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Adoção: como alcançar o sucesso

Renato Bertate
© 201 6 por Renato Bertate

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Bertate, Renato

Adoção: como alcançar o sucesso / Renato Bertate. - São Paulo: Editora


Conexão Sistêmica, 2016.

80 p. ISBN: 978-85-66663-04-4

1. Teoria do conhecimento, causalidade e ser humano. I. Título.

CDD: 120
Neste livro, compartilharei com vocês algo que tem a ver com o
olhar sistêmico acerca do processo de adoção.
O olhar sistêmico segundo Bert Hellinger contempla a criança
adotada, os pais biológicos e os pais adotivos.
O que segue nesta leitura tem a ver com o olhar de Bert, mas
também tem a ver com minha experiência de dezoito anos nesta
área. É fruto da minha experiência com pessoas adotadas, com
pais biológicos e também com pais adotivos que me procuram
para resolver questões complicadas que surgem com os filhos
adotados.

Renato Bertate nasceu em Monte Alto. É formado em Medicina


[1989] pela Faculdade Sul Fluminense, trabalha com medicina
holística com formação na Índia e nos USA. Conheceu Bert
Hellinger pessoalmente através da Sra. Mimansa em 1999.
Acompanha os trabalhos de Bert no Brasil, Alemanha. México.
Colômbia.
Primeiro brasileiro a trabalhar com constelação e primeiro
brasileiro a ministrar treinamento em constelação familiar.
UM OLHAR SISTÊMICO PARA A ADOÇÃO

O olhar sistêmico para os pais adotivos.


As crianças adotadas devem saber que são adotadas?
A adoção é sempre o melhor caminho?
Os pais biológicos são pessoas que não amam seus filhos?
A adoção leviana e suas consequências.
Quem tem direito sobre as crianças?
O que faz a adoção ser um sucesso ou um fracasso?
Devo ou não adotar uma criança?
Qual o lugar certo para uma criança ficar?

Dedicatória
Gostaria de dedicar este livro aos meus amados pais: João
Bertate e Jandira Avanço Bertate. Além de me darem a vida e me
cuidarem e conduzirem com tanto amor, eles me ofereceram
todas as possibilidades de ganhar conhecimentos, experiências e
não pouparam esforços para que eu pudesse viver tudo aquilo
que eu almejava. Muitas vezes, não estavam de acordo com
minhas escolhas, porém eles sempre respeitaram, mesmo não
entendendo ou mesmo contrariados. MUITO OBRIGADO!
Quero agradecer a uma pessoa muito especial na minha vida,
que tem sido como uma mentora, me mostrando caminhos, me
ouvindo e sendo uma grande amiga: Mimansa Erika Farny, a
pessoa que trouxe o trabalho de constelação familiar ao Brasil,
que eu tenho a honra de conhecer desde 1989 e que me
apresentou pessoalmente ao Bert Hellinger em 1999.
Sem palavras que possam alcançar a gratidão que sinto a Bert
Hellinger; eu o reverencio com amor!
Também quero agradecer a Glaucia Paiva, em especial, pois ela
foi a responsável por fazer o convite de falar e escrever sobre
este tema. Sem sua ajuda, Glaucia e Oswaldo Santucci, nada
seria possível.
Também quero agradecer a uma grande parceira, Marly Rossi
Júlio, e à Central de Eventos por me apoiar e ajudar a construir
este trabalho há quase duas décadas.
Também quero agradecer a todas as pessoas que cruzei na minha
vida. Com todas aprendi e levo algo de bom, sejam os clientes
ou os amigos!
Trocar com vocês vem sendo incrível e enriquecedor.

Prefácio
Qual a postura sistêmica para os pais de uma criança adotiva?
Para onde os pais de uma criança adotada devem olhar? A quem
pertence a criança adotada? A criança deve saber que foi
adotada? O que faz uma adoção ser bem-sucedida ou
malsucedida?
O sucesso da adoção começa na forma como a criança foi retirada
dos pais biológicos. Pais biológicos que doam seus filhos amam
menos que os pais que criam seus filhos?
Muitas questões serão olhadas neste livro, que surgiu de uma
aula-palestra que fui convidado a dar em um congresso de
educação sistêmica.
Há quase 20 anos em contato e trabalhando com o olhar
sistêmico segundo Bert Hellinger, venho podendo observar que
a adoção pode ser, sim, um sucesso ou mesmo um grande
fracasso, especialmente em função da forma como as pessoas
envolvidas se relacionam com todo o processo.
O ponto de vista sistêmico nos permite ter um olhar profundo e
amplo, no qual todos os lados e aspectos deste complexo
processo podem ser vistos.
Sem julgamento ou mesmo sem opinião, podemos nos relacionar
com os fatos e observar o que traz força e sucesso ou subtrai
força e gera conflitos. O evento da adoção muda a vida dos
envolvidos para sempre, com consequências boas ou ruins para
todos eles.
Este olhar sistêmico vem surgindo desde o início da minha
formação como médico, quando eu me perguntava: por que as
pessoas adoecem? Desde muito cedo na minha formação,
sempre me inquietou a doença e as inter-relações da família e do
meio em que as pessoas vivem.
Nunca consegui dissociar a pessoa de tudo aquilo que ela vive.
Encontrar Bert Hellinger, suas descobertas e experiências, deu
um salto transformador na minha visão e trouxe respostas a
muitas das minhas indagações.
O que compartilho com vocês neste pequeno livro sobre Adoção
se deve ao olhar sistêmico que desenvolvi ao conhecer Bert
Hellinger, o que me permitiu lidar estes anos todos com centenas
de casos de adoção, olhando para eles sob todos os aspectos -
seja da pessoa adotada, seja dos pais adotivos ou mesmo dos
pais biológicos que entregam seus filhos para adoção. Todos
vieram a mim com questões sobre este tema.
Convido vocês a entrar nestas linhas que se seguem, deixando-
se mover através do seu coração.

Sumário
Dedicatória 5
Prefácio 6
Sumário 8
Introdução 9
Direito 11
1º Foco 12
Os pais biológicos 12
2° Foco 17
Os pais adotivos 17
3 o Foco 22
A criança 22
4° Foco 27
O intermediário no processo de adoção 27
O que fazer quando uma criança para adoção chega a nós 27
Direito sobre a criança 30
O que enfraquece um processo de adoção 32
O que fortalece um processo de adoção 32
Perguntas Circulares 33
Banco de sêmen e barriga de aluguel 34
Teste de DNA 35
Filhos de relações incestuosas ou de estupros 36
Exemplo de caso 38
Agradecimento 39
Introdução
Compartilharei com vocês algo que tem a ver com o olhar
sistêmico acerca do processo de adoção.
O olhar sistêmico segundo Bert Hellinger contempla a criança
adotada, os pais biológicos e os pais adotivos.
O que segue nesta leitura tem a ver com o olhar de Bert, mas
também tem a ver com minha experiência de dezoito anos nesta
área. É fruto da minha experiência com pessoas adotadas, com
pais biológicos e também com pais adotivos que me procuram
para resolver questões complicadas que surgem com os filhos
adotados.
Essa experiência surgiu em função das pessoas adotadas que
procuram o trabalho para lidar com dificuldades, doenças e
limitações, mas também resulta da minha experiência com os
pais adotivos que enfrentam dificuldades com seus filhos
adotados e com pais biológicos que entregaram seus filhos para
a adoção e vivem as consequências de seus atos, buscando algum
tipo de alívio para as suas culpas.
Acredito que essa experiência pode acrescentar algo às pessoas
que trabalham nesta área e pode trazer um novo foco de atenção
para o processo de adoção, inclusive auxiliando na forma de
conduzir possíveis processos de adoção.
Também acredito que a técnica de constelação nos permite ter
um novo olhar sobre o melhor lugar, ou seja, o lugar mais seguro
para a criança estar quando os pais biológicos, de alguma forma,
não podem ou não querem cuidar de seus filhos. Da mesma
forma, acredito que essa técnica nos permite ajudar as pessoas a
caminhar em direção à solução de suas questões com esse tema.
A técnica de constelação ou trabalho sistêmico me permitiu
acrescentar algo muito especial às pessoas que me procuraram
durante estes anos e permitiu que curas e conflitos chegassem a
soluções em função do que experienciaram durante as vivências.
Antes de mais nada, para poder chegar a estas soluções, foi
necessário me despedir de conceitos, crenças acerca de certo e
errado, acerca do bom e do mau, assim como me despedir do
desejo de ajudar estas pessoas ou mesmo salvá-las de seu
destino. Esta ajuda só foi possível graças a uma atitude interna
de força, coragem e humildade, que é a postura necessária para
o desenvolvimento do trabalho de constelação.
A solução para essas questões, muitas vezes, está em um nível
mais amplo do que o nível com o que normalmente estamos
acostumados a lidar, que é o nível moral em que o certo e o
errado são os valores dominantes.
O nível moral, embora seja necessário para a convivência em
sociedade, muitas vezes pode ser um limitador nas soluções de
questões. Vivenciamos a moral de uma forma muito nítida, é um
senso muito claro para todos nós. Porém, é um valor muito
superficial, limitado e muda de grupos para grupos, de família
para família e de religião para religião.
Existe algo maior que está por trás disso tudo. Para acessarmos,
temos que nos despedir desta moral, caso contrário ficamos
impedidos de acessar a resposta ou a solução que, na maioria
das vezes, está em um nível maior.
Acredito que esse olhar pode ajudar professores, educadores,
advogados, juízes, assistentes sociais, psicólogos, ajudadores e,
principalmente, pais que desejam adotar crianças a ter sucesso
nesse processo.
Capítulo 1

Direito
Começo dizendo que todas as pessoas têm o direito de saber
quem são os seus pais biológicos. Isso é um direito do ser
humano.
Negar esse direito a uma criança é uma forma de subtrair força
da possibilidade de ter sucesso no processo de adoção. Essa é
uma afirmação de Bert e, partindo dela, percebemos o fato de
que todas as crianças têm o direito de saber quem são os seus
pais.
Alguns problemas podem começar a surgir a partir dessa
afirmação. As crianças, consciente ou inconscientemente, sabem
se fazem parte de um sistema ou não, se elas vêm ou não daquele
sistema. Os pais podem não dizer isso a elas, mas em algum
ponto elas o sabem. Quando se tornam adultas, em algum lugar
no seu interior - na alma - elas sabem quando pertencem a algum
sistema ou não.
Quando recusamos a uma criança esta informação, pode surgir
deste ato uma desconfiança dela de que os pais adotivos estão
negando a ela o direito de saber que eles não são os seus pais
biológicos, o que pode, posteriormente, ser um motivo de
reações agressivas dessa criança em relação aos seus pais
adotivos. Não importa que estes pais adotivos neguem essa
informação para tentar proteger a criança de sofrimento por ser
adotada; o resultado, na maioria das vezes, traz uma revolta
muito maior do que se a criança crescesse sabendo que eles são
os pais adotivos e não os pais biológicos.
Acredito que, para podermos olhar para esse tema, são três os
focos que são importantes para desenvolvermos um olhar
sistêmico e para os quais devemos direcionar a nossa visão
quando estamos diante de uma situação assim.
Em primeiro lugar, devemos olhar para os pais biológicos. Um
segundo foco seria olharmos para os pais adotivos. Finalmente,
o terceiro foco é olhar para a criança, para a pessoa adotada.
Embora esses sejam os três focos principais, eventualmente
surge um quarto. Digo eventualmente porque, às vezes, isso não
acontece. Esse foco tem a ver com o intermediário do processo
de adoção: devemos saber se foi uma pessoa, uma associação, se
foi legal ou não. Em alguns casos, o intermediário não está
presente e não influencia no sucesso e nos problemas do
processo de adoção, mas pode ter muita influência e determinar
muito nesse processo.

Capítulo 2

1º Foco
Os pais biológicos
Começo pelo primeiro grupo, o dos pais biológicos.
Pode ser um pensamento muito comum dizer que os pais
biológicos abandonam uma criança porque não são bons pais,
porque estão rejeitando essa criança ou porque, por algum
motivo, precisam entregá-la.
O que a gente nota é que, quando isso acontece, existe uma carga
emocional muito profunda envolvida em toda a questão, tanto
para os pais que estão fazendo essa entrega ou para a família,
quanto para a criança que está se afastando de um núcleo ao qual
ela pertence. Neste momento, existe uma carga emocional de
dor, de sofrimento, de perda e de separação muito profunda e
que vai gerar consequências para todos, por gerações e para
sempre.
Podemos observar que isso é um foco de enredamentos, ou seja,
um acontecimento muito grave de exclusão na família que pode
trazer muitas consequências, que vão desde traumas profundos
a doenças, sintomas que podem acompanhar tanto a criança e os
pais que a entregaram quanto as famílias que muitas vezes estão
por trás e participam desse processo.
De um modo geral, o nosso foco tende a ficar muito na criança e
nos pais que a adotaram. Muitas vezes, excluímos os pais
biológicos, como se eles não fossem bons o suficiente ou como
se eles não tivessem mais direitos. Às vezes, fazemos até mais
que isso, muito mais que isso: muitas vezes esses pais biológicos
são profundamente julgados e até mesmo condenados por nós
ou por quem lida com estas situações.
Quando fazemos isso - seja como facilitadores, terapeutas ou
como médicos -, internamente estamos excluindo possibilidades
para soluções que, às vezes, estão neste nível mais amplo.
Muitas vezes, as soluções para as consequências de um processo
de adoção, tanto para a criança como para os pais adotivos, estão
em incluir os pais biológicos.
Dessa forma, olhar para os pais biológicos e nos dedicarmos a
eles sem julgamentos é o que nos possibilita buscar caminhos e
soluções para ajudar o lado de cá, como a criança adotada e os
pais adotivos. Muitas vezes também ajudamos os pais biológicos
com isso.
Como médico, também me deparo com essas pessoas: aquelas
que entregaram as crianças.
Já tive alguns clientes que, por algum motivo, tiveram que
entregar os filhos e, depois, que conviver com isso; pessoas que
sofreram as consequências de entregar um filho para adoção.
Essas pessoas sofrem e, em alguns momentos, buscam ajuda.
Elas querem uma forma de conviver melhor com esta dor, com
este sofrimento ou com as doenças e os sintomas que, muitas
vezes, estão relacionados a esse processo de entregar uma
criança para adoção.
Já recebi mães com dores crônicas e, quando olhávamos para
essas dores a nível sistêmico, o que se revelava era dor de ter
entregue um filho para adoção. Nesses casos - das famosas dores
crônicas sem etiologia -, remédio algum faz efeito, deixando os
médicos de mãos atadas. Claro, não podemos acreditar que toda
dor crônica é consequência deste tipo de ato. Existem muitas
dinâmicas sistêmicas ou mesmo fisiológicas que podem gerar
quadros de dor crônica, mas muitas delas podem ter como
origem questões sistêmicas.
Por isso, é muito importante ter em vista os pais biológicos. Na
maioria das vezes, eu falo da mãe porque é ela quem decide o
destino da criança e são vários os motivos que podem levar uma
mãe a entregar o seu filho.
Às vezes, uma mãe biológica entrega uma criança porque está
com raiva do pai que não assumiu a paternidade do filho. Então,
essa mãe entrega uma criança para adoção porque ela está
machucada e ferida, com raiva de ter que se relacionar com uma
criança que representa um amor frustrado.
Por vezes, uma mãe entrega a criança porque ela é muito jovem
e sua família exerce uma pressão muito grande, dizendo para ela
que não fique com a criança.
Algumas mães entregam a criança por problemas de saúde ou
de adicção, por serem pessoas que estão sem a mínima condição
de cuidar de outra criança porque, muitas vezes, elas se sentem
como uma.
Outras vezes, essas mães entregam as crianças por uma questão
puramente financeira: elas não têm, financeiramente, condição
de trabalhar e de cuidar de uma criança.
Aqui no Brasil e em alguns outros países mais pobres, crianças
são entregues por dinheiro e, outras vezes, crianças são
roubadas dos pais biológicos - sabemos que existe um comércio
de crianças e não podemos fechar os nossos olhos por achar que
isso não acontece: isso acontece.
Olhar para os pais biológicos significa olhar para todas essas
dinâmicas, esses motivos e tudo que leva esses pais ao
movimento de entregar uma criança.
O que podemos observar, quando olhamos para isso isentos de
julgamentos, é que o amor sempre está lá.
Às vezes, ele está lá de uma forma clara e visível, quando uma
mãe entrega o seu bebê com emoção, chorando e sofrendo.
Outras vezes, essa mãe faz isso com raiva, despeito e desprezo.
No entanto, no fundo, isso nunca tem a ver com a criança: essa
raiva, esse despeito e essa indiferença normalmente são uma
projeção do sentimento dessa mãe pelo pai ou pela frustração
desta relação que não pôde ir adiante.
Então, dessa forma, o amor também está lá, mas está sendo
vivido às avessas. O que significa isso? Isso significa que a
criança, quando representa aquilo que não pôde ser vivido
plenamente, se transforma em uma dor, em um trauma, e a
rejeição da criança muitas vezes tem a ver com não querer viver
essa dor, por não suportar viver essa dor.
Mas só é possível ver isso quando olhamos sem julgamentos
para esses pais biológicos, quando damos um lugar com amor
para essas pessoas, respeitando que elas vivem o que vivem por
algum motivo que vai além da nossa compreensão.
Quando olhamos dessa forma para essas pessoas em uma
constelação, muitas vezes somos presenteados pelo sistema nos
mostrando de que forma ou a quem o amor desses pais
biológicos está sendo direcionado e, aí sim, podemos ajudar
todos dentro dessa situação.
De uma forma geral, repito que esses pais biológicos não são
vistos, eles são excluídos ou, muitas vezes até, são vistos como
vilões, como pessoas não boas.
A gente sabe que, muitas vezes, ao contrário desse olhar, uma
mãe entrega um filho por amor, para que essa criança possa
sobreviver.
Eu tenho visto no meu trabalho crianças que são entregues pelas
mães e, às vezes, pelos pais, e eles fazem isso para proteger a
criança. Então poderíamos dizer: proteger do quê?
Muitas vezes, isso acontece para proteger essas crianças de
destinos muito pesados que esses pais e essas famílias trazem.
É muito comum ver pais que se afastam dos filhos porque eles
percebem que têm impulsos incestuosos com os filhos, e para
eles é mais fácil se afastar. Ou mães que olham para uma criança
e têm medo de fazerem algo de ruim para ela - podendo até
matar essa criança.
Nesses casos, os pais estão fazendo isso por desamor ou por
amor?
Isso que eu falo não é teoria, isso é consequência do meu
aprendizado ao trabalhar com pessoas - com pais que entregam
e com crianças que são entregues. Isso é um aprendizado que se
manifesta na prática, quando eu me exponho às pessoas que
chegam até mim; e me exponho a isso plenamente, tentando
entender ou ver onde está a solução ou o que posso acrescentar
para ajudar as pessoas.
Quando fazemos isso, quando nos expomos a essa história com
amor e respeito, exatamente como Bert diz, o sistema nos
presenteia nos ensinando algo sobre essa situação.

Capítulo 3

2° Foco
Os pais adotivos
Quando olhamos para os pais adotivos, de uma forma geral,
olhamos para pais que sentem uma necessidade de compartilhar
algo que receberam.
São pessoas que, tendo recebido muito dos seus pais, sentem a
necessidade de compartilhar isso com outras pessoas. Elas
adotam crianças para poderem compartilhar isso, seja porque
não podem ter filhos ou porque, já tendo um, dois ou três filhos,
sentem que receberam tanto e ainda têm mais para dar e doar.
Nesses casos, ter os filhos biológicos não é suficiente, elas
sentem que ainda têm mais para dar e doar. Essas são pessoas
que, na verdade, querem retribuir para a vida tudo aquilo que
receberam dos seus pais, da sua família de origem. São pessoas
que se sentem muito ricas, que receberam muito e querem dar,
são pessoas que têm uma necessidade de dar, de fazer e de
compartilhar, independentemente de ter filhos.
Na maioria das vezes, os pais adotivos são pessoas que têm esse
grande desejo de compartilhar esse amor.
Mas nem sempre é isso que movimenta as pessoas que querem
adotar uma criança. E, quando não é isso o que acontece, quando
existem outros motivos por trás disso, eles muitas vezes
subtraem um pouco da força ou da possibilidade de sucesso
dessa relação.
Aí podemos nos perguntar: que outros motivos podem existir
para as pessoas adotarem uma criança que não seja a
necessidade de doar amor e fazer algo?
Existem outros motivos:
Um deles, por exemplo, é substituir uma criança morta. O casal
perde um filho ou tem um aborto, e o desejo de adotar vem para
substituir uma criança legítima que eles perderam. Quando a
adoção é feita baseada nisso, a criança que chega está a serviço
de algo para essas pessoas, e não essas pessoas estão a serviço
da criança. Essa não é a ordem natural, a forma saudável. Neste
caso, a ordem se inverteu - porque quem deveria ser necessitado
nessa relação de pais e filhos são as crianças e, neste caso, a
criança está sendo usada para suprir uma necessidade dos pais.
Os adultos doam e as crianças recebem. Aqui fica invertido: as
crianças doam e os adultos recebem.
Esses pais fazem isso pensando na sua dor, e não na criança que
vai chegar. É uma tentativa de esquecer, de substituir a criança
que eles perderam.
Observe que o amor não está ligando, de forma direta, esses pais
e essa criança adotiva. Cria-se uma confusão. Essa criança
adotiva vai ocupar o lugar de uma outra criança, que vai ser
excluída daquele sistema. Muitas vezes, essa criança que chega
para ocupar esse lugar vai viver os sentimentos da criança
excluída e, por mais que os pais se dediquem, ela não se sente
fazendo parte.
Esse é um dos motivos que pode levar os pais a adotarem uma
criança, mas existem outros também:
Uma das partes quer ter um filho e a outra não pode ter, então,
para salvar um casamento ou relacionamento, muitas vezes se
busca uma adoção. Novamente, a criança não está sendo vista:
os pais estão olhando para o relacionamento. Nessa situação,
também ocorre uma inversão: não são os pais que são os
doadores, mas a criança se torna doadora e tenta salvar esses
pais, tenta salvar esse casamento.
Outra situação que pode ocorrer é que, às vezes, o casal tem dois
ou três meninos, mas quer muito ter uma menina - ou vice-versa.
Então eles adotam por um capricho; seria uma adoção leviana,
por assim dizer, pela questão do gênero simplesmente. De novo,
quando isso é feito dessa forma, o olhar desses pais adotivos não
está direcionado à criança, mas sim para uma necessidade
pessoal. Novamente, essa criança está a serviço do casal que
adota, e não o casal a serviço da criança.
Dessa forma, o que a gente entende é que nem sempre os
motivos que fazem uma pessoa adotar são motivos saudáveis
para o sucesso da relação. Às vezes, esses motivos não são
motivos que acrescentam a essa relação, e sim subtraem. Com
muita frequência, quando acontece isso, essa relação entre a
criança adotada e esses pais tende a ficar comprometida.
Muitas vezes, essas crianças se revoltam e combatem esses pais.
Muitas vezes, essa adoção fica muito tumultuada, conflituosa.
Mais que isso, quando o casal já tem filhos e o motivo que os
leva a adotar não é para serem doadores, muitas vezes algo pode
acontecer com os filhos legítimos.
Então, quando olhamos para os pais adotivos, olhamos para eles
reconhecendo neles pessoas que têm uma necessidade de dar e
compartilhar, como pessoas que, com certeza, amam e que, por
trás de tudo isso, existe amor.
Mas precisamos olhar com uma distância que nos permita
entender onde está o amor dessas pessoas que adotam essas
crianças. Isso porque pode ser que, além do amor, existam esses
outros motivos que subtraem força.
Não se trata de maldade, isso não é feito por pessoas ruins, pelo
contrário: são pessoas que vivem o amor de uma forma dolorida,
seja porque o amor dessas pessoas está na criança que morreu e,
para sobreviver, elas querem tentar esquecer, ou seja porque o
marido vai embora se essa mulher não tiver um filho - ou seja, o
amor está no marido.
Onde está o amor? De que forma o amor se manifesta nessas
relações?
Quando o terapeuta não julga, quando o terapeuta se expõe
àquilo que acontece, muitas vezes o sistema nos mostra de que
forma nós podemos ajudar; mais do que isso, o sistema nos ajuda
a trazer respostas para essas situações que estão em conflito,
porque nessas situações o amor não flui livremente.
Só podemos ajudar quando buscamos onde está o amor. O amor
está sendo direcionado para onde e para quem? Por que esse
amor não chega à criança? Por que essa criança está revoltada?
Por que os pais não têm força para assumir a criança? Por que os
pais não conseguem comunicar esse amor a essa criança?
A ajuda só é possível quando o terapeuta pode olhar para tudo
isso em busca do amor. Às vezes, o amor está aprisionado na
criança; às vezes, está aprisionado no medo da perda da relação;
às vezes, está excluído da relação; outras vezes, o amor está
vinculado a histórias de antepassados da família, o que também
reproduz essas histórias de adoção.
Então, quando eu confio plenamente que o amor existe, mesmo
que eu não consiga vê-lo em um primeiro momento, na maioria
das vezes, o sistema me presenteia com caminhos, soluções ou
passos para ajudar nessa relação conflituosa difícil.
Mas eu tenho que confiar no amor, eu tenho que confiar
plenamente que o amor está lá. Se eu duvidar disso, o sistema,
muitas vezes, fecha-se para mim e eu não posso ajudar. Às vezes,
é como se o sistema exigisse de mim, como cuidador, uma
entrega maior do que a entrega que eu venho tendo ou uma
confiança maior ainda no amor do que a confiança que eu venho
tendo.
Ajudar as pessoas, neste caso, significa abrir mão dos meus
julgamentos e da intenção de ajudar e me expor ao que o sistema
revela, ou seja: a ajuda vem do sistema e não do terapeuta. A
solução emerge do sistema e não é o terapeuta que a cria.
A solução se revela quando nos expomos para ver, seja o que for
que o sistema tem para nos revelar, sem preconceito, sem moral,
sem certo ou errado, sem medo de ver o que se revela e com
humildade para não tentar intervir, não tentar diminuir ou
aumentar o que se revela.

Capítulo 4

3o Foco
A criança
A criança, de uma forma geral, quer permanecer no seu sistema,
na sua família de origem.
Por via de regra, para a criança, o lugar mais seguro é o seu
sistema, ou seja, os seus pais. Se os pais não podem ficar com ela
por algum motivo, o bom seria que ela ficasse na família, com os
avós ou com os tios, permanecendo no seu próprio sistema.
Geralmente, esse é o lugar mais seguro para criança, menos
traumático.
É um fato que nem sempre é possível porque os pais não podem
ou não querem, os avós não podem, não querem ou não estão
mais presentes e os tios não podem ou não querem.
De uma forma geral, temos que saber que o lugar mais seguro
para as crianças é com os pais. Esta é a necessidade mais básica
de todos nós: permanecermos no sistema ao qual nós
pertencemos.
Quando isso não é possível, começa todo o processo de adoção.
A criança adotada tem o direito de saber quem são os seus pais.
Quando olhamos para uma pessoa adotada, devemos levar em
consideração que essa pessoa tem um destino difícil. Falo sobre
destino no sentido de que não podemos mudar o fato de que ela
foi precocemente entregue a outra família e que passou por um
trauma de separação dos pais biológicos.
Isso influenciará a criança para sempre, isso trará um sentimento
de dor, rejeição e insegurança para essa criança. Dependendo de
como essa pessoa lidar com esses sentimentos, ela poderá ter
bons frutos a partir dessa experiência difícil ou viver
aprisionada a esse fato, vitimizando-se, e vivendo enfraquecida.
Muitos olham para a criança ou adulto adotado com pena. Esse
é o olhar que mais enfraquece ou subtrai algo dessas pessoas!
Devemos olhar para essas pessoas com respeito, sem
julgamentos.
São geralmente pessoas que têm uma força extra e conseguem
carregar um destino difícil e pesado, o que muitos de nós não
conseguiríamos.
Dessa forma, olhar com respeito e amor para essas pessoas
permite que nós, ajudadores, ganhemos o respeito delas.
Quando reconhecemos a força que essas pessoas têm, estamos
ajudando-as a se conectar mais e mais profundamente com essa
força, e isso faz muita diferença.
Entender qual é o lugar mais seguro para essa criança vem sendo
um dos maiores desafios das pessoas responsáveis pelo processo
de adoção, sejam os juízes ou mesmo os assistentes sociais.
A constelação tem se mostrado um eficiente instrumento para
olharmos para este impasse e encontrarmos este lugar mais
seguro.
Por incrível que pareça, já vivenciei situações em que o melhor
lugar para uma criança era permanecer no abrigo ou orfanato,
especialmente quando essa criança foi bem recebida e criou um
bom vinculo nesse local.
Ao contrário do pensamento de que “toda criança tem que ter
um lar e uma família”, em algumas exceções isto não procede.
Para essas exceções, o abrigo é a boa solução.
Gostaria de esclarecer melhor:
Quando colocamos uma constelação para entender qual o
melhor lugar para a pessoa a ser adotada, na maioria das vezes
estar com os pais adotivos ou mesmo com a família dos pais
biológicos se mostra como solução. Mas não devemos acreditar
que essa será sempre a melhor solução.
Algumas vezes, especialmente se a criança já está há bastante
tempo nestes abrigos e já assumiu esse lugar como sua nova
família, retirar a criança desse lugar mais subtrairia força dessa
pessoa do que acrescentaria. Isso já se revelou claramente em
alguns trabalhos que realizei. Nesses casos, a criança se sente
bem e segura onde está.
Chamo atenção para esta situação para que os responsáveis por
estes processos se abram também para esta possibilidade,
mesmo ela sendo uma exceção. Se excluirmos essa possibilidade
com o pensamento de que “o melhor para todas as crianças é ter
um lar e uma família”, esse pensamento e essa crença irão me
impedir de perceber essas exceções.
A pessoa adotada tem o direito de decidir se quer conhecer os
seus pais biológicos ou não. Especialmente no caso de crianças
que foram adotadas por pais que fizeram a adoção por outros
motivos que não a necessidade de cuidar e dar amor.
Como foi dito anteriormente, esses pais adotivos nutrem uma
insegurança de perder a criança e, desta forma, eles têm medo
de contar para ela que ela é adotada. Claro que esse medo
também vem do amor e do apego que desenvolvem pela criança,
mas esse medo vem especialmente porque não estão olhando
para a criança e sim para o risco que corre o seu casamento, no
caso dos que adotam para salvar o casamento, ou estão com
medo de reviver uma perda, como no caso daqueles pais que
usam a adoção para substituir um filho que perderam.
A criança adotada que não sabe que tem outros pais biológicos
tende a sentir uma confusão. Isso acontece porque os pais
adotivos se dizem ser seus pais biológicos, mas a criança sabe,
na sua alma, que ela vem de outra família, como também muitas
vezes ela percebe que suas características físicas são totalmente
diferentes dos seus pais adotivos ou mesmo de seus irmãos, no
caso dos pais adotivos terem outros filhos biológicos.
Geralmente é um grande alívio para a criança quando tudo fica
esclarecido. A confusão tende a desaparecer e essa pessoa agora
passa a confiar mais em si mesma.
Cada caso de adoção deve ser visto como único! Não devemos
ter conclusões prévias sobre o que é melhor neste ou naquele
caso. Minha experiência mostra que, muitas vezes, nos
surpreendemos quando tentamos definir algo baseado em casos
anteriores, especialmente porque cada caso é único e, na maioria
das vezes, não sabemos os reais motivos dos pais biológicos para
entregar a criança para a adoção e também não sabemos quais
os reais motivos que levaram os pais adotivos ao processo de
adoção.
Ajudar uma criança ou adulto que tem este destino de ser
adotado exige de nós, ajudadores, um olhar especial. Exige a
inclusão da criança no centro do olhar e a ampliação do nosso
olhar com amor para os pais biológicos e os pais adotivos.
Muitas vezes é necessário incluir nesse olhar os intermediários.
Quando fazemos isso, muitas vezes se revela qual a melhor
forma de ajudar essas pessoas.
Quando os pais biológicos entregam uma criança para adoção,
muitas vezes perdem o direito do amor desse filho. O que
significa isso? Significa que a criança não deve mais amor a esses
pais biológicos, a criança deve apenas gratidão pela vida que
recebeu desses pais, mas não deve se sentir culpada se não tiver
mais vinculo amoroso com eles. É um grande alívio para esta
criança ou adulto adotado vivenciar que não precisa se sentir
culpado por não sentir amor em relação aos pais biológicos.
Muitas vezes é libertador para a pessoa saber que ela não é uma
pessoa ruim por não conseguir amar os pais biológicos.
Por outro lado, existem casos em que a pessoa adotada sente um
grande alívio quando ela pode transitar livremente entre a
família biológica e a família adotiva. Porém, em outros casos, a
boa solução seria ela se despedir definitivamente dos pais
biológicos.
Possibilitar uma vivência em que a pessoa adotada se sinta forte
e em paz é o que torna um sucesso o trabalho do ajudador. Mas,
para isso, o ajudador deve incluir todos os envolvidos no
processo e dar um lugar sem julgamento a todos: criança, família
dos pais biológicos e família dos pais adotivos. Devemos olhar e
incluir todos. Quando fazemos isso sem preconceito, com
frequência o sistema nos revela passos para a solução.
Mas temos de fazer isso sem medo, com humildade e coragem.

Capítulo 5

4° Foco
O intermediário no
processo de adoção
O 4º Foco é muito variado, porque pode se tratar de um abrigo,
de uma enfermeira, de uma instituição religiosa, de um
comerciante, etc.
É muito importante ver esse 4 o foco porque, quando cumpre
plenamente o seu papel, ele é uma benção para uma criança. Isso
acontece no caso de uma instituição ou de abrigos que cuidam
de crianças e que cuidam também do seu direcionamento para
um processo de adoção.
Porém, também podem existir outros tipos de mecanismos
intermediários, como eu falei, que não são bons: crianças que são
traficadas, roubadas de seus pais, vendidas e que são levadas
para fora do país. Tudo isso tem que ser visto e olhado com
atenção.

Capítulo 6

O que fazer quando uma criança para adoção


chega a nós
Quando falamos sobre olhar para os pais em relação a uma
criança adotada, eu costumo criar uma imagem: quando alguém
quer adotar uma criança que, por um acaso, chega para essa
pessoa, a primeira coisa que essa pessoa deveria fazer- se ela
realmente olha para a criança - seria levá-la de volta para a
família de origem.
Olhar para a criança é pensar no que é bom para ela, e bom para
a criança seria voltar para a família de origem.
Eu costumo dizer que uma boa atitude seria pegar a criança,
levá-la de volta para os pais e falar: “Vocês não a querem porque
não têm condição de cuidar, mas eu estou disposto a ajudar.
Vocês ficam com ela e, se for uma questão financeira, eu vou
ajudar”.
Se os pais dizem que não têm condição e que não querem, ela
deve ser levada aos avós e deve ser dito: “Aqui está o neto de
vocês. Vocês não têm condições, mas eu gostaria de ajudar”. Isso
também deve ser feito com os tios.
Se ninguém pode, se não há condição ou acordo, só aí eu poderia
cuidar dessa criança. Mas os pais adotivos dessa criança não
podem querer ocupar o lugar dos pais biológicos porque, se
fizerem isso, eles estarão excluindo os pais biológicos do
sistema.
Quando os pais adotivos assumem o papel dos pais biológicos,
a relação deles com a criança pode enfraquecer. Então, os pais
adotivos deveriam dizer, desde muito cedo, que essa criança não
é filha deles. Internamente, os pais adotivos devem dar um lugar
para os pais biológicos e devem se colocar à disposição da
criança para que ela possa conhecer esses pais, para que ela
possa estar livre para fazer este movimento de conhecer esses
pais, de ter esse acesso.
Eu sei que isso é uma ameaça, uma questão muito difícil para os
pais adotivos. Mas, por outro lado, quando eles têm essa
coragem, na maioria das vezes, eles são recompensados com o
afeto da criança, porque ela se sente profundamente respeitada
nas suas necessidades básicas.
Essas crianças muitas vezes voltam, amam esses pais e tem por
eles mais respeito e mais gratidão, porque se sentem vistas e
respeitadas nas suas dores e tendem a voltar para os pais com
muito amor, gratidão e respeito.
Por outro lado, precisamos também ver outro aspecto, que é: o
que ajuda uma criança? O que é bom e necessário para essa
criança?
É aí que entra uma grande contribuição da constelação,
especialmente para as pessoas que têm que lidar com isso, que
têm que definir qual é o melhor lugar para uma criança adotada.
Às vezes, o melhor lugar é com os pais adotivos; outras vezes, o
melhor lugar para ela não é ali, é um abrigo; e, outras vezes
ainda, o melhor lugar para essa criança é com os pais biológicos,
com a família.
Isso pode ser visto rapidamente quando colocamos uma
constelação. Quando colocamos uma constelação, podemos ver,
objetivamente e com muita facilidade, onde é o lugar seguro
para a criança, qual o melhor lugar para ela; onde ela se sente
mais em paz, mais relaxada, mais tranquila, mais presente.
A constelação tem nos ajudado muito a olhar para isso e a tomar
decisões nessas situações.
Advogados, juízes, terapeutas, assistentes sociais podem se
beneficiar muito na tomada de decisão quando se expõem ao
nível sistêmico como mais um recurso, dentre outros, para
decidir. Muitas vezes, a constelação sobre o caso traz uma
vivência clara da situação e pode ser decisiva na tomada da
decisão.

Capítulo 7

Direito sobre a criança


De uma forma geral, quando os pais entregam uma criança para
a adoção, eles perdem o direito sobre ela. Isso significa, na
prática, que, quando os pais entregam a criança para adoção -
não importando os motivos que os levaram a fazer isso, mesmo
que isso tenha acontecido por amor - eles perdem o direito de
criar a criança, de decidir sobre ela. O principal é que eles
perdem o direito do amor da criança.
Eles continuam, no entanto, tendo o direito de ter a gratidão da
criança pela vida que eles deram a ela. Então, uma criança que
foi entregue para adoção tem essa dívida com os pais biológicos:
ela não deve a esses pais biológicos amor, porque eles perderam
o direito ao amor quando a entregaram para adoção, mas eles
têm direito à gratidão pela vida que deram a ela. Então, a criança
adotada deve a sua vida aos pais biológicos, mas não deve a eles
o amor. Ela deve a continuidade da sua vida aos pais adotivos e,
muitas vezes, ela direciona a eles o seu amor.
De novo surge a constelação como um instrumento maravilhoso
para ajudar as crianças que vivem esse conflito: para quem eu
direciono o meu amor?
Para os pais adotivos terem o direito sobre a criança, esses pais
devem merecer esse direito. O que significa isso? Significa que,
para esses pais poderem adotar esta criança, antes eles deveriam
provar que têm condição e atitude adequada para proteger e
cuidar dela. O ideal seria que os pais adotivos tivessem a tutela
da criança e, depois de um tempo, se esta experiência foi boa
para ambos, ou seja, se esses pais provaram que têm condições
de cuidar dessa criança, esta tutela seria renovada, estendida até
que ficasse claro que eles têm plena condição para serem os pais
adotivos dessa criança.
O que fortalece essa criança, o que traz a ela força e sensação de
liberdade? Nesse ponto, nos deparamos com situações muito
diversas.
Muitas vezes, o que ajuda a criança e traz a ela a sensação de
liberdade e fluidez não é se conectar com a família de origem, e
sim se despedir dessa família de origem; dizer a eles: “eu devo
a vocês a minha vida, eu sou grata a vocês, mas agora eu sigo a
minha vida”. Muitas vezes, o que ajuda a criança é ela se
despedir definitivamente dos pais biológicos, mas, para fazer
isso, ela precisa se reconectar com eles, agradecer pela vida e se
despedir.
Outras vezes, o que traz força e liberdade para a criança é ela se
reconectar com os pais biológicos e poder viver aqui, dos dois
lados.
Então, cada caso é um caso e tem que ser visto e avaliado em
todos os aspectos:
• O aspecto relacionado aos pais biológicos;
• O aspecto relacionado aos pais adotivos e à forma que foi
feita essa adoção;
• O aspecto relacionado à criança - como se procede a sua
necessidade e onde está a boa solução para ela.
Esses três aspectos são centrais quando precisamos olhar para
esse tema, seja porque quem chegou até nós é a criança, os pais
biológicos ou os pais adotivos.
Trazer à tona essa realidade por meio de uma constelação exige
de nós muita coragem e também muita humildade, pois nunca
sabemos o que vai se revelar diante do trabalho e, com muita
frequência, somos surpreendidos.
Às vezes é dolorido ter que revelar algo, mas é o que se revela.

Capítulo 8

O que enfraquece
um processo de adoção
Questões que enfraquecem ou inviabilizam um processo de
adoção:
• Negar à criança o direito de saber quem são os seus pais;
• Os pais adotivos quererem ocupar o lugar dos pais
biológicos e não respeitarem isso;
• Os pais adotivos priorizarem as suas necessidades e não
as necessidades da criança;

Capítulo 9

O que fortalece
um processo de adoção
Questões que fortalecem o processo de adoção e que podem
trazer sucesso:
• Os pais adotivos darem um lugar internamente aos pais
biológicos; ao olharem para a criança, verem os seus pais
biológicos e sentirem gratidão a eles por terem dado esse
presente e a possibilidade de doar; olhar para os pais biológicos
com alegria e gratidão, como se recebessem deles um grande
presente;
• Reconhecer que são apenas os pais adotivos, apenas os
segundos na vida da criança; os primeiros são os pais biológicos.
Os pais adotivos devem aceitar o segundo lugar, e não o
primeiro;
• Olhar de fato para as necessidades da criança, olhar de fato
para o que ela precisa.

Capítulo 10

Perguntas Circulares
As perguntas circulares podem ser muito úteis para
coordenadores, professores e pedagogos, ou seja, pessoas que
trabalham com famílias.
As perguntas circulares podem ser fantásticas tanto para a
criança quanto para os pais, porque elas podem ajudar ambos a
desenvolverem um olhar ou a chegarem ao que é essencial para
a relação entre eles.
São formas incríveis de conduzir a pessoa ou de ajudar a pessoa
a se conduzir internamente por aquilo que a movimenta, pelas
suas necessidades e por aquilo que elas fazem.
Tanto os pais adotivos quanto as crianças podem perceber, por
si sós, que aquilo que vivem e suas atitudes, muitas vezes, estão
ligadas a esse processo todo e que, ao olhar para isso, elas podem
conhecer suas necessidades e o que elas precisam dentro dessa
relação com os pais adotivos.
A criança ainda pode perceber o que ela precisa dos professores
para poder suportar os conflitos que às vezes vive com os pais
adotivos e biológicos.
Então, as perguntas circulares realmente podem ser fantásticas
para ajudar no entendimento, principalmente ao olhar para
esses três focos. Por meio das perguntas circulares, é possível
perceber o que existe por trás da criança ou dos pais adotivos,
que são os que mais comumente chegam a nós.
Isso porque os reais motivos para a adoção estão lá - na alma da
família, na alma da criança, na alma dos pais biológicos e na
alma dos pais adotivos. Eles só precisam ser vistos e, para serem
vistos, nós precisamos nos conectar com eles.
Podemos nos conectar com esses motivos por meio da criança ou
dos pais adotivos, olhando para como eles se sentem dentro
dessa relação.
As perguntas circulares, eu acredito, podem ser um mecanismo
riquíssimo para podermos criar imagens ou até para podermos
dar passos nesse processo de reconciliação.

Capítulo 11

Banco de sêmen e barriga de aluguel


Eu devo reconhecer que não chegaram a mim muitas questões
derivadas de processos de banco de sêmen.
O que eu posso falar, então, é o que Bert Hellinger fala sobre
isso, como ele olha para isso. Não se trata de uma afirmação, é
apenas um olhar.
A pergunta que ele devolve, quando surge o assunto dos bancos
de sêmen, é: como será que se sente uma criança que nunca vai
saber quem é seu pai porque sua mãe recorreu a um banco de
sêmen? Como será que uma criança se sente quando não é dito
a ela que ela não é filha desta mãe e nem deste pai, mas que foi
gerada porque ambos recorreram a um banco de sêmen?
E quando é negada a ela essa informação? Como será que fica a
alma dessa criança? Como será que fica a alma do pai e da mãe
que escondem isso dela?

Capítulo 12

Teste de DNA
Em alguns trabalhos de constelação familiar, é revelado que
existem dúvidas sobre a legitimidade da paternidade. Nestes
casos, o recomendado é que se faça o teste de paternidade, teste
de DNA.
Eu tenho experiência com pessoas que foram fazer o teste de
DNA e que, de fato, não eram filhos legítimos e com pessoas que
foram fazer o teste e que, de fato, eram filhos legítimos.
Nesses casos, eu observo que um dos pais carrega a dúvida sobre
a legitimidade do filho e ela se manifesta na constelação. Não só
o pai, mas também a mãe pode carregar essa dúvida - ela pode
ter um relacionamento extraconjugal e engravidar, sem saber se
o filho é do marido ou dessa relação, então existe a dúvida.
Quando isso se revela, eu compartilho essa informação de uma
forma muito delicada. Eu digo: “parece que existe uma confusão
aqui, parece que existe uma dúvida. Eu não sei se essa dúvida é
real, não sei se é uma dúvida que um dos seus pais carrega e eu
não sei se isso é de fato. Eu percebo que aqui existe um núcleo
importante para a sua vida que poderia ser esclarecido, mas isso
tem que ser feito de forma científica, tem que ser feito por um
exame de DNA”.
Normalmente, eu os oriento para que o façam de uma forma
muito discreta, dizendo que essa dúvida pode não ser do
paciente, pode ser dos seus pais. Peço que não tomem isso como
verdade absoluta, mas que entendam que, se essa dúvida existe
no sistema, isso atrapalha a todos.

Capítulo 13

Filhos de relações incestuosas ou de estupros


Crianças que são frutos de relações incestuosas e de estupros são
casos especiais.
Para olharmos para isso, precisamos de mais neutralidade ainda.
Olhar para esses casos exige de nós algo grande porque,
novamente, em tais situações, assumiríamos o lado de vítimas e
iríamos contra os perpetradores.
Normalmente, conseguimos ajudar quando damos mais alguns
passos para trás, além de todos que já damos para lidar com os
casos difíceis.
Isso significa estarmos de acordo com a vida, exatamente como
ela se manifesta. Mesmo em um caso de incesto ou em um caso
de estupro, a vida se manifestou. Se alguém nasce, é a vida se
manifestando.
E, então, a pergunta que nos ocorre quando olhamos para isso é:
será que isso está errado ou será que isso está certo?
Quem somos nós para julgar se isso poderia ou não acontecer?
Mas aconteceu. E, não só aconteceu, como também a vida
aconteceu.
Então, existem situações muito extremas como essa e com muito
mais frequência do que as pessoas imaginam. Em alguns casos,
o que nos resta é lidar com as soluções menos ruins, porque são
situações trágicas na nossa sociedade, com consequências sérias,
em que se criam destinos muito difíceis, principalmente para as
crianças.
Ao estarmos de acordo com isso, podemos estar junto dessa
criança. Normalmente, uma criança nessa situação se sente
absolutamente só, diferente na sua alma, e nós ajudamos quando
conseguimos estar com ela emocionalmente. E quando nós
conseguimos estar com ela nesse lugar para que ela não se sinta
só? Quando estamos plenamente de acordo com a vida como ela
se manifesta, quando deixamos de lado a questão de certo ou
errado, nesse momento, essa criança se sente vista, ela não se
sente mais só. Aí ela ganha força para prosseguir, para continuar
mesmo com todas as dificuldades que ela, provavelmente, vai
carregar.
Em outras palavras, seria: acolhermos com amor um destino
pesado, um destino difícil.
Uma pergunta que faço em situações assim é: essa situação de
estupro acrescentou algo à vida dela ou subtraiu algo da vida
dela? Se isso acrescentou, e por mais que tenha sido difícil a
forma como foi acrescentado algo, dizer sim a isso é o que nós
estamos falando aqui. Quando a pessoa consegue dizer sim,
aquilo que era um peso, uma dor, transforma-se em um dom
especial. Estar com uma mulher assim é um ensinamento acerca
das dimensões que o amor pode ter na vida de uma pessoa.
Uma pessoa que olha para a criança dessa forma imediatamente
ganha meu respeito e minha admiração. Essa é uma atitude de
força, de coragem e de muito amor, porque ela sabe olhar para o
que é essencial e não para o que é menor. Ela opta pelo maior e
não pelo menor.

Capítulo 14

Exemplo de caso
Eu quero contar rapidamente sobre uma cliente que procurou
uma constelação. A pessoa trabalhada na questão da cliente era
sua mãe e, no meio do processo, revelou-se que ela, a cliente,
poderia não ser filha legítima de sua mãe, ou seja, que ela
poderia ser adotada. Esta pressuposta mãe estava com câncer
metastático, em um processo quase final. Quando se revelou
isso, ela ficou impressionada e foi conversar com a mãe, mas isso
foi feito de uma forma muito amorosa e respeitosa.
A mãe se sensibilizou com a forma da filha dizer isso e resolveu
contar toda a história a ela, e de fato ela era adotada. A filha se
emocionou e agradeceu a mãe por ter dado a ela esta
possibilidade da adoção com amor.
Essa mãe, depois de poucos meses, fez exames e constatou que
ela não tinha mais a doença, todas as metástases tinham
desaparecido.
Pode ser uma coincidência e pode não ser coincidência. Então eu
digo: quais as consequências para a criança e quais as
consequências para os pais?

Agradecimento
Antes de mais nada, quero agradecer ao meu Pai João Bertate e minha
Mãe Jandira Avanço Bertate por me darem a vida e me darem
condições de ter alcançado o que venho alcançando. Isso jamais teria
sido possível sem todo o amor, os cuidados e o investimento deles em
mim. Dedico o que faço a eles!
Também quero agradecer a todos os mestres e professores que
encontrei em minha jornada. Cito todos os meus professores, também
Osho e Bert Hellinger, por mudarem minha vida plenamente. Um
agradecimento em especial a Mimansa Erica Farny, por me guiar e
me apresentar o Bert Hellinger. Conhecer Mi- mansa mudou minha
vida. Quero agradecer a Sérgio Savian por me introduzir aos
trabalhos de meditação e me apresentar o Osho. Também quero
agradecer a Gláucia Paiva e Oswaldo Santucci, por me estimularem a
escrever e registrar estas experiências.
Quero também citar meu amado irmão, Paulo Bertate, pessoa com
quem aprendo as coisas simples e profundas da vida. Irmão que me
acolhe e me mostra um jeito simples de ser. Aprendo muito com você,
meu irmão.
Obrigado a todas as pessoas que cruzaram meu caminho como
amigos ou mesmo como clientes, é na troca com todos vocês - pais,
amigos, clientes, mestres, professores - que a minha vida tem ficado
cada vez mais rica.
OBRIGADO A TODOS!

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