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AS PALAFITAS DA MARÉ DO APICUM E O PROJETO INTEGRADO COROA DO

MEIO EM ARACAJU - SE: O QUE PODEMOS APREENDER COM A


EXPERIÊNCIA?

Aline Helena da Costa, graduanda em Arquitetura e Urbanismo, residente na Rua


Promotor Valdir de Freitas, nº125, Bairro Ponto Novo em Aracaju, Sergipe;
aline.costa@aracaju.se.gov.br.

Luciano Silva, graduando em Arquitetura e Urbanismo, residente na Rua Coronel


Ramos dos Santos, 276, Bairro Farolândia em Aracaju, Sergipe;
lucianoarquit@gmail.com.

Thalita Oliveira Coutinho, graduanda em Arquitetura e Urbanismo, residentre na Rua


Engenheiro Silvio César Leite, 105, Apt. 1002, Edf. Mansão Campos do Jordão,
Bairro Salgado Filho em Aracaju, Sergipe; thalita_bambam@hotmail.com.

Orientador: Profº Msc. Rooseman de Oliveira Silva.

RESUMO

Este artigo tem como objetivo analisar o Projeto Integrado Coroa do Meio, focando a
qualidade da área reestruturada para abrigar os moradores das palafitas localizadas
sobre a região de manguezal, conhecida como Maré do Apicum. Para tal, foram
realizadas visitas técnicas com aplicação de 150 questionários, levantamentos
bibliográficos, documentais e cartográficos. Através de invasões desde a década de
1970, geradas pelo crescimento urbano, a região vem sofrendo desgaste ambiental.
Grande parte da população estabelecida nesta região veio de outros Estados, com o
intuito de sobreviver basicamente da pesca, abundante na época. Por intervenção
do Ministério Público, a prefeitura de Aracaju criou o Projeto Integrado Coroa do
Meio que, com a retirada desses moradores da área do manguezal, pôde viabilizar
uma forma de melhorar a qualidade de vida dessa comunidade. Além disso,
estavam previstos no projeto a revitalização da área degradada a criação de
quadras de lazer e o Museu do Mangue.

Palavras-Chave: Aracaju, Coroa do Meio, Meio Ambiente, Palafita, Projeto.


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ABSTRACT

The objective of this article was to analyze the Coroa do Meio Integrated Project, with
focus on the quality of the re-structured area in order to receive the inhabitants of
poorly built stilt houses located above the swamp region, known as the Apicum Tide
region. For such, technical visits were conducted with the application of 150
questionnaires, and bibliographic, documental, and cartographic data was gathered.
Due to the swamp invasions that started in the 1970s, a result of urban growth, the
region has been suffering from environmental damage. A great part of the population
that live in that region came from other states with the objective of surviving, basically
from fishing, that was abundant at that time. Due to the intervention of the Public
Ministry, the City Hall of Aracaju created the Coroa do Meio Integrated Project that
removed the inhabitants of that swamp area to accommodate them somewhere else,
providing that community with a better quality of life. Besides that, the revitalization of
the damaged area and the construction of sports and leisure courts as well as the
Swamp Museum were also part of the Project.

Keywords: Aracaju, Coroa do Meio, environment, project, stilt houses.

1 INTRODUÇÃO

Com a crescente urbanização gerada na cidade de Aracaju, por volta da década de


1970, houve a necessidade da criação de um bairro modelo, independente e
executado de forma funcional. Dessa forma, a prefeitura de Aracaju através do então
prefeito, Engenheiro João Alves Filho, requereu junto ao Governo Federal, a área
que passou a ser chamada Coroa do Meio.
O bairro foi construído em três etapas e posteriormente quatro, que geraram muitos
transtornos e problemas por causa da retirada dos moradores da área, os quais
acabaram invadindo terrenos criando assim, favelas dentro do próprio bairro. Para
solucionar esse problema, foi desenvolvido um projeto que promovesse mudanças
sociais, ambientais e econômicas, transformando a área em um local urbanizado.
A pesquisa teve como objetivo analisar o Projeto Integrado Coroa do Meio, focando
a qualidade da área reestruturada para abrigar os moradores das palafitas
localizadas sobre a região de manguezal, conhecida como Maré do Apicum. Antes
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da reestruturação, o meio ambiente era degradado e as famílias ocupantes das


palafitas viviam em condições subumanas, sem saneamento básico e sem infra-
estrutura necessária para se viver dignamente.
Na referida pesquisa, foram realizados levantamentos bibliográficos, documentais,
aplicação de 150 questionários, visitas técnicas à área estudada e à SEPLAN
(Secretaria Municipal de Planejamento de Aracaju), à EMURB (Empresa Municipal
de Obras e Urbanização) e ao MPE (Ministério Público Estadual). Através desses
métodos, foi possível obter dados significativos que permitiram uma análise mais
detalhada a respeito do assunto abordado.
Como fundamentação teórica foram utilizados os seguintes autores: C.P. Cardoso -
Planejamento Urbano da Área de Invasão do Bairro Coroa do Meio; M.E.S. Carvalho
e A.L. Fontes – Estudo Ambiental da Zona Costeira Sergipana como Subsídio ao
Ordenamento Territorial; e A.D. Nogueira – Patrimônio Arquitetônico e História
Urbana.
Em visitas à SEPLAN, foi analisado o documento Moradia Cidadã: UAS Coroa do
Meio. Projeto Social. Vol. 10 e recolhidas algumas fotos que ilustram este trabalho
de pesquisa. No MPE também foram adquiridas algumas fotos que mostram de
forma aérea as casas construídas através do Projeto Integrado Coroa do Meio. No
período de estudo, iniciado em novembro de 2007 até abril de 2008 foram feitas seis
visitas ao Bairro Coroa do Meio para conhecer a área e executar a aplicação dos
questionários.
O trabalho está dividido em três partes, a primeira parte destina-se a um breve
histórico do bairro Coroa do Meio e o processo de invasão; a segunda descreve o
projeto criado para a reestruturação da área invadida no bairro; e por último são
apresentados os resultados obtidos com a aplicação de questionários a um grupo de
pessoas residentes na localidade, que corresponde a 5% do total de famílias
beneficiadas pelo projeto.

2 HISTÓRICO DO BAIRRO COROA DO MEIO

O Bairro Coroa do Meio limita-se ao norte com o Rio Sergipe, a leste com o Oceano
Atlântico, ao Sul com a Zona de Expansão de Aracaju e a oeste com o rio Poxim e a
planície de maré superior onde se localiza o Apicum. O nome do bairro advém do
conjunto de solos criados sobre antigas coroas de depósitos flúvio-marinhos e
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marinhos nas desembocaduras dos rios Poxim e Sergipe e é uma área que faz parte
dos terrenos da Marinha e está sob tutela do Serviço do Patrimônio da União.
Com o interesse de integrá-la ao conjunto urbano da capital, já que era considerada
uma área inóspita e feia, em 1975 a Prefeitura de Aracaju, em nome do então
prefeito, o Engenheiro João Alves Filho requereu junto ao Governo Federal o direito
de uso e de posses com o objetivo de criar um bairro modelo para a cidade de
Aracaju - SE. Ao Escritório Técnico do Arquiteto Jaime Lerner, foi encomendado,
através da EMURB, o planejamento de um programa de ação e investimentos, que
seria viabilizado através da adesão da Prefeitura ao Programa de Complementação
Urbana, o Projeto CURA – Comunidades Urbanas para Recuperação Acelerada, do
Banco Nacional de Habitação (BNH), que tinha como principal objetivo a
recuperação de áreas onde seriam realizadas obras púbicas de caráter social. No
caso da Coroa do Meio ele se chamou Projeto CURA Especial devido à
possibilidade de escolha da região onde seria implantado o bairro, e às intervenções
urbanísticas que iriam ocorrer.

Na concepção da obra, a idéia foi a de que esta deveria ser planejada numa
escala de abrangência maior, incluindo o balneário de Atalaia. Nesse
sentido, um tratamento urbanístico possibilitaria dar continuidade às
tendências que aquela zona da cidade de Aracaju estava assumindo, em
termos de área com fins dominantemente residenciais e de lazer. Em suma,
era preciso que, no aproveitamento da área, a solução valorizasse a
ocupação de toda aquela região. (LERNER apud SEPLAN, 1977).

2.1 O PROJETO DE URBANIZAÇÃO

A Coroa do Meio possuía 479 hectares (hec) urbanizáveis e segundo o projeto, 227
hec seriam previstos para ocupação habitacional; 118 hec para recreação; 91 hec
para sistema viário; 39 hec para serviços e comércio e 4 hec para educação e
centros comunitários. O projeto foi dividido inicialmente em três etapas e
posteriormente foi criada uma quarta etapa.
Seriam necessárias as seguintes intervenções estruturais: sistema viário, drenagem,
contenção, aterro hidráulico, terraplenagem, rede de energia e iluminação pública,
água potável, áreas de recreação, revitalização da Atalaia, educação, posto
telefônico, centro comunitário e através de iniciativa privada, construção de
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apartamentos por cooperativas e desenvolvimento de atividades comerciais e de


serviços.
Estipulou-se a exigência de uma renda familiar mensal equivalente a 6,8 salários
mínimos ou superiores como requisito para aquisição dos lotes construídos na área
o que gerou questionamentos quanto ao verdadeiro interesse social na região. Com
a venda desses lotes o empréstimo recebido pelo Banco Nacional de Habitação
seria quitado.
A construtora Noberto Odebrecht venceu a concorrência e ficou encarregada para a
execução das obras na primeira etapa, mas permaneceu nas duas etapas seguintes
também.
Para a primeira etapa foram destinados 200 hec sendo que destes, 118 hec foram
para recreação; 91 hec ao sistema viário; 39 hec ao comércio e 4 hec para
construção de escola e centro comunitário. Foi inaugurada no dia 25 de março de
1979, ano de fechamento do mandato do Prefeito Eng. João Alves Filho, porém
houve falhas em sua execução, principalmente na ponte Godofredo Diniz – que
apresentou problemas em sua estrutura, e os consertos só aconteceram na gestão
do sucessor, Heráclito Rollemberg.
Para a segunda etapa, o início foi marcado pela construção do calçadão da Nova
Atalaia, nas imediações da Praia dos Artistas implantado sob um novo estudo de
viabilidade apresentado ao BNH, correspondendo a 13,4 hec para implantação do
sistema viário; 9,0 hec as áreas verdes e recreação e 2,8 hec para construção de
uma rua para pedestres e ciclistas. Esta etapa sofreu um aumento de conflitos com
a comunidade local, principalmente no que se refere à retirada dos moradores, que
foi feita de modo violento, já que a prefeitura através da SSP (Secretaria de
Segurança Pública) encaminhou ao local viaturas para retirada dos mesmos sem
aviso prévio.
A terceira etapa foi finalizada em julho de 1986, porém faltavam ainda tarefas a
serem cumpridas e para não se obter mais prejuízos como nas etapas anteriores,
decidiu-se criar uma quarta etapa que não constava no início do projeto. Foi nessa
etapa a idealização do shopping Riomar, o primeiro centro comercial deste tipo em
Aracaju. Nessa época já começa a existir uma diversidade de construções, dentre
elas, conjuntos residenciais, mansões, barracos de madeira, pequenas cabanas,
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palafitas de invasores do mangue, prédios de associações, colégios, clubes sociais


etc.

2.2 O SURGIMENTO DAS PALAFITAS DA MARÉ DO APICUM

Tem início na Avenida Urbano Neto com aterro do mangue que a margeia e se
estende até a avenida Rotary, no bairro Atalaia, com limites à leste passando
principalmente pela rua José Stemberg e av. Aloísio Campos.
Com a implantação do conjunto Jardim Atlântico, teve início a invasão. As primeiras
habitações surgiram há cerca de 30 anos e gradativamente foram sendo
empurradas para o mangue. Em 1992 já apresentava cerca de 1.060 ocupações e
5.300 moradores.

3 PROJETO INTEGRADO COROA DO MEIO

Tinha como objetivo geral elevar o padrão da qualidade de vida da população alvo,
propiciando suporte técnico-social no processo de implantação de infra-estrutura
urbana, aplicando também regularização fundiária e recuperação ambiental,
impedindo inclusive que novas áreas fossem degradadas, além de medidas
educativas para modificar hábitos e costumes através da participação comunitária
em todas as etapas do processo. O tempo previsto para a execução do projeto era
de 30 meses e o início ocorreu em 2001. Os investimentos recebidos foram da
ordem de R$ 7,5 milhões do Governo Federal, por meio do Programa Habitar Brasil-
BID (HBB), e R$ 3,4 milhões da prefeitura. Os recursos foram utilizados para a
construção das casas e toda a urbanização da área. Foram construídas ruas, uma
ciclovia e a avenida Perimetral, que margeia o manguezal onde antes ficavam as
palafitas. Além disso, o projeto fez 2,5 quilômetros de calçamento e reformou a
escola municipal Juscelino Kubitschek e a creche do bairro.
Como objetivos específicos, o Projeto intencionava mobilizar e criar estímulos para a
participação da população alvo através da estruturação de uma comissão de
moradores para acompanhar o desenvolvimento das obras, havendo dessa forma
uma comunicação e inter-relação entre os moradores, deixando-os mais seguros, no
que se refere a ações do poder público em relação as questões sociais. Para isso,
utilizou-se o Programa Moradia Cidadã, desenvolvido pela Prefeitura Municipal de
Aracaju e coordenado pela SEPLAN.
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As atividades relacionadas ao trabalho de Participação Comunitária foram:


• Discussão dos projetos de intervenção;
• Mobilização para o processo de adesão ao projeto;
• Articulações entre a Prefeitura, a SEPLAN e a Secretaria Extraordinária de
Participação Popular;
• Implantação e acompanhamento do processo de regularização fundiária;
• Acompanhamento do processo de retirada das ocupações que obstruíam o
sistema viário;
• Suporte às obras;
• Acompanhamento das remoções para as unidades habitacionais construídas;
• Acompanhamento do pós-morar;
• Assessoria às organizações comunitárias;
• Capacitação de Líderes Comunitários e/ou grupos representativos;
• Ampliação da Comissão de Representação dos moradores e criação de
grupos temáticos;
Sob o amparo da assistência social as seguintes ações foram desenvolvidas:
• Acompanhamento de família com crianças e adolescentes em situação de
risco pessoal e social;
• Acompanhamento dos grupos de idosos;
• Acompanhamento das famílias com portadores de necessidades especiais;
• Apoio às ações do centro de saúde;
Com relação à sustentabilidade econômico-financeira do projeto foram
implementadas algumas ações com finalidade de propiciar alternativas de geração
de emprego e renda entre os grupos das Unidades de Assentamento Subnormais –
UAS tais como:
• Cursos de capacitação profissional;
• Cursos de alfabetização de jovens e adultos;
• Criação de Escritório de Serviços para que os moradores tivessem
habilidades específicas para prestarem serviços elétricos, hidráulicos e
serviços gerais, para o atendimento de hotéis, pousadas e comerciantes do
bairro, bem como a outras localidades;
• Criação de uma oficina de Recicláveis;
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• Estímulo do associativismo/cooperativismo como alternativa de trabalho.


A implantação do Projeto de Participação Comunitária seguia quatro eixos principais:
mobilização, organização, educação ambiental e geração de trabalho e renda
coordenados pela SEPLAN e com parcerias entre esfera pública e privada.
Para o projeto das moradias foram feitos quatro modelos de plantas, sendo que três
eram casas de um pavimento com área total de 32m2 com um quarto, sala, cozinha
e um banheiro e uma casa com dois pavimentos com área de 54m2, com dois
quartos, sala, cozinha e dois banheiros.
Espera-se do projeto a melhoria na qualidade de vida para 2.581 famílias
cadastradas, tendo em vista a construção de habitações com infra-estrutura
adequada, além da construção de um Museu para preservação do mangue, com a
finalidade de gerar conscientização ambiental. Com relação ao Trabalho de
Participação Comunitária buscou-se um fortalecimento do processo de participação
e organização comunitária, além da viabilização de capacitação profissional e
treinamento, com objetivos de geração de renda às famílias.

4 ANÁLISE SÓCIO-ESPACIAL DO PROJETO INTEGRADO COROA DO MEIO

Para a análise sócio-espacial da área em estudo, foram realizadas diversas visitas


ao local, sendo que 3 (três) delas foram destinadas à aplicação de 150
questionários, os quais, 142 foram respondidos por ex-moradores de residências
denominadas palafitas, e os 08 restantes por moradores que invadiram ou
compraram terreno no bairro. No desenvolvimento da pesquisa, foram observados
dados bastante satisfatórios de como a população encara a localidade e as
avaliações sobre a atual condição em que vivem, se comparada com a vida que
tinham na palafita.
Nas abordagens, os moradores informaram que a Prefeitura de Aracaju realizou
cadastramento e entrevistas no período em que residiam nas palafitas. O processo
de aquisição da nova casa foi demorado para a moradora Antônia Varela dos
Santos, 25 anos. Ela informou que foram feitas várias reivindicações, o primeiro
cadastro foi efetuado errado, tendo que ser refeito.
A maioria dos moradores se instalou há muitos anos através de invasão, e alguns
por compra de barraco, de terreno, indenização e outros que não chegaram a morar
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na área em torno do mangue, mas invadiram ou compraram um terreno na região da


Coroa do Meio. A tabela 1 mostra que 65,33% dos entrevistados correspondem aos
invasores da área. A justificativa da invasão é que não possuíam condições de
pagar aluguel e a única opção seria a ocupação do referido local.

Tabela 1: Processo de Chegada ao bairro Coroa do Meio


Processo de Número de %
Chegada amostras
Invasão 98 65,33
Compra de
Barraco/terreno 40 26,66
Indenização 4 2,66
Não morou no 8 5,33
mangue
Total 150 100
Fonte: Os autores, Abril/2008.

A tabela 2 mostra que a maioria dos moradores residiu até 06 anos nas palafitas, e
19,71% dos entrevistados moraram de 10 a 12 anos. Estes moradores possuíam
faixa etária entre 21 e 50 anos.

Tabela 2: Tempo de moradia


Tempo de moradia Número de %
amostras
Até 03 anos 39 27,46
04 a 06 35 24,64
07 a 09 19 13,38
10 a 12 28 19,71
13 a 15 7 4,92
16 a 18 2 1,40
19 a 21 7 4,92
22 a 24 2 1,40
25 a 27 1 0,70
28 a 30 1 0,70
31 ou mais 0 0
Total 142 100
Fonte: Os autores, Abril/2008.

Para 50,70% dos moradores, verificado na tabela 3, o processo de aquisição das


casas não foi trabalhoso, e dos 70 (setenta) entrevistados que alegaram que houve
trabalho, 24 (vinte e quatro) informaram que o problema ocorreu por conta da
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demora, e 5 (cinco) pelo processo de morar em casas alugadas antes de irem para a
definitiva. Para 55,63% dos entrevistados a casa foi entregue no prazo.
Tabela 3: Processo de Aquisição
Foi trabalhoso ou não Número de %
amostras
Sim 70 49,29
Não 72 50,70
Total 142 100
Fonte: Os autores, Abril/2008.

Outro dado verificado foi a relação entre vizinhos. Como se pode ver na tabela 4,
101 moradores disseram que quase não se relacionam com vizinhos. Na entrevista,
eles se manifestaram em quatro níveis diferentes: às vezes não saem de casa para
se relacionar, pouco se relacionam, quase nunca e não saem de casa. Isso pode ser
supostamente explicado pelo fato de os vizinhos não terem sido mantidos no
processo de mudança, já que deste número, setenta e uma pessoas afirmaram que
a mudança ocorreu. Esse foi um fator importante que não foi levado em
consideração. No caso desses moradores, a relação com a vizinhança se constitui
em um ponto crucial na tentativa de garantir a boa qualidade de vida.

Tabela 4: Relações de vizinhança


Relacionamento Número de %
amostras
Muito 41 28,87
Às vezes 17 11,97
Pouco 49 34,50
Quase nunca 23 16,19
Não sai de casa 12 8,45
Total 142 100
Fonte: Os autores, Abril/2008.

Com base nos dados obtidos, a população se sente satisfeita quanto à qualidade da
casa entregue, se comparada com a moradia na palafita. Essa afirmação foi feita por
52,81% dos entrevistados. O relato é em decorrência das condições precárias em
que viviam anteriormente, como se observa na tabela 5. A maioria dos moradores,
apesar de avaliarem o novo lar como de boa qualidade, reclamou da casa possuir
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somente um quarto e não ter acabamento de piso e reboco interno, como é o caso
do Sr. Luis Carlos, 41 anos, que em sua residência acomoda 5 (cinco) pessoas sem
ter feito nenhum acréscimo de ambiente ao projeto original.

Tabela 5: Qualidade da casa entregue


Qualidade Número de %
amostras
Péssima 7 4,92
Ruim 11 7,74
Boa 75 52,81
Ótima 49 34,50
Total 142 100
Fonte: Os autores, Abril/2008.

Algumas residências foram destinadas ao uso residencial, e outras foram


transformadas em uso misto, como exemplos têm o Bar da Josy, de propriedade de
Cleide de Jesus Santos, 21 anos, e uma marcenaria de propriedade de Maria Isabel
Nascimento da Silva, 37 anos.
Além da avaliação sobre a qualidade da casa entregue, foi feita avaliação sobre a
qualidade de vida na palafita, apresentado na tabela 6. A amostra obtida
surpreendeu quando 9 (nove) moradores avaliaram como ótima, os mesmos
questionaram que não precisavam arcar com despesas fixas (água, energia),
utilizando instalações clandestinas. 31,69% dos moradores achavam a vida na
palafita ruim, como destaca a moradora Maria Patrícia Santos Vieira, 40 anos, que
relata que ocorriam vários acidentes, principalmente com crianças e idosos, que
caíam das passarelas que davam acesso às palafitas.

Tabela 6: Qualidade de vida na palafita


Qualidade Número de %
amostras
Péssima 56 39,43
Ruim 45 31,69
Boa 32 22,53
Ótima 09 6,33
Total 142 100
Fonte: Os autores, Abril/2008.

Nas tabelas 7 e 8, são apresentados os quantitativos de membros por família e


reforma efetuada. A maioria das casas foi reformada, apresentando o acréscimo de
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mais um quarto, porque as famílias são compostas por 2 (dois) ou mais membros,
havendo destaque para a família de Solange Santos, 25 anos, com uma família
composta por 12 (doze) pessoas. Isso mostra que para construção dessas
moradias, não foi levada em consideração a estrutura familiar dos moradores das
palafitas. Ainda com relação às reformas, 24 (vinte e quatro) pessoas construíram o
muro, mostrando a necessidade de isolamento e distanciamento.

Tabela 7: Quantidade de membros por família

Quantidade de Número de %
membros amostras
Por família
Apenas um 13 0,86
Dois 9 6,00
Três 28 18,66
Quatro 43 28,66
Cinco 34 22,66
Seis 14 9,33
Sete 7 4,66
Oito 2 1,33
Nove 0 0,00
Dez 0 0,00
Mais de Dez 1 0,66
Total 150 100
Fonte: Os autores, Abril/2008.

Tabela 8: Reforma efetuada


Reforma efetuada Número de %
amostras
Sim 92 64,78
Não 50 35,22
Total 142 100
Fonte: Os autores, Abril/2008.

Foi identificado no estudo que houve a oferta de cursos profissionalizantes aos


moradores durante o processo de transferência da área das palafitas para a área
atual. A tabela 9 apresenta que 88,02% dos entrevistados foram informados dos
cursos, mas não chegaram a fazer nenhum, já que o horário escolhido pela
Prefeitura de Aracaju não foi compatível com o período de execução das atividades
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da maioria dos membros da comunidade. A moradora Josefa Santos, 43 anos, fez


curso de embalagens para presentes, mas questiona que hoje não pode pôr em
prática o que aprendeu por falta de dinheiro para aquisição de materiais, e desejava
que a prefeitura criasse uma cooperativa onde poderia dar continuidade, repassando
o conhecimento adquirido a outras pessoas do bairro Coroa do Meio. Assim também
é o caso de Claudijane Santos, 27 anos, que fez curso de Agente Ambiental e
informou que prometeram oportunidades de emprego no final do curso, mas não
cumpriram. Já Ana Paula Ramos, 30 anos, que fez o mesmo curso, utiliza o
conhecimento adquirido fazendo a separação do lixo em sua residência.

Tabela 9: Oferta de cursos


Oferta de Cursos Número de %
amostras
Sim 11 7,74
Não 125 88,02
Não ficou sabendo 06 4,22
Total 142 100
Fonte: Os autores, Abril/2008.

Pode-se perceber que, mesmo a prefeitura tendo realizado esses cursos, não surtiu
o efeito desejado, como é o caso do curso de educação ambiental, que não obteve
êxito, tendo em vista que a população continua despejando restos de materiais
diversos na área que compreende o manguezal, contribuindo para a degradação
ambiental.
Houve também o questionamento quanto ao quesito necessidades de morar bem.
62,66% dos entrevistados afirmaram que sentem necessidade de algo e desses, a
principal necessidade foi a segurança com 21 (vinte e uma) indicações, seguidos de
uma casa melhor com 15 (quinze), infra-estrutura com 12 (doze) e escola com 11
(onze). Algumas quadras foram entregues sem calçadas ou até mesmo sem meio-fio
além de na região já haver uma reivindicação por uma escola, mas quando
questionada, a Secretaria de Planejamento afirmou que isso compete à Secretaria
de Educação, o que mostra que há uma falta de comunicação entre os órgãos no
momento do planejamento e implantação do projeto.
No quesito área de uso comum, os moradores reafirmaram haver deficiência na
política de segurança pública. 102 (cento e dois) moradores informaram a falta de
algo. Desses, 20 (vinte), manifestaram necessidade de postos policiais e ronda de
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carros de policia. No entanto, a maior necessidade verificada é de uma área verde


que obteve 35 (trinta e cinco) indicações. Na rua ‘D’ já existe um espaço que,
segundo os moradores, foi destinado à construção de uma praça a ser finalizada
posteriormente, mas três anos após a entrega das casas, a obra não foi executada.
Outros pontos levantados foram a falta de um posto de saúde, infra-estrutura e mais
linhas de ônibus, já que atualmente somente a linha Jardim Atlântico/Centro circula
na avenida principal.
No local estão sendo construídos quadras de lazer e o Museu do Mangue, que no
momento estão com as obras paradas, mas que foram levadas em consideração na
pesquisa quanto à sua importância. Dos 150 (cento e cinquenta) entrevistados, 59
(cinquenta e nove) consideram as obras muito importantes e 50 (cinquenta)
consideram importante, mas como frisam Ricardo Santos, 31 anos, Gilnise Jesus, 37
anos, Ednaldo dos Santos, 48 anos, tem que haver segurança no local, para que
não se torne ponto de marginalidade.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Bairro Coroa do Meio surgiu no ano de 1975 através da necessidade de integrá-lo


ao conjunto urbano da capital, já que a área era considerada inóspita e feia. O
Prefeito da época, o Engenheiro João Alves Filho percebeu que a capital sergipana
precisaria expandir para acompanhar o crescimento populacional e criar um bairro
modelo para a cidade. O nome do Bairro foi dado por causa do conjunto de solos
criados sobre antigas coroas de depósitos flúvio-marinhos e marinhos nas
desembocaduras dos rios Poxim e Sergipe. Essa área faz parte dos terrenos da
Marinha e está sob tutela do Serviço do Patrimônio da União.
O projeto foi dividido inicialmente em três etapas e posteriormente foi criada uma
quarta etapa. A terceira etapa foi finalizada em julho de 1986, porém faltavam ainda
tarefas a serem cumpridas e para não se obter mais prejuízos como nas etapas
anteriores, decidiu-se criar uma quarta etapa que não constava no início do projeto.
Foi nessa etapa a idealização do shopping Riomar, o primeiro centro comercial
deste tipo em Aracaju. Nessa época já começam a existir uma diversidade de
construções, dentre elas, conjuntos residenciais, mansões, barracos de madeira,
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pequenas cabanas, palafitas de invasores do mangue, prédios de associações,


colégios, clubes sociais etc.
As palafitas, objeto de estudo desse trabalho, tiveram início na Avenida Urbano Neto
com o aterro do mangue que a margeiam e se estenderam até a Avenida Rotary, no
bairro Atalaia. Com a implantação do Conjunto Jardim Atlântico, teve início a
invasão. As primeiras habitações surgiram há cerca de 30 anos e gradativamente
foram sendo empurradas para o mangue. Em 1992 já apresentava cerca de 1.060
ocupações e 5.300 moradores. A desocupação das palafitas ocorreu de forma
gradativa, à medida que a Prefeitura executava o projeto, que teve início em 2001.
No mesmo período, os moradores foram transferidos para casas alugadas no
mesmo bairro. O processo de desocupação durou cinco anos e terminou em março
de 2006.
Na pesquisa realizada, percebe-se que mesmo com a intenção de elaborar um
projeto em benefício da população mais carente, a Prefeitura da cidade não levou
em consideração a quantidade de integrantes de algumas famílias, tendo em vista
que as casas entregues apresentam estrutura para acomodar de forma confortável
no máximo duas pessoas. No entanto, ficou comprovado através da pesquisa de
campo realizada pelos autores deste artigo que as famílias se compõem por quatro
ou mais membros. Portanto, para acomodar essas pessoas de forma em que as
necessidades básicas de cada um estejam garantidas seria necessária uma casa
com no mínimo seis cômodos (sala, cozinha, banheiro, área de serviço e dois
quartos).
Outro fato relevante observado foi que o interior dessas residências não apresenta
reboco, piso, e porta no quarto, acarretando em um ambiente úmido e prejudicial à
saúde, principalmente das crianças. Além disso, no projeto consta a construção de
casas com apenas um pavimento, alguns modelos com dois pavimentos, destinadas
às famílias com maior quantidade de membros. De acordo com visitas ao local, as
únicas casas com dois pavimentos foram realizadas por reforma dos moradores.
Outra reforma sempre verificada é a construção de muros, muitas vezes sem
acabamento, que descaracterizam o projeto original. Entretanto, essas reformas são
prejudiciais porque geram o aspecto de favela ao local, as quais deveriam ser
fiscalizadas pela EMURB. De acordo com os moradores, isso não acontece. As
fiscalizações, quando são feitas, são por conta de denúncias dos próprios
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habitantes, já que não é permitida reforma das residências por um período de 25


anos.
Com o trabalho, percebeu-se que a urbanização é um fator importante para que haja
um desenvolvimento da cidade, não só no âmbito arquitetônico, mas também nos
âmbitos da saúde, sócio-econômico e ambiental. Este fator foi negligenciado, como
pôde ser visto na falta de energia em alguns postes, passeios públicos inadequados
à mobilidade urbana, calçamento das vias e drenagem urbana. É também de suma
importância a finalização do projeto, com o término das obras de lazer e infra-
estrutura e criação das praças para uma maior valorização dos moradores nos
projetos que estão sendo criados, além de uma melhor valorização e viabilização da
cidade e seu planejamento.
Durante a realização desse trabalho, os integrantes da equipe perceberam que na
hora da execução de um projeto tão grandioso se faz necessária a integração de
todos os órgãos públicos envolvidos para alcançar plenamente os objetivos
propostos. Nas entrevistas realizadas, ficou comprovado que isso não aconteceu,
tendo em vista que algumas secretarias não se integraram. Na área não existem
escolas de ensino médio, o posto de saúde não atende urgências e emergências e a
política de segurança pública é inadequada. É importante frisar ainda que para
elaborar um projeto de urbanização é preciso analisar as necessidades dos
moradores, os impactos ambientais e observar com detalhes a infra-estrutura a ser
oferecida. Nem sempre esses pontos são levados em conta da maneira correta.
No desenvolvimento desta pesquisa algumas dificuldades foram detectadas, entre
elas, encontrar os moradores em horários oportunos, a falta de organização de
documentos nos órgãos públicos, a precariedade de bibliografias sobre a região
estudada e a resistência de alguns indivíduos em responder o questionário. A equipe
observou também alguns pontos que podem ser destacados como primordiais para
garantir a dignidade de um cidadão. Esse projeto de urbanização na sua forma
original permitiu a melhoria da qualidade das habitações, e melhorou a qualidade de
vida da população. Além disso, foi feita a revitalização da área e reduziu o déficit
habitacional. Em contrapartida, algumas deficiências foram notadas. A urbanização
deveria ser mais eficaz, já que o projeto não foi executado em sua plenitude. As
obras estão paralisadas, a exemplo de quadras, o museu do mangue e a construção
de praças, assim como também, algumas famílias ainda estão sem casas e outras
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vão ser transferidas para o Bairro Santa Maria. Foi observada também a falta de
vasos coletores de lixo ao longo do passeio público que margeia a avenida em torno
do manguezal. Os cursos de capacitação realizados não foram ministrados em
horário adequado à rotina da população.
Ainda de acordo com a avaliação dos autores deste artigo alguns estudos precisam
ser feitos, a exemplo da morfologia das habitações. Nesta pesquisa não foi
analisado o público que hoje reside no atual complexo. Outros pontos importantes
não avaliados são o EIA – Estudo de Impacto Ambiental, que pode ser estudado de
forma mais detalhada em futuras pesquisas e a forma como os antigos moradores
percebem a inserção desse público na área.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARDOSO,C.P;FARIAS,A.M.deS.M. (Orient ). Planejamento Urbano da Área de


Invasão do Bairro Coroa do Meio: Relatório Apresentado ao Curso de Arquitetura
e Urbanismo, Para Obtenção do Titulo de Bacharel. Aracaju, SE 2000. 84p.

CARVALHO, M. E. S; FONTES, A. L. Estudo Ambiental da Zona Costeira


Sergipana como Subsídio ao ordenamento Territorial. Geonordeste, Ano XV, Nº.
2, 2006.

NOGUEIRA. A.D.Patrimônio Arquitetônico e História Urbana: Ensaios sobre o


Patrimônio Arquitetônico de Sergipe e sobre a estrutura sócio-espacial de
Aracaju.São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviêdo Teixeira, 2006.224p.

SEPLAN; FAPESE. Moradia Cidadã: UAS Coroa do Meio. Projeto Social.


Vol.10.Aracaju, Sergipe, Junho 2001.

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