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CURSO: Farmácia.

DISCIPLINA: Química Farmacêutica


PROFESSORA: Paulo Tamashiro
ACADÊMICA: Bruna K. S. de Souza.

Anestésicos Locais

Anestésico local pode ser definido como uma droga que pode bloquear de forma reversível, a
geração e propagação de impulsos elétricos em tecidos excitáveis, bloqueando a transmissão do estímulo
nervoso no local onde for aplicado, sem ocasionar alterações no nível de consciência. Os anestésicos locais
(AL) são bases fracas poucos solúveis e instáveis.
Todos os ALs são anfipáticos e vasodilatadores, o mais vasodilatador é a lidocaína e o menos
vasodilatador é a mepivacaina.
A classificação estrutural e propriedades químicas dos anestésicos locais
Os anestésicos locais são bases fracas com pKa acima de 7,4, razão pela qual são parcialmente
ionizados em pH fisiológico, apresentando uma boa capacidade de penetração na membranas axônica e
bainha nervosa. Em solução, os AL estão em equilíbrio na forma ionizada e não-ionizada.
Os anestésicos locais não devem ser injetados em tecidos inflamados, porque a absorção é rápida e
pode levar a efeitos sistémicos antes dos efeitos locais que se desejam.
Os anestésicos locais possuem em sua maioria um grupo aromático (lipossolúvel, hidrofóbico)
associado a um grupo amina (polar, hidrofílico). Esses dois grupos são ligados por uma cadeia intermediária
que determina a classificação do anestésico local como amida ou éster.

Formula geral dos AL:

O R1

C N
O(CH2)n R2
cadeia centro
Centro intermediária hidrofílico
lipofílico
Radical aromático: é a porção lipossolúvel do fármaco, responsável pela penetração no nervo. Ex: ac.
Benzoico (cocaína, benzocaina), acido para-aminobezoico ou PABA (procaína, cloroprocaina) e a xilidina
(lidocaína, bupivacarina e outras amidas). Esse radical aromático apresenta uma ação alergênica, com
exceção do grupo xilidina, que praticamente não determina reação.
Cadeia intermediaria: é o esqueleto do anestésico. Variações da cadeia intermediaria levam a variações
tanto da potencia como da toxicidade. A ligação dessa cadeia com um grupo amida ou com um do grupo
éster determina o tipo químico da molécula de AL.
Grupo amina: é a porção ionizável da molécula, que vai sofre a influencia do pH do meio e, portanto, é a
única que pode ser manipulada pelo anestesiologista. Determina a velocidade de ação do anestésico local.
O grupo amino-ésteres são biotransformados rapidamente no plasma pela colinesterase plasmática,
exemplo, procaína, tetracaína, benzocaina.
Grupo amino-amidas dependem da biotransformação hepática pelo sistema da P450, exemplo,
lidocaína (Xilocaina), prilocaina, etidocaina, mepivacaina, bupivacaina, dibucaína.
A ligação molecular que existe nos AL do tipo éster é mais fácil de ser quebrada que a ligação
molecular do grupo amida, por isso os ésteres são mais instáveis em solução e não podem ser armazenados
por tanto tempo quanto as amidas. As amidas são termoestáveis e podem sofrer o processo de autoclave, os
ésteres não.
Em todos os anestésicos locais dos tipos éster e amida, o grupo carbonila é ativado pela presença de
carga positiva parcial no átomo de carbono.
A introdução de um grupo na posição para do anel fenílico pode aumentar esta polarização, caso
este grupo (por exemplo, NH2) for doador de elétrons ou diminuí-la, se o grupo for aceptor de elétrons (por
exemplo, NO2).

O
H .. C2H5 O O
N C C2H5
O CH2 N
C2H5
N C
O CH2 N
H CH2 O C2H5
CH2
Favorável
Desfavorável
Figura 2 – Influência dos grupos substituintes no anel aromático dos anestésicos locais.

No primeiro caso, o composto resultante unirse-á ao aceptor firmemente, e assim prolongará a ação
anestésica local.
..
O H CH2 CH3
.. CH2
H2N
.. C CH2 N
+
O CH2 CH3
-
+
- +

Figura 3 – Ligação da molécula da procaína ao aceptor

No segundo caso, o composto resultante não poderá ligar-se tão bem ao aceptor quanto o composto
matriz e , consequentemente, sua atividade anestésica local será reduzida.
O mesmo resultado será obtido se o sistema de duplas ligações conjugadas for interrompido com a
introdução de um grupo -C- ou -C-C- entre o anel aromático e o grupo carbonila.

O
R .. C2H5
N CH2 C
O CH2 N
C2H5
H CH2
Figura 4 – Efeito sobre a nuvem eletrônica , da introdução de um grupo –CH2- entre o anel
aromático e o grupo carbonila

Duração do Efeito – depende da velocidade de hidrólise por enzimas inespecíficas e da


hidrofobicidade dos compostos.

A duração do efeito aumenta progressivamente na seqüência:


Procaína < lidocaína < prilocaína < bupivacaína

Classes
Derivados de Ésteres
São ésteres do ácido p-aminobenzóico. Devido à presença da função éster, são facilmente
hidrolisados, perdendo a atividade.
Cocaína
CH3
N CO2CH3
H
O
C
O
H
Cocaína

É levógera, apresentando-se como cristais incolores ou pó branco cristalino, pouco solúvel em água.
É empregada topicamente no olho, nariz, ouvido, garganta, mas não deve ser injetada nem ingerida.
Com a introdução de fármacos mais potentes e mais seguros, seu uso começa a declinar. Todavia, tem largo
emprego entre viciados em tóxicos.

A Benzocaína é um anestésico local peculiar de solubilidade muito baixa, usado na forma de pó seco para
tratamento de úlceras cutâneas dolorosas. A droga é liberada lentamente e produz anestesia de superfície de
longa duração.

Procaína (Probecilin®)
O

H2N C CH2CH3
O CH2 CH2 N
CH2CH3
Procaína (Novocaína)

Empregada na forma de cloridrato, borato e nitrato. É o protótipo dos anestésicos locais de uso parenteral.
Também é empregada intravenosamente no tratamento de arritmias cardíacas.

Tetracaína (Anestesico®, Anestesiol®)

CH3CH2CH2CH2 HN C CH2CH3
O CH2 CH2 N
CH2CH3
Tetracaína

É sólido, fotossensível e muito pouco solúvel em água, mas solúvel em substâncias lipídicas. É usada nas
formas tanto livre (básica) quanto na de cloridrato.
Início de ação muito lento e duração prolongada

Derivados de Amidas

A função éster foi substituída por amida. Apresentam maior estabilidade e resistência à hidrólise.
Esta resistência é incrementada por grupos metílicos na posição orto em relação à função amida, devido a
impedimento estérico ao ataque do grupo carbonila.

Lidocaína (Lidocord®, Xylocaína®)

CH3 O
C CH2CH3
NH CH2 N
CH2CH3
CH3
Lidocaína

Tanto a base livre quanto o cloridrato são pós cristalinos de odor característico.
É o mais estável dos anestésicos locais conhecidos, mostrando-se extremamente resistente à hidrólise.
Além de ser empregada como anestésico local, também é aplicada intravenosamente no tratamento de
arritmias.
Apresenta ação mais intensa e mais prolongada do que a procaína, durando de 60 a 75 minutos devido sua
hidrofobicidade moderada. É administrada em associação com epinefrina ou levarterenol. Sua ligação amida
impede a degradação por esterases;

Prilocaína (Citanest, citocaina)

CH3
O
CH3
NH C
CH
HN CH2 CH2 CH3
Prilocaína
Pó cristalino branco, muito solúvel em água e em etanol. Tem estrutura e ação semelhantes às da lidocaína,
porém apresenta período de latência e duração de ação superiores.
É eficaz sem a necessidade da adição de epinefrina ou outro vasoconstritor.
Em solução aquosa a 1% é usado em anestesia de infiltração e a 2-3%, em anestesia de bloqueio.
Possui início de ação médio e média duração, além de apresentar ação vasoconstritora intrínseca;

Bupivacaína (Marcaína®)

CH3
O

NH C
N
CH3
H2C CH3
CH2 CH2
Bupivacaína

Pó cristalino branco, solúvel em água e em etanol. É usado para anestesia pó infiltração, de bloqueio e
epidural, mas não para anestesia espinhal.
Seu efeito anestésico duas a três vezes mais que o da lidocaína.
Emprega-se bastante em trabalhos de parto, normalmente junto com epinefrina, com o que se aumenta a
duração do efeito.
Possui início de ação lento e duração prolongada (2 – 3 horas), pois é altamente hidrofóbica (> potência). A
levobupivacaína é um enantiômero da bupivacaína e possui maior segurança e menor efeito cardiotóxico;

Anestésicos Locais Diversos

Diclonina (Dyclone)

O
N
O

Estruturalmente é uma cetona. Usada em anestesia superficial.


Por ser irritante tecidual, não deve ser injetada nem infiltrada nos tecidos.

Tetrodotoxina e Saxitoxina

A tetrodotoxina (TTX) é produzida por uma bactéria marinha e se acumula nos tecidos de um peixe do
Pacífico, o baiacu (puffer fish, fugu), assim chamado porque quando assustado ele próprio incha tornando-se
quase uma bola esférica.

-
O

O O

HO OH

HO OH
N N OH
H2N
H + H
TTX
Leva à morte por parada respiratória.
Dependendo da dose ingerida a LD-50 é 1mg.

A saxitoxina (SPX) é produzida por um microorganismo marinho, que algumas vezes prolifera em grande
número e ainda colore o mar, produzindo o fenômeno da “maré vermelha”.
Em tais ocasiões, o molusco marinho pode acumular a toxina e tornar-se venenoso para os seres humanos.

H H
H
H2N O H H
N
O HN +
NH2
+
H2N N N
H
OH
H OH
H
H H

A sua toxicidade é extremamente elevada, bastando 5 g/ Kg para matar um porco da Guiné ou ratos.
O TTX e STX não são apropriados para uso clínico como anestésicos locais, sendo caros de se obterem de
suas fontes exóticas e ineficientes em penetrarem nos tecidos devido a sua baixa lipossolubilidade.
Contudo, eles foram importantes como ferramentas experimentais para o isolamento e a clonagem dos canais
de sódio.

Anestésicos locais como isômeros.


Os anestésicos locais também podem ser analisados em relação às características de estereoisomeria,
que ocorre no caso da prilocaína e bupivacaína, que possuem dois estereoisômeros conhecidos como a forma
R (+) ou dextrorrotatória e a S (-) ou levorrotatória. A combinação de quantidades iguais da forma R (+) e S
(-) de uma droga determina a mistura racêmica. Misturas com diferentes concentrações de bupivacaína R (+)
e S (-) são associadas a diferentes potências e efeitos colaterais. Por essa razão muitas drogas são preparadas
com apenas um estereoisômero, como a levobuvacaína e a cetamina. Alguns anestésicos locais são aquirais e
não possuem a propriedade de estereoisomeria, como a ametocaína e a lidocaína.

Mecanismo de ação dos anestésicos locais

Os ALs inativam canais de sódio, impedindo o influxo de íons necessário à despolarização da


membrana, impedindo assim, a propagação do estímulo nervoso.
Os mecanismos de ação dos ALs propostos na literatura envolvem tanto a interação com os
componentes lipídicos da membrana (conhecida como “hipótese do lipídio”) quanto com sítio(s) na proteína
canal de sódio.

Figura 5 – Esquema ilustrativo da interação de anestésicos locais com a fase lipídica e as possíveis vias de
acesso destes ao(s) sítio(s) de ação na proteína canal de sódio.
Propõe-se atualmente que os anestésicos locais (ALs) se ligam a uma ou mais regiões diferentes da
proteína canal de sódio, bloqueando o transporte destes íons.
Por outro lado, a correlação direta entre hidrofobicidade e potência anestésica revela que a
partição/distribuição inespecífica de grande quantidade do AL na bicamada é importante para facilitar o
acesso da molécula ao(s) sítio(s) de ligação de sódio voltagem-dependente.
A teoria dos lipídios sugere que o AL, por sua atividade na bicamada lipídica, produza uma alteração
no empacotamento dos lipídios causando uma modificação conformacional nos canais de sódio, o que levaria
à inativação temporária do mesmo.
Também é interessante notar que essa teoria prevê a ligação inespecífica de grande quantidade de AL
na fase lipídica, para que haja a alteração significante da fluidez e permeabilidade da membrana.
Cumpre ressaltar que os anestésicos locais podem ser ineficazes em áreas inflamadas, pois nestes o
pH, sendo mais baixo facilita a ionização de suas moléculas, dificultando a sua penetração na fibras
nervosas.
Uma vez no interior do axônio, é a forma protonada da molécula anestésica local que se liga ao
canal, pois quando ionizado o anestésico local possui maior afinidade pelos canais de Na+. Essa dependência
em relação ao pH pode ser clinicamente importante, visto que os tecidos inflamados são frequentemente
ácidos e, portanto, levemente resistentes aos agentes anestésicos locais.
Os anestésicos locais bloqueiam a condução na seguinte ordem: pequenos axônios mielinizados,
axônios não mielinizados, grandes axônios mielinizados. Por conseguinte, a transmissão nociceptiva e
simpática é bloqueada em primeiro lugar.
Os anestésicos locais podem atuar como agentes antiarrítmicos, em virtude de sua capacidade de
prevenir a taquicardia ventricular e a fibrilação ventricular. Além disso, esses fármacos podem reduzir a
contratilidade cardíaca pela redução das reservas intracelulares de cálcio e diminuição da entrada de cálcio.
Os vasoconstritores (agentes simpaticomiméticos) são frequentemente adicionados aos anestésicos
locais para retardar a absorção sistêmica do anestésico no seu local de injeção. Como retardam a absorção,
esses medicamentos reduzem a toxicidade sistêmica do anestésico e o mantém em contato com as fibras
nervosas por mais tempo, aumentando, portanto, o tempo de ação do medicamento.
Nesse sentido, a adrenalina é a mais empregada. Deve-se ter cuidado quando os anestésicos locais
contendo essa amina são administrados em pacientes com hipertensão.

Principais efeitos indesejáveis dos anestésicos locais:


Os principais efeitos indesejáveis dos anestésicos locais afetam o sistema nervoso central e o sistema
cardiovascular, constituindo a principal fonte de risco quando os anestésicos locais são utilizados
clinicamente.
O principal efeito dos anestésicos locais sobre o sistema nervoso central consiste, paradoxalmente,
em produzir estimulação (agitação e tremor que progridem para convulsões e depressão respiratória). A
lidocaína e a prilocaína possuem efeitos centrais menos pronunciados.
Os efeitos cardiovasculares dos anestésicos locais decorrem da depressão do miocárdio e da
vasodilatação. A redução da contratilidade miocárdia provavelmente resulta da inibição da corrente de Na+
no músculo cardíaco. A consequente redução do Na+ , por sua vez, diminui as reservas intracelulares de
Ca+, reduzindo a força de contração. A vasodilatação afeta principalmente as arteríolas devido ao efeito
direto sobre o músculo liso vascular e da inibição do sistema nervoso simpático. A depressão miocárdica e a
vasodilatação combinadas levam a uma queda da pressão arterial, que pode ser súbita ou potencialmente
fatal, ou até mesmo parada cardíaca. A injeção intravascular inadvertida resulta em grande quantidade de
anestésico na circulação sistêmica, e esses fármacos se ligam rapidamente aos tecidos em despolarização
(tecido cardíaco), ocasionando a depressão do músculo cardíaco.
Algumas vezes podem ocorrer reações de hipersensibilidade, geralmente na forma de dermatite
alérgica e, em raras ocasiões, como reação anafilática aguda.
As reações alérgicas ocorrem quase que apenas com os anestésicos locais do tipo éster: cocaína,
benzocaína, cloroprocaína, procaína e tetracaína. Isso acontece porque o
metabolismo de todos os anestésicos locais ligados ao éster leva à formação do PABA, um conhecido
alergênico para alguns indivíduos. Os anestésicos locais derivados de aminas são essencialmente isentos de
propriedades alérgicas, tais como o cloridrato de lidocaína (que é o anestésico local mais usado), o cloridrato
de bupivacaína, o cloridrato de levobupivacaína, a ropivacaína, o cloridrato de etidocaína, o cloridrato de
mepicacaína e o cloridrato de prilocaína.

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