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São
Paulo: Ed Aleph, 2019. 280 p.
Outros podem dizer que “bruxa” é uma pessoa que tem poderes psíquicos. É
verdade que muitas bruxas afirmam ter poderes psíquicos, mas isso não prova
se de fato elas os possuem ou não, nem se a simples posse de tais poderes
transformaria uma pessoa em bruxa. Existem muitos outros elementos para se
caracterizar uma bruxa. Algumas pessoa podem imaginar vagamente que
bruxa praticam alguma parecida como ao vodu. Isso é sinal de que tais
pessoas interpretam mal tanto a bruxaria como o vodu. O vodu é uma religião
que combina o cristianismo como paganismo africano, e seus rituais são
praticados como um meio de proteção contra a bruxaria. (pág. 11)
Mas, enfim, o que é uma bruxa? Uma das respostas pode ser obtida nas raízes
semânticas e no desenvolvimento variados termos ligados à sua definição. A
palavra witc [“bruxa”, em inglês] deriva de wicca (pronuncia-se “uítcha”, que
significa “bruxo”, em praticante masculino da bruxaria) e de wicce (“uitchê”,
que é “bruxa”), ambos os termos pertencentes ao inglês antigo (Old English).
Os dois substantivos derivam do verbo wccian (“uítchan”), que quer dizer “jogar
um feitiço” ou “lançar um encantamento”. Contrariamente às crenças de alguns
bruxos modernos, a palavra definitivamente não é de origem celta e não tem a
menor relação com o verbo witan [“saber”] do inglês antigo, nem com qualquer
outra palavra com o significado de wisdom ou “sabedoria”. A explicação de que
witchcraft [“bruxaria”] significa “a arte dos sábios” (croft of the wise) é
inteiramente falsa. (pág. 15)
[...] “Feitiçaria” é a magia negra (ou baixa magia) praticada em todo o mundo,
quer seja benéfica ou maléfica, quer seja mecânica ou envolva a invocação de
espíritos. “Bruxaria” significa tanto a chamada bruxaria diabólica da caça às
bruxas quanto a moderna bruxaria neopagã. (pág. 21)
[...] O vodu é um exemplo: começou com uma religião levada para o Haiti por
escravos trazidos da costa do Benin (o nome é uma corruptela da palavra
ioruba para “deus”). Sob a influência do cristianismo e de outras ideias
europeia converteu-se em
O dualismo extremo tinha começado no antigo Irã, como já vimos (p. 45); foi
transmitido aos gnósticos e maniqueístas e penetrou nos Bálcãs, onde se
tornou a base da religião dos bogomilos búlgaros e bósnios. Mas o próprio
cristianismo era uma religião semidualista; e em seu zelo de reforma e pureza
espitirual, as heresias dos século XI e XII enfatizaram de tal forma esse
dualismo inerente ao cristianismo que sua concepções pareceram gnósticas
aos olhos dos ortodoxos. Assim, quando estes condenaram os hereges em
Orleans, dispensaram-lhe termos semelhantes àqueles usados pela patrística
contra os gnósticos. (p.78)
[...] O Inquisidor Bernardo Gui afirmou que bruxaria subentendia pacto, pacto
subentenda heresia, e como a Inquisição tinha o dever de processar os
hereges, também estava obrigada a processar as bruxas. Mas foram os
políticos, não os inquisidores, os responsáveis pelo infame julgamento dos
Templários em 1305-13014. (p. 97)
A ordem do templo havia sido fundada (por volta de 1118) com o objetivo de
libertar a Terra Santa do domínio muçulmano, mas os cavaleiros templários
tinham-se tornado extremamente ricos e corruptos, apresenta-se agora como
alvo tentador para os monarcas cujas gastos com a máquina governamental
cresciam rapidamente. O papa Clemente V, o rei Felipe IV (o Belo) da França e
rei Eduardo II da Inglaterra conseguiram a condenação dos templários por
heresia, afirmando que eles invocavam o diabo, prestavam-lhe vassalagem,
veneração e serviço, e tinham um pacto com ele. A fama e a repercussão do
processo em toda Europa disseminaram a crença na existência de uma religião
organizada que rejeitava Cristo e cultuava Satã. (p. 97-98)
O auge da caça às bruxas ocorreu entre 1560 e 1660, e sua causa mais
importante foram as tensões crescentes entre católicos e protestantes,
culminando nas guerras de religião. A perseguição foi mais severa nas áreas
onde esses conflitos vinculavam-se a fortes antagonismo sociais> onde
calamidades como a peste, a fome e as intempéries climáticas agravavam as
tensões sociais; e onde uma longa tradição de julgamentos por heresias havia
criado as bases para a repressão judicial da bruxaria, como na França. [...] (p.
105-106
A nova cosmo visão emergiu das revoluções filosófica e religiosa que alteraram
todo o conceito de cosmo e de como este funcionava. A revolução filosófica foi
liderada por Descartes (1596-1650), que rejeitou a tradição medieval e
defendeu a existência de leis universais, observáveis, mecânicas e descritíveis
da natureza, que tornaram obsoleta e ilógica a intervenção de demônios (e
anjos). Posteriormente, o ceticismo de Hume iria mais longe; e ainda mais
tarde o fisicalimso declararia que só se poderia afirmar com razoável
segurança a existência de fenômenos que fossem demonstráveis por método
científico. Hoje, para a maioria das pessoas educadas sob os pressupostos do
fiscalíssimo, a crença em bruxaria tonou-se, de fato, uma superstição. (p. 156)
[...] estrato sociais inferiores, sustentou Michelet, mas isso era admirável: a
buxaaria era uma manifestação primitiva do espírito democrático. Desenvolveu-
se entre os camponeses oprimidos da Idade Média, que adotaram os
remanescentes de um antigo culto da fertilidade em protesto contra a opressão
da igreja e da aristocracia feudal. A tese de Michelet, de que a bruxaria era um
forma de protesto, foi adaptada mais tarde pelos marxistas; seu argumento de
que a bruxaria se baseou no culto da fertilidade foi adotado pelos antropólogos
do começo do século XX, influenciando obras como O ramo de ouro, de Sir
James George Frazer, From ritual to romance, de Jessie Weston, O culto das
bruxas na Europa Ocidental, de Margaret Murray, e, indiretamente, The waste
land, de T.S. Eliot. (p. 167)
Foi desse debate que surgiu um dos mais importante conceitos associados á
bruxaria moderna: a vrença de que a bruxaria medieval era, de fato, um forma
de sobrevivência do paganismo pré-cristão. Esta ideia, mais do que qualquer
outra, tornou-se central para o juízo que a bruxaria moderna faz de sua própria
identidade religiosa, e fornece boa parte da força motriz que se encontra por
trás do posicionamento contracultura do movimento. [...] (p. 180)
Apesar de sua séria deficiências, a obra de Murray capturou a imaginação do
público, pois se embasava em uma realidade histórica que de outo modo teria
sido mantida no esquecimento – a saber, que o paganismo tinha sido
suprimido, mas não erradicado pelo cristianismo; que as crenças populares
pagãs não se haviam extinguido com a introdução do cristianismo, mas, ao
contrário, permanecido e construído um substrato básico para a bruxaria. Uma
investigação honesta revela que alguns – de fato, muitos – costumes, crenças
e símbolos pagãos sobreviveram através da Idade Média e chegaram até os
nossos dias. O que está em questão não é se existiram sobrevivências do
paganismo, mas quantas elas eram, de que tipo e em que extensão somaram
alguma coerência como corpo organizado de crenças ou práticas. (p. 193)
Murray enfatizou a ideia de que a “Antiga Religião” era realmente uma antiga
religião da fertilidade. Ela negou que a bruxaria tivesse surgido em oposição ao
cristianismo, afirmado, em vez disso, que era uma sobrevivência pagã que foi
desafiada pelo cristianismo. Foi também Murray que estabeleceu a
terminologia “Sabbat” e “Esbat”. Ela contribuiu com o conceito de que o culto
das bruxas era organizado em covens de treze pessoas, formado por doze
bruxas e seu líder, ou sacerdote. (196)
[...] Estados Unidos, porém, que o movimento da bruxaria conheceu seu maior
crescimento, alcançou sua maior influência e sofreu suas maiores
diversificações. O movimento convergiu de maneira singular como uma série
de poderosas tendências culturais em uma maré que o conduziu ás raias da
aceitação geral. E à medida que a bruxaria “vai se estabelecendo”, os bruxos
americanos passam a utilizar essa condição para interligar sua religião com o
movimento ecumênico internacional – uma conexão que ajudou a bruxaria a
obter aprovação mundial como expressão religiosa plenamente legítima. (p.
214)
Um dos maiores obstáculos enfrentados por homens e mulheres gay
é o manto de invisibilidade colocado sobre nós pelo
heterossexualíssimo da cultura dominante... Uma das piores
experiências que muitos gays compartilham é o sentimento que
experimentam desde a infância de que “eu sou a única pessoa da
minha espécie em todo o mundo...” Assim, quando o web se tornou
disponível – bam!!! – os gay tomaram conta dela para arrancar tudo o
que fosse possível. Quando eu estava começando a estudar
computadores e a Internet, na metade da década de 1990, um de
meus amigos falou: “a internet é formada por pagãos e gays”. Eu não
acredito que essa declaração fosse estatisticamente correta naquela
época, mas era definitivamente uma descrição acurada do que muitos
pagãos gays que eu conheço estavam experimentando por da web:
havia lá muitos como nós, bem mais do que podíamos imaginar. (p.
223)
Dentre os três tipos, aquele das caças às bruxas surtiu o maior efeito histórico.
A bruxaria europeia histórica era um satanismo (adoração do Diabo) formado
por elementos retirados da antiga feitiçaria, do paganismo, do folclore, da
heresia, da teologia escolástica e dos julgamentos em tribunais locais, estatais
e eclesiásticos. Se alguém de fato praticou esse tipo de bruxaria, é uma
questão em aberto. Alguns indivíduos ou grupos podem ter realizado rituais
diabólicos, mas foram raros. A principal importância da bruxaria herética é o
conceito em si mesmo: o que podem realmente ter feito esses bruxos é
eclipsado por aqui que se acreditava que eles faziam. As pessoas agem com
base naquilo que aceitam ser verdadeiro, e aquelas que acreditavam na real
existência de uma conspiração diabólica da bruxaria provocaram a morte de
cerca de 60 mil pessoas, aterrorizaram outras milhares, distorceram as mentes
educadas durante séculos e deixaram uma mancha indelével nos registros
históricos da cristandade. (p. 241)
Não é preciso tornar-se bruxo para entender que a bruxaria é uma expressão
da experiência religiosa. As antigas religiões pagãs, quando entendidas em
profundidade, revelam-se ambivalentes, dotadas tanto de elementos
destrutivos como positivos. [...] (p. 245)