O documento descreve a história da reforma psiquiátrica no Brasil desde os anos 1970, incluindo o surgimento do Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental, a introdução do modelo de co-gestão nos anos 1980, e a I Conferência Nacional de Saúde Mental em 1987 que marcou a desinstitucionalização da psiquiatria.
O documento descreve a história da reforma psiquiátrica no Brasil desde os anos 1970, incluindo o surgimento do Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental, a introdução do modelo de co-gestão nos anos 1980, e a I Conferência Nacional de Saúde Mental em 1987 que marcou a desinstitucionalização da psiquiatria.
O documento descreve a história da reforma psiquiátrica no Brasil desde os anos 1970, incluindo o surgimento do Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental, a introdução do modelo de co-gestão nos anos 1980, e a I Conferência Nacional de Saúde Mental em 1987 que marcou a desinstitucionalização da psiquiatria.
Revisitando os paradigmas do saber psiquiátrico: tecendo o percurso do movimento da reforma
psiquiátrica
Os períodos em que os campos teóricos assistenciais da psiquiatria se estabelecem são
dois: um se marca pela crítica ao modelo asilar, responsável pelos altos índices de cronificação (comunidades terapêuticas nos EUA e psicoterapia institucional na França). O segundo período estende a psiquiatria ao espaço público, a fim de promover saúde mental e prevenir seu deterioramento (psiquiatria de setor na França e psiquiatria comunitária ou preventiva nos EUA). Os dois períodos colocam em xeque a instituição manicomial como local de cura, fazendo com que a terapêutica se torne coletiva e preventiva. Enquanto esses movimentos reformam o sistema, a antipsiquiatria de Franco Basaglia opera uma ruptura, pretendendo desconstruir o aparato psiquiátrico e iniciando um novo movimento teórico e político em relação a direitos dos pacientes de saúde mental. A percepção da loucura apresenta contornos diferentes ao longo da história. Foucault, versando sobre a história da loucura, coloca que na Idade Moderna, em oposição às concepções da Idade Média, a loucura ganha um caráter de repulsa, provocando a exclusão das pessoas que a portam. O louco é um agente do caos, não trabalha e não produz, por isso não tem utilidade social. Na mesma época, mais especificamente a partir do século XIX, a loucura ganha percepção científica e se constitui na prática psiquiátrica medicalizante. Um critério de desrazão marca a exclusão de pessoas com transtornos psiquiátricos. O internamento, então, ganha um “respaldo científico”. A psiquiatria, então, tendo seu caráter médico institucionalizado pelos hospitais gerais (instituições filantrópicas com caráter assistencial), atua como agente de poder sobre esses corpos e sujeitos, ao contrário de sua pretensa cientificidade e medicalização. Pinel inaugura a transformação do hospital geral em espaço medicalizante e farmacêutico e a apropriação da loucura pelos sistemas psiquiátricos. Surgem as primeiras críticas a seu caráter fechado e autoritário, consolidando o modelo de colônia de alienados. O modelo das colônias serve para ampliar a importância social e política da psiquiatria, neutralizando algumas das críticas feitas ao modelo tradicional. No período pós-guerra, surgem modelos abertos de tratamento, trazendo propostas como as comunidades terapêuticas, a psicoterapia institucional, representando as reformas no espaço asilar; a psiquiatria de setor e a psiquiatria preventiva, ampliando o espaço dos asilos e a proposta da antipsiquiatria, que rompe totalmente com os modelos anteriores. A terapia ocupacional surge na mesma época, que na época tinha a ideia da cura pelo trabalho. O enfoque terapêutico se transforma em algo mais próximo do que conhecemos hoje: oficinas de grupo, grupos operativos, grupos de atividades, objetivando, assim, o caráter coletivo do tratamento em saúde mental. Assim, a ideia de comunidade terapêutica contribui para desarticular o espaço hospitalar e asilar. A psicoterapia institucional se encaixa nesse projeto com o mesmo objetivo, propondo horizontalidade no tratamento. A psiquiatria de setor preconiza o tratamento em território, descentralizando o hospital psiquiátrico. A psiquiatria preventiva busca tentar encontrar elementos que levem os usuários dos sistemas a terem transtornos psiquiátricos através do diagnóstico de comportamentos desajustados e enfocando a crise. A antipsiquiatria coloca a loucura e a crise como fruto de dilemas e tensões sociais, onde o louco é colocado dessa forma por contestar as normas sociais e reagir a essas de forma disruptiva, o que traz o aspecto de periculosidade da loucura. A trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil
No Brasil, o movimento de reforma psiquiátrica tem seu estopim na chamada “crise da
DINASAM”, que era o órgão responsável pela formulação das políticas de saúde mental. Na época não realizava concursos públicos e contratava profissionais de saúde em condições de trabalho muito precárias e hostis. A crise se instaura a partir da denúncia vinda de três médicos bolsistas. Assim nasce o MTSM (Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental), um espaço de luta não institucional, que tem como reivindicações principais melhores condições trabalhistas e pressionar para que as práticas manicomiais se extingam. Dessa forma, o MTSM possui pautas tanto políticas quanto corporativas, que acabam se complementando. O movimento ganha a oportunidade de se expandir nacionalmente com o V Congresso Brasileiro de Psiquiatria. Toma de assalto o Congresso, já que a maioria de seus participantes se compunha de psiquiatras conservadores. O MTSM amplia sua atuação pelo país através de diversos congressos, propondo suas questões em relação ao trabalho na psiquiatria e também em relação ao governo da época. O MTST se caracteriza por ser o primeiro movimento de saúde com participação popular, sendo um movimento plural e múltiplo. Dessa forma, se permite ser um movimento de interesses diversos, se desvinculando um pouco de questões corporativas e trabalhistas. No início dos anos 80, a modalidade de co-gestão prevê a colaboração do Ministério da Saúde com o Ministério da Previdência e Assistência Social. Se torna um marco na saúde mental, pois o Estado incorpora os setores críticos da saúde mental, propiciando as ocupações dos movimentos em espaços públicos. Funciona como um mecanismo de gerenciamento conjunto, trazendo gestões paritárias e horizontalizadas. O processo de co-gestão surge a partir de uma crise institucional, onde os investimentos realizados na saúde não garantem resultados satisfatórios, já que o modelo assistencial privilegia o setor privado. A co-gestão entra fazendo um trabalho oposto, priorizando o sistema público de prestação de serviços, a descentralização, a regionalização e a cooperação interinstitucional. Dessa forma, o serviço de atendimento no sistema de co-gestão se dá de forma universalizada, com utilização de recursos humanos por parte dos dois ministérios, também em colaboração financeira. O projeto de co-gestão pode ser considerado como precursor de novos modelos de saúde. A co-gestão gera resistência dos proprietários de hospitais psiquiátricos, os chamados “empresários da loucura”, que veem seus lucros e poderes ameaçados. Dessa forma, o setor de psiquiatria na Federação Brasileira de Hospitais é organizado. Ainda assim, o sistema de co- gestão se mostra mais eficiente e menos dispendioso para os cofres. A partir dessa crise na Previdência, o CONASP (Conselho Consultivo de Administração de Saúde Previdenciária) é criado e tem a função de organizar e aperfeiçoar a assistência médica e financeira, descentralizando, hierarquizando e fortalecendo a intervenção do Estado. A FBH também se opõe a esse modelo. Esse momento do movimento de reforma psiquiátrica no país marca também a incorporação do MTSM no aparato público, o que institucionaliza parte do movimento. Mas há a organização de linhas estratégicas: parte se manteve nos aparatos públicos institucionais e a outra parte exerce função sindical, organizando os trabalhadores e fazendo vigilância à outra parte. Assim, em 1995 boa parte dos cargos de chefia de programas estaduais e municipais de saúde mental e da direção das principais unidades hospitalares públicas está nas mãos de membros do MTSM. Dessa maneira, se organiza o I Encontro de Coordenadores de Saúde Mental, que culmina na I Conferência Nacional de Saúde Mental, onde há uma espécie de ofensiva vinda da FBH, da DINSAM e da ABP, que colocavam que a realização da conferência daria a hegemonia ao MTSM. Mas ainda assim se realizam conferências estaduais e a nacional, contrariando a DINSAM. A Conferência Nacional foi realizada sob impasses, mas o MTSM conseguiu tomar a frente dela. A I Conferência de Saúde Mental se realiza em 1987 e se estrutura a partir de três temas básicos: economia, sociedade e estado; reforma sanitária e reorganização da assistência à saúde mental e cidadania e doença mental. Tem como desdobramentos a desinstitucionalização das práticas em saúde mental, incentivando a participação popular e a priorização de investimentos em serviços extra-hospitalares, revertendo a lógica hospitalocêntrica. De forma paralela, o MTSM se reunia para discutir os rumos do movimento. O desatrelamento do Estado foi pautado como estratégia de renovação e forma do movimento integrar a sociedade e levar questões sobre o manicômio e a loucura. LINHA DO TEMPO DA REFORMA PSIQUIÁTRICA NO BRASIL
Década de 1970 – Início da reforma psiquiátrica – surgimento do MTSM
Década de 1980 – Trajetória sanitarista – incorporação dos movimentos políticos em saúde pelo Estado – co-gestão 1986 – 8ª Conferência de Saúde – participação popular 1987 – I Conferência de Saúde Mental – fim da trajetória sanitarista - Movimento de desinstitucionalização - Surgimento dos CAPS/NAPS
1987 – Congresso de Bauru – dia da luta antimanicomial
Preconceito e discriminação contra pessoas com deficiência no Poder Judiciário e no Ministério Público Federal:: a realidade brasileira com as "bênçãos" dos ministros do STF