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Cosmovisc3a3o Africana No Brasil Eduardo Oliveira
Cosmovisc3a3o Africana No Brasil Eduardo Oliveira
Se awo ki’ku
Awo ki run
Nse é awo ma nlo so Itunla
Itunla ilê awo
Aqueles que fazem o mistério nunca morrem
Os iniciados nunca se corrompem
Os iniciados vão somente para o Itunla (lugar da vida ilimitada
e verdadeira; da vida que se renova)
Itunla casa do mistério. (o ilê awo), de onde os Eguns também
são invocados.
Há uma grande diferença entre o culto dos Egunguns e o culto dos
orixás. Tanto que os ritos religiosos não se podem fazer ao mesmo tempo e no
mesmo lugar. Ancestrais Eguns e orixás estão radicalmente separados. No
entanto, há muita semelhança na estrutura desses cultos, tanto no que diz
respeito à ancestralidade tanto no que diz respeito à relação dessas divindades
com os Homens. Não é uma questão para se adentrar agora, mas ancestrais e
orixás têm relações antigas, mesmo antes da criação dos ara-aiyê. A relação,
no orun, entre elas, era estreita e complementar. Só para citar um exemplo, há
orixás que antes de sê-lo eram ancestrais divinizados. Por sua vez, esses
ancestrais eram líderes comunitários em seu território, como foi o caso do Rei
Xangô, que acabou tornando-se o orixá da justiça, do trovão. Concluindo,
podemos citar Ronilda Ribeiro que assim define a diferença entre orixás e
ancestrais: “Os orixás, associados a elementos cósmicos ou à natureza,
significam matérias simbólicas de origem enquanto os ancestrais, significam
princípios de existência genérica a nível social” (RIBEIRO, 1996, p. 166)
As Geledes é o culto às ancestrais femininas. Marco Aurélio LUZ
(1995,p. 102) narra a seguinte história: “No começo do mundo, era o nada.
Com a criação da terra e das florestas, Olorun enviou ao aiyê sete pássaros.
Três pousaram na árvore do bem, três pousaram na árvore do mal, e um voa
de uma para outra árvore”. Esta história narra a ambiguidade do poder que as
ancestrais femininas, também chamadas de Iya-mi-Agba, receberam de
Olorun. Aqueles que não a respeitarem, morrerão; mas aqueles que a
agradarem e fizerem as devidas oferendas serão protegidos e agraciados por
elas.
Segundo Joana Elbein dos Santos, citada por LUZ (1995,p. 103): “As
aje ou Iya-mi constituem a representação da maternidade, fertilidade e
fecundidade relacionadas ao princípio feminino da existência e Oxun, Olori-iya
Agba Aje Eleye chefe suprema das mães ancestrais possuidoras de pássaros,
as apresenta coletivamente”.
Para LUZ (1995,p. 103): “O que caracteriza o mistério e poder das Iya-
mi é a capacidade de criação e gestação da terra, Igba-nla, a grande cabaça
ventre fecundada. Para tanto, ela deve ser constantemente ressarcida,
restituída e umedecida, pois ela é constantemente solicitada para gerar
abundância de grãos”.
Ronilda Ribeiro, atenta ao culto das mães ancestrais como uma
maneira de restaurar a força pela restituição, afirma que as Iya-agba, “para
poderem cumprir sua função necessitam ser fecundadas, umedecidas,
restituídas. A terra, associada ao que é seco e quente, precisa ser umedecida
continuamente, recuperar o “sangue branco” para poder propiciar novos
alimentos” (RIBEIRO, 1996, p. 165).
De acordo com a autora, a sociedade das Geledes, simboliza aspectos
coletivos do poder ancestral feminino é dirigida “pelas erelu, mulheres
detentoras dos segredos e poderes de Iyami, cuja boa vontade deve ser
cultivada por ser essencial à continuidade da vida e da sociedade, o culto tem
por finalidade apaziguar seu furor; propiciar os poderes místicos femininos;
favorecer a fertilidade e a fecundidade e reiterar normas sociais de conduta”
(RIBEIRO, 1996, p. 159).
Por fim, vemos que o culto aos ancestrais representa de maneira
exemplar a cosmovisão africana, tanto porque compõe as camadas mais
importantes dessas sociedades (princípio masculino, princípio feminino e o
coletivo), quanto pela riqueza de funções que possuem os ancestrais. Vivendo
no tempo do passado, um tempo mitológico (zamani), os ancestrais interferem
e participam ativamente na vida de seus iniciados e de suas comunidades,
atuando e transformando o tempo sasa, construindo e restituindo a força vital
(ou axé) de seus descendentes, fazendo com que a vida seja um continuun
impregnada da energia dos entes sobrenaturais, que, em outros tempos, já
foram ara-aiyê, e que agora emprestam sua energia, seu ser-força, às
comunidades e seus membros, tornando o universo africano um universo
impregnado de energia e força.
Os elementos que estruturam a cosmovisão de mundo de que estamos
falando advém, quase em sua totalidade, das religiões yorubanas e jêje
localizadas na costa ocidental do continente. No entanto, a África abriga
centenas de milhares de religiões. Para exemplificar esta diversidade,
trataremos de tecer comentários sumários e tirar conclusões filosóficas
decisivas de religiões de outras regiões africanas e, ainda que sinteticamente,
retirar daí lições filosóficas que contribuam para a cultura brasileira e, quiçá,
mundial.
Certamente, na África, as religiões jogam um papel primordial na
organização da vida comunitária e na estruturação das sociedades africanas.
Por isso gostaríamos de fazer rápidas considerações a respeito de algumas
religiões da África tradicional, mas que existem até os dias de hoje. Tais
considerações serão traçadas sobre as seguintes religiões que foram
sumariamente analisadas: Religião Akan[21], Banto[22], Dinca[23], Dogon[24],
Fon[25], Ganda[26], Religião Iorubana[27], Lovedu[28], Mbona[29], Mende[30],
Nilótica[31], Nuer[32], Shilluk[33], Shona, Zande e Zulu[34] e a veneração
africana aos Antepassados.
O melhor seria relacionar cada conclusão geral com cada religião em
particular. Este artifício, no entanto, deixaria ainda mais extenso o presente
texto e, de certa forma, ofuscaria nosso objetivo principal que é reter
justamente as conclusões de caráter mais genérico. Assim, elencaremos o que
consideramos as conclusões mais importantes a respeito da análise das
religiões tradicionais africanas, que vai desde a África Ocidental até o sul da
África negra.
Essa riqueza de mitos e ritos é que permitiu uma atualização criativa das
instituições negro-africanas em terras alheias. Exemplo disso é o candomblé.
Todo terreiro de candomblé é um micro-cosmo, uma síntese de várias
instituições sociais africanas. Ressemantização criativa dos símbolos da
tradição africana, foi também uma ressemiotização das organizações políticas
estatais e familiares. Se cada cidade-estado africana cultuava apenas uma
divindade, por exemplo, Oxum, no Brasil o panteão africano da tradição dos
orixás cultua pelo menos 16 orixás que, em África, encontravam-se espalhados
pelos territórios políticos, sendo, muitas vezes, inimigos de vizinhança. No
Brasil não foi possível manter a mesma estrutura organizacional, uma vez que
a situação era de escravidão e não de liberdade. Juntando, inclusive, várias
etnias que outrora viviam em conflito e agora, diante de um mesmo mal (a
escravidão) recriam laços sociais e forjam uma solidariedade diante da
situação opressiva das senzalas brasileiras. Porém, não foi apenas a opressão
que pairou sob os africanos em solo brasileiro. Laços solidários, outrora
impossíveis, foram traçados sob o jugo da escravidão e recriaram as relações
entre nações e etnias adversárias ou desconhecidas. O candomblé, com efeito,
é uma constelação de etnias, nações, línguas, culturas, ideologias e
divindades. É um micro-cosmo brasileiro que reflete o macro-cosmo africano. É
uma síntese re-elaborada pelos afro-brasileiros das sociedades negro-
africanas. É uma instituição social que, em situações adversas, soube manter e
recriar os valores civilizatórios de seu lugar de origem, ao mesmo tempo que
incorporou os valores civilizatórios dos nativos do Brasil, bem como admitiu em
sua cosmogonia aspectos da cultura européia. A umbanda, as Irmandades
Negras, são exemplos dessas respostas criativas que as instituições calcadas
na cosmovisão africana deram à sociedade brasileira.
2) Sincretismo religioso:
No Brasil colonial a hegemonia, sem dúvida, era mantida pela religião
do senhor do engenho. O catolicismo, com efeito, foi declarado como religião
oficial do Estado. Qualquer religião que não fosse a católica era considerada
heresia. A religião dos negros escravizados, então, sequer era considerada
religião, mas práticas de feitiçaria, mandinga, culto ao demônio e tudo mais que
o preconceito racial e a ignorância da cultura negra levaram os senhores de
engenho a pensar. Como estratégia de sobrevivência e resistência cultural, os
negros escravizados tomaram os símbolos da religião do senhor para cultuar
seus próprios deuses. Assim que, prostrados frente a uma imagem de Santa
Bárbara estavam, na verdade, cultuando Yansã, divindade africana transladada
para o Brasil. Na verdade houve uma “malandragem” por parte dos
afrodescendentes: o “sincretismo” religioso foi uma estratégia de dissimulação
para manter os cultos às divindades africanas sob a máscara dos santos
católicos. Mais que uma fusão de culturas houve uma estratégia de
preservação de um código religioso que, por estar subordinado a uma estrutura
de dominação econômica e social, só poderia sobreviver fingindo assimilar a
cultura do senhor quando, na verdade, a partir da artimanha da dissimulação,
preservava os aspectos civilizatórios e a cosmovisão de seu grupo de origem.
As populações africanas não pensam por contradição: não faz parte da
estrutura cognitiva da população africana o princípio identitário. Ali se pensa
por analogia e participação, não por pureza e contradição, diz BASTIDE
(1989).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1]Fazemos questão de nos remeter à África como o continente do Arco-Íris posto que este último é uma
imagem que representa bem a diversidade e a beleza da multiplicidade cultural existente em solo africano
e carregada por seus descendentes em todas as partes do mundo.
[2] “No seu Curso sobre a Filosofia da História, em 1830, declarava Hegel: ‘ A África não é uma parte
histórica do mundo. Não tem movimentos, progressos a mostrar, movimentos históricos próprios dela.
Quer isto dizer que a sua parte setentrional pertence ao mundo europeu ou asiático. Aquilo que
entendemos precisamente pela África é o espírito a-histórico, o espírito não desenvolvido, ainda envolto
em condições de natural e que deve ser aqui apresentado apenas como no limiar da história do mundo’.
In: KI-ZERBO, j. História da África Negra. Ed. Biblioteca Universitária, 1980.
[3] Haja visto que o trabalho escravo, considerado o mais atrasado pela elite rural, foi substituído pelo
trabalho de tração animal. Comenta-se que as condições de trabalho para uma res era mais favorável do
que para o africano escravizado.
[4] As designações “África Branca” e “África Negra” são completamente ideológicas. A chamada
‘África Branca” não é branca, mas negra. Ocorre que ali predomina a cultura árabe, depois de séculos de
ocupação, muito embora interpenetrada com as culturas de origem.
[5] O IPAD – Instituto de Pesquisa da Afrodescendência, tem um projeto de publicar livros didáticos
sobre a História da África, onde teremos a possibilidade de escrever obras especializadas sobre a África
para orientar os educadores.
[6]Povos pastoris, que não constituem estruturas estatais e não coupam um território determinado.
[7] Sobre o regicídio e a lógica política de governos africanos, vide: ZIEGLER (1972).
[8] ERNY, P. L’enfant dans la penséé traditionnelle de l’Afrique noire. Paris: Le livre Africain, 1968.
[9] Yakemi é o nome-de-santo da antropóloga Ronilda Ribeiro.
[10] Prefácio de Jung ao I Ching – O Livro das Meditações – tradução de Richard Wilhelm. São Paulo:
Ed. Pensamento, 1987. 21a. edição.
[11]Sobre Força Vital entre os bantos vide a obra clássica: TEMPELS, R.P.P. La Philosophie Bantoue.
Paris: colléction Présence Africaine, 1949. Vide também no subitem: Filosofia Banto, p. 74, Cap. II.
[12] Segundo LEITE (1984, p. 35), essas relações tem como exemplo os “processos de socialização,
com suas etapas iniciáticas – que fazem configurar o homem proposto pela sociedade em sua dimensão
social -, e também das atividades relacionadas com outras instâncias históricas, onde as ações humanas
complementam a obra inicial do preexistente, colocando-a – com o cuidado e conhecimentos exigidos
pela vitalidade que anima os seres – em estreita relação com a sociedade, como ocorre, para citar outro
exemplo, com a manipulação da terra, fator básico da produção”.
[13] TEMPELS, R.P.P. La Philosophie Bantoue. Paris: Colléction Présence Africaine, 1949.
[14] MBITI, J. S. African Religions and Philosophy. London; Naiorobi; Ibadan: Heinemann, 1969.
[15] Os Griots são contadores de história africanos. São os responsáveis pela transmissão do
conhecimento dos antepassados para as novas gerações. São tradicionalistas, expressam-se através de
crônicas, armam genealogias e são incumbidos de transmitir oralmente a tradição histórica.
[16] OBENGA, T. “Fontes e Técnicas específicas da história da África. Panorama geral”. História Geral
da África: I. Metodologia e pré-história da África. São Paulo: Ática [Paris]: UNESCO, 1982. Páginas
91-104.
[17] “O griot praticamente deixa de lado os afloramentos e emergências temporais denominados em
outros lugares “ciclo”(idéia de círculo), “período”(idéia de lapso de tempo), “época” (idéia de
momento marcado por algum acontecimento importante), “idade” (idéia de duração, de passagem do
tempo), “série”(idéia de sequência, sucessão), “momento” (idéia de instante, circunstância, tempo
presente) etc. É claro que ele não ignora nem o tempo cósmico (estações, anos), nem o passado humano,
já que o que ele relata é, de fato, passado” (OBENGA citado por RIBEIRO, 1996, p. 57).
[18] “A cabeça é composta da fronte, oju ori, que se relaciona com o iyo-orun, nascente do mundo; do
occiptal, ikoko ori, que se relaciona com o iwo-orun, o poente; e dos lados direito, apa-otun ori, e
esquerdo, apa osi-ori, que se relaciona com a direita e a esquerda do universo; e finalmente, do centro,
que reúne todos os apectos” (LUZ, 1995. p. 55).
[19] “Dotada dessa energia vital que a sacraliza, a terra não pode ser apropriada pelo homem, que,
entretanto, está potencialmente habilitado a ocupá-la segundo as normas ancestrais” (LEITE, 1984, p. 47).
[20] SANTOS, Juana Elbein dos. Os Nagô e a Morte: Pàdè, Asèsè e o culto Égun na Bahia. 3 ed.
Petrópolis: Vozes, 1984.
[21] Da região sudanesa.
[22] De toda região austral da África.
[23] Do Sudão.
[24] Da costa ocidental da África.
[25] Região do antigo Daomé, hoje Benin e partes da Nigéria.
[26] Sudeste da áfrica.
[27] Sobretudo da Nigéria.
[28] Região de Angola.
[29] Região da África Central.
[30] Região entre a África Central e Angola.
[31] Região ao longo do Rio Nilo, incluindo o Egito.
[32] Região oeste do Sudão.
[33] Sul da África.
[34] Região do Zimbzbue, que abarca toda a África do Sul e seus vizinhos.
[35] Sobre o Princípio da Complementaridade atualizada nos candomblés brasileiros vide o subitem:
Relações de Gênero e Candomblé, p. 57, Cap. II.
[36] É claro que era a negociação possível dentro do contexto escravocrata da época.
[37] Ao menos é assim que entendemos suas proposições.
[38] SODRÉ, Muniz. A Verdade Seduzida. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988, p. 53.
[39] Cfe. SODRÉ, Muniz. A Verdade Seduzida. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988, p. 131.
[40] Cfe. SODRÉ, Muniz. A Verdade Seduzida. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988, p. 133.
[41] Sobre o segredo, a luta e a regra dos afrodescendentes consultar: SODRÉ, Muniz. A Verdade
Seduzida. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988, p. 137-148.
[42] Sobre a ideologia do branqueamento e sobre a mestiçagem vide: O Mito da Mestiçagem, p. 91,
Cap. III.
[43] “O conflito constantemente vivido entre aquilo que é socialmente imposto se ritualiza todo o tempo”
(CARNEIRO;CURY, s/d b, p. 26).
[44] Cultura “capitalística” é aquela cultura própria do Capitalismo Mundial Integrado, ou seja, não se
refere apenas à sistemas formalmente capitalistas, mas a todas as sociedades que se organizam de acordo
com o sistema do capital, obedecendo e reproduzindo sua lógica.
[45] O grifo é meu.
[46] Trata-se de Willian Madson Calhoun Jr. (Bill), que, no momento em que eu estava escrevendo este
texto sobre meio ambiente e candomblé em Icapuí - CE, surgiu em na minha frente, transfigurado, e me
narrou a história que Yemanjá lhe contava num ouvido, e Ifá ponderava no outro.
[47] Dessa maneira aprofundamos a definição de cultura negra através da reflexão sobre as formas
culturais gestadas pelos afrodescedentes. Estaremos a falar, então, de formas culturais produzidas pela
cultura negra, procurando evitar tanto as análises abstratos-universalizantes – que redundaram em
sistemas totalitários, quanto o relativismo absoluto – que redunda em paralisia política.
[48] Costa ocidental da África.
[49] Região centro ocidental e sul do continente africano.
[50] TEMPELS, P. La Philosophie Bantoue. Paris: Présence Africaine, 1949.
[51] Pe. Altuna citado por LOPES (1988).
[52] Referimo-nos a GUATTARI, F. As Três Ecologias. 4 ed. – Campinas, SP: Papirus, 1993.
[53] Este texto e fruto, originalmente, de uma pesquisa coletiva sobre a Práxis e Subjetividade nos
Movimentos Sociais Populares, no seminário: Movimentos Ssociais Populares: os desafios da práxis.,
ocorrido em Passo Fundo – RS.
[54] Para se entender o paradigma ético-estético e a lógica do sentido, vide: DELEUZE (1974,1992);
GUATTARI (1992, 1993); DELEUZE/GUATTARI (1995 a, 1995b,1996,1997 a, 1997b).
[55] Como discutimos no capítulo anterior ao tematizarmos as relações de gênero no candomblé e a
relação deste com o meio ambiente.
[56] Cumpre lembrar que definimos, com Muniz Sodré, a cultura como a sedução do real.
[57] Trata-se aqui de uma reelaboração do conceito de Emmanuel Lévinas desenvolvido pelo autor em:
LEVINAS, E. De Otro Modo Que Ser, o mas alla de la Esencia, Salamanca: Editora Sígueme, 1987.
[58] É certo que nem toda práxis dos afrodescendentes gera vida, muito menos comunhão e equilíbrio
social. Não queremos criar idealismos! Destacamos, entretanto, apenas os elementos filosóficos que
apontam para uma sociedade que tenha princípios e valores distintos do CMI, por entender que a
cosmovisão africana erige-se como uma proposta de mais vida para a humanidade.
[59] DAVIS, David Brion. O Problema da Escravidão na Cultura Ocidental. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2001.
[60] A obra citada de Gislene SANTOS (2002) foi prefaciada por Kabengele Munanga.
[61] Os grifos em negrito são meus.
[62] “O ‘princípio de corte’ só tem um valor limitado. Supõe, com efeito, um certo equilíbrio entre os
dois movimentos de ‘enculturação’, africano e ocidental (...). Razão porque ele age sobretudo nas famílias
tradicionalmente ligadas ao candomblé, nas classes baixas da sociedade onde a influência da escola
multirracial permanece confinada a alguns anos da primeira infância e nas comunidades onde os
preconceitos de cor são mínimos. Quando, ao contrário, as inversões das estruturas sociais arrastam a luta
das etnias para o mercado de trabalho e, como consequência, a intensificação dos esteriótipos ou das
discriminações, mesmo larvadas ou disfarçadas, como meio de os brancos manterem o comando da
sociedade global, então a crise revela as contradições dos mundos justapostos e as ideologias negras
substituem as religiões africanas, ou as penetram com valores novos” (BASTIDE, 1989, p. 531). (O
grifo é meu).
[63] “Um Outro Mundo é Possível” foi o slogam das três edições do Fórun Social Mundial que ocorrereu
em Porto Alegre em 2001, 2002 e 2003.
[64] Cfe SANTOS, Juana Elbein dos. Os Nagô e a Morte: Pàdè, Asèsè e o culto Égun na Bahia. 3 ed.
Petrópolis: Vozes, 1984. P. 16.
[65] Zamani é o tempo dos mitos. Tempo dos Ancestrais. Tempo inesgotável.
[66] Sasa é o tempo dos viventes. Tempo da experiência. Tempo limitado.
[67] Rodolfo Kusch é filósofo da libertação. Nascido na Argentina fez um trabalho pioneiro na interface
filosofia/antropologia, trazendo novos elementos conceituais a partir da mescla da pesquisa de campo
com a investigação filosófica.
[68] Emmanuel Levinás, filósofo lituano, já defendia a tese da Filosofia como uma Ética. Vide:
LEVINÁS, E. Ética e Infinito. Lizboa: Ed. 70. Concordes com Levinás, cremos que a filosofia é antes de
tudo uma ética posto que baseada na relação com a alteridade. Sobre a Ética de Levinás vide: LEVINÁS
(1980, 1982, 1984).
[69]Diversamente da tradição predominante da filosofia tradicional (período clássico, medieval e
moderno), a filosofia da diferença é uma atitude. Se a pretensão da tradição da filosofia é uma
explicação/compreensão do mundo, esta filosofia é uma atitude frente à filosofia e ao mundo. Como
atitude ela é da ordem do acontecimento. Por princípio não busca a unidade na diversidade mas a
diversidade da unidade. Reconhece o universal e o transcendental. A questão não é negar ou afirmar o
universal. A questão é de ênfase e de guinada de perspectivas. A perspectiva da filosofia da diferença é
atuar visando a diversidade do real e não a unidade dos fenômenos. Na diversidade dos fenômenos
encontra-se as diferenças do real. A ênfase, agora, recai sobre a singularidade e não sobre a
transcendentalidade. Busca-se, então, compreender a complexidade do real e não desvendar seus
complexos códigos em fórmulas simplificadas de filosofia. Compreender as dobras do real, os interstícios
dos contatos, o não dito, o diluído. Mais acompanhar que compreender. Mais criar que explicar. Mais
movimento que ossificação. Mais filosofia como vida, menos filosofia como alheamento. Mais
participação, menos observação. Mais desejo, menos interpretação. Mais usina, menos teatro. Mais
tolerância, menos rejeição. Mais diferença, menos repetição. A filosofia da diferença é antes de tudo uma
ética. Por ser uma filosofia que explicita sua atitude diante do mundo ela é, em primeiro lugar, uma ética.
Sua atitude estética diante da vida é a expressão de uma atividade ética diante do mundo. Estética aqui
não é compreendida como a vertente da filosofia que estuda a arte, o belo. É a “ciência da sensibilidade”,
que opera com os afetos, os perceptos, os energéticos e o cognitivo. É fazer filosofia não apenas com a
razão. É ampliar a definição mesma de filosofia, superando a máxima de que a filosofia é o pensamento
racional. Daí incorporar no tecido mesmo da filosofia, as categorias do desejo, da libido, dos afetos e das
sensações que nos ata ao mundo e sua complexa diversidade.
[70] A isso dá-se o nome de capital especulativo, ou seja, capital que ao invés de produzir bens e serviços,
produz apenas capital.
[71] Mundo invisível, sagrado.
[72] Mundo visível, tangente.
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