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ANATOMOFISIOLOGIA

DO TECIDO ADIPOSO

Gisele Andrade
Anatomofisiologia
do tecido adiposo
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Diferenciar os tipos de tecido adiposo e suas respectivas funções.


„„ Identificar os principais locais de depósito dos tipos de tecido adiposo,
associando-os com a sua função e as consequências fisiopatológicas.
„„ Associar o tecido adiposo com o posicionamento das demais estru-
turas anatômicas.

Introdução
O termo adiposo origina-se do latim Adeps, que significa gordura de ani-
mais. As células do tecido adiposo agrupam-se formando uma variedade
de tecido conjuntivo, com importante função de depósito de energia.
Além de servir de reserva energética, o tecido adiposo é responsável
pelas diferenças aparentes do corpo masculino e feminino, isolamento
térmico, preenchimento de espaços entre outros tecidos e manutenção
da posição correta de alguns órgãos. Esse tecido também possui função
secretora, sintetizando diversos tipos de moléculas.
Para compreensão e conhecimento da anatotomofisiologia do tecido
adiposo é necessária uma adequada avaliação corporal em consultório,
juntamente com uma anamnese detalhada. Tais cuidados possuem fun-
damental importância na aplicação correta e eficiente de tratamentos
corporais.
Neste texto, você vai ver os tipos de tecido adiposo, identificar os
seus locais de depósito, as suas funções e as relações com as estruturas
anatômicas.
82 Anatomofisiologia do tecido adiposo

Tipos de tecido adiposo e suas funções


O tecido adiposo é um tecido conjuntivo especial, caracterizado pela predo-
minância de células especializadas, os adipócitos, que são associados a uma
grande irrigação sanguínea. Em pessoas de peso normal, corresponde de 20
a 25% do peso corporal feminino, e de 15 a 20% do peso corporal masculino.
O tecido adiposo é formado por células do tecido conjuntivo que acumulam
lipídios (gorduras) em seu interior, no citoplasma. Essas células, chamadas de
adipócitos, em sua maioria, são de forma esférica e maiores que as demais.
Além de modelarem a superfície do corpo, ajudam no isolamento térmico do
organismo (auxiliando na manutenção da temperatura do corpo) e possuem a
importante função de servir como uma reserva energética do corpo. Acompanhe
a estrutura dos adipócitos na Figura 1:

Figura 1. Estrutura do adipócito.


Fonte: Paula (2016).

Os triglicerídeos acumulados nos adipócitos são utilizados para fornecer


energia ao organismo nos intervalos entre as refeições. O tecido adiposo
também atua como amortecedor, protegendo o organismo contra os choques
mecânicos. Quando o organismo animal consome menos energia do que
ingere, o excesso é guardado no tecido adiposo. É por isso que animais
sedentários (pouca atividade física, movimentação) são mais “gordos” que
Anatomofisiologia do tecido adiposo 83

os que têm uma vida com maior movimento físico. O excesso de peso nos
humanos não é bom, pois o aumento do volume e da massa corpórea faz
alguns órgãos trabalharem demais (como coração, pulmões, rins etc.), di-
minuindo o seu tempo de vida. Em ursos polares, o tecido adiposo é muito
importante, pois, assim, conseguem resistir ao frio extremo e os longos
períodos de hibernação.
Existem dois tipos de tecido adiposo que apresentam distribuição corpo-
ral, estrutura e fisiologias diferentes. O primeiro deles é o tecido adiposo
unilocular ou amarelo, cujas células apresentam, quando completamente
desenvolvidas, uma única gota de lipídio que ocupa quase todo o citoplasma.
Já o segundo é chamado de tecido adiposo multilocular ou marrom/pardo,
apresenta, em seu interior, inúmeras gotículas lipídicas e um grande número
de mitocôndrias.
A classificação desses tecidos é feita com base em critérios de pigmentação
da gordura armazenada e da forma de organização:

Tecido adiposo amarelo (ou unilocular)


Suas células apresentam forma de esfera, tendo em seu interior uma grande
quantidade de lipídios, em forma de gota, o núcleo achatado e o citoplasma
estão deslocados do centro. A quantidade de substâncias fundamentais é menor
do que em outros tecidos.
Esse tecido é bastante irrigado por vasos sanguíneos. Com isso, em torno
das células está uma vasta rede de fibras reticulares, que dão sustentação à
massa gordurosa. O tecido unilocular predomina em maior quantidade sobre
o tecido multilocular.
Macroscopicamente sua cor é frequentemente amarela devido a pigmentos
e vitaminas (principalmente vitamina A) dissolvidos nos lipídios. Por essa
razão, também é denominado de gordura amarela. É o principal reservatório de
lipídios para ser usado como fonte de energia. Pode ser encontrado espalhado
em quase todo o organismo e, além disso, concentra-se em algumas partes
onde forma coxins de apoio (nas palmas das mãos, planta dos pés e nádegas),
na cavidade abdominal (especialmente em estruturas denominadas epiplons e
em torno de órgãos dessa cavidade), nas camadas profundas da pele (camada
subcutânea) e na parte posterior dos globos oculares.
Além de reservatório energético e de servir como coxins de apoio, o te-
cido adiposo unilocular serve para preenchimento de locais entre órgãos e
de sustentação para eles. Há diferenças de gênero (homem/mulher) para a
distribuição do tecido adiposo unilocular. Esse tecido ainda forma o panículo
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adiposo, que fica sob a pele, absorvendo os impactos e funcionando como


isolante térmico. Assim, as células do tecido conjuntivo podem se diferenciar
para formá-lo. Observe a Figura 2:

Figura 2. Tecido adiposo amarelo (ou unilocular).


Fonte: Connor (2009).

Tecido adiposo pardo (ou multilocular)


As células desse tecido são menores do que as do unilocular, pois em vez
de uma grande gota de gordura, o tecido é constituído por diversas gotículas
(vacúolos), que se espalham por todo o citoplasma. São ricas em mitocôndrias,
organelas que produzem energia e calor. Os animais hibernantes têm bastante
desse tipo de tecido, porque o calor produzido irá manter a temperatura do
corpo em períodos longos de frio. Nesses animais, durante a hibernação, o
sangue, que fica na rede de vasos sanguíneos dentro desses tecidos, se aquece,
sendo bombeado para as outras partes do corpo na hora do despertar para o
verão, o que faz o organismo voltar a funcionar completamente.
Nos seres humanos, esse tecido é mais importante nos recém-nascidos,
para protegê-los do frio. É um tecido que só é formado enquanto o bebê está
no ventre, não sendo mais produzido na vida pós-natal. Verifique a disposição
do tecido adiposo pardo na Figura 3:
Anatomofisiologia do tecido adiposo 85

Figura 3. Principais locais de depósito dos tipos de tecido adiposo, funções e consequências
fisiopatológicas.
Fonte: MOL (2016).

A distribuição de tecido adiposo está associada à saúde e também à doença.


Vários compartimentos distintos de tecido adiposo podem ser identificados
quando ocorre excesso de peso. As mulheres obesas, tipicamente, apresentam
obesidade na porção inferior do corpo. Ao contrário, os homens quando se
tornam obesos, o maior local de deposição de gordura é a porção superior do
corpo. Esta obesidade truncal tem duas localizações: subcutânea e intraperitoneal
(visceral). Por alguma razão, a obesidade abdominal parece estar mais associada
à síndrome metabólica do que à obesidade da porção inferior do corpo.
Alguns dados sugerem que a conversão autócrina de cortisona a corti-
sol pela 11b-hidroxiesteroide desidrogenase-1, especificamente, no tecido
adiposo intra-abdominal (visceral), pode desempenhar um importante fator
nas complicações metabólicas da obesidade. Parece que este tecido adiposo
é mais resistente à insulina e libera mais produtos metabolicamente ativos
para a circulação.
O perfil de secreção do tecido adiposo visceral difere daquele do tecido
adiposo subcutâneo. Como exemplo, a produção de leptina e de adiponectina é
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mais acentuada no tecido adiposo subcutâneo, enquanto a interleucina-6 (IL-6)


e o inibidor do ativador de plasminogênio 1 (PAI-1) são mais abundantes no
tecido adiposo visceral. Também, a expressão de receptores para angioten-
sina 1, adrenérgicos b3, glicocorticoides e andrógenos é mais evidente no
tecido visceral. Por isso, essas observações levantam a possibilidade de que
o tecido adiposo não seja apenas um órgão endócrino, mas sim, um grupo de
órgãos semelhantes, porém com funções e secreções distintas.
Outra importante constatação é que os produtos liberados pela gordura
visceral vão direto para a veia porta e inundam o fígado, comprometendo a
sua função. Assim, nem todos os depósitos do tecido adiposo do organismo
produzem as mesmas substâncias e, portanto, contribuem de forma diferente
com os distúrbios metabólicos envolvidos na obesidade.
O tecido adiposo desempenha uma função no metabolismo energético,
produz peptídeos e proteínas com ação a distância, em uma verdadeira função
endócrina, secreta de enzimas envolvidas no metabolismo de hormônios este-
roides e expressa vários receptores, sendo, portanto, alvo da ação de diversos
hormônios. Com isso, estabelece-se uma ampla comunicação entre as células
adiposas e o fígado, o cérebro e o pâncreas, o que permite, no indivíduo normal,
uma regulação da quantidade de tecido adiposo por intermédio da adequação
da ingestão e da queima de combustíveis com produção de energia. O acúmulo
excessivo de tecido adiposo, levando ao sobrepeso e à obesidade, representa
uma quebra do intrincado equilíbrio metabólico que mantém o peso de um
indivíduo normal estável por décadas ou mesmo pela vida toda. Levando-se
em conta que um indivíduo adulto ingere em torno de 800.000 Kcal por ano,
apenas um erro de regulação de 5% é suficiente para acumular 40.000 Kcal
por ano, o que reflete um ganho de peso de 5,7kg.
No caso da síndrome metabólica, é um conjunto de alterações que compro-
mete, em última análise, a qualidade de vida e a longevidade de um indivíduo.
Vários estudos têm mostrado a associação entre obesidade e todos os fatores
de risco para síndrome metabólica. Essa associação se refere às substâncias
liberadas pelo tecido adiposo, dentre os quais se tem:

„„ Ácidos graxos livres não esterificados (NEFA);


„„ Citocinas inflamatórias;
„„ PAI-1 (inibidor do ativador de plasminogênio 1);
„„ Adiponectina;
„„ Leptina;
„„ Proteínas estimuladoras da acilação;
„„ Glicocorticoides;
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„„ Hormônios sexuais;
„„ TNF-a;
„„ TGF-β.

Durante o jejum, a hidrólise de triglicerídeos ocorre em um ritmo rápido,


liberando NEFA para entrar na circulação. A hidrólise de triglicerídeos é
mediada pela lipase sensível a hormônio, cuja atividade é aumentada pelas
catecolaminas e inibida pela insulina. Alguns acreditam que o aumento da
liberação de NEFA ocorra, porque os adipócitos são relativamente resistentes
à insulina e vários polimorfismos têm sido descritos afetando a membrana
plasmática do adipócito, tal como na glicoproteína-1 da membrana (PC-1),
substrato do receptor de insulina 1 e 2 (IRS-1 e IRS-2).
Assim, quando os indivíduos que carregam estes polimorfismos se tor-
nam obesos, seus adipócitos são duas vezes mais resistentes à insulina e a
liberação de NEFA é duplicada. As adipocitocinas, produzidas no tecido
adiposo, podem atuar localmente ou a distância, alterando a sensibilidade
à insulina em órgãos-alvo, como tecidos musculares e o fígado ou podem
atuar por mecanismos neuroendócrinos, autonômicos ou mesmo por vias
imunológicas.
O tecido adiposo produz citocinas inflamatórias, dentre as quais o fator
de necrose tumoral a (TNF-α) e interleucina-6 (IL-6). Essa liberação é au-
mentada na obesidade, acreditando-se que a obesidade possa ser uma grande
síndrome inflamatória. Logo, o estado protrombótico do paciente obeso é
motivado pela produção aumentada de PAI-1. Por outro lado, há a redução
da adiponectina, o que reduz a sensibilidade das células-alvo à insulina. Já o
aumento da leptina tem sido proposto como causa do aumento da oxidação
de ácidos graxos no fígado.
O tecido adiposo é o grande agente causal da síndrome metabólica e de
algumas das substâncias produzidas que ganharão destaque a seguir:

Leptina
Desde a sua descoberta, em 1994, a leptina assumiu um papel-chave na home-
ostase energética. É um peptídeo de 16kDa, com 167 aminoácidos, secretada
em proporção ao tecido adiposo presente. Funciona, no ser humano, como um
marcador da quantidade de tecido adiposo. O receptor de leptina pertence à
família das citocinas e ocorre em cinco isoformas. Ela age por meio de uma
regulação crônica, da qual controla a ingestão alimentar e a massa adipocitária,
através de uma regulação aguda, relacionada à ingestão alimentar. Dessa forma,
88 Anatomofisiologia do tecido adiposo

de 4 a 7 horas após a ingestão alimentar, há a elevação da leptina e, em caso


de subalimentação ocorre a redução dos níveis de leptina. Os experimentos
iniciais que levaram à descoberta e à compreensão de alguns dos efeitos da
leptina vieram de estudos em ratos. Ratos deficientes em leptina (ob/ob) exi-
bem hiperfagia, obesidade, hipercortisolemia, infertilidade e diabetes, com
reversão do quadro na administração exógena da adipocitocina. Observar-se
que a administração de leptina, mesmo em doses que não são suficientes para
fazer perder peso, atua reduzindo a resistência à insulina, o que mostra que tal
efeito não é dependente da perda de peso. A melhora da resistência à insulina
ocorre tanto com a administração intraventricular de leptina (mecanismo
mediado pelo hipotálamo) quanto pela ação direta em músculo ou fígado.
Em seres humanos é muito rara a deficiência de leptina e os casos descritos
são de indivíduos com obesidade mórbida, hipogonadismo hipogonadotrófico
e resistência à insulina. A maioria dos pacientes obesos apresenta altos ní-
veis de leptina, sugerindo resistência do receptor à ação desta adipocitocina.
Analise a Figura 4:

Figura 4. Adiponectina.
Fonte: Ttsz (2015).
Anatomofisiologia do tecido adiposo 89

A adiponectina, pelas suas funções anti-inflamatória, antiaterogênica e


antidiabética, constitui-se o mais poderoso protetor metabólico secretado
pelo tecido adiposo. Infelizmente, no momento em que o adipócito começa
a acumular gordura, ele vai progressivamente perdendo a sua capacidade de
produção de adiponectina, o que abre espaço para uma sequência de compli-
cações observadas na obesidade.
Em 1995 e 1996, essa substância foi caracterizada por quatro grupos que
trabalhavam independentemente e esta é a razão dos vários nomes que aadi-
pocitocina já recebeu: apM1 - adipose most abundant gene transcript 1; acrp30
- adipocyte complement-related protein of 30kDa; adipoQ; GBP28-gelatin
binding protein of 28kDa. Este polipeptídeo de 247 aminoácidos e 30kDa é
produzido, exclusivamente, pelo tecido adiposo e sua concentração é maior
na gordura subcutânea em comparação à visceral.
Foram identificados dois tipos de receptores para adiponectina (AdipoR1
e AdipoR2), com sete domínios transmembrana, mas, funcional e estru-
turalmente distintos dos receptores acoplados à proteína G. O AdipoR1 se
expressa, primariamente, no músculo e tem alta afinidade para a adiponectina
globular, enquanto que o AdipoR2 se expressa, primariamente, no fígado e
tem afinidade intermediária, tanto para a adiponectina globular, quanto para
a molécula completa ( full-length adiponectin).
Portanto, os efeitos biológicos dependem tanto da proporção das isoformas
de adiponectina circulantes quanto da expressão diferencial dos receptores
nos diversos tecidos. Está bem estabelecida uma poderosa correlação inversa
entre adiponectina, resistência à insulina e estados inflamatórios que enfatiza
a notável capacidade antidiabetogênica e anti-inflamatória dessa adipocitocina.
Assim, vários mecanismos têm sido descritos para explicar os efeitos
metabólicos da adiponectina. No fígado, aumenta a sensibilidade à insulina,
reduz o influxo de ácidos graxos não esterificados, aumenta a oxidação de
ácidos graxos e reduz a liberação de glicose. No músculo, ela estimula a
utilização de glicose e a oxidação de ácidos graxos. Na parede vascular, inibe
a adesão de monócitos, reduz a expressão de moléculas de adesão, também
impede a transformação de macrófagos em células espumosas (fase inicial
da aterogênese) e reduz a proliferação de células de músculo liso em resposta
a fatores de crescimento. Além disso, aumenta a produção de óxido nítrico
pela célula endotelial e estimula a angiogênese.
90 Anatomofisiologia do tecido adiposo

TNF-a
É uma proteína transmembrana de 26kDa, que é clivada em uma fração de
17kDa biologicamente ativa. Trata-se de uma citocina pró-inflamatória, que
não é secretada para a circulação sistêmica, pois age de forma parácrina ou
autócrina. No tecido adiposo, TNF-a é expresso no adipócito e nas células
estromo-vasculares. Tem sido implicado na patogênese da obesidade e na
resistência à insulina. Quanto aos mecanismos envolvidos na ação do TNF-a,
ele influencia a expressão gênica em tecido adiposo e no fígado. No tecido
adiposo, TNF-a reprime genes envolvidos com a captação e estoque de ácidos
graxos não esterificados e glicose, suprime genes para fatores de transcrição
envolvidos na adipogênese e na lipogênese e modifica a expressão de vários
fatores secretados pelo adipócito, incluindo adiponectina e IL-6. Já no fígado,
TNF-a suprime a expressão de genes envolvidos na captação e metabolismo
da glicose e oxidação de ácidos graxos, também aumenta a expressão dos
genes envolvidos na síntese de novo colesterol e ácidos graxos.
Quanto à ação da insulina, o TNF-a altera sua sinalização, através do
aumento da fosforilação em serina dos substratos de insulina 1 e 2 (IRS-1 e
IRS-2), tornando-os pobres substratos para as quinases do receptor de insulina
e aumentando sua taxa de degradação. Como o TNF-a aumenta os ácidos
graxos não esterificados, ele provoca, indiretamente, aumento da resistência
à insulina (ciclo de Randle).

Interleucina-6
É também uma citocina pró-inflamatória que tem sido associada à resistência
à insulina. É secretada por células imunes, fibroblastos, células endoteliais,
músculo-esquelético e tecido adiposo. O tecido adiposo visceral libera mais IL-6
do que o tecido subcutâneo e parece também ser secretada mais pela célula do
estroma do que pelo adipócito. Há evidências sugerindo que a IL-6 suprima, no
fígado, a tradução do sinal do receptor de insulina. Semelhante ao TNF-α, a IL-6
aumenta os ácidos graxos circulantes a partir do tecido adiposo, o que contribui
para a resistência à insulina (ciclo de Randle). Diferentemente do TNF-α, a
IL-6 age sistemicamente e localmente para modular a sensibilidade à insulina.

Inibidor do ativador do plasminogênio 1 (PAI-1)


Secretado por várias células componentes do tecido adiposo, incluindo o
adipócito, é um inibidor da fibrinólise e se encontra elevado na obesidade.
Anatomofisiologia do tecido adiposo 91

A perda de peso e o tratamento com drogas do grupo das tiazolidinedionas


reduzem seus níveis séricos e os riscos trombóticos. O TNF-α contribui para
os níveis elevados de PAI-1 e para a resistência à insulina. Como o PAI-1 pode
contribuir para o desenvolvimento de obesidade e de resistência à insulina,
ele pode ser o elo entre a obesidade e a doença cardiovascular.

Proteínas do sistema renina-angiotensina (RAS)


Renina, angiotensinogênio, angiotensina I, angiotensina II, receptores de
angiotensina tipo 1 (AT1) e 2 (AT2), enzima de conversão de angiotensina
(ACE) e proteases, capazes de produzir angiotensina II, são produzidas pelo
tecido adiposo. Dessa forma, o RAS do tecido adiposo é uma ligação causal
potencial entre obesidade e hipertensão arterial. Componentes do sistema
RA são induzidos durante a adipogênese. A angiotensina II promove o cres-
cimento do adipócito e sua diferenciação. Também inibe a lipólise, promove
lipogênese, diminui a captação de glicose dependente de insulina e aumenta
a gliconeogênese e a glicogenólise hepática. O RAS do tecido adiposo regula
a expressão de fatores endócrinos derivados do tecido adiposo, como prosta-
ciclinas, óxido nítrico, PAI-1 e leptina.

Visfatina e omentina
Essas duas novas adipocitocinas foram recentemente descobertas como mais
produções do tecido adiposo. A visfatina é produzida, preferencialmente, pelo
tecido adiposo visceral, em que é um fator estimulador de colônias em células
pré-B (pré-linfócito B) e aumenta a ação da insulina, ligando-se ao receptor de
insulina em local diferente da ligação de insulina. A omentina foi clonada de
uma biblioteca genômica de tecido adiposo omental. Expressa-se somente no
tecido adiposo visceral e em células intestinais de Paneth, além de aumentar
a sensibilidade à insulina, com o acréscimo de captação de glicose em 30%.

Enzimas envolvidas no metabolismo de hormônios


esteroides
O tecido adiposo apresenta um completo arsenal metabólico para ativação,
interconversão e inativação de hormônios esteroides. Como a quantidade
de tecido adiposo é grande, a contribuição dos hormônios esteroides por ele
produzido é significativa. A aromatase (que converte andrógenos a estrógenos)
e a 17-b-hidroxiesteroide desidrogenase (17bHSD - que converte andrógenos
92 Anatomofisiologia do tecido adiposo

fracos, como androstenediona, a andrógenos potentes, como a testosterona)


são duas enzimas altamente expressas no tecido adiposo, tanto nas células
do estroma quanto nos pré-adipócitos. O tecido adiposo visceral também
tem maior ação de 17bHSD do que de aromatase, constituindo-se em local
importante de produção androgênica.
Quanto ao metabolismo de glicocorticoides, é a enzima 11bHSD1 que cata-
lisa a conversão de metabólitos hormonalmente inativos (cortisona) em ativos
(cortisol). É uma enzima altamente expressa no tecido adiposo, particularmente,
no visceral. Acredita-se que há uma correlação entre o metabolismo glicocor-
ticoide mediado pela 11bHSD1, a obesidade visceral e a síndrome metabólica.
Além disso, drogas que inibem a enzima em questão têm sido estudadas como
potenciais para tratamento da obesidade e da síndrome metabólica.

Tecido adiposo e posicionamento das demais


estruturas anatômicas
A camada de tecido adiposo profunda da pele é chamada de hipoderme, pode
ser mais ou menos desenvolvida conforme a região do corpo e o estado nutri-
cional do indivíduo. Em geral, a hipoderme é bem desenvolvida na coxa, parede
inferior do abdômen e nas regiões glútea e lombar. Visualize as Figuras 5 e 6:

Figura 5. Áreas onde a hipoderme é bem desenvolvida.


Fonte: Adaptada de Desenhos (2010).
Anatomofisiologia do tecido adiposo 93

Figura 6. Hipoderme.
Fonte: Silva (2010).

A diferença de contorno do corpo em homens e mulheres, uma das carac-


terísticas sexuais secundárias, é resultado de diferentes espessuras da camada
de tecido adiposo, nas diferentes regiões do corpo. Na cavidade abdominal, o
tecido adiposo pode ser encontrado em partes do peritônio, como omentos e
mesentério, no espaço retroperitoneal, inclusive em torno dos rins formando
a loja renal. Acompanhe na Figura 7:

Figura 7. Peritônio.
Fonte: Peritônio (2017).
94 Anatomofisiologia do tecido adiposo

Em algumas regiões, o tecido adiposo tem a função de diminuir impactos.


É o caso da porção de tecido que está localizado na palma da mão, na planta
do pé e no corpo adiposo da órbita (em torno do bulbo do olho). Dessa forma,
o tecido adiposo localizado nesses locais não diminui mesmo em períodos os
quais há redução da ingestão de calorias.
O tecido adiposo está envolvido em processos como a formação dos tri-
glicerídeos, que se originam da seguinte maneira:

„„ Absorvidos da alimentação e trazidos até as células adiposas como


triglicerídeos dos quilomícrons.
„„ Oriundos do fígado e transportados até o tecido adiposo, sob a forma de
lipoproteínas de pequeno peso molecular ou VLDL (Very Low Density
Lipoproteins).
„„ Da síntese nas próprias células adiposas, a partir de glicose.

Os quilomícrons são partículas formadas pelas células epiteliais do intestino


delgado, a partir de nutrientes absorvidos. São constituídos por 90% de trigli-
cerídeos e pequenas quantidades de colesterol, fosfolipídios e proteínas. Nos
capilares sanguíneos do tecido adiposo, graças à enzima lipase lipoproteica,
produzida pelas células adiposas, ocorre a hidrólise dos quilomícrons e das
lipoproteínas (VLDL) plasmáticas, com a liberação de seus componentes, áci-
dos graxos e glicerol, que se difundem para o citoplasma das células adiposas,
onde se recombinam para formar novas moléculas de triglicerídeos que são
depositadas. As células adiposas podem sintetizar ácidos graxos e glicerol
a partir de glicose, processo que é acelerado pela insulina. Esse hormônio
também estimula a penetração da glicose na célula adiposa.
Quando necessária, a hidrólise dos triglicerídeos é desencadeada, princi-
palmente, pela noradrenalina. Esse neurotransmissor é liberado pelas termi-
nações pós-ganglionares dos nervos simpáticos do tecido adiposo e captado
por receptores da membrana dos adipócitos que ativam a lipase sensível a
hormônio (intracelular), promovendo a liberação de ácidos graxos e glicerol,
que se difundem para os capilares do tecido adiposo. Os ácidos graxos, que
são quase insolúveis na água, ligam-se à parte hidrofóbica das moléculas de
albumina do plasma sanguíneo e são transportados para outros tecidos, onde
serão utilizados como fonte de energia. O glicerol, muito solúvel no plasma,
é captado pelo fígado e reaproveitado.
Portanto, o tecido adiposo unilocular e o multilocular são inervados por
fibras simpáticas do sistema nervoso autônomo, que desempenham impor-
tante papel na mobilização de gorduras, quando os organismos são sujeitos
Anatomofisiologia do tecido adiposo 95

a atividades físicas intensas, a jejuns prolongados ou ao frio. A remoção dos


lipídios, nos casos de necessidade energética, não se faz por igual em todos os
locais. Primeiro são mobilizados os depósitos subcutâneos, os do mesentério
e os retroperitoneais, enquanto que o tecido adiposo, localizado nos coxins
das mãos e dos pés, resiste a longos períodos de desnutrição.
O tecido adiposo unilocular é também um órgão secretor. Sintetiza vá-
rias moléculas como a leptina, que são transportadas pelo sangue, e a lipase
lipoproteica. A leptina é um hormônio proteico, que participa da regulação da
quantidade de tecido adiposo no corpo e da ingestão de alimentos. A leptina
atua no hipotálamo, diminuindo a ingestão de alimentos e aumentando o
gasto de energia.

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DESENHOS para colorir: corpo humano. Rota 83, 2010. Disponível em: <http://www.
rota83.com/desenhos-para-colorir-corpo-humano.html>. Acesso em: 28 set. 2017.
MOL. Tecido Adiposo Multilocular. In: MOL. Microscopia OnLine: seu guia interativo
de Histologia. São Paulo: USP, 2016. Disponível em: <http://www.icb.usp.br/mol/5-5-
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PERITÔNIO: o que é, funções e onde fica? Anatomia do corpo humano, [2017]. Disponível
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96 Anatomofisiologia do tecido adiposo

Leituras recomendadas
AHIMA, R. S.; FLIER, J. S. Adipose tissue as an endocrine organ. Trends in Endocrinology
and Metabolim, Philadelphia, v. 11, p. 327-332, 2010.
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