Você está na página 1de 53

SOCIEDADE BRASILEIRA

DE CANCEROLOGIA
Publicação Oficial da Sociedade Brasileira de Cancerologia
Departamento de Cancerologia ISSN 1415-6725
da Associação Médica Brasileira Volume 16 - Número 54 - Janeiro a Março de 2014

CORPO EDITORIAL
Editor-chefe Hirokazu Nagawa (Japão)
University of Tokio
Ricardo César Pinto Antunes (SP)
Hospital do Servidor Público do Estado de São Paulo
Hugo Marsiglia (França)
Diretor do Instituto Paulista de Cancerologia (IPC)
Institut Gustave Roussy

Editores Adjuntos Joji Kitayama (Japão)


Gustavo Guimarães (SP) University of Tokio
Hospital A.C.Camargo
José Edson Pontes (Estados Unidos)
Roberto Gomes (ES) Detroit Medical Center
Universidade Federal do Espírito Santo
Mário F. Bruno (Argentina)
Editores-associados Sociedad Argentina de Cancerología
Antonio André Magoulas Perdicaris (SP)
Universidade Metropolitana de Santos Nelson Tsuno (Japão)
University of Tokio
Hiram Silveira Lucas (RJ)
Hospital Mário Kröeff Richard D. Schulick (Estados Unidos)
University of Colorado Anschutz Medical Campus
Comitê Internacional
Rodrigo Erlich (Estados Unidos)
Benedict Daly (Estados Unidos)
Fox Chase Cancer Center
Boston University

Yoshihiro Morya (Japão)


Charles Balch (Estados Unidos)
National Cancer Center
Johns Hopkins Institute for Clinical and Translational
Research
Comitê Nacional
Ademir Torres Abrão (SP)
Fernando J. Kim (Estados Unidos)
Instituto Paulista de Cancerologia
University of Colorado School of Medicine
Adonis Carvalho (PE)
Hiran C. Fernando (Estados Unidos) Hospital de Câncer de Pernambuco
Boston University
Amândio Soares Fernandes Jr. (MG) Luiz Antônio Negrão Dias (PR)
Hospital Felício Rocho Hospital Erasto Gaertner

Angelo Gustavo Zucca Matthes (SP) Marianne Pinotti (SP)


Hospital de Câncer de Barretos Universidade de São Paulo

Bruno Yuki Yoshida (SP) Raphael de Paula (SP)


Instituto Paulista de Cancerologia Hospital do Servidor Público do Estado de São Paulo
Hospital do Servidor Público Estadual
René Aloisio da Costa Vieira (SP)
Carla Ismael (RJ) Departamento de Mastologia e Reconstrução
Sociedade Franco-brasileira de Oncologia Mamária e Departamento de Prevenção
do Hospital de Câncer de Barretos
Flávio Daniel Saavedra Tomasich (PR)
Universidade Federal do Paraná Ricardo Sales dos Santos (SP)
Hospital Israelita Albert Einstein
Gildete Sales Lessa (BA)
Instituto de Oncologia da Bahia Roberto Camargo (SP)
Universidade de São Paulo
Giuliano Noccioli Mendes (SP)
Instituto Paulista de Cancerologia Roberto Porto Fonseca (MG)
Sociedade Brasileira de Cancerologia
Glauco Baiocchi Neto (SP)
Chefe do Departamento de Ginecologia Samuel Aguiar Júnior (SP)
Oncológica do Hospital A.C.Camargo Chefe do Departamento de Cirurgia Colorretal
e Sarcomas do Hospital A.C.Camargo
Guilherme Mendes Filho (SP)
Instituto Paulista de Cancerologia Sergio B. Hatschbach (PR)
Hospital Erasto Gaertner
Helio Vitelli (SP)
Hospital Beneficência Portuguesa Sérgio Renato Paes Costa (DF)
Universidade Federal de São Paulo
Igor Alexandre Protzner Morbeck (DF)
Universidade Católica de Brasília Simão Grossmann (RS)
Centro de Mama do Hospital Santa Rita
João Carlos Sampaio Góes (SP)
Instituto Brasileiro de Controle do Câncer Tiago Santoro (SP)
Hospital A.C.Camargo e Instituto Paulista
José Francisco de Mattos Farah (SP) de Cancerologia
Universidade Federal de São Paulo
Victor Arias (SP)
José Getulio Segalla (SP) Universidade de São Paulo
Hospital Amaral Carvalho
William Eduardo Nogueira Soares (SE)
Instituto de Oncologia San Giovanni

EXPEDIENTE
A RSBC é o órgão oficial de divulgação científica da Sociedade Brasileira de Cancerologia.
É uma publicação editada e reproduzida pela Editora Manole Ltda.

Editor gestor: Walter Luiz Coutinho


Editora: Karin Gutz
Produção editorial: Juliana Morais, Julia Carvalho, Juliana Penna, Fernanda Quinta e Cristiana Gonzaga S. Corrêa
Capa: Rafael Zemantauskas
Projeto gráfico e diagramação: Sopros Design
Av. Ceci, 672, Tamboré – Barueri, SP, Brasil, CEP 06460-120 | www.manole.com.br | (11) 4196-6000
EDITORIAL

Caro leitor,
SOCIEDADE BRASILEIRA
DE CANCEROLOGIA
É com grande prazer que finalizamos mais
um número de nossa Revista da Sociedade
Departamento de Cancerologia
da Associação Médica Brasileira
Brasileira de Cancerologia, trazendo a pala-
vra de respeitados médicos, professores e
Diretoria 2012-2015 pesquisadores de destaque em trabalhos ori-
ginais e relatos de casos. Os textos oferecem
Presidente ao leitor uma análise didática dos temas pro-
Robson Freitas de Moura (BA) postos, sem deixar de compor uma publica-
ção científica que deve ser de qualidade, con-
Vice-presidentes
tínua e cativante.
Amândio Soares Fernandes Junior (MG) Esperamos que a variedade de assuntos seja
Ricardo César Pinto Antunes (SP)
de interesse de nossos leitores e que os dados
Luiz Antônio Negrão Dias (PR)
José Luiz Amorim de Carvalho (PA)
apresentados possam alcançar a aplicação prá-
Pedro Wilson Leitão Lima (CE) tica, favorecendo um grande número de pa-
cientes. Nossa missão é a publicação de tra-
Secretário-geral balhos científicos de pesquisadores nacionais
José Alberto Lopes Nogueira (BA) e internacionais, relacionados à cancerologia.
Secretária Adjunta É importante lembrar que o principal objeti-
Carla Ismael (RJ) vo é compartilhar experiências e informar os
profissionais da área sobre o que existe de
Tesoureiro-geral mais atualizado.
Luiz José Sampaio de Araújo (BA) Nesta oportunidade, temos que agradecer
Tesoureira Adjunta os autores e coautores que acreditaram e en-
Maria Lúcia Martins Batista (BA) viaram seus artigos, colaborando assim para
o progresso e a seriedade da Revista. A sen-
sação é de grande satisfação e de dever cum-
Conselho Superior prido para com os cancerologistas brasilei-
Presidente ros, para com os membros da Sociedade
Roberto Porto Fonseca (MG) Brasileira de Cancerologia e para com a so-
ciedade em geral. Queremos abrir novas por-
Conselheiros tas para a difusão do conhecimento e con-
Roberto Gomes (ES) tribuir para a educação médica no país.
Adonis R. L. de Carvalho (PE) Gostaríamos de convidá-lo(a) a participar
Hiram Silveira Lucas (RJ) de edições futuras, enviando-nos artigos cien-
Luiz Carlos Calmon Teixeira (BA) tíficos. Dessa forma, cooperamos para o aper-
Secretaria Executiva feiçoamento profissional, pessoal e para o al-
Rua Pará, 197 – Pituba cance de resultados mais efetivos em
CEP 41830-000 – Salvador – BA prevenção, pesquisa, diagnóstico e tratamen-
Tel.: (71) 3240-4868 – Fax: (71) 3248-9134 to do câncer.
E-mail: socancer@lognet.com.br Boa leitura!
Site: www.sbcancer.org.br
Reconhecida de utilidade pública federal: Ricardo César Pinto Antunes
Decreto no 73.729 de 4 de março de 1974. Editor-chefe
CGC: 13.525.266/0001-08
SUMÁRIO
Original • Original
Análise de contraturas capsulares em pacientes submetidas à reconstrução mamária com próteses
Analysis of capsular contractures in patients undergoing breast reconstruction with prosthesis
Gustavo Zucca-Matthes, Raphael Luiz Haikel, Ana Carolina Pinsetta Crozera, Ana Luiza Pereira Quinto, Marcos Duarte de Mattos,
Ana Paula de Freitas Porto Fonseca, Gustavo Henrique Fabri Pereira Ribeiro, René Aloisio da Costa Vieira ��������������������������������������������������������������������������������������������������� 5
Câncer de via aérea inferior na Amazônia: uma análise epidemiológica entre os municípios do
Estado do Pará – avaliação dos últimos dez anos
Low respiratory tract cancer in Amazonia: an epidemiological analysis between the cities of Pará –
evaluation of the past decade
Luis Eduardo Werneck de Carvalho, Rosa de Fátima Marques Gonçalves, Bruno Batista da Cunha Filho, Raina Caterina Coelho Arrais ����������������������������������������������� 13
Análise do perfil epidemiológico, clínico e da sobrevida global de pacientes portadores
de neoplasia em estágio avançado atendidos no Hospital Universitário Evangélico de Curitiba
Analysis of overall survival, epidemiological and clinical profile of patients with advanced malignancy treated
at Evangélico University Hospital in Curitiba
Eurico Cleto Ribeiro de Campos, Fábio Roberto Fin, Jonathan Simões, Alexandre de Almeida Guedes, Rafaella Higashi, João Carlos Simões ���������������������������������������� 20
Logística e limitações para a implantação de um banco de tecidos e tumores em hospital
público de pequeno/médio porte
Logistics and limitations for the implementation of a tumor and tissue bank in a small/mid-sized public hospital
Karine Sampaio Lima, Pollyana Anício Magalhães Gontijo, Ana Paula Drummond-Lage, Alberto Julius Alves Wainstein .������������������������������������������������������������������������� 25
Qualidade de vida em oncologia: análise dos resultados entre pacientes tratados com
quimioterapia em estágio clínico avançado
Quality of life in oncology: analysis of mean results among patients treated with chemotherapy in advanced clinic stage
Eurico Cleto Ribeiro de Campos, Suelen Pereira Cordeiro, Jane da Costa Testoni, Paulo Fabrício Nogueira Paim, Fábio Roberto Fin, Christiane Costa Calciolari ������� 34

Relato de caso • Case Report


Rápido desenvolvimento de metástases hepáticas em paciente com adenocarcinoma de pâncreas
Rapid development of liver metastases in patient with pancreatic adenocarcinoma
Enio Campos Amico, José Jorge Maciel Neto, Sulene Cunha Souza, José Roberto Alves ���������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������� 39
Caso raro de lipossarcoma desdiferenciado em períneo
Rare case of dedifferentiated liposarcoma in perineum
Fumiê Ishizawa, Higino Felipe Figueiredo, Marco Antônio Ricci Correa Júnior, Ênio Lucio Duarte Coelho, Gustavo Cardoso Guimarães ��������������������������������������������� 42
Ligadura de ducto pancreático para fístula pancreática pós-duodenopancreatectomia
Pancreatic duct ligature for pancreatic fistula post pancreaticoduodenectomy
Alexandre César Dal Pizzol, Josué Bayer de Carvalho, Marlene Raimunda Andreola Perazzoli�������������������������������������������������������������������������������������������������������������������� 45
Carcinoma de células de Merkel: um caso cutâneo primário fatal com padrão
imuno-histoquímico atípico
Merkel cell carcinoma: a fatal primary cutaneous case with an atypical immunohistochemical pattern
Emmanuel Rodrigues de França, Silvana Maria de Morais Cavalcanti, Ângela Rapela de Medeiros, Aldejane Rodrigues Gurgel,
Eliane Ruth Alencar, Márcia Almeida Galvão Teixeira.���������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������� 48

iv
Original • Original

Análise de contraturas capsulares em pacientes submetidas à


reconstrução mamária com próteses

Analysis of capsular contractures in patients undergoing breast reconstruction


with prosthesis
Gustavo Zucca-Matthes1,2, Raphael Luiz Haikel2, Ana Carolina Pinsetta Crozera2, Ana Luiza Pereira Quinto3, Marcos Duarte de Mattos3,
Ana Paula de Freitas Porto Fonseca3, Gustavo Henrique Fabri Pereira Ribeiro2, René Aloisio da Costa Vieira2
1
Programa de Pós-Graduação em Mastologia da Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista (Botucatu-Unesp), Botucatu, SP.
2
Departamento de Mastologia e Reconstrução Mamária do Hospital de Câncer de Barretos, Fundação Pio XII, Barretos – SP, Breast Unit., Breast Centres Network.
3
Departamento de Radioterapia do Hospital de Câncer de Barretos, Fundação Pio XII, Barretos – SP, Breast Unit., Breast Centres Network.

Resumo
Introdução: o tratamento oncoplástico do câncer de mama inclui não apenas a remoção do tumor, como
também a forma, a simetria e a reconstrução do contorno mamário, visando à melhoria da qualidade de
vida. Merece destaque o uso de próteses mamárias. Objetivo: avaliar os principais fatores relacionados à
contratura capsular em pacientes portadoras de próteses mamárias. Métodos: estudo retrospectivo de
pacientes submetidas à reconstrução imediata com colocação de próteses, com e sem radioterapia
adjuvante. Resultados: foram analisadas 37 pacientes, com idade média de 41 anos. A maioria foi
acometida por carcinoma ductal infiltrante (83,8%), em estádios II e III (68,3%). Setenta e oito por cento
(78,4%) das pacientes foram submetidas à radioterapia com o implante. O tempo de seguimento médio
foi de 73 meses, observando-se recorrência a distância ou óbito em 27% (10) das pacientes. Dezessete
(49,5%) pacientes desenvolveram contratura capsular, sendo a radioterapia sobre a prótese o principal
fator associado (χ2 = 0,004). Conclusão: a radioterapia associada à reconstrução mamária com prótese
relaciona-se à elevação da taxa de contratura capsular; porém, a reconstrução imediata com prótese deve
ser considerada, visando a combinar, em um único procedimento, a melhoria da qualidade de vida e a ma-
nutenção dos princípios oncológicos.
Palavras-chave: neoplasias da mama, tratamento, cirurgia oncoplástica, implante de silicone, radiote-
rapia, complicações.

Abstract
Introduction: The oncoplastic treatment of breast cancer includes not only the removal of the tumor,
as well as the shape, symmetry and breast reconstruction contour, in order to improve the quality of
life. We should note the use of breast implants. Objective: to evaluate the main factors related to
capsular contracture in patients submitted to breasts implants. Methods: it is a retrospective study of
patients undergoing immediate breast reconstruction with prosthesis with and without radiotherapy.
Results: we analyzed 37 patients with a median of 41 years of age. Most patients were affected by
invasive ductal carcinoma (83.8%), and clinical stage II and III (68.3%). 78.4% of patients undergoing
radiotherapy after breast surgery. The average follow-up was 73 months, where we observed 27% (10)
of recurrence or cancer death. Seventeen (49.5%) patients developed capsular contracture and radio-
therapy on the prosthesis was the main factor related to this condition (χ2 = 0.004).

Recebido: 15/8/2013
Aprovado: 17/9/2013

Correspondência: Gustavo Zucca-Matthes – Rua Antenor Duarte Villela, 1331, bairro Dr. Paulo Prata, Barretos – SP, CEP 14784-400
E-mail: ambulatoriomulher@hcancerbarretos.com.br
Conflitos de interesse: não existem

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 5-125


Análise de contraturas capsulares em pacientes submetidas à reconstrução mamária com próteses

Conclusion: radiation therapy associated with prosthesis breast reconstruction is related with elevated
capsular contracture. The immediate reconstruction with prosthesis should be considered, as it is a
single procedure that increases the quality of life and maintaining the oncologic principles.
Keywords: breast neoplasms, treatment, oncoplastic surgery, silicone implant radiotherapy, complica-
tions.

Introdução
Estima-se que, anualmente, apareçam 1,38 milhão lateral (Lei 12.082).9 Em um ambiente de traba-
de casos novos de câncer de mama no mundo,1 sen- lho privado, associado à boa remuneração e sem
do que 60% ocorrerão em países em desenvolvi- filas de pacientes almejando por tratamentos on-
mento.2 No Brasil, estimam-se 52.680 casos novos3 cológicos, aquele pode ser o panorama ideal. Con-
para 2013, o que torna o câncer de mama um pro- tudo, a realidade não é bem essa. A maior parte
blema de saúde pública. dos centros de treinamento oncológico não possui
O tratamento cirúrgico mudou radicalmente nas equipes treinadas nem dispostas a direcionar
últimas décadas, visto a segurança no tratamento recursos para reconstrução mamária, pois estão
conservador,4,5 o aparecimento do linfonodo senti- preocupados em sanar o tratamento oncológico
nela6 e a introdução da cirurgia oncoplástica na ro- imediato – e, inevitavelmente, esquecem que as
tina diária.7 Atualmente, é considerado padrão-ou- reconstruções são etapas eminentes do mesmo.
ro no tratamento: escutar a paciente, individualizar Assim, hoje, são realizadas em torno de 5% de re-
seus anseios frente aos desafios oncológicos e, sem- construções mamárias no Brasil.10 Esta é uma
pre que possível, proporcionar um remodelamento estatística alarmante e que necessita de reflexões.
mamário através de cirurgias oncoplásticas ou re- O uso de técnicas reconstrutoras que envolvam
construções mamárias. materiais aloplásticos e favoreçam a reconstrução
A reconstrução mamária ideal seria aquela que mamária em tempo único pode otimizar esses pro-
permitisse alcançar o resultado mais próximo possí- cedimentos e ser uma saída. A principal crítica
vel da mama contralateral. Contudo, como mencio- permanece frente a resultados estéticos escassos,
nado por Cordeiro,8 o cirurgião reconstrutor precisa principalmente a longo prazo, e a casos que en-
estar preparado para encarar os desafios proporcio- volvem radioterapia.
nados pelas terapias oncológicas e, de algum modo, A radioterapia é fundamental para o controle lo-
adaptar-se a sobrepor obstáculos com o intuito de corregional do câncer de mama. Contudo, mostra-
compreender as mudanças contínuas que envolvem -se uma aliada ingrata das reconstruções mamárias
o tratamento. De maneira geral, a maioria das pa- e está associada a uma alta taxa de resultados des-
cientes com câncer de mama permanecem satisfei- favoráveis, principalmente em razão da contratura
tas e gratas com seus tratamentos, apesar de even- capsular.11,12,13
tuais resultados estéticos escassos. Este artigo visa a mostrar e discutir os dados ob-
Atualmente, existem muitas possibilidades ci- tidos em um Hospital Oncológico Terciário no Bra-
rúrgicas, e o espectro de técnicas reconstrutoras sil, relativos à sua experiência com reconstruções
varia desde o uso de retalhos dermoglandulares lo- mamárias com implantes e radioterapia.
cais e de materiais aloplásticos até a utilização de
retalhos autólogos e microcirúrgicos. Casuística e métodos
A indicação da técnica empregada dependerá Estudo retrospectivo, realizado em hospital onco-
da experiência da equipe, do local escolhido para lógico terciário, de pacientes submetidas à cirurgia
a cirurgia e, é claro, da realidade de cada situa- mamária e à reconstrução imediata com prótese,
ção. No Brasil, hoje, vigora a Lei no 9.797, que dá no período de 1/2006 a 6/2008, com o objetivo de
às pacientes direito à cirurgia reconstrutora. Esta avaliar as características das pacientes submetidas
sofreu um adendo, ampliando os direitos à recons- a esse tipo de reconstrução, bem como os múlti-
trução imediata e associada à simetrização contra- plos aspectos relacionados às próteses mamárias.

6 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 5-12


GZucca-Matthes et al.

Nesse período, a indicação de prótese ocorreu nas Tabela 1. Características gerais


pacientes submetidas à mastectomia poupadora de das pacientes analisadas.
pele, realizada quando a relação mama/volume de tu- Variável Categoria  No  %
mor mostrou-se desfavorável; e nos casos de tumores pacientes 
multifocais ou multicêntricos associados à ausência
Estadiamento clínico 0 2 5,4%
de comprometimento cutâneo e a baixas comorbida- patológico
des. Nas pacientes submetidas à quadrantectomia,
optou-se por colocação de prótese visando à adequa- I 9 24,3%
ção de volume em relação à mama contralateral. A in-   II 22 59,4%
dicação radioterápica foi realizada em todas as qua-
  III 4 10,8%
drantectomias, e nas mastectomias levou-se em
consideração o tamanho tumoral (tumor > 5 cm), tu-  Histologia Ductal 31 83,8%
mores grau III, infiltração cutânea, invasão extracap-   Lobular 5 15,5%
sular, margem comprometida ou exígua, quatro ou
  Medular 1 2,7%
mais linfonodos comprometidos.14
Avaliaram-se, através de ficha padronizada, as Grau histológico Grau I + 28 63,0%
características do tumor e da paciente, o tratamen- II
to realizado e o seguimento. Considerou-se variá-   Grau III 9 27,0%
vel de interesse a contratura capsular e a necessi-
Lado do tumor Direito 23 62,2%
dade de nova cirurgia sobre a prótese, decorrente
da contratura capsular. Avaliou-se a frequência das   Esquerdo 13 35,1%
características das pacientes (Tabela 1). Na com- Comorbidade Ausente 32 88,9%
paração dessas características e dos possíveis fato- tabagismo*
res que pudessem estar relacionados à contratura
  Presente 4 11,1%
capsular, utilizou-se o teste do qui-quadrado; e, na
presença de variáveis com número igual ou inferior Comorbidade IMC* Eutrófico 19 54,3%
a 5, utilizou-se o teste de Fisher. Por causa do nú- Sobrepeso 9 25,7%
mero de casos, agruparam-se variáveis visando à
análise estatística. A última data de coleta de da- Obeso 7 20,0%
dos foi 31 de agosto de 2013. Para análise da so- * Variáveis válidas.

brevida atuarial, utilizou-se o método de Kaplan e


Meier. Os dados foram tabulados e avaliados no
programa IBM SPSS® v20.0.

Resultados
No período, foram realizadas 73 reconstruções ma- imediata (30 dias) foi baixa, observando-se necro-
márias, e em 59 foi realizado o implante de próte- se (13,5%), infecção (5,4%), seroma (5,4%), hema-
se mámaria, sendo 37 decorrentes de reconstrução toma e deiscência (2,7%); porém, todos os eventos
mamária imediata, que fizeram parte do presente foram tratados clinicamente, não ocorrendo perda
estudo. Destas, a idade mediana das pacientes foi de prótese.
de 41 anos (22-62). Quimioterapia adjuvante foi realizada em 78,4%
Frente às características do tumor, 83,8% apre- (29) das pacientes, e a hormonoterapia adjuvante,
sentavam histologia ductal, 68,3% apresentavam em 70,3% (26). A radioterapia adjuvante foi realiza-
estádio II e III. No que se refere às comorbidades, da em 78,4% (29) das pacientes, sendo também rea-
11,1% fumavam, 20% eram obesas, não se obser- lizada na fossa supraclavicular, em 40,5% (15), e na
vando diabéticas no grupo (Tabela 1). axila, em 16,2% (2). A dose no plastrão mamário foi
Quimioterapia neoadjuvante foi realizada em de 5.040 cGy, com frações de 180 Gy, realizando-se
18,9% (7) das pacientes, e nenhuma paciente re- boost nas quadrantectomias. Das 29 pacientes sub-
cebeu hormônio ou radioterapia. No tratamento ci- metidas à radioterapia, 26 utilizaram o Acelerador
rúrgico, 11 (29,7%) foram submetidas à ressecção Linear e 3 utilizaram o Cobalto.
de linfonodo sentinela e 26 (70,3%), à linfadenec- O tempo de seguimento médio e mediano foi de
tomia axilar. A taxa de complicação pós-operatória 73 meses (29 – 137 meses), sendo o seguimento

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 5-127


Análise de contraturas capsulares em pacientes submetidas à reconstrução mamária com próteses

mínimo de 45,6 meses em paciente que não fale- Discussão


ceu de câncer. No final do estudo, 73% (27) encon- É evidente a evolução sofrida pelo tratamento do cân-
traram-se vivas e sem a doença, 16,2% (6) apresen- cer de mama. Passou-se de cirurgias radicais e muti-
taram recorrência a distância e 4 (10,8%) foram a lantes a um tempo de individualização e terapia-alvo
óbito por câncer. Na avaliação da sobrevida atua- dirigida. Independentemente da melhor terapia a ser
rial, 91,5% das pacientes encontram-se vivas aos empregada, busca-se um aumento da sobrevida livre
60 meses (Figura 1). Observou-se apenas uma re- de doença e da sobrevida global, em paralelo a ganhos
cidiva locorregional (2,7%), sendo em paciente ECI, em relação à qualidade de vida. Nesse sentido, a re-
triplo negativo, submetida à quadrantectomia asso- construção mamária deixou de ser mera coadjuvante
ciada a implante de prótese. no palco do tratamento do câncer de mama e, hoje,
No período de seguimento, 45,9% (17) desen- associada a várias técnicas de cirurgia oncoplástica
volveram contratura capsular, sendo classificadas mamária, permite atuação de gala no sentido de res-
em Baker I, II, III e IV, representando 2,7%, 10,8%, gatar a autoestima das pacientes.
10,8% e 21,6% das pacientes, respectivamente. O Contudo, é importante mencionar que recons-
tempo mediano para a contratura foi de 23 meses trução mamária não é, e não deve ser considerada,
(variação 1 a 57 meses), sendo o histograma apre- uma cirurgia estética. Portanto, fica inviável ao ci-
sentado na Figura 1. Quatro pacientes (10,4%) rurgião reconstrutor prometer resultados, porque
apresentaram infecção e perda de prótese, sendo ele depende de muito mais variáveis do que mera-
todos os eventos tardios, ocorrendo em média aos mente da técnica cirúrgica empregada pelo melhor
45,4 meses após o tratamento. Quatro pacientes dos cirurgiões.
(10,4%) necessitaram de dois ou mais procedi- No Brasil, hoje, rege a lei federal que obriga a
mentos para correção da contratura e adequação reconstrução mamária imediata nos serviços de re-
da prótese. ferência do Sistema Único de Saúde (Lei 12.802).9
Na análise dos fatores relacionados à contratu- No entanto, há outra lei que obriga o tratamento
ra e à necessidade de troca de prótese (Tabela 2), de pacientes em 60 dias após o diagnóstico anato-
observou-se que nessa casuística o único fator que mopatológico (Lei 12.732),15 e nesses mesmos ser-
mostrou diferença significativa foi a radioterapia viços, existem filas de pacientes oncológicos aguar-
realizada sobre a prótese (χ2; p=0,004). dando pelo tratamento primário. Seria justo ocupar

1,0
(a) Sobrevida
Censura (b) 5
Média = 23,46
Desvio-padrão =
16,742
0,8 N = 17
4
No. de eventos

0,6
% Sobrevida

0,4 2

0,2 1

0,0 0
0 12 24 36 48 60 72 84 0 10 20 30 40 50 60

Tempo (meses) Tempo (meses)

Figura 1. Seguimento das pacientes: (a) sobrevida atuarial; (b) histograma do número de
primeiros eventos relacionados à contratura capsular em relação ao tempo.

8 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 5-12


GZucca-Matthes et al.

Tabela 2. Análise dos fatores relacionados às condições da paciente/tumor e ao tratamento locorregio-


nal e sua influência em relação à contratura capsular.

Variável Categoria Sem Com Total p


contratura contratura
Estadiamento 0+I 6 (75,0%) 2 (25,0%) 8 0,283
  II 8 (42,1%) 11 (57,9%) 19
  III 6 (60,0%) 4 (40,0%) 10
Lado* Direito 14 (60,9%) 9 (39,1%) 23 0,493
  Esquerdo 6 (46,2%) 7 (53,8%) 13
Fumo* Ausente 18 (56,2%) 14 (43,8%) 32 0,326
  Presente 1 (25,0%) 3 (75,0%) 4
IMC* Eutrófico 8 (42,1%) 11 (57,9%) 19 0,126

  Sobrepeso 6 (66,7%) 3 (33,3%) 9


Obeso 6 (85,7%) 1 (14,3%) 7
Cirurgia MSS 17 (58,6%) 12 (41,4%) 29 0,428
  mamária Quad + prótese 3 (37,5%) 5 (62,5%) 8
Cirurgia PLS 14 (53,8%) 12 (46,2%) 26 1,000

axilar Linfadenectomia 6 (54,5%) 5 (45,5%) 11


Complicação Ausente 15 (55,6%) 12 (44,4%) 27 1,000

pós-operatória# Presente 5 (50,0%) 5 (50,0%) 10


Necrose Ausente 19 (59,4%) 13 (40,6%) 32 0,159
pós-operatória Presente 1 (20,0%) 4 (80,0%) 5
Radioterapia Ausente 8 (100,0%) 0 8 0,004

adjuvante Presente 12 (41,4%) 17 (58,6%) 29


Radiodermite Ausente 13 (61,9%) 8 (38,1%) 21 0,331
Presente 7 (43,8%) 9 (56,2%) 16
Estado VSD 14 (51,9%) 13 (48,1%) 27 0,725
VCD/MOCA 6 (60,0%) 4 (40,0%) 10
* Excluídos casos; # avaliado como qualquer complicação no pós-operatório imediato; Quad: quadrantectomia; MSS: Mastectomia Skin Sparing;
PLS: pesquisa do linfonodo sentinela; VSD: vivo sem doença; VCD: vivo com doença; MOCA: morte por câncer.

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 5-129


Análise de contraturas capsulares em pacientes submetidas à reconstrução mamária com próteses

uma sala de cirurgia, durante grandes períodos, para corregionais,4,21 e muitas pacientes apresentarão re-
tratar apenas uma paciente, incluindo sua recons- corrência a distância sem recorrência locorregio-
trução, enquanto, no mesmo período, poderia ter nal, como observado nesta série. No entanto, se
sido extirpado o câncer de outras três, porém sem fossem submetidas à reconstrução tardia, talvez não
reconstrução imediata? Sem dúvida, é uma ques- fossem submetidas ao tratamento reconstrutor, vis-
tão logística e filosófica que merece ser debatida to que o foco principal do tratamento deve ser o
em esferas mais elevadas da gestão de saúde públi- oncológico. Assim, mantém-se o preceito oncológi-
ca. Atualmente, o número de pacientes é elevado, co de diminuição de recorrência locorregional as-
o número de cirurgiões habilitados para a recons- sociada à elevação da qualidade de vida. Nessa ca-
trução é restrito, e nem sempre o cirurgião da mama suística, a recorrência locorregional ocorreu em
tem disponível um cirurgião plástico em sua equi- apenas 2,7% (uma) das pacientes. Esta foi subme-
pe, principalmente no contexto do SUS. O treina- tida à quadrantectomia com prótese. A quadrantec-
mento em oncoplastia leva tempo,16 fato que pode tomia com prótese encontra-se associada à eleva-
ser aprimorado através de centros de treinamento ção do risco de contratura capsular,13 sendo, nesta
em oncoplastia17 e, na medida em que o cirurgião série, na ordem de 2,36 vezes (IC 0,472-11,82;
se prepara, o número de indicações de reconstru- p=0,296), já que tal procedimento não é mais rea-
ção se eleva.16 Aos cirurgiões da mama, cabe tratar lizado em nosso serviço.
suas pacientes da melhor forma que puderem e A contratura capsular é tempo-dependente, sen-
como puderem. do observada em 49,5% das pacientes, ocorrendo
Nesse sentido, tentar otimizar o tratamento on- em média 23,5 meses após a cirurgia (Figura 1),
cológico completo, proporcionando uma reconstru- tendo neste estudo elevado período de seguimen-
ção mamária com implantes para mulheres com to. A taxa de recorrência locorregional (2,7%) foi
câncer de mama, pode ser uma saída. Fato é que, baixa, sugerindo elevada segurança no procedimen-
uma vez optado pela reconstrução imediata com to. Portanto, preconiza-se a mastectomia poupado-
implantes, existe uma chance de aquele caso vir a ra de pele associada à reconstrução imediata com
ser submetido à radioterapia, tendo sido realizada implantes em tempo único, mesmo que seja neces-
em 78,4% das pacientes deste estudo. Considera- sário o uso da radioterapia. São procedimentos re-
mos que, se possível e dentro dos conceitos onco- lativamente simples, rápidos e que permitem um
lógicos, a reconstrução imediata deve ser realizada resgate da silhueta corporal imediato, diminuindo
com a prótese, deixando os retalhos miocutâneos o efeito mutilatório devastante para a grande maio-
para uso nos casos em que não foi possível o im- ria das mulheres.
plante no primeiro tempo, ou no tratamento das Pelos menos três fatores de risco para o aumen-
complicações. A utilização da radioterapia sobre o to de complicações devem ser enumerados: tumo-
retalho miocutâneo também se encontra relaciona- res avançados (T3 e T4), comprometimento axilar
da à contratura capsular,11,12,13 sendo o tratamento e tabagismo. Segundo Cowen et al.,12 pacientes
cirúrgico mais complexo e a possibilidade de resul- com nenhum, 1, 2, 3 ou todos esses fatores asso-
tados insatisfatórios elevada. ciados apresentam um risco respectivo de insuces-
Alguns autores sugerem estratégias para evitar so com o procedimento de 7%, 15,7%, 48,3% e
complicações nesses casos. Contudo, recomendam 100%. Essa modalidade reconstrutora preconizada,
a colocação de expansores, seguidos de substitui- sem dúvida, está associada à maior taxa de compli-
ção por implante e radioterapia.12,18 Por outro lado, cações. Segundo Drucker-Zertucke et al.,22 mais de
essa sugestão levaria a mais procedimentos em se- 50% das pacientes reconstruídas com implantes te-
gundo tempo, o que implicaria novamente um con- rão complicações e, além disso, estarão dispostas a
gestionamento cirúrgico, sendo, portanto, incom- cirurgias corretoras sequenciais. Este é um impor-
patível com boa parte da realidade dos centros de tante ponto a ser discutido. Não basta ao cirurgião
referência nacionais. reconstrutor fazer a cirurgia, cabe a ele subestimar
Ao realizar a cirurgia imediata, dois fatos devem as expectativas das pacientes em relação ao proce-
ser considerados: a qualidade de vida e a recorrên- dimento. Transcorrido o período de complicações
cia locorregional. A preservação do contorno ma- imediatas com o risco inicial de perda da prótese,
mário melhora a qualidade de vida,19,20 e, sob essa observam-se as complicações tardias, como a con-
ótica, deve-se considerar a reconstrução imediata. tratura capsular, a infecção, a elevação da altura da
A radioterapia diminui as taxas de recorrência lo- prótese e as assimetrias, decorrentes da ausência

10 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 5-12


GZucca-Matthes et al.

de simetrização imediata, ou da alteração do peso Cordeiro et al.8 levantaram uma discussão atual so-
corpóreo da mulher, o qual determina a necessida- bre este tema, que converge para a problemática na-
de de procedimentos sequenciais. Nesta série, ob- cional. Mostram que as reconstruções mamárias ime-
servou-se infecção tardia em 10,4% das pacientes, diatas com implantes, envolvendo um ou dois tempos,
implicando perda da prótese; e 10,4% das pacientes proporcionam uma solução cirúrgica simples para pa-
necessitaram de múltiplos procedimentos conside- cientes em estádio clínico II e III, que devem ser sub-
rados aceitáveis. Quanto mais orientada a paciente, metidas seguramente a tratamentos neoadjuvantes/ad-
melhor a aceitação dos resultados, visto que a reti- juvantes e à radioterapia. Enfatiza que essas pacientes
rada da mama é definitiva, e os achados, por melho- geralmente são extremamente gratas e permanecem
res que sejam, encontram-se distantes de um ideal satisfeitas com o tratamento empregado, apesar dos
de perfeição, já que, infelizmente, se trata de um potenciais resultados escassos. Além disso, alertam que
tratamento oncológico, cujo objetivo primário é este, os cirurgiões reconstrutores precisam trabalhar sem-
sendo o objetivo secundário o contorno corporal. pre na busca de soluções para suas pacientes, apesar
Existem pacientes que, pela sua história de vida pes- dos desafios impostos pelas terapias oncológicas, e pre-
soal, colocam a beleza à frente de seus desejos de cisam estar preparados para confrontar novos desafios,
cura. Esses casos merecem ser tratados individual- como mudanças nas modalidades terapêuticas, que
mente e, muitas vezes, com apoio psicológico e até continuarão ocorrendo.
psiquiátrico em paralelo. Cirurgias sequenciais, se
necessárias ou solicitadas, devem e podem ser fei- Conclusão
tas. Contudo, cabe à equipe deixar claro que não são A reconstrução mamária é parte eminente do trata-
urgentes, ficando a critério de cada serviço e em fun- mento oncológico do câncer de mama. A reconstru-
ção de sua demanda, criando-se uma sequencia es- ção ideal seria aquela que permitisse a reconstrução
pecial para esses procedimentos. Assim, as pacien- mais próxima possível da mama tratada ou da con-
tes se tornam conscientes e acabam aceitando essa tralateral. Muitas variáveis são envolvidas, o que deve
realidade de uma forma mais amena. A literatura é estimular o cirurgião a discutir profundamente as
clara em mostrar complicações associadas a esses possibilidades e perspectivas com suas pacientes. O
procedimentos e à radioterapia. Por outro lado, mos- momento perfeito para sua realização dependerá de
tra um contraponto ao relatar que 72% das pacien- cada ambiente e da experiência de cada equipe, as-
tes manteriam seus tratamentos idênticos aos reali- sim como a modalidade cirúrgica a ser empregada.
zados, apesar de um escasso resultado estético, O uso de implantes na reconstrução mamária, se-
comparando aos de pacientes que não foram sub- guida por radioterapia, aumenta as taxas de compli-
metidas à radioterapia.18 De maneira geral, percebe- cações. Contudo, elas mostram-se aceitáveis, tendo
-se que, apesar da contratura capsular, as pacientes em vista seus benefícios para a maior parte dos pa-
mantêm uma boa satisfação.23,24 cientes. De maneira consciente, permite uma oti-
Como se não bastasse o grande volume de pacien- mização do tratamento oncológico real, muitas ve-
tes, a realidade dos países em desenvolvimento é agra- zes próxima do ideal.
vada pelos diagnósticos realizados tardiamente. Por-
tanto, isso passa a ser um agravante no tratamento, já Agradecimentos
que o uso da radioterapia nesses casos é certo. A Agradecemos aos colegas Rodrigo Augusto Depieri Mi-
reconstrução imediata, sob a forma da mastectomia chelli e Antônio Bailão Jr que, apesar de não participa-
poupadora de pele, pode ser realizada no carcinoma rem deste estudo, contribuíram efetivamente nas ci-
mamário localmente avançado, desde que haja ade- rurgias, no tratamento e seguimento das pacientes.
quada seleção de pacientes.25,26 A elevada sobrevida
e a baixa recorrência observada nesta série (Figura 1) Referências
corroboram esse fato, inferindo a seleção adequada 1. Desantis NC, Siegel R, Bandi P, Jemal A. Breast cancer
das pacientes. O emprego de técnicas de cirurgia on- statistics, 2011. CA: Cancer J Clin 2011;61:409-18.
coplástica e reconstruções mamárias com implantes 2. Parkin C, Bullock I. Evidence-based health care: develop-
após as mastectomias oncoplásticas26,27 favorece a re- ment and audit of a clinical standard for research and its
impact on an NHS trust. J Clin Nurs 2005;14:418-25.
construção imediata e com segurança oncológica.
3. Ministério da Saúde Brasil. Estimativa 2012: incidência
Dessa forma, passa-se a oferecer a mais mulheres um
de câncer no Brasil. Rio de Janeiro. 2012.
conceito da oportunidade de reconstrução mamária
imediata, mesmo diante da radioterapia.

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 5-1211


Análise de contraturas capsulares em pacientes submetidas à reconstrução mamária com próteses

4. Veronesi U, Cascinelli N, Mariani L, Greco M, 17. Zucca-Matthes AG, Vieira RAC, Michelli RAD, Ribeiro
Saccozzi R, Luini A, et al. Twenty-year follow-up of a GHFP, Bailão JR A, Haikel RL, et al. The development
randomized study comparing breast-conserving surgery of an Oncoplastic Training Center - OTC. Int J Surg.
with radical mastectomy for early breast cancer. N Engl 2012; 10:265-269
J Med 2002;347:1227-32. 18. Cordeiro PG, Pusic AL, Disa JJ, McCormick B, Vanzee
5. Fisher B, Anderson S, Bryant J, Margoles RG, Deutsch K. Irradiation after immediate tissue expander/implant
M, Fisher ER, et al. Twenty-year follow-up of a randomi- breast reconstruction: outcomes, complications,
zed trial comparing total mastectomy, lumpectomy, and aesthetic results, and satisfaction among 156 patients.
lumpectomy plus irradiation for the treatment of invasive Plast Rec Surg. 2004;113:877-81.
breast cancer. N Engl J Med 2002;347:1233-41. 19. Curran D, Van Dongen JP, Aaronson NK, Kiebert G,
6. Giuliano AE, Kirgan DM, Guenther JM, Morton DL. Fentiman IS, Mignolet F, et al. Quality of life of
Lymphatic mapping and sentinel lymphadenectomy for early-stage breast cancer patients treated with radical
breast cancer. Ann Surg 1994;220:391-8; discussion mastectomy or breast-conserving procedures: Results of
98-401. EORTC trial 10801. Eur J Cancer. 1998; 34(3):
7. Audretsch W, Rezai M, Kolotas C, Zamboglou N, 307-314.
Schnabel T, Bojar H. Tumor-specific immediate 20. Arndt V, Stegmaier C, Ziegler H, Brenner H. Quality of
reconstruction in breast cancer patients. Perspect Plast life over 5 years in women with breast cancer after
Surg 1998;11:71-100. breast-conserving therapy versus mastectomy: a popula-
8. Cordeiro PG. Discussion: Current status of implant-ba- tion-based study. J Cancer Res Clin Oncol. 2008;
sed breast reconstruction in patients receiving postmas- 134:1311-1318.
tectomy radiation therapy. Plast Reconstr Surg. 21. Clark M, Collins R, Darby S, Davies S, Elphinstone P,
2012;130:524e-25e. Evans E, et al. Effects or radiotherapy and of differences
9. Roussef D, Padilha ARS. Lei 12.802 de 24 de abril de in the extent of surgery for early breast cancer on local
2013. Avaidable from: http://www.planalto.gov.br/ recurrence and 15-year survival: an overview of the
ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Lei/L12802.htm randomized trials. Lancet 2005; 366(9503):2807-2106.
10. Resende M. Reflexões oncoplásticas aos mastologistas 22. Drucker-Zertuche M, Bargallo-Rocha E, Zamora-Del RR.
brasileiros. Rev Bras Mastol. 2013;1:1. Radiotherapy and immediate expander/implant breast
11. Behranwala KA, Dua RS, Ross GM, Ward A, A’hern R, reconstruction: should reconstruction be delayed? Breast
Gui GP. The influence of radiotherapy on capsule J. 2011;17:365-70.
formation and aesthetic outcome after immediate 23. Carnevale A, Scaringi C, Scalabrino G, Campanella B,
breast reconstruction using biodimensional anatomical Osti MF, De Sanctis V, et al. Radiation therapy after
expander implants. JPRAS. 2006;59:1043-51. breast reconstruction: outcomes, complications, and
12. Cowen D, Gross E, Rouannet P, Teisseir E, Ellis S, patient satisfaction. Radiol Med. 2013 Jun 26.
Resbeut M, et al. Immediate post-mastectomy breast 24. Reefy S, Patani N, Anderson A, Burgoyne G, Osman H,
reconstruction followed by radiotherapy: risk factors for Mokbel K. Oncological outcome and patient satisfaction
complications. Breast Cancer Res Treat. 2010;121:627- with skin-sparing mastectomy and immediate breast
34. reconstruction: a prospective observational study. BMC
13. Taylor CW, Horgan K, Dodwell D. Oncologic aspects of Cancer. 2010;10:171.
breast reconstruction. The Breast. 2005; 14:118-130. 25. Giacalone PL, Rathat G, Daures JP, Benos P, Azria D,
14. Barros ACSD, Barbosa EM, Gebrim LH, Aanelli A, Rouleau C. New concept for immediate breast recons-
Figueira filho A, Del Giglio A, et al. Diagnóstico e truction for invasive cancers: feasibility, oncological
tratamento do câncer de mama. Projeto Diretrizes. safety and esthetic outcome of post-neoadjuvant therapy
Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de immediate breast reconstruction versus delayed breast
Medicina. Avaidable from: http://www.projetodiretrizes. reconstruction: a prospective pilot study. Breast Cancer
org.br/projeto_diretrizes/024.pdf. Res Treat. 2010; 122(2):439-51.
15. Roussef D, Cardozo JE, Padilha ARS. Lei 12.732 de 22 26. Zucca-Matthes AG, Uemura G, Kerr L, Matthes AC,
de novembro de 2013. Avaidable from: http://www. Michelli RA, Folgueira MA, et al. Feasibility of oncoplas-
planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/ tic techniques in the surgical management of locally
L12732.htm advanced breast cancer. Int J Surg. 2012; 10(9):500-5.
16. Vieira RAC, Matthes AGZ, Michellli RAD, Ribeiro 27. Zucca-Matthes GMA, Vieira RAC, Michelli RAD,
GHFP, Mendonça MLH, Bailão Jr A, et al. A oncoplas- Matthes ACS. The evolution of mastectomies in the
tia e o treinamento do cirurgião. Rev Bras Mastol. 2010; oncoplastic breast surgery era. Gland Surg. 2013;2:102-06.
20:66-70.

12 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 5-12


Original • Original

Câncer de via aérea inferior na Amazônia: uma análise epidemioló-


gica entre os municípios do Estado do Pará – avaliação dos últimos
dez anos

Low respiratory tract cancer in Amazonia: an epidemiological analysis between


the cities of Pará – evaluation of the past decade
Luis Eduardo Werneck de Carvalho1, Rosa de Fátima Marques Gonçalves2, Bruno Batista da Cunha Filho3, Raina Caterina
Coelho Arrais4

1
Médico, Pesquisador em Oncologia, Membro da Sociedade Brasileira de Profissionais de Pesquisa Clínica (SBPPC), da Sociedade Europeia de Oncologia (ESMO), da
Sociedade Norte-americana de Oncologia Clínica (ASCO) e da Sociedade Brasileira de Cancerologia (SBC). Pós-graduando em Ciências Médicas da Faculdade de Medicina
do ABC (FMABC), SP.
2
Fonoaudióloga, Pesquisadora em Oncologia, Mestre e Doutoranda em Ciências Médicas da FMABC, SP.
3
Acadêmico da Faculdade de Medicina, Instituto de Ciências da Saúde, Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém, PA.
4
Acadêmica da Faculdade de Medicina, Instituto de Ciências da Saúde, UFPA, Belém, PA.

Resumo
Objetivo: avaliar os dados do Departamento de Informática do SUS no Pará, no período de 1998 a
2011, relativos ao câncer de vias aéreas inferiores, pela sua alta incidência e mortalidade. Métodos:
realizou-se um estudo epidemiológico, descritivo, observacional, quantitativo, mapeando as razões de
morbidade e mortalidade por 100 mil habitantes, tendo como descritor geral a CID-10 – C33 e C34, que
correspondem à neoplasia maligna da traqueia, dos brônquios e dos pulmões. A análise estatística foi
realizada com o programa Epi Info versão 3.5.2. Resultados: a incidência de internações no período foi,
para cada 100 mil habitantes, 2,98 homens e 1,86 mulheres. No total, houve uma incidência de 2,88
internações, e o sexo masculino apresentou a maior média em todas as idades. O teste de análise da
variância demonstrou que a associação entre a faixa etária, os municípios do Estado do Pará e a presença
de câncer de vias aéreas inferiores foi significativa. Conclusão: esse tipo de câncer é prevalente na faixa
etária de 59 a 70 anos e municípios interioranos possuem taxas maiores de câncer, provavelmente, pelo
uso de formas mais primitivas de tabaco.
Palavras-chave: neoplasias da traqueia, neoplasias pulmonares, epidemiologia, análise quantitativa.

Abstract
Objective: to evaluate the data from the IT Department of the SUS in Pará, in the period between
1998 and 2011, relative to the lower airways cancer due to its high incidence and mortality. Methods:
we conducted an epidemiological, descriptive, observational, quantitative study, mapping the grounds
of morbidity and mortality per 100,000 inhabitants, using as general descriptor CID 10 – C33 and
C34, which correspond to malignant neoplasm of trachea, bronchi and lungs. Statistical analysis was
performed using Epi Info version 3.5.2 program. Results: the incidence of hospitalizations for the
period was, per each 100,000 inhabitants, 2.98 male and 1.86 female. The total was of 2.88 hospitaliza-
tions, males having the highest average in all ages. The test Analysis of Variance indicated that the age

Recebido: 6/2/2014
Aprovado: 7/3/2014

Estudo realizado na Oncológica/Brasil – Instituto de Ensino e Pesquisa em Oncologia.

Correspondência: Luis Eduardo Werneck de Carvalho – Av. Visconde de Souza Franco, 570, Belém – PA, CEP 66053-000, tel.: (91) 3223-5800
E-mail: dreduardocarvalho@oncologica.com.br
Conflitos de interesse: não existem
Sem fontes de financiamento

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 13-1913


Câncer de via aérea inferior na Amazônia: uma análise epidemiológica entre os municípios do Estado do Pará – avaliação dos últimos dez anos

group and the municipalities of the state of Pará are significantly associated with the presence of lower
airways cancer. Conclusion: this type of cancer is prevalent in the age group between 59-70 years, and
that provincial municipalities have higher cancer rates probably due to the use of more primitive forms of
tobacco.
Keywords: tracheal neoplasms, lung neoplasms, epidemiology, quantitative analysis.

Introdução
O câncer de traqueia, brônquios e pulmão origina-se to comum entre o sexo masculino, sendo pouco uti-
a partir de uma única célula epitelial transformada na lizado pela população feminina até a década de
via área traqueobrônquica. Um carcinógeno liga-se ao 1940, quando a globalização provocou mudanças
DNA de uma célula e a lesiona. Essa lesão resulta em significativas no comportamento feminino.12
alterações celulares, crescimento celular anormal e, Entretanto, é necessário lembrar que a porcenta-
posteriormente, em uma célula maligna.1-3 No Brasil gem de fumantes reduziu de 32%, na década de 1990,
e nos Estados Unidos, o tabagismo é a principal cau- para 17% na última década.13 Porém, há a população
sa de câncer de pulmão, laringe, cavidade oral, farin- de ex-fumantes, cujo risco de apresentar câncer de pul-
ge e esôfago, o que o torna potencialmente suscetível mão é alto.14 O risco populacional atribuível ao fumo
a medidas preventivas de saúde pública. Outros fato- é de 63% para ex-fumantes e de 71% para fumantes.15
res etiológicos, como exposição a poeira mineral, síli- O rastreamento desse tipo de câncer é controver-
ca, asbesto e pesticidas, também já foram relaciona- so. A tomografia computadorizada (TC) helicoidal
dos ao câncer de pulmão no Brasil.3-5 mostrou-se um bom exame para detecção precoce.
Os tumores primários da traqueia são raros. A in- Contudo, estudos randomizados comprovaram que
cidência é inferior a 0,2/1 milhão de habitantes.3 Re- havia muitos falsos-positivos.16 O tratamento depen-
presentam 2% de todos os tumores das vias aéreas e de, principalmente, do estadiamento e do tipo histo-
acometem, principalmente, pessoas entre 30 e 50 lógico. A ressecção cirúrgica por meio da lobectomia
anos.6 O tipo histológico mais comum, o carcinoma ou pneumectomia ainda é o procedimento mais efi-
de células escamosas, possui relação com o tabaco caz para o tratamento definitivo dessa neoplasia; to-
em sua maior parte.7,8 davia, apresenta morbi e mortalidade altas, predispon-
O câncer de pulmão continua a ser o câncer mais do, de forma aguda, à pneumonia e à insuficiência
incidente no mundo (12,3% de todos os casos novos respiratória. Cronicamente, pode reduzir a capacida-
de câncer), sendo também a causa de morte por cân- de do paciente de tolerar exercícios, afetando sua qua-
cer mais frequente no Brasil. Segundo o Instituto Na- lidade de vida.17,18
cional do Câncer, a análise da mortalidade por cân- O objetivo primário deste estudo foi avaliar os da-
cer de pulmão, entre 1970 e 2000, demonstra que as dos epidemiológicos do Departamento de Informá-
taxas apresentaram uma variação percentual relativa tica do Sistema Único de Saúde (Datasus), referen-
de mais de 57% entre homens, que passou de 7,73/100 tes aos casos de câncer de traqueia, brônquios e
mil habitantes para 12,3/100 mil; e de mais de 134% pulmões nos municípios do Estado do Pará, no pe-
entre mulheres, tendo passado de 2,33/100 mil para ríodo de 1998 a 2011; comparar com as taxas padro-
5,53/100 mil.9,10 A taxa de sobrevida de 5 anos de pa- nizadas por 100 mil habitantes e determinar o pa-
cientes com câncer de pulmão é incomum, possuin- drão temporal das internações e óbitos. Dessa forma,
do uma taxa inferior do que a de outras neoplasias.11 três hipóteses inicialmente foram formuladas:
A taxa de mortalidade entre homens é maior. 1. O gênero influencia no desenvolvimento de
Contudo, ao longo da última década, a incidência câncer de traqueia, brônquio e pulmão.
no sexo feminino tem aumentado, enquanto as in- 2. O câncer de via aérea inferior é prevalente
cidências no sexo masculino vêm sofrendo uma li- em pessoas idosas.
geira queda. Esse fato está relacionado com uma 3. Alguns municípios do Estado do Pará possuem
diminuição do consumo de cigarro por parte dos taxas maiores de câncer de vias aéreas, pelo
homens e com um aumento do consumo entre as uso de formas mais primitivas de tabaco, há-
mulheres. O tabagismo iniciou-se como um hábi- bito cultural adquirido dos indígenas.

14 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 13-19


Carvalho LEW et al.

Materiais e métodos pulações dos censos demográficos de 1998 a 2010;


Estudo ecológico de série temporal realizado a par- no ano de 2011, foi coletada uma estimativa dispo-
tir de dados referentes à morbi e à mortalidade hos- nibilizada pelo site do Datasus. As taxas de incidên-
pitalar do Sistema Único de Saúde (SUS), gerido cia foram calculadas segundo as variáveis: tempo,
pelo Ministério da Saúde, por meio da Secretaria de sexo, idade, óbito, média de permanência e espaço
Assistência à Saúde, em conjunto com as Secreta- (censo demográfico). Foram calculadas as taxas de
rias Estaduais de Saúde e as Secretarias Municipais incidência para cada 100 mil habitantes de cada gru-
de Saúde, sendo processado pelo Departamento de po, de 1998 a 2011. Esse cálculo teve como objeti-
Informática do SUS. As unidades hospitalares par- vo avaliar a dinâmica do câncer de via aérea inferior
ticipantes do SUS (públicas ou particulares conve- ao longo do período estudado.
niadas) enviaram as informações das internações efe- Na avaliação das internações ocorridas nos 143
tuadas através da Autorização de Internação municípios do Estado do Pará, utilizou-se o método
Hospitalar (AIH) e do Atestado de Óbito (AO), sen- de padronização direta sobre as taxas de incidência
do que os censos demográficos foram disponibiliza- obtidas na coleta, com o objetivo de comparar os lo-
dos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatís- cais de residência dos pacientes internados, traçan-
tica (IBGE). do um perfil mais detalhado desses tumores na po-
Com relação à amostra, foram selecionados todos pulação paraense em geral.
os pacientes notificados pelo Datasus com os descri- Para as análises quantitativas, os grupos, estrati-
tores C33 e C34, que, segundo a Décima Classifica- ficados por faixa etária, gênero e município, foram
ção Internacional de Doenças (CID-10), correspon- comparados utilizando o teste de Análise de Variân-
deram às neoplasias malignas de traqueia, brônquios cia (Anova).19 Os resultados foram expressos em mé-
e pulmões, por meio da AIH e do AO, no Estado do dia por 100 mil habitantes. Como foram admitidos
Pará, no período de 1998 a 2011. Assim, os critérios grupos e se pressupõe homogeneidade, sua verifica-
de inclusão corresponderam aos indivíduos que se en- ção foi realizada mediante um teste de homogenei-
quadraram nas especificações mencionadas acima. dade de variâncias apropriado. Como, por exemplo,
Dentre as variáveis disponibilizadas de morbi e o teste de Bartlett, citado por Li (1964).20
mortalidade na Base de Dados do Sistema de Infor- O teste de Wilcoxon-Mann-Whitney é uma prova
mação Hospitalar, foram coletadas: ano e mês de pro- não paramétrica e indicada para testar se duas amos-
cessamento da AIH e do AO; local de internação e tras independentes são provenientes da mesma po-
óbito; causa da internação e óbito, segundo a Classi- pulação ou de populações idênticas. Esse teste é apro-
ficação Internacional das Doenças; sexo; faixa etária; priado para averiguar se são iguais as medianas de
quantidade de AIHs pagas no período; e média de per- duas populações contínuas e independentes. As duas
manência das internações referentes às AIHs pagas. amostras envolvidas não precisam ter a mesma dimen-
Dessa maneira, este estudo envolveu a coleta são. A utilização desse teste ocorre quando as variá-
de dados preexistentes, retirados do banco de da- veis estudadas são mensuradas em escala, pelo me-
dos do SUS, disponível no endereço eletrônico do nos em nível ordinal.21 Em todas as análises, foi
Datasus. Fez-se uso, portanto, apenas de dados considerado nível de significância α=0,05.
públicos. Foi realizado segundo a Declaração de
Helsinque e o Código de Nuremberg, respeitan- Resultados
do os preceitos de pesquisa envolvendo seres hu- Foram notificadas 2.244 internações por câncer
manos (Res. CNS 196/96) do Conselho Nacional de via aérea inferior durante os anos de 1998 a
de Saúde. 2011, com predominância do sexo masculino (62%)
sobre o feminino (38%). O ano com o maior nú-
Procedimentos para cálculo mero de internações foi 2006, com 234 interna-
Foi realizada uma análise quantitativa dos dados ob- ções, correspondendo a 10,42% do valor total, sen-
tidos, demonstrando os resultados por meio de re- do que os anos de 2005 e 2010 obtiveram valores
cursos informacionais. Os dados foram analisados e de 10,02% e 10,33%, respectivamente. A incidên-
organizados em tabelas e figuras, e todos os cálculos cia de internações no período foi de 2,98/100 mil
foram realizados utilizando o programa Epi Info ver- habitantes masculinos e de 1,86/100 mil habitan-
são 3.5.2. tes femininas. No total, o Pará possuiu uma inci-
Os denominadores das taxas de incidência das dência de 2,88 internações para cada 100 mil ha-
internações e óbitos foram estimados a partir das po- bitantes.

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 13-1915


Câncer de via aérea inferior na Amazônia: uma análise epidemiológica entre os municípios do Estado do Pará – avaliação dos últimos dez anos

O sexo masculino foi o mais acometido em todos apresentando 0,42 internação ao ano. O teste de Bar-
os anos estudados, com exceção de 2007, em que as tlett teve p=0,0012, sendo o teste de Anova não apro-
mulheres foram mais acometidas, mas com valores priado, pela heterogeneidade da amostra. Assim, foi
brutos muito próximos: 86 casos femininos e 82 mas- utilizado o teste de Wilcoxon-Mann-Whitney. Cru-
culinos. No total, o estado possuiu uma relação de zando a idade com a média das internações, obteve-
incidência masculina/feminina de 1,63. -se p=0,023 (menor que α=0,05), o que comprova
Dessa forma, foi observado que o sexo masculino que há uma força de associação entre o pico de in-
possui maior média de número de internações em to- cidência, de 50 a 79 anos de idade, e o câncer de
das as idades, com 8,28 casos por 100 mil habitantes, pulmão, podendo ser considerado um fator de risco
enquanto o sexo feminino, 5,0867. Assim, foi realiza- para o seu desenvolvimento.
do o teste de Bartlett para iniquidade das variâncias Apesar do pouco número de casos registrados, o
da população, com o qui-quadrado de 3,6024; paciente com menos de 1 ano de idade é o que fica
p=0,0577. O p maior que 0,05 sugere que as variân- mais tempo internado, com uma média de 5,52 dias
cias da população são homogêneas, comprovando que de permanência no hospital, seguido pelos pacien-
a variável estudada é paramétrica. Sendo o teste de tes com mais de 80 anos, com 5,3 dias.
Anova apropriado, este teve p=0,33 – maior que o ní- Os municípios com as maiores médias de inter-
vel de significância (α=0,05) –, o que comprova que nação por 100 mil habitantes foram Medicilândia,
não existe uma força de associação entre o sexo e o com 8 casos; seguido por Anapu, com 7,09 casos;
desenvolvimento de câncer de pulmão. Portanto, o Abel Figueiredo, com 5,23 casos; e Belém, com 5,19
sexo masculino não é fator de risco para câncer de casos. Entretanto, como as amostras não são homo-
pulmão no Pará, de acordo com os testes estatísticos gêneas, ocorrendo números de casos isolados entre
realizados, rejeitando-se assim essa hipótese (Tabela os anos analisados, foi usado o teste de Wilcoxon-
1). Ainda é necessário ressaltar que os pacientes en- -Mann-Whitney para dados não paramétricos. Ob-
tre 1 e 4 anos, 5 e 9 anos, 10 e 14 anos e 30 e 39 anos teve-se p=0,0034. Como esse valor é menor que o
possuíram média aritmética maiores entre o sexo fe- nível de significância (α=0,05), há evidências sufi-
minino (Figura 1). cientes para aceitar a hipótese de que o ambiente
A faixa etária com maior número de internações influencia no câncer de pulmão.
foi a dos pacientes entre 60 e 69 anos, totalizando Foram relatados 556 óbitos no período estuda-
608 casos (27%), sendo a média aritmética de 43,42 do, sendo 64% deles do sexo masculino e 36% do
internações por ano. Em segundo lugar, foi observa- sexo feminino, representando 0,73 óbito para 100
da a faixa etária dos pacientes entre 50 e 59 anos, mil homens, e 0,42 óbito para cada 100 mil mu-
com 37,71 internações ao ano, seguida de 70 a 79 lheres. Em todos os anos, houve mais mortes mas-
anos, com 26,71 internações ao ano. Todavia, na úl- culinas do que femininas. A mortalidade no esta-
tima faixa etária foi notável, em sua evolução tem- do possui um padrão crescente, predominante em
poral, um aumento nos números de internações após ambos os sexos, com um aumento anual de 45%
o ano de 2000, assim como houve um decréscimo no sexo masculino e 36,5% no sexo feminino. Em
do número de casos acima dos 80 anos de idade e 1998, o Estado do Pará possuía uma incidência
abaixo dos 40. O menor número de internações anuais de 0,31 óbito para 100 mil habitantes, enquanto,
foi encontrado entre os pacientes menores de 1 ano, em 2011, o valor se elevou para 1,01 óbitos para

Tabela 1. Tabela de Estatística Descritiva das variáveis cruzadas sexo e média de internações
em todo o período estudado – 1998 a 2011.

Obs Total Média Variância Desvio-padrão


Feminino 12 61,0400 5,0867 28,4916 5,3378
Masculino 12 99,3700 8,2808 94,9663 9,7451
Mínimo 25% Mediana 75% Máximo Moda
Feminino 0,1400 0,8200 2,8150 8,4600 15,8700 0,1400
Masculino 0,2800 0,7100 4,8200 14,1000 27,5700 0,4200

16 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 13-19


Carvalho LEW et al.

250

200
80 anos e mais
70 a 79 anos
60 a 69 anos

150 50 a 59 anos
40 a 49 anos
30 a 39 anos
20 a 29 anos
100 15 a 19 anos
10 a 14 anos
5 a 9 anos
1 a 4 anos
50 Menor 1 ano

0
1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Figura 1. Gráfico demonstra o número de casos por faixa etária entre os anos de 1998 e 2011.

cada 100 mil. O ano com o maior número de mor- do, o estado não possuiu um valor crescente de in-
tes no estado foi 2011, demonstrando uma acen- ternações. Pelo contrário, após 1998, ocorreu uma
tuada linha crescente no número de óbitos a par- diminuição abrupta, culminando na taxa de 0,87/100
tir de 2008. mil habitantes, em 2000. Podemos encontrar esse
Os pacientes entre 60 e 69 anos foram os mais aco- desfecho esperado somente a partir de 2008, quan-
metidos pela doença, com 163 casos notificados. Con- do o estado começou a ter valores mais elevados do
tudo, os pacientes entre 70 e 79 anos foram os que ob- que no ano anterior.
tiveram a maior taxa de incidência para cada 100 mil Quando estudada a faixa etária da população inter-
habitantes, com 3,56 óbitos, sendo 10,21/100 mil ho- nada, chegou-se à conclusão de que os pacientes entre
mens e 4,1 óbitos/100 mil mulheres (Tabela 2). 60 e 69 anos possuem uma incidência maior em com-
paração com outras faixas etárias. Por ser de caráter in-
Discussão sidioso e estar relacionado ao uso constante de deriva-
No Brasil, o câncer de via aérea inferior continua a dos do tabaco, o câncer de via aérea inferior é esperado
ser um problema de saúde pública, tendo como gran- em uma população mais idosa. A população com faixa
de responsável o câncer de pulmão e, em menor nú- etária maior ou igual a 80 anos sofreu um aumento no
mero, o câncer de traqueia e o câncer dos brôn- número de internações a partir de 2008, juntamente
quios.1,3,10 O estudo demonstrou que a população com a população entre 40 e 49 anos.
masculina é certamente a mais afetada por essas neo- O Brasil sofre um processo de modificação no seu
plasias quando estudadas em conjunto. A maior in- perfil demográfico pela redução da mortalidade infan-
cidência de internações do sexo masculino corrobo- til, pela queda da fecundidade e pelo aumento da ex-
ra a literatura, que afirma que os homens são os mais pectativa de vida. Contudo, esse processo ocorre de
afetados.12 forma irregular nas regiões do país. O Pará sofre uma
É válido lembrar que os dados liberados pelo transição demográfica mais tardia do que os estados
Datasus são dependentes de notificações de profis- das regiões sul e sudeste. Segundo dados do Ministé-
sionais de saúde; portanto, seria esperado que, com rio da Saúde, o percentual de idosos (maiores de 60
a atualização dos métodos de coleta de informações, anos) na população geral paraense aumentou de 5,9%,
ocorresse um maior número de internações. Contu- em 2006, para 6,7%, em 2009. Esse aumento tam-

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 13-1917


Câncer de via aérea inferior na Amazônia: uma análise epidemiológica entre os municípios do Estado do Pará – avaliação dos últimos dez anos

Tabela 2. Número de óbitos, média anual de óbitos e taxa de mortalidade a cada 100 mil
habitantes por faixa etária no período de 1998 a 2011.

Número de óbitos Média anual Incidência a cada 100.000 hab.


Faixa etária Masc Fem Total Masc Fem Total Masculino Feminino Total
Menor 1 ano 1 1 2 0,071429 0,07 0,14 0,090385431 0,094011 0,046081

1 a 4 anos 0 0 0 0 0 0 0 0 0
5 a 9 anos 1 1 2 0,07 0,07 0,14 0,017427654 0,018123 0,008884
10 a 14 anos 2 2 4 0,14 0,14 0,28 0,035126759 0,03623 0,017835
15 a 19 anos 4 4 8 0,28 0,28 0,57 0,073497135 0,075063 0,037136
20 a 29 anos 10 1 11 0,71 0,07 0,78 0,111903587 0,011345 0,030985
30 a 39 anos 6 14 20 0,42 1 1,42 0,092811516 0,220376 0,078018
40 a 49 anos 22 25 47 1,57 1,78 3,35 0,485839973 0,573723 0,264469
50 a 59 anos 94 50 144 6,71 3,57 10,28 3,283640901 1,811681 1,280559
60 a 69 anos 107 56 163 7,64 4 11,64 6,311206166 3,352125 2,421287
70 a 79 anos 84 36 120 6 2,57 8,57 10,21728765 4,184937 3,56641
80 anos e mais 24 11 35 1,71 0,78 2,5 7,572745688 2,625254 2,377934
Total 355 201 556 25,35 14,35 39,71 0,736677 0,42 0,58

bém traz consigo o aumento na incidência de doen- tificam três tendências: a pauperização, a juveniliza-
ças que acometem essa população específica, princi- ção e a feminização do tabagismo. Estas são de
palmente as doenças crônico-degenerativas e as extrema importância, pois, na atualidade, as princi-
neoplasias, fato que pode explicar a elevação no nú- pais causas de morte em mulheres no Brasil são:
mero de internações nos últimos anos.13, 14 doenças cardiovasculares (infarto agudo do miocár-
A utilização de métodos mais detalhados de exa- dio e acidente vascular encefálico); em segundo lu-
me de imagem, como a TC helicoidal, proporciona gar, neoplasias (mama, pulmão e colo de útero) e,
o diagnóstico precoce, principalmente na faixa etá- em terceiro, doenças respiratórias. Todas as três são
ria dos pacientes entre 40 e 49 anos. Consegue, en- relacionadas, em algum grau, com o tabagismo.
tão, apresentar um aumento em seu diagnóstico, pos- Nos países desenvolvidos, a incidência de casos
sibilitando a internação para ressecção cirúrgica mais no sexo feminino vem aumentando significativamen-
precoce.15,16 Contrastando com as internações, os te, enquanto a incidência no sexo masculino tende
óbitos são mais atribuídos à população entre 70 e 79 a diminuir ou estabilizar-se. No entanto, o Estado
anos, fato que pode ser explicado pelo próprio diag- do Pará não demonstra esse padrão. O sexo femini-
nóstico tardio ou então pela debilidade natural do no sofre mais internações e óbitos ao longo dos anos
corpo humano nessa idade, impossibilitando cirur- estudados, porém o sexo masculino também possui
gias terapêuticas de grande porte. taxas aumentadas ao longo do mesmo período, de-
Um ponto importante que se deve levar em con- monstrando que essa tendência dos países desenvol-
sideração é a relação da mulher com a neoplasia de vidos e dos pontos mais desenvolvidos do Brasil ain-
via aérea inferior. A partir do século XX, a mulher co- da não chegou ao estado.
meçou a desempenhar um papel mais complexo na Sobre esse assunto, um ponto específico também
sociedade, ocupando cargos antes apenas controla- deve ser considerado. O Estado do Pará é o segundo
dos por homens.12 Com isso, o sexo feminino adqui- maior do Brasil, com 1.247.690 km², possuindo ape-
riu hábitos antes pertencentes aos homens, entre nas uma região metropolitana, localizada na região
eles, o hábito de fumar, aumentando, assim, a inci- nordeste, onde se concentram, aproximadamente, 2
dência e o número de internações, além da mortali- milhões de habitantes. O restante do território possui
dade por neoplasias associadas ao tabagismo entre como principais atividades econômicas a pecuária, a
as mulheres.17 Os dados epidemiológicos do tabagis- agricultura e o extrativismo mineral. Portanto, possui
mo feminino, sob a ótica da leitura sociológica, iden- uma população predominantemente rural. Logo, as

18 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 13-19


Carvalho LEW et al.

7. Al-Qadi MO, Artenstein AW, Braman SS. The “forgotten


políticas públicas de atenção básica e as campanhas
zone”: acquired disorders of the trachea in adults.
contra os fatores de risco para as neoplasias de pul- Respiratory Medicine, 2013; 107
mão tendem a ser pouco efetivas nessa população.3-5 8. Caiado A, Sá JM. Revisão dos tumores da traqueia – a
Corrobora esse fato a forte descendência indígena, le- propósito de um dos casos clínicos de tumor adenoide
vando ao uso de certas plantas da região como forma cístico. Rev Port de Pneu. 2008; 16 (4).
de fumo, substâncias sobre as quais não há estudos 9. Tyczynski JE, Bray F, Parkin DM. Lung cancer in Europe
científicos, não sendo possível determinar o quanto in 2000: epidemiology, prevention, and early detection.
esses agentes podem influenciar nos valores de cân- Lancet Oncol. 2003;4(1):45-55. Erratum in: Lancet
cer de via aérea inferior no Pará.3 Oncol. 2003;4 (7):396.
10. Zamboni M. Epidemiologia do câncer do pulmão. J
Resumo Pneumol 28(1) – jan/fev de 2002.
11. Little AG, Greer EG, Gaspar LE, Stewart AK. National
Há, no momento, uma epidemia mundial de doen-
survey of non-small cell lung cancer in the United
ças relacionadas com o tabagismo. O acesso à in- States: epidemiology, pathology and patterns of care.
formação e a prevenção do tabagismo são, atual- Lung Cancer, 57(3), 2007: 253-260.
mente, medidas governamentais necessárias ao 12. Boing AF, Rossi TF. Tendência temporal e distribuição
combate ao câncer de vias aéreas inferiores. espacial da mortalidade por câncer de pulmão no Brasil
entre 1979 e 2004: magnitude, padrões regionais e
Agradecimentos diferença entre sexos. Rev Bras de Pneu, 2007; 33 (5);
Ao Instituto de Ensino e Pesquisa em Oncologia 544-551
da Oncológica/Brasil, por nos acolher e nos incen- 13. Groot P, Munden RF. Lung cancer epidemiology, risk
tivar sempre a formular problemas e pesquisá-los. factors, and prevention. Radiologic Clinics of North
America, 50 (5), 2012: 863-876.
14. Schwartsmann G. Câncer de pulmão no Brasil: análise
Referências em um contexto internacional. Onco&, julho/agosto,
2012.
1. Castro MSM, Vieira VA, Assunção RM. Padrões
15. Charles SDC, Lynn TT, Matthay RA. Lung cancer:
espaço-temporais da mortalidade por câncer de pulmão
epidemiology, etiology, and prevention review article.
no Sul do Brasil. Rev. Bras. Epidemiol. 2004; 7 (2).
Clinics in Chest Medicine, 32 (4), 2011: 605-644.
2. Barros JA, et al. Diagnóstico precoce do câncer de
16. Abrão FC, Younes RN. Detecção precoce de câncer de
pulmão: o grande desafio. Variáveis epidemiológicas e
pulmão. Onco&, fev/mar. 2011.
clínicas, estadiamento e tratamento. J Bras Pneumol.
17. Guerra MR, Gallo CVM, Mendonça GAS. Risco de
2006; 32(3):221-7.
câncer no Brasil: tendências e estudos epidemiológicos
3. Instituto Nacional do Câncer (INCA). Prevenção e
mais recentes. Rev Bras de Canc 2005; 51(3): 227-234.
detecção: fatores de risco, tabagismo, alcoolismo, hábitos
18. Faresin SM, Stanzani F. Avaliação pré-operatória nas
alimentares. Disponível em http:// www.inca.gov.br/
ressecções pulmonares por neoplasia de pulmão.
2013.
19. Regazzi AJ, Silva CHO. Teste para verificar a igualdade
4. Viegas CAA. Noncigarette forms of tobacco use. J. bras.
de parâmetros e a identidade de modelos de regressão
pneumol. [online]. 2008, 34(12): 1069-1073.
não-linear. Dados no delineamento inteiramente
5. Steliga MA, Dresler CM. Epidemiology of lung cancer:
casualizado. Rev. Mat.Estat., São Paulo, 2004; 22 (3):
smoking, secondhand smoke, and genetics review.
33-45.
Surgical oncology clinics of North America, 20(4), 2011:
20. Li JCR. Statistical inference. Ann Arbor: Edwards
605-618.
Brothers, 1964; 1: 658.
6. Delábio LC, et al. Carcinoma adenoide cístico de
21. Siegel S, Castellan Jr NJ. Estatística não paramétrica
traqueia: ressecção traqueal transesternal seguido de
para ciências do comportamento. Edição: Artimed, 2006:
radioterapia com intensidade modulada. Rev. Med. Res,
448
2011; 13 (4); 272 – 276.

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 13-1919


Original • Original

Análise do perfil epidemiológico, clínico e da sobrevida global de


pacientes portadores de neoplasia em estágio avançado atendidos no
Hospital Universitário Evangélico de Curitiba

Analysis of overall survival, epidemiological and clinical profile of patients with


advanced malignancy treated at Evangélico University Hospital in Curitiba
Eurico Cleto Ribeiro de Campos1, Fábio Roberto Fin2, Jonathan Simões2, Alexandre de Almeida Guedes2
Rafaella Higashi3, João Carlos Simões4

1
Professor Adjunto de Cirurgia-geral da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Ponta Grossa, PR.
2
Cirurgião-geral e Oncológico do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba (HUEC), Curitiba, PR.
3
Aluna do 6º ano do Curso de Medicina da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, PR.
4
Médico Diretor-chefe do Centro de Oncologia (Ceon), Hospital Universitário Evangélico de Curitiba (HUEC), Curitiba, PR.

Resumo
Introdução: o câncer corresponde à segunda principal causa de morte. O elevado número de pacien-
tes que irá apresentar progressão da doença, ou diagnóstico de neoplasia em estágio avançado, justifica
a importância dos cuidados paliativos. Objetivo: identificar o perfil epidemiológico, clínico e patológi-
co de pacientes portadores de neoplasia em estágio avançado, bem como as taxas de sobrevida global
de acordo com o tipo neoplásico. Métodos: análise retrospectiva de 30 pacientes portadores de neo-
plasia em estágio avançado e atendidos no período de 2009 a 2011. Dados epidemiológicos, clínicos e
de sobrevida foram considerados. Resultados: predominaram pacientes do sexo masculino (60%),
sendo as neoplasias gastrointestinais as mais frequentes (53,3%). O tempo médio de seguimento foi de
3,4 meses. A dor foi o sintoma mais prevalente, presente em 60% dos pacientes. Nenhum paciente
referiu dores de intensidade grave. As menores taxas de sobrevida foram observadas entre os pacientes
portadores de neoplasias de cabeça e pescoço. Conclusão: o encaminhamento precoce dos pacientes
oncológicos aos cuidados paliativos e o adequado conhecimento do tratamento da dor, associados a
uma abordagem multidisciplinar, em contínua proximidade com o paciente, podem melhorar a sobrevi-
da e a qualidade de vida desses indivíduos.
Palavras-chave: cuidados paliativos, oncologia, neoplasias, dor.

Abstract
Introduction: cancer configures as the second leading cause of death. A high number of patients will
experience disease progression or cancer diagnosis at an advanced stage, making the palliative care very
important at this stage of the disease. Objective: to identify the epidemiological, clinical and patholo-
gical profile of patients with advanced-stage neoplasia, as well as overall survival rates according to the
neoplastic type. Methods: retrospective analysis of 30 patients with advanced malignancy treated
between 2009-2011. Epidemiological, clinical and survival data were considered.

Recebido: 16/2/2014
Aprovado: 27/3/2014

Estudo realizado no Serviço de Cancerologia Clínica e Cirúrgica do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba (HUEC), Curitiba, PR.

Correspondência: Eurico Cleto Ribeiro de Campos – Al. Augusto Stellfeld, 1908, Curitiba – PR, CEP 80730-150, tel.: (41) 3240-5000
E-mail: euricocrcampos@gmail.com
Conflitos de interesse: não existem

20 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 20-24


Campos ECR et al.

Results: patients were predominantly male (60%) with gastrointestinal malignancies (53,3%). The
median follow-up was 3.4 months. Pain was the most prevalent symptom in 60% of patients. No
patient reported any severe pain. The lower survival rates were observed among patients with head and
neck neoplasms. Conclusion: early referral to palliative care, as well an adequate knowledge of pain
management and putting the multidisciplinary team continuously next to the patient through a multi-
disciplinary approach, may improve survival and quality of life of patients in the end of life.
Keywords: palliative care, oncology, neoplasms, pain.

Introdução
O câncer corresponde à segunda principal causa Objetivos: analisar, em uma casuística inicial de 30
de morte, sendo superado unicamente pelas doen- casos, os principais fatores epidemiológicos e clíni-
ças cardiovasculares. Com o envelhecimento tar- cos, além das taxas de sobrevida global (SG), visando
dio da população, surge um aumento no número à identificação das principais neoplasias e dos princi-
de patologias crônicas diagnosticadas, destacando- pais fatores determinantes na evolução dos pacientes
-se o câncer como a principal.1,2 portadores de neoplasias em estágios avançados.
Para o ano de 2014, foram estimados cerca de
576 mil casos novos de neoplasias na população, Material e métodos
destacando-se as neoplasias de mama, colo de úte- Análise retrospectiva de pacientes atendidos pelo
ro e pulmão como as mais frequentes para o sexo serviço de cuidados paliativos do Hospital Univer-
feminino, e próstata, pulmão e câncer colorretal sitário Evangélico de Curitiba (HUEC), no perío-
para o sexo masculino.3 do de 2009 a 2011. Dados epidemiológicos, clíni-
Já que muitos pacientes diagnosticados irão apre- cos e anatomopatológicos foram coletados dos
sentar progressão da doença, apesar de todos os tra- prontuários dos pacientes disponibilizados no Cen-
tamentos e esforços empregados, os cuidados na tro de Quimioterapia do HUEC. Para análise do
fase final se tornam fundamentais para que o pa- performance status, utilizou-se a escala do Eastern
ciente mantenha a qualidade de vida e, principal- Cooperative Oncology Group (Ecog).6
mente, não sinta dor.4 Para a quantificação dos sintomas principais,
Há uma carência nacional de atendimento na utilizou-se a escala conversora de Edmond, que
área de cuidados paliativos em oncologia, sendo sig- quantifica os principais sintomas com valores de 0
nificativamente superior o número de pacientes (menor valor) a 10 (maior valor), de acordo com a
com doença avançada em relação ao número de intensidade referida pelo paciente.7
profissionais e instituições habilitadas em medici- Foram incluídos no estudo os pacientes porta-
na paliativa. Estima-se a existência de um médico dores de: neoplasias, classificados no CID-10 C;
oncologista para 140 casos de câncer diagnostica- neoplasia maligna confirmada histologicamente e
dos e um médico com formação paliativista para sem possibilidade de tratamento com intenção cura-
1.200 pacientes com doença oncológica diagnosti- tiva; e com idade superior a 18 anos. Foram excluí-
cada em estágio avançado.5 dos os pacientes sem confirmação histológica de
O novo código de ética médica contempla a im- neoplasia ou que necessitassem de cuidados palia-
portância da assistência paliativa ao determinar que tivos em especialidades distintas da oncologia.
o médico deve oferecer todos os cuidados paliati-
vos disponíveis, sem empreender ações diagnósti- Análise estatística
cas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, respei- Os dados foram tabulados em planilha Excel 7.0 e,
tando sempre a autonomia do paciente. Assim, posteriormente, convertidos para a análise estatística
surgem os cuidados ativos e promovidos por uma mediante o emprego do programa Statistical Package
equipe multidisciplinar, assegurando a dignidade for the Social Sciences (SPSS) versão 13.0 para
da pessoa, e apoiando-a em todos os momentos, Windows. A mensuração das variáveis quantitativas
além dos familiares e amigos. foi expressa pelas médias e respectivos desvios-

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 20-2421


Análise do perfil epidemiológico, clínico e da sobrevida global de pacientes portadores de neoplasia em estágio avançado atendidos no Hospital Universitário Evangélico de Curitiba

-padrão, e as variáveis qualitativas, pelas respectivas Todos os pacientes apresentaram algum tipo de sin-
frequências absolutas e relativas. Para a análise da so- toma em consulta inicial, sendo que a dor foi o mais
brevida, foi utilizado o modelo de Kaplan Mayer. frequente e presente em 60% dos casos. O Gráfi-
co 1 demonstra os principais sintomas identifica-
Resultados dos e as respectivas frequências.
A idade média dos pacientes foi de 61,9 anos, va-
riando entre 22 e 75 anos, com predomínio de pa- Gráfico 1. Distribuição dos principais sinto-
cientes do sexo masculino em 60%. A Tabela 1 des- mas e as respectivas frequências.
creve os principais fatores epidemiológicos e clínicos.

60

Tabela 1. Principais dados epidemiológicos e 50

clínicos. 40

Categoria N %

%
Variável 30

20
Idade 22-60 12 40,0
10
61-75 18 60,0
0
Sexo Masculino 18 60,0 Dor Dispneia Emagrecimento Disfagia Rouquidão
Feminino 12 40,0
Sintomas Sim 30 100,0

Tipo de sintomas Dor 18 60,0


Em relação ao controle da dor e ao uso prévio de
Dispneia 3 10,0
opioides, cerca de 46,7% relataram o uso regular
Emagrecimento 4 13,3
de opioides fracos ou de forte intensidade na con-
Disfagia 4 13,3 sulta inicial (Gráfico 2). Assim, quando avaliada a
Rouquidão 1 3,3 dor por meio da escala de Edmond, nenhum pa-
Escala de dor Leve 17 56,7 ciente considerou sua dor de forte intensidade,
Moderada 13 43,3 predominando pacientes com sintomas leves a mo-
Tipo tumoral Cabeça e pescoço 3 10,0 derados.
Gastrointestinal 16 53,3
Gráfico 2. Distribuição de acordo com o uso
Geniturinário 4 13,3
prévio de opiáceo.
Respiratório 4 13,3
Outros 3 10 Opiáceo Não
Sim
Estadiamento TNM EC III 8 26,7
EC IV 22 73,3
Ecog 0e1 14 46,7
≥2 16 53,3 Sim Não
Uso prévio de Não 16 53,3 46,7% 53,3%
opiáceo Sim 14 46,7
Total 30 100

De acordo com o estadiamento TNM, as neopla-


sias em estádio clínico IV foram as mais frequen-
tes, não se observando neoplasias em estágio ini-
cial. Quanto ao performance status avaliado por
meio do Ecog, pacientes classificados como Ecog
1 corresponderam a 43,3% dos casos, e Ecog 2 e 3,
a 46,7%.

22 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 20-24


Campos ECR et al.

Os tipos tumorais mais frequentes entre os pa- Discussão


cientes atendidos pelos cuidados paliativos foram Apesar dos avanços tecnológicos no tratamento do
as neoplasias do trato gastrointestinal (53,3%), ge- câncer, muitos pacientes falecem por progressão da
niturinário (13,3%), respiratório (13,3%) e neopla- doença, sentindo dor e outros sintomas na fase fi-
sias de cabeça e pescoço (10%). nal da vida. Estes prejudicam a qualidade de vida
Em um tempo médio de seguimento de 3,48 me- e impedem o paciente de viver mais ativamente os
ses, 76% dos pacientes tinham falecido pela doença últimos momentos de sua vida.8
e 23% estavam vivos, mas com comorbidades signi- No presente estudo, procuraram-se identificar
ficativas. Na análise do tempo médio de seguimen- os tipos neoplásicos mais prevalentes em cuidados
to de acordo com o tipo tumoral, as neoplasias de paliativos, considerando a instituição sede do estu-
cabeça e pescoço foram as que apresentaram o me- do. A partir da identificação das principais neopla-
nor tempo médio: 1,97 meses. sias, objetivou-se encaminhar mais prematuramen-
Ao analisar as taxas de sobrevida global (SG), e, em- te os pacientes portadores de neoplasia avançada,
bora não sendo estatisticamente significativas, identi- ou de maior risco para progressão futura, para be-
ficaram-se menores taxas para os pacientes portadores, nefício precoce de controle da dor, apoio psicoló-
de idade superior a 60 anos (p=0,128) (Gráfico 3). gico, espiritual e nutricional.9
Nota-se que as neoplasias de trato gastrointesti-
Gráfico 3. Avaliação da SG de acordo com a nal foram as mais frequentes. Pela casuística redu-
idade. zida, não foi possível realizar a análise separada para
cada tipo neoplásico. A maior frequência de tumo-
1,0
res de origem gastrointestinal está de acordo com a
literatura, uma vez que as neoplasias de cólon, reto
0,8
e estômago estão entre as mais frequentes, segundo
p=0,128
dados do Instituto Nacional do Câncer para o ano
% Sobrevida

0,6
de 2014.3
Idade 22-60 O tempo médio de seguimento dos pacientes no
0,4 serviço de cuidados paliativos foi de 3,4 meses, o
que denota um tempo relativamente curto para ten-
Idade > 60
0,2 tar mudar a evolução dos pacientes, otimizar o con-
trole dos principais sintomas e conscientizar o pa-
0,0 ciente e a família da importância da assistência
0,00 2,50 5,00 7,50 10,00 12,50 paliativa. Para Gaertner et al.,8 o encaminhamento
Seguimento (meses) precoce aos cuidados paliativos permite discutir
mais claramente os futuros tratamentos, assegurar
a autonomia do paciente ao longo do tratamento e,
O Gráfico 4 demonstra as taxas de SG de acordo em alguns casos, prolongar a sobrevida.
com os principais tipos neoplásicos analisados. A dor foi o sintoma mais frequente e identificado
em 60% dos pacientes. Segundo a literatura médica,
a dor classificada como moderada ou intensa é iden-
Gráfico 4. Taxas de SG de acordo com os tificada com frequência de 60 a 90%.10,11 A pouca fre-
principais tipos neoplásicos. quência de casos de dor grave e avaliada mediante
emprego da escala visual numérica é decorrente do
Sobrevida global encaminhamento aos cuidados paliativos por médi-
1 Tipo tumoral cos oncologistas e do conhecimento de analgesia em
0,8
CP oncologia, mediante o emprego de opioides.
% Sobrevida

TGI

0,6
TGU
TR De acordo com a OMS, somente 15% dos pro-
CP - Cabeça e pescoço fissionais médicos da América Latina estão habili-
0,4 TGI - Trato gastrointestinal
TGU - Trato geniturinário tados ao uso de opioides, refletindo certamente um
0,2 TR - Trato respiratório
número maior de pacientes com dor moderada a
0
grave, no caso de encaminhamento por médicos
0 2,5 5 7,5 10 12,5
Seguimento (meses) portadores de especialidades diferentes da oncolo-
gia (OMS).12

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 20-2423


Análise do perfil epidemiológico, clínico e da sobrevida global de pacientes portadores de neoplasia em estágio avançado atendidos no Hospital Universitário Evangélico de Curitiba

Quanto à classificação do performance status, Referências


optou-se por classificar os pacientes pela escala 1. Silva RCF, Hortale VA. Cuidados paliativos oncológicos:
Ecog, pela sua fácil aplicabilidade, a qual é com- elementos para o debate de diretrizes nesta área. Cad.
posta por cinco subcategorias.6 Como considera- Saúde Pública 2006; 22: 2055-2066.
ram-se unicamente os pacientes atendidos em re- 2. Gómez-Batiste X, Martínez-Muñoz M, Blay C, Espinosa
J, Contel JC, Ledesma A. Identifying needs and
gime ambulatorial, e também por não se dispor de
improving palliative care of chronically ill patients: a
visita domiciliar durante o período do estudo, não
community-oriented, population-based, public-health
foram identificados pacientes moribundos ou por- approach. Curr Opin Support Palliat Care. 2012;
tadores de Ecog 4. Nenhum paciente portador de 6:371-8.
Ecog 0 foi identificado, refletindo a presença, em 3. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional do
todos eles, de limitações impostas pela doença on- Câncer. Disponível em:<http://www2.inca.gov.br. Acesso
cológica avançada. em fevereiro de 2014.
As menores taxas de sobrevida foram observa- 4. Payne S, Chan N, Davies A, Poon E, Connor S, Goh C.
das entre os pacientes portadores de neoplasia de Supportive, palliative, and end-of-life care for patients
cabeça e pescoço. O pequeno número de pacien- with cancer in Asia: resource-stratified guidelines from
tes portadores dessa neoplasia no estudo, assim the Asian Oncology Summit 2012. Lancet Oncol. 2012;
como o baixo performance status, pode ter contri- 13:492-500.
5. Fahy BN. Palliative care for the surgical oncologist:
buído para as menores taxas observadas. Ao consi-
embracing the palliativist within. Surgery 2013; 153:1-3.
derar que em aproximadamente 90% dos casos de
6. Oken MM, Creech RH, Tormey DC, Horton J, Davis
câncer de cabeça e pescoço estão presentes fato- TE, McFadden ET, Carbone PP. Toxicity and response
res de risco como etilismo e/ou tabagismo, as co- criteria of the Eastern Cooperative Oncology Group. Am
morbidades são frequentes e acabam por impactar J Clin Oncol. 1982; 5:649-55.
negativamente a saúde desses pacientes. 7. Bruera E, Kuehn N, Miller MJ, Selmser P, Macmillan K.
Neste estudo, as principais limitações foram a The Edmonton Symptom Assessment System (ESAS): a
natureza retrospectiva e o pequeno número de pa- simple method for the assessment of palliative care
cientes. Apesar desses fatores limitantes, acredita- patients. J Palliat Care. 1991; 7:6-9.
mos na importância do estudo ao demonstrar a ne- 8. Gaertner J, Wolf J, Voltz R. Early palliative care for
cessidade de encaminhar mais precocemente os patients with metastatic cancer. Curr Opin Oncol 2012;
pacientes e, se possível, desde o momento do diag- 24:357-62.
9. Caraceni A, Hanks G, Kaasa S, Bennett MI, Brunelli C,
nóstico neoplásico inicial, almejando um controle
Cherny N, et al. Use of opioid analgesics in the treat-
eficaz da dor e a disponibilidade de uma equipe de
ment of cancer pain: evidence-based recommendations
cuidados paliativos para o constante apoio ao pa- from the EAPC. Lancet Oncol. 2012; 13:e58-68.
ciente e à família. 10. Dalal S, Del Fabbro E, Bruera E. Symptom control in
palliative care. Part I: oncology as a paradigmatic
Conclusão example. J Palliat Med. 2006; 9:391-408.
Pacientes portadores de neoplasias avançadas, ou 11. Gómez-Batiste X, Martínez-Muñoz M, Blay C, Espinosa
que irão apresentar progressão da doença, devem J, Contel JC, Ledesma A. Identifying needs and
ser assistidos precocemente e até o último momen- improving palliative care of chronically ill patients: a
to de suas vidas, considerando a dor como o sinto- community-oriented, population-based, public-health
ma mais prevalente e abordando-os por intermédio approach. Curr Opin Support Palliat Care. 2012;
de uma equipe multidisciplinar, tendo consciência 6:371-8.
12. OMS. Cuidados Paliativos. En: Control del câncer:
de que é um direito do paciente, contemplado pelo
Aplicación de los conocimientos: guia de la OMS. OMS;
Novo Código de Ética Médica.
1996.

24 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 20-24


Original • Original

Logística e limitações para a implantação de um banco de tecidos e


tumores em hospital público de pequeno/médio porte

Logistics and limitations for the implementation of a tumor and tissue bank in a
small/mid-sized public hospital
Karine Sampaio Lima1, Pollyana Anício Magalhães Gontijo2, Ana Paula Drummond-Lage3, Alberto Julius Alves Wainstein4

1
Biomédica, Mestre em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Pós-graduada em Pesquisa Clínica, Responsável
pela implantação do Biobanco e pelo desenvolvimento da rotina operacional no Hospital Alberto Cavalcanti, Rede Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais
(FHEMIG), Departamento de Desenvolvimento Estratégico e Pesquisa, Belo Horizonte, MG.
2
Enfermeira, Mestre em Enfermagem pela UFMG, Especialista em Ética em Pesquisa, Responsável pelo recrutamento de pacientes voluntários do Biobanco no
Hospital Alberto Cavalcanti, Rede FHEMIG, Departamento de Desenvolvimento Estratégico e Pesquisa, Belo Horizonte, MG.
3
Farmacêutica, Professora da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (FCM-MG), Doutora em Ciências Biológicas (Fisiologia e Farmacologia) pela UFMG,
envolvida na concepção do projeto de implantação do Biobanco no Hospital Alberto Cavalcanti, Rede FHEMIG, Belo Horizonte, MG.
4
Médico, Cirurgião Oncológico, Doutor em Oncologia pelo Hospital do Câncer/Instituto Ludwig, Pós-doutor em Imunologia de Tumores pelo Karmanos Cancer
Institute, Michigan, EUA, e em Pesquisa Clínica pelo Albert Einstein Cancer Center, New York, EUA. Coordenador do Biobanco e da Unidade de Cancerologia do
Hospital Alberto Cavalcanti, Rede FHEMIG, onde coordena a Residência Médica em Cirurgia Oncológica e a Unidade de Cirurgia Oncológica, Professor da
FCM-MG, Belo Horizonte, MG.

Resumo
Introdução: no período de 2007 a 2009, implantou-se o primeiro biobanco no Estado de
Minas Gerais. Objetivo: descrever o processo de implantação de um biobanco em hospital
público de médio porte sem tradição em pesquisa. Métodos: a estruturação física e tecnológi-
ca do biobanco ocorreu em paralelo à constituição de procedimentos operacionais para uni-
formizar os processos. Os materiais biológicos foram coletados segundo as exigências regu-
latórias e armazenados em nitrogênio líquido e freezer a -80°C. Foram obtidas linhagens
celulares primárias dos tumores incluídos e criou-se um biobanco de macromoléculas origina-
das das amostras. Resultados: encontraram-se dificuldades na implantação do biobanco e
problemas macroinstitucionais. Conclusão: é viável para o SUS manter um biobanco de
excelência em um hospital de médio porte a partir de investimentos em pesquisas e em uma
equipe multiprofissional capacitada.
Palavras-chave: banco de tumor, procedimento operacional padrão, infraestrutura, pron-
tuário médico.

Abstract
Introduction: in the period from 2007 to 2009, the first biobank in the state of Minas Gerais,
Brazil, was implemented. Objective: to describe the implementation of a biobank in a mid-
sized public hospital with no tradition in research. Methods: the physical and technological
structuring of the biobank occurred in parallel to the creation of operating procedures to
standardize processes. All biological materials were collected in accordance with regulatory
requirements, and stored in liquid nitrogen and freezer at -80°C. Primary tumor cell lines
were obtained, and a biobank of macromolecules derived from the samples was created.

Recebido: 25/2/2014
Aprovado: 27/3/2014

Correspondência: Karine Sampaio Lima – Rua Cristina, 1.163/302, Santo Antônio, Belo Horizonte – MG, CEP 30330-228, tel.: (31) 8705-9744
E-mails: karine.lima02@yahoo.com.br; pollyanaam@hotmail.com; apdrummond@gmail.com; albertojaw@gmail.com
Conflitos de interesse: não existem

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 25-3325


Logística e limitações para a implantação de um banco de tecidos e tumores em hospital público de pequeno/médio porte

Results: there were difficulties in the implementation of the biobank as well as macro-institu-
tional problems. Conclusion: it is feasible for the Brazilian Unified Public Healthcare System
(SUS) to have a biobank of excellence in a mid-sized hospital from investments in research
and in a skilled multidisciplinary team.
Keywords: tumor bank, standard operational procedure, infrastructure, medical chart.

Introdução
A incidência de câncer no Brasil e no mundo é preo- Recentes avanços em pesquisas científicas so-
cupante, com crescimento consistente e significativo bre expressão gênica, proteica e de metabólitos ge-
da maioria dos tumores. Segundo a Agência Interna- raram uma necessidade paralela de amostras bio-
cional de Pesquisa em Câncer, órgão ligado à Organi- lógicas humanas de alta qualidade.5 Para utilização
zação Mundial da Saúde (OMS), estima-se um au- nas pesquisas, os materiais biológicos humanos,
mento de 75% na incidência da doença até 2030, descritos como espécimes, amostras e alíquotas de
podendo chegar a 90% em países mais pobres. Os pa- material original e seus componentes fracionados,
íses em desenvolvimento serão os mais afetados, e en- são organizados juntamente com dados associados
tre eles está o Brasil.1 ao doador do material.6,7
Finalmente, a maioria dos conhecimentos cientí- A catalogação e o gerenciamento organizado
ficos descritos no século passado está se traduzindo dessas amostras podem ser constituídos em bio-
em avanços e benefícios para os pacientes, com o de- bancos, definidos pela resolução nº 441/11, do
senvolvimento de novos marcadores, melhor estadia- Conselho Nacional de Saúde (CNS), como “cole-
mento e, principalmente, tratamentos com drogas al- ção organizada de material biológico humano e in-
vo-específicas. A maioria ou quase a totalidade desses formações associadas, coletadas e armazenadas
avanços está baseada em plataformas tecnológicas re- para fins de pesquisa conforme regulamento ou
lacionadas a assinaturas moleculares ou imunológicas normas técnicas, éticas e operacionais (…)” ou
dos tumores ou pacientes. Nesse contexto, o acesso, biorrepositórios, “coleção de material biológico hu-
o estudo e o conhecimento de biomarcadores dos tu- mano coletado e armazenado ao longo da execu-
mores dos pacientes são estratégicos não apenas para ção de um projeto de pesquisa específico, confor-
pesquisa e desenvolvimento de drogas, mas principal- me regulamento ou normas técnicas, éticas e
mente para regular o acesso e a demanda dessas dro- operacionais (…).”6 Ou seja, são estruturas que
gas para os pacientes e para a população específica e armazenam uma coleção de amostras biológicas,
única do Brasil. cedidas voluntariamente, com o objetivo de im-
Segundo a estimativa realizada pelo Instituto pulsionar a investigação biomédica em geral ou
Nacional do Câncer (Inca), haverá cerca de 580 um projeto específico, conforme descrito.
mil novos casos de câncer no Brasil em 2014.2 Isso Essas coleções, associadas aos dados de pron-
se deve principalmente ao resultado do processo de tuários e outras informações coletadas, foram reco-
envelhecimento da população brasileira. O Minis- nhecidas como ferramentas necessárias para o avan-
tério da Saúde do Brasil tem se empenhado na rea- ço da análise molecular dos tumores, sendo que a
lização de ações de prevenção, detecção precoce e vinculação com a evolução clínica dos pacientes
oferta de tratamento.3 tem sido crucial para atingir esse objetivo.8,9,10 Seu
Além das atividades pontuais contra o câncer principal valor relaciona-se a projetos científicos in-
realizadas pelos sistemas de saúde, centros de pes- tegrados com testes clínicos, com foco principal no
quisa no mundo têm se dedicado a avanços tecno- benefício ao paciente, seja no diagnóstico ou trata-
lógicos e moleculares de pesquisa em câncer, em mento.11 Além do plano assistencial ou dos possí-
consequência da necessidade de um maior conhe- veis benefícios aos indivíduos, o armazenamento
cimento sobre a patologia molecular das neopla- de materiais biológicos e a possibilidade de seu res-
sias, buscando melhores formas de diagnóstico, gate para fins de pesquisa e/ou para aprimorar as-
acompanhamento e investigação dos eventos mo- sistência com o desenvolvimento de inovações bio-
leculares que conduzem à progressão tumoral, e de tecnológicas têm um grande impacto no âmbito da
combate à doença.4 saúde pública.12

26 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 25-33


Lima KS et al.

Os biobancos também apresentam impacto na me- de um biobanco em hospital público de pequeno/


dicina translacional. A medicina translacional é uma médio porte sem tradição em pesquisa e as dificul-
nova área do conhecimento biomédico definida como dades encontradas.
o elo entre descobertas da pesquisa básica com a are-
na da investigação clínica e a tradução dos resultados Material e métodos
de ensaios clínicos em mudanças na prática clínica.13 A implantação do biobanco
Por meio da medicina translacional, o biobanco per- Para o funcionamento regulamentado e ético de um
mite uma maior interação entre investigadores e clí- biobanco, faz-se necessário o estabelecimento de
nicos, pois, por meio das descobertas realizadas em procedimentos segundo as exigências regulatórias
laboratório, o clínico pode utilizar as informações ge- para cada etapa operacional, além de uma estrutu-
radas para rastreio da patologia, diagnóstico precoce, ra física adequada para padronização dos procedi-
utilização de terapêuticas mais adequadas, monitori- mentos e otimização dos processos.
zação terapêutica e para definir prognósticos, que de- O processo teve início com a elaboração de uma
correm da aplicação das novas tecnologias.12 proposta técnico-científica para captação de verba
A grande maioria ou a quase totalidade dos bio- de fomento, que foi apoiada pela Fundação de Am-
bancos brasileiros está instalada dentro de institui- paro à Pesquisa do Estado de Minas Gerais. Os pro-
ções universitárias ou hospitais oncológicos de gran- blemas tiveram início já na fase de pré-implanta-
de porte. Entretanto, apesar da grande importância ção, em que aprovação e liberação de recursos têm
e do reconhecimento dessas instituições, a grande prazo e um rigor temporal que não encontram con-
maioria dos pacientes oncológicos é operada e tra- sonância com os prazos para as aprovações éticas,
tada em outras instituições, onde não existem bio- regulatórias, de contratação de pessoal e qualifica-
bancos. Nesse contexto, a maioria absoluta dos tu- ção e aquisição de equipamentos.
mores ressecados na população brasileira não tem A implantação do biobanco, entre o período de
amostragem para estudos e pesquisas, por conta da 2007 e 2009, iniciou-se com a estruturação física
indisponibilidade local de estruturas de coleta e ar- e tecnológica, durante a qual, primeiramente, foi
mazenamento de tecidos. Neste trabalho, são apre- realizada uma pesquisa para definir a especificação
sentadas rotinas, implementação e dificuldades para dos materiais e equipamentos previstos no projeto,
a operação de um banco de tecidos e tumores em buscando sua adequação ao estudo, comprometi-
um hospital público de pequeno porte, dedicado à do com grande rigor científico/financeiro e otimi-
atenção oncológica. zação de custos.
Em 2007, foi implantado no Estado de Minas O biobanco foi alocado em duas salas, sendo uma
Gerais o primeiro biobanco, nomeado Banco de Te- próxima ao bloco cirúrgico do HAC. O mesmo con-
cidos e Tumores (BTT), a partir da atuação conjun- templava equipamentos de informática, materiais
ta de duas instituições públicas do estado: Hospital para microdissecção de tecidos, microscópio óptico
Alberto Cavalcanti (HAC), rede Fundação Hospita- com fluorescência, criostato, micrótomo rotativo,
lar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) e Funda- termociclador real time, freezers de até -80°C, con-
ção Ezequiel Dias (Funed), com recursos da Funda- tainers criogênicos, cubas para eletroforese em gel,
ção de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas centrífuga, bidestilador, banho histológico, banhos-
Gerais (Fapemig). Essa iniciativa pioneira caracte- -maria, estufas para cultura celular, estufa para es-
rizou-se como trabalho multi-institucional e multi- terilização de materiais, fluxo laminar, dentre outros.
profissional, desenvolvido pela necessidade de avan-
ços em pesquisas oncológicas no estado, visando a Arquivo biológico
estabelecer um modelo de melhor conhecimento Após a estruturação física do biobanco, foram cons-
da biologia tumoral e a proporcionar a formação de tituídos os procedimentos operacionais padrão
uma rede de pesquisas interdisciplinares para o es- (POPs) de rotina para seu completo funcionamen-
tudo de diversas doenças. Conforme esperado na to, com a captação de materiais biológicos, cedidos
implementação de inovações incrementais, ocorre- por pacientes oncológicos das mais diversas espe-
ram diversos entraves em sua implantação e na con- cialidades médicas atendidas no HAC, armazena-
tinuidade de sua rotina operacional, que são aqui mento e desenvolvimento de estudos, com auxílio
descritos com o objetivo de auxiliar instituições e da biologia celular e molecular. Todos os envolvi-
pesquisadores com propostas semelhantes. Dessa dos (pesquisadores, médicos, residentes, bolsistas,
forma, este artigo propõe descrever a implantação estagiários, enfermeiros e técnicos do bloco cirúr-

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 25-3327


Logística e limitações para a implantação de um banco de tecidos e tumores em hospital público de pequeno/médio porte

gico) foram treinados para que os procedimentos As amostras e seus resultados de pesquisa, cor-
implantados prosseguissem adequadamente, se- relacionados aos dados clínicos, laboratoriais e com-
guindo todos os POPs. portamentais dos tumores mais prevalentes, de maior
A triagem e a abordagem de pacientes oncoló- morbidade e relevância clínico-científica em nosso
gicos, efetuadas por profissional do BTT treinado meio, estabelecem relações de grande significado,
e capacitado, puderam ser realizadas tanto por meio o que contribui para melhores critérios de diagnós-
do atendimento ambulatorial como por meio da in- tico, prognóstico e tratamento.
ternação no HAC. O recrutamento foi realizado de
acordo com os critérios de elegibilidade do bioban- Legislação e biobanco
co: pacientes acima de 18 anos de idade, que con- No Brasil, o fluxo do processo regulatório para ob-
cordassem em assinar o Termo de Consentimento tenção da aprovação ética e legal para iniciação de
Livre Esclarecido (TCLE) e permitissem acesso aos pesquisas com seres humanos envolve as instâncias
seus dados e registros médicos. regulatórias do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP),
Cabe ressaltar que os materiais biológicos cedi- do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Co-
dos ao BTT, mediante assinatura do consentimen- nep) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária
to informado, sob responsabilidade e gerenciamen- (Anvisa). Esses órgãos buscam assegurar a condu-
to da instituição pública HAC-Fhemig, sem fins ção adequada dos estudos desenvolvidos no país.
comerciais, foram coletados e incluídos no bioban- A legislação vigente na época de implementa-
co conforme legislação vigente na época, em 2007. ção do biobanco era regida pelas Diretrizes e Nor-
Foram também coletadas todas as informações ne- mas Regulamentadoras de Pesquisas Envolvendo
cessárias e importantes ao biobanco, tais como: iden- Seres Humanos, resolução CNS nº196/96 do Mi-
tificação do cedente, dados demográficos, história da nistério da Saúde do Brasil, atualmente revogada
doença, história patológica pregressa, história familiar, pela Resolução CNS nº466 de 2012.14
história pessoal/social e dados laboratoriais. Esses da- A cessão do material biológico humano ao bio-
dos, registrados em formulário próprio, trazem infor- banco, atualmente, deve atender às exigências éti-
mações relevantes para o raciocínio clínico-científico. cas e científicas fundamentais vigentes pela Reso-
Todos os participantes da pesquisa, seus respectivos lução CNS nº466/12, compreendendo autonomia,
dados e materiais biológicos cedidos foram codificados beneficência, não maleficência, equidade e justiça,
com um número único para manter o anonimato dos envolvendo seres humanos em pesquisa. Na justi-
voluntários, garantindo o manuseio das amostras de te- ficativa da necessidade de material biológico hu-
cido com segurança e preservando o absoluto anoni- mano para fins de pesquisa, devem ser considera-
mato dos pacientes, cumprindo-se os princípios éticos dos a dignidade individual do participante, os riscos
definidos na pesquisa da área da saúde. de invasão de privacidade, a violação de confiden-
A coleta dos tecidos tumorais, bem como de te- cialidade, os riscos psicológicos, os conflitos, a co-
cidos normais correspondentes, foi realizada por ci- mercialização inapropriada de achados científicos
rurgiões oncológicos do HAC durante procedimen- ou o uso de amostras em projetos que sejam desa-
to médico padrão de rotina, aos quais os pacientes gradáveis ao participante da pesquisa.14
já seriam submetidos. Os tecidos incorporados ao Atualmente, a resolução CNS nº441/11 reitera
BTT foram encaminhados para análise macroscópi- as normas para cessão de material biológico armaze-
ca, microscópica e para processamento, sendo mi- nado em biobanco. O documento ressalta algumas
crodissectados manualmente em ambiente estéril, normas já estabelecidas, trazendo novos critérios para
clivados em fragmentos secundários de 1 cm³, con- biobancos no que diz respeito ao armazenamento e
gelados individualmente em nitrogênio líquido e ar- à utilização desse material biológico cedido.6
mazenados em freezer a -80°C por profissional do O material biológico cedido e os dados coleta-
BTT. Em seguida, parte do material de cada pacien- dos são restritos ao biobanco, a potenciais subpro-
te foi submetido à extração de ácido desoxirribonu- jetos e aos pesquisadores envolvidos. Os tecidos
cleico (DNA), de ácido ribonucleico (RNA) e ao es- podem ser desarquivados e utilizados apenas por
tabelecimento de cultura celular primária. O rápido subprojetos de pesquisa previamente aprovados por
processamento do tecido e seu armazenamento a um CEP e/ou Conep e/ou Anvisa, com a devida au-
baixas temperaturas disponibilizam tecidos com suas torização da coordenação do BTT. Parcerias pode-
características preservadas para estudos molecula- rão ser estabelecidas com outras instituições, com
res, citogenéticos e/ou imuno-histoquímicos. a transferência e o compartilhamento de material

28 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 25-33


Lima KS et al.

biológico entre biobancos. No entanto, elas deve- com o objetivo de contribuir para que projetos se-
rão ser constituídas mediante prévia autorização da melhantes possam ter um fluxo mais linear utilizan-
instituição, da coordenação do BTT e conforme di- do-se dessas reflexões.
retrizes da Resolução CNS n°441/11, que no seu
art. 9 diz: “O material biológico humano armazena- Equipe profissional e capacitação técnica em
do em biobanco ou biorrepositório é do sujeito da um biobanco
pesquisa, permanecendo sua guarda sob a respon- O biobanco demanda a participação primordial de
sabilidade institucional.”6 um anatomopatologista, profissional escasso no mer-
Cada país define as regras éticas que entende cado. A grande maioria ou a quase totalidade dos
necessárias para proteger os seus cidadãos. No Bra- hospitais de pequeno/médio porte apresenta servi-
sil, as normativas regulamentadoras fundamentais ço terceirizado de anatomia patológica. Nesse con-
para a constituição e manutenção do biobanco são: texto, o patologista presta serviço e recebe de acor-
• Resolução 441, de 2011: Diretrizes para Análi- do com o serviço prestado, e não existe vínculo
se Ética de Projetos de Pesquisas que Envolvam institucional. Mesmo que exista interesse e com-
Armazenamento de Material Biológico Huma- prometimento do patologista terceirizado, o aumen-
no ou Uso de Material Armazenado em Pesqui- to das demandas e de suas complexidades inviabi-
sas Anteriores.6 liza uma parceria baseada na “boa vontade”. Um
• Portaria 2.201, de 2011: Diretrizes Nacionais biobanco demanda um patologista não apenas com-
para Biorrepositório e Biobanco de Material Bio- prometido com o projeto, mas com vínculo institu-
lógico Humano com Finalidade de Pesquisa.7 cional e financeiro. No modelo da Fhemig, o servi-
• Resolução 466, de 2012: Diretrizes e Normas ço de anatomia patológica é contratado mediante
Regulamentadoras de Pesquisas Envolvendo Se- concorrência pública. Nesse modelo de concorrên-
res Humanos.14 cia, não está previsto um biobanco, e as empresas
As novas diretrizes deixam bem claro o processo vencedoras não mostravam disponibilidade e/ou in-
de consentimento informado do participante da teresse em participar do projeto. A falta desse pro-
pesquisa, em que ele autoriza de maneira inde- fissional dentro da instituição, conforme previsto
pendente a cessão e o armazenamento de mate- no trabalho, foi uma grande dificuldade e quase um
rial biológico humano e seu uso futuro, formaliza- impeditivo para sua realização.
do através do TCLE, por meio do qual o
participante da pesquisa deve se manifestar ex- Vínculo profissional e tempo dedicado à pesquisa
pressamente quanto às seguintes alternativas, ex- Outro fator limitante que deve ser previsto e so-
cludentes entre si: necessidade de novo consen- lucionado desde o início é o vínculo e o tempo de
timento a cada pesquisa e dispensa de novo dedicação de cada profissional à pesquisa e ao pro-
consentimento a cada pesquisa.6 jeto. A quase totalidade das instituições de peque-
no e médio porte comprometidas com o câncer
Resultados e discussão tem uma ação eminentemente institucional. Nes-
Muitas dificuldades operacionais foram encontradas se modelo, os profissionais recebem por ativida-
na implantação do biobanco, assim como problemas des, serviços ou carga horária, como em plantões.
macroinstitucionais e burocráticos. A Fundação Hos- Na fase de implementação, quando é demandado
pitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) é uma pouco de muitos, é possível ter comprometimen-
instituição de grande porte e complexidade, focada to e dedicação de alguns. Posteriormente, a com-
essencialmente na assistência à saúde, com mais de plexidade e a quantidade de trabalho aumentam
20 unidades. Mesmo contando com apoio institu- muito. Entretanto, instituições como a Fhemig e
cional e da diretoria do HAC, o desenvolvimento de muitas outras não dispõem do enquadramento fun-
um projeto incremental, de grande porte e comple- cional de pesquisador. Os cirurgiões são concur-
xo como esse é muito mais trabalhoso em institui- sados para operar e atender pacientes, e enfermei-
ções sem longa tradição em pesquisa. Além disso, ros, para prestar assistência em turnos. Nesse
atrasos com as aprovações éticas envolvendo o CEP modelo, não existe turno ou tempo dedicado à pes-
local causaram um grande impacto operacional e mo- quisa, o que limita a profissionalização e a opera-
tivacional na equipe. A seguir, de maneira pontual, ção do biobanco, que não pode funcionar basea-
são descritas as principais dificuldades enfrentadas, do em diletantismos pessoais.

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 25-3329


Logística e limitações para a implantação de um banco de tecidos e tumores em hospital público de pequeno/médio porte

Mobilização e comprometimento do corpo gramação terapêutica do paciente, o que não pode


clínico com o biobanco ocorrer, já que a principal premissa de toda a pes-
O sucesso de um biobanco depende fundamental- quisa é não causar dano ao participante da pesqui-
mente da quantidade de amostras e, consequente- sa. Normalmente, os pacientes com câncer e seus
mente, da qualidade destas e de suas informações familiares estão ansiosos e aguardando uma cirurgia
clínicas. Não existe biobanco sem amostras. Estas imediata, com finalidade curativa ou não. Nesse con-
são obrigatoriamente obtidas em procedimentos ci- texto, a solicitação desses testes poderia gerar atra-
rúrgicos, os quais são indicados e conduzidos por sos, o que não condiz com os preceitos da pesquisa
médicos de diversas especialidades. Assim, é es- clínica. Também poderia gerar dúvidas e desvio do
sencial que as múltiplas especialidades médicas in- foco no tratamento oncológico, o que fez com que
formem e motivem seus pacientes cirúrgicos a par- médicos e possíveis doadores não tivessem condi-
ticipar dos biobancos. ções ou interesse em realizar esses testes.
Os profissionais assistenciais, indiretamente en-
volvidos na rotina do biobanco, não conseguiram Estrutura física e adequação
perceber a importância do projeto, o que gerou bai- Ressalta-se a importância de uma sala apropriada,
xo comprometimento em fase inicial, até que os ob- com todas as condições favoráveis para a adequa-
jetivos ficassem claros a todos. Além disso, apesar ção dos equipamentos de tecnologia avançada, a
da colaboração de alguns, as atividades assistenciais execução dos procedimentos de pesquisa e o bom
ocupavam grande parte do tempo e eram prioriza- trabalho da equipe, preferencialmente dentro do
das. Frequentemente, um médico que atende 16 bloco cirúrgico ou adjacente a ele.
consultas em 4 horas precisará de mais tempo para Quanto à estruturação física, a adequação e o
se envolver com o biobanco. Isso implicaria menor preparo da área física no HAC foram mais lentos
número de consultas ou maior tempo trabalhado. do que o previsto. Como todo hospital, o HAC apre-
Normalmente, as demandas são pontuais para os sentava limitações com relação ao seu espaço físi-
setores de enfermagem, bloco cirúrgico, serviço de co, o que impossibilitou a liberação de uma sala
arquivo médico e estatística (Same), que foram co- com as condições plenas necessárias para a insta-
laborativos conforme foram solicitados neste proje- lação completa dos equipamentos especializados,
to. No bloco cirúrgico, o interesse foi crescente en- o bom funcionamento destes e a execução de pro-
tre médicos, residentes e enfermeiros. tocolos de pesquisa. O espaço, ainda insatisfatório,
Parte desse interesse é consequência da ampla proporciona a execução limitada dos estudos, pois
divulgação do biobanco e de um melhor entendi- muitos equipamentos, além de não terem área des-
mento sobre o papel fundamental que cada um tem tinada, sequer possuem instalação elétrica corres-
para que o projeto ocorra com sucesso. A mobiliza- pondente a sua potência e seu consumo.
ção e integração de todos em um projeto como este
é essencial para a evolução do mesmo e a obtenção Prontuários, qualidade e informações
de melhores resultados. Não se percebeu nenhum clínicas
tipo de restrição de qualquer profissional para com A razão de existir de um biobanco consiste no gran-
o biobanco. A principal demanda foi a falta de tem- de número de amostras que possui ou nas qualida-
po ou motivação para isso, o que pode ser solucio- des únicas destas. Entretanto, espécimes despro-
nado com incentivos ou carga horária parcialmen- vidos de informações clínicas relevantes são de
te dedicada. pequena utilidade. A maioria dos prontuários é as-
sistencial e comprometida com as informações clí-
Processo de consentimento informado nicas necessárias à assistência médica. Eles rara-
Idealmente, o processo de consentimento informa- mente continham informações epidemiológicas e
do poderia contemplar autorização para realização clínicas necessárias para um banco de tecidos e tu-
de testes para hepatites B, C e HIV. Nosso modelo mores. Frequentemente, a aplicação do termo de
incluía esses testes como critérios, não para inclu- consentimento informado foi feita no hospital, sen-
são ou exclusão de doadores, mas para conhecimen- do que muitas dessas informações deveriam ter sido
to clínico dos pacientes. Porém, muitos deles e mes- solicitadas na pré-consulta ambulatorial. Um mo-
mo médicos não concordaram com essa premissa, o delo que poderia solucionar isso é o uso de pron-
que interferiria na inclusão de doadores. Os resulta- tuários eletrônicos com anamnese, dados clínicos
dos desses exames poderiam ter implicações na pro- e epidemiológicos solicitados de maneira compul-

30 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 25-33


Lima KS et al.

sória durante a consulta. Entretanto, essa conduta foi prorrogado por mais um ano, mantendo a equi-
gera demanda, custos e tempo, com os limitantes pe inicial treinada e qualificada. Mesmo a verba ten-
descritos previamente. do sido suficiente, o tempo para aplicá-la foi limita-
do a 3 anos. Findo esse tempo, era esperado que a
Volume de cirurgias na instituição Fhemig disponibilizasse pessoal para treinamento e
O número de amostras depende da demanda e do operação do biobanco. Infelizmente, por limitações
volume de cirurgias e biópsias realizadas por cada operacionais, burocráticas e muitas outras, vincula-
especialidade e subespecialidade cirúrgica. Vários das ao modelo estritamente assistencial da institui-
fatores institucionais e profissionais podem causar ção, funcionários não puderam ser desviados das ati-
impacto significativo em um biobanco. Em nosso vidades fins para as atividades de pesquisa, o que
caso, uma reforma e o fechamento parcial do Cen- impactou fortemente e mesmo inviabilizou o opera-
tro de Tratamento Intensivo (CTI) por alguns me- cional e o sucesso deste projeto.
ses limitaram cirurgias de grande porte, pratica-
mente inviabilizando amostras de tumores hepáticos, Parcerias institucionais
pancreáticos e outros durante esse período. Con- O estabelecimento de parcerias e cooperações com
tudo, foi possível a catalogação de mais de 1 mil outros centros de pesquisa, hospitais, empresas de
amostras biológicas, com ênfase em tumores gás- biotecnologia e farmacêuticas é essencial e estra-
tricos, intestinais, de próstata, de mama e de pele. tégico. A implantação de biobancos em hospitais
Estas são a ferramenta para subsidiar pesquisas fu- públicos é de fundamental importância para todo
turas sobre os fatores genéticos ou epigenéticos, o Brasil. A sua viabilização e a sua permeabilidade
que interferem nos comportamentos das células tu- para hospitais de pequeno e médio porte são estra-
morais, marcadores biológicos e ensaios com dro- tégicas por sua capacidade de coletar um grande
gas antineoplásicas. número de amostras, propiciar pesquisas e estudos
da diversidade morfológica, funcional e molecular
Recursos financeiros dos tipos de tumores coletados e de dados epide-
Os recursos disponibilizados pela Fapemig para a miológicos.
implantação do biobanco foram suficientes para a Apesar de todas as dificuldades relatadas, os re-
aquisição de todos os equipamentos e insumos ne- sultados demonstram que é possível para o SUS ter
cessários para coleta, armazenamento e estudo ini- um biobanco de excelência em um hospital de mé-
cial dos materiais biológicos incluídos. O desenvol- dio porte e trabalhar com pesquisa clínica-científi-
vimento do BTT, em parceria com a Fundação ca. A experiência deixa clara a importância da in-
Ezequiel Dias (Funed), viabilizou a obtenção de li- tegração entre uma equipe multidisciplinar e
nhagens celulares primárias, que constituem um as- multi-institucional. Entretanto, ao final do projeto
pecto relevante para o estudo da biologia celular e de implantação do biobanco, não houve seguimen-
molecular, bem como a criação de um biobanco de to da rotina operacional, pela carência de recursos
macromoléculas (DNA e RNA) originadas das amos- institucionais, e, por esse motivo, ainda não foi pos-
tras coletadas. sível o registro do biobanco no Sistema CEP/Co-
nep, conforme preconiza a resolução CNS n°441/11.
Continuidade e sustentabilidade de um bio- É necessário investir em uma equipe de profis-
banco após o fim da verba de fomento sionais capacitados e dedicados, englobando coor-
Não faltou empenho da diretoria do HAC, contudo denadores, patologistas, pesquisadores, estagiários
o processo decisório em órgãos públicos nem sem- e técnicos de laboratório, bem como em recursos
pre é ágil. A falta de mão de obra e de recursos do para pesquisa, dentre outros serviços. Um patologis-
próprio hospital atingiu bastante a implantação do ta envolvido no BTT é um ativo único, que não pode
biobanco, pois a área física e a equipe adequada era ser prescindido. Assim, seremos capazes de auxiliar
contrapartida da instituição. Durante os 2 anos ini- o SUS a definir melhores normas e metodologias
ciais, o projeto funcionou com equipe contratada para os pacientes oncológicos, e validar e incorporar
com bolsas vinculadas à verba de fomento. Foram novas drogas e tecnologias para o diagnóstico e tra-
gastos mais de um ano para adequação física, pro- tamento do câncer. Merece ser mencionado que o
cesso regulatório, aquisição de equipamentos, entre biomédico, profissional ainda pouco reconhecido em
muitos outros. O tempo de aplicação dos recursos modelos de saúde assistenciais, apresenta todos os

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 25-3331


Logística e limitações para a implantação de um banco de tecidos e tumores em hospital público de pequeno/médio porte

pré-requisitos para atuar de maneira estratégica na e no armazenamento adequado de grande número


operação e constituição de um biobanco, juntamen- de amostras, que poderiam, então, ser estudadas
te com o cirurgião e o patologista. em parcerias com instituições de pesquisa.

Conclusão Referências
Um biobanco representa uma importante ferramen- 1. Bray F, Jemal A, Grey N, Ferlay J, Forman D. Global
ta de estudo sobre a patologia, por meio da preser- cancer transitions according to the Human Development
vação de material biológico de qualidade, que pode Index (2008—2030): a population-based study. The
vir a ser utilizado em inúmeras pesquisas, gerando Lancet Oncology. June, 2012.
2. Inca. Instituto Nacional do Câncer. Estimativa 2014.
grandes avanços científicos para a área oncológica,
Incidência de Câncer no Brasil. Ministério da Saúde. Rio
dentre outras, em benefício da população brasileira.
de Janeiro, RJ. 2013. [acesso 09 fev 2014]. Disponível
Os dados gerados por meio de biobancos estão em: http://www.inca.gov.br/estimativa/2014/.
se tornando cada vez mais estratégicos não apenas 3. Inca. Ministério da Saúde. Agência de Notícias. Instituto
para a saúde humana, mas também para a sobera- Nacional de Câncer. Rio de Janeiro, RJ. 2013. [acesso 09
nia dos países. A grande maioria das drogas desen- fev 2014]. Disponível em: http://www2.inca.gov.br/wps/
volvidas gera bilhões de recursos, massa crítica, pro- wcm/connect/agencianoticias/site+/home+/noti-
dutos inovadores, pessoal capacitado e muitos cias/2013/inca_ministerio_saude_apresentam_estimati-
outros fatores, sendo que, para diversos estudos, vas_cancer_2014.
são necessárias plataformas tecnológicas dependen- 4. Inca. Banco Nacional de Tumores e DNA. Coordenação
tes de biobancos. de pesquisa. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de
Na maioria dos países, inclusive no Brasil, os Câncer. Rio de Janeiro, RJ. 2010. [acesso 24 ago 2011].
Disponível em: http://www1.inca.gov.br/conteudo_view.
biobancos estão concentrados em grandes institui-
asp?ID=1326.
ções públicas. Todavia, a grande maioria dos pa-
5. Troyer D. Biorepository standards and protocols for
cientes é atendida e tratada em hospitais de peque- collecting, processing, and storing human tissues.
no/médio porte, motivo pelo qual apresentamos Methods Mol Biol., p. 193-220, 2008.
aqui os aspectos da implantação de um biobanco 6. Conselho Nacional de Saúde. Resolução n. 441, de 12
em um hospital de médio porte. Para a Fhemig, o de maio de 2011. Diretrizes para análise ética de projetos
biobanco possui relevância clínica, médica e mes- de pesquisas que envolvam armazenamento de material
mo estratégica/comercial e pode favorecer pacien- biológico humano ou uso de material armazenado em
tes específicos e/ou a população como um todo, pesquisas anteriores. Diário Oficial da União. 18 de julho
possibilitando que pacientes do SUS tenham aces- de 2011; Seção 1:60-61. [citado 2011 ago 2011]
so a tecnologias avançadas, ampliando o conheci- Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/resoluco-
mento sobre o processo de carcinogênese e geran- es/2011/ Reso441.pdf.
7. Ministério da Saúde. Portaria no 2.201, de 14 de
do novos projetos de pesquisa, rotinas, qualificação
setembro de 2011. Diretrizes Nacionais para Biorreposi-
profissional e investimentos.
tório e Biobanco de Material Biológico Humano com
O estudo da biologia celular e molecular dos tu- Finalidade de Pesquisa. Diário Oficial União. 15 de
mores humanos é cada vez mais essencial para a setembro de 2011; Seção 1:40-42. [citado 2011 set
investigação científica do câncer. A identificação 2011] Disponível em: http://bvsms.saude. gov.br/bvs/
de marcadores biológicos e moleculares para me- saudelegis/gm/2011/prt2201_14_09_2011.html.
lhorar o diagnóstico clínico, a definição de alvos 8. Inca. Instituto Nacional do Câncer. Banco Nacional de
para terapias mais efetivas e a classificação dos tu- Tumores e DNA. Coordenação de pesquisa. Rio de
mores estão entre os desafios centrais do tratamen- Janeiro: MS/Inca; 2010. Disponível em: <http://www1.
to dessa doença. inca.gov.br/conteudo_view.asp?ID=1326>. Acesso em:
Uma importante conclusão que podemos tirar 24 ago. 2013.
de nossa experiência é sugerir que o estabelecimen- 9. Naber SP, Smith LL, Wolfe HJ. Role of the frozen tissue
bank in molecular pathology. Diagn Mol Pathol, 1992;
to de biobancos seja focado inicialmente nas com-
1:73-9.
petências inatas da coleta e do armazenamento,
10. Carvalho L, Bernardo MT, Tavares M, Cotovio P, Mação P,
sem comprometer recursos e treinamento nas ati- Oliveira C. Banco de tumores: imperativo na medicina.
vidades de pesquisa. Com isso, instituições emi- Acta Med Port, 2007; (20):325-33.
nentemente assistenciais poderiam focar na coleta

32 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 25-33


Lima KS et al.

11. Morente MM, Alonso S. Current challenges of human 13. Ashton-prolla P, et al.Biobanco do hospital de clínicas de
tumor banking. Review article. Hematol Oncol. 2005; Porto Alegre: aspectos técnicos, éticos, jurídicos e
23:54-6. sociais. Rev HCPA, v.29, n.1, p. 74-79, 2009.
12. Carvalho L, et al. Banco de tumores: imperativo na 14. Brasil. Conselho Nacional de Saúde. Resolução n° 466,
Medicina. Acta MedPort, v. 20, p. 325-333, 2007. de 12 de dezembro de 2012. Aprova normas regulamen-
tadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Brasília:
Diário Oficial da União, 2013.

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 25-3333


Original • Original

Qualidade de vida em oncologia: análise dos resultados entre


pacientes tratados com quimioterapia em estágio clínico avançado

Quality of life in oncology: analysis of mean results among patients treated with
chemotherapy in advanced clinic stage
Eurico Cleto Ribeiro de Campos1, Suelen Pereira Cordeiro2, Jane da Costa Testoni3, Paulo Fabrício Nogueira Paim4, Fábio
Roberto Fin5, Christiane Costa Calciolari6

1
Professor Adjunto de Cirurgia-geral da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Ponta Grossa, PR.
2
Acadêmica de Bacharel em Enfermagem e Estagiária do Centro Cirúrgico do Hospital da Polícia Militar do Paraná (HPMPR), Curitiba, PR.
3
Enfermeira Gestora do HPMPR, Curitiba, PR.
4
Médico Clínico e Paliativista do Hospital São Vicente, Curitiba, PR.
5
Médico Cirurgião Oncológico do Hospital São Vicente, Curitiba, PR.
6
Fisioterapeuta e Doutora em Patologia pela Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP.

Resumo
Introdução: apesar dos benefícios no controle de sintomas e das taxas de sobrevida resultantes dos
diferentes tratamentos em oncologia, muitos pacientes irão apresentar prejuízo na atividade física,
social, cognitiva e psicológica em decorrência dos efeitos colaterais dos medicamentos ou pela progres-
são clínica da doença, impactando negativamente em sua qualidade de vida. Objetivo: avaliar a
qualidade de vida de pacientes portadores de câncer atendidos no Hospital da Polícia Militar do Paraná
(HPMPR). Métodos: análise descritiva e transversal de 16 pacientes portadores de neoplasia em
estágio clínico avançado e em tratamento quimioterápico. Dados epidemiológicos, clínicos e patológi-
cos foram considerados. O protocolo EORTC QLQ 30 foi o instrumento utilizado para a avaliação da
qualidade de vida dos pacientes. Resultados: predominaram pacientes do sexo masculino em 62,5%
dos casos. Todos eram sintomáticos ao diagnóstico, sendo a dor o sintoma mais prevalente e presente
em 30% dos pacientes. Neoplasias do trato gastrointestinal foram detectadas em 37,5% dos casos. Em
relação ao performance status, Ecog 1 e ASA 1 foram detectados com frequências de 50% e 43,8%,
respectivamente. Na escala funcional, os itens função física, desempenho de papel e função social
foram os mais afetados na avaliação da qualidade de vida. Fadiga e perda do apetite foram o sinal e o
sintoma mais frequentes. A medida global de qualidade de vida obteve índices elevados, sendo que
50% dos pacientes a classificaram como ótima. Conclusão: o atendimento oncológico multidisciplinar
e contínuo do paciente permite aprimorar o controle de sintomas, resultando em níveis mais elevados
de qualidade de vida, com impacto positivo na adesão do paciente ao tratamento, na sua evolução e,
possivelmente, na sobrevida.
Palavras-chave: qualidade de vida, oncologia, quimioterapia.

Recebido: 25/6/2014
Aprovado: 26/7/2014

Estudo realizado no Serviço de Cancerologia Clínica e Cirúrgica do Hospital da Polícia Militar do Paraná, Curitiba, PR.

Correspondência: Eurico Cleto Ribeiro de Campos – Av. Pref. Omar Sabbag, 894, Jardim Botânico, Curitiba – PR
E-mail: euricocrcampos@gmail.com
Conflitos de interesse: não existem
Sem fontes de financiamento

34 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 34-38


Campos ECR et al.

Abstract
Introduction: despite the benefits in symptom control and survival rates resulting from different
treatments in oncology, many patients will experience impairments in physical, social, cognitive and
psychological activity due to the side effects of medications or the clinical progression of the disease,
negatively impacting in their quality of life. Objective: to evaluate the quality of life among patients
with cancer treated at the Hospital of the Military Police of Paraná (HPMPR). Methods: a descriptive
cross-sectional analysis of 16 patients with advanced clinical stage malignancy treated with chemothe-
rapy. Epidemiological, clinical and pathological data were considered. The EORTC QLQ 30 protocol
was the instrument used to assess the quality of life of the patients. Results: most patients were male
in 62.5% of cases. All patients were symptomatic at diagnosis and pain was the most prevalent symp-
tom in 30% of patients. Neoplasms of the gastrointestinal tract were detected in 37.5% of cases. In
relation to performance status, ECOG 1 and ASA 1 were detected with frequencies of 50% and 43.8%,
respectively. Considering the functional scale, the items physical functioning, role performance and
social function were the most affected in the assessment of quality of life. Fatigue and loss of appetite
were the most common sign and symptom, respectively. A global measure of quality of life achieved
high rates as 50% of the patients rated as excellent. Conclusion: the cancer multidisciplinary care and
ongoing patient allows an enhance in symptoms control, resulting in higher levels of quality of life,
impacting positively on patient adherence to treatment, follow-up and possibly on survival.
Keywords: quality of live, oncology, chemotherapy.

Introdução
O câncer corresponde à segunda principal causa de Objetivo: por meio do protocolo European Orga-
morte na população brasileira, sendo superado ape- nization for Research and Treatment of Cancer
nas pelas doenças cardiovasculares. Acredita-se que, Quality of Life Questionnaire (EORTC QLQ 30),
nos próximos dez anos, as neoplasias venham a se avaliar a qualidade de vida de pacientes de oncolo-
tornar a principal causa de morte. Para o ano de 2014, gia, assim como os principais fatores epidemiológi-
foram estimados 580 mil novos casos de câncer.1 cos e clínicos envolvidos no tratamento e os prog-
A cirurgia, a radioterapia e a quimioterapia cor- nósticos dos pacientes.
respondem às principais modalidades terapêuticas,
sendo utilizadas em mais de 90% dos casos.2 Ape- Material e métodos
sar de todos os avanços tecnológicos e do melhor Estudo descritivo e transversal, aplicado no Hospi-
conhecimento da biologia molecular das neopla- tal da Polícia Militar do Paraná (HPMPR), no ano
sias, com novos tratamentos baseados nas altera- de 2013. Foram selecionados os pacientes portado-
ções moleculares presentes e menores taxas de to- res de neoplasias confirmadas histologicamente e
xicidade, muitos tratamentos acabam influindo na submetidos a alguma forma de tratamento além da
qualidade de vida dos pacientes de forma tempo- quimioterapia: cirurgia e/ou radioterapia. Todos os
rária ou definitiva, impondo limitações laborais, so- pacientes eram portadores de neoplasias em estágios
ciais e familiares.3 clínicos III ou IV.
Segundo a Organização Mundial da Saúde
(OMS), qualidade de vida pode ser definida como Métodos
“a percepção do indivíduo de sua posição na vida Informações epidemiológicas, clínicas e patológi-
no contexto da cultura e sistema de valores nos cas dos pacientes foram coletadas dos prontuários
quais ele vive e em relação aos seus objetivos, ex- disponíveis nos arquivos do Serviço de Oncologia
pectativas, padrões e preocupações.”4 do Hospital da Polícia Militar do Paraná.
Assim, a qualidade de vida do paciente é capaz Foram incluídos no estudo os pacientes porta-
de influir diretamente no sucesso do tratamento e, dores de neoplasias confirmadas histologicamente,
por isso, é tão importante que se tenha os conhe- nos estágios clínicos III e IV, e tratados exclusiva-
cimentos técnicos e científicos, baseados nos me- mente no HPMPR. Pacientes tratados em algum
dicamentos e rotineiramente empregados na abor- momento do curso da doença em outros serviços
dagem das neoplasias em estágio clínico avançado. de oncologia ou sem confirmação histológica da

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 34-3835


Qualidade de vida em oncologia: análise dos resultados entrepacientes tratados com quimioterapia em estágio clínico avançado

neoplasia, como também com informações incom- Gráfico 1. Distribuição dos sintomas de acor-
pletas nos prontuários, foram excluídos do estudo. do com a frequência.
Os laudos anatomopatológicos foram oriundos de
um único serviço de anatomia patológica, assim Tipo de sintomas
40
como as classificações do Eastern Cooperative On-
cology Group (Ecog) e da American Society Anes- 30

thesiology (ASA) foram realizadas por um único

%
20

médico oncologista. 10

A qualidade de vida foi avaliada pelo protocolo 0


Dor Mais de 1 Sangramento Dispneia Alteração Outros
EORTC QLQ 30, traduzido para o português e da- sintoma hábito
intestinal
tado de 2000. Esse questionário é composto de 30
itens e diferentes escalas, a saber: escala funcional
(função física, cognitiva, emocional, social e de- O performance status foi avaliado por meio do Ecog.
sempenho de papéis), escala de sintomas (fadiga, O Gráfico 2 demonstra a distribuição dos 16 pa-
dor, náuseas e vômitos), sintomas (dispneia, falta cientes de acordo com o Ecog, identificando-se
de apetite, insônia, constipação e diarreia), além que 50% dos pacientes foram classificados como
de uma escala de qualidade de vida e saúde global.4 Ecog 1. Nenhum paciente foi classificado como
Ecog 4.
Análise estatística
O tempo de seguimento foi calculado em meses e Gráfico 2. Distribuição dos pacientes de
correspondeu ao inter valo de tempo decorrido en- acordo com a classificação do Ecog.
tre a data da cirurgia e a data do último seguimen-
Performance status - Ecog
to clínico do paciente. Para a análise estatística, foi
50
empregado o Statistical Package for the Social Scien-
40
ces (SPCC) para Windows na versão 16.0. A men-
30
suração das variáveis quantitativas foi expressa pe-
%

las médias e respectivos desvios-padrão, e as 20

variáveis qualitativas, pelas respectivas frequências 10

absolutas e relativas. 0
0 1 2 3
Para a mensuração de cada escala, foi obtido um Ecog

escore bruto (EB) e correspondente ao valor da res-


posta do questionário, dividido pelo número de itens,
conforme demonstrado por Paiva.5 O escore final da
escala foi obtido por meio da seguinte fórmula: A classificação da ASA também é determinada roti-
neiramente, por sua fácil aplicabilidade e seu valor
Escore final = [(EB -1)/variação x 100 prognóstico similar ao do Ecog. Os seguintes valo-
res foram encontrados para ASA 1, 2 e 3, respecti-
A variação utilizada na fórmula final corresponde à vamente: 7 (43,8%), 5 (31,2%) e 4 (25%) pacientes.
subtração entre o maior e o menor valor em rela- Todos os pacientes eram portadores de neopla-
ção ao item avaliado. sias avançadas localmente ou metastáticas ao diag-
nóstico. Estágio clínico III foi detectado em seis
Resultados pacientes (37,5%), enquanto que 10 pacientes
Em relação ao sexo, 10 pacientes (62,5%) eram do (62,5%) apresentavam estágio clínico IV.
sexo masculino e seis (37,5%), do sexo feminino. A Ao término do estudo, três pacientes (18,8%)
idade média dos pacientes foi de 45 anos, com va- estavam vivos e assintomáticos, 11 pacientes
riação de 45 a 84 anos. (68,8%), vivos e com doença em atividade, e hou-
Todos os pacientes apresentavam sintomatolo- ve dois óbitos pela doença (12,5%). O tempo mé-
gia ao diagnóstico. Dor foi o sintoma isolado mais dio de seguimento foi de 15,3 meses.
frequente e presente em 30% dos pacientes. Pre- A Tabela 1 demonstra a média e o respectivo
dominaram neoplasias do trato gastrointestinal em desvio-padrão obtidos na aplicação do questioná-
37,5% dos casos. O Gráfico 1 demonstra os princi- rio EORTC QLQ 30.
pais sintomas e as respectivas porcentagens.

36 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 34-38


Campos ECR et al.

Tabela 1. Resultados do instrumento de do tipo de estudo adotado, em que foram selecio-


medida de qualidade de vida EORTC QLQ 30. nados pacientes portadores de neoplasias que são
Itens de escala Média(%) Desvio-padrão mais incidentes no sexo masculino, como câncer
Escala funcional esofágico e gástrico, uma vez que as neoplasias do
Função física 39,25 33,39
trato gastrointestinal foram predominantes.
A dor é descrita como o sintoma mais frequen-
Desempenho de papel 35,27 36,16
te na oncologia, podendo atingir até 90% dos ca-
Função emocional 22,73 25,07
sos.10 Nesta série, encontra-se como o sintoma mais
Função cognitiva 26,33 19,68 prevalente e com frequência inferior à descrita na
Função social 31,87 28,23 literatura. Isso se deve ao fato de os pacientes es-
Escala de sintomas tarem em tratamento quimioterápico. O atendimen-
Fadiga 38,13 25,92 to ambulatorial é realizado em todas as consultas
Náuseas/vômitos 3,27 9,2 pelas equipes de dor e de oncologia geral, que fa-
Dor 25,33 33,78
zem rotineiramente a revisão e o controle de sinto-
mas dos pacientes.
Sintomas
O valor prognóstico e a facilidade de aplicação
Dispneia 22,13 37,01
do ASA em oncologia já foi demonstrado por Zequi
Insônia 24,2 26,36 et al.6 Nenhum paciente do estudo foi classificado
Perda do apetite 37,4 21,11 como Ecog 4 ou ASA 4, uma vez que são pacien-
Constipação 11,0 20,36 tes que não atendem aos critérios do performance
Diarreia 11,0 20,36 status para quimioterapia.
Dificuldades financeiras 11,0 20,36 O instrumento de avaliação de qualidade de vida
Medida global de QV 74,12 22,35 da EORTC QLQ 30 é um dos principais utilizados
QV: qualidade de vida.
na avaliação da qualidade de vida em oncologia.
Destaca-se, especificamente, por ser composto uni-
camente por 30 itens, de fácil aplicabilidade e en-
tendimento, além de ter sido traduzido para o por-
Discussão tuguês e validado em diferentes estudos.5,9,11
O câncer é uma das principais causas de morte no Fadiga é um dos sintomas mais debilitantes e
Brasil, notando-se incidências cada vez maiores, se- frequentes em pacientes portadores de neoplasia
gundo o Instituto Nacional do Câncer.1 Muitos pa- em estágio avançado.12 Entre os sintomas avalia-
cientes serão diagnosticados com neoplasias em es- dos, fadiga apresentou a maior média (38,13). Lima
tágio avançado, resultando em quadros clínicos por et al.9 também identificaram a fadiga como o sin-
vezes mais sintomáticos e debilitados clinicamen- toma principal, atribuindo os achados às condições
te e, assim, impactando negativamente em sua qua- clínicas e psicológicas preexistentes. Acreditamos
lidade de vida. que a maior média detectada para a fadiga seja de-
Apesar dos avanços clínicos e tecnológicos al- corrente do impacto que a doença e o tratamento
cançados ao longo dos anos no tratamento do causam no paciente, demonstrado através do per-
câncer – e principalmente na descoberta de novas formance status.
drogas quimioterápicas –, a toxicidade desses me- Quanto aos sintomas predominantes, as maiores
dicamentos pode gerar efeitos adversos ao pacien- médias foram observadas para perda do apetite, in-
te, destacando-se como os principais: dor, fadiga, sônia e dispneia. O câncer promove no paciente um
dispneia, emagrecimento, perda do apetite, dentre quadro de desnutrição e resulta em perda do apeti-
outros que também podem interferir significativa- te, por ação de diferentes mediadores da resposta in-
mente nas funções física, emocional, social e cog- flamatória, como fator de necrose tumoral, interleu-
nitiva.7,8 cinas e citoquinas pró-inflamatórias.13 A própria
A predominância do sexo feminino em relação quimioterapia também apresenta efeitos colaterais
ao masculino foi demonstrada por Lima et al.,9 em no trato gastrointestinal, reduzindo também a inges-
razão da maior prevalência do sexo feminino em to- tão alimentar do paciente.
das as faixas etárias. A maior frequência do sexo Nota-se uma média baixa para o item dificul-
masculino no presente estudo pode ser decorrente dade financeira, uma vez que são pacientes mili-

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 34-3837


Qualidade de vida em oncologia: análise dos resultados entrepacientes tratados com quimioterapia em estágio clínico avançado

tares, ou dependentes, que contam com uma ren- Referências


da fixa e um plano de saúde exclusivo para militar, 1. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional do
por vezes, diferindo dos pacientes dependentes do Cancer. Disponível em:<http://www2.inca.gov.br. Acesso
SUS. em fevereiro de 2014.
Assim, o acompanhamento nutricional é fundamen- 2. Fahy BN. Palliative care for the surgical oncologist:
embracing the palliativist within. Surgery 2013; 153:1-3.
tal para o bem-estar do paciente, devendo o profissio-
3. Kanesvaran R, Tan MH. Targeted therapy for renal cell
nal médico lançar mão de medicamentos estimulado-
carcinoma: The next lap. J Carcinog. 2014;13:3.
res do apetite, antieméticos e vias predominantemente 4. Fleck MP, et al. Desenvolvimento da versão em portu-
enterais de alimentação para a não interrupção do tra- guês do instrumento de avaliação de qualidade de vida da
tamento, mas sempre considerando a multidisciplina- OMS (WHOQOL-100). Revista Brasileira de Psiquia-
ridade na abordagem inicial e contínua da doença ma- tria, v.21, n.1, p. 19-28, 1999.
ligna. 5. Paiva SM. Avaliação da qualidade de vida de pacientes
A maior média no instrumento EORTC QLQ oncológicos em tratamento quimioterápico adjuvante.
30 foi observada para a medida global de qualida- Dissertação de mestrado. Escola de Enfermagem de
de de vida, com valor de 74,12. Lima et al.9 en- Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, 2006.
contraram a maior média para o item medida glo- 6. Zequi SC, de Campos EC, Guimarães GC, Bachega W
bal de qualidade de vida, com valor de 79,99. Para Jr, da Fonseca FP, Lopes A. The use of the American
Society of Anesthesiology Classification as a prognostic
Bertoncello et al.,11 há uma interação linear entre
factor in patients with renal cell carcinoma. Urol Int.
os aspectos da qualidade de vida, pois ocorrendo
2010;84:67-72.
frequências elevadas de sintomas incapacitantes, 7. Kanesvaran R, Tan MH. Targeted therapy for renal cell
a qualidade de vida dos pacientes sofrerá impac- carcinoma: The next lap. J Carcinog. 2014;13:3.
to negativo. 8. Bilici A. Treatment options in patients with metastatic
A elevada média observada no presente estudo gastric cancer: current status and future perspectives.
é decorrente, principalmente, da baixa prevalência World J Gastroenterol. 2014; 20:3905-15.
de sintomas limitantes das atividades diárias, como 9. Lima TS, Borges GC. Avaliação da qualidade de vida em
dor e dispneia, assim como da baixa média obser- pacientes com câncer assistidos pelo Centro de Trata-
vada para o item dificuldade financeira, que influen- mento de Câncer de Dourados. Interbio 2009; 2:5-10.
ciam negativamente a vida dos pacientes. 10. Wilson J, Stack C, Hester J. Recent advances in cancer
pain management. F1000Prime Rep. 2014; 6:10.
11. Bertoncello KCG. Qualidade de vida e a satisfação da
Conclusão comunicação do paciente após a laringectomia total:
construção e validação de um instrumento de medida. Tese
Nosso estudo apresenta algumas limitações, como de doutorado. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto,
casuística reduzida, natureza transversal e inexis- Universidade de São Paulo, São Paulo, 2004.
tência de análise para um tipo neoplásico exclusi- 12. Vollrath M, Zenger M, Singer S, Einenkel J, Hinz A. The
vo. Contudo, acreditamos que o presente estudo course of fatigue in patients with gynecologic and breast
tenha sido importante, uma vez que os dados são cancer. J Gynecol Oncol. 2013; 24:280-6.
condizentes com aqueles apresentados na literatu- 13. Landskron G, De la Fuente M, Thuwajit P, Thuwajit C,
ra e por ter sido o primeiro a ser realizado em um Hermoso MA. Chronic Inflammation and Cytokines in
ambiente hospitalar militar. the Tumor Microenvironment. J Immunol Res.
2014;2014:149185. Epub 2014 May 13.
14. Andrade V, Sawada NO, Barichello E. Quality of life in
hematologic oncology patients undergoing chemotherapy.
Rev Esc Enferm USP. 2013 Apr;47(2):355-61.

38 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 34-38


Relato de caso • Case report

Rápido desenvolvimento de metástases hepáticas em paciente com


adenocarcinoma de pâncreas

Rapid development of liver metastases in patient with pancreatic adenocarcinoma


Enio Campos Amico1, José Jorge Maciel Neto2, Sulene Cunha Souza3, José Roberto Alves4

1
Doutor em Ciências, Professor de Medicina do Departamento de Medicina Integrada, Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Médico-cirurgião do
Hospital Universitário Onofre Lopes,UFRN, Médico-cirurgião da Liga Norte Rio-grandense Contra o Câncer, Natal, RN.
2
Médico Radiologista do Hospital Universitário Onofre Lopes, UFRN, Natal, RN.
3
Médica Oncologista da Liga Norte Rio-grandense Contra o Câncer, Natal, RN.
4
Doutor em Ciências, Professor de Medicina do Departamento de Medicina Integrada, UFRN, Médico-cirurgião da Liga Norte Rio-grandense Contra o Câncer, Natal, RN.

Resumo
O adenocarcinoma pancreático é um câncer com desenvolvimento agressivo, e pouco se sabe a
respeito da velocidade do desenvolvimento de metástases hepáticas. É apresentado o caso de um
paciente portador de adenocarcinoma pancreático que não aceitou a proposta de tratamento cirúrgi-
co e desenvolveu rapidamente metástases hepáticas no seguimento com exame de imagem. O relato
sugere a necessidade imperativa de tratamento sistêmico efetivo para a doença; do contrário, mesmo
os pacientes com adenocarcinoma pancreático sem aparentes metástases apresentarão mau prognós-
tico, ainda que submetidos à ressecção cirúrgica.
Palavras-chave: neoplasias pancreáticas, metástase neoplásica, adenocarcinoma.

Abstract
The pancreatic adenocarcinoma is a cancer with aggressive development and little is known about the
speed of the development of liver’s metastases in these patients. Is presented a case of a patient with
pancreatic adenocarcinoma who did not accept the surgical treatment proposed and evolved rapidly to
liver metastases during the follow-up with medical imaging procedure. The report suggests the urgent
need for the development of effective systemic treatment for the disease, otherwise, even patients with
pancreatic adenocarcinoma without apparent metastases will have poor prognosis even when under-
gone surgical resection.
Keywords: pancreatic neoplasms, neoplasm metastasis, adenocarcinoma.

Recebido: 21/6/2013
Aprovado: 23/7/2013

Estudo realizado no Hospital Universitário Onofre Lopes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN.

Correspondência para: Enio Amico – Rua Régulo Tinoco, 1319, apto 2102, Barro Vermelho, Natal – RN, CEP 59022-080, tel. (84) 4006-3490
E-mail: ecamic@uol.com.br
Conflitos de interesse: não existem

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 39-4139


Rápido desenvolvimento de metástases hepáticas em paciente com adenocarcinoma de pâncreas

Introdução
Embora represente apenas 2% dos casos de neopla-
sias malignas diagnosticadas no Brasil, o câncer de
pâncreas está associado à alta letalidade. Em 2010,
segundo dados do Instituto Nacional do Câncer
(Inca), 7.440 pacientes morreram dessa doença.1
O desenvolvimento de metástases hepáticas ocor-
re frequente e precocemente no curso do câncer pan-
creático, mesmo nos pacientes submetidos à cirurgia
curativa. O ritmo do desenvolvimento das metástases
estabelecidas no fígado sofre interferência pelo efeito
da quimioterapia indicada, tão logo o diagnóstico seja
feito.2 Dessa forma, existem poucos dados sobre a evo-
lução natural das metástases hepáticas nos pacientes
portadores de adenocarcinoma de pâncreas (AP).
É apresentado o caso de um paciente em que a
evolução natural das metástases pôde ser observada
em virtude da recusa ao tratamento.

Relato de caso
Paciente do sexo masculino, 51 anos, branco, com
quadro de dor abdominal em hipocôndrio direito, as-
sociada à perda ponderal de 25% do peso corpóreo
habitual há um ano. Tabagista ativo há 20 anos (20
cigarros/dia).
Realizou exame de ressonância nuclear magné-
tica, que revelou massa sólida de 3 cm em cauda
pancreática, além de fígado sem lesões metastáti- Figura 1. A. Ressonância nuclear magnética
cas aparentes (Figura 1A). na sequência axial T1 SE (com gadolíneo)
Tratamento cirúrgico foi indicado por provável com ausência de metástases hepáticas. B.
câncer de pâncreas. Paciente recusou o tratamen- Tomografia computadorizada de abdome (fase
to, apesar de ter sido adequadamente explicado so- portal) de controle após três meses e quatro
bre o possível diagnóstico. dias, evidenciando múltiplos nódulos hepáti-
Após três meses, com a piora do quadro clínico, cos, sendo o maior de 4 cm.
o paciente novamente procurou assistência médi-
ca. Foram realizadas dosagem de marcadores tumo-
rais (CA 19.9 = 19.830 U/mL e CEA = 129,9 ng/ cura.2 No momento do diagnóstico, a maioria dos
mL) e tomografia computadorizada de abdome. Esta pacientes apresenta doença localmente avançada
evidenciou lesão expansiva com 4,4 x 3,5 cm na to- ou metastática.2 Mesmo quando a ressecção é rea-
pografia de cauda e corpo de pâncreas, associada a lizada, a maioria dos pacientes apresenta recorrên-
múltiplas lesões hepáticas com tamanho variando cia local ou no fígado ainda no primeiro ano de pós-
entre 1 e 4 cm (Figura 1B). -operatório.2 Esse comportamento agressivo do
Foi realizada laparoscopia diagnóstica que reve- tumor, associado à relativa resistência à quimiote-
lou múltiplos nódulos hepáticos, os quais foram rapia e à radioterapia disponíveis, transforma-o em
biopsiados. O resultado do exame anatomopatoló- um particular desafio na área de oncologia.2
gico com imuno-histoquímica de fragmento de nó- O veloz crescimento do tumor primário e o rá-
dulo hepático mostrou adenocarcinoma pouco di- pido desenvolvimento de metástases podem ser ve-
ferenciado de origem pancreática. rificados nos pacientes portadores de AP. Furuka-
wa et al., acompanhando nove pacientes com lesões
Discussão primárias pancreáticas, observaram que o tempo de
O adenocarcinoma de pâncreas é uma doença ex- duplicação do volume tumoral médio (TDVT) foi
tremamente agressiva associada a baixos índices de de 159 ± 67 dias (média de 144 dias). Esses auto-

40 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 39-41


Amico EC et al.

res apuraram que ele esteve mais relacionado à so- po foi menor que a média do TDVT observada por
brevida que ao próprio tamanho inicial da lesão.3 Barbara et al.5 para o hepatocarcinoma (204,2 dias)
Existem poucas publicações que avaliaram a his- e por Finlay et al.6 para a metástase hepática color-
tória natural das metástases hepáticas nos pacien- retal (155 +/- 34 dias para as metástases detectá-
tes portadores de AP, uma vez que a quimioterapia veis e 86 +/- 12 para as metástases ocultas).
paliativa é indicada para essas situações, estando
associada a aumento de sobrevida. Em um dos pou- Conclusão
cos trabalhos disponíveis na literatura, Amikura et Acredita-se que o AP seja uma das neoplasias malig-
al. relataram que o tempo de duplicação das me- nas mais agressivas e com rápida capacidade de gerar
tástases hepáticas em seis pacientes analisados va- metástases a distância. Urge que se disponha de tra-
riou de 27 a 318 dias.4 A partir disso, concluíram tamento sistêmico efetivo para o controle da doença;
que metástases hepáticas ocultas já existiam no mo- do contrário, mesmo os pacientes submetidos à res-
mento da pancreatectomia, embora possuíssem ta- secção cirúrgica terão poucas chances de cura.
manho muito pequeno para serem detectadas por
exames complementares de imagem.4 Sugeriram, Referências
também, que não é possível melhorar as taxas de 1. Instituto Nacional do Câncer. Inca. Pâncreas. URL:
sobrevida em adenocarcinoma de pâncreas apenas http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/tiposdecan-
com tratamento cirúrgico, sendo preciso comple- cer/site/home/pancreas.
mentar o manejo cirúrgico com terapias adjuvan- 2. Sperti C, Pasquali C, Bissoli S, Chierichetti F, Liessi G,
Pedrazzoli S. Tumor relapse after pancreatic cancer
tes efetivas para prevenir metástases.4   
resection is detected earlier by 18-FDG PET than by CT.
O fato de o paciente em questão ter recusado o
J Gastrointest Surg. 2010; 14(1):131-40.
tratamento possibilitou observar a velocidade de 3. Furukawa H, Iwata R, Moriyama N. Growth rate of
desenvolvimento e crescimento das metástases he- pancreatic adenocarcinoma: initial clinical experience.
páticas. Com intervalo de apenas três meses e qua- Pancreas. 2001; 22:366-369.
tro dias da ressonância nuclear magnética em rela- 4. Amikura K, Kobari M, Matsuno S. The time of occurren-
ção à tomografia computadorizada, foi possível ce of liver metastasis in carcinoma of the pancreas. Int J
registrar nesse último exame nódulos hepáticos en- Pancreato. 1995; 17:139-146.
tre 1 e 4 cm de diâmetro. Ao admitir que já hou- 5. Barbara L, Benzi G, Gaiani S, Fusconi F, Zironi G,
vesse implantes hepáticos no momento da apresen- Siringo S, et al. Natural history of small untreated
tação clínica e inferindo um tamanho inicial para hepatocellular carcinoma in cirrhosis: a multivariate
essas metástases de até 5 mm, esse ponto de corte analysis of prognostic factors of tumor growth rate and
patient survival. Hepatology. 1992; 16(1):132-137.
estaria abaixo da possibilidade de diagnóstico por
6. Finlay IG, Meek D, Brunton F, McArdle CS. Growth
meio da ressonância nuclear magnética. Calculou-
rate of hepatic metastases in colorectal carcinoma. Br J
-se que o TDVT, entre os vários nódulos observa- Surg. 1988; 75(7):641-644.
dos na tomografia, variou de 28 a 84 dias. Esse tem-

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 39-4141


Relato de caso • Case report

Caso raro de lipossarcoma desdiferenciado em períneo

Rare case of dedifferentiated liposarcoma in perineum


Fumiê Ishizawa1, Higino Felipe Figueiredo1, Marco Antônio Ricci Correa Júnior2, Ênio Lucio Duarte Coelho2, Gustavo Cardoso
Guimarães3

1
Residente de Cirurgia Oncológica da Fundação Centro de Controle de Oncologia do Estado do Amazonas (FCECON), Manaus, AM.
2
Cirurgião Oncológico da FCECON, Manaus, AM
3
Cirurgião Oncológico do Hospital A.C. Camargo, São Paulo, SP.

Resumo
Os sarcomas de partes moles são tumores raros. O lipossarcoma é um dos tumores malignos de partes
moles mais comuns na vida adulta. Paciente do sexo masculino, 52 anos, com queixa de dor em região
perineal, com constipação intestinal e proctalgia acompanhada de massa em região perineal de rápido
crescimento (em torno de seis meses). Iniciada incisão via perineal na rafe mediana, com ressecção da
massa de cerca de 12 x 10 cm, com margens de aproximadamente 2 cm. Anatomopatológico com
imuno-histoquímica diagnosticou lipossarcoma desdiferenciado, sendo indicada radioterapia adjuvante
com boa tolerância pelo paciente. Os lipossarcomas originam-se de células mesenquimais primitivas.
As duas localizações mais comuns são as extremidades, particularmente membros inferiores, e o
retroperitônio. É relativamente raro o envolvimento do períneo ou espaço pararretal. A ressecção
cirúrgica do tumor primário continua a ser a principal forma de tratamento do sarcoma de partes
moles. O tratamento cirúrgico com margens negativas do sarcoma de partes moles é fator determinante
para o prognóstico, incluindo regiões de difícil abordagem como a perineal e o espaço pararretal.
Palavras-chave: sarcoma, lipossarcoma desdiferenciado, períneo.

Abstract
The soft tissue sarcomas are rare tumors. Liposarcoma is a malignant tumor of soft parts more common
in adulthood. Male patient, 52 years old, complaining of perineal pain with constipation and proctalgia
accompanied by mass in the perineal region of rapid growth around 6 months. Started via perineal
incision in the median raphe, with resection of the mass of about 12 x 10 cm with margins of around 2
cm. Pathology with immunohistochemistry concluded as dedifferentiated liposarcoma, and indicated
adjuvant radiotherapy that was well tolerated by the patient. Liposarcomas arise from primitive mesen-
chymal cells. The two most common locations are the extremities, particularly the lower extremities
and retroperitoneum. It is relatively rare the involvement of the perineum or the pararectal space.
Surgical resection of the primary tumor remains the main form of treatment of soft tissue sarcoma.
Surgical treatment with negative margins of soft tissue sarcoma is a determinant for prognosis, inclu-
ding regions that are difficult to approach as perineal and rectal space.
Keywords: sarcoma, dedifferentiated liposarcoma, perineum.

Recebido: 16/7/2013
Aprovado: 20/8/2013

Estudo realizado no Serviço de Cirurgia Pélvica da Fundação Centro de Controle de Oncologia do Estado do Amazonas (­ FCECON), Manaus, AM.

Correspondência: Fumiê Ishizawa – Rua José Clemente, 500, Centro, Manaus – AM, CEP 69010-070
E-mail: mimi_fumie@yahoo.com.br
Conflitos de interesse: não existem

42 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 42-44


Ishizawa F et al.

Introdução anormalidades e, ao seguimento do 14º mês de pós-


Os sarcomas de partes moles são tumores raros, -operatório, não foram observadas complicações ou
correspondendo a 1% de todas as neoplasias malig- sinais de recidiva local.
nas em adultos, e 15% em crianças.1 A maioria dos
sarcomas de partes moles primários origina-se nas
extremidades (59%), seguidas pelo tronco (19%),
retroperitônio (13%) e cabeça e pescoço (9%).2 O
lipossarcoma é um dos tumores malignos de partes
moles mais comuns na vida adulta. Possui origem
mesenquimal e é derivado dos adipócitos. Acome-
te igualmente ambos os sexos por volta da quarta
década.3 De acordo com a Organização Mundial da
Saúde, os lipossarcomas são divididos em cinco
subtipos: bem diferenciado, mixoide, de células re-
dondas, desdiferenciado e pleomórfico.4 O lipos-
sarcoma desdiferenciado pode exibir áreas de tran-
sição para sarcomas não lipogênicos de alto grau, Figura 1. Massa perineal rechaçando canal anal.
coexistindo com áreas bem diferenciadas. Esse fe-
nômeno é chamado de desdiferenciação.5

Relato de caso
Paciente do sexo masculino, 52 anos, com queixa de
dor em região perineal, com constipação intestinal
e proctalgia acompanhada de massa em região peri-
neal de rápido crescimento, em torno de seis meses.
Realizado exame físico, identificou-se massa de con-
sistência fibroelástica aderida a planos profundos re-
chaçando canal anal para a região posterolateral di-
reita (Figura 1). Foram solicitados exames de imagem,
como ressonância magnética de pelve, na qual se
identificou massa heterogênea de aproximadamen-
te 8 x 9 cm (Figura 2), tomografia de abdome supe-
rior e de tórax, que estavam dentro da normalidade.
Foi então realizada biópsia incisional com diagnós-
tico anatomopatológico de sarcoma de células fusi-
formes. Indicou-se ressecção cirúrgica como trata- Figura 2. RNM com massa perineal.
mento padrão para sarcomas e procedeu-se à incisão
via perineal na rafe mediana, com ressecção da mas-
sa de aproximadamente 12 x 10 cm, com margens
em torno de 2 cm, identificando-se no transopera-
tório invasão das musculatura do esfíncter externo e
interno do ânus, com ressecção parcial dos mesmos
e lesão uretra-bulbar (Figura 3). Reconstituído o pe-
ríneo por planos, efetuou-se, então, a laparotomia
para confecção da colostomia em alça com sigmoi-
de e cistostomia. O paciente evoluiu no pós-opera-
tório sem intercorrência, recebendo alta no 12º dia
de pós-operatório. Anatomopatológico com imuno-
-histoquímica revelou lipossarcoma desdiferencia-
do, sendo indicada radioterapia adjuvante, com boa
tolerância pelo paciente. O paciente evoluiu sem Figura 3. Ressecção final da massa perineal.

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 42-4443


Caso raro de lipossarcoma desdiferenciado em períneo

Discussão Referências
Os lipossarcomas originam-se de células mesenqui- 1. Rajput A, Kraybill WG. Clinical trials and soft tissue
mais primitivas em vez de células adiposas madu- sarcomas. Surg Oncol Clin N Am. 2003;12(2):485-97.
ras; e a presença de adipócitos não é pré-requisito 2. Cormier JN, Pearson AS, Meterissian SH, Tanabe KK.
para seu desenvolvimento. Eles são raros no teci- Bone and soft tissue sarcoma. In: Feig BW, Berger DH,
Fuhrman GM. The MD Anderson surgical oncology
do subcutâneo, na submucosa e subserosa do tra-
handbook. 3 ed. Philadelphia: Lippincott Williams &
to intestinal, os dois locais mais comuns de lipo-
Wilkins, 2003. p. 322.
mas. São quase sempre encontrados em estruturas 3. Junior RS, Neto VD, Gonçalves R, Botter M, Cristina L,
profundas e originam-se de planos faciais intermus- Siqueira D. Relato de Caso. J Bras Pneumol. 2008;
culares. Lipomas e lipomatoses não são predispo- 34(1):55-582008.
nentes a lipossarcomas. As duas localizações mais 4. Wick MR. The mediastinum. In: Sternberg SS, Antonioli
comuns são as extremidades, particularmente mem- DA. (editors). Diagnostic surgical pathology. Philadel-
bros inferiores e o retroperitônio.6 É relativamente phia: Lippincott Williams and Wilkins, 1999. p.
raro o envolvimento do períneo ou espaço pararre- 1147-1208.
tal.7,8,9 A ressecção cirúrgica do tumor primário con- 5. Henricks WH, Chu YC, Goldblum JR, Weiss SW.
tinua a ser a principal forma de tratamento do sar- Dediffe-rentiated liposarcoma: a clinicopathological
coma de partes moles. A simples enucleação do analysis of 155 cases with a proposal for an expanded
definition of dediffe-rentiation. Am J Surg Pathol. 1997;
tumor deve ser desestimulada, pois é a principal
21(3):271-81.
causa de recorrência local e de metástase.
6. Torres OJM, Tavares RC, Raposo CCBS, Azevedo RP,
Conclusão Raquel L, Caldas DA, et al. Myxoid liposarcoma of the
thigh: case report. Rev Bras Cancerol. 2001; 47(1):43-7.
O tratamento cirúrgico com margens negativas do 7. Loubignac F, Bourtoul C, Chapel F. Myxoid liposarcoma:
sarcoma de partes moles é fator determinante para A rare soft tissue tumor with a misleading benign
o prognóstico, incluindo regiões de difícil aborda- appearance. World J Surg Oncol. 2009; 7:42.
gem, como região perineal e espaço pararretal. 8. Benjaminov O, Gutman H, Nyabanda R, Keinan R, Sabach
G, Levavi H. Myxoid liposarcoma: An unusual presentation.
AJR Am J Roentgenol. 2007; 188(3):817-821.
9. Prabhu R, Amri N. Case report perineal myxoid
liposarcomas: A case report and literature review.
Malaysian J Med Sci. 2010; 17(4):62-66.

44 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 42-44


Relato de caso • Case report

Ligadura de ducto pancreático para fístula pancreática


pós-duodenopancreatectomia

Pancreatic duct ligature for pancreatic fistula post pancreaticoduodenectomy


Alexandre César Dal Pizzol1, Josué Bayer de Carvalho2, Marlene Raimunda Andreola Perazzoli3

1
Médico pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Residência Médica em Cirurgia-geral pelo Hospital do Servidor Público do Estado de São Paulo, Residência
Médica em Cancerologia Cirúrgica pelo Hospital Erasto Gaertner, Médico-cirurgião Oncológico no Hospital Salvatoriano Divino Salvador, Videira, SC.
2
Médico pela Universidade Federal de Santa Maria, Cirurgião-geral, Membro do Colégio Brasileiro de Cirurgiões e da Sociedade Brasileira de Videocirurgia. Médico
Cirurgião-geral do Hospital Salvatoriano Divino Salvador e do Hospital Santa Maria, Videira, SC.
3
Enfermeira pela Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), Campus de Videira, SC. Especialização em Terapia Intensiva pela Universidade do Vale do Rio
dos Sinos, em São Leopoldo, RS, e em Oncologia pelo Instituto Brasileiro de Therapias e Ensino (Ibrate), em Curitiba, PR. Enfermeira Instrumentadora Cirúrgica na
Clínica Andreani e Massaro Médicos Associados. Professora do Curso de Enfermagem da Unoesc, Campus de Videira, SC. Professora do Curso Técnico de
Enfermagem do Colégio Salvatoriano Imaculada Conceição de Videira, SC.

Resumo
A duodenopancreatectomia é procedimento de escolha para tratamento de lesões localizadas em
cabeça de pâncreas e duodeno. Consiste em procedimento de alta complexidade, com altas taxas de
morbi e mortalidade. A fístula de anastomose pancreática jejunal é a principal causa de complicação
cirúrgica, resultando em necrose e deiscência da anastomose. Existem várias abordagens possíveis para
o seu tratamento. Relata-se a seguir o caso de uma paciente de 61 anos, com fístula de anastomose
jejunopancreática pós-duodenopancreatectomia por adenocarcinoma de duodeno. A paciente foi
tratada com ligadura do ducto pancreático principal, com boa evolução.
Palavras-chave: ligadura ducto pancreático, fístula pancreática, duodenopancreatectomia.

Abstract
Pancreaticoduodenectomy is a procedure of choice for treatment of lesions located in the pancreatic
head and duodenum, consisting of a highly complex procedure with high rates of morbidity and morta-
lity. The pancreatic jejunal anastomosis fistula is the major cause of surgical complication, resulting in
necrosis and anastomosis dehiscence. There are several possible approaches to its treatment. Next we
report the case of a 61 year old woman patient with pancreatic jejunum anastomosis fistula after
pancreaticoduodenectomy for pancreatic adenocarcinoma of the duodenum. The patient was treated
with ligature of the main pancreatic duct with good evolution.
Keywords: pancreatic duct ligature, pancreatic fistula, pancreaticoduodenectomy.

Recebido: 18/7/2013
Aprovado: 20/8/2013

Procedimento realizado no Hospital Salvatoriano Divino Salvador, Rua Coronel Fagundes, 150, Santa Tereza, Videira – SC.

Correspondência: Marlene Raimunda Andreola Perazzoli – Rua Abraão Brandalise, Santa Tereza, 85, Videira – SC, CEP 89560-000
E-mail: marleneperazzoli@yahoo.com.br
Conflitos de interesse: não existem

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 45-4745


Ligadura de ducto pancreático para fístula pancreática pós-duodenopancreatectomia

Introdução Foram adotados recursos de nutrição parenteral


A duodenopancreatectomia persiste como proce- total e alimentação enteral por via de jejunosto-
dimento de escolha para tratamento de lesões ma- mia, esta última sendo iniciada no 25º dia do pós-
lignas e benignas localizadas na região da cabeça -operatório. No 35º dia do pós-operatório, a pa-
do pâncreas e no duodeno. No entanto, consiste ciente teve alta hospitalar com alimentação
em um procedimento de alta complexidade, com enteral via jejunostomia, sonda de gastrostomia
elevadas taxa de morbi e mortalidade. A fístula pan- descompressiva e fístula pancreática de baixo dé-
creatojejunal é a principal causa de complicação bito (50 mL/dia). No 70º dia pós-duodenopancre-
dessa cirurgia. atectomia, a paciente já estava com alimentação
A secreção pancreática, quando ativada pelo via oral plena, fechamento espontâneo da fístula
suco entérico, pode causar autodigestão dos teci- pancreática e sem as sondas de jejunostomia e gas-
dos, resultando em necrose e deiscência da anas- trostomia.
tomose cirúrgica. Consequentemente a esse fato, O anatomopatológico da peça cirúrgica eviden-
verificam-se hemorragia e formação de abscesso ab- ciou adenocarcinoma de duodeno, e o tumor em
dominal, causando deiscência de outras anastomo- cabeça de pâncreas foi diagnosticado como metás-
ses, o que justifica a alta mortalidade por essa ci- tase linfonodal. Os exames de controle mostraram
rurgia.1,2 níveis séricos de glicose, hemoglobina glicosilada e
Uma variedade de técnicas cirúrgicas tem sido amilase normais. A pesquisa de gordura fecal foi
descrita a fim de reduzir a incidência de fístula pan- negativa. A paciente foi encaminhada para quimio-
creática, objetivando diminuir os efeitos líticos das terapia adjuvante, tratamento que foi bem tolera-
enzimas pancreáticas na anastomose pancreático- do. Até a data de confecção deste artigo, a pacien-
-jejunal.3,4,5,6,7 te encontrava-se em bom estado geral e sem sinais
A ligadura do ducto pancreático pode inibir a de doença em atividade.
ativação das enzimas pancreáticas na luz intestinal,
impedindo as complicações relatadas.8,9 Discussão
Relata-se a seguir o caso de ligadura de ducto Julgou-se a realização de ligadura de ducto pancreá-
pancreático principal pós-fístula pancreático-jeju- tico principal, uma alternativa para o manejo de fís-
nal. tula de anastomose pancreatojejunal.
Destaca-se que, na evolução, mesmo com toda a
Relato de caso produção do pâncreas exógeno excluída, a paciente
Paciente do sexo feminino com 61 anos, em inves- não teve problemas na absorção alimentar. Obteve ga-
tigação para prurido. Exames de imagem eviden- nho de peso e permaneceu com níveis de glicemia
ciaram lesão tumoral em cabeça de pâncreas, me- normais. A permanência da função endócrina pós-li-
dindo 2,4 cm, ocasionando obstrução de via biliar gadura pancreática já foi evidenciada por Goldsmith10
intra e extra-hepática. em seu trabalho de ligadura versus implantação de
A paciente foi submetida a procedimento de ducto pancreático pós-duodenopancreatectomia. A
gastroduodenopancreatectomia associada à linfa- ausência de gordura fecal e o ganho de peso da pa-
denectomia regional mais jejunostomia. Em virtu- ciente contestam a má-absorção de nutrientes por fal-
de do achado intraoperatório de pâncreas amole- ta de enzimas pancreáticas. Enfatiza-se que em ne-
cido, optou-se pela realização da anastomose nhum momento foi feita reposição de enzimas
pancreatocojejunal pela técnica de telescopagem. pancreáticas.
No 5º dia do pós-operatório, houve início de fís- Usou-se de rotina a jejunostomia, a qual foi rea-
tula pancreática de alto débito (cerca de 1.200 lizada no ato da duodenopancreatectomia, por ser
mL/dia), confirmada pela dosagem de amilase do considerada de extrema importância nos casos com-
líquido de dreno. Em virtude da gravidade do caso, plicados, garantindo uma via alimentar segura e dis-
decidiu-se pela realização da ligadura do ducto tante das anastomoses realizadas. A nutrição paren-
pancreático. Após o procedimento, houve drena- teral total também deve estar disponível para uso
gem de secreção pancreática, mas em menor quan- em situações de complicação.
tidade (cerca de 200 mL/dia). A paciente ainda A metástase linfonodal em cabeça de pâncreas,
foi submetida, no 15º dia do pós-operatório, à gas- simulando um tumor primário, deve ser levada em
trostomia decompressiva em decorrência de este- consideração e lembrada a fim de diagnóstico dife-
nose da anastomose gastrojejunal por peritonite. rencial para tumores em cabeça de pâncreas.

46 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 45-47


Pizzol AC et al.

Grande estudo randomizado poderia dar mais 4. Grace PA, Pitt HA, Tompkins RK, Denbentsen L,
parâmetros sobre a utilidade e indicações da liga- Longmire WP. Jr. Decreased morbidity and mortality
dura de ducto pancreático. after pancreatoduodenectomy. Amer J Surg. 1986;
151:141-148.
Conclusão 5. Christ DW, Sitzmann JV, Cameron JL. Improved hospital
morbidity, mortality, and survival after the Whipple
A ligadura de ducto pancreático consiste em alter-
procedure. Ann Surg. 1987; 206; 358-365.
nativa para tratamento de fístula pancreática pós- 6. Trede M, Schwall G. The complications of pancreatec-
-duodenopancreatectomia. tomy. Ann Surg. 1988; 207:39-47.
7. Warshaw AL, Swanson RS. Pancreatic cancer in 1988.
Referências
Possibilities and probabilities. Ann Surg. 1988; 208:541-552.
1. Trede M, Schwall G. The complications of pancreatec- 8. Aretxabala X, Burgos L, Flores P, Nagakawa T, Miyazaki I,
tomy. Ann Surg. 1988; 207:39. Fonseca L. Pancreaticojejunostomy. Am Surg. 1991; 57:293.
2. Whipple AO, Parsons WB, Mullins CR. Treatment of 9. Shiu MH. Resection of pancreas without production of
carcinoma of ampulla of Vater. Ann Surg. 1935; 102:763. fistula. Surg Gynecol Obstet. 1982; 154:497.
3. Kümmerle F, Rückert K. Surgical treatment of pancreatic 10. Goldsmith HS, Ghosh BC, Huvos AG. Ligation versus
cancer. World J. Surg. 1984; 8(6): 889-894. implantation of the pancreatic duct after pancreatico-
duodenectomy. Surg Gynecol Obstet. 1971; 132:87.

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 45-4747


Relato de caso • Case report

Carcinoma de células de Merkel: um caso cutâneo primário fatal


com padrão imuno-histoquímico atípico

Merkel cell carcinoma: a fatal primary cutaneous case with an atypical


immunohistochemical pattern
Emmanuel Rodrigues de França1, Silvana Maria de Morais Cavalcanti2, Ângela Rapela de Medeiros2, Aldejane Rodrigues Gurgel3,
Eliane Ruth Alencar4, Márcia Almeida Galvão Teixeira2

1
Professor Doutor e Chefe do Departamento de Dermatologia do  Hospital Universitário Oswaldo Cruz, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade de
Pernambuco (UPE), Recife, PE.
2
Professor Doutor do Departamento de Dermatologia do  Hospital Universitário Oswaldo Cruz, Faculdade de Ciências Médicas, UPE, Recife, PE.
3
Preceptora do Departamento de Dermatologia do  Hospital Universitário Oswaldo Cruz, Faculdade de Ciências Médicas, UPE, Recife, PE.
4
Patologista e Preceptora do Departamento de Dermatologia do  Hospital Universitário Oswaldo Cruz, Faculdade de Ciências Médicas, UPE, Recife, PE.

Resumo
O carcinoma de células de Merkel é um tumor neuroendócrino cutâneo agressivo de alta mortalidade.
Seu polimorfismo clínico usualmente dificulta e retarda o diagnóstico. Relata-se o caso de um homem
de 62 anos, com lesão tumoral exulcerada de 2,5 cm de diâmetro no primeiro quirodáctilo esquerdo,
com evolução de seis meses e expansão nos últimos dois meses. A confirmação diagnóstica foi obtida
por meio dos estudos histopatológico e imuno-histoquímico, que revelaram carcinoma neuroendócrino.
O paciente desenvolveu síndrome paraneoplásica neurológica, evoluindo com choque séptico e óbito
após sete meses da avaliação médica inicial. O envolvimento extracutâneo foi excluído pelos exames de
imagem e achados de necrópsia, que não revelaram foco tumoral exceto o cutâneo, ratificando a
agressividade do carcinoma de células de Merkel. A dificuldade em se firmar o diagnóstico clínico, em
conformidade com a literatura, deve-se à raridade desse tumor e às diferentes formas de apresentação.
Palavras-chave: tumor, células de Merkel, carcinoma, extremidade superior.

Abstract
Merkel cell carcinoma is an aggressive cutaneous neuroendocrine tumor with a high mortality rate. Its
clinical polymorphism often hinders prompt diagnosis. This study presents the case of a 62-year-old male,
with an ulcerated tumor measuring 2.5 cm in diameter, which had developed on the left thumb over a
period of six months, having grown rapidly during the last two months. Diagnosis confirmation was
obtained through histopathological and immunohistochemical studies, which revealed neuroendocrine
carcinoma. The patient developed neurologic paraneoplastic syndrome and died of septic shock seven
months after his initial medical evaluation. Extracutaneous involvement was excluded by means of
imaging and autopsy findings, which revealed no other tumor foci other than cutaneous, confirming the
aggressiveness of Merkel cell carcinoma. The difficulty in confirming clinical diagnosis in accordance
with the literature was due both to the rarity of this tumor and the different forms of presentation.
Keywords: Merkel cell tumor, carcinoma, upper extremety.

Recebido: 24/7/2013
Aprovado: 23/8/2013

Estudo realizado no Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco, Recife, PE.

Correspondência: Márcia Teixeira – Hospital Universitário Oswaldo Cruz, Faculdade de Ciências Médicas da UPE, Rua Arnóbio Marques, 310, Santo Amaro,
Recife – PE, CEP 50100-130
E-mail: marciateixeira@folha.rec.br
Conflitos de interesse: não existem

48 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 48-51


França ER et al.

Introdução licas na derme, com núcleos arredondados e vesicu-


O carcinoma de células de Merkel (CCM) foi des- losos arranjados em ninhos (Figura 3), consideran-
crito pela primeira vez por Toker, em 1972.1 É uma do as hipóteses de tumor neuroendócrino, carcinoma
neoplasia cutânea rara, altamente agressiva e com basocelular e linfoma. A imuno-histoquímica utili-
mortalidade em torno de 30%.2,3 Apresenta um po- zou um painel de anticorpos que evidenciou diferen-
limorfismo clínico que dificulta e retarda o diagnós- ciação epitelial e neuroendócrina (imunorreativida-
tico, que é firmado a partir dos exames histopato- de à sinaptofisina e cromogranina A) das células
lógico e imuno-histoquímico.1,2 Descreve-se um tumorais e concluiu tratar-se de neoplasia neuroen-
caso de CCM de evolução rápida e êxito letal. dócrina, sendo o CCM o principal diagnóstico
(Tabela 1).
Relato de caso
Homem de 62 anos, pardo, com história de nódu-
lo indolor no polegar esquerdo com evolução de seis
meses e crescimento rápido nos últimos dois me-
ses, quando se tornou friável e sangrante. O exame
dermatológico demonstrou lesão tumoral, exulce-
rada, de cerca de 2,5 cm de diâmetro, envolvendo
toda a área distal do primeiro quirodáctilo esquer-
do (Figura 1 e Figura 2).

Figura 3.  Aspecto histopatológico da lesão


tumoral: proliferação de células basofílicas na
derme (hematoxilina-eosina).

Tabela 1.  Padrão imuno-histoquímico das


células tumorais.
Proteína S-100 Negativa
Antígeno gp100 Negativo
Sinaptofisina Positiva
Cromogranina A Positiva
Citoqueratina 20 (CK20) Negativa
Figura 1.  Lesão única tumoral localizada na
extremidade do primeiro quirodáctilo esquerdo. CK 40, 48, 50, 50,6 Positiva (em padrão dot)
Proteína p63 Positiva

A B Para exclusão de lesão metastática de carcinoma


neuroendócrino visceral, foram solicitados exames
de imagem de tórax, abdome e colonoscopia, e o
paciente foi encaminhado para a oncologia.
Após o diagnóstico, em menos de quinze dias o
paciente evoluiu com rebaixamento do nível de
consciência e mioclonias persistentes. A radiogra-
fia de tórax e ultrassonografia de abdome mostra-
Figura 2. Imagens detalhadas da lesão ram-se inalteradas. A tomografia computadorizada
tumoral. de crânio foi normal; porém, o exame do líquor evi-
denciou hiperproteinorraquia, considerando-se a
A biópsia incisional evidenciou ulceração superficial hipótese de síndrome paraneoplásica neurológica.
e proliferação de pequenas células tumorais basofí- O paciente necessitou de assistência ventilatória

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 48-5149


Carcinoma de células de Merkel: um caso cutâneo primário fatal com padrão imuno-histoquímico atípico

mecânica em unidade de terapia intensiva, evoluin- bora achados não típicos, como o observado neste
do para óbito por choque séptico após 47 dias. Pela caso, possam levar à confusão diagnóstica.7,8
indefinição quanto ao quadro neurológico e à pre- A imuno-histoquímica, que tem papel relevan-
sença de outros sítios de neoplasia, foi submetido te na confirmação microscópica, evidencia marca-
à necrópsia, a qual não demonstrou nenhum foco dores de diferenciação epitelial e neural. A enola-
tumoral exceto o cutâneo. se neuro-específica é o marcador mais constante,
podendo estar presentes a cromogranina A e a si-
Discussão naptofisina. As citoqueratinas 8, 18, 19 e 20 são
O interesse pela apresentação deste caso deve-se à marcadores frequentes, sendo a última presente em
raridade do carcinoma de células de Merkel, tumor 90% dos casos de CCM, o que contribui para dis-
neuroendócrino de comportamento biológico agres- tingui-lo do carcinoma pulmonar de pequenas cé-
sivo e mortalidade significativamente maior que a lulas.7 No presente relato, a negatividade para CK20
do melanoma (28% e 15%, respectivamente).2,3,4 chamou atenção para dois fatos: o cuidado de se
Neste caso, apresenta-se um paciente de 62 excluir o diagnóstico de CCM, tomando somente
anos, masculino, com lesão em extremidade. Essas como base a ausência de positividade para CK20,
características corroboram os achados da literatu- o que favorece o erro diagnóstico de tumor menos
ra, que descrevem a predominância do tumor em agressivo, evidência reforçada por Pilloni et al, que
áreas fotoexpostas, como cabeça, pescoço e mem- em 2009 descreveram caso semelhante.7 O segun-
bros.1,2,3 Em 90% dos casos, acomete a faixa etária do fato é a motivação para a investigação de um
acima de 50 anos, com idade média de 69 anos. Há foco primário visceral, especialmente o pulmonar.
discreta predominância do sexo masculino, além Neste relato, os exames de imagem e a necrópsia
de uma maior prevalência em pacientes imunossu- nada encontraram, confirmando sítio cutâneo pri-
primidos.1 mário e único do tumor.
O CCM apresenta-se geralmente como nódulo O tratamento de escolha para lesões pequenas
ou placa solitária, localizando-se principalmente em localizadas é a excisão cirúrgica com margens de 3
área fotoexposta. Possui normalmente cor eritêma- cm, ou a cirurgia de Mohs.8 Lesões extensas ou com
to-violácea, é geralmente menor que 2 cm de diâme- acometimento linfonodal e/ou visceral devem ser
tro e assintomático, de forma semelhante ao caso abordadas com exérese do tumor, radioterapia e/ou
descrito. No entanto, pode assemelhar-se a lipomas, quimioterapia.9
apresentando-se como massas subcutâneas.5 Carac- O prognóstico do CCM está associado ao diag-
teristicamente, apresenta expansão rápida em cerca nóstico rápido e à extensão da doença. A sobrevi-
de 2 a 3 meses, motivando a procura por assistência da para doença localizada é maior, decaindo quan-
médica.3 do há envolvimento linfonodal.10 Há tendência para
A etiologia do carcinoma de Merkel tem sido metástase a distância, principalmente para linfono-
atribuída também à descoberta recente de um novo dos, trato gastrointestinal e cérebro, geralmente em
poliomavírus humano em 80% dos tumores, que se poucos meses, reduzindo a expectativa de vida para
encontra presente em determinados tecidos nor- menos de 10% em três anos.11 O caso apresentado
mais, como o trato aéreo digestivo.4,6 evoluiu para óbito sete meses após a avaliação mé-
No presente caso, como na maioria dos casos dica, ratificando o caráter agressivo e letal do CCM.
relatados na literatura, não houve diagnóstico pre-
suntivo de CCM. Por sua raridade e apresentações
clínicas diversas, costuma ser confundido com le- Referências
sões benignas, como cistos e lesões acneiformes, e 1. Heath M, Jaimes N, Lemos B, et al. Clinical characteris-
até com tumores malignos.2,5 tics of Merkel cell carcinoma at diagnosis in 195
À microscopia óptica, no CCM, são observadas patients: the AEIOU features. American Academy of
células neoplásicas de núcleos redondos, vesiculosos, dermatology Journal. 2008 March; 58 (3): 375-81.
PMID: 18280333.
com citoplasma escasso, dispostas de forma agrupa-
2. Chiarelli TG, Grant-Kels JM, Sporn JR, et al. Unusual
da, podendo variar sua forma (de arredondadas a po-
presentation of a Merkel cell carcinoma. American
ligonais) e exibir cerca de três morfologias histopato- Academy of dermatology Journal. 2000 Feb; 42 (2-2):
lógicas: a trabecular, a de células intermediárias ou a 366-70. PMID: 10640935.
de pequenas células.2,7 Os achados histopatológicos 3. Akhtar S, Oza KK, Wright J. Merkel cell carcinoma:
podem sugerir a suspeição diagnóstica do CCM, em- Report of 10 cases and review of the literature. American

50 REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 48-51


França ER et al.

Academy of dermatology Journal. 2000 Nov; 43 profile. Eur J Histochem 2009 Oct-Dec; 53(4): 275-8.
(5):755-67. PMID:11050578. PMID: 20007099.
4. Rockville Merkel Cell Carcinoma Group. Merkel cell 8. Pulitzer MP, Amin BD, Busam KJ. Merkel cell carcino-
carcinoma: recent progress and current priorities on ma: review. Adv Anat Pathol 2009 May; 16(3): 135-44.
etiology, pathogenesis, and clinical management. J Clin PMID: 19395876.
Oncol 2009 Aug; 27(24): 4021-6. PMID: 19597021. 9. Guler-Nizam E, Leiter U, Metzler G, et al. Clinical
5. Sarma DP, Heagley DE, Chalupa J, et al. An unusual course and prognostic factors of Merkel cell carcinoma
clinical presentation of merkel cell carcinoma: a case of the skin. Br J Dermatol 2009 Jul; 161(1): 90-4. PMID:
report. Case Report Med; 2010: 905414, 2010. PMID: 19438439.
20300432. 10. Giannotti G, Lazzeri D, Viacava P, et al. Merkel cell
6. Loyo M, Guerrero-Preston R, Brait M, et al. Quantitative carcinoma of the lower extremity: report of four cases
detection of Merkel cell virus in human tissues and and new considerations Ann Plast Surg 2009 Jan; 62(1):
possible mode of transmission. Int J Cancer 2010 Jun 83-6. PMID: 19131727.
15; 126(12): 2991-6. PMID: 19588496. 11. Feletti A, Marton E, Rossi S, et al. Pituitary metastasis of
7. Pilloni L, Manieli C, Senes G, et al. Merkel cell Merkel cell carcinoma. J Neurooncol 2010 Apr; 97(2):
carcinoma with an unusual immunohistochemical 295-9. PMID: 19806319.

REV SBC - 2014 - VOL. 16 - N. 54 - 48-5151


INSTRUÇÕES PARA PUBLICAÇÃO DOS ARTIGOS
A missão da Revista da Sociedade Brasileira de Cancerolo- Atualizações: trabalhos descritivos e interpretativos, com
gia é a publicação de trabalhos científicos de pesquisado- fundamentação sobre a situação global em que se encon-
res nacionais e internacionais, relacionados à Cancerolo- tra determinado assunto investigativo ou potencialmente
gia, sendo os mesmos de inteira responsabilidade dos investigativo.
autores.
É proibida a reprodução, mesmo que parcial, sem a Comunicações breves e relatos de casos: estudos
devida autorização do editor, assim como a utilização para avaliativos, originais ou notas prévias de pesquisa conten-
fins comerciais de matéria publicada. Todos os manuscri- do dados inéditos e relevantes do fenômeno estudado. A
tos deverão ser submetidos à apreciação para possível pu- apresentação deve acompanhar as mesmas normas exigi-
blicação com exclusividade nesta revista. das para os artigos originais.

SUBMISSÃO DE ARTIGOS APROVAÇÃO PARA PUBLICAÇÃO


Os manuscritos deverão ser submetidos à aprovação dos Todos os trabalhos enviados serão previamente submeti-
pareceristas que fazem parte do conselho diretivo da re- dos à apreciação de dois ou mais membros do Conselho
vista. Os trabalhos deverão ser enviados para editorial13@ Editorial ou consultores ad hoc. Se aceitos, poderão estar
manole.com.br, com cópia para editorial8@manole.com. sujeitos a pequenas correções que não interfiram no es-
br, ou para Editora Manole – Av. Ceci, 672, Tamboré, Ba- tilo do autor. Outras modificações eventuais quanto à for-
rueri – SP – CEP 06460-120, aos cuidados de Juliana ma ou ao conteúdo só ocorrerão após prévia consulta aos
Penna. Para mais informações, ligar para (11) 4196-6000 autores. Quando recusados, os artigos serão devolvidos
– ramal 6062. com a devida justificativa do editor. Os comentários dos
consultores, nesses casos, poderão ser enviados pelo edi-
PERIODICIDADE tor ou solicitados pelo autor.
Trimestral Obs.: para aprovação final do texto, o autor e eventu-
ais coautores deverão assinar um Termo de Cessão de Di-
CATEGORIAS DE ARTIGOS reitos Autorais à Sociedade Brasileira de Cancerologia,
Além dos artigos originais, os quais têm prioridade, a cujo teor será enviado pelo editor. Cabe destacar que, se
Revista da Sociedade Brasileira de Cancerologia publica revi- a pesquisa tiver sido conduzida fora do Brasil ou com a
sões, atualizações, comunicações breves e relatos de casos. participação estrangeira, exige-se aprovação por Comitê
ou equivalente no país de origem.
Originais: são contribuições destinadas a divulgar resul-
tados de pesquisa original inédita, que possam ser repli- FORMAS DE APRESENTAÇÃO
cados e/ou generalizados. Devem atender aos princípios DOS TRABALHOS
de objetividade e clareza da questão norteada, digitados A redação deve ser clara e concisa. Os manuscritos deve-
em Times New Roman 12, com espaço duplo, margem rão ser encaminhados por e-mail e digitados em espaço
de 2,5 cm de cada um dos lados, perfazendo um total de duplo, tanto para título como para resumos, textos, legen-
no máximo 15 páginas (incluindo as ilustrações). As ta- das de gráficos, figuras ou tabelas e referências. Nunca
belas devem incluir apenas os dados imprescindíveis, evi- usar espaço simples. As páginas deverão ser numeradas
tando-se que sejam muito longas, com dados dispersos e no ângulo superior direito. As margens devem estar no
valores não representativos. Figuras serão aceitas, desde mínimo a 2,5 cm de cada borda da página. A apresenta-
que não repitam dados contidos em tabelas. Embora se ção deve conter:
respeitem a criatividade e o estilo dos autores, a estrutu-
ra do texto deve ser a convencional, contendo introdução, 1ª folha: Carta de encaminhamento do material
casuísticas (ou material) e métodos, resultados, discus- Declaração simples estabelecendo exclusividade de publi-
são, conclusão e referências bibliográficas. cação à Revista da Sociedade Brasileira de Cancerologia, caso
o artigo venha a ser publicado.
São também considerados artigos originais as formulações Obs.: a carta de encaminhamento do material deverá ser
discursivas de efeito teorizante e as pesquisas de meto- assinada por todos os autores, podendo ser em folhas se-
dologia qualitativa de modo geral. paradas.

Revisões: avaliação crítica sistematizada da literatura ou 2ª folha: Página de rosto


reflexão sobre determinado assunto, devendo conter con- Título do artigo na língua original e em inglês; nome(s)
clusões. Os procedimentos adotados e a delimitação do completo(s) do(s) autor(es), com titulação, cargo(s)
tema devem estar incluídos. ocupado(s), nome do Departamento e Instituição ou Ser-
viço ao qual o trabalho está vinculado, endereço eletrôni-
co e para correspondência.
Obs.: nomes de outros colaboradores podem ser citados • Nas figuras, as letras, os números e os símbolos devem
no final, em agradecimentos. ser claros e de tamanho suficiente para que, ao serem re-
duzidos para publicação, mantenham-se legíveis.
3ª folha: Resumo e palavras-chave
O resumo deverá ser em português e inglês, não deven- ABREVIATURAS
do exceder, em cada um, o limite de 200 palavras, con- Não são recomendáveis, exceto as reconhecidas pelo Sis-
tendo introdução e objetivo, métodos, resultados e con- tema Internacional de Pesos e Medidas, ou aquelas con-
clusão. Abaixo do resumo, os autores devem fornecer de signadas e consagradas nas publicações médicas. Quan-
3 a 10 unitermos/descritores, em português e em inglês do as abreviaturas forem em grande número, identificar
(keywords), utilizando os termos da chamada MESH seu significado na primeira ocorrência no texto.
(Medical Subject Headings) do Index Medicus. Todos os
artigos deverão apresentar, sequencialmente, os dois re- NOMES DE FÁRMACOS
sumos (em português e em inglês) na primeira página, in- Não é recomendável a utilização de nomes comerciais de
cluindo títulos e unitermos nos respectivos idiomas. drogas (marca registrada), mas, se essa referência for ne-
cessária no decorrer do texto, o nome comercial do pro-
4ª folha: Texto duto deverá vir após a citação do nome genérico, entre
Indicar o texto com o título do trabalho. Os artigos cien- parênteses, seguido do símbolo que caracteriza marca®.
tíficos devem conter: introdução, casuística (ou material)
e métodos, resultados, discussão, conclusão e referências CONSIDERAÇÕES ÉTICAS E LEGAIS
bibliográficas. Evitar o emprego de iniciais, nome ou número de regis-
Ao final do corpo do texto, podem vir agradecimentos, tro hospitalar de pacientes citados em artigos. Os pacien-
que devem ser breves e objetivos, contendo somente as tes não poderão ser identificados em fotografias, exceto
pessoas ou instituições que contribuíram significativa- com consentimento expresso, por escrito, que deve acom-
mente para o estudo. panhar o trabalho original. Os estudos realizados em se-
res humanos devem estar de acordo com os padrões éti-
5a folha: Referências bibliográficas cos e com o devido consentimento dos mesmos. Os dados
Devem ser enviadas segundo o formato Vancouver. publicados em outras revistas ou livros (tabelas e ilustra-
Link: http://library.vcc.ca/downloads/VCC_VancouverS- ções) devem conter as respectivas referências. A revista
tyleGuide.pdf reserva-se ao direito de não publicar trabalhos que não
obedeçam a essas e outras normas legais e éticas, estabe-
TABELAS, FIGURAS E FOTOS lecidas por diretrizes internacionais para pesquisa em se-
• As ilustrações devem limitar-se ao mínimo exigido pelo res humanos, incluindo a aprovação pela comissão ética
conteúdo do texto, não devendo ultrapassar o tamanho do do hospital onde o trabalho foi realizado e o consentimen-
manuscrito. Devem ser apresentadas em folhas separa- to do paciente, dado livremente, depois de informado.
das e numeradas consecutivamente, seguindo a ordem de
sua citação no texto, em números arábicos. CONSIDERAÇÕES FINAIS
• As figuras, as tabelas e os gráficos devem ter o posicio- Os artigos aceitos serão publicados após a autorização de
namento e as referências numéricas indicadas no arquivo impressão da prova gráfica dada por, pelo menos, um dos
de texto (as tabelas e as figuras devem ser identificadas na autores do artigo.
ordem de seu aparecimento, em algarismos arábicos
[1,2,3]). Todas devem conter legenda explicativa.
• As figuras devem ser encaminhadas em TIFF ou JPEG,
em 300 dpi (alta resolução) com 12 cm de largura, ou em
original fotográfico, ou slides, para que sejam escaneados
pela Editora.

Você também pode gostar