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CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
VITÓRIA
2008
SÍLVIA CUNHA GOMES
VITÓRIA
2008
Dados Internacionais de Catalogação -na-publicação (CIP)
(Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)
CDU: 37
SÍLVIA CUNHA GOMES
COMISSÃO EXAMINADORA
_______________________________________________
Professora Doutora Cláudia Maria mendes Gontijo
Universidade Federal do Espírito Santo
_______________________________________________
Professora Doutora Cleonara Maria Schwartz
Universidade Federal do Espírito Santo
________________________________________________
Professor Doutor Amarílio Ferreira Júnior
Universidade Federal de São Carlos
Ao Senhor, por ter me feito compreender que “[...]
aos homens é isso impossível, mas a Deus tudo é
possível” (MATEUS, 19:26).
AGRADECIMENTOS
Aos membros da banca de defesa: Profª Dra. Cleonara Maria Scwartz e Prof. Dr.
Amarílio Ferreira Júnior, pela disponibil idade de compartilhar desse momento de
interlocução.
Aos meus pais, Terezinha de Jesus da Silva e Walter Júlio da Silva ( in memoriam),
que sempre me ensinaram o valor do conhecimento.
À minha família, João Batista Gomes, Lucas Cunha Gomes, Marília C. Cun ha
Gomes e João Pedro Cunha Gomes, pela compreensão nos constantes momentos
de ausência e, especialmente , à Marília e João Pedro, pelo auxílio nos meus
limitados conhecimentos de informática.
Às minhas irmãs, Cilma, Nilma, Nilva e a meu irmão Walter Júni or que, mesmo
distantes, sempre me apoiaram neste projeto de vida. Particularmente, agradeço à
Nilma e família pela presença nos momentos de culminância das realizações no
meio acadêmico.
À Profª Dra. Cleonara Maria Schwartz, pelo empréstimo de materiais e pela atenção
dispensada.
Ao amigo Celso Lopes Andrade, pelo constante incentivo e por facilitar o acesso aos
livros.
Fotografia 6 – Capa de outra edição da Carti lha de Ensino-Rápido da Leitura ... 133
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO
ensino da leitura e da escrita. O marco inicial (1876) foi justificado pela autora pelo
fato de, nesse ano, ter sido lan çada a Cartilha Maternal, do português João de Deus,
em Portugal. No Brasil, segundo Mortatti (2000), em 1882, Silva Jardim passava a
divulgar em conferências, na Província do Espírito Santo, a difusão do método João
de Deus e também suas propostas para o ensino da língua. Propostas estas que ele
já praticava e divulgava como professor.
Mortatti (2000) declara ainda que Silva Jardim criticava intensamente o método da
soletração e visava à concretização do “sentido moderno da educação”. Com a idéia
de reformar o ensino da língua, especialmente da leitura, “[...] Silva Jardim defende
uma educação útil, prática e racional e aplica ao estudo dos métodos de ensino o
princípio de ‘concertar melhorando’” (MORTATTI, 2000, p. 43).
Sobre os resultados da análise dos fatos ocorridos nesse momento inicial, a autora
diz que a Cartilha Maternal no Brasil, em relação a Portugal, não teve a mesma
duração e permanência, e que Silva Jardim abandona o seu e mpenho no magistério
e se volta para a causa republicana, pela qual atua principalmente no Rio de
Janeiro, até a sua morte em 1891. Contudo, continua a autora, a participação de
Silva Jardim, como propagandista na sistemática divulgação do “Método João de
Deus”, contribuiu terminantemente para que a alfabetização no Brasil se constituísse
como objeto de estudo. Assim, Mortatti (2000, p.73) conclui a sua análise:
uma nova tradição no ensino da leitura e da escrita. De acordo com a autora, um dos
principais divulgadores e polemistas do método analítico foi o profess or Arnaldo de
Oliveira Barreto, que, como integrante de uma geração de normalistas, após o
advento da Proclamação da República, passou “[...] a ocupar cargos na
administração educacional, liderar movimentos associativos do magistério,
assessorar autoridades educacionais e produzir material didático e de divulgação
das novas idéias [...]” (MORTATTI, 2000, p. 78), principalmente em relação ao
ensino da leitura.
Essa disputa, continua a autora, está relacio nada diretamente com a reforma
paulista da instrução pública que teve início em 1890 e fazia parte de várias
aspirações extensamente propagadas no Brasil no final do Império. Essas
aspirações, baseadas na filosofia positivista, tendiam a buscar a cientific idade “[...]
na educação da criança e delineavam a hegemonia dos métodos intuitivos e
analíticos para o ensino de todas as matérias escolares, especialmente a leitura”
(MORTATTI, 2000, p. 78).
A partir daí, segundo Mortatti (2000, p. 79), uma “nova bússol a” deveria guiar a
preparação teórica e ”[...] prática de um novo professor sintonizado com os
progressos da ‘pedagogia moderna’, o qual deveria deduzir da psicologia da infância
e suas bases biológicas os modos de ensinar a criança”. Dessa maneira, a
pesquisadora mostra, ao longo desse período, os resultados de sua análise sobre o
ensino na Escola Normal de São Paulo, os métodos de ensino utilizados, as cartilhas
e suas características, os autores e os principais fatos ocorridos no contexto, que
influenciaram na defesa e/ou adoção de um ou outro método (sintético e/ou
20
Sobre os sujeitos que perpassam esse momento histórico, Mortatti (2000) diz que
alguns falecem ou se aposentam, outros desistem da questão da instrução pública e
outros mais jovens ainda continuarão atuando e ligados com preoc upações mais
novas. O resultado das produtivas iniciativas, especialmente as cartilhas, continua a
circular e “[...] muitas das quais nas décadas seguintes têm ainda ampla repercussão
entre os professores primários, com centenas de edições” (MORTATTI, 2000 , p.
134). As disputas ocorridas dos modernos entre si, apesar de fundarem uma nova
tradição, apresentam, com a Reforma Sampaio Dór ia, propensão a se amenizar –
apesar de a validade do método analítico continuar sendo apregoada – e, assim,
outros problemas e urgências surgem e outros sujeitos vão se destacando com suas
propostas de intervenção na área educacional, para o ensino da leitura e da escrita.
O período compreendido entre meados de 1920 até final dos anos 1970 constitui -se,
para Mortatti (2000, p.142), “[...] como o terceiro momento crucial do ponto de vista
da constituição da alfabetização como objeto de estudo”. E ela afirma que, nesse
momento, a partir de aproximadamente meados da década de 1920, observa -se o
início de uma disputa entre “[...] defensores do método misto (analítico -sintético ou
sintético-analítico) e partidários do tradicional método analítico [...]” (MORTATTI,
2000, p. 26, grifos da autora), com uma diminuição crescente do tom de conflito dos
momentos antecedentes e propensão c rescente da importância de o método tornar -
se algo relativo.
De acordo com Mortatti (2000, p. 27), o início de 1980 até os dias atuais constitui o
quarto momento que
Mortatti (2000) explica que, nesse final de século, observou -se, por meio do discurso
oficial, a necessidade de mudanças sociais e políticas. É nesse contexto que o
construtivismo começa a ser defendido por “educadores progressistas”, que, com
tradução, produção e divulgação de livros, vídeos, artigos, teses acadêmicas,
sugestões metodológicas, cartilhas construtivistas e outros materiais, além de relatos
de experiências exitosas, se empenham para convencer os alfabetizadores, com o
objetivo de institucionalizar o construtivismo na rede pública de ensino.
alfabetização das escolas da Rede Pública de São Paulo, “[...] distanciando -se do
discurso oficial-acadêmico, dele, porém, utilizando -se os escritores para justificarem
as propostas didáticas contidas em suas cartilhas” (MORTATTI, 2000, p. 254 -255).
A pesquisadora diz que há, ainda nesse contexto, “[...] a tendência a um outro tipo
de disputa entre mais modernos e modernos: estes, defensores do construtivismo de
base piagetiana; aqueles defensores do interacionismo baseado na Psicologia
Soviética [...]” (MORTATTI, 2000, p. 27), cujo principal representante é L. S.
Vygotsky. Esse período, segundo Mortatti (2000), é marcado por diagnósticos e
revelações dos problemas da educação, que se tornam tema de seminários e
congressos, constatando o fracasso escolar das classes populares, sobretudo na
passagem da 1ª série para a 2ª, com altos índices de evasão e repetência.
Assim, Mortatti (2000) afirma que, após mais de cem anos do estabelecimento do
modelo republicano de escola, ainda nos deparamos atualmente com debates e
denúncias, cujo ponto consensual é o fracasso da escola em alfabetizar seus
alunos. Esse fracasso, segundo a autora, é at ribuído algumas vezes à questão do
método de ensino, outras vezes ao sistema de ensino e ainda ao aluno ou ao
professor. Mas o fato é que a conseqüência “[...] desse fracasso vem consolidando
um outro tipo de ilusão e contradição, constitutivas da busca in cessante daquele
sentido moderno da escola e da educação” (MORTATTI, 2000, p. 298). E, ainda, que
não é exclusividade da nossa época a impossibilidade de a escola conseguir êxito
em sua função histórica básica e, portanto, de responder às “urgências sociai s e
políticas” que lhe sustentam.
Assim, ao fazer a análise das cartilhas como artefato cultural, Trindade (2004, p. 36)
esclarece que discute “[...] suas posições e relações em uma cadeia de produção
cultural, na medida em que os artefatos culturais não interessam por si mesmos,
mas pelo sentido que recebem nas práticas culturais e ao constituir outras mais [...]”.
A autora explica ainda que, nos Estudos Culturais, há um interesse intenso tanto
pelas práticas, quanto pelos artefatos culturais. Dessa forma, as cartilhas podem ser
26
Com base nas afirmações de Nelson, Treicher e Grossberg (1995), Trindade (2004,
p. 37) argumenta que o seu estudo tem relação com o campo dos Estudos Culturais,
inicialmente, “[...] pela característica de os mesmos serem ativa e agressivam ente
antidisciplinares, isto é, não se sujeitarem a uma prática científica moderna de
pesquisa”. Complementa essa autora que, ao escolher os campos de conhecimento
mencionados para fazer a análise cultural, “compartilha” a compreensão de Nelson,
Treicheler e Grossberg (1995) “[...] de que: Os Estudos Culturais se aproveitam de
quaisquer campos que forem necessários para produzir o conhecimento exigido por
um projeto particular” (NELSON; TREICHLER; GROSSBERG, 1995, apud
TRINDADE, 2004, p. 37). Ela salienta a inda que os autores observam que os
Estudos Culturais “[...] têm sido vistos como uma espécie de processo, uma alquimia
para produzir conhecimento útil sobre o amplo domínio da cultura humana”
(TRINDADE, 2004, p. 37).
Em suma, o estudo permitiu à autora “[...] mais do que desc rever as cartilhas como
artefatos culturais [...]” (TRINDADE, 2004, p. 455), pois concluiu que elas “[...]
fizeram parte de uma cadeia de produção cultural, sendo sua intertextualidade
marcada pelo impacto da interdiscursividade da modernidade republicana” (p. 49).
Podemos perceber que os três trabalhos apresentados até então são pesquisas do
tipo historiográfico que buscam, a pa rtir de uma abordagem histórica da
alfabetização, possíveis respostas e/ou explicações para tantos questionamentos
feitos acerca do ensino da leitura e da escrita. Dessa forma, o ponto crucial desses
trabalhos é o ensino da leitura e da escrita -alfabetização, os materiais pedagógicos
destinados a esse ensino, os discursos produzidos e suas representações em cada
período distinto, em que o pano de fundo geral é o cenário nacional e os pontos
específicos são o desenvolvimento da alfabetização no Rio Grande do Sul e em São
Paulo.
Santos (2001) afirma que sua análise, sob a perspectiva da história cultural, é
baseada em estudos de Frago (1993), em que o autor argumenta:
Assim, segundo Santos (2001), para o autor, essas pesquisas só consideram como
possível a alfabetização desenvolvida por meio do sistema escolar formal como
conhecemos hoje, mas as investigações históricas recentes, realizadas em outros
países, fizeram com que o foco no fenômeno analfabetismo se deslocasse para
Sobre essa nova maneira de interrogar as fontes, Santos (2001) diz que Graff (1990)
reconhece que
Santos (2001) cita ainda o estudo de Mortatti (2000), no qual a autora afirma que
pesquisas históricas em Educação e Letras vêm sendo cada vez mais prestigiadas
entre os pesquisadores europeus, mas que continuam ainda sendo pouco
exploradas as pesquisas sobre “[...] matérias escolares, conteúdos e métodos de
ensino, entre outros considerados como aspectos menores e ‘curiosidades’ no
âmbito da educação, da lingüística ou dos estudos literários [...]” (SANTOS, 2001, p.
3).
[...] deveriam povoar o espírito do jovem leitor, através dos livros de leituras,
trechos selecionados – como as fábulas – e antologias (de poesias, histórias
em geral), ao mesmo tempo breves e eficazes: não vacinavam a criança
contra a leitura e engendravam em seu espírito noções de bem-viver. Visto
que eram sempre ‘examinados’ pelo professor competente para o sucesso
do processo pedagógico do ensino da leitura (SANTOS, 2001, p. 85, grifos
da autora).
Sobre os resultados dos dois primeiros capítulos, Santos (2001) esclarece que,
embora os articulistas que compunham o grupo em defesa do método analítico
fossem “[...] partidários da idéia de que a compreensão deve anteceder a
identificação dos códigos da escrita [...]” e os articulistas do grupo “[...] defensor es do
método analítico-sintético defenderem que a compreensão é habilidade que se
conquista após a etapa da identificação dos códigos da língua (palavras, sílabas,
letras)” (p. 66) “[...] ambos os grupos são concordes quanto à tese de compreensão,
diferenciando-se somente quanto ao ‘lugar’ ocupado por essa habilidade no
aprendizado da língua: se anterior ou posterior à identificação dos códigos escritos” (
p. 67). E conclui que,
Pelas afirmações da autora acerca das conclusões sobre o seu estudo, verificamos
disputas em torno dos métodos de ensino da leitura e escrita e de alguns projetos
educacionais na imprensa periódica e nos do cumentos oficiais, bem como a
pluralidade dos métodos, “[...] constituindo -se assim, nesse período e temática, um
jogo conjunto de práticas discursivas – ao mesmo tempo autônomas e integrativas –
calcadas na reflexão em torno dos métodos, do seu estatuto, da sua função e da sua
variedade” (SANTOS, 2001, p. 88).
O estudo de Maciel (2003 b, p. 11) procura, por meio de “[...] uma incursão de quase
duzentos anos nas histórias da aprendizagem da leitura e da escrita [...]”, expor o
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quadro da alfabetização nas es colas de Minas Gerais. A autora afirma que “[...]
coloca em evidência as múltiplas configurações e tendências assumidas pelas
escolas mineiras, ao longo da trajetória de suas práticas expressas, materialmente,
por meio dos mobiliários, objetos, livros e at ores” (p. 11).
A autora evidencia ainda que seu trabalho é um convite ao leitor para uma “[...]
reflexão sobre algumas mudanças na alfabetização em Minas Gerais e a produção
de materiais para o ensino da leitura [...]” (MACIEL, 2003 b, p. 11). É com essa
pretensão que ela faz uma breve incursão na história da educação brasileira, desde
a proibição da publicação de livros e jornais por Portugal, até 1808, apontando
também a escassez de livros como fatos que provocaram a falta de informações
sobre materiais didáticos utilizados na alfabetização dos alunos brasileiros, entre os
séculos XVI e XVIII, e estabelece um paralelo entre o que ocorreu no cenário
nacional e na Província de Minas Gerais.
Sobre a questão dos novos métodos, Maciel (2003 b, p. 13) argumenta que, apesar
de ser “[...] do senso comum dizer que as inovações pedagógicas estão atreladas às
propostas governamentais [...]”, a verdade é que não é sempre que os professores
aprovam essas inovações. Diz ainda que, “[...] nesse contexto, encontramos
propostas pedagógicas de alguns edu cadores que podem ser consideradas de
vanguarda ou de retrocesso” (p.13).
Nesse sentido, ela esclarece que “Os pressupostos do método global trazem
mudanças conceituais na leitura oral e silenciosa e na concepção de alfabetização
[...]” (p. 18). A autora mostra que foi verificado ainda, em sua pesquisa, quais eram
os livros de leitura mais utilizados nas escolas de primeiras letras na então Província
de Minas Gerais e faz uma análise tanto da escrita, quanto das orientações
metodológicas e das ilustrações das cartilhas. Maciel (2003 b, p. 19) comenta
também que
Maciel (2003b) afirma que livros escolares criados em outros Estados também foram
utilizados e descreve a estrutura desses materiais sem, contudo, enfatizar ou fazer
descrições exaustivas sobre a diferença entre as cartilhas, pois, conforme a autora
diz, o objetivo não é esse, “[...] mas apenas buscar ilustrar as diversidades [...]
33
O estudo de Maciel (2003 b) também mostra que pesquisas mais recentes têm
envolvido questões referentes aos métodos de alfabetização, só que trazendo à tona
uma nova concepção de alfabetização e não mais apenas voltadas para a tentativa
de escolher suportes pedagógicos de qualidade superior para o ensino da leitura e
da escrita. A autora então finaliza dizendo que “[...] as considerações feitas neste
trabalho não têm o carát er de ser meramente um resgate histórico [...] [mas que ele]
é acima de tudo, um esforço para contribuir no fomento aos debates no campo da
história da alfabetização” (MACIEL, 2003 b, p. 23).
Para a análise dos dados investigados acerca das representações sobre métodos
para o ensino da leitura e da escrita, as autoras fazem uso da abordagem da história
cultural e buscam apoio nas reflexões de “[...] autores como Chartier (1998), Michel de
Certeau (1990), Guy Vicent (1980), Dominique Julia (1993) [...] [que trabalham com
os] [...] conceitos de representação, prática, apropriação, táticas, estratégias, cultura e
forma escolar [...]” (SCHWARTZ; FALCÃO, 2005, p. 2).
Durante todas as seis primeiras décadas do século XIX, afirmam as autoras, a falta de
local próprio e de materiais de trabalho para as aulas foi fator citado com persistência
36
Segundo as pesquisadoras, o profe ssor João Ortiz, na década de 1860, informava aos
seus superiores que estava conseguindo lograr êxito com a utilização do método
eclético. Tal fato é divulgado pelo presidente da Província e pelo diretor da inspeção
pública em seus relatórios, quando descr evem detalhadamente a utilização do método
pelo professor e, em seguida, o precário estado da instrução, evidenciando a intenção
de conseguir das autoridades respaldo para a utilização do método e a recomendação
para que os professores de primeiras letras freqüentassem as aulas do professor João
Ortiz, com o objetivo de uniformizar o ensino ministrado.
Ao finalizar a análise dos dados sobre a temática proposta, as autoras dizem que foi
possível observar, contudo,
[...] nas mensagens, nas falas e nos relat órios analisados a produção de
discursos que serviram para estruturar representações de que a falta de
formação de professores, a desqualificação dos saberes e das práticas, a
precariedade de instalações para funcionamento das aulas serviam para
construir a idéia de que era necessário um método adequado para o ensino
do ler e escrever, o que assinala estratégia dos presidentes de províncias e
dos inspetores no sentido de construir nova representação acerca de um
método a ser adotado (SCHWARTZ; FALCÃO, 2005, p. 10).
Percebemos que há, nos dois pronunciamentos, a idéi a de que muitas vezes os
professores desconhecem todos os aspectos do método com o qual pretendem e/ou
devem trabalhar e com isso têm as suas idéias pautadas em pesquisas empíricas, o
que pode ocasionar o comprometimento do trabalho a ser desenvolvido.
38
temos, então, o encontro de dois textos (doi s discursos), dois autores. Assim,
consideramos que “[...] só o texto pode ser o ponto de partida” (BAK HTIN, 2003, p.
308) dos estudos orientados por uma perspectiva histórica, pois for am eles que
possibilitaram a reconstrução dos pensamentos e das vivências produzidas pelos
sujeitos no período focalizado neste estudo . Assim, podemos afirmar que, no
pensamento bakhtiniano, encontramos uma concepção de linguagem fundamentada
em uma abordagem histórica, social e cultural que nos ajuda a construir, a elabora r o
nosso entendimento acerca da alfabetização. O texto deve ser examinado de acordo
com o contexto socioideológico . Assim é necessário explicitar que:
[...] o texto, como dado primário das ciências humanas, comporta na sua
análise e leitura o contexto do s sujeitos que o produziram e do sujeito que o
estuda e, portanto, ele se integra às formas de pensar de uma dada
sociedade, do sujeito que o produziu e do investigador que busca
compreendê-lo e reconstituir seus sentidos (GONTIJO, 2005, p. 12).
Como, para Bakhtin (2003, p. 312), “[...] as ciências humanas são as ciências do
homem em sua especificidade, e não de uma coisa muda ou um fenômeno natural
[...]”, trata-se, dessa forma, de perceber e estudar um sujeito -produtor de textos.
Sujeito que se expressa e cria textos cujos discursos que neles se concretizam não
são criações abstratas ou individuais desprovidas de sentido, mas criações sociais e
históricas.
Nesse contexto, é importante explicitar que a noção de texto elaborada por Bakhtin é
coerente com a visão de Le Goff (1996, p. 8), ao afirmar que, “A idéia da história
como história do homem foi substituída pela idéia da história como história dos
homens em sociedade”. Para Helmstadler (1970, apud RICHARDSON, 2007, p.
245), ”[...] a pesquisa histórica apresenta dois objetivos básicos: produzir um registro
fiel do passado e contribuir para a solução de problemas atuais [...]”. No primeiro
caso, o pesquisador se defronta com um problema histórico em que há a
possibilidade de tratá-lo de duas formas: na primeira delas , a informação é coletada
e o problema é descrito em um dado momento (estudo transversal); na segunda
forma, o desenvolvimento de um fato sucedido é descrito através do tempo (estudo
longitudinal).
41
Segundo Richardson (2007, p. 228), a pesquisa documental “[...] pode ser definida
como a observação que tem como objeto não os fenômenos sociais, quando e como
se produzem, mas as manifestações que registram seus fenômenos e as idéias
elaboradas a partir deles”. Dess a maneira, tomamos o conjunto de materiais escritos
e manuscritos do final da década de 1920 até o ano de 1938, relativos à
alfabetização, como documentos em que os discursos materializados traziam
indícios de como se dava esse ensino na referida década, n as escolas do Estado. A
análise desses discursos, produzidos por sujeitos que estavam, direta ou
indiretamente, ligados ao órgão governamental responsável pelas políticas públicas
educacionais teve como objetivo retratar o cenário educacional da época.
Encontramos grande dificuldade de acesso aos documentos que estão sob a guarda
do Arquivo Público do Estado do Espíri to Santo. Apesar das dificuldades,
procuramos, nos estudos e documentos disponíveis, analisar os elementos sobre a
alfabetização presentes nessas fontes. A segunda etapa consistiu na reunião das
fontes documentais pertinentes à época. Esse procedimento se fez necessário para
determinarmos “[...] os aspectos e os limites do trabalho a fim de reunir informações
sobre um campo específico e fazer análises sobre objetos definidos a partir dos
quais se possa compreender uma determinada situação” (CHIZZOTTI, 2000, p. 98).
Com esse objetivo, os documentos foram assim agrupados:
era “o motor da história”. Foi com esse pensamento que, de acordo com Buffa e
Pinto (2002, p. 32), “[...] Políticos e educadores, no final do século XIX, passaram a
defender a necessidade de espaços especialmente construídos para serem
escolas”. Eles acreditavam que era necessário “[...] defender um projeto de
educação popular por entenderem que a própria consolidação da República
dependia da difusão do ensino primário [...]” e da criação de “[...] Escolas Normais
para formar esses novos professores” (BUFFA; PINTO, 2002, p. 43). Esse era,
então, o momento de insti tucionalização das escolas graduadas, ou seja, dos grupos
escolares.
Araújo (1942, p. 2) diz, contudo, em sua análise a partir de dados d ivulgados pelo
Diário Oficial do Estado, que: “Si tomarmos por base o período de 30 anos,
verificamos que o aumento [...]”, no número de escolas e conseqüentemente no
50
Dessas 920 escolas, oito eram de ensino infantil, 873 de ensino fundamental
comum, 21 de ensino supletivo e 18 do ensino complementar. Os dados estatísticos
analisados mostram que, com efeito, houve um aumento considerável no número de
escolas no Estado, mas isso não significava, apesar de tudo, que o problema estava
resolvido, pois, de acordo com Araújo (1942), o ensino fundamental comum,
destinado às crianças de sete a doze anos, o segmento mais importante e o único
acessível a todos, ainda estava muito longe de uma disseminação adequada, que
atendesse a toda população escolar do Estado e facilitasse a alfabetização do maior
número possível de crianças.
Conforme Oliveira (1975, p. 429), destaca -se, nesses 12 anos da gestão de Punaro
Bley, a boa administração do s ecretário da Fazenda – Mário Aristides Freire – que
conseguiu saldar todos os empréstimos feitos e organizar as finanças do Estado.
Desse modo, o Governo Estadual pôde construir edifícios escolares e realizar obras
na área da saúde, estradas de rodagem e o utros setores.
cinco grupos escolares localizados em Rio Bonito, Baixo Guand u, Boa Sorte, Muniz
Freire e Santa Maria de Jequitibá.
Foto 2 – Tipo de construção de grupo escolar rural, adotado em zona de colonização estrangei ra
Fonte: Realizações do Presidente Getúlio Vargas no Estado do Espírito Santo: 1930 -1940.
54
Foto 3: Outro tipo de construção de grupo escolar rural, adotado em zona de colonização estrangeira
Fonte: Realizações do Presidente Getúlio Vargas no Estado do Espírito Santo: 1930-1940.
Porém, por meio da análise dos relatórios e dos termos de visitas dos inspetores ,
visualizamos que a construção dos grupos escolares e, portanto, o aumento de
escolas não implicou mudanças qualitativas na educação primária no Estado. Vale
ressaltar aqui que, a partir de 1931, encontramos pouquíssimos relatórios de
inspetores, mas muitos termo s de visitas que viabilizaram a continuidade do
trabalho.
A falta desses documentos nos levou a buscar outras fontes que nos fornecessem
indícios de como se configurava a educação no período em estudo. Encontramos os
termos de visita utilizados pelos inspetores, referentes a cad a escola que visitavam.
Esses termos, nos anos de 1931 e 1932, eram manuscritos; já no ano de 1935, eram
feitos em formulários próprios. Isso, porém, não se constituiu em uma regra, pois
encontramos, no ano de 1938, alguns termos de visitas manuscritos e o utros em
formulários de dois modelos diferentes.
A afirmação do inspetor sugere que ele teria sido, em algum momento, o único
inspetor no Estado. Entretanto, e le conseguia realizar suas tarefas. Outros relatórios
também se referem à falta de estradas, à localização das escolas rurais, explicando
que o acesso a elas era difícil e, por isso, as inspeções às escolas tinham que ser
feitas a cavalo.
Nesse período, as escolas foram agrupadas em zonas. Elas eram compostas por
municípios ou somente por escolas, como no caso da 6ª zona, que era constituída
pelas escolas da Fazenda de Santa Cruz e Fazenda do Castello. Contudo, havia
municípios e algumas escolas em que não foi possível identificar a que zonas
pertenciam por não haver nos relatórios essa especificação. Nos anos de 1928 a
1930, não localizamos nenhum documento que tratasse da divisão dos municípios
e/ou escolas do Estado em zonas. Percebemos que há zonas que se repetem
referentes a municípios diferentes. A 6ª zona aparece quatro vezes compondo
municípios e/ou escolas diferentes.
Em uma das vezes se refere, conforme dito, às escolas da Fazenda de Santa Cruz e
Fazenda do Castello; a segunda vez , às escolas de Marathayses, Barra do
Itapemirim, Mixta de Queimada e Paineiras; a terceira vez se refere ao município de
Itapemirim (sede), Rio Novo, Iconha e Benevente e depois ao município de Alegre. A
9ª zona é composta dos municípios de São José do Calçado, São Joã o do Muquy,
São Pedro de Itabapoana e Ponte de Itabapoana em um relatório de 1928 e, em
1938, aparece em um relatório como 9ª região referente aos municípios de Alegre,
Rio Pardo e Siqueira Campos.
58
Além das dificuldades de organizar dados confiáveis sobre a realidade das escolas,
outro problema importante diz respeito à realização da inspeção nas escolas
particulares. Conforme afirma A rchimimo Gonçalves, em inspeção ao município de
Santa Thereza nos meses de setembro e outubro de 1929: elas eram várias,
espalhadas no município e, também, tinham vida efêmera. Por isso mesmo, segundo
o inspetor, não adiantava fazê -las cumprir as exigências regulamentares, porque
seus professores eram, na sua maioria, “incapazes”, portanto não resistiriam a uma
palestra com pessoa capacitada e encarregada do registro na Secretaria sobre o
assunto.
Art. 125. Para que se abram e continuem abertos cursos particulares de ensino primario ou
secundario, é necessário o seguinte:
a) remetter mensalmente, á Secretaria da Instrucção os dados estatisticos;
b) ministrar em vernaculo todo o ensino, salvo o de linguas estrangeiras;
c) franquear o estabelecimento á visita das autoridades escolares;
d) ensinar, diariamente, portuguez, geographia, especial mente do E. Santo e historia do
Brasil;
e) respeitar os feriados nacionaes;
f) ensinar nas classes, cantos nacionaes, approvados pela Secretaria da Instrucção;
§ Único. Nos collegios particulares o ensino de portuguez, devera ser ministrado por
professores brasileiros de reconhecida competencia, a juizo da Secretaria da Instrucção.
Segundo exposto nos relatórios e nos termos de visita, os prof essores faltosos
também contribuíam para o atraso na instrução. No relatório de 2 de setembro de
1928, referente às escolas do município de Cachoeiro de Itapemirim, do Sr. Alfredo
Lemos, inspetor da 8ª zona (transferido da 9ª zona, em 3 de agosto de 1928, pelo
secretário da Instrução), há um pedido ao secretário da Instrução para que fosse
dada uma atenção especial à questão dos professores faltosos. Segundo o inspetor,
esse problema não só retardava o ensino como também concorria para que a
instrução fosse desmoralizada.
Esse inspetor diz que as professoras regentes das escolas de Vila de Vianna, de S.
Raphael e de Ribeira – município de Viana – e as de S. Joaquim e de Iriritimirim –
município de Alfredo Chaves – “Abandonam suas escolas e viajam, quasi tod os os
sabbados, para esta Capital”. Supomos que o motivo do transtorno causado pelas
viagens das professoras é que havia aulas aos sábados, conforme mencionado no
Termo de Visita à Escola Mixta de Tatahiba, município de Iconha, do inspetor Alfredo
Lemos, em 1º de junho de 1935, em que diz: “[...] aos sábados a freqüência é
pequena”.
enviarem seus filhos à escola, deixando o inspetor sem argumentos para justificar os
problemas causados pela falta de compromisso da professora. Outro transtorno
ocasionado pelas faltas dos professores, relatado por Archimimo Gonçalves (1929),
é que, às vezes ele era impedido de visitar algumas escolas por não encontrar no
exercício de suas funções as re spectivas professoras.
O mau tempo era outro fator que impedia muitas vezes os inspetores de realizarem
o seu trabalho, devido à dificuldade que as chuvas traziam para que eles se
locomovessem de um lugar para outro, pois as estradas se tornavam muitas ve zes
inacessíveis. Claudionor Ribeiro, inspetor da 7ª zona, composta pelos municípios de
Castello e Affonso Cláudio, confirma, em seu relatório de 2 de abril de 1929, que não
conseguiu visitar todas as escolas de sua zona na inspeção que deveria realizar
devido ao mau tempo.
Verificamos que a maioria dos relatórios trazem denúncias dos inspetores sobre a
falta de material nas escolas e a omissão da Secretaria em atende r aos pedidos,
conforme relata Aristides Costa, em seu relatório de 3 de dezembro de 1929: “As
escolas da zona a meu cargo, com poucas excepções, resentem -se da falta de
64
As escolas a que o inspetor se refere são as seguintes: Mixta de Santa Cruz, Mixta
de Santa Rita, feminina da cidade de Anchieta, masculina da cidade de Anchieta,
Mixta de Marathayses, Mixta da Fazenda da Queimada, masculina da Barra do
Itapemirim, Mixta de Candéus, Mixta da Fazenda da Ribeira, Mixta da Fazenda do
Muquy e masculina de Si ry. A zona a que essas escolas pertencem não é
assinalada.
Essas informações eram registradas a cada visita que o inspetor fazia nas escolas e,
às vezes, consistiam em denúncias que poderiam ser usadas contra o professor.
Porém, havia dificuldades na execu ção desse serviço que impediam que muitas
escolas fossem inspecionadas. Essa falta de inspeção às escolas, certamente,
gerava problemas de várias ordens. Por isso, apesar de percebermos que a
inspeção estava “[...] atrelada aos procedimentos de vigilância sobre os professores
em exercício” (BORGES, 2007, p. 1), não há como negar que a ação dos inspetores
contribuiu para o processo de difusão e constituição do ensino público elementar.
Essa contribuição estava relacionada com a função que exerciam: nas pro postas de
criação de mais escolas nas localidades onde não havia nenhuma ou a existente
não atendia a toda população escolar; na conversão de escolas femininas e/ou
masculinas em mistas para dar acesso a um maior contingente de crianças em idade
escolar; nas instruções dadas aos professores sobre o método adotado; na
65
a) idade de 21 annos;
b) moralidade;
c) aptidão physica e isenção de molestia infe cto-contagiosa ou repugnante,
attestada pelo Director da Hygiene Estadoal;
d) attestado de bôa conducta, passado pela autoridade policial do logar
onde residir o requerente;
e) attestado de pratica pedagogica durante 40 dias, no minimo, na escola
isolada modelo do Estado, passado pelo Director das Escolas Normal e
Annexas.
66
Sabemos, contudo, que essas leis não eram rigorosamente cumpridas, pois havia os
casos em que os professores eram nomeados por indicação de pessoas influentes,
conforme relata Dr. Lopes Ribeiro, inspetor técnico do ensino em comissão, no
relatório de 25 de outubro de 1933, referente à inspeção escolar dos municípios de
Alegre, Muniz Freire, Rio Pardo e Siqueira Campos. O inspetor técnico do ensino em
comissão era funcionário da Secretaria e poderia ser comissionado pelo secretário
da Instrução “[...] para executar qualquer serviço extraordinário” (ART. 25,
DECRETO Nº 6.501, p. 25). Em seu relatório, esse inspetor relata que a professora
da Escola Mixta de Santa Bárbara do Caparaó foi designada pelo delegado de
instrução de Alegre.
funcionado nenhum dia e a professora alegou que o motivo era por estar na época
da colheita do café, que se prolongaria até o mês de julho, quando, então, daria
início aos trabalhos escolares.
se case Dnª Maria Paiva, igualmente de precario preparo para o caso”. Vemos,
portanto, nas duas situações, a incapacidade das professoras para o cargo e, no
caso da primeira, a falta de responsabilidade e de compromisso para com a função.
Ficou clara, também, a impotência do inspetor diante das circunstâncias, pois não
consta no relatório que alguma providência tenha sido tomada.
Ainda registrava as previsões de como seria regida cada escola isolada; nas escolas
reunidas, o 4º ano seria dado juntamente com o 3º e, conforme o número de alunos,
haveria quantos professores adjuntos fossem necessários; as classes da seção
feminina e também as do 1º e 2º anos da masculina teriam uma professora como
regente e as do 3º e 4º anos da seção masculina teriam um professor; nas escolas
reunidas assim como no s grupos escolares, o ensino , na seção feminina e nas
classes do 1º e 2º ano da seção masculina , seria ministrado por professoras e, nas
demais classes, por professores.
O Decreto nº 7.994 (1927), art. 47, dispõe que os professores provisórios seriam
dispensados “[...] à medida que forem sendo providos professores normalistas nas
diversas escolas isoladas, de entrancia inferior para superior”, mas, em
contrapartida, era facultad o aos professores provisórios ou titulados e aos
professores de concurso, “[...] com mais de dois anos de exercício, matricularem -se
na Escola Normal, para obter o diploma de normalista” (DECRETO Nº 7.994, ART.
51).
Esse curso, cuja abertura foi realizada numa cerimônia no salão de festas do Grupo
Escolar Gomes Cardim, em agosto de 1929, era dirigido por Deodato de Moraes,
que lecionava todas as disciplinas e ainda orientava e fazia a adaptação da Escola
Activa nas escolas estaduais, onde , com acesso livre, podia obter dados sobre o
ensino e ainda fazer verificaçõ es sobre a educação. Todos os agentes da escola,
professores, diretores e inspetores deviam dar -lhe informações e também facilitar
seu trabalho.
Soares (1998) diz que os alunos do interior foram beneficiados pelo Decreto nº 9.750
(1929), que lhes garantiu passagens e ajuda de custos. Os que conseguiam bom
aproveitamento tinham preferência nas promoções por merecimento e desempenho
de comissões e, ainda, nas nomeações de diretores de escolas reunidas e grupos
escolares.
Na exposição que fez ao povo do Esp írito Santo em 1935, João Punaro Bley – que
governou o Estado no período de 1930 a 194 3 – , diz que adotou algumas medidas
para atender às aspirações dos três mais prósperos municípios do Estado: criou a
Escola Normal de Cachoeiro do Itapemirim, por meio do Decreto nº 4.678, de 24 de
março de 1935; equiparou a de Alegre em virtude do Decreto nº 4.316, de 21 de
dezembro de 1933; e submeteu a uma prévia fiscalização a de Muquy. O governador
diz que tais providências não necessitavam ser exaltadas, porque tod os sabiam que
76
[...] uma das primeiras providências para esse fim, assumiu caráter
moralizador e foi inspirada pelo desejo de entregar o ensino das primeiras
letras a professores capazes, afastando da direcção das escolas os que
haviam logrado habilitação para o exercício do magistério em concursos
apressados e annuláveis pelos vícios de que se revestiram [...] (BLEY,
1935, p. 28).
Isso era considerado uma desigualdade, pois todos se esforçavam igualmente para
desempenhar suas funções. Com o decreto, essa desigualdade deixou de existir e o
critério para que recebessem aumento de salários passou a ser o tempo de serviço
prestado na função, isto é, foi fixado aos professores vencimento proporcional ao
tempo de serviço prestado ao magistério independente do tipo de escola em que
atuavam.
Segundo João Punaro Bley (1935), as medidas que visavam à melhoria do ensino
não podiam incidir apenas na alfabetização. Nesse sentido, outras medidas legais
importantes vieram a contribuir para essa melhoria. Por meio da Resolução nº 326,
de 31 de março de 1934, foi criado o Serviço de Educação pelo Rádio e o Cinema, e
78
Era a Escola Modelo que servia de padrão para as demais. Ficava situada na Capital
e era onde os alunos do Curso Normal faziam o estágio denominado pelos
inspetores, em seus relatórios, de treinament o, antes de prestarem concurso ou
serem nomeados para atuar nas escolas, isto é claro nos casos em que não havia
favoritismo, pois havia professores que não tinham preparo nenhum e eram
simplesmente indicados para os cargos. O art. 37 do Decreto nº 7.994 ( 1927)
esclarece:
o curso complementar era pré -requisito para os alunos que terminavam o 4º ano e
queriam ingressar na Escola Normal.
Outro exemplo é citado no relatório de Alfredo Lemos, inspetor da 8ª zona, compo sta
por 26 escolas, em 3 de dezembro de 1928, cujas providências tomadas com
relação às faltas dos professores do município de Conceição do Castelo foram:
nas escolas. Isso sem contar que havia ainda professores que desafiavam o Poder
Público, conforme relata o inspetor Alfredo Lemos, em 15 de março de 1935, sobre
uma professora da Escola Pública Mixta de Amarell os, município de Guarapary, que,
tendo ficado cinco dias sem lecionar, ao receber uma observação pela falta de
assiduidade, declarou que não tinha medo das autoridades.
Algumas vezes, a falta dos professores às aulas estava ligada a motivos de ordem
pessoal. Na Escola de Rio Pardo, conforme o relato de Aristides Costa, inspetor da
6ª zona, referente às escolas do município de Alegre, em 3 de outubro de 1928,
Apesar de a maioria dos professores dos municípios citados inspecionados por ele
serem normalistas, há um número elevado de professores substitutos, conseqüência
de um grande número de professores licenciados. Esse fato o levou a relatar que
Entendemos que o inspetor quis dizer que percebeu, nos professores dos
municípios inspecionados, a falta de compromisso com a função que
desempenhavam e, também a falta de consciência em relação aos prejuízos
causados aos alunos com as suas faltas. Apesar de não deixá-los sem aula, de as
escolas funcionarem com professores substitutos, o trabalho não era desenvolvido
do mesmo jeito, acarretando atrasos e problemas de várias ordens.
De diferente modo, Siqueira e Ferreira (2003) dizem que tais problemas têm relação
com frustrações geradas na área profissional e/ou agregadas às ansiedades
derivadas das tentativas de conciliar o trabalho com as necessidades da casa e da
família. A partir da exposição desses fatores que podem ser os desencadeadores de
tantos pedidos de licença dos professores , pensamos que, nesse caso específico,
apesar de termos consciência das dificuldades dessas professoras em desenvolver
o seu trabalho devido às precárias condições das escolas, baixos salários,
deficiência de materiais e da “vigilância” dos inspetores, o m ais difícil para elas era
conciliar o trabalho de casa com o da função de professoras.
82
Encontramos, nesse caso, informações que nos levam a refletir sobre algumas
questões: como poderia ser a professora de concurso se não sabia ensinar o básico
aos alunos? Que concurso era esse? Os conhecimentos necessários para prestá -lo
não tinham relação com o trabalho que desenvolveriam em sala de aula?
Verificamos em, nossa análise, que esses não eram casos isolados e que eles eram
percebidos com freqüência pelos inspetores.
Os alumnos são quasi todos analphabetos, mas estou certo que dentro em
breve estarão alphabetisados, dado o esforço e competencia da actual
regente que lecciona com methodo, pois ofereceu -me a opportunidade de
assistir uma aula de alphabetisação, da qual tive optima impressão.
O primeiro diz respeito às novas exigências acerca da formação dos docentes para
atuar nas escolas. Embora essas exigências ainda não fossem as ideais, pois
continuava sendo expressivo o número de professores de concurso no decorrer da
década, foram as possíveis para o momento, considerando a insuficiência das
escolas para formação de professores, no se ntido de atender às necessidades
geradas pela ampliação da oferta de ensino primário.
Nessa nova organização do ensino nas escolas normais, estavam previstas ainda
medidas para atender aos princípios da escola ativa para preparação dos
professores. A seleção desses profissionais, por meio do critério de merecimento
disposto no Decreto nº 7.994, que era um dos itens adotados para tal procedime nto,
é explicada por Tanuri (2000, p. 62):
Constam ainda artigos e itens apontando que, além dos inspetores, os delegados da
instrução, os policiais estaduais ou municipais, os professores públicos, as
autoridades judiciais e administrativas também eram fiscais na obrigatoriedade do
ensino; o delegado da instrução deveria velar por essa obrigatoriedade e aplicar as
multas convenientes; a freqüência média era “[...] o quociente da divisão total dos
comparecimentos pelo número de dias lectivos” (ART. 93, § único, p. 43), dentre
outras determinações.
A baixa freqüência era uma questão difícil de ser solucionada, pois, em muitos
municípios, não havia escolas, assim as crianças não podiam freqüentá-las.
Archimimo Gonçalves, em 1929, assinala o fato de, no município de Santa Tereza,
não ter o número de escolas que “[...] corresponde à sua população e extensão
territorial, tornando-se necessária a creação de tantas escolas nos diversos núcleos
existentes”. Apesar de ser insuficiente o número de escolas, segundo ele, as 28
escolas rurais que existiam estavam sendo pouco freqüentadas e, por isso, deveriam
ser postas em prática as exigências previstas no Capítulo II, art. 58, p. 33, do
Regulamento da Secretaria da Instrução de 1925 que dizia ser obrigatório “[...] o
ensino primário para todas as creanças de 7 a 12 annos de edade” e do art. 63 que
estabelecia a aplicação de multa aos “[...] pais, tutores ou responsáveis que,
notificados, infringirem as disposições [...]” contidas no capítulo que tratava “Da
obrigatoriedade e da gratuidade do ens ino primário”.
88
Archimimo Gonçalves (1929) diz saber que essa medida é extrema, contudo
considerava que era a única capaz de melhorar a freqüência, principalmente, nos
núcleos estrangeiros, pois um dos problemas que dificultava a freqüência às escolas
estava relacionado com o fato de, em algumas regiões do Espírito Santo, existirem
núcleos significativos de imigrantes que, com o pretexto de ensino religioso,
principalmente os alemães, vinham instalando no interior do Estado um número cada
vez mais crescente de escolas, onde só ensinavam o seu idioma. Gonçalves (1929)
complementa ainda:
A insistência dos alemães em manter escolas estrangeiras também foi relatada pelo
inspetor Alberto d’Almeida em seu relatório parcial de 28 de junho de 1929, referente
89
Qual não foi minha surpresa de encontrar ainda neste Estado escolas onde
a lingua patria é completamente esquecida e lembrado somen te o idioma
allemão! Logo que comprehendi de chôfre a imensidade de tão grande
attentado não medi circunstancias, e procurando o pastor Guilherme Küster
entrei em entendimento com esse senhor mas, sem resultado, porque não
comprehendeu o que lhe disse, ou se fes de não entendido no portugues, o
que entretanto, não posso affirmar. Mesmo alguma palavra em frances, ou
phrase , foi sem resultado. Assim, por meio de mimica dei a entender que ia
escrever um officio, e que elle mandasse um interprete traduzir. Dei xei
então o officio [..] que peço venia a Vª Exª desculpar o modo por que agi,
pois o momento foi quem o sugeriu.
No ofício que o inspetor enviou ao pastor, ele informava que, no curso sob a
orientação do pastor, devia ser ensinado o português e, no ca so de não haver
pessoa habilitada para fazê -lo, que os alunos deviam ser imediatamente
matriculados na escola pública Barra de Crissiúma. Dizia ainda que o ensino da
língua pátria era obrigatório, sob pena de serem multados e sujeitos às penas da lei
os responsáveis por não cumprir tal exigência. Alberto d’Almeida finaliza o relatório
afirmando que pretende voltar brevemente a Barra de Crissiúma para resolver a
questão.
O pastor Guilherme Küster responde ao inspetor que, quando este voltar à Barra de
Crissiúma, ele estará à sua disposição para auxiliá -lo na resolução do problema e
juntos encontrarem uma conclusão satisfatória para ambas as partes. Após ler a
resposta do pastor, Alberto d’Almeida sugere que, caso não seja possível a
matrícula dos alunos do p astor Küster na escola de Barra de Crissiúma, por
dificuldade de compreenderem a língua, no núcleo de Afonso Pena, há um professor
particular habilitado em português e alemão que poderá ensinar aos meninos.
Segundo Kreutz (2003, p. 355), “Os imigrantes alemães vieram de regiões com
acentuada tradição escolar. Não encontrando escolas públicas na região de
imigração, uniram-se para construção de escolas étnicas, manutenção do p rofessor
e produção de material didático”. Essas escolas eram comunitárias, particulares e/ou
concernentes a alguma congregação religiosa. O autor diz ainda que havia, no ano
de 1931, no Estado do Espírito Santo, 22 escolas da imigração alemã, das quais 21
eram evangélicas com matrícula de 705 alunos e a outra era mista com 12 alunos
matriculados (KREUTZ, 2003).
Havia, porém, algumas situações mais difíceis de serem resolvidas. Flávio de
Moraes, em 6 de abril de 1929, afirma, em seu relatório: “Procure i fazer cumprir a
obrigatoriedade do ensino, mas encontrei paes que nem multados mandam os filhos
á escola”. Dessa forma, o referido inspetor sugere ao secretário da Instrução uma
medida que, segundo ele, poderia dar melhores resultados que a aplicação de
multas. A sugestão era que o secretário colocasse à sua disposição um soldado,
“[...] porque o nosso colono não conhece a lei e não a teme, e deante de um
soldado, somente uma multidão se curva [...]”. Esperava o inspetor que a presença
do soldado juntamente com ele às inspeções poderia pôr termo aos abusos dos pais
infratores da lei.
91
O exame do conteúdo dos relatórios e dos termos de visita dos inspetores, relativos
aos anos posteriores, indica que o procedimento de utilizar a polícia para intimidar os
pais,,não se tornou uma prática regulamentar e deixou de ser utilizado, e a cobrança
de multa aos pais que não matriculavam seus filhos continuou a ser adotada. Porém
o problema da baixa freqüência persistiu no decorrer da década.
Consta, no termo de visita do inspetor Alfredo Lemos, da Escola Mixta de Santa
Maria Magdalena, município de Alfredo Chaves, no dia 1º de maio de 1935,
referente à Escola Mixta de São Sebastião: “Recomendei á professora intensificar a
matricula, notificando aos pais de crianças em idade escolar que residem em um raio
de 3 km distantes da escola a virem matricular seus filhos, sob pena de multa”.
ausencia dos meninos, sob pena de multal -os. Mandei chamar alguns paes
a quem fiz ver o signo da lei e ameacei -os de multa. Esperamos o resultado.
Uma das causas das doenças era a falta de higiene, a qual é bastante citada nos
relatórios, demonstrando a preocupação de alguns inspetores. Conforme salient a
Flávio de Moraes, em seu relatório de 12 de abril de 1928,
A falta de higiene nas escolas ia desde a falta de mobiliário para os alunos, que
muitas vezes escreviam apoiando ou se senta ndo no chão e fazendo os bancos de
mesas, até a falta de instalações sanitárias, conforme relata Archimimo Gonçalves
no termo de visita da inspeção que fez à escola fem inina estadual de Patrimônio de
Santo Antônio, município de Santa Thereza, em 16 de agosto de 1938: “Não tem
instalação sanitária. Sendo como é próprio estadoal seria de grande necessidade a
construção de dependência sanitária para os dois sexos annexa ao prédio – É uma
providência aconselhavel e imprescindivel” . O absurdo dessa situação é que a casa
onde a escola funcionava tinha sido doada ao governo pelo povo em “festa solene”,
enfatiza Gonçalves (1938), ou seja, não houve até então investimento nenhum d o
Poder Público na casa.
Esse não era apenas um caso isolado, Archimimo Gonçalves relata outro fato
semelhante no seu termo de visita à escola masculina estadual de Figueira de Santa
94
Conforme foi possível averiguar com base em todo o material analisado, detectamos
em apenas dois relatórios e em duas mensagens do presidente Aristeu Borges de
Aguiar – uma em 7 de setembro de 1929 e outra em 22 de setembro de 193 0 –,
providências no sentido de evitar a proliferação de doenças. No primeiro dos
relatórios, Archimimo Gonçalves sugere a proibição da criação de suinos e cloacas
nos quintais próximos à escola que estava sendo prejudicada. No segundo relatório,
referente ao Grupo Escolar de Alegre, resultado de sua inspeção no período de 30 -
10 de 1930 a 25-10 de 1931, o inspetor Ota cilio Lomba relata que, no mês de
setembro, houve baixa em relação à freqüência, quando esta deveria ter aumentado
“[...] devido ao numero grande de alunos que se matricularam, porque nesse mês,
vacinámos todo o Grupo contra a varíola e inumeros alunos fic aram acamados em
consequencia da reação da vacina”.
Procurando saber as causas, o inspetor det ectou que, em parte, era motivada pelo
forte surto epidêmico de paludismo “[...] combinado ou aggravado ainda com a má
vontade dos paes que querem aproveitarem [sic] do trabalho de seus filhos na limpa
do cafesal para a respectiva colheita”. Confirmados, então, os motivos da falta de
freqüência dos alunos, o inspetor escreveu aos pais prevenindo -os da necessidade
de matricular seus filhos na escola, sob pena de “[...] lhes serem applicados os
rigores da lei”, pois o ensino era legalmente obrigatório. A out ra providência tomada
pelo inspetor foi sugerir ao delegado de hygiene local “[...] a prohibição de suinos e
cloacas nos quintaes circunvisinhos das escolas, rasão primordial do surto
epidemico ora reinante, o qual tem causado grande numero de victimas”.
97
Não consta, contudo, nos documentos analisados, que tal sugestão foi acatada pelo
delegado ou se outra providência foi tomada nesse sentido. É fato, porém, que as
condições sanitárias, tanto das localidades quanto dos prédios onde funcionavam as
escolas e as doenças dos alunos oriundas desses fatores, continuaram a ser
denunciadas pelos inspetores como um dos elementos essenciais que impediam a
freqüência das crianças às escolas.
Essa era uma medida que o inspetor considerou viável para contribuir para o bem -
estar dos alunos e também para a melhoria da freqüência escolar, já que as crianças
começavam a estudar e, logo que ficavam doentes, devido às más condições de
vida e de higiene, deixavam de ir à escola.
Apesar de os castigos físicos terem sido proibidos, outro fator que afetava a
freqüência nas escolas era a sua aplicação pelos professores. Segundo So uza
[200-], os castigos impostos faziam com que a escola se tornasse um lugar de medo
e dor e contribuíam para que os alunos tivessem repulsa aos estudos, aumentando
as faltas às aulas. Sobre esse aspecto, nas visitas que faziam às escolas, os
inspetores se deparavam com casos inéditos que fugiam à sua autoridade para
resolver, necessitando serem levados ao conhecimento do secretário da Instrução.
Um exemplo é a situação relatada por Archimimo Gonçalves, em inspeção às
escolas do município de Santa Thereza , relativos aos meses de setembro e outubro
de 1929. O inspetor relata que havia um professor da Escola de S. Jacintho,
município de Santa Thereza que:
98
[...] mutila seus alumnos fazendo ecchymoses pelo corpo com varas, usa a
deprimente palmatória além de pôr os meninos de joelhos nas janellas da
rua com braços abertos. Não tive informações – vi extatico e pasmado
aquelle homem, vestido de pyjame deante de mais de 40 alumnos de
ambos os sexos, de 6 a 15 annos, esbordoar deshumanamente, como um
tigre enraivecido uns dez meninos deante de 6 ou 8 transeuntes parados à
porta da escola! Levado por um extranho pavor obriguei -o a fechar a escola,
pelo que sei entendeu-se com V. Exª a respeito.
Pelo relato do inspetor, fica claro que não era a primeira vez que o professor agia
dessa maneira. Contudo não há registros sobre quais foram os procedimentos
adotados na primeira vez em Santa Thereza. Pensamos que ele pode ter sido
removido pelo inspetor para outra escola do mesmo município, no caso de ter tido
conhecimento do ocorrido antes de acontecer em S. Jacintho e não fazer valer o
disposto no Decreto nº 6.501, pois já foi verificado que as leis não eram
rigorosamente cumpridas. Mas pode ser que o próprio professor tenha pedido a sua
transferência para outra escola do município por não ter encontrado apoio nos seus
atos em Santa Thereza. Nesse caso, o inspetor só deve t er tomado conhecimento
do fato somente depois do ocorrido na escola de S. Jacintho.
99
Outro caso de castigos corporais é citado por Dr. Lopes Ribeiro, inspetor t écnico do
ensino, que escreve em seu relatório referente à inspeção escolar nos municípios de
Alegre, Muniz Freire, Rio Pardo e Siqueira Campos, em 25 de outubro de 1933, que ,
em sua visita à escola masculina de Santa Cruz, fez “[...] o professor quebrar u ma
palmatória que se achava sobre a mesa, instrumento de tortura que é sempre uma
causa justa de diminuição de freqüência”.
Nesse cenário, consideramos importante ressaltar que, de acordo com Horta (1998),
mesmo sendo defendida entre os intelectuais do final do império, a obrigatoriedade
escolar não foi aclamada como princípio federativo no começo da República. “D a
mesma forma, a gratuidade e a obrigatoriedade ficaram ausentes da Constituição de
100
1891” (HORTA, 1998, p. 15). Segundo Cury (1996, p. 78) , “Nem as emendas que
explicitavam o caráter obrigatório e gratuito do ensino público, nem as que
postulavam a existência exclusiva do ensino livre (sem contraface do ensino público
oficial) tiveram qualquer chance. Foram todas rejeitadas” (grifo do autor). Ainda de
acordo com Cury (1991, apud HORTA, 1998, p. 15):
Assim, fica evidenciado que, de acordo com Romanelli (2006), a estrutura de ensino
existente até o momento nunca foi, de maneira geral, organizada tendo como base
um sistema nacional, e isso era, para a autora, o ponto de partida para a análise da
situação educacional. Ela menciona que “[...] O que existia eram os sistemas
estaduais sem articulação com o sistema central, alheios, portanto, a uma política
nacional de educação. Foi e sse, aliás, um dos pontos visados nos ataques do
chamado movimento renovador” (ROMANELLI, 2006, p. 131).
Movimento este que surgiu, segundo Saviani (2007, p. 193) , “[...] impulsionado pelos
ventos modernizantes do processo de industrialização e urbanizaçã o [...]”. Devido à
nova ordem econômica em implantação, continua Romanelli (2006), em que as
101
De acordo com Fiscarelli (2004, apud SOUZA, 2007, p. 169), o termo materiais
escolares sempre foi historicamente utilizado pelos profissionais da educação no
Brasil, para nomear “[...] o conjunto dos artefatos materiais necessários para o
funcionamento das escolas envolvendo mobiliários e acessórios, infra -estrutura do
prédio escolar, equipamentos e utensílios, destinados ao ensino das matérias [...]”.
Nesses equipamentos e utensílios estavam inclusos os livros de leitura, as cartilhas,
os globos, os mapas, os labor atórios de Química e Física, dentre outros. Contudo,
estudos produzidos a partir da segunda metade do século XX, particularmente em
Didática, delineou “[...] um saber sobre os materiais escolares de natureza prescritiva
e normativa restringindo o sentido d o termo, designando apenas os objetos usados
por professores e alunos no processo ensino -aprendizagem [...]” (SOUZA, 2007, p.
169).
esses eram os termos utilizados e assim optamos por mantê -los tal como são
apresentados na literatura da época.
Segundo Faria Filho (2003), a falta de espaços para o funcionamento das escolas
era visto também como um problema administrativo, pois muitas escolas eram
distantes umas das outras dificultando o trabalho de inspeção, e bo a parte das
verbas era gasta com pagamentos do professor e aluguel das casas onde
funcionavam as escolas. Dessa maneira, “[...] os professores não eram controlados,
os dados estatísticos eram falseados, os professores misturavam suas atividades de
ensino a outras atividades profissionais e, enfim, as escolas não funcionavam, em
boa parte das vezes literalmente” (FARIA FILHO, 2003, p. 147).
O previsto no art. 35 do Decreto nº 6.501 (1924, p. 27) era: “Nenhuma escola poderá
funccionar com matricula inferior a trinta alumno s e frequencia menor de vinte,
cabendo á autoridade escolar respectiva negar attestado ao professor que não
preencher essas condições”. Tomando as contribuições de Faria Filho (2000), diante
dos diagnósticos produzidos pela análise dos relatórios, os profe ssores eram
desleais com o governo fraudando os livros de registros de matrícula e freqüência de
alunos para que pudessem manter a cadeira funcionando.
O não cumprimento desse dever implicava multa para o professor “[...] quando for
inefficaz a de reprehensão [...] [e quando o professor não cumprir as disposições
contidas] [...] nos ns. 7, 8, 9, 10, 12, alineas a), b), c), 14, alineas a), b), c), 20 e 23
do art. 167 ”(ART. 176, p. 68) do mesmo decreto. Nessas disposições havia várias
determinações sobre os deveres dos professores, dentre as quais: distribuição dos
boletins aos pais, escrituração correta da escola, conservação dos móveis, livros e
utensílios da escola, envio de boletim mensal, mapa do movimento de sua escola e
outras.
Sobre a deficiência dos espaços que eram inadequados para o funcionamento das
salas de aula, esse item foi amplamente abordado em praticamente todos os
relatórios e termos de visitas analisados nos anos de 1928, 1929 e na década em
estudo. Havia escolas, embora em menor proporção, que apresentavam boas
instalações, com salas amplas e arejadas. Alguns fazendeiros, mediante auxílio do
governo, propunham construir casa para o funcionamento de uma escola e outros
109
Contudo havia escolas instaladas em casas cobertas de palhas, como era o caso da
Escola Mixta de Comboyos - 3ª entrância, relatado pelo inspetor Flávio de Moraes
em sua inspeção nas escolas de Riacho e Santa Cruz em 3 de agosto de 1928 e da
Escola Mixta de Timboaty, também de 3ª entrancia, do mesmo relatório. O agravante
é que esses não eram os únicos casos.
pois não adiantava ter professores capacitados para atuar em escolas sem
materiais, mobiliário e funcionando em espaços inadequados.
Sobre a situação dos prédios onde funcionavam as escolas, sabemos que a maioria
das escolas funcionava em casas desapropriadas para o fim a que se destinavam.
Havia outras, contudo, que, apesar de funcionarem em prédios próprios,
apresentavam irregularidades em suas insta lações, conforme relata o inspetor
Francisco Generoso da Fonseca, em 29 de setembro de 1930, na sua inspeção ao
Grupo Escolar Amancio Pereira, município de São Matheus:
de construir um predio novo, especialmente para escola. Acredito que não ficará em
promessa, pois a professora casou -se com um dos filhos do pro prietário da Fazenda
e, naturalmente, porá empenho nisso”. Dessa forma, fica claro que não havia, por
parte do governo, o compromisso de construir um prédio para o funcionamento da
escola e sim esperar que a iniciativa para essa situação partisse da profes sora e dos
interessados na manutenção da escola no local.
O predio onde funcciona o Grupo precisa ser substituido por um outro que
ofereça maior conforto á população escolar desta localidade, já pela
dimensão das salas de aula e pela defficiencia da installação sanitária ,
quanto ao pateo, apesar de ter a necessaria amplitude para os folguedos
das creanças precisa de uma providencia do poder competente para cercal -
o ou mural-o (LOUREIRO, 1937).
José Celso Cláudio, afirma sobre a Escola Mixta de Gurgel: “A sala de aulas não é
uma sala em bôas condições higienicas, de vez que é a sala de visitas da séde da
Fazenda, além de faltar luz e ventilação suficiente. Entretanto, não existe outra em
melhores condições na localidade”. Sobre os materiais, diz o inspetor que est a
escola estava desprovida de tudo.
Encontramos nos termos de visita s desse ano e de outros, várias denúncias de salas
de aulas pequenas, cobertas de zinco, anti -higiênicas, sem material e sem
mobiliário, conforme relata Archimimo Gonçalves em 23 de maio de 1938, sobre a
Escola Mixta Estadual de São João de Laranja da Ter ra, município de Affonso
Cláudio:
114
É revoltante constatar que não havia, por parte d o Poder Público, uma ação objetiva
em relação à educação pública neste e nos outros casos estudados. Analisando a
situação descrita, nos perguntamos: Por que ele pede o envio de pelo menos 25
carteiras se havia na sala mais de 60 crianças para sentar? Mes mo não
especificando se eram carteiras individuais ou duplas, não comportava o número
total de alunos. E os outros? Continuariam se sentando no chão? Fariam
revezamento? Que critérios seriam adotados para alguns se sentarem nas carteiras?
Pensamos que essas situações não são condizentes com um espaço onde se
desenvolve o processo de ensino aprendizagem e as finalidades da educação, que
deveria propiciar o desenvolvimento, a formação de pessoas.
Ele diz que todas as escolas visitadas estavam f uncionando regularmente e que as
escolas de Sabino Pessôa tinham taxa de matrícula e freqüência tão boas que o
deixaram muito bem impressionado. Mas o que realmente chamou sua atenção foi a
boa vontade dos pais, “[...] que matriculam seus filhos e concorre m com a respectiva
carteira que, feita embora de caixas de gazolina, suppre a falta de material que alli
é quasi absoluta”. Complementa ainda afirmando que há na localidade “[...] 14
carteiras em mau estado para 127 alumnos frequentes. No entanto, esses alumnos
não deixam de assistir ás aulas. Cada um tem sua carteirinha de caixote”. A outra
escola visitada, a de Volta da Ferradura, funcionava em um prédio “[...] construído
pelos moradores do logar especialmente para escola, e, conforme affirma a actual
professora, D. Vitalina Moffatti, doado ao Estado por escriptura publica”.
115
Apesar de não ter se constituído em regra comum, Arroyo (1985) e Faria Filho
(2000) asseveram que as autoridades republicanas pensavam que era preciso que a
população se envolvesse mais, cedendo lugar e mobiliário para o funcionamento da
escola, como forma de participar da educação dos filhos. Essa cobrança, algumas
vezes, recaía sobre a “municipalidade” e não sobre a população diretamente.
Vemos, nas duas últimas situações de scritas, que não faltava boa vontade e
esforços por parte das pessoas das localidades onde funcionavam as escolas.
Faltava, contudo, por parte do Poder Público, ações que pudessem viabilizar
melhores condições de trabalho aos professores e o atendimento às solicitações de
materiais e mobiliário pelos inspetores, pois, no decorrer do período estudado, as
denúncias sobre esses fatores foram constantes, demonstrando a inércia e a
omissão dos órgãos competentes em relação aos problemas relacionados com a
educação. Outro fator que vem reafirmar essa inércia e omissão é a comprovação
de que o governo não era responsável pela construção ou pagamento de aluguel de
todos os prédios onde funcionavam as escolas.
Acreditamos que essa ocorrência deveu -se às várias reformas no ensino que,
inspiradas em uma diversidade de propostas, cada vez mais voltadas pa ra o
116
Constatamos, assim, que, aliada à precariedade das escolas, havia ainda a falta de
mobiliário e de material pedagógico para o ensino. Entretanto é interessante
observar que o Decreto nº 6.501, art. 102 (p. 45 -47) elencou os materiais de uso
coletivo que as escolas deveriam possuir e também se posicionou sobre as
condições das salas de aula. Porém tal definição legal era ignorada. Isso fica
bastante evidente, quando lemos nos rela tórios e nos termos de visitas dos
inspetores a insistência destes e dos professores em pedir ao secretário da
117
a) bancos e carteiras;
b) mesas e cadeiras;
c) armario para os livros e objectos de trabalho de classe;
d) tela ou quadro negro;
e) espheras e mappas geographicos;
f) mappas e colleções de systema de pesos e medidas;
g) mappas muraes para o ensino da leitura e de lições de cousas;
h) colleções de solidos geometricos e de model os para desenho;
i) relogio de parede e talha de filtro para agua;
j) contadores mecanicos para ensino de arithmetica;
k) cartas de Parker para o ensino de Arithmetica;
l) taboleiros de areia para o ensino de elementos de grographia.
O previsto na legislação sobre o provimento das escolas pelo Poder Público era
totalmente incoerente com a situação real, tanto no que se refere às condições dos
prédios onde funcionavam as escolas, quanto à questão dos materiais escolares e
mobiliário, pois poucas eram as escolas que funcionavam em prédios adequados e
eram providas de materiais e mobiliário.
Além de todos os materiais descritos acima, que eram de uso coletivo, consta ainda
no Decreto que: “Em todas as escolas haverá a mobilia esc olar fornecida pelo
Estado, e confeccionada de modo a attender ás exigencias dos preceitos da hygiene
escolar” (ART. 103, p. 47). Observamos que a legislação, no tocante às funções do
professor, regulamentava suas obrigações e era bastante exigente. Essas eram, a
maioria das vezes, cumpridas de acordo com a sua prescrição e, na “vigilância” dos
inspetores que controlavam suas ações. Entretanto, em relação à obrigação do
governo com as escolas, praticamente nada era cumprido.
118
Dessa forma, podemos inferir que as reclam ações dos professores e dos inspetores,
em relação à ausência de materiais, fazia sentido, já que eram imprescindíveis para
a concretização das práticas educativas e se constituíam como condição do sucesso
ou de impedimento do trabalho docente. Para Cherve l (1990 apud FARIA FILHO,
2000), há uma estreita ligação entre os conteúdos disciplinares e as condições
materiais em que se dá o ensino. Tradicionalmente, a história do ensino ressaltou as
limitações das práticas pedagógicas pela falta de adequação dos lo cais escolares,
119
Nesse contexto, ela cria a impressão de que a pedagogia antiga, em grande parte,
era definida pelas considerações meramente materiais e que, se os professores de
antigamente tivessem tido melhores condições de trabalho, teriam se saído melhor.
Contudo não há nada que permita afirmar que se tivesse havido um melhoramento
repentino dos locais de funcionam ento das escolas, do material pedagógico e do
mobiliário, teriam ocorrido modificações substanciais e duradouras nas práticas e
nas normas do ensino.
Mas, conforme Faria Filho (2000), se, por um lado, não podemos desconsiderar a
adequação que existe entr e as tecnologias criadas ou apropriadas pelas professoras
e as condições em que acontece o ensino, é necessário observar que, de outro lado,
há também as mudanças profundas que ocorreram nas práticas de ensino
decorrentes da reforma do tempo e espaço escol ares e da organização geral do
trabalho escolar. “[...] Ao estabelecimento dessas mudanças, as condições materiais
das escolas punham, muitas vezes, impedimentos muito sérios e, desses,
professoras, diretoras e inspetores tinham plena consciência” (FARIA F ILHO, 2000,
p. 151).
A partir dessas considerações, fica evidenciado, portanto, pelo autor que, embora
sentida e expressa de diferentes maneiras pelos envolvidos no processo de ensino
aprendizagem, a falta de materiais adequados e em número suficien te para os
alunos se constituía em empecilho para a concretização de procedimentos
metodológicos.
A inexistência de mobiliário adequado para salas de aula era também outro aspecto
preponderante nos relatórios analisados. Luiz Edmundo Malisek diz, em 30 de abril
de 1929, que, na Escola Mixta de Caioába, não existem carteiras. “É pena não
existirem carteiras o que muito prejudica a bôa ordem dos trabalhos e bastante
contrária ás normas da pedagogia” contrariando, também, o disposto no art. 103 do
Regulamento da Instrução (1924). O inspetor complementa, em seu relatório ao
secretário da Instrução, que “Os alumnos na hora da escripta ajoelham -se no chão e
120
Geralmente têm elas uma táboa comprida servindo de mesa para certo
numero de crianças, porém outras existem que n em dessa táboa dispõem e
assim escrevem no chão sem banco e sem mesa em uma posição
indescriptível e com gravíssimos perigos para hygiene individual e
pedagogica.
Novamente nos deparamos com fatos ocorridos nas escolas que demonstram o não
cumprimento no disposto no Regulamento da Instrução, sobre o provimento de
materiais pedagógicos nas escolas. Uma das exceções a esse fato é ressaltada por
Aristides Costa, em 20 de agosto de 1929, sobre uma das escolas existentes em Rio
Novo que era provida de quase t odo material elencado no Capítulo VI do
Regulamento da Secretaria da Instrução. Mas, segundo ele, havia outras escolas na
sede da localidade que “[...] estão a mingua, apezar dos reiterados pedidos dos
professores, do Delegado da Instrucção e dos inspetore s – todas elas precisam de
material”.
Assim, segundo o que foi possível concluir, por meio da leitura dos relatórios, as
escolas inspecionadas, no período de 1928 e 1929, apresentavam carência de
material de modo geral e algumas eram totalmente desprovidas desses recursos.
Aristides Costa diz, em 20 de agosto de 1929, que os professores e os inspetores
“[...] já desanimaram de pedir material”. Isso revela o descaso com a educação que
se mostrava cada vez mais distante do ideal, com graves problemas que exi giam
providências imediatas.
121
As escolas dos municípios de Alegre, Muniz Freire, Rio Pardo e Siqueira Campos
também se ressentiam da falta de material, conforme assinala o inspetor técnico do
ensino em comissão, Dr. Lopes Ribeiro, em seu relatório do dia 25 de outubro de
1933: “Apesar da falta de material que se ressentem todas as escolas do interior, a
impressão da visita foi bôa” e sobre a falta de mobiliário diz a respeito da Escola
Feminina de Reeve, município de Alegre que “Nesta, como na maioria das escolas
do interior, as crianças sentam -se em caixões de querozene” (RIBEIRO, 1933).
No município de Rio Pardo, a Escola Mixta de Santana de José Pedro também era
desprovida de mobiliário e a solução encontrada para a problemática foi sugerida
pelo marido da professora, proprietário da fazenda onde a escola funcionava, que se
prontificou a fornecer a madeira necessária para o mobiliário, mas a mão -de-obra
deveria ser paga pelo gov erno. Contudo não consta no referido relatório se a
proposta foi aceita ou não.
Num segundo relatório, assinado por J. E. Tavar, enviado pela Deleg acia de Ensino
do município de Itapemirim, em 29 de abril de 1938, ao secretário da Educação e
Saúde Pública do Estado, consta que da visita feita à escola da cidade, foi possível
observar que o fato de ter a escola um número elevado de alunos a cargo de a penas
uma professora para ministrar -lhes o ensino era merecedor de atenção imediata por
parte da Secretaria, “[...] principalmente porque a escola tem por mistér alphabetisar
os matriculados, isto é, ensina -lhes o abecê e o seguimento que os habilita a pas sar
para a classe inicial das primeiras letras”.
Havia, nessa escola, segundo o autor do relatório, duas turmas de alunos: uma das
crianças de abecê, que era a turma A, e a turma B das crianças que já começavam a
“soletrar juntando as letras”. A providênc ia pedida pelo inspetor, então, é a
nomeação de outra professora para que o trabalho possa ser desenvolvido, pois “A
percepção de que o número elevado de uma única professora trazia sérios
“inconvenientes” para a qualidade do trabalho escolar, implicando ainda, [...] um
grande número de reprovações [...]” (FARIA FILHO, 2000, p. 145).
Uma vez mais, já praticamente no final da década de 1930, deparamo -nos com a
falta de mobiliário e materiais didáticos e pedagógicos, como entrave ao bom
andamento do ensino. Essas proposições evidenciam, portanto, que as condiçõe s
para o funcionamento das salas de aula, os materiais e o mobiliário previstos na
legislação não foram observados no decorrer d o período do estudo, pois não houve
medidas efetivas no sentido de propiciar a construção de prédios escolares e supri -
los com materiais necessários ao desenvolvimento das aulas, pois as melhorias só
seriam possíveis mediante a vontade política dos Poderes Públicos em torná -las
efetivas.
123
A criação e distribuição das escolas nos municípios do Estado é outro fato constante
nos relatórios dos inspetores. Em 4 de dezembro de 1928, Claudionor Ribeiro,
inspetor da 9ª zona, composta dos municípios de São José do Calçado, São João de
Muquy, São Pedro de Itabapoana e Ponte de Itabapoana, pede a criação de escolas
no lugar denominado Ligação , no município de São José do Calçado, dizendo ser de
“[...] absoluta necessidade a creação de uma escola mixta para o ensino das
primeiras letras”. Fato que nos leva a pensar que havia na localidade uma população
escolar de ambos os sexos carentes de esco las.
Costa (1928) diz também que o dono da Fazenda das Palmeiras pede que seja
criada uma escola pública na localidade, onde existe grande número de crianças em
idade escolar e propõe ceder, sem cobrar aluguel, casa para a referida escola e
hospedagem sem ônus para a professora que for nomeada. Essas ações
apresentam-se totalmente contrárias àquelas em que os donos de casas cobravam
altas quantias pelos aluguéis, somente pelo fato de não ser de seu interesse a
criação de escolas na localidade.
O inspetor complementa que ora há distri tos com escolas muito próximas umas das
outras oferecendo facilidades a uma população restrita e ora vêem -se áreas grandes
sem que haja uma só escola. Há, ainda, “[...] lugares que as escolas ficam distantes
umas das outras menos do que a distância prescri pta pelo regulamento que é um
raio de treis kilometros para cada” (GONÇALVES, 1930). As áreas onde quase não
há escolas não permitem que se ponha em execução a lei de obrigatoriedade do
ensino, porque há pais relapsos que não se importam com a ignorância d os filhos e
outros que, necessitando do trabalho braçal deles, vêm “[...] sempre allegando o
excesso de distancia, desarmando dess’arte o auxiliar da lei. Se entretanto, na
distribuição das escolas existentes, houvesse presidido justiça, estaria não só
resolvido, porem remediado o problema” (GONÇALVES, 1930). Diante de tal
problemática, propõe, então, o inspetor a transferência de algumas escolas de
determinados núcleos para outros.
Neste relatório, José Celso Cláudio (1938) diz ao secretário da Educação e Saúde:
Neste capítulo, trataremos especificamente sobre o aspecto que nos interessa mais
diretamente neste estudo: a alfabetização no período de 1928 a 1938. Assim,
apresentaremos, em prime iro lugar, algumas discussões sobre as cartilhas e os
livros de leitura “approvados pela Secretaria da Instrucção para uso das Escolas
Públicas, em 1924”. Ac reditamos que a discussão sobre esses materiais ajudará a
entender sobre a necessidade de adoção de cartilhas e de livros que atendessem às
necessidades de aprendizagem das crianças e, também, ao discurso renovador para
a época, referente aos métodos analíticos.
A construção deste capí tulo, partiu das análises efetuadas dos requerimentos
recebidos pelo secretário da Instrução (1928 a 1938), do livro copiador de cartas do
secretário da Instrução, do livro de registro de cartas e impressos do Departamento
de Ensino Público expedidos pelo correio e dos livros de termos de aprovação de
propostas de material escolar da Secretaria da Instrução encontrados no Arquivo
Público do Espírito Santo e no material bibliográfico n a Biblioteca Central da
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), na Biblioteca Setorial do Centro de
Educação e na Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo. Buscamos,
ainda, informações complementares em instituições localizadas na cidade de Belo
Horizonte: Biblioteca Professora Alaíde Lisboa de Oliveira da Unive rsidade Federal
de Minas Gerais (UFMG), Biblioteca Estadual Professor Luís de Bessa e
Superintendência Regional de Ensino Metropolitana A.
É necessário pontuar que o acesso às fontes que poderiam indicar com mais clareza
quais métodos e materiais de ensin o (cartilhas, livros de leitura, etc.) foram
efetivamente utilizados pelos professores , no período, se constituiu em uma tarefa
particularmente difícil, pois, além de tomarmos conhecimento da inexistência de
algumas por terem sido destruídas por conveniênc ia das situações e/ou pelo tempo,
verificamos que a falta de conservação e de restauração têm possibilitado a
destruição total ou parcial por traças de muitas fontes. Com relação às fontes
acessadas, encontramos dificuldades em reuni -las, porque se encontram dispersas,
em precárias condições de preservação e sem tratamento arquivístico apropriado.
Contudo, foi possível adequarmos os objetivos propostos , inicialmente para esta
pesquisa, ao conjunto de materiais localizados, viabilizando a sua realização.
referiam inicialmente à utilização desse método que não constaria mais “[...] na
seção das bases gerais juntamente com orientações de uso do método intuitivo (art.
2º) e do modo simultâneo (art. 4º)” (TRINDADE, 2004, p. 123).
Trindade (2004) diz ainda que, em 1929, já eram percebidos discursos sobre o
método de ensino intuitivo e da importância de valorizar a infância como um mundo
diferente daquele do adulto. A autora se refere ao trabalho de Mortatti (2000) e
procura localizar, no Rio Grande do Sul, os efeitos dos discursos por ela citados,
afirmando que “[...] com algumas diferenças temporais e de interpretação, os
mesmos circularam e foram efervescentes entre nós, gaúchos/as” (TRINDADE,
2004, p. 325).
Maciel (2003b) afirma, em seu trabalho sobre a história da alfabetização nas escolas
de Minas Gerais, que a aprovação do método global, a partir do fin al do ano de
1920, ocorreu devido ao fato de ser a época propícia às “novas metod ologias” e “[...]
ao fato de os idealizadores da Reforma buscarem inspiração no movimento de
renovação educacional, que ocorreu em vários países europeus e americanos, nos
primeiros anos do mesmo século” (MACIEL, 2003 b, p. 16).
A ênfase nas inovações meto dológicas, segundo a autora, era o elemento que
norteava a Reforma Francisco Campos, no ano de 1927, que trazia
Maciel (2003b) diz ainda que é difícil determinar o término da história da adoção do
método global na Reforma de Francisco Campos, sendo possíve l demarcar apenas
o momento inicial da sua adoção, porque “[...] uma mudança não ocorre
131
Tal situação não ocorria apenas nessa escola, pois, em outros relató rios, há
registros de recomendação dos inspetores aos professores para que recorressem a
esse método, para solucionar o problema da grande quantidade de alunos
analfabetos. Nos livros de nºs 49 e 50 de registros de materiais e móveis escolares
fornecidos às escolas do Estado , no ano de 1928, encontram -se demonstrações de
que foram enviados exemplares da cartilha de Mariano de Oliveira – “Ensino- Rápido
da leitura” 1 – a várias escolas (Foto 5).
1
“Publicada pela primeira vez em 1917, essa cartilha conheceu sucesso extraordinário, atingindo
2.230 edições em 1996 e mais de 6 milhões de exemplares vendidos . Conforme dados da editora
Melhoramentos, até 1941 ela já havia vendido mais de 1 milhão de exemplares, mantendo a média
de tiragem por ano acima dos 100.000 exemplares até 1969. A partir de 1970 a produção caiu
drasticamente para 40.000 exemplares e cheg ou em 1996 com a tiragem de 1000 exemplares”
Disponível em: < http://www.crmariocovas.sp.gov.br/obj_a.php?t=cartilhas01 >. Acesso em: 7 jan.
2008.
133
O método de ensino rápido da leitura tinha como suporte a “Cartilha Ensino -Rápido
da Leitura de Mariano de Oliveira”. Segundo Mortatti (2000), essa cartilha traz , na
página de rosto, uma chancela confirmando a sua aprovação e adoção oficial no
Estado do Espírito Santo. De acordo com essa autora,
A cartilha possui, até a página 47, ilustrações dos objetos representados pela s
palavras escritas; depois, elas representam ações escritas nas sentenças que são
trabalhadas. Nas páginas 46 e 47 (Foto 9), encontra-se exposto o alfabeto
maiúsculo e minúsculo em letras impressas, uma ilustração e uma palavra
correspondente a cada ilust ração que tem a sílaba inicial do nome da letra do
alfabeto em destaque, separada em sílabas. Na página 48 (Foto 10), o autor mostra
136
Além desses, encontram -se, ainda, na lista, nomes de outros livros aprovados para
as demais séries da escola elementar que , por não serem pertinentes à temática do
estudo, optamos em não mencioná -los. Nesse contexto, é relevante ressaltar que os
livros de registros de móveis e mat eriais didáticos enviados às escolas, referentes
aos anos de 1930 até 1938, não foram encontrados no Arquivo Público. Por isso,
não foi possível verificar sobre a circulação de cartilhas nesses anos. Nos livros de
nºs 49 e 50, em que se encontram os registros de materiais e móveis fornecidos às
escolas no ano de 1928, constam ainda que foram enviados às escolas o “Primeiro,
o Segundo e o Terceiro livr o de Erasmo Braga”, “Cartilhas de Higiene” e o livro de
“Leituras Intermediárias de Erasmo Braga”. Examinamos um exemplar da sexta
edição da “Cartilha Analytica de ensino da leitura” do professor Bodart J únior. Na
capa da cartilha (Foto 11), há uma chancela em que lemos:
Foto 12: Verso da capa da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart Junior
Fonte: Acervo particular da Profª Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo
Há, ainda, nesse exemplar, uma manifestação do autor dirigida aos “Illustrados
Collegas”, em que se refere à forma de organização do material; à sua pretensão de
preencher a lacuna em relação à dificuldade de aquisição de livros pela que stão de
serem raros os adotados e, também, porque, quando se tornavam acessíveis , os
preços eram exorbitantes. O autor finaliza a sua manifestação recomendando
procedimentos a serem adotados para o ensino da leitura por meio do método
analítico.
A cartilha de 56 páginas traz, na primeira delas, a foto de uma menina com uma bola
(Foto 13). Na página seguinte, é apresentada a 1 ª lição (Foto 14), sem ilustrações
com quatro sentenças relacionadas com a foto em letras impressas e uma das
sentenças escrita em letras manuscritas compondo uma historieta. Abaixo,
separadas da 1ª parte por um traço – como mais 29 das 43 l ições que compõem a
cartilha –, são apresentadas mais cinco sent enças também associadas à imagem,
em letras impressas e mais uma sentença em letras manuscritas. A 2ª lição , é
composta, na primeira parte, de sete sentenças e seis na 2ª parte, em letras
manuscritas ainda se referindo à foto da menina, c om repetição de palavras -chave.
140
Foto 13: Primeira página da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart Junior
Fonte: Acervo particular da Profª Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo
Foto 14: Primeira lição da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart Junior
Fonte: Acervo particular da Profª Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo
Foto 15: Terceira lição da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart Junior
Fonte: Acervo particular da Profª Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo
Foto 16: Sexta lição da Cartilha Analytica de Ensino da Leitura de Bodart Junior
Fonte: Acervo particular da Profª Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo
todas as lições que apresentam ilustrações. Há , nessa cartilha, seis lições em letras
manuscritas e quatro em letras de imprensa que ocupam a página inteira, sem a
divisão em duas partes. A última lição traz , na 1ª parte, quatro colunas de palavras
e, na 2ª parte, três colunas em que algumas palavras da 1ª parte se repetem,
separadas em sílabas. As atividades assim dispostas atendem aos preceitos do
método analítico, pois, a partir da sentença, chega-se às unidades menores: a
palavra, a sílaba e, depois, ao fonema. Como na Cartilha de “Ensino -Rápido da
Leitura”, a Cartilha Analítica de Bodart Junior também apresenta conteúdos que
podem ser relacionados com outras disciplinas, como Ciências, Matemática e
Geografia.
Essa informação confirma que a c artilha foi efetivamente utilizada nas escolas do
Estado e o fato de constar entre os livros e cartilhas aprovados no Programa de
Ensino do ano de 1924 indica que continuou a circular até essa data. Ela também foi
adotada nas escolas do Estado de São Paulo, confor me constatamos em nossas
pesquisas.
143
Foto 17: Capa da Cartilha Infantil pelo Methodo Analytico de Carlos A. Gomes Cardim
Fonte: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/obj_a.php?t=cartilhas01
Dessa forma, considerando a página da Cartilha a que tivemos acesso (Foto 18),
podemos inferir que a Cartilha Infantil continha ilustrações. As lições eram
organizadas a partir de historietas. Desse modo, ela era baseada no método
analítico e ensinava a ler e a escrever a partir de pequenas histórias organizadas em
frases para melhor facilitar a dec omposição do texto. Não temos elementos para
afirmar como eram ensinadas as unidades menores. Porém, é possível verificar a
preocupação em mostrar a letra de imprensa e cursiva. Os textos em letra cursiva
serviam para as atividades de cópia.
Foto 18: Lição da página 14 (Paulo e seu cão Fiel) da Cartilha Infantil pelo Methodo Analytic o de
Carlos A. Gomes Cardim
Fonte: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/obj_a.php?t=cartilhas01
144
A “Cartilha das Mães”, de Arnaldo Barreto (Foto 19), também foi aprovada para ser
utilizada no Estado. Segundo Razzini (2007), essa cartilha, foi aprovada pelo
Conselho Superior de Instrução Pública de São Paulo, em 15 de fevereiro de 1895.
Em sua pesquisa, a autora expõe algumas considerações sob re a obra, proferidas
por um dos conselheiros que a avaliou, na ocasião de sua aprovação.
Decorridos quatro meses de sua aprovaç ão, foi registrado o pedido do e ditor da
cartilha, para que o Conselho aprovasse a sua adoção nas escolas públicas e que o
governo financiasse a sua edição. Entretanto, a adoção e o financiamento p elo
governo só ocorreram na segunda edição, em 1896, trazendo, no primeiro número,
um artigo do autor, explicando , na “Cartilha das Mães”, seu método de alfabetização
e o modo de aplicá-lo.
145
Segundo Razzini (2007), no artigo, Arnaldo Barreto (1896) diz que as professoras ,
incumbidas por ele de fazerem a experimentação da cartilha se afastaram do
método que ele imaginara, encaminhando -se pelo sistema antigo dos silabários e
que esse fato o havia entristecido. De acordo com o autor,
Outra cartilha que consta na lista de livros aprovados pela Secretaria d e Instrução
Pública do Espírito Santo é a “Cartilha analytico -synthética”, de autoria de Mariano
de Oliveira. O estudo de Sobral [200-] revela que esse autor era filho de Antônio
Guedes de Oliveira e de D. Corina Eugenia de Oliveira que exercia a profissão de
professora. Nascido no dia 26 de maio de 1869, na cidade de Piracicaba, interior do
Estado de São Paulo, foi diplomado pela Escola Normal de São Paulo em 1888.
Exerceu grande influência, como professor, no cenário educacional paulista “[...]
considerando a grande circulação de suas cartilhas e a importância naquele
momento, das suas orientações em relação ao método de ensino adotado no estado
de São Paulo” (SOBRAL, [200-], p. 2).
146
A primeira lição traz a ilustração de uma menina sentada tocando um gatinho com a
mão e, abaixo da imagem, foram escritas cinco sentenças numeradas em letras
manuscritas, relacionadas com a ilustração. Segundo Sobral ( [200-], p. 4, grifos da
autora), essa organização está “[...] de acordo com o indicado no ‘1º passo’ das
Instrucções praticas para o ensino da leitura transcritas ao final da cartilha [...]” . As
letras manuscritas são mantidas nas cinco primeiras lições. A partir da sexta lição, a
letra impressa é inserida in tercalando as sentenças em letra manuscrita. Somente a
partir da oitava lição é que há predomínio do uso da letra impressa, com destaque
para apenas algumas sentenças em letra manuscrita. “[...] Na página 10, as
sentenças de uma das historietas são dispost as verticalmente em colunas e alguns
elementos de cada coluna são reorganizados formando novas sentenças sobre o
mesmo assunto” (SOBRAL, [200-], p. 4).
Sobral [200-] diz que há, nesse momento, a transição do manuscrito para o impresso
e que, até a página 9, as lições correspondiam à fase propriamente analítica da
leitura: análise das unidades maiore s – as sentenças (método da sentenciação). A
partir da página 10, ao dispor as sentenças em colunas, o autor insere o aluno no
método analítico de palavração e mantém esse procedimento nas lições seguintes
até a página 47, quando propõe o estudo da sílaba (método da silabação) inicial de
cada palavra da sentença disposta verticalmente.
Ainda de acordo com a autora, nas lições apresentadas, a partir da página 54, o
estudo da sílaba inicial das palavras retiradas das sentenças, é intercalado com o
estudo de outras sílabas das palavras. Ocorre, assim, a “[...] formação de novas
palavras cujas sílabas iniciais [...] [são] correspondentes às sílabas que compõem a
palavra estudada” (SOBRAL, [200-], p. 5). O estudo de todas as sílabas que
compõem as palavras destacadas para a formação de novas palavras é
149
predominante nas lições das páginas 65 até a 79. As lições das páginas 80 a 87 são
historietas em que não há nenhum tipo de análise. “[...] Na página 88 , há uma
relação de palavras com grafia e sons semelhantes [...], para que os alunos ao lê -
las, confrontem-nas e percebam suas dife renças” (SOBRAL, [200-], p. 6).
Conforme aponta Sobral [200-], o material foi elaborado de acordo com o método
analítico e, portanto, estava adequado ao discurso em vigor sobre a necessidade de
se utilizar métodos de marcha analítica. Ao expor as instruções para o seu uso, os
autores, segundo Sopbral, pretendiam garantir que as pre scrições elaboradas
fossem cumpridas, além de considerar que esse tipo de orientação facilitaria o
trabalho do professor.
Conforme descrito por Matos (2007), esse autor nasceu no ano de 1877, na cidade
de Rio Claro, interior de São Paulo , e faleceu em 1932. Tendo vivido apenas 55
anos, teve sua morte prematura devido, em parte, ao de sgaste sofrido no trabalho
cooperativo. Estudou na cidade de Botucatu, para onde a família havia se mudado,
mas concluiu o ensino secundário na Escola Americana, em São Paulo , e ingressou
no Seminário Presbiteriano.
150
Em 1898, foi ordenado pastor e começou seu ministério em Niterói. Após três anos,
retornou a São Paulo e foi convidado para ministrar aulas em uma grande escola
missionária, o Mackenzie College. Tornou -se, também, professor do seminário em
que se formou e acompanhou essa instituição , quando ela foi transferida para a
cidade de Campinas, em 1907. Erasmo Braga revelou várias características
marcantes: memória privilegiada, grande inteligência e extraordinária capacidade de
trabalho, além de qualidades de caráter e temperamento que atraía m a simpatia das
pessoas.
O 1º livro de Puiggari e Barreto, também constante na lista dos livros aprov ados pela
Secretaria da Instrução, em 1925, trata-se, segundo Oliveira e Souza (2000, p. 33),
de uma série graduada de leitura do autor, em que “[...] um narrador conta a história
de Paulo e o seu convívio no lar e na escola, com os amigos e professores” . Esse
livro, de acordo com as autoras, com utilização restrita aos Estados do Espírito
Santo, São Paulo e Santa Catarina e que compunha a série de quatro livros, tinha
240 páginas, era todo ilustrado com gravuras que representavam cenas expressas
no texto escrito. Não havia, no livro, instruções aos mestres, subscritas pelos autores
Romão Puiggari e Arnaldo de Oliveira Barreto. Os autores iniciavam os relatos a
partir do primeiro dia de aula de Paulo, até o término do quarto ano escolar, ou seja ,
cada livro da série representava um ano de escolaridade do menino. As histórias
tratavam de situações, atitudes, comportamentos e acontecimentos do cotidiano de
uma “família brasileira idealizada”.
151
Na escrita do primeiro, terceiro e quarto livros , foi utilizado um tipo único de grafia, a
letra impressa vertical, que variava nos tamanhos de um livro para outro. Essa série
de livros, criada para atender à forma de ensino da leitura corrente, constituía um
estilo próprio de literatura didática e as lições eram para ser utilizadas em um
momento especial da aula. Justificando, assim, para Oliveira e Souza (2000, p. 34) a
carência de instrução para os professores antes das lições, por deduzir que seus
autores rejeitam advertências e prefácios e se “[...] preocupam em criar essa coleção
para o ensino aprazível da leitura corrente, recheada de lições que prescrevem
normas de comportamento e civismo, estipulando modelos de pessoas que
deveriam ser imitados e incorporados pelas crianças”.
Nos três primeiros livros, segundo as autoras, eram apresentadas poesias, escritas
em rimas leves, com um vocabulário simples . As poesias do primeiro livro eram, em
sua maioria, de autoria dos próprios autores e descreviam cenas abrangendo os
personagens da coleção. Oliveira e Souza (2000, p. 3 5-36) asseveram que, em
relação
Conforme constatamos, pelo que foi exposto pelas autoras, as lições constantes no
primeiro livro de leitura eram atraentes e de fácil entendimento para os alunos, mas
traziam implícito todo um conjunto de convicções e convenções sociais, políticas e
econômicas, consideradas como ideais ao momento histórico .
Conforme assinala Panizzolo [200-], Köpke propôs, ainda, aos professores, durante
a conferência, que iniciassem o ensino da leitura e da escrita com um conto, mas
que eles tivessem alguns cuidados básicos em relação à organização do material
didático e à escolha das palavras . Adverte, também, que o conto deveria ter palavras
conhecidas das crianças , todas as letras do alfabeto e ser adequado à linguagem
infantil. Ele alertou, ainda, os professores para que iniciassem sempre com “palavras
concretas” ou reais, que fossem significativas, para , posteriormente, “[...] passar para
as ‘palavras relacionais’ ou abstratas, que formam imagem mental, como, por
exemplo, ‘a’, ‘um’ e ‘este’” (PANIZZOLO, [200-]). Explicou que as atividades
propostas deveriam contem plar sempre palavras extraídas do conto e “[...] despertar
no aluno a indução por meio da comparação e da semelhança entre a forma fônica e
a forma gráfica” (PANIZZOLO, [200-]). Depois dessas explicações, a autora afirma
que Köpke sugere
Após essas informações sobre apenas o autor do livro de leitura aprovado, João
Köpke, visto que não tivemos acesso à obra conforme dito, po demos observar que a
atuação do autor, no campo educacional na época, foi marcada por idéias criadoras,
renovadoras e que visavam, conforme o discurso vigente, à reforma social pela
reforma da educação. Embora, conforme assinalado por Panizzolo [200-], p. 1), João
Köpke estivesse de acordo com os ideais republicanos, não era porta -voz ou líder
desse grupo, mas “[...] foi um pedagogista, um homem que dedicou parte
significativa de sua vida à criação de teorias, práticas e instrumentos que fossem
capazes de educar os cidadãos que um dia guiariam a República”.
Como o discurso que permeava as discussões nessa época era o de que a solução
para os problemas da educação seriam resolvidos por meio de um ensino que
respeitasse “[...] a liberdade e a individualidade do educando, fornecendo -lhe
progressivamente os meios de adaptação à sociedade, vista em fase de intensas
154
De acordo com Razzini (2007, p.22), “[...] a importância dada à formação dos
professores e à escolha do material didático para a execução de um p rograma
graduado de estudos”, estava relacionado com o projeto republicano de modifi car
para melhor e isso impunha a necessidade de “[...] uniformização [da escola popular]
para garantir a mesma formação elementar aos cidadãos, tanto na escolha do modo
e do método de ensino, como na adoção dos conteúdos e condições materiais”
(RAZZINI, 2007, p. 21-22).
Dessa maneira, o projeto republicano dest inado à instrução popular fica restrito,
portanto, aos grupos escolares que pressupunham uma nova organização da escola
e, consequentemente, gerou nova demanda de materiais didáticos, porque
No Espírito Santo, até 1929, quando tem início a nova reforma do ensino, pelo
Decreto nº 6.501 (1925), o método era o intuitivo. Assim, o decreto dispunha , no art.
74, que: “O ensino terá por base o systema simultaneo, não se devendo prescrever,
absolutamente, o emprego accidental, excepcional de outros systemas, mas
procurando sempre o adeantamento geral e uniforme da classe”. No art. 75,
determinava que era “obrigatório o ensino intuitivo”.
O método intuitivo, conforme evidencia Buffa e Pinto (2002, p. 50), surgiu , no final do
século XVIII, na Alemanha, por iniciativa de Pestalozzi.
Era tributário das idéias dos filósofos empiristas ingleses Bacon, Locke,
Hume, bem como de pensadores como Rousseau, e pedagogos como
Comênio, Froebel, entre outros. Tal método valoriza a intuição como
fundamento de todo conhecimento. Ou seja, a aquisição de conhecimentos
se faz por meio dos sentidos e da observação.
156
Segundo Buffa e Pinto (2002), o método intuitivo se tornou mais conhecido por
Lições de Coisas, embora tenha recebido outras denominações. Faria Filho (2003, p.
143) ressalta que o método intuitivo recebeu esse nome devido à importância
acentuada “[...] que o s seus defensores davam à intuição, à observação, enquanto
momento primeiro e insubstituível da aprendizagem humana”. Lourenço Filho (2002,
p. 227, grifos do autor) acrescenta:
O autor diz ainda que Pestalozzi declarou que a intuição denotava “experiência
direta” e que, em seu método, tudo é baseado na ação. Inicialmente, porque são
encontrados na própria criança os princípios dos conhecimentos e seu sucessivo
desenvolvimento; “[...] depois, porqu e é ela que em si mesmo produz os signos
157
Observamos que essa prática dos professores era incoerente com a concepção de
aprendizagem que orientava os novos métodos de ensino referenciados pelos
inspetores e previsto no Decreto nº 6.501 (1925), pois , segundo Valdemarin (1998,
p. 104),
Porém, não era apenas o despreparo dos professores para o trabalho com os
modernos métodos de ensino que contribuía para a baixa qualidade do ensino n as
escolas. A falta de materiais impedia o trabalho com o método i ntuitivo, pois,
conforme evidencia Buffa e Pinto (2002, p. 50): “[...] Sua aplicação nas escolas
pressupunha uma enorme quantidade e variedade de materiais didáticos. Como a
aquisição desse material, bem como do mobiliário, dos livros e demais utensílios
fosse onerosa, os grupos escolares ressentiam sua falta”.
Valdemarin (2006, p. 98) complementa que, para que sejam alcançados bons
resultados na utilização do método intuitivo, “[...] o amb iente escolar deve ser claro e
arejado, ornamentado com trabalhos feitos pelos próprios alunos, e nas salas de
aula deve haver um conjunto de material disponível para cada uma das crianças”.
Entretanto, é necessário lembrar das queixas nos relatórios dos i nspetores e dos
professores sobre a deficiência e até mesmo inexistência de materiais pedagógicos
nas escolas do Estado do Espírito Santo e, também, das condições de conservação
dos prédios onde a maioria das escolas funcionava. Apesar de o professor poder
improvisar com meios auxiliares , como desenhos ou gravuras na aplicação do
método intuitivo, conforme salienta Valdemarin (2006), sabemos que chegaria o
momento em que esses não seriam mais suficientes, pois , segundo Faria Filho
(2003, p. 143):
159
A etapa de observação, ainda de acordo com Faria Filho (2003), era iniciada pelas
“lições de coisas” e, nesse momento , as condições para que os alunos pudessem
visualizar, observar e sentir os objetos deviam ser criadas pelos professores. Para
esse procedimento, podiam ser utilizados objetos escolares ou outros trazidos para a
escola, além de visitas e excursões nas imediações da escola. Podia ser também
possibilitado aos alunos, nesse momento, o acesso a diversas ilustrações contidas
nos livros próprios de “lições de coisas”, em cartazes produzidos especificamente
para o desenvolvimento do trabalho com o método ou ainda de outros conteúdos.
[...] cujo aspecto, nome e uso lhes sejam familiares. Sempre que exequível
fôr, nas primeiras lições de leitura, se mostrará o objeto discorrendo a seu
respeito, e proferindo-lhe o nome; após o que exibirá o mestre uma estampa
dêsse objeto, ou o desenh ará no quadro prêto, induzindo os alunos a
notarem como essa é a imagem ou pintura dêle. Em seguida se lhe
imprimirá por inteiro o nome no quadro prêto ou imprimirá impresso numa
carta, ou mapa. Então aprenderá o discípulo a distinguir o objeto, a sua
imagem e a palavra que o nomeia [...] ( BARBOSA, 1956, p. 422).
O autor completa que podem ser ensinados muitos vocábulos a partir da palavra que
nomeia o objeto, antes de se iniciar os sons ou letras de cada um. Por ess e método,
estudam-se as “[...]palavras como símbolos dos objetos e dos seus nomes falados;
de sorte que assim a palavra proferida e a palavra figurada exprimirão igualmente o
objeto, possuindo ambas a mesma fôrça de relembrar à me nte as qualidades dele
[...]” (BARBOSA, 1956, p. 423). Os sons e as letras dos vocábulos só mais tarde
serão decompostos.
Conforme constata Faria Filho (2003, p. 143 -144), no Brasil, as discussões acerca
da aplicação do método intuitivo , nas escolas, perduraram até a década de 1930:
160
Após essa introdução, a professora relatou que, na pr imeira parte da aula, foi feita a
apresentação do assunto convidando os alunos para um passeio de avião e, para
aguçar mais o interesse deles, iniciou com o trabalho manual a confecção de aviões
de papel. Assinala, também, que, após as experiências e as fr ases comentadas
sobre o assunto, foi feita a averiguação, por meio dos testes de escolaridade,
constituindo-se esta na parte do “processo de applicação da aprendizagem”. A
161
correção foi feita pelos próprios alunos, os quais tiveram seus testes trocados entr e
si e, sob o controle da professora, foram corrigindo. Diz ainda que a aplicação de
todos os processos seguiu a metodologia.
Notamos também que, apesar de constar no cabeçalho do projeto , que o tema era o
mar, não há, em nenhum momento do desenvolvimento do trabalho , menção ao
mar. A explicação possível é que talvez o plano citado se referisse a uma das partes
de um projeto mais amplo ou houve algum erro de datilografia.
No plano de aula exposto, quando a professora diz que aplicou todos os processos
de acordo com a metodologia, pensamos que ela se referiu aos manuais sobre o
método intuitivo, criados e dirigidos aos professores, alunos e pais. Esses manuais
tinham, segundo Valdemarin (2004, p. 105), “[...] o objetivo de evidenciar o processo
de transposição didática por meio do qual a teoria do conhecimento é desdobrada
em lições e atividades”.
Em seu trabalho, a autora analisa vários desses manuais sobre o método intuitivo.
Tomando as suas contribuições sobre a abrangência de cada um deles acerca dos
conteúdos e procedimentos neles contidos e comparando -os com a descrição do
plano de aula da professora, consideramos imprudente apontar um deles como o
utilizado pela professora, visto que não há indicação nos documentos analisados de
qual manual era usado pelos professores do período em estudo.
Nos relatórios dos inspetores, há evidências ainda de uma visão pessimista com
relação ao trabalho dos professores alfabetizadores. Nesse sentido, é importante
apontar que a forma de ingresso de professores e a sua formação afetavam o
trabalho de ensino da leitura e da escrita. Conforme dito, no final da década de
1920, a maioria das escolas era regida por professores de concurso e muitos deles
eram inexperientes e necessitaram de instruções do inspetor sobre o método de
ensino vigente.
Nesse sentido, como mencionado, os professores não ensinavam com método por
não terem a necessária prática ou experiência. Em 6 de agosto de 1929, em
inspeção às escolas dos municípios da Capital e do Espírito Santo, Aristides Costa
relata o caso da escola “Mirabeau Pimentel” e diz que, apesar de o professor ser
esforçado e de os alunos terem aproveitamento, só discordou do “[...] methodo de
alphabetisação por meio da soletração”.
A questão da falta de formação, de preparo dos professores para atuar nas escolas
era tão séria que o insp etor Flávio de Moraes disse, em 3 de agosto de 1928, que
seria necessário fazer uma rigorosa seleção no magistério para o ingresso de
professores nas escolas e , ainda, que há alguns professores que “[...] necessitam de
163
com Aristeu Borges de Aguiar, presidente do Estado, cuja posse ocorreu no dia 30
de junho de 1928.
Attilio Vivacqua (Foto 21), era considerado um político de grande habil idade e,
segundo Soares (1998), nasceu no dia 11 de outubro de 1894, em Espírito Santo do
Rio Pardo (hoje Muniz Freire). Cursou o ensino primário em Muniz Freire e o curso
superior na Faculdade Naciona l de Direito, no Rio de Janeiro. R epresentou o Brasil
em dois congressos internacionais, quando ainda era estudante. Em 1916, concluiu
o curso superior e iniciou sua vida profissional na cidade de Cachoeiro do
Itapemirim, onde foi também jornalista, vereador e prefeito.
Conquistou uma cadeira de deputado em 1921 e , após três anos, mudou-se para
Colatina, como diretor-presidente da Companhia Territorial, empresa pública de
desenvolvimento incumbida de realizar o Plano de Recuperação do Vale do Rio
Doce. Vivacqua era um homem inteligente, liberal, progressista, muito bem
informado e, na Assembléia Legislativa , por dedicar-se a temas sociais, ganhou o
apelido de “esquerda radical platônica”.
Após a “Revolução de 1930”, ele defendeu várias pessoas perseguidas pel o novo
regime por meio da Junta de Sanções, tribunal de exceção. Derrotou o governo em
alguns processos que tiveram grande repercussão. Elegeu -se deputado federal pelo
165
A intenção desses educadores era renovar o ensino, trazendo para o Brasil idéias e
descobertas novas em Pedagogia, baseadas em conhecimentos da Sociologia e da
Psicologia para a consolidação de uma educação moderna. De acordo com
Lourenço Filho (2002, p. 356), a Escola Nova tinha os seguintes princípios gerais: o
primeiro deles, “[...] é o respeito à personalidade do educando ou o reconhecimento
de que deverá ele dispor de liberdade”. Assim, o desenvolvimento de cada aluno
dependerá de seus recursos e capacidades próprio s, por esforço e ação individual.
“[...] O impulso vital exprime uma exigência só possível de realizar -se pelo indivíduo
no indivíduo, como ser unitário, que harmonize tendências e conflitos” (LOURENÇO
FILHO, 2002, p.356, grifo do autor).
O próximo princípio definido por Lourenço Filho (2002, p. 357), “[...] abrange a
compreensão da aprendizagem simbólica em situações de vida social”. Se mpre é
considerado de cooperação social, uma situação de ensino qualquer, característica
que não era levada em conta pela escola tradicional. Contudo, é ela essencial na
educação, sendo por isso fundamental na vida humana. “[...] Tanto quanto a vida
biológica, a existência mental depende de interação do organismo e do meio físico,
como na interação de cada pessoa com o seu grupo, ou ambiente de pessoas, uma
coletividade, na qual evolui” (LOURENÇO FILHO, 2002, p. 357).
Lourenço Filho (2002, p. 358) a centua ainda que “Temos, assim, um princípio final.
Qual seja o de que as características de cada indivíduo serão variáveis, segund o a
cultura da família, seus grupos de vizinhança, de trabalho, recreação, vida cívica e
religiosa”. Esse princípio é confirmado pela observação mais simples na vida de
cada um e “[...] também pela documentação histórica e a dos estudos antropológicos
em geral, que ampliam a escala de observação no tempo e no espaço” (LOURENÇO
FILHO, 2002, p. 358). São inegáveis as diferenças biológicas refletidas na expressão
de cada uma das pessoas. “[...] Tais diferenças, no entanto, são mais de
possibilidade de desenvol vimento que mesmo de qualificação essencial quanto as
aquisições possíveis, de ordem intelectual e moral” (LOURENÇO FILHO, 2002, p.
358, grifos do autor). Duas conseqüências significativas na reflexão pedagógica são
resultantes do reconhecimento desse fato .
Pensamos que é a partir desses princípios gerais da escola nova , que autores, como
Queiroz e Sobrinho (acesso em 17 jan. 2008), afirmam que, no paradigma da escola
nova, o aluno é considerado ativo e centro do processo de ensino e aprendizagem,
169
Soares (1998, p. 40) assevera que “O uso do jornal, já incorporado como elemento
civilizador e só acessível aos alfabetizados, portanto, reprodutor da discriminação
social, não foi contestado”. Dessa forma, foi lançado pela Secret aria de Instrução,
um jornal quinzenal – que posteriormente passou a ser mensa l – denominado
“Resumo Escolar” (Foto 22). Esse jornal era destinado à divulgação da escola ativa,
“[...] com noticiário atualizado, nacional e internacional, inclusive com assun tos
infantis, e matérias visando o aperfeiçoamento dos professores” (SOARES, 1998, p.
40) e havia, no primeiro número, a recomendação de que se tornasse obrigatória a
sua leitura na sala de aula como um importante exercício recreativo, não como “um
livro de leitura escolar”.
170
Vivacqua (1929) declarou que o Grupo Escolar “Gomes Cardim” e a Escola Normal
estavam providos de instalações cinematográficas; que tinham sido encomendados
172
vários aparelhos portáteis para uso dos inspetores e que a adoção desse novo
aparato didático foi acolhida com muito interesse, nos meios escolares e fora deles.
Porém, era necessário ainda que os inspetores e professores se preparassem para
praticar essa inovação.
Uma das tentativas feitas por Vivacqua consistiu na realização de uma sessão de
cinema falado no Teatro Carlos Gomes de Vitória, em que mais de três mil pessoa s
disputaram ingressos. A outra foi a projeção, no Grupo Escolar Gomes Cardim, do
filme Centenário do cafeeiro, na abertura do Curso Superior de Cultura Pedagógica .
Em todo material analisado , apenas dois relatórios trazem referências ao cinema nas
escolas e ambos foram escritos pelo inspetor Archimimo Gonçalves. No primeiro, de
5 de dezembro de 1928, já mencionado neste trabalho, o inspetor diz ter feito
demonstrações cinematográficas nos municípios de Itaguass u e Afonso Cláudio. No
segundo, referente à inspeção n os municípios de São Pedro do Itabapoana e Ponte
do Itabapoana, em junho de 1929, o inspetor diz que: “[...] Resta -nos entretanto a
effectividade do cinema como meio de instrucção concreta, de accordo com o desejo
de V.Exª”.
O projeto de Attilio Viva cqua sobre o uso também do rádio , como moderno
instrumento de ensino, conforme Soares (1988, p. 40), consistia na instalação de
radiotelefonia para “[...] proporcionar o contato das escolas do interior com as da
capital, facilitando ‘a transmissão de músic a, cursos, lições, conferências”,
encontradas mais facilmente em um “centro grande e civilizado”. Dessa forma, o
173
A criação do Curso Superior de Cultura Pedag ógica ocorreu após os dois primeiros
passos para a introdução da Escola Ativa no Estado. Esse curso foi instituí do pelo
Decreto nº 9 750, de 30 de agosto de 1929, em caráter provisório, e “[...] destinava -
se ao aperfeiçoamento de inspetores escolares e professores indicados pelo
Secretário de Instrução, para formar o núcleo reprodutor da reforma do ensino.
Estava aberto até as pessoas estranhas ao magistério, como assistentes” (SOARES,
1998, p. 51). Mesmo sendo provisório, o curso equivalia para seus formandos ao
ensino superior.
apresentou a Escola Ativa como inovação educac ional, a qual foi “[...] aprovada
como padrão e reconhecida como modelo para todo o país” (SOARES , 1998, p. 14,
grifos do autor). Contudo, conforme já observamos , essa inovação já vinha sendo
posta em prática em algumas escolas.
Assim, foi instalada, anexa ao Grupo Escolar “Go mes Cardim” a primeira “Escola
Activa” do Estado, organizada pelo professor Deodato de Moraes, o qual informou a
Vivacqua (1930) que a escola estava funcionando sob a direção do prof essor
Placidino Passos e do inspetor escolar Luiz Edmundo Malisek, que o a uxiliava. Essa
escola tinha 134 alunos matriculados, “[...] distribuídos em seis turmas mistas, que
recebem grupos de aulas de 90 minutos, três vezes por dia, das 11 às 16,30”
(VIVACQUA, 1930, p. 18).
As aulas eram ministradas nas seguintes salas -ambiente: 1ª) Sala de Expressão; 2ª)
Sala da Medida; 3ª) Sala da Observação Terra e Vida; 4ª) Sala da Observação
Espaço e Tempo; 5ª) Sala da Saúde; 6ª) Sala da Documentação; 7ª) Sala dos
Trabalhos. Para cada uma dessas salas , encontravam-se especificados os
conteúdos que deveriam ser desenvolvidos.
Para Vivacqua (1930), a escola era organizada sob moderna orientação, por meio
de fichas de matrícula e freqüência, e todos os alunos eram submetidos a exames
técnicos e clínicos, feitos na Saúde Pública, os quais eram registrados na “Carteira
Biographica Escolar”. Os programas que determinavam a técni ca das aulas eram
organizados pelo Curso Superior de Cultura Pedagógica e apresentavam
flexibilidade tanto em relação ao mestre, quanto ao aluno.
176
O movimento dos alunos era rotativo pelas salas, onde ficava o respectivo professor
das disciplinas. As lições eram todas orientadas de acordo com o ensino ativo, ou
seja, respeitava a individualidade do aluno e propiciava o seu desenvolvimento,
As outras deliberações diziam respeito a como deveria ser a escola; onde deveria
estar localizada; como deveria se adaptar à região que se “propõe a servir”; como
seria a colaboração da escola juntamente com a família e os alunos; onde seria
fornecido o ensino primário e em que “graus”; como deveria ser a escola rural
178
Tanto que, numa escola onde já esteja funcionando regularmente tal ensino, o
silêncio que se pode notar é um sinal de que todos estão trabalhando, i nteressados
nos múltiplos assuntos das aulas variadas. Porém, conforme revela o inspetor,
180
“Infelizmente, isso não notamos ainda aqui, pois bem podemos declarar que, apezar
das aulas serem activas, o periodo ainda é de transicção. Ainda o barulho de uma
aula é ouvido na outra, atrazando assim a marcha do ensino” (D’ALMEIDA, 1930). O
inspetor complementa o relatório sobre as aulas ativas na referida escola afirmando
que “Cêdo, felizmente, cêdo, poude chegar até nós a bemdita reforma do ensino,
substituindo as nossas escolas tristonhas, em verdadeiras colmêas de alegria”.
Complementando a exposiçã o dos fatos, Ramos (1935) diz que é possível perceber
que há entusiasmo nos alunos na “busca do saber” e que não são só as crianças
que estão se beneficiando da mudança, que há rapazes com idade superior a
dezoito anos, em algumas fazendas que, depois do t rabalho nos campos, se dirigem
às aulas. Nas escolas, o clima é de alegria e é possível perceber “comunhão”,
cordialidade entre educador e alunos.
O desenvolvimento dos trabalhos estimula o interesse dos alunos que têm mais
aproveitamento, sem o “espanta lho” da palmatória ou da vara de marmelo “[...]
empregada abusivamente pelos velhos professores, que só sabiam ministrar
rudimentares conhecimentos à custa de pancadarias. Veio no entanto, a Escola
Nova, dispertando na criança interesses relativos á vida” (RAMOS, 1935, p. 77). Na
visão do inspetor, aquela escola que coagia os alunos a ficar presos às carteiras por
181
Pelo exposto, na manifestação de Newton Ramos , fica evidente que a Escola Ativa
havia sido implantada com êxito em algumas instituições escolares e que as reações
manifestadas pelos alunos demonstravam que a mudança tinha sido bastante
benéfica. Contudo, há indícios, nos livros de registros de materiais, nos relatórios e
termos de visita analisados , de que o método intuitivo não foi abandonado pelos
professores, pois, além das cartas do Ensino Intuitivo ser um dos materiais
constantes nas escolas, havia professores, embora fossem poucos, que o
requisitavam aos inspetores. Outro fato que revela que o método intuitivo continuava
a ser utilizado, é a aula sobre “Lição de Cousas” publicada na Revista de Educação
no ano de 1937.
Um fato é inegável, os relatórios e termos de visitas dos inspetores , nos anos que se
seguem, embora em número menor em relação aos de 1928 e 1929, trouxeram
menos denúncias sobre o insucesso das escolas do Estado e do pouco
aproveitamento dos alunos. Em muitos relatórios, os reg istros dos inspetores
apontaram que os alunos tiveram aproveitamento regular ou bom e que os
professores são esforçados e/ou competentes e ensinam com método. Apenas uma
observação é constante nesses documentos: a orientação aos professores sobre a
Escola Ativa pelos inspetores.
Consta no relatório que foi encontrado pelo chefe da seção no Atheneu Espírito
Santense, no Regimento Policial Militar (Escola Regimental) e no Externato Julio
Penna, referente às três escolas: duas Cartas de Parker e quatro mapas do ensino
intuitivo, dentre outros materiais. Sobre o Colégio Nossa Senhora Auxiliadora
(Carmo), Coutinho (1933) diz que foi informado pela irmã superiora que a Secretaria
de Instrução havia fornecido 500 exemplares de livros e cartilhas para serem
vendidos: 100 exemplares da Nova Cartilha Mariano de Oliveira, 100 exemplares de
Leituras Intermediárias, 100 exemplares do 1º livro de Erasmo Braga, 100
exemplares do 2º livro de Erasmo Braga e 100 exemplar es do 3º livro de Erasmo
Braga.
Esse fornecimento foi feito no ano de 1928, porém não foram vendidos todos os
exemplares e havia ainda uma outra quantidade que devia ser oferecid a às alunas
pobres, de acordo com a determinação do Sr. Secretário. Sobre esse as sunto,
Mortatti (2000, p. 199) assevera que , com a expansão da indústria e do mercado
livreiro, e a consolidação do livro didático como
Podemos dizer que, no contexto do ano de 1928, em que a falta de materiais nas
escolas era constantemente denunciada pelos inspetores, associada à falta de
condições financeiras da população para aquisição do material necessário, a adoção
de uma medida como essa, se colocada em prática, traria incontáv eis benefícios.
Braga. Após fazer a verificação de todo o material fornecido às ref eridas escolas,
Coutinho (1933) confirma que havia um saldo de 198 exemplares. Assim, sugere ao
secretário que estes sejam distribuídos aos alunos pobres do Colégio Nossa
Senhora Auxiliadora e, caso algum fosse vendido, a importância arrecadada deveria
ser creditada na “Caixa Escolar” da localidade.
Esse fato reafirma a circulação das Cartilhas de Mariano de Oliveira, dos livros de
Leitura Intermediária e os de Erasmo Braga no ano de 1928 e, provavelmente, a sua
continuidade nos anos posteriores, pois o presente relatório era de 1933 e Coutinho
sugere a doação dos livros aos alunos, ou a possibilidade de venda. Como não
foram localizados outros documentos que trouxessem informações de quai s livros
didáticos foram adotados na década, pensamos que tal sugestão ao secretário não
seria feita por Coutinho (1933) para um material obsoleto.
Sendo assim, sugeria que eles preferissem os constan tes na lista abaixo, por serem
“[...] óptimos auxiliares do professor primário, approvados e aconselhados pela
Secretaria da Educação e Saúde Pública do Estado do Espírito Santo”:
1º Anno – Cartilhas
O amigo da Infância – Stella Brant de Carvalho
Meu Livro – Theodoro de Moraes
Ler Brincando – Thales de Andrade
1º Anno – Leitura
Sei Ler – Intermediário – Theodoro de Moraes
Novas Leituras 1º - M. Oliveira e R. Dordal
184
Dessa forma, o Decreto nº 6. 501 (1924) determinou, no art. 82, que: “Nas escolas
públicas só serão permitidos os livros adoptados pelo Governo, cabendo ao
professor o direito de escolher entre os adoptados os que mais convenham á sua
classe”. Essa escolha era averiguada pelos inspetores, pois dentre as suas
atribuições, encontrava-se também a de verificar “ [...] os livros adoptados nas
escolas e a sua conformidade com os programmas de ensino e preceitos
pedagógicos” (ESPÍRITO SANTO, 1924, p. 16).
Como não foi localizado um novo regulamento prevendo quais livros didáticos foram
adotados a partir de 1931, não temos como saber se os relacionados pela
companhia Editora Nacional , apesar de aprovados e aconselhados pelo Governo,
foram ou não adotados para que os professores fizessem sua opção, ou se foram
estes os escolhidos pelos professores.
Em 1930, quando é dada posse à Junta Governativa constituída por João Punaro
Bley, Afonso Corrêa Lírio e João Manuel de Carvalho, encontravam -se em
desenvolvimento nas escolas a aplicação da Escola Ativa e a utilização do jornal,
cinema e rádio. Os documentos analisados apont am que essas mudanças
continuaram em prática no decorrer do período. Soares (1988) informa que a Junta
Governativa, logo depois de assumir o poder , desfez a equipe que preparava as
mudanças para a Escola Activa. O capitão João Punaro Bley, Interventor Fede ral,
“[...] convocou os professores comissionados para aquele trabalho, mas só Paulo
Gomes Cardim compareceu, prestando solidariedade ao governo deposto [...]. Mas
era preciso desmontar a máquina deixada por Attilio Vivacqua” (S OARES, 1988, p.
91, grifos do autor).
185
O autor diz ainda que o inspetor Bodart J únior, que havia trabalhado com Attilio
Vivacqua sem, contudo, ser indicado para o Curso Superior de Cultura Pedagógica ,
escreveu um livro dividido em capítulos no jornal Diário da Manhã, criticando a
Escola Ativa cujo ponto central era o estímulo à “liberdade em excesso”. O inspetor
que era conservador temia a perda do controle disciplinar.
Mesmo assim, ao que tudo indica , o legado de Vivacqua não foi totalmente
desmontado. Afinal, as mudanças nã o são instantâneas. Logo, não foi localizada ,
nos documentos acessíveis, uma nova regulamentação que previsse a adoção de
um método específico no período. Consta apenas que , no ano de 1931, foi
aprovada, em conformidade com o disposto no art. 41 do Decreto nº 7.994, a
Resolução nº 375, que adotou “[...] programas de ensino para uso das escolas
primárias do Estado”.
Para cada disciplina, encontravam -se dispostos os procedimentos que deveriam ser
adotados pelos professores, os materiais que deveriam ser utilizados (inclusive a
cartilha, mas não diz qual), quais conselhos deveriam ser dados aos alunos em
Instrução moral e cívica, os assuntos que deveriam ser aconselhados em Noções de
Higiene, os tipos de música na matéria “Canto” e os tipos de exercícios em Ginástica
para o desenvolvimento do programa. Após a exp osição do programa da matéria
“Leitura por Sentenciação”, há uma nota explicativa: “Com a recordação da cartilha
(findo o primeiro semestre) a classe devera estar lendo correntemente e conhecendo
a pontuação”.
Após o ano de 1930, o único decreto encontrado que trazia determinações sobre o
funcionamento das escolas foi o Decreto -Lei nº 9.255, de 13 de abril de 1938 , que
tratava das “[...] condições para o funcionamento dos colégios particulares, dispõe
sobre a obrigatoriedade do ensino e dá outras providências”. Sobre os colégios
particulares, trazia normas gerais para a instalação e funcionamento dessas escolas,
inclusive a distância de uma escola para outra, que recebia o nome de
“Circunscrição Escolar”. Isso queria dizer que, num raio de três quilômetros de uma
escola pública ou particular, não poderiam ser instaladas outras escol as da mesma
categoria, a não ser que a “capacidade didática” das instalações da escola existente
não fosse suficiente ou que toda a população em idade escolar não fosse atendida.
referido, fosse “[...] alegado e provado motivo de força maior, julgado procedente
pela autoridade competente para impôr a multa” (§ 2º). A partir do que fosse
decidido pelo “[...] inspetor ou delegado d e ensino relevando a omissão na fórma do
paragrafo anterior, haverá recurso necessário dentro de 10 dias, para o diretor do
Departamento de Educação que poderá, conhecendo das alegações fe itas, tornar
efetiva a multa” (§ 3º).
Havia multa também de 50$00 0 imposta pelos inspetores de ensino da Região aos
pais, tutores ou responsáveis que , por motivo não justificáv el, dificultassem ou
impedissem a freqüência escolar das crianças sob sua responsabilidade
matriculadas em uma escola pública e, caso houvesse re incidência, o valor da multa
seria o dobro (art. 22). O parágrafo único estabelecia que penalidade igual seria
imposta aos que direta ou indiretamente , criassem, sem motivo justo, impedimentos
à fundação ou funcionamento de uma escola pública. Os valores referentes a todas
as multas pagas eram revertidos “[...] em bene ficio do Fundo de Educação” ( art. 25).
Era por meio do Fundo de Educação ou pelas Caixas Escolares que o Estado
auxiliava os alunos reconhecidamente pobres .
Os recursos utilizados pelos professores em suas aulas foi outro assunto por nós
averiguado nas fontes a que tivemos acesso. Sobre isso, detectamos, po r meio de
um artigo publicado no ano de 1935, escrito pelo diretor do grupo Escolar Bernardino
Monteiro de Cachoeiro de Itapem irim, Dr. Osvaldo Marchiori , que a dramatização era
um dos recursos de aprendizagem utilizado s nas escolas. Soares (1988, p. 62)
também afirma que “As excursões e os jogos de xadrez, estavam incorporados ao
ensino” (Foto 24).
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Dessa forma, afirma que a dramatização na educação é essencial, bem como todas
as atividades artísticas, porque possui “elementos em ocionais”, que contribuem para
que a humanidade não se esqueça e valorize mais os superiores dons da vida
espiritual, como a paz, o entusiasmo e a felicidade, por viver atormentada pela
preocupação utilitarista excessiva da época. Havia ainda o benefício d e proporcionar
satisfação aos alunos de todos os “graus de desenvolvimento” que assistiam.
Assim, o trabalho com a dramatização era gradual: os alunos do 1º ano inicia vam
com os simples jogos de imitação, de acordo com os projetos em desenvolvimento
ou com outros temas de interesse previamente tratados. As imitações iniciais
estavam relacionadas com as cenas da vida familiar (aniversários, visitas, refeições,
a visita do médico, etc.); comportamentos dos trabalhadores (apanhador de café,
190
A dramatização já se tornara um hábito nas escolas, tanto que era muito comum os
alunos dramatizar um tema de uma palestra ou de uma leitura, uma data ou outro
assunto que fosse do interesse deles. O mais comum era dramatizarem assuntos
relacionados com projetos diversos ou como fechamento de trabalhos, em que era
costume que fizessem de um “modo festivo”.
Esse procedimento não era comum a todas as escolas . Havia algumas em que os/as
professores/as pediam que os alunos levassem pratinhos com guloseimas de casa e
faziam um lanche coletivo com a participação da família. Toda essa programação
tinha um significado especial para os alunos e para os/as professores/as, pois era a
culminância de um trabalho vivenciado por todos, principalmente nas aulas de
“Instrucção Moral e Cívica”, em que , dentre os “Conselhos” para os alunos ,
constavam os de ordem, civilidade e patriotismo.
Por fim, a partir das informações contidas nas fontes investigadas, o panorama
vislumbrado sobre a alfabetização no período é o de que , no ano de 1928, o método
de ensino adotado oficialmente era o intuitivo. Embora tenhamos constatado que, na
prática, os professores muito se esforçavam dentro de suas limitações de formação
e de condições de trabalho para alfabetizar os alunos e, que muitas vezes, os
inspetores verificavam que o método utilizado era o da silabação e soletração ou , às
vezes, não havia um método específico, os registros apontam que , em algumas
escolas, o método intuitivo era praticado pelos professores.
Em 1929, quando teve início o movimento da Escola Ativa proposto por Attilio
Vivacqua, surgiram outras necessidades decorrentes da adoção dessa nova
proposta, por exemplo, a formação dos profissionais que deveriam colocá -la em
193
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Outro problema que, também, refletiu o descaso do Poder Público Estadual com a
educação primária e com a educação escolar de modo geral foi observado nas
Constituições de 1928 e 1935 que não privilegiaram adequadamente a educação,
provocando um distanciamento entre os discursos político e legal e as mudanças
ocorridas no campo educacional. Essa omissão era incoerente com as medidas
195
Dessa forma, não era aplicado em todas elas e paralel amente à sua aplicação,
alguns professores continuaram a utilizar os métodos de soletração e silabação para
alfabetizar os alunos. Contudo, as cartilhas e os livros de leitura aprovados pela
Secretaria da Instrução Pública concretizavam métodos de marcha analítica , de
acordo, portanto, com o projeto republicano de uniformização da “[...] instrução
popular [...] para garantir a mesma formação elementar aos cidadãos [...] (RAZZINI,
2007, p. 21).
7 REFERÊNCIAS
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FONTES CONSULTADAS
LEGISLAÇÃO
LIVROS DE REGISTROS
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CARTA
REQUERIMENTOS