíduos, fato observado desde o reinado de Sancho I, filho de Afonso Henrique.

Nas feiras circulavam a literatura oral, sendo divulgada por meio dos jograis,
recitadores, cantores e músicos andarilhos. A poesia e a música estavam sempre ligadas,
o trovador compunha o poema que era cantado pelo jogral, que percorria todo o reino,
inclusive as peregrinações religiosas e as festas palacianas, acompanhado pelo menestrel,
músico agregado a uma corte.

Essa produção cultural trovadoresca, chamada de literatura cantada e, por isso,


conhecida como cantigas, sobrevive até hoje em coletâneas renascentistas registradas em
coleções, Os Cancioneiros. Infelizmente, as partituras das músicas se perderam quase todas,
sobrando nos dias de hoje apenas cinco, escritas por Martim Codax.

A Literatura

De um modo geral pode dizer-se que apesar da Literatura portugue-sa ter expressão
literária em todos os gêneros, predomina o lirismo em todas as suas formas até na épica,
características aparentemente dominantes no temperamento nacional.
A primeira forma das literaturas ocidentais é a poesia e é oral: e compilada de forma
escrita posteriormente, transcritos os poemas de memória. O verso com ritmo e rima é
mais fácil de memorizar e sobreviveu até ser registrado, o que não aconteceu com as estórias
que necessariamente existiram e poderiam ter caráter literário também.
A história da poesia moderna ocidental inicia-se com a poesia cavalheiresca da
Idade Média. Depois de um período de três séculos em que a poesia provinha exclusivamente
de monastérios, e tinha a religião como tema, a poesia cavalheiresca, em pleno teocentrismo
medieval, tem como objeto o profano, o homem e os seus sentimentos, principalmente o
amor.
O lirismo provençal irradiou-se por toda a Europa meridional e não se compreenderia
Petrarca e Dante sem ela como antecedente. É proveniente de Provença, região ao sul da
França que tinha muita riqueza devido ao próspero comércio com a bacia mediterrânea e o
norte de África de Massília, cidade fundada pelos romanos. Ali dominava a língua d’oc,
doce e rica, enquanto no norte da Gália se falava a língua d’oil, rústica e veemente, que vem
a ser usada na prosa. Prosa essa que influenciará também as outras literaturas do mundo
ocidental com os romances do ciclo Bretão (rei Artur) e com as novelas do ciclo carolíngio
(Carlos Magno e a demanda do Cálice Sagrado).
Os provençais foram, portanto, os mestres e iniciadores da poesia européia moderna.
Como sua influência aconteceu em Portugal:

1 - Casamento dos três primeiros reis de Portugal com princesas do sul da Gália,
que traziam em seu séquito jograis e trovadores.
2 - A primeira dinastia é chamada de Borgonha porque foi fundada pelo conde de
Borgonha e foi toda ligada à França.

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3 - As romarias aos santuários famosos como o de Santiago de Compostela. O
canto, a poesia e o drama litúrgico eram os meios com que o clero fomentava o interesse e
a participação do povo. Esses foram evoluindo e expulsos para os adros. Vinham romeiros
de França com seus cantares característicos. Nos santuários, vários povos confraternizavam
culturalmente.
4 - O intercâmbio de várias espécies entre portugueses e provençais: relações
comerciais, vida comum entre os cruzados, as viagens dos cruzados lusitanos, etc.

Em toda a cristandade medieval, a Igreja viu-se obrigada primeiro a proibir a prática


de ritos e festas pagãs que persistiam em cantos e danças eróticas de mulheres dentro dos
próprios templos.
Depois expulsou estas manifestações que se davam nos adros (manifestação
persistente seria, por exemplo, as lavagens dos adros das Igrejas em Salvador.
Os costumes e as práticas populares medievais nos adros das igrejas ou por ocasião
de feiras de produtos é uma fonte de restauração das energias gastas no sacrifício e no
trabalho durante o resto do ano. No momento da romaria, cessa o penoso trabalho de todos
os dias, instaura-se o reino da abundância, da permissividade, da alegria; há trocas
materiais, culturais e afetivas; danças, cortejos triunfais, aproximação entre pessoas,
encontros e fusões de grupos e categorias pela conjuntural cessação das proibições, tudo
isto se sente ou se pressente na poesia trovadoresca.
Desde o fim do século XII, com a formação das cortes senhoriais, a produção cultural
nobre diversifica-se: surge a poesia lírica e satírica, com as cantigas de amigo, de amor e
de escárnio e maldizer. Assiste-se, então, a uma intensa atividade criativa, constantemente
renovada pelos contatos e a competição com as cortes estrangeiras, que os cavaleiros
jovens, idealistas, aventureiros e sem fortuna, visitavam freqüentemente, trazendo para
Portugal as influências culturalmente preponderantes na Europa da época: as influências
provençais.
Os poetas conseguem dar vivacidade aos diversos estados emocionais da mulher
enamorada: a saudade, o ciúme, o ressentimento, os amuos, as ansiedades, as
desconfianças, a reivindicação da liberdade exigida à mãe são expressas de modo muito
vivo; as mulheres ora são ingênuas ou sabidas ora compassivas ou calculistas e astutas,
sensíveis ou indiferentes, ora se entregam ou se negam aproveitando-se dos seus

!
namorados. Os poetas trovadores mostram uma ampla experiência que a sua vida
sentimental variada lhes proporcionou. Nas canções de amigo, de origem local, o amor não
é experiência idílica, platônica, ela é realista, física.

Indicação de Filme
TÍTULO DO FILME: O SÉTIMO SELO (Det Sjunde Inseglet, Suécia, 1957)

DIREÇÃO: Ingmar Bergman


ELENCO: Max von Sydow, Gunnar Bjomstrand, Bengt Ekerot, Nils
Pope, Bibi Anderson, Ingá Gill, Maud Hanson, Inga Landgre; 102
min.
O século XIV assinala o apogeu da crise do sistema feudal,
representada pelo trinômio “guerra, peste e fome”, que juntamente
com a morte, compõem simbolicamente os “quatro cavaleiros do apocalipse”
no final da Idade Média. Nesse contexto de transição do feudalismo para o
capitalismo, além do desenvolvimento do comércio monetário, notamos
transformações sociais, com a projeção da burguesia, políticas, culturais e até
religiosas com a Reforma Protestante e a Contra Reforma.

9
1ª Época Medieval
A POESIA LÍRICA GALEGO-PORTUGUESA
Estudo
daLiteratura O nascimento da produção literária portuguesa
Portuguesa acontece quase simultaneamente à formação da nação
lusa. Apesar de seus primeiros representantes serem
todos ligados à corte, não devemos atribuir à primeira fase da
Literatura Portuguesa, a da lírica dos trovadores – também conhecida
como poesia lírica galego-portuguesa –, um caráter nacional. É
necessário considerar que as fronteiras políticas e culturais na
Península Ibérica, nesse período, eram muito flexíveis, pois os laços
matrimoniais entre os nobres de diferentes cortes eram comuns, fato
que favorecia a sua circulação.

Outro fator de grande importância para o seu desfronteiramento foi a utilização de


uma língua única para as composições. A língua usada ainda não é o português, mas o
galego-português, um romanço (língua de origem latina) falada na costa da Península Ibérica.
Apesar desta língua ser usada somente no Noroeste da Península, sua escolha não foi
aleatória. Lembremos que a região formava uma unidade política cultural que abrangia a
Galiza e o território que se tornaria o reino português. Acontece que, mesmo depois do
desmembramento, Portugal continuou a manter relações culturais estreitas com a região
galega, transformando-se em uma região de importante intercâmbio cultural, principalmente
com as peregrinações a Santiago de Compostela.

Não é fácil datar com precisão as primeiras composições do período trovadoresco


português, seja pela escassez dos dados biográficos de muitos dos poetas, seja pela natureza
própria a essa poesia: a da oralidade. Uma das mais antigas manifestações literárias
galego-portuguesas que se tem notícia é a cantiga de maldizer feita por João Soares de
Paiva “Ora faz ost’o Senhor de Navarra”, mas muitos consideram a Cantiga da Ribeirinha –
também chamada de Cantiga da Garvaia – como a mais antiga, por ser esta a mais antiga
registrada. A Cantiga da Ribeirinha foi composta por Paio Soares de Taveirós, provavelmente
no ano de 1189 (ou 1198, há rasuras na datação). Como as datas não são claras e as
controvérsias entre os estudiosos desse assunto são constantes e cabíveis, conveniou-se
datar, portanto, como marco inicial da Lírica Medieval Portuguesa, o último decênio do século
XII. Ela se estende até o ano de 1418, quando se inicia, em Portugal, o Quinhentismo; e, na
Galiza, os chamados Séculos Escuros.

A primeira geração histórica dos trovadores foi caracterizada pelo


policentrismo e a extrema mobilidade dos poetas. Depois, uma segunda
geração denominada “geração do meio” surge na corte de Fernando III,
Afonso X de Leão e Castela e na do rei português D. Afonso III. A poesia
desta nova fase possuía um caráter dirigido, ou seja, os interlocutores
se apresentavam em forma de desafio, provocando, assim, a resposta
de outros trovadores. As cantigas de maldizer foram bastante favorecidas
pelo grupo.

Embora este período seja de grande atividade poética, entra em declínio com a morte
de Afonso X e, mesmo ainda existindo trovadores importantes, é a corte de D. Dinis que
passa a ser o centro dos trovadores, sendo ele próprio um grande poeta, mas faltou em sua
corte um movimento poético que envolvesse a todos, como na geração anterior. Com a

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morte de D. Dinis poderíamos pensar no fim do lirismo trovadoresco, no entanto documentos
comprovam ter existido, ainda, uma pequena atividade poética patrocinada por seu filho Pedro.

As origens da poesia lírica:

Uma poesia com influência Provençal e/ou uma poesia de caráter popular?

A poesia trovadoresca Provençal surge no sul da França em fins do


século XI, tem o seu apogeu no século XII, e declina no século XIII, quando
a crise dos senhores do sul obriga os trovadores a abandonarem a região
em busca de novos patrocinadores. É caracterizada por ser o primeiro
lirismo Ocidental em língua vernácula e pelo caráter inovador dessa poesia.
Mesmo com toda a influência socio-cultural somada, ela representou uma
ruptura com o período clássico até então cultivado e, principalmente, uma
nova visão de mundo. Um jeito novo de fazer poesia valorizando o erotismo e apresentando
uma outra forma de falar de amor, marcada pelo código de comportamento amoroso chamado


fin’amors mais tarde conhecido como o “amor cortês”.
Esse código possivelmente tenha chegado filtrado em Portugal e na Espanha devido
à religiosidade vigente, pois Provença era considerada a corte da luxúria e a poesia
considerada demasiadamente erótica.

Podemos, então, dizer que o erotismo


provençal foi podado pelo moralismo religioso
dos trovadores galego-portugueses?

A relação amorosa cantada pelos trovadores provençais é a transferência do sistema


de vassalagem existente na Idade Média. Representado por um amor cortês no qual um
homem da baixa nobreza apaixona-se por uma dama de classe superior que, devido a esta
diferença, não irá retribuir a esse amor, passando a existir uma vassalagem amorosa. Mas
o amado não quer possuir a amada, e sim gozar desse estado de não-possessão, embora
ele sonhe com a retribuição por parte da amada, mesmo porque ela representa a sua
ascensão social. Percebemos ser o sentimento amoroso concebido numa tensão constante
pelos trovadores desse período.

E foi esta a poesia difundida por toda a Europa Ocidental, em diferentes proporções,
a depender da região. O norte da Itália e a Catalunha, por estarem mais próximas e possuírem
costumes parecidos aos da região Provençal, receberam uma influência mais direta,
enquanto a Península Ibérica teve uma influência filtrada e menor.

Os Cancioneiros

As poesias trovadorescas galego-portuguesas são consideradas como Literatura


Românica e não são propriamente portuguesas, pois abrangia a península Ibérica (hoje
Portugal e Espanha). Foram, primeiramente, registradas pela oralidade e só depois de
algum tempo fixadas por escrito e transmitidas em três coletâneas:

 Cancioneiro da Ajuda; copiado provavelmente na corte de D. Monso X. Contém


apenas as cantigas de amor dos poetas mais antigos.
 Cancioneiro da Vaticana; feito na Itália, inclui cantigas de amor, de amigo e de
escárnio e maldizer.

11
 Cancioneiro da Biblioteca Nacional; é o mais completo.
Contém a “Arte de Trovar”, tratado poético que possui instruções para os
leitores quanto a arte de compor trovas.
Estudo Por falta de registros suficientes, não há como ter uma
daLiteratura melhor compreensão do período dos trovadores. Inicialmente,
Portuguesa por ser uma poesia destinada à oralidade, e esse motivo
tornava desnecessário um registro escrito, e também pelo
não reconhecimento da importância de conservá-la. Acredita-
se ter havido uma divulgação escrita dessas cantigas, porém
em pequeno número.
Gêneros principais da poesia trovadoresca

A poesia trovadoresca apresenta dois gêneros principais: a lírico-amorosa e a sátira.


A poesia lírico-amorosa divide-se em Cantiga de Amor e Cantiga de Amigo e a poesia
satírica divide-se em Cantiga de Escárnio e Cantiga de Maldizer.

Cantiga de amor

O homem canta o seu amor à amada, sendo ela uma dama da alta nobreza e ele de
classe inferior. De origem provençal, embora tenha perdido um pouco da variação das formas
e da riqueza de expressão desta poesia. Isso porque, como já vimos, sofreu algumas
modificações para se adequar a Península Ibérica. Um outro fator que indica diferença dessa
cantiga de uma região para outra é que, enquanto na Provençal o amante nutre um desejo
de recompensa por parte da amada e ele vive com alegria esse amor platônico; o amante
da poesia galego-portuguesa se torna um coitado, vítima de um amor inacessível que só
traz lamento e desilusões e amar é um grande pesar que culmina com o desejo da morte.

Quanto à estrutura e regras formais, podemos dizer que embora a lírica galego-
portuguesa não tenha desenvolvido tantos estilos como a Provençal, ela manifesta uma
grande preocupação formal. As cantigas eram classificadas em dois tipos: cantigas de
refrão e cantigas de mestria (sem refrão), e os trovadores utilizavam alguns recursos
estilísticos para darem acabamento formal as suas cantigas.

Cantigas de amigo

Diferente das cantigas de amor, o eu-lírico desta é feminino. O trovador se expressa


pela voz da mulher – que tanto pode se dirigir ao amigo, como à sua mãe, irmãs ou mesmo
a algum elemento da natureza. Podemos, então, dizer que essas cantigas podem ser
divididas em dois tipos. O primeiro tipo, que se dirige a um amigo, é muito parecido com as
de amor, pois elas apresentam o ponto de vista feminino do amor cortês se dando às vezes
até a substituição do vocábulo “amigo” por “mia senhor”. A semelhança era ainda maior
quando os trovadores desenvolvem o mesmo tema nos dois gêneros.

As características mais marcantes desse tipo de cantiga é o paralelismo, que consiste


em montar uma composição com base em segmentos repetidos. Sendo este um recurso
poético comum na chamada poesia tradicional, de cunho popular. Recurso que se tomou
muito importante para os trovadores, e se espalhou por todos os gêneros, inclusive as
cantigas de amor, onde o paralelismo semântico é facilmente encontrado.

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Muitos estudiosos, ao se depararem com essas cantigas, se deslumbram não só
por seu caráter inovador, mas, principalmente, por pensarem estar diante de uma poesia
puramente popular. A origem dessa poesia pode ser explicada como sendo uma poesia
feminina pré-trovadoresca, o que é reforçado pelos materiais encontrados. Isso nos leva a
crer que inicialmente esse tipo de cantiga tradicional não encontrou lugar entre os nobres,
embora eles tenham com certeza apreendido um pouco do gênero. Mas não podemos
esquecer que os textos das cantigas que possuímos são obras de poetas conhecidos, dentro
de uma poética aristocrática.

Cantigas de escárnio e maldizer


Antes de tudo, é necessário estabelecer uma pequena diferença entre esses dois
tipos de cantiga. As cantigas de escárnio o trovador usa termos ambíguos que dificultam a
compreensão imediata dos insultos, enquanto nas de maldizer o poeta usa palavras violentas
e diretas.

REFLITA

Apesar das diferenças, as cantigas de escárnio e maldizer possuem


algo que as unem: ambas falam mal de alguém, além de pertencerem
ao gênero satírico, por vezes burlesco e obsceno, e serem muito
apreciadas pelos poetas galego-portugueses.

Devido a essas semelhanças, muitos estudiosos preferem uma classificação geral


dessas cantigas por perceberem que em muitas poesias esses critérios se misturam.

Devido à linguagem utilizada e por tratar de temas obscenos, parece ser um gênero
totalmente distante dos demais, no entanto, se fizermos uma analise mais minuciosa veremos
que elas estão ligadas a começar pelos autores, são os mesmos das de amor e de amigo
e, sobretudo, pela capacidade desse gênero em incidir nos demais, parodiando-os.

 Um outro tipo de poesia é a Mariana, que existiu no século XIII, que são cantigas
de Santa Maria. Por apresentarem temas e reflexões mais amplas e possuírem mais poesias
narrativas que de louvor à virgem, muitos autores não as consideram quando analisam a
poesia galego-portuguesa, todavia não se podem ignorar as pontes que ligam esse gênero
aos demais. O primeiro é o fato de ela ser escrita em galego-português e também ser
composta como uma unidade de música e poesia. Sem contar os traços líricos e satíricos
encontrados em algumas dessas cantigas.

Para concluir, é preciso ressaltar que, embora as inúmeras críticas feitas à poesia
galego-portuguesa, muitas vezes vista como um ramo da poesia Provençal, é incontestável
sua importância para a formação de uma nova geração poética, que muito influenciou na
poesia procedente. Além de retratar a sociedade da época de uma forma inovadora e de
vários ângulos sociais – a corte através das cantigas de amor, o ambiente mais simples e
campestre do povo com as cantigas de amigo e ainda uma crítica cômica de todo o sistema
social com as cantigas de escárnio e maldizer.

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A Novela de Cavalaria
A Demanda do Santo Graal
Estudo
daLiteratura Considerada pelos estudiosos como um dos assuntos mais espinhosos
Portuguesa da literatura medieval, devido a enorme quantidade de textos e as inúmeras
versões de uma mesma obra, a “matéria da Bretanha” é também um dos temas
fascinantes do medievo, embora não seja nada fácil estudar esse período. Muitas vezes é
necessário que o especialista recorra a um trabalho arqueológico e filológico das obras
existentes para esclarecer datas, local de origem, etc.
O primeiro nó a desatar é quanto à originalidade da demanda
portuguesa. O único documento existente é o códice 2594 da
Biblioteca Nacional de Viena que é, na verdade, uma tradução de
um outro original, possivelmente francês, cujo paradeiro é
desconhecido. Um outro impasse é ter surgido nesta mesma época
(1400-1438) uma outra versão castelhana do mesmo texto. Isso
deu margem a inúmeras discussões acerca da prioridade de uma
sobre a outra. Mas estudos feitos por Rodrigues Lapa e D. Carolina
Michaeles de Vasconcelos demonstrou ser Portugal o responsável
pela tradução e adaptação da obra.

Com o objetivo de minimizar os problemas oriundos da diferença de datas entre o


original (século XIII) e a tradução (século XV) e também os de diferença cultural e ainda
distingui-las das canções de gestas – cantigas medievais que celebravam os grandes feitos
de heróis da época – é tradição dividir a ficção cavalaresca em três ciclos: o Carolíngio –
que tem no imperador Carlos Magno e seus pares as figuras centrais; o Clássico – que
abrange matéria da Antiguidade clássica, episódios e heróis das literaturas grega e latina;
e aquele mais interessante para nós: o Bretão ou Arturiano – onde encontramos a figura do
Rei Artur e seus Cavaleiros na Bretanha, pois este é o único ciclo presente na prosa
portuguesa.

Um esclarecimento muito importante a fazer é quanto à


distinção entre a lenda do Rei Artur e o mito do Graal. Apesar de
aparecerem juntos na memória popular não são da mesma época,
sendo o mito bem mais antigo que a lenda. O Rei Artur foi
considerado um grande chefe guerreiro das Ilhas Britânicas, que
entre os séculos VI e VII ficou célebre em perigosas batalhas contra
os inimigos saxões, e teve suas histórias contadas principalmente
pelos conteurs bretões (narradores de contos e fábulas folclóricas
que passavam de pais para filhos). Observemos que este é um
tema bélico por excelência, enquanto o tema do Graal era
essencialmente religioso.

Vendo por este ângulo, parece impossível a junção desses dois temas, no entanto
temos textos históricos que traçam todo o caminho percorrido desde a primeira descrição
dos feitos do Rei Artur, com Nennius, até a união desses dois temas com Chrétien Troyes
na obra Perceval ou le conte du Graal em que o autor vai além dos episódios amorosos,
mergulhando em um universo místico, embora sem caracteres cristãos, é, com certeza, a
partir daí que se dá a cristianização desse material.

14
Se razões históricas e textuais explicam os laços entre o Graal e o Rei Artur, as
afinidades temáticas parecem mais eloqüentes. A vida do rei Artur é totalmente envolvida
pela magia de Merlin e pela proteção das fadas, pois foi ele gerado por meio da magia e
mesmo depois de morto foi levado pela fada Morgana à ilha de Avalon. E o povo ficou a
esperar messianicamente a volta de Artur. Percebemos nitidamente a presença marcante
do misticismo não somente na vida do rei como também na vida do reino. São pormenores
que acrescentaram á biografia de Artur aquele halo espiritual responsável pela mitificação
da lenda.

A ligação do elemento guerreiro ao místico na configuração do Império adquiriu, na


verdade, proporções gigantescas. Artur não era somente um chefe político, ele tornou-se
para o povo também um chefe simbólico e a ambição de qualquer cavaleiro era tornar-se
membro da ordem do Rei Artur, mesmo que para isso fosse preciso renunciar a toda família.
Quando a “ordem arturiana” adquire tal magnitude – ao situar os homens num plano de
valores em que o heroísmo guerreiro rivaliza com as qualidades morais, sempre cultivadas
por vias que exigem renúncias às vezes quase impossíveis, com vistas ao prêmio no fim da
longa caminhada, quando isso ocorre – a confluência na tradição do Graal parece inevitável:
“o próprio Graal pode, no fundo, representar o elemento transcendente com que esta
cavalaria aspirava a completar-se”. Onde o fim justificava os meios, ou seja, a matança que
ocorreu na Demanda não era pecaminosa e sim demonstração de bravura para se alcançar
à premiação.

Tendo em vista a importância da realidade histórica para toda e qualquer literatura


não podemos deixar de ressaltar alguns fatores que contribuíram para o surgimento e
desenvolvimento da matéria ficcional da demanda:

A voga do neocetismo; com a conquista normanda, empreendida por Guilherme,


abriu para o mundo as portas do folclore céltico-bretão, com seus inúmeros lutadores ferozes
e amantes insaciáveis protegidos pelo fantasioso mundo das fadas.

O movimento intenso das cruzadas, aproximando o Oriente e o Ocidente; com


o objetivo de proteger e recuperar os lugares sagrados e também “recuperar” fiéis para a
igreja.

O surgimento da lírica trovadoresca; sendo o século XII considerado o século de


ouro da literatura da França, cuja importância é indiscutível como fonte de todo o lirismo
europeu dos séculos posteriores.

A ascensão da cavalaria; que de simples organização militar começa a se transformar


com Carlos Magno (Século IX) numa espécie de confraria religiosa, exigindo do ingressante
a observância de uma série de rituais.

Se aliarmos esses fatores ao intenso crescimento das cidades e surgimento das


universidades, teremos uma idéia do extraordinário choque de valores que caracterizou os
séculos XII e XIII, onde a matança em nome de Cristo e a preservação dos valores da Igreja
eram sinônimo de obediência e valorização diante de Deus. E, as peregrinações eram uma
forma de obter perdão dos pecados e reinstaurar a paz.

Inserida no centro dessas forças antagônicas, a Demanda do Santo Graal tornou-se


o retrato definido da Idade Média mística e, ao mesmo tempo, o maior monumento literário

15
que a época nos legou no campo da ficção. Quanto à estrutura, podemos
dizer terem sido feitas em forma de novelas, o que permitia estruturar os
capítulos em contos independentes, com significado próprio.
Estudo
daLiteratura Um dos pontos mais importante, quando analisamos a Demanda, é
Portuguesa percebermos a influência da Igreja na sociedade da época. O remorso e a
expiação estão sempre presentes na vida dos cavaleiros. Na figura da “Besta
Ladrador” temos uma amostra da punição para aqueles que cometerem o crime do perjúrio,
considerado pecado mortal. Sendo o juramento uma condição para ingressar na santa busca.
Uma outra condição é não levar mulher na viagem, sob pena de, também, cometer pecado
mortal. Pela proibição e a pena imposta, aqueles que desobedecessem – não conseguiriam
chegar ao Graal –, percebemos que a Igreja não via com bons olhos a liberdade amorosa
cantada pelos trovadores e embalada pela fértil imaginação dos celtas.
Pobre de Lancelot, que embora seja considerado o cavaleiro
mais valente da corte arturiana é também o mais pecador. Como se
não bastasse ser o pai bastardo de Galaaz, apaixonou-se pela
esposa do rei Artur, cometendo pecado duplo: adultério e traição, o
que vai contra a moral da Igreja e a ética da cavalaria. Apesar de
conhecedor da sua enorme culpa e de padecer com o remorso que
ela lhe causa, Lancelot não consegue deixar de amá-la e só a
abandona depois que ela morre. Isso retrata a dualidade vivida por
Lancelot, de um lado o amor forte e inabalável pela rainha; do outro,
o respeito, a admiração e a amizade por Artur, que apesar de tudo,
ele continuava cultivando. Acontecimentos que o afasta das honrarias
as quais os outros cavaleiros participam e, inclusive, da possibilidade
de alcançar a conquista do Graal.
É nesse contexto que surge Galaaz como o “cavaleiro eleito”, “o puro dos puros”
porque nunca pecou contra a castidade, passando, assim, a simbolizar um novo Cristo, que
com a conquista do Graal salvaria o reino do pecado e implantaria a tão sonhada paz.
Mesmo com todos esses méritos, Galaaz não está livre da tentação, e como Jesus, foi
levado ao “deserto” para ser tentado pelo Diabo, aqui simbolizado pela mulher: durante a
noite Galaaz estava deitado quando a filha do rei penetra no seu quarto, porém ela o encontra
usando um cinto de castidade e vendo seus planos frustrados, a donzela ameaça matar-se.
Ele, desesperado, cede, mas já era tarde e ela havia morrido, mesmo assim ele foi
consolado e eximido de culpa por Boorz. Esse episódio prova que nem mesmo Galaaz, o


escolhido, pode se descuidar e deixa claro as muitas provações encontradas pelos
cavaleiros. Todavia pensava-se que quanto mais difíceis os obstáculos, maiores as chances
de purificação e mais eminente o perdão de Deus.

Vamos reconsiderar os séculos XII e XIII?

A época é de conturbada polaridade; Deus e o Diabo estão como que lado a lado,
com apelos igualmente sedutores; a Igreja e a cavalaria encontram na guerra santa e no
monge guerreiro uma forma de minimizar suas diferenças e, na literatura, o erotismo
trovadoresco e combatido pelas hagiografias sobre a vida de santos e mártires. Divididos
entre a oração e o pecado, o homem medieval vê nas cruzadas uma forma de adquirir o
perdão divino. Se confrontarmos essa realidade com a realidade dos Cavaleiros da Távola
Redonda e a Demanda perceberemos uma grande afinidade entre ambas, pois as aventuras

16
existentes na busca do Graal eram formas de peregrinação. Sendo que na Demanda a
fantasia e a realidade se misturam, a ponto de não discernimos os limites entre esses dois
mundos.

Em suma, não é sem razão que a Demanda é considerada o maior monumento

!
literário da Idade Média, pois além de ser uma obra coesa e extraordinariamente bem
estruturada, ela também retoma elementos de crença heterodoxas, não para puni-los ou
cerceá-los, mas para revê-los e até absorvê-los, segundo os dogmas da Igreja.

Indicação de Filme
TÍTULO DO FILME: EXCALIBUR (Excalibur, inglaterra, 1981)

DIREÇÃO: John Boorman


ELENCO: Nigel Therry (Rei Arthur), Helen Mirren
(Morgana),Nicholas Clay (Lancelot), Cherie Lunghi (Guinevere),
Paul Geoffrey (Percival), Nicol Williamson (Merlin), Robert Addie
(Mordred), Gabriel Byrne (Uther Pendragon); 142 min.

Durante muitos séculos, historiadores consideraram Rei Arthur apenas um


mito, mas a lenda, acredita-se, baseava-se em um herói real, dividido entre
suas ambições pessoais e o dever para com o povo.

2ª Época Medieval
As manifestações literárias da primeira época medieval caracterizavam-se pelo
predomínio da oralidade e, por esta razão, as cantigas trovadorescas tiveram maior destaque.
O século XV, segunda época medieval, representa um momento de transição entre a literatura
trovadoresca e o Renascimento do século XVI, é quando a prosa e o teatro ganham o primeiro
plano. É um dos períodos mais dinâmicos da história portuguesa, pois, nesse século, além
de aumentar seus domínios, Portugal mostra para a Europa a força da coesão moral de um
povo solidário e fiel ao seu rei e uma unidade política inviolável, até então desconhecida.

Inicia-se em 1415, com a tomada de Celta, o período dos


descobrimentos e das conquistas marítimas. Durante mais de cem anos a
nação lusa se deteve no propósito mercantilista e a literatura acompanhou
esse movimento, dando grande importância aos trabalhos históricos e
didáticos: produção de textos de caráter documental, cuja finalidade
primeira não seria exatamente literária e sim de doutrinação. Portanto,
podemos deduzir que as grandes criações artísticas não encontravam
espaço, e as canções, até então comum aos palácios, ficaram restritas às
reuniões familiares.

A prosa doutrinal encontra na família de Avis expoentes notáveis no séc. XV: O Livro
da Montaria de D. João I, sobre a arte e os prazeres da caça; A Ensinança de Bem Cavalgar
Toda a Sela e Leal Conselheiro, sobre a arte de montar e sobre a ética e a prática da vida
quotidiana, respectivamente, de D. Duarte; e Virtuosa Benfeitoria, adaptação de Séneca
sobre os benefícios dos nobres, do Infante D. Pedro.

17
O gosto dos desportos
Estudo
daLiteratura Desde os meados do século XIV, a escola trovadoresca em Portugal,
Portuguesa assim como o exercício da poesia, da imaginação e da sensibilidade começou
a ser substituído pela cultura da força física. É Afonso IV que inicia
ostensivamente o predomínio do corpo sobre o espírito. Eram muitos os exercícios praticados
naquela época, dentre os mais apreciados estavam as caçadas, a montaria, sem contar as
lutas, os torneios, as justas, etc. Por conta dessa mudança no gosto da sociedade é que
surgiu uma literatura que refletia as preocupações dominantes da época. Um bom exemplo
é D. Fernando, ele trazia a casa cheia de falcões e encarregou seu falcoeiro Pero Menino
de elaborar um tratado de mezinas para aplicar às doenças que atacavam os falcões. Este
livro, entre outros semelhantes, tem reduzido valor literário; o que não acontece com o Livro
da Montaria, de D. João I, considerado um valioso documento da literatura desportiva
portuguesa.

O livro da Ensinança de Bom Cavalgar

D. Duarte, ainda príncipe, começou este livro, levado


pelo desejo de ensinar aos seus súditos a teoria de bem
cavalgar. É uma obra original, não decalcada dos modelos
clássicos, onde não abundavam livros destes, é um fruto
da sua experiência. Todavia esse livro não pode ser
considerado apenas um ensinamento sobre equitação,
pois ele transcende a esfera profissional e penetra no
campo psicológico, falando sobre o medo no aprendizado
da disciplina e recomenda a beleza das atitudes na prática dos exercícios. É a percepção
estética do jogo clássico.

O Leal Conselheiro

Devemos a primeira edição deste livro aos esforços de dois portugueses, moradores
de Paris: o visconde de Santarém e José Inácio Roquette, o conhecido dicionarista. Não
tendo unidade de tempo nem de pensamento: é um tratado de recopilação enciclopédica,
que versa as disciplinas mais variadas. D.Duarte, espírito exatíssimo, profundo observador,
adquiriu cedo o costume de tomar apontamentos por escrito. Não confiava na memória. O
livro era dedicado a sua esposa, a rainha, e tinha, como o título indica, um fim educativo, era
como que um guia de moral caseira.

O estilo de D. Duarte

Sem nenhum talento poético, D. Duarte empregava uma linguagem excessivamente


culta, prática pouco aceita no período medieval. Muito rigoroso no emprego dos vocábulos,
chegava por vezes a discriminar as diferenças de sentido – É um dos primeiros em Portugal
que não crêem na existência de sinônimos. Contudo, isso não deve ser atribuído ao seu
instinto literário, e sim a sua cultura moral e desejo de perfeição. Lia e traduzia o latim no

18
desejo de se aproximar ao máximo do original e é este empenho de tradutor que dá ao seu
estilo um caráter arrevesado e truncado, pois limitava-se a aplicar a sintaxe latina na frase
portuguesa.

O cronista Fernão Lopes


Ao tempo em que D. Duarte compunha os últimos capítulos do
Leal Conselheiro, começa Fernão Lopes, arquivista das escrituras
desde 1417, a registrar em crônicas as estórias dos antigos reis de
Portugal. Sua obra é fruto de um imenso trabalho, realizado em quinze
anos de busca fadigosa de documentos antigos de toda espécie e em
várias línguas. Compreendendo todas as crônicas, desde a do conde
D. Enrique até à de D. João I. Inclusive, as crônicas dos reis antigos,
que foram atribuídas a Rui de Pina – um furto literário denunciado por
Damião de Góis com base, sobretudo, nas diferenças estilísticas
existentes.

Das crônicas que escreveu, só restam três:

a) Crônica de D. Pedro

Esta crônica abrange os dez anos de reinado de D. Pedro (1357 a 1367). É constituída
por um prólogo e quarenta e quatro capítulos. Tal como fez para as restantes crônicas,
Fernão Lopes apoiou-se em fontes narrativas e diplomáticas, como é o caso dos documentos
dos livros da chancelaria de D. Pedro.
História e mito tendem a se confundir no imaginário advindo do episódio que envolve
Inês de Castro e seu amante, o futuro rei de Portugal D. Pedro, filho de D. Afonso IV. Os
primeiros textos de que se tem notícia a enfocar o drama do “Romeu e Julieta português”
(nas palavras de Alexandra MARTINS) são de Fernão LOPES (1380?-1460?), cronista que
conduz a historiografia lusitana a novas perspectivas, ao filtrar as lendas dos fatos.

b) Crônica de D. Fernando

Esta crônica foi, provavelmente, redigida por volta de 1436. É constituída por um
prólogo e cento e setenta e oito capítulos. Começa por relatar as peripécias de pouco
depois da morte de D. Pedro, em março de 1367 e finda também pouco depois da morte
de D. Fernando. Os últimos seis capítulos são de grande interesse, pois retratam a reação
do povo e de uma parte da nobreza, quando D. Leonor Teles se torna regente do Reino,
substituindo a sua filha D. Beatriz, rainha de Castela.

c) Crônica de D. João I (1ª e 2ª partes)

Esta crônica é considerada a obra-prima de Fernão Lopes e, segundo algumas


opiniões, é classificada como sendo mais épica do que Os Lusíadas e muito mais nacional.
Em cronologia é a maior das crônicas, visto que abrange acontecimentos ocorridos durante
28 anos. Na concepção de José Hermano Saraiva, a primeira parte da Crônica de D. João
I não é uma crônica no sentido rigoroso do termo, mas um livro de história, na acepção que
hoje damos a esta expressão.
Trata-se do primeiro livro de História que se escreveu em Portugal e, durante muito
tempo, o único. Nesta crônica, Fernão Lopes relata aquele que foi um dos momentos mais
conturbados da história portuguesa: a crise de sucessão de 1383/85.

19
O CANCIONEIRO GERAL

O fim do período de consolidação da língua (ou de utilização do


Estudo
português arcaico) é marcado pela publicação do Cancioneiro Geral de Garcia
da Literatura de Resende, em 1516, período no qual o Português tornou-se uma língua
Portuguesa madura, com uma tradição literária riquíssima, separando-se definitivamente
do galego (no séc XV, a língua na Galiza começou a ser influenciada pelo
Castelhano – basicamente o Espanhol moderno).

Tempo em que as guerras e a instabilidade da política não


refrearam a aspiração de uma vida melhor, pelo contrário, a nobreza
compreendeu que só em volta do rei lhe restava viver para se abrigar
da penúria e da opressão. A aristocracia começou a freqüentar e
cultivar as reuniões e as maneiras do palácio. Nos tempos de D.
João II, os serões tiveram grande esplendor, pois o rei prezava a
poesia e sentindo que a sociabilidade poderia funcionar como uma
obra de propaganda política, encontrou nesses encontros uma
maneira de ter os fidalgos na mão. A corte, então, tornou-se o
principal centro de produção cultural e literária, graças a esse
fortalecimento da casa real.

Freqüentador da corte, o risonho e inteligente Garcia de Resende, homem da criação


de D. João II, teve a ótima idéia de compilar a produção poética do lirismo palaciano, obra
que publicou em 1516, sob o nome de Cancioneiro Geral.

A moda de colecionar a poesia cortesã viera da Espanha, pois lá, a vida cortesã e
galante começou mais cedo do que em Portugal, graças ao favor de reis como D. João II,
grande agasalhador de poetas. O que resultou, na segunda metade do século XVI, um
acusado predomínio da cultura e da língua castelhanas. Não é, pois, de se admirar que
topemos no Cancioneiro de Resende com numerosas composições em castelhano, e este
hispanismo continuará pelo século de Quinhentos, favorecido já agora pela hegemonia política
de Espanha. Mas, acentuar-se, a maior e melhor parte do Cancioneiro está em língua
portuguesa.

É certo que há na poesia palaciana mais futilidade, já que a própria ocasionalidade


da inspiração dá um profundo acento a algumas composições feitas – lembremos que foram
compostas para serem recitadas e não para serem publicadas em livro. O fato mais
insignificante despertava a inspiração poética. E tudo isso se dava num ambiente de
liberdade, característico da renascença.

A tradição lírica galego-portuguesa

Um dos fatos que devemos primeiramente destacar no


Cancioneiro é a persistência da antiga tradição lírica, não é claro
sob o aspecto formal, pois há muito desaparecera o paralelismo da
cantiga de amigo, mas pelo que se refere às tendências permanentes
do temperamento saudosista. O amor triste é ainda muito presente
no Cancioneiro de Resende.

20
Mas o amor adquire aspectos novos, torna-se mais natural e mais atrevido. A dama
aparece em acordo com a realidade e as relações afetivas são incrementadas por um
toque de ardência sensual. Havia, pois, um conflito aberto entre as duas concepções do
amor: a tradicional, platônica, e aquela que já se respirava na atmosfera cálida e sensual da
renascença.

A corrente satírica

Obedecendo ainda a uma corrente da antiga tradição, encontramos no Cancioneiro


freqüentes exemplos do escárnio de amor; o poeta, despeitado dos rigores da dama, retrata-
a em cores de fealdade física ou moral. Como modelo do poeta cômico, galhofeiro, que não
desce ao fundo das coisas e se atém aos aspectos ridículos da vida, o Cancioneiro oferece-
nos Henrique da Mota que, em certo modo, pode ser considerado um precursor de Gil
Vicente, pois que as suas composições, dialogadas, são teatralizáveis e constituem
verdadeiras farsas. As peças satíricas mais notáveis em alcance social são as trovas de
Álvaro de Brito Pestana a Luís Fogaça sobre os ares maus de Lisboa, as de Duarte da
Gama às desordens da vida portuguesa e as de Luís da Silveira e Garcia de Resende à
mudança dos tempos.

Dantismo e petrarquismo

A influência dantesca aparece já no período galego-castelhano, mas vai-se


acentuando cada vez mais, até que, no último quartel do século XV, dá lugar a uma forma
especial de poesia. Essa imitação de Dante de primeira mão deu-se primeiramente em
Espanha e depois em a Portugal, por intermédio de Juan de Mena e do Marquês de
Santilhana. A influência indireta de Dante foi igualada, senão até superada pela arte francesa,
que era mais clara, superficial e acessível. Outra influência italiana e essa mais direta e
profunda, porque encontrava correspondência no nosso temperamento, foi a de Petrarca,
que renovara no século XIV o lirismo dos velhos trovadores. A atitude petrarquista manifesta-
se nas antíteses, nas imprecações dolorosas e na utilização artística da natureza como
espelho ou contraposição do estado de alma do poeta.

Temos, pois, que a dupla influência de Dante e de Petrarca despertou, ou melhor,


renovou a sensibilidade romântica na poesia portuguesa: porque há uma verdadeira
antecipação romântica na poesia do Cancioneiro que se mostra nos contatos entre o poeta
e a natureza e ainda em o poeta procurar, numa saudade triste, os lugares em que viveu os
seus antigos amores.

O espírito clássico

Já na poesia alegórica é evidente um certo estendal de erudição mitológica, mas se


a forma denuncia já uma curiosidade renascentista, o fundo é ainda mais romântico-medieval.

21
Esse mesmo espírito clássico provocou algumas tentativas falhadas
de poesia épica. O ar andava, já então, carregado de inspirações heróicas.
Simplesmente, ainda não chegara o tempo e o poeta que as havia de
Estudo
condensarem estrofes imortais. Um poeta de então, Luís Henriques, exercitara
da Literatura o verso maior em assuntos graves. Nem todos, porém, se deixaram ir nessa
Portuguesa corrente. E um pequeno grupo de poetas, tocado de espírito horaciano,
cultivando o conceito filosófico da mediania dourada, começou a reagir à

!
margem do bulício do palácio, contra as ambições do tempo. Esse pequeno núcleo aparece
representado no Cancioneiro por Diogo de Melo, Nuno Pereira e João Roiz de Castelo
Branco.
Indicação de Filme
TÍTULO DO FILME: 1492 - A CONQUISTA DO PARAÍSO
(1492: Conquest of Paradise, ESP/FRA/ING, 1992)
DIREÇÃO: Ridley Scott
ELENCO:Gérard Depardieu, Sigourney Weaver, Armand Assante,
Ângela Molina, Fernando Rey, Tcheky Kario, 150 min, Vídeo Arte.

A viagem de Cristóvão Colombo insere-se no cenário da


expansão ultramarina liderada por Portugal e Espanha entre os séculos
XV e XVI. Portanto, para compreender a passagem da Idade Média para
a Idade Moderna, é necessário inseri-la no quadro das transformações
por que passou a Europa na Baixa Idade Média (século XII ao XV), durante
a transição do feudalismo para o capitalismo comercial.

! 22
Atividades
Complementares

1. O sentimento do eu-lírico ou eu-poético idealiza a mulher, elevando-a a um pedestal.


Que versos expressam essa idealização?

2. Além de colocar nas mãos de Deus a possibilidade de ser feliz, o poeta atribui a
Ele a responsabilidade pela beleza da mulher. Que fragmento da cantiga expressa a
segunda idéia?

23
Estudo
3. O eu-lírico é masculino e tem um desejo.
a) O que ele pede?
daLiteratura
Portuguesa
b) A quem ele dirige seus pedidos?

c) Se os pedidos não puderem ser atendidos, qual é a solução entrevista pelo eu-
lírico?

4. Nesse texto aparecem as características mais comuns da Cantiga de Amor. Trace


um paralelo com o que você apreendeu sobre a Cantiga de amigo, confrontando as
diferenças e semelhanças entre elas.

5. Alguns compositores se inspiram nesses tipos de cantiga para elaborar suas


composições. Nos dias atuais, que exemplos de Cantiga de Amor e de Cantiga de Amigo
podemos extrair da música brasileira.

24
DO TEATRO PORTUGUÊS AO ARCADISMO

O Teatro de Gil Vincente


Durante a Idade Média surge em Portugal o Teatro Vicentino,
representação que se caracteriza pelos temas, linguagem e atores
populares. A carreira literária de Gil Vicente começa em 1502, quando
representa o Auto da Visitação, até o ano de 1536, ano da
representação de sua última peça Floresta de Enganos. Durante os
anos de sua trajetória teatral dedicou-se a escrever e representar teatro
para o entretenimento da realeza e da fidalguia, são dezenas de peças
de temas variados. Escreveu cerca de 44 peças: 17 bilíngües, 16 em
português e 11 em espanhol. Na corte portuguesa usava-se, também,
o idioma espanhol em razão da rainha Maria, segunda mulher de D.
Manuel I, ser filha dos Reis Católicos da Espanha. Além disso, falar
espanhol era sinal de distinção entre os nobres, pois o povo falava
apenas português.

Didaticamente, pode-se dividir em fazes o teatro vicentino. Temos três fazes principais:

1502-1514 – Sob influência de Juan del Encina.


1515-1527 – Corresponde ao ápice da carreira dramática.
1528-1539 – Teatro intelectualizado, sob influência do classicismo renascentista.

Quanto ao tema, pode ser dividido em:


Tradicional
Peças de caráter litúrgico, ligados ao teatro de Juan del Encina, aos assuntos bucólicos
e às novelas de cavalaria.
Atualidade
Caracteriza-se pela presença de um retrato satírico do modo de viver do seu tempo,
e não perdoa nenhuma classe social, seja ela a fidalguia, a burguesia, o clero ou a plebe.

É um teatro baseado na espontaneidade e com intento de divertir


e organizava-se sob a lei do improviso. Supõe-se que Gil Vicente redigia
um roteiro básico, apenas para ordenar a encenação em uma seqüência
verossímil. Lírico ou cômico, seus textos continham a predominância da
visão medieval e de uma nostalgia de um tempo perdido. O grande mérito
do autor é o seu talento de poeta, sobretudo de poeta dramático, é em
conseqüência disso que o teatro vicentino se tornou um marco dentro da
Literatura Portuguesa.

VOCÊ SABIA QUE...

A obra literária vicentina possui uma linguagem arcaica, popular,


não polida e sem termos eruditos? É que, mesmo escrita em linguagem
popular, o vocabulário é rico, se adequando aos personagens, valendo-
se ainda do latim eclesiástico e do baixo latim – usado pelo povo?
.

25
Suas peças estão classificadas em obras de devoção, comédias,
tragicomédias, farsas e obras miúdas, como monólogos e paráfrases de
salmos e apresentam a seguinte divisão:
Estudo
daLiteratura Os Autos: são composições religiosas, pastoris, nos quais se nota a
Portuguesa influência do teatro pastoril de João de Encima, dramaturgo espanhol. São
peças de temática devota e moral, alegórica, que refletem os valores do mundo
medieval.

As comédias: trazem valores greco-romanos e mitológicas, contendo relatos


romanescos como as novelas de cavalaria.

As farsas: preservam a mesma estrutura dos autos, traçando, porém, uma caricatura
contra os maus costumes, apresentando uma crítica social contundente, mordaz, carregada
de alusões pessoais. De caráter pedagógico moral, há uma longa tradição na farsa medieval
sobre o tema do adultério feminino.
RESUMINDO...
Primeira fase: 1890 a 1198-1434

A criação literária portuguesa, no primeiro período medieval (1890 a 1198-1434),


corresponde à floração trovadoresca e acontece quase simultaneamente à formação da
nação lusa. Essa produção cultural denominada também de cantigas era composta pelos
trovadores e cantada pelos jograis que percorria todo o reino em ambientes diversos. A fim
de preservar essa literatura, que era transmitida oralmente, fora fixada por escrito em
coletâneas denominadas cancioneiros.

A poesia trovadoresca é dividida em dois tipos: lírico-amorosa compreendendo às


Cantigas de Amigo, associadas ao canto e à dança, impregnadas do realismo da vida
campesina, da sensualidade, queixume, euforia, amor popular e amor burguês; e as Cantigas
de Amor de origem provençal, marcadas pela vassalagem amorosa, impregnadas pelo
idealismo, a “coita” de amor e idealização da mulher. O outro tipo é a satírica subdivida em
escárnio, maldizer, seguir e tenção de briga. Os principais trovadores desse período foram
Paio Soares de Taveirós D. Dinis, Martim Codax, Aires Nunes e João Garcia de Guilhade.
Além poesia a época trovadoresca se caracteriza também pelo aparecimento da prosa
medieval: novelas de cavalaria, retratando um heroísmo de influência religiosa e feudal,
biografias, crônicas e livros de linhagem.

Segunda fase: 1434-1527

Período conhecido também como Humanismo, vai desde a nomeação de Fernão


Lopes como cronista-mor da Torre do Tombo, em 1434, até o retorno de Francisco Sá de
Miranda da Itália, quando introduziu uma nova estética, o Classicismo, em 1527. Teve como
principais características a divulgação dos mestres da Antiguidade greco-latina, o incentivo
às Universidades, a laicização da cultura e o Culto do Homem.

A prosa, no humanismo português, consistiu, principalmente, na crônica histórica e


teve como principal expoente Fernão Lopes um cronista realista de técnica literária da
narrativa, um criador de perfis psicológicos que tratou o povo como agente da história.
Destacaram-se, também, Gomes Eanes de Zurara e Rui de Pina. Outro tipo de prosa

26
inaugurado pelo regime absolutista da dinastia de Avis foi a prosa doutrinária, direcionada
para a educação da realeza e da fidalguia, com o sentido de orientá-la no convívio social e
no adestramento físico.

Além da prosa tivemos a poesia palaciana recolhidas por Garcia de Resende no


Cancioneiro Geral. São poesias já dissociadas de música, elaboradas para serem lidas e
recitadas nas cortes. Surge também o Teatro popular de Gil Vicente produção literária
caracterizada pela sátira à sociedade portuguesa e a visão religiosa medieval moralizadora.

Classicismo
O Renascimento e a Lírica Camoniana

Considerado o marco inicial da era moderna, o Renascimento é o mais importante


movimento de renovação cultural ocorrido na Europa durante os séculos XV e XVI. O
crescimento gradativo da burguesia comercial e das atividades econômicas entre as cidades
européias estimulou a vida urbana e o surgimento de um novo homem cujo reconhecimento
de seu valor contribuiu para o enriquecimento do ambiente cultural, resultando na formação
de um novo clima intelectual otimista e confiante na força do ser humano – que se torna o
centro do universo (antropocentrismo), manifestado pela ruptura com a tradição feudal
que era marcadamente religiosa e teocêntrica.

A visão humanista é o primeiro impulso para o surgimento do Classicismo. Esse


movimento literário surge em Portugal, em 1527. E, como resultado da mudança que o
homem tinha de si mesmo – sendo, portanto, uma continuação do Humanismo – são
traduzidas e difundidas numerosas obras gregas e latinas, de assunto literário, filosófico e
científico, com o objetivo de reviver os ideais da Antigüidade Clássica, influenciando assim,
as artes, a cultura e a literatura.

Essa retomada à Antiguidade clássica influi diretamente na linguagem, na forma e


nos temas. A linguagem clássico-renascentista é a própria expressão das idéias e dos
sentimentos do homem do século XVI, sendo usada com clareza e objetividade, é sóbria,
simples e precisa. A valorização da forma está expressa na preferência pelo soneto, com
versos decassílabos distribuídos em duas quadras e três tercetos. Nesses versos é usada
a chamada medida nova em oposição à redondilha medieval, chamada de medida velha.
Nos temas, presenciamos o uso da mitologia, do amor platônico, da exaltação das
faculdades humanas (o herói nacional), do nacionalismo, do culto à beleza e da perfeição.

Temos, então, algumas características que individualizam o Classicismo:

 Humanismo
 Valorização da antiguidade
 Contenção lírica
 Locus Amoenus
 Carpe Diem
 Verossimilhança
 Ausência de Conflitos

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VOCÊ SABIA QUE...

Entre os séculos XV e XVI, Portugal é um dos países


Estudo mais importantes da Europa?
daLiteratura
Portuguesa
Portugal é, então, um dos países mais importantes da Europa e se
encontra mergulhado no espírito aventureiro das viagens marítimas e dos descobrimentos.
O espírito renascentista pode ser entendido como oposto ao que orientou o mundo medieval.
O antropocentrismo toma o lugar do teocentrismo e o homem passa a valorizar o
conhecimento, a filosofia e se volta para a razão.

Em Portugal, Luís de Camões é o homem-síntese, a expressão


do Renascimento. Camões inaugurou, em se tratando de linguagem
poética, o Classicismo em terras Lusas. Considerado o poeta máximo
da língua portuguesa, tem sua obra dividida em duas fases, a Lírica e
a Épica. A épica tem n’Os Lusíadas a sua mais importante obra
classicista. A Lírica é representada pelos sonetos, mas também
contribuiu com canções e redondilhas. E, no gênero Dramático,
escreveu Anfitriões, Filodemo e El rei Seleuco. Suas obras se situam
entre o Classicismo e o Maneirismo.

Platão, Petrarca, Horácio, Virgílio entre outros do clássico grego e romano, assim
como todo o Renascimento, pulsam na poesia de Camões, mas, dentre todas as influências
recebidas, Platão é considerado a principal, pois foi nas passagens da doutrina Platoniana
que Camões soube ver uma forma de investigar as relações da palavra com seu referente,
fazendo dele um exímio “manipulador” das mesmas.

[...]
Que alma é tábua rasa
Que com escrita doutrina
Celeste tanto imagina.
Que voa da própria casa
E sove a pátria divina [...]

Os sonetos contêm um grande lirismo. A preocupação técnica impressiona o mais


parnasiano dos poetas, a mais comum das rimas de Camões possui os 14 versos em
decassílabo, distribuídos em 2 quartetos e 2 tercetos, de rima abba-abba-cde-cde. É de
clara descrição do ambiente, percebendo-se a presença de elementos pagãos e católicos.
Os temas giram em torno do amor, abordado principalmente através da antítese amor
platônico x amor carnal; da busca da perfeição; do desconcerto do mundo; da pátria; de
Deus; da figura feminina, na figura idealizada da mulher x beleza física; e da visão da natureza.

Infelizmente, dizem alguns estudiosos, que alguns sonetos que a ele são atribuídos,
não são realmente de sua autoria, como por exemplo, um dos mais lidos e apreciados por
seu lirismo de beleza universal:

Amor é fogo que arde sem se ver;


É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer; [...]

28
RESUMINDO...

O novo estilo de época que caracteriza o Renascimento é denominado de Classicismo


e, em Portugal, é marcado pela convivência do feudalismo com o mercantilismo, pelas
grandes descobertas e por importantes transformações culturais. As principais
características do movimento foram a imitação dos clássicos gregos e latinos, o racionalismo,
o antropocentrismo e o neoplatonismo.

Os autores de destaque foram Sá de Miranda, introdutor do movimento; Bernardim


Ribeiro poeta e novelista; Antônio Ferreira que, além de poeta, era também dramaturgo, e
Luís Vaz de Camões escritor mais representativo do Renascimento sendo também o
prenunciador do Barroco. Além de poeta Camões era dramaturgo e cabe-lhe no que
concerne a linguagem poética a inauguração do movimento em terras Lusas. Considerado
o poeta máximo da língua portuguesa, tem sua obra dividida em duas fases, a Lírica e a
Épica.

No século XVI comparece, também, a prosa historiográfica tendo como principal


representante João de Barros, cuja concepção de história caracteriza-se pela preocupação
de contribuir com o exemplo moral e superior dos heróis para a elevação dos espíritos.
Outros historiadores desse período foram Gaspar Correia, Fernão Lopes de Castanheda,
Damião de Góis e outros. A Novela de Cavalaria se nacionaliza com João de Barros que
traz como herói nessas narrativas os portugueses.

Barroco
Dois fatos importantes ocorridos em 1580, quando se inicia
o Barroco em Portugal, marcam a vida cultural e política do país, a
morte de Camões e a de D. Sebastião na batalha de Alcácer-
Quibir na África. Com o desaparecimento do rei, o trono português
é passado para Felipe II, da Espanha, sendo Portugal anexado à
Espanha e permanecendo sob seu domínio durante 60 anos.

Desse modo, o Barroco acontece em meio a uma crise de identidade do povo


português, que sob o julgo espanhol esforça-se em preservar sua cultura e sua língua, todavia
percebe a impossibilidade de ignorar as influências culturais espanholas. Ao mesmo tempo
em que recebe forte influência da Contra-Reforma, de grande penetração nos países ibéricos.

Segundo Massaud Moisés 1,o movimento Barroco – iniciado em Espanha e


introduzido em Portugal durante o reinado filipino – “é de instável contorno por corresponder
a uma profunda transformação cultural, cujas raízes constituem ainda objeto de polêmica.”
Se tomarmos como base o aspecto literário, percebemos traços do Barroco já no
Renascimento, no chamado Maneirismo.

O Barroco, no entender de alguns estudiosos, tornou-se a arte da Contra-Reforma, a


qual teria absorvido a estética barroca fazendo dela uma espécie de estratégia de
catequese, mesmo porque nesse período o ensino fica quase por completo a cargo dos
jesuítas. A censura eclesiástica, nesse sentido representou um obstáculo a qualquer avanço
no campo científico cultural, por conta disso enquanto a Europa vivia um período de
efervescência cultural a Península Ibérica permanecia um reduto da cultura medieval.

1
MOISES, Massaud. A literatura portuguesa, 3a edição, São Paulo: Cultrix, 1990.

29
A estética barroca procurava sintetizar a visão de mundo medieval de
base teocêntrica e a ideologia clássica renascentista, pagã, terrena e
antropocêntrica. Era a tentativa de conciliar elementos opostos como o claro
Estudo
e o escuro, a matéria e o espírito, a luz e a sombra visando anular pela
da Literatura unificação a dualidade do ser humano, dividido entre os apelos do corpo e os
Portuguesa da alma. A arte assume, assim, uma tendência sensorial ligada ao mundo
físico, ao mundo das percepções dando preferência às figuras de linguagem,
a um vocabulário rebuscado e aos jogos sonoros.

Como vimos, a dicotomia barroca servia como representante das confusões no


espírito do homem da época. Esse embate entre os dois pólos radica no problema do
conhecimento da realidade, que nessa perspectiva se faria de dois modos.

 No primeiro modo, o conhecimento se faria pela descrição dos objetos, num


estado de verdadeiro delírio cromático, em que se procurava saber o como das coisas.
Conhecer seria descrever. Essa tendência recebe o nome de Gongorismo, por conta da
influência do poeta espanhol Luís de Gôngora e seus adeptos, procuravam cultivar uma
linguagem rebuscada, especiosa e rica e, para alcançá-la consideravam de bom tom o
emprego de neologismos, hipérbatos, trocadilhos, dubiedades e todas as demais figuras
de sintaxe que tornam o estilo pesado, tortuoso e alambicado. Expressão em forma de
poesia.

 No segundo modo, o conhecimento se faria pela análise dos objetos no sentido


de lhes conhecer a essência, ou melhor, saber o que são, conceituá-los, para tanto, utilizam-
se da inteligência e da razão sem prejuízo dos sentidos. Corrente denominada de
conceptismo, expressa, sobretudo, em prosa, tinha como um dos principais representantes
o espanhol Quevedo, do qual deriva o termo Quevedismo.

Não devemos pensar com isto que tais correntes jamais se cruzaram, mesmo porque
é comum encontrarmos numa mesma escritura traços tanto do Gongorismo como do
Conceptismo. Ambos obedecem a uma concepção pragmática de arte: o primeiro,
enaltecendo as sinestesias, procura criar um clima de brincadeira verbal com o objetivo de
entreter; o Gongorismo não raras vezes se propõe como espetáculo para o gozo dos sentidos,
no qual se confundem poesia e prazer lúdico.

Não podemos esquecer que o Barroco começou nas artes plásticas, sendo essa
época uma das mais importantes para as artes plásticas, embora não o seja para Portugal,
onde poucas vezes alcançaram maior nível, relativamente ao resto da Europa, incluindo a
Espanha aonde a arte barroca atingiu graus de primeira grandeza. Para Portugal esta
literatura não apresentou o brilho do século anterior. Faltou à época uma “atmosfera” comum,
pois os intelectuais eram guiados por clichês ou padrões estéticos de alambicamento e de
forçado sentido literário. Falta à época a conexão entre os homens, apenas aproximados
por coincidência.

Alguns representantes do Barroco

VOCÊ SABIA QUE...

Padre Antônio Vieira também é estudado na Literatura Brasileira?

30
Padre Antônio Vieira

O padre Antônio Vieira grande expressão do Barroco português e


brasileiro era assistido por grande dinamismo e boa oratória. Pensou muita
das questões candentes em seu tempo e procurou agir praticamente para
lhes dá um rumo compatível com aquilo que julgava correto numa linha mental
e política. Para o autor, o ato de pregar tinha como fim último a reafirmação
dos dogmas da igreja, da redenção humana e da autoridade absoluta do
papa. Tendo sempre objetivos morais, Vieira procura convencer para ensinar,
orientar, excitando os fiéis no entendimento das mensagens evangélicas
que pretende transmitir.

Os sermões de Padre Antônio Vieira seguem a estrutura clássica que compreende


intróito (ou exórdio), em que o orador declara o plano a utilizar na análise do tema em pauta;
desenvolvimento (ou argumento), em que apresenta o sermão propriamente dito; e a
peroração em que finaliza conclamando os ouvintes a seguirem prática das virtudes
propostas. Para Vieira os valores constituintes de um perfeito orador são três: ensinar,
deleitar e mover. Diante disso, pregar é agir, falar não é apenas falar, e sim pensar e fazer.

Escreveu além de mais de quinhentas cartas, algumas delas em torno de importantes


questões da época, obras de profecia, mas é por seus sermões que Vieira é mais conhecido.
De contorno dilemático, contraditório, feito de antíteses e oposições, instável como o próprio
ondular das idéias no esforço de orientar e persuadir, os sermões vieirianos correspondem
à preocupação de anular a dicotomia radical existente no ser humano formado que é de
corpo e alma. A característica comum às produções de Vieira é a união do tema religioso à
questão política, ofensivo, atacava tanto a inquisição portuguesa na perseguição aos judeus,
quanto à escravidão que se imprimia à vida do indígena.

Barroco, conceptista e não gongórico, o padre Vieira parte sempre de um fato real,
observado ou de flagrante presença para, de pronto, persuadir o ouvinte, chamando-o ao
dever de pensar e de reagir. Para ele, o sermão não era apenas pensamento e palavra, era
necessário pregar com gesto e voz. Voz forte, na tentativa de tirar o homem do tempo presente
e projetá-lo para o futuro eterno.

Sóror Mariana Alcoforado

Sóror Mariana Alcoforado nasceu em Beja, onde professa cedo no


Convento de Nossa Senhora da conceição. Em 1663 conhece Chamilly,
oficial francês servindo em Portugal durante as guerras da Restauração.
Enamoram-se. Um dia, porém, o militar regressa à França impelido por
chamado superior, teriam trocado cartas, das quais só ficaram as escritas
pela religiosa. Em 1969 publicam-se em Paris, pela primeira vez, as Lettres
portugaises traduites em français. Naquele mesmo ano sai uma nova
edição em Colônia e daí para frente foram lidas e traduzidas em várias
línguas, sempre com progressivo interesse.

Embora existam muitas dúvidas acerca da autoria e da originalidade da mesma é


inegável a importância destas cartas para a literatura portuguesa. Perpassa-as um sopro
de paixão incontrolada, insana, superior às inibições e convenções e ao impulso da vontade
e da consciência moral. Paixão e não amor, pois o sentimento expresso contém na raiz um

31
avassalador ímpeto carnal, explicável, inclusive, pelo quadro barroco em que
o caso amoroso se desenrola. As cartas ganham maior relevo ainda como
documento literário precisamente por não visarem a publicação nem a serem
Estudo
encaradas como peça literária.
daLiteratura
Portuguesa Dispostas da forma como se apresentam, as cartas descrevem uma
curva cujo ápice é marcado pela terceira carta na qual o sofrimento atinge o
limite máximo, graças à concentração de efeitos e sensações, apoiada numa linguagem
precisa, concisa, ao mesmo tempo em que suficientemente plástica para apreender o zigue-
zague da paradoxal confissão.

Outros autores barrocos

No Barroco português, a prosa foi mais explorada. Tivemos além de Vieira, Padre
Manuel Bernardes, cuja produção é marcada pela clausura. O autor procura mostrar em
seus textos que a relação com Deus é possível pelo culto das virtudes morais. D. Francisco
Manuel de Melo produziu uma obra variada e numerosa que compreende poesia,
historiografia, teatro polêmica, biografia e literatura moralista. Francisco Xavier de Oliveira
(o Cavaleiro de Oliveira, como ele assinava) escreveu obras de observação e com propósitos
definidos: realizar conquistas amorosas, defender-se dos ataques que lhe eram dirigidos e
satirizar os costumes da época. O teatro foi representado por Antonio José da Silva, que
transforma a dramaturgia portuguesa. Escreveu suas peças em prosa utilizando-se de
aspectos da sociedade de Lisboa para satirizar através do riso.

A poesia barroca

A poesia barroca portuguesa seguiu caminho diferente do


da literatura doutrinária e moralista. Era poesia para entreter, valia
pelo aspecto lúdico, pelo divertimento verbal, expresso no
malabarismo das imagens e das correlações sintáticas. Em síntese
correspondia mais ao culto da forma, do verso, que do conteúdo.
Apresenta-se em figuras isoladas e em antologias organizadas

!
com o mesmo intuito das compilações dos cancioneiros
medievais. Sobressaem D. Francisco Manuel de Melo e Francisco
Rodrigues Lobo, Gabriel Pereira de Castro, Vasco Mouzinho de
Quevedo e Antônio de Souza de Macedo.
Indicação de Filme
TÍTULO DO FILME: A MISSÃO (The Mission, ING, 1986)

DIREÇÃO: Roland Joffé


ELENCO: Robert de Niro, Jeremy Irons, Lian Neeson, 121 min.,
Flashstar

Ao longo dos séculos XVI e XVII várias missões católicas foram criadas
pelos jesuítas na América do Sul. Surgidas no século XIII, com as ordens
mendicantes, esse trabalho de evangelização e catequese, desenvolveu-
se principalmente nos séculos XV e XVI, no contexto da expansão marítima
européia. Embora o objetivo fosse a difusão da fé e a conversão dos
nativos, as missões acabaram como mais um instrumento do colonialismo.

32
RESUMINDO...
O início do Barroco em Portugal é marcado por dois fatos importantes que modificam
a vida cultural e política do país, a morte de Camões e a de D. Sebastião na batalha de
Alcácer-Quibir na África. Este último evento acarreta a incorporação de Portugal ao domínio
espanhol, sob o qual permanece durante 60 anos. Desse modo, o Barroco acontece em
meio ao fracasso econômico, estagnação cultural, recrudescimento da inquisição,
Sebastianismo e patriotismo, além de uma crise de identidade do povo português que se
esforça em preservar sua cultura e sua língua, embora perceba a impossibilidade de ignorar
as influências culturais espanholas. Ao mesmo tempo em que recebe forte influência da
Contra-Reforma.

Podemos apontar como principais características do movimento o dualismo: razão


e emoção; o medievalismo e renascimento; o conceptismo e cultismo. O principal
representante desse movimento foi Padre Antônio Vieira que se dedicou a uma atividade
literária bastante diversificada, compreendendo sermões, cartas e obras proféticas.
Considerado o maior prosador barroco, pertence tanto à literatura portuguesa quanto à
brasileira, era conceptista e não apenas religioso, mas político e profético. É importante
salientar ainda a presença de outros escritores desse momento como D. Francisco Manuel
de Meio, os historiadores de Alcobaça, Frei Luís de Sousa, Sóror Mariana Alcoforado e
Antônio José da Silva.
Arcadismo ou Neoclassicismo
O Arcadismo ou Neoclassicismo é o período que caracteriza principalmente a
segunda metade do século XVIII e deu as artes uma nova tonalidade burguesa. Vive-se,
agora, o Século das Luzes, o Iluminismo burguês. Derivado do espírito crítico do Iluminismo,
visa um retorno renovado aos gêneros, às formas, às técnicas e às expressões clássicas,
que vingaram em Portugal no séc. XVI. O desenvolvimento das técnicas de produção
acarretou a grande evolução das ciências naturais, pois se acredita que para expandir a
produção fazia-se necessário conhecer as propriedades da matéria. Neste período, os
filósofos passam a acreditar que a razão é a única fonte de conhecimento da natureza e da
vida em sociedade. Portanto, a religião e a Igreja são vistas como instrumentos de ignorância
e tirania. Assim, cientistas e filósofos não aceitam, no plano político, o Estado absolutista
e suas instituições. São contra a constante intervenção do poder real na economia, pois
isso limitava o direito da propriedade.

O Arcadismo é a expressão, na literatura, do momento ideológico que se impõe em


meados do século XVIII representando a crítica da burguesia culta ao modo de vida da
nobreza e do clero. De espírito reformista, pretendeu reformular o ensino os hábitos e o
comportamento social em prol dos ideais da burguesia em ascensão. Se no século XVII
Portugal esteve influenciado pela cultura espanhola, no século XVIII a influência veio da
França, mas especificamente da burguesia francesa, politicamente forte e responsável pelo
desenvolvimento da economia. Sua força política se manifesta a partir de 1750, nos
constantes ataques dos filósofos burgueses aos poderes real e clerical e na denúncia da
corrupção dos costumes.

Podemos perceber que era um tempo de transformações em toda a Europa,


sobretudo na França. Mas Portugal, apesar de procurar seguir alguns dos passos dessas
transformações convive ainda com o peso de uma tradição ideológica fundamentada em
dogmas e princípios arraigados na cultura medieval, o que não significa ter o país se
ausentado por completo dessas mudanças. O século XVIII representou também para os

33
portugueses o início de um processo de modernização nos setores econômico,
político, administrativo, educacional e cultural.

Estudo
A partir do reinado de D. José (1750-1777), o ministro Marques de
da Literatura Pombal, apoiado por diversos intelectuais, em especial Pe. Antônio Verney,
Portuguesa promove uma série de medidas que coloca Portugal num clima de
efervescência cultural. Dentre as mudanças efetuadas, merece destaque a
proibição do ensino jesuítico e sua substituição por uma educação renovada e mais
progressista. Tais posturas originaram um amplo debate sobre a necessidade de renovar a
cultura portuguesa.

Em 1756, funda-se a Arcádia Lusitana por iniciativa de Antônio Dinis da Cruz, Manuel
Nicolau Esteves Negrão e Teotônio Gomes de Carvalho. Inicia-se, assim, uma nova etapa
literária empenhada em expressar o repúdio às coisas inúteis (inutilia truncat) que
adornavam a poesia barroca. Acreditando que esta representou o desequilíbrio e a
decadência dos valores clássicos, querem restabelecer a simplicidade da arte renascentista,
para tanto, recuam no tempo até à Antiguidade greco-latina em busca da mitológica Arcádia
e dos princípios norteadores da nova arte.

Características do movimento:

Empenhados em restaurar a literatura clássica e combater a arte barroca, o escritor


árcade elegeu alguns princípios orientadores de sua escrita:

 A arte devia ser regida pelo princípio da verossimilhança, devendo, portanto, ser
constituída de imaginação, mas de uma imaginação que não se chocasse com a “natureza
das coisas”, pretendia-se, assim, atrelar a imaginação à razão.
 Pregam a volta aos clássicos antigos (greco-latinos) e quinhentistas
principalmente, Camões. Parte-se do pressuposto de que a beleza absoluta foi atingida
por estes escritores, nada mais restando aos posteriores do que seguir-lhes as pegadas.
 Elogio da vida simples, sobretudo da natureza, no culto permanente das virtudes
morais, uma vida medíocre materialmente, mas rica em realizações espirituais (aurea
mediocritas).
 Fuga da cidade para o campo (fugere urbem), pois a primeira é considerada
foco de mal-estar e corrupção, o campo, por sua vez, resguarda o homem mantendo-o
natural, síntese de espontaneidade e simplicidade.
 Desprezo ao luxo, à riqueza e à ambição, que enfraquecem o homem e elogio
da vida serena, plácida pela superação dos desejos carnais.
 Idealização amorosa, neoplatonismo, convencionalismo amoroso.
 O gozo pleno da vida, minuto a minuto, (carpe diem) na contemplação da beleza
e da natureza.
 Racionalismo, a razão deve governar a emoção.

Quanto à estrutura literária ainda seguem os modelos antigos, defendem, portanto, a


separação de gêneros e a abolição da rima por considerá-la uma contrição para o
pensamento e o verso. Reivindicam também o emprego de metros simples e ressaltam a
importância da mitologia. Adotam pseudônimos pastoris para que o “fingimento” poético
seja maior e imaginam-se vivendo num mundo habitado por deuses e ninfas, numa Natureza
e num tempo fictícios, utópicos. Deve-se salientar que as características da estética arcádica
dizem respeito exclusivamente à poesia, pois embora se cultivasse a prosa, esta não

34
obedecia às regras rigorosas do arcadismo. Sendo um movimento de oposição aos exageros
do Barroco, buscava-se, ainda, a clareza absoluta, o equilíbrio e a simplicidade formal e de
conteúdo.

Representantes do movimento

Manuel Maria Barbosa du Bocage

Bocage é o pastor Elmano Sadino da Nova Arcádia, poeta que


foi consagrado pela imaginação popular como autor de piadas e
anedotas picantes. Mas, além desse anedotário acrescido pelo gosto
popular, Bocage possui vasta obra poética, legada pela tradição
literária, em duas vertentes principais, a satírica e a lírica. A veia satírica
de Bocage diferencia-se dos poetas anteriores por não ser impessoal,
nem genérica, nem zombeteira, mas extremamente contundente,
grosseira, feita de sarcasmo e ditada por um amor-próprio ferido,
incapaz de perdoar. Inúmeros aspectos sociais da época não escapam
à sua crítica mordaz, critica o poder, percebendo a estreita união
existente entre os dogmas da Igreja e o poder absolutista dos reis. Escritores, frades,
mulheres esquivas, senhores todo-poderosos, nada escapa à crítica ou maledicência de
Bocage.

Mas, é a poesia lírica de Bocage, popularmente menos conhecida, a mais comentada


pela critica literária que a considera sua produção superior. Nessas poesias revela-se a
orientação do academicismo do século XVIII como a presença do pseudônimo pastoril, da
mitologia clássica, a ânsia do locus amenus, ilustrando o fugere urbem, a produção de
sonetos. Todavia, por sua originalidade e pessoalismo, particulariza, sobretudo nos sonetos,
sua poesia, retratando nela o seu drama poético indissociável do seu drama pessoal; a sua
obra, mais do que qualquer outra, é permeada de experiências pessoais, marca-lhe a vida
com suas grandezas, misérias, esperanças e desajustes. Sentimentos desmedidos
transformam-se em matéria poética na qual perpassa a natural indisciplina do poeta, fonte
de uma permanente irritabilidade e orgulho desmedido e pressente-se a sua inconstância
amorosa exacerbada por um temperamento impulsivo e inclinado a um ciúme delirante.

Escreveu em todos os gêneros literários em voga no seu tempo - idílios, odes,


canções, epístolas, epigramas, fábulas - em todas elas, demonstrando a mesma qualidade
de estilo, perfeito na adequação e no apuro do vocabulário, na fluência da dicção e na
sedução melódica, mas nos sonetos surgem composições de tipos completamente
diferentes: eróticos, morais e devotos, heróicos joviais, libertinos e satíricos e ainda filosóficos.
Apesar de ser fortemente influenciado pelo estilo dominante em sua época é comum
encontrar na poesia de Bocage, principalmente nos poemas escritos depois de sua prisão,
uma luta constante entre a razão iluminista e a emoção. Nessa luta dolorosa e angustiante a
emoção sobrepuja a razão, nas suas composições combina elementos neoclássicos com
o gosto pelo pré-romantismo como a solidão, o sofrimento, o amor-ciúme, a morte. Essas
transgressões fazem de Bocage um poeta de transição entre o Neoclassicismo e o
Romantismo, sua poesia anuncia os primeiros valores do Romantismo em Portugal, sendo
o poeta, portanto, considerado por vários estudiosos como um poeta pré-romântico.

35
Outros autores

Além de Bocage, outros autores participaram do movimento árcade,


Estudo
como Antônio Dinis da Cruz e Silva, Padre Antônio Correia Garção, Domingos
da Literatura dos Reis Quita pertencentes à Arcádia Lusitana; Domingos Caldas Barbosa
Portuguesa e padre José Agostinho de Macedo que faziam parte da Nova Arcádia. Alguns
poetas, porém, renegaram a Arcádia ou fundaram grupos para combatê-la,
como Filinto Elísio pseudônimo do padre Francisco Manuel do Nascimento, que pretendia
renovar a linguagem literária, pré-romântico pelo tom confessional de alguns poemas, exerceu
influência em muitos escritores do romantismo, inclusive Garrett e poetas brasileiros. Um
outro escritor que não participou de nenhuma academia foi Nicolau Tolentino de Almeida,
grande representante da crítica aos costumes sua obra é constituída de sátiras e de
homenagens aos poderosos dos quais dependia, o curioso é que essas sátiras criticavam
exatamente os poetas que viviam da mendicância de favores.
RESUMINDO...
O Arcadismo ou Neoclassicismo caracteriza a segunda metade do século XVIII e
deu às artes uma nova tonalidade burguesa. Vive-se, agora, o Iluminismo burguês e visa-se
um retorno renovado aos gêneros, às formas, às técnicas e à expressão clássicas. De
espírito reformista, pretendeu reformular o ensino os hábitos e o comportamento social em
prol dos ideais da burguesia em ascensão no país. Mas, embora Portugal tenha procurado
seguir alguns dos passos das transformações em voga, convive, ainda, com o peso de uma
tradição ideológica fundamentada em dogmas e princípios da cultura medieval. Apesar
disso, esse século representou para os portugueses o início de um processo de
modernização nos setores econômico, político (Despotismo Esclarecido), administrativo,
educacional e cultural. Surgimento das Academias de Ciências e as Academias Literárias.

O Arcadismo é a expressão, na literatura, desse momento ideológico representando


a crítica da burguesia culta ao modo de vida da nobreza e do clero e teve como características
o racionalismo, o princípio da verossimilhança, a imitação dos clássicos, o ideal de vida
pastoril (locus amenus) e a oposição ao Barroco: inutilia truncat. Principais autores: Nicolau
Tolentino de Almeida - poeta satírico; Manuel Maria Barbosa du Bocage - poeta satírico e
lírico considerado árcade e pré-romântico e Filinto Elísio que renovou linguagem literária
em Portugal.

36
Atividades
Complementares
O amor e a razão

Pinta-se o amor sempre menino, porque ainda que passe dos sete
anos [...] nunca chega à idade de uso da razão. Usar de razão e amar são
duas coisas que não se juntam. A alma de um menino que vem a ser?
Uma vontade com afetos e um entendimento sem uso. Tal é o amor vulgar.
Tudo conquista o amor, quando conquista uma alma; porém o primeiro
rendido é o entendimento. Ninguém teve a vontade febricitante, que não
tivesse o entendimento frenético. O amor deixará de variar, se for firme,
mas não deixará de tresvariar, se é amor. Nunca o fogo abrasou a vontade,
que o fumo não cegasse o entendimento. Nunca houve enfermidade no
coração, que não houvesse fraqueza no juízo.

1.
(Pe. Antônio Vieira, Sermão do Mandato, In Sermões)

O jogo de oposição de idéias é típico do Barroco. Justifique essa afirmativa com


base no texto acima.

2. A razão e o amor sempre foram discutidos pelos poetas e escritores. Veja um soneto
de Camões com o mesmo tema do texto anterior e, a partir do que foi estudado, identifique
as características próprias do estilo de época:

Sempre a Razão vencida foi de Amor,


mas, porque assim o pedia o coração,
quis Amor ser vencido da Razão.
Ora que caso pode haver maior!
Novo modo de morte, e nova dor!
Estranheza de grande admiração,
que perde suas forças a afeição,
por que não perca a pena o seu rigor.
Pois nunca houve fraqueza no querer,
mas antes muito mais se esforça assim
um contrário com outro por vencer.
Mas a Razão, que a luta vence, enfim,
não creio que é razão, mas há de ser
inclinação que eu tenho contra mim.”
Luís de Camões, In rimas
37
3. Ao analisar o texto, é possível dizer que ele revela traços em comum
com os cantares trovadorescos. Nesse caso, faça o que se pede:
Estudo
daLiteratura Abandonada por você
Portuguesa Apaixonada por você
Eu vejo o vento te levar
Mas tenho estrelas pra sonhar
E ainda te espero todo o dia
(In Fafá: Pássaro sonhador.)

a) A que tipo de composição medieval relaciona-se o texto?

b) Justifique sua resposta.

Texto para as questões 4 e 5


Oh! Maldito o primeiro que, no mundo,
Nas ondas vela pôs em seco lenho!
Digno da eterna pena do Profundo,
Se é justa a justa Lei que sigo e tenho!
Nunca juízo algum, alto e profundo,
Nem cítara sonora ou vivo engenho,
Te dê por isso fama nem memória,
Mas contigo se acabe o nome e a glória.

4.
(Camões, Os Lusíadas)

Considerando este trecho da fala do velho do Restelo no contexto da obra a que


pertence, explique os dois primeiros versos, esclarecendo o motivo da maldição que, neles,
é lançada.

38
5. Nos quatro últimos versos, está implicada uma determinada concepção da função
da arte. Identifique essa concepção, explicando-a brevemente.

DO ROMANTISMO À LITERATURA
CONTEMPORÂNEA
DO ROMANTISMO AO SIMBOLISMO: PERÍODO DE GRANDES
TRANSFORMAÇÕES LITERÁRIAS
Romantismo: Contexto Histórico e 1ª Geração
O Romantismo corresponde não só a uma revolução literária, mas
designa, também, uma tendência geral de vida e de arte. Com esse
movimento, abre-se um ciclo de cultura novo, correspondente à
diminuição do poder das oligarquias reinantes em prol das monarquias
constitucionais ou das repúblicas federadas, e ao aparecimento do
Liberalismo em política, moral, arte etc. O comportamento romântico
caracteriza-se por uma atitude emotiva e subjetiva diante do mundo no
qual o sujeito está imerso.

O romântico idealiza um universo melhor, defendendo a idéia da expressão do eu-


lírico, no qual prevalece o tom melancólico e nostálgico. Enfim, o ideal romântico tenta
colocar o universo presenciado de forma subjetiva. Nesse sentido, a expressão do
sentimento não precisa obedecer a nenhuma regra, antes adorada pelos clássicos. O
movimento romântico recusa a cosmovisão racionalista e a estética neoclássica a ela ligada.

Contexto Histórico

O Romantismo é proveniente de dois acontecimentos marcantes


na segunda metade do século XVIII na história européia: a Revolução
Francesa e a Revolução Industrial, responsáveis pela abolição das
monarquias aristocratas e pela introdução da burguesia que, então,
dominava a vida política, econômica e social da época.

39

REFLITA

Como as novas ideologias políticas, econômicas e


Estudo sociais intervêm em todos os campos da sociedade do
daLiteratura século XIII, instaurando novos modos de expressão artística
Portuguesa e cultural?

Em Portugal, inicia-se, com as mudanças econômicas


ocorridas no Brasil a partir de 1807 provenientes da chegada da corte
de D. João VI, uma nova fase moderna da vida econômica e social.
Ainda com a família real fora de casa arrebenta em 1820, no Porto,
uma revolução em defesa da implantação do liberalismo no país a
qual com o auxílio de Lisboa e do resto do país saiu vitoriosa.

O rei D. João VI, que havia se refugiado no Brasil, então regressa. Todavia os
problemas em Portugal não terminam aí, a luta pelo trono português continua com veemência
gerando conturbação e desordem interna na nação. De um lado, D. João VI, representante
do liberalismo; de outro, D. Miguel, seu irmão absolutista. Depois da morte de D. João VI os
absolutistas apoderam-se do poder e iniciam uma perseguição aos liberais, levando muitos
deles a exilar-se em Inglaterra e França.

Diante de tantas turbulências, o processo de instauração do movimento romântico


no país foi lento e incerto. Enquanto o realismo tomava forma no horizonte parisiense, o
romantismo português procurava ainda afirmar-se. Alguns autores chegam a assegurar que
esta afirmação só houve como uma cultura de importação, pela via indireta dos exílios a
que se sujeitaram Almeida Garrett e Alexandre Herculano. Almeida Garrett acaba por exilar-
se na Inglaterra, onde entra em contato com a Obra de Lord Byron e Scott. Ao mesmo
tempo, por estar presenciando o Romantismo inglês, envolve-se com o teatro de William
Shakespeare. Em 1825, Garrett publica o poema Camões, que passa a ser considerado o
ponto de partida para a fixação da cronologia do romantismo português, que durou cerca
de 40 anos terminando por volta de 1865 com a Questão Coimbrã ou Questão do Bom
Senso e do Bom Gosto, encabeçada por Antero de Quental.

Características
O Romantismo foi uma forma de repúdio às regras que contornavam e preenchiam o
campo literário da época – o classicismo. Opondo-se às regras e modelos, os românticos
buscavam a total liberdade de criação, além de defender a mistura dos gêneros literários.
Com o domínio burguês, ocorre a profissionalização do escritor, que recebe uma remuneração
para produzir a obra, enquanto o público paga para consumi-la. Dentre as características
do movimento destacam-se pela recorrência nas obras do período:

 Subjetivismo, sentimentalismo, egocentrismo escapismo: O escritor


romântico trata os assuntos de uma forma pessoal, de acordo com o que sente, aproximando-
se da fantasia. Exaltam-se os sentidos, e tudo o que é provocado pelo impulso é permitido.
Cultua-se o “eu” interior, numa atitude narcisista, em que o individualismo prevalece. O escritor
romântico projetava-se para dentro de si, tendo como fonte o eu-lírico, numa espécie de
escapismo por não aceitar a realidade que o cerca.
 Idealização e culto ao fantástico: motivado pela fantasia e pela imaginação,
o artista romântico passa a idealizar tudo; as coisas não são vistas como realmente são,
mas como deveriam ser, segundo uma ótica pessoal. A natureza e a mulher são importantes

40
pontos desse momento, o homem idealizava a mulher como uma deusa, algo divino. Recorria
também à presença do mistério, do sobrenatural, representando o sonho, a imaginação;
frutos da pura fantasia, que não carecem de fundamentação lógica, do uso da razão.
 Liberdade de criação: O escritor romântico recusa formas poéticas, usa o verso
livre e branco, libertando-se dos modelos greco-latinos, tão valorizados pelos clássicos, e
aproximando-se da linguagem coloquial. O homem deve realizar-se na criatividade e na
sensibilidade. A inspiração instantânea, a centelha intuitiva é o verdadeiro guia do escritor
romântico. A métrica, a rima, não podem ser empecilhos para a explosão sentimental do
poeta. A sua criação é fruto da pura espontaneidade. Não pode nem deve ser retocada,
torneada e acabada por critérios artesanais.
 Medievalismo: Há um grande interesse dos românticos pelas origens de seu
país, de seu povo. Na Europa, retornam à Idade Média e cultuam seus valores, por ser uma
época obscura.
 Nativismo: Fascinação pela natureza. Muitas vezes, o nacionalismo romântico
é exaltado através da natureza, da força da paisagem. Pode-se falar, também, em um
interesse romântico pelo exotismo e pelo indianismo, pois, estando no encalço do homem
em estado “natural”, o romântico se põe a procurá-lo em outras regiões que se distinguiam
pela presença dos denominados “selvagem” ou “indígena” pela diferença acentuada de seu
modo de “bárbaro” e “bizarro” em relação aos padrões europeus e ocidentais.
 Luta entre o liberalismo e o absolutismo: Poder do povo X poder da
monarquia. Até na escolha do herói, o romântico dificilmente optava por um nobre.
Geralmente, adotava heróis grandiosos, muitas vezes personagens históricos, que foram
de algum modo infelizes: vida trágica, amantes recusados, patriotas exilados.
 Religiosidade: Como uma reação ao Racionalismo materialista dos clássicos,
a vida espiritual e a crença em Deus são enfocadas como pontos de apoio ou válvulas de
escape diante das frustrações do mundo real. Os românticos almejavam a reabilitação do
cristianismo praticado na Idade Média.
 Nacionalismo: Também chamada de patriotismo é a exaltação da Pátria, de
forma exagerada, em que somente as qualidades são enaltecidas.
 Pessimismo: O artista vê-se diante da impossibilidade de realizar o sonho do
“eu” e, desse modo, cai em profunda tristeza, angústia, solidão, inquietação, desespero,
frustração. O romântico era pessimista também em relação à sociedade e à civilização.
Não acredita nem em uma nem em outra, pregava a idéia de uma natureza humana primitiva,
que, no entanto, vai sendo corrompida pela cultura. Sentem-se criaturas infelizes e
desajustadas, que não conseguem enquadrar-se no contexto social e que tampouco querem
fazê-lo porque a sociedade só iria cindi-las ainda mais. Decorem disso o sentimento de
inadequação social, a aflição e a dor que induz o sujeito à busca de evasão da realidade
por meio de fugas ou, mesmo, suicídios.

A vitória das idéias românticas em Portugal não foi rápida nem do mesmo modo
durante todo o período que compreende o movimento. Desse modo, podemos falar em três
momentos diferenciados tanto no que concerne às idéias preponderantes como aos autores
que se destacaram.

Primeira Geração

Atuante a partir de 1825 é ainda bastante ligado ao Classicismo, mas muito contribuiu
para a consolidação do liberalismo em Portugal. Os ideais românticos dessa geração estão
embasados na pureza e originalidade, no nacionalismo, historicismo e medievalismo. Como
toda tendência nova, o Romantismo não veio implantar-se totalmente nos primeiros

41
momentos em Portugal. Inicialmente, buscava-se, gradativamente, apagar os
modelos clássicos que ainda permeavam o meio sócio-econômico. Os
escritores dessa época eram românticos em espírito, ideal e ação política e
Estudo
literária, mas ainda clássicos em muitos aspectos.
daLiteratura
Portuguesa Alexandre Herculano

Alexandre Herculano de Carvalho e Araújo (1810-1877) foi um dos


líderes do Romantismo português. Em decorrência da situação política
em Portugal é obrigado a exilar-se na França, onde aprimora os estudos.
Em 1833, tornou-se segundo-bibliotecário na Biblioteca Municipal do
Porto, mas demitiu-se três anos depois por discordar dos políticos
dominantes. Em 1839, foi nomeado bibliotecário na Biblioteca Real da
Ajuda. Editor de revista no meio tempo, Herculano escreveu poesia, prosa
e ensaios. Foi na prosa que se destacou, principalmente com Eurico, o
Presbítero. Escreveu também muitos contos. Ficou conhecido por suas
narrativas históricas e tornou-se um intelectual atuante nos programas de
reformas da vida portuguesa.

Na ficção de Herculano, prevalece o caráter histórico dos enredos, voltados para a


Idade Média, enfocando as origens de Portugal como nação. Além disso, ocorrem muitos
temas de caráter religioso. Quanto à sua obra não-ficcional, os críticos consideram que
renovou a historiografia, uma vez que se baseia não mais em ações individuais, mas no
conflito de classes sociais para explicar a dinâmica da história.

Almeida Garrett

João Batista da Silva Leitão de Almeida Garrett (1799-1854) foi


o introdutor do Romantismo em Portugal. Garrett foi educado nos Açores,
já que sua família fugiu para lá pela ocasião da invasão de Portugal por
Napoleão. Em 1816 voltou a Portugal para estudar em Coimbra. Cinco
anos depois se mudou para Lisboa, onde se tornou funcionário público.
Quando aconteceu a revolução de 1823, Garrett exilou-se na Inglaterra
e depois na França. Voltou a Portugal mais tarde, mas retornou à
Inglaterra pela ocasião da subida ao poder de D. Miguel.

Em 1834, após a vitória dos liberais, passou a se dedicar ao teatro. Foi embaixador,
ministro, parlamentar, jornalista, soldado (durante a luta contra o absolutista D. Miguel).
Escreveu Camões (1825) inspirando-se na epopéia Os Lusíadas. A narrativa é uma biografia
sentimental de Camões, poema considerado introdutor do Romantismo em Portugal, por
apresentar características que viriam se firmar no espírito romântico: versos decassílabos
brancos, subjetivismo, nostalgia, melancolia, e a grande combinação dos gêneros literários.

Almeida Garrett teve uma obra extensa, que contempla desde o resgate do teatro
português – com seus grandes autores como Gil Vicente – a uma renovação da poesia e
incursões na prosa. Garrett cultivou a oratória parlamentar, o pensamento pedagógico e
doutrinário, o jornalismo, a poesia, a prosa de ficção e o teatro, o qual entrou em contato
com o de Shakespeare quando em exílio na Inglaterra. Teve uma vida sentimental bastante
atribulada em que se sobressai o seu romance adúltero com a viscondessa da Luz, a qual
inspirou seus melhores poemas. Na vasta obra de Garrett encontramos, além de Camões,

42
outros poemas como Retrato de Vênus (1821), Dona Branca (1826) e Lírica de João Mínimo
(1829). Na prosa de ficção agrupam-se três obras: Viagens na minha terra, O arco de
Sant‘Ana e Helena. Em matéria de teatro produziu entre outras Um auto de Gil Vicente
(1838) O Alfageme de Santarém (1842) Frei Luís de Sousa (1843) Dona Filipa Vilhena
(1840).

Antônio Feliciano De Castilho

Antônio Feliciano de Castilho (1800-1875) perdeu a visão quase


completamente aos 6 anos. Contou com o apoio de seu irmão, Augusto
Frederico de Castilho, que o incentivou a continuar a estudar. Com muita
força de vontade conseguiu se formou em Direito na Universidade de
Coimbra. Foi também tradutor. A partir de 1842, passou a dirigir a “Revista
Universal Lisbonense”, o que lhe permitiu exercer influência sobre o meio
cultural português. Teve como principal papel traduzir poetas clássicos.

Começou sua carreira como um poeta árcade, mas já na metade de sua vida
apresentava traços românticos bem acentuados. Sempre combativo, criticava as renovações
da Literatura Portuguesa e foi o iniciador da Questão Coimbra. Algumas de suas obras:
Cartas de Eco a Narciso (1821), A Primavera (1822), Amor e Melancolia ou a Novíssima
Heloísa (1828) Tratado de Versificação Portuguesa (1851), Felicidade pela Instrução
(1854), A Chave do Enigma (1861), O Outono (1863), dentre outras.

Romantismo: A 2ª e 3ª Gerações
Segunda Geração

Também conhecido como Ultra-Romantismo, marcado pelo exagero, desequilíbrio,


sentimentalismo, acontece entre os anos 1838 e 1860. Pode-se perceber a partir desse
momento maior emoção nas obras, dando maior ênfase ao tédio, melancolia, desespero,
pessimismo, fantasia e liberdade de expressão. Neste momento, desfazem-se os enlaces
arcádicos que ainda envolviam os escritores da época. Aqui, nota-se com plena facilidade
o domínio da estética e da ideologia romântica. Os escritores tomam atitudes extremas,
transformando-se em românticos descabelados, caindo fatalmente no exagero, nos temas
soturnos e fúnebres, tudo expresso numa linguagem fácil e comunicativa. Os poetas ultra-
românicos reuniram-se em três grupos principais: o dos medievalistas, um segundo grupo
liderado por João de Lemos de Seixas e Castelo Branco, e o grupo O Novo Trovador.

Camilo Castelo Branco

Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco (1825-1890) foi um escritor


romântico e, a contragosto, um escritor realista depois (Ele muito criticou e
se opôs a esta escola.). Camilo Castelo Branco impressiona, primeiro que
tudo, pela vida aventuresca e trágica que levou. Órfão de pai e mãe casa-se
aos 16 anos com uma aldeã que abandona em seguida com uma filha. Em
1858, Ana Plácido, mulher casada, abandona o marido e vai viver com
Camilo; o marido a processa por adultério. Em 1885, Ana Plácido morre;
em 1890, deprimido pela cegueira iminente e a demência do filho, suicida-
se com um tiro na cabeça. Tendia a escrever sobre situações ridículas e
originais, novelas passionais, acontecimentos dramático e finais trágicos.

43
Produziu obras ultra-românticas e satíricas. Escreveu em colaboração
com outros autores, traduziu, editou e foi jornalista; todavia, o eixo ao redor do
qual gira toda a importância do autor é constituído pela novela passional. Autor
Estudo
de obra vastíssima, inicialmente romântica, aderiu ao realismo com A Brasileira
da Literatura de Prazins, em 1882, tendo escrito Eusébio Macário em 1879 ridicularizando
Portuguesa esta escola recém-introduzida. Sua obra mais importante é Amor de Perdição,
que foi seguida por Amor de Salvação, mas não ficou restringido a estas
obras: publicou muitas novelas – com destaque para Maria Moisés – livros de poesias e
peças de teatro.

Soares de Passos

Antônio Augusto Soares Passos (1826-1860) filho de família burguesa


estudou na Universidade de Coimbra onde fundou o jornal “O Novo Trovador”.
Nele, muitos poetas da época publicaram algo. Em 1856, Soares Passos reuniu
todas essas poesias publicadas em um livro chamado “Poesias”. Mesmo
tendo uma vida curta, é considerado um dos poetas ultra-românticos
portugueses mais importantes.

Soares de Passos constitui a encarnação mais significativa do “mal-do-século”.


Vivendo na própria carne os devaneios de que se nutria a fértil imaginação de tuberculoso,
sua vida e sua obra espelham claramente o prazer romântico do escapismo das
responsabilidades sociais da época, acabando por cair em extremo pessimismo, um incrível
desalento derrotista, cultivava em suas obras a liberdade, exaltação cívica, confiante na
vitória do homem, poesia delicada, reflexo da dor pessoal. É desse dilema, impulsionado
por angústias metafísicas e religiosas que decorre a poesia do autor. Obra: Poesias (1855).

Terceira Geração

Acontece, aqui, um tardio florescimento literário que corresponde ao terceiro momento


do Romantismo, em fusão dos remanescentes do Ultra-Romantismo. Esse período é
marcado pela presença de poetas, como João de Deus, Tomás Ribeiro, Bulhão Pato, Xavier
de Novais, Pinheiro Chagas e Júlio Dinis, que purificam até o extremo as características
românticas.

Júlio Dinis

Pseudônimo de Joaquim Guilherme Gomes Coelho, nasceu em 1839 e


faleceu em 1871. Visão detalhada do ambiente. Cultivou o romance do namoro
ambientados no campo. Os poemas de Júlio Dinis armam-se sobre uma tese
moral e teleológica, na medida em que pressupõem uma melhoria, embora
remota, para a espécie humana, frontalmente contrária à desesperação e ao
amoralismo cético dos ultra-românticos, numa linguagem coerente, lírica e de
imediata comunicabilidade.
Considerado pela crítica como pré-realista, conduz suas histórias, sempre
a um epílogo feliz, não considerando a heroína como “mulher demônio”, mas, sim, como
“mulher anjo”. Escreveu romances, sendo As Pupilas do Senhor Reitor, sua principal obra,
e também poesias e teatro.

44
João de Deus

João de Deus Ramos (1830-1896), retoma a tradição lírica


portuguesa. Foi admirado pelos realistas. Teófilo Braga foi quem reuniu
seus poemas e publicou-os sob o título Campos de Flores (1893).

Escritor apenas de poesia, lírico de incomum vibração interior, pôs-se à margem da


falsa notoriedade e dos ruídos da vida literária e manteve-se fiel até o fim a um desígnio
estético e humano que lhe transcendia a vontade e a vaidade. Contemplativo por excelência,
sua poesia é a de um “exilado” na terra a mirar coisas vagas e, por vezes, a se deixar

!
estimular concretamente. Considerado pela crítica como pré-realista, mantinha, no entanto
em algumas obras, o idealismo amoroso e a visão espiritualizada da mulher. Sua poesia
biparte-se em lírico-amorosa e satírica, o amor é o motivo permanente de sua poesia.

Indicação de Filme
TÍTULO DO FILME: Don Juan DeMarco (Don Juan DeMarco, EUA, 1995)

DIREÇÃO: Francis Ford Coppola


ELENCO: Marlon Brando; Johnny Depp; Faye Dunaway

A melhor parte do amor é perder todo senso de realidade. Don Juan é um


personagem literário que se converte em mito. Don Juan visa o poder em
suas relações amorosas: sacrificar as mulheres à sua glória, pela glória
dominar os homens, e sua dominação se exerce de forma teatral.

RESUMINDO...

1. A introdução do Romantismo

O movimento romântico aparece vinculado a dois acontecimentos importantes da


segunda metade do século XVIII europeu: a Revolução Francesa e a Revolução Industrial,
responsáveis pela abolição das monarquias aristocratas e pela introdução da burguesia
que então dominava a vida política, econômica e social da época. As novas ideologias
políticas, econômicas e sociais, intervêm em todos os campos da sociedade que instaura
novos modos de expressão artística e cultural. Os autores desse movimento enfatizavam o
subjetivismo, o sentimentalismo, o egocentrismo e escapismo, a idealização e culto ao
fantástico, a liberdade de criação, o medievalismo, o nativismo, a religiosidade, o
nacionalismo e o pessimismo.
Em Portugal inicia-se, com as mudanças econômicas ocorridas no Brasil a partir de
1807 provenientes da chegada da corte de D. João VI, uma nova fase moderna da vida
econômica e social. Ainda com a família real fora de casa, arrebenta em 1820, no Porto,
uma revolução em defesa da implantação do liberalismo no país. Diante de tantas turbulências
o processo de instauração do movimento romântico no país foi lento e incerto. O termo foi
introduzido em Portugal por Almeida Garrett, escritor de vida amorosa intensa e militante
político. Pertencia à tradição do Iluminismo, participando tanto do Arcadismo como do
Romantismo. Suas principais produções foram na poesia “Retrato de Vênus” – obra que
escandalizou os conservadores –, “Camões” – considerado o primeiro poema romântico

45
português e “Folhas Caídas” seus poemas mais românticos. Além de poemas,
escreveu “Viagens na minha terra”, romance com grande observação da
realidade e de denúncia da oligarquia; e “Frei Luís de Sousa”, uma obra-prima
Estudo
do teatro romântico português. É de sua autoria ainda na prosa o “Romanceiro”
da Literatura uma Pesquisa de narrativas tradicionais.
Portuguesa Merece destaque também Alexandre Herculano, escritor liberal
moderado, formado dentro do Romantismo, de grande coerência política que
se empenhou em fazer uma pesquisa histórica para definir nacionalidade. Na ficção,
preocupava-se com o problema da integração entre a matéria histórica e ficcional, desse
estilo são as obras O bobo; Eurico, o presbítero; O monge de Cister e Lendas e narrativas.
Na História, possuía um método objetivo de investigação e documentação. Suas principais
produções foram História de Portugal; História da Origem e Estabelecimento da Inquisição
em Portugal. Escreveu, ainda, poesia e uma coleção documental - Portugaliae Monumenta
Histórica.

2. O ultra-romantismo

O período considerado de transição para o Realismo é marcado pelo exagero,


desequilíbrio, sentimentalismo, acontece entre os anos 1838 e 1860. Ênfase ao tédio,
melancolia, desespero, pessimismo, fantasia e liberdade de expressão.

São considerados ultra-românicos o escritor Camilo Castelo Branco, um dos grandes


prosadores em língua portuguesa. Dono da biografia paixão e desgraças, que apresenta
uma correlação com os temas de sua obra. Fez uso da técnica folhetinesca, tendo se
notabilizado como autor de novelas, sendo as passionais as mais típicas. Suas principais
produções foram as novelas de mistério ou terror Os mistérios de Lisboa e Livro negro de
padre Dinis; as novelas históricas O judeu; O santo da montanha e A filha do regicida ; as
novelas passionais Amor de Perdição; Carlota Ângela; Amor de Salvação e A Doida do
Candal; também as novelas satíricas Coração, cabeça, estômago e A queda dum anjo
ainda as novelas de influência realista EusébioMacário; A corja e A brasileira de Prazins
As novelas do Minho.

Um outro escritor de destaque é Soares de Passos; considerado um paradigma do


poeta ultra-romântico, fora um escritor caricaturizado pelos escritores realistas e escreveu
“Noivado do Sepulcro”.

3. A transição para o Realismo

Acontece, aqui, um tardio florescimento literário que corresponde ao terceiro momento


do Romantismo, em fusão dos remanescentes do Ultra-Romantismo. Esse período é
marcado pela presença de poetas, como João de Deus, que atualiza as formas poéticas
da tradição popular e tem como característica o espiritualismo e a criticidade, sua principal
produção literária é o Campo de Flores; Júlio Dinis, mais significativo na prosa de ficção,
ligando-se à formação da consciência da classe média liberal-burguesa, afasta-se do
passionalismo ultra-romântico para enfocar as tensões psicológicas das personagens
atreladas à situação sócio-econômica. Suas principais produções foram As Pupilas do
senhor reitor; Uma Família Inglesa; A Morgadinha dos Canaviais e Os Fidalgos da Casa
Mourisca. Além desses dois autores merecem destaque Tomás Ribeiro, Bulhão Pato, Xavier
de Novais, Pinheiro Chagas.

46
Realismo
Contextualizando o Realismo

A partir da segunda metade do século XIX, o ambiente sócio-cultural europeu


apresenta significativas mudanças. A Revolução Industrial entra em uma nova fase, utilizando
agora, por exemplo, o petróleo, o aço, a eletricidade. É um período também de grandes
descobertas científicas, no qual a ciência passa a ser cada vez mais defendida: antes de
expor idéias é preciso prová-las cientificamente; era a defesa do pensamento científico. A
civilização burguesa industrial começa a se firmar e as idéias de liberalismo e democracia
ganham dimensões cada vez maiores, as ciências naturais desenvolvem-se e os métodos
de experimentação e observação da realidade passam a ser encarados como os únicos
capazes de explicar racionalmente o mundo físico. Diante de tantas mudanças, as exigências
literárias também passam a serem outras.

O desenvolvimento científico da época transformou a intelectualidade que, das


cátedras universitárias aos bares boêmios, adere ao cientificismo e ao materialismo, opondo-
se à metafísica, à religião, aderindo ao pensamento científico, às doutrinas filosóficas e
sociais e assumindo atitudes liberais e republicanas redimensionam a literatura da época.
O Realismo foi um movimento de oposição à idealização e ao subjetivismo do Romantismo,
acusado de abordar temas desligados da vida comum. Nesse sentido, o escritor realista
irá enfatizar a localização precisa do ambiente descrito, a descrição de costumes e
acontecimentos contemporâneos em seus mínimos detalhes, a reprodução da linguagem
coloquial, familiar e regional e a busca da objetividade na descrição e análise dos
personagens. Almejavam, ainda, técnicas narrativas e descritivas perfeitas, negando a
hipérbole e a retórica, proferiam a realidade tal como ela era, ou melhor, a captavam,
recriando-a através da narração ou da descrição, tornando a obra um espelho da realidade.
Por conta disso, preferiam a expressão simples.

Motivados pelas teorias científicas e filosóficas da época, principalmente o


positivismo, o determinismo e o darwinismo, os escritores realistas desejavam retratar o
homem e a sociedade em sua totalidade. Não bastava mostrar a face sonhadora e idealizada
da vida como fizeram os românticos, era preciso mostrar a face que ainda não haviam
revelado: a do cotidiano massacrante, do amor adúltero, da falsidade e do egoísmo humano,
da impotência do homem comum diante dos poderosos. Em lugar do egocentrismo
romântico, verifica-se um enorme interesse em descrever, analisar e até criticar a realidade.
A visão subjetiva e parcial da realidade é substituída pela visão que procura ser objetiva,
fiel, sem distorções. Em lugar de fugir à realidade, os realistas procuram apontar suas falhas
como forma de estimular a mudança das instituições e dos comportamentos humanos. Em
lugar de heróis, surgem pessoas comuns, cheias de problemas e limitações. Na Europa, o
realismo teve início com a publicação do romance realista Madame Bovary (1857) de Gustave
Flaubert.

Desdobramentos do movimento em Portugal

Os homens da chamada geração de 70 acabaram de se formar depois de


institucionalizado e consolidado o liberalismo em Portugal. Mas, por outro lado, as novas
instituições inseriam-se numa sociedade que sob o ponto de vista tecnológico, econômico
e mesmo social pouco progredia. E, por falta de dinamismo econômico interno, por falta de
uma expansão da produção nacional, o grupo político dirigente dependia cada vez mais do

47
capital bancário interno ou externo. Emerge, então, uma massa de
descontentes formada pela pequena burguesia industrial e o resíduo do
artesanato, assim como uma parte da burguesia comercial que tende a ficar
Estudo
fora do sistema, enquanto não se organiza o partido republicano. À base, os
da Literatura camponeses, mudos, constituíam a massa de manobra dos partidos
Portuguesa governantes, na dependência imediata dos poderosos locais.
É nessas condições que as novas idéias européias penetraram, embora tardiamente,
mas ainda a tempo de criar certo mal-estar e gerar polêmicas entre realistas e românticos
em Portugal. O movimento realista operou mudanças radicais na consciência literária e na
mentalidade dos intelectuais do país. Eclodiu com a chamada Questão Coimbrã, polêmica
literária que opôs, de um lado, Antero de Quental, Teófilo Braga e a geração de escritores
surgida na década de 1860 e, de outro, os representantes da geração anterior, em 1871.
Foram importantes também para a consolidação do movimento as Conferências do Casino,
nesta nova manifestação da chamada Geração de 70. Os contornos do que seria o realismo
apareceram com maior nitidez, especialmente através da conferência realizada por Eça de
Queiroz intitulada “O realismo como nova expressão da arte”.

Sob a influência do Cenáculo, e da sua figura central de Antero de Quental, Eça de


Queiroz funde as teorias de Taine, do determinismo social e da hereditariedade com as
posições estético-sociais de Proudhon. Ataca, também, o estado das letras nacionais e
propondo uma nova arte, uma arte revolucionária, que respondesse ao “espírito dos tempos”
(zeitgeist), uma arte que agisse como regeneradora da consciência social, que pintasse o
real sem floreados. Para Eça, só uma arte que mostrasse efetivamente como era a realidade,


mesmo que isso implicasse entrar em campos sórdidos, poderia fazer um diagnóstico do
meio social, com vista à sua cura. Assim, reagia contra o espírito da arte pela arte, visando
mostrar os problemas morais e dessa maneira contribuir para aperfeiçoar a humanidade.

VOCÊ SABIA QUE...

O Realismo firmou-se em Portugal como resposta à artificialidade,


formalidade, exageros e a sentimentalidade mórbida do Romantismo?

Para os representantes dessa nova literatura, o trabalho do escritor devia consistir


na observação e experiência, na análise psicológica dos tipos, no esclarecimento dos
problemas humanos e sociais, no aperfeiçoamento da literatura, isentando-a da retórica,
da fantasia. Pregavam uma arte revolucionária que reagisse contra o marasmo em que
tinha caído o Romantismo. A obra literária passou a ser considerada utensílio, arma de
combate, de reforma e ação social. Repudiando o reinado da “Arte pela Arte”, pregavam a
arte comprometida com o social, ou seja, a arte engajada.

A estética literária realista caracterizava-se por um conteúdo ideológico profundo,


pois, ao contrário do romantismo que parecia estar vazio de idéias, os escritores realistas
propunham uma literatura em que as teorias do positivismo, do socialismo e do hegelianismo
fossem visíveis. Acreditava-se que somente essas teorias poderiam exprimir a problemática
real do Homem. Pretendiam, também, uma impassibilidade na análise do real, iam, portanto,
contra todos os sentimentos exagerados dos românticos e preferiam a análise, a síntese e
a exposição da realidade com uma verdade e neutralidade de emoções. A natureza deveria
ser recriada com exatidão, como um retrato dessa mesma realidade, sem deturpações a
literatura deveria funcionar como espelho e por meio dela a sociedade burguesa do tempo
veria patenteada sua decomposição moral.

48
Os escritores realistas proclamavam uma religião sem dogmas, muito mais panteísta,
com atitudes que chegavam a ser anticlericais. Demonstravam, também, um inconformismo
com a tradição, muitos literatos consideravam que a sociedade portuguesa devia deixar de
olhar constantemente para seu passado e começar a assentar novos princípios de justiça e
dinamismo. Pregavam a crítica social e de costumes por considerarem o passado estéril e
o presente sem nada que se conseguisse aproveitar, desejavam fazer uma reforma da
sociedade. Assim, começaram a ser feitos inúmeros ataques contra a alta e média burguesia,
contra o clero, contra a política, a literatura do tempo, a educação, a economia, enfim contra
toda a sociedade com o objetivo que esta pudesse melhorar. Além disso, para que a literatura
pudesse revestir-se de certo teor científico, fazia-se necessário um esforço por analisar as
causas biológicas ou sociais do comportamento das personagens do romance. Acreditavam
ainda em uma supremacia da verdade física, considerada a única verdade válida. Toda a
crença metafísica e moral era relegada ao universo das conjecturas, enquanto as novas
teorias filosóficas eram tomadas como base para o movimento.
A implantação efetiva do Realismo em Portugal dá-se com a publicação do O Crime
do Padre Amaro (1875), seguida dois anos mais tarde pelo Primo Basílio (1876), obras
ambas de Eça, que são caracterizadas por métodos de narração e descrição baseados
numa minuciosa observação e análise dos tipos sociais, físicos e psicológicos, aparecendo
os fatores como o meio, a educação e a hereditariedade a determinarem o caráter moral
das personagens. Em ambos os romances, a descrição minuciosa e a análise psicológica
baseada em princípios deterministas, nas idéias da hereditariedade e influência do meio,
além da severa crítica de costumes, tomam nítida feição naturalista. São romances que têm
afinidade com os de Émile Zola, com o intuito de crítica de costumes e de reforma social. O
primeiro destes romances foi acolhido pelos críticos de então com um silêncio generalizado.
O segundo provocou escândalo aberto.

A polêmica e a oposição entre Realismo e Romantismo instalam-se definitivamente.


Pinheiro Chagas ataca Eça, considerando-o antipatriota, pelo modo como apresenta a
sociedade portuguesa. Chegaram a aparecer panfletos acusando os realistas de
“desmoralização das famílias” (Carlos Alberto Freire de Andrade: “A escola realista, opúsculo
oferecido às mães”) Camilo Castelo Branco vai parodiar o Realismo com Eusébio Macário
(1879) e voltando a parodiar com A Corja (1880). Mas, curiosamente, mesmo através da
paródia, Camilo vai absorver a nova escola, como é nítido na novela A Brasileira de Prazins.
(1882). Entretanto, Eça vai desorientar os seus seguidores ortodoxos com a publicação de
O Mandarim. O que faz com que Silva Pinto (1848-1911), que tinha exposto a teoria da
escola realista e elogiado Eça num panfleto intitulado Do Realismo na Arte, vai agora atacar
Eça em Realismos, ridicularizando o novo estilo deste. Reis Dâmaso, na “revista de estudos
livres” também insurgi contra a publicação de O Mandarim acusando Eça de ter atraiçoado
o movimento. Estas acusações não eram infundadas porque de fato Eça já estava a descolar
de um realismo ortodoxo para o seu estilo mais pessoal onde o humor e a fantasia se aliam
num estilo único.

Desde a implantação do Realismo que o movimento logrou um núcleo de apoiantes


que se empenhavam em explicar e defender o seu credo estético. Todavia esse núcleo se
resvalou, regra geral, para uma posição mais extremamente realista, o Naturalismo,
tornando-se ortodoxos e dogmáticos. Os defensores desta posição eram José Antônio dos
Reis Dâmaso (1850-1895) e Júlio Lourenço Pinto (1842-1907) autor da “Estética naturalista”,
que pretendia ser um evangelho do naturalismo, todavia estes autores foram considerados
fracos do ponto de vista literário e esquecidos. Aqueles que não enveredaram por posições
tão rígidas estão menos esquecidos como Luís de Magalhães com a obra O Brasileiro

49
Soares (1886), prefaciado por Eça de Queiroz. Outros nomes são Trindade
Coelho, Fialho de Almeida e Teixeira de Queiroz. Por volta de 1890, o
Realismo/Naturalismo tinha perdido o seu ímpeto em Portugal. Em 1893, o
Estudo
próprio Eça o declarava morto nas Notas Contemporâneas.
da Literatura Embora por vezes doutrinariamente fraco e/ou confuso o Realismo em
Portuguesa Portugal apresenta-se por isso mesmo, mais do que um movimento
consistente, como uma tendência estética, um sentir novo, que se opôs ao
Idealismo e ao Romantismo. A sua conseqüência mais importante foi à introdução em
Portugal das descobertas estrangeiras nos vários domínios do saber. Alargando as escolhas
literárias e renovando um meio literário que estava muito fechado sobre si mesmo. Assim,
com a absorção de teorias estrangeiras, como a irreligiosidade de Loisy e Renun, a
supremacia da verdade física, com o desenvolvimento das ciências exatas e experimentais,
as novas teorias filosóficas - Idealismo de Hegel, Socialismo de Proudhon, Positivismo de
Comte, e Evolucionismo de Darwin e Lamark, que levam à crença nos princípios de justiça
e igualdade; o materialismo otimista graças ao progresso técnico, que explica o atraso do
passado pela passividade do Homem e a sua crença nas forças sobrenaturais, provocando
uma verdadeira revolução cultural: repensa e questiona toda a cultura portuguesa desde as
origens, fixando-se no ponto alto das descobertas; pretende-se assim preparar uma profunda
transformação na ideologia política e estrutural social portuguesas isto é, a revolução
republicana de 1910.
Como não podia deixar de ser, a obra construída pelos realistas apresenta vários
ângulos, uma vez que estavam conscientes da necessidade de fornecer a cultura portuguesa
exemplos significativos em cada setor da atividade intelectual. Explica-s, assim, que essa
geração, ao lado da poesia, do conto e do romance, ainda desenvolvesse, com igual
convicção, a literatura de combate e de idéias assim como a literatura de viagens, a
historiografia e crítica literária e, em menor proporção, o teatro.

Principais autores

Guerra Junqueiro

Abílio Manuel Guerra Junqueiro (1850-1923), fez curso de Direito


em Coimbra, tendo sido deputado e embaixador. Quando mais jovem,
acalentou idéias revolucionárias e participou de alguns movimentos
reivindicatórios, o que resultou em alguns poemas de ataque ou protesto.
Foi, sobretudo, um poeta e, ocasionalmente, prosador; sua obra inicial
se caracteriza por um forte apelo revolucionário contra o
conservadorismo católico lusitano. Associando a beatice ao próprio
Romantismo, atacava duramente o movimento. Formalmente, contudo,
o poeta ainda era bastante influenciado pelo próprio estilo que atacava.
De fato, o arrebatamento e a eloqüência refletiam formas tardias da
poesia social do último período romântico, que teve no poeta francês,
Victor Hugo, seu principal praticante.
As obras marcantes desse período são: A morte de D. João (1874) e A Velhice do
Padre Eterno (1885). Nesta fase não é muito coerente com os postulados científicos que
passa a defender, talvez em conseqüência de sua formação religiosa ou temperamento
pende entre os extremos.

A partir de Os simples (1892), o poeta deu novo rumo à sua poesia. Com o próprio
título, voltou-se para a temática das pessoas humildes, refletindo uma visão lírica da vida

50
rural portuguesa que, no entanto, não abandona o registro realista. Começa a repelir os
rigorosos compromissos estético-científicos e a desfazer as contradições íntimas. Os
simples é dividido em várias partes, cada uma delas tratando de um tipo de trabalhador
português. Nele, reúnem-se os elementos que, segundo a crítica, caracterizaram a poesia
da Guerra Junqueiro: a linguagem direta e simples, a temática do trabalho, a visão fatalista
da existência. Tais elementos que criam um lirismo de forte tonalidade social, marcado pela
nota popular da repetição rítmica do lamento que, como um refrão, entremeia os versos.

Antero Tarquínio de Quental

Mais do que um poeta importante da literatura portuguesa e figura


ímpar do final do século XIX, Antero Tarquínio de Quental (1842-189)
constituiu-se líder intelectual da geração de 70. Poeta comprometido
com os problemas filosóficos e sociais do seu tempo, cultivou a poesia
e a prosa polêmica e filosófica. A influência do Romantismo observa-se
nas primeiras obras: Raios de extinta luz e Primaveras românticas.
Mas a publicação de Odes Modernas assinala a adesão plena do poeta
aos ideais revolucionários dos novos tempos, a que se segue, mais
tarde, uma poesia marcadamente filosófica, angustiada por incertezas
religiosas e metafísicas, claramente presentes em seus Sonetos. Deixou
ainda inúmeras cartas e escritos filosóficos.

Podemos identificar três fases distintas na obra de Antero de Quental. A primeira


delas corresponde a uma poesia revolucionária e de entusiasmo juvenil, representada pelas
Odes Modernas (1865), poemas que representam a fase do autor e sua adesão às idéias
de justiça social, igualdade e dignidade humanas. Para ele, o ato de escrever é um ato
revolucionário, revelando nítida influência das idéias de Proudhon. Os poemas dessa fase
refletem o drama social da segunda metade do século XIX. As crenças socialistas, as
filosóficas e as científicas congregam-se para criar uma poesia realista revolucionária e
compromissada.

A terceira fase documentada em Sonetos completos revela o poeta atormentado por


questões humanas, filosóficas e metafísicas, resultando uma poesia dilemática, angustiada
e pessimista, envolvida com as idéias de morte e as tentativas de explicar e entender Deus.
De certa forma, essa fase representa uma síntese das perturbações que ocupavam o poeta
desde a juventude. Nela, Antero atinge o ponto alto de sua carreira, com um raro refinamento
artístico que une a força de reflexões filosóficas bem fundamentadas com beleza rítmica,
criando frases imponentes e eloqüentes. Sua obra representa uma incessante busca do
Ideal, isto é, a essência humana, corporificada em Deus, na Sociedade, ou no próprio Homem
– dependendo das oscilações ideológicas pelas quais passou o poeta.

Cesário Verde

José Joaquim Cesário Verde nasceu em Lisboa em 1855, filho de


um lavrador e comerciante, dedicou-se desde muito jovem a essas
atividades. No ano de 1873, matriculou-se no curso de Letras da
Universidade de Coimbra, mas freqüentou o curso somente por alguns
meses. Nesse período, começou a publicar poesias no Diário de Notícias,
no Diário da Tarde, no Ocidente e em alguns outros periódicos. Nessa
época também surgem os sintomas mais agudos da tuberculose, doença

51
que o levaria a morte em 18 de julho de 1886. No ano seguinte, Silva Pinto,
seu amigo dos tempos de universidade, reúne seus poemas em um livro
intitulado O Livro de Cesário Verde.
Estudo
daLiteratura A poesia de Cesário Verde serviu de trânsito entre o Romantismo e o
Portuguesa Realismo, de um lado, e de ponte de passagem para algumas das atitudes
que estarão em moda na estética simbolista e na modernista. Tal caráter
transitivo explica sua posição em face do inconformismo revolucionário da geração de 70.
Alheio às lutas ideológicas em curso, só de passagem o poeta se deixar envolver pela
atmosfera contemporânea. O pensamento socialista, que levava às atitudes de reforma
social, toca-lhe apenas de passagem a poesia, e assim mesmo, sem cor política. Em suas
poesias, a realidade objetiva funde-se com a realidade subjetiva. Dotado de um
temperamento anti-literário, o poeta projeta-se nas coisas exteriores com o peso de sua
vida interior, a fim de apreender a imagem fugaz das coisas, em perpétuo dinamismo. É,
então, que nasce a poesia do cotidiano, do trivial, marca da poesia de Cesário Verde que
se coloca numa zona limítrofe que compreende o impressionismo e o expressionismo.

Entre 1877 e 1880, Cesário enfocará a cidade e os seus mistérios: o cotidiano entra-
lhe em cheio na poesia. Todavia, depois de 1881, aborrece-se da cidade e do gênero de
vida que chegou a admirar e seu amor à cidade transforma-se em amor ao campo. No
contato com o ar livre, o poeta encontrava inspiração para sua poesia e como isso a
modificava de modo que ao sombrio de antes, sucede agora a claridade; à morbidez, a
robustez; à inação, a ação.

Eça de Queirós

José Maria Eça de Queirós (1845-1900) – Considerado o mais


importante prosador realista e da literatura portuguesa, Eça de Queirós
deixou uma imensa produção literária que muita influência exerceu sobre a
evolução do próprio romance em língua portuguesa. Participou ativamente
das polêmicas de seu tempo por meio de escritos críticos (As Farpas), de
conferências (participou dos debates e foi um dos palestrantes nas
Conferências Democráticas do Cassino Lisbonense), de sua copiosa
correspondência e, sobretudo, por meio das próprias obras de ficção.

Com a publicação de O Crime do Padre Amaro, em 1875, Eça de Queirós inicia o


romance realista em Portugal, apresentando nessa obra algumas características básicas
de sua postura literária: crítica violenta da vida social portuguesa, denúncia da corrupção do
clero e da hipocrisia dos valores burgueses. Essas características acentuam-se ainda mais
no romance O Primo Basílio, impiedosa expressão da decadência da sociedade burguesa.
Sua visão corrosiva e satírica, por outro lado, manifesta-se em O Mandarim e A Relíquia.
Com Os Maias (1888) observa-se, porém, uma mudança nessa atitude irreverente e
destruidora de Eça de Queirós. Segue-se, então, uma nova fase literária do autor, em que a
descrença no progresso e nos ideais revolucionários se manifesta na expressão saudosa
da vida do campo e na valorização das virtudes nacionais. É o momento de obras como A
Cidade e as Serras e A Ilustre Casa de Ramires, de contos como Suave Milagre e de
biografia religiosas. A crítica literária costuma identificar três fases distintas na obra de Eça
de Queirós.

52
A primeira fase compreende, basicamente, crônicas jornalísticas reunidas
posteriormente em volume, sob o título de Prosas Bárbaras. Nessa fase, Eça escreveu um
romance, O Mistério da Estrada de Sintra, em parceria com Ramalho Ortigão. Fase de
indecisão, preparação e procura, percebe-se um realismo ainda incipiente que convive
com heranças românticas. A segunda fase tem início com a publicação do romance, O
Crime do Padre Amaro, em 1875. Três anos depois, o autor daria continuidade a ela com O
Primo Basílio. Aderindo às teorias do Realismo, o autor coloca-se sob a bandeira da
República e da Revolução, começa a escrever obras de combate às instituições vigentes
(Monarquia, Igreja, Burguesia) e de ação e reforma social. A ironia utilizada nesses romances
desmascara o comportamento hipócrita e ocioso da burguesia lisboeta. São algumas das
obras dessa fase que marcam o aparecimento do romance em Portugal.

A partir de 1880, com a publicação de Os Maias, percebe-se um escritor mais


confiante em seus próprios recursos expressivos, dando livre vazão ao seu lirismo.
Escapando da rigidez das normas realistas-naturalistas, confere lugar de destaque à fantasia,
sem abandonar o registro crítico realista. Em romances como A Relíquia (1887), A Ilustre
Casa de Ramires (1897) e A Cidade e as Serras (1901), o escritor se permite alguns vôos

!
de imaginação. Acrescente-se a nota saudosista das tradições portuguesas. Sua linguagem
vai assumindo um registro cada vez mais pessoal. Ao derrotismo e pessimismo analítico
da etapa anterior, sucede um momento de otimismo, de esperança e de fé.

Indicação de Filme
TÍTULO DA MINISSERIE: Os Maias (Brasil, 2001)

DIREÇÃO: Luiz Fernando Carvalho


ELENCO: Ana Paula Arósio , Fabio Assunção , Walmor Chagas

Uma produção muito cuidadosa da Globo com uma caracterização de


época magnífica e com ótimas atuações de todo o (muito bem selecionado)
elenco: “uma soberba adaptação que a TV Globo exibiu em 44 capítulos,
podendo perfeitamente ser incluída num rol de produtos teledramatúrgicos
de excelência artística, realizados pela nossa televisão”, diz Cristina Brandão.

RESUMINDO...
O período histórico que marca os últimos anos do Romantismo em Portugal já indicava
uma sociedade em crise, pois, mesmo já estando institucionalizado e consolidado o
liberalismo no país, as novas instituições inseriam-se numa sociedade que sob o ponto de
vista tecnológico, econômico e mesmo social pouco progredia. Emerge, então, uma massa
de descontentes formada pela pequena burguesia industrial e o resíduo do artesanato, assim
como uma parte da burguesia comercial que tende a ficar fora do sistema, enquanto não se
organiza o partido republicano. Os camponeses, mudos, apareciam nesse cenário como
massa de manobra dos partidos governantes.

O movimento realista Eclodiu em Portugal em 1871 e firma-se como resposta à


artificialidade, formalidade, exageros e à sentimentalidade mórbida do Romantismo. Os
adeptos do realismo tinham como bases teóricas o determinismo de Taine, o positivismo
de Comte, o socialismo “utópico” de Proudhon, o evolucionismo de Darwin, o fisiologismo
de Claude Bernard e o anticlericalismo de Renan. Diante de tais idéias, ocupavam-se de

53
uma crítica à educação romântica, ao conservadorismo da Igreja, almejando
a reforma social, a representação da vida contemporânea e uma visão objetiva
da realidade. Para os representantes dessa nova literatura, o trabalho do
Estudo
escritor consistia na observação da experiência, na análise psicológica dos
da Literatura tipos, no esclarecimento dos problemas humanos e sociais, no
Portuguesa aperfeiçoamento da literatura, isentando-a da fantasia. Pregavam a arte
comprometida com o social, ou seja, a arte engajada, prezavam também a
descrição de costumes e acontecimentos contemporâneos em seus mínimos detalhes e a
reprodução da linguagem coloquial, familiar e regional.

Sinteticamente, podemos vislumbrar três momentos do Realismo em Portugal: a


eclosão com a Questão Coimbrã quando Castilho no Posfácio Poema da mocidade critica
o estilo poético da “escola coimbrã cita os nomes de Antero Quintal, Teófilo Braga e Vieira
Castro. As respostas vieram através dos folhetos Bom senso e bom gosto e A dignidade
das letras e as literaturas oficiais ambos de Antero de Quental, que recebeu também o
apoio de Teófilo Braga em Teocracias Literárias. Um momento posterior seria o da afirmação
com o grupo do Cenáculo, nesse momento destacam-se As Farpas de Eça de Queirós e
Ramalho Ortigão e as conferências do Cassino. A última etapa ou a decadência marcada
pela crise de desalento da “Geração de 70” que acabam formando o grupo dos “Vencidos
da Vida” nesse período ocorre também o episódio do Ultimato e o suicídio de Antero de
Quental.

Os principais escritores desse período foram o poeta Antero de Quental principal


líder realista e que revela em sua ora e em suas atividades políticas as contradições do
movimento em Portugal. Sua produção poética pode ser dividida em três fases: as poesias
da juventude – Sonetos; as de combate – Odes modernas e as Dilemáticas – Sonetos
completos. Destacou-se também Eça de Queirós o escritor, cuja obra é a mais representativa
das tensões ideológicas do realismo português, sendo também a mais importante do ponto
de vista da elaboração artística. Sua obra pode ser dividida em três Fases uma Neo-
romântica com Notas marginais outra Realista-naturalista com O crime do padre Amaro e
a última de Afastamento do Naturalismo com A ilustre casa de Ramires. Cesário Verde
outro escritor importante registrou o processo de urbanização, tematizou o operariado, sendo
também o precursor do Modernismo. Temos, ainda, Guerra Junqueiro autor de uma poesia
militante e popular que se afastava dos padrões realistas.

Simbolismo
O Simbolismo é um movimento literário que surge em finais do século XIX tendo
Baudelaire como um dos mais influentes precursores. Esta arte sugestiva é teorizada em
1886 por Jean Moréas quando publica no Figaro Um Manifeste Littéraire no qual define,
pela primeira vez, o que denomina simbolismo. A este escritor juntam-se nomes como
Rimbaud, Mallarmé, Paul Verlaine, Jules Laforgue, Gustave Kahn, Pierre Louys, entre outros.
Em Portugal os primeiros sinais da escola Simbolista aparecem no ano de 1889 nas revistas
Boémia Nova e Os Insubmissos, que contavam com a colaboração de Eugênio Castro e
Antônio Nobre e divulgavam os grandes nomes contemporâneos das letras francesas, em
especial aqueles empenhados no movimento.

Com a publicação do livro de poemas Oaristos, de Eugênio de Castro, em 1890,


inicia-se oficialmente o Simbolismo português, durando até 1915, época do surgimento da
geração Orpheu, que desencadeia a revolução modernista no país, em muitos aspectos
baseada nas conquistas da nova estética. O termo Oaristo é de origem grega e significa
“diálogo íntimo” ou “diálogo entre amantes”. Essa obra, além dos poemas, que tratam de
um amor ardente e fatal, apresenta em seu prefácio o programa da estética Simbolista.
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Neste prefácio, o autor critica a poesia portuguesa da época afirmando ser esta repleta de
lugares comuns e pobre nas rimas e no vocabulário. Traz como proposta a liberdade do
ritmo e um vocabulário escolhido e variado e o uso de palavras menos vulgares. O término
do Simbolismo português se dá em 1915, já em meio à primeira guerra mundial, quando
Mário de Sá Carneiro e Fernando Pessoa lançam a revista Orpheu e dão início ao movimento
Modernista.

Durante os 25 anos de predomínio da estética Simbolista,


Portugal foi governado por D. Carlos I, seguido por D. Manuel II e no
ano de 1910 acontece a Proclamação da República. Portugal
atravessa um período muito conturbado, devido a grave crise
econômica e financeira e, para piorar a situação, a Inglaterra deu um
ultimato a Portugal, exigindo que fossem retirados os exércitos portugueses que se
encontravam entre Angola e Moçambique, caso contrário a guerra seria declarada.
A tentativa de enfrentar os exércitos ingleses em qualquer tipo de batalha seria
considerado uma verdadeira loucura. Por isso, o governo português acabou cedendo, atitude
que deixou o povo português humilhado.

Aproveitando-se dessa crise que se instaurava na monarquia, os republicanos fizeram


uma série de campanhas para a derrubada da monarquia e após muitas tentativas, em 5 de
abril, a revolução, iniciada na madrugada do dia anterior em Lisboa, termina com a vitória
dos republicanos apoiados pela Inglaterra. Foi estabelecido, então, um governo provisório
presidido por Teófilo Braga. Em 1911 foi Promulgada a Constituição de 1911 e, ainda nesse
mesmo ano, foi eleito o primeiro presidente da República: Manuel de Arriaga. No final do
seu mandato, Manuel de Arriaga, alarmado com as lutas políticas procedeu a um autêntico
golpe de Estado: ele demitiu todo o governo e encarregou, em ditadura, o general Pimenta
de Castro de organizar um ministério, com o objetivo de pacificar a Nação e preparar
próximas eleições legislativas. A ditadura Pimenta Castro durou pouco. Ainda em 1914 o
povo rebelou-se e a ditadura chegou ao fim com a renúncia de Manuel Arriaga. Mais uma
vez Teófilo Braga assume a Presidência da República até que se organizasse novas eleições.

Como pudemos perceber, o Simbolismo português surge num momento em que a


crise espiritual e o decadentismo de certos meios filosóficos e artísticos europeus, do final
do século, coincidem com o sentimento de pessimismo e frustração do povo português,
relacionada com algumas causas históricas como o ultimatum da Inglaterra, a queda da
monarquia e a instauração da república. Os poetas simbolistas portugueses vivenciam um
momento de intensa agitação social, política, cultural e artística.

Características

 É uma corrente de reação contra o positivismo científico, o materialismo. Busca


a espiritualidade, a transcendência física e a imaginação, proclama o retorno à mentalidade
mística, a integração cósmica e valorização do espiritual para se conseguir a paz interior.
 Interesse pelo noturno, pelo mistério e pela morte, assim como pelos momentos
de transição como o amanhecer e o crepúsculo; interesse pela exploração das zonas
desconhecidas da mente humana.
 Valorizava o conhecimento intuitivo e não-lógico, enfatizando a imaginação e a
fantasia, as concepções voltam-se ao místico e sobrenatural.
 Maior ênfase pelo particular e individual do que pelo geral e universal, os
simbolistas se voltam para dentro de si à procura de zonas mais profundas.

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 Utilização de substantivos abstratos, efêmeros, vagos e
imprecisos. Os textos comumente retratam elementos como fumaça, gases,
neve e imagens grandiosas para expressar a idéia de liberdade.
Estudo
 Pouco interesse pelo enredo e ação narrativa: pouquíssimos
da Literatura textos em prosa. Foi na poesia que o Simbolismo se firmou recebendo
Portuguesa influências do formalismo parnasiano, dos motivos da poesia francesa e do
neogarretismo, apegando-se ao tradicionalismo de base historicista e
folclórica.
 Linguagem vaga, fluida, sugestiva e não nominativa, ela devia ser ornada, colorida,
exótica, bem rebuscada e cheia de detalhes: as palavras são escolhidas pela sua sonoridade,
num ritmo colorido, devendo evocar e não descrever, aludir e não definir.
 Os procedimentos técnicos mais ligados ao Simbolismo são a sinestesia e a
musicalidade. A sinestesia corresponde à mistura de sensações, provocada exatamente
para acionar no leitor uma série de sentidos. A musicalidade é obtida com a exploração da
camada sonora dos vocábulos.
 Acredita-se na existência de um mundo que se supunha existir para além da
realidade visível e concreta. Os objetos, as figuras humanas, enfim toda a realidade era
focalizada através de imagens vagas e imprecisas, que propositadamente dificultavam sua
compreensão e interpretação.
 A inovação na combinação de expressões conhecidas conduziu naturalmente
os simbolistas à criação de neologismos, isto é, novas palavras.

Alguns autores

Antônio Nobre

Antônio Nobre nasceu na cidade do Porto em 1867 e morreu em


1990, vítima de tuberculose. Em 1888, matriculou-se no curso de Direito na
Universidade de Coimbra. Como os estudos lhe corressem mal, partiu para
Paris onde freqüentou a Escola Livre de Ciências Políticas, licenciando-se
em Ciências Jurídicas. Autor de grande e refinada sensibilidade, que tomado
de um sentimento ambíguo e entristecedor por um lado a vida parece-lhe
um fio ininterrupto de dores, mas lastima abandoná-la.
Mesmo porque reconhece receber dela um gozo estético e afetivo, no amor da mulher,
na contemplação da terra natal e no encontro com os familiares e no encontro de valores
espirituais. Entretanto ao debruçar-se em seu mundo interior o poeta realiza uma espécie
de amarga reflexão sentimental de sua vida.

Sua principal contribuição para o Simbolismo português foi a alternância do vocabulário


refinado dos Simbolistas com um outro mais coloquial. A princípio, sua poesia mostra certa
influência de Almeida Garret e de Júlio Dinis, porém, em uma segunda fase fica clara a
influência do Simbolismo Francês. Obras poéticas: Só (publicada em Paris em 1892),
Despedidas (1902) e Primeiros Versos (1921), ambas publicadas postumamente.

Eugênio de Castro

Eugênio de Castro e Almeida nasceu em Coimbra em 1869 e faleceu


em 1944. Por volta de 1889 formou-se em Letras pela Faculdade de Coimbra
e mais tarde veio a lecionar nessa faculdade. Colaborou com a publicação
das revistas “Os insubmissos” e “Boêmia nova”, ambas seguidoras do

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Simbolismo Francês. Em 1890, entrou para a história da literatura portuguesa com o
lançamento do livro de poemas “Oaristos”, marco inicial do Simbolismo em Portugal. Poeta
que manifestava uma forte atração por um barroquismo de linguagem algo estranho à estética
simbolista em voga.

A obra de Eugênio de Castro pode ser dividida em duas fases: Na primeira fase ou
fase Simbolista, que corresponde a sua produção poética até o final do século XIX, Eugênio
de Castro definiu algumas características da Escola Simbolista, como, por exemplo, o uso
de rimas novas e raras, novas métricas, sinestesias, aliterações e vocabulário mais rico e
musical. Na segunda fase ou neoclássica, que corresponde aos poemas escritos já no
século XX, percebemos um poeta voltado à Antiguidade Clássica e ao passado português,
revelando certo saudosismo, característico das primeiras décadas do século XX em
Portugal. Além de Oaristos, podemos citar como obras do poeta Belkkiss (1894), Saudades
do céu (1899), Constança (1900), O cavaleiro das mãos irresistíveis (1916), Últimos versos
(1938), entre outras.

Camilo Pessanha

Poeta português, natural de Coimbra, nasceu filho ilegítimo de um


estudante de Direito, oriundo de uma família aristocrática, e de uma mulher
de condição social muito inferior. Acometido de tuberculose, morre em 1º
de março de 1926 em Macau. Sua poesia, que influenciou vários poetas
modernistas, mostra o mundo sob a ótica da ilusão, da dor e do pessimismo.
O exílio do mundo e a desilusão em relação à Pátria também estão presentes
em sua obra e passam a impressão de desintegração do seu ser. A sua
obra mais famosa é Clepsidra, relógio de água, que contém poemas com
musicalidade marcante e temas até certo ponto dramáticos.
Poeta notabilizado pela qualidade rítmica e musical dos versos e cultivando uma
forma meticulosa, de grande equilíbrio e rigor, afastou-se do tradicional lirismo romântico e
do sentimentalismo tão comuns na poesia portuguesa.

Camilo Pessanha é considerado o mais simbolista dos poetas da época e influenciou


a geração de Orpheu, que iniciou o Modernismo em Portugal. Considerado de difícil leitura,
pois trabalha bem a linguagem. Em sua obra, Clepsidra (1926), distancia-se de uma situação
concreta e pessoal, e sua poesia é pura abstração. Os seus poemas caracterizam-se por
um forte poder de sugestão e ritmo, apresentando imagens estranhas, insólitas, não lineares,
isto é, repletas de rupturas e cores – elementos tipicamente simbolistas. Em seus poemas
predomina o tema do estranhamento entre o eu e o corpo; o eu e a existência e o mundo,
cujos elementos mais familiares, ao mesmo, tempo tornam-se esquivos, perante uma
sensibilidade poética fina e sutil, mas na qual não se encontra os derramamentos emocionais
e a subjetividade egocêntrica. Além da obra citada, é também de sua autoria: China, estudos
e tradições (1944).

Raul Brandão

Autor de uma literatura forte e dramática. A sua melhor produção está


na prosa de ficção: A Morte do Palhaço e o Mistério da Árvore (1926), A
Farsa (1903), Os Pobres (906), Húmus, O Pobre de Pedir. O estilo de Raul
Brandão aproxima-se mais da poesia que do romance, o que lhe acompanha
nas diversas fases de sua carreira. Mais poeta que ficcionista graças à

57
linguagem estruturalmente poética, pelo jogo das imagens, pelo metafórico,
pelo ritmo, emociona e, sobretudo, pela liberdade expressiva. Considerado
pela crítica como o escritor que melhor realizou a tendência fundamental da
Estudo
prosa simbolista, acabando por ser o mais importante prosador do Simbolismo
da Literatura português.
Portuguesa RESUMINDO...
O Simbolismo é um movimento literário que surge em finais do século XIX, tendo
Baudelaire como um dos mais influentes precursores. Em Portugal, os primeiros sinais da
escola Simbolista aparecem no ano de 1889 nas revistas Boémia Nova e Os Insubmissos.
Todavia é em 1890 com a publicação do livro de poemas Oaristos, de Eugenio de Castro,
que se inicia oficialmente o Simbolismo português, durando até 1915, época do surgimento
da geração Orpheu, que desencadeia a revolução modernista no país. Essa obra, além dos
poemas, que tratam de um amor ardente e fatal, apresenta em seu prefácio o programa da
estética Simbolista, no qual o autor critica a poesia portuguesa da época. Traz como proposta
a liberdade do ritmo e um vocabulário escolhido e variado e o uso de palavras menos
vulgares.

O movimento em portugal surge num momento em que a crise espiritual e o


decadentismo de certos meios filosóficos e artísticos europeus, do final do século, coincidem
com o sentimento de pessimismo e frustração do povo português. Após o ultimatum da
Inglaterra e a queda da monarquia e a instauração da república, no país afirma-se uma
reação idealista contra o Realismo-Naturalismo, identificado com o progressismo burguês
que só beneficiava o grande capital. Diante disso, os poetas simbolistas portugueses
vivenciam um momento de intensa agitação social, política, cultural e artística.

As principais características do movimento foram o registro da decadência da


realidade e produções bastante elaboradas; impressionismo com o registro de impressões
fugazes e indo contra a estandartização; afastamento do sensualismo impressionista;
irracionalismo e espiritualismo; coexistência do neo-romantismo e construção artesanal do
poema. Reação ao positivismo científico e ao materialismo; valorizava do conhecimento
intuitivo e não-lógico, enfatizando a imaginação e a fantasia. Maior ênfase pelo particular e
individual. Utilização de substantivos abstratos, efêmeros, vagos e imprecisos. Pouco
interesse pelo enredo e ação narrativa: pouquíssimos textos em prosa. Linguagem vaga,
fluida, sugestiva e não nominativa. Os procedimentos técnicos mais ligados ao Simbolismo
são a sinestesia e a musicalidade. Acredita-se na existência de um mundo que se supunha
existir para além da realidade visível e concreta.

É possível apontar três momentos do simbolismo em Portugal: a introdução, com as


revistas Boêmia Nova e Os Insubmissos, merecendo destaque o esteticismo de Eugênio
de Castro com Oaristos; a busca da realidade enfatizando o neogarrettismo; o saudosismo
com Antonio Nobre (Só) e Teixeira dos Pascoais que aproxima o Simbolismo do Modernismo
e a maturidade artística com Camilo Pessanha na poesia e Raul Brandão na prosa.

Antônio Nobre autor de grande e refinada sensibilidade contribuiu alternando ao


vocabulário refinado dos Simbolistas um outro mais coloquial. A princípio, sua poesia mostra
certa influência de Almeida Garret e de Júlio Dinis, porém, em uma segunda fase fica clara
a influência do Simbolismo Francês. Temos, também, Eugênio de Castro e Almeida que
entrou para a história da literatura portuguesa com o lançamento do livro de poemas
“Oaristos”, marco inicial do Simbolismo português. Sua obra pode ser dividida em duas

58
fases: a fase simbolista, que corresponde a sua produção poética até o final do século XIX
e a segunda fase ou neoclássica, que corresponde aos poemas escritos já no século XX,
nos quais ele se volta para a Antiguidade Clássica e ao passado. É desse período ainda
Camilo Pessanha, cuja poesia influenciou vários poetas modernistas e mostra o mundo
sob a ótica da ilusão, da dor e do pessimismo. É considerado o mais simbolista dos poetas
da época e autor de apenas um livro: Clepsidra. Ainda faz parte dessa geração Raul Brandão,
autor de uma literatura forte e dramática. A sua melhor produção está na prosa de ficção,
seu estilo aproxima-se mais da poesia que do romance, o que lhe acompanha nas diversas
fases de sua carreira.

Atividades
Complementares
Texto para as questões 1 e 2

“Quero uma virgem com uma tez bem alva / pálida e pálida, amorosa
e mole / quero uma virgem, que convide os lábios / a beberem-lhe o amor
gole por gole / Quero uma virgem que receie ainda / quebrar com um ai o
fio dos pen-sares / quero uma virgem que me entenda todo / por um volver
de místicos olhares / Quero assim minha virgem: pela terra /, louco, deito-
me enfim a pro-curá-la / Um ente assim, Deus tê-lo-á formado / Guia-me

1.
anjo do amor que eu hei de achá-la”. (Junqueira Freire)

Identifique as características do texto.

2. A que estilo de época pertence o texto a seguir?

Idealismo e Realismo
Eu sou, pois associado a estes dois movimentos, e se ainda ignoro
o que seja a idéia nova, sei pouco mais ou menos o que chamam aí a
escola realista. Creio que em Portugal e no Brasil se chama realismo,
termo já velho em 1840, ao movimento artístico que em França e em
Inglaterra é conhecido por “naturalismo” ou “arte experimental”. Aceitemos,
porém, realismo, como a alcunha familiar e amiga pela qual o Brasil e
Portugal conhecem uma certa fase na evolução da arte.
(…)
Não – perdoem-me – não há escola realista. Escola é a imitação
sistemática dos processos dum mestre. Pressupõe uma origem individual,
uma retórica ou uma maneira consagrada. Ora o naturalismo não nasceu
da estética peculiar dum artista; é um movimento geral da arte, num certo
momento da sua evolução. A sua maneira não está consagrada, porque
cada temperamento individual tem a sua maneira própria: Daudet é tão

59
diferente de Flaubert, como Zola é diferente de Dickens. Dizer “escola
realista” é tão grotesco como dizer “escola republicana”. O naturalismo é a
forma científica que toma a arte, como a república é a forma política que
toma a democracia, como o positivismo é a forma experimental que toma
Estudo a filosofia. Tudo isto se prende e se reduz a esta fórmula geral: que fora da
daLiteratura observação dos factos e da experiência dos fenômenos, o espírito não
Portuguesa pode obter nenhuma soma de verdade. Outrora uma novela romântica,
em lugar de estudar o homem, inventava-o. Hoje, o romance estuda-o na
sua realidade social. Outrora no drama, no romance, concebia-se o jogo
das paixões a priori; hoje, analisa-se a posteriori, por processos tão exactos
como os da própria fisiologia. Desde que se descobriu que a lei que rege
os corpos brutos é a mesma que rege os seres vivos, que a constituição
intrínseca duma pedra obedeceu às mesmas leis que a constituição do
espírito duma donzela, que há no mundo uma fenomenalidade única, que
a lei que rege os movimentos dos mundos não difere da lei que rege as
paixões humanas, o romance, em lugar de imaginar, tinha simplesmente
de observar. O verdadeiro autor do naturalismo não é, pois, Zola – é Claude
Bernard. A arte tornou-se o estudo dos fenômenos vivos e não a idealização
das imaginações inatas…

3.
(Eça de Queirós. Cartas Inéditas de Fradique Mendes. In: Obras de Eça de Queirós.)

Independentemente das idéias de IDEALISMO apontada no texto, relate a sua


concepção acerca do idealismo.

4. Diante do que você já estudou anteriormente, como poderia ser definido o


REALISMO?

4. Considerando que, em seu texto, Eça de Queirós defende e assume os princípios


mecanicistas e deterministas na composição literária, explique o que ele quer dizer com a
frase seguinte sobre a técnica de composição da narrativa realista: “Outrora no drama, no
romance, concebia-se o jogo das paixões a priori; hoje, analisa-se a posteriori, por
processos tão exactos como os da própria fisiologia”.

60
O MODERNISMO PORTUGUÊS E A LITERATURA
CONTEMPORÂNEA
Modernismo: Contexto Geral e a Geração Orfeu
Contexto Histórico-Social

Gestadas no século anterior, profundas e amplas transformações


culturais e estéticas, que serviram de ensaio para alguma coisa de novo,
só veio a declarar-se, explosivamente, na Europa nos primeiros anos no
início do século XX. Surgiram várias manifestações artísticas, sob a
denominação genérica de correntes de vanguarda (do francês avant-garde,
que significa “estar à frente, tomar a dianteira”). Esses diferentes
movimentos tinham – além do ismo em seus nomes – posições comuns
em relação às artes: liberdade, interpretação pessoal da realidade,
rebeldia, ilogicidade, busca de novas formas de expressão, etc. Assim,
aparece o Futurismo de Marinetti (Itália), o Cubismo de Picasso (espanha),
o Dadaísmo suíço, o Expressionismo alemão e o Serrealismo francês. Portugal, então,
procura adaptar-se ao ritmo da mudança européia e, ao mesmo tempo, busca beneficiar-
se do progresso cultural em curso.

Em 1890, o governo inglês lançou um ultimatum a Portugal: o país deveria abandonar


imediatamente as colônias que ainda mantinha. A obediência a essa imposição encheu o
povo português de vergonha e abalou profundamente a crença na monarquia, já
desacreditada por seu anacronismo. Neste período de grandes transformações se avolumou
uma onda de insatisfação contra o regime monárquico que se mostrava incapaz de resolver
os problemas mais urgentes da Nação e de oferecer um clima de tranqüilidade e progresso.
A desordem e a sanguinolência generalizou-se quando o Rei D. Carlos foi assassinato por
um homem do povo em 1908, ao voltar, em carruagem aberta, de uma de suas habituais
estações de caça em Vila Viçosa. Como no atentado também falecera o príncipe herdeiro,
D. Luís Filipe, D. Manuel II –sobrevivente do morticínio no Terreiro do Paço – é imediatamente
chamado a ocupar o trono. Ainda muito jovem ascende ao poder em clima de turbulências
e mantém o posto de monarca até 1910, quando, precisamente a 4 de outubro, se instala a
República em Portugal.
A República, incapaz de resolver os problemas mais profundos do país, e sem
conseguir equacionar as diferenças existentes entre os próprios republicanos, acabou por
dar lugar à ditadura salazarista, que durou cerca de cinqüenta anos, até a Revolução dos
Cravos, de caráter socialista, em 1975. Portanto, as mudanças sociais esperadas não
aconteceram de forma a contentar os republicanos mais exacerbados. Na verdade, a
República tinha como principal objetivo integrar Portugal no quadro do imperialismo europeu,
sinônimo de modernização. Esse ambiente favoreceu a difusão das idéias modernistas.
Assim, o Modernismo Português é um movimento estético que nasce em clima de tensas
mudanças e é empreendido pela geração de Fernando Pessoa, M. Sá-Carneiro e Almada-
Negreiros em conjunto com a arte e a literaturas Européia, expressando toda a uma
particularidade nacional. Foi na capital, Lisboa, em 1913, que se constituiu o núcleo do
grupo modernista. O Modernismo se tornara basicamente lisboeta, apenas com algumas
adesões de Coimbra (o poeta e ficcionista Albino de Meneses, etc.) e ecos vagos noutros
pontos da província. Nesse ano de 1913, escreveu Sá-Carneiro, aplaudido pelo seu amigo
Fernando Pessoa, os poemas de Dispersão; ambos nutriam o sonho duma revista.

61
O Modernismo em Portugal

 A “GERAÇÃO DE ORFEU”
Estudo
daLiteratura Em 1915, os jovens modernistas e artistas de
Portuguesa vanguarda, estimulados pela aragem de atualidade
vinda de Paris com Sá-Carneiro e Santa-Rita (Pintor),
adeptos do futurismo, aderiram ao projeto que Luís da Silva Ramos
(Luís de Montalvor) acabava de trazer do Brasil: o lançamento duma
revista luso-brasileira. Cria-se, então, a revista Orpheu, marco
inaugural do Modernismo em Portugal. Através dela, as novas
propostas artísticas foram divulgadas e discutidas. A duração da
revista foi efêmera, prejudicada pelo suicídio de Sá-Carneiro. Esses
primeiros modernistas ficaram conhecidos, exatamente em função
da revista, por “geração de Orpheu”.

A primeira atitude dos novos escritores foi de desprezar o “sentimentalismo falso”


dos românticos, adotando uma participação ativa e primando pela originalidade de idéias
e, na poesia, não deveriam se prender à rima e a métrica. Os autores modernos não
fundaram propriamente uma nova escola literária, com regras rígidas, pelo contrário,
desvincularam-se das teorias das escolas anteriores e procuraram os fatos da vida atual e
a realidade do país para transmitir suas emoções, de uma forma livre e descompromissada.
Era preciso para isso esquecer o passado, comprometer-se com a nova realidade e
interpretá-la cada um a seu modo.

A sociedade portuguesa vivia uma situação de crise aguda e de desagregação de


valores. Os modernistas portugueses respondem a esse momento, agredindo o sistema
com escândalo e sarcasmo, investigando as regiões inexploradas e indefinidas do
inconsciente e entregando-se à vertigem das sensações da vida moderna, da velocidade,
da técnica, das máquinas.

Os modernistas portugueses tiraram proveito da herança simbolista, sem renegá-la


totalmente. Assim, o saudosismo do poeta Antônio Nobre, que tinha fortes conotações
nacionalistas, ganhou força entre os membros da “geração de Orpheu”. Ao lado disso, a
absorção das conquistas futuristas que tomavam conta da Europa inteira, como a apologia
da máquina e do progresso urbano, conduz o movimento à vanguarda. Assim, o que se
destaca, no panorama modernista português, nesse primeiro momento, é a forma de


elaboração entre tradição e o novo. Com isso, eles conseguem retomar formar e temas
arcaicos, enquadrando-os dentro de propostas modernistas.

Fernando Pessoa e os Heterônimos

VOCÊ SABIA QUE...

Fernando Pessoa possui uma faceta rica, densa e intrigante e diz respeito
ao fenômeno da heteronímia, ou seja, à sua capacidade de despersonalizar-se e
reconstruir-se em outros personagens?

62
Fernando Antônio Nogueira Pessoa (1888-1935) é um poeta que se
transfigura em vários poetas, os seus heterônimos, e para cada um deles deu
uma biografia, caracteres físicos, traços de personalidade, formação cultural,
que resultam em diferentes maneiras de interpretar o mundo. Foi assim que
Fernando Pessoa “fez nascer” os poetas Alberto Caeiro, Ricardo Reis e
Álvaro de Campos.
OBSERVE: É importante não confundir heterônimo com pseudônimo.
Pseudônimo é um nome falso, sob o qual alguém se oculta. O heterônimo vai além: é um
outro nome, uma outra personalidade, uma “outra individualidade”, diferente, portanto, da
do criador. Como nos explica o próprio Fernando Pessoa:
“Por qualquer motivo temperamental que me não proponho analisar,
nem importa que analise, construí dentro de mim várias personagens
distintas entre si e de mim, personagens essas a que atribuí poemas
vários que não são como eu, nos meus sentimentos e idéias, os escreveria.
Assim têm os poemas de Caeiro, os de Ricardo Reis e os de Álvaro de
Campos que ser considerados. Não há que buscar em quaisquer deles
idéias ou sentimentos meus, pois muitos deles exprimem idéias que não
aceito, sentimentos que nunca tive. Há simplesmente que os ler como
estão, que é aliás como se deve ler”.
Fernando Pessoa - obra poética.

Foi um dos diretores da revista “Orpheu”, participando ativamente do Modernismo


em Portugal. Queria ser absoluto e abrangente; universal, e talvez por isso, multiplicou-se
para poder sentir os vários ângulos da realidade por meio da sua heteronímia. Tornou-se,
então, vários poetas ao mesmo tempo, com características próprias, biografias próprias,
etc. Quis reconstruir o mundo, organizar o caos.

Escreve como F. Pessoa - ele mesmo e seus heterônimos.

PERFIL DOS HETERÔNIMOS

Para que você conheça um pouco melhor esses “poetas”, apresentamos, a seguir,
os heterônimos:

ALBERTO CAEIRO

Nasceu em Lisboa em 1889 e morreu tuberculoso, também em


Lisboa, no ano de 1915. Considerado o mestre dos outros heterônimos e
do poeta ortônimo, Alberto Caeiro escreveu em versos livres (sem métrica
regular) e brancos (sem rimas), de forma lírica, espontânea, instintiva, de
candura e placidez ideais. Caeiro não teve profissão, nem educação quase
alguma, só instrução primária, daí, algumas vezes, a simplicidade quase
infantil do estilo. Órfão, é o heterônimo menos culto e complicado, e por ter
vivido no campo, escreve com a linguagem simples e o vocabulário limitado
de um poeta camponês pouco ilustrado.

Ficou conhecido como o Poeta das sensações, pois considerava que a sensação
seria a única fonte válida do conhecimento. Assim sendo, a sua produção literária é
completamente entregue à infinita variedade do espetáculo das sensações, principalmente
as visuais. Para ele o real é a própria exterioridade - “tudo é como é, e assim é o que é”.

63
Um rápido esboço de suas características:

Estudo
 Fuga para o campo - rural clássico reinventado.
da Literatura  Pretende ser objetivo - o mundo não carece de subjetivismos.
Portuguesa  Sensacionismo - Objetiva o registro das sensações sem a
mediação do pensamento (objetivismo visualista): “pensar é estar doente dos
olhos”
 Proclama-se antimetafísico - pratica o realismo sensorial, numa atitude de rejeição
as elucubrações do Simbolismo.
 Poeta-filósofo, fruto do seu contato direto com a realidade (influencia Antônio
Mora).
 É um poeta por natureza - “um poeta e nada mais”.
 Agnóstico – nega qualquer forma de espiritualismo ou de transcendência.
 Paganismo – “pensar como os deuses, pelos pés, pela boca, pelo ouvido, pelos
olhos.”
 É (ou pretende ser) um homem franco, alegre, de visão ingênua. Bucólico.
 Prestava-se à descrição pictórica impressionista.

ÁLVARO CAMPOS

Nasce em Tavira, em 1890 e viveu em Lisboa na inatividade sem


constar data da morte. Era alto, magro e corcunda. Intelectual, teve uma
educação vulgar de Liceu; depois foi mandado para a Escócia estudar
Engenharia, primeiro a Mecânica e depois a Naval, mas não exerceu a
profissão. É todo emoções - É o heterônimo mais nervoso e emotivo, que
por vezes vai até à histeria. É considerado um poeta futurista.

Possui uma evolução literária caracterizada em 3 fases:

1ª Fase

 Inicia-se como “decadente-simbolista” – Decadentismo (poemas ainda


metrificado e rimado).
 Homem hiper-civilizado, é o poeta moderno cosmopolita, melancólico.
 Entediado com o mundo, fuma ópio para escapar da doença da vida (escapismo).
(OPIÁRIO)

2ª Fase

 Ingressa no modernismo - na segunda fase - com a sua vitalidade transbordante,


e o seu amor ao ar livre e ao belo feroz.
 Sofre a influência de Alberto Caeiro (a quem toma como mestre)
 Passa a cultuar a energia e a força.
 Ele é, pelo tom e pelo estilo, um Sensacionalista – Explosão de emoções e vida.
 É o poeta que pretende sentir tudo de todas as maneiras”, ultrapassar a
fragmentaridade numa “histeria de sensações”.
 Subjetivista, Campos defende uma estética não aristotélica baseada na idéia
de força, na emotividade individual - Poesia de força e não de contemplação.
 Revolucionador das formas.

64
 Futurista da exaltação da energia, da velocidade e da força da civilização
mecânica (adotando um estilo febril, entre máquinas e a agitação da cidade).
 Entusiasta do mundo moderno.
 É um homem sujeito à máquina. É por meio da reflexão do homem inserido na
realidade moderna e naquilo que gerará a progressão dela que Campos
desenvolve os problemas existenciais.
 Pela técnica, o homem pode abrir o seu caminho de regresso ao paraíso”.
 Vanguardista.
 Explora os aspectos fonéticos, onomatopaicos (dadaísmo).

3ª Fase

 Por fim, amargurado, reflete de forma pessimista e desiludida sobre a existência.


 Volta ao vazio.
 Inadaptação às condutas sociais.
 Canta a angústia do homem de seu tempo e a crise de valores espirituais.
 Amargura angustiada.
 Desencontro do sujeito com o mundo e com a existência.
 Seu estilo é marcado pela oralidade e pela forma prolixa que se espalha em
versos longos, próximos à prosa.
 Lirismo desencantado (aproximação com F. Pessoa, ortônimo).
 Para ele a metafísica é a pseudociência de se figurar mundos impossíveis.

RICARDO REIS

Nasce em Porto, em 1887, e não há registros de morte. Estudou


com os Jesuítas e se formou em Medicina. Discípulo de Caeiro, o segue no
amor da vida rústica, junto da natureza. Reis é um ressentido que sofre e
vive o drama da transitoriedade, doendo-lhe o desprezo dos deuses.
Afligem-no a imagem antecipada da Morte e a dureza do Fado, por isso é
considerado um poeta fatalista, nos diz ele: “Acima de nós e dos deuses
está o fado (destino)”.

Seus poemas têm forte influência do poeta romano Horácio, sendo assim latinizante
no vocabulário e na sintaxe. O seu estilo é densamente trabalhado e revela ainda, muito
claramente, o seu tributo à tradição clássica no uso de estrofes regulares, quase sempre de
decassílabos nas referências mitológicas, na freqüência do hipérbato, na contenção e
concisão altamente expressivas e lúcidas. Considerava-se neoclássico, classicista na
expressão das emoções e sentimentos.

Um rápido esboço de suas características:

 Monárquico, auto-exila-se no Brasil (1919).


 O pensamento como fator inerente à criação artística.
 Sensacionismo - Parte das sensações.
 A disciplina a serviço do pensamento.
 Busca da perfeição e do equilíbrio – disciplina mental.
 Clareza das idéias.
 Simboliza uma força humanista de ver o mundo.
 Busca o refúgio dum epicurismo temperado de algum estoicismo.

65
 Estoicismo – “Seremos mais felizes quanto menor forem nossas
necessidades”.
 Epicurismos – Necessidade de gozar o aqui e o agora.
Estudo
 Versos elegantes e nostálgicos.
daLiteratura  Culto da ode.
Portuguesa  Um permanente convite ao amor, ao vinho, às flores.
 Culto ao paganismo - “pagão por caráter”.

A Geração de Presença

 A REVISTA PRESENÇA

Da revista Orpheu saíram, com efeito, dois números (os únicos


publicados) em 1915; Feitos, em parte, para irritar o burguês, para
escandalizar, estes dois números alcançaram o proposto, tornando-se
alvo das troças dos jornais; mas a empresa não pôde prosseguir por
falta de dinheiro. Na seqüência, surgiram duas outras revistas, dentro
da mesma tendência: Centauro (1916) e Portugal Futurista (1919).

Em 1917 Almada-Negreiros, “o poeta do Orpheu e o Narciso do


Egipto”, organizou no Teatro República (hoje São Luís) uma escandalosa
sessão futurista, ainda dentro da corrente modernista – definida como uma
nova concepção da literatura como linguagem que põe em causa as relações
tradicionais entre autor e obra, e ao mesmo tempo suscita uma exploração
mais ampla dos poderes e limites do Homem, o momento em que defronta
um mundo em crise, ou a crise duma imagem congruente do Homem e do
mundo.

Alguns anos mais tarde, em 1927, surgiu a revista Presença, que não só valorizou as
obras dos artistas da Orpheu, como também as divulgou e deu continuidade a elas, adotando
uma participação ativa e dentro da realidade da vida moderna. A revista Presença, aparecida
em 1927, não só deu a conhecer e valorizou criticamente as obras dos homens do Orpheu,
como lhes herdou o espírito por intermédio de alguns dos presencistas, pertencentes já a
uma segunda geração modernista. Nela também colaborou Fernando Pessoa.

O modernismo português conheceu ainda mais uma geração estética:

 O NEO-REALISMO
Rejeitando a temática psicológica e metafísica que tinha dominado a geração anterior,
o Neo-realismo defende uma arte participativa, de temática social. Por sua postura de ataque
à burguesia, encontraram pontos de contato com o Realismo de Eça de Queirós. Mas
receberam também forte influência do chamado Neo-realismo nordestino da literatura
brasileira (que incluía nomes como Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Rachel de Queiroz
Jorge Amado, entre outros). Parte dos artistas alinhados no Neo-realismo derivara para
uma literatura marcada pela exploração do fantástico e do absurdo. Seus principais
representantes foram: Alves Redol, Vergílio Ferreira, Fernando Namora, Ferreira de Castro.

66
Características do Modernismo

 Combate ao passadismo; contra os padrões clássicos e tradição.


 Irreverência contra o preestabelecido.
 Liberdade formal; versos livres; ausência de rima; liberação do ritmo; liberdade
de estrofação.
 Linguagem coloquial, do dia-a-dia; regionalismo.
 Humor, ironia, paródia e poema-piada.
 Busca do novo, original, dinâmico refletindo a industrialização, máquinas, motores.
 Sem enfeites e rebuscamentos; a simplicidade.
 Abstenção de uma postura sentimentalóide.
 Preocupação com a observação e análise crítica da realidade.
 Consciência nacional.

Outros autores

MÁRIO DE SÁ – CARNEIRO

 Nasceu em Lisboa em 1890 e cometeu suicídio em Paris, 1916.


 Em 1915 lançou a revista “Orpheu” junto com o amigo F. Pessoa.
 Profunda crise moral e financeira.
 Mostrou inadaptação ao mundo, deixava levar-se pelas emoções, pela
megalomania perdendo-se da realidade.
 Interiorizou-se, mostrando-se inseguro e egocêntrico.
 Principal obra: A Confissão de Lúcio.

José Saramago: O Nobel da Literatura

Vimos que a trajetória da Literatura Portuguesa, ao longo do século


XX, foi marcada por rupturas e confrontos efetuada pelos Modernistas da
Vanguarda, que se iniciou com a geração do Orfeu e da Presença. Neste
entremeio de tempo, o romance e a poesia seguiram caminhos por vezes
divergentes e foi o neo-realismo, nos anos 30 e 40, que se constituiu como
movimento ideológico e estético unificador.

Após a ruptura e a aceitação da diversidade de estilos e de processos literários, os


anos sessenta corresponderão, então, à superação definitiva do Neo-realismo. Escritores
como José Cardoso Pires, Vergílio Ferreira ou Almeida Faria, vão explorar toda uma gama
de possibilidades estéticas do novo romance e “num cenário inteiramente renovado”, a
partir de 1947, surge José Saramago, que em busca de uma singularidade própria
redescobre a História através da “efabulação” narrativa, quando publica o seu primeiro livro,
o romance Terra do Pecado. A escrita de Saramago integra-se, portanto, nos novos caminhos
do romance em Portugal dos últimos anos, recriando os caminhos do fantástico.

“Uma escrita de subversão na subversão da escrita”

José Saramago assume para si um estilo de escrita aparentemente incorreta, pois


usa a pontuação de uma maneira não convencional. Nos diálogos de seus personagens
abole os travessões fazendo com que estes sejam inseridos nos próprios parágrafos que
os antecedem: “este tipo de marcação das falas propicia uma forte sensação de fluxo de
consciência, a ponto do leitor chegar a confundir-se se um certo diálogo foi real ou apenas

67
um pensamento”. Ele é conhecido também por utilizar-se de frases e períodos
compridos, sendo que suas sentenças, muitas vezes, ocupam mais de uma
Estudo página, pois usa as vírgulas onde normalmente se usaria pontos finais.
da Literatura
Entretanto, seu estilo não torna a leitura mais difícil: seus leitores acostumam-


Portuguesa se facilmente com seu ritmo. São características que tornam o estilo de
Saramago único na literatura contemporânea: é considerado por muitos críticos um mestre
no tratamento da língua portuguesa.

VOCÊ SABIA QUE...

José Saramago foi o primeiro escritor de língua portuguesa a receber


o Prêmio Nobel de Literatura (1998)?

Mesclando o real e o imaginário, sua obra é uma das mais conhecidas e traduzidas
da literatura portuguesa contemporânea e “aborda, freqüentemente, o fenômeno histórico
em seus movimentos e contingências, enquanto investiga e recria situações que relatam e
analisam as ansiedades e esperanças humanas. Seu estilo se caracteriza por uma pequena
influência barroca, temperada por refinada ironia”. Publicou desde poesia a peças teatrais,
mas é como autor de romances que José Saramago mais se destacou.

Obras publicadas

Poesia
 Os Poemas Possíveis, 1966
 Provavelmente Alegria, 1970
 O Ano de 1993, 1975

Crônica
 Deste Mundo e do Outro, 1971
 A Bagagem do Viajante, 1973
 As Opiniões que o DL teve, 1974
 Os Apontamentos, 1976

Literatura de Viagem
 Viagem a Portugal, 1981

Teatro
 A Noite, 1979
 Que Farei Com Este Livro?, 1980
 A Segunda Vida de Francisco de Assis, 1987
 In Nomine Dei, 1993
 Don Giovanni ou O dissoluto absolvido, 2005

Contos
 Objecto Quase, 1978
 Poética dos Cinco Sentidos - O Ouvido, 1979

68
Romance
 Terra do pecado, 1947
 Manual de pintura e caligrafia, 1977
 Levantado do chão, 1980
 Memorial do convento, 1982
 O ano da morte de Ricardo Reis, 1984
 A jangada de pedra, 1986
 História do cerco de Lisboa, 1989
 O Evangelho Segundo Jesus Cristo, 1991
 Ensaio sobre a cegueira, 1995
 Todos os nomes, 1997
 A caverna, 2001

!
 O homem duplicado, 2002
 Ensaio sobre a lucidez, 2004
 As intermitências da morte, 2005

Indicação de Filme
TÍTULO DO FILME: Lingua - Vidas em Português (BRA/POR, 2004)
DIREÇÃO: Victor Lopes
ELENCO: Mia Couto; José Saramago; Martinho da Vila; João
Ubaldo Ribeiro; Teresa Salgueiro; Edinho. 105 minutos

Retrata o cotidiano de 200 milhões de pessoas, de seis diferentes


países, que falam a Língua Portuguesa. No documentário, a Língua
Portuguesa é apresentada como patrimônio imaterial, pelo qual, todos os
dias, se revela a diversidade de costumes e valores de milhões de pessoas
que expressam em português situações cotidianas, seja realizando
negócios, escrevendo poemas, brigando no trânsito ou declarando seus
amores. Todo dia o Português nasce e renasce em bocas brasileiras,
moçambicanas, goesas, angolanas, japonesas, cabo-verdianas,
portuguesas e guineenses.

RESUMINDO...
Modernismo é uma designação genérica para um variado grupo de correntes
estéticas de vanguarda do século XX. No início do século XX. Surgiram várias manifestações
artísticas, sob a denominação genérica de correntes de vanguarda. Esses diferentes
movimentos tinham posições comuns em relação às artes: liberdade, interpretação pessoal
da realidade, rebeldia, ilogicidade, busca de novas formas de expressão, etc. Assim, aparece
o Futurismo de Marinetti, o Cubismo de Picasso, o Dadaísmo, o Expressionismo e o
Serrealismo. Portugal, então, procura adaptar-se ao ritmo da mudança européia e, ao mesmo
tempo, busca beneficiar-se do progresso cultural em curso. As bases filosóficas do
movimento eram a Filosofia de Nietzche o intuicionismo de Bergson e o anti-humanismo de
Heidegger e os escritores modernos pregavam a irreverência contra o preestabelecido, a
liberdade formal, a linguagem coloquial, o humor, a ironia, a paródia e o poema-piada. Além
da busca do novo, original e dinâmico e de uma preocupação com a observação e análise
crítica da realidade e uma consciência nacional.

69
A jovem República portuguesa, encontrava-se num impasse, pois não
conseguia resolver os problemas mais profundos do país, nem equacionar as
diferenças existentes entre os próprios republicanos. As mudanças sociais
Estudo
esperadas não aconteciam de forma a contentar os republicanos mais
da Literatura exacerbados. Assim, nasce o primeiro modernismo português (o orfismo)
Portuguesa associado à profunda instabilidade político-social da primeira república e
constituindo uma resposta artística de setores sociais mais inovadores das
classes médias urbanas. Empreendido pela geração de Fernando Pessoa, M. Sá-Carneiro
e Almada-Negreiros em consonância com a arte e a literatura européia, sem, contudo deixar
de expressar uma particularidade nacional se constituiu o núcleo do grupo modernista na
capital Lisboa, em 1913.

A “Geração de Orfeu”

A revista Orpheu, marco inaugural do Modernismo em Portugal, é criada em 1915


por jovens modernistas e artistas de vanguarda que estimulados pelas novidades trazidas
de Paris por Sá-Carneiro e Santa-Rita, aderem ao projeto de Luís da Silva Ramos de lançar
uma revista luso-brasileira, partir de então as novas propostas artísticas foram divulgadas e
discutidas. A primeira atitude dos novos escritores foi abandonar o “sentimentalismo falso”
dos românticos, defender a originalidade de idéias e abolir a rima e a métrica na poesia.
Esses autores não fundaram propriamente uma nova escola literária e sim se desvincularam
das teorias das escolas anteriores e procuraram os fatos da da realidade do país para
transmitir de forma livre e descompromissada suas emoções. Saíram da revista Orpheu
apenas dois números em 1915, mas surgiram dentro da mesma tendência duas outras
revistas: Centauro (1916) e Portugal Futurista (1919).

Fernando Pessoa foi um dos diretores da revista “Orpheu”, participando ativamente


do Modernismo em Portugal era um escritor de alto nível artístico e possuía a atitude-
experiência, própria do futurismo e a ausência de síntese poética (descontinuidade). O autor
teve como principais tendências artísticas o saudosismo, o paulismo, o sensacionismo, o
futurismo e o interseccionismo. Conhecido por suas “máscaras” poéticas é dono de uma
obra ortônima/heterônica e faz uso da dialética fingimento/sinceridade. Seus heterônimos
principais são: Alberto Caeiro - poeta bucólico; Ricardo Reis - poeta neoclássico e Álvaro
de Campos - poeta modernista.

Outros escritores de destaque foram Sá-Carneiro escritor herdeiro do decadentismo-


simbolismo e Almada Negreiros propagandista do Modernismo fez a ponte entre Modernismo
e tendências contemporâneas atuando em vários campos artísticos.

A Geração de Presença

Em 1927, um grupo de estudantes funda, edita e dirige em Coimbra a revista


Presença, que não só valorizou as obras dos artistas da Orpheu, como também as divulgou
e deu continuidade a elas, adotando uma participação ativa e dentro da realidade da vida
moderna. Nela também colaborou Fernando Pessoa. Tinha como marca a oposição ao
evasionismo, o grupo Presença procurava realizar simultaneamente à consolidação do
Modernismo e implantar um regime de rigor e severidade artística. Os escritores mais
significativos foram José Régio, Miguel Torga - prosador com literatura social Branquinho
da Fonseca - contista Edmundo de Bettencourt - precursor do Surrealismo Adolfo Casais
Monteiro - Poeta, ensaísta e professor de literatura no Brasil.

70
Neo-Realismo: uma outra geração estética

Rejeitando a temática psicológica e metafísica que tinha dominado a geração anterior,


o Neo-realismo defende uma arte participativa, de temática social. Por sua postura de ataque
à burguesia, encontraram pontos de contato com o Realismo de Eça de Queirós, mas
receberam também forte influência do chamado Neo-realismo nordestino da literatura
brasileira. Parte dos artistas do Neo-realismo derivou para uma literatura marcada pela
exploração do fantástico e do absurdo. Seus principais representantes foram: Alves Redol,
Vergílio Ferreira, Fernando Namora, Ferreira de Castro.

Superação do Neo-Realismo

Após a ruptura e a aceitação da diversidade de estilos e de processos literários, os


anos sessenta correspondem à superação definitiva do Neo-realismo. Escritores como José
Cardoso Pires, Vergílio Ferreira ou Almeida Faria, vão explorar uma gama de possibilidades
estéticas do novo romance e “num cenário inteiramente renovado”.

A partir de 1947, surge José Saramago, que em busca de uma singularidade


redescobre a História através da “efabulação” narrativa, quando publica o seu primeiro livro,
o romance Terra do Pecado. A escrita de Saramago recriando os caminhos do Fantástico
integra-se nos novos caminhos do romance em Portugal dos últimos anos. Saramago
assume para si um estilo de escrita aparentemente incorreta, pois usa a pontuação de uma
maneira não convencional. É conhecido também por utilizar-se de frases e períodos
compridos, particularidade que não torna a leitura mais difícil: seus leitores acostumam-se
facilmente com seu ritmo, características que tornam o estilo desse autor único na literatura
contemporânea. Mesclando o real e o imaginário Saramago é autor de uma vasta produção
literária que compreende poesias, crônicas, literatura de Viagem, teatro, contos e romances.

Atividades
Complementares
1. O poema “Falso diálogo entre Pessoa e Caeiro”, de José Paulo Paes, remete-nos
ao poema X de “O guardador de rebanhos”, de Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando
Pessoa). Leia atentamente os dois poemas, transcritos a seguir, e identifique no poema
de Alberto Caeiro as falas que, segundo o poema de José Paulo Paes, poderiam ser
atribuídas a Pessoa e a Caeiro, respectivamente. Justifique sua resposta.

Falso diálogo entre Pessoa e Caeiro

[Pessoa] - a chuva me deixa triste...


[Caeiro] - a mim me deixa molhado.

Poema X (O guardador de rebanhos)

“Olá, guardador de rebanhos,


Ai à beira da estrada,
Que te diz o vento que passa?”
“Que é vento, e que passa,
E que já passou antes,
E que passará depois.
E a ti, o que te diz?”

71
“Muita cousa mais do que isso,
Fala-me de muitas outras cousas
De memórias e de saudades
Estudo
E de cousas que nunca foram.”
daLiteratura “Nunca ouviste passar o vento.
Portuguesa O vento só fala do vento.
O que lhe ouviste foi mentira,
E a mentira está em ti”.

2. Qual a temática do poema?

3. Quem poderia estar sendo representado pelo guardador de rebanhos?

4. Quais as características desse poema?

5. Analisando o primeiro poema, que características podem ser extraídas dele?

72
Atividade
Orientada
Caro aluno,

A atividade a seguir é de caráter obrigatório e tem por objetivo avaliar o seu


aprendizado durante o curso. Para isso, você poderá utilizar todos os recursos
disponibilizados neste período e complementar com pesquisas em livros, revistas e sites. A
atividade deverá ser realizada em ambiente de tutoria e em equipe.

A proposta é criar um jornal/painel informativo-cultural acerca de um dos temas


abordados nos quadros e textos a seguir.

Crónica Breve do Arquivo Nacional é uma narração bastante sumária da vida dos
seis primeiros reis de Portugal, desde D. Afonso Henriques até D. Dinis. As Crónicas Breves
de Santa Cruz de Coimbra, ou Crónicas Avulsas, são quatro textos que foram compilados
no Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra. Os manuscritos estão actualmente na Biblioteca
Pública Municipal do Porto. Datam a maior parte da segunda metade do século XV, sendo
possível que a primeira redacção tenha ocorrido no século XIII. Todas estas crónicas foram
publicadas por Alexandre Herculano nos Portugaliae Monumenta Historica, volume
correspondente aos Scriptores, tendo algumas delas inspirado o mesmo autor na elaboração
de certos textos de Lendas e Narrativas.
In: http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/index.html

D. Sebastião, rei de Portugal D. Sebastião

Louco, sim, louco, porque quis grandeza ‘Sperai! Caí no areal e na hora adversa
Qual a Sorte a não dá. Que Deus concede aos seus
Não coube em mim minha certeza; Para o intervalo em que esteja a alma imersa
Por isso onde o areal está Em sonhos que são Deus.
Ficou meu ser que houve, não o que há.
Que importa o areal e a morte e a desventura
Minha loucura, outros que me a tomem Se com Deus me guardei?
Com o que nela ia. É O que me sonhei que eterno dura,
Sem a loucura que é o homem É Esse que regressarei.
Mais que a besta sadia,
Cadáver adiado que procria? Fernando Pessoa, Mensagem
Fernando Pessoa, Mensagem

73
Estudo
daLiteratura
Portuguesa
O Sebastianismo

O Sebastianismo foi um movimento místico-secular que ocorreu em Portugal na


segunda metade do século XVI como conseqüência da morte do rei D. Sebastião na batalha
de Alcácer-Quibir, em 1578. Por falta de herdeiros, o trono português terminou nas mãos do
rei espanhol Felipe II. Apesar do corpo do rei ter sido removido para Belém, o povo nunca
aceitou o fato, divulgando a lenda de que o rei encontrava-se ainda vivo, apenas esperando
o momento certo para volver ao trono e afastar o domínio estrangeiro. Seu mais popular
divulgador foi o poeta Bandarra que produziu incansáveis versos clamando pelo retorno do
Desejado. Explorando a crendice popular vários oportunistas se apresentavam como o rei
oculto na tentativa de obter benefícios pessoais. O maior intelectual a aderir ao movimento
foi o Padre Vieira. Finalmente em 1640, pelo golpe restauracionista liderado pelos
Braganças, no Porto, Portugal voltou a ser independente e o movimento começou a arrefecer
no interior do Nordeste, também ser motivo da crença na chegada de um “rei bom”.
Basicamente é um messianismo adaptado às condições lusas e depois nordestinas. Traduz
uma inconformidade com a situação política vigente e uma expectativa de salvação, ainda
que miraculosa, através da ressurreição de um morto ilustre.
In: http://educaterra.terra.com.br/voltaire/500br/canudos7.htm

Barroco - Momento Histórico


Lisboa era considerada a capital mundial da pimenta, a agricultura lusa era
abandonada. Com a decadência do comércio das especiarias orientais observa-se o
declínio da economia portuguesa. Paralelamente, Portugal vive uma crise dinástica: em
1578 D. Sebastião desaparece em Alcácer-Quibir, na África; dois anos depois, Felipe II da
Espanha consolida a unificação da Península Ibérica.
A perda da autonomia e o desaparecimento de D. Sebastião originam em Portugal
o mito de Sebastianismo (crença segundo qual D. Sebastião voltaria e transformaria
Portugal no Quinto Império). O mais ilustre sebastianista foi, sem dúvida, o Pe. Antônio
Vieira, que aproveitou a crença surgida nas “trovas” de um sapateiro chamado Gonçalo
Anes Bandarra.
In: http://members.tripod.com/~netopedia/Literatura/barroco.htm

“[...] Veio depois a derrota de Alcácer-Quibir e o desaparecimento do Rei (1578). A


nação caiu sob o domínio castelhano. A literatura chorou, com a perda de D. Sebastião, o
desfazer das esperanças desmedidas, a ruína dum povo que, havia pouco, deslumbrara o
mundo com os Descobrimentos e a criação de um grande Império. Vasco Mouzinho de
Quevedo, por exemplo, recorda doridamente o Rei, «Sebastião cuja morte inda hoje é viva,
/ Renovando-se sempre de ano em ano». Foi então que surgiu, como instintiva reacção, o
sebastianismo. Julgou-se que só a fé visionária poderia salvar-nos. Na primeira metade do
séc. XVI vários pretensos profetas, desafiando os rigores da Inquisição, haviam aliciado
adeptos, nomeadamente cristãos novos. Entre esses «profetas» contava-se Gonçalo Anes,
de alcunha «o Bandarra», sapateiro de Trancoso (Beira Alta), homem cujas trovas,
largamente divulgadas, se tornariam «o evangelho do sebastianismo». O Bandarra (falecido
em 1545, segundo um epitáfio mandado gravar no séc. XVII) tinha-se inspirado na Bíblia

74
para verberar a corrupção da época e fazer obscuras predições, entre as quais, parece,
estavam a da conquista de Marrocos, a da derrota dos Turcos e a do Quinto Império. [...]
Durante o séc. XIX, o sebastianismo foi passando da esfera política para os domínios
literário e culturológico. O sonho heróico de D. Sebastião, a sua morte na batalha, o mito do
seu regresso e a quimera do Quinto Império inspiram poetas e prosadores. [...] No Frei Luís
de Sousa de Garrett, é Telmo, o velho criado, quem associa à fé no retorno do Rei a convicção
de que D. João de Portugal, seu amado amo, um dia aparecerá.”
(Coelho, Jacinto do Prado, DICIONÁRIO DE LITERATURA)
Alexandre Herculano: em busca das origens

Um exército de homens, montados em cavalos e armados com lanças, atiradeiras e


escudos, põe-se em fileira. Em suas bandeiras vêem-se brasões e o símbolo da cruz. À sua
frente, coloca-se outro exército de homens de feições diferentes, com turbantes na cabeça,
roupas compridas e largas, falando uma língua estranha e defendendo um deus diferente:
Alá.
Não se trata de um filme da “sessão da tarde” na televisão, embora esse seja um
tema de filmes de aventura. Trata-se de uma das situações criadas por Alexandre Herculano
(1810--1877), escritor português que se interessou por temas históricos, principalmente
aqueles cujo cenário é a Idade Média, mundo de fantasias em que cavaleiros heróicos
lutam contra o exército árabe e procuram salvar donzelas indefesas.
Embora também tenha cultivado a poesia, foi na prosa de ficção que Alexandre
Herculano deixou sua maior contribuição. Nela o autor fez uso de seu largo conhecimento
da história de Portugal, particularmente a relativa à Idade Média, introduzindo o romance
histórico no país.
Esse gênero renovou e revigorou a prosa de ficção portuguesa, dado o desgaste
das novelas de cavalaria e das novelas sentimentais. Herculano é autor dos romances O
bobo (situado no século XII), Eurico, O presbítero (situado no século VIII) e O monge de
Cister (situado no século XVI).
Cereja & Magalhães, 1999:20

Os Lusíadas
As armas e os barões assinalados
Os Lusíadas são considerados a
Que, da ocidental praia lusitana,
principal epopéia da época moderna
Por mares nunca de antes navegados
devido à sua grandeza e universalidade.
Passaram ainda além da Taprobana,
As realizações de Portugal desde o
Em perigos e guerras esforçados,
Infante D. Henrique até à união dinástica
Mais do que prometia a força humana,
com Espanha em 1580 são um marco na
E entre gente remota edificaram
História, marcando a transição da Idade
Novo reino, que tanto sublimaram.
Média para a Época Moderna. A epopéia
(...)
narra a história de Vasco da Gama e dos
Cantando espalharei por toda a parte,
heróis portugueses que navegaram em
Se a tanto me ajudar o engenho e arte
torno do Cabo da Boa Esperança e
abriram uma nova rota para a Índia.
Camões, Lusíadas, Canto I.
É uma epopéia humanista, mesmo nas suas contradições, na associação da mitologia
pagã à visão cristã, nos sentimentos opostos sobre a guerra e o império, no gosto do repouso
e no desejo de aventura, na apreciação do prazer e nas exigências de uma visão heróica.
In: http://pt.wikipedia.org

75
Estudo
daLiteratura
Portuguesa
D. Sebastião
Décimo sexto rei de Portugal, filho do príncipe D. João e de D.
Joana de Áustria, nasceu em Lisboa a 20 de Janeiro de 1554, e morreu
em Alcácer Quibir, a 4 de Agosto de 1578. Sucedeu a seu avô D. João
III, sendo o seu nascimento esperado com ansiedade, enchendo de júbilo
o povo, pois a coroa corria o perigo de vir a ser herdada por outro neto
de D. João III, o príncipe D. Carlos, filho de Filipe II de Espanha.
De saúde precária, D. Sebastião mostrou desde muito cedo duas
grandes paixões: a guerra e o zelo religioso. Cresceu na convicção de
que Deus o criara para grandes feitos, e, educado entre dois partidos palacianos de
interesses opostos - o de sua avó que pendia para a Espanha, e o do seu tio-avô o cardeal
D. Henrique favorável a uma orientação nacional -, D. Sebastião, desde a sua maioridade,
afastou-se abertamente dum e doutro, aderindo ao partido dos validos, homens da sua
idade, temerários a exaltados, que estavam sempre prontos a seguir as suas
determinações.
Nunca ouviu conselhos de ninguém, e entregue ao sonho anacrónico de sujeitar a si
toda a Berbéria a trazer à sua soberania a veneranda Palestina, nunca se interessou pelo
povo, nunca reuniu cortes nem visitou o País, só pensando em recrutar um exército a armá-
lo, pedindo auxílio a Estados estrangeiros, contraindo empréstimos e arruinando os cofres
do reino, tendo o único fito de ir a África combater os mouros.
Chefe de um numeroso exército, na sua maioria aventureiros e miseráveis, parte
para a África em junho de 1578; chega perto de Alcácer Quibir a 3 de Agosto e a 4, o
exército português esfomeado a estafado pela marcha e pelo calor, e dirigido por um rei
incapaz, foi completamente destroçado, figurando o próprio rei entre os mortos.

O QUINTO IMPÉRIO - Ontem como Hoje


Realizador - Manoel de Oliveira
Ano de Produção - 2004
www.madragoafilmes.pt

Sinopse
Este filme a que dou o título de O QUINTO IMPÉRIO - ONTEM COMO HOJE, baseia-
se na peça teatral EL-REI SEBASTIÃO, de José Régio. José Régio (1900 a 1968) foi
crítico, poeta, dramaturgo, romancista e ensaísta, figura cimeira do seu tempo e de hoje,
que segundo uma sua própria declaração, pretendeu analisar o Rei, o Homem e a mítica
personagem. O rei Sebastião, depois da estrondosa derrota na batalha de Alcácer-Kibir
(1578), mais conhecida pela Batalha dos Três Reis, e por jamais ter sido identificado o seu
corpo após a batalha, se tornou no mito do encoberto ele que fora antes o desejado e o
destinatário ao mito. Mito, aliás cantado e exaltado nos sermões do Padre António Vieira
(Século XVII), pelo filósofo Sampaio Bruno (século XIX) e no século XX pelo poeta Fernando
Pessoa e pelo filósofo José Marinho, entre outros escritores e psicólogos portugueses,

76
como ainda por estudiosos estrangeiros. Curiosamente, este mito também faz parte da
mitologia muçulmana com a mesma nomenclatura do encoberto e, tal como o rei Sebastião,
é suposto vir a acontecer o mesmo com o Iman muçulmano (o da décima segunda geração)
cuja crença comum é a de que virá num cavalo branco, em uma manhã de nevoeiro para
derrubar definitivamente o mal do mundo e estabelecer a concórdia entre os povos.

Alcácer Quibir battle.


In: http://genealogia.netopia.pt/home/article.php?id=57

77
Etapa 1
Os acontecimentos da História de Portugal estão intimamente ligados
a sua produção literária. A fim de colher informações a respeito da atividade
Estudo proposta, observe os quadros e textos acima e escolha um dos temas, para
da Literatura em seguida discutir o tema e criar as duas primeiras partes do jornal/painel
Portuguesa informativo-cultural: o editorial e a reportagem. Para isso veja algumas dicas
e sugestões.

PRODUZINDO UM EDITORIAL

Leve em conta as características de um editorial:


Expressa a opinião do jornal sobre um assunto quase sempre polêmico;
Tem intenção de persuadir os leitores, esclarecer ou alterar seus pontos
de vista, alertar a sociedade e, às vezes, até mobilizá-la;
 É uma tese ou ponto de vista fundamentado por comparações,
exemplificações, depoimentos, pesquisas e dados estatísticos, citações,
retrospectiva histórica, etc.;
 Possui uma estrutura convencionalmente organizada em três partes:
introdução, desenvolvimento e conclusão;
Deve ter linguagem clara, objetiva e impessoal;

Com base nas informações colhidas, na pesquisa e no próprio conhecimento a


respeito do tema elabore um editorial apresentando aos leitores os assuntos que serão
abordados. Sugere-se que o editorial possua entre 20 a 30 linhas, que seja empregado o
padrão culto e formal da língua portuguesa, como é próprio desse gênero literário.

PRODUZINDO UMA REPORTAGEM

Leve em conta as características de uma reportagem:


Normalmente, apresenta título, lead e, em seguida, desenvolve de modo
mais aprofunda- dos fatos que interessam ao público a que se destina o jornal ou a
revista;
Costuma estabelecer conexões entre o fato central e fatos paralelos, por
meio de citações.
Trechos de entrevistas, boxes informativos, dados estatísticos, fotografias;
Pode ter um caráter opinativo, questionando as causas e os efeitos dos
fatos, interpretan-do-os, orientando os leitores;
Apresenta versões e opiniões diferentes sobre um mesmo fato;
Predomínio da função referencial da linguagem;
Se necessário, busque informações em jornais, revistas e livros, além dos textos
disponibilizados. Escreva a reportagem, considerando as características do gênero e, se
possível, ilustre-a com fotografias, gravuras ou figuras. Dê-lhe um título que atraia a atenção
do leitor e, ao mesmo tempo, anuncie o assunto. Coloque um subtítulo, se julgar necessário.
A linguagem deve ser impessoal, objetiva, direta, de acordo com o padrão culto da língua.

78
Etapa 2
Para complementar o jornal/painel informativo-cultural é necessário criar agora
algumas produções de caráter mais pessoal como a crônica e a crítica, conforme orientação
a seguir.

PRODUZINDO UMA CRÔNICA


Leve em conta as características de uma crônica:
Texto publicado geralmente em jornais e revistas;
Relata de forma artística e pessoal fatos colhidos no noticiário jornalístico
e no cotidiano;
Consiste em um texto curto e leve;
 Tem por objetivo divertir e/ou refletir criticamente sobre a vida e os
comportamentos humanos;
Pode apresentar os elementos básicos da narrativa: fatos, personagens,
tempo e lugar;
O tempo e o espaço são normalmente limitados;
Pode apresentar narrador-observador ou narrador-personagem; às vezes,
emprega a 2ºpessoa.

1ª Opção: Pensar em uma situação corriqueira, semelhante às narradas nos textos


acima, que tenha sido presenciada por vocês no decorrer do curso, diretamente relacionada
com o estudo desse módulo. Escreva uma crônica sobre ela.
2ª Opção: Tomar como base um fato ocorrido e amplamente divulgado pela imprensa
escrita (exemplificada nos textos). Elabore uma crônica que revele uma visão pessoal do
acontecimento.

Aborde o fato ou a situação escolhida procurando ir além do circunstancial, narrando


com sensibilidade ou, se quiser, com humor. Terminando o texto, dê a ele um título sugestivo.
Lembre-se que a linguagem, geralmente, está de acordo com o padrão culto e informal da
língua.

PRODUZINDO UMA RESENHA CRÍTICA OU CRÍTICA LITERÁRIA


Leve em conta as características de uma crítica:
Texto de natureza argumentativa, que tem por objetivo informar o leitor
sobre um objeto cultural e avaliar seus pontos positivos e negativos;
Estrutura livre; normalmente se faz um resumo do texto, apresentando um
breve histórico de seu(s) autor(es) seguido de uma avaliação, na qual aponta os
aspectos mais importantes, estabelecendo relações com outros textos e contexto
histórico, comentando a sua importância e defendendo um ponto de vista.
Linguagem clara, objetiva e dinâmica, que procura prender a atenção do
leitor até o fim;

Escolha um texto literário para fazer uma crítica: um livro, um conto, um poema, etc.
de sua preferência, estudado durante o curso, tomando o cuidado de registrar: autor do
texto e a escola literária a qual pertence. Sugere-se que o texto possua entre 20 a 30 linhas.

79
Estudo
Etapa 3
Agora é chegado o momento de reunir todas as produções criadas
daLiteratura
Portuguesa nas etapas anteriores e montar o jornal/painel informativo-cultural. Para compor
a parte visual do jornal/painel, você poderá selecionar fotografias/figuras de
fontes diversas. Se houver entre vocês poetas e/ou contistas, seus textos serão bem vindos
para serem integrados ao jornal, pois este terá, também, cunho cultural.

80
Glossário
ABSOLUTISMO – O chamado absolutismo, etimologicamente falando, é o ato de
governar à solta, isto é, sem limites internos, sem contra-poderes, travões ou forças de
bloqueio. a forma de governo na qual um chefe de estado goza de um poder sem controle e
sem limites.

ANTROPOCENTRISMO – Doutrina que coloca o homem no centro do universo e


medida de todas as coisas. Necessidade inerente à raça humana de afirmar-se como criatura
suprema e acabada, o que algum dia fez com que o homem vinculasse sua imagem à dos
deuses.

BUCOLISMO – Tendência poética referente às obras que fazem o elogio da vida


campestre. Essas poesias são também chamadas de pastoris, porque nelas os pastores
são presenças constantes. O bucolismo foi uma das características da poesia arcádica.

CANTIGA DE REFRÃO – Forma poética caracterizada pela repetição de um ou


mais versos no final de cada estrofe, que corresponde à estrutura típica da cantiga peninsular
medieval.

CARPE DIEM – “Colhe o dia”, exortação de Horácio, poeta latino da época do


Imperador Augusto; foi o lema persuasivo do galanteio e da conquista dos corações femininos,
na medida em que chama a atenção para a perecibilidade da beleza, da morte de tudo.

DICOTOMIA – Divisão em duas partes de alguma coisa.

EVOLUCIONISMO – A teoria da evolução, também chamada evolucionismo, afirma


que as espécies animais e vegetais existentes na Terra não são imutáveis, mas sofrem ao
longo das gerações uma modificação gradual, que inclui a formação de raças e espécies
novas.

FARSA – Modalidade teatral cômica que surgiu por volta do século XIV, e se
caracteriza pelos personagens e situações exageradas, a farsa se distingue da comédia
propriamente dita por não observar regras de verossimilhança e difere da sátira ou da
paródia por não pretender questionar valores. Geralmente desligada da reflexão a respeito
da beleza e de propósitos éticos ou didáticos, pretendendo assim, provocar o riso explorando
situações engraçadas, grotescas e ridículas da vida quotidiana, apelando para a caricatura
e os exageros. Às vezes ganha conteúdo crítico ou de denúncia à revelia do autor. Não tem
outra intenção a não ser provocar o riso.

FEUDALISMO – O feudalismo é um modo de produção típico de sociedades


agrárias, caracterizado por relações de servidão do trabalhador ao proprietário da terra,
dividida em lotes produtivos (feudos). Predominou na Europa durante a Idade Média.

LAICIZAÇÃO – Da palavra laico - adjetivo que significa oposição a tudo o que tenha
qualquer ligação com a religião.

81
Estudo
daLiteratura
Portuguesa

LUSA – Refere-se a Portugal

MEDIDA VELHA E MEDIDA NOVA – Duas técnicas versificatórias, no séc. XVI: a


primeira designa a tradicional (estruturas e metros utilizados pelos poetas do Cancioneiro
Geral, em redondilha menor ou maior); a segunda, a importada de Itália por Sá de Miranda
e António Ferreira (com um novo verso, o decassílabo, e novas formas e sub-gêneros, como
o soneto, a canção, etc.).

PANTEÍSTA - Panteísmo é uma doutrina que identifica o universo (em grego: pan,
tudo) com Deus (em grego: theos).

POSITIVISMO – O positivismo foi uma corrente filosófica cujo mentor e iniciador


principal foi Auguste Comte, no século XIX. Apareceu como reação ao idealismo, opondo
ao primado da razão, o primado da experiência sensível (e dos dados positivos). Propõe a
ideia de uma ciência sem teologia ou metafísica, baseada apenas no mundo físico/material.

REDONDILHA – São versos de cinco ou sete sílabas poéticas. O de cinco sílabas é


chamado de redondilha menor; o de sete, de redondilha maior.

ROMANCES – Do Romanceiro - Poesia Portuguesa e espanhola de carácter épico,


anónima, destinada ao canto e transmitida por tradição oral, durante a Idade Média.
Compilação desses poemas tradicionais, os romances.

TEOCENTRISMO – Baseia-se na concepção de que Deus é o centro do universo.


Foi a corrente de pensamento predominante no período medieval.

TROVA – (Latim, tropare = inventar, compor tropos) Durante a Idade Média (galaico-
portuguesa), o vocábulo “trova” era sinônimo de “cantiga”, e, portanto, designava toda a
espécie de poema em que havia aliança entre letra e música. A partir do século XVI, com a
desvinculação havida entre música e letra, o termo fixou-se como equivalente da quadrinha.

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Referências
Bibliográficas
ABDALA JR & PASCHOALIN, M. Aparecido. História social da literatura
portuguesa. São Paulo: Ática, 1982.

MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa através dos textos. São Paulo: Cultrix,
1990.

MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. 26 ed. (rev. e aum.), São Paulo: Cultrix,
1991.

MOISÉS, Massaud (org.). A literatura portuguesa em perspectiva. São Paulo:


Atlas, 1994, 4 vols.

SARAIVA, António José e LOPES, Óscar. História da literatura portuguesa. 10


ed. Porto: Porto Editores, 1978.

SPINA, Segismundo. A Cultura Literária Medieval. São Paulo: Ateliê, 1997.

SITES CONSULTADOS:

http://www.instituto-camoes.pt
http://www.secrel.com.br
http://www.pt.wikipedia.org
http://www.itaucultural.org.br
http://www.vidaslusofonas.pt
http://www.mundocultural.com.br
http://www.citi.pt

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Estudo
daLiteratura
Portuguesa

FTC - EaD
Faculdade de Tecnologia e Ciências - Educação a Distância
Democratizando a Educação.
www.ftc.br/ead

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