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Teoria da Constituição.
1 - Introdução
requerer e de, assim, servir de mote para um rápido exercício mais profundo de
estatal, pelo contrário, sabemos que sempre que essa redução ocorre, estaremos
determináveis, que sempre são aplicados em uma certa situação concreta dada, e
Administração. Daí fomos capazes de ver sob o foco da luz do melhor Direito, com
novo contexto, cobra o sentido oposto daquele que era anteriormente atribuído ao
Essa postura era muito bem sintetizada na idéia de que o administrador e o juiz
de que este esteja aberto e sensível às pretensões jurídicas levantadas por todos
pública como algo bem mais amplo do que o mero Estado que se encontra, sem
dúvida, em seu centro, mas que inequivocamente não a esgota e que é passível, a
esfera, tem necessariamente que ser levada em conta, para que a doutrina do
Constituição
A Teoria da Constituição é uma disciplina criada por Carl Schmitt para rever
Constitucional?
aprendizado e que, hoje, nos permite reconhecer uma certa linha de continuidade
pode lançar mão de fundamentos absolutos para legitimar o seu próprio sistema
comunidade de homens livres e iguais, co-autores das leis que regem o nosso
viver em comum.
controle por parte dos afetados das medidas adotadas em seu nome, e, pelo
democracia é um regime improvável pois sempre requer que se corra o risco ínsito
de nossa época. Em primeiro lugar, gostaria de ressaltar que essa nossa questão
democrática.
mais alto nível normativo de nosso ordenamento, do que à idéia de uma ordem
acreditarmos que somos uma comunidade de homens livres e iguais que ordena
revela um imenso problema uma vez que, no nível discursivo da linguagem, não
sentidos diversos e, mesmo antagônicos, sem que disso nos demos conta. Basta
que vivencia (ou a idéia que afirma) a identidade entre governante e governado,
contrário, é uma invenção burguesa bem mais recente, que encontra suas origens
nas assembléias medievais das castas, os denominados Estados Gerais. Na
duas facções podia ser medida, sobretudo, de um lado, pela defesa intransigente
uma renda acima de tanto para participar do que então se denominava sociedade
seria o índice manifesto da total inviabilidade desse regime, pois ele próprio
para o autor, esse regime estaria fadado ao mais retumbante fracasso, porque em
seu cerne ele agasalharia uma contradição interna absoluta e insolúvel entre o
princípio da identidade governante e governado e o da representação política,
governante e governado. Por isso mesmo, Schmitt previa que esse regime
teria esse sentido invertido, esse sinal invertido. É o próprio governante que se
pese todo o viés autoritário dessa reflexão, ou precisamente em razão dele, esta é
Chantal Mouffe começa, de sua parte, por indagar o que teria feito com que
ditaduras do século XX e qual seria, afinal de contas, a força desse regime. Essa
É claro que “povo” é uma palavra gorda, manipulável, que serve a usos
como esse que Carl Schmitt fez da democracia. No Estado Moderno, há uma
tensão entre o fato de o Direito ser imposto de cima para baixo, por um aparato
estatal, e a exigência de uma legitimidade fundada na autodoação do próprio
que as regem. Essa tensão inafastável, inerente ao Direito moderno, exige que,
Schmitt. Por isso mesmo, o povo como legitimação, esse povo compacto, esse
entanto, toda essa discussão levou mesmo, como disse Friedrich Müller, à clara
possível visualizar toda a imensa dimensão dos perigos, dos riscos presentes
idéia de povo, a firmar o povo como uma unidade dada, embora sabendo-se que
democracia.
observarmos isso para vermos que, de uma sorte ou de outra, como diz Friedrich
Müller, os arroubos discursivos são perigosos, mas, obviamente, não são tão
processo democrático e, sobretudo, que a idéia de povo não possa ser uma idéia
sempre que admitimos essa redução e absorção do indivíduo sem diferenças num
todo igualitário.
essa tensão, aquilo que Schmitt via como uma contradição interna e que levaria à
morte do regime, ser precisamente o que lhe deu vida e lhe garantiu sobreviver ao
o que importa uma revisão permanente dessa identidade do povo em relação aos
4 – O conceito de Paradigma
textos e, desse modo, uma noção básica é hoje requerida: a noção de paradigma,
Kuhn e que, por sua vez, chega a Khun mediante a leitura de Gadamer em
ciências humanas, das ciências que têm por objeto precisamente a interpretação
ciências, e é de se destacar que seu enfoque se centra nas ciências ditas exatas
É claro que tudo isso que eu estou dizendo, digo no pressuposto de que
discurso, como fizemos com o termo democracia, veremos que acerca de seu
significado havia não um acordo racional mas mero preconceito, ou seja, uma
como regra geral. A comunicação como tal, por meio da linguagem, é muito
improvável e, no entanto, ela se dá, nós nos comunicamos graças a esse pano-
sociais que realizamos todos os dias sem nos apercebermos dela e que molda o
nosso próprio modo de olhar, a um só tempo, aguça e torna precisa a nossa visão
condição humana. Para Kuhn, nós não temos como sair de um paradigma, ou
de paradigma, esse vai ser um filtro, óculos que filtram o nosso olhar, que moldam
como vemos. Por isso mesmo, um olhar estrangeiro na ciência, de fora daquela
5 – Os Paradigmas Constitucionais
Essa noção passa a ser rica também para o Direito, a partir de uma
Direito havia paradigmas. Fazendo dessa longa história uma história bastante
primeira vez na história que todos os homens são livres, iguais e proprietários.
tudo aquilo que um mínimo de leis não proíbam, diz Locke, diz Montesquieu. Isso
meus instintos internos e ser capaz de não ser escravo da matéria, de ascender,
de ter controle sobre os meus próprios instintos; uma liberdade interna, da qual até
televisão: “liberdade é ter uma calça Lee”. A crítica de Hegel é contundente. Essa
compro o Fusca, a minha liberdade se esvai por dentre os meus dedos, ficando a
compro o Opala; no dia em que adquiro o Opala, minha liberdade se esvai dentre
Hegel, essa é a liberdade do burguês, que tem uma goela enorme que nunca se
de igualdade de uma sociedade que afirma que todos os seus membros são
dessas pessoas pelo fato de que, pela primeira vez na história, é possível um
sociedade como um todo, precisamente porque todos devem ser iguais diante da
lei, todos são proprietários, todos são sujeitos de direito. Em seu Segundo Tratado
sobre Governo, diz Locke: eu posso ver que os homens são diferentes; são altos,
baixos, gordos, magros, ricos, pobres, mas, na verdade, quando digo que todos
são iguais, pretendo dizer que todos são iguais diante da lei, diante das
sociais. Uma igualdade que se assenta no fato de, como vimos, pela primeira vez
sociedade moderna; uma sociedade que chega ao ponto de ter como seu
problema básico, exatamente, o de como se instituir como sociedade: como eu,
como viver em conjunto. Inventa-se o indivíduo, a pessoa pode ser vista agora
não mais como um microcosmo que só adquiriria sentido como parte de um todo,
mostra que, apesar das intenções, aqueles iluministas, aqueles racionalistas que
sistema autopoiético, que se dá suas próprias razões, e que tem uma lógica
como a política também é outro sistema que, por sua vez, tem seu próprio código
binário, mais poder/menos poder, também operando autonomamente em termos
que não quer dizer que, precisamente por serem diferenciados, eles não se
olhar, por exemplo, na Inglaterra, onde a Constituição formal não existe, a relação
o auxílio da política, ou seja, da sanção estatal organizada. Como, por outro lado,
esse Estado organizado só pode atuar se autorizado pela lei, se legitimado pelo
códigos específicos de cada um, os articula. Mas esse raciocínio complexo não
nos interessa tanto desenvolver agora, a não ser no que toca ao esclarecimento
esses homens podiam ver essa relação entre o Direito e a política em termos
institucionais.
É claro que os homens dessa época viam uma oposição radical entre o
civil é o terreno dos Direitos naturais, onde todos, por nascimento, a integram,
onde todos são livres, iguais e proprietários. No entanto, nem todos são membros
uma idéia natural e o Estado uma criação política para garantir pura e
simplesmente o livre curso da sociedade civil e que, por isso mesmo é visto como
liberdade do outro. Público e privado são vistos, portanto, como ordens distintas,
garantir o livre curso do privado. O privado é visto como egoísmo e o público visto
como estatal.
Pois bem, fazendo dessa longa história outra vez uma história breve, após
a I Guerra Mundial, vamos poder verificar quase que a “ressaca” desse modelo.
Aquela idéia de que o Estado mínimo deveria garantir o máximo de liberdade aos
reação que já conhecemos bastante e a muita luta social. Enfim, após a I Guerra
Mundial, o que vamos encontrar nas Constituições é a configuração de um novo
tábua de direitos. Assim é que, na verdade, não temos uma mera edição de um
segunda geração de Direitos, que seriam sociais, coletivos, mas temos uma
É óbvio que não se pode mais entender a liberdade como ausência de leis
lei das diferenças materiais entre as pessoas e sempre a proteção do lado mais
fraco das várias relações. É precisamente com essa mudança básica que os
Direitos sociais coletivos se importam; é com ela que vamos ter a idéia de
previdência social, etc. É claro que vamos ter também aí a noção da propriedade
condicionada a uma função social, não mais vista como um Direito absoluto, mas
condicionado.
É o que Kelsen observa muito bem quando afirma que o Direito público e o
privado não são categorias ontológicas. Para ele, podemos manter a distinção
didática entre Direito público e Direito privado, mas, na verdade, todo Direito é
público, todo Direito é estatal, todo Direito é criado num parlamento. A quantidade
exatamente essa a idéia básica desse paradigma, que Kelsen representa tão bem.
também nessa visão, o público vai se apresentar como estatal, até porque
Schmitt, que, como demonstra José Alfredo de Oliveira Baracho Júnior, também é
pode ser tratada como massa, como conjunto dos destinatários, dos objetos, dos
programas sociais, jamais como os seus sujeitos, ou seja, são programas cuja
que agora universalizado, continuaria a unir essas duas dimensões vistas como
algum dia vir, de fato, a definir as políticas que lhe são destinadas, ou, em outros
termos, para que o exercício do voto não seja inconsciente, manipulado, uma
construir uma cidadania que, desde o início, é, de fato, desqualificada por carência
paradigma constitucional é que ele propõe a cidadania e, ele próprio, gera tudo
menos cidadania. Essa é a crítica que surge na década de 70, com o fim ou a
morte do chamado Estado de Bem-Estar Social. Uma crítica que não pode ser
reduzida ao chamado neoliberalismo, pois ela é bem mas profunda do que isso e
requer que reflitamos sobre os enganos cometidos pelo chamado socialismo real e
uma experiência de aprendizado para qualquer povo. Temos que aprender a fazer
qualquer bolo crescer, até porque esse bolo jamais vai crescer como democrático
se de seu crescimento não formos o fermento, se não atuarmos efetivamente na
processo, como participação efetiva. É claro que ocorre uma nova mudança de
paradigmas, na qual, outra vez, podemos salientar novos tipos de Direito, como o
adequado.
central, até porque esses direitos, denominados de última geração, são direitos
que vão apontar exatamente para essa problemática: o público não mais pode ser
visto como estatal ou exclusivamente como estatal e o privado não mais pode ser
visto como egoísmo. A complexidade social chegou a um ponto tal que vai ser
omisso.
Usualmente, em todos esses direitos denominados de terceira geração, o
precisamente, aquela instância capaz de lutar por esses Direitos e de zelar pela
toda a teoria processual, o que mostra que os dois paradigmas anteriores eram
requerida pelo aporte, por exemplo, dos direitos da criança ou da mulher casada
fizeram com que mesmo aquele espaço mais privado, o lar ou o leito conjugal, se
transformasse em espaço público, onde direitos são garantidos contra os pais ou o
marido.
privados, e o próprio público é uma esfera que não pode ser confundida com a do
Estado, reatando-se, outra vez, com aquela noção de povo que não pode ser visto
como consciência coletiva ou algo desse tipo, mas, a rigor, requer ser enfocado
complexidade doutrinária que é requerida hoje para darmos conta dos desafios
de constitucionalidade no Brasil
Friedrich Müller, ou seja, uma teoria que, em primeiro lugar, como é da tradição da
abstrato, quando não previstos no próprio texto constitucional, não pode significar
jamais que importemos a Alemanha como se ela tivesse sido nosso extrato de
não podemos esquecer que somos um país com mais de cem anos de prática de
mais antigo, reconhece titularidade a todo e qualquer juiz para, em qualquer ação,
constitucionalidade de lei.
assenta numa prática americana, que é tradição muito vivenciada, pois nasce da
da supremacia da lei do parlamento inglês. Esse hábito fez com que Hamilton, por
o juiz tem que fazer é verificar se a lei existe ou se ela não existe e, dentre os
no Direito: no tempo, ou seja, a questão da lei mais nova prevalecer sobre a lei
mas antiga e, se ela for muito específica, ela pode também prevalecer sobre uma
mais genérica ou, ainda, a questão da supremacia formal, por exemplo, uma
Hamilton dizer que o juiz tem que fazer esse primeiro passo, essa primeira
verificação, que é saber se essa lei está ou não de acordo com a Constituição. Se
assim não fosse, ele ainda argumenta, o artigo V da Constituição não teria
sentido, ou seja, para que prever um processo especial, mais rigoroso, para
emanada do legislativo.
Tudo isso posto, esses mesmos argumentos serão retomados por Marshall
Por outro lado, naquela virada de paradigma para o social, Kelsen vai defender
uma outra posição, que se consubstancia em uma crítica ácida, muita vezes
americana. É uma crítica mas, ao mesmo tempo, essa crítica não deixa de revelar
uma grande admiração, porque ele quer introduzir alguma forma de controle
puramente político.
pirâmide de normas, vai colocar claramente essa idéia segundo a qual o controle
público, é claro, é sempre considerado por ele como reduzido ao estatal, uma
marca indelével de sua época) é tamanha que vai ser necessária a emenda de
judicial review.
eliminar ou reduzir essa abertura que vê como um problema central para todo o
Direito. Para o primeiro Kelsen, o da Teoria Pura de 1933, a indeterminação dos
traçar o quadro das leituras possíveis dos textos legais e constitucionais, de tal
Este último deveria escolher, determinar, dentro do quadro dos sentidos possíveis
edição revista da Teoria Pura do Direito, de 1960, Kelsen procede ao famoso giro
decidisse por um sentido que não estivesse contido no interior do quadro dos
é a autoridade que pode impor a observância das normas e não o cientista. Kelsen
ciência neutra, seu fracasso revela a ingenuidade com que buscou enfrentar o
problema da linguagem. Para nós, é óbvio que não há dicionário ou gramática, por
mais bem feita que seja, capaz de congelar a linguagem. Dicionários e gramáticas
ficam defasados em pouquíssimo tempo diante da força atribuidora de sentido da
tangível consagrado por escrito. Embora bem mais recente, o enfoque Kelseniano
é que se viu negado pela abordagem mais complexa que hoje podemos adotar no
consagrada por Peter Häberle, é que impede que a Constituição possa ser
se apresentar como o seu guardião, não guardaria nada mais do que os próprios
cidadãos, pois base dessa comunidade de homens livres e iguais que vivem sob a
égide das leis que fizeram para autoregerem-se em sua vida em comum. Algo que
não é passível de ser assenhorado, privatizado, por nenhum dos órgãos estatais,
sob pena de se esvair, de se esvaziar, de não ser nada a não ser a face mais
príncipe para a ótica dos administrados muito pode nos ensinar acerca dos
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