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DE LINA BO BARDI
Resumo
Desde o início de sua carreira, Lina Bo atuou não só como arquiteta, mas
também no desenvolvimento de um constante trabalho de expografia. A relevância dos
trabalhos desenvolvidos desde o princípio da pinacoteca do MASP, seus projetos para o
Museu de Arte Moderna da Bahia e as experiências com exposições organizadas na
Fábrica da Pompéia comprovam sua relevância no pensamento construtivo de um
museu que vai além de seu interior, sendo a arquiteta um dos maiores exemplos de
expografista que pensou além do “cubo branco”.
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ANELLI, Renato
relação de troca mútua entre ambos. Neste ponto, a arquiteta pode ir além de seus
predecessores italianos, pois, trabalhando no Brasil, num contexto diferente de uma
Itália totalmente construída num estilo já concretizado, teve a oportunidade de construir
museus não só em seus interiores que se instalavam em espaços já prontos. Seus
projetos eram a síntese completa do exterior do prédio, e o que pretendia apresentar em
seu interior
Imagem 1: Edoardo Pérsico e Marcello Nizzoli, Sala da Medalha de Ouro na Mostra da Aeronáutica
Italiana, Milão, 1934. A mostra fotográfica dispõe-se sobre uma grelha de tubos de aço; a linearidade do
conjunto, ao mesmo tempo que mantém a transparência do espaço e permite uma visualização do
conjunto como um todo, traz a exposição um caráter escultural e gráfico.
Imagem 2 - Franco Albini, Mostra de Il Scipione, Milão, 1941. As pinturas neste caso são
expostas suspensas em tubos metálicos, que sustentam molduras externas que apoiam as pinturas. O
modelo criado pelo arquiteto e muito semelhante ao projeto expográfico inicial para a pinacoteca do
MASP da rua 7 de Abril, primeira sede do Museu.
Imagem 3 – Projeto de exibição das obras para o salão do MASP na rua 7 de Abril. Aqui, Lina já
apresenta os primeiros sinais do que seria a sua desconstrução do museu com uma organização linear e
pré-determinada, ao manter o espaço totalmente aberto, e não organizar as obras em ordem cronológica,
permitindo ao visitante que interaja livremente com as pinturas expostas, na ordem que lhe agradar.
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Tecnicamente, o modelo apresentado pela arquiteta também é de grande
funcionalidade, principalmente devido a insuficiência do museu recém-criado, que,
apesar de ter um acervo em crescimento extremamente rápido, continha várias lacunas
de obras que impediriam um panorama cronológico da produção artística europeia que
pudesse ser claro, ou não ignorasse grandes períodos de tempo. Ao exibir todos recursos
disponíveis no acervo, do modo como o fez, a exposição se torna completa por permitir
a comparação entre os itens de forma mais explícita (o que foi um dos grandes trunfos
do acervo do museu, que apesar de vasto, sempre teve lacunas temporais em seu
acervo).
Durante a década de 1960, Lina Bardi foi convidada pelo próprio governo
baiano, numa parceria com a Universidade Federal da Bahia, na qual também viria a
exercer um cargo de docência, para formular e instalar em Salvador o projeto do Museu
de Arte Moderna da Bahia. Durante todo o trajeto do período que passa na Bahia,
estudando a cultura do Nordeste e entrando em contato com o sertão brasileiro, Lina
tem o que provavelmente é a sua grande experiência inspiradora, e partir do que percebe
na região, desenvolve um projeto de difusão cultural que marcaria todos seus projetos a
partir de então.
Imagem 4 – Pavilhão da Bahia na V Bienal de Arte de São Paulo, na foto, destaque para a
exposição de tecelagens típicas, tanto na produção de tapeçarias quanto vestimentas
Sua mudança definitiva para a Bahia acontece em 1960, quando, convidada para
dirigir o recém-inaugurado Museu de Arte Moderna da Bahia (MAMB). Num primeiro
momento, sem sede, o museu é instalado no foyer do Teatro Castro Alves. A temática
segue a lógica das exposições no MASP da 7 de abril, e as exposições iniciais do museu
acontecem em grande parte através do empréstimo de obras do museu em São Paulo.
Mantendo exposições extremamente didáticas, entretanto, diferente do ambiente
paulista, na cidade de Salvador, Lina conta com o apoio das grandes personalidades e
instituições intelectuais e culturais da região, o que permite o desenvolvimento de um
grande projeto multidisciplinar, envolvendo a participação, além da arquiteta, de alguns
dos grandes nomes da cultura dos anos 60, como o reitor da Universidade Federal da
Bahia, Edgard Santos, e o cineasta Glauber Rocha4.
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Bardi, Lina Bo e Gonçalves, Martim. Bahia no Ibirapuera (1959). In Lina Bo Bardi (Antologia)/ Marcelo
Ferraz (coord.). Instituto Lina Bo e P. M. Bardi, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2008
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É possível traçar diversos paralelos entre as teorias e manifestos desenvolvidos pelo cineasta, em
especial seu principal texto “Estética da Fome” e a chamada Arquitetura Pobre de Lina Bo Bardi, por
estabeleceram uma relação de influências e exploração da cultura popular originada nas regiões de
extrema miséria do país, que, tem como destino uma denúncia social, mas ao mesmo tempo não se
apoiando numa visão colonialista sobre as populações dessa região, ao procurar compreender os
aspectos que tornariam o desenvolvimento cultural das mesmas “livre” das influências da sociedade
ocidental desenvolvida.
do espaço, mas também criou todo o programa de funcionamento da exposição, através
da criação de um eixo temático de grandes exposições, associados a eventos culturais, e,
principalmente, a oficinas e cursos técnicos no museu, num entendimento de que o
museu, na situação em que se encontrava, tinha o papel não só de armazenar arte, mas
produzir arte, e arte também ligada a um processo de profissionalização da população,
que daria possibilidade à qualificação da mão-de-obra local5.
Para montar a exposição, Lina optou por uma disposição muito menos
“museológica” que a escolhida para a exposição no Ibirapuera (ainda que esta tenho
sido bastante incomum, não extrapolava os limites da expografia no aspecto de modos
de dispor os objetos, inovando sim no espaço que os cercava). Dentro do edifício do
museu, dispôs os objetos de forma muito semelhante a uma feira local, onde estes se
esparramavam sobre prateleiras, tablados simples, ou mesmo diretamente no chão. Aqui
o objetivo não era isola-los e permitir a cada um exibir suas características particulares,
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O projeto é colocado em prática junto as políticas de alfabetização em massa desenvolvidas a partir das
experiências de Paulo Freire.
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Mais uma vez, entendendo arte como o fazer técnico, não como produção de fins exclusivamente
artísticos ou decorativos.
mas sim, mostrar seu significado em conjunto, e também de forma muito semelhante ao
ambiente no qual estão originalmente inseridos. A cultura nordestina é colocada dentro
do museu, assim, com o mínimo de intervenção possível do que poderia ser entendido
como um olhar tradicional de expografia, numa prática museológica que “libera” o
objeto da estigmatização do espaço do museu.
Imagem 5 – Exposição Civilização do Nordeste, cuja disposição dos objetos faz lembrar uma
feira de rua ou mercado aberto.
Imagem 6 - Exposição Civilização do Nordeste, organização dos objetos dentro do Solar,
fazendo referência a seus usos cotidianos
Cavaletes de Cristal
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Exemplo claro da permanência das experiências ocorridas na Bahia foi a inauguração da exposição
temporária A Mão do Povo Brasileiro, durante a inauguração da nova sede do MASP, simultânea a
abertura da pinacoteca do MASP em seus cavaletes de vidro.
uma infinidade de caminhos a serem criados por entre a galeria, tendo cada visitante a
possibilidade de traçar sua própria rota de aprendizado entre as pinturas.
Imagem 9 – O arranjo dos cavaletes traz a possibilidade de novos tipos de interação do público
com as obras. Na imagem, um visitante posa junto do quadro Reneé, de Modigliani
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EYCK, Aldo Van, “Um dom superlativo”. In: Museu de Arte de São Paulo. Portugal: Instituto Lina Bo e
P.M. Bardi, Blau, 1997.
Por fim, o último aspecto de grande importância favorecido pela expografia do
acervo nos cavaletes de cristal é a própria interação dos quadros. A “grande família”9
formada pelo acervo, configurada sobre as superfícies de vidro permite que os quadros
se contraponham, sobreponham e interfiram um nos outros. E se num museu tradicional
possivelmente a presença de diversas obras numa mesma sala está sujeita a uma mesma
temática, a exposição de todo acervo num mesmo ambiente permite as inumeráveis
comparações de qualquer um dos itens expostos com todo o restante das obras presentes
no espaço, seguindo apenas as infinitas possibilidades de associação que cada
expectador pode criar em sua visita.
Imagem 10 – Reformulação atual dos cavaletes de cristal inaugurada em 2015, com projeto
coordenado pelo escritório METRO Arquitetura
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EYCK, Aldo Van, “Um dom superlativo”. In: Museu de Arte de São Paulo. Portugal: Instituto Lina Bo e
P.M. Bardi, Blau, 1997.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARDI, Lina Bo, O Museu de Arte de São Paulo – Função Social dos Museus, in
Habitat, no. 1, out/dez-1950,p.17.
FERRAZ, Marcelo (org.). Lina Bo Bardi: Antologia. 4. ed. São Paulo: Instituto Bardi,
2018.
RUBINO, Silvana; GRINOVER, Marina (org.). Lina por Escrito: Textos Escolhidos de
Lina bo Bardi. 8. ed. São Paulo: Cosac Naify, 2012.