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Luiz Kobayashi
PEREGRINOS DO SOL
A arte da espada samurai
© Luiz Kobayashi, 2010
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ
K79p
Kobayashi, Luiz, 1979-
Peregrinos do Sol : a arte da espada samurai / Luiz O. M.
Kobayashi ; [prefácio de Toshihiko Tsutsumi]. - São Paulo : Estação
Liberdade, 2010.
il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-7448-192-0
Este livro é dedicado a todos aqueles que praticam ou têm interesse pela
arte tradicional da espada japonesa.
Agradecimentos
De início, agradeço Àquele que não possui Nome, mas que recebe vários
nomes.
Agradeço aos meus pais por absolutamente tudo o que sou e o que
tenho.
Agradeço à Suprema Mestra Ching Hai por ela ser o que ela é.
Agradeço a todos os senseis da Confederação Brasileira de Kendô.
Agradeço ao sensei Tsukimoto e aos seus alunos.
Agradeço à sensei Matsunaga e à sensei Kato.
Agradeço ao sensei Kanno e a Kaneko, Usui, Satô e Nemoto.
Agradeço ao sensei Naganuma e aos senseis Koyama, Suzuki, Suzuka,
Ôtsuka, Hoshi, Yumida e Gotô.
Agradeço ao sensei Yoshinari e a Yoshida.
Agradeço à sensei Ogikubo.
Agradeço a todos os mestres que compartilharam comigo os seus
conhecimentos e visões.
Sumário
11
Toda‑ryû 89
Ittô‑ryû 93
O surgimento do Shintô‑ryû 96
Tenshinshôden Katori Shintô‑ryû 96
O surgimento do Shinkage‑ryû 97
Kage‑no‑nagare 97
Kashima Shin‑ryû (Shinkage‑ryû) 99
Shinkage‑ryû 99
As primeiras ramificações 103
Kashima Shintô‑ryû 103
Tendô‑ryû 110
Iaijutsu ou battôjutsu – técnicas de saque 113
Shin Musô Hayashizaki‑ryû 114
Tamiya‑ryû 115
Hôki‑ryû 117
(Hasegawa) Eishin‑ryû 118
3. O apogeu da esgrima 123
Contexto histórico 125
A evolução dos estilos 133
As mudanças na esgrima japonesa 138
Para a unificação da esgrima japonesa 144
Os estilos derivados do Shinkage‑ryû 149
Yagyû Shinkage‑ryû 149
Taisha‑ryû 160
Hikida Kage‑ryû 164
Jiki Shinkage‑ryû 164
Mujû Shinken‑ryû 166
Shintô Munen‑ryû 172
Estilos derivados do Ittô‑ryû 173
Ono‑ha Ittô‑ryû 174
Tadanari‑ha (Chûya‑ha) Ittô‑ryû 180
Mizoguchi‑ha Ittô‑ryû 181
Nakanishi‑ha Ittô‑ryû 183
Yuishin Ittô‑ryû 184
Mugai‑ryû 184
Hokushin Ittô‑ryû 187
Kôgen Ittô‑ryû 191
Tenshin Shirai‑ryû 192
Estilos derivados do Shintô‑ryû 200
Jigen‑ryû 200
12
13
Prefácio
É muito oportuna a publicação de Peregrinos do Sol, a compilação da
história da tradicional arte da espada japonesa feita por Luiz Kobayashi.
Este livro é resultado de uma ampla e profunda pesquisa realizada pelo
autor e acredito que seja um tomo extremamente valioso, indo ao encon-
tro da sede de saber, não apenas dos amantes das artes marciais japonesas,
mas também de todos os interessados por cultura japonesa, em particular
pela cultura samurai.
Não só no Brasil, mas fora do Japão de modo geral, a bibliografia
existente sobre o tema é extremamente exígua, existindo uma grande
demanda por uma obra como esta, que se baseia em fontes históricas e
academicamente reconhecidas para apresentar e esclarecer os pontos fun-
damentais da evolução da arte da espada japonesa.
Esta é, portanto, uma obra de grande importância para saciar o inte-
resse de todos — praticantes ou não — pelas artes marciais. Isso porque,
ao utilizar a língua portuguesa, ele traz do Japão para o leitor, de forma
clara e acessível, os conhecimentos sobre as linhagens e tradições dos sa-
murais, revelando de forma detalhada as origens e a evolução da arte e de
suas escolas, situando-as no contexto histórico do Japão.
Pude amealhar um bom conhecimento sobre o tema deste livro, gra-
ças ao acesso que tive a muitos escritos e documentos, bem como a inú-
meros mestres de estilos antigos de artes marciais tradicionais japonesas.
Entretanto, acredito que seja realmente muito raro se deparar, espe-
cialmente fora do Japão, com uma fonte de conhecimento equivalente a
esta obra, que se propõe a aglutinar de forma tão abrangente a evolução
da cultura marcial, notadamente a arte da espada japonesa, desde os pri-
mórdios na Antiguidade até os dias atuais.
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PEREGRINOS DO SOL
Deve-se ressaltar mais uma vez a extensa pesquisa que respalda este
livro, que traz também nomes e termos em consonância com a pronúncia
japonesa, o que por si só já permite aprofundar o interesse e o entendi-
mento acerca da cultura samurai.
Esse interesse manifestado por pessoas do mundo inteiro sobre a vida,
as visões e a mentalidade dos guerreiros japoneses é algo que sempre atrai
minha atenção.
A história nos conta que, por volta dos séculos X e XI, surgiram grupos
de guerreiros peritos em luta com espadas. Foi nessa época que surgiram
os primeiros nomes de técnicas e, em registros dos séculos subsequentes,
é possível ver nomes que evocam golpes extremamente fortes e intensos,
utilizados amplamente no campo de batalha.
Afirma-se que, em meados do século XIX, havia mais de setecentas es-
colas no Japão, mas este livro mostra que é possível rastrear suas origens até
alguns poucos estilos fundamentais, que possuíam dois importantes pontos
em comum: o primeiro foi a presença de um fundador altamente capaz e
habilidoso; e o segundo foi a existência de técnicas e conceitos deveras sofis-
ticados que justificassem a existência e a continuidade do estilo.
Dentro desta obra, há uma divisão bem organizada dos nomes e es-
tilos dos samurais que foram os grandes baluartes de sua época e creio
que isso será de muita valia ao leitor, pois permite vislumbrar de maneira
correta as origens da tradicional arte marcial da espada japonesa.
No início, não havia uma separação entre as artes marciais, que cons-
tituíam um grande conjunto de formas de combate desenvolvidas a partir
de necessidades reais na guerra. Com o passar do tempo, a estruturação
das técnicas e do ensino propiciou a especialização em uma determinada
forma. Isso influenciou outras artes, como o teatro nô, a cerimônia do chá,
os arranjos florais e a música, que também foram sistematizados em estilos.
Tudo isso serviu como pano de fundo para a educação do guerreiro ja-
ponês, cujo modus vivendi era pautado por elevados valores morais. E a pre-
sença de tais valores nos treinamentos de artes marciais japonesas, mesmo
nos dias atuais, é, em minha análise, o que desperta ainda hoje um grande
interesse no mundo todo pelo modo de vida samurai.
Além disso, faço sinceros votos para que os atuais praticantes da arte
da espada japonesa — e os praticantes de artes marciais em um sentido
16
P R E FÁ C I O
Toshihiko Tsutsumi 1
1
Toshihiko Tsutsumi é natural da província de Kumamoto, no Japão, e reside há sete
anos no Rio de Janeiro. Praticante de Kendô e Iaidô, é vice-presidente da Confederação
Brasileira de Kendô.
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Nota ao leitor
Para melhor aproveitamento deste livro, alguns pontos devem ser es-
clarecidos.
1. Ele está dividido em partes de acordo com os períodos históricos.
Cada uma delas começa com o contexto histórico da época e, a seguir,
o tema do livro é abordado. A última parte em particular apresenta
um pequeno resumo da história da arte da espada (esgrima) japonesa
no Brasil.
2. Este livro não é, nem pretende ser, a obra definitiva sobre a arte da
espada japonesa. A intenção é que ele seja um ponto de partida e
possa munir o leitor de conhecimentos básicos que o ajudem a com-
preender a evolução da arte, a buscar outras fontes de conhecimento
e a analisá‑las de forma crítica de forma a enriquecer sua instrução.
3. Todas as informações contidas neste livro foram extraídas de fontes
elaboradas por especialistas ou foram diretamente obtidas a partir de
registros históricos. No final, há uma lista das obras básicas utilizadas
como referência. Deve‑se ressaltar que a bibliografia é composta exclu-
sivamente por obras japonesas e registros da colônia japonesa no Brasil.
4. Todas as traduções apresentadas não são oficiais e foram feitas de
modo a ficarem próximas o quanto possível do sentido original dos
textos. Em em alguns casos, elas são propositalmente literais ou até
mesmo se optou por não traduzir os conceitos descritos.
5. Alguns textos trazem descrições de técnicas, outros, ensinamentos de
estilos. Tais textos são de caráter meramente ilustrativo e o autor não
se responsabiliza por quaisquer consequências de seu uso.
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PEREGRINOS DO SOL
20
N O TA A O L E I T O R
L. K.
21
1
Mitos e lendas
DA ANTIGUIDADE À ERA KAMAKURA (10.000 a.C.– c. 1333)
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PEREGRINOS DO SOL
28
MITOS E LENDAS
1
É um local muito relevante para as lendas japonesas.
2
O atual imperador, Akihito, é o 125º imperador e descendente direto deste clã.
29
PEREGRINOS DO SOL
clãs mais fracos, denominados be. Dentro do sistema criado, os clãs eram
também divididos de acordo com quatro títulos, chamados de kabane:
Omi, Muraji, Kimi e Atai. Em particular, apenas as famílias mais podero-
sas e tradicionais podiam ser Omi ou Muraji.
Dentro do escopo deste livro, vale a pena ressaltar os clãs Ôtomo e
Mononobe. Os dois eram Muraji3 e especialistas em assuntos militares.
De modo geral, o clã Ôtomo era responsável pela guarda imperial e os
Mononobe cuidavam da segurança interna e das expedições militares con-
tra os outros povos que habitavam o arquipélago.
Especialmente os povos Kumaso, residentes ao sul da região de
Kyûshû, e os Ezo (também chamados de Ebisu ou Emishi), residentes ao
norte do Japão, eram uma ameaça ao império Yamato. Os Ezo só seriam
completamente derrotados e incorporados ao império tempos depois.
As lendas e histórias relativas aos Ôtomo e Mononobe são bastante
interessantes, mas seria impossível fazer uma apresentação detalhada de
tais relatos aqui. Todavia, vale notar que os poemas relativos aos Ôtomo
comprovam a existência de códigos de conduta e de atitudes que os guer-
reiros japoneses deviam seguir já naquele período.
Não se sabe exatamente se tais códigos possuíam um nome, mas textos
do século VIII atribuem nomes como Kyûba no michi (“caminho do arco
e do cavalo”) ou Yumi‑ya no michi (“caminho do arco e da flecha”) ao con
junto de códigos que hoje se conhece por Bushidô (“caminho do guerreiro”).4
Com relação aos Mononobe, o próprio nome do clã já é bastante in-
trigante, uma vez que pode ser interpretado como Mono‑no‑be, cuja possí-
vel tradução seria “clã dos guerreiros”, entre outras alternativas.5 Deve‑se
notar também a semelhança entre o nome Mononobe e a palavra japonesa
mononofu, que significa “guerreiro”, “homem de valor”.
3
Posteriormente receberam um status mais alto, de Ô‑Muraji, e passaram a responder
diretamente ao imperador.
4
Não existia e nunca existiu um código único para a conduta dos guerreiros. A conduta
variava de acordo com o clã ou feudo, a região geográfica e a época. É um equívoco
acreditar que haveria um código único chamado bushidô que ditaria o comporta
mento dos guerreiros.
5
Mono pode significar “arma”, “guerreiro” e até mesmo “espírito”, dependendo da in-
terpretação. O clã Mononobe, além de ter um lado bélico, também era responsável
por muitos ritos esotéricos.
30
MITOS E LENDAS
6
Wang ren, em romanização da pronúncia chinesa.
7
Existem documentos que supostamente contêm a antiga escrita japonesa, chamada
de Kamiyomoji, que teria sido criada antes da introdução da escrita chinesa. São for-
mas geométricas predominantemente curvilíneas que em nada se assemelham à escrita
chinesa. Há outras formas que são extremamente similares ao alfabeto coreano ou
remetem até mesmo ao alfabeto devanagari.
8
No caso de textos bastante antigos, é comum utilizar o termo Man’yô‑gana, em refe-
rência à antologia poética Man’yô‑shû. É interessante notar que, a partir dos ideogra-
mas escolhidos, é possível estimar aproximadamente a época em que o texto foi escrito.
31
PEREGRINOS DO SOL
9
Apesar de ser chamado de Imperador (Tennô), Suiko foi uma mulher. Não se utiliza
o termo Imperatriz (Kôgô), pois essa palavra implica ser esposa do Imperador, o que
não foi o caso de Suiko.
10
Suiko não foi a primeira estadista da história japonesa. Antes dela, Himiko gover-
nou Yamatai‑koku, a Imperatriz Jingû (esposa do Imperador Chûai) supostamente
32
MITOS E LENDAS
33
NATANAEL
Luiz Kobayashi
Luiz Kobayashi
PEREGRINOS Existe atualmente uma aura mítica em torno
Nesse sentido, saudamos o aparecimento do
presente livro. Em estilo leve e despojado, o do samurai. Ele é o grande herói de mangás,
autor soube mesclar convenientemente os ensi- animês, filmes e novelas que chegam de roldão
DO SOL A ARTE DA
namentos da esgrima com episódios (reais ou ao imaginário de jovens (ou não muito jovens)
imaginários) dos mestres dessa arte e dos samu- brasileiros. Com sua habilidade no manejo da
rais. Mais ainda: ele conseguiu contextualizá-los espada, o samurai vence (quase sempre) o mal
ESPADA SAMURAI
na história nipônica. Para completar, ofere para a redenção do bem.
ce-se um esboço histórico da evolução (invo
PEREGRINOS DO SOL
Professor do Departamento de
de preservação das artes marciais tradicionais
História da USP Porém, até que ponto essa e outras histórias re
Presidente do Centro de
japonesas, recebeu instruções diretamente de
fletem a realidade? Infelizmente, muito pouco.
Estudos Nipo-Brasileiros renomados mestres dessa arte no Brasil e no Muitos erros, conhecimentos falsos e crenças
Japão, e durante anos compilou material — parte equivocadas pululam nesse cenário mítico.
dele, extremamente raro — para a elaboração do Enquanto se estiver no terreno do entreteni-
livro que ora chega a nossos leitores. mento, não há nada a que se opor. Ninguém
www.estacaoliberdade.com.br
consegue ficar exposto constantemente à dura
e fria realidade. Necessita-se de uma válvula
de escape. E, para isso, nada melhor do que NATANAEL
ISBN 978-85-7448-192-0
9 788574 481920
quer se aprofundar no tema. Os mitos e técni-
cas de espadachins nascidos da fantasia muitas Cortar Altura: 20 cm Cortar Altura: 20 cm
vezes acabam sendo um desserviço para o co-
nhecimento da cultura japonesa.
(cont.)