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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMIÁRIDO

CAMPUS MOSSORÓ
BACHARELADO EM CIÊNCIA E TECNOLOGIA

MATEUS SOARES DA SILVA XAXÁ

CONSTRUÇÃO COM TERRA CRUA: BLOCO MATTONE

MOSSORÓ – RN
2013
MATEUS SOARES DA SILVA XAXÁ

CONSTRUÇÃO COM TERRA CRUA: BLOCO MATTONE

Monografia apresentada à Universidade


Federal Rural do Semiárido – UFERSA,
Campus Mossoró, para a obtenção do título de
Bacharel em Ciência e Tecnologia.

Orientador (a): Prof.ª Dra. Marineide Jussara


Diniz - UFERSA

MOSSORÓ – RN
2013
Ficha catalográfica preparada pelo setor de classificação e catalogação
da Biblioteca “Orlando Teixeira” da UFERSA
X1c Xaxá, Mateus Soares da Silva.

Construção com terra crua: bloco Mattone / Mateus Soares da


Silva Xaxá. – Mossoró, RN: 2013.

44f. : il.

Orientadora: Prof.ª Drª. Marineide Jussara Diniz.

Monografia (Graduação) – Universidade Federal Rural do


Semi-Árido, Graduação em Ciência e Tecnologia, 2013.

1. Terra crua. 2. Materiais de construção. 3. Bloco Mattone. I.


Título.

CDD: 691.2
Bibliotecária: Marilene Santos de Araújo

CRB-5/1033
AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus primeiramente, por todas as conquistas até aqui alcançadas. A minha família,
por todo o apoio e incentivo. Igualmente aos amigos que estiveram ao meu lado. E a minha
orientadora, Marineide Jussara Diniz, por todo apoio e conselhos para a realização deste
trabalho.
RESUMO

Entre os materiais benéficos aos seres humanos tem-se a terra crua que os acompanha
desde os primórdios da humanidade. A construção com terra, largamente utilizada por nossos
antepassados, é uma manifestação marcante do uso de recursos naturais abundantes na
convivência do Homem com a Natureza. Atualmente, o uso da terra como material de
construção pode ser distinguido de dois modos: a sobrevivência dos sistemas construtivos
primitivos, preservados pela carência em que vivem algumas populações; ou pelo uso de
técnicas inovadoras, incentivadas pelas investigações em universidades e outras instituições,
caracterizadas pela simplicidade, eficácia e baixo custo. O solo-cimento é uma das
possibilidades do uso da terra para a produção de edificações. A mistura da terra e cimento,
devidamente dosada e compactada, adquire resistência e apresenta durabilidade compatíveis
com os critérios necessários para a construção de edificações. Este trabalho mostra a aplicação
da técnica solo-cimento conhecida como BTC – Blocos de terra compactado, tipo Mattone.

Palavras–chave: Terra Crua, Materiais de construção, Bloco Mattone


LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas


A.C – Antes de Cristo
BTC – Bloco de Terra Compactado
GO – Goiás
MG – Minas Gerais
NBR – Norma Brasileira
UFERSA – Universidade Federal Rural do Semiárido
LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 - ALMACENES, TEMPLO DE RAMSÉS II, GOURNA, EGITO............................................ 13


FIGURA 2 - GRANDE MURALHA DA CHINA ................................................................................ 14
FIGURA 3 - IGREJA FEITA EM TERRA, PIRENOPÓLIS-GO ............................................................. 14
FIGURA 4 - CASA DE TAIPA MAL ACABADA ............................................................................... 16
FIGURA 5 - TAIPAL E PILÃO ....................................................................................................... 18
FIGURA 6 - CASA DE TAIPA DE PILÃO EM CAMPINAS-SP ........................................................... 18
FIGURA 7 - TIJOLOS DE ADOBE SENDO MOLDADOS .................................................................... 19
FIGURA 8 - TIJOLOS DE ADOBE SECANDO AO SOL ...................................................................... 19
FIGURA 9 – CÚPULA DE ADOBE ................................................................................................. 20
FIGURA 10 – ESTRUTURA (ENTRAMADO) DE MADEIRA ............................................................. 21
FIGURA 11 - CASA DE TAIPA MAL ACABADA ............................................................................. 22
FIGURA 12 - PAU-A-PIQUE COM TÉCNICA ADEQUADA ................................................................ 22
FIGURA 13 - CONSTRUÇÃO COM PÃES DE BARRO ...................................................................... 23
FIGURA 14 - ESCULTURA EM PAREDE DE COB............................................................................ 24
FIGURA 15 - MÓVEIS EM COB .................................................................................................... 24
FIGURA 16 - PRENSA MANUAL PARA FABRICAÇÃO DE SOLO-CIMENTO ..................................... 25
FIGURA 17 - PRENSA HIDRÁULICA ............................................................................................ 26
FIGURA 18 - TIJOLO DE SOLO-CIMENTO MACIÇO ...................................................................... 26
FIGURA 19 - TIJOLOS COM ENCAIXES MACHO E FÊMEA .............................................................. 27
FIGURA 20 - DIMENSÕES DO BLOCO .......................................................................................... 27
FIGURA 21 - SOLO SENDO PENEIRADO ....................................................................................... 28
FIGURA 22 - HOMOGENEIZAÇÃO DOS ELEMENTOS ..................................................................... 29
FIGURA 23 - PRENSA PARA MOLDAGEM DOS BLOCOS................................................................. 29
FIGURA 24 - CURA E ARMAZENAMENTO .................................................................................... 30
FIGURA 25 - PRENSA ALTECH GEO 50 ...................................................................................... 32
FIGURA 26 - FÔRMA DA PRENSA PARA O BLOCO MATTONE ....................................................... 32
FIGURA 27 - PROF. MATTONE EXPLICANDO O FUNCIONAMENTO DA PRENSA E O BLOCO
MOLDADO ........................................................................................................................... 32

FIGURA 28 - DETALHE DA FUNDAÇÃO ....................................................................................... 34


FIGURA 29 - LEVANTAMENTO DA PAREDE (CORREÇÃO DOS DESNÍVEIS) ................................... 35
FIGURA 30 - PAREDE SEM ACABAMENTO E DECORADA .............................................................. 36
FIGURA 31 - EDIFICAÇÃO SEM REVESTIMENTO .......................................................................... 37
FIGURA 32 - A CASA FOI PINTADA PELO MORADOR .................................................................... 37
FIGURA 33 - PAREDE DE BLOCO MATTONE SOB CARGA DE 200 KN ........................................... 38
FIGURA 34 - TESTE REALIZADO NO POLITECICO DE TORINO ...................................................... 38
FIGURA 35 - ARMOU-SE UMA REDE PROVANDO A RESISTÊNCIA DO PAINEL................................ 39
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 11

2. METODOLOGIA............................................................................................................... 12

3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .......................................................................................... 13

3.1. GENERALIDADES ........................................................................................................... 13


3.2. TERRA CRUA – TÉCNICAS DE CONSTRUÇÃO ................................................................ 15
3.2.1. Taipa de Pilão ......................................................................................................... 17
3.2.2. Adobe ...................................................................................................................... 19
3.2.3. Pau-a-Pique ............................................................................................................ 20
3.2.4. Pães de Barro.......................................................................................................... 22
3.2.5. Cob .......................................................................................................................... 23
3.2.6. Solo-cimento ou BTC ............................................................................................. 25
3.3. TIJOLO OU BLOCO MATTONE ....................................................................................... 26
3.3.1. Processo de Produção ............................................................................................ 28
3.3.1.1 Tipo de Solo ...................................................................................................... 30
3.3.1.2. Mistura e Homogeneização ............................................................................ 31
3.3.1.3. Moldagem ........................................................................................................ 31
3.3.1.4. Cura ................................................................................................................. 33
3.3.2. Processo Construtivo .............................................................................................. 33
3.3.2.1. Locação ............................................................................................................ 33
3.3.2.2. Fundação ......................................................................................................... 33
3.3.2.3. Levantamento das paredes ............................................................................ 34
3.3.2.4. Coberta ............................................................................................................ 35
3.3.2.5. Acabamento e Instalações .............................................................................. 36
3.3.3. Testes Experimentais.............................................................................................. 37
3.3.3.1. Testes Realizados ............................................................................................ 39

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 40

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................. 41


1. INTRODUÇÃO

A terra é um das matérias mais abundantes no planeta. Assim sendo, possui um excelente
potencial para ser utilizado como base para a construção, apresentando ainda as vantagens de
sua utilização não necessitar de processos de transformação dispendiosa em termos energéticos,
apresentar um bom comportamento térmico e acústico, ser reutilizável e reciclável, ser atóxico
e incombustível. As construções podem ser feitas completas ou parcialmente de terra,
dependendo fundamentalmente da sua localização, do clima, dos recursos disponíveis, do custo
e do uso que se fará do mesmo, podendo as paredes ser erguidas de forma monolítica ou não,
utilizando-se elementos construtivos na forma de tijolos, blocos ou painéis.
Para a construção com terra, é preciso conjugar duas condições básicas: a existência da
matéria-prima em abundância e o conhecimento adequado das técnicas de construção. A terra
crua e o solo-cimento utilizam como matéria-prima bruta a própria terra, necessitando apenas
da energia mecânica humana para a sua fabricação, ou seja, moldagem. Além de poderem ser
utilizadas com facilidade por indivíduos de menor poder econômico, é excelente agente de
integração entre comunidades carentes, seja em nível de formação de mão-de-obra
especializada, seja em nível de implementação de programas de moradias populares construídas
pela comunidade, o que acarreta ganhos nos aspectos social, econômico e ambiental.
As inovações científicas e tecnológicas do último século, sobretudo no que diz respeito às
soluções de estabilização do solo melhoraram significativamente a construção em terra: a sua
durabilidade, economia, sustentabilidade e estética. Fazendo uso das atuais tecnologias e de
certa forma respondendo à necessidade de maior rapidez na execução das construções, surge
assim o Bloco de Terra Compactado designado por BTC.
O presente trabalho mostra a aplicação da técnica de solo-cimento conhecida como BTC -
Bloco de Terra Compactado, do tipo Mattone, enumerando algumas vantagens oferecidas pelo
emprego deste material na construção.
2. METODOLOGIA

Na elaboração deste estudo foi feita pesquisa, em forma de revisão bibliográfica, sobre
o que existe em termos de tecnologia construtiva ao nível de paredes de alvenaria com particular
atenção aos blocos de solo-cimento(BTC), tipo Mattone.
Objetivo foi conhecer, através do estudo e pesquisa de trabalhos anteriores, a evolução
dos sistemas construtivos de alvenarias com solos desde os primórdios da humanidade até aos
nossos dias.
3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
3.1. Generalidades
Em quase todos os climas semiáridos e temperados do mundo, a terra tem sido o material
de construção predominante. Ainda hoje, um terço da humanidade vive em moradias de terra,
e em países em desenvolvimento isto representa mais da metade da população. (MINKE, 2005)
Não é consensual a data em que o homem começou a utilizar a terra na construção.
Minke refere que deve ter sido há mais de 9.000 anos, baseando essa convicção na descoberta
de habitações no atual Turquemenistão à base de blocos de terra (adobe) datadas de um período
entre 8.000 a 6.000 A.C. Já Pollock afirma que a utilização da terra para construção remonta ao
período de El-Obeid na Mesopotâmia (5.000 a 4.000 A.C). Por outro lado, Berge refere que
datam de 7.500 A.C os exemplares mais antigos de blocos de adobe, os quais foram descobertos
na base do rio Tigres, pelo que na sua opinião as habitações em terra poderão ter começado a
ser usadas há mais de 10.000 anos. Não parece contudo ser muito relevante saber se a
construção em terra se iniciou há mais de 9.000 ou há mais de 10.000 anos. Porém, não se estará
muito longe da verdade se admitir-se que a construção em terra tenha tido o seu início
juntamente com o início das primeiras sociedades agrícolas num período cujos conhecimentos
atuais remontam entre 12.000 a 7.000 A.C. São inúmeros os casos de construções em terra, que
executadas há alguns milhares de anos conseguiram chegar ao século XXI. O Templo de
Ramsés II em Gourna (figura 1), construído em adobe há 3.200 anos é um deles. Também a
Grande Muralha da China (figura 2), cuja construção se iniciou há aproximadamente 3.000 anos
apresenta trechos bastante extensos construídos em taipa. Importante também ter presente que
muitos trechos que inicialmente foram construídos em taipa só mais tarde que foram revestidos
com alvenaria de pedra. (TORGAL; JALALI, 2009)
Figura 1 - Almacenes, templo de Ramsés II, Gourna, Egito

Fonte: MINKE, 2005


Figura 2 - Grande Muralha da China

Fonte: BORGES; COLOMBO, 2009


As construções em terra crua chegaram ao Brasil, trazidas pelos colonizadores europeus
e, mais tarde, pelos africanos. Os índios não utilizavam esse material para a construção de suas
casas. Em lugar da terra e da pedra, materiais de origem mineral, utilizavam materiais de origem
vegetal, como a madeira e a palha. Suas casas tinham uma dinâmica própria, bem diferente das
casas europeias. Eram casas comunitárias, que não possuíam repartições internas e onde
dormiam várias famílias e, durante o dia, as diferentes atividades aconteciam paralelamente
dentro da casa, sem que uma impedisse a execução da outra. (ALVES FILHO, 1998 apud
SILVA, 2000)
Em cidades históricas como Tiradentes-MG, Pirenopólis-GO, ilustrada na Figura 3, e
Ouro-Preto-MG, existem diversas construções com terra que foram construídas há muitas
décadas e permanecem bem conservadas ao longo de todos esses anos. (BORGES;
COLOMBO, 2009)
Figura 3 - Igreja feita em terra, Pirenopólis-GO

Fonte: BORGES; COLOMBO, 2009


O advento da Revolução Industrial provocou a rejeição, de um modo geral, aos produtos
manufaturados. Em nome do progresso, as tecnologias consideradas rudimentares - entre elas
a técnica de construção em terra crua - foram sumariamente desprezadas, consideradas arcaicas
e pobres; principalmente nos países industrializados. E os países pobres, por sofrerem forte
influência por parte dos países ricos, absorvem os costumes destes, em detrimento aos costumes
locais, e alguns acabam por perder sua identidade cultural por completo. Tal comportamento
gera, entre outros, os problemas causados pela substituição de soluções locais, culturalmente
sedimentadas, por soluções importadas, nem sempre adaptáveis, sobretudo culturalmente.
(SILVA, 2000)
Assim, nas últimas décadas sua utilização foi reduzida, devido ao surgimento de
matérias que tornam o processo construtivo mais rápido - apesar de devastadores. (BORGES;
COLOMBO, 2009)
A indústria da produção de tijolos cozidos, em lugar da madeira como fonte de energia,
pode utilizar o combustível fóssil ou a energia elétrica. Embora ambas soluções sejam
igualmente problemáticas, se levarmos em conta a grave crise energética que o país enfrenta.
E, dependendo do combustível utilizado, essa produção pode gerar pesados níveis de poluição
atmosférica, causando danos ao meio ambiente e à saúde das pessoas.
O uso da terra crua como material de construção garante a manutenção do equilíbrio
ecológico, por se tratar de material não tóxico, que pode ser usado por pessoas de qualquer
idade, inclusive crianças - ao contrário da maior parte dos materiais utilizados atualmente.
(SILVA, 2000)
Pode-se notar um crescente interesse por construções ambientalmente sustentáveis, e
também pela necessidade em minimizar o déficit habitacional, em todo o mundo, deste modo
às técnicas de construção com terra vêm sendo resgatadas. (BORGES; COLOMBO, 2009)
As construções com terra apresentam custo de montagem e manutenção que permite o
seu consumo pela população local, utiliza matéria prima local sem exigir transporte - estes por
sua vez que consomem energia ou recursos não renováveis - o material utilizado é reciclado,
ou seja, não geram resíduos, e por fim privilegia a mão de obra local. (COELHO, 2007 apud
BORGES; COLOMBO, 2009).

3.2. Terra Crua – Técnicas de construção


As técnicas tradicionais baseadas no uso da terra crua são técnicas artesanais, pois
utilizam materiais disponíveis no próprio local da construção e, de uma forma geral, recursos
locais. Por essa razão, apresentam normalmente variações acentuadas de região para região,
podendo mesmo haver diferenças significativas entre construções situadas em terrenos
próximos. Não obstante, é possível efetuar uma classificação genérica dos seus principais
sistemas construtivos. (GONÇALVES; GOMES, 2012)
Construções em terra crua são aquelas, cujas paredes são feitas em barro socado ou sob
forma de tijolos crus, sem cozimento. O sistema construtivo em terra crua é composto por
técnicas como a taipa de pilão, adobe, pau-a-pique, pães de barro e solo cimento, cada uma com
características e especificidades próprias. Trata-se de um sistema construtivo milenar, datado
de cerca de 5.000 anos e que, ainda hoje é o método construtivo mais utilizado em todo o
mundo, apesar da crescente industrialização e até informatização na área da construção civil.
Entretanto no Brasil, as casas de terra crua representam sinônimo de insalubridade, pobreza e
infecção pela Doença de Chagas. (SILVA, 2000)
Segundo Barbosa (2002) a maioria das construções com terra ainda existentes são
exemplos de tecnologia perdida. As construções dos senhores de engenho apresentavam bom
desempenho e aspecto, e eram feitas em terra. Ainda segundo Barbosa (2002) este material é
visto como “material de pobre” devido ao uso incorreto, resultando em construções de má
qualidade e péssimo aspecto (Figura 4).
Figura 4 - Casa de Taipa mal acabada

Fonte: BARBOSA; MATTONE; MESBAH, 2002


A terra como material de construção é utilizada, basicamente, de dois modos: embebido
em água, constituindo uma massa plástica ou barro; ou uma mistura úmida, compactada ou
prensada, denominada terra comprimida. (NEVES et al, 2005)
Além de apresentar bom resultado tanto em regiões de climas secos, quanto em regiões
de climas úmidos, esse material também apresenta eficácia em climas quentes e em climas frios.
Quando as paredes são espessas (40 a 50cm de espessura) garantem a inércia térmica necessária
para manter a temperatura interna constante, a níveis amenos, apesar da temperatura externa
estar extremamente alta ou baixa. Essa inércia térmica garante também a versatilidade do
material, no sentido de possibilitar o seu uso em regiões do planeta, cujos climas sejam tão
diferentes entre si, e até opostos. (SILVA, 2000)
São várias as técnicas de construções com terra, tais como: taipa de pilão, adobe, super
adobe, taipa leve, pau-a-pique - que nos países latino americanos de língua espanhola é
conhecido como quincha - tijolo de solo-cimento, Cob, entre outras. (BORGES; COLOMBO,
2009)
As técnicas mais utilizadas no Brasil na época da colonização eram então, a taipa de
pilão e a taipa de mão ou pau-a-pique. A taipa de pilão, por necessitar de maiores esforço e
contingente de mão de obra, era reservada somente aos prédios públicos, como Igrejas e Casas
de Câmara, ou à residência das classes dirigentes da época. Tais prédios eram construídos com
o uso luxuoso do óleo de baleia, como um componente importante para dar “liga” e resistência
às paredes. (SILVA, 2000)
E, por ser a técnica da taipa de pilão mais sólida e resistente do que o pau-a-pique, alguns
exemplares desse tipo de construção sobreviveram até os dias atuais, ainda em uso. E técnica
da taipa de mão ou pau-a-pique, talvez por necessitar de menor tempo e esforço para ser erguida,
ou por satisfazer à ideia de provisoriedade, atendendo ao costume nômade herdado dos índios,
era (e continua sendo ainda hoje) a técnica mais utilizada pela camada mais pobre da população,
e por isso era identificada pelos colonizadores europeus como um tipo miserável de construção.
(SILVA, 2000)
Atualmente, fora de um âmbito de aplicação tradicional, são empregues essencialmente
três técnicas construtivas em terra: o adobe, a taipa e o BTC. Em determinados contextos e
regiões, verifica-se ainda a utilização da terra como material de enchimento de uma estrutura.
Esta última utilização é mais expressiva em países onde, por razões sísmicas, é necessária a
criação de uma estrutura dúctil. (LOURENÇO; BRITO; BRANCO, 2001)

3.2.1. Taipa de Pilão


Um dos sistemas construtivos mais utilizados na antiguidade, a taipa de pilão era
considerada o mais sólido sistema de construção em terra crua, já que as paredes construídas
inteiras, monoliticamente, iam se solidificando progressivamente, com o passar dos tempos.
(SILVA, 2000)
A taipa de pilão foi trazida ao Brasil pelos colonizadores europeus e consiste em socar
a terra dentro de uma armação de madeira chamada taipal (figura 5), semelhante às fôrmas
atualmente utilizadas para moldar concreto. Dentro do taipal é colocada a argamassa em
camadas de 15cm, aproximadamente. (MOTORO, 1994 apud SILVA, 2000)
Figura 5 - Taipal e Pilão

Fonte: COISAS DA ARQUITETURA, 2013


Essa técnica predominou no estado de São Paulo, no período colonial, devido à
dificuldade em se obter pedra para construção. No período colonial as tabuas eram cortadas
manualmente, o que agregava valor às taipas, sendo assim, chegaram a fazer parte de
inventários. (PISANI, 2007 apud BORGES; COLOMBO, 2009).
Uma casa construída na técnica da taipa-de-pilão (figura 6), se for bem feita, ou seja, se
o barro for bem escolhido e bem compactado e se as paredes tiverem uma espessura entre 40 e
80cm, será uma casa sólida e confortável do ponto de vista térmico e acústico. E, quanto ao
ponto de vista estético, essas casas são bastante agradáveis, podendo até dispensar o uso de
reboco (camada final de revestimento), pois suas paredes ficam totalmente lisas, de modo que
permitem a aplicação da pintura direto sobre as paredes, depois de prontas. (SILVA, 2000)
Figura 6 - Casa de Taipa de Pilão em Campinas-SP

Fonte: ABCTerra, 2013


3.2.2. Adobe
O adobe é uma técnica de construção de paredes com tijolos de terra crua, preparados
em moldes e secos ao sol (figuras 7 e 8). Nesta técnica, a terra é misturada com água e, às vezes,
são adicionadas fibras que podem ser vegetais ou sintéticas, de forma a criar um bloco
consistente. Não devem ser usadas terras com argilas expansivas.
Figura 7 - Tijolos de Adobe sendo moldados

Fonte: ARTE CENTRAL, 2013


Figura 8 - Tijolos de Adobe secando ao sol

Fonte: PIRENÓPOLES, 2013


A massa para assentar os tijolos é a mesma que eles foram manufaturados, seguindo-se
os mesmos cuidados de se usar prumo, nível e demais ferramentas usadas na construção em
geral. (PICORELLI, 2011)
Ele foi utilizado em diversas regiões do mundo, principalmente regiões de clima seco.
Devido ao surgimento do tijolo cerâmico, o adobe foi perdendo espaço e seu uso ficou restrito
a população com poucos recursos, por isso o adobe e outras técnicas de construção com terra
são associadas à pobreza. (BORGES; COLOMBO, 2009)
Segundo Silva (200) esta técnica pode ser usada para a construção de paredes, e também
para a construção de abóbadas ou cúpulas (figura 9).
Figura 9 – Cúpula de Adobe

Fonte: PICORELLI, 2011


Existem diversas vantagens no uso do adobe, o barro é um material reutilizável, quando
não cozido pode ser triturado e umedecido para voltar ao estado original, sendo assim não gera
resíduos em uma obra e não contamina o meio ambiente. O barro é um material econômico que
pode ser encontrado na maioria das vezes próximo aos locais de obras e pode vir a substituir
outros materiais de construção, é também excelente regulador de umidade e gera excelente
conforto térmico e acústico na edificação. (BORGES; COLOMBO, 2009)

3.2.3. Pau-a-Pique
O pau-a-pique é também conhecido como taipa de sopapo, taipa de mão, taipa de sebe
e barro armado, nessa técnica a terra tem função de preencher os vazios deixados pelo
entrelaçamento de madeiras, ou seja, seu papel é quase de coadjuvante. A técnica consiste em
construir um entramado de madeira (figura 10), usa-se muito o bambu, e o barro é lançado e
batido com as mãos. O pau-a-pique serve como elemento de vedação, geralmente usado como
paredes internas das edificações, mas também pode ser parede externa. (BORGES;
COLOMBO, 2009)
Figura 10 – Estrutura (entramado) de Madeira

Fonte: BORGES; COLOMBO, 2009


O tempo de secagem, de uma parede de 15 a 20 cm, dura aproximadamente 30 dias,
após esse período as taipas recebem um revestimento para que as paredes sejam protegidas das
intempéries. (BORGES; COLOMBO, 2009)
O termo “pau-a-pique” se refere às peças de madeira ou bambu, que são colocadas “a
pique” sobre o baldrame, ou seja, perpendicularmente a ele. (VASCONCELOS, 1979 apud
SILVA, 2000). Trata-se da técnica construtiva mais comum no Brasil, por sua simplicidade e
facilidade, pois qualquer pessoa, mesmo que não seja especialista no assunto, pode construir
com esta técnica. A taipa em pau-a-pique, é processo construtivo antigo, conservado pela
tradição oral e conhecido por toda a população rural. É um material que apresenta incrível
maleabilidade. (SILVA, 2000)
De acordo com Smith (1955), os primeiros colonizadores portugueses, ao chegarem ao
Brasil, já encontraram os índios morando em casas feitas de estruturas de madeira, recobertas
de barro. Entretanto, para Milanez (1958), antes da chegada dos portugueses, os índios não
usavam a terra para construir: seus abrigos eram de madeira, paus roliços e vedações de palha
e folhagens. (LOPES; INO, 2003)
Muito utilizada em construções rurais, a taipa de mão foi também usada em áreas
urbanas, tanto nas paredes externas quanto nas internas. Era comum o seu uso associado a outras
técnicas, sendo as paredes externas construídas de adobe ou taipa de pilão e as divisões internas
e paredes do piso superior construídas com esta técnica, devido ao material ser mais leve.
(LOPES; INO, 2003)
Entretanto a execução do pau-a-pique quando mal feita, ou seja, sem acabamento, como
mostrado na figura 11, pode gerar uma série de problemas, desde a degradação da construção
até a proliferação de roedores e insetos, dentre eles o mais conhecido, Triatoma infestans,
vulgarmente conhecido com barbeiro, mosquito transmissor da doença de Chagas. (BORGES;
COLOMBO, 2009)
Figura 11 - Casa de Taipa mal acabada

Fonte: JORNAL DA USP, 2013


A figura 12 apresenta uma casa construída em taipa de mão utilizando corretamente as
técnicas de construção com este material.
Figura 12 - Pau-a-pique com técnica adequada

Fonte: Portal São Francisco, 2013

3.2.4. Pães de Barro


Muito usada na Europa do século XIX, sobretudo na Alemanha, esta técnica sobreviveu
e ainda hoje é utilizada nesse país e em alguns países da América do Sul. A técnica consiste em
confeccionar grandes bisnagas de barro e colocá-las uma sobre a outra, formando as paredes.
Essas bisnagas eram confeccionadas por toda a família, para a construção de suas casas,
conforme está ilustrado na gravura abaixo, tal era a leveza e a salubridade do material. (SILVA,
2000)
Técnica que consiste em moldar bolas de terra úmida e ir moldando-as uma a uma
(Figura13). Nesta técnica, os pães úmidos de barro são colocados sem argamassa. Um buraco
é feito com os dedos na face exterior de cada um para melhorar a aderência da argamassa do
reboco que se coloca posteriormente em ambos os lados e polida com uma pedra plana. São
colocadas de três a cinco fileiras por dia. Depois da secagem da parede, aplicam-se várias
camadas de reboco de cal. A primeira moradia foi construída em 1925. Nos anos seguintes
foram criadas cooperativas, formadas por desempregados, que construíram mais de 300
moradias, as plantas dos cômodos são em geral retangulares com esquinas arredondadas, todos
os membros da família participavam da produção e da construção. (AGUIAR, et. al., 2013)
Figura 13 - Construção com Pães de Barro

Fonte: MINKE, 2005

3.2.5. Cob
Esta técnica utiliza a mesma massa do adobe, porém diretamente no local da
construção. São feitas bolotas com a massa e essas são assentadas umas ao lado das outras em
camadas de até 20 cm. Faz-se todo o perímetro do cômodo a ser construído de uma só vez,
respeitando as camadas. Cada camada deve estar bem seca antes de se começar a próxima
camada. (ECOD, 2012)
Os cuidados com a fundação e cobertura são os mesmos que para as demais construções
com terra crua. Esta técnica permite que se façam cômodos circulares e se agreguem esculturas
na própria estrutura das paredes (Figura 14). (ECOD, 2012)
Figura 14 - Escultura em parede de Cob

Fonte: PERMACULTURA, 2013


Segundo Borges e Colombo (2009), essa técnica tem a vantagem de se empregar pouco
material, utiliza pouca água, possui longa vida útil além da possibilidade de se esculpir nas
paredes e fazer móveis, tais como, cadeiras, forno, sofá, saindo diretamente das paredes (Figura
15). Porém, possui algumas desvantagens, é bastante lenta pela necessidade de ser feita em
etapas, é muito cansativa e exige várias pessoas para ser realizada.
Figura 15 - Móveis em Cob

Fonte: Knitting a Family, 2013


3.2.6. Solo-cimento ou BTC
O tijolo de solo-cimento é basicamente feito de terra e cimento, em uma proporção de
nove partes de terra para uma parte de cimento. A técnica consiste em misturar a terra com
cimento e água, sendo adicionada aos poucos, por que a massa não pode ser muito seca, nem
muito molhada, a produção dos tijolos é feita através de prensa mecânica (Figura 16) ou
pneumática, podendo também ser manual, assemelhando-se à técnica do adobe. (BORGES;
COLOMBO, 2009)
Figura 16 - Prensa Manual para fabricação de Solo-Cimento

Fonte: BARBOSA; MATTONE, MESBAH, 2002


Os tijolos são compactados na prensa, que pode ser manual ou hidráulica (Figura 17).
Na primeira existem três cavidades para confecção de tijolos. Coloca-se a massa nestas
cavidades, fecha-se com a tampa, que também é um elemento nivelador e, encaixa-se sobre ela
a alavanca. Puxa-se então a alavanca até o chão, e os tijolos estão prontos (Figura 18). É só
abrir a tampa e esperar que eles subam pela ação do pistão extrator. Os tijolos devem ficar
abrigados em local fechado, durante oito dias. Durante uma semana, deverão ser regados com
pouca água, para se fazer a cura. (SILVA, 2000)
Figura 17 - Prensa Hidráulica

Fonte: ECOMÁQUINAS, 2013


Figura 18 - Tijolo de Solo-Cimento Maciço

Fonte: MONTEIRO TIJOLOS, 2013


As vantagens de se construir com o tijolo é a rapidez no processo construtivo, alta
resistência à compressão, alta produtividade, o baixo consumo de água, área de produção
reduzida, limpeza do canteiro, além disso, há uma boa aceitação por parte da população.
(BORGES; COLOMBO, 2009).

3.3. Tijolo ou Bloco Mattone


Através da técnica de produção do tijolo de solo-cimento, foi desenvolvida uma nova
forma de fabricação deste que consiste em um tijolo que possui saliências de encaixe do tipo
macho e fêmea, tanto nas extremidades como nas partes superior e inferior (Figura 19).
Figura 19 - Tijolos com encaixes macho e fêmea

Fonte: BARBOSA; MATTONE; PASERO, 2013


Concebida pelo professor italiano Roberto Mattone, do Politecnico de Torino, esta nova
forma proporciona maior resistência e qualidade à parede, além da praticidade na sua execução,
pois os tijolos se encaixam uns nos outros através das saliências. Porém, segundo Barbosa
(2003), estas saliências proporcionam pequenos deslocamentos relativos aos blocos, permitindo
as correções de prumo das paredes.
As dimensões dos blocos, conhecidos como Bloco Mattone, são de 14cm X 28cm X
9,5cm (Figura 20), e pesando entre 6,6 e 7 quilos.
Figura 20 - Dimensões do Bloco

Fonte: PRATI, 2013


Além das boas características estruturais, esse tijolo não precisa de revestimento (como
de resto os tijolos prensados estabilizados em geral), pois apresenta um excelente aspecto,
proporcionando uma boa estética, e praticamente dispensa argamassa de assentamento, sendo
necessária apenas uma mistura fluida de terra, cimento e água. (BARBOSA, 2003). Essa
mistura é constituída por terra peneirada numa malha de aproximadamente 2mm e cerca de 8%
a 10% de cimento, numa consistência pastosa, quase fluida.
Segundo Barbosa (2003), a implementação prática de um projeto de construção de casas
com tijolos Mattone deve passar por duas etapas de formação pessoal: uma para o processo de
fabricação dos tijolos, o ensino das etapas da produção desde a escavação e peneiramento até o
processo de cura e cuidados na estocagem; e outra no processo construtivo, ensinar e orientar
todos os passos.

3.3.1. Processo de Produção


O processo de fabricação dos blocos Mattone passa pelas mesmas etapas de um tijolo
de solo-cimento comum que, segundo Silva (2013), são:
• Preparação do solo: peneiramento do solo e quebra de torrões (Figura 21);
Figura 21 - Solo sendo peneirado

Fonte: BARBOSA; MATTONE; PASERO, 2013


• Preparo da mistura: espalha-se o cimento ao solo preparado misturando bem até a
obtenção de uma coloração uniforme. Feito isso, adiciona-se água, aos poucos, sempre
misturando até obtenção da umidade desejada (Figura 22);
Figura 22 - Homogeneização dos elementos

Fonte: BARBOSA; MATTONE; PASERO, 2013


• Moldagem dos tijolos (Figura 23);
Figura 23 - Prensa para moldagem dos blocos

Fonte: VIRDIS, 2013


• Cura e armazenamento (Figura 24): Os tijolos são cobertos com lona plástica.
Figura 24 - Cura e armazenamento

Fonte: BARBOSA; MATTONE; PASERO, 2013


As diferenças estão nas dimensões, na forma e na quantidade de cimento para
estabilizar.

3.3.1.1 Tipo de Solo


Praticamente qualquer tipo de solo pode ser utilizado. Entretanto, os solos mais
apropriados são os que possuem teor de areia entre 45% e 50%. Somente os que contêm matéria
orgânica em sua composição não podem ser utilizados. Eles só precisam ser umedecidos, para
que se tornem resistentes. (XAVIER; FREIRE; PEREIRA XAVIER, 2011).
De acordo com Barbosa (2003), é importante a análise da composição granulométrica.
A plasticidade o limite de liquidez não deve ser excessivo, de preferência menor que 40-45%.
No caso, para os tijolos prensados, o ideal é que o solo tenha:
• 10% a 20% de argila;
• 10% a 20% de silte;
• 50% a 70% de areia.
Caso o solo não estiver dentro dessas porcentagens, é feita uma correção
granulométrica. É comum misturar areia a solos muito argiloso e com os limites de liquidez e
plasticidade altos. Assim, no momento da produção dos blocos, é feito o peneiramento para a
obtenção da granulometria ideal.
3.3.1.2. Mistura e Homogeneização
Com o solo já peneirado, é feita a mistura dos materiais que consiste em terra, cimento
e água.
a) Estabilizante
O cimento está presente como estabilizante, com a função de melhorar as propriedades
do solo, até mesmo sob a ação da água. Segundo Barbosa (2002), além de formar agentes
cimentícios ao reagir quimicamente com a água, também ocorre reação com partículas finas do
solo. Os teores de cimento utilizado na produção dos blocos Mattone variam entre 4% e 6%, já
garantindo blocos de excelente qualidade.
b) Umidade
A terra não deve ficar muito úmida, já que a umidade interfere nas propriedades
mecânicas do produto e, também, dificultar a moldagem do mesmo. Portanto, a água deve ser
adicionada aos poucos à mistura até alcançar a consistência necessária.
A umidade ideal é obtida através de amostras do solo que são submetidas a testes. Estes
são realizados com base na compactação do solo, já que os tijolos serão prensados. A umidade
obtida é denominada umidade ótima.
Os tijolos prensados, em geral, são moldados com uma percentagem de água em torno
de 8% a 15%. Nas condições locais, a umidade de equilíbrio com a atmosfera é em torno de 2%
a 4%. (BARBOSA, 2003)
É importante que a água utilizada seja limpa e livre de impurezas que interfiram na
hidratação do cimento e na compactação dos blocos, prejudicando a resistência dos mesmos.

3.3.1.3. Moldagem
A modelagem do tijolo é feita através de uma prensa. A escolha desta é importante, pois
quanto maior for a compactação proporcionada por ela, melhor será o seu produto.
A prensa utilizada na produção dos blocos Mattone é a prensa manual Altech GEO 50
(Figura 25, 26 e 27). Esta comprime o solo exercendo pressões da ordem de 2 MPa. A forma
desta prensa foi modificada para que o produto adquirisse a forma idealizada pelo professor
Mattone.
Figura 25 - Prensa Altech GEO 50

Fonte: PRATI, 2013


Figura 26 - Fôrma da prensa para o Bloco Mattone

Fonte: PRATI, 2013


Figura 27 - Prof. Mattone explicando o funcionamento da prensa e o Bloco moldado

Fonte: PRATI, 2013


No mercado, além das prensas manuais, existem prensas hidráulicas que fornecem
pressões muito superiores, porém são equipamentos que ocupam muito espaço e são muito
caros.

3.3.1.4. Cura
Segundo Barbosa (2003) a saída rápida da água da mistura é prejudicial à qualidade dos
blocos. Ocorrendo a evaporação, não haverá tempo para que ocorra a reação desta com o
cimento, caindo a qualidade do produto. Além disso, pode ocorrer a retração do solo, gerando
fissuras no bloco, o que pode inutilizar o bloco.
Para evitar essa saída repentina da água, é de extrema importância realizar a cura. De
acordo com Barbosa, Mattone e Mesbah (2002), o método mais eficaz para a realização desta
é cobrir os tijolos com lona plástica assim que são fabricados. Um outro método consiste em
molhar os tijolos novos periodicamente, porém não é tão eficaz.
Segundo a NBR 10832 (ABNT, 1989), os tijolos de solo-cimento devem ser utilizados
no mínimos 14 dias após sua fabricação.

3.3.2. Processo Construtivo


Com esse tipo de tijolo e o devido controle de qualidade, é possível se fazer construções
de até três pavimentos com os blocos tendo função estrutural. (BARBOSA; MATTONE;
MESBAH, 2002).

3.3.2.1. Locação
De acordo com Barbosa (2003), a locação deve ser feita de maneira tradicional, sendo
que o projeto já tenha previsto dimensões para os ambientes que correspondam a números
inteiros ou inteiros mais metade de tijolos, já que estes não permitem muita quebra, pode-se
apenas dividí-lo ao meio.

3.3.2.2. Fundação
O processo construtivo adotado para edificações com esse tipo de tijolo, a fundação é
de pedra. Nas paredes internas, no caso de não haver pedras suficientes, pode-se fazer uma vala
de 30 cm de largura e profundidade e preenchê-la com a mesma mistura na qual o tijolo foi
fabricado, compactando-a firmemente. As pedras devem ser assentadas com argamassa de
cimento, no caso de edificações maiores. Para as edificações menores, no caso de casas
populares, basta preencher os vazios com terra e ou areia.
Uma camada de concreto é colocada sobre as pedras, de 20 cm de largura e 7 cm a 8
cm de espessura, e um ferro de 6,3 mm, fazendo a armação pela parte superior das pedras. A
parte superior da cinta deve ficar no nível do piso (Figura 28).
Figura 28 - Detalhe da Fundação

Fonte: BARBOSA; MATTONE; MESBAH, 2002


Em seguida, sobre a cinta, corre-se uma primeira camada de concreto. Deve-se marcar
a posição das portas, onde esta camada é interrompida. Sua espessura deve ter de 5 cm a 7 cm.
Na largura, recomenda-se 20 cm nas paredes internas e 17 cm nas paredes externas. O objetivo
é deixar um rodapé resistente, com 2 cm ou 3 cm, para proteção de choques e de água quando
da lavagem dos ambientes. (BARBOSA, 2003)
As formas para as primeiras fiadas, antes feitas de compensado, foram substituídas por
réguas metálicas e foram criados espaçadores que facilitaram a moldagem da primeira camada.
(BARBOSA, 2003).

3.3.2.3. Levantamento das paredes


Feita a fundação, é importante conferir suas dimensões posicionando tijolos sobre esta
camada sem nenhum ligante. Realizando este procedimento, podem ser encontradas pequenas
defasagem que poderão ser corrigidas. Em seguida, é feita a primeira fiada de tijolos, que são
assentados com argamassa de cimento-areia, já que o cimento tem melhor aderência ao concreto
onde a fiada estará assentada.
A cada tijolo é colocado o nível nas duas direções, corrigindo os desníveis com martelo
de borracha ou pancadas em pedaços de madeira apoiados no mesmo (Figura 29). Como dito
anteriormente, as saliências do bloco Mattone permitem pequenos deslocamentos para
correções de nível, linearidade e verticalidade.
Figura 29 - Levantamento da parede (Correção dos desníveis)

Fonte: BARBOSA; MATTONE; PASERO, 2013


O assentamento das demais camadas é feito com a própria terra finamente peneirada e
misturada com cerca de 10% de cimento e muita água, de forma a permitir uma argamassa bem
fluida. Defasam-se as juntas de forma que cada tijolo apoie-se sobre outros dois. O controle do
nível deve existir ao longo de todo o processo. A linearidade das paredes é controlada pela linha
que corre paralelamente a elas, e a verticalidade, por régua e nível. Nos cantos passa-se o
esquadro em cada tijolo assentado. (BARBOSA, 2003)
No topo da parede, que corresponde à altura das portas e janelas, passa-se uma cinta de
concreto, no caso das casas populares, com apenas um ferro de 6.3mm. Esta passa por onde há
parede, amarrando toda a construção. As saliências superiores do tijolo promovem uma
excelente integração da cinta com a parede. Sobre as portas e janelas, para facilitar, podem-se
usar elementos pré-fabricados, reforçados com aço ou mesmo com materiais vegetais como o
bambu ou outro produto local. Deixando-se o devido comprimento de ancoragem, consegue-se
uma boa ligação com o restante das cintas. (XAVIER; FREIRE; PEREIRA XAVIER, 2011).
A cinta de amarração sobre portas e janelas teve a sua forma aperfeiçoada. Em vez de
ferro pode-se usar varas de bambu, que também têm um bom comportamento se forem usadas
ao longo de toda a cinta, dispensando a armadura. (BARBOSA, 2003)

3.3.2.4. Coberta
Sobre a cinta de concreto é colocado o madeiramento e cobertura. Pode-se por mais
fiadas de tijolo, caso se deseje um pé-direito mais alto.
O telhado pode ser o tradicional, com telhas cerâmicas tipo canal. Segundo Barbosa
(2003), com o intuito de barateá-lo, estuda-se a implementação de um telhado a base de cimento
produzido pelos próprios moradores. Também é estudada uma cobertura reforçada com fibra
se sisal.
No telhado, deve-se deixar um significativo beiral de pelo menos meio metro, de forma
a proteger o máximo a parede da ação das chuvas. (BARBOSA; MATTONE; MESBAH, 2002).

3.3.2.5. Acabamento e Instalações


O acabamento final das paredes pode ser feito preenchendo-se com uma pasta de terra
peneirada misturada com cimento e água os pequenos orifícios que podem aparecer entre fiadas.
Procedendo-se a uma limpeza correta, nenhum revestimento é necessário. (BARBOSA, 2003).
A aparência dos muros ao final do processo é bastante agradável, não necessitando de
pintura (Figuras 30, 31 e 32). Esta fica a critério do morador.
Figura 30 - Parede sem acabamento e decorada

Fonte: BARBOSA; MATTONE; PASERO, 2013


Figura 31 - Edificação sem revestimento

Fonte: XAVIER; FREIRE; PEREIRA XAVIER, 2011


Figura 32 - A casa foi pintada pelo morador

Fonte: BARBOSA; MATTONE; PASERO, 2013

3.3.3. Testes Experimentais


Painéis de paredes com estes tijolos foram testadas experimentalmente no Politecnico
di Torino e também na Universidade Federal da Paraíba. Os ensaios experimentais (Figura 32)
mostraram um excelente comportamento, as paredes apresentando grande rigidez, o que mostra
que o material merece confiança. (BARBOSA; MATTONE; MESBAH, 2002).
Figura 33 - Parede de bloco Mattone sob carga de 200 kN

Fonte: BARBOSA; MATTONE; MESBAH, 2002


Também foram feitos testes em painéis de alvenaria (Figuras 33 e 34). (BARBOSA;
MATTONE; PASERO, 2013)
Figura 34 - Teste realizado no Politecico de Torino

Fonte: BARBOSA; MATTONE; PASERO, 2013


Figura 35 - Armou-se uma rede provando a resistência do painel

Fonte: BARBOSA; MATTONE; PASERO, 2013

3.3.3.1. Testes Realizados


Para o estudo de desempenho de paredes ante cargas de ocupação e impactos, foi
construído um protótipo. Para a construção deste foi necessária a confecção de cerca de 1.550
blocos. Esse protótipo representa um ambiente com pequenas dimensões (3,14 m x 2,65 m) de
uma edificação e foi construído com blocos propostos com idade superior a 28 dias. (MELO,
et al. 2011)
Com este protótipo foram realizados os seguintes testes:
• Ensaio de cargas provenientes de peças suspensas em paredes do protótipo;
• Solicitações em paredes do protótipo por fechamento brusco de portas;
• Impactos de corpo duro e corpo mole em paredes do protótipo;
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A utilização deste material de construção vem suprir boa parte das necessidades de
instalações de baixo custo e de baixo impacto ambiental, em grande parte das construções rurais
e urbanas brasileiras.
Essa técnica é de fácil assimilação por qualquer pessoa, utiliza somente materiais locais,
além de não necessitar de energia para a sua produção. Com a utilização de Tijolos Matonne de
solo-cimento, diminui-se o consumo de diversos produtos industrializados, que necessitam de
grandes queimas de energia para a sua fabricação.
As vantagens da utilização dos BTCs vão desde a sua fabricação até a sua utilização no
canteiro de obras, uma vez que os equipamentos utilizados (prensas manuais) são simples e de
baixo custo, possibilitando a operação dentro do próprio canteiro, e consequentemente
reduzindo custos com transporte, entrega, energia, mão de obra e impostos.
Apesar destas vantagens, as construções com terra sofrem constantemente o preconceito da
aceitação por parte das pessoas, as quais enxergam este material como sinônimo de pobreza e
de baixa durabilidade.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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