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DOS TÁVORAS
Guilherme de Oliveira Santos
Leandro Correia
Roberto Carlos Reis
O PROCESSO
DOS TÁVORAS
A REVISÃO
Instauração, depoimentos e sentenças
TÍTULO
O Processo dos Távoras
A revisão – Instauração, depoimentos e sentenças
AUTOR
Guilherme de Oliveira Santos | Leandro Correia | Roberto Carlos Reis
DESIGN E PAGINAÇÃO
Vitor Duarte
ISBN
XXXXXXXXXXXXXX
DEPÓSITO LEGAL
XXXXXXXXXXXXXX
DATA DE EDIÇÃO
XXXXXXXXX 2017
EDIÇÃO
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Ruders emite juízos díspares acerca de Carvalho e Melo. Ver Cartas 2ª e 17ª.
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Concluindo:
Segundo reza um velho brocardo jurídico traduzido em vulgar: o que
não está no processo não está no mundo. Reconhece, portanto, a relativi-
dade das decisões judiciárias: não é o mundo que está no processo; o pro-
cesso é que está no mundo. Há mais coisas no céu e mais na terra, dizia
Hamlet.
E o tempo não apagou da memória dos homens a dramática inter-
rogação de Pôncio Pilatos no julgamento dos séculos: “que é a verdade?”.
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MARQUÊS DE POMBAL
DE SANTA MARIA DA FEIRA A LISBOA
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baro castigo. D. Pedro mandou então que lhe trouxessem «cebola e vi-
nagre para o coelho» e fez tirar «o coração pelos peitos a Pêro Coelho
e a Álvaro Gonçalves pelas espáduas» (Fernão Lopes). Esta estranha
execução é confirmada por uma das cenas da rosácea do Túmulo de
D. Pedro2.
Nesta Casa ainda lá existe uma velha pedra de armas com uns
coelhinhos avultando em rude escultura. De acordo com Vaz Ferreira,
foi nesse pardieiro desamparado e em ruina que nasceram a bisavó e o
avô do grande Marquês de Pombal. Também nela nascera três gerações
antes, um Gaspar Leitão Coelho, de quem a parcimônia de herança fez
um enqueredor, distribuidor e escrivão de serventia da então vasta co-
marca da Feira. Filho segundo de fidalgo pobre, casara com D. Cecília
Pinto nascida de Pedro de Melo Soares, o do Púcaro, e de D. Briolanja
Pereira.
Talvez por esta alcunha de louceiro os entendidos em linhagens
deem facilmente como pai da D. Cecília. Esta teve pelo menos dois filhos:
um do mesmo nome do pai, que chegou a licenciado e desembargador, e
António Soares Coelho, cuja descendência veio a viver na Casa de Justas,
sendo sua bisneta D. Ana Maria de Viveiros Freire. Mãe duns poucos de
bastardos do último Conde da Feira, D. Fernando Forjaz Pereira Pimentel,
que antes fôra Dom Prior da Colegiada de Guimarães.
D. Cecília morreu deixando o viúvo e o filho, ambos Gaspar Leitão
Coelho, a viverem na Arrifana, freguesia do concelho da Feira, à borda
da estrada de Lisboa ao Porto, confinante com S. João da Madeira.
O viúvo casou-se de novo. Casamento por conveniência, uma mésal-
liance, com a filha dum Sebastião Lopes e duma Joana Fogaça que, ainda
para mais, se chamava burguesissimamente Eva Machada. Mas o Lopes era
rico e a Eva tão boa criatura que se afeiçoou ao enteado Gaspar. Em 1590
morre o Sebastião Lopes, partilham-se os bens dele e a viúva Joana Fogaça
(apelido pouco nobre) doa ao genro e à filha a sua parte nas propriedades
em Gaiate e Cesar.
Fazem então a Eva e o Gaspar testamento in eadam charla, a que
se chamava de mão comum, e deixam esses bens ao enteado dela e filho
dele: Gaspar Leitão Coelho, licenciado em direito e futuro desembarga-
dor, com encargo de missas por alma de ambos na igreja da Arrifana.
2
“D. Pedro” – Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira. vol. XX, Lisboa-Rio de Janeiro:
Editorial Enciclopédia, LDA, 2008, pp.772-775.
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Correio da Feira, 21 de Julho de 1945
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Esta capela está encimada por uma cruz, hoje partida, sobre um
plinto, na convergência de dois panos de cantaria que descem até às suas
paredes laterais. Sobre aquele portal de entrada está aplicada uma pedra
de armas onde estão representadas, no primeiro e quarto quartéis, os
Leitões e, no segundo e terceiro, os Coelhos. Esta pedra de armas é sim-
ples e não tem elmo, nem timbre, terminando, em cima, em ponta formada
por duas curvas reentrantes. Para sul, desenvolve-se a casa, formada de
rés-do-chão e primeiro piso, este servido por um portal que deita para uma
velha escadaria que a separa da capela.
Arruinada, mas com sinais da sua antiguidade, como o portal, duas
janelas com varandas (hoje transformadas em simples janelas) voltadas
para nascente e uma outra voltada para sul, (prejudicada pelo seu estrei-
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rito Santo foi também reconhecido como abade de São Mamede de Tra-
vanca e de São Cristóvão da Regedoura, o que aumentou o seu poder
espiritual na vila e arredores. O padre João de São Pedro Quintela re-
fere ainda a fundação da Misericórdia da Feira no reinado de D. Manuel,
muito embora os primeiros estatutos aprovados pela coroa datem do ano
de 16544.
Quanto aos efeitos do terramoto de 1755 na Feira, o pároco re-
fere sobre o convento do Espírito Santo: “Este Convento forma hũa
perfeyta quadra fazendo a Igreja o lansse della da parte do Norte, o
dormitório da parte do Sul. Na Terra motto de sincoenta e sinco teve
alguma ruina pella qual razão se acha ainda escorado, tem no meyo
hũ muyto espaçoso claustro todo de galaria obrado ao moderno com
dezasseiz janelas rasgadas com suas grades de ferro, e no meyo tem
hũ fermozo chafariz a agoa do qual se reparte por todas as ruínas da
caza”. No que respeita ao castelo da Feira, que se achava ao tempo
em grande ruína, o terramoto atingiu fortemente o campanário; “o
qual deu tanto de si que está arredado da mais parede perto de dois
palmos”. Por fim, “Além desta ruína e da abóbada da Misericórdia e
do Dormitório do Convento, como assim dissemos, não ouve ruina al-
guma memorável” 5.
Não é possível comentar o texto integral da “memória” de 1758
sobre a vila da Feira, embora alguns dados sejam merecedores de ci-
tação. Tal a notícia de uma feira no dia 20 de cada mês: “que antiga
mente se fazia em Santo André, e por se modar para o Rocio desta Villa
se chama a Feyra nova. He franca e dura hum dia”. Havia uma outra
feira, essa anual, no dia 25 de Março, extramuros do castelo, junto à
Senhora da Encarnação a que nesta terra chama o vulgo a “Senhora
do Março”, cuja imagem era de grande devoção. A vila era, nos meados
do século XVIII, cabeça de comarca, embora da provedoria de Es-
gueira, com um ouvidor, um juiz de fora, três vereadores, um procu-
rador do concelho, quatro tabeliães do judicial e notas, meirinho e
alcaide, além de outras autoridades do foro militar, tendo à frente um
capitão-mor e a presença de 12 companhias de ordenança da vila e
seu termo. Outrora privilégio dos condes, a apresentação destes fun-
4
Veja-se CARDOSO, Luís – Diccionario Geographico de Notícia Histórica (...)., Tomo I, Lisboa:
Regia Officina Sylviana e Academia Real, 1747-1751, p. 32.
5
Veja-se de PINTO, A. Ferreira, “Colegiada ou Colégio do Espírito Santo na Vila da Feira”, in
Arquivo do Distrito de Aveiro, volume IV, Aveiro, 1938, pp. 81-90.
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Veja-se a transcrição do documento por COSTA, Eduardo Alberto da, “Memórias Paroquiais
do século XVIII, n.° VII, Freguesias de S. Nicolau da Vila da Feira”, Arquivo do Distrito de
Aveiro, volume XXXVI, n.° 143, Aveiro, 1970, pp. 198-210.
7
Trechos da referida correspondência citados por MONTEIRO, Nuno Gonçalo F. D. José I: na
sombra de Pombal. Lisboa: Temas e Debates, 2008, p. 131.
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8
Idem, p. 133
9
MARQUES, José Oscar de Almeida. “Voltaire e um episódio da História de Portugal”. In: Me-
diações: Revista de Ciências Sociais. Londrina, vol. 09, n.º 2, 2004, pp. 37-52.
10
MONTEIRO, Nuno G., ob cit, 2008, p. 134.
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Arquivo Nacional Rio de Janeiro - Negócios de Portugal, Processo dos Marqueses de Tá-
vora, cód. 746; M. 005.0.73 v. 1.. Cf. folhas iniciais. Ao comparar a publicação do processo
de Pedro de Azevedo com os manuscritos originais, pode-se afirmar que a impressão de
1921 é bastante cuidadosa e fiel. Não apresenta, é verdade, as inúmeras anotações nas mar-
gens, assim como as rasuras e reparos que aparecem no original sem nenhuma ressalva.
Mas por certo é extremamente útil, haja vista que existem muitas partes dos manuscritos
que estão ilegíveis ou mesmo danificadas. Assim, ver o mesmo edital em Pedro de Azevedo.
AZEVEDO, Pedro – O processo dos Távoras. Lisboa: Tipografia da Biblioteca Nacional, 1921,
pp.5-6.
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BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas (1764). São Paulo: Martin Claret, 2006.
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Ver desenho do patíbulo construído em Belém para a execução dos fidalgos que pode ser
consultado no site do Arquivo Nacional da Torre do Tombo: http://antt.dglab.gov.pt/exposicoes-
virtuais-2/o_suplicio_tavoras/.
15
O trecho presente e os seguintes foram citados por Nuno Gonçalo Monteiro com base nos
documentos transcritos por Pedro de Azevedo na primeira edição do processo dos Marqueses
de Távora. Cf. MONTEIRO, Nuno G., ob cit., 2008, pp.152-153.
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MONTEIRO, Nuno G., ob. cit., 2008, p.153.
17
Idem, pp. 154-155.
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menos, com as potencias confusas para menos sentir a fratura dos ossos,
a que sem interrupção se procedia; foi necessário depois destes despeda-
çados, repetir os golpes no peito, e cara para acabar o fim do alento,
dando bem a conhecer, pelos sentidos ais que se lhe ouviam, a violência
e tirania que suportava.” 18
A sentença que condenou os fidalgos e seus criados à pena de
morte por crime de conspiração e lesa-majestade foi rubricada apenas
pelos magistrados que compunham a Junta como, por exemplo, o já ci-
tado juiz da inconfidência, Pedro Gonçalves Cordeiro, e João Antônio de
Oliveira Machado, que servira de escrivão. No manuscrito original apa-
recem muitas notas às margens, numeradas e que, aparentemente, fazem
referências e comentários aos depoimentos prestados pelos réus e teste-
munhas. Composta por vinte e oito parágrafos, insistia no facto de que
o Duque de Aveiro – importante figura da Corte, tendo inclusive no rei-
nado de D. João V ocupado o cargo de presidente do Desembargo do
Paço –, contrariado por D. José I em pretensões políticas19, idealizou em
conjunto com outros pares (os Távoras e o Conde de Atouguia), e sob a
direção de alguns padres da Companhia de Jesus (Gabriel Malagrida é
textualmente citado na sentença), o assassinato do rei e a sua destituição.
A sentença sugeria ainda que o objetivo dos conjurados era conduzir D.
Pedro, marido da futura rainha D. Maria I, ao governo. Porém, não se ex-
plica ao certo como os fidalgos e os padres concretizariam tal intento.20
Além da sentença e dos depoimentos, consta em anexo aos autos do
processo pombalino um curioso texto, uma espécie de apêndice intitulado
Providências, no qual se trata dos religiosos da Companhia de Jesus em
Portugal e dos sequestros de seus bens. As tais Providências antecipavam
as ideias e máximas que posteriormente seriam difundidas na Relação Abre-
viada e na Dedução Cronológica e Analítica. Mediante as “maquinações”
dos jesuítas, que por não reconhecerem a autoridade régia incitaram os
réus à rebelião, o texto assegurava que se faz “preciso ocorrer às suas ma-
quinações com providências tão eficazes e tão prontas, que desde logo de-
18
MONTEIRO, Nuno G., ob. cit., 2008, p.155.
19
A não renovação das comendas que tinha a casa de Aveiro e a não autorização para casar o
primogénito d. Martinho de Mascarenhas com uma filha dos Duques de Cadaval. Cf. MON-
TEIRO, Nuno G., ob. cit., 2008, pp.145-152.
20
ANRJ, ob. cit., cód. 746 - M. 005.0.73, vol. 1, fls. 62-85, F. e V. Guilherme G. de Oliveira
Santos publicou a sentença de condenação no seu SANTOS, Guilherme de Oliveira – O caso
dos Távoras. Lisboa: Livraria Portugal, 1979, pp.327-347.
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ANRJ, ob. cit., cód. 746 - M: 005.073, vol. 1, ff.97-99:, AZEVEDO, Pedro, ob., cit., 1921, pp.
5-61.
22
Acerca dos conflitos entre o poder da Coroa e o poder temporal exercido pela Igreja e, es-
pecialmente, pela Companhia de Jesus em Portugal do século XVIII, cf. ALVES, Patrícia Domin-
gos Wolley Cardoso – Os Jesuítas diante de O Verdadeiro Método de Estudar: conflitos políticos
e de ideias no setecentos português (C. 1740-1760). Niterói: UFF, 2004. Dissertação de Mestrado.
23
ANRJ, ob. cit., cód. 746 - M: 005.073, vol. 1, fls. 97-99, F. e V. .
24
Idem.
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para que pudessem se defender; a Defesa que a favor dos réus ofereceu o
desembargador Eusébio Tavares de Siqueira, procurados para eles nomeado
por Sua Majestade” – que diferentemente da Declaração de Culpa, apre-
senta uma letra muito difícil à compreensão, além do papel estar muito da-
nificado –; e mais um conjunto de quinze “cartas suspeitas”, copiadas dos
originais, escritas por jesuítas portugueses “que pelos correios passam para
cortes estrangeiras [...]”. Tais cartas, datadas entre 1756 e 1758 e examinadas
por um oficial da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da
Guerra, foram anexadas aos autos como supostas provas da conspiração
política contra o rei. Muitas se encontram ilegíveis, mas foram igualmente
reproduzidas por Pedro de Azevedo na sua obra.25
25
ANRJ, ob. cit., cód. 746 - M: 005.073, vol. 1, fls. 110-124, F. e V. Geralmente eram endereçadas
a religiosos da Companhia de Jesus em Roma, e narravam as complicações políticas em anda-
mento no reino entre os jesuítas e o gabinete pombalino.
26
CORDEIRO, Manoel Caldas. O Marquez de Pombal: folheto para poucos. Porto: Typographia
de A. J. da Silva Teixeira, 1890.
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O Marquês de Távora e o duque de Aveiro, segundo a sentença, deviam ter os braços e as
pernas quebrados e serem queimados vivos. O rei modificou-lhes esta tremenda morte.
28
CORDEIRO, Manoel Caldas, ob. cit., 1890.
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Mário Dominguez (DOMINGUES, M. Marquês de Pombal: o homem e sua obra (1955). Lisboa:
Ed. Prefácio, 2002), escrevendo de uma perspetiva mais à esquerda, o avalia de forma equili-
brada e destaca seus méritos sem poupá-lo de críticas.
Por fim, a extensa análise de Teixeira Soares (SOARES, T. O Marquês de Pombal: a lição do
passado e a lição do presente. Rio de Janeiro: Ed. Alba, 1961) é na maior parte favorável e pro-
cura restituir-lhe um lugar de primeira grandeza no processo de modernização de Portugal.
Essa ligação expressa-se claramente na conhecida passagem de Oliveira Martins: “O terramoto
[de Lisboa] durou cinco anos (1755-1760) e subverteu as ruas e as casas, os templos, os mo-
numentos, as instituições, os homens, e até as suas ideias. E sobre as ruínas e destroços da ci-
dade maldita levantou-se a Jerusalém do utilitarismo burguês; sobre as migalhas de Síbare, a
efêmera Salento do Marquês de Pombal...” OLIVEIRA MARTINS, J. P. História de Portugal
(1879). Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1988. pp. 172.
33
Voltaire, ob. cit., vol. xv, 1768, pp. 335-36. Todas as citações de Voltaire foram traduzidas
por José Oscar de Almeida Marques Dep. e Filosofia – UNICAMP e devidamente adaptadas à
ortografia (Português-Portugal).
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Publicada anonimamente em 1759 é logo identificado o seu Autor e nesse mesmo ano a
obra conhece vinte edições, seguindo a sua fama para a Itália e Inglaterra onde é traduzida.
Voltaire foi o introdutor de um género de conto que utiliza a ironia para revelar criticamente
a realidade do mundo em que vivia: utiliza a ficção como interrogação e os seus personagens
agem por vezes em contradição com o senso-comum da época.
Em Cândido, o seu herói confronta-se regularmente com o optimismo veiculado pelas teorias
de Leibniz (o melhor dos mundos possíveis), ou o seu nome não exprimisse precisamente a
ideia da candura que o optimismo gera na adversidade através da existência do mal e da justiça
divina. Podem consultar os 29 capítulos em http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/candido.html.
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à época, com os príncipes, “seja por suas imensas riquezas, seja pelas
agitações que promoveram desde sua fundação.”37
Não será necessário recordar a hostilidade de Voltaire e em geral
dos philosophe em relação aos jesuítas, acompanhada frequentemente da
denúncia da existência de uma fabulosa riqueza canalizada para a ob-
tenção de poder e controlo político das instituições. Para as diversas teo-
rias da conspiração daquele tempo, também era clara a fonte dessas
riquezas: a prata e o ouro do Novo Mundo e a exploração direta dos re-
cursos desses territórios por meio da mão-de-obra indígena que os jesuí-
tas controlavam.
“Os jesuítas eram, como se sabe, os verdadeiros soberanos do Para-
guai, apesar de reconhecerem o rei da Espanha. A corte da Espanha
tinha cedido através de um tratado38 alguns desses territórios ao rei de
Portugal José I, da casa de Bragança. Os jesuítas foram acusados de se
oporem a esse tratado e de promoverem a revolta das populações. Essa
queixa, juntando-se a muitas outras, fez com que os jesuítas fossem ex-
pulsos da corte de Lisboa.” 39
Escutemos todavia e a título do contraditório, pela sua pungente
sensibilidade, a célebre página de Camilo Castelo Branco sobre a execu-
ção da marquesa de Távora merece ser citada por extenso:
“A aurora do dia 13 de janeiro de 1759 alvorejava uma luz azulada
do eclipse daquele dia, por entre castelos pardacentos de nuvens esfuma-
radas que, a espaços, saraivavam bátegas de aguaceiros glaciais. O ca-
dafalso, construído durante a noite, estava úmido. As rodas e as aspas
dos tormentos gotejavam sobre o pavimento de pinho. Às vezes, rajadas
de vento do mar zuniam por entre as cruzes das aspas e sacudiam li-
geiramente os postes. Uns homens, que bebiam aguardente e tiritavam,
cobriam com encerados uma falua carregada de lenha e barricas de
alcatrão, atracada ao cais defronte do tablado. Às 6 horas e 42 minutos
ainda mal se entrevia a facha escura com umas cintilações de espadas
nuas, que se avizinhava do cadafalso. Era um esquadrão de dragões. O
patear cadente dos cavalos fazia um ruído cavo na terra empapada pela
chuva. Atrás do esquadrão seguiam os ministros criminais, a cavalo, uns
37
Voltaire, ob. cit., vol. XV, 1768, p. 395.
38
O Tratado de Madrid, assinado em 13 de janeiro de 1750, pelo qual Portugal entregava à Es-
panha a Colónia do Sacramento, à beira do Prata, em troca dos Sete Povos das Missões.
39
Voltaire, ob. cit., vol. XV, 1768, p. 395.
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41
GIL, A. Pedro (dir.) – “O Processo dos Távoras”. In Os Grandes Julgamentos da História. vol.
XIV, Brasil: Otto Pierre, 1980.
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meio de seus tribunais, um monge regicida; para isso era preciso o con-
sentimento de Roma. Os outros povos estavam no século dezoito, mas os
portugueses pareciam viver no século doze.
Para a posteridade, será difícil crer que o rei de Portugal tivesse so-
licitado a Roma por mais de um ano a permissão de levar ao tribunal os
jesuítas seus súditos, sem conseguir obtê-la. A corte de Lisboa e a de Roma
estiveram por muito tempo em um conflito declarado, e chegava-se mesmo
a aventar de que Portugal se livraria de um jugo que a Inglaterra, sua
aliada e protetora, já havia posto por terra há tanto tempo; mas o minis-
tro português tinha inimigos em demasia para ousar empreender o que
Londres havia concretizado, e mostrava ao mesmo tempo uma grande
firmeza e uma extrema condescendência.” 42
42
Voltaire, ob. cit., vol. XV, 1768, pp. 396-7.
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43
CORDEIRO, Manoel Caldas, ob. cit., 1890.
44
BADINTER, Elisabeth. As Paixões Intelectuais. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007-2009,
3 volumes.
45
D. João de Almeida Portugal (1726-1802), 4º conde de Assumar e 2º marquês de Alorna.
Antes de ser encarcerado por conta do atentado a D. José I, D. João de Almeida ocupou os
postos de oficial-mor da Casa Real, comendador da comenda Moreira na ordem de Cristo, ca-
pitão de cavalaria do exército e sócio da Real Academia Portuguesa de História. ANTT, Fundo
dos Marqueses de Fronteira e Alorna, Arquivos Pessoais do 2º Marquês de Alorna, pasta n.
123 (reúne os diplomas, alvarás, requerimentos e cartas régias relativas à renovação das co-
mendas e bens da Coroa em favor de D. João de Almeida Portugal, em 1777); pasta n. 124
(contém uma versão da minuta de carta que D. João de Almeida pretendia enviar à pessoa
influente da Corte, já sob a regência de D. João); pastas 125 e 126 (são as mais importantes,
pois reúnem as minutas e os apontamentos políticos escritos por D. João de Almeida prova-
velmente entre os anos de 1777 e 1792); pasta 127 (contém o panfleto “Considerações Mili-
tares para Pedro”, espécie de manual militar que redigiu especialmente para o filho. Além
disso consta dessa pasta uma minuta de carta que D. João pretendia dirigir ao príncipe regente
D. João, na tentava de alcançar o desfecho para a revisão do processo dos Távoras); pasta
128 (reúne correspondência diversa que o 2º Marquês de Alorna destinou à família, especial-
mente nos últimos anos de vida.
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SANTOS, Guilherme de Oliveira. O Processo dos Távoras: a importância do processo revisório.
Lisboa: Livraria Portugal, 1979.
47
No que se refere à “Leitura de Bacharéis”, recentemente foram publicados os índices da
coleção. Cf. Lourenço C. de Matos e Luís Amaral. Leitura de Bacharéis: índice dos processos.
Lisboa: Guarda-Mor, 2006.
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prestar provas no Desembargo do Paço, antes das quais era efetuada uma
inquirição ou devassa da vida do candidato, bem como da sua ascendência.
Estas inquirições, eram orientadas pelo corregedor da Comarca e integravam
um questionário tipificado que as testemunhas deviam responder.
O guia das questões consistia nos seguintes itens: primeiro, per-
guntava-se ao interrogado se ele sabia o motivo pelo qual havia sido
chamado, ou se alguém o havia instruído previamente. Segundo, se a
testemunha conhecia o candidato ou os seus ascendentes – pai, mãe,
avós maternos e paternos. A esse respeito, é curioso observar a obstina-
ção dos juristas encarregados das inquirições. Muitas das vezes era pre-
ciso visitar três ou quatro lugares diferentes, procurando conhecidos e
testemunhos sobre os parentes mais remotos. A terceira referia-se à pu-
reza de sangue do candidato. A testemunha devia declarar se o can-
didato era ou não cristão velho, sem ascendentes de “infecta nação”, ou
seja, sem ascendência de cristãos novos, judeus, mouros e, em alguns
processos, acrescenta-se a categoria “mulato”. O quarto item interrogava
sobre a fama do habilitante, e as testemunhas deviam informar se sabiam
de fatos ou rumores que desqualificassem o candidato. A quinta questão
aferia sobre os ofícios praticados pelos ascendentes do habilitante. Se
esses eram ou não oficiais mecânicos, do que viviam, como viviam, etc.
Por fim, no sexto e último item, a testemunha devia ratificar as declara-
ções sobre a honra do candidato, informando se o candidato vivia de-
centemente, e dos meios com que vivia.
A julgar pela riqueza dos processos a que se teve acesso, nos quais
se pode saber das origens sociais dos bacharéis e das relações estabele-
cidos por eles visando construir uma carreira na magistratura, as Leituras
de Bacharéis, assim como os processos de Habilitação para o Santo Ofí-
cio, constituem ricas ferramentas de investigação sobre as trajetórias de
personagens históricos “menores” e desconhecidos. Além disso, permitem
vislumbrar o Antigo Regime em movimento. Afinal, a despeito de todos
os impeditivos de sangue e restrições hierárquicas que podiam vir à tona,
os que conseguiam construir suas carreiras na magistratura, alcançavam
não só a possibilidade de ascensão social, mas também o respeito e a
honra, elementos primordiais aos valores da época.48
48
CAMARINHA, Nuno – Les Juristes Portugais de l’Ancien régime (XVIIe - XVIIIe siècles). Bernard
Vincent (dir.), Lille: Atelier National de reproduction des thèses, 2015, nota 83; (DARNTON,
Robert – Boemia Literária e Revolução. As origens culturais da Revolução Francesa. São Paulo:
Cia. das Letras, 1987.)
59
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
49
ALVES, Patrícia Domingos Wolley Cardoso Lins – D. João de Almeida Portugal e a revisão
do Processo dos Távoras: conflitos, intrigas e linguagens políticas em Portugal nos finais do
Antigo Regime (c. 1777-1802). Niterói: Tese de Doutoramento apresentada ao programa de
Pós-graduação e História da UFF como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor
em História, 2011.
60
O PROCESSO DOS TÁVORAS
61
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
54
LB: (1735), Maço12, n.15. HOC: Letra A, Maço 47, n.33.
Natural do Porto, cavaleiro professo na Ordem de Cristo, familiar do Santo Ofício e expositor
de Cânones na Universidade de Coimbra. Num primeiro momento teve o pedido de HOC in-
deferido. Porém, alcançou a habilitação alegando os serviços prestados em Coimbra.
55
LB: (1739), Maço: 4, n° 9. HOC: (1757). Letra: S, Maço: 1, n° 5.
Na HOC aparece já como Desembargador. Filho legítimo de Manuel Francisco e de Vitória
Luísa, todos naturais da Vila e distrito de Óbidos. Foi batizado em 26 de janeiro de 1713, e,
portanto, tinha mais de 60 anos quando da revisão. As inquirições para a HOC foram realizadas
em Óbidos e em Lisboa. Os pais foram descritos como pessoas honradas e puras de sangue.
Ricarda Pereira, viúva, de idade de 80 anos, moradora em Óbidos, acrescentou que os pais do
justificante valiam-se “das fazendas de uma capela que traziam arrendada por pouco, e que
não cometeram crime de lesa-majestade”.
56
LB: (1734), Maço: 62, n° 32. HOC: Incompleta.
Natural de Lisboa. Filho legítimo de João Batista de Moura e de D. Antónia Ferreira de Figuei-
redo. O avô paterno foi descrito como “Mercador da Casa Real” e Familiar do Santo Ofício.
Tanto a LB quanto a HOC são bastante sumárias, e não acrescentam maiores detalhes sobre a
vida do magistrado.
57
LB: (1742), Letra M, Maço: 29, n° 9. HOC: não localizada.
Filho legítimo de António Serrão Diniz, cavaleiro professo na Ordem de Cristo e coronel de in-
fantaria, e de Leonor Josefa, todos naturais de Frielas (hoje Concelho de Loures). Licenciado na
Faculdade de Canones. Pai e avô paterno eram militares. LB sumária, sem maiores detalhes.
58
LB: (1748), Maço: 3, n° 3. HOC: (1751). Letra L, Maço: 18, n° 102.
Filho legítimo de João Gomes Rebelo e de Tereza de Jesus Quintela. Natural de Lisboa e for-
mado em Leis pela Universidade de Coimbra. Contava 26 anos quando da LB. Seu pai é descrito
nas inquirições como “homem de negócio de grosso trato”, que “vive a lei da nobreza com a
sua carruagem”. A HOC num primeiro momento lhe foi negada, devido à atuação dos ascen-
dentes como mercadores. O pai “nos seus princípios foi mercador, e o avô paterno também
mercador, e avô materno mercador de chapéus. A mãe e as duas avós mulheres de segunda
62
O PROCESSO DOS TÁVORAS
condição.” O magistrado recorreu, alegando os serviços prestados a Sua Majestade como Juiz
de Fora da vila de Santarém, e foi dispensado, habilitando-se em 1751.
59
LB: Não localizada. HOC: Não localizada.
60
LB: Não localizada. HOC: Não localizada.
Nos registros da Chancelaria de D. Maria I (“Próprios”) consta a informação de que em 21 de
junho de 1786 lhe foi passado alvará de mantimento com o lugar de Chanceler da Casa da Su-
plicação.
(L. 29, f. 53 v).
61
LB: (1750), Maço: 8, n° 4. HOC: não localizada.
Natural da Vila de Idanha-a-Nova, Comarca de Castelo Branco (Beira). Filho legítimo do também
desembargador e conselheiro da fazenda Fernando Afonso Giraldes. As inquirições da LB reali-
zaram-se em Lisboa. Pretendia alcançar um lugar de Desembargador Extravagante e Extranume-
rário na Casa da Suplicação de Lisboa. Os ascendentes são descritos como “pessoas de conhecida
nobreza, e dos principais da província da Beira Baixa”. Era sacerdote, fidalgo da Casa Real, Freire
da Ordem de Avis e deputado do Santo Ofício. Foi conventual e reitor no Colégio dos Militares
da cidade de Coimbra, no qual atuou ainda como “opositor às cadeiras dos sagrados cânones”.
62
No inventário dos processos de Habilitação na Ordem de Cristo consta apenas um Francisco
Feliciano Velho, seguido dos demais sobrenomes indicados [da Costa Borges e Mesquita Castelo
Branco]. Trata-se de um processo de habilitação bastante completo. Ainda assim, não há certeza
de que se trata da mesma pessoa. Mas há indícios concretos que sugerem fortemente essa pos-
sibilidade. O pai do suplicante, por exemplo, era desembargador e corregedor do crime da Corte
e Casa, o dr. António Velho da Costa. Quanto a Francisco Velho, as testemunhas informavam que
na altura em que as inquirições foram realizadas, o magistrado era ainda um rapaz jovem, con-
tando cerca de 18 anos, cursava a Universidade de Coimbra, e vivia sob a autoridade do pai.
LB: não localizada. HOC: (1753) Letra F, Maço 01, n° 19.
Natural do Porto, embora sempre tenha vivido em Lisboa. Filho legítimo do desembargador e
corregedor do crime da Corte e Casa, Dr. António Velho da Costa. Na HOC possuía apenas 18
63
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
anos, e cursava a Universidade de Coimbra. O pai e a avó materna eram provenientes do “Reino
de Angola”, da cidade de São Paulo de Angola. O avó paterno, Francisco Velho, aparece descrito
como “homem de negócio”.
63
No inventário dos processos de Habilitação na Ordem de Cristo consta a indicação referente
a José Joaquim Emaús: HOC: Letra J, Maço: 38, n. 16. Contudo, ao solicitar o processo para
consulta, o mesmo não foi encontrado pelos funcionários do ANTT.
LB: (1752), Letra J, Maço: 24 n° 45. HOC: Não localizada.
Filho natural de André Emaus, professo na Ordem de Cristo, e de Maria de Deus. Natural de
Lisboa e formado em Leis pela Universidade de Coimbra. O tio, José Pedro Emaus, foi chanceler
da Relação do Porto. Quanto aos ascendentes, as testemunhas informaram que o avô materno
“vivera do seu trabalho, e cultura dos campos”. A família da mãe, natural de Sesimbra (hoje
região metropolitana de Lisboa), era mais humilde. Não se pode ter certeza se era filho legí-
timo, haja vista que na LB consta ser “filho natural”. Em 19 de agosto de 1778 o magistrado
recebeu carta de Corregedor do Crime da Corte e Casa. (Chancelaria de D. Maria I, “Próprios”,
L. 80, f. 58 v.). Também em 1778 recebeu carta de privilégio de Desembargador (L. 27, f. 144
v). Em 22 de agosto de 1782 consta registro de que recebeu carta de Conselheiro do Conselho
da Fazenda. (L. 19, f. 362 v).
64
Embora constem as indicações referentes a Inácio Xavier de Sousa Pizzaro nos respectivos
inventários - LB: 1749, Letra I, Maço: 21, n.51 e HOC: Letra I, Maço: 23, n. 9. -, os processos
desse magistrado não foram encontrados pelos funcionários do ANTT. A respeito do sobre-
nome Pizzaro, cf. MONTALVÃO, José Timotéo – Dos Pizarros de Espanha aos Pizarros de Por-
tugal e do Brasil.
LB: Não localizada. HOC: Não localizada. Embora não tenha sido possível consultar a LB e a HOC,
os registros da Chancelaria Régia de D. Maria I possuem informações importantes.
Em 11 de setembro de 1782 recebeu carta de Corregedor do Crime da Corte e Casa (L. 20, f.
116 v). Já em 4 de abril de 1783, apenas dois anos após a sentença de revisão ter sido proferida,
lhe foi passado alvará de Juiz de Alfândega de Pernambuco, com a faculdade de poder renun-
ciar o dito ofício. (L. 84, f. 254 f). Ao que tudo indica, não foi para o Brasil, pois em agosto de
1783 constam duas referências que sugerem sua permanência na Corte. A primeira, uma “carta
de um lugar de Cavalheiro do Conselho da Fazenda” de 27 de agosto, a segunda, “carta do
Título do Conselho de Sua Majestade”, de 2 de agosto.
65
LB: (1748), Letra J, Maço: 6, n° 7. HOC: (1754) Letra J, Maço: 99, n° 14.
Natural da cidade de Lisboa. Filho legítimo do tenente coronel de cavalos do Regimento da Guar-
nição da Corte, José Jorge Vidal, natural de Espanha (Valência). Tanto o pai, quanto um irmão e
o tio, o sargento mor de Infantaria Pedro Vicente Vidal, eram já habilitados na Ordem de Cristo
quando de seu processo (HOC), e por isso o bacharel foi dispensado das inquirições.
66
LB: 1743, Maço: 14, n. 33. HOC: não localizada.
Natural da Freguesia de Nossa Senhora do Rosário, Concelho de Vieira do Minho, Braga. Filho
legítimo de António de Araújo e de Madalena Martins. Os pais são descritos como “lavradores
64
O PROCESSO DOS TÁVORAS
honrados sem outro trato”. Pretendia encartar-se no ofício de Meirinho do Concelho da Ribeira
de Soaz, também região de Vieira do Minho.
67
LB: (1753), Março: 23, n° 25. HOC: Letra J, Maço: 01, n° 01.
Natural do Algarve. Filho legítimo de António de Sousa, sargento mor do Regimento de Faro,
e de Maria de Sousa. Formado em Cânones na Universidade de Coimbra. Em 6 de outubro de
1777 recebeu carta de Desembargador Ordinário da Casa da Suplicação (D. Maria I,”Próprios”,
L.3, f. 314 v.). Em 16 de junho de 1778 foi designado para um lugar de Desembargador dos
Agravos da mesma casa. (L.11, f. 313 v). Em 19 de setembro de 1786 alcançou o lugar de De-
sembargador do Paço (L. 30, f. 6 v).
68
LB: não localizada. HOC: (1761) Letra T, Maço: 2, n° 26.
Natural do Porto. Filho legítimo do Dr. António Quaresma de Carvalho e de D. Joana Lima
do Nascimento. Em 1739 fez diligências para se tornar Familiar do Santo Ofício. Na altura
exercia o ofício de Juiz de Fora da Vila de Pinhel. Solicitou a HOC quando tinha já 51 anos
de idade, motivo pelo qual o seu pedido foi indeferido. Recorreu do parecer, anexando ao
processo um despacho assinado por Francisco Xavier de Mendonça Furtado, de 17 de abril
de 1760, o qual informava que o rei D. José I lhe fazia a mercê “de 40 mil réis de tença [...],
dos quais 12 mil réis a título da HOC”. O mesmo documento informa dos serviços prestados
pelo magistrado entre os anos de 1735 e 1758. Atuou como Desembargador da Relação do
Porto, foi Juiz de fora de Pinhel, Ouvidor de Bragança, Conservador da Universidade de Coim-
bra. Em 1739, encontrava-se já como familiar do Santo Ofício. O pai, também bacharel, foi
descrito como “advogado do número da Relação do Porto”. O hábito lhe foi concedido em
11 de março de 1761.
69
LB e HOC: não localizadas.
Por meio de alvará de 10 de Janeiro de 1791 foi nomeado Deputado da Junta da Administração
do Tabaco (D. Maria I, “Próprios”, L. 39, f. 5 v). Em 24 de dezembro de 1793 recebeu carta do
Título do Conselho de Sua Majestade. Em 9 de dezembro de 1778 recebeu carta de Desembar-
gador da Casa da Suplicação. (L. 13, f. 141). Em 8 de maio de 1779 recebeu nova carta do
ofício de Desembargador dos Agravos do mesmo tribunal (L. 80, f. 187 v).
70
LB e HOC: não localizadas.
71
LB: (1746), Maço: 1, n° 47. HOC: não localizada.
Natural da Vila de Óvoa, comarca de Viseu. Filho legítimo de Teodósio da Cunha Pinto e de
Maria Pinto. Tinha 23 anos quando da sua LB. Formado em Direito Canónico pela Universidade
de Coimbra. Em 07 de outubro de 1771 recebeu Carta de Procurador Fiscal da Companhia do
Grão-Pará e Maranhão (Chancelaria D. José I - Próprios. L. 32, f. 83).
65
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
66
O PROCESSO DOS TÁVORAS
tratos médios diversos – alguns possuíam pais militares (1, 8, 16, 18),
outros pertenciam a famílias de magistrados (12, 13, 14, 19), e há ainda
alguns cujos avós são descritos como “lavradores honrados” (3, 17, 23),
ou então, os que cuja família “vivia à moda da nobreza”. Também entre
os magistrados da revisão temos indivíduos cujos antepassados eram des-
critos como “negociantes de grosso trato” (7, 9, 13), posição, aliás, bem
diferente dos que possuíam ascendentes que tiveram “no seu princípio
loja aberta, ou seja comerciantes a retalho e mecânicos (1,5). Constam
ainda magistrados cujos pais exerceram ofícios na Corte (2, 23), como o
caso do desembargador da Casa da Suplicação (2), cujo pai foi médico
e físico mor do reino. A origem geográfica igualmente é diversa, existindo
entre eles indivíduos oriundos do Norte de Portugal, como por exemplo,
de Braga e do Porto, mas também do Alentejo, de Lisboa e do Algarve.
Em alguns casos, a limpeza de sangue era duvidosa, o que, no entanto,
não lhes embaraçou a carreira, haja vista que a concessão de dispensas
era prática comum, como se verificou das informações recolhidas nos
processos. O caso do escrivão e desembargador da Casa da Suplicação
Henrique José de Mendanha Benavides Cirne (1), natural de Braga, é
exemplo disso mesmo. O bacharel habilitou-se na Ordem de Cristo com
apenas doze anos de idade, em 1753, baseado no facto dos seus avós ma-
ternos terem sido comerciantes.
História parecida foi a de António Alves da Cunha (5), juiz da
junta especial nomeada em 8 de agosto de 1780 para apreciar o pedido
de revisão do caso dos Távoras. Em 1735, aquando da realização da
Leitura de Bacharel, os depoimentos então prestados registraram a boa
vida e conduta do habilitando. Uma das testemunhas, o Doutor Manoel
Pereira da Silva, médico no hospital do Porto e cavaleiro da Ordem de
Cristo, garantiu, em resposta quinto item das inquirições, que o pai do
bacharel “trabalha a lei da nobreza, considera-se rico, vivendo de sua
fazenda, sem algum exercício vil”. No entanto, António Alves da Cunha
encontrou problemas para habilitar-se na Ordem de Cristo. Na ocasião
daquelas inquirições, constatou- se que “as avós paterna e materna
foram mulheres de segunda condição, e o avô materno carpinteiro de
carro”. Mesmo tendo a habilitação indeferida, ao apelar da decisão,
alegando os serviços prestados como magistrado e opositor de Cânones
em Coimbra, António Alves da Cunha foi dispensado dos impedimentos,
concretizando a habilitação na Ordem de Cristo e prosseguindo com
sua carreira.
67
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
76
WEHLING, Maria José; WEHLING, Arno – Direito e justiça no Brasil colonial: O Tribunal da
Relação do Rio de Janeiro: 1751-1808. Rio de Janeiro, IHGB, 2004, pp. 249-322.
68
O PROCESSO DOS TÁVORAS
últimas décadas do século XVIII, e após longa carreira, José Freire Falcão
devia ter alcançado prestígio e reconhecimento na Corte, uma vez que
foi lembrado pela rainha para conduzir assunto tão melindroso”.
Aliás, resta agora o exame dos autos e papéis relacionados à re-
visão. Esta tarefa difícil, tanto quanto àquela a que se dedicaram os
magistrados aqui apresentados, foi o objetivo doa abordagem os autos
de revisão do processo dos Távoras – Entre a Clemência e a Intransi-
gência
Os autos do processo dos Marqueses de Távora encontram-se no
Arquivo Nacional do Rio de Janeiro e que de forma casuística tive acesso.
Por obra do acaso quis que António França, Técnico Superior da Câmara
de Ovar me juntasse ao primeiro estudioso da matéria em Portugal e ao
jovem investigador Leandro Correia, que numa feliz coincidência, jun-
tando-se os diversos elementos (documento original, transcrição, análise)
veio dar continuidade ao estudo de Guilherme G. de Oliveira Santos: O
Caso dos Távora. Lisboa: Livraria Portugal, de 1958.
Este documento original é mais um legado da vinda da Corte em
1808, uma vez que durante muito tempo julgou-se que o original do pro-
cesso tinha sido destruído e pouco se sabia a respeito dos documentos
relativos à revisão que ocorrera no reinado de D. Maria. O Real Gabinete
Português de Leitura possui a primeira publicação da fase pombalina do
processo (1758-1759), de 1921, prefaciada e anotada por Pedro de Aze-
vedo, que à época era o responsável pela secção de manuscritos da Bi-
blioteca Nacional de Lisboa.77
Azevedo publicou o processo condenatório a partir de um translado
autêntico existente naquela instituição. Translado este realizado em 1784
sob a direção de Henrique José de Mendanha Benevides Cirne, desembar-
gador da Casa da Suplicação de Lisboa e escrivão nomeado por D. Maria
I para atuar na revisão do processo. Segundo o cuidadoso organizador
desta primeira edição, o processo original completo estaria perdido para
sempre, pois teria sido destruído por D. João VI nas perspetiva de se pre-
caver de possíveis conspirações idealizadas por Carlota Joaquina e alguns
membros da alta nobreza, aquando do regresso da Corte a Lisboa.78
Porém, ao consultarmos a documentação sob a guarda do Arquivo
Nacional do Rio de Janeiro, é possível atestar que se trata do original
77
AZEVEDO, Pedro de, ob. cit., 1921.
78
Idem, p. 5.
69
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
79
SANTOS, Guilherme de Oliveira, ob. cit., 1958; Idem, ob. cit., 1979.
80
ANRJ, ob. cit.; cód. 746 - M. 005.0.73 (vol. 1-4) e 005.1.73 (vol. 4-6)
70
O PROCESSO DOS TÁVORAS
71
O PROCESSO
DE SENTENÇA
REVISÓRIA
1777-1790
Leandro Correia
Nota Introdutória
75
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
Critérios de Transcrição
76
O PROCESSO DOS TÁVORAS
77
[fl. 1]1
Este masso assim atado, e com o rótulo
<Marquez de Alorna
Inquirição de testemunhas>
[fl. 3]3
Inquirição ad perpetuam rei memoriam, facultada pella Rainha
Nossa Senhora ao Marquez d’Alorna como Procurador da Marqueza sua
mulher e filhos.
[fl. 4]4
Anno do nascimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil e sette-
centos e settenta e sette, aos dezoitto dias do mez de Novembro do dito
anno, nesta cidade de Lisboa e Caza da Supplicação da mesma; me foi
apresentado pello Dezembargador Joze Alberto Leitão, Corregedor do
crime da Corte e Caza, hum Decreto da Rainha Nossa Senhora da data de
Villa Viçoza, e sette do prezente mez; para que como Escrivão no mesmo
Real Decreto nomeado, o authuace a fim de se proceder na inquirição de
1
No canto superior esquerdo lê-se «Para Memória».
2
No canto inferior direito pode ler-se «Este masso que he original e na verdade seria origem
de horrorosas consequencias, se procedesse o intento, deve conservar-se com summa cau-
tela».
3
Não constam os fls. 1v, 2 e 2v; passamos a referir-nos aos fólios pela sigla fl. e/ou fls, con-
forme a situação.
4
Não consta o fl. 3v.
79
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 5]5
[Decreto de 7 de novembro de 1777]
Tendo consideração ao que me representou o Marquez de Alorna,
por si, e como Procurador da Marqueza sua mulher e filhos, que sendo
notoriamente interessados na restituição da fama de Francisco de Assiz
de Tavora, Leonor de Tavora, Luiz Bernardo de Tavora, Jeronimo de Ataide,
e José Maria de Tavora, pertendia acautelar para o futuro as provas com
que intentava justifica-los innocentes no processo e sentença proferida
em Junta de doze de Janeiro de mil setocentos cincoenta e nove em que
participaram da nota do horrorozo e execrando crime de inconfidencía.
E não sendo da minha real intenção permittir que possa perecer, nem
ainda arriscar-se a verdade em hum assumpto de tão grave ponderação
quando se proporcionam para o conhecimento della os meyos legitimos
da sua averiguação, hey por bem conceder licença ao referido Marquez
de Alorna para produzir ad perpetuam rei memoriam sobre a innocencia
e defeza dos sobreditos, todas as testemunhas que aprezentar, ainda que
não sejam velhas, nem enfermas para dellas se valer em qualquer tempo
e juizo em que haja de conhecer-se da cauza de que pertende tratar. E
para inquirir as ditas testemunhas na cidade de Lisboa e cinco legoas ao
redor della, sou servida nomear por Juiz o Doutor José Alberto Leitão,
Corregedor do Crime da Corte e Caza, e para Escrivão o Doutor Henrique
José de Mendanha Benavides, Dezembargador da Caza da Supplicação.
Na Comarca do Porto o Corregedor do Crime da Corte e Caza da Primeira
Vara, e para Escrivão o outro Corregedor do Crime da Corte e Caza da Se-
gunda Vara os quaes tirarão as ditas testemunhas sendo citados pelos mes-
mos escrivaens, para as verem jurar os Procuradores da Coroa dos
districtos a que competirem, não só como taes, mas tambem como fiscaes
da justiça. Nas outras Provincias se procederá na mesma forma servindo
de Juizes Inqueredores os Corregedores das Comarcas e de Escrivaens os
Juizes de Fora Criminaes onde os houver. E não os havendo os Juizes de
Fora do Civel, fazendo os Provedores das respectivas Comarcas nesta di-
5
Não consta o fl. 4v.
80
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 6]
O Marquez d’Alorna como Procurador da Marqueza sua mulher e
de seus filhos, authorizado pelo Decreto de sua Magestade de 7 de no-
vembro de 1777 offerece-nos nomes que reprezenta os itens seguintes,
para por elles se perguntarem as testemunhas que nomear, cujo numero
addicionará conforme os factos que de novo vierem á sua noticia.
1
Item. Que sendo prezos Francisco de Assis de Tavora, Luiz Bernardo
de Tavora, Marquezes que foram deste titulo, Jeronimo de Ataide Conde que
foi de Atouguia e Jozé Maria de Tavora, foram logos tratados como se já es-
tivessem absoluta e plenamente convencidos e condemnados pelo horrorozo
delicto de Leza Magestade comettido contra a sagrada pessoa do Senhor Rey
D. Jozé o 1º em o sacrilego attentado da noute de 3 de setembro de 1758.
2
Item. Que aos ditos Francisco de Assis, Luiz Bernardo, Jeronimo de
Ataide, Jozé Maria, e da mesma forma a D. Leonor de Tavora Marqueza
que foi do dito titulo, se não deu lugar algum para se defenderem da im-
putação do mesmo horrorozo delicto, mas antes se procedeo com ellez
como se nenhuma defeza podessem ter, nem allegar.
6
No canto inferior esquerdo lê-se «Registado a folha 253 do livro VIII».
81
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
3
Item. Que sem embargo de ser nomeado para Pro[fl. 6v]curador
dos referidos suppostos réos o Dezembargador Euzebio Tavares se lhe
limitaram as horas para allegar todas as diversas e distinctas defezas dos
ditos réos, sendo elles onze em numero.
4
Item. Que do pouco tempo dado a este Ministro para esta diligen-
cia, lhe foi tomada huma grande parte pelo Ministro d’Estado de sorte,
que teve muito poucas horas uteis, não passando de nove, ou dés, para
se informar dos reos e allegar por todos e cada hum delles as suas dis-
tinctas e seperadas defezas.
5
Item. Que essas horas tiradas ao tempo determinado para a defeza
as gastou o Ministro d’Estado em preparar o dito Dezembargador Procu-
rador com muitas limitaçoens e instrucçoens.
6
Item. Que estas limitaçoens e instrucçoens se dirigião mais a pro-
curar a condemnação dos suppostos réos e descubrir maior numero de
outros semelhantes do que para elle Dezembargador Procurador lhe fazer
huma boa e livre defeza.
7
Item. Que sendo deste modo quartado e tomado o tempo ao dito
Dezembargador e limitadas as circumstancias para fazer o officio de Pro-
curador, lhe foi impossivel cumprir com a sua obrigação nem formalizar
as defezas de cada hum dos suppostos réos com separação das suas dif-
ferentes circumstancias como aliás lhe não seria difficultozo se houvesse
mais [fl. 7] espaço de tempo e liberdade.
8
Item. Que offerecendo-se alguns ou todos os referidos suppostos
réos para provar com testemunhas nomeadas que naquella mesma noute
de 3 de setembro de 1758 assim ás horas das onze, como na hora antes,
e na hora depois estiveram continuadamente em lugares distantes da-
quelle aonde o delicto se cometêo, não forão perguntadas as ditas teste-
munhas.
9
Item. Que ao dito Dezembargador se não comunicaram os autos
para a defeza dos reos, e se lhe deu somente huma sorte de minuta para
por ella se haver de regular.
82
O PROCESSO DOS TÁVORAS
10
Item. Se he certo que antes de elle dito Dezembargador ouvir os
réos e preparar a defeza vio a sentença escripta ou a ouvir dictar por
mão e boca de quem? E se não ficou então posetivamente persuadido,
que elle só fora nomeado Procurador por forma solemnidade, ou forma-
lidade do processo, e não para se dar lugar a qualquer defeza que os
reos podessem ter.
11
Item. Que ao réo Joze Mascarenhas foi insinuado antes de pergun-
tas, ou no tempo dos tormentos, que podia ser-lhe favoravel a declaração
de maior numero de pessoas que com elle tivessem sido participes no
dito sacrilego attentado, ainda sendo pessoas, ou pessoa de mais alta
ordem, e a testemunha poderá talvez declarar quem fez esta insinuação
ao dito Joze Mascarenhas.
12
Item. Que o dito Jozé Mascarenhas sendo levado [fl. 7v] a tratos
horrorozos, declarou na força do tormento que estavão innocentes os
reos de quem se trata: que não forão participes do delicto: que revogava
qualquer declaração feita por elle e extorquida pelo horror de tormento
ou movido pela esperança de que declarando maior numero de sócios
da primeira Nobreza, poderia o seu delicto escapar do ultimo e mais ri-
goroso castigo.
13
Item. Que a dita declaração e retrattação chegou a ser escripta e
foi depois rasgada e desprezada por dizer hum dos juizes que se não
devia della fazer cazo. E as testemunhas, que a este item jurarem, poderão
declarar, sendo perguntadas, quem escreveo esta retractação, quem foi o
Juiz ou o Ministro que a rasgou reputando-a por inutil e quem estava
prezente.
14
Item. Que desde então até o ultimo instante continuou o dito Joze
de Mascarenhas a declarar constantemente a innocencia dos réos, de que
se trata, e assim o protestou diante do mesmo Deos Sacramentado,
quando poucas horas antes da sua morte o recebeo por Viatico.
15
Item. Que o Padre Francisco Manoel de S. Boaventura dado nessa
occazião por confessor do dito Jozé Mascarenhas, confiou a algumas pes-
soas ter sido encarregado pelo dito seu penitente de fazer a mesma de-
83
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
84
O PROCESSO DOS TÁVORAS
21
Item. Que passado algum tempo dessa noute infeliz, o dito Jeronmo
de Ataide, mandou chamar ao quarto de sua mulher, D. Marianna de Lo-
rena, huma criada por nome D. Rita, a quem ordenou trouxesse duas peças
de pano, destinadas para pannos e guardanapos para a cozinha e copa, e
elle mesmo Jeronimo d’Ataide assistio e derigio toda a operação do corte
dos ditos guardanapos em que se gastou até às onze horas da noute.
22
Item. Que chegando então de fora a essa hora a dita D. Marianna
sua mulher, a foi abaixo buscar o dito Jeronimo d’Ataide arguindo-a de
ter tardado tanto, e ella o arguio tambem a elle de a não ter hido buscar
ao Rio Seco a caza de seus pays, como era o seu costume, ao que se se-
guio a cêa, que acabaria pela huma hora da noute, depois da qual se
forão logo deitar.
[fl. 9]
23
Item. Que este facto referido ficou impresso na memoria das pes-
soas que o prezenciaram, sem que depois lhe podesse esquecer. Porque
sucedendo a prizão dos ditos D. Jeronimo d’Ataide e D. Marianna de Lo-
rena recolegiram logo o que tinha assim passado, para dahi concluirem
a impossibilidade de ser certo, que o dito D. Jeronimo d’Ataide se achasse
no horrorozo insulto da noute de 3 de Setembro de 1758 no tempo em
que fôra comettido, quando a essa mesma hora se achava em sua caza,
no sitio de Santo Amaro occupado em tão diferente exercicio, como foi
o de prezedir ao corte dos guardanapos referido.
24
Item. Que tendo certeza desta circumstancia os criados e criadas
do dito Jeronimo de Ataide, julgaram firmemente quando seus amos
forão prezos, que não poderiam ter o menor perigo e que facilmente se
faria a seu favor a descoberta da verdade; mas sendo depois condemnado
e executado o dito Jeronimo d’Ataide, de cuja innocencia não duvidavão,
com o fundamento dos factos acima ditos, fallaram huns com outros, re-
conhecendo a injustiça da dita execução, de que conservaram sempre a
mesma idéa, juntamente com as dos factos que approvão.
25
Item. Que na mesma infeliz noute de 3 de Setembro de 1758 antes
das dés horas se recolheo a sua caza no Rio Seco D. Leonor de Tavora,
85
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
86
O PROCESSO DOS TÁVORAS
horrorozos, para lhe fazer dizer, e que quizerão, mas depois se contra-
disse, e protestou a fasildade do dito facto.
30
Item. Que alguns dos juizes que assignaram a sentença disserão e
confiaram a seus amigos intimos que elles em sua consciencia entendião
que a família dos Tavoras tinha sofrido innocente, e que o seu voto fora
na conformidade das provas atribuidas aos autos, com que lhe facilitaram
a assignatura da sentença sem que lhe fosse permittido nenhum exame,
nem duvida das mesmas provas, salvando a sua consciencia com a rela-
ção que lhe fizerão do que havia nos autos.
31
Item. Que todos estes suppostos réos até á ul[fl. 10v]tima hora pro-
testaram pela sua innocencia, pedindo aos seuz confessores que assim o
declarassem por ser essa a verdade, a que não podião faltar nas circums-
tancias de estarem para apparecer em poucas horas, ou minutos, diante
do Eterno Juiz, que os havia de julgar de outra sorte. E a mesma inno-
cencia protestaram antes disso na forma mais solemne, quando houveram
receber por Viatico o Santissimo Sacramento.
32
Item. Que depois de executada a sentença e passado algum tempo
houve secretarios de Estado que não obstante de a ter assignado, profe-
rião della claramente expressoens de desapprovação significantes da in-
nocencia destes réos.
E finalmente
33
Item. Que ha suspeita de terem sido viciados os autos e que delles
foi visto arrancarem-se folhas que depois se queimaram, e introduzi-
rem-se outras em seu lugar, sobre cujo facto poderão as testemunhas de-
clarar as circumstancias a respeito do tempo, do lugar, e das pessoas e
de tudo o mais que se possa comprehender nesta matéria.
34
Item. Se os Marquezes que forão de Tavora e Jeronimo de Ataide e sua
mulher forão a caza do reo Mascaranhas na manham seguinte á noite dos tiros.
(assinatura)
Marquez d’Alorna7
7
No canto inferior esquerdo lê-se «Junte-se ao decreto e ao Ministro nomeado para escrivam
declararei os dias em que se hao de tirar as testemunhas – [assinatura] Leitão».
87
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 11]
O Marquez d’Alorna nomea as testemunhas seguintes para serem
perguntadas ad perpetuam rei memoriam na forma do Real Decreto de
7 de Novembro de 1777 aos artigos que tem offerecido e protesta nomear
as de que mais tiver noticia.
Artigos
11, 12, 13, O Cirurgião do Santo Officio Morador na rua de São Jozé
14, e 29. Domingos Monteiro
32, 33. Manoel Joaquim Garção Morador na rua que vai da
Official da Secretaria porta d’Alcantara para a
dos Negocios Estrangeiros ponte
11 athe 16 Martinho Teixeira Homem Morador á Cruz da Pedra
Raymundo Noyer Capitam do Regimento do
Principe
Simão Infante Agregado ao Regimento do
Caes
Pedro de Roxas Nas suas cazas junto á Graça
Bernardo de Lemos Senhor da Trofa
17,15 e 31 Frei Adrião de São Jozé Religioso de São Pedro
de Alcantara
Frei Antonio de São Jozé Guardião de São Pedro
de Alcantara
O Padre Christovão Joze De Rilhafoles
de Castro
O Padre Joze da Silva Rebello De Rilhafoles
O Padre Francisco de Abreu De Rilhafoles
Frei Joze da Expectação Nos Marianos dos Remedios
Frei Joze de Santa Catharina No Convento de São Comelio
Frei Domingos da Natividade Em São Joze de Riba Mar;
ou na Boa Viagem
Frei Antonio das Chagas Em São Pedro de Alcantara
Frei Manoel Evangelista Em caza seu irmão o
de Oliveira Dezembargador Luiz Manoel
de Oliveira
Frei Antonio de Quadros Religioso da Graça
Joze Antonio de Castilho No Colegio dos Nobres
88
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 11 v]
Caetano Antonio Rodrigo Escripturario da Contadora
Godinho do Senado
O Doutor Lopo Joze Advogado nesta Corte
de Azevedo Vargas
João da Camara Na sua Quinta de Bemfica
Francisco Varella de Castro Mercador da Capella
17, 18 e Antonio Joze de Matos Na rua dos Capellistas
19. 34 Diogo Joze de Faro Na Junqueira junto
ao Cirurgião mor
D. Elena Xavier Ás escolas Geraes nas cazas
de Sayão
A Madre Soror Anna No Convento do Rato
de Santa Tereza
Miguel Joze Granate Official da Secretaria
do Ultramar
Monsenhor Rode Criado do Duque de Cadaval
Bento Pereira Cascavel da Alfandega
Francisca Joaquina Mulher do dito Bento Pereira
Gabriel da Veiga Medidor do Ferreiro
Antonio Dias Lacaio do Conde de Vimieiro
Andre da Fonseca Lacaio do Marquez d’Alvito
O Padre Espinoza Religioso de Bellem
A preta chamada Lourença Ao Cardal da Graça
da Cruz
A preta Maria Roza Mulher do preto Aleixo,
Mulher de dança a São
Francisco de Paula
20, té 24 Manoel de Jesus Mestre de Meninos
inclusive ás Janellas Verdes
Joze Machado Com loja de Barbeiro
defronte do Conde da Ponte
Andre de Campos Na Rua dos Navegantes
Antonio Joze Bolieiro de Francisco Xavier
de Alcaçovaz
Jozé Ribeiro Porteiro do Marquez de Louriçal
Antonio Caldeira Delgado Escudeiro da Senhora
Condessa de Obidos
89
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
90
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 14 v]8
Anno do nascimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil e sette-
centos e settenta e oitto aos sette dias do mez de Fevereiro nesta cidade
de Lisboa e Caza da Supplicação da mesma; ahi me foi dado pello De-
zembargador Joze Freire Falcão e Mendonça hum avizo da Secretaria de
Estado dos Negocios do Reyno incluzo hum Decreto da Rainha Nossa
Senhora, pello qual a mesma Soberana Senhora o nomeya para durante
a auzencia do Dezembargador Joze Alberto Leytão, Corregedor do Crime
e da Corte e Caza, proceguir nesta comissão de que o dito Ministro se
achava encarregado, tudo a fim de eu authuar o sobredito avizo e men-
cionado Decreto que aqui authuei e são os que ao diante se seguem.
Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
[fl. 15]
Sua Magestade manda remetter a Vossa Merce o Decreto incluzo
em que a mesma Senhora o encarrega de proseguir durante a auzencia
8
Não constam os fls. 12v, 13, 13v e 14.
91
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 16]10
[Decreto de 31 de janeiro de 1778]
Sou servida nomear o Doutor José Freire Falcão de Mendonça De-
zembargador da Caza da Supplicação para que durante a auzencia do
Doutor José Alberto Leitão Corregedor do Crime da Corte e Caza prosiga
na commissão de que se acha encarregado o dito Ministro na conformi-
dade do meu Real Decreto de sete de Novembro do anno proximo pre-
cedente. O mesmo José Freire Falcão de Mendonça o tenha assim
entendido e o execute. Salvaterra de Magos, em trinta e hum de Janeiro
de mil sétecentos setenta e oito.
(assinatura)
Rainha11
[fl. 16 v]
Anno do nascimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil e sette-
centos e setenta e oitto, aos vinte dias do mez de Março do dito anno, e
nas cazas donde rezide o Dezembargador Joze Freire Falcão e Mendonça;
ahi pello sobredito Dezembargador me foi dado hum avizo da Secretaria
do Estado dos Negocios do Reino pello qual sua Magestade he servida
que o mencionado Ministro continue esta dilligencia athe a sua ultima
concluzão; o qual avizo e ordem que o mesmo contem aqui authuei e he
o que adiante se segue. O Dezembargador Henrique Joze de Mendanha
Benavides Cirne, o escrevi.
9
No canto inferior esquerdo lê-se «Senhor Jose Freire Falcão de Mendonça».
10
Não consta o fl. 15v.
11
No canto inferior esquerdo lê-se «Registado a folha 22».
92
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 17]
[Aviso de 20 de março de 1778]
Sendo prezente a sua Magestade que a Vossa Merce fora commettida
a inquirição, que a requerimento do Marquez de Alorna se havia ordenado
por seu Real Decreto que tirasse o Doutor Jozé Alberto Leitão, Corregedor
do Crime da Corte e Caza, e que se achava com muito adiantamento a di-
ligencia da mesma inquirição, na qual entrando de novo o mesmo Doutor
José Alberto Leitão retardaria mais o progresso della, por se achar ocu-
pado em outras diligencias. He sua Magestade servida, conformando-ze
com o parecer do referido Corregedor do Crime da Corte e Caza, que
Vossa Merce continue na diligencia da sobredita inquirição athé a ultima
conclusão della, e na conformidade do Decreto pelo qual se ordenou.
Deos guarde a Vossa Merce. Paço, em 20 de Março de 1778.
(assinatura)
Visconde de Villa Nova da Cerveira12
[fl. 17 v]
Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne Dezembargador da
Caza da Supplicação e Escrivão nomeado pello Real Decreto de sette de
Novembro de mil e settecentos e settenta e sette para a inquirição facultada
ao Marquez d’Alorna como Procurador da Marqueza sua mulher e filhos,
certefico que notefiquei na forma do mesmo regio Decreto ao Dezembar-
gador Procurador da Coroa para ver jurar as testemunhas que o mencio-
nado Marques intenta produzir aprezentando-lhe em sua caza o rol das
mesmas e partecipando-lhe o dia em que se principiarão a inquirir; a que
me respondeu se acharia prezente de que para constar passei esta que as-
signo. Lisboa, sette de Fevereiro de mil e settecentos e settenta e oitto.
(assinatura)
Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne
93
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 22]13
Aos nove dias do mez de Fevereiro do anno de mil e settecentos e
settenta e oitto nas cazas da morada do Dezembargador Joze Freire Fal-
cão de Mendonça, que actualmente serve de Corregedor do Crime da
Corte e Caza e que novamente se acha pello Real Decreto junto nomeado
para proceguir nesta commissão, ahi pello dito Dezembargador forão in-
quiridas as testemunhas ao diante especificadas, deferindo-lhe o mesmo
Ministro o juramento dos Santos Evangelhos, para que bem e verdadei-
ramente dicecem e declaracem o que soubecem de quanto lhe fosse per-
guntado. As quais em nomes e cognomes, cidades, costumes, e dittos são
como ao diante se verá; de que eu Henrique Joze Mendanha Benavides,
Dezembargador da Caza da Supplicação e Escrivão, tambem nomeado
para esta dilligencia formei este termo e o escrevi.
1ª
Domingos Monteiro Ramalho, Notario appostolico de sua Santi-
dade e dos aprovados na forma do sagrado Concillio de Trento e Cirur-
gião do numero dos carceres secrettos do Santo Officio desta Corte,
morador na rua direita de São Joze e de idade que disse ter secenta
annos; testemunha jurada aos Santos Evangelhos, em que pos a sua
mão direita prometendo dizer a verdade. E ao costume disse nada. [fl.
22v] E perguntado pello undessimo artigo dos itens juntos, a que foi
apontado, e a que ja duvidou depor, pella rezão de se achar ligado com
ordens de sua Magestade, que secretamente se lhe derão, quando foi
conduzido para a quinta do meyo, a fim de executar o que se lhe de-
terminace debaixo do segredo que então se lhe ordenou, e de que agora
se acha dispençado. Disse ao dito artigo que elle em rezão do seu mi-
nisterio se achava proximo a meza em que se fazião as perguntas aos
reos do sacrilego atentado da noute de tres de Setembro de mil e set-
tecentos e sinquenta e oitto em cuja meza se achavão Sebastião Joze
de Carvalho e Mello, Secretario de Estado, o Dezembargador Pedro
Gonçalves Cordeiro, como Juiz da Inconfidencia e o Dezembargador
Joze Antonio de Oliveira Machado como Escrivão do mesmo juizo,
sendo sempre quem perguntava aos reos o mencionado Sebastião Joze
de Carvalho e Mello, Secretario de Estado e hoje Marquez de Pombal.
E o primeiro que perguntado foi o estribeiro do reo Joze Mascarenhas,
13
Não constam os fls. 18, 18v, 19, 19v, 20, 20v, 21 e 21v.
94
O PROCESSO DOS TÁVORAS
Duque sido de Aveiro, e que sendo logo depois repetidas vezes per-
guntado, o sobredito Joze Mascarenhas fora incluhindo nas suas confi-
çoins alguns fidalgos, dizendo se achavão em certos lugares em que se
[fl. 23] se fazião conventiculos e se tratava do execrando dellicto e morte
de sua Magestade, e destas confiçoins resultavão as prizoins das pessoas
que elle nomeava, sem outra algũa averiguação. Porem nas ultimas per-
guntas feitas ao mesmo reo, na mesma meza, na prezença das pessoas
acima referidas e estando mais prezentes na dita ocazião D. Luis da
Cunha, e Thome Joaquim da Costa Corte Real, Secretarios de Estado,
declarou que tudo quanto havia ditto e confessado a respeito dos fidal-
gos e padres da Companhia que tinha culpado nas suas respostas, era
falso por ter sido persuadido a este fim com o engano de lhe ser mais
favoravel a pena a que houvece de ser condemnado; e se retractava
para descargo de sua consciencia e não padecerem os inocentes a quem
tinha culpado e requeria se lhe tomace esta sua retractação e que assim
se lhe escrevece. Mas que a isto se lhe não deu reposta algũa e menos
se escreveu aquella declaração antes o Secretario de Estado D. Luis da
Cunha chamou a elle testemunha e particularmente lhe ordenou o man-
dace à tortura, a que com effeito o levou, sem que nella nem depois se
desdicece da declaração [fl. 23 v] declaração que tinha feito. E por-
quanto da rezulta do tormento percizava de curativo, foi elle testemu-
nha no dia seguinte ao quarto da sua prizão, para lhe aplicar os
remedios necessarios na forma do costume e em cazos tais praticados.
E o mesmo reo Joze Mascarenhas se queixou a elle testemunha de lhe
não quererem mandar escrever a retractação que tinha feito, para des-
cargo de sua consciencia, a qual tinha comunicado ao seu confessor
Francisco Manoel de São Boaventura. E mais não disse deste, nem do
duodecimo, decimo terceiro, e decimo quarto por ja ter deposto o que
sabia do contheudo nos mesmos artigos.
E perguntado pello vigessimo nono a que tambem foi apontado,
disse que elle acestira ao tormento dado ao reo Bras Joze Romeiro; o
qual tormento, pellas ordens que recebeu, lhe mandou dar em grao su-
perior e extraordinario e que lhe não lembra se este confessou algũa
couza no mesmo acto do tormento, tem sim lembrança que hum dos reos
confessara no tormento em termos que veyo o Juiz da Inconfidencia e o
Escrivão tomar a confissão por escritto, mas não tem tambem [fl. 24] tam-
bem lembrança do que elle confessou pellos muitos annos que tem de-
corrido e mais não disse do ditto item e artigo. E assignou depois de lhe
95
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
ser lido seu depohimento e dizer estava na verdade conforme com o que
jurado tinha. E eu, o Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Bena-
vides, Escrivão desta comissão, o escrevi.
(assinaturas)
Joze Freire Falcão de Mendonça
Domingos Monteiro Ramalho
2ª
O Reverendo Padre Frei Antonio das Chagas de Alemcastro reli-
giozo da provincia da Arrabida donde foi duas vezes provincial e actual-
mente defi[fl. 24 v]nidor geral de toda a ordem serafica conventual em
São Pedro de Alcantara testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que
pos a sua mão direita prometendo dizer a verdade e de idade que disse
ter secenta e quatro annos, e ao costume nada disse. E perguntado pello
artigo decimo quarto dos itens justificativos a que foi apontado disse que
no tempo em que se justiçarão os fidalgos pello insulto cometido contra
a pessoa do Fidellissimo Rey o Senhor D. Joze, era elle testemunha actual
guardião do Convento de São Pedro de Alcantara do qual entre varios
relligiozos que forão asistir aos dittos fidalgos entre elles foi o Mestre
Frei Urbano de Santo Antonio que assistio como confessor ao Marques
de Tavora pay. E depois de executada a sentença nos ditos Fidalgos o
ditto seu subdito lhe partecipara de que o mesmo Marques lhe tinha dado
hũa caixa de ouro e se acha duvidozo se tambem hum rellogio para lhe
mandar dizer em missas o seu producto, o que elle testemunha lhe res-
pondeu fosse fazer entrega ao Secretario de Estado Sebastião Joze de
Carvalho e Mello e tambem lhe declarou que o ditto Marques lhe man-
dara que para descargo de sua consciencia fosse dizer ao mencionado
96
O PROCESSO DOS TÁVORAS
3ª
O Reverendo Padre Frei Antonio de S. Joze guardião actual do Con-
vento de São Pedro de Alcantara, testemunha jurada aos Santos Evange-
lhos em que pos a sua mão direita, prometendo dizer a verdade, idade
que disse ter sincoenta e oitto annos e do costume nada. E perguntado
97
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
pello artigo decimo quarto dos itens justificativos a que foi offerecido
disse que elle nada sabe do contheudo no dito artigo, quanto ao que dis
respeito ao reo Joze Mascarenhas, porque elle não fora destinado para
assistir a este reo; mas sim ao reo Joze Bernardo de Tavora com seu com-
panheiro Frei Francisco de Santa Anna ja falescido. E com effeito entrando
a uzar do seu ministerio com o ditto reo e increpando-lhe o ter perpetrado
hum delicto tam enorme [fl. 26] como o de que se trata, elle lhe mostrara
as mãos desconjuntadas de sorte que não podia pegar em hum lenço para
se assoar e os braços todos cheios de chagas pella cruel tortura que lhe
tinhão dado nas suas perguntas, e lhe respondeu que por não poder ja
sofrer mais tormentos se rezolvera a querer morrer antes de hũa vez que
tornar outra a experimenta-llos; e que esta fora a rezão porque confessara
o que não tinha feito, e isto mesmo disse não so antes de receber o San-
tissimo Sacramento; mas no mesmo acto de o receber estando ja o Sacer-
dote para lho ministrar protestando que na presença daquelle Senhor que
estava para receber por Viatico declarava estar inocente no crime que lhe
imputavão. E estando ja na cadeirinha na sala aonde se achava a solda-
desca repetio o mesmo protesto, e ultimamente ja no cadafalso o tornou
a repetir declarando mais que elle pedia perdão aos reos que padecessem
por cauza da sua confição. E querendo continuar a falar viera correndo o
Corregedor do Crime dizendo para o Meirinho da execução senão havia
hũa mordassa para meter na boca aquelle reo e que desse logo a sentença
á execução. E que tendo elle testemunha a curiozidade de perguntar [fl.
26 v] a hum familiar do Coronel Graces Palha, carcereiro dos referidos
reos, que era quem hia aos quartos aonde estavão os mesmos prezos, se
algum delles fizera a mesma declaração que tinha feito o seu confessado
lhe dicera o ditto familliar a quem não soube nem sabe o nome que a
Marqueza de Tavora protestara tambem diante do Santissimo Sacramento
que ella, seu marido e seus filhos morrião todos inocentes. E mais não
disse do dito artigo nem dos mais a que foi apontado, e lido seu juramento
disse estava na verdade e assignou com o ditto Dezembargador. E eu Hen-
rique Joze de Mendanha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Frei Antonio de São Joze
98
O PROCESSO DOS TÁVORAS
4ª
O Reverendo Padre Frei Joze de Nossa Senhora do Pillar, definidor
habitual da provincia da Arrabida [fl. 27] testemunha jurada aos Santos
Evangelhos em que pos a sua mão direita prometendo dizer a verdade,
idade sinquenta e nove annos. E do costume disse nada. E perguntado
pello vigessimo nono artigo dos itens justificativos a que se acha apon-
tado disse que sendo nomeado pello seu perlado para hir assistir aos
reos do insulto de que se trata juntamente com o seu companheiro o
Padre Frei Martinho de Santa Maria forão ambos para os carceres, e vindo
o Dezembargador Joze Antonio de Oliveira Machado, lhe ordenara fos-
sem com elle e na sua companhia e na do Coronel Graces forão condu-
zidos aonde se achava o reo Bras Joze Romeiro e ahi na prezença de
todos lhe leu o dito Ministro a sentença. E logo que a acabou de ler, disse
o reo que elle era o homem mais infelis que tinha nascido, pois elle
mesmo tinha dado a sentença contra si, e querendo continuar a falar lhe
disse o mencionado Ministro que calace a boca que não tinha ja para
onde appellar; mais, que para os Padres no que dicesse respeito a sua
alma e se retirou. E logo entrando o reo a chorar protestou que estava
inocente e que pella violencia e rigor dos tratos que lhe tinhão pergun-
tado, lembrando-ce das especies que concervava das repetida[s] pergun-
tas que precedentemente lhe tinhão feito ameaçando-o que ja que não
confessava elle o diria no tormento de forma que confessou. [fl. 27v] De-
pois deposto nelle o que lhe lembrou lhe tinhão perguntado, pois elle
ignorava que tivece havido emboscadas, mudança de cavallos e o nome
delles de tal sorte que se o metecem na tortura e lhe dessem os mais for-
tes tratos elle nada diria de tudo quanto nelles tinha confessado se lho
não tivecem dito primeiro nas antecedentes perguntas, e disse mais elle
testemunha que os tratos tinhão sido tam crueis que o deixarão de forma
que não podia pegar em cousa algũa e elle testemunha lhe ministrava
99
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
tudo pella sua mão. E elle reo lhe disse tambem que no tormento tivera
hum acto de dezesperação da fe que professava. E mais não disse. E de-
pois de lido o seu juramento declarou estava escrito como na verdade
tinha deposto pello que assignou com o ditto Dezembargador. E eu Hen-
rique Joze de Mendanha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Frei Joze de Nossa Senhora do Pilar
5ª
O Reverendo Padre Frei Domingos da Natividade Custodio e Mestre
na provincia da Arrabida conventual em Nossa Senhora da Bõa Viagem
testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pos a sua mão direita
prometendo dizer a verdade, idade que disse ter secenta e sinco annos e
ao costume disse nada. E perguntado pello decimo quarto artigo dos itens
justificativos a que foi apontado disse que elle não assistira ao reo Joze
Mascarenhas mas sim foi logo destinado para assistir ao Conde da Attou-
guia com quem esteve e seu companheiro Frei Joze de Bellem. E que sem-
100
O PROCESSO DOS TÁVORAS
pre o ditto reo protestara estar inocente no delicto porque se achava con-
demnado, nem delle [fl. 28v] nada sabia, nem soubera nunca, antes dizia
se achava muito obrigado a sua Magestade de quem nunca recebera of-
fensa algũa. E que com o não assistira quando receberão o Sagrado Via-
tico, não sabe se continuou com o mesmo protesto, e que entende na sua
consciencia que o ditto reo morreu inocente da culpa porque padeceu, e
mais não disse deste nem dos mais a que foi apontado por de todos elles
ter dito o que sabia, e sendo-lhe lido seu juramento disse estava escritto
como na verdade tinha deposto e assignou com o ditto Dezembargador.
E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Frei Domingos da Natividade
6ª
O Reverendo Padre Frei Martinho de Santa Maria relligiozo da pro-
vincia da Arrabida e conventual no [fl. 29] Convento de São Joze de Ri-
bamar, testemunha jurada aos Santos Evangelhos que prometeu dizer a
verdade, e idade que disse ter secenta e sinco annos e do costume disse
nada. E perguntado pello decimo quarto artigo dos itens justificativos a
que foi apontado disse nada, nem do decimo quinto. E perguntado pello
trigessimo primeiro disse que elle fora com seu companheiro o Padre
Frei Joze do Pillar assistir ao reo Bras Joze Romeiro e que quando lhe
lerão a sentença se pozera a chorar protestando que morria innocente,
que elle não morria por aquella culpa mas sim por muitas com que tinha
offendido a Deos, e como seu companheiro tomou logo conta delle não
sabe o que com elle passou. E so lhe ouvi-o muitas vezes que se o roda-
101
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
vão vivo se não podia salvar pois temia dezesperar pello momento que
tinha ja padecido nos tormentos que lhe tinhão dado e que por sinco
vezes vira nelles a morte diante dos olhos e que elle testemunha o vira
cortado de pernas e braços de forma que era precizo meter-lhe o comer
na boca e elle testemunha esteve tam transtornado de ver o mizeravel
estado daquelle reo que so lhe lembra o que tem deposto, e o mais o
poderá declarar milhor o ditto seu companheiro por ter mais animo e
lhe assistir de mais perto. [fl. 29v] E mais não disse. E sendo-lhe lido seu
juramento disse estar na forma que deposto tinha pello que assignou
com o ditto Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavi-
des, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Frei Martinho de Santa Maria
7ª
O Reverendo Padre Frei Joze de Santa Catharina Bellem, religiozo
da provincia da Arrabida e conventual no Convento de São Cornellio dos
Olivais, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pos a sua mão
direita prometendo dizer a verdade, e de idade disse ter secenta e quatro
annos e ao costume nada. E perguntado pello decimo quarto artigo a
que foi apontado disse que elle não assistira ao reo Joze Mascarenhas,
porque sem embargo de acompanhar o Santissimo a todos os reos
quando chegou a porta do carcere aonde estava este. Foi ja tam compun-
gido do que tinha ouvido aos mais [fl. 30] reos que não teve animo de
entrar dentro. Porem ahi ouvio a pessoas que lhe não lembra que o ditto
reo se retratara das confiçoins que tinha feito em que culpava aos mais
102
O PROCESSO DOS TÁVORAS
103
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
8ª
O Reverendo Padre Frei Adrião da Natividade, religiozo da provin-
cia da Arrabida e conventual neste Convento de São Pedro de Alcantara,
testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pos a sua mão direita,
prometendo dizer a verdade, e idade que disse ter oitenta e seis annos,
e do costume disse nada. E perguntado pello decimo quarto artigo dos
itens justificados a que foi apontado disse que quanto ao reo Joze Mas-
carenhas nada sabia porque lhe não assistio e so vindo depois da execu-
ção o Padre Frei Manoel de São Boaventura confessor do dito reo Joze
Mascarenhas dissera que elle assistira a execução dos reos do Porto.
Porem que so em terra de emelhan se fazia emelhante tirania a que elle
teste[fl. 31 v]munha acodio dizendo-lhe se callace e nada mais lhe ouvio.
E sabe, outrosim, que sendo destinado para hir assistir ao reo Marques
de Tavora pay com seu companheiro, o Padre Mestre Frei Urbano, hoje
falescido forão conduzidos ao carcere do dito reo pello Coronel Graces
Palha e pello Dezembargador Joze Antonio de Oliveira Machado. E logo
que entrara no ditto carcere principiou este a ler a sentença proferida
contra o mesmo reo, e tendo lido parte della lhe perguntou o reo se
aquillo tinha algũa appellação a que respondeu o Dezembargador que
logo lhe daria a reposta, e foi continuando na leitura da mesma e tor-
nando-lhe no fim a fazer outra igual pergunta lhe respondeu “Vossa Ex-
celencia bem ve a sentença provada com as testemunhas do facto” e com
os Padres que aqui ficão he que já de conferir a sua appellação. E logo
se retirou e ficou o reo lamentando o ser condemnado sem ser ouvido
dizendo que so no dia antecedente ali fora o Dezembargador Euzebio
Tavares perguntar-lhe a defeza que tinha. A que respondendo-lhe que
nessa noute estivera sempre em caza com a sua famillia e criados e que
104
O PROCESSO DOS TÁVORAS
della não sahira, a que o Dezembargador lhe dissera que a sua caza es-
tava fechada, e logo continuou a dizer que não havia motivo para elle
cometer emelhante delicto mas [fl. 32] antes era muito obrigado a sua
Magestade de quem tinha recebido muita honra e ainda dinheiros em
algũas occazoins e que sempre athe a hora da morte estivera constante
em protestar a sua inocencia. E elle testemunha revio o braço direito bas-
tantemente magoado de sorte que não podia já delle e queixando-ce das
muitas dores que padecera dizia-lhe parecia lho tinhão cortado. E estando
já para hir para o patibollo viera o escrivão e o advertira que não falace
nem dicesse couza algũa nem quizece dar satisfaçoins a que o reo res-
pondeu que tambem o privavão de falar. E mais não disse deste, nem do
decimo quinto e mais itens a que foi apontado. E lido seu depohimento
disse estava escrito na verdade e assignou não obstante o ser sego com
elle ditto Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides,
o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Frei Adrião
105
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
9ª
Doutor Frei Manoel Evangelista de Oliveira Mascarenhas, Doutor na
Faculdade da Sagrada Theologia pella Universidade de Coimbra e Con-
sultor do Santo Officio e Examinador das Ordens Militares, testemunha
jurada aos [fl. 33] Santos Evangelhos em que pos a sua mão direita pro-
metendo dizer a verdade, idade sinquenta e dous annos. E ao costume
nada. E perguntado pello artigo decimo quarto a que foi dos itens justifi-
cativos apontado disse que so sabe que assistindo alguns mezes no Lumiar
na quinta do Excelentissimo Marquez de Angenja e isto depois de pade-
cerem os fidalgos de que se trata, tendo passado couza de vinte dias
pouco mais ou menos dissera o mesmo Marquez que havia de mandar
chamar o Frei Joze de Santa Catharina, Carmelita Descalso para assim sa-
berem com individuação do facto dos mesmos fidalgos por ter sido o dito
religiozo companheiro de Frei Manoel de São Boaventura que tinha as-
sistido por confessor do reo Joze Mascarenhas. E vindo com effeito o ditto
Padre forão para hum retiro da quinta, o mesmo Marquez, elle testemu-
nha, o ditto Padre e Francisco Xavier de Negreiros Alfeirão Dezembarga-
dor da Relação Ecleziastica e Vigario Geral da Comarca de Beja, pessoa
de conhecida virtude e literatura o qual falesceu a poucos tempos e
achando-ce sos no mencionado retiro ahi o sobredito Marquez perguntou
ao ditto relligiozo o que tinha passado com o Duque e o que sabia dos
mais Fidalgos reos, ao que respondeu [fl. 33v] que elle fora com o seu
companheiro destinado para o carcere em que se achava o ditto reo Joze
Mascarenhas, o qual acharão deitado com hũa palhossa com grilhoins e
cheyo de chagas que lhe tinhão feito na tortura e logo o Dezembargador
Joze Antonio de Oliveira Machado lhe principiou a ler a sentença. E fa-
lando nella em seu tio Frei Gaspar da Encarnação respondera o reo que
seu tio fora hum relligiozo Santo e o ditto Dezembargador o mandara
calar e lida a sentença se retirara e ficando com o ditto reo este dissera
“Padres eu vou a morrer mas quero que vossas paternidades declarem
em todo o tempo que o Marquez de Tavora, sua mulher e filhos e o Conde
da Attouguia vão a padecer innocentes”; porquanto sendo eu conduzido
e perguntado a vista da caza dos tormentos, eu me horrorizei de forma
que por quantas pessoas me perguntarão se tinhão concorrido para a con-
juração a todas incluhi nella respondendo que sim. Porem passados dias
ouvi gemidos e grittos e pella voz conheci serem do Marquez de Tavora
filho, e entrando em graves remorsos de consciencia pedi ao Coronel car-
cereiro me chamace o confessor de El Rey, o qual veyo e lhe disse quizece
106
O PROCESSO DOS TÁVORAS
107
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
10
Pedro de Roxas de Lemos fidalgo da Caza de sua Magestade, Tenente
Coronel do Regimento de Cavallaria de Miranda, testemunha jurada aos San-
tos Evangelhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade,
idade [fl. 35] que disse ter quarenta e oitto annos. E ao costume disse nada.
E perguntado pello artigo undecimo dos itens justificativos a que foi offere-
cido disse que por se achar no posto de Alferes no tempo em que os reos
do insulto de que se trata se achavão prezos e de que era carcereiro o seu
Coronel fora publico que o reo Joze Mascarenhas culpara os mais Fidalgos
e a rezão que tinhão para assim se entender foi porque nas primeiras per-
guntas lhe não derão tratos, e mais se verificou isto quando sahindo para o
patibolo perguntou se os Tavoras tinhão padecido e respondendo-lhe alguns
soldados que estavão de sentinella que ja la hião e tinhão padecido, dicera
hião inocentes e virando-ce para o confessor dicera tambem e agora como
ha de ser visto, não me posso salvar, e o confessor o exortara dizendo-lhe
que ja aquillo não tinha remedio e so o cuidar na sua salvação. E que algũas
vezes proferira o reo na mesma occazião as palavras “enganarão-me, enga-
narão-me” o que tinha prezencido bem hum soldado chamado Simão Gomes
ja falescido e assistente que foi em caza delle testemunha. E disse mais que
hindo assistir a ceya do reo Joze Maria de Tavora, vendo que estava lendo
hum livro frances, o advertira que era milhor examinar a sua consciencia [fl.
35v] ao que respondeu que elle não tinha remorso algum da culpa que se
lhe imputava e que nella estava inocente e que ouvindo muitas vezes rezar
o terso em voz alta ao Marquez de Tavora filho este sempre no fim repetia
“vos meu Deos bem sabeis que estou inocente”, o que proferia com lagrimas.
E a mesma inocencia protestou no patibollo como elle testemunha ouvio
aonde o ameassarão com hũa mordassa para o fazerem calar e mais não
disse nem dos mais que lhe forão lidos como tambem o seu juramento que
achou escritto na verdade pello que assignou com o ditto Dezembargador.
E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Pedro de Roxas de Lemos
108
O PROCESSO DOS TÁVORAS
que assim o ordena fis este termo que ambos assignarão. Henrique Joze
de Mendanha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Pedro de Roxas de Lemos
[fl. 36]
11
O Reverendo Padre Frei Antonio de Quadros, ex vezitador da pro-
vincia de Nossa Senhora da Graça, testemunha jurada aos Santos Evange-
lhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, idade
que disse ter secenta e dous e ao costume nada. E perguntado pello artigo
decimo quarto dos itens justificados a que foi apontado, disse que delle
nada sabia como tambem do decimo quinto. E ao trigessimo primeiro
disse que somente sabia por lhe dizer seu tio João Graces que acistia o
seu irmão o Coronel Henrique Graces Palha de Almeida carcereiro que
foi dos reos do insulto de que se trata, que acistindo a comunhão que por
Viatico se dera a Marqueza de Tavora estando para receber o mesmo, pe-
dira licença para falar e que ali protestara para aquelle Senhor que indig-
namente estava para receber que ella e seu marido e toda a sua famillia
se achavão inocentes da culpa que lhe arguhião, e por aquelle Senhor
perdoava o testemunho que lhe levantavão para que o mesmo Senhor lhe
perdoace os seus peccados e he o que lhe disse o dito seu tio hoje fales-
cido. E que, outrosim, tambem lhe dicera seu tio o ditto Henrique Graces
que sempre entendera que os Tavoras forão inocentes porque todos pro-
testarão a sua inocencia quando receberão o Sagrado Viatico. E quando
tambem lhe dicera que o boleeyro da sege aonde se derão [fl. 36v] os tiros
lhe certificara que depois delle grittar hia ali sua Magestade se suspende-
rão os agressores sem mais seguirem a carruagem de que inferira que os
tiros se não dirigião a El Rey nosso senhor mas sim a Pedro Teixeira que
hia com elle na sege e mais não disse e sendo-lhe lido seus juramentos
achou estar escrito na verdade pello que assignou com o ditto Dezembar-
gador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Frei Antonio de Quadros
109
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
dos Santos Evangelhos em que pondo a sua mão direita prometeu não re-
vellar a materia de seu depohimento de que para constar ter-ce executado
o Real Decretto que assim o determina se fes este termo que assignarão.
E eu o Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Frei Antonio de Quadros
12
João Pedro da Camara, fidalgo da Caza de sua Magestade e do Con-
selho do mesmo Senhor, morador na sua quinta de Bemfica testemunha
jurada aos Santos Evangelhos em que pos a sua mão direita prometendo
dizer a verdade, e idade que disse ter sinquenta annos. E ao costume
disse [fl. 37] lhe parecia tinha algum parente[s]co com a famillia dos Ta-
voras mas que não sabia em que grao. E perguntado pello decimo quarto
artigo dos itens justificativos a que foi apontado disse que nada ouvira
ao reo Joze Mascarenhas sem embargo de entrar na sua prizão como Ca-
pitão que era de cavallos nas ocazioins em que se achava de goarda a
elle e aos mais prezos; e que a estes ouvira sim muitas vezes protestarem
a sua innocencia. E com especialidade a Marqueza de Tavora a qual es-
tando para receber o Sagrado Viatico pedindo licença para falar dicera
que ella por aquelle Senhor que estava para receber declarava estar in-
nocente da culpa que se lhe arguhia e toda a sua famillia e que perdoava
a quem tinha sido cauza della receber tam grande infamia e que a seu
confessor dava licença para declarar depois da sua morte o que ella lhe
tinha comunicado. E que o mesmo protesto de innocencia ouvio fazer
ao Marquez seu marido na occazião em que se sacramentou tambem por
Viatico. E que entrando tambem na prizão do reo Bras Joze Romeiro o
vira sumamente desconjuntando de pes e mãos pellos rigorozos tratos
que lhe tinhão dado, e o mesmo lhe dicera, lhos tinhão dado para que
elle dicesse o que não sabia. E mais não disse deste nem de todos os
mais a que foi offerecido por neste ter incluhido o que delles sabia, e
sende-lhe lido [fl. 37v] seu juramento o achou escritto na verdade pello
que assignou com o ditto Dezembargador. E eu Henrique Joze de Men-
danha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
João Pedro da Camara
110
O PROCESSO DOS TÁVORAS
13
O Reverendo Padre Frei Joze da Expectação relligiozo descalso de
Nossa Senhora do Carmo e conventual14 Prior de Corpus Christi desta ci-
dade, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pos a sua mão
direita prometendo dizer a verdade, idade que disse ter sinquenta e seis
annos e do costume disse nada. E perguntado pello artigo decimo quarto
a que dos itens justificativos foi apontado disse que elle nada ouvira ao
reo Joze Mascarenhas. Porem, que ao confessor que lhe acistio na prizão,
que foi o Padre Frei Manoel de São Boaventura, [fl. 38] ouvira dizer que
muito antes do insulto de que se trata nesta justificação, tinha pertendido
o Duque e os Fidalgos Tavoras fazer decahir da graça de sua Magestade
ao Secretario de Estado Sebastião Joze de Carvalho e Mello e que por esta
rezão consultara a Marqueza a alguns jezuitas se lhe seria licito concorrer
para que fosse deposto da ocupação de Secretario, porem que nem ella
nem passoa algũa da sua famillia souberão do referido insulto, e que
sendo prezo por elle o reo Joze Mascarenhas este persuadido de que teria
milhor livramento fizera nas suas confiçoins e tratos partecipantes aos
ditos Tavoras, mas que depois pedindo confessor e dando-ce-lhe o de sua
Magestade, este lhe dicera se não podia salvar sem se retratar, e com ef-
feito pedindo o levacem a prezença dos Juizes, ahi se retratara diante do
mencionado Sebastião Joze de Carvalho e Mello Secretario de Estado e o
Dezembargador joze Antonio de Oliveira Machado. E entrando neste
tempo o Dezembargador Pedro Gonçalves Cordeiro dicera que aquillo era
ilegal pello que se rasgou e o ameasarão com tratos ao que respondeu o
reo fizecem o que quizecem que aquella era a verdade que sempre havia
de dizer. E não so lhe disse o dito Padre quanto referido tem. Mas de tudo
14
Segue-se um «e» cortado.
111
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
e de outras circumstancias que agora lhe não occorrem [fl. 38v] lhe mos-
trou hum papel que disse tinha feito por assim lho ordenar o mesmo reo,
para descargo de sua consciencia, pello não poderem ter feito nem antes
nem no tempo do supplicio o que milhor constará do referido papel, no
qual tambem se declara não terem feito a dita declaração porque no
tempo em que o Padre e o reo sahião para o supplicio chegou a elles
hum homem de capa e volta e lhes disse que não falacem mais que hum
com outro, e que se decessem algũa couza lhe havia de por aquella mor-
dassa que lhe mostrou e mais não disse deste nem dos mais que lhe forão
lidos e a que foi offerecido por nelle ter dito o que delles sabia e sendo-lhe
lido seu juramento disse estar escritto na verdade e assignou com o ditto
Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Frei Jozé da Expectação Prior
112
O PROCESSO DOS TÁVORAS
15
Lopo Joze de Azevedo Vargas, advogado da Caza da Supplicação,
testemunha jurada aos (...)15
[fl. 42]16
[16]17
(...) que ignoravão e que elle sabia isso milhor porque por sua infe-
licidade tinha sido nomeado por confessor do mesmo reo e lhe assistira
athe o patibullo e fazendo-lhe elle testemunha varias perguntas e instancias
15
O depoimento número 15 encontra-se suspenso.
16
Não constam os fls. 40, 40v, 41 e 41v.
17
Por ausência dos fls. supracitados, não consta parte do depoimento número 16.
113
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
17
O Reverendo Padre Frei Joze da Costa, Ex Vigario Corrector do Con-
vento de São Francisco de Paula, testemunha jurada aos Santos Evange-
lhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, de idade
que disse ter sinquenta e tres annos. E do costume nada. E perguntado
pello trigessimo artigo dos itens justificativos a que foi offerecido disse
que elle tivera hũa grande amizade e frequente comunicação com o De-
zembargador João Pacheco Pereira para cuja caza hia muitas tardes e nou-
tes e que depois da execução dos fidalgos de que se trata o via triste e
aflito, pello que passados alguns dias teve a confiança de lhe perguntar
que aflição era aquella que tanto o ocupava ao que lhe não respondeu
couza algũa. [fl. 43] Porem, passados tempos, estando conversando como
costume, olhando o dito Ministro para hũa Senhora da Conceipção que
114
O PROCESSO DOS TÁVORAS
tinha sempre com luz, deu hum suspiro e disse, so vos Senhora me podeis
valer nesta aflição que tanto me embaraça a consciencia, o que deu oca-
zião a que elle testemunha lhe tornace a perguntar que aflição padecia e
que não desconfiace da mizericordia de Deos, e então lhe respondeu que
nem tudo se podia dizer. Mas instando elle testemunha que dezafogace a
sua consciencia prometendo-lhe o devido segredo, então fechando a porta
da caza em que estavão lhe declarou que antes de serem julgados os reos
do atentado da noute de tres de Septembro de sinquenta e oitto, o cha-
mara o Secretario de Estado Sebastião Joze de Carvalho e Mello e lhe di-
cera que elle havia de ser Juiz no processo dos mesmos, e que tudo estava
muito bem provado e que estivece por tudo porque sua Magestade assim
o determinava. E que hindo depois ao acto de se sentencear o referido
processo elle assignara a sentença sem ter feito exame algum no mesmo
processo e sem embargo de que hum dos companheiros que estava junto
delle lhe fizera signal [fl. 43v] pello qual entendeu queria se examinace o
dito processo porem que elle encolhera os hombros e assignara a sen-
tença. Pello grande temor que tinha do mencionado Secretario de Estado,
receando o perdece e a sua caza. E que tambem lhe dicera mais que hindo
depois falar ao mesmo Secretario de Estado dizendo-lhe que tinha feito o
que sua Excellencia lhe ordenara e sua Magestade queria. O dito Secreta-
rio lhe respondera que os Tavoras erão huns homens levantados e que
era precizo dar-lhe e que fosse para a sua caza que sua Magestade o havia
de atender. E mais não disse. E lido seu juramento achando estar escripto
na verdade assignou com o ditto Dezembargador. E eu Henrique Joze de
Mendanha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Frei Jozé da Costa
115
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 44]
18ª
O Reverendo Padre Francisco Abreu, Sacerdote da Congregação da
Missão, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a sua
mão direita prometeu dizer a verdade de idade que disse ter secenta e
sette annos. E do costume nada. E perguntado pello decimo quarto artigo
dos itens justificativos a que foi offerecido disse nada. E perguntado pello
decimo quinto disse que somente sabe que o Padre Frei Manoel de São
Boaventura fora dado por Confessor do reo Joze Mascarenhas e que pouco
tempo antes de morrer o dito Frei Manoel de São Boaventura fora elle tes-
temunha vizitallo e que estando ambos sos lhe dicera que os Tavoras ti-
nhão padecido inocentes e replicando-lhe elle testemunha, pois isso he
certo, lhe respondeu com toda a ceveração que era certo. E depois ouvio
dizer a algũas pessoas que o dito religiozo tinha feito hum papel em que
declarava a inocencia dos mesmos. E mais não disse e mais não disse (sic)
deste. E perguntado pello trigecimo primeiro disse que elle não entrara
nas prizoins dos reos, excepto na em que se achava a Marqueza de Tavora
mãy a quem fora dado por confessor e que elle a acautellara antes [fl. 44v]
de se lhe ler a sentença para que nada dicesse quando se lhe lece, o que
não so executou exactamente mas posta de joelhos a ouvio com toda a
humildade, e acabada de ler beijou a terra e que como tem passado muitos
annos e elle testemunha não fes lembrança nem aprehenção do mais que
ali se passou, nada mais pode dizer ao dito artigo. E lido seu depohimento
pello achar conforme com o que tinha deposto assignou com o dito De-
zembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Francisco de Abreu e Oliveira, Sacerdote da Congregação da Missão
116
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 45]
19ª
Romão Joze Roza Guião e Abreu, Fidalgo da Caza de sua Magestade
do Conselho do mesmo Senhor, e Deputado da Meza da Consciencia e Or-
dens, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a sua mão
direita prometeu dizer a verdade, de idade que disse ter settenta annos. E
do costume nada. E perguntado pello trigessimo artigo dos itens justifica-
tivos a que foi apontado disse que elle testemunha sobre o cazo principal
de que trata o artigo não tivera pratica algũa com os Juizes da cauza, e so
passados muitos tempos hindo vizitar como costumava muitas vezes ao
Juiz da Inconfidencia, Pedro Gonçalves Cordeiro, por ter com elle boa ami-
zade em rezão de ser seu provinciano, o mesmo Juiz entrando a falar no
Duque de Aveiro lhe contara que na primeira occazião em que fora man-
dado hir as primeiras perguntas que se lhe fizerão na quinta chamada do
meyo ou das vacas, fora o Duque tam pouco conciderado que intentou
fugir. E que chegando com effeito ao acto das perguntas, o dito Juiz lhe fi-
zera as mesmas pellas [fl. 45v] palavras seguintes “como vos chamais e
donde sois natural” o que ouvindo o Duque lhe respondera com demons-
tração irada que aquelle não era o tratamento que se lhe devia dar por ser
muito diferente o de que sua Magestade lhe tinha feito merce e que ou-
vindo isto o Secretario de Estado Sebastião Joze de Carvalho e Mello que
acistia as ditas perguntas se enfurecera muito e lhe dicera as seguintes pa-
lavras “calai-vos ahi que vos ja não sois Conde, nem Marques, nem Duque,
e so sim hum patife, hum desavergonhado e hum traidor e repondei logo
senão vos mandarei fazer em quartos” e lhe contou mais que o Duque fi-
cara perturbado e algũa couza tremullo e que logo entrara a depor e sem
passar a mais lhe contou tambem que na ocazião em que fora as segundas
perguntas chegara aquelle acto o Duque mais senhor de si e que logo di-
cera queria reclamar as primeiras perguntas por ser menos verdade o que
tinha respondido e deposto nellas. E que sem embargo do Secretario de
Estado ficar na duvida se se lhe devia tomar a dita retractação elle persiso
resolvera que não, lembrando-ce que quando hũa testemunha prestava
dous juramentos contrarios sobre a mesma [fl. 46] materia so o primeiro
era atendivel em direito e que por esta rezão e tambem em atenção a gra-
vidade do dellicto lhe não quizera mandar escrever a dita retractação. E
finda esta pratica que tambem presenciou outro Ministro de cujo nome se
não lembra e so sim que sahindo ambos vierão murmurando da opinião
que tinha seguido o mencionado Juiz da Inconfidencia acentando que elle
117
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O PROCESSO DOS TÁVORAS
119
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
Santos Evangelhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a ver-
dade, idade que disse ter sinquenta e dous annos. E do Costume nada. E
perguntado pello trigessimo artigo dos itens justificativos a que foi pro-
duzido disse que emquanto a inocencia da famillia dos Tavoras nada ou-
vira aos Juizes que assignarão a sentença, porem, poucos mezes antes de
morrer o Dezembargador Antonio Teixeira Alvares, hindo este a caza delle
testemunha e conversando sobre a infelicidade da mesma famillia lhe di-
cera o dito Dezembargador que elle logo no tempo da execução da dita
sentença soubera por varias razoins que a sobredita famillia dos Tavoras
tinha padecido inocentemente e que mais se persuadira desta verdade
porque reparando em que seu companheiro no Concelho da Fazenda o
Dezembargador João Marques Bacalhao, Juiz que tinha sido na sentença,
andava muito alegre como quem mostrava não ter remorso na sua cons-
ciencia quando elle entendia o devia ter pellas razoins que [fl. 48v] sabia.
Então se rezolvera a buscar particullarmente ao dito Dezembargador João
Marques Bacalhao a fim de se tirar da duvida que a sua alegria lhe moti-
vado e com effeito falando-lhe nesta materia com todo o segredo lhe res-
pondera o mesmo João Marques Bacalhao que elle andava alegre porque
não tinha vottado demeritis na referida sentença. Antes sendo-lhe apre-
zentada pello Secretario de Estado Sebastião Joze de Carvalho e Mello,
para elle dito João Marques Bacalhao a assignar. A duvidara assignar por18
conter a nullidade de não ter sido ouvida e perguntada a Marqueza de
Tavora na mesma condemnada e se não ter assignado tanto a esta como
aos mais reos tempo competente para as suas defezas; ao que respon-
dendo-lhe o dito Secretario de Estado se hia argumentar com elle. Então
lhe dicera que não hia argumentar, mas que não vottava demeritis sem
ser sanada aquella nullidade. Depois do que lhe ordenara o mesmo Se-
cretario de Estado que assignace aquillo mesmo que dizia e que elle nesta
conformidade assignara a sobredita sentença de que não lhes rezultara
escrupollo algum para deixar de andar alegre. E mais não disse. E lido [fl.
49] seu juramento achando estar escripto na forma que tinha jurado as-
signou com elle dito Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha
Benavides Dezembargador da Caza da Supplicação, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Antonio de Mesquita e Moura
18
Segue-se um «que» cortado.
120
O PROCESSO DOS TÁVORAS
22ª
Gonçallo Xavier de Alcassova, mosso Fidalgo da Caza de sua Mages-
tade, Alcaide mor de Campo Mayor, Donnatario das saboarias de Olivensa
e Secretario perpetuo da Academia da Historia Portugueza, testemunha ju-
rada aos Santos Evangelhos em que pondo a sua mão direita prometeu
dizer a verdade, idade que disse ter secenta e tres annos. E do costume
nada. [fl. 49v] E perguntado pello trigessimo segundo artigo dos itens jus-
tificativos a que foi produzido, disse que no mayo proximo a sentença de
que trata artigo, tendo hido acompanhar seu primo Joze Correa de Sá que
hia para Governador da Ilha da Madeira, aonde hia tambem o Secretario
de Estado Thome Joaquim da Costa Corte Real e o senhor D. João, na volta
estando elle testemunha e o dito Secretario de Estado e lamentando-ce-lhe
na Junqueira donde era a sua caza que a formozura daquelle sittio ficara
desfigurada com a vista daquelle forte em que se encerravão tantos mize-
raveis e pella reprezentação da cauza horroroza porque ali estavão encer-
rados, o dito Secretario de Estado que com elle testemunha tinha grande
amizade e confiança, principiou a zombar destas tristes refexoins ao que
elle testemunha incistio protestando-lhe que aquella materia não era digna
de ser tratada por aquelle modo sendo tam seria e tam respeitavel. E tor-
nando elle a tratalla com as mesmas demonstraçoins de zombaria, elle tes-
temunha mostrando-lhe toda a sencibilidade que produzia nelle aquella
afectada maneira, exclamou dizendo-lhe se era pocivel que se tratace como
bocatella hũa traição e crime de Leza Magestade da primeira cabessa e
então elle Secretario [fl. 50] de Estado lhe replicou dizendo ao falar-lhe na
sentença proferida sobre o mesmo cazo as palavras seguintes “tambem
voce he desses, qual sentença nem meya sentença, quando se levou a junta
ja hia feita de caza” ao que elle testemunha enchendo-ce de horror para
que nunca se esquecesse daquellas mesteriozas palavras e para que em
121
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122
O PROCESSO DOS TÁVORAS
24ª
Francisco Varella de Castro, mercador da classe da Capella, teste-
munha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a sua mão direita
prometeu dizer a verdade, de idade secenta e seis annos. E do costume
nada. E perguntado pello decimo quarto artigo dos itens justificativos a
que foi produzido disse que elle tivera especial amizade com o Padre
Frei Joze de Santa Catharina, religiozo Carmellita Descalso, o qual hindo
a caza delle testemunha passados oitto dias, pouco mais ou menos, de-
pois da execução dos Fidalgos, ahi separando-ce de seu companheiro e
chamando-o de parte lhe disse que elle fora por companheiro de Frei
Manoel de São Boaventura assistir aos ditos Fidalgos e que acompanhara
[fl. 51v] o Sagrado Viatico quando se lhe ministrou e que a primeira pri-
zão a que forão fora a em que se achava a Marqueza de Tavora. E estando
abraçada com hum Santo Christo dicera que por aquelle Senhor e pello
Santissimo Sacramento que estava para receber e a quem brevemente es-
tava para dar conta, protestava de que não so não tinha concorrido para
semilhante atentado, mas que nem delle tivera noticia. E que passando
as prizoins do Marques de Tavora, de seus filhos e do Conde de Attouguia
todos protestarão da mesma forma a sua inocencia diante do mesmo Se-
nhor Sacramentado. E passando ultimamente a prizão do reo Joze Mas-
carenhas, este dicera que so elle e duas pessoas que elle asallariara he
123
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
que tiverão parte naquelle atentado de que nimguem mais fora sabedor,
o que tudo tinha sido no mesmo acto em que estava para receber o
mesmo Senhor Sacramentado. E mais não disse, nem dos mais a que foi
apontado. E lido seu juramento, achou estar escritto na verdade e assig-
nou com o referido Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha
Benavides Cirne o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Francisco Varella de Castro
25ª
Caetano Antonio Rodrigo Godinho, primeiro Escripturario da Con-
tadoria Geral do Senado, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em
que pondo a sua mão direita, prometeu dizer a verdade, idade quarenta
hum anno. E do costume nada. E perguntado pello decimo quarto artigo
dos itens justificativos a que foi produzido disse nada, nem do decimo
quinto. E perguntado pelo trigessimo primeiro disse que elle tivera
grande amizade com o Padre Mestre Frei Urbano, religiozo de São Pedro
de Alcantara, a que hindo vezitar poucos dias depois da execução dos fi-
dalgos e achando-o muito triste lhe perguntara o que tinha, e vindo elle
a porta da cella, a examinar se estava algem no dormitorio, fechara a
porta por dentro e recomendando-lhe todo o segredo lhe disse “como
que vosse que ca não esteja triste se eu fui confessor do reo Marques de
Tavora e sei que elle morreu inocente” e lhe disse mais que logo que o
Dezembargador Joze Antonio de Oliveira Machado lhe lera [fl. 52v] a sen-
tença dicera este que appellava della para El Rey, ao que respondeu o
dito Ministro que não havia appellação nem agravo e o reo dicera então
124
O PROCESSO DOS TÁVORAS
appellava para Deos. O que tudo o dito religiozo lhe expressou com as
lagrimas nos olhos e com grandes demonstraçoins de sentimento. E mais
não disse. E lido seu juramento, achou estar escripto na verdade e assig-
nou com o dito Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Be-
navides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Caetano Antonio Rodrigo Godinho
26ª
O Reverendo Frei Dionizio Luis de Faro, Monge de São Jeronimo,
conventual em Bellem, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que
pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, idade que disse ter
secenta e dous annos. E do costume disse [fl. 53] ser hũa sua prima di-
reita, cazada com Nuno Gaspar de Lorena. E perguntado pello trigessimo
artigo dos itens justificativos a que foi produzido disse que pella rezão
da particullar amizade que tinha o Dezembargador João Marques Baca-
lhao com a Viscondeça de Barbacena sua tia, aonde elle testemunha acis-
tia e continuadamente concorria o dito Dezembargador não so pella
amizade mas tambem pella vezinhança, este depois da execução da sen-
tença dos Fidalgos lhe dissera muito em segredo que a famillia dos Ta-
voras padecera inocente e que dera algũas rezoins explicando-ce por
palavras e termos de que elle testemunha se não lembra pello muito
tempo que tem decorrido. Porem, se não esquesse de que todas se enca-
minhavão a provar a inocencia da dita famillia e especialmente se lembra
delle lhe dizer que lhe Herodes não fora mais cruel com os inocentes do
que o Secretario de Estado Sebastião Jozé de Carvalho e Mello tinha sido
125
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
com a sobredita famillia e que tambem lhe ouvira dizer que o mesmo
Secretario inquiria particularmente as testemunhas e depois vinha dizer
o que tinha jurado a testemunha e o que havia de escrever. E mais não
disse, pello que lido seu depohimento e achando estar [fl. 53v] escritto
na verdade, assignou com o dito Dezembargador. E eu Henrique Joze de
Mendanha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Frei Dionizio Luis de Faro
27ª
O Illustrissimo Joaquim Jansem Moller, do Concelho de sua Mages-
tade, Prelado da Santa Igreja Patriarchal e morador junto a Igreja de São
Tyago desta cidade, idade que disse ter sinquenta e nove annos.
Sendo-lhe dado o juramento dos Santos Evangelhos em que pos a sua
mão direita prometendo dizer a verdade. E do costume disse nada. E per-
guntado pello trigessimo artigo dos itens justificativos a que foi produ-
zido disse que falando com seu amigo, o Dezembargador Joze Simoins
Barboza, com quem [fl. 54] se tratava particularmente alguns dias depois
da execução da sentença de que trata o artigo, discorrendo sobre as pro-
vas da mesma dissera o seguinte “e o pior he que os Ministros vottarão
sem verem os authos e so pella informação que se lhe deu” afirmando o
referido com tanta segurança que elle testemunha se capacitou então que
o mesmo Ministro tinha sido Juiz em algũa das sentenças que precederão
a dita execução e que sobre o ponto de estarem ou não inocentes os Ta-
voras não afirmara mais algũa couza o dito Ministro. Porem, que sendo
seu sobrinho Henrique Jansem Moller, official do Regimento dos Dra-
126
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 55]
28ª
Miguel Joze Granatti, Official da Secretaria do Conselho de Ultramar,
morador junto ao Palacio da Anunciada, testemunha jurada aos Santos
Evangelhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade,
idade que disse ter trinta e sinco annos. E do costume nada. E perguntado
pello decimo settimo artigo dos itens justificativos a que foi produzido
127
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
disse que sabe de certa sciencia que Luis Bernardo de Tavora antes do
execrando dellicto de tres de Setembro de mil e settecentos e sinquenta
e oitto, hia ao ensayo de hũas contradanças que se ensayavão em Bellem
nas cazas de Joze Mascarenhas, às quais acistia o rebeca Andre. O qual
depois de executada a sentença no dito Luis Bernardo segurou a elle tes-
temunha com as lagrimas nos olhos que elle acompanhara naquella refe-
rida noute ao mesmo Luis Bernardo para o ditto ensayo no qual estiverão
athe a meya noute, donde sahirão ambos juntos levando o ditto Luis Ber-
nardo a elle Andre de ancas no seu cavallo. E o mesmo dizia que se Luis
Bernardo era culpado que tambem elle o era, pois ja depois da meya
noute se apeara do cavallo e sobira as escadas de Santo Amaro em direi-
tura as cazas donde rezidia e elle rebeca [fl. 55v] montara no mesmo ca-
vallo e se fora para sua caza. E mais não disse deste nem do decimo
oittavo e decimo nono e trigecimo quarto a que foi apontado, pello que
sendo-lhe lido seu juramento achando estar escripto na verdade, assignou
com o ditto Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides
Cirne, Dezembargador da Caza da Supplicação, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Miguel Joze Granate
29ª
Antonio Joze de Mattos Ferreira, Cavalleiro professo da Ordem de
Christo e Apontador das moradias dos fidalgos Cappelains da Caza Real,
testemunha jurada aos Santos Evangelhos em pondo a sua mão direita
prometeu dizer a verdade, de idade [fl. 56] secenta annos. E do costume
nada. E perguntado pello decimo settimo artigo dos itens justificativos a
que foi offerecido disse que na noute de tres de Septembro de mil e set-
128
O PROCESSO DOS TÁVORAS
129
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 57]
30
Diogo Joze de Faro e Vasconcellos, Cavalleiro professo na Ordem
de Christo, Escrivão do cargo de guarda reposte da Caza Real e morador
na Junqueira, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo
a sua mão direita prometeu dizer a verdade, de idade que disse ter se-
centa annos e do costume nada. E perguntado pello decimo settimo ar-
tigo dos itens justificativos a que foi produzido disse que na tarde do dia
tres de Septembro de mil e settecentos e sinquenta e oitto sahio elle tes-
temunha com o filho de Joze Mascarenhas, Duque que foi de Aveiro, de
quem era ayo, e recolhendo-ce a horas de se acenderm luzes acharão já
em caza a Luiz Bernardo de Tavora e a Condessa de Attouguia com o re-
beca Andre para continuarem os ensayos que costumavão fazer de con-
tradanças a fim de hirem a hũas festas da Cova da Piedade e com effeito
principiarão o ditto ensayo logo e o proceguirão com outros brincos athe
depois da meya noute, sendo sempre assistente a elles e inseparavel dos
mesmos em todo o tempo que tem referido o mencionado Luis Bernardo
de Tavora, o que sabe por ter sempre resencia a tudo sem mais intervallo
do que o sahir da caza donde estavão com o dito ensayo [fl. 57 v] a salla
de fora a falar com o Joze Anastacio Guerreiro com quem se demorou
poucos minutos e afirma pello resenciar tambem que acabado o brinco
depois da meya noute se auzentara a referida Condença e logo junta-
mente o mencionado Luis Bernardo de Tavora sahindo de cavallo com a
farda do seu Regimento, sem capote, levando de ancas o rebeca Andre.
E mais não disse deste nem do decimo oittavo, decimo nono e trigessimo
quarto, pello que lido seu juramento achando estar escripto na verdade,
assignou com o ditto Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha
Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Diogo Joze de Faro e Vasconcellos
130
O PROCESSO DOS TÁVORAS
(assinaturas)
Falcão de Mendonça
Diogo de Faro e Vasconcellos
[fl. 58]
31ª
Lourença da Crus, mulher preta e livre, cazada com Thome Fernan-
des, moradora no Cardal da Graça, testemunha jurada aos Santos Evan-
gelhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, e
idade quarenta e sinco annos pouco mais ou menos. E do costume nada.
E perguntada pello decimo septimo artigo dos itens justificativos a que
foi produzida disse que sendo criada da Duqueza de Aveiro vira que
antes do ferimento que se disse feito a sua Magestade se perparavão na
caza da mesma Duqueza vestidos e mascaras e se ensayavão contradan-
ças para hirem a hũas festas de touros da banda d’alem nas quais entrava
Luis Bernardo de Tavora que sempre levava comsigo o rebeca Andre e
vio ella testemunha que na noute em que se dicerão feitos os ditos feri-
mentos ao acender das luzes, pouco mais ou menos, fora o ditto Luis
Bernardo com o referido rebeca e ahi dansarão athe depois da meya
noute, sem que dali sahicem, o que tudo prezenciara a famillia da caza,
pelo que quando lhe dicerão que o ditto Luis Bernardo padecera por
cauza dos mencionados ferimentos acentara que essa não podia ser a
cauza por elle ter estado ali athe depois da meya noute. E mais não disse
deste nem do decimo oittavo, decimo [fl. 58v] nono e trigecimo quarto.
E sendo-lhe lido seu juramento, o achou conforme com o que tinha de-
posto e não assignou por não saber escrever e somente assignou o refe-
rido Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne
o escrevi.
(assinatura)
Jozé Freyre Falcão e Mendonça
131
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
32ª
Maria Roza, pretta livre e cazada com Aleyxo Teixeira, Mestre de
rebeca, moradora na Pampulha, testemunha jurada aos Santos Evange-
lhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, de idade
trinta annos, pouco mais ou menos. Do costume nada. E perguntada pello
decimo septimo artigo dos itens justificativos a que foi produzida disse
que ella testemunha acistira no serviço da Duque[fl.59]za de Aveiro, rezão
porque ahi via hir muitas noutes o Marques moço Luis Bernardo de Ta-
vora acistir ao ensayo de hũas contradanças levando hum rebeca cujo
nome não sabe e que depois que entravão no dito ensayo so costumava
sahir depois da meya noute e quando elle fora prezo, e os mais Fidalgos,
ouvira dizer ás criadas da caza que na ocazião dos tiros elle tinha estado
no ditto ensayo. E mais não disse deste nem do decimo oittavo, decimo
nono e trigecimo quarto. E lido seu juramento achou estar escrito na ver-
dade, não assignado por não saber escrever pello que somente assignou
elle mencionado Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Be-
navides, o escrevi.
(assinatura)
Jozé Freyre Falcão e Mendonça
132
O PROCESSO DOS TÁVORAS
133
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
34ª
Manoel Joze da Costa, cazado e morador no forte de Xabregas, tes-
temunha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a sua mão direita
prometeu dizer a verdade, de idade quarenta e oitto annos. E do costume
disse ser criado da Marqueza D. Thereza de Lorena. E perguntado pello
decimo septimo artigo a que foi produzido dos itens justificativos de que
se trata disse que somente sabe por lho dizer Antonio Joze que, hoje se
acha no Estado da India e criado que foi do Marques Luis Bernardo, que
este tivera na noute de tres de Septembro de mil e settecentos e sinquenta
e oitto ensayando hũas contradanças em caza do Duque de Aveiro e que
se tinha recolhido pella meya noute trazendo o rebeca Andre d’ancas no
cavallo em que se recolhera e que isto mesmo lhe dicerão tambem algũas
criadas da Duqueza queixando-ce de que o dito Marques Luis Bernardo
as tinha mohido com contradanças e quando [fl. 61] referido fizera lem-
brança porque logo depois que lho dicerão ouvio tambem dizer se tinhão
dado huns tiros em Pedro Teixeira. E mais não dice deste, nem do decimo
oittavo, decimo nono e trigessimo quarto, pello que lido seu juramento,
achando estar escritto na forma que tinha deposto, assignou com o dito
Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Manoel Joze da Costa
35ª
Bento Dias, cazado e morador a S. Lazaro, testemunha jurada aos
Santos Evangelhos em que pondo a sua mão direita prometeu [fl. 61v]
dizer a verdade, de idade quarenta e oitto annos. Costume nada. E per-
guntado pello decimo setimo artigo dos items justificativos a que foi pro-
134
O PROCESSO DOS TÁVORAS
duzido disse que sabe por ter sido ajudante da copa do Duque que foi
de Aveiro, que em caza do mesmo estiver desde horas de ave marias athe
a meya noute Luis Bernardo de Tavora e o rebeca Andre ensayando hũas
contradanças em que entravão vários amiliares da caza do mesmo Duque
e que acabado o dito ensayo sahira a meya noute como dito tem de farda
e sem capote, levando d’ancas no cavallo em que hia ao mesmo rebeca
Andre e que no dia seguinte a dita noute se publicou logo teren-ce dado
os tiros a Pedro Teixeira pello que ficara certo de que nelles se não podia
achar o dito Luis Bernardo por ter sido inseparavel da caza do Duque
athe meya noute. E mais não dice deste, nem do decimo oitavo, decimo
nono e trigecimo quarto. E lido seu juramento o assignou com o referido
Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o
escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
† de Bento Dias
36ª
D. Rita de Sales Granate, cazada com João Carlos Finali, Official da
Secretaria de Ultramar, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que
pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, de idade trinta annos
e ao costume nada. E perguntada pello decimo settimo artigo dos items
justificativos a que foi produzida disse que ella testemunha fora criada
de poucos annos em caza do Marquez Luis Bernardo de Tavora, o qual
no dia declarado no artigo se lembra fora por horas do sol posto vestir-ce
ao seu quarto e dicera a ella testemunha e a sua filha que se viece o re-
beca Andre o ssustasse e tomacem lição de dança athe elle vir. E vindo
o dito rebeca, mas já a horas de acender luzes, chegara tambem o mesmo
135
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
Marquez vestido [fl. 62v] de farda e de meyas e dicera não erão horas de
tomarem lição porque queria hir com o dito rebeca para caza do Duque
de Aveiro ensayar hũas contradanças que havião de hir fazer a banda
d’alem e que sahindo ambos se recolhera pella meya noute pouco mais
ou menos e que se lembra do que tem deposto por no dia seguinte se
publicar terem-ce dado hums tiros em Pedro Teixeira e se seguir a prizão
do mesmo Marquez e mais Fidalgos no tempo do qual se lembra tambem
que sendo o dito Marquez prezo de manham. Achando-ce a Marqueza
muito aflita, sobira o criado Antonio Joze boleeyro e lhe dicera que se
não ssustasse porque elle tinha sempre acompanhado o Marques e sabia
que elle não tinha culpa algũa. E mais não disse deste nem do decimo
oittavo, decimo nono e trigessimo quarto, pello que lido seu juramento
achando estar escritto na verdade assignou com o dito Dezembargador.
E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Ritta de çales (sic) Granate
37ª
Gabriel da Veiga, medidor do terreiro, cazado e morador no Vale
de Santo Antonio, freguesia de Santa Engracia, testemunha jurada aos
Santos Evangelhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a
verdade, de idade quarenta e dous annos. E do costume nada. E pergun-
tado pello decimo settimo artigo dos items justificativos a que foi produ-
zido, disse que elle servira de azemel da caza do Duque que foi de Aveiro
e tem toda a certeza e lembrança de que na noute declarada no artigo
estivera o Marquez Luis Bernardo de Tavora em caza do dito Duque no
136
O PROCESSO DOS TÁVORAS
38ª
Andre da Fonseca, cazado e asistente em caza do Marquez de Al-
vito, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a sua mão
direita, prometeu dizer a verdade, de idade quarenta e dous annos. E do
costume nada. E perguntado pello decimo settimo artigo dos items justi-
ficativos a que foi produzido, disse que elle servia na caza do Duque que
[fl. 64] que foi de Aveiro em o anno de mil e settecentos e sinquenta e
oitto e tem lembrança de que na noute que se disse tinhão dado hums
tiros em Pedro Teixeira. Estivera em casa do mesmo Duque o Marquez
Luis Bernardo de Tavora com o rebeca Andre e que ambos forão ao
tempo que ja as luzes estavão acezas e principiando logo hum ensayo de
contradanças nelle e em outros brincos se demorarão athe a meya noute
em que se despedio o dito Marquez, levando d’ancas no cavallo em que
hia ao referido rebeca Andre. E mais não disse deste nem do decimo oit-
137
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
tavo, decimo nono e trigecimo quarto, pello que lido seu juramento,
achando escritto como tinha deposto o assignou com o dito Dezembar-
gador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
† de Andre da Fonseca
[fl. 64 v]
Aos quatro dias do mez de Abril do anno de mil settecentos e set-
tenta e oitto neste Convento das relligiozas de Nossa Senhora do Reme-
dio, Trinas de Campolide aonde veyo o Dezembargador Joze Freire Falcão
e Mendonça, ahi em hũa das grades do mesmo Convento forão pergun-
tadas as testemunhas ao diante nomeadas, dando-ce-lhe ajuramento dos
Santos Evangelhos para dizerem a verdade, de que eu Henrique Joze de
Mendanha Benavides Cirne, Dezembargador da Caza da Supplicação e
Escrivão da sua inquirição, fis esta acentada e a escrevi.
39ª
A Madre Soror Anna de Santa Thereza, que no seculo se chamou D.
Anna da Cunha Guedes, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que
pondo a sua mão direita, prometeu dizer a verdade, de idade quarenta e
quatro annos. E do costume disse nada. E perguntada pello decimo settimo
artigo dos items justificativos a que foi apontada, disse que na noute em que
se derão os tiros de que trata o artigo, acistira ella testemunha com a Du-
queza de que foi de Aveiro desde as oitto horas, pouco mais ou menos, athe
a meya noute a ver hũas contradanças que na caza da mesma se ensayavão
e em todo este tempo, das oitto horas athe a meya noute, esteve sempre
prezente Luis Bernardo de Tavora, que nellas fazia figura sem que [fl. 65] se
138
O PROCESSO DOS TÁVORAS
40
Miguel Pedrozo, Tenente de cavallos do Regimento de Alcantara,
testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a sua mão di-
139
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 66v]
41ª
Antonio Jorge, soldado da Companhia de Carvalho do Regimento
de Alcantara, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a
19
Não consta a segunda assinatura de Falcão e Mendonça.
140
O PROCESSO DOS TÁVORAS
42ª
Manoel da Silva Moreira, cazado e soldado reformado do Regi-
mento de Alcantara aonde servio na Companhia que foi do Masques Luis
Bernardo de Tavora morador defronte da estrella, testemunha jurada aos
Santos Evangelhos, em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a
verdade, de idade secenta e sinco annos. E do costume nada. E pergun-
tado pello vigecimo oitavo artigo dos itens justificativos a que foi produ-
141
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
43ª
Joze Francisco Rijo, cazado e morador em Valêjas no sittio da Bica,
testemunha jurada aos Santos Evangelhos, em que pondo a sua mão di-
reita prometeu dizer a verdade, de idade quarenta e sinco annos. E do
costume dice nada. E perguntado pello artigo vigecimo oitavo dos itens
justificativos a que foi produzido, dice que no tempo do sacrilego insulto
de que trata o ar[fl. 68]tigo era elle testemunha Cabo de esquadra da
Companhia do Marques Luis Bernardo de Tavora e tinha debaixo da sua
inspecção todos os cavallos que o dito Marques tinha na cavalharice a
Santo Amaro e que della não sahio cavallo algum na noute do referido
atentado nem nas noutes e dias precedentes porque não podião sahir
sem elle testemunha o saber e que concerva a referida lembrança porque
sendo tambem prezo logo depois que o forão os Fidalgos, o Secretario
142
O PROCESSO DOS TÁVORAS
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Joze Francisco Rijo
[fl. 68v]
E tendo deposto a referida testemunha logo elle mencionado De-
zembargador Joze Freire Falcão e Mendonça lhe deu segundo juramento
dos Santos Evangelhos em que pondo a mão prometeu não revellar a
materia de seu depohimento de que para constar ter-ce executado o Real
Decreto que assim o determina, se fes este termo que assignarão. E eu o
Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Joze Francisco Rijo
44ª
O Illustrissimo e Excelentissimo Marquez de Marialva, testemunha
jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a sua mão direita prometeu
dizer a verdade, de idade secenta e quatro anos. E do costume dice ter
algum remoto parentesco com a famillia dos Tavoras. E perguntado pello
trigessimo segundo dos itens justificativos a que foi produzido, dice que
somente lhe lembra que achando-ce nas Caldas com Thome Joaquim de-
pois que este não exercitava o lugar de Secretario de Estado, quei-
143
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
45ª
Pedro Hipolito de Figueiredo, Cavalleiro professo na Ordem de
Christo, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a sua
mão direita prometeu dizer a verdade, de idade quarenta e dous annos.
E do costume nada. E perguntado pello trigecimo segundo artigo dos [fl.
69v] itens justificativos a que foi produzido, dice que achando-ce elle tes-
temunha na Villa das Caldas e na acistencia do Marquez de Marialva, con-
versando este com o Secretario de Estado Thome Joaquim da Costa Corte
Real que ahi se achava retirado da Corte, lhe ouvira as palavras seguintes:
“dizem que o estupor me dera pella cabessa, a cabessa de Thome Joa-
quim he tam bõa antes do estupor como depois delle e se tem receyo de
que diga algũa couza podem degollar-me porque naquelle patibollo pa-
144
O PROCESSO DOS TÁVORAS
decerão cabeças tam inocentes como a minha”. E mais não dice pello
que lido seu juramento, achando estar escritto na verdade, o assignou
com o dito Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides
Cirne, Dezembargador da Caza da Supplicação, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Pedro Hippolito de Figueiredo
[fl. 70]
46ª
Martinho Teixeira Pequeno Chaves, Fidalgo da caza de sua Mages-
tade, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a sua mão
direita prometeu dizer a verdade, de idade quarenta e oitto annos. E do
costume nada. E perguntado pello resenci artigo dos itens justificativos
a que foi produzido dice nada nem do resencio. E perguntado pello de-
cimo terceiro dice que sabe por ter estado de guarda aos Fidalgos prezos
pello infelis insulto de que se trata, como Capitão de cavallos do Regi-
mento de Aveiro que os guardava e por lhe ser incumbido o mete-llos e
tira-llos das prizoins quando era precizo hirem a perguntas, que logo que
se leu a sentença ao reo Joze Mascarenhas este pedira a elle testemunha
quizece mandar recado ao Juiz da Inconfidencia, Pedro Gonsalves Cor-
deiro, para que lhe viece falar a prizão e com effeito por hum Official,
de quem lhe não lembra hoje o nome, mandou o dito recado. E vindo o
dito Ministro, elle abrio a porta da prizão e entrando para dentro se de-
morou com o mencionado reo algum tempo, porem, elle testemunha nem
ouvio nem podia ouvir a pratica que tiverão e so sim sahindo o mesmo
Ministro vio o esperava fora o Secretario de Estado Sebastião Joze de
Carvalho e Mello e perguntando-lhe este o que quer que foi e que elle
145
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
E tendo deposto a referida testemunha, logo elle dito [fl. 71] De-
zembargador Joze Freire Falcão de Mendonça lhe deferio segundo jura-
mento dos Santos Evangelhos em que pondo a mão prometeu não
revellar a materia de seu depohimento, de que para constar ter-ce exe-
cutado o Real Decreto que assim o determina, se fes este termo que as-
signarão. E eu o Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Benavides,
Cirne o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Martinho Teixeira Pequeno Chaves
47ª
D. Catharina Ge[r]trudes Jorge, mulher de João Jorge, homem de
negocio da praça desta cidade, testemunha jurada aos Santos Evange-
lhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, de
146
O PROCESSO DOS TÁVORAS
147
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
48ª
D. Anna Joaquina de Souza, viuva de Nicolao Ribeiro da Cunha e
acestinte em caza d[o] Visconde d’Asseca, testemunha jurada aos Santos
Evangelhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade,
de idade quarenta e sinco annos, pouco mais ou menos. E do costume
nada. E perguntada pello vigecimo quinto artigo dos itens justificativos
a que foi produzida, dice que tem certeza de que na infelis noute de
tres de Septembro de mil e settecentos e sinquenta e oitto, antes das
des horas da mesma noute se recolhera a caza do Rio Seco, D. Leonor
de Tavora, Marqueza que foi do mesmo titullo, na companhia de sua
filha D. Marianna de Lorena de que muito bem se lembra, não so por-
que no dia seguinte ouvio falar nos tiros que se derão na referida noute
mas tambem porque na mesma se juntou hum lacayo da caza d’Attou-
guia com sua mulher e ella testemunha e outras pessoas da mesma Mar-
queza intentavão hir fazer-lhe algũas peças, o que não executarão pella
dita Marqueza se recolher as horas que [fl. 72v] tem deposto de que fi-
carão muito sentidas e tambem porque ella testemunha era hũa das
criadas que acistia frequentemente a mencionada Marqueza e a que lhe
foi acistir no tempo em que estava para padecer e se lembra bem que
tanto que ella testemunha foi conduzida a prezença da mesma mar-
queza esta lhe dicera: “aqui me achas condemnada a morte, mas ino-
cente e toda a minha famillia”. E isto mesmo lhe ouvio repetir na
ocazião em que estava para receber o Santissimo Sacramento, protes-
tando na prezença do mesmo Senhor que estava para receber, que ella
fazia aquella declaração da sua inocencia e de todos os seus para des-
cargo de sua consciencia e imediatamente recebeu. E mais não dice. E
perguntada pello vigecimo seixto a que tambem foi produzida dice que
pellas mesmas rezoins com que tem deposto ao artigo acima sabe e
tem a mesma certeza de que o Marques Francisco de Assis se recolhera
na referida noute ao mesmo tempo, pouco mais ou menos, que a Mar-
queza sua mulher se tinha re[c]olhido. E tanto não sahio mais de caza
nessa noute que logo que chegou e se despio dice vinha muito tomado
do peito pella queixa de asma que padecia e pedio hum caximbo de
que uzava quando era acometido da dita queixa. O qual ella testemunha
lhe ministrou e depois de caximbar por largo espasso no qual a Mar-
queza se ocupou em ler por hum livro se foi logo deitar, tendo-ce pouco
antes retirado a dita [fl. 73] sua filha. E mais não dice pello que lido
seu juramento achando estar escrito na verdade, o assignou com o dito
148
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 73v]
49ª
O Illustrissimo D. Antonio de Aguillar Sequeira, Prelado da Santa
Igreja Patriarchal e do Conselho de sua Magestade, testemunha jurada aos
Santos Evangelhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a ver-
dade. E do costume dice nada. E perguntado pello vigecimo quinto artigo
dos itens justificativos a que foi produzido dice nada. E perguntado pello
vigecimo sexto artigo dos mesmos itens justificativos dice que no dia tres
de Septembro do anno de mil e settecentos e sinquenta e oitto, foi elle
testemunha de tarde para caza do Secretario de Estado Sebastião Joze de
Carvalho e Mello, a quem pertendia falar e ja na salla aonde esperou,
achou o Dezembargador Euzebio Tavares com quem esteve conversando
149
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
150
O PROCESSO DOS TÁVORAS
50
Joze Machado, de officio Barbeiro, cazado e morador defronte do
Conde da Ponte, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que
pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, de idade trinta e oitto
annos. E do costume nada. E perguntado pello vigecimo artigo dos itens
justificativos a que foi produzido, dice que sendo elle testemunha guarda
roupa de Jeronimo de Atayde, o vestira na tarde do dia tres de Septembro
[fl. 75] de mil e settecentos e sinquenta e oitto para hir a freguezia de
Nossa Senhora da Ajuda ser padrinho do cazamento do seu lacayo Ber-
nardo de quem tambem fora padrinho o Marquez que então era de Fron-
teira. E vindo o sobredito Jeronimo de Atayde para caza pellas ave marias,
pouco mais ou menos, o despio elle testemunha e lhe deu hum roupão
e chinellas em que ficou essa noute. E sucedendo nessa noute o infelis
insulto dos tiros que logo no dia seguinte se fes publico e sendo tambem
depois prezo o ditto Jeronimo de Atayde por se dizer ter sido reo do
mesmo insulto, elle testemunha com seu companheiro Manoel de Jezus
lembrando-ce de que no referido dia daquella noute se tinha recebido o
mencionado lacayo discorrerão que o referido Jeronimo de Atayde não
tinha nella sahido de caza e que se achava inocente, porque não podia
sahir fora senão de roupão e chinellas porque tudo o mais estava debaixo
da chave delle testemunha e do ditto seu companheiro. E mais não dice
deste nem dos mais athe o vigecimo terceiro. E perguntado pello vige-
151
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
cimo quarto dice que elle testemunha e os mais criados do dito Jeronimo
de Atayde, quando este foi prezo e tambem sua mulher, a Condessa de
Attouguia, acentarão [fl. 75 v] firmemente que os dittos seus amos breve-
mente tornavão para caza e que não tinhão perigo algum pella rezão que
ja declarou no artigo a que tambem ja depos. E mais não dice, pello que
lido seu juramento, achando estar escripto na forma em que tinha de-
posto, o assignou com o ditto Dezembargador. E eu Henrique Joze de
Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Jozê Machado
51ª
Manoel Jezus, Mestre de escripta, cazado e morador na rua do Oli-
val detras do Convento de São Francisco de Paula, testemunha jurada
aos Santos Evangelhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer
a verdade, de idade quarenta annos. E do costume nada. [fl. 76] E per-
guntado pello vigecimo artigo dos itens justificativos a que foi produzido
dice que na tarde do dia declarado neste artigo se recebeu em Nossa Se-
nhora da Ajuda hum lacayo de Jeronimo de Atayde, chamado Bernardo,
do qual fora padrinho o mesmo Jeronimo de Atayde e o Marquez que
então era da Fronteira e como elle testemunha acistia na guarda roupa e
juntamente seu companheiro Joze Machado, ambos virão que o dito seu
amo Jeronimo de Atayde se recolhera naquelle dia por horas de ave ma-
rias, pouco mais ou menos, e logo que chegou se fora despir a guarda
roupa e ficara de roupão e chinellas, sem que mais sahice essa noute. E
mais não dice deste nem do vigecimo primeiro. E perguntado pello vige-
cimo segundo, dice que ou o copeiro ou o escudeiro da Condeça, mulher
152
O PROCESSO DOS TÁVORAS
20
Não consta a segunda assinatura de Falcão e Mendonça.
153
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
perguntado pello vigecimo artigo dos itens justificativos a que foi pro-
duzido, dice que sendo copeiro de Jeronimo de Atayde está bem certo
pellas rezoins que depois dirá que estando elle testemunha no lugar da
sua obrigação na noute do dia tres de Septembro de mil e setecentos e
sinquenta e oitto, ahi chegara o dito Jeronimo de Atayde que vinha de se
despir da guarda roupa, de chinellas e roupão sem nada na cabessa. E
que isto seria pellas nove horas da noute, pouco mais ou menos. E dicera
para elle testemunha chamace a criada D. Rita que elle tambem chamou.
E vindo esta, lhe dice que fosse ao quarto da Condeça e trouxece duas
pessas de linhagem para panos de copa e cozinha as quais trouche a dita
criada. E hindo com ellas todos para a caza da costura, ahi disputarão se
os ditos panos havião de ser de meya vara ou de tres quartos e se acentou
que focem de tres quartos e assim se cortarão para o que se mandou
buscar hũa vara. E em toda esta operação se ocuparão athe onze horas
ou onze e meya, pouco mais ou menos, no qual [fl. 77 v] tempo chegara
a Condessa e o dito Jeronimo de Atayde a fora buscar abaixo tam apres-
sadamente que fora o primeiro que abrira o saco da carruagem e ella se
queixou delle a não ter hido buscar a Rio Seco a caza de seus pays como
costumava sempre. E vindo para sima forão cear no que se demorarão
athe hũa hora, tempo em que se recolherão. E destes factos tem certa
lembrança, não so pello memorando e horrorozo insulto que nessa noute
aconteceu, mas tambem porque logo depois da morte do dito Jeronimo
de Atayde teve hũa disputa em que referio os mesmos factos pellos ter
prezenciado na forma que tem referido; tanto assim que elle testemunha
e os mais criados acentavão que o referido seu amo seria logo posto na
sua liberdade. E mais não dice deste nem de todos os mais que lhe forão
lidos, pello que lido seu juramento, achando estar escritto na verdade, o
assignou com o dito Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha
Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Andere de Campos
154
O PROCESSO DOS TÁVORAS
53ª
Joze Ribeiro, porteiro da Sala do Marquez de Lourisal, testemunha
jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a sua mão direita prometeu
dizer a verdade, idade secenta e quatro annos. E do costume nada. E per-
guntado pello vigecimo artigo dos itens justificativos a que foi produzido,
dice que no dia declara o artigo fora o Conde Jeronimo de Atayde ser
padrinho do seu lacayo chamado Bernardo que se recebeu na igreja de
Nossa Senhora da Ajuda, o que sabe por elle testemunha ter sido com-
prador da caza do dito Conde e vio então que este por couza de nove
horas sahira do seu quarto em roupão e chinellas e chamara pella criada
D. Rita e lhe dice foce buscar duas peças de linhagem para [fl. 78v] se
medirem e cortarem para panos de copa e cozinha. E elle testemunha
pegou na vara por onde a dita criada as medio passando depois a
corta-llas, acestindo a tudo o mencionado Conde Jeronimo de Atayde
athe que sendo de onze horas para sima chegou sua mulher a quem elle
foi buscar a carruagem e ahi tiverão suas graças sobre ella vir tarde e a
respeito delle a não hir buscar a Rio Seco a caza de seus pays. E que su-
cedendo ser prezo o dito Conde elle testemunha e varios criados da
mesma caza, ignorando a cauza da prizão discorrião com variedade,
porem falando-ce em que seria o infelis insulto se recordarão do que tem
referido e que o Conde ja pellas nove horas da noute do mesmo estava
em caza donde estivera athe vir a Condeça depois das onze e quem com
ella foram logo cear, em que se demorara athe hũa hora e por esta rezão
acentarão em que estava inocente e lhe não dava cuidado a sua prizão
antes esperavão que della sahice muito brevemente. E mais não dice
deste nem de todos os mais por ter delles dito o que sabia, pello que
lido seu juramento, achando estar escripto na verdade, assignou com o
dito Dezembargador. E eu Henrique [fl. 79] Joze de Mendanha Benavides
Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Joze Ribeiro
155
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
54
Andre Alvarez, familliar do Marquez de Lourisal, cazado e morador
na caza do mesmo Marquez, testemunha jurada aos Santos Evangelhos,
em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, de idade
trinta e sete annos, pouco mais ou menos. E do costume nada. E pergun-
tado pello vigecimo artigo dos itens justificativos a que foi produzido,
dice que sabe por ter sido azemel da caza do Conde da Atouguia que
este fora padrinho do recebimento de hum seu lacayo chamado Bernardo
e que na [fl. 79v] noute desse dia se recolhera o dito Conde antes das
nove horas e entrando para o seu quarto sahira de roupão e chinellas e
mandara a hũa criada chamada D. Rita fosse buscar duas peças de linha-
gem para se fazerem panos para copa e cozinha que ali se cortarão e as
criadas estiverão abainhando, estando sempre prezente o dito Conde athe
que sendo depois das onze, pouco mais ou menos, chegara a Condessa
que elle foi buscar a carruagem e subindo ambos para sima forão cear,
recolhendo-ce depois para o seu quarto pella hũa hora, pouco mais ou
menos. E elle testemunha se não lembra do dia e anno em que se recebeu
o dito criado, porem lembrace sim que no dia seguinte ouvira dizer se ti-
nhão dado huns tiros cometendo-ce o insulto de que se trata. E mais não
dice deste nem dos mais por ter dito quanto delles sabia, pello que lido
seu juramento achando estar escrito na verdade, o assignou com o dito
Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o
escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
† de Andre Alvarez
156
O PROCESSO DOS TÁVORAS
E tendo a dita testemunha dado seu juramento [fl. 80] logo pello
mencionado Dezembargador Joze Freire Falcão e Mendonça lhe foi de-
ferido segundo dos Santos Evangelhos, em que pondo a sua mão direita
prometeu não revellar a materia de seu depohimento, de que para cons-
tar ter-ce executado o Real Decreto, que assim o determina, se fes este
termo que assignarão. E eu o Dezembargador Henrique Joze de Menda-
nha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
† de Andre Alvarez
55ª
Antonio Joze, boleeyro de Gonsallo Xavier de Alcasova, cazado e
morador na calsada de Santo Amaro, testemunha jurada aos Santos
Evangelhos, em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade,
de idade quarenta e sette annos, pouco mais ou menos. E do costume
nada. E perguntado pello vigecimo artigo dos itens justificativos a que
foi produzido, dice que sabe por ter sido boleeyro do Conde da Atou-
guia que na tarde do dia e anno declarado no artigo fora o dito Conde
a igreja da Ajuda ser padrinho do recebimento de hum seu criado cha-
mado Bernardo e elle [fl. 80v] testemunha bolleava a carruagem do dito
Conde e com elle se recolheu pellas oitto horas da noute do dito dia,
pouco mais ou menos. E sabe que o dito Conde não sahira mais de caza
porquanto elle testemunha foi para caza do noivo e vindo as horas cos-
tumadas a buscar a sua ceya, achando a porta da cozinha fechada en-
trara pella sala e fora dar a caza donde trabalhavão as criadas, aonde
vio ao mesmo Conde ocupado com hum corte de huns panos para copa
e cozinha. E logo passado pouco tempo, que seria pellas onze horas
quarto mais ou menos, chegara a Condessa a quem elle fora buscar a
carruagem, queixando-ce della não ter vindo mais sedo, a que respon-
dera estivera ouvindo ler hum sermão de que muito gostara e que tam-
bem elle a não tinha hido buscar. Ao que elle dice que aquella noute
se tinha recolhido com as gallinhas. E logo forão cear, aonde se demo-
rarão athe depois da meya noute e do referido se lembra elle testemu-
nha pella rezão do cazamento do dito criado e por ouvir no seguinte
dia fala com variedade nos tiros do insulto de que tratão os artigos se-
guintes de que nada dice por ter deposto o que delles sabia, pello que
lido seu jura[fl. 81]mento achando estar escritto na verdade o assignou
157
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
56ª
Thereza de Jezus, assistente em caza do Visconde d’Aseca, teste-
munha jurada aos Santos Evangelhos, em que pondo a sua mão direita,
prometeu dizer a verdade, de idade quarenta annos, pouco mais ou
menos. E do costume dice nada. E perguntada pello vigecimo artigo
dos artigos justificativos a que foi produzida, dice que ella testemunha
fora criada da caza [fl. 81v] do Conde de Atouguia e tem bõa lembrança
de que na tarde do dia declarado no artigo fora o mesmo ser padrinho
do recebimento de seu criado Bernardo e que a noute se recolhera de-
pois de ave marias. E que logo que se despira no seu quarto viera em
roupão e chinellas para a caza das criadas, para onde mandara vir duas
peças de linhagem que ali se medirão e cortarão em panos de copa e
cozinha, sem que o dito Conde dali sahice athe que chegou a Condessa
que elle foi buscar a carruagem. E subindo ambos, logo forão cear no
que gastarião athe couza da hũa hora depois da meya noute e se lembra
do referido porque sendo prezo o dito Conde e dizendo-ce que a cauza
da sua prizão forão os tiros que se tinhão dado na referida noute, ella
e os mais criados acentarão que na dita noute se não podia achar o dito
Conde naquelle insulto, pello que esperavão que fosse solto e restitu-
hido a sua caza. E mais não dice deste nem de todos os mais, pello que
lido seu juramento, achando estar escripto na verdade, assignou com o
158
O PROCESSO DOS TÁVORAS
57ª
Francisca das Chagas, acistente em caza do Visconde d’Aseca tes-
temunha jurada aos Santos Evangelhos, em que pondo a sua mão direita
prometeu dizer a verdade, de idade trinta e oitto annos, pouco mais ou
menos. E do costume dice nada. E perguntada pello vigecimo artigo dos
itens justificativos a que foi produzida dice que por ser nascida e criada
em caza do Conde de Atouguia se lembra bem de que na tarde do dia
declarado no artigo fora o mesmo Conde ser padrinho do recebimento
do criado Bernardo e que na noute desse dia se recolhera por horas de
ave marias [fl. 82 v] e depois de se despir no seu quarto fora para a caza
das criadas de roupão e chinellas e ahi mandara D. Rita buscar duas
peças de linhagem que se estiverão medindo e cortando para panos da
copa e cozinha, sem que o dito Conde dali sahice ate chegar a Condessa
que seria pellas onze horas ou onze e meya, a qual fora então buscar a
carruagem e sobindo ambos para sima forão cear donde lhe parece se
recolherão a durmir pella hũa hora depois da meya noute. E quando de-
pois se dice que o Conde tinha sido prezo por cauza dos tiros e que estes
se tinhão dado na noute de tres de septembro se averiguou pellos criados
da caza que fora a noute do recebimento do dito Bernardo e que nella
não sahira o dito Conde fora e que por esta cauza sempre teve a famillia
da caza esperança de que elle sahice livre. E mais não dice deste nem
dos mais a que foi apontada por ter dito neste o que delles sabia, pello
159
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
58ª
Maria Joaquina, cazada e acistente em caza de D. João da Costa,
testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a sua mão di-
reita prometeu dizer a verdade, de idade quarenta e hum anno. E do
costume dice nada. E perguntada pello vigecimo artigo dos itens justi-
ficativos a que foi produzida, dice que por ser criada de Jeronimo de
Atayde tem certa lembrança de que o mesmo fora padrinho do recebi-
mento de seu lacayo Bernardo e que nesse dia se recolhera por couza
de ave marias e hindo-ce despir ao seu quarto sahira de roupão e chi-
nellas e passara para a caza das criadas e dicera a [fl. 83v] D. Rita foce
buscar hũas teyas de linhagem para se partirem em panos de copa e
cozinha e que ali estivera athe que chegara a Condessa que seria depois
das onze. E elle partira então logo a busca-lla a carruagem e na sobida
para sima se queixava graciozamente a mesma Condessa, delle a não
ter hido buscar a Rio Seco. A que elle lhe respondera tinha estado go-
vernando a sua caza. E logo consequentemente forão para a ceya e ahi
se demorarão athe muito mais da meya noute, donde se recolherão a
durmir e a criada D. Rita lhe foi fechar a sua camera aonde ficarão
ambos fechados levando a mesma criada a chave como sempre costu-
mava. Tanto assim que quando forão prender ao sobredito Jeronimo de
Athayde foi precizo que a referida criada fosse com a chave para abrir
160
O PROCESSO DOS TÁVORAS
59ª
D. Rita Bernarda de Vasconsellos, acistente em caza do Marquez
de Tancos, testemunha jurada aos Santos Evangelhos, em que pondo a
sua mão direita prometeu dizer a verdade, de [fl. 84v] idade quarenta e
dous annos, pouco mais ou menos. E do costume dice nada. E pergun-
tada pello vigecimo artigo dos itens justificativos a que foi produzida
dice que ella testemunha não fizera lembrança do dia em que se recebeu
o lacayo Bernardo que servia a Jeronimo de Athayde. Tem sim certeza
fizica por ser nesse tempo criada do mesmo Jeronimo de Athayde que
elle nesse dia do recebimento se recolhera por horas de ave marias,
pouco mais ou menos, e que hindo-ce despir ao seu quarto sahira delle
de roupão e chinellas e passara para a caza das criadas aonde chamara
161
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
a ella testemunha e lhe dicera fosse buscar hũas peças de linhagem para
se cortarem panos de copa e cozinha e ahi os estiverão cortando e co-
zendo nelles e o mesmo Jeronimo de Athayde esteve gracejando sobre
o cazamento do referido lacayo Bernardo sem que dali se separace athe
que chegou a Condessa pellas onze horas, pouco mais ou menos, e logo
forão cear no que gastarião athe depois da meya noute, recolhendo-ce
depois ao seu quarto de que ella testemunha lhe fechou a porta levando
a chave para o seu quarto como costumava de forma que na madrugada
da prizão do [fl. 85] referido Jeronimo de Athayde foi precizo que a ella
testemunha se fosse pedir a dita chave e depois de justissado o mesmo
Jeronimo de Athayde, ouvio dizer publicamente que o fora por huns
tiros que se tinhão dado no tempo que declara o artigo e por ella teste-
munha estar certa que na noute do recebimento não tinha sahido o men-
cionado Jeronimo de Athayde de caza, ficou acentando que morrera
inocente e tambem porque nunca lhe vira acção ou palavra pella qual
podece suspeitar que elle concorrece para semilhante insulto. E mais
não dice deste nem de todos os mais por ter delles dito o que sabia,
pello que lido seu juramento, achando estar escritto na verdade, o as-
signou com o dito Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha
Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
D. Rita Bernarda de Vasconcellos
21
Declaração final interrompida.
22
Não constam os fls. 85v e 86.
23
Por ausência dos fls. supracitados, apenas se encontra redigida a declaração final do depoi-
mento número 60.
162
O PROCESSO DOS TÁVORAS
61
Antonio Joze Gomes, cazado e morador ao Calharis no Bairro Alto,
testemunha jurada aos Santos Evangelhos, em que pondo a sua mão di-
reita prometeu dizer a verdade, de idade sinquenta e oitto annos, pouco
mais ou menos. E do costume nada. E perguntado pello vigecimo artigo
dos itens justificativos a que foi produzido, dice que não esta lembrado
da tarde do dia em que se recebeu o lacayo Bernardo que servio a Jero-
nimo de Athayde a quem elle testemunha servia tambem de mosso da
cavalharice e so relembra que no dia seguinte estando ao sol, ali se jun-
tarão outras pessoas e dicerão que naquella noute tinhão dado [fl. 87] os
tiros do infelis insulto e tem lembrança que o dito seu amo se recolheu
na tarde do mencionado recebimento por horas de ave marias, pouco
mais ou menos, e falou com elle testemunha a porta da cavalharice como
costumava quando vinha de fora e não sabe que elle tornace a sahir fora
essa noute, porque nem carruagem nem cavallo sahio da cavalharice,
antes sim, hindo elle testemunha buscar a cea por couza de onze horas,
achando a porta da cozinha fechada se resolveu a hir pella sala e na caza
aonde trabalhavão as mossas vio o dito seu amo Jeronimo de Atayde de
roupão e chinellas com hũa tizoura na mão com que cortava huns panos.
E mais não dice deste nem de todos os mais por ter dito o que sabia,
pello que lido seu juramento, achando estar escrito na verdade, o assig-
nou com o dito Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Be-
navides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
† de Antonio Joze Gomes
6224
E tendo deposto esta testemunha, logo elle Dezembargador Joze
Freire Falcão e Mendonça lhe deferio segundo juramento dos Santos Evan-
24
Erro de numeração. Continuamos, contudo, a seguir o original.
163
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
gelhos, em que pondo a sua mão direita, prometeu não revelar [fl. 87v] a
materia de seu juramento de que para constar ter-ce executado o Real De-
creto, que assim o determina, se fes este termo que assignarão. E eu o
Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
† de Antonio Joze Gomes
63
Monica Thereza, cazada com Felipe da Crus, moradora em Caparica
no lugar de Pera de Baixo, testemunha jurada aos Santos Evangelhos, em
que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, de idade qua-
renta e seis annos. E do costume dice nada. E perguntada pello vigecimo
artigo dos itens justificativos a que foi produzida, dice que por ter sido
ama de crear da caza de Jeronimo de Atayde e estar nella quando se re-
cebeu o lacayo Bernardo, tem bõa lembrança que delle fora ser padrinho
seu amo Jeronimo de Atayde e que no dia do recebimento se recolhera
o mesmo Jeronimo de Atayde por horas de ave marias, pouco mais ou
menos, e que despindo-ce no seu quarto delle fora de roupão e chinellas
para a caza das criadas e mandara a criada D. Rita fosse buscar hũas
peças de estopa ou linhagem para se cortarem panos de cozinha e copa
e ahi estiverão cortando [fl. 88] e cozendo nos mesmo, sem que daquella
caza se separace o dito Jeronimo de Atayde, athe que sentio a carruagem
em que se recolhia a Condessa, sua mulher, que descendo então a
busca-la a mesma carruagem sobirão para sima ambos vindo. Ela quei-
xando-ce de não ter hido buscar a Rio seco e elle respondendo-lhe
estivera governando a sua caza. E hindo logo cear, acabada a cea ime-
diatamente se recolherão ambos a sua camera e a criada D. Rita lhe fe-
chou a porta por fora, levando a chave como costumava. E sabe que o
mencionado recebimento fora no dia declarado no item, o que se averi-
guou quando se soube que o referido Jeronimo de Atayde padecera pel-
los tiros que se tinhão dado naquella noute em que como dito tem não
sahira elle de caza. E mais não dice deste nem dos mais por ter dito
quanto sabia e lido seu juramento, achando estar escritto na verdade, as-
signou somente elle dito Dezembargador. E eu o Dezembargador Henri-
que Joze de Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinatura)
Jozé Freyre Falcão e Mendonça
164
O PROCESSO DOS TÁVORAS
64
Maria Francisca, preta livre e acistente em caza do Conde de São
Vicente, testemunha jurada aos Santos Evangelhos, em que pondo a mão
direita, prometeu dizer a verdade, de idade sinquenta annos, pouco mais
ou menos. E do costume nada. E perguntada pello vigecimo artigo dos
itens justificativos a que foi produzida, dice que sabe que no dia decla-
rado no item se recebera o lacayo de Jeronimo de Atayde, chamado Ber-
nardo, porque nesse tempo servia elle testemunha na caza do mesmo
Jeronimo de Atayde e sabe que foi no dito dia porque no seguinte ouvira
dizer que naquella noute se tinhão dado os tiros di [sic] infelis insulto,
na qual noute não sahira de caza o mencionado Jeronimo de Atayde por-
que recolhendo-ce do recebimento em que foi padrinho do mesmo la-
cayo pellas oitto horas da noute, pouco mais ou menos, despindo-ce no
seu quarto fora de roupão e chinellas para a caza das criadas e para hi
mandara vir por D. Rita duas peças de linhagem que estiverão cortando
para panos de copa e cozinha [fl. 89] e da dita caza não sahira senão
quando sentio a carruagem da Condessa sua mulher, que seria por couza
de onze horas. E logo forão cear e se recolherão a sua camera, fechando
a porta D. Rita como costumava. E mais não dice deste nem de todos os
mais a que foi offerecida, pello que lido seu juramento, achando estar
escritto na verdade, assignou somente o dito Dezembargador. E eu, o De-
zembargador Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinatura)
Jozé Freyre Falcão e Mendonça
165
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
gelhos, em que pondo a sua mão prometeu não revelar a materia de seu
juramento, de que para constar ter-ce executado o Real Decreto que assim
o determina, se fes este termo que somente assignou o mesmo Dezem-
bargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinatura)
Jozé Freyre Falcão e Mendonça
65
João de Figueiredo, cazado e morador na calsada de Santo Amaro,
testemunha jurada aos Santos Evangelhos, em que pondo a sua mão direita
prometeu dizer a verdade, de idade sinquenta e quatro annos. E do costume
nada. E perguntado pello vigecimo artigo dos itens justificativos a que foi
produzido, dice que elle testemunha, por ter sido criado de Jeronimo de
Atayde e estar justo para tornar para sua caza ahi fora depois do mesmo se
achar prezo e perguntando a os mais criados seus companheiros se sabião
a cauza da dita prizão, estiverão discorrendo todos qual ella seria. E fa-
lando-ce sobre a noute dos tiros, dicerão todos não podia ser por quanto
na tarde do dia da noute em que se dizião dados se tinha recebido hum
criado chamado Bernardo que do recebimento tinha sido o mencionado
[fl. 90] Jeronimo de Atayde padrinho, e que se recolhera por horas de ave
marias não tornando a sahir de caza, tanto assim que tinha estado na caza
das criadas aonde se cortarão huns guardanapos athe hir cear, depois do
que se recolhera a sua camera aonde a criada D. Rita lhe dice o tinha dei-
xado fechado na forma que costumava. Pello que todos ali acentarão não
podia ser este o motivo da sua prizão. E lido seu juramento, achando que
estava escritto na forma que tinha deposto, o assignou com o ditto Dezem-
bargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
João de Figueiredo
166
O PROCESSO DOS TÁVORAS
167
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
67
Domingos Fernandes Pinto, cazado e morador na rua nova de Jezus, tes-
temunha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a mão direita prometeu
dizer a verdade, de idade quarenta annos, pouco mais ou menos. E do costume
dice nada. E perguntado pello vigecimo quinto artigo dos itens justificativos a
que foi produzido, dice que elle testemunha estava justo para boleeyro da Mar-
queza de Tavora D. Leonor. Porem, que na noute que [fl. 91v] que na noute
que declara o artigo se não achava ainda em caza da mesma e so fora na manhã
seguinte na qual prezenciou que a dita Marqueza não sahira de caza. Porem,
de tarde, sahio ja com ella na boleya e lhe não lembra para onde mas certa-
mente está lembrado de que não foi a caza do Duque. E mais não dice deste
nem de todos os mais, pello que lido seu juramento, achando estar escrito
como na verdade depos, o assignou com o dito Dezembargador. E eu o De-
zembargador Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
† de Domingos Fernandes Pinto
168
O PROCESSO DOS TÁVORAS
68
Francisco Joze de Moura e Miranda, acistente em caza do Marquez
d’Alorna, testemunha jurada aos Santos Evangelhos, em que pondo a sua
mão [fl. 92] direita prometeu dizer a verdade, de idade trinta e nove
annos. E do costume nada. E perguntado pello vigecimo quinto artigo
dos itens justificativos a que foi produzido dice que no tempo do infelis
insulto era elle testemunha criado grave do Marques de Tavora Francisco
de Assis, pello que está bem certo que na noute do mesmo infelis insulto
se recolhera a sua caza do Rio Seco antes das des horas a Marqueza D.
Leonor de Tavora acompanhada de sua filha D. Marianna de Lorena e
que logo passado muito pouco tempo se recolheu o dito Francisco de
Assis seu marido, a quem elle testemunha veyo apear da carruagem,
acompanhado de Joze Fernandes e de Joze Manriques, seus companhei-
ros e ambos falescidos, o qual vio elle testemunha que vinha acompa-
nhado com a sua guarda e archote acezo e da parte da Ajuda e que logo
que sobira pedira o seu cachimbo como costumava e depois de cachim-
bar largo tempo se recolheu a sua camera sem que tornace a sahir de
caza aquella noute. E mais não dice deste nem do vigecimo sexto. E per-
guntado pello vigecimo septimo dice que na tarde do dia da mesma in-
felis noute fora elle testemunha com Joze Maria de Tavora a Sacavem
donde se recolherão entre as sete horas e oitto da noute e elle testemu-
nha o deixou [fl. 92v] ao Loretto na caza dos cambiassos e partio a toda
a presa para chegar a caza antes que se recolhece a Marqueza e com ef-
feito chegou por couza de nove horas e antes das des se recolheu tam-
bem o dito Joze Maria de Tavora porque seus pays o querião sempre
achar em caza e sabe que não sahio mais de caza aquella noute e tem
lembransa do referido porque logo ouvio dizer que sua Magestade tinha
molestado hum brasso ou pê na quinta do meyo e logo depois se falou
que na dita noute se tinhão dado huns tiros. E mais não dice deste, pello
que lido seu juramento, achando estar escritto na verdade o assignou
com o dito Dezembargador. E eu o Dezembargador Henrique Joze de
Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Francisco Joze de Moura Miranda
169
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
25
Corrigimos de «cortas».
170
O PROCESSO DOS TÁVORAS
70
Mathias Joze Rodrigues, acistente em caza do Excelentissimo Conde
de Villa Verde, testemunha jurada aos Santos Evangelhos, em que pondo
a sua mão direita prometeu dizer a verdade, idade trinta e nove annos. E
do costume nada. E perguntado pello vigecimo quinto artigo dos itens
justificativos a que foi produzido, dice que não está certo a que horas se
recolheu D. Leonor de Tavora na noute declarada no artigo, porem, sabe
por ter sido familliar de sua caza naquelle tempo, que costumava reco-
lher-ce sempre pellas des horas e pellas mesmas se recolhia regullar-
mente seu marido Francisco de Assis e que logo tambem pedia o
cachimbo de que uzava todas as noutes. E mais não dice deste nem do
vigecimo sexto. E perguntado pello vigecimo septimo, dice que elle tes-
temunha acistia a Joze Maria de Tavora, o qual em noute algũa faltou em
[fl. 94v] se recolher pellas des horas, por ser este o preceitto que tinha
de seus pays e que não sabe por onde andou na tarde declarada no ar-
tigo, o que poderão saber os criados que o acompanharão. Sabe sim, que
depois de se recolher pellas des horas nunca mais sahia de caza, o que
elle testemunha acevera por durmir no mesmo quarto em que o mencio-
nado Joze Maria de Tavor[a] durmia. E mais não dice deste. E lido seu ju-
ramento, achando estar escritto na verdade, o assignou com o referido
171
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
71
Manoel Joze Soares, boleeyro do Juiz do Crime do Bairro de Santa
Catharina, Francisco de Azevedo [fl. 95] Coutinho, testemunha jurada aos
Santos Evangelhos, em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a
verdade, de idade sinquenta annos. E do costume nada. E perguntado
pello vigecimo quinto artigo dos itens justificativos a que foi offerecido,
dice que por ter sido criado de acompanhar de D. Leonor de Tavora, sabe
que esta se recolhera na noute declarada no artigo por couza de des
horas, por elle nessa ocazião a ter acompanhado e conserva esta lem-
bransa porque logo no dia seguinte ouvio falar que na mesma noute se
tinha cometido o atentado de que se trata e que quando chegarão a caza
ja nella estavão os criados que acompanhavão Francisco de Assis, marido
da mesma D. Leonor de Tavora, que lhe dicerão havia pouco tinhão che-
gado com seu amo e que os tais criados. Se lembra muito bem, erão Joze
Antonio, boleeyro que foi mandado para a India e o de acompanhar se
chamava Joãozinho, que tambem o exterminarão para o mesmo estado,
e que nessa noute não sahira mais de caza o sobredito Francisco de Assis.
E mais não dice nem do vigessimo sexto. E perguntado pello vigecimo
septimo, dice que na tarde do dia declarado neste artigo fora Joze Maria
de Tavora para Sacavem e suposto elle testemunha o não vira hir, con-
tudo, vio os criados perperados e o seu cavallo. E perguntando-lhe para
onde hião lhe responderão que para Sacavem e depois lhe dicerão tam-
172
O PROCESSO DOS TÁVORAS
bem se tinhão recolhido por [fl. 95v] caza dos cambiassos. E quando elle
testemunha se recolheu com a dita D. Leonor, ja tambem os achou em
caza e lhe dicerão se tinhão recolhido sedo e que nessa noute sabe não
sahio mais de caza pellos seus criados durmirem no mesmo quarto em
que elle testemunha durmia. E mais não dice deste. E lido seu juramento,
achando estar escritto na forma em que tinha deposto, o assignou com
o referido Dezembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides
Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Manoel Joze Soares
72
Pedro de Saldanha de Albuquerque, do Conselho de sua Mages-
tade e Marechal de campo de seus exercitos, testemunha jurada aos San-
tos Evangelhos, em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a
verdade, de idade sinquenta e seis annos. E do costume dice nada. E
perguntado pello vigessimo sexto artigo dos itens justificativos a que foi
produzido, dice que nada sabe deste artigo mais do que quanto lhe re-
173
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
E tendo esta testemunha dado o seu depohimento [fl. 97] logo elle
dito Dezembargador Joze Freire Falcão de Mendonça lhe deferio segundo
juramento dos Santos Evangelhos, em que pondo a mão prometeu não
revellar a materia de seu juramento, de que para constar ter-ce executado
o Real Decreto, que assim o determina, se fes este termo que assignarão.
E eu o Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o
escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
Pedro de Saldanha de Albuquerque
174
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 98]
Francisco de Negreiros Alfeirão, formado em os Sagrados Canones
pela Universidade de Coimbra, Vigario Geral Juiz dos casamentos, rezi-
duus e dizimos, que fui em a cidade de Beja e Dezembargador da Rela-
çam Eclesiastica da cidade de Evora por provizoens do Excelentissimo
Reverendissimo Senhor Arcebispo D. Frei Miguel de Souza, que Deos
tenha em gloria.
175
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
176
O PROCESSO DOS TÁVORAS
Em testemunho de verdade
O Tabaliam
[Sinal do Tabelião]
(assinatura)
João Christomo (sic) Pereyra
[fl. 99v]
Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil e sette-
centos e settenta e oitto annos. Aos dezoitto dias do mez de Julho nesta
cidade de Lisboa e Caza da Supplicação da mesma, ahi me foi entregue
pello Dezembargador Joze Freire Falcão e Mendonça hum avizo do Se-
cretario de Estado dos Negocios do Reino e esta inquirição para na forma
da ordem de sua Magestade, que no mesmo se partecipa, se proceguir na
inquirição das mais testemunhas que o Marquez d’Alorna quizer produzir.
E para assim se executar authuei aqui o mencionado avizo e he o que ao
diante se segue e que tem a data de onze de Julho do prezente anno. O
Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
[fl. 100]
Sendo prezente a sua Magestade que tendo o Marquez de Alorna
obtido a Real Graça de que se procedesse a inquirição de testemunhas,
de que Vossa Merce e o Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Be-
navides como Escrivão della, tem sido encarregados, se havia entregado
nesta Secretaria de Estado a sobredita inquirição na intelligencia de que
o mesmo Marquez não teria mais testemunhas que produzir. He a mesma
Senhora servida que à vista das mais testemunhas que de novo tem ap-
parecido e o dito Marquez intenta que se inquiram. Que practicando
Vossa Merce a determinação do Decreto de 7 de Novembro do anno de
1777 na mesma inquirição incorporado, prosiga-o Vossa Merce a inquirir
todas as mais testemunhas que de novo lhe forem aprezentadas com o
mesmo Dezembargador nomeado Escrivão na forma do mencionado De-
creto athe de todo concluir a mesma inquirição.
177
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 100 v]
Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, Dezembargador da
Caza da Supplicação e Escrivão desta inquirição pello Real Decreto de
sette de Novembro de mil e settecentos e setenta e sette, certefico parte-
cipar ao Dezembargador Procurador da Coroa, se proceguia na inquirição
de mais testemunhas, do que para constar passo esta que assigno. Lisboa,
20 de Julho de 1778.
(assinatura)
Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne
[fl. 104]27
[73]28
(...) E eu o Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Benavides
Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
João Bernardo de Vasconcellos
26
No canto inferior esquerdo lê-se «Senhor Joze Freire Falcão e Mendonça».
27
Não constam os fls. 101, 101v, 102, 102v, 103 e 103v.
28
Por ausência dos fls. acima mencionados, não consta grande parte do depoimento número
73, pelo que só é possível ler o que aqui transcrevemos.
178
O PROCESSO DOS TÁVORAS
74
João Henriques da Motta e Mello, fidalgo da caza de sua Magestade,
natural do Bombarral, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que
pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, de idade quarenta
annos, pouco mais ou menos. E do costume nada. E perguntado pello
trigessimo segundo artigo dos itens justificativos a que foi produzido dice
[fl. 104v] que era verdade e bem constante ter o Secretario de Estado
Thome Joaquim da Costa Corte Real hũa particular amizade com a caza
delle testemunha de forma que fora padrinho de sua filha e na passagem
que fazia para as Caldas, hia pernoutar a mesma caza delle testemunha.
E ainda que na primeira ocazião da sua passagem lhe ouvio algũas pala-
vras bastantes para formar conceitto da inocencia da famillia dos Tavoras.
Comtudo, nesta occazião se não declarou como depois em outra em que
lhe dice que o Secretario de Estado Sebastião Joze de Carvalho e Mello
tinha chegado ao trono pello sangue que tinha feito derramar aos ino-
centes Fidalgos. E replicando elle testemunha que aquillo seria assim,
mas que os tiros se tinhão dado em sua Magestade, lhe respondeu que
delles não tiverão a menor noticia nem ainda os que os dispararão sabião
a quem atiravão, o que tudo lhe declarou recomendando-lhe particular
segredo e que na materia da sentença que condemnou aos mesmos Fi-
dalgos lhe não declarou couza algũa. E, outrosim, dice mais que em certa
occazião, estando conversando elle testemunha com o Padre Frei Joze
de São Domingos, Vigario Geral que foi da Boa Hora, achando-ce tam-
bem [fl. 105] prezente hum leigo franciscano chamado Frei Antonio e
Joze de Lafetta, conversando todos no acontecimento dos ditos Fidalgos,
o leigo que era hum pouco livre nas suas praticas dice que a morte que
padeceu a Marqueza de Tavora fora justa ja que ella se tinha metido
sendo hũa mulher em semilhantes emboscadas ao que inflamado o dito
Padre Frei Joze de São Domingos em altas vozes e com as lagrimas nos
olhos lhe dice: “cale-ce irmão, não sabe o que dis, eu confessei sempre
a Marqueza desde que ella entrou nas grillas athe que sahio e no dia do
juizo se verá a culpa que ella tinha”. E mais não dice, pello que lido seu
juramento, achando estar escrito na verdade, o assignou com o dito De-
zembargador. E eu Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o es-
crevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
João Henriques da Motta e Melo
179
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
75
Martinho Affonso Henriques de Mello, Fidalgo da caza de sua Ma-
gestade, natural do Bombarral, testemunha jurada aos Santos Evangelhos
em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, de idade qua-
renta annos, pouco mais ou menos. E do costume nada. E perguntado
pello trigessimo segundo artigo dos itens justificativos a que foi produ-
zido dice que sem embargo da grande amizade e comunicassão que o
Secretario de Estado Thome Joaquim da Costa Corte Real tinha com a
caza delle testemunha, de forma que nas passagens para as Caldas per-
noutava na sua mesma caza e elle testemunha e seu irmão hião estar al-
guns dias com elle em sua caza nas mesmas Caldas, nunca lhe falara na
sentença que se tinha proferido contra os Fidalgos de que [fl. 106] se
trata nesta inquirição e so lhe ouvio algũas palavras de que formou con-
ceito que os ditos Fidalgos tinhão padecido inocentes. E em duas oca-
zioins se declarou mais dizendo-lhe em hũa que nem os que dispararão
os tiros sabião a quem atiravão, porque ignoravão que naquella carrua-
gem fosse sua Magestade, asseverando isto mais com a expressão se-
guinte repetida algũas vezes: “nisto não ha duvida algũa”. E em outra,
alargando-ce mais, dice que o Secretario de Estado Sebastião Joze de Car-
valho e Mello tinha chegado ao trono sobre o cadafalso dos Fidalgos, ao
que replicando elle testemunha, ser inegavel o atentado do ferimento de
sua Magestade, lhe respondeu o mesmo Secretario de Estado o seguinte:
“ainda mal que assim sucedeu, mas vosse que estava no Bombarral teve
tanta culpa como os fidalgos”, e mais se capacitou elle testemunha da
inocencia dos Tavoras, porque passados dous annos, pouco mais ou
menos, depois do insulto achando-ce no quarto delle testemunha o Padre
Frei Joze de São Domingos, Vigario geral que foi da Boa Hora, hum leigo
180
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 107]
76
O Dezembargador Euzebio Tavares de Sequeira, do Conselho de
sua Magestade, Deputado apozentado da Meza da Consciencia e Ordens
e professo na Ordem de Christo, testemunha jurada aos Santos Evange-
lhos em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, de idade
setenta e hum anno. E do costume nada. E perguntado pello vigecimo
artigo dos itens justificativos a que foi produzido dice que elle testemu-
nha ja depozera perante o Corregedor da Comarca de Coimbra aos itens
que lhe forão remetidos da Secretaria de Estado dos Negocios do Reino,
debaixo de hum avizo do Excelentissimo Visconde de Villa Nova da Cer-
181
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
Aos trinta dias do mez de Julho do anno de [fl. 108] mil e settecen-
tos e setenta e oitto neste Convento de Nossa Senhora da Conceipção de
Carmelitas Descalsas dos Cardais, aonde veyo o Dezembargador Joze
Freire Falcão e Mendonça, nelle e na grade do mesmo, forão inquiridas
e perguntadas as testemunhas cujos nomes, cognomes, idades, costumes
e ditos ao diante serão escritos e especificados, deferindo-ce-lhe primeiro
a todas o juramento dos Santos Evangelhos, de que eu, o Dezembargador
Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, Escrivão da sua inquirição,
fis esta acentada e a escrevi.
182
O PROCESSO DOS TÁVORAS
77
A Madre Maria Antonia de São Joze, relligioza deste Convento dos
Cardais e actual Priora do mesmo, testemunha jurada aos Santos Evan-
gelhos, em que pondo a sua mão direita prometeu dizer a verdade, idade
que dice ter q[u]arenta e nove annos. E do costume nada. E perguntada
pello vigecimo quinto artigo dos itens justificativos a que foi produzida
dice que vindo a este Convento o Padre Frei Joze de Santa Catharina,
logo depois da execução dos Fidalgos de que se trata, dicera na prezença
della testemunha e de outras relligiozas, que elle tinha assistido ao acto
de se Sacramentar a Marqueza que foi de Tavora [fl. 108v] e que antes de
receber o Sacramento dicera que por aquelle Senhor que estava para re-
ceber, protestava morria inocente do dellicto que se lhe imputava. E que
tambem ao Padre Frei Manoel de São Boaventura, que tinha sido confes-
sor do Duque sido de Aveiro, ouvira dizer que elle tinha declarado ser
so o culpado e seus dous criados e que os mais reos, que na sua confissão
tinha culpado, estavão inocentes o que tinha declarado para dezonerar a
sua consciencia. E mais não dice, pello que lido seu juramento, achando
estar escritto na verdade, o assignou com o dito Dezembargador. E eu,
Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Jozé Freyre Falcão e Mendonça
Maria Antonia de S. Joze
183
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
vigecimo quinto artigo dos itens justificativos a que foi produzida, dice
que depois da morte dos Fidalgos de que se trata nesta inquirição, viera
a este Convento o Padre Frei Manoel de São Boaventura e que na pre-
zença della testemunha, particularmente, lhe dicera que elle tinha sido
confessor do reo Joze Mascarenhas, o qual lhe declarara, para descargo
de sua consciencia, que so elle e seus dous criados erão culpados no in-
sulto dos tiros que se tinhão dado e que os mesmos criados não sabião
a quem atiravão, porque so lhe tinha declarado era hum seu competidor
e que por temor dos tormentos e por ver se escapava da ultima pena,
tinha culpado aos mais Fidalgos como socios daquelle delicto, estando
todos, na verdade, inocentes. E que tendo acentado declarar isto mesmo
no patibollo lhe tinha sido intimada hũa ordem para não falar com a co-
minação de mordassa quando assim o não executace, pello que não tinha
feito a referida declaração [fl. 109v] e o dito Padre em outra occazião re-
petio o mesmo perante ella testemunha e de outras mais relligiozas. E
mais não dice, pello que lido seu depohimento o assignou com o dito
Dezembargador. E eu, o Dezembargador Henrique Joze de Mendanha
Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Jozé Freyre Falcão e Mendonça
Thereza Maria de S. Jozé
(assinaturas)
Jozé Freyre Falcão e Mendonça
Thereza Maria de S. Jozé
79
A Madre Anna de Jezus Maria Joze, religioza deste Convento, teste-
munha jurada aos Santos Evangelhos, em que pondo a sua mão direita
prometeu dizer a verdade, de idade secenta annos. E do costume nada.
184
O PROCESSO DOS TÁVORAS
185
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
dito que elle não duvidava jurar que os Fidalgos Tavoras tinhão morrido
inocentes. E mais não dice, pello que lido seu juramento, achando que
estava escritto na forma que tinha deposto, o assignou com o dito De-
zembargador. E eu, Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o es-
crevi.
(assinaturas)
Jozé Freyre Falcão e Mendonça
Anna de S. Jozé
81
A Madre Bernarda Thereza de Jezus Maria Joze, religioza deste Con-
vento dos Cardais, testemunha jurada aos Santos Evangelhos, em que
pondo a mão prometeu dizer a verdade, de idade quarenta e hum anno.
E do costume nada. E perguntada pello vigecimo quinto artigo dos itens
justificativos a que foi produzida, dice que vindo muitas vezes a este Con-
vento o Padre Frei Manoel de São Boaventura, depois de justissados os
Fidalgos, nelle com grande sentimento proferira algũas expressoins indi-
cativas da inocencia dos mesmos Fidalgos, das quais, por terem passado
muitos annos, não tem a mayor lembrança. Porem, sempre lhe lembra
ter dito o mesmo Padre ou o Padre Frei Joze de Santa Catharina, que a
Marqueza [fl. 111v] que foi de Tavora antes de receber o Santissimo Sa-
cramento protestara pello mesmo Senhor a sua inocencia. E tambem lhe
lembra que o referido Padre Frei Manoel de São Boaventura pello que
tinha passado na assistencia que tinha feito ao Duque sido de Aveiro, co-
nhecera bem a inocencia dos mais fidalgos, porquanto a semilhante res-
peito dizia algũas vezes que no dia de juizo se havião de ver muitas
couzas. Pello que lido seu juramento, achando estar escrito na verdade,
186
O PROCESSO DOS TÁVORAS
82
A Madre Margarida Getrudes de São Joze, religioza deste Convento
dos Cardais, testemunha jurada aos Santos Evangelhos, em que pondo a
mão prometeu dizer a verdade, de idade sinquenta e oitto annos. E do cos-
tume costume nada. E perguntada pello vigecimo quinto artigo dos itens
justificativos a que foi produzida, dice que depois da morte dos fidalgos
viera ao locutorio deste Convento o Padre Frei Joze de Santa Catharina e
nelle dicera que tinha assistido ao acto em que se Sacramentara a Marqueza
de Tavora, a qual, antes de receber o Sacramento, dicera que ella morria
pellas suas culpas porque tinhão sido muitas, mas que emquanto a culpa
de que a arguhião morria inocente. E que tambem dicera outras mais couzas
de que ella testemunha se não lembra e so sim que todas envolvião a ino-
cencia da famillia dos Tavoras e que ao Padre Frei Manoel de São Boaven-
tura ouvira tambem dizer que o Duque tinha culpado aos mais fidalgos
para ver se escapava de mayor pena e que querendo declarar depois isto
mesmo lhe não permitirão. E mais não dice, pello que lido seu juramento,
[fl. 112v] achando estar escrito na verdade, o assignou com o dito Dezem-
bargador. E eu, Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Jozé Freyre Falcão e Mendonça
Margarida Getrudes de S. Joze
187
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
E tendo jurado esta testemunha, logo elle referido Ministro lhe de-
ferio segundo juramento que recebido prometeu não revellar a materia
de seu depohimento, de que para constar ter-ce executado o Real De-
creto, que assim o determina, se fes este termo que assignarão. E eu, o
Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Falcão e Mendonça
† Margarida Getrudes de S. Joze
83
A Madre Thereza de Jezus Maria Joze, relligioza deste Convento dos
Cardais, testemunha jurada aos Santos Evangelhos em que pondo a mão
direita prometeu dizer a verdade, de idade sinquenta annos. E do cos-
tume dice ser parenta por afinidade da famillia dos Tavoras. E perguntada
pello artigo decimo quinto dos itens justificativos a que foi produzida,
dice que vindo a esta comunidade [fl. 113] o Padre Frei Manoel de São
Boaventura poucos dias depois da morte dos Fidalgos, dicera a ella tes-
temunha e a outra religioza em particular, que o Duque a quem elle tinha
assistido declarara para descargo de sua consciencia que todos os Fidal-
gos que tinha culpado por socios no delicto se achavão inocentes e que
o temor dos tratos o movera a asocia-llos no mesmo delicto. E tambem
lhe parece que o mesmo Padre lhe dice que o dito Duque incluhira nas
suas confiçoins aos mais Fidalgos por entender que teria milhor livra-
mento. E isto mesmo que dice a ella testemunha, particularmente, o re-
petio depois a muitas religiozas desta mesma comunidade. E que tambem
ouvira dizer ao Padre Frei Joze de Santa Catharina que elle tinha assistido
ao acto de se Sacrementar a Marqueza que foi de Tavora e que esta antes
de receber o Santissimo Sacramento dicera que diante daquelle Senhor
que estava para receber e que brevemente a havia de julgar, declarava
que ella padecia a morte pellos seus peccados e não pella culpa que lhe
imputavão, porque nella se achava inocente. E mais não dice, pello que
lido seu [fl. 113v] juramento, achando estar escrito na verdade, o assignou
com o dito Dezembargador. E eu, Henrique Joze de Mendanha Benavides
Cirne, o escrevi.
(assinaturas)
Jozé Freyre Falcão e Mendonça
Thereza de Jezus Maria Jozé
188
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 114]
Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, Dezembargador da
Caza da Supplicação e Escrivão nomeado para esta inquirição por sua
Magestade, que Deus guarde, certifico noticiar ao Dezembargador Pro-
curador da Coroa que nella se não produzião prezentemente mais teste-
munhas e que fechada e lacrada a hia na forma da ordem que tinha
entregar na Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, a que me res-
pondeu que de novo nada se lhe offerecia alem do protesto que ja me
tinha referido, de que para constar passo esta que assigno. Lisboa, 23 de
Setembro de 1778.
(assinatura)
Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne
[fl. 118]29
Sua Magestade manda remetter a Vossa Merce o Decreto da copia
incluza para o Marquez de Alorna produzir in perpetuam rei memoriam
29
Não constam os fls. 114v, 115, 115v, 116, 116v, 117 e 117v; No Canto superior direito lê-se
«1777».
189
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[fl. 118v]
Cumpra-se o determinado neste avizo o qual com os mais docu-
mentos será entregue ao Doutor Juiz do Crime para o autuar e noticiar
ao Doutor Provedor da Comarca para ver jurar a testemunha o Dezem-
bargador Euzebio Tavares de Sequeira e a este para ir á Caza da Camera
depor aos itens apontados no dia 7 do seguinte Janeiro pellas 9 horas da
manham. Coimbra, 26 de Dezembro de 1777.
(assinatura)
Ignacio Joze da Motta de Carvalho
[fl. 119]31
Senhora
Diz o Marquez de Alorna que elle tem de produzir por testemunha
aos itens copiados no papel junto ao Dezembargador Euzebio Tavares,
assistente na cidade de Coimbra, para ser perguntado na conformidade
do Real Decreto de Vossa Magestade de 7 de Novembro do prezente
anno, preciza que com copia delle se ordene por avizo do Secretario de
Estado dos Negocios do Reyno ao Ministro a que toca segundo a provi-
dencia do mesmo do mesmo Real Decreto, haja de ahi inquirir a dita tes-
temunha. Imquirida, que seja remeter fechado o seu depoimento ao
Dezembargador Corregedor do Crime da Corte e Caza, a quem se acha
cometida a principal deligencia para que este em estando completa haja
de tudo entregar na dita Secretaria como lhe está ordenado.
30
No canto inferior esquerdo lê-se «Senhor Corregedor da Comarca de Coimbra».
31
No canto superior esquerdo lê-se «Passe do que constar não havendo inconveniente. Nossa
Senhora da Ajuda em 19 de Dezembro de 1777. [assinatura] Visconde».
190
O PROCESSO DOS TÁVORAS
Para Vossa Magestade lhe faça merce manda-lo assim por seu Real
Avizo para se haver de observar o determinado no Real Decreto.
Espera receber merce
191
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 121]32
O Dezembargador Euzebio Tavares, assistente em Coimbra hê
apontado por testemunha aos artigos 1º the 14º inclusive e ao artigo 29
e 31 dos itens que offereceo ao Dezembargador Joze Alberto Leitão o
Marques de Alorna, authorizado pelo Decreto de sua Magestade de 7 de
Novembro de 1777, e são como se segue:
32
Não consta o fl. 120v.
192
O PROCESSO DOS TÁVORAS
quesa que foi do dito titulo, se não deo lugar algum para que se podes-
sem defender do dito horrerozo crime, antes se procedeo contra elles
como se nenhũa defeza podesem ter ou alegar.
4º – Item. Que dessas mesmas horas que se lhe limitarão lhe forão
tomadas algumas pelo Ministro de Estado, de sorte que teve muito pou-
cas horas uteis para se informar dos reos e alegar por todos e cada hum
[fl. 121v] delles a destinta e separada defeza que podese ter.
5º – Item. Que essas horas que lhe tomou o Ministro de Estado das
que erão distinadas a preparar a defeza, as gastou em preparar ao dito
Dezembargador com limitaçoens e instruçoens que lhe pareceo dar-lhe.
193
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
12º – Item. Que o dito Joze Mascaranhas foi levado a tratos horro-
rozos e ahi declarou estando no tromento que os reos de quem se trata
herão innocentes. Que não forão particepes no delicto. Que revogava
qualquer declaração que desso tivese feito pello horror do tormento ou
pella concideração delle ou na esperança de que declarando mayor nu-
mero de socios da primeira Nobreza poderia o seu delicto escapar o ul-
timo e mais rigorozo castigo.
194
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 124]33
Depoimento ad perpetuam rei memoriam do Dezembargador Eu-
zebio Tavares de Sequeira, Deputado da Meza da Conciencia.
Certidam da notocia
Antonio da Costa de Vasconcellos de Souza Arnaut, profeço na
Ordem de Christo e Juis de Fora do Crime nesta cidade, faço certo
em como noticiei ao Doutor Constantino Barreto de Souza, Provedor
desta Comarca Fiscal da Croa para ver jurar a testemunha o Dezem-
bargador Euzebio [fl. 124v] Tavares de Sequeira e este para ir à caza
da Camara desta cidade dar o seu depoimento aos itens juntos com
o avizo asima declarado em que daqui pasei a prezente que asinei
33
Não constam os fls. 113 e 113v; No canto superior direito lê-se « 1, Arnaut».
195
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
Advertencia(?)
Aos sete dias do mes de Janeiro de mil e setesentos e setenta e oito
nesta cidade de Coimbra, em caza da Camara dela, aonde veio o [Do]utor
Ignacio Joze de Motta de Carvalho, Corregedor desta Comarca com An-
tonio da Costa de Vasconcellos de Souza Arnaut, Juis do Crime desta
mesma cidade, ahi sendo prezente o Dezembargador Euzebio Tavares
de Sequeira, Deputado da Meza da Conciencia e Ordens, para efeito de
ser preguntado como testemunha aos itens que vieram remetidos da Se-
cretaria de Estado dos Negocios do Reyno, cujo depoimento he [fl. 125]34
he o que se segue:
O Dezembargador Euzebio Tavares de Sequeira, Deputado da Meza
da Conciencia e Ordens, testemunha preguntada pelo o Doutor Correge-
dor que lhe deferio o juramento dos Santos Evangelios em que pos sua
mam direita e prometeu dizer verdade. E de idade dice ter setenta anos.
E ao costume nada.
E sendo preguntado ao primeiro item, dice que sabia que as pesoas
no item declaradas foram prezas por ordem de sua Magestade e que ele
testemunha prendera algumas delas e que se foram bastante(?) mal tra-
tadas, quantos a que fica ao trato [...] ele testemunha o não sabe e pelo
o que toca ao mais que respeita ao modo como foram procesadas, o de-
clararão aos mais itens a que vai depondo na parte que pasou por elle
testemunha como hu defençor. E mais não dice deste.
E preguntado ao segundo, dice que ele [fl. 125v]35 testemunha foi
nomeado hum Decreto que a de andar(?) junto dos autos da culpa dos
reos conteudos no item que [...] a outros(?) mais reos [...] de vinte e quatro
dias dos quais(?) [...] do tempo porque foi mandado pelo Excelentissimo
Sebastiam Joze de Carvalho e Mello, Ministro de Estado, naquele tempo
conferio com todos sobre [...] culpas do que eram [...] gastou(?) [...] do
tempo nesas(?) comfiçoins [...] as once horas(?) da noutte ate principio
da[s] outo da manhã. E mais não dice deste.
34
No canto superior direito lê-se «2 Arnaut».
35
Fl. bastante danificado devido à tinta ferrogálica que corrói o suporte.
196
O PROCESSO DOS TÁVORAS
36
No canto superior direito lê-se «3 Arnaut».
37
Fl. bastante danificado pelas razões acima mencionadas.
38
No canto superior direito lê-se «4 Arnaut».
197
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
39
Fl. bastante danificado pelas razões acima mencionadas.
40
No canto superior direito lê-se «5 Arnaut».
198
O PROCESSO DOS TÁVORAS
porque esta fora sobordinada pelo marido, mas que a Marqueza tanto o
não fora, que antes ela sobornara não só ao marido, mas tambem a toda
a parentela, porque entre eles era oraculo e antam lhe respondera ele
testemunha que os defençores alegaram aquilo que lhes parecia sufra-
gava aos reos que defendiam e que aos Juizes he que tocava a obrigação
de fazer escolha daquilo que lhes parecece asestido de rezam e justiça,
e que destas e de outras mais pasagens [fl. 128v]41 pasagens [...] com que
o dito Ministro [...] dice naquele particular, por cujo modo [...] não ficar
em sua caza como ele queria, para nela fazer aquela defeza. E mais não
dice deste.
E preguntado ao setimo, dice que se ele testemunha tivesse mais
tempo, mais poderia dizer do que dice a favor dos reos, mas que quanto
ao facto de que eles o instruiram, ele testemunha minutou distantemente
a respeito de cada hum lhe não faltou com a deduçam e que de direito
tambem dice quanto lhe pareceu bastante e com a mesma distinçam a
respeito de cada hum deles. E mais não dice deste.
E preguntado pelo outavo item, dice que do facto respetivo a cada
hum dos reos em que estes o instruiram fes ele testemunha a deduçam
competente por artigo sem que intenda e que por esta falta foram ja dis-
tituidas de defeza, mas que quanto e a que respeitando Francisco de Asis,
Marques que foi de Tavora, insistindo este em que naquela noute e na
ora pouco mais ou menos comfrontada na culpa tinha estado em caza
do Excelentissimo Sebastiam Joze de Carvalho e que dela saira para sua
caza. Dice ele testemunha ao dito [fl. 129]42 ao dito reo, que naquele par-
ticular falava verdade. Tanto asim, que nesa mesma noute tinha ele tes-
temunha estado na mesma caza com o Muncinhor Aguilhar e que
pasando ele dito Francisco de Asis para fora, falara a ele testemunha
agradecendo-lhe haver sentenciado huma sua cauza a seu favor, mas que
iso não era coartada legitima porque era pouca a distancia que mediava
do sitio da sua caza ao sitio onde se lhe arguia que ele se fora postar a
espera de sua Magestade, mas que sem embargo diço lhe deduzira este
facto em hum artigo. E mais não dice deste.
E perguntado pelo nono item, dice que era verdade que a ele tes-
temunha se não facilitaram os autos da culpa destes reos, porque indo
ele testemunha a caza do Ministro de Estado segunda ves depois que
41
Fl. bastante danificado pelas razões acima mencionadas.
42
No canto superior direito lê-se «6 Arnaut».
199
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43
No canto superior direito lê-se «7 Arnaut».
200
O PROCESSO DOS TÁVORAS
44
No canto superior direito lê-se «8 Arnaut».
201
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45
No canto superior direito lê-se «9 Arnaut».
202
O PROCESSO DOS TÁVORAS
em não ficar em caza do dito Ministro, por evitar asim alguma sugestam
que ahi quizeçe fazer-lhe. E mais não dice deste.
E preguntado ao undecimo, dice que na ocaziam em que foi se-
gunda ves à quinta do meio a comferir com D. Leonor de Távora esteve
com o Dezembargador [Joze Antonio] de Oliveira Machado, que o acom-
panhou para testeficar o sumario a que estava mandado meter pela Junta
da Imcomfidencia, lhe dicera este que Joze Mascarenhas, Duque que foi
de Aveiro, não chegara a levar tratos porque posto que a principio esti-
vece negativo, sendo levado ao sitio do trato pedira o levacem outra ves
ao lugar das preguntas que tinha que dizer a escapar aos tratos. E que
antam depozera já sem negaçam e que o mesmo ouvio ele testemunha
dizer ao mesmo Duque e que antam declarara serem comprehendidas
naquele delito as mais pesoas que eram [fl. 133]46 eram a Nobreza e os
Padres jezuitas, mas que conciderando que lhe levantara testemunho, os
levava a todos atrevaçados na garganta, fazendo com a mam memçam
na sua mesma garganta, a que repetidas vezes lhe dicera mostrando
grande a[r]rependimento de asim o haver declarado. Ao que ele testemu-
nha lhe respondera que aquilo lhe não pertencia a ele testemunha por-
que era so destinado para o temporal da sua defeza, mas que competia
ao seu comfeçor em quem poderia falar naquela materia e que com ele
Duque estava vivo ainda podia pedir ao seu Juis que o admitiçe a erronea
comfiçam que havia feito a respeito daqueles treceiros a quem dezia ter
levantado testemunho. E que antam lhe dicera o dito Joze Mascarenhas
que ja havia requerido o admitiçem a retratar-ce e que, com efeito, fora
o dito Ministro de Estado com o Dezembargador Joze Antonio Joze An-
tonio de Oliveira Machado à caza onde se faziam as preguntas e fora
tambem levado a ela o dito Joze Mascarenhas e se entrara a escrever pelo
dito Dezembargador Joze Antonio de Oliveira a sua retractacam dictando
o dito Ministro de Estado, mas que dipois de estar escrita huma [fl. 133v]
huma grande parte dela, entrara pela caza dentro o Dezembargador
Pedro Gonçalves Cordeiro e vendo aquela acçam preguntara que era
aquilo. E que sendo-lhe dito que era a retractaçam das comfiçoens que
o dito Joze Mascaranhas havia feito contra os ditos treceiros, respondera
o dito Juis da Imcomfidencia que a comfiçam espontanea que o dito Joze
Mascaranhas tinha feito se não podia retractar senão no tormento e que
a não admitia e que com isto se suspendera a acçam e eles se retiraram
46
No canto superior direito lê-se «10 Arnaut».
203
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
47
No canto superior direito lê-se «11 Arnaut».
204
O PROCESSO DOS TÁVORAS
acçam. E por este motivo, no mesmo papel da defeza, fes por mostrar
que o delito não era notorio porque fora comitido de noute e que não
sam estes os delitos a que o direito e Doutores chamam [fl. 135]48 notórias
como dis no referido papel ao qual em tudo se reporta. E dice mais ele
testemunha que posto neste depoimento diga que o Decreto da sua co-
miçam para defeza dos reos lhe prescrevia vinte quatro oras. Comtudo,
não tem cabal lembrança de que o dito Decreto asim o mandace, mas
que era para ele testemunha de comtrovercia certa, que na acçam em
que fora chamado para se lhe dar a dita comiçam depois de se ter no-
meado na Junta da Incomfidencia que os reos tivecem defeza, lhe orde-
nou o dito Ministro de Estado que viece na manha do dia emediato para
ir aos carceres comferir com os reos. O Dezembargador Joze Antonio de
Oliveira Machado fazia a primeira acçam notificando aos reos o sumario
a que estavam mandados meter e a obrigaçam de dizerem por ele teste-
munha a sua defeza de feito e direito no dito termo das vinte quatro oras
e que para esta defeza se não deram a ele testemunha os autos da culpa,
mas humas minutas munto socintas sem serem asinadas por pesoa al-
guma que, [fl. 135v] prefuntoriamente, declaravam a que porque cada
hum era arguido. E que a respeito de alguns dos ditos reos nem ainda
esta tal minuta se lhe dera, como fora a respeito da Marqueza de Tavora,
dizendo-lhe o Ministro de Estado que a sua culpa seria pouco mais ou
menos que a do Marques seu marido. E que comferindo-a, ele testemu-
nha, por ela, estivera sempre a dita Marqueza estivera sempre [sic] nega-
tiva, dizendo era mentira o que se lhe imputava e que tudo era
perciguiçam à Nobreza. E que com isto, se retirara ele testemunha indo
fazer o papel da defeza de todas e indo a entrega-lo no outro dia às duas
oras, como se lhe tinha ordenado. Viera o dito Ministro de Estado
falar-lhe em companhia do Dezembargador Pedro Gonssalves Cordeiro
e entrando a ler o papel, depois de acabar, preguntara ao dito Dezem-
bargador se ele testemunha tinha obrigaçam de asistir à sentença e este
respondera que se o não quizece fazer não era obrigado, de cujo indulto
ja aproveitou ele testemunha dizendo que como ficava na sua escolha
ele se retirava porque havia dois dias e noutes que não dormia nem
comia e a apenas toma alguns caldos e se retirava esperando. Porem, que
se lhe [fl. 136]49 esperando, porem, que se lhe noteficace a sentença para
48
No canto superior direito lê-se «12 Arnaut».
49
No canto superior direito lê-se «13 Arnaut».
205
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
a embargar, o que se não fes, mas antes os reos foram na manha seguinte
para o patibulo para se executarem neles as penas em que foram conde-
nados. E que depois de pasadas alguas oras subiram ja impreças as de-
duçoens coronoloficas em nome do Dezembargador Joze de Siabra e
Sylva, antam Procurador da Croa, no primeiro tomo das quaes leu ele
testemunha a copia do Decreto da sua comiçam para a defeza dos reos
e vio que este dezia que focem defendidos por ele testemunha de feito
e direito no mesmo identico processo. E logo mais abaicho se dis que a
ele testemunha se deram por ordem da Junta da Imcomfidencia os tras-
lados das suas culpas, sendo que como ja tem dito nem se lhe deu o
identico processo da culpa como o Decreto ordenava, nem tambem os
traslados da culpa, mas tam somente as abreviadas minutas que tem de-
clarado pelas quaes se regeu com o papel da defeza, ao qual outra ves
se refere. E na mesma acçam ele [fl. 136v] ele testemunha por não ter
mais que depor aos itens por que foi preguntado, requereu ao Doutor
Corregedor inquirente mandace que eu, Escrivam nomeado para esta de-
ligencia, numerace e rubricace as folhas deste depoimento, que sam treze,
que por mim vam numeradas e rubricadas. E sendo tornado o mesmo
depoimento a ele testemunha, dice estar em tudo comforme com o que
tinha deposto e asinou com ele Doutor Corregedor. E eu, Escrivam no-
meado para esta deligencia, Antonio da Costa de Vasconcellos de Souza
Arnaut, que a escrevi.
(assinatura)
Ignacio Joze da Motta de Carvalho
[fl. 139]50
Autos de diligencia de testemunhas feitos e ordenados a requerimento
do Marquez de Alorna como se mostra do seo contheudo
50
Não constam os fls. 37, 37v, 38 e 38v.
206
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 140]51
Pela certidao incluza do Decreto de 7 de Novembro do anno proximo
passado, constará a Vossa Merce que sua Magestade foi servida conceder
licença ao Marquez de Alorna, per si, e em nome de sua mulher e filhos,
como interessados na restituição da fama de seus cunhados e seus sogros,
para produzir ad perpetuam rei memoriam52 de provas para justificar a
defeza e innocencia dos sobreditos com as testemunhas que houver de
produzir a este fim. E ordena a mesma Senhora que Vossa Merce proceda
logo a inquerir por testemunha a Pedro Joseph da Fonceca Delgado, as-
sistente nessa cidade da Guarda, na conformidade do dito Decreto, reme-
tendo o summario do mesmo depoimento a esta Secretaria de Estado dos
Negocios do Reino, como se determina no referido Decreto.
Deos guarde a Vossa Merce. Palacio de Nossa Senhora da Ajuda em
10 de Abril de 1778.
(assinatura)
Visconde de Villa Nova da Cerveira53
[fl. 142]54
Senhora
Dis o Marquez d’Alorna em nome de sua mulher e de seus filhos
que para a justificação de seus cunhados e seus sogros lhe he necessario,
segundo os itens adjuntos a esta petição, o depoimento de Pedro Joze
da Fonceca Delgado, assistente na cidade da Guarda, e como judicial-
51
Não consta o fl. 139v.
52
Por se encontrarem sublinhadas as referidas palavras no documento original, procedemos
de igual modo.
53
No canto inferior esquerdo lê-se «O Senhor Corregedor da Commarca da Guarda».
54
Não constam os fls. 140v, 141 e 141v; No canto superior esquerdo lê-se «Passe do que constar,
não havendo inconveniente. Nossa Senhora da Ajuda em 10 de abril de 1778. [assinatura] Vis-
conde».
207
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
Decreto
Tendo consideração ao que me representou o Marquez de Alorna,
per si, e como Procurador da Marqueza sua mulher e filhos, que sendo
notoriamente interessados na restituição da fama de Francisco de Assis de
Tavora, [fl. 142v] Leonor de Tavora, Luis Bernardo de Tavora, Jeronimo de
Ataide e Jozeph Maria de Tavora, pertendia acautellar para o futuro as pro-
vas com que intentava justifica-llos innocentes no processo e sentença pro-
ferida em junta de doze de Janeiro de mil setecentos sincoenta e nove em
que parteciparam da nota do horrorozo e execrando crime de Inconfiden-
cia. E não sendo da minha real intensão permitir que possa perecer nem
ainda arriscar-se a verdade em hum assumpto de tão grave ponderação,
quando se proporcionam para o conhecimento della os meyos legitimos
da sua averiguação. Hey por bem conceder licença ao referido Marquez
de Alorna para produzir ad perpetuam rei memoriam sobre a innocencia
e defeza dos sobreditos, todas as testemunhas que apresentar, ainda que
não sejam velhas nem enfermas, para dellas se valer em qualquer tempo
e juizo em que haja de conhecer-se da cauza de que pertende tratar. E para
inquerir as ditas testemunhas na cidade de Lisboa e sinco legoas ao redor
della, sou servida nomear por Juis o Doutor Jozeph Alberto Leitão, Corre-
gedor do Crime da Corte e Caza, e para Escrivão o Doutor Henrique Jozeph
de Mendanha Benavides, Dezembargador da Caza da Supplicação na Com-
marca do Porto, o Corregedor do Crime da Corte e Caza da Primeira Vara
e para Escrivão o outro Corregedor do Crime da Corte e Caza [fl. 143] da
Segunda Vara, os quaes tirarão as ditas testemunhas, sendo citados pelos
mesmos Escr[i]vães para as verem jurar os Procuradores da Coroa dos des-
trictos a que competirem, não só como taes, mas tãobem como Fiscaes da
Justiça. E nas outras provincias se procederá na mesma forma servindo de
Juizes Inquiredores os Corregedores das Commarcas e Escrivães os Juizes
208
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 144]
O Marquez d’Alorna como procurador da Marqueza sua mulher e
de seus filhos, authorizado pelo Decreto de sua Magestade de 7 de No-
vembro de 1777, oferece-nos nomes que reprezenta os itens seguintes,
para por elles se perguntar Pedro Joze da Fonceca Delgado:
1
Item, que Jeronimo de Ataide, Conde que foi de Atouguia, na tarde
do dia tres de Setembro de 1758 foi, juntamente com o Marquez de Fron-
teira, D. Fernando, ser padrinho na freguezia de Nossa Senhora da Ajuda
do cazamento do seu lacaio Bernardo Duarte e vindo para caza às Ave
Marias se despio logo, ficando de roupão e chinelas, e nessa noite nunca
mais dahi sahio.
2
Item, que passado algum tempo dessa mesma noite, o dito Jero-
nimo de Ataide mandou chamar ao quarto da Condeça sua mulher hũa
209
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 146]55
Antonio Joachim da Costa Corte Real, Juiz de Fora do Civel e Crime
desta cidade da Guarda e Escrivão da inquerição que se manda fazer a
55
Não constam os fls. 145 e 145v.
210
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 147]56
Depoimento de Pedro Joze da Fonceca Delgado desta cidade,
perguntado aos itens que requereo o Marquez de Alorna na forma
do Real Decreto
Aos quinze dias de Mayo de mil setecentos e setenta e outo annos nesta
cidade da Guarda, em caza do Doutor Joze de Castro Henriquez, Corregedor
actoal desta dita cidade aonde veio como [...] para effeito de ser perguntado
na sua prezença, sendo testemunha Pedro Joze de Fonceca Delgado aos itens
requeridos pelo Marquez de Alorna aonde com effeito veyo o dito Pedro Joze
da Fonceca Delgado para dar depoimento que abayxo se segue de que tendo
feito este termo de atentado, que eu Antonio Joachim da Costa Corte Real,
Juiz de Fora do Civel e Crime desta cidade, Escrivão desta diligencia por De-
creto de sua Magestade Fidelissima, que Deos guarde, o escrevy.
Pedro Joze da Fonceca Delgado, cidadam(?) desta cidade da Guarda
e nella Tabaliam do Publico Judicial e Notas, proprietario, [...] testemunha
sitada por mim Juiz de Fora desta mesma cidade e Escrivão desta dili-
gencia por forsa do Real Decreto de sua Magestade, e jurado aos Sanctos
Evangelhos, em que poz a sua mam direita para dizer a verdade e guardar
o segredo recomendado. E de sua idade dice ser de quarenta e trez [fl.
147v]57 e trez annos. E do costume dice nada.
E perguntado pelo primeiro item, dice que estando accommodado
em caza do Conde de Atouguia com a intençam de acompanhar a Con-
56
Não consta o fl. 146v; fl. danificado pelas razões acima mencionadas.
57
Fl. bastante danificado pelas razões acima mencionadas.
211
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
deça sua mulher, está lembrado que o mesmo Conde estimava a hum la-
cayo chamado Bernardo Duarte e que foy padrinho de cazamento do re-
ferido criado e do batizado de algum seo filho mas nam esta prezente se
elle [...] foy no dia trez de Setembro do anno de mil setecentos cimqoenta
e outo, porem(?) veyo(?) no dia(?) quatro(?) de Setembro do mesmo anno,
andando elle testemunha a passear perto(?) das cazas do mesmo Conde
juntamente com o Capitam Diogo de Moraes Sarmento [...] do dito Conde
e que seria huma [...] com o quarto da Condeça sua mulher e elle indo
para sima [...] ao seo guarda roupas despi-lo e passado pouco tempo des-
ceo pella escada e [...] indo de roupam que era de huma [...] e de chinellas
[...] para as cazas principaes [...]. E mais não dice deste.
E ao segundo, dice que entrando o dito Conde para as ditas cazas,
logo elle testemunha com o dito Capitam entrarão tambem para a mesma
caza e com elle estiveram conversando algum tempo athe que o mesmo
Conde mandou buscar por hum dos seos guardas roupas huma peça de
guardanapos que tinha no seo dito quarto. E chamando a huma criada por
nome Dona Rita Bernarda, subio com a mesma peça de guardanapos para
o segundo andar das mesmas cazas, ordenando-lhe que [os] cortasse. E la
estava assistindo ao corte dos mencionados guardanapos e que durou athe
as honze hores da noute, pouco mais ou menos. E mais não dice deste.
E ao treceiro dice, que pela mesma [fl. 148] mesma razam sabe que
estando o dito Conde em sobredito exercicio chegou a Condeça sua mu-
lher seria pelas ditas onze horas, pouco mais ou menos, e logo o Conde
a veyo esperar a primeira sala, de donde se conduziram ao segundo
andar das cazas, ao quarto da mesma Condeça, aonde depois de mudar
de vestidos cearam, o que tudo se extendeo athe ao dipois da meya noute
na forma que uzualmente costumavão. E dahy se foram para o quarto de
cima aonde chamaram a dita Dona Rita para despir a Condeça e com ef-
feito logo se deitaram na cama e que elle testemunha prezenciou por lhe
assistir na mesma noute a meza. E mais nam dice deste.
E ao quarto dice, que divulgando-se o attentado dos tiros dados
em El Rey, o Senhor Dom Joze, que Sancta gloria haja, e seguindo-se de-
pois a prizam dos ditos Condes, se recordou elle testemunha, com os ou-
tros criados, de hum caso daquella noute e que nam podia ser possivel
que o dito Conde se achasse naquelle horrorozo attentado e sua prisao
se não esperava, que fosse convencido cumplice daquelle gravissimo de-
licto, quando ao tempo delle se achava em sua caza no referido exercicio
como deposto tem. E mais não dice deste.
212
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 149]
Inqueriçam de testemunhas a requerimento do Marquez de Alorna
que vay remettido do avizo da comição desta comarca da Guarda, feita
por especial mandado de sua Magestade e remettida a Secretaria de Es-
tado dos Negocios do Reyno, fechada e lacrada com trez pingos de lacre
por banda, de que fiz esta declaraçam. Antonio Joachim da Costa Corte
Real, escrivão que a escrevi e asigney.
(assinatura)
Antonio Joachim da Coste Corte Real
[fl. 153]59
1778
Autos de inquirição de testemunhas ad perpetuam rei memoriam,
tiradas a favor e de requerimento do Excelentissimo Marques de Alorna
como procurador da Excelentissima Marqueza, sua mulher, e filhos, inte-
ressados na restituição da fama de Luis Bernardo de Tavora, que foi Mar-
ques deste titulo, processados em conformidade do Real Decreto de sete
de Novembro de mil setecentos e setenta e sete e do avizo da Secretaria
de Estado dos Negocios do Reino, datado em des de Abril do prezente
anno de mil e setecentos e setenta e oito que ao diante vão juntos.
58
Rubrica de díficil descodificação, ficando a impressão que se trata de «Cabral».
59
Não constam os fls. 149v, 150, 150v, 151, 151v, 152 e 152v; No canto superior esquerdo lê-
se «Ouvidoria de Beja».
213
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[fl. 154]
Pela certidão incluza do Decreto de 7 de Novembro do anno pro-
ximo passado constará a vossa Merce que sua Magestade foi servida con-
ceder licença ao Marquez de Alorna, per si, e em nome de sua mulher e
filhos, como interessados na restituição da fama de seus cunhados e seus
sogros, para produzir ad perpetuam rei memoriam as provas para justi-
ficar a defeza e innocencia dos sobreditos com as testemunhas que hou-
ver de produzir a este fim. E ordena a mesma Senhora que Vossa Merce
proceda logo a inquirir por testemunha a Dona Micaella da Silveira Pan-
toja, assistente nessa cidade de Beja, na conformidade do dito Decreto,
remetendo o summario do mesmo depoimento a esta Secretaria de Es-
tado dos Negocios do Reino, como se determina no referido Decreto.
Deos guarde a vossa merce. Palacio de Nossa Senhora da Ajuda em
10 de Abril de 1778.
(assinatura)
Visconde de Villa Nova da Cerveira60
[fl. 154v]
Cumpra-se na conformidade do Real Decreto, que vai junto. Beja
em 18 de Abril de 1778.
(assinatura)
Botelho
60
No canto inferior esquerdo lê-se «o senhor Ouvidor da commarca de Beja».
214
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 155]61
Senhora
Dis o Marquez d’Alorna em nome de sua mulher e de seus filhos,
que para a justificação de seus cunhados e seus sogros lhe he necessario,
segundo os itens adjuntos a esta petição, o depoimento de D. Micaela da
Silveira Pantoja, assistente na cidade de Beja, e como judicialmente só o
poderá conseguir, mandando Vossa Magestade que tenha neste cazo exe-
cução o seu Real Decreto de sette de Novembro do anno proximo pas-
sado.
Pede a vossa Magestade seja servida ordenar que assim se execute.
Espera receber merce
61
No canto superior esquerdo lê-se «Passe do que constar, não havendo inconveniente. Nossa
Senhora da Ajuda, em 10 de abril de 1778. [assinatura] Visconde».
215
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 157]
O Marquez d’Alorna como procurador da Marqueza sua mulher e
de seus filhos, authorizado pelo Decreto de sua Magestade de 7 de No-
vembro de 1777, oferece-nos nomes que ajestade os itens seguintes, para
por elles ser perguntada D. Micaela da Silveira Pantoja.
216
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[1]
Item. Que Luis Bernardo de Tavora, Marquez que foi de Tavora, na
noite de tres de Setembro de 1758, desde as oito horas da noite athe pas-
sado a meia noite, se achou em Belem nas cazas de Joze Mascaranhas,
Duque que foi de Aveiro, onde levou comsigo o rebeca chamado André
e sem dahi se aportar impregou todo o tempo no ensaio de hũas contra-
danças destinadas para se praticarem na outra banda na ocazião das fes-
tas da piedade, nas quaes contradanças assim elle como muitas pessoas
de hum e outro sexo da familia do dito Joze Mascaranhas fizerão figura.
[2]
Item. Que o dito Luis Bernardo não se aportando da dita caza, nem
suspendendo o ensaio das contradanças athe à meia noite, sendo delle in-
separavel o rebeca Andre e as mais pessoas assistentes, se despedio depois
da dita hora e levou então d’ancas no seu cavalo o mesmo rebeca Andre.
[3]
Item. Que este facto ficou naturalmente impresso na memoria das
pessoas que o prezenciarão sem delle se poderem esquecer, por que sendo
o dito Luis Bernardo acuzado, prezo e executado pelo delicto de leza ma-
jestade se lembrarão logo e recolegirão o dito facto concluindo por elle
ser impossivel achar-se o dito Luis Bernardo na perpetração do dito crime.
(assinatura)
Marquez d’Alorna
[fl. 157v]
Certidão da citação feita ao Prometor Fiscal da Coroa
217
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
que elle leo, ouvesse de ver jurar a testemunha Dona Micaela da Sylveira
Pantoja, moradora em esta mesma cidade, sobre os itens antecedentes. E
para poder constar, passei a prezente que asignei.
Beja, 18 de Abril de 1778.
(assinatura)
Guilherme Antonio Apolinar Anderson
[fl. 158]
Inquirição
Aos dezoito dias do mes de abril de mil setecentos e setenta e oito
annos nesta cidade de Beja e cazas de apozentadoria do Doutor Joze de
Oliveira Pinto Botelho e Mosqueira, proffesso na Ordem de Christo, Ou-
vidor Corregedor desta dita cidade e sua Comarca por El Rey, Nosso Se-
nhor, e com alsada por sua Magestade Fedelissima, a Raynha Nossa
Senhora, que Deos guarde, donde eu, Juiz de Fora desta mesma cidade,
Escrivão nomeado pela sobredita Senhora, fui para efeito de inquirir com
elle a testemunha mencionada no avizo da Secretaria de Estado dos Ne-
gocios do Reino, inserto nestes autos e produzida pelo Excelentissimo
justificante aos itens incorporados nos mesmos. Logo ahi pelo dito mi-
nistro foi preguntada a mesma testemunha, cujo depoimento he o que
se segue. De que para constar fis este termo. Eu Guilherme Antonio Apo-
linar Anderson, Juiz de Fora do Civel e Crime desta cidade e Escrivão no-
meado para esta deligencia, que o escrevi.
[fl. 158v]
Dona Micaela Margarida da Sylveira Pantoja, filha de Antonio de
Oliveira Pantoja, natural da Corte e cidade de Lisboa, e ao prezente mo-
radora nesta cidade de Beja, testemunha jurada aos Santos Evangelhos
que pelo Doutor Ouvidor Corregedor da Comarca lhe forão dados, em
que pos sua mão direita e prometeo dizer verdade do que soubesse e
lhe fosse preguntado. E de sua idade disse ser de sincoenta e hum annos,
pouco mais ou menos. E do costume disse nada.
E perguntada ella testemunha pelo primeiro ittem dos interrogatorios
insertos, disse que em rezão de se achar ella testemunha asestindo em
caza de Jozé Mascarenhas na ocazião e tempo mencionado neste item,
sabia, pelo ver e prezenciar, que na noute de tres de Setembro de mil se-
tecentos e sincoenta e oito se achara em Belem nas cazas do dito Joze Mas-
218
O PROCESSO DOS TÁVORAS
carenhas, Duque que foi de Aveiro, Luis Bernardo de Tavora, que [fl. 159]
que foi Marques de Tavora, desde as oito horas da noute dita athe à meia
noute, pouco mais ou menos, empregando-se em todo aquele tempo no
exercicio de humas contradansas em que figurarão algumas pessoas da
caza do mesmo Joze Mascarenhas, havendo levado comsigo o rebeca cha-
mado André, que tocava nas ditas contradansas. E que era certo que o dito
Luis Bernardo de Tavora se não ceparara da mesma caza em todo o refe-
rido tempo, mas que não tinha lembrada se as contradansas predictas se
destinavão para a festividade mencionada neste item, posto que tinha ella
testemunha toda a certeza de que o dito Luis Bernardo de Tavora tanto na
noute de que se fas menção, como em muntas outras anteriores e poste-
riores, concorrera na mesma caza ao referido fim. E mais não disse deste.
E do segundo, disse que era verdade, como já havia deposto, que o
referido Luis Bernardo de Tavora se conservara com efeito em a noute
mencionada na sobredita caza athe à hora declarada [fl. 159v] sem dela
se separar, nem suspender o exercicio das contradanças expressadas, em
que sempre tocara o referido rebeca Andre. Porem, que não sabia se este
fora conduzido de ancas no mesmo cavalo em que se retirara o dito Luis
Bernardo de Tavora, porque ella testemunha o não observara em rezão
de conservar-se no interior das cazas sobreditas, ignorando por isso o que
se passara a este respeito da escada para baixo. E mais não disse deste.
E do terceiro e ultimo, disse que sendo alguns tempos depois da
referida noute prezo, acuzado e executado o dito Luis Bernardo pelo sa-
crilego crime de Leza Magestade, cometido na mesma noute, logo ella
testemunha e algumas outras pessoas que prezenciarão o facto já decla-
rado nos itens antecedentes, se persuadirão de que era impossivel
haver-se estado o dito Luis Bernardo na perpetração do dito crime,
porque constando das oras em que elle se perpetrara se lembrarão com
toda a certeza de que em as mesmas identicas [fl. 160] identicas oras se
achara elle dito Luis Bernardo de Tavora em as cazas do referido Joze
Mascarenhas como dito fica, sem delas se haver separado naquele tempo.
E mais não disse, e asignou sendo-lhe primeiro lido seu depoimento que
disse estar conforme com o que dissera. E eu Guilherme Antonio Apoli-
nar Anderson, Juiz de Fora do Civel e Crime desta cidade, Escrivão no-
meado para esta deligencia, o escrevi.
(assinaturas)
Botelho
D. Micaella Margarida da Silveira Pantoja
219
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[fl. 164]62
Instrumento, digo, Inquirição de testemunhas produzidas ad per-
petuam rei memoriam por parte do Excelentissimo Marques de Alorna,
per si e como procurador da Excelentissima Marqueza sua mulher, e fi-
lhos, que vai remetida do Juiz da Ouvidoria e Correição desta cidade de
Beja, para ser entregue ao Illustrissimo e Excelentissimo Senhor Visconde
de Villa Nova da Cerveira, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios
do Reino.
[fl. 165]63
Acordao os do Conselho e Dezembargo da Raynha Nossa Senhora,
etc., que visto o alvará da dita Senhora, de que se manifesta, que repre-
zentando-lhe o Marquez de Alorna como procurador da fama e memoria
de seus sogros, os Marquezes de Tavora, de seus cunhados, o Marquez
do mesmo titulo e Joze Maria de Tavora, e do Conde de Atouguia, que su-
posto reconhecia não terem sido frequentes os exemplos de revsitas em
cauzas crimes e ainda muito menos nas que se havião processado sobre
o sempre detestavel delito de Inconfidencia. Estava tão publicamente co-
nhecida a innocencia dos ditos seus sogros, cunhados e Conde de Atou-
guia, tão patente e notoria a injustiça da sentença de 12 de Janneiro de
62
Não constam os fls. 161, 161v, 162, 162v, 163 e 163v. Passa-se a transcrever a «Sentença Re-
visória».
63
Não consta o fl. 164v; No canto superior direito lê-se «23 maio 1780». Passa-se a transcrever
a «Sentença Revisória».
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Alvarez, que depoem tãobem por seu cunhado abzente, por serem ambos
os assassinos falados ajustados e corrompidos pello dito Mascarenhas
para o insulto e companheiros em quantos passos para elle derão, a que
forão inteira e individualmente conformes as primeiras declaraçoens que
do dito atentado fes o mesmo reo Mascarenhas depondo o dito Manoel
Alvarez athe dos trages de que elle se vestira [fl. 169] quando sahira para
o insulto. Que lhe dicera esperasse por elle no jardim onde o esperva.
Que se recolhera pelas onze horas e tres quartos. Que fora immediata-
mente para o seu quarto largar os vestidos com que sahira e tomar os de
caza. Que não vira que na mesma noite falasse no jardim com pessoa
algũa nem que houvesse conciliabulo algum em sua caza na manha a se-
guinte, levando esta verdade athe o ponto de ser torturado com dous tra-
tos ezpertos que sofreo constantemente sem que nem ainda com tão
excessivo grao de tormento se lhe podesse extorquir declaração algũa
contraria. Sendo na mesma excluzão daquelles ajuntamentos a elle intei-
ramente conforme o dito Joze Mascarenhas nas suas primeiras declara-
çoens, chegando athe requerer confrontação com quaesquer testemunhas
que tivessem deposto o contrario, ao que se lhe não deferio.
Não podendo opor-se o minimo defeito contra a verdade com que
depozerão os ditos Manoel Alvarez e Antonio Alvarez, que depois de de-
porem contra si, contra seu amo e contra pessoas tão conjuntas como
são irmaons e cunhados, não podia haver presumpção que não fosse vio-
lenta nem razão algũa de direito que possa persuadir a ocultação de pes-
soas estranhas o concurso e ajuntamento dellas, se na realidade o
houvesse.
Sendo pois esta verdade constante da devaça por testemunhas con-
testes e de facto proprio, confirmadas pello mesmo Mascarenhas nas suas
primeiras declaraçoens e que fazem concluir com evidencia que entre
elle e os dous assassinos somente foi disposta e consumada esta sacrilega
manobra que abortarão o odio, a ira e a vingança em que a sua ambicio-
sissima soberba o precipitou contra o dito Senhor, por lhe haver dezar-
mado as suas desmedidas ideas quem pondo os olhos em Deos, na justiça
e na verdade, poderá acreditar o concurso dos Tavoras que se [fl. 169v]
escreveo na sentença, tendo contra si alem da verdade do facto já de-
monstrada, tudo quanto pode persuadir a inverossimilidade contemplada
em termos geraes e especificos que são as regras decisivas em combina-
çoens de provas e que fazem outras tantas dezentranhadas da devaça,
exclusivas inteiramente do referido concurso.
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O PROCESSO DOS TÁVORAS
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O PROCESSO DOS TÁVORAS
pellos guardas e sentinelas que rodeão o mesmo Palacio, este foi sem
duvida o motivo daquella recomendação e não de esperas asima que ca-
recem [fl. 171] de toda a verossimilidade. E o que do referido se conclue
he hũa absoluta exclusão daquelle imputado concurso que tal tratado de
confederação que refere a sentença não houvera para elle com os Tavoras
e que tão abominável insulto foi só concebido e executado pello dito
Mascarenhas e pellos seus dous mandatarios que para elle armou, apa-
relhou e corrompeo.
A terceira inverossimilidade, se deduz do mesmo depoimento do
assassino Antonio Alvarez emquanto declarou que vindo dous dias de-
pois dos tiros fallar ao jardim com o dito Mascarenhas e referindo a este
se dezia que os tiros forão dados em El Rey e Pedro Teixeira, lhe tapara
a boca com as ja referidas palavras “calurda que se tu o não diceres nem
o diabo o pode saber”. E que prova mais evidente dada pella boca do
mesmo Mascarenhas de que só elle e os ditos assassinos entrarão no in-
sulto que acabavão de commeter e delle souberão e comsequentemente
que foi inteiramente falso e fabuloso o congresso ou chamado concilia-
bulo na mesma noite do delito e manhãa seguinte para em hum e outro
se proferirem às blasfemas jactancias e sacrilegas increpaçoens que refere
a sentença?
A quarta inverossimilidade, se deprehende da recomendação que o
dito Joze Mascarenhas fes aos dous executores do insulto, que depois de
o efectuarem não voltassem outra vez na mesma noite ao jardim mas fo-
gissem retrocedendo athe se meterem na rua direita de Lisboa como fize-
rão. E sendo esta ordem dada para que nunca se podesse achar vestigio
de que se sospeitassem os delinquentes ou por onde se podesse vir no
conhecimento delles a mesma prevenida cautella com que foi dada esta,
excluindo toda a crença daquelles ajuntamentos em a mesma noite dos
tiros e manhãa seguinte, porque [fl. 171v] se o mesmo Mascarenhas não
consentio que voltassem na mesma noite ao jardim os que descarregarão
os tiros para tirar toda a ocazião de sospeita e evitar o perigo que com
ella podia correr como havia prohibir aquelle ajuntamento aos assassinos
e permiti-lo aos das chamadas emboscadas para falarem todos no insulto
com tanta devassidão. Joze Mascarenhas teve aquella prevenção com os
dous assassinos como não a teria com os Tavoras ou estes comsigo mes-
mos, correndo igoal perigo e não sendo menos advertidos? Se o mesmo
Mascarenhas tapou a boca a hum dos assassinos ainda depois de passados
dous dias, como he crivel que consentisse se abrissem tantas outras na
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mesma noite do insulto e manhãa seguinte para nelle falarem tão livre e
incautamente? Se houvessem precedido aquelles ajuntamentos em que se
fallara no insulto com tanta liberdade, que motivo ou rezão havia para fe-
char a boca dous dias depois a hum assassino com quem estava só no
jardim e de quem tinha confiado a execução do delito?
Acabão de por a expendida verdade em toda a sua luz os dous con-
testes depoimentos do sempre infeliz João Miguel e de Joaquim dos San-
tos, cocheiro do mesmo Mascarenhas, que excluirão o concurso dos
Tavoras com tal constancia que nem a força dos mais excessivos tormen-
tos que sofrerão se lhes pode extorquir couza algũa contra a verdade que
tão firmemente sobstentarão e unidos estes dous depoimentos ao do re-
ferido Manoel Alvarez que ainda depois de cruelmente torturado sobs-
tentou a exclusão daquelle concurso, fazem todos hũa plenissima prova
dada pella mesma justiça autora de que o não houve.
Com estas precisas nosçoens que ao mesmo passo que indigitão
os agressores certos daquelle barbaro delito são exclusivas de outro
algum concurso, he indispensavel [fl. 172] o most[r]ar-se que os termos
do direito natural e divino, quanto aos chamados complices que com-
prehende o recurso, forão excedidos e atropellados desde o principio do
processo athe a execução da sentença.
Não permite o direito natural que alguem seja prezo e privado da
sua liberdade antes de haver algũa prova da sua culpa, que sem ser ple-
namente convencido do delito seja condemnado nas mais severas pennas
e que sofra as da sentença sem poder replicar a ella quando não foi pre-
cedida de hum convencimento plenissimo ou ao menos confirmado pella
espontanea confissão do mesmo reo.
Forão prezos os Tavoras e Conde de Atouguia no dia 13 de Dezem-
bro de 1758 como agressores de hum delito que havia mais de tres mezes
tinha sido commetido sem haver contra elles a minima prova, pois que
a primeira testemunha de que logo se tratara depos em 15 do dito mez
de Dezembro, dous dias depois das suas prizoens. Os motivos particula-
res que a familia dos Tavoras tivesse contra a pessoa de sua Magestade
quando fossem certos poderião fazer hũa sospeita contra elles depois de
não aparecerem outros delinquentes tendo-se praticado todas as deligen-
cias possiveis para os descobrir, mas antes desta exacta indagação não
podião ser bastantes para aquelle procedimento. E se o erão, porque não
forão logo prezos no mesmo mez de Septembro? Quando não tivesse me-
deado tanto tempo e se podesse averiguar com mayor certeza onde ha-
230
O PROCESSO DOS TÁVORAS
viao passado a noite de tres do dito mez ou fosse para legalizar a culpa
ou a innocencia dos reos, o que não era possivel depois de tanto inter-
vallo em que moralmente nem as testemunhas nem os mesmo reos se
podião lembrar onde havião estado, nem o que tinhão feito naquella in-
feliz noite.
Consistio o delito em dous tiros e nos estragos que fizerão na car-
ruagem, vestido e pessoa de sua Magestade nas primeiras deligencias
que se praticarão forão logo descobertos [fl. 172v] os delinquentes, por-
que dous tiros disparados ao mesmo tempo necessitavão de duas pessoas
que os atirassem. Pelo depoimento de Manoel Alvarez e de seu irmão,
Antonio Alvarez, já referidos, constou que este tinha sido hum dos agres-
sores e outro seu cunhado Joze Policarpo. Era de prezumir que estes
dous assassinos ainda que ignorassem quem hia naquella carruagem ti-
vessem mais algum socio e, ou o ignorassem, ou o soubessem, era ve-
rossimel que fossem mandatarios pois não se podia crer que elles
viessem de Lisboa esperar hũa carruagem para matarem a pessoa que
nella se conduzia por motivos pessoaes se não a conhecião e muito
menos se conhecião que era El Rey. E por isso se logo não declarassem
que o seu mandante fora o Duque de Aveiro, era justissima toda a inda-
gação para o conhecimento delle.
Porem, sendo perguntados instantemente pellos delinquentes e pel-
los complices, hum depondo contra seu proprio irmão e cunhado, contra
seu amo e contra si mesmo, pello que respeita a ser conscio do crime e
não o haver delatado, não falla em outro algum socio ou complice do
delito, sem embargo de ser atormentado para os declarar. Outro, de-
pondo contra si mesmo, contra seu cunhado e o seu bemfeitor, sendo
tres vezes perguntado, tãobem não declara outro algum socio ou com-
plice e pode-se prezumir que os ocultassem se os houvesse ou fossem
sabedores delles. Pode porventura entender-se que os comprehendidos
no recurso serião maos choros àquelles confitentes, ou que tivessem
mayor enteresse em os emcobrir do que em se encobrirem assi mesmos
aos seus mais proximos parentes e a seu proprio amo?
Pois se se achão descobertos dous autores de dous tiros e o man-
dante destes dous mandatarios e elles que tinhão a milhor razão para o
saberem, dizem que não sabem de outros alguns complices se se está
vendo completamente chea a idea do delito e dos delinquentes na sua
reciproca proporção não reziste. [fl. 173] Era Joze Maria de Tavora aju-
dante das ordens do Marquez seu pay, o qual perguntara ao mesmo Mas-
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O PROCESSO DOS TÁVORAS
embuste fabricado pello dennunciante para ver se por elle lhe davão
algũa coiza.
A sentença porem, jurou tanto sobre as suas palavras que decla-
rando se aconcelhara para a dennuncia com aquelle assistente nas mer-
cearias de Bellem que fica apontado, não lhe lembrou ou não entendeo
que era necessario legalizar a dennuncia e qualificar o denunciante, per-
guntando o tal conselheiro e confrontando-o com o mesmo dennunciante
no cazo de negar o conselho nem de taes deligencias tendentes à averi-
goação da verdade há vestigios alguns na devaça.
Segue-se Marianna Thereza, moça da caza de Joze Mascarenhas,
preza na cadea de Bellem logo depois da dennuncia e perguntada no dia
dezassete de dezembro, negando constantemente que soubesse ou sus-
peitasse a cauza da sua prizão. Se lhe fes saber que se dicesse a verdade
seria premiada por sua Magestade assim como castigada se a encobrisse.
Com esta tão poderosa como reprovada sugestão, confessou o commercio
que tinha com o dennunciante, posto que para o fim do matrimonio que
na referida noite o avizara para lhe fallar da jannella do jardim da parte
das terras, que não podera falar-lhe nessa ocazião porque indo ao jardim
antes da meya noite vira andar passeando Joze Mascarenhas só, embru-
lhado em hum capote e logo se retirara por não ser sentida que [fl. 175v]
voltando outra vez o tornara a ver assentado em hum poyal tãobem só,
motivo porque se retirara e não voltara mais nessa noite ao jardim e que
logo na manhãa seguinte participara ao tal dennunciante aquelle emba-
raço. Perguntada pello mais conteudo na dennuncia, respondeo que nada
vira nem ouvira.
Estas primeiras declaraçoens que fes a moça, assim corrompida e
intimidada, podem ser verossimeis na parte em que declara fora na refe-
rida noite ao jardim ao fim que aponta não o são, porem, emquanto
afirma vira nelle o Mascarenhas nas duas vezes que ali chegara. Porque
ou foi ao jardim antes da meya noite, ou depois delle? Se foi antes, quem
vio no jardim não foi o Mascarenhas mas o criado Manoel Alvarez que
ali por elle estava esperando que se recolhesse do insulto como lhe dei-
xara recomendado quando para elle partira. Se foi ao jardim depois da
meya noite ninguem podia ja ver no jardim porque o Mascarenhas se re-
colheo do insulto pellas onze horas e tres quartos e foi immediatamente
para a caza onde tinha deixado os vestidos do uzo para os reassumir e
dali era muito natural que fosse para a salla onde tinha dispozto o festejo
da rabeca athe para não fazer nelle falta tal de que se podesse formar
235
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contra elle algũa sospeita. Podia, comtudo, a dita moça enganar-se nas
horas, hir antes da meya noite ao dito sitio em ambas as vezes e repre-
zentar-se-lhe que era o Mascarenhas o mesmo criado que por elle estava
esperando.
Nas segundas perguntas que se lhe fizerão em vinte de Dezembro,
confirmou o que dice nas primeiras e acrescentou que em a referida
noite, hindo, com efeito, para fallar ao dennunciante depois da meya
noite, vira que estavão tres vultos à porta do jardim da parte de dentro
e que ali não vira o Mascarenhas, salvo se estava da parte de fora ou era
algum dos tres, porque o susto com que ficou e a preça [fl. 176] com que
se retirara lhe não derão lugar a fazer mayor reparo. De sorte que tres
vezes fora ao jardim, primeira quando vira passando o Mascarenhas, se-
gunda quando o vira assentado, terceira quando vira os ditos homens. E
nada mais tinha que declarar.
Instada para que declarasse quem erão os tres homens que con-
fessa tinha visto, fora o dito Mascarenhas porque havia conhece-los pella
pouca distancia ou ao menos pella falla. Depois de varias instancias,
assim se explica o Escrivão sem as declarar, respondeo que conhecera
tanto pella fala quanto pella altura que hum delles era o Marquez de Ta-
vora pay, porque como hia muitas vezes conversar com a Duqueza sua
irmãa o tinha visto e ouvido fallar. E perguntada pelo que dicera o Mar-
quez, visto o ter conhecido pela falla? Respondeo que só percebera o eco
da voz, mas não palavra algũa.
Já fica notado o nenhum credito que merece hũa testemunha cor-
rompida com promessas de enteresses e a cresse a esta o ser intimidada
com ameaços de castigos e amofinada com instancias que se ocultão, ha-
vendo-se escrito as outras que se lhe tinhão feito, e que as declaraçoens
que fes fossem efeitos extorquidos por aquelles reprovados meyos se
mostra porque tendo ella ja dito que vira o Duque seu amo naquelle sitio
só em ambas as duas vezes que a elle fora, que razão tinha para ocultar
o Marquez de Tavora, se na realidade o tivesse visto ou ouvido? Se ella
tivesse visto ou ouvido aquelles vultos não deixaria de o declarar às rei-
teradas instancias que lhe forão feitas nas primeiras perguntas, pois ne-
nhum enteresse tinha em o encobrir, sendo ella de dezassete annos de
idade, vendo-se em rigorosa prizão amofinada com instancias e ameaços
e sendo inquirida pello Escrivão, somente, sem assistencia de outra algũa
pessoa bem se pode nestas circunstancias [fl. 176v] prezumir mentiroza
e sugerida.
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Corrigimos de «Cerra».
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cavallo mais assima? Se antes dos tiros o temor lhe multiplicou os objec-
tos, quando os ouvio crescendo-lhe o medo mayor se deve conciderar a
sua illuzão.
O denunciante Salvador Joze Durão, que dennunciando no dia 15
de dezembro, foi o que deo principio à devaça, depende do mais espe-
cifico e concludente convencimento por que a sentença, abandonando
toda a verdade do facto e toda a verossimilidade, lhe deo o credito que
elle não podia ter sem ofensa dos sobreditos direitos. Dice elle, que tendo
algum commercio illicito com hũa Mariana Thereza, moça da caza do reo
Joze Mascarenhas, e fazendo-lhe o mesmo aviso que na referida noite de
tres de Septembro lhe poderia falar da meya noite por diante, fora, com
efeito, à hora destinada e que sendo duas depois da meya noite, pouco
mais ou menos, achando-se elle escondido debaxo de hũa ponte de pao
que estava ao lado jardim, vira chegar dous embuçados a pé dos quaes
hum era o dito Joze Mascarenhas que tirara hũa pistolla ou bacamarte
com que batera tres vezes em hũa pedra espraguejando em vox que elle
conhecera ser do mesmo Joze Mascarenhas e com as palavras: “valha-te
os diabos que quando eu te quero não me serves”. Que outro que vinha
com o dito Mascarenhas, lhe pareceo que [fl. 183] devem supor-se nelles
os dictames da razão por que costuma regular-se quem a tem nos confli-
tos das mais ponderaveis consequencias. E não podendo haver algum
mayor do que aquelle, como pode compadecer-se que o Duque comuni-
casse a tanta gente o seu arriscadissimo projecto correndo o mayor perigo
em ser delatado? Que o confiasse de familias, ainda que conjuntas, emu-
las, com quem não tinha vivido sempre em perfeita armonia e amizade,
e que o deixasse comprehender a tantos criados indignos de confiança?
Seria possivel que os Marquezes de Tavora, logo depois do delito
commetido e tão perto do sitio onde se tinha perpetrado, fossem largar
nelles os cavallos e fazer hũa galhofa ou assemblea no campo proximo
ao jardim do mesmo Joze Mascarenhas, falando claramente em materia
que pedia o mayor recato onde podião ser vistos e ouvidos de pessoas
que nas terras populares nunca faltão a toda a hora da noite?
Seria possivel que elles logo na manhãa seguinte, com todos os
seus mais proximos parentes, concorressem a caza do dito Mascarenhas
para se comprazerem da cauza que lhes devia infundir o mayor terror?
Antes pello contrario. Se elles fossem participantes daquelle crime se ha-
vião desviar do mesmo chefe delle e não frequentarião tão sedo a sua
caza onde somente hirião separados huns dos outros e as menos vezes
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que lhes fosse possivel para se não fazerem suspeitos, ou pella mayor
frequencia ou pello total retiro. As vizitas e conversaçoens entre os ami-
gos ou parentes havidas depois de commetido hum delito por algum del-
les, serão por ventura argumento certo de conjuração que o podia
preceder e de que não há a menor aparencia? Dice o Mascarenhas [fl.
183v] que havia tres esperas, duas das quaes estavão por sima da que
disparou os tiros que em hũa estava o Marquez pay e o Cabo Braz Joze
Romeiro e em outra o Conde de Atouguia e seu cunhado Joze Maria, não
atinou, porem, a destinar lugar ao Marquez filho.
Primeiramente, desde o sitio onde forão dados os tiros athe a cal-
sada da Ajuda, sobre a qual se acha situado o paço de sua Magestade,
não há distancia para tantas esperas nem lugar acommodado para ellas
se collocarem por ser hum caminho direito e descuberto que não permite
serventia por algum dos lados. A ultima não podia avizinhar-se à sobre-
dita calsada, sempre frequentada de gente e tão proxima do Paço. Pellas
dez horas da noite, seria necessario que ambas estivessem muito juntas
hũa à outra, seria muito facil que àquellas horas passasse por aquelle ca-
minho muita gente e alguas luzes de archotes, que fossem vistos dous
homens a cavallo mais abaxo e outros dous ou tres montados mais acs-
sima, todos parados e sem se poderem encobrir nem disfarçar o seu in-
tento de estarem esperando alguem, ou fosse para o roubarem ou para
o assassinarem, que algum dos passageiros que concebesse esta sospeita
a fosse logo delatar e que viesse a tropa ou a justiça a surprender aquelles
espantalhos.
Pelo contrario, o sitio em que se pozerão os dous correos Antonio
Alvarez e seu cunhado era muito acommodado e mais seguro para a em-
boscada por ser hũa encruzilhada de caminhos que dão serventia para
quatro ou sinco partes, ali havia a sombra das cazas da quinta mo meyo,
do arco que a dividia de sima e os muros de ambas, à mesma sombra
podião estar parados os agressores sem algum receo se vissem que vinha
gente por algum dos lados, podião desviar-se para outro fingindo que
marchavão para poderem [fl. 184] voltar outra vez ao mesmo lugar. Não
era este o mais oculto e o menos exposto, suspeito e arriscado para as
esperas em todo aquelle tranzito? E se os Marquezes de Tavora e mais
chamados complices se empregassem nellas não serião senhores de es-
colherem para si aquelle sitio como mais seguro e acautellado athe para
a retirada? Logo, he contra toda a verossimilidade quanto dice o Masca-
renhas do numero das esperas e das pessoas que nellas se postarão.
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E para que não haja declaração algũa das que fes nas terceiras e
quartas perguntas, o mesmo Joze Mascarenhas que se não mostre inve-
rossimel, falsa e convencida pela devaça bastará se discorra por cada hũa
dellas, que se combinem huas com as outras ainda sem chegar-se ao es-
forço de hũa boa critica.
Logo que se lhe deo a sugestiva noticia da prizão dos Tavoras e
que se lhe propos como verossimel o concurso de outras diferentes pes-
soas de diverso foro, estranhas do prezente objecto e que fazião hũa das
principaes intençoens das perguntas e que se conseguio que elle as de-
clarasse, o não quizerão por aquella vez incommodar com mais pergun-
tas. E na seguinte sessão, dando-se já por certos os influxos das outras
pessoas já por elle declaradas, foi só perguntado a quem os communicara
e pellos efeitos que rezultarão dessa participação, dice que os communi-
cara primeiramente a seu cunhado, João de Tavora, e depois aos Mar-
quezes de Tavora, pay e filho. Porem, que tendo-se o mesmo João de
Tavora oferecido para ser hum dos executores do insulto não so recla-
mara logo o oferecimento mas o exhortara a que dezistisse de tão detes-
tavel projecto pello perigo a que expunha a sua vida e a sua caza, mas
que os Marquezes de Tavora, pay e filho, falando com elles separada-
mente, não só aprovarão a proposta, mas oferecerão cavallos e o mais
que fosse necessario para a execução do insulto. Já fica apontada a inve-
rossimilidade desta participação, tanto da parte do Mascarenhas, [fl. 184v]
como pelo que respeita aos Tavoras. E ficão tãobem expendidas as outras
muitas que fazem incrivel e improvavel o concurso delles deduzidas da
mesma devaça. Nem se poderá fazer crer que João de Tavora, ainda na
falsa supozição daquella pratica, sendo hum filho segundo e arriscando
menos, reclamasse o concurso e o aceitassem os dous Marquezes arris-
cando tanto!
Bem previo, quem fes a pergunta, que este auxilio oferecido logo
por aquelles Marquezes, se havia de fazer incrivel sendo elles tão favo-
recidos pelo senhor Rey D. Joze com honras e mercez. Para a sentença
fazer o delito de Joze Mascarenhas, foi necessario asignar-lhe as cauzas
que teve para o commeter e suposto não possa haver algũa por mayor
que seja que se proponha bastante a justifica-lo seria sempre dificil de
acreditar sem ellas aquelle oferecimento de auxilio prestado por huns
vassallos que farião mais infame a seu crime com a vileza e com a ingra-
tidão, era pois necessario que se o corresse a este reparo que faria incri-
vel a oferta daquelle auxilio. E como se ocorreria a elle? Couza notavel!
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funestissima, não consentio que fossem nos seus proprios cavallos, mas
lhes ordennou que os comprassem por prevenir-se contra a mesma sos[fl.
185v]peita, quis antes passar pello incomodo de hir a pé para o insulto
do que a cavallo. Conduzido pella mesma advertencia athe a fes aos as-
sassinos dous dias depois do insulto para que não vendessem logo os
cavallos que lhes comprara, para que vendidos immediatamente depois
do mesmo insulto se não podesse sospeitar que para elle se comprarão.
Como pode, pois, concordar-se tanta prevenção antecedente tanta cau-
tella e posterior advertencia com a anterior relaxação de mandar preparar
não menos que nove cavallos e manda-los conduzir por criados para as
terras e lugar do insulto na mesma noite delle? De que servia aquella ad-
vertencia depois de executado o insulto, se o segredo delle se havia re-
laxado na mesma noite em que foi commetido?
Merece o mesmo conceito a hystoriada finta que deo tão pouca aut-
horidade à sentença que fes vacillar a fé della, não só nestes reynos mas
nos estranhos, e fazendo-se duvidosa em hũa parte, ficaria sospeita athe na
verdade constantissima de que Joze Mascarenhas e os dous assassinos forão
os barbaros executores do insulto, como sucede em todas aquellas, que se
não estelescem65 (sic) em fundamentos, que os fação respeitar. Se a critica
pode entrar por hũa parte, fas argumento contra a verdade das outras.
He indubitavelmente certo que desta finta não houve prova ou ves-
tigio algum na devaça nem teve mais existencia que na simples declara-
ção de Joze Mascarenhas e isto só bastou para que se acreditar-se como
verdadeira. Dice o mesmo Mascarenhas que concorrera o Marquez de Ta-
vora pay com doze moedas, a Marqueza sua molher com dezasseis, oito
por si e oito pella Condeça de Atouguia, sua filha, e com doze as mais
pessoas que aponta, entre as quaes as dividio para que todas completas-
sem as quarenta que se derão aos assassinos. De sorte que elle foi o que
[fl. 186] os chamou, o que os aparelhou, armou e lhes pagou com qua-
renta moedas, dezasseis por hũa vez, quatro por outra e ultimamente
com vinte dous dias depois do insulto, mas foi tão mizeravel, forte mize-
ria! Que quis tirar a salvo toda esta despeza, condemnando e fintando
todas as pessoas e familias que aponta e andando pellas portas dellas
mendicando estas vilissimas esmollas e isto para que? Para se tirar a vida
a hum Rey, achando logo as bolsas abertas para estes sacrilegos auxilios
como se fossem para algũa obra de religião e de piedade.
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Entenda-se «estabelecem».
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tença os fes valler para constituir chefe do insulto a mesma infeliz Mar-
queza. E para se mandar conduzir do Convento em que se achava para
o lugar em que havia de ouvir a sentença de morte sem ser perguntada
nem defendida, não podendo haver fundamento que se não repute ofen-
sivo athe da humanidade, para que fossem tantas vezes perguntados os
outros chamados reos e o não ser a Marqueza, darem-se os extratos das
culpas dos mais comprehendidos na sentença ao Procurador e nada se
lhe dar do que pertencia à Marqueza serem os outros precipitadamente
defendidos e a Marqueza nem bem, nem mal. Assim acabou os seus dias
aquella disgraçada Marqueza, sem outra noticia da cauza da sua morte
mais do que a que lhe deo a sentença que lhe foi notificada e o procedi-
mento que com ella [fl. 188] se teve. Fas tãobem a ultima prova do que
se ve praticado nesta devaça contra seu marido, seus filhos e seu genro.
Mas que conceito pode merecer hũa sentença athe de si mesma
desconfiada e das provas da devaça emquanto toma por fundamentos
tantos factos estranhos de que na mesma devaça não aparece o menor
vestigio? Se hũa tal liberdade podesse permitir-se sem censura nesta se
expenderião outros, talves de mais publica notoriedade em ultimo
abonno da verdade que sobstenta, mas deve reputar estranho tudo o que
se não pode verificar pellos autos. E tãobem não pode julgar bem da pre-
cipitação com que aquella sentença se executou sem se admitir a menor
replica aos reos. Se ella se negasse aos que verdadeiramente o tinhão,
teria a negação mais disculpa porque nada poderião dizer que os rele-
vasse. Mas negar-se, tãobem, aos que certamente não estavão convenci-
dos pella devaça, aos que não forão nem podião ser bem defendidos no
apertadissimo termo que lhes foi concedido, foi violencia intoleravel que
acabou de atropellar os sagrados e immutaveis principios dos direitos
natural e divino, tantas vezes violados na devaça.
Mostrando-se, pois, em recapitulação de tudo o referido, os agres-
sores certos daquelle atrocissimo crime, convencida de falsa e fabuloza
a dennuncia que deo o primeiro principio a inquizição contra os Tavoras.
Demonstrada a exclusão do concurso destes, por testemunhas contestes
e de facto proprio, e por outras mais provas de indubitavel cer[fl.
188v]teza deduzidas da devaça, convencidas de falsas, mentirosas e entre
si contrarias e irreconsiliaveis, as posteriores declaraçoens de Joze Mas-
carenhas e as outras extorquidas à violencia de tormentos e com as su-
gestoens que dellas mesmas se manifestão huas sem retificaçoens e
outras com ellas tão informes como se tem feito patente e ainda estas
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Entenda-se «vacas».
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Entenda-se «vacas».
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Segue-se repetida a palavra «fingio».
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homem de armas a hũa criança como era Joze Maria, que a mesma sen-
tença trata por ainda mosso e verde Oficial, e menos ainda o Conde de
Atouguia, hum Fidalgo pacifico de quem não tinha dito hũa só palavra
nas anteriores perguntas [fl. 191] nem que tivesse figurado nas fantasticas
confederaçoens ou chimericos ajuntamentos da noite do delito e da ma-
nhãa seguinte. E sendo certa e patente a toda a corte a idea que de si
mesmo fes antes de sugerido e torturado, aparece pella primeira vez, nas
ultimas perguntas, hum homem armado pello respondente para fazer
com o cunhado a terceira emboscada que elle fingio. Aparece condem-
nado para o embuste da finta em oito moedas que elle nem deo nem de-
zembolsou pella mesma declaração do Mascarenhas, unico autor desta
trapassa e não declarando nada de si em tormentos, aparece condemnado
na ultima penna.
Todo o resto das mentiras que comprehendem estas ultimas per-
guntas fica já convencido. He, porem, sempre digno da critica mais se-
vera, que tendo negado constantissimamente o ajuntamento na mesma
noite do delito depois de commetido, chegando athe a pedir confronta-
ção com os que tivessem jurado o contrario. Aqui, sem algũa repugnancia,
declarou o tal ajuntamento sem se lhe fazer cargo de que o tinha negado
com tanta constancia, nem ser perguntado pella razão ou motivo que ti-
vera para oculta-lo nas antecedentes perguntas como era indispensavel
para saber-se quando falara verdade, se quando negara o dito ajunta-
mento, ou se agora, quando o declara? Mas isto que nunca esqueceo a
quem procede com espirito de justiça e de verdade, foi ommitido pello
Juiz e Escrivão das perguntas e sem salvarem a incompatibilidade de duas
declaraçoens diametralmente contrarias sem fazerem cazo da primeira,
estiverão arbitrariamente pella segunda. E sendo indispensavel assen-
tar-se que o Mascarenhas mentio em hũa dellas, quem examinar a devaça
com espirito de verdade ha de julgar que elle a fallou na primeira e que
mentio na segunda, convencida por fabuloza na mesma devaça por pro-
vas clarissimas, mas estes, os efeitos dos tormentos e do medo delles em
hum reo tão debil e tão fraco como foi o Mascarenhas, e os das mais cau-
zas que ficão apontadas.
Deve, tãobem, [fl. 191v] notar-se em comprovação do referido, que
chegou a tal excesso de relaxação a facilidade com que estava disposto
ou corrompido o animo do dito Joze Mascarenhas para declarar quanto
quizessem o Juis e Escrivão das perguntas que ultimamente nas quartas
chegou a ser advertido pellos mesmos interrogantes, couza notavel, que
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não impozesse falso testemunho a pessoa algũa por mais mizeravel que
fosse. Depois de elle ter imposto tantos, guardarão aquelles interrogantes
para o fim de todas as perguntas a impreterivel advertencia, posto que
extemporanea e já sem efeito, está indicando que os mesmos interrogan-
tes, Juis e Escrivão, vacilavão sobre a fé e sobre a verdade de tão amplas
como dezordenadas declaraçoens dando desta duvida a prova mais de-
cisiva em adoptarem huas e refutarem outras por inverossimeis e incri-
veis, sendo necessario para que ellas tivessem termo que dessem por
acabadas as perguntas, porque se continuassem não escaparião a hũa
animozidade atreiçoada e mentirosa todas as mais pessoas que com hum
tal respondente tivessem parentesco, trato, ou amizade, e ou padecerião
como as outras ou haveria mais declaraçoens que se refutassem por falsas
e incriveis.
He notavel o cazo do Padre D. Paulo da Annunciação, que decla-
rando o Mascarenhas a particular amizade que com elle tinha, que lhe
declarara a idea do insulto e athe lhe dera a noticia de que não produzira
os efeitos que dezejava. Sendo perguntado o mesmo Padre o que resultou
das suas coherentes respostas, foi hũa declaração no fim dellas que fize-
rão os interrogantes de que o mesmo Padre se achava provavelmente in-
nocente. Elle o tinha feito conscio do crime, os interrogantes declarão-lhe
a innocencia e aqui temos mentirosa, no mesmo conceito dos interro-
gantes, a contraria declaração do Mascarenhas, aqui a vemos refutada
por falsa e inverossimel. Como podião, pois, acreditar-se as outras [fl.
192] por verdadeiras sem se atropellarem as regras fundamentaes de
todos os direitos.
Mas estas são as declaraçoens de Joze Mascarenhas, tão falsas e
mentirosas como fica demonstrado, tão distantes da verdade pello que
respeita ao concurso e complicidade dos Tavoras, como fica a sombra da
luz. E como podião entrar em linha de prova contra elles para fazerem a
baze da sentença, sem ofensa dos direitos mais sagrados?
Dado, comtudo, que no conceito do Juiz e Escrivão das perguntas
fizessem contra os Tavoras hum indicio urgente as declaraçoens de Joze
Mascarenhas, sem embargo de serem contrarias ao que tres dias antes
tinha afirmado e confirmado quando antão se devia crer que nada mais
tinha que declarar, confessando abertamente o seu proprio delito e de
ser o reo principal delle, que não merece credito. Dado, tãobem, que se
persuadissem que aquelle indicio era suficiente para a tortura dos com-
plices indicados pello mesmo Mascarenhas, he de verdade innegavel que
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nada dicerão, nem contra os complices assim por elles declarados? Mas
huns e outros padecerão a ultima penna!
He a terceira regra, que sendo o tormento hũa prova subsidiaria a
que se não recorre senão na ultima extremidade quando de outra forma
não pode constar do delinquente e por isso ainda depois de exhauridos
os outros meyos, deve primeiro ser intimado aos reos o Decreto do tor-
mento ou porque podem allegar algũa razão que delle os reluzem ou
porque pode bastar o medo da tortura para que confessem como não
poucas vezes acontece. Tãobem esta humanissima regra não teve obser-
vancia algũa, porque os infelices torturandos só sabião dos tormentos
quando erão mandados deitar sobre os potros, bastando a simples nega-
ção dos delitos para se passar logo deste extremo ao ultimo da mais cruel
tortura com ofensa gravissima da humanidade.
He a quarta regra, que a confissão que o reo fizer na caza do tor-
mento, ou depois da noticia do Decreto que nelle o condemnou, deve
ser ratificada fora da [fl. 194] dita caza, depois de passados alguns dias,
termo que deve regular-se pello grao de tormento que sofreo o atormen-
tado e estado em que ficou, não podendo ratificar-se antes de passar
aquelle proporcionado termo, nem dilatar-se a ratificação por muito
tempo. De forma que a confissão que o reo fas no tormento, ou com o
medo delle, de nada valle senão depois de legalmente ratificada, devendo
o mesmo reo ser perguntado se se lembra da confissão que fes em tal
dia e em tal estado? Se he verdade o que então disse e o afirma, ratifica
e dis de novo sem medo, força ou violencia algũa? E asignando a ratifi-
cação desde o instante em que a fes, he que principia agrava-lo a sua de-
claração. Tãobem nada disto se observou, porque primeiramente mostra
a devaça sem ratificação todas as declaraçoens que fizerão em tormento
os criados de Joze Mascarenhas e dos Marquezes de Tavora pais, a ex-
cepção somente da que fes Braz Joze Romeiro que por isso mesmo que
foi o que mentio mais dezordenadamente como logo se mostrara, houve
o cuidado de ratifica-la no dia seguinte, outras com ratificação feita im-
mediatamente aos tormentos na mesma caza delles sem asignatura dos
atromentados, ainda com os estragos dos crueis tormentos que sof[r]erão
com ignorancia athe da ordennação libro 5º. titulo 134. § 1º, outra final-
mente dahi a dous dias qual foi a do referido Marquez de Tavora filho
em que, alem das sugestoens e seduçoens que ficão adverdidas e prova-
das, se faz digno de notar-se que levando só hum trato que o não podia
inhabilitar para asignar a ratificação e muito menos depois de passados
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dous dias, não aparece asignada por elle mas só pello Escrivão a seu
rogo que o seu processo se não acha numerado senão athe a quinta folha
e que não sendo elle nem dos mais eloquentes, nem dos milhores retho-
ricos, aparecem as declaraçoens que fes em tormento com mais bella
ordem dedução e clareza que nenhũa das outras fazendo-o methodica-
mente discreto a mesma dor do tormento em que as produzio.
Com estas previas luzes dos tor[fl. 194v]mentos e das suas regras
milhor se qualificão as testemunhas que cederão à violencia delles e as
que nos mesmos perseverarão constantes para se concluir a verdade de
huas e as mentiras das outras. Dicerão em tormentos sinco testemunhas
contra os Tavoras ou sete entrando tãobem o Marquez Luis Bernardo e
Conde de Atouguia. Perseverarão, porem, constantes no tormento, sem
nada dizerem contra os Tavoras que os faça culpados no insulto, dez,
como forão Manoel da Cozta, porteiro do Duque, o criado João Miguel,
o guarda roupa Manoel Alvarez, o cocheiro Joaquim dos Santos, Antonio
Martinz ferrador da cavalharice, o sota cavalharice do Marquez pay Joze
Fernandes, Joze Antonio seu bolleeiro, João Bernardo seu criado, o
mesmo Marquez, pay, e seu filho Joze Maria. Se as ditas sete pessoas que
cederão ao tormento fallarão verdade, então faltarão a ella as dez que
lhe não cederão e pello contrario se estas sobstentarão a verdade, men-
tirão aquellas. Passando ao exame das sete, mostra-se pella devaça que
se lhes sugeria nas perguntas anteriores ao tormento o que se pertendia
que declarassem nelle e que ainda assim tomarão mal o ensino. Dice An-
tonio Dias, que nos cavallos que levara para as terras montarão em hum
o Marquez pay, em outro o Marquez filho, em outro o Conde de Atouguia
e em outro Joze Maria, o Conigo. O Marquez pay, declara o Mascarenhas,
que fizera a emboscada com Bras Joze Romeiro, quanto ao Marquez filho
prova-se legalmente pella devaça que não figurara em algũa e que pas-
sara a noite no baille que houve em caza do mesmo Mascarenhas e com
esta materia o defende o Ministro Procurador pelo que ouvio a elle
mesmo Joze Maria, o Conigo, nem o minimo vestigio há na devaça de
que figurasse no insulto. E o Conde de Atouguia he dado pelo Mascare-
nhas nas suas mentiras, fazendo a terceira espera com seu cunhado Joze
Maria. Veja-se em que juizo pode caber o credito destes disparates? Fes
bem o Escrivão em não ratifica-los porque a ratificação não pode fazer o
milagre de que as mentiras passem a verdades.
Dice Joze Manoel da Silva [fl. 195] Bandeira que em hũa das esperas
estavão os Marquezes, pay e filho, em outra Joze Maria sem declarar qual
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delles já fica mostrado que nem o Marquez filho, nem Joze Maria, o Co-
nigo, figurarão em emboscada algũa. Dice, tãobem, que estando detras
de hum reposteiro na referida manhãa de 4 de Septembro, ouvira dizer
ao Marquez filho as palavras: “cá pello homem etc.”, ao mesmo passo
que as ditas palavras as atribue o Mascarenhas a Joze Maria, ajudante das
ordens. Isto he o que se tira dos tormentos quando a elles precedem su-
gestoens do que pertende saber-se dos tormentos, mentiras dezordena-
das, extorquidas do mesmo rigor das torturas, tãobem estas não tiverão
ratificação nem della necessitavão.
O que dice Braz Joze Romeiro, nada mais he necessario do que
ler-se para se conhecer logo ao primeiro golpe de vista, que mentio em
quanto declarou, não sofre a decencia que se repita toda a sua declaração
por extenso, baste so o que refere lhe dicera o Marquez filho que estivera
com seu pay na emboscada assima da quinta das vacas quando, como já
se dice, se acha legalissimamente provado que elle passara a noite no
baille. Lembrou, porem, ratificar as declaraçoens desta testemunha, sendo
a que nellas mentio mais destampadamente entendendo-se que a ratifi-
cação as podião fazer verdadeiras. Domingos Marques, depondo da hys-
toria dos seis cavallos que levara Antonio Joze, que não foi perguntado,
mentio com o mesmo Antonio Dias, assima que fallando só de quatro ca-
vallos, dice que elle fora o que os levara. Manoel do Nascimento depos
da mesma arenga dos cavallos que na noite do insulto sahirão da cava-
lharice do Mascarenhas os dous, Palhavãa e Serra, sem dizer para onde
nem quem os levara. Dis dos dous cavallos do Marquez filho, conduzidos
para a cavalharice do Mascarenhas, dous dias antes do insulto, pelo bo-
lieiro do mesmo Marquez, Antonio Joze, que não foi perguntado e que
na mesma noite os sellara e conduzira sem dizer para onde [fora] o criado
Domingos Marques. Dis, tãobem, dos cavallos, Palhavãa e Coimbra, e fa-
zendo menção de seis só já sahida aos quatro na noite do insulto e de
nenhũa forma se pode [fl. 195v] fazer conteste com o que dicerão os dous
criados de que fez menção Domingos Marques e Antonio Dias. Toda esta
hystoria dos cavallos do Mascarenhas e Marquez filho fica convencida
de mentirosa, não teve ratificação esta testemunha, nem mereceria mais
credito com ella. As declaraçoens do Marquez de Tavora filho e do Conde
de Atouguia já tiverão as notas de que são bem dignas e ja se mostrou
que forão abortos da sugestão e da noticia com que forão enganados.
Pello contrario, as dez testemunhas que não cederão à violencia
dos tormentos, nem incluirão os Tavoras em confederaçoens, emboscadas
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Na margem esquerda lê-se «Fomos prezentes e peço vista para embargos. [rubricas, ilegíveis,
dos dois desembargadores procuradores da Coroa e da Fazenda]».
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Aos vinte e tres do mez de Mayo do anno de mil [fl. 198] settecentos
e oittenta e hum, e na Secretaria de Estado dos Negocios do Reyno, foi
publicada a sentença supra escrita e assignada de que logo tambem pedio
vista o Dezembargador Procurador da Coroa e de que eu o Dezembarga-
dor Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne, Corregedor do Crime
da Corte, Escrivam desta revista, fis este termo que escrevi e assignei.
(assinatura)
Henrique Joze de Mendanha Benavides Cirne
[fl. 199]70
Aos outo dias do mes de Agosto de 1780, na Secretaria d’Estado
dos Negocios do Reyno, a que por avizos do Illustrissimo e Excelentis-
simo Senhor Visconde de Villa Nova da Cerveira, Ministro e Secretario
d’Estado da dita repartição, forão convocados os Dezembargadores do
Paço, João de Oliveira Leite e Jozé Alberto Leitão, o Conselheiro da Fa-
zenda Antonio Alves da Cunha, os Deputados da Meza da Conciencia e
Ordens, Sebastião Francisco Manoel e Manoel Ignacio de Moura, o De-
zembargador Concelheiro Ultramarino, Miguel Serrão Dinis, os Dezem-
bargadores dos Agravos da Caza da Supplicação, Jozé Freire Falcão e Luis
Rebello Quintella, Juis dos Feitos da Coroa e Fazenda, ahi pelo dito Il-
lustrissimo e Excelentissimo senhor Visconde de Villa Nova da Cerveira
foi ditto:
Que o Marques de Alorna, como procurador da memoria e fama
posthuma de seus sogros e cunhados, e pelo interesse que nella tem sua
mulher e filhos, fizera a sua Magestade a petição que prezentava, na qual
expendia os varios fundamentos para mostrar a innocencia dos ditos seus
sogros e cunhados, e a injustiça e nullidade da sentensa em que forão
condemnados pelo horrorozo crime de Lesa Magestade, cometido na in-
fausta noite de 3 de Setembro de 1758, contra a sagrada pessoa do Au-
gustissimo Senhor Rey D. Joze 1º. Supplicava finalmente o dito Marques
de Alorna a sua Magestade, fosse servida cometer aos Ministros que a
mesma Senhora se dignasse nomiar o exame de todos os papeis e pro-
70
Não consta o fl. 198v; Passa-se a transcrever o «Assento de 16 de agosto de 1780».
267
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O PROCESSO DOS TÁVORAS
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O PROCESSO DOS TÁVORAS
271
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nas leys, ainda em cazos que não instão tanto como o prezente, a tem
concedido e como este involve a perda dos bens e a infamia dos descen-
dentes que são penas retractaveis, fica a sua concessão mais propria e
competente, e a mesma ley de 3 de Novembro de 1768 que tanto restrin-
gio as revistas, enunciou no § 4º o poderem-se pedir e obter nas cauzas
criminaes. Que sua Magestade ha de tambem ser servida conceder, po-
derem-se perguntar nos autos da mesma revista provas extrinsecas de
cuja concessão são tambem bastantes os exemplos e dispensar, outrosim,
no alvará de ley de 17 de Janeiro de 1759, que confirmou a condemnação
da sentensa mencionada e em todas as mais leys que possão obstar. E de
tudo que fica referido, se fes este assento. Lisboa, 16 de Agosto de 1780.
(assinaturas)
João de Oliveira Leite de Barros
Luis Rebello Quintella
Joze Alberto Leitão
Jozé Freyre Falcão e Mendonça
Sebastião Fancisco Manoel
Doutor Antonio Alves da Cunha e Araujo
Manoel Ignacio de Moura
Miguel Serrão Diniz
[fl. 202]71
Eu, a Rainha, faço saber:
Que reprezentando-me o Marques de Alorna como Procurador da
memoria e fama posthuma de seus sogros e cunhados, e pelo interesse
que nella tem sua mulher e filhos, que na sentença proferida na Junta da
Inconfidencia em doze de Janeiro de mil setecentos sincoenta e nove
sobre o horrorozo crime de Leza Magestade e alta traição, commettido na
infausta noute de trez de Setembro de mil setecentos sincoente e outo,
contra a sagrada e amabilissima pessoa de El Rey, meu Senhor e pay, que
descansa em gloria, houvera não so nullidades substanciaes, mas tambem
injustiça notoria por se expenderem na mesma sentença, factos, funda-
mentos e provas que não existiam no processo. Supplicando-me que fosse
servida conceder revista de graça especialissima da dita sentença, fui ser-
vida, depois de maduros exames e averiguaçoens, mandar propor este ne-
gocio em huma Junta de Ministros do meu Conselho e Dezembargo,
71
Passa-se a transcrever o «Alvará de 9 de outubro de 1780».
272
O PROCESSO DOS TÁVORAS
273
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
que faça executar este alvará como nelle se contém, o qual não passará
pela Chancellaria, posto que o effeito delle haja de durar mais de hum
anno, não obstante a ordenação que o contrario determina. Dado no Pa-
lacio de Lisboa em nove de Outubro de mil setecentos e outenta.
(assinatura)
Rainha
[fl. 204]73
Authos de revista criminal concedida por graça especialíssima
[fl. 205]74
Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil sette-
centos e oittenta annos e aos vinte e oitto dias do mez de Novembro do
dito anno, na Secretaria de Estado dos Negocios do Reyno, aonde eu, o
Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Benevides Cirne, fui cha-
72
No canto inferior esquerdo lê-se «João Chrysostomo de Faria e Souza de Vasconcelos de Sá
o fez».
73
Não consta o fl. 203v.
74
Não consta o fl. 204v.
274
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 206]75
Marques de Alorna
Inquirição de Testemunhas
[fl. 207]76
Senhora
Diz o Marquez d’Alorna, como procurador da memória e fama pos-
thuma de seos sogros e cunhados e pelo interesse que nella tem sua mu-
lher e filhos, que tendo feito a Vossa Magestade vários requerimentos
sobre a restituição da honra e memória daquelles seos desgraçados pa-
rentes, expõem novamente à alta comprehensão e rectissima justiça e à
incomparável clemencia de Vossa Magestade pela concessão dos meyos
necessários para conseguir o fim da mais importante pertenção, sendo
certo que nada pode haver mais agradavel a Vossa Magestade que fazê-la
instrumento da applicação da justiça e do triunfo da verdade, e que nada
75
Não consta o fl. 205v.
76
Não consta o fl. 206v.
275
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
mais honrozo para elle que repetir supplicas [a] Vossa Magestade, pois,
quando os soberanos são, como [Vossa] Magestade he, tem os vassallos
grande satisfação em supplicarem e grande fortuna em (...)77 derem.
§1
Que para mayor clareza, funda[mente] até demonstração da justiça
da cauza (...)78 licito fazer com summo respeito e co[m] [fl. 207v] a ver-
dade, hũa recopilação de factos que já não estão sugeitos a segredo por
serem notórios de hũa fama publica, e em virtude della andarem cons-
tantemente na bocca de todos.
Quanto ao Processo
§2
Hé publico que o réo Jozé Mascarenhas, que foi Duque de Aveyro,
accuzando a muitas pessoas de complices no horrorozo attentado comet-
tido na noite de 3 de Settembro de 1758, se retractou depois quando por
inspiração divina se dispoz para morrer arrependido, declarando a todos
innocentes, menos a si, e a dous criados que fez vis instrumentos do
mayor delicto que querendo (couza incrivel) fazer esta re[vo]gação judi-
cial lhe não foi admittida quando esta(?) se não encaminhava à sua pró-
pria (...)79 unicamente servia para exonerar a (...)80.
§3
Hé publico que tudo isto communicou o (...)81 seo confessor naquella
hora, o Padre Manoel de São Boaventura, religiozo [fl. 208] Carmelita Des-
calço, cujas letras, prudencia e virtude forão bem conhecidas nesta Corte,
o qual assim o repetio antes e depois deste feliz reynado a algũas pessoas
fidedignas e acrescentou que chegara a participar esta noticia a El Rey
Nosso Senhor, antes de se assentar no throno com Vossa Magestade.
§4
Hé publico que o ditto religiozo, estando próximo à morte, fez por
escripto toda esta importante declaração como lho encarregou o peni-
tente, a qual não pode deixar de ter sido vista e mandada guardar por
Vossa Magestade.
77
Folha rasgada no canto inferior direito.
78
Folha rasgada no canto inferior direito.
79
Folha rasgada no canto inferior esquerdo.
80
Folha rasgada no canto inferior esquerdo.
81
Folha rasgada no canto inferior esquerdo.
276
O PROCESSO DOS TÁVORAS
§5
Hé publico que a sogra do supplicante, que foi Marqueza de Távora,
sendo tirada do Convento das Agostinhas Descalças, do sitio do Grillo,
pouco antes da execução, não foi perguntada judicialmente, cazo que tal-
vez não tenha exemplo em réo algum, principalmente nos de similhente
crime, acrescentando-se a não pequena circunstancia da qualidade e sexo
da mesma accuzada e mais que tudo, pela ter declarado a sentença hum
dos chefes da conjuração, de que se segue que devia ter sido séria e ma-
duramente perguntada, não só para o exame da culpa [fl. 208v] mas para
a segurança do Estado. Este unico facto bastaria para prova notoria da
irregularidade e precipitação daquelle processo.
Hé publico que os réos não forão acareados e ainda que se queira
dizer que a acareação não he absolutamente necessária, comtudo, ella se
está practicando todos os dias com os réos de pequenos delictos por ser
este hum dos modos mais conducentes para os Juizes virem no conheci-
mento da innocencia, ou culpa, dos mesmos réos. E a quem viria ao pen-
samento que hum cazo que necessitava dos exames mais miudos e das
perguntas mais repetidas feitas em particular aos reos e depois confe-
rindo e combinando tudo com elles à vista para se arguirem huns aos
outros ou se conformassem entre si de sorte que observada a confuzão
dos semblantes ou a incoherencia das respostas, a debilidade das con-
tradictas e a falta de quartadas podessem ser convencidos e sentenciados
a quem viria, pois, ao pensamento que deixaria de se acarearem os reos
de hum delicto que por ser mais privilegiado para as penas, heo o que
necessita de mais provas para se julgar commettido?
[fl. 209]
Hé publico que o Procurador que se nomeou para defender os reos
não escolhido por elles, teve somente vinte e quatro horas para ouvir e
defender a dez pessoas que podião ter defezas e excepções diversas, prin-
cipalmente ao que consistisse em tempo e lugar que são as mais legaes
de todas, sendo certo que aquellas poucas horas não bastavão para a ins-
trução do Procurador quanto mais para se meditar e escrever a defeza
como ella hé de direito natural, hé tambem certo que se faltou a elle con-
cedendo-se similhante termo dentro do qual moralmente se não podia
fazer a ditta defeza porque ainda que pela especialidade do delicto hou-
vessem muitos Decretos que dispensassem toda a ordem e formalidade
de direito civil, não se podião alterar as regras de direito natural que não
está sugeito, antes hé superior a toda a legislação positiva.
277
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
Quanto as Sugestões
para a Sentença
Hé publico que os trez Secretários d’Estado que então erão, prezi-
dirão à Junta que proferio a sentença, pois por esta razão se declara nella
82
Na margem direita lê-se «(1) sentença do Juiz da Inconfidencia página 27.».
83
Na margem esquerda lê-se «(2) Portugal restaurado. 1. Livro V. página 281.».
278
O PROCESSO DOS TÁVORAS
que a rubricarão (3)84 e que o mais antigo delles não deixaria de influir
muito na ditta sentença, pois, sendo notório que elle costuma[fl. 210v]va
tomar a si até os negócios minimos não deixaria de o fazer neste que era
o mais importante de todos e em que tinha o mayor interesse, porque se
o Principe viesse a persuadir-se que à vigilancia delle se tinha devido a
conservação da sua Real Pessoa e do Estado, certamente se faria neces-
sário seguraria o grande poder que tinha e viria ahi excluir a qualquer
outro Ministro, não só do mando absoluto, mas até da participação delle.
Hé publico que aquelle Ministro nas materias que dirigia e em que
tinha empenho, suggeria facilmente a sua vontade e expunha os seos
fundamentos às pessoas que havião votar ou resolver essas mesmas ma-
térias para que se conformassem com elle, sendo poucos, ou raros, os
que se attrevião a resistir-lhe por medo que verdadeiramente cahia em
varão constante pelos grandes e reparáveis damnos que se lhe seguião
como mostrava a experiencia e muitas vezes lhe era precizo em beneficio
das mesmas partes fazer a estas algum damno por lhe evitar outro mayor.
Hé publico que o mesmo Ministro tinha todo o crédito no Senhor
Rey D. Jozé o 1º, e por [fl. 211] esta cauza o mayor poder neste reyno e
que era costumado fosse natureza ou arte a suspeitar sem fundamento a
resolver sem circunspecção e a castigar sem limite, e que consequencias
não resultarião então aos reos do pezo daquella influencia e da força da-
quellas presumpções?
Hé publico para mayor testemunho das suggestões, ou para mayor
prova da nullidade, que o estylo e fraze da sentença que os argumentos,
indicios e prezumpções em que ella se funda, hé tudo inteiramente o
mesmo que o que se lê em outros muitos escriptos do ditto Ministro, de
que vem a conhecer-se ser elle quem compoz a sentença e até se per-
tende que o Procurador dos réos lha ouvio dictar antes de se instruir
com elles e de preparar a defeza, e tambem se affirma que alguns dos
Juizes disserão a pessoas que o repetem, que não tinhão visto o processo
e assignarão a sentença sem a ler porque estiverão pelas provas que se
lhe repetirão. Não era este o cazo, assim pelo crime, como pelos réos, de
estarem os Juizes pela proposta verbal do Relator, ainda que o feito fosse
de conferencia e de cauza summarissima, e menos de se satisfazerem
com as razoens que apontasse o Ministro d’Estado que tudo dirigio [fl.
211v] e que tudo atropellou.
84
Na margem esquerda lê-se «(3) Ditta sentença página 27.».
279
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
Quanto às Contradicções
da Sentença
A primeira contradicção consiste em dizer a sentença que tudo cons-
tava pela confissão da mayor parte dos reos. Ellas erão onze, contando
auzente e fogido Jozé Policarpo. Tem-se por certo que quatro negarão
constantemente, a saber: Francisco de Assiz, sua mulher (que não foi per-
guntada) seo filho Jozé Maria e João Miguel. Igualmente se tem por certo
que Joze Mascarenhas retractou a confissão em quanto era prejudicial à
familia de Távora, e outros, e que Antonio Alvares pela Confissão e Manoel
Alvares pela noticia, só se declararão correos de Jozé Mascarenhas e Jozé
Policarpo. Logo, cazo negado, que prejudicassem a familia de Távora as
confissoens de Luiz Bernardo, Jeronymo de Ataide e Bráz Jozé Romeyro,
não havia contra esta infeliz familia a confissão da mayor parte dos réos.
A segunda contradicção consiste em dizer a sentença que entrando
[fl. 212] a sogra do supplicante na confederação de Jozé Mascarenhas e
dos Jezuitas, elles e ella tratarão de persuadir a todas as pessoas do seo
conhecimento e amizade que Gabriel Malagrida da mesma religião era
homem penitente e santo, attribuindo a sentença esta opinião e fama a
hum novo estratagema dos confederados. Hé indubitável que esta opi-
nião e fama prevalecia nesta Corte desde o reynado do Senhor Rey D.
João V, logo a sentença deo origem à aquella fama muitos annos depois
do tempo em que ella principiou.
A terceira contradicção consiste em dizer a sentença que o réo Jozé
Mascarenhas dissera ao réo Antonio Alvares, com o dedo na bocca e
muito desafogado, as palavras: “calurda que nem o diabo o pode saber,
se tu o não disseres”. Destas palavras, que a sentença não impugna, antes
serve dellas (4)85 necessariamente se segue que o reo Jozé Mascarenhas
estava certo de serem poucas as pessoas que sabião do delicto que não
passarão delle mandante e os dous bárbaros mandatários, pois este ig-
noraria que Antonio Alvares o tivesse confiado a seu irmão. Logo, se fos-
sem sabedores daquelle segredo mais oito pes[fl. 212v]soas incluidas na
sentença, alem de vários jesuitas enunciados nella e nas provas da de-
ducção chronológica, nenhũa força terião as palavras com que o réo Joze
Mascarenhas recomendara o segredo a hum dos dous infames assacinos.
A quarta contradicção da sentença consiste em dizer que o réo Jozé
Mascarenhas mettera na conjuração a Manoel Alvares, quando ao mesmo
85
Não consta qualquer anotação nas margens.
280
O PROCESSO DOS TÁVORAS
tempo diz que trez ou quatro dias depois do insulto hé que soubera delle
pelo conhecimento que do mesmo cazo lhe deo seo irmão Antonio Alvares
(5)86, pois, ainda que o ditto Manoel Alvares o chamou por ordem de seo
amo e a este ministrasse os capotes e cabelleiras na noite do attentado, nada
disto prova a noticia antecedente do delicto. Logo, hé falso que Jozé Masca-
renhas mettesse na conjuração a Manoel Alvares, posto que este se fizesse
criminozo de Estado porque não revelou o que seo irmão lhe contara.
A quinta contradicção consiste em dizer a sentença que nas esperas
e emboscadas que fizerão os réos concorrerão onze cavallos que repete
pelos seos nomes e outros tantos cavalleiros que nelles [fl. 213] montarão
(6)87, sendo certo que a culpa de Manoel Alvares foi somente não revelar o
que seo irmão lhe contou dias depois e que a sogra do supplicante se não
achou nas dittas esperas, porque alem de ser fora de toda a verosimilidade,
a mesma sentença o não repete e não era circunstancia que ella omittisse.
Logo, sendo onze o numero dos réos e sendo certo que dous desses não
montarão nos cavallos, nunca podião ser mais de nove os cavalleiros.
Quanto às Inverosimilidades
da Setença
Que inverosimilidade que a fátua Junta dos parentes como lhe
chama a sentença! Todo o homem por mais cego que esteja quando co-
mette hũa acção bárbara, logo depois de commettida, principalmente se
errou o golpe, fica em tal confuzão e desordem que até parece arrepen-
dido e o seo principal cuidado hé occultar a mão de que sahio o mesmo
golpe. Como pode, pois, crer-se que na manhã successiva à noite do in-
sulto se juntassem os aggressores do mayor delicto com os seos parentes,
que não erão [fl. 213v] poucos, e dessem voluntariamente indicios da sua
culpa por mais leves que fossem, mostrando temor ou susto em se jun-
tarem tão promptamente e em hũa caza que estava quase no lugar do at-
tentado e quase às portas do offendido (7)88.
Que mayor inverosimilidade que ser a pequena quantia de quarenta
moedas de ouro o premio de dous assassinos que não erão mendigos
nem pessoas de exercicio vil e que cometterão o delicto por ordem ou
em obzéquio de pessoas tão grandes e que o réo Jozé Mascarenhas, o
86
Não consta qualquer anotação nas margens.
87
Não consta qualquer anotação nas margens.
88
Na margem direita lê-se «(7)».
281
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
89
Na margem direita lê-se «(8)».
90
Na margem esquerda lê-se «(9)».
91
Na margem direita lê-se «(10)».
282
O PROCESSO DOS TÁVORAS
92
Na margem direita lê-se «(11)».
93
Na margem esquerda lê-se «(12)».
94
Na margem esquerda lê-se «(13)».
283
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
mentos, diz a sentença que confessara que o réo Luiz Bernardo lhe havia
confiado a conferencia que teve na tarde do insulto com seo pay e irmão,
e que dous Marquezes o encarregarão com segredo de guiar trêz cavallos
que forão de noite para as terras, mas quando passa a afirmar que este
réo se achou nas emboscadas, já se não refere a confissão, mas só que
assim se [fl. 216] provava. E quando assevera que se achou no ajuntamento
que depois do insulto fizerão naquellas terras os criminozos, tambem se
não refere a confissão, porem, só que assim constava (14)95. E que juizo
se pode formar desta confissão, ou que se deve dar à sentença, que hũas
vezes se contradiz e outras não mostra provas que são convincentes.
95
Na margem esquerda lê-se «(14)».
96
Na margem esquerda lê-se «(15)».
97
Na margem direita lê-se «(16)».
284
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 217]
Quanto a ter passado a Sentença em cauza julgada
e não haver Revista em cauza crime
Hé grande a auctoridade da couza julgada mas para esta ter o seo
completo effeito hé necessário que o réo tenha esgotado todos os graos
de recurso com que o direito para melhor averiguação da verdade e da
justiça costuma soccorrer aos vencidos. A sentença de que se trata não
admittia pela sua natureza, appellação ou aggravo, mas podia e devia ser
embargada se os réos que ella condemnou não tivessem ido indefezos e
se o tivera permittido a calamidade que foi fundamento do processo.
Quando os embargos, remédio ordinário da ley, ainda em cauzas sum-
márias se não formarão por cauzas justas que para isso houve e porque
as circunstancias do tempo o impedirão, não pode com razão dizer que
passou a sentença em julgado quando contra ella se allega injustiça no-
tória em tempo que não hé contra a decencia das razõens de Estado que
se facilitem os meyos para a prova da innocencia.
Se o supplicante podera ter vista do processo, talvez pediria li[fl.
217v]cença a Vossa Magestade para citar o Procurador da Coroa e vir
com embargos de nullidade por falsas provas e por suggestão de pessoa
poderoza que equivale à corrupção dos Juizes, ou intentaria, por estes
dous principios, hũa revista de justiça na forma da ley (17)98.
Contenta-se, porem, o supplicante de pedir a Vossa Magestade a
revista de graça especial como lhe chama a ley e que ella mesma insinua
para os cazos em que se allega injustiça notoria (18)99.
Estas são as que se concedem todos os dias e como a negara a jus-
tiça e a clemencia de Vossa Magestade em hum cazo até digno da revista
mais difficultoza, qual hé a de graça especialissima.
Não obsta a pertenção do supplicante a resposta vulgar de que não
há revista em cauzas crimes pelas razõens que vai por na real prezença
de Vossa Magestade.
As sentenças crimes hũas vezes impõem penas que depois de exe-
cutadas se não podem revogar, como são as de morte, talhamento de
membro, tratos, açoutes e marcas. Outras vezes impõem penas que por
sua natureza tem trato successivo como hé [fl. 218] a condemnação a
galés ou desterro e o exterminio. Quando a ley do reyno diz que não
98
Na margem direita lê-se «(17)».
99
Na margem direita lê-se «(18)».
285
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100
Na margem esquerda lê-se «(19)».
101
Na margem esquerda lê-se «(20)».
286
O PROCESSO DOS TÁVORAS
102
Corrigimos de «Concelho».
103
Corrigimos de «Concelho».
104
Corrigimos de «Concelho».
287
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
288
O PROCESSO DOS TÁVORAS
Supplica
A vista de tão ponderozas razões pede unicamente o supplente, já
que Vossa Magestade se dignou de conceder que se inquirissem neste caso
as testemunhas que elle produzio (graça que ficaria inutil se não houvesse
de se fazer obra por ella), seja Vossa Magestade servida de commetter a
Ministros que pelo numero, letras e probidade sejão dignos de tal com-
missão e exame da inquirição de testemunhas, confiando-lhe juntamente
o processo para que informem a Vossa Magestade do pezo que faz hũa [fl.
221v] e outra couza para a concessão da revista. Informem a Vossa Mages-
tade se será da igualdade da sua justiça não concederem em hum cazo tão
extraordinário aquella revista que em outros muitos menos fortes se tem
tantas vezes concedido. E informem a Vossa Magestade se a concederão
de algum modo obrigada a permittir hum meyo que a tire da justa duvida
que Vossa Magestade não pode dei[xar] de ter sobre a justiça, ou injustiça,
de hũa sentença que tem por si mesma as mayores consequencias.
Assim o espera o supplicante, e assim o esperão todos, para que
se confirme ainda mais o justo e gloriozo titulo que os vassallos tem dado
a Vossa Magestade de restauradora da sua honra, da sua fama e da sua
liberdade, o que Vossa Magestade practicaria igualmente com todos os
homens se se podesse conferir o império universal a aquelle Principe
que mais o merece.
[fl. 222]
Ano do nascimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil settecen-
tos e oittenta e hum e aos sette de Abril do anno referido, na Secretaria
de Estado dos Negocios do Reyno, aonde eu, o Dezembargador Henrique
Joze de Mendanha Benevides Cirne, Escrivam desta revista, fui vindo ahi
pello Illustrissimo e Excelentissimo Senhor Visconde de Villa Nova da Cer-
veira, Ministro Secretario de Estado da mesma repartição, me forão entre-
gues os Reays Decretos de trinta de Janeiro e vinte e seis de Fevereiro do
prezente anno, em que sua Magestade se digna de nomear em lugar dos
Juizes mortos e impedidos, aos Dezembargadores Estanislao da Cunha
Coelho, Jorge Manoel da Costa e João Ferreira Ribeiro Lemos, declarando
fizece neste processo o officio de Procurador de sua Real Fazenda o De-
zembargador do Paço Bartholomeu105 Joze Nunes Cardozo Giralde de An-
drade, para que os authoace como com effeito executo neste autho a que
105
Corrigimos de «Bartholameu».
289
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 223]106
Por ter falecido o Doutor Jozé Pinto de Moraes Baccellar e se achar
com impedimento diuturno o Doutor Manoel Jozé da Gama e Oliveira,
do Meu Conselho e do da minha Real Fazenda, Juizes que tinha nomeado
para a cauza do novo exame da devaça e sentença de doze de Janeiro de
mil setecentos sincoenta e nove, que fuy servida comceder em recurso
do Marquez de Alorna, hey por bem nomear em seu lugar os Doutores
Estanislao da Cunha Coelho e Jorge Manoel da Costa, Dezembargadores
dos Aggravos da Caza da Supplicação, e declarar que o Doutor Bartho-
lomeu Jozé Nunes Cardozo Giraldes de Andrade, do meu Conselho e De-
zembargador do Paço, deve fazer na dita cauza o officio de Procurador
da minha Real Fazenda, ficando por esta Caza sendo treze somente os
Juizes , não obstante que no alvará da concessão da revista se acham no-
meados quatorze. O visconde de Villa Nova de Cerveira, meu Ministro e
Secretario de Estado dos Negocios do Reyno, o tenha assim entendido e
faça executar. Palacio de Nossa Senhora da Ajuda em trinta de Janeiro
de mil setecentos outenta e hum.
(assinatura)
Rainha107
[fl. 224]108
Havendo falecido o Doutor Jeronymo de Lemos Monteiro, do meu
Conselho e do de minha Real Fazenda, Juiz que por mim foi nomeado
para a cauza do novo exame da devassa e sentença de doze de Janeiro
de mil setecentos sincoenta e nove, que fuy servida conceder em recurso
do Marquez de Alorna, hey por bem nomear em seu lugar o Doutor João
Ferreira Ribeiro de Lemos, Dezembargador dos Aggravos da Caza da Sup-
plicação. O Visconde de Villa Nova da Cerveira o tenha assim entendido
106
Não consta o fl. 222v.
107
No canto inferior esquerdo lê-se «Registado»; Por sua vez, no canto inferior direito: «Cum-
pra-se na conformidade do que sua Magestade ordena. Lisboa em 7 de Fevereiro de 1781. [as-
sinatura] Visconde de Villa Nova da Cerveira».
108
Não consta o fl. 223v.
290
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 225]110
E logo no mesmo dia, mez e anno supra declarados, fis estes authos
concluzos de que eu, o Dezembargador Joze de Mendanha Benevides
Cirne, Corregedor do Crime da Corte, fis este termo que assignei.
(assinatura)
Henrique Joze Mendanha Benevides Cirne
Concluzos
[fl. 226]111
Concluzos
Aos vinte sette de Novembro do anno de mil e settecentos e oittenta
e tres na Secretaria de Estado dos Negocios do Reyno e em conferencia
a que prezidio o Illustrissimo e Excelentissimo Senhor Martinho e Mello
e Castro, Ministro Secretario de Estado dos Negocios Ultramarinos, se re-
zolveu que a obrepção e subrepção deduzida pello Dezembargador Pro-
curador da Coroa contra o alvara que concedeu esta revista e estabeleceu
esta Junta constituia duvidoza ajurisdição da mesma e que como os em-
bargos em que ella se deduzio erão daquelles que a legislação deste
reyno mandava remeter-se, assentou em que os mesmos fossem remeti-
dos ao Illustrissimo e Excelentissimo Senhor Visconde de Villa Nova da
Cerveira, Ministro Secretario de Estado dos Negocios do Reyno, para os
por na Real Prezença de sua Magestade, a fim da mesma Senhora deter-
minar o que fosse servida. E escripto este assento, logo com effeito foi
entregue ao dito Illustrissimo e Excelentissimo Senhor Prezidente de que
eu o Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Benevides Cirne fis
este termo que escrevi e assignei.
(assinatura)
Henrique Joze de Mendanha Benevides Cirne
109
No canto inferior esquerdo lê-se «registado».
110
Não consta o fl. 224v.
111
Não consta o fl. 225v.
291
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 226v]
Anno do nascimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil sette-
centos e oittenta e tres e aos vinte e dous dias do mez de Dezembro do
mesmo anno, me foi entregue pello Illustrissimo e Excelentissimo Senhor
Visconde de Villa Nova de Cerveira, Ministro Secretario de Estado dos
Negocios do Reyno, o Real Decreto em que sua Magestade se digna de
nomear os novos Juizes que hão de deccidir os embargos de obrepção e
subrepção pello Dezembargador Procurador de sua Real Coroa offereci-
dos, tudo para que eu como Escrivam no referido Decreto nomeado o
auctuace a fim de se proceguirem os termos da decizão ordenada, o que
executo neste aucto a que junto o mencionado Decreto que he expedido
na data de des do prezente mez e o que a diante se acha, de que eu o
Dezembargador Henrique Joze de Mendanha Benevides Cirne, Escrivam
desta revista e igualmente nomeado para esta dependencia fis este que
escrevi e assignei.
(assinatura)
Henrique Joze de Mendanha Benevides Cirne
[fl. 227]112
Porquanto a Junta que pelo meu Alvara de nove de Outubro de mil
setecentos e outenta, creei para rever o processo que se fez aos reos do
horrorozo crime de Alta Traição commettido na infausta noute de trez
de Setembro de mil setecentos sincoenta e outo contra a sagrada e Ama-
bilissima Pessoa de El Rey, meu Senhor e pay, que está em gloria, assen-
tou que a materia de obrepção e subrepção com que o Dezembargador
Procurador da minha Real Coroa tinha embargado o dito alvará, fazia va-
cillante a jurisdicção da mesma Junta e conforme ao direito deste reyno
deviam ser remettidos a mim aquelles embargos para os decidir. Sou ser-
vida nomear aos Doutores Joze Correa de Lacerda, do meu Conselho e
do de minha Real Fazenda, Belchior Joze de Vasconcelos de Carvalho,
Conselheiro do Conselho Ultramarino, Antonio Joze da Cunha, Vereador
do Senado da Camara, Francisco Xavier de Araujo, Antonio Teixeira da
Motta, Antonio de Mattos e Silva, Rodrigo Coelho Machado Torres, De-
zembargadores de Aggravos da Caza da Supplicação, Joze Antonio Pinto
Donas Boto e Marcelino Xavier da Fonceca Pinto, Dezembargadores da
mesma Caza e Corregedores do Civel da Corte, para que, prezidindo-lhes
112
Passa-se a transcere o «Decreto de 11 de Dezembro de 1783».
292
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 228]114
E dados estes authos, os fis concluzos na data antecedentemente
declarada.
113
No canto inferior esquerdo lê-se «registado a folha»; Por sua vez, no canto inferior direito:
«Cumpra-se na conformidade do que sua Magestade ordena. Lisboa 20 de dezembro de 1783.
[assinatura] Visconde de Villa Nova da Cerveira»
114
Não consta o fl. 227v.
115
Corrigimos de «Concelho».
116
Constam, ainda, mais três rubricas, sendo que duas pertencem aos dois Desembargadores
procuradores da Coroa e da Fazenda.
293
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 229]
E logo subsequentemente se me forão entregando as procuraçoins
ao diante juntas nas diferentes datas em que se achão feitas. E como em
todas he constituido por Procurador o Doutor Manoel Joze Saturnino da
Veiga lhe continuo vista, ficando em meu poder o competente recibo des-
tes authos de que fis este termo que escrevi e assignei.
(assinatura)
Henrique Joze de Mendanha Benevides Cirne
[fl. 230]117
D. João d’Almeida Portugal, Marquez d’Alorna, Conde d’Assumar
do Conselho da Rainha minha Senhora [e] Vossa.
Por este meu alvará constituo meu Procurador ao Senhor Doutor
Manoel Joze Saturnino da Veiga, para que por mim e em meu nome possa
alegar e requer[er] na cauza de meus cunhados e meus sogros tudo o
que for a bem da sua justiça. E para esse efeito lhe concedo todos os po-
deres em direito necessarios. 11 de Janeiro de 1784.
(assinatura)
Marquez d’Alorna
[fl. 231]118
A Condeça de Atouguia D. Maria Anna de Lorena
Por esta constituo meu Procurador ao Senhor Doutor Manoel Jozé
Saturnino da Veiga, para que por mim e em meu nome possa alegar e re-
querer tudo o que for a bem da cauza de meu marido e Conde que foi
de Atouguia, de meus pais, os Marquezes que forão de Tavora, e de meus
irmaos, o Marquez que foi de Tavora, Luiz Bernardo de Tavora e Jozé
117
Não consta o fl. 229v.
118
Não consta o fl. 230v.
294
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 232]120
Pella prezente minha procuração, por mim feita e asignada, constituo
meu bastante Procurador a meu tio o Illustrissimo e Excelentissimo Senhor
Marquez de Alorna, para que por mim, em meu nome, pos[s]a requerer e
allegar tudo o que necesario for a fim de se declarar a innocencia de meus
avós, pays e tio, na inconfidencia por que forão condenados. E para tudo
mais que necesario for a semelhante respeito, pois, para o mesmo fim, lhe
concedo todos os poderes em direito necesarios, com expresa faculdade
de substabelear121 os mesmos poderes em hum o[u] muitos Procuradores a
seu arbitrio. E para constar lhe fiz a prezente. Lixboa, 7 de Janeiro de 1784.
(assinatura)
D. Joanna Bernarda Jozé de Lorena
[fl. 233]122
Constituo por meu bastante Procurador ao Senhor Doutor Manoel
Joze Saturnino, para por mim e em meu nome como se prezente fouse,
pos[s]a alegar e req[u]erer tudo o que for a bem da minha justiça sobre
a cauza em que se trata da restauração da fama de meu pay e meus avos.
E para ese efeitu lhe consedo todos os poderes em direito nesesarios.
Lisboa, 10 de Janeiro de 1784.
(assinatura)
D. Luis de Atayde
119
Corrigimos de «eifeito».
120
Não consta o fl. 231v.
121
Entenda-se «Substabelecer».
122
Não consta o fl. 232v.
295
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 234]123
Havendo constado a sua Magestade que Vossa Senhoria havia feito
hum grande reparo sobre a falta, que no processo, que faz o objecto da
revista da sentença contra os Marquezes de Tavora, se achava das cartas
do jesuita Gabriel Malagrida e havendo-se achado as referidas cartas entre
os papeis do falecido Arcebispo de Thessalonica, posto que dellas não
pareça que se conclue algũa prova. Comtudo, a mesma Senhora, para
que o referido processo se reponha no seu primeiro estado com o apenso
das cartas sobreditas, as manda remetter a Vossa Senhoria para que ajun-
tando-as ao mesmo processo à vista dellas possa Vossa Senhoria dizer o
que ao seu officio justo e conveniente parecer.
Deos Guarde a Vossa Senhoria. Salvaterra de Magos, em 30 de Ja-
neiro de 1790.
(assinatura)
Visconde Mordomo Mor124
[fl. 235]125
Ao Senhor João Pereira Ramos de Azeredo Coutinho, do Conselho
de sua Magestade, Dezembargador do Paço e Procurador da Coroa.
Lisboa
(assinatura)
Do Visconde Mordomo Mor
[fl. 236]126
Cartas de Gabriel de Malagrida
à Marqueza de Tavora
[fl. 237]127
Excelentissima e estimadissima minha Senhora Marquesa
Não tenho palavr[as] para encarecer a Vossa Excelencia a satisfação,
consolação e admiração que recebo em ver a Condessa sua filha e Vossa
Excelencia tão animadas e attentas em executar aquelles fracos ensinos
123
Não consta o fl. 233v.
124
No canto inferior esquerdo lê-se «Senhor João Pereira Ramos de Azeredo Coutinho.».
125
Não consta o fl. 234v.
126
Não consta o fl. 235v; Ao centro lê-se o número «1».
127
Não consta o fl. 236v; Ao centro lê-se o número «2».
296
O PROCESSO DOS TÁVORAS
que lhes pode administrar tão ruin cabeça como a minha. Crea-me, minha
Marquesa, parece-me maior milagre e beneficio que Deos Nosso Senhor
favorecesse a Condessa com tão eroico procedimento do que se lhe ti-
vesse resuscitada a mesma dithosissima filha, porque em resuscitar a filha
não avia d’encontrar o braço omnipotente nenhuma minima repugnancia,
mas em elevar-nos a tão eroica constancia e amor e submissão total ao
seo querer divino, quantas repugnancias e dificuldades e contradiçoens
dos nossos apetites!
Enfim, eu me regalo de ter tão boas dissipulas e tenho em agrade-
cimento ao Altissimo e para Vossas Excelencias e suas cazas offerecida a
missa e offereco a ellas todo o meo coração. Eu as aceito para dissipulas,
ainda que avia de ser ao reves, mas com este pensamento(?) que sejão
minhas companheiras e coapostolas em atrhair quantas puderão da sua
exfera a abrazar-se todas no serviço e amor de tão bom Senhor. Não co-
nhecer, não apalpão, que esta he a verdadeira vida, o verdadeiro em-
prego, a unica consolação e paraiso que podemos ter, não só noutra vida,
mas tãobem nesta mesma! Porque não avemos de compadecer-nos das
maes que se vão mettendo em hum multiplicado inferno e cá e lá. Esse
hé o maior sacrificio que podemos oferecer a Jesu Cristo, o zelo das
almas remidas com o seo sangue. Que cilicios, que disciplinas, que jejum
a pão e agoa! Dou traça ao entendimento da nosa fazer a Vossas Exce-
lencias dar, lidar, estudar para que todas conhecen que não outro bem
verdadeiro, não ha outra honra, outro triunfo, outra gloria, outro reino,
outra coroa <do> [...] por amor de tão divino Senhor trazer rendidas aos
seos pes e lhe as render do seo amor as suas almas. Não tenho tempo
para maes. Logo mandarei a secunda instrucção ou a 2ª prece(?), mas
desejo muito que tãobem Vossas Excelencias lhe metten as suas maos e
ajudar a tarea128. Pode vos(?) pelo(?) quando algum dia soceda faltar ao
instrumento suplir-vos outros tres e roguen para este triste pecador.
128
Entenda-se por «tarefa».
297
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 238]129
Illustrissima e Excelentissima Senhora
Hontem fui a Lumiar por causa do Jubileo instituido. A Senhora Mar-
quesa d’Anjeja m’encomendou muito dizesse a Vossa Excelencia que ace-
ler esse negocio dos Excercicios Pelas Senhoras, poes so desejava entrar
e ajudar a metter a caminho obra(?) de tão grande serviço de Deos e que
se lembre do que lhe disse quando Vossa Excelencia esteve no Lumiar. O
mesmo me diz a Senhora Monteira Mor com sua filha, a Senhora da Sil-
veira, e varias outra[s] que sospirão esta bella moda ardentemente e me
dizen que não são necessarias tantas Senhoras porque quatro e cinco com
as suas criadas bastão a fazer muito grande comunidade. Ja Vossa Exce-
lencia vio o Recolhimento? Falou? Ajustou? Soltou as mil dificoldades que
sempre se levantão nas obras de maior serviço de Deos? Ou tudo esta ja
de fuogo130 morto? Nossa Senhora encaminhe as suas obras e as suas pro-
curadoras.
Caza dos Exercicios, 10 Setembro 756
[fl. 239]131
Senhora Marchesa, minha Senhora
Quem tal dissera que hum seo mesmo filho...... e que nao bastasse
todo o seo amor, todas as suas attençoens para divertir hum golpe tão
[s]ensivel. Porem, entenda, minha amadissima Senhora Marquesa, que
estes golpes são ordenados do Altissimo a grandes intentos. Quer este
Pai(?) Senhor mas adiantara a Vossa Excelencia no seo amor e para isto
são necessarios estes desengannos. Queremos amar a Deos de patrulha
como as maes criaturas e talvez menos ainda que as criaturas que em-
porta que não digamos se o fazemos? Deos Pai ha de ir com esses maru-
lhos132, tanto elle amou e ama a Vossa Excelencia como se não tivesse
outro objetto do seo amor e do mesmo modo e com a mesma singulari-
129
Não consta o fl. 237v; Ao centro lê-se o número «3».
130
Entenda-se por «fogo».
131
Não consta o fl. 238v; Ao centro lê-se o número «4».
132
Entenda-se por «perturbações».
298
O PROCESSO DOS TÁVORAS
dade quer ser amado, servido e adorado da Vossa Excelencia. Este, minha
Marquesa, há de ser todo o seo estudo, o seo empenho, o seo desejo, a
sua vida, o maes hé lamentavel cegueira. Se Vossa Excelencia tem huma
Maii133 Santa nao me dira porque não procura taobem a filha viver e mor-
rer Santa? Ha cousa maes douce, maes bella, maes ricca do que entre-
gar-se toda e totalmente a tão grande e amoroso Senhor, tomara eu que
ca estivesse ou que assim como sei que outros Fidalgos procurão este
governo, assim o Senhor Marques o alcançasse para desperta-la bem
neste particular que não hé tão dificultouso e somos devera[s] bestas e
maes que bestas se não o procuramos com todo o possível esforço e es-
pecialmente aquellas a quem Deos deo hum boucado maes de intelli-
gencia, e brio, e capacidade para isto. Hé possivel que saiba eu que há
este bem infinito e que em punto de morte chorarei a lagrimas de sangue
por não ave-lo amado e procurado quanto me foi possivel e agora não o
faça.
Veja que poderoso e amoroso Senhor seja este em hum dos maes
estupendos prodigios, pratticado nestes nossos dias com huma Jesuitessa
ou Ursulina do Brasil tresportada do mesmo Senhor do Brazil athe o
Campo Grande aos seis de Novembre, e não so ver-me como desejava,
mas ouvir toda a prattica que fiz e athe as ladainhas que mandei cantar
e apunta athe a hora, e tudo acerta.
Ora, Senhora, o que pude ou pode fazer esta pobre e humilde crea-
tura para agradar tanto ao Nosso Senhor, não poderá tãobem faze-lo
Vossa Excelencia a quem deo Deos maior talento? E não acabo de faze-lo
eu que tenho tanto maior obrigação e esperiencia do que Vossa Excelen-
cia? Porem, Vossa Excelencia não ignora o ditado, bem o prega Frey Tho-
mas, etc.
133
Entenda-se por «mãe».
134
Entenda-se por «Beija».
299
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 240]135
A Excelentissima Illustrissima Senhora Marqueza de Tavora, minha
Senhora guarde Deus muitos ann[os] – Lisboa
[fl. 241]136
Excelentissima e Estimadissima Senhora Marquesa.
Oh quanto he douce e seguro seguirmos o northe da providencia que
nos governa e fiarmos de aquel Piloto que não pode ter erros nos seos ca-
minhos! Dizen que o meu juiço do terremoto despertou outros terremotos
e que realmente estou arguido e condennado para enfamar nelle muita
gente, etc. Isto seja ditto entre nos para que veja a muita confiança que fazo
de Vossa Excelencia. Mas como tudo foi unicamente não para agravar a
ninguem, mas para fazer a minha obrigação de Pregador e Missionario de
Jesu Cristo, que hé clamar contra(?) os publicos vicios e escandalos e apun-
tar os verdadeiros caminhos para aplacar a indignação divina e fugirmos
[a] castigos maes lutuozos, tomara eu para tão bom Senhor perder mil vidas.
Juro-lo que estou to[do] cheo de alegria e tomara ter presente a Vossa Ex-
celencia para comunicar-le todo o meo coração e a torto e direito teimar
com ella para que desprezando eroicamente todo este desprezado mundo
fruto se largue toda e totalmente nas mãos e amor de tão bom Senhor, que
eu sei certamente que murre de amor por ella.
Pretendo de dar os Exercicios mas custa muito em tão grandes rui-
nas achar ritiro capaz para homes. Se no Recolhimento de Vossa Senhora,
no qual fiz 30 cubiculos, não estivessem algumas donzelas que eu não as
mett[i], não podia aver melhor lugar, a igreja não pode ser melhor, ainda
que me vejo tão falto de meios e em terra tão miseravel espero não só
restaurar as poucas ruinas, mas fexar137 a cerca. Se Vossa Excelencia cá
estivesse podria ser sportola e minha valeosa companhia para exercicios
e fortificação de todas estas mulheres, lhe agradeço a esmola e favor de
encommendar tanto aos 2 capitaens, se me podrão ajudar de alguma sorte
no dito empenho. Estima-lo-hei muito porque mourro para voz138.
Nunca m’esquecerei de pedir a Deos por Vossa Excelencia, de quem
sou e serei139 sempre.
135
Não consta o fl. 239v.
136
Não consta o fl. 240v; Ao centro lê-se o número «5».
137
Entenda-se por «fechar».
138
Entenda-se por «vós».
139
Corrigimos de «sarei».
300
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 242]144
A Illustrissima e Excelentissima Senhora Marquesa de Tavora
guarde Deus muitos ann[os]
(assinatura)
Junqueira
[fl. 243]145
Illustrissima e Excelentissima Senhora Marquesa
Bejo146 as maos a Vossa Excelencia, ao Senhor Maquez, Senhores
Conde e Condessa da Attoguia, para esmola pelos Exercicios, nos quaes
torno entrar hoje e terrei [sic] cuidado rogar e fazer rogar para todos e
140
Entenda-se por «mãe».
141
Entenda-se por «mãe».
142
Cestos de cana.
143
Entenda-se por «conta».
144
Não consta o fl. 241v.
145
Não consta o fl. 242v; Ao centro lê-se o número «6».
146
Entenda-se por «beijo».
301
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
147
Entenda-se por «mãe».
148
Entenda-se por «celas».
149
Corrigimos de «pertaria».
150
Entenda-se por «ainda».
151
Entenda-se por «Confesso-lhe».
152
Entenda-se por «mãe».
302
O PROCESSO DOS TÁVORAS
amos(?) tão tenros, amorosos e bons, ainda que seja tão secco como hum
pão, me caie o coração desfeito em lagrimas. E tomara abrazar-me e des-
pedaçar-me por elles e tomara ve[r] a Vossas Excelencias todas arrebata-
das do mesmo fuogo153.
Tomara que estivesse em minha mão o alivio do Senhor Conde. Ja
rezei para elle tres missas, o certo hé que o considero no maior perigo.
Estes Senhores, que são tão riccos e poden, avião154 d’entrar nestas fun-
daçoens tão importantes, Conventos, Recolhimentos, Seminarios, Casas
d’exercicios [se] não como fundadores ao menos como confundadores155
ou benfeitores insignes. Porem, pare[c]e a esta nossa sencibilidade que
tudo o que damos a Deos e ao alivio e seguro das almas o perdemos.
[244]157
Excelentissima e estimadissima minha Senhora Marqueza
Ja tenho escritto a Vossa Excelencia e acompanho com esta minha a
este Sargento por ver o grande empenho com que o bom Capitão e criado
de Vossa Excelencia, agora feito Sargento mor, deseja o seo adiantamento
maes justo, sentindo a conhecida injustiça que se lhe tem feito nas passadas
153
Entenda-se por «fogo».
154
Entenda-se por «haviam».
155
Entenda-se por «co-fundadores».
156
Entenda-se «quartinho». Correspondia ao quarto de moeda ou doze tostões, no século XVIII.
Ver, SILVA, António de Morais - Diccionario da Lingua Portugueza. Tomo II, Lisboa: Typo-
graphia Lacerdina, 1813, p. 535.
157
Não consta o fl. 243v; Ao centro lê-se o número «7».
303
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
promoçoens. Esta mesma injustiça testefica o seo Tenente Coronel, feito Co-
ronel em Penamacor. Como este seo criado fes os Exercicios spirituaes com
muita satisfacção minha, e proveito seo, nao posso dexar de faze-lo o gosto,
munto maes que o que peço a Vossa Excelencia hé que procure muito que
o Senhor Marques não caia em pecado mortal fazendo huma injustiça ma-
nifesta ao seo Sargento. O dia de Pascoa avia d’entrar com outra bollada
d’Exercicios por me ter mandado hum proprio o Conde de São Lourenço,
que enfalivelmente se acharia em tal dia para entrar nos Exercios com o Se-
nhor Dom Rodrigo [...] de Algarve. Tudo se frustrou com feura tão mali[g]na
de que esteve em perigo manifesto de morte. Graças a Deos e a Nossa Se-
nhora das Missoens que o livrarão disto e peço aos mesmos Soberanos com
tanto calor para que abrazem a Vossa Excelencia e a Senhora Condessa, sua
filha, do seo divino amor que hé todo e o unico bem desta e doutra vida.
[fl. 245]159
Illustrissima e Excelentissima Senhora Marqueza
Caza d’Exercicios, Settu[b]al, 22 Abril 759
Agradeço muito e muito a Vossa Excelencia e ao Senhor Marquez
o desvelo para adiantamento e commodo desse soldado. Todo o meu
fruito160 e conveniencia(?) será161 s’elle entrar nos Exercicios e com elles
se resolver a limpar sua(?) consciencia e viver para aquel fim para qual
158
Entenda-se por «beijo».
159
Não consta o fl. 244v; Ao centro lê-se o número «8».
160
Entenda-se por «fruto».
161
Corrigimos de «sará».
304
O PROCESSO DOS TÁVORAS
foi criado, cousa tão longe desta profissão. Acerca das re[s]postas do Se-
nhor Patriarca, não se canse(?) maes. Tomara eu puder siquer manifestar
a estes Senhores que tem estes cargos ou ecclesiasticos ou seculares o
gravissimo danno que causão e o maes grave cargo que levão na
[con]sciencia com estas tuas omissoens. Talvez a de menor parte era desta
pobre Regente desse Recolhimento que recorria em g[r]ave duvida ao
seo prelado e que rezão pode ter hum prelado de não responder? Por
isto lhe protesto e juro que não vejo cousa maes importante e necessaria
para a salvação das almas, que casas e maes casas em cada canto d’Exer-
cicios e que todos, Principes e Vassalos, Nobres e Mecanicos seculares e
ecclesiasticos huma vez cada anno se cheguen a elles.
Esta mesma demora tão grande em aprovar como deve, e está ob-
rigado hum instinto tão aprovado na Igreja como o instituto da Compa-
nhia, que hé o que proffessão as Ursulinas, e peden com força depoes
de tantas trapaças e armaçoens do inimigo estas recolhidas, que la met-
terão a torto e direito162 os meos contrarios (e m[e] hé preciso sofrer e
abaxar a cabeça) que detrimento não causa à mesma obra? Porque passa
o tempo apportuno(?) por este [...] e eu trattava não só de restaurar os
cubicolos, demolir e levantar paredes como a necessidade pede, mas tão-
bem entrar a <cerca>. E os mesmos superiores <meos>, vendo tanta de-
mora, me prohiben (e tem rezão) ga[s]tar maes hum vintein. Em rezão(?)
porque receião que os mexidoures, que se acomodarão para necessidade
de reparar as ruinas, depoes de reparadas estas, não se levanten outra
vez com o Santo que hé Nossa Senhora e com a sua esmola, e não tornen
a dizer que hão de ser Franciscanas. Porem, bem sabe Vossa Excelencia
que hé facil com engannos e embustes virar a cabeça a humas pobres
molheres que a163 tem tão fraca. O meo gosto seria continuar; e sejão de
que instituto for, ou de São Francisco ou de Santa Teresa, ou da Madre
de Deos, ou Trillas com tanto que attentão à sua perfeição. E eis aqui,
minha amadissima Senhora Marquesa, o vento com que navegamos. O
demonio nos dá travalhos e couçes de desesperado, mas toda a minha
esperança e confiança hé na minha Ama que pode maes. Estimo tanto e
não lhe sei dar as graças por ter livrado de tão grande perigo o Conde
de São Lourenço, por me parecer tão recto e tão pio. Assim tomara eu
que fossen todos e todas as Fidalgas como Vossa Excelencia, a Condessa
162
Corrigimos de «dirreito».
163
Corrigimos de «há».
305
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
De Vossa Excelencia,
O maes humilde e obrigado servo,
(assinatura)
Gabriel Malagrida
[fl. 246]165
Excelentissima Senhora Marquesa
Settu[b]a]l, 6 Fevereiro, 757
Pelo(?) muito que esto[u] empenhado no bem maes verdadeiro de
Vossa Excelencia esti[m]arei muito que se aproveite destes contratempos
para practicamente entender que somos peiores que bestas em não acabar
d’entender que o nosso north[e], o nosso alvo, o nosso unico bem, hé o
nosso Paii e Maii166 e Senhor e só merece todo e totalmente o nosso amor e
fora167 disto não há que [sic] afliçoens, ingratidoens, desesperazoens. E aquel-
les a quem Deos deo o maior caco e entendimento para comprender isto
ainda são maes bestas se não o fazem e executão com toda a resolução.
Eu ja tenho escritto a Vossa Excelencia, e ainda que não tenho
re[s]posta, para que veja que a minha memoria hé maes viva e fixa, não res-
pondo <só> sem re[s]posta sua, mas correspondo com este mimo para Vossa
Excelencia e a Senhora Condessa aliviar suas penas. Merece estimação não
pelos versos, mas pelo Author que hé o patrono da sua excelentissima Caza
São Bernardo. Acabo(?) lendo hum seo inno ao nome Santissimo de Jesus o
164
Corrigimos de «saria».
165
Não consta o fl. 245v; Ao centro lê-se o número «9».
166
Entenda-se por «mãe».
167
Corrigimos de «fura».
306
O PROCESSO DOS TÁVORAS
achei tão cheo de doçura que o fui enterpretando do modo que vaii na
minha lingoa italiana que ja não sei. O certo hé que eu chorei em consolo(?)
sem embargo de ter o coração como pedra. Quanto maes chorará hum co-
ração maes tenro e devoto. Sera facil à Senhora Condessa achar hum conhe-
cido italiano que o metta em solfa, e se não, valha-se do meio da Senhora
Marquesa de Anjeja, ou do Padre Timoteo, mestre das Princessas, e se cá
vier estimarei ouvi-lo cantado da sua bouca168. Estou para entrar com a 3ª
bollada dos Exercicios o que esta taxado pelo sustento <de cada qual> hé
hum coartinho, e mui poucos são aqueles que possão pagar essa lemitação
<depoes de> tanto estrago na terra, com que se Vossas Excelencias promet-
terão alguma praça, athe que eu, em consciencia nao posso recusar este
availlo169, specialmente vendo-me tão cheo de despezas para este Recolhi-
mento de Ursulinas que me assombrão. Graças a [Deos] e a Maria Santissima
estou acabando de reparar os dannos do terremoto. Entra-me agora hum
estranho empulso de conclui[r] a cerca porque certamente esta hé alma
d’huma clausura. E ainda que não pude aver170 nenhum auxilio desta villa
quando estava florente, e muito menos tenho que esperar agora que não hé
maes que hum montão de ruinas e miserias imponderaveis, comtudo, eu
não descanço, mando [ar]rancar e preparar pedras e officiaes. Chegarei
aonde puder, o sitio se o vir conhecerá que não pode aver171 maes bello. A
igreja, excelentissima em outros tempos(?), alcancei de sua Majestade facul-
dade de metter na cerca hum baloarte e hum grande lenço de muralha real
e esta cerca da banda do mar. São necessarios 300 palmos de muro para
cercar da banda da villa, tomara puder fazer do sangue dinheiro e dos ossos
pedra pedra [sic] para concluir cerca e negocio tão emportante ao serviço
de Deos, ao qual peço e pedirei que abrace a Vossa Excelencia e as excelen-
tissimas filhas do seo tão amor. Muitas lembranças à Senhora Marquesa de
Anjeja, Condessa Riibeiras, Duquesa de Aveiro e maes Senhoras conhecidas.
De Vossa Excelencia
O maes indigno e humilde servo
(assinatura)
Gabriel Malagrida
168
Entenda-se por «boca».
169
Entenda-se por «aval».
170
Entenda-se por «haver».
171
Entenda-se por «haver».
307
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
[fl. 247]172
Minha Amadissima e estimadissima Senhora Marquesa
Já tenho escritto a Vossa Excelencia: Antti hontem acabei os Exercicios
que dei a huma bollada de 30 mulheres com toda a regularidade clausura-
das no Recolhimento de Nossa Senhora das Missoens, juntho a formosis-
sima capella de Nossa Senhora da Saude, nesta villa. Protesto a Vossa
Excelencia que vejo tão grande o fruitto e necessidade de taes Exercicios
que cada vez maes me abraço de desejo de ver em cada canto semelhantes
cazas. E como vejo o bom animo e desejo de Vossa Excelencia de me querer
ajudar e concorrer como se fora minha companheira nestes divinos minis-
terios e eu não posso faltar de ir a Santarem, aonde desejo e espero intro-
duzir estes mesmos Exercicios, Vossa Excelencia fará muito serviço a Deos
se procurerá [sic] saber aquellos Fidalgos que tem cazas em Santarem e pe-
dirá a faculdade para valer-me da sua caza para dar nella duas ou tres veçes
os ditos Exercicios. Com re[s]posta de Vossa Excelencia resolv[e]rei se será173
melhor ir antes a esta villa ou depoes de ter dada satisfação a Vossa Exce-
lencia e suas filhas, ja que tão louvavelmente persistão neste proposito. O
mesmo Senhor abrace a Vossas Excelencias todas no seo amor.
[fl. 248]174
Illustrissima e Excelentissima Senhora
Confesso ingenuamente a Vossa Excelencia que igoal à estimação
e veneração que proffesso a Vossa Excelencia hé a saudade e desejo que
me asiste de ve-la, e 5 meses me parecer cinco annos. Porem, se não
pode ser, paciência175. Estimarei muito que nos vejamos diante da majes-
tade divina em aquella gloria que se há [de] ter principio, nunca ha <de>
ter fim. Pague o mesmo Senhor a Vossa Excelencia <o zelo> em procurar
172
Não consta o fl. 246v; Ao centro lê-se o número «10».
173
Corrigimos de «sara».
174
Não consta o fl. 247v; Ao centro lê-se o número «11».
175
Corrigimos de «patiencia».
308
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 249]177
Excelentissima Senhora Marquesa
Muito me consola o ver que busca o verdadeiro caminho e maes
suave para ser Santa que hé o Padre Alonso Rodriguez e para esto(?) com
maes ancia desejo que complete a sua promessa e vermos porque não
sei entender que grande crime d’estado seja (ainda que eu(?) seja tão
mão178 vir a ter os Santos Exercicios e Vossas Excelencias mesmas que
saben muito bem que cousa são, avião179 d’estar todas por elles, e defen-
der e patrocinar a causa do Senhor ou da salvação de tantas almas).
Se Vossas Excelencias vissen o que eu vejo, não du[v]ido que me-
terião a vida(?) por isto quando tivessen huma só faisca de amor de Deos.
Não estranho demónio fazer-me tão desesperada guerra porque ainda
hão d’estar vivos e vivas as que publicamente na igreja de São Julião ovi-
rão180 os ameaços que me fe[z]. Era estranho que tenha tantos ajudantes
e eu nenhum sinto maes <que a perda(?) das almas> ao(?) ser(?) em tan-
tos e tantas este desejo, pareceo-me emportante ao serviço de meo Amo
e Senhor que(?) specialmente às Senhoras o embaraço do cansaço(?) e
chegar-me por 11 dias maes perto à Corte como saria181 em Almada, etc.
176
Entenda-se por «beijo».
177
Não consta o fl. 248v; Ao centro lê-se o número «12».
178
Entenda-se por «mau».
179
Entenda-se por «haviam».
180
Entenda-se por «ouviram».
181
Entenda-se por «seria».
309
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
182
Entenda-se por «carregado».
183
Entenda-se por «seria».
184
Entenda-se por «bota».
185
Entenda-se por «fora».
310
O PROCESSO DOS TÁVORAS
[fl. 250]186
Minha Excelentissima Senhora Marquesa
Como este vouto187 hé santo, não se há de resgatar(?) a força(?) de
direitos e braços, mas abraço[s]. Eu verei, comtudo, o feito que me
manda, mas não sou perito(?) muito nestas cousas. O Padre Diogo, meo
companheiro, parece-me maes apto para isto. Posto assegurar que não
sahirá daqui D. Joze Maria sem resolução firme de antes mourer que pec-
car mortalmente.
Deos Nosso Senhor abraze o coração da minha Senhora Marquesa
e fará que entenda bem e s’aproveite de tão grande Padre spiritual, o
Padre Alonso Rodriguez. Mas veja bem o tratado188 que faz da caridade
e consulte com elle como se ha de valer nesta tão renhida demanda do
demonio(?).
[fl. 254]189
Minha Excelentissima e Amadissima Senhora Marquesa
Settu[b]al, 17 Março, 757
Bem grande tevera190 sido a consolação de vermos em via longa,
porem, sem licença do Provincial não posso de cá sahir. Eu assim o en-
186
Não consta o fl. 249v; Ao centro lê-se o número «13».
187
Entenda-se por «voto».
188
Corrigimos de «travado».
189
Não constam os fls. 250v, 251, 251v, 252, 252v, 253 e 253v; Ao centro lê-se o número «17».
190
Entenda-se por «tivera».
311
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
tendo que cá não parei eu athe 17(?) meses, porque parece-me que Deos
tãobem em outras partes entende fazer semelhantes fundaçoens e mis-
soens, etc. Deos pague a Vossa Excelencia e aos maes benfeitores o novo
subsidio da sua caridade. Tomara eu ter tão boa companheira e zeladora
em outras partes aonde me sinto pouxado ou [sic] Evora, ou Porto! Se
por la for, folgarei ao menos que aquelles prelados sejão Irmãos de Vossa
Excelencia porque para obras semelhantes e missoens, e Exercicios, etc.,
emporta muito que os prelados sejão cheos de Deos e bem affectos a se-
melhantes obras. <Como> for avisado, darei particulares notícias.
Ja tenho dado vivas graça[s] a Nossa Senhora para melhora do
Conde da Rybeira Grande, eu estimarei melhor que comple[t]ar agora o
que tem promettido de fazer os Exercicios spirituaes e preparar-se bem e
muito bem para aquela ter[r]ivel jornada da eternidade. Não posso dilatar
maes que m’está cahindo a cabeça com sonno. Viva mil annos Vossa Ex-
celencia para novo subsidio e dolo(?) para(?) [sic] dos papeis. Deos tudo
e muito maes merece. Os meos obsequios ao Senhor Marquez e a todos
os maes conhecidos e conhecidas. Como hontem me veio hum criado do
Senhor Conde de São Lo[u]renço <lhe encomendei> a mesma diligência
das respostas de S. Cruz para este Padre Prior. Se Vossa Excelencia ja as
procurou, avise(?) o Senhor Conde para que nao os procure.
De Vossa Excelencia
O maes humilde criado
(assinatura)
Gabriel Malagrida
[fl. 255]191
A Illustrissima e Excelentissima Senhora Marquesa de Tavora, D.
Lianor, guarde Deus muitos annos.
(assinatura)
Junqueira
[fl. 256]192
Crea-me Excelentissima e Estimadissima Senhora Marquesa, que es-
timo como meos todos os bon[s] sucessos e beneficios que Deos Nosso
191
Não consta o fl. 254v.
192
Não constam os fls. 255 e 255v; Ao centro lê-se o número «18».
312
O PROCESSO DOS TÁVORAS
Senhor a tão boas Senhoras e totalmente suas. Oh provera Deos que che-
gassemos bem a entender que o nosso Senhor e Pai hé feito, de elle e uni-
camente para sy. Nem pode achar quietação e socego senão virado. A boa
Marquesa d’Anjeja vay bem embebida disto e toda desejosa de amar-se e
abrazar-se com Vossa Excelencia e suas filhas como verdadeiras Irmaas e
ajudar-se humas com outras, como tantos carvoens ao mesmo entento. Oh
quanto estimara eu e se regalara o mesmo Senhor, que todas as Damas da
Corte fizessen tão boa liga. Tem o demonio tantos e tantas que sustentão
o seo partido, não achara, tãobem, as suas o mesmo Senhor?
A unica desconsolação que tive foi chegar domingo a essa villa e
achar que hum Monsenhor do Patriarca com outros tres que tinhão vindo
pelos Exercicios por ter eu dado a elles aviso que para 4ª feira, despoes
das 8as de [...] me restituiria a esta villa, não sabendo da Marquesa de An-
jeja. Esperarão 11 dias em uma stalagem indigna e voltarão a Corte bem
aferbos193. O bom Conde de São Lourenço vem domingo a vila, dia 6.
Marques de Lorisal, Monsenhor Sampayo, D. Martinho, e outros, com que
nao hé ainda reputado tão grande crime vir aos Exercicios, assim viessen
todos a assegurar negocio194 de tanto peso195, qual hé a nossa estranha(?)
salvação. Enculque isto bem aos seos, e dê minhas lembranças(?) à Mar-
quesa de Lorna, sua filha.
Settu[b]al, 4 abril, 58
De Vossa Excelencia
O maes humilde criado
(assinatura)
Gabriel Malagrida
193
Entenda-se por «acervos».
194
Corrigimos de «negotio».
195
Corrigimos de «peço».
313
BIBLIOGRAFIA
314
O PROCESSO DOS TÁVORAS
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IV, Aveiro, 1938;
315
ÍNDICE
CRONOLÓGICO
1756
7 de janeiro
Carta do Pe. Gabriel Malagrida para a Marquesa de Távora.
10 de setembro
Carta do Pe. Gabriel Malagrida para a Marquesa de Távora.
26 de novembro
Carta do Pe. Gabriel Malagrida para a Marquesa de Távora.
1757
6 de fevereiro
Carta do Pe. Gabriel Malagrida para a Marquesa de Távora.
6 de março
Carta do Pe. Gabriel Malagrida para a Marquesa de Távora.
17 de março
Carta do Pe. Gabriel Malagrida para a Marquesa de Távora.
12 de abril
Carta do Pe. Gabriel Malagrida para a Marquesa de Távora.
8 de maio
Carta do Pe. Gabriel Malagrida para a Marquesa de Távora.
1 de junho
Carta do Pe. Gabriel Malagrida para a Marquesa de Távora.
319
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
8 de setembro
Carta do Pe. Gabriel Malagrida para a Marquesa de Távora.
12 de setembro
Carta do Pe. Gabriel Malagrida para a Marquesa de Távora.
1758
4 de abril
Carta do Pe. Gabriel Malagrida para a Marquesa de Távora.
1759
22 de abril
Carta do Pe. Malagrida para a Marquesa de Alorna.
1777
7 de novembro
Decreto pelo qual se nomeou os inquiridores das testemunhas nas diversas
províncias e pelo qual a Rainha concedeu licença ao Marquês de Alorna para
nomear as testemunhas necessárias como procurador da sua mulher e filhos.
18 de novembro
Henrique José de Mendanha Benavides Cirne, Desembargador da Casa da
Casa da Suplicação, confirma a receção do Decreto de 7 de novembro de 1777.
novembro
Itens pelos quais se houve de perguntar as testemunhas nomeadas pelo
Marquês de Alorna.
Testemunhas nomeadas pelo Marquês de Alorna.
320
O PROCESSO DOS TÁVORAS
19 de dezembro
Aviso da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino pelo qual se con-
firma a autorização ao Marquês de Alorna para produzir testemunhas e
para que se inquirisse o Doutor Eusébio Tavares de Sequeira.
Notificação da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino para se in-
quirir por testemunha o Desembargador Eusébio Tavares de Sequeira, de
acordo com o Decreto de 7 de novembro de 1777.
26 de dezembro
Notificação para que se cumprisse o determinado no Aviso da Secretaria
de Estado dos Negócios do Reino, devendo o mesmo e outros documen-
tos serem entregues ao Juiz do Crime que, por sua vez, deveria notificar
o Doutor Provedor da Comarca para ver jurar o Desembargador Eusébio
Tavares de Sequeira.
28 de dezembro
Confirmação da receção do Aviso e dos documentos anexos da Secretaria
de Estado dos Negócios do Reino pelo Corregedor da Comarca de Coim-
bra, Doutor Inácio José de Mota de Carvalho.
29 de dezembro
António da Costa de Vasconcelos de Sousa Arnaut, professo na Ordem
de Cristo e Juiz de Fora da cidade de Coimbra, confirma que notificou o
Provedor da Comarca Fiscal da Coroa, o Doutor Constantino Barreto de
Sousa, para ver jurar o Desembargador Eusébio Tavares de Sequeira.
dezembro
Itens pelos quais se houve de perguntar o Desembargador Eusébio Ta-
vares de Sequeira.
1778
7 de janeiro
Depoimento do Desembargador Eusébio Tavares de Sequeira, deputado
da Mesa da Consciência e Ordens.
321
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
31 de janeiro
Decreto pelo qual a Rainha nomeou o Doutor José Freire Falcão de Men-
donça para substituir o Doutor José Alberto Leitão na comissão de in-
quirição de testemunhas.
Aviso da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino sobre nomeação
do Doutor José Freire Falcão e Mendonça.
7 de fevereiro
Confirmação da receção do Aviso da Secretaria de Estado dos Negócios
do Reino, sobre a nomeação do Doutor José Freire Falcão e Mendonça,
pelo Desembargador Henrique José de Mendanha Benavides Cirne.
Henrique José de Mendanha Benavides Cirne, declara que notificou o
Desembargador Procurador da Coroa para ver jurar as testemunhas pro-
duzidas pelo Marquês de Alorna.
9 de fevereiro
Início dos interrogatórios nas casas do Desembargador José Freire
Falcão de Mendonça
– Depoimento de Domingos Monteiro Ramalho, Notário Apostólico e Ci-
rurgião dos cárceres secretos do Santo Ofício.
– Depoimento do Reverendo Padre Frei António das Chagas, religioso da
província da Arrábida.
– Depoimento do Reverendo Padre Frei António, guardião do Convento
de São Pedro de Alcântara.
– Depoimento do Reverendo Padre Frei José de Nossa Senhora do Pilar,
Definidor da província da Arrábida.
14 de fevereiro
Início dos interrogatórios no Convento de São Pedro de Alcântara
– Depoimento do Reverendo Padre Frei Domingos da Natividade Custó-
dio, Mestre na província da Arrábida e conventual em Nossa Senhora da
Boa Viagem.
– Depoimento do Reverendo Padre Frei Martinho de Santa Maria, Reli-
gioso da província da Arrábida e conventual no Convento de São José de
Ribamar.
– Depoimento do Reverendo Padre Frei José de Santa Catarina Belém,
religioso da província da Arrábida e conventual no Convento de São Cor-
nélio dos Olivais.
322
O PROCESSO DOS TÁVORAS
323
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
20 de março
Henrique José de Mendanha Benavides Cirne declara ter recebido um
aviso da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino, para que o Desem-
bargador José Freire de Falcão e Mendonça continuasse na comissão de
inquirição de testemunhas até ao termo da diligência.
Aviso da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino, pelo qual a Rainha
requer a continuação do Desembargador José Freire Falcão e Mendonça
à frente da comissão de inquirição de testemunhas até que a diligência
esteja concluída.
21 de março
Início dos interrogatórios nas casas do Desembargador José Freire
Falcão de Mendonça
– Depoimento de Miguel José Granatti, Oficial da Secretaria do Conselho
de Ultramar.
– Depoimento de António José de Matos Ferreira, Cavaleiro da Ordem
de Cristo e Apontador das moradias dos Fidalgos Capelães da Casa
Real.
– Depoimento de Diogo José de Faro e Vasconcelos, Cavaleiro da Ordem
de Cristo, Escrivão do cargo de guarda reposte da Casa Real.
– Depoimento de Lourença Cruz, casada com Tomé Fernandes e mora-
dora no Cardal da Graça.
– Depoimento de Maria Rosa, casada com Aleixo Teixeira, moradora na
Pampulha.
– Depoimento de D. Helena Filipa Xavier de Navarro, moradora nas es-
colas gerais.
– Depoimento de Manuel José da Costa, morador no forte de Xabregas.
– Depoimento de Bento Dias, morador em São Lázaro.
– Depoimento de D. Rita de Sales Granate, casada com João Carlos Finali,
Oficial da Secretaria do Ultramar.
– Depoimento de Gabriel da Veiga, medidor do terreiro, morador no Vale
de Santo António, freguesia de Santa Engrácia.
– Depoimento de André da Fonseca, assistente do Marquês de Alvito.
4 de abril
Início dos interrogatórios no Convento das Religiosas de Nossa
Senhora do Remédio
– Depoimento da Madre Soror Ana de Santa Teresa.
324
O PROCESSO DOS TÁVORAS
7 de abril
Início dos interrogatórios nas casas do Desembargador José Freire
Falcão de Mendonça
– Depoimento de Miguel Pedroso, Tenente de cavalos do Regimento de
Alcântara.
– Depoimento de António Jorge, soldado da Companhia de Carvalho do
Regimento de Alcântara.
– Depoimento de Manuel da Silva Moreira, soldado reformado do Regimento
de Alcântara, onde serviu na Companhia de Luís Bernardo de Távora.
– Depoimento de José Francisco Rijo, morador em Valejas, na Bica.
– Depoimento do Excelentíssimo Marquês de Marialva.
– Depoimento de Pedro Hipolito de Figueiredo, Cavaleiro da Ordem de
Cristo.
– Depoimento de Martinho Teixeira Pequeno Chaves, Fidalgo da Casa de
sua Majestade.
– Depoimento de D. Catarina Gertrudes Jorge, casada com João Jorge,
negociante.
– Depoimento de D. Ana Joaquina de Sousa, assistente em casa do Vis-
conde de Asseca.
10 de abril
Aviso da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino para que se proce-
desse à inquirição da testemunha, Pedro José da Fonseca Delgado.
Notificação da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino para que se
inquirisse, enquanto testemunha, Pedro José da Fonseca, de acordo com
o Decreto de 7 de novembro de 1777.
Aviso da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino para que se proce-
desse à inquirição da testemunha, Dona Micaela Margarida da Silveira
Pantoja.
Notificação da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino para que se
inquirisse, enquanto testemunha, Dona Micaela Margarida da Silveira
Pantoja, de acordo com o Decreto de 7 de novembro de 1777.
14 de abril
Início dos interrogatórios na casa do Conselheiro da Fazenda, Gon-
çalo José da Silveira Preto
– Depoimento de D. António de Aguilar Sequeira, prelado da Santa Igreja
Patriarcal e do Conselho de sua Majestade.
325
G. O. SANTOS | L. CORREIA | R. C. REIS
18 de abril
Guilherme António Apolinar Anderson, Juiz de Fora do Cível e Crime, da
cidade da Guarda e escrivão nomeado, confirma a receção do autos de
inquirição, aviso e decreto, que autuou e remeteu à Secretaria dos Negó-
cios do Reino.
Guilherme António Apolinar Anderson, cita o Bacharel André Ferreira de
Almeida Guimarães, para que este fizesse as vezes de promotor da justiça
e fiscal da Coroa e fosse ver jurar a testemunha, Dona Micaela Margarida
da Silveira Pantoja.
– Depoimento de Dona Micaela Margarida da Silveira Pantoja, natural da
corte e cidade de Lisboa, moradora e assistente na cidade de Beja.
23 de abril
Início dos interrogatórios nas casas do Desembargador José Freire
Falcão de Mendonça
– Depoimento de José Machado, barbeiro, morador defronte do Conde
da Ponte.
– Depoimento de Manuel Jesus, Mestre de escrita, morador na Rua do
Olival, por trás do Convento de São Francisco de Paula.
– Depoimento de André de Campos, conserveiro, morador na Freguesia
de Nossa Senhora da Lapa.
– Depoimento de José Ribeiro, porteiro da sala do Marquês de Louriçal.
– Depoimento de André Alvarez, familiar do Marquês de Louriçal.
– Depoimento de António José, Boleeiro de Gonçalo Xavier de Alcá-
çova.
– Depoimento de Teresa de Jesus, assistente em casa do Visconde de As-
seca.
– Depoimento de Francisca das Chagas, assistente em cada do Visconde
de Asseca.
– Depoimento de Maria Joaquina, assistente em casa de D. João da Costa.
– Depoimento de D. Rita Bernarda de Vasconcelos, assistente em casa
do Marquês de Tancos.
– Depoimento de D. Helena Rita, colaça de Mesquita caldeira.
– Depoimento de António José Gomes, morador no Calhariz no Bairro
Alto.
– Depoimento de Mónica Teresa, moradora em Caparica.
– Depoimento de Maria Francisca, assistente em casa do Conde de São
Vicente.
326
O PROCESSO DOS TÁVORAS
abril
Itens oferecidos pelo Marquês de Alorna, pelos quais se houve de per-
guntar a testemunha, Pedro José da Fonseca.
Itens oferecidos pelo Marquês de Alorna, pelos quais se houve de per-
guntar a testemunha, Dona Micaela Margarida da Silveira Pantoja.
6 de maio
Início dos interrogatórios nas casas do Desembargador José Freire
Falcão e Mendonça
– Depoimento de João Figueiredo, morador na calçada de Santo Amaro.
– Depoimento de Manuel Mendes da Cunha, morador na Quinta da Ponte
do Trancão.
– Depoimento de Domingos Fernandes Pinto, morador na Rua Nova de
Jesus.
– Depoimento de Francisco José de Moura e Miranda, assistente em casa
do Marquês de Alorna.
– Depoimento de António Caldeira Delgado, escudeiro da Condessa de
Óbidos.
– Depoimento de Matias José Rodrigues, assistente em casa do Conde de
Vila Verde.
– Depoimento de Manuel José Soares, boleeiro do juiz do crime do Bairro
de Santa Catarina, Francisco de Azevedo Coutinho.
10 de maio
António Joaquim da Costa Corte Real, Juiz de Fora do Cível e Crime, da
cidade da Guarda, confirma a receção do Aviso da Secretaria de Estado
dos Negócios do Reino, de 10 de abril, tendo em vista a inquirição de
testemunhas.
14 de maio
António Joaquim da Costa Corte Real, Juiz de Fora do Cível e Crime da
cidade da Guarda, afirma ter comunicado ao Doutor Francisco António
Jacome de Gouveia Freire e Vasconcelos, Juiz de Fora da Vila de Celorico,
para que fosse ver jurar Pedro José da Fonseca Delgado.
15 de maio
Depoimento de Pedro José da Fonseca Delgado, assistente na cidade da
Guarda e Tabelião Judicial e Notas.
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3 de junho
Início dos interrogatórios nas casas do Desembargador José Freire
Falcão e Mendonça
– Depoimento de Pedro de Saldanha de Albuquerque, do Conselho de
sua Majestade e Marechal de campo dos exércitos.
10 de junho
Declara o Marquês de Alorna, perante o Desembargador José Freire Fal-
cão e Mendonça, não ter mais testemunhas para serem inquiridas.
11 de junho
Henrique José de Mendanha Benavides Cirne, Desembargador da Casa
da Suplicação e escrivão, participa ao Desembargador Procurador da
Coroa a conclusão das inquirições.
Atestação, de 28 de novembro de 1777, do Reverendo Francisco de Ne-
greiros Alfeirão, Desembargador da Relação Eclesiástica da cidade de
Évora, apresentada pelo Marquês de Alorna para ser anexada à inquirição.
18 de julho
Entrega do Aviso da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino, datado de
11 de julho de 1778, pelo Desembargador José Freire Falcão e Mendonça
ao Desembargador Henrique José de Mendanha Benavides Cirne, para se
prosseguir a inquirição das testemunhas, nomeadas pelo Marquês de Alorna.
20 de julho
Henrique José de Mendanha Benavides Cirne, participa ao Desembarga-
dor Procurador da Coroa a continuação da inquirição de testemunhas.
30 de julho
Início dos interrogatórios no Convento de Nossa Senhora
da Conceição de Carmelitas descalças
– Depoimento da Madre Maria Antónia de São José, religiosa e priora do
Convento dos Cardais.
– Depoimento da Madre Teresa de São José, religiosa do Convento dos
Cardais.
– Depoimento da Madre Ana de Jesus Maria José, religiosa do Convento
dos Cardais.
– Depoimento da Madre Ana de São José, religiosa do Convento dos Cardais.
328
O PROCESSO DOS TÁVORAS
julho
– Depoimento de João Bernardo de Vasconcelos.
– Depoimento de João Henriques da Mota e Melo, fidalgo da Casa de sua
Majestade.
– Depoimento de Martinho Afonso Henriques de Melo, fidalgo da Casa
de sua Majestade.
– Segundo depoimento do Desembargador Eusébio Tavares de Sequeira,
do Conselho de sua Majestade, deputado aposentado da Mesa da Cons-
ciência e Ordens e professo na Ordem de Cristo.
20 de setembro
Henrique José de Mendanha Benavides Cirne, Desembargador da Casa
da Suplicação e Escrivão, declara que o Marquês de Alorna não apresen-
tou mais testemunhas para serem inquiridas.
23 de setembro
Henrique José de Mendanha Benavides Cirne, Desembargador da Casa
da Suplicação e Escrivão, notifica o Desembargador Procurador da Coroa
que o Marquês de Alorna não produzirá mais testemunhas.
1780
16 de agosto
Assento pelo qual se demonstram algumas contrariedades e imperfeições
no processo condenatório (1758-59) em relação às ordenações do reino.
9 de outubro
Alvará pelo qual a Rainha concede licença de revisão do processo e sen-
tença criminal, proferida na Junta da Inconfidência, a 12 de janeiro de
1759, ao Marquês de Alorna.
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10 de outubro
Confirmação do Alvará, de 9 de outubro, pela Secretaria de Estado dos
Negócios do Reino.
28 de novembro
O Desembargador Henrique José de Mendanha Benavides Cirne, Escrivão
da diligência, confirma a entrega do Alvará de 9 de outubro pelo Ministro
Secretário de Estado, Visconde de Vila Nova de Cerveira, assim como o
assento dos Ministros Informantes.
Recopilação de factos quanto ao processo e sentença criminal, apresen-
tados pelo Marquês de Alorna.
1781
30 de janeiro
Decreto pelo qual a Rainha se dignou nomear o Doutor Estanislau da
Cunha Coelho e Jorge Manuel da Costa em substituição do Doutor José
Pinto de Moraes Bacelar e do Doutor Manoel José da Gama e Oliveira, da
mesma forma que declara que o Doutor Bartolomeu José Nunes Cardoso
Giraldes Andrade passou a fazer as vezes de Procurador da Fazenda Real.
26 de fevereiro
Decreto pelo qual a Rainha se dignou nomear o Doutor João Ferreira Ri-
beiro de Lemos, Desembargador dos Agravos da Casa da Suplicação, em
substituição do Doutor Jerónimo de Lemos Monteiro.
O Desembargador Henrique José de Mendanha Benavides Cirne, Escrivão no-
meado e Corregedor do Crime da Corte, declarou ter feito os autos conclusos.
7 de abril
O Desembargador Henrique José de Mendanha Benavides Cirne, Escrivão
da diligência e Corregedor da Corte, confirma a receção dos Decretos
reais de 30 de janeiro e 26 de fevereiro, pelos quais a rainha se dignou
a nomear novos juízes.
23 de maio
Sentença revisória, remetida do Juiz da Ouvidoria e Correição da cidade
de Beja para o Ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Reino,
330
O PROCESSO DOS TÁVORAS
1783
27 de novembro
Conclusos: Assento que demonstra que a obrepção e subrepção deduzida
pelo Desembargador Procurador da Coroa contra o Alvará de 9 de outu-
bro de 1780, que concedeu a revista do processo, constituía dúvida, pelo
que cabia ao Ministro Secretário de Estado, Visconde de Vila Nova de
Cerveira, apresentar o caso junto da Rainha para que esta fosse servida
de determinar conforme era direito.
11 de dezembro
Decreto pelo qual a Rainha nomeou novos juízes para decidirem sobre
o embargo do Desembargador Procurador da Real Coroa ao Alvará de 9
de outubro de 1780.
22 de dezembro
O Desembargador Henrique José de Mendanha Benavides Cirne, Escrivão no-
meado para a diligência, confirma ter recebido do Ministro Secretário de Es-
tado, Visconde de Vila Nova de Cerveira, o Real Decreto de 11 de dezembro.
1784
7 de janeiro
Acórdão que manda dar vista aos embargos de obrepção e subrepção,
publicado e Confirmado pelo Desembargador Henrique José de Menda-
nha Benavides Cirne.
Procuração pela qual D. Joana Bernarda José de Lorena delegou os seus
poderes ao Marquês de Alorna, seu tio, a fim de este, como seu Procura-
dor, fazer tudo o que fosse necessário para comprovar a inocência de
seus avós, pais e tio.
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8 de janeiro
Procuração pela qual o Marquês de Alorna delegou os poderes dados
por sua sobrinha, D. Joana Bernarda José de Lorena, ao Doutor Manoel
José Saturnino da Veiga, salvaguardando-os de igual modo.
9 de janeiro
Procuração pela qual a Condessa de Atouguia, D. Maria Ana de Lorena,
nomeou por seu Procurador o Doutor Manuel José Saturnino da Veiga,
para que em seu nome fizesse quanto fosse necessário para provar a ino-
cência de seu marido, o então Conde de Atouguia, de seus pais, os Mar-
queses de Távora, e seus irmãos.
10 de janeiro
Procuração pela qual D. Luís de Ataíde nomeou por seu Procurador o
Doutor Manuel José Saturnino da Veiga, para que em seu nome fizesse
quanto fosse necessário para provar a inocência de seu pai e seus avós,
os Marqueses de Távora.
11 de janeiro
Procuração pela qual o Marquês de Alorna, D. João d’Almeida Portugal,
nomeou por seu Procurador o Doutor Manuel José Saturnino da Veiga,
para que em seu nome fizesse quanto fosse necessário para provar a ino-
cência de seus cunhados e sogros.
janeiro
O Desembargador Henrique José de Mendanha Benavides Cirne confir-
mou a entrega das procurações que davam poder de direito ao Doutor
Manuel José Saturnino da Veiga para que, no exercício das suas funções,
declarasse a inocência da família Távora.
1790
30 de janeiro
Notificação do Visconde Mordomo Mor, Senhor João Pereira Ramos de
Azeredo Coutinho, para que se anexasse as cartas do Padre jesuíta, Ga-
briel Malagrida, ao processo.
332
O PROCESSO DOS TÁVORAS
1796
29 de março
Confirmação da entrega do processo no Gabinete do Príncipe, que se
encontrava nas mãos do Bispo Inquisidor e de Joseph de Seabra da Silva,
então Ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Reino.
333
POSFÁCIO
G.G. de O. S.
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