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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

SÍLVIA CUNHA GOMES

A ALFABETIZAÇÃO NA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DO


ESPIRITO SANTO NO PERÍODO DE 192 4 A 1938

VITÓRIA
2008
SÍLVIA CUNHA GOMES

A ALFABETIZAÇÃO NA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DO ESPÍRITO


SANTO NO PERÍODO DE 1924 A 1938

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Espírito Santo,
como requisito parcial para a o btenção do
grau de Mestre em Educação, na linha de
pesquisa Educação e Linguagens.
Orientadora: Profª Dra. Cláudia Maria
Mendes Gontijo.

VITÓRIA
2008
Dados Internacionais de Catalogação -na-publicação (CIP)
(Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)

Gomes, Sílvia Cunha, 1961-


G633a A alfabetização na história da educação do Espírito Santo no
período de 1924 a 1938 / Sílvia Cunha Gomes. – 2008.
209 f. : il.

Orientadora: Cláudia Maria Mendes Gontijo.


Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Espírito
Santo, Centro de Educação.

1. Alfabetização – Métodos de ensino. 2. Cartilhas. 3. Livros


de Leitura . 4. Educação – Espírito Santo (Estado) – História. I.
Gontijo, Cláudia Maria Mendes. II. Universidade Federal do Espírito
Santo. Centro de Educação. III. Título.

CDU: 37
SÍLVIA CUNHA GOMES

A ALFABETIZAÇÃO NA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DO


ESPÍRITO SANTO NO PERÍODO DE 1924 A 1938

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Espírito Santo,
como requisito parcial para a obtenção do
grau de Mestre em Educação, na linha de
pesquisa Educação e Linguagens.

Aprovada em 04 de abril de 2008.

COMISSÃO EXAMINADORA

_______________________________________________
Professora Doutora Cláudia Maria mendes Gontijo
Universidade Federal do Espírito Santo

_______________________________________________
Professora Doutora Cleonara Maria Schwartz
Universidade Federal do Espírito Santo

________________________________________________
Professor Doutor Amarílio Ferreira Júnior
Universidade Federal de São Carlos
Ao Senhor, por ter me feito compreender que “[...]
aos homens é isso impossível, mas a Deus tudo é
possível” (MATEUS, 19:26).
AGRADECIMENTOS

Ao Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal do


Espírito Santo (UFES) que apoiou o desenvolviment o desta pesquisa e,
particularmente, às Professoras Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo, Dra. Cleonara
Maria Scwartz, Dra. Juçara Luzia Leite, Dra. Antonia de L. Colbarin, Dra. Moema
Lúcia M. Rebouças, Dra. Regina Helena Silva Simões, Dra. Edivanda Mugrabi d e
Oliveira e ao professor Dr. Carlos Eduardo Ferraço, por contribuírem para a minha
formação acadêmico-científica no decorrer das disciplinas cursadas.

Aos funcionários do Arquivo Público e Assembléia Legislativa do Estado do Espírito


Santo, Bibliotecas Central e Setorial da Universidade Federal do Espírito Santo
(UFES), Biblioteca Professora Alaíde Lisboa de Oliveira da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG), Biblioteca Estadual Professor Luís de Bessa e
Superintendência Regional de Ensino Metropolit ana A, da cidade de Belo Horizonte,
pela atenção e pelo precioso auxílio no acesso às fontes.

De forma especial, à minha professora orientadora , Dra. Cláudia Maria Mendes


Gontijo, uma grande referência na minha formação, pelas contribuições e estímu lo
para a concretização deste trabalho e, principalmente, pela paciência e respeito
acerca das minhas dificuldades e limitações.

Aos membros da banca de defesa: Profª Dra. Cleonara Maria Scwartz e Prof. Dr.
Amarílio Ferreira Júnior, pela disponibil idade de compartilhar desse momento de
interlocução.

Aos meus pais, Terezinha de Jesus da Silva e Walter Júlio da Silva ( in memoriam),
que sempre me ensinaram o valor do conhecimento.

À minha família, João Batista Gomes, Lucas Cunha Gomes, Marília C. Cun ha
Gomes e João Pedro Cunha Gomes, pela compreensão nos constantes momentos
de ausência e, especialmente , à Marília e João Pedro, pelo auxílio nos meus
limitados conhecimentos de informática.
Às minhas irmãs, Cilma, Nilma, Nilva e a meu irmão Walter Júni or que, mesmo
distantes, sempre me apoiaram neste projeto de vida. Particularmente, agradeço à
Nilma e família pela presença nos momentos de culminância das realizações no
meio acadêmico.

À Profª Dra. Cleonara Maria Schwartz, pelo empréstimo de materiais e pela atenção
dispensada.

À professora Alina Bonella, pela dedicação no trabalho de revisão textual e pela


amizade construída no decorrer desse processo.

Ao amigo Celso Lopes Andrade, pelo constante incentivo e por facilitar o acesso aos
livros.

A todos os meus amigos, pelas orações e também pelas palavras de ânimo e


confiança. De forma especial, a Hugo Luiz de Souza e Marlene Martins de Oliveira
por me estimularem a fazer o Curso de Mestrado e às colegas de curso, Fernanda
Zanetti Becalli, Dânia Vieira Costa e família, Wirlândia D. Devéns, pelo incentivo nos
momentos difíceis para que pudesse concluir com êxito este trabalho e, acima de
tudo, pela amizade resultante dessa convivência.
As ciências humanas são as ciências do homem em
sua especificidade, e não de uma coisa muda ou de
um fenômeno natural. O homem em sua
especificidade humana sempre exprime a si mesmo
(fala), isto é, cria texto (ainda que potencial). On de o
homem é estudado fora do texto e independente
deste, já não se trata de ciências humanas [...], pois
[...] O texto é a realidade imediata (realidade do
pensamento e das vivências) [...]. Assim, [...] Onde
não há texto não há objeto de pesquisa e
pensamento.
(MIKHAIL BAKHTIN)
RESUMO
Esta dissertação é parte integrante de uma pesquisa mais ampla que se encontra
em desenvolvimento pela Profª Dra Cláudia Maria Mendes Gontijo, intitulada: “A
alfabetização na história da/o Província/Estado do Espírito San to (1876 a 1920)”.
Este trabalho trata de uma pesquisa documental de caráter qualitativo. Pautado na
concepção bakhtiniana de linguagem, especialmente em sua noção de texto, tem
como problema investigar a alfabetização na história do Espírito Santo , no período
de 1924 a 1938. Ao focalizar a temática, busca reconstruir, pelo conjunto de
materiais escritos e manuscritos , a alfabetização no período investigado. A análise
realizada possibilitou vislumbrar incoerências entre o discurso oficial e a
concretização do projeto educacional estabelecido. Com relação aos métodos de
ensino da leitura e da escrita, observa a proeminência , nos documentos oficiais, dos
métodos analíticos. Entretanto, a definição legal de utilização desse tipo de método
não impediu que, na prática, continuassem a ser utilizados os métodos sintéticos,
principalmente, nas escolas situadas em cidades distantes da Capital do Espírito
Santo.

Palavras-chave: Alfabetização. Métodos d e ensino. Cartilhas e livros de leitura .


ABSTRACT

This paper is part of a broader research that is being developed by the


Professor/PhD Cláudia Maria Mendes Gontijo, titled: “The alphabetization in the
history of the Espírito Santo Province (1876 to 1920)”. The work is about a
documental qualitative research. Based on the bakhtiniana conception of language,
mainly in its notion of text, it discusses the investigation of the alphabetization in the
State of Espírito Santo from 1924 to 1938. When it focuses on the thematic, it aims at
rebuilding, by the group of written and manuscript materials, the alphabetization in
the investigated period. The analysis made indicated the incoherence between the
official discourse and the concretization of the educational project established. In
relation to reading and writing teaching methods, it was observed the prominence, in
official documents, of the analytical methods. However, the legal definition of using
such kind of method could not avoid that, in the practice, synthetic methods were
used, specially, in the schools located far from the Espírito Santo capital.

Keywords: Alphabetization. Teaching methods. Reading books.


LISTA DE FOTOGRAFIAS

Fotografia 1 – O interventor João Punaro Bley ... ............................................... .... 51

Fotografia 2 – Tipo de construção de Grupo Escolar Rural ................................... 53

Fotografia 3 – Outro tipo de construção de Grupo Escolar Rural .......................... 54

Fotografia 4 – Uma aula de higiene bucal .................................................. ............ 95

Fotografia 5 – Capa da Cartilha de Ensino -Rápido da Leitura ............................. 132

Fotografia 6 – Capa de outra edição da Carti lha de Ensino-Rápido da Leitura ... 133

Fotografia 7 – 1ª lição da Cartilha de Ensino -Rápido da Leitura ........................... 134

Fotografia 8 – 2ª e 3ª lições da Cartilha de Ensino -Rápido da Leitura ................. 134

Fotografia 9 – Penúltima lição da Cartilha de Ensino -Rápido da Leitura ............. 135

Fotografia 10 – Última lição da Cartilha de Ensino -Rápido da Leitura ................. 136

Fotografia 11 – Capa da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart


Júnior ............................................................ .................................. ....................... 138

Fotografia 12 – Verso da capa da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de


Bodart Júnior ................................................................................. ........................ 138

Fotografia 13 – 1ª página da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart


Júnior ............................................................................................. ....................... 139
Fotografia 14 – 1ª lição da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart
Júnior ............................................................................................ ........................ 140

Fotografia 15 – 3ª lição da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart


Júnior .............................................................................................. ....................... 141

Fotografia 16 – 6ª lição da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart


Júnior ...................................... ....................................................... ........................ 141

Fotografia 17 – Capa da Cartilha Infantil pelo Methodo Analytico de Carlos A.


Gomes Cardim ............................................................................. ......................... 143

Fotografia 18 – Lição da página 14 da Cartilha pelo Methodo Anal ytico de Carlos


A. Gomes Cardim ................................................................................ ................. 143

Fotografia 19 – Capa da Cartilha das Mães de Arnaldo Barreto ......................... 144

Fotografia 20 – Capa do Livro de Leitura 1 de Erasmo Braga ............................. 149

Fotografia 21 – Attilio Vivacqua ...................................................... ...................... 164

Fotografia 22 – Crianças elaborando o Jornal Resumo Escolar na tipografia ...... 170

Fotografia 23 – Alunos e alunas da Escola Ativa .................................................. 179

Fotografia 24 – As excursões e o jogo de xadrez ................................................. 189

Fotografia 25 – Grupo de crianças que dramatizaram o descobrimento do


Brasil ............................................................................................................ ........ 191
SUMÁRIO

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................ 14

2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO ...................................................... ....... 17

3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS ................................... 39

3.1 A pesquisa documental ................................................................................. 41

4 A EDUCAÇÃO PRIMÁRIA NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (1928 -1938).. 44

4.1 Formação dos professores e docência ......................................................... 65


4.2 A freqüência das crianças na escola ............................................................ 84
4.3 Os prédios e os materiais escolares ............................................................. 104

5 A ALFABETIZAÇÃO NO ESPÍRITO SANTO .................................................. 126

5.1 As cartilhas e os livros de leitura adotados em 1924 ................................ 131


5.2 O método intuitivo ......................................................................................... 154
5.3 A Escola Ativa ........................................................................................... ... 162

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................ ..................................... ........... 194

7 REFERÊNCIAS ...................................................... ......................................... 197


14

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Até meados dos anos 1980, os estudos e as pesquisas sobre a alfabetização


estavam voltados praticamente para as “faceta s psicológicas e pedagógicas” d esse
processo: como o sujeito aprende a ler e escrever; questões relacionadas com os
pré-requisitos (prontidão) e com os métodos de alfabetização. Somente à medida
que se foi compreendendo e reconhecendo a complexidade e a multiplicidade de
aspectos que envolvem o fenômeno alfabetização, é que pesquisadores e
estudiosos de “[...] diferentes áreas do conhecimento passaram a dedicar -se à
análise e à investigação desse fenômeno [...] acrescentando -se abordagens
diferenciadas que explicam outras facetas da alfabetização [...]” (MACIEL, 2003 a, p.
230), razão pela qual se explica , em parte, a questão de ainda ser recente e,
conseqüentemente, pouco explorado o campo historiográfico nas pesquisas sobre
alfabetização.

Nesse sentido, o interesse pelo estudo da alfabetização em uma perspectiva


histórica se justifica pela escassez de estudos nac ionais e locais sobre a história da
alfabetização. Além disso, inicialmente, como educadora, em salas multisseriadas,
na zona rural, e, posteriormente, como professora alfabetizadora d e grupos
escolares, sempre pensei que hav eria explicações históricas par a o fato de
utilizarmos determinadas cartilhas . Atualmente, ao lecionar para o Curso Superior de
Pedagogia, constatei que há alunos(as)/ professores(as) que atuam em salas de
alfabetização, mas que apresentam deficiências graves em sua escrita. Assim, a
vivência como educadora e a necessidade de contribuir para a construção da
história da alfabetização, no Estado do Espírito Santo, motivaram o nosso interesse
pela temática desta pesquisa.

Dessa forma, objetivamos com este estudo investigar a alfabetização na história da


educação do Espírito Santo no período de 192 4 a 1938. Para delinearmos a
investigação, realizamos a análise do conjunto de textos escritos e manuscritos
reunidos e relativos ao período em foco . Assim, esses textos constituíram o corpus
documental da pesquisa. A análise partiu do princípio de que os discursos
materializados nos documentos são textos e “[...] por trás de cada texto, está o
15

sistema de linguagem. A esse sistema corresponde no texto tudo o que é repetido e


reproduzido e tudo o que pode ser repetido e reproduzido, tudo o que pode ser dado
fora de tal texto (o dado)” (BAK HTIN, 2003, p. 309-310). Dessa forma, o texto dá
sentido, produz significados , pois é a expressão das idéias, valores, ideologias, etc.
que fizeram parte de um contexto histórico, social, cultur al, econômico, religioso, etc.
Nesse sentido, ele só poderá ser compreendido , se estudado em consonância e/ou
em relação com esses elementos. Adotamos, para o desenvolvimento do estudo, a
pesquisa documental de natureza qualitativa. Durante a coleta dos dados, utilizamos
a técnica de registro do conjunto de materiais pertinente s ao tema e ao período
focalizado, por meio de fotografia, de escrita manual e, raras vezes , xerocopiamos
os documentos disponíveis .

As contribuições originadas da pesquisa foram organizadas em seis capítulos. No


próximo capítulo, contextualizamos o problema a partir de discussões das produções
acadêmicas em que as pesquisadoras ele geram a alfabetização como objeto de
estudo numa perspectiva histórica. No terceiro capítulo, expomos os pressupostos
teóricos e metodológicos que nortearam o trabalho de pesquisa . No quarto,
discutimos a situação da educação pública primária no Estado do Espírito Santo a
partir do corpus documental acessado e da lite ratura disponível. Consideramos
importante evidenciar, no início desse capítulo, como estava organizado o serviço de
inspeção escolar, porque grande parte da documentação analisada era composta de
relatórios e termos de visitas dos inspetores escolares. Dessa maneira, com base no
material reunido e organizado, foi possível configurar a educação pública primária ,
considerando os seguintes aspectos: formação de professores e docência,
freqüências das crianças às escolas, a situação dos prédios e materiais esc olares.

No quinto capítulo, primeiramente, apresentamos os principais temas que


permeavam as discussõe s recorrentes em outros Estados brasileiros sobre a
alfabetização no período em estudo . Após essa apresentação , fazemos a análise do
material coletado que trata da alfabetização no Estado do Espírito Santo. A eleição
dos aspectos analisados foi possível a partir de uma análise preliminar dos dados
coletados. Desse modo, analisamos os seguintes aspectos: as cartilhas e os livros
de leitura, os métodos de ensino adotados no período investigado e os recursos de
ensino utilizados pelos professores.
16

No último capítulo, apresentamos algumas considerações possíveis tendo como


referência o objetivo proposto para esta pesquisa. Contudo, sabemos que as nossa s
reflexões finais poderão ser pontos de partida para questionamentos que emergirão,
visto que a realização de pesquisas sobre alfabetização, numa perspectiva histórica ,
têm revelado inúmeras possibilidades e limites.
17

2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO

Com o objetivo de analisar a produção acadêmica que trata da alfabetização numa


perspectiva histórica e contextualizar o nosso trabalho de pesquisa , lançaremos “um
olhar” na direção das pesquisas realizadas. C ontudo, é importante enfatizar que, até
o momento da elaboração deste relatório , por ser um campo pouco explorado ,
verificamos um número reduzido de trabalhos científicos que abordam a
alfabetização sob essa perspectiva.

O trabalho de Mortatti (2000), originad o de um projeto de pesquisa elaborado em


1992, cujo objetivo inicial era “[...] compreender as relações entre teorias e práticas
contemporaneamente operantes no ensino da língua materna na escola brasileira
[...]” (MORTATTI, 2000, p. 17), vem se consolidar em u m marco inaugural, visto que
é um dos primeiros a abordar um período de longa duração (1876 -1994) em estudos
históricos acerca da alfabetização. Na obra, Mortatti (2000, p. 18) discute

[...] o problema da alfabetização, explorando os sentidos que lhe for am


sendo atribuídos em decorrência das tematizações, normatizações e
concretizações produzidas na província/Estado de São Paulo, entre 1876 e
1994, relativamente à ‘questão dos métodos’ de ensino da leitura e escrita
na fase inicial da escolarização de cri anças.

Percebemos que a autora recorreu a um grande volume de fontes primárias e


secundárias referentes ao período em estudo e ao repertório das cartilhas mais
usadas. Em relação às fontes utilizadas em seu trabalho, a autora afirma:

Quanto à sua contribuição para a produção de sentidos em cada um dos


momentos, os documentos selecionados foram classificados em: fontes
primárias ou diretas – quando se trata de documentos produzidos pelos
sujeitos do momento que estiver sendo focalizado (sujeitos de é poca); e
fontes secundárias ou indiretas – quando produzidos por sujeitos de um
outro momento, mas contendo informações e interpretações relativas ao
momento em foco. Desse modo, um mesmo documento pode ser tomado
como fonte primária e fonte secundária, de pendendo de sua relação com o
momento em foco [...] (MORTATTI, 2000, p. 29 -30, grifos da autora).

Os resultados da pesquisa possibilitaram a definição de quatro momentos, na


História, que permitiram a compreensão do percurso e o desenvolvimento da
alfabetização na Província/Estado de São Paulo. O primeiro momento,
compreendido entre 1876 e 1890, foi caracterizado como o da metodização do
18

ensino da leitura e da escrita. O marco inicial (1876) foi justificado pela autora pelo
fato de, nesse ano, ter sido lan çada a Cartilha Maternal, do português João de Deus,
em Portugal. No Brasil, segundo Mortatti (2000), em 1882, Silva Jardim passava a
divulgar em conferências, na Província do Espírito Santo, a difusão do método João
de Deus e também suas propostas para o ensino da língua. Propostas estas que ele
já praticava e divulgava como professor.

Mortatti (2000) declara ainda que Silva Jardim criticava intensamente o método da
soletração e visava à concretização do “sentido moderno da educação”. Com a idéia
de reformar o ensino da língua, especialmente da leitura, “[...] Silva Jardim defende
uma educação útil, prática e racional e aplica ao estudo dos métodos de ensino o
princípio de ‘concertar melhorando’” (MORTATTI, 2000, p. 43).

Dessa forma, a autora expõe as tem atizações e concretizações de Silva Jardim no


campo da educação, especificamente do “Método João de Deus”, nesse primeiro
momento de seu trabalho, considerado por ela como “[...] crucial no âmbito do
movimento de constituição da alfabetização como objeto d e estudo” (MORTATTI,
2000, p. 42).

Sobre os resultados da análise dos fatos ocorridos nesse momento inicial, a autora
diz que a Cartilha Maternal no Brasil, em relação a Portugal, não teve a mesma
duração e permanência, e que Silva Jardim abandona o seu e mpenho no magistério
e se volta para a causa republicana, pela qual atua principalmente no Rio de
Janeiro, até a sua morte em 1891. Contudo, continua a autora, a participação de
Silva Jardim, como propagandista na sistemática divulgação do “Método João de
Deus”, contribuiu terminantemente para que a alfabetização no Brasil se constituísse
como objeto de estudo. Assim, Mortatti (2000, p.73) conclui a sua análise:

[...] a atuação de Silva Jardim abre caminho para o fortalecimento das


disputas pela hegemonia em relação aos métodos de ensino da leitura,
mediante o entrecruzamento, no momento seguinte, de tematizações,
normatizações e concretizações a respeito do método analítico para o
ensino da leitura.

O segundo período, compreendido entre 1890 e 1920, foi c aracterizado pela


institucionalização do método analítico, o que levou, segundo a autora, à função de
19

uma nova tradição no ensino da leitura e da escrita. De acordo com a autora, um dos
principais divulgadores e polemistas do método analítico foi o profess or Arnaldo de
Oliveira Barreto, que, como integrante de uma geração de normalistas, após o
advento da Proclamação da República, passou “[...] a ocupar cargos na
administração educacional, liderar movimentos associativos do magistério,
assessorar autoridades educacionais e produzir material didático e de divulgação
das novas idéias [...]” (MORTATTI, 2000, p. 78), principalmente em relação ao
ensino da leitura.

Mortatti (2000) considera que a atuação desses normalistas representou a geração


de uma atitude tipicamente paulista e definidora do segundo momento decisivo no
“[...] movimento de constituição da alfabetização como objeto de estudo no Brasil: a
disputa entre mais modernos e modernos [...]” (MORTATTI, 2000, p. 78) –
justapondo-se à disputa observada na década de 1880, entre antigos e modernos –
“[...] pela hegemonia de tematizações, normatizações e concretizações relativamente
ao ensino da leitura, da qual resulta a fundação de uma (nova) tradição” (p. 78).

Essa disputa, continua a autora, está relacio nada diretamente com a reforma
paulista da instrução pública que teve início em 1890 e fazia parte de várias
aspirações extensamente propagadas no Brasil no final do Império. Essas
aspirações, baseadas na filosofia positivista, tendiam a buscar a cientific idade “[...]
na educação da criança e delineavam a hegemonia dos métodos intuitivos e
analíticos para o ensino de todas as matérias escolares, especialmente a leitura”
(MORTATTI, 2000, p. 78).

A partir daí, segundo Mortatti (2000, p. 79), uma “nova bússol a” deveria guiar a
preparação teórica e ”[...] prática de um novo professor sintonizado com os
progressos da ‘pedagogia moderna’, o qual deveria deduzir da psicologia da infância
e suas bases biológicas os modos de ensinar a criança”. Dessa maneira, a
pesquisadora mostra, ao longo desse período, os resultados de sua análise sobre o
ensino na Escola Normal de São Paulo, os métodos de ensino utilizados, as cartilhas
e suas características, os autores e os principais fatos ocorridos no contexto, que
influenciaram na defesa e/ou adoção de um ou outro método (sintético e/ou
20

analítico), e também as polêmicas geradas acerca das disputas entre mais


modernos e modernos. Enfim, esclarece:

Ao longo desse momento histórico, a alfabetização – assim como a


educação – vai-se consolidando como objeto de estudo tendente à
autonomia e irredutibilidade às demais manifestações educacionais e
culturais. E funda-se uma nova tradição segundo a qual o método analítico
para o ensino da leitura é o melhor, porque sintetiza todos os a nseios da
‘ensino moderno’, ou seja: é o mais adequado às condições biopsicológicas
da criança, ‘marcha natural do desenvolvimento do espírito humano’,
proporcionando um aprendizado que tem o professor como guia e a
‘redenção intelectual’ da criança como f im (MORTATTI, 2000, p. 134).

Sobre os sujeitos que perpassam esse momento histórico, Mortatti (2000) diz que
alguns falecem ou se aposentam, outros desistem da questão da instrução pública e
outros mais jovens ainda continuarão atuando e ligados com preoc upações mais
novas. O resultado das produtivas iniciativas, especialmente as cartilhas, continua a
circular e “[...] muitas das quais nas décadas seguintes têm ainda ampla repercussão
entre os professores primários, com centenas de edições” (MORTATTI, 2000 , p.
134). As disputas ocorridas dos modernos entre si, apesar de fundarem uma nova
tradição, apresentam, com a Reforma Sampaio Dór ia, propensão a se amenizar –
apesar de a validade do método analítico continuar sendo apregoada – e, assim,
outros problemas e urgências surgem e outros sujeitos vão se destacando com suas
propostas de intervenção na área educacional, para o ensino da leitura e da escrita.

O período compreendido entre meados de 1920 até final dos anos 1970 constitui -se,
para Mortatti (2000, p.142), “[...] como o terceiro momento crucial do ponto de vista
da constituição da alfabetização como objeto de estudo”. E ela afirma que, nesse
momento, a partir de aproximadamente meados da década de 1920, observa -se o
início de uma disputa entre “[...] defensores do método misto (analítico -sintético ou
sintético-analítico) e partidários do tradicional método analítico [...]” (MORTATTI,
2000, p. 26, grifos da autora), com uma diminuição crescente do tom de conflito dos
momentos antecedentes e propensão c rescente da importância de o método tornar -
se algo relativo.

Assim, segundo a pesquisadora, a partir do momento em que fossem respeitadas a


maturidade individual da criança e a necessidade de rendimento e eficiência,
qualquer um dos métodos (analítico – sintético – misto ou eclético) poderia ser
21

utilizado com resultados satisfatórios: “Dessa posição resulta um ecletismo


processual e conceitual, que passa a permear as tematizações, normatizações e
concretizações relativas à alfabetização, fundando -se uma nova tradição:
alfabetização sob medida” (MORTATTI, 2000, p. 26).

Esse fato, acrescenta Mortatti (2000, p. 26), é consequência, sobretudo, “[...] da


disseminação, repercussão e institucionalização das novas e revolucionárias bases
psicológicas contidas em Testes ABC (1934), de Lourenço Filho [...]” (MORTATTI,
2000, p. 26), pois, alcançando preponderância, os usos de medida do nível de
maturidade e de classificação dos alfabetizandos, indispensáveis para a
aprendizagem da leitura e da escrita, foram relativ izando e considerando tradicional
a importância do método. Nessa parte de sua pesquisa, a autora destaca a figura de
Lourenço Filho no cenário educacional brasileiro, porque

[...] sua atuação representa a busca de concretização de uma das


aspirações sociais e culturais típicas do início desse momento histórico,
cujos efeitos tendem a se tornar ‘normais’ e ‘rotineiros’ nas décadas
seguintes: a reforma da educação, diretamente relacionada à necessidade
de renovação e inovação intelectuais e de uma reforma a mpla em todos os
setores da sociedade brasileira, iniciada com a revolução de 1930 e que
pressupunha, dentre outros aspectos, difusão da instrução elementar e
redefinição e aumento das escolas superiores, como forma de
democratização da sociedade (MORTATTI , 2000, p. 142-143)

Com essa afirmação, Mortatti (2000) demonstra a grande influência do pensamento


e, conseqüentemente, das ações desse renovador e inovador da época, bem como
de outros que aliaram “atividades intelectuais e acadêmicas” com “atividades
político-administrativas”, por exemplo, no Manifesto dos Pioneiros da Educação
Nova, em 1932, e em outros momentos, propondo alternativas e/ou “soluções
técnicas” para os problemas educacionais do País.

Dessa maneira, após analisar as contribuições desses personagens, os discursos


sobre o ensino da leitura e da escrita que permeavam, na época, as polêmicas
suscitadas acerca do uso de um ou outro método, os materiais produzidos e os seus
usos, Mortatti (2000, p. 212) diz que, distintamente dos dois momentos anteriores,
em que os “[...] os marcos iniciais e finais são mais facilmente delimitáveis, esse
terceiro momento se caracteriza, sobretudo, pelo que denominei ‘dispersão’ das
bandeiras de luta anteriores e simultaneamente pela rotinização do método ecléti co
22

[...]”, pelo processo de preponderância “[...] das bases psicológicas do processo de


alfabetização” (p. 212). A pesquisadora apresenta ainda considerações sobre a
importância do material produzido por Lourenço Filho (Testes ABC), nos níveis: das
tematizações, das normatizações e das concretizações e afirma:

[...] esse livro de Lourenço Filho contribui decisivamente para a fundação de


uma tradição: ‘nova’ para o momento em que se a engendra e em relação à
‘antiga’ tradição que esse momento herda; no enta nto, ‘velha’ e ‘tradicional’
para seus herdeiros atuais que, sobretudo a partir da década de 1980, no
nível das tematizações e normatizações, buscam insistentemente superar
essa tradição herdada e teimosamente operante (MORTATTI, 2000, p. 216)

Apesar de concordarmos com a autora, não podemos nos esquecer de que


atualmente, os livros não são mais os únicos materiais usados para o ensino da
leitura e da escrita; pois as revistas, os jornais, as embalagens de produtos, os
materiais de propaganda, dentre outr os, vêm ganhando cada vez mais espaço
nessa prática.

De acordo com Mortatti (2000, p. 27), o início de 1980 até os dias atuais constitui o
quarto momento que

[...] se caracteriza por uma disputa que passa a se destacar a partir


aproximadamente, do final da década de 1970: entre partidários da
‘revolução conceitual’ proposta pela pesquisadora argentina Emilia Ferreiro,
de que resulta o chamado construtivismo, e entre os defensores – velados e
muitas vezes silenciosos, mas persistentes e atuantes – dos tradicionais
métodos (sobretudo o misto), das tradicionais cartilhas e do tradicional
diagnóstico do nível de maturidade com fins de classificação dos
alfabetizandos.

Mortatti (2000) explica que, nesse final de século, observou -se, por meio do discurso
oficial, a necessidade de mudanças sociais e políticas. É nesse contexto que o
construtivismo começa a ser defendido por “educadores progressistas”, que, com
tradução, produção e divulgação de livros, vídeos, artigos, teses acadêmicas,
sugestões metodológicas, cartilhas construtivistas e outros materiais, além de relatos
de experiências exitosas, se empenham para convencer os alfabetizadores, com o
objetivo de institucionalizar o construtivismo na rede pública de ensino.

Contudo, apesar de toda essa estimulaçã o, os métodos tradicionais de ensino e as


cartilhas continuam a ser usados de forma explícita ou não nas salas de
23

alfabetização das escolas da Rede Pública de São Paulo, “[...] distanciando -se do
discurso oficial-acadêmico, dele, porém, utilizando -se os escritores para justificarem
as propostas didáticas contidas em suas cartilhas” (MORTATTI, 2000, p. 254 -255).

A pesquisadora diz que há, ainda nesse contexto, “[...] a tendência a um outro tipo
de disputa entre mais modernos e modernos: estes, defensores do construtivismo de
base piagetiana; aqueles defensores do interacionismo baseado na Psicologia
Soviética [...]” (MORTATTI, 2000, p. 27), cujo principal representante é L. S.
Vygotsky. Esse período, segundo Mortatti (2000), é marcado por diagnósticos e
revelações dos problemas da educação, que se tornam tema de seminários e
congressos, constatando o fracasso escolar das classes populares, sobretudo na
passagem da 1ª série para a 2ª, com altos índices de evasão e repetência.

Assim, a autora vai analisando as possíveis explicações e soluções, para esse


fracasso: desigualdade social, ideologia dominante, falta de democratização das
oportunidades, proposta do ciclo básico, etc. Apresenta, ainda, algumas
considerações de Ferreiro e Teberosky sobre o construtiv ismo: concepção e
pretensão das autoras com a teoria construtivista, referência à expansão da
produção acadêmica sobre educação, ensino da língua e, especialmente, sobre
alfabetização. Busca também retratar os discursos produzidos acerca das medidas
que, paralelas aos estudos e pesquisas, tinham como objetivo “o resgate da
qualidade do ensino”. Sobre o ensino -aprendizagem da leitura e da escrita, neste
quarto momento, a autora explicita que esse ensino

[...] vem-se sedimentando como um objeto de estudo e pesquisa


acadêmicos integrado a um campo de conhecimento específico – ensino da
língua [...] e que o interesse crescente que os problemas relativos a esse
processo de ensino-aprendizagem têm despertado em pesquisadores de
outras áreas [...] indica uma tend ência de a alfabetização se constituir um
campo de conhecimento superespecializado, autônomo e,
simultaneamente, interdisciplinar (MORTATTI, 2000, p. 288).

Considerando os sentidos atribuídos à alfabetização no decorrer da história, os


sujeitos que fazem história, os contextos em que se essas histórias são produzidas,
etc., pensamos que a alfabetização já se apresenta como interdisciplinar, conforme
já tem sido demonstrado em algumas pesquisas acadêmicas nas áreas de História e
Filosofia, encontradas na no ssa busca por produções acadêmicas sobre o tema.
24

Em relação à preponderância do pensamento construtivista no ensino da leitura e da


escrita (alfabetização), Mortatti (2000, p. 286) diz que não pretende fazer previsões,
visto que, com o recorte indispensáve l, “[...] no ano de 1994 não pretendo dar por
encerrado, a tendência parece ser a de se estender, ainda por largo espaço de
tempo - como ocorre com o momento anterior -, a hegemonia do pensamento
construtivista em alfabetização [...]”.

Assim, Mortatti (2000) afirma que, após mais de cem anos do estabelecimento do
modelo republicano de escola, ainda nos deparamos atualmente com debates e
denúncias, cujo ponto consensual é o fracasso da escola em alfabetizar seus
alunos. Esse fracasso, segundo a autora, é at ribuído algumas vezes à questão do
método de ensino, outras vezes ao sistema de ensino e ainda ao aluno ou ao
professor. Mas o fato é que a conseqüência “[...] desse fracasso vem consolidando
um outro tipo de ilusão e contradição, constitutivas da busca in cessante daquele
sentido moderno da escola e da educação” (MORTATTI, 2000, p. 298). E, ainda, que
não é exclusividade da nossa época a impossibilidade de a escola conseguir êxito
em sua função histórica básica e, portanto, de responder às “urgências sociai s e
políticas” que lhe sustentam.

Trindade (2004), em sua pesquisa sobre as cartilhas de alfabetização usadas na


Instrução Pública no Estado do Rio Grande do Sul, no período compreendido entre
1890 e 1930, se propôs a analisar as cartilhas e os métodos u tilizados nas primeiras
séries do ensino fundamental no lugar e tempo históricos determinados e
mencionados acima. O estudo constitui -se em uma pesquisa de natureza
exploratória, a partir de uma perspectiva cultural e histórica, tendo por referência os
Estudos Culturais, pois, para a autora, “[...] os textos e as ilustrações das cartilhas e
os métodos de ensino da leitura e da escrita que as orientam fazem parte de uma
rede de discursos e representações que podem ser localizados como produtos
culturais de uma determinada época” (TRINDADE, 2004, p. 37).

A autora traz ainda as seguintes considerações, ao esclarecer como o seu trabalho


foi composto:
25

A cada capítulo procuro privilegiar a descrição das diferenças,


transformações, continuidades e mutações que ma rcam os discursos da dita
pedagogia moderna sobre métodos de ensino da leitura e da escrita e sobre
outros métodos e modos de ensino, alfabetização e alfabetismo,
articulando-os aos discursos políticos que implementaram a Instrução
Pública republicana no Estado do Rio Grande do Sul, entre 1890 e 1930,
especialmente, bem como buscando visibilizar as representações que eles
receberam nas páginas das cartilhas (TRINDADE, 2004, p. 48).

Percebemos que Trindade (2004) procura coerentemente, com sua abordagem


teórica, dar conta não somente da análise dos métodos e das cartilhas, mas também
dos discursos produzidos e suas representações acerca da temática, da questão da
construção dos prédios das escolas, da substituição do mobiliário escolar e da
aquisição de material didático, produção, circulação e consumo das cartilhas,
analisando os decretos e outros documentos do Governo Estadual sobre como se
formavam os órgãos responsáveis pelo exame, aprovação e adoção desse material
e também questões relacionadas com a fo rmação da identidade nacional por meio
das cartilhas e da mobilidade dos conceitos de educação e alfabetização em um
contexto que trazia marcas de continuidades, descontinuidades, rupturas e
deslocamentos, que é como a autora caracteriza o período em estud o.

A base teórica de análise privilegiou, segundo Trindade (2004), a perspectiva de


Silva (1999) que, sob a ótica dos Estudos Culturais, considera como cultural todo
conhecimento constituído em um sistema de significação que, como tal, está
intimamente ligado às relações de poder. Ainda de acordo com a perspectiva de
Silva (1999, p. 133), afirma a autora:

O objeto a ser analisado com as práticas de pesquisas dos Estudos


Culturais caracteriza-se como artefato cultural, por ser resultado de um
processo de construção social (Silva, 1999), ao mesmo tempo que produz
identidades e subjetividades, no contexto de relações de poder (p. 142). No
entanto, deve-se frisar que essa ênfase na cultura não pode reduzir toda a
dinâmica social à dinâmica cultural.

Assim, ao fazer a análise das cartilhas como artefato cultural, Trindade (2004, p. 36)
esclarece que discute “[...] suas posições e relações em uma cadeia de produção
cultural, na medida em que os artefatos culturais não interessam por si mesmos,
mas pelo sentido que recebem nas práticas culturais e ao constituir outras mais [...]”.
A autora explica ainda que, nos Estudos Culturais, há um interesse intenso tanto
pelas práticas, quanto pelos artefatos culturais. Dessa forma, as cartilhas podem ser
26

analisadas como artefatos que tornam permanentes, de certa maneira, os


significados e as representações de certas épocas e de diferentes grupos em cada
uma delas, bem como as “cadeias de produção cultural” em que estão situadas.

Para compreender a cadeia discursiva em que se “encaixam” as cartilhas, Trindade


(2004, p. 36) procura “[...] recuperar um pouco das práticas dentro das quais esses
artefatos ‘significavam’ um instrumento importante [...]”. Ao fazer essa
“contextualização histórica”, o valor atribuído às cartilhas à época também é
recuperado. A autora traz ainda que privilegiará “[...] as contribuições do próprio
campo dos Estudos Culturais, associadas às de outros campos, como o pós -
modernismo, o pós-estruturalismo e estudos da Análise Crítica do Discurso”
(TRINDADE, 2004, p. 36).

Com base nas afirmações de Nelson, Treicher e Grossberg (1995), Trindade (2004,
p. 37) argumenta que o seu estudo tem relação com o campo dos Estudos Culturais,
inicialmente, “[...] pela característica de os mesmos serem ativa e agressivam ente
antidisciplinares, isto é, não se sujeitarem a uma prática científica moderna de
pesquisa”. Complementa essa autora que, ao escolher os campos de conhecimento
mencionados para fazer a análise cultural, “compartilha” a compreensão de Nelson,
Treicheler e Grossberg (1995) “[...] de que: Os Estudos Culturais se aproveitam de
quaisquer campos que forem necessários para produzir o conhecimento exigido por
um projeto particular” (NELSON; TREICHLER; GROSSBERG, 1995, apud
TRINDADE, 2004, p. 37). Ela salienta a inda que os autores observam que os
Estudos Culturais “[...] têm sido vistos como uma espécie de processo, uma alquimia
para produzir conhecimento útil sobre o amplo domínio da cultura humana”
(TRINDADE, 2004, p. 37).

Trindade (2004, p. 48) argumenta tamb ém que procurou

Trabalhar com uma abordagem histórica reconhecida por Focault como


‘geral’ e que se oporia a uma história ‘total’ (Kendall; Wickham, 1999), na
medida em que a primeira abordagem revelaria atenção no detalhe, na
partícula, na complexidade, buscando ir além da caricaturização da
periodização histórica. Cada capítulo é como se fosse um arquivo de
discursos locais, enquanto o conjunto de capítulos forma a rede desses
discursos locais.
27

Em suma, o estudo permitiu à autora “[...] mais do que desc rever as cartilhas como
artefatos culturais [...]” (TRINDADE, 2004, p. 455), pois concluiu que elas “[...]
fizeram parte de uma cadeia de produção cultural, sendo sua intertextualidade
marcada pelo impacto da interdiscursividade da modernidade republicana” (p. 49).

A pesquisa de Santos (2001) sobre os métodos de ensino da leitura e da escrita no


Estado de São Paulo, de 1920 a 1930, tem como objetivo analisar o debate em torno
da temática, pois, conforme justifica a autora, esse foi um período de “[...]
reorganização educacional que articulava em torno de si conhecimentos e práticas
da Sociologia, da Higiene, Saúde e Psicologia [...]” (SANTOS, 2001, p. 5) Assim,
segundo a autora, essa foi uma época de importância significativa para as definições
em relação ao ensino primário no Estado de São Paulo.

Sua análise se dá a partir de uma investigação documental sob a perspectiva da


história cultural. Ela salienta que o foco central da análise incidiu inicialmente nos
artigos das revistas da “Sociedade de Educação ”, “Escolar” e “Educação” (fontes
primárias) e, posteriormente, recorreu à bibliografia referente à época e revistas
(fontes secundárias).

Podemos perceber que os três trabalhos apresentados até então são pesquisas do
tipo historiográfico que buscam, a pa rtir de uma abordagem histórica da
alfabetização, possíveis respostas e/ou explicações para tantos questionamentos
feitos acerca do ensino da leitura e da escrita. Dessa forma, o ponto crucial desses
trabalhos é o ensino da leitura e da escrita -alfabetização, os materiais pedagógicos
destinados a esse ensino, os discursos produzidos e suas representações em cada
período distinto, em que o pano de fundo geral é o cenário nacional e os pontos
específicos são o desenvolvimento da alfabetização no Rio Grande do Sul e em São
Paulo.

Santos (2001) afirma que sua análise, sob a perspectiva da história cultural, é
baseada em estudos de Frago (1993), em que o autor argumenta:

A preocupação com a alfabetização numa perspectiva histórica [.. .], remonta


ao início do século XX com os estudos de Olóriz (1900), Luzuriaga (1926),
Guzmán Reina, Gil Carretero, Rodriguez Garrido e Cerrolaza (1955),
28

Samaniego Boneu (1973), que constituem boa descrição da distribuição e


evolução do analfabetismo por sexo, idade, província, etc., acompanhada
de uma tentativa de determinar suas causas (econômicas, étnicas,
geográficas, demográfico -urbanísticas, etc.) e que assinalam uma
concordância básica: o analfabetismo é o resultado de uma escolarização e
assistência escolar deficientes (SANTOS , 2001, p. 1).

Assim, segundo Santos (2001), para o autor, essas pesquisas só consideram como
possível a alfabetização desenvolvida por meio do sistema escolar formal como
conhecemos hoje, mas as investigações históricas recentes, realizadas em outros
países, fizeram com que o foco no fenômeno analfabetismo se deslocasse para

[...] o acompanhamento do processo de alfabetização como um todo – seus


agentes, os modos de atuação desses agentes, os pressupostos e
interesses ideológicos que o impulsionava, f reava ou legitimava –
analisando quais vias e quais espaço e tempo determinados, o que de
alguma forma, passava a examinar as relações entre alfabetização,
industrialização, urbanização e crescimento econômico sob uma nova ótica,
impossibilitando uma análise e interpretação simplista e linear, ligada à
teoria da modernização (SANTOS, 2001, p. 1).

A autora assegura ainda que, na França, EUA, Espanha e Portugal e também no


Brasil, embora mais recentemente, percebe -se um interesse crescente por essa
forma de estudar “[...] a alfabetização, sobre a história da alfabetização e práticas de
leitura e escrita [...], com uma nova maneira de interrogar as fontes disponíveis [...]”
(SANTOS, 2001, p. 2).

Sobre essa nova maneira de interrogar as fontes, Santos (2001) diz que Graff (1990)
reconhece que

[...] uma série de fontes históricas e contemporâneas, embora não


plenamente satisfatórias em si mesmas, podem ser empregadas [...]. Alguns
podem questionar a qualidade desses dados [...]. Para responder a essas
objeções comuns, é preciso passar para a segunda tarefa envolvida em
definir o alfabetismo. Esta consiste em enfatizar, sublinhar, o fato de que o
alfabetismo é, acima de tudo, uma tecnologia ou conjunto de técnicas para
a comunicação e a decodificação e reproduç ão de materiais escritos ou
impressos [...]. O alfabetismo é, às vezes, concebido como uma habilidade,
mas com mais freqüência como simbólico ou representativo de atitudes e
mentalidades. Isto é sugestivo. Em outros níveis, os ‘limiares’ do alfabetismo
são vistos como um requisito para o desenvolvimento político e estabilidade,
padrões de vida, controle da fertilidade, e assim por diante [...]. Uma
contradição principal no empreendimento (ou deveríamos dizer ‘indústria’?)
do alfabetismo-como-uma-via-para-o-desenvolvimento é a disparidade entre
as suposições teóricas e as pesquisas empíricas (GRAFF, 1990, p. 34 -35,
grifos do autor, apud SANTOS, 2001, p. 2).
29

Santos (2001) cita ainda o estudo de Mortatti (2000), no qual a autora afirma que
pesquisas históricas em Educação e Letras vêm sendo cada vez mais prestigiadas
entre os pesquisadores europeus, mas que continuam ainda sendo pouco
exploradas as pesquisas sobre “[...] matérias escolares, conteúdos e métodos de
ensino, entre outros considerados como aspectos menores e ‘curiosidades’ no
âmbito da educação, da lingüística ou dos estudos literários [...]” (SANTOS, 2001, p.
3).

Em sua pesquisa, Santos (2001) identifica, no primeiro capítulo, intitulado “Os


defensores do método analítico: compreender para ler”, os componentes eleitos para
ilustrar o grupo que defende o “método analítico” para o ensino da leitura e da
escrita escolhidos por causa da imposição incisiva ao método sintético. Dessa forma,
a autora apresenta a defesa de cada componente do grupo e a influ ência que outro
membro exercia nessa defesa, bem como a de outros fatores relacionados com o
ensino da leitura e da escrita na época.

No segundo capítulo: “Os defensores do método analítico -sintético: ler para


compreender”, Santos (2001) identifica os su jeitos que compõem esse grupo e
aponta a trajetória e interesses de cada um. Sustenta ainda que os articulistas
reunidos nesse grupo “[...] defendem a idéia de que o ensino da leitura e escrita não
deve ser ministrado única e exclusivamente pelo ‘método an alítico’ puro. Para esse
grupo, análise e síntese são ‘fases’ que devem permear o ensino da leitura e escrita”
(SANTOS, 2001, p. 43).

O terceiro capítulo, intitulado “ Os textos a serem compreendidos: extrair o sentido do


texto ou atribuir um sentido ao texto?”, foi escrito, segundo a autora, com a finalidade
de examinar

A tendência à prática da leitura expressiva e a seleção de algumas das


leituras de cunho moralista propostas à época, que deveriam nortear a
relação entre as aulas de leitura e as aulas d e moral e cívica, visto que as
primeiras deviam ter um valor educativo (SANTOS, 2001, p. 6).

Nessa parte do trabalho, Santos (2001, p. 85) ressalta a importância atribuída às


fábulas, visto que, “[...] com a finalidade de incutir à atividade de leitura, c aráter
30

educativo e moralizador [...]”, as fábulas apresentavam “tipos de sentimentos” e


“corpo de condutas” que

[...] deveriam povoar o espírito do jovem leitor, através dos livros de leituras,
trechos selecionados – como as fábulas – e antologias (de poesias, histórias
em geral), ao mesmo tempo breves e eficazes: não vacinavam a criança
contra a leitura e engendravam em seu espírito noções de bem-viver. Visto
que eram sempre ‘examinados’ pelo professor competente para o sucesso
do processo pedagógico do ensino da leitura (SANTOS, 2001, p. 85, grifos
da autora).

Sobre os resultados dos dois primeiros capítulos, Santos (2001) esclarece que,
embora os articulistas que compunham o grupo em defesa do método analítico
fossem “[...] partidários da idéia de que a compreensão deve anteceder a
identificação dos códigos da escrita [...]” e os articulistas do grupo “[...] defensor es do
método analítico-sintético defenderem que a compreensão é habilidade que se
conquista após a etapa da identificação dos códigos da língua (palavras, sílabas,
letras)” (p. 66) “[...] ambos os grupos são concordes quanto à tese de compreensão,
diferenciando-se somente quanto ao ‘lugar’ ocupado por essa habilidade no
aprendizado da língua: se anterior ou posterior à identificação dos códigos escritos” (
p. 67). E conclui que,

[...] em se tratando dos métodos para o ensino da leitura e escrita, a


importância atribuída à compreensão, tão amplamente defendida por um ou
outro grupo independentemente se antecedendo ou não à identificação d as
palavras, sílabas e letras, é a tradução do treino de uma habilidade mais
audaciosa: a compreensão da ‘metodização’ da vida revestida do ritmo
fabril, ou seja, a compreensão da sociedade tal qual esta se apresenta, bem
como a adaptação a seus valores e condições (SANTOS, 2001, p. 88).

Pelas afirmações da autora acerca das conclusões sobre o seu estudo, verificamos
disputas em torno dos métodos de ensino da leitura e escrita e de alguns projetos
educacionais na imprensa periódica e nos do cumentos oficiais, bem como a
pluralidade dos métodos, “[...] constituindo -se assim, nesse período e temática, um
jogo conjunto de práticas discursivas – ao mesmo tempo autônomas e integrativas –
calcadas na reflexão em torno dos métodos, do seu estatuto, da sua função e da sua
variedade” (SANTOS, 2001, p. 88).

O estudo de Maciel (2003 b, p. 11) procura, por meio de “[...] uma incursão de quase
duzentos anos nas histórias da aprendizagem da leitura e da escrita [...]”, expor o
31

quadro da alfabetização nas es colas de Minas Gerais. A autora afirma que “[...]
coloca em evidência as múltiplas configurações e tendências assumidas pelas
escolas mineiras, ao longo da trajetória de suas práticas expressas, materialmente,
por meio dos mobiliários, objetos, livros e at ores” (p. 11).

A autora evidencia ainda que seu trabalho é um convite ao leitor para uma “[...]
reflexão sobre algumas mudanças na alfabetização em Minas Gerais e a produção
de materiais para o ensino da leitura [...]” (MACIEL, 2003 b, p. 11). É com essa
pretensão que ela faz uma breve incursão na história da educação brasileira, desde
a proibição da publicação de livros e jornais por Portugal, até 1808, apontando
também a escassez de livros como fatos que provocaram a falta de informações
sobre materiais didáticos utilizados na alfabetização dos alunos brasileiros, entre os
séculos XVI e XVIII, e estabelece um paralelo entre o que ocorreu no cenário
nacional e na Província de Minas Gerais.

Apresenta, ainda, observações sobre os dados registrados na ava liação do


Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) em 2001 e da “[...]
declaração do ministro da Educação, professor Paulo Renato de Souza, no Jornal
do Brasil, em 05/12/2001, “a escola brasileira não sabe ensinar a ler e
ponto”(MACIEL, 2003b, p. 13) e, então, afirma que “Atentar para o fracasso na
aprendizagem da leitura e da escrita é indagar, questionar ou buscar novos métodos
[...]” ( p. 13).

Sobre a questão dos novos métodos, Maciel (2003 b, p. 13) argumenta que, apesar
de ser “[...] do senso comum dizer que as inovações pedagógicas estão atreladas às
propostas governamentais [...]”, a verdade é que não é sempre que os professores
aprovam essas inovações. Diz ainda que, “[...] nesse contexto, encontramos
propostas pedagógicas de alguns edu cadores que podem ser consideradas de
vanguarda ou de retrocesso” (p.13).

Maciel (2003b, p. 15) mostra, no decorrer do trabalho, como são entendidos os


métodos analítico, sintético e de soletração, declarando que “[...] diferentes
concepções de método ger am, conseqüentemente, diversos procedimentos
32

didáticos propostos com base em cada concepção” e que a mudança de um para


outro método não acontece de forma instantânea.

Ao abordar a questão da difusão do método global no Estado de Minas, a


pesquisadora diz que ela está “[...] embasada nos pressupostos decrolyanos [...]” e
que “[...] as idéias decrolyanas também estão presentes nas salas de aula, nos
materiais pedagógicos, no planejamento escolar [...]” (MACIEL, 2003 b, p. 17). Há,
ainda, segundo Maciel (2003 b), nas recomendações de como ensinar a ler e a
escrever, objetividade no texto sobre a escolha pelos preceitos do método global.

Nesse sentido, ela esclarece que “Os pressupostos do método global trazem
mudanças conceituais na leitura oral e silenciosa e na concepção de alfabetização
[...]” (p. 18). A autora mostra que foi verificado ainda, em sua pesquisa, quais eram
os livros de leitura mais utilizados nas escolas de primeiras letras na então Província
de Minas Gerais e faz uma análise tanto da escrita, quanto das orientações
metodológicas e das ilustrações das cartilhas. Maciel (2003 b, p. 19) comenta
também que

Esses manuais distinguem -se de boa parte dos livros portugueses,


destinados à aprendizagem da leitura, produzidos na época. São
inovadores ao serem apresentados como um volume dentro de uma coleção
de livros de leitura para séries graduadas .

Ao finalizar suas análises, a pesquisadora inferiu que o êxito do método global, no


Estado de Minas Gerais, “[...] deveu -se em grande parte, aos materiai s didáticos
produzidos na Escola de Aperfeiçoamento, de acordo com a técnica e os
pressupostos teóricos desta perspectiva [...]” (MACIEL, 2003 b, p. 21). Observamos,
no trabalho da pesquisadora, explicações de como eram testados esses materiais
nas “Classes de Demonstração” e como as “alunas -mestras” procediam no
aprimoramento das técnicas da “nova metodologia”.

Maciel (2003b) afirma que livros escolares criados em outros Estados também foram
utilizados e descreve a estrutura desses materiais sem, contudo, enfatizar ou fazer
descrições exaustivas sobre a diferença entre as cartilhas, pois, conforme a autora
diz, o objetivo não é esse, “[...] mas apenas buscar ilustrar as diversidades [...]
33

demonstrar que as questões, envolvendo opções metodológicas, estão po stas


desde o início da produção didática nacional [...]” (MACIEL, 2003 b, p. 22-23).

O estudo de Maciel (2003 b) também mostra que pesquisas mais recentes têm
envolvido questões referentes aos métodos de alfabetização, só que trazendo à tona
uma nova concepção de alfabetização e não mais apenas voltadas para a tentativa
de escolher suportes pedagógicos de qualidade superior para o ensino da leitura e
da escrita. A autora então finaliza dizendo que “[...] as considerações feitas neste
trabalho não têm o carát er de ser meramente um resgate histórico [...] [mas que ele]
é acima de tudo, um esforço para contribuir no fomento aos debates no campo da
história da alfabetização” (MACIEL, 2003 b, p. 23).

Verificamos, ao longo do trabalho, que as considerações feitas pela autora


trouxeram informações significativas sobre a história da produção e dos usos dos
materiais para o ensino da leitura e da escrita no Estado de Minas Gerais, bem como
das influências visíveis dos materiais que circulavam no País. Assim, considera mos
este trabalho como uma valiosa contribuição para o estudo que pretendemos
realizar.

Em nível local, a pesquisa de Schwartz e Falcão (2005) também empreende u


esforços para tratar das questões relacionadas com o ensino da leitura e da escrita.
As autoras afirmam que a pesquisa “[...] teve como objetivo inicial levantar
representações autorizadas sobre o ensino da leitura e da escrita no Espírito Santo
nas seis primeiras décadas do século XIX [...]” (SCHWARTZ; FALCÃO, 2005, p. 1) e,
esclarecem:

[...] denominamos representações autorizadas as veiculadas nas/pela


legislação de ensino e nos/pelos discursos dos agentes responsáveis pela
política de organização do ensino por meio de falas, de mensagens e de
relatórios de presidentes de província e de inspet ores da instrução [...]
(SCHWARTZ; FALCÃO, 2005, p. 1).

Schwartz e Falcão (2005, p. 1) complementam, ainda:

A partir das representações levantadas, analisamos o discurso oficial sobre


o ensino da leitura e da escrita, a fim de investigar estratégias de i mposição
e tática de apropriação que contribuíram para a conformação de métodos
34

pedagógicos para o ensino da língua materna nesta província no processo


inicial de institucionalização da escola brasileira.

De acordo com as pesquisadoras, o que justifica a delimitação do período que


corresponde ao estudo é o “[...] fato de que até o começo da segunda metade do
século XIX, notam-se os esforços por parte do Estado para organizar a instrução
pública brasileira” (SHWARTZ; FALCÃO, 2005, p. 2 -3). Dessa forma, elas explicitam
que esse é o período em que há preocupação tanto por parte dos dirigentes do País,
quanto dos presidentes das diferentes províncias em refletir sobre o papel da
educação e do ensino da leitura e da escrita à população e também à mulher , para
que estivesse preparada para educar “a nova geração de brasileiros”. E é nesse
contexto que as autoras confirmam:

[...] nos prendemos a investigar representações sobre métodos para o


ensino da leitura e da escrita no processo inicial da institucionalização da
escola pública na província do Espírito Santo, buscando analisar, a partir
dos discursos de presidentes de província e de inspetores da instrução
pública, usos e apropriações de métodos de ensino da leitura e da escrita
nas seis primeiras décadas do séc ulo XIX na Província do Espírito Santo [...]
(SCHWARTZ; FALCÃO, 2005, p. 2).

Para a análise dos dados investigados acerca das representações sobre métodos
para o ensino da leitura e da escrita, as autoras fazem uso da abordagem da história
cultural e buscam apoio nas reflexões de “[...] autores como Chartier (1998), Michel de
Certeau (1990), Guy Vicent (1980), Dominique Julia (1993) [...] [que trabalham com
os] [...] conceitos de representação, prática, apropriação, táticas, estratégias, cultura e
forma escolar [...]” (SCHWARTZ; FALCÃO, 2005, p. 2).

As pesquisadoras também apontam medidas tomadas por meio do Decreto -Lei de 15


de novembro de 1827, para a resolução do problema do analfabetismo, em que se
percebe claramente a intencionalidade de torna r uniforme, nas províncias existentes,
o método de ensino – método Lancaster – e os conteúdos, para o fato de que, apesar
do ato adicional de 1834 dar autonomia para que as províncias escolhessem seus
métodos de ensino, até 1848, no Espírito Santo, permane ceram as orientações da Lei
Geral, pois foi somente nesse ano que ocorreu o estabelecimento das primeiras
determinações legais para as escolas de Primeiras Letras. No entanto, até final da
década de 60 do século XIX, é possível visualizar, nos discursos de presidentes de
províncias e inspetores da instrução pública, vestígios desse método.
35

Dessa forma, explicitam em detalhes o histórico do método em questão e como ele


deveria ser trabalhado para o alcance dos objetivos propostos. Contudo afirmam que
encontraram indícios de que, na Província do Espírito Santo, o método prescrito era
seguido parcialmente pela falta de lugar adequado e materiais de trabalho para o
ensino, levando os professores a adaptar o método às condições de que dispunham.

Constam também afirmações das autoras de que o ensino individual, utilizado na


educação dada em casa, era também um método usado em escolas de primeiras
letras, o que as levou a constatar “[...] que o ensino da leitura e da escrita na
província, apesar da prescrição do ensino mútuo, não se desvinculou em sua
totalidade das antigas formas como vinham ocorrendo antes da Lei Geral da
Instrução” (SCHWARTZ; FALCÃO, 2005, p. 6).

No ano de 1841, segundo Schwartz e Falcão (2005), esse método de ensino


individual ainda era utilizado pelos professores, misturado com o mútuo, suscitando
críticas do presidente da Província por essa mescla. Mas, sustentam as
pesquisadoras, apesar dessa tentativa de mesclar os métodos, os professores ainda
não conseguiam êxito em suas práticas, confo rme mostravam os resultados
apresentados pelos alunos ao final de nove a dez anos de escolaridade.

Os problemas apresentados sobre a questão da aplicação dos métodos, continuam as


pesquisadoras, eram freqüentemente atribuídos à falta de preparo dos profes sores
para o ensino da leitura e da escrita. Em 1864, foi registrada pelo presidente da
província, Eduardo Pindaíba de Mattos, a constatação de que havia poucos
professores habilitados. Esse fato se tornou tema predominante nos discursos
proferidos pelos presidentes de província e dos inspetores da instrução pública,
comumente associado às sugestões de

[...] enviar professor para ser preparado na Corte, de criar regulamentos


para as escolas para uniformizar o método de ensino e de tornar mais
efetiva a inspeção nas escolas, deixando -se antever, dessa forma,
estratégias de criação de multiplicadores para aplicação uniforme de
método adequado (SCHWARTZ; FALCÃO, 2005, p. 8).

Durante todas as seis primeiras décadas do século XIX, afirmam as autoras, a falta de
local próprio e de materiais de trabalho para as aulas foi fator citado com persistência
36

pelos presidentes da Província e inspetores, como causas da problemática


envolvendo a aprendizagem das crianças e, também, como impedimento para que o
método simultâneo fosse empregado.

Schwartz e Falcão (2005) constataram que, ao final da década de 1850, esse


método ainda mostrava problemas na sua aplicação por conta da falta de espaço
com a capacidade necessária designado pela Lei e que, na década de 1860, os
utensílios e móveis, além de não chegarem com facilidade às escolas, quando
chegavam, apresentavam -se em precárias condições. É nesse contexto que os
alunos passavam de quatro a cinco a cinco anos dominando somente a leitura.

Segundo as pesquisadoras, o profe ssor João Ortiz, na década de 1860, informava aos
seus superiores que estava conseguindo lograr êxito com a utilização do método
eclético. Tal fato é divulgado pelo presidente da Província e pelo diretor da inspeção
pública em seus relatórios, quando descr evem detalhadamente a utilização do método
pelo professor e, em seguida, o precário estado da instrução, evidenciando a intenção
de conseguir das autoridades respaldo para a utilização do método e a recomendação
para que os professores de primeiras letras freqüentassem as aulas do professor João
Ortiz, com o objetivo de uniformizar o ensino ministrado.

Ao finalizar a análise dos dados sobre a temática proposta, as autoras dizem que foi
possível observar, contudo,

[...] nas mensagens, nas falas e nos relat órios analisados a produção de
discursos que serviram para estruturar representações de que a falta de
formação de professores, a desqualificação dos saberes e das práticas, a
precariedade de instalações para funcionamento das aulas serviam para
construir a idéia de que era necessário um método adequado para o ensino
do ler e escrever, o que assinala estratégia dos presidentes de províncias e
dos inspetores no sentido de construir nova representação acerca de um
método a ser adotado (SCHWARTZ; FALCÃO, 2005, p. 10).

Houve a possibilidade, segundo Schwartz e Falcão (2005), de apontar que, entre o


que é prescrito e o que é praticado, existe um distanciamento, o que torna evidente
que métodos de ensino, particularmente neste estudo, no tocante ao ensino da lei tura
e escrita, “[...] não podem ser vistos como saberes pedagógicos que funcionam como
dispositivo de conformação de práticas escolares, pois dependem do modo como os
37

saberes são apropriados pelos agentes responsáveis pelo processo educacional”


(SHWARTZ; FALCÃO, 2005, p. 10). E ainda salientam:

As fontes documentais demonstraram, então, que no movimento inicial de


institucionalização do sistema público de ensino no Espírito Santo, ensinar a
ler e a escrever requereu dos mestres, dos inspetores e dos pres identes de
província táticas de apropriação de métodos que, por sua vez, refletem
como as estratégias de imposição de formas de ensinar a ler e escrever não
foram suficientes para superar as precárias condições materiais e humanas
para implementações de po líticas públicas educacionais (S CHWARTZ;
FALCÃO, 2005, p. 10).

Com base nas conclusões das pesquisadoras, observamos que os professores,


apesar de despreparados para o ensino da leitura e da escrita, apresentavam
pressupostos de trabalho para esse ensino, pois conseguiam modificar o método de
ensino prescrito, conforme assinalado por Schwartz e Falcão (2005), e adaptá -lo às
condições físicas e materiais disponíveis.

A análise realizada pelas pesquisadoras nos possibilitou verificar estratégias dos


presidentes da Província do Espírito Santo e dos inspetores para a legitimação de um
determinado método para o ensino da leitura e da escrita. Em relação aos
professores, o texto do relatório do presidente da Província, em 1861, expressa que
eles deveriam ter aprendido não apenas ler e escrever, como também a ensinar o que
queriam ensinar. Essa expressão vai de encontro ao posicionamento de Renato
Jardim, um dos articulistas que compunham o grupo dos defensores do método
analítico-sintético, citado por Santos (200 1), o qual se distanciava da defesa do
método analítico como o melhor para o ensino da leitura, pois diz que o uso de um
método determinado não é o aspecto mais importante, pois o professor pode utilizar
quantos e quais métodos ou processos de ensino quise r, “[...] desde que os saiba
praticar e alcancem o objetivo deste ensino: o de dar conhecimento de um sistema de
escrita e habilitar o uso dele lendo ou escrevendo [...]” (SANTOS, 2001, p. 64).

Percebemos que há, nos dois pronunciamentos, a idéi a de que muitas vezes os
professores desconhecem todos os aspectos do método com o qual pretendem e/ou
devem trabalhar e com isso têm as suas idéias pautadas em pesquisas empíricas, o
que pode ocasionar o comprometimento do trabalho a ser desenvolvido.
38

Ao finalizarmos a apresentação dess e último trabalho de pesquisa, reconhecemos a


sua relevância para a história da educação e as importantes contribuições que ele
trouxe para o nosso trabalho. Temos conhecimento da existência de ou tros trabalhos
que tratam a alfabetização, como o de Amâncio (2003), intitulado “Cartilhas de ensino
de leitura e escola primária em Mato Grosso no início do século XX” que, segundo a
autora, busca “[...] elementos para compreensão das possíveis articulações entre a
adoção de um método de ensino de leitura, a circulação, a distribuição e o uso de
cartilhas em Mato Grosso” (AM ÂNCIO, 2003, p. 54); o de Bernardes (1999), “História
e memória da alfabetização : análise dos processos de elaboração do Programa Alfa”,
que se ocupou, conforme a autora, “[...] em investigar as bases teóricas e
metodológicas do Programa, além de resgatar a história da sua implantação e
execução [...]” (BERNARDES, 1999, p. 8) e outros que apresentam características
e/ou propósitos mais distanciados dos objetivos d a pesquisa que propomos realizar.

Apesar da existência de um número reduzido de trabalhos, h á uma tendência de


crescimento, em diversos Estados brasileiros, de trabalhos de pesquisa que abordam
a alfabetização numa perspectiva histórica. A pesquisa que re alizamos se insere
nessa tendência e, como apontamos na Introdução deste relatório, teve por finalidade
investigar a alfabetização na história da educação do E spírito Santo no período de
1924 a 1938. Para o alcance desse objetivo geral, primeiramente, conf iguramos a
educação pública primária, no Espírito Santo, no período recortado para estudo, e, em
seguida, analisamos as cartilhas e livros de leitura e os métodos de ensino adotados
oficialmente no Estado. Esperamos que a pesquisa venha a contribuir para a difícil
tarefa de reconstruir a história da alfabetização no Espírito Santo.
39

3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS

Os resultados da pesquisa relatad os neste trabalho integram um conjunto de


estudos orientados pela Profª Dr a. Cláudia Maria Mendes Gontijo que têm por
finalidade investigar a alfabetização na história da/o Provínci a/Estado do Espírito
Santo. Assim, esses trabalhos têm em comum o objeto de estudo – a alfabetização.
O primeiro relatório que resultou do esforço sistemát ico de reconstruir a história da
alfabetização foi elaborado por Gontijo (2008) e tem como título A alfabetização na
história da/o Província/Estado do Espírito Santo (1870 a 1920) .

Neste trabalho, como mencionado, nos propomos a investigar a alfabetização na


história do Espírito Santo no período de 1924 a 1938. O fato de termos encontrado
importantes fontes documentais relativas a esse período explica a sua delimitação.
O marco inicial – ano de 1924 – pode ser justificado pelo fato de, nesse ano, ter sido
promulgada a Lei nº 6.501 que reorganizou a instrução pública no Espírito Santo. No
ano de 1938, é possível visualizar como estava se desenvolvendo o processo de
implementação da escola ativa no Espírito Santo e como eram pensadas pelos
gestores públicos as mudanças para a educação.

O corpus documental analisado foi constituído de materiais escritos (manuscritos


e/ou impressos) produzidos no período em foco. Nesse sentido, efetuamos a análise
dos textos produzidos na época e, por isso, tomamos “[...] como referência a
concepção bahktiniana de linguagem, particularmente a sua noção de texto [...]”
(GONTIJO, 2005, p. 10). De acordo com Bak htin (2003, p. 307), o texto é o

[...] dado primário de todas [...] [as] disciplinas, do pensamento filológico -


humanista no geral (inclusive do pensamento teológico e filosófico em sua
fonte). O texto é a realidade imediata (realidade do pensamento e das
vivências), a única da qual podem provir essas disciplinas e esse
pensamento. Onde não há texto não há objeto de pesquisa e pensamento.

O texto constitui-se em permanente diálogo entre interlocutores e com outros textos,


pois “O acontecimento da vida do texto, isto é, a sua verdadeira essência, sempre se
desenvolve na ‘fronteira de duas co nsciências, de dois sujeitos’” (BAK HTIN, 2003, p.
311) e, portanto, na fronteira entre indivíduo e sociedade. Segundo o autor, há um
texto “pronto, concluído” e outro que emerge em conseqüência do primeiro, onde
40

temos, então, o encontro de dois textos (doi s discursos), dois autores. Assim,
consideramos que “[...] só o texto pode ser o ponto de partida” (BAK HTIN, 2003, p.
308) dos estudos orientados por uma perspectiva histórica, pois for am eles que
possibilitaram a reconstrução dos pensamentos e das vivências produzidas pelos
sujeitos no período focalizado neste estudo . Assim, podemos afirmar que, no
pensamento bakhtiniano, encontramos uma concepção de linguagem fundamentada
em uma abordagem histórica, social e cultural que nos ajuda a construir, a elabora r o
nosso entendimento acerca da alfabetização. O texto deve ser examinado de acordo
com o contexto socioideológico . Assim é necessário explicitar que:

[...] o texto, como dado primário das ciências humanas, comporta na sua
análise e leitura o contexto do s sujeitos que o produziram e do sujeito que o
estuda e, portanto, ele se integra às formas de pensar de uma dada
sociedade, do sujeito que o produziu e do investigador que busca
compreendê-lo e reconstituir seus sentidos (GONTIJO, 2005, p. 12).

Como, para Bakhtin (2003, p. 312), “[...] as ciências humanas são as ciências do
homem em sua especificidade, e não de uma coisa muda ou um fenômeno natural
[...]”, trata-se, dessa forma, de perceber e estudar um sujeito -produtor de textos.
Sujeito que se expressa e cria textos cujos discursos que neles se concretizam não
são criações abstratas ou individuais desprovidas de sentido, mas criações sociais e
históricas.

Nesse contexto, é importante explicitar que a noção de texto elaborada por Bakhtin é
coerente com a visão de Le Goff (1996, p. 8), ao afirmar que, “A idéia da história
como história do homem foi substituída pela idéia da história como história dos
homens em sociedade”. Para Helmstadler (1970, apud RICHARDSON, 2007, p.
245), ”[...] a pesquisa histórica apresenta dois objetivos básicos: produzir um registro
fiel do passado e contribuir para a solução de problemas atuais [...]”. No primeiro
caso, o pesquisador se defronta com um problema histórico em que há a
possibilidade de tratá-lo de duas formas: na primeira delas , a informação é coletada
e o problema é descrito em um dado momento (estudo transversal); na segunda
forma, o desenvolvimento de um fato sucedido é descrito através do tempo (estudo
longitudinal).
41

No segundo caso, não se trata d e realizar “um registro do passado” e, sim, de


contribuir para a solução de problemas por meio da análise de fatos passados.
Tendo em vista os objetivos desta pesquisa, pensamos qu e ela se insere no
segundo caso, pois a investigação dos fatos do passado po de contribuir para a
compreensão do presente, principalmente, com relação à permanência de
problemas relacionados com os baixos índices de desempenho em leitura e escrita
de grande parte dos estudantes brasileiros .

3.1 A pesquisa documental

Segundo Richardson (2007, p. 228), a pesquisa documental “[...] pode ser definida
como a observação que tem como objeto não os fenômenos sociais, quando e como
se produzem, mas as manifestações que registram seus fenômenos e as idéias
elaboradas a partir deles”. Dess a maneira, tomamos o conjunto de materiais escritos
e manuscritos do final da década de 1920 até o ano de 1938, relativos à
alfabetização, como documentos em que os discursos materializados traziam
indícios de como se dava esse ensino na referida década, n as escolas do Estado. A
análise desses discursos, produzidos por sujeitos que estavam, direta ou
indiretamente, ligados ao órgão governamental responsável pelas políticas públicas
educacionais teve como objetivo retratar o cenário educacional da época.

A pesquisa com base documental, conforme assinala Richardson (2007), é utilizada


para investigar uma variedade de elementos que encerram um valor documental:
elementos iconográficos, documentos fonográficos, cinematográficos, videocassetes,
objetos, etc. Portanto as fontes que podem dar informações sobre fenômenos
sociais não se constituem apenas nos documentos escritos ou na estatística. Esses
documentos podem se apresentar em diversos formatos, compilados pelo autor, no
momento em que se produzem ou após o acontecimento. Porém, neste estudo,
foram utilizadas fontes escritas e manuscritas.

Assim, com o objetivo de constituir o corpus documental de nossa pesquisa,


buscamos, inicialmente, por meio de consulta no livro: “História da Educação no
Espírito Santo: catálogo de fontes”, material produzido por uma equipe de
42

pesquisadores do Programa de Pós -Graduação em Educação (PPGE) e do


Programa de Pós-Graduação em História (PPGHIS), sob a coordenação da
professora Regina Helena Silva Simões (200 4), levantar as fontes relacionadas
nesse material que contemplavam a temática e que eram pertinentes ao período
correspondente ao nosso estudo.

Concomitante a esse procedimento, realizamos, ainda, no Arquivo Público do Estado


do Espírito Santo, o levant amento de documentos oficiais, relatórios e termos de
visitas dos inspetores, publicações em periódicos e outros, além de livros pertinentes
ao tema e à época. Em busca de materiais compl ementares, recorremos ainda à
Biblioteca Central da Universidade Fede ral do Espírito Santo (UFES), à Biblioteca
Setorial do Centro de Educação (UFES), à Assembléia Legislativa do Estado do
Espírito Santo, à Biblioteca Professora Alaíde Lisboa de Oliveira da Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG), à Biblioteca Estadual Professor Luís de Bessa em
Belo Horizonte (MG) e, ainda, à Superintendência Regional de Ensino Metropolitana
A, também em Belo Horizonte.

Encontramos grande dificuldade de acesso aos documentos que estão sob a guarda
do Arquivo Público do Estado do Espíri to Santo. Apesar das dificuldades,
procuramos, nos estudos e documentos disponíveis, analisar os elementos sobre a
alfabetização presentes nessas fontes. A segunda etapa consistiu na reunião das
fontes documentais pertinentes à época. Esse procedimento se fez necessário para
determinarmos “[...] os aspectos e os limites do trabalho a fim de reunir informações
sobre um campo específico e fazer análises sobre objetos definidos a partir dos
quais se possa compreender uma determinada situação” (CHIZZOTTI, 2000, p. 98).
Com esse objetivo, os documentos foram assim agrupados:

a) legislação Federal e Estadual: Constituição Federal e Estadual; Leis, Decretos e


Resoluções;

b) documentação oficial e técnica: mensagens do presidente do Estado do Espírito


Santo nos anos de 1928 e 1929; requerimentos recebidos pelo secretário da
Instrução; livro de registros de cartas e impressos do Departamento de Ensino
Público expedidos pelo correio e livros de termos de aprovação de propostas de
43

materiais escolares da Secretaria da Instrução; relatórios e termos de visitas dos


inspetores escolares;

c) estudos disponíveis e publicações periódicas: livros acerca da temática do estudo


e revistas de educação que c ircularam no período do estudo ;

d) cartilhas adotadas no período.

Após a seleção e agrupamento dessas fontes, iniciamos a terceira etapa que


consistiu nos registros dos fatos determinados ou relatados no conjunto de materiais
coletados. Os registros foram feitos por meio de fotografia e/ou man ualmente e,
raras vezes, xerocopiados, porque a maioria dos materiais não foi disponibilizada
para esse fim. Com o corpus documental definido e caracterizado, demos início à
quarta etapa que consistiu na realização da leitura de todo o material coletado, o que
possibilitou a construção de uma visão geral dos discursos sobre a alfabetização .
Após a leitura, fez-se necessário o estabelecimento de categorias para tornar
possível a construção do relatório de pesquisa .

Assim, a leitura dos dados coletados p ermitiu visualizar elementos referentes à


situação da educação primária, às cartilhas e aos métodos adotados no Espírito
Santo, no período de 1924 a 1938. Construímos este relatório a partir desses
elementos. Como analisamos vários textos produzidos por inspetores escolares,
iniciamos o próximo capítulo pela análise desse material.
44

4 A EDUCAÇÃO PRIMÁRIA NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO


(1924-1938)

Discutiremos a situação da educação no Espírito Santo a partir de livros , artigos


científicos, revistas de educação e documentos (legislação, relatórios e termos de
visitas dos inspetores escolares no período de 1924 a 1938, mensagens do
Presidente do Estado do Espírito Santo nos anos de 1929 e 1930 ).

Tomaremos, para análise da educação primária no Espíri to Santo, alguns elementos


presentes nessas fontes que di zem respeito à formação de professores e docência;
à freqüência dos alunos às escolas; às condições da estrutura física das escolas; ao
provimento de materiais pedagógicos para o ensino da leitura e da escrita e os
métodos de ensino. Consideramos que todos esses aspectos ajudam a evidenciar
as dificuldades e possibilidades de concretização do trabalho com as cartilhas, livros
de leitura e métodos de ensino adotados no período de 1924 a 1938 no Espírito
Santo.

Iniciaremos trazendo à luz as determinações previstas na Constituição do Estado do


Espírito Santo promulgada , em 11 de agosto de 1935, em consonância com a
Constituição Federal de 1934. De acordo com Costa (2002, p. 12), “Cada
Constituição nacional representa a institucionalização de uma nova ordem social,
econômica e jurídica, decorrente de um acontecimento político importante”. É
necessário, porém, um tempo de dois a três anos após o acontecimento, “[...] para a
convocação de uma assembléia con stituinte e para a elaboração e a aprovação do
texto constitucional” (COSTA, 2002, p. 12).

A Constituição de 1934 foi promulgada quatro anos depois da Revolução de 1930,


num momento em que, de acordo com Costa (2002), a situação política e econômica
do Brasil não era boa. No campo político, as eleições fraudulentas e manipuladas
por chefes políticos, ou “coronéis” geravam insatisfação popular e, no campo
econômico, as impossibilidades de exportação da produção do café traziam
problemas, pois era, na época , a principal riqueza do Brasil. Dessa forma, tanto em
uma área quanto em outra, a situação era preocupante.
45

Segundo Rocha (1996, p. 119), toda a mobilização que envolveu a Revolução de


1930, “[...] não se restringiu apenas ao seu aspecto jurídico -eleitoral, mas estendeu-
se também à renovação do campo educacional”. A Constituição de 1934, então, foi o
resultado de toda uma inquietação em torno do “[...] chamado movimento renovador
da educação” (ROCHA, 1996, p. 121) expressado, na primeira metade dos anos 30 ,
e presente, também, na década de 20 nas várias reformas educacionais. Nessa
Constituição, de acordo com Costa (2002, p. 15), a educação teve destaque,

[...] vindo a ser tratada no capítulo II e em outros artigos ao longo do texto


legal, que incorporava várias idéias discutidas e propostas por educadores e
intelectuais da época. A constituição dispunha sobre vários assuntos
importantes, tais como: plano nacional de educação, obrigatoriedade e
gratuidade do ensino primário, organização dos sistemas educaci onais,
ensino religioso, liberdade de cátedra e vinculação de recursos de impostos
na manutenção e no desenvolvimento dos sistemas de ensino.

A importância desses temas, entre outros, favorecia a implementação de uma


educação universal, mais a cessível e mais bem qualificada em relação ao ensino.
Sobre a relevância dos aspectos abordados nessa Constituição, Rocha (1996) e
Costa (2002) concordam em um ponto: “[...] a Constituição de 1934 é uma carta
plenamente realizada na história educacional do país, contrariamente, ao que se
possa imaginar em decorrência de seu curto período de vigência legal” (ROCHA,
1996, p.138).

Ao contrário da Constituição brasileira que colocou a educação em posição de


destaque em seu texto, a Constituição do Espírito San to dedicou uma parte
chamada “Título V – Da obra educacional, do interesse público e da ordem social”,
ou seja, não tratava exclusivamente da educação e cultura. Nos treze capítulos, sete
incisos e três parágrafos que compõem esse título, estão dispostas d eliberações
sobre a criação de um Conselho Técnico de Educação e um de Saúde Pública; a
regulação da composição, o funcionamento e a competência desses conselhos e
dos que forem criados; a manutenção de um órgão técnico destinado a dirigir e
difundir a Educação Física que seria obrigatória nos programas dos
estabelecimentos oficiais . Esse órgão seria responsável , também, pela orientação e
aperfeiçoamento dos professores especializados.
46

Havia ainda as determinações de que competiria aos Conselhos Técnicos d e


Educação e Saúde Pública, a fiscalização dos estabelecimentos de ensino e das
instituições de assistência social subvencionadas pelos cofres públicos e , também, a
fiscalização da aplicação das verbas destinadas aos serviços de educação,
assistência hospitalar, amparo à maternidade , à infância e à saúde pública. Um
artigo da Constituição se referia ao ensino religioso que deveria ser ministrado nos
horários regulamentares e nas mesmas condições das outras disciplinas, porém , de
freqüência facultativa. Trazia também deliberações sobre contratação de pessoas de
direito privado para execução de serviços públicos , estimulação ao desenvolvimento
das sociedades de esporte com o auxílio de materiais e meios necessários à prática
da educação física; e, ainda , outras determinações sobre o exercício das profissões
liberais e normas para a construção de casas populares no município.

De todos os artigos, parágrafos e incisos que compõem esse título da Constituição


de 1935, do Estado do Espírito Santo , destacamos apenas três artigos: o 135 , que
se limitava a respeitar as diretrizes traçadas pela União a respeito da organização e
manutenção do sistema próprio de educação pelo Estado em todos os graus e ,
também, à gratuidade e obrigatoriedade do ensino primário. O ar t. 140, que dizia
respeito à obrigatoriedade de toda empresa industrial ou agrícola com mais de 50
funcionários, “[...] manter pelo menos uma escola primária para o ensino gratuito de
seus empregados e trabalhadores [...]” e o art. 142 § 1º , em que era estabelecido
auxílio ou subvenção aos estabelecimentos de ensino primário, secundário, técnico,
profissional ou de assistência social, quando estes se submeterem à sua
permanente fiscalização e apresentarem requisitos satisfatórios em relação à sua
utilidade e eficácia.

O fato de a educação não ser privilegiada na Constituição Estadual era incoerente


com o discurso do Poder Público na época de elaboração e promulgação da
Constituição, visto que a proposta do Governo era criar escolas onde houvesse
necessidade delas, equipá-las com o material necessário e ter um corpo docente
competente para atuar no ensino. Se a preocupação principal era a educação, como
não privilegiá-la na legislação? Deparamo -nos aqui com a distância entre os
discursos político e legal, num momento em que o Estado vivia uma reforma
47

educacional, principalmente em torno da metodologia de ensino: do método intuitivo


para o da escola ativa, iniciada em 1929.

Mas os problemas em relação à educação não eram preocupação só do Estado do


Espírito Santo. Na verdade, era um problema nacional de longa data que se refletia
nos Estados da Federação. Carvalho (2003, p. 13) diz que, apesar de desde os anos
20, existir “[...] entre intelectuais que se aplicavam a pensar o Brasil e a avaliar a
República instituída, a crença de que na educação residia a solução dos problemas
que identificavam”, a educação na década de 1930, no Estado do Espírito Santo,
seguia os moldes da que era prestada no período imperial, pois continuava a faltar
espaços adequados para as escolas funcionarem e, também, materiais didáticos e
pedagógicos para os alunos.

O “entusiasmo pela educação”, reinante na Primeira República, trazia em seu bojo o


ideal de que a educação tem papel fundamental no processo de modernização
social e econômica. Nesse contexto, o caráter transformador da educação era
hiperdimensionado, pois “[...] tratava -se de dar forma ao país amorfo, de transformar
os habitantes em povo, de vitalizar o organismo nacional, de constituir a nação [...]”
(CARVALHO, 2003, p. 13).

De acordo com Nagle (2001, p. 134), o surgimento desse entusiasmo pela


escolarização e do otimismo pedagógico resultam em duas grandes questões:

De um lado, existe a crença de que, pela multiplicação das instituições


escolares, da disseminação da educação escolar, será possível incorporar
grandes camadas da população na senda do progresso nacional, e colocar
o Brasil no caminho das grandes nações do mundo; de outro lado, existe a
crença de que determinadas formulações doutrinárias sobre a escola rização
indicam o caminho para a verdadeira formação do novo homem brasileiro
(escolanovismo). A partir de determinado momento, as formulações se
integram: da proclamação de que o Brasil, especialmente no decênio da
década de 1920, vive uma hora decisiva, que está exigindo outros padrões
de relações e de convivências humanas, imediatamente decorre a crença
na possibilidade de reformar a sociedade pela reforma do homem, para o
que a escolarização tem um papel insubstituível, pois é interpretada como o
mais decisivo instrumento de aceleração histórica.

Assim, a crença resultante desse duplo movimento da Pedagogia nova – o


entusiasmo pela educação e o otimismo pedagógic o – é a de que a escolarização
48

era “o motor da história”. Foi com esse pensamento que, de acordo com Buffa e
Pinto (2002, p. 32), “[...] Políticos e educadores, no final do século XIX, passaram a
defender a necessidade de espaços especialmente construídos para serem
escolas”. Eles acreditavam que era necessário “[...] defender um projeto de
educação popular por entenderem que a própria consolidação da República
dependia da difusão do ensino primário [...]” e da criação de “[...] Escolas Normais
para formar esses novos professores” (BUFFA; PINTO, 2002, p. 43). Esse era,
então, o momento de insti tucionalização das escolas graduadas, ou seja, dos grupos
escolares.

Os grupos escolares, organizados em classes seqüenciais, passam a exigir uma


organização nova do espaço escolar. De acordo com os autores, “[...] o
estabelecimento do vínculo entre edifí cio-escola e concepções educacionais é
tardio; surge no momento mesmo em que a escola primária começa a ter a
configuração que conhecemos hoje” (BUFFA; PINTO, 2002, p. 33).

Essa organização dos grupos escolares, segundo os mesmos autores, vigorou


legalmente durante oito décadas. Foram criados em 1893 e suprimidos em 1971, por
meio da Lei Federal nº 5.692 que, fixando as diretrizes para o ensino de 1º e 2º
graus, fez a junção do primário ao ginásio, sendo instituído o ensino de Primeiro
Grau que, atualmente, corresponde ao ensino fundamental. A escola graduada de
ensino primário, no Brasil, organizada em várias salas de aula e classes de alunos
com um professor para cada uma, apareceu, “[...] pela primeira vez no ensino
público, no estado de São Paulo, na dé cada de 1890” (BUFFA; PINTO, 2002, p. 33).

Os autores afirmam ainda que o grupo escolar republicano, diferentemente das


escolas de primeiras letras, estabelece uma ordenação nova do tempo escolar.
Tempo este marcado pelo relógio que passa a ser o brigatório em cada sala de aula.
“O emprego do tempo ganha importância e significado na organização racional do
ensino da escola primária republicana” (BUFFA; PINTO, 2002, p. 52). No Espírito
Santo, desde o século XIX, o relógio já era um dos materiais pre visto no Regimento
das Escolas de primeiras letras para ter nas salas de aulas, pois a adoção do
método de ensino simultâneo baseada numa rigorosa organização do tempo escolar
o exigia.
49

Se, na República, a educação teria papel fundamental, no final da déca da de 1920,


a situação da educação primária no Estado do Espírito Santo era precária.
Funcionavam em todo o território estadual cinco grupos escolares, tendo esse
número aumentado para 24, localizando -se os estabelecimentos novos em alguns
dos principais municípios: Calçado, Cachoeiro de Itapemirim, Serra, Santo Antônio,
Anchieta, Alegre, Santa Leopoldina, Santa Thereza, Affonso Cláudio, Itaguass u,
Timbuhy, Cidade do Espírito Santo, Castelo, João Pessôa, Siqueira Campos e
Jucutuquara.

No município de Vitória, onde a população escolar estava crescendo


extraordinariamente, criaram -se mais 13 escolas isoladas, duas escolas reunidas e
dois grupos escolares. As escolas isoladas, segundo o art. 32 do Decreto nº 6.501,
1925, p. 26: “[...] são especiaes para cada sexo, onde houver duas ou mais, e mixtas
para as localidades onde fôr mantida uma única”. No art. 33 do mesmo documento é
definido que “As escolas do sexo feminino e as mixtas serão regidas
exclusivamente, por professoras, e as do sexo masculino podem sel -o,
indiferentemente, por professores ou professoras”.

As escolas reunidas, de acordo com o art. 55 do Decreto nº 6.501/1924,


funcionavam nas cidades e vilas em que o número de escolas fosse de dois a seis e,
poderiam funcionar em um só prédio com a denom inação de Escolas Reunidas,
podendo ter como diretor um professor que fosse também regente de classe. O art.
46 define que os grupos escolares, em qualquer localidade, eram as escolas que
tinham que ter necessariamente uma freqüência de 220 alunos em um an o, com
prédio próprio para essa capacidade. No art. 47, consta que os grupos escolares
“[...] terão quatro classes para cada sexo, devendo o terceiro e quarto annos
masculinos ser regidos por professores”. O art. 48 estabelece que “[...] cada
professor terá a regencia de uma classe em que leccionará todas as materias do
programma”. Essas escolas assim especificadas foram criadas no município de
Vitória, conforme dito anteriormente.

Araújo (1942, p. 2) diz, contudo, em sua análise a partir de dados d ivulgados pelo
Diário Oficial do Estado, que: “Si tomarmos por base o período de 30 anos,
verificamos que o aumento [...]”, no número de escolas e conseqüentemente no
50

número de matrículas, ”[...] em cada decênio é bastante significativo”. O autor , então,


faz uma análise a partir do ano de 1911 e relata:

Em 1911 o Estado contou, no ensino primário, 6.204 creanças matriculadas


em 190 escolas. Em 1921 as inscrições elevaram -se a 13.871, isto é, mais
7.667 ou 123,6%. Em 1931 computaram -se 43.325 alunos que
correspondem a 212,3% a mais. O ano passado a matrícula nas 920
escolas atingiu a 67.148, dando a percentagem de 55%. Por onde se vê que
de 1911 a 1941 houve um aumento de 730 escolas e 60 .944 matriculas que
correspondem a 982,3% (ARAÚJO, 1942, p. 2).

Dessas 920 escolas, oito eram de ensino infantil, 873 de ensino fundamental
comum, 21 de ensino supletivo e 18 do ensino complementar. Os dados estatísticos
analisados mostram que, com efeito, houve um aumento considerável no número de
escolas no Estado, mas isso não significava, apesar de tudo, que o problema estava
resolvido, pois, de acordo com Araújo (1942), o ensino fundamental comum,
destinado às crianças de sete a doze anos, o segmento mais importante e o único
acessível a todos, ainda estava muito longe de uma disseminação adequada, que
atendesse a toda população escolar do Estado e facilitasse a alfabetização do maior
número possível de crianças.

Segundo o autor, é digno de louvor o empenho do governo em ampliar a rede de


ensino de modo que possa atender ao maior número de crianças e o esforço para
que a educação se torne a cada dia mais eficiente. No entanto, para Araújo (1942),
falta ainda colocar em prática, por um tempo previamente estabelecido, um plano de
organização cujas linhas fundamentai s possam ser avaliadas após esse período
para que o ensino possa apresentar melhor rendimento e ser mais produtivo. Ele
acredita que, “[...] Quanto mais eficiente f ôr o ensino, maior será o seu rendimento e
quanto mais render, menor será a quantidade de cr eanças que abandonará a escola
antes de cursar o 3º ano” (ARAÚJO, 1942, p. 10).

Foi possível observar, pelas considerações do autor ao longo do seu trabalho e,


principalmente, sobre o aproveitamento no ensino primário, que a grande dificuldade
era manter os alunos na escola. A quantidade de alunos evadidos era bastante
significativa e, para ele, ficou evidente que a causa principal desse fato era a falta de
aproveitamento em todas as modalidades de ensino: infantil, fundamental comum,
supletivo e complementar.
51

Segundo Oliveira (1975, p. 428), “Quando estalou o movimento revolucionário de


1930, achava-se à frente do Governo estadual o Presidente Aristeu Borges de
Aguiar, que se empossara aos trinta de junho de 1928 [...]”. Contudo, devido à falta
de apoio político para organizar a defesa da capital, em 16 de outubro, o presidente
abandonou o cargo e, em seu lugar, para governar, foi chamado o sucessor
imediato, de acordo com a Constituição – Antônio Francisco de Ataíde – Presidente
do Congresso. “Duas ou três horas depois, apresentou -se em Palácio, assumindo o
Governo, o Coronel José Armando Ribeiro de Paula – Comandante do 3º Batalhão
de Caçadores – nomeado Interventor Federal por Decreto do Presidente da
República” (OLIVEIRA, 1975, p. 428).

Com a entrada das tropas revolucionárias na Capita l – noite de 18 de outubro – o


coronel Ribeiro de Paula se viu sem o apoio dos soldados do 3º B. C., que se uniram
à Revolução e também abandonou o cargo. “No dia seguinte, - dezenove - o chefe
revolucionário deu posse à Junta Governativa, constituída por João Manuel de
Carvalho, capitão João Punaro Bley e Afonso Corrêa Lírio” (OLIVEIRA, 1975, p.
429). Assim, no dia 22 de outubro de 1930, empossou -se no cargo de Interventor
Federal do Estado, o capitão João Punaro Ble y (Foto 1), nomeado por decreto do
Governo Provisório. João Punaro Bley , governou o Estado como interventor federal
no período de 1930 a 1935, como governador constitucional de 1935 a 1937 e
assumiu novamente o governo com o título de interventor de 1937 a 1943.

Foto 1: O interventor Federal João Punaro Bley


Fonte: Realizações do Presidente Getúlio Vargas no Estado do Espírito Santo: 1930 -1940.
52

Conforme Oliveira (1975, p. 429), destaca -se, nesses 12 anos da gestão de Punaro
Bley, a boa administração do s ecretário da Fazenda – Mário Aristides Freire – que
conseguiu saldar todos os empréstimos feitos e organizar as finanças do Estado.
Desse modo, o Governo Estadual pôde construir edifícios escolares e realizar obras
na área da saúde, estradas de rodagem e o utros setores.

Conforme consta no álbum sem autor, não paginado, intitulado “Realizações do


Presidente Getúlio Vargas no Estado do Espírito Santo – 1930-1940”, editado como
uma “homenagem do Govêrno e do Povo do Estado do Espírito Santo , ao eminente
Presidente Getúlio Vargas no décimo aniversário de seu Govêrno”, composto e
impresso no mês de dezembro de 1940, nas oficinas do Serviço Gráfico do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística do Rio de Janeiro, a construção de prédios
escolares no Espírito Santo também foi possível, graças à parceria entre os
Governos Federal e Estadual.

No campo da educação, a obra de cooperação entre os governos federal e


estadual se traduz de maneira bastante expressiva. Recebendo do Govêrno
da União o melhor apoio para a causa da educação, já pelo auxílio
concedido para a construção de grupos escolares em núcleos de
colonização estrangeira, já pelo estímulo dado ao ensino superior, [...] o
Govêrno Estadual tem procurado corresponder a essa colaboração, levando
também ao Govêrno Federal sugestões que a experiência de contacto
direto com o ensino pode aconselhar
(ÁLBUM, 1940).

Assim, o documento aponta que a parceria entre os governos foi de grande


importância na área educacional, principalmente no problema da nacionaliz ação do
ensino, considerado “[...] dos mais importantes na vida do Estado” (ÁLBUM, 1940).
Havia espalhados por vários municípios do Estado, em núcleos densos,
aglomerados estrangeiros disseminados em pequenas “colônias”, que logo atraíram
a atenção do Governo Estadual que iniciou a campanha de nacionalização do
ensino. Nessa campanha, pôde contar com a ajuda do Governo Getúlio Vargas.
Assim, em 1939, a União concedeu ao Estado um auxílio financeiro “[...] para
construções escolares em núcleos de colonização estrangeira” (ÁLBUM, 1940).
Essa ajuda permitiu a construção de “[...] 8 Grupos Escolares nos núcleos de
Araguaia, Sapucaia, Tancredo, 25 de Julho, Laranja da Terra, Lagoa, Recreio e
Palmeira” (ÁLBUM, 1940). Em 1940, ainda se encontravam em construção mai s
53

cinco grupos escolares localizados em Rio Bonito, Baixo Guand u, Boa Sorte, Muniz
Freire e Santa Maria de Jequitibá.

Encontravam-se projetados e em vias de início de construção, “[...] os 13 Grupos


que beneficiarão Rio Taquara, Rio Claro, Jequitibá, Hol anda, Califórnia, São Bento,
Barra do Limoeiro, Água Limpa, Santa Rosa, Bananal, Liberdade, São Domingos e
Águia Branca” (ÁLBUM, 1940). De maneira geral, os grupos obedeciam a dois tipos
padronizados: um com duas salas de classe, adotado nos núcleos mais p opulosos;
outro com uma sala de aula e respectiva residência do professor, adotado nos
lugares onde a população estrangeira e assimilar era menor (Fotos 2 e 3).

Foto 2 – Tipo de construção de grupo escolar rural, adotado em zona de colonização estrangei ra
Fonte: Realizações do Presidente Getúlio Vargas no Estado do Espírito Santo: 1930 -1940.
54

Foto 3: Outro tipo de construção de grupo escolar rural, adotado em zona de colonização estrangeira
Fonte: Realizações do Presidente Getúlio Vargas no Estado do Espírito Santo: 1930-1940.

Dando prosseguimento à obra de nacionalização do ensino nos núcleos


estrangeiros, em 1940, o Governo Federal concedeu novamente auxílio para mais
construções escolares. Foi iniciada, então, a construção de cinco grupos escolares
com quatro salas de classe, nas seguintes localidades: Barra do Itapemirim, Fundão,
Figueira de Santa Joana, Rio Pardo e Bom Jesus. Para a construção de sete grupos
escolares, “[...] situados em Afonso Pena, Alfredo Chaves, Pau Gigante, Córrego da
Barra Sêca, Ponta do Ouro, Pontões e Venda Nova; os três primeiros serão de
quatro salas e os quatro restantes obedecerão ao tipo de uma sala com residência”
(ÁLBUM, 1940).

Porém, por meio da análise dos relatórios e dos termos de visitas dos inspetores ,
visualizamos que a construção dos grupos escolares e, portanto, o aumento de
escolas não implicou mudanças qualitativas na educação primária no Estado. Vale
ressaltar aqui que, a partir de 1931, encontramos pouquíssimos relatórios de
inspetores, mas muitos termo s de visitas que viabilizaram a continuidade do
trabalho.

No ano de 1931, encontramos apenas seis relatórios contendo escassas


informações sobre as escolas e os professores. Em 1932, há apenas uma denúncia
feita pelo inspetor Claudionor Ribeiro acusando uma professora regente da escola
55

masculina de Guarapari de não cumprir seus deveres com a devida regularidade.


Encontramos, no ano de 1933, dois relatórios: o primeiro se refere ao fornecimento
de objetos e móveis aos colégios e estabelecimentos de ensino particulares, pelo
almoxarifado da extinta Secretaria da Instrução , e o segundo é o resultado do
inquérito da professora acusada pelo inspetor Claudionor Ribeiro.

Em 1934, há um relatório do professor José Celso Cláudio, diretor do Grupo Escolar


“Professor Lellis”, localizado na cidade de Alegre, com data de 7 de janeiro de 1934.
Nesse relatório, o diretor diz que assumiu a direção do educandário em 14 de julho
de 1933 e, então, passa a relatar como foi o período de sua administração,
abordando questões r elacionadas com a matrícula, escrituração, funcionamento da
escola normal e ginásio do grupo e outros assuntos pertinentes à escola. O outro
documento encontrado é uma carta do Sr. Loren M. Reno, diretor -geral do Colégio
Americano ao secretário do Interior propondo um curso normal em regime de
internato no referido colégio. Nos anos 1933, 1936 e 1940 , não encontramos
relatórios ou termos de visitas. Em 1937, há apenas um pequeno relatório do diretor
do Grupo Escolar “Virgílio Ramalhete” especificando as con dições do prédio e do
mobiliário.

A falta desses documentos nos levou a buscar outras fontes que nos fornecessem
indícios de como se configurava a educação no período em estudo. Encontramos os
termos de visita utilizados pelos inspetores, referentes a cad a escola que visitavam.
Esses termos, nos anos de 1931 e 1932, eram manuscritos; já no ano de 1935, eram
feitos em formulários próprios. Isso, porém, não se constituiu em uma regra, pois
encontramos, no ano de 1938, alguns termos de visitas manuscritos e o utros em
formulários de dois modelos diferentes.

Como utilizaremos, inicialmente, os dados contidos nos relatórios dos inspetores


(período de 1928 a 1938), é necessário comentar sobre esse serviço. De acordo
com o disposto no Regulamento da Secretaria d a Instrucção (1924), Capítulo III –
Secção III – art. 10: “Os inspetores escolares são auxiliares immediatos do
Secretario da Instrucção encarregados da inspeção e fiscalização do ensino primário
e da execução de quaesquer serviços relativos ao mesmo ensin o, de accordo com
as exigencias da organisação escolar” (p.15). No inciso 1º (p.15) consta que “Os
56

inspetores escolares serão de livre nomeação e demissão do Governo do Estado e


escolhidos dentre professores de reconhecida competencia”.

O detalhamento das atribuições dos inspetores escolares é feito em 27 itens


constantes no inciso 3º que incluíam: a fiscalização de todos os estabelecimentos de
ensino oficiais, municipais e particulares; o fornecimento de dados estatísticos sobre
os alunos matriculados; as condições de conservação e higiene do prédio escolar e
do material de ensino; a observação dos programas, disciplina, pontualidade de
professores e alunos; as condições de conservação e higiene do prédio escolar e do
material do ensino; a distribuição do s matriculados pelos cursos, séries e classes.

Observamos que, nos 27 itens, relativos às atribuições dos inspetores, há


predomínio das funções fiscalizadoras, de controle administrativo, mas são em
número bastante reduzido os itens que tratam de orienta ções didático-pedagógicas
aos professores. A remuneração pelos serviços prestados era uma diária de quinze
mil reis além de terem direito à condução para que pudessem se locomover de um
lugar para outro. Ao final de cada mês, deviam enviar ao secretário da Instrução um
relatório das inspeções realizadas,

[...] com referencia especial aos municipios e povoações percorridos, ás


populações e condições destas localidades quanto ao desenvolvimento do
ensino; ao estado dos predios escolares, se são estadoaes, m unicipaes ou
particulares, devendo esse relatorio trazer sempre informações certas e
detalhadas sobre o numero total das matriculas e frequencias verificadas
nas escolas (DECRETO N º 6.501 – REGULAMENTO DA SECRETARIA DA
INSTRUCÇÃO – 1924, p. 17).

De acordo com o regulamento, os relatórios tinham que ser bastante detalhados e


ricos em informações tanto a respeito da população, quanto das escolas existentes.
Contudo, verificamos que não eram todos os inspetores que apresentavam seus
relatórios de acordo com o prescrito. Alguns não apresentavam dados sobre as
matrículas, outros sobre a freqüência e outros ainda não traziam referência sobre os
municípios e povoados e nem sobre os professores.

De acordo com Archimimo Gonçalves, em relatório de 10 de abril de 1930, resultado


da inspeção feita às escolas do município de Santa Thereza, esse serviço era
realizado com um acompanhante denominado “camarada”, pago pelo governo. Para
57

ele, o transporte dos inspetores se constituía em um problema e “talvez o mais


difícil”. O inspetor diz que:

Há annos, quando só eu viajava e que não havia estradas de automoveis,


adquiri em troca de vencimentos mensaes, treis animaes de montaria e o
Estado me pagava 30$000 diarios pelos alugueis dos mesmos e de um
camarada. Assim eu viajava todo o anno sem prejuizo de diarias e visitava
frequentes vezes todas as escolas do Estado. Agora, porem, que a
excepção de 6 escolas em Santa Thereza e todas as de Itaguassú são
situadas em margens de estradas bôas adquiri nas mesmas condiçõe s um
automovel e nelle faço visitas constantes a todas, controllando de forma
efficiente as escolas, matricula e frequencia (GONÇALVES, 1930).

A afirmação do inspetor sugere que ele teria sido, em algum momento, o único
inspetor no Estado. Entretanto, e le conseguia realizar suas tarefas. Outros relatórios
também se referem à falta de estradas, à localização das escolas rurais, explicando
que o acesso a elas era difícil e, por isso, as inspeções às escolas tinham que ser
feitas a cavalo.

Nesse período, as escolas foram agrupadas em zonas. Elas eram compostas por
municípios ou somente por escolas, como no caso da 6ª zona, que era constituída
pelas escolas da Fazenda de Santa Cruz e Fazenda do Castello. Contudo, havia
municípios e algumas escolas em que não foi possível identificar a que zonas
pertenciam por não haver nos relatórios essa especificação. Nos anos de 1928 a
1930, não localizamos nenhum documento que tratasse da divisão dos municípios
e/ou escolas do Estado em zonas. Percebemos que há zonas que se repetem
referentes a municípios diferentes. A 6ª zona aparece quatro vezes compondo
municípios e/ou escolas diferentes.

Em uma das vezes se refere, conforme dito, às escolas da Fazenda de Santa Cruz e
Fazenda do Castello; a segunda vez , às escolas de Marathayses, Barra do
Itapemirim, Mixta de Queimada e Paineiras; a terceira vez se refere ao município de
Itapemirim (sede), Rio Novo, Iconha e Benevente e depois ao município de Alegre. A
9ª zona é composta dos municípios de São José do Calçado, São Joã o do Muquy,
São Pedro de Itabapoana e Ponte de Itabapoana em um relatório de 1928 e, em
1938, aparece em um relatório como 9ª região referente aos municípios de Alegre,
Rio Pardo e Siqueira Campos.
58

A 5ª zona também aparece em dois relatórios diferentes co mposta de municípios


também diferentes. A 1ª zona não é mencionada em nenhum dos relatórios
analisados. De acordo com as nossas análises, apesar de todas essas
irregularidades, concluímos que o Estado estava dividido em mais de dez zonas,
pois há municípios nos relatórios que os inspetores não informam a que zona
pertenciam.

Averiguando a legislação, vimos que em 3 de março de 1931, o secretário da


Instrução apresenta a Resolução nº 8, que trata da divisão do Estado em zonas
escolares que ficaram assim cla ssificadas:

1º: Capital, Espirito Santo, Cariacica, Viann a, Domingos Martins e Santa


Leopoldina; 2º: Fundão a Pau Gigante, Serra e São Matheus; 3º: Alfredo
Chaves, Guarapary, Anchieta, Iconha, Rio Novo e Itapemirim; 4º: Colatina,
Santa Thereza, Itaguassú e Afonso Cláudio; 5º: Cachoeiro de Itapemirim,
Castello, São José do Muquy e João Pessôa; 6º: Alegre, Rio Pardo, Muniz
Freire, Veado e São José do Calçado.

Não comprovamos se a finalidade dessa classificação dos municípios por zonas,


feita por meio de resolução, era para que fossem organizadas as inspeções e seus
determinados inspetores ou para atender a uma outra necessidade, pois, nos
relatórios e documentos encontrados a partir de 1931, não há referência a esse fato.

Nas visitas, os inspetores também argüiam os alunos para checar o nível de


aproveitamento em relação aos conhecimentos apreendidos nas matérias escolares,
avaliavam as condições de instalação das escolas, o provimento de materiais e o
trabalho do professor, instruíam os p rofessores acerca dos métodos e processos de
ensino, ou seja, verificavam se desenvolviam o trabalho de acordo com o programa
e os preceitos pedagógicos exigidos na época; observavam se eram assíduos, se
faziam as escriturações dos alunos matriculados e do s materiais existentes na
escola e, também, se o trabalho desenvolvido era de qualidade.

Enfim, executavam as suas funções de acordo com o que estava prescrito no


Regulamento da Secretaria da Instrucção (1924) vigente no período em estudo,
porém, sem muito rigor, conforme mencionado. Caso fosse percebida alguma
59

irregularidade a respeito de qualquer um dos itens citados, o professor era advertido


e punido de acordo com a legislação vigente.

Outro problema que dificultava o trabalho dos inspetores e, cons eqüentemente, a


coleta de informações estava relacionado com o fato de os inspetores não residirem
nas regiões onde realizavam o serviço, o que possibilitava o falseamento da
realidade educacional. Segundo o Relatório de Flávio de Moraes, em 3 de agosto de
1928, em inspeção às escolas dos municípios de Riacho e Santa Cruz, pertencentes
à 5ª zona, sempre que um inspetor chegava à região, os professores já haviam sido
avisados de sua chegada e aguardavam a visita com tudo organizado.

Após a inspeção, voltav am com o procedimento irregular de antes e, assim,


continuavam até serem avisados da próxima visita. Por isso, “[...] é que às vezes, ao
fim de um semestre letivo, notamos a insignificância dos resultados escolares de
muitas escolas” (MORAES, 1928). Para s olucionar tal problema, sugeria que os
inspetores residissem na região em que realizavam o serviço.

Flávio de Moraes (1928) afirma que , se os inspetores fossem obrigados a residir na


zona que inspecionavam, haveria mais perfeição no serviço feito, os professores
trabalhariam mais e melhor e os gastos de viagem e as diárias pagas seriam
menores. “[...] Porque, neste caso, o Inspector recebia as diárias de accordo com o
numero de estatisticas apresentadas, sendo, portanto, tambem menores as
despezas de transporte”. E as viagens seriam feitas de acordo com as necessidades
do ensino, ao invés de seguirem um roteiro preestabelecido, pois havia escolas que
precisavam de visitas constantes.

No relatório em questão, encontra -se, ainda, a solicitação do in spetor ao secretário


da Instrução, no sentido de tomar providências sobre as irregularidades que
encontrava em sua zona de inspeção. Flávio de Moraes (1928) afirma que são elas
procedentes “[...] de abuso de attribuições por parte dos Snrs. delegados de
Instrucção, concedendo licenças de favor a professores, attestando para a
percepção de vencimentos quando os extractos de chamada accusam frequencia
média illegal, etc.”.
60

A freqüência ilegal a que o inspetor se refere é quando os livros de escrituração da


chamada nas escolas acusavam um número inferior a 30 alunos matriculados e
freqüência menor de 20, cuja escola não poderia nem funcionar, conforme prescrito
no art. 35, p. 27, do Decreto nº 6.501. Consta também, no referido artigo, que a
autoridade escolar não poderia fornecer “[...] attestado ao professor que não
preencher essas condições”.

Os delegados da Instrução, nes se caso, não estavam cumprindo as suas


obrigações, estavam agindo ilegalmente, pois, de acordo com o Decreto nº 6.501
(1924, art, 14, p. 19): “A fiscalização local do ensino será feita, em cada Municipio,
por um delegado da Instrucção, de livre nomeação do Governo do Estado”, que
deveria:

1º inspecionar mensalmente, cada uma das escolas da séde do municipio


em que exercer suas funcçõe s, e duas vezes, no minimo, por semestre, as
escolas existentes fóra da sede;
2º dar attestado para que o professor possa receber vencimentos, desde
que junte ao requerimento apresentado, um extracto do livro de chamada do
mez respectivo, accusando uma fre quencia nunca inferior a vinte (20)
alumnos (DECRETO Nº 6.501, 1924, ART. 15, p. 20).

As funções dos delegados da Instrução eram semelhantes às dos inspetores, porém


cabia exclusivamente aos delegados a função de controlar a freqüência dos alunos
mensalmente, para que os professores pudessem receber seus vencimentos.

Além das dificuldades de organizar dados confiáveis sobre a realidade das escolas,
outro problema importante diz respeito à realização da inspeção nas escolas
particulares. Conforme afirma A rchimimo Gonçalves, em inspeção ao município de
Santa Thereza nos meses de setembro e outubro de 1929: elas eram várias,
espalhadas no município e, também, tinham vida efêmera. Por isso mesmo, segundo
o inspetor, não adiantava fazê -las cumprir as exigências regulamentares, porque
seus professores eram, na sua maioria, “incapazes”, portanto não resistiriam a uma
palestra com pessoa capacitada e encarregada do registro na Secretaria sobre o
assunto.

As escolas clandestinas também se constituíam em problema para os inspetores


devido ao pouco tempo de funcionamento. Archimimo Gonçalves , no relatório
61

relativo às escolas do município de Itaguass u que compunham a 3ª zona do Estado,


na data de 18 de agosto de 1928, diz que muitas são as pessoas “[...] que assumem
a atitude de professor e em mesas improvisadas de caixas de gazolina estabelecem
escolas clandestinas e que absolutamente não se submetem ás exigencias
regulamentares por terem vida ephemera”. Além de se constituírem em dificuldades
para a inspeção, também era problema para a população do local que não podia
contar com a escola para a continuidade dos estudos.

Constatamos, pela argumentação do inspetor, que não só as carteiras como também


as escolas clandestinas eram improvisadas e, assim, não havia int eresse por parte
dos responsáveis em cumprir as exigências regulamentares, porque isso significaria
investimento de tempo e dinheiro em algo que não tinha a menor condição de ser
permanente.

As exigências regulamentares para o funcionamento de uma escola particular,


segundo o Decreto nº 6.501 (1924), estão dispostas nos arts . 125,126, 127 e 129 (p.
52-53 ) e consistiam em:

Art. 125. Para que se abram e continuem abertos cursos particulares de ensino primario ou
secundario, é necessário o seguinte:
a) remetter mensalmente, á Secretaria da Instrucção os dados estatisticos;
b) ministrar em vernaculo todo o ensino, salvo o de linguas estrangeiras;
c) franquear o estabelecimento á visita das autoridades escolares;
d) ensinar, diariamente, portuguez, geographia, especial mente do E. Santo e historia do
Brasil;
e) respeitar os feriados nacionaes;
f) ensinar nas classes, cantos nacionaes, approvados pela Secretaria da Instrucção;
§ Único. Nos collegios particulares o ensino de portuguez, devera ser ministrado por
professores brasileiros de reconhecida competencia, a juizo da Secretaria da Instrucção.

O art. 126 determinava que não poderia funcionar no Estado nenhum


estabelecimento de ensino particular, sem o registro previamente adquirido,
gratuitamente, na Secretaria da Instrução . Por fim, o art. 129, em suas deliberações,
indicava que qualquer alteração feita no estabelecimento particular deveria ser
comunicada à Secretaria da Instrução pelo diretor ou responsável no prazo de cinco
dias. Essas eram, portanto, as exigências da Sec retaria da Instrução para o
funcionamento de um estabelecimento de ensino particular no Estado. Mas, como
verificamos nos relatórios dos inspetores, essas exigências não eram sempre
cumpridas.
62

Segundo exposto nos relatórios e nos termos de visita, os prof essores faltosos
também contribuíam para o atraso na instrução. No relatório de 2 de setembro de
1928, referente às escolas do município de Cachoeiro de Itapemirim, do Sr. Alfredo
Lemos, inspetor da 8ª zona (transferido da 9ª zona, em 3 de agosto de 1928, pelo
secretário da Instrução), há um pedido ao secretário da Instrução para que fosse
dada uma atenção especial à questão dos professores faltosos. Segundo o inspetor,
esse problema não só retardava o ensino como também concorria para que a
instrução fosse desmoralizada.

Esse inspetor diz que as professoras regentes das escolas de Vila de Vianna, de S.
Raphael e de Ribeira – município de Viana – e as de S. Joaquim e de Iriritimirim –
município de Alfredo Chaves – “Abandonam suas escolas e viajam, quasi tod os os
sabbados, para esta Capital”. Supomos que o motivo do transtorno causado pelas
viagens das professoras é que havia aulas aos sábados, conforme mencionado no
Termo de Visita à Escola Mixta de Tatahiba, município de Iconha, do inspetor Alfredo
Lemos, em 1º de junho de 1935, em que diz: “[...] aos sábados a freqüência é
pequena”.

Há em outro Termo de Visita à Escola Pública Mixta de Santa Cruz, município de


Santa Cruz, do mesmo inspetor em que ele diz: “Aos sábados a freqüência é menor,
conforme allega a professora”. Apesar de o relatório denunciando a falta das
professoras ser de 1928 e os Termos de Visitas sobre as aulas de sábado serem de
1935, pensamos que as aulas, nesse dia, poderiam ser uma prática de longa data,
porque não há, na legislaçã o vigente, menção sobre mudanças dessa ordem.
Assim, pensamos que a nossa suposição tem fundamento, porque há também o fato
de o inspetor se referir às aulas aos sábados em municípios diferentes, indicando
que essa poderia ser uma prática em todas as esc olas do Estado.

Em relação às faltas de professoras, a Escola Mixta de Barra Mansa também tinha


problemas. Conforme mostra Archimimo Gonçalves, inspetor da 9ª zona, em seu
relatório referente aos municípios de S. Pedro do Itabapoana e Ponte do Itabapoana ,
em junho de 1929, a escola ainda não havia funcionado regularmente no corrente
ano, pois a professora se ausentava continuamente, desmotivando os pais de
63

enviarem seus filhos à escola, deixando o inspetor sem argumentos para justificar os
problemas causados pela falta de compromisso da professora. Outro transtorno
ocasionado pelas faltas dos professores, relatado por Archimimo Gonçalves (1929),
é que, às vezes ele era impedido de visitar algumas escolas por não encontrar no
exercício de suas funções as re spectivas professoras.

O mau tempo era outro fator que impedia muitas vezes os inspetores de realizarem
o seu trabalho, devido à dificuldade que as chuvas traziam para que eles se
locomovessem de um lugar para outro, pois as estradas se tornavam muitas ve zes
inacessíveis. Claudionor Ribeiro, inspetor da 7ª zona, composta pelos municípios de
Castello e Affonso Cláudio, confirma, em seu relatório de 2 de abril de 1929, que não
conseguiu visitar todas as escolas de sua zona na inspeção que deveria realizar
devido ao mau tempo.

Os estudos realizados sobre a questão da inspeção às escolas, embora em número


reduzido, têm nos apontado algumas considerações importantes sobre esse serviço.
Borges (2007, p. 1) em seu estudo sobre a inspeção de professores na corte,
enuncia: “A inspeção era considerada importante dispositivo para o bom
funcionamento do ensino, condição indispensável ao projeto civilizatório do governo
imperial”. Pensamos que essa visão persistiu durante o período republicano.

Gonçalves (2004, p.1), em seu trabalho sobre a inspeção escolar no período de


1830 a 1858, aponta que o “[...] ensino público era enunciado como força civilizatória
e a inspeção escolar como um claro mecanismo de controle e direcionamento desse
ensino, em conformidade com os anseios elitistas de educação”. Pensamos que,
além da inspeção, era necessário, para garantir uma educação de qualidade à
população, equipar as escolas com o material necessário para o ensino. Porém,
conforme foi possível verificar na análise dos r elatórios e dos termos de visita dos
inspetores, no período em estudo, as escolas funcionavam precariamente.

Verificamos que a maioria dos relatórios trazem denúncias dos inspetores sobre a
falta de material nas escolas e a omissão da Secretaria em atende r aos pedidos,
conforme relata Aristides Costa, em seu relatório de 3 de dezembro de 1929: “As
escolas da zona a meu cargo, com poucas excepções, resentem -se da falta de
64

material [...]. As professoras e as autoridades escolares pedem insistentemente,


porém sem resultado satisfactório”. Nesse relatório, há ainda registrado pelo inspetor
que havia escolas que nada possuíam, nem mesmo o horário de funcionamento
estabelecido.

As escolas a que o inspetor se refere são as seguintes: Mixta de Santa Cruz, Mixta
de Santa Rita, feminina da cidade de Anchieta, masculina da cidade de Anchieta,
Mixta de Marathayses, Mixta da Fazenda da Queimada, masculina da Barra do
Itapemirim, Mixta de Candéus, Mixta da Fazenda da Ribeira, Mixta da Fazenda do
Muquy e masculina de Si ry. A zona a que essas escolas pertencem não é
assinalada.

Borges (2007, p. 2) faz referência em seu trabalho sobre os relatórios que os


inspetores faziam após as inspeções às escolas, dizendo:

O relatório usado como um dispositivo para documentar na i nspeção do


ensino, funcionou como um documento cujo exercício de escrita pode ser
entendido como componente de uma maquinaria disciplinar, que descreve e
dá visibilidade a um conjunto de determinadas informações, referentes à
instrução, ao corpo docente e às suas práticas, colocando -os em um campo
de vigilância.

Essas informações eram registradas a cada visita que o inspetor fazia nas escolas e,
às vezes, consistiam em denúncias que poderiam ser usadas contra o professor.
Porém, havia dificuldades na execu ção desse serviço que impediam que muitas
escolas fossem inspecionadas. Essa falta de inspeção às escolas, certamente,
gerava problemas de várias ordens. Por isso, apesar de percebermos que a
inspeção estava “[...] atrelada aos procedimentos de vigilância sobre os professores
em exercício” (BORGES, 2007, p. 1), não há como negar que a ação dos inspetores
contribuiu para o processo de difusão e constituição do ensino público elementar.

Essa contribuição estava relacionada com a função que exerciam: nas pro postas de
criação de mais escolas nas localidades onde não havia nenhuma ou a existente
não atendia a toda população escolar; na conversão de escolas femininas e/ou
masculinas em mistas para dar acesso a um maior contingente de crianças em idade
escolar; nas instruções dadas aos professores sobre o método adotado; na
65

divulgação de dados sobre a população escolar; na reordenação do tempo e


espaços escolares; e no incentivo dado aos pais para que matriculassem seus filhos
nas escolas – embora às vezes de form a inadequada, com medidas coercitivas ou
punitivas. Assim, pensamos que muitos procedimentos adotados pelos inspetores
refletiram positivamente no ensino público elementar e no processo de formação das
gerações.

4.1 Formação dos professores e docência

Os relatórios e termos de visitas dos inspetores assinalam , ainda, questões


relacionadas com a docência nas escolas. Entretanto, antes de nos atermos a esses
documentos, é necessário esclarecer, conforme o Regulamento vigente, que

A nomeação para o cargo de professor primário só poderá recahir em


pessoa diplomada pela Escola Normal do Estado, ou por estabelecimentos
a ella equiparados, ou em pessoa habilitada por concurso prestado na
forma deste Regulamento (ART.144, DECRETO Nº 6.501 , 1924, p. 57).

Consta, no referido decreto, que também poderiam ser nomeados professores ,


pessoas que fossem diplomadas por qualquer outra Escola Normal da República,
desde que o curso fosse igual ao da Escola Normal do Espírito Santo e que esses
professores deveriam ter seus diplomas registrados na Secretaria da Instrução.
Caso a organização do curso dos diplomados em outros Estados não fosse idêntica
à da “[...] Escola Normal Official, poderão ser aproveitados interinamente, devendo,
entretanto, dentro de tres mezes , prestar exames das materias que lhes
faltarem”(DECRETO Nº 6.501 , 1924, ART. 144, I; II e III, p. 57). Para atuar no ensino
primário, segundo o art. 145, o professor deveria ter:

a) idade de 21 annos;
b) moralidade;
c) aptidão physica e isenção de molestia infe cto-contagiosa ou repugnante,
attestada pelo Director da Hygiene Estadoal;
d) attestado de bôa conducta, passado pela autoridade policial do logar
onde residir o requerente;
e) attestado de pratica pedagogica durante 40 dias, no minimo, na escola
isolada modelo do Estado, passado pelo Director das Escolas Normal e
Annexas.
66

O período de concurso para o magistério primário era de 15 de fevereiro a 31 de


maio de cada ano (ART. 145, IV, p. 58). Com relação aos exames a que fosse
submetido o candidato, era lavrada um a ata mencionando o julgamento da
Comissão Examinadora (INCISO V, p. 58). “Dessa acta será extrahida a certidão de
approvação, pela qual o candidato pagará 40$000 de emolumentos” (ART. 145, VI,
p. 58). Além de todos esses procedimentos, o candidato, para s er admitido no
concurso, tinha que recolher uma taxa para pagamento da comissão examinadora
(ART. 145, VIII, p. 59).

Sabemos, contudo, que essas leis não eram rigorosamente cumpridas, pois havia os
casos em que os professores eram nomeados por indicação de pessoas influentes,
conforme relata Dr. Lopes Ribeiro, inspetor técnico do ensino em comissão, no
relatório de 25 de outubro de 1933, referente à inspeção escolar dos municípios de
Alegre, Muniz Freire, Rio Pardo e Siqueira Campos. O inspetor técnico do ensino em
comissão era funcionário da Secretaria e poderia ser comissionado pelo secretário
da Instrução “[...] para executar qualquer serviço extraordinário” (ART. 25,
DECRETO Nº 6.501, p. 25). Em seu relatório, esse inspetor relata que a professora
da Escola Mixta de Santa Bárbara do Caparaó foi designada pelo delegado de
instrução de Alegre.

Archimimo Gonçalves também traz outro exemplo de protecionismo, em seu relatório


de 5 de dezembro de 1928, correspondente aos municípios de São Matheus,
Conceição da Barra, Santa Cruz e Riacho. A escola de Mucuratá de Lima tem como
regente uma professora que “[...] mal assigna seu nome e não conhece o menor
preceito de pedagogia. Não sabe sequer fazer a escripta e sobretudo não sabe
obedecer aos conselhos que receb e já para a bôa execução dos trabalhos
escolares”. Diz o inspetor que ela ocupa tal cargo somente porque é “[...] protegida
como viuva de um official de policia”.

Há também o caso de monopólio da cadeira de professora relatado pelo inspetor da


9ª zona, Archimimo Gonçalves, em junho de 1929, referente aos municípios de São
Pedro do Itabapoana e Ponte do Itabapoana. Consta no relatório que a professora
da Escola Fazenda da Serra era filha do fazendeiro e , como ia se casar, não vinha
dispensando à escola a devida atenção. A escola, até o mês da inspeção, não havia
67

funcionado nenhum dia e a professora alegou que o motivo era por estar na época
da colheita do café, que se prolongaria até o mês de julho, quando, então, daria
início aos trabalhos escolares.

Esse jogo de interesses, de permanentes alianças e composições era , segundo


Vasconcellos (1995, p. 127), “[...] a existência de um mesmo imaginário: o imaginário
coronelista. A existência de uma mesma visão de mundo e de um mesmo grupo de
interesses sustentava a solidariedade”. O ponto principal desse imaginário, de
acordo com o autor, era a permanente exclusão da maior parte da população da
vida política e social.

Em relação ao argumento da professora, afirmando que só começaria as aulas após


a colheita do café, não encontramos, nos documentos analisados, registros de
quando se iniciava a colheita do café. Sabemos , pela argumentação da professora ,
que se prolongaria até julho. O fato, porém, é que , a princípio, nesse caso, o
inspetor não podia fazer nad a, pois, segundo o prescrito no Decreto nº 6.501, “Nas
escolas ruraes, segundo as necessidades locaes, a juizo do Governo, as ferias
poderão coincidir com a epoca da colheita principal“ (ART. 81, INCISO ÚNICO, p.
41).

Contudo, a previsão de férias, de ac ordo com o art. 81 do Decreto nº 6.501, era de


três meses distribuídos em dois períodos; “[...] um de quinze a trinta de Junho e
outro de primeiro de dezembro a trinta e um de janeiro”. Considerando o disposto no
art. 80, do Decreto nº 6.501, que previa o início das aulas no primeiro dia útil do mês
de fevereiro e o término em 30 de novembro, havia cinco meses que a escola não
funcionava. Mesmo se a escola funcionasse com o restante do ano sem férias, ainda
assim acarretaria um sério prejuízo aos alunos em relação aos dias letivos,
horas/aula e, conseqüentemente, aos conteúdos estudados, pois, de acordo com o
disposto no art. 79 §1º (p. 40) do decreto em questão, a carga horária diária nas
escolas isoladas rurais era de quatro horas, tendo início às oito da manhã e
terminando às doze.
Segundo Gonçalves (1929), havia ainda outro problema na Escola Fazenda da
Serra: “É lamentável ainda saber que a cadeira está monopolisada não permittindo
alli outra professora senão uma moça leiga que lá existe como aia da faze nda, caso
68

se case Dnª Maria Paiva, igualmente de precario preparo para o caso”. Vemos,
portanto, nas duas situações, a incapacidade das professoras para o cargo e, no
caso da primeira, a falta de responsabilidade e de compromisso para com a função.
Ficou clara, também, a impotência do inspetor diante das circunstâncias, pois não
consta no relatório que alguma providência tenha sido tomada.

Um caso de pedido de nomeação para o exercício do magistério é descrito pelo


inspetor escolar da 7ª zona, Luiz Malinz ek, composta pelos municípios de Santa
Thereza, Santa Leopoldina e Fundão, em seu relatório (sem data) ao secretário da
Instrução:

Cumpre-nos Exmo. Snr. Dr. Secretario lamentar profundamente a falta de


criterio de determinados chefes politicos que não olh ando outro intuito,
senão o de oferecer suas facções, vêm asediando os dirigentes desta
Secretaria com pedidos insistentes de nomeação para o magisterio, de
protegidas suas, esquecendo -se de que a missão do professor é bem
differente daquelles que se aluga m ao Estado como mercenários.
São estes, os professores de concurso que infelizmente na sua maioria
predominam no interior do Estado, verdadeiro entrave ao serviço ora a
cargo de V. Exa. e barreira intransponível na execução do programma a que
se propõe o Exmo. Snr. Dr. Presidente do Estado.
Desconhecedores dos mais rudimentares methodos de ensino, sem
nenhum preparo intellectual e mesmo moral, vêm esses funcionários,
prejudicando grandemente a educação da infancia a seu cargo.

Dessa maneira, entendem os que os professores normalistas, em muitas situações,


não passavam por concurso. Alguns eram nomeados e assumiam diretamente a
sala de aula, pois, teoricamente, já se encontravam devidamente preparados no
Curso Normal e na Escola Modelo pela qual passava m antes de assumirem o
magistério. O concurso, então, podia ser requerido por qualquer pessoa que
provasse o disposto no art. 145 do Decreto nº 6.501, descrito anteriormente. Isso
quer dizer que não tinham, necessariamente, que ter feito o Curso Normal.

Os candidatos requerentes se apresentavam na escola isolada modelo do Estado,


praticavam “durante 40 dias no mínimo”, adquiriam o atestado de prática pedagógica
e, em conformidade com os outros itens exigidos no referido artigo, prestavam
concurso. Por isso, o inspetor diz que eles eram despreparados.
69

O dispositivo presente no decreto criou três categorias de professores: normalista,


de concurso e provisório. Os professores normalistas eram os que estavam
cursando ou haviam cursado a Escola Normal, os de concurso eram os que haviam
prestado os exames e os provisórios eram os leigos. Não há registros, na
documentação analisada, de que, para atuar nas classes de alfabetização, os
professores necessitavam de uma formação específica ou mesmo diferenciada dos
demais. No ano de 1938, conforme o relato de Archimimo Gonçalves, em seu termo
de visita à Escola Mixta Municipal de Firma Grande, município de Affonso Cláudio,
há denúncia de que havia uma professora que não era concursada dando aulas de
alfabetização. Diz o inspetor que “A professora não tem concurso e já conta 1 anno
de exercicio nesta escola – Já vae alphabetisando regularmente [...]” .

Os procedimentos constantes no Decreto nº 6.501, de 1924, para a atuação de


professores no ensino primário , perduraram durante toda a década, porém com
algumas modificações, complementadas pelo Decreto de nº 7.994, de 1927 e pela
Lei nº 1.693, de 1928, pois a reforma no ensino proposta pelo então presidente do
Estado, Aristeu Borges de Aguiar, juntamente com o secretá rio da Instrução, Attilio
Vivacqua, em 1929, previa o critério de regime transitório, para que não ocorresse
uma mudança brusca nas escolas entre o trabalho que já vinha sendo desenvolvido
e o que estava por vir. Assim, a mudança ocorreria de forma gradati va e, de acordo
com Attilio Vivacqua, em entrevista concedida ao Jornal “Diário da Manhã”, em 1929,
“[...] Em seguida, de accordo com os dados da experiência, virá a regulamentação
que fôr aconselhada”.

No Decreto nº 7. 994, de 10 de fevereiro de 1927, en contravam-se determinações


sobre matrículas dos alunos na Escola Normal Pedro II; normas para transferência
de alunos de um estabelecimento para outro; exames finais e promoção dos alunos
da Escola Normal; obrigatoriedade para todos os alunos dos diversos anos do
estabelecimento fazerem os concursos trimestrais; exclusão da folha de pagamento
do professor que não tivesse passado o registro da nota dos alunos; forma de
determinar a média para promoção dos alunos. Constava, ainda, como seria feita a
equiparação das escolas normais e de outras escolas do Estado com a Escola
Normal Pedro II.
70

Ainda registrava as previsões de como seria regida cada escola isolada; nas escolas
reunidas, o 4º ano seria dado juntamente com o 3º e, conforme o número de alunos,
haveria quantos professores adjuntos fossem necessários; as classes da seção
feminina e também as do 1º e 2º anos da masculina teriam uma professora como
regente e as do 3º e 4º anos da seção masculina teriam um professor; nas escolas
reunidas assim como no s grupos escolares, o ensino , na seção feminina e nas
classes do 1º e 2º ano da seção masculina , seria ministrado por professoras e, nas
demais classes, por professores.

O art. 37 do referido decreto tratava da finalidade da Escola Modelo “Jeronymo


Monteiro”, anexa à Escola Normal, um grupo escolar modelo, que, como a escola
isolada modelo, anexa à Escola Normal, é destinada “[...] aos exercícios de ensino
dos alumnos do 4º anno da Escola Normal e à prática pedagogica dos professores
primários”.

O Decreto nº 7.994 (1927), art. 47, dispõe que os professores provisórios seriam
dispensados “[...] à medida que forem sendo providos professores normalistas nas
diversas escolas isoladas, de entrancia inferior para superior”, mas, em
contrapartida, era facultad o aos professores provisórios ou titulados e aos
professores de concurso, “[...] com mais de dois anos de exercício, matricularem -se
na Escola Normal, para obter o diploma de normalista” (DECRETO Nº 7.994, ART.
51).

O Decreto-Lei nº 1.693, de 29 de dez embro de 1928, elaborado e outorgado no


mandato do presidente do Estado Aristeu Borges de Aguiar, juntamente com o
secretário da Instrução Attilio Vivacqua, estabelecia que estava o Poder Executivo
autorizado a reformar a instrução pública do Estado e, den tre as considerações
propostas, estava a “[...] a adopção das medidas que julgar conveniente para
attender aos princípios da escola activa [...]” (ART. 1º). Dentre as determinações, o
art. 6º trazia que tanto os grupos escolares quanto as escolas reunidas poderiam ter
professores de música e trabalhos manuais e, ainda, quantos adjuntos fossem
preciso. Os professores adjuntos eram, segundo Tanuri (2000, p. 65), “[...]
aprendizes empregados como auxiliares do professor em exercício, de modo a
71

prepará-los para o desempenho da profissão docente, de maneira estritamente


prática, sem qualquer base teórica”.

Esse sistema de inspiração austríaca e holandesa foi adotado devido ao insucesso


das primeiras escolas normais e aos poucos resultados produzidos por elas,
tornando-as tão desprestigiadas que vários presidentes de Província e, também,
inspetores de instrução rejeitaram -nas como instrumento para qualificar docentes,
considerando como mais aconselhável e econômico utilizar o sistema de
“professores adjuntos”. In troduzido na Província do Rio de Janeiro em 1849, em
virtude do fechamento da Escola Normal e, adotado, posteriormente, na corte, por
meio do Decreto 1331-A, de 17/12/1854, “[...] baixado pelo Ministro Couto Ferraz, e
a seguir instituídos em outras provínc ias, onde persistiram, por muito tempo, mesmo
após a instalação das escolas normais” (TANURI, 2000, p. 65).

O art. 7º do referido Decreto -Lei também definia ainda que os professores de


concurso nomeados em caráter provisório e aprovados no exame de capaci dade
técnica não poderiam ser dispensados mediante requerimento de professores
normalistas, no período de três anos, a partir da aprovação e, quando completassem
cinco anos de exercício, seriam titulados.

Verificamos que a Lei idealizada e organizada pelo então secretário da Educação


Attilio Vivacqua era bastante abrangente e visava, principalmente, à mobilização
para o combate ao analfabetismo cujas taxas eram em: “[...] 1920: 75% de
analfabetos, excluídos os menores de 6 anos e esse coeficiente desce pa ra 69,1%;
1930: 50% de analfabetos muito longe do ideal” (VIVACQUA, 1929, p. 11 -12).

No Decreto nº 1.693, encontravam -se ainda vários artigos determinando condições


para o provimento de professores nas escolas vagas, destacando que havia
preferência pelos “[...] diplomados pela Escola Normal ou estabelecimentos
equiparados [...]” (ART. 43). Também definia normas para o ingresso dos
professores em exercício não habilitados e para a remoção de professores.

A partir da análise do conjunto de dispositivos con stantes no Decreto nº 7.994,


concluímos que houve pequenos avanços em relação ao Decreto nº 6.501 (1924). O
72

número de artigos que trata de questões relacionadas com os professores é maior e,


no caso da nomeação de professores, destaca -se a preferência pelos professores
diplomados pela Escola Normal para assumirem o cargo em qualquer escola vaga.
Entendemos que essa é uma forma de valorizar o profissional que buscou
qualificação e de estimular os que não possuíam tal qualificação.

A respeito da regulamentaç ão do ensino que, de acordo com Vivacqua, viria depois,


não identificamos nenhuma mudança no período, pois, segundo consta na pasta do
Fundo Educação do Estado do Espírito Santo, entre 1932 e 1933, “[...] desaparece
Secretaria da Instrucção – ensino afeto à Secretaria do Interior”. Na pasta consta,
ainda, que não é possível precisar a data em que a Secretaria foi “extinta”, porque
não existem leis em 1932, 1933 e 1934. Somente em 1935, por meio da Lei de nº 5,
de 31de outubro do referido ano, foi criada a S ecretaria de Educação e Saúde
Pública. Com exceção do Decreto nº 9.255 de 13 de abril de 1938, que trata das
questões relacionadas com as condições para funcionamento dos colégios
particulares e dispõe sobre a obrigatoriedade do ensino, não há registro no acervo
do Arquivo Público de uma nova regulamentação do ensino posterior à de 1924
(DECRETO nº 6.501).

Analisando as questões relativas ao ingresso dos professores no magistério, foi


possível observar que as adaptações feitas diziam respeito mais diretame nte aos
professores de concurso, porque eles eram maioria e precisavam ser mais bem
capacitados. Visto que encontramos o registro de apenas uma professora que
prestou concurso e foi reprovada por questões de saúde, então estamos
considerando o fato de que, salvo essa exceção, todos os concorrentes eram
aprovados nos concursos que prestavam. Segundo Vivacqua (1929), havia , no ano
de 1929, em exercício no Estado, 878 professores, sendo 304 destes normalistas e
574 de concurso. “[...] Estes, admittidos com o c aracter de professores de
emergencia sendo substituidos paulatinamente por diplomados, sem perdermos de
vista, porém, a necessidade de aperfeiçoar -lhes a capacidade didactica”
(VIVACQUA, 1929, p. 29).

Para isso, a proposta do secretário da Instrução era c hamar esses profissionais, em


momentos propícios, para praticar nos estabelecimentos principais de ensino que,
73

futuramente, seriam as escolas -modelo e, também, colocar em prática o disposto no


art. 1º da Lei nº 1.693, de 1928, que estabelecia sobre “[...] a verificação da
capacidade technica do actual professorado provisorio de concurso, mediante
provas especiaes”. Essa medida já se encontrava em andamento, pois ele diz, em
sua entrevista já citada, que “No próximo mez serão submettidos á prova de
sufficiencia technica mais de 300 professores de concurso, nos termos da Lei 1.693”
(VIVACQUA, 1929, p. 29). As adaptações legais diziam respeito aos professores
provisórios, também no sentido de estimulá -los na busca por capacitação.

A reforma do ensino proposta pelo governador do Estado e pelo secretário da


Instrução consistia na aplicação do método da escola ativa nas escolas do Estado e,
para isso, acreditavam que os professores necessitavam de um preparo técnico
adequado para o alcance de resultados positivos. Daí a razão das medidas a
respeito da capacitação de professores para atender às necessidades dessa nova
humanidade que surgiu, segundo Vivacqua (1929, p. 7), “[...] depois da guerra
européia [...] provocando um desequilibrio entre o espirito da época e a organização
social vigente”.

Uma das medidas adotadas pelo Governo, no sentido de preparar os professores de


acordo com a nova proposta foi, segundo Soares (1998, p. 51), instituir, em caráter
provisório, o Curso Superior de Cultura Pedagógica pelo Decreto nº 9.750, de 30 de
agosto de 1929, que, mesmo provisório, equivalia, para seus formandos, ao ensino
superior. Esse curso “[...] destinava -se ao aperfeiçoamento de inspetores escolares
e professores, indicados pelo Secretário de Instrução, pa ra formar o núcleo
reprodutor da reforma do ensino”. Podiam também fazer o curso, como assistentes,
pessoas que não tinham nenhuma relação com o magistério.
74

Esse curso, cuja abertura foi realizada numa cerimônia no salão de festas do Grupo
Escolar Gomes Cardim, em agosto de 1929, era dirigido por Deodato de Moraes,
que lecionava todas as disciplinas e ainda orientava e fazia a adaptação da Escola
Activa nas escolas estaduais, onde , com acesso livre, podia obter dados sobre o
ensino e ainda fazer verificaçõ es sobre a educação. Todos os agentes da escola,
professores, diretores e inspetores deviam dar -lhe informações e também facilitar
seu trabalho.

Soares (1998) diz que os alunos do interior foram beneficiados pelo Decreto nº 9.750
(1929), que lhes garantiu passagens e ajuda de custos. Os que conseguiam bom
aproveitamento tinham preferência nas promoções por merecimento e desempenho
de comissões e, ainda, nas nomeações de diretores de escolas reunidas e grupos
escolares.

Estabelecido pela Resolução nº 257, o programa do Curso Superior foi distribuído


em quatro partes: “Didactica, Pedagogia Scientifica, Questões Tecnicas e Sociaes e
Escola Activa”. Para a demonstração prática das teorias, foram dispostas salas com
equipamentos exclusivos no Grupo Escolar Gom es Cardim para determinados
aprendizados. No final do curs o – 14 de junho de 1930 – 35 alunos, dos quais 20
eram do sexo feminino e 15 do sexo masculino, apresentaram, em caráter público,
uma monografia sobre aspectos do programa, que era apreciada por doi s
debatedores que podiam fazer questionamentos . Uma semana após a solenidade de
encerramento, que acont eceu no dia 16 de julho de 1930,
75

[...] sob a direção do professor Deodato de Moraes, o grupo começou a


discutir o regime de transição para a introduçã o da Escola Activa no Espírito
Santo. Para isso, contava, desde 24 de maio, com o Decreto Nº 10 171 que,
provisoriamente, já determinara que as escolas normais seriam ‘centros de
experimentação pedagógica’, ministrando ensino ‘prático e activo’, animado
por ‘espírito fundamentalmente brasileiro’ (SOARES, 1998, p. 60, grifos do
autor).

Nesse contexto, foi oficialmente implantada a Escola Ativa no Estado. Contudo,


Attilio Vivacqua não conseguiu homogeneidade no posicionamento dos professores
a respeito de suas propostas, mas as desconfianças e/ou discordâncias encontradas
não chegaram a se constituir em impedimento, porque os professores dependiam do
governo e a grande maioria era suscetível às pressões políticas.

A preocupação do governo em capacitar os professores era compreensível, pois, de


acordo com os relatórios dos inspetores de ensino enviados ao secretário da
Instrução, relativos aos anos de 1928 e 1929 e aos municípios visitados,
observamos que, com exceção das escolas públicas e particulares da Capital e do
município, citadas por Esmerino Gonçalves, em seu relatório de 6 de setembro 1928,
referente à sua inspeção a essas escolas , a maioria das salas de aula era m regidas
por professores de concurso, porque fa ltavam professores normalistas para suprir a
necessidade das escolas.

Acreditamos que esse diferencial na formação dos professores atuantes no


município da Capital e nos demais municípios foi devido ao fato de estar nela
localizada a Escola Normal “Pedro II”. Com isso, os profissionais que atuavam
nessas escolas eram privilegiados pela facilidade de acesso, pois os que
trabalhavam no interior teriam que se deslocar de seus municípios para freqüentar a
Escola Normal.

Na exposição que fez ao povo do Esp írito Santo em 1935, João Punaro Bley – que
governou o Estado no período de 1930 a 194 3 – , diz que adotou algumas medidas
para atender às aspirações dos três mais prósperos municípios do Estado: criou a
Escola Normal de Cachoeiro do Itapemirim, por meio do Decreto nº 4.678, de 24 de
março de 1935; equiparou a de Alegre em virtude do Decreto nº 4.316, de 21 de
dezembro de 1933; e submeteu a uma prévia fiscalização a de Muquy. O governador
diz que tais providências não necessitavam ser exaltadas, porque tod os sabiam que
76

o “[...] numero de professores diplomados pelas escolas normaes da capital fica


aquem das necessidades do magistério, tendo sido o governo forçado por isso, a
prover a maior parte das escolas primárias com professores de concurso” (BLEY,
1935, p. 7).

Contudo, as fontes analisadas evidenciam outros problemas, além da formação dos


professores, que impediam o desenvolvimento de um bom trabalho nas escolas
primárias. No relatório de Esmerino Gonçalves (6 -12-1928), o inspetor menciona que
a Escola masculina “União e Progresso”, município da Capital, tinha graves
problemas: além de não ter a professora a necessária prática de ensino e seus
alunos encontrarem-se muito atrasados, a sala onde funcionava a escola era
escuríssima e ladrilhada. “Os 23 alunos analphabetos não têm recebido no quadro
negro as indispensáveis lições de alphabetisação motivando não ter havido no 1º
semestre um alumno sequer alphabetisado”.

Mas a preocupação dos governantes sempre recaía na formação, na falta de


preparo dos professores. Segundo Soares (1998, p. 39), “As deficiências do ensino
eram atribuídas à incapacidade ou má formação dos professores, somada à
“irresponsabilidade’ dos pais”. Esse era, então, o argumento dominante.
Obviamente, esse era um aspecto que me recia atenção, mas não era o único,
conforme ficou demonstrado em outros tópicos deste estudo. Na exposição do
capitão João Punaro Bley (1935), constam medidas apontadas por ele que visaram
à melhoria da formação de professores e, portanto, da qualidade da educação
primária:

[...] uma das primeiras providências para esse fim, assumiu caráter
moralizador e foi inspirada pelo desejo de entregar o ensino das primeiras
letras a professores capazes, afastando da direcção das escolas os que
haviam logrado habilitação para o exercício do magistério em concursos
apressados e annuláveis pelos vícios de que se revestiram [...] (BLEY,
1935, p. 28).

Com essa manifestação, o governador demonstra preocupação em relação ao


ensino das primeiras letras nas escolas da épo ca e disse ter criado mecanismos
legais que, postos em prática, equacionariam o problema da instrução e a situação
dos professores em exercício. Desse modo, por meio do Decreto nº 277, de 31 de
77

dezembro de 1930, foram dispensados professores de concurso co m menos de


cinco anos de serviço e determinada a realização de novos exames para o
provimento das escolas vagas. Com essa medida, o governador acreditou ter
conseguido melhorar o quadro de professores primários e reparar as injustiças em
relação à remuneração dos serviços prestados por esses educadores. Por
intermédio do Decreto nº 1.486, de 28 de dezembro de 1931,

Fez-se a classificação dos professores por ordem de antiguidade, fixando -


se-lhes vencimentos proporcionaes ao tempo de serviço prestado ao
magistério, desapparecendo, dessa forma, a desigualdade entre os que
serviam nas zonas ruraes e os que, nas cidades, dispendendo a mesmma
somma de energia, auferiam maiores vantagens pecuniarias. Desse modo,
conseguiu-se resolver, em parte, o problema da inst abilidade dos
professores (instabilidade que o systema de remuneração por entrancia, até
então usado, aggravava sobremaneira, de vez que a remoção para os
centros urbanos era o único meio de obter o profe ssor augmento de
vencimentos) (BLEY, 1935, p. 32).

Antes da existência desse decreto, os professores recebiam seus salários de acordo


com as categorias das escolas. As escolas localizadas na Capital (zona urbana e
suburbana) eram de 1ª entrância, as localizadas em cidades ou vilas eram de 2ª
entrância e aquelas dos distritos e das povoações eram de 3ª entrância. Dessa
forma, os professores que recebiam maiores vencimentos eram os que atuavam nas
cidades, ou seja, nas escolas de 1ª entrância. Os que trabalhavam nas escolas de 3ª
entrância recebiam vencimentos menores e a única forma de ter esses vencimentos
aumentados era pedindo remoção para as cidades.

Isso era considerado uma desigualdade, pois todos se esforçavam igualmente para
desempenhar suas funções. Com o decreto, essa desigualdade deixou de existir e o
critério para que recebessem aumento de salários passou a ser o tempo de serviço
prestado na função, isto é, foi fixado aos professores vencimento proporcional ao
tempo de serviço prestado ao magistério independente do tipo de escola em que
atuavam.

Segundo João Punaro Bley (1935), as medidas que visavam à melhoria do ensino
não podiam incidir apenas na alfabetização. Nesse sentido, outras medidas legais
importantes vieram a contribuir para essa melhoria. Por meio da Resolução nº 326,
de 31 de março de 1934, foi criado o Serviço de Educação pelo Rádio e o Cinema, e
78

criou-se na Capital do Estado o Jardim de Infância “Ernestina Pessoa”. Essa


resolução definiu ainda a substituição das escolas complementares, na Escola
Modelo e nos Grupos E scolares, pelos Cursos de Adaptação que, ministrando o
ensino intermediário, preparavam os alunos que saíam das escolas primárias para o
ingresso nas escolas normais, dentre outras.

Segundo o disposto no art. 42 do Decreto nº 6.501 do Regulamento da Secre taria da


Instrucção (1924, p. 29):

A escola modelo, annexa á Escola Normal, é destinada a educar e instruir,


separadamente, em classes, creanças de ambos os sexos e será, como a
escola isolada modelo, destinada aos exercícios de ensino dos alumnos do
curso normal e á aprendizagem dos professores de concurso.

Era a Escola Modelo que servia de padrão para as demais. Ficava situada na Capital
e era onde os alunos do Curso Normal faziam o estágio denominado pelos
inspetores, em seus relatórios, de treinament o, antes de prestarem concurso ou
serem nomeados para atuar nas escolas, isto é claro nos casos em que não havia
favoritismo, pois havia professores que não tinham preparo nenhum e eram
simplesmente indicados para os cargos. O art. 37 do Decreto nº 7.994 ( 1927)
esclarece:

A escola modelo “Jeronymo Monteiro”, annexa á Escola Normal, é um grupo


escolar modelo, destinado, como a escola isolada modelo, anexa áquele
estabelecimento, aos exercicios de ensino dos alumnos do 4º anno da
Escola Normal e á pratica pe dagogica dos professores primarios.

Estavam propensos a essa prática pedagógica aqueles professores primários que já


estavam atuando, mas que os inspetores detectavam necessitar de
aperfeiçoamento. No art. 44 do mesmo regulamento, consta que “A escola
complementar, annexa á escola modelo, tem por fim completar o curso primario e
servirá de intermediario entre este e a Escola Normal”. O art. 36 do Decreto nº
7.994, de 1927, esclarece que a finalidade do ensino nas escolas complementares,
era “[...] complementar o curso primário, servindo de intermediário entre este e o
curso secundário. O curso das escolas complementares sera de um anno, dividido
em duas secções, uma masculina e outra feminina”. Dessa forma, entendemos que
79

o curso complementar era pré -requisito para os alunos que terminavam o 4º ano e
queriam ingressar na Escola Normal.

Os relatórios analisados apontam aspectos importantes com relação ao exercício da


docência. Eles indicam que os professores não tinham grande interesse na
educação, pois suas atividades de ensino se misturavam com outras atividades.
Archimimo Gonçalves, em 5 de dezembro de 1928, na inspeção às escolas dos
municípios de São Matheus, Conceição da Barra, Santa Cruz e Riacho, relata o caso
da professora de uma escola mista da localidade de Ribeirão, município de Riacho e
registra que ela não tem compromisso com suas obrigações e “[...] só pensa [...] na
aproximação das férias e licenças para poder voltar suas vistas para o lar”.

Outro aspecto fundamental relacionado com o exercício da docência destacado nos


relatórios é o absenteísmo. Com relação a esse problema, os inspetores relatam que
aplicavam penas prescritas no Regulamento de 1924 para obrigar os professores a
cumprir suas tarefas. Sobre o caso de uma professora que fechou a escola se
recusando a dar aulas, porque compareceram à escola somente dez alunos,
Claudionor Ribeiro, inspetor da 7ª zona do Estado, composta dos municípios de
Castello e Affonso Cláudio, em 2 de abril de 1929, escreve, em seu relatório,
enviado ao secretário da Instrução, que “[...] Obriguei -a a cumprir com suas
obrigações mandando-a lecionar aos 10 discípulos porque eles tinham interesse em
instruir e educar [...]”.

Outro exemplo é citado no relatório de Alfredo Lemos, inspetor da 8ª zona, compo sta
por 26 escolas, em 3 de dezembro de 1928, cujas providências tomadas com
relação às faltas dos professores do município de Conceição do Castelo foram:

Apliquei aos professores, as penalidades do art. 177, letra B, do regimento


da instrucção. Ao profes sor, penalidade de 10 dias por encontrar -se ausente
de sua escola desde 16 de novembro. Às professoras dando sciencia ao
Juiz districtal a fim de não conceder os attestados para percepção de
vencimentos integralmente, porque encerraram os trabalhos escolar es no
dia 16 de novembro a mando do professor que se ausentou.

Esses exemplos mostram a severidade das punições dadas a alguns professores


por suas faltas. Entretanto é possível concluir que não resolviam o problema, pois,
conforme mostrado anteriormente, não era possível fazer uma inspeção contínua
80

nas escolas. Isso sem contar que havia ainda professores que desafiavam o Poder
Público, conforme relata o inspetor Alfredo Lemos, em 15 de março de 1935, sobre
uma professora da Escola Pública Mixta de Amarell os, município de Guarapary, que,
tendo ficado cinco dias sem lecionar, ao receber uma observação pela falta de
assiduidade, declarou que não tinha medo das autoridades.

Algumas vezes, a falta dos professores às aulas estava ligada a motivos de ordem
pessoal. Na Escola de Rio Pardo, conforme o relato de Aristides Costa, inspetor da
6ª zona, referente às escolas do município de Alegre, em 3 de outubro de 1928,

A falta de frequencia provem do procedimento incorreto do mari do da


professora; das brigas constantes entre elle e ella; das surras por elle
applicadas á sua esposa; cousa publica em Rio Pardo. Não encontrará em
Rio Pardo outra casa para alugar, porque sustentando o marido, que
absolutamente não trabalha, nada lhe so bra para seus compromissos para
pagamento de suas despezas. Encontrei -a ás portas da miseria, tendo me
declarado que passava dois e mais dias sem se alimentar, por falta de
recursos para comprar e porque cassaram -lhe o credito. A sua situação é
contristadora, si bem que seja ella a única responsavel e até mesmo a
causadora.
Nesse caso, pensamos que o problema não poderia ser resolvido nem pelo inspetor
nem pelo secretário da Instrução, visto que havia regras a serem cumpridas acerca
do funcionamento de uma escola: o professor alugava uma casa e o Estado enviava
um valor a ser pago pelo aluguel e pelo salário do profissional, sendo este o
responsável direto pelo pagamento do aluguel. Assim, cabia inteiramente à
professora a responsabilidade por seus atos.

Esmerino Gonçalves, em seu relatório de 14 de junho de 1928, referente à inspeção


das escolas dos municípios da Capital, Cariacica e Espírito Santo, diz que tem
empregado todos os esforços para inspecionar as escolas de sua zon a – não
identifica, contudo, a que zona se refere – e tem verificado com rigor quais são os
professores assíduos e de “comprovada moralidad e” – o que são poucos – pois a
maioria não “[...] procura desempenhar com a indispensável dedicação e
assiduidade tão nobilitante missão, concorren do assim para o decrescimento da
freqüência que tenho notado em muitas escolas do Estado”.
81

Apesar de a maioria dos professores dos municípios citados inspecionados por ele
serem normalistas, há um número elevado de professores substitutos, conseqüência
de um grande número de professores licenciados. Esse fato o levou a relatar que

Fui professor 16 annos, tendo lecionado em Itangá, Campinho de Santa


Izabel, Collatina, São João do Muquy, Cachoeiro de Itapemirim (no Grupo
Escolar Bernardino Monteiro), Guara pary e Serra, sem nunca ter pedido
uma licença, trabalhado muitas vezes doente, na certeza de que o meu
afastamento concorreria para a desordem da minha escola, porque os
professores substitutos nunca trabalham satisfactoriamente embora sejam
competentes.

Entendemos que o inspetor quis dizer que percebeu, nos professores dos
municípios inspecionados, a falta de compromisso com a função que
desempenhavam e, também a falta de consciência em relação aos prejuízos
causados aos alunos com as suas faltas. Apesar de não deixá-los sem aula, de as
escolas funcionarem com professores substitutos, o trabalho não era desenvolvido
do mesmo jeito, acarretando atrasos e problemas de várias ordens.

Gasparini, Barreto e Assunção (2005, p. 3) afirmam que as condições em qu e os


professores desenvolvem o seu trabalho e mobilizam as suas aptidões físicas,
cognitivas e afetivas, para que os objetivos da produção escolar sejam atingidos,
podem causar “[...] sobreesforço ou hipersolicitação de suas funções
psicofisiológicas. Se não há tempo para a recuperação, são desencadeados ou
precipitados os sintomas clínicos que explicariam os índices de afastamento do
trabalho [...]”.

De diferente modo, Siqueira e Ferreira (2003) dizem que tais problemas têm relação
com frustrações geradas na área profissional e/ou agregadas às ansiedades
derivadas das tentativas de conciliar o trabalho com as necessidades da casa e da
família. A partir da exposição desses fatores que podem ser os desencadeadores de
tantos pedidos de licença dos professores , pensamos que, nesse caso específico,
apesar de termos consciência das dificuldades dessas professoras em desenvolver
o seu trabalho devido às precárias condições das escolas, baixos salários,
deficiência de materiais e da “vigilância” dos inspetores, o m ais difícil para elas era
conciliar o trabalho de casa com o da função de professoras.
82

Segundo foi possível verificar, os problemas relativos à docência, indicados nos


relatórios dos inspetores, no final da década de 1920, persistem n os anos iniciais da
década de 1930. O inspetor Aristides Costa diz, em seu relatório, de 16 de junho de
1930, que a professora de concurso que atua na Escola Mixta Quarteirão de
Sant’Anna é “[...] sem preparo, sem vocação para o magistério, sem ao menos ter
desejo de ensinar alguma cousa. Alumnos atrazados. Ella não sabe sommar e nem
comparar duas frações ordinárias!!” .

Encontramos, nesse caso, informações que nos levam a refletir sobre algumas
questões: como poderia ser a professora de concurso se não sabia ensinar o básico
aos alunos? Que concurso era esse? Os conhecimentos necessários para prestá -lo
não tinham relação com o trabalho que desenvolveriam em sala de aula?
Verificamos em, nossa análise, que esses não eram casos isolados e que eles eram
percebidos com freqüência pelos inspetores.

Em 10 de abril de 1930, Archimimo Gonçalves relata que, na inspeção que fez às


escolas do município de Santa Thereza, há uma professora de concurso que
assumiu a Escola Mixta de São Pedro, porém, “[...] com pouco conhecimento da
Pedagogia, não está satisfasendo á população que já se manifestou contraria á sua
permanencia alli, de formas que está ella sofrendo grande pressão, faltando -lhe
recursos para se manter”. Assim, o inspetor pede urgentemente a sua remoção,
utilizando-se de uma medida legal disposta no art. 150 do Decreto nº 6.501 (p. 60),
que trata das remoções e permutas dos professores.

No mesmo relatório, Archimimo Gonçalves (1930) registra que a professora da


Escola Mixta de Alto Tancredinho tinha poucos conhecimentos de Peda gogia e,
além disso, “[...] é arbitraria e injusta nos castigos impostos á creançada, de formas
que está incompatibilisada alli não podendo de forma alguma continuar, sob pena de
soffrer da população local alguns vexames”. Não há registros no referido rela tório
sobre os tipos de castigos e as providências tomadas a respeito da situação,
confirmando que a falta de algumas informações nos documentos analisados
prejudica a análise.
83

Conforme dito, a partir de 1930, encontramos pouquíssimos relatórios de inspe tores,


mas, apesar das dificuldades, tivemos acesso aos termos de visitas desses
profissionais que, mesmo sendo mais sucintos, uma grande quantidade deles traz
informações sobre as escolas, os materiais, o mobiliário, os professores, o ensino e
o aproveitamento dos alunos.

Na leitura e análise desses termos de visitas, um fato nos chamou a atenção: os


constantes elogios dos inspetores aos professores regentes. Nos relatórios
analisados anteriormente, isso era raro, pois havia denúncias e críticas ao traba lho
desenvolvido pelos docentes. No caso dos termos de visitas, a partir de 1931, os
elogios são constantes “[...] aos mestres assíduos, esforçados e dedicados”.
Esmerino Gonçalves em visita à Escola Mixta de 4ª entrância no município da Serra,
em 1º de setembro de 1931, assevera:

Os alumnos são quasi todos analphabetos, mas estou certo que dentro em
breve estarão alphabetisados, dado o esforço e competencia da actual
regente que lecciona com methodo, pois ofereceu -me a opportunidade de
assistir uma aula de alphabetisação, da qual tive optima impressão.

Nesse caso, o inspetor demonstra, ainda, confiança no trabalho desenvolvido pela


professora, a qual não menciona se é normalista ou de concurso. Alfredo Lemos, em
visita à Escola Mixta de 2ª Entrância da Vila de Itapemirim, na data de 14 de
setembro de 1931, elogia o professor regente dizendo: “[...] é um devotado
educadôr, sendo merecedôr dos meus melhores elogios”. O inspetor Archimimo
Gonçalves, em 26 de outubro de 1938, também tece elogios à profe ssora da Escola
Mixta Estadual de Socego, município de Itaguass u, afirmando: “[...] Aplica o methodo
moderno com real proveito – Felicito, mais, a professora pelos bons serviços
prestados à causa da alphabetisação”. Esses elogios aos professores normalista s ou
de concurso, registrados tanto nos relatórios quanto nos termos de visitas dos
inspetores, eram previstos, no art. 54 do Decreto nº 7.994/1927, como um dos itens
do critério de merecimento para o preenchimento das vagas de professores nas
escolas.

Acreditamos que as mudanças observadas no conteúdo dos relatos dos inspetores


sobre o desempenho dos professores foi decorrente da combinação de dois fatores.
84

O primeiro diz respeito às novas exigências acerca da formação dos docentes para
atuar nas escolas. Embora essas exigências ainda não fossem as ideais, pois
continuava sendo expressivo o número de professores de concurso no decorrer da
década, foram as possíveis para o momento, considerando a insuficiência das
escolas para formação de professores, no se ntido de atender às necessidades
geradas pela ampliação da oferta de ensino primário.

O segundo fator é referente às medidas provisórias adotadas em relação à Escola


Normal, citadas na mensagem do presidente Dr. Aristeu Borges de Aguiar, em 22 de
setembro de 1930, que também se refletiu positivamente nas mudanças ocorridas no
desempenho dos professores. Segundo o presidente

O Decreto nº 10.171, expedindo instruções provisórias sobre o ensino e


contendo outras medidas ligadas ao funcionamento deste educand ário, deu
à Escola Normal nova organização. Além de uma divisão mais pedagógica e
proveitosa das disciplinas, annexando -se as cadeiras de Hygiene,
Pedagogia, Trabalhos Manuaes, ensinamentos mais amplos sobre
Anatomia e Physiologia Humanas, Psycologia, Dire ito Usual e Economia
Domestica foram introduzidas modificações nos programmas das diversas
disciplinas, no propósito de enquadrá -las, o mais possível, nas finalidades
do ensino moderno (AGUIAR, 1930).

Nessa nova organização do ensino nas escolas normais, estavam previstas ainda
medidas para atender aos princípios da escola ativa para preparação dos
professores. A seleção desses profissionais, por meio do critério de merecimento
disposto no Decreto nº 7.994, que era um dos itens adotados para tal procedime nto,
é explicada por Tanuri (2000, p. 62):

Antes porém que se fundassem as primeiras instituições destinadas a


formar professores para as escolas primárias, já existiam preocupações no
sentido de selecioná-los. Iniciativas pertinentes à seleção não somen te
antecedem as de formação, mas permanecem concomitantemente com
estas, uma vez que criadas as escolas normais, estas seriam por muito
tempo insuficientes, quer numericamente, quer pela incapacidade de atrair
candidatos, para preparar o pessoal docente da s escolas primárias.

Assim, concluímos que, apesar de todas as iniciativas registradas, o esforço ainda


se configurava bastante pequeno no sentido de investir, de modo consistente e
efetivo, na qualidade da formação docente. O que agravava ainda mais a situação,
segundo Tanuri (2000, p. 85), é que essas falhas, na política de formação, eram
acompanhadas pela inexistência “[...] de ações governamentais adequadas
85

pertinentes à carreira e remuneração do professor, o que acabava por se refletir na


desvalorização social da profissão docente, com conseqüências drásticas para a
qualidade do ensino em todos os níveis”.

Outro ponto fundamental a ser ressaltado é a verificação de que as medidas que


objetivaram organizar a educação no Estado em bases nacionais auxi liaram no
sentido de propiciar alguns avanços, por exemplo, a ampliação da oferta do ensino
primário. Contudo vimos que os problemas, em relação à ação docente, agravada
pelos parcos salários e pela precariedade quantitativa e qualitativa dos espaços
físicos e do deficiente provimento de materiais e mobiliário escolar, atravessaram
todo o período em estudo.

4.2 A freqüência das crianças nas escolas

Outro dado importante encontrado nas fontes que afetava o desenvolvimento da


educação e, portanto, a alfab etização de crianças diz respeito à freqüência escolar.
Conforme Regulamento da Instrução (Decreto nº 6.501 -1924), vigente na década de
1930, “Nenhuma escola poderá funccionar com matricula inferior a trinta alumnos e
frequencia menor de vinte [...]” (ART. 35, p. 27). Sobre as faltas dos alunos, reza que
“Nenhuma creança depois de matriculada poderá faltar á aula sem motivo
justificado, por mais de tres dias em cada mez” (ART. 64, p. 35). No parágrafo único
desse mesmo artigo, consta ainda que “A justificaç ão só poderá ser por motivo de
doença ou por força maior”.

O documento registra que estão sujeitos a multas os patrões que impedirem ou


dificultarem menores a seu serviço de freqüentarem escolas primárias e que as
penas impostas aos patrões não isenta de responsabilidades os pais ou
responsáveis das crianças. Sobre a matrícula, encontramos determinações de que,
nas Escolas Modelo, nos grupos escolares, nas escolas reunidas e isoladas e na
escola complementar, elas serão feitas no período de 25 a 31 de jan eiro, mas, com
motivo devidamente justificado, poderá ser feita fora desse período regulamentar.
86

Constam ainda artigos e itens apontando que, além dos inspetores, os delegados da
instrução, os policiais estaduais ou municipais, os professores públicos, as
autoridades judiciais e administrativas também eram fiscais na obrigatoriedade do
ensino; o delegado da instrução deveria velar por essa obrigatoriedade e aplicar as
multas convenientes; a freqüência média era “[...] o quociente da divisão total dos
comparecimentos pelo número de dias lectivos” (ART. 93, § único, p. 43), dentre
outras determinações.

No regulamento (Decreto nº 6.501 -1924), havia um capítulo com nove artigos


dedicados a questões relativas à obrigatoriedade e gratuidade do ensino primário e,
especificamente, o art. 61 (p. 34) determinava que “Os paes, tutores ou quem lhes
faça as vezes são responsáveis pela matricula e frequencia das crianças obrigadas
á escola primaria” e que incorreria em multa os pais, tutores ou responsáveis que,
notificados, infringissem o disposto no capítulo citado.

Conforme podemos verificar, havia, legalmente, respaldo para a questão da


importância da matrícula e da freqüência dos alunos às escolas. Faltava, contudo,
em alguns casos, a conscientização por par te da família da importância da escola na
vida das crianças e, em outros casos, a necessidade que as famílias tinham de
utilizar a mão-de-obra de toda a família na lida com a terra, impedindo as crianças
de ter acesso à educação escolarizada.

Enfim, de acordo com os relatórios e os termos de visita dos inspetores, diversos


fatores contribuíam para a baixa freqüência dos alunos à escola. Werebe (1997)
afirma que são múltiplas as causas de muitas crianças não ingressarem na escola
ou de a abandonarem nos pr imeiros anos de estudo. A mais relevante se relaciona
com fatores socioeconômicos das famílias, que , muitas vezes, não têm condições de
manter seus filhos na escola, principalmente quando são por várias vezes
reprovados, ou porque precisam inseri -los no mercado de trabalho por precisarem
do complemento dos salários deles.

Outro fator é o horário escolar incompatível com os horários de dedicação ao


trabalho na lavoura. Aristides Costa, em seu relatório de 26 de julho de 1928,
referente à escola da Fazen da Santa Cruz e da Fazenda do Castello, diz que os “Os
87

colonos aproveitam na apanha do café e nos demais serviços da lavoura os seus


filhos, obrigando-os a falharem constantemente”. Diante de tal fato, propõe a
mudança de horário das aulas para 8 as 12 horas ou, se o secretário julgar mais
conveniente, para 9 as 13 horas, adequando-o, desse modo, aos horários de
trabalho na lavoura. Embora, de acordo com o Regulamento da Instrução (1924), o
horário oficial das aulas fosse das 11 às 16 horas, o que nem sempr e era cumprido
em todas as escolas.

A mudança de horário seria uma medida simples, pois, conforme apontam os


relatórios, os horários estabelecidos no Regulamento não eram cumpridos em
muitos municípios. As escolas de Santa Tereza inspecionadas por Archimi mo
Gonçalves, em 1929, “[...] na grande maioria não visitadas nos annos de 1928 e
1929, estavam funccionando com vários horários – de 7 a 11, de 8 a 12, de 8 a 13,
de 11 a 16 e de 12 a 16 – o que constitue uma desordem [...]”. Conforme
averiguado, os horários eram tão diferentes nesse município porque as escolas, por
não terem sido visitadas, não estavam cumprindo o horário oficial, mas, “[...] a
intenção do inspetor era fazer com que todas obedecessem o horário official de 11 a
16 como em todo o Estado” (G ONÇALVES, 1929).

A baixa freqüência era uma questão difícil de ser solucionada, pois, em muitos
municípios, não havia escolas, assim as crianças não podiam freqüentá-las.
Archimimo Gonçalves, em 1929, assinala o fato de, no município de Santa Tereza,
não ter o número de escolas que “[...] corresponde à sua população e extensão
territorial, tornando-se necessária a creação de tantas escolas nos diversos núcleos
existentes”. Apesar de ser insuficiente o número de escolas, segundo ele, as 28
escolas rurais que existiam estavam sendo pouco freqüentadas e, por isso, deveriam
ser postas em prática as exigências previstas no Capítulo II, art. 58, p. 33, do
Regulamento da Secretaria da Instrução de 1925 que dizia ser obrigatório “[...] o
ensino primário para todas as creanças de 7 a 12 annos de edade” e do art. 63 que
estabelecia a aplicação de multa aos “[...] pais, tutores ou responsáveis que,
notificados, infringirem as disposições [...]” contidas no capítulo que tratava “Da
obrigatoriedade e da gratuidade do ens ino primário”.
88

Archimimo Gonçalves (1929) diz saber que essa medida é extrema, contudo
considerava que era a única capaz de melhorar a freqüência, principalmente, nos
núcleos estrangeiros, pois um dos problemas que dificultava a freqüência às escolas
estava relacionado com o fato de, em algumas regiões do Espírito Santo, existirem
núcleos significativos de imigrantes que, com o pretexto de ensino religioso,
principalmente os alemães, vinham instalando no interior do Estado um número cada
vez mais crescente de escolas, onde só ensinavam o seu idioma. Gonçalves (1929)
complementa ainda:

Estes brazileiros infelises, victimas indefesas da falta de uma providencia


energica, vêm carpindo as mais duras privações e difficuldades da vida
practica pela absoluta ignorancia e falta de conhecimento do nosso idioma.
Varias têm sido as providencias postas em pratica pelos illustres
antecessores de V.Exª sendo umas mais energicas outras mais tolerantes,
estabelecendo-se assim um termo de franca possibilidade de levarem a
effeito o seu prejudicialissimo objetivo. Perseguidos pela ininterrrupta
fiscalisação que prohibe o ensino de linguas estrangeiras aos brazileiros
menores de 12 annos antes de conhecerem a sua, esses individuos,
membros de grandes sociedades religiosas, en contraram no capitulo VII do
decreto 6.501 o habeas-corpus que vêm imbaindo a nossa bôa fe e
fiscalisação, ensinando então ostensivamente o seu idioma.

Segundo o inspetor, havia ainda o agravante de os dirigentes dessas escolas


tentarem “[...] convencer aos brazileiros ate terceira e quarta gerações que são
allemães e so o seu idioma precisam conhecer!”
A forma encontrada por alguns inspetores para conter a criação dessas escolas era
criá-las ou apoiá-las nesses locais e exigir o cumprimento da Lei. De a cordo com o
regulamento (DECRETO Nº 6.501 de 1924): “É expressamente prohibido nos
collegios ou cursos particulares dar -se ás creanças menores de doze annos, o
ensino de linguas estrangeiras, salvo se já souberem ler e escrever correntemente o
portuguez” (ART. 128, p. 53). Esse foi o caso da Escola Particular de Pontal que,
segundo Archimimo Gonçalves, em seu relatório, resultado da inspeção às escolas
do município de Itaguass u, em 18 de agosto de 1928, diz que essa escola é “[...] o
resultado de esforço meu contra o funccionamento de escola allemã, pelo que o seu
responsável – Sr. Ricardo Búcher resolveu mantel -a”.

A insistência dos alemães em manter escolas estrangeiras também foi relatada pelo
inspetor Alberto d’Almeida em seu relatório parcial de 28 de junho de 1929, referente
89

ao movimento do ensino nas escolas do município de Collatina (Barra de Crissiúma),


em que relata:

Qual não foi minha surpresa de encontrar ainda neste Estado escolas onde
a lingua patria é completamente esquecida e lembrado somen te o idioma
allemão! Logo que comprehendi de chôfre a imensidade de tão grande
attentado não medi circunstancias, e procurando o pastor Guilherme Küster
entrei em entendimento com esse senhor mas, sem resultado, porque não
comprehendeu o que lhe disse, ou se fes de não entendido no portugues, o
que entretanto, não posso affirmar. Mesmo alguma palavra em frances, ou
phrase , foi sem resultado. Assim, por meio de mimica dei a entender que ia
escrever um officio, e que elle mandasse um interprete traduzir. Dei xei
então o officio [..] que peço venia a Vª Exª desculpar o modo por que agi,
pois o momento foi quem o sugeriu.

No ofício que o inspetor enviou ao pastor, ele informava que, no curso sob a
orientação do pastor, devia ser ensinado o português e, no ca so de não haver
pessoa habilitada para fazê -lo, que os alunos deviam ser imediatamente
matriculados na escola pública Barra de Crissiúma. Dizia ainda que o ensino da
língua pátria era obrigatório, sob pena de serem multados e sujeitos às penas da lei
os responsáveis por não cumprir tal exigência. Alberto d’Almeida finaliza o relatório
afirmando que pretende voltar brevemente a Barra de Crissiúma para resolver a
questão.

O pastor Guilherme Küster responde ao inspetor que, quando este voltar à Barra de
Crissiúma, ele estará à sua disposição para auxiliá -lo na resolução do problema e
juntos encontrarem uma conclusão satisfatória para ambas as partes. Após ler a
resposta do pastor, Alberto d’Almeida sugere que, caso não seja possível a
matrícula dos alunos do p astor Küster na escola de Barra de Crissiúma, por
dificuldade de compreenderem a língua, no núcleo de Afonso Pena, há um professor
particular habilitado em português e alemão que poderá ensinar aos meninos.

A conclusão dessa problemática, contudo, nã o foi encontrada nos relatórios


subseqüentes, o que inviabiliza o seu desfecho mas, pensamos que, aos poucos,
essas situações foram em parte equacionadas, pois, nos relatórios seguintes,
consta, entre os alunos matriculados, um grande número de crianças es trangeiras.
Nesse mesmo relatório, Alberto D’Almeida diz que, nas proximidades, se acham
outras escolas na mesma situação, por exemplo, a da “Comunidade Lutherana de
90

Barra do Aventureiro”, cujo pastor é Paulo Knoch, e a de “Laranja da Terra”, no


município de Afonso Cláudio.

Uma medida adotada pelos inspetores no sentido de resolver o problema das


crianças estrangeiras em idade escolar que ainda não freqüentavam a escola era
pedir ao secretário da Instrução a nacionalização do ensino em algumas regiões,
conforme relata o inspetor Edmundo Malisek, em 30 de abril de 1929. Ele pede a
nacionalização do ensino em Santa Leopoldina, pelo motivo acima citado e, diz: “[...]
officiei aos paes rebeldes e possuidores da lei do ensino por mim distribuída,
concedendo-lhes o prazo de 15 dias para matricularem seus filhos, sob pena de lhes
ser aplicada a multa que trata a lei vigente”, ou seja, a lei de obrigatoriedade do
ensino. Edmundo Malisek (1929) complementa ainda que esperava, com a medida e
o fim do prazo concedido, matricular todas as crianças.

Segundo Kreutz (2003, p. 355), “Os imigrantes alemães vieram de regiões com
acentuada tradição escolar. Não encontrando escolas públicas na região de
imigração, uniram-se para construção de escolas étnicas, manutenção do p rofessor
e produção de material didático”. Essas escolas eram comunitárias, particulares e/ou
concernentes a alguma congregação religiosa. O autor diz ainda que havia, no ano
de 1931, no Estado do Espírito Santo, 22 escolas da imigração alemã, das quais 21
eram evangélicas com matrícula de 705 alunos e a outra era mista com 12 alunos
matriculados (KREUTZ, 2003).
Havia, porém, algumas situações mais difíceis de serem resolvidas. Flávio de
Moraes, em 6 de abril de 1929, afirma, em seu relatório: “Procure i fazer cumprir a
obrigatoriedade do ensino, mas encontrei paes que nem multados mandam os filhos
á escola”. Dessa forma, o referido inspetor sugere ao secretário da Instrução uma
medida que, segundo ele, poderia dar melhores resultados que a aplicação de
multas. A sugestão era que o secretário colocasse à sua disposição um soldado,
“[...] porque o nosso colono não conhece a lei e não a teme, e deante de um
soldado, somente uma multidão se curva [...]”. Esperava o inspetor que a presença
do soldado juntamente com ele às inspeções poderia pôr termo aos abusos dos pais
infratores da lei.
91

A sugestão de Moraes (1929), sem dúvida, era também complicada, mas


entendemos que os inspetores se viam bastante frustrados no exercício de sua
função, ao ver que seu empen ho em fazer com que os pais enviassem seus filhos à
escola não davam resultados. Porém, se o pagamento de multas não redundava os
efeitos esperados, pois a maioria da população era pobre, o uso da força policial não
possibilitava resultados diferentes.

O inspetor técnico do ensino em comissão, Dr. Lopes Ribeiro, em seu relatório de


inspeção aos municípios de Alegre, Muniz Freire, Rio Pardo e Siqueira Campos, do
dia 25 de outubro de 1933, posiciona -se com relação às multas e ao uso da polícia
de modo que nos parece bastante pertinente:

[...] parece-me contraproducente o recurso ás multas e á polícia. Aquelas


em geral, não são pagas e ficam os que as impõem definitivamente
desmoralisados, pois se torna evidente, então, que não são executadas
realmente as multas.
Quanto á polícia pode-se proceder apenas quanto aos pequenos, porque os
senhores feudais do interior ficam a coberto da pressão policial, visto que
continuam a ser, como sempre foram, os mandões dos seus latifundios,
amigos dos administradores muni cipais e decisivos fatores de vitorias
eleitorais.

O exame do conteúdo dos relatórios e dos termos de visita dos inspetores, relativos
aos anos posteriores, indica que o procedimento de utilizar a polícia para intimidar os
pais,,não se tornou uma prática regulamentar e deixou de ser utilizado, e a cobrança
de multa aos pais que não matriculavam seus filhos continuou a ser adotada. Porém
o problema da baixa freqüência persistiu no decorrer da década.
Consta, no termo de visita do inspetor Alfredo Lemos, da Escola Mixta de Santa
Maria Magdalena, município de Alfredo Chaves, no dia 1º de maio de 1935,
referente à Escola Mixta de São Sebastião: “Recomendei á professora intensificar a
matricula, notificando aos pais de crianças em idade escolar que residem em um raio
de 3 km distantes da escola a virem matricular seus filhos, sob pena de multa”.

Em 4 de abril de 1938, Archimimo Gonçalves relata em seu termo de visita à Escola


Mixta Estadual de Cambury, município da Capital:

A pequena freqüência é motivada pela abstinência de paes analphabetos,


porem afixei em logar publico dando praso de 8 dias para justificarem a
92

ausencia dos meninos, sob pena de multal -os. Mandei chamar alguns paes
a quem fiz ver o signo da lei e ameacei -os de multa. Esperamos o resultado.

A partir dessas considerações, percebemos que os inspetores ainda continuavam,


ao final da década, orientando e tentando, mesmo sob ameaça de multa, convencer
os pais de crianças em idade escolar a matricular seus filhos nas escolas
comprovando, conforme Faria Filho (2000, p. 54) “[...] que não são raras as vezes
em que a responsabilidade pela baixa freqüência dos filhos à escola é imputada às
famílias”.

As doenças infecto-contagiosas era outro fator que interferia na freqüência escolar.


Conforme relata Claudionor Ribeiro, em 6 de maio de 1929, a coqueluche motivou o
fato de várias crianças deixarem de se matricular na Escola Mixta de Ribeirão, no
município de Affonso Cláudio ou de Castello: “Disse -me a regente que o número
diminuto de matrícula é motiv ado pela coqueluche, que está irrompendo,
assustadoramente na localidade”. Assim, o inspetor diz que a medida mais
conveniente seria a supressão dessa escola.

No estudo dos relatórios e dos termos de visita dos anos subseqüentes,


constatamos que as doenç as continuaram a ser um dos empecilhos para a
freqüência dos alunos à escola. Contudo, o ano de 1938 foi o que mais nos chamou
a atenção devido à quantidade de municípios afetados por epidemias. O inspetor
Alfredo Lemos traz, em seu termo de visita de 27 d e agosto sobre a Escola Mixta de
Coby, município de Espírito Santo: “A freqüência tem decrescido em virtude do
estado sanitário da localidade, estando grassando o empaludismo e sarampo”.

Na Escola Mixta da Fazenda Sant’Anna, município de Cariacica, Alfred o Lemos diz


que a professora informou que diversos alunos de sua escola estavam com
coqueluche. Archimimo Gonçalves afirma, em seu termo de visita do dia 10 de junho
de 1938, relativo à Escola Mixta Estadual do Limoeiro, município de Itaguass u, que
“Reina um surto forte de grippi na localidade e por isso os mininos estão todos
tossindo muito; alguns tem faltado a aula”. O inspetor informa ainda que, na Escola
Mixta Estadual de Bananal, do mesmo município, a freqüência tem caído muito, no
local como em todo município, por causa do sarampo em todas as localidades.
93

Alfredo Lemos informa também que, no Grupo Escolar “Barão de Monjardim” de


João Neiva, município de Pau Gigante, “A freqüência tem decrescido em virtude de
estar grassando a coqueluche, dor d’olhos e cachumba”. Podemos verificar que são
diversas as doenças, pois, em visita à Escola Mixta Estadual (2º turno) de Firme,
município de Affonso Cláudio, Archimimo Gonçalves relata, em seu termo de visita à
referida escola, que “O estado sanitário não está b om. Há muito sarampo, cachumba
e catapora, dahi a rasão da diminuição da freqüência”.

Uma das causas das doenças era a falta de higiene, a qual é bastante citada nos
relatórios, demonstrando a preocupação de alguns inspetores. Conforme salient a
Flávio de Moraes, em seu relatório de 12 de abril de 1928,

[...] desaladoras foram as minhas impressões ao visitar certas escolas dos


municípios de São Matheus e Conceição da Barra, no tocante à hygiene
escolar. É uma zona, com excepção de alguns lugare s, cujas condições
sanitárias são péssimas.

Como conseqüência, várias crianças apresentam doenças. Assim, ele pede o


fornecimento de remédios para as crianças pobres matriculadas nas escolas dos
referidos municípios.

A falta de higiene nas escolas ia desde a falta de mobiliário para os alunos, que
muitas vezes escreviam apoiando ou se senta ndo no chão e fazendo os bancos de
mesas, até a falta de instalações sanitárias, conforme relata Archimimo Gonçalves
no termo de visita da inspeção que fez à escola fem inina estadual de Patrimônio de
Santo Antônio, município de Santa Thereza, em 16 de agosto de 1938: “Não tem
instalação sanitária. Sendo como é próprio estadoal seria de grande necessidade a
construção de dependência sanitária para os dois sexos annexa ao prédio – É uma
providência aconselhavel e imprescindivel” . O absurdo dessa situação é que a casa
onde a escola funcionava tinha sido doada ao governo pelo povo em “festa solene”,
enfatiza Gonçalves (1938), ou seja, não houve até então investimento nenhum d o
Poder Público na casa.

Esse não era apenas um caso isolado, Archimimo Gonçalves relata outro fato
semelhante no seu termo de visita à escola masculina estadual de Figueira de Santa
94

Joanna, município de Itaguass u, em 8 de junho de 1938. Segundo o inspeto r, “A


escola não pode continuar funccionando na casa onde se encontra por falta de
hygiene – Não tem agua, nem dependencia sanitaria [...]“. Agora, é claro que o mal
estado sanitário das localidades onde as escolas estavam instaladas contribuía para
a proliferação de doenças, mas é importante ressaltar que, apesar de os inspetores
terem esse conhecimento, tudo só ficava, na maior parte das vezes, na denúncia
dos fatos.

Conforme foi possível averiguar com base em todo o material analisado, detectamos
em apenas dois relatórios e em duas mensagens do presidente Aristeu Borges de
Aguiar – uma em 7 de setembro de 1929 e outra em 22 de setembro de 193 0 –,
providências no sentido de evitar a proliferação de doenças. No primeiro dos
relatórios, Archimimo Gonçalves sugere a proibição da criação de suinos e cloacas
nos quintais próximos à escola que estava sendo prejudicada. No segundo relatório,
referente ao Grupo Escolar de Alegre, resultado de sua inspeção no período de 30 -
10 de 1930 a 25-10 de 1931, o inspetor Ota cilio Lomba relata que, no mês de
setembro, houve baixa em relação à freqüência, quando esta deveria ter aumentado
“[...] devido ao numero grande de alunos que se matricularam, porque nesse mês,
vacinámos todo o Grupo contra a varíola e inumeros alunos fic aram acamados em
consequencia da reação da vacina”.

Na primeira mensagem do presidente Aristeu Borges de Aguiar (1929), o Dr.


Mirabeau da Rocha Pimentel, então secretário do Interior, fala sobre o estado
sanitário do Espírito Santo. Ele diz que apesar de ter ocorrido, no Rio de Janeiro,
uma epidemia de febre amarela e de o Estado do Espírito Santo estar em
comunicação diária com es sa cidade, não foi registrado no Estado nenhum caso da
doença. Apareceram alguns casos de febre típica no município de Itaguas su,
Collatina e Lauro Muller, porém “[...] o governo agiu imediatamente e foram
vacinadas 805 pessoas” (PIMENTEL, 1929). Nessa mesma mensagem, consta que
foi feita, nas escolas, a distribuição entre os professores de mil exemplares da obra –
“Amarellão e Maleita” – do Dr. Belisario Penna e também uma grande divulgação de
“[...] conselhos prophylaticos organizados pelos serviços de cooperação nacional
contra a febre amarela” (AGUIAR, 1929).
95

A Secretaria da Presidência, também empenhada nessa campanha, fez a


distribuição desses mesmos exemplares aos promotores públicos, juízes de Direito,
oficiais e delegados de Polícia, prefeitos e vereadores, acompanhados de uma
circular que tratava da importância de se empenhar, na escola, um trabalho de
ensinar à população do campo e da cidade os “preceitos de higiene” (Foto 4). Nesse
cenário, Rocha (2005) assegura que, se diversos eram os meios e variadas eram as
formas de que nesse empreendimento se tinha a possibilidade de lançar mão, uma
vez mais é a escola que se impõe como local privilegiado para a propagação de tais
preceitos.

Foto 4 – Uma aula de higiene bucal


Fonte: Revista de Educação, 1936

De acordo com a segunda mensagem , também apresentada ao Congresso


Legislativo pelo presidente do Estado do Espírito San to, Dr. Aristeu Borges de
Aguiar, em 22 de setembro de 1930, foi iniciado , nesse ano, o trabalho das
educadoras sanitárias. A criação desse serviço era a base da efetivação da reforma
do ensino nessa parte, que consistia em preparar os professores em exerc ício e os
futuros professores na Escola Normal, em cursos especiais para atuarem na
educação sanitária. Rocha (2005) afirma que “[...] a criação desse curso, que
representou a possibilidade de reorientação profissional para todo um grupo de
professoras dessa geração, deve ser compreendida no âmbito das propostas
modernizadoras de intervenção no campo da saúde pública“.
96

Conforme artigo publicado na Revista de Educação no ano de 1936, com o título:


“As colonias de férias e o serviço médico escolar no Espí rito Santo”, pelo Dr. Mario
Bossois Ribeiro (chefe do Serviço de Inspeção Médica e Educação Sanitária
Escolar), a educação sanitária ficava sob responsabilidade das educadoras
sanitárias escolares que, segundo ele, “[...] São auxiliares indispensáveis nos
Serviços Médicos Escolares e as espírito -santenses têm se revelado competentes e
trabalhadoras” (RIBEIRO, 1936, p. 17).

Elas trabalhavam quatro horas por dia executando fielmente um programa de


Educação Sanitária e puericultura em prática no Estado. Os h orários das aulas eram
combinados previamente com os diretores dos grupos e com os responsáveis pelos
demais estabelecimentos de ensino. “As Bandeiras de Saúde tambem são
organizadas e orientadas por ellas [...] trabalhando 14 na Capital e as demais nas
sédes das Regiões e cidades mais populosas” (RIBEIRO, 1936, p. 17).

A respeito do fato, que resultou na proibição da criação de suinos e cloacas, ele


ocorreu quando Archimimo Gonçalves, em inspeção às escolas do município de
Santa Thereza, em 10 de abril de 1930, visitou a escola masculina da sede de
Fundão, a pedido da professora regente – essa escola não fazia parte da zona a seu
cargo – a fim de tomar providências a respeito da freqüência em constante declínio.

Procurando saber as causas, o inspetor det ectou que, em parte, era motivada pelo
forte surto epidêmico de paludismo “[...] combinado ou aggravado ainda com a má
vontade dos paes que querem aproveitarem [sic] do trabalho de seus filhos na limpa
do cafesal para a respectiva colheita”. Confirmados, então, os motivos da falta de
freqüência dos alunos, o inspetor escreveu aos pais prevenindo -os da necessidade
de matricular seus filhos na escola, sob pena de “[...] lhes serem applicados os
rigores da lei”, pois o ensino era legalmente obrigatório. A out ra providência tomada
pelo inspetor foi sugerir ao delegado de hygiene local “[...] a prohibição de suinos e
cloacas nos quintaes circunvisinhos das escolas, rasão primordial do surto
epidemico ora reinante, o qual tem causado grande numero de victimas”.
97

Não consta, contudo, nos documentos analisados, que tal sugestão foi acatada pelo
delegado ou se outra providência foi tomada nesse sentido. É fato, porém, que as
condições sanitárias, tanto das localidades quanto dos prédios onde funcionavam as
escolas e as doenças dos alunos oriundas desses fatores, continuaram a ser
denunciadas pelos inspetores como um dos elementos essenciais que impediam a
freqüência das crianças às escolas.

Archimimo Gonçalves, em 5 de dezembro de 1928, em seu relatório sobre os


municípios de São Matheus, Conceição da Barra, Santa Cruz e Riacho, solicita ao
secretário de Instrução que, num gesto de humanidade, distribua medicamentos aos
residentes em algumas insalubres zonas de Riacho e Santa Cruz. Archimimo
Gonçalves (1928) afirma:
[...] impossível se torna manter escolas com a necessária regularidade e
assim, para diminuir este inconveniente e minorar os sofrimentos de
milhares de infelizes que não têm a sorte de gosarem saúde, proponho a
distribuição de determinados medicamen tos a cada escola para socorro dos
alunos doentes e miseráveis [...].

Essa era uma medida que o inspetor considerou viável para contribuir para o bem -
estar dos alunos e também para a melhoria da freqüência escolar, já que as crianças
começavam a estudar e, logo que ficavam doentes, devido às más condições de
vida e de higiene, deixavam de ir à escola.

Apesar de os castigos físicos terem sido proibidos, outro fator que afetava a
freqüência nas escolas era a sua aplicação pelos professores. Segundo So uza
[200-], os castigos impostos faziam com que a escola se tornasse um lugar de medo
e dor e contribuíam para que os alunos tivessem repulsa aos estudos, aumentando
as faltas às aulas. Sobre esse aspecto, nas visitas que faziam às escolas, os
inspetores se deparavam com casos inéditos que fugiam à sua autoridade para
resolver, necessitando serem levados ao conhecimento do secretário da Instrução.
Um exemplo é a situação relatada por Archimimo Gonçalves, em inspeção às
escolas do município de Santa Thereza , relativos aos meses de setembro e outubro
de 1929. O inspetor relata que havia um professor da Escola de S. Jacintho,
município de Santa Thereza que:
98

[...] mutila seus alumnos fazendo ecchymoses pelo corpo com varas, usa a
deprimente palmatória além de pôr os meninos de joelhos nas janellas da
rua com braços abertos. Não tive informações – vi extatico e pasmado
aquelle homem, vestido de pyjame deante de mais de 40 alumnos de
ambos os sexos, de 6 a 15 annos, esbordoar deshumanamente, como um
tigre enraivecido uns dez meninos deante de 6 ou 8 transeuntes parados à
porta da escola! Levado por um extranho pavor obriguei -o a fechar a escola,
pelo que sei entendeu-se com V. Exª a respeito.

Pelo seu procedimento, segundo o inspetor, o professor deveria se r suspenso, pois,


de acordo com o regulamento vigente da Secretaria da Instrucção, sobre as penas
disciplinares no Capítulo I, Art. 177, do Decreto nº 6.501 (1924) , será suspenso o
professor quando: d) “[...] infringir aos seus alumnos castigos corporaes q ue, por
qualquer meio, possam contribuir para diminuil -os, offendendo-lhes o brio e a
dignidade”. Contudo, como podemos ver ificar, a lei não era cumprida, pois, segundo
o inspetor, o professor se entendeu com o secretário da Instrução.
O inspetor diz ao secretário que esse professor já tinha usado indelicadezas com
determinada pessoa em Santa Thereza, por não ter encontrado apoio às suas
“selvagerias”. Dessa forma, solicita ao secretário : “[...] não ser empolgado pelas
lamurias desse sargento desertor do ex ercito, e que tem uma grande bagagem de
horriveis precedentes”. No final do relato, Archimimo Gonçalves faz um apelo ao
secretário “[...] no sentido de evitar quanto possível a continuação desse individuo na
diminuição dos brios e dignidades desses infelis es, victimas indefesas da ignorancia
dos paes e da inclemencia desse homem” .

Pelo relato do inspetor, fica claro que não era a primeira vez que o professor agia
dessa maneira. Contudo não há registros sobre quais foram os procedimentos
adotados na primeira vez em Santa Thereza. Pensamos que ele pode ter sido
removido pelo inspetor para outra escola do mesmo município, no caso de ter tido
conhecimento do ocorrido antes de acontecer em S. Jacintho e não fazer valer o
disposto no Decreto nº 6.501, pois já foi verificado que as leis não eram
rigorosamente cumpridas. Mas pode ser que o próprio professor tenha pedido a sua
transferência para outra escola do município por não ter encontrado apoio nos seus
atos em Santa Thereza. Nesse caso, o inspetor só deve t er tomado conhecimento
do fato somente depois do ocorrido na escola de S. Jacintho.
99

Em 10 de abril de 1930, o inspetor Archimimo Gonçalves registrou em seu relatório


sobre a inspeção feita nas escolas do município de Santa Thereza que, na Escola
Mixta de Tancredinho, havia uma professora que “[...] é arbitrária e injusta nos
castigos impostos á creançada, de formas que está incompatibilisada alli não
podendo de forma alguma continuar, sob pena de soffrer da população local alguns
vexames”. Nesse caso, o inspetor não especifica que tipos de castigos eram
aplicados aos alunos e a indicação é que ele pensa em removê -la e não fazer
cumprir o disposto no Decreto nº 6.501, de 1924.

Outro caso de castigos corporais é citado por Dr. Lopes Ribeiro, inspetor t écnico do
ensino, que escreve em seu relatório referente à inspeção escolar nos municípios de
Alegre, Muniz Freire, Rio Pardo e Siqueira Campos, em 25 de outubro de 1933, que ,
em sua visita à escola masculina de Santa Cruz, fez “[...] o professor quebrar u ma
palmatória que se achava sobre a mesa, instrumento de tortura que é sempre uma
causa justa de diminuição de freqüência”.

Observamos que variados eram os motivos que ocasionavam a baixa matrícula e


freqüência dos alunos nas escolas, mas, segundo Esmeri no Gonçalves, em seu
relatório de 14 de junho de 1928, sobre sua inspeção às escolas dos municípios da
Capital, Cariacica e Espírito Santo, o decréscimo da freqüência percebido em muitas
escolas se deve à falta de compromisso, falta de idoneidade de seus d irigentes que,
muitas vezes, deixam de cumprir as obrigações pertinentes à sua função.

As medidas legais adotadas pelos inspetores quando se tratava de castigos


corporais aplicados pelos professores aos alunos era a sua suspensão de acordo
com o disposto no art. 177 do Decreto nº 6.501 de 1924, mas, nos relatórios e
termos de visitas analisados, as situações dessa natureza identificadas foram
poucas e as providências tomadas foram o cumprimento dos rigores da lei que
incluía a suspensão ou a remoção do/a p rofessora/a.

Nesse cenário, consideramos importante ressaltar que, de acordo com Horta (1998),
mesmo sendo defendida entre os intelectuais do final do império, a obrigatoriedade
escolar não foi aclamada como princípio federativo no começo da República. “D a
mesma forma, a gratuidade e a obrigatoriedade ficaram ausentes da Constituição de
100

1891” (HORTA, 1998, p. 15). Segundo Cury (1996, p. 78) , “Nem as emendas que
explicitavam o caráter obrigatório e gratuito do ensino público, nem as que
postulavam a existência exclusiva do ensino livre (sem contraface do ensino público
oficial) tiveram qualquer chance. Foram todas rejeitadas” (grifo do autor). Ainda de
acordo com Cury (1991, apud HORTA, 1998, p. 15):

Pode-se, neste momento, interrogar o porquê da não -aprovação da


gratuidade e de obrigatoriedade. A primeira e mais expressa razão se
encontra na idéia federativa. Postas em atribuições gerais de cada nível
administrativo, ficaria a cargo das Assembléias Constituintes Estaduais a
especificação mais detalhada des tas competências’ [...]. O Congresso,
através das bancadas estaduais, tinha preocupação com os encargos já
previstos e não queria auto -impor-se constitucionalmente mais um... A
gratuidade e a obrigatoriedade seriam aceitas nos limites da organização
federativa que abria espaços para as Constituintes Estaduais legislarem
sobre o assunto. Tratava -se, aqui, de buscar na descentralização os
caminhos da cidadania republicana. Aos estados federados competia, no
âmbito de suas prerrogativas tributárias, mais do qu e ‘animar’ as primeiras
letras, efetivá-las.

Não tendo a obrigatoriedade da educação incorporada à primeira Constituição da


República, coube aos Estados a tarefa de tornar efetiva a educação primária em
todos os aspectos. Mas, os Estados, conforme ap onta Horta (1988), não tinham
como, sozinhos, assumir o pesado ônus de expandir quantitativamente as escolas.
Por isso, nas Constituições Estaduais do começo da República, o ensino primário é
assumido como “[...] tarefa pública não obrigatória, exceto em S ão Paulo, Santa
Catarina, Mato Grosso e Minas Gerais” (HORTA, 1988, p. 15).

Assim, fica evidenciado que, de acordo com Romanelli (2006), a estrutura de ensino
existente até o momento nunca foi, de maneira geral, organizada tendo como base
um sistema nacional, e isso era, para a autora, o ponto de partida para a análise da
situação educacional. Ela menciona que “[...] O que existia eram os sistemas
estaduais sem articulação com o sistema central, alheios, portanto, a uma política
nacional de educação. Foi e sse, aliás, um dos pontos visados nos ataques do
chamado movimento renovador” (ROMANELLI, 2006, p. 131).

Movimento este que surgiu, segundo Saviani (2007, p. 193) , “[...] impulsionado pelos
ventos modernizantes do processo de industrialização e urbanizaçã o [...]”. Devido à
nova ordem econômica em implantação, continua Romanelli (2006), em que as
101

classes médias em franca ascensão reclamavam o ensino médio e as camadas


populares, o ensino primário, o movimento renovador, então, percebeu que era hora
de “[...] o Estado assumir o controle da educação e que, portanto, esta deveria ser
gratuita e obrigatória [...]” (ROMANELLI, 2006, p. 143). E foi nesse clima de ebulição
social que, em 1932, Fernando de Azevedo elaborou um documento assinado por
26 educadores brasileiros, intitulado, segundo Saviani (2007), “A Reconstrução
Educacional do Brasil – ao povo e ao governo – Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova”. Os reformadores divulgam o conteúdo do referido documento
atribuindo a desarticulação e fragmentação do sistema escolar à “[...] falta da
determinação dos fins de educação (aspecto filosófico e social) e da aplicação
(aspecto técnico) dos métodos científicos aos problemas de educação” (SAVIANI,
2007, p. 242).

A obrigatoriedade, a laicidade e a gratuidade d o ensino sob a responsabilidade do


“[...] Estado de garantir a educação contando com a cooperação das demais
instâncias sociais” (SAVIANI, 2007, p. 245) são apresentadas no segundo tópico no
texto do documento: “’[...] O Estado em face da educação’, em que se enunciam os
seguintes princípios: função essencialmente pública da educação; escola única,
laicidade, gratuidade, obrigatoriedade e co -educação” (SAVIANI, 2007, p. 244).

Por todas as questões abordadas no “Manifesto” em relação à educação, Saviani


(2007, p. 253) afirma:

O ‘Manifesto’ apresenta-se, pois, como um instrumento político, como é


próprio, aliás, desse ‘gênero literário’. Expressa a posição do grupo de
educadores que se aglutinou na década de 1920 e que vislumbrou na
Revolução de 1930 a oport unidade de vir a exercer o controle da educação
no país.
102

Dessa forma, a Constituição de 1934 explicita a vitória, quase em sua totalidade, do


movimento renovador que dedica um capítulo inteiro à Educação e Cultura. Em
relação à obrigatoriedade e à freqüên cia, de acordo com Horta (1998, p. 18), é
determinado, no texto definitivo da Constituição de 1934, que “[...] o ensino primário
integral gratuito e de freqüência obrigatória, extensivo aos adultos, e a tendência à
gratuidade do ensino educativo ulterior a o primário”. Mas essa Constituição teve
breve duração e, em 1937, outra era promulgada.

A Constituição de 1937 não privilegiou a educação como a de 1934, e “[...] Aquilo


que na Constituição de 1934 era um dever do Estado passa, na Constituição de
1937, a uma ação meramente supletiva” (ROMANELLI, 2006, p. 153). Assim, devido
ao fato de ter predominado a mentalidade conservadora e o regime ter se revestido
de características peculiares, o movimento renovador de educação teve então, de
“[...] entrar em hibernação [...], menos pela ação de seus membros, que continuaram
a lutar no terreno da ação pessoal, e mais pela movimentação das idéias, agora sem
condições de serem externadas” (ROMANELLI, 2006, p. 154).

O nosso objetivo com a narrati va que ora apresentamos é mostrar a dimensão


histórica da questão da obrigatoriedade da educação e o lugar que ocupou nos
debates ocorridos no final do Império e na Primeira República. Voltando ao início da
história da educação, veremos, segundo Horta (199 8, p. 11), que a Constituição
Imperial de 1824, apesar de garantir “[...] a gratuidade da instrução primária para
todos os cidadãos”, não traz nenhuma referência à obrigatoriedade escolar. Ela só
virá a ser “[...] reafirmada na lei de 15 de outubro de 1827 , que determina também a
criação de escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugares mais
populosos” (ROMANELLI, 2006, p. 154).

Assim, a legislação provincial que vigoraria no Município Neutro tornava a afirmar a


gratuidade escolar,

[...] à qual virá se acrescentar a definição da obrigatoriedade escolar,


entendida como obrigação de freqüência à escola primária, com previsão de
penalidades e multas a serem aplicadas aos pais ou responsáveis que não
matriculassem nela seus filhos, dentro da faixa etária prevista, em geral dos
sete aos doze ou quatorze anos de idade (HORTA, 1998, p. 11).
103

Na referida lei, havia o compromisso explícito do Poder Público de fornecer escolas


à população e, esta, por sua vez, teria o compromisso de freqüentá -las sob
imposição. Mas essa lei, ao mesmo tempo em que obrigava uma parte da
população, dos sete aos doze ou quatorze anos de idade a freqüentar a escola,
desobrigava a outra parte que não se encaixava nessa faixa etária.

Em maio de 1874, o então ministro J oão Alfredo defende, em frente à Câmara,

[...] a instrução elementar obrigatória para todos os indivíduos de sete a


quatorze anos, e também para todos os de quatorze a dezoito anos que não
adquiriram a dita instrução e que moram nas proximidades de um curso
diurno ou noturno para adultos (HORTA, 1998, p. 12).

Novamente, percebemos aqui a exclusão dos outros indivíduos que moravam


distante das escolas. No decreto de 19 de abril de 1879 , percebemos situação
semelhante, pois apesar de tornar obrigatória a instrução para as crianças de ambos
os sexos, com idade menor de 14 anos de idade, a medida tinha ressalvas: “[...]
atingia apenas os meninos situados em um raio de quilômetro e meio em torno de
uma escola pública e as meninas dentro do raio de um quilôm etro” (HORTA, 1998,
p. 12-3). Isso quer dizer que as crianças fora desses parâmetros estavam
desobrigadas dessa determinação. Contudo a aplicação das multas aos pais que
não enviassem seus filhos à escola permanecia e, também, a determinação de que
seriam fornecidas roupas às crianças pobres, sob a inspeção do Conselho Diretor da
Instrução Pública.

Contudo, apesar de a temática “obrigatoriedade escolar” estar sempre presente


entre os intelectuais no período imperial, como vimos, não foi contemplada na
primeira Constituição Republicana e tampouco na Constituição Estadual do Espírito
Santo, de 1892. Na de 20 de junho de 1928, que vigorou até 1935, estava previsto,
no art. 6º, que ”O Estado manterá a instrução primária como serviço gratuito e
obrigatório [...]”. Como era dever do Estado a gratuidade e a obrigatoriedade, cabia à
família o cumprimento da determinação matriculando e mantendo a freqüência das
crianças, de acordo com o previsto na legislação.
104

A Constituição de 11 de agosto de 1935, em vigor até 10 de outubro de 1945,


quando é promulgado o Decreto -Lei nº 8.063, que vigorou, portanto, durante os
cinco anos restantes do período em estudo, manteve sob a responsabilidade do
Estado a educação primária gratuita e obrigatória, cabendo à família o compromiss o
de cumprir o previsto.

O Regulamento da Secretaria da Instrução – Decreto nº 6.501 de 1924, em vigor na


década de 1930, previa a obrigatoriedade do “[...] ensino primário para todas as
creanças de 7 a 12 annos de idade” (ART. 58, p. 33) e no art. 66, a determinação de
que, no Estado, o ensino público, em todos os cursos previstos no dito
Regulamento, seria gratuito, leigo e obrigatório. Mas, ao mesmo tempo, estavam
previstos no art. 60 situações que desobrigava m a matrícula e, conseqüent emente, a
freqüência nas escolas oficiais:

a) os que receberem instrucção em domicilio ou escolas particulares;


b) os que residirem fóra do perimetro escolar determinado no § 1° do art.
58 – “ “[...] que abrange a area de dois kilometros para o sexo feminino e
de tres para o masculino, sendo o centro a escola pública”.
c) as creanças que sofrerem de incapacidade physica ou mental ou de
molestia contagiosa ou repugnante;
d) os indigentes emquanto não lhes fôr fornecido o vestuario indispensavel
á decencia e á hygiene.

Embora, no parágrafo único, houvesse a determinação de que todas essas isenções


deveriam “[...] ser provadas perante o Secretário da Instrução”, entendemos que a
obrigatoriedade não era para ser cumprida por todos, ou seja, a lei era contraditória,
incluindo e excluindo ao mesmo tempo. Pensamos, assim, que a dificuldade dos
inspetores em manter a freqüência nas escolas, apesar de todos os outros
problemas, tinha relação com a legalização da não matrícula e freqüência. Essa
situação, segundo Horta (1998) , perdura até os dias atuais, visto que as discussões
sobre a obrigatoriedade escolar nas constituições ainda é assunto debatido no meio
educacional.

A partir do exposto sobre os fatores que se consistiam em impedimentos para que a


freqüência dos alunos à s escolas fosse satisfatória, comprovamos que os
mecanismos utilizados, juntamente com a força da lei, não foram suficientes para
resolver tal problemática. Constatamos, ainda, que, apesar das denúncias, dos
105

discursos por aperfeiçoamento, de maneira geral, da escola, pouco se avançou e o


cunho obrigatório e gratuito da instrução primária exprimia o reconhecimento legal
do quanto era necessário instruir a população, apesar de não possuir, em nenhum
de seus aspectos, com exceção da obrigatoriedade da matrícul a, qualquer
mecanismo representado por obrigações exigíveis em determinados prazos, que
confirmasse um valor real capaz de produzir efeitos concretos e práticos aos
privilegiados pela norma. “A oferta de ensino e a qualidade dessa oferta situava -se,
em síntese, no campo da discricionariedade do administrador público, ladeada por
critérios de conveniência e de oportunidade” (MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO
DO RIO GRANDE DO SUL, 1999, acesso em 7 jan. 2008).

4.3 Os prédios e os materiais escolares

De acordo com Fiscarelli (2004, apud SOUZA, 2007, p. 169), o termo materiais
escolares sempre foi historicamente utilizado pelos profissionais da educação no
Brasil, para nomear “[...] o conjunto dos artefatos materiais necessários para o
funcionamento das escolas envolvendo mobiliários e acessórios, infra -estrutura do
prédio escolar, equipamentos e utensílios, destinados ao ensino das matérias [...]”.
Nesses equipamentos e utensílios estavam inclusos os livros de leitura, as cartilhas,
os globos, os mapas, os labor atórios de Química e Física, dentre outros. Contudo,
estudos produzidos a partir da segunda metade do século XX, particularmente em
Didática, delineou “[...] um saber sobre os materiais escolares de natureza prescritiva
e normativa restringindo o sentido d o termo, designando apenas os objetos usados
por professores e alunos no processo ensino -aprendizagem [...]” (SOUZA, 2007, p.
169).

Dessa forma concebidos, os materiais escolares receberam, ao longo do tempo,


diferentes denominações: recursos de ensino, m ateriais didáticos, recursos
audiovisuais, materiais auxiliares, materiais pedagógicos e outros. Embora
concordemos com a autora que o termo “materiais escolares” abranja o conjunto de
artefatos materiais utilizados no funcionamento da escola, estaremos, a o longo deste
trabalho, utilizando separadamente os termos: materiais didáticos ou pedagógicos,
mobiliário e condições dos prédios escolares, porque, nos documentos analisados,
106

esses eram os termos utilizados e assim optamos por mantê -los tal como são
apresentados na literatura da época.

Assim, os relatórios e os termos de visitas analisados apontam que as condições de


funcionamento das escolas e a falta de materiais escolares aliadas à falta de
preparo dos professores também afetavam a qualidade da educação. Vários
inspetores pediam, em seus relatórios, a criação de escolas em algum município
para poder suprir a necessidade da população e se referiam à precariedade em que
essas escolas se encontravam com relação ao espaço em que funcionavam e ao
aparelhamento didático e mobiliário.

Segundo Faria Filho (2003), a falta de espaços para o funcionamento das escolas
era visto também como um problema administrativo, pois muitas escolas eram
distantes umas das outras dificultando o trabalho de inspeção, e bo a parte das
verbas era gasta com pagamentos do professor e aluguel das casas onde
funcionavam as escolas. Dessa maneira, “[...] os professores não eram controlados,
os dados estatísticos eram falseados, os professores misturavam suas atividades de
ensino a outras atividades profissionais e, enfim, as escolas não funcionavam, em
boa parte das vezes literalmente” (FARIA FILHO, 2003, p. 147).

Entretanto, como assinalado no relatório de Archimimo Gonçalves, de 5 de


dezembro de 1928, em visita às escolas dos m unicípios de São Matheus,
Conceição da Barra, Santa Cruz e Riacho, havia regiões no Espírito Santo em que
as distâncias entre as escolas não eram grandes devido ao “[...] favoritismo político”.
Assim, havia “[...] escolas distantes 20 minutos uma da outra [...]”. Esse favoritismo
pontuado por Faria Filho (2000, p. 28) era, em boa parte das vezes, devido ao
interesse das autoridades estaduais em privilegiar uma determinada pessoa ou
região por conta da pressão das famílias que, para reforçar os argumentos de que
havia necessidade de uma escola na localidade, faziam abaixo -assinados “[...]
dirigidos ao governo do Estado lembrando a importância da instrução e o
compromisso, sempre reiterado, dos republicanos com a causa da educação
pública” (GONÇALVES, 1928).
107

Nesses locais, os professores falseavam os dados sobre a freqüência de alunos


para manter as escolas em funcionamento. Porém, conforme aponta o relatório, não
havia população suficiente para que a freqüência apresentada nos livros de
freqüência fosse um mí nimo de 30 alunos no fim do mês. No entanto,

Este inconveniente desaparece com a feitura criminosa da escripta que


fazem convencer que ali há meninos. O inspetor chega, lê e examina tudo.
Porém excetamente nesse dia não houve freqüência cujo motivo sempre é
allegado pela chuva, doenças diversas. Que providencia poderia dar o
inspetor nesse caso? Nenhuma! (GONÇALVES, 1928).

O previsto no art. 35 do Decreto nº 6.501 (1924, p. 27) era: “Nenhuma escola poderá
funccionar com matricula inferior a trinta alumno s e frequencia menor de vinte,
cabendo á autoridade escolar respectiva negar attestado ao professor que não
preencher essas condições”. Tomando as contribuições de Faria Filho (2000), diante
dos diagnósticos produzidos pela análise dos relatórios, os profe ssores eram
desleais com o governo fraudando os livros de registros de matrícula e freqüência de
alunos para que pudessem manter a cadeira funcionando.

A falta de inspeção e fiscalização contínua às escolas e ao professorado contribuía,


segundo os inspetores e autoridades do ensino, para que não houvesse mudanças
nesse sentido. Outros fatores que agravavam essa situação eram as péssimas
condições de trabalho dos professores, os materiais e locais inadequados para as
escolas, os baixos salários que recebia m, dentre vários outros.

Observamos a menção sobre o falseamento de dados estatísticos em vários outros


relatórios. Em alguns, a razão desse falseamento era para a manutenção das
escolas, em outros era para que o professor recebesse inte gralmente seus
vencimentos, como no caso da professora da Escola Mixta de Barra Mansa, citado
no relatório de Archimimo Gonçalves referente aos municípios de S. Pedro do
Itabapoana e Ponte do Itabapoana, em junho de 1929, em que diz que a escola

Em abril não funccionou um só dia e no entanto a professora serviu -se


criminosamente de presenças imaginárias, constituio seu mappa e com
estes foi ao Juiz Districtal em S. Pedro, onde obteve o attestado de
funccionamento afim de receber vencimentos indevidos mais uma vez.
108

Conforme mostra o relato, a professora já havia se utilizado desse recurso


anteriormente com a finalidade de receber seu salário, visto que legalmente só tinha
direito a vencimentos “[...] os professores cujas escolas tiverem uma frequencia
minima de 20 alumnos e uma matricula nunca inferior a 30” (DECRETO Nº 6.501,
ART. 169, p. 66). Segundo o inspetor, desde o ano de 1927, que a freqüência dessa
escola, mesmo sendo adulterada, vinha apresentando decréscimo. A escrituração
correta da escola, inc luindo com exatidão os mapas e boletins, se constituía em um
dos deveres dos professores, contido na disposição de nº 8 do Decreto nº 6.501 de
1924, conforme o art. 167.

O não cumprimento desse dever implicava multa para o professor “[...] quando for
inefficaz a de reprehensão [...] [e quando o professor não cumprir as disposições
contidas] [...] nos ns. 7, 8, 9, 10, 12, alineas a), b), c), 14, alineas a), b), c), 20 e 23
do art. 167 ”(ART. 176, p. 68) do mesmo decreto. Nessas disposições havia várias
determinações sobre os deveres dos professores, dentre as quais: distribuição dos
boletins aos pais, escrituração correta da escola, conservação dos móveis, livros e
utensílios da escola, envio de boletim mensal, mapa do movimento de sua escola e
outras.

No Capítulo VI, do já mencionado decreto, estava disposto ainda que “A falsificação


da escripta, em livros, boletins, mappas e informações á Secretaria da Instrucção,
autorisa depois de convenientemente provada em processo administrativo, o
Governo a demittir o funccionario culpado”. Como o inspetor não explica as medidas
adotadas no caso, se o professor já havia ou não sido repreendido, não foi possível
saber se houve ou não o cumprimento da lei. Acreditamos que a lei não foi
cumprida, porque não há regis tro nos documentos analisados de nenhum professor
que tenha sido demitido por falsear dados.

Sobre a deficiência dos espaços que eram inadequados para o funcionamento das
salas de aula, esse item foi amplamente abordado em praticamente todos os
relatórios e termos de visitas analisados nos anos de 1928, 1929 e na década em
estudo. Havia escolas, embora em menor proporção, que apresentavam boas
instalações, com salas amplas e arejadas. Alguns fazendeiros, mediante auxílio do
governo, propunham construir casa para o funcionamento de uma escola e outros
109

ofereciam espaços para essa finalidade – embora houvesse alguns completamente


inadequados. Há ainda, nos termos de visita, notas sobre proprietários de casas na
localidade que as ofereciam p ara a escola e hospedagem para a professora
nomeada.

Contudo havia escolas instaladas em casas cobertas de palhas, como era o caso da
Escola Mixta de Comboyos - 3ª entrância, relatado pelo inspetor Flávio de Moraes
em sua inspeção nas escolas de Riacho e Santa Cruz em 3 de agosto de 1928 e da
Escola Mixta de Timboaty, também de 3ª entrancia, do mesmo relatório. O agravante
é que esses não eram os únicos casos.

Os relatórios apontam situações em que as escolas ofereciam riscos para os alunos


e professores. Segundo Aristides Costa, em março de 1929, havia uma escola, em
Barra do Itapemirim, que

A casa é um velho pardieiro em ruínas, com as paredes pendidas para


dentro e o assoalho todo estragado. Paredes sujas internamente, com o
rebôco cahido aqui e alli ; portas que não se fecham, calçada cahindo. O
telhado pode ser comparado a uma peneira. Eis descripta a casa em que
está a escola masculina, arapuca apavorante, ameaça continua ás vidas
das creanças.

É no mínimo lamentável que um governo, ciente de que h avia escolas nas


condições acima citadas, ainda tenha como prioridade a expansão do ensino a
qualquer custo e a capacitação dos professores para atuar em escolas nessas
condições. A mensagem apresentada ao Congresso Legislativo, em 22 de setembro
de 1930, pelo presidente do Estado, Dr. Aristeu Borges de Aguiar, confirma a sua
preocupação com a formação, a fiscalização e estímulo ao desempenho dos
professores. Dizia o presidente que “[...] não bastaria crear escolas onde não
existissem ou fossem deficientes ou apparelhá-las convenientemente. Mas que era
preciso selecionar o professorado, velar pela efficiencia dos methodos de ensino,
fiscalizar e estimular o cumprimento do dever”.

Esse discurso revela que, teoricamente, havia pretensão do Poder Público em


resolver os problemas da educação. Contudo, era necessária uma visão mais ampla,
110

pois não adiantava ter professores capacitados para atuar em escolas sem
materiais, mobiliário e funcionando em espaços inadequados.

Alberto D’Almeida é outro inspetor que, em visita às escolas do município de


Anchieta, em 10 de abril de 1929, aponta as condições precárias da Escola de
Jacutinga a qual não estava funcionando na data de sua inspeção e complementa:

Esperava encontrar funcionando regularmente, estava completame nte


desorganizada, faltando todos os requisitos pedagógicos e hygiênicos, além
de sem frequencia (apenas 13, 4 alumnas e 9 alumnos) funcionando num
cubiculo apertado entre quatro paredes sem rebôco, onde a luz e o ar a
custo podiam penetrar; a casa coberta de palhas; sem água proxima, não
sendo bôa a de que serviam os locais que bebiam, as de cacimbas abertas
á margem dos pantanaes; enfim a escola procurando, alli agrupar creanças
para instruil-as, creava-lhes um espirito mais culto, ao passo que lhes
conduzia ao definhamento do corpo que só poderia reverter em maiores e
funestas consequencias.

A explicação do inspetor nos mostra o quanto continuava precária a situação de


algumas escolas no Estado, embora houvesse interesse desses profissionais em
buscar meios para melhorar a situação, com denúncias das condições em que se
encontravam as escolas e apresenta ção de sugestões que tornassem viáveis as
melhorias tão necessárias. Alberto D’Almeida, por exemplo, pede a transferência da
referida escola para outro lo cal. Mas isso, em algumas vezes, nem era possível
devido à falta de casas. Assim, as alternativas eram deixar funcionando desse jeito
ou fechá-la. A opção, na maioria das vezes, era deixá -la funcionando precariamente
até que outra fosse construída ou cedid a por alguma “alma bondosa” da localidade.

O inspetor Flávio de Moraes é mais um dos inspetores que também escreve, em um


relatório, de 6 de abril de 1929, que a Escola Mixta de São Vicente “Está installada
em um pardieiro que o dono da Fazenda cedeu, som ente até a epoca da colheita”,
reforçando a nossa afirmação de que muitas escolas ainda estavam longe de
atender ao prescrito na legislação, embora as reivindicações por melhorias fossem
constantes nos relatórios dos inspetores.

Também há registros, em um grande número de relatórios e termos de visitas, de


que o aluguel de muitas casas onde funcionavam as escolas era obra de caridade
de alguns proprietários dos prédios e fazendas. Segundo Araújo (1941, p. 3), no ano
111

de 1940, dos 855 prédios ocupados pe los estabelecimentos escolares existentes,


“[...] 74 pertenciam ao Estado, 2 á União, 18 aos municípios e 761 a particulares.
Destes últimos 496 foram cedidos e 240 alugados. Os restantes 25 pertenciam ás
entidades que mantinham as escolas particulares”.

Archimimo Gonçalves, em junho de 1929, confirma em seu relatório que “Há


proprietários, cujo procedimento é digno de louvor, facilitando gratuitamente casa e
pensão às professoras, dando casa gratuitamente para escolas, casas feitas
especialmente para tal fim [...]”. Mas que também havia outros proprietários que “[...]
primam pela ganância alugando verdadeiros pardieiros sem o menor principio de
hygiene e preceitos pedagógicos por alto preço, só por si tratar de funcionários do
governo”.

Sobre a situação dos prédios onde funcionavam as escolas, sabemos que a maioria
das escolas funcionava em casas desapropriadas para o fim a que se destinavam.
Havia outras, contudo, que, apesar de funcionarem em prédios próprios,
apresentavam irregularidades em suas insta lações, conforme relata o inspetor
Francisco Generoso da Fonseca, em 29 de setembro de 1930, na sua inspeção ao
Grupo Escolar Amancio Pereira, município de São Matheus:

Uma irregularidade a que infelizmente não pude e não poderei obstar é a


sahida dos alumnos, á hora do recreio, e, em consequencia tambem a das
professoras; as privadas do grupo não funccionam, tornando -se
indispensável deixar que os alumnos vão ás suas casas, por ocasião do
recreio.

Verificamos, assim, que o estado de conservação dos prédi os em que funcionavam


as escolas ia muito além das salas pequenas e anti -higiênicas, o que comprometia o
atendimento das necessidades fisiológicas dos alunos e dos professores pela
deficiência das instalações sanitárias

Em 12 de março de 1936, encontramos um relatório cujo nome do inspetor foi


rubricado, tornando-se impossível identificar a sua autoria. Nesse relatório, referente
à inspeção das escolas dos municípios de Santa Leopoldina e Santa Thereza, o
inspetor diz que a Escola Santa Júlia funciona em u m salão mal iluminado e mal
ventilado, pois só possui uma “portazinha” de entrada. Complementa: “[...] trata -se
112

de construir um predio novo, especialmente para escola. Acredito que não ficará em
promessa, pois a professora casou -se com um dos filhos do pro prietário da Fazenda
e, naturalmente, porá empenho nisso”. Dessa forma, fica claro que não havia, por
parte do governo, o compromisso de construir um prédio para o funcionamento da
escola e sim esperar que a iniciativa para essa situação partisse da profes sora e dos
interessados na manutenção da escola no local.

Francisco de Almeida Loureiro, diretor do Grupo Escolar “Virgílio Ramalhete”, em


seu relatório de 10 de dezembro de 1937, cuja escola se encontrava situada no
município de Timbuhy, assevera que as condições do mobiliário eram precárias, e

O predio onde funcciona o Grupo precisa ser substituido por um outro que
ofereça maior conforto á população escolar desta localidade, já pela
dimensão das salas de aula e pela defficiencia da installação sanitária ,
quanto ao pateo, apesar de ter a necessaria amplitude para os folguedos
das creanças precisa de uma providencia do poder competente para cercal -
o ou mural-o (LOUREIRO, 1937).

Pela forma de o inspetor se manifestar, pensamos que ele espera a construção d e


um novo prédio com salas de aula de maiores dimensões e instalações sanitárias
que atendam aos preceitos de higiene, visto que diz que o pátio da escola atende às
necessidades dos alunos só necessitando ser cercado ou murado. O pátio, de
acordo com Faria Filho (2000, p. 63), era um espaço que dava maior segurança aos
alunos por tirá-los da rua e evitava também “[...] que eles adentrassem à sala de
aula no mesmo ritmo que vinham da rua” e o muro representaria, material e
simbolicamente, a demarcação “[...] de um espaço próprio, apartado da rua e que se
auto-institui como significativo, ao mesmo tempo em que produz aquela como lugar
maléfico às crianças”.

No ano de 1938, consta no acervo do Arquivo Público apenas um relatório que


aborda as condições das sal as de aulas das escolas e a falta de materiais e de
mobiliário. Mas, há no acervo os termos de visitas dos inspetores que, embora
menos detalhados, pois são feitos em impressos próprios, nos fornece m
informações sobre a educação de uma maneira geral. O rel atório referido, com data
de 12 de dezembro, resultado da inspeção às escolas dos municípios de Alegre, Rio
Pardo e Siqueira Campos, que compreendem a 9ª região do Estado, pelo inspetor
113

José Celso Cláudio, afirma sobre a Escola Mixta de Gurgel: “A sala de aulas não é
uma sala em bôas condições higienicas, de vez que é a sala de visitas da séde da
Fazenda, além de faltar luz e ventilação suficiente. Entretanto, não existe outra em
melhores condições na localidade”. Sobre os materiais, diz o inspetor que est a
escola estava desprovida de tudo.

As escolas de Celina, continua José Celso Cláudio (1938), funcionam em um prédio


de propriedade da Prefeitura Municipal, contudo, “O prédio das escolas está em
pessimas condições, oferecendo sérios perigos aos alu nos, pois as paredes estão
cahindo aos pedaços”. Sobre a Escola Mixta de Córrego de Santa Luzia, o inspetor
em questão expressa que a professora tem enfrentado sérias dificuldades para
desenvolver seus alunos, devido à falta absoluta de material.

Esclarece ainda que a Escola Mixta de Bom Sucesso funciona em um porão da


residência do dono da fazenda, mas que se encontra em boas condições, sendo um
local limpo, com ventilação e luz suficientes. Sobre a Escola Mixta de Alto Santa
Catharina, diz o inspetor: q ue “A sala de aulas é a pior que já vi em toda a Região a
meu cargo”. Constatamos, assim, que , nessa zona, havia várias escolas que
necessitavam de cuidados em vários aspectos.

Somando a essas dificuldades havia, ainda, escola que funcionava em ca sa de


família, conforme relatado por Archimimo Gonçalves no seu termo de visita, em 31
de março de 1938. Segundo o inspetor, a Escola Mixta de Gurugica, município da
Capital, sob a alegação de que não havia outra casa, tinha a sala de aulas em uma
casa muito baixa, coberta de zinco “[...] introduzida no interior de uma casa de
família, o que impossibilita um perfeito e discreto funccionamento”, além de ser uma
sala pequena que não comportava todos os alunos matriculados.

Encontramos nos termos de visita s desse ano e de outros, várias denúncias de salas
de aulas pequenas, cobertas de zinco, anti -higiênicas, sem material e sem
mobiliário, conforme relata Archimimo Gonçalves em 23 de maio de 1938, sobre a
Escola Mixta Estadual de São João de Laranja da Ter ra, município de Affonso
Cláudio:
114

É lamentavel e contristadora mesmo a impressão que se tem ao entrar


nesta escola, ao ver-se mais de 60 creanças de joelhos para poderem
escrever sobre bancos toscos servindo de mesa – Faço aqui um appelo ao
Dr. Secretario no sentido de ser enviadas, pelo menos 25 carteiras.

É revoltante constatar que não havia, por parte d o Poder Público, uma ação objetiva
em relação à educação pública neste e nos outros casos estudados. Analisando a
situação descrita, nos perguntamos: Por que ele pede o envio de pelo menos 25
carteiras se havia na sala mais de 60 crianças para sentar? Mes mo não
especificando se eram carteiras individuais ou duplas, não comportava o número
total de alunos. E os outros? Continuariam se sentando no chão? Fariam
revezamento? Que critérios seriam adotados para alguns se sentarem nas carteiras?
Pensamos que essas situações não são condizentes com um espaço onde se
desenvolve o processo de ensino aprendizagem e as finalidades da educação, que
deveria propiciar o desenvolvimento, a formação de pessoas.

Infelizmente, esse não é o único caso absurdo. No ano de 193 4, encontramos um


relatório intitulado “Relatório Estatísticas – Victória, 3/11/34”. Esse relatório foi
assinado por uma pessoa cujo nome não foi possível ler, mas ele diz que recebeu
uma comunicação do Exmo. Snr. Diretor do Ensino Publico, pelo officio nº 581,
referindo-se à ligeira inspeção que essa pessoa fez pelo município de Alegre,
visitando especificamente as seguintes escolas: Valla do Souza, as três de Sabino
Pessôa e a de Colonia de S. Francisco.

Ele diz que todas as escolas visitadas estavam f uncionando regularmente e que as
escolas de Sabino Pessôa tinham taxa de matrícula e freqüência tão boas que o
deixaram muito bem impressionado. Mas o que realmente chamou sua atenção foi a
boa vontade dos pais, “[...] que matriculam seus filhos e concorre m com a respectiva
carteira que, feita embora de caixas de gazolina, suppre a falta de material que alli
é quasi absoluta”. Complementa ainda afirmando que há na localidade “[...] 14
carteiras em mau estado para 127 alumnos frequentes. No entanto, esses alumnos
não deixam de assistir ás aulas. Cada um tem sua carteirinha de caixote”. A outra
escola visitada, a de Volta da Ferradura, funcionava em um prédio “[...] construído
pelos moradores do logar especialmente para escola, e, conforme affirma a actual
professora, D. Vitalina Moffatti, doado ao Estado por escriptura publica”.
115

Apesar de não ter se constituído em regra comum, Arroyo (1985) e Faria Filho
(2000) asseveram que as autoridades republicanas pensavam que era preciso que a
população se envolvesse mais, cedendo lugar e mobiliário para o funcionamento da
escola, como forma de participar da educação dos filhos. Essa cobrança, algumas
vezes, recaía sobre a “municipalidade” e não sobre a população diretamente.

Vemos, nas duas últimas situações de scritas, que não faltava boa vontade e
esforços por parte das pessoas das localidades onde funcionavam as escolas.
Faltava, contudo, por parte do Poder Público, ações que pudessem viabilizar
melhores condições de trabalho aos professores e o atendimento às solicitações de
materiais e mobiliário pelos inspetores, pois, no decorrer do período estudado, as
denúncias sobre esses fatores foram constantes, demonstrando a inércia e a
omissão dos órgãos competentes em relação aos problemas relacionados com a
educação. Outro fator que vem reafirmar essa inércia e omissão é a comprovação
de que o governo não era responsável pela construção ou pagamento de aluguel de
todos os prédios onde funcionavam as escolas.

Nos relatórios e termos de visitas, há inúmeros casos d e locais cedidos pela


população da localidade para que as escolas pudessem funcionar. Assim, as verbas
destinadas a esse fim poderiam ser revertidas na aquisição de mobiliário e materiais.
Mas isso não foi feito, e as escolas continuaram com sérios problem as nesses
aspectos e, conseqüentemente, ineficazes na sua função, pois, segundo Buffa e
Pinto (2007, p. 174):

A forma pela qual ao longo dos dois últimos séculos os professores e


profissionais da educação estabeleceram a imprescindibilidade dos
materiais escolares para a concretização das práticas educativas,
justificando-os como condição do sucesso ou das dificuldades do trabalho
docente, relacionando-os às efetivas possibilidades de renovação
pedagógica, modernização e eficiência educacional, é suficient e para
perceber que a cultura material escolar não constitui tão -somente um
construto do historiador, mas está enraizada na própria forma escolar de
educação. Bastaria, para exemplificar, considerar alguns dispositivos
definidores da escola como o quadro -negro, o caderno, o livro didático, a
carteira ou as edificações escolares com várias salas de aula.

Acreditamos que essa ocorrência deveu -se às várias reformas no ensino que,
inspiradas em uma diversidade de propostas, cada vez mais voltadas pa ra o
116

educando e o processo de ensino e aprendizagem, foram tornando imprescindíveis


a utilização de materiais didáticos e pedagógicos e, conseqüentemente, a sua
necessidade para a efetivação do trabalho do professor.

Assim, vamos compreendendo que o ideá rio republicano e a crença na educação


não resultaram em medidas concretas para a melhoria da estrutura física e do
ensino nas escolas, pois ainda no final da década de 1930, se encontravam elas
funcionando em condições totalmente contrárias ao disposto no art. 85 do
Regulamento da Instrução – Decreto nº 6.501 (1924, p. 41), que definia que as salas
de aula deveriam satisfazer “[...] as condições de salubridade, segundo os preceitos
da hygiene [...]”. Como afirma Vasconcellos (1995, p. 84): “[...] Os propagantistas e
os principais membros do movimento republicano perceberam rapidamente que a
República brasileira não era aquela de seus sonhos”, que a equalização de
oportunidades por meio da instrução não se concretizaria, e os paradoxos existentes
não seriam encerrados devido ao desinteresse do Estado pelas prioridades sociais.

De acordo com Almeida (2004), o sonho liberal republicano se desfez com a


voracidade do capitalismo e não há sistema escolar que consiga superar as
diferenças existentes entre a po breza e a riqueza. Nesse sentido, a concretização
do projeto de escola pública, gratuita, democrática, laica e obrigatória, anunciado
pelos arautos do liberalismo no final do século XIX, não se realizou. Nascimento
(2006) nos chama a atenção para o fato d e que são diferentes os interesses dos
pobres e dos ricos e, mesmo que entendêssemos que são idênticos, as condições
expostas pelo Estado republicano, provavelmente, não fossem o bastante para dar
fim ao analfabetismo e menos provável ainda que pudessem at ender à população
em idade escolar que necessitava da instrução pública.

Constatamos, assim, que, aliada à precariedade das escolas, havia ainda a falta de
mobiliário e de material pedagógico para o ensino. Entretanto é interessante
observar que o Decreto nº 6.501, art. 102 (p. 45 -47) elencou os materiais de uso
coletivo que as escolas deveriam possuir e também se posicionou sobre as
condições das salas de aula. Porém tal definição legal era ignorada. Isso fica
bastante evidente, quando lemos nos rela tórios e nos termos de visitas dos
inspetores a insistência destes e dos professores em pedir ao secretário da
117

Instrução o envio desses materiais que, legalmente, já estavam previstos, a saber


(art. 102):

a) bancos e carteiras;
b) mesas e cadeiras;
c) armario para os livros e objectos de trabalho de classe;
d) tela ou quadro negro;
e) espheras e mappas geographicos;
f) mappas e colleções de systema de pesos e medidas;
g) mappas muraes para o ensino da leitura e de lições de cousas;
h) colleções de solidos geometricos e de model os para desenho;
i) relogio de parede e talha de filtro para agua;
j) contadores mecanicos para ensino de arithmetica;
k) cartas de Parker para o ensino de Arithmetica;
l) taboleiros de areia para o ensino de elementos de grographia.

Além dos materiais pedagógicos, o Decreto estabelece, para as escolas isoladas,


escolas reunidas e para os grupos escolares, uma série de materiais que têm por
finalidade dar uma organização administrativa às escolas . Esses materiais eram os
livros de matrículas, de promoção, de notas de aplicação, de faltas e
comparecimentos e de chamada para os alunos, de ponto para o pessoal docente
administrativo, de nomeação, posse e licença do pessoal, de termos de visitas e
inspeções, de registro de correspondência e ainda um tympano para cada classe.

O previsto na legislação sobre o provimento das escolas pelo Poder Público era
totalmente incoerente com a situação real, tanto no que se refere às condições dos
prédios onde funcionavam as escolas, quanto à questão dos materiais escolares e
mobiliário, pois poucas eram as escolas que funcionavam em prédios adequados e
eram providas de materiais e mobiliário.

Além de todos os materiais descritos acima, que eram de uso coletivo, consta ainda
no Decreto que: “Em todas as escolas haverá a mobilia esc olar fornecida pelo
Estado, e confeccionada de modo a attender ás exigencias dos preceitos da hygiene
escolar” (ART. 103, p. 47). Observamos que a legislação, no tocante às funções do
professor, regulamentava suas obrigações e era bastante exigente. Essas eram, a
maioria das vezes, cumpridas de acordo com a sua prescrição e, na “vigilância” dos
inspetores que controlavam suas ações. Entretanto, em relação à obrigação do
governo com as escolas, praticamente nada era cumprido.
118

A falta de materiais pedagógic os e de mobiliário foi o aspecto mais denunciado pelos


inspetores nos seus relatórios, conforme relata Flávio de Moraes, em 12 de abril de
1928,

Em todas as escolas que inspecionei, notei falta de material, o que vem de


certa forma retardando a marcha do s trabalhos escolásticos. O ensino é
ministrado com grande difficuldade, pois em umas escolas não se
encontram mappas para o ensino de geographia ou para história do Brasil;
em outras nota-se a ausência de cartas para o ensino de arithmética, de
solidos para o de geometria; e em algumas não há carta para Linguagem e
o ensino intuitivo. É necessário que sejam as escolas providas do material
de que carecem, pois sem o que não se pode ter umas tantas exigencias na
fiscalização do ensino [...].

Notamos, pela argumentação do inspetor, que, além de prejudicar o bom andamento


dos trabalhos escolares, a falta de materiais prejudicava também a inspeção nas
escolas, já que isso impedia de exigir uma boa qualidade no processo de ensino
aprendizagem. Assim, teria ele q ue se contentar com o que estivesse sendo feito, a
julgar pela falta de recursos pedagógicos, inclusive para trabalhar com o método em
vigor, o intuitivo, sobre o qual Souza (2007, p. 175) argumenta que “[...] teve uma
importância fundamental na consolidaç ão de uma sensibilidade para a necessidade
do uso e diversificação dos materiais didáticos na transição do século XIX para o
século XX”. Sobre o uso e diversificação desses materiais, Valdemarin (2004, p.
130) assinala que

Os objetos utilizados nas liçõe s de coisas são cadeiras, sinos e campas,


alfinetes, relógios, chapéus, sapatos, portas, cartas, chave, esponja, água,
leite, vidro, lã, cola, goma arábica, cortiça, com uma análise completa de
sua forma, suas partes constitutivas, seu uso, etc. Iniciando as lições sobre
as formas com objetos presentes no cotidiano da criança, o programa de
ensino progride até chegar a objetos industrializados ou elementos naturais,
isto é, fabricados ou postos a serviço do homem.

Dessa forma, podemos inferir que as reclam ações dos professores e dos inspetores,
em relação à ausência de materiais, fazia sentido, já que eram imprescindíveis para
a concretização das práticas educativas e se constituíam como condição do sucesso
ou de impedimento do trabalho docente. Para Cherve l (1990 apud FARIA FILHO,
2000), há uma estreita ligação entre os conteúdos disciplinares e as condições
materiais em que se dá o ensino. Tradicionalmente, a história do ensino ressaltou as
limitações das práticas pedagógicas pela falta de adequação dos lo cais escolares,
119

pela carência do material pedagógico, pelo sumário estado do mobiliário e também


pela questão irregular dos livros que as crianças traziam.

Nesse contexto, ela cria a impressão de que a pedagogia antiga, em grande parte,
era definida pelas considerações meramente materiais e que, se os professores de
antigamente tivessem tido melhores condições de trabalho, teriam se saído melhor.
Contudo não há nada que permita afirmar que se tivesse havido um melhoramento
repentino dos locais de funcionam ento das escolas, do material pedagógico e do
mobiliário, teriam ocorrido modificações substanciais e duradouras nas práticas e
nas normas do ensino.

Mas, conforme Faria Filho (2000), se, por um lado, não podemos desconsiderar a
adequação que existe entr e as tecnologias criadas ou apropriadas pelas professoras
e as condições em que acontece o ensino, é necessário observar que, de outro lado,
há também as mudanças profundas que ocorreram nas práticas de ensino
decorrentes da reforma do tempo e espaço escol ares e da organização geral do
trabalho escolar. “[...] Ao estabelecimento dessas mudanças, as condições materiais
das escolas punham, muitas vezes, impedimentos muito sérios e, desses,
professoras, diretoras e inspetores tinham plena consciência” (FARIA F ILHO, 2000,
p. 151).

A partir dessas considerações, fica evidenciado, portanto, pelo autor que, embora
sentida e expressa de diferentes maneiras pelos envolvidos no processo de ensino
aprendizagem, a falta de materiais adequados e em número suficien te para os
alunos se constituía em empecilho para a concretização de procedimentos
metodológicos.

A inexistência de mobiliário adequado para salas de aula era também outro aspecto
preponderante nos relatórios analisados. Luiz Edmundo Malisek diz, em 30 de abril
de 1929, que, na Escola Mixta de Caioába, não existem carteiras. “É pena não
existirem carteiras o que muito prejudica a bôa ordem dos trabalhos e bastante
contrária ás normas da pedagogia” contrariando, também, o disposto no art. 103 do
Regulamento da Instrução (1924). O inspetor complementa, em seu relatório ao
secretário da Instrução, que “Os alumnos na hora da escripta ajoelham -se no chão e
120

servem-se dos bancos à guisa de meza. As deformações physicas adquiridas nas


escolas pelo uso de material a nti-pedagógico e hygienico são bastante conhecidos
de V. Exª [...]”.

Em seu relatório de 10 de abril de 1929, o inspetor Alberto D’Almeida relata que a


Escola Mixta da localidade denominada Baixo Guand u encontrava-se totalmente
desprovida de material, cuja mobília escolar era “[...] composta de caixões de
kerosene, o que sobremaneira constitue um mao attestado para a instrucção pois a
escola está dentro de uma villa”. Archimimo Gonçalves também trata, em seu
relatório de 5 de dezembro de 1928, da prec ariedade em que se encontravam as
escolas dos municípios de Riacho e Santa Cruz, com relação à falta de mobiliário e
material didático:

Geralmente têm elas uma táboa comprida servindo de mesa para certo
numero de crianças, porém outras existem que n em dessa táboa dispõem e
assim escrevem no chão sem banco e sem mesa em uma posição
indescriptível e com gravíssimos perigos para hygiene individual e
pedagogica.

Novamente nos deparamos com fatos ocorridos nas escolas que demonstram o não
cumprimento no disposto no Regulamento da Instrução, sobre o provimento de
materiais pedagógicos nas escolas. Uma das exceções a esse fato é ressaltada por
Aristides Costa, em 20 de agosto de 1929, sobre uma das escolas existentes em Rio
Novo que era provida de quase t odo material elencado no Capítulo VI do
Regulamento da Secretaria da Instrução. Mas, segundo ele, havia outras escolas na
sede da localidade que “[...] estão a mingua, apezar dos reiterados pedidos dos
professores, do Delegado da Instrucção e dos inspetore s – todas elas precisam de
material”.

Assim, segundo o que foi possível concluir, por meio da leitura dos relatórios, as
escolas inspecionadas, no período de 1928 e 1929, apresentavam carência de
material de modo geral e algumas eram totalmente desprovidas desses recursos.
Aristides Costa diz, em 20 de agosto de 1929, que os professores e os inspetores
“[...] já desanimaram de pedir material”. Isso revela o descaso com a educação que
se mostrava cada vez mais distante do ideal, com graves problemas que exi giam
providências imediatas.
121

Mas as providências não eram tomadas e a falta de materiais, mobiliário e também


as condições de uso dos disponíveis nas escolas continuaram na década de 1930 a
ser assuntos constantes em quase todos os relatórios de inspetore s, conforme
assinala Archimimo Gonçalves, em 10 de abril de 1930, em seu relatório referente à
sua inspeção nas escolas do município de Santa Thereza, cuja zona não é
mencionada. Diz o inspetor que “[...] há falta de mobiliário em quase todas as
escolas, chegando mesmo a impossibilitar a marcha dos trabalhos escolares” e que
raras são as escolas que têm o material didático completo ou pelo menos o
necessário. “Há falta de tinta, lapis, giz, papel, canetas, etc, etc. e os professores
não acham onde adquirir, de formas que dessa falta resulta graves consequencias
em prejuizo do aproveitamento geral”.

As escolas dos municípios de Alegre, Muniz Freire, Rio Pardo e Siqueira Campos
também se ressentiam da falta de material, conforme assinala o inspetor técnico do
ensino em comissão, Dr. Lopes Ribeiro, em seu relatório do dia 25 de outubro de
1933: “Apesar da falta de material que se ressentem todas as escolas do interior, a
impressão da visita foi bôa” e sobre a falta de mobiliário diz a respeito da Escola
Feminina de Reeve, município de Alegre que “Nesta, como na maioria das escolas
do interior, as crianças sentam -se em caixões de querozene” (RIBEIRO, 1933).

No município de Rio Pardo, a Escola Mixta de Santana de José Pedro também era
desprovida de mobiliário e a solução encontrada para a problemática foi sugerida
pelo marido da professora, proprietário da fazenda onde a escola funcionava, que se
prontificou a fornecer a madeira necessária para o mobiliário, mas a mão -de-obra
deveria ser paga pelo gov erno. Contudo não consta no referido relatório se a
proposta foi aceita ou não.

No relatório de 12 de março já mencionado nes te tópico, cujo nome do inspetor não


foi possível identificar, encontra -se a denúncia feita por esse inspetor afirmando que,
no Grupo Escolar Penha, “Não há carteiras. Os alumnos se servem de duas grandes
mezas toscas e outros tantos bancos. O predio – um velho pardieiro, não é digno de
comportar uma escola [...]”.
122

Num segundo relatório, assinado por J. E. Tavar, enviado pela Deleg acia de Ensino
do município de Itapemirim, em 29 de abril de 1938, ao secretário da Educação e
Saúde Pública do Estado, consta que da visita feita à escola da cidade, foi possível
observar que o fato de ter a escola um número elevado de alunos a cargo de a penas
uma professora para ministrar -lhes o ensino era merecedor de atenção imediata por
parte da Secretaria, “[...] principalmente porque a escola tem por mistér alphabetisar
os matriculados, isto é, ensina -lhes o abecê e o seguimento que os habilita a pas sar
para a classe inicial das primeiras letras”.

Havia, nessa escola, segundo o autor do relatório, duas turmas de alunos: uma das
crianças de abecê, que era a turma A, e a turma B das crianças que já começavam a
“soletrar juntando as letras”. A providênc ia pedida pelo inspetor, então, é a
nomeação de outra professora para que o trabalho possa ser desenvolvido, pois “A
percepção de que o número elevado de uma única professora trazia sérios
“inconvenientes” para a qualidade do trabalho escolar, implicando ainda, [...] um
grande número de reprovações [...]” (FARIA FILHO, 2000, p. 145).

No termo de visita do inspetor Archimimo Gonçalves, em 26 de outubro de 1938,


sobre a Escola Mixta de Bananal, município de Itaguass u, há uma observação feita
por ele que diz:

Chamo a attenção de quem de direito para o estado em que se encontram


as escolas ruraes desprovidas de todo material didactico, mobiliario e de
consumo. Nestas condições nada se pode exigir das professoras que,
embora esforçadas, não apresentam resu ltados satisfatórios.

Uma vez mais, já praticamente no final da década de 1930, deparamo -nos com a
falta de mobiliário e materiais didáticos e pedagógicos, como entrave ao bom
andamento do ensino. Essas proposições evidenciam, portanto, que as condiçõe s
para o funcionamento das salas de aula, os materiais e o mobiliário previstos na
legislação não foram observados no decorrer d o período do estudo, pois não houve
medidas efetivas no sentido de propiciar a construção de prédios escolares e supri -
los com materiais necessários ao desenvolvimento das aulas, pois as melhorias só
seriam possíveis mediante a vontade política dos Poderes Públicos em torná -las
efetivas.
123

A criação e distribuição das escolas nos municípios do Estado é outro fato constante
nos relatórios dos inspetores. Em 4 de dezembro de 1928, Claudionor Ribeiro,
inspetor da 9ª zona, composta dos municípios de São José do Calçado, São João de
Muquy, São Pedro de Itabapoana e Ponte de Itabapoana, pede a criação de escolas
no lugar denominado Ligação , no município de São José do Calçado, dizendo ser de
“[...] absoluta necessidade a creação de uma escola mixta para o ensino das
primeiras letras”. Fato que nos leva a pensar que havia na localidade uma população
escolar de ambos os sexos carentes de esco las.

Contudo há, em outras localidades, a necessidade de transferir as escolas de um


lugar para outro, pela absoluta falta de freqüência, conforme propõe o inspetor da 6ª
zona, Aristides Costa, em 26 de julho de 1928, em inspeção às escolas da Fazenda
de Santa Cruz e Fazenda do Castello. Ele sugere transferir a escola de Santa Cruz
para o município de São Domingos pelo motivo citado, justificando que um
fazendeiro forneceria gratuitamente casa para a escola e hospedagem gratuita para
a professora.

Costa (1928) diz também que o dono da Fazenda das Palmeiras pede que seja
criada uma escola pública na localidade, onde existe grande número de crianças em
idade escolar e propõe ceder, sem cobrar aluguel, casa para a referida escola e
hospedagem sem ônus para a professora que for nomeada. Essas ações
apresentam-se totalmente contrárias àquelas em que os donos de casas cobravam
altas quantias pelos aluguéis, somente pelo fato de não ser de seu interesse a
criação de escolas na localidade.

Archimimo Gonçalves (1930) menciona ainda que a distribuição das escolas no


referido município de Santa Thereza não atende às exigências da população
escolar, porque o número de escolas fica aquém do que a população exige,
chegando mesmo a ser oferecido pelo Estado escolas a me nos da metade das
crianças em idade de freqüentá -las. “[...] Sobre esse factor contra a alphabetisação,
temos ainda a má distribuição das escolas, que parece obedecer mais a interesses
diferentes ao fim desejado”.
124

O inspetor complementa que ora há distri tos com escolas muito próximas umas das
outras oferecendo facilidades a uma população restrita e ora vêem -se áreas grandes
sem que haja uma só escola. Há, ainda, “[...] lugares que as escolas ficam distantes
umas das outras menos do que a distância prescri pta pelo regulamento que é um
raio de treis kilometros para cada” (GONÇALVES, 1930). As áreas onde quase não
há escolas não permitem que se ponha em execução a lei de obrigatoriedade do
ensino, porque há pais relapsos que não se importam com a ignorância d os filhos e
outros que, necessitando do trabalho braçal deles, vêm “[...] sempre allegando o
excesso de distancia, desarmando dess’arte o auxiliar da lei. Se entretanto, na
distribuição das escolas existentes, houvesse presidido justiça, estaria não só
resolvido, porem remediado o problema” (GONÇALVES, 1930). Diante de tal
problemática, propõe, então, o inspetor a transferência de algumas escolas de
determinados núcleos para outros.

A criação de escolas nos municípios de São Matheus e Nova Venécia, devid o ao


elevado número de crianças em idade escolar residentes em várias colônias nesses
municípios, é pedida por Flávio de Moraes, inspetor da 5ª zona, em 12 de abril de
1928, em inspeção nos referidos municípios. O distrito de Bananal, descrito pelo
inspetor Alfredo Lemos em 6 de maio de 1929, em seu relatório da inspeção feita às
escolas dos municípios de Cachoeiro de Itapemirim, subordinadas à 2ª zona, era
outro lugar carente de escolas. Lemos (1929) afirma que o lugar “[...] tem
necessidade de 3 escolas, onde constatei a existencia de 200 crianças em idade
escolar”.

Casos de conversão de escolas masculinas em escolas mistas , também aparecem


nos relatórios conforme apresentado no relatório de 4 de outubro de 1928, do
inspetor Claudionor Ribeiro, na inspeçã o feita à 9ª zona do Estado, composta pelos
municípios de São João do Muquy, São José do Calçado, Ponte de Itabapoana e
São Pedro de Itabapoana. O motivo da conversão é que, segundo o inspetor, “[...]
existe um considerável número de meninas que não têm es colas, onde devam
aprender as primeiras letras [...]” (RIBEIRO, 1928). Nesses casos específicos, a
simples conversão de escolas existentes resolvia o problema da população em idade
escolar necessitada de instrução.
125

Observamos, no decorrer da análise dos relatórios, que a referência à criação,


conversão e transferência de escolas de um lugar para outro desaparece dos relatos
dos inspetores a partir de 1931. Uma observação sobre criação de escolas aparece
em um relatório de 12 de dezembro de 1938, do inspet or José Celso Cláudio, em
inspeção às escolas dos municípios de Alegre, Rio Pardo, Siqueira Campos que
compreendem a 9ª Região.

Neste relatório, José Celso Cláudio (1938) diz ao secretário da Educação e Saúde:

Devo ressaltar aqui um fato de grande significação para o engrandecimento


da gestão de V. Exa. Na pasta da Secretaria da Educação e Saude:
enquanto o Espirito Santo procura resolver o problema educacional dentro
de suas fronteiras, creando escolas nos mais l onginquos logares, como sóe
acontecer com as escolas de Crissiuma, Laranja da Terra, Padaria e São
João do Príncipe, o Estado de Minas Geraes não tem feito nada nesse
sentido, pois percorrendo uma grande extensão territorial daquele Estado,
só encontrei uma escola (municipal) no logar denominado Pouso Alegre, na
estrada que dá acesso á cidade de Manhumirim.
O povo mineiro que reside nas fronteiras do municipio de Rio Pardo é
unanime em elogiar a acção do Governo do Espirito Santo.

A ressalva do inspetor em seu relatório deixa claro que o objetivo do governo em


relação às escolas era quantitativo para atender à demanda, mesmo nos municípios
mais distantes. Contudo já observamos que havia ainda algumas regiões em que a
quantidade de escolas existentes não ate ndia a toda população em idade escolar.

Araújo (1941), contudo, ressalta que é digna de aplausos a intenção do governo em


estender a rede de ensino, de modo que possa atender ao maior número possível
de crianças e fazer-se cada vez mais eficiente. Mas ale ga que falta ainda um
programa organizado e traçado com um tempo previamente estabelecido, que possa
ser avaliado após o seu final, para que o ensino seja mais produtivo e obtenha
melhor rendimento.

Assim, terminamos a análise sobre os prédios e o s materiais escolares d o período


em estudo, sem indícios de indicativos que pudessem trazer melhorias nas
condições dos espaços, provimento de materiais e de mobiliário para as escolas. No
tocante às mudanças, acreditamos que elas somente ocorrerão na educ ação e,
conseqüentemente, em todos os elementos que compõem a escola, a partir da
formação de uma nova consciência por parte do Poder Público que gerará um novo
126

discurso sobre o assunto e a implementação de políticas públicas viáveis, passíveis


de serem realmente efetivadas.

5 A ALFABETIZAÇÃO NO ESPÍRITO SANTO

Neste capítulo, trataremos especificamente sobre o aspecto que nos interessa mais
diretamente neste estudo: a alfabetização no período de 1928 a 1938. Assim,
apresentaremos, em prime iro lugar, algumas discussões sobre as cartilhas e os
livros de leitura “approvados pela Secretaria da Instrucção para uso das Escolas
Públicas, em 1924”. Ac reditamos que a discussão sobre esses materiais ajudará a
entender sobre a necessidade de adoção de cartilhas e de livros que atendessem às
necessidades de aprendizagem das crianças e, também, ao discurso renovador para
a época, referente aos métodos analíticos.

Em seguida, discutiremos a adoção do método intuitivo e a adequação das cartilhas


e dos livros de leitura a esse modelo de ensino. Na última parte deste capítulo,
127

discutiremos a implantação da escola ativa no Espírito Santo, os mecanismos


utilizados na sua propagação e preparação dos professores para a sua adoção e,
finalmente, apontaremos que a implantação da Escola Ativa não provocou
mudanças nos métodos de alfabetização. Por um lado, continuaram a ser adotados
os de marcha analítica e ainda utilizados pelos professores, nas salas de aula, os de
soletração e silabação.

A construção deste capí tulo, partiu das análises efetuadas dos requerimentos
recebidos pelo secretário da Instrução (1928 a 1938), do livro copiador de cartas do
secretário da Instrução, do livro de registro de cartas e impressos do Departamento
de Ensino Público expedidos pelo correio e dos livros de termos de aprovação de
propostas de material escolar da Secretaria da Instrução encontrados no Arquivo
Público do Espírito Santo e no material bibliográfico n a Biblioteca Central da
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), na Biblioteca Setorial do Centro de
Educação e na Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo. Buscamos,
ainda, informações complementares em instituições localizadas na cidade de Belo
Horizonte: Biblioteca Professora Alaíde Lisboa de Oliveira da Unive rsidade Federal
de Minas Gerais (UFMG), Biblioteca Estadual Professor Luís de Bessa e
Superintendência Regional de Ensino Metropolitana A.
É necessário pontuar que o acesso às fontes que poderiam indicar com mais clareza
quais métodos e materiais de ensin o (cartilhas, livros de leitura, etc.) foram
efetivamente utilizados pelos professores , no período, se constituiu em uma tarefa
particularmente difícil, pois, além de tomarmos conhecimento da inexistência de
algumas por terem sido destruídas por conveniênc ia das situações e/ou pelo tempo,
verificamos que a falta de conservação e de restauração têm possibilitado a
destruição total ou parcial por traças de muitas fontes. Com relação às fontes
acessadas, encontramos dificuldades em reuni -las, porque se encontram dispersas,
em precárias condições de preservação e sem tratamento arquivístico apropriado.
Contudo, foi possível adequarmos os objetivos propostos , inicialmente para esta
pesquisa, ao conjunto de materiais localizados, viabilizando a sua realização.

Assim, diante das limitações decorrentes do acesso às fontes, analisaremos


somente o material disponibilizado e não todo o material existente no Arquivo
Público do Estado do Espírito Santo e constante na Pasta denominada Fundo
128

Educação, devido à impossibilid ade de manuseá-lo no presente momento.


Posteriormente, com tratamento adequado e se o Poder Público se interessar por
preservar a memória cultural e, especialmente, a memória da educação no Espírito
Santo, esperamos que essas fontes venham a ser disponibil izadas para os
pesquisadores da área.

Dessa maneira, a nossa análise sobre a alfabetização no Espírito Santo , no período


proposto, será desenvolvida a partir dos relatórios e dos termos de visitas dos
inspetores encontrados no Arquivo Público Estadual. En tretanto, antes de
começarmos a tratar essa questão, é preciso evidenciar, por meio dos trabalhos
desenvolvidos por outros autores em outros estados (São Paulo, Rio Grande do Sul
e Minas Gerais), os principais temas discutidos acerca da alfabetização n o período
delimitado para o estudo. Lembramos que esses trabalhos já foram detalhados, no
capítulo 2: “Contextualização do estudo”.

Mortatti (2000) registra em seu estudo histórico acerca da alfabetização no Estado


de São Paulo que, em meados de 1920, te m início um movimento de disputa entre
os que defendiam o método misto (analítico -sintético ou sintético-analítico) e os
defensores do tradicional método analítico, com uma tendência crescente de o
método tornar-se algo relativo. Tal fato, segundo a autora , implicava na utilização de
qualquer um dos métodos: analítico, sintético, misto ou eclético, desde que a
maturidade individual da criança e a necessidade de rendimento e eficiência fossem
respeitadas. O resultado de tal posição é um “ecletismo processual e conceitual”,
que permeia as tematizações, normatizações e concretizações analisadas pela
autora. Nesse contexto, a autora diz que há a fundação de “[...] uma nova tradição:
alfabetização sob medida” (MORTATTI, 2000, p. 26), pois o mais importante era
escolher um método de ensino que se adequasse aos interesses e capacidades
intelectuais da criança.

O estudo de Trindade (2004) sobre as cartilhas de alfabetização utilizadas na


Instrução Pública no Estado do Rio Grande do Sul evidencia que, por m eio do
Decreto nº 3.898, de 4 de outubro de 1927, um novo regulamento da instrução foi
baixado trazendo novas orientações acerca do ensino da leitura, visto que o método
oficializado entre 1890 e 1930 era o método João de Deus. Tais orientações se
129

referiam inicialmente à utilização desse método que não constaria mais “[...] na
seção das bases gerais juntamente com orientações de uso do método intuitivo (art.
2º) e do modo simultâneo (art. 4º)” (TRINDADE, 2004, p. 123).

Isso quer dizer, segundo a autora, q ue a orientação para a utilização do método


João de Deus passaria a constar a partir de então, “[...] somente no regimento para
os estabelecimentos públicos do Estado (Decreto nº 3.903), que disporia, inclusive,
sobre a possibilidade de ser usado um outro método de leitura na 1ª seção”
(TRINDADE, 2004, p. 123). Assim, pelo Decreto nº 3.903:

Permanecem as orientações quanto à adoção do método intuitivo e do


modo de ensino simultâneo, quanto à adoção do método de leitura João de
Deus ela é mantida em parte, uma vez que surge a possibilidade de adotar
um novo método de leitura, desde que permitido pela direção do ensino,
embora não haja referência mais clara quanto à instância em que tal
decisão poderia ocorrer (TRINDADE, 2004, p. 123).

Trindade (2004) diz ainda que, em 1929, já eram percebidos discursos sobre o
método de ensino intuitivo e da importância de valorizar a infância como um mundo
diferente daquele do adulto. A autora se refere ao trabalho de Mortatti (2000) e
procura localizar, no Rio Grande do Sul, os efeitos dos discursos por ela citados,
afirmando que “[...] com algumas diferenças temporais e de interpretação, os
mesmos circularam e foram efervescentes entre nós, gaúchos/as” (TRINDADE,
2004, p. 325).

A continuidade da orientação legal da utilização do método João de Deus , já indica


uma diferença entre os preceitos legais que estive ram em vigor na Primeira
República, no Estado do Rio Grande do Sul e na Capital Pauli sta, pois, nesse último,
a influência tanto do método quanto da ca rtilha João de Deus ocorreu antes,
compreendendo o final do Império e princípio da República.

A segunda diferença diz respeito às interpretações sobre “A hegemonia do método


analítico e a sua revisão mediante as disputas entre modernos e os mais modernos
[...]” (TRINDADE, 2004, p. 325) que, também, se diferem nos dois Estados. No
momento em que na capital paulista , o método João de Deus é compreendido como
fonético, no Rio Grande do Sul , “[...] o método era reconhecido, ainda, como
130

insuperável e se distinguia dos métodos fonéticos vistos na República do Uruguai e


reconhecidos como analítico -sintéticos” (TRINDADE, 2004, p. 325). Somente no final
da década de 1920 é que o método João de Deus sofre uma revisão, “[...] passando
de método analítico, pela ênfase na palavra, a método sintético, pela ênfase na
análise fonética” (TRINDADE, 2004, p. 325). Esse fato ocorre com a adoção do
método de leitura do professor José Henriquez Figueira, um uruguaio, que
reconhece o seu método como analítico -sintético.

A partir dessas proposições e das considerações de que os métodos analíticos


partem de unidades maiores ( palavras, frases ou textos) e os métodos sintéticos
partem das unidades menores (fonemas, letras ou sílabas), podemos inferir que,
apesar das diferenças tempora is e de interpretação, no final da década de 1920, os
métodos analíticos são adotados nos dois Estados. Em São Paulo, porém, ocorrem
debates entre os defensores dos métodos analíticos e é inaugurada a visão de que
esses deveriam estar de acordo com o dese nvolvimento infantil.

Maciel (2003b) afirma, em seu trabalho sobre a história da alfabetização nas escolas
de Minas Gerais, que a aprovação do método global, a partir do fin al do ano de
1920, ocorreu devido ao fato de ser a época propícia às “novas metod ologias” e “[...]
ao fato de os idealizadores da Reforma buscarem inspiração no movimento de
renovação educacional, que ocorreu em vários países europeus e americanos, nos
primeiros anos do mesmo século” (MACIEL, 2003 b, p. 16).

A ênfase nas inovações meto dológicas, segundo a autora, era o elemento que
norteava a Reforma Francisco Campos, no ano de 1927, que trazia

[...] uma mudança no paradigma da aprendizage m da leitura e da escrita,


por isso podemos considerá -la como um marco na história da alfabetizaç ão
em Minas; a partir dela, é adotado o método global par a a alfabetização de
crianças (MACIEL, 2003b, p. 16).

Maciel (2003b) diz ainda que é difícil determinar o término da história da adoção do
método global na Reforma de Francisco Campos, sendo possíve l demarcar apenas
o momento inicial da sua adoção, porque “[...] uma mudança não ocorre
131

instantaneamente” (MACIEL, 2003b, p. 16). Não há como ignorar que o “preâmbulo”


da Reforma já vinha sendo sentido nos anos anteriores a 1927.

O método global em Minas Gerais, conforme disposto no Programa de Ensino de


1927, é uma adaptação do método Decroly, “[...] a título de sugestões de atividades
para os professores. As idéias decrolyanas , também, estão muito presentes nas
salas de aula, nos materiais pedagógicos, n o planejamento escolar [ ...]” (MACIEL,
2003b, p. 17). A autora complementa que havia ainda, nas Instruções e Programas
do Ensino Primário do Estado, no ano de 1927, a determinação de que nada seria
ensinado por meio de letras ou sílabas. O livro adotado se ria recebido pelos alunos ,
quando tivessem aprendido, no quadro -negro, determinada quantidade de lições e
apresentassem segurança no conhecimento das atividades referentes às lições, sem
que houvesse decoração.

O método global é usado como sinônimo de m étodos analíticos. Assim sendo,


partem de unidades maiores ( palavras, frases ou textos) sem, contudo, desprezar a
análise das unidades menores do texto , ou seja, a síntese (sílabas, letras ou
fonemas). Dessa forma, podemos afirmar q ue, no Estado de Minas G erais, no final
da década de 1920, começam a ser utilizados os métodos de ma rcha analítica-
sintética, havendo a presença do princípio da “intuição”, já que esse é um dos
princípios que caracterizam o método de Decroly, cujos pressupostos estão
presentes na adoção do método global em Minas Gerais a partir do ano de 1927.

Tomando por base o conjunto de fontes analisadas neste trabalho – os discursos


produzidos no período, os relatos dos inspetores de ensino contidos nos relatórios,
os termos de visita e as C artilhas –, podemos afirmar que, também, no Espírito
Santo, já vinham sendo adotado métodos e cartilhas de marcha analítica. Dessa
forma, as discussões que ocorriam, em outros Estados brasileiros, sobre os métodos
analíticos, também, se desenvolveram no Es pírito Santo.

5.1 As cartilhas e os livros de leitura adotados em 1924


132

Nos documentos encontrados, no Arquivo Públ ico do Espírito Santo, há registros


sobre o alto índice de analfabetismo nas escolas. Como escrito por Esmerino
Gonçalves, em 6 de setembr o de 1928, a Escola Mixta de Cambury apresentava
problemas com relação à alfabetização das crianças. Nessa escola, a situação era
tão preocupante que, segundo o inspetor, ele próprio chegou a dar aulas sobre o
método mais fácil e rápido de alfabetização pa ra a professora, pois, numa sala de 30
alunos, apenas quatro eram alfabetizados.

Tal situação não ocorria apenas nessa escola, pois, em outros relató rios, há
registros de recomendação dos inspetores aos professores para que recorressem a
esse método, para solucionar o problema da grande quantidade de alunos
analfabetos. Nos livros de nºs 49 e 50 de registros de materiais e móveis escolares
fornecidos às escolas do Estado , no ano de 1928, encontram -se demonstrações de
que foram enviados exemplares da cartilha de Mariano de Oliveira – “Ensino- Rápido
da leitura” 1 – a várias escolas (Foto 5).

A Escola Mixta de Mundo Novo do município de Cachoeiro de Itapemirim recebeu 20


exemplares, em 25 de junho de 1928; a masculina de Jucutuquara, município da
Capital, em 13 de junho de 1928, recebeu seis exemplares, entre outras. Há ainda
uma lista manuscrita, sem data, de uma professora da escola feminina de Santa
Angélica no município de Alegre, em que consta o pedido de 20 exemplares da
Cartilha.

1
“Publicada pela primeira vez em 1917, essa cartilha conheceu sucesso extraordinário, atingindo
2.230 edições em 1996 e mais de 6 milhões de exemplares vendidos . Conforme dados da editora
Melhoramentos, até 1941 ela já havia vendido mais de 1 milhão de exemplares, mantendo a média
de tiragem por ano acima dos 100.000 exemplares até 1969. A partir de 1970 a produção caiu
drasticamente para 40.000 exemplares e cheg ou em 1996 com a tiragem de 1000 exemplares”
Disponível em: < http://www.crmariocovas.sp.gov.br/obj_a.php?t=cartilhas01 >. Acesso em: 7 jan.
2008.
133

Foto 5 : Capa da Cartilha de Ensino-Rápido da Leitura


Fonte: : http://www.crmariocovas.sp.gov.br/obj_a.php?t=cartilhas01

O método de ensino rápido da leitura tinha como suporte a “Cartilha Ensino -Rápido
da Leitura de Mariano de Oliveira”. Segundo Mortatti (2000), essa cartilha traz , na
página de rosto, uma chancela confirmando a sua aprovação e adoção oficial no
Estado do Espírito Santo. De acordo com essa autora,

Certamente em razão da preocupação com a “rapidez” do ensino da leitura,


essa Cartilha se inicia com palavras, sempre acompanhadas de estampas
em letra manuscrita vertical, que vão sendo separadas em sílabas,
apresentando-se ao final da página, as vogais. Nas lições seguintes,
inicialmente são apresentadas palavras, seguidas de sua divisão em sílabas
e reorganização em frases (não historietas), sendo depois novamente
separadas e divididas em sílabas. A letra de imprensa redonda é introduzida
à página 12 e as historietas, à página 14, misturando -se também os dois
tipos de letras. Ao final da Cartilha, é apresentado o alfabeto maiúsculo e
minúsculo, em letra de imprensa e manuscrita (MORTATTI, 2000, p. 102,
grifos da autora).

Analisamos um exemplar da Cartilha de Ensino -Rápido da Leitura (Foto 6). Pela


ilustração da capa e forma como são apresentadas as lições, verificamos que é uma
edição diferente da que foi analisada por Mortatti (2000) . A cartilha em questão não
traz informações sobre a edição e o ano em que foi editada. Verificamos que ela não
tem prefácio e não traz orientações sobre a forma de sua utilização pelo professor
e/ou aluno.
134

Foto 6: Capa da Cartilha Ensino-Rápido da Leitura – outra edição


Fonte: Acervo da Biblioteca Profª Alaíde Lisboa de Oliveira - UFMG

Composta por 36 lições, a Cartilha , de 48 páginas, tem sete lições em letras


manuscritas, 18 em letras de imprensa e, em 12 lições, aparecem expressões
intercaladas com letras manuscritas e de imprensa. Na primeira lição (Foto 7), são
apresentadas palavras em letras manuscritas, iniciadas com as vogais e ilustrações
que correspondem às palavras. Ao final, são apresentadas as vogais. Entendemos ,
assim, que a criança é levada, inicialmente, a efetuar a leitura das palavras e, em
seguida, a decompô-las em sílabas, para finalmente, aprender as vogais que
formam as palavras.

Foto 7: Primeira lição da Cartilha de Ensino -Rápido da Leitura


Fonte: Acervo da Biblioteca Profª Alaíde Lisboa de Oliveira - UFMG
135

A partir da 2ª lição (Foto 8), são apresentadas sentenças relacionadas com as


ilustrações e às palavras-chave. As historietas aparecem, em forma de sentenças
numeradas, a partir da 3ª lição (Foto 8). Entretanto, elas têm como finalidade ajudar
na memorização das sílabas e fonemas que são ensinados.

Foto 8: Segunda e Terceira lições da Cartilha de Ensino -Rápido da Leitura


Fonte: Acervo da Biblioteca Profª Alaíde Lisboa de Oliveira - UFMG

O autor apresenta ainda palavras no diminutivo , principalmente na lição das páginas


28 e 29. Primeiramente, expõe a ilustração de um pintinho e a expressão “Um
pintinho”, depois duas ilustrações e a expressão “Dois pintinhos, e da mesma forma
com três pintinhos. Ao lado , a ilustração de um pato, a expressão “Um pato” e, a
seguir, uma historieta relacionada apenas com os “pintinhos”. Dessa forma, é
possível observar a preocupação com o ensino de aspectos gramaticais desde o
início da alfabetização.

A cartilha possui, até a página 47, ilustrações dos objetos representados pela s
palavras escritas; depois, elas representam ações escritas nas sentenças que são
trabalhadas. Nas páginas 46 e 47 (Foto 9), encontra-se exposto o alfabeto
maiúsculo e minúsculo em letras impressas, uma ilustração e uma palavra
correspondente a cada ilust ração que tem a sílaba inicial do nome da letra do
alfabeto em destaque, separada em sílabas. Na página 48 (Foto 10), o autor mostra
136

o alfabeto minúsculo e maiúsculo, os numerais de 1 a 9, sendo o 0 o numeral final,


em letras manuscritas e impressas.

Foto 9: Penúltima lição da Cartilha de Ensino -Rápido da Leitura


Fonte: Acervo da Biblioteca Profª Alaíde Lisboa de Oliveira - UFMG

Foto 10: Última lição da Cartilha de Ensino -Rápido da Leitura


Fonte: Acervo da Biblioteca Profª Alaíde Lisboa de Oliveira - UFMG

Averiguamos ainda que, na cartilha analisada, há lições cujos conteúdos poderiam


ser relacionados com os de outras disciplinas escolares, como: Geografia,
Matemática e Ciências.
137

A utilização dessa cartilha no Espírito Santo é confirmada pelos dado s descritos


anteriormente sobre pedidos e notificações de envio da cartilha para as escolas.
Podemos concluir ainda que o método de ensino concretizado na Cartilha é visto
pelos inspetores como eficiente para ser aplicado nas escolas em que havia altos
índices de analfabetismo entre as crianças e, por isso, importante para aqueles que
necessitavam ser alfabetizados num espaço menor de tempo.

Além disso, a adoção da cartilha estava prevista, no Programa de Ensino das


Escolas Isoladas (1924, p. 23), anexo a o Regulamento da Instrução (Decreto nº
6.501/1924), juntamente com outros livros e car tilhas:

Livros approvados pela Secretaria da Instrucção para uso das Escolas


Públicas
Cartilha Analytica do professor Bodart Junior.
Cartilha de Suzette Cuendet.
Cartilha de Gomes Cardim.
Cartilha das Mães de A. Barreto.
Cartilha de Mariano de Oliveira.
Leitura Rápida de Mariano de Oliveira.
1º livro de leitura de João Kopke.
Leituras preparatórias da serie <Corações de Creanças> de Rita
Macedo.
Paginas Infantis de Mariano de Oliveira.
1º livro de Erasmo Braga.
1º livro de Puiggari Barreto.

Além desses, encontram -se, ainda, na lista, nomes de outros livros aprovados para
as demais séries da escola elementar que , por não serem pertinentes à temática do
estudo, optamos em não mencioná -los. Nesse contexto, é relevante ressaltar que os
livros de registros de móveis e mat eriais didáticos enviados às escolas, referentes
aos anos de 1930 até 1938, não foram encontrados no Arquivo Público. Por isso,
não foi possível verificar sobre a circulação de cartilhas nesses anos. Nos livros de
nºs 49 e 50, em que se encontram os registros de materiais e móveis fornecidos às
escolas no ano de 1928, constam ainda que foram enviados às escolas o “Primeiro,
o Segundo e o Terceiro livr o de Erasmo Braga”, “Cartilhas de Higiene” e o livro de
“Leituras Intermediárias de Erasmo Braga”. Examinamos um exemplar da sexta
edição da “Cartilha Analytica de ensino da leitura” do professor Bodart J únior. Na
capa da cartilha (Foto 11), há uma chancela em que lemos:

Approvada pelo Conselho Superior de Ensino do Estado do Espírito Santo e


adoptada officialmente nas escolas publicas, pelo Decreto nº 4 .660, de 3 de
138

Dezembro de 1920. Approvada e adoptada officialmente no Estado do Rio


de Janeiro.

Impressa na “Typografia Coelho” (Foto 12), localizada em Vitória, no ano de 1936,


esse exemplar traz na folha de rosto um texto intitulado: “Excerpto [sic] do parecer
sobre a ‘Cartilha Analytica’, do prof. Bodart J únior”. Esse parecer favorável à
utilização da referida cartilha foi escrito na cidade de Niterói , em 24 de setembro de
1923, e é de autoria de Armando Gonçalves, inspetor escolar. Ao final do parecer ,
encontram-se algumas considerações sobre o ensino da leitura enfatizando a
importância de iniciá-lo pelas frases, indicando o autor como Faria de Vasconcellos e
a referência à página 342.

Foto 11: Capa da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart J únior


Fonte: Acervo particular da Profª Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo
139

Foto 12: Verso da capa da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart Junior
Fonte: Acervo particular da Profª Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo

Há, ainda, nesse exemplar, uma manifestação do autor dirigida aos “Illustrados
Collegas”, em que se refere à forma de organização do material; à sua pretensão de
preencher a lacuna em relação à dificuldade de aquisição de livros pela que stão de
serem raros os adotados e, também, porque, quando se tornavam acessíveis , os
preços eram exorbitantes. O autor finaliza a sua manifestação recomendando
procedimentos a serem adotados para o ensino da leitura por meio do método
analítico.

A cartilha de 56 páginas traz, na primeira delas, a foto de uma menina com uma bola
(Foto 13). Na página seguinte, é apresentada a 1 ª lição (Foto 14), sem ilustrações
com quatro sentenças relacionadas com a foto em letras impressas e uma das
sentenças escrita em letras manuscritas compondo uma historieta. Abaixo,
separadas da 1ª parte por um traço – como mais 29 das 43 l ições que compõem a
cartilha –, são apresentadas mais cinco sent enças também associadas à imagem,
em letras impressas e mais uma sentença em letras manuscritas. A 2ª lição , é
composta, na primeira parte, de sete sentenças e seis na 2ª parte, em letras
manuscritas ainda se referindo à foto da menina, c om repetição de palavras -chave.
140

Foto 13: Primeira página da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart Junior
Fonte: Acervo particular da Profª Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo

Foto 14: Primeira lição da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart Junior
Fonte: Acervo particular da Profª Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo

A 3ª e a 6ª lições, intituladas “Recapitulação e Analyse” (Fotos 15 e 16), trazem, em


duas colunas, sentenças escritas em le tras impressas e, em três colunas, palavras-
chave. Abaixo das colunas de palavras da 3ª lição, estão escritas as mesmas
palavras-chave em duas colunas e mais uma palavra nova, separadas em sílabas e ,
ao lado delas, as letras que formam as sílabas dessas pa lavras. Esse procedimento
é repetido em mais três lições. No final da página, são dispostas em letras
minúsculas e impressas as vogais em ordem, mais a letra y na 1ª linha , abaixo as
141

letras do alfabeto (sem as vogais), e a letra k incorporada nessa disposi ção. A 6ª


lição apresenta diferenças em relação à terceira: nas duas colunas onde são
apresentadas as palavras -chave separadas em sílabas, uma dessas palavras não
aparece; ao final da página, as vogais mais a letra y são organizadas de forma
alternada na 1ª linha e, abaixo, em três linhas, são dispostos os encontros vocálicos.

Foto 15: Terceira lição da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart Junior
Fonte: Acervo particular da Profª Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo

Foto 16: Sexta lição da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart Junior
Fonte: Acervo particular da Profª Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo

O material é ilustrado com fotos e desenhos relacionados com o conjunto de


sentenças que formam as historietas ou as palavras apresentadas, mas não são
142

todas as lições que apresentam ilustrações. Há , nessa cartilha, seis lições em letras
manuscritas e quatro em letras de imprensa que ocupam a página inteira, sem a
divisão em duas partes. A última lição traz , na 1ª parte, quatro colunas de palavras
e, na 2ª parte, três colunas em que algumas palavras da 1ª parte se repetem,
separadas em sílabas. As atividades assim dispostas atendem aos preceitos do
método analítico, pois, a partir da sentença, chega-se às unidades menores: a
palavra, a sílaba e, depois, ao fonema. Como na Cartilha de “Ensino -Rápido da
Leitura”, a Cartilha Analítica de Bodart Junior também apresenta conteúdos que
podem ser relacionados com outras disciplinas, como Ciências, Matemática e
Geografia.

Na busca pelas cartilhas aprovadas, no programa de ensino mencionado, nã o


encontramos registro sobre a Cartilha de Suzette Cuendet. As informações obtidas
sobre a “Cartilha Infantil pelo método analítico”, de Carlos Augusto Gomes Cardim
(Foto 17), são bastante restritas. Conforme averiguamos, a primeira edição desse
material data de 1908 e , segundo Falcão [200-], constava na “Relação de livros
escolares fornecidos pelo Governo nos anos de 1908 a 1912 publicada na exposição
sobre os negócios do Estado, no governo do Presiden te do Estado Jeronymo
Monteiro”. Conforme a mesma autora, foi fornecido um total de 1.413 exemplares,
distribuídos ao presidente do Grupo Municipal do Cachoeiro do Itapemirim, Imprensa
Oficial, Escolas de Villa Rubim, Delegado Littera rio de Santa Thereza, Quartel da
Polícia e Fazenda Modelo. Havia a inda 127 exemplares destinados à distribuição
gratuita e 460 em depósito, totalizando 2 .000 cartilhas de Gomes Cardim.

Essa informação confirma que a c artilha foi efetivamente utilizada nas escolas do
Estado e o fato de constar entre os livros e cartilhas aprovados no Programa de
Ensino do ano de 1924 indica que continuou a circular até essa data. Ela também foi
adotada nas escolas do Estado de São Paulo, confor me constatamos em nossas
pesquisas.
143

Foto 17: Capa da Cartilha Infantil pelo Methodo Analytico de Carlos A. Gomes Cardim
Fonte: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/obj_a.php?t=cartilhas01

Dessa forma, considerando a página da Cartilha a que tivemos acesso (Foto 18),
podemos inferir que a Cartilha Infantil continha ilustrações. As lições eram
organizadas a partir de historietas. Desse modo, ela era baseada no método
analítico e ensinava a ler e a escrever a partir de pequenas histórias organizadas em
frases para melhor facilitar a dec omposição do texto. Não temos elementos para
afirmar como eram ensinadas as unidades menores. Porém, é possível verificar a
preocupação em mostrar a letra de imprensa e cursiva. Os textos em letra cursiva
serviam para as atividades de cópia.

Foto 18: Lição da página 14 (Paulo e seu cão Fiel) da Cartilha Infantil pelo Methodo Analytic o de
Carlos A. Gomes Cardim
Fonte: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/obj_a.php?t=cartilhas01
144

A “Cartilha das Mães”, de Arnaldo Barreto (Foto 19), também foi aprovada para ser
utilizada no Estado. Segundo Razzini (2007), essa cartilha, foi aprovada pelo
Conselho Superior de Instrução Pública de São Paulo, em 15 de fevereiro de 1895.
Em sua pesquisa, a autora expõe algumas considerações sob re a obra, proferidas
por um dos conselheiros que a avaliou, na ocasião de sua aprovação.

Nessas considerações, é mencionado que as 30 lições que compõem a cartilha


original foram submetidas a minucioso exame e que ela não apresentava novidade
em matéria de ensino. Contudo, amoldava -se a um método geralmente aceito: o
silábico. São apontadas , também, várias faltas em algumas das lições. Assim,
segundo o parecer, depois de observadas as indicações e feitas modificações pelo
autor, opinava pela aprovação do material , porque estava certo de que p oderia
prestar “bons serviços ao ensino público”.

Foto 19: Capa da Cartilha das Mães de Arnaldo Barreto


Fonte: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/obj_a .php?t=cartilhas01

Decorridos quatro meses de sua aprovaç ão, foi registrado o pedido do e ditor da
cartilha, para que o Conselho aprovasse a sua adoção nas escolas públicas e que o
governo financiasse a sua edição. Entretanto, a adoção e o financiamento p elo
governo só ocorreram na segunda edição, em 1896, trazendo, no primeiro número,
um artigo do autor, explicando , na “Cartilha das Mães”, seu método de alfabetização
e o modo de aplicá-lo.
145

Segundo Razzini (2007), no artigo, Arnaldo Barreto (1896) diz que as professoras ,
incumbidas por ele de fazerem a experimentação da cartilha se afastaram do
método que ele imaginara, encaminhando -se pelo sistema antigo dos silabários e
que esse fato o havia entristecido. De acordo com o autor,

A Cartilha das Mães basêa-se sobre o mais sábio aphorismo de Pestalozzi:


- Não ensinar ás crianças aquillo que ellas por si puderem aprender.
Por isso, em cada nova lição, colloquei duas estampas adequadas,
escrevendo-lhes em baixo o nome respectivo, donde, em caractere s em
tinta vermelha, resalta a sylaba que vai ser objecto dessa mesma lição.
Immediatamente, em linha horizontal, vem as cinco syllabas classicas,
isoladas; depois combinadas em palavras, mas destacadas pelas coôres
[sic]; e finalmente, as palavras em pequ enas historias.
Parto, segundo a logica, do elemento mais simples – a sylaba, para o mais
complicado – a historia.
Portanto, é analytico-synthetico o methodo da Cartilha das Mães, ou antes,
simultaneo da syllabação e palavração. [...]
Na segunda edicção da Cartilha colloquei umas sentenças em manuscripto
que servirão de modelo para as crianças copiarem.
O ensino da leitura deve ser companheiro do da escripta (BARRETO, 1896,
p. 30-34, grifos do autor, apud RAZZINI, 2007, p. 25).

Ao avaliarmos todas as infor mações coletadas sobre o material em questão,


concluímos que a “Cartilha das M ães” era composta por 30 lições . Ela possuía
imagens de objetos cujos nomes eram ensinados. Porém, diferentemente do que
escreve o seu autor, ela concretiza o método sintético -analítico, pois parte da
unidade sílaba. O parecer emitido sobre os originais da cartilha já indicava que o
método utilizado priorizava as unidades menores da língua e ele tinha razão.

Outra cartilha que consta na lista de livros aprovados pela Secretaria d e Instrução
Pública do Espírito Santo é a “Cartilha analytico -synthética”, de autoria de Mariano
de Oliveira. O estudo de Sobral [200-] revela que esse autor era filho de Antônio
Guedes de Oliveira e de D. Corina Eugenia de Oliveira que exercia a profissão de
professora. Nascido no dia 26 de maio de 1869, na cidade de Piracicaba, interior do
Estado de São Paulo, foi diplomado pela Escola Normal de São Paulo em 1888.
Exerceu grande influência, como professor, no cenário educacional paulista “[...]
considerando a grande circulação de suas cartilhas e a importância naquele
momento, das suas orientações em relação ao método de ensino adotado no estado
de São Paulo” (SOBRAL, [200-], p. 2).
146

Mariano de Oliveira exerceu o cargo de inspetor escolar, provavelmente, n as


primeiras décadas do século XX, e publicou , em 1911, a monografia intitulada
“Como ensinar leitura e linguagem nos diversos annos do curso preliminar ”, em
parceria com Theodoro de Moraes, Miguel Carneiro e J. Pinto e Silva, editada pela
Siqueira, Nagel & Comp., vinculada à Directoria Geral da Instrucção Publica.
Presumivelmente, ainda quando ocupava o cargo de inspetor e em parceria com os
professores Ramon Roca Dordal e Arnaldo de Oliveira Barreto, publicou, no ano de
1914, na Revista de Ensino as “Instrucções praticas para o ensino da leitura pelo
methodo analytico – modelos de lições”. Esse documento se tornou um norteador
para ele, outros professores e seus contemporâneos que escreveram cartilhas de
alfabetização.

A “Nova Cartilha analytico -synthética”, de Mariano de Oliveira, que circulou por


vários Estados brasileiros, foi publicada , em 1916, pela Editora Weiszflog Irmãos e
editada até 1955, alcançando a 185ª edição. Autor da “Cartilha de Ensino -Rápido da
leitura”, já citada neste trabalho, Mariano de Oliveira também publicou um livro
didático para o ensino da leitura, linguagem e aritmética; dois livros de leitura; dois
documentos oficiais de órgãos do Governo Estadual referentes à educação e um
artigo em revista. “Em maio de 1917, assumiu o cargo de Diretor da Escola Normal
de São Carlos, no qual permaneceu até abril de 1922, quando se aposentou”
(SOBRAL, [200-], p. 3).

A autora referenciada apresenta em seu trabalho a análise de um exemplar da


“Cartilha analytico-synthética”, publicado pel a Editora Companhia M elhoramentos de
São Paulo que, antes era Weiszflog Irmãos e , atualmente, Melhoramentos. Nesse
exemplar, em sua 54ª edição, não havia data da edição, mas Sobral ( [200-], p. 3),
presume “[...] que seja anterior a 1938, pois , nesse ano, o nome da editora foi
substituído de ‘Companhia Melhoramentos de São Paulo’ por ‘Edições
Melhoramentos’, como aparece , por exemplo, na capa da edição de 1941” . A falta
da data de edição dificulta a afirmação de que a cartilha analisada por Sobral tenha
sido adotada no Estado do Espírito Santo .

Segundo Sobral [200-], no centro da capa desse exemplar de 100 páginas


numeradas, coloridas em tons de rosa, aparece a figura de uma menina
147

expressando tranqüilidade e alegria, usando vestido, meias, sapatos e um l aço na


cabeça. Ela está sentada com as pernas cruzadas em um banco próximo de uma
mesa, apoiando o livro que está lendo. Na mesa, há um vaso com flores dando a
impressão de ser este um ambiente agradável. A menina apóia a cabeça com sua
mão direita e com a esquerda aparenta acompanhar a leitura no livro. Compondo a
capa, há o título da cartilha impresso em letras grandes, o nome do autor e algumas
informações sobre a editora.

O título e o nome do autor aparecem novamente n a página de rosto, junto com a


informação de que a cartilha foi aprovada e adotada oficialmente nos Estados de
Goiás, São Paulo, Rio Grande do Norte, Paraná e Santa Catarina. Esse dado
confirma que não foi essa a edição adotada no Estado, mas , como há referência a
ela na lista de livros aprovados pela Secretaria da Instrução em 1924, pensamos
que é válido fazer a apresentação desse material neste trabalho.

As lições que o compõem são apresentadas sem numeração da página 5 até a 90 e


nas páginas 89 e 90, é apresentado o alfabeto em letra s manuscritas e impressas,
maiúsculas e minúsculas, com uma palavra seguida de uma gravura reforçando o
emprego e o som da letra. Na página 91, há apenas o alfabeto impresso nos
mesmos tipos de letras das páginas anteriores e os numerais de 0 a 9 e o cifr ão. A
página 92 traz a estampa de uma menina sentada em um banco, aparentemente de
uma praça, trazendo um livro ao colo. A partir da página 93, até o final da cartilha,
encontram-se dispostas as “Instrucções praticas para o ensino da leitura”, assinadas
por Mariano de Oliveira, Arnaldo de Oliveira Barreto e Ramon Roca Dordal. Essas
instruções estão organizadas em cinco passos, e cada um corresponde a um
conjunto de lições e vão sendo repetidos em diversas delas, até o momento de
adotar as instruções sugeri das para o 2º passo e assim por diante.

As ilustrações são elementos constantes nas lições da cartilha e são consideradas o


“assumpto da lição”. Elas se referem, em sua maioria, à s cenas do cotidiano infantil:
um menino jogando bola; meninas brin cando de boneca; crianças brincando com
animais, etc. Há, ainda, lições relacionadas com valores cívicos; outras com um
ambiente rural e ainda outras, que enfatizam o valor ao estudo. Mas, de acordo com
as “Instrucções”, uma mesma cena pode ser usada como base para várias lições,
148

exigindo esforço dos alunos no exercício de compor diferentes historietas, fazendo -


os “trenar [suas] faculdades mentaes ”. Cada lição é constituída por sentenças
numeradas; “coordenadas entre si”; elaboradas a partir de uma figura e , “[...] á
medida que se avançam nas lições, o número de sentenças das historietas aumenta
gradativamente. A primeira lição apresenta uma historieta com cinco sentenças e a
historieta mais extensa tem 17 sentenças” (SOBRAL, [200-], p. 4).

A primeira lição traz a ilustração de uma menina sentada tocando um gatinho com a
mão e, abaixo da imagem, foram escritas cinco sentenças numeradas em letras
manuscritas, relacionadas com a ilustração. Segundo Sobral ( [200-], p. 4, grifos da
autora), essa organização está “[...] de acordo com o indicado no ‘1º passo’ das
Instrucções praticas para o ensino da leitura transcritas ao final da cartilha [...]” . As
letras manuscritas são mantidas nas cinco primeiras lições. A partir da sexta lição, a
letra impressa é inserida in tercalando as sentenças em letra manuscrita. Somente a
partir da oitava lição é que há predomínio do uso da letra impressa, com destaque
para apenas algumas sentenças em letra manuscrita. “[...] Na página 10, as
sentenças de uma das historietas são dispost as verticalmente em colunas e alguns
elementos de cada coluna são reorganizados formando novas sentenças sobre o
mesmo assunto” (SOBRAL, [200-], p. 4).

Sobral [200-] diz que há, nesse momento, a transição do manuscrito para o impresso
e que, até a página 9, as lições correspondiam à fase propriamente analítica da
leitura: análise das unidades maiore s – as sentenças (método da sentenciação). A
partir da página 10, ao dispor as sentenças em colunas, o autor insere o aluno no
método analítico de palavração e mantém esse procedimento nas lições seguintes
até a página 47, quando propõe o estudo da sílaba (método da silabação) inicial de
cada palavra da sentença disposta verticalmente.

Ainda de acordo com a autora, nas lições apresentadas, a partir da página 54, o
estudo da sílaba inicial das palavras retiradas das sentenças, é intercalado com o
estudo de outras sílabas das palavras. Ocorre, assim, a “[...] formação de novas
palavras cujas sílabas iniciais [...] [são] correspondentes às sílabas que compõem a
palavra estudada” (SOBRAL, [200-], p. 5). O estudo de todas as sílabas que
compõem as palavras destacadas para a formação de novas palavras é
149

predominante nas lições das páginas 65 até a 79. As lições das páginas 80 a 87 são
historietas em que não há nenhum tipo de análise. “[...] Na página 88 , há uma
relação de palavras com grafia e sons semelhantes [...], para que os alunos ao lê -
las, confrontem-nas e percebam suas dife renças” (SOBRAL, [200-], p. 6).

Conforme aponta Sobral [200-], o material foi elaborado de acordo com o método
analítico e, portanto, estava adequado ao discurso em vigor sobre a necessidade de
se utilizar métodos de marcha analítica. Ao expor as instruções para o seu uso, os
autores, segundo Sopbral, pretendiam garantir que as pre scrições elaboradas
fossem cumpridas, além de considerar que esse tipo de orientação facilitaria o
trabalho do professor.

Apresentaremos, ainda, com relação aos livros de leitura constantes no Programa de


Ensino das Escolas Isoladas, o livro de “Leitura 1”, de Erasmo Braga (Foto 20).

Foto 20: Capa do Livro de Leitura 1 de Erasmo Braga


Fonte: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/obj_a.php?t=cartilhas01

Conforme descrito por Matos (2007), esse autor nasceu no ano de 1877, na cidade
de Rio Claro, interior de São Paulo , e faleceu em 1932. Tendo vivido apenas 55
anos, teve sua morte prematura devido, em parte, ao de sgaste sofrido no trabalho
cooperativo. Estudou na cidade de Botucatu, para onde a família havia se mudado,
mas concluiu o ensino secundário na Escola Americana, em São Paulo , e ingressou
no Seminário Presbiteriano.
150

Em 1898, foi ordenado pastor e começou seu ministério em Niterói. Após três anos,
retornou a São Paulo e foi convidado para ministrar aulas em uma grande escola
missionária, o Mackenzie College. Tornou -se, também, professor do seminário em
que se formou e acompanhou essa instituição , quando ela foi transferida para a
cidade de Campinas, em 1907. Erasmo Braga revelou várias características
marcantes: memória privilegiada, grande inteligência e extraordinária capacidade de
trabalho, além de qualidades de caráter e temperamento que atraía m a simpatia das
pessoas.

O autor foi um pastor dedicado, competente professor e destacou -se na área do


jornalismo. Foi sócio e freqüentemente sócio -fundador de várias entidades de
serviços, científicas e literárias. No início de 1910, iniciou a escrita da notável “Série
Braga”, livros de leitura destinados à escola primária que foram utilizados durante
muitos anos nas escolas brasileiras. Porém, devido à falta de informações sobre o
material, não podemos afirmar se este era coerente com o discurso da época sobre
os métodos de ensino. Contudo, acreditamos que , dadas as circunstâncias, a
coerência e a lógica, o livro se encaixava nos denominados métodos de marcha
analítica.

O 1º livro de Puiggari e Barreto, também constante na lista dos livros aprov ados pela
Secretaria da Instrução, em 1925, trata-se, segundo Oliveira e Souza (2000, p. 33),
de uma série graduada de leitura do autor, em que “[...] um narrador conta a história
de Paulo e o seu convívio no lar e na escola, com os amigos e professores” . Esse
livro, de acordo com as autoras, com utilização restrita aos Estados do Espírito
Santo, São Paulo e Santa Catarina e que compunha a série de quatro livros, tinha
240 páginas, era todo ilustrado com gravuras que representavam cenas expressas
no texto escrito. Não havia, no livro, instruções aos mestres, subscritas pelos autores
Romão Puiggari e Arnaldo de Oliveira Barreto. Os autores iniciavam os relatos a
partir do primeiro dia de aula de Paulo, até o término do quarto ano escolar, ou seja ,
cada livro da série representava um ano de escolaridade do menino. As histórias
tratavam de situações, atitudes, comportamentos e acontecimentos do cotidiano de
uma “família brasileira idealizada”.
151

Na escrita do primeiro, terceiro e quarto livros , foi utilizado um tipo único de grafia, a
letra impressa vertical, que variava nos tamanhos de um livro para outro. Essa série
de livros, criada para atender à forma de ensino da leitura corrente, constituía um
estilo próprio de literatura didática e as lições eram para ser utilizadas em um
momento especial da aula. Justificando, assim, para Oliveira e Souza (2000, p. 34) a
carência de instrução para os professores antes das lições, por deduzir que seus
autores rejeitam advertências e prefácios e se “[...] preocupam em criar essa coleção
para o ensino aprazível da leitura corrente, recheada de lições que prescrevem
normas de comportamento e civismo, estipulando modelos de pessoas que
deveriam ser imitados e incorporados pelas crianças”.

Nos três primeiros livros, segundo as autoras, eram apresentadas poesias, escritas
em rimas leves, com um vocabulário simples . As poesias do primeiro livro eram, em
sua maioria, de autoria dos próprios autores e descreviam cenas abrangendo os
personagens da coleção. Oliveira e Souza (2000, p. 3 5-36) asseveram que, em
relação

ao conteúdo implícito das lições, detectamos certa rigidez na imposição de


determinados valores apresentados pelos autores. Essa não é uma
característica atribuída somente a essa série de leitura, mas a toda literatura
escolar produzida na época. Trata -se de verdades preestabelecidas e
inquestionáveis que, alimentadas em nome de uma ideologia positivista,
retratam uma preocupação com a transformação do homem dentro de uma
nova sociedade moderna.

Conforme constatamos, pelo que foi exposto pelas autoras, as lições constantes no
primeiro livro de leitura eram atraentes e de fácil entendimento para os alunos, mas
traziam implícito todo um conjunto de convicções e convenções sociais, políticas e
econômicas, consideradas como ideais ao momento histórico .

O 1º livro de leitura de João Köpke, componente da lista de livros e cartilhas


aprovados pela Secretaria de Instrução, era, segundo Panizzolo [200-], um dos livros
de leitura da profícua produção do autor que, “[...] Envolvido com a causa
republicana e educacional, teve sua atuação marcada tanto pela inquietação
criadora e renovadora tanto quanto pela coerência de princípios e pelo pioneirismo
na divulgação de suas idéias modernas e práticas” (PAN IZZOLO, [200-]). João
Köpke fazia parte, conforme a autora, de um grupo de intelectuais que, além de ter
152

defendido a reforma social pela reforma da educação, pôs em execução


experiências de escolarização, trabalhou ativamente na propagação do método
analítico da leitura, “[...] na abertura e na manutenção de escolas e, sobretudo, na
definição e na criação de um novo campo pedagógico, alicerçado em um ensino
intuitivo, científico, racional, misto, leigo e seriado” (PANIZZOLO, [200-]).

Na conferência “A leitura analítica”, proferida por Köpke, em 1º de março de 1896,


no Instituto Pedagógico Paulista, o autor propôs aos professores que fizessem uma
reflexão acerca das questões relacionadas com o ensino infantil e agradeceu pela
oportunidade de demonstrar o mé todo que propõe: o analítico. Utilizando o método
indutivo na sua exposição, faz várias demonstrações práticas e , por meio delas, e,
também, de exemplos de leitura, conduz iu o público a “[...] identificar as
características comuns das demonstrações prática s para, enfim, concluir com a
formulação de conceitos” (PANIZZOLO, [200-]). Foi dessa maneira que ele propôs
que fosse ensinada a leitura às crianças, ou seja, elas deveriam aprender, primeiro,
questões práticas e, depois, as abstratas.

Conforme assinala Panizzolo [200-], Köpke propôs, ainda, aos professores, durante
a conferência, que iniciassem o ensino da leitura e da escrita com um conto, mas
que eles tivessem alguns cuidados básicos em relação à organização do material
didático e à escolha das palavras . Adverte, também, que o conto deveria ter palavras
conhecidas das crianças , todas as letras do alfabeto e ser adequado à linguagem
infantil. Ele alertou, ainda, os professores para que iniciassem sempre com “palavras
concretas” ou reais, que fossem significativas, para , posteriormente, “[...] passar para
as ‘palavras relacionais’ ou abstratas, que formam imagem mental, como, por
exemplo, ‘a’, ‘um’ e ‘este’” (PANIZZOLO, [200-]). Explicou que as atividades
propostas deveriam contem plar sempre palavras extraídas do conto e “[...] despertar
no aluno a indução por meio da comparação e da semelhança entre a forma fônica e
a forma gráfica” (PANIZZOLO, [200-]). Depois dessas explicações, a autora afirma
que Köpke sugere

os cinco passos ou exercícios para o ensino da leitura e da escrita, por meio


do método analítico.
O primeiro passo tem por objetivo fazer com que o aluno seja capaz de ver
a história que está escrita na prancha mural do professor e no seu porta -
vocábulo. O segundo passo consiste em exercitar o aluno para fazer
153

coincidir a impressão acústica com a ótica, estando pronto para o próximo


passo, que nada mais é do que fazer o aluno ler, porque entende o que vê.
Forma mentalmente a imagem que a palavra sugere e consegue sol etrar. O
quarto passo refere-se a levar o aluno a ler e realizar composição com as
novas palavras. E o quinto e último passo tem por objetivo a realização da
síntese.

Após a execução desses procedimentos, Köpk e declarou que o aluno já es taria


capacitado para fazer uma leitura expressiva, pois já podia ler os contos, os
vocábulos e já conseguia especificar os elementos, combiná -los em vocábulos
novos e redigir por cópia ou ditado. Assim, estava preparado para o trabalho com o
livro de leitura.

Ao final da conferência, continua Panizzolo [200-], o autor defendeu que o ensino da


leitura devia ser feito em classes homogêneas e que a idade média da criança para
que fosse iniciado esse ensino era de sete anos. Disse também que não era
possível prever exatamente o t empo para que a prática da leitura e da escrita fosse
atingida conforme o método analítico, porque isso envolvia vários fatores
relacionados com a criança, o professor e com as atividades propostas, contudo
aconselhou os professores a abandonar o método s intético e aplicar o analítico,
pois, embora fosse mais trabalhoso, era certamente o mais aprazível para os alunos.

Após essas informações sobre apenas o autor do livro de leitura aprovado, João
Köpke, visto que não tivemos acesso à obra conforme dito, po demos observar que a
atuação do autor, no campo educacional na época, foi marcada por idéias criadoras,
renovadoras e que visavam, conforme o discurso vigente, à reforma social pela
reforma da educação. Embora, conforme assinalado por Panizzolo [200-], p. 1), João
Köpke estivesse de acordo com os ideais republicanos, não era porta -voz ou líder
desse grupo, mas “[...] foi um pedagogista, um homem que dedicou parte
significativa de sua vida à criação de teorias, práticas e instrumentos que fossem
capazes de educar os cidadãos que um dia guiariam a República”.

Como o discurso que permeava as discussões nessa época era o de que a solução
para os problemas da educação seriam resolvidos por meio de um ensino que
respeitasse “[...] a liberdade e a individualidade do educando, fornecendo -lhe
progressivamente os meios de adaptação à sociedade, vista em fase de intensas
154

transformações” (CAMPOS; ASSIS; LOURENÇO, 2002, p. 17), consideramos que o


método analítico proposto d e forma pioneira por João Köpke e concretizado nos
demais livros e cartilhas apresentados neste tópico, vem consolidar esse ideário.
Porém, as mudanças práticas que viabilizariam a reforma, dependiam de fatores que
iam desde boas condições dos espaços para o funcionamento das escolas, a
formação dos professores até o efetivo interesse do Poder Público pela educação
primária. Porém, como demonstramos no capítulo anterior, as mudanças
relacionadas com esses fatores eram lentas e impediam o desenvolvimento do
ensino primário no período.

5.2 O método intuitivo

De acordo com os relatórios dos inspetores, os resultados insatisfatórios na


alfabetização eram atribuídos à não aplicação do método definido e, portanto, à
adoção de métodos antigos baseados na soletração ou ainda à falta da adoção de
um deles. Em seu relatório de 10 de abril de 1928, o inspetor Esmerino Gonçalves
assinala que, na escola de Campinho, apesar dos esforços da professora, ele notou
que “[...] as suas aulas de alphabetisação não podiam dar um resultado satisfatório,
porque a professora não leciona de accordo com as exigencias do methodo actual”.
Por outro lado, afirma ainda o inspetor que, nas escolas de Aruaba, Sauanha, Lage
e Chapada Grande, as professoras não utilizam um método para ensinar e sugeriu
que a professora de Aruaba fosse p raticar na Escola Modelo.

De acordo com Razzini (2007, p.22), “[...] a importância dada à formação dos
professores e à escolha do material didático para a execução de um p rograma
graduado de estudos”, estava relacionado com o projeto republicano de modifi car
para melhor e isso impunha a necessidade de “[...] uniformização [da escola popular]
para garantir a mesma formação elementar aos cidadãos, tanto na escolha do modo
e do método de ensino, como na adoção dos conteúdos e condições materiais”
(RAZZINI, 2007, p. 21-22).

Porém, na prática, conforme a autora, são percebidas diferenças de ordem


organizacional, de currículos e formação de professores, seja nas modalidades
155

diferentes de escola elementar, seja na duração do curso, da quantidade de


matérias e dos programas, seja ainda, na questão da diferença nos salários dos
professores que promoviam , desde o começo do período republicano, pelo menos
dois tipos de formação de professores:

a do Grupo Escolar (ou eschola preliminar), mais completa, voltada para os


cidadãos do meio urbano, mais extensa e identificada com as inovações
pedagógicas e tecnológicas; e a da Escola Isolada (ou eschola provisoria)
mais simplificada, dirigida aos cidadãos do meio rural, abreviada e mais
próxima da então combatida escola i mperial. Percebe-se, assim, o limitado
alcance dessa escola moderna, uma vez que, nessa época, a maioria da
população brasileira se concentrava no campo (RAZZINI, 2007, p. 22).

Dessa maneira, o projeto republicano dest inado à instrução popular fica restrito,
portanto, aos grupos escolares que pressupunham uma nova organização da escola
e, consequentemente, gerou nova demanda de materiais didáticos, porque

passou a exigir uma variedade maior de produtos adaptados ao ensino


graduado do programa e capaz de atender aos requisitos do método
intuitivo e das matérias adicionadas ao currículo. Além disso, a
uniformização e seriação dos conteúdos e a adoção do ensino simul tâneo
para toda a sala de aula apontam uma mudança importante para a
produção de material escolar, pois obrigaria que cada aluno tivesse seu
próprio material escolar, aumentando consideravelmente a demanda por
produtos [...] (RAZZINI, 2007, p. 22).

No Espírito Santo, até 1929, quando tem início a nova reforma do ensino, pelo
Decreto nº 6.501 (1925), o método era o intuitivo. Assim, o decreto dispunha , no art.
74, que: “O ensino terá por base o systema simultaneo, não se devendo prescrever,
absolutamente, o emprego accidental, excepcional de outros systemas, mas
procurando sempre o adeantamento geral e uniforme da classe”. No art. 75,
determinava que era “obrigatório o ensino intuitivo”.

O método intuitivo, conforme evidencia Buffa e Pinto (2002, p. 50), surgiu , no final do
século XVIII, na Alemanha, por iniciativa de Pestalozzi.

Era tributário das idéias dos filósofos empiristas ingleses Bacon, Locke,
Hume, bem como de pensadores como Rousseau, e pedagogos como
Comênio, Froebel, entre outros. Tal método valoriza a intuição como
fundamento de todo conhecimento. Ou seja, a aquisição de conhecimentos
se faz por meio dos sentidos e da observação.
156

Esse método foi introduzido no Brasil , inicialmente, em escolas particulares


consideradas inovadoras, porém as contribuições valiosas de Rui Barbosa com seus
pareceres e com a tradução do liv ro “Primeiras lições de coisas de Norman Alice
Calkins”, publicado em 1886, muito contribuíram para sua divulgação. “Tratava-se de
um manual de orientação para professores muito difundido nas escolas normais e
primárias brasileiras no final do século XIX e início do XX” (BUFFA; PINTO, 2002, p.
50-51).

Dadas as condições do trabalho escolar da época, o ensino intuitivo vinha se opor à


organização do ensino existente, bas eada no “sistema monitorial” ou “ensino
mútuo”’. Lourenço Filho (1956) diz que , apesar de Pestalozzi recomendar que “A
lição de coisas”, podia ser aplicada a um grupo, ou imitar a forma de “ensino
simultâneo”, foram geradas idéias e interesses contrários ao movimento, durante
muito tempo. Esse fato ocorreu porque , mesmo podendo ser dirigida t al qual o
ensino simultâneo, a lição de coisas “[...] exigia maior capacidade da parte de quem
o ministrasse, com maior fadiga aos professôres, que já não poderiam entregar
grande parte de sua tarefa aos decuriões” (LOURENÇO FILHO, 1956, p. XV).

Segundo Buffa e Pinto (2002), o método intuitivo se tornou mais conhecido por
Lições de Coisas, embora tenha recebido outras denominações. Faria Filho (2003, p.
143) ressalta que o método intuitivo recebeu esse nome devido à importância
acentuada “[...] que o s seus defensores davam à intuição, à observação, enquanto
momento primeiro e insubstituível da aprendizagem humana”. Lourenço Filho (2002,
p. 227, grifos do autor) acrescenta:

Freqüentemente, é salientado no sistema didático de Pesta lozzi o relevo


com que pregava o ensino objetivo ou pelas coisas. Retomando a velha
noção de Comenius, concorreu sem dúvida para que a expressão ensino
intuitivo viesse a ser aprofundada e vulgarizada. A verdade, porém, é que
com esse nome Pestalozzi não só se referia às impr essões recebidas pela
criança do mundo das coisas ou do ambiente físico, mas assim também às
que recebesse da vida social e moral.

O autor diz ainda que Pestalozzi declarou que a intuição denotava “experiência
direta” e que, em seu método, tudo é baseado na ação. Inicialmente, porque são
encontrados na própria criança os princípios dos conhecimentos e seu sucessivo
desenvolvimento; “[...] depois, porqu e é ela que em si mesmo produz os signos
157

representativos dos objetos e instrumentos que sirvam à ação [...]” (LOURENÇO


FILHO, 2002, p. 227).

Dessa forma, a adoção do método intuitivo e do simultâneo exigiu ainda a adoção de


cartilhas e de livros, no Espírito Santo, que atendessem às exigências do método
geral de ensino. Exceto a Cartilha de Arnaldo Barreto, t odas as cartilhas e livros
adotados estavam de acordo com os princípios do método intuitivo que propôs o
método analítico para o ensino da leitura. Mesmo a Cartilha de Arnaldo Barreto
trazia imagens que eram muito enfatizadas no método intuitivo.

Apesar da obrigatoriedade legal de ensinar por meio do método intuitivo, havia


professores que não cumpriam essa determinação. A professora do Colégio Nossa
Senhora da Penha, no município de Alegre, conforme relatado por Aristides Costa,
em 3 de outubro de 1928, “ [...] desconhece os novos métodos de ensino. Usa o
antiquado método de decoração, de maneira que os seus alunos não respondem á
uma pergunta si ella se afasta da do livro em que estudam”. Complementa ainda que
a professora da Escola Mixta Ponte do Gregorio “[...] é a ignorancia personificada
[...]” e que os alunos nada sabem do que decoram.

Flávio de Moraes, em 3 de agosto de 1928, também relata que, em algumas


escolas, os professores ditam pontos para os alunos e, diz que “[...] Impossível se
torna uma cultura intellectual sem exercício e desenvolvimento de memoria; mas não
um exercicio mnemonico, predominante, absorvente”. O relator afirma ainda que “O
ensino de uma boa leitura, rigorosamente feita, é quasi sempre descurado, assim
como os exercícios de r edação e composição, que ficam no primeiro plano como
recursos do ensino da linguagem”.

Observamos que essa prática dos professores era incoerente com a concepção de
aprendizagem que orientava os novos métodos de ensino referenciados pelos
inspetores e previsto no Decreto nº 6.501 (1925), pois , segundo Valdemarin (1998,
p. 104),

[...] com a adoção do método de ensino intui tivo, pretende-se educar a


criança a partir de novos padrões intelectuais, que se fundamentam numa
nova concepção sobre o conhecimento, que postula a origem das idéias nos
158

sentidos humanos e que, aplicada ao ensino, pretende formar indivíduos


que usem menos a memória e mais a razão e que valorizem a observação e
o julgamento próprios como meios de construção do conhecimento e da
implementação das atividades produtivas.

Entendemos, assim, que a adoção do novo método possibilitaria o desenvolvimento


da criança, de acordo com as novas necessidades de modernização surgidas no
final do século XIX. Mas, para Valdemarin (1998 apud T RINDADE, 2004, p. 117), o
método de ensino intuitivo interessava ao discurso político e educacional gerado
nesse momento histórico porque , utilizado na sala de aula como estratégia de
intervenção, local apropriado e específico , tanto da instrução quanto da mudança
das práticas pedagógicas, propiciava a adequação da escola ao “projeto político
modernizador”.

Porém, não era apenas o despreparo dos professores para o trabalho com os
modernos métodos de ensino que contribuía para a baixa qualidade do ensino n as
escolas. A falta de materiais impedia o trabalho com o método i ntuitivo, pois,
conforme evidencia Buffa e Pinto (2002, p. 50): “[...] Sua aplicação nas escolas
pressupunha uma enorme quantidade e variedade de materiais didáticos. Como a
aquisição desse material, bem como do mobiliário, dos livros e demais utensílios
fosse onerosa, os grupos escolares ressentiam sua falta”.

Valdemarin (2006, p. 98) complementa que, para que sejam alcançados bons
resultados na utilização do método intuitivo, “[...] o amb iente escolar deve ser claro e
arejado, ornamentado com trabalhos feitos pelos próprios alunos, e nas salas de
aula deve haver um conjunto de material disponível para cada uma das crianças”.
Entretanto, é necessário lembrar das queixas nos relatórios dos i nspetores e dos
professores sobre a deficiência e até mesmo inexistência de materiais pedagógicos
nas escolas do Estado do Espírito Santo e, também, das condições de conservação
dos prédios onde a maioria das escolas funcionava. Apesar de o professor poder
improvisar com meios auxiliares , como desenhos ou gravuras na aplicação do
método intuitivo, conforme salienta Valdemarin (2006), sabemos que chegaria o
momento em que esses não seriam mais suficientes, pois , segundo Faria Filho
(2003, p. 143):
159

[...] os defensores do método intuitivo chamaram a atenção para a


importância da observação das coisas, dos objetos, da natureza, dos
fenômenos [...]. Essa etapa da observação minuciosa e organizada é
condição para a progressiva passagem, pelos alunos, de um conhe cimento
sensível para uma elaboração mental superior, reflexiva dos conhecimentos.

A etapa de observação, ainda de acordo com Faria Filho (2003), era iniciada pelas
“lições de coisas” e, nesse momento , as condições para que os alunos pudessem
visualizar, observar e sentir os objetos deviam ser criadas pelos professores. Para
esse procedimento, podiam ser utilizados objetos escolares ou outros trazidos para a
escola, além de visitas e excursões nas imediações da escola. Podia ser também
possibilitado aos alunos, nesse momento, o acesso a diversas ilustrações contidas
nos livros próprios de “lições de coisas”, em cartazes produzidos especificamente
para o desenvolvimento do trabalho com o método ou ainda de outros conteúdos.

Concluímos que os materiais pa ra o trabalho com o método intuitivo eram


importantes, porque, conforme averiguamos na versão do livro de Calkins , traduzido
por Rui Barbosa, o processo de aprendizagem da leitura era iniciado pela
visualização de um objeto escolhido dentre es ses materiais,

[...] cujo aspecto, nome e uso lhes sejam familiares. Sempre que exequível
fôr, nas primeiras lições de leitura, se mostrará o objeto discorrendo a seu
respeito, e proferindo-lhe o nome; após o que exibirá o mestre uma estampa
dêsse objeto, ou o desenh ará no quadro prêto, induzindo os alunos a
notarem como essa é a imagem ou pintura dêle. Em seguida se lhe
imprimirá por inteiro o nome no quadro prêto ou imprimirá impresso numa
carta, ou mapa. Então aprenderá o discípulo a distinguir o objeto, a sua
imagem e a palavra que o nomeia [...] ( BARBOSA, 1956, p. 422).

O autor completa que podem ser ensinados muitos vocábulos a partir da palavra que
nomeia o objeto, antes de se iniciar os sons ou letras de cada um. Por ess e método,
estudam-se as “[...]palavras como símbolos dos objetos e dos seus nomes falados;
de sorte que assim a palavra proferida e a palavra figurada exprimirão igualmente o
objeto, possuindo ambas a mesma fôrça de relembrar à me nte as qualidades dele
[...]” (BARBOSA, 1956, p. 423). Os sons e as letras dos vocábulos só mais tarde
serão decompostos.

Conforme constata Faria Filho (2003, p. 143 -144), no Brasil, as discussões acerca
da aplicação do método intuitivo , nas escolas, perduraram até a década de 1930:
160

A partir de um intenso trabalh o de produção e divulgação de variados


impressos pedagógicos (livros, revistas, jornais) e de um crescente
refinamento teórico, sobretudo com uma maior aproximação entre os
campos da psicologia e da pedagogia, a discussão sobre a pertinência e a
forma de se trabalhar com o método intuitivo na escola primária [...].

Essas proposições evidenciam, portanto, uma intensificação de produção literária e


de discussões sobre o trabalho com o método intuitivo nas escolas brasileiras.
Conforme observamos, podemo s inferir, então, que os materiais eram
imprescindíveis para que os professores pudessem realizar o trabalho pedagógico
com o método, mas, se as escolas não estavam devidamente providas de materiais ,
como poderiam os professores desenvolver o trabalho?

A partir de um plano de aula com o título “Lição de cousas”, publicado na Revista de


Educação nº 30-31, ano IV, junho e julho de 1937, elaborado pela professora
normalista Jacy Leão Castello, encontram -se especificados os procedimentos da
professora e dos alunos para a sua concretização. A análise do plano de aula
permite verificar a utilização de materiais simples e que faziam parte da vida pessoal
e escolar dos alunos. Desse modo, podemos dizer que os materiais eram
adequados à situação das escolas e mo strava a possibilidade de adoção do método.
Tais materiais eram: prato, c oto de vela, papel, fósforos, talo de mamão e copo. No
documento, a professora escreveu:

Aula de Projecto – Um passeio de avião.


Thema – estudo sobre o mar [sic].
Noções – existência e utilidade do ar; composição do ar.
Methodo de Observação e experimentação da applicação do methodo
analytico, pois que, este, é o methodo geral que em sua aplicação exige a
collaboração dos dois particulares citados.
A observação faremos pelo proprio p henomeno de nossa respiração e das
plantas. A experimentação com as experiencias com um côto de vela, com
um copo cheio d’agua e um papel, e ainda pelos <talos de mamoeiro>
(CASTELLO, 1937, p. 11).

Após essa introdução, a professora relatou que, na pr imeira parte da aula, foi feita a
apresentação do assunto convidando os alunos para um passeio de avião e, para
aguçar mais o interesse deles, iniciou com o trabalho manual a confecção de aviões
de papel. Assinala, também, que, após as experiências e as fr ases comentadas
sobre o assunto, foi feita a averiguação, por meio dos testes de escolaridade,
constituindo-se esta na parte do “processo de applicação da aprendizagem”. A
161

correção foi feita pelos próprios alunos, os quais tiveram seus testes trocados entr e
si e, sob o controle da professora, foram corrigindo. Diz ainda que a aplicação de
todos os processos seguiu a metodologia.

Na última parte do plano, com o título “Testes”, a professora pontua todos os


questionamentos feitos: “As pedras respiram. Certo ou errado? – Errado. As plantas
respiram pelas folhas. Certo ou errado? – Certo. Havia ainda outras perguntas e
todas elas relacionadas com o ar. Finalizando a exposição, a professora diz que,
para as classes do 1º e 2º ano, mandou que os alunos fizessem o desenho de um
avião e construíram-no com papel. Concluímos , assim, que a aula descrita era para
turmas de 3º e/ou 4º ano e que seria também desenvolvida com alunos de 1º e 2º
anos com um único diferencial: o desenho do avião.

Notamos também que, apesar de constar no cabeçalho do projeto , que o tema era o
mar, não há, em nenhum momento do desenvolvimento do trabalho , menção ao
mar. A explicação possível é que talvez o plano citado se referisse a uma das partes
de um projeto mais amplo ou houve algum erro de datilografia.

No plano de aula exposto, quando a professora diz que aplicou todos os processos
de acordo com a metodologia, pensamos que ela se referiu aos manuais sobre o
método intuitivo, criados e dirigidos aos professores, alunos e pais. Esses manuais
tinham, segundo Valdemarin (2004, p. 105), “[...] o objetivo de evidenciar o processo
de transposição didática por meio do qual a teoria do conhecimento é desdobrada
em lições e atividades”.

Em seu trabalho, a autora analisa vários desses manuais sobre o método intuitivo.
Tomando as suas contribuições sobre a abrangência de cada um deles acerca dos
conteúdos e procedimentos neles contidos e comparando -os com a descrição do
plano de aula da professora, consideramos imprudente apontar um deles como o
utilizado pela professora, visto que não há indicação nos documentos analisados de
qual manual era usado pelos professores do período em estudo.

Contudo, considerando os fatos históricos acerca da difusão do método intuiti vo no


Brasil, podemos alegar que , provavelmente, o manual utilizado pela professora era o
162

“Primeiras Lições de Coisas” , de Norman Alice Calkins, porque , segundo Buffa e


Pinto (2002), era esse manual que circulava nas escolas primárias e normais
brasileiras no fim do século XIX e princípio do XX.

5.3 A Escola Ativa

Nos relatórios dos inspetores, há evidências ainda de uma visão pessimista com
relação ao trabalho dos professores alfabetizadores. Nesse sentido, é importante
apontar que a forma de ingresso de professores e a sua formação afetavam o
trabalho de ensino da leitura e da escrita. Conforme dito, no final da década de
1920, a maioria das escolas era regida por professores de concurso e muitos deles
eram inexperientes e necessitaram de instruções do inspetor sobre o método de
ensino vigente.

Nesse sentido, como mencionado, os professores não ensinavam com método por
não terem a necessária prática ou experiência. Em 6 de agosto de 1929, em
inspeção às escolas dos municípios da Capital e do Espírito Santo, Aristides Costa
relata o caso da escola “Mirabeau Pimentel” e diz que, apesar de o professor ser
esforçado e de os alunos terem aproveitamento, só discordou do “[...] methodo de
alphabetisação por meio da soletração”.

O mesmo inspetor escreve, no r elatório datado de 20 de agosto de 1929, que, nos


municípios de Itapemirim (s ede), Rio Novo, Iconha e Benevente, os alunos da escola
Pau d’Alho são atrasadíssimos e “[...] a professora mal conhece as 4 operações; é
semi-alphabetisada”. Problema semelhante é o da Escola Mixta Capim Angola, cujas
crianças além de serem atrasadíssimas e mal classificadas, têm uma professora
provisória e de pouco preparo.

A questão da falta de formação, de preparo dos professores para atuar nas escolas
era tão séria que o insp etor Flávio de Moraes disse, em 3 de agosto de 1928, que
seria necessário fazer uma rigorosa seleção no magistério para o ingresso de
professores nas escolas e , ainda, que há alguns professores que “[...] necessitam de
163

prática pedagógica, e outros que, por incompetência, devem ser afastados do


magistério”.

Era também de competência do inspetor informar -se sobre o progresso,


adiantamento e bom aproveitamento dos alunos (DECRETO Nº 6.501, 1924, p. 18).
Sobre o assunto, Flávio de Moraes (1928) escreve, no ref erido relatório, que o
Estado deveria aproveitar os alunos pobres que mais se destacassem na escola
primária, porque, sem dúvida, seriam bons servidores no futuro. Alega ele que a
escola dá instrução a todos – pobres e ricos – mas que os ricos, inteligente s ou não,
continuam os estudos e os pobres vão para a lavoura, para as fábricas, assim
poderiam ter uma chance se fossem aproveitados para outras funções.

Mas, nos relatórios, também há indícios de professores que, na perspectiva dos


inspetores, desenvolviam o trabalho adequadamente e, por isso, eram considerados
competentes. Archimimo Gonçalves (1929) relata que , na visita que fez à Escola
Mixta de Fazendinha,

[...] sob a regencia da zelosa e assaz competente normalista Rosa – deixa


esta escola a melhor impressão possível a quantos a visita, ja pelo
aproveitamento geral, ordem e disciplina irreprehensiveis e já pela
habilidade e proficiencia com que a professora vem applicando o methodo
moderno de ensino intuitivo. Tivemos oportunidade de ouvil -a em aula e
notamos com prazer que é uma perfeita preceptora, senhora da pedagogia
que applica com maestria.

Esse relato do inspetor confirma que o método intuitivo é considerado a inovação e


que estava em prática em pelo menos algumas escolas do Estado, visto que havia
outras em que as condições humanas e materiais impossibilitavam tal prática.
Assim, ser uma professora competente era relacionado com a aplicação do método
moderno, ou seja, do método intuitivo.

No ano de 1929, os dirigentes do Estado e da Instrução pública parecem encontrar a


solução para o problema da formação dos professores e para divulgação do novo
modelo de ensino considerado “mais inovador”. Assim, nesse ano, tem início a
reforma do ensino baseada nos princípios da Escola Nova, proposta por At tilio
Vivacqua, que assumira a Secretaria da Instrução em junho de 1928, juntamente
164

com Aristeu Borges de Aguiar, presidente do Estado, cuja posse ocorreu no dia 30
de junho de 1928.

Attilio Vivacqua (Foto 21), era considerado um político de grande habil idade e,
segundo Soares (1998), nasceu no dia 11 de outubro de 1894, em Espírito Santo do
Rio Pardo (hoje Muniz Freire). Cursou o ensino primário em Muniz Freire e o curso
superior na Faculdade Naciona l de Direito, no Rio de Janeiro. R epresentou o Brasil
em dois congressos internacionais, quando ainda era estudante. Em 1916, concluiu
o curso superior e iniciou sua vida profissional na cidade de Cachoeiro do
Itapemirim, onde foi também jornalista, vereador e prefeito.

Foto 21 : Attilio Vivacqua


Fonte: Soares, 1998

Conquistou uma cadeira de deputado em 1921 e , após três anos, mudou-se para
Colatina, como diretor-presidente da Companhia Territorial, empresa pública de
desenvolvimento incumbida de realizar o Plano de Recuperação do Vale do Rio
Doce. Vivacqua era um homem inteligente, liberal, progressista, muito bem
informado e, na Assembléia Legislativa , por dedicar-se a temas sociais, ganhou o
apelido de “esquerda radical platônica”.

Após a “Revolução de 1930”, ele defendeu várias pessoas perseguidas pel o novo
regime por meio da Junta de Sanções, tribunal de exceção. Derrotou o governo em
alguns processos que tiveram grande repercussão. Elegeu -se deputado federal pelo
165

Partido da Lavoura, em 1934, mas um decreto varguista que atingiu os ex -


secretários de Estado não permitiu a sua diplomação. Nesse período , ele já exercia
a profissão de advogado, no Rio de Janeiro, e alcançou a presidência da Ordem dos
Advogados do Brasil. Além de exercer a profissão de professor da Faculdade
Nacional de Direito, “[...] Vivacqua substituiu Cecília Meireles à frente da Página de
Educação, no Diário de Notícias, de janeiro de 1933 até 1934” (SOARES, 1998, p.
119).

No ano de 1946, formou uma tendência no PSD e elegeu-se senador, participando


da Constituinte. “No ano seguinte, fundou o Partido Republicano (PR) concorrendo
ao cargo de governador [...], mas foi derrotado pela máquina burocrático -oligárquica,
formada durante o Estado Novo“ (SOARES, 1998, p. 120). Em seu programa de
governo, havia importantes propostas educacionai s, dentre as quais, a criação da
Universidade. Vivacqua manteve -se na oposição e, em 1954, reelegeu-se senador.

Nos mandatos de senador, alcançou destaque cuidando de questões re gionais e,


também, atuando em temas nacionais. Defendeu ainda , de forma consciente, a
descentralização do Estado por meio da municipalização e publicou vários livros. Ele
faleceu no dia 21 de janeiro de 1964. Embora conste em outras obras dados sobre a
origem de sua família e de sua trajetória política, Soares (1998, p. 120) diz qu e “[...]
seguramente, ainda falta uma biografia que resgate a rica contribuição de sua vida
pública”.

Partilhamos dessa afirmação do autor, pois percebemos que , na biografia extraída


de sua obra, não é mencionado que ele foi secretário da Instrução Pública no
Espírito Santo e um dos signatários do “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova” .
Além disso, nada é citado sobre a sua contribuição na implantação da reforma
educacional baseada nos preceitos da Escola Nova, movimento iniciado por
educadores que instituíram a Associação Brasileira de Educação (ABE) , no ano de
1924, e foram responsáveis por reformas educacionais em muitos Estados, na
década de 1920. Para Campos , Assis e Lourenço (2002, p. 17) , esses profissionais
iniciaram esse movimento
166

[...] com o objetivo de lutar pela democrati zação da educação brasileira e


pela aplicação dos conhecimentos das ciências humanas na organização de
um sistema escolar moderno e eficiente, capaz de contribuir para a
disseminação de conhecimentos úteis para a vida r eal em uma sociedade
em mudança.

A intenção desses educadores era renovar o ensino, trazendo para o Brasil idéias e
descobertas novas em Pedagogia, baseadas em conhecimentos da Sociologia e da
Psicologia para a consolidação de uma educação moderna. De acordo com
Lourenço Filho (2002, p. 356), a Escola Nova tinha os seguintes princípios gerais: o
primeiro deles, “[...] é o respeito à personalidade do educando ou o reconhecimento
de que deverá ele dispor de liberdade”. Assim, o desenvolvimento de cada aluno
dependerá de seus recursos e capacidades próprio s, por esforço e ação individual.
“[...] O impulso vital exprime uma exigência só possível de realizar -se pelo indivíduo
no indivíduo, como ser unitário, que harmonize tendências e conflitos” (LOURENÇO
FILHO, 2002, p.356, grifo do autor).

Essa proposição opõe-se à educação tradicional em relação ao seu aspecto


impositivo, “[...] caracterizado pelo apelo ao automatismo, com eliminação do valor
dos impulsos naturais, desejos e propósitos, fontes do sistema vi tal que é a
personalidade” (LOURENÇO FILHO, 2002, p. 356). Em conseqüência, hão de
modificar-se as relações entre aluno e professor, sem , contudo se verificar a idéia de
“abandono do educando” que produziria como conseqüência a negação da
intencional ação de educar.

O autor diz que “O segundo princípio resulta da compreensão funcional do processo


educativo, quer sob o aspecto individual, quer social” (LOURENÇO FILHO, 2002, p.
357). Esse processo depende do tempo, do crescimento e da maturação para que
ocorra, pois esses três fatores possibilitam ao educando formas cada vez mais
elevadas de “expressão de vida”, de modo eficiente e harmonioso, que só podem
acontecer pela experiência. Se assim não for, não haverá possibilidade de se
concluir nenhuma realização educa tiva. “[...] Todos os sistemas insistem no valor da
atividade, não em si mesma, como fim, mas visando aos fins que o educando
gradualmente a si mesmo se proponha” (LOURENÇO FILHO, 2002, p. 357, grifo do
autor).
167

Dessa maneira, as atividades dispersas e múl tiplas, segundo cada grau de


desenvolvimento ou idade do educando, passam a responder a algo sentido ou
desejado por ele. Aceitando essa “compreensão dinâmica”, deverão ser utilizadas
atividades livres e situações de jogo na ação educativa, como ponto de p artida para
desencadear propósitos relacionados com projetos que “[...] exigem observação,
análise, generalização, aquisição enfim dos quadros da vida social. Assim, o
interesse ensinará a disciplina e o esforço. De qualquer forma, aprender -se-á a fazer
fazendo, e a pensar pensando, em situações definidas” (LOURENÇO FILHO, 2002,
p. 357).

O próximo princípio definido por Lourenço Filho (2002, p. 357), “[...] abrange a
compreensão da aprendizagem simbólica em situações de vida social”. Se mpre é
considerado de cooperação social, uma situação de ensino qualquer, característica
que não era levada em conta pela escola tradicional. Contudo, é ela essencial na
educação, sendo por isso fundamental na vida humana. “[...] Tanto quanto a vida
biológica, a existência mental depende de interação do organismo e do meio físico,
como na interação de cada pessoa com o seu grupo, ou ambiente de pessoas, uma
coletividade, na qual evolui” (LOURENÇO FILHO, 2002, p. 357).

Dessa forma, à proporção que o desenv olvimento da pessoa se processa, esse


ambiente do qual a cultura é assimilada por ela, proporcionando depois a sua
participação, também se amplia. Para que o educando consiga afirmar a sua
personalidade própria, necessariamente necessitará da aquisição de algo “pessoal
ou existencial”, mas, ao mesmo tempo, de algo comum, compartilhado com outros.
“[...] Então a noção de liberdade individual encontra limites na de responsabilidade,
sem a qual não terá razões de direção e equilíbrio, na forma de ajustamento n ormal”
(LOURENÇO FILHO, 2002, p. 357, grifos do autor). Responsabilidade, liberdade e
atividade se exercem conjuntamente “em termos de vida social”.

Nesse sentido, a renovação defende que a própria escola se organize e funcione


como uma pequena comunidad e, de acordo com as exigências e necessidades da
vida de todos em comum. A personalidade , como é um “sistema de ação” , exige
funções mais abrangentes: “[...] a de sermos entendidos em função dos demais, e a
168

de podermos nos fazer entendidos pelos outros. Po r origem, função e destino, a


educação é um processo social” (LOURENÇO FILHO, 2002, p. 358).

Lourenço Filho (2002, p. 358) a centua ainda que “Temos, assim, um princípio final.
Qual seja o de que as características de cada indivíduo serão variáveis, segund o a
cultura da família, seus grupos de vizinhança, de trabalho, recreação, vida cívica e
religiosa”. Esse princípio é confirmado pela observação mais simples na vida de
cada um e “[...] também pela documentação histórica e a dos estudos antropológicos
em geral, que ampliam a escala de observação no tempo e no espaço” (LOURENÇO
FILHO, 2002, p. 358). São inegáveis as diferenças biológicas refletidas na expressão
de cada uma das pessoas. “[...] Tais diferenças, no entanto, são mais de
possibilidade de desenvol vimento que mesmo de qualificação essencial quanto as
aquisições possíveis, de ordem intelectual e moral” (LOURENÇO FILHO, 2002, p.
358, grifos do autor). Duas conseqüências significativas na reflexão pedagógica são
resultantes do reconhecimento desse fato .

A primeira é que não serão legítimos os fundamentos de qualquer doutrina


que pretenda qualificar os homens por sua origem, raça, nacionalidade,
idioma ou crenças. A Segunda é que o homem é, em grande parte,
expressão do meio cultural, das possibilidade s de desenvolvimento
espiritual que ele ofereça, ou enfim das condições em que viva ou passe a
viver. Nessas condições, a escola nova confia nas possibilidades de um
desenvolvimento intelectual e moral, resultante das oportunidades de
educação que a todos possam ser oferecidas com igualdade. Admite, enfim,
que tais sejam essa oportunidades, a vida e o mundo poderá unir os
indivíduos e os povos, em ideais sempre mais elevados de trabalho
produtivo e concórdia universal ( LOURENÇO FILHO, 2002, p. 358).

Os traços gerais dos “grandes pressupostos do movimento da escola nova”, assim


se delineiam, complementa o autor. Contudo, nada impede aos educadores,
independentemente das corren tes filosóficas, que se filiem a esses princípios e com
interpretações de ordem particular enriquecerem -nas. “Também nenhum educador,
qualquer que seja sua filiação filosófica, poderá renegar, se bem informado, que os
fins últimos que à educação possa propor, estejam na dependência de condições
objetivas, que a esses fins imprimam realidade” (LOURENÇO FILHO, 2002, p. 359).

Pensamos que é a partir desses princípios gerais da escola nova , que autores, como
Queiroz e Sobrinho (acesso em 17 jan. 2008), afirmam que, no paradigma da escola
nova, o aluno é considerado ativo e centro do processo de ensino e aprendizagem,
169

enquanto o professor é o facilitador desse processo e, esse paradigma fundamenta -


se no respeito ao ritmo de aprendizagem da criança, em sua singularidade, à sua
capacidade de pensar e à sua auto -estima. Como partia do princípio de que a
aprendizagem ocorre em grupos, pregava que cabia à escola fomentar situações de
participação e cooperação entre os alunos, a escola e a comunidade.

Os autores acrescentam ainda que o ideário escolanovista chegou ao Brasil, no ano


de 1920 do século XX, por Anísio Teixeira, entusiasmado pelas idéias de John
Dewey, que propagava novas maneiras de ensinar; por Fernando de Azevedo sob a
influência das idéias de Durkheim e por Lauro de Oliveira Lima, inspirado pelas
idéias de Piaget, exercendo grande influência nas reformas educacionais brasileiras.

Esse fato é constatado no Estado do Espírito Santo na reforma do ensi no proposta


por Vivacqua. Soares (1998) assegura que, ao assumir o cargo, Vivacqua não tinha
ainda uma proposta bem or ganizada de Escola Ativa. Apenas trazia as idéias
principais do que pleiteava desenvolver e, assim, passou a trabalhar diretamente
ligado ao Departamento do Espírito Santo da Associação Brasileira de Educação,
ajudando a organizá-lo. Desviando-se em parte das lamentações e acusações sobre
a formação dos professores, sugeriu , então, como modernos instrumentos de
ensino, a utilização do jornal, do rádio e do cinema nas escolas. Mas, para isso, teve
que conseguir vitória num debate com os conservadores, princi palmente sobre o
cinema.

Soares (1998, p. 40) assevera que “O uso do jornal, já incorporado como elemento
civilizador e só acessível aos alfabetizados, portanto, reprodutor da discriminação
social, não foi contestado”. Dessa forma, foi lançado pela Secret aria de Instrução,
um jornal quinzenal – que posteriormente passou a ser mensa l – denominado
“Resumo Escolar” (Foto 22). Esse jornal era destinado à divulgação da escola ativa,
“[...] com noticiário atualizado, nacional e internacional, inclusive com assun tos
infantis, e matérias visando o aperfeiçoamento dos professores” (SOARES, 1998, p.
40) e havia, no primeiro número, a recomendação de que se tornasse obrigatória a
sua leitura na sala de aula como um importante exercício recreativo, não como “um
livro de leitura escolar”.
170

Foto 22: Crianças elaborando o jornal Resumo Escolar na tipografia


Fonte: Soares, 1998

Contudo, é necessário lembrar que utilizar o jornal em sala de aula, sem


questionamentos, não auxiliará a formação de aluno s questionadores, reflexivos,
emancipados. Assim, ao lançar mão desse recurso, o professor necessita inovar a
sala de aula e essa inova ção tem início com a crítica (PAROLI; ALMEIDA, 2006). No
“Resumo Escolar”, eram utilizadas imagens coloridas e a particip ação de alunos em
sua impressão, mas teve sua circulação suspensa após a “Revolução de 1930”. Em
1932, a sua circulação foi retomada com a edição do n . 10, mas não teve
continuidade.

A utilização do cinema chegou a ser implantada, provocando “debates apaixonados”


e “desconfianças”. Soares (1998, p. 41) afirma que “[...] Um argumento elitista
sempre repetido era comparar o teatro, a ‘verdadeira arte’ com o cinema, que não
passaria de uma ‘diversão’ vulgar”. Havia ainda outras observações sobre o cinema ,
tais como: ser considerado em franco prejuízo em comparação à literatura, porque
embotaria a aptidão de redação e, quando apareceu o cinema falado, foi dito por um
membro da Academia Brasileira de Letras, como uma forma de alerta, que isso
representaria uma “ameaça” para a língua portuguesa. Havia os músicos que
alegavam, em forma de protestos , que, com o fim do cinema mudo , perderiam
mercado. Soares (1998, p. 41), porém, reitera que:
171

O Diário da Manhã reproduzia ainda artigos nacionais em defesa do cine ma,


de autores respeitados, como Oduvaldo Vianna. Este, além de informar
sobre o uso do cinema na escola e no ensino industrial e agrícola na União
Soviética, sublinhava que o ‘cinema falado pode ser o livro e o professor ao
mesmo tempo’ (Grifos do autor).

Essas proposições evidenciam, portanto, os debates sobre a utilização do cinema


nas escolas do Estado que, apesar das dificuldades encontradas, foi levado para
algumas delas. Archimimo Gonçalves confirma essas dificuldades em seu relatório
de 5 de dezembro de 1928, referente à inspeção das escolas dos municípios de São
Matheus, Conceição da Barra, Santa Cruz e Riacho, durante os meses de outubro e
novembro. Diz o inspetor que “É opportuno aclamar aqui a mim o direito de ter
applicado em primeira mão com serias difficuldades financeiras o cinema nas
escolas”.

O inspetor assinala também que, nos municípios de Itaguass u e Afonso Cláudio,


obteve bons resultados nas aulas práticas com demonstrações cinematográficas,
mas que, nos municípios de Santa Cruz e Riacho, ainda não tinha sido possível
fazer o mesmo, devido à escassez dos recursos para transportar o aparelho e os
acessórios. Archimimo Gonçalves (1928) diz que, como forma de estabelecer o
“intercâmbio didático” e estimula r as escolas mais atrasadas, filmou todas as escolas
em flagrante. Contudo, as intenções do inspetor, com as filmagens, eram também
mostrar ao Secretário da Instrução, conforme escr eve em seu relatório, a
necessidade de construção de casas para o funcionam ento das escolas e a “[...]
realidade desoladora da instrucção pri mária no interior”.

No ano de 1929, em uma entrevista concedida ao Jornal Diário da Manhã, Attilio


Vivacqua argumentou sobre a importância do cinema educativo, enfatizando os bons
resultados da aplicação dessa inovação em outros países. No Espírito Santo, diz
que foi criada a Filmoteca da Secretaria da Instrução com o objetivo de centralizar a
tarefa de selecionar, preparar, guardar, catalogar e trocar os filmes pedagógicos,
bem como a taref a de conservação dos aparelhos cinematográficos e
epidiascópicos.

Vivacqua (1929) declarou que o Grupo Escolar “Gomes Cardim” e a Escola Normal
estavam providos de instalações cinematográficas; que tinham sido encomendados
172

vários aparelhos portáteis para uso dos inspetores e que a adoção desse novo
aparato didático foi acolhida com muito interesse, nos meios escolares e fora deles.
Porém, era necessário ainda que os inspetores e professores se preparassem para
praticar essa inovação.

Apesar dos esforços empreendidos, no sentido de aquisição de projetores para


algumas escolas e de filmes, es sa preparação não atingiu todos os professores.
Além disso, de acordo com Soares (1998), Attilio Vivacqua fez algumas tentativas
para convencer a comunidade escolar e a sociedade de modo geral dos benefícios
do uso dessa nova tecnologia que, “[...] ligada ao progresso científico das
sociedades modernas, insere -se nesta concepção que define os meios de
comunicação de massa como capazes de irradiar a cultura para a populaç ão, ainda
em formação e deficiente culturalmente” (CATELLI, acesso em 15 jan. 2008).

Uma das tentativas feitas por Vivacqua consistiu na realização de uma sessão de
cinema falado no Teatro Carlos Gomes de Vitória, em que mais de três mil pessoa s
disputaram ingressos. A outra foi a projeção, no Grupo Escolar Gomes Cardim, do
filme Centenário do cafeeiro, na abertura do Curso Superior de Cultura Pedagógica .

Em todo material analisado , apenas dois relatórios trazem referências ao cinema nas
escolas e ambos foram escritos pelo inspetor Archimimo Gonçalves. No primeiro, de
5 de dezembro de 1928, já mencionado neste trabalho, o inspetor diz ter feito
demonstrações cinematográficas nos municípios de Itaguass u e Afonso Cláudio. No
segundo, referente à inspeção n os municípios de São Pedro do Itabapoana e Ponte
do Itabapoana, em junho de 1929, o inspetor diz que: “[...] Resta -nos entretanto a
effectividade do cinema como meio de instrucção concreta, de accordo com o desejo
de V.Exª”.

O projeto de Attilio Viva cqua sobre o uso também do rádio , como moderno
instrumento de ensino, conforme Soares (1988, p. 40), consistia na instalação de
radiotelefonia para “[...] proporcionar o contato das escolas do interior com as da
capital, facilitando ‘a transmissão de músic a, cursos, lições, conferências”,
encontradas mais facilmente em um “centro grande e civilizado”. Dessa forma, o
173

rádio seria utilizado como “’[...] elemento didactico de informação e approximação, a


serviço da unidade nacional’” (SOARES, 1988, p. 40).

Os documentos apontam que esse instrumento de ensino foi realmente implantado.


Em julho de 1935, foi publicada, na contracapa da “Revista de Ensino”, uma nota
explicativa sobre as vantagens da “radiophonia” para os povos e anunciando que foi
fundada na Capital, a “Rádio Club do Espírito Santo”. Em março de 1936, na mesma
mídia, consta num artigo sem autor , que o serviço de “Cine-Rádio Escolar” estava
crescendo animadoramente , revelando o avanço pedagógico do Estado.

O professor Luiz Edmundo Malizek, inspetor regional do ensino e técnico, dirigia


esse serviço, nomeado pelo Governo do Espírito Santo. Era ele também o
responsável pelo desenvolvimento de tal serviço nas escolas públicas do Estado.
Em 12 de março de 1936, a direção do “Serviço de Educação pelo Rád io e Cinema”
recebeu a visita do governador Capitão João Punaro Bley. Nessa ocasião, “O Prof.
Luiz Edmundo Malizek fez a projecção de vários jornaes educativos, por elle mesmo
confeccionados, de factos e aspectos interessantes desta bonita e moderna Capit al”
(1936, p. 36).

A reforma de Vivacqua previa , ainda, o preparo dos professores e dos inspetores


para o trabalho com os preceitos da Escola Ativa. Em 1929, conforme aponta Soares
(1998), Attilio Vivacqua trouxe para o Espírito Santo o professor paulist a Deodato de
Moraes, para que organizasse o Curso Superior de Cultura Pedagógica. Para tal, já
havia desencadeado, nas reuniões de professores e na imprensa , a defesa da
Escola Activa e, na cerimônia de abertura do curso, a um público composto de
professores e, na presença do presidente do Estado e de autoridades do meio
educacional, o professor Deodato de Moraes criticou veementemente o ensino
tradicional.

Como já tinha sido apresentado no meio educacional capixaba como diretor do


Curso Superior de Cultur a Pedagógica, em uma cerimônia ocorrida no final do mês
de julho de 1929, como enfatiza Soares (1998), a proposta de implantação da
Escola Ativa no Estado já era a discussão principal no campo da educação.
Vivacqua (1930, p. 3) informa no livro sobre a apl icação da Escola Ativa no Estado:
174

A introdução da escola activa em nosso Estado, autorizada mediante a Lei


nº 1.693, de 29 de dezembro de 1928, que prevê sobre a reforma do ensino,
representa uma das mais significativas e fecundas realizações de política
educacional. Depois de um intenso e largo trabalho, de preparação da
opinião pública, por uma constante e criteriosa propaganda dos objectivos e
methodos da escola nova, iniciámos a obra, que consideramos fundamental
em emprehendimentos dessa natureza, da f ormação do primeiro corpo de
inspetores e professores destinados a servir de vanguardeiros das idéas e
praticas da pedagogia activa.

O primeiro passo dado nesse sentido foi selecionar pessoas (inspetores


comissionados, professores e candidatos estranhos à Secretaria), por meio de um
concurso para inspetores escolares, cargo considerado por Vivacqua como “base da
construção pedagógica” que pretendia realizar. O segundo passo foi o “exame de
sufficiencia technica” dos professores rurais provisórios de concu rso, que antes
passavam por um estágio no grupo escolar, e recebiam instruções preparatórias.

A criação do Curso Superior de Cultura Pedag ógica ocorreu após os dois primeiros
passos para a introdução da Escola Ativa no Estado. Esse curso foi instituí do pelo
Decreto nº 9 750, de 30 de agosto de 1929, em caráter provisório, e “[...] destinava -
se ao aperfeiçoamento de inspetores escolares e professores indicados pelo
Secretário de Instrução, para formar o núcleo reprodutor da reforma do ensino.
Estava aberto até as pessoas estranhas ao magistério, como assistentes” (SOARES,
1998, p. 51). Mesmo sendo provisório, o curso equivalia para seus formandos ao
ensino superior.

Vivacqua (1930) expõe, em sua obra, as condições para o funcionamento do Curso


Superior e os programas aprovados pela Resolução nº 257, de 30 de agosto de
1929. Conforme mencionado, esses programas foram distribuídos em quatro partes:
Pedagogia Scientífica, Didactica, Escola Activa e Questões Technicas e Sociaes .
Em cada uma das partes , eram explicitados os conteúdos respectivos, cuja
organização teve a colaboração do diretor Deodato de Moraes, também, professor
da maior parte das disciplinas.

Deodato de Moraes, com amplos poderes, orientou e fez a aplicação da “Escola


Activa” nos estabelecimentos estaduais e teve acesso livre para fazer verificações e
coletar dados sobre o ensino. Assim, em setembro de 1930, no Congresso
organizado pela Associação Brasileira de Educação (ABE), Attilio Vivacqua
175

apresentou a Escola Ativa como inovação educac ional, a qual foi “[...] aprovada
como padrão e reconhecida como modelo para todo o país” (SOARES , 1998, p. 14,
grifos do autor). Contudo, conforme já observamos , essa inovação já vinha sendo
posta em prática em algumas escolas.

De acordo com Vivacqua (1 930, p. 17-18), durante todo o desenvolvimento do


Curso, funcionou no Grupo Escolar “Gomes Cardim”, conforme determinado no
decreto de sua criação, uma Escola Ativa de ensaio

[...] adaptada ás necessidades e exigencias da observação e pratica dos


cursistas. Essa instituição, que representa uma interessante e auspiciosa
experiencia pedagogica, foi a base para a installação, naquele
estabelecimento, de 2 padrões de escola activa – a integral e a transitoria.

Assim, foi instalada, anexa ao Grupo Escolar “Go mes Cardim” a primeira “Escola
Activa” do Estado, organizada pelo professor Deodato de Moraes, o qual informou a
Vivacqua (1930) que a escola estava funcionando sob a direção do prof essor
Placidino Passos e do inspetor escolar Luiz Edmundo Malisek, que o a uxiliava. Essa
escola tinha 134 alunos matriculados, “[...] distribuídos em seis turmas mistas, que
recebem grupos de aulas de 90 minutos, três vezes por dia, das 11 às 16,30”
(VIVACQUA, 1930, p. 18).

As aulas eram ministradas nas seguintes salas -ambiente: 1ª) Sala de Expressão; 2ª)
Sala da Medida; 3ª) Sala da Observação Terra e Vida; 4ª) Sala da Observação
Espaço e Tempo; 5ª) Sala da Saúde; 6ª) Sala da Documentação; 7ª) Sala dos
Trabalhos. Para cada uma dessas salas , encontravam-se especificados os
conteúdos que deveriam ser desenvolvidos.

Para Vivacqua (1930), a escola era organizada sob moderna orientação, por meio
de fichas de matrícula e freqüência, e todos os alunos eram submetidos a exames
técnicos e clínicos, feitos na Saúde Pública, os quais eram registrados na “Carteira
Biographica Escolar”. Os programas que determinavam a técni ca das aulas eram
organizados pelo Curso Superior de Cultura Pedagógica e apresentavam
flexibilidade tanto em relação ao mestre, quanto ao aluno.
176

O movimento dos alunos era rotativo pelas salas, onde ficava o respectivo professor
das disciplinas. As lições eram todas orientadas de acordo com o ensino ativo, ou
seja, respeitava a individualidade do aluno e propiciava o seu desenvolvimento,

[...] sem a interferencia dos exames, das promoções e da disciplina classica.


Toda aula, comprehendendo uma parte activa, uma de lição e outra de
applicação, termina sempre por um relatorio collectivo, afim de desenvolver
no trabalho, o sentimento da solidariedade, e por outros i ndividuaes, afim de
fixar com precisão e clareza, as noções aprendidas (VIVACQUA, 1930, p.
20).

As visitas e excursões, com caráter instrutivo e educativo, previamente traçadas e


previstas na organização da Escola Ativa, também , já haviam sido iniciadas. A
disciplina adotava o regime “[...] “do ‘self governement’, onde cada creança é levada
á idéa da responsabilidade pessoal, a ter emfim, personalidade definida”
(VIVACQUA, 1930, p. 20). Nos grupos formados naturalmente, havia a eleição de
um líder que era incumbido de manter o bom andamento e, também, o bom
rendimento dos trabalhos desenvolvidos. Assim, cada grupo avançava de acordo
com as personalidades de seus membros. “[...] O professor é, apenas, na Escola
Activa, um guia zeloso, um amigo intelli gente e solicito, a distribuir conselhos e a dar
o bom exemplo da delicadeza e do amor ao trabal ho” (VIVACQUA, 1930, p. 20).

O autor assegurou que, ainda no ano de 1930, teriam idêntica organização as


escolas anexas à Escola Normal Pedro II, os grupos esc olares de Castelo,
Cachoeiro de Itapemirim, Muqui, Alegre, Colatina, Veado e Mimoso , que
funcionariam como institutos -modelo, onde os professores do Estado seriam
iniciados e treinados nos novos métodos de ensino. Estava também sendo
preparado um “padrão de escola rural unitária”, que obedeceria à s normas da nova
remodelação didática do Estado. Essas escolas seriam , segundo Vivacqua (1930 , p.
21), “[...] centros organizados de experimentação e irradiação dos princípios da
reforma”. A intenção era

Animar a organização escolar existente, do espirito novo “[...] depois


transformal-o gradativamente segundo as conveniencias e recursos de cada
escola, para finalmente integral -a no systema de educação activa
(VIVACQUA, 1930, p. 21).
177

Esse movimento renovador tamb ém foi estendido às escolas particulares de ensino


e vinha ganhando aceitação entre o professorado, que se propôs a colaborar, de
acordo com suas possibilidades, na execução do programa do governo. Nesse
contexto, com relação ao regulamento da instrução pú blica, é importante lembrar a
declaração de Vivacqua (1930, p. 27):

O regulamento provisorio baixado pelo decreto nº 10.171, de 24 de maio de


1930, provendo sobre a adaptação gradual do ensino normal ao regimen
planejado, a creação de elementos educaciona is novos no paiz, como os
clubes escolares agricolas, as missões culturaes [...] e outros [...], a
constante preocupação de elevar a cultura do magisterio estadual, a par das
variadas instrucções especiaes da propaganda social do valor do ensino e
da necessidade do aperfeiçoamento dos methodos – eis um conjunto
organico de iniciativas e actividades que, dentro da orientação traçada de
um criterioso regimen transitorio, se vem realizando a todo instante,
segundo as possibilidades encontradas .

Nesse sentido, conforme apontamos anteriormente, Vivacqua previu, inicialmente,


em seu plano de reforma, capacitar os professores de acordo com os princípios e
práticas da Escola Ativa e, dessa forma, acreditava que os Decretos
Regulamentares nºs 6.501 e 7.994, de 1924 e 1927, respectivamente,
complementados “[...] pela autorização legislativa contida na lei nº 1.693, de 1929,
que habilitou o governo a reformar o ensino, permittiriam iniciar, sem tropeços, o
programma governamental” (VIVACQUA, 1930, p. 28).

Attilio Vivacqua (1930) expõe, ainda, em sua obra, o projeto do regulamento do


ensino primário em artigos não numerados , anunciando: “O extracto seguinte do
projecto do regulamento define, em linhas geraes, os objectivos do ensino primario,
como devemos organizal -o no Estado” (VIVACQUA, 1930, p. 30). No primeiro
desses artigos não numerados, consta que: “O ensino primario sera organizado de
accordo com os principios da pedagogia scientifica, para ministrar a educação
integral adaptada ás condições e finalidades da c ivilização, sob o seu aspecto
humano e brasileiro” (VIVACQUA, 1930, p. 30).

As outras deliberações diziam respeito a como deveria ser a escola; onde deveria
estar localizada; como deveria se adaptar à região que se “propõe a servir”; como
seria a colaboração da escola juntamente com a família e os alunos; onde seria
fornecido o ensino primário e em que “graus”; como deveria ser a escola rural
178

localizada na zona agrícola e na zona marítima; como as escolas deveriam estar


aparelhadas e continham , ainda, especificações sobre as atribuições da Secretaria
da Instrução para atender aos objetivos da escola rural; a elaboração de planos de
extensão educativa extra -escolar e como seriam organizados esses planos. Nessa
exposição, Vivacqua (1930) não emite nenhum pare cer ou previsão sobre o projeto
do regulamento. Dessa maneira, a reforma que previu foi sendo colocada em
prática.

Conforme demonstraram os dados, o Curso Superior de Cultura Pedagógica foi


desenvolvido e, assim , no dia 3 de setembro de 1930, segundo Soares (1998), o
professor Sezefredo Garcia de Rezende, sob aplausos , defendeu sua monografia
sobre Cooperação e extensão cultural . Esse era um dos 35 trabalhos que foram
publicamente apresentados pelas alunas e alunos concludentes do Curso Superior
de Cultura Pedagógica em Vitória. “[...] De acordo com o projeto de Attilio Vivacqua,
estavam prontos para iniciar o processo de transição entre a velha escola tradicional
e a orgulhosamente denominada Escola Activa Brasileira do Estado do Espírito
Santo (SOARES, 1998, p. 20, grifos do autor).

Porém, Dr. Lopes Ribeiro escreve em seu relatório , de 25 de outubro de 1933,


referente à inspeção escolar dos municípios de Alegre, Muniz Freire, Rio Pardo e
Siqueira Campos, uma nota sobre a impossibilidade d e os professores trabalharem
com os métodos modernos de ensino:

Os metodos modernos de ensino são absolutamente impraticaveis nas


zonas que percorri, até mesmo nos centros mais povoados, para
alfabetização dos alunos e, ainda, o ensino coletivo nas classes mai s
adiantadas.
Varios motivos levam os professores a abandoná -los: a falta de cartilhas no
comercio, a pobresa dos alunos para adquirir outra coisa que não seja a
carta de a b c, a matricula em qualquer tempo do ano, a ignorancia de
certos pais espalhada no ambiente que envolve as professoras e faz co m
que élas cedam, afinal é pressão do meio.

A manifestação do inspetor indica que, apesar da existência e divulgação dos


modernos métodos, eles não podiam ser c olocados em prática pelos professores,
por conta dos motivos aqui expostos agravados pela “[...] falta absoluta de material
em grande número de escolas que muito perturba tambem desenvolvimento do
ensino público” (RIBEIRO, 1933). Tais proposições nos incita a concluir que os
179

professores desenvolviam o tr abalho de alfabetização de acordo com os recursos


humanos, materiais e pedagógicos que possuíam.

Paralelamente aos problemas enfrentados nas escolas, a difusão da Escola Ativa


continuava a ser feita (Foto 23). Em 29 de setembro de 1930, o inspetor Franc isco
Generoso da Fonseca diz que , no município de São Matheus, nas escolas por ele
inspecionadas, tem explicado em sucessivas palestras os “novos e eficientes
métodos da Escola Activa”. Nessas escolas, tem encontrado boa receptividade por
parte das professoras e preparou inclusive, uma demonstração pública das aulas
ativas em São Matheus.

O relatório do inspetor Alberto d’Almeida, de 10 de setembro de 1930, sobre sua


inspeção às “aulas activas” do Grupo Escolar Gomes Cardim, também traz
informações de como estava o andamento do trabalho. Ele afirma que, na Escola
Ativa, as aulas são “cheias de vida”, todos trabalham e que não é, como supõem
alguns professores e algumas pessoas leigas , “[...] uma casa de loucos; mas um
logar onde as crianças buscam liv remente a educação completa para a vida”.

Foto 23: Alunos e alunas da Escola Ativa


Fonte: Soares, 1998

Tanto que, numa escola onde já esteja funcionando regularmente tal ensino, o
silêncio que se pode notar é um sinal de que todos estão trabalhando, i nteressados
nos múltiplos assuntos das aulas variadas. Porém, conforme revela o inspetor,
180

“Infelizmente, isso não notamos ainda aqui, pois bem podemos declarar que, apezar
das aulas serem activas, o periodo ainda é de transicção. Ainda o barulho de uma
aula é ouvido na outra, atrazando assim a marcha do ensino” (D’ALMEIDA, 1930). O
inspetor complementa o relatório sobre as aulas ativas na referida escola afirmando
que “Cêdo, felizmente, cêdo, poude chegar até nós a bemdita reforma do ensino,
substituindo as nossas escolas tristonhas, em verdadeiras colmêas de alegria”.

Newton Ramos, lente de História Natural da Escola Normal “Muniz Freire”, de


Cachoeiro de Itapemirim , escreveu um artigo para a Revista de Educação nº 14
(1935, p. 76-77) elogiando também o novo método de ensino empregado no interior
do Estado, com o título: “A conquista do novo methodo de ensino”. Nesse artigo, ele
diz que o trabalho que vem sendo feito no Estado ultimamente, em relação à
instrução, difundida da cidade ao sertão, ”[... ] onde centenas de crianças buscam
luzes para os seus pequeninos cerebros, é realmente grandioso e digno dos nossos
melhores applausos e acolhimento” (RAMOS, 1935, p. 76). No artigo supradito, o
autor noticia ainda que:

Hoje, quem se der ao trabalho de se embrenhar pelo interior do Estado, há


de sentir-se, de momento em momento, sacudido de alegria, tocado de
contentamento, em contemplar, aqui e alli, bando de crianças garrulas, de
sacolas ao hombro, encaminhando -se ás escolas .

Complementando a exposiçã o dos fatos, Ramos (1935) diz que é possível perceber
que há entusiasmo nos alunos na “busca do saber” e que não são só as crianças
que estão se beneficiando da mudança, que há rapazes com idade superior a
dezoito anos, em algumas fazendas que, depois do t rabalho nos campos, se dirigem
às aulas. Nas escolas, o clima é de alegria e é possível perceber “comunhão”,
cordialidade entre educador e alunos.

O desenvolvimento dos trabalhos estimula o interesse dos alunos que têm mais
aproveitamento, sem o “espanta lho” da palmatória ou da vara de marmelo “[...]
empregada abusivamente pelos velhos professores, que só sabiam ministrar
rudimentares conhecimentos à custa de pancadarias. Veio no entanto, a Escola
Nova, dispertando na criança interesses relativos á vida” (RAMOS, 1935, p. 77). Na
visão do inspetor, aquela escola que coagia os alunos a ficar presos às carteiras por
181

várias horas foi desaparecendo aos poucos, dando lugar a um ambiente de


espontâneas manifestações, tornando a escola num lug ar de liberdade e atividade.

Pelo exposto, na manifestação de Newton Ramos , fica evidente que a Escola Ativa
havia sido implantada com êxito em algumas instituições escolares e que as reações
manifestadas pelos alunos demonstravam que a mudança tinha sido bastante
benéfica. Contudo, há indícios, nos livros de registros de materiais, nos relatórios e
termos de visita analisados , de que o método intuitivo não foi abandonado pelos
professores, pois, além das cartas do Ensino Intuitivo ser um dos materiais
constantes nas escolas, havia professores, embora fossem poucos, que o
requisitavam aos inspetores. Outro fato que revela que o método intuitivo continuava
a ser utilizado, é a aula sobre “Lição de Cousas” publicada na Revista de Educação
no ano de 1937.

Um fato é inegável, os relatórios e termos de visitas dos inspetores , nos anos que se
seguem, embora em número menor em relação aos de 1928 e 1929, trouxeram
menos denúncias sobre o insucesso das escolas do Estado e do pouco
aproveitamento dos alunos. Em muitos relatórios, os reg istros dos inspetores
apontaram que os alunos tiveram aproveitamento regular ou bom e que os
professores são esforçados e/ou competentes e ensinam com método. Apenas uma
observação é constante nesses documentos: a orientação aos professores sobre a
Escola Ativa pelos inspetores.

Esmerino Gonçalves expõe , em um termo de visita à Escola Pública Mixta Rural de


“Mucuratá” do município de Santa Cruz, em 29 de abril de 1932, que a professora de
concurso da escola “[...] ensina com methodo e dedicação, desempenha ndo a
contento a missão de educadora”. Sobre os alunos, ele diz que os que foram “[...]
arguidos nas principaes materias do programma, revelaram aproveitamento
satisfatório”. O mesmo inspetor esclarece ainda sobre a Escola Pública Mixta de
Piranema, município de Fundão em 26 de abril de 1932, que orientou a professora
sobre a Escola Ativa e que esta continua trabalhadora e esforçada.

Um relatório enviado ao secretário do Interior e Justiça, em 3 de janeiro de 1933,


pelo chefe da seção de tombamento e de co ntrole de material Sr. Pedro de Oliveira
182

Coutinho, localizado na pasta do Fundo Educação, trouxe alguns dados sobre o


fornecimento de materiais e móveis “[...] aos colégios e outros estabelecimentos de
ensino particulares, pelo Almoxarifado da extinta Secr etaria da Instrução, hoje
Departamento de Ensino Público” (COUTINHO, 1933).

Consta no relatório que foi encontrado pelo chefe da seção no Atheneu Espírito
Santense, no Regimento Policial Militar (Escola Regimental) e no Externato Julio
Penna, referente às três escolas: duas Cartas de Parker e quatro mapas do ensino
intuitivo, dentre outros materiais. Sobre o Colégio Nossa Senhora Auxiliadora
(Carmo), Coutinho (1933) diz que foi informado pela irmã superiora que a Secretaria
de Instrução havia fornecido 500 exemplares de livros e cartilhas para serem
vendidos: 100 exemplares da Nova Cartilha Mariano de Oliveira, 100 exemplares de
Leituras Intermediárias, 100 exemplares do 1º livro de Erasmo Braga, 100
exemplares do 2º livro de Erasmo Braga e 100 exemplar es do 3º livro de Erasmo
Braga.

Esse fornecimento foi feito no ano de 1928, porém não foram vendidos todos os
exemplares e havia ainda uma outra quantidade que devia ser oferecid a às alunas
pobres, de acordo com a determinação do Sr. Secretário. Sobre esse as sunto,
Mortatti (2000, p. 199) assevera que , com a expansão da indústria e do mercado
livreiro, e a consolidação do livro didático como

Instrumento privilegiado de ensino, mediador entre as tematizações,


normatizações e concretizações pedagógicas, intens ifica-se, [...] a
necessidade de controle por parte dos órgãos oficiais que aprovam,
autorizam e compram livros didáticos para distribuição entre os alunos
pobres das escolas públicas [...].

Podemos dizer que, no contexto do ano de 1928, em que a falta de materiais nas
escolas era constantemente denunciada pelos inspetores, associada à falta de
condições financeiras da população para aquisição do material necessário, a adoção
de uma medida como essa, se colocada em prática, traria incontáv eis benefícios.

De acordo com Coutinho (1933), a quantidade de livros oferecidos às alunas pobres


era a seguinte: 10 Nova Cartilha Mariano de Oliveira, 41 de Leitura Intermediária, 43
1º livro de Erasmo Braga, 54 2º livro de Erasmo Braga e 51 3º livro de Erasm o
183

Braga. Após fazer a verificação de todo o material fornecido às ref eridas escolas,
Coutinho (1933) confirma que havia um saldo de 198 exemplares. Assim, sugere ao
secretário que estes sejam distribuídos aos alunos pobres do Colégio Nossa
Senhora Auxiliadora e, caso algum fosse vendido, a importância arrecadada deveria
ser creditada na “Caixa Escolar” da localidade.

Esse fato reafirma a circulação das Cartilhas de Mariano de Oliveira, dos livros de
Leitura Intermediária e os de Erasmo Braga no ano de 1928 e, provavelmente, a sua
continuidade nos anos posteriores, pois o presente relatório era de 1933 e Coutinho
sugere a doação dos livros aos alunos, ou a possibilidade de venda. Como não
foram localizados outros documentos que trouxessem informações de quai s livros
didáticos foram adotados na década, pensamos que tal sugestão ao secretário não
seria feita por Coutinho (1933) para um material obsoleto.

A única referência a livros didáticos constante nos documentos averiguados a partir


de 1930 foi localizada na capa (parte interna) da Revista de Educação n º 30-31, em
que há uma lista com o título “Livros primários” e a recomendação da Companhia
Editora Nacional, certamente aos professores , para não adotar na escola um livro
qualquer, que optassem pelos melhore s e que estivessem de acordo com os
preceitos pedagógicos e higiênicos em relação à qualidade do papel, tamanho dos
tipos, simplicidade, correção da linguagem, natureza dos assuntos expostos e
clareza.

Sendo assim, sugeria que eles preferissem os constan tes na lista abaixo, por serem
“[...] óptimos auxiliares do professor primário, approvados e aconselhados pela
Secretaria da Educação e Saúde Pública do Estado do Espírito Santo”:

1º Anno – Cartilhas
O amigo da Infância – Stella Brant de Carvalho
Meu Livro – Theodoro de Moraes
Ler Brincando – Thales de Andrade

1º Anno – Leitura
Sei Ler – Intermediário – Theodoro de Moraes
Novas Leituras 1º - M. Oliveira e R. Dordal
184

A seguir, encontravam-se elencados os livros de leitura do 2º, 3º e 4º anos, que


julgamos não ser pertinente aqui relacioná -los. Considerando o dispost o no Decreto
nº 6.501, de 1924, que continuou a vigorar na década de 1930, apesar de ter sido
complementado pelo Decreto 7.994 e pela Lei nº 1.693, em alguns aspectos já
mencionados neste trabal ho, na questão da adoção de livros didáticos , não há
registros, em nenhum documento posterior , indicando que ocorreram mudanças
nesse sentido.

Dessa forma, o Decreto nº 6. 501 (1924) determinou, no art. 82, que: “Nas escolas
públicas só serão permitidos os livros adoptados pelo Governo, cabendo ao
professor o direito de escolher entre os adoptados os que mais convenham á sua
classe”. Essa escolha era averiguada pelos inspetores, pois dentre as suas
atribuições, encontrava-se também a de verificar “ [...] os livros adoptados nas
escolas e a sua conformidade com os programmas de ensino e preceitos
pedagógicos” (ESPÍRITO SANTO, 1924, p. 16).

Como não foi localizado um novo regulamento prevendo quais livros didáticos foram
adotados a partir de 1931, não temos como saber se os relacionados pela
companhia Editora Nacional , apesar de aprovados e aconselhados pelo Governo,
foram ou não adotados para que os professores fizessem sua opção, ou se foram
estes os escolhidos pelos professores.

Em 1930, quando é dada posse à Junta Governativa constituída por João Punaro
Bley, Afonso Corrêa Lírio e João Manuel de Carvalho, encontravam -se em
desenvolvimento nas escolas a aplicação da Escola Ativa e a utilização do jornal,
cinema e rádio. Os documentos analisados apont am que essas mudanças
continuaram em prática no decorrer do período. Soares (1988) informa que a Junta
Governativa, logo depois de assumir o poder , desfez a equipe que preparava as
mudanças para a Escola Activa. O capitão João Punaro Bley, Interventor Fede ral,
“[...] convocou os professores comissionados para aquele trabalho, mas só Paulo
Gomes Cardim compareceu, prestando solidariedade ao governo deposto [...]. Mas
era preciso desmontar a máquina deixada por Attilio Vivacqua” (S OARES, 1988, p.
91, grifos do autor).
185

O autor diz ainda que o inspetor Bodart J únior, que havia trabalhado com Attilio
Vivacqua sem, contudo, ser indicado para o Curso Superior de Cultura Pedagógica ,
escreveu um livro dividido em capítulos no jornal Diário da Manhã, criticando a
Escola Ativa cujo ponto central era o estímulo à “liberdade em excesso”. O inspetor
que era conservador temia a perda do controle disciplinar.

Mesmo assim, ao que tudo indica , o legado de Vivacqua não foi totalmente
desmontado. Afinal, as mudanças nã o são instantâneas. Logo, não foi localizada ,
nos documentos acessíveis, uma nova regulamentação que previsse a adoção de
um método específico no período. Consta apenas que , no ano de 1931, foi
aprovada, em conformidade com o disposto no art. 41 do Decreto nº 7.994, a
Resolução nº 375, que adotou “[...] programas de ensino para uso das escolas
primárias do Estado”.

No art. 41, encontrava-se disposto que: “A Secretaria da Instrucção organizará os


programmas de ensino, distribuindo as matérias pelos diverso s annos do curso das
escolas”. Dessa maneira, de acordo com o prescrito, compunha m o programa as
seguintes matérias e conteúdos: “Leitura por sentenciação, Linguagem oral,
Linguagem escripta, Arithmética, Instrucção moral e cívica (Conselhos), Noções de
Hygiene (Conselhos), Canto e Gymnástica”.

Para cada disciplina, encontravam -se dispostos os procedimentos que deveriam ser
adotados pelos professores, os materiais que deveriam ser utilizados (inclusive a
cartilha, mas não diz qual), quais conselhos deveriam ser dados aos alunos em
Instrução moral e cívica, os assuntos que deveriam ser aconselhados em Noções de
Higiene, os tipos de música na matéria “Canto” e os tipos de exercícios em Ginástica
para o desenvolvimento do programa. Após a exp osição do programa da matéria
“Leitura por Sentenciação”, há uma nota explicativa: “Com a recordação da cartilha
(findo o primeiro semestre) a classe devera estar lendo correntemente e conhecendo
a pontuação”.

A apresentação das matérias e dos conteúdos feita, no documento, se estende do 1º


ao 4º ano do curso primário elementar. A complexidade e exigências em relação aos
conhecimentos são gradativas e complementares e são mencionados ainda alguns
186

procedimentos, sob a forma de sugestões e quais os materiais pedagógicos ou


recursos de ensino e aprendizagem os professores usavam para alcançar os
objetivos do trabalho.

Não há, contudo, referência a qual método ou cartilhas/livros eram utilizados.


Embora haja, em um termo de visita do inspetor Esmerino Gonça lves, de 6 de abril
de 1932, a seguinte afirmação: “Os livros são os adoptados pelo regulamento” ,
torna-se impossível distinguir se o inspetor se referia ao regulamento de 1924 ou a
um novo regulamento, pois tal documento não é sequer mencionado nas lista s
existentes no Arquivo Público e na Assembléia Legislativa, em que constam toda a
legislação publicada no Estado do Espírito Santo.

Após o ano de 1930, o único decreto encontrado que trazia determinações sobre o
funcionamento das escolas foi o Decreto -Lei nº 9.255, de 13 de abril de 1938 , que
tratava das “[...] condições para o funcionamento dos colégios particulares, dispõe
sobre a obrigatoriedade do ensino e dá outras providências”. Sobre os colégios
particulares, trazia normas gerais para a instalação e funcionamento dessas escolas,
inclusive a distância de uma escola para outra, que recebia o nome de
“Circunscrição Escolar”. Isso queria dizer que, num raio de três quilômetros de uma
escola pública ou particular, não poderiam ser instaladas outras escol as da mesma
categoria, a não ser que a “capacidade didática” das instalações da escola existente
não fosse suficiente ou que toda a população em idade escolar não fosse atendida.

No art. 2º, constava que podiam dirigir estabelecimentos particular es de ensino ou


ministrar o ensino pré-primário, primário e o complementar no território do Estado,
somente “[...] os brasileiros natos ou naturalizados que hajam prestado serviço
militar ao Brasil com os requisitos de idoneidade moral, intelectual, profis sional ou
tecnica, a juizo do Departamento de Educação”. A organização curricular da escola
estava prevista no art. 4º que prescrevia:

Todo estabelecimento de ensino particular devidamente registrado no


Departamento de Educação na forma deste Decreto -Lei, é obrigado a
observar o seguinte;
a) o ensino obrigatório de língua vernácula, da história pátria, da geografia,
da instrução moral e civica, da educação fisica e dos trabalhos manuais:
187

b) a ministrar exclusivamente na língua vernácula o ensino pré -primário e o


complementar;
c) a só adotar os livros aprovados pelo Departamento de Educação [...].

As outras determinações tratavam de assuntos referentes a patriotismo (festas


cívicas, hino à bandeira, etc.) , pedidos de registro de escolas particulares, valor de
taxas a serem pagas e de normas a serem cumpridas para que o registro da escola
não fosse cassado.

As determinações sobre a obrigatoriedade do ensino versavam sobre o dever do


Estado em assegurar à infância e à juventude, o ensino primário obrigatóri o e
gratuito e o “[...] prevocacional e profissional destinado ás classes menos
favorecidas” (ART. 1º, DECRETO Nº 9.255, 1938). O parágrafo único rezava que ,
desde que fossem observadas as exigências contidas nes se decreto, era livre a
iniciativa particular para cooperar com o Estado nesse sentido. A matrícula e a
freqüência eram obrigatórias a todas as crianças com idade entre sete e quatorze
anos de idade, que residissem num raio de até três quilômetros de uma escola (art.
20).

Essa limitação de idade da s crianças para serem matriculadas não implicava


proibição dos analfabetos acima de 14 anos, desde que houvesse vaga na escola e
não existissem Cursos Noturnos de Educação Popular na “Circunscrição” prevista
(PARÁGRAFO ÚNICO). O art. 21 estabelecia que ca bia às autoridades e aos
professores, de modo geral, “[...] matricular “ex-ofício” as crianças analfabetas em
idade escolar existentes na ‘Circunscrição’ de uma escola pública ou
subvencionada”. O pai, tutor ou responsável pelo menor matriculado “ex -ofício”, era
notificado pelo inspetor da região ou pelo professor, no caso das escolas isoladas
para que providenciasse, no prazo de 30 dias, o comparecimento do aluno à escola
respectiva.

Caso não fosse considerada tal determinação dentro do prazo estipulado e,


verificado por meio de comunicação do professor que o menor matriculado “ex -
ofício” não compareceu à escola, o responsável por sua matrícula (inspetor ou
delegado de ensino) deveria impor ao pai, tutor ou responsável uma multa de
50$000 a 100$000. Tal p rocedimento só seria evitado se, no período do prazo
188

referido, fosse “[...] alegado e provado motivo de força maior, julgado procedente
pela autoridade competente para impôr a multa” (§ 2º). A partir do que fosse
decidido pelo “[...] inspetor ou delegado d e ensino relevando a omissão na fórma do
paragrafo anterior, haverá recurso necessário dentro de 10 dias, para o diretor do
Departamento de Educação que poderá, conhecendo das alegações fe itas, tornar
efetiva a multa” (§ 3º).

Havia multa também de 50$00 0 imposta pelos inspetores de ensino da Região aos
pais, tutores ou responsáveis que , por motivo não justificáv el, dificultassem ou
impedissem a freqüência escolar das crianças sob sua responsabilidade
matriculadas em uma escola pública e, caso houvesse re incidência, o valor da multa
seria o dobro (art. 22). O parágrafo único estabelecia que penalidade igual seria
imposta aos que direta ou indiretamente , criassem, sem motivo justo, impedimentos
à fundação ou funcionamento de uma escola pública. Os valores referentes a todas
as multas pagas eram revertidos “[...] em bene ficio do Fundo de Educação” ( art. 25).
Era por meio do Fundo de Educação ou pelas Caixas Escolares que o Estado
auxiliava os alunos reconhecidamente pobres .

Os recursos utilizados pelos professores em suas aulas foi outro assunto por nós
averiguado nas fontes a que tivemos acesso. Sobre isso, detectamos, po r meio de
um artigo publicado no ano de 1935, escrito pelo diretor do grupo Escolar Bernardino
Monteiro de Cachoeiro de Itapem irim, Dr. Osvaldo Marchiori , que a dramatização era
um dos recursos de aprendizagem utilizado s nas escolas. Soares (1988, p. 62)
também afirma que “As excursões e os jogos de xadrez, estavam incorporados ao
ensino” (Foto 24).
189

Foto 24: As excursões e o jogo de xadrez


Fonte:Soares, 1998

No artigo, Marchiori (1935) informa so bre a origem do teatro e menciona quanto a


imitação é agradável às crianças, além de propiciar a expressão de idéias sobre o
mundo e a vida, a construção de experiências e a manifesta ção de suas idéias, seus
impulsos. Acrescenta ainda que:

Explendida forma de expressão, impõe-se pedagogicamente em todas as


escolas a dramatização, pois nossas creanças, regra geral, no trabalho
normal de classe, só se valem da expressão linguística; pou co desenham,
quasi nada modelam, escassas vezes constroem algo, raramente cantam e
nunca dansam ( MARCHIORI, 1935 , p. 24).

Dessa forma, afirma que a dramatização na educação é essencial, bem como todas
as atividades artísticas, porque possui “elementos em ocionais”, que contribuem para
que a humanidade não se esqueça e valorize mais os superiores dons da vida
espiritual, como a paz, o entusiasmo e a felicidade, por viver atormentada pela
preocupação utilitarista excessiva da época. Havia ainda o benefício d e proporcionar
satisfação aos alunos de todos os “graus de desenvolvimento” que assistiam.

Assim, o trabalho com a dramatização era gradual: os alunos do 1º ano inicia vam
com os simples jogos de imitação, de acordo com os projetos em desenvolvimento
ou com outros temas de interesse previamente tratados. As imitações iniciais
estavam relacionadas com as cenas da vida familiar (aniversários, visitas, refeições,
a visita do médico, etc.); comportamentos dos trabalhadores (apanhador de café,
190

marceneiro, etc.) e, poderiam também dramatizar temáticas pequenas rela tivas às


estações do tempo, ao vestuário, à alimentação, etc., ou ainda historietas sobre
animais. Eram dramatizações mais espontâneas, porém subordinada s a certas
regras. Para Oliveira (acesso em 15 jan. 2008):

[...] A dramatização é mais espontânea quanto maior for a contribuição


trazida pela criança, quanto mais criador for o seu jogo, não só quanto à
linguagem (palavras suas), mímica (gestos seus) e marcação de cena
(movimentação), e também (no ca so de atividades correlatas) quanto à
iniciativa de pesquisa e outras actividades [...].

Pensamos que a espontaneidade da criança numa cena dramatizada pode estar


relacionada com o conhecimento que ela tem sobre o que vai representar. Se ela
conhece bem a situação ou o tema, se sentirá mais segura e , conseqüentemente,
mais espontânea.

Para os alunos de oito a doze anos de idade, eram apropriadas as dramatizações


sobre exploradores, índios, inventores, navegadores, etc., porque os simples jogos
de imitação já não interessava m mais a eles. Os educadores podiam , ainda, nessas
idades dos alunos, “[...] personificar figuras celebres ou interpretar assumptos outros
que se coadunem, principalmente com seu amor á aventura, aos grandes feitos, mas
normalmente relacionados com o trabalho da classe” (MARCHIORI, 1935, p. 25).

Depois, vinham as dramatizações mais complexas de fatos históricos (Foto 25),


quadro vivo e outras, além de diversos trabalhos de invenção, podendo ainda ser
aproveitados, o teatro de sombras e o de bonecos. As dramatizações não podiam
ser longas, porque, além de fatigar desnecessariamente os alunos, demandariam
muito tempo.
191

Foto 25: Grupo de alunos que dramatizaram o descobrimento do Brasil


Fonte: Revista de Educação, 1935

A dramatização já se tornara um hábito nas escolas, tanto que era muito comum os
alunos dramatizar um tema de uma palestra ou de uma leitura, uma data ou outro
assunto que fosse do interesse deles. O mais comum era dramatizarem assuntos
relacionados com projetos diversos ou como fechamento de trabalhos, em que era
costume que fizessem de um “modo festivo”.

Grande ênfase era dada às comemorações cívicas e ao encerramento do ano letivo


com solenidade. De acordo com o disposto no Regulamento , Decreto nº 6.501/1924
(p. 65) era dever dos professores “ [...] promover festas cívicas e commemorar as
datas nacionaes, explicando -as em linguagem ao alcance das creanças”. Essa
determinação foi complementada pela Resolução nº 1 .511, de 11 de novembro de
1938, a qual previa que os professores deviam encerrar as aulas, no dia 19 de
novembro, “[...] com exceção do Grupo Rural de Santa Maria, no distrito de
Jequitibá, municipio de Santa Leopoldina e das escolas rurais especializadas,
situadas em núcleos de colonização estrangeira, ora sujeitas a um regime especial”.

Estabelecia, ainda, que, no encerramento das aulas, juntamente com a cerimônia de


“caráter solene” da Festa da Bandeira, os professores deveriam fazer a entrega dos
boletins e dos certificados de aprovação aos alunos. Todas as atividades deveriam
obedecer ao programa elaborado pelo Departamento de Educação. Após o
cumprimento dessa determinação, os professores deveriam fazer um relatório,
192

obrigados sob as penas regulamentares, das solenidades relativas ao encerramento


do ano e à Festa da Bandeira , e enviar ao Departamento de Educação.

Essa determinação era rigorosamente cumprida, conforme constatado pela enorme


quantidade de relatórios constantes , no ano de 1938, alusivos às solenidades de
encerramento do ano, Procla mação da República e Dia da Bandeira. A programação
tinha início com a formação dos alunos em frente ao prédio escolar para cantarem o
Hino Nacional Brasileiro; em seguida , o diretor ou um(a) professor(a) da escola fazia
uma exposição do assunto (Proclamaç ão da República ou Dia da Bandeira) e, no
final, todos davam “vivas”; os alunos participavam fazendo declamações em prosa e
versos sobre os motivos da solenidade e/ou ainda fazendo referência a outros temas
pertinentes: a pátria, a criança, o Natal, etc . O Hino à Bandeira era cantado pelos
alunos que, em seguida, se retiravam.

Esse procedimento não era comum a todas as escolas . Havia algumas em que os/as
professores/as pediam que os alunos levassem pratinhos com guloseimas de casa e
faziam um lanche coletivo com a participação da família. Toda essa programação
tinha um significado especial para os alunos e para os/as professores/as, pois era a
culminância de um trabalho vivenciado por todos, principalmente nas aulas de
“Instrucção Moral e Cívica”, em que , dentre os “Conselhos” para os alunos ,
constavam os de ordem, civilidade e patriotismo.

Por fim, a partir das informações contidas nas fontes investigadas, o panorama
vislumbrado sobre a alfabetização no período é o de que , no ano de 1928, o método
de ensino adotado oficialmente era o intuitivo. Embora tenhamos constatado que, na
prática, os professores muito se esforçavam dentro de suas limitações de formação
e de condições de trabalho para alfabetizar os alunos e, que muitas vezes, os
inspetores verificavam que o método utilizado era o da silabação e soletração ou , às
vezes, não havia um método específico, os registros apontam que , em algumas
escolas, o método intuitivo era praticado pelos professores.

Em 1929, quando teve início o movimento da Escola Ativa proposto por Attilio
Vivacqua, surgiram outras necessidades decorrentes da adoção dessa nova
proposta, por exemplo, a formação dos profissionais que deveriam colocá -la em
193

prática. Nesse sentido, o jornal, o rádio e o cinema tiveram papel importante na


difusão desse novo ideário.

Apesar da mudança de governo em plena implantação da grande reforma proposta


e das críticas suscitadas no meio político pelos que eram contra, várias medidas
adotadas continuaram vigorando no decorrer do período, entre elas , a adoção,
mesmo parcial, dos novos métodos de en sino da Escola Ativa. Porém, como vimos,
o ensino intuitivo continuava a ser praticado, juntamente com o método de ensino
rápido da leitura, devido à necessidade de atender ao grande número de alunos
analfabetos nas escolas.

A circulação das Cartilhas de Ensino -Rápido de Mariano de Oliveira, da Cartilha de


Higiene, do 1º, 2º e 3º livros de Erasmo Braga e o de Leituras Intermediárias do
mesmo autor, confirma que estes eram o s livros utilizados pelos professores nas
escolas, juntamente com o emprego de recursos, como: a dramatização, as
excursões e o jogo de xadrez, acompanhados do uso do cinema, do jornal e do
rádio, privilégio de algumas escolas.

Podemos assegurar, também, que, apesar da instalação do regime re publicano, em


1889, ter contribuído para que a escola se afirmasse como meio privilegiado de
formação do cidadão republicano, oferecendo conhecimentos estipulados que
confluíam para que fosse viabilizado esse regime, os mesmos problemas relativos
ao ensino da língua escrita, legado do império, persi stiram no decorrer do período
em estudo. Isto é, os índices de analfabetismo continuaram altos.
194

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi caracterizada, neste trabalho, a situação da educa ção no Estado do Espírito


Santo e focalizada a alfabetização de 1924 a 1938. Esse foi um período de
reorganização educacional, fértil em movimentos e d iscussões associados à
educação, que tinham como objetivo principal a forma ção do novo cidadão
republicano. Pode, então, ser considera do um marco na história da educação ,
porque é rico em idéias renovadoras relacionada s com a alfabetização. Tentamos,
assim, buscar os elementos que nos fornecessem indícios de como se configurava a
alfabetização no período em foco, analisando o conjunto d e materiais escritos e
manuscritos relativos ao tema e ao espaço de tempo delimitado.

Constatamos que, apesar de ter sido atribuída à escola a função essencial de


preparar o cidadão republicano – educá-lo e instruí-lo – e, que fosse essa uma
necessidade imperiosa por estar associada ao projeto civilizatório idealizado, tal
função não pôde ser cumprida pela instituição educativa privilegiada para a difusão
de conhecimentos. Os fatores que se constituíram em impedimentos para o
cumprimento desses propósitos estão relacionados com a formação de professores,
as precárias condições e/ou a falta de espaços físicos adequados para o
funcionamento das escolas, a falta de recursos materiais para o ensino da leitur a e
da escrita e, portanto, ao descaso do Poder Público com a escola elementar. Como
muitos autores apontam, a educação primária não foi, no plano das ações,
prioridade do Poder Público. Assim, o descaso com a educação primária, no Espírito
Santo, pôde ser observado na falta de políticas de formação de profe ssores, nas
condições de funcionamento dos prédios escolares, na escassez de cartilhas e de
livros nas escolas, etc.

Outro problema que, também, refletiu o descaso do Poder Público Estadual com a
educação primária e com a educação escolar de modo geral foi observado nas
Constituições de 1928 e 1935 que não privilegiaram adequadamente a educação,
provocando um distanciamento entre os discursos político e legal e as mudanças
ocorridas no campo educacional. Essa omissão era incoerente com as medidas
195

adotadas no sentido de inovar o ensino e com as manifestações dos representantes


políticos que alegavam dar atenção especial à educação.

O tratamento dispensado especificamente às questões relacionadas com a


alfabetização, que incidem , inicialmente, na adoção de material de suporte
específico para alfabetizar mais rapidamente os alunos, não apresentou os
resultados esperados, visto que o número de alunos analfabetos nas escolas
continuou alto. A prescrição legal do método intuitivo, considerado como mod erno,
foi outra medida adotada, mas que se deparou com a falta de condições humanas e
materiais nas escolas para que fosse aplicado.

Dessa forma, não era aplicado em todas elas e paralel amente à sua aplicação,
alguns professores continuaram a utilizar os métodos de soletração e silabação para
alfabetizar os alunos. Contudo, as cartilhas e os livros de leitura aprovados pela
Secretaria da Instrução Pública concretizavam métodos de marcha analítica , de
acordo, portanto, com o projeto republicano de uniformização da “[...] instrução
popular [...] para garantir a mesma formação elementar aos cidadãos [...] (RAZZINI,
2007, p. 21).

Posteriormente, a partir de 1929, com a reforma do ensino baseada nos princípios


da Escola Nova – implantação da Escola Ativa – ,o foco recaiu sobre a formação dos
professores que deveriam ser preparados para propagá -la e adotá-la. Verificamos
que, apesar da tentativa de melhorar o nível de formação dos professores e de
implementar recursos considerados inovadores, como a utilização d o cinema, do
jornal e do rádio, a qualidade do ensino oferecido à população não sofreu mudanças
significativas. Em relação aos métodos de alfabetização, vimos que os professores
continuaram a adotar os de marcha analítica em algumas escolas e, em outras,
mantiveram suas práticas, utilizando ainda os métodos de soletração e de silabação.

Dessa forma, reiteramos a necessidade de que mais estudos e pesquisas segundo a


abordagem histórica centrada em pes quisa documental, sejam realizados, por
considerarmos fundamentais para que continuemos avançando em relação aos
conhecimentos já apropriados sobre a alfabetização no Espírito Santo. Como esta
196

pesquisa soma-se às descobertas nessa área, esperamos que contribua na busca


de soluções para os problemas d o ensino no tempo presente.
197

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dezembro de 1931. Victória, 1932.
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do Espírito Santo. Junta Governativa e Interventoria Federal. Decretos e
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Espírito Santo, Interventoria Federal. Decretos e Resoluções: janeiro a março de
1931. Victoria: Imprensa Oficial, 1932.

______. Resolução nº 375. Programas de ensino para grupos escolares, escolas


reunidas e escolas isoladas . Victoria, 1931.

LIVROS DE REGISTROS

Livros de registro de materiais e móveis escolares fornec idos às escolas do Estado


no ano de 1928.

Livro de registro de material da escola de Laranjeiras do município da Capital –


Secretaria da Instrução, nos anos de 1928/1933/1934/1935/1937.

Livro de termos de aprovação de propostas de material escolar da Sec retaria da


instrução no ano de 1928.

MENSAGENS DO PRESIDENTE DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

AGUIAR, Aristeu Borges de. Presidente do Estado do Espírito Santo. Mensagem


apresentada ao Congresso Legislativo na 2ª sessão da 13ª legislatura, em 7 de
setembro de 1929 (Microfilme).

AGUIAR, Aristeu Borges de . Presidente do Estado do Espírito Santo. Mensagem


apresentada ao Congresso Legislativo na 3ª sessão da 13ª legislatura em 22 de
setembro de 1930 (Microfilme).

PUBLICAÇÕES PERIÓDICAS (jornal, revista)

BLEY, Punaro. Ensino público. Exposição apresentada ao povo do Espírito Santo.


Revista de Educação , Victoria, anno 2, n. 14, p. 5 -10, maio 1935.

CASTELLO, Jacy Leão. Lição de cousas. Revista de Educação, Victoria, anno IV,
n. 30-31, p. 11-12, jun./jul. 1937.

CINE-radio escolar. Revista de Educação, Victoria, anno 3, n. 22, março 1936.

MARCHIORI, Osvaldo. A dramatização. Revista de Educação, Victoria, anno 2,


n.14, p. 25-28, maio 1935.
205

RADIO Club do Espírito Santo. Revista de Educação, Victoria, anno 2, n. 15-16,


jun./jul.1935.

RAMOS, Newton. A conquista do novo método de ensino. Revista de Educação,


Victória, anno 2, n. 14, p. 76 -77, maio 1935.

RIBEIRO, Mário Bossois. Colônias de férias e o serviço médico escolar do Espírito


Santo. Revista de Educação, Victoria, anno 3, n. 25 -26-27-28, p. 17-19,
set./out./nov./dez./ 1936.

CARTA

RENO, Loren M. Carta enviada, em 16 de outubro de 1934, ao Exmo. Snr.


Secretário do Interior. Vitória, 1934.

RELATÓRIOS DOS INSPETORES ESCOLARES ANALISADOS NO PERÍ ODO

CLÁUDIO, José Celso. Relatório apresentado, em 7 de janeiro de 1934, ao Snr. Dr.


Diretor do Departamento do Ensino. Vitória, 1934.

______. Relatório apresentado, em 12 de dezembro de 1938, ao Exmo. Snr. Dr.


Secretário da Educação e Saúde Pública. Vit ória, 1938.

COSTA, Aristides. Relatório apresentado, em 3 de dezembro de 1929, ao Exmo. Sr.


Dr. Secretário da Instrução. Vitória, 1929.

COSTA, Aristides. Relatório apresentado, em 3 de setembro de 1928, ao Sr. Dr.


Secretário da Instrução. Vitória, 1928.

______. Relatório apresentado, em 16 de junho de 1930, ao Sr. Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1930.

______. Relatório apresentado, em 26 de julho de 1928, ao Sr. Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1928.

______. Relatório apresentado, em março de 1929, ao Sr. Dr.Secretário da


Instrução. Vitória, 1929.

______. Relatório apresentado, em 20 de agosto de 1929, ao Sr. Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1929.

______. Relatório apresentado, em 3 de outubro de 1928, ao Sr. Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1928.

______. Relatório apresentado, em 6 de agosto de 1929, ao Sr. Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1929.
206

COUTINHO, Pedro de Oliveira. Relatório apresentado, em 3 de janeiro de 1933, ao


Secretário do Interior e Justiça. Vitória, 1933 .

D’ALMEIDA, Alberto. Relatório apresentado, em 28 de junho de 1929, ao Sr. Dr.


Secretário da Instrução. Vitória, 1929.

______. Relatório apresentado, em 10 de abril de 1929, ao Sr. Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1929.

______. Relatório apresenta do, em 10 de setembro de 1930, ao Sr Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1930.

FONSECA, Francisco Generoso. Relatório apresentado, em 29 de setembro de


1930, ao Sr. Dr. Secretário da Instrução. Vitória, 1930.

GONÇALVES, Archimimo. Relatório apre sentado, em 10 de abril de 1930, ao Sr. Dr.


Secretário da Instrução. Vitória, 1930.

______. Relatório apresentado, em 1929, ao S. Exª Sr. Dr. Secretário da Instrução.


Vitória, 1929.

______. Relatório apresentado, em 18 de agosto de 1928, ao Sr. Dr. Secre tário da


Instrução. Vitória, 1928.

______. Relatório apresentado, em junho de 1929, ao Sr, Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1929.

GONÇALVES, Archimimo . Relatório apresentado, em 5 de dezembro de 1928, ao


Exmo. Sr. Dr. Secretário da Instrução. Vitóri a, 1928.

______. Relatório apresentado, em outubro de 1929, ao Exmo. Sr. Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1929.

GONÇALVES, Esmerino. Relatório apresentado, em 6 de setembro de 1928, ao Sr.


Dr. Secretário da Instrução. Vitória, 1928.

______. Relatório apresentado, em 14 de junho de 1928, ao Exmo. Sr. Dr.


Secretário da Instrução. Vitória, 1928.

______. Relatório apresentado, em 10 de abril de 1928, ao Exmo. Sr Dr. Secretário


da Instrução. Vitória, 1928.

INSPETOR DE ENSINO. Relatório apresentado, em 12 de março de 1936, ao Exmo.


Snr. Dr. Secretário da Educação e Saúde Pública. Vitória, 1936.

______. Relatório apresentado, em 3 de novembro de 1933, ao Exmo. Snr. Diretor


do Departamento do Ensino Público. Vitória, 1933.

LEMOS, Alfredo. Relatório apres entado, em 2 de setembro de 1928, ao Sr. Dr.


Secretário da Instrução. Vitória, 1928.
207

______. Relatório apresentado, em 3 de dezembro de 1928, ao Sr. Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1928.

______. Relatório apresentado, em 6 de maio de 1929, ao Sr. D r. Secretário da


Instrução. Vitória, 1929.

LOMBA, Otacilio. Relatório apresentado (s.d.) ao Secretário da Instrução. Vitória,


[19--].

LOPES, Ribeiro. Relatório apresentado, em 25 de outubro de 1933. Vitória, 1933.

LOUREIRO, Francisco de Almeida. Rela tório apresentado, em 10 de dezembro de


1937, ao Meritíssimo titular da pasta de Educação e Saúde Pública. Vitória, 1937.

MALISEK, Luiz. Relatório apresentado, (s.d.) ao Secretário da Instrução. Vitória,


[19--].

______. Relatório apresentado, em 30 de a bril de 1929, ao Sr. Dr.Secretário da


Instrução. Vitória, 1929.

MORAES, Flávio de. Relatório apresentado, em 3 de agosto de 1928, ao Snr. Dr.


Secretário da Instrução. Vitória, 1928.

______. Relatório apresentado, em 6 de abril de 1929, ao Sr. Dr. Secre tário da


Instrução. Vitória, 1929.

MORAES, Flávio. Relatório apresentado, em 12 de abril de 1928, ao Sr.


Dr.Secretário da Instrução. Vitória, 1928.

______. Relatório apresentado, em 6 de abril de 1929, ao Sr. Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1929.

RIBEIRO, Claudionor. Relatório apresentado, ao Secretário do Interior e Justiça do


Estado do Espírito Santo. Protocolado em 6 de dezembro de 1932. Vitória, 1932.

______. Relatório apresentado, em 2 de abril de 1929, ao Exmo. Snr. Dr. Secretário


da Instrução. Vitória, 1929.

______. Relatório apresentado, em 6 de maio de 1929, ao Exmo. Sr. Dr. Secretário


da Instrução. Vitória, 1929.

______. Relatório apresentado, em 4 de dezembro de 1928, ao Sr. Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1928.

______. Relatório apresentado, em 4 de outubro de 1928, ao Sr. Dr. Secretário da


Instrução. Vitória, 1928.

RIBEIRO, Lopes. Relatório apresentado, em 25 de outubro de 1933. Vitória, 1933.


208

TAVAR, J. E. Relatório apresentado, em 29 de abril de 1938, ao Exmo Snr. D r.


Secretário da Educação e Saúde Pública. Vitória, 1938.

REQUERIMENTOS

Requerimentos recebidos pelo Secretário da Instrução no período de 1928 a 1938


(documentos originais, datilografados em papel de seda, sem registro de outros
dados de identificação).

TERMOS DE VISITAS DOS INSPETORES DE ENSINO

GONÇALVES, Archimimo. Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e


Saúde Pública, em 25 de junho de 1938. Vitória, 1938.

______. Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e Saúde Pública, em 26


de outubro de 1938. Vitória, 1938.

______. Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e Saúde Pública, em 10


de junho de 1938. Vitória, 1938.

______. Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e Saúde Pública, em 16


de junho de 1938. Vitória , 1938.

GONÇALVES, Archimimo . Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e


Saúde Pública, em 8 de junho de 1938. Vitória, 1938.

______. Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e Saúde Pública, em 31


de março de 1938. Vitória, 1938.

______. Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e Saúde Pública, em 23


de maio de 1938. Vitória, 1938.

______. Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e Saúde Pública, em 26


de outubro de 1938. Vitória, 1938.

______. Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e Saúde Pública, em 4


de abril de 1938. Vitória, 1938.

GONÇALVES, Esmerino. Termo de visita enviado à Secretaria da Instrução, em 1º


de setembro de 1931. Vitória, 1931.

______. Termo de visita enviado à Secretaria da Instrução, em 29 de abril de 1932.


Vitória, 1932.

LEMOS, Alfredo. Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e Saúde


Pública, em 1º de junho de 1935. Vitória, 1935.
209

______. Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e Saúde Pública, em 15


de março de 1935. Vitória, 1935.

______. Termo de visita enviado à Secretaria da Instrução, em 14 de setembro de


1931. Vitória, 1931.

______. Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e Saúde Pública, em 27


de agosto de 1938. Vitória, 1938.

______. Termo de visita enviado à Secretaria de Educação e Saúde Pública, em 1º


de maio de 1935. Vitória, 1935.

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