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A canção contém caráter narrativo [1ª pessoa], a figura de linguagem de cunho metafórico,
com: começo, meio e fim bem definidos. A filosofia é fusão de Rousseau, Marx e
Nesta primeira estrofe, o narrador diz que vem do sertão. Repare que é um retirante e, por
invadida, assim como também poderá incomodar pelo jeito de pensar. O narrador é
possivelmente da classe baixa e tem uma forma de pensar diferente das outras classes
sociais.
Além disso, a mensagem que o narrador está a propagar pode não agradar quem a escuta
Como o narrador não é do mainstream social, é de vivência sofrida, tal condição o fez
E como ele está narrando uma vivência, ele dá pista que: “vivo para consertar” [isso
é caracterizado pelo tempo verbal], ou seja, saiu da condição de impotência pela limitação
Essa estrofe aponta o ponto de ruptura e a mudança de status social do próprio narrador.
multidão [um mero “acebolado”], por causa de um fenômeno qualquer o fez mudar este
status quo [não porque ele forçou isso: “não por um motivo meu”], mas porque houve
mudança no sistema de liderança, o qual ele ocupou porque não há vácuo no poder [por isso
que o narrador diz: “porém por necessidade”]. O narrador tomou o lugar do vaqueiro.
Por causa da modulação “Na boiada já fui boi, mas um dia me montei“, tal condição reflete
que o narrador é realmente do “povo acebolado” [já foi boi], o que desmonta a tese de que a
canção remeteria ao ex-presidente João Goulart [que era filho de coronel fazendeiro, dono
de muitas áreas de terra e de muitas cabeças de gado]. João Goulart nunca foi povão
líderes anteriores, ao controlar o povo de forma a segurar muito gado e muita gente
vantagens que o poder dá: que é até mesmo o poder de manter o povo como gado.
Seguir como num sonho significa o problema do poder subir à cabeça, o deslumbre
do poder que o torna um rei [rei significa aquele que pode tudo].
Como o sonho significa poder subir à cabeça, além de que o narrador estava deslumbrado
pelo poder ao ponto de tornar-se o que mais temia: o mesmo tipo de líder opressivo que
acha que pode tudo, este modelo continuado o fez acordar e enxergar a verdade: refletir
que estava fazendo a mesma coisa que os outros líderes tiranos faziam.
desafortunados, esquecendo-se até mesmo de onde veio, deste modo, o narrador não pode
seguir com o mesmo modelo, ao virar, agora, de fato um agente de mudança. Porque ele vive
pra consertar. Ou seja, se sensibilizará com o gado [a massa popular]. Com gente é
diferente.
Ao rever os conceitos, ao decidir não ser como o líder do Sistema anterior [com
os mesmos vícios], o narrador dá a entender metaforicamente que não será mais repressivo
E o narrador, também, arremata ao explicar ao receptor que está convicto e não mudará de
ideia de jeito nenhum [não liga para quem é resistente a mudanças]. Se o ouvinte não
Não por mim nem por ninguém, que junto comigo houvesse
O narrador passou por tantas coisas, desde ser retirante do sertão até ser comandante do
Sistema, ao conseguir por milagre deixar de ser só mais um para virar “rei”, com essa
ascensão social o narrador desafia qualquer receptor a mostrar se teve algo próximo a esta
O narrador desafia e garante que ninguém chegou tão longe quanto ele. O
narrador faz apelo à autoridade pra explicar estar certo em modificar o Sistema
[repressivo]. Ou seja, o receptor não tem vivência nem maturidade para compreender a
mudança porque não viveu na classe baixa e não sofreu o que o narrador sofreu.
Laço firme e braço forte num reino que não tem rei
Após refletir por muito tempo [“mundo foi rodando nas patas do meu cavalo”] E
como o narrador aceita ser este agente de mudança [já que um dia montei agora sou
cavaleiro], o narrador aceita o desafio e comandará um novo Sistema, mas sem o “pode-
tudo” que a tirania fornece, ou seja, construirá um “reino que não tem rei”.
Dá lição de moral no sentido de que só porque se tem o poder não precisa ser
tirânico; mostra que a insensibilidade de quem está no poder se dá porque o sujeito que se
acha superior aos demais não se coloca no lugar dos desafortunados porque não teve,
que possuem medo da mudança, em que o narrador impõe a metamorfose social ao invés de
apenas sugerir.
A canção fez crítica à ditadura militar de 64? Também [porque foi um sistema
repressivo]. Mas o foco da música é dar indireta a qualquer sistema tirânico que trata o
povo como gado, e que dependendo das condições há de surgir até revolução [o gado virou
boiadeiro]. A esses regimes a carapuça serve de forma salutar. E disparada pode ser
não no sentido de revolta violenta. Uma música para convencer tiranos a deixarem de ser.
Meu professor de português no primeiro ano do curso científico em Mirassol era pouco
ortodoxo. Preocupava-se quase nada com gramáticas, análises sintáticas, análises
morfológicas, ortografias e vivia estimulando a reflexão. No começo do ano letivo de 1967,
fez com que a turma se posicionasse a respeito das músicas Disparada de Theo de Barros e
Geraldo Vandré e A Banda de Chico Buarque, que haviam sido vencedoras do II Festival da
Música Popular Brasileira da TV Record no ano anterior.
Foi aí que nos demos conta da beleza que havia na simplicidade e no jogo de palavras de A
Banda, que fazia com que até o velho fraco se esquecesse do cansaço e dançasse e a moça
feia na janela pensasse que a banda tocava pra ela. Mas foi com a riqueza de significados
de Disparada que nos surpreendemos, do homem, do boi, da boiada, do reino que não tinha
rei. Certamente enxergamos no poema mais do que Vandré quis dizer.
No site da TV Record pode ser vista a apresentação de Jair Rodrigues na final desse
festival.
http://entretenimento.r7.com/videos/jair-rodrigues-canta-disparada-no-festival-de-
musica-brasileira-de-1966/idmedia/536b954d0cf23f63c341ee05.html
Relevem a qualidade do vídeo e verão que a música, o arranjo, a interpretação são, de fato,
emocionantes.
Há exatamente um ano, publiquei este texto no blog Xarope de Letrinhas. Jair Rodrigues,
falecido em 08 de maio de 2014 foi um grande intérprete da música brasileira.
No caso de “Disparada”, a queixada de burro além de trazer para o palco uma combinação
de sons e o caráter da música, trouxe também um elemento do “espaço” em que a narrativa
estava inserida: o sertão.Vandré sempre se mostrou bastante crítico em relação à
incorporação de elementos estrangeiros na música brasileira, não necessariamente impondo
uma pureza à nossa música, mas buscando uma autoafirmação no que diz respeito à sua
valorização, daí a sua divergência com os tropicalistas e até mesmo com os bossanovistas.
Seu afastamento em relação aos “rótulos” revela uma forte tendência de rejeição às
influências da cultura norte-americana na música brasileira (numa atitude anti-imperialista)
e às temáticas, aparentemente, descomprometidas, mas também em relação ao que
denominava como “arte panfletária”. Para compreender a postura de Vandré é importante
refletirmos sobre a política de intervenção dos Estados Unidos nos países da América
Latina e sua forte atuação e colaboração com a Ditadura Civil Militar no
Brasil. Estudos recentes têm aprofundado o conhecimento a respeito do papel dos Estados
Unidos nessa conjuntura.
COMPREENDENDO A CANÇÃO
3 – Vandré associa o povo daquele seu sertão a uma boiada, percebemos aqui uma metáfora
Explique.
Ele considera que cada pessoa simples era um boi, e ele como integrante daquela
sociedade, era também um boi em toda a boiada.
5 – No momento em que o eu-lírico diz “mas um dia me montei”, que significa este verso?
Que montar-se seria assumir definitivamente uma nova posição dentro da boiada, vindo
a ter, inicialmente, atitude similar à do fazendeiro.
Como já fizera em postagem anterior com a canção “Starway to Heaven” da banda Led
Zeppelin desta vez apresentarei as minhas impressões sobre a canção nacional “Disparada”
de Geraldo Vandré, permanecendo na lógica anterior de metalinguagem/inter-texto/sub-
textual.
Para tanto juntamente com a letra da canção abaixo farei inserções de comentários, todos
em itálico.
Disparada
Geraldo Vandré
Composição: Geraldo Vandré e Theo de Barros
Tem outra visão sobre esta mesma canção? Coloque aqui o seu comentário e vamos dialogar.