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1. ENQUADRAMENTO TEÓRICO ................................................................................................................. 5
2.3. A arbitragem.................................................................................................................................................................13
2.3.1. A convenção arbitral .............................................................................................................................................14
2.3.2. Arbitrabilidade ......................................................................................................................................................15
2.3.3. O processo arbitral ................................................................................................................................................16
2.3.4. Impugnação da decisão arbitral .............................................................................................................................16
12. A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO PELO MAU FUNCIONAMENTO DA ADMINISTRAÇÃO DA
JUSTIÇA (PROFESSOR DOUTOR RICARDO PEDRO) ........................................................................................ 45
13.8. O principio da persuasão racional (e outros princípios e regras relativos à prova) ........................................................76
13.8.1. Introdução à atividade probatória .........................................................................................................................76
13.8.2. Apreciação da prova pelo julgador ........................................................................................................................77
13.8.3. Imediação na apreciação da prova ........................................................................................................................78
13.8.4. Medida da prova ...................................................................................................................................................79
13.8.5. Ónus da prova .......................................................................................................................................................80
13.8.6. Restrições à persuasão racional .............................................................................................................................82
13.8.7. Limites à apreciação probatória: a prova ilícita ......................................................................................................83
Se tenho um direito,
Há sobreposição do
direito adjetivo. Tem vai, necessariamente,
que se ter um processo existir um processo
adequado à pretensão para o efetivar.
Elementos da negociação: deve existir inicialmente uma fase de preparação e informação, dentro da qual se deve
preparar a reação face às propostas da outra parte e tentar prever aquilo em que se pode conceder, tendo em conta:
• Conteúdo: o acordo deve ser satisfatório, por salvaguardar os interesses das partes e apto a cumprir pelas
partes. Pode acontecer que chego a uma situação em que o acordo é ótimo para mim e péssimo para a outra
parte: este contrato pode não ser bom, pode não ser apto a ser cumprido, pode não permitir a manutenção
da relação das partes para o futuro…
• Processo: deve haver uma atitude coerente com a atitude que se quer ter com as outras partes. É fundamental
uma boa comunicação já que só se consegue saber os interesses da outra parte se se conseguir comunicar
devidamente com ela. Uma boa negociação prepara também para futuras negociações: pode estar-‐se num
litigio e pensar que poderão surgir outros litígios e outros momentos em que será preciso negociar.
• Pessoas: as pessoas devem ser movidas por uma motivação para o cumprimento. Devem ter-‐se em conta os
sentimentos e perceções das partes e todas as pessoas que possam influenciar a negociação ou o período
posterior à mesma. Pode existir um acordo fantástico em que o consumidor chega a um acordo com o
vendedor: chega a casa e a mulher não concorda com o acordo (a mulher influencia o negócio). Não se trata
apenas da legitimidade para chegar a acordo, existem outras pessoas que podem influenciar o acordo e o
cumprimento.
Distinguem-‐se interesses de posições:
• Interesses: os interesse podem ser compatíveis apesar de as posições serem incompatíveis. Os interesses são
muito mais vastos e variados, podendo não ter nada a ver com as posições que as pessoas adotam.
• Posições: direitos são posições. Se temos uma situação jurídica temos uma posição. As posições são a parte
visível do litigio, mas a parte mais pequena.
Exemplo: dois cozinheiros querem uma laranja e dizem que têm direito a ela: um porque a comprou, outro porque a
adquiriu por usucapião. As posições são incompatíveis. Porém, um quer o sumo da laranja e o outro a raspa: os
interesses são compatíveis.
Conceitos fundamentais:
• Legitimidade: é preciso que quem está a negociar tenha legitimidade para chegar a acordo;
• Interesses
• Credibilidade
• Preparação
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2.2. A mediação
è A mediação é regida pela Lei n.º 29/2013, de 19 de abril
è Esta conceção de mediação é sucedânea da Diretiva 2008/52/CE do Parlamento Europeu
De acordo com o artigo 2º, mediação consiste na “forma de resolução alternativa de litígios, realizada por entidades
públicas ou privadas através do qual duas ou mais partes em litígio procuram voluntariamente alcançar um acordo
com assistência de um mediador de conflitos.
A mediação é um negócio assistido por um terceiro –
o mediador. Este é um terceiro que tem de ser imparcial
• Existência de um acordo prévio
em relação às partes.
para resolver o litígio através de
Assim, não vai ser ele a tomar a decisão, mas sim as mediação
partes (artigo 4º); é nas donas do litígio que reside a
solução adequada e justa do problema. O mediador • Numa mediação o resultado será o
apenas as coloca em contacto, ajudando-‐as a conciliar os acordo ou o não acordo, sendo que
seus interesses. o que se procura é o acordo;
mediador, de acordo com o artigo 2º é “um terceiro, imparcial e independente, desprovido de poderes de
O
imposição aos mediados, que os auxilia na tentativa de construção de um acordo final sobre o objeto do litígio.
• “imparcialidade” -‐ surge no sentido jurídico, da objetividade e do profissionalismo, já que faz parte da
condição Humana ser parcial. Pretende-‐se que se tome o menor partido possível poo uma das partes.
• “independência” -‐ significa não ter relação com nenhuma das partes.
• “desprovido de poderes de imposição” – ao contrário de um árbitro ou de um juiz, o mediador não pode
impor um acordo (artigo 26º/b). O mediador auxilia e assiste, não dirige nem impõe. A sua função é
simplesmente a de ajudar as partes primeira a restabelecer a comunicação e, segundo, a encontrar a solução
adequada.
Nos casos em que as partes consigam negociar por si só a mediação é inútil. Aqui, a negociação será a melhor
solução.
Qual é, então, a intervenção que o mediador pode, ou não, ter? Existem dois modelos:
• Mediação facilitadora: centra o trabalho do mediador na reabertura das pessoas ao diálogo;
• Mediação interventiva: pressupõe uma postura mais ativa do mediador, não se limitando a trazer as partes
ao diálogo, mas agindo também ao nível do mérito da questão;
O modelo português dominante é o modelo de uma mediação facilitadora com uma muito menor intervenção do
mediador. Vigora a ideia de folha em branco: o mediador deve ir para a mediação sem qualquer conhecimento sobre
as partes, colocando-‐as em comunicação.
Há quem defenda que se houver uma mediação ou intervenção de um terceiro mais interventiva já não vamos ter
mediação. O professor discorda desta consequência, podendo haver uma mediação mais interventiva, ainda que as
suas fronteiras tenham de ser bem definidas. O mediador não pode insistir com as partes para aceitar determinado
acordo, mas pode, na sequência da mediação, fazer uma ou outra sugestão, contando que não se perca o
empowerment.
O que se procura na mediação não é que as partes aceitem uma solução, mas que cheguem a uma solução. Assim,
a maior intervenção do mediador tem de ser feita com muita cautela para que não se chegue a uma solução exterior,
por intervenção do mediador. Este tem que, simplesmente, introduzir sugestões que ajudem as partes a chegar a um
acordo que parta da sua iniciativa.
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Empowerment -‐ é um termo chave na mediação que significa domínio do processo pelas partes. No âmbito de uma
mediação as partes têm de sentir que o processo é delas e que elas é que decidem se querem ou não chegar a acordo,
cabendo-‐lhes a responsabilidade pelas decisões que tomam. As pessoas têm, então:
• Domínio do processo: podem sair quando quiserem, nada as obrigado a chegar a acordo;
• Domínio do conteúdo: não é possível qualquer solução do litígio que nelas não tenha origem.
Pacificação social – O fim da mediação é a pacificação social, isto é, tem como objetivo sanar o problema,
restabelecendo a paz social entre os litigantes. Este fim sobrepõe-‐se inteiramente à questão do direito. Não importa
saber quem tem razão, mas antes procurar resolver os problemas subjacentes ao aparecimento do litígio. Trata-‐se,
portanto de um método de resolução de litígios assente nos interesses e não nos direitos.
Princípios da mediação:
• Voluntariedade: a mediação é voluntária, não podendo as partes ser obrigadas a participar de tal meio de
resolução.
• Igualdade: é muito difícil uma mediação em que haja um desequilíbrio entre as partes. Ou se cria uma
igualdade através de técnicas de mediação (presença de advogados na mediação, por exemplo), ou se deve
terminar a mediação por não estarem reunidas as condições para esta ser bem-‐sucedida.
• Confidencialidade: a mediação é confidencial porque se pretende que as partes revelem os seus interesses,
isto é, informações que não estejam disponíveis fora daquele circulo. Deste modo, o mediador não pode
revelar o que se passou na mediação, nem pode ser chamado como testemunha em processo judicial
posterior. A confidencialidade é um dos princípios da mediação, consagrado no artigo 5º, LM.
A questão da prova assume aqui especial relevância: se o arguido confessar na mediação, mas nãos e conseguir
o acordo e o processo seguir, não pode utilizar-‐se essa confissão como meio de prova. Não pode, sequer,
saber-‐se que ela existiu.
As exceções à confidencialidade são três:
o Se as partes decidirem em contrário;
o Razões imperiosas de ordem pública, em especial para assegurar o interesse de criança ou evitar que
seja lesada a integridade física ou psíquica de uma pessoa;
o Situações em que a divulgação de conteúdo do acordo obtido por via de mediação seja necessária
para efeitos da sua aplicação ou execução;
Para que haja mediação, ambas as partes têm de recorrer à mesma.
Assim, os teóricos puristas da mediação vão dizer que não existe mediação obrigatória, as partes têm de a querer.
Em alguns países, como Itália, o que ainda se aceita é uma situação de pré-‐mediação obrigatória. Isto significa que
é obrigatório que as partes vão a uma sessão de pré-‐mediação. Na qual há um mediador que explica o processo, o que
é a mediação… no final, as partes decidem se querem ou não participar no processo. O que acontece é exigir que a
partes conheçam a mediação antes de a recusar.
Na prática, existem duas formas de vinculação à mediação:
• Via legal (a lei obriga à mediação em tais situações)
• Via contratual
A mediação em Portugal opera a três níveis:
• Ligada a sistemas públicos de mediação: Em Portugal, a mediação é essencialmente ligada a sistemas públicos
de mediação. Isto é, há uma direção geral que coordena os sistemas públicos de mediação: familiar, laboral,
penal. Em direito penal, a mediação pode ser dificultada por ser entre arguido e ofendido, só sendo possível
em determinados crimes.
• Ligada aos julgados de paz: Antes de recorrer ao juiz de paz há uma fase de mediação que é facultativa. É
muito comum haver mediações dos julgados de paz que na prática não funcionam tão bem como deveriam.
6. A injunção
A injunção é regulada pelo Decreto-‐Lei 220-‐A/2008. Este DL comporta duas matérias:
• Ação especial para o cumprimento de obrigações pecuniárias (AECOP) que se reportam aos litígios de massa;
• A injunção: “É aprovado o regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações
pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a (euro) 15 000, publicado em anexo, que faz parte
integrante do presente diploma.” (artigo 1º, diploma preambular)
No que toca à primeira parte:
• Litígios de massa: litígios em que estamos perante uma empresa com um número muito grande de clientes e
que regularmente têm de pagar um preço; estes litígios caracterizam-‐se por se tratarem de obrigações
pecuniárias que resultam de contratos entre as partes.
• Petição e contestação simplificadas (artigo 1º)
• São litígios com valor muito baixo.
• Tramitação subsequente simplificada (artigos 4º e 5º)
• Convenção de domicilio (artigo 1º-‐A): se houver um domicilio convencionada no contrato que emerge a
dívida, esse domicilio será o domicilio relevante para aquele processo. Se a pessoa for citada nesse domicilio,
considera-‐se citada mesmo que já lá não viva.
• “Se o réu, citado pessoalmente, não contestar, o juiz, com valor de decisão condenatória, limitar-‐se-‐á a
conferir força executiva à petição, a não ser que ocorram, de forma evidente, exceções dilatórias ou que o
pedido seja manifestamente improcedente” (artigo 2º)
No que toca à segunda parte:
A injunção consiste na “providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o
cumprimento das obrigações” pecuniárias emergentes de contrato cujo valor não exceda o valor da alda da Relação
ou “das obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo DL nº 32/2003 de 17 de fevereiro (Artigo
7º).
Trata-‐se de uma providência cujo objetivo é permitir ao credor de uma prestação pecuniária de montante não
muito elevado obter um título executivo para o seu cumprimento coercivo, de modo rápido e simplificado.
Pretende-‐se, então, a obtenção pelo credor, de forma célere e simplificada, de um título executivo.
A finalidade do legislador foi, portanto, a de descongestionar os tribunais, procurando dar resposta a uma “situação
de rutura (…) originada, essencialmente, pelo crescimento explosivo da procura dos tribunais pelas empresas, que,
como litigantes frequentes, demandam, em regra, cidadãos consumidores, que não pagam atempadamente bens e
serviços” – litigância de massa.
No nosso sistema de recurso, há normalmente um duplo grau de jurisdição, sendo que em matéria penal este duplo
grau de jurisdição corresponde a uma garantia (art. 32º, CRP).
De acordo com o art. 44º, nº1 da Lei da Organização do Sistema Judiciário os valores de alçada em vigor são os
seguintes: 5000€ para os tribunais de primeira instância e 30.000€ para os tribunais da Relação.
Hipóteses práticas:
1-‐ O valor da ação (por exemplo, pedido de indemnização) é 4.500€. O tribunal de primeira instância condena o
réu ao pagamento de uma indemnização no valor de 200€. O autor pode recorrer para um tribunal da Relação?
Qual é o valor da sucumbência do autor? E a sucumbência do réu?
O valor da sucumbência é 4500€. O valor da sucumbência permitir-‐lhe ia recorrer. No entanto, os requisitos são
cumulativos, e uma vez que o valor da ação não permitia, não seria possível recorrer.
O valor da sucumbência do réu é 200€. Portanto, o réu tampouco poderia recorrer por tanto o valor da ação, como o
valor da sucumbência, não o permitirem.
2-‐ O valor da ação é de 12.500€. E o tribunal de primeira instância condena o réu ao pagamento de uma
indemnização no valor de 8.000€. O autor pode recorrer para um tribunal da Relação?
R: O valor da ação é superior ao valor da alçada do tribunal de primeira instância. O valor da sucumbência do autor é
4.500€. Estes valores são superiores aos valores necessários, portanto, o autor pode recorrer ao tribunal da relação.
O réu também poderia recorrer dado que o valor da ação é o mesmo e o valor da sucumbência do réu é 8.000€.
1
O valor da ação é normalmente o valor indicado pelo autor quando inicia o processo.
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3-‐ O valor da ação é 40.000€ e o tribunal da Relação condena o réu ao pagamento de uma indemnização no valor
de 30.000€. o autor pode recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça?
R: Não, porque o valor da ação está preenchido (valor da alçada é 30.000€ no Tribunal de Relação), no entanto, o valor
de sucumbência de 10.000€ é inferior ao valor da alçada do tribunal a que se recorre, portanto, não poderia recorrer.
2
A unidade de conta é atualizada anualmente de acordo com o valor do Indexante dos Apoios Sociais (IAS). Aquando do início
de um processo, o valor que se deve considerar é precisamente aquele que estiver em vigor no momento em que o processo é
iniciado, não interessando o momento em que a taxa tem de ser paga. No entanto, no caso de um incidente, por exemplo, ser
deduzido em ano diferente, a taxa de justiça para essa ação já será a que corresponde à UC daquele ano. Ainda mais importa
referir que cada ação, execução, procedimento, incidente ou recurso têm uma tributação própria.
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No consumo, existe um direito potestativo do consumidor á arbitragem. O prestador do serviço não tem liberdade
de não ver aquele litigio resolvido por via arbitral. E como em alguns casos não há recurso, a ver o litigio
definitivamente resolvido por via arbitral.
Em que casos pode haver recurso? Se as partes convencionaram. Mas e se não houver convenção em concreto,
quais serão as regras a aplicar? As do centro de arbitragem.
13.1.5. Negócios jurídicos processuais
Os negócios jurídicos processuais, ainda que processuais, são atos de liberdade, que permitem às partes limitar o
seu acesso ao direito.
13.1.5.1. Pactos privativo e atributivo de jurisdição
Os artigos 94º e 95º regulam a modificação da competência por convenção das partes. Em ambos os casos, a
competência, que normalmente seria atribuída a um dado tribunal para dirimir determinado litigio, poderá ser
modificado por acordo das partes.
Se a convenção tiver por fim alterar a jurisdição competente para dirimir um litigio determinado, ou os litígios
eventualmente decorrentes de certa relação jurídica, estamos perante um pacto de jurisdição que pode ser atributivo
ou privativo (artigo 94º).
Pacto privativo ® retira-‐se a competência a um ou a vários tribunais portugueses, atribuindo-‐a em exclusivo a um ou
a vários tribunais estrangeiros;
Pacto atributivo ® resulta a atribuição da competência exclusiva ou alternativa, a um ou a vários tribunais
portugueses.
O artigo 94º/1, CPC atribui às partes a possibilidade de convencionaram qual a jurisdição competente para decidir
um litigio (atual ou eventual) desde que este decorra se uma relação jurídica conexa com mais do que uma ordem
jurídica.
A “designação convencional pode envolver a atribuição de competência exclusiva ou meramente alternativa com
a dos tribunais portugueses quando esta não exista, presumindo-‐se que seja exclusiva em caso de dúvida (artigo
94º/2).
A eleição do onde se exerce a jurisdição é preciso reunir os seguintes requisitos de validade (artigo 94º/3):
• Litigio sobre direitos disponíveis;
• Aceitação pela lei do tribunal designado – competência exclusivas;
• Interesse sério de ambas as partes, ou se apenas de uma, quando não seja inconveniente para a outra parte;
• Não pode violar a competência exclusiva dos tribunais portugueses;
• Tem de haver sempre acordo escrito ou confirmação pro escrito, bem como menção da jurisdição
competente;
Quanto ao acordo escrito ou confirmação por escrito, o artigo 94º/4 vem esclarecer: “qualquer meio de comunicação
que fique prova escrita”. Este meio de comunicação pode conter diretamente o acordo ou pode dele constar cláusula
que remeta para documento onde esteja vertido o acordo.
Artigo 95º/1: veda às partes a disponibilidade de afastarem as regras de competência em razão da:
• Matéria
• hierarquia
• valor da causa
Os deveres anexos visam assegurar o cumprimento da prestação de forma a que o credor possa retirar dela o
benefício esperado: visa assegurar-‐se o cumprimento de acordo com a finalidade que subjaz à prestação; os deveres
de proteção visam evitar a produção de danos e, portanto, visam também o cumprimento de acordo com tal
finalidade. A fonte destes deveres anexos e de proteção é a boa-‐fé (primazia da materialidade subjacente).
Os deveres anexos e de proteção implicam a cooperação entre as partes, nomeadamente impondo-‐lhes deveres
de esclarecimento, de lealdade (deveres anexos) e de proteção.
A distinção entre dever principal e deveres anexos e de proteção pode, com vantagem, ser transplantada para o
direito processual. Também no âmbito processual é possível identificar um “dever”, um objetivo principal, que é a
“justa composição do litígio”, bem como deveres anexos (e de proteção) relativamente ao principal mas essenciais
para assegurar a realização daquele; neste âmbito os deveres anexos e de proteção são aqueles que decorrem do
principio processual da cooperação. Porquê? Porque ao procurar-‐se atingir qualquer objetivo através do cumprimento
de determinadas regras (algo que ocorre tanto nos negócios jurídicos como no processo) é possível perverter o
cumprimento de regras de modo a que o objetivo não seja cumprido.
13.6.1. Deveres de cooperação decorrentes do principio da cooperação
O princípio da cooperação engloba os seguintes deveres:
Note-‐se que cada regra que veremos é simultaneamente a decorrência de mais do que um destes deveres (pois
todos eles estão ligados em função da sua origem comum, que é a boa-‐fé), mas é possível identificar uma dimensão
essencial, um dever que é principalmente assegurado em cada regra, ainda que sem excluir os demais.
• Procurar esclarecer (alertar) as partes relativamente a quaisquer aspetos de facto ou de direito que, no seu
entendimento, elas não conheçam e devam passar a conhecer, para que se possam pronunciar (vertente
ativa);
• Esclarecer-‐se junto das partes relativamente a quaisquer questões de facto ou de direito alegadas pelas partes
de forma obscura ou incompreensível (vertente passiva).
Como podemos ver, o dever de esclarecimento divide-‐se numa vertente ativa e numa vertente passiva.
• Convite dirigido ao suprimento de pressupostos processuais (artigos 590º, nº2, al. a) + 6º, nº2);
• Convite dirigido ao suprimento de irregularidades e à clarificação ou concretização das peças processuais
(artigos 7º, nº2 + 590º, nº2, al. b), nºs 3 e 4 + 639º, nº3);
i) Suprimento de irregularidades dos articulados (590º, nº3);
ii) Suprimento das insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto
alegada (590º, nº4);
iii) Suprimento de irregularidades, insuficiências ou imprecisões no âmbito das conclusões do recurso
(639º, nº3);
• Convite dirigido à correção do enquadramento jurídico do caso, diferente do discutido pelas partes (art. 3º,
nº3 – princípio do contraditório).
Por outro lado, a vertente passiva traduz-‐se essencialmente no dever do juiz de questionar as partes de modo a
tornar claro ao juiz qual o sentido que a parte pretende atribuir a certa alegação de facto ou de direito ou a um pedido
(art. 7º, nº2).
Um exemplo jurisprudencial relativo à necessidade de formular um convite dirigido à correção do enquadramento
jurídico do Tribunal da Relação de Coimbra de 13/11/2012 (AVELINO GONÇALVES): «Estaremos perante uma decisão
surpresa quando ela comporte uma solução jurídica que as partes não tinham obrigação de prever, quando não fosse
exigível que a parte interessada a houvesse perspetivado no processo, tomando oportunamente posição sobre ela ou,
no mínimo e concedendo, quando a decisão coloca a discussão jurídica num módulo ou plano diferente daquele em
que a parte o havia feito».
13.6.1.2. Dever de lealdade
O dever de lealdade é um dever essencialmente dirigido às partes e a terceiros, mas indiretamente também ao
juiz. Visa assegurar que os sujeitos processuais:
• Não adotem um comportamento que impeça ou onere desnecessariamente o correto apuramento da verdade
e/ou do direito aplicável (vertente negativa);
• Adotem um comportamento que promova ativamente o correto apuramento da verdade e/ou do direito
aplicável (vertente positiva).
A vertente negativa traduz-‐se na proibição da chamada litigância de má-‐fé, que ocorre se a parte, com dolo ou
negligencia:
• “Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar” (art. 542º, nº2, al. a);
• “Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa” (542º, nº2, al. b);
• “Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir
um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação de justiça ou protelar, sem
fundamento sério, o transito em julgado da decisão (542º, nº2, al. d).
Por outro lado, a vertente positiva engloba obrigações específicas para as partes de colaborarem ativamente na
descoberta da verdade. Exemplos: art. 429º a 431º (documentos em poder da parte contrária); art. 452º, nº1
(comparência para depoimento de parte); art. 7º, nº3 (comparência para prestar esclarecimentos ao juiz).
13.6.1.3. Dever de proteção
O dever de proteção, à semelhança do dever de esclarecimento, é um dever do juiz. O juiz deve então:
• Promover ativamente a descoberta da verdade, não se limitando à iniciativa probatória das partes (vertente
inquisitorial). Traduz-‐se no poder-‐dever de o juiz requerer oficiosamente a produção de prova, sempre que
achar necessário. Exemplos: art. 411º (dever genérico de inquisitoriedade; art. 436º, nº1 (documentos); art.
452º, nº1 (prova por confissão das partes; art. 466º, nº2 (prova por declarações de parte); art. 467º, nº1; art.
468º, nº1, al. a) + 487º, nº2 (prova pericial); art. 490º, nº1 (inspeção judicial); art. 501º + 516º, nº4 + 526º,
nº1 (prova testemunhal).
• Auxiliar as partes no que toca ao exercício dos seus direitos, faculdades, deveres e ónus processuais (vertente
assistencial) – art. 7º, nº4.
O dever de esclarecimento traduz-‐se em regras que têm simultaneamente por finalidade assegurar o dever de
proteção. Todas as regras que visam o dever de esclarecimento visam também o dever de proteção (na vertente
assistencial), mas nem todas as regras que visam o dever de proteção (nomeadamente na vertente inquisitorial) visam
o dever de esclarecimento.
Exemplos:
• Função integrativa do princípio da cooperação:
i) Convite dirigido à correção do enquadramento jurídico do caso, diferente do discutido pelas partes –
dever de esclarecimento (vertente ativa) e de proteção (vertente assistencial);
• Função bloqueadora do princípio da cooperação:
i) O art. 637º, nº2, prescreve a recusa imediata das alegações de recurso caso não sejam acompanhadas
do acórdão fundamento, o que é incompatível com o princípio da cooperação (dever de
esclarecimento, na vertente ativa + dever de proteção, na vertente assistencial), impondo-‐se a
emissão de convite à junção da cópia antes da rejeição;
ii) A apresentação de documentos em língua estrangeira que as partes e o tribunal não compreendam
pode implicar que o juiz ordene a presentação de tradução parcial, apenas das partes relevantes, caso
seja patente que só estas interessam ao caso (art. 134º, nº1, que parece exigir a tradução total) –
evidencia-‐se o dever de proteção na vertente assistencial (está também em causa a função integrativa
do princípio da economia processual).
• Se quem incumprir for uma parte, deverá ser condenada em multa (542º, nº2, al. c);
• Se a irregularidade influir no exame ou decisão em causa, gera-‐se uma nulidade processual3 (195º, nº1);
• Por vezes, a lei prevê consequências específicas: exemplo: art. 417.º, n.º2 (apreciação livre da recusa para
efeitos probatórios e, caso a recusa implique a impossibilidade da prova, inversão do ónus da prova – 344.º,
n.º2 do CC).
16.6.4. Cooperação e imparcialidade do juiz
O princípio da cooperação, nomeadamente o dever de esclarecimento na vertente ativa e o dever de proteção na
vertente assistencial, pode por em causa a imparcialidade do juiz relativamente à parte a quem é dirigida a assistência
do juiz?
O critério que devemos utilizar para determinar se o juiz foi imparcial no exercício destes seus deveres é o seguinte:
• Se o aspeto sobre o qual incide a assistência do juiz às partes (nomeadamente o convite) for suscitado por
algum elemento, implícito ou explícito, que as partes mencionaram, então não há violação do dever de
imparcialidade; o juiz estará apenas a auxiliar as partes. Exemplo: o autor fundamenta o seu pedido em
incumprimento contratual, mas os factos que alega indiciam a existência de enriquecimento sem causa e o
juiz convida as partes a discutirem esta possibilidade.
• Se o aspeto sobre o qual incide a assistência do juiz às partes (nomeadamente o convite) for completamente
novo, a que as partes não aludiram de todo, então o juiz não estará a ser imparcial; o juiz estará a tomar
partido por uma das partes. Exemplo: o réu não alude à figura do abuso de direito nem alega quaisquer factos
do qual este possa resultar e o juiz convida as partes a discutirem esta questão e alegar os eventuais factos
respetivos.
16.6.5. Cooperação e caracterização do modelo processual atual
Os dois modelos processuais típicos são o adversarial (predomínio da liberdade e autonomia das partes e respetiva
responsabilização) e o inquisitorial (predomínio dos poderes do juiz).
O atual regime processual civil é orientado por interesses, por um lado, de natureza privada (princípio do
dispositivo) e, por outro, de natureza pública (cooperação e economia processual);
Assim, o regime processual civil segue um modelo intermédio mais equilibrado e justo: o modelo cooperativo.
Neste modelo as partes devem ter o controlo sobre a configuração do processo (interesses privados -‐ dispositivo) mas
devem encontrar nos tribunais as condições reais para conseguir que essas pretensões sejam asseguradas (interesses
públicos -‐ cooperação e economia processual).
3
Problema: as nulidades têm, em regra, que ser arguidas pelo interessado no prazo de 10 dias desde o momento em que, depois
de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato no processo (arts. 199.º, n.º1 e 149.º, n.º1), mas a violação de muitas (não
todas) das regras decorrentes do princípio da cooperação só é “descoberta” aquando da sentença. O Professor Teixeira de Sousa
avança uma solução: considerar que tal nulidade está “consumida” pela nulidade da sentença por “excesso de pronúncia” (art.
615.º, n.º1, al. d) e n.º4).
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16.7. Principio da igualdade
O princípio da igualdade das partes ou “igualdade de armas” corresponde ao princípio constitucional da igualdade
no plano processual e é um princípio fundamental do processo civil.
• Igualdade formal: identidade de meios, cominações e sanções processuais. Exemplos: mesmo prazo para a
prática de atos processuais (art. 588º, nº3) e regras idênticas para a apresentação de meios de prova (arts.
552º, nº2 + 572º, al. d);
• Igualdade substancial: além da igualdade formal, envolve a correção de assimetrias extraprocessuais.
Exemplos: convite ao aperfeiçoamento dos articulados (art. 590º, nº1) e redução ou carência de multa em
caso de carência económica (art. 139º, nº8).
A doutrina maioritária considera que a igualdade consagrada é uma igualdade meramente formal, pois rejeita a
intervenção assistencialista do juiz com base na neutralidade e equidistância do julgador, afirmando a existência de
outros mecanismos (como o apoio judiciário) que visam salvaguardar a igualdade substancial.
Deve-‐se entender que a igualdade substancial existe, mas só nos casos previstos na lei. O orador não considera,
então, a igualdade substancial um principio. É de exigir uma norma expressa que exija essa intervenção assistencialista.
O artigo 4º deve ser interpretado no sentido de igualdade formal. A concretização do instituto de igualdade substancial
é dada por exemplos de igualdade formal e não de assistencialidade.
O juiz pode verificar que há uma desigualdade técnica muito grande e promover a igualdade convidando a parte
a colocar-‐se ao mesmo nível que a outra parte. É o caso de, por exemplo, uma parte ser representada por advogado
e outra não.
A igualdade formal impõe, contudo, um tratamento diferenciado para situações distintas, no pressuposto de que
é diferente a posição das partes no processo. Por isso, o autor pode escolher o momento para propor a ação. Por sua
vez o réu dispõe de um prazo para contestar, eventualmente prorrogável (art. 569º). Réu e autor estão em posições
diferentes no processo.
A forma da notificação está prevista no artigo 12º do DL 269/98 sob a forma de:
• Notificação postal registada para a morada indicada pelo requerente;
• Notificação postal simples para as moradas constantes de bases de dados oficiais.
Quanto ao conteúdo da notificação, esta deve conter, entre outros elementos, o prazo de oposição e deve
descrever as consequências da falta de oposição.
A oposição à execução é dos meios de defesa que o executado dispõe na ação executiva. A lei, no artigo 857º
estabelece uma equiparação entre os meios de defesa na execução de sentença e de requerimento de injunção com
fórmula executória. A questão que se coloca é que para além de não estarmos perante um caso em que existe
apreciação jurisdicional, a forma de notificação é completamente distinta da citação.
• Será a notificação postal simples um meio idóneo para assegurar a cognoscibilidade do requerimento?
• Será que a notificação não deveria aludir expressamente aos meios de defesa na ação executiva? A única coisa
a que se aludia no artigo 12º era ao prazo de oposição e às consequências da falta de oposição. Portanto, a
notificação não anunciava todas as suas consequências. Por isso o TC declarou inconstitucional o art. 857º por
violação do direito de defesa.
A segunda vertente do direito de defesa é a audiência prévia do réu. De acordo com o artigo 3º/2 só
excecionalmente se pode saltara a audiência prévia. A regra geral é a audição do réu. Os fundamentos são:
• Assegurar o exercício do contraditório em condições de igualdade com o autor;
• Permitir uma prova e uma decisão mais esclarecida a mais informada por parte do próprio juiz. Assim permite-‐
se-‐lhe ter em conta todos os aspetos que as partes trouxerem ao processo. Há a criação de um quadro mais
completo.
A audiência prévia pode ser dispensada me algumas situações. Essa dispensa depende sempre de previsão legal
expressa (“casos excecionais previstos na lei”). O contraditório é diferido e não suprimido (ocorre depois da decisão).
Exemplos:
• No procedimento cautelar comum (artigo 306º/1) a audiência prévia do requerido é a regra. Porém, pode ser
dispensada para assegurar o fim ou a eficácia da providência ou caso a citação pessoal não seja viável;
• No caso de restituição provisória da posse e arresto (artigos 378º e 393º, nº1) dispensa-‐se automaticamente
a audiência prévia, pois presume-‐se que a audiência representaria um risco sério para o resultado.
• Na ação executiva na forma sumária a regra é a de que o executado não é citado antes da penhora (art. 855º,
nº3), sendo o contraditório diferido para depois da penhora (art. 856º, nº1), garantindo assim uma maior
segurança dos títulos executivos abrangidos por esta forma processual.
• Razões de facto: aqui o contraditório deve ser exercido por escrito na petição inicial e na contestação em que
a parte deve, para além do pedido, indicar quais os factos subjacentes a esse pedido. Desde 2013 a resposta
às exceções é por regra oral e tem lugar em audiência. Isto implica que na primeira fase do processo há uma
petição inicial, há uma contestação por parte do réu4 por escrito (552º e 272º). O resto terá a forma oral e sob
a forma de audiência (603º). O fundamento é a simplificação do processo (redução da fase inicial) e
4
O réu pode defender-‐se por impugnação (alegando que os factos não são verdadeiros) ou por exceção (não contrariando a
veracidade dos factos, mas alegando, por exemplo, que o contrato é nulo, que o prazo prescreveu, etc.).
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prevalência da oralidade. Apesar disto, o juiz pode admitir articulados escritos adicionais ao abrigo da gestão
processual.
• Razões de Direito: por regra as alegações de direito são escritas e devem constar da petição inicial e da
contestação (552º e 572º). Na audiência final processa-‐se oralmente (604º, nº3, al. e). As alegações de direito
correspondem a um ónus das partes;
• Prova.
Para analisar convenientemente o princípio do contraditório é preciso ter em conta outros princípios processuais,
como o dispositivo, a oralidade e o conhecimento oficioso do direito.
Contraditório e jura novit cura (principio do conhecimento oficioso de direito) – artigo 5º/3: o juiz não está sujeito
às alegações das partes no que toca à indagação, interpretação e alegação na matéria de direito. Este principio tem
como limites:
• Principio dispositivo;
• Conhecimento da questão dependente da sua invocação pelas partes (casos de prescrição e anulabilidade):
ainda que conste do processo o facto pelo qual decorre a prescrição ou de anulabilidade, o juiz não o pode
fazer sem que a parte o tenha invocado.
Um dos princípios mais importantes quando se fala no jura novit cura é a proibição de decisões surpresa. Exemplo:
o juiz entende que o contrato é de depósito e não de comodato como assumido pelas partes. Quid juris? O juiz deve
promover o contraditório (artigo 3º/3).
A atividade probatória consiste na identificação e análise dos vestígios que os factos passados deixaram no mundo
para deles inferir uma conclusão acerca da sua ocorrência ou não ocorrência.
Os meios pelos quais se analisam esses vestígios chamam-‐se meios de prova:
• Prova testemunhal;
• Prova pericial ou prova por inspeção;
• Vestígio intencional -‐ registo da ocorrência ou não ocorrência nalgum suporte durável: prova por documentos.
No estudo da atividade probatória iremos tentar compreender a resposta a estas perguntas:
• Como se processa este raciocínio que nos permite passar da análise dos meios de prova para a conclusão da
ocorrência ou não ocorrência de um facto?
• Como avaliar os meios de prova da melhor maneira?
• A que tipo de conclusão podemos chegar com esta análise dos meios de prova? Podemos ter a certeza de que
o facto aconteceu ou não aconteceu?
• O que fazer se não se conseguir chegar a qualquer conclusão?
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• A lei pode dizer-‐nos como construir essa conclusão?
• Quais os limites na análise dos meios de prova?
13.8.2. Apreciação da prova pelo julgador
Breve excurso histórico relativo à evolução da atividade probatória:
• Idade média e centralização do poder político: menos poder dos juízes;
• Tradução desta realidade na atividade probatória: a prova tarifada;
• Revoluções liberais e movimento de “democratização”;
• Tradução desta realidade na atividade probatória: julgamento por júri e apreciação da prova totalmente livre;
• Posteriormente, chegou-‐se à conclusão de que esta forma de avaliar levava a situações absurdas e assim se
chegou ao atual modelo de apreciação probatória, mais equilibrado: a persuasão racional.
Atualmente o modelo da persuasão racional tem uma consagração expressa na lei: “Na fundamentação da
sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente
as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram
decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados
por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo
dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência” (art. 607º, nº4).
Vamos partir da análise deste artigo para compreender o processo de apreciação da prova pelo julgador,
nomeadamente pela análise da expressão “extraindo dos factos apurados as presunções impostas (...) por regras de
experiência”, pois nela se contém o essencial para compreender aquele processo.
Todo o processo de apreciação da prova assenta na lógica da presunção. Qual a estrutura de uma presunção? Se
se prova o facto-‐base da presunção, então assume-‐se que ocorreu o facto presumido, exceto se se provar que não
ocorreu o facto presumido, independentemente de se provar o facto-‐base da presunção (presunção ilidível).
Nas presunções previstas na lei, esta estabelece quais são os factos-‐base e os factos presumidos;
Nas presunções que ocorrem no âmbito da apreciação dos meios de prova (presunções judiciais), os factos-‐base
são os factos instrumentais e os factos presumidos são os factos principais.
Dentro da categoria dos factos instrumentais podemos distinguir os factos probatórios e os acessórios:
• Factos probatórios: são os factos diretamente revelados pelos meios de prova;
• Factos acessórios: são os factos que atestam a verosimilhança da ocorrência dos factos essenciais.
Exemplo:
• Facto principal: A entregou X a B (necessário para verificar o cumprimento do contrato);
• Facto probatório: o facto de que uma testemunha refere ter visto A entregar X a B;
• Factos acessórios: o facto de que a testemunha está próxima do acontecimento (por ex. provado por uma
fotografia), o facto de que o depoimento foi coerente.
Conclusão: o que os meios de prova nos relevam diretamente não são os factos essenciais/principais mas antes e
apenas os factos instrumentais; só indiretamente, por meio de uma inferência, é que podemos concluir pela
ocorrência, ou não, dos factos principais; Logo, toda a prova é indireta.
Com que critério podemos afirmar que os factos instrumentais, em particular os probatórios, indiciam a ocorrência
dos factos principais? Esse critério consiste nas máximas de experiência: estas são conhecimentos da experiência de
vida, da lógica, da regularidade ou normalidade dos acontecimentos que permitem afirmar que se certos factos
ocorreram (factos-‐base), então é provável que outros tenham ocorrido também (factos presumidos);
1-‐ Coerência do discurso, em si e em confronto com outros, indicia a sua veracidade;
2-‐ Quanto maior for a improbabilidade dos factos probandos (eventuais factos presumidos), em abstrato, maior
será a necessidade de os factos-‐base indiciarem fortemente a sua ocorrência para que se possa concluir por
ela;
3-‐ A prova do habitual modo de proceder de alguém indicia a improbabilidade de um ato incoerente com esse
modo de proceder;
4-‐ A falta de necessidade para a prática de um ato indicia a existência de vícios no consentimento para a prática
desse ato.
5-‐ A prova da destruição de um documento por quem poderia ser prejudicado pela prova dos factos que esse
documento poderia demonstrar indicia a ocorrência desses factos;
6-‐ O facto de um condutor percorrer todos os dias o mesmo percurso indicia que ele conhecia bem os locais mais
perigosos do mesmo;
7-‐ A colaboração de alguém nalguma obra ou ato indicia o consentimento na sua realização;
8-‐ Se alguém que está em cadeira de rodas dá o seu cartão bancário e respetivo código a certa pessoa e esta
alega que lhe fez uma doação avultada, tal indicia falta de consentimento na mesma, pois para fazer uma
doação avultada existem meios mais adequados.
O recurso, devidamente justificado e explicitado (607.º-‐4), às regras da experiência é o que garante a correta
apreciação da prova e é nisso que se concretiza o traço distintivo do modelo probatório da persuasão racional (o
princípio caracteriza o modelo probatório atual), que visa contribuir para a objetividade na apreciação da prova e
garante a possibilidade prática de recurso sobre decisões de facto.
13.8.3. Imediação na apreciação da prova
A apreciação da prova segundo as regras da experiência procura assegurar uma decisão sobre a matéria de facto
que se aproxime o mais possível da realidade (além de ter também o objetivo de explicitar e permitir o recurso –
sindicabilidade – desta decisão);
Contudo, a apreciação da prova segundo as regras da experiência não é a única forma de contribuir para aquele
objetivo. Outra forma de contribuir para ele é procurar que o julgador esteja na melhor posição possível para apreciar
os meios de prova, ou seja, o mais próximo possível deles para os analisar de forma o mais completa e precisa possível.
Nisso consiste o princípio da imediação na apreciação da prova.
O princípio da imediação na apreciação da prova traduz-‐se nas seguintes regras:
• Produção de prova e discussão de facto (e de direito) perante o mesmo juiz que irá decidir acerca da ocorrência
dos factos (art. 605.º);
• Realização dos atos de produção de prova, discussão de facto (e de direito) e julgamento num curto intervalo
temporal entre eles, tendo lugar, os dois primeiros, na audiência final (art. 604.º-‐3 e 4), que deve ser contínua
(art. 606.º), e o terceiro no prazo de 30 dias desde o encerramento de tal audiência (art. 607.º-‐1);
• Regras que podem ser unificadas na ideia de que os meios de prova que possam ser apresentados sob a forma
de depoimento oral o sejam realmente, perante o julgador (cfr., por exemplo, os arts 452.º-‐1, 466.º-‐2, 2.ª
parte, 486.º-‐1 e 526.º, n.º1). Especialmente relevante a este respeito é a regra constante do art. 461.º-‐2,
respeitante à prova por confissão mas aplicável ex vi arts. 466.º-‐2, 2.ª parte e 516.º-‐7 à prova por declarações
de parte e à prova testemunhal respetivamente, que determina a proibição de o depoente levar o depoimento
escrito e se limitar a lê-‐lo.
Há a necessidade de compatibilizar este princípio com outros, como a economia processual ou mesmo com a
necessidade de análise de maior quantidade de provas.
0% 50% 75% 90% 100%
Provada preponderante
Ponto de ignorância
Dadas as várias medidas da prova, qual deve ser a medida que deve estar atingida para que se possa decidir com
base na ocorrência de certo facto? Com que critério devemos decidir qual é a medida aplicável? O critério é a diferença
entre a gravidade de uma decisão condenatória (factos principais considerados provados) e de uma decisão
absolutória (factos principais não considerados provados) se assumirmos que houve erro na apreciação da prova
(“erro judicial”), pois não podemos excluir essa hipótese. Quanto maior for essa diferença, maior deve ser a medida
da prova para assim se minimizar a probabilidade de erro judicial.
In dúbio pro reo Provada a
Provada a não ocorrência ocorrência
Ponto de ignorância: Página 79 de 85
presunção de inocência
• Se uma decisão condenatória for igualmente grave quando comparada com a decisão absolutória
correspondente, então não há razão para exigir uma elevada medida de prova; é o que ocorre na maioria das
matérias de direito privado. Neste caso, a medida da prova mais apropriada será a prova preponderante, que
implica uma igual exigência probatória quer para a prova dos factos em causa (condenação) quer para a prova
de que esses factos não ocorreram (absolvição):
50% 100%
0%
Ponto de ignorância
• No entanto, existem alguns casos que, embora se reportem ao âmbito do direito privado, exigem que a prova
dos factos seja feita segundo uma medida da prova mais exigente, nomeadamente a prova clara e
convincente. Exemplos: processos de jurisdição voluntária; processos em que se discuta a titularidade de
direitos de propriedade industrial. A justificação para esta maior exigência reside no facto de neles estarem
em causa interesses de terceiros que implicam que uma decisão favorável ou desfavorável ao autor tenham
gravidades distintas:
0% 50% 75% 100%
Provada a ocorrência
Provada a não ocorrência
É neste âmbito, e apenas neste âmbito, que é relevante o ónus da prova, enquanto critério de decisão na dúvida
sobre a ocorrência de um facto. O ónus da prova funciona da seguinte forma: na dúvida deve decidir-‐se como se
tivesse ocorrido a versão factual (positiva ou negativa) desfavorável à parte que suporta o ónus da prova.
Assim, o problema fundamental para compreender o funcionamento deste critério de decisão é o de determinar a
distribuição do ónus da prova, ou seja, o problema de saber qual das partes deve suportar o OP de que versão factual.
• Cabe ao autor o ónus da prova dos factos constitutivos do direito do autor;
• Cabe ao réu o ónus da prova dos factos impeditivos, modificativos e extintivos do direito do autor.
Os factos constitutivos, impeditivos, modificativos e extintivos formam o conjunto dos factos principais/essenciais.
Este é o critério regra, de origem alemã (teoria das normas de Leo Rosenberg), usado em vários ordenamentos de
civil law: segundo este critério a qualificação dos factos depende da forma como as normas estão escritas, ou seja, da
forma como as normas, na sua literalidade, apresentam os factos como constitutivos ou impeditivos.
Exemplo do funcionamento da teoria das normas -‐ artg. 509.º, n.º1 do C.C.: “Aquele que tiver a direcção efectiva
de instalação destinada à condução ou entrega da energia eléctrica ou do gás (...) responde pelo prejuízo que derive
da condução ou entrega da electricidade ou do gás (...) excepto se ao tempo do acidente esta estiver de acordo com
as regras técnicas em vigor (...)”. Nesta norma encontramos:
• Elementos literais que, em regra, prenunciam a indicação de factos constitutivos: “aquele que”, “sempre que”,
“desde que”, “apenas se”, e outras de significado equivalente;
• Elementos literais que, em regra, prenunciam a indicação de fatos impeditivos: «a não ser que», «isto não vale
se», «exceto se», «salvo se», «este preceito não se aplica quando», e outras de significado equivalente.
No entanto, a aplicação do critério da teoria das normas apresenta vários problemas:
1-‐ Primeiro porque a identificação de que factos são constitutivos, impeditivos, modificativos ou extintivos:
• Nem sempre é praticável – critérios de decisão sem base textual fixa, sem que estejam consagrados em regras
com previsão e estatuição definidas (exs.: abuso de direito, garantia bancária autónoma e cláusulas gerais);
• Nem sempre é coerente – o mesmo facto pode ser considerado como constitutivo ou como impeditivo (ex.:
os factos que consubstanciam a nulidade de um contrato (ex.: falta de forma) podem ser impeditivos numa
ação em que se peça o cumprimento do contrato e podem ser constitutivos numa ação em que se peça a
declaração de nulidade).
Uma possível solução pode consistir em procurar na compreensão dos vários institutos do direito material a solução
para a correta qualificação dos factos como constitutivos ou como impeditivos; porém, o direito material não tem em
conta os problemas relativos à prova, que são os que interessam a propósito do OP.
2-‐ Depois porque aquele critério é completamente formal, não visa atingir qualquer finalidade materialmente
valiosa ou justa, pois não é possível encontrar, na forma como as normas estão redigidas ou no direito
material, qualquer preocupação relativa à distribuição do OP – este é o problema essencial.
“Aquele que tiver a direção efectiva de instalação destinada à condução ou entrega da energia eléctrica ou do gás (...)
responde pelo prejuízo que derive da condução ou entrega da electricidade ou do gás (...) exceto se ao tempo do
acidente esta estiver de acordo com as regras técnicas em vigor (...)”
Mudando a redação da norma, “transformamos” um facto impeditivo num facto constitutivo:
“Aquele que tiver a direcção efectiva de instalação destinada à condução ou entrega da energia eléctrica ou do gás e
que esteja, ao tempo do acidente, em desconformidade com as regras técnicas em vigor, responde pelo prejuízo que
derive da condução ou entrega da electricidade ou do gás”.
Um critério alternativo à teoria das normas para a distribuição do OP consiste na distribuição dinâmica do OP. O
conceito, numa primeira abordagem, refere-‐se à possibilidade de o juiz atribuir o ónus da prova à parte com maior
facilidade relativa de provar a versão dos factos que a favorece.
A verificação destes critérios não implica que a parte onerada apresente efetivamente maior facilidade probatória.
O juiz deve ouvir as partes antes de decidir (na audiência prévia).
1. Prova de que o devedor e o terceiro (não) agiram de má fé, nos casos de impugnação pauliana de ato oneroso
-‐ Art. 612.º do CC: “O ato oneroso só está sujeito à impugnação pauliana se o devedor e o terceiro tiverem
agido de má fé”. Vejamos como a solução será diferente:
• Se aplicarmos a teoria das normas: a má fé é apresentada como um facto constitutivo do direito à impugnação
pauliana – é o interessado na impugnação que tem o ónus de provar a má fé do devedor e do terceiro.
• Se aplicarmos a distribuição dinâmica: o devedor (e o terceiro) tem o controlo do facto: praticou o ato que se
visa impugnar – ele tem o ónus de provar que não agiu de má fé.
2. Prova de que a intervenção médica (não) foi efetuada de acordo com as boas práticas médicas em casos de
negligência médica (responsabilidade contratual; obrigação de meios).
• Teoria das normas: art. 798.º do CC: “o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-‐
se responsável pelo prejuízo que causa ao credor” – o incumprimento apresenta-‐se como facto constitutivo,
logo o paciente suporta o ónus da prova de que a intervenção não respeitou as boas práticas;
• Distribuição dinâmica: o médico tem o controlo do facto que se visa provar; o médico praticou esse facto
enquanto profissional – o médico suporta o ónus da prova de que a intervenção respeitou as boas práticas.
• A procura pela verdade material (maior probabilidade de se provarem os factos e de, na dúvida sobre a sua
ocorrência, a decisão corresponder à verdade);
• Igualdade entre as partes (uma tem mais facilidade em provar mas a outra não suporta o ónus da prova);
• Economia processual.
• Implica a existência e a identificabilidade de um desequilibro nas capacidades probatórias das partes, o que
nem sempre se verifica.
13.8.6. Restrições à persuasão racional
A atividade probatória encontra-‐se genericamente regulada pelo modelo da persuasão racional, avaliando-‐se as
provas de acordo com as regras da experiência relevantes no caso concreto, sendo estas determinadas e aplicadas
pelo julgador.
Contudo, existem ainda alguns casos em que se podem ter em conta na decisão do processo factos que não foram
provados segundo o modelo da persuasão racional.
A primeira situação em que tal acontece corresponde a alguns casos de prova tarifada (também chamada prova
legal, pois o seu valor probatório está previsto na lei) que ainda subsistem na legislação atual.
Trata-‐se de casos em que a lei estabelece previamente quais os “factos presumidos” que se devem considerar
provados se se verificarem certos “factos-‐base”, também estes previstos na lei; nalguns desses casos a lei admite prova
• Admissão por acordo (prova pleníssima), art. 574.º, n.º2 -‐ justificada pela regra de experiência de que se duas
partes em litígio estão de acordo sobre a ocorrência de um facto, ele corresponderá à verdade;
• Documentos autênticos e documentos particulares com assinatura reconhecida (prova plena), arts. 371.º,
372.º e 375.º e 376.º do CC – justificada pela autoridade pública reconhecida à entidade documentadora ou
que reconhece as assinaturas;
• Todos os casos de presunções legais ilidíveis (prova plena) – justificada pelas regras da experiência.
O outro caso em que se podem ter em conta na decisão do processo factos que não foram provados segundo o
modelo da persuasão racional é o dos chamados factos notórios (412.º, n.º1). Os factos notórios são os factos do
conhecimento geral, cuja ocorrência seja indiscutível. O facto de serem do conhecimento geral não significa
necessariamente que sejam do conhecimento de toda a gente: podem ser apenas do conhecimento de certo grupo
de pessoas (por exemplo, os habitantes de certa localidade), desde que esse grupo inclua as partes e o juiz. Exemplos:
a distância entre duas localidades, a ocorrência de um evento meteorológico fora do comum (cheias, trovoada forte),
etc.
13.8.7. Limites à apreciação probatória: a prova ilícita
A apreciação da prova segundo o modelo da persuasão racional tem limites, dado que os valores que este visa
proteger não podem justificar a apreciação de meios de prova obtidos de forma ilícita (ex.: apresentação de
documentos furtados, testemunha ameaçada para depor em certo sentido, apresentação de um vídeo que viole a
intimidade da vida privada);
Trata-‐se de uma matéria muito estudada no âmbito do processo penal, onde o CPP a regula expressamente (arts.
125.º e 126.º do CPP), tal como a CRP (art. 32.º, n.º8);
No processo civil não há regras diretamente aplicáveis que regulem esta questão, pelo que se considera ser
aplicável, por analogia, o regime do art. 32.º, nº8 da CRP à obtenção de provas no processo civil (Isabel Alexandre,
Provas Ilícitas em Processo Civil): “São nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coação, ofensa da integridade
física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas
telecomunicações.”
13.9. Principio da transparência do processo e das decisões
Este princípio tem como subprincípios:
• Princípio da publicidade
• Princípio da fundamentação das decisões
“As audiências dos tribunais são públicas, salvo quando o próprio tribunal decidir o contrário, em despacho
fundamentado, para salvaguarda de dignidade das pessoas e da moral pública ou para garantir o seu normal
funcionamento” -‐ Art. 206º, CRP.
“Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente […] O julgamento deve
ser público, mas o acesso à sala de audiências pode ser proibido à imprensa ou ao publico durante a totalidade ou
parte do processo, quando a bem da moralidade, da ordem publica ou da segurança nacional numa sociedade
democrática, quando os interesses de menores ou a proteção da vida privada das partes no processo o exigirem, ou,
na medida julgada estritamente necessária pelo tribunal, quando, em circunstâncias especiais, a publicidade pudesse
ser prejudicial para os interesses da justiça” -‐ Art. 6º, nº1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
1. Permite o controlo social da decisão do tribunal e do processo que conduziu a essa decisão, evitando decisões
arbitrárias ou injustas;
2. Assegura a transparência da justiça em geral e de cada julgamento em particular, permitindo reforçar a
legitimidade democrática de que se revestem as decisões judiciais;
3. Contribui para a salvaguarda do princípio da imparcialidade;
4. Releva para o cabal conhecimento do direito pela sociedade;
5. Assegura a certeza e a uniformidade jurídicas;
6. É importante no avanço da ciência do direito.
“A audiência [final] é pública, salvo quando o juiz decidir o contrário, em despacho fundamentado, para
salvaguarda da dignidade das pessoas e da moral pública, ou para garantir o seu normal funcionamento” – Art. 606º,
nº1, CPC.
O princípio da publicidade da audiência tem de ser articulado com o direito à imagem, consagrado no art. 79º,
nº2, CC, onde se afirma que “não é necessário o consentimento da pessoa retratada quando […] a reprodução da
imagem vier enquadrada na de lugares públicos, ou na de factos de interesse público ou que hajam decorrido
publicamente”.
“O processo civil é público, salvas as restrições previstas na lei” – Art. 163º, nº1, CPC.
“A publicidade do processo implica o direito de exame e consulta dos autos na secretaria e de obtenção de copias ou
certidões de quaisquer peças nele incorporadas, pelas partes, por qualquer pessoa capaz de exercer o mandato judicial
ou por quem nisso revel interesse atendível” – Art. 163º, nº2, CPC.
“O acesso aos autos é limitado nos casos em que a divulgação do seu conteúdo possa causar dano à dignidade das
pessoas, à intimidade da vida privada ou familiar ou à moral pública, ou pôr em causa a eficácia da decisão de proferir”
– Art. 164º, nº1, CPC.
O nº2 do art. 164º CPC concretiza a cláusula geral do nº1, indicando alguns casos em que o acesso é sempre
limitado.
Publicidade das decisões finais
Segundo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, esta reveste carácter absoluto.
Considera-‐se suficiente o depósito da sentença que fique acessível ao público, não sendo necessária a sua leitura
pública.
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Para a publicidade das decisões finais é importante a publicação na internet (em Portugal, www.dgsi.pt), revelando-‐
se adequada a não divulgação de dados pessoais das partes e outros envolvidos, com vista a garantir o equilíbrio dos
interesses em questão, tendo em conta a proteção da intimidade da vida privada e familiar (art. 26º, CRP).
No que diz respeito à arbitragem, de acordo com o art. 30º, nº5 da LAV: “Os árbitros, as partes e, se for o caso, as
entidades que promovam, com carácter institucionalizado, a realização de arbitragens voluntárias, têm o dever de
guardar sigilo sobre todas as informações que obtenham e documentos de que tomem conhecimento através do
processo arbitral, sem prejuízo do direito de as partes tornarem públicos os atos processuais necessários à defesa dos
seus direitos e do dever de comunicação ou revelação de atos do processo às autoridades competentes, que seja
imposto por lei”. No entanto, tal “não impede a publicação de sentenças e outras decisões do tribunal arbitral,
expurgadas de elementos de identificação das partes, salvo se qualquer destas a isso se opuser” (art. 30º, nº6 da LAV).
13.9.2. Princípio da fundamentação das decisões
“As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei” – Art.
205º, nº1, CRP.
O princípio da fundamentação das decisões encontra o seu fundamento na proteção das partes contra o arbítrio
do juiz e no sentido do controlo da decisão (incluindo, quando admitido, o recurso, enquanto meio de pôr em causa a
decisão junto de um tribunal hierarquicamente superior). Contribui também para o prestigio da oferta de justiça,
escrutinada pelo público e pela opinião pública, legitimando o poder judicial.
• O princípio da fundamentação é um princípio transversal, que assume um papel mais significativo em alguns
processos (penal, administrativo, por exemplo);
• A sentença proferida nos julgados de paz deve conter apenas “uma sucinta fundamentação” – Art. 60º, nº1,
al. c) da LJP.
• No regime da AECOP a sentença deve ser “sucintamente fundamentada” – art. 4º, nº7.
Normas do CPC que se relacionam com este princípio: art. 154º + 567º, nº3.
Quando à arbitragem:
• “A sentença deve ser fundamentada, salvo se as partes tiverem dispensado tal exigência […]” – art. 42º, nº3
da LAV. Pergunta: será este preceito conforme à CRP?