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Apontamentos sobre o comércio entre Brasil e China, entre

2003 e 2014.1
Apoena Canuto Cosenza2

Resumo: De 2003 a 2014, o comércio entre o Brasil e a China permitiu que o Brasil
voltasse a crescer. No entanto, as relações entre os dois países foi caracterizada pela
concentração da exportação brasileira em torno de poucos produtos primários, e importação
de produtos variados de alto valor agregado. Para o Brasil, a China é uma economia de grande
importância. Para a China, o Brasil é apenas mais um fornecedor de matérias-primas e um
mercado potencial. Apesar do alto saldo comercial, o brasil não logrou superar seus problemas
estruturais, ainda sendo um país de economia dependente.
Palavras-chave: Comércio Brasil-China; História Econômica; Comércio
Internacional; História Atual.

-- -- -- --

As relações comerciais entre o Brasil e a China são objeto de reflexão de alguns


trabalhos recentes. Também é tema bastante discutido na mídia especializada. O comércio
entre esses dois países foi um dos fatores que permitiu ao Brasil apresentar bom desempenho
econômico, entre 2003 e 2011.

No entanto, o fato dessas relações serem marcadas pela demanda chinesa por
commodities (matérias-primas, bens alimentícios de baixo valor agregado, e insumos) foi alvo
de crítica. Entre 2003 e 2014, o peso dos produtos básicos aumentou na pauta de exportação
brasileira. Isso serviu de indício para que especialistas apontassem que estava em curso a
reprimarização da economia brasileira.

Ao mesmo tempo, o saldo comercial brasileiro permitiu que o país acumulasse divisas
e pagasse parte de sua dívida externa. O dinamismo adquirido se somou a programas sociais
que retiraram parcela do povo brasileira da miséria, eliminou a fome, e aumentou o consumo
familiar.

1 Esse trabalho é parte integrante da pesquisa de doutorado em andamento: O setor externo e a recuperação
econômica recente do Brasil, 2000 a 2013.
2 Mestre em História Econômica pela USP e doutorando de história econômica da USP.

1
Entre os pesquisadores que se debruçaram sobre o tema, está Marcos Cordeiro Pires.
Em seus artigos, Marcos Cordeiro entende que as relações do Brasil com a China são
marcadas por: (a) problemas estruturais do Brasil ainda não resolvidos; e (b) assimetria das
relações, onde a China é parceira essencial para o Brasil, mas esse é apenas prioridade
periférica para China.

O presente artigo tem como objetivo apresentar dados que confirmam e reforçam essa
leitura. O intuito é demonstrar que as relações entre o Brasil e a China foram uma
oportunidade para o Brasil voltar a crescer, ao passo que reforçaram problemas estruturas
anteriores. Pretende-se dissociar a ideia de crescimento e recuperação econômica da ideia de
superação da dependência. Na prática, o Brasil pode crescer, mas não romper com o seu papel
de dependência econômica na Divisão Internacional do Trabalho.

1. Sobre alguns estudos já realizados

Ao longo da última década, a importância da economia chinesa chamou a atenção de


muitos pesquisadores. No caso da América Latina, e portanto do Brasil, o comércio com a
China foi alvo de reflexão. No entanto, o assunto era recente e muito do que era discutido, o
era com base em tendências. Isso gerou uma divisão entre pensadores que viam as relações
com a China uma grande oportunidade, e outros que viam como um perigo para as economias
locais.

Desde que as relações entre o Brasil e a China ganharam maior proporções, em 2003,
um dos primeiros pesquisadores a se debruçar sobre o assunto foi Henrique Altermani de
Oliveira. Em seu artigo Brasil-China: trinta anos de uma parceria estratégica 3, o autor
apresentou uma visão otimista dos caminhos que a relação entre os dois países levava. Para
ele, havia a oportunidade de fortalecimento de alianças estratégicas, que poderia servir para
que o Brasil desenvolvesse sua tecnologia. Evidentemente, o estudo realizado em 2004 podia
apresentar pouco mais do que as tendências dos anos anteriores. Ainda assim, a visão por ele
apresentada representou uma linha de leitura sobre as relações entre Brasil e China. Essa
linha, que a China representava uma oportunidade para a economia brasileira, até hoje tem

3 OLIVEIRA, Henrique Altermani de. Brasil-China: trinta anos de uma parceria estratégica. Revista
Brasileira de Política Internacional. Vol 47. no.1 Brasília. Jan/Junho 2004.

2
influência.

Em 2006, João Bosco Mesquita Machado e Geleno Tinoco Ferraz apresentaram um


estudo ligado ao IPEA sobre as relações comerciais entre Brasil e China, e o impacto do
crescimento chinês no setor externo brasileiro4. O referido estudo revelou dados pertinentes.
Primeiro, demonstraram como o comércio entre o Brasil e a China ganhou mais fôlego a
partir de 2001, quando as exportações brasileiras para aquele país passaram a crescer
aceleradamente. No entanto, o crescimento estava concentrado em matérias-primas, no setor
agrário e no extrativo-mineral.

João Bosco Mesquita Machado e Geleno Tinoco Ferraz demonstraram que o Brasil
ganhou competitividade no comércio com a China apenas nos produtos agrários e extrativo-
mineral. Ainda, sofreu perda de competitividade no mercado mundial, no que se referia aos
produtos industriais. A perda de competitividade dos produtos brasileiros coincidiram com o
ganho de competitividade dos produtos chineses. Para eles, isso apontava para um tipo de
relação de comércio internacional denominado “vantagens comparativas” e não de “troca
intra-industrial”5. Portanto, se o crescimento da economia chinesa abria oportunidades para o
Brasil, também representava um perigo para indústria brasileira.

Ainda em 2006, Marcos Cordeiro Pires apresentou uma leitura mais complexa e
madura sobre as relações entre China e Brasil6. Demonstrou que a China já era um dos
maiores traders do mundo, sendo o maior consumidor de commodities, exceto do petróleo.
Ainda, apontou que a China havia adotado a estratégia de se alinhar com os países em
desenvolvimento. Naquele ano, a América Latina representava 3,5% das exportações
chinesas, mas 27,1% das importações. Na prática, era uma região fornecedora, mas ainda não
era um mercado prioritário. Para o Brasil, a relação representava a oportunidade de conquistar
a recuperação do deteriorado balanço de pagamentos. No entanto, o país tinha (e continua
tendo) um perfil de Stop-and-Go. Ou seja, o Brasil tem como uma de suas características o
crescimento econômico em etapas cíclicas de (a) crescimento alto; e (b) baixo crescimento.

4 MACHADO, João Bosco Mesquita & FERRAZ, Geleno Tinoco. Comércio Externo da China: efeitos sobre
as exportações brasileiras. Brasília: IPEA, maio de 2006.
5 Na literatura de comércio internacional, o termo “vantagens comparativas” aponta para relações onde um
país se especializa em tipos de produtos (industriais, por exemplo), e outro país em produtos
complementares (agrícolas, por exemplo), de acordo com o grau de produtividade para cada produto em
cada país. Em geral, esse tipo de relação é feita entre países desenvolvidos cm países dependentes.
6 PIRES, Marcos Cordeiro. As Relações Comerciais da República Popular da China e a América do Sul:
Uma reflexão sobre a especialização produtiva. Julho de 2006.

3
Na prática, Marcos Cordeiro Pires retirou a responsabilidade do “perigo chinês” da China, e o
transferiu para própria economia chinesa. A China seria uma oportunidade se o Brasil
aproveitasse o seu superavit e sua recuperação econômica para reorganizar sua economia.
Caso contrário, o país manteria sua característica de stop-and-go.

Após a crise de 2008, o papel da China na economia brasileira voltou a ser repensada.
Como o Brasil apresentou rápida recuperação no cenário de crise, após queda no PIB em
2009, a linha que via a China como oportunidade para o Brasil ganhou novo fôlego. Em 2010,
Henrique Altemani de Oliveira escreveu um novo artigo sobre o tema 7. Para ele, as relações
entre o Brasil e a China de fato se caracterizava pelo perfil de dependência do Brasil em
relação à China. No entanto, os chineses teriam interesse na recuperação econômica brasileira.
Daí resultava alianças estratégicas (não escritas) e projetos de desenvolvimento. Isso
permitiria que o Brasil adquirisse ganhos técnicos científicos. Apesar do grau de concentração
das exportações brasileiras em torno das commodities, desde 2009 a China passou a investir
no desenvolvimento da América Latina. Para o autor, como o Brasil era fornecedor importante
de matérias-primas e um mercado potencial, seria interesse chinês que a região se
desenvolvesse mais.

Em 2011, André Moreira Cunha reforçou essa linha interpretativa. No artigo A China
e o Brasil na Nova Ordem Internacional8, entendeu que na última década a China havia
retomado o seu lugar na história como grande economia. O país passou por urbanização e
ganhou peso no comércio internacional. Nessa “nova ordem internacional”, o Brasil teria
ganhado espaço como parceiro da China. Haveria tendência ao ganho de importância das
exportações brasileiras para o setor externo chinês.

Entre 2013 e 2014, a China reviu a sua política econômica. Até então, o comércio
exterior como impulsionador para o investimento havia sido uma das grandes prioridades. A
partir dali, o governo chinês buscaria priorizar o investimento e o consumo voltados “para
dentro”. Essa mudança, parcialmente motivada pelo esgotamento da possibilidade de
crescimento das exportações chinesas, levou à queda na taxa de crescimento. Os preços das
commodities, que já haviam parado de crescer, sofreram queda. Isso impactou diretamente

7 OLIVEIRA, Henrique Altemani de. Brasil e China: Uma nova aliança não escrita?. Rev. Bras. Polít. Int. 53
(2): 88-106 [2010]
8 CUNHA, André Moreira. A China e o Brasil na Nova Ordem Internacional. Curitiba: Revista de Sociologia
Política, v 19, n suplementar, 2011.

4
nos balanços comerciais dos países da América Latina

Essa mudança fez despertar, na região, a necessidade de refletir de forma mais crítica
sobre as relações entre os países em desenvolvimento e a China. Nesse contexto, a linha que
Marcos Cordeiro Pires desenvolvia desde 2006 ganhou maior espaço. Entre 2014 e 2015,
Cordeiro produziu dois novos artigo sobre assunto, o primeiro em parceria com Gustavo
Enrique Santillán, o segundo sozinho. Ambos artigos 9 foram publicados em veículos que
refletem sobre o desenvolvimento na América Latina.

Em ambos artigos, o argumento central é que a China ganhou grande importância para
a América Latina durante a primeira década do século XXI. No entanto, a América Latina,
incluso o Brasil, é de pequena importância para a China. Embora seja fornecedora importante
de matérias-primas, a América Latina representou apenas uma pequena parte do comércio
exterior chinês. Ainda, um fenômeno novo, que surgiu a partir de 2009, são os investimentos
chineses na América Latina. Trata-se de investimentos significativos nos setores extrativo
minerais e de infraestrutura. Os investimentos se encaixam na perspectiva de (a) garantir a
oferta de matéria-prima para a China; e (b) garantir espaço no mercado local da América
Latina.

Se a China é importante para a América Latina, mas a América Latina não é tão
importante para a China, é responsabilidade das economias locais tirar algo da relação. Se há
oportunidade de crescimento e recuperação econômica devido aos investimentos chineses e
do saldo comercial, cabe à economia local transformar esse cenário positivo em
desenvolvimento.

2. Uma caracterização da China e do Brasil.

A China e o Brasil são países de perfis bastante distintos. Não obstante, integram o
bloco denominado BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China, e África do Sul). O bloco
representou, durante a década de 2000, uma “alternativa” aos países desenvolvidos. Boas

9 PIRES, Marcos Cordeiro & SANTILLÁN, Gostavo Enrique. Reflexões sobre a relação China e América
Latina. Anuário de Integración, ano 2014; e PIRES, Marcos Coerdeiro. “Notas sobre a parceria estratégica
Brasil – China” in SORIA, Adrián Bonilla & GARCÍA, Paz Milet (orgs). China em América Latina y el
Carive: Escenarios estratégicos subregionales. San José: Banco de Desarrollo de América Latina, 2015.

5
taxas de crescimento e capacidade de projeção na economia e política internacional
caracterizavam esses países. Reconhecendo o potencial da aliança entre eles, buscaram formar
laços comerciais, e mesmo alianças pontuais nos órgãos internacionais. Durante o governo de
Luís Inácio Lula da Silva, o Brasil foi um dos grandes impulsionadores de parcerias entre os
BRICS. Tratava-se da estratégia de política internacional denominada Sul-Sul. Ou seja,
favorecer relações que políticas e econômica entre os países em desenvolvimento, como
forma de diminuir a dependência em relação aos países desenvolvidos.

No entanto, as diferenças entre o Brasil e a China faz com que alguns pesquisadores
classifiquem as relações entre os dois países como de dependência, conforme já apresentado
na seção anterior. Para facilitar uma caracterização das relações entre Brasil e China, é
necessário antes realizar uma caracterização, ainda que superficial, de cada um desses dois
países.

2.1. Uma caracterização da economia chinesa

Marcelo José Nonnenberg, em um artigo de 201010, realizou uma boa análise da fase
recente que a China passou. Para ele, após a abertura organizada da China ao mercado
internacional, o país passou por uma fase de crescimento. Mas foi na década de 2000 que a
China passou a conquistar maior espaço na economia internacional. A partir de então, o país
passou a ser grande importador, mas com balança bem sustentada na exportação. Nessas
condições, foi capaz de manter expansão de seu comércio exterior, com taxa cambial fixa,
sem inflação, e com largo crescimento. O aumento da dívida pública chinesa foi balanceado
por bons saldos comerciais. De 2001 em diante, a China conseguiu expandir sua capacidade
de poupança. O crescimento chinês, embora resultante de bom desempenho no comércio
exterior, teria sido impulsionado pelo investimento e consumo interno. Segundo o autor, a
capacidade de poupança teria sido fruto de: (a) aumento do lucro das empresas chinesas; (b) o
Estado ser acionista majoritário e praticamente não recebe dividendo; e (c) boa parte do
crescimento da China foi impulsionado pelo acumulo de capital. Disso resultou que a taxa de
poupança doméstica foi de 49%, e de investimento de 42% do PIB.

10 NONNENBERG, Marcelo José. China: Estabilidade e crescimento econômico. Revista de Economia


Política, vol. 30, no 2 (118), pp. 201-218, abril-junho/2010

6
Gráfico 1: Produto Interno Bruto Chinês real, 2003 a 2014
12000

10000
bilhões de dólares de 2006

8000

6000

4000

2000

0
2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
ano

PIB Chinês ajustado


*dados: World Bank Data. Gráfico de elaboração própria

Os dados corroboram a caracterização de Nonnenberg. Entre 2003 e 2014, a China


cresceu a uma média de 8,44%11 ao ano. Conforme pode-se observar no Gráfico nº1, o PIB
chinês cresceu acima dessa média entre 2007 e 2011, e abaixo da média entre 2013 e 2014.
Trata-se de uma taxa de crescimento média bastante alta. Pode-se inferir que tratou-se de um
bom período para economia chinesa. Ainda, para China, a crise econômica internacional de
2008 teria significado uma oportunidade de ampliar sua economia. Em 2013, no entanto, o
crescimento diminuiu. Isso está de acordo com a declaração do governo chinês que, a partir de
2013, iniciava-se uma nova fase da economia do país.

Tabela 1 - Elasticidade do PIB chinês componentes da economia chinesa em relação ao PIB,


2003 a 2014.
(I) (II) (III) (IV) (V)
Variável independente Elasticidade Erro Padrão R^2 DW
Formação Cruta de Capital
(FBK) chinês 0,913355 0,0140561 0,997637 1,410207
exportação chinesa 1,16108 0,0857267 0,948304 0,857209
importação chinesa 1,21177 0,0662708 0,97096 1,431359
Dados: World Bank Data. Elaboração própria.

Na tabela nº1, observa-se a elasticidade de alguns componentes do Produto Interno


Bruto chinês, assinalados na coluna (I). A elasticidade foi calculada com base em regressões
11 Taxa de crescimento calculada através de uma regressão log-linear, com o PIB real do China como variável
dependente, e o tempo como variável independente.

7
do modelo log-log. A elasticidade, assinalada na coluna (II), expressa quantos por cento
cresceu o PIB se houve aumento de um por cento na variável. Têm-se que valores abaixo de
1% expressam relações inelásticas, enquanto valores acima de 1 expressam relações elásticas.
O R^2, assinalado na coluna (IV) é uma medida que verifica o poder explicativo da regressão
original, e é o quadrado da correlação entre as duas variáveis. O DW (Durbin-Watson),
assinalado na coluna (V) é uma medida de espuriedade da regressão. Têm-se que valores de
DW inferiores ao R^2 assinala uma regressão com espuriedade, e que deve ser analisada com
maior cautela.

O que se observa é que, apesar da elasticidade do PIB ser abaixo de 1 em relação à


Formação Bruta de Capital (FBK) chinesa, o valor não é muito baixo. Ainda, o PIB chinês foi
elástico para as exportações e para importações. No entanto, apenas para as importações a
regressão não foi espúria. Esses dados indicam que a economia chinesa provavelmente é mais
impulsionada pelos investimentos (formação bruta de capital e importações) do que pela
exportação.

Para sustentar uma economia guiada pelos investimentos é necessário (a) ter um
economia nacional organizada; ou (b) conseguir manter o crescimento da sua capacidade de
importação no nível necessário para manter seu crescimento econômico. Isso quer dizer que é
necessário ou produzir os bens de capital e insumos necessários, ou adquirir divisas
suficientes no comércio internacional para importá-los. No caso da China, parece ter ocorrido
ambos.

Tabela 2 – Elasticidade-renda da importações chinesas, 2003 a 2014.


(I) (II) (III) (IV) (V)
Variável independente Elasticidade Erro Padrão R^2 DW
PIB real 0,72307 0,0386937 0,972161 1,857464
Dados: World Bank Data. Elaboração própria.

Tabela 3 – Taxa de crescimento de alguns componentes da economia chinesa, 2003 a

8
2014
(I) (II) (III) (IV) (V)
Taxa de crescimento Erro
Variáveis dependentes (em porcentagem) Padrão R^2 DW
Importação chinesa 6,07096 0,414859 0,955387 1,368735
Exportação chinesa 6,17424 0,540219 0,928889 0,905516
Produto Interno Bruto real
da China 8,43938 0,0225628 0,992903 0,392084
Dados: World Bank Data. Elaboração própria.

Na tabela 2, observa-se a elasticidade das importações chinesas em relação ao PIB real


da china. Na coluna (II) da tabela, verifica-se que a elasticidade foi de 0,72. Isso significa que
para cada 1% de crescimento no PIB, as importações chinesas cresceram em média 0,72%, de
acordo com uma regressão da alta confiabilidade, conforme o R^2 e DW, nas calunas (IV) e
(V). Na tabela 3, verifica-se as taxas de crescimento da importação chinesa, da exportação
chinesa e do PIB real chinês. Observou-se, entre 2003 e 2014, um crescimento do PIB chinês
de 8,44% ao ano, aproximadamente, conforme se verifica na coluna (II) da tabela 3.
Considerando a elasticidade das importações chinesas em relação ao PIB, era de se esperar
que as importações crescessem cerca de 6,10% ao ano. No entanto, cresceram apenas 6,07.
Enquanto isso, as exportações chinesas cresceram 6,17% ao ano.

Esses dados apontam para uma economia de crescimento equilibrado, com uma
balança comercial sóbria. A tese que a economia chinesa teve seu crescimento impulsionada
pelo investimento, e que o investimento foi financiado pelas exportações, parece ter
consistência.

2.2. Uma caracterização da economia brasileira

Na literatura estruturalista sobre a economia brasileira, é comum descrever o


crescimento econômico do país como sendo de modelo “pare e ande” (ou stop and go). Isso
significa que o país é marcado por ciclos de crescimento seguidos por ciclos de estagnação.
Ainda, têm-se que a economia do país é demasiadamente frágil aos impactos exógenos. Parte
disso se justifica por ser uma país cujo crescimento econômico é (a) dependente da
importação de insumos de bens de capital; e (b) dependente da exportação para financiar tanto
sua industrialização como o seu consumo.

9
O próprio governo brasileiro declarou, na época, que o crescimento entre 2003 e 2014
era justificado por um modelo impulsionado pelo consumo. Essa afirmação é parcialmente
verdade. O que se deixou de comentar é que o consumo foi financiado pela exportação,
especialmente de commodities.

Gráfico 2: Produto Interno Bruto real do Brasil, 2003 a 2014


1700

1500
bilhões de dólares de 2006

1300

1100

900

700

500
2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
ano

PIB real do Brasil ajustado

*dados: IBGE e World Bank Data. Elaboração própria.

O gráfico 2, acima, traz o PIB real do Brasil e a curva ajustada em crescimento de


3,22% ao ano, que foi a taxa média de crescimento do PIB 12. O gráfico 2 nos permite verificar
que, no período, o crescimento do PIB brasileiro também seguiu o modelo pare e ande. Na
prática, observou-se 2 períodos de aquecimento da economia brasileira: 2004 a 2008, e 2010 a
2011. Há que se ter em mente que o período entre 2003 e 2013 pode ser considerado, no
conjunto um período de aquecimento da economia brasileira, com um pequeno intervalo em
2009.

Tabela 4 - Elasticidade do PIB brasileiro frente a alguns dos componentes da economia


brasileira, 2003 a 2014.
(I) (II) (III) (IV) (V)
12 Taxa média resultante de uma regressão log-log com o PIB real como variável dependente, e o tempo como
independente.

10
Variáveis independentes Elasticidade Erro padrão R^2 DW
Exportação brasileira 1,25616 0,0741282 0,966348 1,584803
Importação brasileira 0,913731 0,0468792 0,974353 1,762214
Formação Bruta de Capital
brasileira 0,840225 0,0201659 0,994273 2,563545
Consumo das famílias
brasileiras 0,99211 0,0106247 0,998854 1,17969
dados: IBGE e World Bank Data. Elaboração própria.

Na tabela 4, verifica-se a elasticidade do PIB frente a alguns componentes do PIB


assinalados na coluna (I). Na coluna (II), verifica-se os valores da elasticidade. Nas demais
colunas encontram-se os dados estatísticos para confiabilidade e espuriedade da regressão de
modelo log-log usada para o cálculo da elasticidade.

Observa-se que o PIB brasileiro foi elástico apenas em relação às exportações


brasileiras. No entanto, o crescimento do Produto praticamente acompanhou o crescimento do
consumo das famílias, e acompanhou pouco o desempenho da formação de capital. Isso
significa que a economia brasileira não cresceu devido a investimentos. Na prática, observou-
se uma economia voltada para fora para sustentar o crescimento do consumo local.
Evidentemente, um modelo como esse se sustenta apenas enquanto durar alta da demanda
pelos produtos exportados.

Tabela 5 – Elasticidade renda das importações brasileiras, 2003 a 2014


(I) (II) (III) (IV) (V)
Variável dependente Elasticidade Erro Padrão R^2 DW
PIB real brasileiro 2,04322 0,112009 0,970825 1,390241
dados: IBGE e World Bank Data. Elaboração própria.

Tabela 6 – Taxa de crescimento de alguns componentes da economia brasileira, 2003 a


2014
(I) (II) (III) (IV) (V)
Taxa de crescimento em
Variáveis dependentes porcentagem Erro Padrão R^2 DW
Exportações brasileiras 4,55955 0,557115 0,870099 1,195963
Importações brasileiras 6,44001 0,637015 0,910878 1,307928
PIB real do Brasil 3,21714 0,154348 0,9775 1,237252
dados: IBGE e World Bank Data. Elaboração própria.

11
Na tabela 5, observa-se a elasticidade renda das importações brasileiras frente ao PIB
real do país. Verifica-se, na coluna (II), que a elasticidade foi de 2,04. Trata-se de um valor
bastante alto. Significa que para cada um por cento no crescimento real do PIB brasileiro, o
país precisou aumentar as importações em 2%.

Na tabela 6, verifica-se a taxa de crescimento de alguns componentes da economia


brasileira, para o período entre 2003 e 2014. Na coluna (I), estão assinaladas as variáveis em
destaque. Na coluna (II), verifica-se a taxa de crescimento adquirida através da regressão log-
linear. Nas colunas (III), (IV) e (IV), estão disponíveis os dados para verificação da
confiabilidade da regressão. Com alto grau de precisão, verificou-se que o crescimento das
exportações brasileiras foi de 4,56% ao ano. Enquanto isso, o crescimento das importações
foram de 6,44%. Note que, para sustentar a taxa de crescimento do PIB de 3,22% ao ano.

Para sustentar o modelo econômico de expansão pelo consumo, o Brasil ampliou o


valor total de suas importações. As exportações cresceram em ritmo menos acelerado, mas
como partiram de um valor inicial mais alto, e cresceram mais rapidamente na primeira
metade do período em análise, foram capazes de gerar saldo comercial. Evidentemente, como
a taxa de crescimento das exportações era menor do que a das importações, esse era um
modelo que sofreria esgotamento mais cedo ou mais tarde. Em especial quando as
exportações sofressem um baque na redução da demanda pelos principais produtos
exportados.

O modelo econômico do Brasil demonstra uma estrutura dependente e,


consequentemente desequilibrada e frágil à oscilações externas. Ainda, o país sofre com
perdas de divisas em suas transações correntes, que incluem os serviços e envios de renda ao
exterior. Desse modo, pode-se caracterizar o Brasil, com relativa segurança, como de
economia dependente.

3. Sobre a relação comercial entre o Brasil e a China

O governo chinês prega que busca relações comerciais e diplomáticas de ganhos


mútuos. O governo brasileiro prega algo similar: que busca fortalecer as relações
internacionais dentro dos marcos das relações Sul-Sul. Ou seja, busca fortalecer relações de

12
países em desenvolvimento que estejam interessados no fortalecimento das economias locais.

No entanto, a literatura sobre o tema já esclareceu que as relações entre o Brasil e a


China são assimétricos. A leitura atual de Marcos Cordeiro Pires aponta que para o Brasil, a
China é importante. Para o país asiático, no entanto, o Brasil não é prioridade. Trata-se apenas
de um fornecedor de matérias-primas e um mercado potencial. Alguns dados confirmam essa
interpretação.

Entre 2003 e 2014, o Brasil exportou produtos no valor de 275,5 bilhões de dólares
para a China, e importou no valor de 235 bilhões de dólares. O saldo foi, portanto, de cerca de
39,5 bilhões de dólares. Mas a característica das pautas de importação e exportação nas trocas
entre os dois países revelam desvantagem de médio e longo prazo para o Brasil.

Tabela 7 – Principais produtos exportado do Brasil para China em milhões de dólares, 2003 a 2014.
(I) (II) (III) (IV) (V) (VI) (VII)
Minérios de Demais
Soja mesmo ferro e seus Óleos brutos Óleo de soja produtos (-10 Total
Ano triturada concentrados de petróleo em bruto primeiros) exportado
2003 1313,07 764,86 22,27 256,40 676,25 4532,56
2004 5439,96 1114,96 210,13 422,87 1016,34 5439,96
2005 1716,92 1784,63 541,63 144,04 1316,88 6833,67
2006 2431,57 2629,46 835,85 113,12 1146,41 8399,52
2007 2831,86 3710,29 839,90 n/a 1349,26 10748,81
2008 5324,05 4886,12 1702,46 824,03 1423,59 16403,04
2009 6342,96 7010,66 1338,30 398,99 2242,59 20190,83
2010 7133,44 13338,02 4053,45 780,59 2458,90 30785,91
2011 10957,10 19797,08 4883,73 759,82 3412,90 44314,60
2012 12028,32 14922,12 4834,74 924,21 3566,71 41227,54
2013 17147,97 15933,12 4034,52 507,16 3232,64 46026,15
2014 16615,16 12303,31 3472,94 338,90 3122,16 40616,11
somas 89282,39 98194,62 26769,91 5470,14 24964,63 275518,69
Participação dos quatro principais produtos: 79,75%
Participação dos dez primeiros itens: 90,93%
Dados: MDIC. Elaboração própria

A tabela 7 traz os valores de exportação para os quatro principais produtos exportados


do Brasil para China. O critério utilizado para a seleção dos principais itens foi a participação
deles no total exportado para China. Além dos valores exportados dos quatro principais
produtos, a tabela traz os valores exportados dos demais produtos, excetuando os dez
primeiros itens da pauta de exportação, na coluna (VI); e o total exportado para china, na

13
coluna (VII). Ao final da tabela, verifica-se a participação dos quatro principais produtos no
total exportado pelo Brasil para China, e a participação dos dez principais itens.

O que se revela é que as exportações brasileiras para a China são extremamente


concentradas. Os dez primeiros itens representam mais de 90% do total exportado para quele
país. Os quatro primeiro itens representam quase 80%. Ainda, os quatro principais itens de
exportação são todos de baixo valor agregado: minérios de ferro, soja em grão ou triturada,
óleos brutos de petróleo, e óleo de soja. São produtos cujo preço é bastante sensível à
demanda. Isso significa que muito do desempenho comercial depende do preço de poucos
produtos, que costumam ter oscilação considerável na demanda, conforme. Trata-se de um
perfil de exportação típico de país dependente, conforme a teoria de Prebisch, Celso Furtado,
e outros.

Tabela 8 – Elasticidade-preço dos principais produtos exportados pelo Brasil para


China, 2003 a 2014
(I) (II) (III) (IV) (V)
Variável dependente Elasticidade Erro Padrão R^2 DW
Minério de Ferro 2,75547 0,725131 0,59083 0,998141
Soja em grão ou triturada 1,52642 0,142269 0,920072 0,942522
Óleos brutos de petróleo 1,63179 0,127298 0,942633 1,554566
Óleos de soja em bruto 1,31963 0,0351785 0,992944 1,81558
Dados: MDIC. Elaboração própria

A Tabela 8, que traz a elasticidade preço dos quatro principais produtos exportados
pelo Brasil para a China, entre 2003 e 2014, ajuda a explicitar a sensibilidade às oscilações de
preço. Na coluna (I), estão assinalados os produtos em análise. Na coluna (II), verifica-se a
elasticidade preço. Na coluna (III), verifica-se o R^2, que é a medida do poder explicativo da
regressão log-log utilizada para calcular a elasticidade. Nas demais colunas, estão os
resultados para teste de confiabilidade e espuriedade da regressão. O que se observa é que
todos os quatro produtos possuem elasticidade alta (acima de 1).

De todos os produtos, o que o preço parece ter sido menos importante para as
oscilações no valor exportado foi o minério de ferro. Isso foi resultado da alta demanda
chinesa pelo produto, que permitiu que a quantidade exportada de minério de ferro tivesse
aumento pontuais acima das variações de preço. Ainda assim, o poder explicativo é alto
(quase 60%), e a elasticidade também (quase 2,76).

14
Para todos os quatro produtos, verifica-se que alterações de 1% no preço geram
alterações de mais de 1% no valor total exportado. Isso quer dizer que em momentos de baixa
de preços nas commodities (que incluem 3 dos 4 principais produtos), as exportações
Brasileiras certamente sofreriam revés. Esse foi o cenário a partir de 2013, quando a China
entrou em um novo momento de sua economia.

Tabela 9 – Principais produtos importados pelo Brasil da China, em milhões de dólares, 2003 a 2014
(I) (II) (III) (IV) (V) (VI) (VII)
Partes e acessórios Circuitos
Circuitos Partes de de maquinas impressos e Demais
integrados e aparelhos automáticas para outras partes produtos
microconjuntos transmissores processamento de para aparelhos (-10 Total
Ano eletrônicos ou receptores dados de telefonia. primeiros) Exportado
2003 81,31 199,94 60,10 N/a 1133,39 2147,63
2004 157,47 347,08 119,45 N/a 2068,18 3709,90
2005 212,96 564,93 211,33 N/a 3168,77 5353,26
2006 306,99 840,06 352,85 N/a 4873,53 7989,10
2007 346,04 340,40 588,16 825,14 8219,11 12617,76
2008 521,89 698,50 966,91 1069,97 13221,04 20040,02
2009 647,65 643,93 767,35 570,19 10701,79 15911,15
2010 898,46 1438,93 1050,04 724,17 17199,68 25593,14
2011 808,51 1684,33 1119,55 1027,25 23374,62 32788,42
2012 814,55 2003,61 1651,18 995,84 24265,61 34248,50
2013 1026,15 1979,61 1572,06 1290,78 26805,17 37302,15
2014 985,56 1591,60 1332,80 1761,17 26643,14 37340,61
somas 6807,55 12332,92 9791,78 8264,51 161674,02 235041,64
Participação dos quatro principais produtos: 15,83%
Participação dos dez principais produtos: 31,21%
Dados: MDIC. Elaboração própria

A tabela 9 traz os valores de importação para os principais produtos importados pelo


Brasil da China, em milhões de dólares. Os quatro principais produtos (coluna II à V) foram
selecionados pelo valor e constância no período. Os dez principais produtos (coluna VI)
foram selecionados pelo valor importado. A tabela traz também a participação dos quatro
principais produtos no total importado pelo Brasil da China, e a participação dos dez
principais produtos.

Todos os quatro principais produtos podem ser descritos como ligados à informática,
telefonia, e telemática. São produtos de alto valor agregado. Ainda, observa-se baixa
concentração da pauta de produtos importados pelo Brasil de origem chinesa. Os dez

15
primeiros itens expressaram apenas 31,2% de tudo que o Brasil comprou da China. Os quatro
primeiro produtos representaram apenas 15,8% do mesmo total. Dada a variedade de produtos
importados, e dada a participação de produtos de alto valor agregado, configura-se uma pauta
de importações pouco sensível à oscilações pontuais de preços. Novamente, se confirma um
perfil de dependência do Brasil em relação à China, em termos comerciais.

Tabela 10 – Elasticidade-renda as exportações e importações brasileiras, 2003 a 2014


(I) (II) (III) (IV) (V)
Variável dependente Elasticidade Erro Padrão R^2 DW
Exportação brasileira 0,609372 0,061811 0,90671 1,278045
Importação brasileira 1,06635 0,0547092 0,974353 1,821594
Dados: MDIC e World Bank Data. Elaboração própria

A tabela 10 contém a elasticidade-renda do total das exportações e importações do


Brasil. A elasticidade-renda das exportações foi calculada considerando apenas o PIB nominal
da China. A elasticidade-renda das importações foi calculada usando o PIB nominal do Brasil.
Dessa forma, os valores expressos na coluna (II) representam respectivamente quantos por
cento cresce a exportação brasileira caso aumente em um por cento o PIB da China; e quantos
por cento aumenta as importações brasileiras caso aumente em um por centro o PIB do brasil,
em valores nominais. Os R^2 atingidos foram altos, demonstrando bom poder explicativo das
regressões utilizadas para calcular a elasticidade.

O que se verifica é que as exportações brasileiras foram inelásticas em relação ao PIB


chinês. Isso significa que o crescimento da economia chinesa teve um impacto
proporcionalmente menor na expansão da exportação brasileira. Na prática, para cada 1% a
mais no PIB nominal da China, as exportações brasileiras cresceram, no período, apenas
0,6%. Enquanto isso, as importações brasileiras foram elásticas em relação ao PIB nominal do
Brasil. Para cada 1% de aumento no PIB, as importações cresceram 1,07%.

Enquanto o crescimento da economia chinesa esteve em torno ou acima da média de


crescimento do período (2003 a 2011), foi possível para o Brasil expandir suas exportações
em ritmo acelerado. Quando o crescimento Chinês reduziu, as exportações brasileiras viram
sua capacidade de expansão minguar. Ao mesmo tempo, o ritmo de crescimento das
importações brasileiras havia sido acelerado, e acompanhou os movimentos do PIB do país.

Como a economia brasileira havia crescido conforme um modelo guiado pelo

16
consumo e pela exportação, não houve formação de uma estrutura produtiva capaz de
sustentar o crescimento econômico. Daí resultou que a mudança de padrão da economia
chinesa tenha acelerado a crise econômica no Brasil, a partir de 2013. Esse é o significado da
leitura de Marcos Cordeiro Pires: a China é importante para o Brasil, mas o Brasil é apenas
periférico para a China.

Tabela 11 – Participação do comércio entre China e Brasil no total do comércio


internacional de cada país, 2003 a 2014
(I) (II) (III) (IV) (V)
Participação das Participação das Participação das
exportações importações exportações Participação das
brasileiras nas brasileiras na chinesas nas importações chinesas
importações exportações importações nas exportações
Ano chinesas chinesas brasileiras brasileiras
2003 1,10% 0,49% 4,45% 6,20%
2004 0,97% 0,63% 5,91% 5,64%
2005 1,04% 0,70% 7,28% 5,78%
2006 1,06% 0,82% 8,74% 6,11%
2007 1,13% 1,03% 10,46% 6,69%
2008 1,45% 1,40% 11,57% 8,29%
2009 2,03% 1,35% 12,46% 13,20%
2010 2,24% 1,65% 14,09% 15,25%
2011 2,59% 1,76% 14,49% 17,31%
2012 2,33% 1,72% 15,35% 17,00%
2013 2,42% 1,73% 15,57% 19,01%
2014 2,08% 1,60% 16,30% 16,77%
Dados: MDIC e World Bank Data. Elaboração própria

Se o Brasil não importa para a China em termos do desempenho econômico, também


não é tão importante para o desempenho do comércio exterior chinês. A tabela 11 traz a
participação das exportações e importações brasileiras no comércio internacional da China, e
a as exportações e importações chinesas no comércio internacional do Brasil.

Nas colunas (II) e (III) da tabela 11, verifica-se a participação das exportações e
importações brasileiras no comércio internacional chinês. Verifica-se que, de 2004 a 2011, a
participação do Brasil foi crescente, mas passou a oscilar para baixo a partir de 2013. Ainda,
em nenhum momento o Brasil representou mais de 2,6% das importações chinesas, e nem
mais de 1,8% das exportações daquele país. Em outras palavras, o Brasil não parece ter sido,
para China, um fornecedor de suma importância, nem um mercado de alta relevância.

17
Já nas colunas (IV) e (V) da referida tabela, verifica-se a participação das exportações
e importações chinesas no comércio internacional brasileiro. A importância exportações
chinesas nas importações brasileiras cresceu durante todo o período, saltando de 4,45% para
16,30%. Já a participação das importações chinesas para as exportações brasileiras cresceu
quase constantemente, com dois revés pontuais (um em 2004, outro em 2014). Entre 2003 e
2013, a China se saltou como destino final de 6,20% para 19,01% das exportações brasileiras.
Dessa forma, a China é mercado de grande importância e fornecedor fundamental para a
economia brasileira.

4. Considerações finais

Discutir se a China representou uma oportunidade ou um risco para o Brasil parece ser
infrutífero. Isso porque ela foi ambos. Um povo de um país colocar sob a responsabilidade de
outro país tirar do buraco a sua própria economia não é muito sábio. Não era responsabilidade
da China desenvolver o Brasil. Era responsabilidade do Brasil aproveitar as oportunidades e
minimizar os possíveis revés de suas relações econômicas.

O Brasil é um país que possui uma estrutura ainda oligárquica, de baixa


industrialização, e baixa complexidade econômica. Após as severas crises entre 1998 e 2001,
o comércio exterior, impulsionado pelo crescimento chinês, ofereceu para o Brasil a
oportunidade de saldos comerciais. Esses saldos foram tão grandes que permitiram até saldos
nas transações correntes do balanço de pagamento. Isso significa que o país pode, entre 2003
e 2010, acumular divisas.

No entanto, com uma estrutura econômica que favorece o oligopólio e o agronegócio,


esse saldo serviu para pouca coisa. O então governo buscou diminuir a miséria através de
políticas de distribuição de renda e incentivo ao consumo. Na prática, logrou garantir
dinamismo econômico através do aumento do consumo das famílias. Mas, como esse
dinamismo era garantido pelo comércio exterior, o caminho traçado levou a (a) aumento da
concentração em torno de poucos itens, ainda que tenha aumentado o volume exportado; e (b)
aumento das importações em ritmo acelerado como forma de suprir a demanda nacional.

Quando a demanda chinesa cessou de crescer aceleradamente, a crise econômica

18
atingiu o Brasil, a partir de 2013. O resultado foi a queda no crescimento do PIB brasileiro, e
mesmo queda real do PIB para o ano de 2015. Trata-se de um processo já descrito e previsto
pela teoria cepalina, e bem discutido em Prebisch: países dependentes tendem a crescer em
momento de alta das demandas dos produtos primários, e entrar em crise em momentos de
baixa.

O ciclo econômico onde o crescimento chinês e a demanda por matérias-primas podia


impulsionar a economia brasileira cessou. Durante o período, apesar do saldo comercial e do
crescimento econômico, o Brasil derrapou. Não houve investimento em indústria. Isso
impossibilitou a transição das relações comerciais do Brasil com a China de um caráter
dependente para uma outra. No entanto, isso não quer dizer que o país ficara “para trás”.

A China demonstrou interesse em fortalecer seus laços comerciais com o Brasil para
os próximos anos, inclusive aumentando a compra de bens industriais. Também tem interesse
em aumentar os investimentos em infraestrutura. Já indicou que teria até mesmo interesse em
investir na siderurgia do Brasil. Isso é resultado da própria transição planejada pelo governo
chinês. Planeja-se transferia a economia chinesa de impulsionada pelo investimento e
comércio exterior para uma economia impulsionada pelo consumo local. Parte desse projeto
inclui a transferência de parte se sua produção industrial para sócios no exterior.

Isso significaria, para os países que aceitarem esse “negócio da China” instalar
indústria, recebendo investimento estrangeiro direto ou empréstimos. O custo disso será o
envio de remessas para o exterior, ou o pagamento de juros, em um futuro breve. Seja como
for, o Brasil já aceitou parte dessa proposta.

Já estão em vigor acordos entre o Brasil e a China que versam sobre o investimento
em infraestrutura e o aumento das exportações de produtos manufaturados e
semimanufaturados13. Além desses acordos, a desvalorização do Real tornou mais atrativo
para o estrangeiro esse tipo de produto brasileiro. No entanto, a parte do acordo que versaria
sobre investimento e desenvolvimento de siderurgia no Brasil, as negociações patinaram
durante 201514.

13 Sobre o assunto, ver a entrevista de 11 de junho de 2015, de Paulo Dantas da Costa, presidente do Conselho
Federal de Economia, no programa Agenda Econômica. Disponível em
http://www.senado.gov.br/noticias/TV/Video.asp?v=408485&m=405836. Última visualização em
10/01/2016.
14 Sobre o acordo ver a entrevista de 05 de março de 2015, de José Carlos de Assis, presidente do Intersul, no

19
Apesar dos chineses terem demonstrado disposição em investir na indústria de base
brasileira, o setor privado do Brasil parece, ainda, estar interessado no negócio. A China
deseja retirar de seu país a indústria siderúrgica poluente, e instalar novos parques
siderúrgicos em países parceiros, diluindo a poluição em maior distribuição territorial e
utilizando novas tecnologias. No entanto, trata-se de investimentos que demorariam para dar
frutos, e com taxas de lucro que parecem não atrair o empresariado. A dificuldade de emplacar
um acordo como esse é um dos resultados da estrutura oligopolista e dependente do Brasil,
onde projetos de médio e longo prazo não interessam.

Não é a China que ameaça a indústria brasileira. É a estrutura econômica e social do


Brasil.

Fontes:

data.worldbank.org/
http://www.ibge.com.br/home/
http://mdic.gov.br/sitio/

Bibliografia

CUNHA, André Moreira. A China e o Brasil na Nova Ordem Internacional. Curitiba: Revista
de Sociologia Política, v 19, n suplementar, 2011.
OLIVEIRA, Henrique Altemani de. Brasil e China: Uma nova aliança não escrita?. Rev.
Bras. Polít. Int. 53 (2): 88-106 [2010]
OLIVEIRA, Henrique Altermani de. Brasil-China: trinta anos de uma parceria estratégica.
Revista Brasileira de Política Internacional. Vol 47. no.1 Brasília. Jan/Junho 2004.
MACHADO, João Bosco Mesquita & FERRAZ, Geleno Tinoco. Comércio Externo da
China: efeitos sobre as exportações brasileiras. Brasília: IPEA, maio de 2006.
PREBISCH, Raúl. Dinâmica do desenvolvimento latino-americano. Rio de Janeiro: Editora
Fundo de Cultura, 1969.
PIRES, Marcos Cordeiro. As Relações Comerciais da República Popular da China e a
América do Sul: Uma reflexão sobre a especialização produtiva. Julho de 2006.
PIRES, Marcos Cordeiro & SANTILLÁN, Gostavo Enrique. Reflexões sobre a relação China
e América Latina. Anuário de Integración, ano 2014;
PIRES, Marcos Coerdeiro. “Notas sobre a parceria estratégica Brasil – China” in SORIA,
Adrián Bonilla & GARCÍA, Paz Milet (orgs). China em América Latina y el Carive:
Escenarios estratégicos subregionales. San José: Banco de Desarrollo de América Latina,
2015.

programa Agenda Econômica. Disponível em http://www.senado.gov.br/noticias/TV/Video.asp?v=395486.


Última visualização em 10/01/2016.

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