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A Relato de Caso

Simões MP et al.

Terapia nutricional em paciente renal crônico com quadro agudo de


insuficiência respiratória: relato de caso
Nutritional therapy in a chronic renal failure patient with acute respiratory insufficiency: a case report

Maíra Pereira Simões1


Eduila Maria Couto Santos2
Christiane D´Emery de Macedo Moura3
Poliana Coelho Cabral4

Unitermos: RESUMO
Desnutrição proteico-energética. Diálise. Cuidados críti-
cos. Insuficiência respiratória. Nutrição enteral.
Introdução: A desnutrição protéico-energética (DPE) é um importante fator que contribui
para a elevada morbi-mortalidade dos pacientes em diálise. Por outro lado, o déficit nutri-
Key words: cional também afeta o bom funcionamento do aparelho respiratório. Objetivo: O objetivo
Protein-energy malnutrition. Dialysis. Critical care. Respira-
tory insufficiency. Enteral nutrition. desse trabalho foi relatar a conduta nutricional aplicada a uma paciente renal crônica, de
20 anos, em diálise peritoneal, apresentando importante déficit de crescimento e admitida
Endereço para correspondência na UTI com quadro de insuficiência respiratória. Relato do Caso: Os dados, obtidos
Poliana Coelho Cabral
Rua Conselheiro Ribas 131 – Casa Amarela – Recife, a partir do prontuário da paciente, foram: peso seco (22 kg), altura (1,25 m), ou seja,
PE, Brasil – CEP: 52070-400 valores antropométricos de uma criança de 7 anos. A via de acesso para a alimentação
E-mail: cabralpc@yahoo.com.br
foi a enteral, com sonda em posição gástrica, administração intermitente gravitacional
de 3/3h. Por não dispor do aparelho de calorimetria indireta, foram utilizados em nível de
Submissão
14 de maio de 2010 comparação três métodos para cálculo das necessidades calóricas: Harris-Benedict (1740
kcal); Ireton Jones (1835 kcal) e Método prático (990 kcal). A opção de escolha foi pelo
Aceito para publicação
15 de dezembro de 2010 método prático, pelo receio de se hiperalimentar a paciente. A cota protéica oferecida foi
de 1,86 g/kg. O óbito veio no 27º dia de UTI, por sepse. Os dados apresentados ilustram
a dificuldade de se avaliar as necessidades calóricas em pacientes críticos com déficit
extremo de peso e que, nesse caso, o método prático (25 a 35 kcal/kg) mostrou-se mais
próximo da realidade.

ABSTRACT
Introduction: Protein-energetic malnutrition (PEM) is an important factor that contributes
to high morbidity and mortality rates among dialysis patients. On the other hand, nutri-
tional deficit also affects the proper functioning of the respiratory apparatus. Objective:
This study aimed to report on the nutritional behavior of a twenty-year old chronic renal
failure patient under peritoneal dialysis, who presented a severe growth deficit and was
admitted to an ICU because of an episode of respiratory insufficiency. Case Report: The
following data were obtained from the patient’s records: dry weight (22 kg), height (1.25
m), that is, the anthropometric values of a seven-year old child. Enteral feeding was used
1. Especializanda em nutrição clínica pelo Instituto Materno with a gastric tube and intermittent gravitational administration every 3hs. Due to the lack
Infantil Professor Fernando Figueira-IMIP. of an indirect calorimeter unit, for the sake of comparison, three methods were used for
2. Professor assistente de nutrição clínica – Centro Acadêmico
de Vitória - Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); calculating calorie needs: Harris-Benedict (1740 kcal); Ireton Jones (1835 kcal) and the
Mestre em Nutrição pela UFPE; Especialista em Nutrição
Clínica pela UFPE. Practical Method (990 kcal). The practical method was chosen out of fear to overfeed the
3. Nutricionista clínica do Hospital Oswaldo Cruz- PE; Mestre patient. 1.86 g/kg was offered as a protein quota. Death came on the 27th day of ICU as
em Nutrição pela UFPE; Especialista em Nutrição Clínica
pela UFPE. a result of sepsis. Conclusion: These data illustrate the difficulty to evaluate the calorie
4. Professor adjunto Depto de Nutrição – UFPE; Doutora em needs of critical patients with extreme weight deficit, as well as the fact that, in this case,
Nutrição pela UFPE; Especialista em Nutrição Parenteral
e Enteral pela SBNPE. the practical method (25 to 35 kcal/kg) revealed to be closer to reality.
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Terapia nutricional em paciente renal crônico com quadro agudo de insuficiência respiratória: relato de caso

Introdução • Método Prático (repleção de peso) = 990 kcal


A Doença Renal Crônica (DRC) é uma síndrome clínica • Harris-Benedict = 1740 kcal
decorrente da perda lenta, progressiva e irreversível das • Ireton Jones = 1835 kcal
funções renais1. Numerosas funções metabólicas e endócrinas, No que se refere ao cálculo das necessidades protéicas, fez-se
normalmente executadas pelos rins, estão comprometidas, a opção pelo valor de 1,5 a 2,0 g/kg de peso/dia em virtude de
e a evolução inexorável para a falência renal quase sempre se tratar de uma paciente nefropata em diálise peritoneal, com
é acompanhada de anemia, desnutrição, alteração do meta- insuficiência respiratória aguda1.
bolismo dos carboidratos, lipídios e proteínas e utilização A via de acesso para a alimentação foi enteral, com sonda
deficiente de energia2,3. em posição gástrica, administração intermitente gravita-
A desnutrição tem sido relatada com bastante frequência cional. O volume inicial foi de 20 ml de 3/3h, 7 horários,
na DRC, tanto em tratamento conservador, quanto durante totalizando 140 ml, sendo que no 4°dia de internamento a
toda a fase dialítica2,4. Diversos aspectos do metabolismo paciente atingiu 100 ml de 3/3h, totalizando 700 ml, com
1134 kcal e 41 g de proteína/dia.
calórico protéico são afetados com a progressão da doença
Houve um consenso por parte da equipe multidisciplinar
renal, levando à redução da massa protéica corporal e contri-
em se manter a dieta nos valores do 4º dia de UTI, o que se
buindo para o retardo do crescimento, no caso de crianças5. aproximava do valor calórico estimado pelo método prático
Alguns estudos têm evidenciado que o déficit nutricional (990 kcal/dia) e garantia um aporte protéico de 1,82 g/kg/dia.
correlaciona-se de forma significativa com a elevada morbi- Quanto ao tipo de produto, foi utilizada uma formu-
mortalidade dos pacientes em diálise6,7. No caso específico lação polimérica, adequada à condição clínica e nutricional
de diálise peritoneal (DP), a desnutrição tem se mostrado da paciente. A opção foi por um produto específico para
um fator de risco independente para peritonite, necessidade pacientes renais crônicos em tratamento dialítico (densidade
de internação hospitalar e mortalidade7,8. calórica 2 kcal/ml e teor protéico @ 7 g/100 ml), utilizada
A desnutrição, em sua forma mais grave, também afeta o em 5 horários (Dieta 1), associada a uma dieta artesanal
bom funcionamento do aparelho respiratório. Segundo Weisman administrada nos dois horários restantes (Dieta 2).
& Hyman9, na vigência de escassos depósitos nutricionais e/ O motivo para adoção de tal conduta dietoterápica
ou estado hipercatabólico prolongado, pode ocorrer perda de encontra-se sumarizado abaixo:
musculatura torácica e diafragmática, acarretando a diminuição • O uso exclusivo da dieta específica, em volume de 700
dos movimentos respiratórios e, como consequência, o acúmulo ml, forneceria 1400 kcal e 51g de proteína/dia, o que
de secreções pulmonares que, ao se infectarem, configuram seria excessivo para a paciente em questão;
estados infecciosos graves de alta mortalidade. • O volume necessário, da dieta específica, para atingir as
Desse modo, o objetivo principal desse trabalho foi recomendações de micronutrientes, ficaria em torno de
relatar a conduta nutricional, aplicada a uma paciente com 1000 ml;
DRC em diálise peritoneal, apresentando importante déficit • Com a dieta artesanal foi possível ajustar a cota
de crescimento e admitida na UTI com quadro de insufici- protéica, de vitaminas e minerais, sem grandes acrés-
ência respiratória. cimos de líquidos e calorias.
Será descrito a seguir o esquema alimentar utilizado:
RELATO do Caso • Dieta 1 – fórmula enteral específica para pacientes com
Este estudo é um relato de caso de uma paciente de 20 DRC em tratamento dialítico;
anos, apresentando DRC, em diálise peritoneal intermitente • Dieta 2 – dieta artesanal composta por uma fórmula
(DPI) há mais de um ano. Admitida na UTI do Hospital das láctea sem lactose.
Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), No que se refere à nutrição enteral, apesar do estado
com quadro de insuficiência respiratória secundária a uma geral grave e da má adaptação ao respirador, a paciente
broncopneumonia. aceitou bem a dieta oferecida, não sendo registrado nenhum
Além da DRC, a paciente era portadora de retardo do episódio de vômito ou refluxo gastroesofágico. Quanto à
desenvolvimento neuropsicomotor, com idade mental esti- função intestinal, ocorreu diarreia no 11º dia de UTI, com
mada de 8 meses. Na avaliação nutricional, realizada na vários episódios de fezes líquidas, esverdeadas e com muco,
admissão, foram observadas características bastante atípicas. obrigando a substituição da dieta por uma fórmula com
Os dados relatados pelo pai foram: idade 20 anos; peso seco proteína láctea hidrolisada, a qual foi mantida de forma
22 kg e altura 1,25 m, ou seja, paciente com altura e peso exclusiva por 2 dias e, no 3º dia, o desmame foi iniciado,
de uma criança de 7 anos. com retorno à dieta anterior.
Os dados antropométricos acima dificultaram a elabo- Com o agravamento da condição clínica, associada à
ração da conduta nutricional. Que parâmetros seguir? suspeita de sepse, a paciente começou a apresentar débito
Paciente adulta com perfil antropométrico de criança. elevado por sonda nasogástrica, acarretando a suspensão da
Inicialmente, por não dispor de aparelho de calorimetria dieta. O óbito veio logo após, no 27º dia de UTI.
indireta, foram utilizados em nível de comparação, três Alguns dados bioquímicos apresentados pela paciente,
métodos para cálculo das necessidades calóricas, cujos durante sua permanência na UTI, encontram-se sumarizados
resultados encontram-se abaixo: a seguir nas Tabelas 1 e 2.
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Tabela 1 – Dieta oferecida.


Itens Dieta 1 (500 ml) Dieta 2 (200 ml) Total Recomendações*
Caloria (kcal) 1000 134 1134 (51,5 kcal/kg) 35-50 kcal/kg
Proteína (g) 37 4 41 (1,86 g/kg) 1,5 a 2,0 g/kg
Sódio (mg) 527 46 573 < 1000-1500
Potássio (mg) 405 160 565 < 1500-2500
Vitamina A (µg) 500 120 620 700
Vitamina C (mg) 40 11 51 60-100
Cálcio (mg) 650 120 770 1000-1400
Ferro (mg) 9 2 11 > 10-18
Fósforo (mg) 329 80 409 8-17 mg/kg = 176-374
Zinco (mg) 12 3 15 12-15
* Recomendações segundo Cuppari et al.1

Tabela 2 – Dados bioquímicos. No que se refere ao aporte calórico, a administração inade-


quada de nutrientes, nessa situação, tem justificado alguns
Itens 1º dia 5º dia 10º dia 15º dia 20º dia 25º dia
cuidados específicos, principalmente para evitar o excesso de
Glicose 106 117 129 117 154 167 energia pela via enteral ou parenteral. Os efeitos prejudiciais da
(mg/dL)
hiperalimentação resultam, principalmente, em complicações
Ureia 41 52 55 52 55 77 metabólicas, aumento do gasto energético, comprometimento
(mg/dL)* respiratório, disfunção hepática, supressão imunológica e
Creatinina 4,0 4,5 3,4 4,5 4,5 4,5 aumento da morbimortalidade13,14.
(mg/dL)* A determinação do gasto energético pela calorimetria indireta
Sódio 128 128 131 140 126 123 é um método não-invasivo que mede o calor liberado durante o
(mEq/L) processo oxidativo através dos valores do consumo de oxigênio
Potássio 5,2 4,3 4,0 3,9 2,5 5,5 (VO2) e produção de gás carbônico (VCO2)15. Embora seja
(mEq/L) considerado atualmente o “padrão ouro” de avaliação do gasto
* valores pós-diálise energético, apresentam limitações técnicas de aplicação, como
custo elevado do equipamento, exigência de pessoal treinado para
aferição com disponibilidade de tempo e necessidade de fração de
Os dados demonstram valores de creatinina e ureia bem oxigênio inspirado (FIO2) maior que 0,6, dentre outros16.
abaixo dos valores esperados para indivíduos em tratamento Fórmulas têm sido propostas para estimar o gasto energé-
dialítico, que são: 10 a 15 mg/dL e aproximadamente 100mg/ tico basal de doentes graves. O método mais conhecido utiliza
dl, respectivamente, são indicativos de um estado nutricional a fórmula clássica de Harris-Benedict, onde o gasto energético
bastante deficitário, o que com certeza se refletiu na capacidade basal (GEB), em kcal/24h, e calculado e acrescentam-se os
da paciente em responder de forma satisfatória ao tratamento fatores injúria e atividade; enquanto a fórmula de Ireton Jones
empregado. considera idade, peso, sexo e a presença ou não de trauma
e queimadura. No entanto, existem evidências na literatura
Discussão demonstrando que o emprego dessas duas fórmulas pode
O sistema pulmonar é afetado pela doença renal e pela superestimar as necessidades dos pacientes críticos com o
diálise. Alterações na função muscular respiratória, mecânica risco da hiperalimentação13-16.
pulmonar e nas trocas gasosas são frequentes na DRC. A O método prático seria, portanto, mais adequado por não
disfunção pulmonar pode ser resultado direto da circulação das superestimar a taxa metabólica, diminuindo, assim, o risco de
toxinas urêmicas, ou indireto, a partir da sobrecarga do volume, hiperalimentação. Este foi o método de escolha para o cálculo
anemia, supressão imunológica, desnutrição, calcificação extra- das necessidades calóricas desta paciente. Utilizou-se a reco-
óssea, desordens eletrolíticas e desequilíbrio ácido-base10, 11. mendação de 45 kcal/kg/dia devido à desnutrição e ao elevado
Atualmente, a terapia nutricional tem tido papel de destaque catabolismo em função do estresse17.
no manuseio desses indivíduos, tendo como objetivos: oferecer A recomendação de proteína para pacientes graves varia
condições favoráveis para o estabelecimento do plano tera- conforme os autores, podendo ser de 1 g a 2,5 g por kg de peso
pêutico, oferecer energia, fluidos e nutrientes em quantidades por dia18-20. Para a paciente, a quota protéica sempre esteve
adequadas para manter as funções vitais e a homeostase; dentro do recomendado.
recuperar a atividade do sistema imune; reduzir os riscos da Quanto ao posicionamento da sonda, o uso de alimentação
hiperalimentação; garantir oferta protéico-energética adequada pós-pilórica quando comparado à infusão gástrica reduz a
para minimizar o catabolismo protéico e a perda nitrogenada9,12. prevalência de regurgitação, pneumonia, associada à aspiração
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Terapia nutricional em paciente renal crônico com quadro agudo de insuficiência respiratória: relato de caso

e aumento da quantidade ingerida de nutrição enteral, mas não de ureia sérica são dependentes da função renal residual e da
há diferença entre os dois métodos com relação à redução da intensidade da diálise1. A excreção da ureia no paciente crítico
mortalidade e ao tempo de internação21. é um índice de intensidade da resposta metabólica ao estresse33.
Sabe-se que pacientes críticos podem apresentar gastropa- A creatinina sérica também é considerada um marcador
resia e aumento do resíduo gástrico, sendo a estase gástrica uma nutricional importante, embora dependa da função renal resi-
das principais causas mensuráveis que impedem a administração dual e da massa muscular. Níveis baixos de creatinina refletem
da nutrição enteral. Um ponto a ser considerado é que, na diminuição da massa muscular e estão associados com maior
literatura, estudos comparando posicionamento da sonda pré e taxa de mortalidade nos pacientes em hemodiálise34.
pós-pilórica mostram-se um tanto inconclusivos22,23. As alterações do estado nutricional podem surgir como
Tendo em vista a impossibilidade da paciente se alimentar consequência do inadequado aporte de nutrientes ou como resul-
por via oral, utilizou-se a via enteral, sendo a sonda posicionada tado de uma alteração no metabolismo (por exemplo, a sepse).
na posição gástrica, e gotejamento intermitente, com infusão Em qualquer um dos casos segue-se a redução da massa
gravitacional lenta, em intervalos regulares, apresentando corporal magra e a subsequente perda de estrutura e função dos
a vantagem potencial de se aproximar do padrão normal de órgãos e tecidos que a compõem. Em ambos os casos, a meta é
alimentação, e pelo fato também do paciente não apresentar evitar que a desnutrição chegue a se converter em um cofator
sinais de gastroparesia e por não apresentar vômitos, regurgi- importante na disfunção orgânica e na morbi-mortalidade.
tação, possibilitando a utilização na posição gástrica. Isso é possível quando se ofertam nutrientes, ajustando-os em
Foi utilizada uma dieta artesanal, composta de leite em pó quantidade e qualidade às exigências do hipermetabolismo,
isento de lactose e sacarose, diluído em água. O que constituiu especialmente o catabolismo protéico, observado nessas
um risco, tendo em vista que alguns autores já observaram circunstâncias 30 .
contaminação microbiana em quase 100% de amostras de
dietas artesanais avaliadas24-26 . A escolha, apesar do risco, foi Considerações Finais
motivada pela necessidade da adequação dietética, impossível O relato de caso serve para levantar a discussão sobre a
de ser conseguida com a fórmula específica para renais crônicos conduta nutricional de uma paciente de extremo baixo peso com
em diálise. DRC e quadro de insuficiência respiratória, bem como servir
Recomenda-se iniciar a terapia nutricional com fórmulas de subsídio teórico para os demais profissionais que atuam em
com proteína intacta (polimérica). Fórmulas à base de peptídeos casos semelhantes ao estudado.
podem beneficiar pacientes com complicações gastrointestinais, Sugere-se que mais estudos sejam realizados nesta área,
sendo, contudo, necessário um maior número de estudos para uma vez que, a cada dia, a Medicina está avançando e, conse-
definir a sua recomendação27,28. quentemente, as terapêuticas adotadas estão sendo reformuladas
A hiperglicemia é uma reação natural do organismo ao e, pesquisas desse tipo podem proporcionar aos estudantes e
estresse metabólico, devido às alterações hormonais. Além profissionais em saúde um melhor entendimento sobre o assunto
disso, os cuidados ao paciente crítico aumentam a resposta hiper- no que tange à aplicabilidade e à eficácia de tais terapêuticas.
glicêmica, devido ao uso de corticoides, agentes adrenérgicos
e suporte nutricional hipercalórico. Apesar de ser uma resposta Referências
normal do organismo, a redução dos níveis de glicemia melhora 1. Cuppari L, Avesani CM, Mendonça COG, Martini LA, Monte
a evolução e diminuem o risco de complicações, especialmente JCM. Doenças renais. In: Cuppari L, ed. Guia de nutrição: nutrição
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rotina em UTI. Mais estudos são necessários para definir faixas estado nutricional em crianças com doença renal crônica: escore-Z,
ideais de glicemia em diferentes situações clínicas15,29. IMC e Waterlow. J Bras Nefrol. 2008;30(4):239-44.
Está presente também, no paciente grave, o intenso cata- 6. Araújo IC, Kamimura MA, Draibe SA, Canziani ME, Manfredi
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Local de realização do trabalho: Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE, Brasil.

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