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,,

Emile Durkheim

As Formas Elementares
1


da Vida Religiosa
O sistema totêmico na Austrália

Tradução
PAULO NEVES

PUCRS/BCE

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Martins Fontes .;·.··


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PRESERVE�ÍJA FONTE
São Paulo 2000
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DE CONHECIMENTO

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1
LIVRO I II - Crítica da primeira tese. - Distinção da idéia de
QUESTÕES PRELIMINARES alma e da idéia de duplo. -O sonho não expli-
ca a idéia de alma ...... ........ .... .. .... ...... ....... .. .. .... ..... 42
Capítulo I - DEFINIÇÃO DO FENÔMENO RELIGIOSO III- Crítica da segunda tese.-A morte não explica a
E DA RELIGIÃO transformação da alma em espírito. - O culto
das almas dos mortos não é primitivo ........ .......... 48
1
Utilidade de uma definição prévia da religião; méto­ IV- Crítica da terceira tese. - O instinto antropo­
.J
do a seguir para proceder a essa definição.-Por que mórfico. Crítica que Spencer fez dele; reservas a
convém examinar primeiro as definições usuais .......... 3 esse respeito. Exame dos fatos pelos quais se
julga provar a existência desse instinto. - Dife­
I - A religião definida pelo sobrenatural e pelo
rença entre a alma e os espíritos da natureza. O
misterioso. - Crítica: a noção de mistério não é
primitiva .. .. .. .... .. ............. ..... .. ...... ............. .. .. .. .... ....
antropomorfismo religioso não é primitivo.......... 54
5
V- Conclusão: o animismo reduz a religião a não
II- A religião definida em função da idéia de Deus
ou de ser espiritual. - Religiões sem deuses. -
ser mais que um sistema de alucinações .............. 58.
Nas religiões deístas, há ritos que não implicam
nenhuma idéia de divindade................................. 11
III - Busca de uma definição positiva. - Distinção
Capítulo III-AS PRINCIPAI CONCEPÇÕES DA S
RELIGIÃO ELEMENTAR (cont.)
das crenças e dos ritos.-Definição das crenças.
- Primeira característica: divisão das coisas em
II - O naturismo
sagradas e profanas. - Caracteres distintivos
dessa divisão. - Definição dos ritos em função
Histórico da teoria .......................................................... 61
das crenças.-Definição da religião ..................... 18
IV - Necessidade de uma outra característica para dis­ I - Exposição do naturismo segundo Max Müller ..... 63
tinguir a magia da religião. - A idéia de igreja. - II - Se a religião tem por objeto exprimir as forças na­
As religiões individuais excluem a idéia de igreja? .. 26 turais e se as exprime de maneira errônea, não se
compreende como tenha podido se manter.-Su­
posta distinção entre a religião e a mitologia . ........ 70
Capítulo II-AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES
.

III - O naturismo não explica a distinção das coisas


DA RELIGIÃO ELEMENTAR
em sagradas e em profanas ................................... 76

I - O animismo
Capítulo IV-O TOTEMISMO COMO RELIGIÃO
Distinção entre animismo e naturismo.......................... 33 ELEMENTAR

I- As três teses do animismo: 1) Gênese da idéia


Histórico da questão. Método para tratá-la
de alma; 2) Formação da idéia de espírito; 3)
Transformação do culto dos espíritos em culto
I História sumária da questão do totemismo .......... 82
da natureza .......... :.................................................. 35
-
- - ------- ·--- ----- ----·

II-Razões de método pelas quais o ·estudo terá por esse parentesco. - O caráter sagrado do homem
objeto especialmente o totemismo australiano. - é mais manifesto em certos pontos do organis­
Importância que será dada aos fatos americanos... 87 mo: o sangue, os cabelos, etc. - Como esse ca­
ráter varia com o sexo e a idade. -O totemismo
não é uma zoolatria nem uma fitolatria............ ... 129 .

LIVRO II
AS CRENÇAS ELEMENTARES
Capítulo III-AS CRENÇAS PROPRIAMENTE
Capítulo I-AS CRENÇAS PROPRIAMENTE TOTÊMICAS TOTÊMICAS (cont.)

I-O totem como nome e como emblema III -O sistema cosmológico do totemismo
e a noção de gênero
I - Definição do clã. - O totem como nome do clã.
- Natureza das coisas que servem de totens. - I - As classificações das coisas por clãs, fratrias,
Maneiras pelas quais se adquire o totem. - Os classes..................................................................... 138
totens de fratrias, de classes matrimoniais............ 96 II - Gênese da noção de gênero: as primeiras classi­
II- O totem como emblema. -Desenhos totêmicos ficações das coisas tomam seus marcos da socie­
gravados ou esculpidos nos objetos, tatuados dade. -Diferença entre o sentimento das seme­
ou desenhados nos corpos.................................... 107 lhanças e a idéia de gênero. - Por que esta é de
III - Caráter sagrado do emblema totêmico. - Os origem social.......................................................... 142
churinga. - O nurtunja. - O waninga. - Caráter III - Significação religiosa dessas classificações: todas
convencional dos emblemas totêmicos. ..... ... .... 112 . .
as coisas classificadas num clã participam da na­
tureza do totem e de seu caráter sagrado. - O
sistema cosmológico do totemismo. - O tote­
Capítulo II - AS CRENÇAS PROPRIAMENTE mismo como religião tribal.................................... 146
TOTÊMICAS (cont.)

II-O animal totêmico e o homem Capítulo IV-AS CRENÇAS PROPRIAMENTE


TOTÊMICAS (finaD
I - Caráter sagrado dos animais totêmicos. - Inter­
dição de comê-los, de matá-los, de colher as IV-O totem individual e o totem sexual
plantas totêmicas. -Atenuações diversas dessas
interdições.-Proibições de contato.-O caráter I - O totem individual como prenome; seu caráter
sagrado do animal é menos pronunciado que o sagrado. - O totem individual como emblema
do emblema ........................ ..... . . ..... . .... ...... .... . ..... . . 123 pessoal. - Vínculos entre o homem e seu totem
II- O homem. - Seu parentesco com o animal ou a individual.-Relações com o totem coletivo .. ... 155 .. .

planta totêmicos. -Mitos diversos que explicam


II- Os totens dos grupos sexuais. - Semelhanças e ubiqüidade. -Seu caráter ao mesmo tempo físi-
diferenças em relação aos totens coletivos e in- co e moral .............................................................. 189
dividuais. -- Seu caráter tribal ... ......................... .. 162
. . II - Concepções análogas em outras sociedades in­
feriores.-Os deuses em Samoa.-O wakan dos
Sioux, o orenda dos Iroqueses, o mana na Mela­
Capítulo V-ORIGENS DESSAS CRENÇAS nésia. -Relações dessas noções com o totemis-
mo. -O A.rUnkulta dos Arunta .... ....... ...... .......... 193
.. .

I -Exame crítico das teorias III - Anterioridade lógica da noção de força impessoal
em relação às diferentes personalidades míticas.
I - Teorias que derivam o totemismo de uma reli­
-Teorias recentes que tendem a admitir essa
gião anterior: do culto dos antepassados (Wil-
anterioridade .......................................................... 201
ken e Tylor); do culto da natureza (Jevons). -
IV - A noção de força religiosa é o protótipo da no-
Crítica dessas teorias.............................................. 166
ção de força em geral ............................................ 206
II- Teorias que derivam o totemismo coletivo do to­
temismo individual. - Origens atribuídas por es­
sas teorias ao totem individual (Prazer, Boas, Hill
Capítulo VII - ORIGENS DESSAS CRENÇAS (final)
Tout). -Inverossimilhança dessas hipóteses. -
Razões que demonstram a anterioridade do to-
III - Génese da noção de princípio ou mana totémico
tem coletivo ........................................................... 171
III- Teoria recente de Prazer: o totemismo concepcio­ I - O princípio totémico é o clã, mas pensado sob
nal e local. -Petição de princípio em que ela re­ formas sensíveis. ....................................... . ... .... 209
. . ...

pousa. -O caráter religioso do totem é negado. II- Razões gerais pelas quais a sociedade é apta a
-O totemismo local não é primitivo . .................. 180
. despertar a sensação do sagrado e do divino. -
N- Teoria de Lang: o totem seria apenas um nome. A sociedade como potência moral imperativa; a
-Dificuldades para explicar desse ponto de vis- noção de autoridade moral. - A sociedade como
ta o caráter religioso das práticas totêmicas ......... 184 força que eleva o indivíduo acima de si mesmo.
V- Todas essas teorias somente explicam o totemis- - Fatos que provam que a sociedade cria o sa-
mo postulando noções religiosas que lhe seriam grado ............................................ ..................... 211
.

anteriores ............................................................... 186 III- Razões específicas às sociedades australianas. -


As duas fases por que passa alternadamente a
vida dessas sociedades: dispersão, concentra­
Capítulo VI - ORIGENS DESSAS CRENÇAS (cont.) ção. - Grande efervescência coletiva durante os
períodos de concentração. Exemplos. -Como a
II-A noção de princípio ou mana totémico idéia religiosa nasceu dessa efervescência. Por
e a idéia de força que a força coletiva foi pensada sob as formas
do totem: por que o totem é o emblema do clã.
I- A noção de força ou princípio totémico. - Sua
-Explicação das principais crenças totêmicas ..... 221
--·---- ·- -- ----- ------- ·

.• /IV- A religiã.o não é um produto do temor.-Ela ex­ Capítulo IX-A NOÇÃO DE ESPÍRITOS E DE DEUSES
prime algo de real. -Seu idealismo essencial. -
Esse idealismo é um caráter geral da mentalida­ I- Diferença entre a alma e o espírito. -As almas
de coletiva. - Explicação da exterioridade das dos antepassados míticos são espíritos, tendo
forças religiosas em relação a seus substratos. - funções determinadas. -Relações entre o espíri­
O princípio a parte equivale ao todo ................... 231 .
to ancestral, a alma individual e o totem indivi­
V- Origem da noção de emblema: o emblemaris­ dual. -Explicação deste último. -Sua significa-
mo, condição necessária das representações co­ ção sociológica ...... ................................................ 289
letivas. -Por que o clã tomou seus emblemas II- Os espíritos da magia .......... ......... .......................
.. 298
do reino animal e do reino vegetal....................... 239 ··
III- Os heróis civilizadores ...... ...................................
. 300
VI- Da inclinação do primitivo a confundir os rei- IV- Os grandes deuses. -Sua origem. -Sua relação
nos e as classes que distinguimos. - Origens com o conjunto do sistema totêmico. -Seu cará-
dessas confusões. -Como elas abriram caminho ter tribal e internacional ....... ......... .... ..................
.. 302
para as explicações científicas. - Elas não ex­ V- Unidade do sistema totêmico . . . .
. .. . . . . ... . ........ ....... .. 312
cluem a tendência à distinção e à oposição......... 245

LIVRO III
Capítulo VIII-A NOÇÃO DE ALMA AS PRINCIPAIS ATITUDES RITUAIS

I- Análise da idéia de alma nas sociedades austra- Capítulo I-O CULTO NEGATIVO E SUAS FUNÇÕES.
lianas 251
.............................. ...... . . . . . . . ...... ........ . . . . ... . .....
OS RITOS ASCÉTICOS
II- Gênese dessa noção.-A doutrina da reencarna­
ção segundo Spencer e Gillen: ela implica que a 1 - O sistema das interdições.-Interdições mágicas
alma é uma parcela do princípio totêmico. - e religiosas. Interdições entre coisas sagradas de
Exame dos fatos mencionados por Strehlow; espécies diferentes. Interdições entre sagrado e
eles confirmam a natureza totêmica da alma ........ 257 profano. -Estas últimas estão na base do culto
III- Generalidade da doutrina da reencarnação. - negativo. - Principais tipos dessas interdições;
Fatos diversos em apoio da gênese proposta .... 269
IV sua redução a dois tipos essenciais .. . . 318
..
. ...... .... .......

- A antítese da alma e do corpo: o que ela tem de II- A observância das interdições modifica o estado
objetivo. - Relações entre a alma individual e a religioso dos indivíduos. - Casos em que essa
alma coletiva. -A idéia de alma não é cronolo­ eficácia é particularmente evidente. -Eficácia
gicamente posterior à idéia de mana.................... 275 religiosa da dor.-Função social do ascetismo.... 327
V- Hipótese para explicar a crença na sobrevivência . 281 . .
III- Explicação do sistema das interdições: antago­
VI A idéia de alma e a idéia de pessoa; elementos
-
nismo entre o sagrado e o profano, contagiosi-
iffi
pessoais da personalidade ........................ . ...... 284
.
dade do sagrado . .. . ..
..... . .
..... . .
.... .337. ..... .... ............ .. ...

IV- Causas dessa contagiosidade. -Ela não pode ser


explicada pelas leis ela associação de idéias. -
Ela resulta da exterioridade das forças religiosas cerimônias em que eles são empregados para _

em relação a seus substratos. -Interesse lógico assegurar a fecundidade da espécie ..................... 379
dessa propriedade das forças religiosas ............... 342 II- Eles se baseiam no princípio: o semelhante pro­
duz o semelhante. -Exame da explicação dada
pela escola antropológica a esse princípio. - Ra­
Capítulo II-O CULTO POSITIVO zões que levam a imitar o animal ou a planta. -
Razões que levam a atribuir a esses gestos uma
,I I -Os elementos do sacrifício eficácia física. -A fé. - Em que sentido ela se
fundamenta na experiência. - Os princípios da
A cerimônia do Intichiuma nas tribos da Austrália magia nasceram na religião................................... 385
central. -Formas diversas que ela apresenta................ 349 III- O princípio precedente considerado como um
I- Forma Arunta. - Duas fases. -Análise da pri­ dos primeiros enunciados do princípio de cau­
salidade. -Condições sociais das quais este últi­
meira: visita aos lugares santos, dispersão de
mo depende. -A idéia de força impessoal, de
poeira sagrada, efusões de sangue. etc., para as-
segurar a reprodução da espécie totêmica .. . .. 351 . .. ...
poder, é de origem social. -A necessidade do
julgamento causal explicada pela autoridade
II- Segunda fase: consumo ritual da planta ou do
inerente aos imperativos sociais .... .. .... ................. 393
animal totêmicos.................................................... 358
III- Interpretação da cerimônia completa. - O se­
gundo rito consiste numa comunhão alimentar.
Capítulo IV-O CULTO POSITIVO (cont.)
-Razão dessa comunhão ......... ............ . ......... 361
. ... . ..

IV- Os ritos da primeira fase consistem em ablações.


III -Os ritos representativos ou comemorativos
-Analogias com as ablações sacrificiais. -O In­
tichiuma contém, portanto, os dois elementos I - Ritos representativos com eficácia física. -Suas
do sacrifício. -Interesse desses fatos para a teo- relações com as cerimônias anteriormente des­
ria do sacrifício ...... ............ ........... ......... . .... .. .......... 366 critas. -A ação que eles produzem é inteira-
V- Do pretenso absurdo das ablações sacrificiais. - mente moral ........................................................... 405
Como elas se explicam: dependência dos seres II- Ritos representativos sem eficácia física. - Eles
sagrados em relação a seus fiéis. - Explicação confirmam os resultados precedentes. - O ele­
do círculo no qual parece se mover o sacrifício. mento recreativo da religião; sua importância;
-Origem da periodicidade dos ritos positivos... 370 ..
suas razões de ser. -A noção de festa . .... ....... 410 .... .

III- Ambigüidade funcional das diferentes cerimônias


estudadas; elas se substituem mutuamente. -
Capítulo III-O CULTO POSITIVO (cont.)
Como essa ambigüidade confirma a teoria pro-
II-Os ritos miméticos e o princíç.io de causalidade posta 418
........................... . . . ............. ............................

I - Natureza dos ritos miméticos. - Exemplos de


Capítulo V - OS RITOS PIACULARES E A AMBIGÜIDADE humano da religião. - Da objeção que opõe a
DA NOÇÃO DO SAGRADO sociedade ideal e a sociedade real. Como se ex­
plicam, nessa teoria, o individualismo e o cos­
Definição do rito piacular .............................................. 425. mopolitismo religioso ............................................ 458
II- O que há de eterno na religião. - Do conflito
I - Os ritos positivos do luto. - Descrição desses ri-
entre a religião e a ciência; ele diz respeito uni­
tos ..... ... . .. .............. ........... .. . ..... ..... ...... ..... 426
camente à função especulativa da religião. -
. .. . . .. . . . . . . . .

II - Como eles se explicam. -Eles não são urna ma­ Em que essa função parece chamada a se trans-
nifestação de sentimentos privados. - A malda­ formar ...... ............. ........................... .............. .... 472
. . . ..

de atribuída à alma do morto tampouco é capaz III - Como pode a sociedade ser uma fonte de pen­
de explicá-los. - Eles dependem do estado de samento lógico, isto é, conceituai? Definição do
espírito no qual se encontra o grupo. - Análise
conceito; ele não se confunde com a idéia ge­
desse estado. - Como ele cessa através do luto. ral; caracteriza-se por sua impessoalidade, sua
- Mudanças paralelas na maneira como a alma comunicabilidade. - Ele tem uma origem coleti­
do morto é concebida .......... ......... .. ...................... 434 va. - A análise de seu conteúdo testemunha no
III - Outros ritos piaculares: em decorrência de um mesmo sentido. - As representações coletivas
luto público, de urna colheita insuficiente, de como noções-tipos das quais os indivíduos par­
uma seca de uma aurora austral. - Raridade ticipam. -. Da objeção segundo a qual elas só

desses rit s na Austrália. -Como eles se expli- seriam impessoais com a condição de ser verda­
cam ...................... .. ...................... .... ................... 442
. . . .
deiras. - O pensamento conceituai é contempo-
IV - As duas formas do sagrado: o puro e o impuro. râneo da humanidade....................... ... .......... ..... 479. . .

- Seu antagonismo. - Seu parentesco. - Arnbi­ IV - Como as categorias exprimem coisas sociais. -A
güidade da noção do sagrado. � Explicação categoria por excelência é o conceito de totalida­
dessa ambigüidade. - Todos os ntos apresen- de, que só pode ser sugerido pela sociedade. -
tam o mesmo caráter .............. ............ .................. 449
.
Por que as relações que as categorias exprimem
não podiam se tornar conscientes a não ser na
sociedade.-A sociedade não é um ser alógico.-
CONCLUSÃO Como as categorias tendem a se separar dos
agrupamentos geográficos determinados.
Em que medida os resultados obtidos podem ser ge- Unidade da ciência, de um lado, da moral e da
neralizados........ ............. ...... ....... ...... ......................... 457
. . . . .
religião, de outro. - Corno a sociedade permite
I - A religião apóia-se numa experiência bem fun­ compreender essa unidade. -Explicação do pa­
dada, mas não privilegiada. - Nece� sidade de pel atribuído à sociedade: sua potência criado­
uma ciência para apreender a realidade que ra. -Repercussões da sociologia sobre a ciência
fundamenta essa experiência. -Qual é essa rea­ do homem ....... ... . .. ............... ......
. . . ...... . .......... .
. . ... .. 488 ·__

lidade: os agrupamentos humanos. - Sentido


Notas ................... ................. ....................... . ..... .....
. . . . ... .. 499
INTRODUÇÃO
OBJETO DA PESQUISA
Sociologia religiosa e teoria do conhecimento

O 1996. Li1•rona Manins Fome.t Eduoro Luln..


Titulo origma/· lES FORMES ÉLÊMENT"ARES DE. LA V/E RE.LJG/J;USE.
Copynx/11
SdtJ Paulo. pma o prrMmr �içõo.

l!�i(ão 1996
4� tingem 1009

Tradução
PAIJW.VE\'E.S

Re\isio da tradu(io

Rnisão gráfica
&l1umlo Brmuliio

Saudm Rodrit"l'S Garria


CerrJ V«ehione
Produção gráfica

Paginação/Fotolitos
Gernltlo Afra
Propomo-nos estudar neste livro a religião mais pri­
S1mlfo J Dl'.J.em ·Qfrimemo l:.ditorwl mitiva e mais simples arualmente conhecida, fazer sua
análise e tentar sua explicação. Dizemos de um sistema

lnlem.'ldooais d< Calalogaçii o Publirnç'".., (CWI religioso que ele é o mais primitivo que nos é dado ob­
(Câm.1111 llmsilcira do Livro. SP, Brasil)
!}.Idos M

servar, quando preenche as duas condições seguintes: em

g t lê i
--0-u-
rlh-
.....
e- , êmile. 1858-1917.
, ., primeiro lugar, que se encontre em sociedades cu ja orga­
As forma..'\ clemcn1ares d:t vida reli ios a : o shtcmn o m co 11:1
nização não é ultrapassada por nenhuma outra em simpli­
Martin� Ponte,, 1996. - (Coleç ão Tópicos).
A u Mralm I Hm1lc Durkheim. traduç3o Paulo Ne'e�. São P..1ll lu
cidaclet; é preciso , além disso, que seja possível explicá-lo
T(mlo ongmal: Lc'! formC!'! élémenHures de la '1c rchg1eu,e.
sem fazer intervir nenhum elemento tomado ele uma reli­
ISBN 85-336-0515-3 gião anterior.
J, Religião e suciologin 2. Religião primitiva 3. To1cm 1�mo Faremos o esforço ele descrever a economia desse
Au,.1rt'ilia 1. T ít ul o. li. S�rie. sistema com a exatidão e a fidelidade de um etnógrafo
96-2404 CDD-306.6 ou de um historiador. Mas nossa tarefa não se limitará a
Índices para catálogo sistemático: isso. A sociologia coloca-se problemas diferentes daque­
les da história ou da etnografia. Ela não busca conhecer
1. To1cm1�111u : Religião . Soc1olog1a 306.6

Todos os direitos desw etfiçlio resenados à


as form as extintas da civilização com o único objetivo de
Uvraria Martins Follle., Editora Lida. conhecê-las e reconstituí-las. Como toda ciência positiva,
Rua Conselheiro Ra11111/ho. 330 01325-000 São Pmtfo SP Brasil
tem por objeto, acima de tudo, explicar uma realidade
atual, próxima de n ós , capaz port an co ele afetar noss as
Te/. (//)3241.3677 Fax (11) 3105.6993
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Vl AS FONMAS ELEAIENTANES DA \'/Dll lml.JGIOSA OBJETO DA PESQUISA VII

idéias e nossos atos: essa realidade é o homem e, mais de durar. S<.: não estivesse fundada na natureza das coisas,
especialmenLc, o homem de hoje, pois não há outro que ela reria encontrado nas coisas resistências insuperáveis.
estejamos mais interessados em conhecer bem. Assim, Assim, quando abordamos o estudo das religiões primiti­
não estudaremos a religião arcaica que iremos abordar. vas, é com a certeza de que elas pertencem ao real e o
pelo simples prazer de concar suas extravagâncias e sin­ exprimem; veremos esse princípio rerornar a t0do mo­
gularidades. Se a tomamos como objeto de nossa pesqui­ mento ao longo das análises e elas discussões a seguir, e o
sa é que nos pareceu mais apta que outra qualquer para que censuraremos nas escolas das quais nos separamos é
fazer encender a naLUrcza religiosa do homem, isto é, pa­ precisamente havê-lo desconhecido. Certamente, quando
ra nos revelar um aspecro essencial e permanente da hu­ se considera apenas a letra das fórmulas. essas crenças e
manidade. práticas religiosas p'.lrecem. às vezes. desconcertantes, e
Mas essa proposição não deixa de provocar forres podemos ser tentados a atribuí-las a uma espécie de aber­
ob1eçóes. Considera-se estranho que. para d1egar a co­ ração mtrínseca. Mas, debaixo do símbolo, é preciso sa­
nhecer a humanidade presente, seja preciso começar por ber atingir a realidade que ele figura e U1e dá sua signifi­
afastar-se dela e transportar-se aos começos da história. cação verdadeira. Os ritos mais bárbaros ou os mais extra­
Essa maneira ele proceder afigura-se como particularmen­ vagantes. os miros mais estranhos traduzem alguma ne­
te paradoxal na questão que nos ocupa. De fat0, costu­ cessidade humana, algum aspecto ela \'ida, seja indiYidual
mam-se atribuir às religiões um valor e uma dignidade ou social. As razões que o fiel concede a si próprio para
desiguais: diz-se, geralmente, que nem rodas contêm a justificá-los podem ser - e muitas vezes, de fato, são - er­
mesma parte de verdade. Parece, pois, que não se pode rôneas; mas as razões verdadeiras não deixam de exisúr;
comparar as formas mais elevadas do pensamento reli­ compete à ciência descobri-las.
gioso com as mais inferiores sem rebaixar as primeiras ao o fundo, portanto, não há religiões falsas. Todas
nível das s<.:gundas. Admitir que os cultos grosseiros das são verdadeiras a seu modo: todas correspondem, ainda
tribos australianas podem ajudar-nos a compreender o que de maneiras diferentes, a condições dadas da existên­
cristianismo, por exemplo, não é supor que este procede cia humana. Certamente não é impossível dispô-las se­
da mesma mentalidade, ou seja, que é feito das mesmas gundo uma ordem hierárquica. Umas podem ser superio­
superstições e repousa sobre os mesmos erros? Eis aí co­ res a outras, no sentido de empregarem funções mentais
mo a importância teórica algumas vezes atribuída às reli­ mais elevadas, ele serem mais ricas em idéias e em senti­
giões primitivas pôde passar por índice el e uma irreligio­ mentos, de nelas haver mais conceitos, menos sensações
sidade sistemática que, ao prejulgar os resultados ela pes­ e imagens, e ele sua sistematização ser mais elaborada.
quisa, os viciava ele antemão. Mas, por reais que sejam essa complexidade maior e essa
N�10 cabe examinar aqui se houve realmente estuclio- mais alta idealiclacle, das não são suficientes para classifi­
11� q111 111t·n�c<.:ram essa crítica e que fizeram da história e car as religiões correspondentes em gêneros separados.
11 1 • 1 1 111� :i il i;1 rl'I igiosa uma máquina de guerra contra a Todas são igualmente religiões, como todos os seres vivos
"li 1 111 l 1111111ln1.1so, ess<.: não poderia ser o ponto de são igualmente vivos, dos mais humildes plastídios ao ho­
1 1 1 1 11111 '" 11 •I• ·�·.< 1 < .< u11 deito, é um postulado essen- mem. Portanto, se no� diriginlos às religiões primitivas,
1 l1 1 1,, 1 1 'I''' 11111.1 1mtituiçào humana não pode não é com a idéia ele depreciar a religião de uma maneira
l 1 11 1 1 111• 11111.l, t:iso contrário não po- geral; pois essas religiões não são menos respeitáveis que
VIII AS FOR.IIAS ELE.\fE.VTARES DA VTDA RE!JG/OSA OBJETO DA PESQUISA rx

as outras. Elas correspondem às mesmas necessidades, rada à maneira ca11ec;iana, isto é, um conceito lógico, um
desempenham o mesmo papel, dependem das mesmas puro possível. construído P.elas forças do espírito. O que
causas; portanto, podem se1vir muito bem para manifestar devemos encontrar é uma realidade concreta que só a obser­
a natureza da vida religiosa e, conseqüentemente, para re­ vação histórica e etnográfica é capaz de nos revelar. Mas,
solver o problema que desejamos tratar. embora essa concepçào fundamental deva ser obtida por
proceclin1entos diferentes, continua sendo verdadeiro que
Mas por que conceder-lhes uma espécie de prerroga­ ela é chamada a ter uma influência considerável sobre to­
tiva? Por que escolhê-las de preferência a todas as demais da a série ele proposições que a ciência estabelece. A evo­
como objeto de nosso estudo? Isso se deve unicamente a lução biológica foi concebida de forma completamente di­
razões de método. ferente a partir do momento em que se soube da existên­
Em primeiro lugar, não podemos chegar a compreen­ cia de seres monocelulares. Assim também, o detalhe e.los
der as religiões mais recentes a não ser acompanhando na fatos religiosos é explicado diferentemente, conforme c;e
história a maneira corno elas progressivamente se compu­ ponha na origem da evolução o naturismo, o animismo ou
seram. A história, com efeito, é o único método de anãlise alguma outra forma religiosa. Mesmo os estudiosos mais
explicativa que é possível aplicar-lhes. Só ela nos permite especializados, se não pretendem limitar-se a uma tarefa
decompor uma instituição em seus elemenros consriniti­ de pura erudição, se desejam explicar os fatos que anali­
vos, uma vez que nos mostra esses elementos nascendo sam, são obrigados a escolher urna dessas hipóteses e nela
no tempo uns após os outros. Por outro lado, ao situar ca­ se inspirar. Queiram ou não, as questões que eles se colo­
da um deles no conjunto de circunstâncias em que se ori­ cam adquirem necessariamente a seguinte forma: de que
ginou, ela nos proporciona o único meio capaz de deter­ maneira o naturismo ou o animismo foram determinados a
minar as causas que o suscitaram. Toda vez, portanto, que adorar, aqui ou acolá, tal aspecto particular, a enriquecer­
empreendemos explicar uma coisa humana, tomada num se ou a empobrecer-se deste ou daquele modo? Uma vez
momento determinado do tempo - quer se trate de uma que não se pode evitar tomar um partido sobre esse pro­
crença religiosa, de uma regra moral, de um preceito jurí­ blema inicial, e uma vez que a solução que lhe é dada estã
dico, de uma técnica estética ou de um regime econômi­ destinada a afetar o conjunto da ciência, convém abordã­
co -, é preciso começar por remontar à sua forma mais lo frontalmente. É o que nos propomos fazer.
simples e primitiva, procurar explicar os caracteres através Aliás, inclusive sem considerar essas repercus�ões in­
dos quais ela se define nesse período de sua existência, fa­ diretas, o estudo e.las religiões primitivas tem, por si mes­
zendo ver, depois, de que maneira ela gradativamente se mo, um interesse imediato que é ele primeira importância.
desenvolveu e complicou, de que maneira tornou-se o Se, de fato, é útil saber em que consiste esta ou aque­
que é no momento considerado. Ora, concebe-se sem difi­ la religião particular, importa ainda mais examinar o que
culdade a importância, para essa série de explicações pro­ é a religião de uma maneira geral. É o problema que, em
gressivas, da determinação do ponto de partida do qual todas as épocas, tentou a curiosidade dos filósofos, e não
elas dependem. Era um princípio ca1tesiano que, no enca­ sem razão, pois ele interessa à humanidade inteira. Infe­
lk·amento das verdades científicas, o primeiro elo desem­ lizmente, o método que eles costumam empregar para re­
JH'll h.1 um papel preponderante. Claro que não se trata de solvê-lo é puramente dialético: limit am-se a analisar a
'11)111 .11 11.1 h;1�t· da ciência das religiões uma noção elabo- ic.léia que fazem da religião, quando muito ilustrando os
X AS FORMAS ELEMENTARES DA \'lDA RlllJGIOSA OBJETO DA PESQUISA Xl

resultados dessa análise com exemplos tomados das reli cios fo'.:is; confonne os homens, os meios, as circunstâncias,
gióes que realizam melhor seu ideal. Mas, se esse méroclo tanto as crenças como os.riras são experimentados de for­
eleve ser abandonado, o problema permanece ele pé e o mas diferentes. Aqui, são sacerdotes, ali, monges, alhures,
grande serviço que a filosofia prestou foi impedir que ele leigos: há místicos e racionalistas, teólogos e profetas, etc.
fosse prescriro pelo desdém cios eruditos. Ora, tal proble­ Em tais conc.liçôes, é difícil perceber o que é comum a to­
ma pode ser retomado por outras vias. Como todas as re- dos. Claro que se pode encontrar o meio de estuda r pro­
1 igiões são comparáveis, e como rodas são espécies de veitosamente, através de um ou outro desses sistemas, es­
um mesmo gênero, há necessariamente elementos essen­ te ou aquele faca particular que neles se acha especial­
ciais que lhes são comuns. Com isso. não nos referimos mente desenvolvido, como o sacrifício ou o profetismo, a
simplesmente ao� caracteres exteriores e visíveis que co­ vida monástica ou os mistérios: mas como descobrir o
das apresentam igualmente e que lhes pennicem dar, des­ fundo comum da vida religiosa sob a luxuriante vegeta­
de o inJCio da pesquisa, uma definiçào provisória, a des­ çao que a recobre? Como, sob o choque das teologias,
coberta desses signos aparentes é relativamente fácil, pois elas variações dos rituais. da mult iplicidade dos grupos, da
a obsef\·ação que exige não precisa ir além da superfície di\·ersitlade dos inc.li\'íduos, encontrar os estados funda­
das coisas. J\las as semelhanças exteriores supõem oucras, mentais característicos da mentalidade religiosa em geral?
que são profundas. Na base de todos os sistemas de cren­ Algo bem diferente ocorre nas sociedades inferiores.
ças e de todos os cultos, deve necessariamente haver um O menor desenvolvimento das individualidades, a menor
ce1to número de representações fundamentais e de atiru­ extensão do grupo, a homogeneidade das circunstâncias ex­
des rituais que, apesar da diversidade de fom1as que tanto reriores, tudo contribui para reduzir as diferenças e as va­
umas como outras puderam revestir, rêm sempre a mes­ riações ao mínimo. O grupo realiza, ele maneira regular.
ma significação objeriva e desempenham por roda parre uma uniformidade intelectual e moral cujo exemplo só ra­
as mesmas funções. São esses elementos permanentes ramente se encontra nas sociedades mais avançadas. Tu­
que constituem o que há de eterno e de humano na rdi­ do é comum a todos. Os movimentos são estereotipados;
gião; eles são o conteúdo objetivo da icléia que se expri­ todos executam os mesmos nas mesmas circunstâncias, e
me quando se fala e.la religião em geral. De que maneira, esse conformismo da conduta não faz senão traduzir o cio
portanto, é possível atingi-los? pensamento. Sendo todas as consciências arrastadas nos
Não, certamente, obse1vando as religiões complexas mesmos turbilhões, o tipo n
i dividual praticamente se con­
que aparecem na seqüência da história. Cada uma é for­ funcle com o tiro genérico. Ao mesmo tempo em que tu­
mada de tal variedade ele elementos, que é muito difícil do é uniforme, tudo é simples. Nada mais tosco que esses
distinguir nelas o secundário do principal e o essencial do mitos compostos ele u m mesmo e único tema que se re­
acessório. Que se pense em religiões como as do Egito, pete sem cessar, que esses ritos feitos ele u m pequeno nú­
da Índia ou ela Antiguidade clássica! É uma trama espessa mero ele gestos recomeçados interminavelmente. A imagi
de cultos múltiplos, variáveis com as localidades, com os nação popular ou sacerdotal não teve ainda rempo nem
templos, com as gerações, as dinastias, as invasões, etc. meios de refinar e transformar a matéria-prima das idéias
Nelas, as superstições popu lares estão mescladas aos dog­ e práticas religios..is; esta se mostra, portanto, nua e se
mas mais refinados. Nem o pensamento, nem a atividade oferece espontaneamente ã obse1vação, que não precisa
rdigiosa encontram-se igualmente distribuídos na massa mais que um pequeno esfo rço para descobri-la. O acessó-
XII AS FORMAS ELEMENTA R!JS DA l 'lDA Rl:.VG/0.SA OBJETO DA PESQU/SA Xlll

rio, o secunJário, os desenvolvimentos de luxo não vie­ mcsm.1 razão que a descoberta dos seres monocelulares,
ram ainda ocultar o principal2. Tudo é reduzido ao indis­ de que falávamos há pouco, transformou a idéia que se
pensável, àquilo sem o que não poderia haver religião. fazia correntemente da vida. Como nos seres muito sim­
Mas o indispensável é também o essencial, ou seja, o que ples a vida se reduz a seus traços essenciais. estes dificil­
acima de tudo nos importa conhecer. mente podem ser ignorados.
As civil izações primitivas constituem, portanto, casos Mas as religiões primitivas não permitem apenas des­
privilegiados, por serem casos simples. Eis por que, em tacar os elememos constitutivos da religião; têm também
todas as ordens de fatos. as observações dos etnógrafos a grande vantagem de facilitar sua explicação. Posto que
foram com freqüência verdadeiras revelações que renova­ nelas os fatos são mais simples, as relações entre os faros
ra m o estudo das instituições humanas. Por exemplo. an­ são também mais evidentes. As razões pelas quais os ho­
tes da metade do século XIX. todos estavam convencidos mens explicam seus atos não foram ainda elaboradas e
de que o pai era o elemento essencial da família; não se desnaturadas por uma reflexão erudita; estão mais proXJ­
concebia sequer que pudesse haver uma organização fa­ mas, mais chegadas às motivações que realmente deter­
miliar cuja pedra a ngular não fosse o poder paterno. A minaram esses atos. Para compreender bem um delírio e
descobe11a de Bachofen veio derrubar essa velha concep­ poder aplicar-Lhe o trntamento mais aprop1iado, o médico
ção. Até tempos bem recentes, considerava-se evidente tem necessidade de saber qual foi seu ponto de partida.
que as relações morais e jurídicas que constituem o pa­ Ora, esse acontecimento é tanto mais fácil de discernir
rentesco fossem apenas um outro aspecto das relações fi­ quanto mais se puder observar tal delírio num período
siológicas que resultam da comunidade ele descendência; próximo de seu começo. Ao contrário, quanto mais a doen­
Bachofen e seus sucessores, Mac Lennan, Morgan e mui­ ça se desenvolve no tempo, mais ela se furta à observa­
tos outros, estavam ainda sob a influência desse precon­ ção: é que, pelo caminJ10, uma série de interpretações in­
ceito. Desde que conhecemos a natureza do clã primitivo, tervieram, tendendo a recalcar no inconsciente o estado
sabemos, ao contrário, que o parenresco não poderia ser original e a substituí-lo por outros, através cios quais é di­
definido pela consangüinidade. Para voltarmos às rel i ­ fícil às vezes reencontrar o primeiro. Entre um delírio sis­
giões, a simples consideração das formas religiosas que tematizado e as impressões primeiras que lhe deram ori­
nos são mais familiares fez acreditar durante muito tempo gem, a distância é geralmente consideráve l . O mesmo va­
que a noção de deus era característica de tudo o que é rc- le para o pensamento religioso. À medida que ele progri­
1 igioso. Ora, a religião que estudaremos mais adiante é, de na história, as causas q u e o chamaram à existência,
em grande parte, estranha a toda idéia de divindade; as embora sempre permanecendo ativas, não são mais per­
forças às quais se dirigem seus ritos são muito diferentes cebidas, senão através de u m vasto sistema de imerpreta­
daquelas que ocupam o primeiro lugar em nossas reli­ ções que as deformam. As mitologias populares e as sutis
giões modernas; não obstante, elas nos ajudarão a melhor teologias fizeram sua obra: sobrepuseram aos sentimentos
compreender estas últimas. A5sim, nada mais injusto que primitivos sentimentos muito diferentes que, embora liga­
o desdém que muitos historiadores conservam ainda pe­ dos aos primeiros, dos quais são a forma elaborada, só
los trabalhos dos etnógrafos. É certo, ao contrário, que a imperfeitamente ddxam transparecer sua natureza verda­
etnografia determinou muitas vezes, nos diferentes ramos deira. A distância psicológica entre a causa e o efeito, en­
da sociologia, as mais fecundas revoluções. Aliás, é pela tre a causa aparente e a causa efetiva, tomou-se mais con-
XIV AS FO!ll/AS ElElfEKlilRES DA l 7DA REIJGlO.'iA UB}/:,70 DA PESQLl.'>A

sid1:rán:I L mais difícil dL p1.:rcorrer par,1 o espírito. O dc­ çõcs :i natureza faz espontaneamente c;implific."1çôe" do
mesmo ripo no inicio da. h1stóna. Querema:. apenas tmir
senvoh·imcnto desra obra será uma ilustração e uma veri­
proveito delas. E claro que só poderemos atingir. por esse
ficação dessa observação metodológica. \'cremos de que
maneira, nas religiões primitivas, o fato religioso traz ain­ método, fatos muito elementares. Quando, na medida do
possível, os tivermos atingido, ainda assim não estarão
da visível a marca de suas origens: bem mais difícil nos
Leria sido inferi-las com base na simples consideração das explicadas as novidades de Lodo tipo que se produziram
na seqüência ela evolução. Mas, se não pensamos em ne­
religiões mais desenvolvidas.
gar a importância dos problemas que elas colocam, j u lga­
O esLudo que empreendemos é, portanro, uma ma­
mos que tais problemas ganham em ser tratados na sua
neira de retomar. mas em condições novas, o velho pro­
blema da origem das religiões. Se. por origem, entende-se de\ ida hora, e que há inte resse em abord{l-los somenLe

um primeiro comeco absoluto, por certo a questão nada depois daqueles CU JO csLUdo iremos empreender.

cem de cientifica e de\ e ser resolutamente descartada.


'Ião há um instante radical em que a religião Lenha come­
LI
çado a existir, e não se Lmta de encontrar um exped icnLc
que nos permita transportar-nos a ele cm pensamenLO.
Como toda instituição humana, a religião não começa em Mas nossa pesquisa não interessa apenas à ciência
elas religiões. Toda religião, com efeito, tem um lado pelo
parte alguma. Assim, LOdas as especulações desse gênero
qu al vai além do círculo das idéias propriameme religio­
são justamente desacreditadas; só podem consislir cm
construçôes subjetivas e arbitrárias que não comportam sas e, sendo assim, o estudo dos fenômenos religiosos

controle de espécie alguma Bem diferente é o problema fornece um meio de renovar problemas que até agora só
foram debatidos entre filósofos.
1 lá muito
que colocamos. Gostaríamos de encontrar um meio de
-;e sabe que os primeiros sistemas de repre­
discernir .is causas. sempre presentes. de que dcpcmkm
as formas mais essenciais do pensamento e da práLica reli­ sentações que o homem produziu do mundo e de s1 pró­
prio sào de origem religiosa. Não há religião que não seja
giosa. Ora, pelas razões que acabam de ser expostas, es­
uma cosmologia ao mesmo tempo que uma especulação
sas causas �
. ão mais facilmente observáveis quando as so­
ciedades em que as observamos são menos complicudas. sobre o divino. Se a filosofia e as ciências nasceram da re­

Eis por que buscamos nos aproximar das origensi. Não ligião, é que a própria religião começou por fazer as ve­
zes de ciências e de filosofia. Mas o que foi menos notado
que pretendamos atribuir às religiões inferiores v i r L u des
particulares. Pelo contrário, elas são rudimentares e gros­ é que ela não se limitou a e n r iquecer com um certo nú­
mero de icléias um espírito humano previamente forma­
seiras; não é o caso, po1i.anto, de fazer delas modelos que
do; também contribuiu para formar esse espírito. Os ho­
as religiões posLeriores apenas teriam reproduzido. Mas
mens não lhe de\'em apenas. cm parte notáve l. '.l matéria
M.: u próprio aspecto grosseiro as toma instruti\ as, poi:;,
deste modo, elas constiLUem experiências cômodas em de seus conhecimentos, mas igualmente a forma segundo

que os fatos e suas relações são mais fáceis de perceber. a qual esses conhecimentos sào elaborados.
Na raiz de nc �sos julgamentos, há um certo número
O físico, pam descobrir as leis dos fenômenos que estuda,
procura simplificar esses últimos, desembaraçá-los de de noções essenciais que dominam toda a nossa vida in­
telectual; são aquelas que os filósofos. desde Ariscóccles,
seus caracteres secundários. 'o que concerne às institui-
XVl AS FORMAS ELEMEi\TARES DA \IDA RELIGIOSA e 1/1}1;70 DA PESQWSA XVII

chamam de categoriac; do entendimento: noçôcs de tem­ mos atr.l\'és de marcas objetiva<;, um tempo que não seria
po, de e:.paço-•. de gêncro. de número, de causa, de subs­ uma sucessão de anos. me.ses, semanas, dias e horas! Se­
tância, de personalidade. etc. Elas correspondem às pro­ ria algo mais ou menos impensável. Só podemos conceber
priedades mais universais das coisas. São como quadros o tempo se nele distinguirmos momentos cliferemes. Ora,
sólidos que encerram o pensamento; este não parece po­ qual é a origem dessa diferenciação? Certamente os esta­
der libertar-se deles sem se destruir, pois tudo indica que dos de consciência que já experimentan1os podem repro­
não podemos pensar objetos que não estejam no tempo duzir-se em nós, na mesma ordem em que se desenrola­
ou no espaço, que não sejam numeráveis, etc. As outras ram primitivamente; e, assim, porções de nosso passado
noções são contingentes e móveis; concebemos que pos­ voltam a nos ser presentes, embora distingu indo-se espon­
sam faltar a um homem, a uma sociedade, a uma época, taneamente do presente. Mas, por importante que seja es­
enquanto aquelas nos parecem quase inseparáveis do sa distinção para nossa experiência privada, ela está longe
funcionamento normal do e:.pírito. São como a o:.satura de bastar para constituir a noc,;ào ou categoria de tempo.
da inteligência. Ora, quando analisamos metodicamente Esta não consiste simplesmente numa comemoração, par­
as crenças religiosas primitivas, encontramos naturalmen­ cial ou integral, de nossa vida transcorricla. É um quadro
te em nosso caminho as principais dessas categorias. Elas abstrato e impessoal que envolve não apenas nossa exis­
nasceram na religião e da religião, são um produto do tência individual, mas a ela humanidade. É como um pai­
pensamento religioso. É uma constatação que haveremos nel ilimitado, em que toda a duração se mostra sob o olhar
de fazer várias vezes ao longo desta obra. do espírito e em que todos os acontecimentos possíveis
Essa observação possui já um interesse por si pró­ podem ser situados em relação a pontos de referência fi­
pria; mas eis o que lhe confere seu verdadeiro alcance. xos e determinados. l\ão é o meu tempo que está assim
A conclusão geral do livro que se irá ler é que a reli­ organizado; é o tempo tal como é objetivamente pensado
gião é uma coisa eminentemente social. As reprec;entações por todos os homens de uma mesma ci\'ilizaçào. Apenas
religiosas são representações coletivas que exprimem rea­ isso já é suficiente para fazer entrever que uma tal organi­
lidades coletivas; os ritos são maneiras de agir que só sur­ zação deve ser coletiva. E, ele fato, a observação estabele­
gem no interior de grupos coordenados e se destinam a ce que esses pontos de referência indispensáveis, em rela­
suscitar, manter ou refazer alguns estados mentais desses ção aos quais todas as coisas se classificam temporalmen­
grupos. Mas, então, se as categorias são de origem religio­ te, são tomados da vida social. As divisões em dias, sema­
sa, elas devem participar da natureza comum a todos os nas, meses, anos, etc., correspondem à periodicidade dos
fatos religiosos: também elas devem ser coisas sociais, ritos, das festas, elas cerimônias públ icas;. Um calendário
produtos cio pensamento coletivo. Como, no estado atual exprime o ritmo ela atividade coletiva, ao mesmo tempo
de nossos conhecimentos desses assuntos, devemos evitar que tem por função assegurar sua regularidacleú.
toda tese radical e exclusiva, pelo menos é legítimo supor O mesmo acontece com o espaço. Como demonstrou
que sejam ricas em elementos sociais. Hamelin", o espaço não é esse meio vago e indetermina­
Aliás, é o que se pode, desde já. entrever para algu­ do que Kant havia imaginado: puramente e absolutamen­
mas delas. Que se tente, por exemplo, imaginar o que se­ te homogêneo, ele 1 . ão serviria para nada e sequer daria
ria a noção de tempo, se puséssemos de lado os procedi­ ensejo ao pensamento_ A representação espacial consiste
mentos pelos quais o dividimos, o medimos, o exprimi- essencialmente numa primeira coordenação introduzida
xvrn AS FORMAS ELEME!VTARES DA 17011 RELIGIOSA OBJETO DA Pt:SQUISA XIX

entre os dados da experiência sensível. Mas essa coorde­ te qu.1rteirões do mundo está cm íntima relação com um
nação seria impossível se as partes do espaço se equiva­ qua1teirão do pueblo, isto é, com um grupo de clãs10. "As­
lessem qualitativamente, se fossem realmente intercambiá­ sim, diz Cushing, uma divisão eleve estar em relação com
veis umas pelas ouu·as. Para poder dispor espacialmente o norte; uma outra representa o oeste, uma terceira o
as coisas, é preciso poder situá-las diferentemente: colo­ sul•t. etc." Cada qua1teirão do pueblo tem sua cor caracte­
car umas à direita. outras à esquerda. estas em c i m a . rística que o simboliza; cada região cio espaço tem a sua,
aquelas embaixo. a o norce ou a o sul, a leste ou a oeste. que é exatamente a cio quarteirão correspondente. Ao lon­
etc., do mesmo modo que. para dispor temporalmente os go da história, o nú mero de clàs fundamentais variou; o
estados da consciência. cumpre poder localizá-los em da­ número de regiões variou da mesma maneira. Assim, a or­
tas determinadas. Vale dizer que o espaço não poderia ser ganização social foi o modelo da organização espacial.
ele próprio se. assim como o tempo. não fosse d1nd1do e
diferenci..tdo. Mas essas cfü isões. que lhe �ào csscnci.tis,
que é uma espécie de decalque da primeira. Até mesmo a
distmçao de d1rc1ta e esquerda, longe de estar implicada
de onde provêm? Para o espaço mesmo. não há direita na natureza do homem em geral. é muito provavelmente o
nem esquerda, nem alto nem baL-..:o, nem norte nem sul. produto de representações religiosas, portanto coletivas 12.
Todas essas distinções provêm. evidentemente, de terem Mais adiante serão encontradas provas análogas rela­
sido atribuídos valores afetivos diferentes às regiões. E tivas às noções de gênero, de força, de personalidade, de
como todos os homens de uma mesma civilização repre­ eficácia. Pode-se mesmo pergu ntar se a noção de contra­
sentam-se o espaço da mesma maneira, é preciso, eviden­ dição não depende, também ela, de condições sociais. O
Lernente, que esses valores afetivos e as distinções que que leva a pensar assim é que a influência que ela exer­
deles dependem lhes sejam igualmente comuns; o que ceu sobre o pensamento variou segundo as épocas e as
implica quase necessariamente que tais valores e distinçõe::. sociedades. O princípio de identidade domina hoje o
são de origem sociaJH. pensamento científico; mas há vastos sistemas de repre­
P or sinal há casos em que esse caráter social tornou­
,
sentações que desempenharam na história elas idéias um
se manifesto . Existem sociedades na Austrália ou na Amé­ papel considerável e nos quais ele é freqü entemente igno­
rica do Norte em que o espaço é con cebido sob a forma rado: são as mitolog ias , desde as mais grossei ras alé as
de u m círculo imenso, porque o próprio acampamento mais ela boradas •3. Elas tratam sem parar de seres que têm
tem um a forma circular9, e o círcu lo es pacial é exatamen­ simu ltaneamente os atributos mais contraditórios, que são
te dividido como o círcu lo triba l e à imagem deste úllimo. ao mesmo tempo unos e m úl tiplos , materiais e espi riluais ,

Distinguem-se tantas regiões q uantos são os clãs da tribo, que pod em subdividir-se indefinidamente sem nada per­
e é o l ugar ocupado pel os clàs no interior cio acampa­ der daqui lo que os constitui; em m itolog ia , é um axioma
mento que determina a orientação das reg iões. Cada re­ a parte equivaler ao todo. Essas variações a que se sub­
gião d efine-se pelo tOLem do clã ao qu al ela é destinada. meteu na história a regra que parece governar nossa lógi­
Entre os zufi i , por exempl o , o pueb/o compreen d e sete ca atual provam que, longe de estar inscrita desde roda a
quarteirões; cada um deles é um grupo ele clãs que teve eternidade na constituição mental cio homem, essa regra
sua unidade: com toda a certeza, havia primitivamente depende, pelo menos em parte, de fatores h istóricos, e
um único clã que depois se subdividiu. Ora, o espaço portanto sociais. N ão sabemos exatamente q u e fatores
compreen de igualmente sete regiões e cada um desses se- são esses, mas podemos presumir que existemH.
XX AS FORMAS ELEllE\TARES DA �?DA RELIGIOSA OB]ETO DA PESQl ISA XXI

L'ma \"CZ admitida essa hipótese. o problema <lo co­ úiferente do que são, de reprc-.entá-las como ...e tr.inscor­
nhecimento coloca-se em novos tem1os. ressem numa ordem distinta daquela na qual se produzi­
Alé o presente, duas doutrinas apenas haviam se de­ ram. Diante delas, nada nos prende, enquanto considera­
frontado. Para uns, as categorias não podem ser derivadas ções ele um outro gênero não intervierem. Eis, porta nto,
da experiência: são logicamente anteriores a ela e a con­ dois ti pos de conhecimentos que se encontram como que
dicionam. São representadas como e.lados simples, irredu­ nos dois pólos contrários da inteligência. Nessas condições,
tíveis, ima nentes ao espírito humano em virtude de sua submeter a razão à experiência é fazê-la desaparecer, pois
constituição natural. Por isso se diz dessas categorias que é reduzir a universalidade e a necessidade que a caracteri­
elas são CI priori. Para outros, ao contrário, elas seriam zam a serem apenas puras aparências, ilusões que, na prá­
construídas. feitas de pecas e pedaços. e o indivíduo é tica. podem ser cômo<las, mas que a nada corrc<>pondem
que seria o operário dessa constmcão1s. nas coisas: conseqüentemente. é recusar toda realidade
..\las ambas as soluçóes le,·antam graves dificuldades. obiem·a à ,·ida lógica que as categonas têm por função re­
Adotaremos a tese empirista? Então, cumpre retirar gular e organizar. O empirismo clássico conduz ao irracio­
das categorias todas as suas propriedades características. nalismo; talvez até seja por esse último nome que conve­
Com efeito, elas "e distinguem de Lodos os outros conhe­ nha designá-lo.
cimenLos por sua u niversalidade e sua necessidade. Ela:-. Os aprioristas, apesar cio sentido ordinariamente as­
são os conceitos mais gerais que existem, já que se apli­ sociado às denominações, são mais respeitosos com os fa­
cam a todo o real e, mesmo não estando ligadas a alg um tos. j á que não ad mitem como verdade evide nte que as
objeto particular, são independentes ele todo sujeito indi­ categorias são feitas cios mesmos elementos que nossas
vidual: são o lugar-comum em que se encontram todos os representações sensíveis, eles não são obrigados a empo­
espíritos. Mais: estes se encontram necessariamente a í , brecê-las sistematicamente, a esvaziá-las de todo conteú­
pois a rnzão. que não é outra coisa senão o conjunto das do real. a reduzi-las a er apenas artifícios Yerbais. Ao
cacegorias fundamentais, é investida de uma autoridade à contrário, conservam todas as características especificas
qual não podemos nos furtar à vontade. Quando tenta­ delas. Os aprioristas são racionalistas; crêem que o mun­
mos insurgir-nos contra ela, l ibertar-nos de algumas des­ do tem um aspecto lógico que a razão exprime eminente­
sas noções essenciais, deparamo-nos com fortes resistên­ mente. Mas, para isso, precisam atribuir ao espírito u m
cias. Portanto, elas não apenas não dependem de nós, co­ certo poder d e ultrapassar a experiência, ele acrescentar
mo também se impõem a nós. Ora, os dados empíricos algo ao que lhe é imediatamente dado; ora, desse poder
apresentam características diametralmente opostas. Uma singular, eles não dào explicação nem j ustificaç ão . Pois
sensação, uma imagem se relacionam sempre a um objeto não é explicar dizer apenas que esse poder é inerente à
clete1minaclo ou a uma coleção de objetos desse gênero e natureza da inteligência humana. Seria preciso fazer en­
exprimem o estado momenrâneo de uma consciência par­ tender ele onde tirnmos essa surpreendente prerrogativa e
ticular: elas são essencialmente individuais e subjetivas. de que maneira podemos ver. nas coisas, relações que o
Assim, podemos dispor. com relativa liberdade. das repre­ espetáculo das coisas não poderia nos revelar. Dizer que
sentações que têm essa origem. É claro que, quando nos­ a própria experiência só é possível com essa condição, é
sas sensações são atuais, elas se impõem a nós de fato. talvez deslocar o problema, não é resolvê-lo. Pois se trata
Mas, de direito, temos o poder ele concebê-las de maneira precisamente de saber por que a experiência não se bas-
XXJI AS FO!ll/AS ELE.lfE\TARES DA l 1DA RE
LIGIOSA OBJETO DA PF.5Ql ISA XXJ J [

ta. mas supúe condii,-ües qlll: lhe :;ào 1::xteriures e anterio­ te1- pda narurcza psíquica do indivíduo. Ao contrário. -,e
res. e de que m aneira essas condicões são realizadas as categorias são, como pensamos. representações essen­
quando e como convém. Para responder a essas questões, cialmente coletivas, elas traduzem ames de tudo estados
imaginou-se às vezes, ror cima das razões individuais, da coletividade: dependem da ma neira como esta é cons­
uma razão superior e perfeita da qual as primeiras emana­ tiruída e organizada, de sua morfologia, ele suas institui­
riam e na qual conservariam, por uma espécie de partici­ ções religiosas morais, econômicas, etc. Há, po1tanto, en­
,

pação mística, sua maravilhosa faculdade: é a razão divi­ tre essas duas espécies ele representações toda a d istância
na. Mas essa hipótese tem, no minimo, o grave inconve­ que separa o individual do social, e não se pode mais de­
niente de suhtrair-se a todo controle exrerim ental; não riva r as segundas das primeiras. como tampouco se pode
satisfaz portanto às condições requeridas ele uma hipótese deduzir a sociedade elo indivíduo. o rodo da parte, o
ciencífica Além disso. as categorias do pensamento huma­ complexo do simples18. A sociedade é uma realidade sui
no jamais são fixadas de uma fom1a definida; elas se fa­ ge11eris; tem i>Uas características próprias que nào se en­
contram, ou que não se encontram da mesma fonna. no
resto do uni\ erso. As representações que a exprimem
zem. se desfazem. se refazem permanencemence; mudam
conforme os lugares e as épocas. A razão divina , ao con­
trário, é imutável. De que modo essa imutabilidade pode­ têm, portanto, um conteúdo completamence distinto das
representações puramente individuais, e podemos estar
ce1tos ele antemão de que as pri meira s acrescentam algo
ria exp licar essa incessante variabilidade?
Tais são as duas concepções q u e há séculos se cho­
cam uma contra a outra; e, se o debate se eterniza, é q u e às segundas.
n a verdade o s argumentos trocados s e equivalem sensi­ A maneira como ambas se formam acaba por diferen­
velmente. Se a razão é apenas uma forma da experiência ciá-las. As representações coletivas �ão o produto de uma
individual, não existe mais razão. Por outro lado. se reco­ imensa cooperação que se estende não apenas no espaço,
nhecemos os poderes que ela se atribui. mas sem justifi­ mas no tempo� para criá-las. uma multidão de espíritos di­
cá-los, parece que a colocamos fora da natureza e da ciên ­ versos associou, misrurou, combinou suas idéias e seus
cia. Em presença dessas objeções opostas, o espírito per­ sentimentos; longas séries ele gerações nelas acumularam
manece incerto. Mas, .se admitirmos a origem social das sua experiência e seu saber. Uma intelectualidade muito
categorias. uma nova atitude torna-se possível, atitude particular, infinitamence mais rica e mais complexa que a
do indivíduo, encontra-se po1tanco como que concentrada
aí. Compreende-se, assim, ele que maneira a razão cem o
que permitiria, acreditamos nós, escapar a essas dificulda­
des contrári as .
A proposição fundamental do ap riorismo é que o co­ poder de ultrapassar o alcance dos conhecimentos empíri­
nhecimento é formado de duas espécies de elementos ir­ cos. Não eleve isso a uma virtude misteriosa qualquer, mas
redutíveis um ao outro e como que ele duas camadas dis­ simplesmente ao fato de que, segundo uma fórmula co­
tintas e superpostasio. l\oi>sa hipótese mantém integral­ nhecida, o homem é duplo. Jiá dois .seres nel1:: um ser in­
mente esse princípio. De fato. os conhecimentos que cha­ dividual. que tem sua base no organismo e cujo círculo de
mamos empíricos, os únicos que os teóricos do empiris­ ação se acha. por isso mesmo. estreitamente limitado, e
mo utilizaram para construir a razão, são aqueles que a um ser social. que representa em nós a mais elevada reali­
ação direta dos objetos suscita em nossos espíritos. São. dade, na ordem intelectual e moral, que podemos conhe­
pm1:111to, estados individuais, que se explicam inteiramen- cer pela observação, quero dizer, a sociedade. Essa duali-
XXIV AS FO/l\/AS ELEMENTARES DA VIDA REUGJOSA OBJETO PESQl7SA
DA XXV

dade de noi>i>a natureza tem por conseqüência, na ordem mesmo em nosso foro inrerior, liberrar-nos dessas noções
prática, a irredutibilidade do ideal moral ao móbi l utilitá­ fundamentais, sentimos que não somos completamente li­
rio, e, na ordem do pensamento, a irredut ibili dade da ra­ vres, que algo resiste a nós, dentro e fora de nós. Fora de
zão ã expe riên cia individual. a medida em que p artici pa nós, há a opinião que nos julga; mas, alé m disso. como a
da sociedade, o indivíduo naturalmente ultrapassa a si soci eda de é também represe nta da em nó s , ela se opõe
mesmo, seja qu a ndo pensa, seja qua ndo age. desde dentro de nós a essas veleidades revolucioná rias;
Esse mesmo caráter social permite compreender de temos a impressão ele não podermos nos ent reg ar a elas
onde vem a necessidade das cat egorias . Diz-se de uma sem que nosso pensamento deixe ele ser um pensamento
idéia que ela é necessária quando, po r uma espécie de ve rd a dei ra me nte humano. Tal parece ser a o rigem da au ­
virtude interna, impõe-se ao esp írito sem ser acompanha­ toridade muito especial inerente à ra z ão e que nos faz
da de nenhuma prova. Há, portanto, nela, algo que obri­ aceitar com contiança suas sugestões. É a autoridade da
ga a in te ligência , que conquista a adesão, sem exame pré­ sociedade mesmat9, comunicando-se a certa::. maneira::. de
vio. Essa eficácia singular, o apriorismo a postula, mas pensar que são como as condições indispensáveis de toda
sem se dar conta disso, pois dizer que as categorias são ação comum. A necessidad e com que as categorias se im­
necessárias por serem ind ispensáveis ao funcionamento põem a nós não é, portanto, o efeito de s i mpl es hábitos
do pensamento, é s imp lesmente repetir que são necessá ele cujo domíni o po deríamos nos desvencilha r com um
rias. Mas se elas têm a origem que lh es atribuímos, não há pouco ele esforço; não é também uma necessidade física
nada mais que surpreenda em sua autoridade. Com efei­ ou metafísica, já q u e as categorias mudam conforme os
to, elas exprimem as relações mais gerais que existem e n­ lugares e as épocas: é uma espécie particu l ar de necessi­
tre as coisas; ultrapassando em extensão todas as nos sas dade moral que está pa ra a vida intelectual assim como a
outras noções, dominam LOdo deta lhe de nossa vida inte­ obrigação moral eslá para a vontade20 .
lecrual. Se, portanto, a cada momento do tempo, os ho­
mens não se entendessem acerca dessas idéias essenciais, Mas, se as categorias não traduzem originalmente se­
se não tivessem uma concepção homogénea do tempo, não estados sociais, não se segue daí que elas só podem
do espaço, da causa. do número, etc., toda concordância aplicar-se ao resto da natureza a título de metáforas? Se
se tornaria impossível entre as inteligências e, por conse­ elas são feiras unicamen te para exprimir coisas sociais,
guin te toda vida em comum. Assim a sociedad e não po­
, ,
parece que não pod eriam ser estendidas aos outros rei nos
de abandonar as categorias ao livre arbítrio dos part icul a­ a não ser por convenção. Assim, na me di da em que nos
res sem se abandonar ela própria. Para poder viver, ela servem para pensar o mundo físico ou biológico só po­
,

nã o necessita apenas de um suficiente conformismo mo­ deriam ter o valor ele símbolos artificiais, talvez úteis n a
ral: há um mínimo de co nformismo lógico sem o qual ela prálica, mas sem relação com a realidade. Po1tanto retor­
também não pode passar. Por essa razão, ela pesa com naríamos, por outra via, ao nominalismo e ao empirismo.
toda a sua autoridade sobre seus membros a fim de pre­ J\las interpretar dessa maneira uma teoria sociológica
venir as d i ss id ê nci as. Se um e sp í rito infringe osten s iva - do conhecimento é esquecer que, se a sociedade é uma
11wn1e essas normas do pensamento, ela não o considera realidade específic;,, ela não é, porém, um império dent ro
1 1 1.11• 1 1 1 1 1 espírito humano no sentido pleno da palavra, e d e u m império: ela faz pa rte da nan1reza, é sua manifesta­
1 1 1 1 1 " 1 · 1 1 1 con fo rm i dade Por isso, q uand o r entam os
. ,
ção mais e levada O reino social é um rei no natural que
.
XXVI AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RbLIGIOSA OBJETO DA PESQUTSA XXVII

não difere dos outros, a não ser por sua maior complexi­ empirismo não poderiam vencer. Pois elas aparecem, en­
dade . Ora, é impossível que a natureza, no que tem de tão , não mais como noçõ�s muito simples que qualquer
mais essencial, seja radicalmente diferente de si mesma um é capaz de extrair de suas observações pessoais e que
aqui e ali. As relações fundamentais que existem entre as a imaginação popular desastradamente teria complicado,
coisas - justamente aquelas que as categorias têm por mas , ao contrário , como hábeis instrumentos de pensa­
função exprimir - não poderiam, portanto, ser essencial­ mento, que os grupos humanos laboriosamente forjaram
mente dessemelhantes conforme os reinos. Se, por razões ao longo elos séculos e nos quais acumularam o melhor
que teremos de investigar2 1 , elas sobressaem de forma de seu capital intelectua[24. Toda uma parte da história da
mais evidente no mundo social, é impossível que não se humanidade nelas se enc.ontra como que resumida. Vale
encontrem alhures, ainda que sob formas mais encober­ dizer que, para chegar a compreendê-las e julgá-las, cum­
tas. A sociedade as torna mais manifestas, mas ela não pre recorrer a omros procedimentos que não aqueles uti­
tem esse privilégio. Eis aí como noções que foram elabo­ lizados até o presente. Para saber de que são fe itas essas
radas com base no modelo elas coisas sociais podem aju­ concepções que não foram criadas por nós mesmos , não
dar-nos a pensar coisas de outra natureza. Se essas noções, poderia ser suficiente interrogar nossa consciência: é para
quando assim desviadas de sua significação primeira, de­ fora de nós que devemos olhar, é a história que devemos
sempenham num certo sentido o papel de símbolos, são observar, é toda uma ciência que é preciso instituir, ciên­
símbolos bem-fundados. Se, pelo simples fato de serem cia complexa, que só pode avançar lentamente, por um
conceitos construídos, há aí um artifício, é um artifício trabalho coletivo, e para a qual a presente obra traz, a tí­
que segue de perto a natureza e que se esforça por apro­ tulo ele ensaio, algumas contribuições fragmentárias. Sem
ximar-se dela cada vez mais22. Po1tanto, do fato de as icléias fa zer dessas questões o objeto direto de nosso estu do,
de tempo, de espaço, de gênero, de causa, ele personali­ aproveitaremos toda ocasião que se oferecer para captar
dade serem construídas com elementos sociais, não se de­ em seu nascimento pelo menos algumas dessas noções,
ve concluir que sejam desprovidas de todo valor objetivo. as quais, embora religiosas por suas origens , haveriam ele
Pelo contrário, sua origem social faz antes supor que te­ permanecer na base da mentalidade humana.
nham fundamento na natureza elas coisas23.
Assim renovada, a teoria do conhecimento parece
destinada a reunir as vantagens contrárias elas duas teorias
rivais, sem seus inconvenientes. Ela conserva todos os
princípios essenciais do apriorismo; mas, ao mesmo tem­
po, inspira-se nesse espírito de positividade que o empi­
rismo procurava satisfazer. Conserva o poder específico
ela razão, mas justifica-o, e sem sair do mundo observável.
Afirma como real a dualidade de nossa vida intelectual
mas explica-a, e mediante causas naturais. As categoria �
deixam ele ser consideradas fatos primeiros e não analisá­
veis; no entanto, permanecem de uma complexidade que
íl n(J 1 i s s simplistas como aquelas com que se contentava o
LIVRO 1

QUESTÕES PRELIMINARES
CAPÍTULO I
DEFINIÇÃO DO FENÔMENO RELIGIOSO
E DA RELIGIÃO'

Para saber qual a religião mais primitiva e mais sim­


ples que a observação nos permite conhecer, é preciso
primeiro definir o que convém entender por religião, caso
contrário correríamos o risco de chamar de religião um
sistema de idéias e d e práticas que nada teria de religioso,
ou de deixar ele lado fatos religiosos sem perceber s u a
verdadeira natureza. O que mostra bem q u e o perigo na­
da tem de imaginário e que ele modo nenhum se trata de
u m vão formalismo metodológico é que, por não haver
tomado essa precaução, um estudioso, a quem não obs­
tante a ciência comparada das religiões deve muito, o sr.
Frazer, não soube reconhecer o caráter profundamente
religioso das crenças e elos ritos que serão estudados mais
adiante e que, para nós, constituem o germe inicial da vi­
da religiosa da humanidade. Há aí, portanto, uma questão
que precede o julgamento e que eleve ser tratada antes ele
qualquer outra. Não que possamos pensar em atingir des­
de já as características profundas e verdadeiramente expli­
cativas da religião: elas só podem ser determinadas ao tér­
mino da pesquisa. Mas o que é necessário e possível é in­
dicar um certo número de sinais exteriores, facilmente
4 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGIOSA QUESTÕES PRF:.LIMINARES 5

perceptíveis, que permitem reconhecer os fenômenos re­ to falta para que a melhor forma de estudar a religião seja
l igiosos onde quer que se encontrem, e que impedem considerá-la de preferência sob a forma que a p resenta
que os confundamos com outros. É a essa operação preli­ nos povos mais civilizadosz.
minar que iremos proceder. Mas, para ajudar o espírito a libertar-se dessas con­
Mas para que ela dê os resultados esperados, deve­ cepções usuais que, por seu prestígio, podem impedi-lo
mos começar por libe1tar nosso espírito de toda idéia pre­ de ver as coisas tais como são, convém, antes de abordar
conce b i d a . Os homens foram obrigados a criar para s i a questão por nossa conta, examinar algumas das defini­
uma noção d o que é a religião, bem antes que a ciência ções mais correntes nas quais esses preconceitos vieram
das religiões pudesse instituir suas comparações metódi­ se exprin1ir.
cas . As necessidades da existência nos obrigam a todos,
crentes e incrédulos, a representar de alguma maneira as
coisas no meio das quais vivemos, sobre as quais a todo
momento emitimos juízos e que precisamos levar em con­
ta em nossa conduta. Mas como essas pré-noções se for­ Uma noção tida geralmente como característica de
maram sem método, segundo os acasos e as circunstâncias tudo o que é religioso é a de sobrenatural. Entende-se por
da vida , elas não têm direito a crédito e devem ser manti­ isso toda ordem de coisas que ultrapassa o alcance de
das rigorosamente à distância do exame que iremos em­ nosso entendimento; o sobrenatural é o mundo do misté­
preender. Não é a nossos preconceitos, a nossas paixões, rio, do incognoscíve l , do incompreensível. A religião se­
a nossos hábitos que devem ser solicitados os elementos ria, portanto, uma espécie de especulação sobre tudo o
da definição que necessitamos; é a realidade mesma que que escapa à ciência e, ele maneira mais gera l , ao pensa­
se trata de definir. mento claro . "As religiões, diz Spencer, diametralmente
C o l oquemo-nos, pois, diante dessa real i dade . Dei­ opostas por seus dogmas, concordam em reconhecer taci­
xando de lado toda concepção da religião em geral, con­ tamente que o mundo, com tudo que contém e tudo que
sideremos as religiões em sua realidade concreta e procu­ o cerca, é um mistério que pede uma explicação" ; portan­
remos destacar o que elas podem ter em comum; pois a to, ele as faz consistir essencialmente na "crença na oni­
religião só pode ser definida em função das características presença de alguma coisa que vai além da inteligência"3.
que se encontram por toda parte onde houver religião. D o mesmo modo, Max Müller via em toda religião "um
Introdu ziremos portanto nessa comparação todos os siste­ esforço para conceber o inconcebível, para exprimir o
mas re l i giosos que podemos conhecer, os do presente e inexprimível, uma aspiração ao infinito"4.
os do passado, os mais simples e primitivos assim como É certo que o sentimento do mistério não deixou de
os mais recentes e refinados, pois não temos nenhum di­ desempenhar um papel importante em certas religiões,
reito e nenhum meio lógico de exclu ir uns para só reter especialmente no cristianismo. Mas é preciso acrescentar
os outros. Para aquele que vê na religião uma manifesta­ que a importância desse papel variou singularmente nos
ção natural da atividade humana, todas as religiões são diferentes momentos da história cristã . Há períodos em
instrutivas, sem exceção, pois todas exprimem o homem que essa noção paí'sa ao segundo plano e se apaga. Para
:'1 s u · 1 m a neira e podem assim ajudar a compreender me­ os homens do século XVII, por exemplo, o dogma nada
l i l or css aspecto de nossa natureza. Aliás, vimos o quan- tinha de perturbador para a razão; a fé conciliava-se sem
6 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGIOSA QUESTÕES PRELIMINARES 7

dificuldade com a ciência e a filosofia, e pensadores co­ los mesmos procedimentos; mas, para aquele que crê ne­
mo Pascal, que sentiam com intensidade o que há de pro­ las, não são mais ininteligíveis do que o são a gravidade
fu ndamente obscuro nas coisas, estavam em tão pouca ou a eletricidade para o físico de hoje. Veremos aliás, ao
harmonia com sua época que permaneceram incompreen­ longo desta obra, que a noção de forças naturais derivou
didos por seus contemporâneos5. Portanto, poderia ser muito provavelmente da noção de forças religiosas; assim,
precipitado fazer, de uma idéia sujeita a tais eclipses, o não poderia haver entre estas e aquelas o abismo que se­
elemento essencial ainda que apenas da religião cristã . para o racional do irracional. Mesmo o fato de as forças
Em todo caso, o que é certo é que essa noção s ó religiosas serem geralmente pensadas sob a forma de en­
aparece muito tarde na história das religiões; ela é total­ tidades espirituais , de vontades conscientes, de maneira
mente estranha não somente aos povos chamados primiti­ nenhuma é uma prova de sua irracionalidade . À razão
vos, mas também a todos os que não atingiram um certo não repugna a priori admitir que os corpos ditos inanima­
grau de cultura intelectual. É verdade que, quando os ve­ dos sejam, como os corpos humanos, movidos por inteli­
mos atribuir a objetos insignificantes virtudes extraordiná­ gências, ainda que a ciência contemporânea dificilmente
rias, povoar o universo com princípios singulares, fe itos se acomode a essa hipótese. Quando Leibniz propôs con­
dos elementos mais díspares, reconhecemos de bom gra­ ceber o mundo exterior como uma imensa sociedade de
do nessas concepções um ar de mistério. Acreditamos espíritos entre os quais não havia e não podia haver se­
que os homens só puderam se resignar a idéias tão per­ não relações espirituais, ele entendia agir como racionalis­
turbadoras para nossa razão moderna por incapacidade ta e não via nesse animismo universal nada capaz de
de encontrar outras que fossem mais racionais. Em reali­ ofender o entendimento .
dade, porém, essas explicações que nos surpreendem afi­ Aliás, a idéia de sobrenatural, tal como a entende­
guram-se ao primitivo as mais simples do mundo. Ele não mos, data de ontem: ela supõe, com efeito, a idéia contrá­
vê nelas uma espécie de ultima ratio a que a inteligência ria, da qual é a negação e que nada tem de primitiva. Para
só se resigna em desespero de causa, mas sim a maneira que se pudesse dizer de certos fatos que são sobrenatu­
mais imediata de representar e compreender o que obser­ rais, era preciso já ter o sentimento de que existe uma or­
va a seu redor. Para ele, não há nada de estranho em po­ dem natural das coisas, ou sej a , que os fenômenos do
der-se, com a voz ou o gesto, comandar os elementos, universo estão ligados entre si segundo relações necessá­
deter ou precipitar o curso dos astros, provocar a chuva rias chamadas leis. Uma vez adquirido esse princípio, tu­
ou pará-la, etc. Os ritos que emprega para assegurar a fer­ do o que infringe essas leis devia necessariamente apare­
tilidade do solo ou a fecundidade das espécies animais de cer como exterior ã natureza e, por conseqüência, à ra­
que se alimenta não são , a seus olhos, mais irracionais do zão: pois o que é natural nesse sentido é também racio­
que o são, aos nossos, os procedimentos técnicos que os nal, tais relações necessárias não fazendo senão exprimir
agrônomos utilizam para a mesma finalidade. As potências a maneira pela qual as coisas se encadeiam logicamente .
que ele põe em jogo por esses diversos meios nada lhe Mas essa noção do determinismo universal é de origem
parecem ter de especialmente misterioso . São forças que recente; mesmo os maiores pensadores da Antiguidade
diferem, certamente, daquelas que o conhecedor moder­ clássica não chegaram a tomar plenamente consciência
no concebe e cujo uso nos ensina; elas têm uma outra dela. É uma conquista das ciências positivas; é o postula­
maneira de comportar-se e não se deixam disciplinar pe- do sobre o qual repousam e que elas demonstraram por
8 AS FORMAS ELEMENTARES DA \!IDA REUG!OSA QUESTÕES PREUMINARES 9

seus progressos. Ora, enquanto ele inexistia ou ainda não cem J coisa mais clara do mundo; é que não percebem
se estabelecera solidamente, os acontecimentos mais mara­ sua obscuridade real: é que não reconheceram ainda a
vil hosos nada possuíam que não parecesse perfeitamente necessidade de recorrer aos proced imentos laboriosos elas
co ncebível. Enquanto não se sabia o que a ordem das coi­ ciências naturais para dissipar progressivamente essas tre­
sas tem de imutável e de inflexível, enquanto nela se via a vas. O mesmo estado ele espírito encontra-se n a raiz de
obra de vontades contingentes. devia-se achar natural que muitas crenças religiosas que nos surpreendem por seu
essas vontades ou outras pudessem modificá-la arbitraria­ simplismo. Foi a ciência, e não a religião, que ensinou
mente. Eis por que as intervenções miraculosas que os an­ aos homens que as coisas são complexas e d i fíceis de
tigos atribuíam a seus deuses não eram, no seu entender, compreender.
milagres, na acepção moderna da palavra. Para eles. eram Mas. responde .Jevons". o espírito humano não tem
espetáculos belos. raros ou terríveis. objetos de surpresa e necessidade ele uma cultura propriamente científica para
de maravilhamento (0aúµa-ra, mirab1/ia, 1111racu/a); mas notar que exi:;tem entre os fatos seqüências determinadas,
de modo nenhum viam nisso uma espécie de acesso a um uma ordem constame de sucessão, e para observar, por
mundo misterioso que a razão não pode penetrar. outro lado, que essa ordem é freqüentemente perturbada.
Podemos compreender tanto melhor essa mentalida­ \comece que o sol se eclipse bruscamente, que a chuva
de na medida em que ela não desapareceu completamen­ falte na época cm que é esperada, que a lua demore a res­
te do meio de nós. Se o princípio do determinismo está surgir após seu desaparecimento periódico, etc. Como es­
hoje solidamente estabelecido nas ciências físicas e natu­ t;1o fora do curso ordinário das coisas, esses aconrecimen­
rais. faz somente um século que ele começou a introdu­ tos são atribu ídos a causas extraordinárias, excepcionais.
zir-se nas ciências sociais, e sua autoridade é ainda con­ ou seja, em suma. extranaturais. É sob essa forma que a
testada. Apenas um pequeno número ele espíritos está idéia de sobrenatural teria nascido desde o início ela histó­
convencido da idéia de que as sociedades estão submeti­ ria, e foi assim que. a partir desse momento, o pensamen-
das a leis necessárias e constituem um reino natural. Daí a 10 religioso se viu munido de seu objeto próprio.
crença de que nelas sejam possíveis verdadeiros milagres. Mas, em primeiro lugar, o sobrenarnral não se reduz
Admite-se, por exemplo, que o legislador pode criar uma de modo algum ao imprevisto. O novo faz parte ela natu­
insriruição do nada por urna simples inju nçào ele sua von­ reza, assim como seu contrário. Se constatamos que, em
tad e, transformar um sistema social cm outro, assim como geral, os fenómenos se sucedem numa ordem determina­
os cremes de tantas religiões admirem que a vontade divi­ d:t, observamos igualmente que essa ordem é sempre
na criou o mundo do nada ou pode ar bi tr ariamente trans­ .qxoxirnac.la, que não é idêntica duas vezes seguidas, que
m utar os seres uns nos outros. No que concerne aos fatos comporta todo tipo de exceções. Por menor que seja nos­
so ciais, temos ainda uma mentalidade ele primitivos. No . ;1
s experiência, estamos habituados à frustração freq üente
entanto, se, cm matéria d e sociologia, tantos contemporâ­ dl• nossas expectativas e essas decepções retornam muito
neos apegam-se ainda a essa concepção antiquada, não é sq.tuidamente para que as vejamos como extraordinárias.
que a vida das sociedades lhes pareça obscura e misterio­ l lma cena contingência é um dado da experiência, assim
s a ; pelo contrário, se se comentam tão facil mente com tais nimo uma certa unirormiclacle; portanto. não há razão pa-
explicações, se se obstinam nessas ilusões que a experiên­ 1.1 relacionar uma a causas e forças inteiramente diferen­
cia desmente sem cessar, é que os fatos sociais lhes pare- ll'' daquelas de que depende a outra. Assim, para que te-
10 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RlliJG!O.�A QUESTÕHS P/UiLIM!NA !UJS ]]

nhamos a idéia e.lo sobrenatural, não é suficiente que seja idéia contrária. Por isso, ela só ocorre num pequeno nú
mos testemunhas de acontecimentos inesperados; é preci­ mero de religiões avançadas. Não se pode. ponanro, fazer
so, além disso, que estes sejam concebidos como impossí­ dela a característica dos fcnômenos religiosos sem exclu ir
veis, isto é, como inconciliáveis com uma ordem que, cer­ da definição a maioria dos fatos a definir.
ta ou errada, nos parece necessariamente implicada na
natureza das coisas. Ora, essa noção de uma ordem ne­
cessária, foram as ciências positivas que pouco a pouco li
construíram, portanto a noção contrária não poderia lhes
ser anterior. Uma outra idéia pela qual se tentou com freqüência
Além disso, seja como for que os homens tenham se definir a religião é a da di\'indade. "A religião. diz A. Ré­
representado as novidades e as contingências que a expe­ ville. é a determmação da vida humana pelo sentimento
riência revela, nao há nada nessas represencações que de um \'inculo que une o espmto humano ao espmro mis­
possa se1vir para caracterizar a religião. Pois as concepções terioso no qual reconhece a dominacão sobre o mundo e
religiosas têm por objeto, acima de tudo, exprimir e expli­ sobre si mesmo, e ao qual ele quer sentir-se unido."9 É
car, não o que há de excepcional e anormal nas coisas. verdade que. se entendemos a palavra divindade num
mas, ao contrário, o que elas têm de constante e regular. sentido preciso e estrito, a definição deixa de fora grande
Quase sempre, os deuses servem menos para explicar quantidade de fatos manifestamente religiosos. As almas
monstruosidades, extravagâncias, anomalias, cio que a dos mortos, os espíritos de toda espécie e de toda ordem,
marcha habitual do un iverso, do movimento dos astros, com que a imaginação religiosa ele tantos povos diversos
do ritmo das estações, do crescimento anual da vegeta­ povoou a natureza, são sempre objeto de ritos e, às vezes,
ção, da perpetuidade das espécies, etc. Po1tanto, a noção até de um culto regular; no entanto não se trata de deuses
do religioso está longe de coincidir com a do extraordiná­ no sentido próprio da palavra. Mas, para que a definição
rio e cio imprevisto. jevons responde que essa concepção os compreenda, hasta substituir a palavra deus pela de ser
das forças religiosas não é primitiva. No começo, estas te­ espiritual, mais abrangente. Foi o que fez Tylor: "O pri­
riam sido imaginadas para justificar desordens e aciden­ meiro ponto essenci�d quando se trata ele estudar sistema­
tes, e só depois util izadas para explicar as uniformidades ticamente as religiões das ra ça s inferiores, é, diz ele, defi­
da natureza7. Mas não se percebe o que teria levado os nir e precisar o que se entende por religião. Se se conti­
homens a atribuir sucessivamente a elas funções tão mani­ nuar fazendo entender essa palavra como a crença numa
festamente contrárias. Além disso, a hipótese segundo a divindade suprema . . . um certo número ele tribos estará
q u a l os seres sagrados teriam sido confinados de início excluído cio mundo religioso. Mas essa definição demasia­
num papel negativo de pe1turbaclores, é inteiramente arbi­ do estreita tem o defeito ele identificar a religião com al­
trária. Veremos, com efeito, que, desde as religiões mais guns de seus desenvolvimentos pa1ticulares . . . Parece pre·
simples que conhecemos, eles tiveram por tarefa essencial ferível colocar sim plesmente como definição mínima ela
manter, de uma maneira positiva, o curso normal da vidall. religião a crença em seres espirilllais."JO Por seres espiri­
Assim, a icléia do mistério nada tem de original. Ela tuais, devemos entLncler sujeitos conscientes, dotados de
não foi dada ao homem: foi o homem que a forjou com poderes superiores aos que possui o comum dos homens;
suas próprias mãos, ao mesmo tempo que concebia a essa qual ificação convém, portanto, às almas dos mortos,
12 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RJJL/(,'f()SA QlE
STÕES PREl/Aflf\ARBS 13

aos g<'.:nios, aos dcmônios, canro quanto às di\ incfadcs pas pl'las quais é preciso passar para chegar a essa su.
propriamente dicas. É importante notar, de imediato, a pressao: a ret1dao, a meditação e, enfim, a sabedona, a
concepção particular da religião que está implicada nessa plena posse da doutrina. Atravessadas essas três etapas,
definição. O único comércio que podemos manter com chega-se ao término do caminho, à libertação, à salvação
pelo Nirvana.
Ora, cm nenhum desses princípios está envolvida a
seres dessa espécie se acha determinado pel a natureza
que lhes é atribuída. São seres consciemes; não podemos.
portanto, agir sobre eles. senão como agimos sobre as divindade. O budista não se preocupa em saber de onde
consciências em geral, isto é, por procedimentos psicoló­ vem esse mundo do devir em que ele vive e sofre; toma-o
gicos, tratando de com·encê-los ou de comovê-los, seja como um fato•- e todo o seu esforço está em evadir-se
ror meio de palavras ( invocaçàes. preces), seja por ofe­ dele. Por outro lado, para essa obra de salvação, ele só
rendas e sacnf1cios. E já que a religião teria por objeto re­ pode contar conMgo mesmo: "nao tem nenhum deus pa ra
gular nossas rel..içõc:. com esses seres espec1J1s, so podt:­ agradc<..cr .iss1m <..omu, nu combate, não chama m.:nhum
,

deus cm seu auxílio''111. Em vez ele rezar, no sentido usual


da pala\'ra, cm \'CZ de voltar-se para um ser superior e im­
ria haver religião onde há preces, sacrifícios, ricos propicia­
: �
tórios ' c�c. ·1 cr am�s . assim, �m �ritério muito simples que
. .
permttma d1stingu1r o que e religioso do que não é. E a plorar sua assistência, concentra-se em si mesmo e medi­
esse critério que se referem sistematicamente Frazer 1 e, ta. Isso não significa "que negue frontalmente a existência
com ele, vários etnógrafos•2. de seres chamados lndra, Agni, Varuna19, mas julga que
não lhes deve nada e que não precisa deles··. pois o po­
desses seres só pode es tender-se
Contudo, por mais evidente que possa parecer essa
definição, em conseqüência de hábitos de esrírito que der sobre os bens deste
devemos à nossa educação religiosa. há mu itos fatos aos mundo, os quais, para o budista, são sem valor. Portanto,
quais ela não é apl icável e que, no entanto, dizem respei­ ele é ateu no 1.entido de desinteressar-se da questão de
to ao domínio da religião. saber 'ie existem ou não deuses. Aliás, mesmo se existis­
Em primeiro lugar, existem grandes religiões cm que sem e estivessem 111vest1dos ele algu m poder, o santo, o li­
a idéia de deuses e espíritos está ausente, nas quais, pelo bertado, julga-se su perior a eles; pois o que faz a dignida­
menos, e l !' desempenha cão-só um pa pe l secundário e de dos seres não é a extensão da ação que exercem sobre
a pagado. E o caso cio budismo. O budismo, diz Burnouf,
minho ela sal vaçàoio
as coisas, é exclusivamente o grau de seu avanço no ca­
.
" a p rt:�enta-se, em oposição ao bramanismo, como uma
moral sem deus e um ateísmo sem Natureza"t3. "Ele não É Vl!rdade que o Buda, pelo menos em certas div isões
reco n h ece u rn d e u s do q u a l o homem de pe n d a , d i z da Igreja budista, acabou por ser considerado uma espé­
13a rth; sua doutrina é absolutamente atéia"l4 ' e Oldenbcrg cie ele deus. Tem seus templos; tornou-se objeto de u m
por sua vez, chama-o "uma religião sem deus"IS. De fato : culto que, por sinal, é muito simples, pois s e reduz essen­
o essencial do budismo consiste em quatro proposiçàes cialmente ã oferenda ele algumas flores e à adoração de
que os fiéis chamam as quatro nobres verclades•6. relíquias ou imagens consagrad as Não é mu ito mais do
.

A primeira coloca a existência da dor como ligada ao que um culto da lembrança. Mas essa divinização do Bu­
perpétuo fluxo das coisas; a segunda mostra no desejo a da, supondo-se qu<' a expressão seja exata. primeiramen­
causa da dor; a terceira faz da supressão do desejo o úni­ te é particular ao chamado budismo setentrional. "Os bu­
co meio de suprimir a dor; a quarta enumera as três eta- distas do Sul, diz Kern. e os menos avançados entre os
14 1IS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGIOSA QUESTôES PRELIMINA RES 15

budistas do Norte, podemos afirmar com base nos dados nheça e pratique a boa doutrina. Claro que ela não pode­
hoje conhecidos, falam do fundador de sua doutrina co­ ria ter sido conhecida se o Buda não tivesse vindo revelá­
mo se fosse um homem."21 Certamente, eles atribuem ao la; mas, uma vez feita essa revelação, a obra do Buda es­
Buda poderes extraord inários, superiores aos que possui tava cumprida. A partir desse momento, ele deixou ele ser
o c? mum cios mortais; mas era uma crença muito antiga um fator necessário da vida religiosa. A prática das quatro
na India, e aliás muito comum numa série de religiões di­ verdades sagradas seria possível ainda que a lembrança
versas, que um grande santo é dotado de virtudes excep­ daquele que as fez conhecer se apagasse das memórias28.
cionais22; não obstante, um santo não é um deus, como Algo bem diferente ocorre com o cristianismo, que, sem a
tampouco um sacerdote ou um mágico, a despeito das fa­ icléia sempre presente e o culto sempre praticado de Cris­
culdades sobre-humanas que geralmente lhes são atribuí­ to, é inconcebível; pois é por Cristo sempre vivo e a cada
das. Por outro lado, segundo os estudiosos mais autoriza­ dia imolado que a comunidade elos fiéis continua a comu­
dos, essa espécie de teísmo e a mitologia complexa que nicar-se com a fome suprema ela vida espirirual29.
costuma acompanhá-lo não seriam senão uma forma deri­ Tudo o que precede aplica-se igualmente a uma ou­
vada e desviada cio budismo. A princípio, Buda teria sido tra grande religião da Í ndia, o jainismo. Aliás, as duas
considerado apenas como "o mais sábio dos homens"23. doutrinas têm sensivelm ente a mesma concepção do
" A concepção ele um Buda que não seria um homem C')Ue mundo e el a vida. "Como os budistas, diz Barth, os jainis­
alcançou o mais alto grau ele santidade, diz Burnouf, não tas são ateus. Não admitem criador; para eles, o mundo é
pertence ao círculo das icléias que constituem o fundo eterno, e negam explicitamente que possa haver um ser
mesmo dos Sutras simples"24; e, acrescenta o mesmo au­ perfeito para toda a eternidade. Jaina tornou-se perfeito,
tor, "sua humanidade permaneceu um fato tão incontesta­ mas não o era o tempo todo". Assim como os budistas elo
velmente reconhecido ele todos que os autores de lendas, Norte, os jainistas, ou pelo menos alguns deles, se volta­
aos quais custavam tão pouco os milagres. não tiveram ram porém a uma espécie de deísmo; nas inscrições do
sequer a idéia de fazer dele um deus após sua morte"25. Decào, fala-se de um J inapati, espécie de Jaina supremo,
Assim, cabe perguntar se alguma vez ele chegou a despo­ que é chamado o primeiro criador; mas tal linguagem, diz
jar-se completamente desse caráter humano, e se temos o o mesmo autor, "está em contradição com as declarações
direito de assimilá-lo completamente a um deus26. Em to­ mais explícitas ele seus escritores mais autorizados"3º.
do caso, seria um deus de uma natureza muito particular Aliás, se essa indiferença pelo divino desenvolveu-se
e cujo pape! de modo nenhum se assemelha ao das ou­ a tal ponto no budismo e no jainismo, é que ela já estava
tras personalidades divinas. Pois um deus é, antes de tu­ em germe no bramanismo, do qual derivaram ambas as re­
do, um ser vivo com o qual o homem eleve e pode con­ ligiões. Ao menos em algumas de suas formas, a especula­
tar; ora, o Buda morreu, entrou no Nirvana, nada mais cão bramânica culminava em "uma explicação francamen­
pode sobre a marcha dos acontecimentos humanos21. te materialista e atéia do universo"31. Com o tempo, as
Enfim, e não importa o que se pense da divindade múltiplas divindades que os povos ela Índia haviam de iní­
do Buda, o fato é que essa é uma concepção inteiramente cio aprendido a adorar acabaram como que se fundindo
exterior ao que há de realmente essencial no budismo. numa espécie de princípio uno, impessoal e abstrato, es­
Com efeito, o budismo consiste, antes de tudo, na noção sência de tudo o que existe. Essa realidade suprema, que
de salvação, e a salvação supõe un icamente que se co- nada mais possui de uma personalidade divina, o homem
16 A S FORMAS ELEMENTARES DA V!DA RELIGIOSA QUESTÕES PRELIMINARES 17

contém em s i , ou melhor, identifica-se com ela, uma vez !: verdade que esses ritos são puramente negativos;
que nada existe fora dela. Para encontrá-la e unir-se a ela mas não deixam de ser religiosos. Além disso, há outros
ele não precisa, portanto, buscar fora de si mesmo ne� que reclamam cio fiel prestações ativas e positivas, e que,
nhum apoio exterior; basta concentrar-se em si e meditar. n o entanto, são da mesma natureza. Eles atuam por si
"Quando, diz Oldenberg, o budismo lança-se nesse gran­ mesmos, sem que sua eficácia dependa de algum poder
de empreendimento ele imaginar um mundo de salvação divino; suscitam mecanicamente os efeitos que são sua ra­
em que o homem salva-se a si mesmo e ele criar uma reli­ zão ele ser. Não consistem em preces, nem em oferendas
gião sem deus, a especulação bramânica já havia prepara­ dirigidas a um ser a cuja boa vontade o resultado espera­
do o terreno para essa tentativa. A noção de divindade re­ do se subordina; esse resultado é obtido pela execução
cuou gradativamente; as figuras dos antigos deuses pouco automática da operação ritual. Tal é o caso, em particular,
a pouco se apagam; o Brama pontifica em sua eterna quie­ do sacrifício na religião védica. "O sacrifício, diz Bergaig­
tude, muito acima e.lo mundo terrestre, e resta apenas uma ne, exerce uma influência direta sobre os fenômenos ce­
única pessoa a tomar parte ativa na grande obra ela liberta­ lestes"36; ele é oni potente por si mesmo e sem nenhuma
ção: o homem."32 Eis, portanto, uma porção considerável influência divina. Foi ele, por exempl o , que rompeu as
da evolução religiosa que consistiu, em suma, num recuo portas da caverna onde estavam encerradas as auroras e
progressivo da icléia ele ser espiritual e ele divindade. Ei� aí fez brotar a luz do dia37. Do mesmo modo, foram hinos
grandes religiões em que as invocações, as propiciações, apropriados que, por uma ação direta, fizeram cair sobre
os sacrifícios, as preces propriamente ditas, estão muito a terra as águas cio céu, e isto apesar dos deuses38. A práti­
longe de ter urna posição preponderante e que, portanto, ca ele certas austeridades tem a mesma eficácia. E mais:
não apresentam o sinal distintivo no qual se pretende re­ "O sacrifício é de tal forma o princípio por excelência,
conhecer as manifestações propriamente religiosas. que a ele é relacionada não somente a origem dos ho­
Mas, mesmo no interior das religiões deístas, encon­ mens, mas também a dos deuses. Tal concepção pode,
tramos um grande número de ritos que são completamen­ com razão, parecer estranha. No entanto, ela se explica
te independentes de toda idéia de deus ou de seres espi­ como uma das últimas conseqüências ela icléia da onipo­
rituais. Antes de mais nada, há urna série ele interdi ções. A tência do sacrifício."39 Assim, em toda a primeira parte elo
Bíblia, por exemplo, ordena ã mulher viver iso lac i'a todo trabalho ele Bergaigne, só são abordados sacrifícios em
mês durante um período cleterminado33 ; obriga-a a u m que as divindades não desempenham nenhum papel.
isolamento análogo durante o parto31; proíbe atrelar jun­ Esse fato não é particular ã religião védica, sendo, ao
tos o jumento e o cavalo, usar um vestuário em que o câ­ contrário, ele grande generalidade. Em todo culto há práti­
nhamo se misture com o linho35, sem q u e seja possível cas que atuam por si mesmas, por uma virtude que lhes é
perceber que papel a crença em Jeová pode ter desempe­ própria e sem que nenhum deus se intercale entre o indi­
nhado nessas interdições; pois ele está ausente de todas víduo que executa o rito e o objetivo buscado. Quando,
as relações assim proibidas e não poderia estar interessa­ na festa dos Tabernáculos, o j udeu movimentava o ar agi­
do por elas. O mesmo se pode dizer da maior parte das tando ramos ele salgueiro segundo um certo ritmo, era pa­
interdições alim entares. E essas proibições não são parti­ ra fazer o vento le,-antar-se e a chuva cair; e acreditava-se
culares aos hebreus, mas as encontramos, sob formas di­ que o fenômeno desejado resultasse automaticamente do
versas e com o mesmo caráter, em numerosas religiões. rito, contanto que este fosse executado de forma correta4°.
18 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA Rfi/GIOSll QUESTÕES PREUJlf/f\A RES 19

Aliás, é isso o que explica a impo1tância primordial dada esfo1(0u-se por ahsorvê-los e assimilá-los; imprimiu-lhes
por quase todos os culros à parte material das cerimônias. uma cor cristã. Todavia, muitos deles persistiram até uma
Esse formalismo religioso, muito provavelmente a forma data recente ou persistem ainda com uma relativa autono­
primária cio formalismo jurídico, advém ele que a fórmula mia: festas da árvore de maio, do solstício de verão, do car­
a pronunciar, os movimentos a executar, tendo em si mes­ naval, crenças diversas relativas a gênios, a demônios lo­
mos a fonte de sua eficácia, a perderiam, se não se confor­ cais, etc. Embora o caráter religioso desses fatos vá se apa­
massem exatamente ao tipo consagrado pelo sucesso. gando, sua importância religiosa, não obstante, é tal que
Assim há ritos sem deuses e, n i clusive, há ritos dos permitiu a Mannhardt e sua escola renovarem a ciência elas
quais derivam os deuses. Nem todas as virtudes religiosas religiões. Uma definição que não levasse isso em conta não
emanam de personalidades di\·inas, e há relações cultu­ compreenderia, portanto. tudo o que é religioso.
rais que nsam outra coisa que não unir o homem a uma Os fenome11os rel1g1osos classificam-se natural mente
dhind<tdt.. Portanto, a religião vai além da ídt!ia de deuse:. cm <lua:. categorias fund<lmcmais. as crenças e os ritos �\s
ou de espíritos, logo não pode se definir exclusivamente primeiras são estados da opinião, consistem em represen­
em função desta última. tações; os segundos são modos de ação determinados.
Entre esses dois tipos de fatos há exatamente a diferença
que separa o pensamento do movimento.
III Os ritos só podem ser definidos e distinguidos elas
outras práticas humanas, notadamente das práticas mo­
Descartadas essas definições, é nossa vez de nos co­ rais, pela natureza especial ele seu objeto. Com efeico,
locarmos diante do problema. uma regra moral, assim como um rito. nos prescreve ma­
Em primeiro lugar observemos que, em todas essas neiras de agir, mas que se dirigem a objetos de um gêne­
fórmulas. é a natureza da religião em seu conjunto que se ro diferente. Portanto. é o ohjeto do rito que precisaría­
tenta exprimir diretamente. Procede-se como se a religião mos caracterizar para podermos caracterizar o rróprio ri­
formasse uma espécie de entidade indivisível, quando ela to. Ora, é na crença que a natureza especial desse objeto
é um todo formado ele partes; é um sistema mais ou me­ se exprime. Assim, só se pode definir o rito após se ter
nos co mplexo de mitos, ele dogm as, de ritos, de cerimô­ definido a crença.
nias. Ora, um todo não pode ser definido senão em rela­ Todas as crenças religiosas conhecidas, sejam sim­
ção às partes que o formam. É mais metódico, portanto, p les ou com p lex a s , apresentam u m mesmo caráter co­
procurar caracterizar os fenômenos elementares dos q ua is mum: supõem uma cl ass ifi cação das coisas , reais ou ideais,
toda religião resulta, antes do sistema produzido por sua que os homens concebem, em duas classes, em dois gê­
união. Esse método impõe-se sobretudo pelo fato de exis­ neros opostos, designados geralmente por dois termos
tirem fenômenos religiosos que não dizem respeito a ne­ distintos que as palavras profa110 e sagrado t ra du zem bas­
nhuma religião determinada. É o caso dos que constituem tante bem. A divisão do mundo em dois domínios que
a matéria do folclore. Em geral, são restos de religiões de­ compreendem. um, tudo o que é sagrado, outro, Ludo o
sa parecidas, sobrevivências inorganizadas; mas há outros que é profano, tal f> o traço distintivo cio pensamento reli­
também que se formaram espontaneamente sob a influên­ gioso: as crenças, os mitos, os gnomos, as lendas, são re­
cia de causas locais. Nos países europeus, o cristianismo presentações ou sistemas de representações que exrri-
20 AS FORMAS ELEMENTARES D1I \ffDA REl/GfOSll Q[.'ESTÕF.S Pl?El/MINllRES 21

mem a natureza das coisas sagradas, as virtudes e os po­ segunda seja sag rada em relação à primeira. Os escravos
deres que lhes sáo atribuídos, sua história, suas relações dependem de seus senhores, os súditos de seu rei, os sol­
múLUas e com as coisas profanas. Mas, por coisas sagra­ dados de seus comandantes, as classes infer iores das clas­
das , convém não entender simplesmente esses se res pes­ ses dirigentes, assim como o avarento depende de seu
soais que chamamos deuses ou espíritos: um rochedo, ouro e o ambicioso, do poder e das mãos que o detêm;
uma árvore, uma fonte, um seixo, um pedaço de madeira, ora, se dizemos ãs vezes de um homem que ele tem a re­
uma casa, em uma palavra, uma coisa qualquer pode ser ligião dos seres ou das coisas aos quais atribui. assim. um
sagrada. Um riro pode ter esse caráter; inclusive, não exis­ valor emin ente e uma espécie de superioridade em rela­
te rito que não o tenha em algum grau . llá palavras, fra­ ção a si próprio, é claro que, em todos esses casos, a pa­
ses, fórmulas que só podem ser pronunciadas pela hoca lavra é ramada num sentido metafórico e que não há na­
de p e rso nagens consagrados: há gestos e movimentos da. nessas relações, que seja propriamente religioso•!.
i o podem ser executados por cotlu o muntlo. ::>e o
quL n< Por outro lado, com·ém não perder de vista que há
sacrifício védico teve tal eficácia, se inclusive, segundo a coisas sagradas de todo tipo e que há aquelas dia nte das
mitologia. foi gerador de deuses, ao in\'és de ser apenas quais o homem se sente relativamente à v onta de. l:m
um meio de conquistar seus favores. é que ele possuía amuleto tem um caráter sagrado. no entanto o respeito
uma virtude comparável à dos seres mais sag l"<1dos. O cír­ que in sp ira nada tem de e xcepcion al . Mesmo diante de
culo dos objetos sagrados não pode, portanto, ser deter­ seus deuses, o homem ne m sempre se encontra numa po­
minado de uma vez por todas; sua extensão é infinita­ sição de acentuada inferioridade. pois muitas vezes exer­
mente variável conforme as religiões. Eis de que maneira ce sobre e les uma verdadei ra coercào física para obter o
o budismo é uma religião: é que, na falta de deuses, ele qu e desej a . Bate-se no fetiche com o q u a l não se está
ad mite a existência de coisas sagradas, que são as quatro contente, reconciliando-se com ele caso venha a se mos­
verdades santas e as práticas que delas derivam 1 1 . trar mais dócil aos desejos de seu adoradorH. Para ohter a
Mas limi tamo-nos até aqu i a enumerar, a título de chuva, lançam-se pedras na fonte ou no lago sagrado on­
exemplos, um certo número de coisas sagradas; cumpre de se supõe re si dir o deus da chuva: acredita-se, deste
agora indicar através de que características gerais elas se modo, obrigá-lo a sa ir e a se mostrar". Aliás, se é verdade
distinguem das coisas profanas. que o homem depende de seus deuses, a dependência é
Poderíamos ser tentados a defini-las, ele início, pelo r ecíproca . Também os deuses têm necessidade cio ho­
lugar que geralmente lhes é atribuído na hierarquia dos mem: sem as oferendas e os sacrifícios, eles morreriam.
seres. Elas costumam ser consideradas como superiores Teremos ocasião ele mostrar que essa dependência dos
em dignidade e em poderes às coisas profa nas e, em par­ deuses em relação a seus fiéis mantém-se inclusive nas re­
ticular, ao homem, quando este é apenas um homem e ligiões mais idealistas.
nada possui, por si próprio , de sagrado. Com efeito, o ho­ Mas, se uma distinção puramente hierárquica é um
mem é representado ocupando, em relação a elas, uma si­ critério ao mesmo tempo muito geral e muito impreciso,
ruaçào inferior e dependente; e essa representação por não nos resta outra coisa para definir o sagrado em rela­
certo não deixa ele ser verdadeira. Só que nisto não há na­ ção ao profano, a não ser sua heterogeneidade. E o que
da que seja realmente característico cio sagrado. Não basta torna essa heterogeneidade suficiente para caracterizar se­
que uma coisa seja subordinada a uma outra para que a melhante classificação elas coisas e disting ui- la de qual-
22 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGIOSA QUESTàES PREWlf!NARES 23

quer outra é justamente o fato de ela ser muito particular: re, que a pessoa determinada que ele era cessa de existir
ela é absoluta. Não existe na história do pensamento hu­ e que uma outra, instantaneamente, substitui a preceden­
mano um outro exemplo de duas categorias de coisas tão te. Ele renasce sob uma nova forma. Considera-se que ce­
profundamente diferenciadas, tão radicalmente opostas rimônias apropriadas realizam essa morte e esse renasci­
uma ã outra. A oposição tradicional entre o bem e o mal mento, entendidos não num sentido simplesmente simbó­
não é nada ao lado desta; pois o bem e o mal são duas es­ lico, mas tomados ao pé da letra46. Não é isso uma prova
pécies contrárias de um mesmo gênero, a mora l , assim co­ ele que há solução ele continuidade entre o ser profa no
mo a saúde e a doença são apenas dois aspectos diferen­ que ele era e o ser religioso em que se torna?
tes de uma mesma ordem de fatos, a vicia, ao passo que o Essa heterogeneidade inclusive é tal que não raro de­
sagrado e o profano foram sempre e em toda pa1te conce­ genera num verdadeiro antagonismo. Os dois mundos
bidos pelo espírito humano como gêneros separados, co­ não são apenas concebidos como separados, mas como
mo dois mundos entre os quais nada existe em comum. As hostis e rivais um do outro. Como só pode penencer ple­
energias que se manifestam num não são simplesmente as namente a um se tiver saído inteiramente cio outro, o ho­
que se encontram no outro, com alguns graus a mais; são mem é exortado a retirar-se totalmente do profano, para
de outra natureza. Conforme as religiões, essa oposição foi levar uma vicia exclu sivamente religiosa. Daí a vida mo­
concebida ele maneiras diferentes. Numa, para separar es­ nástica que, ao lado e fora cio meio natural onde vive o
ses dois tipos ele coisas, pareceu suficiente localizá-las em homem comum, organiza artificialmente um outro meio,
regiões distintas cio universo físico; noutra, algumas delas fechado ao primeiro e que quase sempre tende a ser o
são lançadas num meio ideal e transcendente, enquanto o seu oposto. Daí o ascetismo místico, cujo objeto é extirpar
mundo material é entregue às outras em plena proprieda­ do homem tudo o que nele pode permanecer ele apego
de. Mas, se as formas do contraste são variáveis45, o fato ao mundo profano. Daí, enfim, todas as formas de suicí­
mesmo do contraste é universal. dio religioso, coroamento lógico desse ascetismo, pois a
Isso não significa, porém, que um ser jamais possa única maneira de escapar totalmente à vida profana é, em
passar de um desses mundos para o outro; mas a maneira última instância, evadir-se totalmente ela vida.
como essa passagem se produz, quando ocorre, põe em A oposição desses dois gêneros irá, aliás, traduzir-se
evidência a dualidade essencial dos dois reinos. A passa­ exteriormente por um signo visível que permita reconhe­
gem implica, com efeito, uma verdadeira metamorfose. É cer com facilidade essa classificação muito especial, onde
o que demonstram particularmente os ritos de iniciação, quer q u e ela exista. Como a noção de sagrado está, no
tais como são praticados por uma quantidade ele povos. A pensamento dos homens, sempre e em toda parte separa­
iniciação é uma longa série ele cerimônias que têm por da ela noção ele profano, como concebemos entre elas
objeto introduzir o jovem na vida religiosa: ele sai pela uma espécie ele vazio lógico, ao espírito repugna invenci­
primeira vez cio mundo puramente profano onde trans­ velmente que as coisas correspondentes sejam confundi­
correu sua primeira infância para entrar no círculo elas das ou simplesmente postas em contato, pois tal promis­
coisas sagradas. Ora, essa mudança de estado é concebi­ cuidade ou mesmo uma contigüiclacle demasiado direta
da, não como o simples e regular desenvolvimento de contradizem violertamente o estado ele dissociação em
germes preexistentes, mas como uma transformação totius que se acham tais idéias nas consciências. A coisa sagrada
substantiae. Diz-se que, naquele momento, o jovem mor- é, por excelência, aquela que o profano não deve e não po-
AS FOR.ll-1.S ELE.llL\TARFS DA 1 7D.I RLLIGIOSA QlESTÕE.� PRELJ.lfl,\ARES _.,
r

de imrunemcnte tocar. Claro que essa interdirão não ro­ me a� circunstâncias em que se apl ica . st:ria, no fundo,
c.leria <..hegar ao ponto de tornai impOiiSÍ\el toda comu rn­ por toda parte, idêntico
a si mesmo: trata-se de um todo
caçào entre os dois mundos, pois, se o profano não pu­ formado de partes distintas e relativamente individualiza­
desse de maneira nenhuma entrar em relação com o sa­ das. Cada grupo homogêneo de coisas sagradas, ou mes­
grado, este de nada serviri a . l\las esse relacionamento, mo cada coisa sagrada de a lgu ma importânci a, constitui
além de ser sempre, por s i mesmo, uma operação delica­ um centro organizador em tomo do qual gravica um gru­
da. que requer precauções e uma n
i iciação mais ou me­ po de crenças e de ritos, um culco particular; e não há re­
nos complicada.�, de modo nenhum é possível sem que o ligião, por mais unitária que seja, que não reconheça uma
profano perca suas características específicas, sem que se pl ura lidade de coisas sagradas. Mesmo o criscianismo, pe­
torne ele pré>prio sagrado nu m ceno grau e numa cena lo menos cm sua forma católica. admite, além da persona­
medida. Os c.lois gêncros não podem se aproximar e cun­ lidade divina - aliás, tripla ao mesmo tempo que una -, a
seí\.ir ao mesmo tempo ':ilia natureza propria. \ i rgem, os anios, os santoii, as almas dos mortos, ecc..
Temos, desta vez, um primeiro critério daii crenças Assim, uma religião não se reduz geralmente a um
religiosas. Claro que, no interior desses dois gêncros fun­ culco único, mas consiste em um sistema de cultos dota­
damentais, há espécies secundárias que, por sua vez, são dos de certa autonomia. Essa autonomia, por si n al , é variá­
mais ou menos incompatíveis umas com as outras·•>i Mas vel. Às vezes, os CLiltos são hierarq uizados e subordinados
o característico do fenômeno religioso é que ele supõe a um culto predominance, no qual acabam inclusive por
sempre uma divisão bipa rtida do universo conhecido e ser absorvidos; mas ocorre também estarem simplesmente
conhech·el cm dois gêneros que com preende m tudo o justapostos e confederados. A religião que iremos estudar
que existe, mas que se excluem radicalmente. As coisas nos fornecerá justamente um exemplo desta última orga­
sagradas são aque las que as proibições protegem e iso­ nização.
lam; as coisas profanas, aquelas a que se a pl ic a m essas Ao mesmo tempo, explica-se que possa haver grupos
proibii.;ü es e que devem permanecer a c.listância das pri­ de fenômenos rel igiosos que não pertencem a nenhum a
meiras. As crenças religiosas são representações que ex­ religião constituída: é que eles não estão ou não mais es­
primem a natureza das coisas sagradas e as relações que tão integrados num s istema relig ioso. Se um dos c.:ulcos
elas mantê m, seja entre si, seja com as coisas profanas. em questão cons egu i r manter-se por razões especiais
Enfim, os ritos são regras de conduta que prescrevem co­ quando o conjunto do qual fazia parte desaparece, ele irá
mo o homem deve comportar-se com as coisas iiagradas.
Qua nclo u m certo número de c oi sas sagradas man­
sobreviver apenas no estado desintegrado. Foi o que
aconteceu a tantos cultos agrários que sobreviveram a si
cém entre si rc laçôes ele coordenação e de subordinaçào, próprios no folclore . Em certos casos, não é sequer um
de maneira a formar um sistema dotado de uma certa uni­ culto, mas uma simples cerimônia , um rit o particular qul!
c.lade. mas que não participa ele próprio de nenhum outro persiste sob essa forma 19•
sistema do mesmo gênero, o conjunto das crenças e dos Em bora essa definição sej a a penas prelim ina r, ela já
ritos correspon dent es conscitui uma religião. Vê-se, por permite entrever em que termos se deve colocar o proble­
essa definição, que uma religiào não corresponde neces­ ma que domina nc�essariamente a ciência das religiões.
sariamente a uma única e mesma idéia, não se reduz a Quando se acredita que os seres sagrados só se distin ­
um princípio único que, embora diversificando-se confor- guem dos demais pela maior intensidade dos poderes que
26 11.S FORMAS ElhillEN'filRliS DA l'fDA f<ElfG'fOSA <JI ESTÕES PRJ.il/Jllft\ANfü 27

lhes são atrihuídos, a questão de saher de que maneira os rnágko. Os demónios são igualmente u m instrumento
homens puderam ter a icléia desses seres é bastante sim­ usual da ação mágica. Ora, também os demônios são se­
ples: basta examinar quais são as forças que, por sua ex­ res cercados de proibições: também eles são separados,
cepcional energia, foram capazes de impressionar tão vi­ \·ivem num mundo ã pane e, inclusive, costuma ser difícil
vamente o espírito humano para inspirar sentimentos reli­ distingui-los dos deuses propriamente clitoss3. Aliás, mes­
giosos. Mas se, como tentamos estabelecer, as coisas sa­ mo no cristianismo, não é o diabo um deus decaído? E.
gradas diferem em natureza das coisas profanas, se são de independente até de suas origens, não tem ele um caráter
uma ouu·a essência, o problema é muico mais complexo. religioso pelo foto mesmo de o inferno. d o qual é o pre­
Pois é preciso perguntar emão o que levou o homem a posto. ser um elemento indispensável da religião cristã?
ver no mundo dois mundos heterogêneos e incompará­ I lá inclusi,·e divindades regulares e oficiais que são invo­
veb, quando nada na experiência sensh·el parecia dever cadas pelo mágico. Algumas vezes. são os deuses de um
.-..ugcrir-lhc .i idéia Je uma dualidade tào rndical. pon> estrangeiro: por exemplo, os mágicos gregos faztam
inte1vir deuses egípcios, assírios ou judeus. Outras vezes,
são deuses nacionais mesmos: Hécate e Diana eram obje­
N to de um culto mágico; a Virgem, Cristo e os santos foram
utilizados da mesma maneira pelos mágicos cristãos�·•.
Entretanto, essa definição não é ainda completa, pois Será que se deveria então dizer que a magia não pode
convém igualmeme a duas ordens de fatos que, embora ser cliscinguicla com rigor ela religião? Que a magia está re­
aparcnlac.los entre si, precisam ser distingu idos: u-arn-se da pleta de religião. como a religião de magia, e que. por
magia e da religião. conseguime, é impossível separá-las e definir uma sem a
Também a magia é feita de crenças e de ritos. Assim outra? J\<las o que torna essa tese dificilmente sustentável é
como a religião, tem seus mitos e seus dogmas ; eles são a marcada repugnância da religião pela magia e, em con­
apenas mais rudin1emares, certamente porque, buscando trapartida, a hostilidade da segunda pela primeira. A magia
fins técn icos e utilitários, a magia não perde seu tempo tem uma espécie de prazer profissional em profanar as
com especulações. Ela tem igualmente suas cerimônias, coisas sagradas�\ em seus ritos. realiza em sentido diame­
seus sacrifícios, suas pu rificações, suas preces, seus can­ tralmente oposto as cerimônias religiosas56. Por sua vez, a
tos e suas danças. Os seres que o mágico invoca, as for­ religião, se nem sempre condenou e proibiu os ritos mági­
ças que emprega não são apenas ela mesma natureza que cos, os vê geralmente com desagrado. Como observam
as forças e os seres aos qLiais se dirige a religião; com m u i ­ Hubert e Mauss, há, nos procedimentos do mágico, algo
ta freqüência, s ã o exatamente os mesmos Assim, desde . ele intrinsecameme anti-religioso57. Portanto, ainda que
as sociedades mais i n feriores, as almas dos morros são possa haver alguma relação entre esses dois tipos ele insti­
coisas essencialmente sagradas e são obj eto de ritos reli­ tuições, é difícil que elas não se oponham em algum pon­
giosos. Ao mesmo tempo, porém, elas desempenharam to; e é ainda mais necessário perceber em que se d istin­
na magia um papel considerável. Tanto na Aust
rália50 co­ guem na medida em que pretendemos limitar nosso estu­
mo na Melanésia51, tanto na Grécia como nos povos cris­ do ã rel igião e deter no ponto em que começa a magia.
tàoss2, as almas dos morros, suas ossadas, seus cabelos, Eis de que mane ira se pode traçar uma linha ele de­
estão entre os intermediários muitas vezes utilizados pelo marcação entre esses dois domínios.
26 A.\ FORMAS ELE.l/EJ\TARES DA l7DA RELJG!OSA VI ESTÕES PREUWi\ARfil 27

lhes <;ão acrihuíclos a questão de c;aber dt' que maneira os 111!íg1n). Os demônios são igualmente u m instrumenro
homens puderam ter a idéia desses se res é hascance sim­ usual da ação mágica. Ora, também os dernônios são se­
ples: basca examinar quais são as forças que, po r sua ex­ res cercados de p roibições : também eles são separados.
cepcio na l energia, foram capazes de impressionar tão ,-i­ ,·ivem num mundo ã parte e. inclusive, costuma ser d ifícil
vamente o espi riLo humano para inspirar sentimentos reli­ distingui-los dos deuses pro priamente ditoss3. Aliás, mes­
giosos. Mas se, como ten tamos esrabelecer, as coisas sa­ mo no crist ia n ism o, não é o diabo um deus decaído? E,
gradas diferem em natureza das coisas profa nas, se são de indepen dente até de suas origens. não tem ele um caráter
uma outra essência, o p roblema é muito mais comp lexo. rel igioso pelo fato mesmo ele o inferno, cio qual é o pre­
Pois é p reciso perguntar então o que levou o homem a posto, ser um elemento i nd i spensá vel da rel ig iã o cristã7
ver no mundo dois mundos heterogêneos e incompará­ l lá inclusive divindades regu la res e ofi cia is que sào invo­
veis, quando nada na experi ência s<::n sível pa re cia dever cadas pelo mágico. Algumas vezes , são os deuses de um
s ugerir-lhe a id6ia de uma dualidade Láo radical . povo e.st rang<.:i ro: por exemplo, os mágicos g regos faziam
inlervir deuses egíp c ios , assírios ou j u deus . Ou tras vezes,
s:io deuses nacionais mesmos: I IécaLe e D iana eram obje­
IV lO de um culto mágico ; a Virgem, Cristo e os santos foram
utilizados da mesma maneira pe los mágicos cristàos5 1 •
Entretanto, essa definição não é ainda com pleta , pois Será que se deveria então dizer que a magia não pode
convém igua lmen te a duas ordens de fatos que, embora ser disti nguida com rigor da rel igião? Que a magia está re­
a parentados entre si, precisam ser distinguidos: trata-se da p leta de reli g iã o. como a rel i g ião de magia. e que. por
magia e da rel igião . co nsegu i nte . é impossíve l se pa rá-l as e definir uma sem a
Também a magia é feita de crenças e de ritos. Assim outra? �las o que torna essa tese dificilmente sustentável é
como a religi ão , tem seus mitos e seus dogmas; eles são i
: marcad a repugnâ ncia da rel igião pela magia e, em con­
apenas mais rudimenrares, certamente porq u e . buscando trapart ida, a hostilidade da segunda pela primeira. A magia
fins técnicos e utili tários, a m agi a não perde seu tempo tem uma espécie de prazer profissional em profanar as
com espe cula çôes . Ela tem ig ualmente suas cerimônias, coi sas sagradas'i'i ; em seus ritos, realiza em sentido diame­
seus s acrifí cios, suas pu ri ficações, suas preces, seus can­ tralmente oposto as ceri mônias re l ig iosass6 . Por sua vez, a
tos e suas danças. Os seres que o mágico i nv oca , as for­ re l igião, se nem sempre condenou e p roibiu os ritos mági­
ças que emprega não são apenas da mesma natureza que cos, os vê gera l m en t e com desagrado. Como observa m
as forças e os seres aos quais se clirige a religião; com mui­ ! lubert e Mauss, há, nos p roced i m entos do mágico, algo
ta freqüência , são exatamente os mesmos . Assim, desde de int ri nse ca me nt e anti-re lig ioso17. Portanto, a i nda q u e
as socie d a des mais inferiores. as almas dos mortos são possa haver algum a re l ação entre esses dois tipos ele insti­
co isas essencia l mente sag ra da s e c;ào objeto ele ritos reli­ tuições. é difícll que elas não c;e opon ham em algum pon­
giosos. Ao mesmo tempo. porém, elas desempenh a ra m to; e é ainda ma is necessário perceber cm que se distin­
na magia um papel considerável. Tamo na Auscráliaso co­ guem na medida em que r retende mos limitar nosso estu­
rno n a Melanésia'i1, canto n a Grécia como nos povos cris­ do ã rel ig ião e deter no ponto em que começa a magia.
tàos52, as almas dos mortos, suas ossadas, seus cabelos, Eis d e que maneira se pode tra çar uma linha de de­
estão entre os intem1ediários mu itas vezes utilizados pelo marcação entre esses dois domínios.
28 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGIOSA QUESTÔES Pf?ELIM!NARES 29

As crenças prorriamente religiosas são sempre co­ uma mesma vida. Não existe ip,rr�ja mágica. Entre o mági­
muns a uma coletividade determinada, que declara aderir co e os ind ivíduos que o consultam, como também entre
a elas e praticar os ritos que Lhes são solidários. Tais cren­ esses indivíduos, não há vínculos duráveis que façam de­
ças não são apenas admitidas, a título individual, por to­ les os membros de um mesmo corpo moral, comparável
dos os membros dessa coletividade, mas são próprias do àquele fo1mado pelos fiéis de um mesmo deus, pelos pra­
grupo e fazem s ua unidade. Os indivíduos que compôem ticantes de um mesmo culto. O mágico tem uma clientela,
essa coletividade sentem-se ligados uns aos outros pelo não uma igrej a e seus clientes podem perfeitamente não
,

simples fato de terem uma fé comum. Uma sociedade cujos manter entre si nenhum relacionamento, ao ponto de se
membros estão u n idos por se representarem da mt:sma ignorarem uns aos outros; mesmo as relações que estabe­
maneira o m un d o sagrado e por traduz irem essa repre­ lecem com o má gi co são, em geral , acidentais e passagei­
sentaçao comum em práticas idênticas, é isso a que cha­
mamo� uma 1gre1a. Ora. não encontramo� na hhtória. n::­
ras: são em tudo semelhantes às de u m doente com seu
.
médico. O caráter oficial e publico com que às vezes ele é
ligião sem igreja. Às vezes a igreja é est rit amente nacional. invest i do não modifica em nada a situação; o fato ele
outras ,·ezes estende-se para além das fronteiras; ora exercer sua função abertamente não o une de maneira
abrange um povo inteiro (Roma, Atenas, o povo hebreu), mais regular e durável aos que recoffe m a seus serviços.
ora compreende apenas uma de suas frações (as socieda­ É verda de que, em certos casos, os mágicos formam
des cristãs desde o advento cio protestantismo); ora é diri­ enu·e si sociedades: acontece ele se reunirem mais ou me­
gida por um c orpo de sacerdotes, ora é mais ou menos nos periodicamente para celebrarem em comum certos ri­
desprovida de qualquer órgão clirigenre oficiaJ58. Mas, on­ tos: conhecemos o luga r que ocupam as reuniões de feiti­
de quer que obse rvemos uma vida religiosa, elíl tem por ceiras no folclore europeu. Mas, antes ele mais nada, no­
substrato um grupo definido. Mesmo os cultos ditos priva­ tar-se-á que tais associações de modo nenhum são indis­
dos. como o culto doméstico ou o culto corporativo, satis­ pensáveis ao funcio namento da magia; são inclusive raras
fazem essa condição, pois são sempre celebrados por e basta nt e excepcionais. O mágico não tem a menor ne­
uma coletividade - a família ou a corporação. Aliás, assim cessidade, para praticar sua a1te, de u nir-se a seus con fra­
como essas religiões particulares são, na maioria das ve­ des. Ele é sob retu do um iso lado; em geral, longe de bus­
zes, apenas formas especiais de uma religião mais geral car a sociedade, a evita. "Mesmo em relação a seus cole­
que abarca a totalidade ela vicJa59, essas igrejas restritas, na gas, conserva sempre uma atitude rese1vada. "61 Ao contrá­
realidade, não são mais que capelas de uma igreja mais rio, a religião é inseparável ela icléia d e igreja. Sob esse
vasta, a qual, por causa dessa extensão mesma, merece primeiro aspccLo, já exi s te entre a magia e a religião uma
ainda mais ser chamada por esse nome00. diferença essencia l . Além cio mais, e sobretudo, essas so­
Algo bem diferente se dá com a magia. Claro que as ciedades mágicas, quando se formam, jamais compreen­
crenças mágicas jamais deixam de ter alguma gencralida­ dem, muito pelo contrário, todos os adeptos ela magia,
dt:; co m freqüência estão difusas em largas camadas ele mas apenas os mágicos; os leigos, se é possível chamá-los
população e há inclusive muitos povos em que seu nú­ assim, ou seja, aqueles em proveito dos quais os ritos são
mero ele praticantes não é menor que o ela religião pro­ celebrados, aquele�, em suma, que representam os fiéis
priamente elita. Mas elas não têm por efeito ligar uns aos cios cultos regulares, são excluídos dess es encontros. Ora,
outros seus adeptos e uni-los num mesmo grupo, vivendo o mágico está para a magia assim como o sacerdote para
30 AS FORMAS J::LHMENTARES DA VIDA RJ::L!GlOSA tJl 1ESTÕES PRELIMINARIJS 31

a religiã o, e um colégio de sacerdotes não é um a igreja, ro de religiões americanas, assim como ela rel igiã o roma­
como tampouco o seria uma congregação religi o sa que na (para citar apenas dois exemplos); pois ela é, como
prestasse a a lgum santo, na sombra do cl a ustro, um culto Vl'remos mais adiante, estreitamente solidária ã idéia de
parti c ul a r. Urna igreja não é s implesmente uma confraria . l ima, e a idéia de alma não é das que possam ser inteira­
sace rd ota l; é a com u nidade moral formada por todos os mente abandonadas ao arbítrio dos particulares. Em uma
crentes ele uma mesma fé , tanto os fiéis como os sacerdo­ palavra, é a igreja ela qual ele é membro que ensina ao in­
tes. Uma sociedade desse gênero normalmente não se ve­ divíduo o que são esses deuses pessoais, q u a l é seu pa­
rifica na magia 62 . pel, ele que maneira deve entrar em contato com eles, ele
Mas, se introduzimos a noção de igreja na definição que maneira deve honrá-los. Quando analisamos metodi­
de religião, não estaremos excluindo dela. ao mesmo tem­ ni mente as doutrinas dessa igreja, seja qual for, surge um
po, as religiões individuais qLie o indivíduo institui para si momento em que encontramos no trajeto aquelas que di-
mesmo e celebra por conta própria' Ora, há poucas socie­ 1.l'm rcspeito aos culros especiais. Ponamo, não temos aí
dades em que estas não ocorram. Cada Oji bway, corno ve­ duas religiões ele tipos diferentes e voltadas em sentidos
remos mais adiante, tem seu mcmit11 pessoal que ele pró­ opostos, mas sim, ele ambos os lados, as mesmas idéias e
prio escolhe e ao qual presta deveres rel ig iosos particula ­ os mesmos princípios, aplicados a q u i às circunstâncias
res; o melanésio nas ilhas Banks tem seu lamanfu63; o ro­ que interessam à coletividade cm seu conjunto, ali, ã vicia
mano tem seu genfw,--ó4 ; o cristão, seu santo pad roeiro e do indivíduo. A soliclarieclacle é inclusive tão estreita q ue ,
seu anjo ela gua rda, etc . Todos esses cultos parecem, por cm alguns povos66, as cerimônias através das quais o fiel
defi nição , ind ependentes ela icléia d e grupo. E essas rel i­ entra pela primeira vez em comunicação com seu gênio
giões indivi duais não apenas são muito freqüentes na his­ protetor se misturam a ritos ele caráter púb l ico incontestá­
tória: alguns se perguntam hoje se elas não estão destina­ vel, a saber, os ritos de iniciaçãoó7.
das a se tornar a forma eminente ela vicia religiosa e se não Restam as aspirações contemporâneas a uma religião
cheg a rá o dia em que não haverá outro culto senão aquele que consistiria inteiramente em estados interiores e subje­
q u e cada um celebrará livremente em seu foro interio1-6s. tivos, e que seria livremente construída por cada um de
Mas, clcixanclo provisoriamente ele lado essas especula­ nós. Mas, por mais reais q u e sejam, elas não poderiam
ções sobre o futu ro , se nos limitarmos a considerar as reli­ afetar nossa definição, pois esta só pode aplicar-se a fatos
giões tais como são no presente e tais como foram no conhecidos e realizados, nào a virtualidades incertas. Po­
passado, aparece com evidência que esses cultos indivi­ demos definir as religiões tais como são ou tais como fo­
duais constituem, não sistemas religiosos distintos e autô­ ram, não tais como tendem mais ou menos vagamente a
nomos, mas simples aspectos el a religião comum a toda ser. É possível que esse individualismo religioso seja des­
igreja da qua l os indivíduos fazem parte. O santo padroei­ t i nado a traduzir-se nos fatos, mas, para poder dizer em
ro dos cristãos é escolhido na lista oficia l cios santos reco­ que medida, seria preciso já saber o que é a religião, de
nhecidos pela igreja católica, e são igualmente regras ca­ que elementos é feita, ele que causas resulta , q u e função
nônicas que prescrevem ele que maneira cada fiel eleve preenche; questões todas essas cuja solução não se pode
cumprir esse culto particular. Do mesmo modo, a idéia de prejulgar enquantc não se tiver ultrapassado o limiar ela
que cada homem tem necessariamente um gênio protetor pesquisa. É somente ao cabo desse estudo q u e podere­
está, sob formas diferentes, na base ele um grande núme- mos tratar de antecipar o futuro.
32 AS FORMAS ELEMENTARES DA VTDA JU:.'LJGIOSA

Chegamos, pois, à seguinte definição: uma religião é < \ P Í'I L.JLO II


1tm sistema solidário de crenças e de práticas relativas a PRINCIPAIS CONCEPÇÕES
/\S
DA RELIGIÃO ELEMENTAR
coisas sagradas, isto é, separadas, proib idas, crenças e
p1ât icas que reúnem numa mesma comunidade moral,
chamada igreja, todos aqueles que a elas aderem. O se­
gundo elemento que participa assim de nossa definição
não é menos essencial que o primeiro, pois, ao mostrar
que a idéia de religião é inseparável ela ieléia ele igreja, ele
faz pressentir que a religião eleve ser uma coisa eminente­
mente coletiva6H

1 - O animismo

Munidos dessa definição, podemos sair em busca da


rdigião elementar que nos propomos alcançar.
As religiões, mesmo as mais grosseiras que a história
e a etnografia nos fazem conhecer, já são ele uma comple­
xidade que se ajusta mal à ieléia que algumas vezes se faz
da mentalidade primitiva. Nelas encontramos não apenas
um sistema cerrado de crenças e de ritos, mas inclusive
tal pluralidade de princípios diferentes, tal riqueza de no­
ções essenciais, que pareceu im possível perceber nelas
ouLra coisa que o produto tardio de uma evolução bastan­
te longa. Donde se concluiu que, para descobrir a forma
realmente original da vicia religiosa, era necessário descer,
através ela análise, mais abaixo dessas religiões observá­
veis, elecompô-las em seus elementos comuns e funda­
mentais, para descobrir se, entre estes últimos, haveria al­
gum cio qual os outros derivaram.
Ao problema assim colocado, duas soluções contrárias
foram propostas.
AS FORMAS ELEMENTARJJS Dll VIDA l<ELJGIOSA 11/ /'.STÕFS PREL/ill/NllRES 35

Não existe, por assim dizer, sistema religioso, antigo ( ompreender-se-ft melhor que é indispensável tentar u m
ou recente, no qual, sob formas diversas, não se encon­ novo caminho, quando s e tiver compreendid o a insufi-
trem lado a lado como que duas religiões, as quais, em­ 1 1 ência dessas concepções tradicionais.
bora estreitamente unidas e até penetrando-se mutuamen­
te, não deixam de ser distintas. Uma dirige-se às coisas da
natureza, seja às grandes forças cósmicas, como os ven­
tos, os rios, os astros, o céu, etc., seja aos objetos de todo
tipo que povoam a superfície da terra, plantas. animais, Foi Tylor quem constituiu, em seus traços essenciais,
pedras, etc.; por esse motivo lhe dão o nome de naturis­ .1 teoria animista�. Spencer, que a retomou cm segu ida,

mo. A outra tem por objeto os seres espirituais. os espíri­ n.i o o fez. é verdade, sem nela introduzir algumas modifi­
tos, almas, gênios, demônios. divindades propriamente cações>. Mas, em �uma, tanto para um como para outro as
ditas ..igcntes ammados e consciences <.:omo o homem, questões se <.:olc>Lam nos mt:smos termo:>, e a� solu1,ocs
mas que se distinguem dele pela natureza dos poderes
.

.H.lotaclas. com exceção de uma, são exatamente as mes­


que lhes são atribuídos e, sobretudo, pela característica mas. Podemos portanto reunir essas duas doutrinas na ex­
particular de não afetarem os sentidos do mesmo modo: posição a seguir, assinalando, porém, no momento opor­
tuno, o ponto a panir do qual elas di ve rgem
Para se ter o direito de ver nas crenças e práticas ani­
normalmente não são perceptíveis a olhos humanos. C:ha­
Ora, para ex­
.

mistas a forma primitiva ela vida religiosa, cumpre satisfa­


ma-se animismo essa religião dos espíritos.
plicar a coexistência, por assim dizer universal, dessas
Ler a um triplo desideralum: l) uma vez que, nessa hipó­
tese, a icléia ele alma é a noção cardinal ela religião, é pre­
duas espécies de culto, e.luas teorias contraditórias foram
propostas. Para uns. o animismo seria a religião primitiva,
ciso mostrar como ela se fo rmou sem tomar nenhum de
�eus elementos de uma religião anterior; 2) a seguir, é pre­
da qual o naturismo seria apenas uma forma secundária e

ciso ver ele que maneira as almas tornaram-se objeto c.lc


clerivacfa. Para outros, ao contrário, o culto ela natureza é

um culto e transformaram-se em espfritos; 3) enfim, já que


que seria o ponto de partida ela evolução religiosa, o cul­

o culto dos espíritos não é tudo em nenhuma religião, res­


to dos espíritos sendo apenas um caso particular dele.

ta explicar como o culto da natureza derivou do primeiro.


Essa.s dua.s teorias são, até o presente, as C111ícas pelas
quais se tentou explicar racionalmeme 1 as origens do pen­
samento religioso. Ass im, o problema capital que a ciência
das religiôes se coloca freqüentemente s<..: reduz a saber A idéia de alma teria sido sugerida ao homem pelo
qual dessas duas sol uções é preciso escolher, ou se não espetáculo, mal compreendido, da dupla vida que ele le­
seria melhor combiná-las, e, neste caso, que lugar deve-se va normalmente no estado de vigília, de um lado, e du­
atribuir a cada um desses dois elementos2. Mesmo os es­ rante o sono, de outro. Para o sclvagem6, com efeito, suas
tuclim•os que não admitem nenhuma dessas hipóteses em rcpre'>entações durante a vigília e aquelas que percebe no
sua íorma sistemática, não deixam de conservar esta ou sonho possuem, ao que se diz, o mesmo valor: ele objeti­
aquela das proposições sobre as quais elas repousam3. va as segundas como as primeiras, ou seja, vê nelas a
Há, portanto, um ceita número ele noções acabadas e de imagem de objetos �xteriores cujo aspecto elas reprodu­
aparentes evidências que é necessário submeter à crítica zem mais ou menos exatamente. Assim, quando sonha
antes de abordar, por nossa conta, o estudo dos fatos. que visitou um país distante, acredita ter e5tado realmente
36 AS FORMASELEMENTARES DA VIDA REUG!OSA 1,JI f\7ÔES PRELLIILVARES 37

, ,.1111 ir-se para inclinar oc; espíritos no mesmo sentido: a


'-llln>pe,
lá. Mas ele só po de cer ido 5e exiscem dois seres nele: um,
a apoplexia, a catalepsia, o êxtase. em uma pala­
\ 1.1, todos os casos de insensibilidade temporária. De faca,
::.eu corpo. que permaneceu deitado no chão e que ele
reencontra ao despenar na mesma posição; outro que.
1·-.ses casos se explicam muito bem a partir da hipótese de
qttl! o princípio da vida e do sentin1ento pode deixar mo-
durante o mesmo tempo, moveu-se através d o espaço.
Do mesmo modo, se, durante o sono, se vê conversando
com um de seus companheiros que ele sabe estar distan­ 11u.:ntaneamente o corpo. Por outro lado, era natural que
te, conclui que também este último é composto de dois 1 ·sse princípio fosse confundido com o duplo, uma vez
seres: um que dorme a uma cena distâ ncia, e outro que < J lll! a ausência deste durante o sono tem colidianamente
1 >< >r efeito suspender a vicia e o pensamento. Assim obser­
' .1çoes diversas pareciam verificar-se mutuamente e con-
veio manifestar-se por meio do sonho. Dessas experiências

1 1 1 rnar a idéia da dualidade constitutiva do homemH.


repetidas desprende-se pouco a pouco a idéia de que
existe em cada um de nós u m duplo, u m outro , que, em

Mas a alma não é um es p írito . Está presa a um corpo


determinadas condiçôcs, cem o poder de deixar o orga­
nismo onde resicle e sa ir a peregrinar ao longe.
do qual só excepcionalmcntc sai: e, enquanto não for na­
d;t a l ém disso, não é objeto ele nenhum culto. O espírito,
Esse duplo reproduz naturalmente todos os craços es­

.10 contrário, embora tendo ge ralm e nte por residência


senciais cio ser sensível que lhe serve ele invólucro exterior;
mas, ao mesmo tempo, distingue-se dele por várias caracte­
rísticas. É mais móvel, já que é capaz ele percorrer num ins­ uma coisa determinada, é capaz de afastar-se dela à von-
tante vastas distâncias. É mais maleável mais plástico pois 1.1de e o homem só pode entrar em relações com ele ob­
para sair do corpo, deve poder passar �elos orifícios do or� "L'rva ndo precauções rituais. Portanto, a alma só podia
ganismo, especialmente o nariz e a boca. É representado, tornar-se espírito com a condição de transformar-se: a
�11nples aplicação das idéias precedentes ao fato da morte
produziu naturalmente essa metamorfose. Para uma inteli­
portanto, como feito de matéria, sem dúvida, mas de uma
matéria muito mais sutil e etérea do que todas aquelas que
gl!nc1a rudimentar, com efeito, a morte não se distingue
(k um longo desmaio ou de um sono prolongado; ela
conhecemos empiricameme. Esse duplo é a alma. E tudo
indica que, num grande número de sociedades, a alma foi
concebida como uma imagem do corpo; acredita-se inclu­ tem todas as aparências disso. Assim, parece que também
da consiste numa separação da alma e do corpo, análoga
. 1 que se produz toda noitL:; mas como, em seme lh a nte
sive que ela reproduz as deformações acidentais do corpo,

l aso, nào se vê o corpo reanimar-se, forma-se a i d é i a de


como as resultantes de ferimentos e mutilações. Certos aus­
tralianos, após terem matado seu inim igo, conam-lhe o po­
legar direito a fim de que sua alma, privada conseqüente­ 1 1 ma sepa ração sem limite de tempo determ inável. Inclusi­

m e nt e cio p olega r, não possa atirar a lança e se vingar. \'l', uma vez destruído o corpo - e os ritos funerários têm

Mas, embora assemelhando-se ao corpo, ela já possui ao l'm parte por objeto apressar essa destruição -, a separa­
mesmo tempo algo de semi-espiritual. Diz-se que "é a par­ ( .10 é tida necessariamente por definitiva. Eis, portanto,
te mais sutil e mais leve do corpo", que "não tem carne, v" pír itos desligados de todo organismo e soltos livremen-
nem ossos, nem nervos"; que, quando se quer pegá-la, na­ 1�· pdo espaço. Como seu número aumenta com o tempo,
da se sente; que ela é '·como um corpo purificado"'.., _ lonna-se, ao lado d.1 população viva, uma população de
Aliás, juntamente com esse dado fundamental do so­ .limas. Essas almas de homens têm necessidades e pai­
nho, outros fatos da experiência vinham naturalmente \úes de homens; procuram, portanto, misturar-se à vida
38 AS FORMAS ELENEl\'TARES DA \'IDA REUGJOSA \ / 1 1/ 1 l'J<lllMINARES 39

de seus compan heiros de ontem . seja para ajudá-los, �cja nf1cios teriam sido oferendas alimentares desti
para prej ud icá-los, conforme os sentimentos que co nser­ 11 • l 1 1 ·,, 11 1sfazer as necess idades e.los d efu ntos ; os pri­
varam por eles. Ora, sua narureza faz delas, conforme o h 1 1'- d 1 . m:s teriam sido túmu losw.
caso, ou auxiliares muito preciosos, ou adversários muito
temidos. Essas almas podem, com efeito. graças à sua ex­ �l 1 o rn o esses espíritos eram de origem huma na .
1 1 M 111IL'ressavam pela vicia dos homens e agia m su­
1s
trem a fl u idez, penetrar nos corpos e causa r todo tipo de
deso rdens, ou então, ao contrário, aumentar sua vitalida­ l' 1 1 1 1 1 1 1 1 l l' apena s sobre os acontecimentos hu ma nos .
x pl 1r< 1 r de que maneira outros espíritos foram ima­
1
de. Assim, surge o hábito de atribuir-lhes todos os aconte­ J • 1 1 ,
cimentos ela vida que fogem um pouco do comum: há l 1 1 1d11" p.11.1 explicar ou tros fenômenos do universo. e de
pouco:> des:>es acontecimentos q ue não possam exp li ca r. q 1 1 1 111 1111 11 . 1 po rtanto . ao lado d o cu l to dos antepassa -
Elas consmuem, portanto, uma espéue de a rsenal de cau­ d• 1
sas SL'mprL' d isponíveis e que jamais deLxam l.:111 a pu
< 1 1 11�1i1u1 se um culto ela natureza.
ros o m ismo sena devida a
espírito cm busca de exp licações . Um homem parece ins­
1',11.1 1 }"lot. t:ssa extensão do am
1 1 1i 1 11,dld.1dl' pa rt icular do primiti vo que, como a criança .
pirado? Fala com veemência? Encontra-se como que acima 11 \11 .li,,, d is t ingu ir o animado do inanimado. Já q u e os
de si mesmo e do nível médio dos homens? É que uma a l­ p 1 h 1 1 1 " ' " sl·rcs dos quais a criança começa a fo rm a r-se
ma benfazeja está dentro dele e o ani ma . Um outro �ofre 1 1 1 1 1 1 1d1 1.1 s,10 homens, isto é, el a própria e seus p róxi-
um ataque de loucura? É que um espírito mau introduziu­ 1 1 11 ' t 1 1 11 1 1 base no modelo da natureza humana que ela
1 n 1m:eber todas as co isas . Nos se us brinquedos,
,
se em seu corpo e u·ouxe-lhe a perturbação. Não há doen­ 11 1 1d•
ça que não possa ser relacionada a alguma influência des­ 11l iw111s <.k: todo tipo que afetam seus sentidos. ela vê
se gênero . Assim, o poder das almas cresce com tudo o
111 1
"( 11 ' hns como ela. Ora. o primitivo pensa como uma
, f 1 1 1 1i, .1. < :onseqüememcnte, também ele está inclinado a
'i
que lhes é atribuído, de tal maneira que o hom em acaba
por ver-se prisioneiro desse mundo imagi nário do qual, no 1 1 > 1 s.1s, mesmo inanimadas. de uma natureza aná
entanto , é o amor e o modelo. Cai sob a dependência des­
1 1 ,1
1 ,1 Ml•l. Tendo c hegado, ponamo, pelas razões expos-
r

sas forças espiri ru a i s que criou com sua própria mão e à


li '

sua próp ria imagem. Pois, se as a lmas determinam a tal


1.1 1 1 1 , 1 b .1cima. à idéia de que o homem é um corpo que
p 1 1 1 1 0 ,m i ma , ele haveria necessariamente de atrib u ir
ponto a saúde e a enfermidade, os bens e os males , é pru­
111 1 1
1 • 1 1 1piios corpos brutos uma dual i dade do mesmo gê-
dente obter sua benevolência ou apaziguá-las q u a ndo es­
.i"

111 , , , dm:is seme l hantes à sua . Todavia, a esfera de ação


tão irritadas: daí as oferendas, os sacrifícios, as preces, em d1 1 1 1 d 1.1s nao rodia ser a mesma. Almas de homens só
suma, tod o o conj u nto elas obse1vâ ncias religiosas9.
Eis aí a al ma transformada. De si mples pr incípio vital,
1 1 1 1 1 1 1 d l u v n c i a di reta sobre o mundo dos homens: elas
11 1 1 1 l ll' l 1 1 organismo humano uma es pécie ele predileção,
anim ando um corpo de h omem , tornou-se um espír ito , 1 1 11 • < 1 1 1 1 1 q u : 1 m l o a morte deu-lhes a liberda de . Ao contrá-
um gênio , bom ou mau, uma divindade incl usive, segu n­ 1 1• . , 1 , i l 1 1 1 . 1.s d,1s coisas residem antes de Lu do nas coisas e
do a impo rtância dos efeitos que lhe são imputados. Mas, s.11 • •1 1.., 11k:radas causas produto ras de tudo o que nelas
;11 1 1 1 1 1 1 " , . A.:, pri meiras explicam a saúde ou a doen ça , a
, •
já q ue a morte é que Le ri a operado essa apoteose, é aos
mortos , em última instânci a , às almas dos antepassados, h d 1111d.1dv ou a falta de jeito, etc.; através das segu nelas
que teria se dirigido o primeiro culto da h u manidade . As­ l' 1 •li• 1 1 1 1 Sl' sobr e tu do os fenôme nos do mundo físico, a
sim , os primeiros ritos teriam sido ritos mortuários; os pri- 1 1 1 . 1 1 1 1 1 . 1 do.� rios ou dos astros, a gemúnaçào das plantas,
40 AS FORJIAS ELE\/J1NTARES DA \!//)ti Rl!.LIGJOSA (li /:S7ÚES PRl:.LL\fJNANHS 41

a proliferação dos animais, etc. Foi assim que a primeira 111111Lo d ifund i do dar a cada indivíduo, seja no momento
filosofia do homem, que está na base do culto dos ante­ 1k seu nascimento, seja mais ta rd e , o nome de um a n i -
pass ados, co mpl ecou -se por uma filosofia do mundo. 1 1 1 a l , de u m a p la nta, de um astro, de um objeto natural
Ante esses espí ritos cósmicos. o homem vi u-se num qualquer. Mas, por causa da extrema imprecisão de sua
estado de depe ndênc ia ainda mais evidente do que fa ce l i nguagem , é muito difícil ao primitivo dist i ngu ir uma me­
aos duplos errantes de seus antepassados. Pois, com estes l 1 fo ra ela realidade. Portanto, ele logo teria perdido de
últimos, ainda podia manter um comércio ideal e imagi­ \ 1sta que essas denominações eram apenas figuras e. to-
nário, ao passo que ele depende realmente das coisas; pa­ 1 1 1a n do-as literalmente, teria acabado por acreditar que
ra viver. tem necessidade delas; ponanto. acreditou igua l ­ u m ant epassado chamado Tigre ou Leão era realmente
mente ter necessidade dos espíritos que su postamente 1 1 1 11 tigre ou um leão. Em conseqüência. o culto prestado
animavam essas co isas e detemúnavam suas manifestações .1t(· ent ão a esse antepassado teria se transferido para o
d1n:rsa:.. Jmplorou sua assistência, solitnou-a mediante 11mal com o qual do ra \a nte era confundido: e o pera n ­
oferendas, preces, e a religião do homem completou-se do se a mesma subst i tu ição em relação às plantas. aos as-
numa religiào da natureza. 1 ros. a todos os fenômenrn; naturais, a religião ela natureza
l lerbert Spencer objeta a essa explicação que a hipó­ 11·na romado o lugar da velha religião cios mortos. Certa-
tese sobre a qual repousa é contestada pelos fatos. Adnú­ 1m:11Le, ao lado dessa confusão fundamental, Spencer ass i-
te-se. diz ele, que houve um momemo em que o homem 11.1la outras que teriam, aqui ou ali, reforçado a ação ela
não percebia as diferenças que separam o animado cio p 1 1meira. Por exemplo, os animais que freqüenram os ar-
inanimado. Orn, à med ida que se sobe na escala animal, 1l'dores dos túmulos ou as casas dos homens teriam sido
vê-se aumentar a capacidade de fazer essa distinção. Os 1nmados como almas reencarnadas. e é nessa qual id ade
anim a is superiores não confundem um objeto que se mo­ que os teriam adoradoll; ou, então, a m on t a n ha , que a
\'e por si mesmo e cujos movimentos se ajuswm a fins. 1 1 1d i çã o apont�n·a como o lugar de origem da ra<;a, terin
com aqueles movidos de fora e mecanicamente. ''Quando ,11 .ihaclo por se transformar na origem mesma dessa raça;
um gato se entretém com um rato que pegou, se ele o vê 11•riam acreditado que os homens eram os descendentes
pe rma necer por mui to tempo imóvel, toca-o com a ponta d1·1:! porque os a nt e passados tinham vindo de lá e, r o r-
da pata para fazê-lo correr. Evi de n te me nte, o gato pen sa 1 . i l llO, ela própria seria vista como antepassaclo 1 3. Mas, co-
que um ser vivo que for inco mo d a do procurará e sca ­ 1 1 10 confessa S pencer, essas causas acessórias só t eri a m ti­
par. " 1 1 O homem, mesmo prim i tivo, mlo p ode ria, no en­ do u ma influência sec u ndá ria : o que teria principal mente
tanto, ter uma i n te ligên c ia inferior ã ci os a n i mais q u e o t l1 ·11,;rminado a instituição cio natu rismo é "a interpretação
precederam na evol u ção ; assim, não pod e ser por falta ele l l ll'rnl ci os nomes metafóricos"t4.
d isc e rn ime nto que ele pas sou do culto do s an tepassados Precisávamos expor essa teoria a fim de que nossa
ao culto elas coisas. ,1 prt•senraç:io cio aninúsmo fosse co mpleta ; mas ela é mui­
S e gu n d o Spencer, q u e neste po n to , mas somente l• > 1 1 u deq uacla aos fatos e está por demais universa lmente
neste, afasta-se de Tylor. essa passagem se deve ele fato a .iliandonada hoje para que haja motivos de deter-se ainda
u ma confusão, mas de outra espécie . Ela seria, p elo me­ 111.11s nela. Para podt.:r exp licar por uma i l u são um fato tão
nos na maior parte, o resu l tado de uma série de ambigüi­ V,<'1,d como a religião ela nat u reza . seria preci so que a ilu-
cla<les. Em muitas sociedades inferiores, é um costu me • 10 im·ocacla se devesse a causas de uma igual generali-
•.
42 AS FOJi\IAS ElE!lfEf\7'ARES DA VIDA REL/GfOSA ljl ESTÕES PREll.MINARES 43

dadc. Om, ainda que enganos como os que Spenct:r men­ 1 1.1 L da mitologi.i. ='Ião cabe duvidar, com efeito. que ela
cio na com uns raros exemplos pudessem explicar, lá onde 'eja algo essencialmente religioso por sua natureza, suas
os constatamos, a transformação do culto dos antepassa­ origens e suas fun ções . Foi da religião que os filósofos a
dos em culto da natureza, não se percebe por que razão receberam; assim, não se pode compreender a forma sob
eles teriam se produzido com uma espécie de universali­ .1 qual ela se apresenta entre os pensadores da Antiguida­
dade. Nenhum mecanismo psíquico necessitava deles. Cla­ de. se não se levarem em conta os elementos míticos que
ro que a palavra, por sua ambigüida de podia favorecer o
, serviram para formá-la.
equívoco; mas todas as lembranças pessoais deixadas pelo Mas se Ty lor teve o mérito de colocar o problema, a
antepassado na memória dos homens deviam opor-se à ,
. o]uçào que ele oferece não deixa de levantar graves difi­
confusão. Por que a tradição que representa,·a o antepas­ rnldades.
sado tal como havia sido, isto é, como um homem que vi­ Antes de mais nada, haveria reservas a fazer sobre o
veu uma vida de homem, teria por toda parte cedido ao principio mesmo que está na base dessa teoria. A<lmite-::.e
prestígio ela palavra? Por outro lado. devia haver alguma n>mo uma evidência que a alma é inteiramente distinta
dificuldade em admitir que os homens pudessem nascer do corpo e que, dentro ou fora dele, ela vive normalmen-
de uma monta nha, ele um astro, ele um animal ou ele uma 1e uma vicia própria e autônoma. Ora, veremosis que essa
planta; a idéia de tal exceção às condições ordinária::. ela rnncepção não é a cio primitivo; pelo menos, ela exprime
geração não poderia deixar de levantar fortes resistências. .1penas um aspecto da idéia que se faz ela alma. Para o
Assim, longe de o erro encontrar diante de si um caminho primitivo, a alma, embora independente, sob certos as­
aberto, razões de toda ordem pareciam dever defender os pecros, do organismo que a anima, confunde-se em pane
espíritos contra ele. Portanto, não se compreende como, a rnm este ú ltimo, ao ponto de não poder ser separada ra­
despeito de tantos obstáculos, teria podido triunfar de dicalmente dele: há órgãos que são, não apenas sua sede
uma mant:ira tão gemi. pri,·ilegiada, mas sua forma exterior e sua manifesracão
material . A noção é, portanto. mais complexa cio que su­
püc a doutrina e, conseqüentemente, é duvidoso que as
Il vxperiências invocadas sejam suficientes para jus ti fi cá-la .
pois, mesmo se permitissem compreender de que manei-
Resta a teoria el e Tylor, cuja autoridade é sempre 1, 1 o homem acreditou-se duplo. elas não saberiam expli­

grande. Suas hipóteses sobre o sonho, sobre a gênese das < , i r como essa dualidade não exclui, mas, ao contrário.
_
idéias de alma e espirito, são ainda clássicas. E importan­ 11 nplica, uma unidade profunda e uma penetração íntima
te. pois, testar ::.eu valor. dos dois seres assim d iferenciados.
Em primeiro lugar, deve-se reconhecer que os teóri­ Admitamos, porém , que a idéia de alma seja redutíYel
cos cio animismo prestaram um importante se1v1ço à ciên­ 1 1déia de duplo e n::jamos como teria se formado esta úl-
cia das religiões e mesmo à história geral elas idéias, ao 1 1 1na. Ela teria sido sugerida ao homem pela experiência
submeterem a noção de alma à análise histórica. Ao invés 1 lo sonho. Para compreender de que maneira, enquanto
de a considerarem, como tantos filósofos, um dado sim­ l'll corpo pennane....ia deitado no chão, era capaz ele ver

ples e imediato da consciência, viram nela, de maneira dura nte o sono lugares mais ou menos distantes, ele teria
hem mais justa, um todo complexo, um produto da histó- sido levado a conceber-se como formado por dois seres:
l'-l •IS FOflllAS ELEllE.VFARHS DA 1 7DA RELIGIOSA C>l ESTÔfil PRE.l..Llfl.\ARES

-;eu corpo, de um lado. e. de outro, um segundo si mL'-; pel 1 > nw'>mo tempo que n6c;· acreditamos vê-lo e ouvi-lo
mo, capaz de deixar o organismo no qual habita e de per­ .th onde no:. mesmos nos \Cmos. Segundo o animismo. o
correr o espaço. Mas. em primeiro lugar, para que essa hi­ primitivo explicará esses fatos imaginando que seu duplo
i
pótese de duplo pudesse mpor-se aos homens com uma 101 ,·isitado ou encontrado pelo duplo deste ou daquele de
e�pécic de necessidade. era preciso que fosse a única pas­ seus companheiros. Mas será suficiente que os interrogue.

sivei ou. pelo menos, a mais econômica. Ora, em realida­ ao despertar. para constatar que a experiência deles não
de há hipóteses mais simples, cuja idéia, ao que parece, t·oincidc com a sua. Dura nte o mesmo tempo. também
devia apresentar-se também naturalmente aos cspíricos. des tiveram sonhos, mas diferentes. ão se viram pa1t1c1-
Por que, por exemplo, o adormecido nào teria imaginado panclo da mesma cena; acreditam ter visitado lugares bem
que, d urante o sono, era capaz de ver a di s tâ nci a ? Para diversos. E uma vez que, em semelhante caso, cais contra­
di<,,:Ocs devem ser a regra, como elas não leva ria m 01. ho­
nH:: ns a dizcr·se que houve provavclmenLc erro, que dcs
atribuir-se um w l pod er, o dispêndio de imaginação seria
menor do que para construir essa complexa noçao de um
d u p lo , feito de uma substância etérea, semi-invisível, do imaginaram, que foram vítimas de uma ilusão? Pois há um
qual a cxp eri l: ncia direta não oferecia nenhum exemplo. n::no simplismo na cega cred ulidade qu e se atribui ao pri­
Em Lodo caso, supondo-se que cenas sonhos peçam natu­ mitivo. É improvável que ele objetive necessariamente to­
ralmente a explicação animista, há com ceneza muitos ou­ das as suas sensações. Não dcL-xará de perceber que, mes­

tros que são absolutamente refratários a ela. Com muita mo no estado de vigília, seus sentidos o enganam às vezes.

freqül:ncia nossos sonhos relacionam-se a acontecimentos l'or que os acreditaria mais infalíveis à noite que e.Jurante o

sados; revemos o que ,·imos ou fizemos durante a vigí­


�as dia? �luitas razões se opunham, portanto, a que tomasse fa­

lia, ontem. anteontem. em nossa juventude, etc.; sonhos t·ilmente seus sonhos por real idades e os interpretasse co­

como esses são freqüentes e ocupam um lugar considerá­ mo um desdobramento de seu ser.
,.el em nossa vida noturna. Ora, a idéia do duplo não é ca­ Além do mais. mesmo que todo sonho se explicac;se
paz de explicá-los. Se o duplo pode transportar-se de um perfeitamente pela hi pótese do duplo e inclus1\ e nào pu­
ponto a outro do espaço. não se compreende como lhe desse explicar-se de outro modo, faltaria dizer por que o
seria possível remontar o curso do tempo. Como é que o homem huscou dar-lhe uma explicação. Certamente, o
homem, por mais rudimentar que fosse sua inteligência, sonho constitui a matéria de um problema possíve l . Mas
pocl�ria acreditar, uma vez desperto, que acabara ele pre­ passamos constantemente ao largo de problemas que nüo
senciar realmente ou de to ma r parte em acontecimentos no:, colocamos, que nüo suspeitamos sequer, enquanto
que ele sabia terem se passado outrora( Como poderia :tlguma circunstância nüo nos fez sentir a necess i d a de ele
im ag ina r que Linha vivido durante o sono uma vida que colocá-los. Mesmo qua ndo o gosto da pura cspcculacâo é
despertado, a r efle x ã o está longe d e levantar Loc.las as
que•aõ
ele sa bi a ter há muiLo transcorrido? Era bem mais natural
que visse nessas imagens renovadas o que elas s:'.i.o real­ e<; a que poderia eventualmente aplicar-c;e; somen­
mente, isto é, lembr,mças, cais como ele as rem durante o tL· a atraem as que apresentam um interesse particular. So­
dia, ma<> de uma intensidade particular. bretudo quando se trata de fatos que se reproduzem sem­
Por outro lado, nas cenas em que somos arares e tes­ pre da mesma mareira, o coMume adormece facilmente a
temunhas enquanto dormimos. acontece freqüentemente t uriosidade e sequer pensamos em nos interrogar. Para
que um de nossos contemporâneos desempenhe um pa- ..,an1dir esse torpor, é preciso que exigências pr.íticas ou,
46 AS FORMAS ELEtl/EN'fARES DA VZDA RHLTGIOSA 1 li 'ESTÔE
S PRELh\llNARES 47

p e l o menos, um interesse teórico muito premente ve­ �onho::., ou a lguns deles, às movimentacões ele seu duplo.
nham estimular nossa atenção e voltá-la para esse l a d o . Mas isso não quer dizer que o sonho forneceu efetiva­
Eis aí como, a cada momento ela história, h á tantas coisas mente os elementos com os quais a icléia ele duplo ou ele
que renunciamos a compreender, sem mesmo ter cons­ .lima foi constrnícla; pois ela pode ter sido apl icada poste­
ciência ele nossa renúncia. Até épocas não muito distan­ riormente aos fenômenos do sonho, cio êxtase e ela pos­
tes, acreditava-se que o sol tivesse apenas alguns pés ele �essão, sem no entanto derivar deles. É freqüente que
diâmetro. Havia algo de incomp reensível no fato ele u m uma idéia, uma vez constituída, seja empregada para co­
disco luminoso tão pequeno ser suficiente para il uminar a < >rclenar ou esclarecer, com uma luz às vezes mais aparen­
Terra; no entanto, du rante séculos, a humanidade não te que real, fatos com os quais ela primitivamente não se
pensou em resolver essa contradição. A hereditariedade é relacionava e que não podiam, por s i próprios, sugeri-la.
um fato há muito conhecido, mas só recentemente procu­ l loje, prova-se correntemente Deus e a imortalidade ela
rou-se elaborar a sua teoria. Eram até aceitas certas cren­ .tlma mostrando que essas crenças decorrem dos princípios
ças que a tornavam inteiramente ininteligível: assim, para lunclamentais ela moral; em realidade, elas têm uma ori­
várias sociedades australianas de que iremos falar, a crian­ gem bem diferente. A história cio pensamento religioso
ça não é fisiologicameme o produto ele seus pais 1 6. Essa poderia fornecer numerosos exemplos dessas justificações
preguiça intelectual é levada necessariamente ao máximo retrospectivas que nada podem nos ensinar sobre a ma­
no primitivo. Esse ser frágil, disputando com dificuldade neira como s e formaram as icléias nem sobre os elemen­
sua vicia contra todas as forças que o assaltam, não tem los que as compõem.
tempo para o luxo em matéria ele especulação. Só deve Aliás, é provável que o primitivo distinga entre seus
refletir quando incitado a isso. Ora, é difícil perceber o :-.onhos e não explique todos ela mesma forma . . . Em nos­
que pode tê-lo levado a fazer cio sonho o tema de suas sas sociedades européias, mesmo as pessoas, muitas ain­
meditações. O que é o sonho em nossa vida? Como é pe­ < la, para quem o sono é uma espécie ele estado mágico­
queno o espaço que nela ocupa! Sobretudo por causa das religioso, no qual o espírito, a liviado parcialmente do cor­
impressões muito vagas que deixa na memória, da pró­ po, tem uma acuidade ele visão que não possui durante a
pria rapidez com que se apaga ela lembrança. E corno é , igília. não chegam ao ponto ele considerar toe.los os seus
surpreendente, portanto, que um homem de uma inteli­ o.;onhos como intuições místicas: muito pelo contrário, vêem
gência tão rudimentar tenha despendido tantos esforços 11�1 maior parte deles, como todo o mundo, apenas esta­
para encontrar sua explicação! De suas duas existências < los profanos, jogos ele imagens insignificantes, simples
sucessivas, a diurna e a noturna, é a primeira que devia . d ucinações. É possível supor que o primitivo sempre fez
interessá-lo mais. Não é estranho que a segunda tenha ca­ distinções análogas. Codrington diz formalmente, cios me­
tivado suficientemente sua atenção para que fizesse dela l.1 nésios, que eles não atribuem a migrações de almas to­
a base de todo um sistema ele idéias complicadas e desti­ ' los os seus sonhos indistintamente , mas apenas os que
nadas a ter sobre seu pensamento e sua conduta uma in­ 1 1 1 1 p ressionam fortemente sua imaginação17. Certamente
fluência tão profunda? , kvem-se entender como tais aqueles em que o aclorme-
Tudo tende a provar, portanto, que a teoria animista 1 ido ju lga-se em cantata com seres religiosos, gênios ben­

da alma, apesar cio crédito que ainda desfruta, deve ser lvitores ou malignos, almas cios mortos, etc. Do mesmo
revisada. Claro que, hoje, o próprio primitivo atribui seus 1 1 1 oc.lo, os Dieri distinguem muito claramente os sonhos
'f8 AS FO!l\/AS ELE..ltE.\1�1RES DA l 7{)A RFLJGIO!JA !JI T...ffÓES PREL/.11/,\tlRFS

ordmúrios e as \'isõec; norurnac; em que "e mostram ·1 clec; 1.er cn·r que a alma sobrevi\·e ao corpo (e ha reser\'as a
um anugo ou um parente fal ecido. Dao nomes diferentes 1..'ll1 itír sobre e:..'>e ponto), por que essa almJ, pelo simpk:s
a esses dois tipos de estados. 10 pri meiro, ,·f:em uma fato de e>tar agora desligada do organismo, mudaria com­
simples fantasia de sua imaginação; atribuem o segundo à pleta mente de natureza? Se, em vida, não era senão uma
ação de um espírito malignoHl . Todos os fatos que l lowitt toisa profa na, um princípio vital ambula nte, de que manei­
menciona a título de exemplos para mostrar como o aus­ '"' se transformaria de repente numa coisa sagrada, objeto
traliano atribui ã alma o poder ele abandonar o corpo têm de sentimentos rel igi osos? A morte não U1e acrescenta nada
igua l mente um caráter místico: o adormecido ju lga-se de essenc ia l, salvo uma maior liberdade de movimenLOs.
transportado ao país dos morros ou então conversa com 'bo estando mais ligada a uma residência oficial, doravan­
um companheiro dcfunto19_ Esses sonhos sao frcqüentes l l' da pode fazer o tempo tcxlo o que até então só fazia de
entre os prnrncivus-0. rui provavelmente em wrno desses 1101te; ma.., a ação que e capaz de exercer é ::.empre da me..,
fatos qrn. Sl formou a teoria. Para cxpl id-lus . aJm ite-M! 111.1 natureza Por qu1.; então os 'h·os leriam 'isto nesse du
que as almas dos mortos viessem reencontrar os vivos du­ pio desenraizado e ,·agabundo de seu companheiro de on­
ra n te seu sono, expl i cação tanto mais faci lmente aceita lt'lll algo mais cio que um semelhante? Tratava-se de um se­
porque nenhum faca de experiência podia invalidá-la. Só melhante cuja vi zinhança podia ser incômoda; não se trata­
que esses sonhos só eram possíveis onde j á houvesse a ' a de uma clivindadcl!.
idéia de espíritos, de a l mas, de país cios mortos, ou seja, Inclusive parece que a morte deveria ter po r efei to
onde a evolução rel igiosa estivesse relativamente avança­ dl'h i l itar as energ ias vitais, ao invés de realçá-las. De fato,
da. Longe de poderem fornecer à re l ig ião a noção funda­ uma crença muito difundida nas sociedades infe rior es
mental sobre a qua l repousa, tais sonhos supunham u m <Jll l..' a alma participa intimamente da vida d o corpo. Se cs-

sistema religioso já constituído e d o qual depcndiam2 1 . 11· e ferido, ela também o é, e no lugar corre::.pondente.
p, > rtanto ela de,·eria em·elhecer j u ntamente com ele. llá
P«>'os em que nao se prestam deveres funer.í rios aos ho
ll1 111L·ns chegados ã senilidade; eles são tratados como se
1.11nhém sua alma li\ esse se tornado seniP3. Aco n tec e
Mas chegamos ao que constitui o núcleo mesmo da 111L·smo q ue sejam regul armente mortas. antes de terem ai­
doutrina. l llt'<ldo a velhice, as person:ilidades privilegiadas, reis o u
,,11 l· rdotes, tidas corno detentoras d e u m poderoso espí ri-

De onde quer que venha a idéia de um duplo, ela não


basta, como reconhecem ani mistas, para explicar como 11 > cuja proteção a so ci edade deve conservar . Q uer-se as­
" ' ' \\ l'Vilar que esse espírito seja atingido pela decadência
os

se fo rmou esse culto cios antepassados do qual se quis fa­


zer o modelo inicial de todas as religiões . Para que o duplo l t'>i( <t e.los que são seus depositários momemâneus; para
'ie tornasse ohjeto de um culto, era preci so que dcixa'ise de 1 1111n retiram-no do organismo cm qu e reside antes que a
ser uma simples réplica do indi\'íduo e adquirisse as ca rJc­ 1d.1dl..' possa enfraquecê-lo e o transportam, enquanto na­
tcrbtic-as necessárias para ser elevado à ordem dos seres sa­ 'l 1 puJeu ainda de seu vigor, para um corpo mais jovem,
grados. É a morte, dizem. que opernria essa trnnsformaç:.io. 1 1 u qual poderá conser\'ar n
i tacla sua \'italidade!•. Assim,
J\1as de onde pode vir a virtllde que lhe atribuem? Ainda ' 1 1 1 .1 ndo a morte resulta da doença ou da velhice, parece
que a analogia do sono e da morte fosse suficiente para fa- ' llll' .1 alma só pode conservar forças minguadas; e, uma
50 AS FOR.llAS ELEME\TARES DA \7DA REIJC!OSA Ql füTÕES PRELl,\Jl.\ARES 51

\·ez dissolvido definitivamente o corpo não "e percebe 1lma-. d o s morros· dirigem-lhec; preces. invocacões. fa­
como ela poderia lhe sobreviver, se é apenas seu <luplo. zem-lhes oferendas e sacrifíc ios. Mai> nem todo ti11dalo (:
A idéia <le uma sobrevivência torna-se, desse ponto d e objeto dessas práticas rituais; somente têm essa honra os
vista, dificilmente inteligível. Há, portanto, um hiato, u m que emanam ele homens aos quais a opinião pública atri­
vazio lógico e psicológico entre a idéia ele um duplo em buía, em vicia, uma virtude muito especial que os mela­
liberdade e a de um espírito ao qual se presta um culto. nésios chamam de mana. Mais adiante teremos ele preci­
Esse intervalo afigura-se mais considerável ainda sar a idéia que essa palavra exprime; por ora, será sufi­
quando se sabe o abismo que separa o mundo sagrado ciente dizer que é o caráter distintivo de todo ser sagra­
do mundo profano, pois é evidente que uma simples mu­ do. O mana, diz Codrington, "é o que permite produzir
dança de grau não poderia ser suficiente para fazer passar efeitos que estào fora do poder ordinário dos homens,
uma coisa ele uma categoria à outra. Os seres sagrados fora dos processos ordinários da natureza"'2'. Cm sacer­
não se disunguem apenas <los profanos pda:. formas es­ dutt::, um feiticeiro. uma fórmula ritual têm o mana, assim
tranhas ou desconcertantes que assumem ou pelos pode­ como uma pedra sagrada ou um espírito. Portanto, os
res mais amplos que possuem; entre ambos, também não únicos tindalo aos quais são prestadas homenagens reli­
há medida comum. Ora. na noção de duplo não há nada giosas são aqueles que, quando seu proprietário era vivo,
que possa explicar uma heterogeneidade tão radical. Diz­ já eram por si mesmos seres sagrados. Quanto às outras
se que, uma vez libertado do corpo, o duplo pode fazer almas, as dos homens comuns, ela multidão cios profa­
aos vivos ou muito bem ou muito mal, segundo a maneira nos, elas são, diz o mesmo autor, "nada, tanto depois co­
pela qual os trata. Mas não é suficiente que um ser cause mo antes da morte"26 . A morte, portanto, espontanea­
inquietação no seu meio para que pareça de uma nature­ mente e por si só, não possui nenhuma virtude diviniza­
za diferente daqueles cuja tranqüilidade ameaça. É verda­ dora. Como ela consuma, de uma maneira mais completa
de que, no sentimento que o fiel experimenta pelas coisas e definitiva, a separação da alma em relação às coisas
que adora, entra sempre alguma reserva e algum temor; profanas, pode muito bem reforçar o caráter sagrado d a
mas é um temor sui generis, feito de respeito mais que de alma, se esta j á o possui, mas não o cria.
pavor. no qual pre\·alece essa emoção muito particular Aliás, se realmente, como supõe a hipótese animista,
que a majestade inspira ao homem. A idéia de majestade os primeiros seres sagrados foram as almas cios mortos e
é essencialmente religiosa. Assim, pode-se dizer que nada o primeiro culto o dos antepassados, deveríamos consta­
se explicou da religião enquanto não se tiver descoberto tar que, quanto mais as socieclacles são ele um tipo inferior,
ele onde vem essa icléia, a que ela corresponde e o que tanto mais esse culto tem importâ ncia na viela religiosa.
pode tê-la despertado nas consciências. Simples almas de Ora, é antes o contrário que se verifica. O culto ancestral
homens não poderiam ser investidas desse caráter pelo :-;ó se desenvolve e, inclusive, só se apresenta sob uma
simples fato de terem desencarnado forma caracteríc;tica em sociedades avançadas como a
É o que mostra claramente o exemplo da Melanésia. China. o Egito, as cidades gregas e latinas; ao contrário,
Os melanésios crêem que o h o m e m possui u m a a l m a l'Stá ausente nas sociedades australianas que representam.
q u e abandona o corpo n a morte; e l a muda então d e no­ como veremos, a forma de organização social mais baixa
me e torna-se o que eles chamam um linda/o, u m 11at­ e mais simples que conhecemos. Nelas encontramos, cer­
mat, etc. Por outro lado, existe entre eles um culto das tamente, ritos funerários e ritos de luto; mas essas práticas
52 rlS FORMAS EUJ..\f&\TARES DA 17DA RWGTOS11 !..11 /\TÕES PRELIMh\ílRES 53

não con<;tituem um culto ainda que às vezes lhes tenha 1 ·tnmônias consistem geralmente em repn.:scntações
sido dado. erradamente, esse nome. Com efeito, um culro dr.1máricas nas quais são imitadas as ações que os mitos
não é simplesmente um conjunto de prescrições rituais 11 ribu em a esses heróis Iegendários29. Só que os persona­
que o homem é obrigado a segu ir em certas circunstâncias; i.:ens assim colocados em cena não são homens que, após
é um sistema de ritos, de festas , de cerimônias diversos ll'rcrn v i vido uma vida de homens. teriam sido rra nsfor-
que apresentam todos a característica de retornarem perio­ 111ados em espécies de deuses pelo faro da morte. Su põ e­
dicamente. Eles co rresponde m à necess idade que sente o 'l' que, em v i da desfrutavam já de p od eres sobre-huma-
11os. Atribuem-lhes tudo o que se fez de gra nde na histó-
,

fiel e le manter e fo rta lecer, a i nte rva los ele te mpo regu la­
res, o vínculo com os se res sagrados dos quais depende . 11.1 da tribo e mesmo na história do mundo. Eles é que re-
Eis por que se fala de ritos nupciais, e não de um culto 1 1 1111 fei to em grande parte a te rra tal como ela é e os ho-
nupcial; de ritos de nascimento. e não de u m culto do re­ 111ens tais como eles são. A glória que continua a cercá-los
cém-nJsddo, é quL o� JconteL i mcnco� que enseja ra m es­ 11.10 lhes \·em, portanto, apen as do fato de serem anrepas­
ses ritos não implicam nenhuma periodicidade. Do mes­ 'ados. mas de um caráter divino que sempre lhes foi atri­
mo modo, só há culto dos antepassados quando sacrifícios buído; para retomar a expressão melanésia, eles s;1o cons­
são feitos de tempos em tempos sobre os túmulos, quan­ titutivamente dotados de mana. Portanto, não há nada aí
do libações neles são derra ma das em cl ar as mais ou me­ q u e demonstre ter a morte o menor poder de divinizar.
nos a p ro x im adas , qu a nd o festas sã o regu l a rm ente cele­ Jnc:l usive não se pode, sem im p rop riedade, d izer qu e es­
bradas em ho nra cio morto. Mas o austra liano não man­ 'l'S ritos constituam um culto dos ante passa dos , visto que
tém com seus mortos nenhum comércio desse gênero. 11:·1 0 se dirigem aos a n te passados como tais. Para que pos­
Claro que deve se pu l ta r seus restos con forme o rito, cho­ ,,1 haver um verdad eiro culto dos m01tos. cumpre que os
rá-los durante o tempo prescrito e da maneira prescrita, 1 ntepassados rea is , os parentes que os homens perdem
vingá-los. se for o caso:r. !\las, uma vez quit ados esses de­ 11 1lmente rodo dia se tornem q uando morros, objeto de
, ,

veres piedosos. uma vez dessecados os ossos, e t endo o 11 111 culto: ora. uma vez mais. de um cu lto desse gênero
prazo do luto terminado, tudo está dito e os sobreviventes 11ao exis tem vestígi os na Austrália.
não têm mais obrigações para com seus parentes que dei­ Assim, o culto que, segundo a h ipótese, de\·eria ser
xaram de existir. Há, é verdade, urna forma pela qual os preponderante nas sociedades inferiores, em realidade
mortos continuam a conservar u m l uga r na vi da de seus 111existe nelas. D efini t iv am ente o australiano só se ocupa
dt· seus morros no momento mesmo do falecimento e
,

próximos, mesmo de pois que o luto terminou: com efei ­


to, conserva m-se seus cabelos ou a lgu ns ele seus ossosis , 111H.:d iaramente após. No e n t a n to , esses mesm os povos
por causa das vi rtudes especiais que lhes são atri buídas. praticam, como veremos, em relação a seres sa grados de
Mas nesse momento eles cessaram de existir como pes­ 1 1 111a na tu reza compl eta mente diferente, um culto comple-
soas; red uzem-se à categoria de amu letos anônimos e im­ º· fe it o ele cerim ônias múlt ip las que ocupam às vezes se­
pessoais. Nesse estado, não são objeto de nen hu m culto; manas e até meses inteiros. E inadmissível que os poucos
servem apenas a fins mágicos . 1 1tos que o australiano cumpre ao perder um parente te-
Há, no entanto, tribos australianas em que são perio­ 11h,11n sido a origem desses cultos permanentes, que retor-
dicamente celebrados ritos em honra de antepassados fa­ 11.1m regularm e nte todos os anos e preenchem uma boa
bulosos que a tradição coloca na origem dos te mpos. Es- parte de su a existência. O contraste entre ambos é mesmo
AS FO!l\/AS ELE.llE\TARES DA l 7DA RELIGJOSA '.!I F.ITÕES PREW11.VARES 55

tal que há fu ndamento em perguncar se não foram os pri­ 1 m:m p1,de praticar um comunismo sexual que seria im-
1 >u�sível se esse ciúme não fosse susceth·el de a ten uar-se e
rnesmo desapa rece r quando necessário35. É q ue o homem ,
meiros que derivaram dos segun dos , se as almas do� ho­

1 om efeito , não é apen as o a nimal com algumas quali da­


mens, lo nge de terem sido o modelo com base no qual se

des a mais: é outra co isa . A natureza humana deveu-se a


imaginaram os deuses, não foram concebidas, desde a
origem, como ema nações ela divindade.
11ma espécie de remodela gem da natureza animal e ao
lo ngo das operações complexas de que resultou e s re- �;
IV 111<xlelagem. ocorreram perdas e ganhos ao mesmo tempo.
<)uancos instintos não perdemos! A razão disso é que o

A pa rtir do momento em que o culto dos mortos nãu


homem não está apenas em relação com um meio fís ico,

é primitivo, o animismo carece ele base. Poderia part!cer


111.1:; também com um ml!io social infinitamente mais ex­
ll'nso, mais estável e mais ativo que aquele que influencia
inútil, po rta nto, clbcutir a terceira tese e.lo :;iMema, d c.iue
1 >s animais . Portanto, para viver, é preciso que ele se aclap-
diz respeito à transformação cio culto cios mortos em culto
da natureza. Mas, como o postulado sobre o qual ela re­
11· •l esse meio. Ora. a sociedade, para poder manter-se, re­
< 1ucr com freqüência que vejamos as coisas sob u m certo
pousa aparece mesmo em hisLOriadores que não admitem
ngulo, que as sintamos de um certo modo: conseqüenre-
o a n im i s m o propriamente dito. tais como B rin ro n 3o,
1

Lang3I, RévilJe32 e o próprio Robertson Smith33, é necessá­ 111cn1e. modifica as idéias que seríamos levados a ter des­
rio fazer seu exame. �.is coisas. os sentimentos a que estaríamos incl inados se
nhcdecêssemos apenas ã n ossa natureza animal; ela os al-
11·ra ao ponto mesmo de substitu í-los por sentimentos con-
Essa extensão cio culto cios mortos ao conjunto da na­
tureza viria cio fato de tendermos instintivamente a repre­
sentar todas as coisas à nossa imagem. isto é, como seres 1 1 .1 rios. Acaso não chega a fazer-nos considerar nossa pró-
vivos e pensantes. Já vimos que o próprio Spencer contes­ 111 ia vida algo de pouco valor, quando ela é. para o ani-
o 1 11.d, o bem por excelência.31•? Portanto, é enganoso buscar
111k·rir a constituição mental do homem primitivo toma ndo
ta v a a realidade desse suposto instimo. Uma vez que

• • 11110 base a dos animais superiores.


an imal dis ting ue claramenre os corpos vivos dos corpos
brutos. parecia-U1e impossível que o homem, herdeiro do
Mas, se a objeção de Spencer não tem o alcance deci­
s1\·o que lhe atrib uía seu autor, o postulado animista não
animal, não th·esse , desde a origem, a mesma facul dade
de discernimento. Por mais cercos, porém. que sejam os
fatos citados por Spen ce r, eles não têm, no ponLO em 1 111dcria, em troca, tirar nenhuma autoridade das confusões
1 1 1 c as criança s parecem cometer. Qua n do ouvimos uma
xingar com cólera um objeto que a feri u , concluí-
questão, o valor demonstrativo que lhes atribui. Seu racio­ •

cínio supõe. com efeito, que todas as faculdades, os instin­ 1 1 1 ;111ç·a


tos e as apti dões dos a ni ma is passaram integralmente ao 1 1 1<>' que ela vê nesse objeto um ser consciente como ela;
homem; ora, m u itos erros têm por origem esse princípio. 1 1 1.1 .... é interpreta r mal suas palavras e seus gestos. Em reali-
que se toma indevidamente como uma verdade ób,·ia. Por 1 l 11 lc. isso não corresponde ao raciocínio complicado que
exemplo, do fato de o ciúme sexual ser geralmente muito lli1 l . lribuímos. Se ela chuta a mesa que lhe causou um fe-
1 1 11 1L·nto, não é que a suponha animada e inteligente, mas
•.1 1 1 1 por ter-lhe causado u m ferime nto . A cólera, provocada
forte nos a nimais superiores, concluiu-se que ele devia ve­

p1· l. 1 dor, tem necessidade de


r ificar- se no homem, desde o início da história, com a
mesma intensidade3- • . Ora, escá constatado hoje que o ho- se extravasar; portanto, bus-
AS FORMAS l:.'J.EJ!h;\TARF..� 011 \ '/{)1\ Rl:'UG/OSA ' 1 ' t r ir\ l'Rfif.\f/,\ARfü

c:i algo sobre o que <;e descarregar e se dirige natu ral rnen­ 1 1c :ico ntece com os espíritos atribuídos :'is c.lifc
w
l <

para a coisa que a provocou, embora esta mio te n ha 111• rrnsas da natureza. O deus do Sol nào se encontra
tu 1
H .,

cul pa. A conduca do adulto, em semelhante caso, é muitas .,a riamente no Sol, nem o espírito desta pedra na
1 < t l 1 . 1 que lhe serve de hábitat prin cipa l. Claro que um es-
<.'

vezes ig ual mente pouco razoáYel. Quando ficamos violen­


tamente irritados, .sentimos necessidade de in\'eCli\'ar, <le 1 •11 1 1 1 , mantém estreitas relações com o �arpo ao qua l está
IU 11lc1; mas emprega-se um a expressao mexata q uando se
_
dcMruir, sem que por isso atribuamos aos ob jetos sobre os
quais despejamos nossa cólera uma espécie de má vonta­ 1 1 1 qm ele é a alma desse corpo . ..Na Melanésia. diz Co­
de co nsc ien ce . Hã tão pouca confusao que, q u a n do a d 1 1 1 1�1on. nào parece que se creia na existência de espíri-
emoção e.la c ria nça se acalmou , ela sabe muito bem distin­ 111 q l l l' animam um o bjet o natural, como u m a árvore,
guir uma cadem.1 de uma p essoa: não se compon.i da mes 1 1 1 1 1 1 queda cl'água, uma temp e:.tade ou u m a rocha. de
ma forma com as e.luas. É urna razao aná loga que explica 1 1 1 1 1 ll'ira que este1am para esse objeto como a alma, su-
su,1 11.:nc.h'.':nu.1 a trat<lr seus brinquedos <.:omo SL fosse m se 1 11 11 eslj para o <.:orpo humano. Os europeus, é Yerda
res 'i\·os. É a imensa necessidade de brincar que cria uma t i• ', l .d.1111 dos espíritos do ma r, da tempestade ou da flo­
matéria aprop ria da para si, assim corno, no caso prcceclcn­ ' •H 1 mas a idéia cios in díge nas. assim traduzida, é b e m
Le, os senlimentos violentos que o sofrimento desencadea­ 1 l il1 1 l·nte. Estes pensam que o espírito freqüenta a floresta
ra cria \'am a sua. Portanto. para poder brincar consciPncio­ 1 11 1 , mar. e tem o poder de provocar tempestades e fazer
samente com seu p olich inelo. a c r ia nça o imagina uma 1111 11·1. L 'r os viaj a ntes . "'Ili Enquanto a a lma encontra-se es­
pessoa viva. Aliás. a ilusão é ainda mais fácil na criança >t·m 1 .1 l mente no interior do corpo, o espírito passa a mai or
por ser a imaginação soberana; ela quase só pensa por 1 • 1 1 1 1• tle sua exisLência fora do objeto que lhe serve de
i magens, e sabe-se o quanto as i mage ns são coisas flexí­ t i l ·�tmto. Eis já uma dife renç a que não parece testemu-
'eis que se dobram facilmente a todas as exi gê ncia s <lo 1 1 1 1.11 que a segu nda idéia tenha vindo da p rim ei ra .
desejo. l\las da não <;e ilude com sua própria tkc;io e seria l'or ou tro lado. se de fato o homem tivesse tido ne­
a primem.1 a se esp an tar se. de repente, eMa virasse reali­ t • � -1d,1<le de pro jeta r sua imagem nas coisas, os primeiros
dade e seu fantoche a mordesse37. • 1 1·., sagrados te ria m sido con cebidos à sua seme lha nça .
Deixemos de lado. portanto, essas duvidosas analo­ l 1 1 . 1 o antropomorfismo, longe ele ser primitivo, é antes a

g i as . Para saber se o homem esteve primitivamente incli­ 1 1 1 . 1 11 .1 de uma civilizacào relativamente avan çada . Na ori­
nado às confusões que l he im puta m, mio é o a ni ma l nem " 111 os seres sagrados sflo concebidos sob uma forma
a criança de hoje que devemos cons idera r, mas as próprias 1 1 1 1 1 1 1:1 1 ou vegetal e.la qual a forma humana só len tamen te
crenças primitivas. Se os espíritos e os deuses tia natureza ,, dvsvcncilhou. Veremos ad i a n t e de que m a n e i r a , n a
são rea l m e nt e construídos à i m age m da a l m a humana, \ 1 1., 1 r: i l ia , a n i ma is e p l a mas situam-se n o pr i mei ro plano
eles devem trazer a marca de sua origem e evocar os Lra­ , l.1 .. n>isas sag ra da s. Mesmo e n tre os índios da América do
(OS essenciais ele seu modelo. A ca racterística por exce­ 1\1(11 l l , as gra ndes di\'i nc.ladcs cósmicas, que começam ali
l<?ncia e.la alma é ser concebida corno o pr i ncí pio interior 1 ,, ., objeto de um culto, são com mu ita freqüê ncia repn.:­
que anima o organismo; é ela que o move. que produz ,, 1 11 .1dos sob espécies a n i ma isW. ·'A difere nça entre o �1 ni-
sua vida, de modo que, quando dele se retira, a vida se 111.d o homem e o ��r divino, diz Réville. que constata o
detém ou é s us pen sa . É no corpo que ela tem sua resi­ 1 1 1 1 1 nao sem surpresa, não é se nt id a nesse estado de es-
dência naLUral, pelo menos enquanto existe. Ora, não é 1 •11110 e. na maioria das vezes, dir-se-ia que é a forma a11i-
">8 AS FOJWAS ELDIE1VTARES
I 011 \'JJ)A REJ.1G10SA 1 1/ Jr !/::\ PREL/,\1/NARE.S 59

mal ct .forma Ji1 nda mental. '' 10 Para encontrar um deus n untes imagens que ocupam nossos espíritos du-
consLruído inLeiramente com elementos humanos, é preci­ 1 1 1 \ll' n sono, pois a alma e o d uplo, e o duplo não é se-
so chegar quase até o cristianismo. Aqui o Deus é um ho­ 1 1 1 1 1 o homem tal como aparece a s i mesmo enquanro
mem, não somente pe lo aspecto físico sob o qual manifes ­ lt l1 me. De s se ponLo de vista, os seres sagrados se riam,
tou-se temporariamente, mas também pe las idéias e os l '"1 l , 1 11 l o, apenas concepções imaginárias que o homem
sentimentos que exprime. Mas mesmo em Roma e na Gré­ I • 1 1.1 proc.luzido numa espécie de delírio que dele se apo­
cia, embora os deuses fossem geral mente representados ,1, 1.1 regula rmenrc todo dia, sem q ue se possa perceber
com traços humanos. vários personagens míticos traziam p 1 1 1 que fins úteis elas servem ou a que correspondem
ainda a marca de uma origem animal: é D ioniso. que ve­ 11.1 1 l·;1 l i dade . Se o homem reza. se faz sacrifícios e oferen­
mos ::.eguidamente sob a forma de um touro ou pelo me­ t l 1 se se submete às privações múl ti pla s que o rito lhe
nos com os chifres de couro; é Demécer. represen tada com l 'l l '"neve. é q ue uma espécie de aberraçào constitutiva o
uma cri na de GI\alo, é Pà. é �Hle no . sao os Faunas, etc .• I 1 ; 11 >ma r os sonhos por pen.:e pções . a morte por um so­
Falcava mu ito. portanto. para que o homem estivesse incli­ n• • prolongado, os corpos brutos por seres vivos e pen-
nado a im por sua fonna às coisas. E mais: ele próp ri o co­ 111tcs. Assim, não apenas, como mu itos tendem a admi -
meçou por conceber-se como participando imimameme 1 1 1 .1 forma sob a q ua l as forças rel igiosas são ou foram
e.la natu reza animal. Com efeito, é uma crença quasL uni­ 1qiresentac.las não as exprimiria exatamente; nã o ap enas
\'ersal na Austrália, também muito difundida entre os índios 1 1 s1 1nbolos atrnvés cios quais elas foram pensadas masca-
da América do None. que os an tepassados dos hom ens fo­ 1 , 1 11;1111 p a rc ia l mente sua verdadeira natureza, mas tam­

ram a nimais ou pl antas. ou, pe lo menos, que os primeiros h,·m. por trás dessas imagens e dessas figuras, não have-
homens tinham. na totalidade ou em parte, os caracteres 1 1.1 outra coisa senão pes adelos de es pírit os n i cultos. A re­
distintivos de cenas e spécies animais ou vegetais. Assim , ligi a o seria apenas, em última instância, um sonho siste-
longe de ver em toda parte apenas seres semelhantes a 11: 1tizado e vivido, mas sem fundamento no rea1'2. Eis por
ele, o homem começou por pensar a si pró prio à ima gem ' l l le os teóricos do animismo, quando buscam as origens
de seres cios quais especificamente se diferenciava. do pensamento re l igioso , se contentam. em suma, com
muito pouco . Q ua n do j ulg am ter conseguido expl icar de
' ue maneira o homem pôd e ser n
l i duzido a imaginar se res
V , om formas estranhas, vaporosas, como os que vemos em
"onho, o problema lhes pa rece resolvido . ,
A t e or ia anim ista implica, aliás, u ma co nse qüênc ia Em realidade, ele não foi seq uer abordado. E inacl-
que é cal vez sua melhor refutação. 111issível, com c.:feiLo, que sistemas de idéias como as reli­
Se fosse verc.ladeira, seria preciso admitir que as cren­ giúes, que ocuparam na história um lugar tão considcrã-
ças religiosas não passam de represen tações alucinatórias, 1 t'i, nos quais os povos de todas as épocas v ieram buscar
sem nenhum fundamento objetivo. Supõe-se, com efeito, .1 en ergia necessária para viver. sejam apenas tecidos de

que toe.las sejam derivadas da noção de alma, já qu e não ilusões. Todos reconhecem hoje que o direito, a mora l , o
se vêem nos espiritos e nos deu ses nada mais que almas próprio pensamente científico nasceram na religião, du-
sublimadas. Mas a noção de alma, esta, é inte i ramente 1.1nte muito tempo confundiram-se com ela e permanece­
construída, segunc.lo Tylor e seus discípulos, com as vagas r.un penetrados de seu espírito. Como é que uma vã fan-
60 AS FORMAS ELE
MENTARES DA \/IDA RJ::l!C!OSrt

1 1 1'1 IJ.0 III


tasmagoria teria pocliclo modelar tão fortemente e de ma­

�'
neira tão duradoura a s consciências humanas? Segura­
mente, eleve ser um princípio, para a ciência das religiões, PRI NCIPAIS CONCEPÇÕES
que a religião não exprime nada que não esteja na natu­ 1 1 \ HELIG IÃO ELEMENTAR
f t "111/111 1ação)
reza; pois só existe ciência de fenómenos naturais. Toda a
questão está em saber a que reino ela natureza pertencem
essas realidades e o que pôde levar os homens a conce­
bê-las sob essa forma singular que é própria cio pensa­
mento religioso. Mas, para que essa questão possa ser co­
locada, é necessário começar por admitir que são coisas
reais que são assim representadas. Quando os filósofos
do século XVIII faziam da religião um vasto erro imagina­
do pelos padres, eles podiam ao menos explicar sua per­
sistência pelo interesse ela casta sacerdotal em enganar as
multidões. Mas se os próprios povos foram fabricantes

11 O naturismo
desses sistemas de idéias erróneas e , ao mesmo tempo,
vítimas deles, como é que esse logro extraordinário pôde
perpetuar-se ao longo ele toda a história?
Deve-se mesmo perguntar se, nessas condições, o lkm diferente é o espírito em que se inspira a escola
termo ciência das religiões pode ser empregado sem im­ 11 1 1 1 1 rista.
propriedade. Uma ciência é uma disciplina que, não im­ Seus adeptos, aliás, provêm de outros meios. Os ani-
porta como seja concebida, se aplica sempre a uma reali­ 1 1 1 1 �1.1s, na sua maior parte, são etnógrafos ou antropólo-
dade dada. A física e a química são ciências, porque os 111 11-o. As religiões que estudaram figuram entre a s mais
fenómenos físico-químicos são reais e de uma realidade 1 • 1 1 1ssciras que a humanidade praticou. Daí a importância
que não depende das verdades que elas demonstram. Há 1 1 1 1 1nordial que atribuem às almas dos mortos, aos espíri­
uma ciência psicológica porque há realmente consciências '' '" • aos demónios, isto é, aos seres espirituais ele segunda
cujo direito à existência não depende dos psicólogos. Ao "' dvm: é que essas religiões praticamente não conhecem
conu·ário , a religião não poderia sobreviver à teoria ani­ 1 1 1 11ros que sejam de uma ordem mais elevada1. Ao con­
mista, a partir do momento em que esta fosse reconheci­ l 1 Mio, as teorias que iremos agora expor são obra ele estu-
da como verdadeira por todos os homens, pois estes neces­ 1 l lc 1sos que se ocuparam sobretudo das grandes civil izações
sariamente abandonariam os erros cuja natureza e origem 1 l.1 l � u ropa e da Ásia.
lhes seriam assim reveladas. Que ciência seria essa, cuja Desde que, a pa1tir dos irmãos Grimm, se percebeu o
principal descoberta consistiria em fazer desapa recer o
1 t t l l'resse que havia em comparar umas às outras as dife-
objeto mesmo ele que trata?
1 1 · 1 nes mitologias elos povos indo-europeus, chamaram a
1 1 vn<;ão as notáveis simil itudes que elas apresentavam. Fo-
1 . 1 m identificados personagens míticos que, sob nomes cli­
l 1 ·f'l'ntes, simbolizavam as mesmas idéias e cumpriam as
62 AS FOR.llAS ELFllF\TARES DA 1 ln.I RI':/1G/Q!)A 1 /1 •I \ f'REU\fli\ARill 63

mesm:.ts funções. inclusi\·e compar..1ram SL os nomes e jul na Fran..,a por .\fü:hd Bréal"'. Ela encontra\'a tão
gou-se poder estabelecer que às vezes rinham algum pa­ 1 t !\ l l .1 rl.'sistência que, seg undo uma frase de Gruppe''.
rentesco. Tais semelhanças só pareciam poder explicar-se ht g1 •li um momento em qu e, com exceção de algu ns fi-
por uma comun idade de origem. Ponanto. era-se levado a 1 !1 'W1s chíssicos, alheios aos estudos védicos, todos os
supor que essas concepções. por mais variadas na a pa rên­ 1 1 1 11 , J . •).lns tomavam como ponto de partida de suas expli-
cia prov in ha m , em realidade, de um fundo comum do 1 1 1 11•s os princípios ele Max Müller ou ele Kuhn"7.
que
,

qual não eram mais que fo rmas diversificadas e que não < .onvém portanto examinar em consistem esses
era impossível identificar. Pelo método comparativo. de­ pr l111 lfHOS e o que va l em.
\'ia-se poder remontar. para além dessas grandes rel igiões. 1 .nmo ninguém os apresentou de forma mais siste-
a um sistema de idéias bem mai<. antigo. a uma religião real­
tllt .1 do que \fa,· \lüller, é sobretudo dele que tomare
1 1 1u'I 11-; elementos ela exposição a seguir8.
11
mente pnmitiva da qual as outras teriam derivado .

Pon:m. o que nu1s cont nbu1u para despert,1r essas


a mbições foi a descobena elos Vedas. Com os Vedas, de
fato, 1inha-se um texto escrito cuja antiguidade certamente
pode ter sido exagerada no mome nto de sua descoberta,
mas que não deixa de ser um dos mais a nt igos existentes
numa língua indo-européia. Estava-se assim em con dições
\ i mos que o postul ado subentendido elo a n i mismo é
• 1 '11'.1 re l i gião, pelo menos na sua origem, não exp ri me
de est udar, com os métodos ordinários da filologia, uma
literatura tão ou mais velh a que a de l lome ro , uma reli­
111•11liuma realidade experimental. É do p rincípio contr ário
1 1 m parte Max Müller. Para ele, trata-se de um a xioma a
1 1 '11).ltao base a r-se numa expenência ela qu al retira toda a
gião considerada mais primitiva que a dos a ntigos germa­
nos. l m documento de tal ,·alor est;l\'a e\ 1dcntemenre
1111 ,n1toridade "A religião . diz ele. para ocupar o lugar
qllt' lhe cabe como elemento legíUmo de nossa consciên­
destinado a lançar uma nova luz sobre os primórdios reli­
giosos da humanidade. e a ciência das religiàt!'> não podia
deixar de ser reno\'acla por ele. ' 1 . 1 , de,·e, como todos os nossos outros conhecimentos,
, 01m:r.,ar por uma ex pe riência sensíYel."9 Retomando o
\ 1•1110 adágio empírico Nihil est in i11te/lectu quod non an­
A concepçào assim originada correspondia t:io bem
ao estado da ciência e à marcha geral das idéi as que ela se
ma nifestou quase ao mesmo tempo cm dois países dife­ I• jitC'ril in sensu, ele o aplica à religião e declam que na­
d.1 pode haver na fé que não tenha estado anLes nos sen-
1 1dos. Temos aqui, pois, uma doutrina que pa rece esca-
rentes. Em 1856, Max Müller expunha os princ:ír>ios dela
nos seus O:iford Essays2. Três anos mais tarde, aparecia o
livro d<.: Adalben l<u h n sobre a OnRem do fogo e da hehida 1 •. 1 1 , desta vez, à grave objeção
que fazíamos ao animis-
dit•i11a\ que se in s pira claramente na mesma con cepçào . 11111 Desse ponto de vista, com efeito a religião parece
,

\ idéia, uma n:z emitida, difundiu se rapidamLnte nos cl<'\L'I necessariamente se apresentar. não como um vago
meios c1cntíficos. Ao nome de Kuhn está intimamente as­ t' confuso devaneio, mas como um sistema de idéias
e de
sociado o de seu cunhado Schwarrz. CUJO l n ro sobre a pr.111c.1s bem fundamentadas na realidade.
Origem da mitologia• foi pu blicado logo depois do prece­ \1as quais são <1:; sensações geradoras do pensamen­
dente. Steinhal e toda a escola alemã da l 'õlke1psycbologie t • , rd i gioso? Tal é a questão que o estudo dos Vedas de­
ligam-se ao mesmo movimento. Em 1863, a teoria fo i in- ' 1.1 1 judar a resolver.
.
AS FOR.IIAS EIEllEVTARES DA \'IDA RELIGIO�A \ / l >/·\ PREU\11,\ARES 65

Os nomes dos deuses védicos são gerJlmente noml:� 11 ..,1 milagre foram chamado� naturab. no �emido de
comuns, ainda empregados como Lais, ou antigos no­ 1 1 • 1 1 1 previstos, o rd i ná r ios, intel igíveis . . . Ora, foi esse
mes comuns cu j o sentido original é possível recuperar. 1 11 1 domínio aberto aos sentimentos ele su rpresa e de Le-
Ora, tanto uns como outros designam os principais fenô­ 1 1 1 11 l o i essa maravilha, esse milag re, esse imenso desco-
menos da natureza. Assim, Agni, nome ele uma elas princi­ 1 1 h ido oposto ao que é conhecido . . . que deu o primeiro
pais divindades ela Índia, significa, a princípio, apenas o 1 1 1 1 1 111 1 ,o ao pensamento religioso e à linguagem religio-
fato material do fogo, tal como os sentidos o percebem e 1 1 1 . para ilustrnr seu pensamento, Max Müller o aplica
sem nenhuma adição mitológica. Mesmo nos Vedas ele é 1 1 1 111.1 força natural que ocupa um importante lugar na re­
li ri lo \'éd ica: ao fogo. "Procurem, diz ele, transportar-se
ainda empregado nessa acepção: em todo caso, o que -
mostra claramente o traço primitivo dessa significacào é 11 I " nsamento a e<;se estágio da vida primitiva em que é
que ela se consc1vou cm outras línguas indo-européias: o 1 • , '"º· forçosamente, situar a origem e mesmo as p r i -
laLino ig11is, o lituano ugnis, o antigo eslavo ogny sào evi­ 1 1 11 1 1 . 1 'i fases ela religião ela natureza; poderão facilmente
dentemente parentes próximos de Agni. Do mesmo modo, 1 1 1 1 1i•.111ar a impressão que deve ter causado sobre o espíri-
o parentesco entre o sânscrito Dyaus, o Zeus grego, o jovis 1 1 1 l1111nano o primeiro aparecimento do fogo. Não impor-
latino, o Zio do alto alemão, é hoje incontestado. Ele pro­ 1 , , 11110 tenha se manifestado na origem, quer tenha vin-
va que essas palavras diferentes designam uma única e 1 1 1 1 , li 1 raio. quer tenha sido obtido esfregando-se ramos
mesma divindade que os diferentes povos indo-europeus t i• ,1 1\'0re uns contra os outros, ou ainda que tenha brota-
já reconheciam como tal antes de sua separação. Ora,
Dyaus significa céu brilhante. Esses e outros fatos Lendem
1 11 , , l.1s pedras sob forma de faíscas: era algo que funcio-
1 1 1 1 1, que fazia progredir, a lgo que era preciso preservar,
a demonstrar que, nesses povos, os corpos e as forças da q 1 1 1 t razia a destruição consigo, mas, ao mesmo tempo,
natureza foram os primeiros ob jetos aos quais se apegou o q111 tornava a vida possível no inverno, que protegia du-
sentimento religioso: foram as primeiras coisas divinizadas. 1 11 111 a noite. que 'ief\ia como arma tanto ofensiva quanto
Dando u m passo a mais no caminho da generalização, de 1 1 11:-i,·a. Graças a ele, o homem deixou de devorar a
Max Müller julgou-se autorizado a concluir que a evolução 1 11 m crua e tornou-se consumidor de alimentos cozidos.
religiosa da humanidade em geral th·era o mesmo ponto 1 e 11 t.11nbém por intermédio do fogo que, mai� tarde, tra­
de partida. l i d l i.1ram-se os metais. fabricaram-se os instrumentos e as
É quase exclusivamente por considerações de ordem 1 1 1 1 1 1s, ele se tornou, assim, um fator indispensável de to­
psicológica que ele justifica essa inferência. Os espetáculos ' 11 1 progresso técnico e artísL ico . Que seríamos nós, mes-
variados que a natureza oferece ao hômem lhe parecem 1 1 1 1 1 .1gora, sem o fogo? " I J O homem, diz o mesmo autor
preencher todas as condições necessárias para despertar 1 11 1 1 11;1 outra obra. não pode entrar em relação com a natu-
imediatamente nos espíritos a idéia religiosa. Com efeito. 1 1 • 1 sem se dar conta de sua imensidão, de sua infinicla­
diz ele, "ao primeiro olhar que os homens lançaram �obre ' h l la o excede por wdos os lados. Além dos espaços
o mundo, nada lhes pareceu menos natural que a nature­ q111 de percebe, há outros que se estendem sem conta;
za. A natu reza era para eles a grande surpresa, o grande 1 1 1 b um dos momentos da duração é precedido e segui-
Lerror; era uma maravilha e u m mi lagre permanente. Foi 11 1 de um tempo para o qual nenhum li mite pode ser fixa-
somente mais tarde, quando descobriram sua constância, 1 l11; o rio que corre manifesta uma força infinita, uma vez
sua invariabilidade, seu reto rno regular, que ce1tos aspec- q1 w nada o esgota 1 2 . Não há aspecto da natureza que não
66 AS FORMAS El.EJIE.\TARJ.i.!J 0.-1 11DA REUGIU:.. 1 1 7 \TÔES PRELJ.111.\'ARF.\' 67

seja ca �az de despertar em nós essa sensação e:-;maga 111' 1 1 ou niquc•la categoria de coisas. de maneira a poder
de um infinito que nos envolve e domina i�. E é dessa
dora
sen­ i l 11<·1 que ele é isto ou aqu il o, isto e não aquilo. l\Ias, por
sação que teriam derivado as religiõesi 1 . 1 1 1 1 1 rn lado, classificar é nomear, pois uma i dé ia gera l só
. .No emanto, �la estavam aí apenas em gcrme i s. A re­
� 1rn1 existência e realidade na e pela pa l av ra que a exprime
hg1ao so_
se consrnu1u realmente quando essas forças na­

que cria, por si só, sua individualidade. Assim. a língua


111· um Pº"º sempre influencia a maneim como são classifi­
1
turais deixara m de ser representadas aos espírito
' 11 l 1s nos espíritos. e conseqi.kntemente pe nsadas. as coi-
s sob a
forma abstrata. Foi preciso que elas se transformassem
em
age n�es F'essoais, em seres vivos e pensantes, em 1 novas dadas a conhecer; pois essas coisas são obriga-
• l 1� .1 adaptar-se aos marcos preexistentes. Por essa razão, a
forças
e�� 1ntua1s, em deuses; pois é a seres desse gêncro
.
que se
�lmge geralmente o culto. Vimos que o próprio animism o li 1 1 gua que os homens fa lava m, quando decidiram fazer
e obngad o a colocar-se a questao e de que maneir
a a re­ 1 1 111.1 rep resentaçao daborada do u niverso, marcou com
:soheu. ha' eria no homem uma espéue de incapac 1 111 r.11;0 mddL:n.:I o siswma de idéias então originado.
idade
nativa de distinguir o animad o do inanima do e 'Ião deixamos de consc1var algo dessa língua, pelo
uma ten­
dência irresistível a conceber o segundo sob a 111• 11os no que diz respeito aos povos indo-europeus. Por
forma do
primeir o. Essa solução é rejeitada por Max M ü l ler1<>. 11 111ota que seja, restam dela, em nossas línguas atuais,
1 1 1 1 1 1 i -;cências que nos rermitem conceber o que ela era:
Se­ rc-
gundo ele, é a l i nguagem que, pela ação que exerce
so­
bre o pensamento, teria operado essa metamorfose. 111 .1s raízes. Essas palavras originárias, de que derivam
1 1s uutros vocábulos que empregamos e que se encontram
Explica-se facilmente que, intrigados por essas for­ 1 hase de tcxlos os idiomas indo-europeus, são cons ide­
1d.1:-. por Max l\lüller como ecos da língua que falavam
n
mas maravi lhosas das quais depend iam. os homen
s te­ r
nham sido incitados a refletir sobre das; que se povos correspondentes antes de sua separa<,"ào, isto é,
tenham o
p� rguntado cm que consistiam e se esforçado ror 1 1 • , 111nmento em que se constituiu essa religião da nature­
substi­
tuir a obscura sensação que tinham primitivamente ' 1 que se trata precisamente de explicar. Ora, as raízes
delas
por uma idéia mais clara, u m conceito mais bem ' l 'll sentam duas características notáveis que, certamente,
1 uam bem ohsef\·adas nesse grupo particular ele lín-
definido.
Mas a idéia e o conceito, diz justamente nosso autort'
•:u.1�. mas que nosso autor crê igualmente \'erificá,·eis nas
•1
' são
impos:-;íveis sem a palavra. A l inguagem não é
meramente
? revestimento exterior do pensamento; é seu arcabouço • 11111.ts família:-; lingüísticas18.
interno . Não se limita a traduzi -lo externamente l:m primeiro lugar, as raízes são típicas, ou seja, expri-
que ele se formou : serve para produz i-lo. No entanto
depois
, ela 1 1 w 1 1 1 não coisas particulares, indiv íduos , mas tipos, inclu-
tem uma natureza que lhe é própria e, conseq i\•' tipos extremamente gerais. Elas representam os temas
üentemen­
te, leis que não são as do pensamento. E já que 1 1 1 11' genéricos do pensamento; nelas encontramos, como
ela contri­
hui para elaborá-lo, niio pode deLxar, de certo
modo' l.k q11c• lixa das e cric;ra lizadas es<;ac; categorias fundamentais
violentá-lo e de defor':11á-lo. É uma deformação
desse gê­ d ( I 1•:-;p1rito que. em cada momento da história, dominam
nero que rena .
procluz1do o caráter singular das represen­ 1 1 1.l,1 ,1 \' id a mental e cujo sistema os filósofos tentaram
tações religiosas. 1 1 1 1 1 11.1� ,·ezes reconstitllir19.
Pensar, com efeito, é ordenar nossas idéias; é, pottan­ Fm segundo lugar, os Lipos aos quais correspondem
to, classificá-las. Pensar o fogo, por exemplo, é colocá-
lo 11 1 tipos de ação, não de ohjetos. O que elas traduzem
;IS' FORJ!AS HLE.llE.\T,IRFS DA 1 7DA RFUG/O\: 1
• l�IYIH PREJJ.1\ARES
1/, 69
68

j5 gerais de agir que se podem obser


são as maneira� 111� e. mais especialmente, no homem: 1 J, 1.1 ,. mo uma ação, e cada ato, transitório ou permanen-
·
var nos seres \JVOS 111purrar, de esfregar, de ligar, de ele­
,1 1 l11111tado em sua duraçào pelo Lcmpo em que coloca
11 1ns 0 ,·erbo."ll Claro que nossa cultura cientifica nos per-
açào de bater. ºJ e. i.1bir. de descer. de caminhar, etc. Em 11 111<· rnrrigir facilmente os erros que a linguagem poderia
var, de apenar. e ·.;11em generalizou e nomeou seus prin
110 sugerir deste modo; ma:. a influência da palavr.i deve
outros Lermos, O ho � :io antes de generalizar e nomear os
1 1 sido onipotentc quando não havia contrapeso. Ao
cipais modos d e a ç.-�za io.
fenômenos �a oa t ui."0.ema generalidade, essas palav 1 1 1 1 1 1100 material, tal como se revela aos nossos sentidos, a
ras po- li1 1guagem acrescentou, pois, um mundo novo, composto
Gra(as a su a e>!,(lder-se a todo tipo de objet que
os vi­
diam faci � m��te e�l\e; foi essa eÀ'lrema flexibilidade, aliás 11111l .11nentc de seres espirituais que ela criou por imeiro e
11e . 1uc foram considerados, a panir de então, como as causas
savam pnm1uvª! � ( origem às múltiplas palavras que de-
4ue lh<.:s pen111_1 1 u �'1 qu ando o homem, voltando- 1 , 'lTlinantes dos renômenos físicos.
se para Aliás, sua ac;ào não se deteve aí. Uma vez que havi a m
·1,,., ,.'.1111· Ass1111·
ido f orj a das palavras para designar essas perso na l id ades
,l.,1·
1·1s '
' · �. · , . a nomea- · 1as para potJer pensa- • l as,
• J t ll' a imaginação popular colocara atrás das coisas, a re­
as coisas, com 0ÇOL'
ocáb u l os, embora não tivessem sido
aplicou-lhes esses v' J1Lcce qu<.:, em razão de sua origem,
feitos para elas . Ac�7 nar as diferentes forças da natur f k\<io aplicou-se a essas palavras mesmas: elas propu-

eles só podiam des J'.i.1as manifestações que mais eza 11li.11n enigmas de toda espécie, e foi para resolver esses
se asse­ J>l"hlemas que os mitos for.im inventados. AconLecia que
por meio daque l as :'11 a nas : o raio foi chamado algo que
melham a açõet> h \1 1 o u que espalha o incêndio; o vento, 1 1 111 mesmo objelo recebesse uma pluralidade de nomes,
fende o chão ao caif1e sopra ; o sol, algo que bnça , , 11respondentes à plural idade de aspectos sob os quais
algo que geme o u q�7 ra
através ., .1presenrava na experiência; assim . há mais de vinre pa­
l 1 ras nos \'edas para designar o céu. Como as palavras
u das; o rio. algo que corre. etc. E.
do espaço ílech� 1s d . naLUrais acha,•am-se assim assimila­
como tais fe nônieno:::sse algo a que estavam relac c1.1m diferentes, acreditou-se que correspondiam a outras
ionados 1.1mas personalidades distintas. Mas, ao mesmo tempo,
d�s a atos h �ma nos, conccbic.lo sob a forma de ag entes
ente' 1 • 1 , 1 impossível não reconhecer que essas personalidades
foi necessariam 11os semelhantes ao homem. Não
pes�oais, mais ��.1 me 111as foi tomada ao pé da letra; o era 1111ham um certo parentesco. Para explicá-lo, imaginou-se
erro que formavam uma mesma fanúlia; inventaram-lhes genea­
senao uma mewtora. a ciência, a única que pcx ia dissipar
era inevitável po�q�e.1 inda. Em uma palavra, como l I• >gias. um estado civil, uma história. Em ourras ocasiões,

a 1·1 usao,
a lin- , n1sas diferentes eram designadas por um mesmo termo;
p; 1 ra expl i ca r essas ho m on i mi as, admitiu-se que as coisas
-
nao - exJS[Ja '
, , Jementos h umanos que traduziam es-
guagem era fei ta de ºflão p ôde ap l i car-se à natureza sem
tados hum a n os , e la 0 hoje, observa Bréal, ela nos obriga. , nrresponclentes eram transformações umas das outras, e
1
u·an:-.figurá-la2 . i\ lesn 1 conceber as coisas sob 11nvas ficções se forjaram para tomar inteligíveis essas mc-
esse ângulo .
numa certa medi da, �1 1 idéia. ainda que desig 1 1morfoses. Ou então. ainda. uma palavra que deixara de
·l'í compreendida foi a origem de fábulas destinadas a

pies qualidade, :"Cm , um


j
··'\ão exprimirno:> un 1 a r- l h e um gênero, iMo é,
m. uma sirn­
um sexo : d ir-lhe um sentido. A obra criadora da linguagem prosse­
objeto, considerado de uma for­
d
m1o podemos fal:l & determiná-lo por um aitigo; todo su- guiu portanto em construções cada vez mais comp l exas e,
.1 medida que a mitologia veio dotar cada deus de uma bio­
f
, gera
, l ou nao, - serrJ.;entado
t.'r.1fia progressivamente mais extensa e completa, as per-
m ,1 ·
como um ser agente. toda
jciLO da frase é �1pre·
70 AS FORMAS ELEMENlitRES DA VIDA RELIGIOSA PI HffÕES PRELLl1/J\ARES 71

sonalidades divinas, a princípio confundidas com as coi­ 1 1 que lhes atribuíam Max Müller e sua escola2'1. Mas dei­
sas, acabaram por distinguir-se delas e por determinar-se. \ , tremos de lado essas questoes cujo exame supõe uma
Eis como teria se constituído a noção do divino. Quan­ ' ompetência muito especial de lingüista, para nos deter-
to à religião cios antepassados, ela seria apenas um refle­ 1nos nos princípios gerais cio sistema. Ainda mais q u e
xo ela precedenre13. A noção ele alma teria se formado, a onvém não confundir demasiadamente a icléia naturista
1 om esses postulados controversos, pois ela é admitida
e

princípio, por razões bastante análogas às que dera Tylor,


exceto que, segundo Max Müller, ela teria se destinado a por muitos estudiosos para os quais a linguagem não tem
explicar a morte, e não o sonho24. Depois, sob a influên­ n papel preponderante que lhe atribui Max Müller.
cia ele diversas circunstâncias25, em parte acidentais, as al­ Que o homem tenha interesse em conhecer o mundo
mas dos homens, uma vez separadas do corpo, teriam si­ que o cerca e que, por conseguinte, sua reflexão logo te­
do atraídas pouco a pouco para a esfera cios seres divi­ nha se aplicado a ele, todos admitirão sem dificuldade. O
nos, vindo elas próprias a ser divinizadas. Mas esse novo 1·oncur/>o da/> coisa/> com as quais estava imediatamente
culto seria o produto apenas de uma formação secundá­ vm contato era-lhe demasiadamente necessário para que
ria. É o que prova, aliás, o fato de os homens divinizados nao buscasse investigar sua natureza. Mas se, como pre­
terem sido geralmente deuses imperfeitos, semideuses, tL·nde o naturismo, foi dessas reflexões que nasceu o pen­
que os povos sempre souberam distinguir das divindades s,1mento religioso, é inexplicável que este tenha pocliclo
propriamente ditas26. sobreviver às primeiras tentativas ele investigação, e a per­
sistência com que se manteve torna-se ininteligível. Se, de
l . 1to, temos necessidade ele conhecer as coisas, é para agir
II de urna maneira que lhes seja apropriada. Ora, a repre­
:o.L'nLação que a religião nos oferece cio universo, sobretu­
Essa doutrina repousa, em parte, em certo número de do na origem, é demasiado grosseiramente truncada para
postulados li ngüísticos que foram e são ainda muito dis­ ter podido suscitar práticas temporalmente úteis. As coisas
cutidos. Contestou-se a realidade ele muitas dessas con­ s<10 nada menos que seres vivos e pensantes, consciências,
cordâncias que Max Müller acreditava observar entre os 1wrsonalidades como aquelas que a imaginação religiosa
nomes que designam os deuses nas diferentes línguas eu­ 1 ra nsformou em agentes cios fenômenos cósmicos. Por-
ropéias. Sobretudo, foi posta em dúvida a interpretação 1 . 1 11to, não era concebendo-as dessa forma e tratando-as
que lhes deu: perguntaram se, longe ele serem o indício :-.egundo essa concepçâo que o homem podia fazê-las
de uma religião muito primitiva, não seriam essas concor­ n mcorrer para seus fins. Não era dirigindo-lhes preces,
dâncias um produto tardio, seja ele empréstimos diretos, celebrando-as com festas e sacrifícios, impondo-se jejuns
seja de encontros naturais27. Por outro lado, não mais se v privações que ele podia impedi-las de prejudicá-lo, ou
admite hoje que as raízes tenham existido em estado iso­ • ihrigá-las a servir a seus desígnios. Tais procedimentos só
lado, na qualidade ele realidades autônomas, nem, portan­ podiam ter êxito muito excepcionalmente e, por assim di-
to, que permitam reconstruir, mesmo hipoteticamente, a 1.er, milagrosamente. Portanto, se a razão de ser ela reli­
língua primitiva dos povos inclo-europeus211. Enfim, pes­ giao fosse dar-nos do mundo uma representação que nos
qu isas recentes tenderiam a provar que nem todas as cli­ guiasse em nosso comércio com ele, ela não estaria em
vinclacles védicas tinham o caráter exclusivamente naturis- \'Onclições de cumprir sua função e os povos não tarda-
72 A.\ FO!ll!AS ELE.lfE.\TARES DA \ 'lf)A RUJG/OSA r 11 l:"i1ÔES PRF
JJ..11/,\A RES 73

riam a dar c;e conta dLc;c;o· os fracas.,os. infinitamente maic; l'�'ic \'éu é o tecido de crenças fabulosas que a mitologia
frequentes que os êxitos, logo os teriam advenitlo do en­ l'roJuz. Portanto, o crente 'ive, como o delirante, num
gano, e a religião. abalada a todo instante por sucessivos 111 cio povoado de seres e coisas q u e têm apenas uma
desmentidos, não teria podido durar. • \1stência verbal. Aliás, é o que o próprio �lax Müller re-
Certamente ocorre ãs vezes que um erro se perpetue 1 o nhece, pois ele vê nos mitos o produto de uma doença
na história; mas, à parte um concurso de circunstâncias do pensamento. Primi tivamente os havia atribuído a uma
inteiramente exccpcionais, ele só pode manter-se assim tloenca da linguagem; mas como, segundo ele, linguagem
for praticamente verdadeiro, pensamento são inseparáveis, o que é verdade para um
1 \'erdade para o outro. "Quando, diz ele, tentei car:.icteri-
se isto é, se, mesmo sem nos •

dar uma noção teoricamente exata das coisas a que se re­


laciona, exprimir bastante corretamente a maneira pela 1. 1 r bre\emente <t mitologia cm sua natureza íntima, cha-
qual elas nos afetam, seja para o bem, seia para o mal. 111l· 1-a uma doenp ua l inguagem, ao mvés de uma doença
:\essas umtlições, com efdto. os 1110\ imLntos qut. de de­ d· pcnsamenro. J\las, depois de tud o o que eu disse. em
termina têm todas as chances de ser, pelo menos na maior 111cu liHo sobre A ciêl/cia do pensamento, sobre a insepa­
' 1hilidade do pensamento e da linguagem, e, conseqüen-
1 1 mente, ela identidade absoluta entre doença do pensa­
parte, os que con\'êm, e assim se explica que tenha podi­
do resistir à prova dos fatos30. Mas um erro, sobretudo um
sistema organizado ele erros que só acarretam e só podem r m·nto e doença da l i nguagem, parece não ser mais possí-
l i nenhum equívoco . . . Conceber o deus supremo como
1 r l pa do de Lodos os crimes, enganado pelos homens,
acarretar enganos práticos, não é viável. Ora, o que há de 1

comum entre os ritos através dos quais o fiel procurava


• 1 11gado com sua mulher batendo nos seus filhos, é se­

agir sobre a natureza e os proced imen tos que as ciências e

nos ensinaram a utiliza r e que sabemos agora serem os �:1 1 ramente um sintoma de condição anormal ou doença
únicos eficazes? Se é isso o que os homens pediam à reli­ du pensamento, digamos claramentt:, de loucura bem ca-
gião. não c;e pode compreender que ela tenha podido se 1.1uerizada. ".�! E o argumento não \'ale apenas contra Max
manter, a menos que hábeis artifícios os tenham 1mped1- f\lulkr e sua teoria, mas contr.a o princípio mt:smo cio na-

do de reconhecer que ela não lhes dava o que dela espe­ 1 1 1 1 1-.mo, não importa como se aplique. Se a religião tem
ravam. Seria preciso. portanto. mais uma vez. retornar às po1 principal objeto exprimir as forças da natureza, não é
explicações simplistas do século XV1IP 1 . f l• •ss1\'el ver nela Olrtr.i coisa senão um sistema de ficções
1•1 1,1.pnosas cuja sobrevivência é incompreensível.
I� verdade � fax Müller acreditou escapar à objc­
i\ssim. é somentt: em aparência que o naturismo es­
capa à objeção que há pouco fazíamos ao a n i m ismo. que
Também ele faz da religião um sistema de imagens aluci­ \ 1 1 > , cuja gravidade percebia, ao d isting u ir radicalmente a
natórias, uma vez que a reduz a ser apenas uma imensa 1 1 1 1 1 o l ogia da religião e ao colocar a primeira fora ela se-
metáfora sem valor objetivo. É verdade que lhe atribui um 1 1 11da. Ele reclama o d i reito de reservar o nome religião
• •llll'l1te às crencas que são conformes às prescrições ela
•r. d saudável e aos ensinamentos de uma teologia racio-
ponto de partida no real. nas c;ensações que os fenôme­
nos da natureza provocam em nós; mas, pela açao presti­ 111
giosa da l i nguagem. essa sensação se transforma em con­ 11;.11 Os mitos, ao contrário. seriam construções parasitárias
cepções extravagantes. O pensamento religioso só entra q11c, sob a influência da linguagem. teriam \'indo -;e en-
em contato com a realidade para cobri-la em seguida com 1 l.tr nessas representações fundamentais e desnaturá­
um véu espesso, que dissimula suas formas ' ercladeiras; l1 \�sim. a crença em Zeus teria sido religiosa na medi-
AS FO/lllAS ELEJIE.\TrlRES DA 1WA R/JJ(dOSA 11 /\/l
)E\ Pllf:.Ll.lf/.VARF.'i 75

da cm que os grego-; vi1m em Zeus o deus supremo, pai


I", re1e1rar a.!> outr.h como indignas de scn.:m chama
d,1s religiosa s, porque nos ofendem e desconcerta m. To­
H l
da humanidade. protetor das leis, vingador dos crimes.
etc.: mas tudo o que concerne à biografia de Zeus. seus
dos os mitos. mesmo os que consideramos mais insensa­
to· foram objetos de fél6. O homem a creditou n cl :s. não
casamentos. suas aventuras. seria a penas mitologi a�.-1.
A distinção, porém , é arbitrária. Certamente a mitolo­
1111 11rn; do que em <>uas próprias sensacões; a parur dele.s
gia interessa à estética ao mesmo tempo que à ciência das
t"Ltheleceu sua conduta. Portanto, é in1 possível , a despe1-
religiões, mas ela não deixa de ser um elos elementos es­
I • , d,1s aparênc ias que sejam privados de fu ndam ento ob-
1• ·1 1n> .
,

.
senciais ela vida rel igiosa . Se o mito for ret irado da reli­
gião, cumpre igua lmen te retirar dela o rito, po is os ritos
l�ntretanto. dirão. seja como for que se expliquem as
r ·l iµiocs é certo q11c el as se enganaram sohre a verdadei-
se d irigem, na maioria das vezes, a personalida des defini­
.

das que tém um nome, um carn.ter, acnbu1çóes <letcrmina ­


1 1 n:tturcza das coisas· as ciências o demonstraram. Os
d.1s. um.1 h1�tóna. e \ anam conformL a maneira como sào
111< 1 dns de ação que elas aconseU1a\·am ou prescreviam ao
concebidas essas personalidades. O culto que se presta à
111 u m:m, só raramente, portanto, podiam ter efeitos úteis:
11,10 é com purificaçôes que se curam as doenças, nem
divindade depe nde da fisionomia que lhe é atribuída : e é
o mito que fixa essa fisionomia. Com muita freq üência,
, 1 1lll cantos ou sacrifícios que se faz crescer a colheita. As­
i ncl usive, o rito não é outra coisa senão o mito cm aç;"\o; a
.111 t ,1 objeçãÕ que fizemos ao naturismo parece a pl icar-se
1 11 lllos os sistemas de explicação possíveis.
com unh ão cristã é ins ep arável <lo mi to pasca l , do q u a l
depe n de todo o seu semiclo. Se, portanto, toda mitologia
l lá no entanto1 u ma exceção. Supon ha mos que a re­
l1i.:i.1o c rresponda a uma necessidade bem c. ife r� nte de
� �
é o p rodu to de uma espéci e ele delírio verbal, a questão
que colodvamos permanece de pé: a existência e sobre­
nos 1<laptar ã5 coisas sensíveis: ela não correra o nsco de
tudo a persistência do culto tornam-se inexplicáveis. l\:ào
'il'f enfra que ci da só porque não satisfaz ou satisfaz �ai
'ie compreende como. durante séculos. os homens pude­
t:"'"t rn:ce-.sidadc "L a fé rel i giosa não nasceu para por o
ram continuar a fazer gestos sem objeco. Aliás, não são
l u •mcm em harmonia com o mundo material , as faltas
apenas os traços particulares das figuras divinas que são
q11t c..•l a pode ter cometido em sua luta com o mundo não
assim detenninados pelos mitos: a idéia mesma de que há
1 111111gem em sua fonte, porque ela se alimenta cm outra
deuses, seres espiritu a is , encarreg ados dos diversos de­
lr 11lll' Se não foi por tais razões que se chegou a crer, de-
partamt:ntos da natureza, é essenc i a lment e mítica, mio
1 1 se continuar a crer mesmo que essas razões fossem
i mporw a maneira como são representados3•. Ora, se su­
, 1 1 1 1 1 raditas pelos fatos. Concebe-se mesmo que a fé tenh a
primíssemos das religiões do passado tudo o que se refe­
. 1 t ln bastante forte, não apenas para suportar essas con-
1 1 .tdk·óes, mas para negá-las e para i mpedi r que o cren te
re à noçà o dos deuses concebidos como agc mcs cósmi­
cos , o que restaria? A i d éi.a da d ivi nd ade em s i , de uma
r11·iu.�besse seu alcance. o que tinha por . efeito tor� las� -

força transcendente da qual o homem depende e sobre a


1111 1Jvn-.1\as para a religiao. Quan<lo o sent1mento rchg1oso
t • I• 11w. ele não admite que a religião possa ser culpada e
qual se apóia? Mas essa é uma concepção füosófica e abs­

1 t�l n.: facilmente exp licaçõe:-; que a inocentam: se o rito


trata que 1amais se realizou dessa fonna em nenh u ma reli­

i d n produz os resultados esper.idos. imputa-se o fracasso


gião hbtórica; ela carece de interesse para a ciência das

1 1 1 ma falha de execução, o u , então. ã inten·encào de


religiões3S. Evitemos, pois. dist ing uir entre as crenças reli­
giosas, reter algumas, porque nos parecem justas e saudá-
11111;1 divindade contrária. Mas. para tanto, é preciso que
76 AS FORMAS t:LEMENTARES
DA VJDA RELIGIOSA 11 /\ l ()ES PRELIMINARES 77

as idéias religiosas não tenham sua


origem num senlimen­ 11 l moções. Imaginar o selvagem cheio ele admiração
to melindrado por essas de�epções
ela experiência, pois , . J1 . 1 11le dessas maravilhas é transportar para a origem da
nesse caso, de onde lhes vma sua
força de resistência? l 1 1 , 1 oria sentimentos bem mais recentes. Ele estava por
. J , 1 1 1ais acostumado à natureza para surpreender-se forte-
1 1 11 ·1He com ela. São necessárias a cultura e a reflexão pa-
III 1 1 �acudir esse jugo elo costume e descobrir o que há ele
1 1 1. 1 ravilhoso nessa regularidade mesma. Aliás, tal como
Mas mesmo que o homem tivesse
tido realmente ra­ 1 1l i.�t:rvamos anterionnente37, não basta que admiremos
_

zoes de se obst inar, a desp eito ele


todas as desi lusõ es 1 1 1 1 1 objeto para que ele nos apareça como sagrado, isto
em exprimir em símbolos religioso
s os fenômenos cósmi� para que seja marcado por essa característica que faz
11 1do contato direto com ele parecer um sacrilégio e uma
cos, seria preciso ainda que estes
fossem de natureza a
suge rir essa interpretação. Ora, cte
onde lhes viria essa p 1 ufanação. É desconhecer o que há de específico no
.t•nt imento religioso confundi-lo com toda impressão ele
propnedade? Aqui também, vem
o-nos em pres ença de
um dess :s post ulad os que só são
tidos por evid ente s , 1 1 1 presa admirativa.
porque nao se fez sua crítica. Colo
ca-se como um axioma Dirão porém que, na falta de admiração, há uma im­

q 1e' . no jogo natural das forças físic
as, há tudo o que é J ll \..'SSào que o homem não pode deixar de senri.r em pre­
"l'nça da natureza. Ele não pode deixar de perceber que
p1 ec1so para despertar em nós a
icléia cio sagrado· mas
quan do exam inam os melh or as prov
que foram dadas dessa proposiçã
� :
as, aliás sun árias l'l.1 o supera, o esmaga com sua imensidão. Essa sensação
o, constatamos que ela i ll' um espaço infinito que o cerca, ele um tempo infinito
se reduz a um preconceito.
' 1 11e antecedeu e virá após o instante presente, de forças
F�la-se
?º maravilhamento que deviam sentir
os ho­ 1 1 1 f'initamente superiores às que ele possui, parece não
mens a medi da que descobriam o
mundo. Mas, antes de poder deixar de despertar no homem a icléia de que exis-
11', fora dele, u m poder infinito do qual depende. Ora, es­
mais nada , o que caracteriza a vida
. da natureza é uma re­
hã 0 sol se
gulandad e que beira a monotonia. Toda man s;t icléia entra, como elemento essencial, em nossa con-
eleva no horizonte, todo fim de tarde
se põe; a lua reali­ 1 vpçào do divino.
�ª. o mesmo ciclo todos os meses; o rio corre Mas recordemos o que está em questão: trata-se de
ele maneira
i :unterrupta no seu leito; as mesm
i as estações trazem pe- �:iber como o homem pôde chegar a pensar que havia, na
1_1od1camente as mesmas sensaçõe
s. Claro que, eventual­ 1 l'alidade, duas categorias de coisas radicalmente hetero­
erado se produz: é 0
mente, algu m acontecimento inesp
gC:·ncas e incomparáveis entre si. De que maneira o espe-
sol qu� se eclip sa, é a lua que desa
. parece atrás das nu­ 1 ,1culo ela natureza poderia nos dar a idéia dessa dualida­
vens, e o no que transbord a , etc. Mas
_ essas perturbações de? A natureza é sempre e por toda parte idêntica . Pouco
passageiras so podem dar origem
a impressões igualmen­ unporra que se estenda ao infinito: além do l imite extre­
te pass agei ras, cuja lembrança se
apag a ao cabo de al­ mo onde pode chegar meu olhar, ela não difere do que é
gum tempo; portanto, elas não pode
riam servir de base a .1quém. O espaço que concebo para além do horizonte é
esse s siste mas está veis e perm anen
tes de idéia s que .iinda espaço, iclênti o ao que vejo. Esse tempo que não
con_st1tu
_ em
as religiões. Normalmente, o curso
_ da nature­ cessa de passar é feito ele momentos idênticos aos que vi­
za e umforme e a uniformidade não
saberia produzir for- vi. A extensão, como a duração, se repete indefiniclamen-
78 A� FORMAS ELEJll:.�\·TA RES DA 1 IDA RELICI0\.·1 '1nn PREU.111.VA Rr�\
79
,, I

í o têm, por ,j 1 1 t , in.:r.,o, ª" religiões sL inspira m antes


no sentimento
te: se as pon:ôes que dela experimento n�
1 1 1 1 1 r.1rio . Mesm o as mais eleva das e ideal istas têm por
nH..:smas, caráLer sagrado, como é que as outras teriam? O
com as coisas: elas
fato de não as perceber diretamente não é suficiente para 11 111 > confonar o homem cm sua luta
pi ,1< ssam que a fé é capa z, por si só, de "remm ·er mon­
rransformá-las38. Por mais ilimitado que seja um mundo
é, de domi nar as força s da natur eza. Como
de coisas profanas, ele continua sendo um mundo profa­ t 1 1 t l 1 .1s", isto
a se t \·e�sem por origem

no. Dirrio que as forças físicas com as quais lidamos exce­ pt ' lt nam elas dar essa confian�
eza e de 11npo tenc1a?
dem as nossas? Mas as forças sagradas não se distinguem 1 1 1 11.1 sensação de fraqu
simplesmente das profanas por sua maior intensidade: . se de fato as coisa s da natur eza se tivessem tor-
Aliás
suas formas imponente:,
elas são outms, têm qualidades especiais que as segundas 11 1dn seres sagrados em razão de
• •l i da for�·a que mani festam . teríam os de constatar que o
não têm. Ao contrário, todas as que se man ifestam no
, 11, a lua, o céu. as montanhas. o mar. os vento
s. em uma
uni\er.so são da mesma natureza, tanto que c.stáo den­
p.tl.1\ ra. as grandes forças
as
cosm 1La!>, foram as pnim.:i r.is a
tro e >mo a.s que c.�t..io forn de no::.. Sohretuuo, n<io há ne­ .
o,t•r cle\'adas a essa digni dade , pois não há outras mais ca­
nhuma r::izão que permita atribuir a umas uma espécie de
e a imag inaçã o. Ora,
dignidade eminente em relação às olllras. Se, ponanto, a p.lll:s de impressionar os sentidos
divin izada s tardiamente. Os pn-
11,1 \ erdade elas só foram
- teremos a prm·� dis-
religião tivesse realmente nascido da necessidade de atri­
buir causas aos fenômenos físicos, as força::. que teria1.1 si­ 1 , 1ro� res a que se dirige o culto
humi ldes vegetais ou
do imaginadas não seriam mais sagradas do que as conce­ , , nos capítulos que seguem - são
dos quais o hom em se encontra\'a, pelo
,1111mais, diant e
a lebre, o cangui:-1 , �
bidas pelo cientista de hoje para explicar os mesmos fa­
tos:l9. Vale dizer que não teria havido seres sagrados nem, 11 1<·nos, em pé de igualdade: o palo,
conseqüentemente, reHgião. 0
1 111 1 . lagarto, a lagarta. a
pode
rà, etc.
riam
Suas
ser a
qualidades ob1et �­
origem dos sentt ­
Além do mab:., mesmo supondo-se que essa sensação ' 1., e,·idc ntem ente não
.
de "esmagamento" seja realmente suge<;tiva da idéia reli t 1vntos religiosos que eles inspiraram
giosa, ela nào poderia ter produzido esse efeito sobre o
homem primitivo; pois essa sensação, ele não possui. De
modo nenhum tem consciência de que as forças cósmicas
sejam a tal pomo superiores às suas. Como a ciência ain­
da não veio ensinar-lhe a modéstia, ele atribui-se um do­
mínio sobre as coisas que não possui, mas cuja ilusão é
suficiente para impedi-lo de sentir-se dominado por elas.
Ele se acredita capaz, como já dissemos, c.le governar os
elementos, desencadear o vento0 forçar a chuva a cair de­
ter o sol por um gesto. etc.�º A própria religião cont ibui ;
pam dar-lhe essa segurança, pois supostamente o muniria
de poderes que se estendem sobre a natureza. Os ritos
são, cm pane, meios destinados a permitir-lhe impor suas
vontades ao mundo. Longe, ponanto, de se originarem do
sentimento que o homem teria de sua pequenez em face
\l'ITLLO [\'
<> TOTEMISMO COMO RELIGIÃO
l �LEMENTAR
l ltstôrico da questão. Método para lrettá-/a

Por mais opostos que pareçam em suas conclusões,


, ,, dois sistemas que acabamos de estudar coincidem num
pomo essencial: eles colocam o problema em termos
" I L· nlicos. Ambos, com efeito, empreendem constru ir a
1 0 do divi no com as sensações que certos fenômenos
1 H >1,·�
1 1 1 1 urais, físicos ou biológicos, despen::.1m em nós. Para os
.11umisLas, o �onho, para os naturistas, certas manifestações
• osmicas é que teriam sido o pomo de partida da evolu­
� .10 religiosa. f\las, tanto para uns como para outros, é na
11,11 ureza, seja do homem, seja do universo, que se devc-
1 1 .1 hu�car o germe da grande oposição que separa o pro­
l.1 110 do sagrado.
Tal empreendimento, entreta nto é impossível: ele
.1 1 pôe uma verdadeira criação ex nibilo.
,

Um fato da expe­
· nci a
t tl comum não pode nos dar a idéia de u m a coisa
q11c tem por característica estar fora do mundo da expe-
1 1t· nc:ia comum. O homem, tal como se revela a si mesmo
1 · m seus sonhos, continua sendo apenas um homem. As
t orras naturais, tais como nossos sentidos as percebem,
11.IC> são senão forças narurais, seja qual for sua intensicla­
dv. Daí procede a crítica comum que fazíamos a ambas as
\l'ITLLO [\'
<> TOTEMISMO COMO RELIGIÃO
l �LEMENTAR
l ltstôrico da questão. Método para lrettá-/a

Por mais opostos que pareçam em suas conclusões,


, ,, dois sistemas que acabamos de estudar coincidem num
pomo essencial: eles colocam o problema em termos
" I L· nlicos. Ambos, com efeito, empreendem constru ir a
1 0 do d ivi no com as sensações que certos fenômenos
1 H >1,·�
1 1 1 1 urais, físicos ou biológicos, despen::.1m em nós. Para os
.11umisLas, o �onho, para os naturistas, certas manifestações
• osmicas é que teriam sido o pomo de partida da evolu­
� .10 religiosa. f\las, tanto para uns como para outros, é na
11,11 ureza, seja do homem, seja do universo, que se devc-
1 1 .1 hu�car o germe da grande oposição que separa o pro­
l.1 110 do sagrado.
Tal empree n d i m ento, entre ta nto é impossível: ele
.1 1 pôe uma verdadeira criação ex nibilo.
,

Um fato da expe­
· nci a
t tl comum não pode nos dar a idéia de u m a coisa
q11c tem por característica estar fora do mundo da expe-
1 1t· nc:ia comum. O homem, tal como se revela a si mesmo
1 · m seus sonhos, continua sendo apenas um homem. As
t orras naturais, tais como nossos sentidos as percebem,
11.IC> são senão forças narurais, seja qual for sua intensicla­
dv. Daí proced e a crítica comum que fazíamos a ambas as
AS FORMAS t.LIJMENTARES DA VlDA RELIG •IC lliS PRELLMINARES
82
IOSA 11 83

doutrinas. Para explicar como esses pretensos dados do t l1·,th.: então a suspeitar que se tratava de um sistema
pensamento religioso puderam adquirir um caráter sagra­ 1 11 1 1 1 11<1 cena generalidade.
do que nada fundamenta objetivamente, era preciso ad­ Mas nele não se via muito mais cio que uma institui­
.
m1tll' que todo um modo de representações alucinatórias " , 1·ssencialmente arcaica, uma curiosidade etnográfica
veio sobrepor-se a eles, desnaturá-los a ponto ele torná­ , 1 1 1 grande interesse para o historiador. Mac Lennan foi o
los irreconhecíveis e substituir a realidade por uma pura i •1 l11 wiro a tentar vincular o totemismo à história geral da
fantasmagoria. Aqui, as ilusões do sonho é que teriam l i 1 1 1 11aniclade. Numa série ele artigos publicados na Fort-
operado essa transfiguração; ali, o brilhante e vão cortejo ll:/11�11 Review4, procurou mostrar não apenas que o tote-
ele imagens evocadas pela palavra. Mas em ambos os ca­ 1 1 1 1�1110 era uma religião, mas que dessa religião derivou
sos acabava-se vendo na religião o produto de uma inter­ 1 1 111.1 grande quantidade ele crenças e de práticas que se
pretação delirante. , 1 1 1 llntram em sistemas religiosos bem mais avançados.
Uma conclusão positiva se obtém, portanto, desse 1 l ll'gou a fazer dele, inclusive, a origem ele todos os cul-
exame crítico. Se nem o homem nem a natureza possuem, 1 • " zoolátricos e fitolátricos que podem ser observados
em si mesmos, caráter sagrado, é que o derivam de uma 1 1 1 1� povos antigos. Seguramente, essa extensão do tote-
outra fonte. Portanto, eleve haver, fora elo indivíduo hu­
mano e do mundo físico, alguma outra realidade em rda­
1 1 1 1�1110 era abusiva. O culto elos animais e elas plantas de­
i " nde ele causas múltiplas que não se pode, sem simplis-
ção à qual essa espécie de delírio - que, em certo sentido 1110, reduzir à unidade. Mas esse simplismo, por seus exa­
toda religião é de fato - adquire uma significação e u1 � v.•·1<is mesmos, tinha pelo menos a vantagem ele evidenciar
valor objetivo. Em outros termos: para além elo que foi 1 i111 portância histórica elo totemismo.
chamado ele animismo e ele naturismo, eleve haver um Por outro lado, os americanistas tinham notado h á
.

outro cu to, mais fundamental e mais primitivo, do qual 1 1 1 1 dlo tempo que o totemismo era solidário ele uma orga-
os pnmerros provavelmente são apenas formas derivadas 1d1.1ção social determinada: a que tem por base a divisão
ou aspectos particulares. 1 l,1 sociedade em clãs5. Em 1877, em sua Ancient Society6,
Esse culto existe, ele fato; é o que foi chamado pelos l 1•wis H. Morgan decidiu estudar essa organização, deter-
,
etnografos de totemismo. 1 1 1 111:11' suas características distintivas e, ao mesmo tempo,
1 1 1< >strar sua generalidade nas tribos indígenas da América
.i'IL'ntrional e central. Quase no mesmo momento e, aliás,
11nr sugestão direta ele Morgan, Fison e Howitt7 constata­

É somente no final cio século XVIII que a palavra to­


' .1111 a existência elo mesmo sistema social na Austrália,
i ll'm como suas relações com o totem.ismo.
tem a �arece na literatura etnográfica. Encontramo-la, pela Sob a influência dessas idéias diretoras, as observa­
pnme1ra vez, no livro ele um intérprete dos índios, ] . ', i1·s puderam ser desenvolvielas com mais método. As
1 wsquisas que o Bureau de Etnologia Americana suscitou
.
Long, publicado e m Londres em 17911. Durante cerca ele
meio século, o totemismo foi conhecido como uma insti­ , , intribuíram em grande parte para o progresso desses es­
tuição exclusivamente americanaz. Somente em 1 8 4 1 t mlo ss. Em 1887, o� documentos eram suficientemente
Grey, num texto que ficou célebre3, assinalou a existência 1 111 111crosos e significativos para que Frazer julgasse opor-
de práticas inteiramente similares na Austrália. Começou- 1 uno reuni-los e apresentá-los num quadro sistemático.
AS FORMAS t.LIJMENTARES DA VlDA RELIG •IC lliS PRELLMINARES
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IOSA 11 83

doutrinas. Para explicar como esses pretensos dados do t l1·,th.: então a suspeitar que se tratava de um sistema
pensamento religioso puderam adquirir um caráter sagra­ 1 11 1 1 1 11<1 cena generalidade.
do que nada fundamenta objetivamente, era preciso ad­ Mas nele não se via muito mais cio que uma institui­
.
m1tll' que todo um modo de representações alucinatórias " , 1·ssencialmente arcaica, uma curiosidade etnográfica
veio sobrepor-se a eles, desnaturá-los a ponto ele torná­ , 1 1 1 grande interesse para o historiador. Mac Lennan foi o
los irreconhecíveis e substituir a realidade por uma pura i •1 l11 wiro a tentar vincular o totemismo à história geral da
fantasmagoria. Aqui, as ilusões do sonho é que teriam l i 1 1 1 11aniclade. Numa série ele artigos publicados na Fort-
operado essa transfiguração; ali, o brilhante e vão cortejo ll:/11�11 Review4, procurou mostrar não apenas que o tote-
ele imagens evocadas pela palavra. Mas em ambos os ca­ 1 1 1 1�1110 era uma religião, mas que dessa religião derivou
sos acabava-se vendo na religião o produto de uma inter­ 1 1 111.1 grande quantidade ele crenças e de práticas que se
pretação delirante. , 1 1 1 llntram em sistemas religiosos bem mais avançados.
Uma conclusão positiva se obtém, portanto, desse 1 l ll'gou a fazer dele, inclusive, a origem ele todos os cul-
exame crítico. Se nem o homem nem a natureza possuem, 1 • " zoolátricos e fitolátricos que podem ser observados
em si mesmos, caráter sagrado, é que o derivam de uma 1 1 1 1� povos antigos. Seguramente, essa extensão do tote-
outra fonte. Portanto, eleve haver, fora elo indivíduo hu­
mano e do mundo físico, alguma outra realidade em rda­
1 1 1 1�1110 era abusiva. O culto elos animais e elas plantas de­
i " nde ele causas múltiplas que não se pode, sem simplis-
ção à qual essa espécie de delírio - que, em certo sentido 1110, reduzir à unidade. Mas esse simplismo, por seus exa­
toda religião é de fato - adquire uma significação e u1 � v.•·1<is mesmos, tinha pelo menos a vantagem ele evidenciar
valor objetivo. Em outros termos: para além elo que foi 1 i111 portância histórica elo totemismo.
chamado ele animismo e ele naturismo, eleve haver um Por outro lado, os americanistas tinham notado h á
.

outro cu to, mais fundamental e mais primitivo, do qual 1 1 1 1 dlo tempo que o totemismo era solidário ele uma orga-
os pnmerros provavelmente são apenas formas derivadas 1d1.1ção social determinada: a que tem por base a divisão
ou aspectos particulares. 1 l,1 sociedade em clãs5. Em 1877, em sua Ancient Society6,
Esse culto existe, ele fato; é o que foi chamado pelos l 1•wis H. Morgan decidiu estudar essa organização, deter-
,
etnografos de totemismo. 1 1 1 111:11' suas características distintivas e, ao mesmo tempo,
1 1 1< >strar sua generalidade nas tribos indígenas da América
.i'IL'ntrional e central. Quase no mesmo momento e, aliás,
11nr sugestão direta ele Morgan, Fison e Howitt7 constata­

É somente no final cio século XVIII que a palavra to­


' .1111 a existência elo mesmo sistema social na Austrália,
i ll'm como suas relações com o totem.ismo.
tem a �arece na literatura etnográfica. Encontramo-la, pela Sob a influência dessas idéias diretoras, as observa­
pnme1ra vez, no livro ele um intérprete dos índios, ] . ', i1·s puderam ser desenvolvielas com mais método. As
1 wsquisas que o Bureau de Etnologia Americana suscitou
.
Long, publicado e m Londres em 17911. Durante cerca ele
meio século, o totemismo foi conhecido como uma insti­ , , intribuíram em grande parte para o progresso desses es­
tuição exclusivamente americanaz. Somente em 1 8 4 1 t mlo ss. Em 1887, o� documentos eram suficientemente
Grey, num texto que ficou célebre3, assinalou a existência 1 111 111crosos e significativos para que Frazer julgasse opor-
de práticas inteiramente similares na Austrália. Começou- 1 uno reuni-los e apresentá-los num quadro sistemático.
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AS FOR.\IAS HLF\IE.\?ilRES DA \7DA RELIG!m.-i 1 \ 1r l/-\ l'JlELL\f/,\ARES 83

J k e ntão a su spe itar que se tratav a ele um sis tem a


doutrinas. Para explicar com
o esses pretensos dados do

h 111na certa ge nera l idade.


pensamento rdigioso puderam
adqu irir um ca ráter sagra­
d� que nada fun dame nta obje
. r iv amcn re, era preciso ad­ \-1.ts nele não se via muito mais do que uma in stitu i -
11 1 1 ssencia lmc nte arcaica. uma curiosid ade etnográfica
mi t ir que todo um modo de
representações alucinatórias
veio sobrepor-se a eles, desn
aturá-los a ponto de torná­ 111 vr.in<le interesse para o historiador. Mac Lennan foi o
1 r u 1 1· i ro a tentar vincular o totemismo à história gera l da
los irreconh�cíveis � substituir
fantasm agon a . Aqu i, as ilusõ
a realidade por uma pura
es do sonh o é que teriam
1
ali, o bri lhante e vão cortejo
l i 1 1 1 11anidade. :-.!uma s érie ele artigos publicados na Fort-
11 •li//)' Review\
op�rado essa transfiguração;
de i magens evocadas pela pala
procurou mostrar não apenas que o tote-
vra. Mas em ambos os ca­ 1 11 1 •.in;> era uma re l igi ão, mas que dessa religião derivou
sos acabava-se vendo na relig
iáo o produto de uma inter­ 11 1 1.1 gra n de qua n tidade de crenças e de práticas que se
1 1 1 1 o ntra m em sistemas reltg1osos bem mais avançados.
prela�ào delirante.

hc�o u a fazer dele. mdu!>1n:. a origem <lt.. todos os l:ul·


l·ma cond usào pos111va :o.t..
exan�e crítico Se nem o hom
obtem . portanto, desse
. em nem a natureza possuem
, I•
l

1oolátricos e fitolátricos que p ode m ser obserYados


em s1 mesmos, rnrátcr sagr
ado, é que o de ri vam de uma
11 ,., povos an tigos . Seguramente, essa exten são do tote-
have r, fora do indiv íduo hu­ 1 1 1 1 �1110 era a b us iva . O culto dos a nimais e elas plantas de­
outra fonte. Portanto, eleve

i " nde de causas mú lti pl as q u e não se pode, sem simplis-


mano e do mundo físico, algu
ma outra realidade cm 1ela­
çào à qual essa espécie de delír
io - que, em certo sentido. 1111 >. reduzir à unidade. Mas esse simplismo, por seus exa ­
W 1 1>s mesmos. tinha pelo menos a va ntagem de evidenciar
toda relig ião é de fato - adqu
ire uma sign ificação e um
valo r objetivo. Em outros
termos: para além cio que
cham ado de anim ismo e de
foi 1 11nportância h istórica do totemismo .
natu rism o, deve have r u m ,
Por outro lado, os americanistas tinham notado h a
outro. cu�to, mais fundamental
e mais primitivo, d o qual 111111to tempo que o totemismo era !>Olidário ele uma orga-
os primeiros provavelmente
são apenas formas derivada 111 .1çào social determinada: a que tem por base a d i vi sào
s
o l,1 sociedad e cm clàs'i. Em 1877, em sua A12cie11t Society <>,
ou aspectos particul ares .
Esse culto existe, de fato; é
, o que foi chamado pelos l 1 "is II. M orga n decidiu estudar essa orga nização, deter-
etnografos de toremismo.
1111ar suas características distintivas e, ao mesmo tempo,
111< 1strar sua generalidade nas tribos indígenas e.la América
,, wntrional e central Quase no mesmo momento e. aliás.
1 111r sugestão direta de Morgan, Fison e Howitt co nsta ta­
' .un a existência cio mesmo sistema social na Austrália,
É somente no final do século XVIII que a palavra to­ l 1vm como suas relações com o totemismo.
te�1 a�a rece na literatura etnográfica . Encontramo-la, pela
Sob a influência dessas idéias diretoras, as observa-
pnme1ra " ez. no livro de um intérprete dos índios . ].
r•91 1 .
. ' s puderam ser dcsem·oh idas com mais método l\s
Long, puhltcado em Londres em Durante cerca de
pLsquisas que o Bureau de Etnologia Americana suscitou
meio século, o totemismo foi conhecido como uma insti­
184 1
, ontribuíram em grande parte para o progresso desses es­
tuição e x clusivame n t e americana2. Somente em t udoss. Em 1887, o::- documentos eram su fi c i enteme nte
G rey, num texto que ficou célebre3, assinalou a existência
numerosos e sig nifi cativos para que Frazer julgasse opor-
de prát icas inteiramente similares na AustráJia. Começou-
1 u no reuni-los e apresentá-los n u m quadro sistemático.
82
AS FOR.\IAS HLF\IE.\?ilRES DA \7DA RELIG!m.-i 1 \ 1r l/-\ l'JlELL\f/,\ARES 83

J k e ntão a su spe itar que se tratav a ele um sis tem a


doutrinas. Para explicar com
o esses pretensos dados do

h 111na certa ge nera l idade.


pensamento rdigioso puderam
adqu irir um ca ráter sagra­
d� que nada fun dame nta obje
. r iv amcn re, era preciso ad­ \-1.ts nele não se via muito mais do que uma in stitu i -
11 1 1 ssencia lmc nte arcaica. uma curiosid ade etnográfica
mi t ir que todo um modo de
representações alucinatórias
veio sobrepor-se a eles, desn
aturá-los a ponto de torná­ 111 vr.in<le interesse para o historiador. Mac Lennan foi o
1 r u 1 1· i ro a tentar vincular o totemismo à história gera l da
los irreconh�cíveis � substituir
fantasm agon a . Aqu i, as ilusõ
a realidade por uma pura
es do sonh o é que teriam
1
ali, o bri lhante e vão cortejo
l i 1 1 1 11anidade. :-.!uma s érie ele artigos publicados na Fort-
11 •li//)' Review\
op�rado essa transfiguração;
de i magens evocadas pela pala
procurou mostrar não apenas que o tote-
vra. Mas em ambos os ca­ 1 11 1 •.in;> era uma re l igi ão, mas que dessa religião derivou
sos acabava-se vendo na relig
iáo o produto de uma inter­ 11 1 1.1 gra n de qua n tidade de crenças e de práticas que se
1 1 1 1 o ntra m em sistemas reltg1osos bem mais avançados.
prela�ào delirante.

hc�o u a fazer dele. mdu!>1n:. a origem <lt.. todos os l:ul·


l·ma cond usào pos111va :o.t..
exan�e crítico Se nem o hom
obtem . portanto, desse
. em nem a natureza possuem
, I•
l

1oolátricos e fitolátricos que p ode m ser obserYados


em s1 mesmos, rnrátcr sagr
ado, é que o de ri vam de uma
11 ,., povos an tigos . Seguramente, essa exten são do tote-
have r, fora do indiv íduo hu­ 1 1 1 1 �1110 era a b us iva . O culto dos a nimais e elas plantas de­
outra fonte. Portanto, eleve

i " nde de causas mú lti pl as q u e não se pode, sem simplis-


mano e do mundo físico, algu
ma outra realidade cm 1ela­
çào à qual essa espécie de delír
io - que, em certo sentido. 1111 >. reduzir à unidade. Mas esse simplismo, por seus exa ­
W 1 1>s mesmos. tinha pelo menos a va ntagem de evidenciar
toda relig ião é de fato - adqu
ire uma sign ificação e um
valo r objetivo. Em outros
termos: para além cio que
cham ado de anim ismo e de
foi 1 11nportância h istórica do totemismo .
natu rism o, deve have r u m ,
Por outro lado, os americanistas tinham notado h a
outro. cu�to, mais fundamental
e mais primitivo, d o qual 111111to tempo que o totemismo era !>Olidário ele uma orga-
os primeiros provavelmente
são apenas formas derivada 111 .1çào social determinada: a que tem por base a d i vi sào
s
o l,1 sociedad e cm clàs'i. Em 1877, em sua A12cie11t Society <>,
ou aspectos particul ares .
Esse culto existe, de fato; é
, o que foi chamado pelos l 1 "is II. M orga n decidiu estudar essa orga nização, deter-
etnografos de toremismo.
1111ar suas características distintivas e, ao mesmo tempo,
111< 1strar sua generalidade nas tribos indígenas e.la América
,, wntrional e central Quase no mesmo momento e. aliás.
1 111r sugestão direta de Morgan, Fison e Howitt co nsta ta­
' .un a existência cio mesmo sistema social na Austrália,
É somente no final do século XVIII que a palavra to­ l 1vm como suas relações com o totemismo.
te�1 a�a rece na literatura etnográfica . Encontramo-la, pela
Sob a influência dessas idéias diretoras, as observa-
pnme1ra " ez. no livro de um intérprete dos índios . ].
r•91 1 .
. ' s puderam ser dcsem·oh idas com mais método l\s
Long, puhltcado em Londres em Durante cerca de
pLsquisas que o Bureau de Etnologia Americana suscitou
meio século, o totemismo foi conhecido como uma insti­
184 1
, ontribuíram em grande parte para o progresso desses es­
tuição e x clusivame n t e americana2. Somente em t udoss. Em 1887, o::- documentos eram su fi c i enteme nte
G rey, num texto que ficou célebre3, assinalou a existência
numerosos e sig nifi cativos para que Frazer julgasse opor-
de prát icas inteiramente similares na AustráJia. Começou-
1 u no reuni-los e apresentá-los n u m quadro sistemático.
8..j 1 / \ /( 1/:\ f'Ra.L\11.\ARES
85
,1s FORJIAS ELEltb\TtlRES DA l IDA REU<:;tO.VI

Tal é o objeco de -;eu pequeno livro intitulado Totemisnl''. n t: r , l• acé pouco tempo . Três grupos de sociedades
dizem res­
11 11 1111 particularmente objeto de pesquisas que
Nor?es-
onde este é estudado ao mesmo tempo como religião e
I 11 1 1 .10 totemismo:
como instituição jurídica. Mas esse escudo era puramente em p1imei ro lugar, as tri�os do
descririvo; nenhum esforço havia nele para explicar 0 to­ 1• , .., Tlinki t, os IIaida, os Kwali ul, os Sahsh, os
Ts1ms­
hl 111 L'lll seguida, a grande nação
temismow ou para aprofundar suas noções fundamentais. dos Sioux ; finalm ente,
IH • l'ntro da Améri
,
Robenson Smith foi o primeiro a empreender esse ca cio Norte, os índios dos Pueblo . Os
traba lho de elaboração. Ele sentia mais vivamente que • i l·
1 1 1 1 i iros foram principalmente estudados por
Dall, Krause,
por Dorsey; os
qualq �er um ele seus predecessores o quanto essa religião 1 1( 1 1 -., Swanron e l lill-Tout; os segundos
grosseira e confusa era rica em germes de futuro. É verda­ Minde leff, Sra. Sceven son e Cushi ng 1 '. Ma s.
1 1 l l 1111os por
pPr dla que fosse a coleta de fatos
de que Mac Lennan já ha\·ia aproximado o totemismo das vindo s ele toe.la� as
p 1 1 1vs. os documentos
grandes religiões da Antiguidade, mas isso u nicamente de que se dispun ha perma neciam
l i IJ.1111cn
porque julga\ a reconhecer, tantu aqui como la, um culto túnos . embo ra conte nham nume rosos traços ?e
fase propna-
dos animais e das plantas. Ora, reduzir o cocemismo a u 111·n11smo, as religiões americanas superam a
Por outro lado, na Austrá lia, as observa­
uma espécie de zoolatria ou de fitolatria era perceber 1111;1\lL' totêmica.
, •
apenas o que ele tinha de mais superficial; era inclusive m quase sempr e sobre crença s e � parsas e ritos
\C ., mciclia
proibi ções relauv as ao torem .
desconhecer sua verdadeira natureza. Smith, para além da 1 1 1l.1dos, ritos de iniciação e
!
m � ni e scação das crenças totêmicas, buscou atingir os
.
\ ,.,1111 foi com fatos recolh idos de todos os lados que Fra­
ismo.
"' 1e � tou traçar uma visão de conjun to do totem
mériro
pnnc1 p1os profundos dos quais elas dependem. Já no seu
livro sobre O parentesco e o casamento na Arábia primiti­ estáve l dessa re­
1 1r.1. qualqu er que seja o incont
va1 1 , ele havia mostrado que o totemismo supõe uma ' , 111stituição, empreendida em tais condições,
ela não po­
consubstancialidade, natural ou adquirida, do homem e d1.1 deixar de ser incompleta e hipotética.
Definilivamen-
ainda uma religiã o tocêmk a funcio-
do animal (ou da planta). Em sua Religião dos semitas•1. 11 núo se cinha visto
fez dessa mesma 1déia a origem primeira de todo o siste­ 11.11 1..: 11 1 sua integra lidade .
lacuna
ma sacrificial: é ao totemismo que a humanidade deveria foi somente nos últimos anos que essa gra\·e
observ adores de notáve l sagaci dade.
o pri �cípio da co �1unhão alimentar. É claro que se pode í01 preenchida. Dois
, em parte16•
considerar a teona ele Smith unilateral: ela não é mais 1 1.1klwin Spencer e F.-J. Gillen , descobriram
o consi­
adequada aos facos atualmente conhecidos; mas não dei­ 111 1 interior do continemc austra liano, u m númer
tribos nas quais viram ser pratica do um sisce-
xava de conter uma idéia genial e exerceu, sobre a ciên­ dnavel de
cia das religiões, a mais fecunda iníluência. É nessas mes­ 1 1 1 .1 rel igioso cuja base e unidad
e são formadas pelas cren­
_
mas concepções que se inspira o Golden Bough [O Ramo � .is totêm icas. Os resulc aclos dessa inves tigaçã o foram
renovaram o c�tudo do
de Ouro]l3 de Frazer, cm que o totemismo que Mac Lennan , 1 msignados em duas obras que

I • 1ti.:mbmo. A primeira. Tbe .\'a til'e Tribes o f Centra l A11s-


vinculara às religiões da Antiguidade clássica. e Smith às
das sociedades semíticas, é associado ao folclore euro­ 111ilia•-. trata das mais centrais dessas tribos: os
Arunta, os
tal do
peu. A escola de 1\lac Lennan e a de .t\lorgan \·inham jun­ 1.urncha e, um pouco mais ao sul, à margem ociden
A segun da. intitul ? da he
T_ Nor­
l.1go Eyre, os Lrabu nna.
la?:s
tar-se. assim, à de Mannhardc'�.
Nesse meio tempo, a lradiçào americana continuava o f C entral Austra lia 1 R, refere- se as soc1ec
them Tribes
m o ternto-
a desenvolver-se com uma independência que, por sinal, que vivem ao norte dos Urabunna; elas ocupa
8..j 1 / \ /( 1/:\ f'Ra.L\11.\ARES
85
,1s FORJIAS ELEltb\TtlRES DA l IDA REU<:;tO.VI

Tal é o objeco de -;eu pequeno livro intitulado Totemisnl''. n t: r , l• acé pouco tempo . Três grupos de sociedades
dizem res­
11 11 1111 particularmente objeto de pesquisas que
Nor?es-
onde este é estudado ao mesmo tempo como religião e
I 11 1 1 .10 totemismo:
como instituição jurídica. Mas esse escudo era puramente em p1imei ro lugar, as tri�os do
descririvo; nenhum esforço havia nele para explicar 0 to­ 1• , .., Tlinki t, os IIaida, os Kwali ul, os Sahsh, os
Ts1ms­
hl 111 L'lll seguida, a grande nação
temismow ou para aprofundar suas noções fundamentais. dos Sioux ; finalm ente,
IH • l'ntro da Améri
,
Robenson Smith foi o primeiro a empreender esse ca cio Norte, os índios dos Pueblo . Os
traba lho de elaboração. Ele sentia mais vivamente que • i l·
1 1 1 1 i iros foram principalmente estudados por
Dall, Krause,
por Dorsey; os
qualq �er um ele seus predecessores o quanto essa religião 1 1( 1 1 -., Swanron e l lill-Tout; os segundos
grosseira e confusa era rica em germes de futuro. É verda­ Minde leff, Sra. Sceven son e Cushi ng 1 '. Ma s.
1 1 l l 1111os por
pPr dla que fosse a coleta de fatos
de que Mac Lennan já ha\·ia aproximado o totemismo das vindo s ele toe.la� as
p 1 1 1vs. os documentos
grandes religiões da Antiguidade, mas isso u nicamente de que se dispun ha perma neciam
l i IJ.1111cn
porque julga\ a reconhecer, tantu aqui como la, um culto túnos . embo ra conte nham nume rosos traços ?e
fase propna-
dos animais e das plantas. Ora, reduzir o cocemismo a u 111·n11smo, as religiões americanas superam a
Por outro lado, na Austrá lia, as observa­
uma espécie de zoolatria ou de fitolatria era perceber 1111;1\lL' totêmica.
, •
apenas o que ele tinha de mais superficial; era inclusive m quase sempr e sobre crença s e � parsas e ritos
\C ., mciclia
proibi ções relauv as ao torem .
desconhecer sua verdadeira natureza. Smith, para além da 1 1 1l.1dos, ritos de iniciação e
!
m � ni e scação das crenças totêmicas, buscou atingir os
.
\ ,.,1111 foi com fatos recolh idos de todos os lados que Fra­
ismo.
"' 1e � tou traçar uma visão de conjun to do totem
mériro
pnnc1 p1os profundos dos quais elas dependem. Já no seu
livro sobre O parentesco e o casamento na Arábia primiti­ estáve l dessa re­
1 1r.1. qualqu er que seja o incont
va1 1 , ele havia mostrado que o totemismo supõe uma ' , 111stituição, empreendida em tais condições,
ela não po­
consubstancialidade, natural ou adquirida, do homem e d1.1 deixar de ser incompleta e hipotética.
Definilivamen-
ainda uma religiã o tocêmk a funcio-
do animal (ou da planta). Em sua Religião dos semitas•1. 11 núo se cinha visto
fez dessa mesma 1déia a origem primeira de todo o siste­ 11.11 1..: 11 1 sua integra lidade .
lacuna
ma sacrificial: é ao totemismo que a humanidade deveria foi somente nos últimos anos que essa gra\·e
observ adores de notáve l sagaci dade.
o pri �cípio da co �1unhão alimentar. É claro que se pode í01 preenchida. Dois
, em parte16•
considerar a teona ele Smith unilateral: ela não é mais 1 1.1klwin Spencer e F.-J. Gillen , descobriram
o consi­
adequada aos facos atualmente conhecidos; mas não dei­ 111 1 interior do continemc austra liano, u m númer
tribos nas quais viram ser pratica do um sisce-
xava de conter uma idéia genial e exerceu, sobre a ciên­ dnavel de
cia das religiões, a mais fecunda iníluência. É nessas mes­ 1 1 1 .1 rel igioso cuja base e unidad
e são formadas pelas cren­
_
mas concepções que se inspira o Golden Bough [O Ramo � .is totêm icas. Os resulc aclos dessa inves tigaçã o foram
renovaram o c�tudo do
de Ouro]l3 de Frazer, cm que o totemismo que Mac Lennan , 1 msignados em duas obras que

I • 1ti.:mbmo. A primeira. Tbe .\'a til'e Tribes o f Centra l A11s-


vinculara às religiões da Antiguidade clássica. e Smith às
das sociedades semíticas, é associado ao folclore euro­ 111ilia•-. trata das mais centrais dessas tribos: os
Arunta, os
tal do
peu. A escola de 1\lac Lennan e a de .t\lorgan \·inham jun­ 1.urncha e, um pouco mais ao sul, à margem ociden
A segun da. intitul ? da he
T_ Nor­
l.1go Eyre, os Lrabu nna.
la?:s
tar-se. assim, à de Mannhardc'�.
Nesse meio tempo, a lradiçào americana continuava o f C entral Austra lia 1 R, refere- se as soc1ec
them Tribes
m o ternto-
a desenvolver-se com uma independência que, por sinal, que vivem ao norte dos Urabunna; elas ocupa
11 / '/OFS PRFJJ,lfff\'ANfü'
87
86 AS FORMASELEMEJ\TARES DA \ WA l?EUG/U,\A

uni (,is t'.)dos os documentos importantes


relacionados
rio que vai dos monres Macdonnel ao golfo de Carpentá­
ização familiar e
na. Süo, para citar apenas as principa1::., os Unmatiera, os 1 i 1 11n a religião lOtêmica quanro à organ
ou sem razão, essa religiã o é ti­
Kaitish, os Warrnmunga, os Worga ia, os Tjingilli, os Bin­ 111 1 1 1 1 monial da qual, com
solidá ria. A finalid ade dessa obra não é oferecer
binga, os Walpari, os Gnanji e, enfim, nas bordas do mes­ l 1 rnmo
ismo, mas antes co­
mo golfo, os Mara e os Anula19. 11111.1 ' isào gera l e sistemática do rotem
Mais recentemente, um missionário alemão, Carl Streh­ dos pesqu isador es os materiais neces-
h 11 ,1r à disposição
para uma constr ução desse gêner o28. Nela, os fatos
low, que também passou muitos anos nessas mesmas so­ 1 1111s
estrica meme etnográfica e
ciedades do centro australiano20. começou a publicar suas e �1.111 dispostos numa ordem

J'!'• 1).(ráfica: cada contin ente e, no interio r de cada continen­


observações sobre duas dessas tribos. os Arnnda e os Lo­
l t ' 1 ada tribo OLI grnpo étnico são estud
ados separada-
rilja ( Aninda e Luritcha de Spencer e Gillen)ZI. Grande co­
so. no qual tantos
nhecedor d.1 língua falada por esses pO\'os!!, Slrehlow pô­ 1 1 wnte. Claro que um estudo táo exten
f 'l l >::. divers os sao su1.. c ss1vam ente passa dos em re\1sta,
dt.· nos rel:itar um grande número de mitos totl:micos e
o em todas as suas
cantos religiosos que nos são dados, em sua maior parte, 11 111 podia ser igualm ente aprofundad
r 11tl's; mesmo assim ele const itui um bre,·iário útil para a
no texto original. Apesar das divergências de detalhes que
a e capaz de facilit ar as pesqu isas.
se explicam facilmenre e cuja importância foi grandemen­ ' ' 1nsulc
te cxageradaH, veremos que as observações feitas por
Strehlo" , embora completando, precisando e às vezes aré
retificando as de Spencer e Gillen, as confirmam, em su­ II
ma, em rudo o que têm de essencial.
lia é o ter-
Essas descobertas suscitaram uma abundante litera­ Desse breve histórico result a q u e a Austrá
ismo. Faremos de­
t u ra sobre a qual voltaremos a falar. Os trabalhos d e 1 1 · 110 mais favorável ao estudo do totem
nossa obsef\·açào.
Spencer e Gillcn, sobretudo, exerceram uma intluência l.1 por esse motivo, a área principal de
Em seu Totemi sm, Fraze r havia se dedicado sobretu­
consider-J.\'el, não apenas por serem os mais antigos, mas
ismo que se pode
porque os fatos eram aí apresentados sob uma forma sis­ d<1 a levantar wdos os traços de totem
e na etnog rafia. Assim foi levado a
temática, capaz, ao mesmo tempo, de orientar as obser­ iil'scobrir na história
em seu estud o as socied ades mais diferentes quan-
vaçôes ulterioresl• e estimular a especulação. Seus resul­ 1 11duir
tados foram comentados, discu tid os e interpret <idos de 1 0 à natureza e o grau ele cultllr a: o antigo
Egito29, a Ará-
esl do Sul31 ali apare cem ao lado
Amér ica. Essa maneira ele pro­
todas <is maneirns. Enquanto isso, llowitt, cujos estudos 1>1a, a Grécia-�º e os avos
fragmentá rios cl ispersavam se numa grande q u�1 ntidade
- 1 las tribos ela Austrf tlia e ela
um discípulo da
de pub l icações cliferentes2s, reso lve fazer, para as tribos n:der nada Linha de su rpreendente para
do S ul, que S pencer e Gi l len haviam feito para as do ológic a. Essa escola , com efeito , não busca
1·.�cola antrop
Trihes of South-East A 1 1stralia2<>, ele nos
o
Centro. Em Ncitive 1tuar as religiões nos meios sociais de
que fazem parteU
diferentes aos quais
oferece um painel da organização social dos povos que 1 diferenciá-las em função dos meios
assim relacio nadas . Muito pelo contrá rio, como indi-
ocupam a Austrália meridional. a Nova Gales do Sul e 1·st;lo
escola se deu, seu objetivo é
uma boa parre do Queensland. Os progressos assim reali­ 1 .1 o próprio nome qu" essa

zados sugeriram a Frazer a idéia de completar seu Tote­ das difere nças nacio nais e históricas, as
1t mgir, para além
univer sais e verdad eirame nte human as da vida reli-
mism com uma espécie de compêndio2' onde cscariam hases
11 / '/OFS PRFJJ,lfff\'ANfü'
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86 AS FORMASELEMEJ\TARES DA \ WA l?EUG/U,\A

uni (,is t'.)dos os documentos importantes


relacionados
rio que vai dos monres Macdonnel ao golfo de Carpentá­
ização familiar e
na. Süo, para citar apenas as principa1::., os Unmatiera, os 1 i 1 11n a religião lOtêmica quanro à organ
ou sem razão, essa religiã o é ti­
Kaitish, os Warrnmunga, os Worga ia, os Tjingilli, os Bin­ 111 1 1 1 1 monial da qual, com
solidá ria. A finalid ade dessa obra não é oferecer
binga, os Walpari, os Gnanji e, enfim, nas bordas do mes­ l 1 rnmo
ismo, mas antes co­
mo golfo, os Mara e os Anula19. 11111.1 ' isào gera l e sistemática do rotem
Mais recentemente, um missionário alemão, Carl Streh­ dos pesqu isador es os materiais neces-
h 11 ,1r à disposição
para uma constr ução desse gêner o28. Nela, os fatos
low, que também passou muitos anos nessas mesmas so­ 1 1111s
estrica meme etnográfica e
ciedades do centro australiano20. começou a publicar suas e �1.111 dispostos numa ordem

J'!'• 1).(ráfica: cada contin ente e, no interio r de cada continen­


observações sobre duas dessas tribos. os Arnnda e os Lo­
l t ' 1 ada tribo OLI grnpo étnico são estud
ados separada-
rilja ( Aninda e Luritcha de Spencer e Gillen)ZI. Grande co­
so. no qual tantos
nhecedor d.1 língua falada por esses pO\'os!!, Slrehlow pô­ 1 1 wnte. Claro que um estudo táo exten
f 'l l >::. divers os sao su1.. c ss1vam ente passa dos em re\1sta,
dt.· nos rel:itar um grande número de mitos totl:micos e
o em todas as suas
cantos religiosos que nos são dados, em sua maior parte, 11 111 podia ser igualm ente aprofundad
r 11tl's; mesmo assim ele const itui um bre,·iário útil para a
no texto original. Apesar das divergências de detalhes que
a e capaz de facilit ar as pesqu isas.
se explicam facilmenre e cuja importância foi grandemen­ ' ' 1nsulc
te cxageradaH, veremos que as observações feitas por
Strehlo" , embora completando, precisando e às vezes aré
retificando as de Spencer e Gillen, as confirmam, em su­ II
ma, em rudo o que têm de essencial.
lia é o ter-
Essas descobertas suscitaram uma abundante litera­ Desse breve histórico result a q u e a Austrá
ismo. Faremos de­
t u ra sobre a qual voltaremos a falar. Os trabalhos d e 1 1 · 110 mais favorável ao estudo do totem
nossa obsef\·açào.
Spencer e Gillcn, sobretudo, exerceram uma intluência l.1 por esse motivo, a área principal de
Em seu Totemi sm, Fraze r havia se dedicado sobretu­
consider-J.\'el, não apenas por serem os mais antigos, mas
ismo que se pode
porque os fatos eram aí apresentados sob uma forma sis­ d<1 a levantar wdos os traços de totem
e na etnog rafia. Assim foi levado a
temática, capaz, ao mesmo tempo, de orientar as obser­ iil'scobrir na história
em seu estud o as socied ades mais diferentes quan-
vaçôes ulterioresl• e estimular a especulação. Seus resul­ 1 11duir
tados foram comentados, discu tid os e interpret <idos de 1 0 à natureza e o grau ele cultllr a: o antigo
Egito29, a Ará-
esl do Sul31 ali apare cem ao lado
Amér ica. Essa maneira ele pro­
todas <is maneirns. Enquanto isso, llowitt, cujos estudos 1>1a, a Grécia-�º e os avos
fragmentá rios cl ispersavam se numa grande q u�1 ntidade
- 1 las tribos ela Austrf tlia e ela
um discípulo da
de pub l icações cliferentes2s, reso lve fazer, para as tribos n:der nada Linha de su rpreendente para
do S ul, que S pencer e Gi l len haviam feito para as do ológic a. Essa escola , com efeito , não busca
1·.�cola antrop
Trihes of South-East A 1 1stralia2<>, ele nos
o
Centro. Em Ncitive 1tuar as religiões nos meios sociais de
que fazem parteU
diferentes aos quais
oferece um painel da organização social dos povos que 1 diferenciá-las em função dos meios
assim relacio nadas . Muito pelo contrá rio, como indi-
ocupam a Austrália meridional. a Nova Gales do Sul e 1·st;lo
escola se deu, seu objetivo é
uma boa parre do Queensland. Os progressos assim reali­ 1 .1 o próprio nome qu" essa

zados sugeriram a Frazer a idéia de completar seu Tote­ das difere nças nacio nais e históricas, as
1t mgir, para além
univer sais e verdad eirame nte human as da vida reli-
mism com uma espécie de compêndio2' onde cscariam hases
88 L
AS FOR.itAS EEM .\I
.t.
i AR
T S DA 17/)/1 RELIG/I J \ t
E / 1 1/ ' l'IU'U\l/NAR/iS 89

giosa Fia supôe que o homem possua em si mesmo. l' l l l 1 1 1 11s 1 monogamia freqüente nas tribos australia
1 l
• •

\.1nucJe cJe sua constituição própria e mdependentemenlt 11 1 uda sancionada em nossos códigos, etc. No pró-
de quaisquer condições sociais, uma natureza religiosa. t 1 la\l o de Frazer encontram-se confusões desse gêne­
se propõe detenniná-la33. Para uma pesquisa desse gê1w \1 • 1111eceu-lhe com muita freqüência assimilar às práti­
ro, Lodos os povos podem contribuir. Claro que haverao p1 \ lpnarnen te totêrnica s simples ritos teriolátr ic ?s .
de ser i nterrogados de preferência os mais primiLi\'C"· 111 llllo .1 distância, às vezes enorme, que separa os meios
porque neles essa natureza inicial Lem mais chances de Sl' ' 1 1s rnrrespondence5, exclui toda idéia de assimilação.
1 1 1 1 11110. st: não quisem1os cair nos mesmos erros,
mosLrar nua; mas, como se pode igualmente verificá-la cleve-
nos mais civilizados, é natural que Lambém eles sejam 1110 .10 i m·és de dispersar nossa pesquisa por rodas as
chamados a depor. Com mais razão amda. Lcxlos aquell'' I< d ides possíveis, concentrá-la num tipo claramente
tidos como não muito afastados das origens, Lodos aqul' 1 I• 1 1 11inado.
k:s reunidos co1Úu:>ameme sob a rubrica 1mprecu;a cJe sei 1 11nportante também que essa concenrraçao sqa tao
t'agens, seráo colocados no mesmo plano e consultados 1 1 1 1 11.1 quanto possível. Só podem ser comparados pro­
indiferentemente. AJém disso, como os fatos, desse ponto h1 1·.unente faLOs bem conhecidos. Ora. quando se deci-
de vista, só têm interesse proporcionalmeme a seu grau 1hr . 1 nger todo tipo de sociedades e ciYilizações, não se
de generalidade, considera-se obrigatório acumulá-IL'; na 1 11!1 n>nhece r nenhum a delas com a competência que
maior quantidade possível; julga-se que nunca é demais , 1 1, 1 necessária; quando se reúnem, para aproximá-los,
poder ampliar o círculo das comparações. l 11• ,, de toda procedência, se é obrigado a torná-los
indis­
Esse não poderia ser nosso método, e por várias i l 111111.1<larn ente sem que haja meios ou mesmo tempo de
razões. 1 11 1 '>Ua crítica São essas aproximações tumultu osas e
Em primeiro lugar, tanto para o sociólogo como para · 1 1 1 1.111as que desacreditaram o método
comparativo junto
o historiador, os fatos sociais são função do sistema do 1 1 1 1 1 certo número de bons espíritos. Ele só
pode propor­
qual fazem pane; não se pode, portanto, compreendê-los ' 111n.1r rt:sultados sérios se for aplicado a um número bas-
quando separados desse sistema. Eis por que dois faws, 1 1 1 1 l t' restrito ele sociedades para que cada urna delas pos-
1 ·l'I estudada com suficiente precisão. O essencial é
que dizem respeito a duas sociedades diferentes, não po­ es­
de
dem ser comparados com proveito pela simples razão de ' ' 1lht·r aquelas onde a investigação tem mais chanct:s
part:cerem se assemel har; é preciso também que essas so­ 1 proveito sa.
/\ssim também , o valor dos fatos importa bem mais
q 1 1 t · seu número. A questão ele saber se o to tem is mo foi
c iedades mesmas se assemelhem, isto é, sejam apenas va­
riedades de uma ún i ca espécie. O rnéLoclo comparativo
seria i mpos s íve l se não houvesse tipos soci a is, e ele só 1 1 1. 1 i s ou menos difundid o é, a nosso ver, muito secunclá
-
1 1. 1 • . Se ele nos interessa, é antes ele tudo porque, ao
es-
1 1 1d.1 lo. esperamos tlescobrir rdações capazes de nos fa-
pode ser a p l i cado proveitosamente no interior de um
mesmo tipo Quantos erros não foram cometidos por dcs·
1,·1 nnnpreender melhor o que é a religião. Ora. para
conhecirnemo desse preceito! É assim que indevidamente es-
se aproximaram fatos que, a despeito de suas semelhan­ 1 1l idecer relações, não é necessário nem sempre provei­
ças exteriores, não tinham nem o mesmo sentido, nem o ' ""º amontoa r expe11ên cias umas sobre as outras; bem
mesmo alcance: a democracia primitiva e a de hoje, o co­ 111.1 1.-; imponante é que haja algumas bem construídas e
letivismo das sociedades inferiores e as tendências socia- qt ll' sejam realmente significa tivas. Um fato único
pode
88 L
AS FOR.itAS EEM .\I
.t.
i AR
T S DA 17/)/1 RELIG/I J \ t
E / 1 1/ ' l'IU'U\l/NAR/iS 89

giosa Fia supôe que o homem possua em si mesmo. l' l l l 1 1 1 11s 1 monogamia freqüente nas tribos australia
1 l
• •

\.1nucJe cJe sua constituição própria e mdependentemenlt 11 1 uda sancionada em nossos códigos, etc. No pró-
de quaisquer condições sociais, uma natureza religiosa. t 1 la\l o de Frazer encontram-se confusões desse gêne­
se propõe detenniná-la33. Para uma pesquisa desse gê1w \1 • 1111eceu-lhe com muita freqüência assimilar às práti­
ro, Lodos os povos podem contribuir. Claro que haverao p1 \ lpnarnen te totêrnica s simples ritos teriolátr ic ?s .
de ser i nterrogados de preferência os mais primiLi\'C"· 111 llllo .1 distância, às vezes enorme, que separa os meios
porque neles essa natureza inicial Lem mais chances de Sl' ' 1 1s rnrrespondence5, exclui toda idéia de assimilação.
1 1 1 1 11110. st: não quisem1os cair nos mesmos erros,
mosLrar nua; mas, como se pode igualmente verificá-la cleve-
nos mais civilizados, é natural que Lambém eles sejam 1110 .10 i m·és de dispersar nossa pesquisa por rodas as
chamados a depor. Com mais razão amda. Lcxlos aquell'' I< d ides possíveis, concentrá-la num tipo claramente
tidos como não muito afastados das origens, Lodos aqul' 1 I• 1 1 11inado.
k:s reunidos co1Úu:>ameme sob a rubrica 1mprecu;a cJe sei 1 11nportante também que essa concenrraçao sqa tao
t'agens, seráo colocados no mesmo plano e consultados 1 1 1 1 11.1 quanto possível. Só podem ser comparados pro­
indiferentemente. AJém disso, como os fatos, desse ponto h1 1·.unente faLOs bem conhecidos. Ora. quando se deci-
de vista, só têm interesse proporcionalmeme a seu grau 1hr . 1 nger todo tipo de sociedades e ciYilizações, não se
de generalidade, considera-se obrigatório acumulá-IL'; na 1 11!1 n>nhece r nenhum a delas com a competência que
maior quantidade possível; julga-se que nunca é demais , 1 1, 1 necessária; quando se reúnem, para aproximá-los,
poder ampliar o círculo das comparações. l 11• ,, de toda procedência, se é obrigado a torná-los
indis­
Esse não poderia ser nosso método, e por várias i l 111111.1<larn ente sem que haja meios ou mesmo tempo de
razões. 1 11 1 '>Ua crítica São essas aproximações tumultu osas e
Em primeiro lugar, tanto para o sociólogo como para · 1 1 1 1.111as que desacreditaram o método
comparativo junto
o historiador, os fatos sociais são função do sistema do 1 1 1 1 1 certo número de bons espíritos. Ele só
pode propor­
qual fazem pane; não se pode, portanto, compreendê-los ' 111n.1r rt:sultados sérios se for aplicado a um número bas-
quando separados desse sistema. Eis por que dois faws, 1 1 1 1 l t' restrito ele sociedades para que cada urna delas pos-
1 ·l'I estudada com suficiente precisão. O essencial é
que dizem respeito a duas sociedades diferentes, não po­ es­
de
dem ser comparados com proveito pela simples razão de ' ' 1lht·r aquelas onde a investigação tem mais chanct:s
part:cerem se assemel har; é preciso também que essas so­ 1 proveito sa.
/\ssim também , o valor dos fatos importa bem mais
q 1 1 t · seu número. A questão ele saber se o to tem is mo foi
c iedades mesmas se assemelhem, isto é, sejam apenas va­
riedades de uma ún i ca espécie. O rnéLoclo comparativo
seria i mpos s íve l se não houvesse tipos soci a is, e ele só 1 1 1. 1 i s ou menos difundid o é, a nosso ver, muito secunclá
-
1 1. 1 • . Se ele nos interessa, é antes ele tudo porque, ao
es-
1 1 1d.1 lo. esperamos tlescobrir rdações capazes de nos fa-
pode ser a p l i cado proveitosamente no interior de um
mesmo tipo Quantos erros não foram cometidos por dcs·
1,·1 nnnpreender melhor o que é a religião. Ora. para
conhecirnemo desse preceito! É assim que indevidamente es-
se aproximaram fatos que, a despeito de suas semelhan­ 1 1l idecer relações, não é necessário nem sempre provei­
ças exteriores, não tinham nem o mesmo sentido, nem o ' ""º amontoa r expe11ên cias umas sobre as outras; bem
mesmo alcance: a democracia primitiva e a de hoje, o co­ 111.1 1.-; imponante é que haja algumas bem construídas e
letivismo das sociedades inferiores e as tendências socia- qt ll' sejam realmente significa tivas. Um fato único
pode
90 ,JS FORMAS EU-:.lfF,\?ARHS DA l1DA REIJGIOSA \ /1 •I· ' l'/lj-JJJf/.\A� 91

evidenciar uma lei. ao passo que: uma quantidade de oh­ l.i primeira vez, isto é, as tribos indígenas da América
1 (\; 1 1l ll'
1

servaçôes imprecisas e vagas é capaz de produzir apenas


l'si;.1 extensão do campo da comparação nada tem de
1

confusão. O estudioso de qualque r ciência seria submer­


gido pelos fatos que a ele se oferecem , se nào efetuasse lh •11 llm. É verdade que esses povos são mais avançados
1 ,1, , , ., da Austrália. Sua técnica tornou-se bem mais _e a-!
.

1 •1 1 1 ,1 1 1 1 . ()s homens vivem em casas ou em tendas; ha m-


uma escolha. Ele deve discernir os que prometem ser os
'
1 111 ol\l' aldeias fortificadas. o volume ela sociedade e, lJem
mais instrutivos, concentrar sobre eles sua atenção e afas­
tar-se provisoriamente dos demais.
Eis pur que, com uma reserva que será ulteriormente 1 1 1 1 1� n insiclerável e a centralização, completamente au-
indicada, propomo-nos limitar nossa pesquisa às socieda­ 1 1 11 1 • na Austrália, começa a se manifestar; vemos vastas
, , ,11f,•dl..'racões. como a dos lroqucses, submetidas a uma
1 1 1 1 , " idade central. As \ ezes encontram os u m sistema
des australianas. Fias preenchem todas as condi�·õcs que

1 , ,1111 litado de classe:-. d1Jcrentiadas e hier.i�quizad�1s i\o


acabam ele ser enumeradas. São perfeitamente homogê­
neas, pertencem a um mesmo tipo, embora possamos dis­
, 1 11.111to. as linhas essenciais da estrutura social continuam
1 nd11 semelhantes às da Austrália: trata-se sempre de or­
cernir variedades entre elas. Sua homogeneidade é inclu­

•• 1 1 1 1zação à base de clãs. Portanto, estamos e� presença,


sive tào grande que os marcos da organização social não

1 1 1 1 , de dois tipos diferentes, mas de duas vanedades de


são apenas os mesmos, mas também designados por no­
mes idênticos ou equivalentes num grnnde nú mero de tri­
bos, às vezes muito distantes entre si3S . Por outro lado, o
1 1 1 1 1 mesmo tipo, inclusive bastante próximas uma ela ou-
1 1 , 1 sao dois momentos sucessivos de uma mesma evolu­
totcmismo australiano é aquele sobre o qual Lemos
docu­ \ • 1 1 , ,1 homogeneidade, por con�egui_'.l te, é suficientemen­
mentos mais completos. Enfim, o que queremos acima de
"' grande para permitir as aprox1maçoes.
tudo estudar neste trabalho é a relig1ao mais prim1ti"a e
Por outro lado. essas aproxima ções podem ter sua
mais simples que se pode conhecer Portanto é natural
utaliclade Precisamente porque a técnica dos índios e bem
1,1,11., arnnçacla que a dos australianos. c�rtos �sp:ct�s da
que, para desc:obn- la, nos dirijamos as sociedades que
mais se aproximam das origens da evolu<;<1o: é nelas, e\'i­
oiganização social que lhes é comum sao mais face1s de
denremenre. que temos mais chances de encontrá-la e de
1 udar nos primeiros que nos segundos. Enquanto os ho-
observá-la bem. Ora, não há sociedades que apresentem
1 1 11·ns estão ainda a dar os primeiros passos na arte de ex­
i •nmrr seu pensamento, não é fácil para o ob �ervador per­
esse caráter em mais alto grau do que as tribos australia­
nas. Não somente sua técnica é muito rudimentar - a casa ' i•her 0 que os move, pois nada vem traduzir claramente
, 1 que se passa nessas consciênc as � ue têm a p � nas u "'.
e mesmo a chou pa n a são ainda ignoradas -, como tam­ �
bém sua organização é a mais simples e primitiva das que .
st'nti mento confuso e fugaz ele s1 propnas. Os s1mbolos
se conhecem; é a que chamamos alhures� organização à rl·lrgiosos. por exemplo, consistem , entã ? , ape nas e m
base de clâs. Teremos ocasião, a partir do próximo capítu­ 1 < ,111binações informes ele linhas e cores CUJO senndo.
.
co-
lo, de e\·ocar seus Lr.iços essenciais. 1 110 \'eremos, não é fácil adivinhar. Certamente há os ges-
1, ,.,, os mo\'imentos através do� quatS se exprimem os es-
Contudo, mesmo fazendo da Austrália o objeto prin­ 1,1dos interiores; mas, -:ssencialmente fugazes. eles logo se
cipal de nossa pesquisa. julgamos útil não fazer abstração l u rtam ã obsen·açào. Eis por que o totem.ismo foi consta­
completa das sociedades onde o totemismo foi descober- tado mais cedo na América do que na Austrália: ali era
90 ,JS FORMAS EU-:.lfF,\?ARHS DA l1DA REIJGIOSA \ /1 •I· ' l'/lj-JJJf/.\A� 91

evidenciar uma lei. ao passo que: uma quantidade de oh­ l.i primeira vez, isto é, as tribos indígenas da América
1 (\; 1 1l ll'
1

servaçôes imprecisas e vagas é capaz de produzir apenas


l'si;.1 extensão do campo da comparação nada tem de
1

confusão. O estudioso de qualque r ciência seria submer­


gido pelos fatos que a ele se oferecem , se nào efetuasse lh •11 llm. É verdade que esses povos são mais avançados
1 ,1, , , ., da Austrália. Sua técnica tornou-se bem mais _e a-!
.

1 •1 1 1 ,1 1 1 1 . ()s homens vivem em casas ou em tendas; ha m-


uma escolha. Ele deve discernir os que prometem ser os
'
1 111 ol\l' aldeias fortificadas. o volume ela sociedade e, lJem
mais instrutivos, concentrar sobre eles sua atenção e afas­
tar-se provisoriamente dos demais.
Eis pur que, com uma reserva que será ulteriormente 1 1 1 1 1� n insiclerável e a centralização, completamente au-
indicada, propomo-nos limitar nossa pesquisa às socieda­ 1 1 11 1 • na Austrália, começa a se manifestar; vemos vastas
, , ,11f,•dl..'racões. como a dos lroqucses, submetidas a uma
1 1 1 1 , " idade central. As \ ezes encontram os u m sistema
des australianas. Fias preenchem todas as condi�·õcs que

1 , ,1111 litado de classe:-. d1Jcrentiadas e hier.i�quizad�1s i\o


acabam ele ser enumeradas. São perfeitamente homogê­
neas, pertencem a um mesmo tipo, embora possamos dis­
, 1 11.111to. as linhas essenciais da estrutura social continuam
1 nd11 semelhantes às da Austrália: trata-se sempre de or­
cernir variedades entre elas. Sua homogeneidade é inclu­

•• 1 1 1 1zação à base de clãs. Portanto, estamos e� presença,


sive tào grande que os marcos da organização social não

1 1 1 1 , de dois tipos diferentes, mas de duas vanedades de


são apenas os mesmos, mas também designados por no­
mes idênticos ou equivalentes num grnnde nú mero de tri­
bos, às vezes muito distantes entre si3S . Por outro lado, o
1 1 1 1 1 mesmo tipo, inclusive bastante próximas uma ela ou-
1 1 , 1 sao dois momentos sucessivos de uma mesma evolu­
totcmismo australiano é aquele sobre o qual Lemos
docu­ \ • 1 1 , ,1 homogeneidade, por con�egui_'.l te, é suficientemen­
mentos mais completos. Enfim, o que queremos acima de
"' grande para permitir as aprox1maçoes.
tudo estudar neste trabalho é a relig1ao mais prim1ti"a e
Por outro lado. essas aproxima ções podem ter sua
mais simples que se pode conhecer Portanto é natural
utaliclade Precisamente porque a técnica dos índios e bem
1,1,11., arnnçacla que a dos australianos. c�rtos �sp:ct�s da
que, para desc:obn- la, nos dirijamos as sociedades que
mais se aproximam das origens da evolu<;<1o: é nelas, e\'i­
oiganização social que lhes é comum sao mais face1s de
denremenre. que temos mais chances de encontrá-la e de
1 udar nos primeiros que nos segundos. Enquanto os ho-
observá-la bem. Ora, não há sociedades que apresentem
1 1 11·ns estão ainda a dar os primeiros passos na arte de ex­
i •nmrr seu pensamento, não é fácil para o ob �ervador per­
esse caráter em mais alto grau do que as tribos australia­
nas. Não somente sua técnica é muito rudimentar - a casa ' i•her 0 que os move, pois nada vem traduzir claramente
, 1 que se passa nessas consciênc as � ue têm a p � nas u "'.
e mesmo a chou pa n a são ainda ignoradas -, como tam­ �
bém sua organização é a mais simples e primitiva das que .
st'nti mento confuso e fugaz ele s1 propnas. Os s1mbolos
se conhecem; é a que chamamos alhures� organização à rl·lrgiosos. por exemplo, consistem , entã ? , ape nas e m
base de clâs. Teremos ocasião, a partir do próximo capítu­ 1 < ,111binações informes ele linhas e cores CUJO senndo.
.
co-
lo, de e\·ocar seus Lr.iços essenciais. 1 110 \'eremos, não é fácil adivinhar. Certamente há os ges-
1, ,.,, os mo\'imentos através do� quatS se exprimem os es-
Contudo, mesmo fazendo da Austrália o objeto prin­ 1,1dos interiores; mas, -:ssencialmente fugazes. eles logo se
cipal de nossa pesquisa. julgamos útil não fazer abstração l u rtam ã obsen·açào. Eis por que o totem.ismo foi consta­
completa das sociedades onde o totemismo foi descober- tado mais cedo na América do que na Austrália: ali era
92 AS FO/lll.AS ELE.llF..\TARES DA 17DA RELJG/O.\A

mais visível, embora ocupasse relativamente menos lugar


no conjunto da vida religiosa. Alem disso, onde nào ad­
quirem uma fo rma material um pouco definida, as cren­
ças e as institu ições estão mais expostas a mudar soh a in­
fluência e.las menores circunstâncias ou a apagar-se total­
mente das ml!mórias. Assim, os clàs australianos têm algo
de flutuante e proteiforme, ao passo que a organização
correspondente, na América, tem geralmente maior esta­
LTVRO I I
bilidade e contornos mais claramente definidos. Por isso,
embora o toll!mismo americano esteja mais afastado elas AS CRENÇAS ELEMENTARES
origens qul: o da AuMrá l i a , há nele particularidades im­
portantes cuja lembranç«1 se conservou mdhor.
Em segundo lugar, para compreender bem uma insti­
tuição, geralmente é bom segui-ln até as fases avançadas
de sua evoluçãor, pois, muicas vezes, é quando ela está
pknameme desenvolvida que sua significação aparece
com mais clareza. Também desse ponto de visca, o tOle­
mismo americano, por ter atrás de si uma história mais
longa, poderá servir para esclarecer certos aspectos do to­
temismo australiano31l. Ao mesmo tempo, ele nos permiti­
rá perceber melhor de que maneira o totcmismo se liga às
formas religiosas que se seguiram e assinalar seu lugar no
conjunto do desenvolvimento histórico.
Não nos privaremos, pois, ele utilizar, nas análises a
seguir. alguns fatos tomados das sociedades indígenas da
América do Norte. Não que se trate aqui de estudar o to­
temismo america no3'1; tal estudo requer que seja feito di­
retamente, com essa finalidade, sem ser confundido com
o que iremos em preen de r; ele coloca outros p roblemas e
implica toda uma série de investigações especiais. Recor­
reremos aos fatos americanos apenas a título complemcn­
ta r e somente quando nos pa recerem capaze-; de fazer
compreender melhor os fatos australianos. São estes úlu­
mos que constituem o objeto verdadeiro e i mediato de
nossa pesquisa 10•
92 AS FO/lll.AS ELE.llF..\TARES DA 17DA RELJG/O.\A

mais visível, embora ocupasse relativamente menos lugar


no conjunto da vida religiosa. Alem disso, onde nào ad­
quirem uma fo rma material um pouco definida, as cren­
ças e as institu ições estão mais expostas a mudar soh a in­
fluência e.las menores circunstâncias ou a apagar-se total­
mente das ml!mórias. Assim, os clàs australianos têm algo
de flutuante e proteiforme, ao passo que a organização
correspondente, na América, tem geralmente maior esta­
LTVRO I I
bilidade e contornos mais claramente definidos. Por isso,
embora o toll!mismo americano esteja mais afastado elas AS CRENÇAS ELEMENTARES
origens qul: o da AuMrá l i a , há nele particularidades im­
portantes cuja lembranç«1 se conservou mdhor.
Em segundo lugar, para compreender bem uma insti­
tuição, geralmente é bom segui-ln até as fases avançadas
de sua evoluçãor, pois, muicas vezes, é quando ela está
pknameme desenvolvida que sua significação aparece
com mais clareza. Também desse ponto de visca, o tOle­
mismo americano, por ter atrás de si uma história mais
longa, poderá servir para esclarecer certos aspectos do to­
temismo australiano31l. Ao mesmo tempo, ele nos permiti­
rá perceber melhor de que maneira o totcmismo se liga às
formas religiosas que se seguiram e assinalar seu lugar no
conjunto do desenvolvimento histórico.
Não nos privaremos, pois, ele utilizar, nas análises a
seguir. alguns fatos tomados das sociedades indígenas da
América do Norte. Não que se trate aqui de estudar o to­
temismo america no3'1; tal estudo requer que seja feito di­
retamente, com essa finalidade, sem ser confundido com
o que iremos em preen de r; ele coloca outros p roblemas e
implica toda uma série de investigações especiais. Recor­
reremos aos fatos americanos apenas a título complemcn­
ta r e somente quando nos pa recerem capaze-; de fazer
compreender melhor os fatos australianos. São estes úlu­
mos que constituem o objeto verdadeiro e i mediato de
nossa pesquisa 10•
� l' l{OPRIAMENTE
\S

• 1 1 1 1 1 1 1 1 w 1 1nntl' e como emblema

11 11 1 1 <•111 ptt·enderá naturalmenle duas par­


l 1 11 l1x1.10 L' u>mposta de representações e
1 1 11 d \ ' l'H:mo:-. tmtar sucessh·amente crcn­
11111prios da religião rotêmica. Claro
1111 llll
"

da \ada religiosa são por dcm.us


1 q11\ M'j,1 possível separá-los radicalmente.
1 1 1 1 11 q 1 1 1 1 o culto derive das crenças . ele rea-
' 1 1 1 1 11 1 1 1 mode la-se freqüentementc sobre o
1 1 1 1 I l i ll ,1 lo, sobretudo quando seu sentido
1 1 1 1 1� l' 1 dcnlL'. Inversamente, há crenças
111 1 1 1 tlt .1. 11 1 1 l . 1 ra1rn:nte através dos ritos que as
t s d11:1s partes ela a nálise não pod e m
1

1 1111 1 1 11 1 1
t i 1 11 1 1 ,1 1 <.ontudo, essas duas ordens d<.: fa­
. l i 1 1 • 1 1 • 11ti•s para que não seja indispensável
1 1 1 1 1 • 1 1 ,1d11. E como é impossível entender
1 1 1 1 1 1d 1 1 ignoram as idéias sobre as quais
11 p1 t1111·11 1 lugar essas últimas que devemos
�1·

1 < 1 q111• ' i�amos são as noções elementa-


11 1 h.1 ..1• d;1 religião; mas não se poderia
� l' l{OPRIAMENTE
\S

• 1 1 1 1 1 1 1 1 w 1 1nntl' e como emblema

11 11 1 1 <•111 ptt·enderá naturalmenle duas par­


l 1 11 l1x1.10 L' u>mposta de representações e
1 1 11 d \ ' l'H:mo:-. tmtar sucessh·amente crcn­
11111prios da religião rotêmica. Claro
1111 llll
"

da \ada religiosa são por dcm.us


1 q11\ M'j,1 possível separá-los radicalmente.
1 1 1 1 11 q 1 1 1 1 o culto derive das crenças . ele rea-
' 1 1 1 1 11 1 1 1 mode la-se freqüentementc sobre o
1 1 1 1 I l i ll ,1 lo, sobretudo quando seu sentido
1 1 1 1 1� l' 1 dcnlL'. Inversamente, há crenças
111 1 1 1 tlt .1. 11 1 1 l . 1 ra1rn:nte através dos ritos que as
t s d11:1s partes ela a nálise não pod e m
1

1 1111 1 1 11 1 1
t i 1 11 1 1 ,1 1 <.ontudo, essas duas ordens d<.: fa­
. l i 1 1 • 1 1 • 11ti•s para que não seja indispensável
1 1 1 1 1 • 1 1 ,1d11. E como é impossível entender
1 1 1 1 1 1d 1 1 ignoram as idéias sobre as quais
11 p1 t1111·11 1 lugar essas últimas que devemos
�1·

1 < 1 q111• ' i�amos são as noções elementa-


11 1 h.1 ..1• d;1 religião; mas não se poderia
AS FORJWAS ELEMENTAT<ES DA VIDA RELIGIOSA
1 r Nhl\'ÇAS ELEMENTARES 97
96

querer segui-las através ele todos os desenvolvim


entos, às 1 tvs: deveres de assistência, ele vendera, de luto, obriga­
vezes intrincados, que a imaginação mitológica
desde es­ '" de não se casar entre si, etc.
sas sociedades lhes proporc ionou. Certamente
nos servi­ Mas, por essa primeira característica, o clã não se c.lis-
111 11.(llt! ela gens romana e cio yÉvoç; pois o parentesco cios
remos ele mitos quando puderem nos ajudar a compr
een­
der melhor essas noções fundamentais, mas sem
fazer ela , 111 1os também se devia exclusivamente ao fato de todos
,, , 1 1 1cmbros da gens terem o mesmo nome ' , o nomen
mitologia o objeto ele nosso estudo. Aliás, na medid
a em
que é uma obra ele arte, esta não diz respeito apenas
à ciên­ ., 11/i/icium. E é claro que, num certo sentido, a ge11s é um
cia elas religiõ es. Além d isso, os processos menta
is cios 1 l 1 mas é uma variedade cio gênero que não eleve ser
quais ela resulta são ele uma complexidade muito
grande 1 1 1 1 1lundida com o clã australiano2• O que diferencia este
para que possam ser estudados indiretamente e ele
viés. 1 1 1 1 1 1 110 é que o nome que ele carrega é também o de uma
Trata-se de um difícil problema que requer ser tratado
em , • l 'l'l'ie determinada de coisas materiais, com as quais ele
si mesmo, por si mesmo e segundo um método
que lhe 1 . i 1 1.,.1 manter relações muito particulares e cuja nalllreza
seja especi al.
' ' l l'll10S de explicar adiante: trata-se, notadamente, ele re­

l 1 • , >t'S de parentesco. A espécie ele coisas que serve para


Entre as crenças sobre as quais repousa a religião
to­
têmica, as mais importantes são naturalmente as relacio
na­ ol1 �1gnar coletivamente o clã chama-se seu totem. O totem
das ao totem; portanto, é por elas que elevemos começ
ar. 11 1 1 la é também o ele cada um de seus membros.
d di
ca a clã te seu totem que lhe pertence em parti­
( 1 d.11: dois clãs diferentes de uma mesma tribo não pode-
1 1 1 1 1 1 ter o mesmo. Com efeito, participa-se ele um clã pela
1 1 1 11e ,1 razão ele portar um certo nome. Portanto, todos os
, p 11 Ll:m esse nome são membros dele com o mesmo cli-
Na base ela maior parte elas tribos australianas, encon
­
1 u 1 1 >. não importa como estejam distribuídos pelo territó-
tramos um grupo que ocupa na vida coletiva um lugar
pre­
ponderante: o clã. Dois traços essenciais o caracterizam.
1 1 1 1 tribal, mantêm todos, uns com os outros, as mesmas
1 l 1\(>es ele parentesco3. Em conseqü ência, dois grupos
Em primer i o lugar, os indivíduos que o compõem se
consideram unidos por u m laço ele parentesco,
mas ele 1 p 1 1 têm o mesmo Lotem são necessariamente duas seções
uma natureza muito especi al. Esse parentesco não
se ele­ rl1 1 11 1csmo clã. Sem dúvida, acontece muiLas vezes que
l l l i l d:i não resida por inteiro numa mesma local iclacle,
ve a que mantenham uns com os outros relações
defini­
das ele consangü inielad e; são parentes pelo simple
s fato 1 1 1 1� conte com representantes em diferentes lugares. Sua
ele terem u m mesmo nome. Não são pais, mães,
filhos ou 1 1 1 1 11bde, porém, não deixa ele ser reconhecida, ainda que
filhas, tios ou sobrinhos uns dos outros no sentid
o que 1 1 1 1 1 tl·nha base geográfica.
damos atualmente a essas expressões; no entanto,
consi­ C)uanto à palavra totem, é a que empregam os Ojib­
deram-se como formando uma mesma família, grande
ou ' ' . tribo algonquim, para designar a espécie ele coisas
l i "' da o nome a um clã'•. Embora a expressão nada Lenha
pequena, conforme as dimensões do clã, pela única
razão
. i, . 1 1 1 stralianos e inclusive só se verifique numa única so-
de serem coletivamente designados pela mesma palavra
.
1 11 d 1 dc ela América, º" etnógrafos a adotaram definitiva-
E, se dizemos que se consid eram corno de
uma mesma

1 1 11 1 1tv e servem-se dela para denominar, ele uma maneira


,
família é porque reconhecem uns em relaçã o aos
outros
J, 1 d. a instituição que estamos descrevendo. Foi School-
deveres idênticos àquele s que sempre couberam aos
pa-
AS FORJWAS ELEMENTAT<ES DA VIDA RELIGIOSA
1 r Nhl\'ÇAS ELEMENTARES 97
96

querer segui-las através ele todos os desenvolvim


entos, às 1 tvs: deveres de assistência, ele vendera, de luto, obriga­
vezes intrincados, que a imaginação mitológica
desde es­ '" de não se casar entre si, etc.
sas sociedades lhes proporc ionou. Certamente
nos servi­ Mas, por essa primeira característica, o clã não se c.lis-
111 11.(llt! ela gens romana e cio yÉvoç; pois o parentesco cios
remos ele mitos quando puderem nos ajudar a compr
een­
der melhor essas noções fundamentais, mas sem
fazer ela , 111 1os também se devia exclusivamente ao fato de todos
,, , 1 1 1cmbros da gens terem o mesmo nome ' , o nomen
mitologia o objeto ele nosso estudo. Aliás, na medid
a em
que é uma obra ele arte, esta não diz respeito apenas
à ciên­ ., 11/i/icium. E é claro que, num certo sentido, a ge11s é um
cia elas religiõ es. Além d isso, os processos menta
is cios 1 l 1 mas é uma variedade cio gênero que não eleve ser
quais ela resulta são ele uma complexidade muito
grande 1 1 1 1 1lundida com o clã australiano2• O que diferencia este
para que possam ser estudados indiretamente e ele
viés. 1 1 1 1 1 1 110 é que o nome que ele carrega é também o de uma
Trata-se de um difícil problema que requer ser tratado
em , • l 'l'l'ie determinada de coisas materiais, com as quais ele
si mesmo, por si mesmo e segundo um método
que lhe 1 . i 1 1.,.1 manter relações muito particulares e cuja nalllreza
seja especi al.
' ' l l'll10S de explicar adiante: trata-se, notadamente, ele re­

l 1 • , >t'S de parentesco. A espécie ele coisas que serve para


Entre as crenças sobre as quais repousa a religião
to­
têmica, as mais importantes são naturalmente as relacio
na­ ol1 �1gnar coletivamente o clã chama-se seu totem. O totem
das ao totem; portanto, é por elas que elevemos começ
ar. 11 1 1 la é também o ele cada um de seus membros.
d di
ca a clã te seu totem que lhe pertence em parti­
( 1 d.11: dois clãs diferentes de uma mesma tribo não pode-
1 1 1 1 1 1 ter o mesmo. Com efeito, participa-se ele um clã pela
1 1 1 11e ,1 razão ele portar um certo nome. Portanto, todos os
, p 11 Ll:m esse nome são membros dele com o mesmo cli-
Na base ela maior parte elas tribos australianas, encon
­
1 u 1 1 >. não importa como estejam distribuídos pelo territó-
tramos um grupo que ocupa na vida coletiva um lugar
pre­
ponderante: o clã. Dois traços essenciais o caracterizam.
1 1 1 1 tribal, mantêm todos, uns com os outros, as mesmas
1 l 1\(>es ele parentesco3. Em conseqü ência, dois grupos
Em primer i o lugar, os indivíduos que o compõem se
consideram unidos por u m laço ele parentesco,
mas ele 1 p 1 1 têm o mesmo Lotem são necessariamente duas seções
uma natureza muito especi al. Esse parentesco não
se ele­ rl1 1 11 1csmo clã. Sem dúvida, acontece muiLas vezes que
l l l i l d:i não resida por inteiro numa mesma local iclacle,
ve a que mantenham uns com os outros relações
defini­
das ele consangü inielad e; são parentes pelo simple
s fato 1 1 1 1� conte com representantes em diferentes lugares. Sua
ele terem u m mesmo nome. Não são pais, mães,
filhos ou 1 1 1 1 11bde, porém, não deixa ele ser reconhecida, ainda que
filhas, tios ou sobrinhos uns dos outros no sentid
o que 1 1 1 1 1 tl·nha base geográfica.
damos atualmente a essas expressões; no entanto,
consi­ C)uanto à palavra totem, é a que empregam os Ojib­
deram-se como formando uma mesma família, grande
ou ' ' . tribo algonquim, para designar a espécie ele coisas
l i "' da o nome a um clã'•. Embora a expressão nada Lenha
pequena, conforme as dimensões do clã, pela única
razão
. i, . 1 1 1 stralianos e inclusive só se verifique numa única so-
de serem coletivamente designados pela mesma palavra
.
1 11 d 1 dc ela América, º" etnógrafos a adotaram definitiva-
E, se dizemos que se consid eram corno de
uma mesma

1 1 11 1 1tv e servem-se dela para denominar, ele uma maneira


,
família é porque reconhecem uns em relaçã o aos
outros
J, 1 d. a instituição que estamos descrevendo. Foi School-
deveres idênticos àquele s que sempre couberam aos
pa-
A). FORMAS E.l/f.,l/H.\TARfil DA \1DA RElivll �
99
98

u
crafl o primeiro a e.:;1ender desse modo o sentido da pai;& dd 1.. ncre os Arunta e os Loritj:i. <;trehlow conto
vr.i e a falar de um ·sistema tote1ruco·b. Essa extensão. da d11.1-. sociedades 't'i2 totens, vanos dos quais <lesig-

1 1 1 1 11ma espécie anima l, mas um órgão


partic ular
qual há exemplos bastante numerosos em etnografia. s(
mim.ti -. dessa espécie. por exemplo a cauda
. o estô­
guramente tem inconvenientes. Não é normal que uma
' t io \.\ambá. a gordura do cangu ru, etc .16
instituição de tal importância carregue um nome devido
ao acaso, tomado de um idioma estritamente local, e que! \ 1 1 1 1us que, norma l mente, o totem
não é um ind i\'Í-

1 1 1 1 1 1 uma espécie ou uma variedade: não


é tal c_a ngu-
de maneira nenhuma evoca as características distin tiva s
1 11 1 • llYO, mas o cangu ru ou o corvo em geral. As ve­
·
da coisa que exprime. Mas essa maneira de empregar
p! • 1 1 m .
a

é u m objeto partic u lar. É nece ssaria mente o


palavra é hoje tão universalmente aceita, que seria um ex
_ o serve de
cesso de purismo insurgir-se contra o costume7. 1 11pre que uma coisa única em seu gener
tal conste laçao, etc. Mas aconte-
um a ond ula­
Os ohjews que �e1vem de LOtens penencem , na gran 1 1 1 , c imo o sol, a lua,
de maioria dos casos, M.:ja ao reino vegetal , seja ao reino 1 1 i l w 1 1 1 que os elas tiravam seu nome de
1 1
animal, mas principalmente a este último. Quanto às coi i , 1 11 1 uma depressão de terreno, gcografic31 meme
deter-

1 1 1 1 d.1 de um formig ueiro particu lar, etc. E verdad e que


sas inanimadas, são empregadas bem mais raramente.
1 , 1 11 1 l ll'n:mos um pequeno número desse
s exemplos na
Dos mais de qu inhentos nomes totêmicos levantados por
Howitt entre as tribos do sudeste australiano, não h::í mais 11 1 1 . 1 1t.1 Strehlow cita algum,
delest�. Mas as causas mes-
1 1
de quarenta que não sejam nomes de plantas ou animais: q 1 1 1 produ ziram esses totem, anormais demonstram
nte recente. Com
são as nuvens, a chuva, o granizo, a geada, a lua, o sol. o 1111 ,.J, .., são de uma origem relac ivame
em totenl-i cercos locais é qu� um
vento, o outono. o \'CrJo, o inverno, certas estrelas, o tro· 1 110, o que fez erigir
. dizem . teria ali se detido ou realizado
vão, o fogo, a fumaça, a água. o ocre vermelho. o mar. " , p.1 .,
... 1do nútico
1 Ora, esses antepassa-
atar-se-á o lugar muito restrito reser\'ado aos corpos ce­ 1 11111 .110 de sua vida legendária 11.
são apres entad os nos mitos como
lestes e mesmo. de maneira mais geral, aos gr.indes fenô­ ... ua yez, nos
1,
' 1
tamente �·cgu-
menos cósmicos que, no entanto, haveriam de ser muito • I L ' 1 1 1 vndo a clãs que tinham totens perfei
1 1 1 o;, l'lO
is. As
privilegiados na seqüência do desenvolvimento religioso. é, tomados das espécies animaL5 ou vegeta
Encre todos os clüs de que nos fala Jlowill, apenas dois
.
1 111 1 1 11 i naçõe s totêm icas que comem oram feitos e gestos
ivas, mas
têm por totem a lua1l, dois o sol9, três uma estrela to, três o 1, �··-; heróis não podem portanto ter sido primit
fo rma de totem ismo já deriva da e
trovão 1 1 , dois os relâmpagos12. A chuva é uma exceção, 11 , .pond em a uma
t i• 1 1 .1d:1. n
sendo, ao contrário, muito freqüentel3. É lícito i dagar se os totens meteo rológicos não

1 1 1 1 1 .1 mesma origem; pois o sol, a Jua e os astros


silo com
São esses os totens que poderiam ser ditos normais.
s com os antep assad os da época
Mas o totemisrno tem suas anomalias. Assim, acontece ser 1 1 ' l 'ivncia identificado
o totem, não um objeto inteiro, mas uma parte de objeto. l 1 1 n i lcisa'9.
As vezc.:s, ma:; não menos cxcepciona
O fato parece bao;tante raro na A.ustráliat1: Howitt cita um lment e, é u m
grupo d e antep assad os que serve di­
único exemplo1'. �o encanto, pode ser que ele se verifi­ 1 1 1 1 1 • p.1 ssado o u um
casse com cerca freqüência nas tribos em que os grupos fl 1 .i 1 1 11• nte de rotem. O clã nomei
a-se, então, nào segundo
mas segundo u m
totêmicos se subdividiram em excesso; dir-se-ia que os 1 11 1 1 1 nii.-;a ou uma espe...ie de coisas reais,
mítico. Spencer e Gillen j á haviam assinala­
próprios totens tiveram que se fragmentar para poder for­ , 1 puramente
do dois ou três totens desse gênero. Entre
necer nomes a essas múltiplas d i\·isões. E o que parece os Wan-amunga
A). FORMAS E.l/f.,l/H.\TARfil DA \1DA RElivll �
99
98

u
crafl o primeiro a e.:;1ender desse modo o sentido da pai;& dd 1.. ncre os Arunta e os Loritj:i. <;trehlow conto
vr.i e a falar de um ·sistema tote1ruco·b. Essa extensão. da d11.1-. sociedades 't'i2 totens, vanos dos quais <lesig-

1 1 1 1 11ma espécie anima l, mas um órgão


partic ular
qual há exemplos bastante numerosos em etnografia. s(
mim.ti -. dessa espécie. por exemplo a cauda
. o estô­
guramente tem inconvenientes. Não é normal que uma
' t io \.\ambá. a gordura do cangu ru, etc .16
instituição de tal importância carregue um nome devido
ao acaso, tomado de um idioma estritamente local, e que! \ 1 1 1 1us que, norma l mente, o totem
não é um ind i\'Í-

1 1 1 1 1 1 uma espécie ou uma variedade: não


é tal c_a ngu-
de maneira nenhuma evoca as características distin tiva s
1 11 1 • llYO, mas o cangu ru ou o corvo em geral. As ve­
·
da coisa que exprime. Mas essa maneira de empregar
p! • 1 1 m .
a

é u m objeto partic u lar. É nece ssaria mente o


palavra é hoje tão universalmente aceita, que seria um ex
_ o serve de
cesso de purismo insurgir-se contra o costume7. 1 11pre que uma coisa única em seu gener
tal conste laçao, etc. Mas aconte-
um a ond ula­
Os ohjews que �e1vem de LOtens penencem , na gran 1 1 1 , c imo o sol, a lua,
de maioria dos casos, M.:ja ao reino vegetal , seja ao reino 1 1 i l w 1 1 1 que os elas tiravam seu nome de
1 1
animal, mas principalmente a este último. Quanto às coi i , 1 11 1 uma depressão de terreno, gcografic31 meme
deter-

1 1 1 1 d.1 de um formig ueiro particu lar, etc. E verdad e que


sas inanimadas, são empregadas bem mais raramente.
1 , 1 11 1 l ll'n:mos um pequeno número desse
s exemplos na
Dos mais de qu inhentos nomes totêmicos levantados por
Howitt entre as tribos do sudeste australiano, não h::í mais 11 1 1 . 1 1t.1 Strehlow cita algum,
delest�. Mas as causas mes-
de quarenta que não sejam nomes de plantas ou animais: 1 1 q 1 1 1 produ ziram esses totem, anormais demonstram
nte recente. Com
são as nuvens, a chuva, o granizo, a geada, a lua, o sol. o 1111 ,.J, .., são de uma origem relac ivame
em totenl-i cercos locais é qu� um
vento, o outono. o \'CrJo, o inverno, certas estrelas, o tro· 1 110, o que fez erigir
. dizem . teria ali se detido ou realizado
vão, o fogo, a fumaça, a água. o ocre vermelho. o mar. " , p.1 .,
... 1do nútico
1 Ora, esses antepassa-
atar-se-á o lugar muito restrito reser\'ado aos corpos ce­ 1 11111 .110 de sua vida legendária 11.
são apres entad os nos mitos como
lestes e mesmo. de maneira mais geral, aos gr.indes fenô­ ... ua yez, nos
1,
' 1
tamente �·cgu-
menos cósmicos que, no entanto, haveriam de ser muito • I L ' 1 1 1 vndo a clãs que tinham totens perfei
1 1 1 o;, l'lO
is. As
privilegiados na seqüência do desenvolvimento religioso. é, tomados das espécies animaL5 ou vegeta
Encre todos os clüs de que nos fala Jlowill, apenas dois
.
1 111 1 1 11 i naçõe s totêm icas que comem oram feitos e gestos
ivas, mas
têm por totem a lua1l, dois o sol9, três uma estrela to, três o 1, �··-; heróis não podem portanto ter sido primit
fo rma de totem ismo já deriva da e
trovão 1 1 , dois os relâmpagos12. A chuva é uma exceção, 11 , .pond em a uma
t i• 1 1 .1d:1. n
sendo, ao contrário, muito freqüentel3. É lícito i dagar se os totens meteo rológicos não

1 1 1 1 1 .1 mesma origem; pois o sol, a Jua e os astros


silo com
São esses os totens que poderiam ser ditos normais.
s com os antep assad os da época
Mas o totemisrno tem suas anomalias. Assim, acontece ser 1 1 ' l 'ivncia identificado
o totem, não um objeto inteiro, mas uma parte de objeto. l 1 1 n i lcisa'9.
As vezc.:s, ma:; não menos cxcepciona
O fato parece bao;tante raro na A.ustráliat1: Howitt cita um lment e, é u m
grupo d e antep assad os que serve di­
único exemplo1'. �o encanto, pode ser que ele se verifi­ 1 1 1 1 1 • p.1 ssado o u um
casse com cerca freqüência nas tribos em que os grupos fl 1 .i 1 1 11• nte de rotem. O clã nomei
a-se, então, nào segundo
mas segundo u m
totêmicos se subdividiram em excesso; dir-se-ia que os 1 11 1 1 1 nii.-;a ou uma espe...ie de coisas reais,
mítico. Spencer e Gillen j á haviam assinala­
próprios totens tiveram que se fragmentar para poder for­ , 1 puramente
do dois ou três totens desse gênero. Entre
necer nomes a essas múltiplas d i\·isões. E o que parece os Wan-amunga
100 AS FORMAS ELr
!.MENTARES DA \ITDA REL!Gl< l\4 I \� 1.\ HLElfE
Nli
lRES 101

e os Tjingilli, existe u m clã que tem o nome c.le um antt )l mgatori:tmcnte de um outro totem que seu marido,
passado, chamado Th aba lla, e que parece encarnar a ale 1 11 1 1• 1 l'l�1 vive, por outro lado, na localidade deste último,
gria2º. Um outro clã warramunga traz o nome de uma Sl'f 1111 111liros de um mesmo totem encontram-se necessaria­
pente fa bulosa, monstruosa, da qual o clã su postament BI dispersos entre localidades diferentes, conforme os
descendeu2 1 . Devemos a Strehlow alguns fatos similaresJ 1 dos casamentos que se efetuam. Resulta daí que o
Em todos os casos, é bastante fácil entrever o que devl' 1111o 1 I• >11.•1nico carece de base territorial .
ter ocorrido. Sob a influência de causas d iv ersas . pelo N11111a segunda regra, o totem se transmite em linha
desenvolvimento mesmo do pensamento mitológico, o 1 1 1 1 1 )Csta vez, como a criança permanece junto a seu
totem coletivo e impessoal a pagou-se diante de certrn1 ' ' v1upo local é essencialmente formado de pessoas
personagens míticos que passaram ao primeiro plan o , 1 1 1 will'nccm ao mesmo totem: só as mulheres ca sadas
tornaram-se eles próprios torens. 1 1 1 u11.1111 aí totem, est ra nge iros . D ito ele outro modo,
Essas iliferentes irregularidade,, por mais mtcressantl: 1 lidade tem seu totem particular. Até tempos rc-
que possam ser sob outros aspectos, nada possuem qul' 1111 , l.''>Se modo ele organização só fora encontrado, na
nos obrigue a modificar nossa definição do totem. Elas nao 1 1 l f 1 1 1 1 em tribos onde o totemismo está em via d e de-
11 111 1;1, por exemp lo entre os Narrinyeri, onde o totem
111 1 11;10 tem mais caráter religioso2;. Supunha-se, por-
constituem, como se acreditou às vezesB, espécies de toten11
mais ou menos irredutíveis umas às outr.as e ao tote1'1 nor
1111 1, que houvesse uma re lação estreica entre o sistema
mal, cal como o definimos. São apenas formas secundária11
e às vezes aberrantes de uma única e mesma noção que é,
, 11111 n e a filiação em linha materna. Mas Spencer e Gil-

e em grande quantidade, a mais geral e que seguramente


11 1 11 '.l'rvaram, na pane setentrional do Centro australia-
1• . Jn um grupo de tribos em que a religião totêmica é
de\'e ser consider.ada também a mais primitiva .
, l 1 p1 1 ticada e a transmissão do totem, não obstante, se
1 111 hnha paterna: são os Warramunga; os Gnanji, os
os Bi nbinga , os Mara e os Anula26.
Quanto à maneira como se adquire o nome totêmico,
ela diz respeito antes ao recrutamento e à organização do
111 1 1 1 1

clã do que à religião; poitanto, tem ma is a ver com a socio


1 1 1 1 im, uma terceira combinação é a que se observa

l ogi a da fa mília do que com a sociol ogi a religiosa2·1. As


1 Arunta e os Loritja. Aqui, o totem da criança não é
111,1mcnte nem o da mãe, nem o do pai: é o cio an-
11 '"

si m , nos li mitaremos a indicar sumariamente os princípios 1 1 1 ido mítico que, por procedimentos que os observa-
mais essenciais que norteiam a questão. 1 1 111 >s relatam de diferentes manciras27, veio fecundar
Confo1me as tribos, três regras diferentes são aplicadas. 1 1 1 1 l i• 1 1 1 1v11Le a mãe no momento da concepção. Uma téc-
Num grande número, pode-se até dizer no maior nú 1 1 1 1 . l1 • 1 l · rminacla permite reconhecer qual é esse antepas-
mero de sociedades, a criança tem por totem o de sua mãt". 11 I ' • .1 que grupo totêmico pertence2s. Mas, como é o
por direito de nascença: é o que acontece entre os Dleri l' 1 ' • t l l lL' faz esse antepassado encontrar-se nas proximi-
os Urahunna cio centro da Austrália meridional; entre os 1 11.1 müe e não de uma outra, o totem da criança aca-
Wotjobaluk e os Goumditch-Mara de Victoria; os Kamila 1 1• 1 w11dcndo finalmente ele circunstâncias fortuitas29.
roi, os Wiradjuri, os Wonghibon e os Euahlayi ela Nova Ga
lcs do Sul; os Wakel bura , os Pitta-Pitta e os Kurnandaburi l 111 k·pendenteme1.te e acima elos totens ele clàs, há os
do Queensland, para citar apenas os nomes mais importan 1 11 d1· J'ratrias que, sem diferirem em natureza dos pri-
11 1 • , de\ em no entanto ser distinguidos deles.
t

tes. Nesse caso, como a mãe, em virtude da regra exogâmi·


100 AS FORMAS ELr
!.MENTARES DA \ITDA REL!Gl< l\4 I \� 1.\ HLElfE
Nli
lRES 101

e os Tjingilli, existe u m clã que tem o nome c.le um antt )l mgatori:tmcnte de um outro totem que seu marido,
passado, chamado Th aba lla, e que parece encarnar a ale 1 11 1 1• 1 l'l�1 vive, por outro lado, na localidade deste último,
gria2º. Um outro clã warramunga traz o nome de uma Sl'f 1111 111liros de um mesmo totem encontram-se necessaria­
pente fa bulosa, monstruosa, da qual o clã su postament BI dispersos entre localidades diferentes, conforme os
descendeu2 1 . Devemos a Strehlow alguns fatos similaresJ 1 dos casamentos que se efetuam. Resulta daí que o
Em todos os casos, é bastante fácil entrever o que devl' 1111o 1 I• >11.•1nico carece de base territorial .
ter ocorrido. Sob a influência de causas d iv ersas . pelo N11111a segunda regra, o totem se transmite em linha
desenvolvimento mesmo do pensamento mitológico, o 1 1 1 1 1 )Csta vez, como a criança permanece junto a seu
totem coletivo e impessoal a pagou-se diante de certrn1 ' ' v1upo local é essencialmente formado de pessoas
personagens míticos que passaram ao primeiro plan o , 1 1 1 will'nccm ao mesmo totem: só as mulheres ca sadas
tornaram-se eles próprios torens. 1 1 1 u11.1111 aí totem, est ra nge iros . D ito ele outro modo,
Essas iliferentes irregularidade,, por mais mtcressantl: 1 lidade tem seu totem particular. Até tempos rc-
que possam ser sob outros aspectos, nada possuem qul' 1111 , l.''>Se modo ele organização só fora encontrado, na
nos obrigue a modificar nossa definição do totem. Elas nao 1 1 l f 1 1 1 1 em tribos onde o totemismo está em via d e de-
11 111 1;1, por exemp lo entre os Narrinyeri, onde o totem
111 1 11;10 tem mais caráter religioso2;. Supunha-se, por-
constituem, como se acreditou às vezesB, espécies de toten11
mais ou menos irredutíveis umas às outr.as e ao tote1'1 nor
1111 1, que houvesse uma re lação estreica entre o sistema
mal, cal como o definimos. São apenas formas secundária11
e às vezes aberrantes de uma única e mesma noção que é,
, 11111 n e a filiação em linha materna. Mas Spencer e Gil-

e em grande quantidade, a mais geral e que seguramente


11 1 11 '.l'rvaram, na pane setentrional do Centro australia-
1• . Jn um grupo de tribos em que a religião totêmica é
de\'e ser consider.ada também a mais primitiva .
, l 1 p1 1 ticada e a transmissão do totem, não obstante, se
1 111 hnha paterna: são os Warramunga; os Gnanji, os
os Bi nbinga , os Mara e os Anula26.
Quanto à maneira como se adquire o nome totêmico,
ela diz respeito antes ao recrutamento e à organização do
111 1 1 1 1

clã do que à religião; poitanto, tem ma is a ver com a socio


1 1 1 1 im, uma terceira combinação é a que se observa

l ogi a da fa mília do que com a sociol ogi a religiosa2·1. As


1 Arunta e os Loritja. Aqui, o totem da criança não é
111,1mcnte nem o da mãe, nem o do pai: é o cio an-
11 '"

si m , nos li mitaremos a indicar sumariamente os princípios 1 1 1 ido mítico que, por procedimentos que os observa-
mais essenciais que norteiam a questão. 1 1 111 >s relatam de diferentes manciras27, veio fecundar
Confo1me as tribos, três regras diferentes são aplicadas. 1 1 1 1 l i• 1 1 1 1v11Le a mãe no momento da concepção. Uma téc-
Num grande número, pode-se até dizer no maior nú 1 1 1 1 . l1 • 1 l · rminacla permite reconhecer qual é esse antepas-
mero de sociedades, a criança tem por totem o de sua mãt". 11 I ' • .1 que grupo totêmico pertence2s. Mas, como é o
por direito de nascença: é o que acontece entre os Dleri l' 1 ' • t l l lL' faz esse antepassado encontrar-se nas proximi-
os Urahunna cio centro da Austrália meridional; entre os 1 11.1 müe e não de uma outra, o totem da criança aca-
Wotjobaluk e os Goumditch-Mara de Victoria; os Kamila 1 1• 1 w11dcndo finalmente ele circunstâncias fortuitas29.
roi, os Wiradjuri, os Wonghibon e os Euahlayi ela Nova Ga
lcs do Sul; os Wakel bura , os Pitta-Pitta e os Kurnandaburi l 111 k·pendenteme1.te e acima elos totens ele clàs, há os
do Queensland, para citar apenas os nomes mais importan 1 11 d1· J'ratrias que, sem diferirem em natureza dos pri-
11 1 • , de\ em no entanto ser distinguidos deles.
t

tes. Nesse caso, como a mãe, em virtude da regra exogâmi·


102 A\ HJllllAS ELE.llE.\?ANHS DA 1 IDA RELIG/0.\1 11 \(., I ' l'LE.\IE.\TARES 103

, po1 deviam pertencer a uma língua muito


'.tr<.-aica
Chama-se fratria um grupo de dJs unidos entre si pur
11 1 111.11.., cm uso. Prova disso é que. em muito:.
casos e m
l a fratria tira o nome , a pala­
l aços pa rucula re:. de fratemJdade. onnalmente, uma tribo
auslraliana é dividida em duas fr:nrias, entre as quais se 1 t • .,,, hunos d e que anima
é inteira­
distribuem os diferentes clãs. Há, certamen te. sociedades q11e designa esse animal na língua corrente
' ' nlt• dislínt.a daquela que serve para nomeá -lo"'>.
onde essa organização desapareceu, mas Ludo leva a crer
há como
que e la foi gera l. Em Lodo caso. não existe tribo, na Aus­ 1 1 1 1 n: o totem da fratria e os totens dos clãs,
trália. em que o nú mero de fratrias seja superior a dois. 1 1 1 1 1 1 m a relação de subordinação. Com efeilo, �
c da c! ã ·

1 1 1 i • 1 1 11upio , pertence a uma fratria e a uma


_ e muito
so:
Ora, em quas<.: Lodos os casos em que as fratrias têm
, l ' l 11 1onal que tenha representantes noutra
fratria. O ca­
um nome cujo sentido pôde ser estabelecido. esse nome
do centro, parti-
é o de um animal; Lrala-se portanto. ao que Ludo indica. ' ilH'Z só se verifique em certas tribos
os Arunta l(1; no entant o, mesmo onde
de um tolem. E o que demonstrou claramente A. Lang nu­ i 1 l 1 1 111t·nLe entre
1 cias
ma obra recenLeW. Assim, entre.: os Gou rnditch-Mara (Vic­ 11 1 11 1 l·111 sobreposiçoes dcss<.: gênero devidas a influen
p• 1 1 1 1 1 badoras, o grosso elo clã eslá �cn­
inteiram ente compr
toria) , uma das fralrias chama-se Krokitch e a outra Ka­
apenas uma 111 1 11 0-
lO, 6 que
putch: a primeira palavra significa cacatua-branca, a se­ d h l• numa das duas melade s da tribo;
fl 1 1 11n>ntra-se do outro lado1 . A regra. portan
1
gunda, cacatua-preta-� 1 . As mesmas expressões verificam­
se, na toralidade ou em parte, entre os Buandik e os Wot­ 1 d11.1s fratrias não se misturem; conseq
üentemente, a es­
jobaluk.\Z. Entre os Wuru n-jerri. os nomes empregados lu ,1 dos totens que um indivíd uo pode ter é predetermi-
modo,
são Bunfil e \Xfaang, que significam águia-falcão e corvo33. 11 " 1.1 pela fratria a que ele pertence. Oito de outro
um gên ero do qual os totens
As palanas Mukwara e Kilpara são usadas com idêntica 1 1 1r •1t·m da fratria é como
e essa
finalidade por um grande número de tribos da '\ova Ga­ 1 1 ! 1" t las são e'>péci es. Veremos mais adiante q u
les do Sul3•; designa m os mesmos animais3�. A águia-fal­ 1p1ox11nação não é puramente metafórica.
cão e o corvo dernm igualmente seus nomes às duas fra­
com fre­
trias dos J\garigo e dos Wolgal:l<>. Entre os Kuinmurbura. é Além das fratrias e dos clàs, encon tra-se
c p 11 ncia nas sociedades australianas um outro grupo se­
a cacaLua-branca e o corvo37. Poderíamos citar outros
exemplos. Vê-se, assim, na fratria, um antigo clã que teria t 1 1 11d:1r10 que não deLxa de Ler uma certa i n d h idualid ade:

se desmembrado: os clãs atuais seriam o produto desse 1� 1 lasses matrimoniais.


Com esse nome designam-se subdivisões
e.la fratria ,
desmembramenlo: e a solida riedade que os une, uma
em número variáve l, confor me as tribos: cncon-
q 1 1 1 · sao
1 1 .11 11os ora duas, ora quatro por fratria42. Seu
lembrança de sua primitiva unidade.\8. É verdade que, cm
c stab c l ec i-
pe los d o i s
certas t ribos, as fratrias parecem não ler mais nomes de­
terminados; noutras, cm que esses nomes existem, seu 1 1 11·1Ho e seu funcio namen to s ão regu l ado s
sentido não é mais conhecido sequer pelos ind íge n as. i •1 1 nu p ios seguin tes. 1 ) Em cada fra tri a , cada geraç<io per­

Vias nisso não há nada que poss:i su rpreender. As frJtrias ração imed ia ta
h'm L <I unu outra classe que não a da ge
1 1 11•ntc anterior.
são certamente uma instituição primitiva, pois em toda Portan to. quando há apenas duas classes

parte e:-.tão em via de regressão: os cl<ls. oriundos delas, 11 fra tri elas :.e alterna m necess ariame nte a cada gera­
I "
passaram ao primeiro plano. Portanto. 6 natural que os \ •11 > Os filhos são da dasse da qual seus pais
a,
não faze m

p.1rte: mas os netos são da mesma classe que seus avós.


nomes que levavam tenham pouco a pouco se apagado
compreende
das memórias. ou que tenham deixado de ser compreen- \s,.,im. entre os Kamila-roi a fratria Kupathin
102 A\ HJllllAS ELE.llE.\?ANHS DA 1 IDA RELIG/0.\1 11 \(., I ' l'LE.\IE.\TARES 103

, po1 deviam pertencer a uma língua muito


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Chama-se fratria um grupo de dJs unidos entre si pur
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casos e m
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auslraliana é dividida em duas fr:nrias, entre as quais se 1 t • .,,, hunos d e que anima
é inteira­
distribuem os diferentes clãs. Há, certamen te. sociedades q11e designa esse animal na língua corrente
' ' nlt• dislínt.a daquela que serve para nomeá -lo"'>.
onde essa organização desapareceu, mas Ludo leva a crer
há como
que e la foi gera l. Em Lodo caso. não existe tribo, na Aus­ 1 1 1 1 n: o totem da fratria e os totens dos clãs,
trália. em que o nú mero de fratrias seja superior a dois. 1 1 1 1 1 1 m a relação de subordinação. Com efeilo, �
c da c! ã ·

1 1 1 i • 1 1 11upio , pertence a uma fratria e a uma


_ e muito
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Ora, em quas<.: Lodos os casos em que as fratrias têm
, l ' l 11 1onal que tenha representantes noutra
fratria. O ca­
um nome cujo sentido pôde ser estabelecido. esse nome
do centro, parti-
é o de um animal; Lrala-se portanto. ao que Ludo indica. ' ilH'Z só se verifique em certas tribos
os Arunta l(1; no entant o, mesmo onde
de um tolem. E o que demonstrou claramente A. Lang nu­ i 1 l 1 1 111t·nLe entre
1 cias
ma obra recenLeW. Assim, entre.: os Gou rnditch-Mara (Vic­ 11 1 11 1 l·111 sobreposiçoes dcss<.: gênero devidas a influen
p• 1 1 1 1 1 badoras, o grosso elo clã eslá �cn­
inteiram ente compr
toria) , uma das fralrias chama-se Krokitch e a outra Ka­
apenas uma 111 1 11 0-
lO, 6 que
putch: a primeira palavra significa cacatua-branca, a se­ d h l• numa das duas melade s da tribo;
fl 1 1 11n>ntra-se do outro lado1 . A regra. portan
1
gunda, cacatua-preta-� 1 . As mesmas expressões verificam­
se, na toralidade ou em parte, entre os Buandik e os Wot­ 1 d11.1s fratrias não se misturem; conseq
üentemente, a es­
jobaluk.\Z. Entre os Wuru n-jerri. os nomes empregados lu ,1 dos totens que um indivíd uo pode ter é predetermi-
modo,
são Bunfil e \Xfaang, que significam águia-falcão e corvo33. 11 " 1.1 pela fratria a que ele pertence. Oito de outro
um gên ero do qual os totens
As palanas Mukwara e Kilpara são usadas com idêntica 1 1 1r •1t·m da fratria é como
e essa
finalidade por um grande número de tribos da '\ova Ga­ 1 1 ! 1" t las são e'>péci es. Veremos mais adiante q u
les do Sul3•; designa m os mesmos animais3�. A águia-fal­ 1p1ox11nação não é puramente metafórica.
cão e o corvo dernm igualmente seus nomes às duas fra­
com fre­
trias dos J\garigo e dos Wolgal:l<>. Entre os Kuinmurbura. é Além das fratrias e dos clàs, encon tra-se
c p 11 ncia nas sociedades australianas um outro grupo se­
a cacaLua-branca e o corvo37. Poderíamos citar outros
exemplos. Vê-se, assim, na fratria, um antigo clã que teria t 1 1 11d:1r10 que não deLxa de Ler uma certa i n d h idualid ade:

se desmembrado: os clãs atuais seriam o produto desse 1� 1 lasses matrimoniais.


Com esse nome designam-se subdivisões
e.la fratria ,
desmembramenlo: e a solida riedade que os une, uma
em número variáve l, confor me as tribos: cncon-
q 1 1 1 · sao
1 1 .11 11os ora duas, ora quatro por fratria42. Seu
lembrança de sua primitiva unidade.\8. É verdade que, cm
c stab c l ec i-
pe los d o i s
certas t ribos, as fratrias parecem não ler mais nomes de­
terminados; noutras, cm que esses nomes existem, seu 1 1 11·1Ho e seu funcio namen to s ão regu l ado s
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Vias nisso não há nada que poss:i su rpreender. As frJtrias ração imed ia ta
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1 1 11•ntc anterior.
são certamente uma instituição primitiva, pois em toda Portan to. quando há apenas duas classes

parte e:-.tão em via de regressão: os cl<ls. oriundos delas, 11 fra tri elas :.e alterna m necess ariame nte a cada gera­
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passaram ao primeiro plano. Portanto. 6 natural que os \ •11 > Os filhos são da dasse da qual seus pais
a,
não faze m

p.1rte: mas os netos são da mesma classe que seus avós.


nomes que levavam tenham pouco a pouco se apagado
compreende
das memórias. ou que tenham deixado de ser compreen- \s,.,im. entre os Kamila-roi a fratria Kupathin
104 AS FORMAS ELEME1\IARES DA 117Dll l?ELJGIO'v1 1 /li \\. IS ELEMENTARES 1 05

duas classes. lppai e Kumbo; a fratria Dilbi, duas outra' 1 ,, e n quan to as classes matrimoniais se mantive­
cbamada.s Murri e Kubbi. Como a filiação se faz em linha ' "im efei to, é certo que esras têm às vezes uma força
materna, a criança é da fratria de sua mãe; se esta for uma 1 1 1 "1cncia que os clãs não possuem. Em conseq üên -
Kupachin, também ela será Kupathin. Mas se a mãe for da 1
1
i n terd ições, destituídas ele seus supones primitivos,
classe lppai, a criança será uma Kumbo; os filhos desta, ,,e generalizado na extensão de cada classe, uma
1 1 1111
por sua vez, no caso de uma menina, voltarão a pertenn·r 1 1 11l não havia mais outros agrupamentos aos quais se
à classe lppai. Do mesmo modo, os filhos das mulherl·s 1 1 I• •"l'l11 associar. l\las, se essa regulan1entaçào nasceu
ela classe Murri serão da classe Kubbi. e os filhos da mu 1 , 11 11< 111 i :-.mo, percebe-se que não representa mais que
lhcres de Kubbi serão Mu rri de novo. Quando há quatro 1111 1 lo 11 ma enfraquecida e desnaturada delei6.
classes por frarria, ao im·és de duas, o sistema é mais J 11do o que a caba de ser dito do totem nas socieda-
complexo, mas o princípio é o mesmo. Essas quatro elas 1 1 1 ,.t1ahanas se apli ca às tribos indígen as da América
ses formam dois pare<; de dua.s das.se:- <.ada um, e e.s.sas l H lt A úruca diferença é que, nessas úluma:,, a urg;.1-
duas classes se alternam a cada geração, da maneira qul' 11 ''- · " , totêmica tem uma clareza de contornos e uma es-
acaba de ser indicada. 2) Os membros de uma classe sú 1 111 l 1d1.; ausentes na Austrália. Os clàs australianos não
podem. em princípio13, contrair casamento numa única 1 1 � 1 1 1 1plcsmente muito numerosos: são, para uma mes­
das classes da outra fratria. Os Ippai elevem casar-sp na '' 1 li il u 1, em número quase ilimitado. Os observadores ci­
classe Kubbi; os Murri. na classe Kumbo. É por essa orga­ ' 111 .d�uns deles a tÍlulo de exemplo, mas sem jamais
nização envolver profundamente relações matrimon iais 11 1 , '-:llir nos dar uma lista completa. É que em nenhum
que damos a esses agrupamentos o nome de classes ma­ 1• •1111 1110 essa lista é definitivamente estabelecida. O mes-
trimoniais. 11 , 1 11 < >n·sso de segmentação que desmembrou primitiva-
Ora, perguntou-se se essas classes não tinham ãs ve­ 11 1 1 1 1 1 fratria e que deu origem aos clàs propriamente
zes tocens como as fratrias e como os clàs. l 1 1 iossegue ininterruptamente no interior desses últi­
' ' '"
O que levantou a q uestão é que, em certas tribos do por causa dessa fragmentação progressiva, um clà
Queenslan d, cada classe matrimoni al é submetida a inter­ 1 d 1 1 wlltc tem apenas um efetivo dos mais reduzidos •7.
dições alimentares que lhe são específicas. Os i nd ivídu os 1 n u 11<:<1, ao contrário, o sistema totêmico possu i for-
que a compõem devem abster-se da carne de certos ani­ 1 1 1 1 1 1 1. 1 1s bem definidas. Embora as tribos sejam aí, em
mais que os outros podem livremente consum i r • • . Esses 111 d 1 1 sensivelmente mais volumosas que na Austrá l ia,
animais mio se riam totens? 11 , l.1s sao menos n u merosos. Uma mesma tribo rara-
Mas a in terd ição alimentar não é o sinal característico t ,, 1 1 1 1 1 ! lilta com mais ele uma dezena cleles48, na maioria
do totemismo . Primeiramente e antes ele Ludo, o Lotem é 1 '1 ·s menos; cada clã constitu i, portanto, um agrupa-
um nome e, como veremos, um emblema . Ora, nas socie­ 11• " ' ' ' l 1l'm mais importa nte. Mas, sobretudo, seu nú me ro
1

dades em questão, não existe classe matrimonial que te­ t i l i 1111 determinado: sabe-se quantos são e isso nos é
nha um nome de animal ou de planta, ou que se sirva de lill l 1''
um emblema•5. Ce1tamente é possível que essas proibições 1
dife re nça eleve-se à su perio ridade da técnica so-
li
�.1
tenham derivado indiretam ente do t otemi smo. Pode-se 1 �rupos sociah, desde o momento em que essas
• h
supor que os a n i mais que essas interdições protegem, ser­ 1 1 1 11 • 1 1 11.1111 obse rva das pela primeira vez. achavam-se
viam primitivamente de totens para clãs que teriam desa- 1 1 1 • 1 1 11 nll' enraizados num território, portanto mais capa-
104 AS FORMAS ELEME1\IARES DA 117Dll l?ELJGIO'v1 1 /li \\. IS ELEMENTARES 1 05

duas classes. lppai e Kumbo; a fratria Dilbi, duas outra' 1 ,, e n quan to as classes matrimoniais se mantive­
cbamada.s Murri e Kubbi. Como a filiação se faz em linha ' "im efei to, é certo que esras têm às vezes uma força
materna, a criança é da fratria de sua mãe; se esta for uma 1 1 1 "1cncia que os clãs não possuem. Em conseq üên -
Kupachin, também ela será Kupathin. Mas se a mãe for da 1
1
i n terd ições, destituídas ele seus supones primitivos,
classe lppai, a criança será uma Kumbo; os filhos desta, ,,e generalizado na extensão de cada classe, uma
1 1 1111
por sua vez, no caso de uma menina, voltarão a pertenn·r 1 1 11l não havia mais outros agrupamentos aos quais se
à classe lppai. Do mesmo modo, os filhos das mulherl·s 1 1 I• •"l'l11 associar. l\las, se essa regulan1entaçào nasceu
ela classe Murri serão da classe Kubbi. e os filhos da mu 1 , 11 11< 111 i :-.mo, percebe-se que não representa mais que
lhcres de Kubbi serão Mu rri de novo. Quando há quatro 1111 1 lo 11 ma enfraquecida e desnaturada delei6.
classes por frarria, ao im·és de duas, o sistema é mais J 11do o que a caba de ser dito do totem nas socieda-
complexo, mas o princípio é o mesmo. Essas quatro elas 1 1 1 ,.t1ahanas se apli ca às tribos indígen as da América
ses formam dois pare<; de dua.s das.se:- <.ada um, e e.s.sas l H lt A úruca diferença é que, nessas úluma:,, a urg;.1-
duas classes se alternam a cada geração, da maneira qul' 11 ''- · " , totêmica tem uma clareza de contornos e uma es-
acaba de ser indicada. 2) Os membros de uma classe sú 1 111 l 1d1.; ausentes na Austrália. Os clàs australianos não
podem. em princípio13, contrair casamento numa única 1 1 � 1 1 1 1plcsmente muito numerosos: são, para uma mes­
das classes da outra fratria. Os Ippai elevem casar-sp na '' 1 li il u 1, em número quase ilimitado. Os observadores ci­
classe Kubbi; os Murri. na classe Kumbo. É por essa orga­ ' 111 .d�uns deles a tÍlulo de exemplo, mas sem jamais
nização envolver profundamente relações matrimon iais 11 1 , '-:llir nos dar uma lista completa. É que em nenhum
que damos a esses agrupamentos o nome de classes ma­ 1• •1111 1110 essa lista é definitivamente estabelecida. O mes-
trimoniais. 11 , 1 11 < >n·sso de segmentação que desmembrou primitiva-
Ora, perguntou-se se essas classes não tinham ãs ve­ 11 1 1 1 1 1 fratria e que deu origem aos clàs propriamente
zes tocens como as fratrias e como os clàs. l 1 1 iossegue ininterruptamente no interior desses últi­
' ' '"
O que levantou a q uestão é que, em certas tribos do por causa dessa fragmentação progressiva, um clà
Queenslan d, cada classe matrimoni al é submetida a inter­ 1 d 1 1 wlltc tem apenas um efetivo dos mais reduzidos •7.
dições alimentares que lhe são específicas. Os i nd ivídu os 1 n u 11<:<1, ao contrário, o sistema totêmico possu i for-
que a compõem devem abster-se da carne de certos ani­ 1 1 1 1 1 1 1. 1 1s bem definidas. Embora as tribos sejam aí, em
mais que os outros podem livremente consum i r • • . Esses 111 d 1 1 sensivelmente mais volumosas que na Austrá l ia,
animais mio se riam totens? 11 , l.1s sao menos n u merosos. Uma mesma tribo rara-
Mas a in terd ição alimentar não é o sinal característico t ,, 1 1 1 1 1 ! lilta com mais ele uma dezena cleles48, na maioria
do totemismo . Primeiramente e antes ele Ludo, o Lotem é 1 '1 ·s menos; cada clã constitu i, portanto, um agrupa-
um nome e, como veremos, um emblema . Ora, nas socie­ 11• " ' ' ' l 1l'm mais importa nte. Mas, sobretudo, seu nú me ro
1

dades em questão, não existe classe matrimonial que te­ t i l i 1111 determinado: sabe-se quantos são e isso nos é
nha um nome de animal ou de planta, ou que se sirva de lill l 1''
um emblema•5. Ce1tamente é possível que essas proibições 1
dife re nça eleve-se à su perio ridade da técnica so-
li
�.1
tenham derivado indiretam ente do t otemi smo. Pode-se 1 �rupos sociah, desde o momento em que essas
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supor que os a n i mais que essas interdições protegem, ser­ 1 1 1 11 • 1 1 11.1111 obse rva das pela primeira vez. achavam-se
viam primitivamente de totens para clãs que teriam desa- 1 1 1 • 1 1 11 nll' enraizados num território, portanto mais capa-
106 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGIOSA S
I \ r RENÇAS ELEJHENTARE 107

zes ele resistir às forças dispersivas que os assaltavam. Ao subdivide m, por sua vez, num certo número de clãs:
Á
mesmo tempo, a sociedade já possuía um sentimento de­ l 1 . 1 t rias do Co1vo e elo Lobo, entre os TlinkitSO, da guia e
masiado vivo ele sua unidade para permanecer inconscien­ . i. , Corvo, entre os Haida5 1 . E essa divisão não é sirnples­
te ele si mesma e das partes que a compunham. O exem­ l l ll'nte nominal: correspo nde a um estado sempre atual
plo da América serve, assim, para nos explicar melhor o 1 l1 is costumes e marca profundamente a vida. A distância
que é a organização à base de clãs. Enganar-nos-íamos se 1 1 1oral que separa os clãs é pouca coisa comparada à que
ju lgássemos essa última a partir elo aspecto que apresenta .1 ·para as fratriassz. O nome ele cada uma delas
não é ape-
atualmente na Austrália. Com efeito, aqui ela se encontra 1 1 . 1 s uma palavra cujo sentido se esqueceu ou se conhece
num estado de flutuação e dissolução que nada tem de 1 .igamente ; é um totem em toda a força da
expressã o;
normal; muito pelo contrário, devemos considerá-lo como pnssui todos os seus atributos essenciais. tais como serão
o produto de uma degenerescência, imputável tanto ao 1 ll 'scritos adiantes�. �obre esse ponto também,
portamo,

desgaste natural do tempo quanro à ação desorganizadora li.1via interesse em nào negligenc iar as tribos da América,
dos brancos. Certamente é pouco provável que os clãs I· ' que nelas podemos observar diretamente esses totens
australianos alguma vez Lenham tido as dimensões e a só­ 1 lv fratrias dos quais a Austrália não nos oferece
mais que
lida estrutura dos clãs americanos. Deve ter havido, po­ 1 11 lscuros vestigios.

rém, um tempo em que a distância entre ambos era me­


nos considerável do que hoje; pois as sociedades da Amé­
rica jamais teriam alcançado uma ossatura tão sólida se o II
clã sempre tivesse sido feito ele urna matéria tão fluida e
inconsistente. Mas o totem não é apenas um nome; é um emblema ,
Essa maior estabilidade permitiu inclusive ao sistema 1 1 111 verdadeiro brasão, cujas analogias com o brasão be-
arcaico das fratrias manter-se na América com uma clare­ .t ldico foram freqüentemente assinalad as. "Cada família ,
za e um relevo que não mais possui na Austrália. Acaba­ 1 l 1 z G r e y ao falar dos australian os, adota
u m animal o u
mos de ver que, nesse último continente, a fratria está em 1 1 ill vegetal como s u a s armas e sua marca distintiva (as
decadência em toda parte; com muita freqüência, não tlwir crest and sign)"54; e o que Grey chama uma família é
passa de um agrupamento anônimo; quando tem um no­ 1 1 11 ontestavelmente u m clà. "A organização australiana, cli­
me, ou ele não é mais compreendido, ou, em todo caso, é •1· 111 igualmente Fison e Howitt, mostra que o totem é, an-
incapaz de significar grande coisa ao espírito cio indígena, 1 1·s de tudo, o brasão ele um grupo (the badge ofa group). "55
já que foi tomado de uma língua estrangeira ou que não "1 hoolcraft exprime-se nos mesmos termos sobre os to-
se fala mais. Assim só pudemos inferir a existência dos to­ 1 1 ·11.-; elos índios da América elo Norte: "O totem, diz ele, é
tens elas fratrias com base em algumas sobrevivências, tão 1 1 . 1 verdade um desenho que corresponde aos emblemas
pouco marcantes, na maior parte, que escaparam a mui­ 111 iJldicos elas nações civilizadas e que cada pessoa é au-
tos observadores. Ao contrário, esse sistema permaneceu 1 1 irizada a portar como prova da identidad e da família ã
em primeiro plano cm alguns pontos da América. As tri­ 1 1 1 1.tl pertence. É o que demonstra a etimologia verdadeira
1 Lt ralavra, derivada de dodaim, que significa
aldeia o u
bos ela costa noroeste, os Tlinkit e os Haida particular­
1 1 ·sidência ele u m grupo familiar."56 Assim, quando os ín­
i l11 >S entraram em relações com os europeus e se estabele-
mente, já alcançaram um grau ele civilização relativamente
avançado, no entanto estão divididas em duas fratrias que
106 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGIOSA S
I \ r RENÇAS ELEJHENTARE 107

zes ele resistir às forças dispersivas que os assaltavam. Ao subdivide m, por sua vez, num certo número de clãs:
Á
mesmo tempo, a sociedade já possuía um sentimento de­ l 1 . 1 t rias do Co1vo e elo Lobo, entre os TlinkitSO, da guia e
masiado vivo ele sua unidade para permanecer inconscien­ . i. , Corvo, entre os Haida5 1 . E essa divisão não é sirnples­
te ele si mesma e das partes que a compunham. O exem­ l l ll'nte nominal: correspo nde a um estado sempre atual
plo da América serve, assim, para nos explicar melhor o 1 l1 is costumes e marca profundamente a vida. A distância
que é a organização à base de clãs. Enganar-nos-íamos se 1 1 1oral que separa os clãs é pouca coisa comparada à que
ju lgássemos essa última a partir elo aspecto que apresenta .1 ·para as fratriassz. O nome ele cada uma delas
não é ape-
atualmente na Austrália. Com efeito, aqui ela se encontra 1 1 . 1 s uma palavra cujo sentido se esqueceu ou se conhece
num estado de flutuação e dissolução que nada tem de 1 .igamente ; é um totem em toda a força da
expressã o;
normal; muito pelo contrário, devemos considerá-lo como pnssui todos os seus atributos essenciais. tais como serão
o produto de uma degenerescência, imputável tanto ao 1 ll 'scritos adiantes�. �obre esse ponto também,
portamo,

desgaste natural do tempo quanro à ação desorganizadora li.1via interesse em nào negligenc iar as tribos da América,
dos brancos. Certamente é pouco provável que os clãs I· ' que nelas podemos observar diretamente esses totens
australianos alguma vez Lenham tido as dimensões e a só­ 1 lv fratrias dos quais a Austrália não nos oferece
mais que
lida estrutura dos clãs americanos. Deve ter havido, po­ 1 11 lscuros vestigios.

rém, um tempo em que a distância entre ambos era me­


nos considerável do que hoje; pois as sociedades da Amé­
rica jamais teriam alcançado uma ossatura tão sólida se o II
clã sempre tivesse sido feito ele urna matéria tão fluida e
inconsistente. Mas o totem não é apenas um nome; é um emblema ,
Essa maior estabilidade permitiu inclusive ao sistema 1 1 111 verdadeiro brasão, cujas analogias com o brasão be-
arcaico das fratrias manter-se na América com uma clare­ .t ldico foram freqüentemente assinalad as. "Cada família ,
za e um relevo que não mais possui na Austrália. Acaba­ 1 l 1 z G r e y ao falar dos australian os, adota
u m animal o u
mos de ver que, nesse último continente, a fratria está em 1 1 ill vegetal como s u a s armas e sua marca distintiva (as
decadência em toda parte; com muita freqüência, não tlwir crest and sign)"54; e o que Grey chama uma família é
passa de um agrupamento anônimo; quando tem um no­ 1 1 11 ontestavelmente u m clà. "A organização australiana, cli­
me, ou ele não é mais compreendido, ou, em todo caso, é •1· 111 igualmente Fison e Howitt, mostra que o totem é, an-
incapaz de significar grande coisa ao espírito cio indígena, 1 1·s de tudo, o brasão ele um grupo (the badge ofa group). "55
já que foi tomado de uma língua estrangeira ou que não "1 hoolcraft exprime-se nos mesmos termos sobre os to-
se fala mais. Assim só pudemos inferir a existência dos to­ 1 1 ·11.-; elos índios da América elo Norte: "O totem, diz ele, é
tens elas fratrias com base em algumas sobrevivências, tão 1 1 . 1 verdade um desenho que corresponde aos emblemas
pouco marcantes, na maior parte, que escaparam a mui­ 111 iJldicos elas nações civilizadas e que cada pessoa é au-
tos observadores. Ao contrário, esse sistema permaneceu 1 1 irizada a portar como prova da identidad e da família ã
em primeiro plano cm alguns pontos da América. As tri­ 1 1 1 1.tl pertence. É o que demonstra a etimologia verdadeira
1 Lt ralavra, derivada de dodaim, que significa
aldeia o u
bos ela costa noroeste, os Tlinkit e os Haida particular­
1 1 ·sidência ele u m grupo familiar."56 Assim, quando os ín­
i l11 >S entraram em relações com os europeus e se estabele-
mente, já alcançaram um grau ele civilização relativamente
avançado, no entanto estão divididas em duas fratrias que
h'/ \(.AS UEllE\TARES
108 A\' FO/llfAS ELFllENTAR!i
'i DA l7DA RELIGIU.1.·I t 109

c<:_ram contratos entre ambos,


1 I '" 1!-l i da. onde há sempre várias por c:asah<' Com
é com seu totem que cada J
1 1 � 1m1luplos mastros esculpidos que se erguem por lO­
ela sela\·a o.... tr..11ados assim
conduídos<-.
Os nobres da época feuda l
esculpiam, gravavam, fi­ l 1 os lados e às vezes a uma grande altura, uma aldeia
guravam de todas ru; maneir
as seus brasôes nos muros 11 1d.1 dá a impressão ele uma cidade sagrada, toda cober-
seus cast elo�, cm sua:-. arm
de
as, em todos os objetos que 11 d1 minúsculos campanários ou minareces6-. Entre os Sa-
lhe� �ene ncia m; os negros
da Aus tráli a e os índi os da 11 l i l geralmente nas paredes interiores da casa que o to-
1• m l representado611. Encontramo-lo, além disso, cm ca-
A.menca do ortc fazem o
mesmo com seus totens . Os
ín­
dios que acompanhavam Sam
uel J reame os pintavam em 111 1 1 .., cm utensílios de toda espécie e nos monumentos
seus . escudos antes de saíre
m a combate<;/!. Segundo Char­
le vo 1x, cert as tribo s indí
1 1 1111 rarios"''·
gen as t i n ha m , em tempos Os exemplos que precedem sào cxc�usivamente to-
guerra, verdadeiras insígnias, feitas e.li..! CUiit:
1 1 1 1 dos cios md ios
de
as de árvore ela América cio Norte. E que essas es-
Cii:-.as gravuraii, <.:s ..,a:-. rigura1,ões :-.ó s�10 po:-.s1-
presas na ponta ele uma vara
e nas quai s eram rqwesenta­
d ?s os LolensW. Entre os Tlink
it, quan do irrompia um con­
1 i l 1 u rns,
\ , 1s o nde a técnica das a rtes p l ásticas já chegou a um
Hf 1 u de aperfeiçoamento ainda não al�ançad� p.elas tri­
f l i to ent re dois clàs, os mem
bros dos dois grupos inim igos
l 11 os australianas. Por isso, rcprcsemaçoes totem1cas co-
levavam n a cabeça um capa
cete no qual se achavam re­
1 1 1 1 1 a s que acabam de ser menc i o na das são m� i.s rara.s
presentados seus respectivos
totens<'°. Entre os Jroqueses,
punJ1a-se em cada u•igwam
[aldeia!, como marca do clã, 1 11 1 menos aparentes na Austrália do que na Amenca. C1-
pele do anim . a
al que servia de totem61 . De
t r? observador, o anim al
acordo com ou­ 1 1m se, no entanto, alguns casos. Entre os Warramunga,
emp alha do é que era ergu ,111 linal das cerimônias mortuárias, enterram-se os ossos
ido
de , mono, previamente dessecados e reduzidos a pó; ao
diante da entrada62• Entre os
Wyandoc, cada clã tem seus
ornamentos próprios e suas
pinturas diM1 ntivash;i. Entre
� maha, e de maneira mais gera
os
l entre os Sioux. 0 totem é
l.1do do lugar onde são assim depositados, uma figura
ll'presentativa cio totem é traçada no chão�º Entre os
pintado na tenc.Ja1>1.
O�d': a sociedade tornou-s
\LlrJ e os Anula. o corpo é colocado numa peça de ma­
e sedentária, onde a tenda
_

•kira côncava, igualmente decorada com desenhos ca-


}
e subsutu1 a pe a casa, onde
? as artes plásticas já são mais 1 1 ne ríst icos do cotem�•. Na Nova Gales do Sul, Oxley en­
desenvolvidas, I..! na madeira,

nas paredes,
to�em. sso acontece, por exemplo, entr que se grava 0 t 1 111 t rou gravadas em árvores, próximas do túmulo onde
:i
. rs1 1 shia n , os Salis e os Haid a, os
h, o:-. Tlin kit . .. Um orna men
1 1 111 indígena fora enterrado�i. figu ra'> às quais Brough
.
p� rt 1cu l ar da casa entre os
to mui to 'lmyth atribui u m caráter toremico Os indígenas do alto
Tl i nkit , diz Krause, são os bra­
soes do totem". Trata-se de
1 >arling gravam em seus escudos imagens totêmicas7:1. Se­
formas anim ais, combinadas �u ndo Collins, quase todos os utensílios são cobertos de
cm certos casos com form
as hum anas e escu lpid as em
'.i1astr os, qu': se � levam ao
lado da pona de entrada e
; ,rnamentos que provavelmente têm a mesma significa­
� 10 · encontram-se figuras do mesmo gênero cm pecl ras� 1 .
que
.ilcançam ate qu inze metros
de altura; são geralmente pin­ 1·-.:-.es desenhos totêmicos poderia m inclusive ser mais fre­
tadas em �ores muito cham
. ativasM. No entanto, numa qüentes cio que parece, pois, por razões que scrJo expos­
deia 11mk1c, essas figuraçõe al­
s totêmicas não são muito tas mais adiante, nem empre é fácil perce ber seu verda­
nu­
merosas, verificando-se apen
as dian te das casas dos che­ deiro sentido.
fes e dos ricos. Elas são bem
mais freq üences na tribo vizi-
h'/ \(.AS UEllE\TARES
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é com seu totem que cada J
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ela sela\·a o.... tr..11ados assim
conduídos<-.
Os nobres da época feuda l
esculpiam, gravavam, fi­ l 1 os lados e às vezes a uma grande altura, uma aldeia
guravam de todas ru; maneir
as seus brasôes nos muros 11 1d.1 dá a impressão ele uma cidade sagrada, toda cober-
seus cast elo�, cm sua:-. arm
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lhe� �ene ncia m; os negros
da Aus tráli a e os índi os da 11 l i l geralmente nas paredes interiores da casa que o to-
1• m l representado611. Encontramo-lo, além disso, cm ca-
A.menca do ortc fazem o
mesmo com seus totens . Os
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dios que acompanhavam Sam
uel J reame os pintavam em 111 1 1 .., cm utensílios de toda espécie e nos monumentos
seus . escudos antes de saíre
m a combate<;/!. Segundo Char­
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1 1 1111 rarios"''·
gen as t i n ha m , em tempos Os exemplos que precedem sào cxc�usivamente to-
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1 1 1 1 dos cios md ios
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as de árvore ela América cio Norte. E que essas es-
Cii:-.as gravuraii, <.:s ..,a:-. rigura1,ões :-.ó s�10 po:-.s1-
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e nas quai s eram rqwesenta­
d ?s os LolensW. Entre os Tlink
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1 i l 1 u rns,
\ , 1s o nde a técnica das a rtes p lá sticas já chegou a um
Hf 1 u de aperfeiçoamento ainda não al�ançad� p.elas tri­
f l i to ent re dois clàs, os mem
bros dos dois grupos inim igos
l 11 os australianas. Por isso, rcprcsemaçoes totem1cas co-
levavam n a cabeça um capa
cete no qual se achavam re­
1 1 1 1 1 a s que acabam de ser menc i o na das são m� i.s rara.s
presentados seus respectivos
totens<'°. Entre os Jroqueses,
punJ1a-se em cada u•igwam
[aldeia!, como marca do clã, 1 11 1 menos aparentes na Austrália do que na Amenca. C1-
pele do anim . a
al que servia de totem61 . De
t r? observador, o anim al
acordo com ou­ 1 1m se, no entanto, alguns casos. Entre os Warramunga,
emp alha do é que era ergu ,111 linal das cerimônias mortuárias, enterram-se os ossos
ido
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diante da entrada62• Entre os
Wyandoc, cada clã tem seus
ornamentos próprios e suas
pinturas diM1 ntivash;i. Entre
� maha, e de maneira mais gera
os
l entre os Sioux. 0 totem é
l.1do do lugar onde são assim depositados, uma figura
ll'presentativa cio totem é traçada no chão�º Entre os
pintado na tenc.Ja1>1.
O�d': a sociedade tornou-s
\LlrJ e os Anula. o corpo é colocado numa peça de ma­
e sedentária, onde a tenda
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•kira côncava, igualmente decorada com desenhos ca-


}
e subsutu1 a pe a casa, onde
? as artes plásticas já são mais 1 1 ne ríst icos do cotem�•. Na Nova Gales do Sul, Oxley en­
desenvolvidas, I..! na madeira,

nas paredes,
to�em. sso acontece, por exemplo, entr que se grava 0 t 1 111 t rou gravadas em árvores, próximas do túmulo onde
:i
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to mui to 'lmyth atribui u m caráter toremico Os indígenas do alto
Tl i nkit , diz Krause, são os bra­
soes do totem". Trata-se de
1 >arling gravam em seus escudos imagens totêmicas7:1. Se­
formas anim ais, combinadas �u ndo Collins, quase todos os utensílios são cobertos de
cm certos casos com form
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lado da pona de entrada e
; ,rnamentos que provavelmente têm a mesma significa­
� 10 · encontram-se figuras do mesmo gênero cm pecl ras� 1 .
que
.ilcançam ate qu inze metros
de altura; são geralmente pin­ 1·-.:-.es desenhos totêmicos poderia m inclusive ser mais fre­
tadas em �ores muito cham
. ativasM. No entanto, numa qüentes cio que parece, pois, por razões que scrJo expos­
deia 11mk1c, essas figuraçõe al­
s totêmicas não são muito tas mais adiante, nem empre é fácil perce ber seu verda­
nu­
merosas, verificando-se apen
as dian te das casas dos che­ deiro sentido.
fes e dos ricos. Elas são bem
mais freq üences na tribo vizi-
1 10 �.\ F<JR.ilAS ELE.1/E\TARES DA l1DA RELIGIOSA 1 li'/ \{.. I \ l
!LE. ll
E.\TA
RF� 111

11;i q l<.� da puberdade n;lo teria por finalufade re­


i 1 1d 1 1 1. 1 1 a forma do tOLem. O fato nao est á con h rma c.lo
Esses diferentes fuos já dão uma idéia da imponân
ua cons1derávd que o cotem possui na vida social dos
primitivos. Acé agora, porém, ele mostrou-se a nós relati­ 11 1 • 1101 úvel que, às vezes, os próprios indígenas expli-
vamente exterior ao homem, pois somente o vimos repre­ 1 I L 1 1 1 .issim esse costume. Entre os Arunta, por exempl o,
1 1 1 1 1� ,10 cios dentes só é pra t icada n o clã da chuva e da
1 1 1 1 1 i1<1, segundo a tradição, essa operação teria por ob-
sen ta cl o nas coisas. Mas as imagens totêmicas não são

1 1 " tmnar as fisionom ias semelhantes a certas


apenas reproduzidas nas paredes elas casas, em canoas,
nuve ns
a
nas armas . nos instrumentos e nos tú mulos: encontramo­
las também no corpo dos homens. Estes não colocam seu 1 1 •1,1� co m bordos claros, que viriam n unciar a chegada

brasão apenas nos objecos que possuem. carregam-no em l 1 p 1 1 1\1 111a chuva e. por essa razão, são considemc.las coi-
sua pessoa: ele está impresso n a carne. faz parte deles dl 111c-.ma famíliall!. É uma prova de que o próprio in-
h '• 1 1. 1 tcm consc1ênc1a de que tais deformacõe:-. tem por
1

mesmos e, 1nclusl\e, esse modo de representação é de


longe o mais importante. •tt lu dar lhe, ao menos comenuona lmente, o aspecto
Com efeito, é uma regra muito geral que os membros 1 1 11t 11 totem. Entre os mesmos Arunta, durante os ritos
de cada clã procuram dar-se o aspecto exterior de seu to­ 11 111 1111<.isão*, determinadas incisões na pele são prati ca­
tem. Entre os Tlinkit, em certas festas religiosas, o perso­ i 1 mnãs e na fu tu ra mulher do noviço; disso resu l-
nagem encarregado de d irigir a cerimónia usa uma ,·esti­ 1 111 11 ;llrizcs cuja forma é igu al mente representada sobre
"ª"

menta que representa, na tota lidade ou cm parte, o corpo 1 1 1 1 1 11l iw10 sa grado, do q u a l falaremo s daqui a pou co,
cio animal que dá nome ao clã7>. Máscaras especiais são , l i 1 1 1 1 ido churi11ga; ora, veremos que as linhas desenha-
em pregadas com esse objeti vo. Encontramos as mesmas 1 1 1 1 n ,·huringa são emblemá ticas cio totem8�. Entre os
t 1 1 1 1s i l n euro é consider ado parente próximo e.la chu-
1
práticas em todo o Noroeste americano'6. Idêntico costu­
me entre os Minnitaree quando vão ao combate.,..., e entre 11s pessoas do clã da chuva trazem nas orelhas pe­
os índios cios Pueblos-11 Quando o totem é uma ave. os jlh n. pingentes feitos de dentes de euroR'. Entre os Yer-
indh·íduos levam na cabeça as plumas dessa ave"". Entre 1 l 1 d111.111te a iniciação, inflige-se ao jovem um certo nú-
1 1 1 • ri • dt.· cutilada s que deixam cicatrize s: o número
os Iowa. cada clã tem uma maneira especial de cortar os e a
cabelos. :\o clã da Águia. dois grandes rufas são dispostos 1 1 1 1 .1 dcssas cicatrize s ' a riam conform e os totensHI>. Cm
na frente da cabeça, enquanto um ou tro pende para trás: 1 1 1 1 1 1 1 l nrmantes de Fison assinala o mesmo fato nas tribos
11hsl·rvouR�. Segundo Ilowitt, uma relação do mesmo
t 1 1 1 10 vxist iria , nos Dieri, entre certas esca rificaçôcs e o
n o c l ã do B ú falo, são dispostos em forma de cornosllo. t
Di spositivos an á logos verificam-se entre os Omaha, cada
clã tendo seu pentea do. No clã e.la Tartaruga, por exem­ 1 1 11 1 • 1 1 1 d:1 água88. Quanto aos foclios do Noroeste, o costu-
1 i l l t i· · 1a1uar o totem é m u it o comum entre
plo, os cabelos são raspados para formar seis anéis, dois eles89.
de cada lado da cabeça, um na frente e outro atrás. de l\l 1s se as taruagens realizadas por meio de mutilações
i a imitar as p:uas. a cabeça e a cauda do animaJ'l l .
manera , 1 d1• , ,.,. arifi<.acõcs nem sempre têm uma signifi<.a1,
,.10 to­
�Jas. n a maioria d a s ,·ezes, é no próprio corpo que é t 1111L . 1 '1t1, <ligo d fi erente ocorre com os simples desenhos
impressa a marca totêmica: é um modo de representnçào ll t1 1.1dos no corpo: na maioria dos casos. eles são repre-
que está ao alcance inclusive das sociedades menos avan­
çadas. Chegou-se a perguntar se o rito tã o freq üente que nas panes inferiores do corpo, em especial no prepúcio
cons iste em arrancar e.los rapazes os dois cientes superio- ""
lnn'·'º
1)

1 10 �.\ F<JR.ilAS ELE.1/E\TARES DA l1DA RELIGIOSA 1 li'/ \{.. I \ l
!LE. ll
E.\TA
RF� 111

11;i q l<.� da puberdade n;lo teria por finalufade re­


i 1 1d 1 1 1. 1 1 a forma do tOLem. O fato nao est á con h rma c.lo
Esses diferentes fuos já dão uma idéia da imponân
ua cons1derávd que o cotem possui na vida social dos
primitivos. Acé agora, porém, ele mostrou-se a nós relati­ 11 1 • 1101 úvel que, às vezes, os próprios indígenas expli-
vamente exterior ao homem, pois somente o vimos repre­ 1 I L 1 1 1 .issim esse costume. Entre os Arunta, por exempl o,
1 1 1 1 1� ,10 cios dentes só é pra t icada n o clã da chuva e da
1 1 1 1 1 i1<1, segundo a tradição, essa operação teria por ob-
sen ta cl o nas coisas. Mas as imagens totêmicas não são

1 1 " tmnar as fisionom ias semelhantes a certas


apenas reproduzidas nas paredes elas casas, em canoas,
nuve ns
a
nas armas . nos instrumentos e nos tú mulos: encontramo­
las também no corpo dos homens. Estes não colocam seu 1 1 •1,1� co m bordos claros, que viriam n unciar a chegada

brasão apenas nos objecos que possuem. carregam-no em l 1 p 1 1 1\1 111a chuva e. por essa razão, são considemc.las coi-
sua pessoa: ele está impresso n a carne. faz parte deles dl 111c-.ma famíliall!. É uma prova de que o próprio in-
h '• 1 1. 1 tcm consc1ênc1a de que tais deformacõe:-. tem por
1

mesmos e, 1nclusl\e, esse modo de representação é de


longe o mais importante. •tt lu dar lhe, ao menos comenuona lmente, o aspecto
Com efeito, é uma regra muito geral que os membros 1 1 11t 11 totem. Entre os mesmos Arunta, durante os ritos
de cada clã procuram dar-se o aspecto exterior de seu to­ 11 111 1111<.isão*, determinadas incisões na pele são prati ca­
tem. Entre os Tlinkit, em certas festas religiosas, o perso­ i 1 mnãs e na fu tu ra mulher do noviço; disso resu l-
nagem encarregado de d irigir a cerimónia usa uma ,·esti­ 1 111 11 ;llrizcs cuja forma é igu al mente representada sobre
"ª"

menta que representa, na tota lidade ou cm parte, o corpo 1 1 1 1 1 11l iw10 sa grado, do q u a l falaremo s daqui a pou co,
cio animal que dá nome ao clã7>. Máscaras especiais são , l i 1 1 1 1 ido churi11ga; ora, veremos que as linhas desenha-
em pregadas com esse objeti vo. Encontramos as mesmas 1 1 1 1 n ,·huringa são emblemá ticas cio totem8�. Entre os
t 1 1 1 1s i l n euro é consider ado parente próximo e.la chu-
1
práticas em todo o Noroeste americano'6. Idêntico costu­
me entre os Minnitaree quando vão ao combate.,..., e entre 11s pessoas do clã da chuva trazem nas orelhas pe­
os índios cios Pueblos-11 Quando o totem é uma ave. os jlh n. pingentes feitos de dentes de euroR'. Entre os Yer-
indh·íduos levam na cabeça as plumas dessa ave"". Entre 1 l 1 d111.111te a iniciação, inflige-se ao jovem um certo nú-
1 1 1 • ri • dt.· cutilada s que deixam cicatrize s: o número
os Iowa. cada clã tem uma maneira especial de cortar os e a
cabelos. :\o clã da Águia. dois grandes rufas são dispostos 1 1 1 1 .1 dcssas cicatrize s ' a riam conform e os totensHI>. Cm
na frente da cabeça, enquanto um ou tro pende para trás: 1 1 1 1 1 1 1 l nrmantes de Fison assinala o mesmo fato nas tribos
11hsl·rvouR�. Segundo Ilowitt, uma relação do mesmo
t 1 1 1 10 vxist iria , nos Dieri, entre certas esca rificaçôcs e o
n o c l ã do B ú falo, são dispostos em forma de cornosllo. t
Di spositivos an á logos verificam-se entre os Omaha, cada
clã tendo seu pentea do. No clã e.la Tartaruga, por exem­ 1 1 11 1 • 1 1 1 d:1 água88. Quanto aos foclios do Noroeste, o costu-
1 i l l t i· · 1a1uar o totem é m u it o comum entre
plo, os cabelos são raspados para formar seis anéis, dois eles89.
de cada lado da cabeça, um na frente e outro atrás. de l\l 1s se as taruagens realizadas por meio de mutilações
i a imitar as p:uas. a cabeça e a cauda do animaJ'l l .
manera , 1 d1• , ,.,. arifi<.acõcs nem sempre têm uma signifi<.a1,
,.10 to­
�Jas. n a maioria d a s ,·ezes, é no próprio corpo que é t 1111L . 1 '1t1, <ligo d fi erente ocorre com os simples desenhos
impressa a marca totêmica: é um modo de representnçào ll t1 1.1dos no corpo: na maioria dos casos. eles são repre-
que está ao alcance inclusive das sociedades menos avan­
çadas. Chegou-se a perguntar se o rito tã o freq üente que nas panes inferiores do corpo, em especial no prepúcio
cons iste em arrancar e.los rapazes os dois cientes superio- ""
lnn'·'º
1)

1 12 AS FORMAS ELEMENTARES OA 17011 REL!GJLJ.\.1
1 NI \( 1� HLEMENlilRES Ll 3

sentativos do torem. É verdade que o indígena não os car


1 1 • , tempo que este é uma etiqueta coletiva, te m um
1 1 111 1 religioso. Com e fe i to . é e m relação a ele que as
reg<t u tempo tudo. Quando se entrega a ocupações pura
mente econômicas, quando os pequenos grupos família·
1 s . üo classificadas em sagrada s e em profanas. Ele é
res se dispersam para caçar e pescar, ele não se preocupa
1 1 1 1 11 >rio modelo das coisas sagradas.
com esse costum e. q u e não deixa de se r compli cado.
\s tribos ela Aust rá l ia central, principalmente os
Mas, quando os clàs se reúnem e juntos se ocupam das
cerimônias religiosas, ele obrigatoriamente se enfeita . Ca­
1 1 1111 1 os Loritja, os Kaitish, os Unmatjera, os l lp irra, ser-
1 1 1 ·l' constantemente, em seus ritos. d e certos i nstru-
da uma dessas cerimônias, como veremos, diz respeito a
1111 1 1 1 1 1s·1� q ue, entre os Arunta, são chamados cbu rínga.
um Lotem particul ar e, em princípio, os ricos relacionados
y,i111do Spencer e Gillen, e ljurunga99, segundo Streh-
1 1 \ S;tn peças de madeira ou pedaços de pedra polida.
a um totem só podem ser celebrados por pessoas
desst:
totem . Ora, os que desempenham o papel de oficianresv 1 1 li 1 1m as muito vanadas, mas g eralmente ovais ou alon-
1 1 . Cada grupo totémico possui uma coleçao mais
e, às vezes. até os que assistem como esix:ctadorcs le\am
1! 111l·nos im portante dessas peças. Ora. em cada uma
sempre no corpo desenhos q u e representam o totem92
.
/, i '· acba-se gravado um desenbo que representa o totem
Um dos ritos principais da iniciaçã o. o que faz o jovem
/, ,, mesmo grupo 101 . Alguns desses churinga possuem,
entrar na vida religiosa ela tribo, consiste precisamente em
pintar-lhe no corpo o símbolo totêmico93. É Yerdade 1ue,
1111 111.1 das extremidades, um buraco pelo qual passa um
li 11 l i. 1 nte. feito de cabelos humanos ou pêlos de gambá.
entre os Arunta, o desenho assim traçado não representa
necessariamente o wtem do iniciado91; mas essa é uma
exceç; 1 o, certamente devid a ao estado de perturbação
1 11 " ·t·s objetos, os que são de macieira e fu rados desse
em 1111 " lo servem exatamente às mesmas finalidades que os
que se encontra a organização totêmica dessa cribo<>s. De
(1 1 .1 1 1 1mentos de culto aos quais os etnógrafos ingleses de-
resto, mesmo entre os Arunta , no momenro mais solene
1 1 1 1 1 o nome de bull-roarers. Por meio do laço a que estão
11 J ll nsos. são girados ra pida me nte no ar de maneira a
da in i ci ação , por ser seu coroamento e sua consag
ração,
quando o neófito é admitido no santuário cm que se con­
1 1 1 1 1duzir uma espécie de ronco idêntico ao que emitem
se1vam todos os objetos sagrados pe11encentes ao clã, exe­
11 111/:Jidores que servem a i n d a hoje d e brinquedo a
cuta-se nele uma pintura emblemática , e desta vez é o to­
t•

1 11 1 ,,1s crianças; esse ruído ensurdecedor tem uma signifi­


c 11 .io ritu a l e aco mp anha todas as cerimônias de alguma
tem do jovem que é representado%. Os l aços que
unem o
111q 111rtilncia. Os ch ur i nga , portanto, são verdadeiros bull-
indivíd uo a seu totem são tão esu·eitos que, nas tribos da
, ,, , rc•rs. Mas há ou tros que não são ele madeira ou não
costa noroeste da América cio Norte, o emblema do clã é
pintado não apenas nos vivos , mas também nos
tes ele sep ul tar o cadáver, põe-se nele a marca totêmica97.
mo1tos: an­ 1 1 1 l u rac.los; cm conseqüência, não podem ser emprega­
d• '" dessa maneira. Inspiram no entanto os mesmos senti-
11 11 ·1uos ele respeito religios o .
Com efeito, Lodo churinga, não im po rta para que fi
III 1 1 tl1 dade seja em pregado , figura entre as coisas mais e m i-
1 1 1 1 l l L'mentc sagrad as, inclusive não h á nenhuma que o
Essas decorações totêmicas permitem pressentir que
1 q wre e m dignidade rdigiosa. É o que já indica a palavra
q1 11· serve para designá-lo. Ao mesmo tem po u m substan-
o totem não é somente u m nome e um emblema. É du­
1 1 ' , 1, é também um adjet ivo qu e sign i fica sagrado. Assim,
rante as cerimô nias re l ig i osa s que elas são o totem, a o
1 12 AS FORMAS ELEMENTARES OA 17011 REL!GJLJ.\.1
1 NI \( 1� HLEMENlilRES Ll 3

sentativos do torem. É verdade que o indígena não os car


1 1 • , tempo que este é uma etiqueta coletiva, te m um
1 1 111 1 religioso. Com e fe i to . é e m relação a ele que as
reg<t u tempo tudo. Quando se entrega a ocupações pura
mente econômicas, quando os pequenos grupos família·
1 s . üo classificadas em sagrada s e em profanas. Ele é
res se dispersam para caçar e pescar, ele não se preocupa
1 1 1 1 11 >rio modelo das coisas sagradas.
com esse costum e. q u e não deixa de se r compli cado.
\s tribos ela Aust rá l ia central, principalmente os
Mas, quando os clàs se reúnem e juntos se ocupam das
cerimônias religiosas, ele obrigatoriamente se enfeita . Ca­
1 1 1111 1 os Loritja, os Kaitish, os Unmatjera, os l lp irra, ser-
1 1 1 ·l' constantemente, em seus ritos. d e certos i nstru-
da uma dessas cerimônias, como veremos, diz respeito a
1111 1 1 1 1 1s·1� q ue, entre os Arunta, são chamados cbu rínga.
um Lotem particul ar e, em princípio, os ricos relacionados
y,i111do Spencer e Gillen, e ljurunga99, segundo Streh-
1 1 \ S;tn peças de madeira ou pedaços de pedra polida.
a um totem só podem ser celebrados por pessoas
desst:
totem . Ora, os que desempenham o papel de oficianresv 1 1 li 1 1m as muito vanadas, mas g eralmente ovais ou alon-
1 1 . Cada grupo totémico possui uma coleçao mais
e, às vezes. até os que assistem como esix:ctadorcs le\am
1! 111l·nos im portante dessas peças. Ora. em cada uma
sempre no corpo desenhos q u e representam o totem92
.
/, i '· acba-se gravado um desenbo que representa o totem
Um dos ritos principais da iniciaçã o. o que faz o jovem
/, ,, mesmo grupo 101 . Alguns desses churinga possuem,
entrar na vida religiosa ela tribo, consiste precisamente em
pintar-lhe no corpo o símbolo totêmico93. É Yerdade 1ue,
1111 111.1 das extremidades, um buraco pelo qual passa um
li 11 l i. 1 nte. feito de cabelos humanos ou pêlos de gambá.
entre os Arunta, o desenho assim traçado não representa
necessariamente o wtem do iniciado91; mas essa é uma
exceç; 1 o, certamente devid a ao estado de perturbação
1 11 " ·t·s objetos, os que são de macieira e fu rados desse
em 1111 " lo servem exatamente às mesmas finalidades que os
que se encontra a organização totêmica dessa cribo<>s. De
(1 1 .1 1 1 1mentos de culto aos quais os etnógrafos ingleses de-
resto, mesmo entre os Arunta , no momenro mais solene
1 1 1 1 1 o nome de bull-roarers. Por meio do laço a que estão
11 J ll nsos. são girados ra pida me nte no ar de maneira a
da in i ci ação , por ser seu coroamento e sua consag
ração,
quando o neófito é admitido no santuário cm que se con­
1 1 1 1 1duzir uma espécie de ronco idêntico ao que emitem
se1vam todos os objetos sagrados pe11encentes ao clã, exe­
11 111/:Jidores que servem a i n d a hoje d e brinquedo a
cuta-se nele uma pintura emblemática , e desta vez é o to­
t•

1 11 1 ,,1s crianças; esse ruído ensurdecedor tem uma signifi­


c 11 .io ritu a l e aco mp anha todas as cerimônias de alguma
tem do jovem que é representado%. Os l aços que
unem o
111q 111rtilncia. Os ch ur i nga , portanto, são verdadeiros bull-
indivíd uo a seu totem são tão esu·eitos que, nas tribos da
, ,, , rc•rs. Mas há ou tros que não são ele madeira ou não
costa noroeste da América cio Norte, o emblema do clã é
pintado não apenas nos vivos , mas também nos
tes ele sep ul tar o cadáver, põe-se nele a marca totêmica97.
mo1tos: an­ 1 1 1 l u rac.los; cm conseqüência, não podem ser emprega­
d• '" dessa maneira. Inspiram no entanto os mesmos senti-
11 11 ·1uos ele respeito religios o .
Com efeito, Lodo churinga, não im po rta para que fi
III 1 1 tl1 dade seja em pregado , figura entre as coisas mais e m i-
1 1 1 1 l l L'mentc sagrad as, inclusive não h á nenhuma que o
Essas decorações totêmicas permitem pressentir que
1 q wre e m dignidade rdigiosa. É o que já indica a palavra
q1 11· serve para designá-lo. Ao mesmo tem po u m substan-
o totem não é somente u m nome e um emblema. É du­
1 1 ' , 1, é também um adjet ivo qu e sign i fica sagrado. Assim,
rante as cerimô nias re l ig i osa s que elas são o totem, a o
1 14 AS FORMAS ELEMENTARES D1I \ 'IDA REl!GJOSA 1 \ 1 N/\ÇAS EWI/JJVFARES 115

enrre os nomes que cada A ru nta poss u i , há um tão sagra­ mi i.s(,Iado, é por ser uma coisa de alto valor rel igioso e
do que é proibido revelá-lo a um estrangeiro; só é pro­ • 1q.1 pe rda lesaria gravemente a coletividade e os indiví­
1

nunciado raramente, em voz baixa, numa espéc ie de mur­ d 1 1 1 1s. Ele possui todo lipo ele propriedades maravilhosas:
múrio religioso. Ora, esse nome é aritna churi11ga ( a ritna p1 •I n>ntato, cura feridas, especialmente aquelas que re-
11h 11n da circuncisà o10'>; tem inclusive eficácia contra a doen-
as

quer dizer nome 1 º2). De maneira mais geral, a palavra


churinga designa todos os aros rituais: por exemplo, ilia 1 111, seive para fazer crescer a barba • • • ; confere in1po1tan­
clJ11 ri12ga significa o culto da EmaJ03. Empregado estrita­ poderes à espécie totêmica, cuja reprodução normal ele
1 ·l·gura112; dá aos homens força, coragem, persevernnca,
'l '

mente, como substantivo, churinga é, ponanto, a coisa


que tem por característica essencial ser sagrada. Assim, os 1 , .10 contrário, deprime e enfraquece seus inimigos. Essa
profanos. isto é, as mulheres e os jovens ainda não inicia­ 11h 1111a crença é tao fonemente enraizada que, quando dois
dos a \"ida rel igiosa , não podem tocar nem mesmo ver os • 1J1 1 1 bacen tes e:.tào cm luta, se um deles chega a perceber

c.:huringa , só lhes é permitido olhá-lo:. de longe e, amda )L ·t..U adversário traz consigo um churinga. imc<liacamen
assim, cm raras ocasiões•o.1• 11• perde confiança e sua derrota é cerrall3. Assim, não h á
Os churinga são conservados piedosamente num lugar in .1nimento rin.1al que ocupe um lugar mais importante nas
u·11mônias religiosas•H. Mediante unções , seus poderes são
1 r 1 nsmitidos aos oficiantes ou aos assistences; para tanto,
especial que é chamado, entre os Arunta, o er111atulu11-
ga10"'. Trata-s e de uma cavidade, uma espécie de peqm·no
subtemineo dissimulado num local deserto. Sua entrada é 1 pos serem untados de graxa. são fr iccio nados contra os
cuidadosamente fechada por meio de pedras tão habilmen­ 1 1 ll'mbros. contra o estômago dos fiéis ••s. Ou então são re-
te dispostas que um estranho que passar ao lado não pode­ nhcrtos de urna penugem que se solta e se dispersa em
rá suspeitar que, junto dele, se acha o resouw religioso do 1 i idas as direções quando agitados no ar: é uma maneira ele
clã. O caráter sagrado dos chu ringa é tal, que se transmite • lissl'min ar as virtudes contidas neles• 16.
ao lugar onde são assim depositados: as mulheres, os nào­ Mas os churinga não são apenas úteis aos indivíduos:
iniciados nao podem se aproximar dele. Somente quando sone cio clã inteiro está ligada à sua. Perdê-lo é um de-
1s1rc; é a maior infelicidade que pode acontecer ao gru-
1

a iniciação terminou co mpletam ente é que os jovens têm


acesso a ele; mesmo assim só são julgados dignos desse fa­ 1 'º' P. Às vezes, eles deixam o ertnatulunga, por exemplo,
vor após vários anos de provações 1o6. A religiosidade do lu­ 1 p 1;1ndo são emprestados a um grupo estrangeirot•s. Su­
ga r irradia-se inclusive além e comunica-se ao que está em ' nlc, então, um verdadeiro luto público. Durante duas
volta: tudo o que aí se encontra pa1ticipa do mesmo caráter i. 1 • 1 1 1a nas , as pessoas do totem choram, se lamentam, o
e, por essa razão, é sub tra ído aos atos prof a nos . Um ho­ • 1 1 rpo untado de argil a branca, como fazem ao perderem
mem é persegu ido por outro? Se ele ch egar ao crtnaLUlun­ ilgum de seus próximos • •9. Por isso, os churi nga não são
d1•1xados ã livre disposição cios particulares; o crtnatulun-
1' 1 o nd e são conservados é posto sob o controle elo chefe
ga, estará salvo, não poderá ser pegoJ07. Mesmo um animal
ferido que se refugia nesse lugar deve ser respeitado ios . Ali
as disputas são proibi das. É um lugar de paz, como se d i rá t i o grupo. Claro que cada indivíduo tem direitos especiais
nas sociedades germânicas, é um santuá1io do grupo totê­ ,, 1hre alguns dcles1l<l; cont udo, ainda que seja, numa certa
l o.
mico, um verdadeiro lugar de asi l l K'clida, seu propriet�rio, só pode servir-se dele com o
1 < insentimento e sob a direção do chefe. Trata-se de um
l<"souro coletivo, a arca sagrada do clã•21. Al i ás, a devoção
Mas as virtudes do churinga não apenas se manifes­
tam na maneira como mantém o profa no à distância. Se é
1 14 AS FORMAS ELEMENTARES D1I \ 'IDA REl!GJOSA 1 \ 1 N/\ÇAS EWI/JJVFARES 115

enrre os nomes que cada A ru nta poss u i , há um tão sagra­ mi i.s(,Iado, é por ser uma coisa de alto valor rel igioso e
do que é proibido revelá-lo a um estrangeiro; só é pro­ • 1q.1 pe rda lesaria gravemente a coletividade e os indiví­
1

nunciado raramente, em voz baixa, numa espéc ie de mur­ d 1 1 1 1s. Ele possui todo lipo ele propriedades maravilhosas:
múrio religioso. Ora, esse nome é aritna churi11ga ( a ritna p1 •I n>ntato, cura feridas, especialmente aquelas que re-
11h 11n da circuncisà o10'>; tem inclusive eficácia contra a doen-
as

quer dizer nome 1 º2). De maneira mais geral, a palavra


churinga designa todos os aros rituais: por exemplo, ilia 1 111, seive para fazer crescer a barba • • • ; confere in1po1tan­
clJ11 ri12ga significa o culto da EmaJ03. Empregado estrita­ poderes à espécie totêmica, cuja reprodução normal ele
1 ·l·gura112; dá aos homens força, coragem, persevernnca,
'l '

mente, como substantivo, churinga é, ponanto, a coisa


que tem por característica essencial ser sagrada. Assim, os 1 , .10 contrário, deprime e enfraquece seus inimigos. Essa
profanos. isto é, as mulheres e os jovens ainda não inicia­ 11h 1111a crença é tao fonemente enraizada que, quando dois
dos a \"ida rel igiosa , não podem tocar nem mesmo ver os • 1J1 1 1 bacen tes e:.tào cm luta, se um deles chega a perceber

c.:huringa , só lhes é permitido olhá-lo:. de longe e, amda )L ·t..U adversário traz consigo um churinga. imc<liacamen
assim, cm raras ocasiões•o.1• 11• perde confiança e sua derrota é cerrall3. Assim, não h á
Os churinga são conservados piedosamente num lugar in .1nimento rin.1al que ocupe um lugar mais importante nas
u·11mônias religiosas•H. Mediante unções , seus poderes são
1 r 1 nsmitidos aos oficiantes ou aos assistences; para tanto,
especial que é chamado, entre os Arunta, o er111atulu11-
ga10"'. Trata-s e de uma cavidade, uma espécie de peqm·no
subtemineo dissimulado num local deserto. Sua entrada é 1 pos serem untados de graxa. são fr iccio nados contra os
cuidadosamente fechada por meio de pedras tão habilmen­ 1 1 ll'mbros. contra o estômago dos fiéis ••s. Ou então são re-
te dispostas que um estranho que passar ao lado não pode­ nhcrtos de urna penugem que se solta e se dispersa em
rá suspeitar que, junto dele, se acha o resouw religioso do 1 i idas as direções quando agitados no ar: é uma maneira ele
clã. O caráter sagrado dos chu ringa é tal, que se transmite • lissl'min ar as virtudes contidas neles• 16.
ao lugar onde são assim depositados: as mulheres, os nào­ Mas os churinga não são apenas úteis aos indivíduos:
iniciados nao podem se aproximar dele. Somente quando sone cio clã inteiro está ligada à sua. Perdê-lo é um de-
1s1rc; é a maior infelicidade que pode acontecer ao gru-
1

a iniciação terminou co mpletam ente é que os jovens têm


acesso a ele; mesmo assim só são julgados dignos desse fa­ 1 'º' P. Às vezes, eles deixam o ertnatulunga, por exemplo,
vor após vários anos de provações 1o6. A religiosidade do lu­ 1 p 1;1ndo são emprestados a um grupo estrangeirot•s. Su­
ga r irradia-se inclusive além e comunica-se ao que está em ' nlc, então, um verdadeiro luto público. Durante duas
volta: tudo o que aí se encontra pa1ticipa do mesmo caráter i. 1 • 1 1 1a nas , as pessoas do totem choram, se lamentam, o
e, por essa razão, é sub tra ído aos atos prof a nos . Um ho­ • 1 1 rpo untado de argil a branca, como fazem ao perderem
mem é persegu ido por outro? Se ele ch egar ao crtnaLUlun­ ilgum de seus próximos • •9. Por isso, os churi nga não são
d1•1xados ã livre disposição cios particulares; o crtnatulun-
1' 1 o nd e são conservados é posto sob o controle elo chefe
ga, estará salvo, não poderá ser pegoJ07. Mesmo um animal
ferido que se refugia nesse lugar deve ser respeitado ios . Ali
as disputas são proibi das. É um lugar de paz, como se d i rá t i o grupo. Claro que cada indivíduo tem direitos especiais
nas sociedades germânicas, é um santuá1io do grupo totê­ ,, 1hre alguns dcles1l<l; cont udo, ainda que seja, numa certa
l o.
mico, um verdadeiro lugar de asi l l K'clida, seu propriet�rio, só pode servir-se dele com o
1 < insentimento e sob a direção do chefe. Trata-se de um
l<"souro coletivo, a arca sagrada do clã•21. Al i ás, a devoção
Mas as virtudes do churinga não apenas se manifes­
tam na maneira como mantém o profa no à distância. Se é
AS FORMAS HLEMENTllRES Dll
Ili \'ÇAS ELI
DIENT'ARES
1 16 11DA Rlil/Gl<J.\.� 117
I\

valor que st · 1 PII 1quda relação com um c;er sagrado. é enunciar de


de que os churinga são objeto mostra o alto
atribui a eles. Só são manip ulados com um respeit
o que a l o 1.1-, maneiras o mesmo fato, não é explicá-lo. Aliás, co-
solenidade dos gestos traduz122. São tratado
s com cuida­ 111i , ..., pencer e Gillen reconhecem, mesmo entre os Arunta
do, untados, friccionados, polidos e. quando
os Lranspor­ 1 1 1 .dguns churinga que são fabricados, à vista de todo o
Lam de uma localidade a outra, é em meio
a cerimônias 1111111do, pelos mais velhos do grupo126; estes. evidente­
que Lestemunham ser esse deslocamento um
ato da mais ln• 1 1tc . não provêm dos g rande s antepassados. No entan-
alta importância 1 23.
1• t, possuem, com diferenças de graus apenas, a mesma
Ora, em s i mesmos, os churinga são objeto
s de ma­ l 1 1 .1da que os demais e são conservados da mesma ma-
deira e de pedra, como tantos outros; não se
distinguem 1w11.1 Enfim, há tribos inteiras em que o churinga de mo­
h > 111.nhum é concebido como associado a um espírito1r-.
das coisas profanas do mesmo gênero a não
ser por urna
particularidade: nelt:s está gravada ou de:.enh
ada a marca ,, .. , natureza religiosa pro, ém, portanto. de outra fonte, e
11 ,nc.fe poderia pronr :.cnào <la marca totêmica que � r
totêmica. Portanto, é essa marca, e somem
e da, que U1t.:.s
confere o caráter sagrado . É verdade que. segund
o Spen­ n )'-1' Assim. é a essa imagem que se d i rigen�, em real �cla-

lt
cer e Gillen. o churinga serviria de residência
a uma alma 1s demonstrações do rito; ela é que santifica o ob1eto
de antepassado, e seria a presidência dessa
alma que lhe 1 1 • 1 qual está gravada.
l lá. n o entanto, entre os Arunta e nas tnbos v1zmhas.
confer iria suas propriedades 1 2·1. Strehlo w, . . .
por seu lado.
embora declarando inexat a essa interpretação
, propõe d111.., outros instrumentos litúrgicos claramente relaciona­
º' ,., ao totem e ao próprio churinga que entra orclinaria-
uma outra que não difere sensivelmente da
c huringa seria con si derado uma inlagem do
precedente: o
corpo do an­ 1111 nte em sua composição: o n11rlll 11ja e o waninga.
tepassado ou esse próprio corpo125. Portanto,
seriam mais o nununja I 28, ve rifica do entre os Arunta do 01te e
uma vez os sentimentos inspirados pelo antepa
ssado que , 1 · 1i... vizinhos imediatos129, é feito essencialmente de u m
se relacionariam ao objew material e fariam
dele uma es­ 1 q 1orte vertical que consiste ou numa lança, ou em várias
l 1 1 1l.1s reunidas em feixe, ou ainda numa simples varat:so.
pécie de fetiche. Mas, em primeiro lugar , tanto
uma con­
1 1 t lns de e1vas são presos em volta por mei o de pequenas
cepção quanto a outra - que, aliás, quase não
diferem do
miLo .ª não ser na letra - foram manifestamen
te forjadas 1 1 1 1 s . feitas de cabelos. Por ci ma destes é acres c enta da
1 1 1 11.1 pen ugem, disposta em círculos ou em linhas pa ra le­
depois, para tornar inleligíyel o caráter sagrad
o aLribuído
l . 1 , . de cima a baixo do suporte. O topo é decora do com
aos churin ga. Na constituição dessas peças
de madeira e
1 11 t 1 1 11 as de águia-falcão. Essa é a p enas a forma m ai s geral
desses pedaços de pedra, em seu aspecto exterio
r, não há
nada que os predestine a ser considerados
a residência de , 111:1is típica: ela comporta todo tipo de variações confor-

1 1 1 1· os casos particulares 1 3 I .
uma alma de antepa ssado ou a image m de
Portan to, se us home ns imagin aram esse mito,
seu corpo .
fo i para o waninga , que se verifica apenas entre os ArunLa do
1 i l , os Urabunna e os Lo ritja , tampouco apresenta um
poderem explica r a eles mesmos o respeito
religioso que
1 1 11 1 l k l o único. Redu z ido a seus elementos e ss en ciais,
tais coisas lhes inspira vam. e não porqu e
esse ·respe ito
fosse determinado pelo mito. Essa explicação,
como tan­ 1 1 1 11bém ele consiste num suporte ve1tical, formado por
1 1 1 1 1 ha sLà o com cerca ele meio metro de a l tura , ou por
tas ex plicações míticas, só resolve a questã
o pela questão
mesma, repelida em termos ligeira mente diferen
tes, pois 1 1111;1 lança com vá rios metros de comprimento, e cortado
dizer que o churinga é sagrado e dizer que ele
contém es- 1 11.1 por uma, ora por duas peças transversais132. No pri-
AS FORMAS HLEMENTllRES Dll
Ili \'ÇAS ELI
DIENT'ARES
1 16 11DA Rlil/Gl<J.\.� 117
I\

valor que st · 1 PII 1quda relação com um c;er sagrado. é enunciar de


de que os churinga são objeto mostra o alto
atribui a eles. Só são manip ulados com um respeit
o que a l o 1.1-, maneiras o mesmo fato, não é explicá-lo. Aliás, co-
solenidade dos gestos traduz122. São tratado
s com cuida­ 111i , ..., pencer e Gillen reconhecem, mesmo entre os Arunta
do, untados, friccionados, polidos e. quando
os Lranspor­ 1 1 1 .dguns churinga que são fabricados, à vista de todo o
Lam de uma localidade a outra, é em meio
a cerimônias 1111111do, pelos mais velhos do grupo126; estes. evidente­
que Lestemunham ser esse deslocamento um
ato da mais ln• 1 1tc . não provêm dos g rande s antepassados. No entan-
alta importância 1 23.
1• t, possuem, com diferenças de graus apenas, a mesma
Ora, em s i mesmos, os churinga são objeto
s de ma­ l 1 1 .1da que os demais e são conservados da mesma ma-
deira e de pedra, como tantos outros; não se
distinguem 1w11.1 Enfim, há tribos inteiras em que o churinga de mo­
h > 111.nhum é concebido como associado a um espírito1r-.
das coisas profanas do mesmo gênero a não
ser por urna
particularidade: nelt:s está gravada ou de:.enh
ada a marca ,, .. , natureza religiosa pro, ém, portanto. de outra fonte, e
11 ,nc.fe poderia pronr :.cnào <la marca totêmica que � r
totêmica. Portanto, é essa marca, e somem
e da, que U1t.:.s
confere o caráter sagrado . É verdade que. segund
o Spen­ n )'-1' Assim. é a essa imagem que se d i rigen�, em real �cla-

lt
cer e Gillen. o churinga serviria de residência
a uma alma 1s demonstrações do rito; ela é que santifica o ob1eto
de antepassado, e seria a presidência dessa
alma que lhe 1 1 • 1 qual está gravada.
l lá. n o entanto, entre os Arunta e nas tnbos v1zmhas.
confer iria suas propriedades 1 2·1. Strehlo w, . . .
por seu lado.
embora declarando inexat a essa interpretação
, propõe d111.., outros instrumentos litúrgicos claramente relaciona­
º' ,., ao totem e ao próprio churinga que entra orclinaria-
uma outra que não difere sensivelmente da
c huringa seria con si derado uma inlagem do
precedente: o
corpo do an­ 1111 nte em sua composição: o n11rlll 11ja e o waninga.
tepassado ou esse próprio corpo125. Portanto,
seriam mais o nununja I 28, ve rifica do entre os Arunta do 01te e
uma vez os sentimentos inspirados pelo antepa
ssado que , 1 · 1i... vizinhos imediatos129, é feito essencialmente de u m
se relacionariam ao objew material e fariam
dele uma es­ 1 q 1orte vertical que consiste ou numa lança, ou em várias
l 1 1 1l.1s reunidas em feixe, ou ainda numa simples varat:so.
pécie de fetiche. Mas, em primeiro lugar , tanto
uma con­
1 1 t lns de e1vas são presos em volta por mei o de pequenas
cepção quanto a outra - que, aliás, quase não
diferem do
miLo .ª não ser na letra - foram manifestamen
te forjadas 1 1 1 1 s . feitas de cabelos. Por ci ma destes é acres c enta da
1 1 1 11.1 pen ugem, disposta em círculos ou em linhas pa ra le­
depois, para tornar inleligíyel o caráter sagrad
o aLribuído
l . 1 , . de cima a baixo do suporte. O topo é decora do com
aos churin ga. Na constituição dessas peças
de madeira e
1 11 t 1 1 11 as de águia-falcão. Essa é a p enas a forma m ai s geral
desses pedaços de pedra, em seu aspecto exterio
r, não há
nada que os predestine a ser considerados
a residência de , 111:1is típica: ela comporta todo tipo de variações confor-

1 1 1 1· os casos particulares 1 3 I .
uma alma de antepa ssado ou a image m de
Portan to, se us home ns imagin aram esse mito,
seu corpo .
fo i para o waninga , que se verifica apenas entre os ArunLa do
1 i l , os Urabunna e os Lo ritja , tampouco apresenta um
poderem explica r a eles mesmos o respeito
religioso que
1 1 11 1 l k l o único. Redu z ido a seus elementos e ss en ciais,
tais coisas lhes inspira vam. e não porqu e
esse ·respe ito
fosse determinado pelo mito. Essa explicação,
como tan­ 1 1 1 11bém ele consiste num suporte ve1tical, formado por
1 1 1 1 1 ha sLà o com cerca ele meio metro de a l tura , ou por
tas ex plicações míticas, só resolve a questã
o pela questão
mesma, repelida em termos ligeira mente diferen
tes, pois 1 1111;1 lança com vá rios metros de comprimento, e cortado
dizer que o churinga é sagrado e dizer que ele
contém es- 1 11.1 por uma, ora por duas peças transversais132. No pri-
1 18 REUGJ0,\.-1 1 19
W·\ç,:<iS ELEMENTARES
AS FORMAS ELEiWEJV!ARES DA VID
A
1

meiro caso, tem o aspect o de uma cru z. Cordõ


es feitos 1 1 1 1 n de reunião ao grupo. Não se pode deixar ele ficar
ou de
com cabelo s human os ou com pêlos de gambá
banclicoot atravessam em diagonal o espaço
1 1 1 1 u t·ssionaclo com as analogias que o nurtunja apresenta
compreendi 11 1 1 " mastro sagrado dos Omaha 138 .
< >ra, esse caráter sagrado só lhe pode provir ele um a
do entre os braços da cruz e as extremidades do
eixo cen
traJ; eles são apertados uns contra os outros e constit
uem. 1 1 1•, 1 é que ele representa materialmente o totem. Com
assim, uma rede que tem a forma de um losango
. Q uando 1 , 1 1 1 1 , as linhas verticais ou os anéis de penugem que o
uma it
há duas barras transversais, esses cordões vão de
outra, e daí ao topo e à base cio suporte. Às vezes , , 1 1 l 1rem ou então os cordões multicolorid os que reú-
são co­ 111 11s b ·aços do waninga ao eixo central, não são di�-
;
1 ,,, , , , 1s arbitrariamente pelos operadores, mas elevem obn-
1
bertos por uma camad a bastan te espess
a de penugem

1 1 1 11 i . 1 m ente ostentar uma forma bem determinada pela


que os dissimula aos olhares. O w an inga tem, assi
m , o as

, ,, 1 1, ,10 e que, no pensamento e.los indígenas, representa


pecto ele um verdadeiro estandartel33.
Ora, o nurtunja e o wan inga , que tomam parte
numa ,,, 1 nt.l'l. Aqui, já nao há por que indagar, como no caso
série de ritos importantes, são objeto de um respeit
o reli­ 11 1 , liu ringa, se a veneração a esse instrumento cultual
gioso muito semelhante ao inspirado pelos cl1t1rin
ga. Pro 1 , , , ,1 ·ria senão um reflexo daquela que os antepassado
s
1 p l i .1111, pois uma regra estabelece que cac1a n:1rtunja ou
cede-se à sua confecção e à sua ereção com a maior
sole­
nidade . Fixos no chão ou carregados por um . ,
oficiante, , l 1 waninga dure apenas o tempo ela cenn:iorn.a em que
1 1 1 d i z t d o. Sempre
;
eles marcam o ponto central ela cerimônia: é em
torno de­ o confecc1onam ele
te a
que necessário,
les que as danças e os ritos se desenvolvem. Duran
, , , 1, por completo, e, uma vez executado o rito, clespo-
ja que foi
iniciação, levam o noviço ao pé de um nurtun
1 1 1 1 1 111 1 de seus ornamentos e dispersam os. eleme1tos ele
i " ' 1 leito14o. Portanto, ele não é outra coisa senao uma
erigido para a ocasião e lhe dizem: "Aí está o nurtun �
ja ele
1 11 1 1 �l' l l l - e uma imagem temporária - do totem; conse-
teu pai; ele já serviu para fazer muito s jovens
. " Depois
disso, o iniciado eleve beijar o nurtunjaU4. Por esse
beijo, 1 1 1 1 1 1 1 ·mcnte, é sob esse aspecto, e sob esse aspecto ape-
1 p 1c desempenha um papel religioso.
ele entra em contato com o princípio religioso que
se su­ 11 1
põe residir aí; trata-se ele uma verclacleira comun
hão que Assim, o churinga, o nurtunja e o waninga elevem
11 1 1 1 1a.:nte sua natureza religiosa ao fato de portarem o
eleve dar ao jovem a força necessária para suport
ar a terrí­
vel operação ela subincisão13s. Aliás, o nurtunja
desempe­ 1 1 1 l il1·111a totémico. É esse emblema que é sagrado, con-
nha um papel considerável na mitologia dessas
socieda­ 1 1 1 1do esse caráter em qualquer objeto em que é reprc-
des . Os mitos contam que, nos tempo s fabulo
sos dos 1 1 1 11I<1. Pintam-no às vezes nas rochas. Ora, essas pintu-
10 l'ilamadas churinga ilkinia, desenhos sagrados .
grandes antepassados, o território da tribo era atrave 141
ssado
1 1 1 lc 11 nos com que se enfeitam oficiantes
1 ,
em todos os sentid os por bandos compostos exclus
iva­ e assistentes
mente ele indivi duos de um mesmo totemu 6.
Cada um 1 1 1 1 , 1 i 1 n ônias religiosas levam o mesmo nome, e é proi-
1 1 1� nianças e às mulheres vê-los142. Ocorre, às vezes,
desses bandos trazia consigo um nurtunja. Quand
o se de­
1 ! 1 1 1 1 1 1 (' certos ritos, ser o totem desenhado no chao.
tinham para acampar, as pessoas, antes ele se dispers _
arem
1 1 1 r tl ll ' 1 1 t aí, a técnica da operação mostra os sen;ime mo_s
para caçar, fixavam no solo seu nurtunja, no topo
cio qual

I ' ' , "'L' desenho insrira e o alto valor que lhe e. atnbm-
eram suspensos os churingam. Vale dizer que .
lhe confia­
vam tudo o que tinham ele mais precioso. Ao mesmo
tem­ 1 , , 1 1 1 1 efeito, sendo traçado num terreno previamente
po, ele era uma espécie de estandarte que servia
como 1 1 .. 1 gldo com sangue humano143, e veremos adiante que
1 18 REUGJ0,\.-1 1 19
W·\ç,:<iS ELEMENTARES
AS FORMAS ELEiWEJV!ARES DA VID
A
1

meiro caso, tem o aspect o de uma cru z. Cordõ


es feitos 1 1 1 1 n de reunião ao grupo. Não se pode deixar ele ficar
ou de
com cabelo s human os ou com pêlos de gambá
banclicoot atravessam em diagonal o espaço
1 1 1 1 u t·ssionaclo com as analogias que o nurtunja apresenta
compreendi 11 1 1 " mastro sagrado dos Omaha 138 .
< >ra, esse caráter sagrado só lhe pode provir ele um a
do entre os braços da cruz e as extremidades do
eixo cen
traJ; eles são apertados uns contra os outros e constit
uem. 1 1 1•, 1 é que ele representa materialmente o totem. Com
assim, uma rede que tem a forma de um losango
. Q uando 1 , 1 1 1 1 , as linhas verticais ou os anéis de penugem que o
uma it
há duas barras transversais, esses cordões vão de
outra, e daí ao topo e à base cio suporte. Às vezes , , 1 1 l 1rem ou então os cordões multicolorid os que reú-
são co­ 111 11s b ·aços do waninga ao eixo central, não são di�-
;
1 ,,, , , , 1s arbitrariamente pelos operadores, mas elevem obn-
1
bertos por uma camad a bastan te espess
a de penugem

1 1 1 11 i . 1 m ente ostentar uma forma bem determinada pela


que os dissimula aos olhares. O w an inga tem, assi
m , o as

, ,, 1 1, ,10 e que, no pensamento e.los indígenas, representa


pecto ele um verdadeiro estandartel33.
Ora, o nurtunja e o wan inga , que tomam parte
numa ,,, 1 nt.l'l. Aqui, já nao há por que indagar, como no caso
série de ritos importantes, são objeto de um respeit
o reli­ 11 1 , liu ringa, se a veneração a esse instrumento cultual
gioso muito semelhante ao inspirado pelos cl1t1rin
ga. Pro 1 , , , ,1 ·ria senão um reflexo daquela que os antepassado
s
1 p l i .1111, pois uma regra estabelece que cac1a n:1rtunja ou
cede-se à sua confecção e à sua ereção com a maior
sole­
nidade . Fixos no chão ou carregados por um . ,
oficiante, , l 1 waninga dure apenas o tempo ela cenn:iorn.a em que
1 1 1 d i z t d o. Sempre
;
eles marcam o ponto central ela cerimônia: é em
torno de­ o confecc1onam ele
te a
que necessário,
les que as danças e os ritos se desenvolvem. Duran
, , , 1, por completo, e, uma vez executado o rito, clespo-
ja que foi
iniciação, levam o noviço ao pé de um nurtun
1 1 1 1 1 111 1 de seus ornamentos e dispersam os. eleme1tos ele
i " ' 1 leito14o. Portanto, ele não é outra coisa senao uma
erigido para a ocasião e lhe dizem: "Aí está o nurtun �
ja ele
1 11 1 1 �l' l l l - e uma imagem temporária - do totem; conse-
teu pai; ele já serviu para fazer muito s jovens
. " Depois
disso, o iniciado eleve beijar o nurtunjaU4. Por esse
beijo, 1 1 1 1 1 1 1 ·mcnte, é sob esse aspecto, e sob esse aspecto ape-
1 p 1c desempenha um papel religioso.
ele entra em contato com o princípio religioso que
se su­ 11 1
põe residir aí; trata-se ele uma verclacleira comun
hão que Assim, o churinga, o nurtunja e o waninga elevem
11 1 1 1 1a.:nte sua natureza religiosa ao fato de portarem o
eleve dar ao jovem a força necessária para suport
ar a terrí­
vel operação ela subincisão13s. Aliás, o nurtunja
desempe­ 1 1 1 l il1·111a totémico. É esse emblema que é sagrado, con-
nha um papel considerável na mitologia dessas
socieda­ 1 1 1 1do esse caráter em qualquer objeto em que é reprc-
des . Os mitos contam que, nos tempo s fabulo
sos dos 1 1 1 11I<1. Pintam-no às vezes nas rochas. Ora, essas pintu-
10 l'ilamadas churinga ilkinia, desenhos sagrados .
grandes antepassados, o território da tribo era atrave 141
ssado
1 1 1 lc 11 nos com que se enfeitam oficiantes
1 ,
em todos os sentid os por bandos compostos exclus
iva­ e assistentes
mente ele indivi duos de um mesmo totemu 6.
Cada um 1 1 1 1 , 1 i 1 n ônias religiosas levam o mesmo nome, e é proi-
1 1 1� nianças e às mulheres vê-los142. Ocorre, às vezes,
desses bandos trazia consigo um nurtunja. Quand
o se de­
1 ! 1 1 1 1 1 1 (' certos ritos, ser o totem desenhado no chao.
tinham para acampar, as pessoas, antes ele se dispers _
arem
1 1 1 r tl ll ' 1 1 t aí, a técnica da operação mostra os sen;ime mo_s
para caçar, fixavam no solo seu nurtunja, no topo
cio qual

I ' ' , "'L' desenho insrira e o alto valor que lhe e. atnbm-
eram suspensos os churingam. Vale dizer que .
lhe confia­
vam tudo o que tinham ele mais precioso. Ao mesmo
tem­ 1 , , 1 1 1 1 efeito, sendo traçado num terreno previamente
po, ele era uma espécie de estandarte que servia
como 1 1 .. 1 gldo com sangue humano143, e veremos adiante que
AS PONAIAS l:'LEMENTARES DA VIDA REUC
IOSA
1 20
121
o sangue. por <; i me<;mo. já é
um líquido o:;agrado que ser­
ve apenas a ofícios devotos. 111l'm ou d1.: u m animal por l i nhas pontilhadas, ctc. A si g­
Depois que a imagem foi tra­
çada, os fiéis permanecem sent rnficaçào das figuras obtidas por tais procedimentos é tao
ados no chão dian re dela
na atitu de da mais pura devo .1rbitrária que um desenho idêntico pode ter dois sentidos
d a r à pala vra um sent ido apro
ção1 11. Com a cond ição de
diferentes para os membros de dois totens e representl.l r
aqui um animal, ali um outro ou uma piam<. Isso
priad o à men talid ade do
pr.imitivo, pode-se dizer que é ta lve z
eles a adoram. Eis o que per­
mite com pree nder de q u e ,linda mais evidente no caso dos nununja ( cios waninga.
man eira o bras ão totê mico
pe 1:man cc� u , para os índios Cada um deles representa um totem diferer .te . Mas os ele-
ela Amé rica do Norte, algo
muit o precioso. sendo sempre 1rn.:ntos pouco numerosos e muito simples que entram em
cercado de uma espécie ele
auréola religiosa. sua composição n ão poderiam prod uzir combinações
bastante variadas. Disso resulta que dois nurtunja possam

:\las para compn.:endt.r por tcr exatameme o mesmo aspecto, mas exprimir duas coi­
que as repre�ent<tçoe.'> to­
têmi cas são assim sagradas, "ª" tão diferentes quanto um eucalipto e uma ema 1 19 o
é interessante saber em que
consistem. momento em que confeccionam o nurtunja, dão-lhe um
. sentido que ele conserva d u rante toda a cerimônia, mas
Entre os índio s da Amé rica
do None, são imag ens
que. em suma. é fixa do por convenção.
Esses fatos provam que, se o australiano é fortemen­
P mradas g� vadas ou esculpida
z1r, o mai s fielmente possível,
.
• .
s que procuram reprodu
o aspecto exterior do ani­
mal totêmico. Os procedimento te inclinado a representar seu totem, não é para ter dian­
s emp regados são aqueles
de que nos servimos ainda hoje te dos olhos u m retrato que renove perpetuamente sua
em casos simil ares, exce­
sensação, mas simp lesmente porque sente a necessidade
ele representar-se a idéia que faz dele ror meio c.le u m
to por sere m, em gera l , mais
gros seiro s. Mas o mesmo
não acontece na Aust rália , e
é natu ralmente nas socieda­
des austr alian as que devemos signo material, exterior, não importa qual seja, aliás. es­
busc ar a origem dessas fi­
�e signo. Não podemos ainda compreender o que moveu
�u '.·açõcs. Emb ora o aust ralia no seja bast
ante c::tpa z de o primitivo a <::s crever em sua pessoa e em d i ferentes ob­
tn1ttar, ao menos de uma man
eira rudimentar, as formas
das coisas115. as omamenta(õe jetos a noção que Linha de seu totem, r:ias era importam�
s sagradas parecem, na maio­
ria dos casos, al heias ::t qual qu constatar desde já a natureza da necessidade que deu on­
e r preocupação dess
e gêne­ gem a essas múltiplas figuraçôes1�º .
ro: cons istem esse ncial
mente em desenhos geométric
os
executados nos churinga ou
no corpo dos homens. São li­
nhas , retas ou curvas, p inta das
. . ele maneiras cllferentesH6
..
CU J O con1umo so ...
tem e so pode ter um sentido
'

convencio-
nal A . relação �ntre a figura
e a coisa figurada é a tal pon­
te:_ indireta e cl 1stan1e que não se pode percebê-
:
la quan do
nao se tem ciên cia dela. Só os
membros do clã pod em di­
zer q u a l o sent ido por eles
atrib uído a esta ou àque la
combinação de linha s 1 17. Gera
lmente, homens e mulheres
são representados por semicírcu
los, os anim ais por círcu­
1ª; as pegadas de um ho-
los completos ou por espi rais!
AS PONAIAS l:'LEMENTARES DA VIDA REUC
IOSA
1 20
121
o sangue. por <; i me<;mo. já é
um líquido o:;agrado que ser­
ve apenas a ofícios devotos. 111l'm ou d1.: u m animal por l i nhas pontilhadas, ctc. A si g­
Depois que a imagem foi tra­
çada, os fiéis permanecem sent rnficaçào das figuras obtidas por tais procedimentos é tao
ados no chão dian re dela
na atitu de da mais pura devo .1rbitrária que um desenho idêntico pode ter dois sentidos
d a r à pala vra um sent ido apro
ção1 11. Com a cond ição de
diferentes para os membros de dois totens e representl.l r
aqui um animal, ali um outro ou uma piam<. Isso
priad o à men talid ade do
pr.imitivo, pode-se dizer que é ta lve z
eles a adoram. Eis o que per­
mite com pree nder de q u e ,linda mais evidente no caso dos nununja ( cios waninga.
man eira o bras ão totê mico
pe 1:man cc� u , para os índios Cada um deles representa um totem diferer .te . Mas os ele-
ela Amé rica do Norte, algo
muit o precioso. sendo sempre 1rn.:ntos pouco numerosos e muito simples que entram em
cercado de uma espécie ele
auréola religiosa. sua composição n ão poderiam prod uzir combinações
bastante variadas. Disso resulta que dois nurtunja possam

:\las para compn.:endt.r por tcr exatameme o mesmo aspecto, mas exprimir duas coi­
que as repre�ent<tçoe.'> to­
têmi cas são assim sagradas, "ª" tão diferentes quanto um eucalipto e uma ema 1 19 o
é interessante saber em que
consistem. momento em que confeccionam o nurtunja, dão-lhe um
. sentido que ele conserva d u rante toda a cerimônia, mas
Entre os índio s da Amé rica
do None, são imag ens
que. em suma. é fixa do por convenção.
Esses fatos provam que, se o australiano é fortemen­
P mradas g� vadas ou esculpida
z1r, o mai s fielmente possível,
.
• .
s que procuram reprodu
o aspecto exterior do ani­
mal totêmico. Os procedimento te inclinado a representar seu totem, não é para ter dian­
s emp regados são aqueles
de que nos servimos ainda hoje te dos olhos u m retrato que renove perpetuamente sua
em casos simil ares, exce­
sensação, mas simp lesmente porque sente a necessidade
ele representar-se a idéia que faz dele ror meio c.le u m
to por sere m, em gera l , mais
gros seiro s. Mas o mesmo
não acontece na Aust rália , e
é natu ralmente nas socieda­
des austr alian as que devemos signo material, exterior, não importa qual seja, aliás. es­
busc ar a origem dessas fi­
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ante c::tpa z de o primitivo a <::s crever em sua pessoa e em d i ferentes ob­
tn1ttar, ao menos de uma man
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das coisas115. as omamenta(õe jetos a noção que Linha de seu totem, r:ias era importam�
s sagradas parecem, na maio­
ria dos casos, al heias ::t qual qu constatar desde já a natureza da necessidade que deu on­
e r preocupação dess
e gêne­ gem a essas múltiplas figuraçôes1�º .
ro: cons istem esse ncial
mente em desenhos geométric
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executados nos churinga ou
no corpo dos homens. São li­
nhas , retas ou curvas, p inta das
. . ele maneiras cllferentesH6
..
CU J O con1umo so ...
tem e so pode ter um sentido
'

convencio-
nal A . relação �ntre a figura
e a coisa figurada é a tal pon­
te:_ indireta e cl 1stan1e que não se pode percebê-
:
la quan do
nao se tem ciên cia dela. Só os
membros do clã pod em di­
zer q u a l o sent ido por eles
atrib uído a esta ou àque la
combinação de linha s 1 17. Gera
lmente, homens e mulheres
são representados por semicírcu
los, os anim ais por círcu­
1ª; as pegadas de um ho-
los completos ou por espi rais!
< '\P ÍTUIO II
l\S CRENÇAS PROPRIAMENTE
TOTÊMICAS
1 Continuação)

II - O animal totêmico e o homem

Mas as imagens totêmicas não são as únicas coisas


sagraJas. Existem seres reais que também são objeto de
ritos em virtude das relações que mantêm com o totem:
são eles, antes de quaisquer outros, os seres da espécie
totêmica e os membros do clã.

Em primeiro lugar, como os desenhos que represen­


tam o totem despertam sentimentos religiosos, é natural
que as coisas cujo aspecto esses desenhos reproduzem te­
nham, em alguma mediJa, a mesma propriedade.
Trata-se, na maioria dos casos, ele animais e ele plan­
tas. O papel profano cios vegetais e mesmo dos animais é,
geralmente, servir ele alimento; assim, o caráter sagrado
do animal ou ela planta se reconhece pelo fato ele ser
proibido comê-los. Claro que, sendo coisas sagradas, po­
dem entrar na composição de certas refeições místicas -
< '\P ÍTUIO II
l\S CRENÇAS PROPRIAMENTE
TOTÊMICAS
1 Continuação)

II - O animal totêmico e o homem

Mas as imagens totêmicas não são as únicas coisas


sagraJas. Existem seres reais que também são objeto de
ritos em virtude das relações que mantêm com o totem:
são eles, antes de quaisquer outros, os seres da espécie
totêmica e os membros do clã.

Em primeiro lugar, como os desenhos que represen­


tam o totem despertam sentimentos religiosos, é natural
que as coisas cujo aspecto esses desenhos reproduzem te­
nham, em alguma mediJa, a mesma propriedade.
Trata-se, na maioria dos casos, ele animais e ele plan­
tas. O papel profano cios vegetais e mesmo dos animais é,
geralmente, servir ele alimento; assim, o caráter sagrado
do animal ou ela planta se reconhece pelo fato ele ser
proibido comê-los. Claro que, sendo coisas sagradas, po­
dem entrar na composição de certas refeições místicas -
1 •1 1 1 1 > n
s < .RENÇAS PROPRIAMENTE
1 ( > 1 ÊMICAS
" IJ////llltaÇàO)

li O animal totêmico e o homem

'vias as imagens totêmicas não são as únicas coisas


.. 1�nadas. Existem seres reais que também são objeco de
1 1111s cm virtude das relações que mantêm com o totem:
,ln eles, ames de qu aisqu er outros, os seres da espécie
to11.mica e os membros do clã.

Em primeiro lugar, como os desenhos que represen-


1;1111 o Lotem despertam sent i me ntos rel igi osos é nat ural
que as coisas cujo aspecto esses desenhos reprodu zem te-
,

1 1ham, em alguma medida a mesma propriedade.


Trata-se, na maioria dos casos. de animais e de plan­
,

t.1s. O papel profano dos vegetais e mesmo dos animais é,


�c ra l mente, servir de alimenro; assim, o caráter sagrado
do animal ou da planta se reconhece pelo fato de ser
proibido comê-los. Claro que, sendo coisas sagradas. po­
dem entrar na composição de certas refeições místicas -
1 •1 1 1 1 > n
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1 ( > 1 ÊMICAS
" IJ////llltaÇàO)

li O animal totêmico e o homem

'vias as imagens totêmicas não são as únicas coisas


.. 1�nadas. Existem seres reais que também são objeco de
1 1111s cm virtude das relações que mantêm com o totem:
,ln eles, ames de qu aisqu er outros, os seres da espécie
to11.mica e os membros do clã.

Em primeiro lugar, como os desenhos que represen-


1;1111 o Lotem despertam sent i me ntos rel igi osos é nat ural
que as coisas cujo aspecto esses desenhos reprodu zem te-
,

1 1ham, em alguma medida a mesma propriedade.


Trata-se, na maioria dos casos. de animais e de plan­
,

t.1s. O papel profano dos vegetais e mesmo dos animais é,


�c ra l mente, servir de alimenro; assim, o caráter sagrado
do animal ou da planta se reconhece pelo fato de ser
proibido comê-los. Claro que, sendo coisas sagradas. po­
dem entrar na composição de certas refeições místicas -
A.\ FOR.lfAS ELE.\fE.\T.·LRES DA HDA RFJJGIOSA l\ r RE.\'ÇAS ELF.ME.\TARfü 125

veremos. de faro, que servem às vezes de verdadeira eu· ;t impocm seriam rdati\arnentc rL:cenccs. Eles julgam en-
carbtia, mas, normalmente, não podem ser utilizados para 1 1 1111rar a prova de sua tese nos dois seguintes fatos. Pri-
o consumo vulgar. Quem desrespeitar essa proibição se 111c: 1ro. como acabamos de dizer, há ocasiões solenes cm
expõe aos mais graves perigos. Não que o grupo interve­ l (lll os membros do clã ou seu chefe não apenas podem
nha sempre para reprimir arrificialmente a infração cometi­ 1 .. 1110 devem comer do animal ou da planta totêmicos.
da, mas acredita-se que o sacrilégio acarrete automatica­ \km disso, os mitos contam que os grandes antepassa­
mente a morte. Supõe-se resida na planta ou no animal Lo­ d11s. fundadores dos clãs, comiam regularmente de seu to-
têmico um princípio temível que não pode peneLrar num 11 1 1 1 ; ora, dizem eles, essas narrativas só podem ser com-
organismo profano sem desorganizá-lo ou destruí-10 1 . 1 •11·l·ndidas como o eco de um tempo em que as proibições
Apena:-. os velhos, pelo menos em cerras tribos. sáo libera­
do:-. c.l�sa mLerdiçào!; Yeremos mais adiante a rnzao disso.
11u.1is não teriam existido .
l\las o fato de que, durante cercas solenidades religio-
Entretanto, se a proibição é formal num granc.le nu­ 1 um consumo - alias moderado - do totem seia ritual-
mero de Lribos3 - com exceções que serão indicadas mais 1111•;\lc obrigatório, de modo nenhum implica que ele al-
tarde -. é incontestável que ela tende a atenuar-se à medi­ 1 1 1 1 1;1 yez serviu para a ali mentação vulgar. Muito pelo
da que a velha organização totêmica é abalada. Mas as 1 e • 1 t 1 1.1 ri o, o alimento que se come nessas refeições mísli­
restrições cnLào mantidas demonstram que essas atenua­ ' 1>1 l essencialmente sagrado e, conseqi.ientemente, proi­
ções não foram aceitas sem d i ficuldade. Por exemplo, l •11 l c , .1os profanos. Quanto aos mitos, é proceder segundo
mesmo onde se permitiu comer ela pla nta ou cio animal 1 1 1 1 1 método crítico um tanto sumário atribuir-lhes tão fa-
que se1ve de totem, isso não se faz em compleLa liberda­ 1 l c >1l'nte um valor de documentos históricos. Em gera l ,
de: só se pode consumir uma pequena quantidade de ca­ h s 1l"·m por objeto interpretar ritos existentes e não co-
d a \'CZ. Lltrapassar a medida constitui uma falta ritual 1 1 11 111mar eventos passados; são muito mais uma explica-
com graves conseqi.iências•. Além disso. a proibição per 1 1 c.11 presente do que uma história. :-:o caso, essas tradi-
manece intacta para as parres consideradas mais precio­
sas. isto é, mais sagradas. por exemplo. os O\'OS ou a gor·
• 11 o; wgunc.lo as quais os antepassados da época fabulosa

I• 1 1 1 1 1 1 ...e alimentado de seu totem estão em perfeito acor-


dura\ E esse consumo cambém só é tolerado sem reser 1 , u111 crenças e ritos sempre em vigor. Os velhos, as
1 1 r 1 111;tlidades que chegaram a uma alta dignidade reli-
vas no caso de um animal que ainda não chegou à plena
maluridade". Sem dúvida, considera-se, nesse caso, qm· h 1 1 "ªº liberados das proibições que pesam sobre o
sua natureza sagrada ainda não esLá completa. PorLanto, a 1 11 11 1 11 1 1 1 comumR: podem comer das coisas santas porque
barreira que isola e protege o ser totêmico cede apenas li pmprios são santos. Aliás, essa é uma regra que não
lentamente e não sem fortes resistências, que testemu·
1 , 1 1 1 1 .. ular apenas ao totemismo, mas que se encontra
nham o que ela devia ser primitivamente. r • lit11ocs mais diversas. Ora, os heróis ancestrais eram

1 1
H 1
É verdade que. -;egundo Spencer e Gillen. essas res ll u.-.es. Portanto, devia parecer ainda mais natural
trições não seriam os restos de uma proibição rigorosa p 11 111 1dl•s:-.em se nutrir do alimento sagrado9, mas essa
que iria se atenuando. mas, ao contrário, o prelúdio de 11 l 1 11111:1 r.izão para que a mesma faculdade tenha sido
uma interdicão que estaria começando a se estabelecer 111 d1d:1 .1os simples profanos'º·
De acordo com esses autores- . a liberdade de consumo 1 11l ll'tanto. não é cerro nem mesmo provável que a
teria sido completa na origem, e as limitações que agora 1 1 llu 111 tenha alguma vez sido absoluta. Ela parece ter
A.\ FOR.lfAS ELE.\fE.\T.·LRES DA HDA RFJJGIOSA l\ r RE.\'ÇAS ELF.ME.\TARfü 125

veremos. de faro, que servem às vezes de verdadeira eu· ;t impocm seriam rdati\arnentc rL:cenccs. Eles julgam en-
carbtia, mas, normalmente, não podem ser utilizados para 1 1 1111rar a prova de sua tese nos dois seguintes fatos. Pri-
o consumo vulgar. Quem desrespeitar essa proibição se 111c: 1ro. como acabamos de dizer, há ocasiões solenes cm
expõe aos mais graves perigos. Não que o grupo interve­ l (lll os membros do clã ou seu chefe não apenas podem
nha sempre para reprimir arrificialmente a infração cometi­ 1 .. 1110 devem comer do animal ou da planta totêmicos.
da, mas acredita-se que o sacrilégio acarrete automatica­ \km disso, os mitos contam que os grandes antepassa­
mente a morte. Supõe-se resida na planta ou no animal Lo­ d11s. fundadores dos clãs, comiam regularmente de seu to-
têmico um princípio temível que não pode peneLrar num 11 1 1 1 ; ora, dizem eles, essas narrativas só podem ser com-
organismo profano sem desorganizá-lo ou destruí-10 1 . 1 •11·l·ndidas como o eco de um tempo em que as proibições
Apena:-. os velhos, pelo menos em cerras tribos. sáo libera­
do:-. c.l�sa mLerdiçào!; Yeremos mais adiante a rnzao disso.
11u.1is não teriam existido .
l\las o fato de que, durante cercas solenidades religio-
Entretanto, se a proibição é formal num granc.le nu­ 1 um consumo - alias moderado - do totem seia ritual-
mero de Lribos3 - com exceções que serão indicadas mais 1111•;\lc obrigatório, de modo nenhum implica que ele al-
tarde -. é incontestável que ela tende a atenuar-se à medi­ 1 1 1 1 1;1 yez serviu para a ali mentação vulgar. Muito pelo
da que a velha organização totêmica é abalada. Mas as 1 e • 1 t 1 1.1 ri o, o alimento que se come nessas refeições mísli­
restrições cnLào mantidas demonstram que essas atenua­ ' 1>1 l essencialmente sagrado e, conseqi.ientemente, proi­
ções não foram aceitas sem d i ficuldade. Por exemplo, l •11 l c , .1os profanos. Quanto aos mitos, é proceder segundo
mesmo onde se permitiu comer ela pla nta ou cio animal 1 1 1 1 1 método crítico um tanto sumário atribuir-lhes tão fa-
que se1ve de totem, isso não se faz em compleLa liberda­ 1 l c >1l'nte um valor de documentos históricos. Em gera l ,
de: só se pode consumir uma pequena quantidade de ca­ h s 1l"·m por objeto interpretar ritos existentes e não co-
d a \'CZ. Lltrapassar a medida constitui uma falta ritual 1 1 11 111mar eventos passados; são muito mais uma explica-
com graves conseqi.iências•. Além disso. a proibição per 1 1 c.11 presente do que uma história. :-:o caso, essas tradi-
manece intacta para as parres consideradas mais precio­
sas. isto é, mais sagradas. por exemplo. os O\'OS ou a gor·
• 11 o; wgunc.lo as quais os antepassados da época fabulosa

I• 1 1 1 1 1 1 ...e alimentado de seu totem estão em perfeito acor-


dura\ E esse consumo cambém só é tolerado sem reser 1 , u111 crenças e ritos sempre em vigor. Os velhos, as
1 1 r 1 111;tlidades que chegaram a uma alta dignidade reli-
vas no caso de um animal que ainda não chegou à plena
maluridade". Sem dúvida, considera-se, nesse caso, qm· h 1 1 "ªº liberados das proibições que pesam sobre o
sua natureza sagrada ainda não esLá completa. PorLanto, a 1 11 11 1 11 1 1 1 comumR: podem comer das coisas santas porque
barreira que isola e protege o ser totêmico cede apenas li pmprios são santos. Aliás, essa é uma regra que não
lentamente e não sem fortes resistências, que testemu·
1 , 1 1 1 1 .. ular apenas ao totemismo, mas que se encontra
nham o que ela devia ser primitivamente. r • lit11ocs mais diversas. Ora, os heróis ancestrais eram

1 1
H 1
É verdade que. -;egundo Spencer e Gillen. essas res ll u.-.es. Portanto, devia parecer ainda mais natural
trições não seriam os restos de uma proibição rigorosa p 11 111 1dl•s:-.em se nutrir do alimento sagrado9, mas essa
que iria se atenuando. mas, ao contrário, o prelúdio de 11 l 1 11111:1 r.izão para que a mesma faculdade tenha sido
uma interdicão que estaria começando a se estabelecer 111 d1d:1 .1os simples profanos'º·
De acordo com esses autores- . a liberdade de consumo 1 11l ll'tanto. não é cerro nem mesmo provável que a
teria sido completa na origem, e as limitações que agora 1 1 llu 111 tenha alguma vez sido absoluta. Ela parece ter
126 AS FORMAS ELEA!EtVTARFS DA VJ[)A IU:'UGJOSA I \ r NENÇAS ELEME!VTARFS 127

�ido sempre suspcnsa cm caso de necessidad<.:, por exern pi ma ou o animal proibidos lhe forem apresentados por
pio, quando o indígena está faminto e não tem outra coi­ 1 1 1 1 1 membro da outra fratria1\
sa de que se alimentar1 1 . Com maior razão, isso acontece Uma outra sobre,·ivência do mesmo tipo é a que diz
quando o totem é um alimento sem o qual o homem não 11.: .peito ao totem materno. liá fortes razões para crer que,
pode passar. Assim. há um grande número de tribos em 1 1.1 origem, o totem transmitia-se em linha uterina. Portan­
que existe um totem da água: uma proibição estrita, no '' ' · ;1 filiação em linha paterna, onde foi adotada, prova­
caso. é manifestamente impossível. Contudo, mesmo nes­ \ d rnente só aconteceu depois de um longo período, du-
se caso, a faculdade concedida submete-se a condições 1 11fü.' o qual o princípio oposto fora aplicado; conseqüen­
que restringem seu uso e que mostram perfeitamente que IL' t11cnte, a criança tinha, então. o totem de sua mãe e
ela infringe um princípio reconhecido. Entre os Kaitish e limctia-se a todas as interdições a ele associados. Ora.
os Warf".imunga. um homem desse totem não pode beber t 1 11 certas tribos, cm que, não obstante, o filho herda hoje
<igua hHemente: é pro1b1do de úrá-la do poço e só podc , item paterno, :;obre\ t\'C algo das interdições que pro­
recebê-la das mãos de um terceiro que pertence obrigato­ l• ..:i.11n primitivamente o totem da mãe: não se pode co-
riamente à fratria da qual não é membro 1 2. A complexida­ 111c lo linemente ••. No entanto, no estado presente de coi-
de desse procedimento e o transtorno que causa são ain­ 1 , não há nada mais que corresponda a essa proibição.
da uma forma de reconhecer que o acesso ã coisa sagraJa À. interdição de comer acrescenta-se, com freqüência,
não é livre. A mesma regra aplica-se, em certas tribos do 1 dL' matar. ou, se o totem for uma planta. a de colher15.
Centro, toda vez que se come do totem, seja por necessi­ t.1. 1 ... também aqui há exceções e tolerâncias, em particular
dade, seja por alguma outra causa. Convém acrescentar e• , 1-;o de necessidade, quando, por exemplo, o totem é
que, quando essa fonnalidade não pode ser executada. is­ 1 1 1 1 1 .mimai nocivotó ou não há nada para comer. Inclusive
to é, quando o ind ivíduo está sozinho ou cercado apenas li 1ribos em que é proibido caçar por sua conta o animal
l i ! • > nome se leva, e não obstante é permitido matá-lo
1

de membros de sua fratria. também ele pode, se houver


urgência, dispensar qualquer intermed iário. Vê-se que a I" nmta de outremP. Mas, em geral, a maneira como o
l i • • l' realizado indica claramente algo de ilícito. Pedem-se
11

interdição é suscetível de atenuações variadas.


No entanto, ela repousa sobre idéias tão fo rtemente 11 .t ulpas, como ele uma falta; manifestam-se sentimentos
arraigadas nas consciências, que sobrevive com muita fre­ i J , 1 risteza, de repugn ância t R, e toma m-se as precauções
qüência a suas primeiras razões de ser. Vimos que, muito 111 • vssárias para que o animal sofra o mínimo possível19.
provavelmente, os diversos clãs de uma frau·ia são apenas Além das interdições fündamentais, citam-se casos de
subd ivisões de um clã inicial que teria se desmembrado. I " 1 1 d iição de contato entre o homem e seu totem. Assim,
Houve, portanto, um momento em que todos esses clãs , 1 1 1 1 t • os Omaha, no clã do Alce, ninguém pode tocar em
fundidos tinham o mesmo totem; por conseguinte, onde a ,,, 1 i l n 1 111a parte do corpo do animal macho; num subclã cio
lembrança dessa origem comum não se apagou compkta­ 111 l i do, não é permitido tocar na cabeça desse animaJ20. En-
mcme, cada clã continua a sentir-se solidário dos demais 11 1 , >� Bechuana, ninguém ousaria vestir-se com a pele do
e a considerar que os totens deles não lhe são alheios . . . 1 1 1 1 1 1 1; 1 1 que tem por totemi 1 . Mas esses casos são raros, e
Por essa razão, um indivíduo não pode comer com plena 1 1 t l lll'al que sejam exc<..pcionais vist<:r que, normal mente,
l i berdade dos totens relacionados aos diferentes clàs da 1 1 l 1 1 11nem deve portar consigo a imagem de seu totem ou
fratria da qual não é membro: só pode tocar neles se a tlJ , , que o lembre. A tatuagem e os costumes totêmicos
126 AS FORMAS ELEA!EtVTARFS DA VJ[)A IU:'UGJOSA I \ r NENÇAS ELEME!VTARFS 127

�ido sempre suspcnsa cm caso de necessidad<.:, por exern pi ma ou o animal proibidos lhe forem apresentados por
pio, quando o indígena está faminto e não tem outra coi­ 1 1 1 1 1 membro da outra fratria1\
sa de que se alimentar1 1 . Com maior razão, isso acontece Uma outra sobre,·ivência do mesmo tipo é a que diz
quando o totem é um alimento sem o qual o homem não 11.: .peito ao totem materno. liá fortes razões para crer que,
pode passar. Assim. há um grande número de tribos em 1 1.1 origem, o totem transmitia-se em linha uterina. Portan­
que existe um totem da água: uma proibição estrita, no '' ' · ;1 filiação em linha paterna, onde foi adotada, prova­
caso. é manifestamente impossível. Contudo, mesmo nes­ \ d rnente só aconteceu depois de um longo período, du-
se caso, a faculdade concedida submete-se a condições 1 11fü.' o qual o princípio oposto fora aplicado; conseqüen­
que restringem seu uso e que mostram perfeitamente que IL' t11cnte, a criança tinha, então. o totem de sua mãe e
ela infringe um princípio reconhecido. Entre os Kaitish e limctia-se a todas as interdições a ele associados. Ora.
os Warf".imunga. um homem desse totem não pode beber t 1 11 certas tribos, cm que, não obstante, o filho herda hoje
<igua hHemente: é pro1b1do de úrá-la do poço e só podc , item paterno, :;obre\ t\'C algo das interdições que pro­
recebê-la das mãos de um terceiro que pertence obrigato­ l• ..:i.11n primitivamente o totem da mãe: não se pode co-
riamente à fratria da qual não é membro 1 2. A complexida­ 111c lo linemente ••. No entanto, no estado presente de coi-
de desse procedimento e o transtorno que causa são ain­ 1 , não há nada mais que corresponda a essa proibição.
da uma forma de reconhecer que o acesso ã coisa sagraJa À. interdição de comer acrescenta-se, com freqüência,
não é livre. A mesma regra aplica-se, em certas tribos do 1 dL' matar. ou, se o totem for uma planta. a de colher15.
Centro, toda vez que se come do totem, seja por necessi­ t.1. 1 ... também aqui há exceções e tolerâncias, em particular
dade, seja por alguma outra causa. Convém acrescentar e• , 1-;o de necessidade, quando, por exemplo, o totem é
que, quando essa fonnalidade não pode ser executada. is­ 1 1 1 1 1 .mimai nocivotó ou não há nada para comer. Inclusive
to é, quando o ind ivíduo está sozinho ou cercado apenas li 1ribos em que é proibido caçar por sua conta o animal
l i ! • > nome se leva, e não obstante é permitido matá-lo
1

de membros de sua fratria. também ele pode, se houver


urgência, dispensar qualquer intermed iário. Vê-se que a I" nmta de outremP. Mas, em geral, a maneira como o
l i • • l' realizado indica claramente algo de ilícito. Pedem-se
11

interdição é suscetível de atenuações variadas.


No entanto, ela repousa sobre idéias tão fo rtemente 11 .t ulpas, como ele uma falta; manifestam-se sentimentos
arraigadas nas consciências, que sobrevive com muita fre­ i J , 1 risteza, de repugn ância t R, e toma m-se as precauções
qüência a suas primeiras razões de ser. Vimos que, muito 111 • vssárias para que o animal sofra o mínimo possível19.
provavelmente, os diversos clãs de uma frau·ia são apenas Além das interdições fündamentais, citam-se casos de
subd ivisões de um clã inicial que teria se desmembrado. I " 1 1 d iição de contato entre o homem e seu totem. Assim,
Houve, portanto, um momento em que todos esses clãs , 1 1 1 1 t • os Omaha, no clã do Alce, ninguém pode tocar em
fundidos tinham o mesmo totem; por conseguinte, onde a ,,, 1 i l n 1 111a parte do corpo do animal macho; num subclã cio
lembrança dessa origem comum não se apagou compkta­ 111 l i do, não é permitido tocar na cabeça desse animaJ20. En-
mcme, cada clã continua a sentir-se solidário dos demais 11 1 , >� Bechuana, ninguém ousaria vestir-se com a pele do
e a considerar que os totens deles não lhe são alheios . . . 1 1 1 1 1 1 1; 1 1 que tem por totemi 1 . Mas esses casos são raros, e
Por essa razão, um indivíduo não pode comer com plena 1 1 t l lll'al que sejam exc<..pcionais vist<:r que, normal mente,
l i berdade dos totens relacionados aos diferentes clàs da 1 1 l 1 1 11nem deve portar consigo a imagem de seu totem ou
fratria da qual não é membro: só pode tocar neles se a tlJ , , que o lembre. A tatuagem e os costumes totêmicos
129
128 AS FORMAS ELEMEJ\TARES DA 1IDA RELl<.tt � I \� 1\ U.E.\fFXlilRES

Cur pi tnLJ
do
seriam impraticá\'cis se todo contato fosse proibido. 1 ou o anim al sagrado que o jovem inicia
nicar quan do e 1mrod uzic.lo no círculo da
pre norar, alias, que essa proibição não se obsen·a na , 1 1 .1 se comu
mais
Austrália, mas somente em sociedades em que o totc.· 1111 1 1 1 ligiosa; vimo s, ao contrário, que o momento
1 1 111• da iniciação é quand o o noviço penet ra no santu á­
mo já se afastou bastante de sua forma original; é prm:\
\ el, ponanto. que ela seja de origem tardia e devida 1.11 do, l huring a. t com eles, é com o nurtun ja que o jo-
do totem, portanto,
\'CZ à influência de idéias que nada têm de propriamcnl 1 1 1 �· t omun ica. As representações
s aúva que o própr io cotem.
totêmicas:u. 1 1 1 1 1 1 1 1 eficác ia mai

Se aproxima nnos agora essas di\·ersas interdiçõe.., d.111


relac1onadas a o emblema totêmico. \'Cremos. contraria
mente ao que se podia prever. que estas últimas sào mar li
numero::ias. mais estritas, mais severamente imperati\'a�
que as primeiras. As figur.t!:. de todo upo que rcpresemam
d o homem no
( 11111pre-nos ;1gora detcnmnar o lugar
o cocem são cercadas de um respeico sensivelmente supt• 1 h 111.1 das coisas religio sas.
nco de hábitos
'iomos incl inados. por rodo um conju
l 1 1 1 l mlos e pela força mesm
rior ao inspirado pelo ser mesmo cuja forma é represent;1
a da lingua gem. a conceber
da. Os churinga. o nununja. o waninga jamais devem st·r
comu m. o simpl es fiel, como um ser essencial-
manipulados pelas mulheres ou pelos nào-iniciados. c1 .ic l u mwm
1111 111c profano . É bem possí\'el que
essa concepçào não
só muito excepcionalmente são autorizados a entrevê-los
e a uma distância res peitosa. Ao contrário, a planta ou o l • ' crdacleira. a rigor. para nenhu ma religiào2'; em todo
não se nplica ao corem ismo. Cada membro do clã
animal que dão nome ao clã podem ser vistos e cocados u , la
que não é senSi\·clmen-
1 t 1 1 1·st1do de um caráter sagrado
para o anima l.
por todo o mune.lo. Os churinga são conservados numa
1 1 1 l t nor ao que acaba mos de recon hecer
espécie ele templo, à entrada do qual cessam todos os rur­
1 1
1•

dessa santid ade pesso al é que o homem acredita


c.los e.la vid�1 profana; ali é o domínio das coisas sagrada.'.
1 1 "" me::.mo tempo que
u 1

Ao contrário, animais e plantas totêmicas vivem em rem­ um homem no sentido usual e.la
tôrio profano e estão misturados à vida comum. E, como l i 1\ 1 . 1 . um ani m al ou uma planta e.la espécie totêmica.
1 .1 >111 efeito, ele tem o nome desse anima
l ou planta.
o número e a importância das interdições que isolam uma
idade do nome impli ca uma
coisa sagrada e a retiram de circulação correspondem ao , , 111s1dera-se que a ident
1 1 1 1 1 idade
é consi derad a
e.la segun da: ela a su­
grau de santidade de que ela é investida, chega-se ao cu de natur eza. A prime ira não
1 1 1 1 p l l'�mente como o sinal exterior
l " " ' l ogica ment e. Pois
rio!'io res u l tado de q ue as imagens do ser totêmico sâo
o nome , para o prim itivo, não é
de sons, mas algu-
111ais sagradas cio q11e o própn·o ser /otêmico. De resto, nas
ccrimônias do culto, o churinga, o nurtunja ocupam o pri­ 1 1 .. 11.is uma palav ra , uma comb inação
1 1 1 1 , 01sa do ser, e alguma coisa essen cial. Um membro
meiro lugar; o animal só aparece muito excepcionalmen­
te. Num rito sobre o qual iremos falar1\ ele M:'f\·e tk: ma l f l 1 1.\ do Canguru cham a a si própr io de cangu ru: por-
l dessa mesma
1 nt • •, num certo .sentido. ele é um anima
l 'l'• il· " l m homem, dizem
té �ia a uma refeição religiosa, mas não desempenha papel
Spenc er e Gillen , considera
ativo. Os Arnnta dançam ao redor do nurtunja, reúnem-se
1 c · 1 que lhe .serve de <Otem como a mesm a coisa q u e
1 m indígena, com quem discutíamo
diante da imagem de seu totem e a adoram; jamais seme­
s a quest ão, res-
lhante demonstração dirige-se ao ser totêmico ele mesmo. 1 J,

1 "' 11 ll·t1 nos mostrando


uma fotog rafia que havía mos tira-
Se este fosse a coisa sagrada por excelência, é com ele, é
129
128 AS FORMAS ELEMEJ\TARES DA 1IDA RELl<.tt � I \� 1\ U.E.\fFXlilRES

Cur pi tnLJ
do
seriam impraticá\'cis se todo contato fosse proibido. 1 ou o anim al sagrado que o jovem inicia
nicar quan do e 1mrod uzic.lo no círculo da
pre norar, alias, que essa proibição não se obsen·a na , 1 1 .1 se comu
mais
Austrália, mas somente em sociedades em que o totc.· 1111 1 1 1 ligiosa; vimo s, ao contrário, que o momento
1 1 111• da iniciação é quand o o noviço penet ra no santu á­
mo já se afastou bastante de sua forma original; é prm:\
\ el, ponanto. que ela seja de origem tardia e devida 1.11 do, l huring a. t com eles, é com o nurtun ja que o jo-
do totem, portanto,
\'CZ à influência de idéias que nada têm de propriamcnl 1 1 1 �· t omun ica. As representações
s aúva que o própr io cotem.
totêmicas:u. 1 1 1 1 1 1 1 1 eficác ia mai

Se aproxima nnos agora essas di\·ersas interdiçõe.., d.111


relac1onadas a o emblema totêmico. \'Cremos. contraria
mente ao que se podia prever. que estas últimas sào mar li
numero::ias. mais estritas, mais severamente imperati\'a�
que as primeiras. As figur.t!:. de todo upo que rcpresemam
d o homem no
( 11111pre-nos ;1gora detcnmnar o lugar
o cocem são cercadas de um respeico sensivelmente supt• 1 h 111.1 das coisas religio sas.
nco de hábitos
'iomos incl inados. por rodo um conju
l 1 1 1 l mlos e pela força mesm
rior ao inspirado pelo ser mesmo cuja forma é represent;1
a da lingua gem. a conceber
da. Os churinga. o nununja. o waninga jamais devem st·r
comu m. o simpl es fiel, como um ser essencial-
manipulados pelas mulheres ou pelos nào-iniciados. c1 .ic l u mwm
1111 111c profano . É bem possí\'el que
essa concepçào não
só muito excepcionalmente são autorizados a entrevê-los
e a uma distância res peitosa. Ao contrário, a planta ou o l • ' crdacleira. a rigor. para nenhu ma religiào2'; em todo
não se nplica ao corem ismo. Cada membro do clã
animal que dão nome ao clã podem ser vistos e cocados u , la
que não é senSi\·clmen-
1 t 1 1 1·st1do de um caráter sagrado
para o anima l.
por todo o mune.lo. Os churinga são conservados numa
1 1 1 l t nor ao que acaba mos de recon hecer
espécie ele templo, à entrada do qual cessam todos os rur­
1 1
1•

dessa santid ade pesso al é que o homem acredita


c.los e.la vid�1 profana; ali é o domínio das coisas sagrada.'.
1 1 "" me::.mo tempo que
u 1

Ao contrário, animais e plantas totêmicas vivem em rem­ um homem no sentido usual e.la
tôrio profano e estão misturados à vida comum. E, como l i 1\ 1 . 1 . um ani m al ou uma planta e.la espécie totêmica.
1 .1 >111 efeito, ele tem o nome desse anima
l ou planta.
o número e a importância das interdições que isolam uma
idade do nome impli ca uma
coisa sagrada e a retiram de circulação correspondem ao , , 111s1dera-se que a ident
1 1 1 1 1 idade
é consi derad a
e.la segun da: ela a su­
grau de santidade de que ela é investida, chega-se ao cu de natur eza. A prime ira não
1 1 1 1 p l l'�mente como o sinal exterior
l " " ' l ogica ment e. Pois
rio!'io res u l tado de q ue as imagens do ser totêmico sâo
o nome , para o prim itivo, não é
de sons, mas algu-
111ais sagradas cio q11e o própn·o ser /otêmico. De resto, nas
ccrimônias do culto, o churinga, o nurtunja ocupam o pri­ 1 1 .. 11.is uma palav ra , uma comb inação
1 1 1 1 , 01sa do ser, e alguma coisa essen cial. Um membro
meiro lugar; o animal só aparece muito excepcionalmen­
te. Num rito sobre o qual iremos falar1\ ele M:'f\·e tk: ma l f l 1 1.\ do Canguru cham a a si própr io de cangu ru: por-
l dessa mesma
1 nt • •, num certo .sentido. ele é um anima
l 'l'• il· " l m homem, dizem
té �ia a uma refeição religiosa, mas não desempenha papel
Spenc er e Gillen , considera
ativo. Os Arnnta dançam ao redor do nurtunja, reúnem-se
1 c · 1 que lhe .serve de <Otem como a mesm a coisa q u e
1 m indígena, com quem discutíamo
diante da imagem de seu totem e a adoram; jamais seme­
s a quest ão, res-
lhante demonstração dirige-se ao ser totêmico ele mesmo. 1 J,

1 "' 11 ll·t1 nos mostrando


uma fotog rafia que havía mos tira-
Se este fosse a coisa sagrada por excelência, é com ele, é
130 AS FORMAS ELEMENTARES DA \'TOA RELJG/O.\A 1\ r l.'1-.\ÇrlS HJJD!ENTARES 131

do dele: · Af está exatamente a mesma coisa que eu'. Po1' l• k uma confusão tão perturbadora para o pensamen­
hem, ele diz o mesmo do cangurn!" O canguru era seu to lt 1 \lgumas vezes, um personagem legendáno, por u m
tem2s. Cada indivíduo tem portanto uma dupla natureza. 11 1 . l v seu poder, teria metamorfoseado em homem o ani-
nele coexistem dois seres, um homem e um animal. 1 1 1 11 1·pônimo do clà32. Outras vezes o mito tenta explicar
Para dar uma aparência de inteligibil idade a essa dua 111111. por uma série de eventos mais ou menos naturais e
!idade, tão estranha para nós, o primitivo concebeu mitos 1 1 1 1 1 l'spécie de evolução espontânea, o próprio animal
que, certamente, nada explicarn e não fazem senão deslo 1 r 1,1 pouco a pouco se transformado e acabado por ad-
car a dificuldade, mas que, ao deslocá-la, parecem pelo 111h 11 uma forma humana3�.
menos atenuar seu escândalo lógico. Com variações no l ' erdade que existem sociedades (Haida, TI inkit.
detalhe. todos são construídos segundo o mesmo plano· 1 lm .hian > em que nào mais se admite que o homem te-
têm por objeto estabelecer entre o homem e o animal to­ 1 1 l t 1 1nscido de um animal ou de urna planta: no entanto.
témico relaçóe:, genealógicas que façam do primeiro u111 1 11 1 Ul: uma afinidade emre os animais da espt!cie cotê-
parente do segundo. Por essa comunhão de origem. aliás 1111 1 1 os membros cio clã sobreviveu e se exprime em
representada de maneiras diferentes, acredita-se explicar que. embora diferenciando-se dos precedentes. não
Ir
Hlh 1

sua comunhão de natureza. Os Narrinyeri, por exemplo. , 1 1 1 1 de evocar o q u e eles têm de essencial. É esse.
imaginaram que, enrre os prime iros homens. alguns •i­ ·kito, um dos temas fu ndamentais. O antepassado
1111

1
nham o poder de transformar-se em animais26. Outras so­ p • 1 1 1 1 110 é aí apresentado como u m ser humano, mas
ciedades austra lianas colocam no início da humanidadl· 1 1 1 , .1 pos peripécias diversas, teria sido levado a viver
ou animais estranhos, dos quais os homens teriam des­ 1 1 1 11111· um tempo mais ou menos longo em meio a ani­
cendido não se sabe muito bem comor, ou seres mistos. ' 1 l 1hulosos da espécie que deu seu nome ao clã. Por
intermediá rios entre os dois reinos28• ou ainda criaturas 11 ,1 d1:ssa convivência íncima e prolongada. tornou-se
informe�. dificilmente representáveis, desprovidas de ór 111dhanre a seus novos companheiros que, ao volrar
gàos ou membros definidos, cujas diferentes partes cio 1 " 1 11 11110 dos homens, estes não mais o reconheceram.
corpo mal eram esboçaclas29. Potências míticas, às vezei; l •1 , 1 1 1 1 lhe, portanto, o nome cio animal ao qual se asse-
concebidas na forma de animais, teriam intervindo a se­ 111 11 .1 É de sua temporada nesse país mítico que teria
guir e transformado em homens esses seres ambíguos e 1 1 '' j, , ei emblema totêmico com os poderes e as virtudes
inomináveis que representam, dizem Spencer e Gillen, 11 1 • 1 1 11 .�:io tidos como inerentes�··. Assim, nesse caso co-
"urna fase de transição entre o estado de homem e o de 1 ' 1 1 1 .� n nteriores, su põe-se que o homem faça parte da
animal"30.Essas transformações nos são apresentadas co­ 11 111111 . .1 animal, ainda que essa participação seja conce-
mo o produto de operações violentas e quase cirúrgicas. 1 1 l 1 1 l1 uma forma ligeiramente diferente35.
É a golpes ele machado, ou, quando o operador é uma 1 11 1 1 1 . 11110, também o homem tem algo de sagrado. Oi ­
ave, por meio ele bicadas, que o indivíduo humano teria ]1< lc > organismo inteiro. esse caráter é mais particu-
sido esculpido nessa massa amorfa, seus membros sepa­ 1 1 11• 1 1 1 < ' ' i sível cm certos pomos privilegiados. IIá ór-
rados uns dos outros, sua boca abena, suas narinas perfu­ 1 , , 1c·1 1dos que são especialmente marcados por ele,
radas3J Encontramos na América lendas análogas, com a 1 m 1 1 1c l1 1 o sangue e os t .ibelos.
• 1 .. 111gue humano, em primeiro lugar, é algo tão sa-
_

diferença de que, em razão da mentalidade mais desen­


volvida desses povos, as representações utilizadas não 1 11 1 ' 1 ' "" nas tribos da Austrália central, serve muitas ve-
130 AS FORMAS ELEMENTARES DA \'TOA RELJG/O.\A 1\ r l.'1-.\ÇrlS HJJD!ENTARES 131

do dele: · Af está exatamente a mesma coisa que eu'. Po1' l• k uma confusão tão perturbadora para o pensamen­
hem, ele diz o mesmo do cangurn!" O canguru era seu to lt 1 \lgumas vezes, um personagem legendáno, por u m
tem2s. Cada indivíduo tem portanto uma dupla natureza. 11 1 . l v seu poder, teria metamorfoseado em homem o ani-
nele coexistem dois seres, um homem e um animal. 1 1 1 11 1·pônimo do clà32. Outras vezes o mito tenta explicar
Para dar uma aparência de inteligibil idade a essa dua 111111. por uma série de eventos mais ou menos naturais e
!idade, tão estranha para nós, o primitivo concebeu mitos 1 1 1 1 1 l'spécie de evolução espontânea, o próprio animal
que, certamente, nada explicarn e não fazem senão deslo 1 r 1,1 pouco a pouco se transformado e acabado por ad-
car a dificuldade, mas que, ao deslocá-la, parecem pelo 111h 11 uma forma humana3�.
menos atenuar seu escândalo lógico. Com variações no l ' erdade que existem sociedades (Haida, TI inkit.
detalhe. todos são construídos segundo o mesmo plano· 1 lm .hian > em que nào mais se admite que o homem te-
têm por objeto estabelecer entre o homem e o animal to­ 1 1 l t 1 1nscido de um animal ou de urna planta: no entanto.
témico relaçóe:, genealógicas que façam do primeiro u111 1 11 1 Ul: uma afinidade emre os animais da espt!cie cotê-
parente do segundo. Por essa comunhão de origem. aliás 1111 1 1 os membros cio clã sobreviveu e se exprime em
representada de maneiras diferentes, acredita-se explicar que. embora diferenciando-se dos precedentes. não
Ir
Hlh 1

sua comunhão de natureza. Os Narrinyeri, por exemplo. , 1 1 1 1 de evocar o q u e eles têm de essencial. É esse.
imaginaram que, enrre os prime iros homens. alguns •i­ ·kito, um dos temas fu ndamentais. O antepassado
1111

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nham o poder de transformar-se em animais26. Outras so­ p • 1 1 1 1 110 é aí apresentado como u m ser humano, mas
ciedades austra lianas colocam no início da humanidadl· 1 1 1 , .1 pos peripécias diversas, teria sido levado a viver
ou animais estranhos, dos quais os homens teriam des­ 1 1 1 11111· um tempo mais ou menos longo em meio a ani­
cendido não se sabe muito bem comor, ou seres mistos. ' 1 l 1hulosos da espécie que deu seu nome ao clã. Por
intermediá rios entre os dois reinos28• ou ainda criaturas 11 ,1 d1:ssa convivência íncima e prolongada. tornou-se
informe�. dificilmente representáveis, desprovidas de ór 111dhanre a seus novos companheiros que, ao volrar
gàos ou membros definidos, cujas diferentes partes cio 1 " 1 11 11110 dos homens, estes não mais o reconheceram.
corpo mal eram esboçaclas29. Potências míticas, às vezei; l •1 , 1 1 1 1 lhe, portanto, o nome cio animal ao qual se asse-
concebidas na forma de animais, teriam intervindo a se­ 111 11 .1 É de sua temporada nesse país mítico que teria
guir e transformado em homens esses seres ambíguos e 1 1 '' j, , e i emblema totêmico com os poderes e as virtudes
inomináveis que representam, dizem Spencer e Gillen, 11 1 • 1 1 11 .�:io tidos como inerentes�··. Assim, nesse caso co-
"urna fase de transição entre o estado de homem e o de 1 ' 1 1 1 .� n nteriores, su põe-se que o homem faça parte da
animal"30.Essas transformações nos são apresentadas co­ 11 111111 . .1 animal, ainda que essa participação seja conce-
mo o produto de operações violentas e quase cirúrgicas. 1 1 l 1 1 l1 uma forma ligeiramente diferente35.
É a golpes ele machado, ou, quando o operador é uma 1 11 1 1 1 . 11110, também o homem tem algo de sagrado. Oi ­
ave, por meio ele bicadas, que o indivíduo humano teria ]1< lc > organismo inteiro. esse caráter é mais particu-
sido esculpido nessa massa amorfa, seus membros sepa­ 1 1 11• 1 1 1 < ' ' i sível cm certos pomos privilegiados. IIá ór-
rados uns dos outros, sua boca abena, suas narinas perfu­ 1 , , 1c·1 1dos que são especialmente marcados por ele,
radas3J Encontramos na América lendas análogas, com a 1 m 1 1 1c l1 1 o sangue e os t .ibelos.
• 1 .. 111gue humano, em primeiro lugar, é algo tão sa-
_

diferença de que, em razão da mentalidade mais desen­


volvida desses povos, as representações utilizadas não 1 11 1 ' 1 ' "" nas tribos da Austrália central, serve muitas ve-
132 Çwl \ Fll'\/E,\TARES 133

zes para consagrar os instrumentos mais rcspeitad1" li.; lorte dos <.abdos é Lm ato ritual acompanh·1do
culto. O nurtun1a. por exemplo. é, em certas ocasiões.
r i 111onias específicas: o 10d1v1duo que se submete a
ligiosam�nte ungido. de cima a baixo. com sangue de 1 \l' manter-se agachado no chão. com a face voltada
mem:lb. E sobre terra embebida com sangue que os do e:
1 , �.111 do lugar onde supostamente acampamm os an-
da Ema, entre os Arunta, desenham o emblema sagrad 1d ,� fabulosos de cujo clã sua mãe descenderia ••.
Veremo:-; mais adiante de que maneira o sangue é dl· l't l.1 mesma razão, assim que um homem morre, cor­
mado nos rochedos que representam as plantas ou os a
' 1111 lhe os cabelos, depositam-n os num local afastado.
mais cocêmicos�. Não há cerimônia religiosa em qut•
1 11 1 1c111 .1s mulheres nem os não-iniciados cêm o direito
sangue não desempenhe algum papel39. Durante a inir1 li \ 1 lns: e é nesse local, longe dos olhares profa nos.
çào, os adultos cortam suas veias e regam com seu sa p11 procede à confecção dos cmtos18.
gue o noviço; e esse sangue é tão sagrado que se prrnl
1 •1 1dl'ríamos assinalar outros tecidos orgânicos q u <.! ,
a presença de mul hcres enquanto ele corre; sua visào lh
1 1 1 l" · 1 u s tltv<.!rsos, manifestam propriedades anúlug,1s.
é proibida , assim como a de um churinga 10. O sangue qu
1 li 10 as costeletas, o prepúcio, a gordura do fígado,
o jovem iniciado pcrdc nessas operações violentas qlll' 1 1 • 1\1 .is é inútil multiplicar os ex<.!mplos. Os que prece
h 1 1 1 s:io suficientes para provar que existe no homem ai­
obrigado a suportar tem virtudes muito part icu lares e s
ve a diversas comunhões•1. O que corre durante a s 1hin
" 1 11 •l mantém o profa no a distância e que possui urna
li• 11 1a rcligiosa: cm outros termos. o organismo humano
cisão é, entre os Arunta, piedosamente recolhido e enlt'
rado num sítio sobre o qual se coloca uma peça de ma
, ult 1 cm <;uas profundezas um princípio sagrado que,
111 urcunstância s determinadas , vem ostensi\'amen ce
deira para assinalar aos passanres a santidade do lug.1
nenhuma mulher deve aproximar-se dele•i. Aliás. é pd 1•i111,1r no e:o..'terior Esse princípio não d f i ere especifica-
nawreza religiosa do sangue que se explica o papt•I
1 11 t: daquele que faz o caráter religioso do cocem. Com
1 Hn, .ical �lmo)s de ,·er que as diversas substâncias nas
111
igualmente religioso, do ocre ,-ermclho, também mu11
empregado nas cerimônias: esfregam com ele os churir
• 11 1 1 1 s de mais eminentemente se encarna entram na com­

pn 1�.10 ricual dos i ntrumenros do culto (nurtunja, desc­


ga, utilizam-no nas ornamenta ções ricuais•3. É que elt·

i liw1 totêrnic:os), ou sern:m de un<,·ôes cujo objetivo é re­


considerado, por causa de sua cor, uma substância ap.1
rentada ao sangue. Inclusive várias sedimentações de Ot'I'\"
\ I\ li ll':tr <1S virtudes, seja dos churinga. seja das pedras sa-
vermelho encontradas em d i ferentes pontos do territoriu
1 l 1s. Prntanto, são coisas da mesma espécie.
l'odavia, a dignidade religiosa que, sob esse aspecto,
r
Arunta sã o tidas como sa ngue coagulado que certas heroi
nas da época mílica teriam deixado escorrer pelo chão'11 .
1 1 1 1 •rcnte a cada membro do clã, não é igual em todos.
Os cabelos têm propriedades a nálogas . Os indígena 1 l 1 1 1mcns a possuem em mais alto grau que as mu l he-
do Centro a ustraliano portam cintos, feitos ele cabelo h u
1!" • 1 u e são como que profanas cm relação a eles'io. As-
mano, cujas funções religiosas j á assin..ilamos: servem d
1 1 1 1 l < >lLt ,·ez que: há uma assembléia do grupo totêmico
faixas para en\'olver certos objetos do culto•>. Se honll'm 1 1 1 1 de, da tribo. os homens fazem um acampamento à par­
empresta a outro um de seus churinga, como prova de n:
lt d1-.1imo do das mulheres e fechado a estas: eles são �c­
p 1 1 .1dos�1 . �las há caml ..::m difere �ças na. n:ianeira cc�mo os
conhecimento o segundo presenteia o primeiro com cal�
los: essas duas espécies de coisas são consideradas como
honwns sào marcados pelo caracer rehg1oso. O s 1ovens
de mesma ordem e de valor equivalente•'>. Por isso. a ore-:
11 10 ínil'iados são rotalmence desprovidos de tal caráter.
132 Çwl \ Fll'\/E,\TARES 133

zes para consagrar os instrumentos mais rcspeitad1" li.; lorte dos <.abdos é Lm ato ritual acompanh·1do
culto. O nurtun1a. por exemplo. é, em certas ocasiões.
r i 111onias específicas: o 10d1v1duo que se submete a
ligiosam�nte ungido. de cima a baixo. com sangue de 1 \l' manter-se agachado no chão. com a face voltada
mem:lb. E sobre terra embebida com sangue que os do e:
1 , �.111 do lugar onde supostamente acampamm os an-
da Ema, entre os Arunta, desenham o emblema sagrad 1d ,� fabulosos de cujo clã sua mãe descenderia ••.
Veremo:-; mais adiante de que maneira o sangue é dl· l't l.1 mesma razão, assim que um homem morre, cor­
mado nos rochedos que representam as plantas ou os a
' 1111 lhe os cabelos, depositam-n os num local afastado.
mais cocêmicos�. Não há cerimônia religiosa em qut•
1 11 1 1c111 .1s mulheres nem os não-iniciados cêm o direito
sangue não desempenhe algum papel39. Durante a inir1 li \ 1 lns: e é nesse local, longe dos olhares profa nos.
çào, os adultos cortam suas veias e regam com seu sa p11 procede à confecção dos cmtos18.
gue o noviço; e esse sangue é tão sagrado que se prrnl
1 •1 1dl'ríamos assinalar outros tecidos orgânicos q u <.! ,
a presença de mul hcres enquanto ele corre; sua visào lh
1 1 1 l" · 1 u s tltv<.!rsos, manifestam propriedades anúlug,1s.
é proibida , assim como a de um churinga 10. O sangue qu
1 li 10 as costeletas, o prepúcio, a gordura do fígado,
o jovem iniciado pcrdc nessas operações violentas qlll' 1 1 • 1\1 .is é inútil multiplicar os ex<.!mplos. Os que prece
h 1 1 1 s:io suficientes para provar que existe no homem ai­
obrigado a suportar tem virtudes muito part icu lares e s
ve a diversas comunhões•1. O que corre durante a s 1hin
" 1 11 •l mantém o profa no a distância e que possui urna
li• 11 1a rcligiosa: cm outros termos. o organismo humano
cisão é, entre os Arunta, piedosamente recolhido e enlt'
rado num sítio sobre o qual se coloca uma peça de ma
, ult 1 cm <;uas profundezas um princípio sagrado que,
111 urcunstância s determinadas , vem ostensi\'amen ce
deira para assinalar aos passanres a santidade do lug.1
nenhuma mulher deve aproximar-se dele•i. Aliás. é pd 1•i111,1r no e:o..'terior Esse princípio não d f i ere especifica-
nawreza religiosa do sangue que se explica o papt•I
1 11 t: daquele que faz o caráter religioso do cocem. Com
1 Hn, .ical �lmo)s de ,·er que as diversas substâncias nas
111
igualmente religioso, do ocre ,-ermclho, também mu11
empregado nas cerimônias: esfregam com ele os churir
• 11 1 1 1 s de mais eminentemente se encarna entram na com­

pn 1�.10 ricual dos i ntrumenros do culto (nurtunja, desc­


ga, utilizam-no nas ornamenta ções ricuais•3. É que elt·

i liw1 totêrnic:os), ou sern:m de un<,·ôes cujo objetivo é re­


considerado, por causa de sua cor, uma substância ap.1
rentada ao sangue. Inclusive várias sedimentações de Ot'I'\"
\ I\ li ll':tr <1S virtudes, seja dos churinga. seja das pedras sa-
vermelho encontradas em d i ferentes pontos do territoriu
1 l 1s. Prntanto, são coisas da mesma espécie.
Arunta sã o tidas como sa ngue coagulado que certas heroi
l'odavia, a dignidade religiosa que, sob esse aspecto,
r

nas da época mílica teriam deixado escorrer pelo chão'11 .


1 1 1 1 •rcnte a cada membro do clã, não é igual em todos.
Os cabelos têm propriedades a nálogas . Os indígena 1 l 1 1 1mcns a possuem em mais alto grau que as mu l he-
do Centro a ustraliano portam cintos, feitos ele cabelo h u
1!" • 1 u e são como que profanas cm relação a eles'io. As-
mano, cujas funções religiosas j á assin..ilamos: servem d
1 1 1 1 l < >lLt ,·ez que: há uma assembléia do grupo totêmico
faixas para en\'olver certos objetos do culto•>. Se honll'm 1 1 1 1 de, da tribo. os homens fazem um acampamento à par­
empresta a outro um de seus churinga, como prova de n:
lt d1-.1imo do das mulheres e fechado a estas: eles são �c­
p 1 1 .1dos�1 . �las há caml ..::m difere �ças na. n:ianeira cc�mo os
conhecimento o segundo presenteia o primeiro com cal�
los: essas duas espécies de coisas são consideradas como
honwns sào marcados pelo caracer rehg1oso. O s 1ovens
de mesma ordem e de valor equivalente•'>. Por isso. a ore-:
11 10 ínil'iados são rotalmence desprovidos de tal caráter.
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por não serem admitidos nas cerimônias. É entre os anci:11 1 1 "l" numa tribo corno a dos Arunta, em que há gran-
que esse caráter atinge o máximo ele intensidade. São uc 1 • 1 1 1 . 1 n ticlacle ele totens diferentes, fosse proibido comer
sagrados que certas coisas proibidas ao vulgo lhes 11 11 1 . 1 pvnas cio animal ou ela planta cujo nome se carrega,
permitidas: podem comer mais livremente cio animal tot\'
san

111 1 1 . 1 mbém de todos os animais e plantas que servem d e


mica e, inclusive, como vimos, há tribos em que são lilw 1 •1• 1 1 1 :1os outros clãs, a s fontes alimentares seriam reduzi-
raclos de toda proibição alimentar. l1 .1 zero. IIá, no entanto, tribos em que o consumo ela
Deve-se evitar, pois, ver no totemismo uma espéci\• 1 •l 1 1 1 1 . 1 ou do animal totêmicos não é permitido sem rcstri-
ria. O homem, diante cios animais ou das planta .�
de zoolat "l '· mesmo para o forasteiro. Entre os Wakelbura, ele
cujo nome é o seu, de modo nenhum tem a atitude do fil'l deve ocorrer em presença das pessoas cio totern58.
1 • 11 . 1 1�so. é permitido. Por exemplo, entre os Kaitish e os
" 111

diante ele seu deus, uma vez que pertence ele próprio ao

mundo sagrado. Suas relações são antes as ele dois sere� 1 1 1 1 1 1.1t jcra, quando um homem cio totem ela Ema, achan-
situados no mesmo nível e de igual valor. Quando muito 11 ,l numa localidade ocupada por um clã da Semente
se pode dizer q u e , ao menos em certos casos, o animal 1h1 t .. 1 p im (grass seed ), colhe algumas dessas sementes,
parece ocupar uma posição ligeiramente mais elevada na 1 1 1 1 1 · procurar o chefe, antes ele comê-las, e dizer- l h e :
hierarquia elas coisas sagradas. Assim, ele é chamado à s ' ' d lti estas sementes em suas terras." Ao que o chefe res-
vezes d e p a i ou avô dos homens do clã, o que parece in 1 " 1 1 1 1 k:: '·Está bem, pode comê-las . " Mas se o homem ela
clicar que estes se sentem diante dele num certo estado ele 1 1 1 1 . 1 comesse as sementes antes ele pedir autorização,
dependência moral52. Mas, com freqüência, talvez até I • 1 vd iLa-se que ficaria doente e se arriscaria a morrer59.
com muita freqüência, as expressões empregadas deno­ 11 1 inclusive casos em que o chefe cio grupo eleve ficar
tam antes um sentimento de igualdade. O animal totêmi­ • 1 1 1 uma pequena parte e comê-la ele próprio: é uma es-
ll' de taxa que se é obrigado a pagar<'°. Pela mesma ra-

co é chamado el e amigo, ele irmão mais velho de seus


' ' ' · o churinga transmite ao caçador um certo poder so­
1 ".,

congêneres humanos'i3. Em suma, os vínculos entre am.


bos assemelham-se bem mais aos que unem os membros l 1 1 1 · o animal correspondente, proporcionando maiores
ele uma mesma família: animais e homens são feitos da l 1.1 nces ele caçá-106 1 . É a prova ele que o fato de fazer
I ' · " I L' da natureza de um ser totêmico confere sobre este
1

mesma carne, como dizem os Buanclik54. E m razão desse


parentesco, o homem vê nos animais ela espécie totêmica 1 1 1 1 1 11 1 0 uma espécie ele direito eminente. Enfim, há uma
benfeitores associados, com a assistência cios quais acre­ 1 1 l i 10 no Queensland setentrional, os Karingbool, em que
dita poder contar. Chama-os em sua ajuda55 e eles vêm 1 , pessoas cio totem são as ünicas com o direito ele matar
orientá-lo na caça, adverti-lo cios perigos que pode cor­ 1 1 . 1 nimaJ totêmico ou, se o totem for uma árvore, de reti-
rer56. Em troca, o homem trata-os com consideração, não 1 1 1 lhe a casca. O concurso dessas pessoas é inclispensá-
os brutaliza57; mas as atenções que dedica a eles ele ma­ 11 ·I ,1 todo estrangeiro que queira utilizar para fins pessoais
neira nenhuma se assemelham a um culto. 1 ' .irne desse animal ou a casca dessa áivore62. Portanto.
Às vezes o homem parece ter sobre seu totem inclu­ • l.1.� desempenham o papel ele proprietários, embora evi­
sive uma espécie de direito místico de propriedade. A in­ i l l ' n tcmente se trate aqui ele uma propriedade muito espe­
terdição ele matá-lo e ele comê-Io só se aplica, natural­ ' 1 . i l , que temos certa dificuldade ele conceber.
mente, aos membros do clã; não poderia estender-se às
pessoas estranhas sem tornar a vida materialmente impos-
134 A S FORMAS E'lEMENTARF:S DA VIDA REL/01< 1 1 l 1 1 11/ \(./IS HLEMJoiVTARJ.!S B5

por não serem admitidos nas cerimônias. É entre os anci:11 1 1 "l" numa tribo corno a dos Arunta, em que há gran-
que esse caráter atinge o máximo ele intensidade. São uc 1 • 1 1 1 . 1 n ticlacle ele totens diferentes, fosse proibido comer
sagrados que certas coisas proibidas ao vulgo lhes 11 11 1 . 1 pvnas cio animal ou ela planta cujo nome se carrega,
permitidas: podem comer mais livremente cio animal tot\'
san

111 1 1 . 1 mbém de todos os animais e plantas que servem d e


mica e, inclusive, como vimos, há tribos em que são lilw 1 •1• 1 1 1 :1os outros clãs, a s fontes alimentares seriam reduzi-
raclos de toda proibição alimentar. l1 .1 zero. IIá, no entanto, tribos em que o consumo ela
Deve-se evitar, pois, ver no totemismo uma espéci\• 1 •l 1 1 1 1 . 1 ou do animal totêmicos não é permitido sem rcstri-
ria. O homem, diante cios animais ou das planta .�
de zoolat "l '· mesmo para o forasteiro. Entre os Wakelbura, ele
cujo nome é o seu, de modo nenhum tem a atitude do fil'l deve ocorrer em presença das pessoas cio totern58.
1 • 11 . 1 1�so. é permitido. Por exemplo, entre os Kaitish e os
" 111

diante ele seu deus, uma vez que pertence ele próprio ao

mundo sagrado. Suas relações são antes as ele dois sere� 1 1 1 1 1 1.1t jcra, quando um homem cio totem ela Ema, achan-
situados no mesmo nível e de igual valor. Quando muito 11 ,l numa localidade ocupada por um clã da Semente
se pode dizer q u e , ao menos em certos casos, o animal 1h1 t .. 1 p im (grass seed ), colhe algumas dessas sementes,
parece ocupar uma posição ligeiramente mais elevada na 1 1 1 1 1 · procurar o chefe, antes ele comê-las, e dizer- l h e :
hierarquia elas coisas sagradas. Assim, ele é chamado à s ' ' d lti estas sementes em suas terras." Ao que o chefe res-
vezes d e p a i ou avô dos homens do clã, o que parece in 1 " 1 1 1 1 k:: '·Está bem, pode comê-las . " Mas se o homem ela
clicar que estes se sentem diante dele num certo estado ele 1 1 1 1 . 1 comesse as sementes antes ele pedir autorização,
dependência moral52. Mas, com freqüência, talvez até I • 1 vd iLa-se que ficaria doente e se arriscaria a morrer59.
com muita freqüência, as expressões empregadas deno­ 11 1 inclusive casos em que o chefe cio grupo eleve ficar
tam antes um sentimento de igualdade. O animal totêmi­ • 1 1 1 uma pequena parte e comê-la ele próprio: é uma es-
ll' de taxa que se é obrigado a pagar<'°. Pela mesma ra-

co é chamado el e amigo, ele irmão mais velho de seus


' ' ' · o churinga transmite ao caçador um certo poder so­
1 ".,

congêneres humanos'i3. Em suma, os vínculos entre am.


bos assemelham-se bem mais aos que unem os membros l 1 1 1 · o animal correspondente, proporcionando maiores
ele uma mesma família: animais e homens são feitos da l 1.1 nces ele caçá-106 1 . É a prova ele que o fato de fazer
I ' · " I L' da natureza de um ser totêmico confere sobre este
1

mesma carne, como dizem os Buanclik54. E m razão desse


parentesco, o homem vê nos animais ela espécie totêmica 1 1 1 1 1 11 1 0 uma espécie ele direito eminente. Enfim, há uma
benfeitores associados, com a assistência cios quais acre­ 1 1 l i 10 no Queensland setentrional, os Karingbool, em que
dita poder contar. Chama-os em sua ajuda55 e eles vêm 1 , pessoas cio totem são as ünicas com o direito ele matar
orientá-lo na caça, adverti-lo cios perigos que pode cor­ 1 1 . 1 nimaJ totêmico ou, se o totem for uma árvore, de reti-
rer56. Em troca, o homem trata-os com consideração, não 1 1 1 lhe a casca. O concurso dessas pessoas é inclispensá-
os brutaliza57; mas as atenções que dedica a eles ele ma­ 11 ·I ,1 todo estrangeiro que queira utilizar para fins pessoais
neira nenhuma se assemelham a um culto. 1 ' .irne desse animal ou a casca dessa áivore62. Portanto.
Às vezes o homem parece ter sobre seu totem inclu­ • l.1.� desempenham o papel ele proprietários, embora evi­
sive uma espécie de direito místico de propriedade. A in­ i l l ' n tcmente se trate aqui ele uma propriedade muito espe­
terdição ele matá-lo e ele comê-Io só se aplica, natural­ ' 1 . i l , que temos certa dificuldade ele conceber.
mente, aos membros do clã; não poderia estender-se às
pessoas estranhas sem tornar a vida materialmente impos-
1 · 1 1 1 LO III

"\ eRENÇAS PROPRIAMENTE


1 1 > 1 EMICAS
1 1111/ illllCIÇàO)

111 O sistema cosmológico do totemismo


e a noção de gênero

<.omeça mos a entrever que o totemismo é uma reli-


1 ll • 1 >em mais complexa do que podia parecer à primeira
\ 1 .1.1 Jü distinguimos três categorias de coisas que ele re-
1 1 1 1 h lTe, em graus diversos, como sagradas: o emblema
r 1 111 · 1 1 1 1co. a planta ou o animal cujo a:;pecto e:;se emble-
111 1 Hproduz. os membros do clã. No entanto, esse qua­
l 1 P 11.10 é ainda compleLO. Uma religião, com efeito, não
. i 1 1 1 plesmente uma coleção ele crenças fragmentárias, re­
l 1 1 1 , ,1s
1

a objetos muito particulares, como os que acabam


. J • M'I mencionados. Todas as religiões conhecidas foram,
1 1 1 1 1.1... mais. outras menos, sistemas de idéias que tendiam
1 ,1' 1.in.:ar a universalidade das coisas e a dar-nos uma re­
i ' " ,vntaçào total e.lo mundo. Para que o toternismo possa
li 1 onsiclerado como u111a religião comparável às outras,
1 l " l'ciso que nos ofereça também uma concepçào do
1 1 1 1 1 \ l'rso. Ora. ele satisfaz essa condição.
1 · 1 1 1 LO III

"\ eRENÇAS PROPRIAMENTE


1 1 > 1 EMICAS
1 1111/ illllCIÇàO)

111 O sistema cosmológico do totemismo


e a noção de gênero

<.omeça mos a entrever que o totemismo é uma reli-


1 ll • 1 >em mais complexa do que podia parecer à primeira
\ 1 .1.1 Jü distinguimos três categorias de coisas que ele re-
1 1 1 1 h lTe, em graus diversos, como sagradas: o emblema
r 1 111 · 1 1 1 1co. a planta ou o animal cujo a:;pecto e:;se emble-
111 1 Hproduz. os membros do clã. No entanto, esse qua­
l 1 P 11.10 é ainda compleLO. Uma religião, com efeito, não
. i 1 1 1 plesmente uma coleção ele crenças fragmentárias, re­
l 1 1 1 , ,1s
1

a objetos muito particulares, como os que acabam


. J • M'I mencionados. Todas as religiões conhecidas foram,
1 1 1 1 1.1... mais. outras menos, sistemas de idéias que tendiam
1 ,1' 1.in.:ar a universalidade das coisas e a dar-nos uma re­
i ' " ,vntaçào total e.lo mundo. Para que o toternismo possa
li 1 onsiclerado como u111a religião comparável às outras,
1 l " l'ciso que nos ofereça também uma concepçào do
1 1 1 1 1 \ l'rso. Ora. ele satisfaz essa condição.
138 AS !-ORMAS ELEMENTARES DA \ITDA J<EL/(j{( 11 t 1 11/ \(.'AS ELEMENTARES 139

1 1 1 hu1das a certo totem, o Sol a outro, etc. Todos os


1 n mhecidos acham-se assim dispostos numa espécie
I• , p wlro, ele classificação sistemática, que abrange a na­
,
O que leva a negligenciar geralmente esse aspeC'tn
cio totemismo é que se fez do clã uma noção muito estrt'i h11• 1 inteira.
ta. Costuma-se ver nele apenas um grupo de seres huma lkproduzimos num outro estudo um certo número
nos. Simples subdivisão da tribo, parece, como esta, Mi 1� classificações4; limitamo-nos a recordar algumas cle­
poder ser composto d e homens. Mas, raciocinando dest1· l1 1 1 1 1 1 t l o de exemplos. Uma das mais conhecidas é a que
modo, pomos nossas idéias européias no lugar daquela' 1 1 1 l 1�vrvou na tribo do Mont-Gambier. Essa tribo com-
q u e o primitivo tem do mundo e da sociedade. Para o 1 111 1 1 1 d e duas frarias
t que levam o nome, uma ele Kumita,
ausu·aliano, as próprias coisas, todas as coisas que povoa111 1 . . 1 1 1 1 . 1 de Kroki; cada uma delas, por sua vez, divide-se
o universo, fazem pa1te ela tri bo: são elememos constituli 111co clãs. Ora, "todas as coisas da natureza pertencem
1 1 1 1 ou outro desses dez clãs"5; Fison e Howin dizem que
111 ,
vos e, por assim dizer, elementos regulares dela; portant().
l 1 , 1 ·st3o "incluídas" neles. De fato, são classificadas nes-
1
ela mesma forma que os homens, elas têm um lugar deter
minado no âmbito da sociedade: "O selvagem ela Austrll d1 ·z totens como espécies em seus respectivos gêneros.
lia cio Sul, diz Fison, considera o u niverso a grande tribo, 1 11 q1 11: mostra a seguinte tabela, construída com base nas
a u m a de cujas divisões ele pertence, e todas as coü;-1::.. l1il• •1 1 1 1: 1ções recolhidas por Curr e por Fison e Howitt6:
animadas ou i nanimadas, que são classificadas no mesmo
grupo dele, são partes do corpo cio qual e l e próprio (·
membro." 1 Em virtude desse princípio, quando a tribo sv 1 1 \ 1 Ul'\S
EM CADA CLÃ
CLÀS COISAS CLASSIFICADAS
divide em duas fratrias, todos os seres conhecidos são rc

1 111111.1 A
partidos entre elas. "Toda a natureza, diz Palmer a propó
sito das tribos cio rio Bellinger, é d ividida con forme º'
O fa leão pescador . . . . fumaça, a madressilva, cenas

nomes elas fratrias . . . O Sol, a Lua e as estrelas . . . pertencem


árvores. ecc.
O pelicano ... A árvore de n1acleira escura, os

O
a esta ou àquela fratria assim como os próprios negros."� cães, o fogo, o gelo, etc.
A tribo ele Port-Mackay, no Queensland, compreende duas corvo . . .. . .. . . . . . . . .. ... . A chuva, o trovão, o relâmpa­
go, as nuvens1 o granizo, o
fratrias que têm os nomes ele Yungaroo e Wootaroo, e o

AB
inverno, etc.
mesmo acontece com as tribos vizinhas. Ora, diz Briclg A cacatua-preta ........ . estrelas, a Lua, etc.
mann "todas as coisas animadas e inanimadas são dividi­ Uma serpence nào O peixe, a foca, a enguia, as

das p r essas tribos em duas classes chamadas Yungaroo venenosa . . . . . . . . . . . . . .
e Wootaroo"5. Mas essa classificação não se detém aí. 0:;
á!vores de casca fibrosa.
Uma árvore de chá O pato, o lagos1im, o mocho,
etc.
homens ele cada fratria são repartidos entre um ce1to nú
mero de clãs; cio mesmo modo, as coisas relacionadas a
Uma rniz comestível.. A abetarda, a codorniz, uma

cada fratria se distribuem, por sua vez, entre os clãs que a


espécie de canguru, etc.
A cacawa-branca O canguru, o verão, o Sol, o
compõem. Tal árvore, por exemplo, será atribuída ao clà sen1 oista . . . . . . . . . vento, o outono, ecc.

cio Canguru, e a e l e só. e conseqüentemente terá, assim Sobre o 4º e o )º clàs kroki, faltam detalhes.
como os membros h u manos do clã, o Canguru por torem;
aquela outra pe1tencerá ao clã ela Serpente; as nuvens se-
138 AS !-ORMAS ELEMENTARES DA \ITDA J<EL/(j{( 11 t 1 11/ \(.'AS ELEMENTARES 139

1 1 1 hu1das a certo totem, o Sol a outro, etc. Todos os


1 n mhecidos acham-se assim dispostos numa espécie
I• , p wlro, ele classificação sistemática, que abrange a na­
,
O que leva a negligenciar geralmente esse aspeC'tn
cio totemismo é que se fez do clã uma noção muito estrt'i h11• 1 inteira.
ta. Costuma-se ver nele apenas um grupo de seres huma lkproduzimos num outro estudo um certo número
nos. Simples subdivisão da tribo, parece, como esta, Mi 1� classificações4; limitamo-nos a recordar algumas cle­
poder ser composto d e homens. Mas, raciocinando dest1· l1 1 1 1 1 1 t l o de exemplos. Uma das mais conhecidas é a que
modo, pomos nossas idéias européias no lugar daquela' 1 1 1 l 1�vrvou na tribo do Mont-Gambier. Essa tribo com-
q u e o primitivo tem do mundo e da sociedade. Para o 1 111 1 1 1 d e duas frarias
t que levam o nome, uma ele Kumita,
ausu·aliano, as próprias coisas, todas as coisas que povoa111 1 . . 1 1 1 1 . 1 de Kroki; cada uma delas, por sua vez, divide-se
o universo, fazem pa1te ela tri bo: são elememos constituli 111co clãs. Ora, "todas as coisas da natureza pertencem
1 1 1 1 ou outro desses dez clãs"5; Fison e Howin dizem que
111 ,
vos e, por assim dizer, elementos regulares dela; portant().
l 1 , 1 ·st3o "incluídas" neles. De fato, são classificadas nes-
1
ela mesma forma que os homens, elas têm um lugar deter
minado no âmbito da sociedade: "O selvagem ela Austrll d1 ·z totens como espécies em seus respectivos gêneros.
lia cio Sul, diz Fison, considera o u niverso a grande tribo, 1 11 q1 11: mostra a seguinte tabela, construída com base nas
a u m a de cujas divisões ele pertence, e todas as coü;-1::.. l1il• •1 1 1 1: 1ções recolhidas por Curr e por Fison e Howitt6:
animadas ou i nanimadas, que são classificadas no mesmo
grupo dele, são partes do corpo cio qual e l e próprio (·
membro." 1 Em virtude desse princípio, quando a tribo sv 1 1 \ 1 Ul'\S
EM CADA CLÃ
CLÀS COISAS CLASSIFICADAS
divide em duas fratrias, todos os seres conhecidos são rc

1 111111.1 A
partidos entre elas. "Toda a natureza, diz Palmer a propó
sito das tribos cio rio Bellinger, é d ividida con forme º'
O fa leão pescador . . . . fumaça, a madressilva, cenas

nomes elas fratrias . . . O Sol, a Lua e as estrelas . . . pertencem


árvores. ecc.
O pelicano ... A árvore de n1acleira escura, os

O
a esta ou àquela fratria assim como os próprios negros."� cães, o fogo, o gelo, etc.
A tribo ele Port-Mackay, no Queensland, compreende duas corvo . . .. . .. . . . . . . . .. ... . A chuva, o trovão, o relâmpa­
go, as nuvens1 o granizo, o
fratrias que têm os nomes ele Yungaroo e Wootaroo, e o

AB
inverno, etc.
mesmo acontece com as tribos vizinhas. Ora, diz Briclg A cacatua-preta ........ . estrelas, a Lua, etc.
mann "todas as coisas animadas e inanimadas são dividi­ Uma serpence nào O peixe, a foca, a enguia, as

das p r essas tribos em duas classes chamadas Yungaroo venenosa . . . . . . . . . . . . . .
e Wootaroo"5. Mas essa classificação não se detém aí. 0:;
á!vores de casca fibrosa.
Uma árvore de chá O pato, o lagos1im, o mocho,
etc.
homens ele cada fratria são repartidos entre um ce1to nú
mero de clãs; cio mesmo modo, as coisas relacionadas a
Uma rniz comestível.. A abetarda, a codorniz, uma

cada fratria se distribuem, por sua vez, entre os clãs que a


espécie de canguru, etc.
A cacawa-branca O canguru, o verão, o Sol, o
compõem. Tal árvore, por exemplo, será atribuída ao clà sen1 oista . . . . . . . . . vento, o outono, ecc.

cio Canguru, e a e l e só. e conseqüentemente terá, assim Sobre o 4º e o )º clàs kroki, faltam detalhes.
como os membros h u manos do clã, o Canguru por torem;
aquela outra pe1tencerá ao clã ela Serpente; as nuvens se-
1 RI\(.AS ElE.llE.\TARES
1-lO AS FORMAS ElE.IJE.\TARES DA l'TDA REl/G/U\A
1

1 1 11 lc> de Victoria, na Nova Gales do Sul (entn..: os Euah-


lista das coisas associadas a cada cl:i é, ror sinal.
1� 1 1 ); encontram-se traços bem evidcntes deles
A
b�stame incomp leta ; o r róp rio Curr nos adverte que se li 1 nas tr i­
em
mitou a enumerar algumas delas. Mas, graças aos traba J t, ,., do Centrol3. No Queen s lan cl, onde os clãs pa rec
lhos de Mathews e de Jlowitt�. temos hoje, sobre a classi 1 d1•saparecido e as classes matrimoniais são as únicas
1

fic�ção adotada pela tribo dos Wotjoba luk, informações 11hd1\ 1sões da frarria, é entre essas classes que se distri­
l 1111·111 as coisas. Assim, os Wakelbura dividem-se
em duas
ma1s � mplas 9 uc permitem compreender melhor de qut• são cha-
1 1 1 1 1 1. 1... . Mallera e Wutaru ; as classes da prim eira
manetra um sistema desse tipo é capaz de abarcar todo 0
, Wungo e
1 1 1 11i.1'i Kurgilla e Banhe, as cla sse s ela segu nda
1 11 1 1 1 Ora, aos I3anbc pertencem o gambá, o c angur u , o
univ�rso conh ecid o dos indígenas. Também os Wotjoba­
cm d u as fraufas, uma chamada Gurogity t'
.
t 1 e > mel da abelha pequena, etc. Aos Wungo são atri­
luk d1v1dem-se
a outra Gumaty (Krokirch e Gamurch, segundo Howirt'll·
l 1ujdns a ema, o bamlicoot, o paro-preto, a cobra-preta,
a
para não estender essa enumeração. nos contentaremos
em mdíLar, c.le acure.lo com ,\lachews, as cc>LSas da�Lfica­ • 1sranha
• , aos Obu, a cobra-t apete. o mel elas abe
lh 1 que ferroam . etc.; aos Kurgilla , o porco-e
spinho, o
das em alguns dos clàs da fratria Gurogity.
p1 1 1 1 da s planíci es, a água, a chuva, o fogo, o trovão,
No clã do lnhame são classificados o peru das planí­
. " 11
cie�, o gato selvagem, o mopoke, o mocho dyim-dyim, a
galinha mallee, o papagaio rosela, o peeu>ee. 1 · 11contra mos a mesma organização entre o s índios
l 1 \111erica do Norte. Os Zui'li têm u m sistema de
classifi­
11 1
No clã do Mexilhão9, a ema-cinzema, o porco-espi­
• e que. em linhas essenc iais, é compar ável ponto por
nho. o maçarico-real, a cacatua-branca, o pato dos bos­
ques. o lagarto mallee, a tartaruga fétida, o esquilo voa­ p 11110 .tos que acabamos de descrever. O dos Omaha
ba-
1 1.1 "l' nos mesmos princíp ios que o dos Wotjob aluk 1 �.
dor. o gambá com cauda em forma de anel. o rombo
com asas cor de bronze ( bmnze-wi11g), o wijuggla. 1 1 1 1 e·1 o dessas mesmas icléias persiste até em sociedades
No clã do Sol, o handicool, a Lua, o raro-ca ngu ru , a 1 1 1 1 1 . 1 vançaclas. Entre os Haicla, toe.los os deuses,
tod os
pega-preta e a pega-branca, o gambá, o falcão ngJ/11, a la­ 11 1 · 1 i: s m ísticos que govern am os diferen tes fenôme nos
garta do eucalipto, a lagarta 11 mimoisa ( lcal/le-tree). 0 i l 1 11.11ureza. também são classificados. da mesma forma
111 e 1s homens. numa ou noutra das duas fratrias da
tri-
l 11 1 1 1 1 1 s são Águias, os outros. Corvos"'· Ora, os deuses
planeta Vênus.
No clã do Vento quenreio, a águia-falcão com cabeça s coi-
. 1 l 1 1 e >1sas são apenas um outro aspecto das própria
1 q u c eles govern am17.
cmzenra. a cobra-tapete, o papagaio fumador, o papagaio
Essa classifi cação mitológ ica,
com escamas (shell), o falcão murraka11, a cobra dikko­
mur, o papagaio de colei ra , a cobra mirndai, o lagarto . 1 1 n o , é apenas urna outra forma elas amerio res. As-
1 11 1 r t
1 1 1 1 , 1·stamos seguros de que esse modo de
conceber o
com dorso furta-cor.
Se considerarmos que há muitos outros clàs ( 1 Jowin 1 1 11 1 1 1. l n é independente de qualque r particularidade
t:lni-

enumera doze, Machews catorze, e este último adn�rte que 1 1 1 1 1.!l'ográfica: mas, ao mesmo tempo. manifesta-se
1 1 1 1 1 1 "' idência que ele está intimam ente ligado
ao con-
sua li�ra é muito incomplera 1 1), compreenderemos de que
manetm lodas as coisas pe las quais o indígena se interessa 1111 11< 1 d.1s crenças rorêmica s.
encontram naturalmente seu lugar nessas classificaçôcs.
Foram o bservad os arranjos sim ilares
nos pontos mais
.
diversos do continente australiano: na Austrália do Sul ' no
1 RI\(.AS ElE.llE.\TARES
1-lO AS FORMAS ElE.IJE.\TARES DA l'TDA REl/G/U\A
1

1 1 11 lc> de Victoria, na Nova Gales do Sul (entn..: os Euah-


lista das coisas associadas a cada cl:i é, ror sinal.
1� 1 1 ); encontram-se traços bem evidcntes deles
A
b�stame incomp leta ; o r róp rio Curr nos adverte que se li 1 nas tr i­
em
mitou a enumerar algumas delas. Mas, graças aos traba J t, ,., do Centrol3. No Queen s lan cl, onde os clãs pa rec
lhos de Mathews e de Jlowitt�. temos hoje, sobre a classi 1 d1•saparecido e as classes matrimoniais são as únicas
1

fic�ção adotada pela tribo dos Wotjoba luk, informações 11hd1\ 1sões da frarria, é entre essas classes que se distri­
l 1111·111 as coisas. Assim, os Wakelbura dividem-se
em duas
ma1s � mplas 9 uc permitem compreender melhor de qut• são cha-
1 1 1 1 1 1. 1... . Mallera e Wutaru ; as classes da prim eira
manetra um sistema desse tipo é capaz de abarcar todo 0
, Wungo e
univ�rso conh ecid o dos indígenas. Também os Wotjoba­ 1 1 1 11i.1'i Kurgilla e Banhe, as cla sse s ela segu nda

cm d u as fraufas, uma chamada Gurogity t'


. 1 11 1 1 1 Ora, aos I3anbc pertencem o gambá, o c a ngur u , o
t 1 e > mel da abelha pequena, etc. Aos Wungo são atri­
luk d1v1dem-se
a outra Gumaty (Krokirch e Gamurch, segundo Howirt'll·
l 1ujdns a ema, o bamlicoot, o paro-preto, a cobra-preta,
a
para não estender essa enumeração. nos contentaremos
em mdíLar, c.le acure.lo com ,\lachews, as cc>LSas da�Lfica­ • 1sranha
• , aos Obu, a cobra-t apete. o mel elas abe
lh 1 que ferroam . etc.; aos Kurgilla , o porco-e
spinho, o
das em alguns dos clàs da fratria Gurogity.
p1 1 1 1 da s planíci es, a água, a chuva, o fogo, o trovão,
No clã do lnhame são classificados o peru das planí­
. " 11
cie�, o gato selvagem, o mopoke, o mocho dyim-dyim, a
galinha mallee, o papagaio rosela, o peeu>ee. 1 · 11contra mos a mesma organização entre o s índios
l 1 \111erica do Norte. Os Zui'li têm u m sistema de
classifi­
11 1
No clã do Mexilhão9, a ema-cinzema, o porco-espi­
• e que. em linhas essenc iais, é compar ável ponto por
nho. o maçarico-real, a cacatua-branca, o pato dos bos­
ques. o lagarto mallee, a tartaruga fétida, o esquilo voa­ p 11110 .tos que acabamos de descrever. O dos Omaha
ba-
1 1.1 "l' nos mesmos princíp ios que o dos Wotjob aluk 1 �.
dor. o gambá com cauda em forma de anel. o rombo
com asas cor de bronze ( bmnze-wi11g), o wijuggla. 1 1 1 1 e·1 o dessas mesmas icléias persiste até em sociedades
No clã do Sol, o handicool, a Lua, o raro-ca ngu ru , a 1 1 1 1 1 . 1 vançaclas. Entre os Haicla, toe.los os deuses,
tod os
pega-preta e a pega-branca, o gambá, o falcão ngJ/11, a la­ 11 1 · 1 i: s m ísticos que govern am os diferen tes fenôme nos
garta do eucalipto, a lagarta 11 mimoisa ( lcal/le-tree). 0 i l 1 11.11ureza. também são classificados. da mesma forma
111 e 1s homens. numa ou noutra das duas fratrias da
tri-
l 11 1 1 1 1 1 s são Águias, os outros. Corvos"'· Ora, os deuses
planeta Vênus.
No clã do Vento quenreio, a águia-falcão com cabeça s coi-
. 1 l 1 1 e >1sas são apenas um outro aspecto das própria
1 q u c eles govern am17.
cmzenra. a cobra-tapete, o papagaio fumador, o papagaio
Essa classifi cação mitológ ica,
com escamas (shell), o falcão murraka11, a cobra dikko­
mur, o papagaio de colei ra , a cobra mirndai, o lagarto . 1 1 n o , é apenas urna outra forma elas amerio res. As-
1 11 1 r t
1 1 1 1 , 1·stamos seguros de que esse modo de
conceber o
com dorso furta-cor.
Se considerarmos que há muitos outros clàs ( 1 Jowin 1 1 11 1 1 1. l n é independente de qualque r particularidade
t:lni-

enumera doze, Machews catorze, e este último adn�rte que 1 1 1 1 1.!l'ográfica: mas, ao mesmo tempo. manifesta-se
1 1 1 1 1 1 "' idência que ele está intimam ente ligado
ao con-
sua li�ra é muito incomplera 1 1), compreenderemos de que
manetm lodas as coisas pe las quais o indígena se interessa 1111 11< 1 d.1s crenças rorêmica s.
encontram naturalmente seu lugar nessas classificaçôcs.
Foram o bservad os arranjos sim ilares
nos pontos mais
.
diversos do continente australiano: na Austrália do Sul ' no
1 -1 2 .�S FO!lll.15 EIEllE.\TARE:, DA 1 7011 RELJ(i/O.V,
!\ ( h'l:SÇAS EJLl/E.\TARF.S 1 13

\liás. lü casos cm que visl umbramos as razões que o


II

111,piraram. A:, duas fratrias muico provavelmente const! tui-


1 11 11 os quadros iniciais e fundamentais dessas clas� 1hc�­
-.io trabalho a que nos referimos j á várias . .
,·ezes. mos­
tram�.. que luz esses fatos lançam sobre a maneira como
se fo fmou , na huma nidad e, a noçã o d e gêne ro ou dl' .
\• '<:" que. conseqüencemente. começaram por ser d 1coc:r

1 1 1 1 1 1s. Ora. quando uma classificação se reduz a d01s ge-


classe· Com efeito , essas classi ficações sistemáticas eram
11,.1 os, estes são quase necessariamente concebidos sob a
as pri lneiras que encontrávamos na história; ora, acaba­
mos 0e ver que elas se modelaram com base na orga niza­
1 1 1 1 111�1 an ticéti ca : são uülizados, antes de tudo, como meio
, ,, . -.c:parar claramente as co isas entre _as _qu�s i o contrasti:
ção s t>C ial, ou melhor, tomaram por marcos os próprios
1 111;1is acentuado. Colocam-se umas a d tretta , as outras a
1 -;r 1 u c: rd a Tal é, com efeito, o caráter das classificações
marcc�" da sociedade As fratrias ser\'imm de gl:neros e os

Se a cacatua-branca é classificada numa lra-


elas tle espcues. !·01 por estarem agrupados que os ho­
1mtralianas.

me s pude ra m agrupar as coisas, po is , para dassifica 1 es·
1 1 1. 1 , a cacatua-preta o sera na outra; se o �ol estü num la­
tas úl t imas, limitaram-se a oferecer-lhes um lugar nos gru­
pos qi1e � les p�óprios formavam. E se es-.as diversas cla ­
o ln .1 Lua e os astros da noite estarão no lado oposto 1 8.
1 .n n muita freqüência, os seres que serYe m de totens às

ses de coisas nao fomm simplesmente JUStapostas umas as
. :
du.1s fratri as têm cores contrárias 1 9. Encontramos essas
.

outra� mas ordenadas segundo um plano unitário. é qt•e


grtJPOS s?c_i � is com os quais elas se 1,p0..,ições mesmo fora da Austrá lia. Lá onde uma das fra-
1 1 1.1s é encarregada da paz, a outra o será ela guerra20; se
bém �;iO solida nos e formam por sua uniao um todo orga­
os . ·onfun dem tan ­
� �

nico, ,1 tribo. A unidade desses primeiros sistemas lógicos


1 1 11w tem a água por totem, a ou tra tem por totem . a ter-
1,1 , 1 Certamente (: o que explica q u e as duas fratnas te-
apen :i� reproduz a unidade da sociedade. Uma primeira
111t 1m sido. em gcrnl. concebidas como naturalmente an-
ocasiP nos é assim oferecida de verificar a proposição
1.1gonicas uma da outra. Admite-se q u e haja entre elas
111 1 1 espécie de ri\alidade e, mesmo. de hostlidade cons-
que t>llunciáva nos no início d�sta obra � de nos a-.sc u
� _ �
rar que as noçoes fundamentais do espmto, as categorias
111 111iva22. A oposição das cois as estendeu-se as
! pessoas; o

1 n n traste lógico dupl icou-se numa espécie de conflito so-


essenôais do pensamento, podem ser o produto de fato­
res s<>-·iais. O que acabamos de ver demonstra. com efei­
to, q ul ess� é � c�so da p r pria noção de categoria.
? < 1 " �.

1.-0 nao significa, porem, que preten


damos recusar à
Por outro lado, no interior de cada fratria, dispuse-
c oên c ia indivi dual, mesmo reduz
1 1m se num mesmo clá as coisas que pareciam ter mais
ons ida a suas forças iw­
la d as , :1 faculdade ele perceber semelhanças entre as coisas
li m idade com aquela que servia ele totem. Por exem plo,
pos- s e a Lua j unto com a cacatua-preta' e o Sol, ao con-
parti (ll lares que ela se repre senta . Ao contr ário, vemos .
1 1 .irio. bem como a atmosfera e o vento, iunto com a caca-
111;1 branca Ou, então. reuniu-se ao animal totêmico tudo
clara n:ente que as classificações, inclusi\'e as mais simples .


e pri f1itivas . . já supõem essa acuidade Não é ao acaso
, que ser\ L à Jli1rn.!ntação2\ assim como os animais com
que 0 Juscra hano ordena as coisas num mesmo clã ou em
, ,., quais ele está mais intimamente associado1'i. Cl � ro qu e
m·m sem p re podemos compreender a obscu ra p s1�0I c:g1a
clãs ofaemcs. Tanto nele como em nós, as imagens simi­
la res ;e atrae m, as imag ens opostas se repel em, e (: de
.

' 1t1<.: presidiu a muitas d<.!ssas aproximações ou d1stmçoes.


.
acord' com o sentimento dessas afinidades e repulsas que
ele c1� ifica, aqui ou ali. as coisas correspondentes.
\l.is os exemplos dados são suficientes para mostrar que
11ma cerca intuição das semelhanças ou diferenças que as
1 -1 2 .�S FO!lll.15 EIEllE.\TARE:, DA 1 7011 RELJ(i/O.V,
!\ ( h'l:SÇAS EJLl/E.\TARF.S 1 13

\liás. lü casos cm que visl umbramos as razões que o


II

111,piraram. A:, duas fratrias muico provavelmente const! tui-


1 11 11 os quadros iniciais e fundamentais dessas clas� 1hc�­
-.io trabalho a que nos referimos j á várias . .
,·ezes. mos­
tram�.. que luz esses fatos lançam sobre a maneira como
se fo fmou , na huma nidad e, a noçã o d e gêne ro ou dl' .
\• '<:" que. conseqüencemente. começaram por ser d 1coc:r

1 1 1 1 1 1s. Ora. quando uma classificação se reduz a d01s ge-


classe· Com efeito , essas classi ficações sistemáticas eram
11,.1 os, estes são quase necessariamente concebidos sob a
as pri lneiras que encontrávamos na história; ora, acaba­
mos 0e ver que elas se modelaram com base na orga niza­
1 1 1 1 111�1 an ticéti ca : são uülizados, antes de tudo, como meio
, ,, . -.c:parar claramente as co isas entre _as _qu�s i o contrasti:
ção s t>C ial, ou melhor, tomaram por marcos os próprios
1 111;1is acentuado. Colocam-se umas a d tretta , as outras a
1 -;r 1 u c: rd a Tal é, com efeito, o caráter das classificações
marcc�" da sociedade As fratrias ser\'imm de gl:neros e os

Se a cacatua-branca é classificada numa lra-


elas tle espcues. !·01 por estarem agrupados que os ho­
1mtralianas.

me s pude ra m agrupar as coisas, po is , para dassifica 1 es·
1 1 1. 1 , a cacatua-preta o sera na outra; se o �ol estü num la­
tas úl t imas, limitaram-se a oferecer-lhes um lugar nos gru­
pos qi1e � les p�óprios formavam. E se es-.as diversas cla ­
o ln .1 Lua e os astros da noite estarão no lado oposto 1 8.
1 .n n muita freqüência, os seres que serYe m de totens às

ses de coisas nao fomm simplesmente JUStapostas umas as
. :
du.1s fratri as têm cores contrárias 1 9. Encontramos essas
.

outra� mas ordenadas segundo um plano unitário. é qt•e


grtJPOS s?c_i � is com os quais elas se 1,p0..,ições mesmo fora da Austrá lia. Lá onde uma das fra-
1 1 1.1s é encarregada da paz, a outra o será ela guerra20; se
bém �;iO solida nos e formam por sua uniao um todo orga­
os . ·onfun dem tan ­
� �

nico, ,1 tribo. A unidade desses primeiros sistemas lógicos


1 1 11w tem a água por totem, a ou tra tem por totem . a ter-
1,1 , 1 Certamente (: o que explica q u e as duas fratnas te-
apen :i� reproduz a unidade da sociedade. Uma primeira
111t 1m sido. em gcrnl. concebidas como naturalmente an-
ocasiP nos é assim oferecida de verificar a proposição
1.1gonicas uma da outra. Admite-se q u e haja entre elas
111 1 1 espécie de ri\alidade e, mesmo. de hostlidade cons-
que t>llunciáva nos no início d�sta obra � de nos a-.sc u
� _ �
rar que as noçoes fundamentais do espmto, as categorias
111 111iva22. A oposição das cois as estendeu-se as
! pessoas; o

1 n n traste lógico dupl icou-se numa espécie de conflito so-


essenôais do pensamento, podem ser o produto de fato­
res s<>-·iais. O que acabamos de ver demonstra. com efei­
to, q ul ess� é � c�so da p r pria noção de categoria.
? < 1 " �.

1.-0 nao significa, porem, que preten


damos recusar à
Por outro lado, no interior de cada fratria, dispuse-
c oên c ia indivi dual, mesmo reduz
1 1m se num mesmo clá as coisas que pareciam ter mais
ons ida a suas forças iw­
la d as , :1 faculdade ele perceber semelhanças entre as coisas
li m idade com aquela que servia ele totem. Por exem plo,
pos- s e a Lua j unto com a cacatua-preta' e o Sol, ao con-
parti (ll lares que ela se repre senta . Ao contr ário, vemos .
1 1 .irio. bem como a atmosfera e o vento, iunto com a caca-
111;1 branca Ou, então. reuniu-se ao animal totêmico tudo
clara n:ente que as classificações, inclusi\'e as mais simples .


e pri f1itivas . . já supõem essa acuidade Não é ao acaso
, que ser\ L à Jli1rn.!ntação2\ assim como os animais com
que 0 Juscra hano ordena as coisas num mesmo clã ou em
, ,., quais ele está mais intimamente associado1'i. Cl � ro qu e
m·m sem p re podemos compreender a obscu ra p s1�0I c:g1a
clãs ofaemcs. Tanto nele como em nós, as imagens simi­
la res ;e atrae m, as imag ens opostas se repel em, e (: de
.

' 1t1<.: presidiu a muitas d<.!ssas aproximações ou d1stmçoes.


.
acord' com o sentimento dessas afinidades e repulsas que
ele c1� ifica, aqui ou ali. as coisas correspondentes.
\l.is os exemplos dados são suficientes para mostrar que
11ma cerca intuição das semelhanças ou diferenças que as
144 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIG/0.\. 1 Nl:AÇ'AS ELEMENTrlRES 145

coisas apresentam desempenhou um papel na génese d< l 1 1 1mente definido, de coisas entre as quais existem la­
tais classificações. ' '" 1 nrernos, análogos aos laços de parentesco. E os (111i-
Uma coisa, porém, é o sentimento das semelhanças. 1 1s grupamentos desse tipo, que a experiência nos dá a
outra coisa a noção de género. O género é o quadro extl' ' 1 1 1 I iecer, são aqueles formados pelos homens ao se asso-
rior cujo conteúdo é formado, em parte, por objetos per 1 1 rt' m . As c o i s a s m a t e r i a i s p o d e m formar coleções,
cebidos como semelhantes. Ora, o conteúdo não podt• 1 1 1 1 1 mtoaclos, agregados mecânicos sem unidade interna,
fornecer o quadro no qual se dispõe. Ele é feito de üm 1 1 1 1 s não grupos no sentido que acabamos de dar ã pala-
gens vagas e.flutuantes, devidas à sobreposição e à fusão 1 llma pilha ele areia, um monte de pedras nada têm de
parcial de um n úmero determinado de imagens individuais 1 1 1 111 parável a esse tipo de sociedade definida e organiza­
1

que eventualmente têm elementos comuns; o quadro, ao l.1 q u e é gênero. Portanto, é muito provável que ja-
forma
um

contrário, é urna definida, com contornos nítidos. 1 1 1 . 1 1 s Lería mos podido pensar em reunir os seres do uni­
mas suscetível de aplicar-se a um número determinado ele• ' 1.,n e m grupos homogéneos, chamados géneros, se não
coisas, percebidas ou não, atuais ou possíveis. Todo gê 1 1 1 •·ssemos d i ante dos olhos o exemplo elas sociedades
nero, com efeito, tem um campo de extensão que ultra­ l 1 1 1 111anas, e inclusive se não tivéssemos começado por fa­
passa infinitamente o círculo dos objetos cuja semelhança ' 1 das próprias coisas membros ela sociedade cios ho-
percebemos por experiência direta. Eis por que toda u1·1a 1 1 w11s, de tal maneira que grupamentos humanos e grupa-
escola de pensadores se recusa, não sem razão, a identifi­ 1 1 1•·11tos lógicos foram a princípio confuncliclos26.
car as idéias de género e ele imagem genérica. A imagem Por outro lado, uma classificação é um sistema cujas
genérica não é senão a representação residual, de frontei­ 1 •. 1 1 tcs estão dispostas segundo uma ordem hierárquica.
ras indecisas, que representações semelhantes deixam em 1 1 1 caracteres dominantes e outros subordinados aos pri-
nós, quando se apresentam simultaneamente n a consciên­ 1 1 11• iros; as espécies e suas propriedades distintivas depen-
cia; já o género é u m símbolo lógico através do qual pen 11 1n cios géneros e dos atributos que os definem; ou, ain-
sarnas distintamente essas similitudcs e outras análogas. 1 l 1 . � 1 s diferentes espécies de um mesmo gêncro são con­
De resto, a melhor prova el a distância que separa essas , 1 •hitlas corno situadas no mesmo nível, tanto urnas quan-
duas noções é que o animal é capaz de formar imagens 1 ' . 1 s outras. Se o ponto de vista da compreensão é o que
genéricas, ao passo que ignora a arte de pensar por géne­ 1 11 vvalcce, representam-se então as coisas segundo uma
ros e por espécies. 1 1 1 i ll'm inversa: colocam-se em cima as espécies mais par-
A idéia ele género é um instrumento cio pensamento 1 1 1 1 dares e mais ricas em realidade, embaixo, os tipos mais
que foi manifestamente construído pelos homens. Mas, g< '1 �1is e mais pobres em qualidades. Mas não se deixa ele
para construí-lo, nos foi preciso, pelo menos, um modelo: , 1 1 1 1 cebê-Jos sob uma forma hierárquica. E não se deve
pois como teria ela podido surgir, se não houvesse nada 1 11 · 1 1sar que a expressão tenha aqui apenas um sentido
em nós ou fora ele nós que fosse capaz de sugeri-la? Res 1 1 11t.1fórico: trata-se realmente de relações ele subordina­
poncler que ela nos é dada a priori, não é responder; essa \ .11 > e coordenação que uma classificação tem por objeto
solução rreguiçosa é, como foi dito, a morte da análise. ' ,1.1helecer, e o homem sequer teria pensado em ordenar
Ora, não se percebe onde teríamos podido enconu-ar esse ·•·us conhecimentos clc..ssa maneira se não soubesse, an-
modelo indispensável, senão no espetáculo da vida coleti­ 1 1 ·s , o que é uma hierarquia. Ora, nem o espetáculo ela na-
va. Um género, com efeito, é u m grupamento ideal, mas 1 1 1 1vza fís ica, nem o mecanismo elas associações mentais
144 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIG/0.\. 1 Nl:AÇ'AS ELEMENTrlRES 145

coisas apresentam desempenhou um papel na génese d< l 1 1 1mente definido, de coisas entre as quais existem la­
tais classificações. ' '" 1 nrernos, análogos aos laços de parentesco. E os (111i-
Uma coisa, porém, é o sentimento das semelhanças. 1 1s grupamentos desse tipo, que a experiência nos dá a
outra coisa a noção de género. O género é o quadro extl' ' 1 1 1 I iecer, são aqueles formados pelos homens ao se asso-
rior cujo conteúdo é formado, em parte, por objetos per 1 1 rt' m . As c o i s a s m a t e r i a i s p o d e m formar coleções,
cebidos como semelhantes. Ora, o conteúdo não podt• 1 1 1 1 1 mtoaclos, agregados mecânicos sem unidade interna,
fornecer o quadro no qual se dispõe. Ele é feito de üm 1 1 1 1 s não grupos no sentido que acabamos de dar ã pala-
gens vagas e.flutuantes, devidas à sobreposição e à fusão 1 llma pilha ele areia, um monte de pedras nada têm de
parcial de um n úmero determinado de imagens individuais 1 1 1 111 parável a esse tipo de sociedade definida e organiza­
1

que eventualmente têm elementos comuns; o quadro, ao l.1 q u e é gênero. Portanto, é muito provável que ja-
forma
um

contrário, é urna definida, com contornos nítidos. 1 1 1 . 1 1 s Lería mos podido pensar em reunir os seres do uni­
mas suscetível de aplicar-se a um número determinado ele• ' 1.,n e m grupos homogéneos, chamados géneros, se não
coisas, percebidas ou não, atuais ou possíveis. Todo gê 1 1 1 •·ssemos d i ante dos olhos o exemplo elas sociedades
nero, com efeito, tem um campo de extensão que ultra­ l 1 1 1 111anas, e inclusive se não tivéssemos começado por fa­
passa infinitamente o círculo dos objetos cuja semelhança ' 1 das próprias coisas membros ela sociedade cios ho-
percebemos por experiência direta. Eis por que toda u1·1a 1 1 w11s, de tal maneira que grupamentos humanos e grupa-
escola de pensadores se recusa, não sem razão, a identifi­ 1 1 1•·11tos lógicos foram a princípio confuncliclos26.
car as idéias de género e ele imagem genérica. A imagem Por outro lado, uma classificação é um sistema cujas
genérica não é senão a representação residual, de frontei­ 1 •. 1 1 tcs estão dispostas segundo uma ordem hierárquica.
ras indecisas, que representações semelhantes deixam em 1 1 1 caracteres dominantes e outros subordinados aos pri-
nós, quando se apresentam simultaneamente n a consciên­ 1 1 11• iros; as espécies e suas propriedades distintivas depen-
cia; já o género é u m símbolo lógico através do qual pen 11 1n cios géneros e dos atributos que os definem; ou, ain-
sarnas distintamente essas similitudcs e outras análogas. 1 l 1 . � 1 s diferentes espécies de um mesmo gêncro são con­
De resto, a melhor prova el a distância que separa essas , 1 •hitlas corno situadas no mesmo nível, tanto urnas quan-
duas noções é que o animal é capaz de formar imagens 1 ' . 1 s outras. Se o ponto de vista da compreensão é o que
genéricas, ao passo que ignora a arte de pensar por géne­ 1 11 vvalcce, representam-se então as coisas segundo uma
ros e por espécies. 1 1 1 i ll'm inversa: colocam-se em cima as espécies mais par-
A idéia ele género é um instrumento cio pensamento 1 1 1 1 dares e mais ricas em realidade, embaixo, os tipos mais
que foi manifestamente construído pelos homens. Mas, g< '1 �1is e mais pobres em qualidades. Mas não se deixa ele
para construí-lo, nos foi preciso, pelo menos, um modelo: , 1 1 1 1 cebê-Jos sob uma forma hierárquica. E não se deve
pois como teria ela podido surgir, se não houvesse nada 1 11 · 1 1sar que a expressão tenha aqui apenas um sentido
em nós ou fora ele nós que fosse capaz de sugeri-la? Res 1 1 11t.1fórico: trata-se realmente de relações ele subordina­
poncler que ela nos é dada a priori, não é responder; essa \ .11 > e coordenação que uma classificação tem por objeto
solução rreguiçosa é, como foi dito, a morte da análise. ' ,1.1helecer, e o homem sequer teria pensado em ordenar
Ora, não se percebe onde teríamos podido enconu-ar esse ·•·us conhecimentos clc..ssa maneira se não soubesse, an-
modelo indispensável, senão no espetáculo da vida coleti­ 1 1 ·s , o que é uma hierarquia. Ora, nem o espetáculo ela na-
va. Um género, com efeito, é u m grupamento ideal, mas 1 1 1 1vza fís ica, nem o mecanismo elas associações mentais
1<+6 AS FOR.lfAS ELEME\TARES DA 17DA REll<.te I\ e Nl:.YÇAS El.EJ!Ei'vTARES

poderiam ser capazes de nos fornecer essa idéia. A hin I• mk·m-se harmonizam-se naturalmente. Por exemplo.
quia é exclusivamente uma coisa social. Somente na SOl I q11.1ndo enterram um wakelbura da fratria Mallera, o ta­
dacle existem superiores, inferiores, iguais. Conseq ül'nl l 1l.1do sobre o qual o corpo é exposto "eleve ser feito da
mente, ainda que o s fatos não fossem a tal p o n to d1 1 1 1;1deira de uma árvore pertencente ã fratria Mallcra"30. O
monstrativos, a simples análise dessas noções seria � 1 1 1 1 1 1 1l·smo em relação às ramagens que cobrem o cadáver.
ciente para revelar-lhes a origem. Foi da sociedade qut' , 1 'w o defunto é da classe Banbe, deverá se empregar uma
Lo�amos para projetá-las em seguida em nossa repre.\ lºll .11Yorc Banbe. Na mesma tribo, um mágico só pode ser­
taçao do mundo. Foi a sociedade que forneceu o sup< >ll ' i r se. para sua arte, de coisas relacionadas ã sua fratria3 1 ;
sobre o qual trabalhou o pensamento lógico. porque as outras, sendo-lhe estranhas, não saberiam obe­
d1Ter-lhe. Um laço de simpatia mística une assim cada in­
cl1' iduo aos seres, vivos ou não, que lhe são associados;
lll d1ssu resulta que se acredita poder induzir o que ele fará
1 >li o que ele fez a partir do que esses seres fazem. Entre

Mas essas classificações primitivas dizem respeito. 11;11 1 ns mesmos Wakelbura, quando um indivíduo sonha que
menos diretamente, à gênese do pensamento religioso. 111a tou um animal pertencente a determinada divisão social,
Elas implicam , com efeito, que todas as coisas as!>m dl' espera deparar-se no dia seguime com um homem da
classificadas num mesmo clã ou numa mesma fratria sao 1 11esma clivisão31. Lnversamente, as coisas associadas a um
parentes próximas tanto umas elas outras quanto daqu1.·l.a l la ou a uma fratria não podem servir contra os membros
que serve de totem a essa fratria ou a esse clã. Quando 1 1 dvssa fratria ou desse clã. Entre os Wotjobaluk, cada fra-
austra l iano da lribo de Port-Mackay diz d o Sol, das ser 1 1 1.1 1 cm suas árvores que lhe são próprias. Ora, para caçar
pentes, etc., que eles são da fratria Yungaroo, n ão esla 11 111 animal da fratria Gurogity, podem-se empregar ape-
querendo simplesmente aplicar a todos esses seres díspa 11.1s armas cuja madeira é tirada das á rvores da oulra fra-
res um rótulo comum. mas puramen te convenc ional: a 1 1 1;1 l' inversamente: senão o caçador tem certeza ele que
palavra tem para ele uma significação objetiva. Ele acredi l.tlhar.í-�3. O indígena está convencido de que a flecha se
ta que. realmente, "os jacarés são Yungaroo e que os can dl'wiaria espontaneamente do alvo e se recusaria, por as­
gurus seio Wooraroo. O Sol é Yungaroo. a Lua Wootaroo. sim dizer. a atingir um animal parente e amigo.
e assim por diame para as constela ções, as á rvores. a.� Assim, as pessoas do clà e as coisas que nele são
pl anta� , etc. "r.: Um laço interno os prende ao grupo no 1 l.1ssificadas formam, por sua reunião, um sistema soliclá-
qual sao classiftcaclos, são membros regulares dele. Diz-Sl' 1 10 em q u e todas as partes estão l igadas e vibram simpati­
q�� pertencem a esse grupo2s da mesma forma que os in­ ' .1rnl'nle. Essa organização que, à primeira vista, podia

d1v1duos humano s que dele fazem pane; por conseguinte, 11os parecer puramente lógica, é, ao mesmo tempo, mo-
uma relação do mesmo gênero os une a estes últimos. O 1 . t l l m mesmo princípio a anima e faz sua unidade: é o
homem ,.ê nas coisas de seu clã parentes ou associados; totl'm. Assim como u m homem pertencente ao clã cio
chama-as seus amigos. considera-as como feitas ela mes­ l .on o Ll'm nele algo desse animal, também a chuva, por
ma carne que ele.29. Assim, existem entre elas e ele afini­ 'l ' do mesmo clã e derender do mesmo totem, é n�ces­
dades eletivas e relações de conveniência muito particula­ s,1riamcme considerada como "sendo a mesma coisa que
res. Coisas e pessoas comunic am-se, ele certo modo, en- 1 1 1 1 1 co rvo" ; pela mesma razão, a Lua é uma cacatua-preta,
1<+6 AS FOR.lfAS ELEME\TARES DA 17DA REll<.te I\ e Nl:.YÇAS El.EJ!Ei'vTARES

poderiam ser capazes de nos fornecer essa idéia. A hin I• mk·m-se harmonizam-se naturalmente. Por exemplo.
quia é exclusivamente uma coisa social. Somente na SOl I q11.1ndo enterram um wakelbura da fratria Mallera, o ta­
dacle existem superiores, inferiores, iguais. Conseq ül'nl l 1l.1do sobre o qual o corpo é exposto "eleve ser feito da
mente, ainda que o s fatos não fossem a tal p o n to d1 1 1 1;1deira de uma árvore pertencente ã fratria Mallcra"30. O
monstrativos, a simples análise dessas noções seria � 1 1 1 1 1 1 1l·smo em relação às ramagens que cobrem o cadáver.
ciente para revelar-lhes a origem. Foi da sociedade qut' , 1 'w o defunto é da classe Banbe, deverá se empregar uma
Lo�amos para projetá-las em seguida em nossa repre.\ lºll .11Yorc Banbe. Na mesma tribo, um mágico só pode ser­
taçao do mundo. Foi a sociedade que forneceu o sup< >ll ' i r se. para sua arte, de coisas relacionadas ã sua fratria3 1 ;
sobre o qual trabalhou o pensamento lógico. porque as outras, sendo-lhe estranhas, não saberiam obe­
d1Ter-lhe. Um laço de simpatia mística une assim cada in­
cl1' iduo aos seres, vivos ou não, que lhe são associados;
lll d1ssu resulta que se acredita poder induzir o que ele fará
1 >li o que ele fez a partir do que esses seres fazem. Entre

Mas essas classificações primitivas dizem respeito. 11;11 1 ns mesmos Wakelbura, quando um indivíduo sonha que
menos diretamente, à gênese do pensamento religioso. 111a tou um animal pertencente a determinada divisão social,
Elas implicam , com efeito, que todas as coisas as!>m dl' espera deparar-se no dia seguime com um homem da
classificadas num mesmo clã ou numa mesma fratria sao 1 11esma clivisão31. Lnversamente, as coisas associadas a um
parentes próximas tanto umas elas outras quanto daqu1.·l.a l la ou a uma fratria não podem servir contra os membros
que serve de totem a essa fratria ou a esse clã. Quando 1 1 dvssa fratria ou desse clã. Entre os Wotjobaluk, cada fra-
austra l iano da lribo de Port-Mackay diz d o Sol, das ser 1 1 1.1 1 cm suas árvores que lhe são próprias. Ora, para caçar
pentes, etc., que eles são da fratria Yungaroo, n ão esla 11 111 animal da fratria Gurogity, podem-se empregar ape-
querendo simplesmente aplicar a todos esses seres díspa 11.1s armas cuja madeira é tirada das á rvores da oulra fra-
res um rótulo comum. mas puramen te convenc ional: a 1 1 1;1 l' inversamente: senão o caçador tem certeza ele que
palavra tem para ele uma significação objetiva. Ele acredi l.tlhar.í-�3. O indígena está convencido de que a flecha se
ta que. realmente, "os jacarés são Yungaroo e que os can dl'wiaria espontaneamente do alvo e se recusaria, por as­
gurus seio Wooraroo. O Sol é Yungaroo. a Lua Wootaroo. sim dizer. a atingir um animal parente e amigo.
e assim por diame para as constela ções, as á rvores. a.� Assim, as pessoas do clà e as coisas que nele são
pl anta� , etc. "r.: Um laço interno os prende ao grupo no 1 l.1ssificadas formam, por sua reunião, um sistema soliclá-
qual sao classiftcaclos, são membros regulares dele. Diz-Sl' 1 10 em q u e todas as partes estão l igadas e vibram simpati­
q�� pertencem a esse grupo2s da mesma forma que os in­ ' .1rnl'nle. Essa organização que, à primeira vista, podia

d1v1duos humano s que dele fazem pane; por conseguinte, 11os parecer puramente lógica, é, ao mesmo tempo, mo-
uma relação do mesmo gênero os une a estes últimos. O 1 . t l l m mesmo princípio a anima e faz sua unidade: é o
homem ,.ê nas coisas de seu clã parentes ou associados; totl'm. Assim como u m homem pertencente ao clã cio
chama-as seus amigos. considera-as como feitas ela mes­ l .on o Ll'm nele algo desse animal, também a chuva, por
ma carne que ele.29. Assim, existem entre elas e ele afini­ 'l ' do mesmo clã e derender do mesmo totem, é n�ces­
dades eletivas e relações de conveniência muito particula­ s,1riamcme considerada como "sendo a mesma coisa que
res. Coisas e pessoas comunic am-se, ele certo modo, en- 1 1 1 1 1 co rvo" ; pela mesma razão, a Lua é uma cacatua-preta,
148 t\ /l/ 1/L\TARr:\

1 ro1 ·ge o :i111m:1l tntê mico l"·aende-se aos ani-


o 'iol uma cac:acua-hranca coda árvore de macieira l
um pdtL..tno, t'.tc. Todos O!> seres cla�tf1cados nu 1 1 1 1 1 11 i.1dm>" e. em qua lquer un.unstância. de' t'.m-se
m o clã - homens, animais. planta5, objecos inanim,1d1
u h 1 111os consideraçõe s muito particulares1 1 . O s
são. panante>, simples modalidades do ser cocêmirn. l la
111os que canto u m quanto os outros inspiram são
o que sign ifica a fórmula menciona da há pouco 1· 'I 1 li i
1

produz verdadeiros congêneres: todos são realmenll


1 , , , q u e mostra ainda melhor que todas as coisas
mesma carne no sentido de que codos parcicipam da 1 1;11
1 l l H n l . 1.., a um totem nào d iferem deste em natu reza
reza do animal tott:mico. Aliás, os qual ificativos ()lll' l i
1 1, ,, , 11llo, um caráter rel igioso, é o fato de eventua l ­
dão são os mesmos dados ao cotem�1. Os Wocjobaluk d 1 ' t i• .1·111penharem o mesmo papel. São totens aces-
1 1 11 H.lá rio s. o u . segundo u m a expressao hoie
mam pelo mesmo nome ,\tir o cocem e a s coisas q111· ,
abra nge· '>. Lntrt'. os Anmta. onde, como ' cremos , l'Xt!\l� m
1 1d.1 pelo uso. suhtotens•3. Por mfluên cia <le sim-
ainda traç-w; 'isín:i s 1..lt.: d..ts�ifka\.ao. paLI\ra::. ducrl·1111
1 do mome nto se: lo rma m . num clã, afinidades
\'erdade, designam o totem e os seres a ele associadc1'; 111
1 11 1 1 • " · gmpos mais restritos, associações mais limi­
entanto, o nome dado a estes úlcimos tescemunha º' l c lf
l l l L ' tl'ndem a le\'ar uma vida relati\'arnente autôno­
tes vínculos que os unem ao animal cotêmico. DiZ-Sl' qu
são seus íntimos, seus sócios, seus amigos; acredita-s<.· q
' , 111,tttuir corno que uma subdivisão nova, uma es­
t l< .11hdã no interior do primeiro. Esse subclã, para
são inseparáveis deleii•. Tem-se, porranco, o sentinw1 1 1 a
1 1 1 111 1 1 1 1 -.e e individualizar-se, tem n ecessidade de um
d e u m parentesco muit0 próximo.
1 1 1 1 . 1 1 11n ilar, porta n to de um sub to te m •·• . Ora, é e nt re
Mas, por oucro lado, sabemos que o anima l t0Lê111 11 < >
é um ser sagrado. Logo, rodas as coisas classificadas 110
i1 1 d1\·ersas classificadas sob o totem principal que

clã do qual ele é o em b l em a cêm o mesmo caráter. u1111


1 1 1 1 1 < m os totens desses gru po s secundários . Elas
1 •1111, h ceral rnente . totens ' ircuab, e a menor circuns-
,·ez que são. num cerco sencido. animais da me5ma l'�rt
1 l ' suliciente para fazê-las ras-;ar ao ato Há. nelas.
1 1 11 t 1 1 t l l'Za totêm 1c1 latente. que se marufesca táo logo
cie. assnn como o homem. Tambem elas são sagradas: '11
as clas.'iificacões que as sicuam em relação às outras coisa.•
1ml1�1ic.s o permitam ou o exijam. Ocorre, assim. que
do uni,·erso, ao mesmo tempo a tribuem-lhes um lugar no
I l i < 11111 indidduo tenha dois totens: um totem princi-
conjunco do sistema religioso. Por isso, as que são ;1111
mais ou p l a ncas não podem ser l ivremente consu 111 id . 1 '
1 1 1 111111111 à tota l idade do clã, e um subtocem esrecífico
d •, l 1 de que el<:: faz parte. É algo como o 110111e11 e o
pelos membros humanos cio clã. Assim, na tribo cio Mu111 11111111 · 11 tios romanos 1s.
Gambier, as pessoas que têrn por totem uma serpente 11;111
\�. 1 1 'ZL'S, vemos inclusive um s ubclà libertar-se total-
venenosa não devem apenas se abster da carne dessa s<.·r
, 1mnar-se u m grupo autônomo, um clã i ndepc n­
pente; a das focas, das enguias, etc., lhes é igualmcn t1•
1, 1 1 1 1
l l l t , , ,ubtotem, entào, torna- se um totem prop riamen­
proibida3'.' Se. forçados pela necessidade, vierem a conwr
l l l c 1 ma tribo em que esse pmce<;so de segmenta ção
1 1 p1 11 ·'"'im dizer, le\'ado a ::.eu extremo limite é a dos
dessa carne. devem pelo menos atenuar o sacrilégio me
diante ritos expiatórios, como se se tratasse de cotens p n>
1 11111.1 111dKações comidas no primeiro li\TO de Spencer
pri amente d1cos:\>i. Entre os Euahlayi311, onde é permi ti do
1 11llt: 1 1 1.1 emonstra\'a1 que havia entre os Arnnca cerca
J
.1•111.1 toten s'"; mas as recentes pesquisas de Streh-
servir-se do totem. mas sem abusar dele. a mesma regra 1
se a plica às outras coisas do clã. Encre os Amnta, a inter-
1 t '"l . 1 heleceram que o número é bem mais considerá-
148 t\ /l/ 1/L\TARr:\

1 ro1 ·ge o :i111m:1l tntê mico l"·aende-se aos ani-


o 'iol uma cac:acua-hranca coda árvore de macieira l
um pdtL..tno, t'.tc. Todos O!> seres cla�tf1cados nu 1 1 1 1 1 11 i.1dm>" e. em qua lquer un.unstância. de' t'.m-se
m o clã - homens, animais. planta5, objecos inanim,1d1
u h 1 111os consideraçõe s muito particulares1 1 . O s
são. panante>, simples modalidades do ser cocêmirn. l la
111os que canto u m quanto os outros inspiram são
o que sign ifica a fórmula menciona da há pouco 1· 'I 1 li i
1

produz verdadeiros congêneres: todos são realmenll


1 , , , q u e mostra ainda melhor que todas as coisas
mesma carne no sentido de que codos parcicipam da 1 1;11
1 l l H n l . 1.., a um totem nào d iferem deste em natu reza
reza do animal tott:mico. Aliás, os qual ificativos ()lll' l i
1 1, ,, , 11llo, um caráter rel igioso, é o fato de eventua l ­
dão são os mesmos dados ao cotem�1. Os Wocjobaluk d 1 ' t i• .1·111penharem o mesmo papel. São totens aces-
1 1 11 H.lá rio s. o u . segundo u m a expressao hoie
mam pelo mesmo nome ,\tir o cocem e a s coisas q111· ,
abra nge· '>. Lntrt'. os Anmta. onde, como ' cremos , l'Xt!\l� m
1 1d.1 pelo uso. suhtotens•3. Por mfluên cia <le sim-
ainda traç-w; 'isín:i s 1..lt.: d..ts�ifka\.ao. paLI\ra::. ducrl·1111
1 do mome nto se: lo rma m . num clã, afinidades
\'erdade, designam o totem e os seres a ele associadc1'; 111
1 11 1 1 • " · gmpos mais restritos, associações mais limi­
entanto, o nome dado a estes úlcimos tescemunha º' l c lf
l l l L ' tl'ndem a le\'ar uma vida relati\'arnente autôno­
tes vínculos que os unem ao animal cotêmico. DiZ-Sl' qu
são seus íntimos, seus sócios, seus amigos; acredita-s<.· q
' , 111,tttuir corno que uma subdivisão nova, uma es­
t l< .11hdã no interior do primeiro. Esse subclã, para
são inseparáveis deleii•. Tem-se, porranco, o sentinw1 1 1 a
1 1 1 111 1 1 1 1 -.e e individualizar-se, tem n ecessidade de um
d e u m parentesco muit0 próximo.
1 1 1 1 . 1 1 11n ilar, porta n to de um sub to te m •·• . Ora, é e nt re
Mas, por oucro lado, sabemos que o anima l t0Lê111 11 < >
é um ser sagrado. Logo, rodas as coisas classificadas 110
i1 1 d1\·ersas classificadas sob o totem principal que

clã do qual ele é o em b l em a cêm o mesmo caráter. u1111


1 1 1 1 1 < m os totens desses gru po s secundários . Elas
1 •1111, h ceral rnente . totens ' ircuab, e a menor circuns-
,·ez que são. num cerco sencido. animais da me5ma l'�rt
1 l ' suliciente para fazê-las ras-;ar ao ato Há. nelas.
1 1 11 t 1 1 t l l'Za totêm 1c1 latente. que se marufesca táo logo
cie. assnn como o homem. Tambem elas são sagradas: '11
as clas.'iificacões que as sicuam em relação às outras coisa.•
1ml1�1ic.s o permitam ou o exijam. Ocorre, assim. que
do uni,·erso, ao mesmo tempo a tribuem-lhes um lugar no
I l i < 11111 indidduo tenha dois totens: um totem princi-
conjunco do sistema religioso. Por isso, as que são ;1111
mais ou p l a ncas não podem ser l ivremente consu 111 id . 1 '
1 1 1 111111111 à tota l idade do clã, e um subtocem esrecífico
d •, l 1 de que el<:: faz parte. É algo como o 110111e11 e o
pelos membros humanos cio clã. Assim, na tribo cio Mu111 11111111 · 11 tios romanos 1s.
Gambier, as pessoas que têrn por totem uma serpente 11;111
\�. 1 1 'ZL'S, vemos inclusive um s ubclà libertar-se total-
venenosa não devem apenas se abster da carne dessa s<.·r
, 1mnar-se u m grupo autônomo, um clã i ndepc n­
pente; a das focas, das enguias, etc., lhes é igualmcn t1•
1, 1 1 1 1
l l l t , , ,ubtotem, entào, torna- se um totem prop riamen­
proibida3'.' Se. forçados pela necessidade, vierem a conwr
l l l c 1 ma tribo em que esse pmce<;so de segmenta ção
1 1 p1 11 ·'"'im dizer, le\'ado a ::.eu extremo limite é a dos
dessa carne. devem pelo menos atenuar o sacrilégio me
diante ritos expiatórios, como se se tratasse de cotens p n>
1 11111.1 111dKações comidas no primeiro li\TO de Spencer
pri amente d1cos:\>i. Entre os Euahlayi311, onde é permi ti do
1 11llt: 1 1 1.1 emonstra\'a1 que havia entre os Arnnca cerca
J
.1•111.1 toten s'"; mas as recentes pesquisas de Streh-
servir-se do totem. mas sem abusar dele. a mesma regra 1
se a plica às outras coisas do clã. Encre os Amnta, a inter-
1 t '"l . 1 heleceram que o número é bem mais considerá-
150 AS PO!ll!AS ELE.1/
E.\7�1RES DA 17DA RELJc.ic 1 1)1

vel chegando a •H21' Portanto Spencer e Gillen não llll " ainda de totem principal· c;ó teria c;e difercn-
metiam nenhum exagero quando diziam que, .. na reg1àc 1 1 1 { 1 dd.1 numa epoca postcnor. Assim, as aYes chantun­
ocupada pelos indígenas. não existe um objeto, animadc hi•Jl .tssociadas à lagarta witchetty. teriam sido, no!'>
ou inanimado, que não dê seu nome a algum grupo 101 111p > fabulosos, lagartas witchetry que depois se trnns-
mico d e indivíduos"18. Ora, essa quancidade de totcn� 1 1 1 1 1 . 1 1 , 1 111 em aves. Duas espécies atualmente ligadas ao
prodigiosa se comparada ao número da população, dc\l 111 1 1 1 d.1 formiga-pastora teriam sido formigas-pastoras
se ao fato de os clàs primitivos, sob a iníluência de d r 1 ' .unente, etc.55 Essa tra nsformação ele um subtotem
n1 nstâncias particulares. terem se dividido e subdividido 1 1 1h1 1 t1i•t•ll'm efetua-se, aliás, por graus imperceptíveis, de
ao infinito; com isso, quase todos os su b1otcns passaram .1 11 11111 que. em certos casos, a situação é in decisa e é bas-
condição de LOlens. 1 1 " dill<:il dizer se se t ra ta d e u m totem principal o u de
{ o que as observações de Strehlow demonstraram
1 1 1 1 1 1 1 11v111 secundárioS11. Como diz 1 lowitt a propós ito dos
•111 11 1.duk, há submtens que MIO tolcns em via ck
dcfi n i l iv amen tc . S pc n ccr e Gillen haviam citado apcna� forma
alguns casos isolados de totens associados·19. Strehlow l , Assim, as d i fer e nles coisas classificad as num cl ã
mostrou que se tratava, em realidade, de uma organiza 111 .1 1 1 u 1.· rn como que outros tantos centros em to�no dos
ção absolutamente geral e pôde elaborar um quadro em 1 1 1 1 1 · podem se formar novos culLos totêmicos . E a me­
que praticamente todos os totens dos Arunta são classifi l h 11 prova dos sentimentos religiosos que elas inspiram.
cados de acordo com esse princípio: 1odos se ligam. na , 11 1 0 1ivessem um caráter sagrado, não poderiam ser
qualidade de associados ou auxiliares, a uns sessenta to 1 1 1 •1111 1\1das tão facilmente à mesma dignidade das coisas
tens principaisso. Os primeiros são considerados como e!'> 1 11 11l.1s por excelência, os totens propriamente dito:-..
tando a serviço dos segundoss1. Esse estado de depen e > drculo das coisas religiosas estende-se. portanto,
ciência é muito provavelmence o eco de um tempo em 1 1 1 1 . 1km dos limites dentro dos quais parecia a principio
q u e os -al iados� de hoje eram somente suhtorens. um 1 1 l rra lo. Ele n:io compreende apenas os animais totêmi-
tempo em que. portanto, a tribo só contava com um pc , ·� ,. 1is membros humanos do clã, mas como não existe
1 1 11 l.1 1k conhecido que não seja classificado num clã ou
1
queno número de clãs, subdivididos em subclãs. Numero­
sas sohrevivências confirmam essa hipótese. Ocorre fre­ •l i 1 1 111 totem, também não existe nada que não receba,
qi.ienremente que dois gnipos assim associados tenham o 1 1 1 g1.1us dive rsos , a lgum reílexo de religi osi da d e. Quan-
mesmo emblema totêmico: ora, a un i dade cio em blema só 1· . 1 1 . 1 s religiões que se formarão posteriormente, os deu­
é expl icável se, primi1ivamente, os dois grupos formavam ' propriam ente ditos a parecerem , cada um deles será
apenas um52. Além disso, o parentesco dos dois clãs se 1 1 11 . 1 1 rq.(aclo de uma ca tegoria especial ele fenôrnenos na-
ma n i festa pel a participação e o interesse de cada um de­ 1 1 1 1 1 1 -., este do mar, aquele da atmosfe ra , u m terceiro ela
les nos ritos cio outro. Os do i s cultos ainda estão apenas 1 1 11 i 1l'1!.t ou dos frutos, etc., e cada uma dessas pr ovíncias
imperfeitamente c;eparados; é que. com toda a certeza, no 1 1 i1ureza será considerada como dev e ndo a v i d a que
início se confundiam compl etamemes3. A tradição explica p1 1.. s111 .10 deus do qual ela depende. É p recisa meme essa
o vínculo que os une imaginando que, outrora. os dois 1 1 1 1. 1 1 1i�.1 0 ela natureza entre as diferentes divindades que
clãs ocupavam hábitats vizinhos'•. ;'\loutros casos, o mito .> que essas religiões nos dão do
1 1 •11'il1tui a representaçà
diz expressamente que um deles derivou do outro. Conta­ l l lll\ l'rso. Ora, enquanto a humanidade não ultrapassa a
se que o animal associado começou por pertencer à espé- 1 .,. do totemism o, os diferentes totens desempe nham
150 AS PO!ll!AS ELE.1/
E.\7�1RES DA 17DA RELJc.ic 1 1)1

vel chegando a •H21' Portanto Spencer e Gillen não llll " ainda de totem principal· c;ó teria c;e difercn-
metiam nenhum exagero quando diziam que, .. na reg1àc 1 1 1 { 1 dd.1 numa epoca postcnor. Assim, as aYes chantun­
ocupada pelos indígenas. não existe um objeto, animadc hi•Jl .tssociadas à lagarta witchetty. teriam sido, no!'>
ou inanimado, que não dê seu nome a algum grupo 101 111p > fabulosos, lagartas witchetry que depois se trnns-
mico d e indivíduos"18. Ora, essa quancidade de totcn� 1 1 1 1 1 . 1 1 , 1 111 em aves. Duas espécies atualmente ligadas ao
prodigiosa se comparada ao número da população, dc\l 111 1 1 1 d.1 formiga-pastora teriam sido formigas-pastoras
se ao fato de os clàs primitivos, sob a iníluência de d r 1 ' .unente, etc.55 Essa tra nsformação ele um subtotem
n1 nstâncias particulares. terem se dividido e subdividido 1 1 1h1 1 t1i•t•ll'm efetua-se, aliás, por graus imperceptíveis, de
ao infinito; com isso, quase todos os su b1otcns passaram .1 11 11111 que. em certos casos, a situação é in decisa e é bas-
condição de LOlens. 1 1 " dill<:il dizer se se t ra ta d e u m totem principal o u de
{ o que as observações de Strehlow demonstraram
1 1 1 1 1 1 1 11v111 secundárioS11. Como diz 1 lowitt a propós ito dos
•111 11 1.duk, há submtens que MIO tolcns em via ck
dcfi n i l iv amen tc . S pc n ccr e Gillen haviam citado apcna� forma
alguns casos isolados de totens associados·19. Strehlow l , Assim, as d i fer e nles coisas classificad as num cl ã
mostrou que se tratava, em realidade, de uma organiza 111 .1 1 1 u 1.· rn como que outros tantos centros em to�no dos
ção absolutamente geral e pôde elaborar um quadro em 1 1 1 1 1 · podem se formar novos culLos totêmicos . E a me­
que praticamente todos os totens dos Arunta são classifi l h 11 prova dos sentimentos religiosos que elas inspiram.
cados de acordo com esse princípio: 1odos se ligam. na , 11 1 0 1ivessem um caráter sagrado, não poderiam ser
qualidade de associados ou auxiliares, a uns sessenta to 1 1 1 •1111 1\1das tão facilmente à mesma dignidade das coisas
tens principaisso. Os primeiros são considerados como e!'> 1 11 11l.1s por excelência, os totens propriamente dito:-..
tando a serviço dos segundoss1. Esse estado de depen e > drculo das coisas religiosas estende-se. portanto,
ciência é muito provavelmence o eco de um tempo em 1 1 1 1 . 1km dos limites dentro dos quais parecia a principio
q u e os -al iados� de hoje eram somente suhtorens. um 1 1 l rra lo. Ele n:io compreende apenas os animais totêmi-
tempo em que. portanto, a tribo só contava com um pc , ·� ,. 1is membros humanos do clã, mas como não existe
1 1 11 l.1 1k conhecido que não seja classificado num clã ou
1
queno número de clãs, subdivididos em subclãs. Numero­
sas sohrevivências confirmam essa hipótese. Ocorre fre­ •l i 1 1 111 totem, também não existe nada que não receba,
qi.ienremente que dois gnipos assim associados tenham o 1 1 1 g1.1us dive rsos , a lgum reílexo de religi osi da d e. Quan-
mesmo emblema totêmico: ora, a un i dade cio em blema só 1· . 1 1 . 1 s religiões que se formarão posteriormente, os deu­
é expl icável se, primi1ivamente, os dois grupos formavam ' propriam ente ditos a parecerem , cada um deles será
apenas um52. Além disso, o parentesco dos dois clãs se 1 1 11 . 1 1 rq.(aclo de uma ca tegoria especial ele fenôrnenos na-
ma n i festa pel a participação e o interesse de cada um de­ 1 1 1 1 1 1 -., este do mar, aquele da atmosfe ra , u m terceiro ela
les nos ritos cio outro. Os do i s cultos ainda estão apenas 1 1 11 i 1l'1!.t ou dos frutos, etc., e cada uma dessas pr ovíncias
imperfeitamente c;eparados; é que. com toda a certeza, no 1 1 i1ureza será considerada como dev e ndo a v i d a que
início se confundiam compl etamemes3. A tradição explica p1 1.. s111 .10 deus do qual ela depende. É p recisa meme essa
o vínculo que os une imaginando que, outrora. os dois 1 1 1 1. 1 1 1i�.1 0 ela natureza entre as diferentes divindades que
clãs ocupavam hábitats vizinhos'•. ;'\loutros casos, o mito .> que essas religiões nos dão do
1 1 •11'il1tui a representaçà
diz expressamente que um deles derivou do outro. Conta­ l l lll\ l'rso. Ora, enquanto a humanidade não ultrapassa a
se que o animal associado começou por pertencer à espé- 1 .,. do totemism o, os diferentes totens desempe nham
152 A.\ FORMAS ELEllE.vTARE
.\ TJA 17nll REUCI0.\.1 1\ < /Uf.;\ÇAS ELE.\/Ei\T11RES 1 53

exatamente o papd que c:aherá mais tardi..: às personalida m pr.nk.ados no interior de uma mesma tribo não se
dl ..,l.!nvolvem paralelamente e ignorando-se uns aos ou-
1

des divinas. :'-la tnho do :\.1ont-Gamhier, que comamos co­


mo principal exemplo, há dez clàs; por conseguinte, o 1 1 c ,.., como se cada um fosse uma religião completa e au-
mundo inteiro é dividido em dez classes, ou melhor. em 1 < • ...uficiente. Ao contrário, eles se implicam mutuamente:
dez famílias, sendo que cada uma tem um totem especial .. 11 1 apenas partes de um mesmo todo. elementos de uma
por oligem. É dessa origem que todas as coisas classifica­ 1 1 1 ..sma religião. Os homens de um clã de modo nenhum
das num clã obtêm sua realidade, já que são concebidas 1 1 lllsideram as crenças dos clãs vizinhos com a indiferen­
como modos variados do ser totêmico; para reromar nosso � · 1 o ceticismo ou a hostilidade que uma religião alheia
exemplo, a chuva, o trovão, o relâ mpago, as nuvens, o gra­ • > 1 d i n ariame ntc inspira; eles próprios partilham essas
nizo. o inverno são vistos como tipos diferentes de corvo. , 11·11ças. As pessoas do Corvo também estão convencidas
Reunidas, essas dez famílias de coisas constituem uma re­ . i .. que as ela Serpente têm uma serpente mítica como an-
presi..:ntaçào completa e sistemática e.lo mundo, e ess a repre­ 1• 1 1.1 ssado e devem a essa origem virtudes especiais e po­
sentação é rel igi osa , uma vez que são noções religiosas que dc·rL'S maravil hosos. Acaso não vimos que, em certas co n­
fornecem seus princípios. Longe de limitar-se a uma ou i l1�·oes pelo menos, um homem não pode comer de um
duas categorias de seres, o domínio da religião totêrnka es­ l • • 1 1.· m que não é o seu, senão após ter obse1vado formali­
tende-se, po1tanto, até os últimos limites do universo e')­ l l.tdes rituais? Em particular, ele pede autorização aos in­
nheciclo. Assim como a religião grega, ela coloca o divino d1\ 1duos desse rotem. se acaso estiverem presentes. Por-
em toda parte; a fórmula célebre m:xvi:à nÀTJpfi 0Erov [Tudo 1 . 1 1\lo, também para ele esse alimento não é puramente
está cheio de deuses] pode igualmente serYir-lhe de divisa. 1 ' 1 . ,fono: também ele admite que, entre os membros de
Só que. para se poder conceber assim o totemismo. é 11111 dà de que não faz parte e o animal que lhes dá o no-
preciso modificar, num ponto essencial, a noção que por 111< i..:xistem íntimas afinidades. Aliás, essa comunhão de
muito tempo se teve dele. Até as descobertas dos últimos nças manifesta-se às vezes no culto. Se. em princípio.
anos, faziam-no consbtir inteiramente no culto de um to­ 1 ·� ntos relacionados a um totem só podem ser efetuados

tem particular e o definiam como a religião do clã. Desse 1 1e·IJs pessoas desse totem, é muito freqüente, porém, que
ponto de vista, parecia haver. numa mesma tribo, tantas 11 prl.!�entantcs de clàs diferentes os presenciem. Acontece
religiões totêmicas, independentes umas das outras, quan­ 1111 lusive não ser seu pa p el o de si m p les espectadores;
to s fossem os clãs nela existentes. Essa concepçào, por si­ 1 111 dúvi da , não são eles que oficiam, mas ornamentam

nal, estava de acordo com a idéia que se faz correntemen­ , " oficiantes e preparam o serviço. Eles próprios estão in-
te do clã: uma sociedade autônomasR, mai s ou menos fe­ 1 • 'lt's a dos em q u e o rito se celebre; por i sso , e m certas
s
chada às sociedades s i m ilares ou mantendo com estas 11 ll >os, são eles que convidam o clã qualificado a proceder
apenas relações exteriores e superficiais. Mas a realidade 1 1.il celebraçãoW.
é mais complexa Claro que o culto de cada totem tem 1 1:1. inclusive, todo um ciclo de ritos que se desenrola
sua sede no clã correspondente; é aí e somente aí que ele ol >iigatoriamente em presença da tribo reunida: as ceri-
é celebrado: são os membros do clã que têm esse encar­ 1 1 1 1 111i<1' LOtêmicas da iniciaçãoW.
go; é através deles que o totem é transmitido ele uma ge­ 1)e resto, a organiZ..lçào totêmica, tal como acabamos
ração a outra, bem como as crenças que constituem sua ( !, di..:screvê-la. deve manifestamente resultar de uma es­
base. /\las, por outro lado, os diferentes cultos totêmicos P• ., i1.· de entendimento entre todos os membros da tribo
152 A.\ FORMAS ELEllE.vTARE
.\ TJA 17nll REUCI0.\.1 1\ < /Uf.;\ÇAS ELE.\/Ei\T11RES 1 53

exatamente o papd que c:aherá mais tardi..: às personalida m pr.nk.ados no interior de uma mesma tribo não se
dl ..,l.!nvolvem paralelamente e ignorando-se uns aos ou-
1

des divinas. :'-la tnho do :\.1ont-Gamhier, que comamos co­


mo principal exemplo, há dez clàs; por conseguinte, o 1 1 c ,.., como se cada um fosse uma religião completa e au-
mundo inteiro é dividido em dez classes, ou melhor. em 1 < • ...uficiente. Ao contrário, eles se implicam mutuamente:
dez famílias, sendo que cada uma tem um totem especial .. 11 1 apenas partes de um mesmo todo. elementos de uma
por oligem. É dessa origem que todas as coisas classifica­ 1 1 1 ..sma religião. Os homens de um clã de modo nenhum
das num clã obtêm sua realidade, já que são concebidas 1 1 lllsideram as crenças dos clãs vizinhos com a indiferen­
como modos variados do ser totêmico; para reromar nosso � · 1 o ceticismo ou a hostilidade que uma religião alheia
exemplo, a chuva, o trovão, o relâ mpago, as nuvens, o gra­ • > 1 d i n ariame ntc inspira; eles próprios partilham essas
nizo. o inverno são vistos como tipos diferentes de corvo. , 11·11ças. As pessoas do Corvo também estão convencidas
Reunidas, essas dez famílias de coisas constituem uma re­ . i .. que as ela Serpente têm uma serpente mítica como an-
presi..:ntaçào completa e sistemática e.lo mundo, e ess a repre­ 1• 1 1.1 ssado e devem a essa origem virtudes especiais e po­
sentação é rel igi osa , uma vez que são noções religiosas que dc·rL'S maravil hosos. Acaso não vimos que, em certas co n­
fornecem seus princípios. Longe de limitar-se a uma ou i l1�·oes pelo menos, um homem não pode comer de um
duas categorias de seres, o domínio da religião totêrnka es­ l • • 1 1.· m que não é o seu, senão após ter obse1vado formali­
tende-se, po1tanto, até os últimos limites do universo e')­ l l.tdes rituais? Em particular, ele pede autorização aos in­
nheciclo. Assim como a religião grega, ela coloca o divino d1\ 1duos desse rotem. se acaso estiverem presentes. Por-
em toda parte; a fórmula célebre m:xvi:à nÀTJpfi 0Erov [Tudo 1 . 1 1\lo, também para ele esse alimento não é puramente
está cheio de deuses] pode igualmente serYir-lhe de divisa. 1 ' 1 . ,fono: também ele admite que, entre os membros de
Só que. para se poder conceber assim o totemismo. é 11111 dà de que não faz parte e o animal que lhes dá o no-
preciso modificar, num ponto essencial, a noção que por 111< i..:xistem íntimas afinidades. Aliás, essa comunhão de
muito tempo se teve dele. Até as descobertas dos últimos nças manifesta-se às vezes no culto. Se. em princípio.
anos, faziam-no consbtir inteiramente no culto de um to­ 1 ·� ntos relacionados a um totem só podem ser efetuados

tem particular e o definiam como a religião do clã. Desse 1 1e·IJs pessoas desse totem, é muito freqüente, porém, que
ponto de vista, parecia haver. numa mesma tribo, tantas 11 prl.!�entantcs de clàs diferentes os presenciem. Acontece
religiões totêmicas, independentes umas das outras, quan­ 1111 lusive não ser seu pa p el o de si m p les espectadores;
to s fossem os clãs nela existentes. Essa concepçào, por si­ 1 111 dúvi da , não são eles que oficiam, mas ornamentam

nal, estava de acordo com a idéia que se faz correntemen­ , " oficiantes e preparam o serviço. Eles próprios estão in-
te do clã: uma sociedade autônomasR, mai s ou menos fe­ 1 • 'lt's a dos em q u e o rito se celebre; por i sso , e m certas
s
chada às sociedades s i m ilares ou mantendo com estas 11 ll >os, são eles que convidam o clã qualificado a proceder
apenas relações exteriores e superficiais. Mas a realidade 1 1.il celebraçãoW.
é mais complexa Claro que o culto de cada totem tem 1 1:1. inclusive, todo um ciclo de ritos que se desenrola
sua sede no clã correspondente; é aí e somente aí que ele ol >iigatoriamente em presença da tribo reunida: as ceri-
é celebrado: são os membros do clã que têm esse encar­ 1 1 1 1 111i<1' LOtêmicas da iniciaçãoW.
go; é através deles que o totem é transmitido ele uma ge­ 1)e resto, a organiZ..lçào totêmica, tal como acabamos
ração a outra, bem como as crenças que constituem sua ( !, di..:screvê-la. deve manifestamente resultar de uma es­
base. /\las, por outro lado, os diferentes cultos totêmicos P• ., i1.· de entendimento entre todos os membros da tribo
1 54 AS FORA/AS ELEME!vTARES DA VTDA REL!GJO.\. I

indistintamente. É impossível que cada clã tenha elabor:1 1 \ l 'l'l'l ILO I V


do suas crenças de uma maneira absolutamente inclepen \� CRENÇAS PROPRIAMENTE
ciente; é preciso, forçosamente, que os cultos cios cliversm
1 '< >TÊMI CAS
1/ / /lfll)
totens tenham sido ele algum modo ajustados uns aos ou
tros, visto que se completam com exatidão. De fato, vimo�
que, normalmente, um mesmo totem não se repetia dua�
vezes na mesma tribo e que o universo inteiro era repa11i
do entre os totens assim constituídos, para que o mesmo
objeto não se achasse em dois clàs diferentes. Uma reparti
çào tão metódica não poderia ter sido feita sem um acor
cio, tácito ou explícito, de que a u'ibo inteira deveria parti
cipar. O conjunto ele crenças assim originado é, portanto.
em parte (mas apenas em parte), uma coisa triba J61 .
Em resumo : para se fazer uma idéia adequada do to­
temismo, convém nã o se limitar ao clã, mas considerar a
tribo em sua totalidade. Seguramente, o culto pa 1ticu la r d1• 1 V - O totem individual e o totem sexual
cada clã goza de uma grande autonomia: pode-se mesmo
prever desde agora que é no clã que se encontra o fer­ No que precede, estudamos o totemismo apenas co-
mento ativo da vida religi os a. Mas, por outro lado, todos 1 1 10 uma instituição pública: os únicos totens que foram
esses cultos são solidários uns elos otmos e a religião totê­ !'.los até aqui eram objeto comum de um clã, de uma fra-
mica é o sistema complexo formado pela reunião deles, 1 1 1. 1 ou, num certo sentido, ela tribo 1 ; o indivíduo só partici-
assmi como o p oliteísmo grego era constituído pela reunião
1 1. 1 \ ,l enquanto membro do grupo. Mas sabemos que não
l 1.1 rdigiâo que não tenha um aspecto incliviclual. Essa ob­
ele todos os cultos pa rticu lares que se endereçavam às di­
ferentes divindades. Com isso, mo stramos que o toternis­
" ·1 vaçâo geral se aplica ao totemismo. Ao lado cios totens
mo, assim entendido, também tem sua cosmologia.
1 1 1 q )t:ssoais e coletivos que figuram em primeiro plano, há
1 11 1 1 ros que são próprios ele cada indivíduo, que exprimem
1 1 .1 personal idade e cujo culto ele celebra cm particular.

Em algu mas tribos auslralianas e na maior parte elas


"1tit:dacles indígenas da América cio NorteL, cada indiví­
i l 110 mantém pessoalmente com urna coisa determinada
1 1111<1 relação comparável àquela que ca d a clã manLém
, 1 )fll seu totem. Essa coisa é, às vezes, um ser inanimado
1 54 AS FORA/AS ELEME!vTARES DA VTDA REL!GJO.\. I

indistintamente. É impossível que cada clã tenha elabor:1 1 \ l 'l'l'l ILO I V


do suas crenças de uma maneira absolutamente inclepen \� CRENÇAS PROPRIAMENTE
ciente; é preciso, forçosamente, que os cultos cios cliversm
1 '< >TÊMI CAS
1/ / /lfll)
totens tenham sido ele algum modo ajustados uns aos ou
tros, visto que se completam com exatidão. De fato, vimo�
que, normalmente, um mesmo totem não se repetia dua�
vezes na mesma tribo e que o universo inteiro era repa11i
do entre os totens assim constituídos, para que o mesmo
objeto não se achasse em dois clàs diferentes. Uma reparti
çào tão metódica não poderia ter sido feita sem um acor
cio, tácito ou explícito, de que a u'ibo inteira deveria parti
cipar. O conjunto ele crenças assim originado é, portanto.
em parte (mas apenas em parte), uma coisa triba J61 .
Em resumo : para se fazer uma idéia adequada do to­
temismo, convém nã o se limitar ao clã, mas considerar a
tribo em sua totalidade. Seguramente, o culto pa 1ticu la r d1• 1 V - O totem individual e o totem sexual
cada clã goza de uma grande autonomia: pode-se mesmo
prever desde agora que é no clã que se encontra o fer­ No que precede, estudamos o totemismo apenas co-
mento ativo da vida religi os a. Mas, por outro lado, todos 1 1 10 uma instituição pública: os únicos totens que foram
esses cultos são solidários uns elos otmos e a religião totê­ !'.los até aqui eram objeto comum de um clã, de uma fra-
mica é o sistema complexo formado pela reunião deles, 1 1 1. 1 ou, num certo sentido, ela tribo 1 ; o indivíduo só partici-
assmi como o p oliteísmo grego era constituído pela reunião
1 1. 1 \ ,l enquanto membro do grupo. Mas sabemos que não
l 1.1 rdigiâo que não tenha um aspecto incliviclual. Essa ob­
ele todos os cultos pa rticu lares que se endereçavam às di­
ferentes divindades. Com isso, mo stramos que o toternis­
" ·1 vaçâo geral se aplica ao totemismo. Ao lado cios totens
mo, assim entendido, também tem sua cosmologia.
1 1 1 q )t:ssoais e coletivos que figuram em primeiro plano, há
1 11 1 1 ros que são próprios ele cada indivíduo, que exprimem
1 1 .1 personal idade e cujo culto ele celebra cm particular.

Em algu mas tribos auslralianas e na maior parte elas


"1tit:dacles indígenas da América cio NorteL, cada indiví­
i l 110 mantém pessoalmente com urna coisa determinada
1 1111<1 relação comparável àquela que ca d a clã manLém
, 1 )fll seu totem. Essa coisa é, às vezes, um ser inanimado
156 ;15 FOf?l/.-1S ELl-:lflrtARES IJA
I\ CRESÇAS EJ..E.llE.\T/IRES 157
17D;i Rli/JGJU.\. I

ou um objeto ani fi cial, nw s n a lllJior ia das ve%es é u m


li\ idua l possuiria o dom de ver fu turo; se leva o nome do
1 1 1so, d i z-se
animal. Em ceno:,; caso:., u ma rxir1;i o rcstriLa do organis­
qu<::
mo, como a cabeça, os pés , O fíga do, cump re a mesma
se arr isca a ser ferido cm combates, por­
i
que o urso é lento e pesado e dexa -
fu nção.i .
se apanhar facilmen­
r.oJ\ se o a n i m a l é desprezado, o ho mem é ob j eto do
clesprezo 1•. A afinidade dos dois seres é mesmo
O nome da coisa serve ca m btm de nome ao indiví­
duo. É seu nome pessoal , se u prenome que se acrescenta
1 11 esmo

1 d que, e m ce rtas ci rcu nstâ nc ias, sob rewdo de perig� ,


rcredi ta- se que
ao totem coletivo como o p roenomen cios romanos ao
1wmem gentilicil11 1. É verda de C J llr o fato nos é afirmado
o homem pod e tomar a forma do a111-
; 1 1 1 a J l5 . lnversa mente, o animal é considerado u m d upl o do
a pe nas de um certo n úmero c e soci eda des ·I; mas e l e é
!
l 1 omem, seu alter ego16. Um a associação tão ínti m a q u e
.
provav e l mente geral Com efeito, mostraremos, daqu i a
pouco, que há i de ntidat.lc t.lc na tureza entre a cois.i e o
·l'Us destinos sao tidos geralmente como solidários: nada
pode atingir um deles sem se refletir no outro17. Se ? an i­
indivítlu o; ora, a idcnlid,1de d<;_ n?run:za implka a do no­
JJJal morre, a \.1da do homem e ame aç.ida. Por isso, e u ma
rl·gra muito gera l que não se deve matar o a n imal nem,
me. Conferido durante ccri moma1 religiosas part icula r­

sobretudo, comer s u a carne. A i nterd ição, que, no caso


mente i mportantcs, esse pre nom e f)ossu i um caráLCr sa­
grado. Não é pronu n ci a do nas CHcunstâ ncias ordin árias
.

da vida p rofa na Ocorre me s mo que <i pa l a v ra da língua


do totem do c l ã , comporta u m a série de atenuações e
. .1daplações, é a qui bem mais forma l e absoluta 111.
usual que serve para clcsign:r r a coisa seja mais ou menos
modificada para servir a esse emprego panicular5. É q ue
Por seu lado, o animal protege o homem e lhe serve,

os Lermos da língua usual sfio ex.cluidos da vida religiosa.


de certo modo, de padroeiro. Adverte-o dos perigos pos­
"í\•eis e dos meios de escapar deles19; dizemos que ele é
Pelo menos nas tribos a111encanas, esse nome é refor­
çado por u m emblema que perte nce a cada indiv íduo e
.�eu amigo211. Inclusive, como é tido gera lmente por poss u ir

que, sob formas diversas rcp rescma a coisa que esse no­
, poderes maravilhosos, transmite-os a seu associado hu­

me designa. Cada Mandan, por exemplo, leva a pele do


lllano. Este ju lga-se à prova ele ba l as, flechas, awques de

animal de que é o hornônim06. S� for u ma ave, ele se en­


toda espéci e2 1 . A con fia nça que o indivíduo tem na eficá­
feita com suas plu mas7. Os J Jurani�nos, os Algonquins ta­
cia de seu protetor é w I que el <:: afronta os m a iores peri­
gos e rea liza proezas desconcertantes com uma serena in­
t u a m -se com a imagem desse a n 1 1nalR. Representam-no
em suas armas'1• Nas tribos do Nonlcste, o emblema indi­
i repidez: a fé lhe dá a coragem e a força necessáriasu. Con­
tudo, as relações do homem com seu padroeiro não sào
,·idual é gravado ou esc ulpi d o, as �im como o embl ema
pura ,
co let ivo cio clã, nos utensílios, nas cas as10 , ele. ; o prim eiro
de e simples dependência. O indiv íduo por � ua v�z,
pode agir sohre o animal. Dá-lhe ordens, exerce i nfl u en ­
se1ve de marca ele p ropriedade pessoaJ 1 1 . Mu itas vezes os
dois emblemas se combinam: é o que ex pl ica, cm parte, a
cia sobre ele. Um Kurnai que tem o tubarão como amigo
e.: aliado acredita poder, por meio de um encantamento,
grande d iver->idadc de a�pectos que apresenta m, nesses
dispersar os tubarões que amea1,.am um harco� ·1. Noutros
povos, os brasões totêmic<J.'1i,
Entre o indivíduo e seu a nim al epônimo existem os
casos, o vinculo assim contraído daria ao homem uma ap­

vínculos mais estreitos. O ho mem Pa rt icipa ela nature za


tidão particular para caçar o animal com sucessol •.
A natureza mesma dessas relações parece ind icar cla­
cio animal; tem suas qualidades , assi;11 como tamb ém seus
ramente que o ser ao qual cada ind ivídu o está assim asso­
defeitos. Por exemplo, quem rcm a aguia como brasão in-
ciado só pode ser, ele próprio, um indivíd uo não u ma ,
156 ;15 FOf?l/.-1S ELl-:lflrtARES IJA
I\ CRESÇAS EJ..E.llE.\T/IRES 157
17D;i Rli/JGJU.\. I

ou um objeto ani fi cial, nw s n a lllJior ia das ve%es é u m


li\ idua l possuiria o dom de ver fu turo; se leva o nome do
1 1 1so, d i z-se
animal. Em ceno:,; caso:., u ma rxir1;i o rcstriLa do organis­
qu<::
mo, como a cabeça, os pés , O fíga do, cump re a mesma
se arr isca a ser ferido cm combates, por­
i
que o urso é lento e pesado e dexa -
fu nção.i .
se apanhar facilmen­
r.oJ\ se o a n i m a l é desprezado, o ho mem é ob j eto do
clesprezo 1•. A afinidade dos dois seres é mesmo
O nome da coisa serve ca m btm de nome ao indiví­
duo. É seu nome pessoal , se u prenome que se acrescenta
1 11 esmo

1 d que, e m ce rtas ci rcu nstâ nc ias, sob rewdo de perig� ,


rcredi ta- se que
ao totem coletivo como o p roenomen cios romanos ao
1wmem gentilicil11 1. É verda de C J llr o fato nos é afirmado
o homem pod e tomar a forma do a111-
; 1 1 1 a J l5 . lnversa mente, o animal é considerado u m d upl o do
a pe nas de um certo n úmero c e soci eda des ·I; mas e l e é
!
l 1 omem, seu alter ego16. Um a associação tão ínti m a q u e
.
provav e l mente geral Com efeito, mostraremos, daqu i a
pouco, que há i de ntidat.lc t.lc na tureza entre a cois.i e o
·l'Us destinos sao tidos geralmente como solidários: nada
pode atingir um deles sem se refletir no outro17. Se ? an i­
indivítlu o; ora, a idcnlid,1de d<;_ n?run:za implka a do no­
JJJal morre, a \.1da do homem e ame aç.ida. Por isso, e u ma
rl·gra muito gera l que não se deve matar o a n imal nem,
me. Conferido durante ccri moma1 religiosas part icula r­

sobretudo, comer s u a carne. A i nterd ição, que, no caso


mente i mportantcs, esse pre nom e f)ossu i um caráLCr sa­
grado. Não é pronu n ci a do nas CHcunstâ ncias ordin árias
.

da vida p rofa na Ocorre me s mo que <i pa l a v ra da língua


do totem do c l ã , comporta u m a série de atenuações e
. .1daplações, é a qui bem mais forma l e absoluta 111.
usual que serve para clcsign:r r a coisa seja mais ou menos
modificada para servir a esse emprego panicular5. É q ue
Por seu lado, o animal protege o homem e lhe serve,

os Lermos da língua usual sfio ex.cluidos da vida religiosa.


de certo modo, de padroeiro. Adverte-o dos perigos pos­
"í\•eis e dos meios de escapar deles19; dizemos que ele é
Pelo menos nas tribos a111encanas, esse nome é refor­
çado por u m emblema que perte nce a cada indiv íduo e
.�eu amigo211. Inclusive, como é tido gera lmente por poss u ir

que, sob formas diversas rcp rescma a coisa que esse no­
, poderes maravilhosos, transmite-os a seu associado hu­

me designa. Cada Mandan, por exemplo, leva a pele do


lllano. Este ju lga-se à prova ele ba l as, flechas, awques de

animal de que é o hornônim06. S� for u ma ave, ele se en­


toda espéci e2 1 . A con fia nça que o indivíduo tem na eficá­
feita com suas plu mas7. Os J Jurani�nos, os Algonquins ta­
cia de seu protetor é w I que el <:: afronta os m a iores peri­
gos e rea liza proezas desconcertantes com uma serena in­
t u a m -se com a imagem desse a n 1 1nalR. Representam-no
em suas armas'1• Nas tribos do Nonlcste, o emblema indi­
i repidez: a fé lhe dá a coragem e a força necessáriasu. Con­
tudo, as relações do homem com seu padroeiro não sào
,·idual é gravado ou esc ulpi d o, as �im como o embl ema
pura ,
co let ivo cio clã, nos utensílios, nas cas as10 , ele. ; o prim eiro
de e simples dependência. O indiv íduo por � ua v�z,
pode agir sohre o animal. Dá-lhe ordens, exerce i nfl u en ­
se1ve de marca ele p ropriedade pessoaJ 1 1 . Mu itas vezes os
dois emblemas se combinam: é o que ex pl ica, cm parte, a
cia sobre ele. Um Kurnai que tem o tubarão como amigo
e.: aliado acredita poder, por meio de um encantamento,
grande d iver->idadc de a�pectos que apresenta m, nesses
dispersar os tubarões que amea1,.am um harco� ·1. Noutros
povos, os brasões totêmic<J.'1i,
Entre o indivíduo e seu a nim al epônimo existem os
casos, o vinculo assim contraído daria ao homem uma ap­

vínculos mais estreitos. O ho mem Pa rt icipa ela nature za


tidão particular para caçar o animal com sucessol •.
A natureza mesma dessas relações parece ind icar cla­
cio animal; tem suas qualidades , assi;11 como tamb ém seus
ramente que o ser ao qual cada ind ivídu o está assim asso­
defeitos. Por exemplo, quem rcm a aguia como brasão in-
ciado só pode ser, ele próprio, um indivíd uo não u ma ,
l'i8 AS FONMAS ELEMENTAR/is JJA l'llJA NllLf(,'/()�A 1 \ CNESÇA.S E/Fl/l:,V/i!Nfü' 159

chss(' N:i o st• lem uma espécie como alter e1 w ík fa10. 1 1 nda maa- porque o próprio primitivo serve-se da mesma
ha casos em que é com ceneza tal árvore, tal pedra dt'ter­ p.tla\ía para des ig na r o lotem do da e o animal p rot1.:t l> 1
minada que desempenha esse papef25. É o que acontece do indivíduoi•. Se Tylor e Powell rejcitaram essa denomi-
11 içao e redamarnm tem1os diferentes para esses dois t i­
pos de institu içôcs religiosas. é porque, segundo eles, o
necessariamente sempre q u e se traca de um a n i m a l , e a

101em coletivo n:1o passa de um nome. de u ma design a­


existência desse animal e a do homem são consideradas

\ .10 com u m , sem carál<:r rclig ioso}s. Mas sabemos, a o


solidáriai,. Seria i mpossível escar unido por uma solida rie­

1ontrário, que e l l' e uma coisa sagrada. e i n cl us i \ e c m


dade dei,se tipo a u m a espécie inteira, pois nao há dia

ma is alco grau que o a ni ma l protetor. A continuação e.lesse


nem instame, por assim dizer, em que essa espécie não
perca algum de seus membros. Todavia, há no primiti\·o
l·.-.1udo irá mostrar. .1has, o quanto esses dois tipos de to
tem1::.mo "ªº msepar�l\ 1.:1::. um do outro .
uma cena incapacidade de pensar o individuo separada­

Contudo, por 111a1ur C)Ul' s1.:ja a ,1finidade dessas duas


mente da espern:; o vinculo que o une a um estende-se
l1•llllralm1.:me a outra, ele os confunde no nwsmo '>Ull1
mento. Por isso, a espécie inteira lhe é sagrada i11• rnstiruiçõcs, há entre elas diferenças importantes. Enquan­
Esse Sl'r prol cto r (• naLuralmencc chamado por nomes to o clã se considera oriundo do animal ou da planta que
diferences conforme as sociedades: 11ag11al entre os índios lhe serve de cotem . o indivíduo não acredita manter ne­
do t\léxicol7, 111a11i111 entre os Algonquins, okki cntrc e s nhuma relaçao de descendência com seu cocem pessoa l .
l luranianos.!li, s11am entre alguns Salish2>.1, sulia entre ou­ 1 ste é u m am igo, um socio, u m protetor: n ã o é u m as
tros11l, h11djt111 entre os Yuin3 1 , yunbeai entre os Euahlayi il, 1l
'ndente. O homem se bcncfkia das virtudes que ele su­
etc. postamcncc possui, mas náo súo do mesmo sangue. Em
,egundo lugar. os membros de um clã permitem aos dàs
CU J O nome carregam coleti\ a­
Por musa da imponância que têm essas crenças entre
os índios da América do Norte , propôs-se criar a palavra ' 1;:inhos comer do m im ai
.

11ag 11afism11 ou 111c111ituísmo para designá lasu Mas dan rnente. com a úni ca cond1cáo de que formalidades neccs­
do-lhes u m nome especi a l e distintivo, amscamo-nos a .,arias se1am observadas. Ao contrario, o individuo nao
-.omente respeita a es ré c: ic à qu�tl pertence seu totcm
como tambl:m s1.: esforça para protegê l a contra
desconhecer sua relação com o 1ocemismo. Com efeito,
são os mcsmos p rincír ios que se aplicam aqui ao clã pessoal.
1is estrangeiros, pelo menos cm toda parte que o dcstino
e al i
ao
-

indivíduo. Em am bos os casos, trata-se ela mesma crcn­


'Xistência de vínculos vitais entre as coisas e os ho­ do homem e do animal sejam tidos como conexos.
to te ns diferem s obretu do re-
i; na l
;a
mens, as pr i me i ras sendo dotadas ele poderes cspcciais de Mas esses dois tipos de
q u e seus <1l iados humanos Li ram proveito. Tra t;1-se wm­ 1; 1 maneira corno são adqui ridos.
bém do mesmo costume de da r ao homem o nome da O Lotem coletivo faz pa rte do estatuto legal de cada
coisa à qual é associado e j un tar a esse nomc um emble­ md i v íd u o, é geralmente hereditário; cm todo caso, l: o
ma. O l otem é o padroeiro do clã, assim como o padroei nascimento que o dl'signa sem q u e a vontade dos ho
ro do indivíduo St!1ve-lhe de totem pessoal . 1Já interess<:, 111ens intervenha. Ora a criança tem o totem de sua mãe
h.a milaroi, Dicri, l ra h u nna. etc.), ora o do pai (Narrinye-
\\í'arramunga, CtC.). ( ra ainda O que predomina no lu­
porta1110, cm que a terminologia torne sensível essa afini­ e

dade dos dois sistemas; por isso, com Frazer, chamaremos 1i.

tote1111��1110 individ11af o culto que cada indivíduo presta a gar cm que sua m:ie concebeu (Arunta, Loritja). Ao con­
seu padroeiro. Em certos casos, essa expressão justifica-se trario, o lotem indi\ idual é adquirido por u m ato delibera-
l'i8 AS FONMAS ELEMENTAR/is JJA l'llJA NllLf(,'/()�A 1 \ CNESÇA.S E/Fl/l:,V/i!Nfü' 159

chss(' N:i o st• lem uma espécie como alter e1 w ík fa10. 1 1 nda maa- porque o próprio primitivo serve-se da mesma
ha casos em que é com ceneza tal árvore, tal pedra dt'ter­ p.tla\ía para des ig na r o lotem do da e o animal p rot1.:t l> 1
minada que desempenha esse papef25. É o que acontece do indivíduoi•. Se Tylor e Powell rejcitaram essa denomi-
11 içao e redamarnm tem1os diferentes para esses dois t i­
pos de institu içôcs religiosas. é porque, segundo eles, o
necessariamente sempre q u e se traca de um a n i m a l , e a

101em coletivo n:1o passa de um nome. de u ma design a­


existência desse animal e a do homem são consideradas

\ .10 com u m , sem carál<:r rclig ioso}s. Mas sabemos, a o


solidáriai,. Seria i mpossível escar unido por uma solida rie­

1ontrário, que e l l' e uma coisa sagrada. e i n cl us i \ e c m


dade dei,se tipo a u m a espécie inteira, pois nao há dia

ma is alco grau que o a ni ma l protetor. A continuação e.lesse


nem instame, por assim dizer, em que essa espécie não
perca algum de seus membros. Todavia, há no primiti\·o
l·.-.1udo irá mostrar. .1has, o quanto esses dois tipos de to
tem1::.mo "ªº msepar�l\ 1.:1::. um do outro .
uma cena incapacidade de pensar o individuo separada­

Contudo, por 111a1ur C)Ul' s1.:ja a ,1finidade dessas duas


mente da espern:; o vinculo que o une a um estende-se
l1•llllralm1.:me a outra, ele os confunde no nwsmo '>Ull1
mento. Por isso, a espécie inteira lhe é sagrada i11• rnstiruiçõcs, há entre elas diferenças importantes. Enquan­
Esse Sl'r prol cto r (• naLuralmencc chamado por nomes to o clã se considera oriundo do animal ou da planta que
diferences conforme as sociedades: 11ag11al entre os índios lhe serve de cotem . o indivíduo não acredita manter ne­
do t\léxicol7, 111a11i111 entre os Algonquins, okki cntrc e s nhuma relaçao de descendência com seu cocem pessoa l .
l luranianos.!li, s11am entre alguns Salish2>.1, sulia entre ou­ 1 ste é u m am igo, um socio, u m protetor: n ã o é u m as
tros11l, h11djt111 entre os Yuin3 1 , yunbeai entre os Euahlayi il, 1l
'ndente. O homem se bcncfkia das virtudes que ele su­
etc. postamcncc possui, mas náo súo do mesmo sangue. Em
,egundo lugar. os membros de um clã permitem aos dàs
CU J O nome carregam coleti\ a­
Por musa da imponância que têm essas crenças entre
os índios da América do Norte , propôs-se criar a palavra ' 1;:inhos comer do m im ai
.

11ag 11afism11 ou 111c111ituísmo para designá lasu Mas dan rnente. com a úni ca cond1cáo de que formalidades neccs­
do-lhes u m nome especi a l e distintivo, amscamo-nos a .,arias se1am observadas. Ao contrario, o individuo nao
-.omente respeita a es ré c: ic à qu�tl pertence seu totcm
como tambl:m s1.: esforça para protegê l a contra
desconhecer sua relação com o 1ocemismo. Com efeito,
são os mcsmos p rincír ios que se aplicam aqui ao clã pessoal.
1is estrangeiros, pelo menos cm toda parte que o dcstino
e al i
ao
-

indivíduo. Em am bos os casos, trata-se ela mesma crcn­


'Xistência de vínculos vitais entre as coisas e os ho­ do homem e do animal sejam tidos como conexos.
to te ns diferem s obretu do re-
i; na l
;a
mens, as pr i me i ras sendo dotadas ele poderes cspcciais de Mas esses dois tipos de
q u e seus <1l iados humanos Li ram proveito. Tra t;1-se wm­ 1; 1 maneira corno são adqui ridos.
bém do mesmo costume de da r ao homem o nome da O Lotem coletivo faz pa rte do estatuto legal de cada
coisa à qual é associado e j un tar a esse nomc um emble­ md i v íd u o, é geralmente hereditário; cm todo caso, l: o
ma. O l otem é o padroeiro do clã, assim como o padroei nascimento que o dl'signa sem q u e a vontade dos ho
ro do indivíduo St!1ve-lhe de totem pessoal . 1Já interess<:, 111ens intervenha. Ora a criança tem o totem de sua mãe
h.a milaroi, Dicri, l ra h u nna. etc.), ora o do pai (Narrinye-
\\í'arramunga, CtC.). ( ra ainda O que predomina no lu­
porta1110, cm que a terminologia torne sensível essa afini­ e

dade dos dois sistemas; por isso, com Frazer, chamaremos 1i.

tote1111��1110 individ11af o culto que cada indivíduo presta a gar cm que sua m:ie concebeu (Arunta, Loritja). Ao con­
seu padroeiro. Em certos casos, essa expressão justifica-se trario, o lotem indi\ idual é adquirido por u m ato delibera-
AS FORMAS ELEME1\'TAl?HS OA 1' e Rt.;W,.'A S f;L/i,l/liNlillU!..\
160 \'/[)11 Nh/JCIUSA
Lúl

dol : toda umLt .,l:rie de o perações rituais é necessá ria pa 1 wncns d i \ 1 natúri os P or ext· mplo. na baía Charlotte. no
ra deten n·1 nL�t- lc> O mécodo ,mais comumcnle empregado , 1 h o 13e dfo rd, 1unto ao no l'roserpme, a avó ou outras
.
g

en trc os. 1' ndios e.la América e o se umte: na epoca da pu-


• ,

• rnulheres velhas pegam uma pequena porção cio cordão
a o momen to d a m1ciaçao. o
. . _

bcrc.lac.le, quando se aproxim 11mbilical , à qual se prende a placenta, e fa zem- n o gi ra r


·ovem retirn-se nu m lugar
a sta do , por exem plo uma ílo- fa \ 1o l enca m ente. Nesse meio-tempo , outras m u l h eres 've­

lh;1s, sentadas cm circulo, propüern sucessivamente dífe-


Jresca.
• '.
Lá 110 r
u ni perí odo de tempo que .\'a rta de a lg uns
g .
.
e.lias a a l uns ano:-., submete-se
a un:ia sene
• c.le exe rc•�c1 0s
mílt-
1 1·ntcs nomes. Adota-se aquele pro nu nciad o exatamente
>< e con tr.í rios à natureza. Je1u a , mortifica-se ,
r te,,
.

Va u 1a SO1tandO grtto.S VIO-


est. • 11an 110 momento cm que o cordúo se rompc•3. Entre os Yar
? : 1 .11kanna do <.:alx> Yo rk , depois que um dente foi a rra nca­
. . .
�
,

ge se diversas muti l UÇÔCS.


de -se no c h ao. llllO\'cl e lamenw ndo-se. do .. 10 jovem intciado. dao-lhe um pouco de água para
• S Vlº/.C,s '"'• l..i· n c '·t , reza ' invoca suas d 1v10c.lad es o rd m a n a:-. .
ientos. ora esten
.
1 ,1,.,,u n u m e:,tadO tfl: tnll;nSLI tXtlt,I
A bochechar e com 1 d a m - n o a c u s p i r n u m b a l d e cheio
, , .o
e c l .1gua . Os 'cl hos ex.i m1 n.1111 c.om cuidado a e.spec1e de
, .
l. l1' n r coloca r-s
Aca>,1
ni·o·x 1· '..",.,o do dcltno. Qu ando chega
s

,
• •

- ºt<> ,. a esse pa ro- agu lo


cil m e nte um cara
çao mui . formado de sangue e saliva que foi assim cuspi­
fa
' 1>

do. e o objeto natural cuja forma ele lembra torna-se o to­


.
.
· çôes adqulfem
, SUa.S r"pr " csenca
ter a 1uu" nat<'>r·ic>. ·Q uando. diz Heckewek
XI.SITIO
, I. er, um rapa . e
z - ll rn pessoa l do jovem iniciado11• omros casos, o totem é
1 .-.. , . s r iniciado. e e
. .
submettdo a u m re g im e d i retamente transmitid o de u m indivíduo a o u t ro , por
, do de 1·c1·urn e tra tamen to medico: al1Ster c.le to-
" a s. ve,,
t,1 -. ,n,. r i
· s de

a 1ternL1 , .
l'Xcmplo, de pai a íilho, de tio a sobrinho•>. Esse procedi-
.
.

. n-se
1 1 . ·n t "
.
<.o a 1me o , i l'

.
.
.
n ere as drogas mais energeuc a s e as ma is 1111:nto é igualmente empregado na América. Num exem­
en te, b eb e 1•1qu1.dos 1ntox1cantes
h 1
repu gn ant , e•L .. ; e,•e nn 1 a n plo relatado por lill Toul. o operador era um xamã 10 que
. -. l -.."s . p i' rito ·
esteja num verdadeiro estado de des-
.
.

queria tr.irn;mitir seu totem a seu sobrinho. "O tio pegou


,. ·s" mome t o, ele tem ou 1ulga ter vi.soes. sonhos
ate • qu e • S"l
o em bl ema simbólico de seu s11a111 (totem pessoal): era.
.
. ·
vano. -.s."
n
extraorc.l 11 1<1· r1· <>s ·ws c1uais to o esse arrebaramemo nat u d 110 caso. a pele dessecadL1 de uma a\·e. Convidou seu so
ral me nte 0 p redis pôs . ! magma-se voando pdos ares , a�-
• • L ·
.

lirinho a soprar nela, depois ele próprio fez o mesmo e


dando sob a terra, salta ndo de u1�1 monte . a outro por c1
- pronunciou pala vras misteriosas . Pareceu então a Pa u l
. <. l os. v·,il•· -.. .s , combate n o e dominando gigantes e mons-
d l lra o nome do sobrinho> que a pele transformava-se nu-
i .s c·on içõcs, se ele ve ou, o que .1 a• no mes-
ma
tl.os·"� . . Ncss . . ·' d 111a ave viva que se pôs a a de a r em torno d el es por a l ­
no estado de v1. ,1 lt. a, um
<
j
A

mo, se l i-. u 1( . . ,. . 1 ·
1 r·i ver cm son h o ou g �uns momentos, para em seguida d esa parecer. Pa ul rece
.,1 n 1· 111..1 l ,.,1)1..... lieu a instruçao de pro c u rn r, no mesmo d i a , a pel.e ele
.
• '

,.5 ",.111ar-s e numa a tttu cle que lhe pa rece de-


t amistosas, , ler desco be rto o
, 1 1 m a ave da mesma es p éc i e cobrir-se com el a , o q u e
e
· c
) cs . .imaginara
.
mons r �1 1 1 1 11e11r
.

· l v z . Na noite se u nt , teve u m son o em que o snam lhe


g i e
• h

·
·pe1 ·av·1l9
padroeiro que es
1parcceu soh a forma de u m ser humano, revelando-lhe o
'
.
Ent reta nto, esse proccd11nento e raramente empreg a-
do na Australi<1 'º· Nt:ssc continente ,. o tole.m pessoa l . pare no me misterioso que se dt:vc.· p ron u nciar quando se quer
ce a ntes ser i mpos to por um terceiro, s�1a no nasn m cn­ 111 ,·ocá-lo e prometendo-lhe proten o. ",� l
r o 1 1 :-.e j a no 1110111cn ro da iniciaçào1z. E g ra lme nte um e !\ião apenas o totem individual é adquirido, e não da­
par nte ci ue desempenha esse
� . .
papel, ou um pe rsonage m
es espcc1a1s, como u m ve li10 ou u m
do. como também sua aqdis1çào geral mente não é obriga­
<> de poder
·
tnVeStºd
1 loria. a Austrália, há uma sér ie de tribos em que esse
"
. i o utilizam-se as vezes proce<.
mágico P ara esse ob et v ,
·
1 1- j •

t ostume parece i n re ir:.1


mentc desconhecido•S. Além disso.
AS FORMAS ELEME1\'TAl?HS OA 1' e Rt.;W,.'A S f;L/i,l/liNlillU!..\
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mentc desconhecido•S. Além disso.
162 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA R/J'L/(,'/C 11 t /i/ \(.;·IS h'UiMHNTAIWS 163

mesmo onde ele existe, com freqüência é facultativo. ''\ · 111,1110 sexual. Só é encontrado na Austráli a, num pe­
s i m , entre o s Euahlayi, s e todos o s mágicos têm um totem I"' 1 1 1 1 nú mero de tribos. Verifica-se sobretudo em V ictoria
i n cliviclual cio qual obtêm seus poderes, há um grande 1111 1 1 1 Nova Gales cio SuJ55. Mathews, é verclacle, declara tê-
mero ele leigos desprovidos dele. Trata-se ele um favw 1 1 1 h.�l'rvaclo em todas as partes ela Austrá l i a que visitou ,
que o mágico distribui, mas que reserva sobretudo a seu' •1•111 relatar fatos precisos em apoio ele sua afirmação56.
111 1 , ,
amigos, a seus favoritos, aos q u e a s p i r a m a tornar s1• Nt·sses diferentes povos, todos os homens ela tribo,
seus confrades49. Do mesmo modo, entre alguns Salis li . 1, 1 1 1 n lado, e todas as mulheres, de outro, em qualquer
os indivíduos que querem distinguir-se parlicularmcm1·, 1 l 1 p; 1rLicular a que ambos pertençam, formam como que
seja na guerra, seja na caça, ou os aspi rantes à função d 1 • 1 1 ! 1 1s sociedades distintas e mesmo antagônicas. Ora, cada
xamã s ã o o s únicos a munir-se ele u m protetor desse gc 1 1 1 11.1 dessas duas corporaçôes sexuais acredita-se unida
neros0. O totem incliviclual parece, pois, ser considerado, I " 11 laços místicos a u m a n i m a l determinado. Entre os
pelo menos por certos povos, uma vantagem e u m be111 1 1 1 1 11.11, os homens se consideram irmãos d a ema-garriça
supl ementar, não tanto uma necessidade. É bom contar 1 ' •' l' rÜng) e as mulheres, irmãs da soberba toutinegra
com ele, mas não se é obrigado a tê-lo. Inversamente, m1 1 1 >11·l·tgün); todos os homens são Yeerung e todas as mu­
da obriga a contentar-se com um único totem: se alguém illl' 1l:S Djeetgün. Entre os Wotjobaluk e os Wu run jerri, são
quiser ser mais bem protegido, pode tentar adquirir várillS , , 111orcego e o nightjar (espécie ele coruja) que desempe-
cleles si e , p o r outro lado, se aquele que possui cumpre 1 i l 1 .1m esse papel. Noutras tribos, o n:ightja r é substituído
mal seu papel, rode trocá-Jos z. 1 11· 1 0 pica-pau. Cada sexo vê no a nimal a que é aparenta­
M�1s, ao mesmo rempo que tem algo ele mais l ivre ' 1 1 1 um protetor que convém tratar com o maior respeito:
• proibido matá-lo e comê-Jo57.
e

fa cu ltativo , o totemismo individual p ossui uma fo rça de


resistência que o totem ismo ele clã está longe ele atingir. Assim, esse animal protetor desempenha, em relação
llm dos principais informantes de H ill Tout era um Salish 1 , ,ida sociedade sexual, o mesmo papel do totem do clã
batizado; no entanto, apesar ele haver abandonado since­ , 111 relação a este último grupo. A expressão totemismo
ramente as crenças ele seus antepassados, apesar de haver ..,·xual, que tomamos emprestada de Frazer58, just ifica-se
se tornado um catequista modelo, sua fé n a eficácia cios 1 1ortanto. Inclusive esse totem ele um novo gênero asse-
totens pessoais permanecia inabalável53. Do mesmo mo­ 1 1 ll'lha-se particularmente ao do clã, no sentido ele q u e
do, embora não restem mais t
raços visíveis do totemismo 1.1 111hém ele é coletivo: pertence indistintamente a todos
coletivo nos países civi lizados, a icléia ele que existe uma 1 1s ind ivíduos ele u m mesmo sexo. Assemelha-se igual­
s o l i cl a r i eclacle entre cada i ndivíduo e um animal, uma l l l l'nte pelo fato de implicar, entre o animal padroeiro e o
p la nta ou um objeto exterior qualquer está na base ele .... l'XO correspondente, uma relação ele descendência e de
costumes ainda obse1váveis em vários países da Europa54. , onsangi.i iniclade: entre os Kurnai, todos os homens são
11dos como descendentes de Yeerüng e todas as mulheres
dl' Djeetgün59. O primeiro observador que, já em 1834,
11 .1ssinalou essa curiosa instituição, a descrevia nos seguin-
1 1•s termos: "Tilmun, uma pequena ave cio tamanho de um
Entre o totemismo colet�vo e o totemismo incliviclual, 1 o rclo (é uma espécie de picanço), é considerado pelas
existe uma forma intermediária que faz parte de ambos: o m u l heres como tendo sido o p rimeiro a fazer mulheres.
162 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA R/J'L/(,'/C 11 t /i/ \(.;·IS h'UiMHNTAIWS 163

mesmo onde ele existe, com freqüência é facultativo. ''\ · 111,1110 sexual. Só é encontrado na Austráli a, num pe­
s i m , entre o s Euahlayi, s e todos o s mágicos têm um totem I"' 1 1 1 1 nú mero de tribos. Verifica-se sobretudo em V ictoria
i n cliviclual cio qual obtêm seus poderes, há um grande 1111 1 1 1 Nova Gales cio SuJ55. Mathews, é verclacle, declara tê-
mero ele leigos desprovidos dele. Trata-se ele um favw 1 1 1 h.�l'rvaclo em todas as partes ela Austrá l i a que visitou ,
que o mágico distribui, mas que reserva sobretudo a seu' •1•111 relatar fatos precisos em apoio ele sua afirmação56.
111 1 , ,
amigos, a seus favoritos, aos q u e a s p i r a m a tornar s1• Nt·sses diferentes povos, todos os homens ela tribo,
seus confrades49. Do mesmo modo, entre alguns Salis li . 1, 1 1 1 n lado, e todas as mulheres, de outro, em qualquer
os indivíduos que querem distinguir-se parlicularmcm1·, 1 l 1 p; 1rLicular a que ambos pertençam, formam como que
seja na guerra, seja na caça, ou os aspi rantes à função d 1 • 1 1 ! 1 1s sociedades distintas e mesmo antagônicas. Ora, cada
xamã s ã o o s únicos a munir-se ele u m protetor desse gc 1 1 1 11.1 dessas duas corporaçôes sexuais acredita-se unida
neros0. O totem incliviclual parece, pois, ser considerado, I " 11 laços místicos a u m a n i m a l determinado. Entre os
pelo menos por certos povos, uma vantagem e u m be111 1 1 1 1 11.11, os homens se consideram irmãos d a ema-garriça
supl ementar, não tanto uma necessidade. É bom contar 1 ' •' l' rÜng) e as mulheres, irmãs da soberba toutinegra
com ele, mas não se é obrigado a tê-lo. Inversamente, m1 1 1 >11·l·tgün); todos os homens são Yeerung e todas as mu­
da obriga a contentar-se com um único totem: se alguém illl' 1l:S Djeetgün. Entre os Wotjobaluk e os Wu run jerri, são
quiser ser mais bem protegido, pode tentar adquirir várillS , , 111orcego e o nightjar (espécie ele coruja) que desempe-
cleles si e , p o r outro lado, se aquele que possui cumpre 1 i l 1 .1m esse papel. Noutras tribos, o n:ightja r é substituído
mal seu papel, rode trocá-Jos z. 1 11· 1 0 pica-pau. Cada sexo vê no a nimal a que é aparenta­
M�1s, ao mesmo rempo que tem algo ele mais l ivre ' 1 1 1 um protetor que convém tratar com o maior respeito:
• proibido matá-lo e comê-Jo57.
e

fa cu ltativo , o totemismo individual p ossui uma fo rça de


resistência que o totem ismo ele clã está longe ele atingir. Assim, esse animal protetor desempenha, em relação
llm dos principais informantes de H ill Tout era um Salish 1 , ,ida sociedade sexual, o mesmo papel do totem do clã
batizado; no entanto, apesar ele haver abandonado since­ , 111 relação a este último grupo. A expressão totemismo
ramente as crenças ele seus antepassados, apesar de haver ..,·xual, que tomamos emprestada de Frazer58, just ifica-se
se tornado um catequista modelo, sua fé n a eficácia cios 1 1ortanto. Inclusive esse totem ele um novo gênero asse-
totens pessoais permanecia inabalável53. Do mesmo mo­ 1 1 ll'lha-se particularmente ao do clã, no sentido ele q u e
do, embora não restem mais t
raços visíveis do totemismo 1.1 111hém ele é coletivo: pertence indistintamente a todos
coletivo nos países civi lizados, a icléia ele que existe uma 1 1s ind ivíduos ele u m mesmo sexo. Assemelha-se igual­
s o l i cl a r i eclacle entre cada i ndivíduo e um animal, uma l l l l'nte pelo fato de implicar, entre o animal padroeiro e o
p la nta ou um objeto exterior qualquer está na base ele .... l'XO correspondente, uma relação ele descendência e de
costumes ainda obse1váveis em vários países da Europa54. , onsangi.i iniclade: entre os Kurnai, todos os homens são
11dos como descendentes de Yeerüng e todas as mulheres
dl' Djeetgün59. O primeiro observador que, já em 1834,
11 .1ssinalou essa curiosa instituição, a descrevia nos seguin-
1 1•s termos: "Tilmun, uma pequena ave cio tamanho de um
Entre o totemismo colet�vo e o totemismo incliviclual, 1 o rclo (é uma espécie de picanço), é considerado pelas
existe uma forma intermediária que faz parte de ambos: o m u l heres como tendo sido o p rimeiro a fazer mulheres.
164 AS FORMAS lilliAIENl/11?/JS ()A V7DA RELIGICJ.\ 1

Essas aves são veneradas relas mulheres arenas60." Trata 1 \J>ÍTULO V


va-se, pois, de u m grande anterassado. Mas, por outro h1
< > IUGENS DESSAS CRENÇAS
do, esse mesmo totem a p roxima-se do totem individu<ll
Com efeito, acredita-se que cada membro cio grupo sexual
esteja ligado pessoalmente a um indivíduo determinado
ela espécie animal correspondente. As duas vicias ligam-sl'
Lào intimamente que a morte do ani mal acarreta a do ho
mem. "A vicia ele um morcego, dizem os Wotjobaluk, é a
vida de um homem."óJ Por isso não apenas cada sexo res
peita seu totem, mas obriga os membros cio outro sexo a
respeitá-lo igualmente . Toda violação dessa regra provo­
ca, entre homens e mul bcresc.�, verdadeiras e sangrenta�
batalhas.
Em suma, o que têm de realmente original esses to­
tens é que eles são, n u m certo sentido, totens tribais. Re­

1 Exame crítico das teorias


sultam do fato ele se conceber a tribo inteira como origi111-
-

c.la de um par de seres míticos. Tal crença parece indicar


claramente que o sentimento tribal adquiriu força suficien­
As crenças que acabamos ele passar em revista são de
te para prevalecer, numa certa medida, sobre o particula­
1 1 : 1 L ureza man ifestamente religiosa, já que implicam u m a
rismo e.los clãs. Quanto à origem distinta atribuída aos ho­
1 l . 1ssificação das coisas em sagradas e profanas. Claro que
mens e às mul heres, a razão eleve ser buscada, ce1tamen­
11;10 se trata aí de seres espirituais e , ao longo de nossa ex­
te, na situação de separação cm que vivem os sexos<d.
Seria interessante saber como, no pensamento austra­ posição, nem chegamos a pronunciar as palavras espíritos,

liano, os totens sexuais se ligam aos totens ele clãs, que gvnios, personalidades divinas. Mas se, por essa razão, al­
relações há entre os dois antepassados colocados na ori­ guns escritores, dos quais precisaremos aliás falar ele novo,

gem da tribo e aqueles dos quais cada clã em particular "l' recusaram a ver no totemisrno uma religião, é que eles
teria descendido. Mas os dados etnográficos atualmente 1 1 1 1ham do fenômeno religioso uma noção inexata.
disponíveis não permitem resolver a questão. Aliás, por Por outro lado, temos a certeza de que essa religião é
mais natural e mesmo necessária que essa questão nos .1 mais primitiva das que podem atual mente ser observa­
pareça, é bem possível que os indígenas jamais a tenham das e até mesmo, muito provavelmen te, de todas q u e
colocado. De fato, eles não sentem, no mesmo grau que l'Xistiram. C o m efeito, ela é inseparável d a organização
nós, a nece'isidade ele coordenar e ele sistematizar suas .,ocial à base de clãs. Não apenas, conforme mostramos,
crenças6 •. "º se pode defini-la em função desta última, como tarn­
livm o clã, na forma que apresenta n u m grande número
, k· sociedades australianas, parece não poder ter existido
�vm o totem. Pois os membros de u m mesmo clã não es-
1.10 unidos entre s i por uma comunidade de hábitat ou ele
164 AS FORMAS lilliAIENl/11?/JS ()A V7DA RELIGICJ.\ 1

Essas aves são veneradas relas mulheres arenas60." Trata 1 \J>ÍTULO V


va-se, pois, de u m grande anterassado. Mas, por outro h1
< > IUGENS DESSAS CRENÇAS
do, esse mesmo totem a p roxima-se do totem individu<ll
Com efeito, acredita-se que cada membro cio grupo sexual
esteja ligado pessoalmente a um indivíduo determinado
ela espécie animal correspondente. As duas vicias ligam-sl'
Lào intimamente que a morte do ani mal acarreta a do ho
mem. "A vicia ele um morcego, dizem os Wotjobaluk, é a
vida de um homem."óJ Por isso não apenas cada sexo res
peita seu totem, mas obriga os membros cio outro sexo a
respeitá-lo igualmente . Toda violação dessa regra provo­
ca, entre homens e mul bcresc.�, verdadeiras e sangrenta�
batalhas.
Em suma, o que têm de realmente original esses to­
tens é que eles são, n u m certo sentido, totens tribais. Re­

1 Exame crítico das teorias


sultam do fato ele se conceber a tribo inteira como origi111-
-

c.la de um par de seres míticos. Tal crença parece indicar


claramente que o sentimento tribal adquiriu força suficien­
As crenças que acabamos ele passar em revista são de
te para prevalecer, numa certa medida, sobre o particula­
1 1 : 1 L ureza man ifestamente religiosa, já que implicam u m a
rismo e.los clãs. Quanto à origem distinta atribuída aos ho­
1 l . 1ssificação das coisas em sagradas e profanas. Claro que
mens e às mul heres, a razão eleve ser buscada, ce1tamen­
11;10 se trata aí de seres espirituais e , ao longo de nossa ex­
te, na situação de separação cm que vivem os sexos<d.
Seria interessante saber como, no pensamento austra­ posição, nem chegamos a pronunciar as palavras espíritos,

liano, os totens sexuais se ligam aos totens ele clãs, que gvnios, personalidades divinas. Mas se, por essa razão, al­
relações há entre os dois antepassados colocados na ori­ guns escritores, dos quais precisaremos aliás falar ele novo,

gem da tribo e aqueles dos quais cada clã em particular "l' recusaram a ver no totemisrno uma religião, é que eles
teria descendido. Mas os dados etnográficos atualmente 1 1 1 1ham do fenômeno religioso uma noção inexata.
disponíveis não permitem resolver a questão. Aliás, por Por outro lado, temos a certeza de que essa religião é
mais natural e mesmo necessária que essa questão nos .1 mais primitiva das que podem atual mente ser observa­
pareça, é bem possível que os indígenas jamais a tenham das e até mesmo, muito provavelmen te, de todas q u e
colocado. De fato, eles não sentem, no mesmo grau que l'Xistiram. C o m efeito, ela é inseparável d a organização
nós, a nece'isidade ele coordenar e ele sistematizar suas .,ocial à base de clãs. Não apenas, conforme mostramos,
crenças6 •. "º se pode defini-la em função desta última, como tarn­
livm o clã, na forma que apresenta n u m grande número
, k· sociedades australianas, parece não poder ter existido
�vm o totem. Pois os membros de u m mesmo clã não es-
1.10 unidos entre s i por uma comunidade de hábitat ou ele
166 AS FO/�S l!.l/J.MENTARES DA VDA
l RELIGIOSA l • NINÇAS ELEMENTARES

sangue, urna vez que não são necessariamente consangüí •· l lm grande número de povos crêem que a alma, após

neos e com freqüência estão dispersos em pontos diferen­ 1 1 1 1orte, não permanece eternamente clesencarnada, mas
tes do território tribal. Sua unidade, portanto, decorre uni­ ' 111 animar novamente algum corpo vivo; por outro lado,
camente ele terem um mesmo nome e um mesmo emble­ , 1 1 1110 a psicologia elas raças inferiores não estabelece ne-
ma, de acreditarem manter as mesm as relações com as 1 i l 1 1 1 ma linha ele demarcação bem definida entre a alma
mesmas categorias de coisas, de praticarem os mesmos ri­ i l 1 1� homens e a dos animais, ela admite sem grande difi­
tos, ou seja, de comungarem no mesmo culto totêmico. ' 1 1 ld:1de a transmigração ela alma humana no corpo dos
Assim, o totemismo e o clã, pelo menos enquanto este úl­ 1 1 1 1 mais"3. Tylor cita u m certo número ele exemplos-'1. Nes-
timo não se confunde com o grupo local, implicam-se 1'> condições, o respeito religioso que o antepassado ins-

mutuamente. Ora, a organização à base de clãs é a mais 1 1 1 1 . 1 transporta-se naturalmente para o animal ou a planta
simples que conhecemos. Ela existe, com todos os seus ' 1 1111 que doravante se confunde. O animal, que serve as-
e lementos essenciais, tão logo a sociedade compreende 1 1 1 1 de receptáculo a um ser venerado, torna-se, para Lo­
dois clãs primários; por conseguinte, não pode haver ou­ d" ·" os descendentes do antepassado, isto é, para o clã
tra mais rudi mentar enquanto não forem descobertas socie­ I J l l t' dele se originou, uma coisa sagrada, o objeto ele um
dades reduzidas a um único clã, e acreditamos q u e até ' 1 1 1 10, em urna palavra, um totem.
hoje não se tenham encontrado vestígios disso. Uma reli­ Fatos observados por Wilken nas sociedades do ar-
gião tão estreitamente solidária cio sistema social, que ul­ 1 p1ipélago malaio tenderiam a provar que é assim, com
trapassa toe.las as outras em simplicidade, pode ser consi­ l'il"ito, q u e as crenças totêmicas se originaram. Em Java,
derada como a mais elementar que nos é dada a conhecer. 1·111 Sumatra, os crocodilos são particularmente honrados;
Se chegarmos, pois, a encontrar as origens elas crenças •.. 111 vistos corno benevolentes protetores que não se eleve
que acabam ele ser analisadas, teremos chances ele desco­ 11r.1tar; fazem-lhes oferendas. Ora, o culto prestado a esses
brir também as causas que fizeram brotar o sentimento re- 111imais advém de que encarnariam almas cios antepassa­
ligioso na humanidade. il()s. Os malaios elas FiJipLnas consideram o crocod ilo co-
Mas antes de nós mesmos tratarmos o problema,
.
1 1 1 0 seu avô; o tigre é tratado ela mesma maneira e pelas
convém examinar as soluções mais autorizadas que lhe 1 11vsmas razões. Crenças análogas foram observadas entre
foram propostas. e is Bantos5. Na Melanésia, acontece às vezes que um ho-
111vm influeme, no momento ele morrer, anuncie sua von-
1.1de c.le reencarnar-se em determinado animal ou planta;
c· x r l ica-se, assim, que o objeto q u e e l e escolheu como
111orada póstuma se torne em seguida sagrado para toda a
Encontramos em primeiro lugar um grupo de estudio­ '>11a famíJia6 . Longe de constituir um fato primitivo, o tote-
sos que acreditaram poder explicar o totemismo derivan­ 11t isrno seria apenas o produto de uma religião mais com­
do-o diretamente ele uma religião anterior. plexa que o teria precedido?.
Para Tylor 1 e Wilken2, o totem ismo seria uma forma Mas as sociedades das quais esses fatos são tomados,
particular do culto dos antepassados; a doutrina da trans­ 1 . 1 a lcançaram uma cultura bastante elevada; em todo ca­
migração das almas, certamente muito difundida, é que Ml, ultrapassaram a fase elo puro totemismo. Há entre elas
teria servido de transição entre esses dois sistemas religio- l.1111íl ias, e não clãs totêmicos8. Inclusive a maior parte cios
166 AS FO/�S l!.l/J.MENTARES DA VDA
l RELIGIOSA l • NINÇAS ELEMENTARES

sangue, urna vez que não são necessariamente consangüí •· l lm grande número de povos crêem que a alma, após

neos e com freqüência estão dispersos em pontos diferen­ 1 1 1 1orte, não permanece eternamente clesencarnada, mas
tes do território tribal. Sua unidade, portanto, decorre uni­ ' 111 animar novamente algum corpo vivo; por outro lado,
camente ele terem um mesmo nome e um mesmo emble­ , 1 1 1110 a psicologia elas raças inferiores não estabelece ne-
ma, de acreditarem manter as mesm as relações com as 1 i l 1 1 1 ma linha ele demarcação bem definida entre a alma
mesmas categorias de coisas, de praticarem os mesmos ri­ i l 1 1� homens e a dos animais, ela admite sem grande difi­
tos, ou seja, de comungarem no mesmo culto totêmico. ' 1 1 ld:1de a transmigração ela alma humana no corpo dos
Assim, o totemismo e o clã, pelo menos enquanto este úl­ 1 1 1 1 mais"3. Tylor cita u m certo número ele exemplos-'1. Nes-
timo não se confunde com o grupo local, implicam-se 1'> condições, o respeito religioso que o antepassado ins-

mutuamente. Ora, a organização à base de clãs é a mais 1 1 1 1 . 1 transporta-se naturalmente para o animal ou a planta
simples que conhecemos. Ela existe, com todos os seus ' 1 1111 que doravante se confunde. O animal, que serve as-
e lementos essenciais, tão logo a sociedade compreende 1 1 1 1 de receptáculo a um ser venerado, torna-se, para Lo­
dois clãs primários; por conseguinte, não pode haver ou­ d" ·" os descendentes do antepassado, isto é, para o clã
tra mais rudi mentar enquanto não forem descobertas socie­ I J l l t' dele se originou, uma coisa sagrada, o objeto ele um
dades reduzidas a um único clã, e acreditamos q u e até ' 1 1 1 10, em urna palavra, um totem.
hoje não se tenham encontrado vestígios disso. Uma reli­ Fatos observados por Wilken nas sociedades do ar-
gião tão estreitamente solidária cio sistema social, que ul­ 1 p1ipélago malaio tenderiam a provar que é assim, com
trapassa toe.las as outras em simplicidade, pode ser consi­ l'il"ito, q u e as crenças totêmicas se originaram. Em Java,
derada como a mais elementar que nos é dada a conhecer. 1·111 Sumatra, os crocodilos são particularmente honrados;
Se chegarmos, pois, a encontrar as origens elas crenças •.. 111 vistos corno benevolentes protetores que não se eleve
que acabam ele ser analisadas, teremos chances ele desco­ 11r.1tar; fazem-lhes oferendas. Ora, o culto prestado a esses
brir também as causas que fizeram brotar o sentimento re- 111imais advém de que encarnariam almas cios antepassa­
ligioso na humanidade. il()s. Os malaios elas FiJipLnas consideram o crocod ilo co-
Mas antes de nós mesmos tratarmos o problema,
.
1 1 1 0 seu avô; o tigre é tratado ela mesma maneira e pelas
convém examinar as soluções mais autorizadas que lhe 1 11vsmas razões. Crenças análogas foram observadas entre
foram propostas. e is Bantos5. Na Melanésia, acontece às vezes que um ho-
111vm influeme, no momento ele morrer, anuncie sua von-
1.1de c.le reencarnar-se em determinado animal ou planta;
c· x r l ica-se, assim, que o objeto q u e e l e escolheu como
111orada póstuma se torne em seguida sagrado para toda a
Encontramos em primeiro lugar um grupo de estudio­ '>11a famíJia6 . Longe de constituir um fato primitivo, o tote-
sos que acreditaram poder explicar o totemismo derivan­ 11t isrno seria apenas o produto de uma religião mais com­
do-o diretamente ele uma religião anterior. plexa que o teria precedido?.
Para Tylor 1 e Wilken2, o totem ismo seria uma forma Mas as sociedades das quais esses fatos são tomados,
particular do culto dos antepassados; a doutrina da trans­ 1 . 1 a lcançaram uma cultura bastante elevada; em todo ca­
migração das almas, certamente muito difundida, é que Ml, ultrapassaram a fase elo puro totemismo. Há entre elas
teria servido de transição entre esses dois sistemas religio- l.1111íl ias, e não clãs totêmicos8. Inclusive a maior parte cios
168 AS FORMAS ELEAIEATARES DA VlDA REUGIOSA I \ CRENÇAS ELEMENTARES 169

animais. aos quais se prestam homenagens religiosas, <'.• 1 0 dada ror Tylor é que o homem, às vezes. lembra ce r-
1c >s traços da anatomia e da psi cologia do animal. "O sei­
z

venerada não por grupos familiares delerminados. mas


por tribos inteiras. Portanto, se essas crenças e essas práti­ ' .1gem, diz ele, o bs erva co m ad mira ção simpática os tra-
cas p odem ter ainda relação com antigos cultos totêmicos, 1 os sem i-h um anos, as ações e o ca rá ter dos animais. Não
agora não representam mais qu e formas alteradas desses • o a nim al a encarnação mesma, se podemos ex pri m ir as­
cultos9 e, conseqüentemente, não são muito próprias para ,1111, de qua li dad es fa miliares ao homem? E qu and o apli­
nos revelar suas origens. Não é considerando uma institui­ ' .1111os, como epíteto, a certos homens o nome de leão,
ção no momento em que está em plena decad ê nci a que o lt• u rso , de raposa, de mocho, de papagaio, ele víbora, ele
se chegará a compreender como ela se formou. Se quiser­ t•rme, não resumimos, numa palavra, alguns traços ca­
mos saber ele que maneira o totemismo se originou, não é ' u t e ríst icos de uma vida humana?" 1 1 Mas se ocorrem, de
Java, nem Sumatra, nem a Melanésia que devemos obser­ l.1t11, essas semelhanças, elas são incenas e exce pcionai s ;
var: é a Austrália. Ora, aqu i mio cxibcc culco dos mortos1 " homem assemelha -.se antes de tudo a s eus pais, a seu s
nem doulrina ela transmigração. Claro que se acredita que u 1 111 pan h e i ros, e não a plantas ou a animais. Analogias
os heróis míticos, fundadores do clã, se reencarnam perio­ 1 111 r..t ras e duvidosas não poderiam prevalecer sobre evi-
clicamenle, 111e1s exclusivamente em corpos humanos, cada 1li·11cias tão partilhadas, nem induzir o homem a pensar a
nascimento, como veremos, é o produto de uma dessa� 1 p róp rio e a seus a nte passados sob formas que contra­
reencarnações. Se os a n i mais ela espécie totêmica são, o l bsessem todos os dados da experiência diária. Porta nto ,
portanto, objeto de ritos, não é porque almas ancestrais 1 q u estão perman ece de pé e, enquanLo não for resol vi da ,
resid i riam neles. É verdade que esses p ri me iros antepas­ 11 11> se pode dizer q ue o totemismo esteja explicado•2.
sados costumam ser representados sob forma animal, e Enfim, toda essa teoria repousa sobre um equívoco
essa representação, muito freqüente, é um fato imporlante l 1 1 11damental. Tanto para Tylor como para Wundt , o tote-
que precisaremos levar em conta; mas não é a crença na 1111.mo seria apenas um caso particular do culto dos ani-
metempsicose que pode tê-lo originado, já que ela é des­ 1 1 1 11s1:1. Sabe mos, ao con trár io , que é preciso ver nele algo
conhecida das sociedades australianas. 1 .. 111 d i feren te de uma espécie de zoolatriall. O animal de
Aliás, longe de poder explicar o lotemismo, essa 1ti.1 11l'ira nenhuma é adorado no tocemismo; o homem é
crença supõe um dos p r incíp i os fundamentais sobre os ' 1t1.1.�e seu igual e às vezes até dispõe dele como coisa pró­
quais ele repousa, isto é, toma como dado exat a me nte p1 1 . 1 , longe de lhe estar subordinado co m o um fiel a seu
aq ui lo que é preciso exp lica r. Com efeito, ela mesm a for­ 1 lc 11s. Se realmente os animais da es péci e totêmi ca fossem
ma que o totemismo, ela implica que o homem é conc e­ • • 1 1 1 sidcrados encarnações dos antepassad os, não se deixa-
bido como intimamente Ligado ao animal, pois, se os dois 1 1 1 11s mem bros de clãs estrangeiros consumir livremente
reinos fossem claramente distingu idos nos espiri tos, não 11.1 1 .i rne. Em realidade, não é ao animal como tal que se
se acreditaria que a alma humana pudesse passar de um a t lí 1 11�l' o culto, mas ao emblema, à imagem do totem. Ora.
outro com essa facilidade. É preciso mesmo que o corpo • 11tw L'ssa religião do emblema e o culto dos antepassados

do animal seja considerado sua verdadeira pátria, pois se 1 1 11 • 1·x 1stc nenhuma relacão.
supõe que ela volta a ele assim que retoma sua liberdade. l· nquanto Tylor reduz o totemismo ao culto cio s a nte-
Ora, se a doutrina da transmigração postula essa singular 1 • 1 �.idos, Jevons o vincula ao culto da natureza• \ e eis de
afinidade, não a explica de maneira nenhuma. A única ra- 1 11 1 1 maneira o deriva dele.
168 AS FORMAS ELEAIEATARES DA VlDA REUGIOSA I \ CRENÇAS ELEMENTARES 169

animais. aos quais se prestam homenagens religiosas, <'.• 1 0 dada ror Tylor é que o homem, às vezes. lembra ce r-
1c >s traços da anatomia e da psi cologia do animal. "O sei­
z

venerada não por grupos familiares delerminados. mas


por tribos inteiras. Portanto, se essas crenças e essas práti­ ' .1gem, diz ele, o bs erva co m ad mira ção simpática os tra-
cas p odem ter ainda relação com antigos cultos totêmicos, 1 os sem i-h um anos, as ações e o ca rá ter dos animais. Não
agora não representam mais qu e formas alteradas desses • o a nim al a encarnação mesma, se podemos ex pri m ir as­
cultos9 e, conseqüentemente, não são muito próprias para ,1111, de qua li dad es fa miliares ao homem? E qu and o apli­
nos revelar suas origens. Não é considerando uma institui­ ' .1111os, como epíteto, a certos homens o nome de leão,
ção no momento em que está em plena decad ê nci a que o lt• u rso , de raposa, de mocho, de papagaio, ele víbora, ele
se chegará a compreender como ela se formou. Se quiser­ t•rme, não resumimos, numa palavra, alguns traços ca­
mos saber ele que maneira o totemismo se originou, não é ' u t e ríst icos de uma vida humana?" 1 1 Mas se ocorrem, de
Java, nem Sumatra, nem a Melanésia que devemos obser­ l.1t11, essas semelhanças, elas são incenas e exce pcionai s ;
var: é a Austrália. Ora, aqu i mio cxibcc culco dos mortos1 " homem assemelha -.se antes de tudo a s eus pais, a seu s
nem doulrina ela transmigração. Claro que se acredita que u 1 111 pan h e i ros, e não a plantas ou a animais. Analogias
os heróis míticos, fundadores do clã, se reencarnam perio­ 1 111 r..t ras e duvidosas não poderiam prevalecer sobre evi-
clicamenle, 111e1s exclusivamente em corpos humanos, cada 1li·11cias tão partilhadas, nem induzir o homem a pensar a
nascimento, como veremos, é o produto de uma dessa� 1 p róp rio e a seus a nte passados sob formas que contra­
reencarnações. Se os a n i mais ela espécie totêmica são, o l bsessem todos os dados da experiência diária. Porta nto ,
portanto, objeto de ritos, não é porque almas ancestrais 1 q u estão perman ece de pé e, enquanLo não for resol vi da ,
resid i riam neles. É verdade que esses p ri me iros antepas­ 11 11> se pode dizer q ue o totemismo esteja explicado•2.
sados costumam ser representados sob forma animal, e Enfim, toda essa teoria repousa sobre um equívoco
essa representação, muito freqüente, é um fato imporlante l 1 1 11damental. Tanto para Tylor como para Wundt , o tote-
que precisaremos levar em conta; mas não é a crença na 1111.mo seria apenas um caso particular do culto dos ani-
metempsicose que pode tê-lo originado, já que ela é des­ 1 1 1 11s1:1. Sabe mos, ao con trár io , que é preciso ver nele algo
conhecida das sociedades australianas. 1 .. 111 d i feren te de uma espécie de zoolatriall. O animal de
Aliás, longe de poder explicar o lotemismo, essa 1ti.1 11l'ira nenhuma é adorado no tocemismo; o homem é
crença supõe um dos p r incíp i os fundamentais sobre os ' 1t1.1.�e seu igual e às vezes até dispõe dele como coisa pró­
quais ele repousa, isto é, toma como dado exat a me nte p1 1 . 1 , longe de lhe estar subordinado co m o um fiel a seu
aq ui lo que é preciso exp lica r. Com efeito, ela mesm a for­ 1 lc 11s. Se realmente os animais da es péci e totêmi ca fossem
ma que o totemismo, ela implica que o homem é conc e­ • • 1 1 1 sidcrados encarnações dos antepassad os, não se deixa-
bido como intimamente Ligado ao animal, pois, se os dois 1 1 1 11s mem bros de clãs estrangeiros consumir livremente
reinos fossem claramente distingu idos nos espiri tos, não 11.1 1 .i rne. Em realidade, não é ao animal como tal que se
se acreditaria que a alma humana pudesse passar de um a t lí 1 11�l' o culto, mas ao emblema, à imagem do totem. Ora.
outro com essa facilidade. É preciso mesmo que o corpo • 11tw L'ssa religião do emblema e o culto dos antepassados

do animal seja considerado sua verdadeira pátria, pois se 1 1 11 • 1·x 1stc nenhuma relacão.
supõe que ela volta a ele assim que retoma sua liberdade. l· nquanto Tylor reduz o totemismo ao culto cio s a nte-
Ora, se a doutrina da transmigração postula essa singular 1 • 1 �.idos, Jevons o vincula ao culto da natureza• \ e eis de
afinidade, não a explica de maneira nenhuma. A única ra- 1 11 1 1 maneira o deriva dele.
170 AS FON1\llAS t:LEMIINTAJWS DA 1'/[)11 IU:'J.l(i/OSll AS CRENÇAS /JLEMliNTA IU!S 171

Urna vez que, sob o impacto da <>u rpresa que l h e necessic.laJcs para que possam ter sua origem num ato cla­
<.:au::.avam as 1m..:gularidades constatadas n o cuf!>o dos fe­ ramente refletido da vontade. Aliás, ao mesmo tempo que
nômenos, povoou o mundo de seres sob renatu ra is 1 1 >, o peca por excesso de simpl ismo, essa hipótese está carre­
homem sentiu a necessidade de conciliar-se com as forças gada de inverossirnilhanças. Diz-se que o homem teria
temíveis de que ele próprio se havia cercado. Para não buscado o apoio dos seres sobrenaturais dos quais as coi­
ser esmagado por elas, compreendeu que o melhor meio sas dependem. Mas, então, deveria ter se dirigido. de pre­
era aliar-se a a lgumas dessas forças e contar assim com ferência aos mais poderosos dentre eles, àqueles cuja pro­
seu apoio. Ora, nessa fase da história, não se conhece ou­ teção prometia ser mais eficaz•7. Ora, muito pelo conLrário,
tra forma c.lc aliança e c.le associaç.-ão a não ser a que resul­
ta e.lo parentesco. 1oc.los os membros de um mesmo ela se
os seres com os quais ele estabeleceu esse parentesco mís­
tico figuram na maioria e.las vezes entre os mais humildes.
;qudam m u tuamente porque são parentes ou, o que da no
<.:orno cai!., ao contr..i rio, das difc
Por outro lado, se rea lmente se Lratasse apenas de fazer
mesmo, porquL M: vêem al iados e defensores, o homem teria buscado contar com
rentes sao tratados como inimigos porque sào de sangue
diferente. A única maneira de obter o apoio e.los seres so­
o maior número possível deles, pois assim estaria melhor
defendido. No enLanto, cm rcalic.lade, cada clã se contenta
brenaturais era, portanto, adotá-los corno parentes e fa­ sistematicamente com um único totem, isto é, com u m
zer-se adotar por eles na mesma q u al id ad e: os procedi único protetor, deixando os outros clãs usufruir do deles
mentos bem conhecidos e.lo blood-coue11a11t ! pacto de cm completa liberdac.le: e-ada clã se encerra rigorosamente
sangue! permitiam atingir facilmente esse resultac.lo. Mas, no domínio religioso que lhe é próprio, sem jamais querer
como nesse momento o indivíduo não tinha ainda perso­ sa reserva e essa moderação são
usurpar o dos vizinhos. Es
na l idade própria. como não v i a nele senão uma parte ininteligíveis na hipótese que examinamos.
qualqu er de seu grupo, isro é, de seu clã, foi o clã em
conju nto, e não o indivíduo, que contraiu coleti\amcntc
esse parentesco . Pela mesma razão, contraiu-o, nao com li
um objeto em particula r, mas com o grnpo natural , isto é,
com a espécie da qual esse objeto fazia parte; pois o ho­ Todas essas teorias, aliás, cometem o e1TO de omitir
mem pensa o mundo como pensa a si mesmo, e, assim uma questão que domina todo o assunto. Vimos que exis­
corno não se concebe separado de seu dã, não podcriõl tem duas espécies de toternisrno: o do indivíduo e o do
concdx:r uma cois" separada ela es pécie à qual rcrtcnce . clã. Entre os dois, há um parentesco demasiado evidente
Ora, urmr espécie de coisa unida a um clã por laços d e para que não mantenh a m qua l q ue r relação. Cabe, porta n-
parentesco, c.l i z .Jevons, é u m totem. 10, perguntar se um não derivou do outro e, em caso de
É certo, c.lc fato, que o totemismo impl ica urna estreita resposta afirmativa, qual o ma is primitivo. Conforme a so­
associação entre um clã e uma categoria determinada de lução adotac.la, o problema e.las origens do toternismo se
objetos. Mas que essa associação, como pretende ,Jcvons, colocará em termos c.lifcrentes. Essa questão se impõe so­
tenha sic.lo assumida del iberadamente, com plena cons­ bretudo por apresentar um interesse muito geral. O rore­
ciência do propósito visado, é o que parece pouco de mismo individual é o a�pecto individual do culto totêmi­
acordo com o que nos ensina a história. As religiões são co. Logo, se for ele o fato primitivo, cumpre dizer que a
coisas complexas, correspo ndem a múltiplas e obscuras religião nasceu ela consciência do indivíduo, que ela res-
170 AS FON1\llAS t:LEMIINTAJWS DA 1'/[)11 IU:'J.l(i/OSll AS CRENÇAS /JLEMliNTA IU!S 171

Urna vez que, sob o impacto da <>u rpresa que l h e necessic.laJcs para que possam ter sua origem num ato cla­
<.:au::.avam as 1m..:gularidades constatadas n o cuf!>o dos fe­ ramente refletido da vontade. Aliás, ao mesmo tempo que
nômenos, povoou o mundo de seres sob renatu ra is 1 1 >, o peca por excesso de simpl ismo, essa hipótese está carre­
homem sentiu a necessidade de conciliar-se com as forças gada de inverossirnilhanças. Diz-se que o homem teria
temíveis de que ele próprio se havia cercado. Para não buscado o apoio dos seres sobrenaturais dos quais as coi­
ser esmagado por elas, compreendeu que o melhor meio sas dependem. Mas, então, deveria ter se dirigido. de pre­
era aliar-se a a lgumas dessas forças e contar assim com ferência aos mais poderosos dentre eles, àqueles cuja pro­
seu apoio. Ora, nessa fase da história, não se conhece ou­ teção prometia ser mais eficaz•7. Ora, muito pelo conLrário,
tra forma c.lc aliança e c.le associaç.-ão a não ser a que resul­
ta e.lo parentesco. 1oc.los os membros de um mesmo ela se
os seres com os quais ele estabeleceu esse parentesco mís­
tico figuram na maioria e.las vezes entre os mais humildes.
;qudam m u tuamente porque são parentes ou, o que da no
<.:orno cai!., ao contr..i rio, das difc
Por outro lado, se rea lmente se Lratasse apenas de fazer
mesmo, porquL M: vêem al iados e defensores, o homem teria buscado contar com
rentes sao tratados como inimigos porque sào de sangue
diferente. A única maneira de obter o apoio e.los seres so­
o maior número possível deles, pois assim estaria melhor
defendido. No enLanto, cm rcalic.lade, cada clã se contenta
brenaturais era, portanto, adotá-los corno parentes e fa­ sistematicamente com um único totem, isto é, com u m
zer-se adotar por eles na mesma q u al id ad e: os procedi único protetor, deixando os outros clãs usufruir do deles
mentos bem conhecidos e.lo blood-coue11a11t ! pacto de cm completa liberdac.le: e-ada clã se encerra rigorosamente
sangue! permitiam atingir facilmente esse resultac.lo. Mas, no domínio religioso que lhe é próprio, sem jamais querer
como nesse momento o indivíduo não tinha ainda perso­ sa reserva e essa moderação são
usurpar o dos vizinhos. Es
na l idade própria. como não v i a nele senão uma parte ininteligíveis na hipótese que examinamos.
qualqu er de seu grupo, isro é, de seu clã, foi o clã em
conju nto, e não o indivíduo, que contraiu coleti\amcntc
esse parentesco . Pela mesma razão, contraiu-o, nao com li
um objeto em particula r, mas com o grnpo natural , isto é,
com a espécie da qual esse objeto fazia parte; pois o ho­ Todas essas teorias, aliás, cometem o e1TO de omitir
mem pensa o mundo como pensa a si mesmo, e, assim uma questão que domina todo o assunto. Vimos que exis­
corno não se concebe separado de seu dã, não podcriõl tem duas espécies de toternisrno: o do indivíduo e o do
concdx:r uma cois" separada ela es pécie à qual rcrtcnce . clã. Entre os dois, há um parentesco demasiado evidente
Ora, urmr espécie de coisa unida a um clã por laços d e para que não mantenh a m qua l q ue r relação. Cabe, porta n-
parentesco, c.l i z .Jevons, é u m totem. 10, perguntar se um não derivou do outro e, em caso de
É certo, c.lc fato, que o totemismo impl ica urna estreita resposta afirmativa, qual o ma is primitivo. Conforme a so­
associação entre um clã e uma categoria determinada de lução adotac.la, o problema e.las origens do toternismo se
objetos. Mas que essa associação, como pretende ,Jcvons, colocará em termos c.lifcrentes. Essa questão se impõe so­
tenha sic.lo assumida del iberadamente, com plena cons­ bretudo por apresentar um interesse muito geral. O rore­
ciência do propósito visado, é o que parece pouco de mismo individual é o a�pecto individual do culto totêmi­
acordo com o que nos ensina a história. As religiões são co. Logo, se for ele o fato primitivo, cumpre dizer que a
coisas complexas, correspo ndem a múltiplas e obscuras religião nasceu ela consciência do indivíduo, que ela res-
172 AS FORMAS ELEA1/IIV/itRES DA VJDA REUG!OSA I\ CRE..\ÇASELEMENTARES 173

ponde antes de tudo a asp i rações individuais e que só se 1 1 1 em seguida passado aos descendentes desse herói mí-
cundariamente adq u iri u uma forma coletiva. 1 ll O po r direito de herança. Esses povos parecem, pois,
O es píri to si mplista , que ainda inspira com freqüên­ 1 vconhecer no Lotem coletivo u m totem i nd ivid ual que te-
cia mu ito s etnógrafos e sociólogos , levaria mu itos estudio­ pe rpetu ado numa mesma famílial1. De fato, aconte-
L' ainda hoje que u m pai transmite seu totem aos filhos .
1 i ; 1 se

sos a exp l ica r, tanto aqui como alhures, o com plexo pelo
simples, o totem do grupo pelo do indivíduo. Tal é, com
1

Portanto, ao imagi nar que, de maneira geral, o totem co­


e feito , a te oria defendida por Frazer, em seu Golde n lv1ivo teve essa mesma origem , apenas se afi nna do pas­
Bough111, por Hill Tout19, pela srta. Fletcher20, por Boas21 e -..1do um fato que é ainda presentemente observáve(l5.
por Swanton22. Ela tem a vantagem, aliás, de estar de Resta ex pl ica r de onde vem o totemismo individual.
acordo com a concepção que correntemente se faz da re- \ resposta a essa questão varia segundo os autores.
1 igi ão, isto é, ver nela a lgo de m u i to íntimo e p essoa l . !! i l i Tout v ê nele u m caso particular d o feti cb ismo.
Desse ponto de vista, o totem do clã só pode ser um Lo­ >1 nti ndo-sc cercado de esríriLos Lemívds por Lodos OS [a
tem individual que teria se general i zado . Um homem mar­ dos, o ind ivíduo teria experimentado o sentimento que,
cante, a pós ter experimentado o valor de um Lotem que 1 1 nda há pouco, jevons atrihuía ao clã : para poder se man-
l ivremente escolhera, o teria transmitido a seus descen­ 11•r, teria bl!scado nesse mundo miste rioso algu m p rotetor
dentes; estes, multipl icando-se com o tempo, teriam aca 1 )(xleroso. E assim que o costume do lOLem individual teria
bacio por formar essa família extensa que é o clã e, assim, '>l' cstabelecidol6. Para Prazer, essa mesma instituição se-
o totem teria se tornado coletivo. 1 1.1 ames um subterfúgio, uma artmanha de guerra inventa­
d.i pelos homens para esca par a certos perigos. S<ibe-se
i

Hill Tout j ulgou encontrar uma prova em apoio dessa


teoria na maneira corno o totemismo é en tend ido por cer­ que, seg undo u m a crença m u i to di fu ndid a n um g ra nde
tas sociedades do Noroeste americano, especialmente pe­ de sociedades inferiores, a alma humana pode, sem
11l1111cro

los Salish e os índios do rio Thom pson . Entre esses po­ 111convenientes, deixar temporariamente o corro que habi-
vos, com efeico, verificam-se tanto o totcmismo individual 1.1, por mais distante que possa esta r, continua a a n imá-lo
como o de clã; mas, ou eles não coexistem nu ma mesma por uma espécie de ação a distância. M<is com isso, em
tribo, ou, quando coexistem, são desigualmente desenvol­ 1 1·rtos momentos críticos que ameaçariam particularmente
vidos. Variam na razão inversa um cio outro: l á onde o LO­ .1 vida , pode haver interesse em retirar a alma do corpo e

tem de clã tende a ser a regra gera l , o totem individual d (' positá- la n u m lugar ou num obj eto, onde ela estaria
tende a desaparecer, e vice-versa. Não eq uivale isso a di­ lllais segura. E , de fato, h á u m certo nú mero de prá ticas
zer que o p ri meiro é u ma forma mais recente do segu ndo, 1 k·sLinadas a exteriorizar a alma a fim ele subtraí- la a algum
que ele exclui ao substituí-lo23? A mitologia parece confir­ 1 •vrigo, real ou imaginário. Por exemplo , no momento em
mar essa interpretação. Nas mesmas so.ciedad es , de fato, q11c as pessoas vão penetrar numa casa recém-construída,

o a ntepassado do clã não é um animal cotêmi co , o funda­ t > lll má gi co extrai suas almas e as põe num saco, restituin­

dor do grupo sendo geralmente representado sob os tra­ ' lc >-as a seus proprietários somente depoLc; que o Limiar for
ços de um ser humano que, em dado momento, teria en­ 1 1 i.1,·essaclo. É que o momento de entrada numa casa nova
trado em relação e em comércio fa m i liar com u m animal 1 l'Xccpcionalmente crítico: corre-se o risco de pem1 rbar e,

fabuloso, d o qual teria recebido seu emblema totêmico. portanto, ofender, os espíritos que residem no solo, sobre-
Esse emblema, com os poderes especiais a ele l igados, te- 1 1 1 do debaixo cio limiar, e, se não forem tomad as precau-
172 AS FORMAS ELEA1/IIV/itRES DA VJDA REUG!OSA I\ CRE..\ÇASELEMENTARES 173

ponde antes de tudo a asp i rações individuais e que só se 1 1 1 em seguida passado aos descendentes desse herói mí-
cundariamente adq u iri u uma forma coletiva. 1 ll O po r direito de herança. Esses povos parecem, pois,
O es píri to si mplista , que ainda inspira com freqüên­ 1 vconhecer no Lotem coletivo u m totem i nd ivid ual que te-
cia mu ito s etnógrafos e sociólogos , levaria mu itos estudio­ pe rpetu ado numa mesma famílial1. De fato, aconte-
L' ainda hoje que u m pai transmite seu totem aos filhos .
1 i ; 1 se

sos a exp l ica r, tanto aqui como alhures, o com plexo pelo
simples, o totem do grupo pelo do indivíduo. Tal é, com
1

Portanto, ao imagi nar que, de maneira geral, o totem co­


e feito , a te oria defendida por Frazer, em seu Golde n lv1ivo teve essa mesma origem , apenas se afi nna do pas­
Bough111, por Hill Tout19, pela srta. Fletcher20, por Boas21 e -..1do um fato que é ainda presentemente observáve(l5.
por Swanton22. Ela tem a vantagem, aliás, de estar de Resta ex pl ica r de onde vem o totemismo individual.
acordo com a concepção que correntemente se faz da re- \ resposta a essa questão varia segundo os autores.
1 igi ão, isto é, ver nela a lgo de m u i to íntimo e p essoa l . !! i l i Tout v ê nele u m caso particular d o feti cb ismo.
Desse ponto de vista, o totem do clã só pode ser um Lo­ >1 nti ndo-sc cercado de esríriLos Lemívds por Lodos OS [a
tem individual que teria se general i zado . Um homem mar­ dos, o ind ivíduo teria experimentado o sentimento que,
cante, a pós ter experimentado o valor de um Lotem que 1 1 nda há pouco, jevons atrihuía ao clã : para poder se man-
l ivremente escolhera, o teria transmitido a seus descen­ 11•r, teria bl!scado nesse mundo miste rioso algu m p rotetor
dentes; estes, multipl icando-se com o tempo, teriam aca 1 )(xleroso. E assim que o costume do lOLem individual teria
bacio por formar essa família extensa que é o clã e, assim, '>l' cstabelecidol6. Para Prazer, essa mesma instituição se-
o totem teria se tornado coletivo. 1 1.1 ames um subterfúgio, uma artmanha de guerra inventa­
d.i pelos homens para esca par a certos perigos. S<ibe-se
i

Hill Tout j ulgou encontrar uma prova em apoio dessa


teoria na maneira corno o totemismo é en tend ido por cer­ que, seg undo u m a crença m u i to di fu ndid a n um g ra nde
tas sociedades do Noroeste americano, especialmente pe­ de sociedades inferiores, a alma humana pode, sem
11l1111cro

los Salish e os índios do rio Thom pson . Entre esses po­ 111convenientes, deixar temporariamente o corro que habi-
vos, com efeico, verificam-se tanto o totcmismo individual 1.1, por mais distante que possa esta r, continua a a n imá-lo
como o de clã; mas, ou eles não coexistem nu ma mesma por uma espécie de ação a distância. M<is com isso, em
tribo, ou, quando coexistem, são desigualmente desenvol­ 1 1·rtos momentos críticos que ameaçariam particularmente
vidos. Variam na razão inversa um cio outro: l á onde o LO­ .1 vida , pode haver interesse em retirar a alma do corpo e

tem de clã tende a ser a regra gera l , o totem individual d (' positá- la n u m lugar ou num obj eto, onde ela estaria
tende a desaparecer, e vice-versa. Não eq uivale isso a di­ lllais segura. E , de fato, h á u m certo nú mero de prá ticas
zer que o p ri meiro é u ma forma mais recente do segu ndo, 1 k·sLinadas a exteriorizar a alma a fim ele subtraí- la a algum
que ele exclui ao substituí-lo23? A mitologia parece confir­ 1 •vrigo, real ou imaginário. Por exemplo , no momento em
mar essa interpretação. Nas mesmas so.ciedad es , de fato, q11c as pessoas vão penetrar numa casa recém-construída,

o a ntepassado do clã não é um animal cotêmi co , o funda­ t > lll má gi co extrai suas almas e as põe num saco, restituin­

dor do grupo sendo geralmente representado sob os tra­ ' lc >-as a seus proprietários somente depoLc; que o Limiar for
ços de um ser humano que, em dado momento, teria en­ 1 1 i.1,·essaclo. É que o momento de entrada numa casa nova
trado em relação e em comércio fa m i liar com u m animal 1 l'Xccpcionalmente crítico: corre-se o risco de pem1 rbar e,

fabuloso, d o qual teria recebido seu emblema totêmico. portanto, ofender, os espíritos que residem no solo, sobre-
Esse emblema, com os poderes especiais a ele l igados, te- 1 1 1 do debaixo cio limiar, e, se não forem tomad as precau-
174 AS FORMAS ELEMENTARES DA l'TDA REIJGIOSll 1\ <.RENÇAS EWMENTANliS 175

ções, eles pode ri am fazer o homem pagar caro sua audá . i, 1s não perm it em atribuir-lhe O primitivo tem u m a ló i­
g
eia. Mas, uma vez passado o perigo, uma vez que se pôdt· • 1, por mais estranha que possa às vezes nos parecer; ora,
prevenir a cólera dos espíritos e até mesmo contar com 1 ll)Cnos que fosse totalmente desprovido dela, ele não
seu apoio graças ao cumprimento ele certos ritos, as almas 1 111deria fazer o raciodnio que lhe imputam. Que ele ju l ­
podem voltar a seu lugar habitual27. Essa mesma crença te­ ' 1 ...se gara n ti r a sobrevivência ele sua alma dissimulando-a
ria dado origem ao totem individual. Para se proteger con­ 1 1 1 1 111 lugar secreto e inacessível, como o teriam feito tan-
tra malefícios m ágicos, os homens teriam julgado prudente 11 ,.., heróis dos mitos e das fábulas, nada mais natural. Mas
ocultar suas almas na multidão anônima de uma espécie , 1 1rno poderia ele julgá-la mais segura no corpo de u m
animal ou vegetal . Estabelecida essa relaçJo, cada indiví­ 1111mal elo que n o seu próprio? Claro que, perdida assim
duo sentiu-se inti mamente unido ao animal ou à p la nta i 1 espécie, a a l m a poderi a ter chances de escapar mais
em que residiria seu princípio vital. Dois seres láo solic.lános 1 11 1 l mcme aos sortilégios elo magrco, mas, ao mesmo tem­
acabaram indusíve sendo considerados praticam(;nte in i ' ' adta\·a-sc total1m:ntc expo:>ta aos ataques <los caçado­
distintos: acredito u-se que um participava da natureza c.lo r • .., Seria um meio singula de proteção envolvê-l
r a numa
outro. &sa crenç·a, uma vez admitida, facilitou e ativou a l• •r ma material que se expunha a riscos a todo instante 29.
m
transfo r ação do rocem pessoal em totem hereditário e, 111hretudo, é i n co ncebíve l que povos inteiros se deixas-
portanto, coletivo, pois pareceu muito evide nte que essc> m levar por semelhante aberraçãoW. Enfun, n u m grande
parentesco de natureza devesse se transmitir hereditaria­ n 11mero ele casos, a função do totem individual é manifes-
mente do pai aos fiU1os. 1 . 1 1 nente muilO distinta da que lhe atribui Frazer: trata-se,
Não nos deteremos a discutir longamente essas duas 111tt·s de ntdo, de a
um meio ele conferir a mágicos, caça­
expl icações do totem individual : são engenhosas noções d1 11cs, a gue rrei ros, poderes extraordinários31. Q ua nto à
do esp írito , mas carecem totalmente de provas positivas. .1 1lrd a riecla de do homem e d coisa, com todos os incon­
a
Para poder reduzir o totemismo ao fetichismo, seria preci­ ' rnt·ntes que im plica , ela é aceita como uma conseqüên-
so ter estabelecido que o segundo é anterior ao primeiro; ' 1.1 obrigatória do rito, mas n ão é desejada em si mesma e
ora, não apenas nenhum fato é alegado para demonstrar I " 11 s i mesma.
essa hipótese, como também ela é con testada por tudo o 1Iá menos motivos ainda ele nos determos nessa con-
que sabemos. O conj unto, mal determinado, de ritos cha­ 1 1 1 1 vcrsia qua n do o verdadeiro problema não se encontra
mados fet ichismo, parece efetivamente só se manifestar 1 1 e> que importa saber antes de tudo é se o totem inclivi-
entre povos que já atingiram um certo grau de civil ização. 1 1 11.tl e realmente o faro primitivo do qu al o totem coletivo
É um t ipo ele culto desconhecido na Austrália. É verdade ' " ' i:i de riva do , pois, conforme a resposta que dermos a
que se qual ificou o chu r inga ele fet iche28; mas, suponclo­ 1 "'' questão, deveremos buscar o núcleo da viela religio-
se que essa qualificação se justifique, ela não poder.ia pro­ ' 1·111 duas direções opostas.
var a anterioridade que se postula. Muito pelo contrário, o Ora, contra a hipótese ele Hill Tout, da srta. Fletcher,
churinga supõe o totcmismo, já que é essencialmente um d1 l loas, de Frazer, há um tal conjunto de fatos decisivos
instrumento do culto totêmico e deve exclusivamente ãs ' I "'' nos surp reende mos que ela tenha sido aceita ele uma
crenças totêmicas as virtudes que llie são atribuídas. 111 1 1 11..•ira tão fácil e tão geral.
Quanto à teoria de Frazer, ela supõe no primitivo Em prin1eiro lugar, sabemos que o homem muito fre­
uma espécie de absurdo intrmseco que os fatos conheci- < 1 1 1 1 · n temen te tem u m fone interesse em não ap en as res-
174 AS FORMAS ELEMENTARES DA l'TDA REIJGIOSll 1\ <.RENÇAS EWMENTANliS 175

ções, eles pode ri am fazer o homem pagar caro sua audá . i, 1s não perm it em atribuir-lhe O primitivo tem u m a ló i­g
eia. Mas, uma vez passado o perigo, uma vez que se pôdt· • 1, por mais estranha que possa às vezes nos parecer; ora,
prevenir a cólera dos espíritos e até mesmo contar com 1 ll)Cnos que fosse totalmente desprovido dela, ele não
seu apoio graças ao cumprimento ele certos ritos, as almas 1 111deria fazer o raciodnio que lhe imputam. Que ele ju l ­
podem voltar a seu lugar habitual27. Essa mesma crença te­ ' 1 ...se gara n ti r a sobrevivência ele sua alma dissimulando-a
ria dado origem ao totem individual. Para se proteger con­ 1 1 1 1 111 lugar secreto e inacessível, como o teriam feito tan-
tra malefícios m ágicos, os homens teriam julgado prudente 11 ,.., heróis dos mitos e das fábulas, nada mais natural. Mas
ocultar suas almas na multidão anônima de uma espécie , 1 1rno poderia ele julgá-la mais segura no corpo de u m
animal ou vegetal . Estabelecida essa relaçJo, cada indiví­ 1111mal elo que n o seu próprio? Claro que, perdida assim
duo sentiu-se inti mamente unido ao animal ou à p la nta i 1 espécie, a a l m a poderi a ter chances de escapar mais
em que residiria seu princípio vital. Dois seres láo solic.lános 1 11 1 l mcme aos sortilégios elo magrco, mas, ao mesmo tem­
acabaram indusíve sendo considerados praticam(;nte in i ' ' adta\·a-sc total1m:ntc expo:>ta aos ataques <los caçado­
distintos: acredito u-se que um participava da natureza c.lo r • .., Seria um meio singula de proteção envolvê-l
r a numa
outro. &sa crenç·a, uma vez admitida, facilitou e ativou a l• •r ma material que se expunha a riscos a todo instante 29.
m
transfo r ação do rocem pessoal em totem hereditário e, 111hretudo, é i n co ncebíve l que povos inteiros se deixas-
portanto, coletivo, pois pareceu muito evide nte que essc> m levar por semelhante aberraçãoW. Enfun, n u m grande
parentesco de natureza devesse se transmitir hereditaria­ n 11mero ele casos, a função do totem individual é manifes-
mente do pai aos fiU1os. 1 . 1 1 nente muilO distinta da que lhe atribui Frazer: trata-se,
Não nos deteremos a discutir longamente essas duas 111tt·s de ntdo, de a
um meio ele conferir a mágicos, caça­
expl icações do totem individual : são engenhosas noções d1 11cs, a gue rrei ros, poderes extraordinários31. Q ua nto à
do esp írito , mas carecem totalmente de provas positivas. .1 1lrd a riecla de do homem e d coisa, com todos os incon­
a
Para poder reduzir o totemismo ao fetichismo, seria preci­ ' rnt·ntes que im plica , ela é aceita como uma conseqüên-
so ter estabelecido que o segundo é anterior ao primeiro; ' 1.1 obrigatória do rito, mas n ão é desejada em si mesma e
ora, não apenas nenhum fato é alegado para demonstrar I " 11 s i mesma.
essa hipótese, como também ela é con testada por tudo o 1Iá menos motivos ainda ele nos determos nessa con-
que sabemos. O conj unto, mal determinado, de ritos cha­ 1 1 1 1 vcrsia qua n do o verdadeiro problema não se encontra
mados fet ichismo, parece efetivamente só se manifestar 1 1 e> que importa saber antes de tudo é se o totem inclivi-
entre povos que já atingiram um certo grau de civil ização. 1 1 11.tl e realmente o faro primitivo do qu al o totem coletivo
É um t ipo ele culto desconhecido na Austrália. É verdade ' " ' i:i de riva do , pois, conforme a resposta que dermos a
que se qual ificou o chu r inga ele fet iche28; mas, suponclo­ 1 "'' questão, deveremos buscar o núcleo da viela religio-
se que essa qualificação se justifique, ela não poder.ia pro­ ' 1·111 duas direções opostas.
var a anterioridade que se postula. Muito pelo contrário, o Ora, contra a hipótese ele Hill Tout, da srta. Fletcher,
churinga supõe o totcmismo, já que é essencialmente um d1 l loas, de Frazer, há um tal conjunto de fatos decisivos
instrumento do culto totêmico e deve exclusivamente ãs ' I "'' nos surp reende mos que ela tenha sido aceita ele uma
crenças totêmicas as virtudes que llie são atribuídas. 111 1 1 11..•ira tão fácil e tão geral.
Quanto à teoria de Frazer, ela supõe no primitivo Em prin1eiro lugar, sabemos que o homem muito fre­
uma espécie de absurdo intrmseco que os fatos conheci- < 1 1 1 1 · n temen te tem u m fone interesse e m não ap en as res-
176 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA Ré'UGIO,\. 1 1 1 < NHNÇAS ELEMENTA RES 177

peitar, mas cm fazer respeitar por seus co mpa n heiros os 1 111 1 se dimi nu i r a distância inserindo entre eles, como urna
animais da espécie que lhe serve de totem pessoa l ; n·ata t .pec1 e de termo médio, o direito que todo deten to r de
se de sua própria vida. Portanto, se o totemismo coletivo 1 1 1 1 1 totem teria ele tra nsmiti-lo a quem quisesse. Mas essas
fosse apenas a fonna generalizada do totem ismo individual, 1 1 1 1 1sferências, não impona onde as observemos, são atos
ele deveria se basear no mesmo princípio. Os membros 1 1 1 os, re lativamente excepcionais; não podem ser opera­
d e um clã não só deveriam se abster de matar e comer ' "' senão por mágicos ou perso n agens investidos de po-
seu anima l-totem, como também deveriam fazer o possí­ d1 1es especia is32 ; em todo caso, só podem ocorrer por
vel para reclam a r dos estrangeiros a mes m a a bstenção. 1 1 11·10 de cerimô n ias rituais que efetuam a mudança. Seria
Ora, na verdade, muito lon ge de impor essa renú nci a a 1 •11·dso expli car, portanto, de que maneira o q ue era prer­
toda a tribo, cad a clã, através de ritos que decreveremos r •i.:a t v i a de alguns tomou-se direito de todos; de que ma-
adiante, cuida para que a planta ou o animal que lhe ser­ 111 1r.1 o que implicava, antes ele mais nada, urna mudanç-a
de totem crei.1,<i e prospere, a fim de a�egur'&r aos ou 1 1fun<la na constitu 11;ào religiosa e moral do in<l ivíd uo
1'• 1de tornar-se um elemento dessa constituição; de que
\'t:

tros clàs uma alimentação a bunda nte. Assim, seria preciso


ao menos admitir que, ao tomar-se coletivo, o totemismo 11 indra, enfim, uma transmissão que, primitivamente, era
i nd ivid ua l tr'Jnsformou-se profundamente, e seri a p reciso • 1 111seqüência de um rito, foi depois considerada como se
expl ica r essa tra nsformação. I '' nduzindo espontaneamente, pela força das coisas e sem
Em segundo luga r, como explicar desse ponto de vis­ 1 interve n ção de nenhuma vontade humana.
ta que, exceto onde o totem ismo está cm decadência, Em apoio ele sua interpretação, H i l l Tout alega que
dois clãs de urna mesma tribo tenham sempre totens dife­ • 1 1 t os mitos alribuem ao Lotem de clã u ma origem indivi­
rentes? Parece que nada impedia dois ou vários membros t l1 1; d : neles se conta que o emb lema totémico foi adq u i ri­
de u ma mesma tribo, sobretudo quando n ão havia ne­ " ' ' por u m indivíduo determinado q u e depo i s o te r ia
nhum parentesco entre eles, de escolher seu totem pessoal 11 1 nsmit ido a seus descendentes. Mas, em primeiro l ugar,
na mesma espécie animal e de transmiti-lo cm seg u ida a • Sl'S m itos são tomados de tribos i ndígen as d a Amér ica
seus descendentes. Não ac ontece hoje, entre nós, duas fa­ 1 l1 1 Norte, ou seja, ele sociedades que chegaram a u m grau
núlias disti ntas Lerem o mesmo nome? A mane ira , estrita­ l 1. 1 s1 ante elevado de cu lt ura . Corno é que uma mitologia
mente regulamentada, com q u e totens e subtotcns são 1 11 1 afastada elas origens poderia reconstituir, com alguma
distribuídos primeiro en t re as duas fra tri as , depois entre 1 gma nça, a forma primitiva ele uma instituição? Hã mui-
os diversos clãs de cada fratri a , supõe ma n ifestamente um 1 ' " chances ele que ca us a s intercorrentes tenham desfigu-
en tendi me n to social, uma organização coletiva. Vale dizer 1 .1 < lo gravemente a lembrança que os homens poderiam
que o totc m ismo é a lgo mais do que uma prática indivi­ 1 1 r conse rvado dela. Além disso, é mu i to fácil opor, a es-
dual que Leria espontaneamente se generalizado. 11 •s m ito s, outros que parecem ser mais primitivos e cuja
Aliás, não se pode derivar o totemismo coletivo do in 1•:nificaçâo é completamente diferente. Nestes, o totem é
cliviclual, a menos que se desconheçam as diferenças que 1 1 p resen t ad o como o ser mesmo do qu al o clã descen­
os separam. O primei ro é design ado à criança por ocasião di 1 1 . É ele, pois, que constitui a substância do clã; os indi­
de seu é um elemento de seu estado civil. O
na sci mento , tt luos trazem-no consiJO desde o nascimento; trazem-no
outro é adqu irido ao longo da vida, supõe o cumprimento 1 1 1 sua carne e em seu sangue, ao invés de o terem rece-
de um rito determinado e urna mudança de estado. Acre- 1 t t t l o ele fora33. E tem mais: os próprios mitos sobre os
176 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA Ré'UGIO,\. 1 1 1 < NHNÇAS ELEMENTA RES 177

peitar, mas cm fazer respeitar por seus co mpa n heiros os 1 111 1 se dimi nu i r a distância inserindo entre eles, como urna
animais da espécie que lhe serve de totem pessoa l ; n·ata t .pec1 e de termo médio, o direito que todo deten to r de
se de sua própria vida. Portanto, se o totemismo coletivo 1 1 1 1 1 totem teria ele tra nsmiti-lo a quem quisesse. Mas essas
fosse apenas a fonna generalizada do totem ismo individual, 1 1 1 1 1sferências, não impona onde as observemos, são atos
ele deveria se basear no mesmo princípio. Os membros 1 1 1 os, re lativamente excepcionais; não podem ser opera­
d e um clã não só deveriam se abster de matar e comer ' "' senão por mágicos ou perso n agens investidos de po-
seu anima l-totem, como também deveriam fazer o possí­ d1 1es especia is32 ; em todo caso, só podem ocorrer por
vel para reclam a r dos estrangeiros a mes m a a bstenção. 1 1 11·10 de cerimô n ias rituais que efetuam a mudança. Seria
Ora, na verdade, muito lon ge de impor essa renú nci a a 1 •11·dso expli car, portanto, de que maneira o q ue era prer­
toda a tribo, cad a clã, através de ritos que decreveremos r •i.:a t v i a de alguns tomou-se direito de todos; de que ma-
adiante, cuida para que a planta ou o animal que lhe ser­ 111 1r.1 o que implicava, antes ele mais nada, urna mudanç-a
de totem crei.1,<i e prospere, a fim de a�egur'&r aos ou 1 1fun<la na constitu 11;ào religiosa e moral do in<l ivíd uo
1'• 1de tornar-se um elemento dessa constituição; de que
\'t:

tros clàs uma alimentação a bunda nte. Assim, seria preciso


ao menos admitir que, ao tomar-se coletivo, o totemismo 11 indra, enfim, uma transmissão que, primitivamente, era
i nd ivid ua l tr'Jnsformou-se profundamente, e seri a p reciso • 1 111seqüência de um rito, foi depois considerada como se
expl ica r essa tra nsformação. I '' nduzindo espontaneamente, pela força das coisas e sem
Em segundo luga r, como explicar desse ponto de vis­ 1 interve n ção de nenhuma vontade humana.
ta que, exceto onde o totem ismo está cm decadência, Em apoio ele sua interpretação, H i l l Tout alega que
dois clãs de urna mesma tribo tenham sempre totens dife­ • 1 1 t os mitos alribuem ao Lotem de clã u ma origem indivi­
rentes? Parece que nada impedia dois ou vários membros t l1 1; d : neles se conta que o emb lema totémico foi adq u i ri­
de u ma mesma tribo, sobretudo quando n ão havia ne­ " ' ' por u m indivíduo determinado q u e depo i s o te r ia
nhum parentesco entre eles, de escolher seu totem pessoal 11 1 nsmit ido a seus descendentes. Mas, em primeiro l ugar,
na mesma espécie animal e de transmiti-lo cm seg u ida a • Sl'S m itos são tomados de tribos i ndígen as d a Amér ica
seus descendentes. Não ac ontece hoje, entre nós, duas fa­ 1 l1 1 Norte, ou seja, ele sociedades que chegaram a u m grau
núlias disti ntas Lerem o mesmo nome? A mane ira , estrita­ l 1. 1 s1 ante elevado de cu lt ura . Corno é que uma mitologia
mente regulamentada, com q u e totens e subtotcns são 1 11 1 afastada elas origens poderia reconstituir, com alguma
distribuídos primeiro en t re as duas fra tri as , depois entre 1 gma nça, a forma primitiva ele uma instituição? Hã mui-
os diversos clãs de cada fratri a , supõe ma n ifestamente um 1 ' " chances ele que ca us a s intercorrentes tenham desfigu-
en tendi me n to social, uma organização coletiva. Vale dizer 1 .1 < lo gravemente a lembrança que os homens poderiam
que o totc m ismo é a lgo mais do que uma prática indivi­ 1 1 r conse rvado dela. Além disso, é mu i to fácil opor, a es-
dual que Leria espontaneamente se generalizado. 11 •s m ito s, outros que parecem ser mais primitivos e cuja
Aliás, não se pode derivar o totemismo coletivo do in 1•:nificaçâo é completamente diferente. Nestes, o totem é
cliviclual, a menos que se desconheçam as diferenças que 1 1 p resen t ad o como o ser mesmo do qu al o clã descen­
os separam. O primei ro é design ado à criança por ocasião di 1 1 . É ele, pois, que constitui a substância do clã; os indi­
de seu é um elemento de seu estado civil. O
na sci mento , tt luos trazem-no consiJO desde o nascimento; trazem-no
outro é adqu irido ao longo da vida, supõe o cumprimento 1 1 1 sua carne e em seu sangue, ao invés de o terem rece-
de um rito determinado e urna mudança de estado. Acre- 1 t t t l o ele fora33. E tem mais: os próprios mitos sobre os
178 A.\ FON/11AS ELEMENTARES {)A \lf{)fl RELI(,'/(!\ 1 1 Ili V�.llS é'LEA1ENTARBS 179

quais .�l' apóia ll i l l Tout contêm um eco dessa antiga con .1 1 e1 1 plena decadência; nas sociedades do Norocs­
' 1 1 1 particular, ele nao possui senao um caráter religio­
n •

cepçao. O fundador epônimo do clã possui claramentt·


1 de homem; mas é um homem que, após ter \'I
ai
' l t. 1... iance apagado. Inversamente, entre esses mesmos
1 1 1\ , ,.., o rotem individual desempenha u m papel consicle-
uma figur.

1 1 \ 1 1 Atribui-se a ele uma eficácia muito grande; tornou-


vicio cm meio aos animais de uma espécie determinada,

1 1 1 1 1 1;1 verdacleirn instituição públic.<1 . É que ele é caractc­


Leria acabado por assemelhar-se a eles. É que certamentt·

t l 111 o de uma civil ização mais avançada. Eis aí, certamen­


chegou um momento cm que os espíritos eram cultivadrn.

ll • 1 11110 se explica a inversão que Hill Tout acredita ter


demais para continuar a admitir, como no passado, qut·

1 •I 1 •• 1vado nos Salish entre essas duas formas de totcmis-


os homens pudessem nascer de um animal; portanto, cll•s
substituíram o animal ancestral, impossível de ser reprl·
sentado, por um ser humano, mas imaginaram que esst· 1110 '>e , onde o totcmismo coletivo é plenamente dcscn­
' "" ido, o outro pmuc.amente mexiste, não é porque o se-
do recuou dianle do primeiro, ao contrário, é porque
homem lrnv1a ad4umdo, por imitação ou por outros pro
n:tl 1nu:ntos, ccn.i.s c<.1rn<.:Lernslicas da animahdadc. As:-.1111 ,
mesmo essa mitologia tardia traz a marca de uma época 1 1 o nd i ções necessárias à sua existência não se realiza­
mais remota cm que o Lotem do clã de maneira nenhuma ' 1 1 1 1 plenamente.
era concebido como uma espécie de criaÇ"Jo individual. Mas o que é ainda mais demonstrativo é que o rote-
M:.is essa hi pótese não levanta apenas graves dificul 1 1 1 1 .mo individual, longe de ter dado origem a o tocemismo
dades lógicas: ela é diretamente contestada pelos faws 11• 1 1,1, supõe este último. É no contexto do cotemismo co-
que seguem. 1, 1 1\'0 que ele se originou e se move, como p a rte ime-
Se o roccmismo individual fosse o fato inicial ele cle­ 1 11ue dele. Com efeito, mesmo nas sociedades em que é
veria ser tanto mais desenvolvido e canto mais �videntl' 1 • 1 1 ponderante, os noviços não têm o direito de tomar por
quanto mais primitivas fossem as sociedades; inversamen­ " >1 <·m pessoal um animal qualquer; a cada clã é atribuído
te, deveríamos vê-lo perder terreno e apagar-se entre os 1 1 111 cerco nümero de espécies determinadas, fora elas
povos mais avançados. Ora, é o contrário que se verifica. ' 1 1 1.11s não é permitido escolher. Em troca, aquelas que as-
As cribos australianas são muito mais atrasadas que as da 1 1 1 1 lhe pertencem são sua propriedade exclusiva; os
Améric.i. do Norte; no emanto, a Austrália é a terra de pre 1 1 wmbros de um clã estrangeiro não podem usurpá-las.n.
1 .,.,<is espécies são concebidas como mantendo relações
dt• estreita depe ndê nci a com aquela que serve de totem
dileção do Lotemismo coletivo. Na grande maioria das lri­

10 clã inteiro. 1 lá inclusive casos em que é possível pcrcc-


bos, ele reina sozinho, ao passo que não há uma dela�� em
nosso conhecimenlo, em que o totemismo i11dioid1 1al seja o
ún ico }Halicado�4. Só encontramos este ültimo, sob um::i 1 ll'r essas relações : o Lotem individual represenca uma par­
form a caracLcrizada, num nl'1 mero ínfimo ele L ribos35, e, ll' ou um aspccto pa rt ic ula r do totem coletivo38. Entre o s
mesmo aí, q u <isc sempre em estado rudimentar. Ele con­ \Voljoba luk, cada membro d o clã considera o s totens pes­
·• >;iis de seus companheiros como sendo em parte seusl9;
1 1 1do indica, ponamo, que sejam subtotens. Ora, o subLo­
siste, então, em práticas individuais e facultativas, mas

h m supõe o cotem, assim como a espécie supõe o gêne-


que não possuem nenhum caráter de generalidade. Os
mágicos são os ü n icos a conhecer a ar1e de estabelecer
relações misteriosas com espécies animais a que não são 1 0 . Deste modo, a prim 'ira forma de religião individual

naruralmente aparentados. As pessoas comuns não gozam que encontramos n a história nos aparece, não como o
desse privilégio�. Ao contrário, n a América, o totem cole- princípio ativo da religião püblica, mas, ao contrário, co-
178 A.\ FON/11AS ELEMENTARES {)A \lf{)fl RELI(,'/(!\ 1 1 Ili V�.llS é'LEA1ENTARBS 179

quais .�l' apóia ll i l l Tout contêm um eco dessa antiga con .1 1 e1 1 plena decadência; nas sociedades do Norocs­
' 1 1 1 particular, ele nao possui senao um caráter religio­
n •

cepçao. O fundador epônimo do clã possui claramentt·


1 de homem; mas é um homem que, após ter \'I
ai
' l t. 1... iance apagado. Inversamente, entre esses mesmos
1 1 1\ , ,.., o rotem individual desempenha u m papel consicle-
uma figur.

1 1 \ 1 1 Atribui-se a ele uma eficácia muito grande; tornou-


vicio cm meio aos animais de uma espécie determinada,

1 1 1 1 1 1;1 verdacleirn instituição públic.<1 . É que ele é caractc­


Leria acabado por assemelhar-se a eles. É que certamentt·

t l 111 o de uma civil ização mais avançada. Eis aí, certamen­


chegou um momento cm que os espíritos eram cultivadrn.

ll • 1 11110 se explica a inversão que Hill Tout acredita ter


demais para continuar a admitir, como no passado, qut·

1 •I 1 •• 1vado nos Salish entre essas duas formas de totcmis-


os homens pudessem nascer de um animal; portanto, cll•s
substituíram o animal ancestral, impossível de ser reprl·
sentado, por um ser humano, mas imaginaram que esst· 1110 '>e , onde o totcmismo coletivo é plenamente dcscn­
' "" ido, o outro pmuc.amente mexiste, não é porque o se-
do recuou dianle do primeiro, ao contrário, é porque
homem lrnv1a ad4umdo, por imitação ou por outros pro
n:tl 1nu:ntos, ccn.i.s c<.1rn<.:Lernslicas da animahdadc. As:-.1111 ,
mesmo essa mitologia tardia traz a marca de uma época 1 1 o nd i ções necessárias à sua existência não se realiza­
mais remota cm que o Lotem do clã de maneira nenhuma ' 1 1 1 1 plenamente.
era concebido como uma espécie de criaÇ"Jo individual. Mas o que é ainda mais demonstrativo é que o rote-
M:.is essa hi pótese não levanta apenas graves dificul 1 1 1 1 .mo individual, longe de ter dado origem a o tocemismo
dades lógicas: ela é diretamente contestada pelos faws 11• 1 1,1, supõe este último. É no contexto do cotemismo co-
que seguem. 1, 1 1\'0 que ele se originou e se move, como p a rte ime-
Se o roccmismo individual fosse o fato inicial ele cle­ 1 11ue dele. Com efeito, mesmo nas sociedades em que é
veria ser tanto mais desenvolvido e canto mais �videntl' 1 • 1 1 ponderante, os noviços não têm o direito de tomar por
quanto mais primitivas fossem as sociedades; inversamen­ " >1 <·m pessoal um animal qualquer; a cada clã é atribuído
te, deveríamos vê-lo perder terreno e apagar-se entre os 1 1 111 cerco nümero de espécies determinadas, fora elas
povos mais avançados. Ora, é o contrário que se verifica. ' 1 1 1.11s não é permitido escolher. Em troca, aquelas que as-
As cribos australianas são muito mais atrasadas que as da 1 1 1 1 lhe pertencem são sua propriedade exclusiva; os
Améric.i. do Norte; no emanto, a Austrália é a terra de pre 1 1 wmbros de um clã estrangeiro não podem usurpá-las.n.
1 .,.,<is espécies são concebidas como mantendo relações
dt• estreita depe ndê nci a com aquela que serve de totem
dileção do Lotemismo coletivo. Na grande maioria das lri­

10 clã inteiro. 1 lá inclusive casos em que é possível pcrcc-


bos, ele reina sozinho, ao passo que não há uma dela�� em
nosso conhecimenlo, em que o totemismo i11dioid1 1al seja o
ún ico }Halicado�4. Só encontramos este ültimo, sob um::i 1 ll'r essas relações : o Lotem individual represenca uma par­
form a caracLcrizada, num nl'1 mero ínfimo ele L ribos35, e, ll' ou um aspccto pa rt ic ula r do totem coletivo38. Entre o s
mesmo aí, q u <isc sempre em estado rudimentar. Ele con­ \Voljoba luk, cada membro d o clã considera o s totens pes­
·• >;iis de seus companheiros como sendo em parte seusl9;
1 1 1do indica, ponamo, que sejam subtotens. Ora, o subLo­
siste, então, em práticas individuais e facultativas, mas

h m supõe o cotem, assim como a espécie supõe o gêne-


que não possuem nenhum caráter de generalidade. Os
mágicos são os ü n icos a conhecer a ar1e de estabelecer
relações misteriosas com espécies animais a que não são 1 0 . Deste modo, a prim 'ira forma de religião individual

naruralmente aparentados. As pessoas comuns não gozam que encontramos n a história nos aparece, não como o
desse privilégio�. Ao contrário, n a América, o totem cole- princípio ativo da religião püblica, mas, ao contrário, co-
180 AS FOl?MAS ELE!llJENTARES DA VIDA l?liUG/O\.1 1 \1/Jl\'7'A l?ES
r Nl:NÇAS ELD 181

que o indi m un tra :1caba de penetrar nela. E, como a criança que


mo um simples aspccLO desta última . O culto

ele certo modo , em s<.:u hcc a seguir não é ouLra coisa senão esse a ntepassado
víduo organiza para s i rnesmo e,

ser o germe cio culto coletiv o, nao 1 n· nca rna do , seu totem é necessa ri a me n te o mesmo; ou
·l'f·' · o clã dessa criança é dete rmi na d o pela localidade
foro interior, longe ele
àS neces sidade s do indiví duo.
1 111dc ela teria sido místicamente co ncebida .
é senão este adapt ado

Ora, é esse tote mism o local que representaria a for-


m 111.1 original do tote m is mo; quando muito, se distanciaria
ti•·-.sa forma por um intervalo muiro curto. Eis como Pra-
1• 1 explica sua gênesc.
Num traba lho m a iS recen te'º, que lhe fo
i sugerido
No instante prec iso cm que a mulher se percebe grá­
pelas obras de Spencer e G i llc n, Prazer tentou uma nova
cm subs titu i�<lo à que ele havi:1 \ 1 l.1 , ela deve pensar que o e� pí ri to que a possui veio dos
ol
ex plica ção do totemismo
ser discutida Ela 'il' Jt'tos que a cercam, sobretudo de um daqueles que,
inicialmente proposto e que acaba de
baseia no postulado de que o totem ismo dos Arunta é o 1 11·-.se momento, atraíam sua atenção. Portanto, se estava

mais primit ivo que co nh ec emos ; Praze r c hega rá a dizer P• 11pada na co l e t a d e a lg u m a planta, ou se vigiava um

que esse totemismo qw1se não difere do


tipo verdadeir.:i e 1 1 1 1 111al, acreditará que a alma desse animal ou dessa pla n-
1 1 passou pa ra ela. Emre as coisas a que se rá particular-
1 1 11·nte levada a atribuir sua gravidez, e ncontra m-se, em
absolutamente origi na l ' ' ·
O que ele tem de singu lar é que os
totens, aqui, não
estão ligado s nem a pessoa s, nem a grupo
s de pess oas 1 •111neiríssimo lugar, os al imentos qu e acabou ele ingerir.
dacles . Cada totem possu i , de ,,. comeu recencemente carne de ema ou inhame, não
determinados mas a (ocaLi
fato '. seu cent ;o num l ugar defini do. É aí que se supõe re­ 1 l 1 1 v idará que uma ema ou um inhame se originou e se

sidüem as almas dos pfi me i ros ante pa


ori­ !.·,envolve dentro dela. Sendo assim, explica-se que a
ss a d os que ! na
totêm ico. E aí qu e 1 1 . 1 nça, por sua vez, seja conside rada como u m a espécie
1 h t• ma ou de inhame, que veja a si própria como u m
gem cios tempos, const ituíam o grupo •

s os churin
se encontra o santuário onde são conservado
distribuição • 1 1ngênere cios animais ou das plantas ela mesma espécie,
ga e onde o culto é cel ebrado. É també m essa
que determ ina a manei ra pela q ual • 1111• lhes demonstre simpatia e consideração, que se proí­
geográfica dos totens
m. A crianç a, com efeito , tem por totem l 1.1 de comê-los, etc.43 A part ir ele então, o totemismo ex is-
forma
não o de seu pai ou de sua mãe, mas
os clãs se
aquele que tem seu 1• 1·111 seus traços essenciais: a noção que o indígena teria
scnLido os primei­ l . 1 gt:raçào é que o teria originado, por isso Prazer chama
1 1 101emismo p ri m i tivo ele concepci:onal.
centro no lugar onde a mãe acredi ta ter
o Arunta
ros sintomas de sua m�ternidade próxima. Pois
ignora ' diz-se 1 a relação precis a que une o fato ela geração É des se tipo original q u e todas as outras formas de
l42; acr�d i tª que toda concc pçào é devida a 1 1 111·mismo teriam derivado. "Se várias m u l heres uma
ao ato sexua
uma espécie de fecundação mística. Ela implic
a, segundo 1 p11s a outra, perceberem os sinais premonitórios a ma­tl
rou no corpo ele '' r 111dade num mesmo lugar e nas mesmas circunstâncias,
• ,.,,. lugar será visto como freqüenta do por espíri tos de
ele, que uma alma de �intcp assaclo penet
aí o princí pio de uma vicia nova.
1 1 1 1 1.1 es péci e particular; e, assim, com o tempo, a região
uma mulhe r e tornou -se
e as pri­
No momento, portan to. em que a mulhe r perceb
da crian ça, ela imagin a que uma das al­ .n .1 d otad a de centros lotêmicos e dividida em distritos
meiras contrações
mas qu e têm sua resi dência princ ipal
no lugar onde se r 1 1r vmicos11." Eis co m o o totemismo local dos Arunta teria
180 AS FOl?MAS ELE!llJENTARES DA VIDA l?liUG/O\.1 1 \1/Jl\'7'A l?ES
r Nl:NÇAS ELD 181

que o indi m un tra :1caba de penetrar nela. E, como a criança que


mo um simples aspccLO desta última . O culto

ele certo modo , em s<.:u hcc a seguir não é ouLra coisa senão esse a ntepassado
víduo organiza para s i rnesmo e,

ser o germe cio culto coletiv o, nao 1 n· nca rna do , seu totem é necessa ri a me n te o mesmo; ou
·l'f·' · o clã dessa criança é dete rmi na d o pela localidade
foro interior, longe ele
àS neces sidade s do indiví duo.
1 111dc ela teria sido místicamente co ncebida .
é senão este adapt ado

Ora, é esse tote mism o local que representaria a for-


m 111.1 original do tote m is mo; quando muito, se distanciaria
ti•·-.sa forma por um intervalo muiro curto. Eis como Pra-
1• 1 explica sua gênesc.
Num traba lho m a iS recen te'º, que lhe fo
i sugerido
No instante prec iso cm que a mulher se percebe grá­
pelas obras de Spencer e G i llc n, Prazer tentou uma nova
cm subs titu i�<lo à que ele havi:1 \ 1 l.1 , ela deve pensar que o e� pí ri to que a possui veio dos
ol
ex plica ção do totemismo
ser discutida Ela 'il' Jt'tos que a cercam, sobretudo de um daqueles que,
inicialmente proposto e que acaba de
baseia no postulado de que o totem ismo dos Arunta é o 1 11·-.se momento, atraíam sua atenção. Portanto, se estava

mais primit ivo que co nh ec emos ; Praze r c hega rá a dizer P• 11pada na co l e t a d e a lg u m a planta, ou se vigiava um

que esse totemismo qw1se não difere do


tipo verdadeir.:i e 1 1 1 1 111al, acreditará que a alma desse animal ou dessa pla n-
1 1 passou pa ra ela. Emre as coisas a que se rá particular-
1 1 11·nte levada a atribuir sua gravidez, e ncontra m-se, em
absolutamente origi na l ' ' ·
O que ele tem de singu lar é que os
totens, aqui, não
estão ligado s nem a pessoa s, nem a grupo
s de pess oas 1 •111neiríssimo lugar, os al imentos qu e acabou ele ingerir.
dacles . Cada totem possu i , de ,,. comeu recencemente carne de ema ou inhame, não
determinados mas a (ocaLi
fato '. seu cent ;o num l ugar defini do. É aí que se supõe re­ 1 l 1 1 v idará que uma ema ou um inhame se originou e se

sidüem as almas dos pfi me i ros ante pa


ori­ !.·,envolve dentro dela. Sendo assim, explica-se que a
ss a d os que ! na
totêm ico. E aí qu e 1 1 . 1 nça, por sua vez, seja conside rada como u m a espécie
1 h t• ma ou de inhame, que veja a si própria como u m
gem cios tempos, const ituíam o grupo •

s os churin
se encontra o santuário onde são conservado
distribuição • 1 1ngênere cios animais ou das plantas ela mesma espécie,
ga e onde o culto é cel ebrado. É també m essa
que determ ina a manei ra pela q ual • 1111• lhes demonstre simpatia e consideração, que se proí­
geográfica dos totens
m. A crianç a, com efeito , tem por totem l 1.1 de comê-los, etc.43 A part ir ele então, o totemismo ex is-
forma
não o de seu pai ou de sua mãe, mas
os clãs se
aquele que tem seu 1• 1·111 seus traços essenciais: a noção que o indígena teria
scnLido os primei­ l . 1 gt:raçào é que o teria originado, por isso Prazer chama
1 1 101emismo p ri m i tivo ele concepci:onal.
centro no lugar onde a mãe acredi ta ter
o Arunta
ros sintomas de sua m�ternidade próxima. Pois
ignora ' diz-se 1 a relação precis a que une o fato ela geração É des se tipo original q u e todas as outras formas de
l42; acr�d i tª que toda concc pçào é devida a 1 1 111·mismo teriam derivado. "Se várias m u l heres uma
ao ato sexua
uma espécie de fecundação mística. Ela implic
a, segundo 1 p11s a outra, perceberem os sinais premonitórios a ma­tl
rou no corpo ele '' r 111dade num mesmo lugar e nas mesmas circunstâncias,
• ,.,,. lugar será visto como freqüenta do por espíri tos de
ele, que uma alma de �intcp assaclo penet
aí o princí pio de uma vicia nova.
1 1 1 1 1.1 es péci e particular; e, assim, com o tempo, a região
uma mulhe r e tornou -se
e as pri­
No momento, portan to. em que a mulhe r perceb
da crian ça, ela imagin a que uma das al­ .n .1 d otad a de centros lotêmicos e dividida em distritos
meiras contrações
mas qu e têm sua resi dência princ ipal
no lugar onde se r 1 1r vmicos11." Eis co m o o totemismo local dos Arunta teria
AS FORMAS HLEMTJNTARES DA VIDA RELIGIOS;1 t 1 1 Nl:NÇAS EL/iMENTARES
182 183

nascido. Para que em seguida os totens se separem ck 1 ' ' ''.lll' se do profano, e vimos que o totemismo é um vas­
sua base terri torial, bastará conceber que as almas ances ' ' , �•.�tema de coisas sagradas. Explicá-lo é, portanto mos-
trais, ao invés ele permanecer imutavel mente fixas num 1 1 11 por que essas coisas foram marcadas por tal caráter46.
lugar determinado, sejam capazes de se mover livremenll' • • 1 . 1 . esse problema não é sequer colocado por Frazer.
sobre toda a superfície do território e de seguir, em suas Mas o que acaba de arruinar esse sistema é que, hoje,
viagens, o s homens e as mulheres do mesmo totem que " postulado sobre o qual repousa não é mais sustentável.
elas. Deste modo, uma mulher poderá ser fecundada por l 1 11 l.1 a argumentação de Frazer supõe, com efeito, que o
um espírito de seu próprio totem ou do totem ele seu ma­ 1 o 111·1 11ismo local dos Arunta é o mais primitivo que conhe­
rido, ainda que ela resida num distrito totémico clifere�te. • ' 1 1 1os e, sobretudo, que é sensivelmente anterior ao tote-
Conforme se imaginar que são os antepassados cio mando 1 1 11•.ino hereditário, seja em linha paterna, seja em linha
ou os da mulher que seguem o jovem casal espreitando a
ocasião de reencarnar-se, o Lotem da criança será o de
1 1 1 . 1 1 vrna. Ora, com base nos simples fatos que a primeira

seu pai ou o ele sua mãe. De fato, é exatamente assim que


'""' de Spencer e Gillen já punha à nossa disposição, pu­
. J1 1 1 1os conjeturar que deve ter havido um momento n a
os Gnanji e os Umbaia, ele um lado, e os Urabunna, de i i h loria cio povo Arunta em que os totens, em vez ele es-
outro, explicam seus sistemas ele filiação. 1 11 ligados a localidades, transmitiam-se hereditariamente
Mas essa teoria, como a de Tylor, repousa sobre uma . J 1 1nüe aos filhos47. Essa conjetura é definitivamente de-
petição de princípio. Para poder imaginar q�1: as alma.s 1 1 11 instrada pelos novos fatos clescobe1tos por St.rehlow4ª e
humanas são almas ele animais ou ele plantas, Jª era preci­ • 11 h • aliás não fazem senão confirmar observações anterio-
so crer que o homem tomasse do mundo animal o u do 1 • de Schulze49. Esses dois autores nos mostram que, ain-
"•

mundo vegetal o que há ele mais essencial nele. Ora, essa 1 l 1 l 1oje, cada arunta, além de seu totem local, tem um
ou­
crença é precisamente uma das que estão na base do to­ l t • ' que é independente ele toda condição geográfica, mas
temismo. Colocá-la como uma evidência é, portanto, • 1 1 1 1 · lhe pertence por direito ele nascimento: é o ele sua
apoiar-se naquilo que seria preciso explicar. , · 1 1 1.11'. Esse segundo totem, assim como o primeiro, é con-
. .
Desse ponto de vista, além elo mais, o carater rel1g10- 1r lnado pelos indígenas como urna potência amiga e
so do totem é inteiramente inexplicável; pois a vaga cren­ 1 • 1 1 1lvtora, que provê o alimento deles, que os advene dos
ça num obscuro parentesco do homem e do animal não é 1 11 1 igos possíveis, etc. Eles têm o direito ele participar de
suficiente para fundar um culto. Essa confusão de reinos ' 1 1 culto. Quando os enterram, dispõem o cadáver de
d istintos não poderia ter por efeito desdobrar o mundo 1 1 1 t 11L·ira a que o rosto fique virado para a região onde se
em profano e sagrado. É verdade que, coerente consigo li 11 .tli za o centro totémico da mãe. Tsso significa que esse
_
mesmo, Frazer se recusa a ver no totemismo uma reltgiao, • 1 1 1 1 ro é também, de certa forma, o do defunto. De fato,
sob pretexto de que nele não se encontram nem seres es­ 1 l . 1 1 > lhe o nome ele tmara altiira, que quer dizer: campo
pirituais, nem preces, nem invocações, nem oferendas, eh 1 lotem que me é associado. Portanto é certo que, entre
etc. Para ele, seria apenas um sistema mágico, entenden­ ' '. Arunta, o totemismo hereditário em linha uterina não é
do por isto uma espécie de ciência grosseira e errônea, i " 1!-.ll'rior ao totemismo local, devendo, ao contrário, rê-lo
um primeiro esforço para descobrir as leis das coisas45. 1 • 1 1 '\'l'dido. Pois o totei.1 materno hoje não possui mais
Mas sabemos o que essa concepção da religião e ela ma­ q1w um papel acessório e complementar, é um totem se-
gia tem de inexata. Há religião assim que o sagrado clis- 1 1 1 1 d :írio, o que explica que tenha podido escapar a ob-
AS FORMAS HLEMTJNTARES DA VIDA RELIGIOS;1 t 1 1 Nl:NÇAS EL/iMENTARES
182 183

nascido. Para que em seguida os totens se separem ck 1 ' ' ''.lll' se do profano, e vimos que o totemismo é um vas­
sua base terri torial, bastará conceber que as almas ances ' ' , �•.�tema de coisas sagradas. Explicá-lo é, portanto mos-
trais, ao invés ele permanecer imutavel mente fixas num 1 1 11 por que essas coisas foram marcadas por tal caráter46.
lugar determinado, sejam capazes de se mover livremenll' • • 1 . 1 . esse problema não é sequer colocado por Frazer.
sobre toda a superfície do território e de seguir, em suas Mas o que acaba de arruinar esse sistema é que, hoje,
viagens, o s homens e as mulheres do mesmo totem que " postulado sobre o qual repousa não é mais sustentável.
elas. Deste modo, uma mulher poderá ser fecundada por l 1 11 l.1 a argumentação de Frazer supõe, com efeito, que o
um espírito de seu próprio totem ou do totem ele seu ma­ 1 o 111·1 11ismo local dos Arunta é o mais primitivo que conhe­
rido, ainda que ela resida num distrito totémico clifere�te. • ' 1 1 1os e, sobretudo, que é sensivelmente anterior ao tote-
Conforme se imaginar que são os antepassados cio mando 1 1 11•.ino hereditário, seja em linha paterna, seja em linha
ou os da mulher que seguem o jovem casal espreitando a
ocasião de reencarnar-se, o Lotem da criança será o de
1 1 1 . 1 1 vrna. Ora, com base nos simples fatos que a primeira

seu pai ou o ele sua mãe. De fato, é exatamente assim que


'""' de Spencer e Gillen já punha à nossa disposição, pu­
. J1 1 1 1os conjeturar que deve ter havido um momento n a
os Gnanji e os Umbaia, ele um lado, e os Urabunna, de i i h loria cio povo Arunta em que os totens, em vez ele es-
outro, explicam seus sistemas ele filiação. 1 11 ligados a localidades, transmitiam-se hereditariamente
Mas essa teoria, como a de Tylor, repousa sobre uma . J 1 1nüe aos filhos47. Essa conjetura é definitivamente de-
petição de princípio. Para poder imaginar q�1: as alma.s 1 1 11 instrada pelos novos fatos clescobe1tos por St.rehlow4ª e
humanas são almas ele animais ou ele plantas, Jª era preci­ • 11 h • aliás não fazem senão confirmar observações anterio-
so crer que o homem tomasse do mundo animal o u do 1 • de Schulze49. Esses dois autores nos mostram que, ain-
"•

mundo vegetal o que há ele mais essencial nele. Ora, essa 1 l 1 l 1oje, cada arunta, além de seu totem local, tem um ou­

crença é precisamente uma das que estão na base do to­ l t • ' que é independente ele toda condição geográfica, mas
temismo. Colocá-la como uma evidência é, portanto, • 1 1 1 1 · lhe pertence por direito ele nascimento: é o ele sua
apoiar-se naquilo que seria preciso explicar. , · 1 1 1.11'. Esse segundo totem, assim como o primeiro, é con-
. .
Desse ponto de vista, além elo mais, o carater rel1g10- 1r lnado pelos indígenas como urna potência amiga e
so do totem é inteiramente inexplicável; pois a vaga cren­ 1 • 1 1 1lvtora, que provê o alimento deles, que os advene dos
ça num obscuro parentesco do homem e do animal não é 1 11 1 igos possíveis, etc. Eles têm o direito ele participar de
suficiente para fundar um culto. Essa confusão de reinos ' 1 1 culto. Quando os enterram, dispõem o cadáver de
d istintos não poderia ter por efeito desdobrar o mundo 1 1 1 t 11L·ira a que o rosto fique virado para a região onde se
em profano e sagrado. É verdade que, coerente consigo li 11 .tli za o centro totémico da mãe. Tsso significa que esse
_
mesmo, Frazer se recusa a ver no totemismo uma reltgiao, • 1 1 1 1 ro é também, de certa forma, o do defunto. De fato,
sob pretexto de que nele não se encontram nem seres es­ 1 l . 1 1 > lhe o nome ele tmara altiira, que quer dizer: campo
pirituais, nem preces, nem invocações, nem oferendas, eh 1 lotem que me é associado. Portanto é certo que, entre
etc. Para ele, seria apenas um sistema mágico, entenden­ ' '. Arunta, o totemismo hereditário em linha uterina não é
do por isto uma espécie de ciência grosseira e errônea, i " 1!-.ll'rior ao totemismo local, devendo, ao contrário, rê-lo
um primeiro esforço para descobrir as leis das coisas45. 1 • 1 1 '\'l'dido. Pois o totei.1 materno hoje não possui mais
Mas sabemos o que essa concepção da religião e ela ma­ q1w um papel acessório e complementar, é um totem se-
gia tem de inexata. Há religião assim que o sagrado clis- 1 1 1 1 d :írio, o que explica que tenha podido escapar a ob-
184 AS FORJ.fAS ELEMENTARES DA VIDA REL!GJO.l.
i � e IUiNÇ'AS ELE!v!EJVTARES 185

<>ervadores tão atentos e avisados como Spencer e Gillen 1 "a de um nome de animal, o homem que o tinha de­
Mas para que se mantivesse assim em segundo plano, co \ 1.1 necessariamente crer que ele próprio possuía os atri­
mo uma repetição do totem local, é preciso que tenha ha l 1111os mais característicos desse animal. Essa crença pro­
vido um tempo em que ele é que ocupava o primeiro pia p 1l(ou-se tanto mais facilmenLe quanto mais se tornavam
no na vida religiosa. Trata-se, em parte, de um totem de 11 1 11otas e se apagavam das memórias as origens históri­
caído, mas que lembra uma época em que a organização l h <le tais denominações. Mitos se formaram para repre-
totêmica dos Arunla era muito diferente da que é hoje. ' 11ur melhor aos espíritos essa estran ha ambigüidade d a
Toda a consLruçào de Frazer acha-se, assim, minada na 1 1 11 11rcza humana. Para explicá-la, m
i aginou-se que o ani-
sua baseso. 1 1 1. d era o antepassado do homem ou que ambos descen­
- 1 1 . 1 111 de um ancestral comum. Assim teriam sido concebi-
1 lc1� os laços de parentesco que u niriam cada clã à espécie
IV •h loisa cujo nome é o seu. Ora, uma vez explicadas as
• 1 1 1gcns desse parentesco fabuloso, parece a nosso autor
Embora Anclrew Lang tenha combatido vivamente es­ • 11 1 1• o totemismo não tenha mais mi stério.
s a teoria de Frazer, a que ele propõe em suas últimas Mas de onde vem, então, o caráter religioso das cren­
obrass1 aproxima-se dela em mais de um ponto. Comn \ •� e das práticas totêmicas? Pois o fato de o homem crer-
Frazer, ele faz o totemismo consistir inteiramente na cren­ ' um animal de tal espécie não explica por que ele atri­
ça numa espécie de consubstancialidade do homem e do li111 a essa espécie virrudes maravilhosas, nem, sobretudo,
animal. Mas explica-a de outro modo. I" 11 que dedica às imagens que a simbolizam um verda­
Deriva-a inteiramente do fato de o totem ser um no­ d1•1ro culto. A essa questão, Lang dá a mesma resposta
me. Tão logo houve grupos h uman os constiruídoss2, cada • j l tt• Frazer: ele nega que o totemismo seja uma religião.
um deles teria sentido a necessidade de distinguir uns dos 10 encontro na Austrália, diz ele, nenhum exemplo de
outros os grupos vizinhos com os quais se relacionava e, 1 ' 1.1ticas religiosas tais como as que consistem em rezar,
com essa finalidade, lhes teria dado nomes d f
i erentes. Es­ 1 1 1 1 1 1ir ou sepultar o totem56." Apenas numa época posterior,
ses nomes foram tomados preferencialmente da fauna e quando já estava constituído, é que o lotemismo teria si-
d a flora circundantes, porque animais e plantas podem 1lc1 como que atraído e envolvido por um sistema de con­
ser facil mente designados por meio de gestos ou repre­ ' •'P(Ões p ropriamente religiosas. Segundo uma observa­
scnlados por desenhos53. As semelhanças mais ou menos �.1<> <le Howitt57, qu ando os indíge nas procuram expl ica r
precisas que os homens podiam ter com este ou aquele 1� i n stituições totêmicas, eles não as atribuem nem aos
ani mal ou planla determinaram a forma como essas deno­ 1 1 1 <>prios totens, nem a um homem, mas a algum ser so­
minações coletivas foram distribuídas entre os grupos54. l 11 vnatural, como Bunjil ou Baiame. "Se, diz Lang, aceitar-
Ora, é um fato conhecido que, "para espíritos primiti­ 1111 >s esse testemunho, uma fonte do caráter religioso <lo
vos, os nomes e as coisas designadas por esses nomes es­ 1 1 1tL'mismo nos é revelada. O totemismo obedece aos de­
tão unidos por uma relação mística e transcendentaJ''55. ' 1 1 ·1os de Bu njil , assim como os cretenses obedeciam aos
Por exemplo, o nome que um indivíduo tem não é consi­ d1·Lretos divinos dados por Zeus a Minas ." Ora, a noção
derado uma simples palavra, um signo convencional, mas • kssas grandes divindades formou-se, segundo Lang, fora

parte essencial do próprio indivíduo. Assim. quando se 1 h> sistema totêmico; este, portanto, não seria por si mes-
184 AS FORJ.fAS ELEMENTARES DA VIDA REL!GJO.l.
i � e IUiNÇ'AS ELE!v!EJVTARES 185

<>ervadores tão atentos e avisados como Spencer e Gillen 1 "a de um nome de animal, o homem que o tinha de­
Mas para que se mantivesse assim em segundo plano, co \ 1.1 necessariamente crer que ele próprio possuía os atri­
mo uma repetição do totem local, é preciso que tenha ha l 1111os mais característicos desse animal. Essa crença pro­
vido um tempo em que ele é que ocupava o primeiro pia p 1l(ou-se tanto mais facilmenLe quanto mais se tornavam
no na vida religiosa. Trata-se, em parte, de um totem de 11 1 11otas e se apagavam das memórias as origens históri­
caído, mas que lembra uma época em que a organização l h <le tais denominações. Mitos se formaram para repre-
totêmica dos Arunla era muito diferente da que é hoje. ' 11ur melhor aos espíritos essa estran ha ambigüidade d a
Toda a consLruçào de Frazer acha-se, assim, minada na 1 1 11 11rcza humana. Para explicá-la, m
i aginou-se que o ani-
sua baseso. 1 1 1. d era o antepassado do homem ou que ambos descen­
- 1 1 . 1 111 de um ancestral comum. Assim teriam sido concebi-
1 lc1� os laços de parentesco que u niriam cada clã à espécie
IV •h loisa cujo nome é o seu. Ora, uma vez explicadas as
• 1 1 1gcns desse parentesco fabuloso, parece a nosso autor
Embora Anclrew Lang tenha combatido vivamente es­ • 11 1 1• o totemismo não tenha mais mi stério.
s a teoria de Frazer, a que ele propõe em suas últimas Mas de onde vem, então, o caráter religioso das cren­
obrass1 aproxima-se dela em mais de um ponto. Comn \ •� e das práticas totêmicas? Pois o fato de o homem crer-
Frazer, ele faz o totemismo consistir inteiramente na cren­ ' um animal de tal espécie não explica por que ele atri­
ça numa espécie de consubstancialidade do homem e do li111 a essa espécie virrudes maravilhosas, nem, sobretudo,
animal. Mas explica-a de outro modo. I" 11 que dedica às imagens que a simbolizam um verda­
Deriva-a inteiramente do fato de o totem ser um no­ d1•1ro culto. A essa questão, Lang dá a mesma resposta
me. Tão logo houve grupos h uman os constiruídoss2, cada • j l tt• Frazer: ele nega que o totemismo seja uma religião.
um deles teria sentido a necessidade de distinguir uns dos 10 encontro na Austrália, diz ele, nenhum exemplo de
outros os grupos vizinhos com os quais se relacionava e, 1 ' 1.1ticas religiosas tais como as que consistem em rezar,
com essa finalidade, lhes teria dado nomes d f
i erentes. Es­ 1 1 1 1 1 1ir ou sepultar o totem56." Apenas numa época posterior,
ses nomes foram tomados preferencialmente da fauna e quando já estava constituído, é que o lotemismo teria si-
d a flora circundantes, porque animais e plantas podem 1lc1 como que atraído e envolvido por um sistema de con­
ser facil mente designados por meio de gestos ou repre­ ' •'P(Ões p ropriamente religiosas. Segundo uma observa­
scnlados por desenhos53. As semelhanças mais ou menos �.1<> <le Howitt57, qu ando os indíge nas procuram expl ica r
precisas que os homens podiam ter com este ou aquele 1� i n stituições totêmicas, eles não as atribuem nem aos
ani mal ou planla determinaram a forma como essas deno­ 1 1 1 <>prios totens, nem a um homem, mas a algum ser so­
minações coletivas foram distribuídas entre os grupos54. l 11 vnatural, como Bunjil ou Baiame. "Se, diz Lang, aceitar-
Ora, é um fato conhecido que, "para espíritos primiti­ 1111 >s esse testemunho, uma fonte do caráter religioso <lo
vos, os nomes e as coisas designadas por esses nomes es­ 1 1 1tL'mismo nos é revelada. O totemismo obedece aos de­
tão unidos por uma relação mística e transcendentaJ''55. ' 1 1 ·1os de Bu njil , assim como os cretenses obedeciam aos
Por exemplo, o nome que um indivíduo tem não é consi­ d1·Lretos divinos dados por Zeus a Minas ." Ora, a noção
derado uma simples palavra, um signo convencional, mas • kssas grandes divindades formou-se, segundo Lang, fora

parte essencial do próprio indivíduo. Assim. quando se 1 h> sistema totêmico; este, portanto, não seria por si mes-
186 AS /-Y)RMAS ELB
MHNTARHS {)A 170A NHUG/t" 1 1� Ellf.l.l BNTARES
1 Ili \(.· 187

111 Ll'rn mou podemos con"tatar que uma crítica co-


md1snntamente para to dos e!>Ses sistemas.
mo uma religião, apcn.1s teria se colorido dt. religiosidadt
1 1 1 1 1 1 1 1 \a le
'il' nos ativermos à letra das fórmulas, eles parece m
em contato com uma religião propriamente dita.
!V1as esses mitos mesmos vão contra concepçào que
I.ang fo7 do rotemismo. Se os australianos só ti,·essem ''' 1 \ u h r se em duas categorias. Uns (frazer. I..ang) negam o
a

LO no totem uma coisa humana e profana, não lhes Lt'n.1 ' 1 1 111·r religioso do totemismo, o que significa, aliás, ne-

vindo a idéia de fazer dele uma instituição divina. Se, ac • 11 •is fatos. Outros o reconhecem, mas julgam poder ex-

contrário, sentiram a necessidade de relacioná-lo a u111.1 1 •li• .1 lo deriva ndo-o de uma religião anterior, da qual o
divindade, é que lhe reconheciam um caráter sagrado. Fs l l l l < '1111smo teria surgido. Em realidade, essa d is t i nção é
sas interpretaçôes mitológicas demonstram, pois, a na t u 1pt 11as aparente: a primeira categoria reaparece na segun-

mas não a expl icam. 1 Nl'm Frazcr nem Lang puderam manter seu princípio

1 1 1 n lim e expl i car o totem ismo como se ele não fosse


reza rel igiosa do totem ismo,
pró pri o Lang percebe que essa so l ução na1 1
1 1 1 1 1 .1 n.:ligiao. Pela força das coi sas, fora m ob ri gad os a in-
Aliás, o
po<.lena ser sufic iente . Ek: recon hece que as co isas totê1111
cas s<lo tratadas com um respeito rel igioso�8; que sobretudo 1 1 • 1c l 1 1z.ir em suas expl icações noções de natureza religi o-

o sangue do a n ima l, corno também o do homem, é objeto 1 \cabamos de ver como Lang teve de fazer intervir a

de m ú lt iplas interdi\,·õcs, ou, como ele diz, de tabus que es 1d1·1.1 de sag rado, isto é, a idéia cardinal de toda religião.

sa mitologia mais ou menos tardia é incapaz de explicar' l 1 . 1 /t'r, por seu lado, tanto na primeira como na segunda
Mas de onde elas provêm então? Eis em que termos I..a ng 1o 111 1.1 que propôs, apela abertamente para a idéia de alma
responde a essa quest<lo: "Assim que os grupos com nome.� • •11 ele espírito, pois, segundo ele, o totemismo viria ou de
• ·� homens acreditarem poder colocar sua alma em segu­
' I li\ a n u m objeto exterior, ou de atribu írem o fato d a
de animais desenvolveram as crenças universalmente di
fundidas sobre o wakan ou o mana, ou sobre a qualidadt·
mbtica e sagrada do sangue, os d i ferentes tabus totêmicos t 1 1mepção a uma espécie d e fecundação espiritual, cujo

dcYem igualmente ter aparecido. "ti() As pala\ ras u·akan t 1 • nte seria um espírito. Ora, a alma, e o espírito m:.iis
mana, como veremos no capítulo seguinte, im pl icam a no 11 1111.1, são coisas sagradas, objetos de ritos; as noções que

çào mesma de sagrado-. uma é wm ada da língua dos Sioux, • ·� t·x pr i mem são, portanto, essencialmente religiosas, e
a outra, dos povos mclanésios. Explicar o caráter sagrado 1 • .1111, por mais que Frazer fa<:a do Lotcmismo um sistema

das coisas totêmicas p os tula ndo esse carúter, é responde r à 1 •1 1 1 ,1 1nentc múgico, também ele só consegue explicá-lo
questão com a questão. O que seria preciso mostra r é de 1 • 1 1 1 lu nç:1o de uma outra religião.

onde provém a noção de wakan e de que maneira se apli­ Mas mostramos as i nsuficiências tanto do na l u r i s-
cou ao totem e a tudo (jUe dele deriva. Enquanto essas duas 1 1 1 1 i co m o cio animismo; portanto, não se pode recorrer a

questões não forem resolvidas, nada foi ex p liG 1 clo. • 11 ·s. como fi 7.e ram Ty lor e je vo n s, sem se expor às mes-
1 1 1.1s objeções. No entanto, nem Frazer nem I..ang pa recem
itn:ver a p ossibilidade de uma outm hipótese62. Por outro
V l . 1do, sa bemos que o totemismo está estreitamente ligado à
' '' 1�.mizaç-.ão social mais primitiva que conhecemos e, muito
p 1 m avclmcnte, que pock ser conhecida. Portanto, supor
• flll' de foi precedido de uma outra religião que não diferia
Passamos em revista as principais expl icações que fo­

ddL· apenas em grau, é sair cios dados da observação pam


ram dadas das crenças totêmicas6•, esforçando-nos respei­
tar a individualidade de cada uma. M as. agora q ue ess e
186 AS /-Y)RMAS ELB
MHNTARHS {)A 170A NHUG/t" 1 1� Ellf.l.l BNTARES
1 Ili \(.· 187

111 Ll'rn mou podemos con"tatar que uma crítica co-


md1snntamente para to dos e!>Ses sistemas.
mo uma religião, apcn.1s teria se colorido dt. religiosidadt
1 1 1 1 1 1 1 1 \a le
'il' nos ativermos à letra das fórmulas, eles parece m
em contato com uma religião propriamente dita.
!V1as esses mitos mesmos vão contra concepçào que
I.ang fo7 do rotemismo. Se os australianos só ti,·essem ''' 1 \ u h r se em duas categorias. Uns (frazer. I..ang) negam o
a

LO no totem uma coisa humana e profana, não lhes Lt'n.1 ' 1 1 111·r religioso do totemismo, o que significa, aliás, ne-

vindo a idéia de fazer dele uma instituição divina. Se, ac • 11 •is fatos. Outros o reconhecem, mas julgam poder ex-

contrário, sentiram a necessidade de relacioná-lo a u111.1 1 •li• .1 lo deriva ndo-o de uma religião anterior, da qual o
divindade, é que lhe reconheciam um caráter sagrado. Fs l l l l < '1111smo teria surgido. Em realidade, essa d is t i nção é
sas interpretaçôes mitológicas demonstram, pois, a na t u 1pt 11as aparente: a primeira categoria reaparece na segun-

mas não a expl icam. 1 Nl'm Frazcr nem Lang puderam manter seu princípio

1 1 1 n lim e expl i car o totem ismo como se ele não fosse


reza rel igiosa do totem ismo,
pró pri o Lang percebe que essa so l ução na1 1
1 1 1 1 1 .1 n.:ligiao. Pela força das coi sas, fora m ob ri gad os a in-
Aliás, o
po<.lena ser sufic iente . Ek: recon hece que as co isas totê1111
cas s<lo tratadas com um respeito rel igioso�8; que sobretudo 1 1 • 1c l 1 1z.ir em suas expl icações noções de natureza religi o-

o sangue do a n ima l, corno também o do homem, é objeto 1 \cabamos de ver como Lang teve de fazer intervir a

de m ú lt iplas interdi\,·õcs, ou, como ele diz, de tabus que es 1d1·1.1 de sag rado, isto é, a idéia cardinal de toda religião.

sa mitologia mais ou menos tardia é incapaz de explicar' l 1 . 1 /t'r, por seu lado, tanto na primeira como na segunda
Mas de onde elas provêm então? Eis em que termos I..a ng 1o 111 1.1 que propôs, apela abertamente para a idéia de alma
responde a essa quest<lo: "Assim que os grupos com nome.� • •11 ele espírito, pois, segundo ele, o totemismo viria ou de
• ·� homens acreditarem poder colocar sua alma em segu­
' I li\ a n u m objeto exterior, ou de atribu írem o fato d a
de animais desenvolveram as crenças universalmente di
fundidas sobre o wakan ou o mana, ou sobre a qualidadt·
mbtica e sagrada do sangue, os d i ferentes tabus totêmicos t 1 1mepção a uma espécie d e fecundação espiritual, cujo

dcYem igualmente ter aparecido. "ti() As pala\ ras u·akan t 1 • nte seria um espírito. Ora, a alma, e o espírito m:.iis
mana, como veremos no capítulo seguinte, im pl icam a no 11 1111.1, são coisas sagradas, objetos de ritos; as noções que

çào mesma de sagrado-. uma é wm ada da língua dos Sioux, • ·� t·x pr i mem são, portanto, essencialmente religiosas, e
a outra, dos povos mclanésios. Explicar o caráter sagrado 1 • .1111, por mais que Frazer fa<:a do Lotcmismo um sistema

das coisas totêmicas p os tula ndo esse carúter, é responde r à 1 •1 1 1 ,1 1nentc múgico, também ele só consegue explicá-lo
questão com a questão. O que seria preciso mostra r é de 1 • 1 1 1 lu nç:1o de uma outra religião.

onde provém a noção de wakan e de que maneira se apli­ Mas mostramos as i nsuficiências tanto do na l u r i s-
cou ao totem e a tudo (jUe dele deriva. Enquanto essas duas 1 1 1 1 i co m o cio animismo; portanto, não se pode recorrer a

questões não forem resolvidas, nada foi ex p liG 1 clo. • 11 ·s. como fi 7.e ram Ty lor e je vo n s, sem se expor às mes-
1 1 1.1s objeções. No entanto, nem Frazer nem I..ang pa recem
itn:ver a p ossibilidade de uma outm hipótese62. Por outro
V l . 1do, sa bemos que o totemismo está estreitamente ligado à
' '' 1�.mizaç-.ão social mais primitiva que conhecemos e, muito
p 1 m avclmcnte, que pock ser conhecida. Portanto, supor
• flll' de foi precedido de uma outra religião que não diferia
Passamos em revista as principais expl icações que fo­

ddL· apenas em grau, é sair cios dados da observação pam


ram dadas das crenças totêmicas6•, esforçando-nos respei­
tar a individualidade de cada uma. M as. agora q ue ess e
188 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGJ(),\.·I

entrar no dorrúnio das conjeturas arbitrárias e inverificáveis 1 \PÍTULO VI

1
Se quisermos permanecer em concordância com os resulta
HUGENS DESSAS CRENÇAS
r < :ontinuaçâo)
dos anteriormente obtidos, devemos, ao mesmo tempo quv
afirmamos a natureza religiosa do totemismo, impedir-nos
de reduzi-lo a uma religião diferente de si mesmo. Não qut·
seja o caso de atribuir-lhe como causa idéias que não seriam
religiosas. Mas, entre as representações que integram a gê·
nese de que ele resultou, pode haver algumas que invocam
por si mesmas e diretamente o caráter religioso. São estas
que devemos pesquisar.

li -A noção de princípio ou mana


totêmico e a idéia de força

Já que o totemismo individual é posterior ao totemis-


1110 de clã e parece inclusive ter derivado dele, é a este
que <levemos nos dedicar inicialmente. Mas, como a aná­
l 11il: que fizemos o decompôs numa multiplicidade ele
ncnças que podem parecer heterogêneas, é necessário,
.1ntes de avançar, que busquemos perceber o que consti-
1 u i a unidade cio totemismo de clã.

Vimos que o totemismo coloca em primeiro lugar,


t· ntre as coisas que reconhece como sagradas, as repre­
sL'ntações figuradas do totem; a seguir vêm os animais ou
os vegetais que dão seu nome ao clã e, finalmente, os
membros desse clã. Como todas essas coisas são igual­
mente sagradas, embora em diferentes graus, seu caráter
1 eligioso não pode depender de nenhum dos atributos
188 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGJ(),\.·I

entrar no dorrúnio das conjeturas arbitrárias e inverificáveis 1 \PÍTULO VI

1
Se quisermos permanecer em concordância com os resulta
HUGENS DESSAS CRENÇAS
r < :ontinuaçâo)
dos anteriormente obtidos, devemos, ao mesmo tempo quv
afirmamos a natureza religiosa do totemismo, impedir-nos
de reduzi-lo a uma religião diferente de si mesmo. Não qut·
seja o caso de atribuir-lhe como causa idéias que não seriam
religiosas. Mas, entre as representações que integram a gê·
nese de que ele resultou, pode haver algumas que invocam
por si mesmas e diretamente o caráter religioso. São estas
que devemos pesquisar.

li -A noção de princípio ou mana


totêmico e a idéia de força

Já que o totemismo individual é posterior ao totemis-


1110 de clã e parece inclusive ter derivado dele, é a este
que <levemos nos dedicar inicialmente. Mas, como a aná­
l 11il: que fizemos o decompôs numa multiplicidade ele
ncnças que podem parecer heterogêneas, é necessário,
.1ntes de avançar, que busquemos perceber o que consti-
1 u i a unidade cio totemismo de clã.

Vimos que o totemismo coloca em primeiro lugar,


t· ntre as coisas que reconhece como sagradas, as repre­
sL'ntações figuradas do totem; a seguir vêm os animais ou
os vegetais que dão seu nome ao clã e, finalmente, os
membros desse clã. Como todas essas coisas são igual­
mente sagradas, embora em diferentes graus, seu caráter
1 eligioso não pode depender de nenhum dos atributos
• -• .. ""'-"'-·--... .... TÂ"C.7

190 ,1.\ HJ/l\IAS ElE.lfENTARES DA VIDA IUilJ(d< ,, 1 191

particulares que as distinguem umas <las outras. Se t.11 , 111 prrr ipal po'>suem em 1lguma medida. o mesmo
pécie animal ou vegetal é objeto de um temor reverem:1.il 11 1ll r l ambém elas tl:m algo de rehgroso. visto que al-
não é cm razão de suas propriedades específicas, já c p u 1 t111.1s sào protegidas por interdições e outras cumprem
o s membros h u manos d o cl ã gozam do mesmo privilcgi1 1 1 1111\ ncs determinadas nas cerimônias do culto. Et.sa reli-
embora num grau ligeiramente inferior, e já que a s i mpl 1... 11 1 idade não di fe re cm natureza daquela q ue diz respei-
imagem dessa mesma planta ou desse mesmo animal in� 1 • 1 1 1 totem, sob o q ua l essas coisas s ão class i ficad as ; ela

pira um respeito ainda mais pronunciado. Os s enti ment m li• r 1\ .1 n e ce s saria me nte do mesmo princípio. É q u e o
semelhantes que essas diferentes espécies ele coisas dl"' 1, 11-. totêmico - para retomar a expressão metafórirn q u e
pena m na consciência do fiel e que fazem sua naturc1.1 t• li 1.11 nos de uti l i za r - está nessas coisas santas assim co-
sagrada. evidentemente só podem vir de um princíp1n 111 ' 1·sta na espécie que sen·e de lotem e nos membros do
que é comum a todos indistintamente , tanto aos embll' • l.1 l'ercebe-se o quamo ele drfcre dos seres nos quab re-
mas totêm1u>s quanto aos membros do da e aos i ndividuo., 1d1 uma n:z q ue e a .dma de tantos :-.eret. diferem�.s.
da espécie que serve de Lotem. É a esse princípio comum l\las essa força i mpessoal , o australiano não a concebe
que se dirige, e m rea lidnde, o culto. Em outras palavras, 0 1 11 > sua forma abstrata. Por influência de causas que tcre-
totem ismo é a rel igião , não de tais animais, ou de tais ho 1 1 1 11� de pesquisar, ele foi leva do a concebê-la sob a fonna
m ens , ou de tais i mage ns , mas de uma espécie de fon,.1 ti, 11111 animal ou de um vegetal, em uma palavra: de u ma
an ônirm1 e impessoal que se manifesta em cada um des ' ' 11�;1 se nsível . Eis cm que consiste realmente o totem: ele é
ses seres, sem no entamo confundir-se com nen hu m de­ t 11 > sú a fo rma material sob a qual é rt:presenracla pa ra as
les. Ne n hu m a possui inteiramente e todos dela partici 1 1 1 1.iginaç_:ões essa substância ima teria l , essa energi a que se
pam. Ela é independente dos sujeicos particulare1> cm que d1l1111de por todo tipo de seres h eterogêneos e que é o ún i­
se encarna, tanto assim que os precede como sobrevive a l • ' objeto verdadeiro do culto. Assim, pod emos com preen-
eles. Os indivíduos morrem, as gerações passam e são k r melhor o que o indígena quer dizer quando afinna que
substituídas por outras; mas essa forca permanece sempre membros da fratria do Corvo, por exemplo, são corvos.
1 k não entende precisamente que sejam corvos no sentido
e

atual, viva e idêntica. Ela anima as gerações de hoje, as­


sim como animava as d e ontem e como animará as de \ 1 1 1.�ar e empírico da pa l av ra , mas que em todos eles se

amanhã. Tomando a palavra num sentido bastante a m plo, ,11 ha um pri ncíp io que constitui o que têm de mais essen-
poder-se-ia dizer que el a é o deus que cada culto lOLêm i 1 1 l i , que lhes é com u m com os a n imais do mesmo nome e
co adora. Só que é um deus i mpessoal, sem nome, sem qtll' e pensado sob a forma exterior do corvo. Dcslc modo ,
história, ima nente ao mundo, difuso numa quantidade in­ • > 11 ni vcrso , tal co mo o concebe o LOLcmismo, é atravessa­
calculável de coisas. do, an imad o por um certo número de forças que a imagi-
Mesmo assim, temos somente u ma idé ia imperfeit a 11.1n10 se representa a tra vés de figuras tomadas, com pou-
da ubiqüicfade real dessa entidade quase divina. Ela não 1' cxcc�·ões, do reino animal ou do reino vegetal: h:.í 1an-
está apenas espalhada em toda a espécie totêmica, em lo­ 1.i-. dessas forÇ"'.1s quantos são os clãs da rribo, e c-.ida uma
do o clã, em todos os objetos que simbolizam o rotem: o dLlcts circula através de certat. categorias de coisa1> dat.
círculo de sua ação estende-se mais além. Com efeito, vi­ q11ab ela é a e!>Sência e e princípio de vida.
mos que, além dessas coisas eminentemente santas, todas Quando dizemos desses princípios que são forças,
aquelas que são atribuídas ao clã como dependências do 11.10 tornamos a palavra numa acepção merafórica: elas
• -• .. ""'-"'-·--... .... TÂ"C.7

190 ,1.\ HJ/l\IAS ElE.lfENTARES DA VIDA IUilJ(d< ,, 1 191

particulares que as distinguem umas <las outras. Se t.11 , 111 prrr ipal po'>suem em 1lguma medida. o mesmo
pécie animal ou vegetal é objeto de um temor reverem:1.il 11 1ll r l ambém elas tl:m algo de rehgroso. visto que al-
não é cm razão de suas propriedades específicas, já c p u 1 t111.1s sào protegidas por interdições e outras cumprem
o s membros h u manos d o cl ã gozam do mesmo privilcgi1 1 1 1111\ ncs determinadas nas cerimônias do culto. Et.sa reli-
embora num grau ligeiramente inferior, e já que a s i mpl 1... 11 1 idade não di fe re cm natureza daquela q ue diz respei-
imagem dessa mesma planta ou desse mesmo animal in� 1 • 1 1 1 totem, sob o q ua l essas coisas s ão class i ficad as ; ela

pira um respeito ainda mais pronunciado. Os s enti ment m li• r 1\ .1 n e ce s saria me nte do mesmo princípio. É q u e o
semelhantes que essas diferentes espécies ele coisas dl"' 1, 11-. totêmico - para retomar a expressão metafórirn q u e
pena m na consciência do fiel e que fazem sua naturc1.1 t• li 1.11 nos de uti l i za r - está nessas coisas santas assim co-
sagrada. evidentemente só podem vir de um princíp1n 111 ' 1·sta na espécie que sen·e de lotem e nos membros do
que é comum a todos indistintamente , tanto aos embll' • l.1 l'ercebe-se o quamo ele drfcre dos seres nos quab re-
mas totêm1u>s quanto aos membros do da e aos i ndividuo., 1d1 uma n:z q ue e a .dma de tantos :-.eret. diferem�.s.
da espécie que serve de Lotem. É a esse princípio comum l\las essa força i mpessoal , o australiano não a concebe
que se dirige, e m rea lidnde, o culto. Em outras palavras, 0 1 11 > sua forma abstrata. Por influência de causas que tcre-
totem ismo é a rel igião , não de tais animais, ou de tais ho 1 1 1 11� de pesquisar, ele foi leva do a concebê-la sob a fonna
m ens , ou de tais i mage ns , mas de uma espécie de fon,.1 ti, 11111 animal ou de um vegetal, em uma palavra: de u ma
an ônirm1 e impessoal que se manifesta em cada um des ' ' 11�;1 se nsível . Eis cm que consiste realmente o totem: ele é
ses seres, sem no entamo confundir-se com nen hu m de­ t 11 > sú a fo rma material sob a qual é rt:presenracla pa ra as
les. Ne n hu m a possui inteiramente e todos dela partici 1 1 1 1.iginaç_:ões essa substância ima teria l , essa energi a que se
pam. Ela é independente dos sujeicos particulare1> cm que d1l1111de por todo tipo de seres h eterogêneos e que é o ún i­
se encarna, tanto assim que os precede como sobrevive a l • ' objeto verdadeiro do culto. Assim, pod emos com preen-
eles. Os indivíduos morrem, as gerações passam e são k r melhor o que o indígena quer dizer quando afinna que
substituídas por outras; mas essa forca permanece sempre membros da fratria do Corvo, por exemplo, são corvos.
1 k não entende precisamente que sejam corvos no sentido
e

atual, viva e idêntica. Ela anima as gerações de hoje, as­


sim como animava as d e ontem e como animará as de \ 1 1 1.�ar e empírico da pa l av ra , mas que em todos eles se

amanhã. Tomando a palavra num sentido bastante a m plo, ,11 ha um pri ncíp io que constitui o que têm de mais essen-
poder-se-ia dizer que el a é o deus que cada culto lOLêm i 1 1 l i , que lhes é com u m com os a n imais do mesmo nome e
co adora. Só que é um deus i mpessoal, sem nome, sem qtll' e pensado sob a forma exterior do corvo. Dcslc modo ,
história, ima nente ao mundo, difuso numa quantidade in­ • > 11 ni vcrso , tal co mo o concebe o LOLcmismo, é atravessa­
calculável de coisas. do, an imad o por um certo número de forças que a imagi-
Mesmo assim, temos somente u ma idé ia imperfeit a 11.1n10 se representa a tra vés de figuras tomadas, com pou-
da ubiqüicfade real dessa entidade quase divina. Ela não 1' cxcc�·ões, do reino animal ou do reino vegetal: h:.í 1an-
está apenas espalhada em toda a espécie totêmica, em lo­ 1.i-. dessas forÇ"'.1s quantos são os clãs da rribo, e c-.ida uma
do o clã, em todos os objetos que simbolizam o rotem: o dLlcts circula através de certat. categorias de coisa1> dat.
círculo de sua ação estende-se mais além. Com efeito, vi­ q11ab ela é a e!>Sência e e princípio de vida.
mos que, além dessas coisas eminentemente santas, todas Quando dizemos desses princípios que são forças,
aquelas que são atribuídas ao clã como dependências do 11.10 tornamos a palavra numa acepção merafórica: elas
ENTARES DA VIDA Rli.IIC ,/e 11 1 /1/N(,/IS 1!.LEMENTARES
192 AS FORMAS ELEM r
19j

agem como verdadeiras forças. São inclusive, num v 1 1 1 l r d igião C:· uma espécie de técnica que permite ao ho-
sentido, forças mater iais qu e engend ram mecanicanw 1 1 1 1 1 1 11 1 1 1 L'nfrentar o mundo com mais confiança. Mesmo pa­
efeitos físicos. Se um indivíduo entra em cont at o com d.1 r 1 e 1 e ristão, não é Deus Pai o guardião da ordem física,
sem cer LOmado as precauções necessárias, recebe 1 1 1 1 1 1 . 11 1 1 como o legislador e o juiz da conduta humana?
choque q u e pode ser comparado ao efeiLO ele u m a dl ''

li
carga elécrica. Às vezes elas parecem ser concebid as l "
mo fl uidos que escapam pelas poncasi. Quando se intro
duzem num organ ism o que não é feito para recebê-la'
produzem nele a doença e a morte, por uma reação co111 l'alvez pergu nta rã o se, interpretando deste modo o
pletamente automática 2. Fora do homem, elas desemrl' 11 111 mismo, não atribuímos ao primitivo idéias que ultra­
"'' sam o a l ca n ce de seu espírito. Por certo. não somos
, 1 p.1Les de afirmar que ele conceba c�sas forças com a
nham o papel de princípio vita l ; é agindo sobre elas, co
IJ10 veremos·\ que se assegura a reprodução das cs pérn.:'
, l.11L'za relativa que tivemos que colocar em nossa
análise.
I ' 1demos mostrar claramente que essa noção é implicada
E sobre elas que repousa a vicia universal.
Mas, ao mesmo cernpo que um aspecto físico, ela.,
cêm u m ca ráter moral. Quando se pergunta a um indígena J l' lo conjunto de suas crenças e que ela as domina; mas
por que ele observa seus ricos, ele responde que seus an 1 1 1 11 saberíamos dizer até que ponto ela é expressamente
tepassaclos sempre os observaram e que deve seguir seu , e 111sciente , em que medida, ao contrário , não
é apenas
1111plícita e confusamente sentida. Faltam de todo os meios
l '·"·L precisar o grau de clareza que ta l idéia pode ter n es-
exemplo'. Po11anto, se ele se comporta desta ou daquela

1s cons ciências obscuras. Mas o que mostra bem, em to-


m a neirn com os seres totêmicos, não é somente porque
as forças que neles residem são em princípio fisicamente
temíveis, é p orq ue ele se sente moralmente obrigado a do caso, que ela cm nada excede a mentalidade primitiva,
comportar-se assim; tem o sentimento de que obedece a 1 que confirma, ao contrário, o resultado
ao qual acaba-
uma es péci e ele imperativo, de que cumpre um dever. 11 1 os <lc chegar, é que encontra mos, em sociedad es apa­
Não tem a penas temor pelos seres sagrados, mas respeito. wntadas às tribos australianas ou mesmo nestas últimas, e
Aliás, o totem é a fonte ela vida moral cio clã. Todos os se­ 1 ll'forma explícita , conccpções que não diferem ela prece­
res que comungam do mesmo pri ncípio totémico se con­ tlcnte senão em graus e em nuanças.
sideram, por isso, moralmente l igados uns aos outros; têm As rel igiões indígenas de Samoa certamente ultrapas­
d everes definidos de assistência mútua, de vend era , etc., e s.1ram a fase totêmica. Nelas encontra mos
verdadeir os
são esses deveres que constituem o parentesco. O princí­ deuses, que têm nomes próprios e, ele certo modo, uma
pio totêmico, portanto, é ao mesmo tempo uma fo rça ma­ 1 isionomia pessoa l . No encanto, os vestígios de totem ismo
terial e uma potência moral; por isso, veremos que ele se s.10 dificilmente contestáveis. Cada deus, com efei to, está
transforma facilmente em divindade propriamente di ta . ligado a um grupo, seja local ou doméstico, assim como o
Aliás, não há nada aí que seja específico do totemis­ totem a seu clã5. Ora, cada um desses deuses é co ncebid o
mo. Mesmo n as reli giões mais avançadas, talvez não haja t omo imanente a uma espécie animal determin ada. Ele
deus que não tenha conservado algo dessa ambigüidade nao reside num indivíduo cm parúcu lar : está em todos ao
e que não cumpra funções simultaneamente cósmicas e mesmo tempo, difunde-se na espécie nteira.
i Quando u m

morais. Ao mesmo tempo que uma disciplina espi ritual, .mimai morre, as pessoas do grupo q u e o veneram lamen-
194 AS FORMAS ELEAl/i/VTARES DA �7DA Rlf.l/(,/C J\ 1 I \ r RENÇAS ElT!AIENTARBS

cam sua morce e prestam-lhe deveres piedosos porque 1 1dações dn sistema totêmico como nas outras sociecla-
um deus habita nde; mas o deus nao esta mono. Ele
ererno como a espécie. Não se confunde com a geraç;u•
t· 1 h's dos Sioux"'9. Ora, entre esses povos, acima de todos
" deuses particulares aos quais os homens prestam um
presente; era já a alma da que precedeu, como será a ai , ulro, existe uma potência eminente ch amada wakan111, da
ma da que virá depois6. Porranto, ele possui todas as ca qual as demais são como que fom1as derivadas. Por causa
racterísticas cio princípio torêmico. Trata-se de um princ1 , il- sua situação preponderante no panteão sioux, esse
pio totêmico que a imaginação revestiu ele formas ligeira princípio foi visto às vezes como uma espécie ele deus so­
mente pessoais. Mas uma persona lidade exagerada não lit-rano, de Júpiter ou Jeová, e os viajantes freqüentcmen­
seria muito compatível com essa d ifu são e essa ubiqüida lt' traduziram wakan por "grande espírito". Era equivocar­
de. Se seus contornos fossem claramente defin idos, ela ·l' gravemente sobre sua natureza verdadeira . O wakan
náo poderia dispersar-se e espalhar-se por uma mul udao 11ao é, de maneira alguma, um ser pessoal: os inc.hgenas
de coi:-.as nao o concebem sob formas determinadas. -Eles dizem,
Nesse caso, porém, é incontesrável que a noção de rnnta um observador citado por Dorsey, que jamais viram
força religiosa impessoal começa a a ltemr-se; mas há ou o wakanda; por isso, não podem pretender personificá­
tros em que ela se afinna em sua pureza abstrata e atinge lo. "" Não é sequer possível defini-lo por atributos e ca­
inclusive um grau de genernlidade bem mais alto do que racteres determinados. "Nenhum termo, diz Riggs, pode
na Austrália. Embora os diferences princípios totêmicos t•xprimir a sign ificação da palavra entre os Dakota. Ela
aos quais se dirigem os diversos clàs de uma mesma uibo compreende todo mistério, todo poder secreto, toda di­
sejam disrintos uns dos outros, eles não deixam ele ser, no vindade."12 Os seres que o Oakota reverencia, "a Terra, os
fundo, comparáveis entre si, pois rodos desempe nham o quatro ventos, o Sol, a Lua, as estrelas, são manifestações
mesmo papel em sua respectiva esfera. Ora, há socieda­ dessa vida misteriosa e desse poder" que circula através
des que rivernm o sentimento dessa comunhão de nature­ de todas as coisas. Ora ele é representado sob a forn1a cio
za e que se elevaram, por conseguinte, à noção de uma \'ento, como um sopro que tem sua sede nos quatro pon­
força religiosa única, da qual todos os outros princípios tos cardeais e que move ruclol3; ora é a voz que se faz ou­
sagrados seriam apenas modalidades e que faria a unida­ 'vir quando o rrovão ressoa"; o Sol, a Lua, as estrelas são
de do un iverso. E, como essas sociedades estão ainda wakan1s. Mas não há enu meração capaz de esgotar essa
completamente impregnadas de totemismo, como perma­ noção infinitamente complexa. Não se trata de u m poder
necem ligadas a uma organização social idêntica à dos definido e definível, o poder de fazer isto ou aquilo; trata­
povos aus1ral ianos, é lícito afirmar que o LOtemismo trazia se do Poder, ele uma maneira absoluta, sem epíteto nem
essa icléia no ventre. determinação ele espécie alguma. As diversas potências
É o que se pode observar num grande número de tri­ divinas são apenas suas manifestações particulares e per­
bos americanas, especialmente as que percencem à gran sonificações; cada uma delas � esse poder visto sob u m
de família dos Sioux: Omaha, Ponka, Kansas, Osage, Assi­ de seus múltiplos aspectos'6. E o que levou um observa­
niboin, Dakota, lowa, Winnebago, Mandan, Hidatsa, etc. dor a dizer que "se trata de um deus essencialmente pro­
Várias dessas sociedades são ainda organizadas em clãs, teiforme, que muda de a l ributos e de funções conforme
como os Omaha7, os IowaH; outras o eram há não muito as circunsrâncias"17. E os deuses não são os únicos seres
tempo e, segundo Dorsey, nelas se encontram "todas as que o wakan anima: ele é o princípio de rudo o que vive,
194 AS FORMAS ELEAl/i/VTARES DA �7DA Rlf.l/(,/C J\ 1 I \ r RENÇAS ElT!AIENTARBS

cam sua morce e prestam-lhe deveres piedosos porque 1 1dações dn sistema totêmico como nas outras sociecla-
um deus habita nde; mas o deus nao esta mono. Ele
ererno como a espécie. Não se confunde com a geraç;u•
t· 1 h's dos Sioux"'9. Ora, entre esses povos, acima de todos
" deuses particulares aos quais os homens prestam um
presente; era já a alma da que precedeu, como será a ai , ulro, existe uma potência eminente ch amada wakan111, da
ma da que virá depois6. Porranto, ele possui todas as ca qual as demais são como que fom1as derivadas. Por causa
racterísticas cio princípio torêmico. Trata-se de um princ1 , il- sua situação preponderante no panteão sioux, esse
pio totêmico que a imaginação revestiu ele formas ligeira princípio foi visto às vezes como uma espécie ele deus so­
mente pessoais. Mas uma persona lidade exagerada não lit-rano, de Júpiter ou Jeová, e os viajantes freqüentcmen­
seria muito compatível com essa d ifu são e essa ubiqüida lt' traduziram wakan por "grande espírito". Era equivocar­
de. Se seus contornos fossem claramente defin idos, ela ·l' gravemente sobre sua natureza verdadeira . O wakan
náo poderia dispersar-se e espalhar-se por uma mul udao 11ao é, de maneira alguma, um ser pessoal: os inc.hgenas
de coi:-.as nao o concebem sob formas determinadas. -Eles dizem,
Nesse caso, porém, é incontesrável que a noção de rnnta um observador citado por Dorsey, que jamais viram
força religiosa impessoal começa a a ltemr-se; mas há ou o wakanda; por isso, não podem pretender personificá­
tros em que ela se afinna em sua pureza abstrata e atinge lo. "" Não é sequer possível defini-lo por atributos e ca­
inclusive um grau de genernlidade bem mais alto do que racteres determinados. "Nenhum termo, diz Riggs, pode
na Austrália. Embora os diferences princípios totêmicos t•xprimir a sign ificação da palavra entre os Dakota. Ela
aos quais se dirigem os diversos clàs de uma mesma uibo compreende todo mistério, todo poder secreto, toda di­
sejam disrintos uns dos outros, eles não deixam ele ser, no vindade."12 Os seres que o Oakota reverencia, "a Terra, os
fundo, comparáveis entre si, pois rodos desempe nham o quatro ventos, o Sol, a Lua, as estrelas, são manifestações
mesmo papel em sua respectiva esfera. Ora, há socieda­ dessa vida misteriosa e desse poder" que circula através
des que rivernm o sentimento dessa comunhão de nature­ de todas as coisas. Ora ele é representado sob a forn1a cio
za e que se elevaram, por conseguinte, à noção de uma \'ento, como um sopro que tem sua sede nos quatro pon­
força religiosa única, da qual todos os outros princípios tos cardeais e que move ruclol3; ora é a voz que se faz ou­
sagrados seriam apenas modalidades e que faria a unida­ 'vir quando o rrovão ressoa"; o Sol, a Lua, as estrelas são
de do un iverso. E, como essas sociedades estão ainda wakan1s. Mas não há enu meração capaz de esgotar essa
completamente impregnadas de totemismo, como perma­ noção infinitamente complexa. Não se trata de u m poder
necem ligadas a uma organização social idêntica à dos definido e definível, o poder de fazer isto ou aquilo; trata­
povos aus1ral ianos, é lícito afirmar que o LOtemismo trazia se do Poder, ele uma maneira absoluta, sem epíteto nem
essa icléia no ventre. determinação ele espécie alguma. As diversas potências
É o que se pode observar num grande número de tri­ divinas são apenas suas manifestações particulares e per­
bos americanas, especialmente as que percencem à gran sonificações; cada uma delas � esse poder visto sob u m
de família dos Sioux: Omaha, Ponka, Kansas, Osage, Assi­ de seus múltiplos aspectos'6. E o que levou um observa­
niboin, Dakota, lowa, Winnebago, Mandan, Hidatsa, etc. dor a dizer que "se trata de um deus essencialmente pro­
Várias dessas sociedades são ainda organizadas em clãs, teiforme, que muda de a l ributos e de funções conforme
como os Omaha7, os IowaH; outras o eram há não muito as circunsrâncias"17. E os deuses não são os únicos seres
tempo e, segundo Dorsey, nelas se encontram "todas as que o wakan anima: ele é o princípio de rudo o que vive,
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1% AS FONMAS EWMF.NTAl</fS lJA VIDA RELIG/c 1\ i

age e se move. "Toda a vida é wakan. E o mesmo aconlt w • 10 quL· e o equivalente exato do wakan dos <.;ioux e do
1 11 , mia dos lroqueses. Eb a definição de mana
dada por
ce com rudo o que manifesta algum puder, como os ,l' l l
n: "Os melanés ios crêem na existênc ia de uma
tos e as nuvens que se acumulam, o u res istência passiv.1, • • •dringto
que
l 1 1 1 l ,, absolutamente distinta de toda força materia l,
e
como o rochedo à beira do caminho."1s
Entre os lroqueses, cuja organização social tem u m •w de todas as formas, seja para o bem, seja para o mal,

q11l· o homem Lem o maior interesse em possuir e


c.lomi-
caráter totêmico ainda mais pronunciado, encontramos ,1
mesma noção: a palavra orenda que serve para exprimi-l .1
pa­
11.11 É o mana. Creio compreender o sentido que essa
é o equivalente exato do wakan dos Sioux. l 1 1 ra tem para os i ndígenas . . . Trata-se de uma força , de
"É Lima potên
eia mística, diz I lewiu, que o selvage m concebe como 1 1 111a influência de ordem imaterial e, num certo sentido,
inerente a todos os corpos que compõem o meio ondl' , il irenatur al; mas é pela força física que ela se revela , ou,
que o
ele vive . . . inerenLC às pedras, aos cursos c.l'água, às pla n , 1 11ao, por Lodo Lipo de poder ou de superioridade
tas e às áivorcs, aos ani mais e ao homem, aos ventos e "·' l 1 1 >111em possui. O mana não está fixado num objeto <lcler-
tempestades, às nuvens, ao trovão, aos relâmpagos, etc. " 1 •1 1 1 1inaclo, pode se estender a toda es pécie de coisas . . . Toda
Essa potência é " vista pelo espírito rudimentar do homem 1 rel ig ião do melanésio consiste cm tentar obter o mana,
de ou-
como a causa eficiente de todos os fenômcnos, de todas �via para proveito próprio, seja para o p rove ito
1n·m. "Z Não é essa
6 a noção mesma de força anônima e di­
as atividades que se manifestam ao redor del e " o. Um fei
z mo
ticeiro, um xamã, tem orend a, mas o mesmo se dirá de l 11sa cujo germe descob ría mos há pouco no totemis
-
um homem bem-sucedido em seus empreendimentos . No . 1 ustraliano? É a mesma impessoalidade, pois, diz Codring
evitar ver nela uma espécie de ser suprem o,
fundo, não há nada no mundo que não tenha sua parte 1on, deve-se
de orenda; só que as partes são desiguais. llá seres, ho­ 1déia essa que '·é compler.amente estranha" ao pensamento
situado
mens ou coisas, que são favorecidos, outros relativamente 1 11elanésio. A mesma ubiqüidade: o mana não está
alguma de maneira definida , está em toda parte.
d eserdados, e a vida universal consiste nas lutas desses t'lll parte

orenda de de5igual intensidade. Os mais intensos subordi 1 odas as formas da vida, todas as cficácias da ação, seja
s, são
nam os mais fracos. Um homem supera seus concorrentes dos homens, dos seres vivos ou dos simples minerai
na caça ou na guerra? .É q ue ele tem mais orenda. Se um .1tribuídas à sua influência27.
às
animal escapa ao caçador que o persegue, é que o oren­ Portanto, não há temeridade alguma em atribuir
sociedades australian as uma idéia como a que tiramos da
da do primeiro é maior que o do segu ndo .
tra­
A mesma idéia encontra-se entre os Shoshone com o .1 nálise das crenças totêmicas, uma vez que a reencon
alto ele abslraç ão e de
nome de pokunt, entre os Algonquins com o nome de ma- mos, mas levada a um grau mais
11itu2 1 , de nauala ent re os Kwakiut(22, de yek entre os Tlin­ na base ele rel igi õ es que mergulh am suas
general idade,
kit23 e de sgâna entre os Haida24. Mas ela não é panicular raízes no siste ma australia no e que trazem visivelmenlc
aos índios da América; foi na Melanésia q ue se a estudou sua marca. As duas concepcões são manifestamente apa­
pela primeira vez. É verdade que, em certas ilhas melané­ rentadas; diferem apenas em grau. Enquanto o mana é di­
para
sias, a organização social atualmente não é mais de base fuso em todo o universo, o que chamamos deus, ou,
ser mais exato, princípio totêmico , está localizad o n um
totêmica; mas em todas elas o totemismo é ainda visíveJ25
não importa o que tenha dito Codrington a respeito. ora : círculo, certamente muito extenso, porém mais limitado,
encontramos nesses povos, sob o nome de mana, uma de seres e ele coisas de espécies diferentes. É mana, mas
I \ 1 /,'FVÇAS ELli.Ml!NTA RES l97
1% AS FONMAS EWMF.NTAl</fS lJA VIDA RELIG/c 1\ i

age e se move. "Toda a vida é wakan. E o mesmo aconlt w • 10 quL· e o equivalente exato do wakan dos <.;ioux e do
1 11 , mia dos lroqueses. Eb a definição de mana
dada por
ce com rudo o que manifesta algum puder, como os ,l' l l
n: "Os melanés ios crêem na existênc ia de uma
tos e as nuvens que se acumulam, o u res istência passiv.1, • • •dringto
que
l 1 1 1 l ,, absolutamente distinta de toda força materia l,
e
como o rochedo à beira do caminho."1s
Entre os lroqueses, cuja organização social tem u m •w de todas as formas, seja para o bem, seja para o mal,

q11l· o homem Lem o maior interesse em possuir e


c.lomi-
caráter totêmico ainda mais pronunciado, encontramos ,1
mesma noção: a palavra orenda que serve para exprimi-l .1
pa­
11.11 É o mana. Creio compreender o sentido que essa
é o equivalente exato do wakan dos Sioux. l 1 1 ra tem para os i ndígenas . . . Trata-se de uma força , de
"É Lima potên
eia mística, diz I lewiu, que o selvage m concebe como 1 1 111a influência de ordem imaterial e, num certo sentido,
inerente a todos os corpos que compõem o meio ondl' , il irenatur al; mas é pela força física que ela se revela , ou,
que o
ele vive . . . inerenLC às pedras, aos cursos c.l'água, às pla n , 1 11ao, por Lodo Lipo de poder ou de superioridade
tas e às áivorcs, aos ani mais e ao homem, aos ventos e "·' l 1 1 >111em possui. O mana não está fixado num objeto <lcler-
tempestades, às nuvens, ao trovão, aos relâmpagos, etc. " 1 •1 1 1 1inaclo, pode se estender a toda es pécie de coisas . . . Toda
Essa potência é " vista pelo espírito rudimentar do homem 1 rel ig ião do melanésio consiste cm tentar obter o mana,
de ou-
como a causa eficiente de todos os fenômcnos, de todas �via para proveito próprio, seja para o p rove ito
1n·m. "Z Não é essa
6 a noção mesma de força anônima e di­
as atividades que se manifestam ao redor del e " o. Um fei
z mo
ticeiro, um xamã, tem orend a, mas o mesmo se dirá de l 11sa cujo germe descob ría mos há pouco no totemis
-
um homem bem-sucedido em seus empreendimentos . No . 1 ustraliano? É a mesma impessoalidade, pois, diz Codring
evitar ver nela uma espécie de ser suprem o,
fundo, não há nada no mundo que não tenha sua parte 1on, deve-se
de orenda; só que as partes são desiguais. llá seres, ho­ 1déia essa que '·é compler.amente estranha" ao pensamento
situado
mens ou coisas, que são favorecidos, outros relativamente 1 11elanésio. A mesma ubiqüidade: o mana não está
alguma de maneira definida , está em toda parte.
d eserdados, e a vida universal consiste nas lutas desses t'lll parte

orenda de de5igual intensidade. Os mais intensos subordi 1 odas as formas da vida, todas as cficácias da ação, seja
s, são
nam os mais fracos. Um homem supera seus concorrentes dos homens, dos seres vivos ou dos simples minerai
na caça ou na guerra? .É q ue ele tem mais orenda. Se um .1tribuídas à sua influência27.
às
animal escapa ao caçador que o persegue, é que o oren­ Portanto, não há temeridade alguma em atribuir
sociedades australian as uma idéia como a que tiramos da
da do primeiro é maior que o do segu ndo .
tra­
A mesma idéia encontra-se entre os Shoshone com o .1 nálise das crenças totêmicas, uma vez que a reencon
alto ele abslraç ão e de
nome de pokunt, entre os Algonquins com o nome de ma- mos, mas levada a um grau mais
11itu2 1 , de nauala ent re os Kwakiut(22, de yek entre os Tlin­ na base ele rel igi õ es que mergulh am suas
general idade,
kit23 e de sgâna entre os Haida24. Mas ela não é panicular raízes no siste ma australia no e que trazem visivelmenlc
aos índios da América; foi na Melanésia que se a estudou sua marca. As duas concepcões são manifestamente apa­
pela primeira vez. É verdade que, em certas ilhas melané­ rentadas; diferem apenas em grau. Enquanto o mana é di­
para
sias, a organização social atualmente não é mais de base fuso em todo o universo, o que chamamos deus, ou,
ser mais exato, princípio totêmico , está localizad o n um
totêmica; mas em todas elas o totemismo é ainda visíveJ25
não importa o que tenha dito Codrington a respeito. ora : círculo, certamente muito extenso, porém mais limitado,
encontramos nesses povos, sob o nome de mana, uma de seres e ele coisas de espécies diferentes. É mana, mas
198 AS PONMA S H.EIWENTA/?ES DA Vll)A REl/GIC!.\i I \ 1 'JWNÇAS ELEMl'.N/A/U!.S 19':)

um pouco mais especializado, embora essa especializa.;;: 111 as.


, , . 1.tlida<lc quc alcançou cm socieda des mais avançad
seja, em suma, muito relativa. causa da insuficie nte aptidão que po­
i.10 é somente por
Aliás, há o caso em que essa relação ele parenresrn a
'" ter o ausLraliano para abstrair e general izar: a naturez
torno u-se pa rticularmente ev idente Entre os Omaha , exis " l i , meio social, antes de tudo, é que
. impunh a esse parti­
tem totens de todo tipo, individuais e coletivos2l\ ora, to ' 1 1 larismo. Com efeito, enquanto o totemismo permanece
dos eles sã o a penas formas pa rticu lares do wakan. "A k 11.1 base ela organização cultual, o clã conserva, na
socie­
cio índio na eficácia do totem, diz a s1ta. Fletcher, repousa muito pronun ciada, embo-
d.tde religiosa, uma autonomia
va na sua concepção da natureza e da vida. Essa concep· 1 . 1 não absoluta. É verdade que, num certo
sentido, pode­
ção era complexa e envolvia duas idéias essenciais. A pri .1 dizer que cada grupo totêm.ico não é mais
que uma ca-
meira é
·

que todas as coisas, animadas ou inanimadas, sao capel a que goza de larga
penetr.tdas por um princípio comum de vida; a segunda e
1'..J a da igreja tribal; mas é uma
celebra , sem formar um
29 Ora, esse princípio comum <lc
1 1 1depend ência. O culto que aí se
que ess..i \'ida é co núnu a . ''
" ido auto-suficiente, mantém, no entamo, com o� dcma1�
vicia é o wakan. O totem é o meio pelo qual o indivíduo se pe­
1 renas relações exteriores: eles se justapõem sem
ado pa-
se coloca em relação com essa fonte de energia; se o ro netrarem·' o totem de um clã só é plenamente s agr
tem tem poderes, é porque encarna o wakan. Se o homem 1 ,1 esse c lã. Por consegu inte, o grupo
das coisas que di-
que violou as i nterd ições que protegem seu totem é ataca­ em res pe it o a cada clã e que fazem parte dele tanto
a n;es­
do pela clocns,-a ou a morte, é porque a força misteriosa dian­ quanto os homens, tem a mesma in<livi dualidad � e
te ela qual se depara, o wakan, reage contra ele com uma represe ntado como 1rreduu vel
ma autonomia. Cada qual é
intensidade proporcional ao choque sofrido30 . Inversa­ similare s, como que sepa ra do deles por uma
.1os grupos
é wakan o wakan, �
.
mente, do mesmo modo que o totem éc1 e e
,
�olução de conLinu idadc, constiLU indo u.ma esp .
por sua vez, lembra, às vezes, pela maneira como é conce­ a 1de1a
reino distinto. Nessas condições, não podia surgir
bido, suas origens totêmicas. Com efeito, e ntre os Dakota, mani­
de 4ue esses mundos hetcrogêncos fossem apenas
funda­
diz Say, o wahcon da se manifesta ora sob a forma de um
" "
t cstaçôes variada s de uma única e mesma força
deles
urso cinzento, ora de um bisão, de um castor ou de algum mental· devia-se ao contrário, supor que a cada um
outro animaf3 1 . Claro que essa fórmula não pod er i a ser � �
corres ondia u 1 mana especificamente diferen
te e cuja
aceita sem reserva. O wakan é avesso a tod a perso n ifi ca­ .1ção n ão po dia estende r-se além do clã e do c
í rculo de
,

ção e, portanto, é pouco provável que alguma vez tenha ídas. A noção de um mana urn­
sido pe nsado cm sua genera l idade abstrata com o auxílio
coisas que lhe eram atribL1
l'O e u niversal só podia nascer a partir
do momento cm
de sí mb olo s tão definidos. Mas a observação de Say apli dos cul­
­
que uma religião da tribo se desenvolvesse acima
ca-se prova ve l me n te às formas pa rticu la res que ele assu­ e os absorve sse mais ou menos c om pletame n­
tos de clãs
ll!. Foi com o sentido da u nidade tribal que despert
me ao especial izar-se na realidade concreta da vida. Ora, ou o
ente,
se realmente houve um tempo em que essas especializa sentido da unidad e substan cial elo mundo . Certam
ções cio wakan test emun havam uma afinidade tão marca­ emos mais adiante 33 que as socieda des da Austrá­
mostrar
da pela forma animal, teríamos aí mais uma prova elos la­ M�s ' se
lia já conhecem um culLo comum à tribo inteira. ._
ços estreitos que unem essa noção às crenças totêmic as 32. nta a forma mais elevada das reltg1oe s
esse culto represe
ios so­
Pode-se, aliás, ex plica r por que, na Austrália, a idéia australianas, ele não conseguiu modificar os princíp
de mana era incapaz de atingir o grau de abstração e ge- almen-
bre os quais elas repousam: o totemismo é essenci
198 AS PONMA S H.EIWENTA/?ES DA Vll)A REl/GIC!.\i I \ 1 'JWNÇAS ELEMl'.N/A/U!.S 19':)

um pouco mais especializado, embora essa especializa.;;: 111 as.


, , . 1.tlida<lc quc alcançou cm socieda des mais avançad
seja, em suma, muito relativa. causa da insuficie nte aptidão que po­
i.10 é somente por
Aliás, há o caso em que essa relação ele parenresrn a
'" ter o ausLraliano para abstrair e general izar: a naturez
torno u-se pa rticularmente ev idente Entre os Omaha , exis " l i , meio social, antes de tudo, é que
. impunh a esse parti­
tem totens de todo tipo, individuais e coletivos2l\ ora, to ' 1 1 larismo. Com efeito, enquanto o totemismo permanece
dos eles sã o a penas formas pa rticu lares do wakan. "A k 11.1 base ela organização cultual, o clã conserva, na
socie­
cio índio na eficácia do totem, diz a s1ta. Fletcher, repousa muito pronun ciada, embo-
d.tde religiosa, uma autonomia
va na sua concepção da natureza e da vida. Essa concep· 1 . 1 não absoluta. É verdade que, num certo
sentido, pode­
ção era complexa e envolvia duas idéias essenciais. A pri .1 dizer que cada grupo totêm.ico não é mais
que uma ca-
meira é
·

que todas as coisas, animadas ou inanimadas, sao capel a que goza de larga
penetr.tdas por um princípio comum de vida; a segunda e
1'..J a da igreja tribal; mas é uma
celebra , sem formar um
29 Ora, esse princípio comum <lc
1 1 1depend ência. O culto que aí se
que ess..i \'ida é co núnu a . ''
" ido auto-suficiente, mantém, no entamo, com o� dcma1�
vicia é o wakan. O totem é o meio pelo qual o indivíduo se pe­
1 renas relações exteriores: eles se justapõem sem
ado pa-
se coloca em relação com essa fonte de energia; se o ro netrarem·' o totem de um clã só é plenamente s agr
tem tem poderes, é porque encarna o wakan. Se o homem 1 ,1 esse c lã. Por consegu inte, o grupo
das coisas que di-
que violou as i nterd ições que protegem seu totem é ataca­ em res pe it o a cada clã e que fazem parte dele tanto
a n;es­
do pela clocns,-a ou a morte, é porque a força misteriosa dian­ quanto os homens, tem a mesma in<livi dualidad � e
te ela qual se depara, o wakan, reage contra ele com uma represe ntado como 1rreduu vel
ma autonomia. Cada qual é
intensidade proporcional ao choque sofrido30 . Inversa­ similare s, como que sepa ra do deles por uma
.1os grupos
é wakan o wakan, �
.
mente, do mesmo modo que o totem éc1 e e
,
�olução de conLinu idadc, constiLU indo u.ma esp .
por sua vez, lembra, às vezes, pela maneira como é conce­ a 1de1a
reino distinto. Nessas condições, não podia surgir
bido, suas origens totêmicas. Com efeito, e ntre os Dakota, mani­
de 4ue esses mundos hetcrogêncos fossem apenas
funda­
diz Say, o wahcon da se manifesta ora sob a forma de um
" "
t cstaçôes variada s de uma única e mesma força
deles
urso cinzento, ora de um bisão, de um castor ou de algum mental· devia-se ao contrário, supor que a cada um
outro animaf3 1 . Claro que essa fórmula não pod er i a ser � �
corres ondia u 1 mana especificamente diferen
te e cuja
aceita sem reserva. O wakan é avesso a tod a perso n ifi ca­ .1ção n ão po dia estende r-se além do clã e do c
í rculo de
,

ção e, portanto, é pouco provável que alguma vez tenha ídas. A noção de um mana urn­
sido pe nsado cm sua genera l idade abstrata com o auxílio
coisas que lhe eram atribL1
l'O e u niversal só podia nascer a partir
do momento cm
de sí mb olo s tão definidos. Mas a observação de Say apli dos cul­
­
que uma religião da tribo se desenvolvesse acima
ca-se prova ve l me n te às formas pa rticu la res que ele assu­ e os absorve sse mais ou menos c om pletame n­
tos de clãs
ll!. Foi com o sentido da u nidade tribal que despert
me ao especial izar-se na realidade concreta da vida. Ora, ou o
ente,
se realmente houve um tempo em que essas especializa sentido da unidad e substan cial elo mundo . Certam
ções cio wakan test emun havam uma afinidade tão marca­ emos mais adiante 33 que as socieda des da Austrá­
mostrar
da pela forma animal, teríamos aí mais uma prova elos la­ M�s ' se
lia já conhecem um culLo comum à tribo inteira. ._
ços estreitos que unem essa noção às crenças totêmic as 32. nta a forma mais elevada das reltg1oe s
esse culto represe
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Pode-se, aliás, ex plica r por que, na Austrália, a idéia australianas, ele não conseguiu modificar os princíp
de mana era incapaz de atingir o grau de abstração e ge- almen-
bre os quais elas repousam: o totemismo é essenci
IWNÇAS ELl..!MHNTARES 201
200 AS FORMAS W.BMENTARES DA VlDA NEUCTOS11 11 r

te uma religião federativa que não pode ultrapassar certo l 1 1 1 . 1 -se, pois, muito precisamente, de u m mana nocivo.
grau de centralização sem deixar de ser o que é. 1 t 1 1•y assinala nas tribos que observou uma noção exata-
1 1 1r•11tc idêntica37. Assim, entre esses diferentes povos, en-
1 p 1. 1 11to as forças propriamente religiosas não conseguem
Um fato característico mostra bem que é essa a razão
profunda que, na Austrália, manteve a noção ele mana
nesse estado de especialização. As forças propriamente , . desfazer de uma certa heterogeneidade, as forças mági­
religiosas, pensadas sob a forma dos totens, não são as ' ,., são concebidas como sendo todas da mesma natureza:
únicas com as quais o australiano se crê obrigado a con­ , t l l representadas aos espíritos em sua unidade genérica.
1 1 >1110 pairam acima ela organização social, acima de suas cli­
' hocs e subdivisões, elas se movem num espaço homogê-
tar. Há também aquelas de que o mágico, mais particular­

1 11 ·o e contínuo onde não encontram nada que as diferen­


mente, dispõe. Enquanto as primeiras são, em princípio,
consideradas como salutares e benéficas, as segundas têm
por função, acima de tudo, causar a morre e a doença. Ao ' 11•. As outras, ao contrário, estando localizadas em contex-
mesmo tempo que pela natureza de seus efeitos, elas di­ 1 • '·" sociais definidos e distintos, diversificam-se e panicula-
ferem também pelas relações que mantêm respectivamen­ 1 11a m-se à imagem dos meios onde estão situadas.
te com a organização da sociedade. Um totem é sempre Assim se percebe o quanto a noção de força religiosa
próprio de um clã, ao passo que a magia é urna institui­ 1 1 1 1 pessoal está no sentido e no espírito cio totemismo aus-
1 1 . i liano, pois ela se constitui com clareza tão logo não haja
1 , 1 u sa contrária q u e se l he opon h a . É verdade que o
ção tribal e mesmo intertribaJ. As forças mágicas não per­

. 1 1 ungquiltha é uma força puramente mágica. Mas, entre as


tencem como algo específico a uma porção determinada
da tribo. Para servir-se delas, basta possuir as receitas efi­
cazes. Do mesmo modo, todos estão expostos a sentir tnrças mágicas e as forças religiosas, não há diferença de
seus efeitos e devem, portanto, procurar se prevenir. Tra­ 1 1 . 1 t ureza38; às vezes, elas são até designadas pelo mesmo
ta-se de forças vagas que não se prendem especial mente 1 1ome: na Melanésia, o mágico e seus sortilégios possuem
a nenhuma divisão social determinada e que podem in­ 1 1 1ana, da mesma forma que os agentes e os ritos do culto
clusive estender sua ação para além da tribo. Ora, é notá­ wgular39. A palavra orencla, entre os Iroqueses40, é empre-
vel que, entre os Arunta e os Loritja, elas sejam concebi­ 1:.1da da mesma maneira. Pode-se, portanto, inferir legiti-
das como simples aspectos e formas particulares de uma 1 1 1< 1 mente a natureza ele umas com base na das outras1 1 •
mesma e única força, chamada em arunta Arungquiltha
ou Arunkulta31. "Esse é um termo, dizem Spencer e Gil­
Ien, de significação um pouco vaga; mas, na sua base, en­ III
contra-se sempre a idéia de um poder sobrenatural de na­
tureza ruim . . A palavra se aplica indiferentemente à má in­
.
O resultado a que nos conduz a análise precedente
fluência que se desprende de um objeto ou ao objeto 1 1 :10 interessa apenas à história cio totemismo, mas tam­
mesmo onde ela reside a título temporário ou permanen­ ·1 wm à gênese cio pensamento religioso em geral.
te." 35 "Por arünkulta, diz StrehJow, o indígena entende Sob pretexto ele que o homem, na origem, é clomina-
uma força que suspende bruscamente a vicia e ocasiona a 1 lo pelos sentidos e pelas representações sensíveis, afir-
morte daquele em quem ela se introduziu. ''36 Dá-se esse 1 1 1ou-se com freqüência que ele havia começado por con­
nome às ossadas, às peças de madeira de onde se tiram t "l'ber o divino sob a forma concreta de seres definidos e
sortilégios maléficos, aos venenos animais ou vegetais. pt.:ssoais. Os fatos não confirmam essa conjetura . Acaba-
202 )
AS FONMAS ELEMEN/'ARHS DA \liA f{}f/J(,/11\A 1 \ r N/\(.AS Hll'.MEN!i1Rfü' 203

ac.lo-
mos de descrever um conjunto, sistematicamente articul 1 ,, , 1 1 animismo. Se o Sol, a Lua e as estrelas foram
do, de <..rença:. religiosas que temos motivos para cons1tk 1 1 1 11 1-., nào deveram essa honra à sua natureza intrínsec a,
rar como muico primi tivo, no entanto não encontramos rw 1 1 1 .ts proprie dades distintiv as, mas ao fato de terem si-
é a
le personal idades desse cipo. O culto propriamente totêm 1 11 1 , oncebidos como particip antes dessa força que
co não se dirige nem a estes animais ou àquelas plantas til· 1 1 1 111 .1 .t conferir às coisas seu caráter sagrado , que se en­

H 1 1 1 1 1 ,1 em vários outros seres, inclusiv


terminadas, nem mesmo a urna espécie vegetal ou animal, e os mais ínfimos.
mas a uma vaga potência, dispersa através das coisas 1 ' 1-. almas dos mortos foram objeto
de ritos, não é por­
' I ' "' ts :supunham feiras de uma espécie de substân
c:_ia flui­
,

Mesmo nas religiões mais elevadas que saíram do 1otcm1s


mo, corno as que vemos emre os índios da América du t i 1 , 1mpalpá vel; não é porque se assemelhavam a som­
ie
Norte, essa 1dé1a. longe de apagar-se, torna-se mais cons l 11 . 1 projetada por um corpo ou a seu reflexo na superfíc
ciente c.le s1; enuncia-se com uma clareza que nào possu1.1 i l , .aguas. A leveza, a fluidez não são suficien tes para
digni­
ante:-., .to 1�Ksmu tempo cm que aka n1,:a uma gcneralidad1 1 1 11 11l'nr a santidade; mas só foram invesnc.las dessa
mais alta. E ela que domina todo o siscema religioso. d.11 le na medida em que havia nelas algo dessa
mesma
Tal é a matéria-prima com que fo ram construídos °' o toda religios idade.
foi
1 ! 11 1 . f nte de
seres diversos que as religiões de todos os tempos consa Pode-se compreender melhor, agora, por que nos
pela idéia de persona lidades
graram e adornram. Os espíritos, os demônios, os gêm is 11possível defuür a religião
repre­
e os deuses de todo porte não são senão as formas con 1111t 1«as, deuses ou espíritos: é que essa maneira de
inerente à
eretas que essa energia, essa "potencialidade", como diz ,, n t a r as coisas religiosas de modo nenhum é
llowitt1:1, assumiu ao individualizar-se, ao fixar-se num .1 1 1 natureza. O que encontramos na
origem e na base do
objeto determinado ou cm certo ponto do espaço, ao to religioso não são objetos ou seres clctcm1ina­
1 nsamen
concentrar-se e m torno d e um ser ideal e legendário. d1 is e distintos que possuem por si próprios um caráter
as,
mas concebido como real pela imaginaç-Jo popular. Um da 1 � rado, mas sim poderes indefin idos, forças anônim
kota, i n terrogado pela srta. Fletcher, exprimia numa lin­ menos numero sas conf o rme as socieda des, às ve-
11 1 a is ou
e é estrita-
guagem cheia ele detalhes essa consubstancia lidade e:s , ..., até reduzidas à unidad e, cuja impessoalidad
ã elas forças físicas que têm suas mani­
sencial de todas as coisas sagradas. "Tudo o que se move, 1 1 1vnte comparável
detém-se aqui ou ali, num momento ou noutro. O pássaro l 1 ·..1ai,·ões estudadas pelas ciências e.la natureza.
Quanto às

• , 11sas sagra das particul ares, são apenas formas individu


que voa se detém num l ugar para fazer o ninho, num ou a­
tro parn desca nsar de seu vôo. O homem que caminha, l11:1das desse princíp io essenci al. Pottanto , não é surpree n-
divi�da­
1 l t · n Le que, mesmo nas religiões em q ue existem
viltude eficaz
detém-se quando lhe agrada. Acontece.: o mesmo com a
divindade. O Sol, tão brilhante e magnífico, é um lugar dvs reconhecidas, haja ritos que possuem uma
onde ela se deteve. As á rvo res e os animais são outros. O , m si mesmo s e i ndepen dentem ente de toda inte1vcn ção
s pronun­
índio pensa nesses lugares e envia a eles suas preces, pa "" ina. É que essa força pode l igar-se às palavra
cias
rn que estas atinjam o local onde o deus estacionou e pa­ ' 1.1das, aos gestos efetuados, tanto quamo a substân
e d�
ra que obtenham assistência e bênção:·11 Oito de outro , orporais; a voz e os movime ntos podem servir-lh
ir os efe1-
modo, o wakan (pois é dele que se trata) vai e vem pelo Vl'1culo, e por interméd;o deles ela pode produz
mundo, e as coisas sagradas são os pontos onde ele pou­ capaz, sem que nenhum deus ou espírito co­
1 1 1s de que é
te-
sa. Eis-nos, desta vez, bem longe tanto do naturismo co- l 1horem . Inclusive, se ela vier a concentrar-se eminen
_ _ ._. ...... _.e._ .. __ ,._ .. .r1.. ?'

AS FORMAS ELEME.VTARES DA VTDA NEl.l<.tr r 1 1 /o1 \(.IS rLE.


: lfE.VrANES 2u5
J().1
1

me ?tc num rito. e-.cc se tornará, através dela, criad1 •r 1 n.1 qu�I :>s ritos teriam se dirigido a forças impessoais
divindades '5. E is também por que calvez nao haja pl'r" ' 1 1 uno o mana melanésio ou o wakan dos Omaha e
nalidade divina q u e não conserve algo de i m pesso.11 1 1 1 >.1kota�11. Contudo, Marrete não chegava a afirmar
Mesmo aqueles que a concebem mais claramente �· 11 11u !.L'mpre e em todos os casos. a noção de esp írito é
u ma forma concreta e sensíve l , pe n sa m- na, ao m es 11 11 1 1 •••1t: . 1 cronologic.-amente posterior à de
mana e dela de­
t 1\ 1d.1, ele parecia até disposto a ad mitir que essa nocão
L'
tempo, como u m poder abstrato que só poc.lc ser definido
pela naLUreza de sua eficácia, como uma força que se dt·' 1t 1 1.1 .1s vezes se constituído de maneira independente e
l i " po rt anto, o pensamento religioso decorre de uma
dobra no espaço e que esrá, ao menos em parte, em cad.1
um de seus efeiLOs.
É o poder de produzir a chuva ou o vento, a colhl' 1 l . 1
l1q1l.1 l"ontei?. Por outro lado, concebia o mana como uma

o u a l u z d o d i a ; Zeus está e m cada uma das gotas de ch u


i •1 1 11 1ril'dacle i nerente às coisas, como um elemento de sua

va que caem, assim como Ceres em cada um dos fetXl'.'>


1 1 .11 m om ia , pois, segundo ele, se trataria s impl esm e n te e.lo
1 1 . 1 1t-· r que atribuímos a tudo o que vai além do orc.liná-
e.la col heita46. M u i tas vezes, incl us ive, essa eficácia é tao
im pe rfei �ame nte determinada que o crente só pode ll'I
1 11 1 , . 1 tudo o que nos inspira um sentimento de temor ou
il .1dmi rnçào�º. Era quase voltar à teo ria naturista5 1 .
uma noçao muito imprecisa dela. Foi essa imprecisão, aliás, P ou co tempo depo is, 1 Iu bert e Mauss, em p rcc nde n­
que tornou possíveis os sincretismos e desdobramentu' d1 1 l.1zcr uma teoria ge ra l e.la magia, estabeleciam que a
ao longo cios quais os deuses se fragmentaram, se de.� 1 1 1.1g1a inteira repousa na noç.<io de manas2. Dado o estrei-
mcmbraram, se confundiram de várias maneiras. Talvez 1 1 1 parentesco entre o rito mágico e o rito religioso, podia-
não haja religião em que o mana original, seja único ou prever que a mesma teoria devesse ser aplicável à reli-
plural, tenha se determinado inteiramente num número 1.tn. Foi o que sustentou Preuss numa série de artigos
bem definido de seres discretos e incomunicáveis entre si;
cada um del �s conserva se mpre uma espécie de auréola
1111hlicados em Glob11s53 no mesmo ano. Apoia ndo-se so­
l 1 ·tudo em focos comados das ci\ ilizações americanas.
.
de 1mpessoahsmo que o torna apto a entrar cm combina­ 1 · 1 �·uss empenhou -se cm demonstrar que as idéias de al-
?
ç cs novas, e isto não por causa de uma simples sobrevi­
_ ma P?r uc �st
111.1 e de espírito só se constituem depo is das de poder e
v;ncra, � � á na natureza das forç·as rel igiosas lt força impessoal, que as pri me iras não são mais que
nao poder md1v1dualtzar-se com pl eta men te . 1 1 1na tra ns fo rm ação das segundas e que conservam, até
Essa concepçào que o s imples estudo do rocemismo
nos s � ge riu , tem a seu fa vo r, alé m di sso, o fato de vá ri os
11ma época relativamente tardi a, a marca de sua impessoa­
lidade primeira. Ele mostrou , com efeito, que, mesmo cm
estuc�rosos t e re m s i d o recentemente co nd u z idos a ela 1 1· 1 igiõ es avança d a s, tais icléias são representadas sob a
atraves d e pesquisas muito diferentes e i nde pe n de n tes l 1 1rma ele vagos eflúvios q u e emanam au t omaticamente
umas das outras. Tende a se produzir sobre esse ponto 1 l.1 s coisas nas quais residem, q ue tendem inclusive a es­
uma concordância espontânea que merece ser assinalada' ' .1par por todas as vias que lhes são abertas: a boca , o na-
pois se rrata de urna conjcLUra
de objetividade. 1 1 z. todos os orifícios cio corpo, o hálito, o olh a r, a fala,
Desde 1899, mostrávamos a necessidade de não fazer 1 tc. Ao mesmo tempo, Preuss mostrnva tudo o que elas
entrar n� definição do fato religioso nenhuma noção de te m de proceiformes, a t.xtrema pl asti cida de que lhes per­
i:ers�)Oaltdade mítica17• Em 1 900, M a rreu assinalava a ex.is­ mite adaptar-se sucessivamente e quase simultaneamente
tencra de uma fase religiosa que ele ch a mava pré-animis- .1os empregos mais variados'>-•. É verdade que, se nos ati-
AS FORMAS ELE..lfENTARES DA VTDA REIJG'/O,\�t 1\ 1 /W\('..AS ELEMENTARE5
-..... - -.t.-. __,.. _ .,,J..._,
206
2ú7

véssemos à letra da terminologia


empregada por esse au 1 pt•cto leigo que interessa à história do pensamento cien-
tor, poderíamos pensar que essas
força s são para ele dt: 1 1 1 11 o. É a primeira forma da noção de força .
natur eza má gica , e não religi osa:
ele as cham a fei tiço:-. O waka n , com efeito, tem no mundo, t a l como o
(Zauber, Zauherkrajie). Mas é vis ível
que, ao expri mir-se , , 111ccbern os Sioux, o mesmo papel que as forças através
assim, ele não entende colocá-las
fora ela rel ig ião , pois é , 1 ,, quais a ciência expl ica os diversos fenômenos da na-
em riLos essencialmente rel igioso
s que as mosLra atuantes, 1 1 1 1 vza. Não que ele seja pensado sob a forma de urna
por exemplo, nas grandes cerimônias
mexicanass5. Se uti­ , 1wrgia exclusivamente física; veremos, ao contrário, no
liza tais expressões, é certamente
na falta de outras que , l ( lllulo seguinte, que os elementos que servem para f or-
marquem melhor a impessoal idade
dessas forças e a es­ 1 1 1 1 1 sua idéia são tomados dos reinos mais diferences.
pécie de mecanismo segundo o qual
elas operam. l.1� t:ssa natureza cornpósica lhe permite precisa mente
Assim, de todos os lados , a mesm
a idéia tende a se ., ., util iz::ido corno um princípio de explicação u niversal .
man ifestar56. Tem-se cada vez mab
a impress<lcJ de que as
1 dl'le que provém toda vida�9: "toda vida <.'.: wakan", e pe­
le 1 11.:rmo vicia eleve-se enten der tudo o que age e reage,
construções mito lógicas, mesmo
a s mais elementares, são
p rodut os secundários'7 e encobrem
um fundo de crenças 1 1 1do o que move ou é movido, tanto no reino mineral co­
- a o mesmo tempo mais sim ples
e mais obscuras, mais >111> no biol ógico . O wakan é a causa de todos os rnovi­
i m· ntos que se produzem no universo. Vimos do mesmo
vagas e mais essenciais - que const
ituem as bases sólida'
moela que o orenda dos Troq ueses é "a causa eficiente de
sobre as quais os sistemas religiosos
se edificaram. Foi es­
se fundo primitivo que nos perm
itiu fazer a anál ise do to­
temismo. Os vários aucores cujas
ti idos os fenóm enos e de rodas as atividades que se mani-
pesquisas acabamos de 1 1·sta rn ao redor do homem". Trata-se ele um poder " ine­
ll'nLe a todos os corpos, a todas as co isas " 60 . É o orenda
mencionar só chega ram a essa conce
pção através ele fatos
tomados de religiões muito diver
sas, algum as delas cor­ que faz que o vento sopre, que o Sol ilumine e a queça a
respondendo inclusive a uma civ
ilizaç;ào já bastante avan­ l'l'rra, que as plantas cresçam, que os animais se reprodu-
çada, por exemplo, as religiões do
México, muito utiliza­ 1.am, que o homem seja forte, hábil, inteligente. Quando
das por Preuss. Podia-se, portanto,
perguntar se a teoria , , iroqu ês diz que a vida da natureza imeira é o produto
se aplicava igualmente às religiões
mais simples. Mas, co­ dos conflitos que se esta belecem entre os orenda de in­
mo não se pode descer mais abaix
o do totemismo, nào t l·ns idade desigual cios diferentes seres, ele não faz senão
nos expusem os a esse risco de erro
e, ao mesmo tempo, 1·xprimir em sua linguagem a idéia moderna de que o
ternos chan ces de have r enco ntrad
o a noçã o inicia l d a
qual derivaram as icléias de waka
1 11 u nc.lo é um sistema de fo rças que se limitam, se con têm
n e ele mana: é a noção v se equilibram.
O
do princípio totêrnicosa
. rnelanésio atribui ao mana o mesm o tipo de eficá­
' 1a. É graças a seu mana que um homem é bem-suced ido
11a caça ou na guerra, que suas plantações têm um bom
TV 1 l'ndimento, que seus rebanhos prosperam. Se a flecha
11i nge seu alvo, é que es tá ca rregada ele mana; a mesma
Mas essa noção n à o é a penas de uma i mportâ n ci a
razão faz que urna redt. pegue muitos peixes, que u ma
primordial, por causa do papel que desempenhou no de­
canoa na vegue bem61, etc. É verdade que, se tomássemos
senvolvimento das idéias religiosas: possui ta mbém um
:ao pé da letra certas expressões de Coclrington, o mana
208 AS FORMAS HLElfENFARES DA l1
D A RELIGJt J\A

\1' 1Tl1.0 VII


seria a causa a que se refere espe
cialmente "tudo o qu
tudo o que está fora do
1
ultrapassa o poder do home m,
anda ment o norm al da natu reza" > R I GENS DESSAS CRENÇAS
r /l11a/)
62. Mas, dos exem plo�
mesmos que ele cita, resu l ta que
a esfera do mana é bt•m
mais exLensa. Em realidade, ele
serve para explicar feno
menos usuais e correnLes; não há
nada de sobre-humano
nem ele sobrenaLural em um barco
navegar, em um caça
dor pegar a caça, eLc. Só que, entre
esses acontecimen1m
ela vicia diária, há algun s tão insig
nificantes e famil iart·,
que passam despercebidos, não
reparamos neles e, por
de explicá-los. O concl'I
tanto, não sentimos necessidade

Lêm suficienLt: imprn


to ele mana só se aplica àqueles que
tância para aLrair a reflex ão, para
despertar um mínim o dt·
in teresse e curio sidad e; mas eles
não são mara vilhoso�
por esse motivo. E o que é verda
de para o mana , como
para o orenda e o waka n, pode
111 Gênese da noção de princípio ou mana totêmico
igual ment e ser dito dll
se mantém a vida do�
princípio totêmico. É por ele que _

mem bros do clã, dos anim ais ou


das plamas da espécit·
totêmica, assim como de rodas as A proposição estabelecida no capítulo precedente
o totem e que pan icipam ele sua
coisas classificadas sob
nat ureza. , ktcrmina os tennos nos quais eleve se colocar o proble-
A noção de força é, pois, de orige
m religiosa. Foi da �
1 1 1 :1 das origens do totemismo. Já que o tot�m si:io é do-
religião que a filosofia, prim eiro,
e depois as ciênc ias, a 1 1 1inado inteiramente pela noção de u m pnnc1p10 quas�
tomaram emprestad a. É o que já havia d1,·ino imanente a certas categorias de homens e de co1-
pressentido Comre,
por isso ele fazia da meta física
a herdeira da "teologia". �
1s e ensado sob uma forma animal ou vegetal, explicar
Só que ele concluía daí que a idéia _ sa­
1·ssa religião é essenciaJrnente explicar essa crença; e
de força está destina
da a desaparecer da ciênc ia, pois, hl'r como os homens puderam ser levados a consLruir tal
em razão de suas ori­
gens mític as, recus ava-l he todo 1déia e com que materiais a construíram.
valor obje tivo. Iremos
mosLrar, ao contr ário, q u e as força
por mais imperfeiLos que possa
s religiosas são reais,
m ser os símbolos com ;1
ajuda dos quais foram pensadas.
E veremos que o mesmo
se dá com o conceito de força em
geral .
ManifestamenLe, isso não se deve às sensações que
1 � coisas que serviam de totens podiam clesp � rt� r � as
t>nsciências; mostramos que elas são em geral ms1gnifi-
1 .unes. O lagarto, a lagarta, o rato, a fonniga, a ra, o peru,
i

,1 carpa, a ameixeira, a cacaLua, etc., para citar apenas no-


1 m:s que ocorrem com freqüência nas l istas de totens aus-
AS FORMAS ELE.l1ENTARES DA l 7DA RELIC/0.1. 1 .S �11
210 1\ r · ÇASELEMENTARF
NlV

ade fossem
Lraliano.s, não são capazes de produzir no homem essa' 1 1 quase divindade, se o grupo e . a divind _
grandes e fortes impressões que por algum aspecto se as des clisrint as? Por conseguinte , o deus do ela, o
d1 1,1, reaJida
semelhem às emoções re l ig iosas e de imprimir nos obje 1 11 1 1 1npio rotêm ico, só pode ser o própr
io clã, mas hiposrn-
s sob as apare nc1as
ros que as suscitam um caráter sagrado. Claro que o mcs 1 . i d o e representad o às imagi naçõe
serve de totem.
mo não vale para os astros, para os grandes fenômenos , 1 1s1veis do vegetal ou do anima l que
ose e por que ela
atmosféricos que, ao contrário, têm tudo para impressio Mas como foi possível essa apote
nar as imaginações; mas ocorre justamente que só em cir­ , , uTcu desse modo ?
cunstâncias muito excepcionais eles servem de totens; :
(
provável inclusive que tenham sido chamados a cumprir
esse ofício apenas tardiamente'. Portanto, não era a natu li
reza intrínseca da coisa cujo nome o clã trazia que a de­
a de que uma
::>ignava a ser objeto de um culto. Aliás, se os senlimentos D<:: uma mane ira ge ra l , não há dúvid
que ela i nspira fossem rea lmente a causa determinante tem tudo o que é precis o para desperrar nos
'incicdade
sobre eles, a sen-
dos ritos e das crenças rotêmicas, essa coisa seria também , .piriros, pela simples ação que exerce
I\ ,10 do divino; pois
o ser sagrado por excelência; os animais ou as plantas ela é para seus memb ros o que um

d1·us é para Com efeiro , um deus é antes de cu­

d11 um ser que o homem concebe,


empregados como totens é que desempenhariam o papel seus fiéis.
eminente na vida religiosa. Ora, sabemos que o centro do sob certos aspectos ,

, orno superior a si
culto encontra-se noutra parte. São as representações fi­ mesm o e do q u a l acred ira depender.

t,h1er
gurativas dessa planta ou desse animal, sào os diversos se trate de u m a perso nalida de consc renre, como
s abstra tas, como aquel as
emblemas e símbolos totêmicos que possuem o máximo f.l·u s ou Jeová, quer de força
ri: s os ca�os,
l H >Stas em ação
de santidade; é neles , portanto, q u e está a fonte da reli­ no totem ismo' o fiel, e ambo
. _
giosidade, e os objetos reais que esses emblemas repre­ crê obriga do a certas manet ras de agrr que lhe sao rm­
,(
i •o stas pela natureza do princípio sagra
sentam não recebem senão um reflexo dela_ do com o qual se

• 1· ntc em canta
Assim, o totem é antes de tudo um símbolo, a ex­ ta. Ora, ramb ém a socie dade provoca em

nos a sensação de uma perpétua depe


pressão material de alguma ouLra coisai. Mas ele quê? ndênc ia. Por rer

1 1 1na natureza que Lhe


Da análise mesma a que procedemos, resulta que ele é própr ia, difere nte da nossa natu-
exprime dois tipos de coisas diferentes. De um lado, é a indiví duo, ela perse gue fins que lhe são igua l-
11·za de

1111.· me específicos , mas, como


forma exterior e sensível claquiJo que chamamos de princí­ nào pode atingi -los, a não
pio ou deus totêmico. Mas, por ourro l ado, é também o de nós, reclam a imper iosam ente nossa
-.n por intermédio
símbolo dessa sociedade determinada que é o clã . O to­ ção. Exige que, esque cidos de nossos mte:esses,
co labora
ete-nos a todo tipo de
tem é sua bandeira, o sinal pelo qual cada clã se distingue t.1nimo-nos seus servidores e subm
dos demais, a marca visível de sua personalidade, marca 1ho rrecimentos , privaç ões e sacrifí cios, sem os quais a vi­
d.1 social seria impossível. É assim que
que se estende a tudo que faz parte do clã de uma manei­ a todo instante so-
ra ou outra, homens, animais e coisas. Portanto, se ele é, 11105 ob ri gad os a sujeit ar-no s a regras
de condu ta e e ?
ao mesmo tempo, súnbolo do deus e da sociedade, não é que não f:zem os nem quise mos, e que, m­
pensamento
nossa s i cl in a ções e a
que o deus e a sociedade são uma coisa só? De que ma­ dusiv e, são às vezes contrárias a
n

fund ame ntais .


neira o emblema do grupo poderia ter se tornado a figura nossos instintos mais
TARFS DA VIDA REllGIO.\. 1 1\ CRENÇAS ELEMEl\TARES 21:)
212 AS FORMAS E
LEMEJ\

Tod avia, se a sociedade obtivesse de nós essas con


i-so mesmo, com o sinal distintivo que provoca o respei­
ccssões e esses sacrifícios apenas por uma coerção mate·
I! >. Como elas são elaboradas em comum, a vivacidade
rial, ela não poderia despertar em nós mais que a idéia dl·
, < >m que são pensadas por cada espirita particular reper­
uma força física à qual devemos ceder por necessidade,
' ute em todos os outros e reciprocamente. As represema­
não de uma potência moral como aquelas que as religiões
adoram. Mas, cm realidade, o domínio que ela exerce so­
\·oes que as exprimem em cada um ele n �� tê�, portanto,
1 1 1na intensidade que os estados ele consc1enc1a puramcn­
l l ' privados não poderiam alingir, pois elas têm a f? rça
bre as consciências eleve-se bem menos à supremacia físi­
ca cujo privilégio detém, do que à autoridade moral de
d.1s inu meráveis representações individuais que serviram
que é investida. Se acatamos suas ordens, não é simples­
para formar cada uma delas. É a sociedade que fala pela
mente porque está armada de maneira a triunfar de nos­
l >oca daqueles que as afirmam em nossa presença; e ela
que ouvimos ao ouvi-los, e a voz de tod�s t�m um accn-
sa::. resistências; é antes de tudo por ser o objeto ele um
verdadeiro respcilo.
10 que a de um só não poderia Ler3. A v1olencia mesma
Diz-se de um sujeito, individual ou coletivo, que ele
l'Om que a sociedade reage, por meio da censura ou da re­
inspira respeito quando a representação que o exprime nas
consciências é dotada de tal força que, auLomaticamente,

pressão material, conLra as Lentativas de dis�id ncia, mani­
h:stando com estrépito o ardor da conv1cçao comum,
suscita ou inibe atos, sem levar em conta qualquer conside­
ração relativa aos (!feitos úteis ou prejudiciais desses atos.
nrntribui para reforçar seu domínio1. Em uma palavra,

Quando obedecemos a uma pessoa em razão ela autorida­


quando uma coisa é objeto ele um estado da opinião, a
representação que cada indivíduo faz dela extrai ele suas
de moral que lhe reconhecemos, seguimos seus conselhos,
origens, das condições nas quais ela se formou, um i::oder
não porque nos pareçam sensatos, mas porque é imanente
de ação que é sentido mesmo por aqueles que nao se
à idéia que fazemos dessa pessoa uma energia psíquica de
-,ubmelem a ela. Essa representação tende a rechaçar, a
um certo tipo, que dobra nossa vontade e a inclina no sen­
111amcr à distância as que a contradizem; ela ordena, ao
n mtrário, atos que a realizem, e isto não por uma coerção
tido indicado. O respeito é a emoção que experimentamos
�uando sentimos essa pressão interior e inteiramente espi­ material ou pela perspectiva de uma coerção desse gêne­
mas pela simples irradiação ela energia me � tal nela
ntual produzir-se em nós. O que nos determina, enlào, não
JO,
são as vantagens ou os inconvenientes da atitude que nos
contida. Ela possui uma eficácia que se deve unicamente
é prescrita ou recomendada, mas a maneira pela qual nos
�5Le
.1 suas propriedades psíquicas, e é precisamente por
representamos aquele que nos recomenda ou prescreve tal _ �
atitude. Eis por que o mandamento se exprime geralmente
sinal que se reconhece a autoridade moral. A opm1ao,
coisa social por excelência, é portanto uma fonte de auto­
em formas breves, categóricas, que não dão margem à he­
ridade, e pode-se mesmo perguntar se Locla autoridade
sitação: na medida em que é um mandamento e age por
n<lo é filha da opinião5. Objetar-se-á que a ciência é com
suas próprias forças, ele exdui toda idéia de deliberação e
freqüência antagonista da opinião, cujos erros combate e
de cálculo e deve sua eficácia à intensidade cio estado .
meneai no qual é dado. É essa intensidade que constitui o
retifica. Mas a ciência só pode ter êxito nessa tarefa se ti­
ver sufici enle auloriclade e não pode obter essa autorida­
de a não ser da própria opinião. Se um povo não tiver íé
que chamamos de ascendente moral.
Ora, as maneiras de agir que a sociedade tem o maior
na ciência, nenhuma demonstração científica terá influên­
cia sobre os espíritos. Mesmo hoje, se a ciência vier a re-
interesse em impor a seus membros estão marcadas, por
2 14 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGJO.\lt I \ 1,'NENÇAS ELEMENTARES 215

sistir a uma corrente muito forte da opinião pública ' cor . • 11 > de uma assembléia que uma paixão comum inflama,
rerá o risco de perder seu crédito6. I• 11 11<1mo-nos suscetíveis de sentimentos e atos de que sería-
Uma vez que é por vias mentais que a pressão social 1 1 1ns incapazes quando reduzidos a nossas sm i ples forças;
se exerce, ela não podia deixar de dar ao homem a idéia " quando a assembléia é dissolvida, quando, novamente
de que existe fora dele uma ou várias forças, morais e ao .11�. recaímos em nosso nível ordinário, podemos avaliar
mesmo tempo eficazes, das quais depende. Essas força:-, 1 1 1 1 :10 a altura a que fôramos elevados acima ele nós mes-
1 1 1os. A história está cheia de exemplos desse tipo. Basta
1 H'nsar na noite de 4 de agosto [de 1789], em que uma as­
ele devia concebê-las, em parte, como exteriores a ele, j:i
que lhe falam num tom de comando, inclusive ordenan
cio-lhe às vezes a praticar violência contra suas inclinaçõe:-, ,, 111hléia foi de repente levada a um ato ele sacrifício e ab-
mais naturais. Certamente, se ele pudesse ver imediata 1 wgação ao qual cada um de seus membros se recusava na
1 1 .pera e do qual todos se surpreenderam no dia seguin­

'' 1 � ( por essa razão que todos os partidos, políticos, eco-


mente que essas influências que sofre emanam da sacie
dade, o sistema das interpretações mitológicas não teria
nascido. Mas a ação social segue caminhos muito indirc 1111111icos, confessionais, preocupam-se em realizar periocli­
' 1 1 11cnte reuniões em que seus adeptos possam renovar
tos e obscuros, emprega mecanismos psíquicos comple­
. 1 1 . 1 fé manifestando-a em comum. Para revigorar senti-
xos demais para que o observador Vlllgar possa perceber
1 1 11 · n tos que, entregues a si própr.ios, se estiolariam, basta
de onde e l a vem. Enquanto a análise científica não vier
1 1 ,1 proximar e pôr em contato mais íntimo e mais ativo
ensinar-lhe isto, ele perceberá que é agido, mas não por
1' 11 1l'les que os experimentam. Eis também o que explica a
quem é ':gido. Assim, é obrigado a construir peça por pe
1 1 11 11de tão particular do homem que fala a uma multidão,
ça a noçao dessas forças com as quais se sente em conta­
,, , .10 menos, chegou a entrar em comunhão com ela. Sua
to, e por aí já se pode entrever ele que maneira foi levado
l11 1guagem tem uma espécie de grancliloqüência que seria
a concebê-las sob formas que lhes são estranhas e a trans­
1 1dwula nas circunstâncias ordinárias; seus gestos têm algo
. i, dominador; seu pensamento mesmo é impaciente com
figurá-las pelo pensamento.

1 111oderação e deixa-se levar facilmente a todo tipo ele


Mas um deus não é apenas uma autoridade ela qual 1 ,1gcros. É que ele sente dentro ele si como que uma pie­
dependemos; é também uma força sobre a qual se apóia
" > 1 , 1 .i.normal de forças que transbordam e tendem a se es­
nossa força. O homem que obedeceu a seu deus e que, l '· t l ll a r ao redor; às vezes, inclusive, dá a impressão de ser
por essa razão, acredita tê-lo consigo, aborda o mundo , h 1 1 1 1 i nado por uma força moral que o ultrapassa e ela qual
com confiança e com o sentimento de uma energia acresci­ 1 .qwnas o intérprete. É nesse traço que se reconhece o
da. Do mesmo modo, a ação social não se limita a reclamar • 1 1 w seguidamente fo.i chamado de clemônio da inspiração
de nós sacrifícios, privações e esforços. Pois a força coleti­ 1 1 1 , 1 1 oria. Ora, esse acréscimo excepcional de forças é mui-
va não nos é inteiramente exterior, não nos move apenai; 1• • 1 1•:i l : vem-lhe do grupo mesmo ao qual se dirige. Os
de fora; como a sociedade não pode existir senão nas 1 1 1 i 1 11cntos que ele provoca com sua fala retornam para
consciências individuais e por elas?, é preciso que ela pe­ • li , 111as acrescidos, amplificados, e reforçam ainda mais
netre e se organize em nós; torna-se, assim, pa1te integran­ , 1 1 .�e ntimento próprio. As energias passionais que ele de­
te de nosso ser e, por isso mesmo, eleva-o e o faz crescer. ,, 1 1 1 . 1 deia repercutem nel<" e fazem aumentar seu tom vi-
Há circunstâncias em que essa ação reconfortante e 1 ti N:10 é mais um simples indivíduo que fala, é um grupo
vivificadora da sociedade é pa1ticularmente manifesta. No • 1 11 . 1 1 nado e personificado.
216 AS FORMAS ELEl!ENTARES DA l'lDA REJJGJCJ\ 1 I \ <.RE/\'ÇAS EJJ':.MENTARES
217

terá mais
Além desses estados passageiros ou intermirentes. lt.1 l1.1rmon ia moral com seus compa nheiros , e l e
como o
outros mais dur5veis em que essa influência Lonificante d.1 , nnfiança, coragem, ousadia na ação, exatamente
olhar de seu deus voltado com bene­
sociedade se faz sentir com mais continuidade e muita� l w l que crê sentir o
sus-
vezes até com mais impacLo. Há períodos his Lóricos e111 volência para ele. Produz-se, assim, como que uma
que, sob a influência de uma grande comoção col et iva a� , 11·n1ação perpétua de nosso ser mora l . Como ela
varia con­
res,
interações sociais Lomam-se bem mais freqüentes e ativa!> lmme grande quantid ade de circuns tâncias exterio
que nos
Os indivíduos se procuram, se reúnem mais. Disso resulta rnnforme nossas relações com os grupos sociais
que são
uma efervescência geral, característica das épocas revolu , l'rcam sejam mais ou menos ativas, conforme o
s deixar de senlir que esse vigor

111oral depende ele uma causa exLcrna: mas não


cionárias ou criativas. Ora, essa superaLividade tem por 1 ·sses grupos , não podemo
efeito uma estimulação geral das forças individuais. Vive percebe-
se mais e de outra forma do que em tempos normais. A� 111os onde está essa causa nem o que ela é.
Assim, conce­
mudanças não são apenas de nuanças e de graus; o ho ' " mo-la correntemente sob a forma de uma força moral
, 1uc, embora nos sendo imanente, representa em
mem torna-se outro. As paixões que o agitam são de tal nós algo
intensidade que não podem se satisfazer senão por atos 1 na is que nós: é a consciê ncia moral da qual, aliás, o ho-
violentos, desmesurados: atos ele heroísmo sobre-humano 1 11em comum jamais fez uma representação um pouco clis­
ou ele barbárie sanguinária. É o que explica, por exempl<> lulla, a não ser com a ajuda de símbolos religiosos.
mo­
as Cruzadas9 e Lamas cenas, sublimes ou selvagens, da Além dessas forças em estado livre que a todo
estão fixa­
Revolução Francesa'º · Sob a influência da exaltação gera l, mcnLO vêm renovar as nossas, hã aquelas que
d.1s nas técnicas e tradições de todo tipo que util
vemos o burguês mais medíocre ou mais inofensivo trans­ izamos.
formar-se ou em heró i , ou em carrasco • 1 . E todos esses uma língua que nã o fomos nós que fizemos ; ser­
Falamos
os
processos mentais são tão claramente os que estão na raiz ' uno-nos de instrumentos que não inventamos; invocam
da religião, que os próprios indivíduos com freqüência re os; a cada geração é transmi tido
lircitos que não instituím
presentaram sob uma forma expressamente religiosa a 1 1 111 tesouro de conhecimentos que não foi ela
que acumu­

lm1, etc. É à sociedade que deve mos esses bens


p ressão à qual cediam assim. Os cruzados acred itav a m variados
sentir Deus presente no meio deles e ordenando-lhes par­ d.1 civilização, e se, em geral, não vemos de que fonte os
nossa.
tir à conquista da Terra Santa; Joana d'Arc acreditava obe­ , ihLivemos, sabemos pelo menos que não são obra
e >ra, são eles que dão ao homem sua fisionomia
decer a vozes celcstesrz. pessoal
por­
Mas não é somente nessas c i rcunstâncias excepcio­ 1•ntre roclos os seres, pois o homem só é um homem
que é civilizado. Portanto, não pod ia deixar ele se
nais que a ação estimulante ela sociedade se faz sentir; não ntir que
em os
há, por assim dizer, um instante de nossa vida no qual al­ 1·xistem fora dele causas atuantes ele que proced
gum afluxo de energia não nos venha de fora. O homem característicos de sua naturez a e como que pode-
11 11butos
m e que
que cumpre seu dever encontra, nas manifestações de to­ 1vs benevolentes que o assistem, que o protege
poderes
do t i po pelas quais se exprimem a simpatia, a estima, a lhe asseguram um destino privilegiado. E a esses
afeição que seus semelhantes têm por ele, uma impressão 1•k• devia necessa riamente conced er uma d i g n idade com­
13.
ele reconforto, da qual mu itas vezes não se dá conta, mas patível com o alto valor Jos bens que lhes atribuía
que o sustenta. O sentimento que a sociedade tem dele real­ Assim, o meio no qual vivemos nos aparece povoado
ça o sentimento que ele tem de si mesmo. Por esLar em d1· forças ao mesmo tempo imperiosas e de amparo, au-
. ---· ________,...., ,,....,

218 A� FORMAS ELEAl.&\TARES f)A VIDA REIJ<.J1 1 t 1 /(/ \( 1.\ ELEMHNTARES 219

gustas e hcnfazejas, com as quais estamos cm contai<,


1 1 1 homens inveslidos de altas funções sociais inspi-
q u e elas exercem :>obre nós uma pressão de que tl'1t11 1� 1 1 1 1 1 11.10 é de natureza diferente do respeito religioso. Ela
a
consciência, necessitamos localizá-la s fora de nós, cor 1 11 , 1 1 11l11z pelos mesmos movimentos: gwirda-sc distânci
1 1 1 11 l.1çào a uma alta personalidade; ela só é abordad
fazemos em relação às causas objetivas de nossas se11,,1 a
çõcs. Mas, por outro lado, os semimem os que elas 11, ," 1 1 11 p r ecauções; para convers ar com ela em pregam -se
inspiram diferem em natureza dos que temos para com " •1 1 1 1 li nguagem e outros gestos, diferentes daquele
s des-
simples coisas sensíveis. Enquanto estas se reduzem .1
·
l 1 1 1 1 l 1 1s ao mortal comum . O sentimento experimentado
seus caracteres empíricos tais como se manifestam na ( ' \ . , "·'" circunstâncias é tão próximo do sentimento religio­
• 1 p w muitos povos os confundiram. Para explicar a
pe riência vulgar, e nqua nto a imaginaçã o religiosa 11;11 1 con­
, , i , 1 . 1 ( ,10 de que gozam os príncipes, os nobres, os
. _
veio metamorfosca-las, nada sentimos por elas que se '" chc-
semelhe ao respeito e elas nào possuem nada capaz d1· 1 1 pt>hticos, auibuiu- se-lhes um caráter sagrado. Na Me-
1 1 1,, 1.1 t.: na Polinésia, por exemplo, diz-se ck um
nos de:ar acima de nós mesmos. As representações qu1 homem
as expnmem nos aparecem, porcanto, como muico difl· 1 1 i l l t 1(·nte que ele tem mana, e é a esse m;ma que atribuem
11 , 1nlluência 1 1. É claro, porém, que sua situação se
re ntes daquelas que as influências coletivas despertam cm deve
1 1 1 1 1 1 . 1 1 ne nte à importância que lhe dá a opinião. Mas isso
_
nos. Tanto umas quanto as outras formam c m nossa cons
1 1 11que o poder moral conferido pela
ciência dois círculos de estados mentais, distintos e sepa opinfao e aquele de
rndos, como as duas formas de vida a que correspondem. 1 11 1 1 · sao investidos os seres sagrados têm, no fundo, u!na
E o
Em conseqüê ncia, temos a impressão de estarmos cm 1 1 1 1 �ma origem e são feitos dos mesmos elemen tos.
conta �o com duas espécies de realidades distintas, qut• 1 1111 l'Xplica que uma mesma palavra possa servir parn dc-
uma linha de demarcação claramente traçada separa uma 11111.lf a ambos.
da outra: o mundo das coisas profanas, de um lado, e o Da mesma forma que homens, a sociedade consagra
-
das coisas sagradas, de outro. , 11sas, em particul ar idéias. Se uma crença for unanime
De resto, tanto no presente como na história, vemos 11w1He partilhada por um povo, será proibido, pelas razões
f l ll' expusemos mais acima, tocar nela, isto é, negá-la
a sociedade incessamemente criar de todas as maneiras ou
coisas sagradas. Se ela vier a se apaixona r por um ho­ u 1111 está-La. Ora, a interdiç ão da crítica é uma interdição
mem, se acreditar descobrir nele as principais aspirações , 1 11110 as outras e prova que estamos diante de algo sagm­
' li 1. Mesmo hoje, por maior que seja a liberdade que
que a agitam, assim como os meios de satisfazê-las esse con­
h ?�em será posto numa categoria à pane e como q e di­ � ' 1·demos uns aos outros, u m homem que negasse total-
vrnr.zado . Ele será i 12 vestido pela opinião de uma majesta­ 1 1 1 l'l1le o progresso, que achincall1asse o ideal humano
a
de rnteirame nte analoga à que protege os deuses. Foi 0 1 1 1 1 1.· as sociedades modern as se devotam , daria a impres-
que aconteceu com tantos soberanos, em quem sua épo­ de um sacrílego. Há, pelo menos, um princípio que os
1 o\os mais apaixonados pelo livre-exame tendem a colo­
10
ca depositava fé: se não eram transformados em deuses,
pelo menos eram vistos como representantes diretos e.la ' 11 acima da discussão e a considerar como intangível,
isto
divindade. E o que mostra bem que a sociedade é a única , . como sagrado: o princípio mesmo do livre-exame.
autora desse tipo de apoteose, é que seguidamente suce­ Essa aptidão da so-.:iedade a erigir-se em deus ou a
deu-lhe consagrar homens que, por seu mérito próprio, 1 1 iar deuses não foi em pane alguma mais visível que
du­
mo-
nenhum direito tinham a isso. Aliás, a simples deferência r.111te os primeiros anos da Revoluçào Francesa. Nesse
220 I \ r.RF�ÇAS El.EMENTARFS
22 1
AS FORMAS ELEME.\TA Rfil DA VlDA Rt.L/GlOH

mento, com efcico, soh a influência do entusiasmo gernl m


coisas pur,11nente leigas por natureza foram tr.insformatlis
a-
pela opinião pública em coisas sagradas: a Pátria, a Liber A v ida elas sociedades australianas passa alcernad
1 • Ora a popula ção está
dade, a Razào15• Uma religião com seus dogmas•6, seu� 1 1 1ente por duas fases diferentes2
, ­
símbolos 17, seus alcares 111 e suas festasl9 cendeu espanta dispersa cm pequenos grupos que se ocupam indepen
família
neamente a se estabelecer. Foi a essas aspirações espon clvntemente uns dos outros, de suas tarefas; cada
o, enfim,
tâneas que o culto da Razão e do Ser supremo procurou 1 1ve então ã parte, caçando, pescando, tentand
1 1hter o alimento indispen sável por todos os meios clispo-
dar uma espécie de satisfação oficial. Essa renovação reli
ra e se
giosa teve, é verdade, apenas uma duração efêmera 111veis. Ora, ao contrário, a população se concent
Acontece que o próprio enn1siasmo patriótico que, na ori 1 nndensa. por um tempo que
varia de vários dias a vários
gcm, empolgava as massas foi se debilicandolO. Desapare meses. em pontos determi nados. Essa concentração ocor­
• l quando um clã ou urna parte da tnboll são convoca
dos
ccndo a causa, o efeito não podia se mantt.:r. Mas .i expe
éias, celebran do-se nessa ocasião uma
riência, por ter sido curta, conserva todo o seu interesse 1 m suas assembl

1 erimônia religiosa ou realizando-se o que


é chamado, na
sociológico. O foco é que vimos, num caso determinado,
um con-ob ori23.
a sociedade e suas idéias essenciais se tornarem, direta­ lmguagem usual da etnografia,
mente e sem transfiguração de nenhuma espécie, objeto Ess�1s duas fases contrastam uma com a outra da ma­
ica é
de um verdadeiro culto. neira m ais nítida. Na primeira , a atividad e econôm
geral uma fase de intensida de
Todos esses fatos já permitem entrever de que ma­ preponde rante, sendo cm
A coleta de grãos ou de e1vas necessár ios à ali­
neira o clã é capaz de despertar entre seus membros a medíocre.
idéia de que existem fora deles forças que os dominam e. mentação, a caça ou a pesca não são ocupações capazes
disper­
ao mesmo cempo, os suscentam, isto é, cm suma, forças de despertar paixões muito fortesi.1. O estado de
que se encontra então a sociedad e acaba por cor­
religiosas: é que não há outra sociedade a que o primitiH> "ªº em
Mas, quan­
esceja mais direta e mais mumamente ligado. Seus víncu­ nar a vida uniforme, desinteressante e opaca2>.
faculda­
los com a tribo são mais frouxos e menos sentidos. Embo­ do acontece um corrobori, tudo muda. Como as
ra ela certamente não lhe seja estranha, é com as pessoas tivas e passiona is do primitivo só se submete m
des emo
à sua vontade , ele perde
de seu clã que o primitivo tem mais coisas em comum· é imperfeitamente à sua razão e
� lacilmcnte o autocontrole. U m acontecimento de
alguma
1 1nportânc:ia coloca-o ele imediato fora de si. Recebe uma
a ação desse gnipo que ele percebe mais imediatamen c;
portanto é também esta ação, preferencialmente a qual­
quer outra, que devia se exprimir em símbolos religiosos. notícia feliz? São transportes de entusiasmo. No caso con­
doido,
Mas essa primeira explicação é demasiado geral, pois t rário, vemo-lo correr para cá e para lá como um
gri­
se aplica indiferentemente a coda espécie de sociedade e, l'ntregar-se a Lodo tipo de movimentos desordenados,
e lançá-la em todas as direçõe s,
por conseguinte, de religião. Busquemos, pois, precisar t.tr, urrar. juntar a poeim
morder- !>l' , brandir suas armas com ar furioso, etc.z6 Om,
que forma particular essa ação coletiva assume no clã e
ex­
de que maneira suscita nele a sensação do sagrado. Afi­ o simpl� lato da aglomeração age como um excitante
l epcion:tlmence podero� u. Uma vez reunidos os indiví­
nal, em nenhuma outra parte ela é maL<; facilmente obser­
ade
vável nem mais visível em seus resultados. duos, su.1 aproximação libera uma espécie de eletricid
inário
que os transporta rapidamente a um grau extraord
222 AS FO!?MAS ELF!.MENTA!?IJS DA VIDA REL!G/O.\ 1 11 O@VÇAS ELEMEN7'A!?ES 223

de exaltação. Cada sentimento exrresso vem repercu ti! 111e a luz das fogueiras penetra aqui e ali, conceberemos
sem resistência, em todas essas consciências largarnent < ' l.1cilmente o efeito que devem produzir semelhantes ce-
abertas às impressões exteriores: cada uma delas ecoa a�. 1 1as sobre o espírito ele todos os seus participantes. Essas
outras e reciprocam ente. O impulso inicial vai assim s< · t l'nas determinam uma superexcitação tão violenta ela vi­
amplificando à medida que repercute, como uma avalan da física e mental, que esta não pode ser suportada por
che aumenta à medida que avança. E corno paixões tão lllUito tempo: o ator que detém o papel principal acaba
intensas e tão liberadas ele todo controle não podem dei por cair exausto no d1ão2s .
xar ele se extravasar, o que se vê, de todos os lados, são Eis, em acréscimo, para ilustrar e precisar esse qua­
gestos violentos, gritos, verdadeiros urros, ruídos ensurdc dro necessariamente esquemático, o relato de algumas ce­
cedores, que contribuem rara intensificar ainda mais o es nas que tomamos emprestadas ele Spencer e Gillen.
taclo que manifestam . É claro que, como um sentimento Uma das solenidades religiosas mais imporrames en­
coletivo só pode se exprimir se observar uma certa ordem tre os Warramunga é a que concerne à serpente Wollun­
que permita a coordenação e os movimentos ele conjunto, qua. Trata-se ele uma série de cerimônias que se desen­
esses gestos e esses gritos tendem naturalmente a ritmar­ volvem por vários dias. No quarto dia, tem lugar a que
se e a regularizar-se; daí, os cantos e as danças. Mas, ao vamos descrever.
tomarem uma forma mais regular, eles nada perdem de De acordo com o cerimonial praticado pelos Warra­
sua violência natural: o tumulto regulado rermanece tu­ munga, representantes elas duas fratrias dela participam,
multo. A própria voz humana é insuficiente nessas ocasiões. uns na qualidade ele oficiantes, outros como preparadores
Sua ação é reforçada por rrocedimentos artificiais: batem­ e assistentes. Apenas os membros da fratria Uluuru estão
se os bumerangu es uns contra os outros · fazem-se girar qualificados para celebrar o rito, mas são os da fratria Kin­
os hull-roa rers. É provável que esses ins rumentos, cujo
; gilll que devem ornamentar os atores, preparar o local, os
emprego é tão generalizad o nas cerimônias religiosas da instrumentos e desempenhar o papel da assistência. São
Austrália, tenham se1vido, antes ele tudo, para traduzir de também encarregados ele fazer previamente, com areia
maneira mais adequada a agitação experimentada. Mas, molhada, uma espécie de montículo sobre o qual é exe­
ao mesmo tempo que a traduzem, eles a reforçam . A efer­ cutado um desenho, feito de penugem vermelha, que re­
vescência chega muitas vezes a rrovocar atos inusitados. presenta a serpente Wollunqua. A cerimônia propriamen­
As paixões desencadeadas são de tal impetuosidade que te dita, à qual Spencer e Gillen assisliram, só começou de­
não se deixam conter por nada. As pessoas se sentem fora pois de anoitecer. Por volta ele dez ou onze ela noite, os
elas condições ordinárias da vida e têm tanta consciência Uluuru e os Kingilli chegaram ao local; sentaram-se no
disso que experimentam como que uma necessidade ele montículo e puseram-se a cantar. Todos estavam num es­
colocar-se fora e acima da moral ordinária . Os sexos se tado ele evidente superexcitação (euery one was evidentlr
juntam contrariamente às regras que presidem ao comér­ uery excited) . Um pouco mais tarde, os Uluuru trouxeram
cio sexual. Os homens trocam suas mulheres. Às vezes suas mulheres e as emregaram aos Kingilli29, que tiveram
até uniões incestuosas, que em tempos normais são julga­ relações com elas. A seguir foram chamados jovens re­
das abomináveis e severamente condenadas, se realizam cém-iniciados, aos qua;s toda a cerimônia foi explicada
ostensiva e impunemen te27. Se acrescentarmos que tais em detalhe, e até as três ela madrugada os cantos prosse­
cerimônias ocorrem geralmente à noite, em meio às trevas guiram sem interrupção. Aconteceu, então, uma cena de
224 AS FORMAS ELEMEIVTARES DA VIDA RELIGl<J.\. I 1\ 1 /U:YÇAS ELEMENTARES 225

um frencsi verdadeiramente selvagem (a scene of the u·i/ A f111 11<1ça, as tochas ílamcjantes, essa chuva de fagulhas,
dest excilement). Enquanto as fogueiras, acesas de todos , '" amontoado de homens dançando e urrando, tudo is-
os lados, faziam sobressair violentamente a brancura do' 1, dizem Spencer e G illen, formava uma cena de uma sei­
eucalipLos no fundo das trevas em volta, os Uluuru se ajoc.: \ 1�l ria impossível de descrever com palavras."3
1
lharam uns aLrás dos outros ao lado do tümulo da serpen Concebe-se sem dificuldade que, chegado a esse es-
Le; depois, levantando-se todos de uma só vez, com a), 1 . 11 lo de exaltação, o homem não mais se reconhece. Scn-
duas mãos apoiadas nas coxas, e ajoelhando-se de novo 1 1 mlo-se dominado, arrebatado por uma espécie de poder
um pouco mais adiante, foram dando a volta ao montícu­ 1 )(lt:rior que o faz pensar e agir de modo diferente que o
lo. Ao mesmo Lempo, inclinavam seus corpos ora à direi­ ""'mal, nacuralmente tem a impressão de não ser mais ele
ta, ora à esquerda, todos soltando, a cada u m des...,es mo­ 1 1 1 1 smo. Parece-lhe Ler-se tornado um ser novo: os orna-
v i mentos, um g r i t o reLumbante, um verdadeiro urro, 1m ntos, as máscaras que cobrem seu rosLo, figuram mate-
}'n-shl Fmbl }17�/J/Enquanto isso, os King1Jli, num grande 11.dmence essa transformaçáo 1ncenor, mais ainda cio que
estado de exaltação, faziam ressoar seus bumerangues, e , 1 1 11Lribuem para determiná-l a. E como todos os seus com­
o chefe deles parecia ainda mais agitado que os outros. p.mheiros, no mesmo momento, sentem-se cransfiguraclos
As
sim que a procissão dos Ulu uru deu duas voltas ao re­ 1 l.1 mesma maneira e traduzem seu sentimento por grilos,
dor do montículo, eles deixaram a posição ajoelhada, sen­ �·l·sLos, atitudes, tudo se passa como se ele realmente fos­
Lamm-se e puser..tm-se de novo a cantar; por momentos, o .,•. transportado a um mundo especial, muito diferente
da­
canto arrefecia, depois recomeçava bruscamente. Quando ' (t1cle onde cosruma viver, a um meio povoado de forças
começou a ama nhecer, Lodos se levantaram; as fogueiras , xcepcionalmenle intensas que o invadem e o metamor­
que extinguiam foram reavivadas e os Uluuru, pressio­ loseiam. De que forma experiências como estas, sobretu­
do quando se repetem todo dia durante semanas, não lhe
se

nados pelos Kingilli, atacaram furiosamente o tümulo com


bumerangues, lanças, pedaços de pau. Em poucos minu­ d i riam a certeza de que há efetivamente dois mundos he-
tos, nada mais restava dele. As fogueiras se apagaram e fi­ 1vrogêneos e incomparávcis entre si? Um é aquele onde
cou um profundo silêncio3o. de arrasta sem interesse sua vida cotidiana; ao comr.1rio,
Uma cena mais violenta ainda é a que foi presencia­ de não pode penelrM no outro sem logo entrar em con-
da pelos mesmos observadores durante as cerimônias do 1.1 to com potências extraordinárias que o galvanizam até o
fogo, entre os Warramunga. delírio. O primeiro é o mundo profano, o segundo, o das
Desde o anoitecer, procissões, danças e canLos já se 1 oisas sagradas.
haviam realizado à luz de tochas; a efervescência geral era Portanto, é nesses meios sociais efervescentes e des­
crescente. Em determinado momento, doze assistentes pe­ sa efervescência mesma que parece ter nascido a idéia re­
garam cada qual uma espécie ele grande Locha inflamada, ligiosa. E o que tende a confirmar que essa é de faLO sua
e um deles, segurando a sua como uma baioneta, invcsliu , 1rigem, é que, na Austrália, a atividade propriamente reli­
contra um grupo de indígenas, os quais se defenderam giosa concentra-se quase exclusivamente nos momentos
brandindo paus e lanças. Uma confusão geral se armou. vm que se realizam c.;ssc.;s encontros. Certamente, não há
Os homens salLavam, enfureciam-se, soltavam urros selva­ povo em que as grandes solenidades do culto não sejam
gens; as tochas brilhavam, crepitavam ao bater nas cabe­ mais ou menos periódicas; mas, nas sociedades mais
ças e nos corpos, lançavam fagulhas em todas as direções. .1vançadas, não há dia, por assim dizer, e m que alguma
226 AS FORA/AS El&1RES
1EiVTA DA VIDA RELJ(;fc 11 t H1 f(J�VÇASELEMENTARES 2r

ma n ifestação ritual não se ja dirig ida aos Jcuses. Na Au' t lt· nns suge re impressões e idéias tristes. Essa transferên­
trália, ao contrário, fora elas festas cio clã e da tribo
0 Lcrn
' 1.1 de semimenLrn; advém simplesmente de que a idéia ela
• 1 11sa e a idéia de seu símbolo estão in t i m am ente l igada s
po é q u ase inteiramente preenchido por funções
l
• 111 nossos espí ri tos ; disso resulta que as emoções provo­
e iga� t ·
p�·ofanas Claro que há p roi bições que devem ser e qw
.
sao observadas mesmo du rant e esses períodos de t tdas po r uma se esLe ndem co nta gi osament e à outra . Mas
alivid;i
de temporal : ja ma is é perm itido matar ou a l ime
ntar-se 11 1 ...se co ntágio, que sempre se produz em algum grau, é
vre mente do animal torêmico, pelo menos onde a imerdt 111uito mais completo e marcante toda vez que o símbolo
ção� conser vou seu rigor prim itivo, mas não 1 .dgo sim ples, d efi n i do, facilmente r eprese n táv e l , ao pas­
se celehra ,
entao, quase nen hum rito positivo , nenhum a c "ll que a coisa, por suas dimensões, o n ú mero ele suas
erimôni ; t
d e alg um.a imponância. Estas s ó ocorrem n o seio dos gru p.1nes e a co mpl ex ida de de sua organização, é c..l ifícil de
pos reunidos. A vida religiosa do australi ano 1harcar pelo pensamento. Pois não poderíamos considc­
passa. por
tanto, por fases sucessivas de completa atonia ' 1 1 numa entidade abstrata, que só represen tamos lalJOrio
e ao con
trário, de h iperexcitação, a vida social osci lan d ... . 1 mente e com uma noção confusa, a origem cios senti­
o ' de acor
a 0 vín­
do com o mesmo ritmo . É o q ue põe cm evidênci mentos fortes que experimentamos. Não po de mos expl i­
c � i lo exi� t�nte entre ambas, enquanto que, entre os povos l a -l os a nós mesmos senão re laci onan do-os a um objeto

d ilos civili zados, a continu idade relaLiva de uma e da ou concreto cuja real idade sentimos vivamente. Portamo, se
tra n�ascara e ?1 ?ª r�e su as rel a ções . Pode-se mesmo .1 própria coisa nã o preenche essa condição, não pode
per
guntar se a violenc1a desse contraste não e ra
necessária ...crvir para nela fixarem-se as impressões exp erimentadas,
p�a f�zer sobressair a se nsação do sagrado em sua fom1a l'mbora cenha sido ela que as provocou . É o si gn o então
primei ra . Ao concentrar-se quase inteiram ente que toma seu lugar; é para ele que se voltam as emo ções
e m mo­
mentos determinados do tempo, a vida coletiva que ela suscita. Ele é que é amacio, te mido , respeitado; a
podia al­
cançar, com efeiLo, o máximo de imensidade e
de eficácia de somos gratos, por ele nos sacrificamos. O soldado que
e, poitanto, dar ao homem um senti mento mai morre por sua ba ndei ra , morre por sua pátria, mas de fa­
s fone da
du p! ª existência que ele vive e da dupla narurez
a da qu al lo, em sua consciência, éa idéia da bandeira que está em
pa mapa .
.
primeiro pl a no. Ocorre inclusive que ela determine direta­
mente a ação. Se u ma bandeira isolada permanecer ou
Mas a ex pl icação é ai nda incompleta. Mostramos de não nas mãos do inimigo, a pá tri a não estará p e rdida por
que forma o clã, pela maneira como age sobre seus mem­ isso, no entanto o soldado se faz matar para relomá-la.
br?s, desperta neles a idéia de forças exteriores que o clo­ Perde-se de vista que a bandeira é apenas um signo , que
rn111am e o e�ltam ; mas resta-nos saber o que faz que es­ não tem valor por si mesma, mas somente faz lembrar a
sas forças SCJam pensadas sob as es pécies do totem ' ou realidade que representa; tratam-na como se ela próp ria
si;ja, sob a fi g ura de um animal ou de u ma planta. fosse essa rea l ida de .
A razão é que esse animal ou essa pl a nta deram seu Ora, o totem é a ba nde ira do clã. É natural, portanto,
nome ao clã e lh e seivem de em blema . Com efeito é uma que as impressões que o clã desperta nas consciências in­
lei co n h:cida qu e os sentimen tos despertados em � ós por dividua is - impressões de d epe n dência e de vitalidade
uma coisa se transmitem es pon t a n e a me nt e ao símbolo acrescida - se liguem muito m a is à idéia do totem que à
q ue a representa. O preto é para nós sinal de luLo; assim, do clã, pois o clã é uma real i da de de m asia d o complex a
I\ f.Nf-\ÇAS E/.EMEtv7A RliS
228
229
para que inteligências tão rudimentar
la claramente em sua unidade concreta.
es possa m conce l w
Aliás, o primi 11\o
1 111.1is os homens se sen1em cm contato, e assim se ex-
lhe vêm d . 1
1 ,fl, .1 que eles tenham sido levados a conc� ber essas for:
\ J -..ob os traços e.lo ser, animado ou inammado, que da
nem mesmo percebe que essas i mpressões

d 11 nome ao clã.
coletividade. Não sabe que a apro ximacão
de um certo
número de homens associados numa mesma
vida tem pc 11 Isto rosto, eslamos em condições de compreender
efeito liberar energias novas que transforma
deles. Tudo o que ele sente é que é erguido
m cada um 111clo o que há de essencial nas crenças tot�micas. _
ucima ele ,, l á que a força religiosa não é ouLra c01sa senao a for­
> letiva e anônima do clã, e já q ue esta só é represe �­
mesmo e que vive uma vida diferente da comu
� 1 \·�
m. EntH·
' 11 c.:I aos espíritos sob a forma do totem, o �mblema LOle-
tanto, é preciso que ele relacione essas sensa
ções a algum
objeto exterior como à causa delas. Ora, o
que ele vl' .1 1 1 1 1 1 o é como que o corpo visível cio deus. E dele, po�an-
seu redor? Em tod�1 parte, o que se oferece
a seus sen11
dos, o que, cham a sua atenção, são as mCllLip
l.is i magc 1 1 �
1 1 1, que parecem emanar as ações, benéficas ou Lem1clas,
e.lo tolem. E o wanin ga, o nurtu nja, símbolos , 111v o culto tem por objetu provocar ou prevenrr; em on­
_

· •·qiiência, é especialmente a ele que se dmgem os ntos .
entre outrm
e.lo ser sagrado. São os bull-roarers, os churi
nga, sobre m. \ sim se explica que, na série elas coisas sagradas, ele
•x upe o primeiro lugar.
quais geral ment e são gravadas comb inaçõ
es ele linha .,
que têm a mesma significa<,.-ão. São as ornamentaç
ões qu•· . ,
Mas o clã, como toda espécie de sociedade, so pode
cobrem as diferentes partes de seu corpo e que
são outras
tantas marcas totêmicas. Como é que essa image , 1vl'r nas e através das consciências individuais que o
, 1 1 1 npôem. Assim, se por um lado, enquanto é conce�ida
m, repeti
ela por toda parte e sob todas as formas, não
teria nos es 1 11110 incorporada ao emblema totêmico, a força religiosa
_
píritos uma importância excepcional? Assim
colocada no ílparece como exterior aos indivíduos e � ot�da, em rela­
\ . t < > a eles, de uma espécie de transcendencia, por outro
centro ela cena, toma-se represemativa dela.
É nela que se:
füc am os sentimentos experimentados, pois é
o único oh l.1do, assim como o clã de que é símbolo, ela só pode s:
Jeto concreto ao qual eles podem se ligar. Ela
lembrá-los e a evocá-los, mesmo dissolvido
continua a l l 'al izar neles e através deles; neste sentido, a força reli­
o encontro; giosa lhes é, portanto, imanente e eles a concebem neces-
pois sobrevive a este, gravada nos instrument
o do culto. 11 1,1mentc como tal. Sentem-na presente e atuante neles,
nas superfícies das rochas, nos escudos, etc.
as emoçôes sentidas são perpetuamente conse
Através dela, poh é ela que os eleva a uma vida superior. E !s aí como º
rvadas e rea _ _ ,
\ivadas. Tudo acontece, lrornem acreditou que havia nele um pnnc1p10 compara­
sc diretamente. É ainda mais natur
portanto, como se ela as insrira.�­
' vi ao que reside no totem; como, portanto, alribuiu a si
al atribu í-las a ela por­
que, como essas emoções são comuns ao l l lL'smo um caráter sagrado, mas menos marcante que o
dem ser relacionadas a uma coisa que lhe seja
grupo, só po­ do emblema. É que o emblema é a fonte eminente da vi­
igualmente d.1 religiosa; o homem só participa dele indiretamente e
comum. Ora, o emblema totêmico é o único a
11 · 1 1 1 LOnsciênci<1 disso: percebe que a força que o tr.ins­
satisfazer 1
essa condição. Por definição, ele é comum
a Lodos. Du­ porta ao círculo das coisas sagradas não lhe é inerente,
ranle a ccrimônia, é o ponto de convergênc
ol hares . Enqu a nto as gerações muda m, ele
ia de todos os rnas lhe vem de fora.
perma nece Por uma outra razão, os animais ou vegetais ela espé­
imutável: é o elemento perrnaneme da vida socia
l. É dele, ' re totêmica deviam ter o mesmo caráter, e até em mais
portanto, que parecem emanar as forças miste
riosas com .tlto grau. Pois, se o princípio torêmico não é outra coisa
VTDA REUGIC1\4 I \ 1 /<I·\"ÇAS Elf:.A-fENTARES
231
230 AS FORMAS Ei.EJlfl!1VTARES DA

senão o clã, o que o embkma representa é o clã pensadc 1 Agora nos explicamos de onde vem a
a mbigü idacle

q111 as forças religiosas apresentam


quand o aparecem na
sob uma forma mate ria l ; ora, essa forma é também a do�
e humanas, morais
seres concretos cujo nome é o do clã. Em razão dessa S(' 111 ,1oria, de que maneira elas são físicas
is ao mesm o tempo . Elas são forças morais po r
1 1 1;t1eria
ll'lll construídas inteiramente com
melhança, esLes não podiam deixar de despertar sen11
as impre ssões que es­
:
mentos aná logos aos que o próprio emblema suscita. J.1
.1 �L·r mora l que é a c o l et i v i da c lt despe rta nesse s outros
que este último é objeto de um respeito rel ig i oso, tam
bém eles deviam insp i rar um respeito cio mesmo tipo l' .1 11 s mo r a is que são os indiví duos; elas Lraduzern, não a
·
nossos sentidos,
aparecer como sagrados. Era impossível que o fiel não 111.1111.: ira pela qua l as coisas físiC"..tS afetam
como a consc iência coleti va age sobre as
1 1 1 .1s o modo
1 , 111sciências ind ividuais. Sua autoridade
pusesse forças da mesma natureza sob formas exteriort·s
não é senão uma
tão perfeitamente idênticas. Eis por que é proibido matar
que a s o ie dad e exerce sobre
comer do animal totêmico, por q ue sua carne é tida por ln1 ma da infl uência moral c
co nceb idas
possuidora de virtu des positivas que os ritos u til i zam : ros. Mas, por ouLro l ado, por serem
.1 ·u:-i memb

�• 1h formas materia is, elas não


t'
podem deixar de ser vistas
, 0111 0 muito próxim
qu e o animal totêmico se assemelha ao emblema do clã,
as das coisas maceriais3•. Elas domi-
isto é, à sua própria imagem. E como, naturalmente, se
Reside m nos home ns,
pios vitais elas coisas.
11.1111, portan co, os dois mund os.
asseme lha mais elo que o homem, situa-se também numa
111.1s, ao mesmo tempo, são os princí
\ iv i fi ca m as consc
posição superior na hierarquia elas coisas sagradas. Clar(J
iência s e as discip linam; ma s são elas
que entre esses dois seres há um forte parentesco, já que
m e os anima is se
comungam na mesma essência: ambos encarnam algo do 1.1 1nhém q ue fazem que as plantas cresça
l l' produ zam. É graças a essa du p l a nature za que a religião
bo
princípio totêmico. Só que, como esse princípio é conce­
como a matriz em que se e la raram os princi­
bido sob uma forma animal, o animal parece encarná-lo pôde ser
que ela a ba rcava
pais germes da civilização humana. Posto
.1 realidade inteira, tanto o universo físico
mais eminentemente que o homem. Por isso, se o homem
como o universo
o considera e o trata como um irmão, é pelo menos como
as forças q u e movem o corpo e a s que co ndu zem
111ora l ,
os espíritos foram concebidas sob
um irmão mais vclho3l.
forma reli giosa . Eis aí
Embora o princípio totêmico tivesse seu centro de
?1 como as técnicas e as prática
da
s mais divers as, ramo as qu e
fun
elei o numa espécie animal ou vegetal determinada, não
ram o c io n a m en to vida moral (direito, moral,
podia permanecer localizado aí. O caráter sagrado é, no a:>.scgu
materia l (ciências
mais alto grau, contagioso33; estendeu-se portanto do ser hdas-artes) quanto as que servem ã vicia
as i nd usL ri a i s) , são, direta ou indireta­
totêmico a tudo o que com ele se parece, de perto ou de da natureza, técnic
longe. Os sentimentos relig iosos que o animal inspirava mente, derivadas ela religião35.
transm itiram-se às substâncias de que ele se alimenta e
9 ue �ervem para fazer ou refazer sua carne e seu sangue,
IV
as coisas que se assemelham a ele, aos seres diversos com
os quais está constantemente em contato. É assim que
Com freqüência se atr ibuíram as pr i meiras c
on ce pçôes
pouco a pouco se associaram aos totens os subtotens, e se
eza e d ep endê ncia, ele
constituíram os sistemas cosmológicos que as classificações religiosas a um sent.i.meuto de fraqu
que teria se apode rado do home m ao
primitivas traduzem. Finalmente, o mundo inteiro se viu temor e angústia
d e uma espécie
partilhado entre os princípios Lotêmicos da mesma tribo. entrar em conrato com o mundo. Vítima
232 AS FORMAS ELE.11ENTARHS DA \'lf)A RElJ(,11 1\1 1 < Nt-\ç.AS lilE.\/ENTARES

de pesadelo criado por e l e próprio, o hom<.:m t<.:ria " 1 ela fa:t parte dele e. porcanto quando ele cede aos
acreditado cercado de forças hoscis e cerníveis que cabcri.1 l11 1pulsos vindos dela, nao acredita ceder a uma coerçao,
aos ritos apaziguar. Acabamos de mostrar que as prinwi 1 1 1 " 1 1 aonde sua natureza o chama37.
ras religiões têm uma origem completamente diferente. A O ra, essa maneira de entender a gênese do pensa­
famosa fórmula Primus in orbe deosfecit timor• de ma "'' 1110 religioso escapa às objeç;ões que as teorias cláss i-
neira nenhuma é justificada pelos fatos. O primitivo n;ío 1 1 mais acreditadas levantam.
viu, em seus deuses, esLrangeiros, inimigos, seres e.ssencial Vimos como naturistas e animistas pretendiam cons-
mente e necessariamente maléficos cujos favores era obri 1 1 1 1 1 r ,1 noç-::io de seres sagrados com as sensações provoca­
gado a atrair a qualquer preço; muito pelo contrário. são i ! " em nós por diversos fenômenos de ordem física e bio­
antes amigos, parentes, protetores naLUrais. Não é assim li •g1ca e mostramos o que essa tentativa tinha de impossí­
que ele chama os seres da espécie cotêmica? A potência :1 \'< 'I e mesmo ele contraditória. Nada provem de nada. As
qual se dirige o culto não é representada paira ndo muito 111 1 prcssõcs que o mundo físico dcsrcna em nós não po­
acima dele e esmagando-o com sua su periori dade· ao o ll' ii am, por definição, conter nada que ultrnpassasse esse
cont rário, está bem perto dele e lhe confere poderes teis Ú 11111ndo. Com o sensível, não se pode produzir senão o
que ele não extrai de sua natureza. Talvez nunc-J a divin­ .\'llsível; com o extenso, não se pode fazer o inexrenso.
dade esteve mais próxima do homem do que nesse mo­ \·,sim, para poder explicar como a noção do sagrado pô­
mento da história, jã que está presente nas coisas que po­ "" :-.e formar nessas condiçôes, a maior parte desses teóri­
voam seu meio imediato e é, em parte, imanence a ele ' os era obrigada a admitir que o homem sobrepôs à rea li­
próprio. O que está na raiz do totemismo são, em última dade, tal como é dada à observação, um mundo irreal,
análise, sentimentos de alegre confiança mais cio que de • onstruíclo inteiramente com as imagens fantasmáticas que
terrorde opressão. Descontados os ritos funerários - la­
e 1gitam seu espírito durante o sonho, ou com as abermçôes
do sombrio de toda religião -, o culto totêmico celebra-se �l·1.1lmente monstruosas que a imaginação mitológica teria
em meio a cantos, danças, representações dramáticas. As produzido sob a influência prestigiosa, mas enganadora,
expiações cruéis, como veremos, são relativamente raras; 1 la l i nguagem. Mas, com isso, tomava-se incompreensível
mesmo as muci lações obrigatórias e dolorosas da inicia­ 1 1 ue a humanidade se obstinasse, dumnte séculos, em er­
ção não têm esse caráter. Os deuses ciumentos e terríveis ros que a experiência logo lhe teria feito perceber.
Do nosso ponto ele vista, essas dificuldades desapa­
recem. A reli gi ão deixa ele ser sabe lá que inexplicável
só aparecem mais tarde na evolução religiosa. É que as

a lucin ação para tomar pé na rea l idade . Podemos dizer,


sociedades primitivas não são espécies de Leviatã que es­
magam o homem com a e norm ida de de seu pode r e o
submetem a uma dura disciplina:l6; o homem entrega-se a l'Om efeito, que o fiel não se engana quando crê na exis­
elas espontaneamente e sem resistência . Como a alma so­ tência de uma força moral da qual depende e da qual ex­
cial é feita então apenas de um pequeno número de idéias lr<ti o melhor de si: essa força existe, é a sociedade Quan­
e de sentimen cos, ela se encarna facilment e em cada do o australiano é transportado acima de si mesmo, quando
consciência individual. O indivíduo a carrega por inteiro -.cnce crescer nele uma vida cuja intensidade o surpreende,
ele não é vítin1a de uma :Iusão; essa exaltação é real e é
O medo (foi o que) primeiro íez os deuses no mundo isto é' realmente o produto de forças exteriores e superiores ao
suscitou a idéia da divindade. Cí. tmduçâo de Paulo Rónai. (N. cJ0o T.)

indivíduo. Claro que ele se engana quando crê que esse


·· ··· - -. ..,..�

A) FO!ll/AS ELEME.\TA RES DA 11DA REIJGIUV.


1 \ f Ili\'(.AS ELE.JfE\TARES 2�5

aumento de vitalich1dc é obra ele um poder com form;i d plldiani ter influência profunda, porque não atingiam
1
1 ,. ,
an i mal ou de planta. Mas o erro incide apert as sobre a l l
1 1·ligiào em seus princípios38.
l >bjetar-se-á no entanto que, mesmo nessa h1pot;�e,
tra do símbolo por meio do qual esse ser é representado . ,

aos espíritos, sobre o aspecto de sua existência. Por 11.1'


dessas figuras e dessas metáforas, mais grosseims ou 01•11!1 111 ligiào continua sendo o produto de un:,i certo d_:ltno.
1111 outro nome, com efeito, pode-se dar a exaltaçao em
qiw .,e encontram os homens quando, devido a uma efer-
t
refmadas, há uma realidade concreta e viva. A religião ad
' ,, t'· ncia coletiva, crêem-se cransp? rtados a um m�ndo
quire assim um sentido e uma raz�io que o racionalist.1
mais intransigente não pode desconhecer. Seu objl·to
principal não é dar ao homem uma representação cio uni 11111 1ramente diference daquele que tem sob os olhos.
lkalmente é verdade que a vida religiosa não pode
1ii 1 11�·ar um cena grau de intensidade sem implica r um�
verso físico, pois, se fosse essa sua tarefa essencial, não sv
compreendena como pôde se manter, visto que. sob esst· _. �
aspeuu, nau muito mais du qu<.: um tec.. 1do de erros , x.111,ição psíquica que tem algo a ver com o delmo.
1 '"1 l'SSa razão que os profetas, os fundadores de rel!­
e

�u 11 ·s, os grandes santos, em uma palavra, os ho mens cu ia


Mas ela é antes de tudo um sistema ele noçôes através das
quais os indivíduos se representam a sociedade da qual _
s ão membros e as relações, obscuras mas ínti ma s, qul'
, 1 1nsciência religiosa é excepcionalmente sens1vel, � pre­
mantêm com ela. Tal é seu papel primordial. E, ainda qut' ,1·n1am com muita freqüência sinais de u m nervo s s mo i

metafórica e simbólica, essa representaç-Jo não é infiel . Ela , '\ccssivo e mesmo propriamente patológico: ess s . taras

traduz, ao contrário, tudo o que há de essencial nas rela­ 1 1..,101ógicas os predestinavam às grandes tarefas r�ltg1osas.
ções que se crnca de exprimir, pois é uma verdade ecerna 1 > l'mprego ritual de bebidas intoxicantes explica-se �a
que existe fora de nós algo de maior que nós e com o 111l·-.ma maneiraW. Por certo, não é que a fé ardente se1a
qual nos comunicamos. 1wcessariamente um fruto da embriaguez e das pertu��a­
'" ll'S mentais que a acompanham, mas, como a expenen­
Por isso, podemos estar certos de antemão que as
práticas cio culto, sejam elas quais forem, são algo mais ' 1,1 Jogo mostrou aos povos as analogias existentes entre a
do que movimentos sem alcance e gestos sem eficácia. 1ncntalidade do delirante e a do vidente, buscou-se che­
i:ar à segunda suscitando artificialmcnt� � -primeira. Se,
por essa razão, pode-se diz�� qu_e a re�1g1ao s; mprc se
Pelo simples fato de terem por função aparente estreitar
os vínculos que unem o fiel a seu deus, elas ao mesmo
tempo estreitam realmente os vínculos que unem o indiví­ .1eompanha de um certo delmo, e preciso porem a: re:­
' L'ntar que esse delírio, se tem as causas que lhe a_trtb� 1-
mos, é hem:fundamentado. As imagens ele �ue e fc1t?
duo à sociedade ela qual é membro, já que o deus não é
senão a expressão figurada da sociedade. Concebe-se
mesmo que a verdade fundamental que a religião assim mio são puras ilusões, como aquelas que naturistas e ani­
continha tenha sido suficiente para compensar os erros rrnstas põem na base da religião; elas correspondem a al­
secundários que ela implica\ quase necessariamente e
:i
go no real. Claro que faz parte da natureza das forças mo­
que, portanto, os fiéis tenham sido impedidos ele afastar­ r.us que elas exprimem não poder afetar com a l�uma
se dela, apesar das decepções que deviam resulta r desses vnergia o espírito humano sem colocá-lo ��ra de s1, s:n:i
erros. Cercamente deve ter acontecido m u itas vezes que mergulhá-lo num estado que se pode qual1f1car de ext�tt1-
co, contanto que a palavra seja tomada em seu sent1?0
<.:timológico eKcr-camç; mas disso não se segue, de manei':
as receitas que ela recomendava ao homem para agir so­
bre as coisas revelaram-se ineficazes. Mas esses fracassos
nenhuma, que elas sejam imaginárias. Muito pelo contra-
REIJGJO\ � I \ < /\/�\(:AS l!LH..\IENTARES
236 AS FORMAS ELEME/\7"ARES DA 17nA

itam atesta sua rca lidac.k 1


rio. a agitaç;1o menta l que susc
olfatJ\ is. gustativas e visuais não deLxam ele corres­
p1 •11der a certos estados ob1etivos das coisas represenu­
s1 mplesm e nte u m a nova prov
. a de q u e uma vida socia l
n:i�1 1 t� i nren.sa causa sempre ao organismo, d exprimem a seu modo as propriedades ou de parti-
como à com. 1.

cie de violência que Pl'r


c1enc1a do in d�víd u o, uma espé
1 11l 1s materiais, ou de movimentos do éter, que, de fato,
turba seu funcionamento norm
al. Assim, ela só pode du I• 1 1 1 sua origem nos corpos que percebemos como odorí­
h 1os,
rar um tempo mu ito l imitad 01o .
saborosos ou coloridos. Mas as representações cole­
i ! \·" at1ibuem com freqüência às coisas às quais se rel acio-
De resto, se chamarmos delírio rodo
:: pm to ac1:esccma aos
, estado no qu al 0
d�dos imediatos uma intu ição
s1ve l e �ro1 et� seus sentimentos sen 11 1 1 11 propriedades que nelas não existem sob nenhuma
e i mpressôes nas coisa,, l • 11 111:1 e em nenhum grau . Do objeto mais vu lgar, elas po-
t��vez �ao lu11a representação cole
tiva que não seja, num 1, 111 fa zer um ser sagrado e muito poderoso .
e.erro s cn udo de liran te; as cren
: ças religiosas são apena., ' o entanto, embora puramente ideais, os poderes
�11n .caso parta.. ular de u ma lei muito geral. O meio sou 1 11 lhe.: são assim conferidos agem <..orno se fossem reais;
1�te1ro n�s a parece como povo
dl'lcrminam a conduta e.lo homem com a mesma necessi-
al
. ado de forças que, em
o espírito. a bem os 0 que 1
rc;1
lidacle so ex ist em em noss
'. S l 1dc que forças fís icas. O a ru nta que se friccionou corre­
bandeira sign ifica para o sold
ado; em si, ela não é m .i i:., 1111ente com seu ch u ringa sente-se mais forte; ele é mais
l1 111c. Se comeu ela carne de um animal que, embora pcr­
que �m pedaço cl� pano. O
i

sangue hum ano não é scrn1


um l iq__u 1 do orga
o
lt 11a mente são, lhe é interdito, sentir-se-á doente e poderá
_
n1co ; no enta nto, aind a hoje
, não pode­
mos ve-lo correr sem experimentar O
q�e suas propriedades fís ico-q
u ma violenta emoção 1 1 1mrer em conseqüência disso. soldado que tomba ao
' 11 knder crê ter se sacrifica­
pl icar. O hon�cm não é outr
uímicas não saberiam ex sua bandeira certamente não
a coisa, do ponto de vi sta fisi· "" por um pedaço de pano. É que o pensamento social,
co, que um sistema de célu
las e, do pomo de vista men l "ºr causa de sua autoridade i mperativa, possui uma eficá-
1 1 1 que o pensamento i nd iv idual não poderi a ter; pela
­
tal, que um sisl<:'ma de repr
esentações: em ambos os <ts­
·'�·'º que exerce sobre nossos espíritos, é capaz de nos fa-
p�ctos, ele diferencia-se apen
as e m grau do ani m al . E,
nao obstante , � soci �dade o
concebe e nos obriga a con­ r ver as coisas sob a luz que lhe convém; ele acrescenta
t 111 s up rim e coisas do real , conforme as circunstâncias.
11
.
0
�ebe-lo como inve stido de
um caráter sui generis que
isola , 9 ue !echaça os conratos
l l.1, ass im , uma região da natureza cm que a fórmula cio
. l"'
's u. 1"to . Es
n ....
temerários, que, numa pa-
lavra ' tmpoe. o ..... . ,. · e1·1g111·da de que o singu
" sa 11k·alismo apl ica-se quase ao pé da letra: é o reino social.
>\1, bem mais do que cm outra parte, a icléia produz a rea­
·

,
ap
l ariza
� rece.- n ?s com? um de seus atrib utos disti ntivos
, em­
natu reza em pí ri ca cio
bota seja 1 m p oss 1 v e l encontrar na lidade. Claro que, mesmo nesse caso, o idealismo precisa
h o1 �1em a lgu ma coisa que a fun dam
.
ente . Um s elo posrnl temperado. Não podemos jamais escapar à dualidade
1 ll' nossa na tu reza e libertar-nos completamente das ne­
'•t'I'
canmbado pode vale r uma
f ortu na ; é evidente que esse
v�lo r de mo�o nen hum está
impl icad o cm suas proprie­ ' l'Ssidades físi cas : para exprimirmos nossas próprias idéias
�ades !1atu ra 1s . N u m certo
sent ido, nossa pró pri a repr
e­ .1 11é>s mesmos, temos necessidade, como mostn1remos em
sent�çao_do mundo exterior
não passa de um tecido de .l'guida, de fixá-las em coisas materiais que as simboli­
a l � c1 �açoe s, pois os odores,
os sabores e as cores q u e ' l'm. Mas, aqui, a parti c;paçào da matéria é reduzida ao
atnbu1mos aos corpos não
são, ou, pelo menos, não são 111111imo. O objeto que serve de suporte à idéia é i nsignifi­
exatamente como percebem .
os No entanto, nossas sens ' ,1me, comparado à superestrutu ra ideal sob a qual desa-
a-
AS FOR.itAs ELEMENTA'RES DA iwA RELIGIOSA
238 239
I\ CRENÇA S EIBl4.El vTARES

ma como vere mos, pode fragm


parece e, além disso, nada tem a ver com essa superestru entar-se em qua.se cantas
tura. Eis em que consiste o pseudodclírio que encontra­ �
pa es quantos são os órgã os e tecid os c�o organismo; ca­
vale a alma tota l . Essa
mos na base de tantas representações coletivas: não é se­ da uma dess as alma s parc iais equi
concepçào seria ine x pl i cável
não uma forma desse idealismo essenciaJl 1 . Portanto, não se ? carát e r �agrado depen­
se trata de um delírio p ropri am en te di to ; pois as idéias des cons tiruu vas da c oisa que lhe ser­
desse das proprieda
.

.
ele devena vanar conJo.rme
que assim se objetivam têm fu ndam en to , não certamente ,.e de substrato, pois, então,
r com ela. Mas, se as vir�u ­
na natureza das coisas materiais sobre as quais se enxer­ t:ssa coisa, crescer e decresce
tam mas na natu reza ela sociedade. ross ui não lhe são intrín�ecas se lhe ve1�
des que a coisa

,

evoca e simboliza, embo1a


.

Pode-se agora compreender de que maneira o princí­ de certos sentimentos que ela
pio totêmico e, de maneira mais geral, toda força religiosa e como ela não tem ne:ess�­
tenham sua origem fora dela,
é exterior às coisas nas quais reside12. É que sua noção não dade , para cum prir esse pape l evocador, de poss uir d1-
a coba terá o mesm o valor,
é constrnída em absoluto com as impressões que essa coisa mensw determinadas, enta o
produz diretamente sobre nossos sentidos e sobre nosso não Com o a parte le mbra � todo,
quer seja intei ra, quer .

os que o todo s � g�1e Um


espírito . A força religiosa não é senão o sentimento que a ela evoca também os sentiment
.

co let i vida de insrira a seus membros, mas projetado fora simp les fra gmento da band eira
representa a p a cna tanto
elas consciências que o experimentam e objetivado. Para se eira; assim , ele é sagrado pela mes­
quanto a próp ria band
.
objeti va r ele se fixa num objeto que, assim, se torna sagra­
,
ma razão e no mesm o grau 44
do; mas qu a lq uer objeto pode desempenhar esse papel.
Em p rincípio, não há objetos predestinados a isso por sua
natureza, com exdusão de outros; tampouco há os que se­ V
jam necessariamente refratários •3. Tud o depende das cir­
nos perm itiu expl} ­
cunstâncias que fazem o sentimento gerador elas idéias reli­ Mas se essa teoria do totem ismo
ticas dessa religião, ela pro­
giosas colocar-se aqui ou ali, em tal ponto e não num ou­ car as crenças ma is caracterís
tro. O caráter sagrado que uma coisa adquire não está, por­ pria repousa sobre u m fato a i nda não ex p l i cado Dada a
clã, o res� a � c e se se�u e ;
.

t.anco, impli cado nas propriedades intrínsecas dessa coisa: é noção do totem , emb lema do _
o se con sutu 1 u A que.o;�o
acrescentado a ela. O mundo do relig ioso nào é um aspec­ mas falta saber como essa noçã
.

to pa rticu lar
da n a tureza empírica; é sobreposto a ela .
é dupla e pode subdividir-se
ass i m: 1)
o que levou o ela a
2) Por que esse s emb lei:na s
Essa conccpção cio religioso permite, enfim, explicar escolher para si um emblema7
anim al e v egeta l , mais parti cu-
um imporcance princípio que encontramos na base ele foram tomados do mundo
uma grande quantidade de m itos e de ricos e que pode larmente do primeiro? .
toda espec1e de grup�,
,

ser assim enunciado: quando um ser sagrado subdivide­ Que um emb lema seja, para
to, é algo que nem se preci­
se, ele permanece por inteiro em cada uma de suas par­ um útil foco de congraçamen
unidade social sob uma f?r­
tes. Em outros termos, para o pensamento rel igioso, a sa demonstrar. Ao exprimir a
parte equiva le ao todo; tem os mesmos poderes , a mesma ma material, ele a torna mais
sensível a todos e, ta1:1bem
eficácia. Um fragmento de relíquia cem as mesmas virtu­ por essa razã o, o emp rc6o cios símb ol�s emb lema t1c_os
.
des que a rel íquia integra l A menor gota de sangue con­ amente assim que sua ideia
.
deve ter se genera li zado rapid
icléia deve ter brotado es-
tém o mesmo princípio ativo que o sangue inteiro. A ai- surgiu. Mas, além disso, essa
240 AS FOiàllfAS ELEMENTARES DA VIDA RELlC!O.\ 1 I \ 1 .NliNÇAS ELE
MEl'ffARES
241

pontaneam�nte das condições ela vida em comum; pois 1 1 .t·ntar,;ões correspondentes. Mas só as simbolizam porque
emblema nao e_ apenas um procedimento cômodo qu(' , , ml ribuírarn para formá-las.
torna mais claro o sentimento que a sociedade tem de si; Aliás, sem símbolos, os sentimentos sociais não po­
ele serve para produzir esse sentimento, ele próprio é u111 il1 ·riam ter senão uma existência precária. Muito foites en-
elemento constitutivo deste. 1 p 1nnto os homens estão reunidos e se infuenciam reci­
Com efeito, as consciências individuais, por elas mcs procamente, eles não subsistem quando a reu nião Lermina,
n:as, estão fechadas umas às outras; não podem se comu 1 não ser na forma ele lembranças que, se forem abando-
rncar senão por meio de signos que traduzam seus esta 11.H..las a si mesmas, irão se apagando cada vez mais; pois,
cios interiores. Para que o comércio que se estabelece en­ , omo nesse momento o grupo não está mais presente e
tre elas possa levar a uma comunhão, isto é, a uma fusão 1t uante, os temperamentos individuais retomam facilmen-
de todos os sentimentos particulares num sentimento co 11· o comando. As paixoes violentas que se desencadea-
mum, é preciso que os signos que as manifestam venham 1 . 1 111 no seio de uma mulLidão refluem e se extinguem as­
a se fundir, eles próprios, numa única resultante. É 0 apa­ s1 m que ela se dissolve , e os indivídu os se pergunt am
rec1mento dessa ·esultante que indica aos indivíduos que , om espanto como puderam se deixar arrebatar a tal pon-
!
_ em
eles estao unissono e que os faz tornar consciência ele 10 fora de seu caráter. Mas se os movimentos pelos quais
s�1a unidade moral. É soltando um mesmo grito, pronun­ vsses sentimentos são expressos vêm se inscrever em coi­
ciando uma mesma palavra, executando um mesmo gesto -�;1s que duram, eles próprios se tornam duradouros. Essas
relacionado a um n ;esmo objero, que eles se põem e se coisas nã.o cessam ele evocá-los aos espíritos e os mantêm
perpetuamente despertos; é como se a causa inicial que
os suscitou continua sse a agir. Assim, o emblem atismo,
s:ntem de . acordo. E verdade que também as representa­
ç�es 1� 1cliv 1dua1s det rmi nam no organismo reações que

nao sao sem importancia; _ elas podem, no entanto, ser necessário para permitir que a sociedade tome consciên-
concebidas sem levar em conta essas repercussões físicas 1·ia ele si, não é menos indispen sável para assegura r a
que as acompanham ou que as seguem, mas que não as continuidade dessa consciência.
constituem. Com as representações coletivas ocorre algo Cumpre, porLanto, não ver nesses símbolos meros ar­
bem diferente. Elas supõem que consciências ajam e rea­ t illcios, etiquetas que se acrescentariam a representações
Jª:11 umas sobre as outras; elas resultam dessas ações e rea­ inteiramente prontas para torná-las mais manejáveis: eles
çoes que, por sua vez, só são possíveis graças a interme­ sao parte integrant e delas. Mesmo o fato de q u e senti­
diários materiais. Estes não se limitam, portanto, a revelar mentos coletivos se achem assim ligados a coisas que lhes
o estado mental ao qual estão associados: contribuem pa­ si'io estranhas não é puramente convencional: ele não faz
ra produzi-lo . Os espíritos particulares não podem se en­ senão mostrar sob uma forma sensível u m caráter real dos
contrar e se comunicar, a não ser que saiam deles mes­ !'atos sociais, a saber, sua transcen dência em relação às
mos; mas só podem exteriorizar-se sob a forma de movi­ consciências individua is. Sabe-se, com efeito, que os fe­
_
mentos. E a homogeneidade desses movimentos que dá nômeno s sociais se originam , não no indivídu o, mas no
ªº grupo o sentimento ele si e que faz, portanto, que ele grupo. Seja qual for nossa pa1ticipação em sua gênese, ca­
.
exista. Uma vez estabelecida essa homogeneidade, uma da um de nós os recebe de fora45_ Portanto, quando os re­
_ presentamos como emanando ele um objeto material, não
nos equivocamos completamente sobre sua natureza . É
vez que os mov1mentos tomaram uma forma e uma figu­
raçao _ estereotipada,
eles seivem para simbolizar as repre-
AS FORMAS ELE.lf.8\TARES DA VIDA RE/J(,J< 1\ 1 H e IU!NÇAS ELEME/\T
243
2'-12
ARES

cl a ro q ue eles não vêm da coisa determinada com a qu.d 11 re os so l d,1d os de u m mesmo quartel, entre os mari-
co, entre os p ris ion ei ros encer-
nos rdac 1onamos; mas continua sendo verdade q u e lt'III
.
1 1 ' 1c1ros de um mesmo bar
o5o . Compreende-se, de fato,
su a origem fora de nós. E mbora a fo rça moral que sustv11 1 . 1dos num a casa ele deten çã
q11c, sobretudo onde a técn ica é ainda rudimentar, a tatua­
Wm seja o meio mais direto e
la o fiel não provenha do ídolo que ele adora, do embk
expressivo pelo qual se p�­
ciências. A melhor mane1-
ma que venera, ela não deixa porém de lhe ser eÀ'terio r t·
cl1· afirmar a co mu nhã o das cons
1 , de atestar a
ele sabe disso. A o bjet i vi d a de cio símbolo não faz ma1!'.
m q u e se faz parte d e
no corpo u ma mesma marca
si mesm o e a outre
que traduzir essa exterioridade.
, 1 111 mesmo grupo é imprimir
1 l islinti va. E o que prova
Assim, a vida social, sob todos os seus aspeclos e
é exatamente a razão de
cm
que essa
lodos os momentos de sua história, só é possível graças a
o mostramos, ela não
um_vast? simbolismo. Os emblemas materiais, as represen ,1·r da imag em totêm ica é que, com
supostamente re­
taçoes figurad as, de que nos ocupamos mais especialmen l 1t1sca reproduzir o aspeCLo da coisa que
prcsenta. Ela é feita de linha s e de pom os aos �uais_se a�­
te no presente cstudo, são uma forma particular disso· ma� enci onal ' 1 . Nao
há mu itas outras. Os sentimentos coletivos podem i� u al l>ui uma sign ificação i n te i rame n te conv
rar um obje to dete m1 inado ,
IL'm por objetivo figurar e lemb
um
mente se encarnar em pessoas ou em fórmulas: há fórmu­
cert o nú mero de indivíd uos pa r­
las que são ba ndei ras; há personagens, reais ou míticos mas testemunhar que
que são símbolos. Mas há um tipo ele emblema que dev � i ici pa de uma mesma vida moral.
O clã, aliás, é uma sociedade que,
mais que qualquer
ter su rg i do rápido, ind epen den te de todo cálculo e de to­
olo, po� pou­
da re� exào: é e xa tamente o que vimos desempenhar no s em embl ema e símb
O dà nao po­
outra, não pode pass ar
cas carecem tanto de consi stênci a com o ela.
tote n� 1sm o um papel considerável - a tatuagem. Fatos co­ nem toda autoridade
de se definir por seu ch e fe, pois, se
nce rta e i nstávef52•
nhecidos demonstram, com efeico, que ela se produz com
nte, es ta p e l o men os é i
uma espécie de automatismo em determinadas co ndiçõ es. ccnri·al é ause
tório que ocu pa,
Quando ho mens de cultura inferior se associam numa vicia Também não po de se definir pe lo terri
o nôma de5:l, não está estre itamente
c?mum, g�ral men te são l evados, como q ue por uma ten­ pois a popu lação, send
idade determi nada . Além di sso , em virtu­
ligada a urna local
de da lei de exogamia , o marido e a mulher
dencia instintiva, a pintar ou a gravar em seus corpos ima­ são obrigatoria ­
gens que lembram essa comunidade de existência. Segu n­ o cotem se
difer ente s; porta nto, lá onde
mente de totens
transmite em li nh a materna -
e esse siste
do um texto de Pro cópi o, os primeiros cristãos mprimiam
i
ma de filiação é
na p el e o nome de Cr ist o ou o sinal da cruz46. D u rante
i da hoje o mais geraf51 -, os filho s são de u m totem dife­
muito tempo, os grupos de peregrinos que i a m à Palesti na an
do junto deste. Por todos es­
faziam-se igua l mente tatuar, nos braços o u nos pun hos , rente de seu pai, embora viven
ses motivos, encontram-se no
interior de uma mesma famí­
lia e mais ainda no inter
desenhos que rep resen tavam a cruz ou o monograma de
ior de uma mesma localidade, rc­
pres mantes do ma is variados
Crist047. Observa-se o mesmo costume nas peregrinações
que se fazem a certos lugares santos da Ilália4ll. Um cu rio­ � � clãs. Assim , a unidade do
ao nome coletivo que possuem
s? ca�o de tatuagem espontânea é relatado por Lombroso: grupo só é perceptível graças
todos os seus mem bros e ao
emblema, igualmente coleti­
vinte Jovens de u m colégi o italiano, no momento de se se­
nada por esse nome. Um clã
pararem, fizeram-se gravar tauagens que, sob formas di­ vo, que reproduz a coisa desig
de indivíduos que têm u m
torno de um mesmo sig-
versas, lembravam os anos que eles acabavam de passar é essencialmente uma reu n ião
juntos49• A se unem em
mesm a prática foi com freqü ênci a o bserva da mesmo nome e que
244 AS FORMAS ELhMENTANES DA VIDA RELIGIO\ 1 1, 1 11/WÇ'AS ELEMENTARES

t Ima observação ele Strehlow perm


ite inclu sive preci-
no. Sem o nome e o signo que o materializa, o clã não e
foram prov avelm ente escolhidos
mais sequer representável. Como ele só era possível nes:;; 1 1 1 ;1 maneira pela qual
ter observado que os cen-
condição, explicam-se tanto a i nstituição cio emblema , «sl·s emblemas. Strehlow diz
ria elas veze s situa dos nas
quanto a imponância desse emblema na vicia cio grupo. 1 1 01> totêm icos estão na maio
u m a mon tanh a, ele uma fonte, de um
111 oxim idacles ele
que serve m ele totem ao
d1 ·sfila clciro , onde os anim ais
ia, e ;ita váric:s exem­
Hesta saber por que esses nomes e esses emblemas
11 1 u r o se encontram
em abun dânc
foram tomados, ele uma maneira quase exclusiva, cio rei
6. Ora, esses centr os totemicos sao certa-
no animal e cio reino vegetal, mas sobretudo cio primeiro. plos desse faros
o clã realizava seus en­
Parece-nos verossímil que o emblema desempenhou 1 1 1l·nte os locais consagrados onde
que cada grup o tomou por in­
um papel mais importante que o nome. Em todo caso o ' 1 nuros. Parece, portanto,

sigi:io escrito ocupa ainda hoje na vicia cio clã um l u ar � "1gni a o anim al ou o vege tal mais difun dido nas vizin han­

\ · ls do lugar onde tinha o hábit


o de se reunir57.
mais central que o signo falado. Ora, a matéria ela ima
gem emblemática só podia ser pedida a uma coisa susce­
tível ele ser figurada por um desenho. Por outro lado era
preciso que essas coisas fossem daquelas com as qua s os l VI

homens do clã estavam mais imediatamente e mais habi­


dar a chave de um
tualmeme em contato. Os animais preenchiam em mais Essa teoria do totemismo vai nos
ade hum ana que, se era mais
alto grau essa condição. Para esses povos de caçadores e traço curio so da men talid
ra cio que hoje , nem por isso desapareceu
pescadores, o animal constituía, com efeito, o elemento marcado outro
desempenhou um papel considerá­
essencial cio meio econômico. Sob esse aspecto, as plan­ e que, em todo caso,
amen to. Será mais uma ocasião de
tas vinham apenas a seguir, pois elas têm necessariamen­ vel na história do pens
que a evolu ção lógic a é estreitamente solid ária
te importância secundária na alimentação enquanto não constatar
nde, com o esta últim a, ele
são cultivadas. Aliás, o animal está mais intimamente as­ d a evol ução relig iosa e depe
sociado à vida cio homem que a planta, quando não por condições sociais5B.
afigura hoje como ple­
causa elo parentesco ele natureza que une esses dois se­ Se há uma verdade que se nos
que se difer enci am, não
res. Ao contrário, o Sol, a lua e os astros estavam demasia­ namente evid ente , é que seres
aparê ncia exter ior, mas por suas proprie­
do longe e davam a impressão ele pertencer a um outro apenas por sua
os mine rais, as plantas, os
munclo55. Ademais, enquanto as constelações não eram dades mais essenciais - corno
não pode riam ser cons idera dos
distinguidas e classificadas, o firmamento não oferecia su­ anim ais e os hom ens -,
es e diret amen te subst ituíve is entre si. Um longo
ficiente cliversiclacle ele coisas diferenciadas o bastante pa­ equivalent
enraizou ameia mais forte­
ra poderem designar todos os clãs e subclãs ele uma tribo· costume, que a cultura científica
em compensação, a variedade ela flora e sobretudo cl ; mente em nossos esrír itos, nos ensinou a estabelecer en­
barreiras cuja existência
fauna era quase inesgotável. Por essas razões, os corpos tre os diversos reinos ela natureza
não nega ; pois, se ele admite que
celestes, a despeito ele sua ostentação, da fo1te impressão o próprio transformismo
nasci do ela maté ria não-viva e o hom em
que causavam aos sentidos, eram impróprios ao papel de a vida pode ter
vivo s, uma vez forma­
totens, para o qual, ao contrário, os animais e vegetais cio anim al, não ignora que os seres
os mine rais, e o hom em, outra
eram perfeitamente indicados. dos, são outra coisa que
AS FORMAS ELEMENTARESDA VTDil REL/Ctl< 1 , UIV(AS ELEMBt•trAR/iS
246
247

1
coisa que um anim al. No inter
ior de cada reino, as nu
.1 1enha 1ncervindo para transfigurar o real de modo a
l 11
mas barreiras separam as difer
lc > mostrar-se sob
entes classes: não concd >t
mos como um mineral poderia um aspecro que não é o seu .
ter os caracteres distintivc ,
de um outro mineral, ou uma Foi a religião o agente dessa transfigu ração; foram as
espécie anim al os de u111,1
1 1 1 1� as religiosas que substituíram o mundo, tal �orno o

1 1 dlern os sentidos, por um mun o diferente. E o que


outra espécie. Mas essas distin
n �turais , não têm nada de prim
ções, que nos parecem 1.11 ,
1 �
itivo. Na origem, todos m
remos se confundem uns com 1 1 1 1 ,�11•1 o caso do totemismo. O que ha de fundamental n�-
os outros. Os rochedos ti·m
um s_:xo, têm o poder de enge 1 i d igião é que as pessoas do clã e os seres diversos �up
ndrar; o Sol, a Lua, as est n · .
J, 1 1 1 1 1a o emblema totêmico reproduz são údos como feitos
1 1 mesma essência. Ora, uma vez admitida essa crença, es­
las sao h�mens ou mulheres,
que experimentam e expn
mem senumemos humanos,
enquanto os homens ao cem
n 1 lançada a ponte entre os diferentes reinos. O homem
trário, são concebidos como anim
cio de indistinção encontra-se
E
ais ou plantas. sse esta
, 1 . 1 tl!presentado como uma espécie de animal ou de plan-
na base de todas as mitolo
gias. Daí o aráter ambíguo 1 1 , .1s pla ntas e os animais corno parentes do homen:; ou
: cios seres que os mitos põem
em c� na; na se pode class 1 1 wlhor. todos esses seres, tão diferentes para os senudos,
? ificá -los em nenh um gêne ro
� .
de m1do , pois part icipa m ao
mesmo temp o dos gêncro.�
, 1 , 1 111 c�ncebidos como participando de uma mesma nature-
mais opostos. Por isso admite-se 1 Assim essa notável capacidade de confundir o que nos
p.1 1ec.:e tã� manifestamente distinto provém de que as pri-
sem dificuldade que ele.�
possam transformar-se uns nos
outros; e é por transforma
ções desse tipo que os hom 1 1 1l'iras forças com que a inteligência humana povoou o L�ni-
ens, dura nte muit o temp o,
. 1crso foram elaboradas pela religião. Como elas eram feitas
acreditar
ck· clemencos tomados dos diferentes reinos, fez-se delas o
am poder explicar a gênese
das coisas.
Que o instinto antropomórfic
o que os animistas atri­
buíram ao primitivo não poss princípio comum das coisas mais heterogêne: s, que se vi-
a explicar essa mentalidade .
é � que demonstra a natu reza assim dotadas de uma única e mesma essenc1a.
1 , 11n
das confusões que a carac.' _
tenzam. Elas decorrem, com Mas sabemos, por outro lado. que essas concepçoes
efeito, não de o homem ter
! i d igiosas são o produto de causas sociais determinadas.
e ;01110 o clã não pode existir sem um nome e sem u m em-
estend do desmesuradamente
o reino hum ano ao ponto
ele faze-lo abranger todos os
outros, mas de haver mistu­
rado os reinos mais díspares. 1 ilcma e c.:omo esse emblema está sempre presente aos
Ele não concebeu o mundo

nlhare. dos indivíduos, é para ele e para os objetos de que
1 · a imagem que se voltam os sentimentos que a socied �de
se conc ebeu à imagem do
à sua imag em mais do que
mundo: procedeu de ambas
as man eiras ao mesmo tem­
po. Na idéia que fazia das coisa desperta em seus membros. Os home�s tivc :am, ass1m,
s, ele certamente introdu­ _
ziu elem ento s hum anos ; mas, necessidade de representar a força colet1va cuia açao sen­
na idéia que fazia de s i
mesmo, introduziu elementos tiam, sob as aparências da coisa que servia de bandei �a ao
q u e lhe vinh am das coisas.
grupo. Na noção dessa força se achavam confu � d1dos,
portanto, os reinos mais diferentes; num certo �e��do, ela
No entanto, não havia nada na
experiência que lhe pu­
desse sugerir essas apro xi maçõ
es ou essas mist uras . Do
ponto de vista ela observação sensí era essencialmente humana, visto que feita de ideias e ele
vel, tudo é diverso e des­
contínuo. Em parte nenhuma, sentimentos humanos; mas, ao mesmo tempo, ela não po­
na realidade, vemos os seres
mistu�rem sua natureza e met dia deixar de aparecer c0mo estreitamente aparentada ao
amorfosearem-se uns nos ou­
tros . E preciso, pois, que uma ser animado ou inanimado que lhe emprestava suas for­
causa excepcionalmente po-
11as exteriores. A causa cuja ação percebemos aqui não é,
;
AS FO/llfAS H.l.E\fE,VTARES DA \IDA Rl:.'/l<.Jt l 1
1\
248 2'-19
Nl'.SÇAS ELEMEtvTARES

, 1 .. 1� Nas u>ndições cm que foi tentado, o empreendi


aliás, particular apenas ao totemismo; não há socil·<l.1d1

1111 1110 evidentemente só poderia chega r a resultados pre-


onde ela não atue. De uma maneira geral, um sent11m:111e 1
coletivo não pode tomar consciência de si a não ser ftx.111
1 1 1,,.., Mas será que alguma vez ele produz resultados de-
do-se num objeto materialS9; mas, e por isso mesmo. 1•11 1
participa da naLUreza desse objeto e reciprocamente. l'r 11
1 11 1 1 1 1,·os? E não é necessár io retomá- l o a todo instanLc?
i. 111 do mais, o que importava era menos o êxito que a
1 111,,1dia. O essencial era não deix a r o espírito subjugado
tanto, foram necessidades sociais que fizeram fundirem �'

1 � 1 p. 1 rên cias sensíveis, mas, ao contrário, ensinar-lhe a


noções que, ã primeira vista, pareciam distintas, e a v1d.1

t h 1 1 1 1111á-las e a aproximar o q u e os sentidos separam,


social facilitou essa fusão pela grande efervescência 111l'll

p• 11o;, a partir do momento em que o homem teve o s�nti-


tal que c.letermina60. É mais uma prova de que o entendi
mento lógico é funç-Jo da sociedade. uma vez que toma .1�
1 1 11•1110 de que existem conexões internas entre as coisas,
1 , ll'ncia e a filosofia se tornavam possíveis. A religião
formas e as atitudes que esta lhe imprime.
É verdade que essa lógica nos desconcerta. Nau d1·
1 ! 1 1 1 1 1 l hes o caminho. Mas, se pôde desempenhar es se
1 , qwl, é porque ela é coisa social. Para impor a lei às in:­
vemos, porém, depreciá-la: por mais grosseira que po:i�.1
nos parecer, ela rrazia, parn a evolução intelectual da hu
l 'll''"flCS dos sentidos e substituí-las por uma nova mane1-
1 e dl· representar o real , era preciso que um pensame_nto
manidade, u m a contribuição da mais alta importânc1.1
Através dela, com efeito, foi possível uma primeira exph
. 1 1 1 1 1 1 1 novo tipo se constituísse: o pensamento coleuvo.
cação cio mune.lo . Claro que os hábitos mentais que ela
implica impediam o homem ele ver a realidade tal come•
" somente este podia ter tal eficácia, é porque, para criar
1 1 11 lo u m mu ne.lo de ideais através do qual o m u ndo elas
l h e mostram os sentidos; mas a realidade, tal como 1·
1 il1dac.les percebidas aparecesse cransfigurad�, era pr�ci:
mostrada pelos sentidos, tem o grave inconveniente d1·
uma superexcitação das forças intel ectuais que so e
1;, "�1,·cl na e pela sociedade.
o
ser refratária a toda explicação. Pois explicar é ligar a�
coisas entre si, é esrabelecer entre elas rela(ões que as fa .
Portanto, é um erro pensar que essa mentalidade n�-
1 l.1 1�·11ha a ver com a nossa. No ss
çam aparecer como funçã o umas elas outras, vibrando
a lógica nasceu dessa lo­
Hll .1 As expl icações da ciência c� ntem !Jorân : a _sã o mais
simpaticamente segundo uma lei interior, fundada em sua
natureza. Ora. a sensação, que não percebe nada além e.lo
. l'g111.1s de ser objetivas porque sao mais meto d1ca s, por­
exterior, seria incapaz de nos fazer descobrir essas relaçõc!'.
q 1 1 1 �e baseiam em observações mais severamente con­
e esses laços internos; somente o espírito pode criar a no
\ 1 1 1l.1das, mas elas não diferem em natureza daquelas que
çào deles. Quando aprendo que A precede rcgularmentl'
13, meu conhecimento se enriqueceu de um novo saber;
1 1 1slazem o pensamento primitivo. Tanto hoje como ou -
1 1 1 1 1 , 1 , exp l i ca r é mostrar como uma coisa p� n_ic i pa_ de u1� a
minha inteligência de maneira nenhuma se satisfaz com
1 1 1 dl.'. várias outras. Foi dito que as part1c1par;oes cu1a
l 1'll'l1Cia é postulada pelas mitologias violam o princípio
uma constatação que não contenha em si sua razão. So
começo a compreender">e me for possível conceber B por
d• , omrac.IKà<> e q u e , por isso, elas se opõem àquelas
um viés que o mostre a mini como não sendo estranho a
1 1 111 1das nas explicações científicas61. Afirmar que u m ho-
1 1 w 1 1 1 0 um canguru, que o Sol é um pássaro, não é ide � ti­
,
A, como estando unido a A por alguma relação c.le paren­
tesco. O g ra n de serviço q u e as religiões prestaram ao
l 11 , 1 1 o mesmo e o outro! Mas não pensamos de maneira
dil• ll'nte quando dizemos, do calor, que é um movirnen-
pensamento é ter construído uma primeira representação
do que podiam ser essas relações de parentesco entre as
1 1 1, d,1 luz, que é uma vibração do éter, etc. Sempre que
250 AS FORMAS ELHllIENTAl?ES DA VIDA REIJ(,'f( J\ 1

• \ l ' l ' l 'l ll.0 V!Il


unimos por um vínculo interno termos heterogêneos, 111
cessariamente identificamos contrários. Claro que os i('I \ NOÇÃO DE ALMA
mos que unimos deste modo não são os que o australia111 •
aproxima; nós os escolhemos por outros critérios e pn1
outras razões; mas o procedimento pelo qual o espírito ( 1:,
põe em relação não difere essencialmente.
É verdade que, se o pensamento primitivo tivesse rw
Ia contradição a indiferença geral e sistemática que lhe ('
atribuída62, ele contrastaria, nesse ponto, e de maneira
acentuada, com o pensamento moderno, sempre cioso dv
guardar sua coerência. Mas não acreditamos que seja pos
sível caracterizar a mentalidade das sociedades inferiorl':o,
por uma espécie de tendência unilateral e exclusiva para
a indistinção. Se o primitivo confunde coisas que distin
guimos, ele distingue outras, inversamente, que aproxi­
mamos, e concebe inclusive essas distinções sob a forma
Estudamos, nos capítulos anteriores, os princípios
de oposições violentas e nítidas. Entre dois seres classifi­
l 1 1 1 1damentais da religião totêmica. Pudemos ver que toda
cados em duas frat.rias diferentes, não há apenas separa­
idéia ele alma, ele espírito, ele personagem mítico está au­
ção, mas antagonismo63. Por essa razão, o mesmo australia­
s\'nte dela. No entanto, se a noção de seres espirituais
no que confunde o Sol e a cacatua-branca opõe esta últi­
11:10 está na base do totemismo nem, conseqüentemente,
ma à cacatua-preta como a seu contrário. Uma e outra lhe
do pensamento religioso em gera l , n ã o há religião em
parecem pertencer a dois gêneros separados entre os
quais não há nada em comu m. Uma oposição ainda mais que essa noção não se verifique. Convém, po1tanto, saber
acentuada é a que existe entre coisas sagradas e coisas como ela se constituiu. Para termos certeza ele que ela é o
profanas. Elas se repelem e se contradizem com tal força, produto de u m a formação secundária, precisamos estabe­
que o espírito se recusa a pensá-las ao mesmo tempo. Ex­ lecer de que maneira derivou das concepções que ante­
pulsam-se mutuamente da consciência. riormente expusemos e explicamos.
Assim, entre a lógica do pensamento religioso e a ló­ Entre os seres espirituais, existe um que deve em pri­
gica do pensamento científico não há um abismo. Ambas meiro lugar reter nossa atenção, por ser. o protótipo a par­
são feitas elos mesmos elementos essenciais, mas desen­ tir do qual os demais foram construídos: a alma.
volvidos ele maneira desigual e diferente. O que parece
sobretudo caracterizar a primeira é um gosto natural tanto
pelas confusões intemperantes quanto pelos contrastes de
opostos. E l a tende a ser excessiva nos dois sentidos.
Quando aproxima, confunde; quando distingue, opõe.
Assim como não h;'i sociedade conhecida sem reli­
Não conhece a medida e as nuanças, busca os extremos;
gião, também não existe nenhuma, por mais grosseira­
por conseguinte, emprega os mecanismos lógicos com
mente organizada que seja, em que não se verifique todo
uma espécie de imperícia, mas não ignora nenhum deles.
__ ,.. --.t.----�- . ,1.....,

2'52 AS FORMAS EI.EJfE.\TARES DA 1"/DA REU<;JCJ\ 1 1 <.Rl!J\'ÇAS ELEMENTARES 253

um sistema de representações coletivas relacionadas ü .li 1111 !>lia forma é essencia lmente inconsistente e indeter
ma, à sua origem, a seu desti no. Tanto quanto se pod1· 1111nada7; ela modifica-se de u m instante a outro ao sabor
julgar com base nos dados da ernografia, a idéia de alm;1 J 1.., circunstâncias conforme as exigências do
mito e do
parece ter sido contemporânea da humanidade e paren· 1 1111 A substância de que é feita não é menos indefinível.
ter tido desde o início todas as suas características essen 1 J.1 não é privada de matéria , já que possui uma form� ,
l " >r mais vaga que seja. E, de fato, mesmo durante
ciais, de sorte que as religiões mais avançadas e a filosofi.1 esta v1-
praticamente se lim itaram a depurá-la, sem nada llw .J.1, ela tem necessidades físicas: come e, rnversa
. men �e,
acrescentar de realmente fundamenrnl. Todas as socied.1 pndc ser comida. Sucede- lhe sair do c<:>rpo e, em suas v1<�­
'• '11'>, aliment ar-se ele almas estrangelías11• Quando
eles australianas admitem, com efeito, que cada corpo hu se Il-
i nou completamente do organismo, supõem que
mano abriga um ser interior, princípio da vida que o ani ela le­
ma: a alma. É verdade que as mulheres constituem excl' "' uma vida inteiram ente análoga à que levava nesta ter-
çào à regra geral: há tribos cm que elas são considt:rnd.i� 1 1 bebe, come, caça, etc.9 Ao esvoaçar nos ramos das ar­
como não tendo alma ' . A acreditar em Dawson, o mesmo 'nrcs, produz ruídos e esta lidos que mesmo _os. ouv1c.los
aconteceria com as crianças pequenas nas trihos que el1· piofanos percebem'º· Mas, ao mesmo tempo, e uda como
obscrvoui. Mas estes são casos excepcionais, provavel "" 1sível ao vulgo". Os mágicos, é verdade, ou os velh �s,
1 1 111 a faculdade de ver as almas, mas isso porque, em
mente tardios3; o último afigura-se inclusive suspeito v v1r­
t 11<k: de poderes especiais, que devem à idade ou
poderia muito bem ser devido a uma interpretação errô a uma
nea dos fatos4 . , 111lura especia l, eles percebem coisas que escapam aos
É difícil determinar a idéia que o australiano faz da 11nssos sentidos. Quanto aos indivíduos comuns, eles só
alma, a tal ponto ela é obscura e flutuante, e não podería 1 1 i.1m o mesmo privilégio, 'iegundo Dawson
, num único
mos nos surpreender com isso. Se perguntássemos a nos 11111mento ele sua existência: quando estão às vésperas de
sos contemporâneos, àqueles mesmos que crêem mais 11111rrer de uma morte prematura. Assim, essa visão quase
firmemente na existência da alma, de que maneira a con 1111raculosa é tida como um sinistro presságio. Ora, a invi-
cebcm, suas respostas não teriam muito mais coerência e ilulidadc é geralmente considerada como u_m cios sinai �
precisão. É que se trata de uma noção muito complexa. , ).1 c!>piritualidade. Portanto, numa certa medida, a � lma :
em que entra uma quantidade de impressões mal analisa c oncchida como imateri al, pois não afeta os sentidos a
das, cuja elaboração foi sendo feita durante !>éculos, sem 1 11.1ncira dos corpos: ela não tem ossos, dizem as tribos do
1 1 1 1 Tullyti. Para conci liar Lados esses ca!�ct�re ?
que os homens tivessem uma consciência cl a ra a respei s postos
. '.
to. Eis aqui, não obstante, os caracteres mais essenciais - 1 1 presenwm-na como feita de uma matena _ mf10,1tamente
freqüentemente contraditórios, aliás - pelos quais ela se 1 1 1 , 1 e sutil, como algo de etéreo 1 3, comparavel a sombra
define. , 111 .1 rcspiração 11.
Num certo número ele casos, dizem-nos que ela tem l:la é disltnta e tndependente do corpo, uma vez que,
o aspecto exterior do corpo5. Mas acontece também ser 1 , nesta vida, pode sair momen taneam ente dele._ Ela o
representada como do tamanho de um grão de areia; ela 11>.1 ndona durante o sono, durante o desmaio, etc. 11 Pode
1111 l11sive permanecer aus<:nte por algum tempo sem
teria dimensões tão reduzidas que poderia passar pelo!> que
menores orifícios e fendas6. Veremos que ela é, ao mes 111\L'nha a morte; todavia, nessas ausênci as, a vida se re­
1 Mas
mo tempo, concebida sob aparências animais . Vale dizer .1111, e irá cessar se a alma não voltar à sua morada 6.
� .... ...
--.t. - --6:0 -•A
...,.

25t AS FORMAS EWMENTARESDA VTDA RELIGJOS. I 1' c.RE\ÇAS EI..EMEX/'ARFS 255

é sol retudo na morte que essa distinção


� p;i com ele. A .1lma não está na respiração: ela é a respira­
�.. 10. Co mp e uma coisa só com a rarte do corpo onde re­
A e essa in<lepL' J I
denc1a se mos tram com mais clareza. Enqua õ
. nto 0 corpo
deixa de existir e dele não resta m mais traços �ide. Daí veio a concepção segundo a qual o homem tem
visíveis a
atr:ia co tinu a viver; num mundo à parte,
A
� �
eXJslencia autonoma.

ela leva u 1a uma pluralidade de almas. Dispersa pelo organismo, a al­
ma se diferenciou e se fragmentou. Cada órgão como que
Mas, por mais real que seja essa dualid ade, 111dividualizou a porção de alma que contém e que assim
ela não
? �
tem nada de ª soluw . eria um erro conce
ber o corpo '.'><.: tomou uma entidade distinta. A do coração nãopode­
como uma espec1e de habita t em que a iia ser idên tica à d a respiração, da sombra ou da place nta.
l·:mbora LOdas sejam apa rent ad as, elas requerem ser d i s­
la ma reside mas
com ? qual só � a nt ém relaçõ es ext e riores . Muito pelo
.
.
conlrano, ela esta unida a ele pe l s laços llnguidas e 1êm inclusive nomes diferentes2.i.
o mais estreito<;·
i clusive só é separável de maneira difícil
� rã Aliás, se esta mais particul a rme nte localizada em cer-
10:. ponto:. do orga nismo, a allna não está ausente dos ou­
e imperfeita.
vimos que Ja possui ou, pelo menos, pode
� adquir ir 0 s­

pecro extenor do corpo. Conseqüentemence
�� , o que atinge tros. Em graus diversos, encontra-se difusa no corpo intei­
�':1 at10ge.
a � :
tra : ;o o erimento do corpo se propa ro. É o que mostram bem os ritos mortuários. Assim que o
1a me nte associada à vida cio
ga
ate a lma 1 7. El.t esta tao
� mtm último suspiro é ex a la do e a alma supostamente ahando­
ele. É por isso
organismo que cresce e enfraq uece com na o corpo, parece que ela deveria imediatamente apro­
que o homem que chegou a uma certa idade veitar a liberclaclc assim recon q uista da para se mover à
desfruta de
P'.ivilégios que são recusados aos jovens vontade e voltar o mais rápido possível à sua verdadeira
: o princípio reli­
?1oso � se ue enconcra nele adquiriu mais forma e eficáci
a
pátria, que esl:á alhures. No emanco, ela permanece junto
a medida que avançava na vida. Mas, no ao cadáver; o laço que a rrende a ele se afrouxou, não se
de prop riamente dita, quando o velho tornou
caso da senilida­
-se incapaz rompeu. É p reciso toda uma série de ritos e speci a is para
�e desempe har um p a pel úlil nas gra de
n fazê-la a fastar- se definitivamente. Por meio de gestos, de
. n s cerimônias re­
l1 10sas em que os interesses vita is d a tribo
ª movimen tos sign ificat ivos, convidam-na a p a r t ir21 . Ahrem­
estão em jogo,
deferências. Considera-se que a
nao r:ia1s . lhe demonstram lhe caminhos, preparam-lhe saídas para que ela possa le­
É que ela não sai u ror com­
.
debilidade do corpo transmitiu-se à allna. vantar vôo mais facilmente25.
Não tendo mais
os mesmos poder es, o sujeito não tem pleto do corpo; impregnava-o muito profundamente para
mais direito ao
mesmo prestígiolfl. poder soltar-se dele de um só golpe. Daí procede o rito
Entre a alma e o corpo não há somente rao freqüentc da antro pofagia funerária:as carnes do mor­
estreita soli­
daned .
acle, mas areia! confusão. Assim como
� to são consumidas porque se supõe qu e nelas resida um
corpo na alma, Jª
há algo do
que esta reproduz às vezes a forma da­
. princípio sagrado, que não é outro senão a alma26. Para
quele, também há a lgo d alma no corpo extirpá-la definitivamente, dissolvem as carnes, submeten­
do-as seja ao calor do <;of2-, seja à ação ele u m fogo artifi­
� . Certas regiões,
certos produtos do organismo teriam uma
afinidade muito
especial com ela: é o caso do coração, ela c1aJl.8.
A alma se vai com os líquidos que escoam. Mas os
respiração, da
placen� 19, do sangue20, da somb 2 1 , dora ossos dessecados conservam ain da alguma coisa dela. As­
fígado, da gordu­
ra do f1gado, cios rins22, etc. Esses diverso sim são emp regados como objetos sagrados o u como ins­
s substratos ma­
teriais ão são, para a alma , meros hábi tat5 ; são a própria
� trumentos mágicos29; ou então, se se quer pôr em comp le­
alma vista de fora. Quando o sangue escorre ta liberdade o princípio que eles contêm, quebram-nos30.
, a alma esca-
256 AS FORMAS ELEMENTARES DA nDA RELIG/CJ\ 1 t < REXÇAS E!El1ENTARES 257

Chega um momento, porém, em que a separação <k Em geral, todas as almas têm o mesmo destino e le-
to
fin itiva é consumada; a alma liberada empreende seu võo. 1 1 111 a mesma vicia. Entretanto, ocorre que um tratamen
se
Mas ela é, por natureza, tão intimamente associada ao t l 1 krente seja aplicado conforme a maneira como elas
corpo, que essa soltura não ocorre sem uma grave trans 1 1 1nduzira m na terra, e vemos surgir como que um pri-
formação ele seu estado. Por isso ela adquire um outro 111l·1ro esboço desses compartimentos distintos e inclusive
nome.�•. Embora conserve todos os traços do indivíduo 1 1p ostos entre os quais se dividirá mais tarde o mundo do
ca­
que animava, seu humor, suas boas e más qual idadesu , 11l m. As almas dos que se destacaram, em vida, como
l 1dores, guerreiros, dançarinos, etc., não
ela tornou-se u m ser novo. A partir ele então, começa pa se confundem
ra da uma nova existência. , l llll a multidão dos outros; um lugar especial lhes é re-
relata
Ela se dirige ao país das almas. Esse país é diversa ' rvadoll . Às vezes, esse lugar é o céu42. Strehlow
dos
mente concebido conforme as tribos; encontram-se inclu­ inclusiv e que, de acordo com um mito, as almas
sive conce pi,:ões diferentes que coexistem lado a lado as por espíritos temíveis e aniqmladas·•3.
1mus são devorad
1 untudo, essas concepções sempre permanecem
numa mesma sociedade. Às vezes ele est:á situado debai­ muito

1111precisas na Austrália 1\ só começam a adquirir um


xo ela terra, e cada grupo totêmico tem o seu. É o lugar pou­
onde os primeiros antepassados, fundadores do clã, cm o e clareza em sociedad es mais avançad as,
' ' ' de definiçã
determinado momento penetraram no solo e passaram a , llmO as da América4s.
viver após sua morte. Assim existe, no mundo subterrâ­
neo, uma distribuição geográfica dos mortos que corres­
ponde ã dos vivos. Lá, brilha um sol perpétuo; lá, correm II
rios que jamais ficam secos. Tal é a concepção que Spen­
a
cer e Gillen atribuem às tribos do Centro, os Arunta33, os Tais são, em sua forma mais primitiva, e reduzidas
relativas à natureza da
Warramunga:H , etc. Ela também se verifica entre os Wor­ " us traços essenciais, as crenças
O
jobaluk�S. Outras vezes, todos os mortos, sejam quais fo­ i l ma e a seu destino. Devemos agora tentar explicá-las.
nele
rem seus totens, são tidos por viverem juntos num mes­ q11 <:: pode ter levado o homem a pensar que havia
es-
mo lugar, mais ou menos vagamente localizado, para lrns seres, um dos quais possuindo os caracteres tão
1 ivciais acabam de ser enumera dos? Para respond er a
� lém do mar, numa ilha36, ou nas margens de um lago37. que
o
As vezes, enfim, é para o céu, além das nuvens, que se , �sa questão , comecemos por examin ar que origem
supõe que as almas se dirigem. "Lá, diz Dawson, encon­ pr<>prio primitivo atribui ao princípio espiJitua l que acre­
ão
tra-se um magnífico lugar, abundante em cangurus e cm d i t a sentir nele: bem analisad a, sua própria concepç
caça de todo tipo, onde se leva uma vida feliz. Lá as al­ 1 1 0:-; colocará no caminho da solução.
mas se reencontram e se reconhecem."38 É provável que Segundo o método que nos esforçamos por praticar,
alguns dos traços de que é composto esse quadro te e tudaremos as idéias em questão num
grupo determina­
nham sido tomados do paraíso dos missionários cris­ do de sociedades em que elas foram observadas com uma
tãos39; mas a idéia de que as almas ou, pelo menos, de ptcci s ão muito particula r: as tribos do centro australiano.
por-
que cenas almas vão ao céu depois da morte, parece ser \ area de nossa observaç;;o, embora extensa, será,
há razões para acredita r que essas
a u tóctone; pois a encontramos em outros pontos do 1 , 1 nw, limitada . Mas
continente10. 1 1 1L'smas idéias, sob formas diversas, são ou foram de uma
259
258 AS FORMAS ELEMENTARES DA VTDA RELIGJCl\ t I\ r liF\'ÇAS ELl!J.IENTARFS

grande generalidade, mesmo fora da Austrália. Além c.lh


a, além da qual a
los fundadores do clã. Numa époc
so, e sobretudo, a noção de alma, nessas tribos cenrrai s, �
1 1 1 1.1gi ação não remo nta e que é cons idera da o primeiro

, • •l lH?ÇO dos temp os, exist iam seres que não deriv�vam d�
não é especificamente diferente do que nas outras socit·
a, por essa razao, Alp­
dades australianas; por toda parte, ela apresenta os mes 111 nhum outro. O arunta os cham
incria dos, os que existem desde toda a
mos caracteres essenciais. Como um mesmo efeito tem ,,111p,amitjina41, os
sempre uma mesma causa, há razões para pensar que e.� 1 tl'rnidade, e, segundo
Spencer e Gillen, ele daria o nome
seres fabulosos
sa noção, sempre idêntica, não resulta, aqui e ali, de ele: 1 11 Alcheringa4s ao período em que esses
nizad os em clàs totêm icos, assim co-
mentos diferentes. A origem que seremos levados a atri­ t • · t'iam vivido. Orga
vam seu tempo em via-
buir-lhe através do estudo das tribos que abordaremos 1 1 10 os homens de hoje, eles passa
quai s reali zaram todo tipo de ações
mais especificamente, deverá, portanto, ser considerada 1w ns, ao longo das
cuja lemb ranç a os mito s perp etua m. Mas
como igualmente verdadeira para as outras. As primeiras prod igios as,
terrestre teve fim:
nos pcnnitir::io fazer, dt: certo modo, uma expenência cujos 1 hegou um momento em que essa vida
grup os, eles se ente rraram no solo .
resultados, como os de toda experiência bem feita' serão 1,oJadamente ou em
em árvores ou em roche­
suscelÍveis de ser general.izados. A homogeneidade da ci­ Sl.!us corpos transformaram-se
s onde teriam desapare­
vilização australiana seria suficiente, por si só, para justifi­ dos que são vistos ainda nos locai
. Mas suas alma s duram sempre; elas
car essa genera lização; mas teremos o cuidado de confir­ rido debaixo da terra
sive a freqüentar os lugares
má-la em seguida por meio ele fatos tomados de outros são imortais. Continuam inclu
de seus prim eiros hospedei­
razão das lembranças que
povos , tanto da Austrália quanto da América. onde terminou a existência
Como as concepções que nos fornecerão a base de ros. Esses lugares têm, aliás , em
lá que se encontram os ok-
nossa demonstração foram relatadas em termos diferentes evocam, um caráter sagrado; é
ários onde são conservados
por Spencer e Gillen, de um l ado, e por Strehlow, de ou­ 11anikilla, espécies de santu
clã e que são com o os centros dos dife­
tro, devemos expor sucessivamente essas duas versões. os churinga do
do uma das alma s que va­
Veremos que, bem interpretadas, elas diferem mais na rentes cultos totêmicos. Quan
um dess es santu ários se introduz no
forma que no fundo e que, em última instância, têm a gueiam em torno de
ltado é u m a co nc�pção e:
mesma significação sociológica. corpo de uma mulher, o resu . _
Porta nto, cada md1v1duo e
s:gund? Spencer e Gillen, as almas que, a cada gera­ mais tarde, um nascimento49.
avata r de um ante pass ado
_

çao, vem arumar os corpos dos recém-nascidos não são o considerado com o u m novo
ado mesm o, retornando
produto de criações especiais e originais; todas essas tri­ determinado: ele é esse antepass
s traço s. Ora, o que eram es-
bos admitiam que existe um estoque definido de almas num novo corpo e sob novo
cujo número não pode ser acrescido de uma unidade46 � ses antepassados? . .
dos de poderes infiru�­
que se reencarnam periodicamente. Quando um indiví­ Em primeiro lugar, eram dota
uem os homens de hoie,
duo morre, sua alma deixa o corpo onde residia e, uma mente superiores aos que poss
s e os mágicos de maior
mesmo os velhos mais respeitado
vez cumprido o luto, dirige-se ao país das almas; mas, ao
cabo de um certo tempo, volta a encarnar-se de novo e reputação. Atribuem-lhes virtud
es que podería�os qua ifi­ �
viaja r no �hao, deba1�0
são ess� s reencarnações que ocasionam as concepçõe e � car de milagrosas: "Eles j)Odi am
de suas veia s, ela podia
os nascimentos. Essas almas fundamentais são aquelas do chão , nos ares ; aberta uma
cont rário, fazer emergir ter-
que, na 01igem mesma das coisas, animavam os antepas- inundar terras inteiras ou, ao
260 AS FORMAS ELEJl!ElffARF.S DA �7DA REL!G/OS.·I 261
\e RE.\ÇAS ELEMEJ\TARES

fisionomia própria ,
ras no�as; numa m�ralh de rochas, faziam surgir
� um lago m1gem delas; como cada uma tem sua
_
ou abrn-se um d�sftlade1ro que lhes serviria de passagem; cada uma, uma f'isiono mia distinta.
1•lv assume, em
nc­
no ponto onde fincavam seu nurtunja, rochas
ou áivores É verdade que esse princípio, em si mesmo, perma
brotavam do chào."5o Foram eles que deram ao estran ha ao homem ; mas sua par­
' l' uma força exterior e
ma que tem atualmente. Criaram todo tipo de
solo a for­
seres ho­ ' da presente em cada um não pode
deixar de con � for­

�e� ou animais. São quase deuses. Suas almas, port nto, � particular no qual reside : ela
ll'S afinidades com o sujeito
tem 1gual �ente um caráter divino. E já que as participa de sua nature za, numa cerra med .

i a se torna su �.
almas cios .
homens sao essas almas ancestrais reencarnadas , ela possu i dois caract eres contra cl1tonos, mas CUJa
em cor­ Assim
da noção de al­
pos humanos, elas próprias são seres sagrados. coexistência é um dos traços distin tivos
Em segundo lugar, esses antepassados não eram outro ra, a alma é, por um lado, o
lllJ. Tanto hoje como
� iste e n;i nós, a ?arte
ho­
m� ns, no senlido próprio da palavra, mas animais que de melho r e mais profun do e
ou vege­
l minen te de no!)SO !)er; n o entanto,
tais, ou entao_ e tamb em um hospe­
serec; mistos em que o elemento animal ou
vegetal predominava: "Os antepassados que viviam em que nos veio de fora, que vive em nós
nesses de de passag
rem l='.o� fabulo os, dizem Spencer e Gillen, eram, uma existência distin ta da do corpo e
que deve retomar
� segundo
a �p1�1ao _

os indígenas, tão intimamente associados aos um dia sua comp leta indep endên cia.
Em uma palav ra,
arnrna1s e as pi amas cujo nome traziam, que um como a socied ade só existe nos e pelos indivíduos,
.
gem do Alchennga pertencente ao lotem do cangu11
persona
.1 por
,1ssim
o princípio lotêmico só vive nas

e p� las consci ncias in­
exemplo, é freqüen tement e representado como
mem-canguru ou um canguru-homem. Sua persona
u �
ho­ dividuais, cuja assoc iação forma o ela. Se elas nao o sen­
ria; são elas que ?
tissem em si, esse princí pio não existi
lidade
humana não raro é absoivida pela da planta ou sidade , pois, de se parti­
do animal põem nas coisas. Ele lem neces
!
de que e e leria descen dido. "5 1 Suas almas, que
duram lhar e se fragmentar entre elas. Cada um desses fragmen­
s�mpre, tem necessariameme a mesma naturez tos é uma alma.
a; nelas Lam­
ro basta nt e
bem se casam o elemento humano e o elemento
animal Um mito que encon tramo s num núme
com u 1�a certa tendência do segundo a predom
_
. inar sobr � grande de socied ades do centr o autral iano
dos
e que, por si­
prece dentes ,
o pnmeuo. Elas são, portanto, feitas da mesma
substância nal não é senão uma forma particular
que o pr.incípio tolêrnico; pois sabemos que este
último �
mo tra ainda melhor que tal é de fato a matér ia de que é
a tradição coloca na
tem prec1�am�nre por característica apresentar esse feita a idéia de alma. Nessas tribos,
aspeclo, sintetizar e confund i r em si os dois reinos.
duplo
origem de cada clã, não uma plural idac

e de antep a �sa­
Como não existem outras almas a não ser estas , ou mesm o um so53. Esse ser urn�
che­ dos, mas apenas dois52
g� mos à conclusão de que a alma, de uma maneira
n� o é senão o princípio tolêmico encarnado em
� era[ co, enqua nto perm anece u assim solitá rio, continha em s1
pois nesse momento
cada incli� a totalidade do princípio torêmico,
v1duo. E ne_ssa derivação não há nada que possa ainda não existia nada a que esse princí pio pudesse se
nos sur­
. ão, todas as al­
preender. Ja sabemos que esse princípio é imanen
te a ca­ comunicar Ora, segundo a mesma tradiç
da um dos membros do clã. Mas, ao penetrar tanto as que anima m presen­
nos indiví­ mas huma nas que existem,
duos, é inevitável que ele próprio se individualize. corpo s dos home ns quant o as que, atualmente
Como temente os
o futuro, teriam
as consciências, das quais ele se torna assim um
elemento desempregadas, estão em reserva para
in tegrante, diferem umas das outras, ele se diferen único ; elas seriam feiras de sua
cia à saído desse personagem
262 AS FORJtAS ELEMENTARES DA
VTDA RELIG!O\A

substância. Ao �e mover na erf


tar: ao se sacudJr, ele as teriasupfeit o
ície do solo, ao se agi
Jetenninante da geração55; esta seria o produto
,, li� ,10
tena semeado nos diversos lugare sair de seu corpo e as 1h riperações místicas, mas diferentes daquelas que �s
que passou. Não é isso dizer, sob s por onde se acredita
uma forma simbólica, 11 1·n·adores anteriores nos mostraram, e se processana
que elas são parcelas da divind ade totêmica? 1 11 11 um ou outro dos seguintes caminhos.
Mas tal conclusão sup t·:m todo lugar onde um antepassado do Alchennga5'
. 6
mos admitem a �o�trina daõereeque as tribos de que fala­ 1 1 1 1• 1 se metido no solo, encontra-se uma pedr� ou uma
11 nn: que representa seu corpo. Chama-se na n1a,�egu_n­
Strehlow, esta sena ignorada pelos nca rnação. Ora, segundo
ciedade que Spencer e Gillen melho Arunca, isto é, pela so­ i 11 1 Spencer e Gillens7, e 11garra, segundo Stre�l<:>w , a ar­
estudaram. Se, nesse caso particular,r e mais longamente \ 1 1 1 v ou a pedra que, mantêm essa relação m1st1ca c�m o
dores tivessem se enganado esses dois observa­ 1 . mi desaparecido. As vezes, é um remoinho que te 1 ta se
..
seus testemunhos deveria ser con a tal pon to, o conjunto de _
1 1 1 1 macio desse modo. Ora, em cada uma d�sas an'o res,
porta, pois, determinar o alca siderado suspeito. Im­ .
111 -.sa.s pedras, desses remomhos, \1vem embnoes de cnan
� 1-;, chamados ratapa�9, que pertencem ao mesmo totem
nce real dessa divergência.
Segundo Strehlow, a alma, um
lt, antepassado correspondente. Por excmp�o, num euca-
a vez definitivament
liberta do corpo pelos rito
do luto, não se reencarnariae
�e nov<:>· Ela partiria para as ilha
1

1 1 pto que representa um antepassado do da cio Canguru


na os dias a dormir e as noites a dan dos mortos, onde passa­
,·ncontram-se ratapa que têm, todos, o canguru po� Lote�.
sobre a terra. Nesse momento, reto çar, até que chovesse ..,l. uma mulher vier a passar e se for da classe matnmorual
, 1 que devem regularmente perrencer as mães desses '. ta­
faria o papel de gênio proteto rnaria entre os vivos e :a

tio<.o, um deles poderá se introcluzJr nela pelo qua�u l. A


r jun to
ou, na falta deles, junco aos netos queaos a
filhos pequenos
mo
xar; ela se introduziria em seus cor rte a fez dei­ mulher é advertida dessa posse por d�res carac�ensucas .
cre�cimenro . Permaneceria ass pos e facilitaria seu A cnanca as­
. dur im, em io à sua antiga que são os primeiros sintomas da gravidez.
farrulta, ante um ou dois anos; depoismediss .,1111 concebida serã naturalmente do mesmo _wrem que o
ªº paí� das almas. Ma o,
. s, ao cab de algum tempo,reto rnaria .imepassado no corpo místico do qual ela res1d1a antes de
mais uma vez para voltar ao pas SI.! encarnar61.
na o deixa­
temporada, que seria a última. Che sar na terra uma nova
garia um momento em Em outros casos, o procedimento empregado e- .r1ge1-·
que seria obrigada a retomar , des ta ramente diferente: é o antepassado em pess�a que mte �­
minho da ilha dos mortos; e lã, apóvez sem retomo 0 ca­ vém. Num dado momento, ele sai de seu reuro subterra­
cujos detalhes é inútil relatar, sob s diversos incidentes
durante a qual seria fulmina reviria urna tempestade . e lança
neo sobre a mulher que passa um pequeno chu-
de uma forma especial, chamado namatuna62. O
da por nnga,
então, estaria definitivamente terminaum raio. Sua carreira' churinga penetra no corpo da mulher e a1- adqu1re · uma
Ela não poderia, pois, se reencarna da54.
. r; em conseqüên­ forma humana, enquanto o antepassado desaparece de
cia, as concepções e os nascimentos novo no solo63.
reencarnaç�o c�e almas que, periodic não seriam devidos à Esses dois modos de concepção são tidos como fre­
novas ex1stenc1as em corpos <l!11ente, recomeçariam qüentes, tanto um quanto 0�1tro. É º. rosto da criança que
da mesma forma _q�e Spencenov revelaria a maneira co· no fot concebida: de acordo com �
os. E claro que Strehlow,
os Arunta, o comercio dos sexos ele r e Gillen, afirma que, para
maneira nenhuma é a forma que tiver, ou larga ou alongada, diz-se que ele e
devido à encarnação de um ratapa ou de um namaruna.
264 AS FORMAS ELEMENTARES DA IWA REUG!OSA 1\ rREi\'ÇAS ELEMENTARES 265

Além desses dois processos de fecundação, StrehJow assi­ 1 1 11noniaJ68. Seu lugar no contexto social da tribo é exata­
nala um terceiro, mas que é tido como bem mais raro. o l l lt:nte aquele que o antepassado teria ocupado outrora.
próprio antepassado, depois que seu namatuna penetrou l'em o mesmo nome69. É uma prova de que essas duas
no corpo da mulher, se introduziria e se submeteria vo­ personalidades são, pelo menos, muito aparentadas uma
luntariamente a um novo nascimento. Desta vez, portan­ ela outra.
to, a concepção se deveria a uma verdadeira reencarna­ Mais: esse parentesco chega inclusive a uma comple­
ção do a �tepa�ado. Só que o caso seria muito excepcio­ t.i identidade. Com efeito, foi no corpo místico do ante­
nal e , alem disso, quando o homem assim concebido passado que o ratapa se formou; é daí que ele provém,
morre, a alma ancestral que o animava partiria, como as romo uma parcela que se tivesse destacado. Em suma,
da
almas comuns, para a ilha dos mortos, onde, após as de­ trata-se de algo do antepassado que penetra no seio
moras usuais, seria definitivamente aniquilada. Portanto' mãe e que se toma a criança. Assim, voltamos ã concep­
ela não sofreria novas reencarnações61. \ .lO de Spencer e Gillen: o nascimento é devido à encar­
Tal é a versão de Strehlow65. No pensamento desse nação de um personagem ancestra l. Claro que não é o
autor, ela se oporia radicalmente à de Spencer e Gillen. persona gem inteiro que se encarna , mas apenas uma
Em realidade, ela difere apenas pela letra das fórmulas
e emanação dele. A diferença, porém, é de interesse muito
dos símbolos, pois em ambos os casos, sob variações de secundário, uma vez que, quando u m ser sagrado se divi­
ca­
forma, o tema nútico é o mesmo. de e se desdobra, ele está presente, com todos os seus
os
Em primeiro lugar, todos esses observadores estão de racteres essenciais, em cada um dos fragmentos entre
acordo quanto a ver em cada concepção o produto quais se dividiu. O antepassa do do Alcheringa está, por­
de
uma encarnação. Só que, segundo Strehlow, o que se en­ tanto, no fundo, inteiro nesse elemento de si próprio que
carna não é uma alma, mas um ratapa ou um namanma. E se transforma num ratapa7o.
o � ue é um ratapa? É um embrião completo, diz Strehlow O segundo modo de concepção, distinguido por
,
feito ao mesmo tempo de uma alma e de um corpo. Mas Strehlow, tem a mesma significação. Com efeito, o churin­
a alma e_ sempre
representada sob formas materiais; ela ga, especialmente esse churinga particular chamado na­
dorme, dança, caça, come, etc. Porranto, também ela matuna é considerado um avatar do ancestral; é o corpo
compreende um elemento corporal . Inversamente 0 rata­ �
dele, s gundo Strehlow11, da mesma forma que a árvore
pa não é visível pelo vulgo; ninguém o percebe uando
. � nanja. Em outras palavras, a personalidade do ancestral,
se mtroduz no corpo da mulher66; vale dizer que é feito seu churinga, sua árvore nanja, são seres sagrados que
de uma matéria comparável à da alma. Assim, sob esse inspiram os mesmos sentimentos e aos quais se atribui o
aspecto, parece não ser possível diferenciá-los claramente mesmo valor religioso. Por isso, eles se transformam uns
um do outro. Trata-se, em última instância, de seres míti­ nos outros: onde um ancestral perdeu um churinga, uma
cos sensivelmente concebidos segundo o mesmo modelo. árvore ou uma pedra sagradas brotaram do chão, o mes­
Schulze chama-o s almas de crianças6-. Além disso, da mo acontecendo no lugar onde ele próprio se enterrou72.
me�ma forma que a alma, o ratapa mantém as relações Há, portanto, uma equ ivalência mítica entre um persona­
mais estreitas com o antepassado cujas formas materiali gem do Alcberinga e .:.eu churinga; por conseguinte,
­
zadas são a árvore ou a pedra. Ele é do mesmo totem que quando o primeiro lança um namatuna no corpo ele uma
esse antepassado, da mesma fratria, da mesma classe ma- mulher, é como se ele próprio penetrasse. De fato, vimos
AS FORMAS ELEME.'ffARES DA VIDA RELIGIOSA
1 \ CRENÇAS El.EME/\TARES
266
267

ll'S metáforas por meio das quais ele chegou a ser expres-
que, às vezes, ele se introduz aí em
pessoa depois do na
matuna; segundo ouLros relatos,
ele o precede, como se .
lhe abrisse o caminho73. O fato M> têm para nós um interesse apenas secun dá no78.
ele esses temas coexisti­ .
rem num mesmo mito acaba most Longe de contradizer os dados sobre os quais repousa
rando que um não é se­
não o substituto do outro. nossa tese as recentes observações de Strehlow nos trazem
Aliás, seja como for que a concepção novas pro�as que a confirmam. Nosso raciocínio co� istia
ocorra, não há
d ú vida de que cada indivíduo está vm inferir a natureza totêmica da alma humana a pa1t1r da
unido a um antepassa­
do determinado do Alche1inga por natureza totêmica da alma ancestral , da qual a primeira é
uma emanação e uma espécie de réplica. Ora, algu n� dos
laços excepcionalmen­
te íntimos. Em primeiro lugar, cada
fatos novos que devemos a Strehlow demo':'�· matS ca:
homem tem seu ante­
passado titular: duas pessoas não
tegoricamente ainda que aqueles de que d1sp�nh�os ate
podem ter simultanea­
mente o mesmo. Dito de outro modo
, um ser do Alche­
ringa sempre conta com um único então esse caráter que ambas possuem. Em pnmelfO lugar,
vivos74. Além disso, um é apen
representame entre os
as u m aspecto do outro .

Strehl w insiste, da mesma forma que Spencer e Gillen, so­
Com efeito, o churinga deixado bre "as relações íntimas que unem cada antepassado a um
pelo antepassado expri­
me, como sabemos, sua personalid animal1 a uma planta o u a um outro objeto natural''. Alguns
ade; se adotarmos a in­
terpretação de StrehJow, que é desses Altjirangamitjina (são os ancestrais do �cheringa. de
talvez a mais satisfatória ,
diremos que é seu corpo. Mas esse Spencer e Gi11en) "devem, diz ele, ter se manifestado dire­
mesmo churinga está
relacionado da mesma maneira tamente na qualidade de animais; outros tomavam a forma
do concebido sob a influência do
ao indivíduo que teria si­
antepassado, ou seja, é
animal de maneira passageira"79. Ainda hoje, acontece-lhes
1 1
o fruto de suas obras místicas. Quan a todo momento transformar-se em animais80. Em todo ca­
do introduzem o jo­
vem iniciado no santuário do clã, so. e não importa seu aspecto exterior, "em cada um deles,
as qualidades próprias e distintivas do animal sobress� em
mostram-lhe o churinga
ele seu antepassado e dizem -lhe:
"Tu és este corpo; és
a mesma coisa que isro."75 Portanto, com evidência''. Por exemplo, os antepassados do da do
segundo a expressão
mesma ele Strehlow, o churinga é Canguru comem erva como cangurus verdadeiros e fogem
"o corpo comum cio in­ .
divíduo e de seu antepassado"76. diante do caçador; os do clã da Ema correm e se alimentam
Para que possam ter o
mesmo corpo, é preciso que, pelo como as emass1, etc. E mais: aqueles dentre os antepassa­
menos por um aspec­
to, suas duas personalidades se confu dos que tinham por totem um vegetal se transformaram, ao
morrer, nesse vegetal!BZ Aliás, o estreito parenrescc:i do a �te­
ndam. Aliás, é o que
reconhece explicitamente Strehlow:
passado e do ser totêmico é percebido c�m tanta mtens1da­
"Pelo tjutunga (chu­
ringa), o indivíduo é unido a seu
de pelo indígena, que isso afeta a termmologia. E_?tre os
antepassado pessoal . "77 .
Assim , tanto para Streh low quan
to para Spencer e
GiUen, há em cada recém-nascido Arunta o filho chama de altjira o totem de sua mae, que
místico. que emana de um antep
um princípio religioso,
assado do Alcheringa. É
lhe se �e de totem secundário83. Como, primitivamente, a
esse princípio que fa z a essência filiação se fazia em linha uterina, houve um tempo em que
de cada indivíduo· ele
caso, sua alma é fei a d
cada indivíduo não tinha outro totem a não ser o de sua
po1tanto, sua alma , ou, em todo
mesma matéria e da mesma subst
� d mãe; é muito provável, po1tanto, que esse termo altjira de­
signasse o totem propriJmente dito. Ora, vemos qt e � !e
ância. Ora, é unicamen­
te nesse fato fundamental que nos
apoiamos para deter­ �
de aLna. As diferen-
minar a natureza e a origem da idéia entra evidentemente na composição da palavra que signifi­
ca grande antepassado, altjirangamitjina84.
AS CRENÇAS ELEMENTARES
269
268 A S FORMAS ELEMENTARE5 DA VIDA RELIGIOSA

embrião míuco que se separa do antepassado e se torna a


A idéia de totem e a de antepassado são inclusive '.
tão próximas uma da outra que, às vezes, p � recem ser
criança; ora, as mesmas palavras designam também o to­
tem dessa criança, tal como é determinado pelo lugar on­
confundidas. Assim, após nos haver falado do totem da
de a mãe acredita ter concebido91.
mãe ou altjira, Strehlow acrescenta: "Esse altjira aparece
aos negros em sonho e lhes faz advertências, do mesmo
modo que leva informações sobre eles a seus amigos
III
adormecidos."85 Esse altjira que fala, que está ligado pes­
soalmente a cada indivíduo, é evidentemente um antepas­
O que foi visto sobre a doutrina da reencarnação diz
sado; no entanto, é também uma encarnação do totem.
respeito, é verdade, apenas às tribos da Austrália central,
Um texto de Roth a respeito de invocações dirigidas ao
portanto poder-se-iam julgar demasiado estreitas as bases
rotem deve, certamente, ser interpretado nesse sentidoB6 .
sobre as quais repousa nossa inferência. Mas, em primeiro
Parece claro, p �ttanto, que o totem seja às vezes repre­
lugar, pelas razões que expusemos, a experiência tem um
sentado nos espmtos sob a forma de uma coleção de se­
. alcance que vai além das sociedades que observamos di­
res tdea1s, ele personagens míticos que são mais ou menos
retamente. Além do mais, fatos em abundância mostram
indistintos dos antepassados. Em uma palavra, os antepas­
que as mesmas concepções se verificam nos pontos mais
sados são o totem fragmentaclo87.
diversos da Austrália ou que neles, pelo menos, deixaram
M� s, se o antepassado confunde-se a tal ponto com o
. vestígios aparentes. Encontramo-los inclusive na América.
ser totemtco, o mesmo deve acontecer com a alma indivi­
Na Austrália meridional, Howitt assinala-os entre os
:lual que se mantém tão próxima da alma ancestral. Aliás, Dieri92. A palavra Mura-mura, que Gason traduzia por
e o que se deduz igualmente dos estreitos laços que
Bom-Espírito e na qual acreditava ver expressa a crença
unem cada homem a seu churinga. Sabemos, com efeito,
num deus criador93, é, em realidade, um nome coletivo
que o churinga exprime a personalidade do indivíduo
que designa o grupo de antepassados que o mito coloca
que dele teria nascido88; mas ele exprime igualmente o
na origem da tribo. Eles continuam a existir hoje como
animal totêmico. Quando apresentou a cada um dos
outrora. "Acredita-se que habitem em árvores que, por es­
n;��b:os do clã do Canguru seu churinga pessoal, o be­ sa razão, são sagradas." Certos arranjos do solo, das pe­
ro1 c1v1ltzador, Mangarkunjerkunja se exprimiu neste ter­
dras, das fontes são identificados com esses Mura-mura94
mos: "Eis o corpo de um canguru."89 Assim, o churinga é,
que, deste modo, se assemelham singularmente aos Altji­
ao mesmo tempo, o corpo do antepassado, do indivíduo
rangamitjina dos Arunta. Os Kurnai da Gippsland, embora
atual e do animal totêmico; esses três seres formam, por­
entre eles existam apenas vestígios de totemismo, crêem
tanto, segundo uma forte e justa expressão de Strehlow
igualmente na existência de ancestrais chamados Muk­
"uma unidade solidária"90. São termos em pa1-re equivalen�
Kurnai, concebidos como seres intermediários entre o
tes e substituíveis entre si. Yale dizer que são concebidos
homem e o animal95. Entre os Nimbaldi, Taplin observou
como aspectos diferentes de uma mesma e única realida­
uma teoria da concepção que lembra a que Strehlow atri­
de, que se define igualmente pelos atributos distintivos cio
bui aos Arunta96. No Estaria de Victoria, entre os Wotjoba­
totem. O princípio totêmico é que é a essência comum de­
luk, encontramos integralmente a crença na reencarnação.
les. A própria linguagem exprime essa identidade. As pa­
_ "Os espíritos dos mortos, diz Mathews, reúnem-se nos
lavras ratapa e, na lmgua dos Loritja, aratapi designam o
270 AS FORMAS E.LEi1ENTARES DA 17DA RELJGIOSA 1\ CRENÇAS EUIMENTARES 271

miyur'J7 de seus respectivos dãs; dali saem para nascer de e única figura
um sincretismo que fez fundir numa mesma
. i s múltip las figuras dos primeiros a � tepa �sados.
novo sob forma humana quando uma ocasião favorãvel O que
se apresenta ."98 Mathews afirma inclusive que "a crença
torna essa h ipótese ao menos veross 11rul, e
.
que � s pala­
na reenca rnação ou na transmigração das almas estã for­ prox1m as;
vras Anje-a e Anjir são evidentemente muito
ora' a sem o-
temente enraizada em todas as tribos australianas"99. mda designa o primeiro homem, o .antepa ssado
Se passarmos para as regiões setentrionais, encontra­ . se ong1
.
� a d? 10'-.
inicial de quem todos os homen s tenam
remos no Noroeste, entre os Niol-Niol, a pura doutrina mcl1ge nas
As mesmas idéias verificam-se nas tnbos
cios Arnnta; todo nascimento é atribuído à encarnação de , diz Krause , as a l mas dos
da Améri ca. Entre os Tlinkit
uma alma preexistente que se introduz no corpo ele uma corpo das
mortos voltariam à terra e se introduziriam no
mulher100. No Queensland do Norte, mitos que se diferen­ �o uma mu:
mulheres grãvidas de sua família. "Assim, quan
ciam dos precedentes apenas na forma traduzem exata­
Iher grãvida sonha com algum parente falec1d
� , ela cr�
mente as mesmas idéias. Nas tribos do rio Pennefather
que a alma deste úlúmo penetro u n � la Se o reccm-nasu

do apresentar algum sinal ca�acten�uco que


:
acredita-se que todo homem tem duas almas: uma, cha� o defunt o
e
macia ngai, reside no coração; a outra, cboi, permanece o propno . defunto, retor
possuía consid era-se que ele �
nado à erra, e clã-se-lhe o mesmo nome. � 3 Essa

na placenta. Logo após o nascimento, a placenta é enter­ 10 crença e
rada num lugar consagrado. Um gênio particular, de no­ _ a tribo
?
xama
igualmente generalizada entre os Haida. E a
me Anje-a, encarregado do fenómeno da procriação, irã qual o parente que se reenca rnou na criança e,
que revela
recolher esse cboi e conservã-lo até que a criança, toman­ ter104. En:
conseqüentemente, qual o nome que esta deve
do-se adulta, se case. Quando chega o momento de dar­ que o último morto retorna ª
tre os Kwakiutl, acredita-se .
lhe um filho, Anje-a pega uma parcela do cboi desse ho­ pessoa da primei ra criança que nasce na fam1-
vida na
ll·a1os . o mesmo acontece entre os Huron
mem, insere-a no embrião que fabrica e que introduz no s, os lroque ses,
seio ela mãe Portanto, é com a alma do pai que é feita a u ru'd os106
� os Tinneh e muitas outras tribos dos Estados
·

ela criança. E verdade que esta não recebe a princípio a


alma paterna na sua integralidade, pois o ngai concinua A generalidade dessas concepçõ� s estende-� e � atu­
no coração do pai enquanto ele estiver vivo. Mas, quando
morre, o ngai, liberado, também irã se encarnar no corpo
ralmente à conclusão que delas deduzimos, ou sep, a ex­
plicação que propusemos d� idéia da �Lrna. O al�ance ge­
.
dos filhos, repartindo-se igualmente entre eles, se forem ral dessa conclusão é confirmado, alias, pelos fatos que
vários. Hã, assim, uma perfeita continuidade espiritual en­ seguem.
Sabemos107 que cada indivíduo contém em si algo d a
.
tre as gerações; a mesma alma transmite-se do pai aos fi­
lhos e destes a seus filhos, e essa alma única, sempre força anónima que está difusa na espécie sagrada; ele
idêntica apesar das divisões e subdivisões sucessivas é a próprio é membro dessa espécie. '."fªS não enquanto s�r
que animava na origem das coisas o primeiro antep ssa­ � empírico e sensível, pois, a despeito dos desenhos e si­
do 101 . Entre essa teoria e a das tribos do Centro hã apenas nais simbólicos com que enfeita seu corpo, ele nada p os­
uma diferença de certa importância: é que, nela, a reen­ sui, sob esse aspecto, que lembre a forma de u� animal
carnação é obra não dos próprios antepassados, mas ele ou de uma planta. Isso significa, portanto, que existe nele
um gênio especial, profissionalmente encarregado dessa u m outro ser no qual não deixa de se reconhecer, mas
função. Mas tudo indica que esse gênio é o produto de que concebe sob as aparências de um animal ou de u m
272 AS FORMAS ELEMENTARE5 DA VIDA RELIGIOSA AS CRE
NÇAS ELEMENTARES �73

vegetal. Não é evidente que esse duplo só pode réptil. Não que o indivíduo seja considerado descendente
ser a ai­
��· visto que a �!ma já é, por si mesma, um duplo do su­ desse animal, mas julga-se haver um parentesco entre o
Jetto que ela anima? O que justifica em definiti
vo essa espírito que anima o homem e o espírito do animal " l l 1 .
identificação, é que os órgãos nos quais mais eminen Há inclusive casos em que a alma é tida por emanar
te­
mente se encarna o princípio totêmico que cada imediatamente do animal ou do vegetal que serve de to­
indiví­
duo contém são também aqueles onde a alma reside.
Éo tem. Segundo Strehlow, entre os Arunta, quando uma mu­
caso do sangue. Há no sangue algo da natureza do lher comeu abundantemente de um fruto, acredita-se que
totem
como o prova o papel que ele desempenha nas cerimôn ela dará à luz uma criança que terá esse fruto por totem.
ia�
totem1cas 108. Mas, ao mesmo tempo, o sangue é Se, no momento em que sentiu as primeiras contrações
A '
uma das
sedes da alma; ou melhor, é a alma mesma vista do filho, ela olhava para um canguru, acredita-se que u m
de fora.
Qua do o sangue sai do corpo, é a vida que escapa, ratapa de canguru penetrou seu corpo e a fecundou1 12. H.
mas
tambem a alma. A alma se confunde, pois, com
n_
o princí­ Basedow relatou o mesmo fato a respeito dos Wogait113.
pio sagrado imanente ao sangue. Sabemos, por outro lado, que o ratapa e a alma são coisas
Por outro lado, se nossa explicação tem fundame mais ou menos indistintas. Ora, não se poderia ter atribuí­
nto
º. rincípio totêmico, ao penetrar, do à alma uma tal origem se não se pensasse que ela é
como supomos, no in�
feita da mesma substância que os animais ou os vegetais
P_
ivJC lu o'. deve conservar nele uma certa autonomia,
� já que
e especificamente distinto do sujeito no qual se da espécie totêmica.
encarna.
Ora, é precisamente o que Howitt diz ter observa Assim, a alma é com freqüência representada sob
do entre
os Yuin: "Que o totem, diz ele, seja concebido nessas forma animal. Sabe-se que, nas sociedades inferiores, a
tri­
bos como sendo, de alguma maneira, uma parte morte jamais é considerada um acontecimento natural,
do ho­
mem, é o que prova claramente o caso do chamad devido à ação de causas puramente físicas; geralmente é
o Um­
bara, de quem já falei. Este contou -me q u e , há atribuída aos malefícios de algum feiticeiro. Num grande
alguns
anos, um indivíduo do clã dos lagartos-rendados (/ace-li­ número de tribos australianas, para determinar qual o au­
zards) enviou-lhe seu totem enquanto ele dormia. O tor responsável por essa morte, parte-se do princípio de
to­
tem penetrou pela garganta do adormecido e que, cedendo a uma espécie de necessidade, a alma do
quase co­
meu-lhe o totem que residia em seu peito, por pouco matador vem inevitavelmente visitar sua vítima. Por isso,
não
lhe causando a morte." 109 Portanto, é certo que o corpo é colocado sobre um andaime; depois, debaixo
o totem se
fragmenta ao individualizar-se e que cada urna do cadáver e ao redor, alisa-se cuidadosamente a terra de
das parce­
l s que assim se separam desempenha o papel modo que a menor marca se torne facilmente perceptí­
� . de um es­
pmto, de uma alma que reside no corpo 110 . vel. Volta-se no dia seguinte; se, no interva lo, um animal
Mas eis aqui falos mais diretamente demonstrativo passou por lá, pode-se reconhecer seus traços sem difi­
s.
Se a alma não é senão o princíp io totêmico individu culdade. A forma revela a espécie à qual ele pertence, e
aliza­
do' ela deve, ao menos em certos casos, manter daí se infere o grupo social de que faz parte o culpado.
relações
.
mais ou menos próximas com a espécie animal ou vegetal Diz-se que é um homem de tal classe ou de tal clã1 14 con­
cuja forma o totem reproduz. E, de fato, "os forme o animal seja um totem desse clã ou dessa classe.
Geawe-Gal
(tnbo da Nova Gales do Sul) crêem que cada um Portanto, é a alma que teria vindo sob a figura do animal
tem em
si uma afinidade pelo espírito de alguma ave, mamífe totêmico.
ro ou
275
AS FORMASELEJfEi\TARES DA HDA REUGJOSA 1 \ CREIVÇASELEMENTARES

do reino animal, co­


Em outras sociedades, onde o totemismo enfraque­ l i ma foram principalmente tomados
mo supõe a teoria que acabamos de expor .
ceu ou desapareceu, a alma continua mesmo assim a ser
pensada sob forma animal. Os indígenas de Cap Bedford

N
(Queensland do Norte) crêem que a criança, no momento
em que entra no corpo da mãe, é um maçarico se for uma
meni �a , uma serpente se for um menino. Só depois ela
ção particu­
aclqu1re fom1a humana11' . Mui tos índios da América do A noção de alma é, portanto, uma aplica
dos. Deste modo
Norte , diz o príncipe de Wiecl, dizem que têm um animal lar das crenças relativas aos seres sagra
essa icléia apres entou
no corpo 1 16 . Os Bororo do Brasil representam sua alma se explica o caráter religio so que
conserva ainda ho­
sob a forma de uma ave e, por essa razão, acreditam ser desde que apareceu na história e que
aves dessa mesma variedadeJ 1 ·. Em outros lugares ela é erada uma coisa
ie. Com efeito, a alma st:mpre foi consid
corpo , que é natu­
uma abeU1a, etc. t t8
concebida como uma serpente, um lagarto. uma mosca, �agrada; nesse aspec to ela se opõe ao
nte profa no. Ela não se distin gue apenas de seu in­
ralme
relação ao fora; não
Mas é sobretudo após a morte que a natureza animal vólucro material, como o dentro em
da alma se manifesta. Durante a vida, esse caráter é como esmen te como feita de uma matéria
é representada simpl
que parcialmente encoberto pela própria forma do corpo ela inspir a algo dos
mais sutil, mais fl uida; além disso ,
humano. Mas, assim que a morte a pôs em liberdade, a al­ reservados ao que é
sentimentos que por toda parte estão
ma volta a ser o que era. Entre os Omaha, em pelo menos dela um deus, perce be-se nela pelo
essencial
se faz
menos uma centelha da divindade. Esse ca ráter
divino. Se não
dois dos clãs do búfalo, acredita-se que as almas dos mor­
tos vão se juntar aos b ú falos, seus ancepassadost t9. Os de alma fosse apena s uma so­
seria inexplicável se a idéia
Hopi estão divididos num certo número de clãs, dos quais ca ao probl ema do sonho , pois, como
lução pré-c ientífi
os antepassados eram animais ou seres com forma ani­ rta r a emoção reli­
não há nada no sonho capaz de despe
mal. Ora, segundo Schoolcraft, eles dizem que na morte é explic ado não poderia ser de
giosa, a causa pela qual
retomam sua forma original; cada um deles volta a ser ur­ é parte da substância divi­
outra nature za. Mas se a alma
so, cervo, conforme o clã a que pertence120. Com muita que nós mesmos; se
na, ela representa em nós algo mais
freqüência, a alma se reencarnaria num corpo de ani­ os seres sagrados, é
é feita da mesma matér ia menta l que
mal121. Provavelmente é daí que veio a doutrina tão di­ os sentimentos.
natural que ela seja o objeto dos mesm
fundida, da metempsicose. Vimos o quanto Tylor' se atra­ se atribu i não é o
E o caráter que o home m assim
p.alha para explicá-la122. Se a alma é um princípio essen­
produto de uma pura ilusão ; da mesm a forma que a no­
cialmente humano, que pode haver de mais singular, com
a noção de alma
.
efeito, que essa marcada predileção que ela manifesta ção de força religiosa e de divind ade,
realid ade. A verda de é que somos
num número tão grande de sociedades, pela forma ani� não é desprovida de
opõem uma à
�ai? Tudo se explica, de duas partes distin tas que se
ao contrário, se, por sua constitui­ formados
e se pode dizer, num
çao mesma. a alma é parente próximo do animal, pois, outra como o profano ao sagrado,
existe divino em nós. Pois a sociedade,
certo sentido, que
o
nesse caso, ao voltar, após a vida, ao mundo da animali­
fonte única de tudo que é sagrad o, não se limita a
dade, ela apenas retorna à sua verdadeira natureza. As­ essa
geiramente; ela se
sim, a generalidade da crença na metempsicose é mais nos mover ele fora e a nos afetar passa
de mane ira durad oura, suscitando todo
uma prova de que os elementos constitutivos da idéia de organiza em nós
AS CRENÇAS ELEME/VTARES
277
276 AS FORMAS ELEMENTARES DA VTDA RELIGIOSA

espiritual que coexistem em nós .\1oralistas e pregadores


um mundo de idéias e de sentimentos que a exprimem,
mas que ao mesmo tempo fazem parte integrante de nós afirmaram freqüentemente que não se pode negar a reali­

mesmos. Quando o australiano sai de uma cerimónia reli­ dade do dever e seu caráter sagrado sem cair no materia­
giosa, as representações que a vida comum despertou ou lismo. De fato, se não tivéssemos a noção dos m
i perativos
tornou a despertar nele não são abolidas ele vez. As figu­ morais e religiososl23, nossa vida psíquica seria nivelada,
ras dos grandes antepassados, os feitos heróicos cuja lem­ todos os nossos estados de consciência estariam no mes­
brança os ritos com emo ram , as coisas i mp o rta ntes das mo plano e todo sentimento de clualiclacle se dissiparia.
quais o culto o fez participar, em uma palavra, os ideais Certamente, para exprimir essa dualiclacle int el igível , de
diversos que ele elaborou coletivamente continuam a vi­ maneira nenhuma é necessário imaginar, sob o nome ele
ver em sua consciência e, pelas emoções que despertam, alma, uma substância misteriosa e irrepresentável que se
pela influência muito especial que exercem, distinguem­ oporia ao corpo. Mas, Lanto aqui como quando se tratou
se claramente das impressões \'Ulgares nele mantida/> por da noção elo sagrado, o erro tem a ver com a letra do sím­
seu comércio cotidiano com as coisas exteriores. As idéias bolo empregado, não com a realidade do fato simboliza­
morais têm o mesmo caráter. Foi a sociedade que as gra­ do. Continua sendo verdade que nossa naLUreza é dupla:
vou em nós, e, como o respeito que ela inspira transmite­ há realmente em nós uma parcela de divindade porque
se naturalmente a tudo o que vem dela, as normas impe­ há em nós uma parcela desses grandes ideais que sào a
rativas da conduta se acham, em razão de sua origem, in­ alm a ela coletividade.
vestidas de uma a ut oridade e de uma dignidade que nos­
sos outros estados interiores não possuem - por isso, atri­ A alma individual, portanto, não é senão uma porção
buímos a elas um lugar à parte no conjunto de nossa vida da alma coletiva do grupo; é a força anónima que está na
psíquica. Embora nossa consciência moral faça parte de base do culto, mas encarnada num indivíduo cuja perso­
nossa consciência, não nos sentimos no mesmo plano nalidade ela esposa; ela é mana individualizado. O sonho
que ela. Nessa voz que se faz ouvir apenas para nos dar pode efetivamente ter contribuído para determinar certos
ordens e enunciar proibições, não podemos reconhecer caracLeres secundários da idéia. A inconsistência e a insta­
nossa voz; o próprio tom com que ela nos fala indica que
bilidade das imagens que ocupam nosso espírito durante
ela exprime em nós algo além de nós. Eis aí o que há de
o sono, sua notável capacidade de transformar-se umas
objetivo na idéia de alma: é que as representações cuja
nas outras, forneceram talvez o modelo dessa matéria su­
trama constitui nossa vida interior são ele duas espécies
ti l, diáfana e proteiforme de que a alma seria feita. Por
diferentes e irredutíveis entre si. Umas relacionam-se ao
outro lado, os fenómenos de síncope, catalepsia, etc., po­
mundo exterior e material; as outras, a u m mundo ideal
dem ter sugerido a idéia de que a alma era móvel e, j á
ao qual atribuímos uma superioridade moral sobre o pri­
nesta vida, abandonava temporariamente o corpo; o que,
meiro. Somos, portanto, realmente feitos de dois seres
por via indireta, serviu para explicar certos sonhos. Mas
que estão orientados em sentidos divergentes e quase
todas essas experiências e observações não puderam ter
contrários, sendo que um exerce sobre o outro uma ver­
senão uma influência acessória e complementar, cuja
dadeira preeminência. Tal é o sentido profundo da antíte­
existência é inclusive difícil de estabelecer. O que há de
se que todos os povos conceberam mais ou menos clara­
realmente essencial na noção provém ele outra parte.
mente entre o corpo e a alma, entre o ser sensível e o ser
r

Z78
AS FORMAS E/DfEll;TARES DA VIDA RELIGIOSA AS CREl\'ÇAS ELEM.E/\TARES

não desconhece 0
Mas essa gênese da idéia
�aráter essencial dela? Se a alma é apenas
de alma totalmente O culto das relíquias demonstra que, ainda

ticul�r d� prir:cí J?iO impesso


uma forma par­ hoje, para a multidão dos crentes, a alma de um santo
al que está difuso no grup continua a aderir a seus diversos restos, com todos os
na espe _ o,
cie totem1ca e nas coisas de
todo tipo que a ele se seus poderes essenciais; o que implica que a concebam
associam, ela própria é imp
essoal na sua base. Portanto
cl�ve ter, com poucos grau
como capaz de se difundir, de se subdividir, de se incor­
s de diferença, as mesmas
pnedad �s da força da qual
pro­ porar simultaneamente às coisas mais diferentes.
não é senão um modo espe Assim como se encontram na alma os atributos carac­
em particular a mesma difu cial,
são, a mesma capacidade
se �spalhar contagiosamente de terísticos do mana, mudanças secundárias e superficiais
, a mesma ubiqüidade. Ora são suficientes para que o mana se individualize sob for­
muito pelo contrário, a alma ,
costuma ser representada ma de alma. Passa-se da primeira idéia à segunda sem so­
mo um ser concreto, inteiram co­
ente concentrado nele mes lução de continuidade. Toda força religiosa que se liga,
mo e incomunicável aos outr ­
os; fez-se dele a base de nos­ nomeadamente, a um ser determinado, participa elos ca­
sa personalidade.
racteres desse ser, adquire sua fisionomia, torna-se seu
Mas essa maneira de conceber
a alma é o produto de duplo espiritual . Tregear, em seu dicionário Maori-Poliné­
uma elaboração tardia e filos
ófica. A representação pop
lar. tal com o espontaneam u­ sio, julgou poder aproximar da palavra mana todo u m
ente brota da experiência
mu� , e mul[o diferente, sobr co­ grupo de outras palavras, como
em. Para 0 aus­ etc., que parecem ser da mesma família e significam cora­
, . manawa, manama na,
etudo na
�ral1a�o, a alma é uma entidade muitoorig vaga, com formas ção, vida, consciência. Não equivale isso a dizer que deve
mdec1sas e flutuantes, espa
lhada pelo organismo intei
Embora se n:anife� te mais ro. existir igualmente alguma relação de parentesco entre as
especialmente em certos icléias correspondentes, ou seja, entre as noções de poder
tos, talvez nao haia ond e pon­
ela esteja totalmente ause
Po:ranto, ela tem uma difu nte. impessoal e as de vida interior, de força mental, em suma
de alma?t24 Eis por que a questão de saber se o churm�a e
são, uma contagiosidade, _,
uma
�°'.ª alma, com<? �reem
orupresença comparáveis
às do man a. D a mesma form
a sagrado porque serve de hábitat a
que o mana, ela pode se divid
ir e se desdobrar ao infini­ Spencer e Gillen, ou porque possm virtudes espec1a1s, co­
to, embora permanecendo
partes : é dessas divisões e
inteira em cada uma de suas mo pensa Strehlow, nos parece de pouco �teresse e sen;
desses desdobramentos que alcance sociológico. Se a eficácia de um obieto sagrado e
sulta a pluralidade das alma re­
s. Por outro lado a doutrina representada nos espíritos sob forma abstrata ou ªO :ibuída
ela reen carn ação , cuja gen
mostra tudo o que entra de
b
eral idad e já esta elec emo
s, a algum agente pessoal, é algo que no fundo nao _ impor­
elementos impessoais na idéia ta. As raízes psicológicas tanto de u m a como da outra
de alm a e o quanto eles
são esse ncia is. Pois, para
que crença são exatamente as mesmas: uma coisa é s�grada
uma mesma alm a possa adqu
irir uma personalidade nova
a c�da geração, é preciso
porque inspira, por uma razão qualquer, um sentimento
que as formas individuais coletivo de respeico que a subtrai aos ataques profanos.
nas
quais ela se envolve sucessiva
exteriores e não se prendam
mente lhe sejam igualmente �
Para explicar esse sentimento, os homens ora o re a cio­
ã sua natu reza verdadeira. .
T:a�-se de uma espécie de
nam a uma causa vaga e imprecisa, ora a um ser espmtual
. substância genérica que se determ inado, dotado de um nome e de uma história; mas
d1v1dualiza apenas secundár in­
ia e superficialmente. Aliá essas interpretações diferentes se juntam a um processo
essa concepção da alma está s
longe de haver desaparecid
� fundamental que é o mesmo nos dois casos.
280
AS CRENÇAS ELEME.tVTARES L81
AS FORMAS ELEME.t\TARFS DA VIDA REiJGIOSA

É que o explica, aliás, as singulares confusões cujos


exemplos encontramos pelo caminho. O indivíduo, a alma coletividade não podem se constituir sem se encarnar em
de antepassado que ele reencarna ou da qual a sua é uma consciências individuais nas quais se individualizam. E1:1
emanação, seu churinga, os animais da espécie totêmica, realidade 1 não há aí dois processos diferentes, mas do1�
são, dizíamos, coisas parcialmente equivalentes e substituí­ aspectos diferentes de um mesmo e ú nic? processo. �
verdade que eles não têm igual importanc1a:� �m del:s e
veis umas pelas outras. É que todas, sob certos aspectos,
estão relacionadas ã consciência coletiva da mesma ma­ mais essencial que o outro. A idéia de ma� n�� sup?e a
neira . Se o churinga é sagrado, é por causa do sentimento 1·cte'1"a de alma, pois, para que o mana possa ind1v1duahzar-
se e fragmentar-se em almas pa1�ticular�s, e prec1. �0 pri­
..
.

de respeito que o emblema lOtêmico, gravado em sua su­


perfície, inspira; ora, o mesmo sentimemo liga-se aos ani­ meiro que ele seja, e o que ele e em � 1 mesn10 nao de­
_ _
pende das formas que assume ao md1v1duahzar-se. _ Ao
mais ou aos vegetais cuja forma exterior o totem reproduz,
ã alma do indivíduo, já que ela própria é pensada sob as contrário, a idéia de alma só se pode compreender em re­
aparências do ser totêmico, e finalmente ã alma ancestral lação à idéia de mana. Sob e:;se aspec_to, podc-s� ?e faro
da qual a precedente não é senão um aspecto particular. dizer que ela é devida a uma formaçao sec�nda�1a! mas
Assim Lodos esses objetos di versos, reais ou ideais, rêm trata-se de uma formação secundária no sentido log1co, e
um lado comum através do q ual suscitam nas consciências não cronológico, da palavra.
um mesmo estado afetivo e, deste modo, se confundem.
Na medida em que são expressos por uma mesma e únka
V
representação, eles são indistintos. Eis aí como o aruma
pôde ser levado a ver no churinga o corpo comum do in­
divíduo, do antepassado e mesmo do ser totêrnico. É uma Mas por que os homens acreditaram. que a alma so­
maneira de exprimir a ele próprio a identidade dos senti­ brevivia ao corpo e podia mesmo sobreviver-lhe por um
mentos relacionados a essas diferentes coisas. tempo indefinido?
Todavia, do fato ele que a idéia de alma derive da Da análise a que procedemos, resulta que a crença .na
idéia de mana, de maneira nenhuma se segue que a pri­ imortalidade de maneira nenhuma se constituiu sob a m­
meira tenha uma origem relativamente tardia, nem que te­ fluência de idéias morais. O homem não imaginou prolon­
nha havido urna época da história em que os homens só gar sua existência além-túmulo a fim de que uma justa re­
_ numa ou­
tribuição dos atos morais pudesse ser garantida
teriam conhecido as forças religiosas sob suas formas im­ _ _
tra vida, depois desta, pois vimos que toda c:ms1der �çao
desse gênero era esu anha à primitiva conc.ei:çao
pessoais. Quando, pela palavra pré-animismo, procura-se : do alem.
·
designar um período h islórico durante o qual o animismo
teria sido totalmente ignorado, constrói-se uma hipótese Também não se pode considerar a h1potese se�10do
arbitrária 125, pois não há povo em que a idéia de alma e a a qual a outra vida teria sido concebida c'?m� um meio de
idéia de mana não coexistam. Não há razão, portanto, pa­ escapar à perspectiva angustiante do am�u!Jª1'.1ento. Em
ra supor que elas se formaram em dois momentos distin­ primeiro lugar, a necessidade de sobr�v1vencia �ess?al
_
está longe de ter sido tão intensa na ongem. O pr_u�1uvo
tos; tudo prova, ao contrário, que elas são sensivelmente
aceita geralmente a idéia da morre com uma espec1� d�
contemporâneas. Assim como não há sociedades sem in­
divíduos, também as formas impessoais que emanam da indiferença. Acostumado a levar pouco em conta sua 1�d1-
vidualidade, habituado a expor constantemente a vida,
2Hl AS HJIWAS ELE1'1Ei\TARES DA VIDA REUGIOSA ,1\ CRENÇASELEME,VTARES 283

�le ren.uncia a ela basta nte facilmente126. Além disso, a Os mito:. que relatamos anteriormente nos fornecem
I?1ortalidade que lhe é prometida pelas
religiões que pra­ .1 única explicação que pode ser dada dessa crença. Vi­

tica na a tem de pessoal. Num grande núme
ro de casos, a mos que as almas cios recém-nascidos eram ou emanações
alma nao conserva ou não conserva por de almas ancestrais, ou essas próprias almas reencarna­
muito tempo a
pe:s nal idade d defunto, uma vez que, das. Mas, para que elas pudessem se reencarnar ou libe­
� . ? esquecida de sua
ex1stenc1a anterior, parte para anim ar outro rar periodicamente emanações novas, era preciso que so­
s corpos. ao
cabo de algum tempo, tornando-se assim brevivessem a seus primeiros detentores. Parece claro,
. o princípio vivi­
f1c � dor de perso nalid ades nova s. Mesm portanto, que se admitiu a sobrevivência dos mortos para
o entre povos
mais avançados, não era a pálid a e triste poder explicar o nascimento dos vivos. O primitivo não
existência das
sombras no Scheol ou no Érebo que podia tem a idéia de um deus todo-poderoso que cria as almas
atenuar os la­
mentos que a recordação da vida perdida do nada. Parece-U1e qw.. só se podem fazer almas com al­
deixava.
Um: explicação mais satisfatória é a que mas. As que nascem, portanto, só podem ser fonnas no­
relaciona a
concepçao de uma vida póstuma às expe vas das que existiram; por conseguinte, é preciso que es­
riências do so­
nho. Nossos parentes, nossos amigos morto tas continuem a existir para que outras possam se formar.
� em em s nho: vcm -los agir, ouvimo-los
� �
s nos reapare­
falar; era natu-
A crença na imo1taliclade das almas, em última instância,
1al cor clu1r que continuassem a existir é a única maneira que o homem possui de explicar a si
: . Mas se essas ob­
serv çoes puderam servir para confirmar mesmo um fa to q u e não pode deixar d e chamar sua
� a idéia, uma vez
surgida, elas não parecem capazes de tê-la atenção: a perpetuidade da vida do grupo. Os indivíduos
suscitado inte­
gralmente. º: sonh s em que vemos reviv morrem, mas o clã sobrevive. As forças que fazem sua vi­
? er pessoas de­
saparec1das sao muito raros, muito breve da devem assim ter a mesma perperu idade. Ora, essas
. s e deixam lem­
branças mutto vagas para que, por si sós, forças são as almas que animam os corpos individuais;
tenham sugeri­ pois é nelas e através delas que o grupo se rea liza. Por
do aos homens um sistema de crenças tão

uma orte desproporção entre o efeito
imponante. Jiá essa razão, é preciso que elas durem. É inclusive neces­
e a causa a que é sário que, ao durarem, permaneçam idênticas a si mes­
atr1bu1do.
O que to na a ques tão emba raços a é mas, pois, como o clã conserva sempre sua fisionomia
� que, por ela característica, a substância espiritual de que ele é feito
me� m�, a noçao de alma não implicava
a idéia de sobrc­ deve ser concebida como qualitativamente invariável. Já
v1venc1a, mas parecia antes excluí-la. Com
efeito vimos que se trata sempre do mesmo clã com o mesmo princí­
que a alma, e nbora distinta do corpo, é
tamente solida
i:
. ria dele: envel
;
tida com estrei­ pio totémico, é preciso que as almas sejam as mesmas, as
hece quando ele envelhece almas não sendo senão o princípio totêmico fragmentado
refl �te todas as enfermidades que o ating
devia parece natural que morresse junto
em; portanto : e particularizado. Há, assim, como que um plasma germi­
� com ele. Pelo nativo, de ordem mística. que se transmite de geração a
me�os, devena se acreditar que ela cessa
sse de existir, a geração e que produz, ou pelo menos deveria produzir,
pamr d momento em que o corpo tivess
� e definitivamen­ a unidade espiritual do clã através da duração. E essa
te perdido sua forma primeira, em que nada
mais restasse crença, apesar de seu ca ráter simbólico, não é desprovi­
do que ele havia sido. No entan to, é justam
ente então da de verdade objetiva. Pois, se o grupo não é imortal no
que se abre para ela uma nova vida sentido absoluto da palavra, a verdade é que ele dura
.
-·�·llS ELEME\TARES DA VlDA REl.l<.!1
1 t
1 1 Ili \(·IS ELEMENTARES 285
por sol >rv os indivíduos, rena
c,1d 1 gcraçno nova.
scendo e se reencarnando
'" .,ulca do que precede que a noção d� pessoa � o
Um fato confirma essa inter ., h !lo de dois tipos de fatores. Um é essenc1alme�te rn1-
11,tl: é o princípio espiritual que �ei:e de aJ ?'1a ª cole-
pretação. Segundo o ll''" 1 ,1

.
que os Arunta distinguem doh
munho de StrehJow, vimos
1i l ide. É ele, com efeito, que const1tl11 a substancia rnes-
, as dos antepassados cio AI
tipos de almas: há, de um lado 11
cheringa e, de outro, as dos 1 1 1 1 d.1s almas individuais. Ora, esse princípio não perten-
1 l ,1 ninguém em particular: faz parte d� pa trimõnio col�-
indivíduos que, a cada monw11
ente o efetivo da tribo. As w
to da história, compõem realm
.
gundas só sobrevivem ao corp 1 1 \ , '· nele e através dele, todas as consc1enc1as se c�murn­
o durame um tempo basra 111t ·
curto; não tardam a ser total • 1 1 1 1 Mas, por outro lado, para que haja personalidades
mente aniquiladas. Somente
como são incriadas, elas 11a1
ª'
primeiras são imortais; assim 1 p.1radas, deve inte1vir um outro fator que fragmente es-
perecem. Ora, é notável que > princípio e que o diferencie: � m ouLros termos, deve
estas sejam também as únic
a�
cuja imortalidade é necessári 11.1\i•r um fator de individuação . E o corpo que desempe-
a para explicar a permanênu
do grupo, pois é a elas e som .1 1 1 J i . 1 esse papel. Como os corpos são distintos uns dos ou-
ente a elas que incumbe a fun
ção de assegurar a perpetuid 1 1 w,, como ocupam pontos diferentes no tem �o e no es­
ade do clã, já que toda concep
ção é obra delas. As outras J •.l(O, cada um deles constitui um meio especial em. qu �
não têm, sob esse aspecto,
nhum papel a desempenhar
. Portanto, as almas só são dit
ne­
as
1.' representações coletivas vêm se refratar e se col _:1r
? ? 1-
imortais na medida em que l 1 rentemente. Disso resulta que, se todas as consc1enaas
essa imortalidade é útil para
nar inteligível a continuidade tor­
da vida coletiva. 1·nvolvidas nesses corpos têm os olhos voltados para o
Assim, as causas que suscitara 1 1 1c.smo mundo, isto é, o mundo de idéias e sc_:ntime�tos
m as primeiras crenças
relativas a uma outra vida nada que fazem a unidade moral do grup� , elas nao o veem
tiveram a ver com as fun­
ções que as inst ituiç ões de
além -túm ulo have riam de �ob o mesmo ângulo: cada uma o expru:rie a s:u r:iodo. .
cumprir mais tarde. Mas. uma Desses dois fatores igualmente 111d1spensave1s, o pn-
vez nascidas, elas logo fo­
ram utili zada s para finalidad 111ciro certamente não é o menos importante, pois é ele
es diferences daqu elas que
haviam sido suas primeiras < 1ue fornece a matéria-prima d� idéia e al�a. Talvez cau­

razões de ser. Já nas socieda­
des australianas, vemo-las se surpresa atribuir um papel tao cons1derave ao elemen- !
10 impessoal na gênese da noção de personalidade. Mas a
começar a se organizar ness
direção. Aliás, para isso elas a
não precisaram sofrer trans­
formações fundamentais. Tant málise filosófica da idéia de pessoa, que antecedeu em
o é verdade que uma mes­
ma instituição soci muito a análise sociológica, chegou a resultados análogos
al pode, sem mudar de natu
reza, cum­
prir sucessivamente funções sobre esse ponto. Entre todos os filósofos, �eibniz é ur:i
dos que mais intensamente sentiram o que e a personali­
diferentes!

dade, pois a mõnada, antes de tu o, e � , um er pessoal e



VI autônomo. No entanto, para Leibmz, o conteudo d� t as �
A
as mônadas é idêntico. Todas, com efeito, são consc1enaas
A idéia de alma foi por muito tempo e continua sen­ ?
que exprimem um me�mo e único o jeto, o rnund?; e co­
do em parte a forma popular da idéia de personalidade 127. mo o próprio mundo e apenas um sistema de rep1esen:a­
A gênese da primeira dessas idéias deve, portanto, nos ções, cada consciência particular não é, em suma, senao
ajudar a compreender corno a segunda se constituiu. um reflexo da consciência universal. Só que cada uma a
exprime de seu ponto de vista e ã sua maneira. Sabemos
- - t" º Q ltl :);Jw

I
r

lJ V :apBp�uaA! a •

286 AS FORMAS ELBfE.VTARES DA \IJDA REUG!OSA


--.. .... -""-·--- ... ... .,J..._..

;oh a qu11 se individualiza, mas não


lhe deve nada de es­
de que maneira essa diferença de perspectivas decorre do
todos os povos atribuí­
fato de as mônadas estarem diversamente situadas umas sencia l. Ora, essa autonomia que
é puram ente ilusór ia, e sabemos agora
em r�lação às outras e em relação ao sistema total que ram à a l m a não
ente é verda de
constituem. qual o seu funda ment o objet ivo. Realm
r a idéia de alma
Sob uma outra forma, Kant exprime a mesma idéia. que os elementos que servem para forma
na repres entaçã o do corpo provê m de
Para ele, a pedra angular da personal idade é a vontade. e os que entram
tes uma da outra. Uns
Ora, a vontade é a faculdade de agir conforme a razão e duas fontes diferentes e independen
prove nientes
a razão é o que há de mais impessoal cm nós. Pois a �a­ são feitos com as impre
ponto s do
ssões
organ
e
ismo;
as image
os outro
ns
s consistem cm
de todos os
zão não é minha razão, é a razão humana em geral. Ela é
ade e que a
o poder qu � tem o espírito de elevar-se acima do particu­ idéias e em sentim entos que vêm da socied
iros, pona nto, nao deriv am dos se­
lar, do conungente, do individual, para pensar sob a for­ exprimem. Os prime
de nós mesmos
n:1ª e.lo uníYersal. Pode-se dizer, portanto, desse pomo de gundos. Assim, há realmerne uma parte
a imediata do fa­
vista, que o que faz do homem uma pessoa é aquilo atra­ que não está colocada sob a dependênci
é tudo o que, cm nós, repres enta a socieda­
vés do qual ele se confunde com os outros homens, o tor orgânico:
a ciênci a imprimem
que faz dele um homem, e não determinado homem. Os de. As idéias gerais que a religião ou
opera ções menta is que essas idéias
sentidos, o corpo, em uma palavra, tudo o que individua­ em nossos espiritos, as
m, as crenç as e os senti m entos que estão na base
liza, é, ao contrário, considerado por Kant como o anta­ supõe
s superiores da ati­
gonista da personalidade. de nossa vida moral, todas essas forma
rta e desenvolve
É que a individuação não é a ca racterística essencial vidade psíquica que a socied ade despe
estão a reboq ue do corpo , como nossas sen­
não
É
da pesso�. .uma pessoa não é apenas um sujeito singular, em nós
s. que, conforme
que se d1st1?gue de todos os outros . Mais do que isso, e sações e nossos estados ccnestésico
no qual se de­
mund o das repre senta ções
sobretudo, e um ser ao qual é atribuída uma autonomia mostramos, o
substrato material,
relativa em relação ao meio com o qual está mais imedia­ senrola a vida social se acrescenta a seu
que reina aí é, por­
tamente e� cantata. Representamo-lo co�o capaz, numa longe de provir dele: o determinismo
tem suas raízes na
cerra �edida, de se mover por si mesmo. E o que Leibniz tanto , bem mais flexív el que o que
ao agente uma im­
.
exprurua de uma maneira exagerada, ao dizer da mônada constituiç-Jo de nossos tecidos, e deixa
maior liberd ade. O meio no qual as­
que ela é completamente fechada para o exterior. Ora, pressão justificada de
mos tem algo de meno s opaco e de menos
sim nos move
nossa análise permite conceber de que maneira se formou
essa concepção e a que ela corresponde.
ficam os mais à vonta de.
resistente: nele nos sentimos e
o único meio de nos liberar mos das for­
A alma, com efeito, expressão simbólica da persona­ Em uma palavr a,
ivas.
.
lidade, tem esse mesmo caráter. Embora estreitamente ças físicas é opor-lhes as forças colet
a nós e a
�1as o que obtemos da sociedade é comum
unida ao corpo, é considerada profundamente distinta de­ de ser tan­
os longe

le e esfrutaria, em relação a ele, de uma larga indepen­ nossos comp anhei ros. Portan to. estam
alizados. Os dois
_
denc1a. Durante a vida, pode deixá-lo provisoriamente e to mais pessoais quanto mais indivi du
são sinôn imos: num certo senti­
abandona-o em definitivo na morte. Longe de depender termos de modo nenl� um
am. A paixão in­
? domina com a dignidade do, eles se opõem mais cio que se implic
dele, ela mais alta que possui.
s sensações são
Pode muito bem tomar-lhe emprestada a forma exterior dividu aliza, no entan to escraviza. Nossa
... ..
f

I
J V :;:,pep�u;:,A!<I •
. ••• �-.t
288 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA REllG!OSA
--.. --,.. ... . ,,,... ,.

CAPÍTULO IX
essencialmente individuais; mas somos tanto mais
pessoas
quanto mais livres dos sentidos, quanto mais capazes
de
pensar e agir por conceitos. Os que insistem, pois,
em tu­
A NOÇÃO DE ESPÍRITOS E DE DEUSES
do o que há de social no indivíduo, não pretendem,
com
isso, negar ou rebaixar a personalidade. Apenas se
recu­
sam a confundi-la com o fato da individuaçào•2B.

Com a noção de alma, saímos do círculo das forças


impessoais. Mas mesmo as religiões australianas já reco­
nhecem, acima da alma, personalidades míticas de uma
ordem superior: espíritos, heróis civilizadores e inclusive
deuses propriamente ditos. Sem entrar nos detalhes das
mitologias, precisamos, pelo menos, saber de que forma
essas três categorias de seres espirituais se apresentam na
Austrália e de que maneira elas se ligam ao conjunto do
sistema religioso.

Uma alma não é um espírito. Com efeito, ela está in­


ternada num organismo determinado; embora possa sair
dele em certos momentos, ela normalmente é prisioneira.
Só consegue escapar definitivamente na morte, e mesmo
assim vimos com que dificu ldade essa separação se con­
suma. O espírito, ao cor.trário, embora com freqüência es­
teja unido por laços estreitos a u m objeto particular, a
uma fonte, a uma pedra, a uma árvore, a um astro, etc.,
290 AS FORMAS ELEMENTARESDA VTDA RELIGIOSA
1\ CRENÇAS ELEMENTARES .
fJ V :ap.rp�uªA!a •

.... ... .. --.t- ·--� "' ·1Y1 1


ou men os prec isa a
embora de preferência resida aí, pode afastar-se à vonta 1u socia is; rem urna funç ão mais
cumprir no sistem a do mun do.
de p ara levar uma existência independente no espaço.
dupl a condição e
Assun ele tem um raio de ação mais amplo. Pode agir so­ Mas há alma s que satisfazem essa
no senti do próp rio, espíritos. São as
bre todos os indivíduos que dele se aproximam ou dos que, portanto, são,
nage ns mític os que a imag inação popular
quais se aproxima. A alma, ao contrário, não tem muita ,limas dos perso
os, os antep assados do Al­
influência, ª nào ser sobre o corpo que ela anima; só mui­ colocou na origem dos temp
. nami tjina dos Arun ta, os Mura-Mura das
to excepc1onalmente, ao longo de sua vida terrestre ' cheringa ou Altjira
ai dos Kurn ai, etc. Num
acontece-lhe afetar outros sujeitos. t ribos do lago Eyre, os Muk-Kurn
, já que outro ra teriam ani­
Mas se a alma não possui os caracteres distintivos cio certo sentido, são ainda almas
dos quais se separ aram num dado momen­
espírito, ela os adquire, ao menos em parte, através da mado corpos
uma vida terrestre, essas
rnorce. De fato, uma vez desencarnada e enquanto não to. Mas, mesmo quan do vivia m
vimo s, poderes excepcionais; ti­
entrou de novo num corpo, ela tem a mesma l iberdade Jlmas já possuíam, como
mana supe rior ao dos home ns comuns e o con­
de movimentos de um espírito. Certamente, quando os ri­ nham um
ra� cio luto são cumpridos, supõe-se que ela parta para 0
regad as de funçàes de­
serva ram. Além disso, estão encar
pais das almas; mas, primeiro, ela permanece por bastan­
e a versão de Spen­
terminadas.
te tempo em volta do túmulo. Além disso, mesmo quando Em primeiro lugar, quer se aceit
low, é a elas que compete ga­
se afastou definitivamente, acredita-se que continue a cer e Gille n ou a de Streh
tame nto periódico do clã . São responsáveis
rondar o acampamento, no mato• . Geralmente a repre­ rantir o recru
sentam como um ser benéfico, sobretudo para os mem­ pelo fenômeno da concepção.
tarefa do antepassa­
bros de sua família que sobrevivem: vimos inclusive que a Uma vez operada a concepção, a
inou. Com pete- lhe zelar pelo recém-nascido.
alma do pai vem ajudar o crescimento de seus filhos ou do não term
u-se adult o, acompa­
de seus netos. Mas acontece também que ela demonstre Mais tarde, quando a criança torno
a enco ntrar as presa s, avisa -o, por
uma verdadeira crueldade: tudo depende de seu humor e nha-o na caça, ajuda
dos sonho s, dos perig os que pode correr, protege-o
da maneira pela qual é tratada pelos vivos2 . Assim, é reco­ meio
ponto, Strehlow está intei­
mendado, sobretudo às mulheres e às crianças, não se contra seus inimigos, etc. Nesse
o com Spen cer e Gillen4 . Pergu ntar-se-á,
aventurarem fora do acampamento durante a noite' a fim ramente de acord
versão destes últimos, é
de evitar perigosos encontros3. é verdade, de que mane ira, na
cump rir essa função, pois, se ele
Entretanto, uma alma de outro mundo não é um ver­ possível ao antepassado
mom ento da conce pção , parece que deveria
cladei1:0 espírito. Primeiro, por ter geralmente apenas uma reencarna no
ça e, por conseguint e,
cap a� 1dade de ação restrita; depois, por não ter atribuições se confundir com a alma da crian
. , desd e fora. Mas é que, em realida­
defm1das. E um sonho vagabundo ao qual não compete não poderia protegê-la
não reenc arna por inteir o; apen as se desdobra.
nenhuma tarefa determinada, pois a morte teve por efeito de, ele
da mulh er e a fecunda;
justamente colocá-lo fora de todas as funções regulares; Uma parte dele penetra no corpo
a exist ir fora e, sob o nome especial
em relação aos vivos, é uma espécie ele desclassificado. uma outra continua
de gênio tutelar; .
Um espírito, ao contrário, tem sempre uma eficácia ele de Arumburinga, cumpre a função
certo tipo e é exatamente por isso que ele se define; é en­
paren tesco desse espirito an­
Vê-se quão grande é o
dos latino s e o õro'.µrov dos gregos6 . A
carregado de uma certa ordem de fenômenos, cósmicos cestral com o genius
AS FORJfAS ELE.lfE\TARFSDA 1'7DA RELIGIOSA
AS CRF..VÇAS ELEMENTARES
292
293
identidade funcional é completa. Com efeito
o 1wnius. é se caráter -;agrado é atribuído ao antepassado, este apare­
em primeiro lugar aquele que engendrn, quigi
gmt; ele ex­ ce como o espírito dessa árvore, dessa pedra, desse rede­
prime e personifica a potência geradora7. Mas
ao mesmo moinho dessa fomet3. Se a fonte for considerada como
tempo é o protelar, o diretor do indivíduo particu
pessoa está ligadoli. Enfim, ele se confunde
lar a cuja Í
tendo a gumas relações com a chuva 14, ele se Lornará um
com a perso­ espírito da chuva. Assim, as mesmas almas que, por um
nalidad e mesma desse indivíduo; representa
o conjunto lado, servem de gênios protetores aos _homens, cumprem
das inclinações e tendências que o caracterizam
e lhe dão ao mesmo tempo funções cósmicas. E certamente neste
uma fisionomia distint a em meio aos outros
homens9. É sentido que se deve emender um texto de Roth segundo
daí que vêm as expressões conhecidas indul
gere genio, o qual, no Queensland setentrional, os espíritos da nal�­
defraudare ge1 1iu m com o sentido de seguir
seu tempera­ reza seriam as almas de falecidos, que teriam eleito domi­
mento 11at1tral. No fundo, o ge lius é uma outra
� forma, um cílio nas florestas ou nas cavernas1s.
duplo da alma do indivíduo. E o que prova
parcial de genius e de manes 'º Os manes
a sinoní mia
· são o genius
Eis, portanto, c.lesla vez, seres espirituais que são ou­
tra coisa que não almas errantes e sem eficácia definida.
após a mo 1tc, mas também o que sobrevive do
defunto, is­ Strehlow os chama de dcuscs16; mas a expressão é impró­
to é, sua alma. Da mesma maneira, a alma
do arunta e o pria, pelo menos na grande maioria dos casos. Com efeito,
espírilo ancestral que lhe serve de genius não
são senão numa sociedade como a dos Aru nta, onde cada um tem
dois aspectos diferentes de um mesmo e único
ser. seu antepassado protetor, haveria tantos ou mais deuses
Mas não é somente em relação às pessoas que
o an­ do que indivíduos. Seria introduzir confusão na terminolo­
tepassado está situado de u m a maneira definid
a, é tam­ gia dar o nome de deus a um ser sagrado que tem apenas
bém em relação às coisas . Embor a se consid
ere que seu um fiel. Pode acontecer, é verdade, que a figura do ante­
verdadeiro hábitat seja debaixo da terra, acredil
a-se que passado cresça ao ponLo de parecer a de uma divin ade �
ele freqüenta consLantemente o lugar onde se
vore ou a pedra nanja, o remoinho que se formou
acham a ár­ propriamente dita. Entre os Warramunga, conforme �s�e­
espon- mosn o clã inteiro é tido como descendente de um urnco
1.aneameme no pomo preciso em que ele desapa
chão, após ter terminado sua primeira existên
receu no �
antep ssado. Explica-se facilmente que, em certas condi­
cia. Como ções, esse antepassado colcLivo tenha podido tornar-se o
essa árvore ou essa pedra representariam o
corpo do he­ objeto de uma devoção coletiva. Foi o que ac<:' ntece� em
rói, imagina-se que sua alma mesma retorna .
a todo ins­ particular com a serpente Wollunqua'ª· Esse animal rrutJ.co,
tante a esse lugar e o habita mais ou menos
a tíLulo per­ do qual o clã de mesmo nome teria se originado, continua
ma nen Le; é pela presença dessa alma q u e
se explica o a viver, acredita-se, num remoinho d'água que é cercado
respeito religioso que tais lugares inspiram.
Ninguém po­ de um respeito religioso. Assim, ele é o objeto de um culto
de quebrar um ramo da árvore nanja sem
correr o risco
de ficar doente 1 1 • ''Outrora, o fato de abatê-la
que o clã celebra coletivamente: através de riLos ?�t� rmi­
ou causar­ nados, procura-se agraciá-lo, atrair seus favores, dmgmdo­
lhe estrago era punido de morte. Um animal
ou um pás­ lhe algo como preces, etc. Pode-se dizer, portanto, que é
saro que nela s e refugia não deve ser morto.
Mesmo o uma espécie de deus do clã. Mas trata-se de um caso ex­
mato ao redor deve ser respeitado; a relva
não deve ser cepcional, inclusive único, segundo Spencer e Gillen. Nor­
queim ada. També m as pedras devem ser
tratadas com malmente, o termo espfritos é o único que convém para
respeito. É proibido deslocá-las e quebrá-las."12
Como es- designar esses personagens ancestrais.
294 AS FOR.MAS El.E.">fENTARES DA VIDA REIJGTOSA 295
\ <NF:NÇAS ELEMENTARES

Quanto à maneira como se formou essa concepçào


1 1 que os segundos, essa associação lürnou, no espír to �
publico, a forma de uma relação entre supen�res e mfen o­
ela resulta ele tudo o que precede.

l l'S, entre patrões e empregados, entre benfe1t_? res e


a�s1�-
Conforme mostramos, a existência ele almas individuais, .
uma vez admitida, não se podia compreender se não se
11dos. Foi assim que surgiu essa curiosa noçao de gemo
imaginasse, no princípio das coisas, um fundo original de
l llldar1 ligado a cada indivíduo.
almas fundamentais de que todas as outras fossem deriva­
A questão de saber como o antepassado foi posto em
das . Ora, essas almas arquetípicas deviam necessariamen­
i'l'laçào não apenas com os homens, mas também com as
te ser concebidas como contendo nelas a fonte de toda
coisas, pode parecer mais embaraçosa; pois não se perce­
eficácia religiosa , pois, como a imaginação não consegue
be, à primeira vista, que relação pode haver entre um per­
ir mais além, é delas e somente delas que proviriam todas
�onagem desse tipo e uma árvore ou uma pedra. Mas
as coisas sagradas, os instrumentos do culto, os membros
uma informação que devemos a Strehlow nos fornece
do clã, os animais da espécie Lotêmica. Elas encarnam to­
uma solução pelo menos verossímil desse problema.
da a religiosidade difusa na tribo e no mundo, e é por is­ Essas árvores e essas pedras não estão situadas em
so que lhes são atribuídos poderes sensivelmente superio­ qualquer ponto do território Lribal, mas principalmente
res aos das simples almas de homens. Aliás, o tempo, por concentradas em volta dos santuários, chamados ertnatu­
si só, aumema e reforça o caráter sagrado das coisas. Um �
lunga, segundo Spencer e G lllen, e ar anaua, se� ndo �
churinga antigo inspira muito mais respeito que um chu­ _
Strehlow, nos quais se depositam os chunnga do ela . Sa­
ringa recente e teria mais virtudes i9. É como se os senti­ bemos o respeito de que esses locais são cercados pelo
mentos de veneração de que foi objeto durante as gera­ simples falo de que aí se conservam os mais pre�iosos
ções sucessivas que o manejaram tivessem se acumulado instrumentos do culto. Por isso, cada um deles _1rrad1a san­
nele. Pela mesma razão, personagens que, há séculos, são tidade a seu redor. É por tal motivo que as árvores e as
objeto de mitos transmitidos respeitosamente de boca em pedras vizinhas aparecem como sagradas, sendo proibido
boca, e que os ritos põem periodicamente em ação, não destruí-las ou danificá-las, toda violência exercida sobre
podiam deixar de assumir, na imaginação popular, um lu­ elas constituindo sacrilégio. Esse caráLer sagrado é devido,
gar inteiramente à parte. em realidade a um simples fenômeno de contágio psíqui­
Mas como se explica que, ao invés de permanecer �
co, mas o in lígena, para explicá-lo, é obrigado a admitir
fora dos marcos da sociedade, eles tenham se tornado que esses diferentes objetos estão em contato �om os se­
seus membros regulares? . .
É que cada indivíduo é o duplo de um antepassado.
res nos quais ele vê a origem ele todo poder relig1os.o, isto
é, os antepassados do Alcheringa. Daí decorre o sistema
Ora, quando dois seres se aproximam a tal ponto, eles de mitos que mencionamos. Imaginou-se que cada ertna­
são naturalmente concebidos como solidários; como par­ rulunga marcava o lugar onde um grupo de antepassados
ticipam de uma mesma natureza, o que afeta um parece havia sumido sob a terra. Os Lúmulos, as árvores que co­
dever afetar necessariamente o outro. O grupo dos ante­ briam o chão, representariam seus corpos. Mas como a al­
passados rrúticos foi ligado, assim, por um vínculo moral, ma, de maneira geral, conserva uma espécie de afinidade
à sociedade dos vivos; a ambos se atribuíram os mesmos em relação ao corpo 110 qual viveu, naturalmente se foi
interesses e as mesmas paixões; foram vistos como sócios. levado a acreditar que as almas ancestrais continuavam a
Só que, como os primeiros tinham uma dignidade mais ai- freqüentar, de preferência, esses sítios onde seu invólucro
296 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA REUGTOSA AS CRENÇAS ELEMENTARES 297

material subsistia. Situaram-na, portanto, nessas á1vores, Assim também, segundo uma expressão da sra. Parker, o
nessas pedras, nesses remoinhos. Assim cada uma delas, totem individual dos Euahlayi, chamado Yunbeai, é u m
embora continuando ligada à proteção de um indivíduo alter ego cio indivíduo: "A alma cio homem está e m seu
determinado, viu-se transformada numa espécie de genius Yunbeai e a alma de seu Yunbeai está nele."26 Trata-se
loci e cumpre essa fu nção21 . pmtanto, no fundo, ele uma mesma alma em dois corpos.
O parentesco dessas duas noções é tão grande que às ve,:­
Essas concepçôes, assim elucidadas, nos capacitam a zes elas são expressas por uma mesma e única palavra. E
compreender uma forma de totemismo que tivemos de o caso na Melanésia e na Polinésia: atai na ilha Mota, ta­
deixar, até agora, sem explicação: o totemismo individual. maniu na ilha Aurora, taleg ia em Motlaw designam ao
Um totem individual se define essencialmente pelos mesmo tempo a alma do indivíduo e seu totem pessoal27.
dois seguintes caracteres: 1) é um ser com forma animal O mesmo acontece com aitu em Samoa2s. É que o totem
ou vegetal, que tem por função proteger um indivíduo; 2) individual é apenas a forma exterior e visível do eu, da
a sorte desse indivíduo e a de seu padroeiro estão estrei­ personalidade, cuja forma interior e invisível é a alma29.
tamente ligadas: tudo o que atinge o segundo se comuni­ Assim, o totem individual tem todos os caracteres es­
ca simpaticamente ao primeiro. Ora, os espíritos ances­ senciais do antepassado protetor e cumpre o mesmo pa­
trais de que tratamos correspondem à mesma definição. pel; e isso porque tem a mesma origem e procede da
Também eles se relacionam, ao menos em parte, ao reino mesma idéia.
animal ou vegetal. Também eles são gênios tutelares. En­ Ambos, com efeito, consistem num desdobramento
fim, um vínculo simpático une cada indivíduo a seu ante­ da alma. O totem, como o antepassado, é a alma do indi­
passado protetor. A árvore nanja, corpo místico desse an­ víduo, mas exteriorizada e investida ele poderes superio­
tepassado, não pode, com efeito, ser destruída sem que o res aos que ela possuiria no interior cio organismo. Ora,
homem se sinta ameaçado. A crença, é verdade, perde esse desdobramento é o produto de uma necessidade psi­
hoje força. No entanto, Spencer e Gillen ainda a obse1va­ cológica, pois apenas exprime a natureza da alma q u e ,
ram e, em todo caso, julgam que outrora era gera122. como vimos, é dupla. N u m certo sentido, ela é nossa: ex­
A identidade verifica-se inclusive nos detalhes das prime nossa personalidade. Mas, ao mesmo tempo, está
duas concepções. fora de nós, já que é apenas o prolongamento em nós de
As almas ancestrais residem em árvores ou pedras uma força religiosa que nos é exterior. Não podemos nos
que são consideradas sagradas. Do mesmo modo, entre confundir completamente com ela, já que lhe atribuímos
os Euahlayi, o espírito cio animal que serve de totem indi­ uma excelência e uma dignidade através das quais se ele­
vidual habitaria numa á1vore ou numa pedra23. Essa árvo­ va acima ele nós e ele nossa individualidade empírica. Há,
re ou essa pedra são sagradas; ninguém pode tocar nelas, assim, toda uma parte de nós mesmos que tendemos a
salvo o proprietário cio totem; e, mesmo assim, quando se projetar fora de nós. Essa maneira de nos concebermos
trata de uma pedra ou rocha, a interdição é absoluta24. acha-se tão bem fundada em nossa natureza que não po­
Disso resulta que são verdadeiros locais de refúgio. demos escapar a ela, ainda que tentemos nos pensar sem
Enfim, vimos que a alma individual é apenas um ou­ recorrer a nenhum símbolo religioso. Nossa consciência
tro aspecto cio espírito ancestral; este, segundo a expres­ moral é como o núcleo em tomo do qual se formou a no­
são de Strehlow , serve, de certo modo, ele segundo eu 2s . ção de alma; no entanto, quando ela nos fala, dá-nos a
298 AS FORMAS ELE!VJENTARIJS DA VT
DA REL/GfOSA AS CRENÇAS ELEMENTARE5 299

impressão de uma força exterior e superior a nós, que nos pio religioso é considerado a fonte da vida; era lógico,
dita a lei e nos julga, mas que também nos ajuda e nos sus­ portanto, relacionar a um princípio do mesmo gênero to­
tenta. Quando a temos a nosso favor, sentimo-nos mais dos os acontecimentos que perturbam a viela ou que a
fortes contra as provações da vida, mais seguros de triun­ destroem.
far delas, da mesma forma que o australiano, confiante em Esses espíritos prejudiciais parecem claramente ter
seu antepassado ou em seu totem pessoal, sente-se mais sido concebidos segundo o mesmo modelo que os gênios
�alente contra seus inimigos3o. Há, portanto, algo de obje­ benéficos ele que acabamos ele falar. São representados
tivo na base dessas diferentes concepções, quer se trate sob forma animal, ou em parte animal, em parte huma­
do geníus romano, do totem individual ou elo antepassa­ na36; mas há uma tendência natural a atribuir-lhes dimen­
do elo AJcheringa; e é por isso que, sob formas diversas, sões enormes e um aspecto repugnante37. Assim como
elas sobreviveram até nossos dias. Tudo se passa como se as almas dos antepassados, supõe-se que habitem árvo­
tivéssemos realmente duas almas; uma que está em nós, res, pedras, remoinhos d'água, cavernas subterrâneas38.
ou melhor, que é nós; outra que está acima ele nós e cuja Muitos nos são representados como almas ele pessoas
função é assistir e controlar a primeira. Frazer percebia que viveram uma viela terrestre39. No que se refere aos
claramente que, no totem individual, havia uma alma ex­ Arunta em particular, Spencer e Gillen dizem expressa­
terior; mas acreditava que essa exterioridade era o produ­ mente que esses maus gênios, conhecidos pelo nome de
to de um artifício e de uma artimanha mágica. Em realida­ Oruncha, são seres do AJcberinga4°. Entre os persona­
de, ela está implicada na constituição mesma da idéia de gens da época fabulosa, havia vários, com efeito, de tem­
alma31. peramentos diferentes: alguns tinham instintos cruéis e
maldosos que ainda conservam41 ; outros tinham natural­
mente má constituição; eram magros e descarnados; as­
II sim, quando se enterraram no chão, as pedras nanja a
que deram origem foram consideradas focos de perigo­
Os espíritos de que acabamos de falar são essencial­ sas influências42.
mente benéficos. Certamente agem com severidade, se o Mas eles se distinguem de seus congêneres, os heróis
homem não se comporta com eles como convém32; mas do Alcheringa, por caracteres particulares. Esses maus es­
sua função não é prejudicar. píritos não se reencarnam; entre os homens vivos, não h á
Entretanto, o espírito, por si mesmo, pode servir tan­ jamais quem o s represente; s ã o privados d e posteridade
to ao mal quanto ao bem. Por isso, ante os espíritos auxi­ humana43. Quando, por certos sinais, acredita-se que uma
liares e tutelares, constituiu-se naturalmente uma classe criança é o produto de suas obras, matam-na assim que
de gênios malignos que permitiram aos homens explica­ ela nasce44. Por outro lado, não s e relacionam a nenhum
rem-se os males permanentes de que devem padecer, os centro totêmico determinado; estão fora dos marcos so­
pesadelos33, as doenças34, os furacões e as tempestades35 ciais4s. Por todos esses traços, admite-se que são potências
etc. Não que todas essas misérias humanas, é claro, pare� muito mais mágicas do que religiosas. E, de fato, é so­
cessem coisas demasiado anormais para só poderem ser bretudo com o mágico que estão em contato; é delas,
explicadas por forças sobrenaturais; mas é que todas as com muita freqüência, q u e este obtém seus poderes46.
forças são então pensadas sob forma religiosa. Um princí- Chegamos a q u i , portanto, ao ponto o n d e termina o
300 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGIOSA ,1\ CRENÇAS El.EM.ENTARES 30J.

�undo ? ª religião e começa o da magia; e, como este úl­ presença da tribo, ou, pelo menos, por ocasião de uma
timo esta fora de nossa pesquisa, não nos cabe levar adian­ .1i.sembléia para a qual diferentes clãs foram convocados .
te esse esn1do47. A razão disso é que a iniciação tem por finalidade intro­
duzir o neófito na vida religiosa, não apenas do clã onde
de nasceu, mas da tribo inteira; portanto, é necessário
III que os aspectos variados da religião tribal sejam represen­
tados diante dele e passem, de certo modo, por seus
O aparecimento da noção de espír olhos. É nessa ocasião que melhor se afirma a unidade
ito marca um im­
p.ortan te progresso na indiv idual moral e religiosa da tribo.
izaçã o das forças reli­
giosas.
�_'.'
Toc vi� os seres espirin1ais ele que
se falou até ago­
Há, assim, em cada sociedade, um certo número de
ritos que se distinguem dos demais por sua homogenei­
.? �unda mais. que personagens secundários. Eles
, m_ o sa '.
ra dade e sua generalidade . Uma concordância tão notável
ou s: �o
g�n�? s maléfcos que pertencem só pareceu poder se explicar por uma unidade de origem .
mais à magia do
que a el1g1ao, u, ligad � imaginou-se, po1tanto, que cada grupo de ritos similares
� � os a u m indiv íduo e a u m lugar
d�termmados, so podem fazer senti
ra10 de ªção muito limitado. Porta
r sua influência num havia sido instituído por um mesmo e único antepassado

. nto, só podem ser 0 ob­ que os teria revelado à tribo inteira. Assim, entre os Arun­
!et� de ntos privados e locais. Mas, uma vez constituída ta, é um antepassado do clã do Gato-Selvagem, chamado
a
1de 1a ele espírito, ela se estendeu Putiaputia4s, que teria ensinado aos homens a maneira de
naturalmente a esferas
mais .
elevadas da viela religiosa, e com fabricar os churinga e de empregá-los ritualmente; entre
isso surgiram per­
sonaltdacles m1tic , as
de uma ordem superior. os Warramunga, é Multll-murtu49; entre os Urabunna, Wi­
Se as cerimônias próprias a cada
clã d i ferem umas turna so; entre os Kaitishs 1 , Atnatu, e entre os Kurnai52,
das outr · elas não deixam de Tundun. Do mesmo modo, as práticas da circuncisão são
. �: se relacionar a uma mes­
n1a r:ltgiao; assim, existe entre atribuídas pelos Dieri do Leste e várias outras tribos53 a
. . elas um cena número de
sunilitudes essenciais. � �mo t?<los os clãs são apenas par­ dois Mura-mura detenninados, pelos Arunta, a um herói
tes de u a mesma e un1ca tribo do Alcheringa chamado Mangarkunjerkunjas�. do totem
� , a unid ade da tribo não
pode deixa r de se fazer sentir atrav do Lagarto. Ao mesmo personagem são atribuídas a insti­
. és da diversidade dos
c� ltos particulares. J? e fato, não há grupo totêmico que tuição das interdições matrimoniais e a organização social
nao te�ha seus chun nga, seus bult- que elas implicam, a descoberta do fogo, a invenção da
roarers, que em toda
P.'.1 1te sa empregad s de forma lança, do escudo, do bumerangue, etc. Com muita fre­
� � semelhante. A organiza­
ça � da �1bo em fra :na , em class qüência, aliás, o inventor do bull-roarer é também consi­
� es matrimoniais, em clàs,
_
as mterd1çoes e_xog�ll1l as a eles ligadas, cons
� tituem igual­ derado como o fundador dos ricos da iniciação55 .
?1:� te verdadeiras mst1tuições tribais. Todas as festas da Esses antepassados especiais não podiam ser postos
_ o comp
m1c1aç� reendem algumas práticas fundamen
tais no mesmo nível dos outros . Por u m lado, os sentimentos
extraçao do dent e' circu cisão,
_

� subin cisào , etc. -, que, de veneração que inspiravam não eram limitados a u m
para .uma mesma tnbo .
, nao variam com os totens. A uni­ clã, mas comuns a toda a tribo. Além disso, era a eles que
for� 1dade em relação a esse pont se atribuía o que de mais estimado havia na civilização tri­
o se estabelece ainda
mais facilmente porq ue a inicia bal. Por essa dupla razão, eles se tornaram objeto de uma
ção semp re ocorreu em
302 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGIOSA IS CRENÇAS ELEMENTARES 303

consideração muito particular. Diz-se de Atnatu, por 10 extensa que compreende o Estado de Victoria, a Nova
exemplo, que ele nasceu no céu, numa época inclusive < . ales do Sul e se estende até mesmo ao Queensland62.
anterior aos tempos do Alcheringa, que criou a si mesmo l\m toda essa região, um número considerável de tribos
e deu-se o nome que tem. As estrelas são suas mulheres nê na existência ele uma verdadeira divindade tribal que,
ou suas filhas. Além cio céu onde ele vive, há um outro segundo as regiões, possui nomes diferentes. Os mais fre­
com um outro Sol. Seu nome é sagrado e jamais eleve ser qüentemente empregados são os de Bunjil ou Punjil63,
pronunciado diante das mulheres ou dos não-iniciaclos56. Daramulun64 e Baiame65. Mas verificam-se também os ele
No entanto, qualquer que fosse o prestígio desses Nuralie ou Nurelle66, Kohin67, Mungan-ngaua6s. Encontra­
personagens, não havia motivo para instituir em sua hon­ se a mesma concepção mais a oeste, entre os Narrinyeri,
ra ritos particulares, pois eles próprios não são mais que onde um grande deus é chamado Nurunderi ou Ngurrun­
ritos personificados. Não têm outra razão de ser senão ex­ <leri69. Entre os Dieri, é bastante provável que, acima dos
plicar práticas existentes, das quais são apenas um outro Mura-mura ou antepassados ordinários, exista um que go­
aspecto. O churinga forma uma coisa só com o antepassa­ ze de uma espécie de supremacia70. Enfim, contrariamen­
do que o inventou; ambos têm, às vezes, o mesmo no­
me57. Quando se faz ressoar o bull-roarer, diz-se que é a
te às afirmações de Spencer e Gillen, que declaravam não
ter observado entre os Arunta nenhuma crença numa di­
voz elo antepassado que se faz ouvir58. Mas, precisamente vindade propriamente dita71, Strehlow garante que, sob o
porque cada um desses heróis se confunde com o culto nome ele Altjira, esse povo, assim como os Loritja, reco­
que teria instituído, acredita-se que ele está atento à ma­ nhece um verdadeiro "bom deus"72.
neira pela qual este é celebrado. Só fica satisfeito se os fiéis Os caracteres essenciais desse personagem são em
cumprem exatamente seus deveres; pune os que são ne­ toda parte os mesmos. Trata-se ele um ser imortal, até
gligentes59. Po1tanto, ele é visto como guardião do rito, ao mesmo eterno, pois não deriva de nenhum outro. Após
mesmo tempo que seu fundador, razão pela qual se acha ter habitado a Terra durante algum tempo, subiu ou foi
investido de um verdadeiro papel moral6o. levado ao céu73, onde continua a viver cercado de sua fa­
mília, pois lhe atribuem geralmente uma ou várias mulhe­

rv
res, filhos e irmãos74 que, às vezes, o assistem em suas
funções. Em razão do lugar onde reside, ele e os seus
costumam ser identificados com estrelas determinadas75.
Entretanto, essa formação mitológica não é a mais Atribuem-lhe, aliás, um poder sobre os astros. Foi ele que
elevada que encontramos entre os australianos. Há um estabeleceu e ordenou a marcha do Sol e da Lua76; ele
certo número de tribos que chegaram à concepção ele um lhes dá ordens77. Ele é que faz cintilar o relâmpago da nu­
deus, senão único, pelo menos supremo, situado numa vem e que lança o raio7s. Como é o trovão, relaciona-se
posição preeminente em relação às outras entidades reli­ igualmente com a chuva79: é a ele que se dirigem quando
giosas. falta água ou quando chove demaisSO.
A existência dessa crença havia sido há muito assina­ Fala-se dele como de uma espécie de criador: é cha­
lada por diferentes observadores61, mas foi Howitt quem mado o pai dos hon1ens e diz-se que os criou. Segundo
mais contribuiu para estabelecer sua relativa generalida­ uma lenda que circulava em Melbourne, Bunjil teria feito
de. Ele a constatou, com efeito, numa área geográfica mui- o primeiro homem da seguinte maneira: com argila, teria
30·Í AS FORMAS ELElfEATAJ?ESDA �WA REUGIOSA ,1\ CRESÇAS ELE.lfE.\TARES 305

fabricado uma e5tatueta; depoi5 terüi dançado ao redor 1· seu CL.lto. Por isso. cuida que esses ritos, em particular,
dela várias vezes, lhe teria soprado nas narinas, e a estatue­ :-,eiam exatamente observados: quando faltas ou negligên­
ta teria se animado e começado a a (ldar8I. Segundo um cias são comelidas, ele as reprime de maneira terrível9S.
outro mito, ele teria acendido o Sol'· a Terra teria então se A autoridade de cada u m desses deuses, aliás, nào se
aquecido e os homens dela teriam b(otado112. Ao mesmo limita a uma única tribo: ela é igualmente reconhecida
tempo que os homens83, esse person agem divino fez os por uma pluralidade de tribos vizinhas. Bunjil é adorado
animais, as árvoresfl.l; é a ele que se d evem todas as artes em quase todo o Estado de Vicroria; Baiame, numa boa
da vida, as armas, a linguagem, os rit'.os tribais85. Ele é o patte da Nova Gales do Sul, etc. É o que explica que es­
benfeitor da humanidade, para a q u a JI continua a desem­ ses deuses sejam em tão pequeno nümero para uma área
penhar o papel de uma espécie de Prc)Vidência. Ele é que geográfica relativamente extensa. Os cultos de que são
provê a seus fiéis o necessário ã existRncia86. fatá em co­ objeto têm, portanto, um caráter internacional. Acontece
municaç-Jo com el<.:s, seja diretamence seja por intenncdiá­ inclusive que essas diferentes mitologias se misturem se
d
rios87. Mas, ao mesmo tempo, guar iíão da moral tribal, combinem, se façam mutuamente empréstimos. Assim, a
castiga quando esta é violadaRS. A julg:a r por certos obser­ maior parte das tribos que crêem em Baiame admitem
vadores, cumpriria inclusive, após a vi c;la, a função de juiz; também a existência de Daramulun; só que lhe concedem
distinguiria entre bons e maus e não r:rataria uns da mes­ uma menor dignidade. Fazem de Daramulun um filho ou
m a for ma que os outrosB9. Em todo caso, costuma ser um irmão de Baiame, subordinado a este ültimo96. A fé
a presentado como encarregado do p>aís dos mortos90 e em Daramulun acha-se assim difundida, sob formas diver­
como acolhedor das almas, quando chiegam no além91. sas, em cada a Nova Gales do Sul. Portanto, o internacio­
Como a iniciação é a forma princ ipal do culto tribal, nalismo religioso está longe de ser uma particularidade
lhe são mais especialmente devotado�s os ritos de inicia­ das religiões mais recentes e avançadas. Desde o início da
ção; ele é o centro desses ritos. Com fnUita freqüência, é história, as crenças religiosas manifestam uma tendência a
representado, então, por uma imagem talhada numa cas­ não se encerrar numa sociedade política estreitamente li­
ca de árvore ou modelada na terra . ])lança-se ao seu re­ mitada; há nelas como que uma aptidão natural a transpor
dor; canta-se em sua honra; dirigem- Ilhe até verdadeiras as fronteiras, a se difundir, a se internacionalizar. Claro
preces92. que houve povos e épocas em que essa aptidão espontâ­
. Explicam aos jovens quem é o pe. rsonagem que essa nea foi barrada por necessidades sociais opostas; mas ela
imagem representa; dizem-lhes seu no• me secreto, aquele não deixa de ser real e, como se percebe, muito primitiva.
que as mulheres e os não-iniciados d�vem ignorar; con­ Essa concepção pareceu a Tylor de uma teologia tão
tam-lhes sua h istória, o papel que a tra Pição lhe atribui na elevada que ele se recusou a ver aí outra coisa que o pro­
vida d_'.1 tribo. Em outros momentos, levantam as mãos pa­ duto de uma importação européia: seria uma idéia cristã
ra o ceu onde se supõe que ele resida ; ou então apontam mais ou menos desnaturada97. A. Lang, ao contrário98,
na mesma direção as armas ou os instnJmentos rituais que considera-a autóctone; mas, admitindo, também ele, que
manejam93: é um meio de entrar em ,comunicação com ela contrasta com o conjunto das crenças australianas e se
�!e. Por toda parte sentem sua presença .. Ele vela pelo neó­ baseia em princípio« completamente diferentes, conclui
fito quando este se retira na íloresta94 . . Está atento ã ma­ que as religiões da Austrália são feitas de dois sistemas
neira pela qual as cerimónias são celetbradas. A iniciação heterogêneos, superpostos um ao outro e derivados, con-
AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RRUG!OSA AS CRENÇAS ELEMENTARES 307

seqüentemente, de uma dupla origem. Haveria, de um la­ mente dotado de poderes mais que humanos, mas que vi­
do, as idéias relativas aos totens e aos espíritos, que teriam veu na terra uma vida perfeitamente humana102. Pintam­
sido sugeridas ao homem pelo espetáculo de certos fenô­ no como um grande caçadorto3, u m poderoso mágico104,
menos naturais . Mas, ao mesmo tempo, por uma espécie o fundador da triboios. Ele é o primeiro dos homens106.
de intuição sobre cuja natureza nada é explicado99, a in­ Uma lenda o representa inclusive sob os traços de um ve­
teligência humana teria concebido desde o início um lho fatigado que mal pode se mover107. Se existiu entre os
deus único, criador do mundo, legislador da ordem mo­ Dieri um deus supremo chamado Mura-mura, a palavra é
ral. Lang julga inclusive que, na origem, em panicular na significativa, pois serve para designar a classe dos ante­
Austrália, essa idéia era mais pura de qualquer elemento passados. Assim também, Nuralie, nome do grande deus
estrangeiro do que nas civilizações que vieram imediata­ nas tribos do rio M u rray, é às vezes empregado como
mente depois. Com o tempo, essa idéia teria sido pouco uma expressão coletiva aplicada ao conjunto dos seres
a pouco rccobena e obscurecida pela massa sempre cres­ rrúticos que a tradição coloca na origem das coisas108. São
cente das superstições animistas e totêmicas. Assim, ela personagens inteiramente comparáveis aos do Alcherin­
teria sofrido uma espécie de degenerescência progressi­ ga tO')_ Inclusive encontramos no Queensland um deus An­
va, até o momento em que, por efeito de uma cultura je-a ou Anjir, que cria os homens e, não obstante, parece
privilegiada, teria conseguido se recuperar e se afirmar claramente ser apenas o primeiro dos humanos 1 1 0.
de novo, com um brilho e uma clareza que não possuía O que ajudou o pensamento dos australianos a pas­
no princípio100. sar da pluralidade dos gênios ancestrais à idéia do deus
Mas os faros não admitem nem a hipótese cética de tribal foi que, entre esses dois extremos, intercalou-se um
Tylor, nem a interpretação teológica de Lang. termo médio, que serviu de transição: os heróis civiliza­
Em primeiro lugar, é hoje certo que as idéias relativas dores. Os seres fabulosos que chamamos com esse nome
ao grande deus tribal são de origem indígena. Elas foram são, de fato, simples antepassados aos quais a mitologia
observadas quando a influência dos missionários não tive­ atribuiu um papel eminente na história da tribo e que, por
ra ainda tempo de se fazer sentir10 1 . Mas disso não se se­ essa razão, foram colocados acima dos outros . Vimos
gue que devamos atribuí-las a uma misteriosa revelação. mesmo que eles faziam regularmente parte da organiza­
Longe de derivarem de uma outra fonte que não as cren­ ção totêmica: Mangarkunjerkunja é do totem do Lagarto e
ças propriamente totêmicas, elas são, ao contrário, a con­ Putiaputia do totem do Gato-Selvagem. Mas, por outro la­
seqüência lógica e a forma mais elevada dessas crenças. do, as funções que eles supostamente cumprem ou teriam
Vimos, com efeito, que a noção dos antepassados cumprido se assemelham muito às que competem ao
míticos está implicada nos princípios mesmos sobre os grande deus. Também este é tido por haver iniciado os
quais repousa o totemismo, pois cada um deles é um ser homens nas artes da civilização, por ter sido o fundador
totêmico. Ora, embora os grandes deuses lhes sejam cer­ das principais instituições sociais e o revelador das gran­
tamente superiores, há entre uns e outros apenas diferen­ des cerimônias religiosas que continuam sob seu controle.
ças de graus: passa-se dos primeiros aos segundos sem Se ele é o pai dos homens, é antes por tê-los fabricado do
solução de continu idade. Um grande deus, de fato, é ele que engendrado; m'ls Mangarkunjerkunja faz a mesma
próprio um antepassado particularmente importante. Com coisa. Antes dele, não havia homens, apenas massas de
freqüência falam-nos dele como de um homem, certa- carne informes em que os diferentes membros, inclusive
308 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELJGIOS11 ,1s CREJ\ÇAS ELEJ1ENTARES 309

01> diferentes indivíduos, não estavam separados uns dos Um de •.cus fi lhos, pelo menos, é um dos totens abrangi­
22•
outros. Foi ele que esculpiu essa matéria-prima e dela ti­ dos pela fratria à qual ele deu ou emprestou seu nome1
rou seres propriamente humanos 1 1 1 . Entre esse modo de Seu irmão é Pallyan, o morcego; ora, este serve de totem
fabricação e aquele que o mito de que falamos atribui a sexual aos homens em numerosas tribos de Victoria 123.
Bunjil, há apenas nuanças. Aliás, o que mostra bem o laço Podemos mesmo ir além e precisar ainda mais a rela­
que une essas duas figuras uma à outra é que uma rela­ ção que os grandes deuses mantêm com o sistema totémi­
ção de filiação é às vezes estabelecida entre elas. Entre os co. Daramulun, como Bunjil, é uma águia-falcão, e sabe­
Kurnai, Tundun, o herói do bull-roarer, é o filho do gran­ se que esse animal é um totem de fratria num grande nú­
de deus Mungan-ngaua112. Do mesmo modo, entre os Euah­ mero de tribos do Sudeste m. Nuralie, dissemos, parece
layi, Daramulun, filho ou irmão de Baiame, é idêntico a ter sido inicialmente um termo coletivo que designava in­
Gayandi, que é o equivalente do Tundun dos Kurnai113. d1Stintamente águi
a1>-falcões ou corvos; ora, nas tribos em
Seguramente de todos esses fatos não se deve concluir que. esse mito foi observado, o corvo serve de totem a
que o grande deus não é nada mais que um herói civiliza­ uma das duas fratrias, a águia-falcão à outra12s. Por outro
dor. Há casos em que esses dois personagens são nitida­ lado, a história legendária dos grandes deuses lembra mui­
mente diferenciados. Mas, se não se confundem, pelo me­ to a dos totens de fratria. Os mitos, e às vezes os ritos, co­
nos são parentes. Também acontece que se tenha alguma memoram as lutas que cada uma dessas divindades teve
dificuldade em distingui-los: há os que podem ser igual­ de travar contra uma ave carnívora, da qual triunfou não
mente bem classificados tanto numa como noutra catego­ sem dificuldade. Bunjil, ou o primeiro homem, após ter
ria. Por isso, falamos de Atnatu como de um herói civiliza­ feito o segundo homem, Karween, entrou em conflito
dor, mas ele está bem mais perto de ser um grande deus. com este e, durante uma espécie de duelo, feriu-o grave­
A noção de deus supremo depende mesmo tão inti­ mente e transformou-o em corvo1 26. As duas espécies de
mamente do conjunto de crenças totêmicas que conserva Nuralie são apresentadas como dois grupos inimigos que,
ainda sua marca. Tundun é u m divino herói muito próxi­ primitivamente, estavam a todo momento em guerra127.
mo da divindade tribal, como acabamos de ver; ora, a Baiame, por sua vez, teve de lutar contra Mullian, a águia­
mesma palavra, entre os Kurnai, quer dizer totem • 1 4 . Do falcão canibal, que, aliás, é idêntica a Daramulun12ª. Ora,
mesmo modo, entre os Arunta, Altjira é o nome do gran­ vimos que entre os totens de fracria há igualmente uma
de deus e também o nome do totem materno1 1s. E mais: espécie de hostilidade constitutiva. Esse paralelismo aca­
muitos grandes deuses têm um aspecto manifestamente ba demonstrando que a mitologia dos grandes deuses e a
totêmico. Daramulun é uma águia-falcão 116 , tem por mãe dos totens são parentes próximas. O parentesco ficará
uma ema• 11. É sob os traços de u m a ema que Baiame é ainda mais evidente se observarmos que o êmulo cio deus
igualmente representado11s. O próprio Altjira dos Arunca é regularmente ou o corvo, ou a águia-falcão, que são, de
tem pernas de ema•19. Nuralie, antes de ser o nome de maneira geral, totens de fratria1 29.
um grande deus, designava, como vimos, os antepassados Baiame, Daramulun, Nuralie, Bunjil parecem, portan­
fundadores da tribo, uns dos quais eram corvos e os ou­ to, ser totens de fratria que foram divinizados. Eis como é
tros falcões1 20. Bunjil, segundo Howitt l21, é sempre figura­ possível conceber que ocorreu essa apoteose. Sem dúvida
do sob uma forma humana; no entanto, a mesma palavra nenhuma, essa concepção se elaborou nas assembléias
serve para designar um totem de fratria, a águia-falcão. que se realizam a propósito da iniciação; pois os grandes
310 •JS CRESÇAS E/..E.HE.\TARES 311
AS FORMAS ELEMENTARES DA VTDA REUGIOSA


d euses só esempenham um papel de alguma importân­ que este ú timo, durante uma luta contra seu rival, fora
.
ua nesses ntos, enquanto são alheios às outras cerimônias 'encido e que sua exclusão fora a conseqüência de sua
!
religios�s. Al ás, como a iniciação é a forma principal do derrota. A idéia foi ainda mais facilmente aceita por estar
c� lto tnb� I. e s�me�t� nessa ocasião que uma milOlogia de acordo com o conjunto da mitologia, já que os totens
tribal podia surgir. Ja vunos como o ritual da circuncisão e de fratria são geralmente considerados inimigos um do
o da subincisão tendiam espontaneamente a se personifi­ outro.
c:r na for�a de heróis civilizadores. Só que esses heróis
yp.iO pode servir para confirmar essa explicação, pois ele
Um mito que a sra. Parker observou entre os Euahla­
nao exerciam nenhuma supremacia; estavam no mesmo
plano que os outros benfeitores legendários da sociedade. apenas a traduz sob uma forma figu rada. Conta-se que,
Mas la_ onde a tribo adquiriu um sentimento mais forte de nessa tribo, os totens eram a princípio apenas os nomes
si, esse sentimento encarnou-se naturalmente num perso­ dados às diferentes partes do corpo de Baiame. Os clâs
nagem qu1.;; se tornou seu símbolo. Para explicar a si mes­ '>criam, portanto, num certo sentido, corno que fragmen­
mos o: vínculos que os uniam uns aos outros, não impor­ tos do corpo divino. Não é outra maneira de dizer que o
t� o ela a 5Jue pertencessem, os homens imaginaram que grande deus é a síntese de todos os totens e, conseqüen­
tinham saido de um mesmo tronco, que eram filhos de temente, a personificação da unidade tribal?
um mesmo p�i a �uem deviam a existência, sem que este Mas o grande deus adquiriu ao mesmo tempo um cará­
a devesse a nmguem. O deus da iniciação era talhado sob ter internacional. Com efeito, os membros da tribo à qual
pertencem os jovens iniciados não são os únicos que assis­
tem às cerirnônias da iniciação; representantes das tribos vi­
medida para esse papel, pois, segundo uma expressão
��e . re �orna com freqüência aos lábios dos indígenas, a
m1c1açao tem precisamente por finalidade fazer fabricar zinhas são especialmente convocados para essas festas, que
;
homens. Atribuiu-se, pois, a esse deus um pod r criador se assemelham a feiras internacionais, a uma só vez religio­
�· por todas :ssas razõ�, ele se viu investido de um pres­ sas e leigasl31. Crenças que se elaboram em meios sociais
tigio que o pos bem acima dos outros heróis da mitologia. ac;sim compostos não podem permanecer como patrimônio
Estes tornaram-se seus subordinados, seus auxiliares; fez­ exclusivo de uma nacionalidade detenninada. O estrangeiro
se deles seus filhos ou seus irmãos menores, como Tun­ a quem elas foram reveladas as comunica, assim que retor­
dun, Gayand1, . Karween, Pallyan, etc. Mas já existiam ou­ na, à sua tribo natal; e como, cedo ou tarde, chegará sua
tros seres sagra �los que ocupavam no sistema religioso da vez de convidar seus anfitriões da véspera, vão se produzin­
tnbo um lugar igualmente eminente: os totens de fratria. do, de sociedade a sociedade, continuas trocas de idéias.
Onde se mantiveram, são tidos por conservar sob sua de­ Constituiu-se, assim, uma mitologia internacional, cujo ele­
pendên � ia os totens dos clãs. Assim tinham tudo o que mento essencial acabou sendo naturalmente o grande deus,
era preciso para que eles próprios se tomassem divinda­ já que essa mitologia tinha sua origem nos ritos da iniciação
des tribais. Era natural, portanto, que uma confusão parcial que ele tem por função personificar. Seu nome passou,
?
se .esta elecesse entre esses dois tipos de figuras míticas. pois, de uma língua a outra com as representações que a
Fot assim que um dos dois totens fundamentais da tribo ele estavam associadas. O fato de os nomes das fratrias se­
emprestou seus traços ao grande deus. Mas como era pre­ rem geralmente comuns a tribos muito diferentes só pôde
ciso explicar por que somente um deles fora chamado a facilitar essa difusão. O n
i ternacionalismo dos totens de fra­
essa dignidade da qual o outro estava excluído, supôs-se tria abriu caminho para o do grande deus.
r '

313
312 AS FORMAS ELF.MENTARES DA HDA REUCIOSA AS CRENÇAS ELEMENTARES

V Quanlo à noção de grande deus, ela se deve inteira­


mente a um sentimento cuja ação já observamos na gêne­
Chegamos, as �im, à concepção mais alta a que se ele­ se das crenças mais especificamente tOLêmicas: o senti­
vou º. t ?�emismo. E o ponto em que ele se junta e prepara mento tribal. Vimos, com efeito, que o totemismo não era
obra isolada dos clãs, mas que se elaborava sempre no in­
as relig1oes que seguirão, e nos ajuda a compreendê-las .
M �s, ao n:esmo tempo, pode-se ver que essa noção cul­
terior de uma tribo, que tinha, em algum grau, consciên­
cia de sua unidade. É por essa razão que os diferentes
minante hga-se sem interrupção às crenças mais grossei­
cultos particulares a cada clã se reúnem e se completam
ras que analisamos em primeiro lugar.
de maneira a formar um todo solidáriot32. Ora, é esse
Com efeito, o grande deus tribal não é senão um es­
mesmo sentimento ela unidade tribal que se exprime na
pírito anceslral que acabou por conquistar um lugar emi­
concepção de um deus supremo, comum à tribo inleira.
nente. Os espíritos ancestrais não são senão entidades
Portanto, são exarnmenre as mesmas causas que estão
f�1jadas . à imagem das almas individuais, cuja gênese es­
tao destmados a explicar. As almas, por sua vez, não são
agindo da base ao topo desse sistema religioso.
Todavia, consideramos até aqui as representações re­
senão a forma Ql!e adquirem, ao individualizar-se em ligiosas como se elas se bastassem e se pudessem explicar
corpos particulares, as forças impessoais que encontra­ por si mesmas. Na verdade, elas são inseparáveis dos ri­
mos na base do totemismo. A unidade do sistema iguala tos, não apenas porque neles se manifestam, mas porque
sua complexidade. sofrem indiretamente sua influência. Sem dúvida o culto
Nesse trabalho ele elaboração, a idéia de alma de­ depende elas crenças, mas reage sobre elas. Para compreen­
sempenhou, certamente, um papel imponante: foi através dê-las melhor, convém, portanto, conhecê-lo melhor.
dela que a idéia de personalidade se introduziu no domí­ Chegou o momento de abordar seu estudo.
nio religioso. Mas, ao contrário do que afirmam os teóri­
cos do animismo, ela está longe de conter toda a religião
em germe. Em primeiro lugar, supõe antes dela a noção
de mana ou de princípio totêmico, da qual não é mais
que um modo particular. Em segundo, se os espíritos e os
cl_e uses não podiam ser concebidos antes ela alma, eles
sao, no entanto, outra coisa que simples almas humanas,
_
liberadas pela morte; pois de onde lhes viriam seus po­
deres sobr�-humanos? A idéia de alma apenas serviu para
_
onentar .ª imaginação miLológica numa nova direção, pa­
r� sugenr-lhe construções de um novo tipo. Mas a maté­
na dessas construções foi tomada, não da representação
da alma, mas desse reservatório de forças anónimas e di­
fusas que constitui o fundo primitivo elas religiões. A cria­
ção de personalidades míticas foi apenas um outro modo
de pensar essas forças essenciais.
-

LIVRO IrI

AS P RI NCIPAIS ATITUDES RITUAIS


CAPÍTULO 1
O CULTO NEGATNO E SUAS FUNÇÕES.
OS RITOS ASCÉTICOS

Não Lemos a intenção de LenLar, no que segue, uma


descrição complet.a do culto primitivo. Preocupados antes
de tudo em atingir o que há de mais elementar e funda­
ment.al na vida religiosa, não buscaremos reco nslituir no
detalhe a mulciplicidade, não raro confusa, de todos os
gestos rituais. Mas gostaríamos, através da extrema diver­
sidade das práticas, d<.: captar as atitudes mais característi­
cas que o rri mitivo observa na celebração de seu culto,
de classificar as formas mais gerais de seus ritos, de deter­
minar suas origens e sua significação, a fim de controlar
e, se possível, precisar os resultados a que nos conduz a
análise das crençasª .
Todo culto apresenta um duplo aspecro: um negati­
vo, outro positivo. Certamente, na realidade, as duas es­
pécies de ritos que assim denominamos estão intimamen­
te associadas; veremos que uma supõe a outra. Mas não
deixam de ser diferentes e, ainda que fosse apenas para
compreender suas relações, é necessário distingui-las.
'3 18
. AS FORMAS ELEMENTARES {)A 170A RFJJ(,f()!:JA 11S PIUA<..lf'lll.\ A "/ /Fl J>/;'.'i RITUAIS 319

comum o faw dl' promu lgarem incompat i hi li c bdc s entrl'


certas coisas e d e separarem as coisas assim declaradas
Os seres sagrados são, por defi nição, seres separados. in com patíve is. Mas há, ent re elas, diferenças considerá­
O que os caracteriza é que, entre eles e os seres profanos , veis. Em primeiro lugar, as sanções não são as mesm�ts
h á u m a solução d e continuidade. Normalmente, uns são nos dois casos. Certamente, como veremos mais adiante ,
exteriores aos outros. Todo um conjunro de ritos tem por acred ita-se com frcqüência que as violações dos interdiL01>
obje10 realizar esse escada de separação que é essencial. religiosos dctermimu11 meca nicame nte desordens materiais
Como 1>ua função é evitar misturas e aproximaçôes indevi­ que o culpado teria de padecer e que são consideradas
das, impedir que um dos domínios avance sobre o outro, uma punição por seu mo. Mas, ainda que se produza real­
esse1> ritos só podem promulgar abstenções, ou seja, alOs mente, esta punição automática não é a única ; sempre (!
negativos. Por essa r.izão, propomos chamar de culLO ne­ acompanhada por uma outm. que supõe uma mtervençao
gativo o s11>1ema formado por esses n tos especiais. Eles hum;1m1. Ou uma pena propriamente dita .icre�ccnta 1>L J

não prescrevem ao fiel que cumpra ações efetivas, mas se el a, quando mio a antecipa, pena essa que é delibernda­
limitam a proibi r-lhe cenas maneiras de agir; ponanto, ac.1- mente inlligida pelo1> homens; ou, pelo menos. há censu­
qu i rem Lodos a forma da interdição, ou, como se diz cor­ ra, reprovação pública . Ainda que o sacrilégio tenha sido
rentemence em et nografia, do tabu . Esta última pah1vr.1 é a como que punido pela do ença ou a monc nawral ele seu
que se emprega na.'> linguas polinésias para designar a i n�­ autor, ele é, além disso, estigmatizado; ele ofende a opiniào,
Litu iç:io em virtude ela qual certas coisas são retirndas e.lo que reage contrJ ele; põe aquel e que o cometeu em estn­
uso comumZ; é também u m adjetivo que exprime o niráwr do de falta. Ao contrário, a incerd içào mágica é sa nciona­
distint ivo desse tipo de coisas. Já t ivemos a ocasião de da apenas pela.... com .eq üências materiais que o ato inter
moscrJr o quanto é impróprio transformar assim, num ter­ dito supostamente prod uz, com uma es pécie de necessi­
mo genérico, uma expressão estritamente local e dialeta l . dade fís ic:i. Ao deso b ed e cer, correm-se riscos, como
Não há religião em que não existam in Lt:rclições e cm que aquelt:s aos quais se expôe um enfermo que não segue os
elas não desempenhem um pa pel considerável; portanto, conselhos de seu médico; mas a desobed iência, nesse ca­
(: lamentável que a terminologia consagrada pareça fazer, so, não const itui uma falta, não causa ind ignação. N<\<> há
de uma institu ição tão u niversal, uma particularidade pró­ pecado mágico. Essa diferença nas pun ições deve-se, a l iás,
pria d�t Pol inésia 5 . A expressão interditos ou i11terdições a uma diíercn<;:1 profund<t na natureza das intcrc.liçôcs. A
nos parece bem mais preferível . Entretanto, " palavra tabu, inLerd iç;1o religios;1 impl ica necessariamente a noção do
como totem, é Lào usual que haveria um excesso de puris­ sagrado, vem cio respeito que o objeto sagrad o inspira e
mo cm proi bi-la sistematicamente; além disso, os inconve­ tem por finalidade im pedi r q u e falte esse respeito. Ao
nientes que ela apresenta são atenuados tão logo se tenha contrário, as i nlerdiçôcs mágicas supõem apenas a no,·ão
o cuidado de precisar seu sentido e seu alcan ce. perfc iL<tmenle leiga de propriedade. As cois:is que o mági
Mas há interdições ele espécies diferentes, que impor­ co recome nda manwr separadas são aquelas que, cm ra­
ta distinguir, pois, no presente capírulo, não iremos tratar zão de suas propri edades caracterísricas, não podem .�er
de todos os seus tipos. misturadas ou :ipro. 1madas sem perigos. Mesmo se ele
Antes ele mais nada, além daq uelas relacionadas ã re­ vem a convidar seus clientes a m an terem distância de cer­
ligião, há as que dizem respeito à m agia . Ambas têm cm tas coisas sagradas, não o faz por respeito a elas e por te-
º ES RITUAJS
,15 PRl1YCIPAIS A T!Tl{)
320
AS FOflltAS ELE!.1ENTARES DA VIDA REUG!OSA 321

mor de que sejam profanadas, pois a magia, como sabe­ Mas ex1�te um ou tro <;istema de interdiçõe-; religiosas
mos, vive de profanações•, mas unicamente por razões de muito mais extenso e mais importante: é o que separa,
utilidade temporal. Em uma palavra , as inte rdições re l ig io­ não espécies d iferentes, mas tudo o que é sag rado ele tu­
sas são i m perati vos categó r i cos ; as o u t ras são máximas do o que é profano. Deriva im edi ata mente, portanto, da
utilitárias, primeira fo rm a ele i nterdições higiênicas e mé­ noção mesma de sag rado, que esse sistema se l im i ta a ex­
dicas. Não se pode, sem confusão, es tu d a r simultanea­ pri m i r e a rea l i za r. Assim, ele fo rn ece a m a téri a ele um
mente, e sob o mesmo nome, duas ordens de fa tos tão di­ verdadeiro cul to, e mes mo de um culto que está na base
ferentes . Iremos nos ocupar aqui apenas das in terd ições de todos os oUlros, po is a atitude que prescreve é aquela
reUgiosas5. de que o fiel jamais _deve se desviar em suas relações
�om
Mas, mesmo entre estas últimas, uma nova distinçã o os seres sagrados. E o que chamamos de culto negauvo.
é necessária. Pode-se dizer, portanto, dessas mt erd içõ�s , que elas são
Há intcrdiçà<.::s rel igiosas que têm por objeto separar, as interdições rel igiosas por excdência.,. E som ente delas
umas das outras, coisas sagradas de espécies diferentes. O que se tratará nas páginas seguintes.
leitor se lembra, por exem pl o , de como, entre os Wakel­ Mas elas assu mem formas múltiplas. Eis aq u i os tipos
bura, o t a b la do sobre o qt1al o morto fica ex posto eleve p ri nci pais que se observam na A ustrália .
_

ser ex c l u s iva mente construído com materiais que perten­ Antc.:s ele tudo, há interdições de contato: sao os tabus
cem à f at ri a
r do clefunro; val e dizer que é i nterd i to todo primários dos quais os outros não são muito mais que va­
contato entre o morto, que é sagrado, e as coisas ela omra riedades particulares . Eles se base ia m no p rin cíp io de que
fratria , que também são sagradas, mas a títulos diferentes. o profano não deve Locar o sagrado. Já vimos que em ca o

Além disso, as armas util izadas para caçar um animal não nenhum os churinga ou os bull-roarers devem ser maneia­
devem ser feitas de uma macieira que esteja classificada dos por não-iniciados. Se os adultos têm essa liberdade, é
no mesmo grupo social que e!;Se animal<>. Mas as mais im­ que a iniciação lhes conferiu um caráter sagrado. O s n­

portanres dessas interdições são as que estudaremos nu m
� _in1c1
gue, e pa rtic u larm ente o que corre clura t e . aç�o ,

tem uma virtude rcligiosaR; ele está submeudo a mesma m­
próxi mo ca pítul o: elas se destinam a prevenir toda comu­
terdição9 . O mesmo aco ntece com os cabelos1º. O morto é
nica ção entre o sagrado puro e o sagrado impuro, e ntre o
um ser sagrado, porq ue a alma que animava o corpo ade­
sagrado fasto e o sagrado nefasto. Tod a s essa s i nterd i ções
re ao cadáver; por essa razão, é às vezes proibido trans­
têm uma característica comum: advêm, não do fato de ha­
portar os ossos cio morto a não ser envolv idos numa casca
ver coisas sagradas e outras que não o são, mas de existi­
de árvorel 1. O l ugar mesmo onde ocorreu o falecimento
rem entre as coisas sagradas relações de inconveniência e
deve ser evitado, po is acredita-se que a alma do defumo
de incompatibilidade. Portanto, n ã o dizem respeico ao
continue a residir ali. Por isso, a aldeia é desmontada e
que há ele essencial na idéia do sagrado. Assim. a obser­
transportada a uma certa distância 1 2; cm alguns casos, ela
vância dessas proibições pode dar ensejo apenas a ritos
é destruída com tudo o que contém 13, e um tempo decorre
isolados, particulares e quase excepcionais, mas não seria
antes que se possa voltar ao mesmo locaJH. Acontece, al­
capaz de constituir um culto propriamente dito, pois um
gumas vezes, que o moribundo já provoque como qu um
culto é feito, antes de tudo, de relações regulares entre o

v azio a seu redor; ele é, então, abandonado, depois ele
p rofano e o sagrado como tal. instalado tão confortavelmente quanto possíveJ 1 5.
322 AS FORMAS ELl:.ME.\TAR!� DA lll)A RHLIG'IOSA ,fS PR!iVCIPAIS ATl111DES R!Tl'AIS 323

! 'm <:onta to excercionalmente íntimo (: o profano� A m u l her jamais deve ver os instrumentos do
que resulta
da ab.sorçao de um alimento. Dai vem a interdiç l Ulto; quando muilo lhe é permitido vislumbrá-los de lon
ao de co­
mer os animais ou os vegetais sagrados, particul ge'9. O mesmo acontece com as pinturas totêmicas execu­
armente
os que servem de totens"'· Um tal ato afigura-se tadas sobre o corpo dos oficiantes por ocasião de cerimô­
tào sacrí­
lego que a p oibi ão aplica-se inclusiv e aos adultos nias particularmente importantesio. A excepcional soleni­
� ! ou,
pelo menos, a m�11or parte deles; somente os velhos dade dos ritos de i n iciação faz que, em certas tribos, as
atin­
gem s u ficiente d i gn i da de rel ig ios a para ne m mulheres não possam sequer ver os locais onde são cclc­
sempre se
submeterem a essa interdição Explicou-se às vezes brados21 nem o próprio neófito22. O caráter sagrado ima­
.
essa
proibição pelo parentesco mít ico que une o homem nente à cerimônia inteira m a n i festa-se nalllralmente na
aos
animais cujo ome ele te m; esses animais serimn pessoa dos que a dirigem ou que dela participam; disso
� proregi­
_
c.los pdo st:nllmento de simpatia resulta q ue o nm iço não pode levantar os olhos para eles,
que inspiram na qua lichi­
c.1: uc parentc.s1 : Ma:;, o que mo:-.tra bt!m que a mterd1ç<lo L a proibição se mantém mesmo depois que o rito se re::ili
nao te m por origem uma s i mples reação do sent zou23. Também o morto é às vezes subtraído aos olhares:
i me n to
de solidari edade domést ica é que o consum o e.la sua face é recoberta de maneira a não poder ser vist.a24.
carne
p roibida é tido por determinar automaticamen A fala é um outro mcio de entrar em con ta to com as
te a doença
e a mo �te . Tr ta-se, portanto, de forças de outro pessoas ou com as coisas. O ar expirado esta belece a co­
que eswo em 1ogo, análogas àquelas que, em
� gêncrc'
todas as re­ municação, é a lgo de nós que se espalha para fora. Por is­
ligiões, reagiriam contra os sacrilégios. so, é proibido aos profanos dirigir a palavra aos seres sa­
Aliás, se certos a l i mentos são proibidos ao profano grados ou, s implesmente, falar em sua presença. Do mes­
po r se rc m sag ra d os , outros, ao contrár io, são mo modo que não deve olhar os oficiantes nem os assis­
p roib i­
dos, ror serem rrofanos, às pessoas marrnd as tentes, ao neófilo é proibido conversar com eles, salvo
de um ca­
rfüer sagrado. Assim, é frcqüentc que animais dctcrm por sinais; e ess a in terd ição persiste até que tenha sido le­
ina­
dos sejam especia lmente destina dos à a l imentaç
ão das vantada por intermédio de um ri to especiall>. De urna ma­
mu lheres; acredita-se que participa m da naturez neira geral, há, entre os Arunta, durante as grandes ceri­
a femini­
na e que, portanto, são profanos. O jovem iniciado mônias, momentos em que o silêncio é obriga tó riol<>. As­
' ao
contníri >, é sub metido a um conj u n to de ritos de sim que os churinga são expostos, todos se calam; ou, se
lar g ra v 1 c la c; ra ra rocl er transm itir-lhe as virtude
� ran icu­
� s que fa la m , é em voz baixa e calmamente27.
lhe pcrm1t1 rao rcnetrar no mundo das coisas sag Além das coisas sagradas, há palavras e sons que têm
rad as de
onde �.�tava excl uído aLé então, faz-se convergir sobre o mesmo caráter; não devem sair dos lábios dos profanos
ele
um feixe excerc1onalme_ nem chegar a seus ouvidos. Há cantos rituais que as mu­
nte poderoso de forças religiosas.
Ele se encomra num estado de santidade que afasta lheres não devem ouvir sob pena de morte28. Elas podem
para
longe tudo o que é profano . Assim lhe é rroibid perceber o ruído dos bu/1-roarers, mas apenas à distância.
o comer
e.la caça que estaria destinada às mulhereslH. Todo nome próprio é considerado um elemento essencial
Mas o cont ara pode se estabelecer de outra forma da pessoa que o tem; intimamente associado nos espíritos
nªº r el o tato. Entra-se cm relação com uma coisa
que
_

à idéia dessa pessoa o nome participa dos senli mcmos


que ela inspira. Se, portanto, ela é sagrada, também ele o
pelo
s1. �ples fato dc olhá-la: o olhar é um con Lato. Por
isso, a
. _

v1sao das coisas sagrada'> é, em certos casos pro é. Assim não pode ser pronunciado ao longo da vida pro-
. ibida aos
324 AS FOR,\IAS Effiltl'..\TARES DA HD1I RELIGIOSA AS PRINCIPAIS A T!n'OES RJntA/S 325

fana . Há, entre os Warramunga, um totem que é particu­ é proib1Jo u tl i7.á- los no convívio profano. Uma vez encer­
larmente venerado; trata-se da serpen te mítica ch amada rada a cerimônia, são enterrados ou queimados1º; os ho­
Wo l lu nq ua , cujo nome é tabu29. O mesmo oco rre com mens devem incl usive lavar-se de maneira a não conser­
Baiame, Daram u l un, Bunjil: a forma esotérica ele seus no­ var nenhum vestígio dos o rn ame ntos que os cobriam4 1 .
mes não pode ser revelada aos nâo- i n ic iaclos3o. Durante o De maneira mais geral, os atos característicos da vida
luto, o nome do morto não deve ser mencionado, ao me­ ordinária são interditos e nq uanto se desenrolam os ela vi­
nos por seus parentes, salvo q ua ndo há absoluta necessi­ cia religios a . O ato de comer é, por si mesmo, profano,
dade e, mesmo nesse caso, somente em voz ba ixa3' . Essa pois acontece todos os dias, satisfaz necessidades essen­
interd ição é muitas vezes perpét ua para a viúva e para al­ cialmente utilitárias e materiais, faz parte de nossa existên­
guns parenres32. Em cercos povos, ela se estende incl usive cia vulgaf'll. Por isso ele é proib ido e m tempos religiosos.
além d a família, todos os indivíduos que têm o mesmo Assim, quando um grupo totêmico emprestou seus churin­
nome d o defunto são obrigados a mudá-lo wmporaria­ ga a um clã estrangeiro, é um momento solene aquel e cm
memc.1.�. Mais: os parentes e os ínt i mos proíbem-se às ve­ que são trazidos de volta e recolocados n o ercnatulunga:
zes cerras palavras da língua usual, certamente porque todos os que tomam pa11e da cerimôn ia elevem perma ne­
eram e m prega da s pe lo morto; p ree n che m-se essas lacu­ cer em jejum enquanto ela d ura r, e ela dura bastante43. A
nas por meio ele perífrases ou e m p réstimos Lomaclos ele m es ma regra se obse1va durante a celebração dos ritosH,
algum dia leto estrangei ro3 1. Além ele seu nome pú b l ico e que.: veremos no capít u lo seguinte, bem como em certos
v u l ga r, os homens têm u m outro guardado em seg redo: momentos da in iciação45.
as mu lh eres e as crianças o ignoram; jamais se faz uso de­ Pela mesma razão, todas as ocupações temporais são
le na vicia ordinária. É que ele possui um caráter religio­ suspensas quando ocorrem as grandes solenidades reli­
so35. ! lá também cerimônias durante as quais se é obriga­ giosas. Conforme uma observação de Spencer e Gillen 16
do a falar uma l i nguagem especial que não se pode utili­ que já tivemos a ocasião de citar, a vida do australiano é
zar nas relações profanas. Trata-se de um começo de lín­ feita ele duas partes muito distintas: uma é dedicada ã ca­
gua sagra da36. ça, à pesca, à guerra, a outra é cons agrada ao culto. E es­
Os seres sagra dos não somente são separados dos sas duas a tivi dades se excl uem e se repelem muruamente.

profanos, como também nada do que concerne, direta ou É nesse pri n cípio que se baseia a in stituiçã o universal do
in d i retam ente , à vicia profana eleve se misturar à vicia reli­ des ca n so re l igio so . O caráter distintivo e.los dias de festa,
giosa. Uma nudez com plet a não ra ro é exigi da d o ind íge­ em todas as re lig i ões conhecidas, é a pa ra l isação do tra­
na como co nd ição prévia para poder participar do rito37; balho, a suspensão da vida pública e privada , na medida
ele é obrigado a despojar-se ele todos os seus orna mentos em que esta não tem objetivo religioso. Esse repouso não
h a b itu a is , m esm o da qu e les a que tem mais apego e d os é simplesmen te uma espécie de fo lga te mporária que os
qua is é mais difícil separar-se por cau sa das virtudes pro­ homens teriam se concedido para se entregarem mais li­
tetoras que lhes atribui38. Se, para desempenha r seu pa pel vremen te aos sentimentos de a legria que os feriados ge­
ritual, ele é obrigado a enfeitar-se, essa ornamentação de­ ralmente despeitam, pois há festas tristes, co nsagradas ao
ve ser feita especialmente para a ci rcu n stân cia : é uma in­ l u t o e à penitência, durante as quais e l e não é menos
dumentária cerimoni<1l, um traje de festa39. Como esses o r­ obligatório. Mas é que o trabalho é a forma e m inen te da
namentos são sagrados em razão do u so que deles se fez, at ivid a de profana, não tem outra finalidade aparente a
326 AS FOR.llASELfüfENTARES DA 17DA REUG!OSA 327
1\ l'IU.YCIPAIS ATm.rnES RIT/IA/S
não ser prover às necessidades temporais da vida; ele só na
Do mesm o modo, a vida religiosa e a vida profa
1 1. 1 0 rodem
nos põe em contato com coisas profanas. Ao contrário nos ele temp o.
� lias d� festa, � vida religiosa atinge um grau de excepclonal
coex istir nas mesm as unida des
111tens1dade. l ortanto, o contraste entre as duas formas de
primeira dias ou perío ­
l 'ortanto, é necessário reservar à
t lm determinados dos quais todas as ocup açõe s profa nas
existência, i:esse momento, é panicularmentc acentuado; . Não há
por consegu111te, elas não podem ser vizinhas. O homem é .qam retiradas. Foi assim que surgiram as festas
H'ligião nem, conseqüentemente, socie dade que não te­
incap�z de se � proximar intimamente de seu deus quando o do tempo em duas
nha conhecido e pratic ado essa divisã
traz a111da em s1 as marcas de sua vida profana· inversamen­ lei variáv el
te, ele só pode re�ornar às suas ocupações usu�is depois ele parles defin idas que se altern am segun do uma
. ações; é muito prová vel até, co-
santificado pelo nto. Assim o descanso ritual é apenas um 1 om os rovos e as civiliz
tenha
1110 dissemos, que a necessidade dessa alt<:rnância
k vado
caso pa1ticula r da i_ncompatibilidade gemi que separa o sa­ contin uidad e e homo ­
. os home ns a introd uzir, na
grado do profano; e o resultado de uma interdição. nciaçõ es que ela
geneidade da duração, distinções e difere
Não poderíamos enumerar aqui lodos os tipos de in­ te
terdições que são observadas, ainda que apenas nas reli­ niio comporta narur almente49. Claro que é praticamen
conce ntrar de
giões australianas. Da mesma forn1a que a noção de sagra­ impossível que a vida religiosa venha a se
que lhe
do sobre a qual repousa, o sistema das interdições estende­ lonna hermética nos meios espaciais e temporais
ídos; é inevi tável que um rouc o dela se
se às relações mais diversas; inclusive é deliberadamente são assim atribu
s sagra das fora cios
utilizado para fins utilitários 11. Mas, por mais complexo que escoe no exter ior. l lá sempre coisa
rodem ser celeb rados em dias de
possa ser, ele resulta fi nalmente em duas interdições fun­ santuários; há ritos que
Mas trata-s e de coisas sagra das de ordem secun ­
damentais que o resumem e o dominam. trabal ho.
rtânc ia. A conc entra ção
Em primeiro lugar, a vida religiosa e a vida profana dária e de riLos de menor imro
ização.
rermanece a característica dominante dessa organ
_

nao pod�m _c:oexistir num mesmo espaço. Portanto, para leta em tudo o que
Ela é aLé mesm o geral mem e comp
que a pnme1ra possa se desenvolver, é preciso providen­ ser celeb rado cm
. concerne ao culto público, que só pode
ciar-lhe um local especial de onde a segunda esteja excluí­ é o único que chega
privad o, indivi dual,
a se mislllrar com a vida temporal. Assim o contr
da. Daí a instilUição dos templos e cios santuários: são comum. O culto
aste en­
porções de espaço destinadas às coisas e aos seres sagra­ huma na atinge seu
Lre essas duas fases sucessivas ela vida
dos e que lhes servem de hábitat, pois estes só podem se inferio res, como
máxim o de intens idade nas socie dades
estabelecer ali com a condição de apropriar-se totalmente dual
daquele chão num raio determinado. Essas providências são as tribos australianas, pois é lá que o culto indivi
são tão indispensáveis à vida religiosa que mesmo as reli­ é o mais ruclimencarso.
giões mais inferiores não podem passar sem elas. O ertna­
tulunga, local onde são depositados os churinga, é um
II
verdadeiro santuário. Assim é proibido aos não-iniciados
aproximar-s_:: dele. É proibido mesmo entregar-se ali a
uma ocupaçao profana, qualquer que seja. Veremos a se­ Até agora, o cultn negativo só se apresentou a nós
como u m sistema de abstenções. Ele parece, portanto,
servir apenas rara inibir a atividade, não para estimulá-la
guir que existem outros lugares santos onde se celebram
impo1tanles cerimônias48.
e Lonificá-Ja. No entanto, por um reflexo inesperado desse
328 AS FORMAS ELE.itE.\TARES DA l'IDA REIJGIOS11 /t\ /'N/.\'C/PA!S A77Tf.JDES RnvAIS
329
e os se av
. ·umul an e
efeito inibidor, ele Jl,1ba exercendo, i.obre a natureza reli­ 11 1111 úmco sujeito; nesse case >, seus e1e1t
na Ai.....istw-
1,
_
giosa e a moral do indivíduo, uma ação positiva da mais M iornam mais manife E o ce,
ito a uina
stos. q u e aconte
alta importância. 1 1 1 1)or ocasião da iniciaç ão . O neófito é adst? 1.e , · .
. . . . , . �
c.r
t 11 � r a
De fato, cm razão da barreira qu<.: separa o sagrado
·
1 · , 1 n:ma vanedade de rnus neg,1t1v os. Deve s L:nc1a e e
d
.
�. .

.1 >l iec.lade na qual


do profano, o hom .:m só pode entrar em contato ínlimo até então, passou sua ex1st- d
-
< . pen-'<IS e
' . · · d
com as coisas sagradas se se despojar do que há de profa­ 1 1 11,1i.e todo comato human o . E pro1b1do �ao ai viv
:a

no nele. Só pode viver uma vida religiosa um pouco in­


tensa, se começar por retirar-se mais ou menos completa­
\l'I mulheres e não-iniciados'i2,
como
antes, sob
tamb�
a onent�
m v 1ção ;:_r n
e a I_
·


11wo, longe de seus semelh l ores l_
A rr
mente da vida temporal. O culto negativo é, pois, em cer­ guns velhos que lhe servem �e padrinhos'ii. <� �
tª· I><;
.-,a lavl'.ª
to sentido, um meio tendo em vista u m objetivo: ele é a meto natura l, qL c
'. :.t 1 �>
u i ronlU consid<.:rada seu de
nhos
.
condição de acesso ao culto positivo. Não se limita a pro­ l.1 c1ual se deo;ign a a iniciaçã o num cerro numer•
d
, .._ freLlra1 1re
o,
s1g111fica o que e da floresta''. Pe 1a mesma
teger os sere::. sagrndos dos contatos vulgares mas age so­ raz:v-
.

a
• • __

'J u(:()-
.. •

bre o próprio fiel, modificando-lhe po1>itivamente o esta­ assiste o neófito com m u' ;:
1s cerimônias a que . . iJ- ongo 1-; n
do. O homem que se submeteu às interdições prescritas da é enfeitado de folhagem5'. Assim ele passa 1
• ·
'
.
n
,_

s
tv

tempo, pe o t 10s d e
nào é, depois delas, o mesmo que era antes. Antes, era s<.:s�. entrecortados, de tempo em ' m pe .•
é u . 1 . :tiouo
<i u e e.leve partic ipar. Para e l'e , . esse tempo 1 � d llU'<!n l S
um s<.: r comum que, por essa razão, devia permanecer
.. .
afastado das forças religiosas. Depois, encontra-se mais de abstinências de toda espec1e. Uma serie . , 111. a c1e
<. <:r' l o
, e. e \·O
. a quant1 CV" -
junto delas, pois aproximou-se do sagrado pelo simples lhe são proibidos; só lhe é pen111l l"d a
não r.: e
;
fato de ter se afastado do profano; purificou-se e sancifi­ mida estritamente indispensável para viv�r'� <

()brig �<.
' , il , �
cou-se por ter se separado das coisas baixas e triviais que submetido a um jejum rigoroso'ill, o� enrao e não
a l i menta, elv . , POd e
entorpeciam sua natureza . Os ritos negativos conferem comer algo imundoW. Quand o se . . h .,,-, s quQ a (l-
-
.1
assim. podere1> eficaze:-. tJntO quanto os ritos positivos; o� comida com as maos, sao os pa d n n
tocar na <rJe ve 1Sa1t
V a
primeiros, como os segundos, podem servir para elevar a troe.l uzem em sua boca6 . Em cenas casos,
0
do d r e
• •

energia religiosa dos indivíduos. Segundo uma justa ob­ tência "'· Do mesmo m º ' � o '.n
mendi gar sua subsis . • ar n �ll<t(l-
fal �.
servação que foi feita, ninguém pode se envolver numa apenas o indispensávelúl. Deve abster-se de
u • . / l111ªí\ 1 fe,. ,.,a
" t·t61
·.
cerimônia religiosa de alguma importância sem se subme­ to não lhe dirigem a palavra ; e por sinais . q v- ,( i , " N· o
, ·

- .
1e
.

ter a u m a espécie de in iciação prévia (jUe o introduza Toda dislraç· ao l i 1nte1


, 1
suas necessidades<• 5. e
Penn. n�c;; e
..i
progressivamente no mundo sagrados1. Para isso, podem
,, se lavarú'· às vezes não pode se mover. ,,... n 1u111
a
node
de n</ ' . a
se empregar unções, pu rificações, bênçãos, todas elas estendido no chào, imóvel66, sem · roupas

!!:>_
._

. - ult 1 Dla• e
1 _,-n
operações essencialm ente positivas; mas chega-se ao pt:cie<>1. Ora, 0 resulta do dessas 1mcrd 1çoes do r;\d .K� 1 .
a
mesmo resultado por meio de jejuns, vigílias, pelo retiro e detem1inar no iniciado uma mudan ça de esta� a ex
mulher es, esta ./ 1.:lutt 0
pelo silêncio, isto é, por abstinências rituais que não são Antes d a iniciação, vivia com . a s
. , dCls 1 __..,_
e
senão a prática de interdições determinadas. ..
do culto. Dorav ante, e a d m1t1 d o na soc1e<.
. 1 a� "
er sa�raq )
Quando se trata apenas de ritos negativos particula­ mens toma parle nos ntos, adqu1n u um carat• , , <
/.es e teprc::
. . . . .·
·

.
res e isolados, sua ação é geralment e pouco acentuada A metamorfose é tão comple ta, que muitas ver

a-se quei o
,_

·í r�
para ser facilmente perceptível. Mas há circunstâncias cm sentada como um segundo nascunento. lmag1
..11
0 m .r
· •

ent?'1 ' Oi �t);


que um sistema completo de interdições está concentrado personagem profa no que o jovem era até
330 AS FONMAS HLh'MHNTA RBS DA VIDA Rhl!GJOSA
1 � f'RTNC/PAIS A TJTUnES RITUAIS 331

tro lado, o alto prestígio religioso que pode ser alcançado


por essa via: o samo budista é essencialmente um.asceta,
que foi morto e levado pelo deus da iniciação, Bunjil, Baia­
me ou Daramulun, e que um indivíduo completamente
e é igual ou superior aos deuses .
diferente tomou o lugar do que não existe mais68. Poitan­ .
Lo vêem-se nitida mente aqui os efeitos positivos que os ri­
Segue-se daí que o ascetismo não é, como se poden�
pensar, um fruto raro, excepcional e quase anormal da vi­
da religiosa; ao contrário, é um elemento essen�ial _<leia;
tos negativos são capazes de ter. Claro que não queremos
afirmar que estes últimos produzam, por si sós, essa gran­
Toda religião o contém ao menos cm germe, pois nao h�
de transformação, mas certamente contribuem para ela, e .
nenhuma em que não se verifique um sistema de mterd1-
em larga medida.
<,:ões. A única diferença entre os cultos, sob ess� aspecto,
À l u z desses fatos, pode-se compreender o que é o
é que esse germe é mais ou menos clesenvolv1do neles.
ascetismo, que importância tem na vida religiosa e de on­
Mesmo assim convém acrescentar que provavelmen Le
de vêm as virtudes que <le maneira muito geral lhe foram
não existe u rr:úniLO no qual es:>e desenvolvimento não
adquira, pelo menos de forma temporá�ia, '?s traços carac­
atribuídas. Com efeito, não há interdição cuja observâ ncia
não tenha, em algum grau, um caráter ascélico. Abster-se
terísticos do ascetismo propriamente dito. E o que ocorre
de uma coisa que pode ser útil ou de uma forma de ativi­
geralmente em cenos períodos críticos, �os quais, � u m
dade que, por ser usual, deve corresponder a uma neces­
tempo relativamente curto, é preciso_ suscitar �1ui� su��1to
sidade humana, é impor-se, obrigatoriamente, renúncias,
uma grave mudança de estado. Entao, para 1nt1oduzi-lo
constrangimentos. Para que haja ascelismo propriamente
mais rapidamente no círculo das coisas sagradas com as
dito, basta portanto que essas práticas se desenvolvam de
quais se busca pô-lo em concato, ele é separado violenta­
mente do mundo profano; e isso é acompanhado de abs­
maneira a tornar-se a base ele um verdadeiro regime de
vida. Normalmente, o culto negativo serve apenas de in­ .
tinências múltiplas e de um recrudescimento excepc1onal
do sistema das interdições. É precisamente o
trodução e de preparação ao culto positivo. Mas pode que ocorre,
acontecer que ele se liberte dessa subordinação e passe transformar
na Austrália, no momento da iniciação. Para
ao primeiro plano, que o sistema ele interdições cresça e um� v�rda­
os jovens em homens, faz-se que eles vivam
se expanda ao ponto de invadir a existência inteira. Assim muito JUSta-
deira vida de ascetas. A sra. Parker chama-os,
se origina o ascetismo sistemático que, conseqüentemen­
te, não é outra coisa senão uma hipertrofia do culm nega­
meme, os monges de Baiame69.
, .
Mas abstinências e privações são inseparave1s dos so­
frimentos. Apegamo-nos por todas as fibras de nossa car­
tivo. As v i rtudes especiais que ele supostamente confere

ne ao mundo profano; nossa sensibilidade nos prende a


são tão-só uma forma ampl ificada daquelas que, em me­
nor grau, a prática de toda interdição confere . Elas têm a
ele; nossa vida depende dele. Ele não é apenas o palco
natural de nossa atividade; penetra-nos por todos os la­
mesma origem, pois se baseiam igualmente no princípio
de que nos santificamos pelo simples fato de nos esfor­
dos, faz paite de nós. Não podemos, pois, separarmo-nos
çarmos para nos separar do profano. O puro asceta é um
dele sem violentar nossa natureza, sem machucar doloro­
homem que se eleva acima cios homens e que adquire
samente nossos instintos. Em outras palavras: o culto ne­
uma santidade particular por meio de jejuns, de vigílias,
gativo não pode se desenvolver sem fazer sofrer. A dor é
pelo retiro e pelo silêncio, em uma palavra, por meio de
uma condição necessária dele. Assim, acabou-se �r co�­
privações, mais do que por atos de piedade positiva (ofe­ ,
siderá-la como constituindo ela mesma uma especie de n-
rendas, sacrifícios, preces, etc.). A história mostra, por ou-
332 S DA VIDA NHl/Cl!OSA
AS FORMAS ELEi\fliNl"ARE ,1s PNh\CIPAIS A 77TUOES RITUAIS 333

to; viu se na dor um estado de graça que é preciso buscar enccrramc..·nto dessa longa série de cerimônias. o jovem
:
e susct �a �, m esmo anificialmente, por causa dos poderes e se estende num leito de folhas sob o qual se colocam
_ _
cios pnvtlcg1os que confere tanto quanto os sistemas ele brasas ardentes; ele permanece deitado, imóvel em meio
interdições, cios quais ela é o acompanhamento natural. ao calor e a uma fumaça sufocantes75. Entre os Urabun­
Preuss foi o primeiro, em nosso conhecimento, que per­ na, observa-se um rito similar; mas, ainda por cima, en­
cebeu o papel religioso-o atribuído à dor desde as socie­ quanto o paciente encontm-se nessa penosa situação, ba­
? ade� inferiores. Ele cita o caso dos Arapaho que, para se tem-lhe nas coscas�6. De u m a maneira geral, todos os
1mun1zarem contra os perigos das batalhas, infl igem-se exercícios a que o jovem é submetido têm esse caráter, a
verdadeiros suplí�ios; dos índios Gros-Ventre (Barriga­ tal ponto que, quando chega a hora de retomar sua vida
Grande] que, na vespera das expedições militares, subme­ comum, ele está com um aspecto lastimável e parece
tem-se a verdadeir.is torturas; dos J lupa que, para garantir meto escupefato77• E verdade que todas essas práticas são
i.:om freqüênda apre:-.enwda:-. como ordálios destinados a
provar o valor do neófito e a mostrar se ele é digno de
o sucesso ele seus empreendimentos, nadam em rios gela­
dos e permanecem em seguida, pelo maior tempo possí­
vel, estendidos junto à margem; dos Karaya que, para for­ ser admitido na sociedade religiosa78• Mas, cm realidade,
talecer seus músculos, tiram de tempos em tempos san­ a função probatória do rito é tão-só um outro aspecto de
gue dos braços e das pernas por meio de raspadeiras fei sua eficácia. Pois o que prova a maneira como ele foi su­
tas com dentes de peixe; dos povos ele Oallmannhafen portado é precisamente que o rico produziu seu efeito, is­
(Terra do l m pcr � ?or G u i l herme, na Nova-Guiné) que to é, conferiu as qualidades que são sua primeira razão
�0 1l?atem a estenltdade de suas mulheres praticando-lhes
� de ser.
mc1soes sangrentas na parte superior da coxa7t. Em out ros casos, essas sevícias rituais são exercidas
Mas encontramos fatos aná logos sem sair da Austrá­ não sobre o organismo em seu conjunto, mas sobre um
lia, parcicul< � rmente durante as cerimón ias de inicia1;,·ào . órgão ou um tecido particular, cuja vitalidade elas têm
.
Muitos dos mos praticados nessa ocasião consistem preci­ por objetivo est imular. Assim, entre os Arunta, os Warra­
samente em infligir ao neófito sofrimentos determin ados munga e várias outras tribos79, n u m certo momento da
tend ? em vista mo:lif car seu estado e fazê-lo adquirir a
� � iniciac;ão, personagens determinados são encarregados de
qualidades caractenst1cas do homem. Assim, entre os La­ morder com vontade o couro cabeludo cio noviço. A ope­
rakia ' enquan �o os jovens estão em retiro na floresta , seus ração é tão dolorosa que, cm geral, o paciente t: incapaz
p� clnnhos
. .
e vigilantes lhes aplicam a todo instante golpes de suportá-la sem gritos. Ora, o objetivo dessa operação é
v1olcntos, sem advertência prévia e sem razâo72. Entre os fazer crescer os cabelost«J. Aplica-se o mesmo tratamento
Urnbunn a, num dado momento, o noviço é estendido no para fazer crescer a barba. O rito de depilação, que Ho­
chão, a face contra o solo. Todos os homens presentes witt assinala em outras tribos, poderia muito bem ter a
batem nele duramente; depois fazem-lhe nas costas uma mesma razão de scr8•. Segundo Eylmann, entre os Arunta
série de entalhes, de quatro a oito, dispostos de cada lado e os Kaitish, homens e mulheres se fazem pequenos feri­
da espinha dorsa l, e uma na linha média da nuca73. Entre mentos no braço por meio de bastões em brasa, a fim de
os Arunta, o primeiro rito da iniciação consiste em escar­ se tornarem hábeis l m fazer o fogo ou de adquirirem a
necer do j�ve1�1; os homens o jogam para cima, pegam-no força necessária para carregar pesadas cargas de madei­
quando cat e iogam-no outra vez11. Na mesma tribo, no raR2. Segundo o mesmo observador, as jovens warramun-
335
AS FORMAS ELE.liE.\TARES DA HDA REIIGIOSA
H l '/.'/.\C/PATS A TITUDES RJTL,AIS
334

1 1 1 1 1 111l' que a dor é geradora de forças exce�cio�ais. E


1 l rcnça não é sem funtla mento. Com efe1Lo, e pela
..:
ga amputam-se, numa das mãos, a segunda e a terceira
falange do indicador, crendo que o dedo se torna, assim,
111,111l·1ra como enfrenta a dor que melhor se manifesta a
mais apto a descobrir os n
i hames113. se
H' • 1 1 ult.:za do homem. Em nenhum outro momento este
Não seria impossível que a extração dos dentes se
1 li•\,1 com mais brilho acima de si mesmo cio que qua � do

L l1 1nu sua natureza , ao ponto de fazê-la seguir uma dire-


destinasse, às vezes, a produzir efeitos semelhantes. Em
todo caso, é certo que os ritos cruéis da circuncisão e da
1 1 1 lOntrária à que ela tomaria espontaneamente: Deste
subincisào têm por objeto conferir aos órgãos genitais po­ s,
1 1 1 1 1do, ele se singular iza entre todas as outras cnaLUra
deres rarticulares. Com efeito, o homem jovem só é ad­
' I ' w vào cegamente para onde o prazer as chama; de
� tc
mitido ao casamento após ter se submetido a eles; portan­ e o
111 1do, cria para si um lugar à parte no mundo. A dor
to, ele deve a esses ritos vi rtudes especiais. O que torna
1 de que se romperam alguns dos laços que � pren­
d1•111 .10 meio profa no; portanto, atesta q�e el� �e libertou
indispensável essa iniciação sui gen ersi é que a união cios
sexos, cm totlas as socicdac.les inferiores, é marcada por
1 ,,m ialmente desse meio e, por consegu.mtc, e �ustame
� te
um caráter religioso. Ela colocaria em jogo forças temíveis hbertaçao. Assim,
1 , 111sic.lera da como o instrum ento da
que o homem não pode abordar sem perigo, a menos
l l l ll'ffi se libertou deste modo não é víúma d� uma pu
�d
it11",10 quando
que lenha adquirido, através de procedimentos rituais, a _ de dom1-
se crê investido de uma especie
111n sobre as coisas: ele realmente se elevou acima delas,
.
imunidade necessária11t. Para tanto, é empregada toda
uma série ele práticas, positivas e negativas, elas quais a a
1• 1t.11nente por ter renunciado a elas; é mais forte que
circuncisão e a subincisão são o preâmbulo. Ao se mutilar tê-la feito calar-se.
11.11urcza , por .
dolorosamente um órgão, dá-se-lhe, porranto, um caráter
Aliás essa virtude está longe de possuir apenas um
sagrado, pois ele é cornaclo capaz, por isso mesmo, de re­
ê
, .tlor est tico: toda a vida religiosa a supõe. Sacrifíci
os e
sistir a forças igualmente sagradas que não poderiam ser ��I.
1 111.'rcndas são inseparáveis de privações que custam ao
ll'-;mo que os ritos não exijam dele prestaçõe� materiais
enfrentadas de outro modo. ,

d1 ·mandam
Dizíamos no início desta obra que todos os elemen­ seu tempo e suas forças. Para servir aos cleu­
tos essenciais do pensamento e da vicia religiosos devem
cumpre que ele se esqueça; para reco ecer-lhe� o

r �eus 1�-
·• ·s,
se manifescar, ao menos em germe, destle as religiões cumpre sacnf1ca
Jiiw1r que ocupam em sua vida,
mais primitivas. Os fatos precedemes confirmam essa afir­ _
1t·rcsses profanos. O culto positivo , portanto , so e poss1-
' vi se o homem é levado à renúncia , à abnegaç ã.o,
mação. Se há urm1 crença lida como específica das reli­ ao
giões mais recentes e idealistas, é a que atribui à dor um
, ksprendimento de si e, conseqü entemen te, ao sofnme �­
poder santificador. Ora, essa mesma crença está na base
" , Este não deve ser temido. Aliás, ele só pode cumpnr
l lcgremente seus deveres s: ? s?frime�to for am� do
dos ritos que acabam de ser observados. Claro que ela é em
desdobrada d i ferentemente conforme os momentos da :sp ensave 9 }
ue se i a exer­
asceucas. k> d��es
, 1.no grau. Mas, para tanto, e md

.
história em que a considerarmos. Para o cristão, é princi­
• ido, e é isso que buscam as praucas
palmeme sobre a alma que ela agiria, depurando-a, eno­
q11e elas impõem não são, portanto , crueldad es arb1trana s
brecendo-a, espiritualizando-a. Para o australiano, sua efi­ homem se
1' estéreis; é uma escola necessária em que o
cácia é sobre o corpo, aumentando as energias vitais, fa­ d�­
lorma e se tempera, em que adquire as qualidades de
zendo crescer a barba e os cabelos, enrijecendo os mem­ as quais não há religião. Inclus1-
-.,1pego e paciência sem
bros. Mas, em ambos os casos, o princípio é o mesmo:
336 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RElJG!OSA 1� PRJ.VCTPA !S A TITUDES RJTUAJS �37

:e , para 9�e esse resultado seja obtido, convém que 0 III


ideal ascet1co venha a se encarnar eminentemente cm
p � rsonagens particulares cuja especialidade é, por assim
Após haver determinado em que consiste o sistema
dizer, representar, quase em excesso, esse aspecto da vi­
das interdições e quais são suas funções negativas e posi­
da ritual, pois eles são como modelos vivos que incitam
tivas, precisamos saber as causas que o originaram.
ao esforço. Tal é o papel histórico dos grandes ascetas. .
Num certo sentido, ele está logicamente implicado
Quando se analisam em detalhe suas façanhas e seus ges­
na noção mesma do sagrado. Tudo o que é sagrado é
tos, pergunta-se qual a finalidade útil disso. Fica-se im­
objeto de respeito, e todo sentimento de respeito se tra­
pressionado com o que há de excessivo no desprezo que
duz, naquele q u e o experimenta, por movimentos d�
professam por tudo o que apaixona ordinariamente os
inibição. Com efeito, um ser respeitado sempre se expn­
homens. Mas esses excessos são necessários para manter
me na consciência por urna representação que, em razão
entre os fiéis um ?esdém suficiente pela vida fácil e os
da emoção que inspira, está carregada de uma alta ener­
�razeres co muns. E preciso que uma elite coloque o obje­ gia mental; por conseguinte, ela está disposta de �anei­
_
tivo demasiado alt� para que a multidão não o coloque
ra a repelir longe de si qualquer outra representaçao que
demasiado baixo. E preciso que alguns exagerem para
a negue, seja em totalidade, seja em parte. Ora, o rnu n­
que a média permaneça no nível que convém. �
do sagrado mantém com o mundo profano urna relaçao
Mas o ascetismo não serve apenas a fins religiosos.
_ como alhures, os interesses religiosos são apenas a de antagonismo. Eles correspondem a duas formas de
Aqui,
vida que se excluem ou que, pelo menos, não podem
forma simbólica de interesses sociais e morais. Os seres
ser vividas simu ltaneamente com a mesma intensidade.
ideais aos quais os cultos se dirigem não são os únicos a
Não podemos, ao mesmo tempo, nos dedicar inteira­
reclamar de seus servidores um certo desprezo da dor:
mente aos seres ideais aos quais o culto se dirige e intei­
também a sociedade só é possível a esse preço. Embora
ramente a nós mesmos e a nossos interesses sensíveis;
exaltando as forças do homem, ela com freqüência é rude
inteiramente à coletividade e inteiramente a nosso egoís­
para com os indivíduos: exige deles perpétuos sacrifícios·
� mo. Há aí dois sistemas de estados de consciência que
não cessa de reprimir nossos apetites naturais, precisa
estão orientados e orientam nossa conduta para dois pó­
mente porque nos eleva acima de nós mesmos. Para que
los contrários. O q u e tiver mais poder de ação deve,
possa �os CLJrnprir nossos deveres para com ela, é preci­
so, pois, que sejamos adestrados a violentar às vezes nos­

portanto, tender a rechaçar o outro para fora a consciên­
_
cia. Quando pensamos nas coisas santas, a 1de1a de um
sos instintos, a contrariar, quando necessário, as inclina­
objeto profano não pode se apresentar ao espírito sem
ções naturais. Assim, há um ascetismo que, inerente à vi­
provocar resistências; algo em nós se opõe a que essa
da social, está destinado a sobreviver a todas as mitolo­
idéia se instale aí. É a representação do sagrado que não
gias e a todos os dogmas; faz parte integrante da cultura
tolera essa vizinhança. Mas esse antagonismo psíquico,
humana. E é ele, no fundo, a razão de ser e a justificação
essa exclusão mútua das idéias deve naturalmente levar
daquele que as religiões de todos os tempos ensinaram.
à exclusão das coisas correspondentes. Para que as idéias
não coexistam, é preciso que as coisas não se toqu�m,
não estejam de maneira nenhuma em contato. Esse e o
princípio mesmo da interdição.
338 AS FORMAS ELE�fENTARFS DA VIDA REUGIOSA
IS PRINCIPAIS AnTUDES RITUAIS 339

um objeto a outro. As forças religiosas são representadas


Além disso, o mundo do sagrado é, por definição,
um mundo ã parte. Como ele se opôe, por todos os ca­
racteres que dissemos, ao mundo profano, deve ser trata­ .ios espíritos de tal modo, que parecem sempre prontas a
do de uma maneira que Lhe seja própria: seria desconhe­ escapar dos pontos onde residem para invadir tudo o que
cer sua natureza e confundi-lo com o que não é ele em­ está a seu alcance. A árvore nanja onde habita o espírito
pregar, em n�ssas relações com as coisas que o compõem, de um antepassado é sagrada para o indivíduo que se
os gestos, a lmguagem, as atitudes que empregamos em considera a reencarnação desse antepassado. Mas todo
nossas relações com as coisas profanas. Podemos livre­ pássaro que vem pousar nessa árvore participa do mesmo
mente manejar estas últimas; falamos livremente com os caráter: é igualmente proibido tocar nelc85. Já tivemos a
seres vulgares; porém não tocaremos nos seres sagrados, ocasião de mostrar como o simples contato de um churin­
ou só tocaremos neles com reserva; não falaremos em ga basta para santificar pessoas e coisas86; aliás, é nesse
presença deles ou não falaremos a língua comum. Tudo o princípio de contagiosidade do sagrado que se baseiam
que é usual em nosso comércio com uns deve ser excluí­ todos os ritos de consagr..i.ção. A santidade dos churinga é
do de nosso comércio com os outros. mesmo tal que faz sentir sua ação à distância. Recorde o

. '.'l
as, mesmo não sendo inexata, essa explicação é in­ leitor como ela se estende não apenas à cavidade em que
suf1c1� nte. Com efeito, há muitos seres que são objeto de são conservados, mas também a toda a região vizinha,
respeJto sem serem protegidos por sistemas de interdições aos animais que nela se refugiam e que é proibido matar,
rigorosas como os que descrevemos. Certamente, há uma às plantas que nela crescem e nas quais não se deve to­
tendência geral do espírito a localizar em meios diferentes car87. Um totem da serpente tem seu centro num lugar on­
!
co sas difer�ntes, sobretudo quando elas são incompatí­ de se encontra um redemoinho d'água. O caráter sagrado
v: 1s entre si. Mas o meio profano e o meio sagrado não do totem transmite-se ao lugar, ao remoinho, à própria
sao apenas distintos, são ambos fechados: entre eles exis­ água, que é interdita a todos os membros do grupo totê­
te um abismo. Deve haver, portanto, na natureza dos se­ micoRS. O iniciado vive numa atmosfera inteiramente car­
res sagrados, uma razão particular que torne necessário regada de religiosidade e ele próprio está como que im­
esse estado de isolamento excepcional e de mútua oclu­ pregnado clela89. Por conseguinte, tudo o que ele possui,
são. E, de faco, por uma espécie de contradição, o mundo tudo o que ele toca é interdito às mulheres e subtraído ao
contato delas, mesmo a ave que ele bateu com seu bas­
tão, o canguru que atravessou com sua lança, o peixe que
sagrado está como que inclinado, por sua própria nature­
za, a se difundir nesse mesmo mundo profano que ele,
por outro lado, excl u i : ao mesmo tempo que o repele, mordeu seu anzol90. Mas, por outro lado, os ritos aos
tende a se escoar nele, bastando que haja uma simples quais se submete e as coisas que neles desempenham u m
. _ . papel são d e uma santidade superior à sua: essa santidade
aproXJmaçao. Por isso, é necessário mantê-los ã distância
um do outro e criar, de certo modo, o vazio entre eles . transmite-se contagiosamente a tudo o que evoca a idéia
O que obriga a essas precauções é a extraordmána tanto de uns como das outras. O dente que lhe foi arran­
contagiosidade do caráter sagrado. Longe de permanecer cado é considerado santo9 1 . Por essa razão, ele não pode
ligado às coisas por ele marcadas, ele é dotado de uma comer de animais que tenham dentes proeminentes, por­
espécie de fugacidade. Mesmo o contato mais superficial que fazem pensar no dente extraído. As cerimônias do
ou mais indireto é suficiente para que ele se estenda de Kuringal encerram-se com uma lavagem ritual92; as aves
aqu áticas são interditas ao neófito porque lembram esse
\
-

340 AS FORMAS ELEMEl'ffARES DA IWA REUG!OSA AS PRINCIPAIS A17TUDES RmJAJS 341

riLo Os animais que trepam até o topo das árvores são giosidaoe inerente a tudo o que é sagrado, um ser profa­
igualmente sagrados porque estão mutto próximos de Da­ no não pode violar uma interdição sem que a força reli­
ramulun, que vive nos céus93. A alma do morto é um ser giosa da qual indevidamente se aproximou não se esten­
sagrado: já vimos que a mesma propriedade transmite-se da até ele e não estabeleça sobre ele seu domínio. Mas
ao corpo onde essa alma residiu, ao lugar onde foi sepul­ como, entre ela e ele, há antagonismo, ele se vê colocado
tado, à aldeia onde habitou quando vivo e que é destruí­ sob a dependência de uma potência hostil, cuja hostilida­
da ou abandonada, ao nome que ele tinha, à sua mulher de não pode deixar de se manifestar sob forma de reações
e a seus parentes94. Também eles são como que invesli­ violentas que tendem a destruí-lo. Por isso, a doença ou a
dos de um caráter sagrado; portanto, convém manter-se a morte são consideradas conseqüências naturais ele toda
clisLância deles; não são Lrataclos como simples profa nos . transgressão desse gênero; e são conseqüências que se
Nas sociedades observadas por Dawson, seus nomes, as­ produ zir ia m esponLaneamente, por uma espécie de ne­
sim como o cio morto, não podem ser pronunciados du­ c.:t:ssidade física. O culpado sente-se invadido por uma
rante o período de luto95. Alguns dos animais que ele co­ força que o domina e conLra a qual é impoLenLe. Se co­
mia freqüentemcnle também são proibidos96. meu do animal totêrnico, sentirá que este o penetra e rói­
Essa contagiosidade do sagrado é um fato muito co­ lhe as entranhas; irá deitar-se no chão e esperar a morte98.
nhecido97 para que seja preciso demonstrar sua existência Toda profanação implica uma consagração, mas que é Le­
através de mais exemplos; queríamos apenas estabelecer mível ao sujeito consagrado e àqueles mesmos que dele
que ela é verdadeira tanto para o toLemismo como para as se aproximam. São as conseqüências dessa consagração
religiões mais avançadas. Uma vez constatada, ela explica que sancionam em parte a interdição99.
facilmente o extremo rigor elas interdições que separam o Observar-se-á que essa explicação das interdições
sagrado do profano. Considerando que, em vim1de dessa não depende dos símbolos variáveis por meio cios quais
extraordinária capacidade de expansão, o contato mais le­ podem ser concebidas as forças religiosas. Pouco importa
ve, a menor proximidade material ou simplesmente moral que elas sejam representadas sob a forma de energias
de um ser profano é suficiente para arrastar as forças reli­ anônimas e impessoais, ou figuradas por personalidades
giosas para fora de seu domínio, e considerando que, por dotadas de consciência e de sentimento. Claro que, no
outro lado, elas não podem sair desse domínio sem con­ primeiro caso, elas reagiriam contra as transgressões pro­
tradizer sua natureza, todo um sistema de medidas é indis­ fanadoras de maneira automática e inconscienle, enquan­
pensável para manter os dois mundos a uma distância res­ to que, no segundo, obedeceriam a movimenLos passio­
peitosa um do outro. Eis por que proíbe-se ao vulgo não nais, determinados pela ofensa sentida. Mas, no fundo,
apenas tocar, mas ver e ouvir o que é sagrado e por que essas duas concepções, que, aliás, têm os mesmos efeitos
esses dois gêneros de vida não devem se misturar nas práticos, apenas exprimem em duas línguas diferentes um
consciências. As precauções são tanto mais necessárias pa­ mesmo e único mecanismo psíquico. O que está na base
ra mantê-los separados na medida em que eles, embora se de ambas é o antagonismo do sagrado e do profano,
opondo um ao outro, tendem a se confundir um no outro. combinado com a notável capacidade do primeiro em
Ao mesmo tempo que a multiplicidade dessas inter­ contagiar o segundo ora, esse antagonismo e esse contá­
dições, compreende-se a maneira como elas funcionam e gio agem do mesmo modo, seja o caráter sagrado atribuí­
as sanções que a elas estão ligadas. Por causa da conta- do a forças cegas ou a consciências. Assim, longe de a vi-
342 AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA REUGIOSA
1\ PRINCIPAIS A TITUDES RITUAJS 343

objeto prnfano as virtudes santificadoras de �n:1 objeto sa-


1.1do:i Nu entanto, é difíci] �rceber, no catohco esclare­
da propriamente religiosa só começar lá
onde existem
personalidades míticas, vê-se, nesse caso,
que o rito per­
manece o mesmo, quer os seres religio l ido de hoje uma espécie de selvagem tardio, que conti­
'
sos sejam ou não
personificados. Essa é uma constatação que
precisaremos .

nua a ser enganado por suas associações de id ias.' sem
repetir em cada um dos capítulos que que nada, na natureza das coisas, explique �u J�Stifique
seguem.
L'SSa maneira de pensar. Aliás, é muito arbitrariamente
que se atribui ao primitivo essa tendência ª objetivar ce­

IV
.
gamente todas as suas emoções. Em sua vida �o�al, no
detalhe de suas ocupações leigas, ele nao _ atnbu1 a uma

Mas se a conta giosidade cio sagrad o contri coisa as propriedades de sua vizinha ou reciprocamen�e.
bui para
explic ar o sistem a das interdições, de se ele é menos apaixonado do que nós por clareza e d1s­
que maneira ela
própria se explica? Linção, falta muito para que haja nele não sei que deplo­
Acreditou-se poder explicá-la pelas leis, bastan rável aptidão a misturar e a confundir tudo. Só o pens �­
te co­
nhecidas, da associação das idéias . Os sentim mento religioso tem uma inclinação acentuada por esse ti­
entos que
uma pessoa ou uma coisa nos inspiram, estend po de confusões . Portanto, é precisame �te na natu :cza
em-se con­ .
tagiosamente da idéia dessa coisa ou dessa especial das coisas religiosas, e não nas leis gerais da mte­
pessoa para as
representações a elas associadas e, por conse ligência humana, que devemos buscar a origem dessas
guinte, aos
objetos que essas representações exprim predisposições.
em. O respeito
que temos por um ser sagrado transmite-se Quando uma força ou uma propriedad � n?s parece
, pois, a tudo o
que tem contato com esse ser, a tudo o ser uma parte integrante, um elemento consutuuvo do s� ­
que se parece
com ele e faz lembrá-lo. Certamente o homem jeito no qual reside, não podemos nos representar facil­
se engana com essas assoca
culto não
i ções; sabe que essas emoções
mente que ela se separe dele para se transportar a hure�. �
Um corpo se define por sua massa e sua compos1çao . ato­
derivadas devem-se a simples jogos de image
ns, a combi­ .
nações inteiramente mentais, e não se entreg mica · assim não concebemos que ele possa comunicar,
ções que tais ilusões tendem a determ inar.
a às supersti­
Mas, dizem, o
� �
por 1 eio d contato, algum desses caracteres distintivos.
primitivo objetiva ingenuamente suas impres Mas, ao contrário, se se trata de uma força que penetrou o
sões sem cri­
ticá-las. Uma coisa inspira-lhe um temor corpo desde fora, como nada a prende a ele, como ela es­
revere ncial? Ele .
tá nele na qualidade de estra nha, não há nada de 1rrep1 _-e­
sentável no fato de que ela possa escapar del e É assim
conclui que uma força augusta e temíve
l reside realmente
nela; po1tanto, mantém-se à distância dessa .
coisa e a trata
como se fosse sagrad a, mesm o que ela que o calor ou a eletricidade, que um objet� q :1alquer r�­
não tenha ne­
nhum direito a esse títuJo ioo. cebeu de uma fonte externa, são transmiss1ve1s ao meto
Mas isso é esquecer que as religiões mais ambiente, e o espírito aceita sem resistência a possibilida­
primitivas
não são as únicas que atribuíram ao caráte de dessa transmissão. Portanto, a extrema facilidade com
r sagrado essa
capacidade de propagação. Mesmo nos cultos que as forças religiosas se irradiam e se difundem n ada
mais recen­ .
tes existe um conjunto de ritos que repou tem de surpreendente, se forem geralmente concebidas
sam sobre esse
princípio. Toda consagração por meio de como exteriores aos :.eres nos quais residem. Ora, é exa­
unção ou de
purificação não consiste, por acaso, em tamente isso que a teoria que propusemos implica.
transferir a um
RF.UGIOSA
345
344 AS FORMAS ELEMENTARES DA \llDA
� l'R!SCIPAJS A 171l'DF.S RITUAIS

ao
alma, embora esteja ligada
Coi:-1 ef�ito, elas são apenas forças coletivas hiposta­ t. 1vore< e. Por isso, a própria
.
muit o pess oais , ame aça a codo momenco
siadas. isto e, forças morais; sao feitas das idéias e dos l 1rpo por laços
. o
todos os poros do organism
sc:_n tim� nlos que o espetáculo da sociedade desperta em ,,aar dele: todos os orifícios,
tend e a se espa lhar e a se difundir
nos, nao das sensações que nos vêm do mundo fís ico. �.10 vias pelas quais ela
Elas são, portanto, heterogêneas às coisas sensíveis nas l'Xteriormente1<>4 .
mel hor o fenômeno que
quais nos situamos. Podem perfeitamente lomar dessas M a s exp licaremo s aind a
nder se, ao invés de cons d�rarmos

coisas as fo1mas exteriores e materiais sob as quais são re­ procuramos compree
re­
s plen ame nte const1tu1da,
p �e�e � tadas; n�as nada lhes devem daquilo que faz sua .1 noção de forças religiosa
tal do qual ela resu lta.
ef1cacm. Elas nao estão presas por laços incernos aos su­ montarmos ao processo men
caráter sagrado de um ser
portes diversos sobre os quais vêm se colocar· não têm Vimos, com efeito, que o
seus atributos intrínsecos. Não
raízes neles; de acordo com uma expressão que 1já empre­ nao se devia a nenhum de
ico tem este aspecto ou aque la
gamos 101 e que pode servir para caracterizá las melhor, · porque o anim al totêm
ira sent imentos religiosos; estes
�las ;e acrescentam a eles. Assim, não há objetos que se­ propriedade que ele insp
te alheias ã natureza do obje
­
iam, a exclusao
_ de lodos os demais, predestinados a rece­ resultam de causas totalmen
fixar. que os cons titui são as im­
bê-las; os mai� insignificantes, inclusive os mais vulgares, to sobre o qual vêm se
O
dependência que a ação ela
podem cumprir esse papel: são circunstâncias adventícias pressões de reconforto e de s
ciências. Por si mesmas, essa
que decidem quais serão eleitos. Lembremo-nos dos ler­ sociedade provoca nas cons
as ã idéia de nenh um objeto de­
emoções não estão ligad
'.
mos em q�e Co?r ngLon fal a do mana: "É uma força, diz
emoções, e emoções particu­
ele, que nao esta fi:xada num objeto material, mas que po­ terminado, mas, por serem a­
m são eminentemente cont
de ser levada a quase todo tipo de objeto."'º2 Assim tam­ larmente intensas, elas també
r'd m, port anto ; este ndem -se a todos os
bém, o dakma da sra . Fletcher nos representava o �akan giosas. Elas se alast
ocup am então o espírita; pe­
como uma espécie de força ambulante que vai e vem pe­ outros estados mentais que
icula rmente as representações
lo mundo, colocando-se aqui ou ah sem se fixar definiti­ netram e con tami nam part
rsos objetos que o homem,
vamente em parte algumaI03. A própria religiosidade ine­ nas quai s se exprimem os dive
mãos ou sob os olhos - de­
rente ao homem não lem outro caráter. Certamente, no no mesmo momento, tem nas
reco brem seu corpo, bull-roarers
mundo da experiência, não há ser que esteja mais próxi­ senhos totêmicos que
ele
que o cercam, o chão que
� o da font� mesma de toda vida religiosa, ninguém parti­ que ele faz ressoar, pedras
adq uirem um valo r a�c­
pisa, etc. É assim que esses
obje tos
cipa mais diretameme dela, urna vez que é nas consciên­ im
não lhes é inerente, mas s
cias humanas que ela se elabora. No entanto, sabemos l igioso que , e m reali dad e, ­
, portanto , não é u m a espé
que o princípio religioso que anima o homem' a saber a conferido d e fora . O contágio
io pelo qua l o carã ter sagrado,
alma, lhe é parcialmente exterior. cie de processo secundár
'

aga; é o processo mesmo pelo



Mas s� as forças re igiosas não têm em parte alguma uma vez adquirido, se prop é
: contágio que ele se fixa; não
lugar propno, sua mobilidade é facil mente explicável. Co­ qual ele se adquire. É por
smit a cont agio sam ente . O que
de admirar que ele se tran
rno nada as prende às coisas onde as localizamos, é natu­ a
ção especial; se ele se liga
ral que, ao menor contaco, escapem - a despeito delas faz sua realidade é uma emo em
ção enco ntro u esse obje to
rn�smas, por assim dizer - e se propaguem mais adiante. um objeto, é que essa emo
ral que ela se estenda, des-
_
A 1ntens1dade delas incita-as a essa propagação que tudo seu caminho. Portanto, é natu
AS FORMAS ELEA1Ef\7"ARF,S DA VIDA RELIGIOSA
1\
346 347
l 'IU.VCIPAIS A77TUDES R/'TVAIS

ce, a todos aqueles que encontrar igualmence nas proximi­


li tlli ações desempenharam

um papel ógico e de gra n­
as cmsas que a sens�-

_
1t utilidade: serviram para vincular
dades, ou seja, a todos aqueles que uma razao qualquer,

1 .ll > deixa exteriores uma


s às outras. Fonte dessas �
conc1gü1dade maLerial ou pura similiLude, aproximou do proxt-
primeiro no espírito. misturas, o cont á gio, �ort anto, esta longe
1 1 1.11,ües e dessas . l
Assim, a comagiosidade do caráler sagrado encontra irrac1onahdade fund ame nt�
iil' possuir essa espécie de
c p u . seríamos a prin:ípio
sua explicação na teoria que propusemos das fo rças reli­ lev� dos a atrib uir-l he. Ele abnu
giosas e, por isso mesmo, serve para confirmá-la•o5. Ao _ ficas do futuro.
mesmo tempo, ela nos ajuda a comp reende r um traço da
, .iminho às explicaçoes c1 enu

mentalidade primitiva para o qual chamamos anterior­


mente a atenção.
Vimos 106 com que facilidade o primitivo confunde os
remos e identifica as coisas mais heterogêneas, homens,
animais, plantas, ascros, ecc. Percebemos agora uma das
causas que mais contribuíram para facililar essas confusões.
Como as forças religiosas são eminentemente concagiosas,
acontece a todo instante que um mesmo princípio anime
do mesmo modo as coisas mais dJferentes: ele passa su­
cessivamente de umas às outras, seja por uma simples
aproximação material, seja por similicudes até superficiais.
É assim que homens, animais, plantas, pedras são Lidos
por participar do mesmo totem; os homens, porque le­
vam o nome do animal; os animais, porque lembram o
emblema totêmico; as plantas, porque servem para ali­
mentar esses animais; as pedras, porque guarnecem o lu­
gar onde se celebram as cerimônias. Ora, as forças religio­
sas são consideradas a fonte de toda eficácia; portanto,
seres que Linham um mesmo princípio religioso deveriam
ser considerados como tendo a mesma essência e como
só se diferenciando uns dos outros por caracteres secun­
dários. Por isso, pareceu muito natural colocá-los numa
mesma categoria e ver neles apenas variedades de um mes­
mo gênero, transmutáveis umas nas outras.
Essa relação estabelecida faz os fenômenos de contá­
gio aparecerem sob um novo aspecto. Tomados em si
mesmos, eles parecem estranhos à vida lógica. Acaso não
têm por efeito mJsLUrar e confundir os seres, a despeito de
suas diferenças nacurais? Mas vimos que essas confusões e
l ' l 1 1 1.0 II

> C l J LTO POSITIVO

Os elementos do sacrificio

Seja qual for a importância do culto negativo e ape­


.sa r de produzir indiretamente efeitos positivos, ele não
lvm, cm si, razão de ser: introduz à vida religiosa, porém
,1 supõe mais do que a constitui. Se prescreve ao fiel afas­
t.1r-se do mundo profano, é para aproximá-lo do mu"ndo
sagrado Jamais o homem concebeu que seus deveres pa­
.

ra com as forças religiosas pudessem se reduzir a u m a


simples abstenção d e todo comércio: sempre considerou
que mantinha com elas relações positivas e bila terais que
u m conj u nto de práticas rituais tem por função regular e
organizar. A esse sistema especia l de ritos damos o nome
de culto positivo.
Durante muito tempo, ignoramos quase totalmente
em que podia consistir o culto positivo da religião totêmi­
ca. Conhecíamos pouco mais do que os ritos de iniciação ,

e mesmo assim os conhecíamos insuficientemente. Mas as


o bserva ções d� Spencer e Gillen, preparadas pelas de
Schulze, confirmadas pelas de Strehlow, sobre as tribos do
Centro australiano, preencheram, em parte, essa lacuna de
350 AS FOR.IJAS EIEM/i.VI'ARl!S /)A l70;.1 RHllG!OSA 3">1
H / '/.'/.\OPA !S A 77Tl 'f)ES RITU AIS

nossas inf orma ções. 1 lá sobretudo uma fesca que esses ex­ , conforme os elas. Para falar
l u •· . mas, numa mesma tribo
1 'l'rdade, os diferentes mec
ploradores se dedicaram pa rt icularmen te nos descrever e an ismos assim emp regados
s para poderem se <lis­
a

que parece, aliás, dominar claramente todo o culto totémi­ outro


1 1 1 muito próximos uns dos
co: ª � ue os � rum a, segundo Spencer e Gillen, chamariam não haja cerimônias cm que
•1 1.1r completamen te. Talv ez
.
!1111cb �11111a. E verdade que Strehlow contesta que seja este s, mas muito desi gualmente
11.10 se verifiquem vários dele
d· 'l nvolvidos: o que, n u
o senudo da palavra. Segundo ele, i11ticbiuma (ou como , só existe cm estado de;
caso
es�r�ve, ;s ceri­ m

J:• 1 me, nout ro


i11tiji11111a) significaria instruir e designaria ame nte, e vice-versa. E
se man ifest a plen
�0� 1<1s representada.s diante do jovem para in iciá-lo às rra­
. los com cuidado, pois const i-
111 1portante, porém, distingui -
drçoes da tn lx>. A festa que iremos descrever teri;i 0 nome devem ser descritos e ex-
1 1 11 m tipos rituais di fe re n tes que
de mbaljalkati11111a, que significa fecundar, colocar em IX>­ só depo is perguntarmos se
r.1c.la 1m.:n te, par a
11l1l ados sep;i
1
as �·ond��·�es•. Ma� deixaremos de l.1do essa qut:st<lo de
vocabula no. <Jlll' nao nos parece e.ssendal, na medida em
aram
rm cronc:o comum e.lo qual deriv
que se obse rvam mais cspccial-
. Começaremos pelos
que os ntos de que falaremos são igualmente cclebrndos
1 11l·nte entre os Arunta
du mnte a iniciacão. Por muro lado, como a palavra Inti­
ch1uma pertence hoje à linguage m corrente da etnografia
.

�º-�º ela �e �ornou quase um nome comum, parece no �


rnuul subsutur-la por uma outra2.
A data em que se real iza o lntichiuma depende, cm a ses sucessivas. Os
ritos
A festa compreende duas f
que se sucedem na prim eira
g�nde parte, e.la estação. Ex istem, na Austrá l ia, duas esta­ têm por obje to asse gu ra r a
çoes claramente defi nidas: uma, seca, que dura muito tem­ ou vege ta l que serve de
al
po; a out �l , chuvosa, que é, ao contrário, muito curta e ge­
prosperi da de da espécie anim podem ser
meio s emp rega dos para isso
lotem ao clã. Os
ralmente irregu la r. Assim que chegam as chuvas, as pkrn­
ipa is.
tas brotam e.la temr como por enc�rnto, os animais se multi­ 1L'duzidos a algu ns tipos princ
ados fabulosos dos quai s
Lembramos que os antepass
plicam e •egiôes que, na véspera, não passavam de deser­ ram outrora na terra e dei­
_ : C'ada cl ã teria c.lcsc enc.li do vive
tos esterers, ra pidame�te se recobrem de uma fa una e de Esse s vestígios consis-
agem.
uma flora _luxuri<intes . E justamen te no momento em que a xara m vestígi os ele sua pass
as ou cm rochas que eles teriam
b?a estaçao parece próxima que se celebra 0 I n l i chiuma. 1em espec ia l men te em pedr
ou que teria m se formado
período elas chuvas é muito va riá vel a d.i­ d e posi tado em certos l u ga res
So que, corno o ceram no chão. Essas ro­
ta �as cerimônias não pode ser fixada de urna vez �or to­ nos pontos onde eles desa pare
das corpos ou partes do
a lembrança assinalam : elas
são cons idera
das. Ela vana conforme as circunstâncias cl im áticas, que d1as e essas pedras os
somente o chefe �o grup� lotêmico, o AJatunja, está quali­ corpo dos antepassados cuj
e. repr esem am igua lmen e
t os
ficad.o para apreciar: no dia que ele julga conveniente, co· rcprec;entam. Por consegui nt
que serv iam ele toten s a esses mes­
munica aos seus co�p �nheiros que o momento chegou3. Jnim ais e as pla ntas
i ndivíduo e seu totem são
mos an tepa ssados, já que um
Cada grupo tote1TI.Jco tem, com efeito, seu Intichiuma. anto a mesma realidade,
'."':s �e o rito é geni l nas sociedades do Centro, ele não é
port
uma coisa só. Atriblii-se-lhcs
aos a nim ais ou às plan tas
as mesmas prop riedades que
1denuco em toda pa rte; entre os Warramunga não é 0 mes­
a l mente. Mas as pedras e as
mo que entre os Arunta; varia, não apenas confom1e as tri- sem elha ntes que vive m a t u
ú ltimo s a vantagem de serem im-
rochas têm sobre estes
35 2 AS FORMAS ELEil!Ei\TARl!S DA VIDA REIJG'JOSll t 1 1 /Mll',llS A TITUDES RJTIIAJS
353

1 1 1 1odos um pouco mais abaLXO, ao pe de u m roche-


perecíveis, ele não conhecerem
a cloenç<t e a mone. Por
celebrado nos mitos do Alcheringa , na base do
1
11 1 t
tanto , cons tituem como uma reser
va permanente, imutá ­ u 1 1 h(· 111
vel e semp re dispo nível ele vida enta, igual-
anim al e vegeta l . E é a 1 , 1 il ·l encontra u m a outra pedrn que repres
lagarta
essa reserva que, num ceno n ja bate nela com seu
ú mero ele casos, se recorre 1111 1111., ,1 witche try. O Alatun
anua lr;iente �ara assegurar a repro o mesmo
dução da espécie. 1 1 1111.11 . 1 : ,ts pessoas que o acompanham fazem .
. Eis a q u i , por exem plo, de q u e mane ira, em A l i ce 111 1 1 1 imos de eucalipto que recolheram no camin
ho, tud?
Sp nngs , o ela_ ela Lagarta witc
. heuy procede a seu Jnti­ 1 1 1 1 1 1t·10 a cantos que renova m o convit e anterio nnente d�-

1 1 11.111 ,10 animal. Cerca de dez locais diferentes sao sucessi-


ch1uma 1 . _
N? d!a fixado pelo chefe, todos os membro.� vezes a uma
1 1 1 11 111c \isitados, alguns delei; situados às
po torem 1co se reun em n o acam
pame nto princ ipal . Os
do gru­
1111 111.1 de dis tâ n c i a '
<. nu·e si. Em cada um, no fu ndo de uma
ho'.nens dos outros lOtens se retira
m a algum a distância\ a-se alguma pedra q ue
1 , 1 11· de gruta ou buraco. encontr
1 1 p11 semaria a lagana
rrns, entre os Arun ta, lhe.s é proibido estar tty num de seus aspectos _ ou
_ . presentes à ce­ witche
fc, b�ç:o do nto, que tem todas a cada uma des-
. as características de uma 1 1 1 1 1 1 1.1 <las fases de sua existência, e junto
cerimonia secreta. Um indivíduo
de um tocem diferente 1 1wdras as mesmas cerimônias
são repetidas . .
mas ela mesma fratri a, pode muir
o bem ser conv idado ' () sentido do rito é eviden te. Se o Alatun ia bate nas
pn li ,1s sagradas, {: para liberar sua poeira.
por amab ilidade, a assistir a ela, c:>s grãos dessa
mas apenas na qualidad�

I " 11 ·ir.1 sanca são consid


nenh uma poderá cer uma
de te�tem unha . Sob h ipótese s de vida, cada qual
erados germe
, , 1 1 1 H.:ndo um princí pio es pi r i l u a l que, ao se introd
. _o .
part1c1paça ativa. uzir
U�1a vez r�unidos os membros do a u m 110-
.a , totem, eles se pêi<:m 1 1 1 1 1 1 1 organismo d a mesma espécie, dará origem
cami nho, deix ando no acam pame assiste ntes carreg am
nto apen as dois ou 1 1 ..,er. Os ramos de árvore que os
_
rrcs deles. Inteiramen te nus, sem s essa preciosa
armas, sem nenh um de ol'l \t.:m parn dispers ar em todas as direçõe
seus ornamentos habituais, avan ob ra fecun­
çam um. atr<ís dos outros pol'ira: ela irá, por todos os lados, fazer sua
d.1ntc. Dessa maneir
num profu ndo silêncio. Sua atitud assegu rJdo a repro-
e e sua marcha deno� a, acredit a-se ter
tam uma gravidade religiosa: é o clã protege,
que o ato do qual tomam h 1 � ,1o abund ante da espécie anima l que
1 u 11 assim dizer, e da qual de�end .
pane ;em, para eles, uma importânc
ia excepcion e.
��· are ° final da cerimônia, são obrigados a obseal. Por is­
.

essa mterpretaçao do 1 1to.


pro�e�e- s� da
s indígen as dao
.
- "

. rvar um Os próprio
,\...sim, no clã do ilpirla (espécie de m.ana)
JCJum rigoroso.
. A região que atravessam está dia do lnc1ch1 uma, o
repleta de lembra nças ··q.�uince maneira. Quando chega o
deixadas pelos gloriosos antepassad . uma g�ande pe­
os Eles chegam , assim, �: 1 upo se reúne num lugar onde se ergue
a um lugar onde um grande bloco acima dela:
de quartzo está plamado dr.1, <le cerca de u m metro e meio de altura;
as arredondadas. o bloco
no solo, tendo a seu redor pedr semelhante a
deva-se uma segunda, com aspecto muito
i nimeir
representa a lagarta witchetcy no re.prese�t�m
estado adulto. O AJatunja a e cerca de outras men?r es. Amba:.
bate nele com uma pequena game
la de madeira chamada qu.intidadcs de mana. O Alatun 1a cava � so lo JllnLO ª, es­
''1:'�1ara6, ;o me�mo temr<:> que sal?10dia um canto
..... 1s pedras e retira
s . enterrado
cuja fi­ um churin ga, que tena 1do
a po r ovos . Faz 0 mesm
nos tempo s do Alcher inga e que consu tu1
nalid ade e conv idar o anim al . como que a
o
com as pedras, que representam os ovos alto da pe
cio anim al e com quintessência do mana. A seg�ir, �le sob� ao �
uma delas, esfrega o estômago de

cada assistente. F�it isso
'
dra mais elevad a e esfrega -a pnmetr amente com esse chu
RmlA IS
Jl'Jt/) xrrn DES
355

35i AS FORMAS ELEMENTARFS DA VIDA NEJJGIOSA corno de


� num loca
l sagrado, em
se
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 real iz a - , epresent.a ' aos olhos
.

º " ' I " ' 1 1 .1 igu


da, que r
a lmente sagra
-
ope raçoes
ringa . depois com as pedras menores que estao ao redor.
s Ap ós a lg u ma s
flore
��-.
, Ha k
Lnfim, com ramos de árvore, varre a poeira que se acu­ 1 ' 1111ltgcnas rito con-
a execu ção do
1 �7:
� �
11111111.11 cs, "o velh
��
mulou na superfície da pedra: cada um dos assistentes re­ e-l he e deix a seu
sa�grar e
obe dec
1 1 1 1 1 1 nvem a os
pete a operação. Ora, d ize m Spencer e Gillen, o pensa­ 1l1 re a pedra, enqu anto
se livremente .sob

mento e.los i nd ígenas "é que a poei ra assim dispersa irá se "' "' i•spal har- que a
.

e corre até
canta r . O sa
ngu
' I • 1 1 1cs continuam a " l 3 . O ob1"eto dessa
colocar nas árvores mulga e nelas prod uzi r mana". E, de co b erta
"
'
.
I"
ctam ente
, •-,cei a compl ra e
virtu des da ped
1 1 '' " . 1 0 re vivi ficar , de e C:
c rt mo d,º ' as�
fato, essas operações são acompanhadas de um canto pe­ ' '

la assistência, no qu al essa idéia é ex pressa7. ec e r com ef eito ,


' ' l 1 '' ' . 1 1 sll<l efica
1 nao e · qu
' eia Conv em
are nte s da

Com va riações , cncomra-se o mesmo rito cm outra::: eles próp rios p


, 1 1 1 r os <lo ·lã são
e particular
O nome t�m-
PU <lo an ·i m ai CU J .
sociedades. Entre os Urabunna, há uma rocha que rcprc· m mb < • e .
nele ' e
1
W•
e
1 1 de v1·da .

senta um antepassado do clã do Lagarto; extraem-se dela · mo


) r in c í pio
ngue reside o
111• i1t1·
mes
pedras que são lançadas e m todas as d ire�·õ es , a fim de cm seu sa
ee dos germes
m desse sangu
. u n é natura
' sirva re gu lar
l que se .·
obter uma grande produção de laga nos11. Nessa mesma oduç ão
urar a repr
possl1i para asseg
·

tribo, existe um banco de areia ao qual as lembranças mi­ 1111 •t1n>s q ue � um hom em está d o ente ou
, . mica Quan do
tológicas associam intimamente o totem do piolho. No 1 1 , .pcc1e tote .. e os Arunt a
que,
entemen te entr
·

f r e q u
mesmo l ugar acham duas árvores , uma delas chamada 1 i11g.1 l1o, acon tece
co mp hei r os a b re-sc
1 0. 1 1 , 1 rcanimá-lo, um
. an
de seus 1ovens
se
1·, pode re-
árvore do piolho comum, e a outra, árvore do piolho-ca­ ue Se o sangue
,., ' •·ias
. o co m se u sang
e 1 n nte que
·

não é su rpr ee
rega-
ranguejo. O s indígenas pegam a a reia , esfregam-na contra · de
d• � pc rtar a vida
num 1ome m , ' e anim al
essas árvores, lançam-na em todas as direções, convenci­ na
1 em la espé ci
i para des perta-
l'' 1ssa w
·
serv·r
a qua l os 110m
dos de que assim nascer.lo muitos piol hos9. Entre os Ma­ m J - . ens do clã se c
onfu n de �.
.
ve g l com lnt1c h1L1m a
O mesmo proce.d1me nto e
� )
ra, é d ispersa ndo poeira retirada de pedras sagrad as que eta no
co d a cerimônia é
,, 1 _ , mpregado
se realiza o T nt ichiu ma das abelhasio. Para o canguru das
,
pal
dn Canguru em Un
d1a ra ( run: t . O
e.
pla nícies emprega-se um méwdo ligeiramente diferente rochi:;do a piqu
se r ue um
Pe ga -se bosta de cang uru ; envolve-se-a numa cena erva rn11 remoi nho
. junto a o qua
Alch erin-
presenta u1;i
guru cio
· !ai can
que esse animal gosta muito de comer e q ue , por essa ra­
zão, está relacionada ao rotem do Canguru. Deposita-se a
1•.s:-,e rochedo re
1-\•' que foi mor to e depo ªS� s!ta nesse luga r
por um ho-
supõ e-se que
oc a., por isso
da mesm a ep
bosta, assim envolvida, no chão entre duas camadas dessa i11cm-canguru
de canguru re si
d� � essa área. De-

Pedras sagrad
s espm , ·tos as fora m es-
mesma erva e põe-se fogo em tudo. Com a chama que se numeroso
certo núme ro de
l ibera, inflamam-se ramos de árvore que são agitados, a prns . que um da maneira que d escr eve-

i regadas umas
conti:a as outras longo da
seguir, de maneira que as fagulhas se dispersem em todas t bem na roch a. ao
s dos ssis te n es so
cerimô­
mos, vário a o
ueis "0 objetiv
da
scorrer s�u san g
as direções. Essas fagulhas desempenham o mesmo pa pe l
qual deixam e . t l n te o
que a poeira nos casos precedentes 1 1 . . dígenas a me
nia, segu ndo O
ua
in é
'
que dizem os derra mado
ue dP home

ce rto u assim
Num número de clàs12, pa ra tornar o rito mais m-cang
íritos dos ca ng
u r
segu inte: o sang
. u-
.
eficaz, os homens misturam à substância da pedra algo de
na-se a reura r dela os esp
na rocha, desti os em todas
sua própria substância. Jovens abrem-se as veias e deixam ntram e a disp
ersá-l
is que aí se enco
o sangue escorrer sobre a pedra. É o que ocorre parti­ rus-anima
cularmente no lnlichiuma da flor I Ta kea, entre os Arunta.
356
AS FORMAS El.Ell/!t\TARES DA l7DA RElJG'IOSA t /'f{J\'<;l!',l/!i A TffiDES RITLAIS 357

as direções, o que deve ocasio


nar um aumento do núme­ 11111 ' t•rd deiro frenesi, batem-se uns nos oucros com suas
\ batalha dur.i alé que csccjam de volta ao aLampa­
ro de cangun1sJ11 "
1 1 1 1 1. 1
Há inclusive um caso, entre
os Anrnta, em que 0 san­ l l l l ' l ll<>. situado a uma discância de aproximadamente uma
gue pa�cce ser o prin cípi o
��ª · nao se empregam pedr
ativo do rito. No grup o da 1111lh.1 Lá, as mulheres intervêm e põem fim ao combace.
as sagradas ou algo que se r 1 s.rngue que corre dos ferimentos é recolhido, misturado
,rssemelhe a elas. O AJatunja
e alguns de seus assiscenres
regam ? solo com seu sangue;
''" t•xcrementos do Minkani", e o produLo da mistura é
na terra embebida são rra­ , 1m·ado na duna. Concluído o rito, todos esl.ào convenci-
çadas linhas, de diversas core
s, que rep resencam' as dife­ """ de que as cobras-tapete nascerão em abundância1º.
rentes pa rtes do corpo da
ema . Todos se a j oel h a m e Em algu ns casos, emprega-se, como pri ncíp i o vivifi­
f
m
, . , . E
'' (I·,, ' 1dor, a su bstância m<.:sma que se busca prod uzir. Assim,
volc a � lesse dese nho e can
. ca m u m cant o monóLo , ,0

, 1 1 1 re os Kaic is h , duran1e
�ma 1ct 1c1n ass� m enca ntac
s�tng uc q ue scrvr u para fazê- la, que pa n iria mnLem ente e.lo
l�1 e, cons eqi.ie
uma cerimônia que tem por ob-
v�v.?s que, �º anim . ar os ;)
os prind ios 1' 11\'0 fozcr chover, rc.:ga-M: com água uma pedra sagrada,
É
embriões e.la nova geração,
impe­ 1 p 1 v representa heróis míticos do clã da água. evidente
drrao a especre de clesapare
.
cer1 1.
E � tre os W?n k ong aru is, 'l l l l.'. desse jeito, acredita-se aumentar as virtudes produlo-
& um clã tem por Lotem u m
certo 11po e �erxe . E Lambém
� 1,1-. da pedra da mesma forma que com o sangue, e pelas
o sangue que desempenha
o papel prrn�rpal n<? Intic hium 11 1l·smas razõesz• . Entre os Mara, o operador vai buscar
a desse tocem. O chefe do
grup<?, c.lepors de pint ar-se IL:lla num remoinho sagrado, bebe-a e cospe-a em todas
cerim onia lmen ce, encra n u
ren:io rnho e senta-s . Então, m 1s direçõeszz. Entre os Worga ia, quando os inhames co­
� com pequenos ossos pontu­
dos, pe �fura sucessivamente tt ll.'Çam a brotar, o chefe do clã do lnhame envia os mem­
o escroto e a pele ao redor

do umbigo. _ sangue que
corre dessas diferentes ferid
as
i>ms da fratria, à qual ele próprio não pertence, para co­
espal ha-se na agua e faz nasc lher essas plantas; estes lhe trazem algumas e solicitam
_ er os peixes"•9.
E por uma prática inteirame .11 1 intervenção para que a espécie se desenvolva bem.
� nte simi lar que os Dieri
creem assegurar a reproduç l·lc.: toma uma delas, morde-a e cospe os pedaços para co­
ão de dois de seus rocens
dos os lados23. Entre os Kaitish, qu ando , depoi s ele ritos
3
�obra-tapete lserpenl tapis]
e a serpente woma (scrpe
C�)'.1:um). Um M u ra-1:1ura chamado �te
v.t riados que não descreveremos, certa semente de capim
M in ka ni é tido por resi­
<.�u sob u1m� clu � a . Seu corpo é
representado por ossadas l ' ha ma da Er l i pi n na chegou a seu ple no desenvolvimento,
se enco ntram , diz-nos J lo­ p u nh ado delas
fosse is de repteis como os que
w m , nos d e l L a s d ?s rios q
o chefe do totem leva um ao acampam<.: n-
u e desa guam no lago Eyre 10 e as mó i entre duas pedras; recolhem-se p iedos amente
Quanc.�o chega o e.Ira da cerimônia .
os farelos assim obtidos e colocam-se alguns grãos nos lá­
. , os homens se reúnem
e s? drr;gcm ao luga r onde bios do chefe que, ao soprar, d ispersa-os em todos os
está o Mink ani. Lá, cavam
areia ate atingir uma camada a
de terra úmida e 0 que cha­ scmidos. Esse contato com a boca do chefe, que possui
�1am de "os excrementos do
Mink ani". Depois continuam 11ma virtude sacramental toda especial, tem por objetivo,
a cavar co� gr.i des precauçõ certamente, estimular a vital idade dos germes que esses
� es, até que apareça "o coto­
velo do Mrnk anr" . Então, dois
homens sangram-se e dei­ grãos contêm e que, nrojctados em codas as direções do
xam o sang�e es orrer sobr
� e a pedra sagrada. Entoa-se horizonte, vão transmitir às plantas as propriedades fe­
0
cant o do Mmk anr enqu anto
os assistentes, tomados por cundantes que possuem11•
AS FORMAS El.E.llEJ\TARES n.1 11nA
358
.:359
Rl:IJGJOSA
IS PRJSC/P,1/S A TinDh\ Rin'AI!>
A cfidcia desses ritos não é posta
dígena. ele c:-.tá convencido
cm dúvida pelo in­
deque devem se produzir os r de ritos. Ela varia um pouco conforme os clàs;
longa se i e
resultados que espera, com uma mas seus elementos essenciais sao por toda pane os mes­
espécie de
necessidade.
Se suas esperanças se frustram, mos. Eis aqui duas das principais formas qu � ela aprese � ­
ta entre os Arunta. Uma está relacionada a Lagarta wn-
simp lesmente conclui que
os ritos foram contrariados pelo
s malefícios de algum gru­
po hostil. Em todo caso, não
resultado favorável possa ser
lhe vem ao espírico que um chetty, a outrn ao Ca g ru.
n u ,
.�. � .
mostram cm abundância, os membros do �ote n; . ,1ss1m e�:
obtido por outros meios. Se. Assim que as laga1tas chegam a plena matun .ic. c
, e se

por acaso, a vegetaçao cre c s e ou _


se os anim ais prol ifernm
antes de lCr se realizado o próprio !n t ich uma mo os estrangeiros, saem a apanhar o maior numero ro.
sível delas; trazem ao acampamento as que encom ;�_ r<� m �
i , ele supõe
que um outro lntic hium a foi e le a
c br do , debaixo da terra,
pelas alma s dos antepassados as fa zem cozinhar, ;.ité que fiquem duras e quebrad1�.1s. Os
e que os vivos rccolh<.:m os
benefícios dessa cer mô n ia su
i t rr
b e âneal'i �?
produtos do cozimento são conse1vados cm v s s de ma­
deira chamados p11dn. A colew das lagartas so c poss1\ el
durante um tempo muito curto, f>OÍS elas só aparecem de­
II pois da chuva. Quando começam a to rna r-se_ m:1��>s nu :
merosas, o Ala tu nja convoca t odo o mundo ao ,1camp �
Tal é o primeiro ato da festa. mento dos homens; a seu convite, cada um traz sua provi­
são. Os estrangeiros deposi tam a sua diante �as pessoas
do Lotem. o Alatunja pega então um desses
No período imediatamente posterior, n<io há cerimô­
nia propriamente elita. No entanto, a vida religiosa perma­ p1tc!11 c, com
nece intensa: ela se manifesta por um agravamento do sis­ a ajuda de seus com pa n he i ros, mói �cu co1�teu d.o cnlr�
tema ordinário elas i nterdições . O caráter sagrado e.lo totem duas pedras; feito isso, come um rouco do po ass11n <> li ?
é como que reforcado; ousa-se menos tcx-ar nele. Enquan­ do, seus assistemes fazem o mesmo, e o resto é �evo�v1do
to, cm tempos nom1ais, os Arunta podem comer do ani­ aos membros dos outros clàs que podem. a segulf, dispor
mal ou da planta que lhes seJVe de totem, ainda que mo­ livremente dele. A partir desse momento, os home ns e as
m ul heres do totem podem comer dele, mas s��1en te um
pouco ; pois, se ul tra passa�sem os li m ites �crmn1d��s'. pe�­
deradamente, no dia seguinte ao lntichiuma esse direito é
suspenso; a interdição alimentar é estrita e incondicional.
Acredita-se que qu al q ue r violação dessa i n 1crd ição terá de r hm os poderes necessanos para celebrM o lnuch1u 111<1
por resultado neutralizar os efeitos benéficos do rito e im­ e a �s p6c i c não se reprodu ziria. Mas, �e não �0 1.� esscm

ne m um pouco e, sobretudo, se, nas c1 rcunstanc1,1 s que
pedir o crescimento da espécie. Os membros dos outros
totens que se encontram na mesma localidade não estão acabamos de citar, o Alatunja se abstivesse totalmente de
submetidos, é verdade, à mesma proibição. Mas. nesse comer seriam vítimas da mesma incapacidade.
momento, sua liberdade é menor do que de costume. Eles N� grupo totêmico do Cang�r� que tem se � �� n ��o
. : c m 1 1 sao
n.io podem consumir o animal LOtêmico num lugar qual­ cm L'mliam, algumas das caractcnst1cas <la cenn . .
quer, por exemplo, no mato; são obrigados a trazê-lo parn marcadas de uma maneira mais evidente. Derens q ue o�
o aG1mpamento, e é somente lá que ele deve ser cozidoi11. ritos que descrevemos se realizam na rocha sagrac.I�, os
jovens saem a caçai canguru e trazem sua caça ª? aca m­
pamento dos homens. Lá, os veU1os,
Uma última cerimônia vem pôr um termo a essas in­
erdições extraordinárias e encerrar defin i tivamen te essa
t entre os quais esta_ o
Alarunja, comem um pouco da carne do animal e untam
n,1 17011 N/!J ICllOSA
360
I \ PN!.VC/1'11 !S A 'fl'f( DHS N!Tl A!S
AS FOR.IIAS ELEMEl\TA Rfü
.�6 1
�om a gordu ra o _corpo
daqueles que pa rtkirara
m do lnti
th1w11a O resto e partilha
do entre os homens reun
m
s:g � ir, as pes soas do Lote
. idos. A
m se enfei tam com desenh
1e�11cos e a noit . os to- O i nteresse do :-.iMema de riros que acaba ele ser des­
e transcorre em cantos
fenos rea l i zados no tempo
. que lembram os
do Al cher1· nga pel o.s iom
1
( rito está cm que nele se encontram, na forma mais ele­
� ca ngu rus. No dia segu inte
. . . . ens e mentar atualmente conhecida, todos os princípios essen­
uais de uma gra nde instituição religiosa, que estava desti­
c�.s nirna1s
«1ç,1 r na íloresta , traz end
, os jovens voltam a
o um núm ero aind a mai
a vez, e a cerirnônia da vés pe r
or d . nada a tornar-se um dos fundamentos do culto positivo
cangurus que da prim eir
recomeçal". � nas religiões superiores: a instituição sacrificial.
Sabemos que revol ução os trabalhos de Rohertson
Com \'a acôes de deta lhes
r! ">mith det ermin a ra m na teoria tradicional do sacrifício1·.
cm ou1ms das arunta.18, entre os
, encontra-se o mesmo
rito
UrJbunmti<>, os Kaitish"111
os t lnma1w
\té ele, \ ia-se no sau·1fício apenas uma espécie de tributo
da baía do Encontro·- 1u homenagem, obrigatória ou gra tu i ta , J ná loga .1s que os
. Em LOd
. r:i � 1 . na lribo
�a rt� �le é feito dos mesmos elem �
entos essencia is .' A lgu n súclitos devem a seus príncipes. Robertson Smith foi o pri­
cspec1mc.1> da planta ou s
do anim al totêrnico .'ião
a rre:;en­
tad�>i> ao chefe do clã , que
meiro a observar que essa exrlicação clássica não levava

obr.1gaçao de come-lo
os come solcncrncnie e cm conta duas características essenciais do rito. Em pri­
s. Se não cum prisse esse
_ iem a
dever per
� ena seu
�oder de celebrar e ficaz men te o lntic hium ;
meiro lugar, t rata-se de uma refeição: são alimentos que
constituem sua matéria . Além disso, Ciata-se de uma refei­
�· �cc na r anu alm ente a espécie. Às vezes, o cons �
de isto
ção da qual os fiéis que a oferecem tornam parte junta­
nt ual � acompa nhado de mo
uma unção feita com a g

o �n: a l ou ce� as part o�dura
es da planta.u. Gcrn lmcme , o rito
mente com o deus a quem ela é oferecida. Certas partes

e re ret ido , depois, pela


� da vítima sào reservadas à divindade; outras são atribuí­
s pessoas do totem ou das aos sacrificantes que as co nso mem; por isso, na Bí­
e, urna vez exe cuta do,

pelo me-
� . as i terdiçôes
�º�'. p los vcl�1os,
blia, o sacrifício é às vezes chamado uma refciç-.10 feita dia n­
cxccpc1ona1s sa o levantad te de Jeová. O ra , num g ra n de n ú m ero de sociedades,
as.
Nas tribo s situ ada s mai
s ao norte e n t r e os Wa considera-se que as refe ições realizadas cm comum criam
mung·'1 e_ ' n as soc1e dacles vizi nhas
1 r,1
entre seus ra 1t i ci pa ntes u m laço de parentesco artificial.


. • -

n e' n 1e nao acon tece . Toda via , enc


·
J1, essa cerimônia atu� il-
Pare n tes, com efeito, são seres n a tu ra l me n te feitos d a
gios que r>mecem teste mun
ontr am-se aind a vestí­

.
h ar que houve u m rc m no m mesma carne e do m esmo sangue. Mas a alimentação re­
, ve rda de que j<• mai s faz constan iemcntc a s u bstância do organi sm o. Porlanto,
o, ,che
c1ue cl·
c fe
- .i nao- era ign orada . E

uma a l i me nta çã o comum pode produzir os mesmos efei­


cio c l ,'. com,


e n t u a l men te e obr igat


��s , cr� c nos ca sos , as tos q ue uma origem comum. Segundo Smith, os banq u e­
oria men te do tote m.
� pessoas que não são cio
cuio ln11c h1um a acaba IOLcm
de ser cele bra do são o tes sacrificiais teriam precisamente por objeto fozcr co­
brig,1 d as
·
trazer o an11na 1 ou a pl a n
.
ta à a l dei a e a oferccê lo
che
a
mungar numa mesma carne o fiel e seu deus, a fim de cs­
- . •

fe, .!
)� rgunta ndo-lhe se que

. ao
r comer. Ele recusa e acre
.
rabelecer emre eles um laço de parentesco. Oes�e pomo
scen­
t�: �
1z iss o ror vocês; vocês pod de vista, o sacrifício revelava-se sob um aspec10 inteira­
menre novo. O q ue o constituía essencialmente não era
? costum e da a presen taçã
em comer Ji vrememc de­
o s ubsiste, portanto e a
le. "l

� u�st310 �aloca da ao chefe


ma epoca em que o consum
parece cl a rame nte referi r
�se a
mais, como se pensou por muito tempo, o ato de renún­
cia que a palavra sacrifício exprime comumentc; era, an­
o rirual era r>raticado.-16.
tes de tudo, um ato de comunhão alimentar.
1IS FO!lHAS E
...., {)I 1 /f)A
-r .
362
LE.
U E:
'v
-,
'ARL',. R
EL!
.
C:
IOS
1I 1 I !./\'<ll'AJS A 777T!DES RJTUAIS 363
l l a veria certa
m e n te a lg u nns rese _ , , i· vas , a fazer, nos li
a u
à e spéci e vegetal ou animal c.:orrcspon­
,J " rn·ane1ra uc expricar
1 1 1 1 1 anin.. tl, é
li 1111
pormenores, acerc

1)anquetes sacrifi
· ' essa
ci'' 1 1·s· Esta nao resulta excl us ·vame
uos a eficácia q ue irão ped ir as forças suplem entares que nccessi-
do f;ato da co 1 1 1 1 1 pa ra ren ová- lo e rejuvenescê-lo. Um homem do clã
-
' e . 0 11omem 1

d· • < 1 ngu ru se julga, s e sente um canguru; é por essa


me
·

c,1
- m
ente por 'scntar-
mcnsalid·id
i-
não
s•
,
"• de certo m
' se sam1"f1ca
od.o ' ,1
· un
q l l didade que se define; é ela qu e m a rca seu l ugar na so-
.•

o d eus, mas sob -' mesma mesa


que
1 11 c l. 1 de. Para conservá-l a, ele faz passar para su a própria
retud o por uc
nessa refeição
com creito ' de
ritual tem u r:; � al11:ie mo que con
' r, ter sagra do.
c·1
Mos tra mos
some
1 i l 1�1fincia, ele tem pos em tempos , u m pouco da carne
d1 ·ssL" mesmo a n ima l . Algu mas parcelas são suficienles,
que m·'1 nc1. 1 a . ' n o" fs·1c
. '
' rif'1 c1·0, toda
de operações pre
J i m in "· • res· , pw 1 .tca ço_ cs uma série
u nçoes, prece s 1 1 1 1 \1rtude da regra: a parle equivale ao todo�9.
1 0 ·'
-
etc., tra nsform' - 11
1 i nuna· 1 que: de ve .
· •

.
· ·

coisa sama. cuja dig ser imolado numa Mas, para que essa o peração possa produzir todos os
. �i;.m J. te-s e
seguida ao fiel t li 111>:. que dela se esperam, é importante que nào se rca-

que dele come


nidade , trn
-Ili Mesm0 a ss i
em
m ' :i comu 1111 ao - al
·

cio"� e ,1 e, me ntas s- e
·

conti nua sendo u m


·

1 m c ntar num momento qualqul'r. O mais oporluno é aquele


Ora, pe nsemos e s -· · do sacrifício. 1 111 que a nova geração chega a seu completo desenvolvi-
s e1o qual se
nc1a1s
. no rito ·
ie·I1 1· u m a ; tamb
·111
' ·
c1ve,
1.1. mo n1as do l n t · encer ra m as ce- 1 1 1v11to, pois é também o mome nto em que as forças que

·

ém e l e, c.onsi.ste
· ·
1111 111am a espécie lotêmica atingem sua p l ena expansão.
a 1 totê mico , o
desse gênero lJina nu m ato
tu nja e os ve lh 1 l.1s mal acabaram ele ser extraídas desses ricos reservató-
vez mono o anim
os come-m sol
.

enem enre dele


· eom ungam, 1 11 >s de vida que são as áivores e as pedras sagradas. Além
Ala-
. .
pois, com o pnncíp
. io sa rado q u .
Iam A ú n ica difere � nele reside e o assim i­

disso, todo tipo de meios foram e mpregados para fazer
nça é �l ue' a q u 1 , o _
q ue' em geral
ani mal é sagrado na- .1urnenrar ainda mais sua intensidade; é o que b uscavam
• ac1 quHe ·
turalmentc ' ao passo
. . 11s ritos rea l iz ados na pri mei ra parte cio lntichiuma. De
, ao 1 ongo do sa
' ' so
Ler a mfic esse carí -
I L'Slo, por seu aspecto mesmo, os primeiros produ tos da
ialmen te,
O ob1.eto d essa
'
crifício
e manifeMo. To-
.

comu nhà. o, po .
do membro de um srnal
.
' . • o lheita manifestam a energia que contêm: o deus totêmi­

uma espécie de
dà toro; cmi o _truz em s1.
n> n el es se afirma com todo o esplendor da juven tude.
a pa rte emme
substância m �
l .1s por q u e, em todos os tempos, as primícias foram con­
íst ic·'1 que conslitu1
pois e • dela ciue e me de seu
. ·
- ,• C i. ta sua alm
ser,
É e e 1 a que proce-
1

. a. ' 1deradas um alimen to sagrado , reservado a seres santos.
'1 ·1)LI i e seL1 pape1 .
dem os poderes
" Ue ele se atn
atraves dela q ue

socral ; é 1·� natural, portanto, que o au stralia no si rva-s e del as para
ele é u ma pessoa ,
i n te-
c1- l a intacta , e
ress e vital em co . 1-Ia, po rta n to, um ... v regenerar espiritualmente . Assim se exp lica m tanto a

q u anto p ossível
nsei · v,.
' i1u m estaclo ele
m mante -la lante
• tua 1uve
data como as circunstâncias da cerimônia .

.

perpe
'
l1. zmen re , todas
as força s, . mesm o as
mucle. Jnfe- Talvez su rpreenda que um alimento t:ão sagrado pos­
.
desgasram com 0 · mais es
.
.p 1 mua is,
.
.
sa ser consumido por simples profanos. Mas, em primeiro
r
se
l ugar, nào há culto positiv o que não se mova nessa con-
tempo, se, na da .
�erdem no curso natural vier � energia que
.
da s cois·as.. rem _
rep o
os ª' uma ncces- 1 radição. Todos os seres s agrados ,
c 1 ue, corno vere
sidade primo rdial e m razão do caráter
e1o culto positivo
·

que possuem, são subtraídos ao acesso p rofano ; mas, por


1 fOS ele un
mos ' é a . raza- o profunda
· Os mem )

·

_ t Olem so pode ou tro l ado, eles de nada serviriam e não teriam razão de
-

pona mo, ma nter ,

ser se não se p usess em ef'l contato com esses mesmos fiéis


. m,

torna rem a vivi fi


sua ident'i da d e se
pri ncíp io Lotêm
ico que s c
nt
ca r o
represeniam
esse p rincíp o � ;�� � dentro deles ; e, c m
a o rma de u m
o o que, ao mesmo tempo, devem permanecer respeitosa­
vegetal ou mente afastados deles. Não há ri to positivo que, no fun-
RJTliA/5
365
361 AS FO/UIAS ELEME\TARES DA l'JnA REUC:/05'1 I\ I N/\<.IPAIS ATIT llDJ:S

u esses
1
Smith, sem conhcc
.,,
. p or .
uma mtuiç,to gcni·ai '
. .

do, não constitua um verdadeiro sacrilégio, pois o homem


.

.engc-

de
1 1111-., te ve, o pre
01
um a série
mio p<xle comerciar com os seres sagrados sem atrm essar ssenti mento deles .
- zir aqui, pois tem
, .
du

. ú til repro
'\ Creditou poder esta-
: e é in
1 1 1 11 1-..is cleduçocs - q �
h1stonco'- -' ele
a barreira que, normalmente, deve mantê-los separados.
·1us
.3
resse
. a 1. 1
1

Tudo o que impo1ta é que o sacrilégio seja fcico com pre­ um inte
. cios
11" i do nos sacrifí
·• ·

1 .. ll-ccr que, na
nol·
, 0n·gem' 0 anim

cauções que o atenuem. Entre as que são empregadas, a , .
. parent e pro,
x1-
o quase div ino e
d1·\ li ter co nsi de rad
1 vam Ora ' ess
mais usual consiste em conduzir a transição e imroduzir o sid o
· · as caract

. en,st'icas são pre-
1110 dos que o uno ª '
. se
fiel no círculo das coisas sagradas apenas de maneira len­ · espécie totêm i-
define a
s pelas quais
ta e gradual. Fragmentado e diluído, o sacrilégio não fere, ' '" imentc aquela 1, e> deveria ter
co-
• .1 Smith sup �
t0te1nism .

o tam )em que 0


um nto .1 teirament
A

assim, violentamente, a consciência religiosa; não é senti­ log o ao que


.
� e aná
do como tal e se desvanece. Ora, é isso o que acontece 1 1l wcido e prancaclo o .1 ver nessa espé-
·' ele tendia mesm
· ·

dar

no caso que examinamos. A série de cerimônias que pre­ '' .1hamos d , es


• t u
'
toda a inslltu1çao
e

• ll de sacrifí
e 1 u�da n1enral de
, 1·i· f
cede u o momenco em que o totem é solenemente comido cio a bas
•,.1l rific1al 11 . O sac
. . '1 c ·1o nao tcna . s·1d o 1
··nst.1tuíclo na ori-
'

ten: por efeito santificar progressivamente aqueles que


um laço de
entre o ho me ·m e seus deuses
. 1 mas para ma.nter e
participaram ativamente delas. Foi um período essencial­ \:l'lll, para criar
1· f·i -,
renov a r o paren-
i
mente religioso que eles não puderam atravessa r sem que ' iarentesco a n· c a '
l l'sco nat ura 1 que
Aqui como
seu estado religioso se tra nsfom1asse. Os jejuns, o conrato
. . · va1n ente
0s unn . ' p n m1 · t 1 · •

u ó
s_
'"' i· mitar a natureza .
com as pedras sagradas, com os churinga 'º · as ornamema­ o ar T
.
Smith se-
i o pa�
� �:
1cio . · teíl'I nasc·d
.ilh ures,

�ao s pr ntava no livro de


çôcs totêmicas, etc., pouco a pouco lhes conferiram um Mas essa hipóte�e
� os s ent ão con hecidos
os
fato
cas
ia ge
caráter que não tinham anteriormente que os coloca, n,10 como uma ide ' · • de
sa-
sem profanação chocante e perigosa, frente a esse al i ­
e
Os ra ros
·1mperfe1tamente.
justificavam apenas
·

m1c•o que ele cita em


A

. cJe sua tes e não tem


apo1·o '
- c.1a' . ,mi·mais que aí
seria interdito11. i
l rifíc10 tote
_
mento desejado e temido que, em tempos normais, lhes figuram nao
1 signi f1ca1,;ao ·
A •

qt 1e lhe s · •os
'
.s hoi·e é líci to afinnar,
opria mente ditos . · •'i . Ma
Se o aLO pelo qual um ser sagra do é imolado e de­ "ªº totens. pr o está fe1t . a:
ser
·m on str açã
pois comido pelos que o adoram pode chamado um nu m ponto pe lo
menos, qu e ª d

, me o importante cJe soc ie-

��
que� n
sacrifício, o rito que acabamos de ver tem direito à mes­ .1<.abamos de . vc r bia, é
ma denominação. De resto, o que mostra claramente sua dades, o sacnfic10
. rotem1c � como Smith o conce
uma temos a
do . Cla �o. qu e ' de maneira nenh
significação são as analogias impressionantes que apre­ ou foi pratica e inerente ao
S�J. ª necessariament
senta com outras práticas que se verificam num grande de que essa pranca os au­
l)rova o germ.e ele qL1e todos
e ela se1a ,
número de cultos agrários. Com efeito, é uma regra bas­ totemismo , nem �u a universalidade
do
l!
. sa1rat�. Mas ' se
c10 .
eante geral, mesmo entre povos que alcançaram um alto tros tipos de sacnfí . .
-o mais
a conte stável
sua ex1stenc1a n
. f.
grau de civilização, que os primeiros produtos da colheita e, h .
ipot e' t '
i ca ' a
elecido que
-.. ve-se cons
rito
1'dcrar como estab •
Doravante, c.l.,
h-
sirvam de matéria a refeições rituais, das quais o banquete ntar ·1 á se ven 1ca
forma ma
· comu n ao alime
pascal é o exemplo mais conhecido•l. Como, por outro is mi. 'sti ca de
ente conhecida.
rudimentar presentem
lado, os ritos agrários encontram-se na base das formas na religião mais
mais elevadas do culto, percebe-se que o lntichiuma das
sociedades australianas está mais próximo de nós do que
fa ria supor seu aparente primarismo.
366 1 l'/U\CIP/li!) A Tln DI� Rlnws
367
AS FOllltAS EL/!.IJE.\TAR!�\ Dr! IWA RElJGJOSr!

IV \J. os fatos q u e expusemos derru bam essa argu-


mente entre os
1 1 11 111.u,ào . Os mos dcsc.ritos figuram certa
Neles n<lo vemos
s de e1ue dis p a- 1 1 1. 1 1 -. primi t ivos até agora observados.
�as, num outro ponto, os fatos novo
·cer ainda ne n h uma perso nali dade
. mítica determina­
mos mvali dam as teorias d e Sm ith . 1p.1 1L
egu ndo. c.:le, a com u nh<1o não seria
S d.1 nem deuses, nem espíritos propriamen
te d i tos; apenas
'.1:en�o es�cnc 1 J
apen as um cle­
� o sac�ifício; seria, pelo menos na orige ,, rl'l"t:rem a forças vagas, an ô nimas e im p essoa is. No en-
seu .e !emem� :m ico. Na?.s mc mc

1 11110, os rnciocí
m,
nios q u e supõe m são precis amente os que
? haveria equívoco quan­
de seu absurdo.
do se reduz isse o sacnf 1c10 a ser !'inuth declarava impossíveis em razão
iro ato do lnti-
apen as um tribur o ou
un rn
. .°.fere nda, como também a idéia de oferenda estaria Reponemo-nos, com efeito, ao prime
1 lm11na umr a fecundidade da
totem ao ela. Es-
�rrn� n_ivarr:en �e ausen te; só leria . aos ritos destin ados a asseg
apa recido ta rdiam ente,
�ob ,1 influencia de �i rcunstânci;.1s c.xteri , '>Jli.:ue an imal ou ' cgetaf que serve de
0 ,, coisa
orcs, e dissim ularia
por excelê nda , nela é que se
os chamar, por me-
a natureza verda deira desse meca L'..,p0lie sagmd a
poder a1ud1� r a compreendê-lo. Smith
nismo ritu,tl longe d .

� :
acred itava com efei � , 1 1carna essen cialme nte o que
.
pudem
, que, para se
to, c escobnr na JXópria noç<lo de oblaç 1 dora a divi ndade tmêmica Vimos, porém
pl' rpe uar, ela tem
ào um absurdo de-
1 �asiado revoltante para que fosse
possível ver nela a , - � neces sidade do concu rso do home m. É
za� P.rofuncla de tão gran de instit uição . Uma das fu n�·c de que, todo ano, dá vida à geraç<lo nova;
dade é assegurar aos
s;: o homem deixar de celebr
sem ele, ela
ar o l ntich iu-
ie da terra.
mais ,' mpona 1� tes que cabem à divin 11;10 veria a luz. Se
homens os a l1 mem os necessários arecer ão ela su perfíc
1
para viver,· nare�"e por 111;1, os seres sagrad os desap
• l que o sacrifício, por sua vez
,. -

os seres sagrados
tan�' unpo · ss1ve a ele, portanto, num certo sentido, que

�ª ª!'resentaç-Jo de alimentos à divindade. P rece �ontr


consista nu-
<L<;pecto, é a eles
dn�no q_ue os deuses esperem do
� a­
dc\em :i existência; no entant
a sua; pois,
o, sob
assim
outro
que chegarem à ma-
� homem seu al imento 1uc o homem deve
para preservar e
q�an o e por eles que este é a limen 1 1 mdade. lhe darfü> as forças necessárias
1 c novar seu ser espintuaL Assim, é o homem
tado. Como teriam ne�
cc�s�d,1d� do concurso dele para que proc.lut:
obter sua JUSta parte so­
br� ' s c�1sa� que ? próprio home ..,cus deuses , pode-s e dizer, ou, pelo menos . é ele que os
' m recebe de suas mãos?
- . . cons1dernçoes,
'
aos deuses que
�css,1s Smith concluía que a idéia do sacr1·- l az du rar; mas, ao mesmo tempo, é graças
f1c10 . �ofe re nc · t1a podi do nasce
Ja s6 t1n de du ra. Portanto, o home m perfaz regula rme nte o círculo
< 1ue, segundo Smith , estaria implicado na
r nas grand es reli-
. • .

g1c;e�, .�n: que. os d euses , sepa rndos noção mesma de


. das coisas com as
qu<11s s� c_onfu nc.l ran� pnm itivam 1 ributo sacrific ial: dá aos seres sagrados um
pouco do que
� om o espec1es de reis, propriet<Írios
ente, foram concebidos
emi nentes da terra e recebe deles e recebe ddes Ludo o que lhes dá .
e .se�s produt�s. A partir desse Mais: as obl ações que ele é assim obriga
do a fazer
,ass1m ila � momento, o sacrifício foi
o :io tr� b�to que os s údi tos pagam .1nu almente não difere m em nature za das q u e se farão
i
a seu príncipe,
didos . M:i s essa
�m troc, 1 dos d 1 re1tos que lhes são conce nos fí
sacri cios propr ament e ditos e o sa crifi­
mais tarde

ldnte imola um a nima l, é para


.

� que os princípios vivos ne­


� �csmo uma corrupçao da concepç<lo primitiva. Poisç<lo
i,n te�retaçao nova ter sido, em
realidade, uma ahcm
le existentes saiam do organ ismo e possam alimentar a di­
\indade .
. "a
ide.'" de pr�Jpnedade ma terial iza tudo Do mesmo modo , os grãos de poeira que o aus­
o que ela toca "'· aº
tantos princípios
se i�t oduz1 r no sacrifício, ela o desna
.
espec

1e de mercado entre o hornem e a divind
turou e foz dele t ma ; tmliano libera da rocha sagrada são
sa no espaç o, para
outros
que saiam a anima r a es-
ade•<>. que ele disper
1
E/hl,fl!J\TA RHS D
,1 l IOA REIJGIO:.:1
368
l \ l'Rl,\CIP.MS A T/Tl Dl:S RITUAIS
AS FORMAS
369
pécie lotêm ica e
- . O g csw
assegurar
qual se faz e"� s'
· ·1 d1ºspe
sua reno '".1çao
pe lo
- • .

rsao e o mes. m o •"N:s �.u1s atos no lnLichiuma, cal como acaba de ser dcs­
normalmen te as of
·
que aco mpanha
erenda s. , E m c�rros. Caiios, a
. ' 1 1 lo. A ú n ica diferença é que, no sacrifício propriamente
dos dois rito·s verifi
. ca -se. me .
i us1ve nos po .
semel hança d J l o'iO, eles se fazem simu ltaneamente ou se seguem ime­
movimentos efe tua . ' me nores dos d1,1 lameme, ao passo que, na cerimônia australiana, estão
que , Pª'.ª fa zer
chover, 0
do s v·
kaitish derra ma água
povos, o sacerdote
� � :'::
s br ' � a pedr:i
� agrada ; em certos
.cparados. Al i são p a rte s de um mesmo rito indiviso;

sobre o a l ta r•- A s '


com o m smo ob .1qui, ocorrem em tempos diferentes e podem até estar se­
- e 1et1vo, derrama água parados por um intervalo bastante longo. Mas o mecanis­
efusoes d e sang
mo, no fundo, é o mesmo. O l nti chiu ma , tomado em con-
-

de Int"ic1 11uma, cons


ue que sao
· ·

num ccno número . •


com uns
1 11 nto , é o sacrifício, 111<1s cujos membros não estão ainda
obl açôes . Ass·im lituc m verdadei ras
como o Arunta ou
o ! ) i" e1.J· rega m
1 g 1·'· 1(fª ou o (1 .
san gu e a rocha ·s·
csenh
com
com frcq ü ência em
'
o •
1otcm1co
·

, acontece
. 1 1 liculados e organizados.

ido s . que o sangu


.

-
l1 u v1tur1<
1tos Essa aproximaçao tem a dupla vantagem de nos fazer
. mais ava nç'
ompn:c..: ndcr m el hor a natureza do lntichiuma e a do sa
• CL1
1 sacrificad·i ou •B .
do propno fiel se1a
. ·
e
't l car
:
.

te ou em cima do dcrrar tiaclo dian-


Nesse caso ele nifício.
é dado aos deu-
·

deram seu a
ses, que o consi Compreendemos melhor o I n t ichiuma. De fato, a
.

, , imen
. co prcfe
lia , ele é dado ·1 . ndo; - na Austrá-
o, nao 1la- mais
' esp
. e · c1e sagrada Por rnncepçào de Frazer, que fazia dele uma simples opera­
e 01 )1-.iça�o um
mouvo . tam
,
para ver na idéia d � .io mágica, desprovida de todo caráter relig ioso� 1 , revela­
civilizuç::io. produ to tardio da
M.� agora insustentável. Não se pode pensar em colocar fo­
Um docu mento ra e.la religião um rito que é como o preâmbulo de uma
que devemos a 'Strehl
esse parentesco do 1 .
• ow poe .
denc1a . - cm evi­ 1 11stillliçào religiosa tão importante.
nuc111um a e do
ta-se de um canto sacnti cio. Tra- Mas com pree ndemos melhor, também, o que vem a
que acom panha o
ser o pró prio sacrifício. Em primeiro lugar, a igu al im por-
lntich iuma .
guru; a cerimôn ia é do Can-
sào expostos os
aí desc ·ca
efeitos qu :�� :� m mo tempo em
s
:. que 1!incia dos dois elementos que o compõem está doravante
cMabeledda. 5e o auMraliano faz oferendas a seus seres sa­
, e esperam. Um
da gord ura do cang . pedaço
uru foi d, epos1tado pelo
um suporte feito chefe s obre grados, não há razão para supor que a idéia de oblação
de ra magens.
gord ura fa z cresc Ora ' o texto d 1z º que essa
er a gordur fosse estranha à orga niz ação primitiva da instituição sacrifi­
a d . cangu rus.i9.
oficia nte não se
limita a es · tl h · po . �� �
Desta vez, o cial e pe11u rbasse s ua economia natural. /\ teor ia de Smith
deve ser revisada nesse pon ro s1 Claro que o s<1crifício é ,
gue huma no; o
�� . : 1 ra s<1gr c a
ou san­

próprio a ni1 �
c m pa ne, um procedimento de comunhão; mas é também,
l e imolado, sa
.

cnf1ca do, po-


e rec1. do
d e-se diz er der)oS
, - .- ' itaclo numa espé
a espec1c cie de alt·ar e 01e
cu1·a vida el e deve e não menos essencial mente, uma doação, um ato de re­

conservar.
Ve-se, agora, cm núncia. Ele supôc sempre que o fiel abandone aos deuses
ch iuma c1 uc ele ctlgo de sua substfmcia ou de seus bens. Toda tentaliva de
que sencido se .
pode dizer do lnti-
conie >m os germ es cJo
Na forma que apr ·
siste ma sacrificial.
ese
· nta quando plena reduzir um desses elementos ao outro é vã. Talvez até a
. mente const1tu1 -
õe-se de do1s e1
o sacnfíc:io comp . · do, oblacão seja mais pennanente que a comunhào�-i.
emencos essenciais:
ç·à�· o fiel com
ato de co mu nh ão
e um a to de obl a um Em segundo luga r, o sacrifício, sobretudo a oblaçào
com seu deus ao i
mo tempo, faz a ess
ngeri r um afim�nLo
e deus uma o1e
< s 1g1.aclo e, ao
unga
mes­
sa crifici al, em geral parece poder dirigir-se apenas a seres
pessoais. Ora, as ablações que aca bamos de ve rificar n<1
renda. Recon hece
mos Austrália não implicam nenhuma noção desse gênero. Va-
370 AS FOTWAS ELE.1/E.\TARES nA 1 m.1 RFU(;fOS.I
371
I\ l'RIACIPAIS A"nTl DES R!Th'AIS

11 1 en texto 0 c;eu esplendor.


le dizer que o sacri fício é independente das formas variá­ ora se dehilita ao ponto de
veis c;oh as quais são pensadas a:. forL as rd1g1osas; esta li
pergu ntarmos :.e nao m 1 se deter. Todos os anos as plantas
. .
gado a rnzóes ma is profundas, que Lere mos de examina r
inorrem: irão elas renascer? As espécies a111mais tendem a
mais adiante. e natural ou violenta: r i Jo renovar-s:
.e ex"tinguir pela mort

.1 te, mpo e da ma neira ·


e1a pa�c;'-
Todavia, é claro que o ato de oferecer desperta natu­ que conv ém ? A chuv a, sobretudo, e
l .iprichosa; há longos períodos
ralmente nos espíritos a idéia de um sujeito moral que durante os quais
essa oferenda está destinada a satisfazer. Os gestos rituais retorno. ? que essa: curvas pen�
l �· ter desaparecido sem
que descrevemos torna m -se mais facilmente intel igíveis ham e que, nas epocas c orre�
_ ­
n m
mun
)()nclentes os seres sagrados c io
dicas da natureza teste
quando cremos que se dirigem a pessoas. As práticas do s quais dep e de os a111-
lnlichium a, embora referindo -se apenas a força s i m pes
: Í
nais as p antas, a chuv a, etc. passam
pelos mesmos esta­
:.e�s penodos de
so�11s, abrium, assim, ca m i n ho a uma c:onccp�·:io difercn­
te'i • . Scgurnm cnLe, elas não teriam bastado para suscitar

dos ríticos; porta nto, tamb ém elc:: s têm
ltr a es:-.es �spe
!J ,14ueza . Ma:. 0 homem nào poderi a assis
por L om p k to a ideia de pe rson al ida des míticas. Mas, que � le v iva , e
,
rente . Para
uma vez f ormada essa idéia, ela foi levada, pela própria
ha indife
taculos como testemun
preciso que a vida un iversa l continue
e, cons � c ue ntem e� ­
natureza desse:. ritos, a penetrar no cu lto; na mesma me­
tc, que os deuses não morram. Ele b u sc a , p 01s .' _
sus :e�L,1 �
dida, tornou-se me nos especu lat i va: misturada mais dire­
1os., aui· da'-los· par..i, poe· a servi
.
ço deles
.

A cia. •
as forç,
0 �angue
1, s de
,
· •
isso
tam�nte à açã o e ã vi da, adquiriu ao mesmo tempo mais . .
a circu nsi_an
que dispõe e que mobiliza para.
� . �I� ?
realidade. Pode-se, portanto, pensar que a prática do cu a es ,
e un
,
v11lu cles f m
que corre em suas veias tem
c

to favoreceu de mane ira secundária certamente, mas seu ela possui; Jra
que derramará . Nas pedras sagradas que
mesmo assim merece ser notada, a personif icação das os e os semeara no
buscar os germes de vida adormecid
forcas religiosas . ?
. ,a
espaço. Em uma palavra, fará biaçõ es. , . ..
. alem c.ltsso
Essas crises externas e fís1c..1s somam-se
t nses i nternas e mentais que tendem ao � esmo resul tado .
V os seres sagra dos só e x i s t em porq ue sao rc pr � �c nta d >� �
ele acred i ta�. neles ' ,
nimo tais nos espíri tos . Se cessarmos
Mas resta expl icar a contradição na qual R. Smith via
será como se não existissem. Mesm o aque les q � e tem u ma
p eri ê n c i a sens 1 � : 1 depen�
forma mate rial e se dào na e x
um inadmissível escândalo lógico.
Se os seres sagra dos manifestassem sempre seus po­ amento dos f1e1s. que, os
-
dcm , sob esse aspccLO, do pens
que faz deles obietos d:
.
deres de uma maneira perfeitamente idêntica seria i ncon­
,
ce bível , de fato que o homem pudesse pen�ar cm ofere­
,ido ram pois 0 carát er sagrado
culLO n o é dado em sua const it u ição
ci natur al; � le
que
lhes e
um
cer-lhes seus serviços, pois não se percebe que necessida mais
u.ru
é
Cang
ça. O cang uru não
­ .ic rescent ado pe l a cren
de poderiam ter deles. Mas. em primeiro lugar, na medida
mim ai como os outro s; mas para as p �s � oas do
cm � ue se confundem com as coisas , na medida em que
de contém em si um pri ncíp io que o
d1sungue dos out1os
se ve ne les os princípios da vida cósmica, os próprios se­ e nos espír itos que o pen­
seres, e esse princ.:ípio só exist
res sagrados estão submetidos ao ritmo dessa vida. Ora, a os ,cre5 sagra dos, uma vez concebi do�,
�amss. Para que
vida submete-se a oscilações em sentidos contrários e que h omen s para dura r, sena
não tivessem necessidade dos
se sucedem segundo uma lei dett:rminada. Ora ela se afir-
.
senta ções que os expnmem
preciso, port.anto, que as repre
IS
A1'f71'/)/f.S RJTPA
375
\ \ l 'J<l\CJl'A /S
374 AS FORMAS E
LfllE.
'V
T .ARES DA 17Dil REL/ClJOSA tambl:m
o simbólica ,
li
que a expressã
·

n:10 são mais este s sem a socie-


1 1 1< 1 pc>lk pass
11�""
\'íduos nern
dores há uma mis1u� 1 de favores q ue se condicionam mu- ar sem os indi
"
1 uamente. A regra du ui des [dou, para que dbl, pela ual
'
qual são
sólid o sob re o
as vezes se definiu o .
-
1
.
�·1? ; ?
1 sacrifício, não é um in­ ; 1l 1d1 ·
\'oca mos aqui
o substrato
faz persi stir desde que
' 1 rLa�ros.: ela apenas traduz de
os
eó rf:�� C os cultos e que são
venção tardia de t l l l lcados todos vemos de que
n:ianeirn explícita o própr"'
;
� :i ecanismo do sistema sa ri fi­ � 1-,\l'tn socie dade s hum anas . Quando
parecem dirig ir-se, pergunca-
c�a l e, de manei a mais g er ' de LOdo culto positivo . O h 111 is os ritos
e para o que m con cebe r
homens pudera
. m1t11 e ' pon·anto, 11em real •· m·is
os
1 1 1 1 1 11
nto com o
. - os com espa am tão fie\-
c1rculo assinalado po.i S
como permanecer
ele nada tem de hum1·111ante para a 0ecorre do fato 1 11kia deles
'
e sobretudo ter vind o a i\u-
ra
• z.io.
· :- lhes pod e
eles. De onde

ligad os a ao vento,
areia lança dos
. c�• encias
de os seres sagrados . em1Jora superiores. ,1os . h omens na
·o 1111 nte
A
algu ns grãos de
. ' .
ele
· ,

com ma ro­
Po(.Icrcm
' , viver a na
· o ser
, cm cons humanas. 111 que ,
derramadas sobr e u
gotas de sangue manter a
Mas esse c í rculo se;: , revehra mais · natural ainda e • 1 1 111 algumas era pos sível
' h.1 ou sobr
' um altar ,
l
c< >mprecndcremos melhor "<:� . sentido . e sua raôo de ser,
sc, e \ ando mais longe a analise e su1 )St1tu1 do os súnbo-
. .
ida de uma
e a pedra de
espé cie anim al ou de um
deus? Certa men
a soluç ão
te,
desse
passo para
I · ' demos an1e

1<�s re1 .1g1osos
. pelas realidades que eles expnmem exam ·
riormenu.:: um
mov ime ntas
ext erio res e
p1 ob\e
• 1-
do, sob ess es
mecanis-
·

ma quan um
narmos de c1ue mane·ira estas se c. m o rtam no ri(Q. Se descobrimos
� � . desa rrazoados .
.
como procuramos estabelecer, º. pnnc1 �10 sagrado nàn ê 1parente mentc
dá um sentido
e um alca nce mora l .

outra coisa senão à ' e h1 osras 1ada e t ransfigurn­ tal que lhes o seja um
socied·1d
� 1110 men esse meca nism
o nã
, ser interpretada em termos nada nos gara nte que ram os clar a-
d<�, a vida ritual deve �oder �la s inatórias . Most
. e
imagens aluc acred itar
le1gos e. sociais. E' de fa(Q da mesma iorma que esta u ' lt' - ,,mp\ cs jogo de os fiéis a
. a vida social se move 'num círcu1o. Por um lado, o m- 1 o leva
esso psicológic espirituais de
ma, . 1nente que proc deles as forças
d.1v1'd uo deve ''í sc)c·te·d a<le o mcll1or de si mesmo• wclo o ren ascer junto
que o rito faz logi came nte ex­
de ser psico
m; mas, do fato
- parte entre os ou-

que 1 he dá uma fisiono11 lia . e um lug·.ir a que necessita tenh a um valor ob-
ça
1ros seres, sua cultura imcl cctua
cren
. 1 c n:ioral. Se do homem vel, não se segue que essa na eficácia
pl icá riza dos a ver
forcm retiradas a linguage �� :s
.A
�.iene ias, as artes, as cren­
.
1ctivo. Para que
aos ritos
este jamos auto
algo mais do
que o prod um de um de­
anari a, é
ças da moral, ele cairá no c1 d,1 arnmalidade. O s acribu­ .1rrib uída anid ade se eng
��iza_ l com o qual a hum
. .

tos característicos da n a humana nos vêm, po rtanto lírio crôn ico


o culto Lem
de fato por
estab elecer que
d� sociedade. Mas por o a sociedade só existe
.ª?º· � prec iso poder um ser mora l do qua l de­
so vive nos e
. periodic ame nte Ora, esse ser
atrn�és
dos " d1v1 uc s Se a idéia da s�cie­
? deito recriar ende de nós.
dacle se extinguir n�s es 1 ntos mchv1cluais, se as crene.is
- � ? : m com o ele dep
.. , pend emo s , assi

, 1. v1c
. 1 ade deixarem ele
,

. dade .
as tradições e as aspiraçoes da - col cL_ exisLe: é a socie religiosas terem
algu ma
e partilhadas etos particulares, a sociedade
. fato , basta as cerimônias os grupos
ser scnudas De a coletividade:
� que mobilizem
. •

ortân cia par.a efeit o, pona n(Q,


'.11� >rrerá . Pode-se dizer del ' portanto, o que se dizia ma1·s imp primeiro
celebrá-las . Seu
a 1t· dacle na medida ern
·

1c1ma. da d ivindacl., ,
'-·· ela so tem re· se reúnem para r seus con tatos e tor­
plica
·A
indivíduos, mulú

é aproximar os das consciên­


que ocupa lugar nas' conscrencias que o conteúdo

. h umanas, e esse lugar faz
os. isso
, que lhe damos Ent
omos. nos revemos agorn a raz;.
1o pro­ ná-los mais íntim com uns, são as preo-
Dura nte os dias

unda pela qual os deuses âo podem p ssar sem seus fiéis

cias se modi fiqu e.

, . . e- que a sociedade, da qual os


nem estes sem seus deuses·
376 AS fnlllM'i ElElfE:\"F. IRES DA 1 7Di1 REUGIOSA i\ /'R/.\UPAIS rtnn•DES RITUAIS 377

11 1111 qwrn do sentem, nesse momento, que há, f or� deles,


cu p_a �ões utilitárias e indiv iduai s que mais
absorvem os
11�11 qu
espmtos. Todos estao dispersos cm que se reanim am, uma vida qu<;
t ra �;<>e ntes de tudo, para a maior
suas tarefas pessoais; e renas ce, forças
.
� parte, de satisfazer às 1 1 1 1 1 1 a a despertar. Essa primavera de
maneira ��nhum a e
e� 1�enc1as da vida material, e a principal ios indiví duos se benef 1cia.m d�h�.
1111aginária, e os própr
auv1dade e onômica se m pre foi o inceresse
morivação da
1•1 11s a parcela de ser social que cada um
traz em si pa_ru c1-
coleuva. 1 am bem a
� privado: Claro
. .
que os senumentos sociais não poderiam
P · ' necessaria mente dessa renovação
dma indiv idua l se regenera ao banha
estar totalmente
ausentes. Perm anecemos em cont r-se de novo na fon-
a to com nossos scme­
1 1 . mesma de onde obtém a vida; por
ll an�es ; < s iábitos, as idéias, as tendê
� isso , ela se sente
� � ncias que a educa­
çao 1mpn m1u em nós e que presidem norma de si, meno s de pendente das nc-
lmente nos­ 11ws forte, mais senhora
sas rel açõe com outrem continuam

1.:ulto positivo tenc..lc natura.t n:e t e a


� a exerc er sua ação. t < ssic..lac..l es físicas .
Mas estas sao constantemente comhatic..las
e neutr..1lizac..las sabemos quL o �
pelas t� nc..lências antagônicas que despertam tra�·os d1st1nt1vos
e mantêm as , 1111ar formas periódicas: é um de seus
t .!.iro que há ritos que o homem celebr
nc�c1-is1dades da luta cotid iana. Elas resist a ocasio � � nal e tc,
Mas es,sa: p rau_��s
para enfre nta r s itua ções passagei ras�
em de maneira
mais ou menos. efi�a z, con for me
sua energia intrín seca;
mas essa energia nao é renovada. Vivem p,1pel acess�-
de seu passado l'pisódicas jamais dese mpe nham senao L� m
e, portanto, se consu mi r i am com o tempo
se nada viesse 110, e, nas religiões que esn1damos espec
1alm�n�e nest� li­
repor-lhes um pouco da força que perdem .
s. O que consuru1 essencial­
nesses coníli­ \TO , elas são quase excepcionlli
tos e atri tos incessantes. Quando os austr rcgulannen-
al ia nos, dissemj­ mente 0 culto é o ciclo das festas que retornam
nados em equenos grupos, caçam con diç ões ag� ra d�
y ou pesca m, eles per­ te em épocas determinadas. Temos . 1. a a_ penod 1c . �­
dem de vista o q ue conc erne a seu
clã o u à sua tribo : compreender de onde prové m essa tendcnc
ce ap�nas exp:1-
; dade: 0 ritmo a que a vid a rel igiosa obede
� : s:1 m apenas cm c bter o máxim o
� rossível de caça. Nos
me 0 riuno da vida social e dele result

fcn � dos, .ªº cont ra, r i o , essas preocupaçõ a. A sociedade nao
es :;e ec l ipsam
pode reavivar 0 sentim
obr;gatonament ; essencialmente profanas, e nto que tem de si mesm a a menos
� elas sáo ex­
clu1d as dos p: nodos sagrados. O que ocup
a, e n t ão, 0 . Mas ela é incapa z de mante r perpc lllam� nte
1t: m
que se reúna
pensamento sao as crenças comuns, as tradiç vida não lhe perm
ôes comuns seus encontros. As exi gênc ias da
as l embranças dos gra ndes ancepassados,
� nte em es t a lo de congr egaça o;
rnr de novo, qu.a n<.�o ,
a m e
reu
o ideal coletiv perma necer indefi n id �
_
do qual e les são a encarnação; em uma pa p ara se
la v ra, são coi­ to, ela se disper sa
sas so�1� 1s. M�s1:10 os interesses ma teri a is
rortan
altemanc.:ias
mais uma vez, sentir necessidad e. E a essas
a regu l a r dos
. onias que as grandes
ccnm re l igiosas têm por objeto sa t isfaze r, e a a lternâ n ci
são de or­ necessárias que corre spond _
dem pública, portanto social. A socied , na ori­
ade inteira está in­ tempos sagrados e dos tempos profanos. Como
teressada em que a colhe ita seja abun dante
. em que a gem, 0 culto tem por objeto, pelo n�enos .apare
nte' regu a­�
ri7ar 0 curso
chuva chegue a tempo e sem excesso, em
que os animais dos fenôm enos nanir a1s, o ntmo da v1. ?a cos­
se . rc 1�roduzam regularmente. Assim, é ela que �)or isso. a�
que, J·'
rit al.
figura em mica apôs sua marca no ritm? ela vida �
pnmell'O p lan o nas consciências; é ela que tempo , toram sazon ais; vunos

g _a c�md uw;. o que equiv ale a dizer que
domina e diri­
ela é, en tão ,
festas, durante muito
era esse o caráter cio lntichiuma australiano.
Mas as est�­
m.11::, viva, mais atuan te e, por conseguinte to exteri or dessa rga111-
, mais real do ções forneceram apenas o contex �
que cm tempo profano. Assim, os home sa; pois mes-
ns não se enga- zação, não o princípio sobre o qual ela repou
378 llS FORMAS ELE.111
!.\TARES DA l 70,l flELIG'!OSA

mo os cultos q u e visam fins exclusivamente espirituais \l 'ÍTl1LO Hl


permaneceram periódicos. Porrnnto, essa periodicidade
< > CULTO POSITIVO
r< i1111inuaçãoJ
deve-se a outras causas. Como as mudancas sazonais são
por natureza, épocas criticas, elas são urna ocasião narura i
de encontros e, por conseguinte, de cerimónias rel igiosas
Mas outros acon tecimen tos podiam desempenhar e efeti­
.

vamente desempenharam o papel ele causas ocasionais. É


preciso reconhecer, porém, que esse qu adro embora pu­
,

ramente exterior, clernonsu·ou uma singular força ele resis­


tência, pois encontramos sinais dele acé nas religiôes mais
afastadas de toda base física. M u itas das festJ.s criscãs li­
gam-se. sem �olução de continuidade, às festas 1x1scoris e
agrárias dos an tigos hebreus, embora, nelas mesmas, nada
mais tenham ele agrário nem de pastoril.
Esse ritmo, a l iás, é suscetível ele variar de f orma 1 se­

li
gundo as sociedades. Onde o período de dispersão é lon­
- Os ritos miméticos e o princípio de causalidade
go e a dispersão é extrema, o período de congregação é,
por sua vez. muito prolongado. Produzem-se, então, ver­
de ver não são
dadeiros abusos de vicia coletiva e religiosa. Festas suce­ Mas os proced i mentos que acabamos
dem-se a festas durante semanas ou meses, e a vida ritual empre gados para assegu rar a fecund idade ela es­
os únicos
É
mesm o objetivo,
atinge <1s vezes uma espécie de frcnesi. o caso das tri­ p<.·cie totêmica. T fá outros que servem ao
indo os
bos australiam1s e de várias sociedades elo Norte e cio No­
dentes , seja substi tu
�cja acompan hando os prece
- .

roeste americano'i<'. Em outros lugares, ao contráiio, essas


duas fases ela vicia social s uce dem-se a incervalos mais
próximos e o contraste entre elas é, então, menos acentua­
do. Quanto mais as sociedades se desenvolvem, menos
parecem se conte ntar com intervalos muito longos. Nas cerimônias mesmas que descrevemos, juncamen­
lc com as oblações, sangrentas ou outras, ritos diferentes
costumam ser celebrados para completa r os primeiros e
consolidar seus efeitos. Eles consistem em movimencos e
gricos que têm por objeco imitar, em suas diferentes aútu­
dcs ou cm seus diferentes aspectos, o animal cuja repro­
dução se deseja; por essa razão, chamamo-los mimélicos.
Assim o l n Lichiuma da Lagarta wiLcheuy, entre os
Arunta, não compree1.cle apenas os ritos realizados nas
rochas sagradas e dos quais falamos anterionneme. Quan­
do estes term inam , todos se põem a caminho de volta ao
AS FOIWAS EL
EME
.VT
ARE
SD'A VlD� RELJG'IOSA
" /11/\1 ll'AIS ATITUDES RJTUAIS
380
381

acampamento· m ª
• "
c:altan do cerca ele uma mi
·11la •• r r 1inam, todos sentam-se no chão ele mane i ra a for-
gar, a marcha é sus pensa e t d s se rname para che·
·· · s

me�ce, retomando a caminh ntam ritual­ 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 semicírculo voltado para o oficiante principal. Es-
adaºe � �
taçoes anu ncia m que u m · . seguKla. E:ssas omamen­ 11 dll'rnadamente, inclina-se acé o chão e levanta-se
'1 •m po rta nLe ce nm ôn nos joell1os; ao mesmo cempo, agita os braços
rea lizar. E de fato , enquan ia irá se
to o grupo escav . a ausen
11 11.1do
dos velhos que ficaram de te, um 1 1" ri didos, o que é uma forma ele representar as asas do
gu ari(1a no acamp

amento cons- 1 1 1 l ' ln. De tempo em cempo, ele se inclina por cima do
' m
tru iu um abr igo ele
agens, ongo e est
U.m bana, reito, cJlam ado 1 ,, 1 1 d o , i mit a n d o a maneira como a borboleta adeja cm
n
que representa a cri
seco.Todos os que par
sá l i da. d e �n�e
.emerge o m­ 1 1 1 1 1 1 < > das árvores onde põe seus ovos . T erm i na da essa
tici aram das
.
se reúnem perco do 1 ug · cerimonias anteri 1 1 1 1 1 nô 11 ia , recomeça uma outra num local diferente para
ar ponde essa, co ns�1çao - e ·
ores
da; depois avançam lentam io1 ergui- 1 1 11.!1 · todos vão em silêncio. Desta vez, empregam-se dois
ent
tc mpo, até chegarem no mbe, dete ndo-se de tempo em 1 1dos. !'\um dele::. são representados, por linhas em zi-
seguida, todos os q ue não _
U _ t:m:, n� q�al penetram. Em 1g ue , os traços da lagarta; no outro, círculos concên
�<10 a fr atn a re l a c ion ada l r h < >s, de dimensões des iguais, representam, uns, os ovos
11

totem da laga rta wit � ao


che tty qfue ass is
1 - tem, mas ele longe ' ll l i nse to, os outros, as sementes da sarça da qual ele se
<1 ce '
.
n a , deita m se no c
-
1ao, a ace contra o so
' e
. 1 o; deve m r l trncnta. Como na primeira cerimônia, todos sen tam- se
permanecer nessa posição
se mover, até qu e lhe::. se­ • 111 silêncio enquanto o oficiante se agita, imitando os
ja permitido levantar-�e. N�
ss�,�=io tempo, um
va-se do interior do Un1 b canro ele- 1rn1vimentos do animal quando deixa a crisálida e se es­
t:ma, comando as d'fi
pe las qu ais passa o ani ma J crentes fas li 1rça para levantar vôo.
l ao . go de seu desenv �s
memo e os mitos re ferente .- lon olvi- Spencer e Gillen assinalam ainda, entre os Arunta, al ­
s as 1 ochas sagracl· gr 1ns fatos aná logos , embora de menor importância. Por
esse' can to te rmi u.' . Q uan d o
na 0h Al a tun ia,.. 1· xe mplo , no lmichiuma da Ema, os ato res , num dado mo­
as.

agach ado ' sai do m ana e em bo ra pe rm ane


avança. f entamente no tcr
cen do
no que se estende de�fran re- mento, procuram reproduzir por sua atitude a aparência e
ce.
companheiros que reprod E seguido por todos os seus e > comportamento dessa ave•; num Intichiuma da água, as

zen
evi dcnte men Le represent:r � seus gestos_, cujo objeto é pessoas do totem emitem o grito caracte1ístico do maçari­
o i�seco ao sa1 r da crisálid
Aliás , um cama que se faz a. co, grito naturalmente associado nos espíritos ã estação
que e como um comentário ouvir n o m esmo .momen to e das chuvas'. Mas os casos de ritos miméticos obsetvados
oral clo i"rt� cons is

mente nu ma descriç te precisa­ por esses dois p esq u i sadores são pouco numerosos. É
ão dos m v •me · ntas que faz o ani ma l certo, porém, que o silêncio relativo deles acerca desse
nesse estágio de seu desenv
o1º · ento 1
v1m ponto decon-e ou de que não observaram suficientemente
Um outro Tntichiuma2 cel
·

outro tipo ele lagarta ' a., 1 aga ebr ad 0 .a propos1to de um os lntichiuma, ou de que negligenciaram esse aspecto das
rta unchalka3, [em esse car .
• .

ter de forma ainda mais � a- cerimônias. Schu lze, ao contrário , ficou impressionado
1 ara. Os atores do

tam com desenhos ue � rito se enfei­ com o caráter essencialmente mimético dos ritos arunta.
qu al essa l aga rt a vi n . �
P�ese n am a sar a unchal "Os corrobori sagrados, diz ele, são, na sua maior parte,
m1c1<? e e sua existê nci a ; dep a
� � ka n
eles cobrem um esc cerimônias represemativas de animais"; ele os ch a ma ani­
udo c c1r�cul?s. concêntricos de pe­
ois
mal ljurunga6, e seu testemunho é hoje confirmado pelos
nugem, que figuram uma
�� espeCJe de sarça na documentos reunidos por Strehlow. Nesse último aucor,
inseco adulto deposita seu qual o
s a% s . Quan do esses preparari- os exemplos são cão numerosos que é impossível citar to-
AS FORMAç ELE.HE.\TARES Orl 170.t Rl:IJGIOSA 383
382 1' l'N/.\C/Pllü A 77Tl'DC.\ Nl1Ulü

1 1 0s rílos. o arco íris é considera


dos: praticamente não há cerimônia cm que a lgu m gesto do intim amen te rclacio
111111auvo nao nos seja assina lado . Segundo J natureú dela e que sempre tem
1 e.los
totens cuja festa se celebra, salta-se à maneira dos cangu­
11•1do à chuva: diz-se que é o filho
pressa de aparecer para fazê- la ces �ar. Para �u: ela o � � -;a

, iir. é
rus, imitam-se os movimencos que eles fazem ao comer, o preci so, porta nto, que ele nao se moscre. Acred1ta­

·,l' obter esse resultado proceden


vôo das fo rmigas aladas, o ruído característico que faz o do da segu inte mane ira.

t \ccuta-sc num
morcego, o grito do peru selvagem , o da águia, o assobio escu do um dese nho que represc nta o ar-
.
da serpente, o coaxar da etc.7 Quando o totem é uma o à aldeia, tendo o cuidado de
10 í ris. Leva-se esse escud
res. Tem -se �erte za t�c
i,
r.

planta, faz-se o gesto de colhê-la11, ou de comê- la9, ele. 111anL ê-lo ocul lo a todos os olha
Entre os \Xfarramunga, o I ntichiuma apresenta, em qut:, ao torn a r invis ível essa imag em .do arco- 11 1s , ,º P��l­
geral , uma forma muito particular que prio a rco- ír i s _é impe dido de se
c.Jcscrev<..: remos no ma m festa r. N � � ssc �1�10
p1tc b1 c heio
.
próximo ca pítulo e que di fe re das que 'imos até agora. tendo a seu lado um
ivmpo, 0 c:hele do clà,
oes tlo�os de pen � 1 �c_m
No entanto, há nesse povo um caso típico de Intichium:.i d agua , lança cm todas as dircç _
ns. lmtt� ç�e� repcud,1s
puramente mimético: o d a ca ca t ua- bra nca . A cerimônia branca que representa m as nuve
que Spencer e Gillen descrevem começou às dez da noi­ dl) grito do maçarico d:m comp
letar a cenmc�nia, que pa
te. Durante a noite toda, o chefe do clà imitou o grito da uma gravi dade muito pa rticu lar, pois, enquanro
rcce ter
m, como aLOres ou como
ave com u ma monoLOnia desesperante. Só se detinha v i a dura, os que e.leia parti cipa
quando estava exausto, sendo, enrào, substituído por seu m ter nenh um contato com suas mu­
t!>sistenccs, não pode
Ihes12. .
filho; depois recomeçava, assim que se sentia um pouco lheres, não podem sequer falar-
s ele figura çao sao dt­
_ .

repousado. Esses exercícios estafantes prosseguiram até Entre os l)ieri , os proced imenm
a não por ág ua , mas por
de manh�i sem intcrrupção H> . il'rences. A chuv a é represen ta d
Os seres vivos não são os únicos que se procura imi­ r de suas veias sobre a as­
s,mgue que homens fazem corre
ta r. Num grande número de tribos, o l ntichiuma da chuva o, eles lança m punl1ac.los de
-.istência n Ao mesmo temp .
consiste essencialmente em ritos imitativos. Um dos mais ca, c.iue ::iirnb oliza as nuve ns. Anre ·� 1orme n�e '.
penugem bran
simples é o celebrado entre os Urabunna. O chefe do clã uma chou pana foi co ns tru ída
. Nela se depo s tta m du.is
senta-se no chão, todo ornamentado de penugem branca grandes pedras que re presc nta 11� acú m � los de nuve �s.

presságio de chuv a. Depois de


deixadas a 1 por algum tem­
cert? dis� ânc ' ª � ��l ca
e segurando nas mãos uma lança. Ele se agita de todas as
maneiras, certamente para soltar de seu corpo a penuge m po, elas são transportadas a �ma

. .
nele fixada e que, espalhada no ar, representa as nuvens. alto poss 1vcl da a rv o 1 e m,11s clcv,1da
as m!vens
das no ponto mais
maneira de � f zer
Assim ele imita os homens-nuvens do Alcheringa que, se­ que se puder encontra r: é uma _
gundo a lenda, tinham o hábito de subir ao céu para for­ gess o redu zida a po e lan­
�ubircm ao céu. U ma pedra de
ito da chuv a faz �
lo o
mar nuvens de que a chuva caía em seguida. Em uma pa­ çada n u m rio; vend o isso, o espír
l a vra , todo o rito tem por objeto figura r a formação e a as­ s , jo,·en s e \ clho s, r�u
de c-.ibeça ba ern , prec1p1-
,1parL' Ler ,1s n uven s. Enfim , tod o
:
censão das nuvens, portadoras de chuva " · nem-se em volta da choupana e,
Entre os Kaitish, a cerirnônia é bem mais complkada. ntamente por d t ro dela e
en
tam-se sobre ela; passam viole
recomeçam 0 movin .ento vária
Falamos, já, de um dos meios emp regados: o oficiante s vezes, até que, de toda a
derrama água sobre as ped ras sagra das e sobre si mesmo. mais de pé senão as vigas que a su­
construção, não resLe
Mas a ação dessa espécie de oblação é reforçada por ou- Então , la nçam -se conc ra estas últim as, sacodem-
portam.
38 1 AS FONMAS l.!LHAIENTA NHS DA l'llJA Rl?J,/ÇJOSA t\ l'l<ffl/CIPAIS A 'J'l' IVDES /UTllAIS 385

li
nas. arrancam-nas, até que tudo desah<:
defini tivamLnte. A
upcraçao q ue conMste cm atravessar a choup
ana de lado a
lado é destinada a representar as nuvens
Todos esses ritos são d o mesmo tipo. O princípio so­
chuva 11.
que se a brem , e
l 11v qual re pousam {; um dos que estão na base daq u il.o
o desabamento da construção, a queda da

q11L' com u me nte , e i mprop r ia mcntc 111 , chama-se magia


Nas tribos do Noroesre estu dada s por C lem
entl \ que
o

ocupam o território compreendido entre


os rios Fonescue .1 1npática.
e Fitzroy, são celebradas cerimônias que
têm exatamente Esses princípios se reduzem, em geral, a dois19.
o p rime iro pode ser assim e nu nciado: o que atinge
a mesma finalidade do l ntich iuma dos Arunta

nte m i méticas.
e que pare­
cem ser, na sua maior parte, essencia lme
11111 objeto atinge também tudo o que 111a11té111 com esse ob­
Ch' 1niam- se tarlow, entre esses povos, mo
.
ntes ele pe­ wtu uma relação de J>roxim idade 011 de solidariedade
11w/quer. Assim, o q ue afeta a pane a feta o todo; toda
dras ev1den temcn te sagradas, uma vez que, como
vere­
mos, são objeto de ritos importantes. Cada
anima l, cada 1 , .10 exercida sobre u m mdh 1<.luo transmite-se a seu:.. v1z1
planta , em suma, cada totem ou subtotem"'
1 1 1 t os a seus parentes, a toe.los os que lhe são solidários
do por um tarlow, que um clã detenninado
é representa­
por uma razão qualquer. Esses rnsos são si m ples apl i ca
.

P deve prote­
há entre esses \ oes da lei c.le contágio que v i mos anteriormente. Um es­
­

ger. Percebe-se facilm ente a analog ia que


tctrlow e as pedras sagrad as dos Arunta .
t . tdo. u m a quali d ad e boa ou má comunicam-se con tag10-
-se ra ros
Quand o os cangurus, por exemplo. tornam
� chefe do clã ao qua l pertence o tarlow dos cangurus di­
1 1nente de um sujeito a um outro que mantenha com o
pn meir o alguma relação.
,

ngc-s� a ele com u m certo número de seus co mpa n hei­ o segu ndo princípio se resu me geralmente a fonnu­
r o . Lá, executam-se diferen
_ ,

� tes ritos, consistindo os princi­ l.1 o semelhante produz o semelhante. A figu ração <l� u m
pais em saltar ao redor do tarlow, como
saltam os cangu­ �vr ou de u m estado produz esse ser ou esse estado. E es-
· 1 máxima que aplicam os ritos que acabam de ser descri­
rus, em beber como eles bebem, ou seja,
em imitar seus
movim entos mais característicos. As armas
que servem tos, e é nessa ocasião que se pode perceber melhor o que
para a caça do anima l desempenham um
papel importan­ 1 la tem de característico. O exemplo clássico do feitiço,
te nesses ritos. Elas são brandidas, lançad
as contra as pe­ t presentado geralmente como a aplicação típica do mes-
1 1 10 preceito , é bem menos significativo. No feitiço, com
.
dras, etc. Quand o se trata de emas, vai-se
ao tarlow da
ema; cami nha-se e corre-se como fazem
essas aves. A ha­ l ' fcito, h á , em g ran de parte, u m s i m pl e s fe nômen� . c.le
bili dade que demonstram os indígenas nessas
imitações é, 1 1 .i nsferência. A ic.léia da imagem é associada nos espmtos
ao que parece, notável.
.1 do modelo; daí os efeitos da ação exercida sobre a esta­
Outros tarlow são consagrados a planta
s, a sementes t ucLa se comunicarem contagiosame nte à pessoa cujos
d ca pim, por exemp lo . Nesse caso, imitam
� -se as opera­ 1 1.1cos ela re produ z. A i magem desempenha, em relação
ori g i nal , o papel da parte em relação ao todo: ela é um
çoes que servem para penei rar essas
sementes ou moê­
las. E como, n a v id a ord iná ria, as mulhe
,10
res é que normal­ 1gente de transmissão. Assim, acredita-se poder obter o
mente se encarregam dessas tarefas, são
elas também que mesmo resultado queimando os cabelos e.la pessoa que se
executam o rito em meio a cantos e da nças
.
quer atingir: a única diferença entre esses dois tip�s de
operação é que, numa, a comunicação se faz por meio da
�imilaric.lacle, na ou tra , por meio ela contigüidade. Aconte-
A\. FORMAS Ell111ENIARES DA
VllJA NllUG!O\/I
386
I f/!\1 11•1/S A TITUDES RIT/!AIS 387

ce algo diferente com os ritos que exa 11 1 1 11.ili;iu •>s de observa�� só a imagem ? d��cJa ; �u.� nt-��
1111 ( 1l 11>' · le na-0 existe lª que a nova gerJçao da espe
supôem apenas o dcsloca rrn.:nco minamos. E les nà11
. 1 us1-
.
de um estado ou de uma � • '

qualidade dados, que pass<im de h 111·111ica ainda não é senão uma esperança e, me
um objeto a outro, ma.,
�1 criaçao de algo inteiram
presen t a r o anima l dá orige m a
ente novo. O si mp les fato de re­ 1 1 1 11.1 esperança incerta. Não poderi� se º caso, P<:>r-
1 1 1 111 1 • li· assimil ação, crrônea ou não: ha �naçao
� -
imit ar o ruíd o do vento ou d a á
esse anim al e o cria; ao pr����-
_
�-
1 1 11 1 1 1 1 1 1 1· 1·... e na - o se f)ercebe de q u e maneira a assoc1aç.10
1 l1 h i . 1s poderia fazer acreditar nes�a cnaçao. . - eon:o ..
g ua que cai, faz-se com
que as nuvens se formem e se convert
am cm chuva, etc
. 1 . ,
Certamente a semelha nça desempe 111 , .,11np les fato de figurar os movimentos de um ani
nha
111 ti 1 •• 1tleria dar a certeza ele que esse anima ira reprodu-
um papel em am­ 1 ,
bos os casos, mas muito diferen
te. No feitico. ela apenas
.
impri me uma d ireção determ in a d v111 abundância?
a à ação exercida; orien­ 11
up 1·ied es
.•
ta num certo senlido uma eficacia
, •
que não provém dela. \.� p1 ad gl!rais da natureza hum:rna. n.1.- 0 s..:'
Nos ritos que exarnin.unos, a :-.emdha especi.us. . Portanto, ao i_ nves
mesm:.1 e diretamente eficaz. Assim, aoni,:a 1 11 • ' n11solidar o princípiotao
•' cxplic.1r praticas

- •• • •
é atuante por s1
sobre o qual elas repou_sam e
t i l111ma geral e abstrata, recoloqucmo-lo no_ meio mor.1
nições usuais, o que diferencia real contrário das defi­
"' q1 w faz parte e onde acabamos de observa-lo, u�amo-
men
da magi<1 di ta s impát i ca e as prática te os dois princípios
s correspondentes não
é q e <i cont igü idadc age
u num as e a semelha nça nou tras, 1 ' I • ' <'<> nj u nto de idéi as e de sentimentos dos qu a is ���
I • 1 . 1 1 1 os ritos em q u e ele se arlica e poderemos pe1ce-
mas sim que, nas primeiras, há s im ples comunic 1
1 i, 1 nidhor as c<1usas de que resulta.
tagiosa e, nas segundas, produção aç-Jo con­
t >s homens que se reúnem por ocas1ao de�s�s n t<:> s
e criaçãozo.
Explicar os ritos miméticos é, port ·- .

t • l l'lll realmente ser animais ou p lan t a s da espc c1 e CUJ?


gundo desses princípios e recipro anto, explicar o se­
1 üo nos deteremos mui
camente.
to tempo a discutir a expl ica­ 1 1 1 1 1 1 11 lem. El e s se sentem uma natureza vc?etal ou ani-
1 1 1 d " v da que constitu i , a seu ver, o que h<i de mais_ es-
<;ào proposta pela escola antroro lógica, Tylor e Fr.t%er em .
pa11icul<1r. Da mesma forma que ' li; i . i l e excelente neles. Um<i vez rcuni�os, portan to '.
' l i primeiro movimento deve ser o de afirmar uns a os
para explicar a contagio­
sidade do caráter sagrado, eles invocam
da associação de idéias. "A mag as propriedades
ia homcopátka - cJ1z Fm­ 1 11 1 1 1 1 1 l•sa" qualidade que se atribuem e pela qual se_defi-
zer, que rrefere essa expressão à 1 1 1 1 1 1 0 totem é o signo de congraçamento deles, e e por
1 •., 1 r:t%ao, como vimos, que e1 es o d csenlnm no corpo
se ia -se na associa<:ào de idéias por magia mimética - ba­
de
M i, 1 1 . 1 0 menos natural é buscare �1 assem e l har-;e � ,
mo a magi<1 co ntagi osa (contagious m i l ar id ade, assim co­
si
magic) na associação

ele.
1 1(,1 .,''ll S gestos ' seus gritos, sua atitude. Como sao em�s
de idéias por contigüidade. A mag
ia homeopática comete ·

o engano de tomar por idên tica 1 11 1 ' . 1 ngu ru s, comportar-se-ão, portanto, como an1ma1s
_ .
t I• ,,.s nom es . Deste 111odo, testemunham-se m ut u am ente
s coisas que se asseme­
l ha m " 21 . Mas isso é des
conhecer o caráter específico das
práticas cm questão. Por um lado q 1 1 1 ,,10 membros da mesma comunidade moral e toma m

, a fó
deri a a plica r-se , com algu ma con rmu la de Frnzer po­ • ' •1 1'1 iência do parentesco que os une . Esse par:nt sc , º
veniência, ao caso do �
i 1 1 • • 1 1 .10 se limita a exprimi-lo: ele o c�1a ou o recna.
feitir;o22. Neste, com efeito, duas cois . .
as distintas são assi­ o1s
miladas uma à outr.:1 em razão de acre­

sua semelhança parcial: 11111 Jarentesco que só <>xiste na medida em que s e
é a i magem e o modelo, o que ela _ A
t 1 1 1 i n le e todas essas demonstrações coleuvas tem l?°r
' f, 111 1 co �serva r as crenças sobre as quais repousa. Ass1m,
representa de maneira
mai s ou menos esq uem átic a. Mas
, nos ritos mim étic os
'Dl!S RffUA IS
I /.'/\< 11•,11.� ATITC
389
388 AS FORMAS ELE.lll!IVFARES DA \f/DA RELJGJ().\4

espíritos se vol-
. o qual todos os
os saltos, os gritos, os movimentos de todo ripo, a paren tl' 111• 111 . o objeuvo para 1 r' de convocá
la,
quer rc."1l iz'L
1 1 1 1 1 dl' Jrzer
mente bizarros e grotescos , têm, em realidade, uma sig111 a eoisa que se , 111-
n ec�s·· r· dade não
uma época

ficaçào humana e profunda. O a ustraliano busca assemt• ' Pl .1-laH . E essa


� é de
é esscr:-
\ daquela re ligião :
1. 1 "
ças cJest ou
lhar-se a seu totem assim como o fiel elas religi ões maii; ndc da s cren
. �
mesmo em rel
i giões mu1-
na. Ets po 1 qu:,
avançada s busca assemelhar-se a seu Deus. Para ambos, 1 i i l 1 1 wn 1e huma fiéis reuni dos para so-
trata-se ele um meio de comungar com o ser sagrado, isto ltkn: ntes eiª que
estu damos, os

.
desciam ar-
.
que
l t 11 1 1 de seus deu
o
é , com o ideal coletivo que este último simboliza. É u 1rn 1
li
ac ont ·ment
- c� s··' ·1 ' os a
figu rar essa
ses um
c� � � tacl
primeira forma cio oµoiromç -ccp 0EÇ>. , 1 , 11\l'mente ,
sao co ri10, que ne
eio
.
de cxpri1rn- la,
C 'I fala e tarnlJem , um m
1 , ,1 .1
, a-
nat u r.a \ ·. ele brota
Todavia, como essa primeira razão refere-se ao qu e ar o qu e a
es po ntan e
há de mais especial nas crenças lotêmicas, se el a fosse .• ' " '' n gest
o na-0 é me nos l a ou, em
. a ntecipa
fa
0, .rn c 1us1· ve se
à
1 1 11 llll' do orga
.
111sm
única, o princípio segundo o qual o semelhante produz o :
p,11 1ha .
ter so b revivido ao tote m i sm o 1 1 1 l<tso, •' aco m
. 11 rc
semelhante não deveria o esses
ende r ass i m corn
Mas ' se
s con1 cia que
eficá
Orn, talvez não haja rel igião em que não se verifiq ue m ri­ emo
a
pod
exp1· icar .
.· nô111a resta
tos que dele d erive m É preciso portanto que uma outra .111s cnu-ararn na
ce111
arm ente a
rra-' no os re et e regul
g
p
il w., e atribuída . Se o ausua
.
para o êx ito
- o, e ' qLJC OS JU l 1a ne ess " rios
razão tenha vindo acrescentar-se ã precedente. c á

De fato, as cerimô nias nas quais vimos esse princípio ' ul.i nova cs taça
. idéia de que, ao
pode ter v111 do a
ser aplicado não têm apenas o objetivo geral que acaba­
lhe
, I< 1 rito
. o n de
qLie ele se repr
D e . oduza?
· ve\ e n
ilme nte inte 1 1g1'
mos de mencionar, por mais essencial que seja: elas vi­ 1 1 1 1 . 1 r o a · m ai determ 11a -se
11 , .1
man.r fcsco e, c1·fic
·
m •

�' · o
S<lm também um objetivo mais próximo e mais conscien­ U m erro tão mate rial para o qual
.
te, que é assegu ra r a reprodução ela espécie wtêmica A o so, se vi . r no nto o olJj.euv que rena
q11.1nt ·1lém do efeito
. ;a � : nos-

; � t��e ; profun -
Mas
icléia dessa reprodução necessária está sempre presente p.11ece tend:r.. � erce urna ação
1 1hn: a especl(:: toten .
1�� ·
; dele
no espírito cios fiéis. é nela q ue se concentram as forças partici pam. Estes rec?­
dos _ 1:1. 1 uc
il.1 sobre a alma cuja s causas nao
e be m -e sta r
de sua atenção e de sua vontade. Ora, uma mesma preo­
.
unpr essa o d
r 1 hc cem u m a
rnas que e
cupação não pode dominar a tal ponto um grupo ele ho­
"" muito
1· ustificada . Eles
mens sem se exteri o riza r numa forma material. Como to­ c1,ararnente é salutar; e, cl,e
ele que a cerim A
l >l'rce 11em . lhes

onia -.
\l·rn 1e nc1 a essa espe-
, 1 Como é que
dos pensam no animal ou no vegetal de cujos dest inos o c o n s c · A
clã é solidário, é inevitável que esse pensamento comum 1 .110, nela refaz em seu ser n.1ora de que o rito
. ·
s.,cn t·me nto
' ic de eu t.ona
- o lhes dana o
t
na o ob1euvo
. .
venha se manifestar exteriormente por gestos, e os mais çou
e ha ser ' alcan
ll'VC exilo, -io1 o 1 , .
. c ue se un
nte l Jusca-
prop
1 . tr\
indi cados para tal função são aqu el es que representam
. ,o conscienteme
0 u n rco o 1ie
A •

-
esse a ni mal ou essa planta num de seus aspectos mais ca­ ' lsaclo? E lª que - ce as�e-
do é a reproduçao ela ixegacJos c.uia
ê , es t a pare
,
espéc ie tot mica m
� .

racterísticos, pois não há outros m ovimentos que se adap­ . ef·1cácia se vê assi


· s em
tem melhor à idéia que ocupa então as consciências, uma )•ura cla pelos rne1o ' e os hom
ens assa ra m a
deste mod� q. u
p
vez que são a tradução imediata e quase automática dessa ilL'monstrada. Foi ·mos virtudes.
criadoras.
vazio s por sr mes
idéia. Todos se esforçam, portanto, em i m ita r o animal; ,11nb . u1r a ge::.·t s ditar em su a

·
, ·eal fez acre
o
a moral cio �tt
o, q� e e

i\ . dicáci, . f' .
ca d a
.

gritam como ele; saltam como ele; reproduzem as cenas 1 .


todo na de
que e rmagrnan
� a , a ' do ' ,
d icac1 a 1s1ca ,
.
.

0s e
em que a pl anta é cotidianament e util izada. Todos esses s realm ente ute1s .
clam en1e fei to
procedimentos de figuração são meios de assinalar osten- isola
parte , tornada .
390 ,iç FORMAS t'lf!ML\7i1Rt;S DA l'l!Jrl RE1JGJOSl1 1\ l'IUSGJPAIS 11 TITC IJES RJT(/11 /S

LJ UC o conjun �o da ccrimônia produz são como uma justi­ il' ltTonlorto moral que a cclehraçào regular do culto pro-
�1ca�ao e�pcnmental d�1s práticas elementares c.le que ela 1 11 11 nona. Deste modo, criam uma predisposição a crer
q1w antecede as provas, que leva a inteligência
e feita, ainda que, em realidade, essas práticas de modo a p�� s� r
1 .. ,, cima
nenhum sejam indispensáveis ao sucesso. Aliás, o que da insuficiê ncia das razões lógicas e a se d1 nª1r,
prova bem que elas não agem por si mesmas é que po­ _
, 11110 que espontaneamente, ao encontro _e.las pro�os1çoes
• f l l \ ' se quer fazê-la aceitar. Esse precon
dem ser substit uídas por outras, de nawreza muito dife­ ceito fav�rav� I, es:
re� tc, sem que o resultad o final se modifique. Parece que ,,. impulso a crer, é precisameme o que constitu i a le. E e
1 lv que dá autoridade aos ritos ante o cre � tc: se1a ele
existem festas do Intichiu ma que compreendem apenas qu �I
oblaçõcs sem ritos miméticos; outras são puramente mi­ 1 1 11 cristão ou austral iano. Toda a supeno nc.lac.lc e.lo pn-
méticas e não compo rtam obla1;ões. Entreta nto, tanto 1 1w1ro consiste cm perceber melhor o processo psíquico
umas como as outras teriam a mesm;i eficácia. Assim, se 1 l t , qual resulta sua cren�·a; ele sab e que
··é a fe que s�tlva .. ._
se prezam essas diferentes manobras, não é por causa que a fe, num cerro scnuc.lo, e
1 1 11permeável à exreriê ncia"l·•. Se ()� fracassos 111term1
cJo É ror ter essa origem
v�llor intrínseco delas, mas por fazerem parte de um rito _ L�n­
austraha -
ll'� do Intichiuma não abalam
com f?lcxo cuja ulil iclacle global é sentida. a co n fi a nça que o
E tanto mais fácil compreendermos esse estado ele es­ 110 tem em seu rito, é porque e le se apega com todas as
pírito na medida cm que podemos observá-lo a nosso re forças de sua alma a essas práticas nas quais \'em se refa-
l'r periodicamente; portant o, ele não poderia negar
dor. Sobretudo nos povos e nos meios mais cultivados, en­ o
contram-se freqüemementc crentes que, embora tendo dú­ princípi o delas sem que disso resulta �se uma verdac.le � ra
1 wlturbação de toe.lo o seu ser que resiste. M�s, por
vidas sobre a eficácia especial que o dogma atribui a cada ma1�1.
, 1 1 1e seja essa força de resistência, ela não distingu e rad1-
rito considerado separada mente, continua m não obstante _
a praticar o culto. Eles não estão certos de que o detalhe 1 . r l mente a menlali clacle religiosa
das outras formas ela
das obse1vâ ncias rrescritas seja rncionalmcnte justificável, 11 1t·ntalidade humana , mesmo daquela s que mais costu-
mas sentem que lhes seria impossível libertar-se delas sem 1 1 1eiramcme se lhe opõem. Sob esse aspecto, a mentalida­
cair numa confusão moral diante da qual recuam. O fato dl' do cientist a não difere da rrccetlente, a não ser em
mesmo ele a fé Ler perdido neles suas raízes intelectuais •1.1us. Quando uma lei científica tem a seu favor a autori-
1 l . 1 c.le ele inúmeras e variadas experiê
põe, assim, cm evidência as razões profundas sobre as ncias, é contrário a to­
quais ela repousa. Eis por que as críticas fáceis que u m ra­ do método renunci ar facilmence a ela devido à descoberta
ci � nalismo simplista dirige às vezes às prescrições , es�r
dl' um fato que parece contradizê-l a . É preciso, a n�es_
m-
rituais
c!e1xa �1 cm ger� I o fiel indiferente: é que a verdadeira jus­ �1.:guro de que este fato não compor ta sen � o_ uma umca
ll ficaçao elas praticas religiosas não está nos fins aparentes 11.·rprctação e de que não é possível explica -lo sem aban­
que elas persegu em, mas na ação invisível que exercem donar a proposição que ele parece invalida r. º'.'1· ? a � s-
sobre as consciências, na maneira como afetam nosso ní­ 1 1 .Lliano não procede ele outra forma quando atnbtu o m­
vel mental. Assim também, quando os pregadores procu­ �ucesso de um lntichiu ma a algum malefício, ou a abun-
ram convencer, eles se clcclicam bem menos a estabelecer 1L111cia de uma colheita prematura a algum lntichiu1 m1 mís­
direta�ncnte � ror provas metódicas a verdade ele tal pro­ tico celebrado no além Ele tem ainda maiores motivos de
P_?S1_�ao particular ou a utilidade desta ou daquela obser­ nao duvidar de seu rito em função de um fato contrário.
vancia, do que a despertar ou a redespertar o sentimento p orque o valor desse rito é ou parece estabelecido por um
iA/S
1 J '/U,\UPA IS 1ITrtUIJl!S R/Tl
:393
392 AS" FORJIAS l:'IL.1/MTAH/iS T>A 1 '/T)A f(f:.1JGIOSA

lo
r m e que
considerável de fatos concorda ntcs Primei­ religiosos em que sL origi naeles 1

c
me ios
a .
110s
.
nli mc ro mais Qu an d o sao vrs-
-lo
mora l da u.:nrnônia e real e é dr reta ­
p l i
raml•nte. a eficácia 1. , º"' umcos capazes de ex soli tários,
á gicos
rncnt� ex pe rime ntada por Lodos que dela participam. Ela 11 , , 11110 obra de ind
,
ivíduos isolados, de m s pude­
eira e s p ír i tos hum ano
co n:;i u u1 uma experiência constantemente renovad:.1, cujo , r i u perguntar de que ma n vez que nad a, na ex­
-los; se:
tais ax iom as, u ma
' 1 1 1 1 ll'r a idéia de
I " t ll'nc:ia, er:.1 capaz
alcance nenhuma experiência contraditória vem diminuir
Além d isso, a própria eficácia física não deixa ele encont ra� de sugeri los nem de verificádo
-

l •l l 't11d o não se ex pl ica


como um a arte tão en gana po­
1-.i

d1· 'l impor, e por tan


nos dados da ob ervação objetiva uma confi rmação ao
;
">
to tempo, à confiança
�o� ho� en!> .
m�nos aparente. E noITTJa l, com efeito, que a espécie totê­
,1.1, 0 probl ema d<.:sa
a mag ra insp ira for
parece se a f(: que
m1ca se reprodu � regula rmente; tudo acontece, portanto, ge ra l, se � la
lar da fé religiosa em
�a grande genera lid ade do.s casos, como se os gestos ritua i.� q 11·11; 1s u m cas o p:1r ticu
o, ck u m a <.: ler :-
o, pel o menos ind iret
t r vcssi:m r�; i l mente produzido os efeitos esperados. Os 1 •11 1pri a for o produt magr a s11npall-
f�� c; 1ssos s� o a excc('ào . Como os ritos, sobrctuuo os c­ ' " l'IKl<l co ku
va . Vale dizer que o termo
1 , 1 para desig ar o con
p icas que acabamos de

de ser im próprio ! lá
. n junt o de prát
nó dr :os, nao pedem outra coisa à nacure:t..a a nào ser pros­ . rito s simpáticos,
s�gurr .seu surpreendente que, na maio­ , 11nmar, não deixa
" " ' ' l'les não são part
curso regular. não é i a; não som ente os cn­
iculares à ma g
r� a das vezes, esta dê a im p ressão de obedecer- lhes. As­
o tam bém é da rel igião que a
o, com
tanto, só pode l evar
' 1 1r11 ramos na reli giã
1 1 1 1g1a os recebeu . Por
sim, se acontece ao crente mostrar-se refrnt:.írio ;1 certas li­ a confusões p; ­
ções da experiência, é por se basear em outrds experiê ncias lhes dão , algo de espec1-

e que
mais demonstrat ivas O cientista não faz l·r fazer deles, pelo nom
l11 unente mágico
que lhe parecem . '' 1

outra coisa, apenas o faz com mais método. reforçar e


sa aná l ise vêm. ass im,
Os resultados de nos
Hu ss q u a n-
, e 1 n li nn ar aqu eles a que che
gar am b <.: rt e Mau

h 1 l'SLu a ra m din:tament
A _Ma� ia, portanto, n ã o é, como afirmou um Frazerzs, s t rara m que
. e a ma g ian El s mo
. e
fato pnmerro do qual a el ig ião seria tão-só uma forma de
r d ria g se
ro � i ra ,
1. 1 era alg o mu ito dis
tinl o de um a ind úst

nv� a . Muito pelo contrário, é sob a iníluência d e idéi<rs �
t
e m
ca ms os,
religi osas que se consrituíram os preceitos sobre os q uais
Por trá s dos m
a,
truncad a.
l l 1 11da c.la num a ciência
ap arência , que o m ág� co e rg
r i : � e
repousa a arte do mágico, e é somente por uma extensão 1 1 1 1 1 .tmente leigos cm s re l rg1o sa s,
cep çoe
um fundo de con
secundá ria que el es foram apl icados a rdaçõcs purn meme , lvs fizeram ver todo ia tomou em ­
_ cu j a idé ia a mag
!) eencle; por
as
leigas. Como todas as forças do u niverso foram concebi­ 1 1 1do um m u ne.lo de forç
Po em os ago ra com �
rgrosos : e que
l ll l'Sta cla da reli giã o.
d
p leta
' ( t il' ela está ass im
das .segundo o modelo das forças sagradas, a contagiosida­ l
_ , re de elementos e r
r l i ião.
d� inerente as s unda foi estendida às
eg s acr ­
primeiras e e
ditou-se que, em condiçõe det ITTJ i na a , 1<x.las as p ro ie­
s e ds pr 1•l 1 na sce da e g
u
dades dos corpos podiam se tra nsm itir comag io.s amentc.
Do mesmo modo, assim que o princípio segun o 0 d qual 0 lll
semelham� produz o semelhante se constituiu para satisfa­
zer �ece.ss1dades religiosas, el e sepa rou de suas origens
se
r � l icado nà<_> tem
de se e p
s a diretamente a te.0
acaba
p que
_
ntua1s parn rornar-se, por uma espécie de ge ner:.l l izacào \1as o p rincí ic -
.1 pl'nas um a funrão riw
al; i t ele n ere s
. Com fe to, trat
esponrâ �ea, u ma lei da natureza.!6. Mas parn compreen der enu nci a-
es ses ax iomas funclamenrais da magia é necessário recolo
a-se
e i de um
- 1 1.1 do con h cim nto
e e
-

39-1 li'. t/S .tTtn"nF.S R/'/l ,l/S


39:;
1 IU\<
AS FOR.11.1.\' Flldll�\71tR/iS DA t '/f)A R/f/1(;/(),\
t

do concrL'lO da lei de causaltdadc e, muito prmwdmt·n o wakan, o orenda, o princípio totl-mk�l, no­
dl\ l'rsos dados a força coleliva, objeti
m 1.
te, um dos enunc.i:.ldos mais pnm1li,·os que ex1stmun. vada e proiet.ac.la
da u m a conce�çã <? da reh1çào causal está implicada lo no 1 t 1 11s.1s.lll. O primei ro poder que os homen s conce_bcram
poder assun atnbu1do ao scmelhanlC' de produzir seu Sl' rn 1 1 ti p a rece ter sido, pon.an to, aq u e l e que a scx-1�dade
melh�1!1tc; e essa concepçào domina o pensamento 1 " ' sobre seus membros. O racioc ínio vem confirmar
t 1v� . J� ql.IC serve de base l<tnto às práticas do culto primi
quan· , 11 ,.1111ado da obser va�·âo ; é possív el, com efciro , esta­
to a tecrnca do mágic o. As origens do preceito i 1 1 1 1 por que essa noç:io de pcxler, de eíic-.ícia, c.lc
força
1i ob rc 0
qual repousam os ritos miméticos séio, pona nto, capazes 1 1 t 1 11111 . n:Jo pode ter vindo de uma ouu-a fonte .
de escl arecer as. do princípio de causalidade. A gêncse de . por !º-
1 1 1 1 p ri mei ro lugar, é evidente e rcconhec1c.lo .
um eleve nos <quclar a com p reend e r a gênese do outrci . q 1 11• via nã o poderia nos ser fornec ida
pe� a expenen�
1 1 1 , xtl'rna . Os senlic.los so nos fazem
1
Ora, arn ha mo:s de mostrar que o primeiro é um prod ver fenomenos ' . que
istvm ou se suc.:ede1n, 111,l/i nada do quc l'les pcrce
uto
1
ele e<�usa� sona 1s: . fora
.
m grupos que o L'labornram Lendo ­
em v1sia 1111 � co letivos, e o que de traduz são sentimentos ( 11 1 1 1 pode nos da r a ic.léia dessa ação conslm � ng dora e de­
co l eti: v os. 1 od e-se , porta nto . presu mir que 0 mesm 1 1 1 1 11,1ntc que é característica do que
denommamos um

acomccc com o seg u ndo. o h

prnli•i ou uma for�-a . O s sentid os alcanç am estados rea­


h 11 li >s. adquiridos, exteriores uns
Basta. com efeito, analisar o princípio de causalicfade aos outros ; o processo
para v�rificar que os diversos elcmenros de que é C"om­ 111t1•1 1111 que liga esses estado s lhes esca� a. Nada d_? que
posto tem efetiv . amente essa c;nr-nos a .1de1a do
origem. 1 11 ., nos inform am seria capaz de su g
? que em _primeiro lugar está implicado na noção ele 1 111, ,. uma influência ou uma eficácia.
E pr�cisamentc p�r
relaçao .caus�I e a idéia de eficácia. de poder prcxluwr. de viram nes.�a.:' d1-
fo�ç-J <111\a. Fm cn<lc-se comumenw por
"· ' 1,1zao que os filóso fos do empir ismo
h l l llles concepções um monte de aben-a
l
causa o que çõcs m11olog1c-..L�.
paz de produzir. uma mudança deienninada. \ causaé éca­a flli mesmo supondo qul' cm tudo isso há ap.cnas aluci-
força am_es que renha manifestado o poder que e:;iü nela: 1 1 1 • ll ·s, é preciso ainda explic ar como
elas sur�m1m.
o efeno . e o mesmo poder, mas atual s
izado. A huma nidade
sempre se representou a causalidade em termos din<lrn se a experiência externa não conta na gencse dessa se-
1, 11 1•1s e se, por ou tr o lado, é inadm issíve l que elas nos
C�)S. Ccnam � nte algun s �-i l óso�os n.:cusam a essa concep­

1 . 1 1 1 1 dad a s inteir amen te pront as, deve-
se sup�r que nos
çao qualq �1t.;i valor objetivo; veem nela falo, a noc;: 1 0 de fo1.ça
_ arb1lr:_1 1'ia d a i maginaçéio que apenas uma cons­ , 1 1 1 i a m da ex pe ri ência interio r. De
truçao não correspo nderia a , ,1.1 manif cstam eme c a rrega d a de eleme ntos esp1r.1tua1s
' I ' "' só podem ter sido tomados de nossa
nada nas coisas . . Mas não precisamos nos pergu ntar, de vida psíquica .
momento, se ela tem fundamento ou não na realidade: n c i a que o ato pelo qu a l
/\cred itou-s e com fre q ü ê
basta-nos c.:onMatar que ela existe, que ela constitui ração, contém nossas
11. ,ssa vontade encerra uma delibe
�empre consutuiu um elemento cb mentalidade comum,
e
ln• l i a�·õcs e comanda nossos órgão
s. podia servir de mo­
e o q�e .recc?nhecem aqueles mesmos que a criticam. Nos­ L n
voliçà o, dizem , aprecndemo-
dc•lo a essa construção. Na
"? ob1et1v o 11nediato é saber nao que ela pode valer lo­
o dir a
1 1 1 1s et men t como
e u m poder em aro. Pon.anto, a par-
g1cameme. mas como se explica. teve essa
homem ele �ó idéia,
1 11 do momento e m que o
J •l l'l'isou, parece, estend
O ra . ela depende de causas sociais. A para o c ce llo
que on
Jª nos permitiu mostrar que o protótipo
análise dos fatos ê-la às coisas
..
da idéia de forca , 1, t r�·a se constituísse.
o
396 AS FORMA S' ELF1/
/JNTA Rfü n11 1 'l/"1 NELJ(,/0
�11 1 / 'l.t,\< ll'AJ� A T!711{)f;S N!TUA!S 397
Enquanto a teoria
ani mista era Lida
1 I< ' ,,zi:;m css.1 , d 'p b condiç:io são a.� que provêm ela
dcmon..,Lrada. ess por um a verdade
a expl icaç<io po
dia pa nxer confi
11 1 . 1 co1eu·v•as · Com efeito ' elas sao,
pela história. , e as rmada
forç-dS com que o m com um: as . torças
pensamento hu ma
l '• H 1111i 'ado, mteir.1 ,
1 _t ,
pri mit iva me nte po
voou o mundo tive no
. . , mente ps1qu1cas,, . sao e"1 ms
- i,. . exclusiva-
1 i11 1 1 1 1 · <1 e 1. cle
ssem sido rea lme .
espíriLos, isto é, ser
es pessoa is e c.:on
nte
� �"as· e de sen u. mcnros obi·etivados. Mas, por
' 1 1 1 1 1 1 l a do, sao im
scientcs, m ais ou . . , ..
nos sem elh antes me­
ao ho me m, poder pes : oa or de finição, por se re m o
íamos acreditar, s
l ''"d11to de um,a cooperaçao. Obia
to, qu e nossa ex de fa­ �s P · ele todos • não pe
pe riê nc ia ind ivi nc n-
du al foi .suficiente
. 1ar. Ader
for ne cer os ele me para . .
nto s co nst itut ivo 1 1 1 .1 nmguem ., em particu . c m t'io
' pouco à perso-
J\las sabemos que s da noção de for . . .
as primeiras forn1s ça. · ·tos
11 t l 1d.1dc dos. suiei nos quais r�s·dem 1 que neles iamais
que os homens ima
1'<)ra• estão

ginamm são , ao ­
·

<·ontr.J rio, potên ' l l \,11n. Assim


" como os penetram desde " sem-
cias anô nim as, vag
J '" prontas a separn r-se, t1 e,, e
fusas, qu e se ass as, di­
emdham por sua Tendem csponwneamence
nc>V<>s
im pessoa lidade às
1 , ,palhar-se mai·s longe e a mv,- 1d1' 1·
ças cósmicas e que for­ �.
contrasta m. porta dommios. Nau
h 1 1111lra.s, .sa1 )e nos
nto. da maneira ma
. cu .
detmida, com e.s.'> b
·

i . · -.
e poder em ine nte " Ue Sl .
'Jam ma
. is . nttgiosas e consi:-
mente pessoal qu
q11n 1IL'men[,
. ,
vontade hu ma na. .. e é a
e, ina is comu111cave1s. C
• • •

As. ,im , é impossíve laro que as forc-dS físi-


·

i , 1 1..m a mes1
l que elas tenham
. . n·1
. . .
,.. o podemos ter d1re-
do conc.:cbidas �1 si­
im agem desta últi
ma . . : propnedade, mas. . na
. .
A l iCts, há um cariíte
r essencial das for 1 i11 i1·nte consciencta delas, não_ Poclemos sequer apreen-
que seria inexplicáve
l nessa hipótese:
ças imp cs<; oai s <>
, ,, l.1s como t ª '· ·5 . porque nos s a cxLeriores · Quando de-
sua
1 •.110 t.o 111 um obstáculo, expenm enro urn·i' sensaç- ào d e
de. As forç;:is da com unica bilic la­ .
·

nat ureza sempre .


,.
foram concebidas
� 0< 1o,. m.i:-. " que causa essa
suscetíveis de pas como .
sar de um objeto t 111s1mng1mento e mcom a forra
. -
·

a outro, de se mis
n0 obstáculo e por con-
l
de se combinar, turar,
o não está em m i m, es

'""·1<·à
de M:: trnnsforrnar
urnas nas outms. ta ' . '
··qumce. esta , �oia
. cio círcu I o de m 1n ha "' o. Pcrce-
• pcrcep r ã
clu sive essa pro É in­ .
priedade qu e lhe
s dá seu valor exp
i · dela
. • mas . nela mesma.
.,1 atingimos
vo , pob é graças lica ti­
.
a ela que os ef eito l 11·rnos os ef·e·tos nao
s podem ser liga
suas causas sem dos a
· _

soJu�·ão de con lin 1111 .is forças sociais acontece a lgo diferente: elas la7em
uidade. Ora, o eu
1 • l ltl' de nossa vida interior e, i:ortan to, não conhecemos
um car áce r pre cis tem
am en te oposto:
ele é inc om un icá
os prod utos de sua ' acao·. vemo- 1as- ,.1g1r. A força
Não pcxle mu da ve l. .
r de substrato, est
ender-se de um ·••llK_·nte
• 1 1 l 1so1a o se . 'r sagrado
só se com unica po a oucro,
r metáfom. A ma
ne ira pela qu al ele 1 . '
e mamem , os profanos à distância
' nesse
,
1 1.10 esta, em re·iltdacle
cide e execurn sua de­
• ·

s decisões não po ·. ser.. e la existe na consc1cn-


. •

deria, po rta nto , nos


ie1s.
t1 os f., estes a scn l'-'
' "11 no momento mesmo
sugerir a iclt:ia de
,11 .
• .

unrn energia que · Assun


.�e comunica, que
1 ·111
de mesmo se con po­
· ·

fun dir com outras que eIa ,.1ge ·sobre sua vontac1e Par
·• t inibir certos rnov1-
·

e, por essas comb


' palavra ' essa açao
ções e misruras, ina­
dar origem a efe . 1 1 1l·ntos ou c·omanclar outros. Em u m·i
.

icos novos .
Assim, a idéia de
força, tal como a 1 1 1nstrangedora e exigente.. q u e nos escapa quando vem
imp l ica o concei
'
dt · urna coisa exterior ()Crce 1Jcm 0- l i
de relar:.to causal to
, deve apre.'>entar · a q u i nitidamente,
·

um du plo caráte
i '' irque e1� ••c.onte -
primeiro lugar, só r. Em

pode nos vir de >ce inteiramente cm nos. Claro


' que nem
nossa experiência .
a mterpret,1 mos. 1 . maneira adequada, mas, pelo
rior; as ún icas for inte­ �1 · mpre
.e
ças que podemo
s diretamente atin .e �
1 1 il·nos, na0 podemos cl e L «
' l l le· ter consciência dela .
necessa riamente gir são
for�-as morais Ma -
. s, ao mesmo tem .
Alérn do mais, a i·c1 , ·. de forca traz de maneira ev1-
preciso que elas po, é
sejam impessoais,
po­
·

der impessoal foi


a primeira a se co
já que a noção de
nstiLuir. Ora, as úni


1knte, a marc-d de sua 0r m Ela lmplic- a idéia de poder �
vez, g se aco1
' npan h't das
cas
que, por sua sempre ' de autorida-
·
396 AS FO/lllAS F/Ellli.\TARES DA 1·mr1 HEJJCIOS/I i f'N/\<.'/PA!!> ATITInm Rl7VA!S
397

Enquanto a teoria anim ista era tida por uma


1 1,
m e.la
verdadl· Ili t.tzcm essa cluph condiçüo o;ão a'i que provê
id.i l
o;
tlemon'>tratla essa explicaçàu podia parece , elas �ao,
pela história. Se as forças com que o pensamento
r <.:unfimiatla ' ll 1 comu m: as torças coleuvas. Com deito
I
1va-
humano "' 11111 lado, inteiramente psíquicas, �ão_ feitas cxclus
primitivameme povoou o mundo tivessem sido obieu vados . Mas, por
realmeme 1111 nll' de idéias e de sentim entos
espíriLos, i sLU é, M.:rcs pessoais e conscientes · serem o
, mais ou me­ 1 11 11 1 < > lado, são impessoais por defini ção, po �
nos semelhantes ao home m, poderíamos
acreditar, de fa­ l '' "duto de uma coopei:ação. Obra de t
?'1
os, n�c \ perten =
fi c ic me para 1 , 111 ,1 ningué
pouco a pers�
to, que nossa exper iência indivi dual foi su m tao
m em particu lar. Adere
de f o rça
fornecer os eleme ntos cons t i t u t i vos da noção le 1ama1s
Mas sabemos que as primeiras f orças que
. 1 1 did.ide dos sujeitos nos quais residem que ne :
11, l t xa m . Assim como
17i na ra m são, ao comrário, poLências
os homens in.;a- os penetr am desde fora, estao sem-

1 , , , prontas a separar-se dele�


. Tendem es pont<111�a 1�1e�te
Nct�>
anônimas, vagas, e.l i
l usas, que se assem elham por sua i m pessoa . �'º.m.1 11:0�.
.1 s e, con�c
1 1·�pa lhar-se mais longe e � 1 nvac.l�r nov�s
s
lidade às for­
1 1 11utras, sabemos, c 1
ç·as cósmicas e q u e contrastam, ronam g o
o, e.la maneira mais nt 1
o que :is forças �1s:-
que M.:pm mais o .

, 1 1 1, mementc, mais comunicáveis. Cla!


tlcfinida, com esse pcxler eminentemente .
chrc-
pessoal que é a
vontade human a. Assim, é i mposs ível que elas nao podem os ter
tenham si­ ' 1 têm a mesma propriedade , mas
1 l l l \l'nte con sciê ncia delas, não podemos
do concebidas à imagem dest:i última . sequer apreen­

di 1.is como tais, porque nos sào exteri


Aliás, há um caráter essencial das forças impes ores. Quand�) de­
soa is
que seria inexplicável nessa hipótese: sua comu
nicabilida­ i '· " º co m um obstá culo. experiment
o uma se sa�ao de �
de . As forças da natureza sempre foram conce c,1usa essa
suscetíveis de passar de um objeto a outro, de
bidas como , , ,11strangimento e incômodo; mas a força que
ulo e por con­
se misturar, M·llsacào não está em mim, está no obstác �
de se combinar, tlc se transformar umas nas Perce-
outras. É in­ ·• 'l'lltnte . está fora do círculo de minha perce rx;ao.
clusive essa propriedade que lh<.:s dá seu valor · atingi mos nela m�sm a.
ex pl ica ti ­ , ,,., 1105 os efeito s dela, mas não a
vo, pois é graças a ela que os efeitos podem nte:: elas fazem
ser ligados a , ,111 as forcas sociais acontece algo difere
p.irtc de nossa
suas causas sem solução de continuidade nào co� hecemo<;
:
vemo-las ag!r. � �or�a
. Ora, o eu tem vida interio r e, portan to.
um caráte r precis amen te oposto: ele é incom
a ,chsta.�� 1a
unicá vel. .C11 11ente os produws de sua ação:
Não pode mudar de substrato, estender-se de
um a outro q11v isola 0 ser sagrado e mant(•m os pro anos :
ira pela qual ele ele� em realida de,
só se comunica por metáfora. A mane existe na c;onse 1en­
cidc e execuLa suas decisões nào poder
11,10 está, nesse ser: e l a
ia, portanlo nos 1,1 dos fiéis. Assim estes a sentem no momecertosnto mesm ?

'
sugerir a icléia de uma energia que se comun
_ .
de mesmo se conf uncllf com outras e,
ica, q u po­ 1 111 que ela age sobre sua vontad
.
e para inibir mo�1-
a, essa açao
ções e mis Lu ras , e.lar origem a efeitos novos.
por essas combina­ palavr
q�1 � nclo vem
11 1l'ntos ou comandar out ros t::m uma
, 1 1nstrangedora e exigente que nos cscap�
Assim, a idéi�t de força, tal como a implica o bemo -la aqui muda mente ,
Ch'.ro que nem
conceiLo or, perce
1 , >rque ela acontece inteira mente . cm nós.
dv uma coisa exteri
caráter fm
de relação causal, deve apresentar um duplo
pri me iro lugar, só pode nos vir de nossa �
experiência ince­ 1·mpre a interpretam os de maneira ade ac a. mas, pel o
��
rior; as única1> forças que podemos diretamente dei � .
a ne1ra cv1-
atingi r são llll'nos, não podemos deixar de ter consoencta .
nec�ssariamente fo rças morais. Mas, ao mesm
o tempo, é Além do mais, a idéia de força traz, d � �
nOÇ<io de po­
preciso que elas sejam impessoais, já que a de �ler
dl'nte, a marca de sua origem. Ela implica a idem
der impessoal foi a primeira a se constituir. anha das de autonda-
Ora, as únic-as que, por sua vez, sempr e se acomp
398 '1\' FOR.IUS LLFllE\7AR�
I /)A 11/hl RLLIGIOSA I'>'/\(/!'AIS A 77TI /)/�� 1un.t11s

cl� . uomínio, dominação e, com: lativamente , ele depen t ll rm i n t o estado conse cutivo C h a m a
. st• o pri � eiro
� le nc1a e suhorc.l inaçào ; ora, as relações <.JUe todas essas J LllZ<> a l i rnrn a ex1sten-
1 111�.1. 0 segund
. .

o efeito, e o causa l

1 l 1 dv u m vínculo necessário entre esses


_
1de1as exprimem são eminen tement e sociais. Foi a dois momentos

li• t o da forca. Essa relaçã o, o espírito coloc


socie­
dade que classificou os seres cm superiores
e em inferio­ a, antes de
res. cm . mestres que comandam e em súditos
que obede­ sob o clomin io de uma espéci e ele coerção
111.d quer prova.
1 1 qual ele n;io podc se libertar; ele a postul a, como
c:m; foi ela que conferiu aos primei ros es se
sa propriedade
constitui o po­ i lil, " priori. .
-.111gular que torna o comando eficaz e que
dei: Tudo tende, portanto, a provar que os primeir
.

, o empmsmo
Desse apriorismo e dessa necessidade
��s d� �ue o c pírito human o teve noção s
� _ ª
os pode­
quclcs que 1 1 1 11.11s conseguiu clar coma. jamais os fi�l sofos d:ssa es�t - �
l 1 1 H 1 deram expl ic
as SO(lcd . . _?� . 1de1as rcfrn ·
ades mst1tuw..1m ao se organizar: e a imagem a r como uma assoc1 açao de
cJe­
l �s que as rorças do mundo físico foram conceb
idas. As­ produ zir outra coisa que um csta­
sim, o homem �ó rtlde chegar :1 se concdler
, 11 t,1 pelo habito podia
ilt • ,fL espera, uma prcdisposi�ao mais ou
como uma mt.nos foi:'-t. d.1s

l1 f.>1,1s a se
.
força que domin a o corpo onde ela reside,
com a condi­ evoca rem segun do uma ordem determinada

< 11,1 0 princípio ele causalidade tem um


ção de i ntroduzir. na idéia que fazia de si próprio caráte r muito dife­
, concei ­
tos L?�1adc�s da vida social. Era preciso, com
i t • n t e . Não é s i m p lesme nte uma tendência
efeito que ele imane nte .de
se d1su ngu 1sse de seu duplo rísico e se atrihuís a se desen rolar de uma cerca manei ra;
se cm rela­ 1 1 1 isso pensa mento
<c·ão a este último , uma espécie de dignidade
p
su erior; em , 1 1 111a norma exterior e superior no curso
de nossas repre­

·• 111 i ções, que ela domin


uma palavra, era preciso que se rensasse como a e regula impern tivame ntc. Essa
De fato, foi exatamente sob a forma da alma
uma alma.
que ele sem­
_ .

que submete e u l tra-


º. s�u <� uwr._ Sob
1 1 1 11 11rn é investi da de uma autorid ade
pre se representou �1 força que acredita ser.
Mas sabemos 1 ,.1.,sa o espírito; ou seja, o espírito não é
que a alma é algo bem diferente de u m nome nada adiant a substi tuir o habito md1v1d ual
dado ã fa­ t • .v aspecto, de

pdt> hábito hereditário. pois o hábito não muda d:


culdade abstrata de se mover. de pensar ou na tu rc-
de senrir· é
ames de tudo, u � pnn cípio rehg1 oso, um aspecto
lar da força coletiva. Em suma, o homem se

parci u� 1.,1 por durar mais q u e uma vida huma na: ele e apena s

sente uma al­ 111.11s forte. Um instin to não é uma regra.


ma e, pclrtanto, uma força, porque é um em entre­
ser social . Embo­ Os r itos que acabam ele ser escudados pern1it
ra o animal mova seus memb ros
como nós, embora tenha te pouco suspei tada dessa au-
a lei causal
" 1 uma fonte, até o presen
a n�esma ação que nós sobre seus músculos,
nada nos au­ Lembr emos, como nasceu
,

tonza a s up or que Lenha consciC:ncia de si


1 1 11 idad e. com efeito,
, 11 ll' os ritos imitativos pôem cm prática. Sob
mesmo como o domíni� �e
um.a causa ativa e eficaz. É que ele não cem, pação o gnipo se reúne: se a cspec1e
ou, para dizer 1 1 111a mesma preocu
mais exacamence, é que não se atribui alma .
Mas se não se dá o nome não se reprod uz. o clã está perdido. O
111t lhe
aLribui alma. é porque não partici pa de uma os seus m� m-
,:ida social , ntimento comum que anima assim todos
co� 1parávcl à cios homen s. Náo existe nada.
entre os ani­ 1 1.,-; se traduz exterio rmente na fomia de gestos cletennma­
mais, que se assemelhe a uma civil izaçào.!9. mesmas circu ns-
. tn-., q ue sempre retornam idênticos nas
1 . i ncias, e, uma vez re; il izada a ccrimônia,
Mas a noção de força não é todo o princípio
ele cau­ verifica-se, p� las
�a :�ce obudo
.
salidad e. Este consiste num juízo q u e enunc d sej a do .
a
ia q u e toda 1 , 1 1.oes expos tas, que '' resulta do e
força se desenvolve de m a neira definida, q u e
o estado em Forma-se, po1tanto, uma associação enu·e
a 1 de1 desse 1�c­
que ela se encontra cm cada momento de seu e essa assoc1acao
devir pre- ,111t ado e a elos gestos que o precedem;
tfOO AS FO!llU'i EU�\flc\T;IRHS DA l WA R/il/(110\A l IU.\c lf',l/S A17TlDFS R/'/"IA/S
101

não \'a ria (.k: um sujeito a ou Lro: é a me!>ma para lodos 0� s afasta-se das dou ui-
1 1. ·1 m·1 is geral d:ts ca tegoria
atores do rno. por !>er o prod uw tk: urna experiênua cole­ 11 , J.1s.'>1<.:as sobre a qucsL.10, embora
111
con ciliando a!>. Jun
1
t iv� . T<xlavia, se nenh um ouLro faLor i nlervics.se, prcxluzir­

t 11m 1t1l' com o aprio rismo


. ela manLém o car.íter anterior
111·1 l'ssari o da rel ação causa
se-ra apenas um esta do colelivo de espera. EfeLUados os l, mas não se limita a afirmá­
gestos mi méllcos, wdos esperariam , com maior ou me nor I • , , l.1 o expli ca, sem no entan to fazê-lo desaparecer sob
confi a n<, a , ' c r m a n i festar-se cm breve o acontecimento o empirisn:o. Alér�� d i�­
· I " ' lv\to de expli cá-lo , como foz
desejado, mas nem por isso uma regra i mperativa do pen­ ' ' • 11.10 se poderia negar
a parte que cabe a expenenc1a
indiví duo
samento se constiLuiria. Comudo, como um in1eresse so­ " ' " " 1dual. Não há dúvida que, por si mesmo, o
enos e adqu ire as-
, , 111�1.n a sucessôcs regul ares de fenôm
Só que essa se11-
cial de primdra importância está cm jogo, a sociedade não
1 1 1 1 1 11 11:1 certa se11sa çào
. A prime ira C: intl
pode deixar as coisas seguirem sua marcha ao sabor das de regu larida de.
circunstâncias; portamo, ela intcrvl:m ai ivamcntc de modo (: a caleR uria de causa lidade !
a regu la r c<>sa mard1a de acordo com suas necessidades. 1, 1 1 1 , a l , !-. ubjc l iva , incom unic:ú vcl;
i11 r10 11<10
nós mes mos a pr:>duza -
Exig� que essa ccrimônia, da qual não pode se privar, seja 1 1 11 ,� com nossa s oçbserv a ôes pe .
sso ai s A segu n da e obra


repe ida sempre que necessário e, por conseguinte, q ue os t l. 1 1 oletividadc, nos é dada jú pronta. Trata-se de um qua­
d 1 1 , no qua l vêm se dispor nossas
m o v i mentos, con d içã o do sucesso, !-.ejam regularmente constatações empíricas
exec utados : da os impõe obrigatoria mente. Ora. esses rno­ l. , 1 ue nos perm ite pensá -las. isto é, \'ê-las de um jeito pe­

� � �
vi me t< s ii 1 p lica m uma atitude definida do espírito que. (,, qual podemos nos entender a
respe i to delas com ou�
_
por via indireta, participa do mesmo car.íter de obriga�1 o. 1 1 1 111 . Claro que, se o quad ro se aplic a ao contc utlo, e
com a maté ria que con­
Prescrc\·er que se deve i mitar o a n imal ou a planta para fa­ porque não deixa de Ler relação

z -l os reproduzi r-se é colocar como um ax iom a, d o q ua l " ·m mas não se confunde com
ela. Ele a u l lrapa ssa e a
le!-. re­
uma ouLra orige m. Não é um simp
nao se deve du v ida r, que o semelhante produz o seme ­ clorm na. Possui
: é feito, antes de tudo.
lhante. A opinião pública não pode permitir que os indiví­ sumo de rccnrclaçôes indiv iduais
da vida em comu n .
d ��s neguem teoricamente esse princ1p10, sem lhes per­ p.1ra responder a exigências �
rrnur ao mesmo Lempo q u e o v i o l e m em s u a conduLa. , o erro do e mp ir is mo foi ver no vincu lo cau-
Em suma
do pensa memo cs­
Portanto, ela o impõe juntamente com as práticas que de .. 1 1 , 1 penas uma construçào engenhosa
le derivam e, assim, o preceito ri tua l é acom panhad o ele

c.lc uma gene raliza ção �mtis ou me-


pl'cu lativo e o produto
um preceito lógico, que não é semlo o aspecto inteleu ual Ora,
_
por si só, a pura cspcc ulaçao nao pode
1 1os metó dica.
d o primeiro. /\ a u Loridade d e <1ml>os deriva d a mesma sórias , hipot éticas , mais
t L 1 r origc m senão a noçües provi
manti das
fonte, a socicdacle. O respeito que esta inspirn t ransmi te-se 1 11 1 menos plausíveis, mas que devem semp re ser

..,< 1h suspciLa, pois não se sabe se,


tanto às 1�anei1 1s de pensar como às manciras de agir quc no futuro, alguma ohs� 1­
: :
s Um axioma que o esp m-
ela valoriza. Nao se pode afastar-se destas nem da quelas ' .lc:lo nova não virú inva lid á-la
.

sem se de para r com as resistências da opi ni:1o pública. Eis 1 , .1c:eica e é obrigado a aceitar. c;em con
trole e sem reser­
s dessa fonte. Some nte as
por q ue as primciras exigem. antes de q u alquer exame, a ' as, não poderia , portanto. \'ir-no
1tl·ccs..-;idade!-. da aç-.io, sobre tudo da ação coletiva, podem
adesão da i nte li gência . assim como as segundas determi­
nam imediatamente a submissão da vontade. v deve m se expri mir 1 m fórmu las categóricas, percmptó ria_s
l' taxativas, que não admitem co
ntradiçã o, pois os movr­
síve is se concertados, portanto
Pode-se \'erificar mais uma vez, com esse exemplo,
como uma teoria sociol ógi ca da noção de causalidade e. mcnLos coletivos só são pos
--

402 .4.S FOR.1/A!> liUiJf/1\TARE


S DA \ 'IDA REIJGIO.�A

se regulacJos e definidos. Eles excluem as hesitações, fonte <i\ PÍ l l LO rY


de anarquia; tendem nawmlrnente a uma organização que, O CULTO POSITIVO
uma vez estabelecida, se impõe aos indivíduos. E . corno a r Co11ti11uação)
atividade não pode se pri1·a r da inteligência, esta é arrast:t­
da pelo mesmo caminho e adota, sem discussão, os postu­
lados teóricos que a prática recla ma. Os imperalivos do
pensamento são verossimi lmente tão-só uma outra face
cios imperativos da vontade.
Nem sequer cogitamos, porém, apresentar as observa­
ções que precedem como uma teoria completa do concci­
LO de causalicJadc. A ques1ao é dcma:-.iacJo complexa para
poder ser assim resolvida. O prindpio de causa foi enten­
dido de maneiras diferentes conforme as épocas e os luga­
res; n u m a mesma sociedade, ele varia com os meios
sociais, com os reinos da natureza aos quais é apl icado:IO.
m _ os ritos representativ
Não se poderia, portanto, com base na consideração de os ou comemorativos
somente uma das formas que ele apresentou na história,
r:vo lve m)S
detennin a r com suficiente precisão as causas e as condi­ A expl icação cios ritos posi L iv�s que dese_
_ u1-lhes um1 s1gnificaç _ �
_ -�o
ções de que depende. As i<léias que acabam de ser expos­ riore s atnb
nos doi!> capítulos anre : a que:_ o fiel
tas devem ser vistas apenas como ind icações que será pre­ l . A eficá cia físic
. i n tes de tudo mor al e soci a
ciso controlar e completar . Entretanto, como a lei causal reco nhec e seria o prod uto de uma interprctaçao que
lhes .
em que nos detivemos é cc1tamente uma das mais primili­ essencial: é por servirem pa­
dissimularia sua r.izào de ser
os que se
vas que exiswm c como desempenhou um papel conside­
ra refaz er mor alme
nte os indiv íduo s e os grup
rável no desenvolvimento do pensamento e da indústria ação sobr e as cOJsa s. Mas. s:
considera que exercem uma
humanos, ela constitui uma experiência privilegiada e, por
L'ssa hipócese nos permitiu expl icar fatos , na� s� p�de �1.-
isso, é presumível que as observações que nos ensejou nte demonstrada; a p1 11ne1ra
1.er que tenh a sido diretame
sejam suscetíveis, numa cena medida, de generalização. ili ar-se bastante mal com a
\ isca, ela parece inclusive conc
r
ritua is que anahs�m os. Que
natu reza e.los mec anis mos
cons istam em oblaçôes ou cm práti cas ímita uvas , os ges­
_
visam fins purame�te m�­
tos ele que são feitos esses ritos
rer unic ame nte por ob1eto fa­
tcriais· eles têm ou parecem
i.cr co'm que a espécie rotêm
ica se repr oduz a. Nessas con­
_
reen dent e que seu verc laderro papel se-
dições, não é surp
iª servir a fins mora :s? . . .

É verdade que sua função física pode


na ter sido exa-

gerada por Spencer e Gille n,


mesmo nos casos em que ela
,05
RIT UAIS
404 AS FORMAS HU:J/HNTARHS DA l lf);t Rh'IJG'JO�A /'/USCIPAJS AT /1'( 1/Jfü

é mais incomest:ível. Segundo esses autort's. cada eh ccle­


br�ma '-l'u lnuch1uma tendo em vist..i ..tsst'gurar ..tos outros melhor ob-
.
c�as um alimento útil, e todo o culto consistiria numa espé­ t: entre os Wamununga que isso pode ser
clã desce nd eri a de
c1� de cooperaçao econômica dos diferentes grupos totê­ 1 'I\ ado�. um me� mo e
local dete rm ina do,
m1cos; C<1da um trabalharia para todos os demais. Mas, de Nesse povo, cad a
que, nascido nu m
acordo com Strehlow, essa concepn1o do totemismo aus­ 1 1 1 1 1co antepassa do
1c·i ia passado sua ex istênciéa que terrestre percorrer a terra
ª.
traliano seria completamente estranha à mentalidade indí­ lhe cena dado, ao lon�
o
gena. '"Se, diz ele, os membros de um grupo totêmico, ao l'lll todos os sentido
s. Ele
que apresenta a tu a lm cnt � : te na

ies, as fontes e os
'ie e<>Í�>rçarem em multiplicar os animais ou as plantas da .i,·;.sas ,iagens, a forma pla n1c
riachos,
seu ca minho gl.:r
nha s e as
esp�;·c1e consagrnda, parecem trabalhar para seus compa­ t. 1w as monta
,.1,. Ao mesmo tem
po, ele semeava em
,i\'os 4uL :.ollJ\am de ;.cu
nheiros dos outros totens, cumpre núo \·er nessa colabora­ sfor
corpo e que se tran
'-L
<,-:1o o princípio funcl�tmemal do tOlemismo arunt,1 ou lurit­ 111.,.
çõe s, nos me m­
s ree nca rna
mar.im, ao cabo de sucessciva
Or a, a crimôn ia que
lª · Jam�1is �>s negros me disseram espomaneamente que tal , entre os Warra­
hiu ma �º? �1:-
clã .
de exatamente ao ln
era a finalida.de de suas cerimônias. Certamente, quando bro s atu s
ai do
lllu nga , correspon
tic
ar a h1stona 1111-
, .1. tem no I' r ob1'eto
eu lhes sugena e expunha essa idéia, eles a compreendiam
trata nem de o)'))açao, nem­,
comemora r e repres ent
e concordavam com ela. l\Jas ninguém há de me censurar -

por desconfiar um pouco de respostas oblidas nessas con­ 11e:a do antepassado. Não se práticas miméticas. O �ilolo con
di�·ões. '' Strehlow observa, aliás, que essa maneira de in­ .-.alvo um ún ico caso•, demb passado e torna- pre­
ler�retar o rito é comestada pelo fato de nem todos os ani­ '>t'ite unicamente cm rele merario ode um a verdadeira rcpre­
mais ou vegetais tocêmicos serem comestíveis ou úteis·' há -.,entc, de certo modo, poravra é ainda mais oportuna por
:-.t·ntaçào dramática. A pal caso, de maneira nenhuma con­
nao ser 0 oficiante,
ª lguns que não servem para nada; há inclusive alguns pc­ nesse
r.�gosos. As cerimônias que lhes dizem respeito não podc­ a ntepassado que representa.
ponanto, ler fins alimentaresi. siderado uma encarnaçãocntdoa um . .
ns i ste � lnu ch1 u­
m1 111 ,
papel .
"Quando, conclui nosso autor, se pergunta aos indíge­ ele é um ator que repres que co
cm
na� �ual a razão detcrminame dessas cerimônias, eles são Eis, a tíllllo de exe mp lo,
servaram Spe nce r e
unanimcs cm responder é que os antepassados instiruíram
: ma da cobra- pre ta, tal como o ob
as coisas assim. Eis por que agimos dessa maneira e não de C l i llcn 5.
Um a primeira ccrimônia não par
ece rcfer�r ao pa �-
se
outra."2 Mas dizer _que o rito é observado porque procede ão que nos é dada nao ª.uton -
dos < 1 ntepassaclos e reconhecer que sua autoridade se con­ sado; pelo menos, a descriçtido . Ela con siste em cor neia s e
fun ( le com a autoridade da tradição, coisa social em pri­ 1.a a interpretá-la nesse sendois ofi cia ntes6, ornamentado.s
meuo · . lugar. Celebram-no para permanecerem fiéis ao pas­ cm saltos que executam am a cobra-preta. Quando, fi­
sado, para preservarem a fisionom ia moral da colc:tividaclc de desenhos que representno chão, os assistentes passam
e n:10 por cau.:a dos efeitos físicos que ele pode produzir'. nalmente caem cxaustos desenhos em blcmálicos que
Assim, a manetra mesma pela qual os fiéis o explicam dei­ suaveme �lc a mflo sobre os s acores. Diz-se que esse iegesdas to
xa transpar�cer as razôcs profundas das quais procede. cobrem as costas dos doidep o começa a sér
Ma:. ha casos em que esse as pecto das cerimônias é agrada ã cobra-preta. Só s. ois diss
imediatamente apa remc. ccrimônias com em ora tiva
106 IS FOR.iLIS FIEJ//l.\TARES nA 11nr1
RHJGIO::..·I O /'/\/.\(,/PAI!> A1Tfl DES RIT/!AIS -i07

Elas rõem em açao a hisl<>ria mític


1 halau afla, desde que saiu do
. . a do anterassaclo 1.m de seu rcscoço está amarrado um maço d�
n,lta

1 11 11 1 1 gem que rep resenta um wa!laby


chão até o mom ento em . Ass11n q ue a cer� ·
q� 1 e defi ni t iva mente retornou a ele. Acompanh am velho traça no chao uma h-
_
- no atra­ 1111111ia principa l termina , um
ves de todas as suas viagens .
Em cada uma elas localida­ ato�.
des onde res id iu, ele celebrou, 1 1 1 t 1 que se dirige ao lugar onde se ocu l ta º . quarto
segundo o mito cerimônias . lt-

Lot mica s; estas são reretidas

na mesma ord m em que
1 ,, outros marcham atrás,
como se segui ssem
de
uma
olhos
pista.
baLxos e l ix os
Ao descobrirem o ho-
nessa
Lenam transcorn.do na origem. 1 11t 1,
O movi ment o que retorna
1111 m. assume m um a r de espanto e u m d e l es
l?at�-lhc
l • •in um bastão.
com mais freqüência consiste numa
espécie de tremor rit­ Toda essa mímica represen ta um incide�­

" da vida da g rand e cobra-preta . Um dia, seu filho


m � do e vic�l c nto do corpo inteir .
o: é que o antep assado se saiu

,11;.inho a can1r, pego u um wallaby


agi tava a�s 1 m n os tem�os mític
os para fazer solta r os ger­ e o comeu sem dar

11.ida a seu suas sL rpreen-


mes de vida nele conudos. Os

atores têm a pele coberta pegadas ,
ele uma renugcm que. com esses
11 u 0 e o fez vomi tar •I fon1s-a; (: a isso qul! t.1z al usa o a
p a i. Este ultimo seguiu
estre 1111.d
s: e espa l ha-se no ar; é uma mane
.: mentos, sol ta­ lJ

ira de figura r a Jibera­ , 1 ·1 que cermina a represenwç:.io11•


. 1 da
çao desses germes m íticos e sua • .
dispersão no csraco. Não mencio naremos aqui todos os acontcnmentos
Lembramos que, entre os Ana nta m­
, o l ocal onde se de­ 1 1 1 1ticos que são su cessiva mente representados. Os cx:
senrola a cerimônia é ritual me nt
e determinado: é o Jug -1 r ra t.er
onde se acl�<tm as redras, as áivor p l os que precede m bastam para mostrar q u�il o ca
es, os remoinhos sagra­ muito
. d1.·ssas cerimônias: são dra mas, mas de um gcnero
r até lá parn celeb rar 0 particul ar: eles agem ou, pelo menos , ''.cr edit�-se . q �
c
dos, e os fieis devem se transrona
culto . Entre os Wa rra mu nga , ao .
, 1 j,1 m sobre
cont rá r io, o terreno ceri­ natureza . Quando a .
c.:omcmo . �ça<�
1.
o curso da
mo nial_ é esco lh ido arbitrariamcn1e
por razões de oportuni­
do Thalaua l la termina, os Warramunga cstao convencidos
ik q ue as cobras-p retas não podem deixar de .cresce
dade. E um cená rio convencional
. Só que o l uga r onde se �e
k se multipli
passarJm os acontecimentos cuja
re pro<luc o comt itui 0 te­
à car. Fsses dramac; süo. p orta n t o . ritos. e tn-
ma do mo, é, nesse laso, repres
entado por meio de dese­ , pela natureza de
_ 1 Jusive ritos rcrfeitameme com paráveis
nhos. As vezes, es ses desenhos são executados no corpo
1� 1csmo e.los atores. Por exemplo, sua eficácia, aos que constituem o I ntichiuma dos Aiunta.
um peq ueno círculo colo­ amlx>s são capazes de esclarecerem mutu�­
Assim
ndo de \·em1ell�o, pintado nas cosla
fi s, é ainda mais legít imo aproxim�-lo� na mc�1 -
se

scma um remom ho7. Noutros cas


s e no estômago, repre­ meme. A t i
os, é no chão que a ima­
da em que entre eles não há solu(ào ele con1 1 n u1c.lacle. N ao
tra�·a da . Na terra . previamente.: sua
,
somente 0 objetivo persegui do é o mesmo !1ºs dois c� sos,
gem e .
e coberw de ocre
vermel ho, desenham-se linhas Clllva . co no nt ual
s, formadas por séries como também o q ue há de mais ca rac t e n s u
de pont os bran cos, que simb oliza
m um riacho ou uma \\'arramunga encontra-se já no outro em estado de genne.
montanha. Tmta-se de um come<.·o
de cenário.
o J ntichium a, Lal como o praticam geralmente os
u1�ta ,A_r
Além das cerim ônias prorria men
te re l igiosas que 0 de com cmo r._içao i m­
a ncerassado teria celebrado outro comém cm si, de fato, uma esrécie .
ra, representam-se sim­ . Os locais onde é celebrad o são, o b nga tonamente
. ,
plícita
aqueles que os antepassados i lu.straram Os ca �mn l�o�
plt>s episódios, épicos ou cômicos, .
de sua carreira terres­ ��r

onde passam os fiéis un suas piedosas peregnnaçoes


tre. Assim , num dado momento,
enqu anto três atores es­ sao
c�'.º c m cena , ocup ados num
rito i m porta nte, um outro
d1ss1m . aqueles que os heróis do Alchcringa perconeram; os luga­
ula-se atrás de umas áivores situad � on-
as a certa distâ n- res onde se detêm para proceder aos rnos sao aqueles
408
l?ES DA l 'I
D •A
,, ncu
"""''
G /
.O:,
,i
AS FORMAS EL&.J/li\TA
1\ 1N/\UPA/S A TITUD/iS RITlAJS 109
de os p ro- pn os · antepassa dos re
r�1 111 n o solo etc sid i r-am. o nde
desa par ece
· ·

nça. de1es
' 'l'uclo, portamo, .-... 1.1hclece1 que se trata de ricos ela mesma naLUreza. Es-
- esp -m. to dos
ao cha ma a lembra
1un tam-se com
a s sis 1 1 1 1 1 os ,pois, autorizados a compará-lo.'> e a serv i r-nos de
frcq üênc · cant
entes. AIem
1 1 1 1 1 pa ra nos ajudar a me lh o r compreender o outro.
. . t ' dISSO
. a os mos .
ces t 1"<1 is '> 5,,
manu
.s narrati'� os que narram os feit s ais
o, an-

,.
Ora, o que têm ele particular as cerimônias warra-
_ .

vas� ao� mvcs - e1e serem d


• • '- essa .

rem representa i t a s , fo­


se sob essa nova forma
, de-
das por ges�os, 11 111nga de que acabamos de falar é que nelas não é feito
se n vo lvere m-se
. de mod o .i tor , t ll'nhum gesto cujo objeto seja ajudar ou provocar clireta-
i
ea cen m ônia te
·'· a cerim on i a 1 1 1l·nce a espécie rotêmica a se reproduzir''· Se a na l i sa r-
narem -se a p·< 1 rte es sen
.
dos wa n.a m u n ga E
rem a· . cial
1 1 1 < >s os movimentos efetuados, assim como a s p a l a v ra s
• A •

a ru nta já é'.�s 1 c,c .to,


.
mais: o Jntich i u nw
:� ) .
pécie de represe
'ie com o antepassado
n taçã o. Com f 1
.
� � pect�, u ma es­
pronunciadas, gera l m ente não encontramos nada que re­
J
:to' o of1c1antc tdc
esce, nde u e q ue
nlifica­ ' de a lgu m a intenção desse gênero. Tudo transcorre em
do � a
.
carna w Os gesto � ele rccn -
s <Jue f:'·1 z rqxesentações que se destinam apenas a tornar presente
• · e a� tc: pa ssa - .1os esp íritos o passado mítico do dã. Mas a mit olog i a ele
. - sao O.'i . que faz1·1 . ess
L1 o nas mesm as circu • •

nstâncias. C, e11.am
. , ente, para
e na
exmidão ' ele não
· um
dizer
o 1a
repres , enta' o p cl'.sonagem ancesrral com um grupo é o conjunto das crenças comuns a esse gru po .

e
·

smo. 0 iato
ator· ele é esse como O que exprimem as tradições cuja lembrança ela perpe­
tua, é a maneira pela qual a sociedade concebe o h omem
, pers onagem me .
sent ido ' é o 1ie . . .
·

que, n u m certo é
., 1 01 que ocup a a
q ue o cara, ter
reprcsentariv do
',1 cend., IJa -
1.·1to se ��en t ue,
e o mundo; trata-se de uma moral e ele uma cosmologia,

� <lO mesmo te m po que de uma h i stória . O


que a d u a l i dade basta rá
of1ciame se ac
do ame ass do e do rito, portanto,
ai nda mais: é pr
ecisa men o que aco fe use só serve e só pode servir para manter a vitalidade dessas
nt re os. A r.unta c1t
mece entre os War-
1 nt1c
ra m u nga ' ' · Mesmo e
1)e]o menos um
. h' . ·1 -se crenças, rara im pedi r que elas se apaguem das memórias,
1uma em ci u c cena ' ou seja, em suma, para revivificar os elementos mais es­
pres entar antepass·i dos pessoas s'a o· en ca r•�eg·"das de rc-
s
. , . . . ' �

co m os qu ai s nao - tem A senciais da consciência coletiva. Através dele, o grupo rea­


m 1'11·ca e no q u '·1II '.
<
relan1o de filia,·a- o
o, 1 ia- represen-

nenhu ma n ima periodi camente o sentimento que tem de si mesmo
- "
prop ' . ' l '· m e n te e
taça o dram á t ica po i , ant
Ema r i. Ne ss e c·1so
. _ e de sua unidade; ao mesmo tempo, os indivíduos são re­
,·gua1meme'1 e a
l t a : e o l n t ich i u
ma da
o con �a- no do
' vigorados em sua natureza de seres sociais. As gloriosas
p ovo ' o pa co
·

tuma ocorrer ne:;.se · que cos-


d isposto a11i fi cia l mente
lembranças que fazem reviver diante de se us olhos e das
quais eles se sentem so l i dá ri os dão-lhes u ma impressão
da cerun ônia pa r
ece ser
•3

��
Do fato de essas
,
du :i s spec 1.es - . de força e ele confiança: as pessoas ficam mais seguras em
d as di feren ças que as e •
de cen môn i a.s a p
.

s ;a es a r s u a fé quando vêem a que passado longínquo ela remon­


; ta e os gra n des feicos que inspirou. É esse caráter ela ceri­
co, não se segue • �c re m um cen paren
que ha ·a en e el, � tes­
de s u cessão q u e
Pode muito Jem l
/,.
uma C J ª uma t r�1
1- s u i:iia relaçao defini
nslo rm açào da outra
da mônia que a torna insu·utiva. Toda ela tende a agir sobre
sem cl han �
· 1 adas
. ina
ocorrer que as . a s co n sc iê nc i as , e somente sobre elas. Portanto, se não

1
se. deva m a unn ras ass
' niesnia r
· obstante acredita-se que ela age sobre as coisas, que ela
·

mesm a cerim ônia ori


•Onte para ' a � �a s isto e, a
'.

u ma - assegura a prosperidade da espécie, isso só pode ocorrer

i na l d � q u a l el<1s -
serra m moela lida-
I usive que "'"ss·
des d i verge ntes.
·a 1 1 1· po - tese e
, sem que sei.
. Vere 10s me " por um reflexo ela ação moral que ela exerce e que, sem
mais provável . M , a a menor dúvida, é a ú n i :a real. Assim, a h i pó tese que
. a necess� no toma r u m
a1i, , .
partido sobre essa
questão' o que prec propusemos se acha verificada por uma experiência signi­
ede e s uficiente
pa- ficativa, e a verificação é tanto mais probatória por não
\ haver, como acaba
,,� N)/?;11AS
HlEIJl_:i \TANE.l'DA 1 Jf)A NE//Gf().\.I
! 1 IU\< li' li.\ rl TJTI ()ES Rl7VAJ Ç 411

. ."1
mos de most
rar, nenhu m;:i .
natureza entre o
s 1 ·s1e1n •1 diferença dt .1 > idênticas à q uelas que os membros dos outros
•l l 1 1'> . 1 ned it a m manter com os fundadores de seus rcs-
Warram u nga e o
as põe ma i s 'I .
· rn u,i dos 111 '
A runra . Um apen
�� 1��
n t e em evi dê
do,,
11\ ns dàs. No tempo elo Alcheringa 1 <>, a Wol l u nq u a

que já havíamo 1 :1
s conjeturado ncia o
1 1 11 1 1 .1 a terra cm todos os sentidos. Nas difercnres lo-
d
1

d11 l. 1 dt.•s onde se detinha, formava um enxame de spirit-


li 1 •1/rlre11, rrincípios espirituais que servem ainda de almas
1 '1vos ele hoje. A Wollunqua é considerada in cl us i ve
Mas existem c
erim ô n ias 1 1 1 1 1 1 l's péci e de totem eminente. Os Wa rra m u nga estão
d 1 c.l os
. e m que ,
d u as e Ki ngi l l i .
senta civo e idea esse cara ier
cm
.
list
· a e ' ,unc.
, . . repre- ti" 1 fratrias chamadas U l u u ru
1a ma is
q
N as u e acaba
mos de mc. 1 . .
acent uado
• 1 1 1 1sv todos os totens e.la p ri mei ra são cobras de espécies
clrn málica não · � uona r, a represem
açào
"
se r("l ' l1· .,,
..,, ,.,1 t l r l 1 rentes. Ora, wdas são tidas por descendentes da Wo l­
um meio em vi 'r�
, , por s1 m ts ·
. m
" .. de um 11m . a, m.i.s em :ipenas
r
.
1• .
1 n e 1· rame111e l 1 1 11qua. diz-se que ela é su a él\Ú 1 -.
1
,..
prod ução d a es ,, material: a re-
n é cie tor"l <em 1ca Ha
- -
_ Pode-se entrever por aí ele que maneira, muito pro-
outr·1
11 d me nte, o mito e.la Wo ll u n u a se orig inou . Para ex-
nao ( i lerem • ' .s ' co ntu c o, qu e
especifi c ' ·1 1ne nte d.as p r q
qua 1 quer preo
curaçào , cl cle:-;,
, ·se gen r
' ecede• n t e . , s
1 •l1car a presença, n u m a mesma fratria, de t.antos totens
apes ar ele
: ?e r

sta ausente. N
representa-se o
rass, 1 o com 0 . 'las• 1111il ares. imaginou-se que todos eram deri vados de um
1111· smo e único tote m: só que foi n eces á io atribuir-lhe
unico ob'1ct1vo
senr<l-lo, de grav
a'-lo mais rroFli
. de repre-
s r
lc 11 mas giga n tescas a fim de que, por se u aspecto mesmo,
nda m • me' nos
sem q ue se esp e
re cio ri o nenh u m '. �
<

bre a n a tu reza ·
t . a a çao dete
es píritos ,

- Pelo 1 1cn os ' os de·c


1
J os· f
, rm 111a da
" s as
so- 1 ·-.1ivcsse ele acordo com o r a pe i consid erável q ue de­
bu1d os a elas ' · ·sà<> tot·" 1
is1co , vezes atri-
men te secun 1 � ·<'mpenhava na história da tribo.
· . que li ies e.
a n·o e sem relação
.s
com a i mronâ nch
' rg 1ea Ora, a Wollunqua é objeto de cerimônias que não di-
E () C�ISO, em
' litu
1 � rcm
-,
.
partic ular: das . r�
é dada .
ga celeb a m e . . �. que os
esta.
cm natureza das que anteriormente estudamos: tra-
r m honr'a cl a se i.
A Woli unqu a,
pente Wol lun qua
Warramun-
1; .
1. 1-se de cerimônias cm que são figu rad os os rrincip<1is
como já : dis .1contecimentos de sua vida fabulosa. Mostram-na saindo
scmo . s, e - um totem
gêne ro muito pa 1 de u m da terra, passando de uma loca lidade a outra; represen­
"
-

1icular• Nao e
gcta1, mas um ser
Cm ic o '��:s-�c �1�<'. �
uma esp écie ,•1111m · a 1 ou ve-
. t a m-se os d iversos epis ódios de suas viagens, etc. Spencer
·
; • .
disso, esse ser é
bem como uma
J1 Ltra me
·
�� e >.
o l l u nqua . Além
s md1genas o
Gillen assisliram a quinze cerimônias desse ti po que se
27 23
L'

esp · d e ,serpente
conce- sucedera m de ele julho a de agosto, encadeando-se
, e ' c1e
nho é t.al c ue' qt1 co1 assai cujo
1..o, sua cabeça
1 ando se . ergue so rama - umas nas outras segundo uma ordem determ inada, ele
se perde nas
nuve ns. Resid e' , : . b. '
a c1c d1ta-se
·e o rau
manei ra a fom1ar um verdadeiro ciclo111• Pelo detalhe dos
ritos que a consti t u em , essa longa festa não se distingue
cha mado Thap , num remoinho
auerlu
' ale sol i l<l rio . Mas em
)
f�
.'
1 ue �e
se di erenc1e
�t
co c c n o fund n �
o ele un � do lntichiuma ordinário dos Warra munga, conforme reco­
tos dos lotem;
tinlivos del '"
d
or i ná rio.s''"ªposs
. sob cercos aspec
­ nhecem os a utores que a descreveram 19. Ma s. por outro
e�
Serve de nome
u i todos os cara
col ·1 i· vo e de e
cteres d is- lado, trara-se ele um lntichiuma que não poderia ter por
gru po c.l e inclivícl e
uo·s qt1e vee m ne a se u a n
mblema a u m objeto assegurar a fLcundidacle de uma espécie animal o u
d

. l -
vegeta l, já que a Wo l l u nqu a é, po r si só, sua própria espé­
mum, e as rela çô tepassa o co-
es que esres � .

man tem co m
esse a n ima l
cie e não se reproduz. Ela é. E os indígenas não parecem
AS FORMAS Elli.111:'\TARF� DA 1?
D A RE/J(,10I.\.· 1 \ 1'/U,\c./PAI.\ AT/TlDES R/Tl AIS

��gar �1ue t�nh ? nece.ss da d ele um culto para p<:r::.c


! 1 1 1 e >u�u ro ·Is crenças q u e 1trib uem
aos ritos esta ou

�sório� L conti
i �la
\ crJ r �1�1s<.:u ser. �as cenmo _

nras nào somente não têm 1q11l'I.� d1càc1a f1s1ca, sao ell!me mos a ce n
_
a f c c1a do lntichiu rna clássico, como n�lo
�� � parecem ter w 11 l''o, já
l que pode m faltar sem qu e ? � 1t� scp alterado

qua não (•
as cemnonras da Woll un­
ef1cac1�1 material de espécie alguma . A Wollun 111 1 que tem de essencial. Assim,
põen'. � nu, por
uma d vindad e enca rregada de uma ordem
� determinada l l " 1, melho r ainda que as precedentes,
de fenomenos natura is, por isso mio se es 1 .1111 dizer a função fundamema
l do culto pos1uvo.
Aliás, e insistimos especial m ente nessas
pera dela cm
! roca do culto, algum favor definido. É dito
� � solenidades,
que, se as presc riç ões rituais são mal observ M.as há �)LJ-
claram nte
, por ca usa de sua excep ci onal imro rtânc ia.
l u n q ��: �e za1�g�1, sai d e eu escond erijo e
adas a Wol­
, ex iste
dos. f1c1s
. . : �
vem s vingar 1 1 .is que têm exatamente o mesm o cará t e r . Assim
"
rapaz que ri . O c lã
t!º.
por sut1s negl i genci. as . l nvcrsa 11 1e111c, quando lu­ 1 1 1 l rc os Warra mung a um totem "do
Spcn cer e G i l l en , .t em a mcs-
A
s e cumpre regularmente, acredita-se que , dizem
tot cm 1cos . Como
da ficará sa­ • 11 1v leva esse nome
trsf
c�1a e qu e..· algum acontecimento feliz :-.<.: produz
ira. Mas 1 1 1 1 nrgan iza1;a o que os dema is grupo
s
, onde
o•lvs, tem seus l oca is sa grados ( m u ngai)
_ .
a 1de1i'. d�s�as s a ções p ssívcis evid en tem en te só
� surgiu
� a ntc ras-
?
d po 1 s, p.irt1 explica r o nto . Uma vez instituí dor celeb rou cc r i m ô n i as nos tempos fa bulosos,
� da a cerimô­ rdo funda
ram
nra, pare eL natura l que ela servisse a algo
e, portan to 1111dc deixou, atrás de si, spiril-children que se torna
� �
que a 0 11ssao das observâncias prescritas expuse ' '· homens do clã; e os
ritos associados a esse t otem são
sse a a i �
gu 11_1 peng > Mas ela não foi instituída parn preven
� aos totens anim ais
� : ir esses 111tl isccrníveis dos que se relac ionam
. evide nte que eles não pode-
peng� m1 1cos ou para obter vantagens particu
� � lares. Es­ 1 111 vegetais?• No entanto, é
tas alias, ao representadas nos espíritos de maneir cia física . Cons istem numa série de quatr o
: � a mui­ 1 1 .1111 ter eficá
to 1mprec 1sa. Por exempl o. quando tudo está 1 l· rim ô n ias que se repetem
mais ou meno s umas às ou­
terminado,
� . , mente a divertir, a pro.'·o-
, a manter a alcgr� a �
os el 1os anunci am que a Wollun qua, se está t r rs mas que se destinam unica
� satisfeita,
enviam chuva. Mas não é para obter chuva que rr o riso pelo riso, ou seja, em suma
o bom humor no grupo que possu
se celebra
a festa�º. Ela é celebrada porque os antepassados i como que a cspeualr­
a cele­
b:a:am, Porque todos estão ligados a ela como dade dessas disrosições mora iszz .
a uma tra­
.
d1çao mu1to respeitada e porque saem dela co r
Enco ntram os entre os p óp ri os Arun
ta mais de um

lotem que não co m po rla outro


. V i mo� , com
m uma im­
p �·essa_ de bem-es tar moral. Quanto às outras l ntich iuma
e
� considera­
nd u la çõ ou depressoes d�
çoes, tem a penas um papel comrle mentar : dt:ito, q u e , nesse povo , as
� -
o s
rodem servir
P � conf�nm�·
� ra ..
os fiéi � n a atitude que o riLo lhes prescre­ tl'rreno que marca m o lugar onde a lg
u m antepassa o r:s1
ir �
. toLens estao liga­
podem te r efei­
ve, ma s nao sao diu servem às vezes de Lote ns z 3. A esses
razao ele ser dessa a tit ude
�is, portanto, todo um conjunto de cerimônias que se .
m cons1�trr cm
nias que, manif estam ente, não
das ce rim ô .
tos físicos de espécie a lgum a . Elas só
r>ro�oem unicam ente redespertar certas idéias pode

·omemomçôes cujo ohjc10 é cel ebra


e certos
senu r o passado e nao ro­
��ntos. ligar o presente ao rassado, o ind ivíduo J lo!• .
colerrv1dade. Elas não só não podem servir a outros nenh um objetivo a lém dessa comemoraç;
fins dem \ ÍSar
der me­
co o os próprios fiéis não U1es pedem nada além
�a
� disso. t Ao mesmo lempo que nos fazem
essas repre senta
comp
ções
reen
ritu a is põem
1 1s uma prova de � ue o estado psíquico no qual se en­ lhor a natureza do cultc
c?�rra o g':'Pº reunrdo constitui claramente a única
base, cm evidência um importante elemento
da religião: o cle­
solid
a e estavel, do que se poderia chamar mentalidade memo recreativo e estélico.
ri-
11 1 A� FORMAS HIJ:..llE\TARE.\. fJA 1 f])A REUGIO��I 1\ t 'Uf.\CIPAIS ATITI DES RITUAIS 115

Já rivemos a oponun i dadc ele mosrrar que das são pa 1 1 1 1 todos podem indiferentemente participar Talvez
até
rentes próxima :. da.� n::presen tações dra1rn111c asis. Esse e atual-
1 l�11mas dessas representacoes, CUJO objeuvo único
de quah-
parentesco revela-se com maior evidência a i nda nas últi­ 1 1 wnte distrair, sejam antigos rit0s que mudara m
mas cerimônias que acabamos ele mencionar Com efeito Na verdade , as fronteir as entre esses dois tipos de
111 .1ç;io.
quais é
elas não somente cmrrega m os mesmos rr�cedim ento� , "' imônias são tão flutuantes que há algumas e.las
que o drama propriamente dito, como também perseouem precisão a q u a l dos dois gêneros
1 1 1 1 possível dizer com
um objetivo similar: estra nhas a todo fim utilitário , f zem � 1 11 ncncem29. . . .
homens esquecerem o mundo real, transronando-os a um É um fato con hec id o que os jogos e as pnnc1pa1s for-
nser­
outro cm que sua i maginaçã o está mais à vontade. Elas da arte parecem ter nascido da religião e que co
distraem. Têm in clusi ve o aspeno exterior ele uma recrea­
111.1s
Per-
' .11.1111. d u ra nte muito tempo, um caráter rclig ioso:l\l.
çao: os assistentes riem e se cll\ enem abcnamentei". 1 l'i'IC-se qual a razào: é que o culto, embora ' 1sanc.lo d 1 re-
Os ritos rcrn:scntat hos l' as n.:uea çoes coleuvas sao para os homLns
não c e­
1,11 11cnte outros fins, foi ao mesmo tempo
inclusive coisas tão próximas que os pa rtici pa ntes passam 1 1 1 1 1 a espécie de recreação. Esse papel, a reli�iào

,1 mpenhou por acaso, graças
de um gê n e ro a outro sem solução de cont i n u i d a d e. O _ circuns tancia,
liz A
a uma fe
que as cerimônias r rop ri amcnte re l i gi osa s têm de caracte­ uma necessi dade c.le sua naturez a. De fa t o , em­

l 1ora o pensam ento re l i g i oso, conforme estabele cemo�


1 1 1.ts por
rísrico é que el e vem ser celebradas n u m local co ns agrado ,
do q u a l as mu 1 hcres e os não-in iciados são excluídos21 . •,1 ' F ' a l go bem distinto de um sistema c.le ficcões. as re a l � ­
Mas há outras em que esse caráter rel igi oso se apaga um exprimir
d.ides às quais ele corresponde só conseguem se
a so-
pouco sem desapa recer por completo. Elas se realizam fo­ 1 . . t1giosamente se a imaginação as transfigura. Entre
1 tl·dade tal como
ra cio terreno cerimon ial. o que mostra que já são le é objetiva mente e as coisas sagrada s
em certo gra u; entn:tanto, os profanos, mulheres e cria n­
igas ela
' l llL' a representam simbolicamente, a distância é
consid e-
ças, ainda não participam . Portanto. tais cerimônias siruam­
_
s
" LI. Foi preciso que as impressões real mente sentida
se no limite dos dois domínios. Em gera l , elas se referem , e que serviram de matéria prima para essa
pl'los homens
a personagens l ege nd ários, mas que não ocupam posição transfo1-
, onstrução, fossem interpretadas. elaboradas e
:
reg� la r nos quadros da religião totêmica. São espíritos, na ecíveis. O m u n do das co1-
1 1 1,1das até se tornarem irreconh
_ elas
ma1ona vezes ma léficos, q u e estão mais em comato '· '' religiosas é, portanto, mas apenas
em sua forma exre-
com os mág i cos do q u e com o fiel comum, espécies de essa
1 1 1 ir, um mundo parcialm ente im aginário , que, ror
bichos-papões nos qu a is não se acredita com a mesma se­ nte às l ivres criaçõe s do es­
1 . 11.ao, se rresta mais c.locilme
ri edade e a mesma firmeza de convicção que nos seres e I uri10. Aliás. como as forças intelectu ais que sc r�c m para
pi oduzi-lo são intensas
n � s coisas propria mente totêmica s2s. À medida q ue tumultuosas, a e�� l us1va � arefa
se e
afrouxa o víncu l o entre a história da tribo e os aconteci
­ 1 111c consiste em exprimi r o real com o au� 1ho de s1m bo-
1, ,,, .u..lcq uac.los não é suficiente para ocupa bs. Em
mentos e personagens representados, tanto uma como g�ral.
os
o utros adquirem também um a.specto mais irreal e as ceri­
l'l' nnanece dispo nível um excedente que procur
a a �hca ­ :
M' L'll1 obras supleme ntares, supérflu
mônias corres pondentes mudam de narureza . É assim qu as e de luxo, isto e,
e
se entra progressiva m ente no domínio da pura fantasia e como
, 1 1 1 obras de arte. lsf-o vale tanLo para as pr:íticas
se passa do rito comem ora liv o ao corrobori vul ga r sim­ ência cm que se en-
p;1 r:.1 as crenças. O est.ado c.le efe1vesc
ples regozijo público q ue nada mais [Cm de rcl igi 'Os e do ; 1 o n tra m fiéis reunido s se exterior iza necessa riament e
os
416 JIS FOllHJIS HLE.HENTARES DJI i1011 REL/iG /'RI\< ll'AIS 1177Tt,()ES Rffi•AIS
10.\.1 t

na forma de movimemos e xu 1) ranc:s


bolos r el igiosos exprimem são for\as reais . com
as
c:- que não se dcixalll
submeter facilm ente a fins mu 1 0 es . não os fazer o
tnta m � mc def inidos . q11 1 1 , devemos contar e das qua is podem

l l ll nos apraz. Ainda que


� .
Eles escapam, em pa rtne'. sem ObJCllvo, man i festa m-se pelo o culto não vise a produzir efei­
s i m pl es praz pr de se 1an 11es
·�

· t' t r compia . zem-se em espé- ' l 1sicos, mas se l i m i t e del iberadamente a agi r sobre os
cies de brin G1 (/ c 1·1 ·,·1 s .. Ale'm c1 1· sso' n a m d ' I
� · •

sentid o qu e não
. e ic a e m gue são 1 11 1 11os, sua ação se exerce num outro
r
'
1 1 1 1 1 .1 pura obra de
imag i nários, os seres aos q u.us .·: · . - . s t çõ e que ele tem por
ão i mage ns va z ias
se e1mge 0 cull:ío sao a te . As repre en a s
em ós
- . 1m-
,to
:
prop nos a con ter e 1.eg ular essa e
ria a pressão de re l 1 da d es tang1_ve1s e
x�1ber â n c ia
res1s1e

: é n cessá -
e
ntes para
Ji1m d esp erta r e mante r
' ! ' " .1 na da corre s pon de m na realid ade,
n nã o s
q ue evoca mos
submeter a a tivid <t dc a' adaptaçoes - . exaras e econo m1cas. la mera satisfação de vê-las se manifestar
- ·
, 1 1 1 objetivo, p e
A ss1m, · neces-
, n>mbinar diante de nossos olhos. Elas são tão
corre 0 risco de com et.er enga
Pl ll�tr
.
nos quem, , para ex-
, tn.1)U1r
·

os rico:;' acredita de•er ., a . a e-dela n os s a vida moral quant o


ieto p reciso e uma razão de ser d etermmad
de
é
. gesto um ob­ 1 1 1. 1 s ao b om funcionamen to
� . ! lá a l gun s . i l 11nen t
Je

.
.
os para o s u s te n to n o s sa vic.la física, pois
,1
que não servem para nada ' c0rresponde se manté m - e sa-
· m sunplesmeme 1l 1 o l \éS delas que o grupo se afirma e
à necessid ade de agir, de se el ao in d i vídu o. Um
. -. mover' de gcst"icu l a 1. que os 111 111os a que ponto este é i nd is p en sáv
sente m. Vemo ·s estes . l tarem , r oei opia é
fie1s · sa

f jogo: é v id a séria. Mas,


· rem, danç a- 1 lln, p o rta n t o, d i e re nte de um
rem, gr i tarem canta rem s . e imaginári o
em ' 1 1 1hora não seja essen cial, o eleme
nto irreal
ve l dar um se l i c lo a ess a ag1 taçao.
n m s re seja possí-
� ' q�c e e m p
1 1.10 deixa de dese mpe n um papel não despr ezível. Ele
, d
_, • ha r
Ass1m
. . rc• l 1g1,10 nao seria o q u e e, �e .
nao-
m l a d o , desse sentim ento de reco nfo rto
. -:-
concedesse p. 1 1 1 i cipa, p or u
q1 ll' o fiel obtém do rito consu mado ,
um lugar às livres combina ·ões d pois a rec rea çã o é
J�
' 0 pensamento e da ativi­
dade, ao jogo ' à arte a tu q�c di�erte o espírito fati­ ento moral que é o oh-
� 11111a das forma s desse restab elecim
ga clo com 0 q u� Í,á le su·e � 1 ç 0 excessiva no trabalho co- 11·10 pri nci pal do culto positi vo . Assim à
q u e cu m p ri mos
tidiano.· as propnas ca usas que n a fiiz� ram exisu.r fazem dis-
. v
so uma necessidade. A arte ào e 1 plesm
pro fana com
• ·

amos i da
>
1 < •ssos deveres rituais . retorn
1
�� ente um orna­ não some nte porque nos pusemos
1 1 1.11s co ragem e a rdor,
mento exterior com q ue o culto
om u ma fonte su perior de energ ia , mas tam­
.
d1ss1 mula ria o que pode
ter ele demasi ado auste10 e clemas1ac lo ruc1 e: por si mes-
1·in contato c
. raram ao viver, por al­
. i>l'm porque nossas forças se revigo
" ? . Por causa d a s relações �\lll1S i n s ta ntes , uma vida menos lensa,
mo, o culto tem algo de estét ic mais agrad ável e
.
com a po esia,
bcm conh ecid as que a in·r _ . canto que n ã o é
. .
1 o l og1a m a ntem 111:tis livre. Por isso, a religião tem u m e n
pret ende u-se às ve zes hcoJ ' occ11., . .i
, pnm e1ra fora ela reli- 1 1 rn de seus menores
giào5 1 ,. a verd i
É por isso que a idé ia mesma de uma ce ri mónia reli­
atrat i v os .
- de e

· .-, inere
' q ue a uma •n· ? cs1<1 · nte a toda re-
que ac? bam ?� s er
ligiào . As ceri mo- n1 as representativas e a idéia
giosa ele certa imp ortân cia despe rta naturalment
. pe�to el a vida re l igi osa ;
estudadas tornam sensível esse as e, toda festa, mesm o que puram ente
dL' festa. Inversament
k ri
mas praticamente não há ritos traços da cerimônia reli­
que nao o apresentem em
·
1ga por sua:; o gens, tem certos
algum grau . indivíduos,
�1osa. pois sempre tem por efeito aproximar os
Por certo, cometeríamos o ma is grave ento as massa s e suscita r. assim, um estado
erro se so vis- pôr cm movim
, �

semos da religião esse u'nico


. , que não deixa
, aspecto ' o u m es. mo s e exa­ dL' efervescênc ia, às vezes até de delírio
gerassemos sua importância . Qu anc1
_

. ig i oso. O home m é
o u m nto serve ape- de ter paren tesco com o estado re l
.
nas para distrair ' não é mais suas ocu p a çõ es e
um nto As fo r ç as mo1a1s
. . que s
t ra n p o rtado fora de si, distra ído de
.
·
.tiS'FOR.114s· E/.E.i
1 18
1 19
fF\T;t RES n.1 1 7/)A Rl:/J(./
0\11 " /'/(/.\UPA!.\ 1171Tl m:.s RJT(,,.l/S
prcocupaçôes ord
. os
. ç-'M lll'nsJ> t>e<;s<.> ponto de vista. o lntichiuma aparece sob
iná ria s. Por. iss
1 >:> . li
' o, 01) s.e
.
bos , 1.va , 1 11 -se cm 1 · m
. s llll:snws ma nif
1
t •
cstarócs g

.
' os, lJntos,
s1ca, movimentos ·
violento�· .d n<:a;-• • . m mu . 1 1 1 1 1 nmu aspecco . Nao é ma is um mecanismo ritual <lis11n­
l i ' repo u sa nd o sobre princípios q u e lhe são p róp rios.
que elevem 0 nh· )�S ca ele esl imu lan .
ef vital' etc. o1 tes
ass. 111,
1
ci<1 que as fes. tas t fado com frcqüên­
uma apl icaçüo particular de cerimônias mais ge rais.
· .
po 111
C) 1 11nn e que
pu lart:s ev am ao 1s

• 1 11l· podem ser utilizadas para fins muito d ife remcs . Por
1-icno
.
s excessos, fa ze
. ·
rcrcler de vi"< ta
'
m
tam bé m h:í c er i m
s ep a r,
ôn ia s i.ef i"g1. osas
1 o elo i lícit o32;
. 1 'º· em sua nova obra, antes de falar do l ntichiuma e da
1111t iaç;ào, eles dedicam um capítulo especial às cerimónias
.
q u e de ter mi nam
· nam
q u e uma ncccss _ como
. 1 111a
· · id·'1 cl c d e v10, ar as
rcgns
ao, e- e1 aro que
e )1(

.' 1o 1 l.IJ.t, ·• 111011v. os


as mais res . pei tadasH ent e 1• •tvmicas cm geral, sem levar em conta as formas diversas
.. . N'
' · •

.
para d1fen ..•nciar e<;sas du as
simples regozijo,
o corrobon_ pro
� '
tiorm, de alt\tda

. n·
ck· pública. O
'l lll' el as podem assumir con form e os fins para os quais
� 111 e m prega dasli>.
rio' ao P''.
l ,",,C> c1ue. cm seu
.1 no n.10 ' t.�a n.1d
conI·u nro uma cenm
a clt: se- Essa 1 11de1erm inacao tn tnn seca das cenmônias to1l:-
•U 11mas so h;n ta s i do 1 11dicacla por Spencer e G ilk n , t: de
. · vo grave \lh
ôn1a ritual
. ,·
sem pre tem um
OI) J' C
s •• .
q u e talvez. n '· i o fnJ· · i ' · e pi euso observar
.l sena
.. 11111<1 maneira basrnnte indireta, mas acaba de ser confir­
n 1 ia alg um eco. No
.1 1.,,
�goz110 no qu •·tl
,
' •

, ei 1· 1rerc nça esta


·1 vicJ · ' . nao .. te- mada por St rchlow nos termos mais exrlícitos. "Qua ntia,
'

diz ele . os jovens noviços p rticipa m das diferemes festas


fu ndo, "
-
porçao desig ual
segundo : • 1
.
•.
. .' ant c•s , na pro- a
d.1 iniciaç:.io, executa-se dia nte deles uma série de cerimô-
1
q u a es:-.es dois elem ent " se
combinam. o
111.ts que, ao mesmo tempo que reproduzem até nos deta­
lhes os ritos mais caracterbticos do culto pro pri amente d i ­
to [entenda-se, os ritos q u e Spencer e Gillen chamam l nti­
Ili
t hiumal. não têm , no entanto, por objetivo mu lt ip licar e

eon F11.m,IJ
. . .
U m fato mais l .1 zer prosperar o totem corresponcleme. ".F É, porta n to , a
geral vem . "
CL'dcm . .1s ideias que pre
.

mesma cc:ri mô nia que serve cm ambos os casos: só o no­

_ G· ·11 len .ª!)resenra\'am



Em sua primeira obra me não é o mesmo. Quando ela tem especialmente por
Spen �er e
o l nti ch ium a co
finida • fa l '1,··'
mo um a e �id· l � a c
objeto a rerroduçüo da espéci e, chamam-na 111baljafkt1/i11-
· 1 n1 deia como c1e � m .
e rttua l perle ttam
eme de e é somente quando constitui u m procedimento de
i ope raçao .. lllCI,
mente de stin ad a cxclu siv a- 111iciaçâo que lhe dariam o nome de Intichiuma38.
a asseg'Lira t. ,. 1 ic;. �
da espécie to-
p1od �1çao _

·
têm ica , dan do a Entre os Arunta, ainda, esses dois tipos de cerimônia
c n t('ne.l c
se distinguem um do ou tro por alguns caracteres secun­
, 1. q ue devern
fora dessa/ '�u nçao
perder todo sentido : . c(cssa
n . . . . name ntc
tbem 'fribes of Central
..
unica . Mas em No
. r­ dários. Embora a contextura d o rito seja a mesma nos
A usI ra ICI, os mesm

. r 111guagem
\'C7 sem .se elarem os autores C<tl-
conta usam �n�a • dois casos, sabemos que as efusões de sangue e. de ma­
nie ' diferente.
.

Reconhecem ciu
nr )(fe m ·tnd"fi
neira mais geral, as oblaçõcs características elo lntich iu ma
!"
e as "n .
'' as cen monns
1 1 1 u ma prop n·111
lc.!mente ter lug;ir .
• ·
1 eren . runta esc:io ausentes das cerimônias d e i n iciação Além
1
no s n tt(. 1
' ','t<>3 , · J> 01t
' 1ente . <
• c1nt
nos mos 1 ·
nos

ou
.

1
de disso, enquanto, nesse mesmo povo, o Intichiuma realiza­
-;e num loca l que a trad ição fixa regulamentarmente e pa­
.
i n i c hç
a·n ·
, o • ela·s ·se rvem
da ,s. � c.1· c !Otc
·

. tanto par;i

fazer reproduzir ,
Am1ca,
1ma1s e p ant·1 s
qua mo pa ra conferir . . '. ' � 1x rJ o qu al se é obrigado , ir em peregrinação, o cenário no
pa rn que se torne
aos novi
e
m m mbro. ��� a
s
g u ,ares da sociedade
:
� ua l 1dades �ecessá rias
_
qual se realizam as cerimônias da iniciação é puramente
dos convenciona f39. Mas quando, como aco n ce ce entre os
\ AS FORMAS Hf.
.&l//INTr1RES DA VIDA REUG!OSA 1 l'RISCIPAIS A71Tl.DES l</Tlr,-W, 121

a 0 Innc
· p1es repre·
Warra mung
sentaçao dramátic 10 rL 1
· 1 de u m rico não
_ •
· h IUm. a consiste numa s1m
.
,
co nsi ste
a . . d 1st a o e co mpleta en tr
l 1 1 11 L· n os efei tos pa rticula-
� ��� c.le firnc.los que ele parece vb,ar e pelos quab costuma
. •

ritos. Ta nto num c n 10ul


m ç e os do1:. 11:s t:
ro, comemora-se o
ma .
o e, encenado, rep passado, o ,., caracterizado, mas numa ação geral que, mesmo per-
1o de (1 u.is e rep resen
resentado, e, nao
ta-
. - se pod
,
ma e ú ni ca ce rim
ma nei ras sensivc.:Jm

ôn ia se rv e' p on anc
• c• rt
cm e fere n tes . Uma me -
. �

s
111.1 11ecendo sempre e em toda ra ne semelhante a si mes-
111.1. é capa z de assumi r formas diferences conforme as cir­
o , conforme as cir-
cunstâncias a u . ' unstâncias . O ra , é p recisa mente o que s u põe a teoria
' · ' L1 "� "' fL1nço - es Cl IS . llnl<IS 10
Eh1 pode in clu sive
ter vfl rios ou t1:os e
s
q11v p ro pusemo . Se o verdadeiro papel do culLo é des­
mos que , sendo 0 . mp1eg . os. Sahe­ l ll'rtar nos fiéis um ce rto estado de alma, fciLo de fo rça
1 1 1oral e de confiança , e se o s efe itos d iv e rsos at ri buíd os
san u: .co . isa sagrada , as m
devcm vê-lo correr
J as s uccc '.
, e qu e uma
ulheres não
b i.·1ga
.
. ulte nu m;.i e(usiio
·

em presença d e, la.s . irromp.1 11 >:-. ritos devem-se apenas a uma cleterrnina\·ào secundá-
inf·iaça o ntu;ll e assim . s
. . e res
' ' O l··d , en t1e
· de . ang u t: . Uma , 1 1.1 e variável desse ...:stado rundamental, não é su rp reen -
homem cujo sangue foi os Arun w , o
cometich .
. 11 nll: que u m mesmo rito, embora conservanc.lo a mesma
o p11 me Jr > ª.. c? rr
·
panu su;:1 fa lt·' 1 • "celef) 1·a r. uma 1
� er deve, para re , nmposiçào e a mesma estrutura, pareça produzir múlti­
-
cerimonia q ue se re
_ , s ua mà
ou ao totem de seu · aci.one plos efeiros. Pois as disrosiçôcs mentais que ele tem por
p,·i 1 , ou ao ue
rua tem um nome e" 11 . Essa cenm
·

especial' Alua �!Pa�1/1


.

. . . o- .. l 1 in('ào permanence suscitar cominuarn as mesmas em to­


11�a , que sig nifica
ngue . Mª�· c'n s1, dos os casos; elas dependem do fato de o grupo estar
apagamemo do sa
. . � nao di fere das q ue se
. . ou. nos 1nuc
celebram por oc·'1s1 1 1·11nido, não das razões especiais pelas quais ele se reu-
" da mrc 1aç <

· ··'0 . 10 .
presema um acome · hJuma : re- 111u. Mas, por outro lado, elas são n
i terpretadas diferente-
a ancest ra l por
cimenro da l11ston
to . ei a pode servir ta n- 11 11.:nte conforme as circunstâncias às quais se aplicam . Se
igualmente t ·'1 n co p.tr , . . . .
agir sobre a espéci a mic rar ou para um resultado físico que se quer obter, a confiança expe-
o parn �x pia r um
1
e ani ma l qu am .
is ad 1·a nte. que um f ·1
' cenm..
1 1 1nentada fa rá crer q u e esse resultado é ou será obtido
légio. Veremos ma sacri-

.es. e
·
1e nto unerano •l
tam 1)ém pode fazer , . orna totem .. ica pdos meios empregados. Se se cometeu alguma falta que
11u 1)ert e M·'1 uss
'
·1s ez
· v
· qu er apagar, o mesmo estado de segurança moral im-
á a ssm
·
•t'
" J.' a Ja m uma a m
ciona l do mesm . bigüiclade fun-
caso do san
rn
. . rTreio e, mais es
..
o genero no
·
. 111 i mi rá aos mesmos gestos rituais virtudes expiatórias. As­
'1rn, a efidcia aparente parecerá mudar, enquanto a cficá­
. ··r· .
pe cia lme nte e.lo sa
r
• i a rea l permanece invariável, e o ri to pa recerá cumprir
-
c ifíc 1·o h in
. u
al ' 0 sac 1"f'
' . d , M ostrn ram com
1J.
crr rc10 comunr - o o sa-
, n. o 0 sac Trc . r!·
·
..
1 1c10 e xp 1. a to
messa, o sacrifício-c n 1?- o- l11n�·ôes d iversas, quando, n a verdade , tem apenas uma e
ontrato. era m a pen '

nico P• 1ec·<1n1smo
• •
J <1s simple
. s vanaçoes
e
'>1•mpre a mesma.
, ·
de um mesmo e ú
to e bem mais pri mit
, Ve mos a' gota que o ia- lnversamente, assim como u m único rito pode servir
ivo e que de ;,, a ner.
mita à instiLuicão sac
rificr""' l Ta 1vez não -
ra nen hum a se li- 1 vários fins, vários ritos podem produzir o m esmo efeito e
apreseme semelh ant · exi sta n·ro que nao
. ·

.,L. substituir mutuamente. Para assegura r a reprodução da


e indeterm ina ça- o
pam os casamem . A missa serve ta nt
.
• ..,péci e totêmica, pode-se igualmente recorrer a ablações.
os com o para os. <::
. n terros; ela redi me as
o
faltas dos mortos . .1 prátkas iniciáticas ou a representações comemorativas.
garante .ª s rvo
de, etc. O i·eJ·u m e 1 ssa aptidão dos riws a se substituirem uns aos ou t ros
:. ? � s os favores ela div
inda-
1 _ a perutenc
uma , expra çao e um .
la mbem uma
p re p·1r '
.
''"u
·
i r-io
,

à
1a, mas e
.
pmva mais uma vez, da mesma forma qu e sua plasticida-
,

re me1 usr.-
co mun 1ao· ele confe
..
.
ve vmudes positivas 1 k, a extrema general idade da ação útil que exercem. O
. Essa ambigüida cl e demonstra que a • ·s,,cncial é que os indivíduos estejam reunidos, que senti-
122 AS FOIWAS EU!ME.Vl/I NFS f)A 1 'IJ)A NEl!G'/O.\A 1 li'//\< 11' l/S A T/'11 '/Jli.\ Nf'l{IAJ::i 'Í23

1 1111L o s fiéis das rdigiocs mais id�1hstas quando. reu-


mentas comuns sejam experimentados c: que
O
prod,unam-sc fllhus do deus onrpotente . Pors, l•llll
eles .'ie exrn
mam por a�os comuns; mas. q uanto a natun
:za pan1cula r 1
1 1 1 1 1 1 1 , .1so como no outro,
desses sentimentos e desses atos, é algo esse sentimen to é feito das mes-
relativamente st•
iência de si, 0
cund á rio e con ti ngente . Para tomar consc
111 1 1 1 1 1pressc"\es de segurança e de respeito suscitadas, nas
ll' l1l'ias individu ais, por essa grande força moral que.:
grupo n� i o tem !1ecess idadc de produzir certo.s
gestos em
gue num mesm o
11

!11 11111�1 e os sustenta, e que é a força coletiva.


\'CZ de outros. E preciso que ele comun

1 >s ou tros ritos q u e estudamos provav elmente


pcnsamento e 1�uma mesma ação, mas pouco não
imponam as
formas sens1v _ . U m a vc:t
e1s sob as quais se realiza essa comu nhão. 1 , 111ais q u e modalidades desse rito essencia l
1 i l 1 1 111 ida a estreita solidariedade do an imal e do homem,
Claro que mio (: ao acaso que se determinam
essa formas
exteriores: elas têm suas razôes. mas essas
razc>cs nào c.li­ 11111 ·M: forteme nte a necessidade de a.ssegurar a rc pro­
h 1 ,11 1 regubr da espccu.! totêmica e fez-se dess<l reprodu
zem rc:spc:ito ao que há de essencial no lUlto. ,
Tudo, portanto. nos faz voltar à mesm:i
, objeto prindpa l do culto. Es:-;as priítit.ts im it:l l i�·a!'i
os ntos sao, �t n tes de tudo, os meios pelos
na origem, t i n ham certame nte apenas �m ol�J�t-1 vo
idéia. é qut· 1

. quais 0 grupo q111


1 1 101 d. viram-se porta nto subordinadas a um hm util1tano
social se reahrma periodicamente. E por
aí. talvez, pode­
mos chegar a recoru.truir hi pateticament
, 111.llL'rial e foram concebidas como meios de produzir o
1 1 1 1 1t.1 do desejado. Mas, à medida que. com o dcsem ul-
c a maneir..i como
o culto totêmico deve ter se originado primiti
vamente Ho­
mens q u e se sentem u nidos, em parte por e
laços de san­ 1111\·nto c.la mitolog ia, o herói ancestra l , primit ivament
gue, porém mais ainda por uma comunhão
de interesses e . . 11 1 unc.lido com o animal totêmico, dele se distingui u ca­
1 , l'Z i
de trnclicôes, se reúnem e tomam consci
ência de sua uni­ l ma s . à medida que ele se tornou uma figura mais
p1
dade moral. Pelas razões que expusemos, sado substi�i.u a imita.cão
do m imai ou justapos-se a ela, e as cenmonr�s rep�cs:�
-
eles são levados oal, a imita(ão do antepas
a repreo;c:nt:� r �ssa unidad e na forma
de uma espcc1e de
�onsubstanc1a lrdade muito especi al: todos ou completa ram os ntos 1111met1-
consideram par­ 1 1 1 1 \ .ts tomaram o lugar
llc1par da natu reza de u m a n im a l determ
inado . Nessas 1 . ,.,. Enfim, para atingir mais seguramente o objetivo visa­
conc.lições, só haverá para eles u m a manei
ra de afirma r "" sentiu-se a necessidade de empregar todos os meios
su� e�stên cia coletiv a: afinnarem-se eles
prôprios como Ir poníYeis . Tinha-se ao alcance da mão as reservas
?e
anrm:.us dc:ssa mesma espécie, e isso nao
apenas no silên­ l 1 1i (as vivas acumulad as mts pedras sagradas, e elas fo-
1 ,1 1 11 utilizadas ; como o sangue do homem era e.la mesma
cio da consciência, mas por aLos materiais .
que � 0 1stiLui
1 1. 1 1 mcza que o c.lo animal, el e foi utilizado com o mesmo
Süo esses atos
1 rão � culto, e eles e\ identemcnle só podem

1 1 l i 1 c: t ivo e derrama do. I n versamen te, e m razão dess�


.
cons1s t1r em 111ov1mcntos pelos quais o
homem imita 0
anima l com o qual se idcmifica. Assim entend
idos os ritos 1 1 11·.,mo parentesco, o homem empregou a carne do anr-
i m irnt ivos a parece m como a forma prime

ira d culto . 111.d para resta urar sua própria substância. Daí os ritos de
nhl;tçào e: ele comun hão . Mas, em última in�tii nc i a , todas
Acharno que é a tri b ui r um papel histórico
muito consicle­
rá\d a práticas que, a primeira vista, parece
m brincadeiras ..s.1� p r.íticas diversas são apenas variações de um mes-
1 1 11 , e único tema: por toda parte. na base. encontr:t-se o
infa1�t i.s. Mas. como mostramos, esses gestos
ingênu os e
desaie1rados. esses procedimentos grosse
iros de figuraçlo,;. 111L·smo estado de es;1írito i n terpretad o d i ferentem ente
traduzem e conservam um sentimento ele história e as dis­
altivez, de confia n­ 1 onforme as situações, os momentos da

posi ções dos fiéis.


ça e de veneração inteira meme compa
rável <lquele que
1 '1 1 1 1 .0 \

1' I{[ ros PIACULARES


\ AMBIGÜIDADE DA NOÇÃO
1 11 > SAGRADO

Por diferentes que sejam uns dos outros pela nature­


t..i dos gestos que implicam, os d iversos ritos positivos
' l l ll' acabamos de passar e m revista têm um caráter co-
11111111: todos são realizados num estado de confiança, de
il 1·gria e mesmo de entusiasmo. Em bora a espera de um
l<'nntecimemo futuro e contingente sempre se acompa-
11 l t � de a l g u m a i n certeza, é n o r m a l que a chuva ca i a
< 1uando chega a estação, que.: as espécies animais e vege-
1.1is se reproduzam regularmente. Uma experiência, mui-
1.1:-. vezes repetida, demonstrou que, cm princípio, os ritos
produzem o efeito que se espera deles e que é sua razão
de ser. São celebrados com segurança, desfruta ndo-se an­
lcc:ipadamente do feliz acontecimento que eles preparam
l' anunciam. Os movimentos executados participam desse
l'Staclo de espírito: têm o caráter grave que uma solenida­
de religiosa sempre supõe, mas essa gravidade não exclui
.1 a n imação nem a alegria.
São festas alegres. Mas há também festas tristes, que
têm por objeto ou enfrentar uma calamidade ou, simples­
mente, relembrá-la e deplorá-la. Esses ritos têm uma fisio­
nomia muito particular que procuraremos caracterizar e
t lf)A REl/(,f< l.\ 1
426
1 / l\l\r lf'1l/S ATf17 fW..\ RrtVAfS
AS FORMAS /!U{.lfFVTAIU�'I n.t
'l.27
exp licar . É
111 , l 1:1 ccnmôni:i rotêmica acabava de ser celebrada
tanto mai s neccss:.ír io estud
que ir.10 nos revelar um n<>\'
O aspccco e.la \ida rel igiosa.
á- l os a parte por

Propomos cha mar piac ular 1 1 w 1 1po de atores e espectatlorcs deixava o kx..il consa
1 1d11 q uan do, de repente, um grito agudo se elcvo�1 e.lo
es as cerimónias e.lesse gi·
nero. O lermo piacu/11111 tem,
com efeito, mio só a vania
gcm de sugerir a ic.léia de 1 1 1 1 1 pamento: um homem estava morrendo. lmediata-
1111 1 1 1 1 todos se puseram a correr o mais rápido po�s!vel �
expiação, mas tam bém de
mais amp la . Toda infelicid
ler uma sign ificação bem cem

ludo o que é de mau aug adt·. 1 111,11or pane. enquanto corria, j:í começava a emitir gn-
úrio , Ludo o que inspira
menro.'> de ang ústia ou d sen 11 111., Entre nós e a aldeia, contam os dois observadores,
e remor necessita um piac
e, em c:onseqüência. é cham u/11111 l i 1, 1 , 1 um riacho profundo à beira e.lo qual vários home�s
ado piac ular 1 . Portanto, a
lavra parece própria para pa 1 l,I\ ,11n sentados; espalhados aqui e ali, a cabeça penc.11-
desi gn.ir ritos qut.' .,<.: cele
na inqu iet ude ou n.1 triste bram 1 1 1 1111e os 1oel hos, eles choravam e gemiam . Atrm essan­
'" 1 1 na cho . encontramos, conforme o costume, a aldc1<1
za.

.ida. �lull11.:rc,,, \·indas dL todas as dire�·1es, cst.1


\ 1111 dcitad<L'i sobre o corpo do moribundo, enquanto ou­
t rns .m redor, de pé ou ajoelhadas. espetava m no alto ela
1 ilil'(. a a ponta de seus bastôes de desenterrar inhames,
pi 1 1\ ocando-se assim ferimentos e fazendo o sa ngue es-
O luto nos oferece um prim
eiro e imp orta nte exem·
pio de ritos piac:ulares.
.
necessá ri a entre os diferen­
Contudo. uma distinção é 1 , 11 rt'f sobre seus rostos. Ao mesmo tempo, elas faziam

tes ritos que con stitu em o


luto. !lá a lguns que consistem 1 11 1 \ ir um lamento ini nterrupto. Nesse momento, chegam
em puras a b:.te ncões: é p
ro i b ido pro nun ciar o nom
1 1� homens: Lambém eles se lançam sobre o corpo en­
morto1, permanecer no loca e do q11,111to as m u lheres se levantam: ao cabo de algun s ins-
l onde ocorreu o falecimen
os parentes, sobretudo do to�·'. 1 , 1 1 1 1 es , não se vê senão uma massa convulsa de corpos
sexo fem inin o, d<.:vcm abst
tran hos1; as ocu pa\:ú<.:s ordin;1-
de todo conta to com os es er-st 1 1 1 rdaçaclos. l\o lado, três homens da classe Th a pungart i,
rias da vida são suspensas, 1 11 u i a ndo ainda suas ornamc.:ntações cerimoniais, ha v ia m
·• sent ado e, com as cos tas volwdas para o monbunc.lo,
da mes ma forma qu e em _
po de festa \ etc Todas essa tem­
s práticas d i zem respeito
cult o negalivo, exp licam-se ao , 11111iam gemidos agudos. Passados um ou dois m i nutos,
com o os ritos e.lo mes mo
nero e, portanto, não dev gê­ 1 1 m ou tro homem da mesma classe chega ao local, urran-
1 li > de dor e brandindo uma faca de ped ra . Desde que en-
em nos ocu par aqu i. Elas deco
rem do fa to de que o mon r­
o é um ser sagrado. Por cons
gu i n te, Luc.lo o que está ou e­ 1 1 1 >li na a ldeia , ele se p ra l i ca i ncisôes p ro fu nda s �a s co·
,.1�. nos músculos, de tal forma que, incap a z ele h:ar de
esteve em relação com ele
enc ontra , por co ntágio, se
) l\'. acaba caindo no meio de um g'.'-1po; �uas ou tres �u­
num estado relig ioso que
todo contato com as coisas ex cl u i
ll iL·res, parentes dele, o rer iram dali e 1pl t�am seus la �
da vida profana. _
ame nLe de i n tcrcl i çôes a l 10 �
••1 >hre as feridas ab erras, enquanto ele pz inene no chao.
Mas o l u to não é feito unic �

observ<ir. Atos positivos sã


< l moribundo só veio a falecer tard e da noi te . Assim que
o exigidos, dos qua is os pa
tes s;io ao mesmo tempo re n ­
agentes e pacienws.
Com mui ta frcq ü ência , esse i ll'll o;
. eu último s uspiro , a mesma cena recomeç·ou. Só
s ritos comecam desde o
momento em que a mon que. desta vez, os gen.idos eram ainda mais a.gudos. Hc'.
e parece iminente. Eis aqu
i uma 1 1w ns e mu l he res, wmados por um verdadeiro frenes 1,
cena testemunhada por Spen
t orriam, agitava m-se, feriam-se com facas , com bastôcs
cer e Gille n entre os War
ra-
,JS FOR.111 � FIE.1113.\TARJ::S OA
1//)A RELIGIOSA DF..'i RJ77.4/S
428
,, /'/U.\lJP,V� ,irrn 129

l 11 • . 1 m:•ssa, da qual se eleva um rumor de gemidos9. En-


pon tiagu dos; as mu lheres
batia m uma s nas outr as sem

1 11 1 1nto 1s::.o, as mulheres recom e('a m a se lac<.:rar a cabeça


que nenhuma procurasse
se p roteger e.los golpes. Fina l­
mente, ao cabo de uma hora
, teve lugar uma procissão à 1 1 w·a exacerbar as feridas que se fazem, chegam a em-
I " ' \: ,1 r pontas de bastões incan(il!scentes 11 .
luz de tochas, ; 1través da plan
ície, até a :.írvore cm cujos 1
ramos o corpo foi .
_
depositado'>. _ .

Sej � qua l for a viol ênc ia dess


Esses tipos de prát icas são gerais em toda a Austraha.
as man ifestações, elas 1 1 1 11os funerários, isto é, os cuidados rituais dedicados ao

, 111.1\ er, a maneira como ele é sepultado, ctc .. mudam


sao estn tame nte reguladas
pela etiqu eta. Os ind i\'ídu
os
, 1 onl onne as tribos li e, numa mesma tribo, variam com a
�ue se :aze m incisões sang
rent as são desi gnad os pelo
:�stur,n e: eles devem
mante� com o morto relações
1cnte sco d eterm i. na
de pa- 1.!.11 k'. o sexo e o valor social dos indivíduos•L. Mas as ccri-
das. Assi m, entre os War rnmu
caso observado por Spe ncer nga, no 1 1 1 1 1 1 1 1as do luto propriamente dito rep rod uz em sempre o
nas coxas eram o avô mate
e Gillc n, os que se feria m 111 .. s1110 rema; as vai 1ações sao apcnas d<.: detalhe. Por toda
rno do de funto, seu tio mate
no, . o tio m�ncrno e o irmão c.le r­ 1 t é o mc.:smo silêncio ent recorcac.lo de gemidos'\ a
sua mu lher'. Out ros são
obng�c.los a cortar as costeleta
1 1 1c�ma obrigaç;io de cortar os cabelos ou a barba••, de c.:0-
s e os cabelos e a cobrir em
seg � 1 da_ o cou ro cab elud
1 11 1 1 .1 caheça com argila, com cinzas ou até com excre-
obngaçoes P? rti c ul::i rmente
o de argi la. As m u l here s
têm 1111 111os•5; por toda parte, enfim, é o mesmo furor e� se
severas. Devem cortar �eus H• 1lpear, cm se lacerar, em se queimar. No ccntro de Y1cto-

c� )el�s, cob nr o corpo inte
iro de argi la; além disso, um 1 1.1 quando acontece um caso de morte, as mulheres cho-
silencio absoluto lhes é impo
sto durante todo 0 tempo do
IL�l�, que pode durar até dois anos. Por caus 1 1 1 1 1 , lamentam-se, rasgam a pele das têmporas com suas
a dessa intcr­ 1 1 1 1 1 ias. Os parentes do defunto se laceram com fu ror, cs�
l '"t i;tlmente se foi um filho homem que per
d1çao, não é raro que, entr
e os Warramunga, todas as deram. O pai
mu­
J .,1tl' na cabeça com um tomahawk [machado de guerra) :
lheres de uma aldeia sejam
condenadas ao silêncio mais
co� pleto Elas incorporam
tão bem o hábito que, mes
ªP?s xp1rar o penodo do luto,
: mo , 1111tt' tristes gemidos. A mãe. sentada junto ao fogo. que1-

te a li nguagem falada e emp rega
renunciam \·oluntariamen­ 111.1 o peito e o ventre com um bastão incanc.lcsce�ce . . . As
�uagem dos gestos, que , aliás , manejam com
m de preferência a fin­ , , /t's, essas queimaduras são tão cruéis que ocasionam ª
1111 1 1te"'" De acordo com um relato de Brough Smyth, eis
.
l�dade. Spencer e Gille n conh
notável habi­
eceram uma velha que havi " que se passa nas tribos meridionais do mesmo Estado.
a
\·,s11n que o corpo é baixado à cova, "a viúva com�ça SL�as
ficado sem falar d u ra nte 1m
1 is ele vinte e qual ro a nos».
_ . �
, , 1 i111ônias fúnebres. Co11a os cabelos da parte d 1a nte 1 ra
A ce imô nia que descrevemos inau gura
sen � ele ntos qu e se sucedem
uma longa
durante semanas e meses. d.1 cabeça e, wmada de um verdadeiro frenesi, pega bas-
Ela e renovada nos dias segu
intes, sob dive rsas formas.
G ':' pos de homens e de m u l
1 1 11 ·s incandescentes e os aplica no peito, nos braços, nas
heres se mantêm sentados no
chao, chora ndo, lame nrando-s 1 w1 n<1s, nas coxa�. Ela parece deleitar-se nas conurns que
l inflige <;eria temerário e. aliás. i n ú t i l tentar dete-la .
e e abracando-se em mo­ �
me ��os dete rmin ado s. Esse
s abraços ritua is repetem-
se 1 1 1 1 ,1 11do, es gotada , não cons<.:gue mais andar, esforça-se
freq uentemente enquanto
tem, ao que parece, a necessida
dura o luto. Os indivíduos
sen­ ,; 11 ,d,1 em dar pontapés nas cinzas do braseiro e lançá-las
de de se aproximar e de 1 1 1 1 todas as direçõ<.:s. Caindo no chão, pega as cinzas com
se comunicar mais intimamente;
são vistos apertados uns 1� mãos e as esfrega em suas feridas; depois arranha o
contra os outros e entrelaçad
os ao ponto de form ar um
a 1 ' 1 1 1prio rosco ( a única pane do corpo que os bastões in-
l '
\

í3 l
/Tl A I�
130 AS FO/ll/AS EU�Hf!.\"/ARH OA 1 1/),-1 Rlil./(;/1 1 I /\l fl',I/\ ,HJTLnl� R

ia C.:: em o.;egui-
candescentes não tocaram). O sangue que corre vem 1111' •s tnb-.uo.;, J quem
. . preciosa relíqu
visório a:-.sim ela
Lurar-'L' ª" cinzas que cobrem sua:-. ch<1g<1:-. e, conunuamlo
. 1 o pro
'

. s·empre 1 a utu

l
·

1 1 11 1 1 1sm 1t1da, mas


• ik mãos em mãos e circu 1a
. grupo20.
de grupo cm
, a p·' 1 rcnte se go ­
li 1o;, n�t es� e 1 ' fu ror com que ca
a se arranhar, ela lança grilos e lamenLaçôcs"P. '
A descrição que nos dá 1low itt e.los ritos e.lo luLo entrL'
1 d
,u • · e' te desses mesmos
, 1'á existe algo
os Kurnai assemelha-se singu larmenLe às anteriores. l·m;i 1 1 1 .v queim a ou se corta
parox ism o é insepa-
1 >r que chega. ao ·
vez envolvido o corpo em pele:-. de gambá e colocado nu , 1 1 1 1 1 1 1cntos: uma de ficar impr essiona-
o se pod de� ·ar
ma monalha c.le casca de árvore, é conslruíc.la urna chou­ 1 1\ tI i l.1 cóle
.
ra . Na _u
enl!e \ ess , s
. prática s e as da ven·

1 mes·mo t Jrincí
nç·1s
1 , 1 , 1 llll as sen1elha

pio' c.lc que a
'
pana onde os pa ren tes se reúnem. " Lá . estendidos no
P
·

\nu 1 as roced e m to
ch�o, eles lamentam sua sorte, di zendo, por exemplo: 1h·1 1 nça e que,
1 1 1 , • 1 lv reque,r e
,. A única difere
-fusões <le sangue 1os.
no outro estra nl

'Por que nos c.leix:asLC?. De tempo:-. em tempos, sua dor


·
L
s sao parent�:> e ' ..
·

1 1 1 1 1 1 1 t a so, as v itima ; dcta, mais


exasperada pelos gemidos penetrante:-. emilidos por um • ve 1

deles· a mulher do defunto grita meu marido


. ua1111� ntL
. . Ç.Oe

ex.. mui,. 1r cspe
1 precisa mos
L
.

con-
- S. i·urídic-is· mas

1
morreu, ou
c.l·1s .
t nS lltlll

t te.lo
'

1 1 l 1t ionada
ao cs '
ritos to
a mac, meufilho morreu.Cada um dos presentes repete o . se vincu la aos
de que .m an .' :"tr,� ela
\ 1 1 1.1 mostra r

11111 1 L1os qu •a·is


mesmo grito: apenas as palavras mudam, confonne o laço
c.lc parentesco com o falecido. Com pedrns afiadas ou 10-
1
· anuncia o hm-
1,
·
·
por uma cen-
0 luto termi na

1eda t es,
mahawks, eles se batem e se dilaceram até que sua� ca­ �m cenas
l
.
soc .·
'. ·

nc1a ·1 . lcanr:a ou ult


1·• 1tJ',tssa
.· a qu e se

• o
• •

lx:ças e seus corpos estejam jorrando sangue. Os choros e 111 1111:.1 cuja cfen·esce au ourais . Entre os
ilcbi-
s 1
· n
U1pm
. o · n·1a
encer �ac:ienro é
ao tlas .. cenm
· -

os gemidos continuam a noite toda . " 1 11 1 1 1 oduz por ocas1 cha ma do


\ 1 11nt a. esse rito de
nw. Spencer e G t
A tristeza não é o único sentimento que se exprime desse s ritos . ttm
durante essas ccrimônias; urna es péci e c.le cólera geral­
ram ' c.10 1· s
· 11e n ass1sn �
· ·

cm horu,, t d e u m
. a
d e uma
ho mem, o outro,

'
mente vem jun ta r-se a ela. Os parentes têm como que 1· 1.1 celebrado últimoiz.
que nos. demm e.lo
r orn '
. a desc ri,"
.. ío
. por manu1•atura
11111ll1er. E· 1s de um gene-

u m a necessidade de vingar, por um meio qualquer, a ·

·i rnc n tos

1os Cbim1 1tilia


morte ocorrida. Vemo-los lança rem-se uns contra o:; ou­ Come
, ça-se homens e
pelos
n in muito partic
ular, cha mat
1· écie
tros e buscarem ferir-se mutuame te . Às vezes o ataque é resina ,
1ra1111 1n·ita
esn de
· pe·l·1 5 mulheres · Com Ltina
real. outrns vezes, fingido19. llá ca:-.os, inclusive, cm que
1 ant·n,ais

anterio rmen te rcco-
chos c.le ca belos que parentes da
'
queno·s ossos te
s , a, ca
es péci es de combates singulares são regularmente organi­ lixa m-se pe
,
zados . Entre os Ka itish a cabeleira do defunto pertence lltidos e gua re.lado
.
: .
. ge nte s eles são pre sos a
. Co mo ptn . .
ne cer am

uma dessas f.a i· x , ·
mort for nor-
por direito a seu genro. Este, em troca, de\'e ir, acompa­ as ,ulheres usam
a
·is de cabeça que
nente com P1umas
nhado de um grupo de parentes e amigos, provocar um a-bra nca e
·
. . de cacatu
maltnente . 1u �ta 1
fcnntnl� ��
de seus irmãos tribais, ou seja, u m homem d a mesma rativo s, as mul� 1eres
. . , d s es prepa
de papagaio. � e o de diferen-
1<.úncm se cm
classe matrimon ial que ele e que, por esse motivo, teria
eia tam 5 us c rpos
o grau de pa
5Ua a .
defunta.
podido igualmente desposar a filha do morto. A provoca , rentcsco com a
tes cores, con f°rme
,.1 hra çat .. 1as
mo nao pode ser recusada e o:-. dois combatentes se infli­ às outr as durante
. . umas
gem sérios ferimentos nos ombros e nas coxas. Termin;1- \pós perman ecerem tem po em que em i·
mesm o
m ind toS, ao
do o duelo, o provocador entrega a seu adversário a ca­ u ma deze na . de . . -
poem e·m rn·' 1 rcha pa ·
.imntc rrupto elas se
uma certa etstanc·i a
tem um gemi do u m irmão
bel<:ira que havia provisoriamente herdado. Este último, ,' enco ntrnm
ra o túmu lo. A
r' •

por sua vez, sai a provocar e a com b a ter um outro de


A\' FORJ/,JS ELE.llF..\1ARES
0/J llfJA
432
REU(dCJ.'>A 1 1/(/\1 //WS Am1 /)fil Rl7l1AIS
d e san gu e ela fal eci
da, aco mp anh ado
fl1<ío11 trih<11s dela
Todos se sentam
de dos ir a lgu ns povo ocorpo antes de <;er definitivamente es­
ções recomeçam. Um pitcbí1� co
no e.hão e as lam
eni a . .
1 1 1 .1 1 1 1 1 . l 1ca exposto_ nu1�a espec1e de plataforma am1a a .
1 1 �·• ilhos
nte ndo os Ch imu
en tão apr ese nta
do ao irm ão ma
rili a e de uma arvore,. deixam que ele se dccompo-
1 11 1 ' ( ,·ntamentc a 1 ·'· acé que nao restem mais que os ossos'
is ve lho , q u e o a

co ntra o estômago perta _ ·
_

: diz-se que é um
1111• • io então recolhidos e, c'?m e_xceçào
me io de aliv iar sua
dor. Separa-se um . de um úmero, e
pôe na cabeça por alg unsCh imurilia
desses
1, I
.
no .mt c' n· or um ton111g ue110. O ú mero é n­
e a mãe da falecid
o " •�1t.1c.los de

a
ins
cado no fJilchi que os ou tro nta tes ; a seg uir ele num es tOJ O
. · cle -casca ,
. o•
de - v a1 ·e o1·naclo.
s homens ape rta m, cada u m ,
é rec olo 1 '' ' ido ele cliferen-
1
.
po r sua vez, concra o peito. Enf 111. incrras. cstO JO cva o .io a
.
e d campamento me io cm
im, o irmão coloc
·

O
mu rilia na cabeça a o Chi­ I> i i• .ntos e gem.idos das m� 11:_er�s. Nos dias que seguem,
·

das du as irmãs ma
b velhas e todos
1 , ld 11.1 se uma s c-, 1-1·e • de o.:nmonias tote � n11·c'·

tomam a marcha re­ relacionadas


mãe atira-se várias
em direçào ao tum
ulo . No cam inh o,
a " t I< lll'l11 do delunto e à 111stona 1111 t"ca dos
.
;·1 santepassados
vezes ao chão, pr
_

beça com um bas t<io pontiagu ocurando co ar a


1

do . A cada vez,
n ca­ 1 I• lon naram o da. . .- qu.m
E . d o todas essas ccrimônias ter
111111,1111 que se proce( . 1 �, '·i n rito de encerra menta.
am e pa recem pre
mu lheres a levant as outras
que ela se fira. C
ocupadas em impedir 1 lma vala, com li mt.i . c.en
, lí 1�lelros de profu nd idade e
hega ndo ao túm
.
ulo , ela se precip
bre o moniíc:ulo de ita so­ 1 1 1 1 , 1 1 ro metros e me •io de compnmento, e.- aben·'i no terre-
terra, procur<1
. 1 · Antes · executou-se
destruí-lo com as

en qu ant o as outra mios, \.' rimonia , no chão • a uma cena


s mu lheres dan çam l
111
literalmente em
1 ·
ma dela. As mães ci­ 1 11· 1.1noa da l i , um desc� c10 totem1�
A • 0 ue representa o to-
-1 tguns los l ugares �nde o antepassado
tribais e as lias (
i rmãs do pai da fale
da) seguem seu exe
mplo; também ela
ci­ 1i 111 l1 o mono e •
r .
�css�nd��:�1��� �ema pequena cova 101
s se atiram ao chã
se golpeiam, se feremmu tua mente; seu
o, ' 1d iu. Bem �eno
s corpos acabam
' ''.ida no chao. Dez ho e 1 1 1 nta cl os avan am en
·.

ficando completam
ente o e c b rto de sangue. Ao cabo _ ç -
um certo tempo, de ' I • > e m fila e, com as m·1os cruza • da s atr'1s ,. , da cabeça e as
s
são retiradas da li. ' .
As irm: h mais velhas - c1m ,· a da vala A um da
ahrl'lll encao um
bur..1co na terra cio
túm ulo , onde dep
1 1 rnas Jfasla(1,1s,. . colocam ' se por
. -
tam os Ch imu rili a previa
mente despedaça
osi­ d11 .....ina1 . a!> mulheres entram na a Ideia no mais profundo
mais, as m:1es trib dos. Uma vez .111'"
.
. ncio; aproximai ldo -sc poem-se . em fit-1 indiana a u ' I n-.
_

ais se lan çam ao


chão e se ferem na · ' .
s co · o ue contém o
• '

be<o·a umas <1s out n1- 1 1 . 1 debs scgL� ranclo


ras. Nesse m m
nt , "os ch ros e os
o e o n
ge­ 111 11cro. A segu i r , todas s_ªe,\ :� ª�1� <�� chdo � apoiadas nas
_

o
·

midos elas
grnu c.le excmu lheres
i1açào. aoa red
g
or pareci�1111 l
corria po r
n u e , qu e
evá- l a s
ao Cr l t imo a c >
11 i s e nos j oe l h os , � a s_sa�n' ��ç 1 n >o ( h v-Jla entre <IS per-
bcno de argila, co­ corpo � :O r
o a' u 1;1 gra de estado
O
seu
11.is abenas dos homens._ c a l
.s
dava-lhes uma apa rência . n
dl' excitação sexual. Ass 1117 q u e u' ltima mulher passou,
final, a velha mãe de espectros. No
foi a
única a permanec ;
wtlfam-lhe o estojo, que e leva o P•a ra a cova junco da
o túm ulo , comp er deitada sobre
letamente exaust
a e gemendo de
ce" . As outras ent bilm en­ qual permanece um ve, lho· - ' este com u m ' golpe �eco que-
ão a levantarame ret iraram a arg ila
cobna 1 1.1 o osso sao '. ados
J
fun ela cerimônia e ,
que

seu corpo. Foi o . e os restos entcrr precipitadamente


do luto l•. li
Entre os Warra mu 1 >uranle esse temr)o '-1s· mu 1e res permaneceram a fasta-
, · ·

nga, o rito final


rísticas apresenta caracte­
' L1s, de costas voltadas pa ra '\ c�n� e' lhes é i nter(1 1 to

.
baM anc e pa nic u lare
parecem se verific
s. As efusões de
ar, mas a efervescê
sangue
não ' L'r. Mas . quando ou, em o e;�achado, elas reli­
duz de outra manei
ra.
ncia coletiva se rra­ i .1111-se, soltando gricos e gcm1c 8?ros. O rito foi consumado;
0 luto terminou2�.
434 AS FONMAS HL!iA1t:NTARIJS DA
l'/l)A REL/(,/OSA I \ l'N/NC/PJlf.Ç A 7771Jl)/JS RITUAIS 455

li
1 1 r:1m u m .lf sorridente e conversem com a maior natu-
1 1 hdacle cio muncJo.!V. O luto nào é um mo\ imcnto natuml
1 l.1 sensibilidade privada, machucada por uma perda cruel,
�sses ritos são de u m
t i p o m u i to d i ferente cios
a ntenonnente exa min que
amo s. Isso não que r dize r
se possa encontra r entr que não i 1 1o1s um dever imposto pelo grupo. As pessoas se lamen-
e aqu eles e estes semelha
nças im­ 1 . 1 1 n . não simplesmente porque e� tejam tristes, i�1as por­
q11c são obrigadas a se lamentar. E uma atitude ntual que
portan tes que . teremos
ele assinalar; mas as dife
.
vez seiam mai s evidente renç as tal­
s. Em vez de danças ;:ifeg
res, ele deve adorar por respeito ao costume, mas que em lar­
e a cal ­ l-1· ' m ed i da é
cantos, ele represe nta çõe ,1•

man� o esp rito, sã? cho



s dramáticas que distraem
ros, gemidos, em uma
i nde pen dent e cio estado '.
afe t i vo cios inc l iv ­
.

man ifest�ç�Jes mai s var pala vra, as duos. Essa obri gaç ão, aliás, é sancionada por castigos mi­
iada s da tristeza ang uMi
uma cspecie de piedade acla e de i 1cos ou sociais. Acredita-se, por exemplo, que, quando
_
n�. F verdade que dur
mú tua que ocupam ago
ante os lntic hium a tam
ra a ce­ 11111 parente nào cum pre o luto como comém. a alma cio
bém há efu­ 1 1 1orlü segue seus passos e o mata�º . Noutros casos, so­
1cdad e não confia às forÇ' a S religiosa s a tarefa de punir os
soes de sa ng ue ; mas são ª.
ob lações feit�1s num mo
de � i ed oso ent usia smo . Se vi me n t o <

sen time nro s que exp rim


os gestos se asse mel ham
, os negligentes: ela própria intervém e reptime as tas rituai �. fa}
Do !11esmo i:1'1C:dº: os rito
em são d i ferentes, opo
stos até. _
'>e um genro não presta a seu sogro as obngaçoes funer�­
s ascéticos imp lica m mui
vaçoes, abstinencias, mut tas pri nas que lhe deve, se não pratica em si as incisõcs prescn-
ilações, mas que elevem

porta as com uma firm
eza i m pa ss íve l e uma
ser su­
es péci e de
_ a u �n
1.1s, seus sogros tribais retiram-lhe a mulher e a dao
sc ren ida�e. Aqu i, ao con o u t ro .i l . Assim, para ficar ele a cordo com o costume, as
trário, a prostração, os
choros sao a regra. O asce gritos, os \'ezes forçam as lágrimas a correr por meios artificiais�2.
ta tonura-se para atestar.
a seus De onde vem essa obrigação?
Etnógrafos e sociólogos geralmente
olh�s e aos olhos de seu
s semelhances, que está
sofnme nto. No l u to as
_
, pessoas se mal tratam
acima cio
para prova r com a resposta que os próp rios indígenas dão à questão.
se contentaram
que sofr em. Reconh ecemos em
todos esses sina is os tra­
ços característicos dos rito Diz-se que o morto quer ser pranteado, que, ao lhe recu­
s piac ulares.
De que maneira, portant sarem o tributo ele lamentos aos quais tem direito, ele se
o, eles se
Ur_:i prim eiro fato é cena: o luto exp licam?
não é a expressão
ofende e que o ún ico meio de evitar sua cólera é confor­
mar-se às suas vontacles33.
Mas essa expl icacâo m i LO lógica apenas modifica os
espontanea de emoçõe
s indi viclu ais2 <>. Se os par
ram, se lam enta m, se entes cho­
mortificam , não é por
que se sint am 1ermos cio problema, sem resolvê-lo, pois ai.nela seria pre­
pessoa lmente atingidos
pela mo rte de seu próxin1
mente pocl� ocorrer, em o. Certa­ ciso saber por que o morto reclama imperativamente o lu­
casos particulares, que
c-: pre�.')a SCJ<� realmen a tristeza to. Dir-se-á que faz parte ela natureza do homem quer�r
te sentidaz1. Mas , de man
nao ha relaçao a lgum eira gera l, ser pranteado e lamentado. Mas explicar por e�se sc nll�
mento o complexo aparel ho ele ritos q u e consutu1 ? IL� to. �
a entre os sen timentos
experimenta
cios e os gestos executa
dos pelos atores cio rito
momento mesmo em 2ll. Se, no atribuir ao australiano exigências afetivas que o propno ci­
que os q u e choram pure
cem mai s vilizado não demonstra. Admitamos - o que não é eviden­
te a priori
arrasados pela dor, lhes
sobre algu m .assu i to tem

d irigem a palavra para
poral, acontece com freq
conversar - que a idéia de não ser logo esquecido seja na­
te de fi s i on omia e de
q ue mud em i mec l1�1ta men üên cia tural mente gratificante ao homem que pensa no futuro.
tom ad-
' Hestaria provar que a lguma vez ela ocupou suficientemen-
ASFORMAS lilllME!•.rt'A
RJJS 011 l'lnA REl/(/
/I A ' 11' 1/S ATrt1'DES Rr!UAIS 437
le o con1çao
dos vivos parn
' • 1 1 t l• 1
que se pudesse
monos urna ment
atribu ir aos rnzoavel m(·n1 .
o rr· ro pelas exigências do mono; mas
t , plicam

precisamente ele sa 1 e
se imeirame alidade que proc
me dessa preo
cupação Sobre
ederia qu.1 -r de onde lhe::. \cio c::.sa
que um tal senti li• I'� .10. Ao tnves
. J
-
verossúnil . tudo, parece in .
, ele poder ser v1sLa com0 um Lruísmo,
• .

i riLO e' por isso, insurl-


men to tenh a podi
i • 1 u > obscura quanto o propr
apaixo nar .
{

hom ens que não do obsidiar t' ·


, -·o
ela hora p resente. ti
muiro além esta vam habit
uad os a pensar
Ao comr,í rio de 1 1.arJ explicá-lo.
l 1 1 1 im, mesmo que· encomra
desejo de
elo luto,
sobreviver na consi dera r 1 1 ' ssemos as razões dessa
mem ória dos vivo
s com o a orige
·

cabe antes pergu m -


• 1 1 1 1 1 1 ·l· nclenle trans�o rrnaçao, restaria explicar por que
wz
ntar__.o;e o próp
l1
ins1i1u ído, rio luto, uma . .
não teria despe ipcnas Lcm ponrra ' urna vez que não dura além e lo
rtad
hll < urnpn'dos < >s n tos
mcntaçõcs o a idéi a e o
gosto das la
•.
póstumas. o mor ·to volta a ser o que era em
ld t i 1111 parente afen��� � cl
·' •

A inte rpretaç<i .
o clássica reve c �v��:cio que pôe a serviço
stentá\ d
la-se mais insu
·•·us o� poderes n tJC o l
ainda qua
ndo se sabe o .
.
não é feitu que cons titui o 1 n�va condiçüo:H Do-
luto prim itivo .
simplesmente de Ell' 1 1 11,. é visto como um gen10 � . l�orn sempre pronto a as-
1 1 1 1 os que 1 ia, pouco atormem,1va.
das àq uele piedosas lam ent
que não mais ações dirigi·
existe , mas ele duras . 'como explicar essas
crifícios. O rito
e cruéis sa absti nências . . , .
não exige apen " 11 i vo lta s sucessivas? S e �s maus sentimentos que s e
pense m as que as pess
mel ancol icam oas l l 1 lli1tl'm a , a 1 ma viessem un1camerite do fato de ela não
peiem, q ue ente no defu mo,
mas que se gol­ . .
d' .
se mortifiquem, 1 1 1 i1 l'star em v da eles dever"iam .permanecer invanavc1s
, .

·• o luto é decorrenc1a isso, ele nüo devena r·md ·a r .


me rn . Vim que se lace rem, que 1 • '.
os, inclusi ve, que se quci­ . .

nlio arrebat algu ns se tortu .


ament o que, às ram com tama­ .
evivem a seus
vezes , não sobr Fssas exp 1 1caçoes- rrúticas cxp1"rmen1 a idéia que o in-
t l 1�·· 11<1 faz do nto, na
fcrirnemos. . .
-

Que razã o tem .


o morto para , .
- 0 0 prop110 1 1. Lo. Podemos porLamo
sup lícios? impor-lh es esse
U ma tal cru s a realiclade que elas tradu-
elda de denota, . _n os- colocar r
il 1,1,1 l as para 1ace :-
1 111, mas desfigurando-a. S.
mais que o de sua parle, .
desejo de não ser algo e luto diferencia-se (1 as ou-
1 1 , 1 lormas c1o c·ulto pos1t1vo
esquecido . Para
º,1.i" uin aspeCLo pelo q u a l se
con t re pra _ ,

que ele en­


1 · , �· t
zer em v e r sofr
1111 ' .1sseme'lha·. tambem e e e er· e) c.Je cerimô nras co 1e l.1-
odeie, q u e e r os seus , é .
preciso q u e os
·

seja ávido ele seu


,

sangu e. Essa fer


\ · " que provocam, nos �ue delas participam, um est.'.
recerá, cen ocid ade pa­
ame me, natural do
rito n ece aos q ue consi ,

deram todo espí­
,

ssari ame nte . i, vk·rvcscência . Os sen.tlm:n Los superexcitados são clife­


uma potê ncia
: .a mesma · É presumível
Mas sabemo m a l é fica e tem
s que há espír ível . . x c1taçao e
• • 1 1 t t:s; mas a s�pt:��
pl i ca que a itos de todo tipo
. Como se ex­
·

alma do morto 1 '"1 t.inlo que a expltcaç�- · _ o dos ritos alegres seja suscet1vc1
rito n1au? seja necessa riamente ,

Enq uanto o hom um espí­ 1, .1pl icar-se aos ritos tnstes, cor ' condição de que seus
em vive, ele ama . n 'l

11 i mos sejam Lranspos.w_s .


troca favores seus pare ntes ,
com eles. Não é
log o l i berad estranho que sua
a do corpo , alma , tão Q u a n d o u m tnd1 v1�lu? n rre o grupo fam i l i a r a o
seu s sentim se despoje insw
entos antigos nian eamemc de
·
para tornar-se 'Ili.ti pertence scntc-se durun u !d 1 ºo e,' para reagir conlra es-
or? É um�1 n:gr · • 1'n fel icid
atorme ntad um gênio ma u e
·
.;1 dim111u1çao, se reune Um.t acle comum tem os
,

a geral , p o rém,
u 1l·smos efeiLos que a c1ie�ad·a de u m acomecimemo 1e
conserva a p
-

ersonalidade do que o morto


e J 1' ,z :
os m esm
porta n to ,
os ódios e os
vivo. tem o mesm
mesmos afetos.
o caráter,
"i \a os sentimenLos coletivos que,. por · sso levam os in­i
es tá longe ele
se com pree nder
A meta morf
ose, di 'viduos a se . , pro. curar e a se aprox11nar. Vi os inclusive :n
i·ssa necess r'dª de de concenuaç.1<
verda d e q u e por si mesma.
os indígenas É .
,,.
> afirmar-se as vezes
admi tem isso im
' om uma energia pall1c u Jar.
, .

pl i c ita mente . - · .
as pessoa s se abraçam, se en­
. .
,
438 AS FONMAS lli.EJl1ENf'A Nl'5 DA VIDA REUC!W t 439
l 'NIW'/PAIS li 71TUJES R171IAJS

lacam, apertam-se o mais que podem umas ele inr ensidade.


craçao. _Scntc�
contras as ou 1.,[L'Za. Qtnndo a dor chega a esse grau
exasp
tras. Ma1> o c.� tado afetivo n o q u a l se _
cncom ra cnrão " ie ele cóler:: 1 e
grupo reflete as circunstâncias que ele 1 1 1 1 11 . 1 se a ela uma espéc
atravessa. Não so ir algum coisa. As
a
1 necessidade de queb rar, ele destru
mente os próximos mais diretamente con�ra os outros.
atingidos trazem a c , �nas se voltam contra si mesm as ou
encon tro sua d o r pesso al, c o m o també 1
m a socied adl· 1 ,, ilpeia m-se, ferem -se, q:reim am -se, ou e�ta� se l ; �çam
exerce sobre seus membros uma pressã _
_ o moral para qul· algué m para golpe a-lo, fen-lo e queim a-lo. 1 01 por
harmo nizem seus sentim emos com a , , ,111ra
situaç ão. Permi tir entregar, dura�te
1 ,1 , que se estabeleceu o coslume de se
que �le� p�rmaneçam indiferentes ao Parece nos muito
golpe que a atingl' orgias ele tortur as.

1 , 11 ,vável que a vendeta e a caça de


, 11110• a verda deiras � .
e a d 1 mmu1 sena proclamar q u e ela n<
io ocupa nos seus cabeças nao Le��ª ' 11
a. Urna fa • H t l ra origem. Se toda morte é au·il?u
c�r�ço _ es
o lugar a que tem direito; seria neg;í-l íc.la a algum sontlc�10
mrfra que tolera que um dos seus possa
morrer sem ser 1 1 1, 1gico e se, por essa razao, acred1 ta se q�e �> '.n�rto dcv:
pranteado testem unha com isso sua falta �
de unidade mo , neces sidade ele enL<>ntrar, a
1 \ mga<lo, é que se sente l
ral e de coesão: ela abdic a, renun cia rreg�r a c�or
a existir. O indiví­ víLim� sobre a qual desc�
ligado à sociedade
' !l l.rlquc r preço, uma
, , 1 cólera
duo, po'.· sua vez. quand o firmemente _ e se v�r bus_car
natura lment
ri� res1s�e�tiae-.
vrtrma
j 1 1 1 a , pois um estranho é um sujei�o mino
coletivas. Essa
de que faz pane, sente-se moralmente
compelido a parti­
cipar de suas tnstezas e de suas alegria de s1mp.iua vo-
s; desin teressar-se
ha nada �ele que
ido pelos sentun entos
, , 11110 não está proteg

parent e ou a um
delas seria romper os vínculos que o unem _
à coletividade o, não
seria renun ciar a querê-la e contra 1.rdos a um vizinh
dizer-se. Se o cristão' e clestruuvos que
ll'd iace e neutralize os senLimcntos maus
É
nas �·estas comemorativas da Páscoa, sem dúvida, qu� a
se o judeu , no ani� pela mesm a razão,
versa n o ela queda c.le Jerus além, jejuam 1 monc despertou.
e se mortificam m, serve de obie-
1 1 1ulher, com mais freqüência que o home
10 passivo aos ritos mais cruéis do luto;
não é parJ manifestar uma tristeza espon con:o ela te� �m
taneamente sen�
tida. Nessas circunstâ ncias, o estado interio
r do crente na­ social , é mais direta mente designada para o
rncno r valor
da tem a ver com as du ras abstinências
a que se submete. papel de bode expiatório.
Se está triste, é sobretudo porque se obriga _

absu·açao com­
a ficar triste, e Vê-se que essa explicação elo luto faz
obriga-se a isso para afirma r sua fé. A ú n icas forças
atitude cio australia­ noção de alma ou de espíri lO. As
no duran te o luto explic a-se ela mesm pleta da
a mane ira. Se ele menLe impessoa l :
I L'almente em jogo são de naLureza inteira
chora, se ele geme, não é simplesmente pela morte d� um
para traduzir uma rtadas n o grupo
s;ro a s emoçôcs despe
de
tristeza indivi dual, é para cump rir um o meca nismo
dever que a socie­ memb ros. Mas o primit ivo igno�a
seus .
dade cm volta não deixa ele lembrar-lhe
na ocasião. pratic a�. Portan to�
psíquico de que res�!.ta,m tod,as essas
Sabe-se, por outro lado, como os sentim _ do ª, fori�r uma �x
en tos huma­ quand o procura justifrca-��s, e obnga
nos se intens ificam quand o se afirmam
coletivamente. A ele sabe e q�e deve
tristeza, e.la mesma forma que a a legria, p l icação muito diferente. l udo o que _
se exalta. se ampli­ nte. Como toda obnga çao des-
se mortificar dolorosame
fica ao reperc utir de consciência em consc , ele busca a se�
iência, por isso erta a icléia de uma vontade que obriga
acaba se exprimindo exterionnence na
tos eÀ""llberames e violemos. Não é mais
fonna de movimen­
a agitação alegre
� cdor de onde pode provir a coerção
rea lidade lhe parece
que sofre. Ora, ha
certa e perfe1t�­
.
uma força mor-ai cuja
que observávamos há pouco: são gritos, que a morte pos
urros de dor. Cada mcnte indicada para esse papel: a alma
um é an-astado por todos; produz-se algo .
como um pânico que ela pode se rme-
em l i berdade. Pois, quem mais cio
......

AS FONl! IS FU!.
lfE.\TARfü DA 1 m11
440
REU(,'/t � 1 /11,1/\ 111'/VDF.S R/'II,11./S
· � ,s que sua I )ropna
ressar pelas ren
· · mone podl· r
,,erc· uss; ;.,
sobre.: o.� ' i vos?
Ima ina-s . e' po . , . mi 1 •mcntos cm que ela passa por um:i provação
se infligem um
marem as ,
exigências dela '
;
Lrat mento anuna
� tnto, que , se e:.tes últin1
tural , e p ra se •
� confor-
1 1t 1t 1 1 'l11110de energia apaga ameia mais LOmpleta-
111 e i s deitos do desamparo produzido na origem, clis-
.

�. ��
. o1 a . ssim. .. _
F
.

dcve Ler intervindo que a ideia de alma


p s� 1orm n t 1 1 1 1 . 1 1 1 �l', assim, a sensação de frio que a mone sempre
o � ; na mitol ogia do lu to
P r outro lado, como , 1 1 1 11 1 s igo. O grupo sente que recupera as forcas pro-
l l uem a ela, ne
cias inumanas, �se caso, ex igi· n 1 . 1 1 m:nte; volta a ter esperança e a viver. Acaba sain-
cumpre sun
1 1 i l• • 1 1 1 1 0, e saindo graças <io próprio luto. Mas, como a
, , .or que, ao
�1nimava, ela despa deixar o corpo
e de todo e qu· 1 que.'
.menr o
·
li 1 1 ' l"l' se faz da alma reflete o estado moral da socieda-
JOu-s
h umé1 no. Assim a quer sent1
se explica .i
que faz do pa 1 , 1•ss; r idéia deve mud<ir quando o estado muda. No pe­
. . me ' t,, mor fose
rente de ontem �
t 1 ,1
• ns 1ro rm
u m intm1g .

' ' 11 1 1 1 d l · abali memo e a n gú st ia , a alma c.:ra representada


o temrc.lo Ess·" .
gem (I<) 1 li to '. e 'i n
- ,
nao esta na ori
; tes. cor1 se . açüo
d
·

.
ue•·nc ra
" ·

·1·ra (1 uz a mu da n(' ª
<J ue ocorreu no
q · dek ,i .
.

.' � 1o .1r1c.:n. \'o e.lo


·
r raços e um ser ma léfico, inteiramente ocupado
·

1
'
I '' 1sc.:gutr os homens. Mas agor.1, quando to<lus
·· . ,,
po: nao pra n teiam s t·
c.:
o monº porqu e gru se scn

é tc.:-
11
mido porque o ele e remido; ele
pranteiam . lo 111 dl· novo confiantes e seguros, deve-se admitir que ela
do esrad . ' o .a liet1vo .
Mas essa muda nça sua natureza primeira e seus primeiros sentimen-
po rá ri n , pois élS c e rimô 1
1 1 t • 11 1 1ou

ni a s. do luw, ao mesm
tem de ser tem-
, , k· ternura e solidariedade. Assim é possível explicar a

o · pouco a pouc
res u ham dela po o L<.:mpo que
' • -",.m - l he um term 1 1 . 1 1 1v1ra muito diferente como ela é con ceb ida nos dife-
ncutra li7..am as pr o elas 1• momentos de sua existência35.
. óprias ' _caus�s que ocasionara
1111·s

. o 1 ut0 e a 1mpr
dan ca . O que ,, m essa mu� Os ritos do luto não somente determinam alguns dos
t
a
< n" , .
t , 1 1 Kt cres secundários atribuídos à alma, como também
• s
'-• ' a ongem d
que se n t� o gru �
fraq uecimemo ess< lo de en-
seus me mbros l\,f· o q u a ndo perde um de
' · ' '· 1s " "ssa impressa 11 111 sao estranhos, talvez, à idéia de que ela sobrevive ao
. . o tem "ºr ef
. tios ou u os
m<ir os indivíduos ! eito aprox i- , , ,, po. Para poder compreender as práticas às quais se
1 i l1111L'te na monc de um parente, o homem é obrigado a
uns
'a sSOCJ;J
.
menlL' l'lll conta to' coloca -lo'i· mais ·
mtJm · <i

1o de ai-
·

• ._, -1 os. . n LI 111 mes . i 11 o estac


ma, e de llldo isso 1 0 indiferentes ao defunto. As efusôcs
que elas não sf
resu lta uma se � . - , HT
. . �a mo c.le �econfono que
compensa o enf
1
�1°)dnic n.I.
rnquecimento d1· sangue que se praticam tão amplamente duran_Le o luto
verdadeiros sacri fícios oferecidos ao morto-16. E que d o
com um, é que.: un S� , existe pr:into em
s sem pre 10

porta nto, sobrevive algu ma coisa; e como não é o


em �o ntar com
pesar do g 1 e,
a colcri vidaclc, a
quc sofrc L r , n a_ o
os outros e
l'stá des-
1 1 1orto,

. poem
mantclada. C h , r o q u"" nesse , nrpo, que manifestamente está imóvel e se d eco mp õe, só
m um cmocôcs d
momento .só .�e -

' t n· s. teza e
em co- po e ser a alma . Cenamente, é impossível dizer com exali­
('> ' , ai. nda
tristes·, mas. co
com ungn r' e toda h -
mun o ·ir n·t
liorma que for,
dao qual foi a parte dessas considerações na gênese <la
1déia
comun ao d as
cle,-a a v1· rªl'd
consci ê ncias
1 socn
· , sep · sob <i
c1ona1 e.las man ife
.
v10 de sobrevivência. Mas é provável que a influência do

· 1 ac.e ·
1 ·..
' l A " Iencw
qL iars · se
, · " excen n1lto tenha sido aqui o que é alhures. Os ritos são mais fa-
cc.:ss..í ria e obrig
staç- oes , atraves da<;
ex rime nc.:-
co ium, :nest a
1 i lmente explicáveis quando se imagina que eles se d iri ­
i ncl usive
atoria mente a d�r r_
quc a socied ade � gem a seres pesso<iis; os homens foram induzidos, porta n-
nesse momento,
do que nunca f) .e f;. 10, a ampliar a in fluência das personalidades míticas na vi­
esta mllis \'iva e
· aro quando o s atuan re
ente, e1 e reage
' e11111ne1110 social
·

chucado c.lolorosam é ma- da religiosa . Para pockr explicar o luto, eles prolongaram
de ordin :írio·. jama com mais força
' 'i·s nos apega do que a existência da alma além do túmulo. É mais um exemplo
mos ramo à noss
a famíli a da maneira como os ritos reagem sobre as crenças.
lí42 AS FOR.IM\ il.E.111:..\TARl:S
n.1 1 7{),I RI':UCd0'\.1
. 1 li\( m4/.\ .1Jm UF.\ RrnAJS 13

pu1l:111 1
Ili
1s
s
re li g ios ao; ou sobre as forças da natureza,
Mas a morte não é 0 - 1 1 1 • • 111.1\es de solrimemo que os indi\íduos infligem ..1 si

pertu rbar uma comu
nida d . � ;�� a�oncecimemo capaz ·
' para os horm
dt 1 1 1 1111JS. �OS territórios e.lo
,
Ol1e, é também í>Or tonuras,
1 111 01110 jeju n s prolongados, vigílias, danças continuadas
ent 1"1s tc.:cerem 0u d
"
outras ocasiões de "e :n.s, muiw.,
1 - de-se e .�e angus tiare m 1 1 1 n l'sgota mcnto <los dançarinos, dores físicas de todo
·

. , prever que La nl
-. os australiano1>
r><>r isso no
nhecem e p ratica m o u ' )cm ·
.

. co 1 1 pn q u e se busca a p azig u a r as potências q u e n< i o se


F
tros. ntos
111• •"IJ'.11n favoráveis aos homens."39 Os s u plícios a que os
.
notá \el porém q u e ' apen a.s um nec1 L 1 e no - .
piac:ulares além elo luto
.
n umero clt·
• .
.. 1 · . observado
exem plos se.: enco ntrem
n os 1e :nos . 111d 1gl'nas se submetem com esse objeti vo os deixam às
\ L ·1·s n u m tal estado de fa d iga que eles são i n cap a zes
,
Um ,nri . ,1. dos res. ,
h11 ullc vários d as, de ir ã caça10•
. me110 ' . nto desse genero ass<::m
�los que acabam de
'
. . , t•liia·se muito
i
1. so bret udo p a 1 .1 lutar con tra a seca que cssJs prüti
ser e·stuth dos. Lcmh
mo, ent re os . Aru nra. c a da grur)o
cer Ki Oll'l l mc.: nte ·
, loc· d .i
ramo-nos de co-
. t 1.1. 1)UI• \1rtu des ex
• - 1 "·'º cmprcgad.is, ja que a falta de á gu a tt'm por consc
· . .
1 . -

de ch u ri nga : é
1111ponan1es ·1 �ua
��i�. .' �� qt1l ncia um<1 e:;cassez geral. Para remediar o mal, recorre-

um pal ád io coletivo . <.. o c .rao


est� n'.1 l gada a própr

sone da coletividade
so ! ia 1os meios \'iolentos. llm deles costuma ser a extração
d1 11111 de n te. Entre os Kaitish, ror exemrlo, arranca-se de
. · � n�o i� 1?1 1g< s ou brancos
co nse gu em rou ha r um �
1 1 1 1 1 i ndiv íd uo u m i ncis ivo que é suspenso n u ma árvore " .
dess.es. lesou 1 os
rel1g1 osos, Pssa
· 1 ·
i1ca.
perda é cons· ide 1·acJ•1·
infonúnio dá ensejo a u l 1 11rc os Oicri, a idéia d a chuva é mais estreitamente asso-
u ma ca, e·1 1111dade pu)
que tem todas as
L Ora, esse
1 1.1da à de incisões sangrentas praticadas na pele do tór..i x
.
m �llo
ricas de um luto·. os �o Gtr..i cterís-
, dos braços 1z . Nesse mesmo povo, q ua ndo a seca é mui­
rpos sao _ cob
. . ; 1�
enos de •,1 1g1
f1 1 eia dum me duas
e os Arunta permanece . ·1 a 1Jranca
.

;j _ " 1 prolongada . o g ra nde conselho se reúne e convoca to­


a chorar e a se lame
ma ais � semanas
l.1 .i tribo. I� um verdadeiro acon tecim ent o tribal. Mulhe-
pe ª man eir..i
to é determinado não uma r>rova de que o
lu­
íl" s:lo em iadas cm toe.las as direçôes a avisar as pessoas
_
alma do mono, mas como (• concehicL! a
m oral do gr u no T , 1J<.:s.�m1 1s , pelo esta d o l ' • t ra se reu n i re m num local e nu m momento dete rm i n a
por <..a us· 1 .m
i- emos a qu i com
. ' .� i ­
i o, um :rto
.
.
dns . Uma vez reunidos, todos se põem a gemer, a gritar

ele't . que,
sua esrnH ura, não se
e que, no emanro (: .
distin'g e d o luto prop � por

n d ente de toda
riamente dito '1m voz aguda o estado miserável da terra e pedem aos
rito ou de gênio n�alé�c� n0(,.'<1o de espí- l /11m-11111ra (antepassados míticos) que lhes dêem o po­
d
��
Uma o u t ra circu i l l'r de fazer cair uma chu va abun<lame1:1. Nos casos, m u i -
mesma natureza é o est
nstân cia e i . motn· I�� . a cerun . ônias
ªdº de a � o em que � da 1 1 1 raros aliás, de haver excesso de umidade, uma cerimô-
111.1 análoga se realiza para deter a chuva. Os velhos cn-
1

a sociedade a nós � se encomra
que 1ia b 1. tam os a rredore
msu f1c1en tes "Os. i· n d'
1 ram ent;1o num verdadeiro estado de frenesi " e os grit os
..
igena s
colhe 1
·r as
. h'go E 1c,
·

s do
cam ig u a l me mc con1·u y " drz Eylmann, bus- '.' que a multi dão emite chegam a ferir os ouvidos•\
ra r a msu fJCien i.
ua do.� re('ursos ali" '>penccr e G il len nos descrevem . sob o nome de lnti­
e t·•1s.
menta res por meio de .
cJas práticas rit · •t as muita s

cerim onias secr


.
,. l h 1 um a uma cerimónia que poderia pc.: rfe i tam cnte ter o
,
·
·

uais· que se o 1)Serv •

ungucm das que foran a m ness,a reg1ao


origem
.
.
. :
:;e dis-
- -

·
i ' 't nrei JOrmcnre vi. nwsmo objeto e a mesma das rreccdentes: uma
de dan cas simbo·1·icas, . . stas • n ao e através
·
tortura física é rraticda para fazer uma espécie a nimal
.
orm1 me ntacões
de movunemos. m1m
des lu n1l)ran tes que
.
et1cos. -
nem de multi pl ica r . Entre os Urabanna, há um clà que tem por
totem uma esp écie de cobra chamada wadmmgadn i. Eis
· se
se procura agir . sobre
AS FO/ll1AS l!l/!,lfENlillU!S IJ1I 1 lf)A
, , /'f(/.\'G1PA/S ti nn '/)fiS NfnJA/S 1'15
'Í'Í4
/UiUG/OS1I

como procede o chefe elo clã para


i mpt'di r que e-;se ani­ me 1t.1r'· Pode se aprox i mar desses fatos o exemplo. cita
lh,
mal \'enha <I fa l ta r . De po is dc ler-sc ·
ornam cncad o, e le mais acima, de uma cerimônia especialmente celeb rada
1'·11.1 apagar os efeitos de uma falta ritual>3. Nesses dois úl­
ajoelh a-se no chão com os braço
s abertos. Um auxili ar
puxa com os dedos a pele do braço
dircito e o opemdor t 1 1 1 111s casos. cercamente, não há ferimentos, nem golpes,
finca, através ela dobra assim formada,
um osso pontudo, 111•111 sofrimento fís ico de nenhuma espécie; no encanto, o
c.le cinco polegadas de comprimento.
Faz-se o mesmo no "'" não d ift!re cm natureza cios precedentes: trata-se sem-
1 1 1 v de afasta r um mal ou expiar u m a falca por meio de
braço esquerdo. Acredita-se que essa
auwm ul i laç:io pro­
duza o resultado desejadom. Entre os
Oieri, um rito aná­ 11111a ccrimônia ritua l extraordi nária.
São esses, all!in do luto, os únicos casos de ritos pia­
logo é empregado para fazer as galin
has selvagens pôr
ovos: os operadores perfura m-s e
a pele do escroto ". Em ' 1 1 (;1res que consegu imos levantar na Austrália. É provável
certas tribos do lago Eyre, fura-se a
on:lha para levar os q11e alguns no:-. tenham escapado , e p od e-s e p resu m i r
inhalllCS a produzirlK.
1 u tlmcmc que outros nao foram percebid os pelos oh:-.er
Mas a escassez total ou parcial mio é
o único flagelo , 1dores. No entanto, se só esses poucos foram clescober­
l ,, até o prt!:-.t:nte, é que provavelme nte não ocupam um
que pode se abater sobre uma Lribo.
Outros acontecimen­
tos se prod uzem , mais ou meno s
peri od ica men te, ue h1g<1r i mporta nte no culto. Vê-se o quanto as religiões pri-
ameaçam ou parecem ameaçar a existê q
ncia coletiva E o 111it1vas estão longe de serem filhas da angústia e cio tc-
caso, por exe mplo, ela aurora austral.
Os Kurnai acreditam 1 1 1or, já que os ricos que traduzem emoções dolorosas são
que se trata ele um fogo aceso no céu
pelo grand e deus 1 1 '1 . uivame nte raros. Certamente, isso é porqu e o australia­
llll. se leva uma existência miserável , comparada à dos po­
Mungan-ngaua; por isso, qua ndo o pe
rceb em , têm medo
·n-. ma is civil izados, em compensação pede t ão pou cas
de que o incêndio se estenda à terra
e os de\(>re. Disso
result a uma gr..1 nde efeIYescência na
mão dessecada de mo110 à qual os Kurna
aldeia . Agita-se uma , , 11sas ã vida, que se contenta facilmente. Tudo o que ele

des \·a riadas e l a nça m-se grilos tais como


i atribuem virtu­ 1 1 1 vcisa é que a natureza siga seu curso normal, que as cs-
: "Ma nda-o em­ 1 . 1 �·úcs st! sucedam regularmente, que a chuva caia na épo
bor� , não deixa que ele n os queim
e." Ao me.<;mo te mpo , 1 .1 p revista, cm abundância e sem excesso; ora, as gra ndes
rea li za m-se, por ordem dos veU1os,
trocas de mulheres, o pvrturba ções na ordem cósmica sào sempre cxcep cio na i s.
\ssim pôde-se notar que a maior pane dos ri tos p ia cu la res
que é semp re s i n a l de uma grand e cxcita
mas l ice n ças sexua is são assina ladas
ção19 _ As mes­
e n t re os W
i i mbaio , 1 1 jos exemplos demos �1cima foram observados nas tribos
toda vez que u m flagelo parece i m
i nente , espec ialme nte do Centro, onde as secas são freqüentes e const ituem vcr­
cm época s de cpide miaso_
d.1 dciros desastres. Não deixa ele ser su rpreendente, é ve r­
Sob a influê ncia dessas i déias, as m utila�;õ
cs ou efusões d.1de, que os ri tos pi a c u l a res esp eci a lm e nte destinados a
� n-
de sa ngu e são às vezes consideradas um
meio eficaz para <'\piar o pecado pareça m quase de todo ausentes. No
1 1 11to o a ustral ia no, como todo homem, deve cometer ta l
curar as doenças. Entre os Dieri. quand
o acontece um aci­
1 1s rituais que ele tem i nteresse em red i m i r; pode-se pcr­
dente �1 uma cria nça, seus parentes se
d<lo golpes na cabe­
ça com um bastão ou um bu me rang
ue, até que o sangue " lll1tar' portanto se o silêncio dos textos sobre esse ponto
co rra pelo rosco. Por esse proceclimemo,
o mal e.la crianças •. Outras vezes, ima
acredita-se aliviar ;, , 10 �
se deve às i sufic il.ncias da observação.
g i na-se obter o mes­ Mas, ainda que os faLOs que pudemos recolher sejam
mo resultado por meio de uma cerim
ônia totêm ica suple- pnuco numerosos, eles não deixam de se r i nst rut ivos.
\

.I\" FOR.llAS 11LHF.\TARES DA '-17


l7D.� RBJ<r!O'i.I I /:l\t.ll'N\ ATfn DES Rm!M\

. 1 ares nas religi·,,. FIL


Qua ndo se estudam os ntos .icu 1c arra\·és das forcas coletivas que poe cm logo.
·
p i,
a, 1s .1 . l ona s rL1 1g1osas .sao md1\ um dcsa.-,tn: 4m.: ameace a colcti\ idJde?

mais . '
:nan�·adas nas

du al iza das el es pa �e m ser �� 1 1 n t 1111111emc


. . ·

. .s
estreitamente sol idá rios 1· t 1 se reúne,
1
como por ocasi ao de um luto. e é natural-
·m;ropomorfica:-; . Se o fiel se m
- d
i poe · , prl\ . .s 111•'1\ll' uma impressão de i n qu i et ude e de angusti a que
concepçó�� i · ,.a<.Ol
s
· '

' ícias· e mar a male vo1 enu. ·


ou se ubmete '·1 sev - para d csar lo1111na o grupo reu n id o. A experiência cm comum des­

que a tri bu i a a lg uns seres sagr


, 1
l 'i "l' ntímencos cem por cfcrto, como sempre.
' � : dos dos q a1s .
acredita dl· intensiílcá­

I< •., \o se a firmarem , eles se exaltam, se i nfl a ma m, atin-
pender. Para apa;d��ar s��
o· d 10 ou sua colera ele S "
, ._ an
rec1pa as suas exigência s g ol pera-
· . •

se para não ser gol pca " 111 um gr a u de violência que se traduz pela violt:ncia
do por eles. Parece Portan t
.

'
o que ess·1s l Xát"1cas so- J')Udl'
.
' 1 1 11 cs po nde n te dos gestos que os expri mcm. Como na
ra m s urg i r a pa rt ir do m
m�n.t� �11 1 q u� d euses e es pír ito1- 1 1 1111 lc de um parente próximo, as pessoas l�111c;arn gritos

" ..

'

pe.sso:.is 111 ora1s . ' ca1 11 1 1 1ver.'> . se cnfurecclll , sen te m a necessidade de rasgar e
fo e

y'
>
1zes
- , t 1, .
r a m con cebi d os · co m
xo s an a l oga.., ;i<; cio.'<
e par-
, ,· . r'º1'.· p�>r esse m ot l' .o l J d1 ,1 ruir, é para satisfazer essa necessidade que e las se ha
Ul·
- •

hum ·mos
Robertson Smit h acr'-"d1'tou po
l er. re. errr a u a d
�lla rc1 at r. 11•111. se ferem , fazem correr sangue. Mas, quando
nicr.d
as emo­
va mente recente os .sa c T . m
e
os. e xp1:1 1ono
oblaçôe.-, 'sacrific1 ·"• 1�s S gun o
s bem co m o as � rn·s tt:m essa vivacidad e, por mais sejam

que
esta ­
.• dolorosas
e l e as e•fl�so - e� de sa n� ue 1 1 1 da rêm de deprimente; ao contrário, denotam um
que ca racteriza m esses ricos _ .
do de efervescência que impl
·

leri a� � ido, a pnnc1p10 . uma mobilizac ao de


h.- ica co­
·

, un­
pies procedimentos de co mun
.10.. o ,iomem teria dcrra d.1., as forças ativas e inclusive u m aflu.xo de e nerg ia s ex-
, e o a l ta r f Y l r 1 cst rcrtar os vrnc
mado seu s·mg ul' sol�r · -
11 nores . Pouco importa que essa ex a l tação tenha sido
'
: '· .' ul os
· ·

que o uniam a ·seu deus O filo .


so terra adquirido um ca
rater piac ular e penal q ��
n 1o s. u s1.gn 1fica�_ o p rim eira
provocada por um aconteci mento triste, ela nao deixa de
·


- .
.
•l' r real e não difere especificamente da que se observa
esquecida e quJn do a
.
ados pcm1 itiu atribuir-lh,

\ a 1de1. 1 que se l in h a d< >s. seit:s
foi
. .., . 11.1s festas alegres. Inclusi\'e ela se manifesra as veze por s
. urna outra fun çao� 1 110\ imL·ntos da mesma naturc1.a: é o mesmo frenesi que
sagr -
\f· . .co 1n s
t:s

� ��
e if a m rit Sl' arodera dos fiéis, a mesma tendência às orgias
_ t>i. pr aculares já nas sodc
.,exuais,
· t rr·1) u ·r r-l h,
dade "'� tr:
··s: ''. : ic
1 l1"'1< > 1
n •· e 1m possrvel ª
... 111al certo de uma grande excitação nen·osa. Robcrtson
• .
cão tardia AI',. ��
1;��.,�" l< 1 º s. os que aca bamos de
es uma ongern
·

observa r, com -.mith já havia assinalado essa curiosa iníl ut:ncia dos ritos
exceção e u d '
' "'1 c > 1ndepen(l entes de q ua Jquer conc
cp- t r i stes nos cultos semíticos: "Nos tempos difíceis, diz ele
,

' lie . l ieuse


.
. s, nem t1 e esprn -
çào amropo môrnca . não se tr·at·1 - ·
quando os pensamentos dos h o m e ns eram habitual mente
' _.
·

s rmene i·as
tos. E por el:1s
-

mesmas. e cl u' .e 't·arnentc tiue '·1s ab · • :-.omhrios , el es recorriam à.� cxcitaçõe.s físicas da religião,
· "
e as efusões de sangu e imp .
.1ssim como agora se refugiam no vinho. Em regra geral,
:�10�
cdcm ' sse·z e cura m as
� .
·r esc-1
doenças. Ent re 0 riro e s e
·

e
q ue ele deve p rodu zi r, quando, entre os semitas, o culto começava por choros
nenh um ser esp iri t ua l v m 11.sc � · nr sua ação . ' Porra mo as l a m e n t ações - como no luto d e A dôn is o u como nos
e��m.,�� :11s
·

.rdc L m.1
persona lidad e-; mític as só . ta ;
n
i terv i . gr.rndes ritos expiatórios que se tornaram frcqi.icntes nos
mo ritu,i , e as servira m para
vez stabcl ec 1do o mec anis
: u ltimos tempos -. uma brusca revolução fazia suceder. ao
serviço fúnebre pelo qual se iniciam a cerimêm i a , uma ex­
coma -l o mais -- . faci lmen te repr
esenta\·d às inte ligên cias
. . cond . -
plosao de a l egria e v i\· acidade . " 56 E m uma pa l a\r t , ainda
mas elas nao sao . s de s • n o.a . Esse
. u.� c . e .
·

, x.1·.'>l
nismo foi insti tu íd o por outr
·
1çoe
mcca-
as razoes, deve sua eficácia que as ccrimôni as religiosas tenham por ponto de partida
uma outra causa . a
um faro inquietante ou doloroso, elas conservam, sobre o
AS FORMAS IIL/!,lfEN7ilR
F<; DA VIDA Rl!IJGJ<l\A
448
INl\c 111 11� A77TlD
.. fil Rm AI\'
esrado afccivo do gr
u o estranho r.las em ambos os caso1> o mecanis-
upo e dos ind ivíduos
mu lan cc. Pelo sim ple , seu poder esc 1 1111 1t•1
s fato de <;erem col
va � a ene gia vital. etivas eb, cl . Jh1quu.:o e essencialmente o mesmov.
Ora, quando as pessoa ' 11111

a vida - se1a sob a for
ma de irritação pen
s sencem em �1
���siasmo -, elas não crêem m1 mo
gre e _ osa, seja de all'
Lran qut l1za m, volram ne; portan to, Slº IV
a ter coragem e, sub
jetivamente cu­
� o riLo tivesse rcalmeme a fa s
0
do aconLece como s
d t m dos maiores serviços que RoberLson SmiLh pres-
E dessa m aneira que
pen_�o que se tem ia. ta o
movunemos de que ele é se atribuem aos 1• • l i.1 ciência das religiôes foi Ler posto e m evidência a
feit o, aos grit os em itid os
sangue d�r rnm ;ido , aos fer ao 1111' iigüidade da noção do sagrado.
imentos infl igidos cm si ou _ ,

0�1.tros, v 1 n ud�s cu rativas 'nos Ai> for�«1s religiosas são de dois t ipos Umas :;ao hcne­
l h ,1:;, guare.lias e.la orden1 física e moral, d ispensadoras da
.

ou rrc ven liva s; e, como ess


c. 11/_crenLc� scv 1cia s fazem nec
essa rié1 mc.• n1c sofre r, 0 prú
as
pn c� sol nm enw aca ba sen ­ 1d,1, da saúde, de toe.las as qualidades que os homens cst1
co�1urar o ma l, de cur ar a
do con sid era do um me io
de 111,1111: é 0 caso do princípio tOLêmico, espalhado por todas
cloenças1. Mais tarde,
n�a�or pane e.las forças qua ndo a 1, es pécies do antepassado míLico, do animal-prote�or,
,
r: ligiosas tomou a for
ª�'� a�e ma ele pcrso­ d11s heróis civilizadores, dos deuses tutelares de todo tipo
� s mora:s, explicou-s
. e a eficácia dessas
1ma �1?a ndo que ela _ priiticas ,. grau. Pouco importa que elas sejam c�nceb idas como
s tmh am por objeto aplaca _
ma lef1c ou irritado. r um deus pl·rsonalidades distintas ou como energias difusas; sob
? Mas essas concepçõe
tem o 1 to e os sentim s apenas refle­ ,unhas as formas, desempenham o mesmo papel e afetam
1Lt mesma maneira a consciência dos fiéis: o respeito que
� entos que ele suscita
pretaçao dele, n:io sua , são uma inter­
causa cleLerminanre.
_LJ ma falta ritu al não age
de outra maneira. Tam
inspiram está misturado com amor e reconhecimento. As
e l � e u a ameaç par bém n >1sas e as pessoas que estão normalmente cm contato
� :i_ a a col etiv ida de; atin
ex1�_ ten. ge-a em sua com elas partilham os mesmos sentimentos e o mesmo ca-
c1a moral, Jª que a atin
ge cm suas crenças.
a col�ra q ue cl� provoca se Ma s se 1.1ter: sao as coisas e as pessoas santas. São eles c�s lugares
afirma ostensivamente
energia, e sa col era e com rnnsagrados ao culto, os objetos utilizados nos mos r�gu­
s� ela for rnte�sam e
� compensa o ma l que a cau
n t e sentida por to e.los , é que
sou. Pois lares, os sacerdotes os ascetas, etc. Por ou tro lado, ha as
çao comeu� la e um
,

a infrri� potências más e impuras, produ toras de desorde�s, �ausa­


doras c.lc morte, de doenças, instigadoras de sacrilégios. O
_ .
a exc eção e a fé comum permanec
Le1r '1 . A uni dad e mo ral do e in­
único sent imento que o homem tem por elas é o temor,
gru po mlo está, por tan to
P�ngo. Or� i, a pena infligida a cm
_
nao a ma nif�st�çào dessa cól
título ele expiação não Ó se­ geralmente acompanhac.lo de horr�r: São e�as as forç:s �o­
bre as quais e pelas quais age o fe1 u cetro as que em.inam
era pública, a prova materi _
Com isso ela tem rea l m
0
de sua una nim idade. al ,

rep_a rador que lhe atri ente efeito dos cac.liiveres, do sangue da menstruação, as desencad��­
das por toda profanação das coisas <>antas, etc o; :sp�1-
buem. No fundo, o
_
esta na raiz dos ritos sen timento que
propriamente expiaLó
em n turez daq uel rios não difere tos e.los monos e os gênios malignos de toda espec1e sao
� � e que encontramos
tros mos p1acu arcs:� na base dos ou­
é um a esp éci e de dor
irritada que
formas personificadas dessas forças.
tcn e ,ª se ma nifesta
? Entre essas duas "alegorias de forças e de seres, o
r por ato s de destrui
_ rn
ahv ção. Ora ela se contraste é o mais completo possível. chegando inclusive
a custa daquele mesm
o que a seme, ora à
custa de ao antagonismo mais radical. As potências boa:, e saluta-
451
AS FORMAS Fll:'!\IFVTARI�'> DA l'ff)A REU<;J 1 1 f/ '.\I.\ ·l7Tfl f)Jf..\ RfllAIS

ne-.ma ol)se
. •i"\,3,. 30 pode se aplicar
,. ,
a u m gra n­
1
11111 11l ru l 1e inter0·ições
\
res repelem para longe delas as que as negam e as conrra­
alime ntares.
Por isso . .:is primeiras sao mtcrc.l1tas às segunda cia que uma

li 111 e
di7em
• , acont
1.isso ece com mui'ta frec1üên
ne sem mu-
1 1 1 1n pur.a ou uma
toe.lo c.:o ntato entre elas é considerado a pior das profana . m alc ' a se tor
É esse o
•fic
, s111ip les modifica

pote ncia

1

• • ·

1 11 d• n at u re za , ·
<:ões. tipo por excelência de interdição entre rn1 . çao das

' ><
- . mas por uma
n·ores un1a (.01s, ·
.

sas sagr.1c.las de espécies diferentes, cuja existência assina ta o u u m a. poten-


1
�an
1 1 1 1111·.t;incias cxte
t
m a do morto,
.

'
1 1 1 1 1 1 v 1 .ir, e vice
l amos anteriormcnte�9. As mulheres d u rante a menstru;1 '

al
,
,1
-v e rsa •· v ·imos
1
com o

e um pnnc1p1
ção, sobretudo ao primeiro aparecimento do mênstruo,

. .' .0 temido rransforma-se
o 1 uLo te nn ina. Do
.
, ·

a
.
1
1111 pi 1 m ntc

m ei r e mesmo
11 l'l"l\IO · prote·toi· •·1·ss11n que
1 0 impuras; assim, nesse momento, elas são rigorosa
sf
mente iso ladas; os homens não devem ter nenhuma rela
, 1 , que começa .
terror e
1111 ., 11 1 o cac.Iavc, .
por .ins.p 1· rar apenas
ção com elas<>0. Os bu/1-roarers, os churinga, jamais en
tram cm contato com o monon a . O sacrílego 0 cxduíc.lo e.la 11 1 . 1 n n amen ll>,
i .
. . a antro1 '.
e ll"l tJ <lo mais
· "
. tare.!e com o um a reh
L pra
qu1a
.
tt 1
1 1u.s
. . tt:m Cnt

\
üen
souec.lade e.los fiéis, o acesso ao culto lhe é interdito. Oc'
1n.1
r, , fre q .
• dessa
.
ia func
.. . 1 1es .'1usu
10 tio • •
.

1 11 l.1 nas souec.ac.


. , a P 1·c)va transtor-
." ·ahanas, e

.

clcncta;

te modo, toe.la a vida religiosa gravita em torno de dois


1 1 1.1� 1011• O anuna
· 1 totern 1co
1
, ' to 11o r exc
. e o ser san

111 1 para aque1e


pólos contrários, entre os quais há a mesma opos iç;1o qut· ·nd
1 evi dam ent e sua carne,
ciuc consome
morte . 0e ui

"era l , o
sacnlc-
p10
na maneira o
l \Ili \ pn. nc1 ·
entre o puro e o impuro. o santo e o sacrílego, o divino e

\\
-
u.: um � rora n o
de do po r
I\'' e si m pl csm e n
o c.liabólico. qu e foi c o nt a g i a

1. · ,)S·a bcnef 1ca ·. Esta


Mas, ao mesmo tempo que esses dois aspectos ela vi­ . muda de nature za ao
1 1 1 1 1 1 força re 1gi
· , l; 1na' cu 1 a ao inve's de santi lhcr e mbora
, 1)lt,i
da religios a se opõem um ao outro, existe entre eles um fica r< 1 . O s:r n-
11111dar c.Ie 11a
>

,
· ·

"lll' q ue prove m cJ
'
''i o é muitas
forte parentesco. Em primeiro lugar, ambos mantêm a _ · tais
· da 111u
0s órgaos geni

mesma relação com os seres profanos: eMes devem se


abster de toda relação tanto com as coisas im puras c.:omo 1dc ntcmc n te · 11n pu ro com o o da menstrti a ç
remec.1 , i·c

) cc )n t
" '
·

doença<>�. A 1
\
1
... 1

• ies empre
ga<.1o com<) um
com as coisas mais santas . As primeiras não são menos in­ ó acu sad a de
' i t un a imo lad a no
i s é
s sacrifíc.:ios exp
at rio
e
terditas que as segundas; sào igualmente retiradas de cir­ nel·1 os pecados qu
que concentrou
' ·

11npu re7..a, uma vez ne


· trata de expi· � r. N<1 e
c.:u laçao. Vale dizer que também são sagradas . Claro que • vez aba tida s u a car
ntanto u ma '

1
'. u i c.lo-
os sentimentos que umas e outras inspiram não são idên­
mp
. ados
eg nos co st m es mais p e

, i nbora a com
e c
e
ticc}S: uma coisa é o respeito, outra, a aversào e o horror. 1· seu sangu ope ra-
s·10
· a um a
. Lin\1' ,. 0 sei
• •

1
,
·

Entretanto, para que os gestos sejam os mesmos nos dois -,os<�'. Ao. contrJno, po r fun ção con sagrar,
. . norm' ·ilmente tem
casos, cumpre que os sentimentos expressos nao difiram
cm natureza. De fato, há horror no respeito religioso, so­
do rehg1osa que
produ z às vezes os m�sm �
os. ·fc1·tos que um
sacrilégio. ln-
os, obriga­
0 cm cert os

cas
' esteados . Dir-se-ia qu e se
a
brerudo quando ele é muito intenso, e o temor que as po­ divíclu�)S � 1 ue com u ngM

J cão mútua · o
u tro mo
dos a fu gi r um e.lo ?
t Hn aram
têndas malignas n
i spiram geralmente é acompanhado de
fonte e contamina
tem po os separa.
uma pengo sa
1 o qt e os
algum caráter reverencial . As nua nces pelas quais �e dife­ ao mesn10
· une
·

renciam essas e.luas atitudes sao às vezes tao fugazes, que dnculo sagr-Jt
Fxcmplos desse t 1 P '? , . .
'. de c m ,u nh � ão são nu me rosos na

is •1p1cos e o q
nem sempre é fácil dizer em que estado de espírito se en­ ue . e s obser va entre os
- 1·1a . U m dos· ma . inl as Quando uma criança vem
�: s v1 z .
con tmm, a.o certo, os fiéis. Entre certos povos semíticos, a Austra .

1
carne de porco era interdita; mas nem sempre se sabia Nan-inyeri e nas tn o seu cordão
pais c o nse rv am com cuidad
ao mundo, seus

com precisão se era a títu l o de coisa impura ou de coisa


\
l'.S RJTl!AIS
1 \ /'/U\C/PAlS AT/11.ID
452 AS FORMAS EIE.llF.1VTARES nA l7nA RliUG!OSA
ros um a Pressão pa-
cc so11re seus memb . te .za,
' irnta m, d cxe1
• sua m:-.
.
,
. n 1 f"1ca uv os
, . •

nstrem , or 1 · tos s1g


, .

umbilical que conteria algo de sua alma. Dois indivíduos


a' 111es i·mpõe como
1 i que demo
colei ' qu e u m

que trocam seu cordão assun conservado comungam jun­ ou .sua � .a · E .'1 1
e
, .
e
geme i.' de, infligir-se
.11a angusua fer ime nto s ou
tos pelo fato mesmo dessa troca, pois é como se trocas­
dl'ver <le chora r, de ·e , taç col etivas, e a
sem sua alma. Mas, ao mesmo tempo, não podem se to­ prn·s essas ma nues õcs .
11 111igi-los a outrem,
'

reforçam, restt-
. 1 s testemu nJ1am e
car, se falar, nem mesmo se ver. Tudo se passa como se
i 11munhao - mo1a qu e ela
ecime ntos ameaça�
ia ue os acont
fossem, um para o outro, um objeto de horro�7. ao grupo a ener�
c.lo ass·11.. " ele se recupere. E
t \11 .:m
O puro e o impuro não são, portanto, dois gêneros � q
ml tln .,.. qu e
ner
,,
\',lm subtra·tr-lhe,
.

ixeta qu and o 1ma.


·

g1-
.

separados, mas duas variedades de um mesmo gêncro que o homem mtei·


l'ssa expenenc1a de,
'fico
.A •

. cu·a hostil
ida a
• .

con st1t uuv


que compreende todas as coisas sagradas. ! Tá duas espé­ s male
i1a, fora dele, sere
. s

' pode ser c.le.san l a da por sof rimentos hu-


cies de sagrado, um fasto, o outro nefasto, e entre as e.luas so ..,..
,li temporana,
sa - o 111ais estados co-
"

· que
· •

esses se r es . nao
·

formas opostas não somente não há solução de continui­


,

to,
_

m:1nos . Po1 1an ta :-.oh u m


. _ ' na ·. .soc ied ade
sao. a p1·op
vis
dade, como também um mesmo objeto pode passar de
letivos ob1euvados
.
utro lado, que as po-

uma a outra sem mudar de natureza. Com o puro se faz o sa )emos. ,


impuro, e reciprocamente . É na possibilidade dessas trans­
de seus aspectos.
tl'.•ncias benc
M�s �
' f'icas iYlO S'IO cons 1 ' t�t�1�1cºlas ' de
e
ou
ex .
J
1
tra
ri m
ma
em
ne ira ;
; tam-
, .
' v 1d a co1 e
iv
t. a
ltam da
a
mutações qúe consiste a ambigüidade do sagrado. . ud e
t.Hnbem el as. .ies. u . da(1e , mas vista num a attt
cm que se. a r·1rm

Mas, se Robertson Smith percebeu bem essa ambigüi­ Cscnta m a soc1e


hém elas repr a
saber no m o rnento
·

dade, jamais a explicou claramente. Lim ira-se a assinalar


hem <l1· rcre nte, a tr1buirem
,
. . co· isas a con
ta com ardor
·

que, como todas as forças religiosas são indistintamente ,


com confiança e ·ms
as
essas duas
'
·uos
. . C
intensas e contagiosas, é prudente abordá-las com respei­ · açao fins que pe1�·egue · omo
reahz . é surpreen-
e .ças têm uma . ongem com
-
não
l·spcc 1cs de 1or
lx1ra a. um
os ten1iam
,
ost
tosas precauções, não importa o sentido no qual se exerce
· ·1d·a.s cm tºido s op

sua ação. Parecia-lhe poder explicar, assim, o aspecto de e\'mg


scn
dente que, embora
·

­
. ·in1 .1m1al ment...". ·intensas e conta

parentesco que todas apresentam , a despeito dos contras­ natu reza, sci o-
: 1
uma mesma
, i· t:•rditas e sagra
c
'
as.
·

tes que as opõem. Mas, em primeiro lugar, a questão era


giosas e, portanto
� ender como elas
apenas deslocada: fa ltava mostrar por que as potências do Exata ment e po1 isso pode-se compre
m o
a vez que reflete
mal têm a mesma intensidade e contagiosidade. Em outros umas nas outras . Um
se transformam que es-
· 1 se encont o gru po bas ta
termos, como se explica que.; também elas sejam ele natu­ . ra
.estado afeuvo no qu<1
.
.

tle senudo .
• ·

1 ',m elas mudem


reza religiosa? Em segundo lugar, a energia e a força de
expansão comuns a ambas não permitem compreender de
se estad o mu < le para q
tenrnna,
.

e t,

,1�n c i c.lade doméstica c�tá _s�­
s ce
Assim que o luto
' p n·o luto ' vo1ta a ter confiança·'
os md1v1-
que maneira, apesar cio conflito que as divide, elas podem . re eles;
se transfo1mar umas nas outras e substituir-se em suas fim­
renada pelo
duos sao _ ru·tv1a
pio
· cios <la penosa p .essa
·
i ' o exercid a sob
o
po rta nto , � uc
sentem-se ma is �a
he s,
ções respcctivas, de que maneira o puro pode contaminar _ v nta de . Pa rece-l pa
enquanto o impuro serve às vezes para santiftcaf>!i.
espírito e.lo morto

a ·,rnd n�u seus
sentimentos ho stis ­

ra se tornar um p
rotetor )enevolen .� te As ou tra s tra nsm u­

los ex pli cam -se da


A explicação que propusemos anteriormente dos ri­
m<.!sma
tos piaculares permite responder a essa dupla questão. ettam os exe m P
taçôes ele que o
a san ud a de de
. u m a coisa , com é
Vimos, com efeito, que as potências más são um pro­ mane ira. O qu e faz , 11Jeto
. - . 0 de que
.
Se ,
. 1euv
ela e o
. .
duto desses ri tos e os simbolizam . Quando a sociedade ento co
mostra mos, o senum
c
atravessa circunstâncias que a en triste em , a angustiam ou
454
AS FONA/AS /iLE,lfE
NTARES IJA vmr1
REJJG/1 1
/\• li'I/.\ AnnDES Rl71r1IS
cm violação às inLer
1::m contato com umacliçõ
profana, o mL·smo semic nr r . 1
cs que a isola m, essa c
. er-;idade e1a vi·c1'l sc>eh
oisa
ttd ldl' l. a e 1 iv
lo .se e.-.tcn dc.:rá a esta p essoa ' l é que produzem,
nwn '

especial. Só que, quan do últim a e lhe imrrimirá u 1111 •lllO tempo, a uni. dade e ,1. diversidade dos seres e
' 1 ' • • 1s. 1s sagradas .
isso acon Lecc , ele s e m carár t•r

esta do muito difcrenLe


1 ,s, 1 am1)tgu1
· .. 'dade , a 1 ias · , . ' nao
, e' pa 1ticu l ar apenas à no-
daqu ele acha nurn
riLado pela profanação ele origem. Machucado, ir
natu ral impl ica, ele torn que essa extensão abu siva e anti t ln sagrado; algo desse m o caráter está rreseme
11 li n los os ritos que acabam ee er estudados. Certamen-
ou-se agre �� ;
lência destrutiva
, tend e a se vingarssivo e propenso à vio
1 ' 1.1 e sen c i a · istmg ui-los: con, funcl1'-los te ri a sido des-
, l d'.
ua ofensa sofri da. Por ·
.
essa razã o, o sujei to cont s
i 111l1t·<er
·

agiado (: visto como inva


por uma força vindema . os múltiplos aspectos d vida religiosa. Mas, por
ª- l1á' entre eles solução
e nociva, que ameaça dido
1 1 1 "' d1lerenles que possam ser, nao
,1, e i m l i nu i dad . Mw. lo p ·I con trário eles se sobrepocm
uele se aproxima; em cons rudo o qul'
wmento e repugnâ nci;1, eqüência, inspira apen as afas c
'" i .tos outroS e podem mesmo s
e º.
. ,

cado por uma tara. -�ªºestá como que manchado e mar ubsl{tuir-.se mutuamente .
11111:-. trnmos que ntu.s cJe '.-'1 ) I·aL.ão e de comun11.10,
·

causa o mes mo esta do pb.st ante , essa mancha tem por - n'tos ..
.f co inemor:mvos, c u i111xem com fri:q: üênc1a.

tâncias, consagra va e sant psíquico que, em outras 1 1 1 1111elicos, filos


i i 1 1esmas unçoes. Poc1cr-se-1·a
circu ns­
assim provocâda seja satisfifica va. Mas basta que a cólera , f)Cnsar que o culto negat1-
, mais. e1 aramen
- ·

ra que, alivia da, el<t cess eii:a por um rito expia tório, pa­ ' • , pelo menos, e • te separac.lo do culto pos1-·
e; o sent imento ofen dido 1 1 \ o· no entanto, vimos C fL1e o p n. eiro é capaz de pro<.1 u-
zigua e volta a seu .
uma vez, corno agia estad o inici al. Ele age por se ara­
.

11 �feitos positivos, iclê nt1cos aos l uc produz o segundo .
·
tanto, mais
e l ltn jejuns. a 1)Sttne
no
santifica. Como cont inuaprin cípio; ao invés de contamin · netas ' a uwmut ·1açõcs ' �btêm-se os
• 1..
1
ar,
ligou , este não poderia a cont agiar o obje to ao qu<d se . . .
',s e os sacnºf'1c1os
ll ll''imos resu uKlos que com comunhões ablações, come- •

giosa m ente indi fere torn ar-s e ele novo prof i1 1oraçõcs . lnversainente as 01e1 e .en, cl't tm-.
que parece ocupá-lonte. Mas o senti do da forçaano e reli­ p li<:am privações e renun , ' cia · . d . toda espécie. Enlre os n-
, transformou-se religiosa . . � \ a �s a continuidade é ainda
umento de purificaçã o. : de impuro, tomou- _P 'ªf��os de sofrime ntos, aceiLos ou
.se puro e instr tos ascéticos e os ntos
Em resum o, os dois pólo mais evidente: ambos �ao
pondem aos dois estad s da vida relig iosa corr .suponados, aos quais e atn·1)Ut' d-1 uma eficácia análoga. As­
os opos tos por que passa coda vida es­
soci al. Há entre o sagr sim, tanto as prn, ticas como as cre nças n-1,o se classificam
em gêneros separados. por n:1ais complexas que se1am
'
ado fast o e o sag rado
. as
· s, ela v1da, re1 tg
mesmo contraste que
. 1· os·1 ela é no fundo,
entre os estados de eufo nefa sto o
feria coletiva. ria e de dis­ manifestações cxrenore
eorresponde em loela pane
Mas, como ambos são igual una e simp 1 es.
• • • •

' a uma mesma


há, entre as construç mente coletivos, .
um ínti mo parentescoões mito lógi cas que os simbolizam , necessidade e em toda parte denva . de um mesmo. estado
lhad os varia m
ele natu reza . Os senti
cio extremo abati ment mentos parti­ de espírito. Sob todas as suas �o 1· 111as tem por oh1eto el e-
da irritação dolorosa ao o à extrema aleg ria var o homem -ac ima de s1. �1esmo e �roporcionar-U1e uma
dos os casos, há com unhãentu siJsmo exta nco; mas, em to­
. \-ida superior a que e1e Lena <>e ohedecesse unicamente a
.
mútu o em con seqüênci a elas consciênci as e reco nforto 1·tv1'dua1·s . .· ·1
· ·

o suas esponlane1·c1a' des me ' s crenças exprimem es-


dess a co mun hão. O pro sa vida em lermos de representaçoes, . . - .. os ritos a organizam .
fundamental é sempre
o colo rem clifereme o mes mo; apenas as circunscâcesso e regu Iam seu funcionamento.
mente. Portanto , em últim ncias
a instâ ncia,
e >'\ICLUSÀO

Anu nciávamos no inicio desta obra que a religião


' l m' iríamos estudar continha os elementos mais carnctc-
1 1. 1 1cos da vida religiosa. Pode-se verificar agora a exati­
t l.10 dessa proposição. Por mais simples que seja o siste-
1 1 1 1 que estudamos, nele encontramos todas as idéias e to­
d.1s as principais atitudes rituais que estão na base e.las re­
lig ioes, indusi\'C as mais avançadas: distinção das coisas
1 111 sagradas e em profa nas, noção de alma, de espírito,
1k· persona lidade mítica, de divindade nacional e mesmo
i n ternacional, culto negativo, com as práticas ascéticas
que são sua forma exasperada, ritos de oblaçào e de co­
munhão, ritos imitativos, ritos comemorativos, ritos piacu-
1.1res - nada de essencial falta nela. Temos, portanto, ra­
zoes para confiar que os resultados a que chegamos não
s�
i o particulares apenas ao totemismo, mas podem nos
ajudar a compreender o que é a religião em geral .
Objetar-sc-á que uma única religião, seja qual for sua
.1rea de extensão, constitui uma base estreita para seme­
lhante indução. Não f)retendemos desconhecer o q u e
u m a verificação ampla pode acrescentar d e autoridade a
uma teoria. Mas não é menos verdade que, quando uma
1 >l\JCLUSÀO

\nunciávamos no início desta obra que a religião


q111 1namos estudar concinh�1 os elementos mais caracce-
11 111 os da vida religiosa. Pode-se verificar agora a exati­
d 11 1 dessa proposição. Por mais simples que seja o sistc-
111 1 que estudamos, nele encontramos todas as idéias e co­
d.1-. .1s principais atitudes rituais que estão na hasc das re-
111:111cs, inclusive as mais avançadas: distinçao das coisas
-
, 111 sagradas e em profanas, noção de alma, de espírito,
.
d• personalidade mítica, de divindade nacional e mesmo
11 1tl·rnaciona l, culto negativo, com as práticas ascéticas
• j lll' são sua forma exasperada, ritos de oblaçi\o e de co-
1 1 1 1 1 11hào, ritos imitativos, ritos comemorativos, ritos piacu­
l 1 1 l'S nada de essencial falta nela. Temos, portanto, ra-
1• ws para confiar que os resultados a que chegamos não
-

�.111 particulares apenas ao totemismo, mas podem nos


1 j1 1dar a compreender o q ue é a religião em geral.
Objetar-se-á que uma única religião, seja qual for sua
lll .1 de cxtens<to, constitui uma base estreita para semc­
ll i.intc indução. Não precenclemos desconhecer o que
1 1 111a verificação ampla pode acrescentar de autoridade a
11111<1 cearia. Mas não é menos verdade que, quando urna
AS FORMAS Flf�
l//�VT,INfü fJA l f!)A l i �J(J
RELIG/I 4')9
lei _fo_i prov1 da por
ht•m f�• 11 · .. 1.
, pro
� uma e\peril·ncia
e \,ilida u111ver.salm cs>1 1 1 11i na• Fssc objeto foi concebido de dift•rcntc:s ma
entL'. Se m c..smo
lllll 1 li 1� naLurcza, infin ito, incognosc1vel. 1deal etc \la.., e.s
>.

o un1co'
• . . •

,1 s urpreender
cien tista ch eo ' num cas
• re
,., asse •
•d o e 1 a vida ,
caso fiosse o'-do ser
0 scg dil t renças pouco importam. Em todos os casos, as re-
mesmo que esse .
i 1 • <'llU<;ôes, as crenças é que ernm considemdas como o
, , dess
protop lásmico maia
· e conce.,er ·is
simples que se nu
das seria m anlic� ' · ver 1 es assim ohll I• 1 1 1 1 11 to essencial da religião . Quanto aos ritos, eles se
1, ,e, s
· a lodos os se
, da(
· r�s· · Vl\'OS,
• •

1• •
, . humil
ma1.s l'fevados. Se '

·inclus ive 1l1r111.1\am apenas, desse ponto d e vista, como uma tra-
. .. h porr
. .soc1ed·ades qut'
.tc<1
amo, n.is
am de ser estud
011
des 1 1 1 1 ,10 cxrerior, contingente e material desses est ados in-
.
1 Jcr a1guns dos · h 1 1 11 1� que seriam os ún icos a Ler u m valor intrínseco. Es-
ad·.is, con . seg u i. mos re·tl
··

. .
mente peH"c
sao IL'ita s a s noç - ,

elen
oes reli·
, nto.s. de que

l<:

1 l'l

1 , r·1z·1o p;1ra
g1os,1s mais ft1t Khni 1 l • HKepdio é tão dilllndida que, na maior parte e.lo tem­
,. .
..

i " • 11s debates a respeiLO da rei igião giram em torno ela


.

' ·.,

v n·ao

" ntai
0� res �-0\,��� '.�<Ili-.
. •1t<
.
'-
nao estend t•r

as outras n.:l igi ôcs


· ·
< •• ·'

ger-.i is de nossa pcs


quisa �: lo é con�d)f\'cl
cu nstânciai-. um
mesmo 'crieno .
llo, 1.: CJUt., <:onlorme as
ur
' 1 • 1 1 ".. t.10 de sa ber se t la pode ou não se conci liar com a
1 isto é, se, .10 l:1do do conhecimento científico. hií
possa ser dcvido
causa, ora d
outr·1 a menos que . . . as c Ln ·s c.
ora a uma li1g.1r para outra forma de pensamento, que seria cspec1fi-

l
liun co1 uma só un1a mesma 1 usas seiam no 1 1 1 1 1t·ntc: religioso.
• ·

P< ·1<.1
- ' e expn. mir aqui
· .

·

.

1deia não
'

• 1.ca 1 1c . 1 acc

·

u ma rca lidad" ,. 1 ·1 \las os crentes. os homens que, vivendo a vida rdi­


'" • ª unJa 1 d'·1cre · nte, a menos
• .

jll• •s 1, rêm a scnsarao direta do que a constitui, objeta m a


sim 1 m n c�
essa duali dade seja qul'
povos. as idéi a.� de
sag ��� � t
' � a �11
a
� n.:me. Se, em algu m
. ,_ �e deuses se
t ,s 1 maneira de ver que ela não corresponde à sua expc­
cam sociologica mente . expli­ 11<.'ia diária. Eles sentem, com efeito, que a verdadeira
' devc-sc �1 cnt1 f1 camen te pres l t i nt.•LO da religi ão não é nos fazer pensar, enriquecer nos­
'"

a n1esma exp l tCJ('<!o " ª


que, em princínio
. 1e
umir
• N• • tonhecimcnto, acrescentar às representações quc de

p<)\os nos quais . . para todos os

- .
mesm os ca ra cte r
ai-. mesmas icf e
·
c:s s
' " · 1s s ve
·· . . 1 '. e rifi q u e m c om os \ o ·mos u
ü ci ê ncia representações de uma o tra origem e de
1· r1ant o, qut:

es e ncia1s. S
, upond o no
nao estqamo.s engana
.f.e 1� menos .ilgu
11111 outro caráter, mas sim nos fazer agir, nos ajudar a \'i
· ·

mas ele nossas O ficl q u e se pôi-. cm contato com seu deus n.1 0 (·
dos ·
conclusões pode l g .
m ·ser � i im 1m g 'r.
_- ente enera lizada s. Che- 1p e nasum homem que percebe verdades novas q u e o
, i· n d uçao
gou o momen t o d,,
·1 s· F un 1ª
1 lt·screntc ignora, é um homem que pode mais. Ele sente
'- a n
,. resenta - l '· - dessa
natureza, rendo ,, no r base uma e'
,
>em e1efin icia
xpe n
-
· enc · 1
e menos temer 'ª 1·m si mais força, seja para suportar as dificuldades da
ária do que tantas
i_:-a<:�>- t·s sumár ias
'
gencr , .'-11·· ' \istência, seja para vencê-las. Está como que elevado
atingir de u m s,:1 1to
que, ao Lenta rem
.i essenc a
sem se apoia rem 1 da religião •lima das misérias humanas porque está <::levado acima
' rc1 ig1ao · · - em par-
na a na
· 1 ar, de. nenhu m·1
·
·1 ise
llcu muito se arrisc . a m a se perder
de sua cone.lição de homem; acredita-se salvo do mal, seja
no vazio. ' l ual for a forma, al iás, que conceba o mal. O primeiro ar­
t igo de toda fé é a crença na salvação pela fé. Ora, não se
pcrcehc como uma simples idéia poderia ter essa eficácia.
l ma idéia, com efeito, nao é senão um elememo de nós

vezes ' .os t�o


mesmos: como poderia nos conferir poderes superiores
, - ncos � u e procurar
Na maioria das .
prim ir a religião am ex- .1os que possu1mos por natu reza? Por mais rica em virtu­
em termos rac1o
tu cfo, um sistema na1s v1rnm ne·la,
antes de des afetivas, ela nada poderia acrescentar à nossa vitalida­
de idéias q ue' correspondia
a um objeto de natural, pois somente é capaz de desencadear as for-
tí60 AS FORMAS El.J!il1
J:.NrARES DA \'IDA RHL!G!0.\; 1
1 1\t ll'.'>ÃO
ças emotivas que estão em
nós,
zê- las crescer Do fat o de nos não de criá las nem de fa
como dig no de . ser amado representarmos um objeto ' l 11 mlamenta e::;teja objetivamcnte d� aco� o r: � ����:�
nos sintamos mais fortes; é
e buscado, não se segue qul
' 1 "' ' dela fazem os cremes. O fato m�sn_1� q ��
preciso que desse objeto ema o ela foi concebida variou infinitamente com as
nem energias superiores às
nhamos algum meio de faz
nossas e que , além disso, re i ' o:
' 1 ">t
,
é suficieme para provar que nenhuma �ess�s con-
.
ê-las penetrar em nós e mis ' p�·ôes a exprime de modo adequado . Se o c1ent1sta es­
rá-las à nossa vida interior. tu­
Ora,
as pensemos, é ind ispensáve para tanto, não basta que 1 iht.:lece como axioma que as sens�1çoes - de calor ou ele
·

l que nos col oqu emos em 11 1 1:· e 1 ue os homens experimentam corrcspon der:1 a uma
sua esfera de a<;<io, que nos
voltemos para o lado em que t 111sa o11 .JCOv - .� ersso não irá concluir que esta seia tal co­
melhor possamos sentir sua . i
preciso que ajamos e repitam
influência; em uma palavra,
(' 1111 i '1 p � r:c � �� � se��t \· c1 s Assim também, embora não
ioda vez que isso for ütil par
os os atos assim necessários, 1 ·11c 1 o 1m , ,g1 n ' i s "
: n�
, , essõ es sentidas , pelos fiéis n o

ponto de vista, percebe-se
a renova r seus efeitos. Desst: nnstiruem imuições �rivilegiaclas; �1 - o 11a �e � 1 ma razao 1�
., ª
portância ess e conjunto de
como adquire toda a sua im­ 1 •.11a pens.ir qu e nos informa m me1 11or so . r narure;a
atos reg ula rmente repetidos 1 .• 1 ·e ro que as sensaçocs . 1gares sobre a narure-
v
u
. De fato, que m quer que tenha pra ' ,l,' t�e o� �)�!pos e ele suas propriedades. Portanto, para cle·s-
-
que con stit ui o cul to
·

cado realmente uma religião ti­


sabe bem que o culto é que ' nhrir em que consiste esse o11�eto, •. p1·eoso que elas se-
suscita essas imp ressões de ·
alegria, de paz interior, de se­ l 1m submetidas a uma ela )Oraçao l � loga à que subsúruiu
ana
ren ida de, de em usi asm o,
que são, para o fiel, como . i representação sens�ve 1 do mun do por uma representa-
· ·

prova exp erim ent al de sua a


s cre
pfesmeme um sistema de sign nças. O culto não é sim ­ .10 cientí fica e conce1rual.
,

os pelos quais a fé se traduz \ Ora foi precisamente isso que Lentamos faz , 1 .,_'_ e vi-
exteriormente, é o conjunto e
dos meios pelos quais ela se i11os que essa realicia cle, que as mitologias conce1Jeram
cria e se recria periodicament

e.
b as 1rn1teriais ou em operaç Quer consista em mano­ 'ºb tantas formas diferentes, mas que e, a causa . objetiva
. •

ões me nta is, é sempre e.le .


r
que é eficaz. 11niversal e eterna e.las sensações sui f{eneris �ue com oe
- '

,1 expe1 rencr·a religiosa é a sociedade. Mosuamos quais � ��


Todo o nosso escudo repous
a no postulado de que forças morais que _ela dese n�o1v: e de e ue maneira ela
.-�

esse sentimento unânime dos


· •

crentes de todos os tempos l iesp:na_ esse sent memo de apoio, c.le plroteçâo , . ' de de-
não pode ser puramente ilus 1
um recente apologista ela fé
ório. Da mesma forma que pendencia tute 1'.tr que 1ig. · ·1 o fiel a seu culto. E a sociedade
1, adm itim os, portanto, que , o eleva ·1c1ma ele s1 mesmo, e,· e1a, inclusive, que o
crenças religiosas 5e baseiam as 1e .
num a experiência específica 1' ·'1Lz Pois o qu'e faz o homem é esse conjunto_ de �en;; rnte­
cujo valor demonsrrativo, num
certo sentido, não é inferior lecruais que constitui a c1v1 · · 1 rzaçao,- e a c1vilizaçao e ob ra
, -·

ao das experiências cie ntíf ·


icas, embora difereme. Tam th sociedade. Assim se explica o pap�l prcpon_derante cio
bém pensamos que "uma árv ­
ore se conhece por seus fru­ c�d�o em todas as religiões, sejam _quai� fo_rem. qu so­
tos"2 e que sua fecundidade
éa
lem suas raízes. Mas do fato l melhor prova do que va­ l Iedade só pode fazer sentir sua influencia se or u� ; nª�to
e e existir, se quiserem , um t. só será um ato se os indivíduos que a compoem - se reu�
··experiência religiosa" e de a
ela ter, de alg um a ma nei ra, 1 c u É eh ação comum que el a

fundamento - aliás, há algum


nha? -, não se segue de mo
a experiência que não o te­
do alg um que a realidade que
:��1�: �;c�:��
c� i � �_e �1r: :. afir�
uma coop�ra�ao at1v�. e o �s t�: =s � �� :n � � ��
� gs� ; � rn é i
� ��
colecivos so sao possive 1 aç a movimentos exteriores
' lf \JW
<+62
'
'f
) .
ASFOR. lllS EL!
�lfF\T.IRF\ f)A I " ,1 Rl:UG/(J\A 163

• con ·1o rmc


es1ahdec·c• mos 1 >
que os simboliz·1m
.1 .1�,10 qut• dom i 1 cma nto. ' H n a �ondi('üo de ver as re l igiões po r e sse â ng u l o
.
·
·•

I"' �,· 1x>uc pcrccbcr seu \'crdadeiro significado.


na a \ ida relig1o
. .

.�cx:iedade ser a s..1, pd o s u ples A j ulgar


n
1 1 l 1-. 1parências, os ricos com freqüência dão a impressão
sua fonte . fato de .1

1 < • pnações pu ramente manuais - unções, lavagens, re­


A todas as razõe
s que foram d· .
conceprno• pod,.. ''das pam 1uscif
ada uma u -1 · lt 1 • )('" Para consagrar uma coisa, ela é posta em contato
icar es.,,1
la de toda esta
.....
...r acres.cen

' Em nosso p
'
"' .,
t
Uma, que resul
· e rcu rs·o, esta 1
o bra
1 1 1 1 uma fo nte de e nergia religiosa, assim como, acual-
' nt,us . e1o pens·i
que as cmegorias Jelccemo.,
. , 1ogo a ciên
fundamc
. 1 1 1 1 1 11:, pa r a aquecer ou e le t ri za r um corpo, ele é posto
· rc l i gi os·1s v·imos c1uc

. ' mento
0 .. 1 1 1 1 1 ·o nta lo com uma fonte de calor ou de eletricidade; os
c:1a, tem origens

n' . . 1 . mo ;1comen·
mcs
1 •1 11 • l ' d ime ntos empregados num caso e no o utro n ão são
com a m a <>h e,
• · .

por consegumte
'
.

1n1· por outro


' com .1s e iversas téc

.til,' u m momcmo
que de la cle rivar· nica,
lado h·' . 11ualmeme diferentes. Assim entendida, a técnica reli
" nH1110
lt 1s,1 parece ser um..1 especie de mecânica místint. l\las
se sahe que l

ªdo e1a evoluç


r-·
"' lat
' 1· \...1meme av·inc·
.10 u
rt•gras ela mo ral • e u
'
ão as
·
.1ir · u.to nao S l' · ·
ll•tnohras m.ttcnais não sào mais que o invólucro
. .
d
. tstmgu 1 ra m das pres- ·

cnçoes ritu ais.


·
Pode-se pcman 11·rno sob o qual se dissimulam operaçôes mentais. No
r o d i zer e m
1. .
. 1..csu rno, q u e
l 1 1 1 1do, trata-se não ele exercer uma espéc ie de coercào fí-
1
q u u se todas as ra nd ,
g ' eS 1. 11StJ. lU I _

. ·s aspectos da v ida
.

" 1 '.'iObre forças cegas e, aliás, imaginárias, mas de atingir


re 1g1ao1 o1�a ' .
_ ÇOl'' '
· S ( )Cid " is · nasc eram
pura que os prin · da
· •

�r·ado por ser


·

c1p,11
.
letiva LenJiam co
<1 a \1da rel igiosa
. me co-
1 1 111sciência.-;, tonificá-las, discipliná-las. Foi dito às vezes
apcn"·is a .sp . ectos cll\·e
é preciso . ev1d . rsos rel igiões inferiores que elas eram materialistas. A ex-
l
1'" ssào é inexata . Todas as rel ig iõe s , mesmo as mais
enrcm

1
ente q ue a vida

g1 osa seja a form


.

a emineme � reli-
resu mida da vicia . como q ue uma
expressão
coletiva 1 nte 1 ra
� 1 1 os.'ie11-as, são, num certo se nt ido , espiritualistas, pois as
1 11 >tências que elas põem em jogo são, antes de tudo, es-
e a re lig iao en
de essen c·'ª1 na
tudo o que há
,.
gendrou
.

SOCJ· edacle é '


. 1 . 1e .
soc1 edad"
-1 alina ua 1'" 1 1 ua 1s e , por outro lado, é sobre a vida moral que el as
-. que a .idei
. 1 1gm
. · ·

.
'" • c
. a da
.
.

o
ças religiosas po
·

A<; for 1 111 por principal função agir. Compreende-se, assim, que
. n<1nto, sao forças
çai. morais . Certa hu m<1 nas, for-
mc�t� o " que frn feito em nome da religiào não poderia ter sido
� l 10 ?
n � s sen imentos
pcxlem tomar co
nsc iê t colet ivos só
n ta e e s1 ao s e
· ' r""''n em Ouj
1!•110 em vão, pois foi necessariamente a sociedade dos
· pnas · . nao '- etos
.
- puderam s .
extenores elas fix·1
pro 111 1mens, foi a humanidade que recolheu seus fnitos .
onst 1tuir sem to-
· ·

mar elas coisas al u m , . . : �


. .
.
.
'" " ts "e
.•

• 1c1u1n
g as ele su.is car.1(tens!
.

"sp c �ci" · de, natureza r1 . Mas , qucstionam, que sociedade exa tamente {: essa
. .. 1, uma
.
<1ss111 '"'
"'' '- ra1n '
·

rnm se mistu rar .:i


·

s1c
pode
., 1 , �'ob esse aspc\:,to
vida d� '.nJL�ndo . vie- •l .1 qual se faz o su bstrato da vida religiosa? Será a soci e ­
ma tena l e foi
.se P'ass
que se acreditou d.1de real, ta l como existe e fu nciona dia nte de nossos
u . no
através delas
. a
r exp 1car o que
mas, mundo. • > l hos, com a organização moral e jurídica que laboriosa-
nas fX >r esse_ 1ado
quando as cons·d i eram os. ape
ente o que. el as. .
papel , vemos som e nes.<;e 111l'nte se moldou ao longo da hiMória? Mas esta é cheia
Em rL'ali d.ic.lc e
.ua t f, taras e de imperfeicôes . Nela, o mal vai de par com o
.
tem ele ma is '>up
cia que fio1 m
rfi cial ·

1.. consc1en .
e

- . l tuem . E com u m

mentos essenciais y tomados os ele- l it'm, a injustiça com freqüência reina soberan a , a verd ade
.1 rnda instante é obscu recida pelo erro. Como é q ue um
que as . consti
cssas forças só tê acha r <1ue
1n L1111 carater
1uma no quando
· '

das sob forma sao pensa- ·l'r assim tão grosscrnmente


i constituído poderia inspi ra r
mesmo as ma·is. i·m • ,_., sentimentos de amor, o entusiasmo ardente, o espírito

humana'·' mas
.
. q ue senu.menr
anonimas · n;1o são outra pessoais e

coisa
o_., obje tivados. • k· a bnegação que todas as re ligiões exigem ele seus fiéis?
AS FORMAS éZ�IH/17/
464
IRt;S OA VID1I RDH1H 1 ;o 165
Os seres pcrfeic
. dem rcr 1
os que são os d
.1 unu. n.:•
. cusc
. s nao Pº
rhúad<:. l'ao mcu
macio seu<; rraços
· -

·' rocn.: , :i s
111ic nào poderia ser de outro modo na reali dade .
• •.

,, 1daç.ào entre essas torças contrárias tosse mver­


.
. ue , <
ze:. ale Láo baixa .
Traca
r-se-á , ao con l1 1 \'rtl.1 seria i mpossível; ora, na verdade da se man­
qual ;1 1· us ti ca e " 1 tt·mlc mesmo a se desenvolver.
trá ri o, d , · soue. , · .dadc perfeita
· , , e seri a m so1
1
.
)era nas da qu 1 1
a verd a u
1ormas' esca
·

. na · ex 1J. rp aúo?
mal sob rodas Nc , e ntanto, embora vejamos clarameme transparecer

·

as suas , '
Náo
• · •

.
ão tn 1.rn!a ·
comesta que ela

esce1a em relaç 1li d.1de acrnvés das miLologias e das Leologias, é hem
r e i 1dt que aquela só se m a nifesca nesLas a ume m ada ,
r
to religioso, com o scnti lllllll
rclig iôes. Só que
pois, dizem é .
cssc1 sociedad e n
pa
'. ra r eal iza-la que ten dem a
,
. , 1 1 1 1 1 l c 1 1 1 1 1ada, i d ea l i za d a . Sob esse aspccto , a s rcl igiôes
à'.º e um ,uado

defin ido e obse empírico i 11 pr i m itivas não diferem das ma is recentes e refi nadas.
era, u m son 110
rvável , e
por exemplo, como os Anmta coloca m na origem
:. uma q u i m
que os home ns 1111
acal � "nta� oc l m suas n,
. m.isé nas,
u ma .s imnl
.
.. . mas que
,. es- ic · 1 era
'
· · que rraduz
\ i\eram na .
reali da cle. E jam.1 1 1 t 11 1pos u ma souel.l.tde mítica cuja organiza1,<1o n:pro­
p iraço x.u.1111cnll' a que cxisre ainda hoje ela compreende
es
, m.us
con.�<. iC.:n<.:ia r 1oss
as as n


· · . ou
-

' ·
• •
·

ao bem, ao be . men-os o bscu ra�


• ·

l o ao i deal · Ora 1 1 1c·smos clàs e as mesmas fratrias, está submetida à


h•• 111;1 regu lamentação matri monial, prntica os mesmos
essas ª"P ,

raizes dentro de

.
" iraço es tem su·L•

'
. � mes mas
no ' s vem das
11 o \l�L'i os personagens que a compõem são :;eres ideais,

nosso ser; port



profu nde za
anto não h� de
1, o1,1dos de poderes e virtudes que os simples monab não
,- nac 1ª. fc:ira
expl icá-l a s . Aliás ., de nos que
�las 1a sa o r lig possa

i Í sas por s i mes


1 " l l'ln alcançar. A natureza deles não é somenLe mais
•I rgr
' -a- o, em vez
port anto a soc e c . : 1 0 m as ,
dl'
ade i dea l sup oe
poder explicá-la6 '·1 re
. , 1, ' . i da, é diferente, pois vincula-se, ao mesmo Lempo, à
Mas, em prim eiro 1 1 1 1 1 11.didade e à human idade. As próprias potências ma­
l ugar é .sunpl'fi .
1 ,�
as coisas ver a · i icar ª'.bit raria meml• l1w1.1.., submeLcm-se a uma metamorfose análoga, o mal
real isca <1 sua
religiã o a en�s
1 • • . mane ira· N� - la 1e iurn
idealisLa: ela t:·
º'. _se u lado
1 ido como que sublimado e idealiza<lo . A quesLào que
la vicros e n 1 a ou moral
·r lcs que nao
1' e ·o loca
ao
· - ten, h · m SJ· d0 d
fí:;'c
não é sa ber de onde vem essa ideal ização.
ivin iza dos. 1 Iou-
·


• e


Ja d� 1 u u ia
ve d euses do
x · e da guerra ,
roul)o e d.a asLuc Respondem que o homem tem u m a faculdade nalll-
da doença e .'
da m one O r ' . . � 1,tl de idealizar, isLo é, de substituir o mundo da realidade
� i�kl� 1 • 11 um mundo diferente ao qual se transporta em pensa-
elevada a idéia cn su� nis 1i:ic> ,
que fa� da por mais

, d o rnªl um l ugar
<tele, foi ohrrga do
.
cede r ao espíri to
· 1og1:1.
a con- 11 wnto. Mas isto é muda r os Lermos do problema, nào é
e uma pc ' ''. <1 esscJ 1c1·,.1
em sua mrto
cr"rs e<to. '" 0ra, mesm o
. ·
Satã " .� olvê- lo nem sequer fazê-l o avanç::ir. Essa idealização
· ·
., d o s istema
do um ser i
p rofrano. O
sen .1�1l'mátie<1 é uma caracLcrísLica essencial das religiões. Ex ­
·

mi)uro ele nao e um .ser


- •

e um deus , inferi

amideus plrtá-las por u m poder inalo de idealizar é, porcanlo,


de amplos
or e subordin
pode res· é indu
.. ado, e-; verda e.
.

mas dotado .1ihstituir simplesmemc uma palavra por outra equivalen-
sive ob1eco de n
iã� �ona nto,
nega tivos . A relig tos, ai nd a que
11 , e como se disséssemos que o homem criou a religião
clad(' rea l longe de igno rar
e de n ' ·'1 0 le'va-l a em a socie- l'ºrque tinha uma natureza religiosa. No entamo, o a n i -
con ta, e , .
ílete todos os a ima?cm dela,
seus aspectos, re- 111;1) conhece apenas u m mundo: o que ele percebe pela
m esmo os mars
repulsin>s. Tudo vulgares e , \periência tanto incerna quanto externa . Somence o ho-
s e cnc ' ontrn nela e se, .
._ m prevalece
vezes ela moscr , na maioria d
as

a 0 ue 111em possui a faculdade de conceber o ideal e ampliar o


rl·al . De onde lhe vem, pois, esse singular privilégio? An­
' ·

r so )re
pocên c·Jas. da luz
sobre a morte, as 1 , o mal, a
vida
sobre as potê ncias
das tes de fazer disso um falo primeiro, uma virLude misterio-
AS FORMA<; l!Lli.\flf.VfARH n.1 1 1nA f<EIJG/OSA

sa que escapa à ciência, convém esrar seguro de que dt' t.trLfas cotidianas da exi
stência Uma <;Ociec.h-
i ' • .1 s
n:lo dependL dl com.liçoes empmcameme detem1ináv1.:is. se recr iar sem, ao mesmo cem-
1' 1 1 11 1 ()Ode se criar nem
ec 'e de ·1to
1 ' ' i 1.1r o idea l. Essa

criação não e uma esp




A explicação que propusemos da religião tem preci­ •

.
samente a vantagem de dar uma resposta a essa questão, de se com plet aria , urna
socieda
1 1 1 •l1· 1 11c.:ntar pelo qua l a �_ pe
e se r� az
pois o que define o sagrado é que de é acrescentado ao
\ 1 / lnrm ac.Ja . mas
0 ato pelo qua l ela se faz , :
_ _ .
real . Ora, o ideal corresponde à mesma definição: não se Ass im, qua ndo se opo e a soe 1ed. _ 1de ide �l a
l 1P.l1 1 unente. rn
istas que nos arrastana
"" "'
pode, portamo, explicar um sem explicar o outro. Vimos,
'" "'ll 'ic.Je real como dois antagon
se º ·
1 :- - '
ios, o que se faz e o que
sa _o
com efeito, que, se a vida coletiva, quando atinge um cer­
1 1 1 1 ,l:ntidos contrár d�
to grau de intensidade, desperta o pens<i mento religioso. s A soc ieda de idea l não está fora_ c�a soc'.e:la
il ..1 1 .1çüe . _ os entr e
li d l1z
é porque determina um estado de efervescência que mu de esta rmo s d 1 \ id1d
a. Lon ge
- 1 os que� .se i·epelem nao l'odemos
• · par te del

1uncar a oULra. Pois unM


da as condirôes da a1 ividade psíquica. As energias , itais
, l.1-. n>m<> entre <.1 01s po :.�>L I�
I l i " 1unc ar a uma sem nos
. ·
.
. . ._
, . .

sao superexcitadas, as paixões ficam mais intens.1s, as


sa dos 1�d � ­
' 1 n k nào é constituída
sens<l\'<>Cs mai1; fortes; h á algumas inclusive que só se ples men te pela mas
produzem nesse momento. O homem não se reconhece;
sim
põem, pelo solo que ocu
pam pdas. c 1-
_.
?
\ iduo:. que a com
senu:-se como que transformado e, em conseqi.iência, mov ime nto s qu� rea� '.za m , m.1s
,1., que utili zam , pelo � , �
.
1 1 1 1 1 .s. de tuc.lo. pela ideia
. Cen a
transforma o meio que o cerca. Para ter uma no<;ãn das _ que ela faz de .s1 rnesm.1.
re a maneira como deve
se

l
c
i m p ressões muito particulares que sente, ele atribui às
1 1 1c. 1ite ' às , vezes ela hesita sob Mas
coisas com as quais está mais d i retamente cm concato em sen u.d os ive rgen tes .' . ,. .
' •1\Leber, sente-se puxada
-
_ sao entre . e

o ide, \ �
propriedades que elas não cêm, poderes excepcionais e mpem, nao
�cs conflitos, quando irro
virtudes que os objetos da experiência vulg�1r não possuem.
i 11·alidad
m

Em uma palavra, ao mundo real no qual transcorre sua vi­


e,
,. o de hoje, entre aquele
mas entr e idea is
que
diferentes, entre o de on �
te � a seu fa �or a auc�r :- \
da profana ele sobrepõe um outro que, num certo senti­ apenas vmdo '' ser e·
1 lh tr1diçào e aquele que esta
do, existe apenas em seu pensamento, mas ao qual atri­
bui, cm relação ao primeiro, uma espécie de dignidade
:
' . ira�1c�ce há razõ
es para saber por que os
osta a e e pro blem
ideais evoluem�
a, a verdade e
1 1 1;1s seja qual for a resp �
• llll' tudo sucede no mun
do do ideal.
l coleuv? que ,1 t� hgia�
maior. Trata-se, portanto, sob esse duplo aspecto, de um , , ., . - .-
_ > ex
mundo ideal.
Portanto, longe de o idea
-

Assim, a formação de um ideal não constitui um fato sei que pod er inat o c�o incl 1v1d uo,
mm e dever-se a nao
coletiva que � tnd1v1duo
l!ll
_ - apren­
irredurívcl, que escapa à ciência; depende de condições antes na escola da ,·ida
orad o� pela .
que a observação pode alcançar; é um produto natural da mila r os idea is elab
dl·u a idealizar. Foi ao assi i de a l.
ou cap az de conceb er º ,
vida social. Para que a sociedade possa tomar consciência
-.oóedade que ele se torn ra d e.: _ _ o,
aça
de si e manter, no grau de intensidade necessário, o senti­ . stando-o em sua esfe
1 :Ot a ·sociedade que ' arra
e de se a 1 7ar acim a do
,u�cítou lhe a necessic.lad
·

mu ndo
mento que cem de si mesma, é preciso que ela se reúna e
e os . me1o ,. s
u-lh
mesmo tempo, fornece
<l
se conc<.:ntre. Ora, essa concentraçao determina uma exal­
'· 1·'1 experiência e' ao r .
e.lc conceber outr
o no vo 101 el a
·

esse m u n
taçào da vida moral que se craduz por um conjunto de o mundo. Pois .
stn11r, lª qu e é e l a que e
• ·•
l e expn-
concepçôes ideais nas quais se exprime a vida nova que que o conslm iu ao :;e. con a f�cu• ld �­
acabou de despenar; elas correspondem a esse afluxo de víduo como no grup�.
me. Assim , canto no indi _ e um l espe-
forças psíqu icas que se sobrepõem àquelas de que dispo- de mist erio so. Nao .
de de idealizar nada tem
469
168 AS FOR.lf,IS E.l.E.l/F\T.1RES OA 1 'IDA Rl;VGIV.'iA li\( ' ' '"º

ic. pe l <�
, 1 i1 l'.liv o, -.vm util i<la de di..: nl!n hum a espé<
c i e d� luxo que o homem poderia dispensar, m.ts um.a 11,
Mo stra 1 s pre ci �am enr e que e
cond1ç·ao de sua l!xbrência. Ele nao seria um ser social is 111, 1 . , prazer de se
afirmar. �� pen-
o caso da auvidadi..: rnu al e do
t? é, não seria um homem, se não a tin:ssc ad quirid o. n>m freqüência, -
Claro que, ao se encarnar nos indivíduos, os ideais coleti "" 1110 mitológico .
vos tendem a se individualizar. Cada um os entende a seu to de causas soci�is, co-
modo e imprime neles a sua marca; alguns elementos são Mas, se a religião é um produ . de
e o caráter universalista

ela nasceu í11 foro externo,


o ind ivid ual
s u primidos, o u tros acrescentados. O idea l pessoal desta 1 1 1 , 1 1·xp lica r o cult � e
1 , 11 1 .-. religiões? Se
com o pod
p " 11 para 0 for o
ca-se, as�ir:n, do ideal social, à medida que a personali aí se eml_1renhar
. inte rno do indivíduo e
dade mc.hvidual se desenvolve e se torna uma fonte autô­ a de sonedacles
ul.i vez mais profu ndamente
) Se ela é obr
nor:ia c.lc ação. J\las, se qu isem10s compreender essa c;1 como pôde destacar-se d�la'i
,

pac1dade, aparentemente tào singular, de vi\·er fora do real tkl inidas e individualiwc.las.
comum e.la hu.ma n_idade. .
,,, . -.cr concebida como o bem
.

o
En contramos ao l ong
basta conectá-la com as nmdiçõc.:s sociais das quais de­ nossa i nvesugaçao
os pn-
tr1sm�>
de .
pende.
111.. 110s germes e.la reli
pol
Não .�e deve, pois, ver nes ta teoria da relig i ã o um
cos mo
gião ind ivid ual e do
; possu 1
1 , Jigioso e vim os
de q ue ma nei ra se formaram que po-
elementos mais ge ra is e.la res
-

.
simples reiuvenescimento do materialismo histórico: seria pos ta
equivocar-se singularmente acerca de nosso pensamento. 1 1 1ns, assim, os

1 l1 ser dada a essa que st<io . .


Ao mostrar na religião uma coisa essencialmente social que maneira a for7:i r� h­
c.le maneira nenhuma queremos dizer que ela se limita � Co m efe ito, mo stra mo s de
encarnar nas consc1encias
traduzir, numa outra linguagem, as formas materiais da t-:'nsa que ani ma o clã , ao se im se formam se�·cs s�gra­
lari za. Ass
sociedade e suas necessidades vitais imedimas. Certamen­ p;ir t iculares, se particu a su a
dns sec und ário s; cad a indivíduo tem os seus, feitos
te, consideramos uma evidência que a vicia social depen­ a inri n1a . sol idá rios de seu
de de seu substrato e traz sua marca. assim como a .,,ida 111agcm. associados à sua vici , o ant epa ssa do pro te­
ivic.l ual
mental cio indivíduo depende do encéfalo e mesmo do , k·stino: a alm a, o totem incl pod e ce­
de ritos que o fiel
organism� inteiro. �as : consciência coletiva é algo mais tor. etc. Esses seres s3o objeto grupo; tmta-se, portanto:
o
khrar sozinho, scparndo de rod
fonm 1
que um simples epifenomeno ele sua base morfológica,
culto individual. Seg
unimenre, e
da mesma �orma que a consciência incLividual é algo mais prim eira de
dc u ma , como a perso­
que uma simples eflorescência cio s iste ma nervoso. Para
rudimentar, porque
t i ne.la um culto muito
.

pouco ace nll! ac.la e como l l�c


que ª primeira se manifeste, é preciso que se produza nalidade individual é, então, e não P?di�
uma s,mtesc sui. ge11eris das consciências particulares. Ora,
o que a exp rim
.llribuem pouco valor, o cult a os mdi­
_ ...er ainda muito des
envolvido. Mas, à medid que
essa smrese tem por efeito criar rodo um mundo de semi­ e o valo r da pes soa aumen­
' íduos se c.liferenciamm mais
tou. também 0 culco corres
menros, de idéias, de imagens que, uma vez nascidos <len te adq uiri u ma is espar,;o
obedecem a leis que lhes sào próprias. Eles se atraem, ��
pon
no co nj u nto da vida rel igiosa, ao m
que se fe­
.
po
repelem, se fundem, se segmentam e proliferam sem q ue
esmo tem
mente cio lado de fora.
i
essas com b naçõ es todas sejam diretamente co ma nda das chou ma is hermetica
A existência de cultos individ
uais não imp lica . �or­
e r�querid �s pelo estado ela realidade subjacente. A vida
que obstrua u m�1 �xphc?­
assim suscaada desfruta inclusive de uma independência tanto, nada que contradiga ou s as forças religiosas as
religião, poi
bastante grande pam se entregar às vezes a manifestações ção sociológica ela
!\< li ,,10
470 AS FO/lllAS r1El/I\TllR/I.\ DA l'lDA RUJGJU.1: 1
I.

l'rt,11 nente na hase. mas no


Lopo cio sistema i , ustralia-

1 , , , llunj il, Dara mulu n e 13a ia


quais eles se dirigem não são mais que fomias individua l i
Z t�la d:· :or�·as .co l eti vas. Assim, mesmo que a religi<lo
1 \1 ,
pll;im c
s deuses
'. �
mc não são
f 1 1h.11s : cada um deles é reco
nhec ido por uma plura lidad e
� a1e�a estar.
� nteiramente no foro interior do indivíduo, l.
.
:1�da � ?
?ª. soc1 da e que se encontra a fonte viva da qual
1, 1 nhos diferente
n 1 l 11>na l. Essa
s. Seu culto , num c ert
oncep ção , portanto, é muit
c
o sentido, é inter-

1 odemos agora apreciar o que vale es.�l'


o próxima da
ahr�1cnt.1.
. Por essa m­
' I "' encontramos nas
� la .s�
r sua au­
teologias mais rece ntes.
md1v1duali�mo '.ddi� I que gostaria de fazer da religião ai
. 111 algu ns escritores ch a ara
m que devi am
nega

ll 11t1t idade, por mais incontest


go purame � te ind1v1dual: ele desconhece as condicõe.s i

seja.
fun�a�1enta'.s da vi cI_a reli� i '?sa. Se permaneceu até Í1ojc
ável que
eira se fom1ou es­
ceoncas que jamais se realizam t' Ora, pudemos mostrar de que man
.
.1 1 1 in cepção
no est, 1 � 0 de asp1raçoes
m li:án. .
ror ser 1 :a · I L:ma filosofia pode muito bem ser e a­ i .
.ivilizaçao n..1 0 podun
:
l i:Jda no s1Icnuo . da meditação 1mcnor, mas náo uma f(· 1 ribO!;; vizin has e de idêntica <.
rda� «>L's c.:ons t..1ntc s uma s com as ou
1 1r dL estar cm
f �1s csr·1 e lntts de tudo, talor, nda, L'ntusiasmo, cx.iha
11 1.., Circunstâncias de todo tipo lhes
dão essa oponuni­

·

çao e toda ' ida mental, transporte do indivíduo acima


de s1 mesmo o.ra . como ele poderia, sem sair de si, au l.1dc além do om é c ioc r , que é entã o rudimentar, há os
os casa men tos intern acio nais são muit o
mentar as energias que possui? Como poderia ultrapassar­ c.1s.1mentos, pois
ntros , os homens to-
se contando apenas com suas forças? A única fonte dt ca 1 11 qi.icn ces na Aust rália. Nesses enco
ia d o pare ntesc o mor al que
lor em que podemos nos aquecer moralmcn ce é a q uel a 111.1111 naturalmente con:-;dênc
rn:i
fo ada rei a sociedade de nossos semelhantes; as únicas 1 1s u ne Têm . a mesm a orga nizaç ão soci al, a mesma divi­
imon iais; prat icam os
força� morais . que podem sustentar
e fazer crescer as nos­
' · ' º cm fratr ias, clâs, classes matr
111l·smos ritos de inici a�·ào ou ritos muit o simi l <1res. Em­
sas sao as que outrem nos empresta. Admitamos indw;ive por reforçar essas
mútu os ou acor dos acab am
que existam . realmente seres mais ou menos análogos aos préstimos
. deus es aos quai s escavam
que as mitologias n�s representam Para que possa� tt:r ·l'melhanças espo ntân eas. Os
ticas dific il-
sobr� as almJs a açao útil que é a razão de ser deles t tao man ifesta men te idên
l igadas instit uições
nos espír itos. Tudo
� 111enc e podi am permanecer disti ntos
o.� aproximava e, por isso,
preciso que �e creia neles. Ora, as crenças só são ati as ndo que cada tri­
mesm o supo
quando partilhadas. Pode-se certamente sustentá-las ai
�u1� �empo por um esf rço inteiramente pessoal, mas não
o hn tenha elabo rado a noçã. o de seus deus es de uma ma­

e :�s1111 que elas nascem, nem assim que se adquirem; é rtdra i n d e pe nde nLe, eles de vi
a m necessariamente tender
. 1 se conf undi r uns com
s. É prová vel, a l iás, que
n�csmo duvidoso a
. os outro
que possam conserv r-s e ncssas condi­ ebidos em asscmbléias
1cnh am sido prim itivam ente conc
çoes. Na verdade, o hom�1 que tem uma verdadeira fé
1ntertriba is. Pois eles são, antes de rudo, deuses da inicia ­
� ão e, nas cerim ônia
se nte a nccessidade i nvencível de espalhá-la; para isso.
de inici ação , tribos diferences en­
sai. d: seu .1solamento, aproxima-se dos outros, busca con­ s
vence-los,_ e é o a rdor das convicções que suscita quL
e
<'Ontram-c;c gera l ment e rep res n ta das
. Portanto, se seres
qual quer socie dade gcografi­
vem reconfortar a sua. Ela rapidament e se estiolaria se ;.agrados independentes de
ada se form aram , não é porq ue tenham
l'amcnte determin
uma origem extra-soei.ti . É porque,
permanecesse sozinha. acim a dess es grupa­
!
Com º un v ersalismo religioso acontece o mesmo
em já outro s cujos cont ornos são
.
que com o 1nd1v1dualismo. . Longe de ser um atributo ex­ mentos geográficos, exist
. s: não poss uem fron teira s prec isas, mas
mais inde ciso
clusivo de algumas grandes religiões, vimos que ele está,
472 AS FONMAS /!'/Eilll!NTA NF\'
/JA l'l/)A NHI !GIOS. I
r 1 1W.LUSA<> 473
compn.: ndem ribo
das. J\ vrda sonal mu , ulos. n .1o diferem em nalllreza das cerim ônias propria-
� � s mais ou menos viz
inhas e aparenta­
ito particular que da
ponamo, a se espalh r resulta, tcndL,
ar numa área de ext 111l·me reltg1osJs. Que diferen<,;a essencial há entre un1<1 Js
te� d fi idos. De ma ensão sem lim i­
mbléia de cristãos que celebram as principais daws da
, id.t de Cristo, ou de judeus que festejam a sa
� � neira mu ito nat ura 1
rnrtologrcos que cor
respondem a ela têm
l, os p<::rsonagens
0 mesmo cará­
��
a do E?ilo
ter; sua esfe de infl
1:.tda ; eles pairam
. , 11 ..ipromulgação do decálogo, e uma reu111ao de c1 a­ �
d.ios qu<.! comemoram a instituição de u � novo_ cod�go
� uência não é del irni
acr. ma das trib os par _
ticu l a res e de seu
gmndes deuses inte esp aço . São os
?
1110r..i l ou algum grande acontecimento da �1 a nacional.
º':1· não há nada nessa situa(ã
rnacionais.
Se, hoje, talvez tenhamos alguma dificuldade �a �a
o que seja específico
das sociedades austral l • 1m:eber em que poderào consistir essas festas e ccn
� o-
11 1.., no futuro, é qu<.! atr..iv<.!ssamos uma fase de tmns1<;ao
ianas. áo há povo
nao estep envolvido nem Estado qul
, mais ou nK
l de meJiocndade mornl.
numa outra sociedade
no:. ilim itada, que abr A:. grn.nd<.!s coisas do passado,
Jus Lom os qua is o JUt Lntusiasmi.I\ ..im nossos pais. nJo mais dcspcrt�1m
ange todos os povos
rod os os Esr 1
em contatc ; não há

primeiro está d ireta
vida nacional que não
ou ind iretam ente
seja dominada
,.111 nós 0 mesmo ardor, seja por terem se transformado

nat ureza incernacio


por uma \'1da colet1\'
rntl. À medi­
_ a de rnirn hábito comum ao ponto de nos tomar inconscient�s,
da 9 ue vança os
� na história, esses agn "l'Jª por não mais corresponderem às aspir�ções � tua1s;
� ipa mentos inter­
nacionais adq u irem 11, 1 entanto, nada foi feito ainda que as subsmua. Nau po-
ma is imponância e
se percebe como, em extens;1o. Assim
1 kmos mais nos apaixonar pelos princípios em nome dos
quais 0 cristianismo recomendava aos senhores trala'.
certos casos, a tendên
lista pô I se des nvo
�� lver ao ponto de af
cia universa­
��-
nas ª;" !dc 1as. � etar, já não ape­
mais elevadas do sist 111,1namente seus escravos, mas, por outro lado, a rde1a
_ c1p ema religioso, mas
pnn ros mesmos sobre os os q11e se tem da igualdade e da fraternidade humanas nos
quais ele repous a.
p;irece hoje dar excessivo lugar a inj � stas dcsr_�ualdade�.
.
, 1 1 1 piedade pelos hu mi ldes é demasiado plato� 1ca; gos-
1,111 amos de uma que fosse mais eficaz, mas n ao ve1�1os
li
unda claramenle o que ela deve ser nem corno podera se
1 l á , portanto, na rel i giã i l 'alizar nos fatos. Em uma pa lavra, os antigos deus �s en­
. o algo ele eterno que .
llna lo a sobre viver a tod está des- \ t· l hecern ou morre m, e outros não nasceram. Foi 1SS
que tornou vii a Le ntat iva de Co� L� de orga n izar uma 1 ��1-
� os os símbolos par
<J �ais pcnsumento reli gioso
t icu lares nos ?
:
giao com velhas lembranças histoncas, artLfrcialmente iea-
o
sucessivamente se env . .
Nao pode haver soc olveu.
1 1 vadas: é da p róp ri a vidu, e não de um passad? morLo,
iesJade que não Len
de man rer e revigorar, ha a necessidade

, 1ue pode sair um culLO vivo . Mas esse estado de '.n?erte7:a


a intervalos regu lare
Los co leti vos e as idé s, os scm imen­

,. de agiLaçào não poderia durar eternamente. Vira o cita


ias coletivas que fazem sua
sua person alid ade . unidade e
Ora, essa restauraç
!
ser oht da por meio
de reuniões, ele ass
ão moral só pode
ernbléia:., de con­
, rn que nossas sociedades conhecerão de novo ho�as de
gregaçoes, em que _
, lervescência criadora ao longo das quais novos 1dea1s
ura nte
os indivíduos, apr oxim
ouLros, reafirmam cm
comum seus scncim
ando-se uns dos
cmos comuns·
.11rgirào, novas fórmulas aparecerão para servir

?
ou seja, cerimônias 1 1 rn tempo, de gu ia à humanidade; e, uma vez v1v1das es­
,,1s horas, os homens sentirão espontaneamente a neces­
que , por seu objeto
que produzem, pelos
procedimentos que
, pelos rcsu lwdo �
nelas são empre-
,1dade de revivê-las de tempo em tempo pelo pcnsamen-
471 AS FOR.\/A'I r:JJ,\ff�\T,\RE\' n.1 17(), \ RELf(,(11\ 1 , ,, li \,10

. . mos uc es
t 1. . tu da r e uma daqu
el:1s

1 .
rd1).;1ao - que, a ab
10. istoé, de conservar sua lembrança por meio de fest.1�
, 11o1os empr egacos . -·o
s,1 os m· u
' s desco ncer-

_ o. 1. Ul1o ne·Ia parece miste rioso


que n.:non.:m rl.'gu lan11ente seus frutos. Já \ unos como .1 111 que os sun . Esses
' Ili " ·
lkvol uçà o francesa instituiu todo um ciclo de fcsras para para a raza os mais
manter num es ado de perp é ua juventude os pri ncípi o
rein
t l l ' que pa rt ·1
e.los
t t s ct t
. · p., m 1 -' 0 mes mo tcmp
o

t 1
arem Ue ser
-
l t • 1e ro eneos.
sem deix
• , t\Ue ·se mu 1 t . p \"ca1
n
'
, frag111cntam
nos quais se inspirava. Se a inslituicào logo periclitou. a
l' g uírem parecem,
e c.11· e-
d 'ini
1 · n
n
q ue a fé revo l u cio ári a durou pouco, é q ue as decepçÕ L's """ que se
sem se
.
i ra f
vi· s a 11e
ntlo ntei me nt
t , te
· r ncer a um m u
. ,
.
e o desâ ni mo rapidamente sucederam a o primeiro mo­ . . que
" llll ' daque1,
1 1111l'1 ra
1eis
a dizer
1 mos; chegou-·se ·né
, '

e em ciue vive .

t ment
.


mento de entusiasmo. Mas, embora a obra tenha abona
1
as
1
to e
1 1 l nsam
a l
sido 1 1 1 c>rava
e.lo, ela nos permite conce ber o que poderia ter ll' e n to ue ea 1oro u · on
1,,
' razão e
a e
o ut as cone.lições; e tudo faz pen sa
< -

entre a
cm

r r qu<.: l 1 l 1 1gte a Jarn,u


-
, · s. talv ez ' o contra·'cte
})ativ e
acen u , 1cto. �e
mai'i cedo ou momento na


u m
r .
c n e1 d·,1c1e ti •
nto,
deve ria o r
· pona
ma is tarde ela será retomada. N�lo s b es
evangelhos que
,
.
se­ I• ,1 mais
hc rog
·
·
elas
te
·

a
1t1�1ona em qu e• ,''.
-

, O ra ' contrariamente as
. t�nci
jam imonais e n ão há razão pari :icr<.:diur quL ,1 h u m.m i· .
e.
c.lade !-i<.:Ja do avr ante incapaz c.le conceber no vos. Quanto c om evK e ' foi hem ess .
às quais se
.

a saber o que ser.lo os símbolos em que vira se exprimir a


.: .as. reali dades
.m
. qrn .
1. r
q 1 en c1 as , coi · 1stat 1 · mos
as mesm as que
ª · a? rel i g iosa são
nova fé, !-ie irao se assemelhar ou não aos do passado se , 111\tl"<l então . cspe
. tare.1e• de oh1eto a ref\e,xa
culaç
' , ·�
- · 0 dos cient istas:
a
se ío ma is adequ d os
r.. à real ida de que
• n1 · a
a lhes competirá tra­ ' i nrào mais parec c
.
saci edad e. O 111islé . rio < 1ue
duzir, eis uma questão que ultm passa as capaci da des hu­ 1 1 . 1 t ureza , o 1ome 1 ' dissipa ante
·

" , ll . a-
se
manas de precisão e que, aliás, não chega a :;er e sse ncial . . 1 as e. • co 11 \ r
1 p e ame nte
su perfi chl e

i re rar o v e u
ti
Mas as festas os ritos, o culto, enfim, não são toda a
. •,

fun clada ·· ha st·'


• .

,
·
. . - a · s apro
LO m i
ao
. m
1 1 1 1 1 a obse rv,1< � . que se
l { • til que a 11n ag.1n.
. 'I Ç'' toI ' og1· ca as '' cobriu para

. con10 ·s·'io · Essas rea 1


religião. Esta não é somente um sis1ema de práticas, é se es-
- .
l
" da<les• a religião - na o
1.::t mbém um sistema de 1111 1strem tais .
1 uz1
idéias com a finalidade de expr i­ gí\'el que
agem intcli
•1 L • · .!-Is' numa 1.mgu
mir o mundo: vimos que mesmo os maii; humilde<; têm " ,1 \ ,1 por tr, . de
·
ega;
cm
empr
d i fere
1,a que a ciên cia
w
1,,ir ,as coisas umas
c.la que
.
' -.se de v cu
sua cosmologia. Ainda que possa haver alg u ma -rela('ào n a r eza . s,
p. 1 rte a pa e , t1
outra
:; n m 1
às
f
entre e1as re aç0
entre es es dois elementos da vida religiosa, eles não dei­ ·at·1 .
1
.
1ca-
,

dv estaI)C1C(er
de dass
• es internas ·.
Vu.
·'
. ,
xam de ser muito diferen1es. Um está voltado para a ação,
�te essenciais
·

, qu e as nocôes
ele solicita ' · -l '· ro que
nos
1 g·1os;1 C 1
sistematizá- las. '·
que e regula; o outro, para o pensamento, q ue
- a
-
l Is · • de

d.1 lógica ci uf - sao


en 1ca 1
.
"\"
- 1e , ongem re 1
· a u ma
e l
iza- as, . ul m
' iência, para utt
ele enriquece e organiza . PortanLO, eles não dependem a b ora
e. s ) ete-as nova
c n a is; de
. de, elem entos i t
·

elas mesmas com.lições, havendo motivos para indagar se a d e


e
o segundo corresponde a nec ss id ad es tiio universais e . ·, depu
\'"to ra-as de todo upo
. eu s pas.sas ela utiliza
permanentes quanto o primeiro. l l ll1a ma n e .
1 r,1, gera
, , , 1 . em todos os s
·
1 > · �1· cerca
.
-se ue pre-
, ·

o e\lie a re11g1,1 · • a · gnc "


Quando se atribui ao pensamento religioso caracteres um espírito cnuc . ... o e o · u
1 í.zo .mtecipado"'

. c , �··t 1 1r a prec1p1"ta" .
, ,1w,;oes par,1
·

específicos, quando se crê que ele tem por funç-.lo cxpri preconceitos e to--
mir, atra vés ue métodos próp ios, todo um asp cto e.lo real 1ura mant er ' �·
M· s sses ape
s ·1 ixões os
r e a �1 c s anc
. ·,
�a �-, � rfeiçoam en s to
das as i níl u cnc1as sub1et tvas f: i_ .ª
.
àO .S'.IO Sll 1C1e n
la e.la
· para di fere nciá-
. ·
que escapa ao conhecimento vulgar e também à ciência,
mero do1o g e os °' . b s per se guem o mesmo
tes
ra lme nte t
1. · -
·

nat u
esse
há u m a recusa cm admitir que a religião
1e 1g1ao Sc>h . c
asp e to, a m a
same nto c1en tt'
possa vir a pe rder seu papel especulativo. Mas a análise
. f ico é tã o-. ó umas form. ·1
v
• ·

dos fatos não nos pareceu demonstrar essa especificida- o bj e i :


t o o pen
476 AS FORl1AS EiJ; lf
L\TARJ?S DA 1ff)A
RBJG/O.\.�
' l i \,!()

mais perfcit:t c.Jo pe


nsa me nto religioso
Parece nat ur,JI .
'' 1 1 1 do mais . enqu• nto ·1 reli ião é ação, enquanto é um
a
i " i 'k fazer 'in!r os homens, a c1� n� 1a não poderia ser
portanto. que o seg g
undo se ;ipaguc progres
'
" ·A

sivamente dian
1 11 1,1dcra d a ta 1 po �· s mesmo expnmmdo a vida não a

ce do primeiro, à me
did a que esce se com
desempenhar a tare e ma is apco ;i • •

fa.
-
1 1 .1, l 1 a pode • perfeitamente procurar explicar a fé, mas,

f ' u l' s 0 há conflito a nao ser


E não é de duv ida . .
r, com efeito, que
essa rcgressüo .. o mes o a supoc. Assll11,
.
_ .
na
1111111 ponto l11rntado . D,·1 s· du '
� ' ·1s funções que a relig 1ao pn-
Lenha se produzido ·-
ao longo da histór . .
ia. Oriunda da reli
·
già o, a ciê nci a ten
de a sub stit uir esta 1 1 1111\ amc..: nle cumpna, ex1·sce uma ' mas uma so . ' que tende ,
que diz respeito às últi ma em Lud o o .
funções cognitivas u l.1 vez mais a lhe esc.a �_a r: fu �ção especu lativa O que .
ª- e o c1 1· re 1'to de existir' é o
e in tele c lll ais O
i ' ll'IKia contesta a •·el ig1ao nao
p róp rio cri slia nis mo .
.
já con sag rou defi n i tiva
1111 ito de d ogmat1z a .1 s·obre •1 natureza d·1. , s co 1· s·1 s é ' ·1 cs-
substi t u ição na ord me nte essa •

em dos fen ôm cno .


I " , IL' tle comrc..:·t cnL .,, ·i ·'1 espccia . 1 q Lie el·'1 se atribuía f)ara
s ma ter iais . Vendo • ' ·•
na mat("ria a t'Oisa
profan a por cxcclC:
ncia, ele fac il mente '
i 1 1 1 '1L'ct· r o hom m � o m u �c 1 o Na verdade, a rt'ligi;l o
aba ndo nou o con hec
·

nha , lradidil mu nd
ime nto dela a u ma
dis cip lina estra­ � _. � b
um ho min um dispw 1 1 , 1 1 1 conhece a 51 i:icsma. Nao a e d e u e el a é feita ,
�_ L �
ationi Foi assim
q ua is necessidades
que as ciências da .
nat ureza puderam
- •A •
se esta belecer e fa­ rcspon e on g de poder d itar
1 11·1 a c1encia, e la P rópria é ob1eto • i E como
iw111 a
zer rec onh ece r sua . de c1encia.
auc ori dad e sem dif ·A
icu lda des mu ito
grandes. Mas ele não
podia abrir má o tão
fac ilm v1cc do p 11 1 out ro lado, forn c o rea l a ue se pl 1'ca a reflexão oen-
J . '
0b'eto
J
mu ndo das almas. - . _ � a
pois é sobre as alm 11111 1, nao existe
· propno sob re o qual incida a es-
as que o deus dos
pn ulaçao re I'1giosa, é evidente que esta na
crisl.àos aspira ant
es de rud o a rei nar
. Eis por que , por
- . .
-0 poderia de-
.
mu ito tempo, a idé
ia de submeter a vid
a psíq uica à ciên­
,
1 mpenJ1ar no futuro o mesmo papel que no passado.

'o entanro, ela parece chamada ames a se transfor-


cia parecia uma esp
écie de profanação;
ainda repugna a num mesmo hoje ela
erosos esp1ritos. Ent 111.ir do que a dcsapa ecer.

I' · - algo de eterno: o culto,


logia experimental reta nto, a psico­ �
e comparativa se con 01.ssemos que ha
preci:-io um car com
ela. Mas o mundo
stit uiu e hoje é
da vida rdigiosa e i ll. Ma:-i os hon ens na p -�� r�,1;�º
celebrar ccrimônias para
1 s �· n e m aceitar uma fé que
moral permanece inte �
rditado. A maioria dos
homens con­ " quais não enam razao <.ev -
1 1 1 0 compreenderiam de ma e a lguma Para proragar
tinu a a cre r que exi �
ste nele uma ordem
o espírito só pode pen ;
de cois 1s na qua l
. . '
n 11 ª �
etrar po r via s mu ito
s
' >l i sunp1e me n te para manter a fe ·, e pre iso 1\ 1slificá-la,
< Il i seJ,L,
'

as fortes res istência especiais. Da í


s enc ont rad as sem r)J'e . · , fazer sua teor ia. U ma teo r ia desse gt!nero ce r a-

t
, o1)i igac. ' ·1 ·se 1
tar cie ntificam ent e os q ue..: se Lenta tra­ · •

.
fenômenos religiosos
ora . IL'nLe e " ' '
· 1) 01a1. n a5 d fe ent . c1cnc1as, a
.
't r cs .A •

· A c·as socia is
e m . 1·1
p<1rllr do momento m e 1 uc elas ex is em c1en
a despeito das opo
sições, as ten tati vas
is Mas, 11
.
t : . 1 . .'
, · m pnme1 ro 1ugar ra
se rep etem e essa
� que a 1e
persistência mesma . .
permite prever que .
1 1. 1 sociedade; p . ·ico 1og ·a 1·5 que a o ee.Jade �
e- 1e J'gi
1 ·osa tem suas origens
.� uma sínte-
ra acabaní por ceder essa últi ma barrei-
.

e que a ciência se esta s C1


. c1enc1a da natureza enfim,
· A • hum·mas· • A
rana mesmo nessa reg belecerá sobe­ s i •

ião reservada. •l' de consc1enc1as


5 •

Ni:;so consiste o con ,


·

comum fazer-se um
fl ito da ciê nci a e da
religião. É 1.1 que < hornem
� .
a sacie
. dade sao '
- funça -o do un iverso e
a idéia inexata a re:; _
,,11 Jrt1fic1,dmente � r><>c.J cm ser abstraídos. Contudo. por
peito. Diz-se que
lll<llS rmportan�es que seiam os empres

a ciência nega a reli . . .
gião em princípio.
Mas a religião exis­ · os tomado:-, das um
' iC:ncias const1tu1das, e 1es não poderiam ser suficientes,
-
te, é um sistema de -
fatos dados; em um
realidade. Como pod a palavra, é uma
eria a ciê nci a negar .
uma rea lidade? pois a fé é, antes de tudo, um rmpulso a agir e a ciência,
nA 1 71),i RELtr;u J.
178
AS FO!ll!A.�
/ I \.1()
F!h
;llFN/'AR!��·
179
permaneci:' â di.�1.1n­
por mais longe que
da d;1 ·1çào \ ciênc
se la nce, semprt'
i a l fragmenia na
mcomrleta, ;!\ ;tfl\ III
apen as lenta mente
e jama is est<í acaba
Teori as dest in a fll;1s. se as no{·ocs fu n c.J-
não pode esperar. d:1; a vic.h1 , porém
-
das a fazer vi ver,
zer agir, são obrig a 1�1
emais da ciência são de
adas, pona nto, a
.�e adia ntar <1 1 t 1 1 1 rel igiosa , como ª rehgiao . �i:i pôdc engenclrú-las? Não
que reiaçoe ,,ntxJc haver enLre
a compl etá-la pre ciênc ia e .
maturamente. Elas · ·

as exigê ncias da só s<lo possíveis l •ll •l'IX! à pnmcira \ 1sta . - < , ,.


prática e as nece '<" .
· · . l i1clus1ve
ssida des v i tais, tais ' l• •Hll'a e a re 1.igiao u nia vez que a realidade
1 •1 v ss ..1 pc·lo pensamento re1 ·ig i o s o é a sociedade, a
' •

d ist i n w m en te , faze
mo as sentimos rn
sem concebê-las
çar, rara a lém do q111•0,t.10 poc.le ·ser coloca " d a nos s·eguintcs Lermos que• i.e-
rensa menr o a v a n m o
perm ite afirm ar.
,
que a cié:•n cia
' l 1 1 1 1 mel h or a m
e.l LO.
Assim . as re lig iões, no�
que - q ue
e
.
a d a a s. ua c1·nculdade:
i 0
1 a v1c1a sona l uma fon ce La
e •-ortante de vi
mesmo .is mais racic
• k 1tzer

nai:; e laicizadas. .
pode rao ja nu 1s \l
mio podem e n :1 o ·
- o im n
1
a precleMinava a esse ra-
pri\·ar de uma espéc
ie muito r a rti c u l 1 l• 11\1ca? !\ada. aparentemcnle,
_ a ,,.c·1tbfazer a neLes:,iJa
la r d e e�rt'cu lac. ,

· 1)V ·0 que nao f 01 pai


que, embora tendo
I
os mesmos objet 10
I " 1 1 >01.s. e· o
pode ria ser propr '-
iamente cien t ífica
os que a ciênda,
li i ·spec ulauvas que os h omens se associaram .
nüo ' .
: as intuk
da sens;1rào e e.lo ôes obscu ras
freqüên cia fu nc io
sent imento com 1 tlvez pareça uma temen.d ade nossa abordar aqui
.

11111 problema de La l c. 1nplexic.ladc. Para poder tratá-lo


o
aí com o razóes l . .

ógica s Por um lad na m


-
. • · -1 p reci.s, o que as. c·onc.lk.ões so ciológ icas
co-
a n to, à que enco
. o, essa especu lação '
1 1 1 1 1 i onvcn , sen,
asse melha -se, pon .

" ' ' e o nhe c1 mc mo fosse


do passa do; nrns, ntram os nas relig �
por o u t ro, distin iões
gue-s e dela. E mbora . . m melhor conhecidas do q u e o
con ceden do-se o
direito de ultrap i • • \renas começamos a enc , rev, er algumas e.leias. Entre­
ass;i r a ciên cia, ela
conhecê la e por in
sp i ra r-se nela. Assm •· ta-0 grave e esta- ta ;o d 1·retame me impli­
ve com eçar ror de­ -
1 1 1110 a qucstao e
1 u i i por n1do o que precec.I · c . q ue devemos fazer um es-
que a autoridade 1
la em conta ; ro
da ciência é estabe
lecida, cump re lev
h 11 \O rara na - o a (leix'tr sem resposta.
i1-
' ·. .
de-se ir mais longe _ .,
mas é c.lehi Cflll' se
que ela sob a rress
\liás. talvez não seia unposs Fl
da neces sidade, ao . -1vel estaheleccr cl sde . .
c:
il",llllS princíp ios gerais capazes, pelo m enos
pode afirmar q u e e.leve ranir. Nada .
Sl'

nada es t<i belcce r


ela negue, nada , , de esclare-
nega r que ela afirm
que não se a p óie e,
1 solu�'ào.
meme, em princí
.\ matéria
, dire ta ou ,l I
• ·co é feita de conceitos
i nc.li re t a­
10111:.idos de emrré
111 0 . A pJ rt ir c.k entã sti-
pios qu<.: lhe sao ' do pensamento 1ogi
o, a fé não exerce . •d ade pode ter (1 csem p e, n h ac.lo um
.

l 1 1da ga r como a soc1c .


gen
mais, sobre: o sisw­
s
ma e.las represenr
ações que poc.lc: .. 1pl'I na , lo rensamen to lo
' g1
· co ec1 u i va le , po rta n-
mos conti n u a r cha
� le' r panicipado da forma-
, ,

l
c e e.
do de re ligiosas,

a mesma hege man­


monia de outr ora. '· ,, perguntar como ela poc.1e
1 11 > dos conceitos.
dela, ergue-se uma Diance
potência rival que,
se. como a contece m .u , .s. co
dela nascida, do­
à sua crítica e a
rava nte a submete
seu cont mle. E . mumente, no conceito só
•.1 ve � u ma .ide1,1 f uvc1. Com
faz prever que tudo
esse controle se
amrlo e m ais <.:fica
torna rá cad a vez - ·, ger,ll,
' , , o roblema parece mso . '

' 1·110. o indivíduo pode,ppor s · etis lJrórrios meios, com


z, sem q u e sqa mais
poss1vel traca r u m 1
p.1r:ir suas percepç
. • õcs e suas
mite a sua influência li­ .
futura . • 1magens, ver o que elas têm
<f1• , 1 avra, gencralizar. Port an to, sena
.
comum . en1 uma ,na
dilidl perce Jer1 por c.iue a genera 1 t·zaça - 0 só sena. passive
- ,1
g
,
. ·d-a de Mas em pnm
1 1 .1 e pela soc1c a
·

·
. -

' . . er r0 l u r é inaclm1ss1-
' d que o pensamemo
·

. 1og1co
- ' se caracterize exclusivamen-
...... ... --�---- ... ... - ... , . ....,

ENTANl::s n,1 17/JA REUG/


480
O.\ 1 1 < 11 \.IO
AS FORMAS FU!.ll
"18 1
te pela maior exte
nsão das repre.se
llll'm . Se JS itléia nrnn>es CJ U<' o canse;
1 11.1 Jo tLmpo do ú \ . r. está subtraído .i toda cs.sa
s parc1cufares
que seria difere nte
nada tl!m de lógi
co, pen . L L !
com as idéias
gerais? O geral
" 1\ ao; d ma
·
- mos
·
. e ue esta_ saua. do numa região difcreme
.
1 ca lm
ª· Não se move por si
apenas no partic exisl l' .
ular; é o particular ,pmro, ma1 . s . serena e mais
simpl ificado e empo .
brecido. As.sim , o . ev• alução interna e espontânea· ao coo-
· • •

primeiro não pode 1111 1110, por um,1


ria ter virtu des e .
vifégios que o segun pri ;,1- mudança E' unia ma ne ua
·

do não tem. Inve 1 1 1 1 11 1. resiste. ;..,, de pensar que, a


rsamente, se o pen. . .
samemo conceitu 111 1 momemo do tempo, é fixa e cristalizadaR. Na medida
·
ai pode se apf ic-.i
r ao gênero, à .
1 variedade,
por mais restri ta espécie, 1 1 1 que e e e o que deve ser e
1 .
, 1mu ra'vel· se muda, nüo é
que esta seja, por

1 1 1 1 l'steja �m sua �<�tur�za


poderia se e1>tender que não
qual tende a repre
ao indivíduo , isto
sentação à medi da
é, ao limite para
o 1 tlguma 11nperfe1çao, e q
_' :ueda1:'reé::ue
' descobrimos ne-
necessidade de ser
que sua exten são .
minui? De fato. exist
em muitos conc d1 1 l 1t.1<lo. O "1" • tn •
.. t c ·i ele conceitos eom 0 qual pensi1mos
ci1os que têm indiv ,
1
duos por ohjeto. í­ 1 i 'ida corrente e aque•le ciue 0 vocabu I' ano· de nossa lin-
Em toda espécie
.

de n:ligijo, os
'>ao md1v1duos
distincos uns dos deuses 11 1 materna expnme, po1s . . cada .P alavra traduz um con-
outros; no enta nto,
são con cebidos,
não percebidos eles , 1 •1to. Ora, .ª 1,mgu.i e '• fixa ' modif1ca-se lentameme e, por
. Cada povo rcpn.: .
de uma cerca senta 1 so ' o mesmo .1

maneira, variável . c·ontece com a organização conceHual


conforme a s époc
q1w ela expnmc.. o ·enlista se encon tra na mesma situa-
heróis históricos ou as, seus .
legen dários; essas ·
.
conce ituais . Enfim, representa�·Õ<.:s são A
11 1 cm face da terminologia e�pecial e111pre ada pela cien-
CI .
cada um de nós p
çào dos indiv íduo
seu cará ter, de
s com os quais
ossui uma cena
nos relacionamo
no­
s, de
( 1.1 a que se (1 e( ric-.t e,
> co nseq uentemente ,
.
m face do sis- :
11·ma especial de conceitos ao �ual essa terminologia cor-

sua fisionomi a ,
dos traços distin
seu temperamento civos de 1 1 sponde. CI aro c1 ue ele pode 10ovar mas suas inovações
físico e moral : essas
noções são verda­
dl'i ros con ceito s . , . · e1e violência praticada contra

. Clar o q u e eles io sempre uma espe�1e


sào, cm geral , _
grosscirameme forma muito i1 1.meiras de pensar inst'.cu1das�
dos. Mas, mesmo
cicm íficos, h;í emre os conceitos
muitos que sejam - relativamente imutável, o
.
Ao mesmo tempo em que e
pcrfeitameme adequ
a seu ohjeto?
Sob esse aspec to, ados - é uni· versal pe1o menos e
' o nceiro, se nao ' u n i versal i zá-
não h á , entre _
e meu conce1·to' é comum a mim e
'
aqudes, senão difere estes e wl. co cc,·Lo
1 '
n·lo
nças ele grau. Um n
É por outras caract " outros homens. ou, e·m todo caso ·

erísticas, f10rta nto, . pocle lhes ser comu111-


que se eleve de­
Ele se opõe às rcpr
finir o conceito. i d o. E .
, 1mpossive .' ·I que eu cons1"g;t transmitir uma 11ensa-
\ .1 0 d e m i n h a consc1cncia ·'I consc1enc1·a ele ot1trem· e 1 a
de toda ordem - csen1 açõe s sens íveis
1
·A · ,
sensações, pe rccp
• • ·

çôes ou im<igens -
·A
las prop ried a des cstrit nmen te

pe­ 1 k· n
que enu meramos s en de o1. an .s o e ele minha pcr-
de me u
1' g 1 rn
. ,0naliclade e nao P�de ser separad a de le s Tu do o q u e
<i eguir.
As representaçõe
s sensíveis cnco
-

perpé!Uo ; suce ntrnm-se num ílux .


· ·

dem-se urnas às o m
l sso fazer é a se colo car diante do
con v 1 da 1 o u tre m ·
outras como as .
um rio e, mesmo ondas de mesmo o1)jeto que , ·u e a se a xu a sua ação . Ao contrá-
1
enquanto dura m ,
,

távei s. Caúa uma não perm anece m


e funçã o do insta imu­ . :. . 1· nrelectual entre os ho-
. ' eo comerc10
a conve rsaç.10
nte preciso em
1 10 ,
ocorre. Jamais estam que mens con11iste numa tr?ca e co�ceitos o conceito e uma

os seguros d e reen

cl
ccpçào tal com o comrar uma per­
a experimencamo
s uma prim eira
representaçao essencialmente impe ss . al' é9 através dele �
pois, se a coisa
perce bida não mudo vez, <(UC as imchgenc1as
. hu 1nanas se comurucam .
mos m<iis os mes u, nós é que não
so­
. •

mos. O conceito, ao .
A nature za do conccao, .
ass111; definido revela suas
contrário, está com .
o ongens. Se ele é comum a todos, e que e , obra da comu-
AS FOJWAS ELEHE.\TRfi
A l DA l'TDA RELIGIO!.A f tJ,\CLL"SÀO 183

�idade . e não traz a marca de nenhuma inteligência par­


� l 1 • 1hcce tc,Jas as pala'ras da língua que fala e a significa­
ucular, e que e _ mtegral <le cada palavra?
elabora<lo por uma inteligência única \ · '"
na
qual todas as outras se encontmm e vêm
de certo modo, Essa observação permite determinar em que sentido
� r. Se tem mais estabilidade que as sensações
. .
"
'e a l iment
_ ,
quL'remos dizer que os conceitos são representações cole-
ou que �s t �agens, é que as representaçõ 1 1 1.ts. Se eles são comuns a um grupo social inteiro, não é
q11L' representem uma simples média entre as representa­
es coletivas sã�
_
'llatS �stave'.s qu e as individuais, pois, enquanto o indiví­

tl o e sens1v el tnclu _
� ive a pequenas mudanças que se \ l l\.'S individuais c01Tespondentes, pois, nesse caso, seriam
p_i o�uzem no s�u meto interno _
e externo, apenas aconte­ 111.ds pobres que estas últimas em conteúdo intelectu al,
runentos de suf1c1e .
nte gravidade podem chegar a afetar a • 111ando, em realidade, estão carregados de um saber que
)ase mental da sociedade. Toda vez que
estamo1> em pre­ 1 i l 1 1apassa o do indivíduo médio. Eles não são abstraçües
·�nça e um tipo•u de pensamemo ou de ação,
� q11L só teriam rc.:alidadc.: nas consciências particulares, mas
'loc uniformemente às vontades e as uueltg 1
que se im­
sentações tão concr(•tas quanto as que o indivíduo
ênctas part1cu­
hrcs, e:sa pressã? exercida sobre o indivíd 111 1de ter de seu meio pessoal , representações que corres­
uo indica a in­
lerven�ao da sociedade. Aliás, dizíamos há l 'ºndem à maneira como esse ser especial, que é a socie­
pouco que os
<once1tos c� m os quais pensa mos corren l.1de, pensa as coisas de sua experiência própria. Se, de
temen te são
n:-10 ha' dllVI 1,110. os conceitos são na maioria das vezes idéias gerais,
aquelt:s consignados no vocabulário Ora
{e que a (inguagem e, portanto, o sistema de conce

. ºda
de objetos parti­
itos
• '

" 1 exprimem categorias e classes em vez

�uc ela traduz, é o produto de uma elabor c u lares, é que as características singulares e variáveis dos
O q�e ela exprui1c e a maneira como a socied .1 rL's só raramente interessam à sociedade;
ação colétiva.
_ em razão mes-
ade em seu
ente só pode ser afetada
pdas propriedades gerais e pem1anentes desses seres. As-
coniunto representa os objetos da experiência. 1110 de sua cx'tensão, ela praticam
As noções

1111 é para aí que se volta sua atenção: faz parte de sua


c.uc correspondem aos diversos elementos
da língua são '
f()rtanto, representações coletivas.
O próp�io conteúdo dessas noções testem 1 1tureza \Ct as cobas por grandes massas e sob o aspecto
• lllL' elas têm mais geralmente. Mas nisso não há pobreza.
unha no
e não hã pala­
lll��mo sentido. Com efeito, praticament
vras, mesmo entre as que mais empregamos 1 111 todo caso, mesmo quando essas representações têm o
Çlo nao - u 1 trap�:se mais ou menos largamente os
, cUJ·a . ,1cep-
, .1 1;1ter genérico que lhes é mais habirual, elas são obra da
e� no�sa e� penenc1a pessoal. U m termo exprime com ,, idl'dade e são ricas de sua experiência.
limites
_
É nisso, aliás, que está o valor que o pensamc.:nto
. fre­
qJencia c01sas que jamais percebemos, exper· .
nJnca fizemos ou das quais nunca fomos
, 1e
· netas que
, o nceitual cem para nós. Se os conceitos fossem apenas
��s'.11 0 qua ndo c?nhecemos alguns dos objetos
testemunhas
aos quai � 11 ll·ias gerais, eles não enriquec eriam muito o conheci-
a
ec se r�lac1o _ na, 1m·nco, pois o geral, como já dissemo s. nada contém
1 1 1 1 1 s que o particula r. Mas se são, antes de tudo, repre­
e apenas a título de exemplos particula­
r� que t l �scram a idéia, mas que, por
si sós, jamais teriam
siJo suficientes para constituí-la. Na palavr ,, ntações coletivas, eles acrescen tam, àquilo que nossa
a acha-se con­
densada.. ponan�� · toda uma ciência para
a qual eu não " pl'ríência pessoal pode nos ensinar, tudo o que a cole­
cG!abore1, uma c1encia mais do que individ t 1 \ idade acumulou de c;abedoria e de ciéncia ao longo dos
ual; e ela a cal
ponto me excede, que não posso seque ,, 1 ulos. Pensar por conceitos não é simplesmente ver o
r me apropriar
ccmplecamente de todos os seus resultados .
Quem de nós " il pelo lado mais geral. é projetar sobre a sensação uma
AS FORMAS l!'l.EMENTARES
n11 l'lnA REL!GJOSA
< r!.\CLUSÀO 485
luz que a i l u m i n a , a
urna coisa é. ', a o me smo
pencLra e a Lransforma
'º len>Ll séculos para se delinear e se constituir. Em. �o�­
. Conceber

�11
tem po q u e apreender
seus demencos essencia me lho r
is, siLuá-la num conjum mundo ocidental, foi com os grandes pensadores d a
o, pois ca­
da civi liza ção tem seu
sisL ema org aniz ado de �
t ; récia que ela tomou, pela primc r� vez, um�a cl ar� con� �
nl:ncia ele si mesma e das consequenc1as que tmph�a,
que a caracLeriza Diante .
. desse sistema de noções
conceitos
, o esp í­
.

descoberta provocou um marav ilha mento, qu� ) latao u a -
'
riLo indi vidu al csLá na
mesma siLu ação que o
voüç ele Pla­ ' f' .

duziu numa lingu agem magrn ica. Mas se foi somen te
tão diante do m undo
f.
elas idéias. Ele se esforça
por assim i­
nessa época que a idéia se exprimiu em formulas 1l osof� ­
lá-la s, pois tem necess ', , .
idade delas para poder
tratar com
c.1s, el a necessariamente preexistia n<:' estado de se�t1-
seus semelhantes; mas
a assimilação é sempre
imperfeita .
bus�aram
Cada um de nós as vê _
a seu mo do. Há a lgum mento obscuro. Esse sentimento, os ftlosofos
·I uc1··c1a--1o, não o criaram. Para que pudessem pensa-lo e
as que nos
que permanecem fora
escapam complecamence,
círculo de visao; out r
.malisá-lo, era preciso que ele lhes fosse dado, e a qucs-
t
de nosso
ns, das qua is só perceb
l.10 e saber <lc onde 'vinha, isto é, �m _qu�l :�pcnen c1a es
. ,
aspectos. J\.f oita s, incl usiv emos alguns ..
e, sao desnaturadas qua
pensamos, pois, sendo ndo as _ _
colelivas por natureza lava fundado. Pois bem, na expenencia coleuva. Foi sob L'•
, não
forma de pensamento coletivo que o pensamemo Lmp:s­
se ind ivid uali zar sem pod em
ser retocadas, modifica
das e, conse­
soal pe l a primeira vez se revelou à h u ma n i lacle, e n
qlie nte mente , faiscadas
nos en tend er; daí, mui
. Daí termos tant a c l ificulcl a cle em � ��
tas vezes até, mentirm
os, sem q u e­ vemos que outra ma neira pocl � n_ � ter ocº'.. ' .'�º essa
ele _ ie
velação. Pelo simples fato de existir a soc1cd.ide, �x1st
re r, uns aos ou1 ros: é .
que empregamos tod . � �
também fora das sensações e elas mugens md1v1dua1s, �o
os as mesmas
pala vras sem lhes darmo
s todos o mesmo scm
ido.
Pode-se agor.a emreve
r qual o papel da socieda ;
do um istema ele representações que gozam ele propne-
....
llad"S.. maravilhosas. Graças a elas, os homens se compreen-
gênese cio pensamemo de na
lógico. Este só é possíve
do mom emo em que , l a par tir
acim a das represemaç
ões fugazes <lcm as inteligências se interpenetram. Elas possuem uma
.
devidas à experiência
ber todo um mu ndo ele
sensh·e l, o homem che
ga a conce­

t•sp cie de força, de ascendência moral, em vlflude ?ª
ideais estáveis, pomo
com um das qu ai se impõem aos espíritos particulares. Por consegum­
imc ligências. Pensar log
icamcme, com efei to, te, O 1lld"!VI'duo se da' conta ao menos obscuramente, ele
é sempre,
· • '

cm algu ma med ida, pen . . ·

sar de maneira impesso q u e acima de SL1as representações pnvadas existe u m


al ; é tam­
mundo ele noções-tipos segundo as quais deve regLt1ar sua�
bém pen sar sub specie
·

idade , esta­
aetemilalis. Impessoal
' · , . ele percebe lodo um remo mteJectL1al do qual 1")a1-
bi lida de: são essas as dua
.
s características ela verd
· ·

1. <.I e1as,
a vid a lógica sup õe c ade. Ora,
v i clememc n te que o hom ticipa, mas que o excede. E , uma pnme1ra
. . · - do rei-
·mlu1çao
no ela verdade. Ce1tamente, a paru : do mom�nlo em que
a o men os con fusa men em saib a,
te, que h á uma ver dad
das aparências sensíve e, d istima
is. Mas como pôde ele tomou consciência dessa mais alta mtelecl� 1ahdade, ele se
chegar a essa
concepção? Argumema-
ela deve<>se ter sé apr
se, na maioria elas vez empenhou em investigar sua natureza; quis saber de �ue
es, como se
esentado espontaneame essas representações eminentes tiravam suas prerrogat.tvas
sim que abr iu os olhos nte a ele as­
para o mun do. No enta
nto, não há e na medida em que acreditou ter descoberto as causas,
nada na experiência ime

r solveu ele próprio aplicar essas caus� s p�ra obter, P?r

diata capaz de sugeri-l
a; tud o in­
suas próprias forças, <'S efeitos que elas imphc� m; ou S�J ,
clus ive a contradiz. Por
isso, a cria nça e o anim
suspeitam dela . A história al sequer
mostra, a l iás, que essa concedeu-se o direito ele fazer conceitos. Assim, a facu -
concep-
dade de conceber se individualizou. Mas, para comp reen-
AS FO!lll I S FILlfl
\TARf-
S IJA \7/)11
486
RE/./(,'Jú.'>,J cri.\·CloAO 487
der bem a.s orige
i das " . cJ . t cr .s.o rela nona
ns da função é p . .
cond ições soua s r, , - la ü s
..,uar da de s mholos imperfeitos. mas os próprios s1mbolos
s
, 1cntíhcos nunca sao mais q u e aproxi mad os. É
. epe nc.11:
' os. o concerto
.
.
Obietar-se-á q u e prcLis<1
'· 1 mente esse princípio que está na base do méloclo que se­
mostram
um de se u ·s a s ,, ·
ap en as por
.
1 unç·ào asseg urar
n e ctos que e e não .tem
_u_n rca mc ntc po r
· •

a concordância d . guimos no estudo dos fenômenos rel igi osos: considera­


o_s esprntos uns
(> .sobretudo, :ma
outros, mas també ' com os mos ser um a..x ioma que as crenças rel igiosas, por mais es
m e
concordâ ncia com
arece que ele so
a n <1 tureza das co1·s·1
.- Lena
s t ranhas às vezes em aparência, têm sua vc rc.lac.le que é
se fos.�c verda d
·

, · raza
eiro isto é' o1))Clrv • . o, e que sua
· • · .

- o de ser preciso descobrir' 1 .


� ,J. nas uma conse
dacle dc.:vcria S"r impe ssoal i- Inversamente, os conc:ciLos, mesmo quando c:omilruí­
. " ..
vidade. É nas cois
·�5��7t��d� •'.<�. quen. A cra
e .

. .. . - . • de sua objcr
i- tlos de acordo com toe.las as regras da ciência, estão longe

�: qu a n­
as
Lo possível , que a dc�fLra da men1e
os . . de derivar sua auto ridade unicamente c.le seu valor objcti
. lu sc cre ia nc
gamos qu e a evo <.:n<11 11 com ungar.
· �·ào (.Onci.:nual
Não nc­ vo. Nao basta que seiam verdadeiros para que
.
· · · , ..
ocoir.i i.:111 nane nesse
(crto que J n m r t
sen tidcJ O con ) , li.:s. ::ie nàu esmer<:m cm hannoma com as outras cren�·as,
rvame nte e consi
·

1
verda deiro por .ser derado

as outra s opiniües, enfim, com o conjunto elas repn.::.cnta­


'
co' l ...,.r·ivo tencl e ·
1 só
se consi derado '. · ·se torna r co e1ivo
verd adeiro . ;· '?e · ,·ões coletivas, :-erào negados; os espíritos se fcchar.:io
eles ; por conseguinte, será como se não existissem. Se
a
· d rmos-lhc
de c:onc:cder-lhe seu1> título
nosso e red rto . s antes
. ·• .
Mas m
� · ies . d mar nada

convém nao perd � <; , hoje é suficiente, cm geral, que eles tragam o selo ela ciên­
maioria dos conce
er de vis ta
1'to·s qL1e ut1�1·1z ·1
e , mes mo :hoie, a gran de
mos-_ n··
cia para obterem uma espécie de crédito privilegia<lo, é
mente constituído
experiC:nc:ia co mu
s; são extr. , 1
m, sem q
��e �� ·•
ao sao
dª 1 m�uag(.'111, isco
- metodica-
é, da
porque temos fé na ciência. Mas essa fé não d ifere essen­
cialmente ela fé religiosa. O valor que arrihuímos à ciência
e�ha m srdo subm
ne nh um a crític<1 _ etido s a depende, em suma, da icléia que temos colet ivamente de
pre lim ina r Os c
ados são � ,
elaborados c critic
ncc'._ tos c1cnlifica
:
c mcme sua natureza e de seu p<ipel na vicia; vale dizcr que ela
exprime u m estado c.le opinião �
Í que tudo na vida social,
Além disso, entre
·
ei;tcs e a q L��n:
u�1'. 1 PL'quena mino
·
ria.

·
que lrram roda a
r, t 0 d e ser 1
e 11 co 1etr vos, há
Loridade do .srm ,n. le sua au- inclusive a ciência, repousa na opiniao. Claro que se pode
·

s 1<1
uma representar" Lomar a opinião como objeto de estudo e del a fazer ciên­
fercn ças de grau .
letiva ' 1-.'1 ap rcsenta
garantias de ol
.
''
( co
·
0
. 1et1· va, por ser-
tão-só di-
c:o- cia; é nisso principalmente que consiste a sociologia. Mas
JJellv
, . ·c1·
foi caJ) <12 ' de. se gcne
r '. ide, pors
.

. . nao é
• .

sem raz.<lo qu e cl <i


n • l rz· 1 r e se manter
a ciência e.la opinião não faz a opinião; pode apenas es­
com suficie nte p
ersi stênch· S:. eI·a É

.
clarecê- la, torná-la ma is co ns c ie nte de si. verdade que,
�st rvess_c cm desacordo
· •

com a na tureza c
bs ,co is'a , na� l � err a podi do adqu
deste modo, pode fazê-la mudar; mas a ciência continua a

,
domínio am plo e irir um depene.ler da opinião no momento em que parece lhe di­
c1o, o quc faz a c
prolonga do SO l)re
os esp rrrto .'. · .
' . s; No fun-
tar a lei, pois, como mostramos, é da opinião que da tira
onfia nça q uc os c:o
piram é que eles _nc <.:itos c:ientrficos ins- a forç<i necessária para agir sobre a opiniâo1i.
podem <;er ��t�di
. Dizer que os conceitos exprimem a maneira como a
Ora, u m a repres �a�ente contr olado
ent açã o c / �-t'� s.
submetida a um com
mens que aderem
rore m e �' amcn
a ela a ',e n-' r1cam
J esra neces saria
te repetido: os ho
mente
-
sociedade representa as coisas é dizer também que o pen­
samento conceituai é conte mporâneo da humanidade. Rc­
.
pn a. Ela não pode
ria' ponanto' ser
por expe ne · A nci•a pró- cusamo-nos, porta nto, ver nele o produ to de uma cultu­
. ,1
qua da a seu objet .. . completamente made- ra mais ou menos tardia. Um homem que não pensasse
o. Podera, exp1
rmr-lo, certam ente,
com a por conceitos não seria um homem, pois não seri a um ser
488 AS FO/ll/A.\ EIJl/l;,RES
,\7A IJA l //).I REUG!OS.� t P\C/.l \.ÀO 189

soci� I . Red ��ido aos mer


li\ itbdL Indusive nào há conceitos que apresentem no
os pern:p1os individuais,
se d1�ung: 11na do <mim ai.
. ele não
�e a tc1.e cont rária pôde
fc:_nd1d a, � que se defi niu ser de­ 1 1 1�·smo grau que elas os sinais pelos quais se reconhece

1 a lhe sao esscn c1 1s . El


o conceito por caracter
:� _ es qul' 111na re present ação coletiva. Com efeito, sua estabilidade

1.tl � e com . _
uma idei
�_ e foi identificado com �1
idéia ge- ,. sua impessoalidade são ta isque com freq üência foram
a geral clar ame nte deli mita
cu n_scn1a ·• .
·

e imutáveis . Aliás, co-


_
� 1 ess�s condições, chegou-s
da e c ir­
e a pensar que as
1 1 das por absolutamente u n ivers ai s
1110 exprimem as condições fundamentais do entendimen-
conhecem o conceito prop ·
..
sociedades infc nores não
mc�te d1t�, Jª que têm ape
.
. • na 1 1 , entre os espíritos, parece evidente que só puderam ser
nas procedimentos de gen
erali- . . i . 1boradas pela sociedade.
Mas. no que diz respeito a elas, o problema é mais
zacao rudimentares e as
noções de que se servem
ge ralm em� defi nida s. Mas não são
a mai or parte de nossos
ceitos aLUa 1� tem a mes
_ con­ , omplexo, pois elas são sociais num outro sentido e co-
ma indeterminaçao; não
nos obri­ 1110 que em segundo grau. Elas nào apenas vêm da so c1e­
ga mos m u n o .1 def ini-l _
os, a nao ser nas d 1sn
qua ndo procedemos com
1ssôes e d.1Je, como as prop nas coisas que expnmem s.10 soua1s.
o cien tista s. Por outro lado
é gen eral izar . Pensar con
mos que conceber não vi­ 'i.10 apenas foi a sociedade que as instituiu, como são as­

ment: �ão é sim plesmen �


ceit ial­ pL'ClOS diferentes do ser social que lhes serve de conteú­
do: a categoria de gênero começou por ser i ndisti nta do
re isolar e agrupar junt
ract nsucas omu ns a u
os as ca­
� � m certo n ú me ro de objetos;
_
sum lf" o vanavel no perm
é sub­ 1 onccito de grupo humano; é o r i tmo da vida social que
anente, o ind iv i dual no
social. E 1·stá na base da categoria de tempo; o espaço oc u pado
pel a sociedade é que forneceu a matéria da categoria de
como o pen sam ento lógi
o, se�
co começa com o conceit
gue-se que ele exis tiu sem
pre; não houve período
co d �1ranre o qua l os hom históri­ vspaco; a força coletiva é que foi o protótipo do conceito
, k' força eficaz, elemento essencial da categoria de causa­
ens teriam vivido, de man
cro _ eira
nica, na contusào e na
contrndiçào. Clar o q u e nun
s� na dem ais insi stir nas rnra
_ ca lidade. No entanto, as categorias não são feitas para se-
ctt•rísticas difcrentiais que 1u11 aplicadas u n icamente ao rt�ino social. elas se esten­
logK _
� a p resenta nos diversos mom entos da a
evolui �orno as r � história: ela dem à realidade inteira. Oe que maneira, portanto, os mo­
ó prias sociedades. Todavia
�ue S�J� m :s d 1fcre!1 �
, por mais reais delos com base nos quais elas se construíram foram toma­
· elas nào devem levar a
_ ignorar dos da sociedade?
Categorias são co n cei tos e m i n entes que desempe­
as s1m d1tudes que nao sao me
nos essencia is.

nham no conhecimento u m papel preponderante. Com


deito, elas têm por função dominar e envolver todos os
IV
outros conceitos: são os ma rcos permanentes da vida
mental. Ora, para que possam cumprir es
sa função, é pre­
Podemos agora abordar
uma últim a questão colo
.

da Ja cm nossa introduçào 1 ca­ dso que tenham se formado sobre uma realidade de igual
� e que ficou como que
_
tendida em toda a scqüên sub en­ .unplitude.
cia desta obra. Vimos que
menos algu mas categorias pelo Cercamente, as relações que elas exprimem existem.
sâo coisas sociais. Trata-se
de de maneira implícita, nas consciências individuais. O indi­
no tempo e possui, como dissemos, um certo
saber de onde lhes vem esse
cará ter. ' íduo vive
Certamente, como elas p
róp r ias são conceitos com sentido daorientação tempora l . Está situado num ponto
preende-se sem dificulda ­
de que sejam um produto
a co- d determinado cio espaço e foi possível afirmar, com boas
7;IRES D.-1 1 1/)A RL/J(d
·i90
<J.\A
IS FOR.11..IS l:l.E.llE.\
1 1 1\0ISAO '!91
razôes, que 1od�1s
as suas sen sações t<'.:m algo de esp . -
Possui t•m Sl'ncim
Lações sim ilares se
ento c.la.s M.:melhan<,.
atraem, se aprox ima
as; nd , as repres
c
acial i"
en
t
11 1
ti
'

que conccm to a
��
.to em ,rc la ç > a
1�11!n 1�:��odcri'l
as ex�e
ser o l'<ipa�·o to-
parti�ulares e no qual ,
m, e a nova reprl' �
semação, fonnac.
la por essa aprox 1 1 , 111 c.l.isso,
. • .t. das. em relação a pontos
� tas cslao coordcn
imação, wm já alg
e
, i. rl' .tere A ncia
genérico Temos o dl·
. 1. n1pcssoa1s
· ·

. igualmente a sen .
com u ns. a todos os indivíduos.
-
sa�·ao de uma cen _
m<K1 o,
'.
gularidade na ord a re­
· ·

em de sucessão dos 1 1 r , mesmo cfuraçao ... (fUe sinto escoar


coneret"
fenômenos; o pró
1 1 1 mim e comigo na > 1 Jode na me dar .,1 'de
. -

prio ani m;l f não é ­
1
·

incapaz dis.so. Só "- ·1 •


a do tempo
.

que Lodas essas rela �


çôcs são pessoais ­ 1 1 1 1 . i l : a primeira exp m a e , �. o ritmo de minha vida
ao ind ivíd uo ne n c, p
las env olv ido e, por
1111 1 1\ . 1'd ua 1; o scou
conseg uin te, a noç �a
ào que ele delas ,., ndo deve conespondcr ao ritmo de uma
pode adq uir ir jam
, ." de ncn 11um .m d'iv1'dLio cm particular, mas
ser.í capaz de se ais -
·

estender alé m de \ ul.1 que nao e


As imagens genérk
seu e:screHo honzom
c l.1 qual todos pa rt1c1pam IA. Do mesmo modo, cnfun. ª"
e. . .
.1s que se formam
· c.1
cm min ha consc1e
cia pela fusão de n­ l
imagens sim il ares 1 t •gulan ades qt 1e perce1<> na n1·1 •' como rmnhas sen­
'>e­
' n"� 1�1
n,io repn;s ent .im
·ov'> S<.: s uceue m , pud c. m e'Ícllvamcnlc Ler valor para
·

n<io Os Objetos que


perceb i lfireta me nte
; não existe nelas
1 1 1 1 111; e1 as ex, p 1 ican1 de que maneira
nada que possa me . . .
dar a idéia de um
a classe, ou seja,
. , q L1 '
a ndo me é e.lado o
marcos capazes de ele
compreender o gru 1 1 1 1L·ccdente de u m pai. de fcnômenos cuja constância ex
po total ele todos
I '' limente1 . Lend o a e ' , esse esta-
os objetos possí .
veis que satisfaça
m a me sm a condiç
'
�sper·1 r o c:onsequen
.
.. le Mas
pessoa l nao P
.
.

• h ' d e esper,1
Seria preciso ter ão.
pri me iram cnc e a
idé ia de grupo, que
_
.
- oder·1·1
ser confundido com a
1 em umve . • 1 de sucessão que se
simples espetácul o . ' rsa
· •

o de nossa vida inte , 'mccpç . , ào


. de uma ore.
rior seria insuficie -
1 1 poe a tora 1·c1· •de dos espmtos
te pam despertar cm n­
nós. Mas, sobretudo,
não há ex eriên­
11 1 ... , . , dos acuntecunemos.
e
.

cia ind ivid ual , po p . , Lota1 e.los. conceitos cx-


,
r ma is ext ens a e Como o mundo que o s1stem.1
. .· ·dade representa, som e' nte ' ,a so
pro longada q u e
p 1 ime e aquele q ue a souc
cap az ele nos faz sej a,
er seq uer .'> usp eiLa
r a exi stê nci a de
gC:nero Lot ai, que um ' icdade pode nos
res e do qua l os
compreenderia a
oucros gêneros nao
uni versa lidade do
s se­
i quais de deve ser rcp e e . do
s
f o rnecer �• ·ões mais gerais segundo
. <> n ���
o � ente um suje ito
seriam ma is do que � �
1111c envo1 ve t < )dos
espécies coordenad
as encre si ou sub os SUJellOS p' rc 1
· c· • rcs é capaz de
uh
ordinadas um as às
. 1 harca r um La l ob'JC,1
a
outras. Essa noção
do todo. que está · s.0 se'> existe na me-
· •

0 0
Como u rnver
na base das classif
caçôes que aprese . i­
' 1.io
1.
a. cm
, e. 1
que _ f)Cnsac. · o e con 10 só é pensado totalmeme
. ·

n1 <1mos, não pode


provir do indivíduo,
.
que não é scn:io um
• ·

a ranc cm rdaçúo pela sociedade, e , nela . ie ele aconcece; ele se torna um


ao Lodo e que não
. qL ·i r e 1s s i m ela própria é o gê-
º
passa de uma fra
çüo 1nfima da rea
lidade. No entanto, vil.'menco de sua vida inter '
,. '
·
nvro Lota1 e -1 .uo q u 'tl nac. a1 e x1ste . o' conceito de tocali-
vez não haja catego cal­
ria mais essencial
do que esta, pois,
ior, · _'
como o papel das
caLCgorias é envolv 1 lade não é senao a forma b. t< do conceito de socicda-
conceitos, a catego
exatamente, o coa
ria por exc elê nci
er todos os oucros
a parece dever ser
,
e 11.:: ela é o todo que comp e � :�� I= todas as coisas, a classe
c:eico de totalidad
n hec: 1me nco geralm
e Os teóricos cio co- .
�uprcma que abrange todas as outras classes. É esse o
ent e o po stu lam prnxípio profu ndo sobre o q�a l :ep ous·1m
. essas dassifi­
passo que ele exc como evi de nte ao
ede infinit am ent e
o conteúdo de cad ,
. · ·1va.s' em que os seres de to los os reinos são
e a(ôcs pnm11 �
e e1 assi· t··ic,i
.. dos · ' r·os ·soc 1· ·' L ·1 ,,
·· com o mesmo
consciência inclivic a
luaf tomada ü parte situados nos quau
,
d i reito que os 11om c.is 1tt · Mas
.
Pe las me sm as raz · ' ·se o m u n do está na socie-
· ·

ões, o esp aço q


u e co nhe ço po r
me us sencidos, do
qua l sou o centro
e no qua l tud o est
dade, .' ocupa se confun de com o espaço
o espaço que ela
á lotai. Vimos, com e�feno, como cada coisa tem seu lugar
AS FO/ll!AS ELEll/.i.\TARES DA 1W.-1
492 í93
Rlf.JJGIOl:1 1 I J\U/SÁO

ente a 1 )mcntos devia satisfazer às difer


marcado no espaço socia l ; e o q u e mostra claram entes neccs<;i-
que ponto c.�sc espaço total c.lif<.:n.: e.las cxtcrt�ó
11 11
d.11 ll s org an i cas, ele
111
nao unha a meno r neces :o,1d ade de
cs concn:­ _
tas � ue <�s se.mie.los nos fazem perceber é que .ir, por todas , uma representa('aO con­
r:­
essa locali­ , l 1hor de uma vez
zaçao � l l'llll•ll e.lo tempo e do espaç
_ o. Mu itos anim ais sabem
tn te t ra me n r e ideal e em nada se assemelha ao
c�ue serra se nos fosse ditada apenas pela experiê nho que os leva aos luga res que lhes sao
ncia sen­ u 1 1 ontrar o cami
a do, sem preci­
s1veP9. Pela mesma razão, o ritmo da vida coletiva
domina 1 11111l iares; fazem isso no momento adequ
• n de nenh uma categoria:
e abrange os ritmos variados de toe.las as vidas as se n saçõe s são suficientes
res (!as quais resu l ta ; em conseq üência , o tempo
elementa­
que 0 ticam ente. Elas tamb ém seriam su fi­
11. 1 1 ,1 d irigi -los a u toma .
' tl' llles ao homem se seus moviment
c;xprrme domina . os tives sem que sat1s­
e abrange LOclas as durações pa rt icu l ares .
l i t\'f' <1pcn as a necessid ades indiv
E o tempo to r a i . A história do mundo d urnm iduai s. Par1 reco n hccc1:
u tras que Jª vimo s, de
e mu ito tem­
, 1 11v uma c
�, .
po não foi senã o um outro aspecto da história o i sa se assem elha a o
da socieda­
de. Uma C:�)mep com a ou tra ; os períodos 1 1 11 ido n<.:nhum é necessário que class
ifi quem os uma e ou-
da primei ra
.-.ao determma lo pelos períodos ela segu n da cspl:c ics: a mane ira com o as i m a­
. O que me­ 1 1 ,1s cm gêneros e cm
i!' 11s seme lhantes se atraem e se
: �
de essa du1açao i mpessoal e globa l, o que fixa fundem é s_ufici<.:��e �ara
os ponLOs
_ o:a em relação i pressao do Jª visto,
m
�le refc�en aos quais ela é dividida e orga ni­ < 1 . 1 1 o sentimento da semelhanç A a.
do 1a experimen
.

zada, sao os movi. mentos de concentrnção ou


de disper<;ão tado, não i m pl ica ne nh uma classi fi cacà o
da ��x�.ed�1dc; ele maneira mais geral, são as necessi buscar c.laqudas que
dades l'.11.1 discernir as coisas qu e devemos
perróc11c�s e.la restauração coletiva. Se esses samo s assoc iar os efeitos de am­
instantes críti­ dl·\cmos evitar, não preci
cos s� ligam com maior freq üência a algum causa s por um nexo lógic o, q uand o apen as
fenôm eno h.1s a suas
matcrra l, como a recorrência regular de detenn , 11nven iências indivi duais estão em
j ogo . Encadeamentos
inaclo astro
o_u a al tcr�â�cia da s estações , é porque sinais forces conex ões entre representações
pmamente empíricos,
perfeitamente <;C�u-
objeti vos
�� o �ec:s.<;. nos para to�nar sensível a todos essa 1 , mretas são, para a vonta de, guias
� organiza­
. e socia l . Do mes outros, mas Lambem
çaC: c.s.senualmcnr mo modo, enfim, a re­ 1ns. Não somente o an imal não tem
11ossa prátic a
laça� ca usa l , a partir do momento cm que é priva da, com muita freqü ência , não supôe
esta belecida
coleuvan: me el grupo, revela-se independente le que tem, do que
i: � � ele ro­ o.ida all:m. O h omem s<.:nsa Lo é aque
d� conso<.:n c m 111d 1 vidual ; ela paira adma de todos os es­
.
1 lt-ve fa7.er, uma sens a çã
o muito clara, mas que mi maio ria

cs É uma
lei.
sociedade. Esta só é
p1 ntos e de �odos os aconte cimentos pa n icular . incap a7. de tradu 7.ir em
t i . i s vezes seria
lei de valor 1 1 n pcss oa l . Mostramos que é Acontece de outro modo com a
s qu� a co m p.õcm �ão
exat a mente as­
sim que ela parcc<.: Ler se originado possível se os indivíduos e as coisa
.

1 vpa rridos
.
Uma ou t ra razão expl ica por que os elemen entre d i fere n t es g r u p o s, ou seia , class1 f1ca dos� e
tos cons­
'l' esses própri os grupos são clas
. .
.
.
ll tu ll �os das categorias tiveram de ser tornados da vida so­ sif i ca dos uns em rela �ao
cial: e que as relações que elas exprimem <;ó is outros. A socie dade supô e, p ortan to, um a orga n iza
nada mais é que uma classi fica­
podiam tor
nar-M� c:o�.-.ucnces na e por meio da soc iedade � 10 consciente de si que
. Se, num
\ 10. Essa organização da sociedade
comunica-se naniral­
�e rco sen r ido, das são imanemes ao indivíduo, este não
tmha razao _ alguma nem meio algum de apreen o que Lia ocup a. Para evita r q �alquer con­
dê-las de ml'nte ao espaç .
_ particular se1a destmad�
pensa- las, de explicitá-las e de erigi-las em noções
tas. Para orientar-se pessoalmente na extens

di tin­ llito, é preciso que a cada grupo
o; em outros termos, e
ão, para sa be r 11ma porç-Jo determinada de espaç
AS FORMAS ElE.llENTARES DA �llJA RHLIGIO.IA
'-l95
494

, 3101 rl..'duzi lo a .;er ape


hina-
nas u m sistema de com
preciso que o espaço total seja dividido. diferenciado. oricn u
o, é relacion á-lo .ª um_ a _c;a usa
tado. e que essas divisões e onencaçõ<.:s :;ejam <.:onhecida:. ' 11 ., Jrti hcia is; ao concrán _
qill' 0 implica naturalmence
. Tsso nào que r dize r, e ohv10,
de codos os espíritos. Por outro lado, toda convocação pa· ar
se oscr
dessa maneira possam n:i
ra uma festa, uma caçada, uma expedição militar, implica q111• noções elaboradas
a seus obje tos. Se a soci eda � e
ela pró� :'ª
que datas sejam combinadas, marcadas. e, ponanto. qu<.:· luwdiatamente adequadas
< ilgo de universal em
o,
_
rela ção ª º indi vídu
se eswbeleça um tempo comum que todos concebem da .
tem sua f1� 10-
,, 111 deixa de ser
uma individualidade que
1 1 , 11nia pessoal, sua idiossin
mesma forma. Finalmente, o concurso de muitos tendo
ucu-
cras ia; ela é um sujeito par

em vista um fim comum só é possível se houver entendi·
e, part i utar iza que pen�a. l:or-
memo acerca da relação que existe entre esse fim e os 1.1 1 . que, por conseg uint :
m ele­
meios capazes de alcançá-lo, isto é, se uma me1>ma rela 1 ,1110 , tam hém as repr
esentacoes colenvas �onte
io que elas seia m rrog res-
ssár
ção causal for admitida por todos o:; participantes do em­ im·ntos subjetivos, e é nece _ _
mais prox1111.is tla�
fato e
as para wrn arem
1, .unente depurad
::.i.:
preendimento. Não é su rpreendente, pois, que o tempo
seiras na sua origem, ?
social, o espaço social, as classes sociais e a causalidade , 1 11sas. Mas, ainda que gros
q 1 t 1. elas traz iam o germ _
e de u na nov a men talid ade à
coletiva estejam na base das categorias correspondentes, 1
:
q11;1( 0 indivíduo jamais tena
por
podido se elevar apena<;
já que é sob suas formas sociais que diferences relações fo.
o, o cam
_
in ho esta ''ª abe rto ª?
ram, pela primeira ,·ez, apreendidas com uma certa clare­ 11;1s forças; a partir de entã
esso al e orga niza do que só prec1-
za pela consciência humana. pvnsamento estável, imp .
olver sua natu reza
Em resumo, a sociedade não é de maneira alguma o �.1va , em seguida, desenv .
rmin aram esse desenvolv �-
ser ilógico ou alógico, incoerente e caprichoso que muito Aliás, as causas que dete
susc1-
rir especificamente d�s que
seguidamente se comprazem em ver nela. Muito pelo 1111..' nto parecem não dife _ co tende ca­
Se o pensam ento log1 _ _
contrário, a consciência coletiva é a forma mais elevada 1 . t ram seu gem1e inic ial.
' t 1 vez mais a se desemba
1euvos
raçar cios elementos sub
da vida psíquica, já que é uma consciência de consciências.
carrega na � rigen� , não é
porqu� a­ �
Colocada fora e acima das comingência1> individuais e lo­ 1• pessoais que ainda
ram; e, mui to pelo contrario,
cais, ela só vê as coisas por seu aspecto permanente e es­ tores extra-sociais intervie
ial de um nov o ti� o passou a se de­
sencial, fixando-o em noções comunicáveis. Ao mesmo porque uma vida soc _
tem po_r
a vida internacional que
tempo em que vê do alto, ela vê ao longe; a cada mo­ ..,envolver. Trata-se dess
d'ei to, desde então, u n iver
sa lizar as cren ças relig iosas. A
�nentC: do tempo, abrange toda a rea lidade conhecida; por
isso so ela pode fornecer ao espírito marcos que se apli­
se alar?ª •
, o horizonte coletivo
1m:dida que ela se estende xcel en­
o o todo por �
quem à totalidade dos seres e que permitam pensá-los. . 1 sociedade deix
a ele aparecer com
e de um toei� b � m mai s vasto,
Esses marcos, ela não os cria artificialmente, mas encon­ cia, para se tornar a part ar m-
inadas e susceuve1s de recu
tra-os dentro de si e apenas toma consciência deles. Eles com fronceiras indeterm pod em
üên cia, as cois a<> não
traduzem maneiras de ser que se verificam em todos os lcfinidamente. Em conseq
ais em que prim itivamente
níveis do real, mas que só se revelam com plena clareza mais se manter nos mar cos soci
erem ser org aniz ada s se�
un o�
l'ram clas sific ada s, requ

no nível superior, porque a extrema complexidade da vi­ çao
pró prio s. im, a orga niza
da psíquica que a í se manifesta necessita um maior de­ princípios que lhes sljam �
orga niza ção soc1 � l e to:n.a�se auto­
senvolvimento da consciência . Atribuir ao pensamento ló­ lógica diferencia-se da
1almente
o vínculo que ligava m1c
gico origens sociais não é, portanto, rebaixá-lo, diminuir noma. Eis como, parece,
496 AS FORMAS ElE.UE.\'úlRES DA HDA RELIGIO\.i 1 1 1.\CLl \ÁO
-197

o pensamcnco a individualidades coletivas vai


pouco ;1 qur• hriga a se peneLrar mutuamence._ � despeito <le
pouco se 11 antagonismo? A u niG t cxrliLação que foi d,1<la a css:i
º' 1
afroux ando; como, portanto, e!>te passa a ser
lil
impessoal e se universaliza. O pensamento verdad
eira e 1wlcss idade si ngula r é a hipótese da queda . com todas ªs
reco:dar aqui.
c J1t iculda<les que ela implic a e que é inútil
.
propria mente human o não é um dado primiti vo,
é um
\n contr ário, rodo misté rio desapa rec
produto da história, é u m limite ideal do qual nos
aproxi­ e a parttr do mo-
mamos sempre mais, mas que provavelmente nunca impessoal é
che­ 1m·nto em que se reconheceu que a razão
garemos a atingir. ,, >ment e u m ouLro nome dado ao pensa mento c oleti vo .

l'nis este só
Assim, longe de haver entre a ciência, de um lado a rupam enlo do� indiví­
indiv1duos, e os ind1v1d uos,
a é possív el atravé s do �
n_:ioral e a rel igiã o, do outro, a espéci e de antinom . _

ia q c i l u os; portanto, ele supõe os

p• > r sua vez, o supõe m, já que. não podem


..
tao freq uenteme nte se admitiu , esses diferentes se m•� ntcr a
atividad e human a derivam , em n.:alida de, de
modos da
uma mesma 1 1. 1 0 ser cm gr po O reino dos fins e das verda< les 1mpcs­

i;c ,,115 sú podc se realizar com


u .
e única fonte. Foi o que Kant com preen deu clarame a contri buição d:is vontad�s
nte.
Po �· isso, ele fe� ela razão especu lativa e da razão e s pelas quais
as ra z e� mesmas
s partic ulares , e as ra z õ
p rática , das sensib ilidade
dois aspectc_>s cl1ferences da mesma faculd ade . O as p ró p r i �
la \'ra, ha �mpess�a l
que, se­ .1,1s part i c i p a m d a qu e l e são
1.,1r,1 as qu ais contribuem. Em uma pa
l
gundo ele, faz a unidade delas é que ambas estão
e, a vida �<?cial
orienta­
das para o univers al. Pensar racionalmente é pensar e há social em nós, como
de l'lll nós porqu _
acordo com leis que se impõem ã universalidade
dos se­ e, nnprecnde ao mesmo Lcmpo
represenraçocs e praucas,
:
res raciona is; agir moralmente é conduzir-se de lment e tanco as
acordo L''sa impes soalid ade esten de-se natura
com máximas que possam , sem contradição, ser
estendi­ 11lc1as quanto aos atos.
das ã universalidade das voncades. Em outros . . a_ socied
1r . , ade
termos a Tahez se espan tem vendo-nos atnbu
ciência e a ?1oral implica m que o indivíduo é capaz
d •1� formas mais elevad as da menta lidade huma na. a <.:ausa
e
p
elevar-se acima de seu ponco de vista próprio e
de viver muito modes ta. consid erado o \'alor que damos ao
m:ce
uma vida impessoal . E, com efeito , não há dúvida idos e dos apetites, de um
de que , frito. Entre o mundo dos sent

t.ido, e 0 da
.
este sep um traço comum a todas as formas su pe ri ores do de ouuo, a distância é Lào
parece só ter p od id o. s: so­
razão e da moral ,

.
pensamento e da ação. Só que o kantism o não ex
p l ica de , () nsiderável, que o segu ndo
onde vem a espécie de contradiçã o que o homem Mas atnbtu r a so­
� de nos�� · 1131 -
l irL'f)Or ao pri meiro por u m ato criado r.
assim realizar . Por q ue é ele constrangido a se
se vê
violenta r ' iL· dadc esse parei preponderante na gênes
i u n:za não é negar essa criaçã o, po
para surera r sua natureza de indivíduo e, inversa i s a socied ade d1spoe
mente
por que a lei impessoal é obr igada a descer e
a se enca r� prl'cisamente de uma potên cia c :i a� ora que ne � hum ser
nar em ind ivíduos? Acaso dirão que há dois mundo o, com ef<:•t� ,� a me-
1en c1� e
s anta­ , >hserv ável pode iguala r . To d a cnaça
11, >:-. que seja uma ope ração mística
gôn icos dos quais p arti ci pam os igualmence o mundo que escape a
Ora.
c
p
da
matéria e dos sentido s. de um lado. o mu do � ela razão 111ce l igência , é o r du to de uma s ín tese . se as sin­

,,...,L's de representações particulares que


o
pura e impessoal, do ?utro? Mas isso é repetir a pergunc se produzem no
. a
em termos quase iguais, pois se trata precisamence são, por s1 m<:_s-
de sa­ 1111enor de cada consciência individual já
ber por que temos de levar ao mesmo tempo essas toras de n<'vid ades. quão mais eficazes serao
duas 111as. produ
existências. Por que esses dois mundos, que parece et as que as so-
m se , ...:-.as \'astas sínteses de consciências c ompl
E 0 que mais poderoso
contradizer, não permanecem fora um do outro?
IL'dades produzem ! Uma sociedade é o
498 AS FOR.llAS Et.F.,\ll:AT.·IRE\ DA l'ff),I NEIJGJ<l.\A

feixe tle forcas físicas e morais cujo espetaculo a naturez:a


nos oferece Em p:Htl! nl!n hu m <t se encontra uma tal n Nl >IAS
queza ele materiais diversos, levados a semelhante grau
de concentra�·ào. Não é surpreendente, pois, que dela
emane uma vida mais elevada que, reagi ndo sobre os ele
mentos de que resulta. os eleva a uma forma superior dl•
existência e os transforma .
Assim, a sociologi a parece chamada a a bri r um novo
cami nho à ciên cia do homem. Até agora , coloc{ivamo-nos
di ante da seguinte alternativa: ou explicar as faculdades
su peri <m:s e.-;pccíficas <lo homem, reduzindo-as às for
a r:i zào .aos sl'ntidos, o es p 1nto
L'

mas inferiores d o ser


, o que sign i ficava negar sua
. 1

matéria especificidade; ou
relacion{i-fas a al gum a rea lidade supra-experimental pos
-

tulada, mas cuja existên ci a nenhuma observ:içào é capaz


de est abel ecer. O que deixa va o espírito nesse impasse (• /11tmd11çâo
considerado fin s
i naturae:
l. :\o mesmo sentido. <lirt:mos
que o i nd ivíd uo além dele
���t
era
dessas sociedad�!> que e��s
não haveria nada mais, pelo menos nada que a ciência _
primitivo o hom�n: dei...sa:.
pudesse acingir. Mas a partir do momento cm que se reco­ plimitivas e chamaremos de
�.111
e <� i­
s. A e'pr essà o, sem dúvi da, carece de prec1sao, mas
n hece que ac im a do indivíduo existe a sociedade e que d.1tle
o cuidado de e-
esta n<lo é um ser nominal e de razao , mas
do teve
um sistema dl'
disso , quan <;e
, ,hm:n te t:' i1:hel e, alem

t<xlo
diz.er que o luxo e:.lt:)J tie
apresenta inconvenientes.
forcas atua n tes, uma nova maneira de exp li car o homem
1,.1 111ina r <;ua signilka(ào, não
J I�'>< > certamen
-· te n<10 quer
cm toda
· ·
se torna rossívcl. Para conservar-lhe seus acnbutos distin­ m.�, que
.es<l� '.
s. Vere mos, ao con�_ra
ças e práticas que nao visam
i 11�me do:-. cultos primitivo
fin::. . . " -
tivos, não é mais necess{irio colocá-los fora da experiên­ l
cia. Pe lo menos, anLes de ch egar a esse extremo, convém IV , AI . . . ,
wl 1giào se encontram cren
. § 2) Mas esse luxo e m L S-
1.11111.:nte uulitario:-. ( 1." ro 1 1 1• cap
saber se aq u i lo que, no indivíduo, ul trapassa o ind ivíduo
· ·

1 ><:nsá
.

nas oum1s, e
ia:s, t le
.

essenaa mesm.1
A

deco rre da sua

·s 1•e1t1·1 n1�.. 11 '


vel à vi<la religi osa:
1 11\LllLO
'
não viria dessa realidade surra-individual, mas d ad a na · 1-1 1· nas reli<>iõ r> cs inferiores que
<1ue
ma1.
e
.
or sua r:1za o d� �r.
: P ,
1 I ·
ex p riê nci a , que é a socied ade . Claro que não �e poderi a nos pt:m1itirú detem1inar melh ,
d •
���
' '' �º
orige ns assim como a
s
3, Percebe-se que amo
�a
dizer desde já aLé onde essas expl icações pode m se esten­ . •
1 1
' ""

p: i l .1\' rJ prim itivo , um sentido


. .' .
'.is
muito relat1vo. E.ntendem
socia l mais snn�
der e se ela s são capazes ele resolver todos os problemas.
e:o;
1
abso luto, mas o estad o
Mas é igu a l men te imposs ível estabelecer de anLemào um ··l ·1 não um começo ·
·
le alem o quad 1 n�o nos é . poss · · 1vc::
. _ I
cc�
-
,1111,ilmemc: conhecido, aque
·

limite que elas não poderi am u ltra pas sar O importante é .


cxpenmcntar a hi pótes e submetê-la Lào metodicamente
ong�ns. l os
, . Qua ndo falar mos das
p1c:s e mc:: meme retroceder t•ll'>
amento, é nesse senudo que
quanco possível ao controle dos fatos. Foi o que pr ocu ra­ l lll'�·os da história ou do pens
mos rea l i za r. "'pressões deverão .ser c:: r tend idas.
..
ço que sao categon.1s, por-
_

4. Dizemos do tempo t: do espa mpe-


ença entre o pape l que <lesc
que não há nenh uma difer
AS FORMAS /;"LHM/•Y!'
Af(f/\' OA l'l!)A Rfi!GJOvt
500
')01
nham essas noçc>es na
:h no�ôt·�
\"ida i n tel cc:tua le o que c:alx·

ro l IAM ELI N, fa.1111


dt• gênero ou ele cau 1 l n1 111. da (·c� letl\ id.ad ' ver em RATZEL, Politiscbe Geo11m-
�,1
fb/1•, " c1 pítu l o mrnula�lo__.'Der ' lbum un Gc1 s1 der Wilkl'1"
(H:r ">l>re esse ron e
sur /es e/é111e11ts pri
lj. l\ào q uere mos dizer q u� o ' n samcnto mitológico o ig-
11cipa11:x de /a repr
ris, Alcan , depois P.U
.F.).
ê.1·e11/t1/io11, pr. 63,

:; o .mfn·nge e de forma mab


76, Pa
'i. Ver em apoi o des , na m .·1 ioria das \ cz �
sa ass erç ão, cm l l
nm,1, mas que e
1 11.1 que o f>C sanlt::nto c1enu·n1co · lnver
·
l BEHT e J\IAL'�:o.. .
,1Jé/a11ges d'h istoire s--i mente mostraremos
o ca pít u l o sobre "La - ncia n..10 ' .z t1e n.10 0 v ·iolar embora conforma n-
mli 1
rcprés cnt a1io n du tem
gieuse ( Trt1t•a11.y de · • '

·-
/'11 1111ée sociologiqueJ _'. �., cain
'i i'i o Entre a c1cn-
11111 . 1 n·e
ps d a n s la religion
,
dn si· mais escru puI os·a mente a e1e do que a rel g
· • •

.
"
1 1.1 1· a rc1•1g1ao, n esse
(Paris, Alca n )
• outros aspectos, há rão-
' ·
.. como em mu itos
. ..
nHxlo ioda a d iferenç
a que exiMe en trt• , d1ferenç:is ele grau; mas, em1)().r:a não devamos exagera- • 1 as, e
6. Percebe-:.e de.\te
o c:omrk-xo de .sensaçc>e
.
serve p:ir:.1 nos orie u1 1ponamc assma 1a • -1•

·
s e de imagens que
• .
.
sigmficauv,1s. .
r.ir na du rar;io e a n Jois
Jª havia sK , ,0 1rnulalh' ' pc.:los fundadores
são
.. 1li'pótcse
categoria de tempo.
As rrimeiras silo o 1 4 . 1-:ssa ''"'.! ,. 1o r
e vá l idas par :1 o ind 1 1 1'<l /ke11J.1yc� olo11ic . I· . . 1a
rno ele ex periências resu
duo <Jlll' as rrocfuz iu ; �� ��;,; � ��
·:
ind ivid uai s -'<>m ent
·

rticultrmcnll'
!\o C<>ntr.írio, O lJlle
1.
n t l a clo ..n it• Frkl·nnr �is'
111d1cac.
111 " c:uno M
ivi­ '
l �\ ��;(:: ·
.
de tem po é u m tempo C'\j>ríml' a C.ategon ll�o dt:
a
assim é poss ível diz
com um ao gn1 po,
é o tempo social, st· i. h re unter d e m V ol in
ccmpo é da própria
.. k psy�
' <'tlsch f VõU•e1psvcholof{1e, V l l pp . !66 ss. Cf. u ma nota de
. holo ischen Gesichtspunkte
F

er. A categoria de
social. Por isso, é
verdade ira in.�c irui çào
. '.,1·1 . INTI IAL •sob re o mesmo assunto, tbid" pp. 1 78 ss.
um a ,

15. Mesmo na reo . a d S ncer é com a expencn c 1. a i· n,'l i-


par ticu lar ao homem
e ' f>C•
a nima l não rem represe : o
A d isti nç::io emre '.
ntação desse tipo.
.
\ id ual que sao c:onst ru1'd a s as GHegonas. A umc.
·-
n
a categoria de tempo , ·., .1· r
1 c 11'crenra
' cxis-
respondentes poderia e :is sens:ições cor­
igualmente -"Cr feir a
h nte, sob esse . , asp ,t·to' entre o empmsm
. . o ordinário e o em pi-
propóMto do espa­
ajudasse a d issi par · ' ltimo os rcsu lw dos
ço, da cau sa. Talvez a
e
mantêm as comrov
.
cenas confusões
que 1 is1110 evoluc:ionista, · . e ·, <rue: ·segu nde> este u • •

érsi a s em torno des


d.1 exp en·-enc1. a 111d'ivi'dua s·
· l 10 cons.ol'd· 1 ac los pela heredita riedade.
ão deste hro (§ 1 l.
sas qucstóes. Voltare
\l.is essa consol 1 dacao
· '

' lhes· acrescen


a esse ponto na con mos
ta nada de essenc1.a 1 :
7. Op. Cll . pp 75 ss.
clus .
,- n·io .
. JC> de1as nenhtin1 elemento que não te-
. 11;10 entra na c:omposiC-
• nessa teo-

a cxp lít< lf e.s.�a con


prec iso adm itir que t cordâ n ci a , seria
8. Caso con trá rio, par
11ha sua origem na expe rtl · -• nn·
odos os indivíduos,
. 1' e1 o 1·nc1·1v'1llt10· Assim
cm virt ude de sua c i 1a, a necessidade com qu': as catcgorhs
··
. impôem atualmente
.1 nós é o prcxluto d uma ilusao,
· se
tilll içâ o orgânico-
psíquica. são cspom ons­ _ �
le u p reconccito s upers t i cio­
. m o mas sem fundamento
aneamcmc a fetado �
mesma ma neira pelas
to mais i m prová ve
diferentes p:ines do
e-"pa�·o, o q ue e mui­
s da
'º· forte m ente enraizado no org n is � •

la s
l , vist o que :i s difere
mesmas, são de fa
r o i nd i fe rentes . Aliá
na natureza das coi sas.
e na,-0 dcfin::imos 0 apriorismo
ntes regiões, por e
s, as div isôes do csp q
. u
1 6 . ·r·alvcz c:1 w.c surpresa
iedades. É a prova � � 1·
mu dam c:om as soc a<;o '
pela hip<'Jtese das q u a l i dadcs inat s · · M·1s em rca ic.l ·•1de' �"ss
l'oncepçao 1 e e
· . ·1
de q ue n:ío e.:.rao fun
·
'
.
das exclusivameme na da­
l s n�,--
9. Ver DURKHEIM e
natureza congc'.:nita do n1• nha na doutnn,1 a pe�� um papel secundú-
. I 'isc� 1 , re resenta r a irredutibihda

É
,
homem.
ve1. de das.�ifkmio
u ma manem1 s1111!)
i
. de
n", in A n née socio/. , VI, dos con heci men tos 1do s empíricos. Dizer cios
MAUSS, "De quelqu rio.
cs formes primiti­
pp . 47 ss.
10. lbid. pp. 34 ss. 1,
racionais ',10,e s
'
1 1 . "Zu ri1 Cr ea t i on My
primeiros que sao 111ªto.
s é apcna� uma � ' positiva
o rm·1 de dizer
,
• · ·

l3th Rep. quL nao sao u m produto da expcncnc


. ." ·1a cal como ela é ordinana-
.

thÇ
, in o/ tbe B11rea11 o/
Amer Clhnolugy. pp 367
12. Ver lIERTZ, "la 17 Pelo meno... . na med'd•
. ss. mente c:oncebic.la.

a in cimice. Étude
préeminencc de la m 1 '1 en1 que h{I reprc.-.cntaçôes i nd i -

se", in Rev. pbi/os.,


de polarité rd igieu . t gralmcntc empmcas.
vicluais e, porta nto, 111
dezembro de 1 909
• . • v • ' na ve rdade, é
. Sobre
i'las
essa mesma quesc:io das
rela cões emre a represe imprová\·el que esses ( o1s . upos
. 1
. de elementos não se encontrem
ntacão do espa\o
estreitamente unidos.
503
502 llS FOR.i/AS Hfllli f"IRH n.1 1 'Tn.I Rf'LJ(,'f<l\11 /\,1 1/, IS
.
.V

fe1ça c•ip'•
t/. dc crescer
•li•' que unita
-0
uma pe r
a natureza com
d tei�po
18. Comem nao entender, aliás. C.'>sa irrcduuhihdadc
\,;10 qucrcmo;, d11.cr qut' nao hap nada nas rt: tego
num
na base da ca ri a e v
v ida col<.:tt a ,
1111111tadamcntc
)',. Por e em
.�l·ntido absol uto. lo, o que est , á
. . - 1 , 1 e.
da n· t1a s.oei.
p
md t\ K u.1
pn.:.�cntalcX::. empiric-.u. que anuncie as reprc.�entaç(x:s racionais. -- x i um a r tmo d
nada no indivíduo que possa ser ' i...to como o • v a
· ·11·• mas se 11ª, -

s 0e, que , , .
rilmo
anúncio da ,·ida so cia l . Se a experiência fosse l·omp lctamc nll' O ri m
, id
iro
um outf<) n-1
l '' "kmos
ou que n.lo haja

d o unive so.
1 1
certo ha e apcn.1s
e
estar
· Do mesmo mod . v -
p e
estranha a tudo o q ue é racio nal , a razào n:10 poderi a ap l ic:ar·Sl'
na r
e <.:VI·t1 te q e
1 1 , man <.:ira m: s i gcni l ,
o 1 1u-
1 o
de grup .
a ela; do mesmo modo, se a natureza psíqui ca do indivíduo fos
os <> ulros
111.11.., • · 1c e u
nt ado en u
-. · ro formou-se s
·
. -ol)í e a

se absolutamente re fratária à v id a social, a socied:idc seria im


nOÇao de g� nc s -
_

a ais, po de- s .
e
. , <> m smo tempo
" u ms que grupos natur

possíve l . L' ma análise comple ta da:. categorias de' cria hu!>car,


ns Ytm
'
foro
',
home '
111.1110 Mas se os
ana-
e
I " " que exista m,
grupos 1
ais de coisas que
i
s· s .

esses grupos natur


·oi
po11an10, inclusive na consciência indiv id ua l esses germes de r.1-
entre as . e . .
cons-
ciona li dadc Aliás. tl·remos a oportun idade de voltar a esse pon e . cs .lo . �i.:
Sao

1 1111.:1n os gen<.:rc>s
nwi-..
�· s . uir uma origem
1i ,gos e dikre
impos.o;ível atrib
·· ci cs.
ar<.:
. ...
ui cspm ms p :cc o, e
Se
to em nossa conrlus:lo. Tudo o que queremos estal>clen:r aqui
e que, entre e:;.-;e;, gcrmes indistintos ck· r:1zoú> l' ;1 r1zào propn.1 , i1 rcurar-lh
es. to<.lo valor
·1 m 1 s o espec ulauv
· ··

mente d11.1, ha uma distância comparável à que separa as pro­


c tegoria::. sei r
(
"'"· 1·1 - 1 às a - ,cnte por nao - se

e
n
11 � ' · ' :
.
r
" cntc
.-
.
· ·s
frequ
. cl·,1 t:·. li· d·a muno
0 e se c:onc1ui
::i dc am
0
d es que
_ .
sen O
o
1 t so c i qu" e 11 rc t t
1 " . � i

<>ll . m�.m ..ti�


priedades dos t'lcmentos minerais que fom,am o ser vivo e os
n· u -1t reza. Mas a c:
1 u a n :
.1 0
u111a o s<1 c i natur a on c:l s

,1 , . , pr tne m
atrihu1os car:1cterí:-.ticos d:1 vida, uma vez constitL11da.
19. Obs<.:rw>u-se com frcqüência que os dbtúrhios so ciais ti­ �) _rnnc:_1p10.
nada; expn
que vale
' .1lc senã o
i
orias a instru men-
nham por <.:feito mu l tip lirn r os d ist(1 rb ios mentais. É ma is urna 1' arar as categ
24 . Por isso e lcg1 u mo co 1 um u ­
o
� ial � c
prma de que a disciplina lógic-a é um asp<.:cto particular da disci­ por e�
l mat<.:r
tegoria e
::ido é c a ta
pi

ocs t
nt<!,
o s o instrumc
p i � cnto, de ca
- .
" '"·
. le strum
pl ina social. A primeim se rela xa quando a segunda enfraquece. entre as t <.:s r ncx-� �
.20. Há a nalogia entre essa nt-cessidade lóRiC:.t e a obrigação
1•11 o • Aliás'.
l
.i,• institui�-ao
,
um 1·0rte p rentesco
a
ha
moral, mas nao ha ident id ade. ao menos atualmcllle. l loj<.:, a so­
dedadl! trata os niminosos diferentemente dos indi\ íduos cuja
intel igência ap<.:nas é anorma l ; é a prova de que a autoridade li­
gada às normas l <">g ica s e a que é in<.:rcnte :1s normas morais,
1 J \ RO 1
e npíl11lo I
apesar dc importa ntes sim i l itud es , náo siio da mesma natureza.
fenf>mcn<> rel i g io
Sào d uas <.:spéc:ics diferentes de um m<.:smo géner o Seria inte­ jú
hav iamos
1.
tent;�do e.� :
,f' · r o
( l . Ili, PP· 1 ss . ) . A
:.c > num

ressante pc.squisar em que consiste e de onde provém <.:ssa d ife­


� iolog iq11e

1 1:e como se
"·�e
cado em
L_'.l"d
ho publi verá, da propo­ qu<.:
dd mi� :I o que 507'
1 1 .1bal
· cntao

·E xprte '
de os razôe s que
.'
rença, que, ao que tudo indica, não é primitiva, pois durant<.: m as
muito te1111x> a consciência pública mal distin gu iu o a l ienado do
. n·., 68
p. d:t
mos na not.i
t teacõc s que
IT
· · ·11i ás ne-
11111s ho1e. não imp1 icam . •
delinqí.i<.:111<.: . Limitamo-nrn; a indicar a questao . Por es.se exem­ faws.
i .
çâ
. m. �c
on p
ram :1 ess a s

ind sobre a nc
nos !<.:va dos
plo, vê-se a quantidade de probl e mas que a análise d<.:ssas no­
� nu.,•1remos insist
ce o
esse1c1al n c ces-
uhuma mudança
? Ver P- Vll l .
� o
ao contt
· .
ddimcoe.'> pr
ções leva nta, noções tidas geralmente como elementares t· 'im­ e métod o a se-

- d<.:s.
sobr
ples, mas qu<: sao, em realidade, de uma extrema complexid:1dc.
o
elimmares nem .
id sas - ,
exp�> s1çao . pode ser ' 1sta
em

• ' chegar Ú! S11ici-


' 'ide
".1 11 para
d isso
questáo é tratada na conclusão do lino. 43
A . ..-
elas. a ss Cf.
nossas Regles de .la
r .
2.2. O racionalismo imanente a
.21. A P .
. p .U. f .) .
n; 1
q11e.-P ·
mét/Jode socs 10logf
c_
ele. PP- 1 ss.
uma teoria sociológica do �lc�
i

fr p 3S-39
e
.
(Pan s,
P· 17 cr. On�llW,
(Paris, Alcan). .
3 . PrC!lll iers p n 1 1c_1t>eSsc1en
conheci mento é. porta nto, intermediário entre o ern pi nsmo e o
u:ar;t , d

p.
- iOllS,
·' . /1
a priorismo clás,.,ico. Para o primeiro, as categorias s;io constru­ ce es elig
r
21
n a la
·
1trod uc1io
ções pur.:imente artificiais: para o segundo, sáo dados naturais: '1
para nós, elas são, num certo sentido, obras de arte, mas de uma 1,1 dél'eloppement
de la reli81011• • . p
504 AS FOR.lú!S l'IEll/�\?"l}(fl'
D.1 l 7DA RT:Li(,lOS.1 l\OlilS "iOS
5. O mesmo t·.spíri1
col:íst ica, corno teM
0 enc1on
· tr,1. - . • igu . 1 menic na e. poc:i e.s-
. ' ,1 l� c.:
' " ·om 111 ,1 peh
Ie1 me
. t
.
rei, de tal modo que o culto não é mab que a ex­
sàu tia perpetu ida de dessa vida comum essa ideia é com­
, • uno meMrl'
·. Fi
cm unh a
es quaere11s tnlelllec um
. ciu·•
L'
i l se
.
.so1"1 de.s.se penodo . a fi ilo-

i ktamente estranha aos budis1as. O me>. tre deles encontra-se no


el, J ll L'"-
flis
t
orr or
6. /11/rod11ctio11 10 lhe
PP- 1) s.�.
l'om .ma; mesmo que os fiéis gritassem por ele, ele núo podL-ria
., · •
� Rei1R1º11 -
7. JEVO i\<S, p. 23.
·

8. Ver <1dian1c, livro


IJI, ca p. l i . • •11\ i-los" (OLDENBERG, le Bouddha, p. 368).
9. PmléM011 e11es à� l 'hisloire des re/Wo 28. "/\ doutri n;i búdica, em lodos os seus traços esse nciais.
10. ..la C11•1!isa11011
ns, p. 31
primilwe, 1. p. 'l9 l .
1 1 . l�<.:.sde a primeir
. poueria existir, tal como exbte em real idade, e a noção do Buda
a edição do Golden
/:Jc)// •h 1 p 0-32.
,, 1 lhe totalmente <.:Wanha" (01..DENBERG, ibid. . p. 322). E o
. . li: • • p . .�
, e' inc
.
1 2 . Especial mente Spence
. . 1 _ '.
qul' é dito do Buda his1órico ;1plica-se ig ualment e a todos os Bu-
'.,, 1or
r e Cillen, lus
cha ma m máoic-ts I C>(l� ive Prcuss, que
1 .�- Bl l W ' /n1mu1t ..1 cl1C. m . " · ' s .n:io t·nd1 \'ldualv.:ida.s.
,., •·
29 Ver no mesmo semido J\lax M(LLE R, i\aluml Nelig1011,
�.s •1 r ças r<.: 1o1 o s·i . . . 1l.1s mitológicos.
a I bi·''/Olft' 'I" 'J<J//

l ddb1�111e i11-
.\ O l ' l
p· 16-i · 11 u• 1t1ma pane;• flfl 103 e p. 190.
t
h c· ,
die11• 2• ed .

30. CJjJ. l il., p. 1 16 .


.
·1 ex 1"·ste
1'.
S.

'' e1 �" L 1 1'1ª


1 1· •«
- •o s1gnrl1
,
·•

.n N'atu n:za e1erna .


"
d1s 1110 nao adm it<.:

t,1 que o bu-
.s ��c l Ll'�

• ' 7b,
ºr • •n c
l'l . BAHTJ l !le!IRIOllS of!11da,
. .
llO .
,
3 1 . BARTl l, in é'11cyc/opédie des scie11ces relig ie11ses, V I ,
15· OLDE:\ BEHG. !e
. t
i p.
1 (trad fr., P:1ri1.,
- , . 'l-18.
depois
Bo11ddha• p. )
P.l/ .F.) , Alcan, 32. le Bouddba, p. 5 1 .
16. O LD EN BERG, ihid 33. 1, Sam., 21, 6.
., pp. 21 1 ' 3 J 8. Cf. . . .
/e. l• pp. 389
. 31
.. . lev., XII .
bo11ddbLm1 edans /'flu KEH N, l l1S1 01re t/11

rfH, f>. 1 10. 35. De11/e1:, XXII, 10 e l l .


s.�.
_
17. lb1d., p. 258: 13AJ

36. la religion uédique, 1 , p. 122.


l9. B/\lffl 1 , P- 108 .
1 8 . !bit/., p. 314.

"Tenho a · nv · .
.. .i� o rnt1111a.
37. lbid., p. 133.
me me B u mou f. -. " U �.
nao l11 es ·se 'iak1a-M um encom
. (O icç, .. . di7 igua l -
·
" ,·
38. "1\Jenhum texto. diz Bergaigne. testemunha melhor a
. 1 • 1nsciê ncia de uma ação mágica do homem sobre
mdo a seu
1 c1 o.s no -
redor um pameio
J)<>,·oado com, os águas do
lid o a mcnor ncn .�s.s l(1 ali<: de u que o verso X, 32, 7. onde essa crença se exprime em 1er-
as
deus

. · es de • que e
mes, de nao lena

'�'-tIli b01u/dhis111 111m> gernis, aplicáveis ramo ao homem atual quan1<> a seus ante­
e i11die11, p. J 1 9).
a /'h · 1 11 1enr•·1 -1 o" (/nlr.
;º· Bll l{NO IJF, op. cil . p.
J l7.
- 1 . KFRN, O/J. cil.
passados reais ou mitológicos: 'O ignorante interrogou o sáb io;
, p. 289. rnstruido pe lo sábio, ele age, e eis o proveito da i ns tr ução : ele
.
22. " /\ crença u n ive 1 1l>1ém o escoamento das corredeiras'" (p. 137).
, · . 1 na l ncl i.a de < J
:39. !biri. (p. 139).
r:;a lm en te '•1c.e1t, •

,in
· 1M • e 1 a 1( L' lacu kla
gra nde san tida dt l ll' um a
1ei. sobren·1turn
t
· é ll�"C'�.
• •
1.im e n 1c acomi)
1 1"·

•0 q u e ele (S·
,·s·
, •

• "k ia-M
M ·

uni ) havc-
is 40. Outros exempl os se encontrarão em HUBEHT, a rt. "Ma­
in Diclicm 11c1ire des A llliquilés, VI, p. 1509.
• • era <> u111 co-:i po1
· de enc
(Ilurn ou f' p. l t9).
'
·
na ontrar nos espíritos"
'l i . Sem falar do sábio e do santo que prnticam essas verd a­
gia ,
23. BURNOUF, p. 120
2'1. !/Jitf. , p. !07.
.
dvs. que. por essa ra:do, são s;1gradas.
25. !hid. . p. �02 42. O q ue nào significa que essas relações não possam ad-
É o que Kem exprime nos - • 1 11mr um GH<íter rel ig io�. l\las das não o possuem necessaria­
�� 1nres.
26.
fX't'tO, ele é um homem; sob cen
. 1<.:m_io.: ·sob ceno as­
.. • não •. nem uma cois 43. SCI I ULTZE, Felicb smus,
i p. 129.
o ' ix:cro, nao e um ll ll'nte.
.
a nem outra'' (o cü
homem: sob
'fJ.
ce110 aspectu
J
e
' ...'
da <'..omu 111.dade mio
-7· ·• p. 290>.
A ideia de que o c 4 1. Encontrar-se-à,> exemplos desses costumes em l'RA­
. seu
. .s• mas pem1anece rea
hefe divmo
·
ausente de en tre está
os /.1· R, Go/de11 8011gb, 21 ed., 1 , pp. 81 ss.
45. /\ concepçào segundo a qua l o profano se opõe ao sa-
lmente entre ele.s
'i06 AS FONJf!I\ f:'IJ'.lfFl\"T,!RF\ /),-1
l l/J.I /U!L/(,l(J.\A 'i07
grndo as.s im como
o racional ao irracio .
nal o i111d igivd '·10 . t•
" º'º· t• apcn;1s um "i9. i'ln Atenas. os dl't1Sl'S aos quais se dirige o c:ullO do-
:1 das formas sob
mr,J
.1s qu..rrs. "l c>.p
orosinio . u m.1 . vez , con slll u1d .
. r 11nc ess a 111< '"u' s<i o 1.tlH>(lllll'nte forma� cspcoalizadas dos dcu't'S da ( 1-
:1. a ci{·ncia ad u •
d.11 il <Zeúç rm1crroç. Zeúç i:1p1Ctiç). Do mesmo modo, na Idade Mé­
.
1. . .
·

profano. sobrci udo l' r rc um caraier


m f:•rc� · . q
. ,

� d.1s re 1g1ocs
.

cn s11 s · cc>nseque
mcn rc, pareceu que
ela n<i o pod·' ap . . · . • ,· ·"
, 1l
· ntc- d1.1 os padroeiro:; <las coníraria:; :;áo samos do calendário.
·
.
.1r-s t .rs. corsa� sagradas.
ª 60. Pois o nome igreja nào co:;lu1m1 ser aplicado senào a
.
-i6. Ver FIV\ . m
· R "O ere oni . s of the
> � � �1 1· Cc111ral Aus· 11111 grupo cujas uerwas comuns relacionem a um círculo de
ZE
irnlian Tribe.s", in A 11;tra/�1�
As.w
'. >ew "111 for the .-ld1 •a11cc•111e

Science' 1 90 1 ' J)p. 2 1 .
se

menos e.,pct1ab.
�) -', s s. A conCCJ)Ç'J() .,,.. .
' · r.r· s. c '.. cJe uma ex 61. HLBl'lff e \Li\t;ss, /ex: cil. . p. 18.
111 r!f l i '"·'"

gcneralid·rele· \i··' •1 rrcma


n d ·1.1.
· p·'
· a Mmp .· ks i n k·rp. . çao
.
tem os mesmos t.'Íe i no mo .sacrificial (il. Hobcrtson SJ\l l TI 1 ja ha\ ia mostrado q u c a magia s e
itos· 0 'kK'rifiJC.•1111e. sr
mple-.mcntc por ent 11p .._. ,j rcligiào assun como o rndi,·idual ao social ( 7be Neli,11m11
_

C'lrculo das corsas sa rar no


. �;d, ; L s'. .mud.1 de [X.rson
L' MAl·s
alrdacle Í\W 1 tl BFJ
ff "' •e \'emite":>, l ed .. pp 161-l(r)J Ali.is, ao dislinguir deste mo­
' �.. s !:;:,, . f
. sur e sacnfrce", rn A 111
. s;.u
esoc:iol li p 101 } d11
1 \cr 1111 " · ·
mawa da reltg1.10. nao querl'mos e....tabt:lcter entre elas

' 1" i. urna lJ lfllC uis · M:llll>'·• t.1·' · r nruaçao p n llfll, solu�.11 uc tt i1111r ndad1. \. ÍP
1

mt..:ir.is emn. >s doi� domí-


8 1\ ,
.
sn
· º��ª �,e � 1 os ma is adi.rnte de •qt; e-�� 111"' ....ão, com frcqüência, 1ndcdsa:;.
r : �
.

ra. c r c ,::� 1 ��; ��� '.:: . anei-


·

. 1 .
. . pe cres d l' co1,,,1s s·•,..
· :; e. ntre as Trcms. a Proc. No1•. Soe. of l 'iclona.
• lh
. . . ron 63 CODl{I GTO:\', rn
quais ha mcompar
ibilidade se exdu .
sagrad;> e�du'. º pro
� nl'sma form.r que XVI p. 136.
fano < l iv�o 1 1 , ca .n;, � � ;; 6-1. l\EGIUOLI, D'!i Genii presso i Romani.
o
"9· E 0 c.is . o dl' · .
certos ricos nu pu • ,11s 65. E a condu:;ao a que chega Spencer em Eccleswslical
exemplo.
· . ou íuneranos. por
/l/\lit11tio11s (cap. X\ D. 1:: também a <le SAJ3ATIER, em lisq111�ç_çe
• .

50. Ver 'S P E NC EH -


Gf d 1111e philosopb ie de la religion d 'aprês la psycbologie e/ /' h stoi­
Ira/ia, pp. 53 , :-.� . \J rt�e '. 1L Ll� ', :"ª'i1 e Tri/Jes of Ce11/m/ A 11s­
N
. ;� .r 1 1 :nbu of .'
i
�· de 1cx.la a escola à qual pc11ence.
5 IT. /\a/1'1�' Trbes <!J .S. p. r63;
Ge111m/ Australit1,
/:.. A11.11mlw, pp. ·i59-J 66 . Em muitos povos indígenas da América do Norte, pa11i-
llO\\'.T
,,

1 Ver CODRJNG'TON, '6 1 •


1 ·fiJe ilfelt111esic111s. cap
n

11J;1rmcn1e.
> · \c
5-. . XII ·
. r Hl mHr . ' · rn · M.rgw " . n ·
6� E
- ;sa constalação de faw não resolve, aliás, a qucswo de
1

' · · · ' 111 tl'liúnue111r tle�


53. por exemplo, na Me
· Allli</ll ilés .
. . lanésia, o ti11da10 ; il >t'r a rcligil
lO exterior e publica nao é apenas o dcsenvolvi-
religioso, or..r mágico � um e.sp rnto or..r
. 1 1 1vnto de uma religi�to inwrior e pes.soal que seria o fr110 primiti-
se

5·1. V<.:, 1 l I U B! , pp . 1 25 ss., 191 s.s· J·


.

�R

1
.
(CODHINGTON
e · ..•1·1 ico
.· . er;i
r ll' gen · .. ou se, ao contnírio, a segunda niio seria o prolongamento d<r
. le de I·" magre
. ..

rn A 1111ee sociolot-:iq '


MAUSS
11e, L VII ' f)p. 83- . Há1.
1 1 1.

p 1 1 1 11eira no imcrior das consciências individuais. O problema


·

'i'i . p .
• • ·,

"'�,e mp l o, ,q , 1 direcamcnll! abordado mais adiante (livro n, cap . IV, § 2. Cf.


56· Fi�>_�
prnfiln�r-se a hóstia
na mi.ssa negra.
c.r-s
t:.de cosra.s para 0
·
- .

alia . d·· . voha a e:.rc


11 1csmo livro, cap. VI e VI 1 , § l l . Por enqua nto, limita mo-nos a
meç·a ndo pela esquer co-
"

da e não pela d;r��'., '"'malar que o culto individual apresema-s<: ao observador co-
.i-sc::
. . "

57. l IUB EHT e MA l JSS,


loc. cil., p. 19: 1111 1 um elemento e uma dependência do culto coletivo.
58. Ce11amen1e é raro 68. É deste modo que nossa definicâo atual aproxima-se da
re1or no momento
qu um:i
cerimonia n;1o tenha
em que é cdehr:rda
seu di -
• 1 1 K' rrorusemos ou1rora cm L A ' 111u'e sociologiq11e. Nesse último
. •

. f\
e,

ks ' . nw nas M>c:t.ctla


mais grosse iram ent
e org-111iz ',· 1d·'
11
de::. 11 1 1 >,dho, ddinramo::. l!xdush arnenle as crenças religiosas por
. s. , h. a. geralmente homens cuja
. .

impon:1ncia de s<:u .1·11 caráter obrigatório; ma:. essa obrigação advém evidenremen-
· p·rp
' '-
, I soua i t.'\ a a exe
drrewra sobre a vid .' · rcer um,1 . m 11 uen cia
·
11 nm10 mosirávamos, do faw de que essas crenças pertencem
. " osa (por ex<:mp
a relior
lo m c
·

pos focais cm certas ·h ·�· d e -


sociedades aus r ra. f'ran.. · )· . . .
.gru 11111 grupo qu<: as im1 X! a seus membros. As duas dcfiniçc>es,

is · Mas ess;i atnbui


<: s
cio de funç)es -
e .i

c . é ai'nda mu r·ro (]uruante. 111 1nanto, sobrcpôem-se em parte. Se j u lgamos dever propor
·

1 1 1 1 1;1 nova. é que a primeira er.r demasiado fom1al e negligencia-


--

AS FO/ll1AS ELF..llR\TARES f)A HDl1 RELJ(,10.\A 11 "


508 509

''ª por demais o conteúdo da1> rcprese

1 \er �PENCER, Princ;pes de soUofogie, 1, pp. 205 ss. (J>a


ntaçôes religiosas. Vcw 11 L )R op. cil , 1, p 529
intcrcssc havia cm C\'I
mos. na� d1scus�óes que se seguem, que

\)1 . 1 1 1 ) e TYLOR, op. cit., 1, pp. 509, 5 17.


denciar de imediato o que esse conteú

11 TYLOR, 1 1, pp. 143 ss.


do tem de característirn
Além disso, embora seja realmente um
traço distintivo das Cfl'll
to ffiid., pp. 326, 555.
ças religiosas, esse caráter imperativo compo
11a um número dt•
graus infinito; conseq üentemente, há casos
em que não é facil 1 1 P1incipes de sociulogie, 1 , p. 18..J.
1 !. Príncipes de sociologie, pp. 477 ss.
mente perceptívcl Daí as dificuldades e
embaraços que evitamo•
1 � !bid.• p. 50-í .
ao subMiruir esse critério por aquele que
agora empregamos.

1 'l Ver mais adiantc, livro l i , cap. VIII.


1 1 lbid. . pp. 478 e 528.

Capít11fo IT
l í> Cf. SPENCER e G I LLEN, The Native Trif1es <1( Ce11trctf
111,1 1<1/ia, pp. 123-127; STREHLO W, Die Aranda 1111d Loril)a-
i11 Lentraf A 11stra/ie11, li, pp. 5.l ss.
1 Deixamos dt• belo. aqui, .1s rcorias qt11.:
, na tot.1ladadc 011
cntais. É o caso s<>· P 7be Mela11esians, pp. 2,19-250.
1,11111m•
cm pa11e, fazem intervir dados supm-experim

1 K HOWJ.lT, 7be 1\'alilf! 7hlx'S ofSo11tb-&ist A11stmlia, p. 3S8


bre� 1do da que Andrcw l.Ai\IG expôs em seu livro 7be Maki11g of
• i
l< I l < nme GASON).
Refg i 10 11 e que P. SCI IMIOT retomou, com
numa série de anigo.� sobre l 01iRi11e de f'idéc
variações de detalhe.
de Die11 (Aflfbmpo.s, l lJ. HOWln-. ibid., pp. 434-442.
.m. Os negros da Guiné meridional, diz Tylor, têm "durante
1908. 1909). Lang náo rejeita completamente o animism
o nem o

çi'io direta do divino. Aliás, se julgamos não


naturbmo, mas, em última análise, admite a
um �ntido, uma intui· 1 , .111111 quase 1amos contatos com os mortos quantos durante
\ l".tlia com os vivos" (Cioilisation primilitJe, 1 , p. 5 1 5). O
essa concepçiio no presente capítulo, não querem
dever expor e discutir mesmo
os silenciar so­ va-
1 1 1 1 1 11 cita. a propósito desses povos, esta no� • . de u m obs:r
.
bre ela; mais adiante a reencontrnremos,
quando nós mesmos ti· Fies consideram todos os seus sonhos visitas dos espmtos
apóia (livro li, cap. IX, § 4).
1111
\ em1os �lc cxplic:.1r os fatos em qm: se
tli ... 11s amigos morros" ( ibid., p. 514). A exp �:ss:i�> é certamen�
2. E o caso, por excmplo. de Fl JSTEL Ol' COL'LA sonhos
NGES que 1·x.1gcrada, ma� e mais uma prova da frequenoa dos
1111.,11l 0,, É
.
aceita .is du.is concep<,:ocs con1unt,1meme (v.
l
.:11ar
Cité antiq11e, livru� entre o� primitivos . o que tende também a confi'
1 e ITI, rnp. IT).
1 , ., 1111ologia que STREllLOW propõe da palavra arunta . a/ll)ere-
3. A;.sim, Je\'ons, embora criticando o animism .
Tylor o expôs. aceita suas teorias sobre a
que
o tal como 11.1 . que significa sonhar. Ela seria composta de aftpra,
1 1 1 ltlow traduz por deus, e rama,
ma, sobre o ií1stinto antropomórfico do homem
génese da idéia de al­ sonho sc-
. Inversamente
que significa ver. O

USENE R, cm Got1enu1111e11,

·• · rcs sagrados ( Die Aranda und Lonlja-Stammo, 1 , P: :- ) .
com
1 1. 1 portanto o 1110111ento em que o hon�e.m est{1 e n� co nt to
mes mo rejeitando certas h i pótese�
tie "'.1ªx Müller que scr�io exposta/> mais adiante a
, admite os prin­ l l . Andrew LANG, que também se recusa a ad1mt1r que

.
c1pa1s posculados do naturismo.
L f,a cil'ilsialion p1imitiL•e, rnp. Xl-XVH I.
1t11•1.1 <le alma foi sugerida pela experiência do sonho,
julgou

t k i derivá-la de outros dados experimentais: os fatos de espm


5. ".er P1i11cipes de suciolog1e, panes 1 e VI.
J
nlt.t discutir sua teoria , tal como a expôs em seu t, ro 71ie Ma­
""1111 (telepatia, visão à distância, etc.). Não achamos
que con­
6 E a palawa de que se ser. e Tylor. Lia tem
o inconve­
kill.•' 11/ReliRio11. Com efeim, ela se baseia na hipótese de �l�C e?
\,
niente de parecer implicar que exisicm homens
no sentido pró­
, .p 11 itismo t: um fato de observaç-Jo constante, de que
prio do cem10 antes d..: haver uma civil ização. a visa<> a
Por sinal, não há
termo adequado para exprim ir essa idéia. de
O termo primitiv o, t 1 1 ·,1.mcia é uma faculdad..! real do homem ou, pelo meno�,
1 , .1 tos homens, e sabemos
que util!zamos preferencialmente na falta de
melhor, está longe, o quanto esse postulado é cient1fica­
como dissemos, de ser satisfatório.
nu me contestado. O que ê mais contestável
ainda é que os fatos
"' t \ '5 1 1
') ] () A�· FON.llAS l'/J�l/1'.
;\7'1N/S O. 1 l 11>A Nf!/J(,'f(1.\'A

i'i l'o comunismo st'Xtnl n:io t'ntendt'mos um t•st,1do d(•


I'' 1 1 1 N lndadc c111 que o homem não teria conhecido ncnhum :1
dl· t·.,piritismo scj:1m râo e\·identt's l' dl unu frn1ikncia sufkwn
te p.ua ll'rcm podido ;,en ir de base a todas as c:rcnça;, e a tcxla 1
as prúl itas religiosas relacionadas <is almas l' aos espíritos. ( ) 11 w 1 l.1111cn1aç:io matrimorna l Acreditamos que esse eMado ja
C'\:lllll' dc;,sas qucstôes nos afa;,caria dcmasiatfamcntc do objt•lo 1 , 11" '""stiu �Ias foi freqi.icntc um grupo de homens estar unido
I• 1'111.irmentt: a uma ou v:írias mulheres.
fü \'cr Le Suicicle. pp. 2:B ss.
dl· nmso estudo. Ali:b. é tanto menos nccc.\S:Írio dcditar-nos ;a
l'-"l' 1..·iwme na medida em que a teoria de l�mg est:1 exposta a
\ a n,1s das ohjeçocs que iremos fat:cr J de Tylor nos parágrafo n SPE0;(.ER. Pri11c1pes de sociologie, l. p. 1 88.
58. !11e Me/a11esl(111s. p. 123
W DORSE). "A Study of Siouan Cults". in Xllb A111111t1/ Re­
'°l'/.\Ullltl'S.
21 JFVO"IS faz uma ohscf\'al�10 .malog:t . Como Tylor. l'lc
11t•m1 o/rl11wr Ht/1110/ogy, pp. 43 ss. e priss1111
admitl' que a 1dda de alma vem do .,onho l' qut•, uma n•z criad;a
c....,,a idl'ia. o homem a projetou nas cois:1" \f i s. it rt'"<'t•nta t•k
f '''' u/111//>e/(1B11t•l1 s. 1. p. 2·t8.
Vl'r \VI DF VISSl'R. !)e (,'raecomm diis 11011 rcf
Rir111 eles 1>e11p/c'S
11<m cü•ilisé
o lato de a natureza ter sido concchicb n1mo anin1:1d:1 i
: imag1·m
ere1111b11s
l , B11/lel111 tle <'IJl'l'<'S/)(>11
1I
do lio1m:111 nao e:1.phca que da tenha se tornado ohwro de um / 1 1 lt Ili bt//lllll/lll// (,) I' l'LJ{[)RIZL:.
mito. Do fato de o homem ,·er na árvore que Sl' agita, na osn "''"' ,. bellé111q1w, 1889, p. 635.
laç:io ti.i s c:hama.s. um ser \'ivo n>1110 de, dt• rmxlo rwnhum rt• 12. St'gundo SPl''-:CFR, porem. haveria na c:rença nos c.spí-
11!1 � 11m gcm1e de 'erdade: a idéia de que "o poder que se 111.1-
1111<·..1 , 1 11;1 c:onsrn:·nua e uma outr.1 fom1a do poder que se mam-
suita que ambas sejam consider.1 das c:omo scrl·s sobrcnarur.1is
muno pdo contdrio. na medida em que se as.
1,1 lora d.1 c:onsdênda" ( Hcclesiastical l11stil11tio11s, S 6'i9)
senwlhair a dt•
nada podem ter de ;,ohrenatur.il a St'us olhos" (/11/md11clio11 /IJ
•('< ll«'r quer dizer com isso que a ncx.�io de força em gcr.i l t:· o
1<
lhe lli..\ICJ1)' <!fReligio11. p. 55>.
23. \er SPEl\CER e GILLE;"J, ,\orlb Tr., p. 506, c Nm Tr. , 111 1111l'nlO da forca que estendemos ao universo inteiro; or.i. é
1 1 1 1 11<' o aninusmo achrnte implicitamente quando povoa a natu­
f\ l.1 dL" espíritos 1>L"mdh:111tt·s ao nos.�o. Mas. ainda que essa hi
p. 'i 12.
f: esse rema ritual e mbtico que FRAZl'H l'.,tuda
l " ''''Sl° sobre a ma neira como se íom1ou a idéia
2t o t·m
de for�·a fossl'
\ 11l.1dt·11a (e t•la e pa,,s1vcl de muitas reserh1s q ue farenms no
seu (,"o/de11 Bo11ub.
.2'i. '/lw lfela11esit1 m, p. 119.
26. lbid. , p. 125. li\ 11 1 1 1 1 , cap. I l i , § j), eb não possui, por si própria, nada de re­
27. Parece que, às vezes , hií até mesmo oferendas fu nerári as l11:11 1so, não evoca nenhum culto. Po11anro, o sistema dos símbo-
(\·er HOTI 1, "Su perstition, Magic and Medicine", in N. Q11eem 1 ' 1 d igiosos e dos ritos, a clas.s ifica�·ão das coisas cm sagrn d as e
/ai/(/ f:'!lJ//og, B u l i . n9 5, 69, c., e "Burial Customs''. N. Q11. f!'llm. , 1'" 1l.1nas, tu d o o que hií de propriamente religioso na rc l igi:.io
l�u l l . n" 10, i n Necords q/the A11stra/ir111 M11se11111, VI, n" 5, p. 39'il 1 0111 rnuaria nf10 tendo nenhuma correspond ência no rl'a l. /\ l i(1:-.,
,'" germe tk: vcrdadt• é também, e sobretudo, um germe de cr­
' " pois, se é verdade: que as !'orças d a natureza e da consciência
Mas l'ssas oferendas não são periódicas.
28. Ver S P ENCfiR e GILLEN, Nat iue '/i'i/Jes of Ce11tral Am
tmlio, pp. 538, 553, e Nurthem Tribes, pp. 16.i, 513, 5·17. 1 1 1 1 1 parenlc:sc:o, elas s:lo também profundamente distintas, e
29. Ver especia l men te SPENCER e C I LLF!\, f\lirlhertt Trihes, 1d• 1 1tHká-las cm expor-se a singulares equívocos.
Glp. VI, VII, JX.
30. 11Je Reluio11s o/Pn. mili11e Peoples, pp. 1' ss.
�J ,��111hes, cultes e/ religio11s. p. 50. ( 11/1/////o Ili
i

32. f,es rr!ligio11s despeuples 11011 c.iL'ili.sés. l i , Conclusão.


33. 1}:Je Religio11 oftbe Semiles, 2' ed . pp. 126, 132. 1 . É também, cenamcnte, o que explic:. 1 a simpatia que foi­
' I• 11 htas como Mannhardt parecem ter experimen tado pelas
i1 l1 '· "" .immbt.is. '\as religiôt's populares, como nas religiões in-
34. E, por exemplo. o r<1ciocínio que faz WESTERMARCK
spêce b u maine. p . 6 ( Paris, Akan).
On.�i1w du mariage dans l'e
512 A.) FORMA!; /lL/i,11/!NTAJWS DA VIDA NHI/GIOSA 1 1 / IS

que, enquanto n:ío uhra­


1 e \lax \tl"1.LER chq�a r;'i .1 d11t:r
p 1 "1 essa fase , 0 pensa me nto
fericm:s. s:lo seres espiriruais de sl'gunda ordem que aparecem
tem muito poLtt�s das l·arac:tcns-

111 1, que il
no primeiro plano.
atribu ímos agora rel igi ào (Pbys ic. Nel., p. l20).
2. No trecho incitul::tdo Compamtiue ll�11tbo/ogy ( pp. 47 ss.l.
16. Phvsíc. Nel., p. 1 28.
1 7 . \er 711e Science of Tho11,C!,hl, p.
Uma t ra d ução francesa foi publicada com o título Essai de . 30.

IH. ,\ at11ral Rei pp. 39.3 ss.


mytbolog 1 e com/x1 rée, Paris-Londres, 18'i9.

1ce of 7 11011g h t. p.
t 9. Pb)'sic. Rei. , p. 1 33 ; 7/Je Se1e1
3. /lera bk1111ft des Feuers 111ul G'õllertranks, Berl i m , 1859 e .
.•

_ 1 9.

i , PP· l :-,.
• •
}

sur la scie11ce d11 ltmgage, t. l


.

(uma nm·a edição foi publicada por Ermt Kuhn em 1886). Cf.
" Der Schuss des Wilden Jiigers auf den Sonnenhirsch", Zeitscbr!f� Ç
,,.11 1·elles 1e m1s
f d. Phil. , 1 , 1869, pp. 89-169; E11twicke/11 11gsst11.fe11 eles Jllytb11.\
327; Physic Nel.. PP 12') s.�
20. The Science of Tho11ght, p. 272.
Abbhandl d &:ri A kad 11 TheScience <!f7bw1ght, 1, p
187.3
de 1e p H.
-1 /J<.'r l ·rspnmg cle1· \(rtho/ogie, lkrlim, 1860.

et i
li11,C1,11stiq1
22 .\Jékm,fles de 111y1/wl<>,C!,Í<'
.!.� 1111hmpolo,e.ical NdW011, pp.
1 28-130.
��-
L 1 . J\ expli caçao , a l i ú s , nao é melh
'). Em seu l ivro llerc11/e e/ Gc1c11s f1· 11de de mytho/oJ:ic> com or que a dt: lylor.
pc1rr!e. O ensa io de mitologia comparada de Max Müller é apon­
�.·1111c1() • ·
t ,IX .
ter adm111do que <_1 v1-
tado aí como uma obra "que marca uma nova época na h iMória ' Jo qut• existem
Mi.ille r• o homem nüo pode ria
1v

sobrevi\'e a o corpo. l·'. t I 1T1c1·1 per-


mortt:· dond e wri<1 cond lllt

nt"k· dois st:res. u m dos quais


< '· ' 'l tl�"t ·1 ,-,,
�,
-·sc com • ·
1 •

d.1 l\ litologia" (p. 12).


6. {)ie Griescbiscben Kulte 111uf \()'lbe11, 1, p. 78.
' li<·r 0 que
a ' ida continua quando o
7. Entre os escritores que adotara m essa concepç'i10, cum­
pcxle ria fazer pens ar que

pre citar lrnNAN. Ver seus Nouve//es études d'bistoire re/(� ie11se, Nel., PP· 3 5 1 ss.
, , 1rp< , está em plena decomposiç
:·10.
25. Ver sobre esse ponto /\111b rop.
..

1 884, p . .3 1 .
..
não impede que M ' 1x Mul­
26. A ntb rop. !?e/., p. 130. O que
de rodo :s. -;e desen �·olv1mento.
ki \eja no cristianismo 0 apogeu
.
8. Além da Compa mtil•e ll�ytbolog
y, os trabalhos de Max

\ r<·li�iào dos antepassados , diz ele, supoe que e � 1:-tc algo


Müller em que cst:lo exposws suas teorias sobre a religiao são de
seguintes: 111/Jlx!l1 lect11res ( 1878), com tradução frnncesa sob a itléia_ q117 .e�ta n:� base �o
di\ ino no homem Ora. mio é essa
ss. > E 1 n u 1 1 l 1ns.1s�1r solne o
.
?
m.

;S78 . . .
o tírul o OriRine e/ dé11e/oppeme111 de ltt re/igion; - Nat11ml Reli
i um, Londres, 1898; - A11tbro­
o , pp
ho num·,1 concc
l ll'inamento de Crist ( 1/Jid.
qul' 1a1 • e.
1e est�
gio11, Londres, 1889; - Physica/ Nelg pçào que faz do c ns nan ismo o

pological Neligio11, 1892; - 7beosopby or Psycbological Re/1gio11.


an
..

que G RL > 11>1, sub_


s.
,, uoamento do culto dos mane
21. \'er sobre esse p<mto a d1scu
_

a
• x M ü l l c r cm G rie
ssao

1893; - 1\"01we//es t!t11des de mytbolo,C!,ie, Paris. Alcan. 1898 Em
_ _

l l l l'tl' HS h 1· p c'> t eses •1-1 chisc b e Kulte 1111d


conseqüência dos vínculos que unem as teorias mitológicas de
Max Müller à s ua precedentes de­
• lle tv

/11 t rod11c1 ion ti


filosofia l ingi.iística, as obras \ J 11the11. pp. 79-184.
. .. '·I EI LLET ,
.
- º · v <.:r

vem ser colt'jac.las com os l ivros que ele dedicou à linguagl'lll ou / "étude co111pa rat1L•e des
p. 1 19.
à lógica, particu larmente Lectures 011 tbe Science of ú1111:11age. 'i 11es imlo-ewupée1111es. 2• ed.,
1t1111 .
\"eda, pp. 59 ss.: MEILLl:."T,
traduzido cm fra ncês sob o título 1\0111'<!//es leçons sur la scie11ce 29 OLDENBERG. ILI religion du
du !t111ga1:e. e 7111! Science of 7bougbt. al asialique. X. n" l , JUl-;igo
Ll' tlieu iranie n .M1thrn • 111 joum
9. Natural Rei., p. 114. 1•107. pp. 14:\ ss. •
jO . .Muitas máximas da sab<.'doria
.
popular mcluc m- se nesse
• • . .

10. f'by.1ic;a/ Nelig10n, pp. 1 19-120.

ating� �>::. que ���m n a re-


1 1 . Pbysic. Ne/., p. 1 2 1 ; cf. p. 30-1
j l . o argumento. é \ erdade, não
' .1�0.

te uma h1�1en� )� cu!as r�g�1 s,



1 2. Natural Religion, pp. 1 2 1 ss . • pp. 1-i9-J5').
ligi<lo uma técnica (part ic.ula rmcn
..m 110ra cst:l ndo Sol)
"·1111>..'10 de ·seres 1mag111nnos, nao .
J 3. "The ovcrwhelming pressure oí thc infinite" Ubid.. _ deixam
.
de ser bem-funda
a �·
p. 1.38). . •

para c hscuur um,1


.

das. Mas não nos deteremos


14. lhid. , pp. 195-196.
515
AS FO/lllAS EW.11/i\Ttl/WS /)li \ //)11 NEIJGl<A\A ,, 1 \

� �
1 ,
ira no ll1Lsm : c g1�1u
<.:<>n<.:erxao la<> msusientável, que. na n:rdaclc 1;1m:1í' loi sus1<·n 1.l o "" atrl'dt1.1v.1 d.1 mcsnu mane .
� �
1, ..ao,
1 K > r l''>.Sa r.u
A l111h1. dt: d .
t:' d1fíc � I
n<io unham ara ter rehg10 :.o.

111 1r1 .•l io entre fábula-. e mitos


Lida <k· maneira sbtemáti<.:a por esp1rilos um pou<o par da lu,,. .
É
.i
_ te
mi-
e cena mente flutu.m

1, tkll·m1inar i\l.is isso n:l o (: mmivo par,i


!<>ria das religic>es. difícil entender em que medida as prá1ka1
fazer de todo,, o:.
lerri' eis da iniciação servem ã :;aúde que ela;, comprome1c111 _
não pensa mos em fazer de todas as la-
f.ihulas. ª"'im como
111.i 1• mitos. f lã pelo menos uma
em que medida as interdiçõe:; alimentares, gera lmente aplíc:tda11 1
carac1 erístic''d qu e , cm nume ro-
a .mimai!> perfeiwmente saudáveb, são higiênic.1s: de que ma
'' < .1 .os. basta para difere
nciar o mito religioso: sua retira<>
> 1 1 1 11 l'Ulto.
ne1m º·' sacrificios, que se faziam por cx:asiit0 da consiruç;1o dt

�- Ver mais acama. p. 9.


uma casa, a torna,·am mais sólida, ele. Ccnamente há prccenu.<1 t

.. .
"8. Por sinal.
religio,,os que demonstram Ler, ao mesmo tempo, uma utilidatlt•
ha na linguagem de Max Ml'l .. l.ER ,·crdade1ros
sl'nsível. diz ele . impl '. ca, ao
1(·<·n1ca, mas de:. :.e confundem com os demai., t•, mu ita� vezt•,
os ser\'1co.s que prestam têm uma compt•nsa�·ao. 'ic ha uma pro 1h11,11s de palJ\'ías. A e'fX'riên<'ia _
l'lll l'el1o:. casos. "que parJ além do conhecido hara a(�o

t
líl. 1>.1a religiosa, ha uma 1mund1cíe religiosa que deriva dos nws 1111 110,
1110., prínup1os ;\ regra que urt.lt:na afa-,1.1r o mono tia aldl·1.1
a per1111s,;âo de cbt1111m· 111)1111/11
desconhecido nao e 1�ece�
1t 1111/•l'ddo, t1f�o q11e peço

porque ele é habitado por um espírito temido e praticamente \uluml Rei., p. 195. Cf p. 218>. O
sa-
necl·.s�a �a1�1cntt'
0 infinito. <·omo tampouco o infinito é
1

os seus pont?s. 1de�uco e.


l l • 1 t u •ntc
ütil. Ma' a mesma crenca faz que os pan:ntt•s se untem com '�'
1 1 11,•st onhecido, se ele for, cm todos
l1qu 1dos oriu ndos do corpo em putrefaç<io, por 'upoMamente Serra preciso dt•-
po i i. into, idênllt'O ao que t·onhecemos dele.
contert•nt vinudcs excepcionais. Sob o a:-.pccto técnico, a magia s do infinito difere cm natureza
111,,1 1,tr.ir que 0 que pcrcclx:mo
de qt1l' n;lo percebemos dele.
:U. i)11des de mylhologie comparC'e, pp. 'i l-'i2.
:.el'\ 1u maí:. do que a religião.

e Max ML LLL:R e�11


..

w. É o que reconhece im·oluntariamem


:B. Ver f\'oul'elles leçons sur la scie11ce d11 lt111gage, l i . p. l'('.

a ver pouca difcren<;a entre a not.·a


'.>
e Physic Rei. , pp. 276 ss. No mesmo 1>e111ido, BRÍ:AL. Mélanges,
1 ct ll '·' momentos. Ele confe
ss
clt'
éter, ªtraves da qu 1Io �"1
calor ( Pbys1c.:. Nel., pp. L6-L 7).
a nodo de
1 " moderno ei.phni .1 luz e o
\gni, 0 deus do fogo, e . �
HHl
p. 6: "l'arn trazer a e:.sa questão da origt•m da mitologia .1 claR·­
y < p ou dl'
e de profano. ü aLO de a
za neccs�ú na, cumpre distinguir com cuidado os dl·u-.es, que ade à de agem:
1\11.is. ele rl·duz a noçao dl' di,·ind

que sf1 0 apenas um produto indireto e involuntário del a. "
:-.ao um produto imediato da inrcl igênci.1 human;t, da:. Cabulas. qu<: nada 1em dl' naturn l

1, l ii• i a o representar as causa


, .n is.il idade
s assim imagi nadas sob a lorma
de
34. É o que reconhece Max MÜLLER . Ver Pbysic.:. Rei., p. � nte para exp li car que �las
te nh am
U2, l' J1�111hologie comparée, p. 58; "01-o deuses , diz ell', são 110 pessoal pode ser prolano e' alem
1.,,. 1 tl'S pl'ssoais n;10 é suficie
1 1 1 1 , ,iráter sagrado. Um agente.:
;
� 1111111i11a, nomes scn_1 ser e não seres sem nome".
111ilw e 1lío
.
cialmente impessoa is.
.1'i. V verdade que Max MULLER su ste nta que, par;i os gre­ '10. Ao f;ilar dos ritos e da fé em sua
. (1"º muitas forças religiosas são essen

l l , cap. J I).
cf'idc ia, veremos de
ilusões (ver livro
ll ll'ntos mito lógi cos, o nome ela Divindade.: suprema" (Scie11ce c/11
gos, "í'.l'us era e continuou sendo, apesar ele todos os obscureci· mane ira se
, 11,,. explic am essas

la 11gt1RI!, l i , p. 173). Não discut iremos c.:ssa afirmaçao, historica­


rrn:nte haswnte contestável; em rodo caso, c.:ssa conccp<·ào de • 11/11/11/0 IV

es {//Ili Trcwel� ofa 11 Jndicm !nlerp1


Zeus nunrn pôde rc.:r sido mais que uma pequena luz em meio a
L 1'0)'(1g
t'ler.
todas .is uutra1> uença1> religiosas dos gregos . .
· da
Altã..,, numa obra posterior, Max MCLLER ir.í fazer da noção 2. A idéia era 1: 1 0 difun dida que REVlLLE fazia a111da
me.,ma de deus em geral o produto de um procc.....so imciramente
i
(Relgion eles peuples 11011
\ i nerica a terra clássica do totemismo
\erhal e, r><>rt:.tnto, uma elaboração mitológica (Pbysc sés, 1, p. 2'12). .
3. }ou mais of ///'() E.'1Jedilicms i11 Norlb
i Rei, p. 138). , 1/'i/i
-\Vesl a11d \fles1e1 11

p.
.36. Cenamenre, fora dos mitos propriamente ditos, sempw
hmn e fá bulas cm que não se acreditava, ou. pelo menos, em l1 1s1mlia, ll, 228.
516 AS FOllllAS H/J!il/FNIANfü ()A \ll)A NFIJ(;/OSA
517

'/7}(! i\'o1:�hip uf A n imais mui Planl.� 'fol<'lll.\ mui Tote �1 11. .1 1 1 do·
Wuaramongo (Warramunga de Spencer e Gillen>. jü
mism ( !8<19. 1870).
1.

MI 1!(the Alllhropologica/ /11slitllle (daqui por diante }.A ./.), pp. 41-
111 18H8, cm "Further '\otl's on the Australian Classes" in }01ir.
5. J\ idéia já se encontrn claramente expre.,sa num estudo
tle GALLATJ.N inlitulado ..S}'nopsis of the fndian Tribes" (Ar­ j , Os Arunta já haviam i.ido sumaria
mente estudad os por
<.!lll<'<Jlogta Ame1ica11a. li, pp. 109 S.
'>.) e numa urcular de MOR­
'-' l ll LZE ("The Ahongines of the Upper and Middle Finkc Hi­

(,/\ '1, n: � roduzida no Camb1innjo11mal, 1860, p. l i9.


Tra nsacticms o/ the Royal Society o/ Soutb A11stra/ia,
\;I\', 2º fa�t.); a organização dos Chingalee (os Tjingillt
\ t'I m

6. &s e lrabalho forn. aliái., precedido e pn:p:u·.ido por duas


de
AT
" 111.'tK<:r e Gillcn), doi. Wombya, etc. , por M JIE\X'S ("Wombya
1
<�u tr..is obr..1.s. do mesmo autor: 711e League o/tbe Jmquois, 1 85 1 e
1 11�;mization of thc J\ui.tralian Aborigines". in America11 A11thn:.1
Systc'ms o/ Co 11sa11g11i11i�v anel A./Jinil)'
. o/ tbe JI11111c111 Fa m; 1 i
. .•
nova i.éric, li, p. 19 1; " ()i, isions of Some WeM AuMrn­
Soe. , X)O,V i l ,
187 1 . /111/11f-!ical,

7 /\à 1111/aro1 (//Ili Kurnai, 1880.


l 'I' l '> J-1';2 e}uuma/ /"�)'. :XX.. <!IA .\. \\ic/Íes, XXXl l , p. 7 1 e XX.\.1 1 1 ,
lr.111 Tribes", 1bid. , p. 185: Proceed. Amer. Pbtlos.

r 1 1 1 Os primdros rL'sultatlos da pesquisa sobre os \ru nta Fl


8. J.i nos primeiros comos do A11 11uc1/ Repor/ o/the Burea11
�>/. l 111enu111 Ltbnolog;, <.:ncontramm. o eMudo tle f'ü\\ ELL. \Fork o/ tbe I lom
\\ yan�lot Gm ernment" O, p. 59). de CUS! llNG, "Zuiii Fetisches·
'• 11•11tific fapedílion to Central /lustra/ia. pane IV 08%) A pri-
l t . 1 \ 1.1m sido, ali:ís, publicados no Nep0f1 011 tbe

C l l , p. 9). de SMITH, "Myt.hs of thc l roquois" ( ihíd., p. n>. o im


porta�te trabalho de DORSEY, "Omaha Sociology" (llT, p. 2 1 1 1, 1111·11.1 parte desse relatório é de �IERLI G , a segunda,
de G IL-
ld\vi n
que sao outr..1s tantas contribu icões ao escudo do totemi'>mo. 1 1· � . e a publict�-:.1o i ntci r.1 eslava sob a supervisão de Ba

9 i:ublicado primeiramente, em forma rei.umicla, na Enq•


17. Londres, 1899; doravante, por a bre\iação, Nalit>e 'f rilx-s
1'1 'CEH.

\ai Tr.
·

10. TYLOR já ha,•ia, em sua PrimiliL'e Culture, tentado uma


clo/1aedw Britannica.
1 111

.
expltc:.1r:io do totemismo, sobre a qual falaremos adiante, mas 1 8 . Londres, 190·t; doravante N011bem Tribes ou North. Tr.
19 Escrt:vt·mo.s os Arunta, os Anula, os Tjingilli, etc., sem
sn.:nta r a csi.cs nomes o s ca racte rí st i co do plural. Parece-
que nao reproduzimos aqui; pois, reduzindo o t<>l<.'mismo a um
11 1 1
caso particul:ir do culto dos antepassados, ela desconhece tota l
menl<: sua importância. Apenas mencionamos ne:-.tc ta pítu lo ª' 11ouco lógit·o incorporar, a pal a\'r..IS de outra língua, um
sig
g1 . 1 1 natical que s() tem sentido na nossa. Só faremos exccçáo
11!

obs� rvaçoes ou as teorias que fizeram o estudo do totemismo 111 1

real i za r r rogressos im porta ntes. 1 • "" r<:gra quando o nome da tribo estiver claramente incorpo­
l 1 . ':-i11sbip ª'.1d Marriage in Ear(v Arabia, Ca mbridge, 1881.
' 1111 1 .1 0 francC:s (os huronia nos, por exemplo).
.W. Strehlow está na A us lr{tl ia desde 1892; pr i m ei ro viveu
1 2 . lbe Re!tg1011 oftbe Semites, l" <:d., 1 889. Tr:ita-s<: da rt•
• 1 11 11 · os Dieri, dep ois entre os Arunta.
cln�·ào de um c u rso proreri do na Universid:1de de Aberdt:en cm

foram pu b l icados �ité o prese nte; o ü h i mo apa-


1 888. Cf. o artigo "Sacrifice" na 811cyclopaedia 1Jrilc11111ica. !. I . Oie Aru11/U 1111ú Lori(ja-Stümme in Zentral-A 11strali<m.

1 1 • 1 · 1 1 no momento cm que o prime iro livro acabava de ser termi-


• 11 1 . 1 1 m fascíc u l os
1 :1 . Londres, 1890. Saiu de pois uma segunda edição em trc'.'s

1 1 1 1 1 1 1 !\;lo p ud emo s contar com ele. Os dois primeiros 1ra1am


volu m es ( 1900), e uma terceira em ci nco volum<:s está para ser

l-1. !\a mesma di reção, convém <:itar a importante obra dr li• '" 1 1 1 1 tos e das lendas, o te rce iro, do culto. Ao nome de Strch­
publicada.

S1dne; J fi\lffLJ\l\D, The Legellll o/Perse11s, :1 vol.. 189+ 1896. J;


•.
' 1usto atrt:Slt:nla r aqui o de
von Leonhardi, que Jesempc-
l.5. Limit:.imo-nos a dar aqui os nomei. dos auwres: as obra� 11111111 papel impo1tante nessa publicação. Ele não somente se en­
t 1111 1-:ou de ctlitar os manuscritos de Streluo'' , como lambem,

16. Se Sp<:ncer e Gillen foram os primeiros a ei.tudar essa11


i.er..to indicadas mais tarde. quando as utilizarmos.
de um ponto, .travb de suas questões judiciosas, fez
.
1 1 1 111.11s

1nl �os de uma maneirn aprofundada, nào for..i m porém os pn


" • 1 1 1 que este ú ltimo precisasse suas observações. Ali<ís, poder.í
mc1ros a fal:ir delas. HOWllT havia assinalado a organização 1 p1meitoso consultar um artigo que LEO:wi.ARDI escreveu
para
518 AS FORMAÇ ELDllL\TARES DA 1 7[), t RELIGIOSA ••/'IS 519

Glolms e on<le se encontrarão sim dl" non�trJm uma niptura com os velhos métodos
da esco­

l 1 1111ropológica.
numerosos trechos de sua corres­ n

pon<ll-ntia uim Strehlow c-Lehcr eimge rd1giüse und t01cmistis­


prin-
d1e Vorstellungen der Aranda und Loritja in Zentral-Australien", 33. Certamente também nós consideramos que o objeto
Glolms, XCI , compree nder o que con. '>ll-

1111 .1 nan1rcza religiosa do homem. ,\las como


in p. 285). Cf. sobre o mesmo assunto um artigo de 1 11 • 11 da ciência das religiões é cheg ar a
não \emu'> nela um

1lulo constituti\O, e sim um produto de causas sociais,


'i.-W THO.\>!,\S publicado em Folk-lore, XVI, pp. -t28 ss.
mio pcxlerí:J-
22 Spencer e Gillen não a ignoram. mas estão longe de
dominá-la como Strehlow. 1111" pen.o;ar em determiná-la fazendo abstração do meio social.
-
23 fapecialmente por KLAATSCH, "Schlussbericht über 34. A importânci:i que atribuímos ao tocemismo, portanto
independente
11111KJ seria demasiado repetir -, é completamente
pp. 6j5
meme lkise nach Australien". in Zeitschrift f Etb110/ogie, 1907,
i l questão de saber se ele foi universal.
O li\ro de K. Langloh PAHKER, 7be Euab/ayi Tribe, ,,
.
�'>. É o caso das fratrias e das classes matrimoniais:
ss.

cap. I l i :
cl. so­
.2·1
de EYLJ\!.\ '\N, Die E1 ngeborene11 cler lw/011 1 e Süda11�1ra/ien, o l 111• esse ponlO SPEl\ C...EH e GILLEI\, Northem Tnbes,
til· .J ohn \IATHFW Tu•o Represe11/a1i1·e Tnhes nf Q11ee11s/mul, 1 11 , ITT. .\a/11e 7i'ibe, r 1 12.

1 1 li ),\IAS, Ki11ship a11d Mariage in AttStra/ia, cap. VI e VII.


uf Suutb rlustra/ia, pp. 109 L i
e:

Dil'isio11 dtt lrat'ail social. 3• ed., p. 150 (Paris. Alcan)


alguns arugos recentes de J\!athew� testemunham a influência
36.
r. Claro que nem sempre é assim. Acontece freqüen
de Spencer e Gillen.
te-
.25. Encontrar-se-á a lista dessas publicações no prefácio de
Sal 7r , pp. 8 e 9. di�emos, que as formas mais simples ajudam
a
11wnte. como
26. Londres, 190-l. Dorarnnte citaremos o Ji,ro com a abre­ <"t•111 preender melhor as mais complexas. Sobre esse
ponto não

\·iaçào 1Yat Ti·., mas fazendo sempre preceder o nome de Ho­ h.1 rq.(ra de método que se aplique automalicamente a
1odos os

witt, a fim de dislingui-lo do primeiro li\ro de Spencer e Gillen < l .os possíveis.
a
38. Assim, o totemismo individual da América nos ajudará
and E'>cogamy. 'f vol . . Londres, 1910. A ohra 1 , •111preender o papel e a importância do da Austrália. Como es­
cujo título abreviamos da mesma maneira.
27. Totem sm
i
des­
começa com uma reedição do opúsculo Totemism, reproduzido ' ' 1 1lumo é muito nidimcntar, provavelmente teria passado

.W. Ali as, não há na América um tipo único de totemism


sem :ilteraçõcs essenciais. ehido.
É o,

111.1'• espécies diíerentcs que será necessário distingu


28. ,·erdade que, no começo e no final, encontramos 1eo­
ir.
10. Não sairemos desse conjunto de fatos a não ser excep­
rias gerais sobre o totemismo que serão expostas e discutidas
mais adiante. Mas essa s teórias são rel a tiva me nte independe ntes
tia cok:tânea de fatos que as acompanha, pois já tinham sido pu ­ 11111.i lmente e q uan do uma aproximação parlicula
nm:ntc instru­
blicadas em diferentes artigos de revistas, bem ;1 n1cs que a obra "' .1 parece r se impor.
'

aparecesse. Esses anigos foram reproduzidos no p rimei ro volu­


me (pp. 89-172).
29. Totemisrn, p. 1 2 . 1 1 \ 1{0 l i
30. fbid., p . 15. 1 11/11/11/0 /
31. lhid. , p. 32.
l . í: a deííniçao dada por Cícero da gentilidade:
Genllfes

111 c111i inter se eodem nomine su111 ( Topica 6).


�2. Deve-se ohsen·ar que. sob esse aspccto, a obra ma� re­
cente, Totem sm
i
l.. J>ode-!>e dizer, de maneira geral, que o clã é um grupo
and Ri::ogamy, marca um progresso importante AI

f 11111ii.1r em que o pare•1tesco resulta urúcamence da (Omunhà


no pensamento e no método de Frazer. Sempre que descreve as
o
instituições religiosas ou domésticas de uma tribo, ele procura
detem1inar as condições geogrãfic:as e sociais em que essa tribo tl• • nome; é nesse sentido que a gens é u m clã. Mas, no g€nero
r.
se encontra. Por mais sumárias que sejam essas análises, mesmo '1111 constituído, o clã totêmico é uma espécie particula
520 AS FORMAS ELl!.\/FVTARES DA \7DA RELIG!O\A I J/,J\" 521

3. !\uma certa medida, esses laços de solidariedade se es 11 RAZER ( Totemi.m1, pp 10 e 1 '\) cita ca�os bastante nu­

cendem mesmo além das fronteira� da tnho. Quando indivíduo� "" 1 0M>s e indu�ive foz ddcs um gênero à parte que ele chama
de tribos diferences têm o mesmo totem, possuem deveres parti· /•lit totems. Mas esses exemplos são tomados de tribos em qu e
, 1 •temismo está bastante alterado, como em Samoa
.
culares uns em relação aos oucros. O faro nos é expres.samentl' e nas mbos
afümado acerca de certas tribos da América do Norte (\. l'RA l k ' llengala.
HOWlTT, 1\'at. Tr. , p. 107.
11nd
ZER, Totemism and Exogamy, UI, pp. 57, 81, 299, 356-357). Os
Ver os qua dros feitos por STREHLOW, Die Aranda
15.
textos relativos à Austrália são menos explícitos. No entanto, l' 16.
/ 1 1r1tja-Stiimme, II, pp. 61-72 (cf. Ili, pp. xiii-xviD
provável que a proibição de casamento encre membros de um . Chama a acen-

1 .111 que esses totens fragmentárias sejam exclusivamente


totens
4. MORGAN, Ancient Sacie�)', p. 16'í .
mesmo totem seja internacional.

17. STREHLOW, li, pp. 52 e 72.


11111nais.

ond�
5. Na Austrália, as palavras cmprcg<idas variam conforml
L8. Por exem plo , um desses totens é uma cavidad e
mepas:,aJo Jo totem do C.. ato Se lvage m repousou, outro e
as trib�s. N as rq�iôes observadas por Grcy, dizia-se Kobo11g; o.s
.
D1en dizem M11rd11 ( HO\\'iTIT, Vai Tr nf 'i .P Amt p 9 n o� 11
'\arrinyeri, Mgai�)'e (TAPLI:\, in CuRR, li, p. 2<1..i), os Warrnmun­ galeria subterrânea que um antepassado do clã do Rato es­
l ·"ou, etc. (ibid., p. 72).
111na
ga, Mungai ou M1111gaii (J\'ortb. Tr., p. 754), etc.
6. fl1dia11 Tribes o/ lhe U11ited States, IV, p. 86. 19. Nat., Tr. , pp. 561 ss . STREHLOW, 1 1 , p. 7 1 ,
n° 2. HO­

\\ 1rr, Nat. Tr., pp. 246 ss.; -on Austral ian Medicine Men",
7. No entanto, essa fortuna da palavra é ainda mais lamen· J.A.I.,
\ f. p. 53; "furthe rn Notes on the Australi an
Class System ".
grafa. Un.s escrevem lotam, outros toodaim, ou dodaim, ou odo­
tável por nào sabermos sequer com exatidão como ela se orto­
1 11.. xvm, PP· 63 ss.
dam (v. FllAZEH, Totemism, p. 1). O sentido mesmo do termo 20. Th;iballa significa rapaz q1te li, conforme a tradução
de

não é exatamente determinado. Se nos referirmos <I linguagem � 1 ' 1'.r'\CER e G!LLEN . membro s do clã que têm s e u nome

usada pelo primeiro observador dos Oj ibway, J. Long, a pala\ra


Os
ia
" redilam ouvi-lo rir nos rochedos que lhe serYem de residênc
pp. 207. 215, 227. o mito relatado na
p 122. teria ha,·ido um grupo inici al de Thaballa míti
nota). Segundo
falará mais adiante (L ino 11, cap. l\'} e não o totem de clà l\ta.s
lotam designaria o gênio procecor, o cotem individual de que se 1 \"11rtb. Tr-.
�os (c:f. p.
fu ll­
.!08). o clã dos Ka ti , homens plenamente desenvolvidos,
senti do contrário (ver sobre esse ponto FHAZER, Totemism and
os testemunhos de oucros exploradores vão formalmente cm
�mu•n men, como dizem SPENCE R e GII.LEN , parece ser clara-
E.wgamy. Ili, pp. 19-52). 111 nte do mesmo gênero (Sorth Tr. . p. 20-"').
8. Os Wotjobaluk (p. 121) e os Buandik (p. 123). 21. Nortb. Tr. , pp. 226 ss.
9. Os mesmos. 22. STREHLOW, II, pp. 71-72. Strehlow cita entre
os Arunta
10. Os Wolgal (p. 102), os Wocjobaluk e os Buandik. que l em bra muito o da serpent e Wollun­

qua: é o totem da serpente mítica da água.


, os Loritja um totem
11. Os �luniburra ( p. 1n>. os Wotjobaluk e os Buandik.
23 É o caso de Klaatseh. cm seu artigo j{1 citado (ver
12. Os Buandik e os Kaiabara (p. 1 1 6). Nocar-sc-á que to­ p. 518.
dos esses exemplos são tomados de apenas cinco tribos. llt lt:.I 23).
13. Do mesmo modo, de 204 espécies de tocens, levantados indicamos no capítulo precedente, o totemi s-
110 refere-se tanto à queseao da religião
24. Conforme
por SPENCER e G!LLE. num grande número de cribos, 188 sào quanto à da família. tá
de animais ou plantas. Os objetos inanimados são o bumeran­ que o clã é uma família. Os dois problemas. nas s�iedades
�fe-
gue, a água fria. a escuridão. o fogo, o relâmpago, a lua, o ocre­ solidário s. Mas ambos sao demasiado
vermelho, a resina, a água salgada, a estrela vespertina, a pedra,
ente
complexos para quc nàu seja indispensável tratá-los se pa rac�
11ores, são estreitam
a-

o sol , a água, o remoinho, o vento, o granizo ( Norlb . Tr., p. 773.


pri m it iva antes de compreender as idéias re l igio.�as pr i mit
ção familiar
111cnte. Aliás, não se pode compreender a organiza
Cf. FRAZER, Totemism and Exogwny, 1, pp. 253-254). ivas .
522 AS FORMAS EU ARES l>A l7DA HEllG'IO!:ul
I. \IE\T ,\OTA.)
523

pob es1as i.en cm de princípios àquela. Por l!-íSO era neccss;i rio r. J \L\THFW 7im Repr(!sentalil'e Tribes of
Q11C!e11slm1d.
estudar o totL'm1smo como religião, ames de eMudar 0 t:la totê­ p. 139.
dadas outras
m1co como agrupamento familiar. 38. Em apoio a essa hipótese, poderiam ser
_ 25. \er TAPU!\J, The Narrinyen· Tribe. Cl..i RR, T I , pp . 2 1-1- mas seria preciso fa zer intervir conside rações relativas à
r•1zões,
r os dois estudos. A
organizaç-jo familiar. e insistimos cm separa
qul!l>tào. aliás, só diz respeito secundariamente
24::>; HOWITI, 1\a/. T1:. p. 131.
26 i\011/J Tr . PP· 163, 169, 170, 172. Convém notar, po- a nosso tema
, Mukwa ra, que design a uma fratria entre
rem. que em todas essas tribos, com exceção dos 1'1ara e dos 39 Por exemp lo,
. segundo Brough­
�nula, a transmis.s; i o do torem em linha paterna seria apenas 0 >s Barkinji. os Paruinji e os Mtlpulko, significa
eendidos nessa fra­
fato mais geral, mas componaria exceções. smyth. agwa-falcâo. Ora. entre os clàs compr
Mas, aqui, esse
. 27. Segundo SPENCER e GILLE"' ( i\'at Tr pp. 123 ss.>. a tria, há u m que tem por totem a águia-falcão.

•:- e •
_

caso" do mesmo
gênero são citados por L.Al\G, op. cit ., p. 162.
.in1mal é dcsiAnado pela pal.1\ ra Bilyara . Vários
alma do antepassado reencarnaria no corpo da m1e
ª ª1 ma ca 1 cnan�·a. �egundo STREHLO\Xi (II . PP 5 I ss . . J. a con-
·µ tcimana
·

. o 110\\ITf
• ,,

.
cq,çao, embur,1 sendo obra do antepassado, nao implKaria uma !U. Sl'L:\LER e lJILU:.'\, .\ai fr . p. 115. Segund

'· ' 0
< op. cil , pp. 121 e '15'1), entre os Wotjob aluk, o clã do Pelit:ano
· -
reencarnaçao. l\las, tanto numa quanto nou1ra interprciaç· ' 10
totem �ropno da
O faro nos parc­
· seria igualmente representado nas duas fratrias.
U! du,idoso. É bem possí,el que
c riança nao depende nccessariamente cio de
• · ·

os dois clàs renham por totens


duas espécies diferentes de pelicanos. É o que
seus pais.
2R. Sat Tr . p. 133: STREHLOW, 1 1 , p. 53
parecem sugerir
dadas por MATHE WS sobre a mesma lribo ("Abo­
", in joumal and Pmcee­
as indicaç ões
rigi nal Tribes of N. S.Wales and Victoria
29 Cm grande parte. é a localidade onde a mãe crê ter
:
di11gs of tbe Royal SocieO' o/ N. S. \Vales, 1904,
concebido que clctem1ina o cotem ela criança. Cada tolem como
pp. 287-288).
v�:en��s, tem �e� 41. Ver sobre essa que�tlio nossa disse1taçào
centro, e os antepassados frcqüentam �l e pre­ sobre "Lc toté­
misme", in 1l 1 111ée sociolog iq11e, l. V. pp. 82 ss.
ferência os lug.1res. que servem de centros a seus respectivos to­

1.2. Ver, sobre essa questào das classes australi


tens. O totem da uiança, ponanto, é aquele rcladonado à locali­ anas em ge­
r.11. nossa dbs(•na1,úo sobre "La Prohibition de
dade onde a mãe crê ter concebido. Ali;ís, como esta deve com !'inceste". in An-
m:11s frequenna· · c�tar próxima do lugar que serve ele centro totê­ sobre as tribos de oito
11ée so<.iol. , 1, pp. 9 ss., e, especialmente
m1co a seu marido, a criança ?everá ser, na maioria das vezes s australiennes",
classes, "L'organisation matrimoniale des société
do mesmo totem que o pai. E o que explica, certamente, po; .
118-147
que, cm cada localidade, a maior parte dos habitantes pertence
43. Esse princípio nào se manteve por coda parte com igual
in A1111ée sociol. , VTll, pp.

ao mesm� totem (Na1. Tr., f'· 9).


rigor. Nas tribos do Centro de oito classes, e m particular, além
;o. tb� pp. 1 59 ss. Cf. FISON e 1 10-
, da classe com a qual o casamento é regularmente
. S(!c ·et <!/_ the Totem,
Wl ,rr, l\ a n1 1laro1 cmd Ku rnai, pp. 40 e 4 1 ; John MATI IEW, Ea­
permitido, há
uma outra com a qual t:xiste uma espécie de

conr111bi11 m secun­
glehawk a11d Crow; THOMAS, Ki11ship a11d Jlfcuriage ln Austra­ O mesmo ocorre
dário (SPENCER e G I LLEN, North. Tr., p. 106).
em cenas tribos de quatro classes. Cada classe
lia, pp. 52 ss. tem a escolha en­
tre as duas classes da outra fratria. É o caso
3 1 . HO\'vTIT, J\a/. T1:. p. 124. dos Kabi (ver MA­
32 !bid . <>J> cil . pp. 1 2 1 , 123, 12·1. CvRR, 111. p. -i6J. TllEW, in CURR, l l l, p. 176.2) .
'-14. Ver ROTH, Eth110/o�ical Studies among tbe
No11b- \Vest­
56
33. lbid., p. 126.
ss.: PALME R, "Notes on

some Austmlian Tribes'', j.A./., X III (1884), pp.


3-J. lblcl., pp. 98 :.s. Ce11tml Q11ee11sland Abongi111:s, pp.
�5. CURR. 11, p. 165; BROUGH SMYTJ 1, 1, p. •í23; HOWJTI, 302 ss.
matrimo­
op. Cll., p. 429. <15. Citam-se, porém, certas tribos em que classes
é o caso dos Kabi
36. HOWlTI, pp. 101-102. niais teriam nomes de animais ou de plantas:
524 AS FORMAS ELEMtiVTA RF'i DA 1'lnA RHLIGIOSA ,\OTAS 525

!MATII E\\ , 7im Representat1LY! Tribes, p. 150>, das tribos ohser­ 18 (..e m exct>çào dos índios Puehlo do <;udoeste ondt'
eles
, 111 A111e-
vatlas peb sra B.\TES ("The �larriage wws and Cu:.1011� of tht: -;;Io m::11s numerosos. 'ver HODGE, "Pueblo Indian Clans
1icc111 Anth ropoloRist, ia série, t. IX, pp. 345 ss. Pode-se
W. Austral. Aborigines , i n Victo1ía11 Gc>0grapbical}o11111al, XXUl­
..
perguncar,
subclàs.
XXIV, p. '-17) e, talvez, de duas tribos observadas por Palmer. porém, se os grupos que têm esses cotens são clãs ou
Mas esses fotos sào muito raros, e sua significaçào, mal eswbele­ 19. Ver os quadros apresentados por tvtORGA,"l em Ancient
cida. Aliás, não é surpreendente que as classes, as.sim como os Vxie�J'. pp. 153-185. .
grupos sexuais, tenham adotado às vezes nomes de animais. Es­ 50. KRAUSE, Die 71i11kit-fll{fianer. p. 112; SWANTO!X, Social
Condition, IJd iefs anel Linguistic Relationship of lhe
sa extensão excepcional das denominações tmêmicas não modi­ Tiingit lndians,
fica em nada nossa concepção do tote mismo. i11 XXVI tb Rep., p. 398.
46. A mesma explicação talvez se aplique a alguma.s outras 51. SWl\NTON, Co11trib111ions to the Ethnolo�y of the lfai-
tribos cio Sudeste e do Leste, onde, a 1ulgar pelas informaçõe� da. p 62
de l lowiu, iambt:m haveria totens especialmente associados a '>2 "The dis1inction between the two clans is ahsolute in
t.atla das.se matrimonial. Seria o caso tios Wirad1un, dos Wakel­ every respect", diz Swanton, p. 68. Ele denomina clàs
o que cl a­ �
bura, dos Bunta-Murra cio rio Bulloo (HOWITJ', Nat. Tr., pp. As duas fratrias, diz ele em outra pane, estao
mamos fratrias.
210, 221, 226). Contudo, os testemunhos que recolheu süo, co­ uma para a outra como dois povos estrangeiros.
mo ele próprio confessa, suspeitos. De fato , nas próprias listas 53. O totem dos clàs propriamente ditos, pelo menos entre
De faco,
que escabeleceu há vários totens que se acham igualmente nas os Haida, é inclusive mais alterado que o das fratrias.
duas classes da mesma fratria. pcrmi1e a um clã dar ou vender o direito de
como o costume
pluralidade
A explicação que propomos baseados em Fl{AZER ( Tote­ usar seu totem, disso resulta que cada clã tem uma
clàs (ver
m sm
i and E:1:ogamy, pp. 531 ss.) levanta, aliás, uma dificuldade. de totens. alguns dos quais em comum com outros
as fratrias de
Em princípio, cada clã e, conseqüentemente, cada totem são re­ S\X A;-.TO"l . pp. 107 e 268). Como Swanton chama
clàs propri�­
presentado:-. indiferentemente nas duas classes de uma mesma clàs, ele é obrigado a dar o nome de família aos
Mas o senu­
fra1ria, uma vez que uma dess:is classes é a dos filhos e a outra a mente ditos, e ele ho11sebold às famílias verdadeiras.

54. jo11mals of two Expeelitions in N. \V. anel W. Austra/ian,


dos pais de quem os primeiros recebem seus totens. Portanto, do real da terminologia que ele adota não deixa dúvidas.
quando os clãs desapareceram, as interdições totêmicas sobrevi­
ventes de\eriam ter pem1anecido comuns às duas classes matri­ 11. p. 228.
moniais, enquanto que, nos c-.i::.os citados, cada classe conserva 55. Kamilaroi anel K11rnai, p. 165.
56. J11dian Tribes, l, p. 420. Cf. 1 , p. 52. Essa etimologia,
aliás,

é muito contestáve l. Cf. 1landbook of American lndians


as suas próprias. De onde provém essa cliferenciaç·ão? O exem­
plo dos Kaiabara (tribo do Sul de Qucensland) sugere talvez de North of
s.v. Totem,
que maneira a diferenciação se produziu. Nessa tribo, as crian­ �lexico (Smitbsonian J11st., Bur. of Etbnol., 2ª parte,

57. SC!!OOLCRA.Ff, !nelim1 Tribes, lll , p. 184. Gamck MAL-


ças têm o totem de sua mãe, mas particularizado por meio de p. 787). .
um sinal distintivo. Se a mãe tem por tocem a águia-falcão negra,
in Tenth Rep.,
o do filho será a águia-falcão branca (II0Wl1T, Nat. Tr. , p. 299). LERY, ''Picture-Writing of the American Indians",
Fxiste aí como uma primeira tendência dos totens a se diferencia­ 1893. p. 377.
rem conforme as classes matrimoniais. 58. HEARNE, joumey to the Nortbem Ocean, p. lq8 (cicado
17. Lma tribo de algumas centenas de pessoas conta até 50 conforme FRAZER. Totemism, p. 30).
ou 60 clàs, bem mais até. Ver sobre esse ponto DURKHEIM e 59. CHARLEVOL>.. . Histo1re et description de la f\011L•elle
J'v!AUSS, "De quelques formes primitives de classification", in France, p. 329.
Alllzée sociologique, t. VI, p. 28, n11 1 . 60. KRAUSE, 71i11kit-Jnelicmer, p. 248.
AS FO/llfAS U.F.111:.\TARfü DA \7DA REIJGIU.'vl
526 1 1/ , , 527

61. Em1innie A SMIIB. "\lvths of the Jroquoi�" in 'lecmu/ "' .ft"LLER . Ge.çchichte der Amerika1111ische11 l rreliR
iO­

80. SCIJOOLCRAFT, Indicm Tribes. ll. p. 269.


Rep. o/tbe !3111t'a 11 o/ Etlmo/., p. -8. . '" li, p. �2"'.
.
62. DODGE, Our �Vild lndia11s, p. 225.
240,
8 1 OORSEY, Omaha Sociol.. 7bird Rep., pp. 229, 238.
' l 'i
63 PO\VELL, "Wyandot Governmcnt", in /. A111wal Report
oftbeB11rem1 o/Ethnology (I881), p. 6-i.
82. SPEt\CER e GI LLEN, .Vai. Tr.. p. 451 .
lU. SPENCER E GT LLEN. ibid., p. 257.
6-1. DORSEY, "Omaha Sociology" , 'fbird Rep.. pp. 229, 2"10,

8·1. Adiante se verá (livro 1, cap. IV) o que significa


248.
m essas

66. lbid. , p. 308.


65. KRA1_,SE, op. cit., pp. 130-131.

8'i. SPENCE R e GILLEN, North. Tr., p. 296.


ll'l.1�ocs de paremesco.

TON, op. cit.. pr. IX. CL TYLOR, "To1<:· rn Post or the 1 faida Villa 86. HOWITI, Nat . li-., flP· 744-746; cf. p. 129.
67. Ver uma rmografia de uma aldeia Haida em SWAN·

ge of Masset", .J.11 .J., nova série, J, p. 133. 87. Kamilaroi cmd K11rncii, p. 66, nota. É verdade que
o ra-

68. 1 lill lOLT. ''Repon on Lhe Ethnology of the Statlumh of


contestado por ouuus 111f0t mantes.
88. llOWITI. Na!. Tr., fl. 744.
11
Brmsh Columbi:1".j.A ./. , t . XXXV, 1905, p. 155.
'ITON. Co11trilmtio11S to the Ethnolop,y o/ lhe
. .
!laida.

PI ' 1 l ss.. pr. XX e XXI:


89. SWA.
69. KRAUSE. op. cit., p. 230; SWA'ffO:-., Haida, pp. 129.
13' ss ; �CIIOOLCRAFf, Indian Tribes, 1, pp. 52-53, 337, 35ú.
BOAS, 7be Social Orga11izalion o/ the
l1.t1·11ki11tl. p. 318; SWANTON, 71i11gil. pr. XV I ss. Num
_

: caso.
:\este ulttmo caso, o totem é repre�t::ntado combado. em sin,.I de
luto. Costume!> .similares ocorrem entre O!. C reek (C. S\VA.'\, in
duas regiões etnográfi cas que estudam os de ma-
ll tl•io aliái. às
nos animais
1w11;1 mais especial. es:;as tatuagens são praticadas
' Illl' pertencem ao clã. Os Bechuana do Sul da África
SCHOOLCRAFT, !11dia11 Tribes o/ tbe únited States. V, p. 265> e
entre os Delaware (HECKE\VELDER, A11 A cco1 111t o/ the Histori'.
esc:io di\·idi­

Man11ers mui Customs o/ the !11dia11 Nations Ll'bo one inhabit�cl


lo, do Búfalo,
"' " num certo número de clàs: há os do Crocodi
do \1:1caco, etc. Os indivíduos do Crocodilo. por
exemplo. fazem
Pennsylmnma, pp. 2'16-247). por sua for-
'0. SPENCER e GlilEN. /\'orth. 'li·.. pp. 168. sr. 5-iO
n.1-. orcU1as de seus bovinos uma incisão que lembr.i

-,1. lbid, p. P-1.


Segundo
111.l o r.iho do animal CCASALIS, les Basolllos, p 221)
Ol> anti-

72. BROl'GH SMYTH, 7be Aborigines o/ Victoria, I, p. 99.


SMlTH, o mesmo costume reria existido entre

1!•" ;tr.ibes ( Kinship and Mmiage in early Arabia, pp. 2 1


l!ohenson
2-214).
90. 1l á algumas, segundo SPENCER e GILLEN, que
nota. não Leriam
73. Ibid., 1, p. 284. STRE!ILOW cita um fato do mesmo gê­ o11h. Tr., pp.
1w11hum sentido religioso (ver Nat. Tr. , pp. 41-42; N
nero entre os Arunt:.1 (lll, p. 68). 1 �.
74. A n Acco11111 o/ the Eng!ish Co/011.)1 i11 N. S. lf!a/es lJ 1)
'1·1-56).
serão
9 1 . Entre os Arunta, a regra comporta exceções, que
381.
' ' '

, xpl icadas mais adiante.


., pp. 179,
75. KRAUSE, p. 327. 92. SPENCER e G!LLE:>J, Na/. Tr., p. 162: North. Tr
assim re­
76 SWA�TO'l, "Social Condiúon, Belief.� and Linguistic Rc­ .!"11), 292, 295-296: SCHULZE, /oc. cil., p. 221. O que é
laaonship of Lhe '11ingit lndians"'. in .XA17 tb Rep., pp 435
. :
mas um dos
da mesma
propriam ente,
, 1hieto:-. que. associados a ele , sao considerados coisas
BOAS. sempre é o Lotem
17Je Social Orga11fzatio11 and lhe Secr<!t Socii:ties o/the Ku·ukiutl
ss.; p1�·scn1a do nem

l11dia 11s. p. 358.


77. FRAZER. Totemism. p. 26.
l , 1 1nilta
93. É o caso, por exemplo, entre os Warramunga.
os Wal­
ra (North.
pari, os Wulmal a, os Tj1ngilli, os Umbaia, os Unmatjc
229; J. \YI. FEWKES, "The Group of Tusaya n Ceremonials called
78. 130�RKE. 17Je Snake Dance o/ tbe Moquis o/Anzona, p.
li , pp. 348, 339). Entre os Warramunga, no momento em
que o

Kaccinas'. in XVlh Rep. . 1897. pp. 251-263.


as se-
, lvscnho é executado. os operadores dirigem ao iniciado
AS FORMAS ElF.MEVTARES DA l7D
\IJTAS
528 529
A REUG!Out
!

guintes p:ilavra s: "Essa marca pertence à o produto ?e uma espéc}e


sua localid ade (yo111• \,1 que e��a é uma exceção ã regra e
place): não ponha os olhos nu ma outrn localida
de". "Ess� lin­ bendk iário da fórmu la assrm revelad� �ao
de wler.incia é que 0
1 K><le dispor livremente dela; se a tra nsmiti
guag�m significa, dizem SPENCER e GILLEN r - e essas transm1ssoes
, que o jovem não
deve intrometer-se em ouc:ras cerimônias um membro do totem ao

qual se relaciona o rim (Nat. Tr..


que não aquelas que 'ªº freqüentes -, só pode ser para
.
concernem a se� t?tem; mostra igualmente ibid.).
a estreita associação
96. Nat. Tr., p. 1 40. 'esse caso. o noviço
que se supoe ex1sDr entre um homem, seu .
conserva a ptnlll-
_

que, por efeito do tempo, ela se


totem e o lugar espe­
Tr., p. 584). Entre os
_
cialmente consagrado i1 esse totem·· (North.
1,1 com que foi enfeit ado até

.1 pague espontaneamente . ..
Warramunga, o totem transmite-se do pai
aos filhos; conseqüen­
temente, cada localidade tem o seu. .
s of Bnu_sh Colu_m-
94. SPENCER e GILLEN, Na/. Tr., pp. 215, 24 1, 376
97. BOAS, "General Report on the lnd1an
· •· . 1·n British Associalionfior lhe Advan
oftbe Dom1111on ,rJ c.a-
cemellf of Sc1e11ce, Fiflb
.V. .
\f' l
Tri JeS O
. 1lia .
95. Lembra-se o leitor (ver p. 101) que. nessa tribo,
·

a crian­ Nep of the Comm ittee on the


ça pode ter um totem diferente do de seu
m entre os. \V/arra
pai, de sua mae e de p. 4 1 .
11ada,
maneira mais geral. de seus parentes. Ora, .
Arunta, e n_ao fi��
os part.•ntes, de 'um 98. Es.ses in.strumento.s c.ambcm existe

lado ou de outro, são os operadores designa


_

que entre os
dos para as cerimô­ munga, mas em menor nú mero
nias da iniciação Por conseguinte, como que ocupem um certo lug,11
um homem, em princí­
ram nas cerimônias totêmicas, ainda
nos mitos (North. Tr., p. 163).
:
.
p1�, �6 tem qual idade de operador ou ele
oficiame para as ceri­
monias de seu totem, resulta que, em cenos outras tribos. ?ª­
casos, os ritos aos 99, Outros nomes são empregados em
quais a criança é iniciada estão obrigatoriamen Arunta, porque nessa tnbo
te relacionados a mos um sentido genérico ao tern10
um tmem que não é o seu. Eis aí de que foram melhor estudados.
os churinga têm mais importância e
100. STREHLOW. ll, p. 81.
maneira as pinturas
executadas no corpo do noviço não represe
ntam necessaria­
meme o totem deste último; encon trar-se-ã pequeno numero,

em SPENC EH e GILLEN , Na/. Tr., p. 229.


o casos desse gênero 101 . Há algumas dessas peças, mas em
nte (ver SPENC EH e G I L­
Aliás, o q u e mostra que não têm nenhu m desenho apare
LEN ' Nal . Tr., p. 144).
bem que existe aí uma anomalia é que, não
li, p. 75.
obsta nte, as cerimô­
102. Na/. Tr., pp. 139 e 648; STREHLOW:
nias da circuncisão dizem respeito essenci
domma�te no g �po local do iniciado, isto
almente ao totem pre­ _

é, ao totem que seria que escrev e 7Ju111 nga, da uma t�duçao um


_ _ _ 103. Strehlow, _
o do propno m1c1ado, .se a organização totêmica não - a, diz. ele, s1gn�ca o que
fosse per­ pouco diferente ã palavra. Essa palavr
turbada, se fosse entre os Arunta o que geheim e). 1Ju é u_m anugo term�
219).
ela é entre os Warra­ eigene
. dize� o que _me
pes soal ( der
que signifi ca escondido, secreto,
é secreto e
munga (ver SPENCER e GILLEN, ibid., p. quer e

.
e n111ga
.• . · 0. " , , , ..
, pode1oso, sag1ado (KE/V�
A mesma perturbação teve uma outra conseq que nesse assunt o, tem mais autoridade
üência. De p1op 1 1 M·is Kemp e

Range, s _,
maneira geral, ela tem por efeito afrouxa
que unem cada tot em a um grupo determ
r um pouco os laços que Strchlow, traduz tj11 por grande _

t. XIII) . No
1tmg Macdo nnell
R.
PE "Vocabulary of the Tribes inhab
?
inado, uma vez que
ca a tot<:m pode contar com membros
afasta tanto da precedente
em todos os grupos lo­ s of lhe Society of l'ictori a.
s.v: 7ju. in Transaction
ca.is poss1ve1s, e mesmo nas duas fratrias
indistintamente. A idéia fundo a tradução de Strehlow não se
de �ue a_s cerimônias de um totem podiam ra vista, pois sec�eto é o que se
ser celebradas por quant� se poder ia supor ã primei
un _
� 111d1v1duo ?e um totem diferente - idéia nos, ou sep. o :;agra do.
contrára i ao.s princí­ subtra i ao conhe cimen lO dos profa
pios do totem1smo, como veremos melhor à palavr a runga , ela nos parece
a seguir - pôde, as­ Quant o à si g nificaç ão atribuí da
sun, se estabelecer sem provocar Ema dizem respe1to a todos
maiores res istências. Adrniti u­ bastante duvidosa. As cerirnô nias da
se que um homem a quem um espírito revelav _
a a fórmula ele memb ros do clà da Ema; todos podem part1c1par; portanto
os
u�a cerimônia estava qualificado para m deles.

104. Nat. Tr., pp. 130-13 2; STREHLOW, ll.


presidi-la, mesmo que não são bem pessoal de nenhu
nao fosse do cotem envolvido (Na/. Tr., p. p. 78. Uma mu-
5 1 9). Mas o que pro-
17DA RELIGW.\A ' '11:1s
531
530 AS FOR.lfASELr.l!E.\TARES DA

s a alguma ce nmcm1.1 (i\át


po� t"•U1ngeiros parn convoGí-lo
Tr.,
lher que \•iu um d1uringa e o homem que lhe mostrou �:10 igu:tl­
mence condenados a morre. pp. 1�1- l·Q).
que os lmll-roarers são
105. Strehlow diama esse lugar, definido exatamente nos 122 /bid. , p. 326. Convém notar
S, "Aborigmal Tribes
al o/ Roy. S<x. <if/1; S. Wa­
ira (MAT HEW
empregados da mesma mane
ol \i
mesmos ll'rmos empregados por �pencer e Gillen arknanaua
ao n i vés de e1111at11/1111ga (STREI ILOW, 11. p. 78). '
s and Victoria", 1n }011m

/,.s. xxxvrn. pp. 307-308>.


S. Wale
lo6. ,\'o11b 7i·.. p. 270; Sal. 71·., p. 1'10.
107. t\'at. 7i·., p. 1 35. 123. Nat. Tr., pp. 161, 250 ss.

e; li, pp. 76. 77 e 82.


125. STREHLOW, 1, l'orworet, infin
124. lbid., p. 138.
108. STREliLOW, II, p. 78. Strehlow diz, porém, que um as­
.
l'ara os Arun
sassmo que se refugie pert? de um crtna tu l u nga é impi edosa­ antepassado; para os Lorit­
mente persegui do e morto. E um pouco difícil conciliar esse fato
. mesm o elo
i;1. é apenas uma i ma gem
la, é o corpo

com o priv ilégi '.> que gozam os animais, e nos perg un tamos se 0
de nasce r, a mae ind ica ao
dele.

maior ngor aplicado ao criminoso n:lo e recente e se não eleve


1 26. Quan do uma c rianr;a acaba
.l i ma ntepassado pcnt·t rou nela.
s parentes, di rige-se a e:.l>C
a <lo
pai onde ela acredita que
a

o
�er atrihuíclo a um afrouxamento <lo tabu que protegia prlrrntiva­ lugar e
de algun
s õe
pai, acom panh ado
mente o ertna tu l u nga. -se. cleLxou cair
nga que o antep assad o, u p
109. Nat. Tr., p. 2-18. procura aí o churi

o colocou aí (a hipótese é
encontrado, ê que algum an­
1 10. lbt d.. pp. 5'15-546. STREllLOW, li, p. 79. Por exemplo, no momento de reencarnar Se for
_ cotêm ico. certa ment e.
a poerra obuda :ro se raspar um churinga de pedra e dissolvida não elo grupo
ário. faz-se u m nO\O churinga
em água con.sutui uma poção que devoln! a saúde aos enfermos. de Spencer e Gillen). Caso contr
o com uma técni ca deter mina da (Nat. 7i·., p. 132. Cf.
1 1 1 . Aat. Tr., pp. 5·6-546. STREllLOW (ll, p. 79) contesta o de acord
STR.EHLOW, f l , p. 80).
127. É o caso dos Warramunga,
fato.
dos Urabunna. dos Wor­
1 1 2. Por exemplo. um churinga do cotem do Inhame de­
dos Tjing illi, dos Gnan ji (Nortb Tr.. pp. 258.
positado no solo. faz crescer os inhames (\'ortb Tr., p. 275). Ele gaia, dos L,mbaia.
N, "They were regar­
: �
em o me:.m poder sobre os anrmais CSTREHLOW, ll, pp. 76, 275-276) Então. dizem SPE:"\CER
ial rnluc hern use
e
of
GllLE
their assoc iation with a to­
decl as of spec
tem" ( ibid., p. 276). Há exemplos
8: Ili. pp. 3. )
1 13. Xat. Tr., p. 135; �TREHLOW, 11, p. '9.
elo mesm o fato entre os Arun­

1 1 4. Notth TI·., p. 278.


(op. cil., 1, pp. +';).
ta (/\ai. Tr. . p. 1 56).
115. lbid. , p. 1 80 . 1 28. STREHLOW escreve inata nja
129. Os Ka itish , os T l pirra, os Unma
tjera; ma� é ra ro entre
116. !hicl. , pp. 272-273.
1 1 7. Na/. 'li'., p. 135. esses últimos.
o
118. Um gru po empresta de um Olllro seus churinga, com 1.30. A vara é às vezes subst ituída
por ch u ri nga muito c m­

a , um outro menor é s us­


pridos, unidos pelas pontas.
1 3 1 . Às vezes, no alto do nu n unj
o pensar:1ento ele q u e estes lhe transmitirão algo das virtudes
q �� contem , ele que sua presença aumentará a vitalidade dos in­
d1vrduos e da coletividade (Nat. 71·., pp 158 ss.).
a forma de uma cruz ou
rte central (.Vai. Tr., pp .
os casos , o nurcu nja tem
penso. Noutr
falta o supo
1 1 9. lbid. , p. 136. de um T. Mais raramente,
298-300, 360-3&!, 6r).
132 l lá casos em que !>ÜO três essas
120. Cada indivíduo é unido por um �ínwlo pamcular pn­ barras trnn�\'(:rsais.
�erramem� � um chunnga especial que lhe ser\'e de penhor de
.
627. Além do nurtunja e
nda, depot:. aquclei:. que recebeu ele seus parentes por herança. 133. A"a/. Tr., pp. 231-231, 306-3 10.
guem uma terceira espé­
ua (1\'al Tr., pp.
CER GlLLE N distin
1 2 1 . J\'ttt. Tr .. p 154: Nortb. Tr., p. 193. Os churinga têm do waninga, SPEN <!
do. o kaua

uma marca colcll\'a tao clara. que substituem os bastões de men­ cie ele mastro ou estandarte sagra
cujas funçõ es, aliás, eles confe ssam não ter podi-
sageiros usados. em outras tribos, por indivíduos enviados a gru- 36-t, 370, 629),
TARF:S D,;I l"IDA REliGlO\.�
532 AS FOR.l/AS ElEl!F\
\11/AS 533
do determinar exatamente
. 01 )Servan1 apenas que
consicJeracJo a lou <.:om
.•
o kauaua ··� lumlem l':irece claro que o homem deve ter começado a de�e-
11har, meno;, para fixar na madeirn ou na pédra bela.� formas que
" um , . s mem hros de toe.l
w ..
Ma�. segundo STREHLOW os. os toten� .
.
·

(lll p. 23 n. 2) o

:�'.:s! � ��� =
auaua
nt e º nurtunja do totem do
am Spencer e Gillen . • , k de que fa-
1•11<.anravam seus sentidos, do que para traduzir materialmente
I
. to de

'
. •

Gato Selvagem. Com "'li pensamento (cf. SCHOOLCRAFf, Jndian Tribes, 1, p 405,
oh1e
.1· 0 a �eu nurrunja ser com
explicar-se-ia o faro de a um culto tribal.
veneraç; 1 >ORSEY. Sioua 11 Cults, pp. 394 ss.).
toe.los os clãs. um a
134 . North. Tr., p. 342; Nat
135. Nat. Ti-., p. 255. 1 't1pít11/o li
. Tr., p. 309.

136. lbid., cap. x e xr.


137. lhic/., pp. 138. 144. 1. Ver casos em TAPL!N, Tbe Naninyert, p. 63; HOW!TI,
,\'ai Tr pp. l-16. 769· FlSO'\ e HOWlTf. Kt1111i/aroi {///l/ K11r-
Rep. , P: ·• 13; "Oma­
138. Ver DORSFY, "Slouan
ha Sociology". 11/rd Rep
Cult.s" \llb
'
. 1 Í'. \'e �d. . <.k que 1 �.1 apena!> um
11c11. p. 169; ROTH, !;uperstition, Magic cmd Med1c1ne, § 150;
\\ \ATI. lidelaIde mui l:."11w1111ter Bay Tribe, in \X'OODS, p. 168,
., p. 2�. 1
mastro sagrado para a tnbo
M EYER , ibid., p. 186.
. , ao passo que cada �,.l·i
tuni:1. Mas o princípio é tu
�m um nur-
���

2. �
Í o que acontece entr e os Warramunga (Norlh. Tr., p.

o mesmo.
- Nat. Tr., pp. 232, 308,
168).
313 , 334, etc.; North. Tr., pp.
186, t 182 ,
l iO. lbid., P· 3"16. Diz-
se é verda d, .
e, que o nurtun1a repre-
3. Por exemplo. emn: os \Varramunga, os Urabunna. os
sado q . ue. no tempo do Alch ·
-
sema a lança do antepas \\'ongh1bon, os Yuin, os Wotjobaluk, os Buandik. os :\geumba.
fja\'a cada cl-i . Mas e1e �

ennga, che-
·

4. Entre os Kaitish, se u m homem do clã come demais de


apenas uma representaç L'[C.
des ta e _ ão simhólica
. ' ' não uma especie de relíquia, com
supõe provir . do pró o o churinga que s
prio antepas , e 'eu torem, os membros da outra frarria recorrem a um expedien
. w mágico supostamente capaz de matá-lo ( Nonh. Tr., p. 294. Cf.
' ' sado A qui,
� ' 1ai mente ev1deme.
. o cara, ter secundário

l, l . Nm. Tr. . pp. 614 ss.,


da interpreta,.:i o é part1cu . :
.,1� tb Tr..
\'ai. Tr., p. 204; La ngloh PARKER, 7be Euahlayi Tribe, p. 20).
p. 5. 1\'af. Tr . p. 202 e nota, STREHLO\X'. li, p 58
e m particular p 617 · Nor

l i2. 1\at. Tr., p. 624. 6. i\'011h TI: . p. 173 .


143. 7. Nat. TI-., pp. 207 s
l-J-1.
lbid., p. 179. s.
!bid., p. 181 . 8. Ver p. 12·1.
NCER e G I LLE N N.
. ' a t . T1.. , fig.
145 . Ver exemplos em SPE 9. Também deve-se levar em conta o fato de que, nos mi­
13 L . São reproduzidos aí á r
.
tos, os antepassados jamais nos são representados alimentando­
v ios d�•s en1los, . mu nos dos qua
.se re&1 1larmente de seu totem. Esse tipo ele consumo é, ao con­
.,
sam evidemememe rep is vi­
res�nrar. an11na1s, plantas,
mem, etc muito esquema cabeças de ho-
·• •
ucameme, é claro. trário. exceção. A alimentação normal deles, ;,egundo Strehlow,
146. Nat. Tr. . p. 617 ; Nortb. era a mesma que a do animal correspondente (ver STREHLOW,
r. P· -t).
Tr.. pp. 716 ss.
1"17 . Ib1d., p. 145 ; STREHL
OW. I I. p. 80 .
148. Ibid., p 1 5 1 . 10. Toda e;,sa teoria, aliás. repousa numa hipóte;,e inteira­
l19. l\'at. Tr., p. 346. mente arb1trarn1: �pencer e Gíllen, assim como Frnzer, admitem
150. Não é de duvidar .. que as tribos cio centro australiano, especialmente os Arunta. re­
, aliá
's. ' q ue ess
�s desenhos e pint uras
���=� ��
tenham ao mesmo tem presentam a forma mais arcaica e, porranro, mais pura do tote­
po c ,. s et 1.co: � uma prim eira
fonna de arte. Sendo ram bé�m es u 1 uma lmgua em escri-
mismo. Diremos mais adiante por que essa conjetura nos parece
ra, o resultado é que as
origens do desen1º e � contrária a toda verossimilhança. É provável. inclush e. que es­
da escma se con-
:.es autores não teriam aceito tão facilmente a rese que �usten-
535
534 AS FOIWAS ElEMEl'ffARFS DA 1 WA REL!GIO\ i

EHT.OW. I I,
se a expulsá-lo (STR
por ele · deve limitar-
I' 'IH. Cf. TAPLIN, p. 63). , .
ram se não tivessem se recusado a ver no mtemismo uma rl'li 11, xladíl
ào e. por consegu inte, ::.e nao nvessem desconhecido o carát,·1 Tr. p . 1 60) .

gi
!':
os Unm ajte ra (Nortl��
sagrado do totem . 17. Ent re os Kai tish ,
1 1 . T�LIN, Tbe Na rri11yeri. p. 64: HO\V!Tf, Nat. Tr.. pp
1ao de a um
que um anc
uringa para permitir
m certos casos.
,, nntece inclusive, e
- e 147; SPENCER e G!LLEN, Nat. Tr., p. 202; GREY, toe. cit . rente um de seus ch
i a l que serve de
_

,.111 de um cotem dife

1 1 1 1ovem caçador matar


1b
mais facilmente o an
m
CURR, IIl, p. 462.
12. North. Ti-., pp. 160, 167. Não basta que o intermediário I• •tem ao doador ( ibid.,
146; GREY, op. cil., L I , p. 22 �:
p. 272).
18. HO\VITT, Nat. Tr., p.
CA­
seja de um outro totem, pois, como veremos, um totem qual
quer de uma fratria é, em cerca medida, proibido inclusive aos ' \llS. Basoutos, p. 221 .
Entre estes últim os, -é preciso purifica r­

o tal sacrilégio".
59. 6 1 .
19. STREHLOW, II, pp. 58.
outros membros dessa fratria que são de um rotem diferente. ·• .1 pós ter cometid
13. North. Tr., p. 167. Pode-se explicar mel hor agora po1
gy, 1Jlrcl Nep., PP· 22)
a interdição não é observada, é a outra fratria qu<·
, 231 .

RSEY, Oma ha Sociolo


2 1 . CASALlS, 1bui.
que, quando 20. DO
promove a repressão do sacrilégio (ver nota 1 da p. anterior). J 111te �d1çoes
. . _

22. Mesmo entre os Omaha, dar


não é cert o que
m
as

11<- contato, de que acab


que ela é a pnnc1pal interessada em que a regm seja respeitada ele
rel a­
s, s;1a
�fei to, quand? a
alguns exempl
�em
amos de '?
Co� regra é violada, acredita-se que a espécil·
nsco de não se re prod uzi r abunda ntemente. 11 .uureza pro pria mente .
delas nao
m ao ela. As�11: 1,
totê mic a, pois vári as
totem1ca cor re o

�·oes direr a s com o anim


al que serve de LOLe
Ora, os membros da outra fratria é que s:lo seus consumidores siste em nao
regula res�. portanto, são eles os atingidos. Eis por que se vingam. P· 239);
con
a in terdição característica
num subclã da Águia,
(DO RSE Y, op. cit.,
l'l. E o q ue ocorre entre os Loriffa (STREHLOW, TI, pp. 6o, poder cocar uma cab
eça ele búfalo
. os Warramunga, os Walpari, os Mara, os An ula,
se pode tocar o
tem o mesmo totem, não
61), s Worga1a, num outro subclã que
? madeira, etc. ( ibid ., p. 245 ?·

os Bmbmga ( North. Tr., pp. 166, 171, 173). Pode-se comê-lo entre .17inhavre, o carvão de
os Warramunga e
er co-
de outr os inrerdiç õe.'> que mencmna F�� :
os Walpari, mas somente se for oferecido por Não falamos ta. pois e ameia
r um anim al ou uma plan
1110 as de nomear ou olha
menos certo q ue seja
um membro da outra fratria. SPENCER e GILLEN assinalam (p. salvo talv�z. no que
hua n: ( lotem1sm,
167, n. 1 ) que, soh esse aspecto, os totens parerno e marerno são m de origem totêmica,
submetidos a uma regu lamentaçã o que parece ser diferente. Sem
obs erva dos entr e os Bec
concerne a certos fatos cntao - e nesse
dúvida, tanto num caso como no outro, o oferecimento deve vir PP· 12- 13). Fraz
faci lme nte,
er admitia demasiado
ição de come� o� to­
res -, que toda interd
da outra fratria. �las. quando s e trma do rotem do pai ou mrem ponto ele teve imitado cren a_s totem1cas.
ente de
que a v 1sao do totem
e necessa riam �
caso, na Austráli a, cm
propriamente dito, essa fratria é aquela à qual o rotem não diz car um anim al depend
comrá rio no caso do totem ela mãe. A ruzào, um �
respeito; oc rre o No entanto, há
o STREHLOW (IT, p.
59), en_tre os Arun a
ce�ta n:iente, e qL'.e o princípio foi inicialmente estabelecido para o
'?
parece proibida. Segund Lua nao d:ve olhá­
que tem por tote m a
pnme1ro e depois estendido mecanicamente ao segundo, embora e os Loritja. um homem
rer p �la mao de :1 m
a situaç-Jo fosse diferente.
pois se arris cari a a mor
Uma vez instilllída, a regra em virtude la por muito rempo, case: umco. Convem
ast rono m1 cos prov ve
mos tratar-ele d e u m
da qual não se podia desrespeitar a interdição que protege o to­ inimigo. Mas acredira �
tem a nao

alguém da aliá s, que os tote ns
_ ser quando a proposta pa1tisse de outra fra­ não perder de vista, o, essa pro1b1çao
s na Aus trali a; por tanr
tria, foi aplicada sem modi ficações ao caso do torem materno. mente não são primitivo
de uma elaboração �omp
lexa
:
? que con­
15. Por exemplo, enrre os Warrdmunga (No1th. Tr., p. 166). poderia ser o produto rerd1çao de olhar
entre os Wotjoba luk, os Buandik, os Kurnai (HO\VITT , pp. 146-
e os Eua hlay 1, a
que, entr �
firma essa hipótese é er
147) e os Narrinyeri (TAPLTN, Tbe Narrinyeri, p. 63).
as as cnanç=s, quaisqu
hlay1, p. )3).
todas dS mães e a tod
ARK Tbe
a Lua aplica-se a
(L. P E R , Eua
que sejam seus rotens
23. Ver l ivro 11, cap. 11, §
16. E, mesmo assim, não em todos os casos. o Arunta do
2.
totem dos Mosquitos não deve matar esse inseto. ainda que in-
IJ\7'::tpep!Sl\JA!U •
. -· .. ,.. _ ,1.____ .... ... . ,1� f
AS FORMAS ELIWE
,\TARES DA l7DA REUGIOSA \'()TAS 537

2·'1. Talvez não haja religião que faça do


homem um ser ex­ quois", JJ11d Rep. , p 77) O clã do Lagostim entre os Choctaw.
c.lu�1v.1men1e prof.ano. Para o cnscao
, a alma que c.:Jua um traz 1t.·na se formado <lc maneira an:1loga. Alguns homens teriam sur­
em si e que constitui a essência mesm
a de nossa personalidade preendido um certo número de lagostins que viviam nas suas
tem algo de sagmdo. Veremos que
essa conccpçào da alma é cão 11ncdiações, os teriam levado consigo, ensinado a falar, a c.:ami­
antiga quanto o pensamento religioso.
Mas o lugar do homem n a nhar e finalmente os teriam admado em sua sociedade (CATLI ,
\'onb America11 J11dians,
hierarquia das coisas sagradas é mais
25 Nat. 1i-., p. 202.
ou menos elevado.
34. Eis, por exemplo, uma lenda Tsimshian. Durante uma
li, p. 128).

26. TAPLI�. 71n 1\'arrinyeri. pp. 59-61 .


2..,. Entre cenos clàs Warrdmunga, por exemp
caçada, um índio encontrou um urso negro que o levou para
lo C/\'ortb. Tr. , ,ua toca, ensinou-lhe a pegar o salmão e a construir canoas. Du­
p. 162)
_28: Entre os l �abunna (,\onb. 7r., p.
117). i\lesmo quando
rante dois anos. o homem permaneceu com o urso, vohando
. Jcpots para sua aldeia natal. Mas as pessoas fic-Mam com medo
nm e dno des.-.es primeiros seres que
des n;ío pa�sam dl' scmi-humanos e
"ªº homem,, em realidade <lele, porque se assemelhava :1 um urso. Ele nao podia falar,

r><
_>
panicipam ao nw,mo tcm­
� �
1 t.lll t.omer outrJ t.oha senao ahmt.ntos c.rus. Lntào fm:c:aona

b.3- b-I).
d.i natu e:w an1 al. E o caso de ccnos
Unmat,era Uhid., pp. ram-no com ervas mágicas e gradualmente ele retomou sua for­
_
Sao m:inc1ras de pensar cuja confus
áo nos desconcer­ ma primitiva Posteriormente, em momentos de necessidade, ele
ta, mas que de,emos aceitar como tais.
Seria desnaturá-las que­
lhes é esLranha Ccf. Nat. Tr.,
t.hamava seus amigos ursos para ajudá-lo. Construiu uma casa e
rer mtroduzir nelas uma clareza que
pmtou na entrada principal um urso. Para a dança, sua innà fez
p 1 19).
29. Entre alguns Aruma (Nat. Tr., pp. 338
um manto no qual um urso estava desenhado. Por isso, os des­

( N011b Tr., p. Vi3 ).


ss.) e Unmacjera cendentes dessa irmã tinham o urso como emblema (BOAS,
Kwakiutl, p. 323. Cf. "Vth Repon on the N. W. Tribes of Cana­
30. ,\'at. Tr., p. 389. Cf. STREHLOW, 1, pp.
3 1 . lbid. , pp. 2 ss. Cercameme há, nesse
2-7. Ja", pp. 23 , 29 ss., llill TOl1T, "Reporc on thc Etnology of thc

�co dos ritos de mi ciação. Também eMa tem por objeto


tema
mítico, um 'itatlumh of British Columbia", in j.A !., 1905, XXXV, p. 150).
fazer do Por aí se percebe o inconveniente de íazer desse parentes­
1 ovem u m hon�em comp leto e, por OLllro lado,
implir n igual­ co místico entre o homem e o animal o caráter <lbtintivo do tote­
mcn1c \·erdacle1ras operações cirürgi
cas (circuncisao, subincisão
comra rative". in Rev11e de /'bistoire des relgions,
mismo, como pror>õe M. Van GENNEP ("Totémisme et méthode
extraç:io de dentes, etc.). Era natura
l que se c.:oncebessem en� L\llll, 1908, ju­
Esse pa rentesco é uma expressão mítica de fatos que
i
55).
l.
base no mesmo modelo os proc.:edimen
1os que serviram para
sil o mais profundos; ele rode estar ausente sem que os traços es­
lho, p.
formar <>.'> primeiros homens.
32. Í:: o caso dos nove clàs cios Moqui
dic11 1 7 i'ibes, TV, p. 86), do clã do Grou
entre os Oj ibwa y (tvÍOR­
(SCHOOLCHAFT ln­ senciais do totcmismo desapare)·am. Certamente sempre há, en­

GAN, Ancie111 Society, p. 180), cios c:l<


tre os membros do c:lã e o an imal totémico, vínculos estreitos,

Rap. 011 tbe N.- \fl. Tribes o/Canada, p.


1s dos Nootka <BOAS , VJth mas que não süo necessa riamente de consangüinidade, embora
43), etc. na maioria das vezes sejam concebidos sob essa forma.
35.
33. Assim teria se formado o clã da Tartaru
ga entre os fro­
entre o homem e o animal é mais pa1ticularmence afirmada. Oiz­
Aliás, há mitos Tlinkit em que a relação de descendência
qucses. Um grupo de tarcarugas teria
sido obrigado a deixar o
lago onde viviam e a buscar outro
hábit:n.
: Uma dc.:las, mais pe­ se que o ela onginou-se de uma união mista, se é pos�ívcl dizer
sada que as outras, suportava com dificul
dade esse exerc.:ício por assim, ou seja, em que o homem, ou a mulher, era um animal da
causa do çalor. Fez esforços tão violen

tos que saiu de sua cara­ espécie que dá seu nome ao clã (ver SWANTON, "Social Condition,
pa a . Uma vez começado, o proces
g� 1u espontaneamente e a tanaruga
so de transformaçáo prosse­ Belicfs and Linguistic Re'..nionship, of the 11ingit lndians", XXVJtb

fo1 o anc.:e trai do clã (Em1innie A. SMITH


tornou-se um homem, que Rep. . pp. 415-418).
, "The Myths of Lhe Iro- 36. NCll. 1i'., p. 28-1
539
538 AS FOR.IMç EJ.E.llF\T4RH DA 1'fn
.·I RELIGIOSA

. p. <160 ntrc os
j7. Jbid., p. 179.
'il f\f1t. ·rr. W1TI, p. 116; 1..
ura, s , u11tlo HO
cg.
38. \'er livro Ili, cap. li. CL Sl'r.Nl.ER e UILLEN. Sal . 1r Bas u to , P· 221 ·
akdb
) Entre os \'\
o s
ihid. ); entre os
"
Ili ' h11ana, '>egu
-,_,
ndo CASALIS
pp. 18-i t: 201. C:. . Kumai (HO\VITI,
39. Na!. 7i-., pp. 20-i. 262, 28-1
Buand1k . os
'i3 Entre os
\V, li, P· :iSJ.
'
e

40. Entre os Dieri, os Parnkalla. Ver HO\'V'lTI', /\ai. Tr., pp 1 1 1 1 1 1 ;1 (STREHLO


''H HO ihi� ion, Magic and
.ully, diz
l
WITI.
5.
ROTH ("Superstit
§ 7-l) , qu an-
658, 661, 668, 669-671.
Junto ao rio ra h
.

<1 1 . Entre os \X'arramunga, o sangue da circuncisão é bebi 55. nº


h'1hd ne " , i n North Q11ee�1sla 11t�E�=1:�!a!a/<le manh�1, pronun­
'

do pela mãe (Nortb. Tr., p. 352). Entre os Binbinga, o sangul'


que manchou a faca que serviu para a subindsào deve ser suga
do pelo iniciado ( ibid. , p. 368). De maneira geral, o sangue qul'
e
i l 1 1 11m indíg n a
mais
vai dorm ir o
ou menos �ti��·� � . nome cio anim
al pelo qual
prática é faze r
o ho­
d próprio é no�cado O o 1) t e
' "' l'm voz et v dessa
perigos ao� quais po-
ou felt z na caça.
provém das partes genitais é tido como excepcionalmentc sagr.1
111• in hábil
ou p�ev nir os
do (Na!. Tr , p. 464; :Vortb 1i·. p '>98) plo, o homem
.
· al· Por exem
1i'., p. 268.
e an m
1l. Nat.
n1en dess t
e egi'do das
·

r. prot
S
' " �e expo pro\ e'
. estã
de cobra
IJ /bit/., pp. 1-H, 561:!. que tem, por
tote m e:: . espe
uma • - c1e .
_ for regu lannente feita. Nat Tr..
41. /\'ai Tr., pp. <H2, 'l.6-1. O mito, al iás, é gernl na Austrália. 64·' HOWI T , f ·P
in\ ocaçao
11 1orthdas, se es.-;a .
Narr1 11ye1"i, p.
56. TAPUN' T/Je
1 1 .. ROTH, /uc.
lf5. Jhid., p. 627
46. Ibid., p. 'l.66. cil.
<17. lbid. Se todas essas formalidades n:lo forem rigorosa­ ,
110\\ IL p. 58.
58. JIOW ITf, p.
mente observadas, acredita-se que gr.t\es calamidades resulta­
57. STRD-
1�8.
l
rão para o indivíduo. PP· ">9-160
59. .Vo11. Tr ,
<18. /\'ai. Tr., p. 358: No11b. Tr., p. 604.
'"-ª'· T1 .
60 Jbid.
19. O prepúcio, uma \·ez separado pela drcuncis:1o. às ve­
- . 202-203. " .
6 1 . Jbid. , p. 2:>5;
62. A L. p C
AME R ?, !'6�
N ., Two Q ueensla
nd
\ ll ,
Tribes ' in

.
zes também é ocultado dos olhares. como o sangue. Ele tem vir­ ccil}u1mia l. 190·1,
.r'\Ja
\tUniC<! U
;
llldes especiais; por exemplo. assegurJ a fecundidade de certas n s
A11 sw11 A 11thropologi
trala

lH. co\. 1 .

espfries vegetab e animais ( Norlh. Tr., pp. 353-35<1). Os pêlos


tia barba são assimilados aos cabelos e tratados como tais
( Nortb. Tr., pp. 5-t4 , 604). Aliás, eles desempenham um papel
nos mitos Uhid., p. 158) Quanto à gordura, seu caráter sagrado
c:t1pít11 /o /li

t111d Kunt ai, P· l


\·em de su a utilizaçil o em certos ritos funerários.

1 . Kc1 m i/aroí . �� bes" , J.A.I. XIIl , p. 300.


e Austrahan
50. Isso n:lo significa que a mulher seja absolutamente pro­
2. Notes on . � N 4·. BROUGH-SMYT
.

fana. '\ios mitos, pelo meno:. entre os Arunta, ela dt:se mpenha som
la-
H,
lTI K m
'�is6 :>� J-IQW ,
·

A11st ralia11 Rac


'
a
ria. !, P· 9 '
um papel religioso hem mais importante que o que tem na reali­ CUR R. i
3. Em .
dade (Na/. Tr., pp. 195-196J. Além disso, ela toma pa1te em cer­ lgi11es of Victo
7be Abor
,.01 wu:/ fútr1
1a1. p. 168.
e i\.lAU SS, ·o
tos ritos da iniciação. Seu sangue, enfim, tem virtudes religiosas itivcs
form es prim
(\ .Vai. Tr., p. -t6-t: cf. -ia prohibition de !'inceste et ses origi­ e que\q ues
nes", Am1ée svcwl. l, pp. 51 ss.).
4 . DU RKlIEIM .
ss.
sociol.. vi. PP· 1
· on· • in Année
É dessa de class1fi1cat1·
5. CUR R. IU.
situação complexa da mulher que dependem as in­ 461
p pessoa. D. S.
6. Curr
pela mesma
terdições exogâmicas. Não falamos disso aqui, porque elas se li­
e Fiso n fora m .mformados
gam mais direcamente ao problema da organi zação doméstica e
matrimonial. Stewart.
540 AS FORMAS ELEllE/\TARfü DA 1 WA IUJL/G/O.V. 54 1

7 !'.IATIIEWS, "Aboriginal Tribe.� of N S. Wale�


and Vicro 19 J l\IATllfW, Ttt'O Repres. Tribes. p. 139: THOMAS, Kin-
in /011mal mui Proceedings o/tbe Royal Society of 111/1 and Mariage,
J\ s \
V. etc, pp. 53-5-l.
les, XXXV I II, pp. 287-288; HOWTIT, Nat. Tr., p. 1 2 i
na·

. . . . a
20. Por exemplo, entre os Osage (ver DORSEY, "Siouan So­
8. A forma feminina dos nomes dados por J\lathew
s é: Gu­ u11logy", in X\/tb Rep., pp. 233 ss.).
.
r�>g1kurk e Gamacykurk. São essas fom1as que
1 lowitt reprodu­ 21. Em Mabuiag, ilha do estreito de Torres (HADDON, /lead
z1t� com uma ortogi fia ligeiramente diferen
te. Esses dois no 1/1111/ers,p. 132). Alias, a mesma oposição verifica-se entre as
:a
_ equival d11;1s fratrias dos Anmta: urna compreende as pessoas da água, a
1 11llra, as pessoas da terra (STREHLOW, I, p. 6).
mes, aliás, ao entes aos que são usados na tribo do

Mont-Gamb1er (Kumita e Kroki).
9. O nome indígena desse clã é Dyàlup, que 22. Entre os lroqueses, há duas espécies de torneios envol-
Mathews não os
traduz. M:1s el>:>a palavra parece idênrida a Jallup, 1.-ndo as duas fratrias ( Morgan, Ancient Society. p. 94). Entre
pela qual Ho­
\\ lll designa um suhclã da mesma
tribo e que ele traduz por
l l .1ida, diz Swanton, os membros das duas fratrias da Aguia e do

' mscar
1 orvo ·são com lrequência considerados inimigos declarados.
lantlos e mulhcn.:s (qlll. sJo obrigatoriamente t.k fratrias
11111.<;:,e/, marisco. mexilhão. Por isso acredita mos roder a .
tlifL
c.�sa tr..tdu�Jo
1 0. É a traduçã o de Howitt. Mathew s traduc 1.-ntes) não hesitam cm trair-se mutuamente" ( 7be Haida, p. 62).
a palavra :mi-
( Wartwur) por calor do Sol ao meio-<lia. a Austrália, essa hostilidade se traduz nos mitos. Os dois
1 1 - A tabela de Mathews e a de Howitt estão em 111.iis que servem de totem às duas fratrias costumam ser apre­
�n� rn�i'> . desacordo
•l'ntados como perpetuamente em guerra um contra o outro
11 cr]. tvlATHEW, Eaglebau•k and Crow, a Study o/ Australia
de um po to m i portante. Parece inclusive que º" clãs
'. �


n
11
,1 nbu1d s por How1tt _ fratria Kr<;>ki são contados por �l::llhews
pp. ss.). Nos jogos, cada fratria é a rival natural
dJ outra (HOWT1T, Nat. Tr., p. 770).
�,1 f�tr:a Garnutch e vice-versa. E urna prova tbortgines,

das grandes difi­

23. Porrnmo, é sem razão que THOMAS acusou nossa tco-


<.: ld tdes
cias nao �ao relevanres para a questão de que tratamo
, �ue apresentam essas observações. Mas tais dbcordân­

12. Sra . Langloh PARKER, TbeEuab/


s. sobre a gênese das fratrias de não poder explicar sua oposi­
a.J'u1 Trib 1
( Ki 1ship a11d Jllarriage 111 Australia, p. 69). Não julgamos,
1 ia

. . os ' - vistos
e• pp. 1 2 ss.
.
l3
n10
1atos serao
l t. CUtm, Ili, p. 27. Cf. HOWTTf, Nat . ·
mais adiante.
, ,., p 1 1 2 L.1 m1· ta
.. . . porém, que se deva reduzir essa oposição àquela entre profano
•-
mo-�os a � .1tar s � t s mais característicos . Para os detalhes, ver e sagrado (ver IJ E RTZ, "La prééminence de la
main droite", in
? � �
r

· As coisas
no.;•s.i d issenaçao ia citada sobre as classiíic.:ações
. Nevue pbil., 1909, dezembro, p. 559). de uma fratria

l 5. lb1d., pp. 34 ss.


primitiva s. não são profanas para a outra; ambas fazem pane de um mesmo

16. SWANTON, The Haida, pp. l3-l4, l?, 22.


sistema religioso (ver p. 152).
o
. J lss? se manifesta particularmente en t re os l laida. Para
�· 2'Í. Por exemplo, clii da Árvore do chá compreende as
portanto os herbívoros (ver Kamilaroi and Kun1al, p.
Swc1.nt_o1_1, ,

í certamente isso que explica uma particulalidade que Boas


1 69). �
. pastagens ,
� les, d1�
,
todo an11nal tem dois aspectos. Por um lad o
e �
u m ser or 111ano que pode ser caçado e comido;
, assinala nos emblemas totêmicos da América do Noite. "Entre o
s

llinkit, diz ele, e em todas as outras tribos da costa, o emblema


mas 30 mes­
mo te1�po, e u m ser sobrenatural, que 1em a forma
exterior de
um animal e do qual o homem depende. Os seres
de um grupo compreende os animais que servem de alimenro
co rr s
!i
míticos ue
aquele que dá seu nome ao gnipo· (Fifth Rep. o/ tbe Committw
� ��ndern aos diversos fenômenos cósmicos têm a me ,
amb1gu1dade (SWANTON, íbid.. pp. 14, 16, 25).
a
etc., Brilisb Associalion/or tbe Advancement o/Science, p. 25).
18. Ver P· 139-140. Ocorre assim entre os Gourditc 25. Assim, entre os Anima, as rãs são associadas ao totem
hmara
( HOW11T, Nat. Tr., p. 1 24), nas tribos observadas do eucalipto, porque cc.n freqüência são encontradas nas cavi­
por Cameron
can­
perto de Mortlake e entre os Wotjobaluk (HOWIIT
' Niat• .,.,
Ir., pp. dades dessa árvore; a água é associada à galinha-d'água, o
125, 250), guru a uma espécie de papagaio que se vê freqüentem enre es-
542
DA 1 70.1 REL!GIC
IM
ASFORJIAS EIEllF\
TIRFS'

animal < SPE'\CER e.


l 16-J.J7 HHl. G I LLE·,\l. ,\at Tr pp
voaça r ao redor desse
'

• JUl' '""em de man.:o:- a cla.!>.'>ifü:açào (\'er p. l'll). Ora. as pts


suded,tde, como �e recordam. são as classes matrimoniais
a ba . n�JO . . . ·a
e
26. Lm do;, smais
Ml ' de uma classe não apenas podem comer dos animais aui­
des
s mdisu .. pnm1u
bu1 as vezes aos gêne
� �
s� �
que se arn

ros u a �rnronal. assim


sõe.s sociais com as
quais eles .
1�1 1'.1 lmente se �
como às div1
confu ndiam . A.�
h11 1do.'i a essa classe, como não podem comer de ou/ros. Qual-
A

z uni,
- · na Am�
sim, entre os Wori'ob

1 J \ CLRH, I li, p. 27).


aluk• na usna lia 1 1 ' ll'r outra alimentac:<1o lhes é proibida (HOW!Tr, Nat. Tr., p.
epanidasli idea 1 mente
. • e enlre
os
·
nca, as coisas são r ·

entre as diferente
giões do espaço da
mesma
;

na qu os elas. Ora,
s rt
� Disso n:io !.e de1·e concluir, porém, que esses animais sejam
s comc1u.em (n�r De
l?l !. u fi
regional das coi a..� a repartiçao
e a . c1ºa- .
1 1 1nsiderados profanos. Observar-se-á, com efeito, que o indi\·í-
. tio11
do �

�P· 3 I s.s.). As cla.'>.s 1f1rnções cem.


. . ·
m p es nmlfn'<!S de clc1ssifica . . . . i eq es ur 1110 nao tem simplesmente a faculdade de alimentar-se dele, mm,
'
re1a1ivn men1e avança csp·rc h 1 ' esmo entre pm
servam inclusive alg
o desse, caracer
·o, 11 1

Ora, esse car:íter imperativo da prescriçao é o sinal ccr'lo


1 1hrigado a isso por c:ausa da proibiçào de alimentar-se de outro
1nntlo.
CI '. .
'

ll '.1,1
55 s.s.).
S"� iil.,_ pp.
'

dos, como '. .

l i<..tona, J, p. 9 J .
27. BH IDG MA NN ,
in BH O l H 'i.\n ��
1 11 . 'fle ,1horigi11es
ill que estamos em presenÇ..11 de coisas que têm urna natureza re-
,,. :-a �ó que.. a rd1gios1tladc c:om que C.'>ÜO marG
28. FISO'\ e HOW
1 uj
. j.:<'111 a uma obrigação positiva, e não a essa obrigação negalirn
t ua� dcu nri­
1TI' !(,am1·1.am1 anti
\\'!TI. "Fun ler 1 • l\ott:s q 1t é uma interdição. Ta lvez até não seja impossível perceher de
Aurnai• p. 168· HO
XVIJI, p. 60. }.11.J.,
. on the .
A U.'>tra

.
1 ian
· Clas.s. Syste ms",
29. CL H H, Ili, p. 'l6l 1 �·l l que todo indivíduo teria uma espécie de direito de proprie­
que maneira pôde ocorrer esse desvio. Vimos mais acima (ver p.
. Trarn-se eI·'1 tn,,o . ._ (1o
Mont-G ambier.
• '

iefs", }.A !., XT!f, p.


30. f!0\Vf1T, On ' l.1de sobre seu totem e, ponanto, sobre as coisas que dele depen­
• some Australian Bel
191, n J . ' k•rn. Basta supor que, sob circu nstâncias especiais, esse aspecco
\ ustra 1·ian J\!e�\age
X'\ 1 li p · 326· "Funh
3J HO\VJTI "i'\ote
, er f\oces" }A Stick5" }.A I
s on ' d.1 relação totêmica !.C desenvolveu, e d1egaremos naruralmente a

. 1 ' X\l!J . P 61, n2 -�


·
• ·
• ·
· · • '"por que os membros de um clã seriam os únicos a poder dispor
"
32. C(;RH' ffJ ' p. 28.
11ao teriam o direito de tocar nele. Nessas condições, um chi só
lc seu totem e de tudo que lhe pertence. ao passo que os outros

bes of i\ '\ w
33. MATITEWS' .. Ethn
1 1es
'
olog ., otcs on the \bo
and Victori a"· in · }°11111
> ica. I "

-• or
l riuina
:t 1\· s IVª�es, '
wa " l Tli·
"
vv "' 43. A sra. Parkcr utiliza a expressão 11111/tiplex lotems.
poderia alimentar-se das coisas que lhe dissessem respeito.
�•
.
·

'IIJ, p. 294.
·

·
cieti · cmd Pmc. oftbe R. So-
�-1 Cf. CLRR, Ili. p. 461, e HO\\ 4'1. Ver como exemplos a tribo dos Euahlayi no livro da
ITT .\at T!. p. 1·16. As ex-
\\ingo ªP1 .rc:am-se a
.
ambos"
pressocs Tooman e
.35 . llOWJTT, Nat. Tr.,
·

�ra. Parker Cpp. l 'i ss.) e a dos Wotjobaluk (HOWITT. Nat Tr .


. .

123
p. pp. 121 ss.; cf. o anigo de Mathews já citado).
36. SPENCEH e G H .
, LEN' N.at. í . r., pp. 147 ss.; 45. Ver exemplos em HOWJTI, Nat. Tr., J1. 122.
I l i , pp. xii ss. STHEJ-!LO\X', 46. Ver De quelquesfonnes primiliues de classificalio11. p .
. 28. n . 2.
K.an11/aro1. a11dK11r11a
37. FfSON e H0\\7JTI
38. elJHR , JJJ, p. 462. i' p. 169.
·

18. Nat Tr. . p. 1 1 2.


'17. STHEHLO\v, 11, pp. 61-72.
.

39. �ra. PARKER, 7be


Ver particularmente Nat. Tr., p. 447, e Nortb. Tr. . p. 1 5 1 .
Euablayi Tnbe. p.
, Nmtb Tr , p. l'il , i\at. Tr.,
20.
p. '1·17:
40. SPENCEH e GJLLEN
Sf'HEJ-!LOW, 111, p. xii.
49.
50. STHcl ILOW, Ili. pp. xiü-xvri. Acontece estarem os mes­
N Nat T'r · p. 419
4-.,· r 1a, ·
4 1 . SPENCER e GllLE
• no entanto
• ·
mos totens secund;'.írios ligados simultaneamente a dois ou três
·
-
' cenas tribos d0 Queens totens principais. Sem dúvida, Strehlow não pôde estabelecer
grupo soeia 1 nao
coisas assim lig� . land cm que as.
º das a um com certeza qual desse� totens era realmente o principal.
. É sob
..

membros desse grupo sao proibidas aos


retudo o caso dos l Dois fatos interessantes. que se deduzem desse quadro.
\\' akelbura. \les-
confim1am algumas proposições que enunciamos anteriormente.
545
544 AS FORMAS EU!.llF..WARFS DA 1WA RELJGIO.V.
:\Tl/ilS

, r proib .lo não implica que


causas
c.�1e seja um cocem. Outra<;
Primeiro, os lotens principab são quase todos animais. com r.1 da, a unid ade religiosa
!>e·
o. Sem c.Jú,·i
p•>•IL·m e.lar origem à interdiçã
��
ras e c çc�s Segundo o� astros nunc;a :.ào mais que 101en1>,
, 11.1 1ribo é real, mas é com
a ajuda de outros símbolo:.
que ela se

c ndanos ou �l'>SOCiados. E mais uma prova de que esces últimos
. 1l11 111a. Mostraremos mais
adia me quais são esses símb olos (livro

1 1 , <ap. !Xl.
so tardiamente foram promovidos à dignidade de 1otens e de.'
que os totens principais foram primitivamente tomados de pre­
ferência do reino animal.
5 1 . Segundo o mito, os totens associados reriam, durante os
11/11/11/0 IV
i_n ?
1
1e p s fabulosos, servido para alimentar as pessoas do colem
da está
l . Os totens são bens da tribo
principal, ou, em se tratando ele árvores, oferecido a elas sua no sentido de que
'
sombra (STREllLOW, llf, p. xii· SPENCER e G LLLEN' Mal· -r 1 r' ., )). que cada clã deve a seu
totem.
402) , 11vol vida por inteiro no culto
l.. fRAZEH fez uma lista basw
· O ' r 1to de que o rotem associado fosse consumido não im- s relati -
"lorte ( Totemism
.
� nte com pleta dos tl!xto

d d l
.
pl��ª· alias, qu� o considerassem como rrofono, pois, na época rica do
c in i vi ua na Amé
1 , " ,10 totcmbmo

111ul E.xogamy, W, pp. 370-'156)


.
los antepassa dos, fundadores cio clã.
m1t1ca. o rropno lotem pri n ipa l, atrcc.lit.i·s<.:, era consumido pc

3 Por exemplo, entre os


os Al­
Huronianos, os lroqucses.
52. Assim, no clã cio Gaco Selvagem, os desenhos gravados
_ Notwelle Fra11ce, VI, PP·

ge au pays des /111ro11s. p 160)


flisto ire de la
�1 1nquins (CHARLEVOLX,
t.7·-o: SAGARD , Le Grand \'oya

no chunnga r presentam a árvore de ílores Hakea, que é hoje .
um totem ?1s1into ( PENCER e G I LL E1\, Na/. Tr., pp. 147- J..1 8).

.

STRE:iLow _c m . p. x11, nora 4) diz que o fato é


Thompson !11dia11S o/ Bri·
freq
<TEI T, 71ie
1·111re os indios Thompson
: R e GILLE:"( Norlb. Tr. p. 182· Na/· Tr., pp · 1 5 1 tf\h Co/11111bia, p. 355).
üente.
::
>3. SPE !'\CE_ ' ' Nat. Tr., p. 133); dos Kur-
e 297. -1. É o caso dos YUlN (HO\VllT,

11.11 ( i/Jid., p. 135); de várias tribo


s do Queesnland C ROT lf, "Su­
54. Nat. Tr., pp. 1 5 1 e 158. 10-
55. lbid. . pp. 4-i7--H9.
", Nortb Quee11s/a11d Etb1
p. 19�);
and Med icine
peN ition , Mag ic
[.!r<1pby. Boletim n" 5, p. 19); (HA
Head 1/1111/ers,
56. Assim, SPEl'<CER e GILLEN nos falam do pombo cha­
DDO !\,
An Acc n1111 1 nf the H1s­
mado lntun1a ora como de um tmem principal (Nat. Tr.. p ·HO>. u11r c os Dela ware (HE CKE l.\\'fL OER .
os índios Thompson
ora como de um totem associado (ibid., p. 1 18). Salis h Statlumh (ll ! L L TOU
238); entre
tu11•... of tbe Jndian /\atio11S, p.
355) ;
T,
57. HOWITI, Fw1ber Notes, pp . 63-6-1 . ,
e os
XV
entr
XX
1 1 FIT, op. cil., p.
., pp. 147 ss. )
58. Assim, com muita freqüência, o clã foi confundido com a
Statl umh ", j.A.l
5. 1 llLL TO UT, toe. cit., p. 154.
lkp. of rhe Ethnol. of the
.
fu � ' q b c çõe 1876 , l,
. especi almente por CURR (I, pr. 61 ss.).
dos e no � os , foi feita 6 . CATLIN, Mcumers a11d
Lnbo. &:sª con s o u e causa segu idos pro lemas nas des ri s C11stoms, etc., Londres,
t lg
59. E o ue acontece em particular entre os Warra m un a ,, 16.
es, nova ecl. . VI, pr. l 72
q g
7. Le/Ires édifia11tes et c11 rleus
ss.
(Nortb. Tr., p. 298).
VI, p. 69.
8. CHARLEVOIX, op. cil.,
6?. Ver, por exemplo, SPENCEH e G!LLEN, Nat. Tr., pp. 380 Rep., p. 443.
9. DORSEY, Siouan C11!1s,
X/lb
10. 130AS, Kwakiutl, p. 323.
61. Poder-se-ia mesmo perguntar se não existem às vezes
e pass1m.

. s. Assim, entre os Aruma há um animal, 0 gato sel\'a· 1 1 . Hill TOGT, toe. cil., p. 15-i.
12. BOAS. Kicakiutl, p. 323.
nbai
totens t
? � � 13. 5rta. FLETCHER, "The
em. q c s rve de totem a um clã particular, mas que é interdito y
Imporr of the Totem. a Stud

mer desse animal muico moderadamente (Nat. Tr., p. 168). Con­


a tnbo inteira; mesmo as pessoas dos outros clàs só podem co­
be" Smilbso11ian Rep. for 1897, p. 583). Fa­
r
op. cil., pp. 354, 356;
! t om the Omaha T i
os em TEIT,
p. 87.
tudo, achamos que seria abusivo falar, nessa circunstância de '"' �imilares serão encontrad
, ! '�·Ler JONES, History o/tbe Ojibway lndians,
um totem Lribal, pois o fato de o livre consumo de um ani mal
. -·· -- .t. -·-- �- .,r�

l'TDA REUGJO\A
549
548 AS FOJlllAS E.LEllE.VTARES DA 1rtS

em realidade, totens pessoais. Mathews quer provavelmente di não se efetuaria. É que


,.1 urado. a [ransmissão
o sopro, e.orno
sop rare m a pele do animal,
alm a. Ao
" mos mai:, adiante, é a
1 inl<> 0 feiticeiro como o jovem
zer que cada indivíduo escolhe seu totem individual num círrnl1 de suas almas que
exalam algo
de coisas relacionadas ao clã de sua mãe. Veremos, com efei10
po que se com uni � a � �om a natu-
penetram, ao mesmo tem
11 ,1 do animal, que tam
que cada clã tem seus totens individuais como propriedade t:\ moma sob a for-
. bém coma parte na cerr
clus1va, os outros clãs não podendo dispor deles. Nesse sentido
.
o nascimento determina numa certa medida, mas nessa medid.1 111.1 ele seu símbolo. ill Tout's V1-
rther Remarks on Mr. H
in Man, 1904, p. 85.
48. N . w. THO MAS , "Fu
apenas, o totem pessoal.
38. J-lECKEWELDEH, "An Account of the History, Manncr� 1•ws on Totemism",

and u�toms of the l ndian Nations who once inhabited Penns>·I


� cit., pp. 20, 29.
XX XV, pp. 143 e 146; 1b1d., XX
49. Langloh PARK.E R, op. . .
vanra , rn Tra 11sact10
XIV,
. . 11s ofthe llistorical and Literary Commillí�' 50. Hill TOU T, in] .A.l .,
oftbe American Philos. Society, l, p. 238. " n-1. Im,ians
. , p.
30; TEIT, 7be 11Jumpson
XV , i-1.
5 1 . PARKER, op. c1t., p .
•o. Hill TOUT, inj.A.I.. XX
op cll.. l. p. 37: Srta l'Ll:.ICHEH, "The lmport of the Totem 111
�9. Ver DORSEY, "Siouan Cult!>", Altb Rep., p. 507; CATU\ .
p. 1

5111ilhso11ia11 Rep.f 1897, p. 580; TEIT, 'l7Je 77Jompson fndi;n".


69.
53. Hill TOlJT, ibid. , p. 145.
52. CHARLEVO IX, VI, p.
pp. 3 1 7-320; l l ill TOUT, j.A.J., XXXV , p. 144.
_

e uma ar­
40. Encontramos, porém, alguns exemplos. É em sonho
de uma criança, planta-s
54. Assim, no nascimento dita- se que sua
acre
\'<>re que é cercada
ele muitos cuidados, pois
( f-IOW in- . Na t. Tr. , p . 387; "On Australian Medicine l\len , in • irte e a da criança são solid
que os feiticeiros Kurnai têm a revelaç<io de seus totens pessoais no seu Gold e11 Bo11gh,
ZER ,
remc_:�eme a
ária s. FRA

, U, PP· 1-))).
crenças que traduzem dife
Perseus
r i·lata vários costumes e
llll..'Sma idéia (cf. HARTLA
Leg
}.A.!., XVI, p. 3'i). Os habitantes do cabo Bedford crêem que.
ND, e nd of
coisa é o totem pessoal da primeira pessoa que ele encont;ar na
quando um velho sonha com alguma coisa durante a noite essa W11T, �a­
pp. 148 ss.; FTSON e HO
55. HOWITT, Nat. Tr.,
manh<i seguime (\l(f. E. ROTH , S11perstilio11, Magic and Medicine
ON , A11s tra/ian
bém
lll ilaroi and Kumai,
pp. 194 , 201 ss.; DA WS
p. 19). Mas é provável que, por esse método, só se obtenhar �
nala -o t a m no Que ens lancl
RlE assi
ces ofEarly Que
1/Jor igines, p. 52. PET .
ensland, pp. 62 e 118)
. of the R. Society ofN. S. Wal
t�tens pessoais complementares e acessórios. pois, nessa mesma < rom Petries Remi11iscen es,
56. journal and Proceed
\XXV!U, p. 339. Os War
tnlx>, um outro procedimento é empregado no momento da ini­ uint e cos tum e: ante s
ramunga têm o seg
?
'i l . Em certas tribos de que fala ROTH Ubid.); em certas ui­ .i.... s epultar o morto, reti
ciaçiio, como afirmamos no texto. do braç o; se for uma
r a-se -lhe um oss
o plu mas de
lucro em que e guardad
mulher junta-se ao invó
42. Entre os Wiradjuri (HOW !TT, Na!. Tr. , p. 406; "On Aus-
bos vizinhas ele Maryborough ( HOWITT, Nat. Tr., p. 147). Tr. , p. 169).
i·ma· s� for um homem,
rth.
plumas de mocho (No
l )cv�-se ver nele um traç
o de tote mism o sexu al? .
43. ROTI!, toe. cit.
[ralian Medicine Men", i n j.A.J., XVI, p. 50). seJ1.'Ual tena
caso em que cada grupo
57. Cita-se inclusive um ariam os t� tens
m, os Wurunjerri acumul
44. HADDON, Head H1mters, pp. 193 ss. dois totens sexuais; assi tjoba­
Kurn ai (em a-ga rriça e toutinegra) e os dos Wo
45. Entre os Wirndjuri (mesmas referências anteriores, no­ -.cxuais dos , Nat . Tr., p. 1 50.
nigh tja1') . Ver HOW ITT
ta 2). luk (morcego e coruja
58. Totemism, p. 51.
59. Kamilaroi and Kur
16. Em geral. parece que essas transmissões de pai parn fi­
lho só se produzem quando o pai é um xam<i ou um feiticeiro. É
por MATHEWS , toe. cit.,
nai, p. 215 .
p. 339.
o caso i�ua lmente entre os inclios Thompso n (TEIT, 77Je 7bomp­ 60. THRELLDKE, citado
148, 1 5 1 .
6 1 . HOWITT, Nat. Tr., pp.
'17. Hill TOlIT (/.A .!., XXXV, pp. 146-147). O rito essencial
so11 f11d1ans, p. 320) e entre os Wiradjuri, há pouco mencionados. , Nat. Tr.,
ai, pp. 200-203; HOW1TT
62. Kamilaroi and Kurn essa s luta s san-
. p. 62. Entre os Kurn ai,
é o que consiste em soprar a pele: se não fosse corretamerne p. 149 : PETRlE, op. cit.
A RELI6/IJ SA 551
510 AS" FOR.llASEi.E.llE.\TARB DA 1W
JT,IS

x 1 1·11'à< os réplcis (cobras, laAartos. etc.) seriam portanco os


i.:rcmas terminam com frequência
em casamemos, dos quais �
prl1 1dros animais ,, st.:rvir de reccptáculo às alm;is dos mortos e
urna e.spéue de pre:i mbulo rilua
l \s \'<:zes, tarnbcm. e� ha11
lhas se lransformam em simp
les brincadeiras (Pl:R
'!
63. er sobre esse ponto nosso
estudo sobre: "La proh ihl
:''T IE, /oc. cit. I
111penhar o papel de rotens. Somente depois, outros <�nima is e
u�11n teriam sido tarnhém os primeiros a ser venerados e a de-
r1on de 1 nceste et ses origines",
i
.
111 plantas e objelos inanimados teriam sido clcvados a mesma
.

?4. in A nnée socia 44 ss.


nte (cap . IX) que existe u1111
l. , pp.

rclaçao entre os totens sexu


No enta nto, veremos adia
r
de prova. af rma (Mytb11s 1111d Reli io , li, p. 269) qu
d1�•.11idade. Mas essa hipótese não se apóia seque num começo
ais e os grandes deuses. WUNDT i g n �
, ,. n:pteis são totens bem mais difundidos que os oulros ani-

Ca/)Í/11/0 \'
111.11,, donde conclui que são mais primitivos. Mas nos é impossí­
\ l'I perceber o que pode justificar essa asser�ào, cm apoio d 1
q11.1I o autor nào •lpresema nenhum fato. Das listas de totens foi'.
1 Cil'llsatfo11 pnmitive, 1 , p. 165, li,
: 1 ,1 , 'eJa na Austrália, :.•·ia na Amérit.1, nada indita que uma espt.-
10 1em1sm \\ i!h special refer
•. i
p. 305; "Remarks on

cermng iC, inj.A./., XXVTII e 1 e<111


t.•nt.t. to some mtxlt:rn theories 1 le mimai qualquer tenha desempenhado em al�uma pane um

1 1.1pel preponderante. Os lotens rnriam de u a regiào a <:utrn



, onforme as condições ela fauna e da flora. E, ameia que o circu­
da nova série, p. 138.
2. / let A11imlsme bij den \'o/ken
pel, pp. 69-75.
van den indischen Arcbt

3. TYT.OR, Ciuilsatio
lo onginal dos totens fosse tão estreitamente limitado, não se
11 primifive, JI. p. 8.
1 . lhid., pp. 8-2 1 .
i pncebe como o t0temismo teria podido satisfazer ao princípio

5 . G . McCall 1HEAL, Recoreis 111l·sma tribo elevem ter dois totens diferentes.
l 1 1 ndamen1al em virtude do qual dois clãs ou su bc s de uma
of South-t:astem A/rica, VII
�onh :
cemos esse trabalho somente
através de um artigo dr 13. "Adoram-se às vezes certos animais, diz Tylor, porque
f l{AZ l: R. "South African Totemism :>.10 vistos como a encarnação da alma divina dos antepassados;
". publ icado em Ma11 1901
n" 1 1 1 '
6. CODRl'\"GTO;o.. . 7be Jlela nesia
t'"'ª crença constitui uma espécie de traço-de-união entre o culto

11s, pp. 32-33. e cana ixs


'ºªI � o�11esmo auro; eirada por n L
OR em }.A f. . '\,'\\ Ili. p. 1-1- li p 305; cf. p. 308 in ft e) . Do mesmo modo, \XTL\JDT apresen-
p1t:stado aos manes e o culto aos animais" (Cil'ilisafiu11 primilin•,
n
1.1 , rotemismo como uma seção do animalismo m. p. 23-1)
14. Ver p. 131.
Essa e tamhém, com poucas nuan
por \x·ui:-.iDT
(Jl�11th11s 1111d Reli io11, li, p.
g
ças, a .�olução adotada

15. fntrod11crio11 to tbe Histo1y o/Religion, pp . 96 ss.


269).
8. E verdade que, para 1YLOR,
o clã não é sem1o uma fa.
� s gru­ 17. É o que o próp rio jcvons reconhece: "Há razões para
mília a1 1pliada; portanto, o
que se pode dizer de um desse 16. Ver p. 10.
ao outro (!A .!., XXV III, p. l57).
pres um ir , diz ele, que, na esc l a de um a l ad o, o ho e
pos a plica-se, segundo ele,

ma i s conwstáveis; a enas o
p
Ma' oh i m m
su õ preferir. .. a espécie que pos u sse o maior poder" (p. 101).
devia
tote m , o qual so a dquire plen
cssu concepçà� é das
clã p e o s í
18. S egu nda ed., III, pp. 416 ss.; ver particularmente p. 419 ,
o sentido no e através do clã.
9. No mesmo sentido, ver A. LA
G, Social OriRins, p. 150.

f RAZER expôs uma teoria cliíerenrc. mas que, no entender dele,


nma 5. Em artigos mais recentes, que serão anal isados adiante,
10. Ver acima, p. 134.

l 2 \X'undt, qut.: retomou, em sua!>


1
1 . CiL'ilisalion primitive, II,
p. 23.

19. "The Ongm of the Tmemism of the Aborigmes of Bri­


náo exclui completamente a do Golden Bougb.
lmhas essencia1i. a teoria

de T) lor. lentou explicar de
outro

modo essa relaç-Jo isreriosa
cla, 2• série, "11 , 2j seção, pp. 3 ss. Ver também "Report on 1he
t! tre o homem e o ammal: o tish Columbia". in Proc. a11d Trmzsac. of tbe R. Society of Ca 11a­
espetácul o proporcionado pelo
ca­
Lthnology of the Statlu nh", j.A.f., XXXV, p. 141. Hill TOUT res­
daver em decomposiç-.10 é que
teria sugerido essa idéia. Ao
ver
pondeu a diferentes objeções feitas à sua teoria . no tomo IX ele
os \·ermes escapando cio corpo
, o homem reria acreditado que
alma eMava aí encarnada e esca a
pava com eles. Os vermes e,
por t
' 'ans. of he R. Society of Canada, pp. 61-99.
/i
546

1•1. �
AS FOIWAS FLE.llEATARES D1I l7D
A REJc,J

Í o caso, por exemplo, do cão entre º" S alish Statlunlh,


1\

'" A
. " 11 nao
ss1 - há • entre esses
animais proretores
·
K re
547

e )s fc i-
clitou poder est.1-


1
rca�·ao que rRAZER
por Lausa <lo e"cado de servidão em que ele ,·ive (l lill TUl rha de dema . do o ser pro-
•· quan
e l fetichismo começana .
toe. cit ., p. 153). 11 ' ' segu ndo _ (Totemism, p.
'.n . v1Clua! , e não uma cl asse
d1
e
o
º

'"' i . i�se um ob1ct _ T l detenninado


.
1 5. Langloh PARKER, Euahlayi, p. 2 1 .
,.

16. " O espírito d e um homem, diz a sra. PARKER ( ibid l. t 1 t 11.1. j na


á Australta, ven tc -
'.� � s que um ani ma
'·Aust ralia n Medici ne
1
er
T
1 ,11 penh a esse papel (V c . � n çõ feciche e
J T
qu as o es de

1
W
tá em seu Yunbeai (totem indi\ idual) e seu Yunbcai está nch:"
' p 3-1). A ver lade e . .
17. Langloh PARKER, op. cit., p. 20. O mesmo acontece t'll 1 • 1 1 .JA ·• l · def 111do.
1 em ' nad a de 1
Ilil i-
· mo não correspon(
XVI

trc certos Salish (Hill TOUT, "Ethn. Rep. on Lhe Stseclis and I• '' 11c111s edings of the Amer.
11
a ·

Skaulits Tribes" ,}.A./., XXXIV. p. 324). O fato é geral entre os 111 '' BRINTON,
Nap,11 a sm. "Proce

:iety", XXXlll, P ·
32 ·
d ios da América Central (BRlNTON, Nag ualism, " A Study in Na ' '' �.>t
VI, p.
tive American Folklore and Jl istory" , in Proceedings of the A1111• .!K. CHAR LEVOT X , thc Srn tlum h of Bri
U on t 1c Ethnol . of
6;-, -

riu111 Phi/osopbical Society, XXXI ll, p. 32). >9 1 lill O ,


42
T T ·'Rcp.

18 P \RKFR ihid · HO\X'ITT, \ai Tr , p 11-. DOJN. \ i h ( :,1�nbi:.t" ./ 1 'V t�,1 aulib
"Siouan Cults", Xlth Rep., p. 443. FrJzcr, por sinal, fez o levanta 50. llill TOUT , "
/ ' '"!'
Ethn o . ep. on
VVV l\f PP • 3 1 1 ss.
the Stseelis and Sk
1
l 1 lhl'S,. ' ·/· A·I. , AfV'.J '
mento dos caso!> americanos e estabeleceu a generalidade da in
terdi(,·ao ( 'fotem sm and Ewgamy, Hl, p. 450). Vimos. é verdadt'. 11 HOW!TT. Na/.
1 h
Tr., p. 1�3.
R op. c1t., p. 20.
\
U. Lang o AR ism , m
i
·
-a View of Totem
que na América o indivíduo devia começar por matar o animal '
1
E
me
K
: 1
P
, A
• .

:� 3. ] . W. pQW ELL " � . � � �ndr ew LAN G ex primi u


cuja pele servia pam fazer o que os etnógrafos chamam um sa
r,
\11111. 1902, n2 84; Tyl� 1 '. : � 1 33-1 35. Enfim. o próprio

1
co-remédio (sac-médecine). 1\las esse costume só foi observado

1.t,.1;1 s ana ' log,1 . em


, s . julga ho1e que,
em cinco tribos. Trr11a-se provavelmente de uma fonna alterad;1 op iniào anterior,
.

Social Ongms, PP · .
1 1( \ZER. recons1dcrando sua · coletivos e
e tardia da instituiç-.lo.
a re la ao entre os totens
,1, que se con
l'eÇ' l mell ior .ç 1 erente ,..,
19. HOWITT, Na!. Tr., pp. 135, 147, 387; "Austrrtl. Meclicim• , á-los por
'
d'f
spirils, convem
des
• '
nomes
Men", j.A.I., XVI, p. 34; TEJT, The Sbuswap, p. 607.
li�, P · �
cl���·� n 1
.\ai Tr . p.
" l•11ard ic111
20. :.. JEYER, Manners and Customs o/ the Ahori� 111es o/ tbl! < ; ·mism .
a11d Exogc1111y. .
os ' u 1 (HO\X'l'IT
Auscr a lia
3-1. E o c�so', na
·

E11co1111ter Bay Tribe, in WOODS, p. 197.


C MEY ER M of the A bo-
H l l e dos N a rn
ms
2 1 . BOAS, V!th Report 011 the Norlh-\'(lest 7i·ibes o/ Cana· 197 ss.) .
a1mers and Custo
'be in WOO PP·
nyen

da, p. 93: TEIT The Thompso n Indians, p. 336; BOAS. Ku·a­ ri�t11es ofthe E11co ' o ao padroeiro do
incli-
DS,
pouc
1111ter Bay
l t'
a .- o
5 "0 se as me i
totem se
kiutl, p. 39'l . 3 . o a uma imag
l ��� à " em de santo
quanto um ' s'
, _

'1 opn '


22. Exemplos em H i ll TOUT, " Re p. of the Elhnol. of the ' 1t1 uo, d.1z Tylor
mo <l se Fr·izer adere hoje <
· iiào
mo
St:nlumh", j.A.l., XXXV , p. 144. Cf. Langloh PA RKE R, op. cil., l /oc cit , p. 2l.
Do mes ao totem de

recus ar agora to ºci� carâter religioso


p. 29. dL' Tylo r, é por 52)
F..�g� my, UI, PÍ
4 .
23. Conforme uma informação dada por Howitt numa carta
adiante, 11, cap. x .
, 1.1 ( Totem lm1 and
ltvto
pessoal a frazer ( Tolemism and é'l':ogamy, I, p. 495 e n. 2). 36. Ver gem de MATH EWS,
entre
gundo uma passa
24. Hill TOUT, "Ethnol. Rep. on the Stseelis and Skaulits 37· Contuclo, se . á rio. " Cada indiv íduo, d'iz
_
'- 1 k tote m �ena heredit
' ' \\ ot )O"ª u o como
Tril'les" j.Al XXXIV p. 32-l. . '
. um objeto inanimado
l, uma !anta ou
25. HOWITT, "Australian Medicine Men", }.A./. , XVI. p. 34; de. tem um anm�a ue herda de sua mãe "
�oa 1
. a n�I
espe cial e pess
C J

LAF!TAU, Moeurs des Sauvage11S a 111érica i11s, 1, p. 370; CHARLE­ "L' U totem p 291). r.tas é ev1-
of ". 5· \ q/ a 'v, ·
m
VOLX. /lisloire de la .Vo1welle France, \li, p. 68. Acontece o mes­ s�a família tivesse
XXXVl ll
uma m e
dos os ltlhos dees,
/'roc. of tbe R. Society
mo com o atai e o tamaniu, na ilha de Mota CCODRL GTO!\ . dent e que, se
em sua mãe tenam,
·

o de sua mae, n
to
·

por totem pessoal


ele s nem
'fbe Melanesians. pp. 250-251).
.-
ASR>R.11AS ElE1
1H.\7'ARF'i OA lID
'>52
A REUGIO.VI ")53
20. Alice C. FLET
CIJEH '"TIie l m por
18,)7
.�mílbsomtm ReJXl t of the Totem ... in
,11 har csqu ,ito esse meio de evitar o perigo. Essa cerimôma é
. pp. 5-ry 586·

21 · 7.be Kwc1kiutl
rtfor
hid·ra11.s, pp 323 ss., ,11 1;il, longm dias po<lem ler tran,,corrido desde o momento em
- "The Deve 1 o
.
.
336-338, 393
•111c o animal foi morto. Durante esse tempo, em que se lrans­
il11tbroip.. n..s. 190
21
l p men c of t h e C l a n .
4' V ' pP.
Sys tem ", i n A mer
• 477-864 .
lnrmou a alma que esta,·a sob sua guarda e o indivíduo do qual
23. f.11 .J, XXXV. p.
.
142. ''"ª alma é o princípio de ' ida? Mas é inútil insistir sobre tudo o
2" lbid . p. 1 50.
cr. ·v11i Rep. on the
t1cs of the N ·.-W T
. que há de inconcebível nessa explicação.
1 s of Canad 31. PARKER, op. cil., p. 20; HOWlTT, "Australian Medicine
. · Phys1c;:il Characteris-
r1Je
acima um miio des j.A.l.,
se .
a" B A A S p. 24. Men
·
mos mais .
ciona- \len", in }.A./., XVl, pp. 34, 49-50; H i l l TOUT, XXXV,
· · · ·

p. 146.
·•

25. .f.A .l., XXXV, p.


·

147.
.

llpo.
26. Pmc. a. Traii.sac
etc., VJJ, 2� seçúo, p. 32. Segundo o próprio Hill TOUT. ''A doação ou a 1rans-
27. Ver n )n� "ro
' ic.
' e n Bougb lll
pp. J)
12.
.z - 1 ·"'�· WTL1"
111íssão (de um lotem pessoal) só podem ser eíetuadas por çenas
EN JÜ havia
••

I
assin al:1clo ' ,
fatos a n á l o pessoas como xamã ::. l u homens que possuem um grande po­
t!�os c", i n Dt G id."

lcr mistl.'rioso" (j ·I l XXXV p. 1 46). Cf. Langloh PARKER, op.


em De Simsonsag
hen M nschen-Dieren
1890 ; "De Betre kk in '"
ven", in lndiscbe Gi
l
cn Plan tenle-
d:: �
f k
1we colo11iale inlernat on a 1888 886-; Ueher das Haarop fer", in Re-
pp. 29-30.
.
33. cr. HARTLAND, "Tocemism and some Recem Discove­
e il.,

18. or ' l
.
1 887.
p
-
ANN em Die E111g
exemplo, EYlM ríes", Folk-lore, XI, pp. 59 ��.
<!IJOrcm•11 der Ko-
eii, p. 199 34. Com cxceç;.1o talvez dos Kumai. Mesmo assim, existem
. .

lo11ie S1/dcms1ra/i
29. Se o Yunbea i d

iz�
e sra. PA IUCER
nessa tribo, além dos lotem> pessoais, cotens sexuais.
35. Entre os Wotjobaluk, os Buandik, os Wiradjuri. os Yuin
layi, ··confere um a ?ropósito dos Euah­
a for' -a xce _
excepcionais, pois
pc1 on,, 1I , Lambem exp
� que fere o an11
. õe a perigos
11al fere o homem" (Eu
tudoç a s tribos vizinhas de Maryborough (Queensland). Ver HO­
layi, p. 29). \VIIT, /\'ai. Tr , pp. 1 1 4-147; l'vlATHEWS, ]. of R. Soe. ofN. S. \Yla­
l'
ab-
30. Num trabal ho Po
en. r ( 1,hc
"
. /es. XXXV III, p. 291. Cf. THOMAS, "Further Notes on M. H i ll
Tbe Fort11igh1!�· R >ie . r:. � Touc's Views of Totemism", in Man, 1904, p. 85.
. .
, Ongm of
Tme mi�m-. in
FHJ\ZER levan ta a obj e ào·
e1 c r
o caso dos Euahlayi e dos exemplos de totemismo
e 899 pp 814-8·1
�e '.º ! É
1
. . 5), o próprio
. Se• d11: ele, guarde 36.
corpo de uma lebre i minha alma no
e eu irmao John membro
.
pessoal assinalados por 1 10\VITT em "Australian Medicine \len"',
est rnngeiro) m ata ( de um clã
essa leb�e, assa in .f.A ./., XVI, pp. 34, 45 e 49-50.
37. Sna. FLETCHER, "A Study oí the Omaha Tribe", in
com minha alma�· -a e come-a, o que
Par acontece
"' evuar esse
Smilbsonian Repor/ fo r 1897, p. 586; DOAS, 7b<! Kwaki11tl,
perigo• é nccessa' no
"
irmão John conhe" que meu
· hª �1ma e que
,.'
1
,
· ·

t essa s1n1a çao de mm


.

matar -- 1e �re, lenha o cuidado


_

1
mente, quand o , posterior-
p. 322; do mesmo autor, "Vth Rep. of Lhe Commitree... of lhe N.­
u i ª a mim ·m
cssa alma e de resli de extrair dela
uma
l w. Tribes of lhe Dominion of Canada"', B.A.A.S., p. 25; llill
• TOUTJA .1., XXXV, p. 148.
tes {le assa
Ceer JU 1 ga
dele seu jantar. " r o animal e fazer
' encontrar essa prá tica
·

Ora Fraz . • ·

nas tribos da Aus em uso


-ua
•--<1 ia
'· ntral · Todos e 38. Os nomes próprios dos diferentes gentes, diz BOAS a
· >s ,anos, .
os adiame'. qu
que descre' crem . durame um nto
propósito do Tlinkil. são derivados de seus totens respectivos,
ndo os anim ais
lade � Pnm �
chegam à mmuric da nova gemção
membros do tot t"ira <..<tça mona t: apresen tendo cada gens seus nomes especiais. A conexão entre o nome
em � wda aos totem (coletivo) às veze� não é muiro evidente, mas exiMe
' mem um
P? uco de sua carne ; so­
t.: u
meme depois os
membr�sc�?s sempre ("Vth Rep. of rhe Comminee.. .", p. 25). O fato de os pre­
vrememe. Esse é um
outros elas podem con
meio d� z Frazer, de �ev lver aos
sumi-la li­
a alm a que podem
fi primeiros
nomes individuais serem propriedade do clã e o caracterizarem

i n terpretação do
ter con .1a �
a esses arnma1s. Mas
?
, além dessa
tão seguramente quanto o totem observa-se igualmente entre os

amente arb itrá ria, t:


rito ser in teir Iroqueses (MORGAN, Ancielll Society. p. 78); entre Wyandot
"' W ya ndot
os
difícil não
(POWELL, Govemment", in lsl Rep., p. 59); entre os

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