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members through cultural design that uses the art among its Recebido: 03 de Dezembro de 2019
strategies. Walden Two is then a privileged work to inves- Revisado: 10 de Fevereiro de 2020
tigate artistic behavior in Radical Behaviorism. This theo- Aprovado: 28 de Fevereiro de 2020
retical study aims to present a systematization about art in Como citar este documento
Walden Two. Excerpts from the book containing key words Vitti, G. R., & Laurenti, C. (2019). Arte e
associated with artistic productions were identified and reg- Comportamento Radical: Um Estudo de
Caso de Walden Two. Revista Brasileira
istered, producing information about: the characteristics of de Terapia Comportamental e Cognitiva.
artistic productions, the descriptive variables of artist and au- 21(3), 332-349. doi: https://10.31505/
rbtcc.v21i3.1377
dience behavior, and the ethical-political functions of artistic
behavior. As a kind of social control, the art needs to be con-
sidered in ethical-political discussions about cultural design.
Keywords: art, social control, cultural design, happiness, É permitido compartilhar e adaptar. Deve dar o crédito
apropriado, não pode usar para fins comerciais.
culture.
RESUMEN: Skinner revela en Walden Two una comunidad ficticia capaz de promover la feli-
cidad de sus miembros por medio de un planeamiento cultural que se utiliza, incluyendo otros
recursos, el arte. Walden Two aparece entonces como un trabajo privilegiado para investigar la
conducta artística en el conductismo radical. El objetivo de esta investigación teórica fue pre-
sentar una sistematización sobre arte en Walden Two. Mediante la búsqueda y registros de ex-
tractos del libro que contienen palabras clave relacionadas con producciones artísticas, fueran
compiladas información para resaltar: las características de las obras de arte, las variables des-
criptivas de la conducta del artista y del público, y las funciones ético-políticas del comporta-
miento artístico. Entendido como una forma de control social, el arte debe considerarse en las
discusiones ético-políticas sobre planeamiento cultural.
Palabras chave: arte, control social, planeamiento cultural, felicidad, cultura.
o que permite que os planejadores da comuni- ladas em WT, o que parece se opor às críticas
dade se concentrem em ações que potenciali- usualmente endereçadas ao comportamentalis-
zam o bem-estar e evitem sentimentos de rai- mo radical que o acusam de negligenciar ati-
va e desprazer (Skinner, 1948/2005). vidades humanas complexas como as criações
Desse modo, é possível afirmar que um dos artísticas (e.g., Chomsky, 1959).
objetivos que prevalece em WT é a felicidade de No entanto, se o comportamento artístico
seus habitantes. Nas palavras de Frazier, planeja- pode ser planejado e controlado, com qual pro-
dor e fundador da comunidade, “felicidade é nosso pósito isso deveria ser feito? Quais benefícios
primeiro objetivo . . .” (p. 194), e “nossa riqueza aos indivíduos e à cultura seriam fomentados
é nossa felicidade” (Skinner, 1948/2005, p. 255). pela arte? Diante dessas indagações, WT desta-
Essa felicidade, porém, não é resultado de ca-se como obra privilegiada na investigação das
contingências acidentais ou do acaso. A tese de- possíveis funções desempenhadas pelas ativida-
fendida no livro é a de que uma sociedade justa, des artísticas no planejamento de uma cultura.
igualitária e satisfatória só poderá ser alcançada Considerando esse panorama, o objetivo deste
mediante a aplicação de princípios de uma ciên- artigo é apresentar uma sistematização sobre a
cia comportamental que seja capaz de promover temática da arte em WT por meio de uma carac-
ações benéficas para a cultura e seus indivíduos terização das principais produções artísticas pre-
(Melo & Castro, 2015). Para atingir esse objeti- sentes na obra; do exame das variáveis descriti-
vo, há, na comunidade, uma série de planejadores vas do comportamento do artista e da audiência;
e administradores responsáveis por projetar dife- e da elucidação das funções ético-políticas do
rentes setores do local. Conforme explica Frazier, comportamento artístico naquela comunidade.
trechos contendo alguma das palavras seleciona- tísticas em WT. A Tabela 1 apresenta o número
das foram catalogados em uma tabela. de ocorrência de cada uma das palavras-cha-
As entradas dessa tabela apresentavam três co- ve, bem como a indicação dos capítulos e das
lunas, as quais foram utilizadas, respectivamente, páginas nas quais elas podem ser localizadas.
para a inserção do número do capítulo e da pági- As 23 palavras-chave selecionadas foram
na de cada trecho, a transcrição literal do excerto mencionadas 217 vezes em todo o livro, sendo
no qual os vocábulos selecionados foram men- que os termos com maior número de ocorrência
cionados, e a anotação de comentários que con- foram art, music, artist(ic) e leisure com, respec-
tribuíssem para análise ulterior. Com base nesse tivamente, 28, 23, 20 e 19 menções. Conforme
registro, as informações sobre o comportamen- representado na Tabela 1, as palavras relaciona-
to artístico em WT foram produzidas e compi- das às produções musicais, como Bach, Beetho-
ladas a partir de duas estratégias de análise: 1) ven, concert, Mozart e music, somam o maior nú-
uma sistematização quantitativa das menções às mero de termos encontrados, com 47 menções1.
palavras-chave selecionadas; e 2) a construção Destaca-se também o elevado número de ocor-
de eixos temáticos que permitiram elaborar uma rências dos vocábulos associados ao cinema e
descrição sistemática do comportamento artístico ao teatro (e.g., theater, audience e movie), com
tanto em relação a seus produtos (tipos de obras 33 menções, e à pintura e escultura (e.g., gallery,
de arte presentes em WT) quanto em termos de museum, painting, picture e sculpture), com 30.
seus efeitos para o indivíduo e a comunidade. A Tabela 1 mostra, outrossim, que as pala-
vras-chave relacionadas à arte foram encontra-
Resultados e Discussão das em 31 dos 36 capítulos de WT, sendo que
apenas os capítulos 1, 2, 12, 13 e 34 não apre-
As informações geradas por meio da aplica- sentaram nenhum dos vocábulos pesquisados.
ção das estratégias de análise mencionadas se- O número de ocorrência dos termos asso-
rão apresentadas de duas formas sucessivas: 1) ciados à arte e a distribuição deles ao longo
uma descrição quantitativa da ocorrência das do livro demonstram que a temática da arte é
palavras-chave selecionadas; e 2) uma análise bastante discutida na obra, o que assinala sua
do comportamento artístico em WT, orientada importância no planejamento cultural em WT.
por três eixos temáticos. São eles: produções
artísticas de WT; variáveis descritivas do com- As produções artísticas em Walden Two
portamento do artista e da audiência; e função
ético-política do comportamento artístico em A comunidade de Skinner apresenta dife-
WT. Cada um desses eixos será descrito separa- rentes tipos de obras de arte, sendo menciona-
damente com o objetivo de dar relevo aos prin- dos, ao longo de todo o livro, quadros e pintu-
cipais aspectos concernentes a cada um deles. ras (e.g., p. 23, 24, 28, 40, 81, 142, 154, 231),
esculturas (e.g., p. 81, 142, 229), teatro (e.g., p.
Descrição quantitativa das menções 35, 198) e literatura (e.g., p. 30, 110, 125, 148,
à arte em WT 185, 198, 301). É possível encontrar também
1
Considerando que a análise de uma dada obra pode
As menções aos termos relacionados à te- indicar os valores pessoais do autor e da cultura a
mática da arte foram quantificadas registran- qual ele pertence (Wolpert, 2005), o maior número de
do-se a ocorrência de cada uma delas ao longo menções a termos relacionados às produções artísti-
cas musicais pode ter relação com a própria educação
dos 36 capítulos do livro, o que contribuiu para e interesses musicais de Skinner, voltados sobretudo
avaliar a importância atribuída às atividades ar- para a música erudita (ver Wiener, 1996, p. 12, 143).
passagens que tratam sobre moda (e.g., p. 29, As obras artísticas de WT não possuem um
30, 66) e outras que descrevem cantatas e con- padrão característico único que seja capaz de
certos sinfônicos, sendo, como já indicado, a descrevê-las de modo amplo e generalizado.
música a categoria artística com maior presen- As pinturas, as músicas, e todas as demais ar-
ça ao longo do livro (e.g., p. 33, 34, 35, 75, 77, tes são descritas como originais, harmoniosas e
81, 84, 154, 185, 186, 200, 236, 261, 265, 275, diversificadas, uma vez que cada uma se apro-
300). Outros tipos de arte também são referen- xima de um estilo artístico diferente, além de
ciados no decorrer dos capítulos, como cinema serem utilizadas técnicas variadas e, em mui-
(e.g., p. 30, 35, 55, 168, 191, 192), dança (e.g., tos casos, inovadoras (e.g., p. 23, 29, 30, 81,
p. 168), desenhos e tapeçaria (e.g., p. 206). 82, 142, 185, 200).
Tabela 1.
Ocorrências das palavras-chave nos capítulos e páginas do livro Walden Two
Número de
Palavras-chave Capítulos Páginas
ocorrências
4, 5, 6, 8. 10, 11, 14, 23, 30, 34, 48, 69, 71, 80, 84, 104, 114, 116, 142,
Art 28
15, 19, 20, 27, 29, 32 164, 212, 221, 237, 259, 275
4, 11, 15, 17, 19, 20, 23, 80, 116, 135, 144, 154, 206, 222, 237, 259, 275,
Artist(ic) 20
26, 27, 29, 32 276
Arts and crafts 3 15, 20, 26 110, 148, 203
Audience 9 6, 11, 22 36, 78, 80, 82, 83, 172
Bach 7 10, 11, 23 73, 75, 77, 82, 186
Beethoven 1 11 78
Concert 15 3, 6, 10, 11, 29, 31 20, 35, 75, 77, 78, 81, 82, 236, 265
Entertain(ment) 8 3, 6, 11, 14, 18, 20, 32 20, 36, 77, 106, 141, 163, 268
Fame 2 20 156
Fashion 5 5, 9, 14, 29 29, 30, 66, 101, 252
Gallery 2 4, 19 23, 142
Idleness 3 8, 18, 20 58, 139, 147
3, 7, 8, 9, 10, 11, 20, 15, 40, 50, 51, 54, 64, 69, 76, 80, 84, 148, 157, 165,
Leisure 19
25, 26 197, 203, 204
Literature 6 5, 15, 16, 20, 25 30, 110, 113, 125, 148, 200
Mozart 1 31 265
Movie 9 5, 6, 8, 21, 24, 35 30, 35, 56, 168, 191, 192, 295
Museum 3 19, 24, 32 142, 191, 273
5, 6, 11, 15, 23, 25, 33, 34, 78, 80, 81, 82, 83, 84, 114, 185, 200, 201,
Music 23
30, 31, 32, 36 261, 266, 275, 300
Painting 5 4, 11, 20 23, 84, 154
3, 4, 5, 7, 16, 19, 20, 19, 24, 28, 40, 124, 142, 144, 154, 168, 206, 259, 268
Picture 15
21, 26, 29, 32
Sculpture 5 4, 11, 19, 28 24, 84, 142, 229
8, 11, 15, 17, 20, 24, 50, 54, 80, 109, 117, 134, 148, 191, 203, 218, 274,
Talent 13
26, 27, 32, 33 280
3, 6, 10, 11, 18, 25, 20, 35, 37, 38, 75, 76, 77, 83, 84, 138, 198, 230, 236
Theater 15
28, 29
Total 217
Esse aspecto diversificado das produções quências, e as pessoas olham para pinturas de-
artísticas pode ser identificado em alguns mo- vido às consequências. Em termos tradicionais,
mentos da narrativa. A descrição das produ- pode-se dizer que as consequências definem os
ções musicais, por exemplo, sugere que elas propósitos da arte” (p. 345, itálicos adicionados).
não seguem um único estilo estético, sendo Partindo dessa concepção consequencialis-
encontradas menções a composições de músi- ta, foram identificadas possíveis variáveis que
cos clássicos como Mozart (e.g., p. 265), bar- controlam o comportamento do artista e de sua
rocos como Bach (e.g., p. 73, 77, 186) e Han- audiência em WT.
del (e.g., p. 186), românticos como Beethoven
(e.g., p. 78) e Schumann (e.g., p. 200), e, até Variáveis descritivas do comportamento
mesmo, música popular (e.g., p. 236). do artista
Os personagens também relatam que as obras
artísticas, como as pinturas, possuem tamanhos, Os reforçadores do comportamento artístico
cores e conteúdos variados, mantendo sempre
uma qualidade profissional notória. Isso fica cla- Qualquer indivíduo em WT, seja ele mem-
ro quando o personagem Burris, ao passear por bro ou visitante, pode ser considerado um ar-
um dos corredores do edifício principal da co- tista em potencial. Isso significa que todos os
munidade, observa que as pinturas ali expostas habitantes da comunidade estão virtualmen-
“eram surpreendentemente vigorosas e inovado- te aptos a produzir algum tipo de obra de arte,
ras, em muitos estilos, e, quase sem exceções, tendo em vista que as contingências que con-
feitas com competência. Eu tinha visto muitas trolam o comportamento artístico são planeja-
exposições profissionais menos interessantes do das para que qualquer um possa aprender e de-
ponto de vista técnico e certamente muito me- senvolver tais habilidades.
nos empolgantes” (Skinner, 1948/2005, p. 23). O destaque dado ao planejamento das ati-
Outra passagem que ilustra o caráter mul- vidades artísticas em WT dá relevo à concep-
tifacetado e arrojado das produções artísticas ção analítico-comportamental, segundo a qual
é encontrada em uma afirmação de Frazier, na os talentos artísticos e as aptidões são entendi-
qual ele defende que os avanços obtidos na dos como comportamentos aprendidos ao lon-
área da música possibilitarão que WT desen- go da história de vida do indivíduo (Skinner,
volva seu próprio gênero musical. Segundo o 1974). Conforme sugere Frazier:
personagem, “nosso público cresce com nos-
sos compositores. Naturalmente, vamos desen- Sabemos alguma coisa sobre as circunstâncias
volver nosso próprio gênero. É o alvorecer – da vida de uma criança que lhe dão uma mente
o alvorecer, pelo menos, de uma Era de Ouro” matemática? Ou que fazem com que ela seja
(Skinner, 1948/2005, pp. 82-83). musical? Quase nada! Essas coisas são deixa-
As obras de arte parecem ocupar lugar central das ao acidente ou atribuídas à hereditarieda-
na vida cotidiana dos habitantes de WT, tendo, de. Adoto uma visão mais otimista: podemos
por conseguinte, um importante papel na organi- analisar o comportamento efetivo e projetar
zação social da comunidade. No entanto, a fun- experimentos para descobrir como gerá-lo em
ção social do comportamento artístico só pode ser nossa juventude. (Skinner, 1948/2005, p. 275)
descrita quando se observam as consequências
que ele produz em determinado contexto (Skin- Em outro momento, ao se referir às oportu-
ner, 1953). Como declara Skinner (1970/1999), nidades de desenvolvimento artístico ofereci-
os “artistas pintam quadros por causa das conse- das em WT, o mesmo personagem declara que
Se você mora em Walden Two e gosta de o uso desse tipo de eventos reforçadores é mi-
música, você pode ir tão longe quanto qui- nimizado. Frazier argumenta que
ser. Não quero dizer alguns minutos no dia
– quero dizer todo o tempo e energia que Quando um homem consegue um lugar ao sol,
você pode dar à música e permanecer saudá- outros são colocados na sombra. Do ponto de
vel. Se você quiser ouvir, há uma extensa bi- vista de todo o grupo, não há ganho algum, e tal-
blioteca de registros e, claro, muitos concer- vez uma perda . . . Um triunfo sobre outro ho-
tos, alguns deles bastante profissionais . . . . mem nunca é um ato louvável. Nossa decisão de
Se você quer se apresentar, você pode obter eliminar o engrandecimento pessoal surgiu na-
instruções sobre quase todos os instrumen- turalmente do fato de que estávamos pensando
tos de outros membros – que recebem crédi- em todo o grupo. (Skinner, 1948/2005, p. 156)
tos por isso. (Skinner, 1948/2005, pp. 81-82)
Se os indivíduos daquela sociedade não pin-
Ao afirmar que determinados habitantes re- tam, tocam ou escrevem devido àqueles reforçado-
cebem créditos de trabalho pelo ensino de ins- res, quais consequências são produzidas por suas
trumentos musicais, Frazier indica que há, em ações? Opondo-se ao uso preponderante de refor-
WT, indivíduos que trabalham profissionalmen- çadores artificiais, os planejadores de WT estabe-
te com arte, os quais exercem, no escopo das lecem contingências para que o comportamento
quatro horas de expediente diário da comuni- do artista seja reforçado predominantemente por
dade, atividades relacionadas à educação artís- reforçadores naturais, isto é, pelas consequências
tica, recebendo, em troca, créditos de trabalho. que dependem direta e exclusivamente da reali-
Não obstante, é preciso ressaltar que a arte zação de atividades artísticas. A melodia de uma
de WT não está restrita ao trabalho desses pro- música, bem como os traços e cores de uma pin-
fissionais, uma vez que, como já indicado, as tura são alguns dos reforçadores produzidos pelo
produções artísticas podem ser realizadas por comportamento artístico (Skinner, 1970/1999).
todos os habitantes da comunidade, muitos Além disso, embora reforçadores positivos usu-
deles com outras ocupações. Em determinado almente provoquem sensações de prazer e bem-
momento da narrativa, por exemplo, o perso- estar, Skinner (1974) argumenta que os reforça-
nagem Burris encontra Frazier tocando piano dores positivos naturais2 estão mais fortemente
juntamente com um quarteto de cordas em uma relacionados com esses sentimentos. Segundo ele,
sala. Ao elogiá-lo, recebe como resposta “mero “um artista, compositor ou poeta ‘natural’ se com-
amador . . . mero amador! Há cinquenta pianis- portará de maneira idiossincrática e estará mais
tas em Walden Two que podem tocar melhor. E propenso a sentir as condições corporais chama-
eles tocam . . .” (Skinner, 1948/2005, p. 202). das excitação ou alegria, associadas a reforçado-
A passagem sugere que os créditos de tra- res ‘naturais’” (Skinner, 1974, p. 126).
balho não são os principais responsáveis por
Não parece haver uma definição inequívoca de reforça-
2
controlar comportamentos relacionados à arte dor natural e arbitrário na Análise do Comportamento,
em WT. Tampouco outros eventos potencial- e a distinção entre eles é ainda controversa (Dorigon &
mente reforçadores comumente atrelados ao Andery, 2015). Para evitar ambiguidade, é pertinente
explicitar que o termo “natural” não está sendo utilizado
comportamento artístico, como fama, adora- neste texto como sinônimo de reforçador primário. O
ção, renome, e prestígio social, não parecem termo descreve um tipo de consequência que é produzi-
exercer influência significativa sobre o com- da diretamente pelo comportamento do indivíduo sem
a intermediação de agentes externos à contingência, ou
portamento dos artistas. O planejamento cul- seja, sem a mediação de comportamentos de outros su-
tural de WT envolve contingências nas quais jeitos (ver Moreira & Medeiros, 2019).
Voltando a WT, os sentimentos de prazer re- to artístico, por exemplo, o autor declara:
latados pelos artistas ao longo da narrativa são
alguns dos indicativos de que o comportamen- Uma relação entre arte e tempo livre tem sido
to desses indivíduos pode estar sendo controla- reconhecida há muito tempo. O homem primi-
do por um processo de reforçamento natural. Isso tivo teve que se livrar de uma constante preo-
pode ser observado no momento em que Burris cupação com comida, abrigo e segurança an-
avista Frazier tocando piano com um quarteto de tes que pudesse começar a decorar suas roupas,
cordas. Embora Frazier cometa alguns erros no sua moradia, suas armas, e seu corpo, e final-
decorrer da melodia, a descrição do episódio su- mente criar coisas com nenhuma outra função
gere excitação e alegria em seu diálogo com os além de serem decorativas. Quando civiliza-
demais músicos. Ele diz “Obrigado! Obrigado! . ções alcançam o estágio no qual muitas pes-
. . Vocês são anjos! Anjos! . . . Por favor, deixe- soas desfrutam de tempo livre, frequentemen-
-me tocar de novo em breve . . . Se vocês soubes- te começam grandes períodos de arte. (Skinner,
sem o quanto isso significa para mim!” (Skinner, 1970/1999, p. 344)
1948/2005, p. 201). A solicitação de Frazier por
uma nova oportunidade para tocar indica que seu Assim, a existência de longos períodos de
comportamento artístico foi, muito provavelmente, tempo livre parece ser fator fundamental para
reforçado pelas próprias consequências que pro- propiciar a ocorrência de arte em WT. Como
duziu, como a melodia agradável da canção exe- reconhece Frazier:
cutada e a socialização com outros indivíduos.
Além de consequências reforçadoras positivas Nós simplesmente evitamos o trabalho não cria-
naturais, a ocorrência de comportamentos artísticos tivo e desinteressante . . . O que pedimos é que
em WT é favorecida por outros fatores, que ganham o trabalho de um homem não sobrecarregue
relevo quando Frazier menciona algumas condi- sua força nem ameace sua felicidade. Nossas
ções necessárias para que ações artísticas aconte- energias podem então ser voltadas para a arte,
çam na comunidade: “esse é o ponto. Condições a ciência, o jogo, o exercício de habilidades, a
certas, isso é tudo. Condições certas. Tudo que satisfação de curiosidades, a conquista da natu-
você precisa. (Desculpe-me.) Tudo que você pre- reza, a conquista do homem – a conquista de si
cisa. Dê a eles uma chance, só isso. Tempo livre. mesmo, mas nunca dos outros. Nós criamos o
Oportunidade. Apreciação” (Skinner, 1948/2005, lazer sem escravidão, uma sociedade que não
p. 84). Essas três condições mencionadas por Fra- explora e nem faz guerra. (Skinner, 1948/2005,
zier precisam, então, ser analisadas detalhadamente. p. 69, itálicos adicionados)
Condições necessárias para a ocorrência do Ao afirmar que sua comunidade fictícia pos-
comportamento artístico sibilita a existência de um lazer sem escravidão,
Skinner defende que o tempo livre dos morado-
Baseando-se no discurso de Frazier, três con- res do local não é utilizado como meio de fuga ou
dições necessárias para a ocorrência do compor- esquiva de situações aversivas, uma vez que es-
tamento artístico se destacam: tempo livre, opor- sas circunstâncias não parecem existir em WT3.
tunidade e apreciação. Em relação à primeira Embora Skinner tenha sugerido que o planejamento
3
delas, cabe salientar que a importância do tem- cultural de WT não utiliza nenhum tipo de contro-
po livre é discutida por Skinner em outros mo- le aversivo, Martins, Carvalho Neto e Mayer (2017)
criticaram essa tese argumentando que é possível
mentos de sua obra (e. g., Skinner, 1969/2013, encontrar na obra exemplos de contingências aver-
1986, 1970/1999). Ao analisar o comportamen- sivas em diferentes trechos.
Contudo, o autor também argumenta que sem Além desses aspectos, WT parece abando-
um planejamento cultural adequado, as pessoas nar práticas de controle coercitivo que pos-
com muito tempo livre podem também se com- sam, mesmo que indiretamente, suprimir as
portar de modo pouco significativo no mundo, ações criativas. Isso pode ser verificado no se-
tendo em vista que nesses períodos os indivíduos guinte trecho:
não têm a necessidade de agir de nenhum modo
específico (Skinner, 1969/2013). É neste ponto Um bebê explora naturalmente tudo o que
que Skinner assinala a segunda condição pri- consegue, a menos que forças restritivas já
mordial para a produção de arte: a oportunidade. estejam em ação. E essa tendência não mor-
Com a ausência de condições propícias para agir re, é inibida. Fizemos um levantamento sobre
de modo relevante, produzindo arte ou ciência, a motivação da criança não-inibida e desco-
por exemplo, os indivíduos agem muito pouco, brimos mais do que poderíamos usar. Nosso
dormindo ou se tornando apenas espectadores trabalho de engenharia era preservá-la, forta-
da vida dos outros (Skinner, 1969/2013, 1986). lecendo a criança contra o desânimo. (Skin-
São esses comportamentos que WT se propõe ner, 1948/2005, p. 114)
a evitar por meio de seus planejadores e adminis-
tradores. Embora tenham muito tempo livre, os Assim, observa-se que práticas punitivas
habitantes do local não se sentem culpados e nem podem influenciar as ações artísticas, supri-
entediados, pois há contingências que estabele- mindo a sua ocorrência. Nessa perspectiva, é
cem oportunidades diferentes para se fazer algo. fundamental que uma sociedade que favore-
Segundo Frazier, a despeito de terem abandona- ça a criação de obras de arte faça uso adequa-
do o trabalho pesado, “não quero dizer que de- do da terceira condição relatada por Frazier:
sejamos ser inativos – provamos que a ociosida- a apreciação.
de não é vantajosa. Mas o trabalho doloroso ou
desinteressante é uma ameaça para a saúde físi- Variáveis descritivas do comportamento
ca e psicológica” (Skinner, 1948/2005, p. 147). da audiência
Para promover oportunidades de ocorrência
de comportamentos artísticos, WT utiliza-se de Os reforçadores do comportamento de
diferentes meios. Todas as pessoas, indepen- apreciação
dentemente da idade ou do trabalho, possuem
acesso a salas com materiais artísticos, podendo Se todos os habitantes de WT podem, em
também participar de grupos de teatro, corais e tese, produzir arte, todos também parecem es-
orquestras (e.g., p. 34, 35, 75, 81, 82, 85, 200, tar capacitados para apreciá-la. Nas palavras
236). O fácil acesso a instrumentos musicais, de Frazier:
e a presença de locais apropriados para a ocor-
rência de comportamentos artísticos são algu- Você não pode incentivar a arte apenas com
mas das contingências que oferecem ocasiões dinheiro. O que você precisa é de uma cul-
propícias para agir artisticamente no tempo li- tura. Você precisa de uma oportunidade real
vre. Outras condições também são menciona- para jovens artistas. A carreira deve ser eco-
das, como a possibilidade de aprender teorias nomicamente sólida e socialmente aceitável,
e técnicas artísticas sem a necessidade de ins- e os prêmios não farão isso. E você precisa de
tituições formais, e a exposição constante a es- apreciação – deve haver público, não para pa-
paços com presença marcante de obras de arte, gar as contas, mas para desfrutar. (Skinner,
como os corredores e as salas de jantar. 1948/2005, pp. 80-81, itálicos adicionados)
De maneira geral, o comportamento de apre- Ela [uma pintura] é reforçadora porque se as-
ciação pode ser compreendido como uma clas- semelha a coisas reais, mas estas são refor-
se de ações com diferentes topografias, tais çadores por outras razões . . . Contingências
como: ir até locais em que as produções artísti- de sobrevivência na evolução da raça huma-
cas estão expostas; assistir teatros e concertos; na têm feito da figura humana um importan-
ouvir música; olhar e tocar quadros e escultu- te reforçador visual, e ela é, claramente, as-
ras; fazer comentários; aplaudir; e, até mesmo, sunto comum na arte de muitas culturas. Os
criticar produtos ou ações artísticas (Skinner, alimentos tornam-se reforçadores por ou-
1948/2005). tras razões biológicas, e não surpreende que
Burris, Castle, Bárbara e até mesmo Fra- as pessoas, de vez em quando, penduravam
zier são alguns dos personagens de WT que quadros de frutas, peixes e caça em suas sa-
acompanham as produções artísticas cons- las de estar. Retratos de pessoas que amamos
tantemente, observando, assistindo e, em al- ou admiramos nos permitem ver essas pesso-
guns casos, tecendo comentários e críticas. as em sua ausência, e quando o jovem aman-
As impressões relatadas por eles são diver- te beija o retrato de sua amada, ele está ape-
sas, ainda que descrevam, repetidamente, a nas exemplificando, de maneira conspícua,
alta qualidade técnica e a beleza das criações. o tipo de coisa que todos fazemos quando
Ao caminhar pelos corredores, por exemplo, olhamos para um retrato: nos comportamos
Burris afirma que diante do retrato, até certo ponto, como nos
comportaríamos diante da pessoa retratada.
notei muitas pinturas nos salões e salas de (Skinner, 1970/1999, pp. 346-347)
leitura, algumas em uma escala bastan-
te ambiciosa. Havia também pequenas es- Assim, a história da arte e de suas inúmeras
culturas. Eu tinha aprendido que a maioria correntes estéticas pode ser compreendida como
dos quartos individuais continha imagens a trajetória dos diferentes reforçadores do com-
de esculturas emprestadas de uma coleção portamento do artista e de sua audiência ao longo
comum. Minha turnê mostrou-se mais con- da história da humanidade (Skinner, 1970/1999).
veniente e, em muitos aspectos, mais agra- Além das consequências reforçadoras, ou-
dável do que uma visita a um museu. Ge- tras condições também são indispensáveis para
ralmente era possível colocar uma cadeira compreender os motivos pelos quais crianças,
se eu quisesse passar algum tempo obser- adultos, e demais membros da comunidade ou
vando um trabalho em particular e, de al- até mesmo visitantes desempenham o papel de
guma forma, eu sentia um prazer adicional audiência em contextos variados, seja nos cor-
com o fato de os quartos serem habitados. redores, nas salas de estudo ou nos quartos par-
(Skinner, 1948/2005, p. 142) ticulares dos moradores.
Frazier: “nosso teatro comporta cerca de du- te, no tempo consumido, muitas vezes com
zentas pessoas. Essa é a nossa maior multidão. mau tempo também . . . Se alguém tiver de
Quando acontece de uma peça ou filme interes- enfrentar todos esses problemas, nada me-
sar a todos nós – e isso é raro – ela é simples- nos que uma performance de duas ou três
mente repetida até que todos a vejam” (Skin- horas satisfará. (Skinner, 1948/2005, p. 78)
ner, 1948/2005, p. 35).
Além desses locais, outros contextos que Os planejadores da comunidade procuram,
ensejam comportamentos de apreciação fo- então, minimizar as situações aversivas que cos-
ram identificados em WT. Em primeiro lugar, tumeiramente devem ser enfrentadas para que
muitas das atividades artísticas existentes na o comportamento apreciador ocorra. Os mem-
comunidade são anunciadas em um quadro de bros da comunidade não precisam se preocu-
avisos localizado em um dos corredores prin- par com eventuais problemas no trânsito, por
cipais. Nele são expostos anúncios de peças de exemplo, e nem mesmo com longas filas nas
teatros, concertos e cantatas, os quais descre- portas do teatro ou preços de ingresso abusivos.
vem informações relevantes sobre cada even- Todavia, é necessário ressaltar que as estra-
to, como o horário de início e o local de apre- tégias voltadas para a diminuição do custo de
sentação, constituindo situações antecedentes emissão das ações de apreciação não garantem
discriminativas para a emissão de comporta- necessariamente que os indivíduos irão se com-
mentos de apreciação. portar como audiência. Nesse sentido, há a ne-
Adicionalmente, outros aspectos da organi- cessidade de uma educação capaz de tornar o
zação da comunidade favorecem a conduta da comportamento dos indivíduos mais sensível à
audiência. As obras de arte de WT, especial- arte. Nas palavras de Skinner (1969/2013), “a
mente pinturas e esculturas, são expostas em educação pode fazer muito mais do que agora
locais com grande circulação de pessoas, de faz nessa direção. Ela pode ensinar as habili-
modo a diminuir o custo da resposta de apre- dades exibidas por artistas, músicos e artesãos.
ciação. Corredores dos edifícios, salas de jan- Pode construir um interesse sustentado na lite-
tar e até mesmo os quartos individuais são al- ratura, bem como nas artes e na música” (p. 80).
guns dos contextos em que a arte aparenta estar Em determinado momento, Frazier apresenta
sempre presente, o que facilita o contato dos indícios de que tal educação já esteja presen-
indivíduos com essas obras. te na comunidade, pois, segundo ele, faz parte
A diminuição do custo de emissão dos com- dos princípios do local “incentivar as crianças
portamentos da audiência também é empre- em todas as artes e ofícios. Temos muito prazer
gada na organização das peças de teatro e das em dedicar tempo para instruí-los, pois sabe-
apresentações musicais em WT. Frazier defen- mos que é importante para o futuro de Walden
de, por exemplo, que os eventos teatrais sejam Two e também para nossa própria segurança”
gratuitos e acessíveis, além de serem rápidos e (Skinner, 1948/2005, p. 110).
sem exageros. Segundo ele Parecem existir em WT práticas educacio-
nais que propiciam o ensino de teorias e méto-
Não faz sentido um longo concerto – não dos artísticos ainda nos primeiros anos de vida
aqui, pelo menos . . . Na cidade, um concer- das crianças. Entretanto, essa educação não se
to de cinquenta minutos seria impossível. propõe a ensinar estilos ou características que
Ninguém pagaria por ele . . . . o custo do in- devam ser, obrigatoriamente, seguidos pelos
gresso é apenas uma pequena parte do que indivíduos. Trata-se de educar a sensibilidade
se paga por um concerto. Pense no transpor- das pessoas, promovendo uma alteração estéti-
a produção de artistas e de obras de arte? Uma voltadas a promover a felicidade dos indivíduos
sociedade com maior número de pintores, escri- (Tamura & Laurenti, 2017). O autor exemplifica
tores, atores, e músicos deveria ser almejada? essa tese mostrando que a infelicidade das pes-
soas na sociedade ocidental não é explicada pela
Função ético-política da arte ausência de eventos prazerosos. Ao contrário,
em Walden Two “o ocidente é especialmente rico em coisas que
chamamos de interessantes, bonitas, deliciosas,
Ao propor uma comunidade fictícia regida divertidas e excitantes” (Skinner, 1986, p. 571).
por princípios comportamentais, Skinner de- O problema é que esses eventos prazerosos
fendeu que a ciência deveria ser utilizada para geralmente são disponibilizados sem qualquer
promover práticas culturais consideradas bené- relação de contingência com comportamentos
ficas para o sujeito e sua cultura (Melo & Cas- relevantes ou úteis para o indivíduo e a socie-
tro, 2015). Consequentemente, as ações dos dade. No ocidente, as pessoas ou não precisam
planejadores e administradores do local deve- fazer quase nada para produzir aqueles eventos,
riam ter como objetivo assegurar uma vida fe- ou precisam emitir nada mais que o comporta-
liz aos indivíduos, sem que as atividades que mento que estabelece o contato com eles, como
propiciem essa felicidade ameacem a sobrevi- apertar botões de televisão, telefones, compu-
vência de todo o grupo (Skinner, 1948/2005). tadores, ou simplesmente ver ou ouvir (Skin-
Como destaca Frazier: “a felicidade é o nos- ner, 1986). Nas palavras do autor
so primeiro objetivo, mas um impulso vivo e
ativo em direção ao futuro é o nosso segundo” Essas coisas tornam a vida cotidiana mais re-
(Skinner, 1948/2005, p. 194). forçadora, mas reforçam pouco mais do que
Conforme argumenta Skinner (1974), a feli- o comportamento que coloca a pessoa em
cidade pode ser definida como “um sentimen- contato com elas. Imagens bonitas reforçam
to, um subproduto do reforçamento operante. olhar para elas; comidas deliciosas reforçam
As coisas que nos tornam felizes são as que nos comê-las; atuações divertidas e jogos exci-
reforçam, contudo, são as próprias coisas, não tantes reforçam assistir a eles; e livros inte-
os sentimentos, que devem ser identificadas e ressantes reforçam lê-los – mas nada mais é
usadas na previsão, controle e interpretação” feito. (Skinner, 1986, p. 571)
(pp. 70-71). As consequências reforçadoras po-
sitivas são fundamentais para uma vida apra- Embora mantenha considerável abundância
zível, na medida em que produzem, de acordo de reforçadores positivos, WT parece se distan-
com Skinner (1974), dois efeitos principais: um ciar dessas práticas ocidentais na medida em
comportamental e outro corporal. O primeiro que seus planejadores organizam contingên-
deles consiste no fortalecimento da ação, au- cias para que as pessoas não apenas apreciem
mentando a probabilidade de ocorrência de um as produções artísticas de outros moradores,
comportamento semelhante no futuro. Já o se- mas também se engajem em comportamentos
gundo é descrito como a produção de sensações que as levem, por exemplo, a produzir suas pró-
corporais agradáveis e prazerosas, as quais de- prias obras artísticas. Desse modo, o planeja-
sempenham importante papel na obtenção de mento cultural em WT, seja favorecendo o pró-
bem-estar e satisfação (Skinner, 1986). prio comportamento artístico que produz coisas
Embora sejam diferentes, Skinner (1986) belas e interessantes, seja favorecendo compor-
argumenta que esses dois efeitos precisam ser tamentos de apreciação que colocam as pesso-
considerados no planejamento de contingências as em contato com coisas belas e interessantes,
ra, escultura, música, teatro, literatura e moda), análise sistemática das informações sobre a arte
as quais também apresentam extensa varieda- a uma única obra (WT). Uma investigação de
de de estilos estéticos e alta qualidade técnica. outros textos e livros de Skinner poderia colo-
A ocorrência de comportamentos artísticos car em perspectiva as considerações aqui expos-
em WT é explicada não só pelas consequências tas, indicando eventuais continuidades ou acrés-
reforçadoras positivas, sobretudo naturais, pro- cimos em relação às teses apresentadas em WT.
duzidas por esse comportamento, como tam- Além disso, é necessário ressaltar que a fun-
bém por outras condições, como tempo livre, ção ético-política da arte apresentada neste arti-
oportunidade e apreciação, favorecidas pelo go baseia-se na aceitação das teses defendidas por
planejamento cultural de WT. Com respeito à Skinner ao longo da narrativa de WT. Todavia,
apreciação, em particular, há contingências es- é preciso salientar que existem, na literatura da
pecíficas voltadas ao aumento da probabilida- área, leituras distintas que compreendem o fun-
de de ocorrência das ações de apreciação, tais cionamento político da comunidade de modo di-
como a existência de estímulos discriminati- ferente daquele defendido por Skinner (e.g., Abib,
vos, a diminuição do custo de resposta e a edu- 2015). Por isso, as análises sobre a arte delineadas
cação artística. A audiência desempenha um no âmbito deste trabalho poderiam ser ponderadas
papel importante na manutenção de compor- e revistas à luz dessas diferentes interpretações.
tamentos artísticos, não por meio do engran- Outro aspecto que merece ser ressaltado é
decimento pessoal do artista, mas funcionando que o possível mau uso do reforçamento positi-
como uma operação estabelecedora motivacio- vo, bem como seus efeitos nefastos representa-
nal que pode potencializar o efeito reforçador dos pela noção de “escravo feliz” (ver Skinner,
das produções artísticas para o artista. Com 1971/1976), não parecem ter sido considerados
efeito, o comportamento artístico não pode ser por Frazier em WT. Os planejadores da comuni-
entendido isoladamente, mas de modo articu- dade parecem ignorar que as consequências re-
lado com a audiência como um sistema social. forçadoras positivas, a despeito de proporciona-
Ao fomentar a arte, o planejamento cultural rem sensações corporais de prazer e liberdade,
de WT promove a felicidade e o bem-estar dos também podem ser utilizadas para controlar, de
membros da comunidade, cumprindo, assim, uma modo sutil, o comportamento dos indivíduos, im-
função ética. As ações artísticas também desem- possibilitando ações de fuga ou contracontrole,
penham uma função política na medida em que como protestos e revoltas (Skinner, 1971/1976).
uma comunidade que proporciona felicidade di- Nesse cenário, se a arte produz felicidade por
minui as chances de deserções e ataques de seus meio de contingências de reforçamento positivo,
membros contra sua própria cultura. Além dis- ela também poderia ser utilizada para ocultar even-
so, as características de um repertório artístico, tuais controles opressivos em WT4. Não obstante
como curiosidade e exploração, podem ajudar essas limitações, este estudo permite concluir que
na resolução de problemas e, consequentemen-
Afastando-se de WT e adentrando à sociedade capi-
4
te, na sobrevivência daquele grupo. A arte pare- talista ocidental, o uso da arte como forma de contro-
ce, portanto, exercer uma função ética e política le social exploratório foi sistematicamente discutido
em WT, pois permite alinhar a autorrealização pelos sociólogos Adorno e Horkheimer (1944/1985),
mostrando que a produção artística pode funcionar a
individual com a sobrevivência de todo o gru- favor da geração de lucro, contribuindo para o acirra-
po (Lopes, Laurenti, & Abib, 2018). mento da desigualdade social. Além disso, a arte, ao
Cabe salientar, porém, que as discussões apre- propiciar felicidade e bem-estar, pode operar como
mecanismo privilegiado de alienação, eclipsando for-
sentadas neste estudo encontram limitações. A mas de controle social que geram iniquidade e opres-
primeira delas diz respeito à restrição da busca e são entre indivíduos em uma dada sociedade.
a arte desempenha uma função social importante versas pragmatistas sobre comportamenta-
no planejamento cultural de WT e, como tal, ela lismo radical (pp. 117-142). Curitiba: CRV.
precisa continuar sendo considerada em discus- Martins, T. E. M., Carvalho Neto, M. B., &
sões atuais sobre o assunto, atentando, sobretu- Mayer, P. C. M. (2017). Walden two: Uma
do, para a possibilidade de a arte ser usada como sociedade utópica não aversiva? Revis-
estratégia para dificultar a identificação e o en- ta Brasileira de Terapia Comportamen-
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